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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE LETRAS PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS – PROGRAMA DE LÍNGUA E CULTURA LUCÉLIA RAMOS ALCÂNTARA TOO GOOD TO BE TRUE? EM BUSCA DE UMA PEDAGOGIA CRÍTICA E CULTURALMENTE SENSÍVEL PARA O ENSINO DE LEITURA EM LÍNGUA INGLESA Salvador 2011

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

INSTITUTO DE LETRAS PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS – PROGRAMA DE LÍNGUA E CULT URA

LUCÉLIA RAMOS ALCÂNTARA

TOO GOOD TO BE TRUE? EM BUSCA DE UMA PEDAGOGIA CRÍTICA E CULTURALMENTE SENSÍVEL PARA O ENSINO DE LEITURA EM LÍNGUA INGLESA

Salvador 2011

LUCÉLIA RAMOS ALCÂNTARA

TOO GOOD TO BE TRUE? EM BUSCA DE UMA PEDAGOGIA CRÍTICA E CULTURALMENTE SENSÍVEL PARA O ENSINO DE LEITURA EM LÍNGUA INGLESA

Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Letras – Programa de Língua e Cultura do Instituto de Letras da Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Linguística Aplicada. Orientação: Profa Dra Edleise Mendes.

Salvador 2011

Sistema de Bibliotecas - UFBA

Alcântara, Lucélia Ramos. Too good to be true? Em busca de uma pedagogia crítica e culturalmente sensível para o ensino de leitura em língua inglesa / Lucélia Ramos Alcântara. - 2011. 165 f. : il. Inclui apêndices e anexos.

Orientadora: Profª Drª Edleise Mendes. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Instituto de Letras, Salvador, 2011. 1. Leitura. 2. Língua inglesa - Estudo e ensino - Estudantes estrangeiros. 3. Pedagogia crítica. 4. Educação intercultural. 5. Professores de línguas - Formação - Salvador (BA). I. Mendes, Edleise. II. Universidade Federal da Bahia. Instituto de Letras. III. Título.

CDD - 371.396 CDU - 028.42(07)

A

Júlia, minha filha, razão pela qual busco incessantemente o crescimento.

Meus alunos, sem os quais esta pesquisa de nada valeria.

AGRADECIMENTOS

Devo, em princípio, esclarecer que os agradecimentos não aparecem em ordem de

importância, mas sim representados por conexões, grupos, como familiares, amigos, colegas

de trabalho, alunos etc.

A Deus, por me ter dado a oportunidade de chegar até aqui, ainda que as pedras no caminho

tenham sido bem escorregadias.

À minha orientadora especialíssima (sem exagero nenhum!), a professora doutora Edleise

Mendes, sem a qual este trabalho certamente teria perdido o rumo, já que meus anseios vão

além do que eu realmente posso fazer em uma dissertação (aguardemos as cenas dos

próximos capítulos!).

A Ely, Isabelle e Raquel, que estiveram em prontidão sempre que eu precisei e sem as quais

não haveria dados para esta pesquisa.

A meu pai (in memoriam), de quem me lembrei em todos os momentos em que a

descontração e o sorriso foram mais importantes do que os problemas com a pesquisa.

À minha mãe, por ter-me dado o exemplo indo às suas aulas na faculdade após chegar do

trabalho de noite, só voltando pra casa depois das 22 horas, extremamente cansada, para se

graduar.

À minha filha, Júlia, por me ensinar que ser mãe está acima de trabalho, estudos ou qualquer

outra coisa, proporcionando-me momentos intensos de amor, compreensão e aprendizado.

Aos meus familiares paternos, por me mostrarem que não há limites para quem tem objetivos

traçados.

Aos meus familiares maternos, por tornarem a família uma instituição importante em minha

vida e me darem os irmãos que não tive.

Aos meus amigos, em especial à minha amiga-irmã Carol e a Jéssica, por terem me ouvido

pacientemente em todos os momentos de angústia quando não sabia que caminho seguir.

À professora, colega e, essencialmente, amiga Fabrícia, que discutiu comigo detalhes

importantíssimos para o desenvolvimento desta pesquisa.

À minha amiga Conceição Rezende (in memoriam), minha primeira “mãe profissional”, que

confiou no meu trabalho aos 17 anos de idade e me colocou em uma sala de aula.

À minha segunda “mãe profissional”, a professora Conceição Torres, que, além de me dar a

oportunidade de buscar outros caminhos, proporcionou-me treinamento de qualidade.

Aos amigos do CEIFE, com os quais muito aprendi.

Aos amigos do LINCE, grupo de pesquisa do qual faço parte com muito orgulho e satisfação.

Às amigas Erika e Manuela, que me acompanham desde a graduação.

À amiga Conceição Oliveira, que demonstra diariamente confiar no meu trabalho.

Aos professores doutores Adelaide Oliveira e Sávio Siqueira, que muito contribuíram para a

minha vida acadêmica, especialmente no momento da minha especialização.

À professora Cláudia Mesquita, por ter-me convidado a dar aulas no Programa de

Licenciaturas Especiais – Língua Estrangeira na UFBA, proporcionando o contato com as

professoras agentes desta pesquisa.

Finalmente, a todos os meus alunos, os quais formaram a profissional que hoje sou, ainda

incompleta, mas ansiosa pelos desafios que ainda virão.

A todos vocês, muito obrigada!

A experiência nos ensina que nem todo óbvio é tão óbvio quanto parece. Assim, é com uma obviedade que começamos este trabalho: toda prática educativa envolve uma postura teórica por parte do educador. Esta postura, em si mesma, implica – às vezes mais, às vezes menos explicitamente – numa concepção dos seres humanos e do mundo. E não poderia deixar de ser assim. É que o processo de orientação dos seres humanos no mundo envolve não apenas a associação de imagens sensoriais, como entre os animais, mas, sobretudo, pensamento-linguagem; envolve desejo, trabalho-ação transformadora sobre o mundo, de que resulta o conhecimento do mundo transformado. Este processo de orientação dos seres humanos no mundo não pode ser compreendido, de um lado, de um ponto de vista puramente subjetivista; de outro, de um ângulo objetivista mecanicista. Na verdade, esta orientação no mundo só pode ser realmente compreendida na unidade dialética entre subjetividade e objetividade. Assim entendida, a orientação no mundo põe a questão das finalidades da ação ao nível da percepção crítica da realidade.

Paulo Freire, 1981, p.34

ALCÂNTARA, Lucélia Ramos. Too good to be true? Em busca de uma pedagogia crítica e culturalmente sensível para o ensino de leitura em Língua Inglesa. 165 fl. 2011. Dissertação (Mestrado) – Instituto de Letras, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2011.

RESUMO

Nesta pesquisa, investiguei o trabalho de professoras de Língua Inglesa, graduadas em Língua Estrangeira – Inglês, na UFBA, pelo Programa de Licenciaturas Especiais – PROLE, analisando a aplicabilidade das pedagogias críticas e culturalmente sensíveis para o ensino de leitura em Língua Inglesa, no Ensino Médio de escolas públicas estaduais em Salvador. Dentro desse cenário de investigação, visei propor atividades autoformativas, tendo como objetivo maior a formação de professores mais conscientes de seu papel social, assim como de alunos-cidadãos e críticos. Para tanto, defini, a partir de uma síntese das perguntas norteadoras desta pesquisa, aquela que orientou todo o percurso da investigação: “De que forma atividades construídas na perspectiva das pedagogias críticas e culturalmente sensíveis, seguindo, portanto, os princípios e orientações apresentados pelo PCN+, podem contribuir para o ensino de leitura em Língua Inglesa e, concomitantemente, para a formação de alunos-cidadãos, capazes de se posicionarem criticamente diante da realidade que vivenciam?”. A partir do diálogo com teóricos como Almeida Filho, Hall, Mendes, Moita Lopes, Rajagopalan, Siqueira, Tomitch, entre outros, discuti o tema da leitura em língua estrangeira, refleti sobre alguns documentos orientadores para o ensino de LE e desenvolvi reflexões sobre diferentes perspectivas críticas e culturalmente sensíveis para a abordagem da leitura e do ensino de LE de modo geral. Assumi, desse modo, como objetivo geral deste trabalho, propor estratégias para o trabalho com a leitura em Língua Inglesa sob essa perspectiva. Propus, então, atividades autoformativas às professoras agentes desta pesquisa e analisei o resultado da sua aplicação, começando por verificar o posicionamento das docentes diante dos pressupostos teóricos do PCN+. Utilizei suas respostas para construir o roteiro da entrevista semi-estruturada, que foi aplicada em seguida ao primeiro questionário, com o intuito de esclarecer tal posicionamento. O próximo passo foi sugerir às professoras que experimentassem, com seus alunos, as atividades supracitadas, cujos resultados geraram novos dados (por meio de suas respostas a um segundo questionário), para serem triangulados com os anteriores, provenientes do primeiro questionário e da entrevista. A partir da revisão teórica, discussão e análise dos dados obtidos, percebi a dificuldade das professoras devido à falta de equipamentos, às salas de aulas cheias, à falta de materiais didáticos adequados e à violência que se configura entre os alunos das escolas e das comunidades em que elas atuam. Também pude verificar o despreparo das professoras para trabalharem de acordo com os pressupostos teóricos embasados nas pedagogias críticas e na interculturalidade, fato facilmente explicado pela graduação por elas cursada, a qual peca por não oferecer formação em ensino/aprendizagem de cultura atrelada à educação; além disso, o ensino gramatical descontextualizado ainda impera, devido à tradição já estabelecida no ensino de línguas nas escolas regulares em geral. No entanto, a partir das atividades autoformativas por mim sugeridas e pelas professoras aplicadas, verifiquei que é possível trabalhar de forma crítica e culturalmente sensível para o desenvolvimento da leitura em Língua Inglesa como língua estrangeira e atingir resultados positivos, visto que as respostas dos alunos – resultantes das atividades propostas – evidenciam sua capacidade de se posicionar e refletir a respeito de questões relevantes em sua realidade, partindo do trabalho significativo com o texto em Língua Inglesa. Palavras-chave: Leitura. Pedagogias Críticas e Culturalmente Sensíveis. Língua Inglesa.

ALCÂNTARA, Lucélia Ramos. Too good to be true? In search for a culturally sensitive critical pedagogy to the teaching of reading in the English Language. 165 pp. 2011. Master Dissertation – Instituto de Letras, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2011.

ABSTRACT

This research is aimed at investigating the practice of English Language teachers whose major was Foreign Language – English at UFBA, through Programa de Licenciaturas Especiais – PROLE. I analyzed the applicability of culturally sensitive critical pedagogies to the teaching of reading in English to high school students at public state schools in Salvador. Considering this investigation scenery, I aimed at suggesting self-formative activities, with the major goal of qualifying these educators to be more conscious of their social role, as well as forming critical students-citizens. With this in mind, I defined, from a synthesis of the leading questions of this research, the one which has oriented the whole investigation path: “In what way can activities built at the light of culturally sensitive and critical pedagogies – following, therefore, the presuppositions presented by PCN+ - contribute to the teaching of reading in the English Language and, simultaneously, to the formation of students-citizens who are able to state (critically) their point of view toward the reality they experience?”. From the dialogue with theorists as Almeida Filho, Hall, Mendes, Moita Lopes, Rajagopalan, Siqueira, Tomitch, among others, I brought to discussion the theme of reading in a foreign language, reflected over some documents which guide the teaching of foreign language and developed thoughts concerning different critical and culturally sensitive perspectives to the approach of reading and foreign language teaching in general. This way, I took over the proposition of strategies to work with reading in English as the main goal of this dissertation. I posited, then, self-formative activities to the teachers-agents of this research and analyzed the results of their application. I started by verifying the teachers’ position toward the PCN+ theoretical presuppositions. Then I used their answers to create the semi-structured interview script which was applied after the first data-collecting questionnaire, aiming at clarifying the teachers’ interview answers. The next step was to suggest that the teachers experienced with their students the above-mentioned activities; their results lead to new data (through the answers to a second questionnaire) to be crossed with the ones previously collected – from questionnaire 1 and interview. From the theoretical review, discussions and analysis of the data obtained, I realized the teachers’ have difficulties to work because of the lack of equipments, the full classrooms, the lack of adequate teaching materials and the violence which surrounds the students and communities they are part of. I could also verify the teachers’ lack of preparation to work with the theoretical presuppositions based on intercultural and critical pedagogies, fact that can be easily explained by the poor undergraduate studies which fail while offering good quality formation in the teaching/learning of culture linked to education. Besides, decontextualized grammar teaching still rules because of its long-term tradition at regular schools in general. However, from the self-formative activities suggested by me and applied by the teachers, I verified it is possible to work in a critical and culturally sensitive way to develop reading in English as a foreign language and achieve positive results since the students’ answers – resulting from the activities applied – demonstrate their capacity to state their point of view and reflect over relevant issues in their realities by going through the meaningful work with the English Language text. Keywords: Reading. Culturally Sensitive and Critical Pedagogies. English Language.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

QUADRO – Formação profissional das professoras agentes da pesquisa 22

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Instrumentos de pesquisa 26

Figura 2 – Abordagem conteudista X abordagem culturalmente sensível 64

Figura 3 – The first pregnant man 66

Figura 4 – Perspectiva de uma aula culturalmente sensível 67

Figura 5 – Ensino de qualidade 77

Figura 6 – Sugestões para o ensino de leitura em LI 103

Figura 7 – Ideia central 105

Figura 8 – Brainstorming 106

Figura 9 – Sugestões de características da situação de sofrer bullying 111

Figura 10 – Sugestões de características de quem pratica bullying 112

Figura 11 – Sugestões de características de quem sofre bullying 112

Figura 12 – Ideal X real 128

LISTA DE ABREVIATURAS

ACIN – Abordagem Comunicativa Intercultural

ENEM – Exame Nacional de Ensino Médio

IFBA – Instituto Federal da Bahia

LA – Linguística Aplicada

LDBEN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

LE – Língua Estrangeira

LI – Língua Inglesa

LM – Língua Materna

LP – Língua Portuguesa

PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais

PCN+ - Orientações Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais

PROLE – Programa de Licenciaturas Especiais

Q1 – Questionário 1

Q2 – Questionário 2

SUMÁRIO

1 AMPLIANDO HORIZONTES 14

1.1 ANTECEDENTES DA PESQUISA 14

1.2 PERGUNTAS DE PESQUISA 18

1.3 OBJETIVOS 19

1.3.1 Objetivo Geral 19

1.3.2 Objetivos Específicos 19

1.4 PRINCÍPIOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS DA PESQUISA 20

1.5 AGENTES E INSTRUMENTOS DE PESQUISA 22

1.6 INSTRUMENTOS E PROCEDIMENTOS DE GERAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS 24

1.6.1 Fase 1: Questionário 1 (Q1) e pré-análise 24

1.6.2 Fase 2: Entrevista semi-estruturada 24

1.6.3 Fase 3: As atividades autoformativas e seus desdobramentos 25

1.7 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO 27

2 “EMPRESTANDO SENTIDOS” AO TEXTO EM LÍNGUA INGLESA 29

2.1 A LEITURA EM LÍNGUA ESTRANGEIRA 29

2.2 A LEITURA EM INGLÊS COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA: “OPENING A CAN

OF WORMS” 37

2.3 A LEITURA NOS DOCUMENTOS OFICIAIS: E O PCN+, O QUE DIZ? 41

3 POR UMA PEDAGOGIACRÍTICA E CULTURALMENTE SENSÍVEL

PARA O ENSINO DE LÍNGUA INGLESA 51

3.1 PEDAGOGIAS CRÍTICAS E INTERCULTURAIS EM LÍNGUA ESTRANGEIRA -

INGLÊS 51

3.2 PEDAGOGIAS CRÍTICAS NOS DOCUMENTOS OFICIAIS (PCN+) 59

3.3 UMA PEDAGOGIA CRÍTICA, O PCN+ E A SALA DE AULA 62

4 FORMAR UM LEITOR CRÍTICO E CULTURALMENTE SENSÍVEL E M

LÍNGUA INGLESA: TOO GOOD TO BE TRUE? 68

4.1 DIÁLOGO COM AS PROFESSORAS INFORMANTES: SEU “MUNDO

DIANTE DE NOSSOS OLHOS” 68

4.2 O PROLE 71

4.2.1 O saber sistematizado x o saber assistemático 72

4.2.2 As disciplinas cursadas e a práxis 78

4.3 O QUE É POSSÍVEL FAZER NO DIZER DAS PROFESSORAS? E O QUE DE

FATO ELAS FAZEM? 80

4.3.1 Interdisciplinaridade e postura crítica 80

4.3.2 O ensino de Língua Inglesa e a afirmação da identidade 87

4.3.3 Leitura e compreensão textual 90

4.3.4 Vocabulário e Gramática: de que forma abordá-los? 93

4.3.5 Produção de sentido 99

4.4 UM POSSÍVEL CAMINHO 102

4.4.1 Desenvolvimento de atividades de leitura na perspectiva crítica e culturalmente

sensível 102

4.4.2 As atividades sugeridas 106

4.4.3 Relato da experimentação da pesquisadora 114

4.4.4 Relato da experimentação das professoras participantes da pesquisa 117

5 “ANALISAR, INTERPRETAR, COMPREENDER E APLICAR” 124

REFERÊNCIAS 132

APÊNDICES 138

ANEXOS 158

1 AMPLIANDO HORIZONTES

1.1 ANTECEDENTES DA PESQUISA

Segundo Rajagopalan (2004, p.107), um professor ouvira de um aluno a seguinte

pergunta em uma aula introdutória sobre a linguística: “como é que um linguista ganha o

Prêmio Nobel?”; a resposta fora um tanto quanto desmotivadora: “um possível candidato

pode ser um linguista, porém ele vai ter que se qualificar por outro motivo” (DI PIETRO,

1977, p.3, apud RAJAGOPALAN, 2004, p.107). Isto porque a Linguística Geral ou Teórica

era uma ciência que mantinha distância do seu objeto de estudo, analisando-o do alto da “torre

de marfim” (RAJAGOPALAN, 2004, p.130), na qual não havia espaço para a preocupação

com a realidade, com as condições de vida da humanidade, fato essencial para ser o ganhador

do Prêmio Nobel. Este trabalho, portanto, que se qualifica dentro do paradigma qualitativo de

pesquisa na área da Linguística Aplicada – como disciplina independente que visa à melhoria

da qualidade de ensino/aprendizagem, e não como mera aplicação da Linguística Geral –

pretende, sim, de forma metafórica, qualificar-se ao “Prêmio Nobel”, à medida que pretende

trazer resultados que tenham a ver com a realidade das pessoas, melhorando suas condições

de vida, ou, mais especificamente, propondo reflexões aos professores de Língua Inglesa que

possam gerar benefícios ao aprendizado de seus alunos.

Isso será feito ao investigar e descrever a realidade, com o intuito de melhorá-la por

meio da geração de dados que facilitem a criatividade de educadores dispostos a mudarem

suas realidades, proporcionando a seus alunos: mais subsídios para sua formação como

cidadãos conscientes e participantes na transformação de problemas em soluções; a mudança

de reações estereotipadas para atitudes compreensivas e respeitosas; e o crescimento como

agentes de transformação de seus familiares, amigos, enfim, de suas comunidades.

Segundo Moita Lopes (2006, p.96), “nessa perspectiva, o ensino de ciências da LA que

se paute dentro de uma postura responsiva social, isto é, crítica, precisa abordar várias áreas

do conhecimento, tornando-se a área da Indisciplina”.

É preciso enxergar o sujeito como social e histórico, e não somente como racional; é

preciso abdicar das lentes da homogeneização e dar valor à diferença. Concordo com Moita

Lopes (2006, p.103) quando diz que o apagamento da sócio-história é inadequado para dar

conta da visão de LA contemporânea que defende. Assumindo essa postura, o educador

também estará garantindo o

princípio ético [que] é parte da constituição de uma coligação anti-hegemônica que colabora na construção de significados oriundos de outras vozes (daqueles marcados pelo sofrimento às margens da sociedade), assim como na construção de outro mundo social, construindo outra globalização, como acho que diria Milton Santos (2002), e reinventando a emancipação em nossos dias (MOITA LOPES, 2006, p.103-4).

Creio que, como acontece com todo professor apaixonado pelo que faz, a motivação

deste trabalho está nos alunos. Naqueles que já tive, nos que tenho e nos que ainda vou ter.

Dos mais jovens aos mais maduros, todos voltados para o mesmo fim: aprender inglês. No

entanto, preciso dizer que esta pesquisa tem como maiores inspiradores meus alunos-

professores, que estiveram presentes em minhas aulas em busca não só de conhecimentos,

mas de caminhos a seguir diante de uma realidade tão conhecida e ao mesmo tempo tão

aparentemente inalcançável: o ensino de Língua Inglesa na escola pública estadual na cidade

de Salvador – Bahia.

Refiro-me aos alunos do Programa de Licenciaturas Especiais (PROLE), com os quais

convivi por aproximadamente dois anos durante seu curso de graduação em Língua

Estrangeira – Inglês pela Universidade Federal da Bahia.

O Programa de Licenciaturas Especiais – PROLE – é um programa que visa a atender

à exigência do artigo 62 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), o qual

determina que

a formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal (Art. 62. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996) 1.

O Governo Federal e o Estado da Bahia, portanto, em cumprimento à lei, ofereceram

aos professores que não tinham licenciatura na disciplina que já lecionavam ou desejavam

lecionar a oportunidade de cursarem a graduação na Universidade Federal da Bahia. A turma

de Língua Estrangeira da qual participaram as professoras agentes desta pesquisa graduou-se

no primeiro semestre do ano de 2008, estando seus alunos-professores devidamente

habilitados para ensinar Língua Inglesa no ensino médio.

1 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso em: 09 jan. 2011.

Eram professores ditos “leigos”, por darem aulas em escolas estaduais sem possuírem

diploma, fato que o governo da Bahia estava “resolvendo” com o programa citado. Ministrei

várias disciplinas e coordenei seminários interdisciplinares, sempre tentando fornecer a esses

alunos-professores subsídios para que melhorassem seus conhecimentos acerca da língua

inglesa e, dessa forma, pudessem repassá-los a seus alunos. A dificuldade, no entanto, era

grande para a maioria do grupo. Poucos (cinco ou seis) eram fluentes em inglês em um grupo

de mais de quarenta alunos. Cada atividade que eu aplicava com eles em sala era “algo de

outro mundo”, como se diz. Muitos deles escreviam as respostas no caderno para que

pudessem usar a atividade para tirar cópia e aplicar com seus alunos em sala. Isso muito me

incomodava. Mas incômodo aqui tem sentido positivo; é a motivação de que eu precisava

para fazer algo para tentar ajudar esses professores e seus alunos, que representam apenas um

recorte do que acontece na maioria das escolas públicas - e em algumas particulares também.

Fui convidada a ser madrinha da turma e, ao dividir aquele momento da entrega dos

diplomas, continuei me perguntando o que seria daqueles alunos-professores, agora

licenciados em Língua Estrangeira pela Universidade Federal da Bahia, quando tivessem que

elaborar suas aulas e demonstrar conhecimentos da língua inglesa em seu dia a dia. Pedi que

eles fossem em busca de cursos livres de inglês, que buscassem uma pós-graduação, que

nunca parassem de se reciclar. Entretanto, sinto que ainda posso fazer um pouco mais.

De acordo com as Orientações Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais,

pela aquisição do adequado conhecimento lingüístico, o indivíduo pode apropriar-se de saberes, transmitir sua cultura e estabelecer vínculos com outras, ampliando seus horizontes. O estudo da língua estrangeira permite a reflexão sobre o idioma e a cultura como bens da cidadania, além de contribuir para a eliminação de estereótipos e preconceitos (PCN+, p.101).

Tenho consciência de que as “Orientações curriculares para o ensino médio: linguagens,

códigos e suas tecnologias” pregam que é preciso desenvolver a oralidade no ensino de língua

estrangeira. Nas palavras dos autores:

Daí entendermos a relevância da retomada – ou introdução, para algumas escolas – de um enfoque sobre a comunicação oral no nível médio, buscando consolidar um trabalho que foi priorizado em alguns anos do nível básico de ensino e suprir a demanda por essa forma de comunicação (PCN, 2004, p. 120).

No entanto, acredito no fato de que “a competência primordial do ensino de línguas

estrangeiras modernas no ensino médio deve ser a da leitura e, por decorrência, a da

interpretação” (PCN+, p.97), principalmente quando lidamos com uma realidade de quarenta

alunos por sala, sem material didático nem recursos adequados. Proponho, portanto, o

desenvolvimento de uma abordagem intercultural para a leitura, que agregue características

das pedagogias críticas para o ensino/aprendizagem de leitura em Língua Inglesa no ensino

médio. Entendo por abordagem os pressupostos teóricos que perpassam as atitudes para com

o ensino/aprendizagem em sala de aula ou, como nos diz Almeida Filho (1997, p.17),

força que orienta, e portanto caracteriza em essência, todo processo específico de ensino de língua.[...] A abordagem orienta o processo ou operação global de ensino que se compõe ordenadamente no seu todo das fases de planejamento de cursos, de produção ou adoção via análise dos materiais, das experiências realizadas para aprender, e das avaliações de rendimento efetuadas (ALMEIDA FILHO, 1997, p.17).

Para “intercultural” atribuo o mesmo sentido que Mendes (2008, p.61): “um esforço,

uma ação integradora, capaz de suscitar comportamentos e atitudes comprometidas com

princípios orientados para o respeito ao outro, às diferenças, à diversidade cultural que

caracteriza todo processo de ensino/aprendizagem [...]”. Adotarei, por escolha, o

ensino/aprendizagem de Língua Inglesa voltados para a leitura e a compreensão textual, visto

que, além de ser fundamental para o desenvolvimento de todas as outras, aplica-se melhor à

realidade das escolas públicas: salas cheias, falta de recursos etc.

Para que um docente adote uma abordagem que se diga “intercultural” para o ensino de

leitura em língua inglesa, portanto, é preciso estar preparado(a) para enfrentar muitos

desafios, entre eles a concepção já estabelecida de que os programas de ensino de Língua

Inglesa devem ser norteados por itens gramaticais. Além disso, também é necessário estar

pronto(a) para criar materiais em que, como diria Siqueira (2009, p.88), sejam levadas em

consideração “situações que tragam à tona temas de cunho político, ideológico, ético, social,

étnico, entre outros, ou seja, que contribuam para a formação da identidade do aprendiz (...)”.

Freire (1979, p.28) nos conta que “ninguém educa ninguém”. No entanto, apesar dessa

postura pró-ativa que se exige dos alunos, é preciso guiá-los, mostrar-lhes o caminho,

“conseguir que o educando reflita sobre sua própria realidade” (FREIRE, 1979, p.30). Isso se

faz mostrando que “a cultura consiste em recriar e não em repetir. O homem pode fazê-lo

porque tem uma consciência capaz de captar o mundo e transformá-lo” (FREIRE, 1979, p.31).

É por meio da aquisição do conhecimento de outras realidades que os alunos devem construir

sua identidade própria, afirmando suas raízes e respeitando as alheias. Para tanto, o caminho a

seguir exige que se veja a Língua Inglesa não apenas como uma disciplina a ser ministrada,

mas como uma ponte entre o indivíduo e o mundo, o desconhecido.

Portanto, defino uma abordagem que se diga intercultural para o ensino de leitura como

o processo de ensino/aprendizagem de estratégias para leitura e compreensão textual em uma

língua estrangeira (no caso, inglês) capaz de suscitar comportamentos e atitudes menos

estereotipadas e mais comprometidas e respeitosas em relação à pluralidade cultural. As

pedagogias críticas e a noção de interculturalidade, características essenciais desta pesquisa,

serão delimitadas no decorrer do trabalho.

Pretendo fazer uma revisão da literatura sobre as características do desenvolvimento da

leitura em língua estrangeira, especialmente o inglês, bem como retomar as pedagogias

críticas que permeiam o ensino/aprendizagem de leitura em LE – inglês. Serão revisados

também os pressupostos presentes no PCN+, buscando aproximar a relação entre teoria e

prática. O maior objetivo deste trabalho é descrever diferentes realidades em que se ensina

Língua Inglesa como língua estrangeira na escola pública estadual, buscando verificar se é

possível aplicar: os pressupostos teóricos do documento oficial (PCN+) e uma abordagem

intercultural para leitura aqui proposta. Também é um desejo dividir a experiência de ter

aplicado esta abordagem por meio de atividades elaboradas cuidadosamente, buscando

desmistificar a dificuldade de trabalhar com as características interculturais em consonância

com o desenvolvimento da leitura na sala de aula de Língua Inglesa, o que se torna, portanto,

parte também essencial deste trabalho. A partir do momento em que se evidencia esta

possibilidade, pode-se também despertar o interesse de ir além do ensino de (apenas)

estruturas gramaticais de inglês, desprovidas de contexto semântico e cultural.

1.2 PERGUNTAS DE PESQUISA

Diante das metas expostas, surge a questão motivadora desta investigação:

- De que forma atividades construídas na perspectiva das pedagogias críticas e

culturalmente sensíveis, seguindo, portanto, os princípios e orientações apresentados pelo

PCN+, podem contribuir para o ensino de leitura em Língua Inglesa e, concomitantemente,

para a formação de alunos-cidadãos, capazes de se posicionarem criticamente diante da

realidade que vivenciam?

Nos seus desdobramentos, surgem ainda outros questionamentos:

- De que modo os princípios e orientações apresentados pelos documentos oficiais

(PCN+) para a Língua Inglesa estão presentes na sala de aula das professoras agentes desta

pesquisa?

- De que forma atividades construídas na perspectiva das pedagogias críticas e da

interculturalidade podem contribuir para o ensino de leitura em Inglês como língua

estrangeira e para o desenvolvimento do senso crítico desses leitores?

- Em que medida uma abordagem que se diga intercultural e crítica para o

ensino/aprendizagem de leitura em Língua Inglesa pode facilitar a formação de alunos mais

conscientes de que as diferenças são parte da construção de sua própria identidade?

- De que modo este trabalho pode contribuir para a formação de professores de Língua

Inglesa?

1.3 OBJETIVOS

1.3.1 Objetivo Geral

A partir da investigação realizada, propor atividades construídas sob uma perspectiva

crítica e culturalmente sensível para o ensino de leitura em Língua Inglesa e verificar o

resultado de sua aplicação nas turmas do Ensino Médio das professoras agentes desta

pesquisa.

1.3.2 Objetivos Específicos

- Observar a aplicação dos princípios teóricos propostos nas Orientações

Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino de Língua Inglesa no

ensino médio de escolas públicas estaduais;

- Elaborar atividades à luz das pedagogias críticas e culturalmente sensíveis para

desenvolver a leitura em LI e o posicionamento crítico dos alunos;

- Verificar o impacto dessas atividades por meio da análise das produções dos alunos e

do discurso das professoras envolvidas na pesquisa;

- Investigar a possibilidade de formar alunos-cidadãos por meio da utilização de uma

abordagem que se diga crítica e culturalmente sensível para o ensino de leitura em LI;

- Contribuir para a formação de professores culturalmente sensíveis e conscientes da

necessidade de estabelecer relações entre culturas para que se promova o respeito às

diferentes identidades.

1.4 PRINCÍPIOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS DA PESQUISA

A partir das perguntas sugeridas, pode-se perceber a aplicação de uma pesquisa que se

encontra dentro do paradigma qualitativo de pesquisa na área da Linguística Aplicada – como

disciplina independente que visa à melhoria da qualidade de ensino/aprendizagem, e não

como mera aplicação da Linguística Geral. É interpretativista e etnográfica, já que

competência intercultural e capacidade de leitura e compreensão textual são imensuráveis

quantitativamente e precisam de descrições de atitudes e comportamentos para evidenciar

uma possível evolução.

Isso será feito ao investigar e descrever a realidade, com o intuito de melhorá-la por

meio da geração de dados que facilitem a criatividade de educadores dispostos a mudarem

suas realidades, proporcionando a seus alunos: mais subsídios para sua formação como

cidadãos conscientes e participantes na transformação de problemas em soluções; a mudança

de reações estereotipadas para atitudes compreensivas e respeitosas; e o crescimento como

agentes de transformação de seus familiares, amigos, enfim, de suas comunidades.

Segundo Moita Lopes (2006, p.96),

na tentativa de pautar uma LA contemporânea, é preciso considerar: a imprescindibilidade de uma LA híbrida; a LA como área que explode a relação entre teoria e prática; a necessidade de um outro sujeito para a LA: as vozes do sul; e a LA como área em que a ética e poder são os novos pilares. Nessa perspectiva, o ensino de ciências da LA que se paute dentro de uma postura responsiva social, isto é, crítica, precisa abordar várias áreas do conhecimento, tornando-se a área da Indisciplina (MOITA LOPES, 2006, p.97).

É qualitativa não apenas por ser sinônima de não-quantitativa, mas sim por valorizar a

descoberta em lugar da constatação; é interpretativista por preferir a interpretação à

mensuração; e é etnográfica por buscar entender o mundo para transformá-lo (SIQUEIRA,

2008, p.39). Como diria André (1995, p.45),

a pesquisa etnográfica não pode se limitar à descrição de situações, ambientes, pessoas, ou à reprodução de suas falas e de seus depoimentos.

Deve ir muito além e tentar reconstruir as ações e interações dos atores sociais segundo seus pontos de vista, suas categorias de pensamento, sua lógica (ANDRÉ, 1995, p.45).

Uma perspectiva racionalista não condiz com este trabalho, o qual partirá da teoria e se

apoiará na prática para gerar soluções a outros linguistas envolvidos em situações semelhantes

às que estão por vir. Como diria Hall (1997, p.226), “we need theories to deepen our

analysis”2.

É preciso enxergar o sujeito como social e histórico, e não somente como racional; é

preciso abdicar das lentes da homogeneização e dar valor à diferença. Concordo com Moita

Lopes (2006, p.103) quando diz que o apagamento da sócio-história é inadequado para dar

conta da visão de LA contemporânea que defende. Assumindo essa postura, o educador

também estará garantindo o

princípio ético [que] é parte da constituição de uma coligação anti-hegemônica que colabora na construção de significados oriundos de outras vozes (daqueles marcados pelo sofrimento às margens da sociedade), assim como na construção de outro mundo social, construindo outra globalização, como acho que diria Milton Santos (2002), e reinventando a emancipação em nossos dias (MOITA LOPES, 2006, p.103-4).

Calvet (1978) afirma que há um

laço constante entre uma ciência em curso de constituição e a sociedade na qual ela se desenvolve. Não é verdade, apesar do que possam dizer os zeladores da ciência ‘neutra’ (e, meu Deus, eles não faltam), que a linguística seja um modo de análise da língua desvinculado da sociedade, isto é, da luta de classes. (CALVET, 1978, p.34)

Cabe a mim, pois, concordar que “o primeiro compromisso de um pedagogo crítico é

com a comunidade, da qual a sala de aula é uma pequena, porém fiel, amostra”

(RAJAGOPALAN, 2004, p.105). Descreverei, portanto, as atitudes das professoras

participantes diante de suas realidades em sala de aula (de acordo com os questionários e

entrevistas), bem como o desenvolvimento de atividades que permitirão perceber a interação

entre teoria e prática, tendo sempre em mente que “as categorias de análise não podem ser

impostas de fora pra dentro, mas devem ser construídas ao longo do estudo” (ANDRÉ, 1995,

p.45).

2 Nós precisamos de teorias para aprofundar nossa análise (HALL, 1997, p.226). Tradução livre.

1.5 AGENTES3 E INSTRUMENTOS DE PESQUISA

Os quarenta alunos-professores que tive no PROLE foram convidados a participar da

pesquisa via e-mail. Sua participação dependia apenas de estarem ou não ministrando aulas

para o ensino médio, nível escolar priorizado neste trabalho. Após as respostas ao meu

pedido, vi que apenas três professoras estavam ministrando aulas para alunos deste nível.

Ao convidá-las, Isabelle, Ely e Raquel4 aceitaram prontamente trabalhar comigo na

construção do conhecimento por meio desta pesquisa, disponibilizando-se para responder

questionários, gravar entrevistas etc.

Portanto, as professoras agentes desta pesquisa foram minhas alunas no Programa de

Licenciaturas Especiais (PROLE), o qual lhes deu acesso à graduação em Língua Estrangeira

– Inglês. Ministram aulas na rede pública estadual da Bahia e atuam (também) no Ensino

Médio, lidando com realidades diferentes e alunos que variam de adolescentes a adultos. Elas

têm também formação e experiência diversas. Vide quadro a seguir.

QUADRO 1 – Formação profissional das professoras agentes da pesquisa.

Professora Formação Curso de inglês

Experiência

em educação

Ensino

de inglês

Ely • Magistério (nível médio); • Licenciatura em LE – inglês

(PROLE).

---

14 anos

04 anos

Isabelle • Pedagogia (nível superior); • Licenciatura em LE – inglês

(PROLE).

07 semestres

24 anos

06 anos

Raquel • Técnico em engenharia eletromecânica (nível médio/técnico);

• Licenciatura em LE – inglês (PROLE).

04

semestres

03 anos

03 anos

3 Escolhi utilizar o termo “agente”, em vez de “sujeito” de pesquisa por considerar mais pró-ativo o posicionamento daquele em relação a este. Um “agente” assume o papel de protagonista, e esse é o meu desejo: dar às professoras agentes desta pesquisa seu devido papel – o de atrizes principais, sem cuja atuação esta produção não seria possível. Ou, ainda, como nos diz Telles (2002, p.97), “como agente, ele é conhecedor dos objetivos e do método da pesquisa, ajuda o pesquisador a tomar decisões”. 4 Os nomes próprios são fictícios e foram escolhidos pelas professoras.

Como é possível perceber no quadro anterior, o que essas professoras têm em comum é

a formação em Língua Estrangeira – Inglês pela Universidade Federal da Bahia, tendo

participado do Programa de Licenciaturas Especiais (PROLE). Eram professoras ditas

“leigas” – ao menos para o ensino de Inglês -, o que lhes possibilitou ingressar no programa,

já que o objetivo do Governo do Estado da Bahia era proporcionar a oportunidade de acesso à

Licenciatura na área com a qual o profissional da educação mais tivesse afinidade. Foram

todas minhas alunas, o que me levou a convidá-las a fazerem parte deste trabalho.

Isabelle tem vasta experiência em educação, já tendo lecionado diversas disciplinas

relacionadas à sua primeira formação – Pedagogia. Por seu interesse em aprender Inglês, fez

curso por três anos e meio, ainda que não pretendesse ensinar a língua. Ao aparecer a

oportunidade de ingressar no PROLE – Língua Estrangeira, pôde unir o útil ao agradável,

lecionando uma disciplina que também lhe satisfazia enquanto aluna.

Ely havia se formado em Magistério no Ensino Médio e nunca tinha feito curso de

inglês. No entanto, desde pequena gostava da língua e se interessava por aprendê-la,

aproveitando, assim como Isabelle, a oportunidade do PROLE para se profissionalizar e poder

lecionar Língua Inglesa na escola pública estadual, onde já atuava como professora primária.

Raquel tinha uma formação em uma área nada relacionada com educação: técnica em

Engenharia Eletromecânica. Entretanto, fez curso de inglês por dois anos e gostava da língua,

o que a levou, também, a se inscrever na seleção do PROLE – Língua Estrangeira para se

preparar para ser professora de Língua Inglesa.

Questões referentes às professoras participantes da pesquisa serão mais aprofundadas no

capítulo da análise de dados.

Quanto aos instrumentos de pesquisa, foram utilizados três neste trabalho: questionários

respondidos pelas participantes da pesquisa; entrevistas semi-estruturadas (com gravação de

áudio); e produções dos alunos dessas professoras.

Quanto ao Questionário 1 (vide Apêndice A), a forma de respondê-lo foi bastante

simples. Algumas citações do PCN+ dizendo respeito ao ensino de inglês foram postas a

serem julgadas como “aplicável”, “parcialmente aplicável” ou “não aplicável” por cada

professora, considerando sua realidade em sala de aula. O questionário foi enviado às

professoras por e-mail e por elas respondido, utilizando o mesmo meio.

Em seguida, as respostas dos questionários foram analisadas para que se criasse um

roteiro para a entrevista semi-estruturada (vide Apêndice B), com base nos questionamentos

que ainda me inquietavam como pesquisadora. Surgiram, é claro, outras perguntas durante as

entrevistas, as quais foram respondidas com os devidos desdobramentos quando necessário

foi.

O Questionário 2 (vide Apêndice E), com dez perguntas, foi aplicado para verificar as

impressões das professoras em relação ao desenrolar das atividades por mim propostas, bem

como suas observações acerca das reações dos alunos no momento de produção. Este

instrumento surgiu a partir da observação dos desdobramentos em minhas aulas, quando meus

alunos foram expostos às mesmas atividades sugeridas às minhas colegas informantes desta

pesquisa; foi a minha prática que aguçou a curiosidade com relação à forma como as mesmas

atividades se desenrolariam em outros ambientes, outras realidades, outras culturas.

As produções dos alunos, oriundas da aplicação das atividades propostas, também

foram utilizadas como instrumento de pesquisa, visto que evidenciam, em grande medida, os

resultados da prática do professor.

