UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o...

293
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE SILVA DO CARMO DISSECANDO O ORNITORRINCO: A CRÔNICA MEXICANA CONTEMPORÂNEA DE JUAN VILLORO RIO DE JANEIRO 2017

Transcript of UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o...

Page 1: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

SIMONE SILVA DO CARMO

DISSECANDO O ORNITORRINCO: A CRÔNICA MEXICANA

CONTEMPORÂNEA DE JUAN VILLORO

RIO DE JANEIRO

2017

Page 2: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

Simone Silva do Carmo

Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de

Juan Villoro

Tese de Doutorado apresentada ao

Programa de Pós-graduação em Letras

Neolatinas da Universidade Federal do

Rio de Janeiro como parte dos quesitos

para obtenção do Título de Doutora em

Letras Neolatinas Estudos Literários

Neolatinos – Opção: Literaturas

hispânicas.

Orientador: Professor Doutor Víctor

Manuel Ramos Lemus.

Rio de Janeiro

Agosto de 2017

Page 3: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

DISSECANDO O ORNITORRINCO: A CRÔNICA MEXICANA

CONTEMPORÂNEA DE JUAN VILLORO

Simone Silva do Carmo

Orientador: Professor Doutor Victor Manuel Ramos Lemus

Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Neolatinas

da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos

necessários para a obtenção do título de Doutora em Letras Neolatinas (Estudos

Literários Neolatinos – Opção: Literaturas hispânicas).

Aprovada por:

Presidente, Professor Doutor Victor Manuel Ramos Lemus – UFRJ – Estudos

Literários Neolatinos.

Professor Doutor Luís Alberto Nogueira Alves – UFRJ – Ciência da Literatura

Professor Doutor Rodrigo Fernández Labriola – UFF – Estudos da Literatura

Professora Doutora Silvia Inés Cárcamo de Arcuri – UFRJ – Estudos Literários

Neolatinos

Professor Doutor João Roberto Maia da Cruz – Fundação Oswaldo Cruz

Professor Doutor Ary Pimentel – UFRJ - Estudos Literários Neolatinos (Suplente)

Professor Doutor Renato Nogueira dos Santos Júnior – UFRRJ – Pós-graduação

contextos contemporâneos e demandas populares – PPGEDUc (Suplente)

Page 4: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

FICHA CATALOGRÁFICA

Page 5: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

Ao meu Deus do impossível, meu eterno

companheiro, que, ao longo dos anos, vem me

colocando à prova na superação das

dificuldades da vida. Obrigada por me permitir

cumprir mais essa etapa de minha jornada!

Page 6: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

Aos meus amores, Luís Paulo, Paulo

Vinícius e Nycollas Henrique, pela

compreensão de tanta ausência, pelo carinho

constante, sempre me encorajando, me

incentivando e não me deixando fraquejar na

busca da realização deste sonho. Muito

obrigada por completarem minha vida e

serenarem meu ser. Amo vocês! A vitória é

nossa!

Page 7: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

AGRADECIMENTOS

A meu pai, Diorge (in memoriam) e minha mãe, Maria Lúcia que na

modéstia do saber fizeram tantos sacrifícios para que eu chegasse até aqui. À minha avó, Altiva, amiga, confidente, mulher de coragem e profunda

sabedoria da vida. Aos meus irmãos, cunhados, sobrinhos, nora, todos os familiares e

amigos, pelo carinho e incentivo constante. Ao Professor Doutor Víctor Manuel Ramos Lemus pela sábia leitura,

paciência, tempo, tolerância, colaboração e conhecimento disponibilizado tão generosamente durante esses oito anos, desde a especialização. Nunca pensei que fosse capaz de chegar tão longe. Sei que minha caminhada continua, mas o percurso até aqui foi menos árduo por sua dedicação de professor e pesquisador. ¡Gracias por su amistad!

Aos meus amigos do grupo pesquisa da Pós-Graduação da UFRJ:

Professora Doutora Sylvia Helena de Carvalho Arcuri e Professor Doutor Tarciso Gomes do Rego que sempre estiveram dispostos a me ajudar, encorajando-me nas horas de desânimo. Sem vocês não teria conseguido. Obrigada por tudo!

À Banca de Qualificação, Ary Pimentel e Rodrigo Fernández Labriola,

pela leitura precisa e fundamental para o término desta pesquisa. A todo corpo docente e demais profissionais do Programa de Pós-

graduação em Letras Neolatinas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, que contribuíram para a realização de meus estudos.

À Professora Doutora Silvia Inés Cárcamo de Arcuri, ao Professor

Doutor Rodrigo Fernández Labriola, ao Professor Doutor João Roberto Maia da Cruz e ao Professor Doutor Luís Alberto Nogueira Alves, por terem gentilmente aceitado participar de minha banca.

A todos os servidores do Instituto Federal de Educação, Ciência e

Tecnologia do Amazonas (IFAM), que contribuíram para a conclusão desse Curso de Doutorado nas pessoas do Reitor Antônio Venâncio Castelo Branco, Pró-reitor de Ensino António Ribeiro da Costa Neto, Pró-reitor de Pesquisa José Pinheiro de Queiroz Neto, Diretora Sistêmica de Ensino Lívia de Souza Camurça Lima e ao Diretor Geral do Campus Humaitá Jorge Nunes Pereira, meus sinceros agradecimentos.

A todos os meus companheiros de trabalho e alunos do IFAM/Campus

Humaitá, obrigada pela compreensão. E, a todos aqueles que me permitiram prosseguir e concluir esse estudo.

Page 8: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

A estrada (Lazão/da Gama/Toni Garrido /Bino Farias)

Você não sabe o quanto

eu caminhei

Pra chegar até aqui

Percorri milhas e milhas

antes de dormir

Eu não cochilei.

Page 9: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

SINOPSE

Análise da produção cronística de Juan Villoro, tendo

como eixo de leitura os textos que compõem: Tiempo

transcurrido: crónicas imaginarias (1986), Los once de la

tribu: crónicas (1995), Safari accidental (2005) e Dios es

redondo (2006), com o enfoque na caracterização da

crônica como um gênero estrutural do projeto de escrita

do autor. A centralidade dada por Villoro à crônica,

demonstra que esse gênero contribui para um debate

atual sobre a literatura, pois revela que se trata de uma

interpretação da realidade.

Page 10: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

RESUMO

CARMO, Simone Silva do. Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana

contemporânea de Juan Villoro. Rio de Janeiro, 2017. Tese de Doutorado

em Letras Neolatinas (Área de concentração: Estudos Literários – Opção:

Literaturas Hispânicas) do Programa de Pós-graduação em Letras Neolatinas

da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ.

A presente tese propõe o estudo e a análise da produção cronística do

escritor mexicano Juan Villoro a partir dos textos que compõem: Tiempo

transcurrido: crónicas imaginarias (1986), Los once de latribu: crónicas

(1995), Safari accidental (2005) e Dios es redondo (2006), com o enfoque na

caracterização da crônica como um gênero estrutural do projeto de escrita do

autor. Essas obras compreendem um período do processo histórico, cultural e

literário mexicano da década de 1970 até os anos de 2000. Nesse intervalo,

observou-se, naquele país, além do aumento significativo da crônica como

gênero, a expansão dos meios massivos de comunicação. Villoro, herdeiro da

geração que impulsionou a crônica no México, recebeu influência de diversas

correntes, como os Modernistas, os Contemporáneos, a Generación del Medio

del Siglo, a geração do boom da literatura hispano-americana e o Novo

Jornalismo. A partir disso, este estudo tenta demonstrar que a centralidade

dada por Villoro à crônica em seu projeto de escrita serve para demonstrar a

importância da mesma para debater literatura, dado que é um gênero que

compartilha em muitos aspectos e características com o conto, o ensaio, o

teatro, a reportagem e o relato entre outros, destacando que, por seu caráter

híbrido, o cronista foi levado a utilizar uma metáfora, intitulando a crônica como

o “ornitorrinco da prosa”. Além disso, este estudo demonstra que o autor utiliza

diversos recursos estilísticos para compor seus textos, destacando, dentre os

quais: a ironia, o humor e o aforismo. Ao mesmo tempo, ele introduz temas

contemporâneos, tais como: a violência urbana, a expansão do narcotráfico e

sua reflexão sobre os limites entre “alta” e “baixa” cultura, por isso a ênfase no

futebol e no rock. A importância que Villoro dá à crônica em seu projeto de

escrita ocorre porque esse gênero contribui para um debate atual sobre a

literatura, pois revela, pela inserção de elementos ficcionais e não ficcionais,

que se trata de uma interpretação da realidade. Para auxiliar na construção

desse pensamento, fez-se necessária uma pesquisa apurada e o uso de

discussões apresentadas por alguns teóricos, que se articularão com a análise

das obras, dentre os quais: Susana Rotker, Julio Ramos, Carlos Monsiváis,

Linda Egan, Martin Caparrós e Darío Jaramillo Agudelo.

Palavras-chave: Juan Villoro - Literatura Mexicana Contemporânea – Crônica – Cultura de massa.

Page 11: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

RESUMEN

CARMO, Simone Silva do. Disecando el ornitorrinco: la crónica mexicana

contemporánea de Juan Villoro. Río de Janeiro, 2017. Tesis Doctoral en

Letras Neolatinas (Área de concentración: Estudios Literarios – Opción:

Literaturas Hispánicas) del Programa de Postgrado en Letras Neolatinas de la

Facultad de Letras da Universidad Federal do Río de Janeiro - UFRJ.

Esta tese de doctorado propone el estudio y análisis de la producción

cronística del escritor mexicano Juan Villoro desde los textos que

componen: Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias (1986), Los once de la

tribu: crónicas (1995), Safari accidental (2005) y Dios es redondo (2006), con el

enfoque en la caracterización de la crónica como un género estrutural del

proyecto de escritura del autor. Esas obras comprenden un período del proceso

histórico, cultural y literario mexicano de la década de 1970 hasta los años de

2000. En ese intervalo, se observó, en aquel país, además del aumento

significativo del género crónica, la expansión de los medios masivos de

comunicación. Villoro, heredero de la generación que impulsó la crónica en

México, recibió influencia de diversas corrientes, como los Modernistas, los

Contemporáneos, de la Generación del Medio del Siglo, de la generación del

boom de la literatura hispanoamericana y del Nuevo Periodismo. Desde ahí,

este estudio intentará demonstrar que la centralidad dada por Villoro a la

crónica en su proyecto de escritura sirve para demonstrar la importancia de la

misma para debatir literatura, dado que es un género que comparte en muchos

aspectos y características con el cuento, el ensayo, el teatro, el reportaje, el

relato entre otros y que por su carácter híbrido llevó el cronista a utilizar la

metáfora, intitulando la crónica como el “ornitorrinco de la prosa”. Además, este

estudio demonstra que el autor utiliza diversos recursos estilísticos para

componer sus textos, entre los que cabe destacar: la ironía, el humor y el

aforismo, al mismo tiempo que introduce temas contemporáneos tales como: la

violencia urbana, la expansión del narcotráfico y su reflexión sobre los límites

entre “alta” y “baja” cultura, por lo que el énfase en el fútbol y el rock. La

importancia que Villoro da la crónica en su proyecto de escritura ocurre porque

ese género contribuye a un debate actual sobre la literatura, pues revela, por la

inserción de elementos ficcionales y no ficcionales que se trata de una

interpretación de la realidad. Para ayudar en la construcción de ese

pensamiento, se hizo necesario una investigación apurada y el uso de

discusiones presentadas por algunos teóricos que se articularán con el análisis

de las obras, entre ellos: Susana Rotker, Julio Ramos, Carlos Monsiváis, Linda

Egan, Martin Caparrós, Darío Jaramillo Agudelo entre otros.

Palabras-clave: Juan Villoro, Literatura Mexicana Contemporánea, Crónica,

Cultura de masa.

Page 12: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

ABSTRACT

CARMO, Simone Silva do. Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro. Rio de Janeiro, 2017. Tese de Doutorado em Letras Neolatinas (Área de concentração: Estudos Literários – Opção: Literaturas Hispânicas) do Programa de Pós-graduação em Letras Neolatinas da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ.

This thesis proposes the study and the analysis of the chronological

production of the Mexican writer Juan Villoro from the texts that compose:

Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias (1986), Los once de latribu: crónicas

(1995), Safari accidental (2005) and Dios es redondo (2006), with the focus on

the characterization of the chronic as a structural genre of the author's writing

project. These works comprise a period of the Mexican historical, cultural, and

literary process from the 1970s to the 2000s. In this interval, it was observed the

significant increase of the chronicle as a genre and the expansion of the mass

media. Villoro, heir of the generation that developed the chronicle in Mexico,

was influenced by several currents, such as the Modernists, the

Contemporáneos, the Generación del Medio del Siglo, the generation of the

boom of Hispanic American literature and the New Journalism. From this, this

study will try to demonstrate that the centrality given by Villoro to the chronicle

in his writing project serves to demonstrate the importance of the same to

discuss literature, since it is a genre that shares, in many aspects and

characteristics, with the tale, the essay , the theater, the report and the story

among others, emphasizing that, because of its hybrid character, the chronicler

was led to use a metaphor, calling the chronicle the "platypus of prose." In

addition, this study will demonstrate that the author uses several stylistic

resources to compose his texts, highlighting, among them: irony, humor and

aphorism. At the same time, he introduces contemporary themes, such as

urban violence, the expansion of drug trafficking and his reflection on the

boundaries between "high" and "low" culture, so the emphasis on football and

rock. The importance that Villoro gives to the chronicle in his writing project

occurs because this genre contributes to a current debate about literature,

because it reveals, through the insertion of fictional and non-fictional elements,

that it is an interpretation of reality. In order to assist in the construction of this

thought, it will be used a detailed research and discussions presented by some

theorists, that will be articulated with the analysis of the works, such as: Susana

Rotker, Julio Ramos, Carlos Monsiváis, Linda Egan, Martin Caparrós and Darío

Jaramillo Agudelo.

Keywords: Juan Villoro - Contemporary Mexican Literature - Chronicle - Mass Culture.

Page 13: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................14 I – JUAN VILLORO E A CRÔNICA MEXICANA .............................................28 1.1 Juan Villoro: o cronista de ideias ..............................................................28 1.2 A linguagem cronística de Juan Villoro .......................................................45

1.2.1 Ironia e humor: uma forma de resistência .......................................46

1.2.2 Aforismos: um estudo liminar ...........................................................58 II. HISTÓRIA E ATUALIDADE DA CRÔNICA ...............................................69 2.1 Reflexões teórico-crítica sobre a crônica mexicana ...................................70

2.2 Para uma estética da crônica na atualidade ...............................................86

2.2.1 Escritores, leitores e mercado cronístico.............................................108

III. CRÔNICA E CULTURA ............................................................................131 3.1 Discussões sobre crônica e cultura de massa ..........................................131 3.2 México: paisagem do pós-apocalipse .......................................................139 3.2.1 DCMX: uma estética do fragmento .....................................................166 3.3 Rock e futebol: o massivo nas crônicas de Juan Villoro............................179 IV. CRÔNICA: O ORNITORRINCO DA PROSA ............................................203 4.2 Crônica: caminhos fronteiriços ..................................................................203 4.2.1 O ornitorrinco da prosa: ficção e realidade .........................................220 CONCLUSÃO …............................................................................................237 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................245 ANEXOS..........................................................................................................284

Page 14: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

14

INTRODUÇÃO

¿Por qué el sitio tan marginal de la crónica en nuestra historia literaria? Ni el enorme prestigio de la poesía, ni la seducción omnipresente de la novela, son explicaciones suficientes del desdén casi absoluto por un género tan importante en las relaciones entre literatura y sociedad, entre historia y vida cotidiana, entre lector y formación del gusto literario, entre información y amenidad, entre testimonio y materia prima de la ficción, entre periodismo y proyecto de nación

1.

Carlos Monsiváis

Escribir sobre la crónica, insistir sobre la crónica... ¿Después de Darío y Morris? ¿Después de José Martí, Victor Segalen, Joseph Roth, José Gutiérrez Solana, Josep Pla, Rodolfo Walsh, George Weller, Truman Capote, Gabriel García Márquez, Hunter S. Thompson, Nicolas Bouvier, Elena Poniatowska, Carlos Monsiváis, Ryszard Kapuściński, Juan Goytisolo, Oriana Fallaci o Gay Talese? ¿Después de casi cien años de premios Pulitzer? ¿De revistas como The New Yorker que publican reportajes de investigación y ensayos literarios desde 1925? ¿De libros teóricos como La invención de la crónica, de Susana Rotker, o Literatura y periodismo, de Albert Chillón? ¿Después de los grandes fotoperiodistas y documentalistas cinematográficos y televisivos? ¿Todavía?

Más que nunca. No sólo porque es ésa la dinámica de la tradición artística: la constante relectura, la reescritura constante (cada cronista vuelve a visitar y a reformular los temas, los espacios, las estrategias narrativas de sus predecesores, sumándoles su propio pacto ético y su propia vuelta de tuerca estética); sobre todo porque la Historia avanza como un tanque y cada presente reclama sus testigos, sus intérpretes, sus cronistas

2.

Jorge Carrión

Esta tese, cuja abordagem se volta para as crônicas do escritor

mexicano Juan Villoro, está centrada nos textos que compõem: Tiempo

transcurrido: crónicas imaginarias, Los once de la tribu: crónicas, Safari

accidental e Dios es redondo, publicadas entre em 1986 e 2006. Através da

análise dessas obras, que compreendem um período do processo histórico,

cultural e literário mexicano, se observa que a situação social daquele país é

abordada por meio de um registro que não é estritamente informativo, mas que

1Fragmento do texto de Carlos Monsiváis em “De la Santa Doctrina al Espíritu Público (Sobre

las funciones de la crónica en México)”. Publicada en la Nueva Revista de Filología Hispánica, 1987, p. 753. 2Trecho do prólogo de Jorge Carrión em Mejor que ficción: crónicas ejemplares. Barcelona:

Editorial Anagrama, 2012, pp.13-14.

Page 15: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

15

procura dar conta da vida cotidiana, colocando os assuntos e agentes

marginais como centro de sua temática, por meio de um gênero híbrido entre

literatura e jornalismo, ficção e não ficção, que desafia definições estabelecidas

e promove uma reflexão sobre o caráter literário e não literário de seus textos:

a crônica.

Este gênero heterogêneo, que aqui se referirá como “a crônica mexicana

atual”3 foi negligenciada e marginalizada por parte da crítica ao longo de quase

todo o século XX. No entanto, observa-se também, que a história literária, nos

últimos anos, tem tentado responder ou pelo menos refletir a respeito do

desafio lançado por Carlos Monsiváis na epígrafe, no final da década 1980.

Durante muitos anos, Monsiváis, considerado o cronista mexicano mais

destacado e um dos maiores estudiosos do gênero no país nas últimas

décadas, solicitou à comunidade literária que tomasse a crônica com a

seriedade dos gêneros canônicos, já que, em se tratando de México “La poesía

lo es todo” (MONSIVÁIS, 1976, p. 357), ainda mais que o romance. Ele notou

que esse fato era devido aos vínculos entre a cultura oral predominante no

país, a persistente religiosidade e o privilégio concedido ao gênero poético,

que, com frequência, invadiu a prosa.

É importante considerar também que há romances clássicos da literatura

mexicana, cuja leitura se pode perceber características da crônica, como

ocorre em El Periquillo Sarmiento (1816) de José Joaquín Fernández de

Lizardi; Los bandidos de Río Frío (1889-1891) publicada por entrega em

folhetim de Manuel Payno; El Zarco (1901) de Ignacio Manuel Altamirano e Los

de abajo (1916) de Mariano Azuela.

