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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO PROFISSIONAL EM AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS RENATA LIMA DA COSTA AVALIAÇÃO DAS AÇÕES DE SAÚDE DO TRABALHADOR E SUAS REPERCUSSÕES PARA O PROCESSO DE TRABALHO FORTALEZA-CEARÁ 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

MESTRADO PROFISSIONAL EM AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

RENATA LIMA DA COSTA

AVALIAÇÃO DAS AÇÕES DE SAÚDE DO TRABALHADOR E SUAS

REPERCUSSÕES PARA O PROCESSO DE TRABALHO

FORTALEZA-CEARÁ

2014

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RENATA LIMA DA COSTA

AVALIAÇÃO DAS AÇÕES DE SAÚDE DO TRABALHADOR E SUAS

REPERCUSSÕES PARA O PROCESSO DE TRABALHO

Dissertação de Mestrado apresentada ao

Programa de Pós-graduação em Avaliação de

Políticas Públicas da Universidade Federal do

Ceará, como requisito parcial à obtenção do

título de Mestre em Avaliação de Políticas

Públicas. Área de concentração: Políticas

Públicas e Mudanças Sociais.

Orientadora: Profª Drª Lea Carvalho

Rodrigues

FORTALEZA-CEARÁ

2014

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação

Universidade Federal do Ceará

Biblioteca de Ciências Humanas

C875a Costa, Renata Lima da.

Avaliação das ações de saúde do trabalhador e suas repercussões para o processo de trabalho /

Renata Lima da Costa. – 2014.

113 f. : il. color., enc. ; 30 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Ceará, Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação, Mestrado Profissional em Avaliação de Políticas Públicas, Fortaleza, 2014.

Área de Concentração: Políticas públicas e mudanças sociais.

Orientação: Profa. Dra. Léa Carvalho Rodrigues.

1.Trabalhadores nos serviços de coleta de resíduos,de limpeza e conservação de áreas públicas –

Saúde e higiene – Avaliação – Fortaleza(CE). 2.Higiene do trabalho – Política governamental –

Avaliação – Fortaleza(CE). 3.Empresa Municipal de Limpeza e Urbanização. I. Título. CDD 331.7613637291098131

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RENATA LIMA DA COSTA

AVALIAÇÃO DAS AÇÕES DE SAÚDE DO TRABALHADOR E SUAS

REPERCUSSÕES PARA O PROCESSO DE TRABALHO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

graduação em Avaliação de Políticas Públicas

da Universidade Federal do Ceará, como

requisito parcial à obtenção do título de Mestre

em Avaliação de Políticas Públicas. Área de

concentração: Políticas Públicas e Mudanças

Sociais.

Aprovada em:_____/_____/_____.

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________

Profª Drª Lea Carvalho Rodrigues (Orientadora)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

______________________________________

Profª Drª Evania Maria Oliveira Severiano

Faculdade Metropolitana (FAMETRO)

____________________________________

Profª Gema Galgani Silveira Leite Esmeraldo

Universidade Federal do Ceará (UFC)

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À minha família, a quem devo tudo que hoje

sou e a quem eu vou amar eternamente.

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AGRADECIMENTOS

Aos cinco anos de idade, quando comecei a estudar, jamais pensei que iria tão

longe, jamais pensei que alimentaria a paixão pela leitura e escrita. Sou privilegiada porque

encontrei nesta caminhada tudo aquilo que alguém precisa para SER. Encontrei uma família

que é minha base, que me aponta para Deus todos os dias, que me educou baseada nos mais

nobres valores, que me ensinou que podemos sonhar e realizar, me ensinou que as conquistas

se materializam com muito trabalho, dedicação e amor ao que faz. E hoje estou aqui,

encerrando um ciclo muito desejado, sonhado, exaustivo, mas também muito prazeroso,

período rico de conhecimentos e de emoções indescritíveis.

A minha gratidão a Deus, por me permitir viver esta experiência singular, por

cuidar de mim em todos os meus momentos.

Aos meus pais Fernando Felipe Costa e Aldeide Alencar Lima da Costa, pela

dedicação e amor incondicional, pelas palavras diárias de incentivo e por acreditarem mais em

mim do que eu mesma.

Aos meus queridos irmãos e irmãs, parceiros de mais uma importante jornada,

obrigada pelo apoio, carinho, compreensão e amizade de sempre.

Especial agradecimento à minha irmã Fernanda do Socorro Lima da Costa, que

me ensinou a ler e a escrever e que, ainda criança, cumpria tão bem o seu papel de educadora.

Aos meus queridos amigos, pelo respeito, carinho, apoio e compreensão. Afinal,

foram muitas as minhas ausências.

Aos colegas de turma, que se tornaram grandes amigos ao longo desta caminhada.

Aos trabalhadores do CEREST Regional e NUAST, pelas preciosas contribuições.

Aos trabalhadores da EMLURB, em especial aos garis lotados na Secretaria

Executiva Regional IV, que me acolheram sempre com muita disponibilidade e que

contribuíram diretamente para a realização desta pesquisa.

Aos colegas de trabalho, pela amizade, compreensão, respeito, incentivo e

tolerância.

Aos professores e funcionários do MAPP, pelo afeto e respeito diários.

Ao professor Alcides Fernando Gussi, coordenador do MAPP, pelas importantes

contribuições ao longo desta jornada.

À banca de qualificação, professores Doutores Marcelo Tavares Natividade e

Evania Maria Oliveira Severiano, pelas valiosas contribuições que deram à dissertação.

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Às professoras Doutoras Gema Galgani Silveira Leite Esmeraldo e Evania Maria

Oliveira Severiano, que compuseram a banca de defesa.

À professora Doutora Lea Carvalho Rodrigues, pela paciência e pelos ricos

momentos.

Ao amor, por ser um grande presente em minha vida!

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RESUMO

A presente pesquisa tem por objeto de estudo as ações de saúde do trabalhador, pautadas na

Política Nacional de Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde. Gestada inicialmente

como um plano nacional, foi posta para consulta pública e, posteriormente, no ano de 2004,

entrou em vigor. Esta traz como proposta a redução dos acidentes e doenças relacionadas ao

trabalho, mediante a execução de ações de promoção, reabilitação e vigilância na área de

saúde. Em uma visão ampla, o Sistema Único de Saúde (SUS) pauta- se na noção de

integralidade do sujeito, percebendo-o como um ser completo e único. A dissertação teve por

objetivo avaliar as ações de saúde do trabalhador e suas repercussões para o processo de

trabalho dos sujeitos envolvidos (garis), por meio de investigação realizada na Empresa

Municipal de Limpeza e Urbanização (EMLURB), na área de abrangência da Secretaria

Executiva Regional (SER) IV, onde estão situadas as zonas geradoras de lixo (ZGL) 13, 14 e

15. No sentido de fundamentar tal estudo, foram realizadas leituras diferenciadas acerca das

concepções diversas que envolvem as categorias norteadoras do estudo, como saúde e

trabalho. A pesquisa parte do pressuposto de que o sujeito é um ser integral e, desta forma, a

concepção de saúde preconizada pelo SUS deve estar evidenciada nas diversas práticas, em

diferentes instâncias institucionais, no sentido de facilitar a compreensão e prática do

princípio da integralidade proposto por esta política. Trata-se de uma pesquisa avaliativa que

intencionou a escuta dos sujeitos por meio da realização de entrevistas abertas e aplicação de

questionários fundamentais para a coleta e a análise dos dados, bem como a pesquisa

documental, bibliográfica e observação in loco, que viabilizaram a compreensão da realidade.

O estudo possibilitou perceber o entendimento sobre as ações de saúde do trabalhador

praticadas em âmbito institucional e como este aspecto está posto no processo de estruturação

da política estudada.

PALAVRAS – CHAVE: Saúde do trabalhador, Políticas Públicas, Avaliação.

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ABSTRACT

This research is the object of study the actions of the worker, guided by the National Policy

on Occupational Health of the Ministry of Health, conceived initially as a national plan, was

put to public consultation and subsequently in 2004, joined into force. This brings the

proposal of reducing accidents and work-related diseases, by implementing health promotion,

rehabilitation and monitoring in health. In a broad view of the Unified Health System (SUS)

is guided on the notion of completeness of the subject, seeing it as a whole being and unique.

The study aims to evaluate the actions of the worker's health and its impact on the work

process of the subjects involved in research conducted by Empresa Municipal Cleaning and

Urbanization (EMLURB), in the area covered by the Regional Executive Secretary (SER) IV

where the zones are situated generating waste (ZGL) 13, 14 and 15. The last two, located at

company headquarters. In order to substantiate this study, we differentiated reading about the

different concepts that evolve the categories guiding the study, such as health and work. This

is an evaluative research purposed listening subjects by conducting open interviews and

questionnaires, which were essential for collecting and analyzing data, as well as the

documentary, bibliographical research, and on-site observation that enabled understanding of

reality. It is an evaluative research that he intended listening subjects through interviews and

questionnaires, which were instrumental in the collection and analysis of data. The research

allowed to realize points of attention in the process of structuring the policy studied.

KEY - WORDS: Occupational Health, Public Policy Evaluation.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1– Mapa das Regionais de Fortaleza ............................................................ 16

Figura 2– Mapa da área de abrangência da Secretaria Executiva Regional (SER)

IV..............................................................................................................

16

Figura 3– Mapa Zona Geradora do Lixo (ZGL) por regionais................................. 18

Figura 4– Nº de CERESTs habilitados por região (2002 a agosto de 2010)............ 47

Figura 5– Área e população dos Centros de Referência em Saúde do Trabalhador

no Estado do Ceará...................................................................................

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo relato

de acidente de trajeto..............................................................................

71

Gráfico 2 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo relato

de uso de bebida alcoólica e sua frequência...........................................

73

Gráfico 3 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo relato

de acidente de trabalho...........................................................................

74

Gráfico 4 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo o

conhecimento e participação nas ações de saúde oferecidas pela

EMLURB................................................................................................

77

Gráfico 5 – Distribuição do nº das ações de saúde reconhecidas pelos garis da

EMLURB que compuseram a amostra...................................................

77

Gráfico 6 – Distribuição do nº de doenças relacionadas ao trabalho, de acordo

com os garis que compuseram a amostra...............................................

83

Gráfico 7 – Distribuição do nº de doenças crônicas sofridas pelos garis da

EMLURB que compuseram a amostra...................................................

85

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Distribuição dos CERESTs por regiões e Estados, conforme Portarias

GM/MS Nº2. 437/05 e Nº2. 728/09....................................................... 47

Tabela 2 – Geração de empregos formais celetistas ............................................... 52

Tabela 3 – Distribuição do nº de garis lotados na SER IV que compuseram a

amostra, segundo ZGL e tempo de serviço na EMLURB..................... 63

Tabela 4 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra segundo sexo,

faixa etária, religião e origem familiar................................................... 64

Tabela 5 – Distribuição por ZGL do nº de garis que compuseram a amostra,

segundo nível de instrução do pai.......................................................... 66

Tabela 6 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, participantes

do Programa SESI Educa....................................................................... 68

Tabela 7 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, por ZGL

segundo nível de instrução da mãe........................................................ 69

Tabela 8– Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo o seu

grau de instrução.................................................................................... 69

Tabela 9 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo a

realização de atividades anteriores......................................................... 70

Tabela 10 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo a

renda e nº de dependentes...................................................................... 70

Tabela 11 – Classificação do grupo de doenças relacionadas ao trabalho................ 82

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LISTA DE ABREVIATURA E SIGLAS

AEPS

BPC

CAPS

CAPS AD

CAT

CEREST

CIPA

CLT

CROA

CTPS

DLP

DRT

EMLURB

EMURF

EPI

GEISAT

HDMJBO

IDH

INSS

LOS

MMA

MS

MTE

MPS

NR

Anuário Estatístico da Previdência Social

Benefício de Prestação Continuada

Centro de Atenção Psicossocial

Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas

Comunicação de Acidente de Trabalho

Centro de Referência em Saúde do Trabalhador

Comissão Interna de Prevenção de Acidentes

Consolidação das Leis de Trabalho

Centro de Atendimento à Criança

Carteira de Trabalho e Previdência Social

Departamento de Limpeza Pública

Delegacia Regional do Trabalho

Empresa Municipal de Limpeza e Urbanização

Empresa de Urbanização de Fortaleza

Equipamento de Proteção Individual

Grupo Executivo Interministerial de Segurança e Saúde do Trabalhador

Hospital Distrital Maria José Barroso de Oliveira

Índice de Desenvolvimento Humano

Instituto Nacional do Seguro Social

Lei Orgânica da Saúde

Ministério do Meio Ambiente

Ministério da Saúde

Ministério do Trabalho e Emprego

Ministério da Previdência Social

Norma Regulamentadora

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NUAST

OIT

OMS

ONU

PCMSO

PETI

PNST

PNSST

PNUD

RENAST

SFIEC

SER

SESA

SESI

SESMT

SIM

SINAN

SIPAT

SUS

UFC

ZGL

Núcleo de Atenção à Saúde do Trabalhador

Organização Internacional do Trabalho

Organização Mundial de Saúde

Organização das Nações Unidas

Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional

Programa de Erradicação do Trabalho Infantil

Política Nacional de Saúde do Trabalhador

Política Nacional de Segurança e Saúde do Trabalhador

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador

Sistema da Federação das Indústrias do Ceará

Secretaria Executiva Regional

Secretaria Estadual de Saúde

Serviço Social da Indústria

Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho

Sistema de Informação sobre Mortalidade

Sistema de Informação de Agravos de Notificação

Semana Interna de Prevenção de Acidentes de Trabalho

Sistema Único de Saúde

Universidade Federal do Ceará

Zona Geradora de Lixo

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ……………………………………………………............................

2 AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS ............................................................

2.1 Perspectivas da Avaliação .........................................................................................

3 PERCURSO METODÓLOGICO ..............................................................................

3.1.Natureza da pesquisa ..................................................................................................

3.2.Estratégias de pesquisa ...............................................................................................

3.3.Instrumentos de coleta de dados ................................................................................

4 ESTADO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SAÚDE DO TRABALHADOR ................

4.1 Estado e Políticas Públicas .........................................................................................

4.2 Política de Saúde do Trabalhador .............................................................................

4.3 Política Nacional de Saúde do Trabalhador: estratégias para implementação............

4.4 Política de Saúde do Trabalhador no Ceará ...............................................................

4.5 Ações de saúde do trabalhador....................................................................................

4.6. Relação Saúde x Doença na EMLURB......................................................................

5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS.........................................................

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................

REFERÊNCIAS ..............................................................................................................

ANEXOS ..........................................................................................................................

APÊNDICES ...................................................................................................................

14

20

20

24

24

26

27

29

29

32

44

48

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1 INTRODUÇÃO

A motivação inicial para propor este estudo é resultante de minha prática

profissional na área de Saúde do Trabalhador realizada no período de maio de 2010 a julho de

2011, quando tive contato mais direto com a temática em questão. Na qualidade de

trabalhadora, estive formalmente vinculada ao Serviço Social da Indústria (SESI),

precisamente ao Núcleo SESI de Referência em Saúde Jorge Parente Frota Júnior, Unidade do

Sistema da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (SFIEC), localizado no município de

Fortaleza – Ceará, onde a principal atividade exercida era a realização diária de ações de

saúde junto aos trabalhadores das inúmeras indústrias em seus diversos segmentos, situadas

em Fortaleza e região metropolitana, no município de Maracanaú, onde fica o Distrito

Industrial, grande polo de concentração das indústrias.

Em julho de 2011, com a minha aprovação no Mestrado Profissional em

Avaliação de Políticas Públicas da Universidade Federal do Ceará (UFC), fui desvinculada da

Instituição supracitada, tendo sido este o desafio primeiro que se colocou à minha frente, pois

a proposta inicial era avaliar a Política Nacional de Saúde do Trabalhador tomando por base

as ações de saúde desenvolvidas pelo SESI, como ponto de partida. Desta forma, fez-se

necessário buscar outro campo para desenvolvimento do estudo, que descrevo posteriormente.

O estudo realizado traz uma reflexão acerca da Política Nacional de Saúde do

Trabalhador no Sistema Único de Saúde (SUS), aplicada pelo Ministério da Saúde (MS), e em

vigência, posta para consulta pública no ano de 2004. Constitui-se como objeto deste estudo a

proposta de avaliação das ações de saúde do trabalhador e suas repercussões para processo de

trabalho dos sujeitos envolvidos (garis) no contexto institucional escolhido como campo de

pesquisa, a Empresa Municipal de Limpeza e Urbanização (EMLURB), localizada em

Fortaleza. Ressalto que não faço parte do quadro funcional da empresa citada e acredito ser

este um fator que, por si, será constituído em distanciamento necessário à realização da

pesquisa científica. A Empresa Municipal de Limpeza e Urbanização (EMLURB), escolhida

como campo de pesquisa, é uma pública de direito privado, integrante da administração

indireta do município de Fortaleza, constituída pela Lei Nº 6.223 de 28 de setembro de 1987.

Tem como finalidade o desenvolvimento e a implantação de planos urbanísticos, o

planejamento e a execução das atividades de limpeza pública e comercialização dos próprios

serviços da Prefeitura de Fortaleza, tais como: promover a coleta, remoção, industrialização e

comercialização de lixo domiciliar e o proveniente de atividades comercial, industrial,

hospitalar e de construção civil. Surgiu com a fusão entre a Empresa de Urbanização de

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Fortaleza (EMURF) e o Departamento de Limpeza Pública (DLP), em 1987. A ideia era

oferecer respostas concretas aos problemas apresentados pela cidade de Fortaleza,

desenvolvendo e implementando planos urbanísticos, bem como planejamento e execução de

atividades de limpeza pública do município. Com a reforma das regionais, as atividades de

todos os órgãos públicos foram redimensionadas e redirecionadas e, a partir daí, esses

serviços ficaram sob a competência de suas respectivas regionais. Com isso, fica sob a

responsabilidade da EMLURB a cobertura em locais e espaços públicos referentes aos

serviços de varrição, capinação, limpeza de praças, parques, área da Orla Marítima,

administração do Horto Municipal Falconete Fialho, do Zoológico Municipal Sargento Prata,

administração dos parques Opaia, Adahil Barreto, Parreão, Rio Branco e Cidade da Criança,

serviços de poda e corte de árvores em praças, parques e áreas públicas, adubação, irrigação e

controle de doenças na arborização urbana. A EMLURB tem como missão administrar e

manter equipamentos urbanos; executar e manter projetos de paisagismo, com excelência no

município de Fortaleza, visando promover lazer e qualidade de vida à população e promover a

limpeza dos espaços públicos, ruas e avenidas da cidade. Sua visão é ser reconhecida pela

sociedade e pelo mercado como uma organização municipal que trabalha com excelência e ser

referência em sua área de atuação, buscando a sua autossustentabilidade e dando continuidade

ao desenvolvimento das ações que favorecem o bem-estar da população1.

A EMLURB foi escolhida como campo de pesquisa por ser uma empresa que tem,

na execução de sua atividade principal, um grande desafio, que é manter limpa uma cidade do

porte de Fortaleza, com 2.452.185 habitantes distribuídos em uma área de 314,930 km²,

segundo dados do censo demográfico de 2010 (IBGE, 2014). Subdividida atualmente em sete

Secretarias Executivas Regionais (SER), utilizando-se da atividade de varrição pública

realizada pelos garis, que se mantêm em seus respectivos postos de trabalho em uma jornada

diária de seis horas em dias úteis.

Os garis que realizam este trabalho são organizados de forma descentralizada e

alocados nas vinte e seis gerências ou zonas geradoras de lixo (ZGL), com áreas de

abrangência diversificadas e estabelecidas dentre as sete secretarias executivas regionais

(SER).

O presente estudo foi realizado no município de Fortaleza, na área de abrangência

da Secretaria Executiva Regional (SER) IV, cuja configuração é apresentada abaixo, em mapa

que engloba todas as regionais do município de Fortaleza.

1Fonte: http://www.fortaleza.ce.gov.br/emlurb. Consulta feita em 10/07/2012.

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Figura 1 – Mapa das Regionais de Fortaleza

Fonte: www.google.com.br. Acesso em 01/07/2013

Figura 2 – Mapa de área de abrangência da Secretaria Executiva Regional (SER) IV

Fonte: www.google.com.br. Acesso em 01/07/2013

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A SER IV foi inaugurada em 25 de abril de 1997. Com área territorial de 34.272

km², abrange 19 bairros e seu perfil socioeconômico é caracterizado por serviços, como uma

das maiores e mais antigas feiras livres da cidade, a da Parangaba, além de vários corredores

comerciais, entre eles, o da Avenida Gomes de Matos, no Montese. São bairros desta área:

São José Bonifácio, Benfica, Fátima, Jardim América, Damas, Parreão, Bom Futuro, Vila

União, Montese, Couto Fernandes, Pan Americano, Demócrito Rocha, Itaoca, Parangaba,

Serrinha, Aeroporto, Itaperi, Dendê e Vila Pery. Sua população é de aproximadamente 305

mil habitantes, segundo o censo demográfico do IBGE do ano de 2010. O bairro mais

populoso é o da Parangaba, com cerca de 32.840 mil habitantes, e o menos populoso é o do

Dendê, com apenas 2.480. A SER IV concentra 15 creches e 28 escolas de Ensino Infantil e

Fundamental. Já a rede de saúde é formada por 12 unidades de atendimento básico, além de

três Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e um Centro de Atendimento à Criança

(CROA). A SER IV possui ainda a segunda maior emergência do Estado do Ceará, o Hospital

Distrital Maria José Barroso de Oliveira (HDMJBO) - Frotinha da Parangaba, que realiza uma

média de 16 mil atendimentos por mês2.

De acordo com o Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil 2013, o índice de

desenvolvimento humano (IDH) é uma medida constituída a partir dos seguintes indicadores:

educação, saúde e renda3. No Ceará, Fortaleza tem o maior IDH, diz estudo realizado pelo

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Fortaleza tem IDH de 0, 754. Das

27 unidades federais, o Ceará tem o 11 º pior IDH, com valor de 0, 682. O Ceará tem IDH abaixo

de Estados como Rio Grande do Norte, Paraná e Espírito Santo4.

A SER IV tem sistematizado três ZGL. A organização das ZGL está de acordo

com a densidade demográfica de cada área, além da natureza do resíduo que a respectiva área

produz. Foram realizadas entrevistas abertas e questionários com trabalhadores que estão

assim alocados: 40 garis na ZGL 13, que abrange os bairros Itaoca, Parangaba, Serrinha,

Itaperi e Vila Pery; 23 garis na ZGL 14, que compreende os bairros Pan Americano, Couto

Fernandes, Demócrito Rocha, Damas, Bom Futuro, Parreão, Vila União, Aeroporto e

Montese, e 52 garis na ZGL 155, constituída pelos bairros Benfica, José Bonifácio, Jardim

América e Fátima.

2 Fonte: http://www.fortaleza.ce.gov.br. Acesso em 01/07/2013. 3 Fonte: http://atlasbrasil.org.br/2013.Acesso em 20/12/2013 4 Fonte: http://g1.globo.com/ceara. Acesso em 20/12/2013. 5 Fonte: Unidade de Pessoal

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Figura 3- Mapa Zona Geradora do Lixo (ZGL) por regionais

Fonte: EMLURB (Unidade Administrativa)

A metodologia foi estruturada a partir da observação in loco e de registros em

diário de campo, aplicação de questionários e realização de entrevistas abertas. Foram

aplicados 68 questionários com o objetivo de traçar e compreender o perfil dos garis

participantes da pesquisa. Foram entrevistados 14 participantes e as entrevistas alcançaram

quatro grupos inicialmente sistematizados da seguinte forma: Grupo 1 – Trabalhadores

operacionais (garis); Grupo 2 – Técnicos que operacionalizam as ações; Grupo 3 – Chefias

imediatas; Grupo 4 – Chefia Institucional. A referida proposta teve por base a compreensão da

trajetória dos participantes na condição de trabalhador, bem como sua percepção sobre as

ações de saúde realizadas em âmbito institucional.