1.6 INSTRUMENTOS E PROCEDIMENTOS DE GERAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Por considerar mais didático, discorrerei sobre o tema deste tópico dividindo a pesquisa

em fases.

1.6.1 Fase 1: Questionário 1 (Q1) e pré-análise

Nesta fase, enviei, primeiramente, às três informantes, os questionários com os trechos

do PCN+ via e-mail para que elas dissessem se o que prega o documento é aplicável,

parcialmente aplicável ou não aplicável em sua(s) sala(s) de aula (vide Apêndice A). As

respostas elas também enviaram por meio eletrônico.

Com os questionários respondidos em mãos, pude fazer sua pré-análise para preparar

um roteiro de perguntas para a entrevista semi-estruturada que seria gravada em áudio na

próxima fase.

1.6.2 Fase 2: Entrevista semi-estruturada

A partir da observação das respostas ao Q1, criei um roteiro para desenvolver a

entrevista com Isabelle, Ely e Raquel. Encontrei cada uma delas separadamente, em

ambientes diversos (residência, trabalho), atendo-me ao roteiro para a entrevista, mas

aproveitando os desdobramentos dos discursos para ampliá-la e deixando as entrevistadas à

vontade para falarem também de coisas que desejassem esclarecer.

As entrevistas transcorreram sem problemas, com duração aproximada de uma hora

cada, em locais calmos, sem barulho, ainda que não tivessem acústica perfeita.

Em seguida, fiz a transcrição5 das gravações de áudio das entrevistas para que pudesse

analisar as respostas das professoras e cruzá-las com as afirmações fornecidas no Q1. De

posse desses dados, pude perceber a distância/proximidade entre as ações pedagógicas com as

quais as professoras concordam e aquelas que, de fato, fazem parte de sua prática cotidiana.

1.6.3 Fase 3: As atividades autoformativas e seus desdobramentos

Apesar das atividades autoformativas6, por mim criadas para serem utilizadas pelas

professoras, não se configurarem em um instrumento de pesquisa propriamente dito, foram

elas que deram origem a dois deles.

O primeiro foi um questionário respondido pelas professoras (Q2), o qual teve como

objetivos: perceber as impressões das professoras acerca das atitudes dos alunos diante da

atividade proposta (participação, dificuldades, identificação com o tema); verificar a

relevância das orientações para o professor contidas na atividade autoformativa aplicada; e

promover o ensino reflexivo, visto que as professoras precisaram observar os resultados da

aplicação das tarefas, o que permite repetir estratégias ou modificá-las, a depender de seu

funcionamento.

O segundo instrumento originado dessas atividades foi a produção dos alunos. Os textos

por eles elaborados foram todos analisados, gerando dados bastante relevantes para a

5 A transcrição foi grafemática, sem preocupação fonética, sendo mantidas as convenções da fala. Vide padrão adotado no Anexo I. 6 Atividades autoformativas são aquelas criadas para, além de orientar o professor durante a execução das tarefas, esclarecer conceitos e explicar as razões de proceder diante de temas/assuntos. Para mais detalhes e exemplos, vide Capítulo 4.

pesquisa, e permitindo a reflexão acerca do que deve ser repensado e o que de

no trabalho com a leitura em

sensível.

De forma mais visual, a pesquisa se desenrolou conforme

Figura 1 –

Figura 1 – Instrumentos de pesquisa

Por meio da geração dos dados, foi possível verificar resultados muito positivos,

evidenciando a possibilidade real de formar alunos com maior capacidade de refletir sobre si

mesmos a partir da “ampliação de suas interações com os outros”, sendo este proce

“reforçador de trocas culturais enriquecedoras e necessárias para a construção da própria

identidade” (PCN+, p. 100). Estabelece

os PCN+ e a sala de aula de Língua Inglesa. Observe que

a pesquisa qude materiais empíricos história de vida; entrevista; artefatos; textos e produções culturais; textos observacionais, históricos, interativos significados rotineiros e problemáticos na vida dos indivíduos. Portanto, os pesquisadores dessa área utilizam uma ampla variedade de práticas interpretativas interligadas, na esperança de sempre conseguirem compreenderLINCOLN, 2006, p.17).

As atividades autoformativas cumpriram seu papel?

A(s) teoria(s) defendida(s) pelas professoras no Q1 correspondem a sua prática?

Na realidade das participantes, o trecho do PCN+ é:

pesquisa, e permitindo a reflexão acerca do que deve ser repensado e o que de

no trabalho com a leitura em Língua Inglesa sob uma perspectiva crítica e culturalmente

De forma mais visual, a pesquisa se desenrolou conforme a figura

Instrumentos de pesquisa.

ção dos dados, foi possível verificar resultados muito positivos,

evidenciando a possibilidade real de formar alunos com maior capacidade de refletir sobre si

mesmos a partir da “ampliação de suas interações com os outros”, sendo este proce

“reforçador de trocas culturais enriquecedoras e necessárias para a construção da própria

, p. 100). Estabelece-se, pois, uma relação não utópica, mas sim real entre

e a sala de aula de Língua Inglesa. Observe que

a pesquisa qualitativa envolve o estudo do uso e a coleta de uma variedade de materiais empíricos – estudo de caso; experiência pessoal; introspecção; história de vida; entrevista; artefatos; textos e produções culturais; textos observacionais, históricos, interativos e visuais – que descrevem momentos e significados rotineiros e problemáticos na vida dos indivíduos. Portanto, os pesquisadores dessa área utilizam uma ampla variedade de práticas interpretativas interligadas, na esperança de sempre conseguirem compreender melhor o assunto que está ao seu alcance (DENZIN, & LINCOLN, 2006, p.17).

Questionário 2 (Q2)

As atividades autoformativas cumpriram seu As produções dos alunos foram satisfatórias?

Entrevista semi-estruturada

A(s) teoria(s) defendida(s) pelas professoras no Q1 correspondem a sua prática?

Em que medida?

Questionário 1 (Q1)

Na realidade das participantes, o trecho do PCN+ é:

aplicável, parcialmente aplicável, ou não aplicável?

pesquisa, e permitindo a reflexão acerca do que deve ser repensado e o que deve ser mantido

nglesa sob uma perspectiva crítica e culturalmente

a seguir:

ção dos dados, foi possível verificar resultados muito positivos,

evidenciando a possibilidade real de formar alunos com maior capacidade de refletir sobre si

mesmos a partir da “ampliação de suas interações com os outros”, sendo este processo

“reforçador de trocas culturais enriquecedoras e necessárias para a construção da própria

se, pois, uma relação não utópica, mas sim real entre

alitativa envolve o estudo do uso e a coleta de uma variedade estudo de caso; experiência pessoal; introspecção;

história de vida; entrevista; artefatos; textos e produções culturais; textos que descrevem momentos e

significados rotineiros e problemáticos na vida dos indivíduos. Portanto, os pesquisadores dessa área utilizam uma ampla variedade de práticas interpretativas interligadas, na esperança de sempre conseguirem

melhor o assunto que está ao seu alcance (DENZIN, &

As produções dos alunos foram satisfatórias?

Em que medida?

aplicável, parcialmente aplicável, ou não aplicável?

A relação entre as duas partes da pesquisa está evidenciada, pois, na busca de descobrir

em que medida os pressupostos teóricos do documento – aqui com foco nas pedagogias

críticas e culturalmente sensíveis – podem se configurar na prática, observando, para isso, o

que dizem as professoras agentes desta pesquisa, o que de fato elas praticam e os resultados

dessa prática.

1.7 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO

Esta dissertação está subdividida em quatro capítulos, seguidos das considerações

finais. No Capítulo 1, trago os fatores que motivaram a realização da pesquisa, os quais

perpassam pela inquietude com relação ao rumo que o ensino de Língua Inglesa tomou nas

escolas públicas, tendo aqui as estaduais como foco. Menciono as perguntas que nortearam a

pesquisa, os objetivos que desejei alcançar e os pressupostos metodológicos que serviram de

base para a geração e análise de dados no decorrer do trabalho. Ilustro também os

instrumentos utilizados para este fim e apresento as professoras que, junto comigo,

construíram o texto deste trabalho e, portanto, são, assim como eu, agentes desta pesquisa.

Por fim, mas não menos importante, descrevo os procedimentos utilizados para realizar a

obtenção dos dados, estabelecendo também fases distintas (mas interligadas) para o

desenvolvimento do trabalho como um todo.

No Capítulo 2, discorro sobre a leitura em língua estrangeira e, mais precisamente,

sobre a leitura em Língua Inglesa, tendo como eixo norteador o conteúdo (ou parte dele) do

PCN+, isto é, sob a ótica das pedagogias críticas e culturalmente sensíveis para a formação do

leitor crítico e ativo diante da realidade que o cerca. Trago visões de alguns autores acerca do

documento oficial supracitado e sua aplicabilidade, e me posiciono de acordo com algumas

leituras feitas e, essencialmente, levando em conta a minha experiência no ensino de Língua

Inglesa e no trabalho com a formação de professores de escolas públicas.

O Capítulo 3 surge com discussões acerca do trabalho convergente entre pedagogias

críticas e culturalmente sensíveis e o ensino de Inglês como língua estrangeira. Para tanto,

apoio-me em alguns autores que defendem essa postura, bem como nas bases teóricas dos

documentos oficiais (PCN+).

Já no Capítulo 4, a questão prática, mais dinâmica, assume o papel de protagonista,

tendo a teoria como coadjuvante. Inicio o capítulo com as trajetórias das professoras Ely,

Isabelle e Raquel até chegarem ao ensino de Língua Inglesa na escola pública estadual, dando

continuidade à discussão ao analisar suas falas e atitudes ao longo da geração de dados.

Discuto também questões referentes à compreensão textual, identidade, posicionamento

crítico, ensino de gramática, entre outras. Apresento as atividades autoformativas por mim

criadas para serem aplicadas pelas professoras participantes da pesquisa, trazendo os

resultados obtidos dessa aplicação. Além disso, analiso os dados dos questionários,

triangulando-os com as respostas dadas no momento das entrevistas e as produções dos

alunos.

Os resultados deste trabalho e as sugestões nele contidas visam a ampliar horizontes e

suscitar mais questionamentos sobre o ensino/aprendizagem de Língua Inglesa no ensino

médio em escolas públicas. Afinal, “quando se sonha sozinho, é apenas um sonho; quando se

sonha juntos, é o começo da realidade”7 (D. QUIXOTE).

Convido você, leitor, a sonhar junto comigo...

7 Disponível em: <http://pensador.uol.com.br/autor/D._Quixote/>. Acesso em: 05 jan. 2011.

2 “EMPRESTANDO SENTIDOS8” AO TEXTO EM LÍNGUA INGLESA

A primeira preocupação que deve pautar a definição de objetivos diz respeito ao fato desses serem informados pelo propósito principal da aprendizagem de LE: envolvimento na construção de sentido (MOITA LOPES & ROJO, 2004, p.46).

2.1 A LEITURA EM LÍNGUA ESTRANGEIRA

Diversas são as razões para a escolha do desenvolvimento da leitura na realidade do

ensino médio na escola pública estadual. Entre elas estão as salas de aula cheias,

impossibilitando um bom trabalho com a oralidade; o fato de que enorme parte da informação

disponibilizada na Internet está em outras línguas que não a portuguesa; e o rápido alcance de

resultados com o ensino/aprendizagem de leitura se comparado à oralidade, por exemplo.

Segundo Moita Lopes e Rojo (2004, p.48), “o texto escrito em LE e a conversa sobre ele em

Língua Materna (LM) devem ser o foco das práticas escolares de letramento, com o objetivo

de fornecer aos alunos uma experiência significativa de engajamento na construção do

significado”. Fato importantíssimo também é que a leitura abrange as demais habilidades, de

certa forma desenvolvendo-as, ainda que em língua mãe. Podemos nos valer, ainda, do que

dizem as Orientações Complementares aos PCNs:

a competência primordial do ensino de línguas estrangeiras modernas no ensino médio deve ser a da leitura e, por decorrência, a da interpretação. O substrato sobre o qual se apóia a aquisição dessas competências constitui-se no domínio de técnicas de leitura – tais como skimming, scanning, prediction – bem como na percepção e na identificação de índices de interpretação textual (gráficos, tabelas, datas, números, itemização, títulos e subtítulos, além de elementos de estilo e gênero) (PCN+, p.97).

Além disso, o Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM) tem como proposta

“conhecer e usar língua(s) estrangeira(s) moderna(s) como instrumento de acesso a

informações e a outras culturas e grupos sociais”9, o que torna essencial o domínio da leitura –

8 Termo de Michel de Montaigne, escritor e ensaísta francês, parafraseada de “Um leitor inteligente descobre frequentemente nos escritos alheios perfeições outras que as que neles foram postas e percebidas pelo autor, e empresta-lhes sentidos e aspectos mais ricos.” Disponível em: <http://pensador.uol.com.br/autor/Michel_de_Montaigne/2/>. Acesso em: 08 jan. 2011. 9 Disponível em: <http://www.sala.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=300:exame-nacional-de-ensino-medio-enem&catid=42:artigos-de-capa&Itemid=162>. Acesso em: 07 jan. 2011.

ainda que também permita a interpretação de que é interessante dominar outras competências,

como a oralidade, por exemplo. Mas não entrarei nesse mérito, visto que estamos aqui lidando

com os percalços das escolas públicas estaduais já citados exaustivamente neste trabalho, os

quais fortalecem a defesa do ensino de leitura, ainda que se almeje a comunicação oral e

escrita na língua estrangeira.

A necessidade desse domínio das técnicas de leitura e, portanto, da habilidade de

compreensão textual, dá-se também pelo fato de que

the written word surrounds us daily. It confuses us and enlightens us, it depresses us and amuses us, it sickens us and heals us. At every turn, we who are members of a literate society are dependent on twenty-some-odd letters and a handful of other written symbols for significant, even life-and-death, matters in our lives (BROWN, 1994, p.283)10.

A beleza poética da definição de Brown encanta, mas torna-se necessário definir que

concepção de leitura será adotada neste texto, visto que há diversas. Assumo a postura de que

a leitura é [...] uma atividade interativa altamente complexa de produção de sentidos, que se realiza evidentemente com base nos elementos linguísticos presentes na superfície textual e na sua forma de organização, mas requer a mobilização de um vasto conjunto de saberes no interior do evento comunicativo (KOCH & ELIAS, 2006, p.11).

Portanto, abdico da concepção de leitura como simples decodificação do texto ou

entendimento e aceitação das ideias do autor. Prego uma interação contínua entre autor, texto

e leitor, juntos construindo o significado. No que diz respeito ao ensino de leitura em língua

estrangeira, devemos aplicar as estratégias de leitura para a maximização dessa compreensão

textual e, por conseguinte, da capacidade do leitor de interagir com o texto e posicionar-se

diante dele, até mesmo porque “a compreensão não requer que os conhecimentos do texto e os

do leitor coincidam, mas que possam interagir dinamicamente” (ALLIENDE &

CONDEMARÍN, 2002, apud KOCH & ELIAS, 2006, p.37).

Retomando as concepções de leitura definidas por Koch e Elias (2006, p. 9-11), afirmo

concordar com o “foco na interação autor-leitor-texto”, o que me leva a discordar do “foco no

autor” e, principalmente do “foco no texto”, e aqui cabe uma explicação mais detalhada.

10 A palavra escrita nos rodeia diariamente. Ela nos confunde e ilumina, deprime-nos e diverte-nos, adoece-nos e cura-nos. A todo momento, nós que somos membros de uma sociedade letrada dependemos de vinte e poucas letras e um monte de outros símbolos escritos para resolvermos situações significativas, até mesmo de vida ou morte em nossas vidas (BROWN, 1994, p.283). Tradução livre.

Se defendesse uma concepção de língua como código – portanto, como mero

instrumento de comunicação, o texto seria visto como produto da codificação de um emissor a

ser decodificado por um receptor, fato que exigiria apenas o conhecimento do código

utilizado para que houvesse entendimento (KOCH & ELIAS, 2006, p.10). Os alunos

precisariam, pois, conhecer as estruturas gramaticais e o vocabulário da língua inglesa apenas

e, com esse conhecimento linguístico, seriam capazes de fazer a decodificação.

No entanto, no ensino de língua estrangeira, o que tenho observado é que o mero ensino

de estruturas gramaticais e vocabulário descontextualizados não tem gerado aprendizagem.

Ao chegarem ao primeiro ano do ensino médio/integrado, os alunos reclamam, por exemplo,

de terem estudado o verbo to be da 5ª à 8ª série sem nem conseguirem usá-lo ou compreendê-

lo no contexto. Torna-se necessário, portanto, o trabalho com estratégias de leitura e

compreensão textual que ultrapassem o dito, o código; é preciso ler no sentido amplo,

utilizando imagens, gêneros textuais, conhecimento enciclopédico e cultural para se retirar o

sentido do texto que faz sentido (perdoem a redundância) para cada um.

Mas o que faz a leitura em língua estrangeira ser diferente da leitura em língua mãe?

Se considerarmos que a intenção dessa atividade não é a mera decodificação de termos,

mas sim a interação autor-leitor-texto, a leitura em língua portuguesa deve ser desenvolvida

da mesma forma já descrita acima. Se o aluno aplicar as estratégias de leitura para ler seus

textos de história, geografia, problemas de física ou matemática, ele certamente terá sucesso,

visto que se preparará antes de iniciar a leitura propriamente dita.

No entanto, há alguns aspectos que dificultam o ensino/aprendizagem de leitura em

língua estrangeira: o primeiro deles é o fato de que alguns alunos só são expostos aos textos

como pretextos para responder questões de interpretação, as quais até verificam a

compreensão textual, mas não favorecem a interação supracitada; outra questão é o uso de

textos criados exatamente de acordo com o nível dos alunos, evitando sua exposição a textos

autênticos, significativos, que estejam de acordo com a realidade social dos alunos; por fim,

mas não menos importante, a assimilação de novos conhecimentos a partir do texto e a

concordância com o autor ou discordância dele dependem da posse de conhecimentos

anteriores e ativação destes.

E já que estamos falando de leitura, vejamos, apenas a título de ilustração dos aspectos

teóricos aqui discutidos, algumas das atividades que foram aplicadas na preparação dos alunos

de uma turma de 1º ano do Ensino Integrado do Instituto Federal da Bahia (IFBA) - Campus

Valença.

Na primeira aula do ano, que também foi o primeiro contato com a turma, ao perguntar

qual a relação dos alunos com língua estrangeira, apenas dois disseram que faziam (ou já

haviam feito) curso de inglês, e a maioria da sala disse que não gostava da disciplina ou já

tinha passado por experiências negativas que levaram à descrença com relação ao aprendizado

de inglês na escola. Alguns disseram, ainda, que gostavam da língua, mas tinham dificuldade

de aprender. Nenhuma outra língua estrangeira foi mencionada.

É bem provável que essa descrença e dificuldade relatadas em relação à disciplina de

língua estrangeira tenha se originado de abordagens já defasadas, como a já conhecida e tão

utilizada “Tradução Gramatical”. De fato, que utilidade os alunos podem ver em memorizar

regras gramaticais e vocabulário descontextualizados? De que forma isso proporcionaria seu

crescimento como leitores e, mais além, como estudantes que utilizariam a língua estrangeira

como meio de acesso a informações relevantes e interações multiculturais pelo mundo afora?

Tomitch (2009, p.195-7) fala dos três momentos em que se deve dividir a aula de

leitura: pré-leitura, leitura e pós-leitura. No que diz respeito à primeira delas, diz que “o

professor deve preparar atividades que tragam à tona o assunto do texto, com o objetivo de

verificar o que eles sabem sobre o assunto, o quanto eles sabem, e assim prepará-los para a

leitura subsequente do texto”. A observação das palavras cognatas nos títulos dos textos, bem

como uma maior atenção a gráficos ou imagens que possam facilitar a dedução do assunto

tratado, já gerariam essa discussão a que a autora se refere. A atividade de brainstorming

(traduzido como tempestade de ideias) também é bastante produtiva nesta fase, visto que ativa

a memória dos alunos para assuntos que tenham relação direta ou indireta com aquele(s) que

possa(m) ser abordado(s) no texto.

Ao chegar à fase da leitura propriamente dita, é importante lembrar que os alunos

tendem a pensar que vão traduzir as palavras que conhecem e tentar entender o texto, ficando

bloqueados para seguir adiante quando encontram uma palavra de cujo significado não estão

cientes. Desconstruída a ideia de tradução em vez de compreensão textual, é preciso deixar

claro ao aluno que ele “vai para o texto a cada momento, com um ou mais objetivos

específicos em mente” (TOMITCH, 2009, p. 196), isto é, o aprendiz é guiado pelas “tarefas

de compreensão, tais como perguntas abertas, as de resposta sim ou não, as de múltipla

escolha e os itens verdadeiro/falso” (TOMITCH, 2009, p. 196). Davies (1995 apud

TOMITCH, 2009, p. 196) sugere “completar ou construir diagramas e tabelas, relacionar

figuras com o texto lido, reorganizar parágrafos para formar um texto” como outras atividades

que podem ser aplicadas durante a leitura.

A fase de pós-leitura é a que mais permite a realização de um trabalho crítico.

Segundo Tomitch (2009, p.197), “o objetivo da pós-leitura é consolidar o que foi aprendido,

fazer com que os alunos utilizem o que foi aprendido em situações que lhes sejam relevantes”.

Eliminar esta fase significa perder a oportunidade de atrelar o assunto do texto à realidade do

aluno, não a comparando, mas contrastando-a com aquela trazida no texto. Considerando-se

que a escolha dos textos seja feita para proporcionar o posicionamento crítico dos alunos,

pode-se aplicar debates sobre o assunto, solicitar produções escritas ou dramatizações (em

língua mãe), sempre com o intuito de verificar até que ponto a compreensão permitiu o acesso

ao conhecimento trazido pelo texto e tocou os alunos de alguma maneira, ainda que os tenha

incomodado, até porque o objetivo é que o aluno exponha a sua forma de pensar diante dos

fatos.

O primeiro passo, no contexto que trago como exemplo, foi tentar mostrar que aprender

uma língua estrangeira era, ao menos, mais fácil (e mais útil!) do que eles imaginavam,

mediante o uso de estratégias de leitura. Começamos observando um texto em português (a

seguir) com palavras inventadas e que deveriam ser deduzidas por eles a partir do contexto.

Foram várias as deduções dos alunos, mas todas girando em torno do mesmo campo

semântico. Dessa forma, eles perceberam que observar o os outros elementos textuais é

crucial para o entendimento de palavras desconhecidas. O desenvolvimento da confiança

neles mesmos, proporcionado pelo incentivo a acreditar nas suas intuições linguísticas, foi um

aspecto fundamental para aqueles alunos que estavam descrentes na possibilidade de

ultrapassarem o obstáculo da língua estrangeira, desconhecida. Vejamos o texto:

Dando seguimento ao trabalho de desmistificação, o próximo texto ao qual os alunos

tiveram acesso foi um texto em dinamarquês, o que os assustou muito no início, mas depois

eles perceberam a facilidade. A atividade seria responder os seguintes questionamentos: qual

Uma situação muito charocada Ontem eu estava na baca de mena zunica quando algo muito charocado me aconteceu.

Estávamos em uma boletinha, quando resolvi ir ao tineiro. Quando voltei percebi

que todas as pessoas sulupiavam para mim e binavam; não me dolotei e continuei

laninhando.

Já tinha lotuado uns dois cricks e laminhado por toda dara, quando uma zunica se

aproximou e tritou que eu havia farenido de telar o cílter da malta quando fui ao

tineiro; o pior de tudo é que eu estava felhando uma fupéba xelena!

(MUNHOZ, 2004, p.17)

é o horário de atendimento do cassino; quanto custa o ingresso; qual é o telefone do cassino; e

quem pode frequentá-lo. Acompanhado de uma foto de pessoas jogando, o texto é o seguinte:

Pela simples observação de palavras cognatas (e nesse momento oportuno explicou-se

que estas são as palavras que se parecem com o português devido à sua origem comum) e dos

números (linguagem universal), foi possível para os alunos que respondessem as questões

propostas. O resultado foram alunos satisfeitos e crentes em uma possibilidade de

compreenderem mais sobre os textos em língua estrangeira.

Missão cumprida até agora. A interação autor-leitor-texto desejada tornou-se realidade;

os alunos foram capazes de construir o significado, retirando do texto as informações que

seriam importantes para uma pessoa que desejasse frequentar o local, em vez de apenas

observarem, por exemplo, a ordem em que as palavras aparecem no texto e sua classificação

morfológica ou sintática.

Abro parênteses para lembrar que, ainda que não tenhamos iniciado a abordagem desse

tópico, a temática do texto geraria uma discussão interessante: quem frequenta cassinos? Eles

são legalizados? O que você pensa de jogos de azar? – questões como essas permitiriam que o

aluno, por meio da compreensão textual, fosse exposto a um assunto que gera polêmica e,

ainda que de forma distante, pode influenciar a sua realidade.

Coube-nos trabalhar com os alunos, seguindo essa linha, e sempre deixando claro que a

ativação do conhecimento prévio é essencial para uma boa produtividade na compreensão

textual, especialmente quando se trata de língua estrangeira. De acordo com Brown (1994,

p.284), trata-se da “schema theory”, que enfatiza a busca do conhecimento enciclopédico do

aluno, incentivando-o a utilizá-lo no momento de tomar decisões que dizem respeito ao

significado de palavras desconhecidas11. De acordo com Solé (1998, p.24), no modelo top

down de leitura (que se adequa à afirmação de Brown),

11 “Schema theory emphasizes this other size of the reading process, the conceptually driven, or top-down processing that brings a whole host of background information into the arena of making decisions about what something ‘means’”(BROWN, 1994, p.284).

CASINO AALBORG Velkommen til Danmarks mest venlige kasino

Ved Stranden, 14-16 Tlf. 98 10 15 50. Glæd dig til spændende og morsomme timer I selskab med festlige mennesker I en international atmosfære. Ǻben alle ugens dage

fra kl. 20.00 – 04.00. Entré DKK 50,00, -. Der er legitimationspligt I henhold til dansk lov. Ingen adgang for unge under 18 ảr. (MUNHOZ, 2004, p.18)

o leitor não procede letra por letra, mas usa seu conhecimento prévio e seus recursos cognitivos para estabelecer antecipações sobre o conteúdo do texto, fixando-se neste para verificá-las. Assim, quanto mais informação possuir um leitor sobre o texto que vai ler, menos precisará se ‘fixar’ nele para construir uma interpretação. Deste modo, o processo de leitura também é seqüencial e hierárquico, mas, nesse caso, descendente: a partir das hipóteses e antecipações prévias, o texto é processado para sua verificação. As propostas de ensino geradas por este modelo enfatizaram o reconhecimento global de palavras em detrimento das habilidades de decodificação, que nas concepções mais radicais são consideradas perniciosas para a leitura eficaz (SOLÉ, 1998, p. 24).

Para ativarmos as informações prévias que possamos ter sobre os mais diversos textos, é

preciso antes levar em conta o tipo de conhecimento que estamos a ponto de ativar. Ao

acionarmos o conhecimento linguístico, estamos lidando diretamente com a gramática e o

léxico, isto é, a estrutura textual e o vocabulário. Nesse momento, levaremos em conta até o

conhecimento da famosa frase “The book is on the table”, muito divulgada na mídia e no

senso comum, já tendo virado letra de música. Se soubermos, por exemplo, que as palavras

book e table significam, respectivamente, livro e mesa, a compreensão será facilitada. Fato

que também ocorrerá se conhecermos o verbo de ligação is (famoso verbo to be conjugado),

que liga o sujeito ao predicado da oração, significando, neste caso, está. Saber o valor da

preposição on (sobre) é essencial, visto que as palavras de ligação são carregadas de

significado.

No entanto, não é porque a noção estrutural é importante que vamos nos ater somente a

ela. Se assim o fizéssemos, retornaríamos à abordagem conhecida como “Tradução

Gramatical”, na qual, entre outras atividades, trabalhava-se com listas enormes de vocabulário

para ser traduzido e decorado, bem como com a memorização de conjugações verbais,

pronomes, preposições e demais palavras de ligação, todos de forma descontextualizada. É

preciso desfazer a prática estabelecida na maioria das escolas de ensino fundamental e médio,

principalmente as públicas, de trabalhar com língua inglesa dessa forma. Torna-se óbvia a

perda de tempo com os alunos quando eles declaram, no primeiro ano do ensino médio, que

não sabem quase nada de inglês, não leem, não falam, não entendem, não escrevem em língua

estrangeira. De que serviram os quatro anos (ensino fundamental) de estudo na disciplina se

nenhuma das habilidades fora desenvolvida? É preciso ir mais além e desenvolver um

trabalho de ensino/aprendizagem acreditando que “aprender uma língua não é só memorizar

vocabulário e regras gramaticais, mas é também chegar-se a uma profunda compreensão

cultural” (PEIYA, 2005 apud SIQUEIRA, 2009, p.18).

Já o acionamento do conhecimento de mundo (enciclopédico) é feito quase que

automaticamente. Nós não nos damos conta de que estamos realizando tal ação, mas é ela que

facilita a compreensão textual, especialmente quando não conhecemos muito sobre a estrutura

e vocabulário do texto. Quando pedi aos alunos que observassem a foto do cassino e

respondessem questões sobre o texto em dinamarquês, estava exigindo deles nada mais que

seu conhecimento de mundo sobre a realidade dos cassinos. Quando os alunos percebem a

importância de carregar consigo esses conhecimentos para a leitura, mais proveitosa e eficaz

ela se torna.

Precisamos ter em mente, no entanto, que cada aluno traz o seu próprio conhecimento,

devido à sua realidade cultural; não se pode esperar, pois, que haja uma sala de aula sem

diversidade e que todos conheçam algo sobre o assunto que será abordado no texto. Daí surge

a necessidade de trabalhar alguma atividade de pré-leitura que, ao menos, forneça aos que

conhecem menos sobre o tema do texto alguma noção de por onde começar e que caminhos

tomar em sua viagem pelo texto.

Kock & Elias (2006, p.45-56) acrescentam o conhecimento interacional, subdividindo-o

em ilocucional, comunicacional, metacomunicativo e superestrutural. O conhecimento

ilocucional, segundo as autoras, é o que permite “reconhecer os objetivos ou propósitos

pretendidos pelo produtor do texto em uma dada situação interacional”. Ele exige dos

aprendizes um maior envolvimento com o texto, com prévia ativação do conhecimento

linguístico e enciclopédico (aqui ativando também sua bagagem cultural) para que sejam

capazes de perceberem os ditos propósitos do autor.

Em uma releitura do que seria o conhecimento comunicacional definido por Koch &

Elias (2006, p.50) para uma abordagem intercultural crítica para o ensino/aprendizagem de

leitura, poderíamos dizer que ele se refere à posse da informação necessária sobre a variante

linguística e o gênero textual para a negociação de sentidos no texto. Em outras palavras,

trata-se da capacidade de usar o conhecimento prévio sobre a variante linguística e o gênero

textual para maximizar a compreensão textual. O conhecimento superestrutural ou

conhecimento sobre gêneros textuais vem a complementar o comunicacional, já que “permite

a identificação de textos como exemplares adequados aos diversos eventos da vida social”

(KOCH & ELIAS, 2006, p.54). É a posse desse conhecimento que facilita o entendimento do

horóscopo em língua estrangeira, por exemplo, visto que já sabemos que possivelmente

aparecerão a sorte do dia/mês, o número e cor da sorte, bem como os acontecimentos na vida

amorosa.

O conhecimento metacomunicativo, definido como “aquele que permite ao locutor

assegurar a compreensão do texto e conseguir a aceitação pelo parceiro dos objetivos com que

é produzido” (KOCH & ELIAS, 2006, p.52), muito nos interessa. Ao pedirmos que os alunos

observem, atentamente, quando as informações aparecem em negrito, itálico, sublinhadas ou

com qualquer outro tipo de destaque, não estamos fazendo nada além de solicitar a ativação

do conhecimento metacomunicativo para facilitar a percepção da importância de

determinados trechos do texto, os quais certamente têm uma razão de terem marcas

tipográficas.

De acordo com Janzen (2002, p.288)12, há quatro pontos que precisam ser observados

ao preparar os alunos para a leitura em língua estrangeira:

1. As estratégias de leitura propostas devem ser percebidas de forma automática, intrínseca, o que pode ser conseguido com a utilização de textos relevantes para os alunos; 2. As estratégias de leitura devem ser ensinadas de forma objetiva, com o professor agindo como modelo, lendo e pensando alto; 3. As estratégias devem ser recicladas constantemente, a cada novo texto e tarefa. O encontro e reencontro com elas facilitará o entendimento de sua utilidade; 4. O ensino descontextualizado de estratégias individuais de leitura por um curto período não ajudará os alunos a serem leitores estratégicos. (JANZEN, 2002, p.288)

Seguindo essas orientações, teremos, certamente, leitores mais bem preparados, isto é,

não apenas decodificadores ou alunos frustrados por não conseguirem extrair nenhum

significado dos textos que almejam compreender. É com o exercício dessas estratégias

sugeridas que a compreensão textual passará a fazer parte da realidade do estudante de língua

estrangeira, sobrepondo reações pessimistas e receosas diante do “novo”. E,

como consequência, nossa avaliação se dará no progresso que o aluno faz ao longo do curso, no que se refere à sua capacidade de efetivamente compreender os textos nos níveis literal e inferencial, e não somente sua capacidade de perceber estruturas sintáticas e gramaticais e vocabulário. (TOMITCH, 2009, p.193)

2.2 A LEITURA EM INGLÊS COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA: “OPENING A CAN OF

WORMS13”

12Tradução livre; vide texto base. 13 “Abrir uma lata de minhocas”. Tradução livre. Termo utilizado por Aya Matsuda para descrever a complexidade da aquisição de língua inglesa diante da atual conjuntura. (MATSUDA, 2005, p.63).

Já sabemos que

a leitura é o processo mediante o qual se compreende a linguagem escrita. Nesta compreensão intervêm tanto o texto, sua forma e conteúdo, como o leitor, suas expectativas e conhecimentos prévios. Para ler necessitamos, simultaneamente, manejar com destreza as habilidades de decodificação e aportar ao texto nossos objetivos, ideias e experiências prévias; precisamos nos envolver em um processo de previsão e inferência contínua, que se apóia na informação proporcionada pelo texto e na nossa própria bagagem, e em um processo que permita encontrar evidência ou rejeitar as previsões e inferências antes mencionadas (SOLÉ, 1998, p.23).

Entretanto, quando tratamos de leitura em língua inglesa, há muitos outros fatores a se

considerar. Entre eles está o status de língua internacional que o inglês adquiriu ao longo dos

anos. Por assim ser considerada a língua inglesa, não se pode mais dizer que o objetivo da

leitura nesta língua é compreender textos em inglês anglo-americano, mas sim toda e qualquer

forma de comunicação escrita de origem dos países desse mundo que se comunica em inglês –

incluindo-se aqui também os falantes não-nativos que dominam uma das variedades deste

idioma –, seja para resolução de negócios internacionais importantes ou para um simples bate-

papo pela internet. McKay (2002, p.56) afirma que, “as it is an international language, the

use of English is no longer connected to the culture of Inner Circle countries”14 e acrescenta

que “one of the primary functions of English as is the case of any international language, is to

enable speakers to share their ideas and cultures” 15.

A alusão à comparação utilizada por Matsuda (2005, p.63) no título deste item é

bastante pertinente, dada a complexidade do ensino de uma língua que ultrapassou os limites

de um país ou outro. Se ensinar inglês é como “abrir uma lata de minhocas”, ensinar leitura

em língua inglesa é também um processo prenhe de questionamentos e incertezas. Que textos

escolher? Com que norma ou variedade linguística trabalhar? Que gêneros textuais utilizar?

Que critérios utilizar ao preparar materiais que se digam promotores da consciência

intercultural crítica? Todas essas dúvidas certamente emergem ao “abrirmos a lata”.

Partindo do pressuposto de que não acredito no ensino/aprendizado de língua dissociado

de cultura, é preciso deixar claro quais línguas/culturas são vistas como alvo, visto que a

língua inglesa deixou de pertencer a uma nação para passar a representar as identidades de

14 Sendo uma língua internacional, o uso do inglês não está mais conectado a culturas de países do Inner Circle (países onde a língua inglesa tem caráter de língua materna: EUA, Reino Unido, Austrália e Canadá). Tradução livre. 15 Uma das funções primárias do inglês, como é o caso de qualquer língua internacional, é habilitar os falantes a compartilhar suas ideias e cultura. Tradução livre.

diversos povos diante das suas relações interculturais por todo o mundo. A questão não é mais

se a língua-cultura16 dos povos falantes de inglês deve ser ensinada, mas como isso deve ser

feito na atual conjuntura. Não basta mais utilizar materiais didáticos que representem a

língua-cultura dos Estados Unidos ou Inglaterra; é necessário fazer com que os alunos se

identifiquem por meio da utilização de materiais que reflitam sua realidade, e não serem

forçados a valorizar, viver e concordar com a verdade “caucasiana”. De acordo com Nault

(2006, p.317),

what is needed is a truly global approach to teaching culture in ELT contexts. Such an approach would recognize that English is not merely the language of an undifferentiated mass of ‘Anglo-Saxon’ Caucasians within a limited region of the world; it would expose students to alternate ways of perceiving reality and using English from all corners of the globe; it would challenge the myth that native speakers, particularly those from Great Britain and the United States, are the sole purveyors of ‘English culture’; and, finally, it would broaden learners’ mindsets and hone their linguistic skills to enable them to communicate effectively in socially complex international settings with people from different races, religions and linguistic and cultural backgrounds17 (NAULT, 2006, p.317).

Outro ponto a se considerar é a quantidade e variedade de falantes da língua inglesa em

todo o mundo. Siqueira (2008, p.212) aponta que “para uma língua que hoje possui três vezes

mais falantes não-nativos do que nativos, adotar posturas e fazer uso de materiais e

procedimentos pedagógicos que se mirem no modelo único e monolíngue do falante nativo” é

cometer um grande erro.

Também é preciso estarmos atentos para o fato de que, se língua é poder – e isso está

fora de questionamento, acredito –, muitos alunos podem reagir negativamente ao

aprendizado do inglês por se sentirem oprimidos pela máquina estadunidense, que afeta os

setores político, econômico e social da esfera mundial. Como afirma Rajagopalan (2004, p.2),

English is not just another language, at least not anymore. Associated with it are a number of connotations not all of which are favourably viewed by

16 Como Kramsch (1993) detalha, o estudo de uma “língua-cultura” pressupõe a construção de uma ponte entre a língua e as estruturas sociais, permitindo uma interação entre culturas, e não a simples transmissão de informações da cultura estrangeira. Também é essencial a reflexão sobre a própria cultura, em detrimento da supervalorização da língua-cultura alvo. Dessa forma, entende-se a cultura como um processo interpessoal de onde emergem significados através da interação social. Uma língua-cultura deve ser ensinada como diferença e transpassar fronteira da disciplina. 17 O que é necessário é uma abordagem verdadeiramente global para o ensino de cultura em contextos de ensino de língua inglesa. Tal abordagem reconheceria que o inglês não é apenas a língua de uma massa de caucasianos anglo-saxões dentro de uma região limitada do mundo; ela exporia os alunos a formas alternativas de perceber a realidade e usar o inglês em cada canto do globo; ela desafiaria o mito de que os falantes nativos, particularmente os da Grã-Bretanha e Estados Unidos, são os únicos detentores da “cultura inglesa”; e, finalmente, ela iria ampliar os horizontes de aprendizes e apurar suas habilidades linguísticas para capacitá-los a se comunicar de forma efetiva em ambientes internacionais socialmente complexos, com pessoas de diferentes raças, religiões e origens culturais e linguísticas. Tradução livre.

sizeable segments of people worldwide, especially in countries widely recognized to be on the seamy size of the new world order. Rightly or wrongly, English is seen as the language of the oppressor which often creates tremendous psychological resistance to learning it18 (RAJAGOPALAN, 2004, p.2).

No entanto, podemos e devemos aproveitar uma das vantagens da globalização e da

difusão do inglês, que é a existência de diversos estrangeirismos já incorporados à língua

portuguesa, o que facilita muito a ativação do conhecimento prévio dos alunos ao se

depararem com essas palavras já familiares em textos em inglês. A presença da língua inglesa

em todos os lugares e contextos (informática, alimentação, marketing etc.) é decerto positiva

partindo dessa perspectiva. Afinal, “o estrangeirismo de ontem é o vernáculo de hoje”

(RODRIGUES, 2005, p.19) e, assim sendo, deixa de ser mais um vocábulo a ser desvendado

em uma língua desconhecida.

Quanto ao papel do professor, torna-se óbvio dizer o quanto é importante na difusão da

importância da valorização das mais diversas culturas entre seus alunos. Isso não precisa ser

feito com longas conversas ou utilização do tempo de aula à parte; é a escolha de materiais

culturalmente sensíveis e que não tenham foco apenas nas línguas/culturas dos países que têm

a língua inglesa como oficial ou primeira língua que proporcionará o aumento da consciência

crítica do aluno. A compreensão do texto em língua inglesa deve ser utilizada como meio para

gerar discussões e atingir, portanto, essa consciência. Segundo Matsuda,

students need to understand the history, current status, and future implications of the spread of English. Such knowledge would allow students to contextualize better the language and their perceptions of it and to critically examine their role in shaping the future of English […] internationally19 (MATSUDA, 2005, p.68).