Na tradição literária mexicana há cronistas relevantes desde o

Modernismo4, como Manuel Gutiérrez Nájera, Amado Nervo, Ramón López

Velarde e Juan José Tablada, os quais, utilizando recursos do jornalismo e da

ficção, que haviam penetrado em sua poesia, formaram-se escrevendo

3 O que Carlos Monsiváis chama de “nueva crónica”, Egan denomina “la crónica actual de

México” (EGAN, 2004, p.24). Nessa pesquisa se utilizará a denominação de Egan com o intuito de valorizar o caráter literário do gênero nos escritos de Juan Villoro. 4 A expressão modernismo nesta tese, refere-se ao Modernismo Hispano-americano

compreendido no período entre 1880-1920. Tendo como expoentes: José Martí, Julián del Casal, Manuel Gutiérrez Nájera, Salvador Díaz Mirón, Enrique Gómez Carrillo, Manuel González Prada, Amado Nervo, José Asunción Silva, Rubén Darío, entre outros.

Page 16: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

16

crônicas para jornais. Afinal, naquele momento, os escritores mais destacados

não eram romancistas, mas poetas. Ou seja, acontecia um movimento em que

o popular, o massivo, aquilo que era feito para ser publicado e consumido de

forma efêmera passou para a literatura considerada elitista, pois “cada

presente tiene un pasado que le es propio y toda historia es opinión” (ROTKER,

2005, p. 19). Assim, os critérios empregados pela crítica literária em uma

determinada época levaram em consideração uma gama de características e

argumentos específicos em detrimento de outros, pois a marginalização de um

determinado estilo ou gênero literário, algumas vezes, atende a um critério

subjetivo.

Mesmo com a dedicação dos modernistas à crônica, ao longo do século

XX, esse gênero, no México, não ocupou o centro das atenções no meio

literário, permanecendo à margem. É provável que um dos fatores que

contribuíram para isso tenha sido o carácter hegemônico do conceito de

literatura do Modernismo, ou seja, literatura como sinônimo de ficção, pois a

concepção de literatura era muito restrita, uma vez que “todo lo que no pasaba

por el libro no era literatura y todo aquello que pasaba por otros soportes no

entraba en la foto” (SASTURAIN apud VILLORO y SASTURAIN, 2014, p.2).

A partir dos anos finais da década de 1960, esse conceito de literatura

começa a ser questionado entre os escritores, aproximando-se de uma ideia

cujo objetivo era romper com esse conceito, considerado por eles como

tradicional. Impulsionado provavelmente pelo que Edgar Morin (2011)

denomina a Terceira Cultura, ou mass-culture, ou mass-media, pois segundo

ele, a intelligentsia literária daquele momento é despojada pelo advento cultural

no qual a criação é dessacralizada e desmantelada a concepção de cultura, de

arte, de literatura, pois “Tudo parece opor a cultura dos cultos à cultura de

massa: qualidade à quantidade, criação à produção, espiritualidade ao

materialismo, estética à mercadoria, elegância à grosseria, saber à ignorância”

(MORIN, 2011, p.8).

No México, além da evolução dos meios massivos de comunicação,

outros fatores contribuíram para a valorização da crônica, como a exposição

contínua de esportes populares, como o futebol, por exemplo, e fatos políticos

marcantes, como o massacre de Tlatelolco ocorrido em 1968, manifestações

Page 17: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

17

da sociedade civil, como as reivindicações de professores e de operários, as

explosões nas instalações da PEMEX em San Juanico e o terremoto de 1985

na Cidade do México. Esses acontecimentos fizeram com que esse tipo de

texto se inserisse com mais vigor no cotidiano.

É importante ressaltar que já havia a circulação de gêneros

considerados menores, como o folhetim, o romance policial, as histórias em

quadrinhos e autores que valorizaram e acentuaram a presença da oralidade

como Luis Spota, José Alvarado, Renato Leduc, entre outros. Entretanto, a

partir desse período, há uma proliferação de autores que dialogam com a

cultura divulgada nos meios massivos de comunicação e é

En este punto es que ingresa otro factor significativo: si el pensamiento de izquierda consiste en el análisis de las circunstancias políticas y culturales de la nación en el sentido amplio y si las herramientas teóricas son insuficientes, es necesario el desarrollo de un nuevo género crítico, lo que será conocido como “la crónica” (SÁNCHEZ-PRADO, 2006, p. 335).

Nesse (re) surgimento da crônica no México, destacam-se então Carlos

Monsiváis, Elena Poniatowiska, José Emilio Pacheco, Vicente Leñero e Jorge

Ibargüengoitia, que, com seus estilos individuais de escrita e diversidade

ideológica, utilizaram a crônica como “modus literário” para dar conta da

realidade num momento de transformações políticas, sociais e culturais

importantes.

Percebe-se que nesses autores não existe esse ou aquele tema, mas

aflora uma consciência de que os escritores podem abordar temas que

envolvam política e literatura, economia e literatura, sociologia e literatura.

Autores que questionam a respeito de qual seria o lugar da literatura. Juan

Villoro, que pertence à geração posterior a que impulsionou a crônica no

México, é certamente um desses. Talvez por isso, ele evidencie em seus textos

formas culturais que questionam os limites entre alta e baixa cultura e

centralize sua escrita num gênero híbrido como a crônica.

A partir do exposto, esta tese propõe o estudo e a análise dos textos que

compõem as obras: Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias (1986), Los once

de la tribu: crónicas (1995), Safari accidental (2005) e Dios es redondo (2006),

Page 18: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

18

do escritor mexicano Juan Villoro, com o enfoque na caracterização da crônica

como um gênero literário estrutural do projeto de escrita desse autor.

Ao selecionar esse corpus, que compreende um arco do processo

histórico, literário e cultural mexicano dos anos finais da década de 1970 até os

primeiros de 2000, evidencia-se o objetivo de apresentar uma amostra

representativa da produção cronística do autor dentro de um intervalo de tempo

que abarca mudanças importantes na sociedade mexicana e que foram

abordadas pelas crônicas de Villoro. É pertinente ressaltar que o movimento

estudantil de 1968, é um marco importante, como um divisor de águas capaz

de contribuir para a retomada da crônica como um meio de criticar a realidade

social naquele país.

Seria audacioso pretender analisar todas as crônicas ou todas as

coletâneas de crônicas de Juan Villoro, que são nove até o momento, não

apenas por serem muito extensas, mas por estarem dispersas. Sendo assim,

fez-se a opção por crônicas compiladas em formato de livro, e tal ocorre devido

à dificuldade para reunir textos publicados em diferentes meios. Far-se-á

referência a outras crônicas e ensaios ao longo do trabalho, incluídas na

bibliografia, procurando manejar uma estrutura livre que permitirá deter-se em

diferentes textos e obras com o intuito de contribuir para a análise do corpus,

de acordo com o tema abordado.

Juan Villoro iniciou sua história literária escrevendo contos e crônicas

nos finais da década de 1970. O início de sua escrita como cronista se dá

quando foi convidado para escrever crítica de rock no suplemento Sábado do

jornal Unomásuno, como declara no prólogo de Los once de la tribu: “Así se

inició mi trayectoria por las aguas de la crónica” (VILLORO, 1998, p.9). Nesse

período, Villoro se torna também roteirista radiofônico do programa El lado

oscuro de la luna na Rádio Educação. Foi cronista de futebol de várias Copas

do Mundo; escritor premiado de obras infanto-juvenis; autor dos romances El

disparo de argón (1991), Materia dispuesta (1997) El testigo (2004) e Arrecife

(2012b); dos livros de contos La noche navegable (1980), Albercas (1985), La

alcoba dormida (1992), La casa pierde (1999) e Los culpables (2007); roteirista

dos filmes El mapa movedizo e Vivir mata; autor das peças de teatro Muerte

parcial, El filósofo declara, Filosofia de Vida e Conferencia sobre la lluvia; além

Page 19: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

19

de roteirista do livro de fotografias Migraciones, de Sebastião Salgado e El

suplicante – México 1971-2007, de Paolo Gasparini. Villoro já declarou em

entrevistas que o substrato massivo que primeiro influenciou sua escrita foram

as narrações de futebol do cronista Ángel Fernández “el locutor que renovó el

imaginario del fútbol y decidió mi vocación por la palabra” (VILLORO, 2006b, p.

218).

Desde o começo de sua trajetória, Villoro vai dando-se conta da

importância da crônica na construção de sua escrita. Em sua obra cronística, a

cultura divulgada nos meios massivos de comunicação é utilizada de forma

crítica. O autor demonstra que a importância da leitura de textos canônicos

como Hamlet, de William Shakespeare ou Don Quijote, de Miguel Cervantes,

chegam até as camadas mais simples de uma sociedade através das

telenovelas, das histórias em quadrinhos, do romance policial, dos livros de

bolso e dos filmes de gênero B. Ele ressalta através de suas crônicas que o

contato com o popular e com o massivo não desmerece a obra de um autor

diante da crítica, pois um escritor nutre sua narrativa de elementos de sua

época.

Villoro inicia sua produção literária num momento historicamente

complexo, devido às consequências do Massacre de Tlatelolco ocorrido em

1968, quando se faz questionamentos que interrogam sobre o “fim da

Revolução Mexicana” e da “filosofia do ser mexicano”, temas que aparecem em

toda sua obra e, principalmente, em suas crônicas. A “filosofia do ser

mexicano” se caracteriza pela busca do “ser nacional”, o qual esteve a cargo

do grupo Hiperión5 formado por estudantes mexicanos sob a influência do

filósofo espanhol José Gaos por volta de 1947 e encabeçado por Leopoldo Zea

e Luis Villoro (pai do escritor do qual se ocupa essa pesquisa), entre outros.

A busca do “ser nacional” ou da “”identidade nacional” aparece na

literatura mexicana desde os anos finais do século XIX, intensificando até a

primeira metade do XX. No caso de Villoro, talvez o que o tenha levado a

5Hiperión é a figura menor da Titanomaquia grega que foi recuperado com particular

intensidade durante o romantismo e, com clara filiação germânica, sobretudo de Hegel e Dilthey. Além dos dois membros mencionados pode-se destacar também Emilio Uranga, Joaquín Sánchez MacGregor, Ricardo Guerra e Jorge Portilla (SÁNCHEZ-PRADO, 2006, p. 191).

Page 20: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

20

recorrer a esse elemento sejam as condições da vida no país durante esse

período, época de grandes transformações culturais, políticas e econômicas,

pois recebeu o impacto do auge e do colapso do Desenvolvimentismo surgido

nos anos 40 e 50, o aumento da vida urbana em que as heranças da cultura

promovida desde o Estado (e que se baseavam nos signos da Revolução

Mexicana e na discussão sobre “o nacional”), se veem complementadas e

contestadas pela contracultura. Nesses anos, as pressões sindicais, operárias

e estudantis convergem no emblemático 2 de outubro de 1968 e o massacre

dos estudantes na Plaza de lasTres Culturas, em Tlatelolco. As tensões não

resolvidas nesse período desembocam nos anos 70.

Os debates sobre a mexicanidade, que nos anos cinquenta foram

incorporadas à expressão cultural, ou melhor, na força do projeto hegemônico

do nacionalismo e no contexto do campo do poder, foram retomados por Juan

Villoro em sua escrita, e, na medida em que ocorre a identificação dos

mexicanos com a imagem de si mesmos no cinema, na literatura e na música

popular, essa foi a maneira através da qual o poder do Estado pôde neutralizar,

de forma bastante eficiente, a resistência. E é contra essa filosofia do “ser

mexicano” que ele se “rebela”, como deixa claro na entrevista Villoro en Villoro

Cuando yo empecé a escribir y leer por mi cuenta había una saturación de autodefinición nacionalista y creo que buena parte de las cosas que yo he escrito han sido un ejercicio de ironizar y de desmontar esos procesos. Creo que el camino que va de 1950 con el Laberinto de la soledad a fines del siglo veinte con la Jaula de la melancolía de Roger Bartra es el camino para entender que el mexicano es múltiple, es híbrido es provisional, que no hay un mexicano emanante […] todas las escrituras de mis cuentos, de mis novelas y de mis ensayos tienen que ver con ese proceso de desmontaje de una identidad unívoca y de una identidad retórica […] (VILLORO, 2009d, p. 1).

Esse processo a que se refere Villoro na entrevista, o de questionar

através de seus textos o discurso essencialista sobre a busca da “identidade

nacional mexicana”, aparece em muitos escritores de sua geração, ou seja, a

dos nascidos no México nos anos cinquenta e que receberam influência da

Generación de la Casa del Lago e dos escritores da Onda.

Page 21: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

21

Villoro lê com muita atenção a tradição literária mexicana. E essas

referências podem ser percebidas em suas crônicas, pois convoca

constantemente obras e escritores paradigmáticos. Entretanto, esse autor

contribui para a reformulação do debate sobre o “ser nacional” e procura

abordar temas que envolvam a “alta” e a “baixa” cultura com a mesma

desenvoltura, tecendo autores e textos da tradição literária em uma prosa

elaborada que abarca o futebol e o rock. Por isso, para José Ramón

Ruisánchez, Villoro é herdeiro de três vertentes mexicanas:

primero, la que va de la novela de la Revolución a Carlos Fuentes, releyendo productivamente a Rulfo; en segundo lugar, el canon que recupera la manera heterodoxa de los Contemporáneos por medio de la Generación de la Casa del Lago y de sus excursiones a literaturas “marginales” que permiten regresar a la novela y al cuento desde la riqueza de una ruptura con el género rígido, lo que llamaron “escritura” siguiendo a los teóricos franceses de la écriture; finalmente, el atrevimiento progresista que bebe por una parte de las grandes narraciones sociales del 68 y del 85 y, por otra, de los hallazgos pop de la Onda (RUISÁNCHEZ, 2008, p. 144).

A Generación de la Casa del Lago6 ou Generación del Medio del Siglo

apresenta uma postura contrária às tendências nacionalistas dos anos

quarenta, sustentada pelos questionamentos dos pressupostos da Revolução

Mexicana e pela denúncia das promessas não cumpridas por parte do governo.

Essa geração composta por escritores como Inés Arredondo, Tomás Segovia,

Huberto Batis, Juan García Ponce, Juan Vicente Melo, Salvador Elizondo,

Carlos Monsiváis, Sergio Pitol, Jorge Ibargüengoitia, José Emilio Pacheco,

entre outros, que não somente desenvolveram obras próprias, mas um

destacado trabalho de crítica em diferentes campos (teatro, cinema, pintura,

música, romance, ensaio, crônica e poesia), além da participação em diversas

instituições culturais, como el Centro Mexicano de Escritores; nas Revista

Mexicana de Literatura (RML), Cuadernos del Viento, S.Nob e La palabra y el

hombre; nos suplementos "México en la Cultura" (do jornal Novedades) e "La

Cultura en México" (da revista Siempre!). É importante mencionar também o

apoio que receberam de diversas editorias, como a “Imprenta Universitaria de

la UNAM, Era, Empresas Editoriales, Joaquín Mortiz, el Fondo de Cultura

6 Essa geração recebe esse nome inspirada no primeiro centro cultural da UNAM situado fora

do campus universitário, fundado em 1959, tendo como diretor e fundador Juan José Arreola (ALBARRÁN, 1998, pp.1-7).

Page 22: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

22

Económica (FCE) y la editorial de la Universidad Veracruzana” (ALBARRÁN,

1998, p.1), para citar alguns exemplos.

Na década de 1960, surgiu um movimento literário no México,

considerado em muitos aspectos como contracultural, denominado em sentido

pejorativo de Literatura de la Onda por Margo Glantz. Através de seus textos,

escritores demonstravam desacordo com o regime autoritário do Partido

Revolucionario Institucional (PRI), utilizando temas como: o rock and roll, a

Guerra do Vietnã, o sexo, as drogas entre outros. Seus integrantes mais

destacados foram: José Agustín, Gustavo Sainz e Parménides García Saldaña.

Ambos os movimentos tiveram influência na prosa cronística de Villoro

através dos temas que envolvem a cultura divulgada nos meios massivos de

comunicação; da prosa elaborada, irônica, repleta de humor e sátira; dos meios

utilizados para a publicação de seus textos, pois, das quatro obras que

compõem o corpus, uma foi publicado pela primeira vez em Fondo de Cultura

Económica (Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias), e a outra em Joaquín

Mortiz (Safari accidental), além de que, na sua composição cronística, podem-

se perceber a influência de José Emilio Pacheco, Jorge Ibargüengoitia, Carlos

Monsiváis, José Agustín entre outros.

Villoro discute, através de suas crônicas, a modernidade do país. No

entanto, observa-se a rejeição do termo “pós-modernidade”, utilizado por

alguns críticos a partir dos últimos anos do século passado, optando pela

expressão em chave irônica: “pós-apocalipse”. Esse termo é tomado

emprestado pelo cronista da obra Los rituales del caos (1995), de Carlos

Monsiváis, na qual ele denomina “México, ciudad post-apocalíptica”

(MONSIVÁIS, 1995, p. 21, grifo do autor).

Em uma paráfrase das ideias de Monsiváis e do título de Alfred

Hitchcock em Vértigo7, filme de 1958, que Villoro apresenta, posteriormente,

em seu ensaio, “El vértigo horizontal. La Ciudad de México como texto”

(2002a), esse autor demonstra preocupação com os conflitos gerados pela

busca da identidade do ser nacional, vistos através do espaço urbano da

megalópole, que é o Distrito Federal. Ele transfere ao espaço textual as

7 No Brasil esse filme foi traduzido com o título “O corpo que cai”.

Page 23: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

23

dinâmicas e os conflitos inerentes do mundo contemporâneo, testemunhando a

novidade do presente e preservando as características essenciais da

modernidade: o fugitivo, o transitório e o contingente.

As obras corpus estão compostas de prólogos que, além de

apresentarem a obra, também discutem a crônica como gênero. Observa-se

que os textos têm como fio condutor a cultura divulgada nos meios massivos

de comunicação, utilizada como meio para discutir o consumo global e a

cultura contemporânea.

Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias, seu primeiro livro de crônicas,

publicado em 1986, é composto por dezoito textos que compreendem um

período entre 1968 a 1985, no qual relatos e retratos de uma geração se

confundem. Nessa obra, percebe-se um recorte in media res, apresentando um

painel de histórias do cotidiano e mudanças, que jovens mexicanos, de três

décadas, tiveram que passar. A vida cotidiana das pessoas comuns que não

ocuparam as páginas dos jornais nem o centro de nenhum fato histórico, mas

estavam ali, à margem dos acontecimentos.

Os capítulos dessa obra são intitulados pelas datas desse período,

durante o qual ocorreram fatos como o massacre de Tlatelolco, a grave crise

econômica a partir de 1970 e o terremoto de magnitude 8.1 sucedido naquele

país no dia 19 de setembro de 1985, além de diversos outros fatos

econômicos, políticos e culturais. Nessa obra, percebe-se a influência da Onda

com a aparição de personagens da classe média e a incorporação de

elementos da cultura pop, principalmente a influência da música rock, do

cinema e da televisão.

Em 1995, reunidos sob o título Los once de la tribu: crônicas surgiu uma

coletânea de textos escritos nos últimos oito anos. Nessa obra, o humor

aparece como ingrediente essencial, através de uma elaboração dicursiva

composta por diversos “aforismos” se percebe a cultura divulgada nos meios

massivos como fio condutor, no qual, nota-se pelo olhar oblíquo do autor, que a

realidade ocorre para ser narrada, para ser interpretada. Composta com textos

sobre o futebol, o boxe e uma visão crítica do rock, passando por Andy Warhol,

Jane Fonda, Ángel Fernández, Gabriel Vargas e o EZLN, pois, como comenta

Page 24: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

24

o crítico Juan Antonio Masoliver Ródenas: “Aquí encontramos las claves que

explican toda la escritura de Villoro. Cada uno de los aspectos que hemos visto

de forma dispersa en sus otros libros aparecen ahora plenamente

desarrollados” (MASOLIVER RÓDENAS, 2011, p. 38). Nessa obra, Villoro

homenageia José Agustín, que “logró el rapto predilecto de los escritores;

ganar a alguien para la literatura: el lector ideal es el que hasta aquel momento

no ha leído un libro por gusto” (VILLORO, 1998, p. 17).

