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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

FACULDADE DE EDUCAÇÃO MESTRADO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO

CURRÍCULO, LINGUAGENS E INOVAÇÕES PEDAGÓGICAS

DANILO PEREIRA DA ROCHA

DO CHÃO SECO E DO SOL FORTE ÀS FLORES DA BARRIGUDA: TECENDO FIOS DE UMA REDE DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL NOS

MUNICÍPIOS DE IRECÊ, IBITITÁ E LAPÃO – BA

Salvador 2015

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DANILO PEREIRA DA ROCHA

DO CHÃO SECO E DO SOL FORTE ÀS FLORES DA BARRIGUDA: TECENDO FIOS DE UMA REDE DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL NOS

MUNICÍPIOS DE IRECÊ, IBITITÁ E LAPÃO – BA

Projeto de intervenção apresentado ao Mestrado Profissional em Educação, Currículo, Linguagens e Inovações Pedagógicas, Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação. Orientadora: Prof.ª. Dr.ª Rosiléia Oliveira de Almeida

Salvador 2015

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SIBI/UFBA/Faculdade de Educação – Biblioteca Anísio Teixeira

Rocha, Danilo Pereira da.

Do chão seco e do sol forte às flores da barriguda: tecendo fios de uma Rede de Educação Ambiental nos municípios de Irecê, Ibititá e Lapão – BA / Danilo Pereira da Rocha. – 2015.

93 f. : il.

Orientadora: Profa. Dra. Rosiléia Oliveira de Almeida. Projeto de intervenção (Mestrado Profissional em Educação, Currículo, Linguagens

e Inovações Pedagógicas) - Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Educação, Salvador, 2015.

1. Educação ambiental. 2. Politica ambiental. 3. Experiência. I. Almeida, Rosiléia Oliveira de. II. Universidade Federal da Bahia. Mestrado Profissional em Educação, Currículo, Linguagens e Inovações Pedagógicas. III. Título.

CDD 302.4 – 23. ed.

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DANILO PEREIRA DA ROCHA

DO CHÃO SECO E DO SOL FORTE ÀS FLORES DA BARRIGUDA: TECENDO FIOS DE UMA REDE DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL NOS

MUNICÍPIOS DE IRECÊ, IBITITÁ E LAPÃO – BA

Projeto de intervenção apresentado ao Mestrado Profissional em Educação, Currículo,

Linguagens e Inovações Pedagógicas, Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia,

como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação.

Aprovado em 17 de outubro de 2015.

Denise Moura de Jesus Guerra ___________________________________________________

Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia, Brasil.

Universidade Federal da Bahia (UFBA)

Michelle Tatiane Jaber da Silva_________________________________________________

Doutora em Ciências pela Universidade Federal de São Carlos, Brasil.

Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT)

Rosiléia Oliveira de Almeida (Orientadora) ________________________________________

Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Campinas, Brasil.

Universidade Federal da Bahia (UFBA)

Zanna Maria Rodrigues de Matos_________________________________________________

Doutora em El Medio Ambiente Natural y Humano en las Ciencias pela Universidade de

Salamanca, Espanha.

Secretaria do Meio Ambiente do Estado da Bahia (SEMA-BA)

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A todas as crianças,

que me movem a lutar por uma sociedade ética, justa e sustentável.

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AGRADECIMENTOS

A Minha Família pela compreensão e apoio nesse meu caminhar.

À Prefeitura Municipal de Ibititá e ao Povo Ibititaense, pela parceria constituída que

possibilitou a abertura e os primeiros passos dessa jornada.

À Comunidade da Escola Benjamim Soares dos Santos Filhos, principalmente aos pais dos

meus alunos, que compreenderam minhas ausências e a rotina caótica de um mestrando.

Aos Companheiros do Mestrado, pelas amizades tecidas e angústias compartilhadas, pelas

boas risadas e pelos momentos de desabafo.

A Rosiléia Almeida, minha orientadora, pelo imenso respeito com o qual tratou minhas ideias

e meus textos.

A Inez Carvalho, pelas provocações e discussões, e por me apresentar um mundo outro.

A Roseli Sá, pela acolhida e afeto, e por proporcionar uma sensação de tranquilidade, desde o

momento da arguição ainda no processo seletivo e durante todo o curso.

A Gabriela e a Cibelli Matos pela acolhida, abrigo e amizade de todas as horas.

A Caroline Rocha, minha sobrinha, pela poética arte que ilustra a capa desse trabalho.

A Diêgo Lôbo e a Saulo Guimarães, pelos laços de amizade que foram fortificados nesses

últimos anos, amigos de luta na batalha de ser o que se é. E pela leitura atenciosa e preciosa do

meu trabalho.

Obrigado a todos que, voluntariamente ou involuntariamente, foram jogados nessa jornada

caótica tecida durante esses dois anos e que contribuíram de forma decisiva nesse processo.

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“Sempre que olhamos para a vida, olhamos para redes”

Capra (2006, p. 78)

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RESUMO

O Mestrado Profissional em Educação: Currículo, Linguagem e Inovações Pedagógicas objetiva a realização de pesquisas para elaboração de projetos de intervenção. Deste modo, este projeto de intervenção nasce a partir das compreensões advindas de uma pesquisa de enfoque fenomenológico que interrogou sobre como a Educação Ambiental é tecida na experiência do mundo-vida de docentes nos municípios de Irecê, Ibititá e Lapão – BA, sendo construído na perspectiva de uma racionalidade outra. A partir das compreensões construídas no acontecer do estudo é proposto um projeto de intervenção que objetiva a articulação de ações com vistas à criação e consolidação de uma Rede de Educação Ambiental (REA) entre os municípios de Irecê, Ibititá e Lapão – BA, como forma de integrar, ampliar e fortalecer as ações e práticas em Educação Ambiental desenvolvidas nos referidos municípios. Nesse sentido, a proposta é organizada em Movimentos de Fiação que se desdobram em ações para o acontecer do projeto, os cinco movimentos são: Movimento de Fiação – Da criação, gestão e consolidação da Rede de Educação Ambiental; Movimento de Fiação – Do fortalecimentos dos Elos e expansão da REA; Movimento de Fiação – Do desenvolvimento de Políticas Públicas Educacionais e Socioambientais; Movimento de Fiação – Do fomento a uma Educação Ambiental do/no Sertão; e, Movimento de Fiação – Dos mecanismos de divulgação de informações sobre atividades e projetos da REA. A implementação da proposta apresentada neste projeto de intervenção possibilitará uma abertura para o desenvolvimento e fortalecimento não somente das práticas em Educação Ambiental, fomentando a ruptura do isolamento dos educadores ambientais em suas escolas, mas também a consolidação do processo democrático, visto que este projeto prevê a participação ativa e colaborativa de educadores e outros membros/elos da REA no desenvolvimento de projetos e políticas públicas municipais voltadas para a educação e desenvolvimento socioambiental. Assim, a implementação deste projeto de intervenção possibilitará uma mudança significativa no acontecer da Educação Ambiental dentro dos munícipios, ao mesmo tempo que moverá diversos atores no processo de construção de uma sociedade mais ética, justa, democrática e sustentável.

Palavras-chave: Rede. Educação Ambiental. Experiência.

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ABSTRACT

This intervention project is a result of a reflecting process based on a phenomenological research which scrutinised how Environmental Education is driven through a Lifeworld perspective on the part of teachers in three municipalities in the state of Bahia: Irecê, Ibititá and Lapão. The project is grounded on the perspective of “another rationality”. An intervention is proposed based on arguments presented throughout the study, which comprehends actions to create and consolidate a Network of Environmental Education (REA) in the municipalities aforementioned. This implementation is a way to integrate, broaden and strengthen Environmental Education actions and practices in these municipalities. The proposal consists of five Movimentos de Fiação, which in turn comprise different strategies. These movement are: Movimento de Fiação - conception, management and consolidation of a Network of Environmental Education; Movimento de Fiação - strengthening of Elos and broadening of the REA; Movimento de Fiação – development of public policies on education and socio-environmental issues; Movimento de Fiação – encouragement of an Environmental Education of/in the semi-arid region; Movimento de Fiação – design of strategies to disseminate information on activities and projects by the REA. The execution of this proposal will enable more possibilities to develop and reinforce not only environmental education practices, thus breaking the cycle of isolation faced by environmental teachers in the schools, but also a more democratic process. This is because the project relies on active and collaborative participation from the part of teachers and other members of the REA in the development of projects and public policies on education and socio-environmental development at the municipal level. Therefore, executing this intervention project will enable a significant change in the practice of Environmental Education in those municipalities at the same time it will encourage several social actors to take part in the process to create a more ethical, just, democratic and sustainable society.

Keywords: Network, Environmental Education, Experience.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 1 O movimento de construção do projeto de intervenção .............................. 19

FIGURA 2 Quixabeira sob a qual os primeiros habitantes de Irecê se abrigaram ........ 24

FIGURA 3 Rochedos localizados na sede do município de Ibititá ............................... 27

FIGURA 4 Praça na cidade de Lapão, onde se localiza a grande Lapa ......................... 30

FIGURA 5 Mapa da vegetação de parte do Território de Identidade de Irecê, em

destaque os municípios de Irecê, Ibititá e Lapão – BA ............................... 32

FIGURA 6 Imagem de satélite do município de Irecê ................................................... 33

FIGURA 7 Imagem de satélite do município de Ibititá ................................................. 34

FIGURA 8 Imagem de satélite do município de Lapão ................................................ 34

FIGURA 9 Participantes da Desconferência lendo as informações/indagações

no banner..................................................................................................... 41

FIGURA 10 Participantes do evento se movimentando dentro da instalação .................. 41

FIGURA 11 Participantes da primeira roda de conversas na minha mesa, antes

do início da construção dos diálogos........................................................... 42

FIGURA 12 A dinâmica de relações dentro de uma rede ............................................... 66

FIGURA 13 Possibilidades propiciadas pelas Redes de Educação Ambiental ............... 70

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AVANTE Avante – Educação e Mobilização Social

BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

CIEA Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental

CDP Comissão de Desenvolvimento do Projeto

CETEB Associação Centro de Educação Tecnológica do Estado da Bahia

EA Educação Ambiental

FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INEMA Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

LDB Lei de Diretrizes e Base da Educação

MEC Ministério da Educação

NASA National Aeronautics and Space Administration

ONU Organização das Nações Unidas

PCNs Parâmetros Curriculares Nacionais

PEABA Programa de Educação Ambiental do Estado da Bahia

PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

ProEASE Programa de Educação Ambiental do Sistema Educacional da Bahia

ProNEA Programa Nacional de Educação Ambiental

REA Rede de Educação Ambiental

REABA Rede de Educação Ambiental da Bahia

REPEA Rede Paulista de Educação Ambiental

SENAR Serviço Nacional de Aprendizagem Rural

UFBA Universidade Federal da Bahia

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ................................................................................................................ 12

PARTE I – O CHÃO SECO E DO SOL FORTE ............................................................... 13

1 O CAMINHO... ................................................................................................................... 14

2 OS TRÊS ELOS: IRECÊ, IBITITÁ E LAPÃO – BA ...................................................... 23

2.1 O ÍNICIO EM COMUM .................................................................................................... 23

2.2 IRECÊ: AS SOMBRAS DA QUIXABEIRA ..................................................................... 24

2.2.1 Alguns aspectos educacionais ....................................................................................... 25

2.3 IBITITÁ: DA SOLIDEZ DOS ROCHEDOS ÀS INCERTEZAS DA CHUVA .............. 26

2.3.1 Panorama da Rede de Ensino ....................................................................................... 28

2.3.1.1 O Currículo desconhecido ............................................................................................ 28

2. 4 LAPÃO: FONTE DE ÁGUA LIMPA ............................................................................... 29

2.4.1 Aspectos educacionais ................................................................................................... 31

2.5 O ENTRELAÇAR DOS ASPECTOS ECONÔMICOS E AMBIENTAIS ........................ 31

2.6 ASPECTOS DAS POLÍTICAS PÚBLICAS EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL NOS TRÊS

MUNICÍPIOS .......................................................................................................................... 35

PARTE II – AS FLORES DA BARRIGUDA ...................................................................... 38

3 A TESSITURA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL: FIOS QUE EMERGEM DO

MUNDO-VIDA ....................................................................................................................... 39

3.1 DESCONFERÊNCIA: FIOS QUE EMERGEM ENTRE CAFÉS E CONVERSAS ......... 39

3.2 ENTREVISTAS NARRATIVAS: FIOS QUE EMERGEM DAS EXPERIÊNCIAS ....... 45

Fios Aqua: motivação e o papel da conscientização .............................................................. 49

Fios Rupes: conteúdos, temáticas, (des)contextualização ..................................................... 52

Fios Arbor: o fazer pedagógico ............................................................................................... 55

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4 REDES E EDUCAÇÃO AMBIENTAL: O ENTRELAÇAR COMO ESTRATÉGIA DE

FORTALECIMENTO .......................................................................................................... 58

4.1 O ENREDAMENTO ......................................................................................................... 64

4.2 CARACTERÍSTICAS DAS REDES ................................................................................ 68

4.3 POSSIBILIDADES E LIMITAÇÕES DAS/NAS REDES ............................................... 69

5 TECENDO OS PRIMEIROS FIOS DA REDE DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL ....... 73

5.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS DOS MOVIMENTOS DE FIAÇÃO ................................... 75

5.2 A FIAÇÃO ........................................................................................................................ 76

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 80

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 83

ANEXO ................................................................................................................................... 88

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APRESENTAÇÃO

Uma consideração inicial deve ser feita antes de qualquer apresentação sobre este

trabalho:

Ele não corresponde a uma dissertação.

Todavia, isso não significa de forma alguma que o texto aqui exposto não se configura

como um trabalho acadêmico, não tenha caráter científico ou mesmo que não busque um rigor.

É preciso ressaltar que este trabalho foi construído com base na tentativa de distanciamento de

uma racionalidade que tem contribuído ao longo da história para a degradação e destruição

ambiental e na busca por uma racionalidade que compreendesse o mundo em sua plenitude,

complexidade e caos. Uma racionalidade outra.

Neste sentido, o Mestrado Profissional em Educação: Currículo, Linguagem e

Inovações Pedagógicas me possibilitou a construção deste trabalho como um projeto de

intervenção que nasce a partir de uma pesquisa no/sobre o mundo-vida, e volta a esse mesmo

mundo na forma de proposta de criação de uma Rede de Educação Ambiental.

Dito isto, o projeto de intervenção aqui apresentado, que finaliza o meu percurso no

Mestrado Profissional em Educação: Currículo, Linguagens e Inovações Pedagógicas, é

resultado da minha própria itinerância no mundo, da minha angústia por buscar compreender a

tessitura da Educação Ambiental no seu acontecer e enquanto ser-no-mundo-com-os-outros, do

meu desejo compartilhado de tecer a Educação Ambiental junto com outros colegas docentes.

O projeto de intervenção é organizado em duas partes. A Parte I – O chão seco e do

sol forte traz o caminho trilhado e o aporte teórico-metodológico que me sustentou no percurso,

além de apresentar uma contextualização sobre os municípios de Irecê, Ibititá e Lapão – BA,

nos quais a pesquisa foi realizada e onde se pretende que o projeto seja implementado.

A Parte II – As flores da Barriguda apresenta o acontecer da pesquisa e as

compreensões dela advindas, e expõe a proposta de criação de uma Rede de Educação

Ambiental entre os municípios de Irecê, Ibititá e Lapão – BA, como forma de fortalecer,

integrar e ampliar as ações e práticas em Educação Ambiental desenvolvidas nesses municípios.

Um aviso importante:

Este trabalho é uma abertura.

Deste modo, as palavras e ideias aqui escritas e defendidas não são um fim em si mesmo,

se configuram com uma abertura para novos caminhos a serem trilhados, uma abertura ao

diálogo, a democratização, uma abertura para que os nós da Rede se conectem.

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PARTE I

O CHÃO SECO E O SOL FORTE _________________________________________

Sertão: é dentro da gente.

João Guimarães Rosa (2006, p. 309)

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1 O CAMINHO...

“Caminhante, não há caminho, o caminho se faz ao caminhar”. Antonio Machado

A Educação Ambiental (EA) teve papel importante na minha formação inicial como

professor-pesquisador. Até o terceiro semestre do curso de Pedagogia eu sentia um

desencantamento com a realidade educacional e com as discussões sobre a profissão e suas

possibilidades, pensava até mesmo em deixar o curso. Foi nesse momento que comecei meus

primeiros estudos sobre a Educação Ambiental, motivado por um trabalho interdisciplinar que

tinha como objetivo nos levar a pensar possíveis temáticas para a monografia. Como as questões

sobre o meio ambiente sempre fizeram parte da minha vida, estudar um viés educacional que

fizesse essa ligação entre meus ideais e a educação me motivou a continuar meus estudos em

Pedagogia.

Os caminhos percorridos nos estudos sobre Educação Ambiental me levaram, no sétimo

semestre da minha graduação, a realizar no estágio curricular um projeto em Educação

Ambiental. O projeto intitulado “Ler, escrever, contar e refletir: construindo aprendizagens

significativas a partir da Educação Ambiental” foi pensado de forma a tecer na

interdisciplinaridade os conteúdos negligenciados em uma prática educativa voltada

exclusivamente para a leitura, a escrita e o contar, deixando de lado conhecimentos importantes

para a formação do ser humano. Desta forma, o projeto articulava conteúdos das disciplinas de

português, matemática, história, ciências, geografia e artes, de forma a evidenciar que as

práticas de ler, escrever e contar podem acontecer de forma contextualizada e significativa.

Ao final da graduação escrevi minha monografia sobre a Educação Ambiental. Na

pesquisa que deu sustentação a esse trabalho, busquei identificar quais tipos de Educação

Ambiental eram exercidos nas práticas dos professores das 3ª e 4ª séries do Ensino Fundamental

– atuais 4º e 5º anos – da rede municipal de educação de Ibititá – BA. Ficou evidente, através

da pesquisa, que o enfoque conservacionista da Educação Ambiental estava mais presente. Em

suas práticas os professores buscavam a transmissão de valores que eles acreditavam ser

ecologicamente corretos, e perpetuavam a separação dos problemas ambientais dos sociais,

políticos, econômicos e culturais.

É essa itinerância que me traz até aqui, em um momento histórico em que a crise

ambiental, entendida como crise de civilização (LEFF, 2003, p. 16), chega a um estado ainda

mais alarmante no Brasil e no Mundo. A região Sudeste do país passa por uma seca

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inimaginável, que associada a má gestão dos recursos hídricos, pode provocar um racionamento

em São Paulo e em outros estados. Com a forte estiagem na região Sudeste, até mesmo a

nascente do Rio São Francisco, considerado o Rio da Integração Nacional, chegou a secar, fato

que nunca tinha ocorrido.

O ano de 2014 foi, de acordo com monitoramento realizado pela NASA – Agência

Espacial Americana, o ano mais quente desde 1880, quando a temperatura do planeta começou

a ser registrada. Mas 2015, segundo a NASA, já está se tornando o ano mais quente da história,

sendo que junho deste ano foi considerado o mês mais quente da história da Terra, um reflexo

do aquecimento global, que coloca em risco o futuro da vida no planeta.

Durante todo o processo de (des)construção pelo qual passei no percurso do Mestrado

Profissional em Educação – UFBA, busquei uma racionalidade que me distanciasse dos

métodos positivistas que corroboraram para a construção/agravamento da atual crise ambiental

planetária. Uma crise ambiental entendida não como uma crise ecológica, mas como uma crise

da razão, do conhecimento (LEFF, 2010, p.10).

Enquanto crise do conhecimento, as soluções para a crise ambiental não podem ser

construídas com base nessa racionalidade que busca a dominação e aprisionamento da natureza.

A busca por soluções perpassa uma racionalidade outra, que engloba uma racionalidade

ambiental:

A racionalidade ambiental abre caminho para uma reerotização do mundo, transgredindo a ordem estabelecida, a qual impõe a proibição de ser. O saber ambiental, interrompido pela incompletude do ser, pervertido pelo poder do saber e mobilizado pela relação com o Outro, elabora categorias para apreender o real desde o limite da existência e do entendimento, a diferença e a outredade. Dessa maneira, cria mundos de vida, constrói novas realidades e abre o curso da história para um futuro sustentável. (...) A racionalidade ambiental abre um mundo pleno de muitos mundos por meio de um diálogo de seres e saberes, da sinergia da diversidade e da fecundidade da outredade, de uma política da diferença (LEFF, 2009, p. 18 -22).

Deste modo, uma racionalidade outra é uma racionalidade para além da razão que

aprisiona, domina e destrói a natureza e seus seres. Que compreende que as (in)certezas e o

caos fazem parte da dinâmica da vida. Uma racionalidade outra se constrói no diálogo eu-

outro-mundo, e propicia a compreensão de que a ciência e o conhecimento surgem a partir da

percepção do ser no mundo-vida. Uma racionalidade outra fomenta o entendimento de que a

linguagem acadêmica abarca outras formas de linguagem e, assim, a poética do mundo assume

seu lugar nas linhas deste trabalho.

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É nesse contexto e a partir dessas compreensões que mais uma vez me coloco a

interrogar sobre Educação Ambiental. Assim, como afirma Bicudo (2011), uma “interrogação

persiste, muitas vezes, ao longo da vida de um pesquisador, ou mantém-se durante muito tempo

com força que, como a physis, faz brotar e manter-se sendo”. Persiste mesmo que a pergunta

“específica de um determinado projeto seja abordada, dando-se conta do indagado” (p. 23 e

p. 24, grifos da autora).

De tal modo, a interrogação que direciona este trabalho me move nesse processo de ser

sendo, me move nessa minha itinerância pelo mundo, e interroga mais uma vez sobre a

Educação Ambiental. Assim, a interrogação que guia este trabalho pode ser expressa da

seguinte forma: como a Educação Ambiental é tecida no mundo-vida de docentes das redes de

educação dos municípios de Irecê, Ibititá e Lapão – BA?