Acredito que o primeiro passo é dar o exemplo; se a atitude do professor for positiva no

que diz respeito à valorização das diversas culturas, acreditando no inglês como língua

internacional, desnacionalizada e patrimônio mundial, a tendência será que seus alunos

comecem a desfazer a imagem da língua inglesa atrelada a um ou dois países em maior

destaque, e passem a vê-la como meio de acesso às relações internacionais, das quais também

participa o Brasil.

18 O inglês não é apenas outra língua; pelo menos não mais. Associadas a ela estão várias conotações, sendo que nem todas elas são vistas favoravelmente por grupos consideráveis de pessoas ao redor do mundo, especialmente em países reconhecidos amplamente como sendo aparentemente tão grandiosos quanto à nova ordem mundial. Correta ou incorretamente, a lingual inglesa é vista como a língua do opressor, o que geralmente cria uma tremenda resistência psicológica a aprendê-la. Tradução livre. 19 Os alunos precisam entender a história, status atual e implicações futuras da disseminação do inglês. Tal conhecimento permitiria que os alunos contextualizassem melhor a língua e suas percepções acerca dela e que examinassem criticamente seu papel na formatação do futuro do inglês [...] internacionalmente. Tradução livre.

2.3 A LEITURA NOS DOCUMENTOS OFICIAIS: E O PCN+, O QUE DIZ?

Competência primordial: a leitura; por decorrência, a interpretação. Leitor “intérprete”,

“ativo”, “capaz de se apropriar do conhecimento e fazer uso autônomo dele”. “Apreensão do

texto sob a ótica da diferenciação de elementos essenciais de informação e de redundância

textual ou gramatical”. Análise e interpretação no contexto de interlocução. Relação de textos

e contextos para compreender as intenções comunicativas. Percepção dos processos

socioculturais. “Análise da própria língua e cultura pelo vínculo com outras culturas”.

Percepção do aumento das possibilidades de interação com os outros. Ampliação das

possibilidades de busca de informações em outro idioma (PCN+).

Inegavelmente, deve-se tentar seguir os pressupostos (acima) estabelecidos no PCN+.

No entanto, o que se percebe nas escolas públicas estaduais em geral é uma grande

dificuldade de atingir esses objetivos. As Orientações Complementares aos Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCN+), portanto, propõem ações a serem tomadas de forma a tentar

minimizar os problemas (tais como salas de aula numerosas, falta de equipamentos, carga

horária reduzida) e maximizar o rendimento dos alunos no que diz respeito às competências

que devem adquirir, entre elas a da leitura, foco deste tópico e da investigação como um todo.

Com base nas orientações teóricas do documento, o elemento essencial para que o

sucesso aconteça é definitivamente o professor. Motivação e qualificação são características

essenciais a esse profissional. É claro que nem todos os alunos serão “conquistados”, mas

com um bom trabalho desenvolvido certamente haverá mais estudantes envolvidos do que

atualmente. Afinal,

tornamos a leitura uma ferramenta para que os nossos alunos possam exercer sua cidadania com mais propriedade e passamos a colocar a compreensão leitora na LE como o objetivo principal a ser atingido. A partir daí, buscamos meios para instrumentalizar o nosso aluno para compreender textos em LE. Nessa perspectiva, o ensino de estratégias de leitura, e/ou o ensino de gramática e/ou de vocabulário são vistos apenas como “ferramentas” ou como “meios” para se atingir o objetivo final e não como “fins” em si mesmos (TOMITCH, 2009, p.193).

De forma convergente, o PCN+ propõe que se use o texto como “ponto de partida”

(PCN+, p.112), visando a fugir do simples trabalho com a estrutura gramatical

descontextualizada, bem como evitar a memorização de listas enormes de vocabulário sem

atrelá-las a nenhum campo semântico. Para tanto, propõe a exposição dos alunos a leituras

diversificadas e de textos de diversas naturezas, objetivando mobilizar diferentes

competências de leitura, sendo isso feito a partir da compreensão textual em vez da simples

tradução dos vocábulos desconhecidos (PCN+, p.113).

Seis são as habilidades/competências propostas para se formar um aluno capaz de

apropriar-se do aprendido, a ver:

Inquirir: O texto deve despertar a curiosidade de saber o que traz e para onde leva, e instigar no aluno perguntas tanto sobre seu assunto e seus temas, quanto para além deles. Compreender: Ao interpretar o significado das partes do texto, o aluno deve captar com clareza os sentidos que remetem ao todo. Executar: Nesta etapa, a ênfase do trabalho é a pesquisa, determinação das palavras-chave e das partes constituintes do texto, bem como o registro pessoal; o aluno deve ser parte integrante do processo, não apenas um aprendiz passivo. Revisar: Cabe ao professor oferecer o suporte necessário para que o aluno verifique e confira as etapas executadas, tirando dúvidas, confrontando sua interpretação com as de outros do grupo. Avaliar: É o momento de avaliar o trabalho realizado (pelo professor e pelos alunos) e também o próprio processo de ensino e aprendizagem, no sentido de aperfeiçoá-lo. A avaliação não é um momento, mas ocorre em todas as etapas do trabalho. Agregar: O novo conhecimento deve agregar-se ao anterior. A apropriação do conhecimento constituirá a nova base e o substrato do que ainda será aprendido. (PCN+, p.115)

Percebe-se, pelas competências acima propostas, que o grande objetivo a se conquistar é

um aluno independente, ativo e capaz de buscar o conhecimento, utilizando-o para emitir

juízo de valor perante as novas informações adquiridas por meio da leitura do texto. O

professor, por sua vez, é visto como suporte, isto é, deixa o papel de protagonista para o

aluno, trabalhando como coadjuvante. Dessa forma, não quero menosprezar o professor, mas

sim exaltar o profissional que é capaz de fazer isso pelo seu aluno.

O PCN+ sugere “perguntas que correspondem a funções mentais de interpretação

textual” (PCN+, p.117), com o objetivo de formar aquele aluno “construtor do conhecimento”:

Apreensão. O que o texto afirma, narra ou descreve? Entendimento. Qual o significado dos enunciados contidos no texto? É o momento de o aluno transpor o conteúdo dos enunciados textuais para o nível de compreensão pessoal, em que se apropria do conhecimento expresso. Aplicação. Onde se verifica tal problema? O aluno deve ser, então, capaz de transpor a situação do texto para outras similares, num processo de transferência e generalização. Análise. Quais as partes constituintes do texto? O assunto, a narrativa, os subtemas podem ser divididos em partes? O desdobramento analítico deve ter finalidade didática: ao partir do simples para o complexo, o objetivo não

é a fragmentação, mas sim a subdivisão em partes com vistas a uma melhor apreensão do todo. Síntese. Toda análise deve remeter novamente à síntese, que recompõe o todo, salientando o que é essencial, discriminando o fundamental do secundário. Julgamento. Qual o valor das ideias expressas e qual é o seu significado naquele contexto? Nem sempre se precisará chegar a essa etapa, mas a partir daqui já entram em ação processos cognitivos que levam à emissão de juízos de valor, de natureza mais complexa e que exigem maior grau de abstração. Criatividade. O novo conhecimento deve levar à projeção de ideias e condutas novas, não apenas em língua estrangeira, mas em outras áreas do conhecimento. (PCN+, p.117)

Para se atingir tudo isso, as sugestões do documento consistem em: utilização de

estratégias de leitura como guessing, pre-questions, skimming, scanning etc; observação das

“palavras-ferramenta” (PCN+, p.117), que são os verbos, substantivos e conjunções, as quais

determinam o sentido do texto, visto que são carregadas de significado; e, por fim, mas não

menos importante, a aquisição de vocabulário por meio de associações semânticas.

Buscando sempre a qualidade do ensino de línguas, um documento complementar ao

PCN+ foi elaborado por Moita Lopes e Rojo (2004), intitulado “Linguagens, códigos e suas

tecnologias”, no qual os autores acrescentam informações que julgaram necessárias para

complementar o conteúdo do PCN+. Schmitz (2008) enxergou ainda outros aspectos que

mereceriam destaque e escreveu o artigo “Uma análise crítica de ‘Linguagens, códigos e suas

tecnologias’, de Moita Lopes e Rojo (2004)”. Como o próprio Schmitz (2008) sugere no final

de seu artigo, agora é hora de convergir/divergir com ele.

Já no resumo, o autor se pergunta se cidadania e ética devem ser assuntos discutidos nos

programas do ensino de português e inglês do ensino médio. Ora, de que forma podemos

formar alunos com uma consciência intercultural e crítica se não perpassarmos por esses

conceitos? Discutiremos isso mais adiante.

Schmitz (2008) também critica os autores quanto à sua fala sobre a importância de se

abordar a diversidade à qual os estudantes têm acesso pelos meios de comunicação. Ele se

prende ao fato de que nem todos os alunos têm computador em casa, trazendo o dado do

IBGE de que apenas 22,1% das casas têm computador.

Sabemos, no entanto, que apesar de sua relevância para o acesso à cultura e às

informações, o computador não é o único que permite o contato com o conhecimento e os

fatos que acontecem ao redor do mundo. Citemos o simples exemplo da televisão, que,

também de acordo com o IBGE, está presente em 90,3% dos lares20 (e esse é um dado de

2004!) e é a grande responsável pela transmissão de informações políticas, econômicas,

culturais, entre outras. Além disso, houve, de fato, um fenômeno de popularização da internet

via meios menos convencionais, como é o caso das lan houses. É verdade que nem todos têm

computador em casa, mas o acesso à rede mundial é garantido àqueles que tenham R$1,50

para pagar pela hora de utilização do serviço. Isso sem falar no acesso à casa de amigos que

possuam o bem e disponibilizem sua utilização.

Em minha opinião, o nosso papel enquanto educadores – e isso é explicitado claramente

em todo o PCN+, por exemplo – é estimular o raciocínio crítico em relação àquilo que nos é

noticiado, permitindo que o estudante não apenas ouça as informações como verdades

universais, mas que reflitam sobre elas e tirem suas próprias conclusões com embasamento

em discussões, que, porventura, possam vir da sala de aula.

Mais uma vez Schmitz (2008) critica os autores do documento, agora com relação à sua

afirmação de que não se deve trabalhar gramática e vocabulário de forma descontextualizada,

ou, como ele cita, completando lacunas ou trabalhando charadas. A crítica aqui não é

sinônimo de discordância, mas sim de ofensa com relação aos conhecimentos de linguística

aplicada que os professores de língua estrangeira já obtêm, não sendo necessário, portanto, de

acordo com Schmitz, mencionar os aspectos que dizem respeito à forma inadequada de

trabalhar estrutura gramatical e léxica.

O que nosso crítico parece ter deixado de mencionar é a quantidade de professores que

não sabe nem diferenciar “linguística” de “linguística aplicada”, quanto mais decidir qual a

melhor forma de trabalhar os aspectos supracitados; isso sem mencionar aqueles que não

conhecem outras abordagens dos conteúdos além da boa e velha Tradução Gramatical.

Contraditória e felizmente, a Schmitz não escapou tal conhecimento tão importante:

no entanto, é bom lembrar que, infelizmente, muitos professores de língua portuguesa [e inglesa também!] ainda insistem em preencher lacunas de exercícios gramaticais e até ensinar “gramatiquice”. (SCHMITZ, 2008, p.39) (Grifo e inclusão meus.)

Schmitz ainda propõe que a realização de uma pesquisa entre os alunos com relação às

suas formas e razões de aprendizagem deveria ter sido feita antes da elaboração do

documento, dizendo que “uma política de ensino-aprendizagem de língua estrangeira não

20 Informação disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_impressao.php?id_noticia=317>. Acesso em: 30 out. 2010.

deve ser definida a priori, pois os objetivos dos alunos, o contexto de aprendizagem e a

cultura de aprender devem ser considerados primeiramente” (SCHMITZ, 2008, p.40).

Eu me pergunto: será que é possível se criar um documento para cada realidade? Porque

se esse documento tiver que ser fiel à realidade de cada aluno – ou grupos deles -, diante da

diversidade que temos no Brasil, precisaríamos de muitos documentos, não apenas um que

norteasse o trabalho do professor.

Entendo que esse tipo de pesquisa poderia ajudar o professor a colher bons frutos em

sua sala de aula, mas ela seria um acréscimo ao PCN+. Como qualquer material de orientação

ao professor, este também não deve ser tido como verdade universal, mas sim como um guia

para ser interpretado diante das diferentes realidades educacionais às quais alunos e

professores forem expostos.

Antes de chegar à seção “Questionamentos e dúvidas para debate”, Schmitz informa

que é a partir dela que vai apresentar uma reflexão crítica sobre o trabalho de Rojo e Moita

Lopes. Eu diria que essa apresentação já começou desde o resumo do texto. Mas vamos

adiante.

O primeiro tópico posto para discussão são as referências feitas à cidadania ao longo do

documento. Schmitz diz que “o esforço de ensinar ‘cidadania’ não tem contribuído para uma

transparência e para uma conduta ética em vários setores da sociedade”. Ora, desistiremos de

formar alunos/cidadãos por causa dos políticos eleitos que não têm noção do que este termo

significa? Se quisermos, um dia, conseguir modificar essa realidade, temos que começar a

formação de cidadãos hoje, para que os eleitores do futuro (e do presente também!) não

permitam que esse tipo de político seja eleito. Já que a “finalidade intrínseca da formação

escolar” (SCHMITZ, 2008, p.40) não está sendo cumprida, que tal começarmos pela sala de

aula e, quem sabe, atingir a comunidade escolar, retomando assim a finalidade ética da

educação: a formação de seres humanos conscientes de que o respeito às individualidades é

característica essencial para a promoção do bem-estar social. Pode parecer uma visão

romântica, mas não vejo outra saída. Cruzar os braços, certamente, não é a melhor forma;

desistir tampouco. Deve ser por isso que tantos professores ainda ensinam a completar

lacunas com o item gramatical correto: desistiram de ser educadores transformadores.

Quando discute a “preocupação com a ética”, Schmitz (2008, p.41) afirma que “os

autores não explicam como a ética deve ser abordada nas escolas” e se pergunta se apenas os

professores de línguas devem lidar com essa questão.

Como foi dito pelo próprio autor, como linguistas aplicados que somos, essas

informações relativas à forma de abordagem da ética em sala de aula seria desnecessária;

entretanto, tento aqui responder aos seus questionamentos. Não só os professores de línguas

devem abordar essa questão, mas parecem ser os mais conscientes, junto aos educadores da

área das ciências humanas, quanto a essa necessidade.

Antes de discutir a abordagem, vejamos a origem da palavra ética:

ética é uma palavra de origem grega, com duas origens possíveis. A primeira é a palavra grega éthos, com e curto, que pode ser traduzida por costume, a segunda também se escreve éthos, porém com e longo, que significa propriedade do caráter. A primeira é a que serviu de base para a tradução latina Moral, enquanto que a segunda é a que, de alguma forma, orienta a utilização atual que damos a palavra Ética. Ética é a investigação geral sobre aquilo que é bom. (MOORE, 1975, p.4)

Segundo Singer (1994, p.4), “a Ética pode ser um conjunto de regras, princípios ou

maneiras de pensar que guiam (...) as ações de um grupo em particular (moralidade), ou é o

estudo sistemático da argumentação sobre como nós devemos agir (filosofia moral)”.

Portanto, quanto à forma de abordagem, devemos considerar que não existe uma só ética;

existem tantas quantas as crenças de diferentes comunidades. Portanto, quando se traz à tona

essa questão, deve-se estar preparado para isentar-se de fazer comparações entre culturas de

povos e comunidades; pelo contrário, é preciso saber contrastar realidades de forma

respeitosa, ainda que se discorde delas – o respeito é uma das características do ser ético.

O trabalho com a ética em sala de aula, pois, será favorecido se desenvolvermos no

aluno a consciência intercultural crítica tão almejada, preparando-o, por meio de sua

exposição a diferentes textos - dos mais variados gêneros e tipos, que tragam questões

relevantes para a sua formação - para agir de acordo com sua própria ética, sem deixar de lado

o respeito à ética de seus semelhantes.

Quanto à questão da interdisciplinaridade, Schmitz aponta a dificuldade de ser um

profissional que trabalhe de forma interdisciplinar devido à má formação universitária – pelo

menos a esse respeito. Seja por esse motivo ou não, de fato, há muita resistência quanto à

proposição de um trabalho sob essa perspectiva; não necessariamente por parte dos

professores de línguas, mas também por parte dos professores das diversas disciplinas que

possibilitariam o caráter interdisciplinar do ensino. Os próprios autores, Rojo e Moita Lopes

(2004, p.18), concordam que se deve manter o caráter interdisciplinar para a educação no

Ensino Médio, mas admitem não saber de que forma isso pode ser feito.

No que diz respeito ao tópico que Schmitz chama de “o respeito da diferença e a

construção da identidade”, o autor aborda muito acertadamente que, ao pregarmos o respeito

ao outro, precisamos deixar claro que esse “outro” pode ter origens diversas, não

necessariamente estadunidense ou britânica, visto que a língua inglesa hoje é a língua de todos

e, ao mesmo tempo, de ninguém. Até concordo com a dificuldade que alguns professores

possam ter para elaborar materiais sensíveis à questão da identidade, mas penso que os

materiais são apenas o resultado da atitude do educador, esta sim mais importante. Muitas

vezes os textos utilizados permitem uma discussão interessante acerca de temas relevantes

para a construção da identidade e o respeito ao “outro”, mas essa oportunidade passa

despercebida; se, pelo contrário, o professor tiver a atitude de contrapor a utilização de

estereótipos e o pré-julgamento de práticas de diferentes comunidades, o aluno, certamente,

será mais bem preparado para lidar com diferentes identidades e formar a sua própria. Afinal,

por trazer o outro e sua diferença para mais perto de nossas vidas, o ensino de LE pode colaborar, de modo singular, no contato e diálogo com a diversidade, e, na verdade, na construção de projetos identitários e sociais mais democráticos e menos naturalizados sobre os outros e sobre nós mesmos. (MOITA LOPES & ROJO, 2004, p.44)

Ao falar das “Línguas Estrangeiras e o ensino único: leitura em língua materna”,

Schmitz questiona a possibilidade de se trabalhar outras habilidades que não somente a da

leitura. Concordo plenamente que assim se faça. No entanto, acredito que, quando Rojo e

Moita Lopes escreveram os documentos, devem ter pensado, principalmente, na realidade dos

professores das escolas públicas, os quais geralmente lidam com salas de aula cheias, sem

recursos, sem acústica própria e que, muitas vezes, não têm fluência para trabalhar a

oralidade, por exemplo. Dessa forma, fica difícil exercitar as quatro habilidades, ainda que

haja boa vontade (o que também não é muito fácil de se encontrar!).

Concordo que o despreparo dos professores para ensinar leitura, podendo torná-la um

mero exercício de tradução, contribui bastante para o dado mencionado por Schmitz, de que

apenas 5,35% dos alunos saem do ensino médio (segundo Rojo e Moita Lopes) com a

capacidade leitora esperada. No entanto, outros fatores dividem a responsabilidade com o

despreparo docente, como é o caso das condições sócio-econômicas desfavorecidas, as quais

dificultam o acesso a bens de consumo que poderiam facilitar a educação como processo

amplo e evolutivo. Essas condições podem perdurar por gerações, o que pode acarretar a falta

de exemplo por parte dos pais e familiares de nossos alunos, que muito provavelmente não

tiveram acesso nem à formação básica. Isso, por sua vez, pode resultar no aumento da

criminalidade e perpetuação do discurso de que não é necessário ter uma boa formação

educacional para se conseguir sobreviver.

Mas voltemos à questão do despreparo docente, o qual pude observar mais de perto. Há

alguns anos, fiz concurso para ensinar na Universidade Federal da Bahia, como professora

substituta. Ao ser aprovada, fui informada de que assumiria as disciplinas do então chamado

“inglês instrumental”, que na verdade configurava o ensino de leitura em língua inglesa para

cursos que não fossem pertencentes ao Instituto de Letras. Portanto, o desejo da coordenação

era que se trabalhasse com estratégias de leitura e vocabulário da área da turma à qual as aulas

seriam ministradas.

O problema é que, como fora citado por Schmitz, não tive nenhuma formação para esse

tipo de aula durante a graduação; na especialização (que nessa época ainda estava cursando),

eu vi algumas coisas que me ajudaram no planejamento das aulas, mas posso dizer que

aprendi a dar aula de leitura com os meus erros, na prática, já que era na sala de aula que eu

testava tudo que lia sobre o então “inglês instrumental”.

O fato de que muitos professores passam por isso não me assusta mais; entretanto, o que

é relevante observar é que muitos deles não procuram fontes para enriquecer suas aulas de

leitura nem refletem sobre seus erros com o intuito de promover seu crescimento enquanto

profissionais da educação.

Por último, mas não menos importante, está o tópico “o Inglês e o ‘pensamento único’,

globalização”, no qual Schmitz (2008) destaca a importância de perceber que a língua inglesa

não mais globaliza apenas, mas também localiza, isto é, a generalização e valorização dos

saberes locais andam juntas, permitindo o reconhecimento da identidade das mais diferentes

culturas e promovendo a visão da língua inglesa como um idioma que permite a comunicação

global, mas não como uma língua/cultura única a ser empurrada goela abaixo.

De forma bastante condizente com o que prega o PCN+, o Ministério da Educação

(MEC) publicou a proposta para o Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM): “conhecer e

usar língua(s) estrangeira(s) moderna(s) como instrumento de acesso a informações e a outras

culturas e grupos sociais” (ALMEIDA FILHO, 2010)21.

Almeida Filho percebeu, nessa proposta, a possibilidade de ir além do ensino de leitura:

os objetivos indicados no Exame e reproduzidos acima são CONHECER e USAR uma de duas línguas estrangeiras (LE), a saber, o Inglês ou o Espanhol. Isso implica aprender sobre fatos da língua-alvo e aprender a usar essa língua. Esse uso não deveria estar restrito à língua escrita, à leitura mais especificamente, como é de praxe na nossa pobre escola. A oralidade também está no jogo e essa possibilidade abre perspectivas inovadoras para o ensino de línguas na escola brasileira. Implica também cuidados oficiais que deverão ser tomados na implementação de uma dimensão contemporânea oral na aprendizagem do uso das línguas que preenchem a disciplina Língua Estrangeira (ALMEIDA FILHO, 2010).

21 Disponível em: <http://www.sala.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=300:exame-nacional-de-ensino-medio-enem&catid=42:artigos-de-capa&Itemid=162>. Nesta página, J.C.P Almeida Filho posiciona-se diante da proposta do ENEM; os trechos (a seguir) referidos a esse autor (ALMEIDA FILHO, 2010) estão disponíveis neste site. Acesso em: 07 jan. 2011.

Devo concordar. Seria muito bom se nossos alunos, assim como ocorre em diversas

universidades na Europa, por exemplo, saíssem do ensino médio fluentes em, pelo menos,

uma língua estrangeira. A realidade que vivencio, no entanto, não é tão satisfatória. Eu penso

que o grande problema não está nem na falta de equipamentos; está no despreparo de grande

parte dos professores, os quais muitas vezes não são nem fluentes na língua que lecionam. Em

outras palavras, acredito que, diante da realidade das escolas públicas estaduais na atualidade,

estaremos contentes se, ao final do ano, tivermos alunos competentes ao menos em leitura.

Face aos problemas que atingem a sociedade – violência, drogas etc –, é fundamental que

privilegiemos a busca pela formação do aluno cidadão e, sem dúvida, a leitura é a habilidade

que torna isso mais acessível aos alunos.

Não quero com isso dizer que é fácil trabalhar com leitura ou que um professor

despreparado possa fazê-lo; mas creio que, de forma menos dispendiosa, e com treinamento

muito menos demorado, leituras e estudo, o profissional dedicado será capaz de arriscar,

acertar, errar e refletir sobre a sua prática, chegando enfim a resultados satisfatórios na

compreensão textual.

Almeida Filho (2010) tem afirmações interessantes e esperançosas a respeito do

trabalho com a oralidade:

numa palavra, é louvável e não sem tempo que as outras línguas de comunicação ampla no mundo mereçam seu lugar no Exame ENEM daqui por diante. A vinculação da experiência à leitura predomina conforme tradicionalmente tem ocorrido no país. Essa visão parcial do que representa aprender uma nova língua na escola não aguentará mais por muito tempo. Conhecer e reconhecer palavras, gramática e ideias contidas num texto parece muito pouco e fora de época como objetivos principais. Pode ser que não tenham atinado ainda com alguma forma prática de avaliar outras habilidades no quadro de limitação do lápis e papel a que ainda estamos condenados. Um exame que pode abrir portas de universidades tem de ser mais autêntico ao representar nos focos das suas questões a língua-alvo integral. O que foi que determinou que após 7 anos de escolarização numa outra língua e sua cultura só restariam palavras, itens gramaticais e algumas posições culturais acerca dessa nova língua avaliadas por escrito? É só isso mesmo o que devemos esperar ou isso é apenas uma deformação que foi sendo instalada nos vestibulares dos quais queremos nos despedir um dia?

Quanto ao fato de que “a vinculação da experiência à leitura predomina conforme

tradicionalmente tem ocorrido no país”, acredito que a predominância na verdade seja outra: a

gramática. Não tenho experiência com as escolas do país, mas falando da realidade de escolas

estaduais em Salvador, aquelas às quais tenho acesso por meio de professores de inglês que

nelas trabalham, o modelo de aulas parte do assunto gramatical a ser trabalhado e o texto é

usado como pretexto para abordá-lo; isso, definitivamente, não é predomínio da leitura.

De fato, seria uma grande evolução ampliar as habilidades a serem estudadas; no

entanto, de forma mais concreta e emergencial, acredito no trabalho com a leitura sob uma

perspectiva transformadora – não reduzida a “palavras, itens gramaticais e algumas posições

culturais”.

Pode até parecer desculpa, mas as salas de aula cheias, a falta de equipamentos e o

despreparo dos professores dificultam, sim, o trabalho com a oralidade e a audição. Para se

resolver esse problema, a mudança teria que surgir dos órgãos públicos competentes, os quais

poderiam providenciar salas de aula e equipamentos adequados para as aulas de língua

estrangeira, bem como a devida qualificação dos professores – que já deveria ser testada no

momento da seleção de docentes. Isso sem falar na falta de interesse de alguns; o que seria

dos cursos de línguas, por exemplo, se os alunos já saíssem das escolas regulares com

fluência?

Por isso, insisto: a iniciativa de defender o trabalho com a oralidade é louvável, mas o

que é que nós podemos fazer agora, na situação em que nos encontramos? Eu defendo o

trabalho com a leitura sob uma perspectiva crítica e (trans)formadora de cidadãos capazes de

interferir na realidade da qual fazem parte – o que é um grande avanço em relação ao trabalho

pouco significativo com estruturas gramaticais e vocabulário descontextualizados.

O uso do texto como ponte para a reflexão pode ser muito útil para tentar minimizar a

violência, o uso de drogas, entre outros problemas que afligem a sociedade como um todo.

Basta delinear programas de ensino que tenham como foco a formação do ser humano, e não

o desenvolvimento de sua capacidade de memorização.

3 POR UMA PEDAGOGIA CRÍTICA E CULTURALMENTE SENSÍVE L PARA O

ENSINO DE LÍNGUA INGLESA

Se interculturalmente línguas queremos ensinar, respeitemos as diferenças entre culturas de lá e de cá e humanizadoramente nossos alunos saibamos tratar. (GOMES DE MATOS, 2010, p.36)

3.1 PEDAGOGIAS CRÍTICAS E INTERCULTURAIS EM LÍNGUA ESTRANGEIRA –

INGLÊS

Buscando fugir do discurso comum entre profissionais da área de ensino de línguas de

que, na teoria, as pedagogias críticas e culturalmente sensíveis são excelentes, mas, na prática,

deixam a desejar, tentarei estabelecer o que se entende por “pedagogia crítica” e a relação que

esta pode vir a ter com o ensino de língua estrangeira.

Silva (2004)22 afirma que “a Pedagogia Crítica enfatiza o papel transformador que o

professor pode cumprir enquanto intelectual. Isto pressupõe não apenas que os professores se

engajem, mas que atuem em todos os espaços possíveis”. Essa constatação deixa bastante

claro que ser um pedagogo crítico nada tem a ver com a aplicação de um método ou técnicas

específicas para o ensino/aprendizagem; trata-se de uma postura que o educador se propõe a

assumir diante da realidade que vivencia.

Adotar uma pedagogia crítica, portanto, é se utilizar dos conteúdos de língua estrangeira

(neste caso) para tentar contribuir para a formação de alunos mais humanos, mais

preocupados com o mundo do qual são parte; é transformá-los, para que eles se tornem seres

humanos transformadores e que nós, professores, também nos transformemos por meio dessa

interação.

De acordo com Giroux23 (2011),

os intelectuais transformadores precisam desenvolver um discurso que una a linguagem da crítica e a linguagem da possibilidade, de forma que os educadores sociais reconheçam que podem promover mudanças. Desta maneira, eles devem se manifestar contra as injustiças econômicas, políticas e sociais dentro e fora das escolas. Ao mesmo tempo, eles devem trabalhar

22 Disponível em: <http://www.espacoacademico.com.br/042/42pc_critica.htm>. Acesso em: 24 jan. 2011. 23 Disponível em: <http://www.espacoacademico.com.br/030/30pc_giroux.htm>. Acesso em: 24 jan. 2011.

para criar as condições que dêem aos estudantes a oportunidade de tornarem-se cidadãos, que tenham o conhecimento e coragem para lutar a fim de que o desespero não seja convincente e a esperança seja viável. Apesar de parecer uma tarefa difícil para os educadores, esta é uma luta que vale a pena travar. Proceder de outra maneira é negar aos educadores a chance de assumirem o papel de intelectuais transformadores.

Em se tratando de uma formação mais humana e que leve ao respeito à diferença, não

podemos deixar de estabelecer uma relação íntima entre os pressupostos teóricos das

pedagogias críticas e a interculturalidade. Afinal, duas das “responsabilidades interculturais

aplicáveis a todos o professores de idiomas” (GOMES DE MATOS, 2010, p.32) são:

- Cultivar, mantener, preservar y fortalecer su identidad cultural, intercultural y planetária. - Motivar a sus alumnos para que compartan la misión de interculturalistas, promotores de la paz comunicativa mediante el uso del español (y otros idiomas)24. (GOMES DE MATOS, 2010, p.32)

Promover a paz comunicativa por meio do uso da língua estrangeira é, sem dúvida, uma

forma de adotar pedagogias críticas na sala de aula.

Para desenvolver um trabalho que favoreça o respeito ao “outro” e a si mesmo, torna-se

necessário compreender as interações entre as diferentes culturas nas sociedades. Com o

intuito de compreender melhor o que pretendo tomar como cultura, trago aqui algumas

definições. Kramsh (1998 apud SIQUEIRA, 2008, p. 207), por exemplo, associa o termo à

“participação de uma comunidade de discurso que compartilha um espaço social e uma

história comuns assim como um sistema comum de padrões no que diz respeito a percepções,

crenças, avaliações e ações”.

No volume “Cultura: um conceito antropológico”, de Roque de Barros Laraia (2008),

podemos encontrar diversas citações sobre cultura, entre elas as de W. Goodenough (p.61),

que diz que cultura “consiste em tudo aquilo que alguém tem de conhecer ou acreditar para

operar de maneira aceitável dentro de sua sociedade”, recebendo o comentário de Keesing

(p.61) de que “se cultura for assim concebida ela fica situada epistemologicamente no mesmo

domínio da linguagem, como um evento observável”.

Segundo Clifford Geertz (p.62), ainda na obra de Laraia, a cultura deve ser considerada

“não um complexo de comportamentos concretos, mas um conjunto de mecanismos de

controle, planos, receitas, regras, instruções (que os técnicos de computadores chamam

24 - Cultivar, manter, preservar e fortalecer sua identidade cultural, intercultural e planetária. - Motivar seus alunos a compartilharem a missão de interculturalistas, promotores da paz comunicativa através do uso do espanhol (e outros idiomas). (GOMES DE MATOS, 2010, p.32) Tradução livre.

programa) para governar o comportamento” e, portanto, “todos os homens estão aptos para

receber um programa, e este programa é o que chamamos de cultura”.

David Schneider diz que

cultura é um sistema de símbolos e significados. Compreende categorias ou unidades e regras sobre relações e modos de comportamento. O status epistemológico das unidades ou ‘coisas’ culturais não depende da sua observabilidade: mesmo fantasmas e pessoas mortas podem ser categorias culturais (SCHNEIDER apud LARAIA, 2008, p. 63).

Seja definida como “uma lente através da qual o homem vê o mundo” (BENEDICT,

1972 apud LARAIA, 2008, p.67) ou como o “conjunto de práticas contestadas e conflituosas

de representação que mantêm uma estreita ligação com os processos de formação e de

reformação dos grupos sociais” (FROW & MORRIS, 2006, p. 328), a cultura será sempre

uma conexão direta com o trabalho e sua organização; com as relações de poder e de gênero no local de trabalho, no lar, no bairro, na rua; com os prazeres e as pressões do consumo; com as complexas relações de classe e de parentesco através das quais forma-se uma noção do eu e do pertencimento; e com as fantasias e desejos por meio dos quais as relações sociais são desenvolvidas e ativamente influenciadas (FROW & MORRIS, 2006, p. 316).

No campo dos Estudos Culturais, a cultura é vista

em sentido amplo, antropológico, de passar de uma reflexão centrada sobre o vínculo cultura-nação para uma abordagem da cultura dos grupos sociais. Mesmo que ela permaneça fixada sobre uma dimensão política, a questão central é compreender em que a cultura de um grupo, e inicialmente a das classes populares funciona como contestação da ordem social ou, contrariamente, como modo de adesão às relações de poder (MATTELART & NEVEU, 2005, p.13-4).

Embasando-me nestas definições que se complementam, refiro-me aqui a cultura como

o objeto mediador do convívio sociocultural e linguístico, possibilitando a partilha de

experiências humanas relativas a crenças e ações decorrentes delas.

Portanto, uma abordagem que se considere culturalmente sensível para o ensino de

língua estrangeira

deve proporcionar aos aprendizes a oportunidade de apreciar as diferenças entre a sua cultura e a cultura de comunidades/países onde a língua alvo é falada; identificar-se com a experiência e a perspectiva das pessoas em países e comunidades em que a língua alvo é falada; usar esse conhecimento para desenvolver uma visão mais objetiva dos seus próprios costumes e maneiras de pensar (CORBETT, 2003 apud SIQUEIRA, 2008, p.225).

Assim como na Abordagem Comunicativa Intercultural (doravante ACIN)25, proposta

por Mendes (2004, p.165), em uma abordagem que se diga culturalmente sensível para o

ensino/aprendizagem de leitura em língua inglesa, a língua é vista como cultura, não podendo

ser dissociada dela, já que é através da língua que se dão as interações sociais das mais

diversas. Portanto, o termo língua-cultura (MENDES, 2004) é bastante adequado também

para este contexto.

No que diz respeito ao ensino/aprendizagem de gramática, as estruturas são vistas

sempre a partir de um contexto, de forma acessória, o que torna inviável a aplicação de listas

de exercícios enormes e descontextualizados. Foca-se no sentido, na compreensão textual

auxiliada pelo conhecimento da estrutura gramatical. Propõe-se também a existência do

“diálogo entre culturas”, em que

ensinar e aprender uma língua-cultura (são vistos) como processos que englobam, além dos aspectos lingüísticos propriamente ditos, toda a rede de aspectos socioculturais, cognitivos, afetivos e psicológicos que caracterizam o uso da linguagem; processos que visam ao engrandecimento do indivíduo como sujeito histórico, cultural e como cidadão, e ao uso comum da nova língua-cultura como passaporte para inserção pacífica e dialógica do sujeito no mundo à sua volta. Pressupõe também o desenvolvimento da intersubjetividade, pela construção conjunta de conhecimentos, através do partilhamento de experiências, antigas e novas, de pessoas que se reconhecem como pertencentes ao mesmo mundo, ao mesmo processo de construir as suas vidas ao vivê-las (MENDES, 2004, p.166).

Mais duas características da ACIN propostas por Mendes (2004) cabem perfeitamente

no contexto em questão: a admissão de professores e alunos como “agentes de

interculturalidade” (MENDES, 2004, p.166), ou seja, defensores do respeito às diferenças e

visão do “novo” com bons olhos; e a avaliação processual, a qual permite, além de avaliar o

desempenho do aluno, que ele próprio avalie o seu crescimento e desenvolvimento de sua

aprendizagem. Nas palavras de Mendes (2004, p.166), “a avaliação tem como foco o

desenvolvimento do processo de aprendizagem e não o seu fim, assim como se preocupa com

a qualidade do que foi aprendido e não com a quantidade [...]”.

Segundo Mendes (2009, p.757), talvez nenhum outro termo ou conceito tenha mais

destaque, ao lado da palavra “cultura”, do que o vocábulo “identidade”. O uso desses termos,

por sua vez, pressupõe a discussão da “diferença”, com a intenção de “reposicionar o homem”

25 A Abordagem Comunicativa Intercultural pode ser resumida como a força potencial que pretende orientar as ações de professores, alunos e outros envolvidos no processo de ensino/aprendizagem de uma nova língua-cultura, o planejamento de cursos, a produção de materiais e a avaliação da aprendizagem, com o objetivo de promover a construção conjunta de significados para o diálogo entre culturas (MENDES, 2004, p.154).

(MENDES, 2009, p.757) dentro de seu mundo, mas respeitando o mundo do outro e se

reconhecendo como pertencente ao mundo que eles têm em comum.

Estando clara a relação entre cultura e identidade, é importante que nós, professores,

saibamos lidar com a diferença e demos o exemplo, não só com os textos que utilizamos em

nossas aulas, mas também com o nosso discurso, evitando a disseminação de termos

pejorativos e estereótipos.

Com a simples escolha das palavras mais adequadas a cada situação, estaremos

mostrando a nossos alunos como devem se portar diante do “outro”, do “diferente”.

Hall (1997, p.234) se perguntou: por que a ‘diferença’ importa? ; ao responder,

considerou quatro tipos de explicação plausíveis para a sua pergunta: a primeira delas vem da

linguística e diz que “a diferença importa porque é essencial ao significado; sem ela, o

significado não poderia existir”26 (HALL, 1997, p.234). Na segunda resposta, disse ser a

origem também das teorias da linguagem, porém de uma escola diferente da de Saussure, com

o argumento de que “precisamos da diferença porque só conseguiremos construir significados

através do diálogo com o ‘Outro’”27(HALL, 1997, p.235). Em uma terceira resposta, recorreu

à antropologia, dizendo que “(...) a cultura depende da atribuição de significado às coisas pela

sua distribuição em diferentes posições dentro de um sistema classificatório”28 (HALL, 1997,

p.236). A quarta explicação está ligada à psicologia e tem como argumento que “o ‘Outro’ é

fundamental para a constituição do eu como sujeito e para a identidade sexual”29 (HALL,

1997, p. 237).

O fato é que essas explicações não são excludentes; na verdade, elas se complementam

e justificam que a diferença seja usada de forma positiva ou negativa, a depender do contexto

em que ela seja aplicada. O problema está quando ela “é convertida em cômico e em

inferioridade do outro: rimos do que não somos (ou ainda, o que vem a dar no mesmo, do fato

de o outro não ser como nós)” (CALVET, Louis-Jean, 1983, p.34). Neste caso, a diferença

torna-se estereótipo.

Segundo Hall (1997, p.257), “estereotipar reduz as pessoas a poucas, simples e

essenciais características, as quais são representadas como determinadas pela Natureza”30.

26 “’Difference’ matters because it is essential to meaning; without it, meaning could not exist”. 27 “[...] we need ‘difference’ because we can only construct meaning through a dialogue with the ‘Other’”. 28 “[...] culture depends on giving things meaning by assigning them to different positions within a classificatory system”. 29 “[...] the ‘Other’ is fundamental to the constitution of the self, to us as subjects, and to sexual identity”. 30 “Stereotyping reduces people to a few, simple and essential characteristics, which are represented as fixed by Nature”.

Essa “naturalização” é, segundo Hall (1997, p.245), uma estratégia representacional

designada a estabelecer a diferença e mantê-la para sempre31.

Além de reduzirem tudo que diz respeito à pessoa a seu jeito de ser e de agir,

exagerando e simplificando essas características, os estereótipos partem de uma estratégia de

separação, excluindo os indivíduos que não sejam “normais” e “aceitáveis” do grupo fechado

e privilegiado dos que o são.

As reações dos alunos quando estão diante de informações culturais de povos ou

comunidades que sejam muito diferentes das suas realidades geralmente são preconceituosas

e, eu diria, muitas vezes cruéis. Não estou aqui propondo que todos concordemos com as

posturas assumidas por culturas diversas como, por exemplo, a de abortar bebês do sexo

feminino na Índia; o que sugiro é que tentemos entender e fazer com que nossos alunos

compreendam a diversidade, posicionem-se diante dela, mas saibam respeitá-la e não

julguem, neste caso, os indianos que assumem tal postura.