Dios es redondo, publicada em 2006, é uma coleção de instantes, no

qual a combinação de crônica com reflexões sociológicas e anedotas pessoais

do vivido e sentido no trabalho cotidiano, registra, de forma irônica, as

mitologias e superstições em torno do futebol. Nessa obra, Villoro ressalta que

o futebol para existir tem que ser narrado, que o faz a partir de uma linguagem

muito particular que envolve metáforas, aforismos e sentido de humor,

conectando realidade e imaginação, pois como comenta o autor que o jogo

ocorre no campo e na mente do público. Através de uma exploração narrativa,

ele aproxima futebol e literatura, sem, entretanto, afastar-se do compromisso

político.

Na composição de Safari accidental (2005), são vinte e três textos

publicados anteriormente em diversos meios, sendo que dois deles se

apresentam como prólogo e epílogo, e os demais estão divididos em cinco

partes. Aparentemente, trata-se de uma coletânea de temas separados, mas,

certamente, não são, pois, seja nos eventuais encontros com celebridades do

rock, seja em viagens pelo México ou até mesmo nas oficinas literárias de

Augusto Monterroso, Villoro tece a memória de eventos, faz uma reflexão sobre

a vida no México pós-68, promovendo uma profunda reflexão sobre a cultura

de massa, não só no México, mas também na América Latina. É uma obra

heterogênea, na qual o autor utiliza a crônica para estabelecer, ao mesmo

tempo, um cunho político e literário aos seus textos.

No prólogo dessa obra, “Ornitorrinco: notas sobre la crónica”, Villoro,

relembrando Alfonso Reyes, que renomeou o ensaio como o “centauro dos

gêneros”, cria uma metáfora que atravessará todo esse estudo, denominando a

crônica de o “ornitorrinco da prosa”. Ao equiparar a crônica a um ornitorrinco,

Villoro, está deliberadamente questionando a realidade. Segundo o poeta e

Page 25: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

25

ensaísta nicaraguense, Moisés Elías Fuentes, “en el ideario colectivo y aun el

intelectivo los inexistentes centauros son más ciertos que los existentes

ornitorrincos. El centauro es un ideal, una aspiración, el ornitorrinco una

adaptación a necesidades concretas” (E. FUENTES, 2007, p.1). Ao ressaltar as

particularidades desse animal indefinido entre mamífero, réptil e ave, que mais

parece uma montagem, aproxima-se da crônica pela capacidade de absorver

características de vários gêneros literários e não literários presentes nesse

texto. Villoro destacou sete: a reportagem, a entrevista, o romance, o conto, o

ensaio, o teatro e a autobiografia, sem deixar de ser ela mesma. Ou seja, a

partir dessa metáfora, seria possível questionar: por que a crônica, esse gênero

híbrido, denominado por Juan Villoro como o ornitorrinco da prosa, é

importante para discutir literatura?

A hipótese que norteará esta tese será a de tentar demonstrar, através

da análise das obras Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias, Los once de la

tribu: crónicas, Safari accidental e Dios es redondo, publicadas entre 1986 e

2006, que a centralidade dada por Villoro à crônica em seu projeto de escrita é

para demonstrar que a crônica é importante para debater literatura, porque, em

sua essência, ressalta que ela não é a realidade, mas uma interpretação dessa

mesma realidade.

Este gênero é utilizado para representar o momento histórico, cultural e

literário mexicano dos anos finais da década de 1970 até os primeiros de 2000,

já que, no México, segundo a visão desse escritor, é o período de expansão da

cultura divulgada nos meios massivos de comunicação, da marca do “fim da

Revolução Mexicana”, de questionamento entre “alta” e “baixa cultura” (daí, por

exemplo, que muitas de suas crônicas sejam sobre futebol e convivam com

ensaios sobre Shakespeare, Thomas Bernhard, entre outros) e os debates

sobre os limites da modernidade, pós-modernidade e até “pós-apocalipse”.

Esse gênero híbrido é privilegiado em tempos “pós-apocalípticos” para contar

os “rituais do caos” no México. Villoro demonstra, desde o início de sua

trajetória literária, a relevância da crônica e da cultura de massa para sua

ficção: “Para mi lo popular es muy importante porque un autor se alimenta de

su época, un autor le devuelve algo a su época, pero usa el lenguaje de la

época” (VILLORO, 2016d). A crônica que se move às margens da literatura e

Page 26: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

26

desafia definições estabelecidas é utilizada por Villoro para estabelecer, ao

mesmo tempo, um caráter político e literário de seus textos.

Esta tese está constituída de quatro capítulos. O primeiro, intitulado

“Juan Villoro e a crônica mexicana” está dividido em duas seções: na primeira,

se destacará a figura do escritor no cenário da cronística mexicana, sua

formação literária, o seu lugar de enunciação, mostrando que ele pertence à

geração posterior à que impulsionou a crônica no contexto histórico-cultural

mexicano a partir de 1968 e como esse período influencia o seu projeto de

escrita. A segunda parte está dedicada à linguagem das crônicas de Villoro.

Nessa parte, serão destacadas as particularidades da linguagem empregada

em suas crônicas, que envolvem o aforismo, a ironia e o humor.

Após situar Villoro no panorama da Literatura Mexicana Contemporânea,

essa pesquisa se estruturará a partir das leituras de críticos como Carlos

Monsiváis (2010), Julio Ramos (2008), Susana Rotker (2005) e Linda Egan

(2004), no capítulo “História e atualidade da crônica”. A partir da escrita

cronística de Juan Villoro, se traça um breve panorama com a evolução e as

principais características de suas crônicas que se pode observar nos

modernistas, nos vanguardistas, da influência da literatura de não ficção norte-

americana e do boom da literatura hispano-americana, procurando demonstrar

que esse é um gênero híbrido, com uma fronteira tênue entre literatura e

jornalismo, ficção e realidade, culto e popular, teoria e história. Na última parte

do capítulo, a análise se centrará no período histórico pós-68 até a atualidade,

focando nos leitores, nos escritores e no mercado cronístico, com o objetivo de

demonstrar que a composição desses três elementos contribuiu para a

evolução do gênero.

No terceiro capítulo “Literatura e Cultura” serão apresentadas

discussões sobre a cultura, principalmente a divulgada nos meios massivos de

comunicação, procurando demonstrar como o autor utiliza o esporte de massa

(o futebol) e a música (o rock) para falar da sociedade, da história, do consumo

e da modernidade no país. Nessa parte, será dado destaque à Cidade do

México como um lugar de debate, de organização da sociedade civil e de

desenvolvimento da cultura de massa. A crônica e a cidade compartilham

muitos sentidos, entre eles, como espaço importante para pensar literatura e

Page 27: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

27

privilegiado para abarcar as interpretações dos fatos coletivos ocorridos no

cotidiano narrados nas crônicas de Juan Villoro. Os textos teóricos que servirão

de base para esta análise são dos críticos Fredric Jameson (2005), Terry

Eagleton (1998), Edgar Morin (2011), Carlos Monsiváis (1996), entre outros.

O último capítulo desta pesquisa, “Crônica: o ornitorrinco da prosa”,

procurará demonstrar que a centralidade que Juan Villoro dá à crônica em seu

projeto de escrita é para evidenciar que, para ele, a crônica debate literatura, e

em sua essência, ressalta que não é a realidade, muito menos um mero

escape para o entorno cotidiano, mas é uma interpretação dessa mesma

realidade. Procurar-se-á ressaltar que, embora o exercício literário proponha a

criação de realidades inexistentes, isto não significa que a literatura careça de

vínculos com o real. A crônica, afinal, é um gênero que permite perceber que

literatura e realidade se relacionam de diversas maneiras.

Page 28: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

28

CAPÍTULO I - JUAN VILLORO E A CRÔNICA MEXICANA 1.1 Juan Villoro: o cronista de ideias

Villoro ha representado, en una proporción que con los años se tornaba preocupante, la crónica de una anomalía

8.

Christopher Domínguez Michael

O cronista, ensaísta e poeta mexicano José Joaquín Blanco9 comenta

que os escritores mais destacados de um país sempre procuram apreender as

correntes literárias anteriores, para que com isso possam criar uma nova voz,

rompendo assim certa tradição. Porém, não haverá totalmente uma ruptura

com tais influências anteriores. O que poderá ocorrer, de fato, será uma

renovação e, portanto, uma aquisição de novos procedimentos estéticos.

O que significa o nome de Juan Villoro na tradição da crônica mexicana?

Há de considerar-se que ele inicia sua trajetória literária na década de 1970, no

trânsito entre a contracultura e a cultura de massa. Período que muitos autores

como Carlos Monsiváis (2013), José Agustín (2007) e Ignacio Sánchez-Prado

(2006) acreditam que se deu o início da formação da sociedade civil mexicana.

É interessante refletir a respeito da influência desse momento em seu projeto

de escrita, já que o México, tradicionalmente, apresentou figuras públicas

exercendo o papel de cronistas: Manuel Gutiérrez Nájera, Ignacio Manuel

Altamirano, Martín Luis Guzmán, Amado Nervo, Luis G. Urbina, José Alvarado,

Salvador Novo, Jorge Ibargüengoitia e José Emilio Pacheco, dentre muitos

outros que, através de seus textos, procuraram apresentar uma visão crítica do

país. Na verdade, essa herança vem desde o início da colonização espanhola

com a presença da figura do cronista oficial:

En 1558 se solicitó al Rey el nombramiento de Francisco Cervantes de Salazar como cronista de la Nueva España, según consta en actas Del Cabildo del Ayuntamiento, el 24 de enero de ese año. Su labor principal era escribir la gran Crónica de la Nueva España (URRUTIA, 2007, p.1).

8 Trecho do artigo de Christopher Domínguez Michael “La vitalidad histórica de los muertos

mexicanos”: El testigo de Juan Villoro. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011, p. 190. 9 Reflexão presente no artigo de Anthony Stanton “Lo culto y lo coloquial en la poesía mexicana

contemporánea”. In: Cuadernos Hispanoamericanos, Madrid, 1991, nº 501, p. 108.

Page 29: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

29

Francisco Cervantes de Salazar foi o primeiro cronista da Cidade do

México, porém não foi espontâneo, mas designado. No entanto, o cargo

continuou sendo ocupado por diversos cronistas anos após anos. Para citar

alguns exemplos, no século passado foram nomeados Luis González Obregón,

em 1911, Artemio de Valle Arizpe, em 1942, Salvador Novo, em 1965, e o

último, Guillermo Tovar de Teresa, indicado em 1985 pelo então presidente

Miguel de la Madrid, que, como destacou Novo, “con amor y brillo,

espontáneamente o por nombramiento” (NOVO apud URRUTIA, 2007, p.1),

seguiram o ofício. Compreendendo a impossibilidade de abarcar o todo, Tovar

de Teresa propôs a criação de um conselho, o que ocorreu em 1987, cujo

intuito era reunir os cronistas mais destacados, “cuyo amor por La Ciudad de

México los hiciera partícipes de una Crónica Colectiva en virtud de la

imposibilidad de que una ciudad de las dimensiones actuales estuviesen en un

solo cronista” (TOVAR DE TERESA apud URRUTIA, 2007, p.1).

Nessa visão literária, especificamente mexicana e ricamente

heterogênea, surge em cena o escritor Juan Villoro. Sua obra está intimamente

ligada à Cidade do México, e é exatamente em suas crônicas que se deve

encontrar o ponto de partida para entender sua escrita. Nascido no México em

1956, filho do filósofo mexicano-catalão Luis Villoro, foi educado numa escola

alemã na Cidade do México, cercado dos mais importantes intelectuais daquele

país. No entanto, além da formação erudita, na figura que o autor se empenha

em criar, observa-se em muitas de suas entrevistas e no prólogo de Los once

de la tribu (1998) menciona que, quando criança, não se interessava pelos

livros, mas pelos cronistas esportivos de rádio, como Ángel Fernández, que lhe

fizeram pensar:

Cuando yo le conocí, hablé con un gran nerviosismo, se me quebró la voz en el teléfono como se estuviera hablando con Borges porque él era el ídolo de mi infancia. Fue la persona que me reveló a mí que las palabras son símbolos mágicos. Las palabras reinventan la realidad y no sirven solamente para cosas utilitarias, para hacer trámites […], no. Las palabras pueden reinventar el mundo. […] Me quedé nerviosísimo de encontrar la persona que me había revelado que el mundo vale la pena porque se puede contar historias y que las palabras tienen un significado que altera la realidad. Cuando yo descubrí eso con Ángel Fernández, yo no sabía que existía la literatura pero que me sensibilizó para que cuando después descubrí la literatura, me di cuenta, claro, eso es como las narraciones que hacía este extraordinario cronista (VILLORO, 2016d).

Page 30: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

30

O autor de Safari accidental cresceu ouvindo as radionovelas, assistindo

à programas de televisão: “En las tardes, yo visitaba a mi abuela para ver Don

Gato y su pandilla, El superagente 86, Mi Marciano favorito” (VILLORO, 2005a,

p.25), além das histórias em quadrinhos La familia Burrón, de Gabriel Vargas, e

escutando as anedotas da avó paterna, que era escritora de bestsellers de

autoajuda. Villoro viveu o declínio dos movimentos de contracultura nos finais

da década de 1970 e, como os escritores da Onda, “está el mundo de lo que en

el momento de su aparición se denominó, por lo que tenía de contestatario,

“contracultura” y que hoy podríamos llamar “cultura popular” o “cultura de

masas”” (MASOLIVER RÓDENAS, 2011, p. 35).

Juan Villoro, autor cuja qualidade cronística é aproximada por muitos à

de Carlos Monsiváis na crônica mexicana, assim como seus antepassados,

escreve ensaios que se assemelham a crônicas e crônicas que parecem

ensaios, sendo também, em alguns casos, próximos aos contos. O próprio

Monsiváis, em sua obra A ustedes les consta: antología de la crónica en

México (2010), destaca que Villoro é: “cronista de primer orden” (MONSIVÁIS,

2010, p.544). No entanto, quando questionado se é herdeiro de Carlos Fuentes

ou de Monsiváis, responde: “Por suerte, la literatura no es una dinastía y

puedes escribir sin suceder a nadie. Ante tu pregunta, me acuerdo de un verso

de otro Carlos, Pellicer: “Todo será posible, menos llamarse Carlos”” (VILLORO

apud BAUTISTA, 2016, p.2). Sobre esse tema, Sergio González Rodríguez em

seu artigo “El Safari cotidiano en esplendor”10, faz uma pequena fábula:

Para expresarlo a partir de personajes de la gran prosa mexicana del último siglo, es como si un día Alfonso Reyes hubiera soñado que era un pez que se comía a otro pez llamado Salvador Novo, que a su vez soñaba que era un pez que se comía a otro pez llamado Carlos Monsiváis, que a su vez soñaba que él terminaba cocinando en un platillo para día domingo en la mesa de Juan Villoro (GONZÁLEZ RODRÍGUEZ, 2011, p.122).

Certamente, a obra de Monsiváis exerce uma grande influência na

narrativa poliédrica de Juan Villoro, assim como Juan Rulfo, Octavio Paz,

Augusto Monterroso, José Agustín, José Emilio Pacheco, Sergio Pitol, Jorge

10

Esse artigo foi publicado originalmente no jornal Reforma, em 22 de outubro de 2005. Aqui se utiliza o formato compilado por José Ramón Ruisánchez y Oswaldo Zavala.

Page 31: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

31

Ibargüengoitia, Salvador Novo, Salvador Elizondo, Juan García Ponce, entre

tantos outros. Na maioria das crônicas que compõem o corpus dessa pesquisa,

Villoro deixa transparecer essa influência, entrelaçando, na narrativa,

características de obras de diversos cronistas, principalmente de Novo e

Monsiváis, através do tema, com humor, ironia e sarcasmo. Outra influência

importante vem de dois polos continentais: a da chamada literatura fantástica

do Rio da Prata (Felisberto Hernández, Jorge Luís Borges, Adolfo Bioy

Casares, Julio Cortázar e Juan Carlos Onetti) e da literatura norte-americana,

exercendo o que se poderia chamar de literatura de velocidade, como declara

Villoro:

con ritmo cinematográfico, una yuxtaposición cinematográfica de escenas y una construcción de secuencias tomadas del montaje de los filmes, los posteriores a la «generación perdida»: Saúl Bellow, John Updike e Truman Capote fueron escritores que influenciaron mi generación (VILLORO, 1997, p.121).

Além dos mencionados, nessa mesma entrevista Villoro comenta a

respeito da tradição da crônica mexicana: “Algunos de nuestros mejores

escritores han sido, ante todo, cronistas. Pienso en el novelista Martín Luis

Guzmán, por ejemplo, cuyas novelas son novelas sin ficción, novelas-crónica

(VILLORO, 1997, p.124), que também influenciaram sua obra.

O autor de Tiempo transcurrido já havia mencionado a influência de

Capote em várias entrevistas, e parece que o que ele admira nesse autor

norte-americano é que, graças a sua obra A sangue frio (1966), hoje se pode

falar em literatura de não-ficção ou Novo Jornalismo. O conceito de ficção é

intrínseco à literatura, ou seja, mesmo quando se escreve sobre algo que

aconteceu de fato, ainda assim está se utilizando ficção. A maneira como

Capote explora esses conceitos é o que atrai o escritor mexicano.

Villoro se encontra cronologicamente entre a geração La Onda e a que

se denomina Generación del Crack11; no entanto, não pertence a nenhum dos

11

Movimento literário mexicano composto por Jorge Volpi, Pedro Ángel Palou, Vicente Herrasti, Ignacio Padilla, Ricardo Chávez Castañeda e Eloy Urroz que lançaram em 1996 um manifesto, inicialmente concebido como ruptura com o postboom latino-americano. Definido por Elena Poniatowska como: “una fisura, un hueso que se rompe, un vidrio que se estrella, una rama de árbol que cae y hace precisamente eso: crack” (PONIATOWSKA, 2003, p. 1). Crack é o mesmo que boom, só que para dentro, é o auge da derrota. Com o tempo os traços mais radicais

Page 32: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

32

dois grupos, porém, como comenta Monsiváis, apresenta referências

geracionais com “Daniel Sada, David Toscana, Guillermo Fadanelli, Enrique

Serna y Mario Bellatín” (MONISVÁIS apud AZNÁREZ, 2003, p.1). Entre os

autores que cresceram no período pós-68, Juan Villoro é o que se encontra

hoje com maior projeção no meio literário, além de Daniel Sada.

As publicações do autor iniciam-se na década de 1970 com contos e

crônicas. Muitos deles, inclusive o livro Tiempo transcurrido, abordam as

mobilizações estudantis de 1968 e o massacre ocorrido na Plaza de las Tres

Culturas. Villoro tinha doze anos de idade nessa data, assim como o

protagonista da crônica que inicia a obra.

Na crônica intitulada “Carnaval y Apocalipsis”, Villoro reflete sobre ese

período: “Después del movimiento estudiantil del 68 y la matanza de Tlatelolco,

México se convirtió en una nación que proclamaba el cambio sin obtenerlo e

inauguraba invisibles modernidades” (VILLORO, 2010b, p.3). Esse evento

histórico foi o primeiro grande conflito urbano do México que demonstrou que o

país estava mudando e que, não somente os estudantes, mas também os

intelectuais e muitos outros profissionais ansiavam por mudanças:

después de 1968, la crónica ni se desvanece ni se repliega en la nostalgia. Entre sus funciones se hallan la consignación de las impresiones de la modernidad, el cultivo de leyendas y mitologías, los retratos de las clases medias detenidas en su ascenso, los personajes nuevos o ya producto de una mirada sin prejuicios tradicionalistas. La crónica también le corresponde reproducir el vértigo de masificación, las sensaciones de caos, la reubicación de la vida cotidiana, la racionalidad que se califica de “heterodoxa”. […] Además, la crónica mantiene la práctica de la literatura en un medio que prescinde de ella. Algunos cronistas atienden los movimientos populares y las expresiones de la sociedad civil. Además, y básicamente, la crónica reivindica la literatura en un medio antiintelectual (MONSIVÁIS, 2010, p. 112).