Na intenção de fazer este trabalho na busca de uma racionalidade outra, o Mestrado

Profissional em Educação – UFBA, diferentemente dos Mestrados Acadêmicos nos quais ao

final do curso é elaborada uma dissertação, tem como trabalho de conclusão de curso a

elaboração de um Projeto de Intervenção. Deste modo, a pesquisa dentro deste Mestrado

Profissional visa fornecer elementos sobre a realidade que se pretende intervir, dando

sustentação para a elaboração do projeto de intervenção, que neste trabalho se constitui como

proposta de criação de uma Rede de Educação Ambiental que envolva inicialmente os

munícipios de Irecê, Ibititá e Lapão, mas com possibilidades de expansão para outros

municípios do Território de Identidade de Irecê.

Nesta perspectiva e buscando uma racionalidade outra, me propus a realizar uma

pesquisa qualitativa de natureza fenomenológica. Para Bicudo (2011) a pesquisa qualitativa se

preocupa com a qualidade do fenômeno percebido. Nesta perspectiva a qualidade do fenômeno

é percebida, e mostra-se na percepção do sujeito que percebe. Assim, a pesquisa qualitativa se

configura como “um modo de proceder que permite colocar em relevo o sujeito do processo,

não olhado de modo isolado, mas contextualizado social e culturalmente” (BICUDO, 2012, p.

17).

Esse aspecto da pesquisa qualitativa caracteriza a natureza fenomenológica que este

trabalho assume em sua constituição. A palavra fenomenologia se forma através da ligadura

dos termos fenômeno mais lógos, e significa etimologicamente o estudo ou a ciência do

fenômeno. Compreende-se fenômeno como aquilo que se mostra na intuição ou percepção, que

se mostra em si mesmo, e lógos como sendo discurso esclarecedor. Pode-se, então,

compreender fenomenologia como sendo o discurso esclarecedor daquilo que se mostra por si

mesmo, buscando captar sua essência (BICUDO, 2011; MARTINS, 1992; PEIXOTO, 2003).

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Para Masini (1989, p. 61) a pesquisa de natureza fenomenológica “caracteriza-se pela

ênfase no ‘mundo cotidiano’, pelo retorno àquilo que ficou esquecido, encoberto pela

familiaridade (pelos usos, hábitos e linguagem do senso comum)”. Merleau-Ponty (2004)

afirma que sempre somos tentados a esquecer parte do mundo em que vivemos, ignorando-o na

postura prática do dia-a-dia. Essa familiaridade citada por Masini, e revelada por Merleau-

Ponty, nos faz ignorar ou esquecer o mundo vivido.

Deste modo, é então tarefa de uma pesquisa qualitativa de natureza fenomenológica a

procura por compreender a experiência do mundo-vida dos sujeitos coautores da pesquisa.

Chamo os envolvidos na pesquisa como sujeitos coautores porque a busca pelas coisas mesmas,

pela compreensão do mundo vida desses sujeitos, nos leva à vivência da experiência do diálogo,

que constitui:

[...] um terreno comum entre outrem e mim, meu pensamento e o seu formam um só tecido, meus ditos e aqueles do interlocutor são reclamados pelo estado da discussão, eles se inserem em uma operação comum da qual nenhum de nós é o criador. Existe ali um ser a dois, e agora outrem não é mais para mim um simples comportamento em meu campo transcendental, aliás nem eu no seu, nós somos, um para o outro, colaboradores em uma reciprocidade perfeita, nossas perspectivas escorregam uma na outra, nós coexistimos através de um mesmo mundo (MERLEAU-PONTY, 2014, p. 475, grifos meus).

Desta forma, no diálogo eu-outrem somos autores do mesmo mundo, e como “toda

autoria é coautoria” (PASSOS; SATO, 2005, p. 219), é na vivência da experiência do diálogo

eu-outrem que se funda um ser a dois, e que as significações do mundo-vida emergem.

Bicudo (2011, p. 35) compreende mundo-vida como sendo um real vivido, o mundo de

nossas experiências, e o seu sentido é entendido como sendo o da totalidade que a expressão

abarca, “que se mostra como um mundo que tem vida”:

Esse sentido se faz valer à medida que olhamos atentamente para o mundo e buscamos compreendê-lo com sua força, impondo-se e tudo abarcando, ao modo de um caldo grosso que vai se alastrando, cobrindo o que aí está, e ao mesmo tempo em que se engrossa e nutre disso que aí está. É um mundo vivo. Portanto mutante, temporalizado, especializado. Assim o sentido que faz para nós é o de um mundo que é vida, onde estamos umbilicalmente ligados, nutrindo-o e sendo por ele nutrido (BICUDO, 2011, p. 35)

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Para Merleau-Ponty, todo o universo da ciência emerge a partir da experiência no

mundo-vida:

Tudo aquilo que sei do mundo, mesmo por ciência, eu sei a partir de uma visão minha ou de uma experiência do mundo sem a qual os símbolos da ciência não poderiam dizer nada. Todo o universo da ciência é construído sobre o mundo vivido, e se queremos pensar a própria ciência com rigor, apreciar exatamente seu sentido e seu alcance, precisamos primeiramente despertar essa experiência do mundo da qual ela é expressão segunda (MERLEAU-PONTY, 2014, p. 3).

A percepção tem um papel importante nesse processo de retorno às coisas mesmas, pois

é através dela que compreendemos o mundo, é através dela que “a verdade do existente,

enquanto tal, mostra-se a nós como presença” (BICUDO, 2011, p. 32). Para Merleau-Ponty,

não existe separação entre corpo e mente, entre pensamento e ação, sentir e compreender

constituiriam então o mesmo ato de significação desencadeado pela percepção. Assim, para ele,

a percepção não é uma ciência do mundo, não é nem mesmo um ato, uma tomada de posição deliberada; ela é o fundo sobre o qual todos os atos se destacam e ela é pressuposta por eles. O mundo não é um objeto do qual possuo comigo a lei de constituição; ele é o meio natural e o campo de todos os meus pensamentos e de todas as minhas percepções explícitas (2014, p. 6).

É preciso então compreender que o ser-está-no-mundo, “e é no mundo que ele se

conhece. Quando volto a mim a partir do dogmatismo do senso comum ou do dogmatismo da

ciência, encontro não um foco de verdade intrínseca, mas um sujeito consagrado ao mundo”

(MERLEAU-PONTY, 2014, p. 6). Desta forma, o sujeito não pode ser separado do mundo e

sua significação do mundo só se dá pela percepção, que implica que o ser esteja inserido

incondicionalmente no mundo. “Construímos a percepção com o percebido (...). Estamos

presos ao mundo e não chegamos a nos destacar dele para passar à consciência do mundo”

(MERLEAU-PONTY, 2014, p. 26).

Sendo ser-no-mundo, e motivado pelo desejo de compreender como a Educação

Ambiental é tecida no mundo vida dos docentes das redes que constituem o Mestrado

Profissional em Educação – UFBA, me inspirei nas ideias de Masini (1989) e constituí o

desenvolvimento da construção deste projeto de intervenção em três movimentos autônomos,

mas interdependentes, que podem ser vistos “compondo um círculo hermenêutico sobre o tema

da pesquisa. Parte-se da compreensão que orienta a atenção para aquilo que se vai investigar”

(MASINI, 1989, p. 65).

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Desta forma, o processo do movimento de um, alimenta o movimento do outro,

catalisando assim o desenvolvimento do estudo/trabalho. Os movimentos podem ser nomeados

da seguinte forma: 1 – de discussão e ação; 2 – de reflexão; 3 – de ação.

Figura 1. O movimento de construção do projeto de intervenção. Fonte: Elaborada pelo Autor.

O movimento de discussão e ação inicia-se com o próprio movimentar do Mestrado.

As primeiras ações constituíram-se em observações nas escolas, realizadas durante o Ciclo Um

do curso. Essas observações foram propostas pela docente do componente curricular Oficina:

Descobrindo a rede, Inez Carvalho, e foram incorporadas a metodologia da pesquisa deste

trabalho. As observações tinham como principal objetivo realizar os primeiros diagnósticos das

Redes Municipais de Educação e iniciar a construção dos primeiros diálogos/conversas com os

professores das redes. Muito além de serem apenas instrumentos de pesquisa, as observações

foram importantes para a escolha dos outros instrumentos utilizados no processo de

desenvolvimento do trabalho.

No mover do movimento e do curso, e mais uma vez interligados às ações desenvolvidas

no componente curricular Oficina, desta vez intitulado Pensando seu espaço de investigação

da rede, oferecido no Ciclo Três, nos propomos a realizar a Desconferência: intervenções do/no

cotidiano, um evento coletivo que teve como objetivo levantar discussões sobre as temáticas

das pesquisas que eram realizadas pelos mestrandos do programa, e através de diálogos

colaborativos com os membros – professores, gestores, coordenadores, das três redes que

compõem o Mestrado Profissional em Educação - UFBA, discutir possibilidades para a

construção dos projetos de intervenções.

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O uso da Desconferência como uma metodologia de pesquisa colaborativa corrobora

com o posicionamento de distanciamento da racionalidade positivista, e se sustenta na busca

por uma racionalidade outra, desta forma, essa atitude possibilitou que os professores das

Redes Municipais de Educação se manifestassem sobre as problemáticas estudadas nos

trabalhos desenvolvidos pelos mestrandos do programa, e sobre os projetos de intervenções,

tornando-os realmente coautores dos trabalhos.

Ainda na busca por essa racionalidade outra, foram realizadas Entrevistas Narrativas

que eram precedidas de um contato com obras de arte, fomentando assim uma experiência

estética. Segundo Gadamer (2014, p. 116):

A experiência estética não é apenas uma espécie de vivência ao lado de outras, mas representa a forma de ser da própria vivência. Assim como a obra de arte é um mundo para si, também o vivenciado esteticamente como vivência distancia-se de todos os nexos com a realidade. Parece, inclusive, que a determinação da obra de arte é tornar-se uma vivência estética, ou seja, arrancar de um golpe aquele que a vive dos nexos de sua viva por força da obra de arte, sem deixar de referi-lo ao todo de sua existência. Na vivência da arte se faz presente uma riqueza de significados que não pertence somente a este conteúdo específico ou a esse objeto, mas que representa, antes, o todo sentido da vida.

Para Merleau-Ponty (2004, p. 65) o “mundo percebido não é apenas um conjunto de

coisas naturais, é também os quadros, as músicas, os livros”. É necessário, portanto,

“redescobrir, depois do mundo natural, o mundo social, não como objeto ou soma de objetos,

mas como campo permanente ou dimensão de existência: posso desviar-me dele, mas não

deixar de estar situado em relação a ele” (MERLEAU-PONTY, 2014, p. 485). E na busca dessa

consciência do mundo em sua complexidade, a arte tem um papel essencial:

(...) esse mundo é em grande medida ignorado por nós enquanto permanecemos numa postura prática ou utilitária, que foram necessários muito tempo, esforços e cultura para desnudá-lo e que um dos méritos da arte e do pensamento modernos (...) é o de fazer-nos redescobrir esse mundo em que vivemos mas que somos sempre tentados a esquecer (MERLEAU-PONTY, 2004, p.1).

Ferreira Gullar costuma dizer que a arte existe porque a vida não basta. Não basta

porque nos deixamos conduzir por uma postura prática e utilitária, todo dia fazemos tudo

sempre igual, nos deixando esquecer do mundo vivido, assim, segundo Merleau-Ponty, a arte

nos situa imperiosamente diante do mundo vivido, nos reconduzindo à visão das próprias

coisas.

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Ainda segundo o filósofo, “o artista é aquele que fixa e torna acessível aos mais

‘humanos’ dos homens o espetáculo de que participam sem perceber” (MERLEAU-PONTY,

1975, p. 120). O pintor, o artista, é aquele que torna visível o que o dia-a-dia nos faz esquecer:

[...] seja qual for a civilização em que nasça, sejam quais forem as crenças, os motivos, os pensamentos, as cerimônias de que se cerque, e mesmo quando parece fadada a outra coisa, desde Lascaux até hoje, pura ou impura, figurativa ou não, a pintura jamais celebra outro enigma a não ser o da visibilidade (MERLEAU-PONTY, 1989, p. 53)

E conclui afirmando que, “a pintura não evoca coisa alguma (...). Ela faz coisa

totalmente diferente, quase o inverso: dá existência àquilo que a visão profana acredita

invisível” (MERLEAU-PONTY, 1989, p. 53). Nesta perspectiva, pretendia-se que através

desse contato com as obras de arte, memórias fossem acionadas provocando o desencadeamento

das narrativas dos professores durante as entrevistas.

A entrevista narrativa, como afirmam Jovchelovitch e Bauer (2014), “tem em vista uma

situação que encoraje e estimule um entrevistado (...) a contar a história sobre algum

acontecimento importante de sua vida e do contexto social. A técnica recebe seu nome da

palavra latina narrare, relatar, contar uma história” (p. 93, grifo dos autores).

De acordo com Dutra (2002), através da narrativa tem-se a possibilidade de nos

aproximarmos da experiência do narrador:

A modalidade da narrativa mantém os valores e percepções presentes na experiência narrada, contidos na história do sujeito e transmitida naquele momento para o pesquisador. O narrador não “informa” sobre a sua experiência, mas conta sobre ela, dando oportunidade para que o outro a escute e transforme de acordo com a sua interpretação, levando a experiência a uma maior amplitude, tal como acontece na narrativa (p. 373).

Ainda segundo Dutra, ao contar aquilo que já ouviu o pesquisador transforma-se em

narrador, pois nesse processo de ouvir a experiência do outro, ele a funde com as suas

experiências, emergindo as significações de um mundo constituído de um ser a dois:

A escolha de um método de inspiração fenomenológica parece o mais adequado quando se pretende investigar e conhecer a experiência do outro, uma vez que o ato do sujeito de contar a sua experiência não se restringe somente a dar a conhecer fatos e acontecimentos da sua vida. Mas significa, além de tudo, uma forma de existir com-o-outro; significa com-partilhar o seu ser-com-o-outro (DUTRA, 2002, p. 377).

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Segundo Ferreira (2009, p. 1) a “pesquisa qualitativa com o uso de narrativas supera a

concepção de que os sujeitos praticantes ou fazedores da educação ambiental são instrumentos

das decisões políticas de governo ou de suas instituições, são compreendidos como

protagonistas”, como sujeitos ativos no processo educativo.

No segundo movimento da construção deste trabalho, o movimento de reflexão buscou-

se através da reflexão-interpretação, compreender como a Educação Ambiental é constituída

no mundo-vida dos docentes entrevistados.

O último movimento, o movimento de ação, configurou-se no processo de escrita e

elaboração deste projeto de intervenção baseado nas compreensões e interpretações constituídas

durante o caminho feito pelo caminhante-pesquisador durante o caminhar da/na pesquisa.

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2 OS TRÊS ELOS: IRECÊ, IBITITÁ E LAPÃO - BA

A história é tecida por acontecimentos que nós humanos contamos a partir da nossa

visão, nos colocamos – quase sempre, como estopins das explosões que vão enredando os fatos

e constituindo a história. Mas esquecemos que “o homem está na natureza”, e que a “natureza

está no homem” (MORIN apud PENA-VEGA, 2010, p. 71), e que é nessa relação complexa

que os acontecimentos vão tecendo a história.

Os três municípios – Irecê, Ibititá e Lapão – BA, nos quais essa proposta de intervenção

será implementada, estão localizados no sertão baiano tiveram suas histórias tecidas pela

relação ser humano-natureza, quer seja pela forte estiagem que deu início a tudo, a qual deixou

o chão seco para que os pés e patas o transmutassem em poeira a ser levantada pelos passos que

seguiam por caminhos incertos, quer pelo abrigo da primeira morada feita embaixo de uma

quixabeira. Neste sentido, este capítulo pretende resgatar aspectos históricos, educacionais,

econômicos e ambientais dos três municípios, enfatizando a forte ligação que possuem com o

meio ambiente que os cerca.

2.1 O INÍCIO EM COMUM

Em 1663, Antônio Guedes de Brito ganhou as terras onde atualmente se localiza grande

parte das cidades da microrregião de Irecê. Logo após obter a propriedade, Antônio organizou

uma comitiva com aproximadamente duzentos homens para que pudesse conhecer suas terras.

Depois de muito andar pela caatinga, tentando escolher os melhores locais para a criação de

gado, dando preferência àqueles nos quais havia água em abundância, a comitiva chegou então

a um local que parecia ser ideal para a pecuária. Nesse local seria estabelecida a primeira

fazenda do Senhor Antônio naquelas terras.

“A primeira de suas fazendas nesta região foi construída no lugar denominado por ele

de Lagoa das Caraíbas ou Brejo das Caraíbas, atual Irecê” (RUBEM, 2001, p. 31, grifo do

autor). Esse nome foi dado devido ao grande número de pés de Caraíbas que havia na

localidade. Contudo, a região da fazenda não chegou a ser povoada, e não se sabe precisar

quando a criação de gado foi abandonada em suas terras.

Em 1877, 224 anos após as primeiras comitivas passarem pela Lagoa das Caraíbas,

centenas de famílias migravam de um lugar para o outro fugindo da seca que assolava parte do

estado. Uma dessas comitivas trazia os homens que fundariam a cidade de Irecê e dariam início

ao povoamento das terras onde seriam construídas as outras cidades dessa região.

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2.2 IRECÊ: AS SOMBRAS DA QUIXABEIRA

Como foi dito anteriormente, em 1877 uma grande seca assolava boa parte do estado da

Bahia. Devido a isso, centenas de famílias migravam de um lugar para o outro em busca de

água e de melhoria de vida. Uma dessas comitivas era composta por Antônio Alves de Andrade,

Hermógenes José Santana, Sabino Badaró, Joaquim José de Sena, Deoclides José de Sena, José

Alves de Andrade e Benigno Andrade, que ao chegarem à Lagoa das Caraíbas descobriram um

bom lugar para permanecer, pois havia muita caça, água em abundância e um solo fértil para

plantar. Eles não possuíam barracas ou outra forma de proteção para se abrigarem, e

encontraram embaixo dos galhos de um pé de quixabeira a primeira morada nessas terras.

Figura 2. Quixabeira sob a qual os primeiros habitantes de Irecê se abrigaram.

Fonte: Blog A história da agricultura de Irecê e os impactos ambientais (2015).

Foi assim que Irecê surgiu, às sombras da quixabeira-mãe, que abraça e protege, que

nina os homens para que sonhem os sonhos de crianças de uma vida melhor. E mesmo depois

de muitos anos, a quixabeira-mãe ainda resiste, talvez como forma de mostrar o início simples

de uma cidade que se faz tão grande.

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Irecê tornou-se efetivamente município, deixando de ser distrito da cidade de Morro do

Chapéu em 31 de maio de 1933, pelo decreto estadual 8.452. Atualmente o município possui

uma população estimada de 72.730 habitantes (IBGE, 2015), e uma área de 319 km².

2.2.1 Alguns aspectos educacionais

Do início simples, de uma educação realizada em pequenos prédios muitas vezes

improvisados, e com professores particulares que eram em sua maioria leigos, a educação de

Irecê atualmente é reconhecida na microrregião pelo esforço na busca da qualidade, visando

sempre a construção de parcerias para uma melhor formação dos professores de sua rede.

Contudo no começo da década de 1990, a educação em Irecê ainda possuía traços de

seus primórdios: professores leigos, ensino feito em lugares improvisados, como acontecia em

determinadas escolas, que devido à falta de espaço físico utilizavam locais como igrejas para

que o ensino em algumas turmas pudesse acontecer. Essa problemática de ausência de espaço

adequado para o ensino afetava pelo menos cinco escolas da sede do município. E devido a

isso, a carga horária do ensino era reduzida para três horas diárias. Juntam-se a esses outros

problemas, como o grande número de crianças fora das escolas, atrasos salariais, entre outros,

que contribuíam para a baixa qualidade do ensino no município.

A partir de 1997 algumas mudanças significativas começaram a acontecer na Rede de

Ensino de Irecê. Várias parcerias com instituições foram firmadas visando a melhoria da

qualidade do ensino, entre essas instituições estão: Instituto Ayrton Senna, CETEB, Petrobras,

BNDES, FNDE, MEC, CAPACITAR e AVANTE. Da parceira com a AVANTE nasceu o

primeiro Currículo da Rede Municipal de Ensino de Irecê para a Educação Infantil, Ensino

Fundamental I e Educação de Jovens e Adultos.

O currículo foi implementado no ano de 1999, sendo que a partir dele a educação de

Irecê passou a adotar o sistema de Ciclos de Aprendizagens. A implementação do currículo

passou por inúmeros problemas, principalmente pela falta de compreensão da proposta de Ciclo

de Aprendizagem e do processo avaliativo proposto.

Em 2013, um novo currículo foi construído para a Rede de Ensino de Irecê, desta vez

por meio de uma parceria com a Universidade Federal da Bahia – UFBA. Através dessa

parceria foi oferecido o curso de Pós-Graduação em Currículo, e os cursistas, após muitas

tentativas de diálogos com os professores da rede em busca de opiniões, apresentaram o

currículo com uma proposta inovadora com um sistema de ensino baseado nos Ciclos de

Formação Humana. Contudo, este currículo ainda não foi implementado, ficando a Rede de

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Ensino de Irecê com um currículo antigo em quase completo desuso e um novo currículo

engavetado.

A Rede de Ensino de Irecê possuía em 2013 – segundo dados do INEP (2015), 34

escolas em atividade, sendo 20 escolas na Zona Urbana, atendendo na Educação Infantil 1.225

crianças; no Ensino Fundamental Anos Iniciais, 3.283 alunos; Ensino Fundamental Anos

Finais, 2.546 alunos; e na Educação de Jovens e Adultos – EJA, 766 alunos; e 14 escolas na

Zona Rural, que atendem: na Educação Infantil, 222 crianças; no Ensino Fundamental Anos

Iniciais, 521 alunos; Ensino Fundamental Anos Finais, 218 alunos; e na EJA, 112 alunos.