Esta dissertação teve por objetivo a avaliação das ações de saúde do trabalhador,

em conformidade com a Lei que normatiza a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e

suas repercussões para o processo de trabalho. Dentre os objetivos específicos, busquei

compreender a política de saúde do trabalhador desenvolvida pela EMLURB em seu desenho

e sua implementação: bem como compreender a relação saúde x trabalho na EMLURB.

Procurei ainda compreender o entendimento do trabalhador no tocante às ações de saúde

desenvolvidas pela EMLURB, além de identificar, no entendimento dos trabalhadores, os

efeitos das ações de saúde e a repercussão destas ações nos respectivos processos de trabalho;

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e ainda identificar como ocorre a implementação da política no âmbito institucional,

atentando para suas dificuldades.

O estudo encontra-se estruturado em cinco capítulos. No primeiro capítulo,

exponho de forma geral a proposta da pesquisa e minha motivação para realizá-la. No

segundo capítulo, reflito, em linhas gerais, a respeito da avaliação de políticas públicas. O

terceiro capítulo traz à cena o percurso metodológico da pesquisa, explicitando sua natureza,

estratégias utilizadas e instrumentos de coleta de dados. No quarto capítulo, reflito mais

amiúde a respeito da relação entre Estado e Políticas Públicas e apresento a Saúde do

Trabalhador e as estratégias para implementação desta Política. E, por fim, no quinto capítulo,

apresento e analiso os dados colhidos ao longo desta pesquisa.

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20

2 AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

2.1 Perspectivas da Avaliação de Políticas Públicas

Compreendo que a tradição do Brasil em realizar avaliação de políticas públicas

data da década de 1980, período associado à reforma do Estado brasileiro, quando o mesmo

exercia o papel de financiador e regulador de políticas públicas; período marcado pela eclosão

dos movimentos sociais, ampliação dos direitos sociais, conhecido historicamente como

processo de redemocratização do Estado brasileiro. Fatos históricos de tanta relevância

incidiram sob a agenda pública, alterando a mesma. Questões sociais emergiram e, uma vez

evidenciadas, passaram a ser identificadas como questão pública e, posteriormente, seriam ou

não consideradas políticas públicas.

Há para a avaliação de políticas públicas múltiplas perspectivas, segundo a

literatura que aborda o tema. Este campo ampliou-se no Brasil em meio a diversas

concepções, algumas semelhantes entre si, as ideias pautavam-se nos conceitos de

julgamento, aferição de valor, estimativa, cálculo. É importante salientar a avaliação na

perspectiva de sistematização e organização dos serviços, modelo mais utilizado

institucionalmente em uma visão mais gerencial (FARIAS, 2005). Neste período a avaliação

de políticas públicas estava mais voltada à reforma do serviço público, a perspectiva era mais

gerencialista. Sob esta influência, a avaliação de políticas públicas enfatiza resultados,

trazendo em si um caráter de medição e julgamento de desempenho, fortalecendo o aspecto

quantitativo da mesma. (FARIAS, 2005). Compreendo com isto que a visão explicitada se

mostrou incipiente e até limitada quando se percebe a avaliação como um processo amplo e

de contínuas alterações.

Ao abordar argumentos que justificam a institucionalização da avaliação da

atividade governamental na América Latina, Farias (2005) referencia a concepção mais

normativa da mesma, definindo-a como:

(a)atividade destinada a aquilatar os resultados de um curso de ação cujo ciclo de

vida se encerra; (b) a fornecer elementos para o desenho de novas intervenções ou

para o aprimoramento de políticas e programas em curso; e (c) como parte da

prestação de contas e da responsabilização dos agentes estatais, ou seja, como

elemento central de accountability (FARIAS, 2005, p.97- 98).

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O mesmo autor enfatiza ainda que é possível distinguir pelo menos quatro tipos de

uso da avaliação: instrumental, conceitual, como instrumento de persuasão e para o

“esclarecimento” (FARIAS, 2005).

Com base nesta leitura compreendo que a avaliação na condição de instrumental é

de suma importância, pois oportuniza melhorias significativas no contexto avaliado. A ampla

divulgação dos resultados obtidos a partir da pesquisa avaliativa faz-se necessária e

importante, uma vez que através destes dados podem emergir outras questões que ainda não

foram percebidas ou não foram tratadas com a devida relevância.

Na condição de “esclarecimento”, a avaliação traz a possibilidade de impacto sob

os profissionais que estão envolvidos com o processo vivenciado, objetivando evidenciar

pontos que nem sempre foram ressaltados, proporcionando novas descobertas embasadas na

vasta literatura.

A avaliação de políticas públicas é estudada e propagada por autores como Cohen

e Franco, Holanda, Ala-Harja e Helgason, Silva e Silva.

Para Cohen e Franco (1993), avaliar é fixar o valor de uma coisa. Na concepção

de Holanda (2006), há tipos diversos de avaliação, bem como categorias distintas. Para este

autor, “a avaliação é uma atividade polimorfa e complexa, que comporta múltiplas

abordagens e abarca diversas categorias e tipos de investigação”.

Ainda de acordo com Holanda (2006, p.84):

A avaliação é um procedimento sistemático de levantamento e análise de dados, o

que pressupõe um trabalho de pesquisa formalmente estruturado e um esforço de

reflexão e análise crítica visando a formular juízos e chegar a conclusões.

Holanda (2006) quando se refere à avaliação como atividade polimorfa e

complexa, como procedimento sistemático de levantamento e análise de dados aponta para a

reflexão de que o campo onde esta atividade acontece é local a ser visto em sua totalidade,

tentando apreender a multiplicidade dos fatores que incidem sob aquele espaço, sob aqueles

sujeitos.

Para Ala-Harja e Helgason (2000) não existe consenso quanto ao que seja

avaliação, tendo em vista que o conceito é amplo e admite múltiplas concepções, inclusive

diferenciadas, posto que a perspectiva de avaliar transita em diversas áreas do conhecimento,

tendo assim, um olhar interdisciplinar. Os autores trazem à reflexão dois tipos de avaliação:

a “somativa – conduzida quando o programa já está implementado há algum tempo

para o estudo de sua eficácia e o julgamento de seu valor geral”; a “formativa –

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adotada durante a implementação de um programa como meio de se adquirir mais

conhecimento quanto a um processo de aprendizagem para o qual se deseja

contribuir (ALA-HARJA; HELGASON, 2000, p.7).

A partir destes autores compreendo que avaliar tem diferentes aspectos. Na visão

de Cohen Franco (1993) a avaliação está voltada a aferição de valores. No entendimento de

Holanda (2006) a avaliação se constitui em um procedimento organizado de coleta e análise

de dados, e para Ala-Harja e Helgason (2000) não existe uma definição única e precisa do que

venha a ser avaliação. Entendo que avaliar comunga com todos estes aspectos, entretanto a

minha concepção de avaliação pauta-se no conhecimento da realidade social complexa que, se

vista somente sob a lógica da aferição de valores e sistematização do levantamento e análise

de dados deixaria relevantes lacunas e somente estes modelos seriam incapazes de dar conta

da totalidade social.

Silva e Silva (2001) caracteriza a avaliação como sendo “uma forma de pesquisa

social aplicada, sendo, portanto, uma atividade sistemática, planejada e dirigida”. Para a

autora, se considerada numa perspectiva de cidadania, a avaliação pode se constituir em

instrumento eficaz para controle social das políticas sociais. Salienta ainda as dimensões

técnica (epistemológica e metodológica) e política, no sentido de empreender esforços no

tocante ao entendimento e aplicabilidade da avaliação no contexto dos programas sociais.

Com base nesta leitura percebo uma concepção mais ampla da avaliação, tendo

em vista que as ideias de Silva e Silva (2001) referem-se à percepção de pesquisa social

aplicada vinculada a ideia de a avaliação ser um instrumento. Com isto entendo que é possível

compreender a realidade em toda a sua dinâmica, olhando para todas as suas dimensões.

Desta forma entendo que a concepção sobre avaliação trazida por esta autora me permite

ampliar a compreensão da realidade.

Sendo assim, na minha concepção, avaliar somente para julgar, para medir, para

aferir valor restringe a concepção da realidade que busquei compreender. Entendo que para

avaliar é primeiramente necessário compreender a realidade, interpretá-la a partir de seus

diversos sujeitos, e a partir desta compreensão então dialogar com a realidade que se

apresenta no contexto institucional. Considerando toda a sua complexidade, compreendo que

para pesquisá-la faz-se necessário eleger um método que vislumbre esta complexidade e as

diversas estratégias metodológicas fundamentais ao processo de pesquisa.

Com base nisto me aproximo da concepção de Rodrigues (2008) por entender que

este caminho me permite vislumbrar a realidade respeitando as suas múltiplas dimensões.

Para a autora é importante conhecê-la em toda a sua extensão e amplidão buscando

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compreensão detalhada a respeito dos fatores que incidem sob ela, e para isto faz-se

necessário lançar mão de diferenciadas estratégias que venham a evidenciar múltiplos dados

colhidos no campo de pesquisa.

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3 PERCURSO METODOLÓGICO

3.1 Natureza da pesquisa

Traçado a partir de uma área temática bem ampla, a saúde, e a subárea ainda em

estruturação, a saúde do trabalhador, o estudo proposto foi inspirado na perspectiva

etnográfica e se deu a partir da pesquisa de campo, observações in loco e entrevistas abertas

ou em profundidade, compreendendo a avaliação como um instrumento para compreensão da

realidade. Busquei embasamento na avaliação como compreensão e interpretação da

realidade, objetivando dialogar com a mesma.

Para a composição desta pesquisa julguei como necessárias as abordagens

qualitativa e quantitativa em momentos diferenciados para buscar esta compreensão. Ressalto

a importância da complementaridade das referidas abordagens para que assim fosse possível

vislumbrar o desenvolvimento das estratégias que compõem a política de saúde do

trabalhador aplicada naquele espaço.

A perspectiva etnográfica preocupa-se com a descrição de um fenômeno social

particular como ressalta o autor:

Este procedimento metodológico de natureza qualitativa permite apreendermos as

representações, a visão de mundo e a perspectiva dos atores envolvidos nos

programas sociais (GUSSI, 2008, p.33).

Entendo que para a compreensão da realidade devem-se considerar diversos

aspectos do cotidiano que está sendo pesquisado, contemplando assim os sujeitos da pesquisa

e o objeto de estudo imersos no contexto a ser compreendido e posteriormente avaliado.

Considero importante a compreensão dos sujeitos acerca da política fazendo-se

necessário avaliar não só o desenho desta, mas também o seu processo de implementação

visto que neste estão envolvidos diversos sujeitos que, por estarem em posições diferenciadas

no quadro funcional da Instituição, apresentam certamente concepções distintas a respeito do

mesmo processo.

Ao longo da pesquisa exploratória me foram oportunizados diversos contatos com

profissionais da Instituição, entre eles um profissional responsável pelo setor de pessoal da

EMLURB, com quem pude dialogar no sentido de compreender a trajetória institucional da

política de saúde do trabalhador e suas repercussões, o recorte temporal estabelecido para o

estudo, que é o intervalo compreendido entre os anos de 2000 a 2012, o contexto sociopolítico

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imbricado, bem como os sujeitos envolvidos e suas respectivas contribuições para o processo

político, ainda em construção nas três esferas, bem como na Instituição que foi campo de

estudo, reconstruindo através deste, de forma mais minuciosa, a trajetória de uma política que

ainda caminha nas trilhas de sua estruturação.

Segundo o referido profissional, a EMLURB vem desde o final dos anos 1990

tentando articular ações de saúde que pudessem beneficiar os trabalhadores. No início ainda

de forma tímida, os trabalhadores participavam esporadicamente, pois, segundo este

profissional, eles ainda não tinham a consciência do quão importante era tratar a saúde. A

empresa já mostrava preocupação com a saúde dos trabalhadores, entretanto não havia

nenhum programa sistematizado para este fim. Já nos anos 2000 estas ações passaram a ser

mais frequentes e já contava com mais adeptos, pois a divulgação se deu de forma mais

enfática e rotineira, explicando sempre a importância dos temas escolhidos para debate. Estes

eram escolhidos a partir do perfil de morbidade6, que foi sendo conhecido ao longo do tempo

com a estruturação do Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do

Trabalho (SESMT). Sendo assim, as ações baseadas na Política de Saúde do Trabalhador se

materializavam a partir da implementação do Programa de Controle Médico de Saúde

Ocupacional (PCMSO), que tem por objetivo a promoção da saúde do trabalhador. Este

Programa vigora até os dias atuais.

Neste percurso metodológico, minha inspiração no tocante ao método de

avaliação da política em estudo baseia-se na avaliação em profundidade de acordo com a

concepção de Rodrigues (2008), pois acredito que a realidade para ser compreendida deve ser

observada por diversos prismas e para que isto ocorra, o pesquisador deve aproximar-se deste

contexto objetivando compreendê-lo mais amiúde, entendendo também de que forma a

política ou programa está sendo executado.

Para a autora, a avaliação em profundidade leva em consideração todas as

dimensões importantes à compreensão do processo de elaboração da política devendo atentar,

em especial, às seguintes: análise de conteúdo, de contexto, da trajetória institucional de

políticas e programas, da temporalidade e territorialidade da política.

Entendo que, em campo é concreta a necessidade de análise do conteúdo da

política estudada, é importante compreender os dados que esta política traz ao longo do seu

processo de elaboração e execução. É fundamental para esta compreensão o entendimento das

6 Variável característica das comunidades de seres vivos, refere-se ao conjunto dos indivíduos que adquiriram

doenças num dado intervalo de tempo. Denota-se morbidade ao comportamento das doenças e dos agravos à

saúde em uma população exposta.

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etapas de formulação da política, como os documentos podem deixar claro, a exemplo das

portarias. Neles foram encontrados os eixos norteadores da política em estudo e as mudanças

ocorridas ao longo do tempo.

Para compreender o contexto de formulação da política, levantei dados sobre o

momento político e as condições socioeconômicas envolvidas no processo de elaboração

desta política, que ocorre até então, quais movimentos impulsionaram o seu processo de

gestação, e como se dá a articulação em nível local, regional e estadual, bem como, em

âmbito institucional.

A partir desta compreensão fui capaz de perceber mais adequadamente a realidade

encontrada em campo, uma vez que esta percepção colabora para o entendimento do contexto

respeitando a dinâmica da realidade.

3.2 Estratégias de pesquisa

Para a realização desta pesquisa empreendi vários esforços no sentido de captar

informações concernentes a política em estudo. Inicialmente, para compor a aproximação do

tema realizei pesquisa documental e bibliográfica, quando pude conhecer mais amiúde a

formulação da política de saúde do trabalhador.

Além disto, busquei informações em outras fontes através da participação em

eventos que abordaram o tema ao longo do ano de 2012. Visitei o Centro de Referência em

Saúde do Trabalhador (CEREST) Regional, onde me aproximei ainda mais da temática

através de conversas informais com os profissionais daquele equipamento.

Dentre os eventos ocorridos em 2012 participei de seminários na qualidade de

ouvinte, que contaram com as presenças dos atores empenhados na implementação desta

política e monitoramento, a saber: INSS; Ministério do Trabalho; Secretaria de Saúde do

Estado do Ceará (SESA); Núcleo de Atenção à Saúde do Trabalhador (NUAST) e do

lançamento de Cartilha A Saúde do Trabalhador no SUS nº 02.

Ainda contemplando a exploração do tema visitei a EMLURB por diversas vezes

objetivando traçar as estratégias adequadas no tocante à abordagem de cada sujeito, pois cada

grupo de sujeitos delimitado para a compreensão do desenho e execução da política está

institucionalmente alocado em áreas diferentes de atuação.

Foi neste momento que identifiquei aqueles que poderiam viabilizar o meu acesso

às pessoas e aos dados necessários para a composição deste estudo. Abordei alguns sujeitos

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individualmente antes da realização da entrevista propriamente dita e aplicação dos

questionários.

Selecionei a amostra a partir dos seguintes critérios: os sujeitos deveriam:

constituir o quadro funcional da empresa há mais de dez anos; estar diretamente relacionados

com o planejamento e/ou execução das ações de saúde do trabalhador; serem beneficiários

diretos ou indiretos das ações de saúde executada pela empresa. Inicialmente defini quatro

grupos de trabalho que assim designei: Grupo 1- composto por trabalhadores operacionais

(garis); Grupo 2- composto por técnicos que operacionalizam as ações de saúde; Grupo 3-

composto pelas chefias imediatas das zonas geradoras de lixo (ZGL); Grupo 4- composto pela

gestão institucional. A coleta alcançou 68 garis, 02 técnicos que operacionalizam as ações, 03

chefes imediatos e 01 representante da gestão institucional.

A cidade de Fortaleza atualmente é subdividida em sete Secretarias Executivas

Regionais (SER). Dentre as sete, escolhi a SER IV, pois é nela que está situada a sede da

empresa e nesta, duas das três zonas geradoras de lixo (ZGL) que fazem parte do espectro

territorial escolhido, o que viabilizou a coleta de dados e facilitou o acesso aos grupos 2, 3 e 4

que foram elencados, objetivando contribuir com o entendimento das informações colhidas

em campo junto ao grupo 1 como um todo.

3.3 Instrumentos de coleta de dados

O estudo foi pautado na coleta de dados de acordo com diferentes fases da

pesquisa, assim como, do uso de diferenciadas técnicas e instrumentos de coleta de dados

como citei anteriormente. Conforme Oliveira (2010), as técnicas utilizadas em pesquisa

devem ser compreendidas como meios específicos para viabilizar a aplicação de método(s).

Dentre as técnicas escolhidas para viabilizar o estudo proposto investi na

observação in loco e entrevista aberta. Percebi as citadas técnicas como as mais adequadas

considerando o cotidiano dos sujeitos participantes da pesquisa. Como instrumento, elenquei

o questionário, pois a meu ver, este se coloca como o mais assertivo. Com ele percebi o perfil

dos trabalhadores entrevistados, conhecendo um pouco mais sua realidade.

Durante as entrevistas, meu objetivo foi colher livremente as narrativas a respeito

da trajetória dos sujeitos na condição de trabalhador. Para tanto fiz uso da entrevista aberta ou

em profundidade, mesmo dispondo de um roteiro prévio.

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Considero essencial ao pesquisador e à coleta de dados o uso dos sentidos além da

aplicação de técnicas e instrumentos. A observação se coloca muitas vezes como estratégia

inicial da pesquisa.

Na pesquisa qualitativa é relevante o trabalho de campo, pois é com ele que o

pesquisador participa e vivencia as experiências deste lugar tão rico que é o campo, pois nos é

dada a oportunidade do contato com a realidade dos sujeitos envolvidos em determinados

processos, bem como com a multiplicidade de fatores que constituem o cotidiano destes

sujeitos (HOLANDA, 2006).

O gravador foi utilizado quando da realização das entrevistas concernentes à

pesquisa e também em alguns momentos na exploração do campo, principalmente em

palestras. Através do uso do gravador foi possível registrar informações que enriqueceram a

coleta inicial dos dados, bem como sua análise. Todos os participantes desta pesquisa

concordaram com o uso do equipamento que foi facilitador durante todo o processo.

Ainda nesta etapa de definição dos instrumentos de coleta de dados o projeto foi

encaminhado ao Comitê de Ética da Universidade Federal do Ceará (UFC) e posteriormente

aprovado, conforme documento (Anexo 2 ).

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4 ESTADO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SAÚDE DO TRABALHADOR

4.1 Estado e Políticas Públicas

Pensar o Estado Brasileiro, conhecendo sua trajetória social, histórica, econômica

e cultural é um grande desafio. Refletir sobre as questões que envolvem o Estado, a Sociedade

e as Políticas Públicas é uma tarefa complexa, pois estas são esferas dinâmicas que passam

por mudanças cotidianas. Ao longo do tempo, o Estado brasileiro vivenciou inúmeras

transformações e a experiência de modelos econômicos desafiadores, modelos estes que

influenciaram diretamente a criação e gestão de políticas públicas voltadas ao contexto

brasileiro.

São muitas as tentativas de conceituar Estado e esferas a ele relacionadas; o que é

comum entre os estudiosos do tema é a perspectiva de que não temos um conceito estanque

do que venha a ser o Estado. O que entendemos é que esta esfera atravessou a história. Com

isso, podemos identificar, dentre os momentos históricos, o Estado Feudal, no qual o senhor

do feudo exercia todo o seu domínio, sendo, ele mesmo, o Estado; e o Estado burguês, como

sendo um Estado que se constituía a partir da divisão da sociedade em classes, sendo estas

entendidas, respectivamente, como estrutura da sociedade.

Classes são entendidas como um componente estrutural da sociedade capitalista e,

ao mesmo tempo, como sujeitos coletivos que têm suas formas de consciência e de

atuação determinadas pela dinâmica da sociedade (FREDERICO, 2009, p. 256).

Assim, não vejo possibilidade de pensar o Estado sem refletir a respeito de sua

estreita relação com a sociedade e com o mercado, bem como não se pode pensar em uma

esfera tão complexa como esta, sem considerar suas relações com as instâncias públicas e

privadas. Na visão de Pereira (2009), o público é uma instância de caráter universal, protegida

pela lei e associada ao Estado, enquanto que o privado é uma instância particular, onde

individualmente os sujeitos têm liberdades civis resguardadas.

Considerando o Estado um ente público, é possível visualizarmos algumas de suas

funções, como por exemplo, sua participação nos assuntos da sociedade. Uma vez dividida a

sociedade em classes, surge o Estado definindo sua natureza e exercendo suas funções sociais.

Tem-se, nesta perspectiva, o Estado burguês, um Estado de classes.

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Para o Marxismo, classes se definem a partir do lugar que os indivíduos ocupam nas

relações de produção, mais precisamente pela posição perante os meios de produção

(proprietários e não- proprietários). (FREDERICO, 2009, p.256).

O Estado, como uma esfera irrestrita, não deve ser concebido de maneira linear,

sua transformação dá-se conforme as transformações societárias que são históricas e

correntes. As relações vivenciadas pelo Estado são mutáveis, dinâmicas. Sendo o Estado um

fenômeno histórico, são contemplados aspectos passados e presentes na tentativa de entender

e construir o futuro com outras e novas relações que se estabelecerão também dialeticamente,

respeitando o contínuo movimento da sociedade e do mercado.

Na perspectiva de Ianni (1986), o Estado nem sempre existiu, ele é criação da

sociedade. Entendo Sociedade como uma esfera inseparável do Estado, e é a partir das

relações estabelecidas entre Estado e Sociedade que aquele exerce o controle político e

ideológico sobre esta. Com isto, é possível percebermos a relação de reciprocidade existente

entre estas duas esferas e como esta relação faz-se importante para o desenvolvimento de uma

nação em todas as suas dimensões, dentre elas a social, a econômica e a política.

Na concepção de Pereira (2009, p. 290):

Quando se fala de Estado, é preciso especificá-lo, isto é, qualificá-lo, porque ele

existe sob diferentes modalidades, formas e contextos. Um mesmo país pode viver

sob domínio de um Estado totalitário, em um determinado momento, e de um Estado

democrático, em outro.

É através de sua relação com todas as classes que o Estado assume caráter de

poder público e, sendo assim, coloca-se a serviço do povo.

Sob a perspectiva de Hegel, o Estado é que fundamenta a sociedade civil e a

família, sendo este que detém o poder supremo, a soberania. Sendo assim, é o Estado que

organiza a sociedade e funda o povo.

Na concepção de Marx (apud PEREIRA, 2001), é a sociedade que, compreendida

como o conjunto das relações econômicas, explica o surgimento do Estado, de sua natureza,

caráter e de recursos políticos.

Respeitadas as divergências entre o pensamento de Hegel e de Marx no que se

refere à concepção de Estado e de Sociedade, o que entendo é que tanto uma esfera quanto a

outra se faz necessária para a organização e funcionamento das relações sociais, econômicas e

políticas. É importante assinalar que a atuação e intervenção do mercado nestas relações

também favorecem o estabelecimento das relações sociais, econômicas e políticas. É na esfera

da sociedade que estas relações se manifestam e se materializam.