Em meados dos anos 70, as crônicas relatavam as mudanças de uma

sociedade que questionava a nação, a modernidade e a tradição vigente até

aquele momento. Carlos Monsiváis é, sem dúvida, uma voz que sobressai: “el

movimiento estudantil de 1968 es causa directa e indirecta de la toma de

foram suavizados e deram um abraço apertado aos seus “pais” e “avôs” literários: Salvador Elizondo, Juan García Ponce, Sergio Pitol, Fernando del Paso etc; e os “pais” José Agustín, Gustavo Sainz, Juan Tovar e Parménides García Saldaña (PONIATOWSKA, 2003, pp. 1-5).

Page 33: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

33

consciencia” (MONSIVÁIS, 2013, p.240); no entanto, não está só, podendo

acrescentar escritores como Elena Poniatowska e José Joaquín Blanco que

empregaram também a crônica como “modus literário”. É, porém, uma

participação pequena, levando em consideração a proporção do evento, como

comenta o narrador da crônica “1969”, que diz: “En 1968 los periodistas,

transformados en inmunólogos, describían la revuelta estudantil como un vírus

que atacaba el rosado y saludable cuerpo social” (VILLORO, 2006a, p.20). Na

televisão, a crítica simplesmente não existia e, no rádio, estava muito vigiada.

No entanto, é importante destacar que 1968 é considerado como uma linha

mítica e não cultural “Tlatelolco es un fenómeno de consecuencias inmensas,

pero no exatamente literárias (MONSIVÁIS apud AZNÁREZ, 2003, p.8).

Desde o fim da Revolução Mexicana, que o PRI (Partido Revolucionario

Institucional), formado por membros vitoriosos do movimento armado em 1910,

manteve-se no poder. Com o irrestrito apoio do Congresso, havia-se tornado

absoluto, conseguindo exercer poder total sobre os Três Poderes, as Forças

Armadas, a mídia, as associações de trabalhadores, os empresários, os

sindicatos e os camponeses. Muitos acreditam, e Juan Villoro, inclusive,

compartilha essa ideia, que o fim da Revolução Mexicana se deu somente

quando concluídas as eleições presidenciais de 2000, exatamente quando o

PAN (partido de direita – conservador e cristão, capaz de estabelecer um

contato mais estreito entre Igreja e Estado) assumiu o poder, o que, em tese,

colocaria um fim aos 71 anos de hegemonia do PRI, prometendo instaurar,

finalmente, uma democracia. Tal fato não se concretizou, entretanto,

provocando uma profunda revisão do valor da Revolução Mexicana na

consolidação das instituições políticas e culturais, assim como dos poderes

econômicos do país.

Poucos anos na história do século passado estão impregnados de

acontecimentos políticos12 como o de 1968. Esse período é considerado por

Villoro “o momento decisivo para julgar a liberdade de expressão” (VILLORO,

12

Além do Massacre de Tlatelolco, pode-se ressaltar a intensificação da guerra entre EUA e Vietnã; o assassinato de Martin Luther King e Robert Kennedy e diversos movimentos estudantis: Maio de 68 na França, ocupações e passeatas de estudantes na Espanha, Itália e Alemanha; repressão a passeatas de estudantes no Rio de Janeiro e intensificação da repressão de ditaduras em vários países latino-americanos; fim da Primavera de Praga e Golpe Militar no Peru.

Page 34: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

34

2002, p.65, tradução minha). Foi uma etapa na qual surgiram muitas crônicas,

principalmente sobre este tema, fato que levou Bencomo (2002) a batizar a

crônica de “hija de Tlatelolco” (BENCOMO, 2002, p. 612).

Para o México, “1968 fue un parteaguas, ya que la narrativa mexicana

regresó a criticar esa realidad social” (VILLORO apud AZ, 2013, p.1). No livro:

La crónica de un año maravilloso de Alberto Pulido Aranda, publicado pela

primeira vez 30 anos depois desta data, sendo reeditado e ampliado em 2008

ao completar 40 anos, o autor traça uma cronologia dos fatos ocorridos no

mundo naquele ano, com ênfase no massacre de Tlatelolco sucedido no dia 2

de outubro na Plaza de las Tres Culturas, destacando a música rock, a

cinematografia e a literatura produzidas naquele momento. No entanto, isso

não significa que havia liberdade de imprensa. É o que comenta Monsiváis,

tratando dos poucos avanços que aconteceram:

No es muy distinta la situación entre 1940 y 1968, con el autoritarismo que hace las veces de criterio valorativo. La prensa escribe – sin contradicción alguna – amplio crédito [...] y desconfianza notoria [...], y el que trabaja en periódicos es un ser especial y/o un vendido, un vocero popular y/o un cómplice del poder (MONSIVÁIS, 2010, p. 92).

Em 1968, a imprensa mexicana havia-se tornado um dos lugares

incondicionais de sustentação do regime, com críticas leves, poucas

reportagens de investigação e, por isso mesmo, os editoriais eram ignorados

pelos leitores. Desde o início de julho, os enfrentamentos de estudantes e

policiais, os ônibus incendiados e a entrada de policiais na Preparatoria

Nacional em 30 de julho eram prenúncios do massacre que aconteceria em 2

de outubro. No dia primeiro de agosto, o reitor da UNAM, Javier Barros Sierra

encabeçou uma marcha. A imprensa insistiu na conjura de elementos

subversivos infiltrados, e poucos jornais mantiveram a objetividade possível,

entre eles: ¡Siempre!, La cultura en México, Excélsior (todos parcialmente) e

¿Por qué? “la única que publicó in extenso fotografías de la matanza”

(VILLORO, 2005a, p.33). Julio Scherer assumiu a direção de Excélsior em

1968 e, com grande agudeza,

cancela en definitiva la práctica de vender las ocho columnas, y con rapidez rectifica el derechismo del diario (el anticomunismo como

Page 35: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

35

persecución de los intentos de justicia social), y es cada vez más crítico del gobierno y su partido (MONSIVAIS, 2010, p.105).

Esse posicionamento desagrada o Presidente Echeverría, e Scherer

sofre um golpe em julho de 1976. Em novembro do mesmo ano, ele publicou o

primeiro número de Proceso. No ano seguinte, surgiu o jornal Unomásuno,

dirigido por Manuel Becerra Acosta, subdiretor de Excélsior junto com Sherer.

Em homenagem prestada pela Universidad Autónoma Benito Juárez a Julio

Sherer, Juan Villoro, em seu discurso, diz: “Para mi generación, el Excélsior de

Julio Scherer fue la universidad abierta en la que ni siquiera supimos que

estábamos inscritos” (VILLORO, 2007b, p.2).

Villoro iniciou sua trajetória literária como cronista escrevendo críticas de

rock para o suplemento de sábado do jornal Unomásuno. Um jornal que

assumiu um posicionamento crítico, mesmo sendo patrocinado pelo Estado,

como diz o narrador sobre o personagem Genaro da crônica “1980”, “Genaro

estaba tan dentro de la realidad que las secreciones de su cuerpo ya no

dependían de glándulas sino de las noticias del Unomásuno” (VILLORO,

2006a, p. 88) e com espaço para temas e categorias menores, utilizando a

crônica para dar conta das notícias divergentes:

En Unomásuno se inicia lo que el tradicionalismo impedía: el reconocimiento del carácter noticioso, de los temas y problemas de la vida cotidiana, entre ellos, las causas del feminismo, el análisis del machismo, los movimientos gays y lésbicos, los derechos de las asistentes domésticas (MONSIVÁIS, 2010, p.106).

A obra de Villoro transita por esses temas e também absorve outras

disciplinas, como a história, a sociologia, a filosofia, a psicanálise e as artes em

geral, tencionando as manifestações da chamada cultura popular, a

contracultura, a cultura de massa e a cultura erudita. Ele dá vazão à liberdade

que o registro da crônica proporciona.

Seus textos abordam diversos assuntos. O massacre de Tlatelolco, no

entanto, aparece explícita ou implicitamente em vários deles: romances,

artigos, ensaios e, principalmente, em suas crônicas. Esse foi um evento de tal

importância na vida do país que diversos autores escreveram textos sobre esse

tema, como a reflexão de Fabrizio Mejía Madrid:

Page 36: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

36

El 68 mexicano se pensó como un pozo al que había que asomarse para gritar y que el eco te devolviera tu nombre. El precipicio sin fondo podía ser llenado con los nombres de las víctimas, de los muertos, de los desaparecidos, de los encarcelados, de sus historias, del mismo modo en que se le podía atribuir el inicio de la lucha democrática en México. Ese pozo que nos sigue devolviendo nuestro propio eco (MEJÍA MADRID, 2013, p. 3).

Diversos desdobramentos políticos e culturais surgiram desse evento.

Por um lado, ocorreu, através dos Halcones, o acirramento da repressão e da

coerção, como aparece na crônica “1969”, que inicia com o “bazukazo” que

explodiu a porta da Escola Preparatoria 1 no dia 30 de junho de 1968. Nesse

mesmo texto, há a descrição da prisão de Tomás “También él fue jaloneado.

Cayó al piso, recibió una patada, perdió la mariguana. [...] De reojo, alcanzó a

distinguir el brillo asesino que se aproximaba, las tijeras que entraban en su

pelo [...]” (VILLORO, 2006a, p. 21). Depois foi sequestrado, passou três dias

nos “separados policíacos” e, quando conseguiu fugir, foi para a serra

oaxaquenha, pois “se volvía cada vez más brutal y una bayoneta podía hacer

que sus entrañas corrieran la misma suerte que su pelo” (VILLORO, 2006a, p.

21). Por outro lado, há, nesse período, uma ampla distribuição de benefícios

através de bolsas e recursos a intelectuais e estudantes pelo governo de Luis

Echeverría Álvarez, como é o caso de publicações como Siempre!, na qual

apareceram vários escritores, incluindo Carlos Monsiváis, que “foi diretor do

suplemento cultural “La cultura en México”” (LEMUS, 2015, p.3). É, portanto,

nesse caldeirão cultural e político que Villoro inicia sua trajetória literária, e é

também esse momento histórico que permite a ampliação de um público leitor

e a expansão de um mercado editorial da crônica no México. Villoro seria então

o homem orquestra das Letras Mexicanas, e tal opinião é compartilhada por

Juan Antonio Masoliver Ródenas:

Pero la escritura de Villoro va mucho más allá de la crónica de un pasado muerto, un presente caótico y un futuro agonizante e inmóvil como es inmóvil el desierto de “Coyote” donde, sin embargo, se agita la violencia. Esta realidad que procede de la crónica se ve visiblemente transformada por la invención, por una serie de riesgos narrativos que convierten a Juan Villoro en uno de los escritores más audaces de la literatura mexicana actual (MASOLIVER RÓDENAS, 2011, p. 51).

Page 37: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

37

Estudos recentes sugerem que, em linhas gerais, o cronista pode adotar

duas perspectivas: a do cronista-testemunho ou a do cronista-protagonista13.

No primeiro caso, o cronista define a si mesmo como um informante que

observa e documenta em primeira pessoa, mas não há uma participação

efetiva. Já o cronista-protagonista participa do texto, selecionando elementos,

diferenciando perspectivas no momento de apresentar ao público leitor,

podendo ou não estar em primeira pessoa, mas percebe-se sua participação.

Na maioria das crônicas, Villoro é principalmente um cronista-protagonista. No

entanto, ele se utiliza também da outra variante quando se coloca como

entrevistador. Assim como seus antecessores ilustres, desde Manuel Gutiérrez

Nájera a Salvador Novo, a Jorge Ibargüengoitia e a Carlos Monsiváis, não foge

do compromisso com a realidade que descreve e renuncia a uma interpretação

limitada, deixando lugar para diversas possibilidades de leituras, reinventando

a realidade através das palavras.

Villoro não foi escolhido para ocupar o cargo criado pelo rei Carlos I de

cronista da Cidade do México, porém foi selecionado com outros cidadãos

mexicanos para compor um grupo que irá construir um projeto que será levado

à Assembleia Constituinte para a criação da Constituição da Cidade do México,

que desde 2016 passou a ser intitulada oficialmente como CDMX. A respeito

desse tema, o autor comenta:

Creo que una Constitución debe ser un espejo en el que todos y todas nos podamos ver y nos sintamos incluidos. Debe ser un espejo moderno, que nos capte con nuestras diferencias y nos permita tener este sentido de la discrepancia en la unidad. Eso es lo que me llevó a participar. [...] Los grandes rezagos que tenemos tienen que ver con la violencia, con la falta de igualdad. Son dos rezagos extraordinarios. El historiador austriaco Friedrich Katz dijo que la única revolución del mundo que sigue teniendo vigencia intelectual es la mexicana, por una razón muy sencilla: sus principios no se han cumplido. Siguen siendo demandas diferidas. Mientras no haya justicia social, mientras no haya seguridad, la Revolución Mexicana seguirá siendo un lema vigente. De ahí que muchas fuerzas políticas reclamen su herencia: desde el Ejército Zapatista hasta el PRD, pasando por el PRI (VILLORO apud LAMMERS, 2016, p. 1, destaque do autor).

13

Anadeli Bencomo apresenta um estudo aprofundado dessas duas possibilidades na obra Voces y voceros de la megalópolis, Madrid, Iberoamericana, 2002, p. 36.

Page 38: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

38

A mistura de política e literatura é certamente uma questão complexa,

mas que já faz parte do cenário social mexicano, pelo menos desde os anos

finais do século XIX. A mistura desses dois elementos frequentemente esteve

presente na vida de muitos intelectuais no México14. Na atualidade, é uma

postura que tem sido duramente criticada em jornais do país, assim como já

ocorrera com outros, como Salvador Novo e Carlos Monsiváis, por terem sido

nomeados cronistas da Cidade do México. Uma questão que ilumina o

comentado são as críticas emitidas a Juan Villoro referentes à sua participação

na marcha pelos estudantes desaparecidos15.

Além do já mencionado Unomásuno, Villoro já publicara seus escritos

em diversos periódicos na América Latina, como: Gatopardo, Malpensante,

Letras Libres, Etiqueta Negra, Reforma, El Mercurio, Vuelta, Nexos, Proceso,

Cambio e La Jornada, sendo que, neste último, foi editor entre 1995 e 1998.

Sobre La Jornada, destaca Monsiváis: “el diario percibe la intensidad de los

cambios sociales y comienza a registrarlos. Ya es hora de un diario

abiertamente de izquierda […]” (MONSIVÁIS, 2010, p. 119). Ao observar os

meios em que esse autor colaborou, é importante destacar o seu

posicionamento ideológico. La Jornada, fundada em 1984, foi o primeiro na

América Latina a lançar um suplemento, Letra S, que expôs os múltiplos lados

da SIDA, além do engajamento no combate à homofobia. Apoiou causas da

esquerda política mexicana, como: a campanha de Cuauhtémoc Cárdenas em

1988, o EZLN em 1994 e as manifestações contra a eleição de 2005. Além

desses jornais, é importante mencionar os espanhóis: El Periódico de

Catalunya e El País. Villoro, que por longos anos foi militante do Partido

Mexicano de los Trabajadores, quando entrevistado por Diego Henrique

Osorno, declarou-se de esquerda. No entanto, reconheceu as críticas

14

A tese de Ignacio Sánchez-Prado, intitulada Naciones intelectuales: la modernidad literaria mexicana de la constituición a la frontera (1917-2000), publicada em 2006 trata da relação dos intelectuais e o poder desde o porfiriato até os anos 2000. 15

O desaparecimento de 43 jovens de Ayotzinapa no dia 27 de setembro de 2014, no município de Iguala, Guerrero, a 220 km da Cidade do México, que supostamente foram sequestrados por policiais. Villoro, que publicou algumas crônicas a respeito do desaparecimento, participou de uma marcha juntamente com Taibo II e centenas de outros cidadãos. Através de uma foto publicada em La Razón, tirada da manifestação na qual Villoro sorri, dá origem a artigos, caricaturas (anexo I) e cobrança de sua postura ética. Com posicionamentos controversos a respeito da participação do escritor na marcha (LA RAZÓN, 2017), (VEINTICUATRO HORAS, 2014), (FRIERA, 2014).

Page 39: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

39

recebidas da esquerda, que o acusou de ser direitista: “Sí. Uno de los grandes

problemas de la izquierda es que si no asumes la postura mayoritaria,

parecería que eres un traidor al interior del grupo (VILLORO apud OSORNO,

2013, p.5). Logo no início do artigo El cronista y la crónica en Safari accidental,

María Elvira Villamil relata:

Desde la perspectiva sociológica, el autor se acerca al polo heterónomo del campo de la producción cultural, el cual se asocia con toda una serie de beneficios simbólicos y económicos. En última instancia, esto implica que el autor evita asumir una posición consistentemente crítica frente al sistema socioeconómico vigente. Asimismo, su orientación política concuerda con el liberalismo como doctrina basada en teorías individualistas del ser humano y la sociedad, y por tanto en conflicto con el socialismo. A pesar de que Villoro asume una posición crítica en numerosas instancias, llegando a afirmar que “el intento de darles voz a los demás es un estímulo cardinal de la crónica”, las contradicciones que presenta Safari accidental lo sitúan en el centro del campo de la producción cultural y ésta manifiesta una postura acomodaticia (VILLAMIL, 2011, p. 66).

Ao analisar detidamente esse longo trecho, observa-se que Villamil

(2011) exige de Villoro um posicionamento sociológico, político e econômico a

partir de uma obra literária e considera sua postura complacente. Nota-se que,

nessa análise, há uma extrapolação das funções da literatura, ou seja, a

institucionalização da literatura, ainda hoje, não está separada da esfera

pública. Na América Latina, os obstáculos enfrentados por essa não separação

reproduzem discursos como os que aparecem no artigo de Villamil, os quais

extravasam os limites convencionais do campo literário. Certamente Villoro

entende o papel do intelectual e do escritor na América Latina, declarando “eu

jamais escrevi crônica fora de um senso de “responsabilidade social””

(VILLORO, 2002c, p.67, tradução minha). E certamente seus escritos sugerem

que a crítica literária não pode viver enclausurada em uma torre de marfim,

porque a sua matéria prima, a literatura, está inevitavelmente interligada à vida

política e às vertentes da história.

Em 2000, ano emblemático, principalmente para o cenário político

mexicano, Juan Villoro e Jorge Volpi, este último um dos fundadores do Crack,

são entrevistados pela revista El Cultural sobre muitos assuntos. Questionados

por que os intelectuais latino-americanos, tradicionalmente, estão

Page 40: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

40

comprometidos com seu tempo, sempre refletindo de maneira lúcida sobre o

período em que se encontram, ambos respondem separadamente. Em

conjunto, no entanto, suas respostas traçam um perfil do intelectual latino-

americano que implica diretamente na delimitação do campo de atuação e da

autoridade social deste no cenário atual, como afirma Villoro:

El intelectual tiene un papel social protagónico en países atrasados. Como domina una forma de la dificultad (la escritura), a la que pocos tienen acceso, se convierte en intérprete de emergencia y gurú accidental de todos los asuntos. La participación de los intelectuales como profetas de lo real ha ayudado a evitar males peores y en muchas ocasiones ha sido heroica; sin embargo, también ha dotado al escritor de un aura casi religiosa. En el futuro, con más democracia e igualdad, los escritores mexicanos serán menos importantes como guías morales y más como poetas o contadores de historias (VILLORO, 2000b, p.3).