2.3 IBITITÁ: DA SOLIDEZ DOS ROCHEDOS ÀS INCERTEZAS DA CHUVA

Em 1887, a notícia de que uma comitiva havia encontrado solo fértil e bastante água nas

terras da Lagoa das Caraíbas, atual Irecê, se espalhou aos quatro ventos, e outras pessoas

partiram rumo à localidade a fim de se apossarem de um bom pedaço de terra para plantar, e

assim continuarem suas vidas com um pouco mais de tranquilidade. Com o tempo, não se sabe

precisar como, alguns dos moradores da nova localidade descobriram que as terras tinham

herdeiros e resolveram avisá-los que centenas de pessoas estavam tomando posse delas.

Após serem avisados, os irmãos Martiniano, Clemente e Benigno Marques Dourado

partiram do município de Brotas de Macaúbas, a fim de tomarem posse do que havia restado

de suas terras e fugirem da seca que assolava seu município. Ao chegarem a um pedaço de terra

coberta de vastos rochedos, mas também de solo fértil, os irmãos perceberam na fertilidade da

terra a possibilidade de cultivo de feijão, milho, cana e outros produtos. E decidiram fixar

moradia no local, nomeando-o então de Rochedo.

Após 40 anos da excursão dos irmãos Dourado, mais precisamente em 1927, Rochedo

tornou-se distrito do município de Irecê. Mas devido à forte agricultura que crescia no distrito,

e a grande extensão de terras ainda virgens, mais moradores chegavam à localidade buscando

trabalho, um pedaço de terra para plantar e a possibilidade de um futuro promissor. O

desenvolvimento do distrito culminou na sua emancipação política, que ocorreu em 17 de

outubro de 1961, por meio do Decreto Lei n.º 1518. Rochedo passou então a ser cidade, de

nome Ibititá.

Contudo, mesmo após 52 anos de emancipação política e de ter tido seu nome

modificado, boa parte da população ainda se refere ao município de Ibititá como Rochedo, o

que pode evidenciar um sentimento de pertencimento e identificação dos habitantes do

município com o meio ambiente que os cerca.

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Figura 3. Rochedos localizados na sede do município de Ibititá. Fonte: Blog Conhecer para preservar (2015).

Atualmente, Ibititá possui uma área territorial de aproximadamente 623 km², e uma

população estimada em 18.752 habitantes (IBGE, 2015). A atividade econômica principal

ainda é a agricultura, mas devido à seca que tem assolado o semiárido baiano nos últimos anos,

a produção agrícola tem sido ínfima. Devido a esse fato, parte da população mais carente do

município vive do dinheiro obtido através dos programas federais de transferência de renda e

das aposentadorias dos idosos das famílias.

Assim, todo nascido em Ibititá - como eu sou, cresce compreendendo as incertezas das

chuvas, cresce desejando que ela venha forte, farta e constante, para que em uma relação quase

carnal, fecunde a terra e germine em seu solo a nova vida que renasce. Como uma fênix, que

ressuscita das cinzas, a caatinga desse sertão revive através das águas da chuva. Mas não é

somente a vegetação que ressuscita, a nossa esperança dos seres que habitam essas terras

também ganha nova vida com as chuvas. E é nesse eterno (re)viver que alimentamos a

esperança - quiçá utópica, que como diria Eduardo Galeano, nos move para assim continuar

construindo a nossa história.

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2.3.1 Panorama da Rede de Ensino

Com a cidade crescendo e o aumento de sua população, constatou-se a necessidade de

investimentos em educação. Um dos primeiros prédios escolares construídos exclusivamente

para finalidade do ensino em Ibititá foi a Escola Hermano Marques Dourado, precisamente em

1969. A escola atendia turmas de 1ª à 4ª série do Ensino Fundamental, e em meados dos anos

80, passou a atender também as turmas de Pré-Escola. Foi a primeira escola no município a

fornecer educação para as crianças dessa faixa etária.

Essa iniciativa de atender às crianças em idade pré-escolar foi importante conquista para

o município. “As salas de aula não possuíam uma infraestrutura adequada para atender crianças

de 4 a 6 anos. Porém, as professoras possuíam curso de magistério e desenvoltura para trabalhar

com crianças dessa faixa etária.” (COLPO, 2008, p. 40)

A primeira creche do município foi fundada em 1985, funcionava em um galpão

improvisado e era mantida pela prefeitura. A Creche Mãe Nêna não possuía nenhum registro

legal e não atendia adequadamente às crianças. Pouco tempo depois a creche foi instalada em

uma casa alugada, funcionando das 8h às 14h, oferecendo refeições para as crianças, que eram

em sua maioria de famílias carentes.

Em 1993 houve uma mudança significativa na infraestrutura da creche, passando a ter

instalação própria e mais adequada à faixa etária das crianças. Outra mudança foi o nome da

instituição, que passou a se chamar Creche Mãe Du, em homenagem a uma parteira que

trabalhou gratuitamente na cidade dos anos 1950 até os anos 1980.

Segundo dados do INEP (2015), a Rede de Ensino de Ibititá possui 33 escolas em

atividade, sendo que a maioria está localizada na Zona Rural, mais precisamente 28 escolas.

Em 2013 foram atendidos 3.160 alunos, sendo: 582 alunos de Educação Infantil; 2.468 alunos

de Ensino Fundamental; e 110 alunos de Educação de Jovens e Adultos.

2.3.1.1 O Currículo desconhecido

A Proposta Curricular no município de Ibititá foi elaborada entre os anos de 1997 e

2000, mas não se pode precisar o ano de sua implementação. Embora no seu texto seja afirmado

que a Proposta Curricular foi elaborada com a colaboração dos diretores, professores e

funcionários, seu conteúdo é desconhecido pela maioria dos educadores, apesar de ainda vigorar

oficialmente.

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No documento são traçados dois compromissos do Poder Municipal para com a

sociedade ibititaense: o primeiro afirma que nenhuma criança deverá permanecer fora da escola

por falta de vagas, de alimentação ou vestuário; o segundo afirma o compromisso de oferecer

educação de jovens e adultos para as pessoas que não tiveram oportunidade de frequentar a

escola na idade certa. (IBITITÁ, [2002])

Dentre os objetivos estabelecidos no currículo, podem ser destacados os seguintes:

“compreensão do mundo em que vive; conquista da autonomia; criação de vínculos para uma

interação social; acesso ao saber historicamente construído pela humanidade; ampliação do

conhecimento” (IBITITÁ, [2002]).

Outro ponto abordado no documento é que os conhecimentos sejam funcionais, ou seja,

que possam ser efetivamente utilizados quando as circunstâncias em que se encontra o aluno

exijam essa ação. Para que isso possa acontecer, são estabelecidos no currículo critérios para

escolha dos conteúdos a serem ensinados, são eles: “ser relevante para a sociedade; ser relevante

para o desenvolvimento dos alunos; precisar de uma ajuda específica para ser aprendido”

(IBITITÁ, [2002]). No documento o sistema escolar é organizado em ciclos: Educação Infantil,

de 0 a 3 anos; creche, de 04 a 06 anos; pré-escola; Ensino fundamental 1°, 2°, 3° e 4° ciclos.

Essa organização não chegou a ser implementada, e atualmente o Ensino Fundamental é

organizado em Anos, atendendo a regulamentação da Lei 11.274/2006, que institui o Ensino

Fundamental de Nove Anos.

2.4 LAPÃO: FONTE DE ÁGUA LIMPA

A história dos três municípios, Irecê, Ibititá e Lapão, sempre esteve conectada. Em uma

dessas comitivas que vieram para essas terras estava Herculano Dourado, que fixou moradia

em um lugar denominado Fazenda Boi, que ficava perto da Lagoa das Caraíbas. Herculano era

dono de muitas terras, tantas que não conhecia as riquezas de sua propriedade.

Em 1900 era comum os homens saírem para caçar e procurar mel, que servia tanto para

consumo de suas famílias, como também para comercialização nas feiras de cidades vizinhas.

Sair para caçar era rotina de Pedrinho, João e Antônio Neném de Matos, que na época moravam

em Rochedo (RUBEM, 2010, p. 34), atual Ibititá. Eles sempre caçavam juntos, mas um dia

Pedrinho decidiu se aventurar por outras partes daquela imensa terra, e chamou seus

companheiros para procurar um lugar diferente para caçar.

Acostumados com a certeza de conseguir caça, seus companheiros não aceitaram partir

em busca de uma incerteza. Não intimidado pela recusa dos companheiros, Pedrinho partiu

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sozinho, andou um bocado até avistar um pé de gameleira, árvore que chamava a atenção por

ser mais alta que as demais. Caçador experiente, ele sabia que as gameleiras cresciam perto de

rochedos, onde poderiam ser encontrados animais em busca de água.

Ao chegar perto, percebeu uma grande lapa na qual parecia haver uma espécie de rio

subterrâneo e inúmeros animais que estavam ali para saciarem a sede. Pedrinho não contou aos

amigos sobre a descoberta e não quis mais caçar com eles. Depois de muitos dias, e de muita

desconfiança com a recusa do amigo em lhes acompanhar, João e Antônio resolveram seguir

Pedrinho e o encontraram deitado às margens da grande lapa, às sombras da gameleira.

Os dois lembraram Pedrinho que as terras pertenciam a Herculano, e o correto seria

avisá-lo da descoberta em sua propriedade. Mas Pedrinho não quis ouvir os conselhos, afirmava

que ele havia descoberto o local e, sendo assim, lhe pertencia. Mesmo assim os amigos foram

até Herculano e lhe contaram da grande lapa.

Herculano mandou chamar Pedrinho para uma conversa, com medo, ele não foi.

Herculano então ordenou aos seus capangas que buscassem Pedrinho. Depois de muita

conversa, o dono das terras autorizou Pedrinho a continuar a caça e também lhe ofertou um

pedaço de terra para que pudesse cultivar perto da grande lapa.

Figura 4. Praça na cidade de Lapão, onde se localiza a grande Lapa.

Fonte: Site Cidades do meu Brasil (2015).

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Não foi só a Pedrinho que Herculano doou um pedaço de terra. Decidido a povoar a

região da grande lapa e a fundar um povoado, ele começou a doar pequenas propriedades para

quem decidisse fixar moradia naquela localidade. Dezenas de pessoas se mudaram então para

aquelas terras, e assim se deu o surgimento do município de Lapão. A grande gameleira, em

cuja sombra Pedrinho aproveitava para descansar, foi derrubada em 1962, porém uma nova

árvore da mesma espécie foi plantada no seu lugar no ano de 1999.

2.4.1 Aspectos educacionais

Por volta do ano de 1926, o atual município de Lapão ainda era um pequeno povoado,

mas já possuía uma escola pública, o que era um diferencial em relação às outras localidades

da região. A escola funcionava em um amplo salão, como eram chamados naquela época os

espaços utilizados para o ensino, e tinha apenas uma professora, Ana Guanaes de Lima, que

lecionou nessa escola até 1930, sendo substituída por sua irmã.

Sabe-se que até o ano de 1996, antes da publicação da Lei de Diretrizes e Bases da

Educação, Lei n. 9394, a educação do município de Lapão, como de outros da microrregião,

passou por uma série de problemas. Quase todos os professores eram contratados, e em sua

grande maioria eram leigos, muitos com baixa escolaridade. O ensino público somente era

ofertado até a 4ª série do Ensino Fundamental. Do início ousado, com a fundação de uma escola

pública ainda enquanto era povoado, a educação do município de Lapão tinha ficado parada no

tempo. A partir de 1997, o ensino público do município começa a ser estruturado, no mesmo

ano foi realizado concurso público para professores, iniciou-se uma discussão sobre melhoria

salarial, ocorreu a construção de um Plano de Carreira para o Magistério, iniciou-se a utilização

de TVs e Vídeos Cassetes durante as aulas, e principalmente, ocorreu a ampliação da oferta de

ensino até a 8ª série do Ensino Fundamental.

Atualmente o município de Lapão, segundo dados do INEP (2015), possui 26 escolas

em funcionamento, a grande maioria na Zona Rural, sendo 18 no total, atendendo 1.020 crianças

na Educação Infantil; 2.270 alunos no Ensino Fundamental Anos Iniciais; e 1.631 alunos no

Ensino Fundamental Anos Finais.

2.5 O ENTRELAÇAR DOS ASPECTOS ECONÔMICOS E AMBIENTAIS

Durante muitos anos a principal atividade econômica dos municípios de Irecê, Ibititá e

Lapão foi quase que exclusivamente a agricultura. Isso se deu principalmente nas décadas de

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1970 e 1980, quando o governo federal intensificou o financiamento do plantio e colheita nesses

municípios. A agricultura era centrada basicamente na produção do chamado tri consórcio,

feijão – milho – mamona. Os produtores recorriam à agricultura não apenas como forma de

sustento de suas famílias, mas também como forma de buscar o enriquecimento, tentando a

cada ano aumentar a produção, o que consequentemente aumentou a extensão das áreas

plantadas e a intensificação do desmatamento na região. Foi durante esse período que a região

de Irecê recebeu o título de Capital Mundial do Feijão, quando cerca de 400 mil hectares do

produto foram plantados, rendendo uma safra de aproximadamente 11 sacos por hectare.

A última grande safra de feijão na região foi em 2000, quando obteve-se uma produção

de 5 milhões de toneladas do grão. Mas devido às questões climáticas e à degradação do solo,

a produção não tem mais o mesmo rendimento. Dos 400 mil hectares plantados nos anos de

1980, atualmente o plantio de feijão não passa de 30 mil hectares. Irecê, depois de quase 30

anos, perdeu o título de Capital Mundial do Feijão. Lopes (2010) afirma que o intensivo

financiamento feito pelo governo federal e o sistema de produção utilizado configuraram-se

como um “elemento de forte pressão sobre o ambiente e de fragilização dos mecanismos de

convivência da população com os recursos naturais” (LOPES, 2010, p. 88). Na figura 5,

podemos ver o atual estado da vegetação na região.

Figura 5. Mapa da vegetação de parte do Território de Identidade de Irecê, em destaque os municípios de Irecê, Ibititá e Lapão - BA. Fonte: Inema (2014). Nota: modificado pelo autor.

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Como podemos ver no mapa, a parte de cor mais clara que cobre praticamente toda a

extensão dos municípios de Irecê, Ibititá e Lapão, mostra o alto grau de derivação antrópica1

em que estão essas localidades, principalmente no município de Ibititá. As imagens de satélite

a seguir mostram de forma mais evidente o nível de desmatamento e degradação ambiental nos

três municípios. Para Lopes, o atual estágio de derivação antrópica pode ser sentido no alto

nível de poluição e degradação das margens dos rios na região de Irecê, na salinização das áreas

de produção, na destruição da vegetação e no comprometimento dos lençóis freáticos, associado

à contaminação pelo uso de agrotóxicos e ao uso intenso dos recursos hídricos para irrigação,

pela abertura de grande número de poços tubulares de “[...] forma descontrolada, sem a

existência de fiscalização e de um monitoramento do uso da água” (LOPES, 2010, p. 92).

Figura 6. Imagem de satélite do município de Irecê. Fonte: Google Earth (2015).

1Derivação antrópica é a alteração direta ou indireta do meio ambiente resultante das ações humanas (MONTEIRO, 2001 apud SANTOS, 2014, p. 279).

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Figura 7. Imagem de satélite do município de Ibititá. Fonte: Google Earth (2015).

Figura 8. Imagem de satélite do município de Lapão. Fonte: Google Earth (2015)

Embora tenha tentado buscar dados oficiais sobre o desmatamento nos três municípios,

através de mensagens eletrônicas, telefonemas e indo diversas vezes ao Posto Avançado do

Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) em Irecê, tais dados não foram

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disponibilizados pelo órgão. Contudo, através do Mapa da Vegetação, mostrando o grau de

derivação antrópica, e das imagens de satélite, pode-se constatar que a situação ambiental dos

três municípios nos quais este estudo é realizado, bem como de outros municípios do Território

de Identidade de Irecê, é cada vez mais crítica e já pode ser sentida por toda a população dos

municípios.

2.6 ASPECTOS DAS POLÍTICAS PÚBLICAS EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL NOS TRÊS

MUNICÍPIOS

Durante os dois primeiros ciclos do Mestrado Profissional em Educação, realizados

entre outubro de 2013 e agosto de 2014, fomos convidados pelas Oficinas Descobrindo a rede

e Compreendendo espaços específicos da rede a adentrar nos espaços educativos a fim de

aprofundar nosso conhecimento sobre as redes municipais de educação e diagnosticar a

realidade. Assim, as informações contidas nessa seção do trabalho são frutos dessas visitas a

esses espaços educativos, e da busca de informações junto às Secretarias de Educação dos

municípios de Irecê, Ibititá e Lapão.

Nesse processo de descobrimento e compreensão das redes, visando sempre um maior

entendimento do acontecer da Educação Ambiental, busquei junto às Secretarias de Educação,

através de conversas com os coordenadores responsáveis pela EA, e/ou dos coordenadores

técnicos, informações e documentos que me ajudassem a compreender como a Educação

Ambiental é tratada institucionalmente pelos municípios pesquisados. Em conversa com os

coordenadores, pude perceber que em nenhuma das redes há uma regulamentação para a

Educação Ambiental, a temática nem mesmo é tratada nos textos curriculares. Entretanto, no

município de Lapão já existe uma tentativa de institucionalizar a EA como política pública na

rede de educação. Para isso, o município criou em 2011 a Proposta de Educação Ambiental,

com o título “Educando para a cidadania: a Participação do sujeito na valorização do seu espaço

ambiental”. De acordo com o documento, a proposta deve servir como referência para a

elaboração de programas setoriais e projetos pedagógicos e sociais em todo o território do

município, e tem como objetivo principal:

Desenvolver uma compreensão integrada do Meio Ambiente e suas múltiplas e complexas relações, envolvendo aspectos ecológicos, psicológicos, legais, políticos, sociais, econômicos, científicos, históricos, culturais, tecnológicos, éticos e pedagógicos, contribuindo para estimular a capacidade de representatividade política e técnica das pessoas em todos os segmentos de sociedade lapoense” (LAPÃO, 2011, p. 6).

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A proposta ainda traz orientações didáticas para as práticas pedagógicas em Educação

Ambiental, visando dar suporte aos educadores. As orientações são baseadas no Programa de

Educação Ambiental do Sistema Educacional da Bahia (ProEASE – BA) e no Programa

Nacional de Educação Ambiental (ProNEA). Entre as orientações didáticas, podem ser

destacadas as seguintes:

Projetos – atividade flexível que permite a realização de trabalhos com temáticas adequadas à realidade escolar e sua problematização, envolvendo as etapas de identificação do tema, elaboração de objetivos e metas, seleção de atividades, execução, acompanhamento e avaliação com definição de critérios; [...] Teatro ou dramatizações – atividades pedagógicas que envolvem componentes cognitivos, corporais, afetivos, e simbólicas facilitando o entendimento dos problemas ambientais; Pesquisas – sobre conflitos e problemas ambientais atuais em fontes diversificadas, considerando os atores sociais envolvidos, os documentos de instituições públicas e privadas, bem como de associações, sindicatos e ONGs, dando concretude aos temas abordados; Elaboração/encaminhamento de documentos – cartas e manifestos produzidos na escola, que expressam denúncias e ações de intervenção diante da degradação socioambiental; [...] Palestras – envolvendo a comunidade escolar e profissional da área e a comunidade como um todo nos processos de reflexão, intervenção e construção coletiva; Produção coletiva e divulgação de materiais contextualizados – cartilhas, livretos, vídeos e similares feitos autonomamente nas escolas, facilitando o acesso à comunicação e o diálogo entre áreas de conhecimento (LAPÃO, 211, p. 14).

Contudo, conforme explicitado no documento, as escolas têm autonomia na criação e

consolidação da educação ambiental, podendo desenvolver suas estratégias didáticas, escolhas

de temas, porém sempre em consonância com os princípios e diretrizes destacados na proposta.

Já em relação ao município de Ibititá, a única menção em documento oficial sobre a

Educação Ambiental é no Plano Municipal de Educação, Lei nº 650, de 14 de março de 2011.

No documento, é afirmado como um dos objetivos do Plano a oferta de cursos de formação

continuada em Educação Ambiental para professores e gestores que atuam no Ensino

Fundamental. As formações, segundo o texto, deveriam ter começado no primeiro semestre de

2011. Porém, nenhuma formação nesse sentido foi iniciada.

No município de Irecê, há uma iniciativa a ser iniciada em parceria com o Serviço

Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR-AR/BA), o Programa Despertar. A iniciativa

atenderá somente escolas das comunidades rurais do município e visa formar cidadãos rurais

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conscientes, aptos a exercer a cidadania e a participar de um processo de desenvolvimento mais

próximo da sustentabilidade. Entre os objetivos do Programa Despertar, estão: formar cidadãos

capazes de valorizar e preservar o meio ambiente em que vivem e habilitar educadores para

desenvolver ações estratégicas sobre os temas transversais, com atividades pedagógicas

significativas, a partir de projetos interdisciplinares.

Embora os municípios de Ibititá e Irecê não possuam programas ou propostas

específicas para a Educação Ambiental, as escolas e principalmente os professores afirmam

realizar ações e atividades em EA no seu cotidiano, contudo em nenhuma das visitas foi possível

observar atividades em EA acontecendo. As visitas foram realizadas em escolas2 nos

municípios de Ibititá e de Irecê, sendo realizadas duas visitas em cada unidade de ensino.

Em uma das visitas na localizada no município de Ibititá, a coordenadora da escola me

esclareceu que o trabalho com EA é difícil, porque embora os professores tenham consciência

de sua importância, não conseguem trabalhar com as temáticas dentro de suas aulas. O mesmo

ocorre na escola no município de Irecê, segundo a coordenadora da instituição as atividades de

Educação Ambiental ficam praticamente restritas às Oficinas de Jardinagem e Artes do

Programa Mais Educação. Mesmo com essa dificuldade, segundo as coordenadoras, alguns

professores costumam inserir atividades de Educação Ambiental em suas práticas através de

projetos, que na maioria das vezes não atingem toda a escola, tendo caráter bastante específico

e pontual, voltados para datas comemorativas.