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Gramsci (1989) contribui para o entendimento de tais esferas como a teoria do

Estado ampliado. Ele se apoia na descoberta dos “aparelhos privados de hegemonia”. Para

este autor, o Estado tem sentido amplo e comporta duas esferas principais: a sociedade

política e a sociedade civil.

Vislumbro com isto o entendimento do Estado como esfera ampla e que comporta

em si a sociedade civil. O Estado relaciona-se com a sociedade, com o mercado, com as

Instituições e com o próprio povo a partir de diretrizes que norteiam suas ações como ente

público; diretrizes estas que conhecemos como Políticas Públicas.

Não encontrei uma única definição sobre o que seja Política Pública. Mead (1995)

a define como um campo dentro do estudo da política, que analisa o governo à luz de grandes

questões públicas. Lynn (1980) a define como um conjunto específico de ações do governo

que irão produzir efeitos específicos. Peters (1986) segue o mesmo veio: Política Pública é a

soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou através de delegação, e que

influenciam a vida dos cidadãos. Dye (1984) sintetiza a definição de política pública como “o

que o governo escolhe fazer ou não fazer”.

De acordo com Teixeira (2002, p. 2): “Políticas Públicas são diretrizes, princípios

norteadores de ação do poder público; regras e procedimentos para as relações entre poder

público e sociedade, mediações entre atores da sociedade e do Estado”.

Dentre as concepções dos estudiosos do tema, visualizo fatores comuns: Política

Pública como questão importante para o Estado e demais sujeitos sociais; a compreensão da

política pública em si, sua concepção, elaboração, implantação, implementação e avaliação

dentro de um ciclo processual.

Para que fazer a política, para quem fazê-la, quando fazê-la, por que fazê-la, onde

e quanto custa fazê-la. Segundo Secchi (2010, p. 2),

uma política pública é uma diretriz elaborada para enfrentar um problema público,

[…] em outras palavras, a razão para o estabelecimento de uma política pública é o

tratamento ou a resolução de um problema entendido como coletivamente relevante.

As Políticas Públicas têm objetivos, características e tipologias diversas, bem

como definições diferenciadas e formatos institucionais particulares.

De acordo com Lowi (apud SECCHI, 2010), há as seguintes tipologias de

Políticas Públicas: regulatórias, distributivas, redistributivas e constitutivas. As políticas

regulatórias desenvolvem-se numa perspectiva pluralista. As políticas distributivas se

desenvolvem em espaços de barganha ou troca de apoios. As políticas redistributivas estão

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voltadas a concessão de benefícios para grupos de atores. Já as políticas constitutivas definem

competências e regras da luta política.

Entendo que a política de saúde do trabalhador, em sua essência, identifica-se com

a concepção de política regulatória, principalmente por ter sido gestada dentro de uma

correlação de forças antagônicas, sendo, ao mesmo tempo, sua implantação e implementação

de interesse da sociedade e do poder público.

É no processo de gestão de políticas públicas que encontramos a forma adequada

de compreender a atuação do Estado como esfera pública e sua relação com os sujeitos

envolvidos no processo.

4.2 Política de Saúde do Trabalhador

O campo da saúde do trabalhador no Brasil vem avançando. É importante a

observação a respeito da trajetória desta política, que em sua concepção inicial estava sob o

domínio da Medicina do Trabalho, ficando depois atrelada à Saúde Ocupacional e

constituindo-se, atualmente, em perspectiva ampla, como Saúde do Trabalhador.7

De acordo com Mendes & Dias (1991), a Medicina do Trabalho nasce na

Inglaterra, na primeira metade do século XIX, a partir da Revolução Industrial, importante

marco histórico para a compreensão da saúde do trabalhador como política pública. Aquele

momento foi marcado por um alto consumo da força de trabalho, conhecido por impor aos

trabalhadores jornadas excedentes e precárias condições para desenvolvimento do trabalho em

todos os postos, ocupados indiscriminadamente por homens, mulheres, crianças e idosos. Os

processos de trabalho eram desumanos, a produção era acelerada e as jornadas extenuantes.

Os trabalhadores, por sua vez, submissos a tais condições no sentido de garantir a

sobrevivência – ameaçada neste contexto favorável ao adoecimento – cumpriam as atividades

impostas, entretanto não tinham nenhuma forma de cuidado com a saúde, a não ser aqueles

ofertados por instituições filantrópicas, ainda insuficientes para acompanhar o crescente

movimento fabril.

Sendo assim, fez-se necessária a presença de um profissional responsável que

pudesse vislumbrar as questões de saúde e, ao mesmo tempo, fazer-se de elo entre o

trabalhador e aquele que lhe “ofertava” (grifo nosso) trabalho, objetivando verificar o efeito

que o trabalho tinha sobre as pessoas. Tal fato repercutiu e culminou com o surgimento da

7Minayo; Gomez; Thedim; Costa, 1997; Seligmann Silva, 1994.

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medicina do trabalho, uma especialidade que, na época, voltava-se aos cuidados de prevenção

de doenças. Ações conhecidas como “ações de prevenção” eram realizadas com foco nos

trabalhadores que se encontravam no interior das fábricas, em plena execução de suas

atividades e tinham como finalidade prevenir danos à saúde, danos estes resultantes dos riscos

do trabalho. Caso este trabalhador viesse a adoecer, o médico seria o único responsável pelo

fato, tirando do proprietário da fábrica toda a responsabilidade por eventuais adoecimentos e

acidentes ocorridos no interior delas.

Pela própria expansão do trabalho industrial ocorrido na época, deu-se uma

importante preocupação com o provimento de serviços médicos a serem disponibilizados aos

trabalhadores. Esta preocupação se destaca no cenário nacional e também na agenda da

Organização Internacional do Trabalho (OIT), criada em 1919.

Com isto, são discutidos documentos que legitimam a saúde dos trabalhadores na

perspectiva da época, como se segue:

Assim em 1953, através de legislação própria, a Recomendação 97 sobre a "Proteção

da Saúde dos Trabalhadores", a Conferência Internacional do Trabalho impunha aos

Estados Membros da OIT que fomentassem a formação de médicos do trabalho

qualificados e o estudo da organização de "Serviços de Medicina do Trabalho". Em

1954, a OIT convocou um grupo de especialistas para estudar as diretrizes gerais da

organização de "Serviços Médicos do Trabalho". Dois anos mais tarde, o Conselho

de Administração da OIT, ao inscrever o tema na ordem-do-dia da Conferência

Internacional do Trabalho de 1958, substituiu a denominação "Serviços Médicos do

Trabalho" por "Serviços de Medicina do Trabalho. (MENDES; DIAS, 1991, p. 342).

Ainda de acordo com instrumento normativo, a Recomendação 112 determina o

serviço de Medicina do Trabalho como sendo um serviço organizado em locais de trabalho e

uma de suas finalidades é “Assegurar a proteção dos trabalhadores contra todo o risco que

prejudique a sua saúde e que possa resultar de seu trabalho ou das condições em que se

efetue” (MENDES; DIAS, 1991, p. 342). Nasce, assim, a Medicina do Trabalho e suas

respectivas competências.

Os trabalhadores, vivendo em contextos adversos no período da II Guerra Mundial,

passaram a custar mais para os proprietários das fábricas. Jornadas extensivas e acidentes de

trabalho traziam mutilações, invalidez e morte aos trabalhadores. Todo este movimento

redundava em relevante ônus para as companhias de seguro, que pagavam pesadas

indenizações por incapacidades provocadas pelo trabalho. Os processos de trabalho evoluíram

e sofreram influência da tecnologia industrial. Sendo assim, a Medicina do Trabalho não era

mais suficiente para dar conta deste universo que se transformava. A influência da tecnologia

industrial modificou o ambiente de trabalho e agora, além da preocupação com os

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trabalhadores, os proprietários deveriam se preocupar com o ambiente onde estes estavam

inseridos. Para tanto, fez-se necessário buscar conhecimentos em outras ciências e profissões,

nascendo, assim, a Saúde Ocupacional, como ressaltam os autores:

Surge, sobretudo, dentro das grandes empresas, com o traço da multi e

interdisciplinaridade, com a organização de equipes progressivamente

multiprofissionais, e a ênfase na higiene “industrial”, refletindo a origem histórica

dos serviços médicos e o lugar de destaque na indústria nos países “industrializados”

(MENDES; DIAS, 1991.p. 343).

O modelo de Saúde Ocupacional previa uma equipe multiprofissional, como

exposto anteriormente, e seu objetivo era a higiene ocupacional. O papel mais relevante da

referida equipe era controlar os riscos ambientais, evidenciando que o sujeito não era o mais

importante neste cenário, o que chamava atenção para um modelo epidemiológico apenas.8

A Saúde Ocupacional, entretanto, foi um modelo que se esgotou. De cunho

mecanicista, estava ainda pautada no referencial da Medicina do Trabalho, e não concretizou

o apelo à interdisciplinaridade, conforme sua proposta inicial, como explicitam os autores:

A insuficiência do modelo da SO9 nas relações trabalho/saúde é uma realidade

mundial. O intenso processo social de mudanças ocorrido no Mundo Ocidental nas

décadas de 1970 a 1990 gerou consequências para a hegemonia do modelo de SO

vigente, dos quais se podem citar como exemplos a participação dos trabalhadores

nas questões de saúde e segurança, o abalo do conceito de exposição segura, o

surgimento de novas tecnologias, os novos riscos à saúde a SO passa a se preocupar

com a prevenção de doenças), o reconhecimento do direito dos trabalhadores à

informação e à participação no processo de trabalho (...) KARIN; MARTINS;

BOBROFF (2011, p. 396).

A falência do modelo de Saúde Ocupacional contribuiu para o surgimento da

Saúde do Trabalhador, uma nova prática preocupada com outros aspectos, entre eles a

reflexão acerca das relações entre trabalho e saúde, como apontam os autores:

Como característica básica desta nova prática, destaca-se a de ser um campo em

construção no espaço da saúde pública. Assim, sua descrição constitui, antes, uma

tentativa de aproximação de um objeto e de uma prática, com vistas a contribuir para

sua consolidação enquanto área (MENDES; DIAS, 1991, p. 347).

O objeto desta nova prática é definido como o processo saúde e doença dos

grupos humanos, enquanto se relacionam com o trabalho. Os autores a seguir explicam o

papel da saúde do trabalhador na vida social.

8 Karino ME; Martins JT; Bobroff MCC (2011) 9 SO – Saúde Ocupacional

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[...] a saúde do trabalhador considera o trabalho, enquanto organizador da vida

social, como o espaço de dominação e submissão do trabalhador pelo capital, mas,

igualmente, de resistência, de constituição, e do fazer histórico. Nesta história os

trabalhadores assumem o papel de atores, de sujeitos capazes de pensar e de se

pensarem, produzindo uma experiência própria, no conjunto das representações da

sociedade (MENDES; DIAS, 1991, p. 347).

O termo Saúde do Trabalhador é bem recente. Difundido na década de 1980 na

América Latina, faz referência a um campo do saber que visa compreender as relações entre o

trabalho e o processo saúde x doença. É neste momento que é introduzida a percepção do

processo de trabalho, considerando o seu aspecto social, político, econômico, cultural.

Com o avanço da legislação na área e ainda em consonância com o texto da

Constituição Federal, aponto o que diz a Lei Orgânica da Saúde, nº 8080/90 - LOS, 1990, em

seu art. 6º § 3º:

Entende-se por saúde do trabalhador, para fins desta lei, um conjunto de

atividades que se destina, através das ações de vigilância epidemiológica e

vigilância sanitária, à promoção e proteção da saúde dos trabalhadores, assim

como visa à recuperação e a reabilitação da saúde dos trabalhadores

submetidos aos riscos e agravos advindos das condições de trabalho [...]

(BRASIL, 1991).

É importante ressaltar que os avanços legais ocorridos e materializados na

Constituição Federal foram oriundos de uma aguerrida movimentação ocorrida na década de

1980. O movimento, conhecido como Reforma Sanitária, deu vida à luta pelas questões da

saúde e propôs uma nova concepção de Saúde Pública para o conjunto da sociedade brasileira,

que incluiu a Saúde do Trabalhador como campo de práticas institucionais no Sistema Único

de Saúde – SUS (BRASIL, 2006a), como enfatizam os autores:

No Brasil, em 1986, a VIII Conferência Nacional de Saúde fortaleceu ações do SUS

relacionadas ao direito social e de cidadania, representando um marco na formulação

de propostas desse setor, propostas que se consolidaram na Reforma Sanitária

Brasileira. (Karino ME; Martins JT; Bobroff MCC., 2011.p. 396)

Na perspectiva de Souza e Machado (2011), a proposta do Movimento de

Reforma Sanitária convidava os trabalhadores a participarem ativamente nas ações que

envolviam o tema saúde, salientando e chamando atenção para as ações de vigilância e

educação em saúde, tendo sido amplamente discutida na 1ª Conferência Nacional de Saúde

dos Trabalhadores10, em dezembro de 1986, e, em seguida, na 8ª Conferência Nacional de

10A 1ª Conferência Nacional de Saúde dos Trabalhadores contou com a participação de representações de vinte

Estados da Federação, resultando em vasta adesão dos sindicatos ao projeto de construção do SUS (Souza;

Machado, 2011).

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Saúde, que estabeleceu os princípios de equidade, integralidade, universalidade,

descentralização e hierarquização das ações do SUS.

Conforme Santana e Silva (2009), com o resultado deste movimento, reforçou-se

a ideia da Saúde como direito, tendo sido proposta a elaboração de uma Política Nacional de

Saúde do Trabalhador (PNST) que representasse alternativa ao modo de atenção à saúde

existente, tendo como referência um diagnóstico da situação de saúde.

A década de 1980 culmina com a promulgação da Constituição Federal em 1988

e, com ela, a saúde é disseminada como política, o que garante ao sujeito o direito a ela,

inclusive quando este se encontra na condição de trabalhador.

Sob o olhar de Karino et. al. (2011), na década seguinte, ocorreram mudanças

significativas nas normas regulamentadoras, que demarcam a atuação dos serviços de

segurança no trabalho e propõem ações pontuais voltadas para a saúde do trabalhador, que

objetivam claramente a redução dos acidentes e doenças relacionadas ao trabalho, somando-se

esforços na construção de uma Política Nacional que busque o bem estar do trabalhador,

como evidencia o autor:

A partir de 2004, o Governo Federal põe em marcha a Política Nacional de Saúde do

Trabalhador, com vistas à redução dos acidentes e doenças relacionadas ao trabalho,

mediante a legitimação das ações de promoção, reabilitação e vigilância da saúde do

trabalhador (OLIVEIRA, 2011, p. 62).

Ainda nesta mesma perspectiva, ocorre a elaboração de documento que propõe

uma estratégia nova para a saúde do trabalhador.

O documento que propôs a Política Nacional de Segurança e Saúde do

Trabalhador (PNSST), em 200411, objetivou a superação da fragmentação, desarticulação e

superposição das ações implementadas pelos setores que interagem diretamente com esta

política. São eles: Trabalho, Previdência Social, Saúde e Meio Ambiente, como exposto no

referido documento:

A Política Nacional de Segurança e Saúde do Trabalhador (PNSST), além de estar

diretamente relacionada com as políticas dos setores Trabalho, Previdência Social,

Saúde e Meio Ambiente, apresenta interfaces com as políticas econômicas, de

Indústria e Comércio, Agricultura, Ciência e Tecnologia, Educação e Justiça, em

uma perspectiva intersetorial e de transversalidade. (BRASIL, 2004, p. 4).

Com isto, compreendo o caráter mais amplo e transversal que a política traz em

sua constituição:

11 PNSST. BRASÍLIA, 29/12/ 2004. Disponível em < www.portal.saude.gov.br>

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Para fins desta Política são considerados trabalhadores todos os homens e mulheres

que exercem atividades para sustento próprio e/ou de seus dependentes, qualquer

que seja sua forma de inserção no mercado de trabalho, no setor formal ou informal

da economia. Estão incluídos nesse grupo todos os indivíduos que trabalharam

como: empregados assalariados; trabalhadores domésticos; avulsos; rurais;

autônomos; temporários; servidores públicos; trabalhadores em cooperativas e

empregadores, particularmente os proprietários de micro e pequenas unidades de

produção e serviços, entre outros. Também são considerados trabalhadores que

exercem atividades não remuneradas, participando de atividades econômicas na

unidade domiciliar; o aprendiz ou estagiário e aqueles temporária ou definitivamente

afastados do mercado de trabalho por doença, aposentadoria ou desemprego

(BRASIL, 2004, p. 4).

Em consonância com a PNSST (2004), trabalhador é todo sujeito que exerça

atividade de trabalho, independente de ser no mercado formal ou informal, e isto inclui o

trabalhador doméstico, que realiza as atividades domiciliares.

Sendo assim, é importante enfatizar que a Política Nacional de Saúde do

Trabalhador (PNST) praticada pelo Sistema Único de Saúde (SUS) é alinhada com a Política

Nacional de Segurança e Saúde do Trabalhador (PNSST), proposta em 2004.

Registra-se, no ano seguinte, a existência da Portaria Interministerial Nº 800, de 3

de maio de 2005, pela qual os Ministros de Estado da Previdência Social, da Saúde e do

Trabalho e Emprego publicam o texto base da Minuta de Política Nacional de Segurança e

Saúde do Trabalho, elaborada pelo Grupo de Trabalho instituído pela Portaria Interministerial

nº 153 de 13 de fevereiro de 2004, prorrogada pela Portaria Interministerial nº 1009 de 17 de

setembro de 2004, para consulta pública.

De acordo com o documento citado:

A presente Política tem por finalidade a promoção da melhoria da qualidade de vida

e da saúde do trabalhador, mediante a articulação e integração, de forma continua

das ações de Governo no campo das relações de produção-consumo, ambiente e

saúde (PORTARIA INTERMINISTERIAL MPS/MS/MTE Nº 800.2005. p. 09).

A gestão da Política passa a ser conduzida pelo Grupo Executivo Interministerial

de Segurança e Saúde do Trabalhador (GEISAT), integrado por representantes dos Ministérios

da Saúde (MS), Trabalho e Emprego (MTE) e Previdência Social (MPS), o que nos faz

compreender a intrínseca relação destas esferas no tocante à política e aos seus

desdobramentos.

A gestão da política dispõe, ainda, sobre as responsabilidades institucionais de

competência de cada uma das instâncias citadas anteriormente. Dentre elas, ressalto algumas:

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Cabe ao MS, gestor do SUS: Coordenar, no âmbito do SUS, as ações decorrentes

desta Política e assessorar as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde na sua

execução; promover a incorporação das ações de atenção à saúde do trabalhador na

rede de serviços de saúde, organizada por níveis de complexidade crescente, na

atenção básica, serviços de urgência e emergência, na média e alta complexidade;

compete ao MTE formular e implantar as diretrizes e normas de atuação da área de

segurança e saúde no trabalho; planejar, supervisionar, orientar, coordenar e

controlar as ações e atividades de inspeção do trabalho na área de segurança e saúde;

fica sob a responsabilidade do MPS avaliar, em conjunto com o SUS, a relação entre

as condições de trabalho e os agravos à saúde dos trabalhadores; avaliar a

incapacidade laborativa para fins de concessão de benefícios previdenciários

(PNSST, 2005, p. 13).

A Saúde no Brasil, assim como a Previdência Social, tem suas bases originárias de

outros modelos.

O seguro social instituído no Brasil já no século XX segue a lógica de duas

estratégias oriundas de países capitalistas da Europa central: o modelo bismarckiano, origem

previdenciária adotada na Alemanha nos anos de 1883 a 1888 por Otto Von Bismarck, que

objetivava garantir renda ao trabalhador diante dos riscos sociais e de suas ausências no

trabalho; e o beveridgiano, que surgiu na Inglaterra após a Segunda Guerra Mundial, com o

objetivo de combater a pobreza e instituir os direitos universais a todos os cidadãos,

incondicionalmente.

Sob a influência da lógica bismarckiana é que se orienta a Previdência Social

Brasileira, e sob o ideário beveridgiano orientam-se a Saúde e a Assistência Social praticadas

em nosso país.

Alguns autores, ao refletirem sobre as Políticas Públicas de Saúde, Assistência e

Previdência e a abrangência destas, evidenciam os modelos seguidos no país a partir da

concepção das mesmas, como se segue:

A seguridade social, na definição constitucional brasileira, é um conjunto integrado

de ações do Estado e da sociedade voltadas a assegurar os direitos relativos à saúde,

à previdência e à assistência social, incluindo também proteção ao trabalhador

desempregado, via seguro desemprego. Pela lei, o financiamento da seguridade

social compreende, além das contribuições previdenciárias, também recursos

orçamentários destinados a este fim e organizados em único orçamento

(BOSCHETTI, 2009, p. 52).

Com isto, compreendo que só é assegurado pela Previdência Social aquele

trabalhador que contribui com ela, diretamente, através do imposto recolhido com fins de

seguro social via carteira de trabalho (CTPS); o trabalhador do mercado formal de trabalho,

ou indiretamente, contribuição paga, sob qualquer valor, pelo trabalhador do mercado

informal ou avulso, direto ao Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), assegurando sua

contribuição e acesso à política.

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Com base na Constituição Federal (1988), um dos objetivos da Seguridade Social

é a universalidade da cobertura e do atendimento. Esta universalidade, por sua vez, restringe-

se à contribuição previdenciária do trabalhador, seja ele oriundo de uma relação formal de

trabalho ou não. Tal aspecto traduz-se em uma disparidade na prática desta política que

objetiva universalizar cobertura e atendimento e, ao mesmo tempo, condiciona tal cobertura e

acesso à contribuição prévia.

Nesta lógica, só tem acesso aos direitos da seguridade social os chamados

“segurados” e seus dependentes, pois esses direitos são considerados como

decorrentes do direito ao trabalho. Assim, se destinam a quem está inserido em

relações formais e estáveis de trabalho e possuem duas características centrais.

Primeiro são condicionados a uma contribuição prévia, ou seja, só têm acesso

aqueles que contribuem mensalmente. Segundo, o valor dos benefícios é

proporcional à contribuição efetuada (BOSCHETTI, 2009, p. 326).

Há trabalhadores que durante toda a sua jornada laborativa não contribuíram para

a previdência, ficando à margem do acesso a esta política. Desta forma, a universalidade da

cobertura se inviabiliza e este trabalhador adentra a lógica da política não contributiva, ou

seja, a assistência social.

No Brasil, a partir dos 65 anos, aqueles que não têm direito à aposentadoria por

contribuição são amparados pelo Benefício de Prestação Continuada (BPC), destinado a

públicos específicos e de acordo com suas condicionalidades: pessoas com 65 anos ou mais,

que provam não ter condição de prover seu sustento e pessoas com deficiência comprovada,

que venha a incapacitar o sujeito para o trabalho, mediante laudo médico.

Diante disto, é importante ressaltar que, mesmo com a pretensão de abranger uma

lógica universal, a política de proteção social ao trabalhador ainda se põe de forma

fragmentada e dicotômica, ora apontando para a lógica securitária, ora apontando para a

lógica social.

Nas condições de trabalho em que vive a grande massa trabalhadora deste país,

operacionalizar uma política sob a lógica exclusivamente previdenciária é, muitas vezes,

delicado, pois há aqueles que estão à margem do sistema e que dificilmente conseguem

adentrá-lo, o que potencializa a ideia de pobreza, fragiliza a lógica do seguro e aponta muito

mais para a lógica social do que para a lógica previdenciária, como constitucionalmente está

posto.

Desta forma, refletir a respeito da saúde do trabalhador na contemporaneidade

exige que sejam feitas algumas considerações relevantes. Destaco as relações sociais que se

constituem nos espaços ocupacionais com sua natureza contraditória e permeada de conflitos.

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Este cenário em nada impede a constante venda da força de trabalho por parte do trabalhador,

sendo esta considerada puramente uma mercadoria. Estudos nesta área vêm sinalizando e

comprovando a precarização do trabalho e da saúde do trabalhador em diferentes frentes de

atuação profissional. 12

Observo que a política de saúde do trabalhador é, ainda, em nosso país, um

processo em construção. Encontra-se em espaço tomado pela luta de contrários, pela luta de

direitos e concretização de deveres, ora pelo poder público, ora por instituições privadas.