Villoro tornou-se professor de Literatura na Universidade Nacional

Autônoma do México (UNAM), sendo também professor convidado das

Universidades de Yale, de Boston, de Pompeu Fabra e de Princeton. Obteve o

reconhecimento de seu trabalho com prêmios importantes, como: Premio

Xavier Villaurrutia por La casa pierde em 1999; Premio Herralde de Novela por

El testigo em 2004 (com um jurado composto por Enrique Vila-Matas, Salvador

Clotas, Juan Cueto entre outros); obteve o Premio Internacional de Periodismo

Vázquez Montalbán na categoria de jornalismo esportivo por Dios es redondo,

livro de ensaio e crônicas sobre futebol em 2006; Premio Internacional de

Periodismo “Rey de España” por La Alfombra roja, el império del narcotráfico

em 2010; Premio Iberoamericano de Letras José Donoso em 2012, Homenaje

Nacional de Periodismo Cultural "Fernando Benítez" de la FIL-Guadalajara pela

"riqueza e a variedade" de sua obra como escritor e jornalista em 2013;

Premio de Excelencia José Emilio Pacheco em 2015; Premio Crónica en

México em 2015, entre outros.

As primeiras criações literárias de Villoro foram três contos incluídos em

Zeppelín compartido, uma coletânea organizada por Miguel Donoso Pareja,

tendo então se iniciado como escritor. Fez sua estreia na narrativa breve com

um conjunto de onze contos em seu primeiro livro La noche navegable (1980).

Aluno da oficina literária de Augusto Monterroso entre 1976 e 1977, exerceu o

Page 41: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

41

cargo de adido cultural na Embaixada do México em Berlim, entre 1981 e 1984.

Além da narrativa, da crônica, dos artigos jornalísticos, do ensaio, das letras

para músicas, da literatura infantil, de traduzir a obra Aforismos (2012), de

Georg Christoph Lichtenberg e também a tradução de vários de textos de

Truman Capote, que certamente influenciaram seus escritos, ele escreveu

roteiro para teatro e cinema. Pode-se citar, então, o filme Vivir mata (2002),

dirigida por Nicolás Echevarría, para o qual, além do roteiro, escreveu as letras

das várias canções inéditas musicalizadas pelo grupo de rock Café Tacuba.

A leitura do romance De perfil (1966), de José Agustín16, o fundador da

corrente literária La Onda, foi “la que despertó su vocación literaria a los quince

años” (ESQUEMBRE, 2011, p.1). Villoro dedicou seu primeiro livro de crônicas

Tiempo transcurrido a esse escritor. Anos depois, na crônica “¡Hombre en la

inicial!”, de Los once de la tribu, o narrador disse: “Jorge y yo ignorábamos que

se podía escribir ficción en la primera persona; leímos De perfil como trozo de

vida” (VILLORO, 1998, p.18). Como declarou em entrevista a Elena

Poniatowska (2016), o cronista pensou que se tratava de confissões de um

adolescente.

Nota-se que em muitas crônicas do autor aparece sua biografia, porém

percebe-se também que ele não teve a pretensão de torná-las crônicas

autobiográficas. Apresentou-as como memórias, evocações de sua vida

pessoal, literária e de seu posicionamento político, que se tecem aos eventos

narrados. No prólogo de Safari accidental, menciona sua participação em um

jornal do colégio, impresso em mimeógrafo:

La primera crónica que escribí fue un recuento del incendio del edificio Aristos, en la Avenida Insurgentes. Esto ocurrió a principios de los años setenta del siglo pasado, yo tenía unos 13 ó 14 años y tomaba clases de guitarra en el edificio. [...] Cronistas de la más diversa índole han descubierto su vocación ante el fuego: Ángel Fernández, máximo narrador del fútbol mexicano, recibió su rito de paso en el incendio del Parque Asturias, y Canetti el suyo durante la quema del Palacio de Justicia de Viena (VILLORO, 2005a, pp. 18-19).

16

O crítico mexicano Marco Antonio Campos diz que a maneira de medir a grandeza da obra de um escritor é a importância literária de seus discípulos e conclui “Si sólo mencionáramos a Juan Villoro y a Enrique Serna, la tarea de José Agustín como escritor que se convierte en maestro estaría plenamente justificada” (CAMPOS, M. A., 2006, p.1).

Page 42: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

42

Observando a relação de Villoro com a crônica, nota-se que está focado

numa sociedade heterogênea, na qual a dicotomia entre “alta” e “baixa” cultura

perde o sentido. Seus temas são amplos, porém com inclinação à cultura

divulgada nos meios massivos, não havendo assuntos menores ou

irrelevantes. Esse fato pode ser observado em seus nove livros de crônicas

publicados até o momento, mas principalmente nos quatro que fazem parte do

corpus dessa pesquisa.

Além das quatro17 obras já resenhadas na introdução, os outros livros de

crônicas do autor, por data de publicação são: Palmeras de la brisa rápida: un

viaje a Yucatán, 1989; 8.8: El miedo en el espejo: una crónica del terremoto en

Chile, 2010; ¿Hay vida en la tierra?, 2012; Espejo retrovisor (2013), Balón

dividido (2014), conforme anexo III, além de diversas outras crônicas dispersas

em jornais da América e Europa. É autor de contos, romances e ensaios, além

de letras de músicas para filmes e bandas de rock; porém, em todas essas

produções, a crônica e a cultura de massa estão ali, não como pano de fundo,

mas ocupando a centralidade das discussões. É o meio utilizado por Villoro

para falar do cidadão mexicano, de sua cultura, de sua história, das questões

sociais, econômicas, políticas e da modernidade no México.

Na obra Palmeras de la brisa rápida: un viaje al Yucatán (1989), o

narrador é um jovem cronista que percorre de carro a península de Yucatán e

apresenta com muita ironia seu ponto de vista. Nesse livro, além da peculiar

visão da identidade mexicana e da presença da cultura popular, nota-se sua

percepção da realidade desse país e sua própria biografia dentro dessa

realidade. Villoro, que recebeu influência dos escritores da Onda, os quais

rejeitavam a temática dominante no México a partir da Revolução Mexicana,

sobre a busca da “identidade do ser mexicano”, como se observa nas obras El

perfil del hombre (1934), de Samuel Ramos, ou El laberinto de la soledad

(1950), de Octavio Paz, tratando de desmontá-la através da ironia. Os

escritores da Onda foram os primeiros a romper com essa ideia, reivindicando

a nova cultura pop, que não necessariamente inclui a cultura popular presente

em Juan Villoro, como menciona Masoliver Ródenas:

17

Anexo II.

Page 43: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

43

Lo interesante en el caso de Villoro es cómo partiendo de una biografía real ha inventado un personaje que es la voz narradora de sus libros, donde esta visión de lo popular coincide con su visión de un México que surge más de la realidad contemporánea que del fatalismo de la Historia (MASOLIVER RÓDENAS, 2011, p. 43).

Já o livro de crônicas 8.8: el miedo en el espejo (2011) relata o violento

terremoto ocorrido no Chile. Villoro se encontrava nesse país para assistir a um

evento literário, tornando-se testemunha do acontecimento, experiência que em

seu relato conecta com o vivido em 1985 no México, quando um terremoto

destruiu parte da cidade.

¿Hay vida en la tierra? (2012) está composto por cem crônicas que

foram publicadas em diversos meios: La Jornada Semanal, Letras Libres e

Reforma a partir de 1995 até a publicação e que estão a meio caminho da

narração costumbrista, o relato fantástico e a reflexão antropológica. São

relatos independentes, mas que podem ser lidos como um ciclo, pois muitos

personagens se repetem como a mãe do narrador e os amigos Cacho e Frank.

É interessante observar nas resenhas publicadas até o momento a respeito

dessa obra, que cada crítico a qualifica de uma maneira distinta, pois uns

acreditam ser relato; enquanto outros, artigo, conto ou crônica. Há quem a

denomine artigo-conto ou mini-crônica. Ignacio Chavarría a apresentou como

jornalismo experimental. Enfim, são textos que permitem redescobrir com

assombro o ordinário.

A partir de uma seleção de contos e crônicas dos últimos trinta anos, e

também com contos inéditos, surge Espejo retrovisor, publicado em 2013.

Neste arquivo narrativo se confrontam a condição humana da atualidade: a

família, a política, as viagens, o rock e uma análise dos mistérios da vida

literária.

Um esporte tão popular como o futebol está muito presente nas crônicas

de Villoro. Torcedor de uma equipe mexicana, "El mercurial Necaxa es el

equipo de mi calle. Poco importa que ese trozo de ciudad haya cambiado.

Tampoco importa que yo haya dejado de vivir ahí. […] Una calle es para

nosotros lo que estuvo (la infancia, el Necaxa). Por eso vale la pena"

(VILLORO, 2006b, p.21) e de uma espanhola “Mi primer regalo fue un llavero

del Barça. En 1962, a los seis años. Pude ver por primera vez a «mi» equipo en

Page 44: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

44

su gira por México” (VILLORO, 2006b, p. 19), assim Villoro expõe sua conexão

com esse esporte. É realmente um aficionado por futebol. Além de Dios es

redondo (2006), Villoro reuniu em Balón dividido (2014) uma série de crônicas

que se conectam entre a literatura, a psicologia, a história, frases e

personagens da cultura popular através de figuras recentes do esporte como:

Messi, Cristiano Ronaldo, Pep Guardiola, Piqué entre outros.

Além das crônicas, contos e dos romances, Villoro publicou também dois

livros de ensaios, nos quais claramente se podem notar características de

crônicas: Efectos personales (2001), que reúne uma série de quinze ensaios

divididos em três partes. A primeira, sobre escritores de língua espanhola,

como: Alejandro Rossi, Augusto Monterroso, Carlos Fuentes, Ramón del Valle

Inclán, Roberto Arlt, Juan Rulfo, Sergio Pitol; na segunda, discute literaturas em

idiomas estrangeiros: Arthur Schnitzer, Italo Calvino, Thomas Bernhard, William

Burroughs, Vladimir Nabokov, Robert Louis Stevenson, propondo um fluido

diálogo entre as literaturas da América e da Europa. Entre ambas as partes

estão dois ensaios que questionam a exótica pré-noção europeia sobre a

literatura e a cultura latino-americanas. No prólogo dessa obra, esclarece que o

texto de Burroughs está “por momentos más cerca de la crónica que del

estudio literario” (VILLORO, 2001, p.9).

Já em De eso se trata (2008), Villoro amplia o arco, indo desde o

Renascimento até os autores hispano-americanos, os quais, ele mesmo relata,

são essenciais para sua formação: Onetti, Borges e Bioy Casares. Para Villoro,

o ensaísta é como um dedo indicador apontado para um fato de que não havia

sido visto e que não há como captar em fotografia o instante entre a mão que

aponta e o olhar de quem observa. E é desse gesto que depende o ensaio.

Além de De eso se trata e Efectos personales, Villoro tem uma série de

ensaios dispersos em variados meios. No ensaio publicado em 2012, em

Buenos Aires, Antología Esencial de Carlos Monsiváis, apresenta um intitulado

“Instantáneas hacia un cronista”, e nele relata que, se um cronista mexicano

tiver o atrevimento de consultar um tema sobre o qual pretenda escrever, irá

descobrir que alguém já havia se adiantado e declara: “Carlos Monsiváis es el

turista japonés de los tiempos que nos constan: ya tomó todas las fotos y ya

probó todos los platos típicos (VILLORO, 2012c, p. 1).

Page 45: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

45

Juan Villoro, escritor que sobressai no contexto literário mexicano, tem

demonstrado em cada discurso, entrevista e em muitas de suas obras,

principalmente suas crônicas, um posicionamento crítico, como observado no

discurso proferido ao receber o Premio Excelencia en las Letras José Emilio

Pacheco 2015, declara que

la literatura no puede dejar de ejercer su valor político porque es la más eficaz ventanilla de quejas contra los desastres del mundo. […] el arte no cierra los ojos ante los agravios, pero también demuestra que incluso en el horror hay algo que no es horror. Preservar la ironía, la sensualidad y la experiencia lúdica, son tareas de resistencia” (VILLORO apud CAMPOS, 2016, p.1).

1.2 A linguagem cronística de Juan Villoro

A crônica oferece diversas características que a aproximam do leitor:

retomam um assunto que já foi discutido, é um texto curto, apresenta registro

do cotidiano, mas, principalmente, a linguagem informal, favorecida pelo

envolvimento das duas modalidades discursivas: oral e escrita, as quais

colaboram para essa maior conexão entre o leitor e a crônica. Essa linguagem

é constituída por um jogo de argumentação enredado em si mesmo, com o

objetivo de construir um mundo através das palavras e persuadir o interlocutor.

Ao destacar, nesse capítulo, elementos estilísticos como o humor, a

ironia e o aforismo, não significa que todas as crônicas de Villoro girem em

torno desses elementos, mas pretende-se apresentar uma rede de caminhos

possíveis para adentrar no espaço aberto, acidentado e sinuoso, que é sua

produção cronística.

Page 46: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

46

1.2.1 Ironia e humor: uma forma de resistência

Ora, a crônica está sempre ajudando a estabelecer ou restabelecer a dimensão das coisas e das pessoas. Em lugar de oferecer um cenário excelso, numa revoada de adjetivos e períodos candentes, pega o miúdo e mostra nele uma grandeza, uma beleza ou uma singularidade insuspeitada. Ela é amiga da verdade e da poesia nas suas formas mais diretas e também nas suas formas mais fantásticas

– sobretudo porque quase sempre utiliza o humor18

. Antonio Candido

Yo creo que la literatura puede ser seria y hacer reír también19

.

Juan Villoro

Nessa parte da pesquisa, pretende-se apresentar uma breve análise de

como Juan Villoro utiliza a ironia e o humor como ferramenta de crítica e de

reflexão sobre um discurso essencial a respeito do mito da identidade nacional,

os paradoxos da vida cotidiana urbana e o consumo. Como comenta em

entrevista

Más que una construcción es una manera de ser. Hay algo que me parece terrible, que es cuando alguien se hace el chistoso, cuando alguien quiere causar gracia de manera forzada. Eso es lamentable. En cambio, cuando surge una opinión irónica y brota natural frente a lo que se está contando, creo que el efecto puede ser más interesante. Estoy convencido de que la función del sentido del humor no es tanto la risa como hacer pensar. Mostrar las cosas de otra manera (VILLORO apud LARA RAMOS, 2014, p.5).

O humor na literatura mexicana era um recurso utilizado com pouca

frequência até a década de sessenta do século passado. No entanto, já podia

ser percebida nos ensaios de JulioTorri, nos romances de Genaro Estrada, nas

poesias de Renato Leduc e nas crônicas de Salvador Novo e de Carlos

Monsiváis, que exploraram o registro humorístico em seus textos. Nota-se,

entretanto, que esse elemento nunca ocupou um espaço privilegiado na cultura

mexicana.

Carlos Monsiváis, no prólogo da Antología de la poesia mexicana del

siglo XX, comenta que a grande pendência da literatura mexicana era com o

humor. Esse fato pode ser observado em uma rápida análise dos títulos de

algumas obras clássicas: El luto humano (1943), de José Revueltas; Los dias 18

Fragmento do ensaio “A vida ao rés-do-chão” de Antonio Candido, 1992, p. 14. 19

Trecho da Conversa pública “Charlando con Juan Villoro”. Disponível em:https://www.youtube.com/watch?v=wURkL8KyBxg Último acesso em 28.08.2016.

Page 47: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

47

enmascarados (1954), de Carlos Fuentes; El labirinto de la soledad (1950), de

Octavio Paz; Muerte sin fin (1939), de José Gorostiza; Nostalgia de la muerte

(1938), de Xavier Villaurrutia; El llano em llamas (1953), de Juan Rulfo, entre

outras que envolvem situações limite. No entanto, é a partir de Jorge

Ibargüengoitia, que se considera que o humor deixa de ter um caráter

ocasional para torna-se a concepção de toda uma obra. Villoro compilou suas

crônicas em uma antologia intitulada Revolución en el jardín (2009), fazendo,

também, o seu prólogo. Ibargüengoitia dedicou-se ao teatro, além de escrever

contos, romances, ensaios. Deste modo:

forjó una vasta obra periodística, que rebasa la caducidad del género y adquiere jerarquía literaria. De hecho, muchos de los procedimientos narrativos más celebrados en Ibargüengoitia pueden encontrarse en estas crónicas que poseen, en el mayor grado, poder de síntesis, distancia crítica, agudeza y amenidad (GONZÁLEZ TORRES, 2009, p.1).

A obra de Ibargüengoitia aborda variados temas e sua produção

cronística pode ser dividida em quatro grandes temas: “la complicada vida

cotidiana en México; las nimiedades del mundo intelectual; la mecánica del

viaje y el catálogo de las costumbres y manías nacionales” (GONZÁLEZ

TORRES, 2009, p.1). É importante destacar que Villoro, em suas crônicas,

reflete sobre a vida cotidiana e os costumes nacionais com um caráter de

humor, assim como o escritor de Guanajuato que, em seus escritos, propõe

mais que uma ética, enfatizando uma visão cética da condição humana.

Ibargüengoitia, assim como Villoro, não estão escarnecendo ou desdenhando

do México, senão das coisas que não estão bem e utilizam principalmente o

humor como um efeito de esclarecimento lúdico da linguagem. Assim afirma

Villoro sobre a obra desse escritor:

Su obra en un país tan dolido como el nuestro, pocas cosas son tan rebeldes y disidentes como sentirse bien, a veces todo conspira para que estemos bien, dispongamos de nuestro humor, alegría, ilusiones y sensualidad, eso es lo que nos da toda la obra de Jorge Ibargüengoitia (VILLORO apud LUIS, 2016, p.1, destaque do autor).

Esse escritor é importante para a formação literária de Villoro, a quem

dedica dois ensaios: “El diablo en el espejo” (2002c) e o prólogo “El cronista en

su jardín” (2009c). Logo no início do primeiro ensaio, ele destaca a

Page 48: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

48

preocupação com os temas políticos que aparecem em suas crônicas e diz que

Ibargüengoitia

fue el cronista rebelde de una nación avergonzada de su intimidad e incapaz de ver en su Historia otra cosa que próceres de bronce. Para el escritor guanajuatense, los héroes no se forjan en el cumplimiento del deber sino en los avatares de su muy humana condición. Más de una batalla se ha ganado porque un general deseaba almorzar su guiso favorito en cierta hostería de la ciudad ocupada. La satisfacción de los deseos más nimios y los insondables azares provocan las peripecias que los políticos y la costumbre transforman en epopeyas. Desmitificador de tiempo completo, Ibargüengoitia buscó los vínculos entre la alcoba y el poder, los vapores de la cocina y el Palacio Nacional. Escribió a contrapelo en un país donde los gobiernos emanados de la Revolución definieron la vida pública de 1929 a 2000. Esos 71 años dejaron solemnes monumentos en todas las ciudades (VILLORO, 2002c, p. XXIII).

Nesse trecho, Villoro ressalta a solenidade do discurso revolucionário, o

qual havia imperado no México durante várias décadas, além de ressaltar a

maneira como esse “cronista rebelde” aborda esse tema em seus textos,

mostrando de que forma ele escapa de algumas vertentes da época. Afinal,

segundo Villoro, ele não se aproximava dos romances da Revolução, que

representavam o conflito armado com uma visão dramática, nem do boom, pois

A diferencia de Carpentier, Roa Bastos, Fuentes, Vargas Llosa o García Márquez, Ibargüengoitia no se interesa en la cara oculta de los acontecimientos (las tramas profundas tergiversadas por los ideólogos del poder); para él, la Historia es siempre un disparate, un colosal acto fallido. Este ataque frontal a las gestas sociales lo apartó, no sólo de la noción de «intelectual comprometido», tan en boga en los años sesenta, sino de la estética dominante en la narrativa latinoamericana, que emprendía a través de la novela el recuento alterno, seguramente más verídico, de episodios velados y silenciados por una larga sucesión de gobiernos autoritarios (VILLORO, 2002c, p. XXIV).