Alguns projetos apesar de serem pontuais, atingem toda a escola e/ou o município,

como o projeto do desfile cívico de 7 de setembro, realizado em 2013 pelo município de Lapão.

Intitulado Lapão: a caminho do desenvolvimento sustentável, o projeto visava “promover a

apropriação de novas concepções e práticas educacionais que incorporem a dimensão ambiental

e promovam o ideário da sustentabilidade, garantindo assim uma nova postura ética diante do

mundo” (LAPÃO, 2013, p. 01).

Contudo, apesar dessas raras iniciativas de projetos em comum, as práticas em Educação

ambiental ainda são realizadas de forma bastante solitária, seja pelas escolas, seja pelos

professores, sem um diálogo entre professores, entre escolas, entre escolas e secretarias, e

principalmente, com pouco apoio formativo por parte das secretarias de educação.

2 Visando garantir o anonimato dos entrevistados, seus nomes e os nomes das escolas serão omitidos.

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PARTE II

AS FLORES DA BARRIGUDA _________________________________________

O sertão é do tamanho do mundo.

João Guimarães Rosa (2006, p. 73)

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3 A TESSITURA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL: FIOS QUE EMERGEM DO

MUNDO-VIDA

Na busca e no desejo de compreender a tessitura da Educação Ambiental nos municípios

de Irecê, Ibititá e Lapão, a fim de obter elementos para elaboração da proposta de criação de

uma Rede de Educação Ambiental envolvendo os referidos municípios, foram construídos no

caminho metodológico da investigação instrumentos de pesquisa sustentados na perspectiva de

uma racionalidade outra, e deste modo entendendo que o conhecimento surge a partir do

diálogo eu-outro-mundo.

Nessa perspectiva, os instrumentos utilizados, sejam inovadores como a

Desconferência: Intervenções do/no Cotidiano, ou mais usuais no âmbitos das pesquisas

qualitativas com as Entrevistas Narrativas, visavam a compreensão da tessitura da Educação

Ambiental a partir do diálogo com os docentes, e sendo na experiência do diálogo que se funda

um ser a dois (MERLEAU-PONTY, 2014), os docentes que participaram do estudo são sujeitos

coautores deste trabalho.

Assim, este capítulo será dividido em duas seções: a primeira, apresenta as discussões e

diálogo tecidos na Desconferência: Intervenções do/no Cotidiano; a segundo, traz as

compreensões e discussões que emergem a partir das narrativas dos docentes.

3.1 DESCONFERÊNCIA: FIOS QUE EMERGEM ENTRE CAFÉS E CONVERSAS

A Desconferência: intervenções do/no cotidiano foi realizada no dia 22 de abril de

2014, no Parque da Cidade localizado no município de Lapão. O objetivo do evento era a

construção de diálogos com os membros – professores, gestores, coordenadores, das três redes

que compõem o Mestrado Profissional em Educação – UFBA. Através desses diálogos

buscávamos ouvir os professores sobre as temáticas das pesquisas que então eram realizadas

pelos mestrandos do programa, e ouvir suas sugestões para os projetos de intervenções nos

quais naquele momento começávamos a pensar.

O evento foi organizado pelos 20 mestrandos do programa, sob a orientação da

Professora Inez Carvalho, visando romper a lógica comum de uma conferência ou palestra, nas

quais geralmente os participantes são meramente ouvintes ou quando têm a possibilidade de se

expressar permanecem sentados em lugares fixos durante todo o evento. Desta forma,

decidimos adotar o termo Desconferência, que vem sendo utilizado em eventos, principalmente

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nas áreas de tecnologias, como uma saída para romper com um ou mais aspectos de uma

conferência convencional.

Assim, a organização da Desconferência: intervenções do/no cotidiano foi pensada na

perspectiva de fuga do convencional, os membros das três redes que participaram do evento

foram convidados a conversarem, a serem coautores, e não apenas meros figurantes ou ouvintes

de uma preleção

Seu uso nesse evento da área educacional, que tinha um cunho acadêmico e de pesquisa,

corrobora com nossa ideia inicial de escuta aos profissionais da educação dos municípios, visto

que uma conferência ou uma palestra não nos permitiria ouvir esses profissionais. Nessa

perspectiva, o evento foi organizado visando romper a lógica comum de uma conferência, nas

quais geralmente os participantes são apenas ouvintes e raramente tem a possibilidade de se

expressar.

A organização da Desconferência: intervenções do/no cotidiano foi pensada visando o

distanciamento do convencional, e na busca de uma racionalidade outra, os participantes foram

convidados a se movimentarem pelos espaços, a interagirem, a conversarem, a serem coautores

do processo de construção dos projetos de intervenção, e não apenas meros figurantes ou

ouvintes de uma preleção. Neste sentido, a Desconferência foi organizada em três

espaços/momentos que, no acontecer da dinâmica do evento, deram vida à Desconferência.

O primeiro dos espaços/momentos era Alameda, que se constituiu como o espaço de

entrada dos participantes, espaço de acolhimento e provocação, no qual ficaram expostos os

banners com as informações e indagações sobre as temáticas das pesquisas realizadas pelos

mestrandos. Nos banners não haviam informações sobre os mestrandos, o objetivo com isso era

que os participantes escolhessem as mesas por afinidades com as temáticas, e não por afinidade

com os mestrandos ou por serem de suas redes. As imagens as seguir mostram como foram

expostos os banners na Alameda, e a interação dos participantes com o espaço.

Já a Instalação tinha como objetivo a sensibilização e a provocação dos participantes,

e foi construída com objetos que remetessem às temáticas da pesquisa. A instalação era

composta por uma cama de gato que fazia com que os participantes se desequilibrassem ao

andar pelos espaços, provocando a busca constante de equilíbrio. A cama de gato foi utilizada

como metáfora para os problemas que acontecem no cotidiano escolar e na tentativa de busca

de solução para esses problemas.

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Figura 9. Participantes da Desconferência lendo as informações/indagações no banner. Fonte: Vera Cavalcante

Figura 10 – Participantes do evento se movimentando dentro da instalação. Foto: Vera Cavalcante

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O World Café foi utilizado como instrumento para efetivação dos diálogos

colaborativos entre os participantes do evento. O World Café é organizado em várias rodas de

conversas que acontecem simultaneamente em diversas mesas. As rodas têm um tempo

determinado para o seu acontecer, ao final desse tempo os participantes devem se levantar e

escolher outra mesa, para que possam tecer um novo diálogo/conversa.

Na Desconferência, essa metodologia foi composta por 14 mesas divididas de acordo

com as temáticas das pesquisas dos mestrandos do programa, e foram realizadas quatro rodadas

de conversas com 10 participantes a cada rodada. Cada rodada de conversa teve 20 minutos de

duração, o final do tempo era sinalizado com música tocada pelos irmãos artistas Victoria e

Victor Portugal, filhos de Joelma Portugal, mestranda do projeto. E por mais que o fim da

conversa acontecesse de forma um tanto abrupta, ainda no calor das discussões, as músicas

deram melodia e vida à dinâmica da metodologia. Cabia a nós mestrandos durante a

Desconfêrencia o papel de coadjuvantes, éramos instigadores das conversas, ouvintes das

prosas.3

Figura 11. Participantes da primeira roda de conversas na minha mesa, antes do início da construção dos diálogos. Foto: Hilma Souza

As conversas, tecidas entre a degustação de alguns sequilhos e um pouquinho de café,

foram gravadas através de um aplicativo no meu celular, contudo e infelizmente, por

esquecimento não ativei o aplicativo de gravação após o intervalo das duas primeiras rodadas

de conversas, assim apenas os áudios das primeiras rodadas ficaram registrados. E devido à

3 No World Café foram utilizados copos descartáveis devido ao alto custo que seria fornecer copos reutilizáveis. Contudo, os participantes do evento foram orientados a utilizarem apenas um copo.

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dinâmica do evento, algumas pessoas no calor da conversa não se apresentaram,

impossibilitando sua identificação. Desta forma, os participantes serão identificados apenas

como professoras.

Para desencadear os diálogos iniciais, lancei a indagação: como a Educação Ambiental

acontece nas escolas?

A conversa é iniciada por uma fala de uma professora que propõe que a Educação

Ambiental seja inserida nos currículos municipais com disciplina especifica, expondo um

debate histórico da Educação Ambiental, que parecia ter sido superado, mas que sempre

ressurge como uma maneira de tornar as ações em Educação Ambiental nas escolas mais

frequentes. Contudo, no tecer da conversa as falas de outras professoras demonstram outras

formas de pensar e compreender essa questão, sendo que a própria legislação vigente que dispõe

sobre a Educação Ambiental, a Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999, institui como um dos

princípios da Educação Ambiental a perspectiva inter, pluri, multi e transdisciplinar, e os

Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs tratam o Meio Ambiente como tema transversal.

Um aspecto bastante importante revelado nos fios da conversa, é a não contextualização

dessas práticas com os problemas ambientais da região, que devido a uma forte seca e a

problemas de gestão hídrica, passa por um racionamento de água. O trecho da conversa que

mostras esse aspecto é exposto a seguir:

Professora A: “É uma questão curricular, ela como disciplina. Cobrado realmente para

ser realizado”.

Professora B: “Eu vou mais além da cobrança disciplinar, eu vou mais para o olhar do

próprio professor”.

Professora D: “Se o professor não tiver esse olhar ambiental...”.

Professora B: “Porque já tem tanta coisa que é cobrada no currículo, mas não acontece”.

Professora C: “Porque é uma questão transversal, a própria lei diz que é transversal”.

Professora B:

Os PCNs já trazem isso. Mas falta esse olhar ambiental. Quando a gente faz um evento na escola, ou que vai trabalhar mesmo o Dia do Meio Ambiente, aí a gente vê muitos professores cortando galhos verdes para decorar o espaço. Eu posso decorar com galhos secos, com folhas secas. Eu tenho outras opções, mas eu só tenho isso se eu parar para refletir que se eu tiver quebrando o galho, eu estou no dia do meio ambiente agredindo o meio ambiente.

Professora C: “Ou faz a passeata pela conscientização para produzir menos lixo, e

distribui panfleto de papel!”.

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Professora B:

E outras coisas, diversas coisas que acontecem. No Dia da Criança, muitas escolas fazendo banho de mangueira, e nós estamos passando por racionamento de água, a gente não sai do racionamento já há uns três anos. Mas toda escola fez o banho de mangueira. Eu estou incentivando meu aluno a chegar em casa e a fazer o banho de mangueira qualquer dia que ele quiser. Aí em minha aula eu falo: usar o balde para limpar a casa ou carro, usar o balde, não usar a mangueira, aí eu vou e faço banho de mangueira na escola. Então são pequenas coisas que a gente faz na escola que reflete muito na vida das crianças.

Transcrevo agora um trecho de outra conversa que foi iniciada com a mesma pergunta

da anterior:

Professora 1: “Assim, tem que trabalhar mais na escola a questão ambiental, tem ficado

muito a desejar. Geralmente trabalha apenas um dia, no Dia do Meio Ambiente”.

Professora 2:

Conscientização é um processo lento, mas o que acontece é o professor trabalhar apenas o mês de junho com o meio ambiente, depois fica esquecido o resto do ano todo. Então, não vai conscientizar o aluno num projeto de 15 dias. Isso precisa ser trabalhado diariamente. Outro problema é que a gente não tem formação para trabalhar com Educação Ambiental. Não tem nenhum material da Secretaria, o currículo não tem.

Professora 3: “Quando vem algo é para trabalhar com reciclagem, aí você vai trabalhar

com o que? Com garrafa PET, essas coisas”.

Professora 4: “Gasta EVA4 para fazer uma bordinha ali”.

Professora 5: “Você acaba produzindo mais lixo ainda, por que produz um enfeite que

não vai ser utilizado”.

Através desse trecho da conversa tecida pelas professoras podemos perceber que a

Educação Ambiental tem acontecido de maneira bastante pontual nas escolas, e está ligada

principalmente a datas comemorativas, como o dia do Meio Ambiente – 5 de junho, que é

citado no diálogo, e ao tema lixo e reciclagem. No relato também pode ser percebido que as

professoras têm conhecimento da importância da conscientização dos alunos em relação às

questões ambientais, contudo as falas deixam transparecer que não existe um

aprofundamento do debate dessas questões no processo de ensino e aprendizagem, o que

pode ser reflexo de uma carência de formações para o trabalho com a Educação Ambiental.

Outro ponto importante levantado na conversa se trata da ausência de políticas públicas

4 EVA é um emborrachado utilizado nas escolas para confecção de artesanatos e enfeites.

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municipais relacionadas à Educação Ambiental, como o não aparecimento nos currículos de

orientações para o trabalho nas escolas ou a produção de materiais que deem suporte para as

ações dos professores, contudo, emergem na conversa falas que mostram que apesar da ausência

de políticas públicas especificas, projetos são enviados pelas Secretarias de Educação para as

escolas trabalharem, embora os professores deixam transparecer em suas falas que as temáticas

dos projetos muitas vezes não estão contextualizadas com as realidades das escolas e das

comunidades nas quais estão inseridas.

3.2 ENTREVISTAS NARRATIVAS: FIOS QUE EMERGEM DAS EXPERIÊNCIAS

A palavra narrativa tem sua origem etimológica na palavra latina narrare, que significa

contar, narrar, relatar, tornar algo ou algum acontecimento conhecido. O hábito de narrar

história é comum em todas as comunidades, cresci ouvindo histórias contadas pela minha mãe,

minha avó e outros familiares sobre minha família, histórias de como meu bisavô materno

sempre mudava de cidade com a chegada da seca, levava sua família pelo mundo em busca de

lugares com água farta e terra produtiva, na qual pudesse viver com sua família. Ou de como

minha avó materna nasceu no meio do mato, enquanto sua família se escondia da passagem dos

Revoltosos da Coluna Prestes, em 1926, pelo interior da Bahia. Certa vez, ouvi minha mãe

contar de quando era menina e ia para a roça de sua Tia Maria. Ela ia na garupa de um cavalo

ou mula, não me lembro bem ao certo, seu Tio João era quem guiava o animal, minha mãe me

contou que em uma dessas idas sentiu sede e que reclamou com seu tio, ele parou o animal,

tirou o chapéu, e estendeu o braço para pegar com o chapéu um pouco de água que tinha ficado

empoçada das chuvas de alguns dias atrás. Segundo ela, não tinha água melhor no mundo.

Eu ouvia essas narrativas serem contadas na sala de minha casa, sentado na porta nos

dias de calor, ou na roça de minha tia-avó a luz dos lampiões. As narrativas fazem parte da vida

das pessoas, é através das histórias narradas por familiares que conhecemos e compreendemos

a própria história de nossas famílias. Segundo Barthes (1976, p. 19-20), existem incontáveis

narrativas no mundo, nesse sentido, ele afirma que a narrativa:

[...] está presente no mito, lenda, fábula, conto, novela, epopeia, na história, na tragédia, no drama, na comédia, na mímica, na pantomima, na pintura (pensemos na Santa Úrsula de Carpaccio), no vitral, no cinema, nas histórias em quadrinhos, no fait divers, na conversação. Além disso, sob estas formas quase infinitas, a narrativa está presente em todos os tempos, em todos os lugares, em todas as sociedades; a narrativa começa com a própria história da humanidade; não há em parte alguma povo algum sem narrativa; todas as

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classes, todos os grupos humanos têm suas narrativas, e frequentemente estas narrativas são apreciadas em comum por homens de cultura diferente, e mesmo oposta: a narrativa ridiculariza a boa e a má literatura: internacional, trans-histórica, transcultural; a narrativa está aí, como a vida.

As narrativas estão tão presentes em nossas vidas que tornam-se algo intrínseco à

própria vida, ao contar nossas experiências estamos tecendo narrativas sobre nossa itinerância

no mundo, as palavras narradas carregam a nossa própria existência, em sua pluralidade de

sentidos, significados, sons, cores, gosto e desgosto. A experiência humana é narrada em

diversas formas, como foi expresso anteriormente na citação de Barthes, as pinturas, os vitrais,

as histórias, contos e causos que são contados por pessoas sentadas nas calçadas, nas cozinhas,

nas praças, nas salas de professores, nos pátios das escolas. Nesse sentido, Jovchelovitch e

Bauer (2014, p. 91) nos dizem que:

Na verdade, as narrativas são infinitas em sua variedade, e nós as encontramos em todo lugar. Parece existir em todas as formas de vida humana uma necessidade de contar; contar histórias é uma forma elementar de comunicação humana e, independentemente do desempenho da linguagem estratificada, é uma capacidade universal. Através da narrativa, as pessoas lembram o que aconteceu, colocam a experiência em uma sequência, encontram possíveis explicações para isso, e jogam com a cadeia de acontecimentos que constroem a vida individual e social. Contar histórias implica estados intencionais que aliviam, ou ao menos tornam familiares, acontecimentos e sentimentos que confrontam a vida cotidiana normal.

Enquanto capacidade universal, as narrativas estão ligadas a própria existência humana,

embora as formas que cada comunidade desenvolve para contar suas narrativas dependam dos

contextos socioculturais e econômicos. As palavras, os sentidos e tipos de narrativas dependem

do modo de vida de cada comunidade. Nos municípios de Irecê, Ibititá e Lapão – BA as

narrativas contadas nas formas de causos ainda são as mais comuns. Os causos são narrativas

que representam acontecimentos que podem ou não ter acontecido, e são contadas de forma

engraçada e lúdica. Todavia, outras formas de narrativas são comuns nos referidos municípios,

suas próprias histórias somente são conhecidas devido às narrativas contadas de geração em

geração.

Apesar do ato de narrar histórias pareça ser algo simples, as narrativas não são um

listagem de acontecimentos contados de forma solta. Existe na narrativa uma tentativa de liga-

los, possibilitando a construção de sentidos e significados. Assim “o enredo é crucial para

constituição de uma estrutura narrativa. É através do enredo que as unidades individuais (ou

pequenas histórias dentro de uma história) adquirem sentido na narrativa”

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(JOVCHELOVITCH; BAUER, 2014, p. 92). É através do enredo que o narrador seleciona os

acontecimentos que irão ou não fazer parte da narrativa, seleciona o que deve ou não ser dito.

Agindo por meio de funções específicas, o enredo trabalha como um tear unindo os fios para

tecer as narrativas, unindo os acontecimentos através de uma estrutura que possibilita serem

contados em narrativas. Como afirmam Jovchelovitch e Bauer (2014, p. 92), embora os fatos,

acontecimentos e fenômenos da vida humana não tenham inícios e fins delimitados, é preciso

demarcar o início e fim dos acontecimentos, para poder lhes atribuir sentido e possibilitar

compreensão do que aconteceu ou do que está acontecendo.

Compreendendo dessa forma, as narrativas não são algo que finda em si mesmo, seus

significados e sentidos estão em toda a história narrada, em cada palavra dita, em cada pausa e

silêncio do narrador e, assim, vão muito além da própria narrativa:

Nesse sentido, as narrativas se prolongam além das sentenças e acontecimentos que as constituem; estruturalmente, as narrativas partilham das características da sentença sem nunca poderem ser reduzidas a simples soma de suas sentenças ou acontecimentos que as constituem. Nesta mesma perspectiva, o sentido não está no “fim” da narrativa; ele permeia toda a história. Deste modo, compreender uma narrativa não é apenas seguir a sequência cronológica dos acontecimentos que são apresentados pelo contador de histórias: é também reconhecer sua dimensão não cronológica, expressa pelas funções e sentidos do enredo. (JOVCHELOVITCH; BAUER, 2014, p. 93).

Embora, como afirma Benjamim (1987, p 197), o uso das narrativas e a própria arte de

narrar sejam cada vez mais raros, a utilização das narrativas em pesquisas qualitativas ganham

força nas Ciências Humanas, pois possibilitam ir além da transmissão de informações, ou de

acontecimentos, fazendo com que a experiência seja desvelada, fomentando a compreensão do

narrador-entrevistado, como também do próprio contexto em que ele está inserido. Assim, o

uso das narrativas neste trabalho, obtidas através das entrevistas narrativas, tem com o objetivo

propiciar a compreensão da tessitura da Educação Ambiental revelada nas experiências dos

docentes dos municípios de Irecê, Ibititá e Lapão.

É preciso nesse momento compreender o significado das palavras tessitura e

experiências. Tessitura vem do latin texere, tramar, urdir, tecer. Tessitura significa o entrelaçar

dos fios produzindo o tecido da existência do fenômeno, dando lhe significado e o modo de ser.

Neste trabalho tessitura é compreendido com o modo de acontecer e ser da Educação Ambiental

no cotidiano escolar.

A palavra experiência, segundo Larrosa (2002), tem sua origem no latim experiri, que

significa provar, testar. A palavra é formada pela raiz ex, de fora, algo exterior, mais peritus,

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testado, com conhecimento. Assim, experiência seria o que é no exterior, mas que nos é

provado, sentido, nos faz conhecer. “A palavra experiência tem o ex de exterior [...], de exílio

[...] e também o ex de existência. A experiência é a passagem da existência, a passagem de um

ser que não tem essência [...], mas que simplesmente ‘ex-iste’ de uma forma singular, finita

[...]” (LARROSA, 2002, p. 25).

Compreendendo assim experiência como sendo o que nos passa, o que nos acontece, o

que nos toca. Não o que passa por nós, não o que apenas acontece ou que toca, sem nos fazer

sentir. Para Heidegger (apud LARROSA, 2002, p. 25):

[...] fazer uma experiência com alo significa que algo nos acontece, nos alcança; que se apodera de nós, que nos tomba e nos transforma. Quando falamos em “fazer” uma experiência, isso não significa precisamente que nós fazemos acontecer, “fazer” significa aqui: sofrer, padecer, tomar o que nos alcança receptivamente, aceitar, à medida que nos submetemos a algo. Fazer uma experiência quer dizer, portanto, deixar-nos abordar em nós próprios pelo que nos interpela, entrando e submetendo-nos a isso. Podemos ser assim transformados por tais experiências, de um dia para o outro ou no transcurso do tempo.