A política de saúde do trabalhador traz em sua trajetória uma marca de conflitos e

adequações às conjunturas e às relações de força vigentes; vai se constituindo de forma

diferenciada, conforme a complexidade da relação capital/ trabalho (FALEIROS, 2010). A

política em questão deve ser percebida como resposta de articulações sociais e discutida e

entendida como resultado de movimentos sociais que avançaram em suas concepções e

tiveram em sua formulação a concretização de muitos anseios.

A saúde do trabalhador atravessa, em sua constituição histórica, diversos

momentos de alternância política no país, vivenciando, também, conflitos e tensões, como

expõe Faleiros (2010):

Na República Velha surge uma política com o discurso liberal da “não intervenção

do Estado” articulada a uma proposta de culpabilização dos trabalhadores e patrões

pelos acidentes de Trabalho. Na era getulista justifica-se a política intervencionista

do Estado com o discurso da harmonia social e do nacionalismo e com o incentivo

ao processo de industrialização capitalista e de controle e integração dos

trabalhadores. No período do pós-guerra, a urbanização e a pressão das massas

exigem novas articulações políticas assim como o aumento da produtividade, que

por sua vez, enfrenta pressões sindicais, sendo que a institucionalização expressa um

forte debate entre o setor privado e o setor público. ( p. 13).

Sendo assim, entendo que a política de saúde do trabalhador, como todas as

outras, não se constitui de forma linear, é um processo em contínuo movimento. Da

Revolução Industrial aos dias atuais, o mundo do trabalho vivenciou diversas transformações

e em proporções adversas, de acordo com cada contexto, com cada espaço ocupacional, com

cada categoria de trabalhadores.

A saúde do trabalhador se coloca como questão social na medida em que outras

questões também emergem na conjuntura nacional. Encontra-se inserida no processo de

construção de uma sociedade democrática, no ato da ávida luta por direitos, pela conquista de

cidadania e pela consolidação da livre organização dos trabalhadores.

12 Olivar (2006); Gonçalves (2006)

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Olivar (2006), em seu estudo sobre as condições dos trabalhadores do Hospital

Souza Aguiar, retrata as condições às quais eram submetidos os trabalhadores da emergência

daquele hospital. Segundo a autora, a pesquisa demonstrou que a Saúde do Trabalhador revela

um momento de viabilização das conquistas obtidas no plano jurídico-institucional, que

abrangem direitos garantidos na legislação, mas que, na prática, ainda encontram dificuldade

de sua efetivação, tendo em vista que esbarram no contexto da política neoliberal de desmonte

do serviço público, assim como na conjuntura de retração do movimento organizado dos

trabalhadores. Ainda neste estudo, a autora sinaliza como importante alguns embates e

enfrentamentos no que se refere à Política de Saúde do Trabalhador na contemporaneidade, a

saber:

1. A contraposição de dois polos relevantes: o Projeto de Reforma Sanitária e o Projeto

Privatista;

2. A ausência de uma efetiva Política de Saúde do Trabalhador nas três esferas do governo,

que coloque marco conceitual claro, apresente diretrizes de implementação e proponha

estratégias e planos de ação e de avaliação para efetivá-la;

3. O fato de que a saúde do trabalhador não foi estabelecida como prioridade no Pacto de

Gestão, proposto pelo Ministério da Saúde – que nortearia o processo de implantação do SUS

em todo o território nacional, e isto considerando o contexto ainda incipiente da Rede

Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador – RENAST13.

Para Olivar (2006), os resultados da investigação demonstram que a maioria dos

trabalhadores em saúde da unidade pesquisada sentem-se desgastados física e mentalmente

após um dia de trabalho. Os trabalhadores são submetidos regularmente à sobrecarga de

trabalho mental, física e social. Segundo a autora, esta sobrecarga de trabalho, o trabalho

imediato e a pressão por tomadas de decisões rápidas no atendimento ao usuário incidem na

construção do processo de alienação social no espaço de trabalho. Ao imaginar o perfil dos

trabalhadores da unidade estudada, sinaliza, ainda, questões relevantes para a reflexão. Em

seus achados, diz que os trabalhadores, ao terminarem a jornada diária, querem descansar,

pois relatam não ter disposição para diversão, estudo ou continuidade da rotina de trabalho;

consideram o trabalho insalubre e perigoso e têm ou tiveram problemas de saúde relacionados

ao trabalho.

13A Rede Nacional de Atenção Integral à saúde do trabalhador – RENAST foi criada em 2002, através da

Portaria GM /MS nº 1.679, de 19 de setembro (BRASIL, 2002a). Esta rede é instituída como principal estratégia

para consolidação da implementação da Política Nacional de Saúde do Trabalhador.

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Outra dimensão a ser observada no mundo do trabalho é a ocorrência do acidente,

que pode ser típico ou de trajeto. Fator inquietante quando pensamos sobre isto é a efetivação

ou não da notificação do mesmo, que deve ser feita pela unidade de saúde que recebe o

acidentado, devendo a mesma registrar a ocorrência do acidente junto ao Sistema de

Informação de Agravos de Notificação14 (SINAN), como exposto no Protocolo de

Complexidade Diferenciada do Ministério da Saúde (2006).

Os acidentes e as violências no Brasil são agravos que, pelo seu expressivo impacto

na morbimortalidade da população, constituem-se em importante problema de saúde

pública, sendo, portanto, objeto prioritário das ações do Sistema Único de Saúde,

que, em conjunto com outros segmentos dos serviços públicos e da sociedade civil,

deve continuar formas efetivas para seu enfretamento (BRASIL, 2006, p. 7).

Olivar (2006) relata que o acidente de trabalho é um dado preocupante nos

hospitais e enfatiza, ainda, que o hospital onde desenvolveu a sua pesquisa não estava

preparado para os eventos de acidente de trabalho e assistência ao trabalhador acidentado.

Ressalta que, no espaço, não havia protocolo para a notificação de acidente de trabalho com

material biológico.

O Protocolo de Complexidade Diferenciada do Ministério da Saúde (2006) é um

documento voltado à notificação e vigilância de acidentes. Esclarece textualmente que:

Todo caso de acidente de trabalho fatal, mutilante ou envolvendo crianças e

adolescentes menores de 18 anos, é passível de notificação compulsória pelo SUS,

segundo parâmetro da Portaria MS/GM nº 777, de 28 de abril de 2004. Da mesma

forma, toda ocorrência deve ser comunicada à Previdência Social, por meio de

abertura de Comunicação de Acidente de Trabalho – CAT. (BRASIL, 2006, p. 25).

O estudo realizado por Olivar (2006) aponta para a necessidade de investigação

meticulosa, buscando desvendar a rede de fatores envolvidos que contribuíram para a

ocorrência dos adoecimentos e acidentes de trabalho. Para tanto, segundo a mesma autora,

parte-se da necessidade de notificações mais detalhadas sobre os agravos, que devam ser

alcançadas por meio da produção de dados que busquem retratar a realidade da ocorrência

destes agravos com vistas à identificação das condições influenciadoras das situações de

acidente e de morbimortalidade. Além da importância fundamental da adesão dos municípios

no processo de notificação de agravos à saúde decorrentes do trabalho.

14 O SINAN permite a coleta de dados e o trabalho com informações desde a unidade de saúde. Conta com dois

instrumentos padronizados de coleta, emitidos pelas Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde (ficha

individual de notificação e ficha individual de investigação). (MOTA E CARVALHO, 1999).

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Dados por mim colhidos em trabalho de pesquisa junto a trabalhadores do Centro

de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST) Regional revelam a dificuldade que se

tem para coletar de forma fidedigna a notificação de acidentes de trabalho. Isto porque estes

são facilmente subnotificados por diversas razões, entre elas o fator econômico e a percepção

de custo para as Empresas, bem como a sujeição às penalidades em razão da ocorrência do

acidente, assim como a frágil articulação entre as unidades de saúde, que, de acordo com o

nível de complexidade, também deveriam notificar o acidente, e algumas vezes, não o fazem.

O trabalhador acidentado adentra a unidade de saúde com determinada questão, entretanto

esta não é considerada como acidente de trabalho característico. Esta é uma questão que

emergiu de forma tênue no momento da coleta de dados e é apresentada na etapa de análise

dos mesmos.

O Ministério da Saúde (MS) aponta quatro razões para que haja a subnotificação

do acidente de trabalho: cultura de materialização e banalização dos acidentes e doenças

relacionadas ao trabalho; desconhecimento da legislação; resistência das empresas por

imperativos econômicos e medo dos trabalhadores quanto à perda dos empregos15.

Diante das transformações ocorridas no mundo do trabalho, emergem, no contexto

atual, outras questões ainda mais delicadas e silenciosas do que o próprio acidente.

Gonçalves (2006), em sua dissertação intitulada O assédio moral no Ceará:

naturalização dos atos injustos no trabalho, investigou a prevalência do assédio moral e os

principais atos negativos relacionados ao assédio a trabalhadores no Ceará. Examinou a

relação entre os atos negativos vivenciados e aspectos da cultura cearense. Os dados foram

coletados em amostra de 218 trabalhadores que aguardavam atendimento na Delegacia

Regional do Trabalho (DRT/CE). Em seu estudo, a autora usou duas diferentes estratégias de

medição do assédio moral para posterior comparação. No conceito de assédio moral, a autora

aborda os atos negativos repetitivos que submetem, intimidam, ameaçam e humilham. Estes

se constituem em violência que atenta contra a dignidade humana.

Dentre as condutas consideradas negativas no ambiente de trabalho, a autora

destacou: o não cumprimento de direitos trabalhistas, a pressão para o exercício de horas-

extras e a conduta dos líderes que se portaram de forma intimidadora e hostil.

Gonçalves (2006) observa em sua coleta que existe uma tendência à naturalização

dos atos injustos no trabalho, com muitas condutas negativas percebidas como normais e

comuns. Os resultados apontaram para a existência de uma relação entre os atos negativos

15 Fonte:<http://portalsaude.saude.gov.br> - Consulta feita em 20/10/2012

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vivenciados pelos trabalhadores e as influências do contexto histórico, social e cultural

cearense no ambiente de trabalho. A pesquisa revelou, ainda, que o assédio moral é um

fenômeno amplamente disseminado entre os trabalhadores e que condutas encontradas

comumente nas organizações, em nosso Estado, não parecem ser percebidas como

perseguição ou discriminação pelos trabalhadores, apesar do sofrimento que provocam. A

autora menciona, ainda, a gerência autoritária que usa gritos, xingamentos, humilhações e

ameaças para intimidar os subordinados. Segundo Farias (2004), a história do Ceará é

marcada pelas poderosas oligarquias e pela figura do coronel, que exerciam o poder na região

usando toda a sorte de abusos e corrupções, como o “voto de cabresto” (voto coagido ou

comprado), repressão às questões de direitos sociais e políticos da sociedade, fraudes,

impunidade, clientelismo, perseguição de adversários, entre outros. A autora aponta, ainda,

outra conduta negativa, que ela diz também estar relacionada à cultura cearense. Trata-se do

fato de disseminar boatos, que no estudo foram traduzidos como fofoca, constituindo-se em

falatórios, intrigas e mexericos. O comportamento instaurado nas relações sociais, segundo

ela, faz parte da cultura regional, que vai desde a casa até a rua, ou seja, perpassa diferentes

espaços; contudo, ao chegar à empresa, apresenta consequências nefastas sobre os demais

trabalhadores. Conclui, destacando que o assédio moral atenta contra a dignidade da pessoa e

viola direitos fundamentais, sendo esta uma temática que merece atenção quando se trata da

saúde do trabalhador.

Questões relacionadas ao assédio moral situam-se em esfera delicada. A

legislação reconhece que riscos relacionados ao trabalho são os físicos, químicos, biológicos,

ergonômicos, mas ainda não deixa claro o risco psíquico e/ou emocional que atinge a tantos

trabalhadores em muitas frentes de trabalho e em variados Estados, não só no Ceará.

Situações desta natureza ainda ficam sob falsas aparências em grandes empresas e o

trabalhador, muitas vezes por medo de perder o emprego, não sinaliza e nem denuncia. Esta é

uma dimensão que vem sendo percebida como risco para o trabalhador, não só para o

processo de trabalho no qual o mesmo está inserido.

4.3 Política Nacional de Saúde do Trabalhador: estratégias para a sua implementação

Considerando as ações para a implementação da Política Nacional de Saúde do

Trabalhador no SUS, entendo que seu processo de disseminação dá-se a partir dos seguintes

marcos legais: a Constituição Federal de 1988 e a Lei Orgânica da Saúde (LOS) nº 8080/90.

No artigo 200º da Constituição Federal, fica definida como competência do SUS a execução

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das ações de saúde do trabalhador e colaboração na proteção do meio ambiente, nele

compreendido o do trabalho. A LOS, por sua vez, reafirma a Saúde do Trabalhador como

parte integrante da área de atuação do SUS e regulamenta os preceitos constitucionais sobre a

saúde do trabalhador. A partir deste momento, inicia-se a expansão dos Programas de Saúde

do Trabalhador e dos já existentes Centros de Referência em Saúde do Trabalhador

(CEREST), este último como parte integrante do processo de estruturação da Rede Nacional

de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador (RENAST).

A RENAST foi criada em 2002, por meio da portaria GM/ MS nº 1.679 de 19 de

setembro, e sua instituição é a principal estratégia para a consolidação da implantação da

Política Nacional de Saúde do Trabalhador em âmbito federal.

A RENAST integra os serviços desenvolvidos pelos equipamentos que a integram.

O eixo integrador da RENAST é a rede regionalizada de Centros de Referência em

Saúde do Trabalhador (CEREST), constituída por Centros estaduais localizados em

cada uma das capitais, e regionais, de gestão estadual ou municipal de acordo com a

definição do estado, localizados em regiões metropolitanas e municípios sede de

pólos de assistência das regiões e microrregiões de saúde, com a atribuição de dar

suporte técnico e científico às intervenções do SUS no campo da saúde do

trabalhador, integradas, no âmbito de uma determinada região, com a ação de outros

órgãos públicos (BRASIL, 2002a).

Os CEREST são unidades legalmente instituídas através de portarias. Segundo

Souza e Machado (2011, p. 94):

A Portaria GM/MS nº 1.679/2002 previu a implantação de 130 CEREST, sendo 27

estaduais (BRASIL, 2002a). Ainda no final de 2002 foram habilitados os primeiros

17 CEREST; entretanto, as primeiras liberações de recursos federais ocorreram

somente a partir do ano de 2003.

Ainda segundo os mesmos autores, de acordo com a Política, todos os CEREST

desenvolvem ações de promoção da saúde, de prevenção, de vigilância dos ambientes de

trabalho, de assistência, incluindo diagnóstico, tratamento e reabilitação, de capacitação de

recursos humanos e de orientações aos trabalhadores. Estas ações são executadas em âmbito

estadual e municipal.

A estratégia de implementação da RENAST traz para a prática da atenção integral

à saúde do trabalhador situações desafiadoras, bem como alguns avanços, como citam os

autores Souza e Machado (2011, p. 94):

Um dos importantes avanços trazidos pela RENAST foi a garantia de um

financiamento federal sistemático para as ações de saúde do trabalhador, traduzido

nos recursos repassados aos estados e municípios para a habilitação e manutenção

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mensal dos CEREST. No caso dos CEREST estaduais e CEREST regionais de

gestão estadual, os recursos são repassados do Fundo Nacional para o Fundo

Estadual de Saúde, e no caso dos CEREST regionais de gestão municipal os

recursos são repassados do Fundo Nacional para o Fundo Municipal de Saúde

(BRASIL, 2002a, 2005a).

O fato de existir uma rede de atenção integral à saúde do trabalhador também se

constitui como desafio, pois, como se sabe, há diversas fases que compõem um processo de

implementação de uma política. Dentre os desafios sinalizados, aponto o fato de a Política de

Saúde do Trabalhador ter uma rede de atenção e ainda ampliá-la na prática, objetivando

alcançar melhor desempenho na implantação de uma política que ainda está se estruturando.

Dentre os avanços trazidos pela implementação da RENAST, cito a publicação,

em 2005, da Portaria GM/MS nº 2.437 de 7 de dezembro, que dispõe sobre a ampliação da

citada rede, tendo em vista a necessidade de uma maior cobertura no tocante a ações de saúde

do trabalhador.

Os CEREST, na condição de unidades especializadas de retaguarda técnica, têm,

respectivamente, suas áreas de abrangência, entretanto, o financiamento para o funcionamento

destas unidades se dá conforme a Portaria GM/MS nº 2.437/05, art. 9º:

Classificar os CEREST a serem habilitados e reclassificar os já existentes, com

redefinição dos valores de repasses mensais, segundo valores abaixo: I - para os

regionais, trinta mil reais (R$ 30.000,00) mensais; e II - para os estaduais, quarenta

mil reais (R$ 40.000,00).

Em relação à rede de CEREST, foi estabelecido o aumento de 130 para 200

centros, estabelecendo-se recursos adicionais e novos valores do incentivo para implantação e

do repasse mensal, que correspondem a R$ 50 mil mensais, em parcela única quando da

implantação; repasses mensais de R$ 30 mil para os centros regionais e de R$ 40 mil para os

centros estaduais (BRASIL, 2005a). Estes são os valores de repasses vigentes.

De acordo com Souza e Machado (2011), no processo de instituição da RENAST,

de 2002 a 2010, houve uma disseminação de CERESTs em todos os Estados da União (Figura

1) e uma considerável conformidade na distribuição do número de CEREST por região

(Figura 2).

A estratégia de alcançar todas as regiões do país mostra uma preocupação singular

com o avanço da política e fortalece a articulação entre os pares institucionais que trabalham

para a sua implementação em âmbito nacional, ampliando e consolidando a saúde do

trabalhador como política pública, tentando colocá-la ao alcance de todos os trabalhadores.

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Figura 4 – Número de CERESTs habilitados por região (2002 a agosto de 2010).

Fonte: BRASIL, 2011.

Tabela 1- Distribuição dos CERESTs por Regiões e Estados, conforme Portarias GM/MS Nº

2. 437/05 e Nº 2. 728/09

Regiões/Estados

CERESTs

habilitados até

agosto de 2010

CERESTs a serem

habilitados Total

Norte 16 3 19

Rondônia 2 - 2

Acre 1 1 2

Amazonas 3 - 3

Roraima 1 1 2

Amapá 2 - 2

Pará 4 1 5

continua

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48

conclusão

Tabela 1- Distribuição dos CERESTs por Regiões e Estados, conforme Portarias GM/MS Nº 2.

437/05 e Nº 2. 728/09

Regiões/Estados

CERESTs

habilitados até

agosto de 2010

CERESTs a serem

habilitados Total

Tocantins 3 - 3

Nordeste 56 - 56

Maranhão 5 - 5

Piauí 4 - 4

Ceará 8 - 8

Rio Grande do Norte 4 - 4

Paraíba 4 - 4

Pernambuco 9 - 9

Alagoas 4 - 4

Sergipe 3 - 3

Bahia 15 - 15

Sudeste 72 10 82

Espírito Santo 3 2 5

Minas Gerais 17 2 19

Rio de Janeiro 10 6 16

São Paulo 42 - 42

Sul 23 6 29

Paraná 6 4 10

Santa Catarina 7 - 7

Rio Grande do Sul 10 2 12

Centro-Oeste 14 - 14

Mato Grosso 3 - 3

Mato Grosso do Sul 3 - 3

Goiás 5 - 5

Distrito Federal 1 - 3

Total 181 19 200

Fonte: BRASIL, 2011.

4.4 Política de Saúde do Trabalhador no Ceará

Em pesquisa exploratória, visitei informalmente dois equipamentos que tratam

diretamente da temática em estudo no sentido de buscar outros elementos para composição

deste estudo. Em entrevista informal no Núcleo de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador

(NUAST), de gestão estadual, e no Centro de Referência em Saúde do Trabalhador

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(CEREST) Regional, de gestão municipal, foram elencadas, pelos profissionais abordados,

fragilidades comuns aos contextos estadual e municipal no tocante à implementação da

Política de Saúde do Trabalhador, a saber: profissionais terceirizados e não concursados,

rotatividade destes profissionais, falta de profissionais qualificados, profissionais que ainda

desconhecem a Política. Estes são pontos de atenção que se colocam no caminho da

implementação das ações voltadas a este público nas esferas estadual e municipal. Na esfera

institucional, não há rotatividade profissional intensa, pois os trabalhadores são empregados

públicos com estabilidade, entretanto a própria dinâmica da instituição por vezes interfere na

implementação de tais ações, pois projetos sugeridos no tocante à melhoria das ações de saúde

do trabalhador não são encampados com frequência por dificuldade ou inexistência de

profissional especializado para favorecer a continuidade de tais ações. Funcionava

institucionalmente um projeto que realizava sessões de ginástica laboral, porém, pela ausência

do profissional que dava corpo a esta ação, estas foram suspensas por tempo indeterminado, o

que fragilizou a implantação sistemática das ações de saúde pautadas na Política Pública que

propõe ações de prevenção de riscos.

No Ceará, foram disseminados os seguintes Centros de Referência de Saúde do

Trabalhador (CEREST), de acordo com a tabela abaixo, o que nos faz concluir que as

estratégias para implantação da política vêm avançando na tentativa de dirimir questões

relevantes voltadas a esta temática.

Figura 5- Área e população dos Centros de Referência em Saúde do Trabalhador no Estado do

Ceará.

Fonte: CEREST Regional/ Ano 2012.

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No Ceará, somente no ano de 200716, através do Núcleo de Atenção à Saúde do

Trabalhador (NUAST) da Secretaria Estadual de Saúde (SESA), foi criada a área técnica de

Saúde do Trabalhador, como iniciativa do Governo do Estado, sendo responsável por atuar

diretamente em questões voltadas à saúde do trabalhador em todo o Estado. O NUAST

trabalha com as estratégias de implementação em âmbito estadual, realizando ações como

oficinas, palestras, divulgação, articulação e mobilização junto aos municípios, objetivando

acompanhar e monitorar as ações realizadas. São elas: atenção primária, saúde mental, saúde

especializada, urgência e emergência e saúde bucal17·. Este núcleo faz parte da Coordenadoria

de Políticas de Atenção à Saúde. A prática realizada pelo núcleo pauta-se também na Portaria

GM/MS Nº 1.125 de 06 de julho de 2005, que dispõe sobre propósitos da Política de Saúde do

Trabalhador para o SUS, através do:

Art. 1º Estabelece que toda política de saúde do trabalhador para o SUS tenha por

propósito a promoção da saúde e a redução da morbimortalidade dos trabalhadores,

mediante ações integradas, intra e intersetorialmente, de forma contínua, sobre os

determinantes dos agravos decorrentes dos modelos de desenvolvimento e processos

produtivos, com a participação de todos os sujeitos sociais envolvidos (Portaria

GM/MS Nº 1.125)

No Estado do Ceará, as ações de implementação da Política de Saúde do

Trabalhador acontecem a partir das ações realizadas pela Secretaria Estadual de Saúde

(SESA), através do NUAST. As ações desenvolvidas são voltadas à articulação,

acompanhamento e monitoramento da política na esfera estadual18·O NUAST acompanha e

monitora ações desenvolvidas pelos CEREST estadual e regional através das Redes

Sentinelas19, unidades de saúde responsáveis por identificar, diagnosticar, investigar e

notificar casos de doenças e agravos ou acidentes relacionados ao trabalho. Segundo relatos

de profissionais envolvidos nesta prática, o monitoramento dos acidentes está também sendo

estruturado pela realização de estudos nesta área específica.