Villoro, mais adiante, chama a atenção para a etiqueta de “humorista”

colocada pela sociedade literária, que conduz os textos de Ibargüengoitia a

uma visão reducionista, acabando por marginalizar sua obra. É basicamente

como afirma Villoro, recorrendo à análise de Gustavo Santillán: “el tópico

humorístico sirvió para comprenderlo, pero usado sin freno ha contribuído a

mutilarlo” (SANTILLÁN apud VILLORO, 2002c, p. XXIV).

Page 49: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

49

Ao utilizar a ironia e o humor em suas crônicas, Ibargüengoitia e,

certamente, Villoro percorrem entre o otimismo e o pessimismo na mesma

velocidade e fazem com que essa atitude contraditória seja explicada por uma

citação de Scott Fitzgerald utilizada por Monsiváis (cronista que também

recorre ao humor, à ironia e à sátira) para encerrar o prólogo de Entrada libre:

crónicas sobre la sociedad que se organiza, e diz “La verdadera prueba de una

inteligencia superior es poder conservar simultáneamente en la cabeza dos

ideas opuestas, y seguir funcionando. Admitir por ejemplo que las cosas no

tienen remedio y mantenerse sin embargo decidido a cambiarlas”

(MONSIVÁIS, 2013, p. 15). Essa reflexão parece condensar, de maneira

irônica, o encanto e o desencanto dos dois escritores mexicanos. Ou seja, a

ironia e o humor como atributo da inteligência, como uma forma de resistência

que permite encontrar no texto um segundo plano e acaba por proteger o leitor

da crueza dos fatos.

É importante destacar que caracterizar um texto ou um trecho como

humorístico é um juízo subjetivo e, por isso mesmo, arriscado, pois um leitor

pode interpretá-lo como cômico ou não observar nenhuma das duas

inclinações. Para melhor aclarar esses recursos estilísticos nas crônicas de

Villoro, se vale do estudo de Umberto Eco sobre a obra de Luigi Pirandello, El

humorismo (1908). Eco (1989) menciona que, para Pirandello, apesar das

inúmeras formas de pensar o cômico e o humorístico, a percepção do

“contrário” é a principal característica, ou seja, o desacordo entre o ideal e o

real. Ressalta ainda que a “percepção do contrário” pode tornar-se o

“sentimento do contrário”.

Para ilustrar a reflexão anterior, vale a pena recorrer ao elemento que

utiliza frequentemente por Villoro: a ironia de caráter pessoal, no qual aborda

com o intuito de reler os estereótipos da mexicanidade que as perspectivas

estrangeiras projetam sobre a literatura latino-americana e confessa

ironicamente que, na infância, foi uma espécie de mexicano profissional. Para

exemplificar, é pertinente destacar o relato do cronista em Safari accidental, no

qual menciona os primeiros anos numa escola alemã na Cidade do México que

destinava vagas para alunos nativos como parte de uma política de integração

cultural:

Page 50: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

50

Un extraño examen de admisión me situó en un grupo donde todas las materias (salvo Lengua Nacional) se cursaban en alemán. Así las cosas, crecí en un ámbito donde mis compañeros se llamaban Helmut, Peter y Rudy, y donde teníamos que resolver problemas matemáticos relacionados con las paradas del tren entre Colonia y Hamburgo o la cantidad de semillas de amapola necesarias para hacer un Mohnkuchen, pastel tan exótico que había sido decomisado en la Pastelería Alemana Tacubaya por un comando antinarcóticos, convencido de que se trataba de venta clandestina de opiáceos (VILLORO, 2005a, p. 117).

Mais adiante continua a reflexão:

Como yo era de los pocos mexicanos en la clase, los maestros me consultaban sobre las tradiciones vernáculas. ¿Qué pensaba mi familia de los sacrificios humanos? ¿En verdad comíamos una salsa con cuarenta chiles sin que se inconformara el colon? ¿Las calaveras de azúcar que se regalaban el Día de Muertos eran un señal de aprecio o una ofensa horrible? Me gustaba dar una versión exagerada de la patria y tal vez por eso mis maestros me consultaban más que a otros compañeros. Crecí como un folklorista exaltado entre alemanes […] (VILLORO, 2005a, p. 117).

Nos trechos destacados, observa-se um personagem com traços de

humor que foge de um perfil ideal, aproximando-se de uma fixidez de alteridade

cultural e até do caricato, estabelecendo assim o primeiro contato com o

contrário. Essa primeira observação gera o cômico, o riso imediato. No entanto,

a partir do momento em que se passa a refletir sobre essa contradição, a

situação deixa de ser cômica e aproxima-se da humorística. Sendo assim, a

diferença básica entre o cômico e o humorístico estaria, segundo Pirandello

citado por Eco, na “advertência do contrário” e no “sentimento do contrário”

provocado por essas situações (ECO, 1989, p. 253).

Ao analisar o fragmento que inicialmente provoca o riso, percebe-se que,

com a reflexão, surge certo desconforto. É o que pode ser depreendido ao

deter-se somente na situação em que se encontra a criança diante de um

permanente disfarce ou exagero de características de sua identidade, o que

pode levar a um sentimento melancólico. Nesse momento, reflete Eco: “eu

perco a minha superioridade, porque penso que eu também poderia ser ele”

(ECO, 1989, p. 253). Constata-se assim uma mistura de humor e melancolia,

que, segundo Pirandello, são traços indissociáveis. Lélia Parreira Duarte, em

seu estudo sobre a ironia, retoma a ideia de Arthur Schopenhauer, que também

observa a seriedade por trás do humor, e diz:

Page 51: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

51

Schopenhauer chama-o de humorismo (1991, pp. 77-83), explicando que, quando a brincadeira se esconde atrás da seriedade, surge a ironia, e quando a seriedade se esconde atrás da brincadeira, surge o humorismo. A inspiração do humorismo seria uma disposição subjetiva, séria e elevada, que involuntariamente se choca com um mundo brutal que lhe é heterogêneo ou hostil [...] (DUARTE, 1996, p.36).

O humor presente na maioria das crônicas de Villoro passa por essa

acepção, na capacidade de transformar o desagradável em risível, o qual

frequentemente dá lugar ao humor, à ironia e à melancolia.

Em “El escape de Disney World”, o narrador anuncia, desde o título, num

jogo com a preposição “de” em lugar de “a”, o intuito de relatar que havia

escapado de um dos espaços mais emblemáticos da cultura norte-americana.

Esta crônica é uma demonstração pertinente de como através de um texto

composto das vivências do cronista como viajante em terra estrangeira,

misturadas a impressões reais e imaginárias coletadas nesse ambiente, com

um viés de humor e ironia, converte-se em crítica ao capitalismo, ao

neoliberalismo e em análise sociológica da cultura de massa, procurando

observar como o turismo se torna uma grande viagem-espetáculo (MORIN,

2011). Logo no início, declara “En el siglo de las caricaturas no es extraño que

el Reino de la Fantasía tenga por logotipo a un roedor de manos enguantadas.

Como la estrella de Mercedes o el doble arco de McDonald’s, Mickey es una

marca registrada” (VILLORO, 2005a, p.171). Nela, Villoro adota um olhar

peculiar, no qual a viagem com a família se converte de diversão em

investigação e Disney World, parque infantil por antonomásia, governado por

um rato limpo “explicó Walt Disney, lo cual no significa que esté dispuesto a

lavarse las orejas” (VILLORO, 2005a, p. 172), representa os sonhos da

indústria do espetáculo, a hiper-realidade que transforma Mickey Mouse em um

emblema corporativo, e um parque se torna a primeira cidade “con copyright”

(VILLORO, 2005a, p.178). Anadeli Bencomo em seu artigo “Los enemigos del

Mickey” diz que Villoro “reitera sus impresiones e incriminaciones ante un

parque percibido como hábil manipulación mercadotécnica” (BENCOMO, 2012,

p. 203).

Outros escritores também retrataram em seus textos esse microcosmo

da indústria norte-americana do entretenimento

Page 52: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

52

para Jean Baudrillard, por ejemplo, “Disneylandia es un modelo perfecto de todos los órdenes de simulacros entremezclados” (25), para Umberto Eco es un espacio hiperreal, para Marc Augé Disney ofrece la experiencia límite de libertad y vacío, mientras para Louis Marin Disneyland representa una utopía degenerada (BENCONO, 2012, p. 200).

Desde de o início dessa crônica, Villoro indica que o percurso será

acompanhado pela reflexão de “Umberto Eco [que] advirtió que cada atracción

de Disney World desemboca en un supermercado disfrazado donde compras

obsesivamente, creyendo que todavía estás jugando” (VILLORO, 2005a, p.

172) e também do escritor e urbanista estadunidense Michael Sorkin, “que

argumenta que el éxito de Disney World depende, en buena medida, de su

deliberada inautenticidad” (VILLORO, 2005a, p.178). Ou seja, o parque será

analisado como ícone da hiper-realidade, como um simulacro no qual o

consumismo fica subjacente ao cenário onírico em que “puedes pagar en

dólares o en moneda local, que parece acuñada por un banco de dibujos

animados. Aunque la equivalencia es de uno a uno, los Disneydólares

representan algo más que una divisa: el ingreso a otra realidad” (VILLORO,

2005a, p. 171). As lojas coloridas e repletas de desenhos induzem à compra de

maneira descontrolada, pois se entra na lógica da fantasia, e o dinheiro se

torna também um brinquedo, além de cumprir a função de “lembrancinha”, pois

muitos ficam com os Disneydólares, ou seja, decidem “não gastar”, guardar

como recordação, esquecendo que já gastaram.

Nessa micro-sociedade, na qual parece que há uma obrigação de

sensação de bem-estar, pois não querem parecer que gastaram dinheiro e não

se divertiram o suficiente, os pais cumprem todos os desejos dos filhos

comprando coisas desnecessárias. O país capitalista em miniatura tenta tirar o

máximo do visitante. Em um lugar em que o mais importante é mover-se,

ironicamente, comenta Villoro um dado estatístico: “Los sociólogos del

deterioro calculan que en un día promedio, una visita de ocho horas puede

estar compuesta por cinco horas de colas” (VILLORO, 2005a, p.176). Por isso

as filas são em forma labiríntica, há objetos bem colocados como plantas e

cartazes, além de estarem em lugares cobertos para dar a impressão de que

não são extensas. Tudo isso combinado, inclusive com música põe à prova os

Page 53: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

53

nervos dos pais que, depois de tantas horas, como comenta o cronista com

uma dose a mais de humor:

Confieso que pasé por todas estas fases del lugar común e ingresé con mi hijo en un vagón vagamente vaquero que subió y bajó rieles en espiral hasta demostrarnos que la verdadera emoción consistía en recorrer de espaldas una rueda de 360 grados. Mientras apretaba los dientes en lo alto, también me apretaba el pecho para que no se me cayeran las tarjetas de crédito. La imagen revela algo más que los miedos del ciudadano capitalista ante el desplazamiento inmoderado: Disney World te sacude como muñeco de caricaturas hasta sacarte el último centavo (VILLORO, 2005a, p. 172).

No fechamento da crônica, Villoro narra os últimos momentos no parque

e a chegada ao aeroporto uma hora depois do horário previsto, quando já não

tem mais tempo de despachar as malas. Assim são obrigados a levá-las

consigo e, quando tentam passar por um detector de metais, “se dispara un

ruído atronador. Un comando descubre que el hijo lleva un revólver en la

maleta, junto a su cocodrilo de peluche. No importa que el arma sea una estafa

comprada en el galerón […]” (VILLORO, 2005a, p.180). Esse trecho demonstra

o quanto irônica é a situação, pois o parque vende as armas de brinquedo para

os turistas, que não podem levá-las e, como não conseguiram despachar,

comenta o cronista: “Hay que decir adiós a las armas y correr rumbo al tren sin

dejar de gritarle al huérfano de armamento: “¡en México podemos comprar una

AK-47!” (VILLORO, 2005a, p.180). Observa-se que, nesse momento,

abandona-se o simulacro, o mundo perfeito e os sentimentos descritos. Em

chave irônica, demonstra que voltam para o mundo real, ou seja, um mundo

autêntico, contrário do mundo inautêntico, mas nem todos ““¡Este juego si

estuvo genial!”, comenta el hijo, después de experimentar la única emoción real

que permite Disney World: el inesperado escape” (VILLORO, 2005a, p.180).

Juan Villoro nasceu na década de cinquenta, momento em que pairava

sobre a intelectualidade mexicana a filosofia do “ser mexicano”. Essa filosofia,

embalada por Octavio Paz, Luis Villoro e Leopoldo Zea, entre outros, partem da

premissa “de que un pueblo mexicano era sólo posible por una identidad

psicológica común” (SÁNCHEZ-PRADO, 2006, p. 371). Alguns escritores

Page 54: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

54

contemporâneos20 prescindem intencionalmente deste tema, porém Villoro o

converte em assunto central de alguns de seus textos, recorrendo à sátira, ao

riso, ao humor e à ironia para desmontar estereótipos de uma identidade

nacional, local e de fronteira, revelando os excessos provocados pelo sistema

capitalista global.

O título da crônica “Nada que declarar: welcome to Tijuana” faz

referência ao trecho da música do cantor e compositor hispano-francês Mano

Chao, que é citada textualmente: “Welcome to Tijuana/ tequila, sexo y

mariguana/ con el coyote no hay aduana” (VILLORO, 2005a, p. 132). Com esse

trecho, o narrador introduz os chamados bichos da fronteira: o coiote “indica el

que habla mal y dispone del picaporte secreto para que los mexicanos entren a

Estados Unidos” (VILLORO, 2005a, p.132); a foca “animal indeciso entre el mar

y la tierra” (VILLORO, 2005a, p.132) e a “zebra” ou “burros pintados de cebras.

Por razones insondables, a los turistas les gusta retratarse junto a esta

arbitrariedad veterinaria” (VILLORO, 2005a, p.132), demonstrando a

construção de um imaginário coletivo, principalmente norte-americano, que

desenha Tijuana como uma cidade festiva, nascida para a recreação e

exploração do ócio consumista, como meio de transporte para a degradação

humana, com prostíbulos disfarçados de bares e salas de massagens, crianças

indigentes e policiais corruptos. Villoro, citando García Canclini, chama Tijuana

de “uno de los mayores laboratorios de la posmodernidad” (VILLORO, 2005a,

p.131). Percebe-se que, para o cronista, essa cidade fronteiriça é a foto da

globalização, inclusive pela presença da cultura chinesa: “Ahí los chinos fueron

bien venidos porque el terreno se consideraba inhabitable. Con el sigilo de una

tribu que generalmente vive en las cocinas, se extendieron por toda la frontera”

(VILLORO, 2005a, p. 134). Ou seja, os chineses somente foram quistos nessa

região porque era considerada a pior. Ironicamente, o cronista menciona que

não era, mas o fato permaneceu em segredo porque eles ocupavam posições

subalternas.

Ao evocar essas imagens sincréticas que, somadas a outras, como a da

economia informal, através da venda de objetos, como máscaras do

20

Entre os escritores mexicanos contemporâneos que rejeitam essa temática estão os do grupo Crack.

Page 55: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

55

expresidente Salinas de Gortari e artesanatos como Bart Simpson, Pocahontas

e Aladin de gesso, Villoro representa a fronteira como uma realidade hiper-real,

pois não é o que parece ser e coloca em evidência a consolidação neoliberal

através de intervenção na cultura e na economia mexicana.

O cronista se fixa na falsa identidade ou na identidade imaginada

(inspirada em Comunidades imaginadas, Benedict Anderson) para refletir sobre

a construção de estereótipos a partir de diferentes ângulos, demonstrando o

exotismo imposto desde Estados Unidos e Europa e auto imposto por questões

de sobrevivência, como se observa com relação aos burros pintados de zebras,

nos quais García Canclini, ao recolher a fala de seus entrevistados na obra

Culturas Híbridas (2008) a respeito de Tijuana, comenta que:

Em várias esquinas da Avenida Revolución há zebras. Na realidade são burros pintados. Servem para que os turistas norte-americanos sejam fotografados com uma paisagem de fundo [...]. “Frente à falta de outro tipo de coisas, como no sul, que tem pirâmide, aqui não tem nada disso... a gente tem que inventar alguma coisa para os gringos”, disseram em um dos grupos (GARCÍA CANCLINI, 2008, p. 321).

Ao se aproximar de um fato como esse, é natural o riso. Analisando-se,

porém, os comentários daqueles que vivem desse ofício, observa-se que há

uma situação econômica grave por trás e que, ao abordar esse tema, o

cronista, assim como o antropólogo, não tem a pretensão de fazer rir, mas

denunciar, levar à reflexão.

Em “Retrato de grupo: 100 millones de mexicanos”, Villoro recorre à

imagem estereotipada de Tijuana nos filmes americanos, de maneira ácida, diz:

Definirse a sí mismo es un ejercicio de comparación. México y Estados Unidos comparten la frontera más cruzada del mundo y en buena medida lo “mexicano” sirve para distinguirnos de Gringolandia, esta Siberia donde el guacamole deja de picar. Hollywood padece el mismo afán de autoafirmación y ha codificado al mexicano como el hombre dormido junto a su burro, que despierta para traicionar a su madre por una botella de aguardiente, se arrepiente demasiado tarde y azota su sombrero contra el piso (siempre lleno de polvo). Las películas recientes repiten el canon. En Pulp Fiction, unos gángsters asaltan una cafetería de Los Ángeles al grito de: “¡Saquen a los mexicanos de la cocina!”, y en Traffic, las escenas que ocurren en Tijuana parecen reveladas en aceite para freír quesadillas: un amarillento refugio de narcos (VILLORO, 2005a, p. 39).

Page 56: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

56

Há no tema Tijuana questões políticas subjacentes que, nas primeiras

linhas de “Nada que declarar”, são convocadas pelo cronista: “En una de sus

mejores parodias, Adolfo Bioy Casares y Jorge Luis Borges inventaron a un

escritor tan comprometido con su realidad que sólo describía lo que pasaba en

la esquina nor-noroeste de su mesa de trabajo” (VILLORO, 2005a, p. 131),

porém como ele é “Menos prudente que ese personaje, acepté escribir sobre

Tijuana, el ángulo nor-noroeste del país” (VILLORO, 2005a, p. 131). Nesse

trecho, está condensado implicitamente um plano oficial do governo de Miguel

de la Madrid, intitulado Programa Cultural de las Fronteras, cujo objetivo era

“afirmar a identidade mexicana na fronteira norte” (GARCÍA CANCLINI, 2008,

p. 325). Villoro, recorre ao humor para escrever a crônica e decide ir além do

que passa a noroeste de sua mesa de trabalho.

O projeto governamental recebeu alguns apoios, porém muitos

intelectuais locais se posicionaram contra, por não ser um programa

verdadeiramente inclusivo e por privilegiar projetos culturais e literários que

enfatizavam tradições da cultura nacional em detrimento das diferenças

regionais e “reforzaban el mito de la pureza de la identidad mexicana”

(TABUENCA CÓRDOBA, 1997, p. 93), entre eles, o jornalista Felix Miranda

que, como comenta o cronista “El Gato Félix promovió la campaña “chilangos

go home21” antes de ser asassinado (hasta donde se sabe, no por un

capitalino22)” (VILLORO, 2005a, p.132). Muitos escritores tijuanenses se

dedicaram a criticar, não só o governo, mas também os escritores que

abordaram, em seus textos, temas que tivessem envolvido Tijuana23.