Laraia (2008, p.50-1) esclarece a diferença entre o instinto e o desenvolvimento da

cultura, citando os exemplos dos pilotos suicidas japoneses (camicases), durante a Segunda

Guerra Mundial, e a prática do infanticídio, comum entre as mulheres Tapirapé, tribo Tupi do

Norte do Mato Grosso, que eram obrigadas a matar todos os filhos depois do terceiro, visto

que não tinham conhecimento de nenhuma técnica anticoncepcional. Esses exemplos só

ratificam a importância dos padrões culturais em detrimento de comportamentos

determinados biologicamente. Assim,

cada sistema cultural está sempre em mudança. Entender esta dinâmica é importante para atenuar o choque entre as gerações e evitar comportamentos preconceituosos. Da mesma forma que é fundamental para a humanidade a compreensão das diferenças entre povos de culturas diferentes, é necessário saber entender as diferenças que ocorrem dentro do mesmo sistema. Este é o único procedimento que prepara o homem para enfrentar serenamente este constante e admirável mundo novo do porvir” (LARAIA, 2008, p. 101).

O desafio está lançado: dar aulas de língua-cultura inglesa, fugindo da tão conhecida

fórmula de expor os alunos às comidas típicas, os pontos turísticos e os costumes de

diferentes povos do globo terrestre. É o que Santomé (1995, apud MOTA, 2010, p.42) chama

de “currículo turístico”, o qual enfatiza o estudo superficial de características de culturas

diversas, propondo exposição dos alunos a tradições culturais que pouco ou nada acrescentam

à sua formação como ser humano, até porque tendem a fortalecer a perpetuação de

estereótipos. Acaba sendo deixada de lado a necessidade de proporcionar ao aluno momentos

31 “’Naturalization’ is therefore a representational strategy designed to fix ‘difference’, and thus secure it forever.

de posicionamento diante dos acontecimentos importantes nessas sociedades, os quais têm

repercussão em diversas outras, inclusive em sua cultura e, portanto, em suas vidas.

Ao observarmos as abordagens já utilizadas para o ensino de inglês como língua

estrangeira, podemos perceber que houve uma evolução no que diz respeito à questão cultural.

Partimos do Método da Tradução Gramatical, no qual a ênfase era dada ao estudo de

vocabulário e gramática por meio da memorização, sem qualquer preocupação com o

contexto ou questões culturais; passamos pela abordagem Audiolingual, cujo fim era a

reprodução de diálogos previamente estruturados, os quais promoviam a afirmação dos

Estados Unidos e Inglaterra como países detentores da “boa pronúncia” e, portanto, donos da

língua-cultura inglesa; vivenciamos o Método Direto, que tinha como base o trabalho com a

língua de forma comunicativa, também privilegiando os “detentores da língua”; e chegamos

ao Método Comunicativo, no qual o “currículo turístico” (SANTOMÉ, 1995 apud MOTA,

2010, p.42) e o desenvolvimento da fluência têm destaque.

Ainda que o trabalho com a cultura, até esse ponto, tenha sido feito de forma

estereotipada e pouco preocupada com o respeito à diferença, a abordagem de aspectos

culturais já retrata certa evolução, visto que permite visualizar o estudo da língua como

veículo para o acesso ao conhecimento de outras realidades. Finalmente, é com a percepção

da importância da adoção das pedagogias críticas para o ensino de língua estrangeira que

questões como a interculturalidade – que é imprescindível na formação do aluno crítico e

culturalmente sensível – passaram a ter destaque nos materiais didáticos e textos no campo da

linguística aplicada. Essa preocupação, é claro, também passou a se fazer presente entre os

profissionais que trabalham diretamente com os alunos na sala de aula, os quais estão em

busca de novidades que permitam melhorar o trabalho com a língua estrangeira, tornando-o

significativo na vida dos alunos.

Quando comecei a vivenciar a realidade do ensino médio, diversas vezes, ao iniciar o

trabalho em uma turma, deparei-me com a colocação de alguns alunos: “Pra que eu vou

aprender inglês? Eu odeio os Estados Unidos!”. Essa reação é capaz de desestabilizar um

professor desavisado, como já aconteceu comigo. O que fazer com esses alunos? O que dizer

a eles?

Se pararmos para analisar essa afirmação mais a fundo, perceberemos que ela retrata a

ideia de que a língua inglesa está diretamente ligada aos Estados Unidos, desconsiderando os

outros países que têm o inglês como língua oficial ou segunda língua e, mais grave ainda,

esquecendo-se de que a língua inglesa possui o status de língua internacional, o que significa

que ela não pertence a nenhuma nação e, ao mesmo tempo, pertence a todas, as quais se

utilizam dela para realizar suas interações comerciais, políticas e sociais em geral. O Brasil,

portanto, está entre essas nações e, como tal, será mais bem representado se os brasileiros

tiverem acesso a esse passaporte para a comunicação mundial.

De forma a tentar minimizar essa reação negativa e de resistência à aprendizagem da

língua inglesa, além de mencionar o status do inglês na atualidade, passei a comparar a

“aceitação” dos Estados Unidos – já que representa a potência detentora do inglês no

imaginário do aluno em geral – com a relação que existe com a cultura indígena no Brasil.

Gersem Baniwa (2006, p.60) diz que o modelo de organização indígena formal – um

modelo branco – foi sendo apropriado pelos povos indígenas ao longo do tempo, da mesma

forma que eles foram se apoderando de outros instrumentos e novas tecnologias dos brancos

para defenderem seus direitos, fortalecerem seus modos próprios de vida e melhorarem suas

condições de vida, o que é desejo de qualquer sociedade humana. Segundo ele, isto não

significa tornar-se branco ou deixar de ser índio. Ao contrário, quer dizer capacidade de

resistência, de sobrevivência e de apropriação de conhecimentos, tecnologias e valores de

outras culturas, com o fim de enriquecer, fortalecer, e garantir a continuidade de suas

identidades, de seus valores e de suas tradições culturais (BANIWA, 2006, p.60).

Parafraseando Baniwa (2006, p.60), traço um paralelo entre a relação intercultural

índio-branco e o posicionamento, muitas vezes de rejeição, com respeito ao aprendizado de

língua inglesa. Pensemos que a língua da globalização – o inglês – foi sendo apropriada pelos

povos do mundo inteiro ao longo do tempo, da mesma forma que eles foram se apoderando de

outros instrumentos e novas tecnologias dos estadunidenses (devido à sua hegemonia

econômica mundial) para defenderem seus direitos, fortalecerem seus modos próprios de vida

e melhorarem suas condições de vida, o que é desejo de qualquer sociedade humana. Isto não

significa tornar-se estadunidense ou deixar de ser quem você é. Ao contrário, quer dizer

capacidade de resistência, de sobrevivência e de apropriação de conhecimentos, tecnologias e

valores de outras culturas, com o fim de enriquecer, fortalecer e garantir a continuidade de

suas identidades, de seus valores e de suas tradições culturais.

O estudo da língua inglesa, pois, deve ser visto como uma forma de apropriar-se do

conhecimento, já que - como uma língua internacional – é com ela que se desenvolvem os

estudos, os negócios e a tecnologia. Não se deve pensar em aprender inglês como uma forma

de submissão aos Estados Unidos. Primeiro, porque a língua já se desnacionalizou de forma a

ser considerada uma língua mundial; segundo, porque é conhecendo a língua “de dominação”

que se aproxima da forma de pensar e agir do povo “dominante”, o que facilita reações

precisas e inteligentes do “dominado”.

É preciso ter essa consciência para que não se chegue ao processo que Hall (2006, p.76)

chama de “homogeneização cultural”, que define como o fenômeno em que

as diferenças e as distinções culturais, que até então definiam a identidade, ficam reduzidas a uma espécie de língua franca internacional ou de moeda global, em termos das quais todas as tradições específicas e todas as diferentes identidades podem ser traduzidas (HALL, 2006, p.75/6).

Prefiro defender uma hibridização cultural, em que “a impureza, a mistura, a

transformação, que vêm de novas e inesperadas combinações de seres humanos, culturas,

ideias, políticas, filmes, músicas” (RUSHDIE, 1991, p.394 apud HALL, 2006, p.92) servem

para enriquecer e afirmar a cultura e identidade de cada povo, desde que este tenha

consciência deste processo.

3.2 PEDAGOGIAS CRÍTICAS NOS DOCUMENTOS OFICIAIS (PCN+)

De acordo com Paraquett,

os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) acabam determinando uma abordagem que toma língua como discurso, particularizando, portanto, questões de interação sócio-culturais que vão além da comunicação pragmática; e os mais preocupados com a aprendizagem de línguas para a comunicação têm-se dedicado ao que se está denominando Educação Multicultural ou Pedagogia Crítica (PARAQUETT, 2009, p.768).

Ainda segundo ela, “não há limites estabelecidos entre os que ensinam e aprendem

línguas pela comunicação, pela interação sócio-cultural, ou pela inclusão social”

(PARAQUETT, 2009, p.768). Dessa forma, os pressupostos teóricos presentes nos documentos

oficiais (PCN+) vêm de encontro ao desenvolvimento do pensamento crítico culturalmente

sensível, o qual permite que a interação sócio-cultural seja feita de forma respeitosa com

relação ao “outro”, ao diferente, estranho, desconhecido,

possibilitando a compreensão de que esse ‘outro’ é menos estrangeiro do que se imagina, porque tem na sua história e no seu cotidiano, elementos que muito se assemelham aos nossos. E essas discussões, certamente, colaborariam para a derrubada de fronteiras – procedimento tão necessário à aprendizagem de línguas estrangeiras [...] (PARAQUETT, 2009, p.772).

É importante ressaltar que quando me refiro ao “outro”, não quero falar apenas daquele

que não é brasileiro, mas sim daquele que, de alguma forma, é diferente de nós em algum

aspecto, isto é, daquele que é diferente, mesmo dentro da mesma cultura. É o caso de trazer

para as aulas de língua estrangeira textos que abordem a situação em que se encontram as

ditas “minorias”, como, por exemplo, os deficientes físicos, homossexuais, índios, negros,

enfim, aqueles que, de alguma forma, ainda que não sejam minorias de fato em determinadas

comunidades, encontram-se em situação de discriminação.

Já que língua, cultura e identidade são conceitos que se entrelaçam, nada mais justo do

que utilizar as aulas de língua para o fortalecimento da cultura-identidade dos alunos,

possibilitando que eles se posicionem criticamente diante das interações sociais das quais

participam, respeitando também as realidades alheias. Afinal,

a construção da identidade cultural parte da consciência da necessidade de se construir a identidade lingüística, constituída pelo estudo da conservação e das rupturas, da posição dos interlocutores em dado momento histórico, das negociações de sentido, intenções e expectativas envolvidas. O estudo das línguas estrangeiras modernas deve levar ainda à reflexão sobre estatutos de indivíduos frente a outros, competência que transcende o domínio das habilidades lingüísticas. (PCN+, p.98)

Por exemplo, ao expormos nossos alunos a diferentes gêneros textuais, de origens

diversas, que abordem temas relevantes para a realidade desses estudantes, estamos, sem

dúvida, privilegiando a construção da identidade ao simples estudo de vocabulário ou

estruturas gramaticais descontextualizados. A atitude conteudista favorece a rejeição ao

estudo da língua inglesa por sua omissão aos aspectos culturais intrínsecos ao estudo de uma

língua-cultura. É preciso ter em mente que “apropriar-se do conhecimento por meio do

aprendizado das línguas estrangeiras modernas permite que o aluno faça uma análise mais

acurada do seu contexto social, ao compará-lo com outras culturas e visões de mundo”

(PCN+, p.103).

Precisamos fazer valer tal afirmação e refletir acerca do fato de que

a possibilidade de cada indivíduo usufruir do patrimônio cultural da humanidade amplia-se a partir da aprendizagem de línguas estrangeiras. Vale lembrar também que, pela aquisição de competências e habilidades que possibilitam acesso ao conhecimento e ao fazer cultural universal, o aluno do ensino médio pode construir sua própria identidade cultural. (PCN+, p.102/3)

Isso, no entanto, só será verdade se os currículos forem traçados de forma menos

conteudista, mais humanista e comprometida com a valorização do aluno como ser humano

dotado de competências que vão além da sala de aula. Ou mais: se o professor estiver disposto

a driblar os percalços, utilizando-se de sua criatividade para escapar desses currículos pré-

determinados, da falta de equipamentos e de material didático, conquistando os seus (muita

vezes) mais de 40 alunos por turma e levando-os a pensar criticamente diante da realidade que

encontram nos textos em língua inglesa aos quais são expostos.

Os autores do PCN+ acreditam que,

sendo a língua um bem cultural e patrimônio coletivo, no estudo de idioma estrangeiro é fundamental a abordagem de aspectos que envolvem a influência de uma cultura sobre a outra. No caso do Inglês, por exemplo, pode-se analisar a influência da cultura norte-americana e da própria língua inglesa sobre outras culturas e idiomas. A ampliação de horizontes culturais passa pela ampliação do universo lingüístico. (PCN+, p.100)

Mas é preciso deixar claro que a análise dessa influência cultural não se restringe a um

país, ainda que este detenha a supremacia político-econômica mundial; devemos abordar,

pois, no ensino de língua inglesa, as relações interculturais entre os diversos países, regiões e

comunidades mundiais a que tivermos acesso e suas consequências para a vida de cada

indivíduo. É a partir do trabalho com diferentes realidades que se desenvolve o pensamento

crítico e reflexivo que é tão importante para o crescimento como ser humano. No ensino dessa

língua-cultura inglesa, cabe-nos também saber que

uma das tarefas da disciplina é conscientizar o aluno da importância da aquisição não apenas gramatical, mas discursiva e estratégica do idioma estrangeiro: o fazer cultural exige acordos mediados pela língua e por seus usuários, em contextos socioculturais diversos, segundo intenções específicas. Em resumo: trata-se de refletir sobre a língua estrangeira (e as demais linguagens) como códigos de legitimação de acordos de sentidos, negociados a partir de características simbólicas, arbitradas e convencionadas no encontro dos discursos usados nas várias esferas da vida social. (PCN+, p.102)

O ensino/aprendizagem de leitura em língua inglesa é bem propício para desencadear

discussões e debates acerca de problemas que afligem diferentes grupos sociais. No momento

da escolha do texto que vai discutir com seus alunos, o professor já traça os objetivos da aula,

os quais devem ir além de estudar o passado simples, por exemplo. O tema do texto deve ser

discutido, com os aspectos gramaticais funcionando como pano de fundo. Se soubermos

aproveitar bem o conteúdo cultural dos textos, perceberemos que

o conhecimento da língua estrangeira permite identificar razões e motivos que justificam, no eixo temporal, a existência de produtos culturais que, por não serem vazios de ideologia, mantêm estreita relação com a realidade histórica que os circunda. (PCN+, p.102)

Cabe a nós professores guiarmos nossos alunos na busca da(s) ideologia(s) presente(s)

nas entrelinhas dos textos, visando a torná-los capazes de se posicionarem diante dela(s), de

forma que o trabalho com a compreensão textual tenha sentido. Com a exposição do estudante

a diferentes realidades, facilita-se o reconhecimento, aceitação e, muitas vezes, transformação

da sua própria realidade, com vistas a seu bem-estar social.

Dessa forma, percebemos que o papel do professor é essencial na criação de

oportunidades para essa construção ou afirmação da identidade do aluno. Precisamos

ultrapassar os limites do conteúdo programático e tecer as nossas aulas a partir de temas que

promovam em nossos alunos o desenvolvimento do pensamento crítico; não podemos nos

contentar em sermos meros aplicadores de materiais sem sequer refletirmos sobre as

consequências que eles podem causar; precisamos traçar objetivos (que não apenas saber

colocar a preposição correta, por exemplo), visando ao crescimento do aluno como ser

humano que interfere no curso dos acontecimentos em sua comunidade; precisamos, enfim,

ter consciência de que

a ação é trabalho não por causa do maior ou menor esforço físico despendido nela pelo organismo que atua, mas por causa da consciência que o sujeito tem de seu próprio esforço, da possibilidade de programar a ação, de criar instrumentos com que melhor atue sobre o objeto, de ter finalidades, de antecipar resultados. Mais ainda, para que a ação seja trabalho, é preciso que dela resultem produtos significativos que, separando-se do produtor, se podem dar à sua reflexão crítica ao mesmo tempo em que o condicionam. (FREIRE, 1981)

Afinal, se a cultura é um “complexo de expectativas, costumes e valores sociais que

afetam nossos métodos de trabalho” (FROW & MORRIS, 2006, p.315), não podemos ficar

alheios a ela; portanto, adotar uma pedagogia crítica culturalmente sensível em nossa prática

como professores de língua inglesa não deve ser um bônus, mas sim a base de tudo.

Mas como fazer isso?

3.3 UMA PEDAGOGIA CRÍTICA, O PCN+ E A SALA DE AULA

A grande questão referente ao ensino de língua inglesa diz respeito, exatamente, à

aplicabilidade dos pressupostos teóricos presentes nos documentos – e também oriundos das

pedagogias críticas – no momento de ministrar as aulas e desenvolver o currículo proposto. É

certo que a maioria dos profissionais envolvidos com o ensino de língua inglesa e estrangeira

em geral concordam em desenvolver nos alunos a consciência crítica intercultural por meio do

estudo da língua; a dificuldade, no entanto, consiste em pôr isso em prática diante de turmas

lotadas, currículo conteudista, alunos desmotivados e muitas vezes despreparados, falta de

equipamentos e materiais didáticos, sem falar na questão social, quando surgem o

preconceito, desrespeito e indiferença.

De acordo com Mendes,

ao nos defrontarmos com esses contextos, somos expostos a uma realidade bastante complexa, que envolve o universo multicultural da sala de aula, com seus diferentes mundos, com suas diferentes identidades individuais, sociais, linguísticas e culturais, de professores, alunos, da escola, da comunidade etc., todos em situação de aproximação, afastamento, conflito e embates de poder. Pensar, portanto, em cultura e identidade, discutir pedagogias críticas e abordagens que considerem a cultura, as relações interculturais e a sua importância para o ensino/aprendizado de línguas, passam pela configuração do indivíduo como múltiplo, multicultural, assentado na sua identidade e, ao mesmo tempo, naquilo que o faz diferente, a sua alteridade (MENDES, 2009, p.764).

Com o intuito de buscar em nossas salas de aula um aluno sem uma identidade fixa, mas

em contínua transformação, capaz de assumir diferentes identidades em diferentes

circunstâncias (MENDES, 2009, p.759), almejo encontrar uma relação entre os pressupostos

teóricos das pedagogias críticas culturalmente sensíveis – presentes também nos documentos

oficiais – e a realidade das aulas de língua inglesa.

Estou ciente de que não é simples trabalhar de forma crítica e culturalmente sensível,

traçar objetivos e antecipar resultados. Buscando promover uma reflexão, trago aqui dois

exemplos de textos retirados da internet.

Texto 01:

Christmas is both a sacred religious holiday and a worldwide cultural and commercial phenomenon. For two millennia, people around the world have been observing it with traditions and practices that are both religious and secular in nature. Christians celebrate Christmas Day as the anniversary of the birth of Jesus of Nazareth, a spiritual leader whose teachings form the basis of their religion. Popular customs include exchanging gifts, decorating Christmas trees, attending church, sharing meals with family and friends and, of course, waiting for Santa Claus to arrive. December 25--Christmas Day--has been a federal holiday in the United States since 1870.32

32 Disponível em: <http://www.englishexperts.com.br/forum/exercicio-texto-sobre-o-natal-em-ingles-leitura-interpretacao-t13409.html>. Acesso em: 06 jan. 2011. Acesso em: 10 dez. 2010. Tradução livre: O Natal é tanto um feriado religioso quanto um fenômeno cultural e comercial em todo o mundo. Por dois milênios, as pessoas pelo mundo têm vivenciado o Natal com tradições e práticas que são tanto religiosas quanto seculares por natureza. Os cristãos celebram o dia de Natal como o aniversário de nascimento de Jesus de Nazaré, um líder espiritual cujos ensinamentos formam a base de sua religião. Costumes populares incluem trocar presentes, decorar árvores de Natal, frequentar a igreja, fazer as refeições com a família e amigos e, é claro, esperar a chegada de Papai Noel. 25 de dezembro – Dia de Natal – é um feriado nacional nos Estados Unidos desde 1870.

Exemplos como o Texto 1

trata da tradição natalina e o que se costuma fazer nessa festa, partindo de uma perspectiva

estadunidense, o que se torna óbvio na última frase do texto. Apesar de ser um texto simples e

tendencioso (devido ao lugar de onde fala o autor), pode desencadear um bom diálogo com os

alunos a depender da forma como seja abordado.

Observe o quadro a seguir e veja algumas possibilidades de ampliação de questões de

compreensão textual a partir de uma abordag

uma abordagem crítica e culturalmente sensível para o ensino/aprendizagem de leitura em

língua inglesa:

Figura 2 – Abordagem conteudista X abordagem culturalmente sensível

Pensando nos desdobramentos das

culturalmente sensível aqui adotada, vejamos algumas possibilidades de reações dos

estudantes.

Ao fazer a pergunta de número “1”

respostas; um aluno pode afirmar

não tem família, mora sozinho ou não tem dinheiro para comprar presentes de Natal. A reação

comum diante de uma resposta como essa

é demonstrada de imediato, deixando constrangido o aluno. Em vez disso, podemos

simplesmente lidar com o fato de que nem todos vivem a nossa situação familiar, financeira

Co

nte

ud

ista

1. Quais são algunspara a celebraçãoacordo com o texto?

2. Marque verdadeiro

( ) O Natal épara o comércio mundial

3. Em que tempooração "For two

people around the

been observing it

a) Presente perfeito

b) Presente perfeito

c) Passado perfeito

d) Passado perfeito

Exemplos como o Texto 1 podem ser facilmente encontrados em livros de inglês. Ele

trata da tradição natalina e o que se costuma fazer nessa festa, partindo de uma perspectiva

estadunidense, o que se torna óbvio na última frase do texto. Apesar de ser um texto simples e

so (devido ao lugar de onde fala o autor), pode desencadear um bom diálogo com os

alunos a depender da forma como seja abordado.

Observe o quadro a seguir e veja algumas possibilidades de ampliação de questões de

compreensão textual a partir de uma abordagem meramente conteudista e superficial para

uma abordagem crítica e culturalmente sensível para o ensino/aprendizagem de leitura em

Abordagem conteudista X abordagem culturalmente sensível

Pensando nos desdobramentos das perguntas feitas sob a ótica da pedagogia crítica

culturalmente sensível aqui adotada, vejamos algumas possibilidades de reações dos

Ao fazer a pergunta de número “1”, o professor deve estar preparado para ouvir diversas

e afirmar que não tem nenhum dos costumes do texto, seja porque

não tem família, mora sozinho ou não tem dinheiro para comprar presentes de Natal. A reação

diante de uma resposta como essa (já passei por isso!) é de surpresa, a qual realmente

strada de imediato, deixando constrangido o aluno. Em vez disso, podemos

simplesmente lidar com o fato de que nem todos vivem a nossa situação familiar, financeira

alguns costumescelebração do Natal de

texto?

verdadeiro ou falso:

um fenômenomundial.

tempo verbal está atwo millennia,

the world have

it ..." ?

perfeito

perfeito contínuo

perfeito

perfeito contínuo

Cu

ltu

ralm

ente

sen

síve

l 1. Você se identificados costumes mencionadostexto para a celebraçãoNatal?

2."Christmas is

commercial phenomenon"

que você pensadessa afirmaçãotexto?

3. Na oraçãomillennia, people

world have been

..." , a ideiatransmitir é de:

a) Ênfase na duraçãoaté o presente

b) Acontecimento

podem ser facilmente encontrados em livros de inglês. Ele

trata da tradição natalina e o que se costuma fazer nessa festa, partindo de uma perspectiva

estadunidense, o que se torna óbvio na última frase do texto. Apesar de ser um texto simples e

so (devido ao lugar de onde fala o autor), pode desencadear um bom diálogo com os

Observe o quadro a seguir e veja algumas possibilidades de ampliação de questões de

em meramente conteudista e superficial para

uma abordagem crítica e culturalmente sensível para o ensino/aprendizagem de leitura em

Abordagem conteudista X abordagem culturalmente sensível

perguntas feitas sob a ótica da pedagogia crítica

culturalmente sensível aqui adotada, vejamos algumas possibilidades de reações dos

, o professor deve estar preparado para ouvir diversas

nenhum dos costumes do texto, seja porque

não tem família, mora sozinho ou não tem dinheiro para comprar presentes de Natal. A reação

(já passei por isso!) é de surpresa, a qual realmente

strada de imediato, deixando constrangido o aluno. Em vez disso, podemos

simplesmente lidar com o fato de que nem todos vivem a nossa situação familiar, financeira

identifica com algummencionados no

celebração do

is [...] (a)

phenomenon". Opensa a respeito

afirmação retirada do

oração "For two

people around the

been observing it

que se quer

duração da ação

Acontecimento no passado

etc., reagindo de forma natural e perguntando: se você não tem esses costumes, então o que

você costuma fazer?

O nosso exemplo é muito importante para os alunos em geral; se eles vêm nossa reação

de surpresa, certamente se sentirão à vontade para fazer o mesmo, agindo, muitas vezes, de

forma preconceituosa; mas se percebem naturalidade na nossa forma de lidar com a situação,

ainda que fiquem surpresos, terão, na maioria das vezes, uma atitude respeitosa.

A questão 2 nos permite abordar a característica capitalista da sociedade, a qual está

presente até em momentos nos quais a subjetividade deveria sobrepor o materialismo, como é

a época de Natal. Essa é a minha opinião, mas será que é a mesma dos alunos?

Esse é um aspecto com o qual devemos ter cuidado. Muitas vezes temos ideias já tão

cristalizadas a respeito de determinados assuntos, que fica difícil assumir a postura de

mediador e tentar, de alguma forma, demonstrar neutralidade; o nosso papel, apesar de não ser

completamente neutro (até porque a dita neutralidade já configura uma escolha), é importante

no que tange a promover a reflexão. Que importância esses estudantes dão ao convívio

familiar nessa data? Os presentes são essenciais? São preparados pratos típicos do Natal?

Alguém faz doações a pessoas carentes nessa época?

Todos esses questionamentos podem ser interessantes, mas também é preciso tomar

cuidado com aqueles que não têm família, que não terão ceia de Natal, que não receberão (e

até que nunca receberam) presentes. Não se pode preparar (nem ministrar) uma aula sem

considerar a realidade dos alunos. É uma questão delicada; precisa ser tratada com toda

atenção.

No que diz respeito à questão 3, sugiro que, em vez de abordar a estrutura gramatical

meramente como uma organização de termos da forma “correta”, percebamos a sua

importância para transmitir o significado que desejamos a determinado enunciado. O uso do

tempo verbal, assim como de outras estruturas, tem uma função, uma ideia nele contida. Não

basta que o aluno saiba a nomenclatura; dizer que a oração está no presente perfeito contínuo

não garante o entendimento de que essa estrutura possa designar uma ideia enfática da

duração de um evento que se iniciou no passado, mas que ainda ocorre no presente.

Vejamos agora outro exemplo.

Texto 02:

Mr. Beatie, who is 34 now, was born female but had gender reassignment surgery and is now legally married to a woman. His choice to have a baby was an easy decision. His wife had a hysteractomy a few years ago so Thomas decided to carry the baby for her. He was able to get pregnant as he kept his female organs when he switched genders. This new revelation has

not only come as a shock to the world but also to close friends and his wife’s family who did not know Thomas was once a woman.33

O Texto 02 já traz um assunto mais interessante de ser abordado, pois foge da temática

de festas, feriados nacionais, costumes, comidas típicas e locais turísticos. Trata de questões

polêmicas, que podem ser perfeitamente utilizadas para proporcionar uma maior reflexão aos

alunos.

No caso desse texto, em vez de observarmos a diferença de abordagens, proponho que

voltemos nossa atenção para o que seria um possível roteiro de discussão com os alunos.

Antes de abordar o texto propriamente dito, mostrar a imagem e o título (a seguir)

possibilitaria questionar aos alunos que associação eles conseguiriam fazer a partir dessas

informações; essa seria uma forma de prepará-los para o conteúdo do texto. Certamente,

haveria muito estranhamento, fazendo com que esses estudantes se perguntassem como tal

situação seria possível: “um homem grávido?”

Figura 3 – The first pregnant man www.english-4u.com Em seguida, após aplicar as estratégias de leitura e compreensão textual sugeridas

anteriormente no Capítulo 2, e tendo garantido o entendimento do texto, seria o momento de

levantar questões de cunho social acerca dos desdobramentos do tema do texto. Por exemplo:

- O que você pensa em relação a Thomas ter feito uma cirurgia para troca de sexo?

- Na época, Thomas precisou fazer a cirurgia para poder se casar legalmente. Hoje, em

muitos lugares, o casamento homossexual já foi legalizado. O que você pensa a esse respeito?

- Que aspectos você acha que devem ser observados antes de ter um bebê?

33 Disponível em: <www.english-4u.com>. Acesso em: 06 jan. 2011. Tradução livre: Sr. Beatie, que tem 34 anos agora, nasceu do sexo feminino, mas fez cirurgia de mudança de sexo e agora está legalmente casado com uma mulher. Sua escolha de ter um bebê foi uma decisão fácil. Sua esposa fez uma histerectomia alguns anos atrás, então Thomas decidiu carregar o bebê para ela. Ele pôde engravidar porque manteve seus órgãos femininos quando mudou de sexo. Essa revelação não só foi um choque para o mundo, como para amigos próximos e a família de sua esposa, que não sabiam que Thomas já tinha sido mulher.

The first pregnant man

- A esposa de Thomas fez uma histerectomia. O que você acha dessa forma de

contracepção? Você conhece outras? Qual você julga ser a melhor delas?

- Como você acha que os amigos do casal e a família da esposa de Thomas reagiram ao

saber que ele já tinha sido mulher e estava grávido?

Só com esses questionamentos já haveria assunto para duas aulas inteiras. Poderia ser

feito um debate, ou formar-se um júri, com cada aluno externando suas ideias e justificando

seu ponto de vista. Ao professor caberia o papel de mediador, observando as situações em que

predominasse o preconceito, e tentando fazer com que os alunos refletissem sobre outras

formas de se posicionar diante das situações expostas, a fim de que o respeito predominasse.

Isso é ser um professor culturalmente sensível.

A figura a seguir mostra o objetivo de uma aula nessa perspectiva:

Figura 4 – Perspectiva de uma aula culturalmente sensível.

Partindo, portanto, da compreensão textual, que envolve vocabulário, estruturas

gramaticais e, essencialmente, estratégias de leitura; passando pelas entrelinhas do texto, as

quais revelam os aspectos polêmicos, interessantes, dignos de discussão; e chegando,

finalmente, ao pensamento crítico. É um processo trabalhoso no início, mas que com a prática

passa a ser natural; como qualquer atividade em nossas vidas, pensar também requer prática e

dedicação – nesse caso, de ambos: professor e aluno.

Compreensão textual

Observação de aspectos sociais,

culturais, identitários

Capacidade de refletir

criticamente sobre as ideias do texto;

posicionar-se diante da

realidade; ser um estudante

transformador.

4 FORMAR UM LEITOR CRÍTICO E CULTURALMENTE SENSÍVEL EM LÍNGUA INGLESA: TOO GOOD TO BE TRUE34?

4.1 DIÁLOGO COM AS PROFESSORAS INFORMANTES: SEU “MUNDO DIANTE DE

NOSSOS OLHOS”

Conforme já descrito no capítulo introdutório, as agentes desta pesquisa são

professoras atuantes no ensino médio da escola pública estadual na cidade de Salvador- BA.

Têm em comum sua graduação em Língua Estrangeira – Inglês, pela Universidade Federal da

Bahia, proporcionada pelo Programa de Licenciaturas Especiais (PROLE). Elas vivenciaram e

vivenciam experiências e realidades distintas.

No primeiro momento da entrevista, elas narram sua história até chegarem ao ensino

de inglês na escola pública estadual. A narrativa é um “discurso capaz de evocar, através da

sucessão temporal e encadeada de fatos, um mundo dado como real ou imaginário, situado

num tempo e num espaço determinados. (...) Como uma imagem, a narrativa põe diante de

nossos olhos, nos apresenta, um mundo”(SODRÉ, 1988, p.75). Por esse motivo, inicio este

capítulo com as trajetórias de Isabelle, Ely e Raquel em relação à sua caminhada até chegar ao

ensino de inglês como língua estrangeira na escola pública do Estado da Bahia. Os trechos a

seguir são um recorte das entrevistas, momento em que elas falaram de sua experiência em

sala de aula, formação acadêmica, influências externas e motivações, entre outras coisas.

A primeira informante, Isabelle 35, com vinte e quatro anos de sala de aula, sendo seis

desses de língua inglesa, inicia a descrição de sua trajetória até chegar ao ensino de inglês na

escola pública:

Isabelle. eh...eu já trabalhava na escola pública...eu já trabalhava na escola pública, mas não como professora de português... eu fiz concurso pro estado como pedagoga, dava aula de psicologia, didática, metodologia, estrutura e funcionamento do ensino, enfim, trabalhava no Magistério. Eu me removi pra uma outra escola e comecei a dar aula de português. Isso foi em 1991 e eu comecei a estudar inglês em 2000...e eu comecei a fazer o curso porque eu queria fazer uma atividade outra, queria um desafio, tava com tempo livre, resolvi estudar alguma coisa que eu não tinha estudado antes – inglês. Aí eu comecei a fazer porque eu achava bacana, porque eu achava legal, eu queria ocupar meu tempo. Eu não tinha pretensão de aprender a falar inglês, eu não tinha pretensão de ensinar inglês, eu queria só experimentar ser aluna e aprender alguma coisa que eu não sabia. Isso foi em 2000, mas em 2005

34 Tradução livre. “Bom demais para ser verdade?” 35 Como já mencionado anteriormente, serão utilizados nomes fictícios para identificar as professoras agentes desta pesquisa (os quais por elas foram escolhidos), buscando a preservação de suas identidades.

eh... surgiu uma oportunidade de eu fazer uma graduação em língua estrangeira, que foi o curso que eu fiz no PROLE. Essa graduação ela não ia modificar meu status profissional, não ia aumentar meu salário, não ia aumentar minha gratificação, nada disso. A única coisa que ia acontecer, concluindo meu curso de graduação, é que eu passaria a ter uma prerrogativa de escolher turno, série, ah...eh...turno e série do ensino na escola. Focada nisso, em poder escolher o que eu podia escolher ensinar e não pegar o que o outro não quisesse, eu fui fazer minha graduação.

Alguns fatos chamam a atenção nesta primeira fala e merecem aqui ser abordados. O

primeiro deles é a formação da professora em questão. Vê-se que sua primeira graduação foi

em Pedagogia, o que lhe deixa uma bagagem de teorias do ensino/aprendizagem, fato que é

comprovado por sua afirmação de que deu aulas de Psicologia, Didática, Metodologia e

Estrutura e Funcionamento do Ensino em cursos de Magistério, proporcionando-lhe o

estabelecimento de uma ligação entre teoria e prática.

Outro aspecto a ser observado é sua remoção para uma escola na qual lecionaria

Língua Portuguesa sem formação em Letras Vernáculas, fato comumente praticado em

escolas públicas com o objetivo de preencher carga horária ou resolver problemas de falta de

professor para determinadas disciplinas.

No que diz respeito à Língua Inglesa (daqui em diante LI), Isabelle afirma que

começou a estudar despretensiosamente, por achar interessante aprender algo que não sabia;

além disso, queria ocupar seu tempo livre. Estudou por alguns anos sem saber que, num

futuro próximo, o Governo do Estado da Bahia lhe proporcionaria cursar Licenciatura em

Língua Estrangeira pela Universidade Federal da Bahia, por meio de um Programa de

Licenciaturas Especiais (PROLE daqui em diante). Apesar desse curso ter sido planejado para

professores ditos “leigos”, isto é, aqueles que não tinham tido acesso à formação acadêmica,

Isabelle pôde nele ingressar por não ter formação em Língua Estrangeira, disciplina que agora

desejara ensinar.

Percebe-se que sua intenção ao fazer tal licenciatura nada tinha a ver com assuntos

financeiros, pois, como ela mesma menciona, “não ia aumentar meu salário, não ia aumentar

minha gratificação, nada disso”. Seu objetivo, além do gosto desenvolvido pela LI, era o

poder de escolha em relação ao turno e série de ensino na escola, não ficando apenas com as

sobras de outros professores.

Nossa segunda informante, Ely, descreve assim seu caminho até tornar-se professora

de inglês:

Ely. Bom, começou com, com a minha vontade de aprender inglês, sempre tive vontade de aprender inglês, sempre gostei de inglês desde que era menina. Desde que eu era menina eu gostava de inglês, né isso? Então desde

o primário, assim, desde a 3ª, 4ª série que eu pego, pegava o dicionário de inglês e começava a ler sozinha, né? Quando chegou na 5ª série a gente começa a ter inglês, né isso? Então era a matéria que eu mais gostava da 5ª, 6ª, 7ª, 8ª série. Então, fomos pro ensino médio. No ensino médio eu fiquei mais empolgada porque as professoras trabalhavam com música, né, e aí já vinha naquele tempo o pensamento de ensinar inglês, mas ser professora, assim. Aí veio a formatura, me formei, Magistério. Fui pra ensinar primário, passei 9 anos, 9? 10 anos. Na época, chegou a uma época que não me satisfazia. Então eu tive a oportunidade de entrar nesse, nesse programa e entrar na licenciatura de língua inglesa, gosto muito de língua inglesa, gosto muito de ensinar inglês, mas a escola pública tem vários problemas, né?

Paixão pela LI. É o que se percebe no texto de Ely que, ainda que sem orientação

quando criança, teve a iniciativa de pegar um dicionário de inglês para aprender suas

primeiras palavras. Seu gosto pela língua permaneceu no segundo ciclo do Ensino

Fundamental e aumentou no Ensino Médio devido ao trabalho com músicas. Bastante

provável que se tornaria uma professora de inglês. Após sua formatura no Magistério e

atuação em sala de aula por dez anos, teve a tão esperada oportunidade de ter acesso à

academia para tornar-se licenciada em LI através do mesmo projeto mencionado por Isabelle

– o PROLE. Surge, então, a possibilidade de relacionar a teoria com a prática, gerando

resultados que serão abordados mais adiante.

Raquel, terceira e última informante desta pesquisa, conta-nos também a sua trajetória

até chegar a ser professora de língua inglesa, a ver:

Raquel. Na verdade, eu devo a meus filhos essa função de professora, porque eu levava eles pra escola e eu ficava ajudando a professora, aí ela dizia que eu tinha paciência com criança, por que que eu não seguia a carreira, aí eu dizia: “pode ser, amanhã ou depois”... aí surgiu uma vaga de prestação de serviços, aí comecei a trabalhar como prestadora de serviços. Olhava meus filhos e ao mesmo tempo ganhava dinheiro. E meus filhos cresceram e eu continuei. Alguns eu pude acompanhar porque eu continuei na escola primária. Depois surgiu a oportunidade de fazer adicionais pra ensinar com uma disciplina o de 5ª à 8ª. Aí eu disse: “é, eu vou fazer português, porque eu gosto muito”, aí fiquei ensinando português. Depois que apareceu a oportunidade de fazer... pra ensinar no ensino médio, que foi a disciplina de língua inglesa na UFBA, que eu peguei essa oportunidade, e agora tô ensinando no Ensino Médio.(...) Um programa que era destinado aos professores da rede pública, o PROLE. [ ] justamente qualificar os professores e elevar mais o nível. E o governo não podia continuar com aquela quantidade de professores já que a prefeitura tomou a liderança de ficar com o 1º grau. (...) Eu tinha também uma... um sonho. De estudar inglês... não tinha, assim, pretensão de ensinar inglês, só pra estudar inglês, pra falar inglês, não pra ensinar, mas é que houve essa oportunidade, aí juntei o útil ao agradável. E hoje em dia eu posso dizer que eu tô realizada. (...)

Na verdade, eu me dividi, porque meu marido trabalhava numa firma e eu precisei fazer Engenharia Eletromecânica do curso técnico e agora o próprio CREA já me abriu a oportunidade pra fazer Engenharia, eles pagando a metade, lá na Jorge Amado, Engenharia de nível universitário, aí, quer dizer, me divido em duas, mas eu posso me sentir realizada com inglês. (...) Eu estou aproveitando e colhendo alguns dados pra escrever uma tese sobre a língua inglesa na escola pública como, como inclusão social, que eu já to fazendo a pós pela FTC – é à distância, mas a gente tem um orientador, né – e eu estou pegando da minha sala de aula os argumentos pra minha tese. E enriquece, principalmente uma escola desse tipo, enriquece meu trabalho, porque é um desafio tremendo trabalhar com esses meninos, porque esse pessoal, tem aluno de 18 anos no 2º grau, mas que é um menino ainda, que fica brincando, tem as carências ainda de menino de 5ª série.