Em Fortaleza, o processo de notificação de acidente de trabalho encontra-se

fragilizado e, segundo relato de profissional vinculado ao Centro de Referência em Saúde do

Trabalhador (CEREST) Regional gerenciado pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS), as

16No ano de 2007, o governador do Estado do Ceará era Cid Ferreira Gomes, eleito no ano de 2006 e reeleito em

outubro de 2010. 17Dados colhidos em pesquisa exploratória junto à Secretaria Estadual de Saúde (SESA); Núcleo de Atenção à

Saúde do Trabalhador ( NUAST). 18 Dados colhidos em pesquisa exploratória. 19 A Rede Sentinela é composta por unidades de saúde (chamadas de unidades sentinela) de mais de 3.500

serviços médicos e ambulatoriais de média e alta complexidade responsáveis por identificar, diagnosticar,

investigar e notificar, quando confirmados ,os casos de doenças, agravos e/ou acidentes e doenças relacionados

ao trabalho no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN-NET).

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unidades de saúde que constituem a rede articulada ainda não priorizam o registro do acidente

como tal20.

Dentre as ações voltadas à saúde dos trabalhadores praticadas pela EMLURB

destacam-se as palestras, que contemplam temas diversos, tais como o uso do álcool e a

prevenção de acidentes, enfatizando a relação entre eles.

O que mais acontece, segundo profissional do setor pessoal da EMLURB, é o

acidente de trajeto, pois muitos trabalhadores usam a bicicleta como meio de transporte para

deslocar-se de casa para o trabalho e retornar do trabalho para casa, percurso, segundo o

referido profissional, às vezes, interrompido pela visita dos trabalhadores aos pequenos bares

localizados ao longo do trajeto, nos quais ingerem álcool e só depois continuam seus

respectivos percursos. .

De acordo com os achados da pesquisa, dentre os 68 garis entrevistados na SER

IV, 3 declararam que fazem uso abusivo de álcool e um deles faz uso de outras drogas, como

crack, maconha e cocaína, entretanto apenas um dos três encontra-se atualmente em

tratamento pelo Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS AD), o que nos faz

refletir acerca da necessidade de uma atenção integral que envolva este sujeito. O seguinte

relato revela esta realidade: “Uso cachaça, maconha, crack, cocaína, o que vier, mas não deixo

o meu trabalho. Não vou pro CAPS, porque eu uso quando eu quero, sei a hora de parar”

(Entrevistado grupo 1 – Apêndice 6a)

Conforme o Serviço Social da EMLURB, os trabalhadores que fazem uso abusivo

de drogas são encaminhados ao CAPS da SER IV e o tratamento é acompanhando pela

Instituição, por meio das chefias imediatas e do Serviço Social, a partir da frequência deles no

serviço de saúde. Acredito que poderiam ser viabilizadas, em intervalos de tempo menores,

ações que informam e sensibilizam quanto aos efeitos nocivos das drogas no organismo pois

ações desta natureza, segundo relatos dos garis, são realizadas anualmente.

Desde 2007, com dados atualizados até abril de 2012, o Ceará registrou 7.606

acidentes e doenças relacionadas ao trabalho. Os óbitos em consequência de acidentes de

trabalho são crescentes desde 2007 no Estado, segundo o Sistema de Informações sobre

Mortalidade (SIM)21.

20 Dados colhidos em pesquisa exploratória. 21 Estabelecido pelo Ministério da Saúde em 1975, utiliza um instrumento padronizado de coleta de dados – a

Declaração de Óbito (DO), constitui-se como elemento essencial para o Sistema Nacional de Vigilância

Epidemiológica (Mota e Carvalho, 1999).

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Entre 2010 e 2011, houve um aumento de 4,7% no número de registros de

acidentes fatais relacionados ao ambiente de trabalho. A informação foi divulgada pelo

Ministério da Previdência Social, por meio de seu Anuário Estatístico, publicado no dia 24 de

outubro. Segundo o AEPS, no último ano, 2.884 trabalhadores perderam suas vidas durante o

exercício de suas atividades profissionais, enquanto que, em 2010, foram registrados 2.753

mortes no trabalho. O relatório do MPS também aponta um leve aumento no número de

acidentes de trabalho. No último ano, foram notificados 711.164 acidentes laborais, enquanto

que, em 2010, foram contabilizados 709.474 registros no ambiente de trabalho, o que

representa uma elevação de 0,2% no percentual de acidentes de trabalho (Fonte:

http://www.protecao.com.br. Acesso em 01.07.2013)

Com o crescimento do emprego formal, os postos de trabalho passam a ser

ocupados em maior número. Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados

(CAGED), de 2011, elaborado pelo MTE, trazem as seguintes informações:

Tabela 2 – Geração de empregos formais celetistas

GERAÇÃO DE EMPREGOS FORMAIS CELETISTAS

Empregos declarados de janeiro a dezembro

de 2011, no prazo

1.566.043

Empregos declarados fora do prazo, de janeiro

a novembro de 2011

378.517

Total de empregos gerados em 2011 1.944.560

Fonte: Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), 2011 - MTE

A partir destas informações, é possível compreender que, com a maior ocupação

dos postos de trabalho, pode-se haver um crescente número de acidentes, seja por falta de

equipamentos de proteção, seja por insuficientes esclarecimentos a respeito dos agentes

causadores dos citados acidentes e da saúde do trabalhador em linhas gerais.

Dessa forma, a estratégia para sistematizar ações de saúde do trabalhador quando

este é regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) dá-se a partir dos Programas

Médicos de Controle de Saúde Ocupacional (PCMSO) baseados na Norma Regulamentadora

(NR) 7, que, no entanto, traz uma visão pontual do que venha a ser saúde do trabalhador,

relacionando à mesma somente a ocorrência de acidentes de trabalho, evidenciando uma

perspectiva incipiente se comparada à ampla visão do SUS. Para que as ações possam ser

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postas em prática, elas são detalhadas pelo MTE no escopo de NR, que, por sua vez,

regulamentam o que está posto na Consolidação das Leis Trabalhistas (RIBEIRO, 2012).

4.5 Ações de saúde do trabalhador

Ações de saúde do trabalhador são definidas de acordo com o marco legal que as

regulamentam. A Lei nº 8080/90 (LOS), no seu parágrafo 3º do artigo 6º, assim define as

ações de saúde do trabalhador:

Um conjunto de atividades que se destina, através das ações de vigilância

epidemiológica e vigilância sanitária, à promoção e proteção da saúde dos

trabalhadores, assim como visa à recuperação e reabilitação da saúde dos

trabalhadores submetidos aos riscos e agravos advindos das condições de trabalho.

(RIBEIRO, 2012, p.75).

O marco legal exposto embasa a realização das ações de saúde no âmbito do SUS,

entretanto, empresas ou mesmo instituições públicas mistas que têm os seus trabalhadores

vinculados formalmente por meio da CLT implementam suas ações de saúde com base em

normas regulamentadoras e programas de saúde, como citado anteriormente. Como esclarece

Ribeiro (2012):

No Brasil, os contratos de trabalho são regidos pela Consolidação das Leis

Trabalhistas (CLT), exceção feita aos órgãos públicos (municipais, estaduais ou

federais) que podem ter estatutos próprios, norteados pelos princípios da

Constituição Federal. ( p.91).

A EMLURB, como citei no início deste texto, é uma empresa pública de direito

privado, integrante da administração indireta do Município de Fortaleza; tem capital

exclusivamente público, entretanto seu vínculo com os trabalhadores se faz por meio da CLT.

A estabilidade dos trabalhadores, empregados públicos, existe, mesmo que menor do que

aquela inerente aos servidores públicos, cuja forma de ingresso nas instituições ocorre por

meio de concurso público.

Desta forma, as ações voltadas aos trabalhadores realizadas pela EMLURB são

baseadas no que rege a NR, detalhada e regulamentada de acordo com a CLT e aprovada pela

Portaria GM nº 3.214, de 8 de junho de 1978,.

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Em destaque, cito a NR 7 de acordo com a Portaria GM n.º 3.214, de 08 de junho

de 197822, que implementa o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO):

Estabelece a obrigatoriedade de elaboração e implementação, por parte de todos os

empregadores e instituições que admitam trabalhadores como empregados, do

Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional - PCMSO, com o objetivo de

promoção e preservação da saúde do conjunto dos seus trabalhadores. (MTE,

1978.Texto dado pela Portaria SSST n.º 24, de 29 de dezembro de 1994, p. 01)

O PCMSO contempla a perspectiva da integralidade física do trabalhador e é

constituído pelas seguintes ações: exame admissional, exame periódico, exame de retorno ao

trabalho após afastamento de 30 dias, exame de mudança de função e exame demissional, de

acordo com os riscos físicos. Os exames incluem avaliação clínica (com anamnese física e

mental) e exames complementares, conforme o que prevê a NR.

A realização das ações que compõem este programa é vista como momento

propício para orientação e informação acerca de diversos temas pertinentes à saúde do

trabalhador, inclusive a prevenção de riscos químicos, biológicos e ergonômicos. A ginástica

laboral, as campanhas de vacinação, a constituição da CIPA (NR 5) e a realização da Semana

Interna de Prevenção de Acidentes (SIPAT) são outras práticas associadas e implementadas

como ações de saúde do trabalhador na EMLURB. Dentre outras legislações trabalhistas,

podem-se assinalar as campanhas antitabagista e de prevenção da AIDS.

Dentre as ações de saúde reconhecidas pelos grupos de trabalhadores operacionais

– garis (grupo 1) posso elencar, de acordo com os dados da pesquisa, os seguintes relatos:

A CIPA é muito importante porque a gente faz curso de prevenção de acidentes e

gente aprende muita coisa, como os primeiros socorros também... mas, às vezes, os

garis se negam a votar na CIPA porque não vêm nenhuma melhoria ... de fato tem

gente trabalhando na CIPA, mas quando chega na empresa para cobrar ninguém faz

nada (Entrevistado grupo 1- gari).

Nos exames periódicos a gente faz raios-X de tórax, eletrocardiograma, sangue,

exame da próstata, agora quando é outro tipo de exame faz pelo plano IPM ou outros

laboratórios ou outras clínicas (Entrevistado grupo 1 – gari).

Conforme relato dos técnicos que operacionalizam as ações (entrevistados do

grupo 3), no ano de 2013 não foi realizada a SIPAT por falta de recursos financeiros.

Quanto aos relatos das chefias imediatas (entrevistados do grupo 3) , dentre os

exames periódicos, não se verifica a existência de exame de prevenção do câncer

22 NR 7- PROGRAMA DE CONTROLE MÉDICO DE SAÚDE OCUPACIONAL. Disponível em

http://portal.mte.gov.br. Acesso em 01.07.2013.

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ginecológico, haja vista que a empresa não faz tal exigência. Porém, em contraponto, são

solicitados exames de próstata. Considerando que, em média, 95% dos trabalhadores

operacionais (garis) são homens, este fato potencializa a segmentação no tocante ao gênero,

pois,. Reitero que os exames que rastreiam o câncer de próstata são realizados em laboratório

através da coleta de sangue, diferindo daquele que rastreia o câncer ginecológico, que colhe

outro tipo de material e, geralmente, são solicitados em consultas de rotina, que ficam sob a

responsabilidade da trabalhadora, não competindo à empresa o referido cuidado.

As ações pautadas no PCMSO se constituem sob a perspectiva de promoção da

saúde que, na concepção de Buss (2003), consiste em adotar medidas que buscam aumentar a

saúde e o bem estar, não privilegiando especificamente uma doença ou desordem pré-

estabelecida. Para o autor, inclui ações de educação e motivação sanitária, visando

impulsionar determinadas condições para o desenvolvimento humano em sua totalidade.

Os PCMSO estão voltados à lógica tradicional, vinculados aos Serviços

Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT/NR 4).

Estes programas previstos praticam as ações de saúde com uma concepção similar àquela

proposta pela Política Nacional de Segurança e Saúde do Trabalhador (PNSST), que, em sua

base,

[...] apresenta os fundamentos de uma Política Nacional de Segurança e Saúde do

Trabalhador, a ser desenvolvida de modo articulado e cooperativo pelos Ministérios

do Trabalho, da Previdência Social e da Saúde, com vistas a garantir que o trabalho ,

base da organização social e direito humano fundamental,seja realizado em

condições que contribuam para a melhoria da qualidade de vida, a realização pessoal

e social dos trabalhadores e sem prejuízo para sua saúde ,integridade física e

mental.(PNSST, 2004, p.3).

Entretanto, estas ações realizadas apontam para a necessidade de superação de

uma prática que vislumbre o sujeito para além dos riscos físicos, pois os mesmos estão

vulneráveis aos demais riscos: biológicos, ergonômicos e psíquicos. A concepção de Saúde

Pública, no que diz respeito à atenção integral do sujeito, ultrapassa a barreira destes riscos,

uma vez que o compreende como um ser único e completo envolvido na relação

saúde/trabalho.

Questões e reflexões voltadas à saúde do trabalhador no cenário contemporâneo

vislumbram ao fomento das práticas diversificadas de atenção ao sujeito em sua totalidade,

como preconiza o SUS quando se refere à atenção integral.

Entendo a ação de atenção à saúde do trabalhador a partir de uma concepção

referenciada na saúde pública e legitimada pelo SUS, que propõe atenção integral à saúde do

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trabalhador. Reduzir esta prática à prevenção do risco físico torna-se insuficiente quando

aplicada ao cotidiano do trabalho, tão complexo e com múltiplos determinantes.

Oliveira (2011) reflete acerca das múltiplas visões que permeiam a saúde do

trabalhador e enaltece a prática desta política baseada nos preceitos do SUS, pois compreende

a visão da ação integral, superando assim a lógica tradicional de refletir tão somente sobre os

riscos visíveis aos quais os trabalhadores estão vulneráveis. Em sua concepção, há sete

aspectos constitucionais que referenciam esta política, a partir da Constituição Federal de

1988: o aspecto sanitário, previdenciário, tributário, ambiental, penal, civil e trabalhista.

A existência destes aspectos embasa e solidifica a interface da Política de Saúde

do Trabalhador com as demais políticas, evidenciando a relevante atuação de seus respectivos

Ministérios, trazendo a necessidade de conceber a referida Política sob o prisma da

intersetorialidade23.

Para o Ministério da Saúde (2000):

A Saúde do Trabalhador constitui uma área da Saúde Pública que tem como objeto

de estudo e intervenção as relações entre o trabalho e a saúde. Tem como objetivos a

promoção e a proteção da saúde do trabalhador, por meio do desenvolvimento de

ações de vigilância dos riscos presentes nos ambientes e condições de trabalho, dos

agravos à saúde do trabalhador e a organização e prestação da assistência aos

trabalhadores, compreendendo procedimentos de diagnóstico, tratamento e

reabilitação, de forma integrada, no SUS (BRASIL, 2000).

A concepção de Saúde do Trabalhador ampliada e compreendida como política

pública a partir de seu reconhecimento legal pauta-se na visão integral do sujeito que tem

legitimado o seu acesso às demais políticas e à política em questão, tornando válido o que

preconiza o SUS, de acordo com suas competências e atribuições:

I - controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a

saúde e participar da produção de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos,

hemoderivados e outros insumos; II - executar as ações de vigilância sanitária e

epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador; III - ordenar a formação de

recursos humanos na área de saúde; IV - participar da formulação da política e da

execução das ações de saneamento básico;V - incrementar em sua área de atuação o

desenvolvimento científico e tecnológico; VI - fiscalizar e inspecionar alimentos,

compreendido o controle de seu teor nutricional, bem como bebidas e águas para

consumo humano;VII - participar do controle e fiscalização da produção, transporte,

guarda e utilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos;VIII

- colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.

(BRASIL, 1988).

23 Integração dos serviços de saúde e outros órgãos públicos com a finalidade de articular políticas e programas

de interesse para a saúde, cuja execução envolva áreas não compreendidas no âmbito do SUS, potencializando,

assim, os recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos disponíveis e evitando duplicidade de meios

para fins idênticos. Disponível em http://www.redehumanizasus.net. Acesso em 12.07.2013.

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57

O princípio da integralidade, na visão de Paim (2006), evidencia o compromisso

de uma prática continuada nos três níveis de atenção à saúde, o que aponta para uma

perspectiva que envolve o sujeito desde a prevenção e/ou diminuição dos riscos até as ações

de promoção e prevenção praticadas em âmbito institucional com base no PCMSO. Ações

como a realização dos exames periódicos, reconhecidas pelos garis como ações de saúde, por

vezes originam encaminhamentos para a rede de atenção à saúde que buscam nesta a sua

concretude, bem como sua continuidade. Estas ações pautadas no programa referenciam-se na

hipótese do risco físico aos quais os garis estão expostos.

Na concepção de Paim (2006), há quatro perspectivas que contemplam a ideia da

integralidade:

[...] como integração de ações de promoção, proteção, recuperação e reabilitação da

saúde compreendendo os níveis de prevenção primária, secundária e terciária; como

forma de atuação profissional abrangendo as dimensões biológica, psicológica e

social; como garantia da continuidade da atenção nos distintos níveis de

complexidade do sistema de serviços de saúde; como articulação de um conjunto de

políticas públicas vinculadas a uma totalidade de projetos e mudanças (Reforma

Urbana, Reforma Agrária, etc.) [...] (PAIM, 2006, p.15).

Estas vertentes trazem um olhar polissêmico acerca do princípio doutrinário da

integralidade, uma vez que os níveis de atenção e a abrangência das dimensões biológica,

psicológica e social do sujeito, a garantia da continuidade das ações nos vários níveis de

complexidade e a articulação com as outras políticas públicas são pertinentes e necessárias à

compreensão e prática da Política de Saúde do Trabalhador. Compreendo que a ideia de

integralidade aqui estudada refere-se principalmente a dois aspectos: a integração de ações de

promoção, proteção, recuperação e reabilitação da saúde e, como garantia da continuidade da

atenção nos distintos níveis de complexidade do sistema de serviços de saúde.

De acordo com os relatos colhidos nas entrevistas dos grupos 2 e 3, há

continuamente o encaminhamento de garis para serviços de saúde da rede pública quando eles

apresentam alguma questão de saúde e/ou após a realização dos exames periódicos. Por

exemplo, os garis que apresentam transtornos associados ao uso excessivo do álcool e de

outras drogas são encaminhados para unidades como os Centros de Atenção Psicossocial

(CAPS) Geral e de Álcool e Drogas (AD). Quando se faz necessário o referido

encaminhamento, o gari permanece em tratamento pelas citadas unidades constituintes da

Rede de Saúde Mental do Município de Fortaleza, sendo acompanhados pelo menos uma vez

por semana no CAPS por equipe especializada.

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58

A frequência do gari no serviço de saúde é equivalente à sua presença na empresa

como em um dia de trabalho qualquer, sendo esta monitorada pela gerência imediata e pelo

Serviço Social, que viabiliza o encaminhamento para a consulta. Tal estratégia reforça a ideia

de integralidade assinalada por Paim (2006), quando este se refere à garantia da continuidade

da atenção, em seus diversos níveis, no tocante à saúde, bem como a integração de ações de

promoção, proteção, recuperação e reabilitação da saúde.

Segundo as chefias imediatas, ações internas são realizadas esporadicamente, o

que é prejudicial à adesão em massa dos garis e compromete o contato sistemático com os

mesmos no sentido de garantir um olhar diferenciado para este profissional, que realiza

trabalho externo e insalubre, o que reforça a ideia de vulnerabilidade no tocante à saúde e que

pode fragilizar a relação saúde/ trabalho. A partir deste aspecto, compreendo que a

articulação, mobilização e realização sistemáticas de ações como palestras informativas a

respeito da saúde trariam uma melhor compreensão e participação dos garis no tocante à

esfera saúde, pois em seus relatos eles explicitam com clareza o desconforto de não se

sentirem cuidados.

4.6. Relação Saúde / Doença na EMLURB

De acordo com Ferreira (2008), lixo é o que se varre da casa, da rua e se joga fora:

entulho, coisa imprestável. A ideia do lixo relaciona-se ao lixeiro. Hoje, ogari, traz consigo

forte estigma social desde a antiguidade até os dias de hoje, quando lixo estava relacionado à

dimensão negativa, caracterizando-se doença.

O trabalho realizado pelos garis traz em si o desafio da rua e de tudo que com ela

se relaciona, pois o lixo se identifica com a noção de impureza, de algo insalubre. Este

trabalho vem sendo executado, segundo os relatos colhidos na pesquisa junto aos

participantes do grupo 1, em condições adversas. O espaço ocupacional onde se desenvolvem

as ações de trabalho dos coletores de lixo é, às vezes, conflitante. A rua é, por si, um local

adverso, hostil, permeado de silenciosos conflitos e de profundas desigualdades.

Com base na observação simples feita em campo junto aos garis, compreendi que

é no território que se evidenciam preconceitos e segmentações; onde o outro tenta se ver de

igual forma é que se percebe, às vezes, discriminado e/ou marginalizado.

Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), a saúde é "um estado de completo

bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades".

Entretanto, esta perspectiva se redefine quando pensamos as mudanças pelas quais o país

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atravessa. O trabalho, por exemplo, vem passando por transformações e, com isso, os

trabalhadores e as condições de realização do trabalho, também.

Ao longo da história, o trabalho ficou conhecido com diferentes conotações; antes

como algo penoso, como uma atividade que implicava perda da liberdade, como um fardo. Do

latim tripalium, trabalho designa um instrumento feito de três paus aguçados, com ponta de

ferro, no qual antigos agricultores bateriam o trigo, as espigas de milho, o linho, para rasgá-

los e esfiapá-los (ALBORNOZ, 1994).

Durante muito tempo, o trabalho esteve associado a sacrifício, tortura, sofrimento.

Em contraponto, contribui para a sociabilidade humana e, com isto, interfere diretamente na

construção do ser social e de suas relações. E como é possível compreender a categoria

trabalho? Para Marx, o trabalho pode ser concebido a partir de duas concepções: como

transformação da natureza e como atividade social assalariada, alienada pelo capital.

Desde o processo de industrialização, o trabalho abstrato caracterizado por Marx e

Engels vem se evidenciando e se estruturando de forma ampla, trazendo à cena diversos

desdobramentos, fortalecendo concentração de renda enfatizando desigualdade social.

De acordo com Antunes (2009), o trabalho assume centralidade na vida do sujeito.

Este, por muitas vezes, para acompanhar as transformações ocorridas, submete-se a situações

adversas somente para preservar seu vínculo com o trabalho, seja ele formal ou informal.

Compreender as mudanças trazidas pelas transformações do processo de trabalho

é tarefa essencial para a compreensão da saúde do trabalhador e as formas de adoecimento

deles como assinalam os autores:

O perfil de morbimortalidade dos trabalhadores se caracteriza por uma combinação

de fatores relacionados à idade, gênero, grupo social e condições de execução do

trabalho e da profissão que exercem ou exerceram, caracterizando-o em quatro

grupos: doenças comuns sem relação ao trabalho; doenças comuns possivelmente

modificadas em sua frequência ou ocorrência de seu surgimento em trabalhadores

sob certas condições de trabalho; doenças comuns cujas causas possam ser

expandidas devido ao trabalho; doenças específicas claramente relacionadas ao

trabalho, caracterizando os acidentes ocupacionais (BIANCO; GRAZZIANO.2012.

p. 576-577)

A doença relacionada ao trabalho não é necessariamente uma predisposição

biológica, mas a conjunção de um conjunto de fatores que deixam o trabalhador vulnerável ao

risco de adoecer.

Para a realização do serviço de varrição pública, assim como para todo trabalho,

são necessárias as condições adequadas para a sua execução.

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Ao longo da pesquisa, os garis chamaram atenção para alguns pontos referentes a

condições de trabalho, evidenciando, a seu modo, a relação saúde/doença em seus relatos,

bem como propondo melhorias para a realização do trabalho, e enfatizando a importância de

tais melhorias para a própria saúde. Para eles, é imprescindível o uso do protetor solar, pois a

exposição prolongada ao sol, no decorrer de todos os anos da jornada de trabalho, poderia

acarretar câncer de pele; o fardamento completo é prioridade, entretanto sempre faltam as

botas, que segundo eles, deve ser fechado e de qualidade, diferente dos que recebem, que são

desconfortáveis e têm pouca durabilidade, sendo, muitas vezes necessário adquirirem outros,

com recursos próprios;; as luvas são de extrema necessidade, pois uma vez feita a varrição em

determinada área, eles fazem a coleta do material e sua transposição para o coletor de lixo que

levam para os respectivos postos de trabalho. Alguns garis, entretanto, relataram trabalhar

sem a luva, pois, segundo eles, este equipamento não é disponibilizado pela empresa.