Assim, experienciar é inserir-se no movimento, é ser-no-mundo aberto a percepção do

mundo, ao sentir, ao sofrer. É permitir-se transformar pelas experiências que fazemos, fazer no

significado exposto por Heidegger, é fazer enquanto abertura para o mundo e abertura aos

sentidos possibilitados em nossas itinerâncias pelo mundo.

Deste modo, o uso das entrevistas narrativas possibilitou conhecer as experiências dos

entrevistados, visto que, como nos diz Dutra (2002, p. 377), “[...] o ato do sujeito de contar a

sua experiência não se restringe somente a dar a conhecer os fatos e acontecimentos da sua vida.

Mas significa, além de tudo, uma forma de existir-com-o-outro”, existir como um ser a dois

enquanto nossas experiências se fundem naquele momento, no ato de narrar e ouvir.

Nesta perspectiva, as entrevistas narrativas foram realizadas com base nas

recomendações de Jovchelovitch e Bauer (2014, p. 97). Primeiramente foi feita uma preparação

com visitas às escolas e identificação de professores que desenvolviam atividades que

envolviam a Educação Ambiental; a segunda etapa se constituiu da realização das entrevistas

narrativas, que aconteceram em três momentos: para iniciar as entrevistas narrativas foram

apresentadas aos docentes reproduções de quadros do artística Antônio Karneiro (figuras em

anexo), com objetivo de provocar e acionar suas memórias, embora não seja possível afirmar

que o contato com as obras de arte tenha provocado uma experiência estética (GADAMER,

2014, p. 116), posso afirmar que o uso das obras de arte nesse momento possibilitou uma maior

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interação com os professores e possibilitou que as narrativas fluíssem com maior naturalidade;

logo após esse momento apresentei aos docentes o tópico inicial para narração: “me conte sobre

suas experiências com a Educação Ambiental”; Após a provocação com o tópico inicial os

docentes iniciaram suas narrativas, ao perceber os sinais de que as narrativas tinha sido

finalizadas, dei início à fase de questionamentos, que tinha como objetivo completar as lacunas

que apareceram nas narrativas.

Foram realizadas seis entrevistas narrativas com os docentes dos referidos municípios,

que foram interpretadas a partir da análise estrutural do fenômeno situado proposta por Bicudo

(2011, p. 59). A partir dessas interpretações foi possível compreender os fios que constituem o

acontecer da Educação Ambiental, esses fios foram separados tentando agregar aspectos

semelhantes do fenômeno, e foram nomeados a partir de inspiração da história do surgimento

dos municípios nos quais o estudo foi realizado. Assim, os Fios Aqua recebem esse nome com

base na história de Lapão, de sua fonte de água limpa que saciou a sede de Pedrinho. Inspirados

nos rochedos imponentes de Ibititá, temos os Fios Rupes, e na quixabeira-mãe de Irecê, temos

os Fios Arbor. As nomenclaturas dos fios vem do Latim: Aqua, água; Rupes, rocha, rochedo;

Arbor, Árvore.

É preciso explicitar que, apesar dos fios constituírem e serem apresentados como

subtópicos dessa seção, decidi não enumerá-los como recomendam os manuais de trabalhos

acadêmicos. Essa decisão visa permitir ao leitor a liberdade de posicionar os fios da maneira

que acredita ser a mais apropriada, com base nos seus conhecimentos, em suas ideias e ideais,

com base na sua percepção e no seu mundo-vida.

Fios Aqua: motivação e o papel da conscientização

A partir das leituras e análise das entrevistas pude perceber que das narrativas emergiam

aspectos que mostram um caráter motivacional que move os professores entrevistados para o

trabalho com Educação Ambiental. Embora esses aspectos não apareçam em todos as

narrativas, é possível perceber diferentes motivações para o trabalho, como a história pessoal/

formação acadêmica, a busca pela valorização do meio ambiente local e a perspectiva de

mudança na organização social.

O fragmento da narrativa da Professora K.O.5 apresentado abaixo, mostra como a sua

história pessoal e concepções movem seu trabalho com a Educação Ambiental:

5 Os nomes dos professoras/professores entrevistados serão apresentados apenas pelas letras iniciais, visando garantir o anonimato e a privacidade dos mesmo.

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Desde sempre eu luto muito pela questão ambiental, pelos vínculos de amizades, e fui buscando essa formação, fui até a Paraíba fazer um curso de produção de agricultura familiar, que é o Sistema Mandala de Produção, depois fiz uma pós-graduação na UNEB em Sustentabilidade Ambiental, tenho buscado essa formação. Estou sempre puxando, seja em qual disciplina for, a sardinha para meu lado, porque eu adoro, é o que eu acredito, essa questão da sustentabilidade, da permacultura, do cuidado com o meio é uma coisa que me move, me faz... eu saí daqui e fui até a Paraíba atrás desse curso.

A luta em defesa do meio ambiente move a busca por uma formação

acadêmica/profissional que possibilite meios para o desenvolvimento de ações e práticas

educativas em Educação Ambiental mais conscientes e contextualizadas com a realidade local.

Em um fragmento da narrativa da Professora Z.D. podemos perceber a importância da

valorização do meio ambiente local para a motivação para com esse trabalho, segundo ela: “o

que me motiva é que somos daqui, moramos na Caatinga, e isso faz com que a gente esteja

valorizando o que é nosso”.

A busca pela construção de uma sustentabilidade é outro fio condutor que move os

professores no processo de realização da Educação Ambiental. Essa busca está atrelada à

perspectiva de uma mudança mais profunda na estrutura da organização social e do abandono

do modo de desenvolvimento capitalista.

A narrativa da Professora F.S. traz bem forte essa perspectiva de busca por uma

transformação social:

Eu como professora de Filosofia, trago a abordagem filosófica da questão ambiental, a discussão social, sempre trouxe nas minhas aulas de Filosofia quando era professora do Ensino Fundamental II, e trago agora para o 4º ano. Como isso acontece, eu discuto muito a questão do modo de produção capitalista, e a forma como esse modo de produção impacta na questão ambiental. E aquela ideia de sustentabilidade, que a meu ver não cabe dentro dessa organização social.

Nesse sentido, a motivação para o trabalho com Educação Ambiental está na idealização

de construção de uma sociedade que abandone e supere o modelo de produção capitalista. Nesse

sentido, é preciso compreender os impactos causados por esse modelo de desenvolvimento.

Para a professora uma mudança dessa lógica desenvolvimentista englobaria e seria alicerçada

no ideal de sustentabilidade. A formação inicial também tem um papel importante na motivação

e no aspecto que as ações em Educação Ambiental terão, se uma perspectiva voltada para uma

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discussão mais teórica ou em uma perspectiva voltada para ações mais práticas. E isso

influencia diretamente como o papel da conscientização é visto dentro da Educação Ambiental.

A partir dos fragmentos a seguir podemos compreender que o papel da conscientização

é visto de forma completamente diferente por alguns professores:

Eu não acredito que consciência muda alguma coisa, se consciência mudasse, já teríamos mudado muita coisa. São ações mesmo, embora determinadas ações não vão mudar o problema, que é bem mais profundo, bem mais concreto. Eu acredito na mudança, numa mudança mais radical em relação ao modo como a gente vive, para a gente realmente ter uma solução. Mas isso não impede, eu passo para meus alunos isso, não impede da gente, ah! porque uma simples ação minha não vai mudar, eu não vou fazer isso, não, eu supervalorizo essas ações individuais, mas não deixo de dizer para eles que eles precisam ter consciência de que isso não vai mudar o mundo, isso são alternativas, paliativos para gente enfrentar, enfrentar isso, mas mudança radical mesmo a gente não vai ter, isso não impede a gente de fazer, e incentivo sim desde a sala, a questão do lixo na sala, um ambiente limpo na sala de aula (Professora F.S.).

Eu tenho buscado essa ligação com Educação Ambiental sempre que pode aqui na escola. Com os meus pequenos do 3º ano é plantar mudas, é tentar mostrar para eles a importância da água, a importância de não desperdiçar água, e fazendo esse sistema de conscientização no caminho, de conscientização e ação. Para evitar problemas futuros (Professora K.O.). Assim, a gente já contempla o conteúdo Biomas, mas eu procuro focar mais no nosso a Caatinga, isso não quer dizer que eu não trabalho os outros, mas eu acabo dando uma importância maior para ao nosso, para que eles conheçam, para que eles tenha aquela visão, sabe, uma sensibilização, cuidando do meio ambiente, das plantas, dos animais, da vegetação (Professora Z.D.).

Através das narrativas desses fragmentos compreendemos as diversidades de formas

que os professores percebem o papel da conscientização dentro da Educação Ambiental. A

conscientização muitas vezes é vista como uma forma de sensibilização para o cuidado com o

meio ambiente, para fomentar uma preservação e conservação ambiental, ou até mesmo vista

como algo dissociado de uma força capaz de realizar mudanças sociais profundas. A

conscientização nessa perspectiva é vista com geradora apenas de ações simples, de medidas

paliativas para os problemas ambientais, mas não chegando a solucioná-los. Contudo, como

podemos perceber na narrativa da professora K.O., a conscientização é algo mais complexo que

a simples visão romântica que a rodeia, embora as atividades em Educação Ambiental dentro

dos espaços formais de educação fomentem uma conscientização que esteja focada

principalmente para a realização de pequenas ações no dia-a-dia, elas são fomento para ações

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maiores que terão um impacto importante na solução dos problemas ambientais no futuro, e

além disso, são um estimulo para que os alunos possam participar ativamente dos processos de

discussão sobre as questões socioambientais.

Fios Rupes: conteúdos, temáticas, contextualização

As narrativas dos professores trazem em suas palavras e sentidos os conteúdos e

temáticas que são trabalhados dentro da perspectiva da Educação Ambiental. As experiências

narradas mostram que os conteúdos e temáticas estão ligados principalmente ao componente

curricular de Ciências, existindo assim uma tendência de compreender que este é o único

componente que possibilita trabalhar dentro da perspectiva da EA, deixando de lado seu caráter

inter/transdisciplinar.

Os principais conteúdos e temáticas trabalhados que aparecem nas narrativas dos

docentes são sobre ecossistemas, vegetação, lixo, consumismo, reciclagem e reutilização de

materiais, e biomas - este com enfoque na Caatinga em uma tentativa de contextualização do

conteúdo com a realidade local. Os fragmentos das narrativas a seguir mostram esses aspectos:

No 4º ano, um elemento que eu gosto de trabalhar, e tento transpor da melhor forma possível para que eles possam compreender a sociedade, mas trazendo essas concepções filosóficas, é a etapa da produção, extração e o impacto na natureza. O impacto das fábricas na natureza, no trabalho das pessoas, na classe trabalhadora, e como configura essa relação classe dominante x classe trabalhadora dentro fábricas, isso tudo a gente vai abordando dentro desse processo de produção. Discuto o consumismo, a questão do consumo dentro de casa, e todo o processo: fábrica, venda, o consumo do produto em casa no caso, e o lixo, o tratamento do lixo, que é outra etapa desse processo de produção, isso eu tento aborda com imagens, com vídeos, dentro do 4º ano, pela idade deles a gente precisa ter vários elementos visuais para que eles compreenderem essa dinâmica que é muito complexa, tem muita coisa para discutir, cada etapa dessa, tanto no aspecto ambiental quanto no aspecto social, como isso influência na vida da gente e essa relação com o modo de produção capitalista é bem complexa. Em ciências, outra disciplina que também leciono no 4º ano, em relação a questão do meio ambiente eu trabalho os conteúdos que são programáticos para o ano, terceiro bimestre estamos trabalhando ecossistema, nisso tem toda a questão ambiental: a relação entre seres vivos, a respiração, alimentação; isso faz parte dos assuntos que está relacionado com o meio ambiente, e uma vez por outra a gente também traz em ciências essa questão da consciência mesmo, essa conscientização em relação ao tema (Professora F.S.)

Nós estávamos trabalhando em Ciências, Caatinga e Cerrado, e como nossa região é Caatinga. São três 5º ano aqui na escola, nós trabalhamos com os meninos enfocando muito a questão do mandacaru, que eles quase não conhecem, tinha aluno que nem conhecia o mandacaru. E a gente foi falando

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mais dessas plantas que sobrevivem na seca, até mesmo no lajedo. Aí programamos com eles para ir Laranjeira6, na Serra, depois de todas as atividades feitas em sala de aula a gente foi para lá, passamos uma manhã com eles, nós subimos a Serra, aí mostramos cactos, o mandacaru, e fotografamos. E assim, lá foi mais para eles verem as plantas, e na sala de aula trabalhamos todo o conteúdo, como o mandacaru fica durante a seca, que ele não resseca ou morre, é uma planta sempre verde, que ele tem sempre aquela umidade, tem a água (Professora V.F.). Eu sempre trabalho com a questão da reafirmação da identidade, sempre que eu trabalho com caatinga, eu trabalho nesse sentido de reafirma, de meios, de técnicas, de possibilidades de conviver com o semiárido, se tem uma coisa que me incomoda extremamente é uma pessoa dizer que quer combater a seca, ninguém combate seca, a gente convive com a seca, sempre que eu trabalho os biomas, eu acabo entrando mais na caatinga, passo pelos outros, mas entro na caatinga, e aí vou visitar uma barriguda, vou visitar um pé de mandacaru que tem um aqui no nosso bairro que é lindíssimo, trago poemas que falam sobre a caatinga, a gente já saiu para fazer fotografias, produzimos poemas em cima das fotografias, então sempre com reafirmação, dando motivo de orgulho, e tentando mostrar a beleza da caatinga, a força que a caatinga tem, sempre nesse sentido de reafirmar, tanto com os alunos grande, quanto com os pequenos. Eles acabam sonhando junto com a gente (Professora K.O.).

Entre as temáticas abordadas na perspectiva da Educação Ambiental que emergem nas

narrativas dos professores podemos destacar: o sistema de produção no modelo capitalista,

como por exemplo a extração de produtos naturais e o impacto na natureza, o consumismo, a

produção de lixo e seu impacto socioambiental. Quando a temática abordada é a Caatinga,

dentro do conteúdo do componente curricular Ciências, as atividades são voltadas para o

fomento para a conscientização sobre a necessidade de reafirmação e construção de uma

identidade local, além do fomento para a conscientização sobre a necessidade de criar

mecanismos para convivência com a seca e preservação da Caatinga.

Embora seja forte essa visão da ligação da Educação Ambiental com o ensino de

Ciências, existem práticas que tentam romper com essa perspectiva. Neste sentido, algumas

narrativas mostram a experiência de trabalhos envolvendo professores ligados aos componentes

de Língua Portuguesa, Arte, e dentro do Programa Mais Educação, na Oficina de Música. A

busca por esse rompimento está atrelada principalmente à motivação e à formação dos

professores para o trabalho com Educação Ambiental. Como mostram as narrativas da

professora a seguir:

Tenho trazido para sala de aula quando é possível, já que uma hora eu estou com Língua Portuguesa, outra hora estou com disciplina de Ciências, agora mesmo estou com Artes, mas sempre que dá eu estou encaixando, no início da minha formação eu comecei com o 6º com Língua Portuguesa no Colégio

6 Laranjeira é uma povoado do município de Uibaí, e que faz divisa com o município de Ibititá.

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Odete com o Sistema de Produção em Mandala, não dá para fazer uma Mandala-Mãe, que é uma extensão muito grande, mas trabalhei com um Mandala pequeninha em forma de horta, e trabalhando todos os conceitos de cuidado com o solo, do manejo do solo, manejo de cultura, e sempre trazendo esses conceitos para eles. Depois do Colégio Odete, eu vim para Escola Luiz Viana, tem seis anos que estou aqui na escola e estou sempre inserindo dentro do que é possível, dentro das disciplinas, agora mesmo na disciplinas de Artes, fizemos por último um trabalho com arte sobre Vik Muniz, que é um artista plástico que trabalhou com lixo, com resíduo sólido, e em cima de produção de artistas nós trabalhamos com resíduos sólidos. Tem a produção final, mas aí tem todo um trabalho de conceitos antes, o que é resíduo sólido, o que é resíduo orgânico, o que eu posso fazer com esse lixo orgânico para que ele não seja jogado no fora, e não se tornar o lixão que tá Irecê. Nós fomos no lixão, nós tiramos fotos do lixão, e então discutimos quais são os danos que trazem a população o lixo ser colocado daquela forma, o assoreamento da terra, a poluição dos lençóis freáticos (Professora K.O.).

As atividades em Educação Ambiental que acontecem a partir dessa abordagem trazem

de forma contextualizada a realidade dos alunos, visto que existe um estudo sobre modos

alternativos de produção, baseados no princípio da sustentabilidade e da produção de alimentos

orgânicos, objetivando que os alunos possam utilizar o conhecimento sobre essas técnicas com

suas famílias em suas propriedades e produções. A contextualização também ocorre com outras

questões ambientais, como a problemática dos lixões urbanos e o trabalho de alguns alunos com

a coleta de lixo. Esse aspecto podemos perceber na narrativa a seguir:

Eu cheguei o ano passado nessa, para trabalhar no Mais Educação, depois uns três meses, quatro meses, percebemos a necessidade dos meninos trabalharem melhor a Oficina de Música, só que aí percebendo que alguns dos meninos tocavam bem tambor, timbau, instrumentos de percussão, eu tive a ideia de confeccionar os nossos próprios instrumentos, e aí dentro da metodologia da escola, que não temos condições de comprar os instrumentos músicas que outras escolas tem, como banda marcial, a gente fez uso da sucata, tambores, latas, garrafa pet, latas, pedaços de pau, cano de pvc, sucata mesmo, depois das ideias prontas, eu passei para nosso diretor, Cristiano, e ele autorizou incialmente um valor mínimo para comprar os baldes que fazem os tambores, depois que a escola conseguiu a gente começou a ensaiar, e hoje graças a Deus, os meninos já tocam, como diz o nome do projeto Sucatocando, estão tocando sucata, e a ideia nossa é de levar essa ideia para além dos muros da escola, a gente já foi na Escola Paraiso, na Escola Nossa Infância, já tocamos na Secretaria de Educação, em eventos organizados pela Rede Municipal, atualmente nós estamos fazendo uma parceria com o Ponto de Cultura, levando essas oficinas para outras escolas, porque a ideia justamente atender o máximo de escolas da Rede. E o bom do projeto é que ele trabalha com aquilo que ninguém quer, que é o lixo.

Essa minha ideia nasceu no meu tempo de estágio, na Escola São Pedro, eu estava concluindo licenciatura em Pedagogia, nessa escola alguns alunos que eu tive contado do Fundamental I, nas disciplinas de matemática e português, eu coloquei a música, e como também é um bairro carente, eu tive a ideia de confeccionar alguns instrumentos, e os poucos instrumentos que eu

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tive condições de confeccionar nós usamos durante o estágio, e como deu certo os meninos ficaram com um gostinho de querer mais, mas como não estava como professor de Rede na época, tive que encerrar o projeto junto com o estágio. E quando eu comecei a trabalhar aqui, a ideia pronto, era uma carta que estava na manga, quando os meninos aqui demonstraram habilidade, eu não pensei duas vezes, e a música dá para trabalhar todas as disciplinas.

E a ideia do meio ambiente, da questão ambiental, a gente enfoca nas letras das músicas, como uma paródia que fizemos da música do Chiclete com Banana, “abra os olhos para entender esse momento, precisamos de você”, e toda letra da música fala da importância da minha contribuição, de sua contribuição para um mundo melhor, através da reciclagem, e o fechamento do projeto foi muito bom, aqui no pátio com as músicas abordando assuntos que foram antes trabalhados na sala de aula sobre a questão ambiental. E na mídia a questão da reciclagem é algo bastante interessante, que não só na escola, mas além dos muros da escola, aqui os meninos trabalham catando lixo, e é até uma forma de sobrevivência, de renda, eles trabalham catando lixo e sucata para vender. E na música nossa, de instrumento diferente só tem o violão, que dá o ritmo na música, mas as latas, os tambores, os chocalhos, tudo com materiais reciclado (Professor C.R.).

Os fios que trazem em sua constituição os conteúdos e temáticas abordados dentro das

atividades voltadas para a Educação Ambiental mostram uma tentativa de reduzir a EA em uma

única disciplina, especialmente quando trabalhada na perspectiva do ensino de Ciências.

Entretanto, outras perspectivas de ações em Educação Ambiental estão acontecendo dentro do

cotidiano escolar, e para além dos muros das escolas, contextualizando a vida dos alunos com

o processo educativo.

Fios Arbor: o fazer pedagógico

Das narrativas dos professores sobre suas experiências em Educação Ambiental

emergem os fios que permitem compreender como acontece o fazer pedagógico de suas práticas

e ações. Deste modo, após analisar as narrativas foi possível identificar aspectos do fazer

pedagógico e compreender que as escolhas das metodologias utilizadas e o enfoque dado a

Educação Ambiental pelos docentes estão intrinsecamente relacionados com suas crenças

filosóficas, sua compreensão de mundo e sua motivação para o trabalho com a Educação

Ambiental.

Nesse sentido, foi possível compreender que o fazer pedagógico envolve diferentes

metodologias e organizações, desde projetos, sequências de atividades e sequências didáticas,

englobando dentro dessas organizações metodologias como as aulas expositivas, discussões

teóricas, debates, produções artísticas – principalmente com a reutilização de materiais, visitas

a espaços fora da escola, realização de conferência e exibição de filmes e documentários.

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Trago a seguir os fragmentos das narrativas nos quais emergem os fios do fazer

pedagógico:

Eu começo com aulas expositivas, eles trazem amostras de plantas para a sala, a gente constrói o Cantinho da Caatinga. Os alunos fazem pesquisa sobre o tema, de plantas que já não existem mais, o porquê de essas plantas estarem extintas, a gente discute o que leva o ser humano a estar, assim, invadindo sem equilíbrio o meio ambiente, a Caatinga (Professora Z.D.).