Nessa crônica, Villoro recolhe diversos símbolos, como burro-zebra,

mexicanos cozinheiros, o sombreiro empoeirado, entre outros, que o turista

constrói no imaginário sobre a cultura da fronteira norte e da mexicana em

21

O título dessa campanha faz referência ao filme E.T – o extraterrestre, produção estadunidense de 1982, dirigido por Steven Spielberg. Em uma das principais cenas do filme, o protagonista diz Et go home. 22

O jornalista Félix Miranda foi assassinado em 1988. Na época se levantou a suspeita de que o motivo seria a sua militância contra esse projeto, segundo a reportagem publicada na revista eletrônica Sin embargo. No entanto, após cumprir vinte e cinco anos de prisão, o assassino confesso do jornalista foi liberto e recorreu a seu ex patrão, um importante político da região para solicitar apoio (SIN EMBARGO, 2015, p.1). 23

Certamente as críticas mais ácidas partiram de Heriberto Yépez em sua Tijuanologías, no qual critica a proliferação de escritos sobre Tijuana, não somente a Juan Villoro e Luis Humberto Crosthwaite, mas também à pesquisa de Néstor García Canclini em Culturas Híbridas, entre outros.

Page 57: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

57

geral. A partir daí, vai promovendo essa desmontagem através do humor e da

ironia, demonstrando que a discussão é outra: “Lo primero que el visitante ve al

aterrizar en la ciudad donde los burros se disfarzan es el muro de metal que el

ejército de Estados Unidos usó para que sus vehículos avanzaran en las dunas

durante la tormenta del desierto24” (VILLORO, 2005a, p. 133, destaque do

autor), e que essas imagens eram pretextos para a aproximação de temas

duros.

O humor e a ironia presentes nas crônicas de Villoro avançam em

variados temas, dos quais somente dois foram destacados: o capitalismo e a

identidade nacional. Mas poderia ser o futebol, a cultura de massa ou o EZLN,

pois a utilização desses meios não limita nem impede uma aproximação crítica

com a realidade mexicana. Ao contrário, é o meio no qual este se apoia para

essa aproximação, pois, como menciona Hutcheon:

Muitos adversários do pós-modernismo consideram a ironia como sendo fundamentalmente contrária à seriedade, mas isso é um equívoco e uma interpretação errônea sobre a força crítica da dupla expressão [...]. Na verdade, talvez a ironia seja a única forma de podermos ser sérios nos dias de hoje (HUTCHEON, 1991, p. 62).

A respeito do líder do movimento zapatista, o cronista reflete como

ocorre a combinação de personagem de ficção e combatente de guerra criado

por Marcos:

Pero hay que matizar el entusiasmo que despierta el Tucídides de la jungla. El culto a la personalidad del subcomandante pasa por la literatura. Verlo sobre todo como un escritor, secuestrarlo al terreno de la ficción, significa un doble atentado: a sus objetivos políticos y a la literatura (VILLORO, 1998, p. 271).

Em “Iguanas y dinosaurios. América Latina como utopia del atraso”,

Villoro evoca um episódio de Materia dispuesta (1996), no qual um grupo de

artistas mexicanos contratados para ir ao estrangeiro atravessam um drama: o

de não parecerem tipicamente mexicanos, pois uns são brancos; outros,

mestiços ou loiros:

24

Esse foi o nome de um plano de ataque colocado em prática pelos Estados Unidos, comandado por George Bush (pai) e outras trinta e quatro nações contra Iraque em resposta à invasão do Iraque ao Kuwait, na década de noventa, cujo número de vítimas é incerto.

Page 58: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

58

Una compañía de teatro mexicana es invitada a una gira europea. Antes de la partida, el promotor hace una recomendación: para tener éxito en ultramar, deben lucir más mexicanos. Los actores caen en un vértigo de la identidad: ¿cómo pueden disfrazarse de sí mismo? El director contrata a unos percusionistas caribeños, que nada tienen de mexicanos pero que en Europa parecerán salvajemente oriundos, y los actores se someten a sesiones de bronceado para ser dignos representantes de la «raza de bronce». En un travestismo cultural, los actores de la novela integran una nueva tribu, de pieles infrarrojas, pigmentadas para no decepcionar a los extranjeros. Estamos ante la más absurda autenticidad artificial (VILLORO, 2001, p.112).

Villoro lê atentamente a tradição literária mexicana. A ironia com que

aborda esse tema é para demonstrar que no momento em que foi pensado, ou

seja, no início do século passado, era válido, pois havia a necessidade de

fortalecer a identidade nacional em construção. No entanto, essa autenticidade

e tipicidade não são possíveis, pois “Nadie puede ser típico para si mismo”

(VILLORO apud GORODISCHER, 2008, p. 1). A crítica surge dessa sede de

exotismo sobre o mexicano e se poderia acrescentar também, o latino-

americano, que a cultura europeia e, principalmente, norte-americana tem

insistido em tentar identificar. Através da ironia e do humor, esse autor deixa

para trás as questões do “ser nacional” e avança com muita clareza para a

cultura de massa, tecendo elementos simbólicos da cultura popular mexicana,

com música, futebol e uma variação de cenários dissimiles entre o cinismo e o

disparate, que procuram demonstrar que conservar esses recursos estilísticos

em suas crônicas também é uma forma de resistência.

1.2.2 Aforismos: um estudo liminar

Un aforismo no coincide nunca con la verdad; es una media verdad o una verdad y media

25.

Karl Kraus

Villoro desenvolveu um estilo com uma linguagem fluida, sem

rebuscamento vocabular ou metáforas excessivas. Com temas literários,

25

Fragmento do ensaio de Juan Villoro “El arte de condenar”. Publicada en la Revista de la UNAM, en octubre de 2010d. Disponível em:

http://www.revistadelauniversidad.unam.mx/8010/villoro/80villoro.html Último acesso em: 23.10.2016.

Page 59: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

59

jornalísticos e massivos, no entanto, essa aparente simplicidade disfarça uma

combinação elaborada, compacta, no qual, além das greguerías26, destaca-se

também a ironia, o humor e um elemento que faz com que sua prosa seja

diferenciada, pois utiliza em suas crônicas, com equilíbrio, o aforismo. É o que

ressalta o escritor Sergio González Rodríguez (2013), quando diz que em:

Sus crónicas muestran una voluntad de flexibilidad al incurrir en el registro de viajes, el retrato generacional, los sucesos de impacto colectivo, o las impresiones que condensan un diagnóstico de situaciones o tendencias. Allí hace renacer la influencia epigramática de Georg Christoph Lichtenberg o de Ramón Gómez de la Serna y sus greguerías, el atisbo irónico de Jorge Ibargüengoitia o Carlos Monsiváis, y el propósito tangencial de Norman Mailer o John Lee Anderson, que podría resumirse en una idea del primero: "Cuando un lenguaje se deteriora, se vuelve menos elocuente". Cada crónica de Juan Villoro es, ante todo, un homenaje a las posibilidades expresivas de la lengua (GONZÁLEZ RODRÍGUEZ, 2013, p. 1).

O autor de Safari accidental recebeu influência de muitos autores, como

Augusto Monterroso, considerado o mestre da narrativa curta através da oficina

de contos, da qual fez parte nos anos finais da década 1970 e também a partir

do trabalho de tradução da obra Aforismos (1989), de Georg Christoph

Lichtenberg. Villoro aproximou-se do gênero o qual, como diz Javier Perucho,

representa a maturidade literária:

[…] casi ningún escritor imberbe ha publicado aforismos, hasta ahora, en la historia literaria. La experiencia de vida, la práctica de la escritura, el bagaje intelectual y su consideración han de esperarse que se viertan en la forma inasible que da consistencia al género (PERUCHO, 2015, p. 1).

No entanto, a estrutura narrativa montada por Juan Villoro em suas

crônicas com uma tendência aforística não se trata apenas de coleção de

frases elaboradas ou simples ocorrências, mas de uma tecitura textual que

contribui para uma indagação capaz de permitir uma análise de seus textos

com uma nova imagem literária e conceitual. Na crônica, essa combinação está

mais evidente, mas ela também pode ser encontrada nos seus ensaios,

romances e contos.

26

São textos curtos como os aforismos. No entanto, nestes se condensa em uma única linha pensamentos filosóficos originais e bem-humorados. O escritor espanhol Ramón Gómez de la Serna, citado em diversas crônicas de Villoro, é considerado o criador desse gênero.

Page 60: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

60

O crítico Mihalí Dés o chama de aforista metido a narrador e destaca

que seu humor não nasce de situações mais ou menos engraçadas, nem

cômicas, mas de um olhar particular e assim comenta:

Villoro es un aforista extraordinariamente agudo que hubiera sido digno protagonista de los más competitivos salones parisinos del Ancien Régime. Si no fuera por su formación germánica, y sobre todo, por el malicioso Lichtenberg, podríamos acusarle de afrancesado aventajado. No hay en las letras contemporáneas escritas en castellano nadie tan dotado para la frase feliz, la formulación axiomática, el resumen analítico. Ese don, unido a su peculiar sentido del humor grotesco, está en el núcleo de todos sus escritos. Por eso tiene importancia que Villoro transite varios géneros. Por eso es que trabaja narrativamente los géneros de no ficción […]. Sus crónicas o reportajes - mezcla feliz de una ágil estructura narrativa, virtudes periodísticas y brillantez dialéctica - […]. (DÉS, 2005, p. 3).

Neste estudo, ao apresentar nas crônicas de Villoro uma tendência

aforística, tem como objetivo apresentar um mecanismo de navegação, pontos

de partida para adentrar, para lidar com a densidade dos textos, pois, como diz

Villa-Matas (2010) a respeito do aforismo na obra desse autor: “la brillante

prosa de Villoro está sembrada de relampagueantes frases aforísticas que

puntúan sus textos a modo de inspirados latigazos” (VILA-MATAS, 2010, p.1).

Opinião compartilhada por González Rodríguez (2011) o qual, sobre Safari

accidental, destaca que:

Siempre un paso más allá del simple remilgo estilístico, la prosa de Juan Villoro se muestra hábil en la frase aforística o en la metáfora reveladora, en la búsqueda de las paradojas y la mirada oblicua que revela la fisura en el edificio de las apariencias (GONZÁLEZ RODRÍGUEZ, 2011, p.122).

Villoro aproxima-se do aforismo, esse gênero da tradição oral, de

condição efêmera, com a tradução de Lichtenberg, mas seu primeiro contato foi

através do Manual del distraído, de Alejandro Rossi. No entanto, esse gênero

já é praticado no México há muito tempo, como pode ser observado na obra

Lapidario. Antología del aforismo mexicano (1869-2014), de Jorge Hiram

Barrios, publicado em 2014. Nela, observa-se a prática deste tipo de texto no

México desde o século XIX, no qual se pode destacar: Ignacio Manuel

Altamirano, Amado Nervo, Renato Leduc, Octavio Paz, José Revueltas,

Page 61: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

61

Augusto Monterroso, José Emilio Pacheco, Guillermo Samperio e Juan Villoro,

entre muitos outros que compõem essa antologia composta por cem autores

mexicanos e estrangeiros radicados no México, fato que, logo no início do

prólogo, comenta:

No ha existido pueblo que no haya cultivado algún tipo de expresión breve, concentrada y certera — o, para decirlo en términos lingüísticos, alguna forma de paremia

27—. El nombre que la bautiza

remite, casi siempre, a una herencia cultural específica: el proverbio es un legado del pueblo hebreo; la sentencia, del latino; el refrán, del hispano; el amtal, del árabe, como el machiotlahtolli del nahua o el libana del zapoteco. El aforismo, ya desde su etimología, apunta a una concepción particular del mundo: la de Grecia antigua, la del logos. Proviene de aphorízein (φορίζειν), propiamente ‘definición’, derivado a su vez de aphorízo: ‘yo separo, defino’ (BARRIOS, 2014, p. 15).

O aforismo é um gênero que tem muitos contornos e, assim como a

crônica, foi se modificando ao longo do tempo. A tradição literária considera

Hipócrates o fundador do gênero, que inicialmente era uma expressão

sentenciosa a qual haveria de aplicar-se à regra para a prevenção ou o

tratamento de sintomas e doenças diversas. A partir do século XX, Friedrich

Nietzsche passou a ocupar um lugar destacado no aforismo contemporâneo.

Como gênero literário, começa a afirmar-se em aproximadamente meados do

século passado com Ramón Gómez de la Serna, Antonio Porchia28, Emil

Cioran, Karl Kraus, a quem Villoro dedica o ensaio “El arte de condenar”

(2010d), entre outros. O aforismo foi uma atividade minoritária, considerado um

gênero subterrâneo e marginal, que privilegiava a visão individual e subjetiva

do autor.

Parece que, na atualidade, há um esforço de resgate desse gênero “Ya

desde la década de los noventa del siglo pasado, Gino Ruozzi impulso la tarea

de censar y compendiar la producción aforística de Italia” (BARRIOS, 2014, p.

18). Na Espanha, José Ramón González registrou um considerável incremento,

27

Paremia (del gr., Παροιμία): “refrán”, “proverbio”, “observación incidental”. Son enunciados breves, sentenciosos, mnemotécnicos a partir de su estructura estable. Con este término la disciplina lingüística conocida como paremiología refiere a todas las unidades fraseológicas, ya sean cultas o populares, según se trate de un ejercicio del intelecto individual (máximas, adagios, sentencias o aforismos de autor), o bien de una construcción del imaginario colectivo (refranes, adivinanzas o dichos anónimos). Una revisión de la taxonomía vigente puede consultarse en Herón Pérez Martínez, El hablar lapidario. Ensayo de paremiología mexicana, México, El Colegio de Michoacán, 1996, pp. 177-183. 28

Poeta argentino, autor de uma única obra Voces, um livro de aforismo. Uma das epígrafes do romance El testigo, de Juan Villoro, é deste autor.

Page 62: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

62

inclusive com prêmios e entre 2000 e 2012: “han llegado a las librerías un total

de ochenta y ocho colecciones de textos breves de inclinación aforística”

(GONZÁLEZ apud BARRIOS, 2014, p. 18). Observa-se que Villoro aproxima

sua escrita a esse gênero que, assim como a crônica, não recebeu muita

atenção da crítica literária, de estudiosos e vem sendo valorizado a partir da

segunda metade do século XX. Praticado por poetas, narradores, jornalistas e

ensaístas, não deixou, porém, de ser “una escritura disidente, subrepticia y

minoritária” (BARRIOS, 2014, p. 43).

Estudos recentes apontam que o avanço nas tecnologias de informação

e de comunicação tem contribuído para o interesse de gêneros breves como o

aforismo. Inclusive o Twitter tem sido considerado “como punta de lanza para la

nueva escritura aforística” (BARRIOS, 2014, p. 18). Villoro é um escritor

assíduo dessa rede social e, como diz Manuel Lario Bastida (2016):

En Twitter, donde aparece como @JuanVilloro56, podemos encontrar, bajo la forma de exquisitos aforismos que nos recuerdan su condición de traductor […] de Lichtenberg, múltiples sentencias sobre sus temas habituales: el fútbol, la política, la identidad mexicana o la literatura (LARIO BASTIDA, 2016, p.19).

Por que Villoro publica no Twitter? Um cronista reflete a cultura de sua

época. Ele não está isolado e percebe que essa rede social tem contribuído

para a desconstrução de um conceito tradicional de literatura, aproximando o

culto e o popular, a escrita e a oralidade. Quando Mauricio Mejía pergunta se

ele acredita que a crônica publicada em diários perecerá diante dos avanços da

era digital, Villoro responde que:

Estamos a la orilla de un océano que desconocemos. La crónica es la mejor forma de mezclar un acontecimiento con la repercusión que tuvo en la vida de una persona o de un grupo de personas. No podemos renunciar a indagar la forma en que lo público afecta en lo privado, o en que la información se convierte en emoción. No creo que este tipo de experiencia se desvanezca en la esfera digital (VILLORO apud MEJÌA, 2014, p.1).

Além das crônicas, dos artigos e dos romances, muitos dos aforismos de

Villoro circulam em sua página eletrônica no Twitter. Quando iniciou, em

apenas quinze dias tinha mais de “once mil seguidores” (FRAGUAS, 2011,

Page 63: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

63

p.2). Esse espaço virtual, com limite de cento e quarenta caracteres, parece ser

na atualidade, o lugar que deu uma nova vida a esse gênero literário e

filosófico de longa tradição. Esse gênero tem proporcionado renascimento de

autores, como, por exemplo, Samuel Johnson, que morreu em 1784 e já estava

praticamente esquecido pela crítica. Depois de mais de trinta mil seguidores na

rede social, sua obra aforística foi reeditada no Reino Unido.

Certamente há diferenças consideráveis entre o gênero que era

praticado por Hipócrates e o dos anos finais do século XX e primeiros do XXI.

Na atualidade, não há consenso entre os estudiosos das características que

identificam esse tipo de texto, apenas caracterizando um como clássico e o

outro contemporâneo. Essas expressões, entretanto, pouco ou quase nada

colaboram para um avanço teórico. Há aqueles, inclusive, que não encontram

distinção entre o clássico e o contemporâneo.

Afinal, definir o aforismo não é tarefa simples, pois rigor e determinação

não são suficientes para isolá-los. É escorregadio, pode enlaçar-se com vários

outros gêneros, exatamente como questiona Villa Matas “¿Qué es un

aforismo? Difícil ser preciso en la respuesta. Uno, en cualquier caso, cree

saber qué no es un aforismo” (VILA-MATAS, 2010, p.1). No entanto, aqueles

que melhor o definiram foram os próprios praticantes, como, por exemplo: “El

aforismo dice todo, aunque le falte decir lo demás” (GONZÁLEZ apud

BARRIOS, 2014, p.40). Assim propõe Francisco León González. Já para Raúl

Aceves, “El aforismo es un género breve, pero no menor” (ACEVES apud

BARRIOS, 2014, p.40), enquanto para Monsiváis, o aforismo: “es una frase que

no se termina nunca de interpretar, de carácter abierto, donde suele

proponerse una paradoja y sus condiciones son la sorpresa, la ironía y la

decisión de contradecir lo que suele ser una frase afirmativa” (MONSIVÁIS

apud EGAN, 2010, p. 24). Com os aforismos de suas crônicas, Villoro enfatiza

sua preferência por gêneros literários que se de esquivam definição ou talvez

sejam atrativos para acomodar sua escrita.

Devido à variedade de tendências e gêneros que se mesclam ao

aforismo na contemporaneidade, ele pode receber denominações diversas,

como: aforismo transgênico, aforismo filosófico, epigrama, provérbio, adágio,

apotegma, parêmia, entre outros. Para cada uma dessas tendências há

Page 64: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

64

características diferentes. Como por exemplo, o aforismo com inclinação

filosófica que se vale do diálogo, do monólogo interno, da pergunta ou

exclamação interna, da piada e da maledicência.

Esse gênero, na atualidade, aproxima-se, inclusive, do ensaio, pois “Se

trata de una escritura prosística que suele asemejarse al ensayo por su

naturaleza híbrida. Es otra literatura de ideas” (BARRIOS, 2014, p. 20). Como

Gabriel Zaid tenta demostrar: “El ensayo más breve del mundo / No hay ensayo

más breve que un aforismo” (ZAID apud BARRIOS, 2014, p. 20). Essa

vinculação do aforismo ao ensaio é somente uma aproximação, pois o ensaio

exige argumentação enquanto que, no aforismo, não dá tempo de argumentar

devido à brevidade. Essa forma textual, porém, brinca, simula, generaliza,

provoca o ensaio. É exatamente assim que se observa em: “Uno de los

grandes misterios del fútbol es que ritualiza la pasión y la contiene” (VILLORO,

2006b, p. 24).

Nota-se que, apesar de que em Tiempo transcurrido, Palmeras de la

brisa rápida e Los once de la tribu, seus primeiros livros de crônicas, haja

frases extremamente elaboradas, de fino humor e sarcasmo, essa inclinação

aflora nas crônicas mais recentes publicadas em Safari accidental e Dios es

redondo, nas quais percebe-se a brevidade, a concisão, o efeito supressivo e o

desenlace irônico dos textos.