Dentre os 68 entrevistados, apenas um relatou a ocorrência de acidente de trabalho

por lesão com objeto perfuro cortante devido à falta da luva. Segundo os entrevistados do

grupo 3, os garis são transportados em caçambas não são lavadas, “carregadas de lixo” e; e

eles acabam sendo confundidos com o trabalho que realizam. Na visão dos garis “eles estão

indo para trás, não tem progresso”.

É de grande importância a noção de direito apresentada pelos entrevistados. De

forma coerente e clara, os garis expressam o conhecimento adquirido a respeito de suas

atividades, a relevância desta para a sociedade e os riscos envolvidos para a sua realização.

Faz-se necessário um olhar institucional mais enfático no que tange às condições de trabalho,

pois, da mesma forma que os inquieta, estas condições despertam neles o sentimento de

indiferença e de invisibilidade institucional.

Outro ponto amplamente evidenciado pelos garis como prejudicial à saúde é a

condição para a varrição em avenidas de intenso fluxo de veículos, pois a área que está sendo

varrida não é sinalizada adequadamente. Segundo eles, as ruas e avenidas deveriam ser

sinalizadas com cones, evidenciando a presença deles naquele espaço e delimitando o espaço

público e o trabalho que está sendo realizado naquele momento, pois é grande o risco de

atropelamento, o que comprometeria a saúde e se configuraria em acidente de trabalho.

A compreensão a respeito da relação saúde/doença por parte de um entrevistado

do grupo 3, representante da chefia imediata, é explicitada da seguinte forma:

Outra coisa muito importante para a saúde e prevenção de doenças é a limpeza. Há

mais de um ano que a gente não tem material de limpeza, não temos papel higiênico,

esse eu trago de casa, porque não tem nas gerências. A gente procura desinfetante,

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água sanitária para limpar os banheiros, mas não tem nada disso. Às vezes a gente

tira do bolso da gente. Tudo isso é conseqüência de não ter uma evolução.

(Entrevistado grupo 3).

A partir do depoimento supracitado, identifico a relevante reflexão no tocante à

relação saúde/doença e à prevenção destas, uma vez que a assistência às pessoas por

intermédio de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, com a realização

integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas constitui-se como um dos

objetivos do SUS. Pequenas condutas fazem a diferença para manutenção do ambiente de

trabalho limpo e saudável, como preconizam a política de saúde do trabalhador e o SUS,

passível de receber qualquer trabalhador ou visitante em condições adequadas. Do contrário, o

ambiente torna-se insalubre e vulnerável, fragilizando o trabalhador, que é usuário deste

espaço. Os garis têm consciência da atividade que realizam e da importância dela para a

sociedade, evidenciando, inclusive o seu papel, conforme o depoimento que segue:

A função do gari é melhor do que a de um médico, porque o médico tá curando

doença e gari tá prevenindo a doença, porque tá tirando o lixo, e o lixo atrai várias

doenças, por isso a profissão é mais eficaz do que a de um médico. (Entrevistado

grupo 1 – gari).

Os entrevistados dos grupos 1 e 3, respectivamente, trabalhadores operacionais

(garis) e de chefia imediata, iniciaram suas atividades na EMLURB, há mais de vinte anos, na

função de gari e apresentam vasto conhecimento da atividade realizada, das condições de

execução do trabalho e do risco de exercê-la em toda a sua amplitude. O conhecimento

adquirido por estes trabalhadores são de grande valor, uma vez que se constituíram a partir

das vivências de rua, com a realização diária do trabalho, que apesar de seguir sob orientação

técnica, é executado tomando por base o campo e suas adversidades.

Reitero a reflexão anterior a respeito da limpeza. É contraditório o trabalhador

responsável pela limpeza urbana de uma grande cidade mostrar-se demasiadamente carente de

condições adequadas de higiene e limpeza, dificultando e/ou até inviabilizando a vivência em

um ambiente de trabalho limpo, saudável e seguro, conforme preconiza a política.

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5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Considero a avaliação em pesquisa social um processo desafiador, composto por

variáveis múltiplas e por um universo que, muitas vezes, precisa ser recortado para assim ser

vivenciado e compreendido. É importante ressaltar que ao adentrar um espaço de pesquisa, os

olhos se voltam curiosamente para um complexo desconhecido que nos desafia a todo instante

a irmos mais além.

Os dados coletados em campo favoreceram a compreensão da implementação da

Política de Saúde do Trabalhador, bem como o contexto institucional e suas particularidades e

serão assim apresentados.

A pesquisa de campo que ocorreu nos meses de setembro, outubro, novembro e

dezembro de 2013 e janeiro de 2014, junto aos participantes dos quatro grupos, foi realizada

in loco nos respectivos postos de trabalho. A entrevista com os garis foi realizada na rua ou na

área de apoio, a ZGL; os demais entrevistados foram abordados nas dependências da

EMLURB. A área de abrangência escolhida para o estudo, como citei anteriormente, foi a

SER IV, onde estão lotados 117 garis, conforme documento emitido pelo setor de pessoal da

EMLURB em agosto de 2013. A amostra, constituída inicialmente por 117 garis que

compõem as ZGLs 13, 14 e 15, obteve o alcance de aproximadamente 58%. Foram

entrevistados 68 garis, além das chefias imediatas das respectivas ZGL, técnicos que

operacionalizam as ações de saúde e representantes da chefia institucional. Do total de garis

lotados na SER IV, 16 estavam de férias/licença; 11 haviam sido transferidos para outras

ZGL; 15 estavam à disposição, desempenhando outras atividades e 7 não quiseram participar

das entrevistas.

Assim, a análise dos dados pautou-se na quantidade que foi alcançada,

respeitando a amostra selecionada para a composição deste estudo, bem como a abordagem de

categorias de análise, que proporcionaram entendimento mais amiúde a respeito da temática

estudada.

Apresento inicialmente o quantitativo e perfil de garis lotados nas suas respectivas

ZGL considerando as seguintes variáveis: sexo, faixa etária, religião e origem familiar.

Compreendo que o padrão educacional é um fator importante para reflexão, por isso

evidencio, com base na coleta de dados, o nível de instrução dos pais dos garis e, em seguida,

o deles próprios, buscando relacionar este padrão educacional com as atividades realizadas

anteriormente por eles e a questão da renda mensal, considerando que, durante a abordagem

individual, alguns garis questionaram se a entrevista era para facilitar empréstimos financeiros

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para eles. Outro fator importante é que tem relação direta com a renda é o número de

dependentes, pois alguns garis têm na sua renda o único aporte financeiro, não contando com

renda complementar. Saliento ainda a importância do Programa de Educação, oferecido pela

EMLURB, aos seus trabalhadores. No referido Programa, todos os alunos são garis, pois,

atualmente, segundo entrevista concedida por profissional de Serviço Social da empresa, são

os trabalhadores com mais baixo nível de instrução. Além destes aspectos, a coleta evidencia

outros dados que contribuíram para a elucidação das questões sinalizadas no início deste

estudo, são eles: a ocorrência de acidentes de trabalho e de trajeto, uso e frequência de bebida

alcoólica, ocorrência de doenças relacionadas ao trabalho e doenças crônicas, conhecimento e

participação dos garis nas ações de saúde realizadas pela EMLURB. A partir de então,

identifico os entrevistados utilizando nomes fictícios a fim de manter em sigilo a identidade

do(a) trabalhador(a) entrevistado(a).

Tabela 3 - Distribuição do nº de garis lotados na SER IV, que compuseram a amostra,

segundo ZGL e tempo de serviço na EMLURB.

ZGL LOTADOS ENTREVISTADOS %

ZGL 13 40 23 33,9

ZGL 14 23 14 20,5

ZGL 15 54 31 45,6

SER IV 117 68 100 Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

O perfil dos garis é constituído conforme dados evidenciados na Tabela 4.

Tabela 4 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra segundo sexo, faixa etária,

religião e origem familiar.

VARIÁVEIS Nº %

Sexo

Masculino 64 94

Feminino 4 6

Faixa Etária

35 – 45 anos 22 32,3

45 – 55 anos 22 32,3

Acima de 55 anos 24 35,2

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Tabela 4 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra segundo sexo, faixa

etária, religião e origem familiar.

VARIÁVEIS Nº %

Religião

Católico 33 48,5

Evangélico 20 29,4

Testemunha de Jeová 3 4,4

Indefinida 11 16,1

Origem Familiar

Fortaleza 30 44,1

Interior do Estado 38 55,8 Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

Os dados evidenciam um número de homens superior ao número de mulheres,

uma vez que a atividade desenvolvida pelos garis, desde o seu início, é adversa e voltada

principalmente ao sexo masculino; entretanto, a partir da década de 1980, as mulheres

passaram a integrar este universo, levando consigo todas as particularidades da sua condição

sociocultural.

Segundo entrevista concedida por uma participante do grupo 2, a contratação de

mulheres para o desempenho da função de gari junto à EMLURB ocorreu da seguinte forma:

Na época da gestão da Maria Luiza, logo que a Maria Luiza entrou, ela abriu

inscrição para as mulheres, tanto é que elas eram chamadas de Mariazinhas, por

conta da Maria Luiza. E essas mulheres eram para ser, de fato, garis, elas foram para

a rua igualmente aos homens, fazendo o mesmo trabalho, elas levavam carrinho,

elas varriam, elas apanhavam o lixo; então elas foram distribuídas no centro da

cidade, na praia (no setor de praia) e com o tempo elas foram desenvolvendo

algumas doenças por conta da própria fragilidade da força feminina que a gente sabe

que existe. É totalmente diferente a força do homem da força da mulher e o trabalho

era um trabalho braçal mesmo, de força física, né? Então elas foram desenvolvendo

algumas doenças e, aí, por conta dessas histórias, a empresa foi abrindo espaços em

outras atividades que fossem mais leves, mais suaves pra que a mulher realizasse por

conta da sua força física mesmo; então elas passaram a varrer praças, que até hoje a

gente tem muitas mulheres que querem ficar na rua, mas elas não são mais aquelas

que faziam a varrição em avenidas, elas são colocadas na praça porque lá elas têm

um ambiente menos insalubre, né? Porque elas vão estar menos expostas ao sol, elas

vão ter um deslocamento menor. Muitas vezes, elas varrem, mas elas não empurram

o carrinho mais, a gente encontra de todas essas situações e a maioria dessas

mulheres, hoje, elas não são mais garis, elas são zeladoras, então elas estão em

serviços internos, estão em serviços dentro da empresa, estão prestando serviços fora

da empresa, prestando serviços como zeladoras, por conta das doenças. Até doenças

que elas adquiriram, né, por conta do esforço físico. (Maria – grupo 2)

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A inclusão da mulher nesse contexto, para assumir a função de gari, aumentou o

número de emprego para elas, entretanto o próprio processo de trabalho ao qual eram

submetidas lhes desfavorecia - não só pelo ambiente insalubre, que desfavorece a todos, mas

também, segundo o depoimento acima, pela força física necessária à execução do trabalho.

Este fato culmina com o adoecimento e a instalação de doenças relacionadas ao trabalho, que,

posteriormente, poderão se constituir em doenças crônicas, como apresentarei mais à frente. O

adoecimento traz consigo o afastamento do trabalho e uma possível readaptação funcional, o

que fez estas mulheres assumirem outras atividades, como a zeladoria dos prédios, conforme

citado no relato acima.

Na realização dos exames periódicos que acontecem anualmente, são solicitados

para os homens os seguintes exames:

Raio X de tórax, eletrocardiograma, sangue, exame da próstata- exames periódicos,

agora, quando é outro tipo de exame, faz pelo plano IPM ou outros laboratórios ou

outras clínicas (Entrevistado – grupo1- João).

No tocante aos exames específicos para as mulheres, elas informaram que é de sua

responsabilidade realizar as consultas de rotina a orientação médica e o acompanhamento

devido conforme relato a seguir:

Não tem prevenção do câncer ginecológico, a empresa não exige. Quando eu quero

saber mais coisas sobre mim, quando eu entro nas férias, eu faço o check up

(Entrevistada - grupo 1 - Mariana).

Ainda para compreender o perfil dos garis, foi importante buscar informações

sobre sua origem familiar, como citei anteriormente. Os dados relacionados ao nível de

instrução dos pais (Tabela 4) foram fundamentais para a percepção do nível de instrução dos

garis, entretanto este quantitativo que se apresenta a seguir não é fidedigno, porque alguns dos

entrevistados ou não lembravam o grau de instrução de seu pai ou não tiveram a oportunidade

da convivência com os mesmos. Outro aspecto a ser explicitado é o da faixa etária, pois

35,2% dos entrevistados estão acima de 55 anos.

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Tabela 5 – Distribuição por ZGL do nº de garis que compuseram a amostra, segundo nível de

instrução do pai.

Variáveis Analfabeto Alfabetizado

Ensino

fundamental

incompleto

Ensino

fundamental

incompleto

Ensino

fundamental

completo

ZGL13 8 2 4 2 1

ZGL 14 10 4 4 1 1

ZGL 15 21 3 5 2 0

TOTAL 39 9 13 2 1 Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

Os pais destes garis, com origem familiar no interior do Estado, eram analfabetos,

sem instrução ou tinham o Ensino Fundamental incompleto, evidenciando baixo padrão

educacional familiar, corroborado pela localização territorial destas famílias, a maioria

oriunda do interior do Estado, em uma época em que o sistema educacional vigente não

dispunha de políticas públicas de alcance da população, da forma como temos hoje.

Até hoje, a forma mais alargada de inclusão produtiva para muitas famílias do

interior do Estado ainda é a agricultura. Segundo relatos dos garis, desde a infância, eles

habituavam-se à prática desta atividade como forma de subsistência, uma vez que o mercado

de trabalho não dispunha de muitas ofertas. Também por isso o baixo nível de escolaridade

era potencializado, uma vez que os pais levavam os filhos para atuarem junto com eles no

plantio e na colheita. É importante enfatizar que os garis originários do interior do Estado,

cuja atividade primordial era a agricultura, chegaram ainda jovens a esta cidade, porém, com

baixo nível de escolaridade e precária qualificação para o trabalho, assumiram e se

identificaram com a referida função, depois de inseridos no campo de trabalho exatamente

pela condição apresentada. Segundo eles, naquela época, quem não estudava só podia ser gari,

pois não precisaria saber ler nem escrever. Entretanto, segundo eles, fizeram da coleta do lixo

o seu trabalho, o seu meio de vida, atribuindo à atividade profissional um caráter particular e

com referido senso de pertencimento.

O nível de escolaridade dos pais aponta também para outro caminho e apresenta

como relevante desdobramento a forma de inclusão produtiva destes sujeitos, que obtinham

seu sustento e de sua família a partir da realização de trabalho autônomo ou informal.

Comportamento apresentado pelos pais dos garis que têm origem familiar na capital e interior

do Estado. Na atualidade, esta situação é atenuada com o Programa de Erradicação do

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Trabalho Infantil (PETI)24, que articula um conjunto de ações para retirar crianças e

adolescentes, com idade inferior a 16 anos, da prática do trabalho precoce.

A EMLURB oferta aos trabalhadores, por meio de parceria com o Serviço Social

da Indústria (SESI), o Programa SESI Educa. É um programa de Educação de Jovens e

Adultos, implementado a partir da execução em sequência de módulos de alfabetização e

Ensino Fundamental com as séries iniciais. Dentro deste programa, os garis ainda têm acesso

aos módulos correspondentes ao Ensino Médio e a aulas de informática, o que lhes possibilita

o enquadramento nas séries subsequentes àquelas já cursadas. A articulação dos

trabalhadores, a divulgação do Programa e o monitoramento do mesmo, constituído por

frequência e rendimento, é realizado pelo Serviço Social da Instituição, que é a área

responsável por implementar práticas que incentivam a emancipação destes sujeitos.

Em entrevista colhida junto a uma participante do grupo 2, pude compreender

mais claramente o alcance do referido Programa, conforme o relato que se segue:

Desde que nós ingressamos na EMLURB que a gente percebeu que o nível de

escolarização era muito baixo; e a gente sempre quis desenvolver alguma ação

voltada para esse público que não sabia ler, que não sabia apanhar um ônibus porque

não sabia identificar e identificava pela cor... e agora, pelo fato de a gente ser

empresa, a gente pode usufruir disso, que é um dinheiro que a empresa precisa

descontar para a indústria, que é o SESI, e esse dinheiro retorna e a gente tá fazendo

isso. Nós tivemos, em 2011, a oportunidade de receber esse projeto, fizemos todo

um levantamento em todos os setores para saber quem tinha interesse de voltar a

estudar. Nós conseguimos que eles viessem para a sala de aula no horário de

trabalho sem nenhum prejuízo. Eles recebem o vale transporte para vir para o

trabalho, eles vêm num dia de trabalho e o salário tá lá garantido, a frequência tá

garantida desde que ele esteja em sala de aula. (Entrevistada – grupo 2 - Maria).

De acordo com o relato acima, entendo que a estratégia utilizada pela empresa é

bastante positiva e contribui com o desempenho do trabalhador, estimulando-o a interagir com

o meio de forma mais assertiva, pois o incentiva a estar em sala de aula no horário de trabalho

respectivo sem nenhum tipo de prejuízo financeiro a este trabalhador. O reflexo desta adesão

ao Programa é positivo no momento em que os garis expressam seus conhecimentos

adquiridos em sala de aula, articulam estes conhecimentos com a vivência profissional e

mostram inúmeras capacidades de relacionar as informações adquiridas com a vivência nas 24 O Programa compreende transferência de renda – prioritariamente por meio do Programa Bolsa Família,

acompanhamento familiar e oferta de serviços socioassistenciais, atuando de forma articulada com Estados e

municípios e com a participação da sociedade civil. O Peti está estruturado estrategicamente em cinco eixos de

atuação: informação e mobilização, com realização de campanhas e audiências públicas; busca ativa e registro

no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal; transferência de renda, inserção de crianças,

adolescentes e suas famílias em serviços socioassistenciais e encaminhamentos para serviços de saúde, educação,

cultura, esporte, lazer ou trabalho; reforço das ações de fiscalização, acompanhamento das famílias com

aplicação de medidas protetivas, articuladas com o Poder Judiciário, Ministério Público e Conselhos Tutelares e

monitoramento. Disponível em : www.mds.gov.br. Acesso em 08/06/2014.

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ruas e construir uma visão crítica acerca dos fatos que lhes rodeiam, facilitando o

entendimento dos mesmos no tocante ao trabalho que realizam, suas consequências,

benefícios para a sociedade e riscos para eles próprios.

O próprio gari que participa deste programa demonstra maior capacidade de

entendimento da realidade, conforme relato abaixo:

A gente não tem tudo que a gente necessita, a gente não tem uma bota, a gente não

tem uma luva, não tem a proteção dos braços. É, a gente trabalha num serviço muito

assim arriscado, e trabalha no meio da rua. (Entrevistado - grupo 1- José).

A existência do referido programa e sua implementação oferta ao trabalhador que

faz parte dele melhor oportunidade de esclarecimento, facilitando com isto sua vivência com

o trabalho que realiza, alimentando também as relações sociais que se estabelecem a partir de

então, pois a sala de aula deste programa é um ambiente acolhedor, de fácil acesso e favorável

ao entrosamento e à construção coletiva do conhecimento. Observo, de acordo com a tabela 5,

que se faz necessário um maior alcance deste programa, tendo em vista que, dentre os 68 garis

entrevistados, há 50 que não participam do programa. Acredito que este é um número elevado

de não participantes, já que a proposta da empresa é de levá-los à sala de aula em dias úteis e

horários de trabalho, conforme carga horária préestabelecida. Os outros 18 que participam do

Programa SESI Educa, ao contrário, vislumbram crescimento e projeção funcional dentro da

EMLURB, condição apresentada por alguns deles no momento da entrevista.

Tabela 6 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, participantes do Programa

SESI Educa.

Variáveis SIM NÃO

ZGL 13 3 20

ZGL 14 5 9

ZGL 15 10 21

TOTAL 18 50 Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

Conforme dados da tabela a seguir (tabela 7), as mães dos garis com origem

familiar no interior do Estado também apresentaram baixo nível de escolaridade e, como

evidenciam as entrevistas, as mesmas, em sua maioria, ocupavam-se da agricultura para

subsistência. Esta condição, segundo os entrevistados, comprometia o processo de

escolarização deles em detrimento da participação da mulher no sustento das famílias.

Ressalto que, assim como nem todos os garis lembraram o grau de escolaridade do pai,

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também não lembraram, integralmente, o grau de escolaridade da mãe, o que fragmentou a

exploração e apresentação dos referidos dados na íntegra.

Tabela 7 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, por ZGL segundo nível de

instrução da mãe.

Variáveis Analfabeta Alfabetizada

Ensino

Fundamental

Incompleto

Ensino

Fundamental

Completo

Ensino

Médio

Incompleto

Ensino

Médio

Completo

ZGL13 9 4 3 1 1 1

ZGL 14 4 8 0 0 1 0

ZGL 15 14 8 9 0 0 0

TOTAL 27 20 12 1 2 1 Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

O baixo nível de escolaridade dos garis é visualizado conforme dados da tabela a

seguir. Esta condição evidencia também que a realização das atividades anteriores não

necessitavam de um nível de instrução mais elevado (tabela 8). Estes dois aspectos

complementam o acesso à renda, que, segundo eles mesmos, é viável para a instrução que eles

têm (tabela 9). Na década de 1990, quando houve o mais recente ingresso de trabalhadores

garis na EMLURB, ainda não havia a necessidade de comprovação de escolaridade no nível

de Ensino Médio concluído, não exigindo, portanto, alto nível de escolaridade.

Há, dentre os entrevistados, 9 trabalhadores que iniciaram sua vida profissional

exercendo a função de gari, levados à empresa por parentes ou conhecidos que também já

trabalhavam como garis; hoje, todos os entrevistados estão há mais de 10 anos nessa

profissão.

Tabela 8 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo o seu grau de

instrução.

Variáveis Analfabeta Alfabetizada

Ensino

Fundamental

Incompleto

Ensino

Fundamental

Completo

Ensino

Médio

Incompleto

Ensino

Médio

Completo

ZGL13 3 1 13 2 1 3

ZGL 14 1 1 10 0 2 0

ZGL 15 3 2 22 2 1 1

TOTAL 7 4 45 4 4 4 Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

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Tabela 9 - Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo realização de

atividades anteriores.

Atividades

Anteriores Do Lar Gari Ambulante Agricultor Pedreiro

Serviços

Gerais

TOTAL 1 9 8 10 20 20 Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

No tocante à renda, 44 garis declararam renda mensal média de um a dois salários

mínimos e 24 declararam renda mensal de dois a três salários mínimos. Considere-se que, em

2013, quando as entrevistas foram realizadas, o valor do salário mínimo era de R$ 678,00.

O fator renda é de suma importância quando relacionamos saúde e trabalho.

Entendo que o trabalhador que vende a sua força de trabalho busca, primeiramente, obtenção

do sustento próprio e de seus dependentes.

Tabela 10 - Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo a renda e nº de

dependentes.

Variáveis Até 2 SM 2 a 3 SM

Nenhum

dependente

Até 2

dependentes

Entre 2 e 5

dependente

s

Acima de 5

dependente

s

ZGL13 11 12 9 10 5 5

ZGL 14 14 0 5 7 4 2

ZGL 15 19 12 4 8 6 2

TOTAL 44 24 18 25 15 10 Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

Um fato curioso que mantém relação direta com a variável renda é que pelo

menos 60% dos entrevistados recebem valor abaixo do declarado em razão da realização de

empréstimos descontados em folha. Eles relataram que estes empréstimos são feitos pela

necessidade de complementação da renda, pois as despesas com os dependentes impactam

diretamente no equilíbrio das finanças.

Quanto ao meio de transporte, 39 garis usam transporte coletivo (ônibus) para

chegar até a EMLURB, enquanto 2 usam carro próprio, 7 utilizam moto, 15 fazem uso de

bicicleta e 5 declararam que chegam ao posto de trabalho caminhando.