De mãe que acompanha seus filhos ativamente na escola, passando por um trabalho de

serviços gerais, depois uma qualificação para ensinar Língua Portuguesa, em seguida se

licenciando em LI, e agora se especializando em LI com um foco nos problemas da escola

pública estadual em que trabalha. Isso sem mencionar uma formação paralela em técnica de

Engenharia Eletromecânica. Nossa colega deixa clara a alma que se desejaria ter em todo

profissional de educação neste país: aquele que aproveita as oportunidades e se qualifica cada

vez mais para atender às necessidades de seus alunos, principalmente aqueles mais carentes

que estão nas escolas públicas, em especial as municipais e estaduais.

Não podemos nos esquecer do sonho, grande motivador intrínseco nessa história, o

qual acabou por levar nossa informante a realizar seu trabalho com prazer e se preocupando

realmente com sua influência na formação de alunos, não apenas em LI, mas como formadora

de cidadãos para o mundo.

Trajetórias determinantes para a construção da identidade profissional. Grandes

narrativas, caminhos diferentes, um mesmo fim.

4.2 O PROLE

O Programa de Licenciaturas Especiais – PROLE – é um programa que visa a atender

à exigência do artigo 62 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), o qual

determina a obrigatoriedade da licenciatura na disciplina que o professor desejar lecionar,

conforme já foi descrito no capítulo introdutório.

Em cumprimento à lei, os órgãos responsáveis ofereceram aos professores ditos

“leigos” a oportunidade de cursarem a graduação na Universidade Federal da Bahia. A turma

de Língua Estrangeira à qual pertenceram as professoras agentes desta pesquisa graduou-se no

primeiro semestre do ano de 2008, estando elas habilitadas para ensinar Língua Inglesa

também no Ensino Médio.

A seleção para o programa foi feita por meio de uma prova objetiva, a qual não exigia

(assim como não exige a prova de vestibular regular de Língua Estrangeira da UFBA)

demonstração de fluência (ao menos oral e auditiva) em Língua Inglesa para o ingresso no

curso. Os candidatos concorriam a pouco mais de quarenta vagas.

Constavam do histórico da graduação disciplinas como Inglês I, II, III e IV,

Português, História da Língua Inglesa, Grupo Nominal/Verbal da Língua Inglesa, Literaturas,

Metodologia, Fonética e Fonologia, entre outras, as quais eram oferecidas no turno

vespertino. A duração do curso foi de três anos (seis semestres) e, como era uma turma única,

não havia a possibilidade de não cursar as disciplinas programadas para os períodos letivos,

deixando-as para os próximos períodos. Caso fossem reprovados nas disciplinas, os alunos

recuperavam os conteúdos durante os recessos.

Um ponto forte do Programa eram os Seminários Interdisciplinares, componente

obrigatório do curso de graduação. A cada término do primeiro período do ano, havia duas

semanas em que os alunos se dedicavam por quarenta horas a atividades relacionadas à

educação em geral, tendo a oportunidade de visualizar formas de interação, por exemplo, de

diversas formas de arte com o ensino de Língua Inglesa. Eles tiveram também a oportunidade

de praticar seu Inglês ao longo desses Seminários.

Quando questionadas em relação à importância do Programa de Licenciaturas

Especiais para sua vida profissional, as professoras participantes desta pesquisa focaram

diferentes aspectos, os quais serão discutidos a seguir.

4.2.1 O saber sistematizado x o saber assistemático

Ao relatarem sua trajetória na educação (ensinando inglês ou quaisquer outras

disciplinas, visto que a prática pedagógica não consiste apenas em lecionar conteúdos

específicos) antes de serem graduadas em língua estrangeira pelo PROLE, as professoras

participantes dessa pesquisa demonstraram já ter alguns anos de experiência. Isabelle disse ter

vinte e quatro anos de sala de aula, sendo seis desses ensinando língua inglesa; Ely afirmou

ter aproximadamente dez anos de experiência, ainda que só tenha começado a ensinar inglês

após concluir a graduação, da mesma forma que Raquel. Elas demonstram ter consciência da

importância de sua experiência para seu desenvolvimento como profissionais de sucesso, sem

deixar de lado a bagagem que adquiriram com seu curso de graduação em língua estrangeira.

Lendo um artigo da revista Veja, deparei-me com o texto de Cláudio de Moura Castro,

que dizia que “o diploma não passa de um atestado de que o seu portador cursou o programa

indicado e teria satisfeito requisitos formais. Não é nem bom nem mau. Depende do uso dado

a ele” (CASTRO, 200636). Essa afirmação me fez refletir, primeiramente, sobre o meu acesso

ao saber institucionalizado, sistematizado, aqui representado pelo “diploma” e, em seguida,

acerca do que a formação acadêmica teria significado para as professoras participantes desta

pesquisa, contrastando-a com seu saber assistemático, empírico.

No que diz respeito a mim, o que ocorreu foi, de certa forma, curioso e, ao mesmo

tempo, corriqueiro, visto que muitos professores de inglês vivem/viveram situação

semelhante. Quanto entrei na graduação, já lecionava inglês em um curso livre, no qual

adquiri fluência na língua e fiz um curso de metodologia para poder ministrar aulas naquela

instituição. A experiência, ainda que insipiente, já me acompanhava nesses primeiros passos

na academia. Cursei disciplinas teóricas, algumas práticas – a maioria destas não cursei

devido a testes de proficiência, mas fui exposta a discussões na língua alvo em níveis mais

proficientes, o que foi de muita valia – e acabei chegando a um momento no curso em que não

via muita utilidade no que estava estudando; parecia “chover no molhado”, como se diz.

Foi então que surgiu a oportunidade de dar aulas em um dos cursos de extensão da

UFBA, o (agora) CEIFE – Centro de estudos de inglês para fins específicos – o qual era

coordenado pela professora Conceição Tôrres, que, além de cuidar da parte administrativa,

oferecia a nós, professores, toda a qualificação profissional de que necessitávamos para

estarmos diante de alunos que almejavam alcançar a fluência em língua inglesa. Foi o

momento em que percebi a necessidade de atrelar teoria à prática, sendo necessário utilizar o

saber institucionalizado como degrau para o aperfeiçoamento da prática. Em outras palavras,

em minha opinião, tanto o saber empírico quanto aquele institucionalizado devem ter igual

importância na formação do professor de línguas.

Para tornar mais visual a diferença e, ao mesmo tempo, compatibilidade entre esses dois

saberes, trago aqui uma comparação com o teatro. O saber institucionalizado seria aqui

36 Disponível em <http://veja.abril.com.br/210606/ponto_de_vista.html>. Acesso em: 10 jan. 2011.

representado por produtores, diretores, autores de teatro, os quais são responsáveis pela

estrutura e encadeamento da apresentação teatral. Sem eles, não seria possível assistir a uma

peça e compreender a interação entre os fatos nela apresentados, atingindo o objetivo

esperado: entretenimento, diversão, emoção.

Os atores e o público representariam o saber empírico. Ainda que munidos de uma

sequência lógica a ser seguida, é a interação com o público que dita de que forma uma piada

terá mais sucesso ou quais “caras e bocas” mais conquistarão o público. Os atores mais

experientes terão, certamente, mais sucesso nessa interação e no improviso, visto que já

vivenciaram várias situações com públicos diferentes.

Fazendo a ponte com a educação, o saber empírico nos mune de atitudes diante de

acontecimentos reais, isto é, com a experiência aprendemos a lidar com situações diversas na

sala de aula, compreendendo os fatores que desencadeiam as reações dos alunos ao

aprendizado de Língua Inglesa. É esse saber que nos permite mudar o plano de aula no

momento de seu desenvolvimento; é ele que nos capacita a, com base na interação dos alunos

com a forma como os conteúdos são abordados, modificar estratégias, antecipar conteúdos e

ampliar discussões – tudo isso em contínua fusão com o saber institucionalizado que

adquirimos em nossa formação acadêmica.

Mas vejamos o posicionamento de nossas colegas:

Isabelle. Quando você faz um curso de extensão, seu foco é na comunicação, você quer falar, aprender a falar. Quando você faz um curso de graduação, o olhar que se dá à língua é um olhar mais científico. Isso foi a contribuição do programa da graduação pra minha formação. Enxergar a língua de uma forma mais abrangente, não apenas como falante, mas como professora de língua. Isso foi que efetivamente modificou. Ely. (...) acertar alguns erros, algum tipo de postura de antes, que depois do PROLE eu comecei a me policiar e ver alguns erros, alguns erros que eu cometia na minha didática mesmo, meu modo de dar aula. Raquel. Muito importante. Eu devo também a ele estar hoje qualificada pra ensinar no 2º grau, no Ensino Médio.

Segundo Isabelle, nessa fala, a evolução de apenas falante de língua inglesa para

professora retrata o acréscimo de conhecimento que a universidade lhe proporcionou. No

entanto, quando descreve seu caminho até se tornar professora de inglês, ela deixa

transparecer que o ensino formalizado está diretamente relacionado à possibilidade de escolha

de turmas e horários; não parece valorizar a qualificação acadêmica para o ensino de LI, até

porque sua experiência em educação é vasta, já tendo ministrado aulas de Psicologia,

Didática, Metodologia e Estrutura e funcionamento do ensino, as quais são essenciais na

construção de um educador; e não esqueçamos sua formação em Pedagogia e experiência no

ensino de Língua Portuguesa antes de ministrar aulas de inglês.

Em outro momento da entrevista, quando questionei a importância da experiência, ela

chega a afirmar a superioridade do saber empírico, ainda que reconheça a necessidade do

estabelecimento de uma interseção entre teoria e prática:

Isabelle. Eu diria que muito mais até, essa experiência docente, muito mais importante, até, do que o próprio conhecimento específico das coisas que a gente aprende na graduação. Claro, o ensino da graduação, o ensino do curso de extensão, ele te dá o conhecimento técnico, mas a bagagem pedagógica, a experiência prática é fundamental. É a práxis, na verdade, né, você consolidar teoria e prática.

Quando lhe questiono se estava “pronta” pra ministrar aulas de inglês antes de fazer a

graduação, Isabelle, de uma maneira mais reflexiva, vai observando que tinha o domínio do

conteúdo – e aqui parece considerá-lo estritamente como o aspecto estrutural – que diz ter

aprendido no curso de extensão, mas admite que não tinha a visão mais abrangente a respeito

“do significado, da importância, da grandeza daquele conteúdo”. E afirma esse ter sido um

acréscimo do curso de graduação, o qual, portanto, influenciou a sua prática: “minha aula, é

claro, se enriqueceu muito mais depois, com os auxílios que a gente foi tendo dos professores,

né, ao longo da graduação”.

Dando sequência a essa reflexão, Isabelle afirma que utiliza o conteúdo das disciplinas

mais práticas que cursou em sua prática docente atual, bem como as demais para garantir “um

respaldo maior como conhecedor da língua”, destacando ainda que

Isabelle. De tudo você pode tirar um pouco e tudo isso você pode trazer pra sua prática porque você, não é porque você tá dando aula só de verbo to be, de simple present, enfim, que você esquece todas as outras coisas. Você tá lendo um texto, por mais simples que seja, você pode trazer referências de tudo aquilo que você estudou quando tava na graduação, e eu gosto muito disso porque eu acho que isso enriquece a sua aula, e o aluno agradece, né?

O que se percebe, com essa oscilação entre a defesa do conhecimento prático e/ou do

saber institucionalizado, é que não se deve pensar aqui em superioridade, mas sim em adição,

complementação, interseção entre os saberes, como já defendi anteriormente na metáfora da

apresentação teatral.

No que diz respeito a Ely, o ensino reflexivo pareceu aflorar, permitindo que ela

aprendesse com seus próprios erros. Em outros trechos da entrevista ela valoriza bastante a

oportunidade de aprender com suas colegas de turma, por serem mais experientes do que ela e

possibilitarem a troca dessas experiências.

É relevante observar, no entanto, a fala de Ely, sobrepondo a importância da

graduação à sua experiência:

Ely. Bom, não tem como negar que a faculdade foi mais importante, foi muito importante porque eu gostava, eu apenas gostava de língua inglesa e conhecia algumas coisas, mas eu não sabia realmente língua inglesa. Gramática... a gramática mesmo assim, por assim falar, era... eu conseguia estudar sozinha, pegar livros, mas aquela coisa de falar mesmo um pouco de língua inglesa eu fui aprender na faculdade.

O que se pode perceber aqui é o resultado do senso comum, de que aqueles que

tiveram acesso à academia são superiores aos demais. Esse é um discurso que aparece

implícita e explicitamente nos mais diversos meios. Atestado de superioridade mesmo é o Art.

295 do Código Processo Penal - Decreto Lei 3689/4137, que garante ao diplomado em

qualquer instituição de ensino superior do país que, ao ser preso, tenha direito à prisão

especial, sendo diferenciado, portanto, não importando a gravidade do crime que tenha

cometido, dos presos que não têm nível superior. E esse é só um exemplo do quão

equivocadas estão as ações/afirmações a respeito da posse de um diploma.

Ely, como todos nós em um momento ou outro, repete o discurso da superioridade da

educação formal, não exaltando a importância do seu saber empírico, construído ao longo dos

seus mais de dez anos de experiência em sala de aula. Não quero com isso negar a

importância da formação acadêmica; mas é preciso ser capaz de valorizá-la sem diminuir o

saber assistemático. Assim dito, podemos perceber que aquele saber proveniente da prática

não é reconhecido como saber organizado. Há ainda um preconceito com relação a ele, até

porque o diploma, em nosso país, é sinônimo de poder, de importância, visto que muitos não

têm acesso a ele.

Para Raquel, o olhar científico adquirido com a graduação representou sua

qualificação para lecionar em níveis mais elevados. Ela atribui igual valor aos saberes em

questão, dizendo que sua formação e experiência “têm o mesmo nível de importância porque

sem um o outro não poderia também ser satisfeito. Os dois são importantes de maneiras

iguais”.

Destacando a importância da experiência, Nunes diz que

esses saberes são transformados e passam a integrar a identidade do professor, constituindo-se em um elemento fundamental nas práticas e decisões pedagógicas, sendo, assim, caracterizados como um saber original. Essa pluralidade de saberes que envolve os saberes da experiência é tida

37 Decreto de 03 de outubro de 1941. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/anotada/2341542/art-295-do-codigo-processo-penal-decreto-lei-3689-41>. Acesso em: 10 jan. 2011.

como central na competência profissional e é oriunda do cotidiano e do meio vivenciado pelo professor. (NUNES, 2001, p.31)

De forma a comprovar a afirmação de Nunes

importância da experiência com seu

desenvolvimento das suas aulas:

Raquel.meus filhos, porque as dificuldades que eles tiveram eu nivelo também com dificuldade a dos alunos daeles se sentiram bem equilibrados para poder dar um passo na vida... essa mesma experiência eu tô levando pra sala de aula. (...) A dificuldade que eles tiveram em relação à fala e à escrita da língua inglesa.Tava uma dificuldade... que “eu tenho que falar de um jeito, escrever de outro tá me deixando maluco” aí eu pedia tanta paciência pra eles... daí eu fui tirando também métodos pra aplicar na sala de aula pra que eles não ficassem [ ].

Raquel reforça, portanto, a crença de que diploma não é sinônimo de qualificação,

como também não o é a experiência; a junção dos dois, de forma reflexiva, no entanto, pode

vir a tornar-se ensino de qualidade.

teatro: o ator depende do texto que lhe é passado durante os ensaios, mas este só terá vida

quando se der a interação com o público. Em outras palavras, na educação:

Figura 5 – Ensino de qualidade.

É digna de atenção,

diversas faculdades/universidades, os quais, em grande proporção, não têm o domínio do

idioma que desejam ensinar, habilidade que deveria ser posse óbvia de um professor de língua

estrangeira. No entanto,

o limite dessaestrangeiras, que, em geral, simbolizam a mais completa falta de bom senso no que diz respeito à formação do docente. A falta de bom senso se materializa na permissão de ingresso de estudantes que nã

Experiência

como central na competência profissional e é oriunda do cotidiano e do meio vivenciado pelo professor. (NUNES, 2001, p.31)

De forma a comprovar a afirmação de Nunes (2001, p.31)

importância da experiência com seus filhos, enquanto estudantes de inglês, para o

desenvolvimento das suas aulas:

Raquel. Eu tiro as minhas metas de... para ensinar inglês, observo mais os meus filhos, porque as dificuldades que eles tiveram eu nivelo também com dificuldade a dos alunos da escola pública. Como eu ajudei meus filhos e eles se sentiram bem equilibrados para poder dar um passo na vida... essa mesma experiência eu tô levando pra sala de aula.

A dificuldade que eles tiveram em relação à fala e à escrita da língua inglesa.Tava uma dificuldade... que “eu tenho que falar de um jeito, escrever de outro tá me deixando maluco” aí eu pedia tanta paciência pra eles... daí eu fui tirando também métodos pra aplicar na sala de aula pra que eles não ficassem [ ].

ortanto, a crença de que diploma não é sinônimo de qualificação,

como também não o é a experiência; a junção dos dois, de forma reflexiva, no entanto, pode

se ensino de qualidade. Partilho com ela essa opinião, retomando a metáfora do

o ator depende do texto que lhe é passado durante os ensaios, mas este só terá vida

quando se der a interação com o público. Em outras palavras, na educação:

Ensino de qualidade.

É digna de atenção, portanto, a situação dos graduados em Língu

diversas faculdades/universidades, os quais, em grande proporção, não têm o domínio do

idioma que desejam ensinar, habilidade que deveria ser posse óbvia de um professor de língua

o limite dessa obviedade é revelado pelos cursos de Letras com línguas estrangeiras, que, em geral, simbolizam a mais completa falta de bom senso no que diz respeito à formação do docente. A falta de bom senso se materializa na permissão de ingresso de estudantes que nã

Formação acadêmica

como central na competência profissional e é oriunda do cotidiano e do meio

(2001, p.31), Raquel ressalta a

s filhos, enquanto estudantes de inglês, para o

u tiro as minhas metas de... para ensinar inglês, observo mais os meus filhos, porque as dificuldades que eles tiveram eu nivelo também com

escola pública. Como eu ajudei meus filhos e eles se sentiram bem equilibrados para poder dar um passo na vida... essa

A dificuldade que eles tiveram em relação à fala e à escrita da língua inglesa. Tava uma dificuldade... que “eu tenho que falar de um jeito, escrever de outro tá me deixando maluco” aí eu pedia tanta paciência pra eles... daí eu fui tirando também métodos pra aplicar na sala de aula pra que eles não

ortanto, a crença de que diploma não é sinônimo de qualificação,

como também não o é a experiência; a junção dos dois, de forma reflexiva, no entanto, pode

Partilho com ela essa opinião, retomando a metáfora do

o ator depende do texto que lhe é passado durante os ensaios, mas este só terá vida

quando se der a interação com o público. Em outras palavras, na educação:

tanto, a situação dos graduados em Língua Estrangeira pelas

diversas faculdades/universidades, os quais, em grande proporção, não têm o domínio do

idioma que desejam ensinar, habilidade que deveria ser posse óbvia de um professor de língua

obviedade é revelado pelos cursos de Letras com línguas estrangeiras, que, em geral, simbolizam a mais completa falta de bom senso no que diz respeito à formação do docente. A falta de bom senso se materializa na permissão de ingresso de estudantes que não dominam a

Ensino de qualidade

língua que serão oficialmente autorizados a lecionar (OLIVEIRA, L. A., 2010, p.40).

Infelizmente, “a realidade frequentemente não é óbvia, não é esperada e não é ideal”

(OLIVEIRA, L. A., 2010, p.40), o que acaba trazendo consequências negativas para a

formação dos alunos e, até mesmo, contribui para a desvalorização do profissional de língua

estrangeira em geral.

Dessa forma, deixo claro que a experiência tem grande valor na docência; entretanto, o

saber sistematizado, neste caso universitário e acerca do idioma que se deseja lecionar, é de

extrema importância para a formação de um profissional completo, ciente de seu papel de

“intelectual transformador”.

4.2.2 As disciplinas cursadas e a práxis

Perguntei a Isabelle, Ely e Raquel quais tinham sido as disciplinas que tiveram maior

importância para elas, no sentido daquelas que mais são utilizadas por elas em sua prática

diária. Elas me responderam assim:

Isabelle. Mais...todas as disciplinas que tivessem aspecto prático. Inglês 1, 2, 3 e 4... muito pouco a parte de fonética... a parte de metodologia foi interessante porque a gente aprende as abordagens de como ensinar a língua estrangeira, o que é língua estrangeira, o que é segunda língua, são conceitos que a gente não aprende quando você faz um curso de aprender a falar e que a graduação vai te trazer. Basicamente essas disciplinas, aquelas disciplinas que te dão um aspecto mais prático. As outras disciplinas, literatura, história, elas são disciplinas que entram pra te dar um respaldo maior como conhecedor da língua, né? E morfologia entra pra te dar assim, poxa, isso aqui é a estruturação da língua, né, é uma coisa que é bonita, eu gosto muito disso. Linguística foi uma disciplina muito interessante pra mim, reestudar um pouquinho de coisas de português também foi bacana, na verdade o curso todo é legalzinho, né, os seminários eram bacanas, tudo é útil, de tudo você pode tirar um pouco e tudo isso você pode trazer pra sua prática porque você, não é porque você tá dando aula só de verbo to be, de simple present, enfim, que você esquece todas as outras coisas. Você tá lendo um texto, por mais simples que seja, você pode trazer referências de tudo aquilo que você estudou quando tava na graduação, e eu gosto muito disso porque eu acho que isso enriquece a sua aula, e o aluno agradece, né? Ely. As atividades, as atividades na verdade me ajudam, na verdade até hoje, algumas atividades, as suas, por exemplo, eu uso bastante, com o 3º ano, principalmente 2º e 3º ano. Eles já conseguem acompanhar porque eles vinham comigo, eles vêm comigo desde a 8ª série, aí fica mais fácil porque eu sei o que eu já dei, então eu uso aquelas atividades de língua inglesa, até as de história de língua inglesa eu consigo usar com eles alguns textos e eles

conseguem acompanhar. Falando a verdade aqui, falando a verdade, algumas matérias não me serviram pra nada, por exemplo, Latim, Latim na minha prática não me serve pra nada, serviu pra mim, pra mim, mas pra minha prática não serviu não. As atividades de língua inglesa 1, 2, 3, 4 me servem até hoje, eu guardei tudo direitinho e uso mesmo, dou uma ajeitada aqui, outra ali, e... muito bom. Língua Portuguesa também, (...) didática não acrescentou muito, realmente teve matérias ali que não acrescentaram muito não, mas outras foram muito importantes. Mas as matérias que vou destacar mesmo: história da língua inglesa, língua inglesa 1, 2, 3, 4, língua portuguesa... todas essas matérias aí ajudam até hoje. Raquel. A história da língua inglesa, que muito me ajudou pra que eu tenha uma visão mais ampla pra poder ter uma base como que eu ia elaborar meus planos; pra eu passar pra eles algum conteúdo eu tinha que saber um pouquinho da história e... me ajudou. Eh... literatura também, porque a gente trabalha músicas e trechos da literatura inglesa, muito me ajudou também essa disciplina, Literatura da Língua Inglesa, eh... Didática, Metodologia, também, da Língua Inglesa, as que mais se destacaram em minha vida.

Destaco aqui dois aspectos que chamam a minha atenção. O primeiro deles é a

concordância de Isabelle e Ely com relação à importância das disciplinas práticas na sua

realidade após a graduação. Ao dizer que utiliza atividades que foram aplicadas com ela

durante o curso, Ely estabelece uma relação real entre teoria e prática, revelando que, em

algum momento, houve uma preocupação com a reflexão da teoria na prática em seu curso de

graduação.

Surpreende-me o fato das professoras considerarem disciplinas como literatura e

história da língua inglesa como importantes para sua formação, ainda que não as utilizem

diretamente com seus alunos; digo isso porque o que se vê, por exemplo, nas realidades de

professores que não têm grande fluência na língua estrangeira, é uma supervalorização de

disciplinas que permitam a busca do “professor ideal”, descrito por muitos como aquele que

conhece muito da estrutura e vocabulário da língua, comunica-se perfeitamente neste idioma,

mas não tem, necessariamente, bagagem histórica, didática e metodológica para desenvolver

os conteúdos com seus alunos. É o que acontece com vários professores de cursos de inglês,

dos quais não é exigida a graduação na língua, mas sim a fluência.

Um segundo aspecto a ser mencionado é o fato de Ely afirmar que Latim não serviu de

nada para sua prática. No entanto, afirma ter sido útil para seu crescimento pessoal, o que

influencia, de alguma forma, a sua prática, ainda que indiretamente. Penso que a declaração

de Ely a respeito da irrelevância da disciplina pode estar diretamente relacionada à forma

como ela tenha sido ministrada; não se pode garantir que se tenha abordado o conteúdo de

maneira atrativa e/ou que evidenciasse a aplicação da teoria na prática. Isso acontece muito,

não só com Latim, mas com diversas disciplinas, sobretudo as que não mantêm um elo com a

prática pedagógica.

Eu tive a oportunidade de observar queixas dos alunos dessa turma de Licenciatura

Especial em Língua Inglesa referentes à abordagem de diversos assuntos, nas mais diversas

disciplinas; o grande problema relatado era a falta de conexão do que se estudava com a

preparação de suas aulas e o momento de ministrá-las. Ora, se as disciplinas fazem parte do

currículo do curso, decerto que têm relevância para a formação do educador, do professor de

língua inglesa; no entanto, isso precisa ser ressaltado e evidenciado para os alunos. Talvez

seja esse o motivo pelo qual as disciplinas “mais práticas” tenham a preferência das nossas

professoras aqui em foco e de tantos outros alunos do curso de Letras – Língua Estrangeira:

retratam a práxis.

Do ponto de vista da linguística aplicada, não é possível admitir que exista uma

dissociação entre o pesquisador e o professor; aquele não pode ser visto como o responsável

único pelo desenvolvimento do conhecimento, enquanto que este seja apenas o “aplicador” de

teorias, sem refletir sobre elas. O conhecimento não deve ser o fim, mas sim o meio para

promover o crescimento do aluno (no caso aluno-professor), o qual deve ser incentivado a

experimentar o conhecimento, refletir sobre suas aplicações diante das mais diferentes

realidades e, com isso, ser capaz de teorizar a partir dos dados provenientes de sua prática.

4.3 O QUE É POSSÍVEL FAZER NO DIZER DAS PROFESSORAS? E O QUE DE FATO

ELAS FAZEM?

4.3.1 Interdisciplinaridade e postura crítica

Essas professoras, com trajetórias totalmente diferentes – porém convergentes –,

receberam um questionário (vide anexos) contendo algumas orientações para o

ensino/aprendizagem de língua inglesa no ensino médio (retiradas do PCN+), e foram

solicitadas a julgar sua aplicabilidade em suas realidades, suas salas de aula. Vejamos as

orientações e as reações das professoras a elas:

A visão estereotipada de povos e de suas culturas deve ser objeto de estudo das línguas estrangeiras, em associação com outras disciplinas curriculares. Esse tipo de reflexão possibilita ao aluno do ensino médio a aquisição de postura crítica quanto ao universo sociocultural que o cerca

imediata e remotamente. Contribuem para a construção desse conceito a identificação de ícones culturais bem como a compreensão de que o fazer lingüístico está muitas vezes associado a preconceitos, clichês culturais e dogmas ideológicos, e que a língua não se desvincula do momento histórico. (PCN+, p.102) (grifos meus)

Aqui há dois aspectos (por mim grifados na citação) a serem analisados. O primeiro

deles, a possibilidade de se realizar um trabalho interdisciplinar ; o segundo diz respeito

ao trabalho com pedagogias críticas e culturalmente sensíveis para desenvolver os conteúdos

de língua inglesa. Enquanto Isabelle e Ely dizem ser parcialmente aplicável a ideia de estudar

questões culturais por meio do ensino/aprendizagem de línguas estrangeiras de forma

interdisciplinar, concordando, pois, em parte, com a orientação acima, Raquel afirma que em

sua realidade tal situação não se aplica. Buscando entender suas respostas, recorro aos trechos

da entrevista que as esclarecem.

Falemos primeiro da questão da interdisciplinaridade.

Isabelle mostrou-se muito descrente; perguntei-lhe o que achava em relação à

afirmação de que a língua estrangeira serve como uma ferramenta para todas as outras

disciplinas, facilitando a articulação entre todas as áreas (PCN+). Ela respondeu:

Isabelle. Se você consegue usar a aquisição de uma língua estrangeira pra garantir um melhor trânsito por outras disciplinas, significa dizer que você consegue desenvolver o espírito científico. Isso é bonito. Não é muito operacional, mas é bonito.

Por que não é operacional? Por causa da falta de comunicação entre os docentes? Ou

seria pela falta de materiais que promovam a interação entre as áreas do conhecimento? É

culpa da base precária dos alunos, a qual torna difícil um passeio por essas diversas áreas? É o

desinteresse por assuntos abordados em outras matérias? Qual(is) seria(m) esse(s) elemento(s)

dificultador(es) da realização de um trabalho interdisciplinar? Talvez a combinação deles.

Ely, respondendo à mesma pergunta, disse que o trabalho interdisciplinar não funciona

por causa do corpo docente:

Ely. Os professores do Estado hoje, infelizmente, são muito individualistas, cada um quer trabalhar na sua, ninguém mais quer se envolver, ninguém mais faz isso aí. Ninguém. Individualismo.

Já Raquel, apesar de ter afirmado que a interdisciplinaridade não é aplicável em sua

sala de aula, acabou se pronunciando, no momento da entrevista, de forma contrária:

Raquel. (a língua inglesa) ajuda a articular as outras disciplinas porque quando a gente trabalha os textos e até as músicas, a depender do assunto, até entra biologia, (...) astronomia ou astrologia. (...) Quando fala da poluição dos rios, (...) a seca, o gado morrendo, a plantação está morrendo, aí já entra geografia. Eu acho que existe uma articulação, sim.

Se juntarmos as respostas das três professoras, podemos perceber que o trabalho

interdisciplinar de fato não se configura com os alunos na escola pública estadual. É claro que

estamos tratando apenas de alunos de três escolas diferentes, mas a situação em que as escolas

estaduais (em sua maioria) se encontram é semelhante, especialmente no que diz respeito a

instalações, materiais didáticos, qualificação de professores, motivação dos estudantes, entre

outras coisas, o que nos permite concluir que o objetivo de trabalhar de forma interdisciplinar

está longe de ser alcançado. No entanto, considerar “bonito” este tipo de trabalho já nos faz

perceber o desejo da professora de agir de tal maneira, ainda que ela não ache viável. Essa

inviabilidade pode estar exatamente no fato de que há muito individualismo por parte dos

professores, o que dificulta seu trabalho em equipe.

Ver a língua inglesa como ponte entre a linguagem e assuntos que interessam a todos –

como demonstra Raquel - configura-se exatamente no primeiro passo para a realização de um

trabalho inter e – por que não dizer – transdisciplinar, visto que visa a ultrapassar os limites da

disciplina e expandi-la de forma que haja um continuum, isto é, que não haja demarcação de

territórios a serem ocupados por cada disciplina, que seus conteúdos não sejam estanques e

que permitam a inter-relação entre as áreas do conhecimento, a qual possibilitará a visão da

realidade como um todo, e não fragmentos dela.

A leitura em língua inglesa é um caminho muito produtivo para o trabalho

interdisciplinar. Ela facilita a abordagem de diversos aspectos da vida como um todo: pode

proporcionar discussões sociais, políticas, enfim, polêmicas; pode permitir o estudo de

conteúdos de outras áreas do conhecimento, complementando, desse modo, o trabalho

desenvolvido por professores de outras disciplinas; pode – e deve – capacitar o aluno a se

posicionar como ser crítico, transformador da realidade que o cerca. E já que estamos aqui

privilegiando a leitura e a compreensão textual, precisamos, de fato, entender que

no mundo atual, mais do que nunca, é essencial deter a competência de ler nos vários níveis possíveis de leitura. É papel da escola, e não apenas das disciplinas da área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, desenvolver essa competência. Ler e compreender uma língua estrangeira deve ser um meio de acesso à cultura, à tecnologia e de abertura para o mundo (PCN+, p.107).

Quanto ao segundo aspecto, o desenvolvimento da postura crítica quanto ao

universo sociocultural, é pertinente observar as declarações das professoras. A elas perguntei

se conseguem propiciar ao aluno a análise de sua própria língua/cultura através do estudo de

outras culturas. Eis suas respostas:

Isabelle. Acredite, essa é a parte que é menos difícil porque, quando você fala em ouvir opiniões é muito mais fácil do que você produzir textos ou você garantir a aquisição de um conteúdo sob um outro olhar, porque comentar é alguma coisa que é muito mais fácil (...) às vezes o comentário não é pertinente, às vezes seu comentário é vazio, às vezes seu comentário é rasteiro, mas é um comentário. Talvez não seja uma análise aprofundada, mas é um comentário, é o primeiro passo.

Percebo aqui que a análise da língua/cultura por meio do estudo de outras culturas pode

ter sido compreendida de modo equivocado. Dizer que “a parte menos difícil” é trabalhar de

forma crítica e culturalmente sensível realmente pode ser uma afirmação precipitada, sem a

devida reflexão. Será que as aulas são preparadas com base no conteúdo “humano” que se

deseja desenvolver? Será que os alunos já estão acostumados a priorizarem a reflexão acerca

do conteúdo do texto em vez de buscarem (exclusivamente) a questão gramatical nele

presente? Será que o texto não é utilizado como pretexto para a aquisição de vocabulário e

estruturas gramaticais? Será que existe a possibilidade de desenvolver uma free-killing

classroom38 com tanta facilidade?

Infelizmente, acredito que não. É uma tarefa, em minha opinião, bastante complicada,

visto que não somos – ou não fomos, já que a realidade (felizmente) parece estar mudando em

algumas universidades – preparados para desenvolver currículos com base na formação de

alunos críticos, mas sim de estudantes capazes de completarem as lacunas com o verbo

correto. Dessa forma, o primeiro passo, que seria a nossa conscientização para podermos “dar

o exemplo” a nossos alunos, se foi dado, não foi um passo firme. Os buracos e declives do

caminho tendem a dificultar a passada segura, desprendida de crenças já intrínsecas a respeito

do ensino de língua inglesa no ensino médio. E esses defeitos na estrada acabam atrasando a

chegada ao destino ou, muitas vezes, nos fazendo desistir dele.

Compreendo a afirmação de Isabelle; ela respondeu de forma a comparar a produção de

textos com a compreensão textual. Ora, se o aluno consegue compreender a ideia central do

texto, atividade facilitada pelo emprego de estratégias de leitura, ele será capaz de emitir uma

opinião, ainda que seja “um comentário rasteiro”. Essa constatação parece valorizar as

habilidades dos alunos, principalmente se considerarmos o seu despreparo para estarem

cursando o ensino médio, visto que muitos não têm a base do ensino fundamental. Sua

dificuldade seria maior, de fato, ao trabalhar produção de textos com alunos que não

38 Uma free-killing classroom seria uma sala de aula sem violência cultural e social, sem preconceitos, que possibilite o respeito à diferença e a afirmação da identidade por meio da convivência com outras realidades. Para maiores informações acerca dos pressupostos teóricos de Nonkilling, defendidos por teóricos como Francisco Gomes de Matos, vide <http://www.nonkilling.org/>. Acesso em: 25 jan. 2011.

conhecem nem o básico relativo a vocabulário e estrutura da língua; no entanto, não é isso o

que torna fácil o trabalho de forma culturalmente sensível.

Vejamos a fala de Ely:

Ely. Esses meninos vêm muito despreparados do fundamental, (...) eles não têm essa leitura, eles não têm esse entendimento não. Chega no 3º ano, no 2º, no 3º ano, parece que os meninos não viram nada, não sei. Minha turma é até uma turma boa, eu considero duas turmas boas, os dois 3º anos, mas mesmo assim às vezes eles tão muito desconectados. (.) É, desconectados com o mundo, com a globalização.

É relevante observar que, na fala de Ely, há uma explicação relativa ao fato do

despreparo dos alunos quando lhes é exigido um posicionamento crítico: a falta de “conteúdo”

do ensino fundamental. No entanto, questionei se ela conseguia proporcionar um momento de

análise da cultura do aluno por meio do acesso a outras culturas, o que pareceu ser respondido

de forma negativa, tendo como justificativa a imaturidade, a falta de conhecimento de mundo.

O que percebo é que pode ter havido um equívoco na compreensão do que chamei de

“outras culturas”. Da forma como o tema “cultura” vem sendo abordado nos materiais

didáticos aos quais nós, professores, temos acesso, é compreensível que, ao se falar em

“acesso a outras culturas”, pense-se automaticamente no “currículo turístico”, nas

informações estereotipadas sobre os países e seus traços culturais ditos mais marcantes – aí se

inclua o Brasil, com samba, mulatas e futebol.

A desconexão “com o mundo, com a globalização” a que Ely se refere pode dizer

respeito a várias coisas, entre elas política, economia, educação, sociedade, temas que estão

inseridos no todo “cultura”; no entanto, a reflexão de nossa colega parece ter um foco no

acesso à informação, sem mencionar o que fazer com ela. Talvez a descrença na capacidade

do aluno de participar de uma discussão termine por não dar-lhes a oportunidade de tentar, o

que é muito comum.

Mais adiante na entrevista, perguntei a Ely se ela abordava a diversidade cultural em

suas aulas:

Lucélia: Em relação à diversidade cultural, você aborda isso em suas aulas? Ely: Cultural, como assim, falar da cultura daqui em contraponto com a cultura americana? Lucélia: A diversidade cultural em geral. Ely: Ainda não abordei esse tema com eles. Lucélia: Você não achou que seria interessante, por que você não abordou? Ely: Talvez falta de tempo.

Ely explica que a falta de tempo ocorre por causa dos problemas de se ministrar aulas à

noite, em uma comunidade violenta, o que gera o cancelamento de várias aulas, reduzindo

ainda mais a carga horária e, portanto, impossibilitando um trabalho intercultural. A partir daí

podemos destacar, na fala de Ely, dois pontos que merecem uma atenção diferenciada. O

primeiro deles é a posição reservada por Ely às questões culturais em suas aulas, dando a

entender que o trabalho intercultural seria um bônus, e não o elemento delineador da

programação dos conteúdos. Isso apenas denota a reprodução de modelos ultrapassados de

ensino de língua inglesa aos quais fomos expostos enquanto aprendizes do idioma. O segundo

fato é a reação de Ely à minha pergunta inicial nesse trecho da entrevista. Questionei se ela

abordava a diversidade cultural em suas aulas, tendo como resposta um questionamento de

Ely, com o objetivo de esclarecer a “que diversidade cultural” eu me referia: “falar da cultura

daqui em contraponto com a cultura americana?”(Ely). Essa reação esclarece a visão da

professora a respeito do que seria, provavelmente, trabalhar cultura com os alunos: expô-los

ao currículo turístico e estereotipado, já tão comum nos livros didáticos de Língua Inglesa.

Esses materiais didáticos, a invasão hollywoodiana e o senso comum (entre outras tantas

coisas) são grandes responsáveis por fazerem muitos de nós acreditarmos que mencionar

alguns aspectos da cultura americana basta para satisfazer o elemento cultural em sala de aula.

É preciso ter em mente que os Estados Unidos são somente uma das nações que utilizam a

Língua Inglesa; e o resto do mundo? Por acaso o Inglês não é a ferramenta de comunicação

para as relações políticas, socioeconômicas, interpessoais e internacionais em geral?

Caso a diversidade cultural de fato fosse abordada e trabalhada com os alunos de Ely,

certamente seria possível, aos poucos, conscientizá-los da importância do acesso a outras

realidades para conhecer melhor a sua própria, especialmente numa comunidade com tantos

problemas sociais. Entretanto, como Ely há muitos outros professores, que tentam fazer

milagres com as horas que lhes sobram para, pelo menos, seguir o conteúdo programático

gramatical, o qual acaba sendo, mais uma vez, privilegiado.

Quando questionei a Raquel sobre a possibilidade de proporcionar aos alunos a análise

de sua língua/cultura por meio do acesso a outras, ela respondeu afirmativamente:

Raquel. Eu acho que sim. Dá pra eles mesmos já terem um conceito, porque estavam criticando que “como é que muda, assim, no meio de um curso, o curso do século, dos tempos, como é que pára tudo e volta tudo atrás e aquela gramática que aqui em casa vou ter que jogar fora... por que fizeram isso? A língua inglesa não tem isso, não tem essa mudança, é uma língua estruturada, não tem essa pouca responsabilidade dos governantes, por que os governantes deixaram fazer isso?” Aí é sinal de que eles já vêm prestando atenção e já faz uma comparação da língua dele com a língua estrangeira.

No entanto, parece voltar sua resposta para uma análise “concreta”, como é a

percepção da mudança do acordo ortográfico. Parece existir uma dissociação entre língua e

cultura no discurso de Raquel, ficando a língua com a parte sólida, concreta, e a cultura com a

parte abstrata e, por conseguinte, mais difícil de abordar.