Eu trabalho com reaproveitamento de material, assim com garrafa pet, com tampinhas. Para a horta a gente recolhe os vasilhames, cortamos, colocamos pedras, o material de adubo, depois de adubados, plantamos. Fazemos todo aquele processo que tem que fazer primeiro para depois começar. Os brinquedos, como carrinho, vaivém, boliche, que faço com garrafa pet, fizemos o boneco com tampinhas e vasos reciclados. Comecei desenvolver essa trabalho no ano de 2012, eu vi que a carência é muito grande para isso, que tínhamos muitos vasilhames jogados fora, aí eu comecei a pensar nisso, pegar esses vasilhames para fazer algum trabalho, e a partir daí a gente começou a fazer. Agora estamos fazendo a horta suspensa, a única coisa que a gente comprou foi o arame, mas as outras coisas é tudo reciclado. Primeiro eu explico aos alunos como recortar, a partir daí cada um vai cuidar da sua, vai molhar, vai cuidar da sua planta. Discuto com eles quanto tempo gasta cada material para se decompor (Professor C.B.).

Eu trabalho desenvolvendo sequências didáticas. Dentro da matéria de filosofia fica mesmo atividades na sala, esse sair, trabalhar com materiais recicláveis, toda essa concepção eu não ando muito por aí, por uma questão mesmo de como eu acredito nessa sustentabilidade, porque de certa forma aquilo a gente defende influência um pouco na forma como trabalhamos. Óbvio que não vou moldar meus alunos a acreditar em concepções, por exemplo em filosofia com os maiores eu sempre abordo diferentes defesas e concepções, enfatizo essa questão da crítica a essa organização capitalista, e o impacto disso no meio ambiente, por uma questão de afinidade e por eu dominar mais a questão inclusive. Mas eu procuro trazer outras defesas, daí eu deixo meio que para eles pensarem, gosto de começar minhas aulas sempre com perguntas, deixar mesmo eles abordarem a forma como eles compreendem. Eu gosto muito ouvir a opinião previa deles, o que eles compreendem previamente sobre aquele assunto para depois eu inserir o conteúdo. Com os meninos maiores eu gosto de debate, eu trago o tema, pergunto muito para saber a compreensão deles sobre o tema, e ai vou entrando no assunto, vou trazendo filósofos, diferentes ideias, principalmente em debates. E a depender do dia, da sequência, eu procuro inserir documentários, que abordam esse aspecto, tem um mesmo A história das coisas, é um curta metragem que eu uso nas minhas aulas de filosofia, por que os meninos são maiores e eu tenho um retorno melhor nas discussões. No 4º anos, eles também discutem, só que você tem que diminuir sua linguagem, a forma como você vai passar aquilo é diferente, até as palavras você tem que tá adequando alguns termos, os alunos questionam o que é isso, o que é aquilo, aí você vai adequando. Então, no 4º ano a seleção do documentário tem que ser bem criteriosa, se não eles não vão compreender, por exemplo, documentário legendado é bem difícil para eles entenderem, então nesse campo do documentário do imagem,

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slide para eles se aproximarem desse tema mesmo, e essa discussão que eu faço com eles não no nível que eu faço com os do 9º ano, mas eu trago essa discussão também (Professora F.S.).

As atividades às vezes são permanentes em sala de aula, outras vezes através de projetos, nós tivemos já uma Conferência de Educação Ambiental aqui na escola com o 4º ano. Mas geralmente a gente monta uma sequência didática em cima do conteúdo, quando se constrói uma sequência didática tem se produto final, que pode ser a produção de cartazes, produção de painéis com lixos, ou a própria conferência que foi uma produção final, dentro dessa conferência nós construímos um documento para escola, falando quais são as nossas metas, as nossas intuições com o meio ambiente, como escola atuando no meio ambiente. Através das sequências didáticas tem produções textuais, tem visualização de vídeos como O veneno está na mesa, como A história das coisas, A ilha das Flores, que eu sempre trabalho com esses vídeos, tem outro agora que é O veneno está na mesa 2 que eu já estou pensando em utilizar (Professora K.O.).

As metodologias utilizadas no fazer pedagógico em Educação Ambiental narrados pelos

professores mostram que há uma tentativa de domar a condição não-linear e complexa do

conhecimento e sua abordagem inter/transdisciplinaridade, tentando encaixá-la em

metodologias tradicionais da educação, como as aulas expositivas, ou tentando reduzi-la a uma

única disciplina, ligada principalmente ao ensino de Ciências. Sem a pretensão de tecer

qualquer julgamento sobre o fazer pedagógico dos professores, mas a fim de compreender

melhor seu acontecer, e entrelaçando com as narrativas dos outros fios, é possível dizer que a

ausência de formação continuada contribui para essas tentativas de redução da Educação

Ambiental em temáticas ligadas ao ensino de Ciências.

É necessário explicitar que dentro da perspectiva desse trabalho, a pesquisa não visa

julgar as práticas e ações do professores, ou tentar classificá-las dentro de tendências de

Educação Ambiental. Deste modo, o objetivo foi compreender como acontecem as práticas em

Educação Ambiental dentro dos municípios, afim de obter elementos para construção da

proposta de intervenção.

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4 REDES E EDUCAÇÃO AMBIENTAL: O ENTRELAÇAR COMO ESTRATÉGIA DE

FORTALECIMENTO

É preciso voltar o olhar ao passado para compreender como os primeiros fios da

Educação Ambiental foram tecidos e como se deu o entrelaçamento da Educação Ambiental

com as Redes. Nesse sentido, é mister entender que a Organização das Nações Unidas – ONU

teve um papel fundamental na amarração dos primeiros nós da Educação Ambiental. Foi a partir

da Declaração de Estocolmo, documento construído na Conferência das Nações Unidas sobre

o Meio Ambiente Humano, realizada da cidade de Estocolmo em 1972, que a EA passou a ser

considerada como campo de ação pedagógico, adquirindo relevância e vigência internacional

(MEDINA, 1997, p. 259).

Dois marcos para o desenvolvimento de uma política mundial para proteção do

ambiente foram trazidos pela Conferência de Estocolmo: o primeiro, a criação do Programa das

Nações Unidas para o Meio Ambiente - PNUMA, com sede em Nairóbi, no Quênia; o segundo,

a recomendação de que se criasse o Programa Internacional de Educação Ambiental - PIEA,

conhecida como Recomendação 96, a qual sugere que “se promova a educação ambiental como

uma base de estratégias para atacar a crise do meio ambiente” (ONU, 1972).

Na Conferência de Estocolmo foram elaborados princípios que visavam estabelecer uma

visão global e princípios comuns para orientação da relação entre os seres humanos e o meio

natural, visando à preservação e à melhoria do ambiente. Dentre estes princípios é válido

ressaltar o Princípio 19, que afirma:

É indispensável um trabalho de educação em questões ambientais, visando tanto às gerações jovens como os adultos, dispensando a devida atenção ao setor das populações menos privilegiadas, para assentar as bases de uma opinião pública, bem informada e de uma conduta responsável dos indivíduos, das empresas e das comunidades, inspirada no sentido de sua responsabilidade, relativamente à proteção e melhoramento do meio ambiente, em toda a sua dimensão humana (ONU, 1972).

É possível perceber que já na Declaração de Estocolmo havia um entendimento que a

Educação Ambiental perpassa todo o processo educativo, educação formal e não-formal. Em

1975, é divulgada a Carta de Belgrado, buscando uma estrutura global para a EA, na qual é

entendido como absolutamente vital que os cidadãos adotem medidas que possibilitem a

construção de um modelo de desenvolvimento que não traga consequências negativas às

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pessoas e que seria construído através, dentre outros mecanismos, da reforma dos processos e

sistemas educacionais.

Após análise da situação ambiental da época, é afirmado na Carta de Belgrado que “os

recursos do mundo devem ser desenvolvidos de modo a beneficiar toda humanidade”

(UNESCO/PNUMA, 1975), o que seria possibilitado através de uma nova ética global, em que

atitudes e comportamentos de indivíduos e sociedades consoantes com o espaço de humanidade

na biosfera sejam defendidos, o que possibilitaria novas abordagens para o desenvolvimento.

Na área educacional a Carta de Belgrado definiu como meta para a EA:

Desenvolver uma população mundial que esteja consciente e preocupada com o meio ambiente e com os problemas que lhe são associados, e que tenha conhecimento, habilidade, atitude, motivação e compromisso para trabalhar individual e coletivamente na busca de soluções para os problemas existentes e para prevenção de novos (1975).

A partir dessa meta foram criados seis objetivos que deveriam orientar as ações em EA,

dentre estes podem ser destacados o segundo objetivo, no qual é afirmada a necessidade de

fomentar as discussões sobre o ambiente como um todo para que exista a construção de uma

compreensão sobre o mesmo; e o quinto objetivo, que ressalta a necessidade de estimular os

indivíduos e os grupos sociais a avaliarem as providências relativas ao meio ambiente e ao

processo educativo. A Carta de Belgrado é finalizada com a proposição de diretrizes básicas

para os programas de EA. As diretrizes orientam que a EA deve ser um processo contínuo,

permanente e de caráter interdisciplinar, devendo o ambiente ser considerado em sua totalidade.

Em 1977, na cidade de Tbilisi - Geórgia, foi realizado um dos mais importantes eventos

internacionais em favor da Educação Ambiental. A Conferência Intergovernamental sobre

Educação Ambiental, fortemente inspirada na Carta de Belgrado, elaborou princípios,

estratégias e ações orientadoras em EA que são adotados mundialmente até os dias atuais.

Segundo Barbieri e Silva (2011, p. 56) a Recomendação n.º 8 da Declaração de Tbilisi

especifica três setores da população:

1. a educação do público em geral; 2. a educação de grupos profissionais ou sociais específicos, cujas atividades e influência tenham repercussões sobre o meio ambiente, como engenheiros, administradores, arquitetos, projetistas industriais, formuladores de políticas e agricultores; e 3. a formação de determinados grupos de profissionais e cientistas que se ocupam de problemas ambientais específicos, por exemplo, biólogos, geólogos, toxicólogos, agrônomos, sanitaristas, meteorologistas, etc.

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A Educação Ambiental, segundo a Declaração de Tbilisi (ONU, 1977), deve preparar

o ser humano através da compreensão dos principais problemas do mundo contemporâneo. A

Declaração de Tbilisi ratificou as orientações das conferências anteriores, entendendo que a EA

é resultado de diferentes disciplinas e experiências educacionais, devendo então ser adotado um

enfoque global enraizado numa ampla base interdisciplinar.

No Rio de Janeiro – Brasil foi realizada, no ano de 1992, a Conferência das Nações

Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que ficou conhecida como Rio-92. Deste

evento pode ser destacado o Capítulo 36 da Agenda 21, intitulado Promoção do ensino, da

conscientização e do treinamento.

Segundo Barbieri e Silva (2011, p. 58) apenas uma única menção foi feita à EA em todo

o texto do Capítulo 36, mesmo assim de forma indireta:

O ensino, inclusive o ensino formal, a consciência pública e o treinamento devem ser reconhecidos como um processo pelo qual os seres humanos e as sociedades podem desenvolver plenamente suas potencialidades. O ensino tem fundamental importância na promoção do desenvolvimento sustentável e para aumentar a capacidade do povo para abordar questões de meio ambiente e desenvolvimento (AGENDA 21, 1995, p. 429).

A Agenda 21, em uma das divisões do Capitulo 36, intitulada Aumento da consciência

Pública, afirma que “é necessário sensibilizar o público sobre os problemas de meio ambiente

e desenvolvimento, fazê-lo participar de suas soluções e fomentar o senso de responsabilidade

pessoal em relação ao meio ambiente” (AGENDA 21, 1995, p. 434). Segundo Medina (1997,

p. 262),

de acordo com os preceitos da Agenda 21, deve-se promover, com a colaboração apropriada das organizações não-governamentais, inclusive as organizações de mulheres e populações indígenas, todo o tipo de programas de educação de adultos para incentivar a educação permanente sobre meio ambiente e desenvolvimento, centrando-se nos problemas locais”.

Desta forma, os objetivos da Agenda 21 consistem em promover uma ampla consciência

pública como parte indispensável de um esforço mundial de ensino para reforçar atitudes,

valores e medidas compatíveis com o desenvolvimento sustentável.

Outro documento construído durante o período da Rio-92, contudo em um evento

paralelo à conferência, conhecido como Fórum das ONGs, foi o Tratado de Educação

Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, que sinaliza a importância

do desenvolvimento sustentável e no qual:

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[...] explicita-se o compromisso da sociedade civil para a construção de um modelo mais humano e harmônico de desenvolvimento, onde se reconhecem os direitos humanos de terceira geração, a perspectiva de gênero, o direito e a importância das diferenças e o direito à vida, baseados em uma ética biocêntrica e do amor (MEDINA, 1997, p. 262).

Em 1997 foi realizada a Conferência Internacional sobre Meio Ambiente e Sociedade:

Educação e Conscientização Pública para a Sustentabilidade, em Thessaloniki – Grécia. No

documento construído na conferência, conhecido como Declaração de Thessaloniki, foi

reconhecido que as recomendações e planos de ação construídos na Conferência de Belgrado

(1975) e na Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental de Tbilisi (1977)

continuam válidos, mas também foi ressaltando que eles não foram completamente explorados

e que os resultados alcançados foram insuficientes, alcançando-se pouco progresso desde a Eco-

92 até então (BARBIERI; SILVA, 2011, p. 60).

Após afirmar que a pobreza torna mais difícil a promoção da educação e favorece a

degradação ambiental, a Declaração de Thessaloniki explicita que:

A educação é um meio indispensável para propiciar, a todas as mulheres e a todos os homens do mundo, a capacidade de conduzirem suas próprias vidas, exercitarem a escolha e a responsabilidade pessoal e aprenderem através de um vida sem restrições geográficas, políticas, culturais, religiosas, linguísticas ou de gênero (ONU, 1997).

Entre as recomendações da Declaração de Thessaloniki destaca-se a que afirma que as

escolas devem ser encorajadas e apoiadas para que ajustem seus currículos em direção a um

futuro sustentável.

No Brasil, a Educação Ambiental aparece pela primeira vez de modo integrado na

legislação brasileira com a Lei nº. 6.938, de 31 de agosto de 1981, que instituiu a Política

Nacional de Meio Ambiente. Em seu Artigo 2º, inciso X, a referida Lei afirma que a EA deve

ser exercida em todos os níveis de ensino, objetivando capacitar os cidadãos para participação

ativa na defesa do meio ambiente (MEC, 2007, p. 19).

Essa Lei foi posteriormente atendida na Constituição Federal de 1988. No Título VIII,

dedicado à ordem social, Capitulo VI – DO MEIO AMBIENTE, Art. 225, Parágrafo 1º inciso

VI, é afirmado como dever do Estado promover a educação ambiental em todos os níveis de

ensino e a conscientização pública para preservar o meio ambiente.

As Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), estabelecidas pela Lei 9.394, não

contemplam nenhuma regulamentação sobre a EA e nem sequer a citam expressamente. Apenas

com uma análise muito profunda é que se pode atribuir alguma intenção de tratar deste tema de

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modo indireto, “no artigo 36, § 1º, segundo o qual os currículos do ensino fundamental e médio

‘devem abranger, obrigatoriamente, [...] o conhecimento do mundo físico e natural e da

realidade social e política, especialmente do Brasil” (MEC, 2007, p 19). A Educação Ambiental

foi regulamentada somente na Lei 9.795, de 27 de abril de 1999, que instituiu a Política

Nacional de Educação Ambiental, que entende em seu Art. 1º, a EA como sendo:

[...] os processos por meios dos quais os indivíduos e a coletividade constroem valores sociais, conhecimento, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sustentabilidade (BRASIL, 2005, p. 65).

No Art. 2º é afirmado o papel essencial da EA no processo da educação nacional,

devendo então estar presente em todos os níveis da educação, o que ratifica a Constituição

Federal. Os princípios da EA são formulados no Art. 4º da Lei 9.795, dentre estes destacam-se

o que atribui à EA os enfoques humanístico, holístico, democrático e participativo, e também

os redigidos nos Incisos II, III e VIII do referido artigo, que afirmam:

II - a concepção do meio ambiente em sua totalidade, considerando a interdependência entre o meio natural, socioeconômico e cultural, sob o enfoque da sustentabilidade; III – o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, na perspectiva de inter, multi e transdisciplinaridade; [...] VIII – o reconhecimento e respeito à pluralidade e à diversidade individual e cultural (BRASIL, 2005, p. 66).

No Art. 5º, Inciso IV, é afirmado como objetivo da EA o incentivo à participação

individual e coletiva, permanente e responsável, na preservação do equilíbrio do meio ambiente,

sendo que o caput do artigo afirma que a defesa da qualidade ambiental é entendida como um

valor inseparável do exercício da cidadania. Ainda no Art. 5º, no Inciso VII, consta também

como objetivo da EA, “o fortalecimento da cidadania, autodeterminação dos povos e

solidariedade como fundamentos para o futuro da humanidade” (BRASIL, 2005, p. 66).

No Capítulo II, na Seção II – Da Educação Ambiental no Ensino Formal, da Lei 9. 795,

Art. 10, Parágrafo I, afirma-se que a EA não deve ser implantada como disciplina específica do

currículo de ensino. Reafirmando o caráter interdisciplinar da EA, no Art. 11, Parágrafo Único,

é exposto que: “os professores em atividade devem receber formação complementar em suas

áreas de atuação, com o propósito de atender adequadamente ao cumprimento dos princípios e

objetivos da Política Nacional de Educação Ambiental” (BRASIL, 2005, p. 68).

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Na Bahia, a Política de Educação Ambiental do Estado da Bahia é estabelecida em 2011,

pela Lei 12.056, na qual a Educação Ambiental é compreendida como:

o conjunto de processos permanentes e continuados de formação individual e coletiva para a sensibilização, reflexão e construção de valores, saberes, conhecimentos, atitudes e hábitos, visando uma relação sustentável da sociedade humana com o ambiente que integra (BAHIA, 2011, p. 1).

Foi através da Lei 12. 056 que o Programa de Educação Ambiental do Estado da Bahia

- PEABA foi criado, no artigo 8 da referida lei, o Programa é definido como:

o conjunto de diretrizes e estratégias que deverão orientar a implementação da Política Estadual de Educação Ambiental, e servirá como referência para a elaboração de programas setoriais e projetos em todo o território estadual, estabelecendo as bases para captação de recursos financeiros nacionais, internacionais e estrangeiros, destinados à implementação da Educação Ambiental (BAHIA, 2011, p. 5).

No Programa de Educação Ambiental do Estado da Bahia - PEABA, são estabelecidos

oito objetivos para a Educação Ambiental no estado, sendo eles:

I - O desenvolvimento de uma compreensão integrada do meio ambiente e suas múltiplas e complexas relações, envolvendo aspectos ecológicos, psicológicos, legais, políticos, sociais, econômicos, científicos, históricos, culturais, tecnológicos, espirituais, éticos e pedagógicos;

II - A sensibilização, o estímulo e a contribuição com a formação de pessoas para o desenvolvimento de uma consciência ética sobre as questões socioambientais;

III - O incentivo às participações comunitárias, ativas, permanentes e responsáveis na proteção, preservação e conservação do ambiente para a sustentabilidade, entendendo-se a defesa da qualidade ambiental como um valor inseparável do exercício da cidadania;

IV - O estímulo à capacitação de pessoas para o exercício da representatividade política e técnica nos colegiados;

V - O incentivo às instituições públicas e privadas na formação de grupos voltados às questões socioambientais;

VI - O incentivo à cooperação e parceria entre as diversas regiões do estado, os órgãos e entidades integrantes do Sistema Estadual de Meio Ambiente - SISEMA, instituições públicas e privadas da rede de ensino do Estado da Bahia, setores públicos e privados;

VII - A promoção ao acesso democrático às informações socioambientais;

VIIII - A promoção e o fortalecimento do exercício da cidadania, a autodeterminação dos povos e a solidariedade para a construção de uma sociedade sustentável (BAHIA, 2013, p. 56).

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O Programa Nacional de Educação Ambiental (ProNEA) foi criado em dezembro de

1994, e na Linha de Ação de número 7 propõe a criação de uma Rede de Centros Integrados de

Educação Ambiental, da qual fariam parte universidades, escolas profissionais e centros de

documentação. O objetivo seria “viabilizar o aprofundamento de aspectos conceituais e

metodológicos da Educação Ambiental, desenvolver material didático, armazenar e difundir

informações” (BRASIL, 1997, p. 27), contudo não há informações que comprovem a

implementação dessa ação. Na segunda edição do ProNEA, lançada em 2003, apesar de fazer

na sua parte introdutória menção a importância das redes de Educação Ambiental, não é posto

nenhum objetivo ou ação direcionada às redes de Educação Ambiental.

A terceira edição do Programa traz uma mudança significativa nesse ponto, o

documento apresenta entre os seus objetivos a necessidade de estimular a cultura de redes de

educação ambiental, e tem como uma de suas estratégias de ação o “fortalecimento das redes

de educação ambiental – por intermédio de políticas públicas, fundos de apoio e divulgação de

suas ações – favorecendo e apoiando sua expansão e consolidação em todos os segmentos da

sociedade brasileira” (BRASIL, 2005, p. 45). Em 2014, a quarta edição do ProNEA é divulgada,

mantendo basicamente o mesmo texto de sua terceira edição, não sendo acrescentado nenhum

novo objetivo ou ação voltada para as redes de Educação Ambiental.

5.1 O ENREDAMENTO

A palavra rede vem do latim retis e significa um entrelaçamento de fios que formam

uma malha, um conjunto de elementos interligados. Segundo Castells (1999, p. 566), rede é um

conjunto de nós interconectados, sendo nó o ponto no qual uma curva se entrecorta. Explicando

melhor, Souza e Guimarães (2008, p. 114, grifos dos autores) afirmam que rede “é a

ramificação que une os nós e que nos direciona para um fortalecimento (formação) num

momento virtual e finaliza com o objetivo maior, que é o fazer junto”.