O deslocamento do trabalhador até o seu respectivo posto de trabalho tem relação

direta com a questão do trabalho, pois a finalidade deste trajeto percorrido pelos garis, de casa

para a empresa, dá-se para a realização da atividade laboral. Um fato importante constatado é

que a EMLURB registra atualmente a ocorrência de acidente de trajeto superior à ocorrência

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de acidente de trabalho. O Gráfico 1 evidencia os dados referentes à ocorrência do acidente de

trajeto.

Gráfico 1 - Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo relato de acidente

de trajeto.

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

Com base nos achados desta pesquisa, 17 garis relataram já ter sofrido acidente de

trajeto, tendo sido 3 pela ocorrência de queda (de bicicleta e da própria altura); 1 pela

ocorrência de acidente de moto e 9 pela ocorrência de atropelamento. Segundo relato de

profissional do setor de pessoal da empresa, a ocorrência destes acidentes no retorno para casa

se dá quando eles param em bares da cidade, ingerem bebida alcoólica e, após, dão

continuidade ao seu respectivo percurso, o que ocasiona as citadas quedas e atropelamentos, o

que, a rigor, descaracteriza os acidente como de trajeto25, conforme preconiza o Ministério da

Previdência Social.

O uso abusivo de álcool é, segundo relato de representante do grupo 2,

comportamento histórico e cultural dos garis, tendo em vista as precárias condições de

25 Acidentes de trajeto são os acidentes ocorridos no trajeto entre a residência e o local de trabalho do segurado e

vice-versa. Disponível em :www1.previdencia.gov.br. Acesso em 01/06/2014.

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trabalho praticadas no período anterior à Constituição Federal de 1988. Anterior à década de

1980 e até meados da mesma, os garis eram contratados para prestação de serviço sem

vínculo empregatício, o que configurava trabalho informal. As relações trabalhistas eram

frágeis, quase inexistentes. Não havia preocupação, por parte da empresa, com os

trabalhadores nem tão pouco com a saúde dos mesmos. Aqueles garis que eram contratados

nestas condições não recebiam nenhum tipo de suporte institucional e as condições para a

realização do trabalho eram as mais adversas.

Segundo relato de entrevistada do grupo 2, os garis, para cumprirem a jornada de

trabalho, que ainda incluía a coleta de lixo, ingeriam bebida alcoólica para suportar o odor do

lixo e as condições nas quais o trabalho era realizado.

E quem fazia coleta? Em que condição era feita a coleta? O homem sem máscara, o

homem sem luva, aí esse homem desenvolvia outras doenças, porque ele achava que

para fazer a coleta, se manter cheirando lixo ele precisava tomar uma, né?! Então,

hoje, a gente tem esse índice de dependência química na empresa em decorrência

disso, inclusive era cultural. Não… vou tomar uma para segurar o lixo, e isso não

era problema nenhum. (Entrevistada – grupo 2 -Maria).

De acordo com a observação de campo, percebi a presença da dependência

química entre os garis. Dentre os 68 entrevistados, 10 deles, o que equivale a 14%, relataram

uso diário de bebida alcoólica (Gráfico 2). Em uma das entrevistas concedidas, na emergência

do tema, o gari relatou que fazia uso da bebida alcoólica todos os dias, logo cedo. Na ocasião,

ele apresentava tremores característicos do usuário do álcool, apresentando dificuldade para

assinar o termo de consentimento livre e esclarecido.

Se considerarmos a dependência química do álcool que se instalou entre os garis

devido às precárias condições de trabalho praticadas anteriormente como desdobramento de

determinante social de saúde26, podemos fortalecer a ideia de acidente de trajeto para além da

legislação vigente, uma vez que este trabalhador utiliza-se da ingestão diária de bebida

alcoólica para enfrentar o campo de trabalho desprotegido e insalubre, tornando-se ainda mais

vulnerável em seu trajeto.

26Determinantes Sociais da Saúde são os fatores sociais, econômicos,culturais,étnicos/raciais,psicológicos e

comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e seus fatores de risco na

população.Disponível em :www.renastonline.org.Acesso em 08/08/2014.

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Gráfico 2 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo relato de uso de

bebida alcoólica e sua frequência.

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

Entretanto, é importante percebermos a diferença entre o uso, que é esporádico ou

episódico e o abuso ou uso nocivo, que é o consumo associado a algum tipo de prejuízo

(biológico, psicológico ou social), trazendo descontrole e desconforto ao usuário.

Neste aspecto, percebi a atual preocupação da instituição com a questão do

alcoolismo na condição de doença. A EMLURB atua com estes trabalhadores através da

comunicação das chefias imediatas (gerências) ao Serviço Social sobre a existência de garis

que fazem uso de bebida alcoólica e a articulação deste com a Rede de Saúde Mental do

Município, no sentido de viabilizar tratamento junto aos Centros de Atenção Psicossocial

(CAPS) Álcool e Drogas (AD). Com a estratégia de articulação da referida rede, pude

perceber a materialização (ou tentativa dela) da ideia de integralidade, conforme preconiza o

SUS e a Política de Saúde do Trabalhador, pois o trabalhador consegue transitar dentro do

sistema de saúde respeitando a perspectiva de reabilitação da mesma.

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Os garis que são acompanhados nestes serviços têm consultas semanais com

profissionais especializados em seu respectivo horário de trabalho, e sua presença no serviço

de saúde é equivalente à sua presença na empresa em um dia de trabalho. A estratégia foi

criada pelo Serviço Social da Instituição no sentido de estimular o trabalhador a tratar-se

conforme sua necessidade. É válido ressaltar que o uso abusivo do álcool pode, inclusive,

causar acidentes de trabalho.

Segundo estimativas da OIT, em âmbito mundial, de um total de 2,34 milhões

de acidentes mortais de trabalho, a cada ano, somente 321 mil se devem a acidentes. Os

restantes 2,02 milhões de mortes são causados por diversos tipos de enfermidades

relacionados com o trabalho, o que equivale a uma média diária de mais de 5.500 mortes.

Trata-se de um déficit inaceitável, afirma a agência da ONU (2012).

No que diz respeito aos acidentes de trabalho registrados na EMLURB, a

incidência é bem menor, uma vez que somente 7 dos garis entrevistados relataram já ter

sofrido este tipo de acidente, conforme mostra o Gráfico 3.

Gráfico 3 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo relato de acidente

de trabalho.

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

As causas dos acidentes de trabalho apontadas pelos garis são as seguintes:

acidente, atropelamento, lesão por objeto perfuro cortante e a queda, sendo esta – queda da

própria altura, queda do caminhão e queda da caçamba. A caçamba citada é o veículo que

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transporta os garis desde a EMLURB ou ZGL até o posto de trabalho, local onde é feita a

varrição, ou seja, a via pública. Esta via, segundo eles, não é sinalizada adequadamente para

evidenciar a presença de pessoas trabalhando, sendo necessário que eles mesmos é que se

defendem dos riscos como o atropelamento, conforme evidenciam os seguintes depoimentos:

É, a gente trabalha num serviço muito assim arriscado, e trabalha no meio da rua. E,

além da gente tá trabalhando aqui na parte da 13 de maio, por exemplo, ali você táa

com a vida na mão e a qualquer hora você pode morrer. Era para ter uns cones para

colocar na parte que a gente tá trabalhando e porque aí tá arriscado a batida dum

carro na gente. Às vezes, a gente tá varrendo e quando a gente vê o carro, tá em cima

da gente, “abuzinando” . É tudo coisa que a gente precisava ter mais segurança

(Entrevistado – grupo 1- Saulo).

É importante trabalhar e ter saúde; é importante saber trabalhar e saber como é que

se cuida. Aqui na prefeitura, você não pode fazer isso porque o povo não dá

condição. A gente trabalha em cima de um carro desses, um carro de lixo e a gente

vai tudo junto (Entrevistado – grupo 1 - Paulo).

. Diante disto, encontrei relevante contraponto com a política e com o discurso dos

programas de saúde quando os mesmos tratam do ambiente de trabalho saudável e seguro e

quando explicitam a relação saúde/doença. No caso estudado, o trabalho é realizado de forma

arriscada e insalubre, não só no tocante ao risco físico e psicológico, mas com relação ao risco

de vida ao qual o trabalhador está sujeito.

As condições de trabalho impactam diretamente na realização do mesmo. A

vestimenta e outros equipamentos de proteção individual, necessários e adequados constituem

o item saúde e podem ser determinantes para a relação saúde/trabalho, como evidenciam os

relatos a seguir:

É, eu já tive experiência na construção civil e quando eu passei pra cá, meu pai já

trabalhava aqui, eu sempre vinha com ele, né , pra ajudar aqui a ele, então eu

encaixei por isso, foi através do meu pai que eu fiquei aqui.E a gente vem

trabalhando ... a parte de saúde aqui é meia precária.A gente não tem tudo que a

gente necessita, a gente não tem uma bota, a gente não tem uma luva ,não tem a

proteção dos braços(Entrevistado – grupo 1- Pedro).

Eu acho importante para a gente porque é um negócio que a gente sempre precisa ter

aquilo ali né, porque de uma hora para outra a gente leva um corte. A gente trabalha

com lixo, às vezes a gente tá trabalhando, tem canto por aí que tem vidro e a gente

não vê. Por exemplo, eu cortei um sapato meu com um vidro de garrafa aí cortou o

sapato, se eu não tivesse de sapato fechado, eu tinha cortado o meu pé e poderia ter

formado uma doença. A minha valência é que eu tava de bota e eu não me cortei

com o ferro, só mesmo a bota. A bota é que ficou perdida (Entrevistado – grupo 1-

Abel).

Os depoimentos dos trabalhadores expressam divergências singulares entre o que

está posto na Política e a realidade vigente. Isto porque a Política prevê, dentre outras

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condições, a existência do ambiente de trabalho saudável e os dados, ao contrário, mostraram

dentre outros aspectos o ambiente de trabalho insalubre e as condições precárias para a

realização do trabalho, como expresso nos depoimentos acima.

A PNSST (2011) prevê que é de competência do Ministério da Saúde fomentar a

estruturação da saúde do trabalhador de forma integral, o que envolve a promoção de

ambientes e processos de trabalho saudáveis.

Na prática, existem pontos de atenção que, acredito, requerem observação mais

minuciosa por parte da empresa, principalmente quando se trata das condições de trabalho,

que, da forma como foram expostas pelos garis, comprometem o processo de trabalho e a

execução com qualidade deste, assim como podem trazer prejuízos à relação saúde/trabalho,

que fica comprometida caso confirme-se o que dizem os próprios relatos colhidos nas

entrevistas, inclusive sobre o não recebimento de fardamento.

De acordo com depoimento de representante da chefia institucional, muitas

lacunas que ocorrem hoje, tanto na manutenção sistemática das ações de saúde como na

aquisição de materiais, como fardamento e equipamentos de proteção individual (EPI), se dão

pelo fato de a empresa depender de processos licitatórios comuns ao serviço público, o que,

segundo a mesma, deixa entraves na execução satisfatória do trabalho do SESMT junto aos

garis, pois são processos demorados e, por isso, acabam por interferir negativamente na

proposta do programa de saúde ocupacional. Sendo assim, estas lacunas também trazem

repercussão negativa para os processos de trabalho dos garis, uma vez que as ações de saúde

são realizadas esporadicamente e, devido aos referidos processos e entraves burocráticos,

ocorre uma quebra importante na execução das ações e os trabalhadores permanecem

desarticulados e sem perspectiva de mudança quanto a este aspecto.

Um ponto importante para reflexão é o ambiente de trabalho, que na proposta da

referida política pública, deve ser protegido e adequado ao trabalhador. Os garis entrevistados

trabalham nas áreas externas, em via pública e com a varrição, o que me fez percebê-lo como

um ambiente adverso e propenso aos riscos físicos, principalmente, pois, como já foi dito

pelos garis, a varrição é feita na rua e não dispõe de nenhuma sinalização, evidenciando a

presença de trabalhadores naquele espaço. Diante deste fato, é possível compreender que,

institucionalmente, este trabalhador deveria estar resguardado dos riscos pertinentes ao

ambiente de trabalho, contradizendo os relatos em campo.

A Constituição Federal (1988) dispõe sobre diversos direitos dos trabalhadores em

seu artigo 7º, entre eles a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de

saúde, higiene e segurança.

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A Política de Saúde do Trabalhador e seus desdobramentos comungam da

perspectiva de atenção integral, no que diz respeito às ações de promoção, vigilância e

assistência à saúde. Ao longo das entrevistas, 32 garis relataram conhecer e/ou participar das

ações de saúde propostas pela EMLURB, conforme dados explicitados no Gráfico 4,

entretanto 36 relataram que desconhecem tais ações e, por isso, não participam.

Gráfico 4 – Distribuição do nº de garis que compuseram a amostra, segundo o conhecimento e

participação nas ações de saúde oferecidas pela EMLURB.

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

As ações identificadas pelos garis como ações de saúde são as seguintes:

Gráfico 5 – Distribuição do nº das ações de saúde reconhecidas pelos garis da EMLURB, que

compuseram a amostra.

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

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As ações identificadas pelos garis como ações de saúde são as mais comuns.

Evidenciam-se as seguintes, conforme os depoimentos a seguir:

A vacina evita as doenças da rua, corre o risco de se furar nos pregos, se cortar, evita

muito de se pegar um tétano... e o exame periódico, a gente mostra lá o doutor , ele

olha a gente e se tiver tudo ok ele dá um papelzinho verde27; se você tem algum

problema, ele vai lhe dar um papelzinho branco para você providenciar de se tratar,

aí vai para as consultas especializadas.

(Entrevistado – grupo 1 – João)

A CIPA é muito importante, porque a gente faz curso de prevenção de acidentes e a

gente aprende muita coisa, como os primeiros socorros também [...]. mas, às vezes,

os garis se negam a votar na CIPA porque não vem nenhuma melhoria [...] De fato,

tem gente trabalhando na CIPA , mas, quando chega na empresa para cobrar,

ninguém faz nada (Entrevistado – grupo 3 – Josué).

A conscientização por parte dos trabalhadores no que diz respeito à sua saúde é

percebida com clareza nos relatos dos mesmos. Acredito que, também por causa da atividade

realizada, os garis apresentam relevante sensibilidade no tocante aos seus cuidados. Estas

ações orientam a melhoria da prática destes profissionais, bem como os conduz à reflexão a

respeito de dois pontos: os benefícios que esses cuidados podem trazer e a saúde, como um

todo.

O Ministério da Saúde ressalta que os determinantes da saúde do trabalhador são

fatores pertinentes ao cotidiano do sujeito em uma perspectiva holística.

Entre os determinantes da saúde do trabalhador, estão compreendidos os

condicionantes sociais, econômicos, tecnológicos e organizacionais responsáveis

pelas condições de vida e os fatores de risco ocupacionais – físicos, químicos,

biológicos, mecânicos e aqueles decorrentes da organização laboral – presentes nos

processos de trabalho. (COSAT/MS, 2001.p.17).

A realização das ações de saúde surge no horizonte institucional também como

uma estratégia facilitadora de organização laboral dos garis. A participação deste público nas

ações promovidas pela EMLURB pode ser percebida a partir dos dados expostos acima.

Segundo os garis e as chefias imediatas entrevistadas, as ações de saúde

acontecem esporadicamente. Na percepção deles, até para uma maior adesão, faz-se

necessário que estas ações ocorram sistematicamente com o objetivo de desenvolver o hábito

27 O papel verde referenciado neste depoimento é o Atestado de Saúde Ocupacional (ASO), documento emitido

pelo médico do trabalho após realização da avaliação clínica ocupacional, quando são avaliados antecedentes

clínicos, cirúrgicos, exames complementares e, ao final, é informado um resultado, identificando se o trabalhador

está apto ou não ao cargo almejado.

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Os relatos a seguir explicitam a percepção dos trabalhadores no tocante à

realização das ações de saúde:

É feita, mas, vamos dizer assim, é mais espaçosa, tinha que ser mais próxima, com

um tempo menor, para eles estarem sempre participando. (Entrevistado – grupo 3 –

Tadeu).

Elas são importantes, porque elas trazem benefícios muito grandes, tanto para o

trabalhador como para a própria empresa que diminui seus gastos com ele, né? E

pode melhorar bastante em outros termos (Entrevistado – grupo 3 – Cristóvão).

Segundo o representante institucional, há quebra das ações e/ou descontinuidade

das mesmas devido aos trâmites burocráticos que o serviço público enfrenta para realizar suas

propostas, enfatizando que o trabalho é realizado junto ao SESMT. Os referidos processos

licitatórios atrasam a ocorrência das ações, que têm um custo para a realização.

A descontinuidade das referidas ações de saúde praticadas internamente pelo

SESMT da empresa se desdobra negativamente para o trabalhador, pois as estratégias

planejadas são objetivadas de forma incompleta, por conta dos referidos entraves

burocráticos.

A Política, em linhas gerais, prevê financiamento para a realização das estratégias

de saúde do trabalhador. Em âmbito institucional, compreende-se que há também orçamento

prévio para o desempenho de tais estratégias, uma vez que elas compreendem o PCMSO, que

é fiscalizado pelo MTE.

Entretanto o relato de entrevistada do grupo 2, diz o seguinte:

Nós estamos há 02 anos sem SIPAT por conta de recursos financeiros. A SIPAT já

estava até nas ações programadas, porque é assim, ocorrem as eleições da CIPA em

maio e aí a gente faz a SIPAT antes, é sempre antes porque a CIPA anterior que tá

na gestão ela quer fazer a SIPAT.Primeiro fazia a SIPAT e depois a eleição da CIPA

porque já fazia parte da programação. Mas não tem recursos e por isso a gente não

fez a SIPAT.( Entrevistada – grupo 2 - Marília)

Neste sentido o empenho institucional no tocante a tais recursos mostra-se

fragilizado, pois ações de grande porte que congregam uma parcela importante de

trabalhadores deixaram de ser realizadas devido à falta de recursos por dois anos

consecutivos.

Tal constatação leva-me à seguinte indagação: Como operacionalizar ações de

saúde para favorecer os trabalhadores, prevenir riscos, acidentes e outros agravos à saúde

diante dos citados entraves burocráticos?

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A dificuldade no tocante ao cumprimento das ações contidas no PCMSO foi

evidenciada ao longo da pesquisa, conforme os depoimentos dos participantes do grupo 3,

abaixo registrados:

Com a CIPA, a gente cobra a melhoria, principalmente nos transportes dos garis,

essas coisas assim, busca benefícios e faz um trabalho de prevenção de acidentes,

mas quando a gente procurava na empresa, ninguém tinha nenhum recurso

(Entrevistado – grupo 3- Josué).

A CIPA era para ser regida por lei ... ó, a CIPA tá exigindo da EMLURB o material

completo dos garis, se não for, vai ser punido, mas não existe esse tipo de lei, tanto

faz você me dar o material como não, vamos deixar do jeito que tá. A CIPA cobra,

mas a empresa não dá aquele material exigido pela CIPA, aí pronto, fica na mesma,

aí, quer dizer, é nadar no seco. (Entrevistado – grupo 3 – Simão)

Em entrevista colhida junto a uma participante do grupo 2, pude compreender

que há relevante necessidade de maior suporte para a realização das ações de saúde, bem

como para a aquisição dos equipamentos de proteção necessários aos trabalhadores, conforme

depoimento abaixo:

A questão dos EPIs, quando você solicita, não recebe; não consegue entregar,

porque você esbarra naquela dificuldade burocrática. Então, assim, as campanhas,

quando você vai a uma gerência falar sobre a importância de ele usar a farda, usar o

EPI, aí vem aquela voz: mas a gente não recebe. E como é que você vai cobrar, falar

da importância de uma coisa que a empresa não dá? (Entrevistada – grupo 2 –

Marília)

De acordo com relatos explicitados, é possível compreender a dificuldade em

implementar a política de saúde do trabalhador que requer não só competência técnica, mas

também o investimento mínimo necessário para a sua concretude, mesmo em contextos

adversos ou caóticos para os trabalhadores que dependem da iniciativa institucional para a sua

saúde e segurança no trabalho. Percebi também a fragilidade de uma política em estruturação

que abrange uma gama de ações, que se articula com outras tantas políticas, mas que se

mostra frágil na sua objetivação.

As ações de saúde do trabalhador são compostas por um conjunto de atividades

que visam à promoção e proteção da saúde dos trabalhadores (RIBEIRO, 2012). Com isto fica

clara a necessidade emergente da sistematização do financiamento institucional que sustenta

esta prática com vistas a garantir que estas ações ocorram satisfatoriamente e de forma a

alcançar os trabalhadores não só pela questão prática desta realização, mas também pela

questão do ideal da proposta que rege a Política em debate.

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De acordo com o Ministério da Saúde (2001), o foco das ações de saúde do

trabalhador é a mudança nos processos de trabalho que contemplam as relações

saúde/trabalho em toda a sua complexidade, entretanto, fica inviável a ocorrência das

referidas mudanças neste contexto institucional por todas as razões aqui apresentadas.

A realidade conhecida através deste estudo se mostra desarticulada, incipiente

frente ao discurso legítimo da política e dos programas de controle médico de saúde

ocupacional. As ações propostas, às vezes, não são realizadas, o que visivelmente

compromete a ocorrência de mudanças nos processos de trabalho; as que ocorrem, são ainda

frágeis para atender à demanda que se apresenta e para alcançar o trabalhador em todas as

suas dimensões, como propõe o princípio da integralidade.

Segundo relato dos entrevistados dos grupos 1 e 3, as ações de saúde hoje

realizadas dentro dos limites da prática institucional são de grande importância, pois, através

destas ações, novos conhecimentos são aprendidos, o que, para eles, pode reduzir os riscos à

saúde.

A ocorrência das ações de saúde é compreendida pelos participantes do grupo 2

também por outro prisma, evidenciando que a proposta da política no âmbito institucional

ainda caminha a passos curtos e lentos, conforme o relato seguinte:

Eu considero que as ações são muito tímidas, elas são deficientes e que deveriam

estar sendo feitas, mas esbarra na questão dos recursos. A gente tem dificuldade de

contratar o médico para implementar esse PCMSO, a gente tem dificuldade de fazer

a SIPAT... (Entrevistada – grupo 2 – Marília).

O depoimento acima traz à cena uma questão de grande importância, pois, para

operacionalizar as ações de saúde do trabalhador, acredito que seja de suma importância a

sistematização prévia do orçamento físico-financeiro para que a gestão institucional, que

também sofre com as alternâncias de governo e gestão municipal, possa viabilizar

satisfatoriamente a realização das referidas ações, fortalecendo, assim, o amadurecimento

destas estratégias.

Considerando a importância das dificuldades expostas, compreendo que, neste

contexto, é possível o processo contínuo de adoecimento e este processo se dá conforme a

atividade laboral realizada.

Categorizando o trabalho, Schilling (2012) classifica de forma ampla um grupo de

doenças relacionadas ao trabalho, conforme tabela a seguir:

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Tabela 11 – Classificação do grupo de doenças relacionadas ao trabalho

CATEGORIA EXEMPLO

I – Trabalho como causa necessária Intoxicação por chumbo

Silicose

Doenças profissionais legalmente

reconhecidas

II- Trabalho como fator contributivo, mas

não necessário

Doença coronária

Doença do aparelho locomotor

Câncer

Varizes dos membros inferiores

III- Trabalho como provocador de um

distúrbio latente ou agravador de uma doença

já estabelecida

Bronquite crônica

Dermatite de contato alérgica

Asma

Doenças mentais Fonte: Adaptado de Schilling, 1984

De acordo com esta classificação, pode-se observar que as doenças assinaladas

pelos garis estão em consonância com a categoria III, pois ao longo da jornada de trabalho

surgem, dentre as afecções, a pneumonia e doenças de pele (dermatites), além das doenças do

aparelho locomotor (lesões nos tendões e lombalgias), conforme demonstração do grupo II.

Encontrei em campo 28 garis que declararam já ter se afastado do trabalho por

diversas doenças, entre elas: fraturas, alcoolismo, hérnia inguinal. O tempo de afastamento é

variável: 16 permaneceram até 03 meses afastados, 08 ficaram afastados entre 03 e 06 meses

e 04 permaneceram afastados por mais de 06 meses.