O que pude perceber, ao longo da conversa com Raquel, é que ela proporciona, sim,

momentos para discussão sociocultural com seus alunos; avalia as necessidades da turma de

acordo com questões sociais da comunidade, leva em conta a realidade familiar de cada aluno,

trata de maneira individualizada os problemas, conscientiza seus alunos diante dos problemas

que afligem a sociedade como um todo, enfim, tenta ser uma “intelectual transformadora”. No

entanto, não parece ter consciência de que este é um trabalho crítico e culturalmente sensível,

talvez também levada pela ilusão de que o “currículo turístico” é o verdadeiro trabalho com

cultura.

Percebemos, a partir das respostas das professoras informantes, que existe uma

divergência em relação às suas realidades. Enquanto Isabelle e Raquel percebem certa

facilidade em relação à possibilidade de se desenvolver uma postura crítica nos alunos, Ely

diz ser impossível devido à falta de conexão destes com o mundo à sua volta.

No entanto, analisando mais profundamente as respostas, pergunto-me se as atividades

que são aplicadas em sala de aula favorecem esse raciocínio crítico que tanto se almeja. Temo

que não. No caso dos comentários rasteiros mencionados por Isabelle, percebo exatamente a

falta de base do ensino fundamental comentada por Ely. Os alunos não têm o costume de

opinar, expor seus pensamentos, posicionar-se diante dos acontecimentos à sua volta. Muitos

deles não se interessam por esses acontecimentos. Daí a necessidade de se utilizar a língua

inglesa como ponte para acesso ao conhecimento de mundo, proporcionando aos estudantes o

trabalho com diversos gêneros de textos que abordem aspectos fundamentais para a formação

do aluno/cidadão. Se a educação inicial tivesse a preocupação de desenvolver o pensamento

crítico dos alunos, eles certamente seriam capazes até de produzir os textos escritos dos quais

Isabelle sente falta.

No que diz respeito à declaração de Raquel em relação ao posicionamento de seus

alunos diante do novo acordo ortográfico adotado para a língua portuguesa, percebo que os

alunos tendem a comparar (e não contrastar) o português com o inglês, parecendo a língua

estrangeira ganhar a disputa. É a mentalidade estadunidense dominante que nos atinge de

diversas maneiras, seja por um filme assistido ou propaganda de um fast-food. Esses alunos

certamente não têm consciência disso, mas reproduzem o discurso de que o que vem de fora é

melhor e, se for dos Estados Unidos, melhor ainda.

A verdade é que este seria um excelente momento para esclarecer a necessidade da

adoção deste novo acordo e mencionar as modificações que já ocorreram na língua portuguesa

ao longo dos tempos, as quais foram sendo assimiladas pelos falantes sem qualquer prejuízo

comunicacional, visto que as línguas são organismos vivos e, portanto, sofrem interferências

das mais diversas maneiras. Seria também interessante abordar o fato de que, devido a

questões sócio-econômicas (variações diastráticas), (inter) culturais, variações diatópicas

(referentes aos falares locais) – entre outras -, a língua é enriquecida, sem que haja uma

rejeição aos novos termos para designar o modo de viver de determinados grupos de falantes,

bem como aceitando estrangeirismos que não ofendam o nacionalismo brasileiro, mas que

acompanhem a evolução tecnológica.

Quanto à língua inglesa, poderiam ser citados os períodos de mudança pelos quais este

idioma passou, partindo do Old English39 (inglês antigo, também chamado de anglo-saxônico

e hoje praticamente irreconhecível), e chegando até os dias de hoje, em que assumiu a postura

de língua internacional, desnacionalizada e pertencente aos mais diversos povos do globo, que

a falam inserindo seus aspectos culturais e apossando-se dela para exprimir sua cultura diante

do mundo.

Todos os momentos da aula devem ser aproveitados para desenvolver a consciência

que falta em nossos alunos. Não basta seguir o plano; uma aula que se diga culturalmente

sensível deve dar vez ao diálogo, às interrupções, às mudanças de rumo, às discussões, desde

que tenha a formação do aluno cidadão como o objetivo mor a atingir.

4.3.2 O ensino de Língua Inglesa e a afirmação da identidade

Continuo me questionando, no entanto, em relação a de que forma o professor de

língua inglesa pode, ainda que o aluno não demonstre ter a base do ensino fundamental,

disseminar uma pedagogia crítica intercultural em sua sala de aula. Na entrevista com a

professora Isabelle, surgiu uma discussão interessante a esse respeito. Quando lhe perguntei

se ela achava que os alunos se compreendem mais quando compreendem outras culturas, ela

me respondeu demonstrando conhecimento dos percalços pelos quais passam seus alunos ao

serem expostos à língua inglesa:

39 Para mais informações sobre a história da língua inglesa, vide BAUGH, Albert C. & CABLE, Thomas (1993).

Isabelle. Eu acho que (...) eles podem fazer comparações, (...) descobrir coisas que às vezes eles se sentem sempre inferiores e, de repente, eles podem perceber que não são tão inferiores assim... eu acho que eles podem trabalhar questões referentes à auto-estima, no sentido de dizer, ah, porque uma vez um aluno meu falou assim: “professora, por que até pobre nos Estados Unidos fala inglês?”, assim, foi um jeito dele dizer que até pobre lá fala inglês, eu digo, claro, porque aquilo é a língua deles, foi um jeito dele dizer que aqui, pra gente falar inglês é uma coisa do outro mundo e que é difícil, que nem todo mundo consegue, mas lá até pobre fala, então assim, foi uma forma dele mostrar pra gente o que ele enxergava de diferença entre um povo e um outro povo, né, mas assim, essa coisa de você trabalhar com outras culturas é uma boa ferramenta pra desmistificar... questões ... e lá na escola que eu trabalho de tarde agora uma professora voltou de uma viagem da Europa e ela comentando que ela viu coisas ...que a gente fica aqui comentando 1º mundo, 1º mundo, 1º mundo, ela viu coisas muito absurdas lá que jamais ela viveria aqui, então ela precisou ir pra lá pra perceber que o 1º mundo tem suas falhas. Aqui a gente fica sempre idealizando, então conseguir mostrar aspectos culturais diferentes pro aluno é fundamental pra começar a ir quebrando essa visão de que eles são o máximo e eu sou o mínimo... isso é muito importante. E ... isso é uma coisa que você mostra, é uma coisa que você fala numa letra de música, uma coisa que você mostra num vídeo (...), uma charge que você traz (...). (Isabelle). Grifos meus.

Aqui percebo trechos que merecem comentários. O primeiro deles é que é louvável o

interesse da professora Isabelle em conscientizar seus alunos de que não são inferiores a

nenhum outro povo; no entanto, é preciso que nós educadores defendamos essa ideia e não

nos deixemos levar pelo discurso homogeneizante que está tão inserido em nossas vidas,

evitando comentários do tipo “tão inferiores assim”, o qual denota que os alunos são, de

alguma forma, inferiores. Certamente, esse não foi o desejo de Isabelle, mas muitas vezes

deixamos escapar aquilo que tem sido inserido em nossas mentes há muito tempo.

Definitivamente não é fácil fugir do processo de “Mcdonaldização”40.

Outra coisa a ser pontuada é a supervalorização que os estudantes dão à língua inglesa,

fazendo com que a professora concluísse que eles pensam que “falar inglês é uma coisa de

outro mundo”. Mais uma vez: é preciso deixar claro o status do inglês como uma língua

internacional, porém vendo este idioma como ponte de acesso ao conhecimento, e não como

privilégio de poucos, aqueles que seriam os “não pobres”. De maneira relevante, Isabelle fala

na oportunidade de utilizar “outras culturas para desmistificar questões”, inclusive que “o

primeiro mundo tem suas falhas”. 40 Termo utilizado no livro “The McDonaldization of Society”, de George Ritzer (1996) e recorrente na literatura do ensino de inglês como língua internacional. Usado para designar a característica plástica e homogeneizante das relações sociais, que tanto atrai pela sua praticidade e eficiência; não condiz, no entanto, com a postura que desejamos desenvolver em nossos alunos, de seres críticos e culturalmente sensíveis, prontos para rejeitar imposições culturais de qualquer natureza.

Por fim, mas não menos importante, está a assertiva de Isabelle: “conseguir mostrar

aspectos culturais diferentes pro aluno é fundamental pra começar a ir quebrando essa visão

de que eles são o máximo e eu sou o mínimo”. Com essa mentalidade é que se pode

desenvolver de fato a práxis no ensino de leitura em língua inglesa. De acordo com o PCN+

(p.100),

o aprendizado de idiomas estrangeiros deve propiciar que o aluno perceba as possibilidades de ampliação de suas interações com os outros. Esse aprendizado, contudo, não deve constituir processo de desvinculação cultural; pelo contrário, é reforçador de trocas culturais enriquecedoras e necessárias para a construção da própria identidade (PCN+, p.100).

Exposição a outras culturas, pois, não consiste em abdicar de sua própria, mas sim em

aprofundar seu conhecimento sobre ela a partir das experiências trocadas.

Voltando-nos agora à realidade de Raquel, podemos observar que o trabalho com

projetos é comum em sua escola. São projetos com eixos temáticos que são utilizados por

todos os professores da escola, de todas as disciplinas. Ela exemplifica falando do eixo

temático de 2010, inclusão social, e do projeto desenvolvido no ano de 2009, cujo eixo era o

folclore, e no qual os alunos tiveram que pesquisar o folclore referente a algumas nações que

falam a língua inglesa. É, sem dúvida, uma forma de proporcionar ao aluno o conhecimento

de outras culturas para que ele possa, enfim, compreender melhor a sua também. Cabe apenas

o cuidado para o trabalho não se tornar um prato cheio para a afirmação de estereótipos.

No que diz respeito à forma de trabalho de Ely, percebo que ela também valoriza

muito a realidade de seus alunos, tentando tornar o ensino significativo para eles. Em um

momento da entrevista, ela relata a produção de bilhetes em sala de aula:

Ely. Os meninos, que se dispõem assim a paquerar as meninas com os bilhetes em língua inglesa, mas as meninas não ficam atrás não, umas me fizeram umas perguntas [...] eu falei pra ela como escrevia, né, e ela colocou no bilhete, eu falei, pra que você quer isso daí? “Ah, eu quero porque eu quero falar com meu marido agora em inglês”. Eu disse: em inglês? E ele sabe? “Ah, ele disse que tá aprendendo inglês para o trabalho, então ele vai entender”.

Neste caso, compreender a língua-cultura do “outro” vai motivar a escrita de bilhetes na

língua-alvo, possibilitando a comunicação no idioma que os dois interlocutores estão

estudando. Saber de que forma se diz algo em uma língua estrangeira, especialmente na

comunicação informal, é uma forma de proporcionar a interculturalidade e, portanto, a maior

compreensão de sua cultura através do estudo de outra.

Nesse ponto Raquel e Ely concordam quanto à total aplicabilidade do ensino de língua

para maximizar as interações sem perda de identidade. Isabelle diz ser parcialmente aplicável

em sua sala de aula, apesar de sua consciência da importância desse aspecto. Elas concordam,

portanto, que uma das competências a ser conquistada pelos alunos de língua inglesa é

“perceber que o domínio de idiomas estrangeiros no ensino médio, ainda que se dê de forma

parcial, permite acesso a informações diversificadas, a outras culturas e realidades de

diferentes grupos sociais” (PCN+, p.108).

4.3.3 Leitura e Compreensão Textual

Voltando a nossa atenção agora para a questão da compreensão textual, observemos o

que diz o documento:

A competência primordial do ensino de línguas estrangeiras modernas no ensino médio deve ser a da leitura e, por decorrência, a da interpretação. O substrato sobre o qual se apóia a aquisição dessas competências constitui-se no domínio de técnicas de leitura – tais como skimming, scanning, prediction – bem como na percepção e na identificação de índices de interpretação textual (gráficos, tabelas, datas, números, itemização, títulos e subtítulos, além de elementos de estilo e gênero)”. (PCN+, p.97)

Raquel diz que tal forma de trabalho não se aplica em sua sala de aula, enquanto que

Ely e Isabelle dizem ser parcialmente aplicável. Vejamos o porquê.

Isabelle relata, eu diria que de forma frustrada, sua tentativa de trabalhar com a leitura

e compreensão textual:

Isabelle. Quando você pretende sair do texto para explorar conteúdos gramaticais (...), o que eu observo: a gente só consegue fazer isso se eu trabalhar com textos muito pequenos, com muito cognato e abordando um tema que eles conheçam. Então, o que eu observo é que se dá muito mais do que a gente planeja do que a gente executa. (...) É mais desejo do que realização.

E explica sua opinião com base na falta de conhecimento prévio dos alunos e na

extensão dos textos atrelada à dificuldade também em outras disciplinas, determinada pela

falta de interesse na leitura:

Isabelle: A leitura, o elemento dificultador é a falta de vocabulário (.). Mas o que eu quero ressaltar é que essa dificuldade é uma dificuldade que a gente

observa nele também na língua pátria. Porque eu normalmente começo a fazer alguma atividade, a discutir algum assunto que vai ser abordado no texto em língua portuguesa e... o texto vai falar sobre AIDS, então eu começo a falar sobre AIDS, e o que eu noto é que, pra que ele comente, pra que ele leia, pra que ele discuta, essa mesma dificuldade aparece com ele quando eu tô falando em português. Se eu começo a fazer isso em inglês, ele continua apresentando as mesmas inibições, os mesmos limites, claro, isso vai crescendo (.). Então, não é só porque é inglês, é porque ele já tem, ele já traz essas dificuldades também. (Se) você mostrar uma reportagem (.) falando sobre o trânsito e pedir que ele comente, que ele traga soluções pra aquilo... então, a conversa é muito rasteira, do tipo “ah, o trânsito tá ruim”... por quê? Por que o trânsito ficou ruim? Que soluções você pensa a esse respeito? A conversa não flui. E aí quando você vai fazer isso num texto de língua inglesa você vai identificar exatamente os mesmos problemas, né, que claro se intensificam um pouco porque aparecem dificuldades na compreensão do texto, vocabulário, enfim, é uma coisa que ele traz de antes, então não é um problema só de inglês, é um problema que a gente nota no geral.

Eis um problema difícil de resolver: falta de base. Falta de um ensino crítico e reflexivo

desde o momento da alfabetização, o que teria proporcionado uma formação mais completa,

que vai muito além de vocábulos e estruturas soltos. Uma educação que criasse o hábito de

leitura, afinal, para emitir opiniões e participar de discussões é preciso ter o que falar. E de

onde viriam esses argumentos senão de leituras diversas?

Ter um vocabulário amplo facilita muito a compreensão textual também em língua

estrangeira. O trabalho com sinônimos e antônimos é facilitado, a identificação de palavras

cognatas é imediata e a compreensão das entrelinhas é maximizada. No entanto, a preferência

por textos imagéticos tem destaque entre muitos adolescentes com os quais trabalho – e

acredito que isso seja bastante comum. A preferência por assistir a um filme a ler um livro é

bastante comum; não que a literatura seja superior ao cinema, mas a fuga dela tem

consequências negativas, tais como, por exemplo, a preguiça. Quem não está acostumado a ler

certamente achará grande um texto de uma página, como é o caso de nossos alunos em geral.

Isabelle. Textos grandes (.) esse é o primeiro bloqueio. (.) Depois eu observo que, além de ser grande, o texto traz muita palavra que ele desconhece. Que mesmo que a gente pegue até alguns textos de vestibular com muito cognato, muita palavra que eles conhecem, até você dizer pra ele “olhe, dá pra você fazer, o texto é fácil, tem um monte de palavra que você conhece, fala sobre um tema que você conhece”, até pra você trabalhar com ele aquela sensação de que ele pode, leva um tempo, porque a primeira reação dele é “Deus me livre, isso não é pra mim!”. Mas eu volto a te dizer uma coisa: acredite, em português é a mesma coisa. Quando ele pega uma prova em português com um texto grande, ele “‘pô’, velho, esse ‘textão’, esse texto é muito grande”, é a mesma reação (.) ele vai sempre tentar uma forma de responder a questão sem precisar ler o texto. (.) Isso é pra Biologia, isso é pra História, isso é pra Língua Portuguesa, e é pra Inglês também. Eu noto, conversando com meus colegas, que a minha dificuldade e a

dificuldade deles se assemelha. O fato de ser uma língua estrangeira, assim, aparece como uma tentativa de justificar, né, mas a gente vai pra realidade, (.) que não é a língua estrangeira. O problema é que essa habilidade (.) de gostar de passear por um texto é alguma coisa que falta ao aluno.

Ely justifica sua opinião de que é parcialmente aplicável um trabalho com estratégias

para o desenvolvimento da habilidade de compreensão textual dizendo que seus alunos não

conseguem compreender tudo, mas são capazes de retirar a ideia central do texto. Demonstra,

assim como Isabelle, uma preocupação em escolher textos menores, apesar de pensar que,

ainda assim, não haja muito rendimento, o que lhe faz buscar alternativas:

Ely. Eu procuro colocar textos menores (.) ou até uma música (.), mas eu não acho que tenha muito rendimento, não acho. Eu agora tô começando a trabalhar com vídeo, a escrita no vídeo, eles acompanharem a música no vídeo, não no papel, porque no papel eles ficam perdidos (.) eu não consigo entender. No vídeo é muito mais fácil.

Não fica muito claro na fala de Ely o trabalho com as estratégias de leitura

mencionadas no trecho do PCN+. É pertinente atentar para o fato de utilizar vídeos e músicas

como alternativa para o trabalho com compreensão textual; eles são, é claro, importantes

como diferentes gêneros textuais, mas não devem ser os únicos a serem explorados.

Raquel, quando falou de seu trabalho com a leitura, deixou clara a dificuldade de seus

alunos em compreenderem os textos, dizendo que pra eles são “complexos”, e que “não

dominam por não praticarem” a leitura. Quando questionada em relação ao que faz para tentar

diminuir essa dificuldade e reverter a situação, ela respondeu assim:

Raquel. Dividimos, 1ª unidade, textos pequenos, de fácil compreensão; na 2ª unidade, já vai aumentando um pouquinho, 3ª e na 4ª, um texto mais complexo, que não precisa nem ser grande (.) lá trabalha muito com projetos (.). Tem projeto que primeiro ela quer que visualize o mundo pra depois chegar na comunidade deles, pra que eles possam entender a divergência(.), e ao mesmo [tempo] o alcance que ele tem, de a língua inglesa ter nascido lá na Inglaterra e hoje estar alcançando um bairro como Paripe, que é pobre, e ele pode usufruir de aprender uma língua inglesa em uma escola pública, ele sendo pobre.

Percebo, aqui, a preocupação de Raquel com o tamanho dos textos, assim como já

haviam mencionado Isabelle e Ely. Entretanto, ela acrescenta o trabalho com textos pequenos

e simples no início, acontecendo o aumento da dificuldade à medida que passam as unidades,

de forma a minimizar o problema da falta de compreensão leitora devido à complexidade dos

textos. Boa alternativa.

Apesar de não mencionar a expressão “pedagogia crítica intercultural”, a professora

Raquel demonstra aplicá-la em sua sala de aula por meio de projetos (parece haver alguém

por trás desse trabalho, uma coordenadora, talvez, o que percebemos quando Raquel diz “ela

quer que visualize o mundo...”). Esse trabalho crítico se dá quando há preocupação com o

desenvolvimento da visão de mundo dos alunos para depois chegar à realidade de sua

comunidade. É importante ressaltar que isso se deve fazer sem que haja comparações, mas

sim contrastes entre realidades, como já falara Isabelle, ao notar a necessidade de mostrar que

seus alunos não são inferiores a nenhum outro povo ou comunidade nem piores ou melhores

que eles, apenas diferentes.

Percebo, com a análise dos dados, que estamos em um terreno fértil; com a exceção de

Isabelle, que declarou já ter o costume de utilizar as estratégias de leitura em suas aulas, Ely e

Raquel, mesmo que concordem com a necessidade de se trabalhar com a leitura em Língua

Inglesa, não parecem lidar com ela de forma cotidiana com seus alunos. Acredito, portanto, na

importância desse trabalho, especialmente para aqueles professores que desejam ampliar os

horizontes de suas aulas de inglês por meio da inclusão de elementos que, até então, eram

deixados de fora de suas aulas.

4.3.4 Vocabulário e Gramática: de que forma abordá-los?

Chegamos agora a uma questão polêmica para o ensino de língua inglesa: como

ensinar vocabulário e gramática de forma funcional, evitando a antiga memorização de listas

de vocabulário e o preenchimento de lacunas com os aspectos gramaticais corretos?

O PCN+ diz que

o trabalho com a estrutura lingüística e a aquisição de vocabulário só se revestirá de significado se partir do texto e remeter novamente ao texto como totalidade. É, pois, a partir do texto e de sua leitura e interpretação que se propõe a seleção de conteúdos gramaticais e de vocabulário a serem desenvolvidos no ensino médio. (PCN+, p.103)

No entanto, nossas professoras informantes são unânimes ao dizer que tal afirmação é

parcialmente aplicável em suas realidades. A explicação para isso se percebe por meio da

observação de algumas falas das professoras entrevistadas. Partirei aqui da questão

gramatical, retomando adiante a aquisição de vocabulário.

Ely declara que vem buscando desenvolver não somente a gramática, mas também a

competência discursiva do idioma estrangeiro desde que começou a dar aula a seus alunos,

mas considera tal tarefa difícil porque eles já têm uma mentalidade gramatical inserida,

advinda da língua portuguesa.

Propus, durante a entrevista, a mesma atividade para as três professoras informantes,

que consistia em colocar em ordem três cartões: em um estava escrito “aquisição de repertório

vocabular”, no outro “leitura e interpretação de textos”, e no último “estrutura linguística”.

Elas foram solicitadas a escolher a ordem de aplicação desses aspectos, dizendo como fariam

em suas aulas.

Ely me surpreendeu rebatendo a minha pergunta: “(na ordem) que acontecem ou que

têm que acontecer?”. Pedi-lhe, então, que me dissesse as duas coisas. Relatando o que

acontece, ela mostrou a seguinte ordem: aquisição de repertório vocabular, estrutura

linguística, e leitura e interpretação de textos. Ao falar de como gostaria que acontecesse,

partiu da leitura e interpretação, passando pela aquisição de repertório vocabular e, enfim,

chegando à estrutura linguística.

Percebe-se que a ordem “real” determina a aquisição de vocabulário e estruturas

gramaticais de maneira totalmente descontextualizada, ainda que Ely demonstre ter

consciência do que seria o “ideal”. Perguntei-lhe, então, por que razão ela desejaria que fosse

diferente de sua realidade, e ela me respondeu:

Ely. Na verdade, (.) eu acredito que leitura e interpretação de texto vai ajudar os alunos mais na hora (.) deles responderem questões, tipo do ENEM(.). Acho que (.), se ele consegue fazer uma leitura e interpretação de textos em língua inglesa, ele vai conseguir fazer qualquer outra coisa, (.) ele vai ter aquisição de repertório, ele vai ter estrutura, somente com a leitura e interpretação, e não tem tanta necessidade, (.) a estrutura linguística. Eu acho. Não pra eles.

Continuei perguntando: “Você conseguiria então escolher os conteúdos gramaticais a

partir do texto?”

Ely. Hum...hum... (.) Eu já procuro o texto que tenha algumas estruturas que eu vou querer trabalhar depois, mas eu não apresento essa estrutura pra eles logo de primeira porque até eles vão até tomar um susto, eles podem até se assustar. Eu deixo eles se divertirem com o texto primeiro, que seja uma música, a leitura daquela música, eles brincam, eles dançam, depois é que eu vou apresentar essa estrutura pra eles, vou tirar vocabulário, vou fazer algumas traduções, por último a estrutura. E eles pegam com muito mais facilidade.

Percebe-se que Ely considera importante o trabalho contextualizado de vocabulário e

estruturas; ela chegou a afirmar que escolhe “os conteúdos gramaticais a partir do texto”

quando respondeu a minha pergunta afirmativamente. No entanto, é relevante observar o fato

da professora partir, de fato, do item gramatical para a escolha do texto. Com base em uma

pedagogia crítica intercultural para o ensino de leitura em língua inglesa, o elemento

norteador para a escolha de textos deve ser sua capacidade de suscitar nos alunos o raciocínio

crítico e o posicionamento diante de questões que aflijam a sociedade que os cerca por meio

da interação entre as diversas culturas ao redor do mundo. A gramática como ponto de partida

e o texto como pretexto para estudo estrutural, pois, devem estar fora de questão. No entanto,

Ely, como eu, como tantos profissionais da área de línguas, deixa-se levar pela formação que

provavelmente teve – essencialmente gramatical. Esse comportamento é algo intrínseco, que

precisamos policiar; como eu já disse anteriormente, agir de forma culturalmente sensível não

é tarefa fácil. Nós sabemos como devemos agir, de que forma preparar aulas, como nos

comportar em sala de aula, que palavras utilizar com os alunos, é verdade. Mas não podemos

permitir que seja “faça o que eu digo, não faça o que eu faço”; nossos alunos precisam do

exemplo, o qual nós só poderemos dar se fizermos da pedagogia intercultural crítica não um

método, uma técnica, uma abordagem, mas um estado de espírito, uma estratégia de ação.

Isabelle, ao colocar em ordem os cartões, estabeleceu assim a relação entre os

aspectos questionados:

Isabelle. Eu acho que alguém só consegue ler e interpretar textos se ele tem um mínimo de repertório vocabular e, se ele tem esse repertório vocabular, ele consegue estruturar linguisticamente aquilo que ele tá fazendo num processo posterior de escrita. Eu vejo que esses três, essas três aquisições, digamos assim, elas estão muito linkadas e que, em hipótese alguma, elas devem ser trabalhadas isoladamente.

Apesar de ter ordenado os cartões a partir da interpretação de textos, passando pela

aquisição de vocabulário e chegando ao trabalho gramatical, a professora Isabelle

demonstrou, assim como Ely, escolher o texto, de fato, partindo do conteúdo gramatical a ser

trabalhado:

Isabelle. Então se eu vou trabalhar com simple present, então eu quero muito texto que fale de rotina e tal e tal, se eu vou trabalhar com passado eu quero alguma coisa que reporte as situações que aconteceram, se eu quero trabalhar com futuro eu vou apelar pra planos, fazer planos, então o meu texto tem bem a ver com o tempo verbal que eu tô trabalhando.

Das três professoras entrevistadas, apenas Raquel assumiu fazer sua escolha de textos

a partir do conteúdo gramatical com o qual iria trabalhar:

Raquel. A aquisição do repertório vocabular ele adquire com a prática da leitura aplicando em sala de aula. A estrutura linguística que é a primeira de todas, senão ele não vai ter uma visão do que ele está aprendendo (.). Primeiro o conteúdo gramatical, depois os textos.

Penso que a necessidade do ensino da gramática ainda está muito evidente nos exames

dos quais os alunos vão um dia participar, sejam vestibulares ou concursos públicos. Talvez,

por esse motivo, nós ainda nos preocupemos tanto com a estrutura gramatical em nossas

aulas, chegando a usá-la como base para planejá-las. Chegamos até a dizer: “hoje é aula de

gramática”, como algo institucionalizado, separado de outros conteúdos, como se o estudo da

língua não fosse um continuum, mas algo fragmentado. A tradição demanda que se trabalhe

assim; a nossa formação conteudista parece tomar conta da situação. Isso sem se falar que é

muito mais fácil trabalhar nessa perspectiva, que, por ser mais mecanizada, acaba se tornando

também muito mais fácil e menos trabalhosa.

É bem verdade que a maioria das questões do Exame Nacional do Ensino Médio

(ENEM) e vestibular da Universidade Federal da Bahia (UFBA), exames bastante

valorizados, tende a exigir do aluno compreensão textual, mas a gramática ainda aparece em

questões isoladas. Veja a questão retirada da 1ª fase do vestibular de língua estrangeira –

inglês da UFBA (2010)41:

Questão 35 Quanto ao uso da linguagem no texto, pode-se afirmar: (01) “it” (l. 3) e “which” (l. 8) referem-se, respectivamente, a “eighteenth century” (l. 2) e a “eighteenth century” (l. 8). (02) “port” (l. 6) e “port” (l. 16) têm função de substantivos. (04) “were used” (l. 8) e “was [...] sent” (l. 10) descrevem ações na voz passiva. (08) “sank” (l. 12) e “began” (l. 17) indicam ações que ocorreram em um passado determinado. (16) “now” (l. 17) e “often” (l. 18) exercem função de advérbios. (32) “uncontrollable” (l. 18) e “unearthed” (l. 19) são palavras formadas por prefixação e sufixação.

É certo que saber a que se referem os termos da proposição (01) facilita a compreensão

textual; da mesma forma, saber o processo de formação das palavras e que função elas

exercem na oração permitirão o entendimento dos termos na ordem correta; conhecer os

tempos verbais e a ideia que eles reportam também é essencial para localizar o conteúdo do

texto no tempo.

Entretanto, o problema aparece quando esses assuntos gramaticais são abordados de

forma descontextualizada, sem mostrar para o aluno a sua importância na compreensão do

texto. O processo de avaliar as funções dos termos da oração é feito automaticamente por

leitores proficientes, sem que seja preciso fazer o trabalho que nos propõe a “Questão 35” – é

41 Disponível em: < http://www.vestibular.ufba.br/docs/vest2010/prv_gab/prv_cad2_1fase.pdf>. Acesso em: 28 jan. 2011.

o que acontece quando lemos em português: não precisamos ver a função de cada termo para

compreender um texto, mas é a organização correta deles que nos permite extrair sentido. Em

língua estrangeira, no entanto, nossos alunos precisam praticar o processo de tal forma que,

após algum tempo de estudo, os itens gramaticais sirvam realmente como elementos

estruturadores de algo mais importante: o conteúdo do texto.

Provas de concursos bastante concorridos também trazem questões essencialmente

gramaticais, como é o caso das duas questões a seguir, retiradas da prova de língua inglesa da

Petrobras (2010)42:

41 The fragment “oil demand should double by 2050.” (line 10) expresses a(n) (A) improbable guess. (B) future permission. (C) past ability. (D) scientific certainty. (E) reasonable expectation.

43 The boldfaced marker is synonymous with the expression in parentheses in (A) “ In order to sustain the needs of an ever globalized world,” - lines 9-10. (So as to) (B) “Nonetheless, geological limitations will disrupt this improbable scenario.” - lines 11-12. (Moreover) (C) “Nevertheless, this methodology is dangerously defective on several key points…” - lines 20-21. (Consequently) (D) “Therefore, relying on the R/P ratio gives a false impression of security…” - lines 35-36. (Yet) (E) “Moreover, OPEC countries continue to present their reserves as flat…” - lines 56-57. (However)

A questão “41” exige do candidato o conhecimento do modal “should” e a ideia que

ele expressa; caso o aluno não tenha estudado esse assunto, fica impossível responder a

questão. O mesmo ocorre com a questão “43”, com diferença apenas do assunto abordado:

marcadores discursivos. Não quero com isso dizer que não é importante conhecer os verbos

modais e as conjunções; muito pelo contrário, eles estabelecem relações fundamentais entre

os termos da oração e carregam consigo um sentido próprio, sem o qual o entendimento do

texto fica prejudicado.

No entanto, quero com esses exemplos mostrar que Raquel tem um porquê de dizer

que escolhe seus textos a partir dos conteúdos gramaticais; todos nós temos. A realidade do

que se exige dos alunos não é exatamente aquilo que desejaríamos, visto que as provas são

42 Disponível em: < http://www.4shared.com/get/0D4cOS5f/CONHECIMENTOS_GERAIS_-_ENSINO_.html>. Acesso em: 28 jan. 2011.

essencialmente objetivas, o que impede o posicionamento do aluno diante do conteúdo do

texto, por exemplo.

Contudo, é preciso ter em mente que o trabalho crítico não permite que a escolha do

texto seja dependente de quaisquer conteúdos estruturais; pelo contrário, o tópico a ser

abordado no texto deve ser a via principal, tendo a aquisição de vocabulário e estruturas

linguísticas como transversais. Não que essas sejam pouco importantes, mas para chegar a

elas é imprescindível passar pela via principal.

Percebo aqui que existe o conhecimento do “como deve ser feito”, mas ainda há uma

distância em relação ao que é realizado de fato. Ao se depararem com o trecho

O professor do ensino médio deve ter clareza quanto ao fato de que o objetivo final do curso não é o ensino da gramática e dos cânones da norma culta do idioma. O domínio da estrutura lingüística envolve, todavia, o conhecimento gramatical como suporte estratégico para a leitura e interpretação e produção de textos. (PCN+, p.104),

Ely e Raquel disseram ser totalmente aplicável tal instrução, enquanto que Isabelle falou de

uma parcialidade na sua aplicação. No entanto, com os trechos da entrevista relatados acima,

o objetivo final do curso parece, sim, ser o ensino da gramática, já que todas as professoras

disseram escolher um texto dependendo do conteúdo gramatical a ser trabalhado.

Conforme destaquei, voltemos nossa atenção agora à abordagem do vocabulário nas

aulas de leitura sob uma perspectiva crítica intercultural. O PCN+ diz que

é essencial o desenvolvimento de técnicas de leitura que obrigatoriamente envolvam atividades de pré-leitura e de preparação para a compreensão propriamente dita: guessing, exploração oral prévia do assunto e dos temas, levando sempre em conta o conhecimento anterior do aluno. Técnicas como skimming e scanning do texto, levantamento de palavras-chave e pesquisa de vocabulário reforçam o aprendizado autônomo e significativo” (PCN+, p.109) (Grifos meus) Faz parte das competências em língua estrangeira no ensino médio adquirir vocabulário por associação semântica de semelhanças ou não com a língua materna (palavras “transparentes” e falsos cognatos)”. (PCN+, p.109) (Grifos meus)

E o que sugerem as professoras agentes dessa pesquisa? De que forma abordam a

aquisição de vocabulário?

Raquel disse ser mais propenso o trabalho por analogias ou oposições entre palavras a

partir de temas em vez da simples memorização de listas de vocábulos dissociados de

contextos, confirmando sua afirmação de que os trechos acima são totalmente aplicáveis em

sua realidade.

Ely propõe o trabalho com músicas para facilitar a aquisição de vocabulário, já que os

alunos “sempre querem saber o que significa o que eles estão cantando”. Acredita que “se

você tira dez, quinze palavras dessa música e você põe pra eles completar(em) ou sublinharem

o que eles estão ouvindo e depois você apresenta pra eles, é difícil eles esquecerem” (Ely).

Isabelle afirma que o trabalho com o vocabulário deve ser feito a partir do contexto.

Na verdade, sua fala denota o trabalho com tópicos: “se hoje eu to falando de banana, amanhã

eu vou falar de outra fruta (...)”; dessa forma, afirma que vai “ampliando cada vez mais,

trazendo mais informações, mais palavras (...)”. Quando respondeu que o trecho do PCN+

supracitado tem aplicação parcial em sua sala de aula, creio ter sido pelo fato de que seus

alunos não têm nenhuma base vocabular para que se acrescentem outras palavras, como fica

evidente em suas palavras: “ele não tem vocabulário não é só em inglês, é em português

também...”.

Ressalto aqui três aspectos. O primeiro deles diz respeito ao que se entende por

analogias ou oposições entre palavras. É preciso deixar claro que essas ações não devem ser

meras traduções, mas sim um trabalho contextualizado, por meio da utilização de grupos

semânticos.

O segundo aspecto remete à importância da seleção de músicas para que um trabalho

com vocabulário a partir delas não se torne uma forma de aprender a cantar a música da

novela. Antes de qualquer coisa, os conteúdos a serem trabalhados devem ser escolhidos com

base em um tema transversal por unidade, subdividido em tópicos para cada material a ser

desenvolvido. Sendo isso feito, o conteúdo da música – aqui não me refiro a gramática ou

vocabulário especificamente – deve ter relevância dentro do escopo do tópico que está sendo

abordado.

O terceiro impasse está no cuidado que se deve ter com a escolha dos textos com foco

no vocabulário que se quer desenvolver. Certamente não encontraremos um texto funcional e

autêntico que aborde diversos tipos de frutas, meios de transporte ou quaisquer outros tópicos.

O caminho aqui está inverso: não se parte do vocabulário para a escolha do texto, mas sim

deste para a discussão que se quer fomentar, a qual evidenciará a necessidade do trabalho com

determinados grupos semânticos. Evitemos, então, os textos custom-made.

4.3.5 Produção de sentido

Já sabemos que a simples decodificação de um texto em nada ajudará a desenvolver o

pensamento crítico do aluno; é preciso compreender o sentido que a organização das palavras

estabelece, percebendo o significado de expressões, frases e orações. O trabalho com palavras

soltas, fora de contexto, só acarretará frustração no momento de compreendê-las como parte

de um todo. Para produzir sentido, portanto, é preciso ir além de fragmentos; é preciso ter

uma noção do todo para que seja possível posicionar-se diante dele.

Pela leitura concretiza-se a principal razão do ato de linguagem, que é a produção de sentido. Aprender a ler de modo amplo e em vários níveis é aprender a comunicar-se, é valer-se do texto em língua estrangeira para conhecer a realidade e também para aprender a língua que, em última instância, estrutura simbolicamente essa realidade, conformando visões de mundo”. (PCN+, p.107)

Quando questionadas em relação à capacidade dos alunos de captar os sentidos do

texto, ler nas entrelinhas, retirar a mensagem do texto em vez de apenas lê-lo literalmente, as

professoras agentes dessa pesquisa não se mostraram muito confiantes. A produção de

sentidos, de acordo com suas falas, parece ficar defasada.

Apesar de confirmar a total aplicabilidade do conteúdo do trecho do PCN+ acima,

Raquel negou veementemente a capacidade do aluno de compreender o texto – o que é uma

contradição, visto que não é possível produzir sentidos sem compreender o texto. Já Ely

manteve sua opinião de que “captar entrelinhas na língua inglesa é difícil”, ainda que em

português eles consigam fazê-lo. Isabelle discorda em parte, justificando assim seu

julgamento a esse respeito:

Isabelle. (...) isso é uma coisa que a gente tenta fazer sempre quando a gente trabalha com análise do discurso (...), fala lá sobre uma campanha publicitária (...), a gente fala sobre o que é vender produtos, e que às vezes você não tá vendendo o produto, mas o sonho atrelado àquele produto. (...) é um pouco complicado pra o aluno, às vezes, compreender essas questões, porque ele tá naquela massa de pessoas facilmente manipuladas por essas grandes empresas que desenvolvem campanhas publicitárias. Até você conseguir tirar essa máscara e enxergar o cerne da questão, isso leva um tempo. Se fazer isso na língua pátria já (...) é um trabalho, pense o que é fazer isso em outra língua, porque as sutilezas da língua, às vezes, são muito complexas pra eles.

Ler com o objetivo de produzir sentidos não é tarefa fácil, principalmente se

estivermos tratando de alunos que não têm um histórico de leitura. Como Isabelle mencionou,

a dificuldade também é recorrente na leitura de textos em português. Ora, esses alunos têm

aulas de Língua Portuguesa, em sua maioria, também centradas nos aspectos gramaticais;

como se pode exigir deles a habilidade de interpretação de textos?

E vamos além: os cursos de Letras não dão ênfase ao ensino/aprendizagem de leitura.

Apenas uma disciplina de Leitura e Produção e Textos não é suficiente para preparar nenhum

professor para dar aula de compreensão textual. É a famosa bola de neve: o professor é mal

formado, os alunos não têm hábito de leitura e não são expostos a ela nas séries iniciais, o que

termina tornando impossível cobrar dos alunos do Ensino Médio que sejam leitores

proficientes e capazes de interagir com um texto – principalmente se este estiver em uma

língua estrangeira.

Infelizmente, como consequência disso, o que se percebe é um total despreparo dos

alunos para irem além de signos linguísticos desenhados no papel; transcender significados

para além do literário ainda é tarefa muito difícil. Entretanto, cabe-nos tentar motivar o aluno

a ler mais, a se inteirar dos acontecimentos que o cercam, a expandir seu conhecimento de

mundo. Com nossa ajuda, quem sabe, esses alunos sintam o gosto de perceber as entrelinhas

de um texto; vamos tentar, ainda que necessitemos começar do zero.

Daí a relevância de um trabalho de pesquisa como este; a investigação da realidade das

aulas de Língua Inglesa das professoras agentes desta pesquisa permitiu compreender de que

maneira devemos abordar os conteúdos da disciplina. Se a leitura é um empecilho, precisamos

criar estratégias para driblá-lo; se os alunos não demonstram utilizar seu conhecimento de

mundo no momento da leitura, vamos ensiná-los a fazê-lo; se a produção de sentidos fica

prejudicada, dificultando o posicionamento crítico do estudante, vamos guiá-lo até que possa

caminhar sozinho.

A palavra de ordem é facilitar . Não podemos exigir do aluno, da noite para o dia, que

interaja com os mais diversos gêneros textuais; lembremos que eles, provavelmente, devem

ter aprendido a usar o texto como pretexto para responder questões gramaticais. Não vale a

pena reclamar da falta dos conteúdos prévios da disciplina se nada disso for resolver o

problema. Precisamos trabalhar com o que temos e, se não tivermos nada, precisamos

construir algo. Facilitar, portanto, não tem aqui o sentido de “dar de mão beijada”, mas sim de

preparar o estudante para começar (sim, é um começo!) uma evolução na leitura em língua

estrangeira, sem que a falta da base do Ensino Fundamental seja um problema. Precisamos

proporcionar momentos para que esses alunos percebam qual estratégia de aprendizagem

melhor se aplica a seu estilo; não podemos impor a nossa forma de pensar, mas sugerir várias

maneiras de atingir um mesmo objetivo.