Para Oliveiri (apud TRISTÃO, 2008, p.56),

[...] redes são sistemas organizacionais capazes de reunir indivíduos e instituições, de forma democrática e participativa, em torno de causas afins. Estruturas flexíveis e estabelecidas horizontalmente, as dinâmicas de trabalho das redes supõem atuações colaborativas e se sustentam pela vontade e afinidade de seus integrantes, caracterizando-se como um significativo recurso organizacional para a estruturação social.

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Para Capra (2006, p. 77-78), “onde quer que encontremos sistemas vivos – organismos,

partes de organismos ou comunidades de organismos – podemos observar que seus

componentes estão arranjados à maneira de rede. Sempre que olhamos para a vida, olhamos

para redes.” E é olhando para a vida que entendemos essa afirmação de Capra, e também

percebemos como as redes propiciam o fortalecimento de organizações ou de organismos, como

é o caso de Pando, o maior organismo vivo da Terra.

Localizado no estado estadunidense de Utah, Pando é uma colônia de uma espécie de

árvores chamada álamo tremulante, e está viva há aproximadamente 80 mil anos. Muito mais

que uma colônia, Pando é um rede de 47 mil árvores que possuem o mesmo código genético, e

são conectadas por um sistema complexo de raízes. Apesar das árvores possuírem as mesmas

características genéticas, elas não são iguais fisicamente e não possuem a mesma idade (A

JORNADA DA VIDA, 2014).

O sistema de raízes da colônia que conecta todas as árvores é o que mantém a colônia

viva por todos esses anos. Além de fornecer água e nutrientes para todas as árvores de forma

igual, as raízes fazem brotar novas árvores no lugar daquelas que morrem. Assim, mesmo que

todas as árvores fossem destruídas, o organismo Pando, a rede viva que o constitui, faria a vida

novamente ressurgir. Essa é uma das características das redes vivas explicitadas por Capra, elas

são autogenerativas: “Elas criam-se e recriam-se continuamente, transformando-se ou

substituindo seus componentes. Nesse sentido, elas passam por mudanças estruturais contínuas

enquanto preservam seu padrão de organização similar a redes” (CAPRA, 2008, p. 20).

Essa característica é o que dá sentido ao nome dessa colônia de álamos tremulantes.

Pando vem do termo em latim para a primeira pessoa do singular do indicativo do verbo

espalhar: eu espalho. A autogeração é o que propicia o espalhamento da vida que ressurge sobre

o solo. É nesse espalhar que os nós das redes enquanto organizações se entrelaçam, se

fortalecem e se mantêm vivos.

O entrelaçamento da Educação Ambiental com os ideais de organização em rede tem

propiciado o seu fortalecimento e o desenvolvimento de práticas e ações. A Educação

Ambiental tem se espalhado pelos nós das redes.

Durante a Rio-92 várias organizações, ambientalistas e educadores do mundo inteiro se

reuniram no Rio de Janeiro para discutir sobre as questões ambientais e vias de ação. O clima

de discussão, mobilização e envolvimento foi propício para gestação de várias ações em defesa

do meio ambiente, entre elas a criação de Rede de Educação Ambiental.

De acordo com Jacobi (2000, p.146) foi a partir do ano de 1992 que algumas “redes e

coalizões passaram a se estruturar com o objetivo de enfrentar nacional e regionalmente, [...]

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temas críticos que demandam organização, articulação e mobilização”. Foi nesse cenário que

a Rede de Educação Ambiental da Bahia (Reaba) foi gestada por um grupo de ambientalistas e

educadores ambientais baianos que participavam da Conferência, com o objetivo inicial de

divulgação do Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e

Responsabilidade Global, documento produzido durante a Conferência no Rio de Janeiro. A

Reaba foi reativada em 2004 durante o Seminário de Educação Ambiental promovido pela

Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa do Estado da Bahia, desta vez com o

objetivo de articulação dos educadores ambientais, visando fortalecer a implementação do

Programa Nacional de Educação Ambiental – ProNEA, e fomentar a troca de experiências e a

capacitação de educadores para o fortalecimento da Educação Ambiental no estado da Bahia.

Outro exemplo de rede de Educação Ambiental gestada no ano de 1992 é a Rede Paulista

de EA (REPEA), que tem “como finalidade socializar informações, experiências e ações de EA,

promovendo seu fortalecimento” (GUERRA et al., 2008, p. 83). Além dessas finalidades, a

REPEA tem tentado romper o isolamento dos educadores ambientais, enfatizando o fazer junto

como forma de fortalecimento das práticas educativas em EA e da própria rede (BORBA;

OTERO; PINHEIRO, 2005, p. 63).

Contudo, embora tenha sido criada em 1992 e tenha desenvolvido ações importantes

desde então, somente em 1999 a REPEA teve um plano de ação aprovado, e assim foi possível

a elaboração de um planejamento que permitisse a captação de recursos que viabilizasse a

continuidade de suas atividades e a realização de novas ações.

Para Martinho (2003), as organizações em redes apresentam-se como um desafio

interessante para promoção das transformações necessárias para uma nova forma de

organização social, econômica e cultural entre pessoas e grupos, que se caracterize pela

cooperação, interdependência, autonomia, solidariedade, respeito recíproco e convivência entre

as diferenças. Nesse sentido:

Operando com padrões de dinâmica conectiva e morfológica, que se assemelham aos ecossistemas naturais, seus atores encontram neste ambiente/estrutura possibilidades de vivenciarem a perspectiva de mudanças de valores, hábitos e atitudes individuais e coletivas, tornando propenso o ambiente de rede para reflexões e práticas que podem contribuir na gestação de uma nova cultura em ebulição (GUIMARÃES et al., 2009, p. 59).

De acordo com Guerra et al. (2008, p. 81), as redes constituem uma alternativa de

comunicação, informação e transformação cultural. Para esses autores, as redes são

comunidades de relações que:

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[...] por meio dos recursos virtuais das tecnologias e de encontro presenciais regionais e nacionais, aproximam pessoas comprometidas com os mesmos interesses e as tornam capazes de se unirem em torno de um objetivo comum. Assim, as redes tornam-se meios abrangentes de mobilização, sensibilização e informação para a participação individual e coletiva, visando atingir as finalidades de uma EA emancipadora e transformadora (GUERRA et al., 2008, p. 81).

Assim entendidas, as Redes de Educação Ambiental se configuram como uma “real

possibilidade de construção de espaço educativo, público e ampliado, constituído por aqueles

que acreditam na importância do exercício da democracia participativa” (GUIMARÃES et al.,

2009, p. 60). Como espaço para romper com o isolamento físico e das práticas educativas, as

redes são um meio para a construção colaborativa e participativa da Educação Ambiental.

Figura 12. A dinâmica de relações dentro de uma rede. Fonte: Elaborada pelo autor.

Através da dinâmica de relações dentro das redes cria-se a possibilidade de comunicação

e articulação de pontos distantes, podendo ser no mesmo município ou entre municípios

diferentes ou entre outras unidades territoriais. Deste modo, as práticas tecidas de forma

solitária em Educação Ambiental dentro do cotidiano escolar ganham força e potencialidade

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para mudanças significativas das realidades por meio da conexão dos nós das redes de Educação

Ambiental.

5.2 CARACTERISTICAS DAS REDES

Quanto à organização das redes, Guerra et al. (2008, p. 82) afirmam que não há um

modelo para definir o padrão organizacional de uma rede de EA, pois suas configurações e

dinâmicas são variadas e vão sendo estabelecidas de acordo com o movimento dos seus

membros, objetivos e finalidades. Contudo, segundo Amaral (2008, p. 20), as redes enquanto

sistemas organizacionais, possuem algumas características que podem ser definidas da seguinte

maneira:

1- São organizacionalmente fechadas, mas abertas aos fluxos de energia e recursos.

Fechadas, porque os objetivos compartilhados, as regras e os ritos definem sua

identidade, criando um sentimento de pertencimento. Mas aberta às novas

participações, à comunicação e à troca de informações;

2- O fluxo de informação é multidirecional, não-linear e tem diversas origens dentro

do sistema. A troca, o fluxo de informação, não é apenas foco de um dos elementos

que constituem a rede, mas de todos os elementos;

3- Os elementos que compõem a rede são autônomos, mas funcionam de forma

interdependente. As ações de uma rede podem ser de toda a rede ou de apenas parte

dela, contudo as pessoas atuam de forma conjunta para a realização de tarefas e para

alcançar os objetivos em comum;

4- As redes são policêntricas. As redes possuem vários centros de iniciativas, que

funcionam como nós que estimulam novas conexões dentro da rede, e inter-redes;

5- As redes articulam diferenças. Congregando diversos setores, segmentos e sujeitos

com culturas diferentes, as redes criam um espaço que estimula a escuta e fomenta

o respeito às diferenças.

As redes de Educação Ambiental podem ser articuladas basicamente de duas formas: a

primeira são as redes românticas ou espontâneas, como as redes que surgiram em 1992 a partir

das discussões e parcerias firmadas entre participantes da Rio-92 e eventos paralelos. As redes

articuladas nessa perspectiva surgem com objetivos bem específicos, que se articulam em torno

dos ideais em comum do grupo que articula a rede.

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O segundo tipo de articulação é conhecido como redes induzidas ou tuteladas. As redes

nesse caso surgem a partir de editais ou de projetos vinculados a instituições, empresas ou a

órgãos governamentais, que tem função de regulação legal e de financiamento da rede. “A

criação induzida traz o diferencial da dotação de recursos financeiros e um conjunto de

atividades, produtos, a exigência de resultados e alguma institucionalização (AMARAL, 2008,

p.23).

No Brasil, o Fundo Nacional do Meio Ambiente lançou em 2001 um edital para seleção

de projetos que visavam à estruturação e à criação de redes de Educação Ambiental. Foram no

total cinco redes beneficiadas pelo edital, sendo que três delas surgiram a partir do mesmo. As

redes foram financiadas durante 18 meses, contudo, após o fim do financiamento algumas redes

tiveram parte de suas atividades suspensas, como aconteceu com a REPEA, que suspendeu seu

processo de expansão para o interior do estado de São Paulo. Todavia, Amaral (2008, p. 23)

afirma que as capacitações para o trabalho em rede possibilitadas através do edital foram

importantes para superar a visão romântica inicial e reconhecer “a necessidade de informação

e formação específica para sustentação dos processos de horizontalização”.

Para Lima (2007, p. 173) as redes induzidas ou tuteladas correspondem a uma solução

organizacional concebida para funcionar enquanto mecanismo de coordenação, em resultado

de uma ação direta e consciente no sentido de criar e financiar uma rede. Nesse sentido, as redes

tuteladas pelo poder público “têm sido apresentadas como um padrão de coordenação

característico de uma sociedade sem centro em que a função do governo seria a de permitir e

incentivar as interações entre múltiplos atores” (LIMA, 2007, p. 176).

Nesse sentido, as redes de Educação Ambiental tuteladas pelo poder público

apresentam-se como possibilidade para o gerenciamento e a construção participativa de

políticas públicas e projetos educacionais e configuram-se como uma abertura no processo de

democratização da gestão pública. Contudo, é preciso incluir dentro dos projetos de criação de

redes tuteladas mecanismos que garantam a descentralização e a gestão participativa e

colaborativa. A não garantia desses aspectos pode acarretar o risco de que as decisões e ações

da rede fiquem restritas às escolhas do agente financiador, descaracterizando assim o sentido

da rede.

5.3 POSSIBILIDADES E LIMITAÇÕES DAS/NAS REDES

Embora as redes, como afirma Capra (2006), estejam presentes na dinâmica da vida, o

entendimento de seus processos de auto-organização e horizontalização apresenta-se como um

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desafio para a criação, consolidação e continuidade das ações de uma rede. Para que o princípio

de auto-organização possa acontecer é necessário que mecanismos e processos dinâmicos sejam

acionados. Nesse sentido, faz-se necessário que as redes possuam uma coordenação que possa

desencadear e mediar os processos de auto-organização.

Nesse sentido, como afirma Amaral (2008, p. 27), “se a coordenação estiver focada nas

dimensões da horizontalidade e da auto-organização, deverá trabalhar com a implementação e

nutrir dinâmicas de cooperação”. As regras devem ser claras e a transparência no processo de

coordenação deve ser estabelecida, evitando assim que a mediação e a intervenção sejam vistas

como impositivas.

Outro ponto que pode limitar o processo e as ações de uma rede é o esfriamento das

relações. Isso ocorre principalmente se a comunicação e as relações ficarem restritas aos meios

digitais, o que é muito comum em ambientes virtuais de aprendizagem, listas de discussões

através de e-mail e sites de fóruns. O esfriamento pode ser superado nos meios digitais através

de facilitadores e animadores que têm como função promover e instigar as discussões, bem

como pela realização de reuniões presenciais periódicas para planejamento e avaliação das

ações da rede.

A formação continuada é uma possibilidade que surge através das redes de Educação

Ambiental. A falta de formação continuada em Educação Ambiental é uma queixa comum entre

professores, sendo que a rede de Educação Ambiental pode propiciar, através de elos, a oferta

de cursos de formação em EA organizados a partir das necessidades e desejos apontados por

seus membros, além de cursos específicos em EA. A rede pode organizar e oferecer cursos

sobre as redes e seus princípios, possibilitando um maior entendimento sobre os processos de

auto-organização e de horizontalização do seu funcionamento.

Outra possibilidade que surge com as redes de Educação Ambiental, nesse caso

principalmente com as redes tuteladas pelo poder público, é a gestão participativa e

colaborativa no processo de criação e desenvolvimento de políticas públicas. Os governos,

através de abertura democrática ou em parceria com as redes de Educação Ambiental, podem

dialogar, possibilitar e concretizar o desenvolvimento de ações, projetos e outros mecanismos

no sentido de criar e desenvolver políticas públicas voltadas para a Educação Ambiental e para

o meio ambiente.

O fluxo de relações e informação não-linear dentro das redes possibilita a

democratização da informação. Desta forma, a informação não fica centralizada e restrita a

apenas um setor ou elemento, podendo fluir através de todos os pontos e nós da rede.

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A coautoria e o diálogo também são possibilitados por meio das redes de Educação

Ambiental. A dinâmica de relações não-lineares das redes possibilita que os membros sejam

parceiros e coautores no desenvolvimento e realização de projetos, rompendo com as práticas

solitárias e isoladas. O diálogo também é fomentado pelas redes, não somente entre os membros

e os elos, mas também entre instituições e organizações que não fazem parte da malha da rede,

o que se apresenta com uma possibilidade para ampliação e fortalecimento das ações e práticas

em Educação Ambiental e do próprio processo de abertura da rede.

O empoderamento dos professores em suas práticas também pode ser explicitado como

uma possibilidade que é fomentada pelas redes de Educação Ambiental. O processo de

empoderamento é propiciado/fomentado através dos cursos de formação e da própria

conscientização sobre as práticas em Educação Ambiental. A participação nas redes não

empodera os educadores, mas possibilita conhecimentos para que os educadores possam

empoderar-se, fomentando assim a realização e o fortalecimento de ações, a reflexão sobre suas

próprias práticas e a participação ativa nos processos democráticos da rede e na sociedade como

um todo.

FIGURA 13. Possibilidades propiciadas pelas Redes de Educação Ambiental Fonte: Elaborada pelo autor.

Assim, a partir dessas possibilidades e garantida a participação colaborativa na gestão

dos processos pode-se compreender que as Redes de Educação Ambiental são espaços nos quais

existe um grande fluxo de troca de informações, de formação, de diálogo, de construção

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colaborativa, coautoria e, principalmente, possibilidades de empoderamento para

fortalecimento das práticas educativas. Deste modo, a formação de Redes de Educação

Ambiental fomenta possibilidades para ampliação das ações em EA, mas principalmente

fornece meios para que os Educadores Ambientais possam tecer a Educação Ambiental de

forma conjunta com outros autores, além de possibilitar aos governos a abertura democrática

da gestão e desenvolvimento de políticas públicas.

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5 TECENDO OS PRIMEIROS FIOS DA REDE DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Um galo sozinho não tece uma manhã: ele precisará sempre de outros galos. De um que apanhe esse grito que ele e o lance a outro; de um outro galo que apanhe o grito de um galo antes e o lance a outro; e de outros galos que com muitos outros galos se cruzem os fios de sol de seus gritos de galo, para que a manhã, desde uma teia tênue, se vá tecendo, entre todos os galos. E se encorpando em tela, entre todos, se erguendo tenda, onde entrem todos, se entretendendo para todos, no toldo (a manhã) que plana livre de armação. A manhã, toldo de um tecido tão aéreo que, tecido, se eleva por si: luz balão. (João Cabral de Melo Neto, Tecendo a manhã)

No poema de João Cabral de Melo Neto que tomo como epígrafe, a manhã é tecida pelos

fios dos gritos dos galos. Cada grito, cada fio, vai se entrelaçando a outros, formando pontos

coloridos e como em um bordado, vai compondo a imagem no pano sem vida. A manhã é então

poeticamente tecida pelas vozes de muitos um ser a dois, um bordado feito a muitas mãos.

Tecer em conjunto, talvez essa seja a principal ideia da proposta aqui apresentada. Os

diálogos construídos no decorrer da pesquisa para elaboração desse trabalho mostram que as

práticas em Educação Ambiental têm sido realizadas de forma bastante solitária, por sujeitos

autores que acreditam numa mudança de postura dos seres humanos em relação ao meio

ambiente e buscam a construção de uma sociedade sustentável, ética e justa.

Enredar essas práticas através de uma Rede de Educação Ambiental articulada e tutelada

em parceria pelas secretarias de educação dos municípios de Irecê, Ibititá e Lapão, e aberta à

vinculação de outras redes municipais de educação do Território de Identidade de Irecê, bem

como a outros agentes de Educação Ambiental, possibilitaria que esses gritos de galos solitários

que tecem a educação ambiental se conectassem em muitos um ser a dois.

Nesse sentido, o objetivo desta proposta é articular ações com vistas à criação e

consolidação de uma Rede de Educação Ambiental entre os municípios de Irecê, Ibititá e

Lapão – BA, como forma de integrar, ampliar e fortalecer as ações e práticas em

Educação Ambiental desenvolvidas nesses municípios.

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Para alcançar o objetivo deste projeto proponho cinco Movimentos de Fiação que

orientaram a dinâmica para concretização desse projeto:

Ø Movimento de Fiação – Da criação, gestão e consolidação da Rede de

Educação Ambiental (REA):

O Movimento de Fiação – Da criação, gestão e consolidação da Rede de Educação

Ambiental apresenta os primeiros passos para criação da REA e visa a articulação entre os

municípios para definição das responsabilidades legais e financeiras no processo de criação e

manutenção da rede. São previstos nesse movimento a implementação de mecanismo que visam

garantir a participação e gestão democrática e colaborativa entre os participantes da rede, além

de mecanismo para a consolidação da REA.

Ø Movimento de Fiação – Do fortalecimento dos Elos e expansão da REA:

Nesse movimento são explicitados mecanismos para o fortalecimento dos Elos que

preveem o mapeamento das ações em Educação Ambiental nos municípios, a criação de grupos

de trabalhos temáticos dentro da REA. Além desses mecanismos, são previstas ações que

objetivam o fortalecimento das relações entre os membros e elos, além da expansão da malha

da REA por outros municípios do Território de Identidade de Irecê.

Ø Movimento de Fiação – Do desenvolvimento de Políticas Públicas

Educacionais e Socioambientais:

O Movimento de Fiação – Do desenvolvimento de Políticas Públicas Educacionais e

Socioambientais apresenta ações que visam garantir a efetiva participação dos membros e elos

da Rede de Educação Ambiental no desenvolvimento de políticas públicas educacionais e

socioambientais. São previstas nesse movimento ações que objetivam a articulação da REA

com órgãos municipais e estaduais de educação e meio ambiente, e a criação de Pontos de

Educação Ambiental nos municípios integrantes da rede.

Ø Movimento de Fiação – Do fomento à uma Educação Ambiental do/no

Sertão:

Buscando uma Educação Ambiental contextualizada com as questões socioambientais

dos municípios de atuação da REA, o Movimento de Fiação – Do fomento à uma Educação

Ambiental do/no Sertão visa à realização de ações que fomentem a construção de uma Educação

Ambiental do/no Sertão, possibilitando a reafirmação da(s) identidade(s) e valorização da(s)

cultura(s) municipais.

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Ø Movimento de Fiação – Dos mecanismos de divulgação de informações sobre

atividades e projetos da REA:

Compreendendo que a divulgação das ações da REA é uma estratégia para o seu

fortalecimento e consolidação, o Movimento de Fiação – Dos mecanismos de divulgação de

informações sobre atividades e projetos da REA objetiva propor mecanismos de divulgação

de informações sobre as atividades e projetos da rede.

6.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS DOS MOVIMENTOS DE FIAÇÃO

Movimento de Fiação – Da criação, gestão e consolidação da Rede de Educação Ambiental

(REA):

· Implantar a Comissão de Desenvolvimento do Projeto (CDP) para articulação entre os

municípios;

· Implementar mecanismos de gestão para a criação e consolidação da REA;

· Definir direitos, deveres e acordo de convivência dos membros da REA;

· Definir o processo para escolha do nome efetivo da REA;

· Desenvolver o Planejamento Estratégico da REA (missão, visão, objetivos, princípios,

linhas de ação e demais aspectos estratégicos) com a participação de todos os membros;

· Elaborar e divulgar a identidade visual da REA.

Movimento de Fiação – Do fortalecimento dos Elos e expansão da REA:

· Criar Grupos de Trabalhos em diferentes Temáticas;

· Mapear ações em Educação Ambiental nos municípios vinculadas à programas dos

governos (Federal, Estadual e Municipal), de empresas, de universidades e demais

organizações;

· Realizar anualmente o Encontro da REA;

· Desenvolver parcerias com outras Redes de Educação Ambiental.