Dentre todos os entrevistados, 11 declararam já ter se afastado devido a doenças

que, segundo eles, são relacionadas ao trabalho. Estas doenças, por eles sinalizadas e

explicitadas no Gráfico 6, são as seguintes: doenças alérgicas (rinite), respiratórias

(pneumonia), de pele (micoses), infecciosas (hanseníase) e outras afecções (dores lombares,

hérnias e intoxicação).

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Gráfico 6 – Distribuição do nº de doenças relacionadas ao trabalho, de acordo com os garis

que compuseram a amostra.

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

É válido ressaltar que cada grupo de trabalhador pode desenvolver diversos tipos

de doenças de acordo com a atividade que desempenha. Estas doenças causam alterações à

saúde do trabalhador e são comumente desencadeadas por fatores relacionados ao ambiente

de trabalho, pois, conforme esclarece Grazziano e Bianco (2012), a etiologia (ou nexo causal)

das Doenças Relacionadas ao Trabalho (DRT) é estabelecida mediante a constatação da sua

frequência em determinadas profissões e pela análise dos ambientes e condições de trabalho

que constituem os fatores de risco de sua ocorrência. No caso dos garis, o trabalho realizado é

varrição e coleta do resíduo propriamente dito, encontrados nas ruas, o que evidencia a

ocorrência de doenças de pele, respiratórias e do aparelho locomotor, como citei acima.

Para os sujeitos desta pesquisa são várias as doenças relacionadas ao trabalho que

podem ser desenvolvidas. O trabalho dos garis entrevistados acontece na rua, onde eles estão

expostos aos inúmeros estímulos do meio ambiente. A atividade de varrição é ampla e para

ser desempenhada exige do trabalhador diversificados esforços. As lombalgias referidas nas

entrevistas ocorrem, segundo os entrevistados, em razão do movimento repetitivo de varrer e

empurrar o carro, que às vezes está pesado; as hérnias e doenças renais, segundo eles,

surgiram devido ao peso que pegam. A hanseníase é uma doença infecto contagiosa que tem

forma de transmissão peculiar e o agente causador, ou agente etiológico não é de natureza

ocupacional. As micoses são infecções causadas por fungos, bastante comuns na região dos

pés, que às vezes estão desprotegidos pelos calçados inadequados. A lesão no tendão surge

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em decorrência de quedas da caçamba, transporte disponibilizado aos garis para se

deslocarem de um ponto a outro nos postos de trabalho dentro das respectivas ZGL. As

doenças respiratórias apontadas como doenças relacionadas ao trabalho também ocorrem

devido às condições e ao espaço onde a atividade é desenvolvida.

De acordo com os entrevistados do grupo 3:

Nosso pessoal, nossos garis, como eles trabalham diretamente no campo, exposto a

lixo, eles têm facilidade muito grande de adoecer e então as doenças deles são mais

complicadas, do que outras que a gente conhece né? É tipo hanseníase, é tipo essas

coisas que já adquire no campo mesmo, então elas são mais... em termo de

tratamento (Entrevistado – grupo 3 – Josué).

A ocorrência de doenças se dá não só pelo trabalho que é desenvolvido, mas

também pela condição inerente ao espaço ocupacional. As gerências são pontos de apoio para

os garis, fiscais e chefes imediatos. Espaço onde são acomodados os materiais usados para o

trabalho, ponto de encontro dos trabalhadores, espaço de convivência e acolhida. Entretanto

são espaços de pouca visibilidade institucional, uma vez que dispõem de precárias

acomodações e condições de higiene, conforme relato que se segue:

Outra coisa muito importante para a saúde e prevenção de doenças é a limpeza. Há

mais de um ano que a gente não tem material de limpeza, não temos papel higiênico,

esse eu trago de casa porque não tem nas gerências. A gente procura desinfetante,

água sanitária para limpar os banheiros, mas não tem nada disso. Às vezes, a gente

tira do bolso da gente. Tudo isso é consequência de não ter uma evolução

(Entrevistado – grupo 3 – Josué).

Desta forma, compreendo que o padrão de adoecimento deste trabalhador

relaciona-se também com a conjuntura institucional, pois sem o incentivo necessário a

atenção integral a saúde dos trabalhadores, a proposta dos programas de promoção da saúde e

as próprias estratégias da política de saúde do trabalhador ficam comprometidas. Além da

contradição que é o trabalhador da limpeza ofertá-la por meio do seu ofício e não recebê-la

como contrapartida institucional.

O grupo de garis entrevistados exerce a referida função há mais de dez anos, como

assinalei nesta análise. Referenciando as dificuldades elencadas aqui quanto à realização das

ações de atenção integral compreendo a importância da busca do estilo de vida destes sujeitos.

No grupo de 68 entrevistados, 28 garis declararam sofrer de doenças crônicas

assinaladas conforme o gráfico a seguir:

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Gráfico 7 – Distribuição do nº de doenças crônicas sofridas pelos garis da EMLURB, que

compuseram a amostra.

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de pesquisa

Considero importante destacar também a repercussão destas doenças crônicas no

cotidiano do trabalhador. As ações de saúde, como as palestras informativas, se propõem a

esclarecer causas e consequências dos estilos de vida para a saúde em linhas gerais. Estas

temáticas são vivenciadas com mais rigor e empenho em momentos como a SIPAT, que é um

momento coletivo e de grande alcance junto aos garis. O depoimento a seguir esclarece:

Tem a SIPAT que eu acho um momento bem bacana dentro da empresa. Aí a gente

vai trazendo aquelas ações direto para o que está acontecendo. Ah tem sobre

diabetes; ah por que diabetes? Porque nós já temos um público que desenvolveu essa

doença. Hipertensão; a higiene; a higiene pessoal, porque isso interfere na questão

da saúde e a gente trabalha dessa forma (Entrevistado – grupo 2 - Marília).

Diante disto é possível compreender que mesmo ainda de forma tímida e instável

a empresa busca através do SESMT orientar seus trabalhadores quanto às doenças

identificadas entre os mesmos. Tais estratégias buscam favorecer o trabalhador no tocante aos

cuidados com a saúde e, são desempenhadas pelos profissionais da instituição e outros que

compõem a rede municipal de saúde.

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A implementação destas estratégias contribui de forma positiva para o processo de

trabalho dos garis uma vez que disseminam informações diversificadas a respeito das

doenças, formas de prevenção, conseqüências e limitações.

As ações de saúde têm o papel fundamental de contribuir para as mudanças no

cotidiano do trabalhador, favorecendo melhoria também ao processo de trabalho, uma vez que

o adoecimento impacta diretamente na rotina do trabalhador.

Diante disto, percebo que a partir do marco legal da política em estudo, bem como

da relação desta com as demais políticas associadas, as relações de trabalho avançaram,

tornaram-se relações formais, o que viabiliza o acesso aos direitos trabalhistas, e o direito à

saúde. A política de saúde do trabalhador praticada na EMLURB com base no PCMSO traz o

mínimo aos trabalhadores, ações ainda incipientes, mas agora com legislação e fiscalização

por parte das instâncias responsáveis. O MT é responsável por fiscalizar o PCMSO que se

destina a cobertura das ações de saúde, o que também me faz refletir que a empresa se

prontifica a cuidar da saúde do trabalhador não exclusivamente pelo bem estar dele, mas

também por ter obrigações legais com este cuidado. Sendo assim, a ideia da saúde integral

ainda não é uma bandeira hegemônica, se constitui em algo ainda em estruturação,

principalmente quando percebemos que o discurso da política é no sentido de favorecer a

saúde do trabalhador de forma ampla e irrestrita.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A área escolhida para composição deste estudo revelou-se ainda mais instigante

do que eu poderia imaginar. Percorri um longo caminho em busca de um entendimento mais

amiúde acerca das propostas de atenção integral à saúde do trabalhador. A investigação

empreendida para construir o objeto desta pesquisa foi incessante. Encontrei um objeto

desafiador, mas ainda pouco explorado em toda a sua riqueza e complexidade.

Legalmente, há portarias, leis, decretos, programas e projetos de atuação na área,

que se expande ainda de forma lenta, contrária à lógica do mercado onde se encontra o sujeito

que trabalha.

Para viabilizar a construção deste objeto, busquei na literatura informações que

pudessem abranger a lógica da saúde como direito, participei de seminários e palestras,

explorei este campo no sentido de compreender a ideia da atenção à saúde do trabalhador,

quais as suas bases legais, qual a sua relação com os princípios do SUS, de que forma esta

proposta chega ao trabalhador e se realmente chega. Aliada às primeiras impressões do

campo, busquei leituras que julguei necessárias de acordo com a diversidade do tema,

almejando que estas pudessem dar conta daquilo que queria pesquisar.

Estabeleci algumas categorias de análise que, futuramente, poderiam elucidar

questões que se colocaram no início deste percurso. O objetivo era avaliar as ações de saúde

do trabalhador, em conformidade com a Lei que normatiza a Política Nacional de Saúde do

Trabalhador, e suas repercussões para o processo de trabalho. Dentro deste objetivo, trilhei a

compreensão da Política de Saúde do Trabalhador desenvolvida na instituição que foi campo

de pesquisa; busquei compreender a relação saúde/trabalho com base no discurso dos sujeitos

que encontrei em campo; tentei compreender o entendimento deste sujeito no tocante às ações

de saúde desenvolvidas em âmbito institucional, bem como identificar os efeitos das ações de

saúde e a repercussão destas ações nos respectivos processos de trabalho, além de reconhecer

como ocorria a implementação da Política no âmbito institucional.

O discurso legitimado pela Política de Saúde do Trabalhador é proposto de forma

ampla e favorável ao alcance de todos, entretanto o estudo favoreceu compreender que as

ações de saúde, em âmbito institucional, ainda não têm o alcance proposto.

De acordo com os dados colhidos, observei que as ações de saúde do trabalhador

existem, entretanto, da forma como acontecem não atendem satisfatoriamente ao público ao

qual se destina, uma vez que estas são realizadas esporadicamente e baseadas na NR 7, que

versa sobre o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), destinado à

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prevenção, rastreamento e diagnóstico precoce dos agravos à saúde. Considerando que os

sujeitos da pesquisa são, em sua maioria, homens, há que se observar mais cuidadosamente a

questão de gênero para que homens e mulheres possam ser atendidos conforme as

peculiaridades de cada sexo.

O olhar mais enfático da empresa para os homens contraria a noção de

integralidade defendida por Paim (2006) no tocante à integração de ações de promoção,

proteção, recuperação e reabilitação da saúde, compreendendo os níveis de prevenção

primária, secundária e terciária, pois, para fortalecer a prática deste princípio, homens e

mulheres deveriam ter sua condição de saúde avaliada de acordo com suas necessidades. A

prática realizada, atualmente, porém, sobrepõe o sexo masculino em detrimento do feminino.

Os sujeitos que participaram da pesquisa sugeriram que a proposta mais viável

para a realização das ações de saúde seria a sistematização destas, tendo em vista que a

conduta indicada fortalece a ideia de prevenção dos riscos à saúde do trabalhador. Como foi

possível perceber, os trabalhadores operacionais estão expostos a inúmeros riscos devido à

natureza da atividade realizada.

Outro fator que observei refere-se às condições de trabalho, que foram

identificadas como precárias, no tocante à falta de uniformes, calçados, luvas adequadas,

protetor solar, o que tornam todos os trabalhadores mais vulneráveis às doenças em geral. Tal

fato é ainda mais impactante para o trabalhador por não haver um acompanhamento médico

sistemático, que muitas vezes é decorrente de entraves burocráticos para a contratação de

profissionais que se disponibilizem a permanecer no serviço e implementar as estratégias

necessárias ao andamento satisfatório do programa de controle médico de saúde ocupacional.

Um dos agentes complicadores, segundo os trabalhadores, é o distanciamento

entre a gestão e o grupo operacional estudado, onde os mesmos não opinam nas questões de

seu interesse, o que fortalece, entre estes, o sentimento de categoria inferior, pois sua

atividade é de limpar a sujeira, evidenciando o estigma da condição de inferioridade.

Para o grupo de trabalhadores entrevistados, as ações que os beneficiariam como

exames periódicos - CIPA, SIPAT – deveriam ocorrer em intervalo de tempo menor, o que

fortaleceria o grupo e favoreceria a troca de conhecimento e a sensação de ser cuidado, como

muitos colocaram, fazendo com que o trabalhador se sentisse mais valorizado, tendo sua

profissão reconhecida como essencial, tal como acontece com outros profissionais.

A Política que norteou este estudo encontra-se em estruturação. No Estado do

Ceará, é acompanhada pelo NUAST e implementada pelos CEREST estadual e regional. No

município, as ações implementadas são de responsabilidade do CEREST regional e, em

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âmbito institucional, as ações de saúde do trabalhador são implementadas pelo SESMT com o

apoio do Serviço Social.

A pesquisa possibilitou compreender que as dificuldades encontradas em campo

no tocante à implementação da política acontece não só em âmbito institucional. Em linhas

gerais, tanto na esfera municipal como na estadual, as dificuldades existem, ora por falta de

pessoal, ora por escassez de recursos financeiros. Isto expõe, de forma negativa, as condições

que envolvem o trabalhador, tendo em vista que o investimento que deveria ser feito

efetivamente na prevenção dos riscos acontece com alternâncias e fragilidades.

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ANEXOS

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ANEXO 1 – FOLHA DE ROSTO

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ANEXO 2 - PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP

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APÊNDICES

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APÊNDICE 1 – QUESTIONÁRIO APLICADO AO GRUPO DE TRABALHADORES

OPERACIONAIS – GARIS (GRUPO 1)

1. Identificação:

Nome completo:

Nome social:

Há quanto tempo reside neste local:

Origem familiar:

Religião:

Grau de instrução do seu pai:

Profissão do seu pai:

Grau de instrução da sua mãe:

Profissão da sua mãe:

2. Data de nascimento: ___/___/____ Idade: _______

3. Grau de instrução/escolaridade

( ) Sem Instrução ( ) Alfabetizado

( ) Ensino Fundamental Incompleto ( ) Ensino Fundamental Completo

( ) Ensino Médio Incompleto ( ) Ensino Médio Completo

( ) Outros

4. Sexo:

1. Masculino ( ) 2. Feminino ( )

5. Orientação sexual:

( ) Heterossexual ( ) Homossexual

( ) Lésbica ( ) Outros

6. Cor ou raça*

( ) Branca ( ) Preta ( ) Amarela

( ) Parda ( ) Indígena ( ) Sem declaração

* Categorias de acordo com IBGE/ Censo 2010

7. Participa do Programa Sesi-Educa

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1. Sim ( ) 2. Não ( )

8. Atividades anteriores ________________________________

9. Atividade atual ________________________________________

10. Área de atuação na EMLURB

10.1.Área operacional

Gari ( ) Serviços gerais( ) Portaria( )

11. Tempo de serviço na atividade atual

Até 6 meses ( ) Entre 6 meses e 5 anos ( )

Entre 5 e 10 anos ( ) Acima de 10 anos ( )

12. Pertence a qual zona geradora de lixo (ZGL)? __________

13. Não pertence a nenhuma zona geradora de lixo sim ( ) não ( )

14. Renda familiar mensal:

De 1 a 2 salários mínimos ( ) De 2 a 4 salários mínimos ( )

De 4 a 6 salários mínimos ( ) Acima de 6 salários mínimos ( )

*considerar salário mínimo vigente – R$ 678,00

15. Número de dependentes:

Nenhum ( ) Até 2 ( )

Entre 2 e 5 ( ) Acima de 5 ( )

16. Com quem mora?

Cônjuge/companheiro(a) ( ) Cônjuge/companheiro(a) e filho(s) ( )

Filhos ( ) Família ampliada ( )

Outros ( )

17. Tempo de serviço na empresa?

Até 5 anos ( ) Até 10 anos ( )

Entre 10 e 20 anos ( ) Acima de 20 anos ( )

18. Utiliza meio de transporte para chegar ao trabalho?

Sim ( ) Não ( )

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Carro ( ) Ônibus ( ) Moto ( )

Bicicleta ( ) Outros( )

19. Utiliza de plano de saúde?

Sim ( ) Não ( )

SUS ( ) Convênio IPM ( )____________

Plano particular ( ) Outros ( )___________________

20. Já esteve afastado(a) do trabalho por problemas de saúde

Sim ( ) Não ( )

21. Qual(is) a(s) doença(s) que o(a) afastou do trabalho?

__________________________________________________________

22. Permaneceu quanto tempo afastado por esta doença?

Até 3 meses ( ) Entre 3 e 6 meses ( )

Entre 6 meses e 1 ano ( ) Acima de 1 ano ( )

23. Faz uso de bebida alcoólica?

Sim ( ) Não ( )

24. Já sofreu acidente de trabalho?

Sim ( ) Não ( )

25. Já sofreu acidente de trajeto?

Sim ( ) Não ( )

26. Conhece e/ou participa das ações de saúde oferecidas pela empresa

Sim ( ) Não ( ) Por quê?

27. Já adquiriu alguma doença relacionada ao trabalho?

Sim ( ) Não ( )

Qual(is): ___________________________________________________

28. Sofre de alguma doença crônica?

Sim ( ) Não ( )

Qual(is):___________________________________________________

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APÊNDICE 2 - ROTEIRO DE ENTREVISTA APLICADA AOS TRABALHADORES

OPERACIONAIS – GARIS (GRUPO 1)

1. Pedir ao entrevistado para ele discorrer sobre a trajetória dele na condição de trabalhador.

2. Pedir ao entrevistado para falar sobre como era tratada a saúde nos lugares onde trabalhou e

quais eram as atividades que desenvolvia.

3. Pedir ao entrevistado para ele discorrer como percebe/entende as questões sobre trabalho e

saúde que se mostram no espaço de trabalho que ele se encontra.

4. Pedir ao entrevistado para ele discorrer como identifica/percebe a realização das ações de

saúde no espaço de trabalho.

5. Pedir ao entrevistado para ele discorrer como identifica/reconhece a contribuição das ações

de saúde no espaço de trabalho.

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APÊNDICE 3 - ROTEIRO DE ENTREVISTA APLICADA AOS TÉCNICOS QUE

OPERACIONALIZAM AS AÇÕES PROPOSTAS PELA POLÍTICA (GRUPO 2)

1. Pedir ao entrevistado para ele discorrer sobre a trajetória dele na condição de trabalhador.

2. Pedir ao entrevistado para ele discorrer de que forma são operacionalizadas as ações de

saúde na Instituição.

3. Pedir ao entrevistado para ele discorrer sobre a percepção dele acerca da realização das

ações de saúde realizadas pela Instituição.

4. Pedir ao entrevistado para ele discorrer sobre o planejamento das ações de saúde que são

executadas pela Instituição.

5. Pedir ao entrevistado para ele discorrer sobre o que fundamenta a prática das ações de

saúde realizadas pela Instituição.

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APÊNDICE 4 - ROTEIRO DE ENTREVISTA APLICADA À CHEFIA IMEDIATA

(GRUPO 3)

1. Pedir ao entrevistado para ele discorrer sobre a trajetória dele na condição de

trabalhador.

2. Pedir ao entrevistado para ele discorrer sobre sua percepção acerca da relevância das ações

de saúde na rotina laboral dos trabalhadores operacionais.

3. Pedir ao entrevistado para ele discorrer sobre o processo educativo (ensino-aprendizagem)

que é proposto quando da operacionalização das ações de saúde.

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APÊNDICE 5 - ROTEIRO DE ENTREVISTA APLICADA À CHEFIA

INSTITUCIONAL (GRUPO 4)

1. Pedir ao entrevistado para ele discorrer sobre a trajetória dele na condição de trabalhador.

2. Pedir ao entrevistado para ele discorrer sobre sua percepção a respeito do processo de

implantação e implementação das ações de saúde do trabalhador.

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APÊNDICE 6 – CARTA AO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA UFC

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APÊNDICE 7 – CARTA DE ANUÊNCIA

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APÊNDICE 8 – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Você está sendo convidado(a) a participar da pesquisa intitulada “AVALIAÇÃO DAS

AÇÕES DE SAÚDE DO TRABALHADOR E SUAS REPERCUSSÕES PARA O

PROCESSO DE TRABALHO, sob a responsabilidade de Renata Lima da Costa, que tem

por objetivo a avaliação das ações de saúde do trabalhador, em conformidade com a Lei que

normatiza a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e suas repercussões para o processo

de trabalho dos atores envolvidos (trabalhadores operacionais – garis, gestores e demais

profissionais envolvidos com as ações de saúde), objetivando compreender quais os efeitos

destas ações na rotina de trabalho e na saúde destes trabalhadores.

A pesquisa justifica-se pelo grande desafio que o trabalhador contemporâneo enfrenta no

mundo do trabalho.

1. PARTICIPAÇÃO NA PESQUISA: Ao participar desta pesquisa você estará respondendo

um questionário, elaborado pela pesquisadora, bem como respondendo um roteiro de

entrevista específico. Lembramos que sua participação é voluntária, você tem a liberdade de

não querer participar, e pode desistir, em qualquer momento, podendo retirar o seu

consentimento, mesmo após ter iniciado o processo, sem nenhum prejuízo para você.

2. RISCOS E DESCONFORTOS: O(s) procedimento(s) utilizado(s) não implica(m) em

risco ou desconforto.

3. BENEFÍCIOS: Os benefícios esperados com o estudo são no sentido de dar visibilidade a

questão da saúde do trabalhador , promovendo melhor entendimento e articulação intersetorial

das políticas.

4. CONFIDENCIALIDADE: Todas as informações que o(a) Sr.(a) nos fornecer serão

utilizadas somente para pesquisa. Suas respostas e contribuições ficarão em segredo e o seu

nome não aparecerá em nenhum dos (as) questionários, gravações, entrevistas, nem quando os

resultados forem apresentados.

5. ESCLARECIMENTOS: Se você tiver alguma dúvida a respeito da pesquisa e/ou dos

métodos utilizados na mesma, pode procurar, a qualquer momento, a pesquisadora

responsável.

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Nome do pesquisador responsável: Renata Lima da Costa

Núcleo de Pesquisas e Estudos Regionais - NUPPER – UFC

Endereço: Rua Marechal Deodoro, s/n - Bairro: Benfica.

Fortaleza – Ceará CEP: 60.000

Telefone de contato: + 55 85 8851.2321

Horário de atendimento: 08h às 11h 14h às 16h

6.RESSARCIMENTO DAS DESPESAS: Caso aceite participar da pesquisa, não receberá

nenhuma compensação financeira.

ATENÇÃO: Se você tiver alguma consideração ou dúvida sobre a sua participação na

pesquisa entre em contato com o Comitê de Ética em Pesquisa da UFC – Rua Coronel Nunes

de Melo, 1127, Rodolfo Teófilo. Fone: 3366-8344.

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CONSENTIMENTO PÓS INFORMADO

Pelo presente instrumento que atende às exigências legais, o Sr.(a)

_____________________________________________, portador(a) da cédula de identidade

___________________________, declara que, após minuciosa leitura do TCLE, teve

oportunidade de fazer ´perguntas, esclarecer dúvidas que foram devidamente explicadas pelos

pesquisadores, esteve ciente dos serviços e procedimentos aos quais foi submetido e, não

restando quaisquer dúvidas a respeito do lido e explicado, firma-se CONSENTIMENTO

LIVRE E ESCLARECIDO em participar voluntariamente desta pesquisa. Declaro, ainda,

estar recebendo uma cópia assinada deste termo.

E, por estar de acordo, assina o presente termo.

Fortaleza, _______ de ________________________ de __________.

Nome do voluntário:__________________________________________

_____________________________________________________

Assinatura do voluntário

Nome do pesquisador: RENATA LIMA DA COSTA

____________________________________________________________

RENATA LIMA DA COSTA

Nome da testemunha:___________________________________________

_______________________________________________________________

Assinatura da testemunha (Se o voluntário não souber ler)

Nome do profissional que aplicou o TCLE:______________________________

____________________________________________________

Assinatura do profissional que aplicou o TCLE