Na tentativa de buscar formas de ajudar os alunos a superar os obstáculos, evoluir na

leitura e posicionar-se criticamente diante dos textos, apresento sugestões de atividades

concebidas sob uma perspectiva culturalmente sensível para o desenvolvimento da

compreensão leitora. Seus desdobramentos serão discutidos a seguir.

4.4 UM POSSÍVEL CAMINHO

4.4.1 Desenvolvimento de atividades de leitura na perspectiva crítica e culturalmente

sensível

Guilherme (2002, p.209) descreve uma abordagem interdisciplinar para a capacitação de

professores como um somatório entre Pedagogia Crítica, Estudos Culturais e Comunicação

Intercultural.

A autora faz questão de deixar claro que a Pedagogia Crítica não consiste em nenhum

método ou metodologia, mas sim num estilo de ação que envolve determinados princípios:

… CP provides principles that enable teachers to create a different approach that stems from a new perspective into (inter)cultural knowledge, its relation to life, and how it is positioned towards and exchanged by teachers and students of foreign languages/cultures (Hones, 1999). Therefore, CP is intrinsically related to culture, power and communication.43 (GUILHERME, 2002, p.217)

Quanto à relação com os Estudos Culturais, Guilherme (2002, p.211) deixa claro que

questões de relevância sócio-política, tais como identidade, poder, multiculturalismo, raça e

gênero devem ser levados em conta, visto que “a tarefa do professor é desenvolver a

consciência crítica cultural e a competência comunicativa intercultural entre seus alunos”44

(GUILHERME, 2002, p.211).

E já que estamos falando de Comunicação Intercultural, cabe dizer que consiste na

ability to communicate and interact with people from different linguistic/cultural backgrounds…” & “… should always consist of a praxis – theory and practice – performed in an interpretative, reflective, exploratory

43 A Pedagogia Crítica disponibiliza princípios que permitem que os professores criem uma abordagem diferente que é proveniente de uma nova perspectiva para o conhecimento (inter) cultural, sua relação com a vida, e como ele é posicionado e compartilhado por professores e alunos de línguas/culturas estrangeiras (Hones, 1999). Portanto, a PC é intrinsecamente relacionada à cultura, ao poder e à comunicação. 44 ... teachers whose task is to develop critical cultural awareness and intercultural communicative competence among their students. (GUILHERME, 2002, p. 211)

and pragmatic mood in order to generate critical cult(GUILHERME, 2002, p.215)

Para desenvolver atividades numa perspectiva crítica

compactuo com Guilherme no trabalho com uma abordagem interdisciplinar, de forma que os

professores sejam preparados para serem

servindo de exemplo a seus alunos, e não apenas pregando uma teoria imaginada

inalcançável. Falando sempre a partir de uma perspectiva da formação de professores e c

objetivo de buscar caminhos que lev

perspectiva crítica culturalmente sensível, p

por professores interessados no ens

Figura 6: Sugestões para o ensino de leitura em LI

45 Tradução livre. Habilidade de se comunicar e interagir com pessoa de origens linguísticas e culturdiferentes (e que) deve sempre consistir em uma práxis reflexivo, exploratório e pragmático, de forma a gerar uma consciência cultural crítica.46 Imagens disponíveis, respectivamente, em: <<hypedesire.blogtv.uol.com.br>. Acesso em: 22 fev. 2011.

Para

como

entre

A seguir

como

quefacilitará

Juntando

um texto

razão

comunicar”

and pragmatic mood in order to generate critical cult(GUILHERME, 2002, p.215)45

Para desenvolver atividades numa perspectiva crítica e culturalmente sensível,

compactuo com Guilherme no trabalho com uma abordagem interdisciplinar, de forma que os

professores sejam preparados para serem educadores críticos, reflexivos e transformadores,

servindo de exemplo a seus alunos, e não apenas pregando uma teoria imaginada

Falando sempre a partir de uma perspectiva da formação de professores e c

objetivo de buscar caminhos que levem ao ensino/aprendizagem de leitura sob uma

perspectiva crítica culturalmente sensível, proponho aqui sugestões que podem ser a

professores interessados no ensino de leitura em língua inglesa:

Sugestões para o ensino de leitura em LI46

Tradução livre. Habilidade de se comunicar e interagir com pessoa de origens linguísticas e cultur

diferentes (e que) deve sempre consistir em uma práxis – teoria e prática – desenvolvida de modo interpretativo, reflexivo, exploratório e pragmático, de forma a gerar uma consciência cultural crítica.

Imagens disponíveis, respectivamente, em: <analisandodiscursos.wordpress.com>, <>. Acesso em: 22 fev. 2011.

Para começar: expor os alunos aos maisdiversos

como textos científicos, quadrinhos,propagandas,

entreoutros. Ou, como no documento oficial,é necessário que o alunotenhapublicitário, jornalístico,poético, literário, científicoestreitar seu contato cominformal, de modo aconfrontarcomunicativos (PCN+, p.106

seguir: perceber a leitura como produção desentidos

como decodificação, deixando clara essadiferença

facilitaráa diferenciação entre compreensãoe

Juntando as peças: mostrar aos estudantes anecessidade

texto como um todo, estruturado de formacoesa,

razão de aspectos socioculturais inerentesà

comunicar”(PCN+, p.107).

and pragmatic mood in order to generate critical cultural awareness.”

culturalmente sensível,

compactuo com Guilherme no trabalho com uma abordagem interdisciplinar, de forma que os

educadores críticos, reflexivos e transformadores,

servindo de exemplo a seus alunos, e não apenas pregando uma teoria imaginada

Falando sempre a partir de uma perspectiva da formação de professores e com o

em ao ensino/aprendizagem de leitura sob uma

sugestões que podem ser adotadas

Tradução livre. Habilidade de se comunicar e interagir com pessoa de origens linguísticas e culturais desenvolvida de modo interpretativo,

reflexivo, exploratório e pragmático, de forma a gerar uma consciência cultural crítica. >, <readingsuccesslab.com> e

diversosgêneros textuais,

propagandas,músicas, vídeos,

tenhacontato com textos –narrativo, dissertativo,

científico – nos quais possaa linguagem formal e

confrontardiferentes recursos106).

sentidose não apenas

diferençapara os alunos, o

e tradução.

necessidadede entender

coesa,coerente e “em

à ideia que se quer

Talvez você, caro leitor, esteja se sentindo como se alguém estivesse lhe explicando

como fazer um bolo sem lhe dar a receita, apenas falando os ingredientes e o modo de fazer,

sem lhe dar tempo de anotar. Portanto, numa tentativa de que o bolo não sole, vamos a eles.

Ingredientes:

• Um texto que tenha a ver com a realidade dos alunos, que lhes leve a pensar,

emitir juízo de valor; enfim, que promova a afirmação de suas identidades, seja pelo

contato com outras realidades ou refletindo sobre a sua de alguma outra forma;

• Conhecimento prévio dos alunos;

• Palavras cognatas e transparentes;

• Palavras-chave;

• Dicionário.

Modo de preparo:

Faça uma pré-leitura com seus alunos, levantando de alguma forma a ideia do texto. Isso pode

ser feito por meio da utilização de imagens ou utilizando uma técnica chamada de brainstorming, a

qual consiste em utilizar um tema como base e pedir que os alunos façam associações de tudo que

lhes vier à mente que tenha relação com o tema. Dessa forma você já estará ativando o conhecimento

prévio dos seus alunos, o qual é extremamente importante para o sucesso da receita, já que a

experiência permite o estudo do texto como se já soubesse algo sobre ele antes mesmo de começar a

ler. Acrescente o conhecimento de palavras cognatas (aquelas que se assemelham à Língua

Portuguesa) e transparentes (aquelas cujo significado os alunos já trazem consigo). Coloque em

destaque as palavras-chave (aquelas que, provavelmente, são repetidas várias vezes) e busque

compreendê-las dentro do contexto. Misture todos os ingredientes e você obterá uma massa coesa,

após aplicar uma estratégia chamada de skimming, com a qual você consegue retirar a ideia central do

texto observando todos os ingredientes e deduzindo expressões desconhecidas pelo contexto. Depois

da compreensão realizada, polvilhe o seu entendimento, se necessário for, com alguns significados:

esse é o momento de usar o último ingrediente – o dicionário. Sirva acompanhado de

questionamentos a respeito da compreensão textual.

De forma mais visual, o que se deseja obter como resultado é algo como a figura a

seguir:

Figura 7 – Ideia central.

Pode parecer muito simplificado, mas

texto em língua estrangeira

interpretação textual, tais como a observação dos tópicos frasais dos parágrafos, o estud

estruturas que facilitam a compreensão da coesão textual, tais como os marcadores

discursivos ou os grupos nominais.

é essencial o desenvolvimento de técnicas de leitura que obrigatoriamente envolvam atividades de prétemas, levando sempre em conta o conhecimento anterior do aluno. Técnicas como pesquisa de vocabulário reforçam o aprendizado autônomo e significativo (PCN

Com essa sugestão em mente e, após verificar as críticas e dificuldades das professoras

participantes desta pesquisa, decidi solicita

seus alunos, as quais foram por mim criadas e que estão devidamente orientadas, podendo

aqui ser chamadas de atividades autoformativas. São assim denominadas porque visam, ao

mesmo tempo, instruir as profes

culturalmente sensível – preparando

alunos um trabalho interdisciplinar segundo o conceito

Ideia central.

Pode parecer muito simplificado, mas essa é uma possibilidade de

em língua estrangeira. É claro que existem estratégias para um aprofundamento da

interpretação textual, tais como a observação dos tópicos frasais dos parágrafos, o estud

estruturas que facilitam a compreensão da coesão textual, tais como os marcadores

discursivos ou os grupos nominais. No entanto, anteriormente a elas

essencial o desenvolvimento de técnicas de leitura que obrigatoriamente envolvam atividades de pré-leitura e de preparação prévia dos assuntos e dos temas, levando sempre em conta o conhecimento anterior do aluno. Técnicas como skimming e scanning do texto, levantamento de palavraspesquisa de vocabulário reforçam o aprendizado autônomo e significativo (PCN+, p.109).

em mente e, após verificar as críticas e dificuldades das professoras

participantes desta pesquisa, decidi solicitar que elas aplicassem determinadas atividades com

seus alunos, as quais foram por mim criadas e que estão devidamente orientadas, podendo

aqui ser chamadas de atividades autoformativas. São assim denominadas porque visam, ao

mesmo tempo, instruir as professoras no que diz respeito à aplicação do material de forma

preparando-as, pois, para serem “o exemplo” –

alunos um trabalho interdisciplinar segundo o conceito de Guilherme (2002)

Ideia central, compreensão

Dedução de vocàbulos pelo

contexto; associação de

ideias

Brainstorming, Conhecimento

prévio

Palavras cognatas,

transparentes, dicionário

essa é uma possibilidade de compreender um

. É claro que existem estratégias para um aprofundamento da

interpretação textual, tais como a observação dos tópicos frasais dos parágrafos, o estudo de

estruturas que facilitam a compreensão da coesão textual, tais como os marcadores

essencial o desenvolvimento de técnicas de leitura que obrigatoriamente leitura e de preparação prévia dos assuntos e dos

temas, levando sempre em conta o conhecimento anterior do aluno. Técnicas , levantamento de palavras-chave e

pesquisa de vocabulário reforçam o aprendizado autônomo e significativo

em mente e, após verificar as críticas e dificuldades das professoras

r que elas aplicassem determinadas atividades com

seus alunos, as quais foram por mim criadas e que estão devidamente orientadas, podendo

aqui ser chamadas de atividades autoformativas. São assim denominadas porque visam, ao

soras no que diz respeito à aplicação do material de forma

– e proporcionarem aos

de Guilherme (2002).

4.4.2 As atividades sugeridas Com o intuito de verificar em que medida os pressupostos teóricos do PCN+ podem ser,

de fato, aplicáveis na realidade de Isabelle, Ely e Raquel, propus que elas aplicassem com

seus alunos atividades por mim produzidas.

Enviei-lhes, por e-mail, duas opções de atividades autoformativas para que elas

escolhessem uma para aplicarem em suas salas de aula. Isabelle foi a única que escolheu a

atividade cujo tema é “racismo”; Ely e Raquel preferiram utilizar a atividade com o tema

“bullying”.

As atividades autoformativas, como já mencionado anteriormente, visam à reflexão do

professor diante dos conteúdos que deseja lecionar. Elas trazem sugestões de como proceder,

mas permitem que o professor faça adaptações a depender de seu desejo. A seção que traz

essas “orientações” foi intitulada “Teacher’s Zone”, já que é um espaço destinado ao

professor e não aparece no material dos alunos.

Apresentarei, agora, a Atividade 1 (Racismo), desmembrada em trechos e acompanhada

das seções direcionadas ao professor. A versão para o aluno encontra-se nos apêndices deste

trabalho. Ao final da compreensão textual, proponho que os alunos produzam textos, em

português, acerca do conteúdo do texto que acabaram de compreender.

Atividade 1 (Racism) – Brainstorming

Figura 8 – Brainstorming.

Racism

Atividade 1 (Racism) – Compreensão textual

Parte 1 (citação)

‘I want to move house. I’m mixed race and a gang of girls keep punching me and taking my money. Mum has contacted the council but nothing’s happened.’ Sylvia, 12

Teacher’s Zone

1º passo: Peça que o aluno faça um brainstorming acerca do assunto do texto e complete o diagrama (na página anterior). Brainstorming: ao pé da letra, “tempestade de ideias”. Essa técnica consiste em partir de uma palavra (no caso o título do texto – Racism) e imaginar outras que tenham relação com ela, que estejam no mesmo campo semântico. É uma estratégia de pré-leitura que facilita a compreensão do texto porque os alunos já imaginam o que encontrarão no texto mesmo antes de começarem a ler. Informar ao aluno que racism é uma palavra cognata, isto é, uma palavra que é semelhante à sua correspondente em português pelo fato de que sua origem é a mesma – do Latim – sofrendo apenas algumas alterações que não impedem sua compreensão. Dar outros exemplos, como dance, complete, future, actor etc.

Trabalhe com as partes do texto, para que o aluno perceba de maneira mais fácil a organização das ideias. Lembre-se sempre de pedir que eles façam as conexões

entre essas partes.

Teacher’s Zone

2º passo: - Peça aos alunos que observem quem escreveu essa parte do texto (Sylvia), que idade ela tem (12) e pergunte o que deve ter acontecido com ela, mesmo antes de começar a ler o trecho. - Peça que eles grifem as palavras cognatas (vide grifo no texto). Somente com essas palavras, peça que eles imaginem o que Sylvia está declarando. Você deve esperar respostas do tipo: “Sylvia é de raça misturada, teve uma gangue que demonstrou racismo contra ela e ela contatou alguém para pedir ajuda”. - Informe a eles que, com as palavras cognatas que eles têm, eles devem imaginar o que deve estar sendo dito, observando o contexto em que essas palavras se encontram (no caso, racismo). - Peça que os alunos se posicionem em relação ao que aconteceu com Sylvia. O que eles acham da situação? Já passaram por situação semelhante? Se sim, como se sentiram? Já foram racistas? Como acham que o “outro” se sentiu?

Parte 2 (1º parágrafo)

Racism is treating someone differently or unfairly simply because they belong to a different

race or culture. People can also experience prejudice because of their religion or nationality . One person can act in a racist way or a group of people or a community of people can be racist.

Parte 3 (2º parágrafo)

Racism can be expressed in many different ways. These can include: • being called names • being teased, insulted or threatened • being hit • having your bag, mobile phone or other possessions taken • being ignored or left out • being forced to do things you don’t want to do • having your things or home damaged

Teacher’s Zone 3º passo: Peça aos alunos que: - Grifem as palavras cognatas (vide grifo); - Façam uma primeira leitura do texto considerando apenas as palavras grifadas e tentem relatar o que compreenderam; - Complementem seu entendimento com a observação de palavras essenciais no glossário; - Anotem ao lado do parágrafo sua ideia central antes de irem ao próximo.

Teacher’s Zone 4º passo: Chame a atenção dos alunos para o layout do texto, isto é, a forma como ele é organizado. Neste trecho, a organização é em tópicos, o que demonstra uma listagem de coisas que se relacionam com a primeira oração. Peça aos alunos que: - Grifem as palavras cognatas (vide grifo); - Façam uma primeira leitura do texto considerando apenas as palavras grifadas e tentem relatar o que compreenderam; - Complementem seu entendimento com a observação de palavras essenciais no glossário; - Anotem ao lado do parágrafo sua ideia central antes de irem ao próximo.

Parte 4 (3º parágrafo)

Racism can have a terrible effect. Children and young people can become lonely, isolated, angry and depressed. They may lose self-confidence and become terrified of going to school or going out alone. To avoid racism, they may keep away from situations where racist behaviors occur and pretend to be ill or be scared to leave their house.

Apresento, a seguir, a proposta de produção de texto feita aos alunos:

Teacher’s Zone 5º passo: Chame a atenção dos alunos para a forma como adjetivo e substantivo se organizam na frase, falando da oposição entre a língua portuguesa (em que 1o vem o substantivo e depois o adjetivo) e a língua inglesa (na qual o adjetivo vem em 1o lugar). Para evidenciar essa diferença, utilize o grupo nominal (a) terrible effect (um efeito terrível), na primeira linha deste trecho. Após a compreensão desta oração - Racism can have a terrible effect. – pergunte aos alunos que efeitos terríveis eles imaginam que o racismo tem. Só após as respostas peça que eles confirmem o que disseram e/ou descubram novos efeitos negativos do racismo por meio da leitura do resto do trecho. Peça aos alunos que: - Grifem as palavras cognatas (vide grifo); - Façam uma primeira leitura do texto considerando apenas as palavras grifadas e tentem relatar o que compreenderam; - Complementem seu entendimento com a observação de palavras essenciais no glossário; - Anotem ao lado do parágrafo sua ideia central. Já que este é o último parágrafo, peça que os alunos reúnam as ideias deles e façam, oralmente, um resumo do que o texto trata. Em seguida, peça que eles preencham a tabela com as ideias principais de cada trecho, chegando ao resumo escrito no final. Na última parte, eles devem responder as seguintes perguntas, em forma de parágrafo: Essa pode ser uma atividade para casa.

Os alunos de Isabelle fizeram a atividade como tarefa para casa, entregando-a na aula

seguinte ao término do trabalho com o texto. Algumas dessas produções podem ser vistas em

anexo.

Escola: ___________________________________________________________________ Aluno(a): _________________________________ No: ____Série/Turma: ____________ Professora: _____________________________ Data: __________________

Atividade de Inglês

Escreva a ideia central de cada parágrafo do texto: 1º: ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 2º: ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 3º: ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Faça um resumo do texto, juntando as ideias centrais de cada parágrafo: ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Responda em forma de parágrafo:

E pra você, o que é racismo, quais consequências ele pode trazer e de que forma você pode evitá-lo? ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

No que diz respeito à Atividade 2 (

semelhantes, com exceção da produção que, em vez de individual como na Atividade 1, foi

sugerida em grupos.

Atividade 2 (Bullying

Figura 9 – Sugestões de características da situação de sofrer

Instructions and Pre-Reading (part 1):

• Organização da sala de aula: 07 grupos; tempo necessário: 2h/a• Cada grupo receberá um dos tópicos do texto “Bullying”; ao todo são 07 tópicos.• Brainstorming: ao pé da letra, “tempestade de ideias”. Essa técnica consiste em partir de

uma palavra (no caso o título do texto com ela, que estejam no mesmo campo semântico. É uma estratégia de préfacilita a compreensão do texto porque os alunos já imaginam o que encontrarão no texto mesmo antes de começarem a ler.Neste caso, outras expressões também facilitarão a antecipação do conteúdo textual. Portanto, antes de entregar os textos, trabalhar com todos opalavras/expressões:

o Bullying (retirar dos alunos o que eles já sabem, perguntando sobre reportagens que eles já tenham assistido, filmes que demonstrem a prática etc.);

o Bully: aquele que pratica o Bullied: aquele que sofre o To be bullied

Pre-Reading (part 2): • Entregar o texto de cada grupo, pedindo que eles completem o

palavras que caracterizem cada um dos “personagens”o O “bully”; o O “bullied”;o No campo “

eles se sentiriam se sofressem

No que diz respeito à Atividade 2 (Bullying – Apêndice D), os procedimentos foram

semelhantes, com exceção da produção que, em vez de individual como na Atividade 1, foi

Bullying)

Sugestões de características da situação de sofrer bullying.

Teacher’s Zone Reading (part 1):

Organização da sala de aula: 07 grupos; tempo necessário: 2h/a Cada grupo receberá um dos tópicos do texto “Bullying”; ao todo são 07 tópicos.

: ao pé da letra, “tempestade de ideias”. Essa técnica consiste em partir de uma palavra (no caso o título do texto – Bullying) e imaginar outras que tenham relação com ela, que estejam no mesmo campo semântico. É uma estratégia de pré

a compreensão do texto porque os alunos já imaginam o que encontrarão no texto mesmo antes de começarem a ler. Neste caso, outras expressões também facilitarão a antecipação do conteúdo textual. Portanto, antes de entregar os textos, trabalhar com todos os alunos com as seguintes palavras/expressões:

(retirar dos alunos o que eles já sabem, perguntando sobre reportagens que eles já tenham assistido, filmes que demonstrem a prática etc.);

: aquele que pratica bullying; : aquele que sofre bullying;

To be bullied: sofrer bullying.

Teacher’s Zone

Entregar o texto de cada grupo, pedindo que eles completem os gráficopalavras que caracterizem cada um dos “personagens” (conforme exemplos a seguir)

”;

No campo “to be bullied”, peça que eles coloquem palavras que indiquem como eles se sentiriam se sofressem bullying.

), os procedimentos foram

semelhantes, com exceção da produção que, em vez de individual como na Atividade 1, foi

Cada grupo receberá um dos tópicos do texto “Bullying”; ao todo são 07 tópicos. : ao pé da letra, “tempestade de ideias”. Essa técnica consiste em partir de

e imaginar outras que tenham relação com ela, que estejam no mesmo campo semântico. É uma estratégia de pré-leitura que

a compreensão do texto porque os alunos já imaginam o que encontrarão no texto

Neste caso, outras expressões também facilitarão a antecipação do conteúdo textual. s alunos com as seguintes

(retirar dos alunos o que eles já sabem, perguntando sobre reportagens que eles já tenham assistido, filmes que demonstrem a prática etc.);

gráficos, indicando 03 (conforme exemplos a seguir):

”, peça que eles coloquem palavras que indiquem como

Figura 10 – Sugestões de características de quem pratica

Figura 11 - Sugestões de características de quem sofre

As figuras sugeridas podem

a participação da turma como um todo. O papel do professor é estimular seus alunos a

fazerem relação dos termos com palavras que tenham relação com eles. Esse momento com o

grupo é muito importante, visto que já dá margem à discussão do tema.

Após a preparação dos alunos para o conteúdo do texto, podemos dar sequência ao

trabalho, agora em grupos.

Sugestões de características de quem pratica bullying.

Sugestões de características de quem sofre bullying.

s podem ser desenhadas no quadro sem os exemplos, o que facilitará

a participação da turma como um todo. O papel do professor é estimular seus alunos a

fazerem relação dos termos com palavras que tenham relação com eles. Esse momento com o

e, visto que já dá margem à discussão do tema.

Após a preparação dos alunos para o conteúdo do texto, podemos dar sequência ao

s no quadro sem os exemplos, o que facilitará

a participação da turma como um todo. O papel do professor é estimular seus alunos a

fazerem relação dos termos com palavras que tenham relação com eles. Esse momento com o

Após a preparação dos alunos para o conteúdo do texto, podemos dar sequência ao

É importante lembrar que estou trazendo aqui a atividade com sugestões direcionadas ao

professor, o que me permite incluir seções com a tradução dos trechos de cada grupo, para o

caso de ser necessária uma consulta. O vocabulário referente a cada trecho aparece tanto na

versão para o professor quanto naquela para o aluno, com o intuito de facilitar a compreensão.

É válido dizer que os alunos não são incentivados a utilizar o vocabulário para fazer uma

tradução do texto, mas sim orientados a aplicar as estratégias de leitura e retirar a ideia central

do trecho, tentando deduzir as palavras desconhecidas, e recorrendo ao vocabulário em último

caso.

Para ser apresentado às professoras, o texto “Bullying”47 foi fragmentado, sendo que

cada trecho foi pensado para ser compreendido por um grupo. Na versão do professor os

trechos vêm seguidos do vocabulário referente a eles e de sua tradução. Apresentarei, aqui,

apenas os tópicos do texto, mas a versão da atividade completa pode ser encontrada nos

apêndices deste trabalho.

1. What is bullying? Bullying is when someone keeps doing or saying things to have power over another person.

2. Why do some people bully? There are a lot of reasons why some people bully.

3. Why are some young people bullied? 4. Why is bullying harmful? 5. What can you do if you are being bullied? 6. What can you do if you see someone else being bullied? 7. Are you a bully?

47 Texto Modificado. Disponível em: <http://www.police.govt.nz/service/yes/nobully/whats_bullying.html>. Acesso em: 12 dez. 2009.

Teacher’s Zone • Em seguida, cada grupo deverá iniciar seu trabalho individualmente. • Explique que o objetivo da atividade é elaborar um folder informativo/educativo para

conscientização dos alunos da escola contra o bullying; cada grupo será responsável por um dos oito itens do folder, o qual será concluído no final da aula, juntando as partes de cada grupo. Nesse momento, alunos voluntários irão escrever os tópicos no folder, com a ajuda dos colegas, bem como ilustrá-lo da forma que julgarem adequada. Para isso, você deve entregar à turma um papel em branco, tamanho A4, dobrado em formato de folder.

• Pedir que utilizem a seção de vocabulário para compreender palavras cujo significado não conheçam. Lembrar-lhes, no entanto, que, após olhar o significado, é preciso adequá-lo ao contexto, conjugando um verbo quando necessário, colocando o substantivo no masculino/feminino ou plural, por exemplo.

• Explicar que os alunos devem compreender o trecho, discutindo em grupo, e depois escrever nas linhas o “texto final” para colocar no folder. Lembrar-lhes que o objetivo é informar, conscientizar, o que exige um texto escrito dentro das características desse gênero textual. Sugerir o uso de verbos no imperativo e a manutenção dos tópicos.

• Lembrar-lhes de que não é necessário utilizar as palavras do texto exatamente; eles podem utilizar suas palavras desde que o texto sirva de fonte de informação para a produção do folder. Incentive-os a usarem a criatividade!

Se cada grupo ficará responsável pela compreensão de um desses itens, sendo que as

ideias centrais retiradas de cada trecho serão reunidas por toda a sala para a confecção de um

folder, então o objetivo de utilizar a leitura em língua inglesa para discutir aspectos que

influenciam a comunidade da qual os alunos fazem parte será alcançado.

No momento de reunir as ideias, os alunos o farão em sequência, exatamente para que

tenham a compreensão do texto estruturado. Primeiro entenderão a definição de bullying,

depois compreenderão que há muitas razões para que as pessoas pratiquem e sofram bullying;

perceberão também o quão prejudicial é a prática em questão e aprenderão a como se

comportarem se sofrerem ou virem alguém sofrendo bullying; e o mais importante: no último

item são convidados a refletir se praticam (ou já praticaram) bullying contra alguém.

Após compreendida a sequência do texto, os alunos terão que decidir a respeito de que

frases devem utilizar no gênero textual “folder”. Conforme já indicado nas “orientações”

direcionadas às professoras, aconselha-se a utilização de frases imperativas, com o objetivo de

persuadir o leitor.

Com o folder pronto, sugiro que sejam tiradas cópias para serem distribuídas pela escola

ou, ainda, se o professor preferir, que se faça uma edição do folder, utilizando todo o

conteúdo sugerido pelos alunos, para que ele fique mais apresentável para distribuição, visto

que os alunos confeccionarão o material em sala, sem nenhum auxílio digital.

A distribuição do material para outros alunos da comunidade escolar fechará com chave

de ouro o trabalho, fazendo valer o papel do intelectual transformador que, por meio de seu

trabalho, possibilitará que seus alunos também sejam intelectuais transformadores da

realidade à sua volta.

4.4.3 Relato da experimentação da pesquisadora

Foi a partir da aplicação dessas atividades com alunos meus que comecei a me

questionar de que forma elas se desenvolveriam em outros contextos. Sabemos que a

realidade do Instituto Federal da Bahia, onde trabalho, ainda que esteja longe de ser

satisfatória, é mais privilegiada do que a das escolas estaduais e municipais. Daí a

curiosidade: as reações dos alunos serão parecidas? Os folders serão de fácil compreensão?

Os textos produzidos atingirão seus objetivos? A proposta de uma atividade que tenha o fim

de conscientizar (e não necessariamente de treinar aspectos gramaticais) será bem aceita por

professoras e alunos?

Quando desenvolvi as atividades, pensei na realidade de meus alunos: moradores de

Valença-BA e redondezas; oriundos de diversas classes sociais, mas de maioria média-baixa;

descrentes no ensino de língua inglesa devido às experiência negativas que já tinham

vivenciado; mas dispostos a tentarem aprender de uma forma diferente (como eu prometi no

primeiro dia de aula).

Pelo fato de ter percebido, entre os alunos, diversas reações preconceituosas e

desrespeitosas, resolvi trazer textos que lhes fizessem lidar com as questões sobre as quais

deveriam refletir: racismo e bullying. Ambas as atividades foram aplicadas na 3ª unidade, com

alunos do 1º ano do Ensino Integrado (médio e técnico). Os alunos, portanto, já tinham

conhecimento de várias estratégias de leitura, vocabulário e algumas estruturas linguísticas, o

que permitiu um maior entendimento dos textos.

A Atividade 1 (Racismo) rendeu discussões que passaram por Martin Luther King Jr.

e Rosa Parks, tendo os alunos se interessado bastante pela condição de segregação em que os

negros viviam nos Estados Unidos por volta da década de 60. Foi um momento oportuno para

fazê-los refletir acerca do “término” da segregação racial: realmente acabou? Acontece

somente nos Estados Unidos? Que outros tipos de segregação você vivencia?

Ao término da compreensão textual, feita por meio da aplicação de estratégias de

leitura, os alunos produziram seus textos e posicionaram-se criticamente. Recorto, aqui, cinco

trechos, nos quais eles falaram sobre vários aspectos:

Hoje em dia, em nossa realidade, não existe esta lei: segregação, mas existe ainda uma divisão racial. No Brasil então, o preconceito é muito forte. Quando há uma vaga para emprego na maioria das vezes sempre o branco tem mais chances. (Aluno 1) [...] não podemos terminar com o racismo, mas sim evitá-lo o máximo que possível. Se cada um fazer sua parte, principalmente o governo começando na educação e leis mais duras. (Aluno 2) Para vencer o preconceito é preciso muita coragem e acreditar, antes de tudo, em si mesmo. Saber que todos nós somos capazes de alcançar o que queremos. (Aluno 3) Muitas pessoas ainda são excluídas de algum modo no meio onde vivem. Isso por serem diferentes dos “padrões exigidos” [...]. (Aluno 4) É importante que desde cedo a criança aprenda, na escola e em casa, que todas as pessoas devem ser aceitas independentemente da cor, religião e etc. (Aluno 5)

Esses adolescentes percebem, portanto, que a segregação existe, ainda que não

institucionalizada, gerando dificuldades para os negros na hora de conseguir um emprego, por

exemplo. Sentem a necessidade da elaboração de leis que favoreçam às pessoas que são

discriminadas por sua raça, e desejam que a educação doméstica e escolar permita

desconstruir os “padrões exigidos”, o que pode levar o indivíduo a acreditar em si mesmo,

ainda que o preconceito exista.

Pode-se perceber que o trabalho com o texto em língua inglesa levou esses alunos a

refletirem sobre a discriminação racial, um problema que aflige sua comunidade. Mais do que

uma simples tradução ou memorização de vocabulário e estruturas gramaticais, a abordagem

que se deu à leitura permitiu um posicionamento crítico diante da realidade que os cerca.

Não quero com isso dizer que o estudo lexical e estrutural devem ser deixados de lado;

selecionar palavras presentes no texto que tenham uma ligação direta com seu conteúdo é uma

forma interessante de acrescentar vocabulário ao conhecimento dos alunos. Fazê-los perceber,

por exemplo, que os verbos modais can e may, no 3º parágrafo do texto “Racism”, indicam

possibilidade é utilizar a gramática a favor do entendimento do texto. Dessa forma, não

estamos abdicando de conhecimentos lexicais e linguísticos, mas utilizando-os como degraus

para chegar ao topo – a compreensão textual.

No que diz respeito à Atividade 2, procedi conforme as instruções na versão destinada

às professoras. Os estudantes demonstraram alguma dificuldade na compreensão, mas, após

aplicarem as estratégias de leitura, recorreram ao vocabulário para eles disponibilizado. O

trabalho foi desenvolvido com três turmas, as quais produziram, em grupos, um folder cada.

Os alunos puderam levar os folders para casa para fazerem uma edição e me entregarem na

aula seguinte. Os resultados deste trabalho podem ser vistos em anexo.

Com o objetivo de retornar esses resultados à comunidade, foram tiradas cópias dos

três folders por eles produzidos, e grupos de alunos os distribuíram entre os colegas da escola.

O trabalho de conscientização, pois, concluiu o trabalho sobre bullying.

No momento da proposta das duas atividades, talvez por já estarem acostumados ao

tipo de trabalho com leitura e posicionamento crítico, os alunos se demonstraram interessados

em desenvolvê-las, ainda que alguns deles dissessem que não conseguiriam ler os textos, o

que é uma estratégia de defesa muito comum usada pelos alunos que têm medo de fracassar

na compreensão textual. É algo do tipo: “se eu não conseguir, já avisei que tenho

dificuldade”.

Ao final, no entanto, os alunos se mostraram contentes com os textos que produziram

sobre racismo e, principalmente, orgulhosos de terem produzidos os folders sobre bullying

para serem distribuídos pela escola. Devo dizer que também fiquei muito satisfeita com o

trabalho deles; sensação de dever cumprido.

4.4.4 Relato da experimentação das professoras participantes da pesquisa

Após aplicarem as atividades, as professoras Isabelle, Ely e Raquel responderam um

questionário cujas questões indagavam sua opinião com relação ao desenvolvimento da

atividade que aplicaram. Elas falaram sobre as reações dos alunos e os efeitos das sugestões

em sua prática.

Os questionamentos e as respostas virão a seguir, divididos em duas partes. A primeira

delas diz respeito à opinião dos alunos (4 primeiras questões); a segunda refere-se às

impressões das professoras (6 últimas questões). Nas perguntas objetivas, comentários extras

foram bem-vindos, mas nem todas as professoras complementaram as respostas.

As perguntas relativas à opinião dos estudantes surgiram a partir do momento que

apliquei as atividades com os meus alunos, quando pude observar suas reações. Surgiu então a

inquietação com relação a como reagiriam outros alunos, em outros contextos. Com relação às

professoras, a ideia era verificar em que medida uma atividade autoformativa pode contribuir

para o trabalho com leitura de forma culturalmente sensível. Veja as perguntas, as opções de

respostas e a escolha das professoras a seguir:

1. Qual a reação inicial dos seus alunos quando você propôs a atividade?

a) Ok! Vamos fazer.

b) Eu não sei ler em português, quanto mais em inglês.

c) Não quero fazer.

d) Outra (qual?).

Isabelle. Outra: inicialmente fizeram aquela barulheira, mas se dispuseram a fazer tão logo foi explicado. Ely. Ok! Vamos fazer.

Raquel. Eu não sei ler em português, quanto mais em inglês. A reação de insegurança acontece em todas as séries. Sempre dizem que não sabem. Mas no decorrer das aulas os alunos se empenham.

2. Após a primeira reação dos alunos, como foi o envolvimento deles para a

realização da atividade?

a) Satisfatório. Participaram ativamente, esforçando-se para superar as dificuldades e

seguindo as orientações.

b) Insatisfatório. Ficaram dispersos e não seguiram as orientações.

c) Outra (qual?).

Isabelle. Satisfatório. Participaram ativamente, esforçando-se para superar as dificuldades e seguindo as orientações. Ely. Satisfatório. Na verdade, essa turma em particular, sempre se envolve e gosta desse tipo de atividade. A dificuldade é na hora de montar os grupos, pois tem a questão das afinidades. Raquel. Satisfatório. Participaram ativamente, esforçando-se para superar as dificuldades e seguindo as orientações. Eu escolhi o 1º ano porque eles estão com todo gás. Gostam dos desafios, alcançar metas, e também por causa do tema transversal, qualidade de vida.

3.Qual o interesse demonstrado por seus alunos diante do tema da atividade

proposta?

a) Achei relevante/interessante/importante.

b) Pra quê isso?

c) E a gramática vai ser o quê, professora?

d) Outros (quais?).

Isabelle. Achei relevante/interessante/importante. Ely. Achei relevante/interessante/importante. Quando o tema foi lançado a atenção deles foi logo despertada, porque, segundo eles, havia passado uma reportagem recentemente na TV. Raquel. Achei relevante/interessante/importante. Gostaram bastante porque acontece no cotidiano deles.

4.Os alunos ficaram satisfeitos com suas produções?

a) Sim. Gostaram do resultado final da atividade.

b) Não.

c) Não emitiram opinião.

d) Outros (quais?).

Isabelle. Sim. Gostaram do resultado final da atividade. Ely. Sim. Gostaram do resultado final da atividade. Mas houve um contratempo na hora de montar o folder final. Um dos grupos divergiu quanto à língua em que seriam escritas as frases e preferiu fazer o seu próprio folder. em separado do resto da turma. Fora isso, eles adoraram a produção.

Raquel. Sim. Gostaram do resultado final da atividade. Os alunos ficaram maravilhados com suas próprias produções que nem acreditavam que foram eles mesmos que fizeram.

Podemos perceber que as posturas foram diversas no momento da proposta da atividade,

variando da célebre frase “eu não sei português, quanto mais inglês” até a concordância

imediata com a proposta. Apesar de estarmos tratando de reações de turmas diferentes, eu

posso perceber todas elas em uma única turma quando proponho um trabalho desse tipo.

Ainda que poucos demonstrem resistência ou demorem a se concentrar, essas reações existem

e são o nosso desafio de cada dia. Acredito que Isabelle, Ely e Raquel tenham aqui relatado a

reação da maioria do grupo.

Passado o primeiro momento, as professoras relatam que houve um envolvimento

satisfatório por parte dos estudantes, os quais declaram que o assunto tratado na atividade foi

relevante, fazendo referência, inclusive, à atualidade do tema e sua recorrência em seu

cotidiano. Isso se comprova quando os alunos declaram que ficaram satisfeitos – e até

surpresos – com suas produções e, principalmente, quando vemos seus trabalhos (em anexo).

Agora observaremos as questões referentes às impressões das professoras.

5. A atividade teve sucesso? Seus objetivos foram alcançados?

a) Sim.

b) Não.

c) Em parte. (Explique)

Isabelle. Sim. Ely. Sim. Raquel. Sim. O objetivo principal foi conscientizar sobre a qualidade de vida sem o bullying.

6. As orientações direcionadas ao professor lhe ajudaram na execução na

atividade?

a) Sim. (De que forma?)

b) Não. (Por que não?)

c) Em parte. (Explique)

Isabelle. Sim. O roteiro especificou as etapas adequadas para a realização da atividade. Ely. Sim. Principalmente no desenvolvimento da atividade. Às vezes, nós deixamos de lado a esquematização da aula e acabamos pulando, invertendo ou até mesmo atropelando a sequência correta da aula.

Raquel. Sim. Porque eles confiam no ponto de vista dos professores sobre o assunto.

As professoras dizem que a atividade teve sucesso e as orientações tiveram utilidade

para o desenvolvimento da aula. Devo deixar claro, contudo, que a atividade autoformativa

tem como objetivo sugerir formas de trabalho e munir o professor de conhecimentos que, por

ventura, venham a lhe faltar. É válido notar que Ely afirma que há uma “sequência correta da

aula”; fico feliz que as minhas sugestões tenham funcionado com seus alunos e que ela tenha

tido um resultado satisfatório, mas é preciso ter cuidado para não visualizar os materiais

didáticos como um manual, uma espécie de Bíblia pedagógica. É claro que as atividades que

sugeri foram pensadas para a realidade com a qual as agentes desta pesquisa trabalham. Os

livros didáticos, no entanto, são feitos para um público amplo, fazendo com que caiba a nós,

professores, a escolha dos melhores textos e exercícios a serem desenvolvidos com nossos

alunos, de forma que o material aplicado seja significativo em sua realidade.

7. Caso não houvesse orientações na atividade proposta para aplicação, você a

teria aplicado da mesma forma?

a) Sim. (Por quê?)

b) Não. (De que forma faria? Explique.