Movimento de Fiação – Do desenvolvimento de Políticas Públicas Educacionais e

Socioambientais:

· Estruturar Pontos de Educação Ambiental nos municípios vinculados a REA;

· Elaborar Documento Referencial para a Educação Ambiental em cada município

vinculado à malha da REA;

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· Desenvolver parcerias com as Secretarias Municipais de Meio Ambiente e com os

Conselhos Municipais de Meio Ambiente dos municípios membros da REA;

· Articular ações com a Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental (CIEA) do

estado da Bahia;

· Realizar anualmente a Conferência Intermunicipal de Meio Ambiente.

Movimento de Fiação – Do fomento à uma Educação Ambiental do/no Sertão:

· Incentivar, apoiar e desenvolver práticas em Educação Ambiental contextualizadas com

a realidade socioambiental;

· Desenvolver estudos sobre as questões ambientais nos municípios de atuação da REA;

· Articular parcerias com órgãos de pesquisa e proteção ambiental a nível municipal,

estadual e federal;

· Articular parcerias com famílias e associações agricultores, de mulheres, e comunidades

quilombolas e remanescentes quilombolas;

· Articular parcerias com Universidades.

Movimento de Fiação – Dos mecanismos de divulgação de informações sobre atividades e

projetos da REA:

· Criar site oficial da REA;

· Desenvolver aplicativo para Tablets e Smartphones para divulgação das ações da REA;

· Desenvolver periódico para divulgação dos resultados das pesquisas, cursos, projetos e

atividades em Educação Ambiental.

6.2 A FIAÇÃO

Movimento de Fiação – Da criação, gestão e consolidação da Rede de Educação Ambiental

(REA).

· Implantação da Comissão de Desenvolvimento do Projeto (CDP), que terá como função a

articulação inicial para o desenvolvimento do projeto. O município de Ibititá será

responsável pela articulação inicial para a implantação da Comissão. A CDP será composta

por três membros de cada município, sendo que obrigatoriamente um dos membros deverá

ser um(a) professor(a) da educação básica em efetivo exercício da profissão. Os membros

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da CDP participaram de formação inicial sobre este Projeto, além de formação sobre as

redes organizacionais. Como parte de suas atribuições, a CDP deverá: a) definir

responsabilidades financeiras dos municípios no processo de criação e manutenção da REA,

estabelecendo orçamento para implementação do projeto; b) desenvolver cronograma para

a realização das ações vinculadas aos Movimentos de Fiação apresentados nessa proposta;

c) realizar reuniões com organizações da sociedade civil, universidades e outras instituições

de ensino, a fim de consolidar parcerias; d) desenvolver ações de divulgação da REA nos

municípios; e) criar termo de adesão para pessoas físicas e jurídicas que tenham interesse

em ser membros da REA; f) enviar convite com termo de adesão e cadastro para as

instituições de ensino e demais organizações que firmarem parceria; g) realizar reunião com

cadastrados para definição de direitos, deveres e acordo de convivência dos membros, além

da definição do processo de escolha do nome efetivo da REA.

· Implantação da Comissão de Gestão Participativa e estruturação da Secretaria Executiva. A

CDP deverá realizar reuniões com todos os membros da REA para definição da composição

e implementação da Comissão de Gestão Participativa e da Secretaria Executiva. Após a

implantação, a Comissão de Gestão Participativa e a Secretaria Executiva serão responsáveis

pela organização das ações da REA, devendo definir o plano de trabalho e o cronograma de

reuniões.

· Desenvolvimento do Planejamento Estratégico da REA (missão, visão, objetivos, princípios,

linhas de ação e demais aspectos estratégicos) com a participação de todos os membros.

· Elaboração e divulgação da identidade visual da REA.

Movimento de Fiação – Do fortalecimento dos Elos e expansão da REA.

· Desenvolver estudos e formações sobre as organizações em rede, visando um maior

entendimento dos membros sobre esse tipo de organização.

· Mapeamento das ações em Educação Ambiental nos municípios (programas, projetos,

práticas educativas e materiais) vinculadas à programas dos governos (Federal, Estadual e

Municipal), de empresas, de universidades e demais organizações.

· Reunião para divulgação do Mapeamento das ações em Educação Ambiental e

desenvolvimento de possíveis estratégias de atuação.

· Criação de Grupos de Trabalhos em diferentes temáticas para o desenvolvimento de ações,

projetos, campanhas e produção de materiais de apoio às atividades em EA.

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· Realizar anualmente o Encontro da REA, como forma de fortalecer os vínculos entre os elos

e as ações da rede.

· Serão convidados para participação no Encontro da REA organizações não governamentais

e governamentais, bem como professores e profissionais envolvidos com a Educação

Ambiental de outros municípios do Território de Identidade de Irecê.

· Desenvolver parcerias com a Rede de Educação Ambiental da Bahia (REABA) e com outras

redes de Educação Ambiental visando conhecer suas experiências, com o intuito de

fortalecer as ações da REA. Nesse sentido, deverá se buscar também a integração da REA

na malha da Rede Brasileira de Educação Ambiental (REBEA).

Movimento de Fiação – Do desenvolvimento de Políticas Públicas Educacionais e

Socioambientais.

· Estruturação de Pontos de Educação Ambiental nos municípios para o desenvolvimento de

pesquisas, projetos, campanhas, produção e divulgação de materiais educativos, além da

organização e implantação de cursos e capacitação para membros e demais profissionais que

tenham interesse em realizar atividades em Educação Ambiental. Os Pontos de Educação

Ambiental deverão ser criados pelas Secretarias Municipais de Educação em parceria com a

REA e demais órgãos e instituições parceiras com interesses e ações em Educação

Ambiental.

· Elaboração de um Documento Referencial para a Educação Ambiental, sustentado nas

características socioambientais e educacionais dos municípios, englobando a diversidade de

ações e conceitos da Educação Ambiental nos âmbitos da Educação Formal e Não-Formal,

em consonância com a legislação e os programas vigentes no âmbito nacional e estadual.

· Articulação de ações e desenvolvimento de parcerias com as Secretarias Municipais de Meio

Ambiente e com os Conselhos Municipais de Meio Ambiente dos municípios membros da

REA.

· Como parte das ações de fortalecimento das ações da REA e na busca pelo aprofundamento

das discussões sobre as questões ambientais, os municípios deverão realizar anualmente a

Conferência Intermunicipal de Meio Ambiente. Como forma de preparação, serão realizadas

etapas escolares e municipais, nas quais serão escolhidos os representantes dos municípios

para Conferência Intermunicipal de Meio Ambiente.

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· Articulação e desenvolvimento de ações com a Comissão Interinstitucional de Educação

Ambiental (CIEA) do estado da Bahia que, tem dentre as suas finalidades e competências a

de “Fomentar e apoiar a criação de redes de educação ambiental no estado, assim como a

produção de instrumentos socioeducativos para a sua maior divulgação” (BAHIA, 2009).

Movimento de Fiação – Do fomento à uma Educação Ambiental do/no Sertão.

· Através dos Pontos de Educação Ambiental a REA irá fomentar o desenvolvimento de ações

em Educação Ambiental no/para o Sertão, articulando essas ações em parceria com

associações e famílias de agricultores, associações de mulheres, de comunidades

quilombolas e remanescentes quilombolas.

· Em parceria com universidades e órgão de pesquisa e proteção ambiental, a REA através dos

Pontos de Educação Ambiental desenvolverá pesquisas visando diagnosticar e propor ações

para solucionar/mitigar problemas ambientais dos municípios.

Movimento de Fiação – Dos mecanismos de divulgação de informações sobre atividades e

projetos da REA

· Criação do Site Oficial da REA e aplicativo para Smartphones e Tablets para divulgação das

ações da rede, de atividades de educação ambiental nos municípios de atuação da rede e em

outras localidades.

· Desenvolvimento pelos Pontos de Educação Ambiental e pela REA de uma publicação

periódica para divulgação dos resultados das pesquisas, cursos, projetos e atividades em

Educação Ambiental.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como todas as coisas chegam ao fim, este trabalho também chega ao seu término. O fim

da escrita deste projeto de intervenção e do meu percurso no Mestrado Profissional em

Educação – UFBA se configuram como o início do processo para o acontecer da proposta aqui

apresentada. São os primeiros fios tecidos na intenção de criação de uma Rede de Educação

Ambiental que envolve os municípios de Irecê, Ibititá e Lapão – BA.

A pesquisa realizada para elaboração deste projeto de intervenção propiciou

compreensões acerca do fenômeno estudado, da tessitura e do acontecer da Educação

Ambiental nos municípios nos quais o estudo foi realizado. Contudo, enquanto estudo de

enfoque fenomenológico, este trabalho se mostra aberto a novas compreensões, a novos olhares.

Assim, a pesquisa não tem a intenção de ser um fechamento ou abarcar a totalidade do mundo,

como afirma Merleau-Ponty (apud MASINI, 1989, p. 66), “o mundo não é aquilo que eu penso,

mas aquilo que eu vivo, sou aberto ao mundo, me comunico indubitavelmente com ele, mas

não o possuo, ele é inesgotável”.

E deste modo, este projeto de intervenção não é um fim em si mesmo, ele é uma

abertura. Uma abertura para o diálogo democrático entre governos municipais, entre os

governos e a sociedade, entre professores, entre escolas, entre comunidades, visando ao

fortalecimento e ampliação das ações de Educação Ambiental dentro dos municípios de atuação

da Rede de Educação Ambiental.

Desde o surgimento no Brasil, as redes de Educação Ambiental têm se apresentado

como uma alternativa para articulação de educadores ambientais, propiciando a ruptura do

isolamento das práticas, principalmente no cotidiano escolar. Além desses aspectos, as redes

têm fortalecido os educadores ambientais que, a partir de sua articulação, ganham força para

participação na construção de políticas públicas educacionais e socioambientais.

Nessa perspectiva, a implementação de uma Rede de Educação Ambiental envolvendo

os municípios supracitados possibilitaria uma abertura para o desenvolvimento e fortalecimento

não somente das práticas em Educação Ambiental, fomentando a ruptura do isolamento dos

educadores ambientais em suas escolas, mas também o fortalecimento do processo democrático

realmente democratizado, visto que este projeto prevê a participação ativa e colaborativa de

educadores e outros membros/elos da REA no desenvolvimento de projetos e políticas públicas

municipais voltadas para a educação e desenvolvimento socioambiental.

Assim, acredito que a implementação da proposta aqui exposta, que objetiva a criação

e consolidação da Rede de Educação Ambiental, e garantidos os princípios de horizontalidade

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e da gestão democrática, participativa e colaborativa, possibilita a construção de um espaço

público educativo e democrático ampliado e amplificador da “cidadania terrestre” (MORIN,

2002, p. 113).

Compreendo que haverá empecilhos para a implementação desta proposta, quer sejam

econômicos, políticos ou de outra natureza. Contudo, acredito que os empecilhos possam ser

superados com uma mudança de postura e o abandono da racionalidade destrutiva em busca de

uma racionalidade outra, possibilitando a abertura para o diálogo, a gestão colaborativa e

horizontalizada.

No mais, como ser-no-mundo que tem se movido pela luta em defesa do meio ambiente

e da Educação Ambiental, acredito que a implementação deste projeto de intervenção

possibilitará uma mudança significativa no acontecer da Educação Ambiental dentro dos

munícipios, ao mesmo tempo que moverá diversos atores no processo de construção de uma

sociedade mais ética, justa, democrática e sustentável.

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Uma última consideração:

O fim é só o começo.

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PENA-VEJA, Alfredo. O despertar ecológico: Edgar Morin e a ecologia complexa. Rio de Janeiro: Garamoud, 2010.

PEIXOTO, A. J. A origem e os fundamentos da fenomenologia: uma breve incursão pelo pensamento de Husserl. In: PEIXOTO, A. J. et al. (Org.). Concepções sobre a fenomenologia. Goiânia: Editora UFG, 2003. p. 13-32.

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ANEXO A – REPRODUÇÃO DOS QUADROS UTILIZADOS NAS

ENTREVISTAS NARRATIVAS

Quadro “Sertão Bonito”, de Antônio Karneiro.

Quadro “Pôr do Sol”, de Antônio Karneiro.

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Quadro “A Barriguda de Rodagem”, de Antônio Karneiro.

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ANEXO B - COMPOSIÇÃO CURRICULAR DO MESTRADO PROFISSIONAL EM

EDUCAÇÃO: CURRÍCULO, LINGUAGENS E INOVAÇÕES PEDAGÓGICAS

O Mestrado Profissional em Educação Currículo, Linguagens e Inovações Pedagógicas

tem duração de dois anos e segue as propostas formativas efetivadas pela FACED-UFBA em

seus convênios de formação em serviço e cursos de especialização com municípios da Bahia.

Tais propostas foram instituídas experimentalmente e imprimiram uma marca de ousadia nos

seus desenhos curriculares. Na graduação, nos municípios de Irecê e Tapiramutá, o currículo

apresentava um curso não disciplinar, com um fluxograma montado individualmente por cada

um dos cursistas. A especialização, em Irecê, foi efetivada em uma árdua atividade coletiva de

montagem do TCC: uma proposta curricular para a rede municipal de educação, cuja

implementação se encontra em andamento.

Estes e outros aspectos da composição curricular destes cursos vêm sendo investigados

em pesquisas de várias universidades. Os pressupostos teóricos desses desenhos curriculares

fundamentam-se na chamada Pedagogia do A-con-tecer, termo cunhado por Mª Inez Carvalho,

profª adjunta da UFBA, a partir dos estudos prigoginianos da Teoria das

Possibilidades/atualizações na vertente defendida por Felippe Serpa – professor que compôs o

quadro do PPGE e foi reitor da UFBA, entre 1993/1998 – de que o mundo funciona como um

jogo em que se vão atualizando as diversas possibilidades postas. Todo o trabalho pedagógico

está alicerçado no conceito de campo das possibilidades pensadas como o desencadeador

intencional do campo das atualizações, o que propicia uma construção curricular mais em

processo e menos como um modelo a ser aplicado.

Na montagem do currículo, o campo das possibilidades pensadas é o direcionador das

escolhas a respeito dos tipos, conteúdos e formas dos componentes curriculares do curso. Tais

componentes curriculares não são pré-definidos em sua integralidade, ou seja, contrariando os

pressupostos disciplinares que, na maioria das vezes, indicam disciplinas com proposições

previamente definidas, neste desenho curricular, os componentes são de diversas naturezas a

fim de contemplar as ideias contemporâneas que enfatizam as linguagens como fundantes nos

processos de aprendizagem, assim como a multiplicidade dos modos de aprender.

Compreende-se que o conhecimento para ser de fato consolidado tem que se desatrelar

da presença, presencial e/ou virtual, sempre constante de um professor, desse modo, os

mestrandos têm autonomia orientada nos estudos e desenvolvimento de suas pesquisas. A

chamada aprendizagem colaborativa pode/deve ocorrer a partir de intercâmbios entre corpo

docente/discente, corpo discente/discente e corpo discente/elementos externos. Para propiciar

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efetivamente esta aprendizagem proposta, o desenho curricular tem uma forte base tecnológica,

entendida para além da dimensão instrumental. No curso há um ambiente de rede com base

tecnológica, no qual todas as informações/produções de conhecimento circulam. Tal ambiente

disponibiliza fóruns de discussão, blogs, espaços específicos para cada componente e

informações diversas.

OS CICLOS

Os componentes curriculares estão distribuídos em ciclos que correspondem

cronologicamente aos semestres letivos. A pertinência da utilização do termo ciclo pode ser

explicada, por ser este um termo - diferentemente do linearmente cronológico semestre - de

caráter não sequencial. Tal característica contempla um dos princípios conceituais sobre

aprendizagem que rege o curso. A ideia de ciclo, tempo cíclico, possui concomitantemente, um

caráter de finitude — os ciclos têm um começo e um fim — e de infinitude — a repetição do

ciclo nunca se realiza da mesma maneira, apesar das intensas relações com o ciclo anterior.

Tal estrutura curricular que atualiza o entendimento de currículo como o “processo

social realizado no espaço concreto escola” (Burnham, 1993) e que abrange percursos de

aprendizagens, discentes e docentes, em suas dimensões epistemológicas, políticas,

econômicas, tecnológicas, ideológicas, estéticas, históricas (Apple, 1988), é consonante com os

atuais documentos que tratam sobre a questão curricular no país, destacando-se localmente o

documento Política de Reestruturação dos Currículos dos Cursos de Graduação da UFBA, que

reforça os conhecimentos, competências e habilidades, como não estáticos e submetidos,

independente de intencionalidades, a um processo contínuo de desconstrução e reconstrução.

O percurso de formação gira em torno de dois movimentos, que a cada ciclo serão

finalizados com um Seminário comum aos dois movimentos e no final do curso com a defesa

dos TCCs. Esta estrutura pode ser apresentada em 4 itens:

Movimento 1. Adentrando no conhecimento socialmente produzido dimensão teórica.

Movimento 2. Adentrando nos meandros das redes de ensino a dimensão prática.

Seminário

Trabalho de Conclusão de Curso

Cada um dos movimentos acontece simultaneamente em cada ciclo, com exceção do

último, o Ciclo Quatro, quando é oferecido apenas o movimento dois. São movimentos

interdependentes e a intenção da simultaneidade é possibilitar, desde o início, conexão direta

com as pesquisas dos mestrandos. No quarto e último semestre, apesar do não oferecimento dos

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componentes curriculares do movimento um, a interdependência é mantida, pois apesar da

inscrição apenas no componente do movimento prático, a oficina, esta é destinada à elaboração

do trabalho final do curso e os mestrandos voltam-se necessariamente aos conteúdos do

movimento teórico dos ciclos anteriores.

A. O primeiro movimento - Adentrando no conhecimento socialmente produzido: é a

dimensão teórica, composta de quatro blocos temáticos, agrupados pela área de concentração e

alinhados com as linhas de pesquisa do programa. São eles:

Educação e currículo ao longo da história;

Educação e prática docente;

Educação e linguagens;

Educação e contextos instituídos e instituintes;

A cada ciclo (com exceção do Ciclo Quatro), os quatro blocos são disponibilizados para

inscrição e aos mestrandos cabe obrigatoriamente:

No Ciclo UM: inscrição em, no mínimo, dois Blocos Temáticos,

No Ciclo DOIS e Ciclo TRÊS: inscrição em, no mínimo, um Bloco Temático.

Cada um dos blocos temáticos terá um professor, chamado Professor Coordenador,

responsável pela organização didática do bloco que será estruturado em três componentes

curriculares, a saber:

Grupos de estudos acadêmicos (GEACs): o professor do bloco temático, em cada um dos

ciclos sonda as demandas, problemáticas e necessidades investigativas do curso e/ou de cada

mestrando e apresenta material selecionado sobre as mesmas, induzindo problematizações

como estímulo para os estudos. Todos os participantes se debruçam sobre o material para

construírem uma produção textual, socializada no ambiente de rede, embasada na prática

escolar, nas referências teóricas indicadas e nos interesses de investigação. É um componente

de 34 horas, semipresencial, com 3 tipos de encontros: com o professor presencialmente (17 h);

com o professor via redes tecnológicas (07 h) e sem professor (10 h). Os encontros são

semanais.

Cursos: serão realizados paralelamente aos GEACs para aprofundamento da discussão

temática de cada bloco e possibilitar uma maior articulação entre a temática do bloco e as

temáticas investigativas dos mestrandos. É um componente de 17 h oferecido modularmente,

uma ou duas vezes durante o ciclo, ou seja, um módulo de 17 horas ou 2 de 8/9 horas.

Palestra: fecha os estudos de cada Bloco Temático e é ministrada pelo Professor Coordenador

que monta a atividade a partir dos resultados obtidos nos diversos estudos do bloco. Apesar de

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não ter atribuição direta de carga horária/crédito, devido ao exíguo tempo de duração, é

caracterizada como componente curricular pela sua importância na finalização de cada Bloco

Temático.

B. O segundo movimento - Adentrando nos meandros das redes de ensino: dimensão

prática que objetiva possibilitar de um real envolvimento do curso com as práticas concretas.

Será realizado através do componente curricular oficina.

A cada ciclo será oferecida uma oficina com inscrição obrigatória. Neste espaço, o

momento é para o aprimoramento do TCC. Tem-se como intenção propiciar um mergulho

crítico, embasado em estudos teóricos, no cotidiano dos espaços das redes de ensino. São as

oficinas assim constituídas: saídas a campo, socialização dos achados em campo, estudos

teóricos. As discussões teóricas deste componente são voltados para a metodologia visando,

qualificar as idas a campo.

Descobrindo a rede: buscar descobrir os meandros da rede de ensino e delimitar

interesses, a partir de visitas a estes espaços. Estudos de metodologia da pesquisa.

Compreendendo espaços específicos da rede: aprofundar-se no conhecimento das realidades da

rede, a fim de alargar a compreensão sobre a mesma, definir o foco da pesquisa e participar do

cotidiano destes espaços.

Pensando seu espaço de investigação da rede: repensar a problemática de investigação

e vivenciar o cotidiano do espaço escolhido para conduzir o aprimoramento de sua investigação.

Será realizada a qualificação, na qual serão apresentadas as propostas de intervenção na rede.

Escrevendo o seu espaço de investigação da rede: ciclo destinado à formulação da

proposta de intervenção para a rede de ensino e defesa final.

C. Os Seminários: objetivam avaliar os trabalhos realizados, socializar as problemáticas

de investigação e viabilizar novas demandas. O seminário do Ciclo QUATRO será destinado

as defesas dos TCCs.

D. O Trabalho de Conclusão do Curso: pensado desde o primeiro semestre, poderá

abarcar as seguintes modalidades: projetos de inovação pedagógica; projetos técnicos e

tecnológicos de intervenção nas escolas; desenvolvimento de materiais didáticos pedagógicos;

proposta de intervenção em procedimentos de gestão e de coordenação ou de serviços

permanentes que interferem na prática educativa. Para a conclusão o trabalho será submetido a

uma banca constituída por no mínimo três membros doutores.