Isabelle. Sim. É interessante ressaltar que atividades como estas já são realizadas com os alunos seguindo as etapas indicadas no roteiro. Ely. Sim. Eu teria aplicado porque o tema está bastante atual, eu já o vinha buscando na Net há um certo tempo. Mas provavelmente, a aula não teria a mesma dinâmica. E eu não teria pensado num folder, talvez um texto, algumas frases. A idéia do folder foi ótima porque, segundo eles, nunca havia feito algo parecido. Raquel. Não. Geralmente não alcançam os objetivos porque tomam várias direções, causando movimentos aleatórios na aprendizagem.48

8.Você adquiriu algum conhecimento com a aplicação da atividade? Se sim,

qual(is)?

Isabelle. A realização de atividades com os estudantes sempre agrega conhecimento ao professor. Ely. Claro. Como já comentei, a idéia do folder foi algo novo tanto para os alunos quanto para mim. Também nunca havia pensado em trabalhar um tema assim, apresentando-o em pequenos textos.

48 Raquel parece não ter compreendido a pergunta, visto que esta resposta destoa das outras dadas ao longo do questionário.

Raquel. Sim, a solidariedade entre eles, inclusive notei que os mais velhos adotam os mais novos. Novos no sentido de pouca experiência de vida.

9.Você acredita, através da aplicação da atividade e desenvolvimento das

discussões nela propostas, ter contribuído, de alguma forma, para o desenvolvimento do

pensamento crítico em seus alunos? Explique.

Isabelle. Sim, verificou-se a compreensão do texto. Nós já trabalhamos com estratégias de leitura com estes estudantes. Tal fato faz parte da rotina dos mesmos e tem ajudado-os para a realização de diversos exames, como por exemplo, o ENEM. Ely. Acredito que sim. Eles tiveram que discutir, apresentar seus argumentos, defendê-los e, às vezes, abrir mão deles em prol de um resultado comum e isso é uma forma de crescimento pessoal. Raquel. Sim, aperfeiçoaram mais o jeito de fazer críticas sem ofensas. E isso era um problema na turma do 1º ano A.

É preciso deixar claro que “desenvolvimento do pensamento crítico” vai além da

compreensão textual (citada por Isabelle); ela é o primeiro passo para desencadear discussões,

de onde surgirão os argumentos e as críticas mencionadas por Ely e Raquel, respectivamente.

Ainda que o trabalho com estratégias e leitura favoreça um posicionamento crítico do

aluno, este fim só será, de fato, alcançado, se a escolha dos textos a serem trabalhados for

feita de forma crítica e culturalmente sensível por parte do professor, o que possibilitará

discussões com os alunos acerca de assuntos que sejam relevantes para sua formação

enquanto cidadãos, podendo resultar em estudantes com capacidade de argumentação e

respeitosos em relação à alteridade.

10. O passo-a-passo para a aplicação das estratégias de leitura e compreensão

textual funcionou de forma eficaz? Por quê (sim/não)?49

Ely. Sim. Porque as declarações dadas após o término da atividade demonstraram o alto grau de entendimento do texto. Inclusive numa das turmas me foi relatado um caso de “Bullying” que está acontecendo com a filha de uma das alunas. Segundo ela, sua filha vem sofrendo esse tipo de violência na escolinha onde estuda. O problema é que o Bully é a própria professora da garota e ela, a mãe, diz que vai acabar agredindo a professora “mais dia menos dia”, segundo suas próprias palavras. E os outros alunos apoiaram e inferiram nos depoimentos dessa aluna. Raquel. Sim, com muita eficiência, no sentido de elevar a auto-estima para enfrentar os problemas da vida. Exemplo de João50, que é gay e se abriu bastante para os colegas, melhorando seu desempenho.

49 Isabelle não respondeu esta questão. 50 Nome fictício; utilizado para preservar a identidade do aluno.

Os casos relatados por Ely e Raquel ilustram a sala de aula como espaço para discussão

de temas significativos na vida dos alunos. Nesse momento, podemos aproveitar para

interferir, deixá-los com uma interrogação em suas mentes, a fim de que reflitam sofre seus

atos, sua forma de pensar. Será que a atitude mais acertada da mãe cuja filha está sofrendo

bullying é mesmo agredir a professora que é o bully da história?

O caso de João, relatado por Raquel, é bastante interessante. Ele parece ter se utilizado

do momento para externar emoções que parecem lhe machucar muito. Veja o texto que ele

escreveu:

Oi, tenho 16 anos, não aceito o bullying na minha escola e nem em outro lugar. O bullying é um mal que mais faz mal. Por quê? Porque eu sou gay, muita gente me discrimina por uma opção sexual minha, na escola e em casa. Em casa não tenho pra onde correr porque a minha família é uma das primeiras a colocar a palavra bullying dentro de casa, sem notar que elas são a minha família, elas têm que nos amar do jeito que somos.

É notório observar que Raquel, que defendera na entrevista o conteúdo gramatical como

base do planejamento da aula, afirmou ser a conscientização o objetivo principal dessa

atividade (vide resposta da questão 5). Ela havia dito: “a estrutura linguística que é a primeira

de todas, senão ele não vai ter uma visão do que ele está aprendendo”. A teoria de Raquel

parece ter ido por água abaixo, já que seus alunos, segundo ela, “aperfeiçoaram mais o jeito

de fazer críticas sem ofensas” e foram capazes de “elevar a auto-estima para enfrentar os

problemas da vida”. Portanto, não foi a gramática que determinou a visão do que o aluno

estava aprendendo; a mudança de atitude, sim, configurou a aprendizagem, a qual foi além de

palavras soltas e estruturas linguísticas descontextualizadas. Os alunos tiveram, de fato, uma

aula culturalmente sensível.

O mesmo aconteceu com Isabelle e Ely; apesar de terem dado a entender, na entrevista,

que ainda partem dos conteúdos léxico-gramaticais para planejar uma aula, saíram-se muito

bem no desenvolvimento das atividades sob uma perspectiva crítica intercultural.

Então, eu me pergunto: será que o que nos falta é conhecimento das pedagogias críticas

e culturalmente sensíveis? Será que não sabemos como utilizá-las como via principal na

elaboração de nossas aulas? O desenrolar desta pesquisa parece nos mostrar que os

pressupostos teóricos lá no PCN+ têm, de fato, fundamento. É mais provável que o que nos

impeça de fazer um trabalho crítico seja a zona de conforto na qual ainda nos encontramos: é

mais fácil ensinar gramática e vocabulário por diversas vezes descontextualizados, sem

qualquer preocupação política e social. O problema é que isso não garante o aprendizado

significativo, fato que se torna óbvio quando assumimos uma turma recém-chegada de uma

abordagem unicamente conteudista da disciplina: estruturas esquecidas, muitos vocábulos

corriqueiros desconhecidos, e pouca ou nenhuma consciência da função das palavras como

parte de um todo coeso. A compreensão textual e uma leitura interativa ficam a desejar, da

mesma forma que é deixado de lado o posicionamento crítico. Precisamos mudar esta

situação!

5 ANALISAR, INTERPRETAR, COMPREENDER E APLICAR 51

Nesta pesquisa, almejei “propor atividades construídas sob uma perspectiva crítica e

culturalmente sensível para o ensino de leitura em Língua Inglesa e verificar o resultado de

sua aplicação nas turmas do Ensino Médio das professoras agentes desta pesquisa”,

observando os resultados da utilização de uma abordagem crítica e culturalmente sensível

para o ensino/aprendizagem de leitura em Língua Inglesa nesse contexto.

Um primeiro passo foi concordar que

se se quiser definir o aprendiz da primeira década do século XXI com uma palavra, como o fez Larsen-Freeman em relação às crenças, penso que a característica principal desse aprendiz seria: textual. Os saberes contemporâneos como a linguística textual, análise do discurso, pragmática, pedagogia crítica, com base no método Paulo Freire, os estudos de tradução e outros baseiam-se na noção ampla de textualidade como um fator decisivo na construção dos significados. Assim, fora do texto – e do contexto – não existe significado possível. Hoje, somente quem é capaz de ler o texto no seu sentido mais abrangente, atingindo o nível do discurso, com todas as suas implicações linguísticas, estéticas, socioculturais e políticas, será considerado alfabetizado (ou letrado). O ensino de línguas estrangeiras, atualmente, lida com metas ambiciosas como esta: capacitar o aprendiz a ler e a compreender criticamente os textos (de diferentes tipos e gêneros, por meio de diferentes modos/canais, como oral, escrito, em jornais, rádio, televisão, em mais de um registro linguístico, como o literário, o científico etc.). (LIMA, 2009, p.48)

Nessa mesma linha, são quatro os saberes propostos pela Unesco (Organização das

Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), os quais funcionam como pilares da

educação nas sociedades contemporâneas: aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender a

viver com os outros; aprender a ser (PCN+, p.23).

Estes quatro saberes, portanto, devem ser desenvolvidos ao longo do trabalho feito em

sala com língua inglesa. Byram; Gribkova & Starkey (2009, p. 7-9) descrevem esses saberes e

a eles acrescentam um quinto. O primeiro deles, savoir (aprender a conhecer), é a obtenção da

informação propriamente dita; ou “o conhecimento de grupos sociais, seus produtos e práticas

no seu próprio país e no do interlocutor, e dos processos gerais de interação individual e

social52”.

51 Adaptado de MOITA LOPES, L.P. da; ROJO, R. (2004, p. 19). 52 (The knowledge) of social groups and their products and practices in one’s own and in one’s interlocutor’s country, and of the general processes of societal and individual interaction. (BYRAM; GRIBKOVA; STARKEY, 2009, p.8). Tradução livre.

Savoir faire (aprender a fazer) diz respeito ao desenvolvimento do comportamento,

isto é, “a habilidade de adquirir conhecimento sobre uma cultura ou práticas culturais e a

habilidade de operar conhecimentos, atitudes e habilidades diante das restrições de

comunicação e interação em tempo real53”.

Savoir apprendre/comprendre (aprender a viver com os outros) é a descoberta de

explicações, ou, em outras palavras, “a habilidade de interpretar um documento ou evento de

uma outra cultura, explicá-lo e relacioná-lo a documentos e eventos de sua própria cultura54”.

Savoir étre (aprender a ser), talvez o mais desafiador dos saberes, é a análise crítica da

própria cultura e da do outro, abandonando atitudes etnocêntricas. Trata-se de demonstrar

“curiosidade e abertura, prontidão para abolir a descrença sobre outras culturas e crença na

sua própria55”. Considero este o mais desafiador dos saberes com base em Byram, Gribkova e

Starkey (2009, p. 7), que dizem que assumir essa atitude de abertura “significa ter um desejo

de relativizar os valores, crenças e comportamentos próprios, não os assumindo como os

únicos possíveis e naturalmente corretos, e ser capaz de enxergar como se pode olhar de uma

perspectiva de observador que tem um conjunto diferente de valores, crenças e

comportamentos. A isso se chama habilidade de ‘descentralizar’”.

Eles acrescentam ainda um quinto saber, savoir s’engager, isto é, uma “habilidade de

avaliar, criticamente e com base em critérios específicos, perspectivas, práticas e produtos em

sua própria cultura e país, bem como na cultura e país do outro56”.

O desafio está lançado: por meio do trabalho com a leitura de textos dos mais variados

gêneros em Língua Inglesa, proporcionar a interseção entre os saberes. Formar, portanto, um

aluno que saiba obter informações e dar destino a elas; interagir com os acontecimentos e

compreendê-los ainda que fujam à sua realidade mais imediata; passear por caminhos

diferentes daqueles que já lhe tenham sido impostos como “únicos” e “corretos”. Isso é ser

um cidadão do mundo, consciente da necessidade de relativizar situações a depender do

contexto em que elas ocorram. É valorizar o outro sem desvalorizar a si próprio; é saber

53 (The) ability to acquire new knowledge of a culture and cultural practices and the ability to operate knowledge, attitudes and skills under the constraints of real-time communication and interaction. (BYRAM; GRIBKOVA; STARKEY, 2009, p.8). Tradução livre. 54 (The) ability to interpret a document or event from another culture, to explain it and relate it to documents or events from one’s own. (BYRAM; GRIBKOVA; STARKEY, 2009, p.8). Tradução livre. 55 Curiosity and openness, readiness to suspend disbelief about other cultures and belief about one’s own. (BYRAM; GRIBKOVA; STARKEY, 2009, p.7). Tradução livre. 56 An ability to evaluate, critically and on the basis of explicit criteria, perspectives, practices and products in one’s own and other cultures and countries. (BYRAM; GRIBKOVA; STARKEY, 2009, p.9). Tradução livre.

conviver em paz, de maneira respeitosa. A sala de aula pode – e deve – ser um espaço para

que se desenvolva esse pensamento.

Temos traçado, portanto, o perfil do aluno-leitor que queremos: proficiente, crítico,

reflexivo, curioso, autônomo e transformador. Aspiração um tanto ousada, não?

Talvez. Mas foi diante dessa meta que surgiu a principal questão motivadora desta

investigação:

- De que forma atividades construídas na perspectiva das pedagogias críticas e

culturalmente sensíveis, seguindo, portanto, os princípios e orientações apresentados

pelo PCN+, podem contribuir para o ensino de leitura em Língua Inglesa e,

concomitantemente, para a formação de alunos-cidadãos, capazes de se posicionarem

criticamente diante da realidade que vivenciam?

Retomemos, então, o que diz o PCN+:

Podemos perceber, claramente, o foco no desenvolvimento da leitura de forma

culturalmente sensível...

Precisamos concordar, portanto, que

os PCNs constituem um grande avanço para o ensino/aprendizagem de leitura e produção de textos na educação básica (nível fundamental e médio) por proporem uma metodologia de enfoque enunciativo-discursivo a ser desenvolvida nas salas de aula. Por consequência, quebram a concepção de ensino tradicional de língua materna de feitio normativo e conceitual. (COSTA, 2001, p.67)

E não só de língua materna; o PCN+ de língua estrangeira deixa clara a necessidade de

que os alunos desenvolvam diversas competências e habilidades que vão além do estudo de

estratégias de leitura, vocabulário e estruturas gramaticais; a isso é preciso atrelar o

aprendizado significativo, o qual se dá a partir do momento em que a compreensão dos textos

em Língua Inglesa permite a reflexão sobre aspectos culturais diversos, incluindo as

diferentes identidades às quais somos expostos diariamente. A leitura deve nos permitir o

passeio pelas relações socioculturais de maneira harmoniosa, respeitosa e vantajosa, no

sentido de que nos habilita a transitar em diversos ambientes sem que nos sintamos superiores

ou inferiores aos demais só porque não comungam de nossos usos e costumes. Vejamos

algumas habilidades e competências propostas no documento oficial:

• Analisar e interpretar no contexto de interlocução; • Reconhecer recursos expressivos das linguagens; • Identificar manifestações culturais no eixo temporal, reconhecendo momentos de tradição e de ruptura • Emitir juízo crítico sobre as manifestações culturais • Identificar-se como usuário e interlocutor de linguagens que estruturam uma identidade cultural própria

• Analisar metalingüisticamente as diversas linguagens • Aplicar tecnologias da informação em situações relevantes

(PCN+, p.99-100)

A partir da análise do documento percebemos que a aula de Língua Inglesa deve

ultrapassar a fronteira gramatical – sem deixar de passar por ela, o que fica claro quando se

menciona a metalinguagem como uma das habilidades a ser desenvolvida. No entanto, ela

deve apenas servir como ponte para a compreensão textual, o que nos levará a ter acesso, por

exemplo, às diversas informações que podem nos ser oferecidas na Internet.

O “portal” das interações culturais também será aberto, mas não para o simples

conhecimento de estereótipos que caracterizam os povos que habitam o planeta. O trabalho

com a cultura é global e, ao mesmo tempo, local; em outras palavras, precisamos verificar a

influência que as interações intermunicipais, interestaduais e internacionais têm sobre as

nossas vidas, mas sem esquecermos que os nossos familiares, amigos e integrantes de nossa

comunidade configuram as interações mais diretas e que merecem ainda mais cuidado para

que vivamos de forma harmoniosa.

Mas de que serve todo esse discurso?

Nesta investigação, por exemplo, verifiquei que as docentes presenciam diversos

problemas sociais, entre eles a violência verbal e física, frutos de uma educação doméstica

falha, do meio em que vivem os alunos e, evidentemente, dos problemas socioeconômicos

que afligem as camadas mais carentes da nossa sociedade. O nosso papel é fazer da sala de

aula, ao menos, um local em que predomine o respeito e a tolerância, com vistas à

transformação do aluno para que este seja um multiplicador de atitudes positivas e

respeitosas. Dessa forma, estaremos cumprindo com o nosso objetivo de, por meio do estudo

de textos em língua estrangeira, perpassando por estruturas e vocabulário, atingir a

conscientização dos seres humanos com os quais lidamos rotineiramente.

Também é pertinente a afirmação de Costa (2001, p.67) quanto ao PCN+:

As sugestões metodológicas que perpassam suas páginas se inspiram no sociointeracionismo, na teoria enunciativa e na linguística textual, cujos enfoques teóricos dirigem o ensino da lingua(gem) para seu uso e funcionamento discursivos, enquanto sistema semiótico e simbólico, contextualizado e determinado sócio-historicamente.” (COSTA, 2001, p.67)

Mas será que o ensino da linguagem é utilizado, de fato, de forma discursiva e

contextualizada? A partir deste questionamento, afirmo que a pergunta de pesquisa central

citada anteriormente ainda permitiu alguns desdobramentos:

- De que modo os princípios e orientações apresentados pelos documentos oficiais

(PCN+) para língua inglesa estão presentes na sala de

pesquisa?

Após a triangulação dos dados gerados a partir da aplicação dos questionários e

realização das entrevistas, apresento a figura a seguir, que ilustra a disparidade entre a

situação “ideal” descrita nos documentos

agentes de pesquisa:

Figura 12 – Ideal X real.

Lima (2009, p.49) diz que

no estudo do texto, todos os recursos são válidos e podem ser acionados simultaneamente, isto é, na mesma aula: as questões lexicmorfológicos e sintáticos, os aspectos fonológicos (mesmo que o foco da aula seja a compreensão do texto escrito, importa muito a pronúncia das palavras) e os conteúdos culturais (LIMA, 2009, p.49).

Mas é muito forte a “raiz estrutural”

a tradução ainda pesam mais na balança. A consciência de que trabalhar de forma crítica e

culturalmente sensível facilitará a formação do aluno cidadão existe; no entanto, mesmo que

tenhamos nos livrado do cachimbo, a boca continua torta. Portanto, os pressupostos teóricos

do PCN+ estão mais presentes no ideal do que na realidade da sala de aula de língua inglesa.

É o que acontece com as nossas agentes de pesquisa: posicionam

aos pressupostos teóricos fundamentados nos princípios da interculturalidade e das

De que modo os princípios e orientações apresentados pelos documentos oficiais

(PCN+) para língua inglesa estão presentes na sala de aula das professoras agentes desta

Após a triangulação dos dados gerados a partir da aplicação dos questionários e

realização das entrevistas, apresento a figura a seguir, que ilustra a disparidade entre a

situação “ideal” descrita nos documentos oficiais e a realidade da sala de aula de nossas

Ideal X real.

Lima (2009, p.49) diz que

no estudo do texto, todos os recursos são válidos e podem ser acionados simultaneamente, isto é, na mesma aula: as questões lexicmorfológicos e sintáticos, os aspectos fonológicos (mesmo que o foco da aula seja a compreensão do texto escrito, importa muito a pronúncia das palavras) e os conteúdos culturais (LIMA, 2009, p.49).

Mas é muito forte a “raiz estrutural” no ensino de línguas. A gramática, o vocabulário e

a tradução ainda pesam mais na balança. A consciência de que trabalhar de forma crítica e

culturalmente sensível facilitará a formação do aluno cidadão existe; no entanto, mesmo que

cachimbo, a boca continua torta. Portanto, os pressupostos teóricos

do PCN+ estão mais presentes no ideal do que na realidade da sala de aula de língua inglesa.

É o que acontece com as nossas agentes de pesquisa: posicionam-

upostos teóricos fundamentados nos princípios da interculturalidade e das

Ideal Real

De que modo os princípios e orientações apresentados pelos documentos oficiais

aula das professoras agentes desta

Após a triangulação dos dados gerados a partir da aplicação dos questionários e

realização das entrevistas, apresento a figura a seguir, que ilustra a disparidade entre a

oficiais e a realidade da sala de aula de nossas

no estudo do texto, todos os recursos são válidos e podem ser acionados simultaneamente, isto é, na mesma aula: as questões lexicais, os elementos morfológicos e sintáticos, os aspectos fonológicos (mesmo que o foco da aula seja a compreensão do texto escrito, importa muito a pronúncia das palavras) e os conteúdos culturais (LIMA, 2009, p.49).

no ensino de línguas. A gramática, o vocabulário e

a tradução ainda pesam mais na balança. A consciência de que trabalhar de forma crítica e

culturalmente sensível facilitará a formação do aluno cidadão existe; no entanto, mesmo que

cachimbo, a boca continua torta. Portanto, os pressupostos teóricos

do PCN+ estão mais presentes no ideal do que na realidade da sala de aula de língua inglesa.

-se de forma favorável

upostos teóricos fundamentados nos princípios da interculturalidade e das

pedagogias críticas, mas não parecem, de fato, aplicá-los em suas aulas. Partem ainda do

vocabulário e gramática para elaborar seus planos de aulas, ainda que tenham consciência da

importância do desenvolvimento do pensamento crítico dos alunos por meio do estudo dos

textos em Língua Inglesa.

As duas perguntas a seguir se complementam, e por isso as responderei ao mesmo

tempo.

- De que forma atividades construídas na perspectiva da pedagogia crítica e da

interculturalidade podem contribuir para o ensino de leitura em Inglês como língua

estrangeira e para o desenvolvimento do senso crítico desses leitores?

- Em que medida uma abordagem que se diga intercultural e crítica para o

ensino/aprendizagem de leitura em Língua Inglesa pode facilitar a formação de alunos

mais conscientes de que as diferenças são parte da construção de sua própria

identidade?

As atividades autoformativas propostas às professoras agentes desta pesquisa foram

criadas à luz de uma abordagem intercultural crítica para o trabalho com leitura, o que

significa que, se desenvolvidas sob a mesma perspectiva, poderiam apurar o senso crítico do

aluno e torná-lo mais culturalmente sensível.

É o que aconteceu quando Isabelle, Ely e Raquel aplicaram as atividades. Ainda que

tenham dado a entender, nas entrelinhas, que o conteúdo gramatical orienta sua preparação de

aulas, abordaram de forma crítica a atividade que aplicaram, seguindo quase sempre as

orientações nela contidas, mas também se utilizando de práticas que já seguiam, como é o

caso de Isabelle com as estratégias de leitura.

O resultado foram textos interessantes e, principalmente, momentos abertos para a

discussão em sala de aula. Não é em toda aula que os alunos conseguem refletir sobre

problemas pelos quais eles, seus amigos ou familiares estão passando. E mais: não é todo

trabalho que favorece a afirmação da identidade. Estamos um passo à frente, à medida que

ultrapassamos a fronteira do trabalho exclusivamente com vocabulário e gramática

descontextualizados. A formação do aluno foi o foco; as informações estruturais e semânticas

foram utilizadas para maximizar a compreensão textual, a qual possibilitou a evolução das

discussões, que levaram à reflexão e consequente respeito às diferentes identidades, inclusive

a sua própria.

- De que modo este trabalho pode contribuir para a formação de professores de

língua inglesa?

Na verdade, essa é uma pergunta que não posso responder sozinha. Creio que as

contribuições possam ir desde a revisão teórica sobre leitura e pedagogias críticas até as

sugestões de atividades, com as opiniões das professoras e produções dos alunos. No entanto,

nada disso terá utilidade se o professor não tiver o desejo de sair da “zona de conforto”, que é

o ensino conteudista, para ampliar seus horizontes no ensino de Língua Inglesa. Já afirmei que

não é um trabalho fácil, mas é bastante gratificante perceber quando o aluno começa a achar o

aprendizado significativo e a se envolver com os conteúdos.

Comparando a postura conteudista que havia por parte das professoras agentes da

pesquisa e o posicionamento crítico dos alunos como resultado final da atividade, fica claro

que as atividades autoformativas devem ter contribuído, de alguma forma, para essa mudança

de atitude.

Voltando à metáfora do bolo, o livro de receitas está aberto, e lá estão os ingredientes e

modo de preparo; tudo para se alcançar o resultado desejado: um bolo bem gostoso, ainda que

falte gás, o forno não esteja muito bom, ou o(a) cozinheiro(a) esteja fazendo o seu primeiro

bolo. Em outras palavras, o trabalho deve ter sucesso na formação de um aluno competente na

leitura e compreensão textual, driblando o desafio das salas de aula cheias, da formação

incompleta e da falta de equipamentos. É válido lembrar que a criatividade para

incluir/excluir ingredientes a depender de quem vá comer o bolo é fundamental; o modo de

preparo também deve ter um toque especial do(a) cozinheiro(a); e não podemos nos esquecer

que o bolo deve ter recheio e cobertura para ficar mais apetitoso: aspectos interculturais

recheiam e o posicionamento crítico cobre todo o bolo, de forma que a massa coesa em que os

ingredientes resultam permite ser entrecortada pelo recheio e tem perfeita aderência à

cobertura.

De acordo com Tomitch (2009, p.200/1),

o papel do professor de leitura em língua estrangeira, assim como do professor de qualquer disciplina, é fornecer andaimes. Nós, professores, assim como os andaimes, não somos permanentes, nossa existência dura enquanto formos necessários. Nosso trabalho é para que o aluno – que no início é naturalmente dependente – vá se tornando cada vez mais independente, e aí vamos tirando os andaimes, até que ele possa seguir sozinho. O ensino, assim como o andaime, deve funcionar como um guia, e nesse sentido deve ser objetivo e bem delimitado (TOMITCH, 2009, p.200/1).

Busquei, com esta pesquisa, passar adiante os andaimes que me foram emprestados por

todos os profissionais que já passaram por minha vida acadêmica. Espero que eles sejam

utilizados de fato, e que contribuam para a formação de professores culturalmente sensíveis e

conscientes da necessidade de estabelecer relações entre culturas para que se promova o

respeito às diferentes identidades por meio do ensino de leitura em Língua Inglesa.

REFERÊNCIAS ALMEIDA FILHO, J. C. P. A abordagem orientadora da ação do professor. In: Parâmetros atuais para o ensino de Português – Língua Estrangeira. Campinas, S.P.: Pontes, 1997, p. 13-28. ALMEIDA FILHO, J.C.P. Análise da proposta publicada pelo MEC. Trechos referidos a ALMEIDA FILHO, 2010, disponíveis em: <http://www.sala.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=300:exame-nacional-de-ensino-medio-enem&catid=42:artigos-de-capa&Itemid=162>. Acesso em: 07 jan. 2011. ANDRÉ, Maria Elisa D. A. de. Etnografia da Prática Escolar. Campinas, SP: Papirus, 1995. BANIWA, Gersem dos Santos Luciano. O índio brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos indígenas no Brasil de hoje. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria da Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade: LACED/Museu Nacional, 2006. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Orientações curriculares para o ensino médio: linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília, 2004. BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN+) Ensino Médio. Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Disponível em: <http://www.cienciamao.if.usp.br/dados/pcn/_linguagenscodigosesuastecnologiaspcn-ensinomedio.arquivo.pdf> Acesso em: 10 abr. 2009.

BRASIL, Secretaria de Educação Média e Tecnológica. PCN+ Ensino Médio: Orientações Educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília: Ministério da Educação/Secretaria de Educação Média e Tecnológica, 2002. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/linguagens02.pdf>. Acesso em: 02 nov. 2010. BROWN, H.D. Teaching by principles: an interactive approach to language pedagogy. NJ: Prentice Hall Regents, 1994. BYRAM, M.; GRIBKOVA, B.; STARKEY, H. Developing the intercultural dimension in language teaching: a practical introduction for teachers. Disponível em: <http://www.lrc.cornell.edu/director/intercultural.pdf>. Acesso em: 10 abr. 2009.

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brasileiros de pesquisa aplicada no âmbito da linguagem. Salvador: Quarteto Editora, 2009.

MENDES, Edleise. Práticas de Leitura e Produção de Textos. Módulo II – Ensino Médio (2º ano). Acre, 2010.

MOITA LOPES, L. P. (Org.). Por uma Lingüística Aplicada Indisciplinar. São. Paulo: Parábola Editorial, 2006.

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SIQUEIRA, D. S. Como abordar questões ideológicas nas aulas de língua estrangeira? In: LIMA, Diógenes Cândido de (org). Ensino e Aprendizagem de Língua Inglesa: conversas com especialistas. São Paulo: Parábola Editorial, 2009. SIQUEIRA, D. S. P. Inglês como língua internacional: Por uma pedagogia intercultural crítica. 2008. Tese (Doutorado em Programa de Pós-Graduação em Letras e Lingüística) - Universidade Federal da Bahia. Disponível em: <http://www.bibliotecadigital.ufba.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=1426>. Acesso em: 15 out. 2009.

SODRÉ, Muniz. Best-Seller: a Literatura de Mercado. Série Princípios. São Paulo, Editora Ática: 1988. Disponível em: < http://historias.interativas.nom.br/klimick/?p=27>. Acesso em: 25 set. 2010.

SOLÉ, Isabel. Estratégias de Leitura. Tradução Cláudia Schilling.6.ed. Porto Alegre: Artmed, 1998. TELLES, João A. “É pesquisa, é? Ah, não quero, não, bem!” Sobre pesquisa acadêmica e sua relação com a prática do professor de línguas. In: Linguagem e Ensino, v. 5, n. 2, 2002. p. 91-116.

TOMITCH, Leda Maria Braga. Aquisição de leitura em língua inglesa. In: LIMA, Diógenes Cândido de (org). Ensino e Aprendizagem de Língua Inglesa: conversas com especialistas. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.

APÊNDICES

ROTEIRO PARA ENTREVISTA

QUESTÕES

1. Descreva sua trajetória até chegar ao ensino de inglês como língua estrangeira na

escola pública do estado da Bahia.

2. Que importância teve o Programa de Licenciaturas Especiais (PROLE) na sua

formação?

3. De que disciplinas você

hoje?

4. Há quanto tempo você leciona inglês? E outras disciplinas? Você considera que essa

experiência tenha sido importante?

5. O que você acha que é ensinar língua inglesa como língua estrangeira, no en

médio, na escola pública?

6. Em relação ao PCN+: você consegue centrar

leitura e compreensão de textos orais e escritos em língua inglesa?

7. Você acha que consegue colocar o aluno frente a situações reais de uso do idiom

8. Você acha que, com suas aulas, os alunos são capacitados pra ler manuais de

instrução?

9. Você acha que seus alunos conseguem resolver questões de vestibular?

10. Seus alunos são capazes de receber e solicitar informações na língua alvo?

11. Eles seriam capazes de

12. Você acha que seus alunos seriam capazes de interpretar um anúncio de emprego?

13. Seus alunos seriam capazes de traduzir um texto?

14. E de escrever pequenos bilhetes?

Nome (fictício):

Tempo de atuação em educação:

Inglês: Outras:

Data/Local da entrevista:

Duração:

ROTEIRO PARA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA

QUESTÕES NORTEADORAS DA ENTREVISTA

Descreva sua trajetória até chegar ao ensino de inglês como língua estrangeira na

escola pública do estado da Bahia.

Que importância teve o Programa de Licenciaturas Especiais (PROLE) na sua

De que disciplinas você lembra cujo conteúdo você utiliza na sua prática docente

Há quanto tempo você leciona inglês? E outras disciplinas? Você considera que essa

experiência tenha sido importante?

O que você acha que é ensinar língua inglesa como língua estrangeira, no en

médio, na escola pública?

Em relação ao PCN+: você consegue centrar-se na função comunicativa visando à

leitura e compreensão de textos orais e escritos em língua inglesa?

consegue colocar o aluno frente a situações reais de uso do idiom

Você acha que, com suas aulas, os alunos são capacitados pra ler manuais de

Você acha que seus alunos conseguem resolver questões de vestibular?

s alunos são capazes de receber e solicitar informações na língua alvo?

seriam capazes de entender uma letra de música? Você trabalha com músicas?

Você acha que seus alunos seriam capazes de interpretar um anúncio de emprego?

Seus alunos seriam capazes de traduzir um texto?

E de escrever pequenos bilhetes?

Tempo de atuação em educação:

Inglês: Outras:

Data/Local da entrevista:

ESTRUTURADA

NORTEADORAS DA ENTREVISTA

Descreva sua trajetória até chegar ao ensino de inglês como língua estrangeira na

Que importância teve o Programa de Licenciaturas Especiais (PROLE) na sua

lembra cujo conteúdo você utiliza na sua prática docente

Há quanto tempo você leciona inglês? E outras disciplinas? Você considera que essa

O que você acha que é ensinar língua inglesa como língua estrangeira, no ensino

se na função comunicativa visando à

leitura e compreensão de textos orais e escritos em língua inglesa?

consegue colocar o aluno frente a situações reais de uso do idioma?

Você acha que, com suas aulas, os alunos são capacitados pra ler manuais de

Você acha que seus alunos conseguem resolver questões de vestibular?

s alunos são capazes de receber e solicitar informações na língua alvo?

entender uma letra de música? Você trabalha com músicas?

Você acha que seus alunos seriam capazes de interpretar um anúncio de emprego?

15. O PCN+ diz que a língua estrangeira serve como uma ferramenta pra todas as outras

disciplinas, facilitando a articulação entre todas as áreas. O que você acha disso?

16. O documento também diz que o aluno deve captar a mensagem do texto, em vez de

simplesmente ler literalmente. O que você pensa a respeito?

17. O PCN+ fala em construir a autonomia do aluno pra que ele seja um leitor ativo, pra

que ele possa pesquisar em fontes escritas, fazer escolhas semânticas, sintáticas, que

melhor reflitam o texto em língua inglesa. Você acha que consegue capacitar o seu

aluno pra ser um leitor ativo?

18. Seu aluno consegue ler e produzir textos articulados, segundo sentidos produzidos ou

objetivados intencionalmente?

19. Você acha que você consegue propiciar ao seu aluno a análise da sua própria língua,

da sua própria cultura através do estudo de outras culturas?

20. Seus alunos conseguem utilizar as tecnologias de informação pra ampliar as

possibilidades de busca em outro idioma?

21. Você acha que você consegue conscientizar o aluno não apenas da importância da

aquisição gramatical, mas discursiva e estratégica do idioma estrangeiro?

22. De que forma você proporciona a aquisição de vocabulário?

23. Como você escolhe os conteúdos gramaticais para trabalhar?

24. Observe os 3 cartões: aquisição de repertório vocabular; estrutura linguística; leitura e

interpretação de textos. Coloque-os na ordem em que eles devem aparecer no

desenvolvimento de uma aula de leitura. Explique.

25. Qual a pedagogia, em sua opinião, mais adequada pra se ensinar uma língua global,

como o inglês é considerado?

Atividade de Inglês

Text : Racism

‘I want to move house. I’m mixed race and a gang of girls keep punching me and taking my money. Mum has contacted the council but nothing’s happened.’ Sylvia, 12

Racism is treating someone differently or unfairly simply because they belong to a different race or culture. People can also experience prejudice because of their religion or nationality. One person can act in a racist way or a group of people or a community of people can be racist.

Racism can be expressed in many different ways. These can include: • being called names • being teased, insulted or threatened • being hit • having your bag, mobile phone or other possessions taken • being ignored or left out • being forced to do things you don’t want to do • having your things or home damaged

Racism can have a terrible effect. Children and young people can become lonely, isolated,

angry and depressed. They may lose self-confidence and become terrified of going to school or going out alone. To avoid racism, they may keep away from situations where racist behaviors occur and pretend to be ill or be scared to leave their house.

Disponível em http://www.childline.org.uk/pdfs/info-racism.pdf Acesso em 03.04.2007

Vocabulary: Alone: sozinho(a) Angry: com raiva Behavior: comportamento Fair: justo ILL: doente Lonely: solitário Prejudice: preconceito Self-confidence: auto-confiança Thing: coisa To avoid: evitar To become: tornar-se

To belong: pertencer To call: chamar To damage: destruir To go out: sair To hit: bater To keep: continuar, manter To leave: sair To leave out, left out: deixar de for a To keep away from: manter-se afastado de To lose: perder To occur: ocorrer

Racism

Escola : ___________________________________________________ Aluno(a): ________________________________ N o: ____Série/Turma: _________ Professora: _____________________________ Data: ___ _______________

Atividade de Inglês Escreva a ideia central de cada parágrafo do texto:

Faça um resumo do texto, juntando as ideias centrai s de cada parágrafo: ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Responda em forma de parágrafo:

E pra você, o que é racismo, quais consequências ele pode trazer e de que forma você pode evitá-lo? ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Escola : ___________________________________________________ Aluno(a): ______________________________________ N o: ____Série/Turma: ____________ Professora: _____________________________ Data: ___ _______________

Cara professora, mais uma vez peço sua colaboração para o desenvolvimento dessa pesquisa de Mestrado. Desde já, agradeço sua atenção e disponibilidade para responder este questionário. Ele diz respeito à aplicação da atividade autoformativa que lhe foi sugerida. Observações:

• Mais de uma alternativa pode ser marcada;

• Os comentários são muito bem-vindos, esclarecendo o desenvolvimento da aula e os desdobramentos permitidos pela aplicação da atividade. Quanto mais detalhes, melhor!

Perguntas: Parte I – Opinião dos alunos

1. Qual a reação inicial dos seus alunos quando você propôs a atividade? a) Ok! Vamos fazer. b) Eu não sei ler em português, quanto mais em inglês. c) Não quero fazer. d) Outra: ________________________________________

Comentários extras: _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

2. Após a primeira reação dos alunos, como foi o envolvimento deles para a realização da atividade?

a) Satisfatório. Participaram ativamente, esforçando-se para superar as dificuldades e seguindo as orientações.

b) Insatisfatório. Ficaram dispersos e não seguiram as orientações. c) Outra: _______________________________________________________________

Comentários extras: ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

3. Qual o interesse demonstrado por seus alunos diante do tema da atividade proposta?

a) Achei relevante/interessante/importante. b) Pra quê isso? c) E a gramática vai ser o quê, professora? d) Outros: _______________________________________________________________

Comentários extras: ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

4. Os alunos ficaram satisfeitos com suas produções? a) Sim. Gostaram do resultado final da atividade. b) Não. c) Não emitiram opinião. d) Outros: __________________________________________________________

Comentários extras: ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Parte II – Sua opinião

5. A atividade teve sucesso? Seus objetivos foram alcançados? a) Sim. b) Não. c) Em parte. (Explique:

_________________________________________________________________________________________________________________________________________)

6. As orientações direcionadas ao professor lhe ajudaram na execução na atividade? a) Sim. (De que forma?

_________________________________________________________________________________________________________________________________________)

b) Não. (Por quê não? _________________________________________________________________________________________________________________________________________)

c) Em parte. (Explique: _________________________________________________________________________________________________________________________________________)

7. Caso não houvesse orientações na atividade proposta para aplicação, você a teria

aplicado da mesma forma? a) Sim. (Por quê?

_________________________________________________________________________________________________________________________________________)

b) Não. (De que forma faria? Explique. _________________________________________________________________________________________________________________________________________)

8. Você adquiriu algum conhecimento com a aplicação da atividade? Se sim, qual(is)? __________________________________________________________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________________________________________________________

9. Você acredita, através da aplicação da atividade e desenvolvimento das discussões nela propostas, ter contribuído, de alguma forma, para o desenvolvimento do pensamento crítico em seus alunos? Explique. ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

10. O passo-a-passo para a aplicação das estratégias de leitura e compreensão textual funcionou de forma eficaz? Por quê (sim/não)? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Muito obrigada!!!! Lucélia

ANEXO I

Adaptado de MENDES, Edleise. Abordagem comunicativa intercultural: uma proposta para ensinar e aprender língua no diálogo de culturas. 316 fls. Tese de Doutorado em Linguística Aplicada, do Programa de Pós-Graduação em Linguística Aplicada da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP/SP, São Paulo, 2004.

CRITÉRIOS PARA A TRANSCRIÇÃO DE AULAS E ENTREVISTAS Os critérios utilizados para a transcrição dos dados foram baseados em Marcuschi (1986) e nas normas de transcrição de inquéritos do Projeto NURC. 1. A transcrição utiliza o sistema ortográfico canônico, exceto nos seguintes casos: a. Fatos de natureza fonética, já consagrados pelo uso comum, devem ser transcritos

conforme realizados pelo falante, a exemplo de pra, pro, né, num, tá, tava etc. b. Representa-se grafematicamente a realização sonora emitida pelo professor - fenômenos

fonéticos, fonético-morfológicos ou fonético-sintáticos – que não estão presentes na fala comum do português brasileiro. Ex. Palavras e expressões marcadas pela interferência do espanhol: entonce, non, regla, de la casa etc.

2. As transcrições das entrevistas vêm acompanhadas da identificação do informante, local,

data e duração da gravação.

3. Convenções para as transcrições: E entrevistador P professor (.) pausa breve (…) pausa longa ... hesitação ? entoação ascendente ! entoação descendente [ ] ausência de frase ou palavra (Inc.) incompreensível (Inaud.) inaudível (( xxx )) comentários do pesquisador / truncamento brusco maiúscula ênfase ou acento forte