O aforismo é considerado um gênero que se impõe, devido à maneira de

se anunciar, com expressões como: todo, ninguém, nunca, sempre, que

costumam ser utilizados para afirmar ou negar categoricamente. É o que se

pode verificar em “Es obvio que no hay historia sin conflicto, y todo conflicto

que vale la pena es “serio” (VILLORO, 1998, p.74). No entanto, essa estratégia

é utilizada por Villoro sarcasticamente, pois não pretende construir ideias,

senão questioná-las, provocar as que existem ou replicá-las: “Publicar algo

bueno nunca es tan bueno como saber que nadie más lo publicó. Sin embargo,

aunque la exclusiva depende de su condición única, su mérito nunca es

individual” (VILLORO, 2005a, p.257) e até em sua obra infantojuvenil como em

El libro salvaje (2011b) há aforismos “Nada es tan aburrido como saber mucho

de tan poco” (VILLORO, 2011b, p. 46).

Page 65: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

65

Na obra de Villoro, o aforismo funciona como um resumo impactante, um

fragmento involuntário, condensado, um instrumento político-sociológico-

engenhoso, que aproxima o texto de uma linguagem popular. Ele se intitula

como um aforista plebeu e declara: “sin la grandilocuencia de quien entrega

máximas para ser publicadas o esculpidas en mármol. Eso me divierte”

(VILLORO apud MÉNDEZ, 2012, p.5). Na expressão “aforista plebeu” está

condensado o entendimento de eliminação de fronteira “alta” e “baixa”. O

aforismo é considerado um gênero elitista. Para ele, porém, é importante

desfazer essa dicotomia; não tem pretensões de docência nem de porta-voz,

mas utiliza a combinação dos gêneros: crônica e aforismo, e se poderia arriscar

uma espécie de “aforiscrônica” ou “croniforismo”, como crítica a um sistema

que tenta impor essa divisão categórica.

A crônica funciona como uma ponte entre ficção e não-ficção, entre o

erudito e o popular, e essa tendência aforística contribui para a conexão destas

pontes, pois o aforismo é um gênero erudito, elitista e tradicional, o qual,

através das crônicas desse autor, ganha contornos populares, pluralizando e

aproximando sua escrita da tradição oral. Javier Perucho, por meio eletrônico,

entrevista, Villoro que comenta a respeito de sua prática no gênero:

En mi opinión hay dos clases de aforistas. Los que escriben deliberadamente con la intención de que esas frases funcionen sueltas y los que sumergen esas frases en textos más amplios, para que sean entresacadas por algún lector. Lichtenberg pertenece al segundo género. Dejó apuntes donde la posteridad encontró aforismos, al modo de lo que subrayamos en un autor favorito. Espero que ése sea mi caso. No he escrito nunca aforismo en forma directa (VILLORO apud PERUCHO, 2011, p.7).

Certamente, como Georg Christoph Lichtenberg, Juan Villoro pertence à

segunda classe de aforistas mencionados na entrevista. Seus aforismos não

estão soltos, mas misturados nos textos para serem captados por um leitor

mais atento. Muitas vezes, provocam dúvidas se determinada oração é

simplesmente boa escrita ou é um aforismo. A esse respeito, destaca-se a

reflexão de Mark Bell: “hay que considerar juntos texto, co-texto, y contexto

para establecer que una observación aislada pertenece al género del aforismo”

(BELL apud EGAN, 2010, p. 25). Ou seja, ainda que o aforismo seja autônomo,

Page 66: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

66

é capaz de sobreviver, de guardar sentido e potência literária depois de ser

retirado do seu contexto original.

Cada aforista tem seu próprio estilo, personalidade e sua maneira de

criar um fragmento “consideravelmente memorável” capaz de convidar o leitor

para selecioná-lo. Como destaca Egan (2010): “uno de los marcadores que

distingue al aforismo del proverbio en la historia evolutiva de los refranes es el

carácter personal de aquél: el proverbio pertenece al dominio común, el

aforismo al autor que lo produce, con o sin premeditación” (EGAN, 2010, p. 25).

Villoro mescla com frequência em suas crônicas aforismos de escritores

que admira, que figuram, dead or alive, entre os quais: Francis Scott Fitzgerald:

“Toda vida es un proceso de demolición” (FITZGERALD apud VILLORO,

2005a, p.245); Truman Capote: “La diferencia entre la buena literatura y el

verdadero arte es sutil pero salvaje” (CAPOTE apud VILLORO, 2005a, p.251);

Carlos Monsiváis: “O ya no entiendo lo que está pasando o ya no pasa lo que

estaba entendiendo” (MONSIVÁIS apud VILLORO, 2005a, p.7); Martín Luis

Guzmán: “El que primero dispara, primero mata” (GUZMÁN apud VILLORO,

2008b, p.1); George Steiner: “el hombre acorralado se vuelve elocuente”

(STEINER apud VILLORO, 1998, p.72) e Samuel Beckett: "No hay juego de

vuelta entre el hombre y su destino" (BECKETT apud VILLORO, 1998, p. 130),

entre outros.

Entre os signos que mais distinguem os aforismos, destacam-se aqui

apenas cinco, baseados nos estudos de Egan (2010), exemplificadas com

aforismos das crônicas de Juan Villoro:

1) A brevidade, pois a concisão é uma característica essencial: “El

animal enjaulado sólo conoce una actividad: la espera” (VILLORO, 2005a,

p.192). Como a crônica é um gênero que normalmente tem um número limitado

de páginas ou caracteres, a brevidade do aforismo contribui para condensar

um pensamento, uma definição, uma paráfrase, favorecendo a fluidez do texto.

2) Caráter geral e definitivo, ou seja, resume uma verdade “universal” ou

aceita como um axioma: “Todo viajero contrasta lo que ve con su sitio de

procedencia” (VILLORO, 2005a, p.146). Esse tipo de aforismo convida o leitor

Page 67: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

67

a respeitar a concisão e a precisão intelectual da frase ao mesmo tempo em

que exige a expansão ou a interpretação desta.

3) A temática ou profundidade filosófica: “Nuestro populoso labirinto es

un escenario perfecto para escapar hacia adentro” (VILLORO, 1998, p.67,

destaque do autor). Esse tipo de aforismo é um modo de explorar e

compreender a humanidade dentro das relações sociais, culturais, artísticas,

políticas e interpessoais;

4) A experiência vital, às vezes com um tom confessional ou marcas

autobiográficas

Aunque vivimos para cortejar la muerte, nos pasa como a los suicidas que se toman el botiquín entero y se salvan porque los somníferos son anulados por los estimulantes. En otras palabras: sobrevivimos porque recurrimos a demasiadas formas contradictorias de hacernos daño (VILLORO, 2005a, p.204).

5) Um artifício retórico, um giro estilístico, uma peculiaridade expressiva

que impacta: “A diferencia de las guías, las crónicas no proponen un estilo de

viaje sino el viaje a un estilo” (VILLORO, 2009a, p.60). Pode ser também por

uma figura de linguagem ou uma construção mais complexa, como uma

parodia ou uma mini-alegoria.

Os aforismos presentes nas crônicas de Villoro têm temas variados, que

vão desde a sociedade (civil) mexicana, pois “La sociedad democratiza las

partes que antes fueron íntimas y las despoja de misterio” (VILLORO, 2005a,

p.197); a história: “Vivida como presente, la historia es un amasijo que rara vez

cobra sentido” (VILLORO, 2005a, p.124); a cultura de massa: “La cultura de

masas no conoce castigos más dañino que el olvido” (VILLORO, 2005a, p.69);

a política: “El EZLN es un ejército al interior de su zona y un movimiento político

hacia el resto del país” (VILLORO, 2005a, p.58) ou “En Chiapas hay un pueblo

que se llama La Realidad. De manera apropiada, está lejos de todo” (VILLORO

apud LARIO BASTIDA, 2016, p.21); a identidade mexicana: “John Lennon dijo

que la gente que más sufre es la que tiene mejor sentido de humor. Si esto es

cierto, los mexicanos somos una superpotencia humorística” (VILLORO, 2005a,

p.42); o futebol: “Elegir un equipo es una forma de elegir cómo transcurren los

Page 68: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

68

domingos” (VILLORO, 2006b, p. 17) ou “Con el fútbol pasa como con las dietas

ricas en fibras: no todo alimenta, pero la mezcla sirve para digerir” (VILLORO,

2006b, p. 33); o rock: “Los decanos del alto volumen son ante todo una imagen,

iconos que han adquirido la pétrea condición de las gárgolas de una catedral”

(VILLORO, 2005a, p.67) ou “La posteridad de Elvis es tan sólida que tiene

futuro en el pasado” (VILLORO, 2005a, p.65); e, certamente, muitos outros

temas que incluem a violencia e até o narcotráfico, porém sempre com um

caráter crítico, político, irônico e, muitas vezes, satírico. Os aforismos não são

frases reconfortantes e amistosas, já que, em sua maioria, são ásperos,

combativos e subversivos.

Assim como a crônica, o aforismo é um gênero considerado marginal, de

condição efêmera, narrativo, de difícil identificação, praticado por diversos tipos

de profissionais, literários e não literários. Também é publicado em diversos

meios: livros, jornais, revistas, suplementos diários e nas redes sociais. É um

gênero controverso, que suporta uma experiência empírica; por isso é

geralmente frequentado por escritores de maturidade literária.

Page 69: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

69

CAPÍTULO II - HISTÓRIA E ATUALIDADE DA CRÔNICA

Haber elegido la crónica como vía no es simple casualidad. Ante alternativas desgastadas o anquilosadas, la elección de un estilo de escritura implica una moral. La elección del género no es políticamente inocente. No se pueden sacar conclusiones generales, pero lo cierto es que la narratividad es un intento por comprender, pero sobre todo, un impulso de moralizar la realidad

29.

Susana Rotker

Y, evidentemente, nadie puede escribir sin antecedentes30

. Juan Villoro

O capítulo que segue está dividido em três partes, que se conectam e se

interpretam. A divisão servirá para uma melhor compreensão de conceitos,

pensamentos e reflexões sobre um único assunto: a crônica mexicana atual. O

objetivo é apresentar um breve panorama desse gênero no México dos

primeiros anos do século vinte até a atualidade. Procurar-se-á demonstrar a

evolução, as características, os escritores, os leitores e o mercado criado por e

para esse gênero, além da problemática relação do gênero no espaço entre a

literatura e o jornalismo, principalmente a partir de 1968, período compreendido

por essa pesquisa. Esses elementos contribuirão para pensar sobre as

crônicas do corpus selecionado e, a partir disso, estabelecer argumentos para

a pesquisa.

Cabe destacar que, apesar da larga produção de crônicas, que “Es la

práctica escritural más popular, rica y duradera” (CORONA & JÖRGENSEN,

2002, p.3, tradução minha) da Literatura Mexicana, as análises críticas dessas

ocorreram com mais frequência nos últimos anos do século XX. Merece

destaque o estudo de Aníbal González com La crónica modernista

hispanoamericana, publicada em 1983; Desencuentros de la modernidad en

América Latina: literatura y política en el siglo XIX, de Julio Ramos, publicada

em 1989; La invención de la crónica, de Susana Rotker, em 2005; as três

voltadas para produções do século XIX, e, A ustedes les consta, em 1980, de

29

Trecho do livro La invención de la crónica. México: Fondo de Cultura Económica. Fundación para un Nuevo Periodismo Iberoamericano, 2005. 30

Fragmento da entrevista a BENAVIDES, Jeovanny. ¿Hay vida en la tierra? Publicada en 2014. Disponível em: https://archivond.wordpress.com/2014/10/25/villoro/ Último acesso: 10.09.2016.

Page 70: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

70

Carlos Monsiváis, o qual compreende um panorama com recorte histórico-

crítico-analítico das crônicas mexicanas entre os anos finais do século XIX até

a década de 1970. O estudo de Darío Jaramillo Agudelo, Antología de crónica

latinoamericana actual, 2012 preocupa-se com as produções das crônicas

latino-americanas dos últimos vinte anos. Certamente, a partir da primeira

década de 2000, diversas dissertações e teses têm analisado criticamente as

crônicas recentes, principalmente nos Estados Unidos. É importante, porém, a

análise permanente de produções diversificadas para a construção, talvez em

um futuro próximo, de ampla teoria crítica dedicada ao gênero.

2.1 Reflexões teórico-crítica sobre a crônica mexicana

O que fica claro é que, efetivamente, toda definição é interpretação

seletiva, todo modo de contar a história da literatura é uma opinião e

que, como tal, é mutável com o tempo e a perspectiva atual31

.

Susana Rotker

A crônica na América Latina tem três momentos importantes, ainda que,

em suas remotas origens, não contivesse características jornalísticas que

possam demonstrar continuidade desde o período colonial até a atualidade. No

princípio, as Cartas de Relação, os poemas épicos e as crônicas de viagem

feitas por conquistadores-soldados-escritores das Índias, os quais realizavam

seu ofício sem preocupação literária, pois estavam mais interessados em

registros escritos com o propósito de dar a conhecer diversos feitos. É

importante destacar também que há uma proliferação, uma repetição constante

de que a Crônica de Índias é a antecessora da crônica contemporânea. É

preciso reconhecer que muitos textos dos séculos XVI e XVII possuem alto

valor literário, “Es decir, son crónicas porque utilizan el lenguaje literario para

describir el presente conflictivo; pero todavía están más cerca de la historia

antigua que del futuro periodismo” (CARRIÓN, 2012, p. 21). No entanto, o que

se ressalta na crônica atual, além da influência do jornalismo, é a figura dos

cronistas, que, no passado, eram sujeitos que relatavam as conquistas na

31

Trecho do livro La invención de la crónica. México: Fondo de Cultura Económica. Fundación para un Nuevo Periodismo Iberoamericano, 2005.

Page 71: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

71

colônia, procurando justificar seus interesses e atropelos. Por outro lado, é

possível afirmar que os cronistas atuais podem ser destacados por terem uma

postura ética e uma preocupação com a função social desse tipo de texto.

Ocorre que, ao longo do tempo, esses autores foram substituídos por

homens de letras de tom modernista desenvolvido entre o fim do século XIX e

o início do XX. A partir daí, observa-se a o crescimento da crônica, tal como se

publica dos anos 60 até os dias atuais. Essa última está indissoluvelmente

marcada por três fatores: a explosão dos meios de comunicação de massa; as

mudanças provenientes do Jornalismo Literário; os processos políticos, sociais

e econômicos do continente, como as ditaduras e a implantação do sistema

neoliberal: “Estos tres factores convergen en la crónica, contaminándola o más

bien metamorfoseándola” (NAVARRETE, 2015, p. 1).

Desde as primeiras décadas do século XIX, nas academias literárias

mexicanas, já se observava a expansão de hommes de lettres, que, em geral,

já não eram sacerdotes. O saber fora da igreja permitiu outra visão da história,

novas interpretações e funções aos letrados como: “La interpretación de los

hechos colectivos, las pautas de la psicología individual reconocida, la

representación de la alta cultura, el conocimiento como la excepción, la

creación de atmosferas verbales como espejos de comunidad (MONSIVÁIS,

1987, p. 756).

Nota-se, nesse contexto que, há muitos anos, a situação social latino-

americana é retratada com registro que não é estritamente informativo, mas

que costuma guiar a prática jornalística nas redações. Como destaca Susana

Rotker “punto de inflexión entre el periodismo y la literatura” (ROTKER, 2005,

p. 25), referindo-se ao gênero crônica32 que, na América Latina, apresenta

características próprias que a põem mais próxima da literatura. A vida comum,

ou seja, aquilo que não é notícia, é posto em cena através de temas abordados

por cronistas para contar histórias capazes de assombrar, indignar e comover,

mantendo um diálogo permanente com a literatura e a análise sociocultural

através da arte de narrar o cotidiano.

32

Ao longo de todo o estudo não será apresentado distinção entre a crônica literária e a jornalística, porque a mistura é que a define.

Page 72: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

72

A crônica dos modernistas foi, frequentemente, marginalizada por parte

da crítica literária com o argumento de que se tratava de relatos com pouco

valor artístico e por ter sido produzida sob as exigências de um jornalismo que

ansiava pela modernidade. Susana Rotker (2005), tratando da pouca atenção

dada aos textos jornalísticos dos modernistas hispano-americanos, destaca

que somente se levava em consideração sua produção poética como se ambas

estivessem separadas, como se um mesmo autor tivesse obras “puras” (leia-se

poesia) e obras “contaminadas” (leia-se crônica), porém

A pesar de la importancia de las crónicas periodísticas para comprender una etapa fundamental de la cultura hispano-americana, ese desinterés por parte de la crítica ha afectado no sólo la total valoración de la obra de Martí y Darío sino de los escritores modernistas en general (ROTKER, 2005, p. 15).

O contato com o jornalismo, a poesia, o conto, o romance e outros

gêneros promoveu uma estrutura flexível de ampla temática, que fizeram da

crônica um laboratório literário, um espaço para a experimentação da

linguagem. Daí a variedade de temas, que incluíram desde as diversões

públicas até os crimes, chegando a questionar uma sociedade em vias de

modernização. No entanto, esses também foram argumentos para a pouca

atenção da crítica ao gênero, como comenta Rotker

La marginación de las crónicas no responde a un criterio “científico” o inapelable; es el resultado de una interpretación selectiva, hecha a menudo como domesticación de la lectura y situada a su vez sobre capas sucesivas de otras lecturas. Hace falta excavar desde otros ángulos para ampliar el horizonte de comprensión (ROTKER, 2005, p.19).

É notável que os escritores modernistas contribuíram para apresentar

novos ângulos de análise de uma obra literária, além de influenciarem através

de sua poética em numerosos artigos, prólogos e crônicas. Não se pode deixar

de considerar, neste caso, o fato de que, nesse período, os homens de letras e

a política eram indissociáveis, como explica José Enrique Rodó:

Quizá no es usted ajeno a esta fatalidad de la vida sudamericana que nos empuja a la política a casi todos los que tenemos una pluma en la mano. Y yo no considero esto enteramente como un mal. Todo está en que no nos dejemos de despojar de nuestra personalidad (RODÓ apud ROTKER, 2005, p.63).

Page 73: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

73

O escritor e político uruguaio Rodó percebe a relação entre a escrita e a

política como uma “fatalidade”. Ele faz uma advertência, afirmando que, no

momento de produzir literatura, é muito importante manter a personalidade e a

autonomia criadora.

A crônica, entretanto, percorreu um longo caminho. Esse termo, no início

do Cristianismo, apenas listava acontecimentos ordenados segundo a marcha

do tempo, mantendo basicamente uma sequência cronológica. Aproximou-se

da História a partir do Renascimento e, no início do desenvolvimento da

imprensa, concretizou-se no Journal de Débats até tomar a forma embrionária

que se tem hoje.

A palavra vem do grego chronikós, relativo a tempo (chrónos), e no latim

chronica (MOISÉS, 1982, p. 245). Originalmente, alinhava feitos, em ordem

cronológica, relativos a um povo. Há vários exemplos análogos de crônica

desde a Idade Antiga, sempre levando em consideração o caráter de relato

circunstanciado sobre feitos, cenários e personagens, a partir da observação

do próprio narrador, ou tomando como fonte, desde protagonistas, até

testemunhas oculares.

Por que se escrevem crônicas? Questionamento instigante feito pela

pesquisadora Valería de los Ríos (2006), que responde relatando que

“Históricamente, estas aparecen en períodos de cambio, cuando se acometen

empresas o surgen transformaciones que es necesario consignar” (Ríos, 2006,

p.128). No contexto modernista, Julio Ramos (2008) refere-se à crônica como

um “género de cambio” e levanta a hipótese de que ela, por ser um gênero

literário não elitista, permitiu “processar”, através da escrita, a vida cotidiana,

ilustrando as incertezas, as inquietações e as angustias do homem num

ambiente urbano, que refletia os sintomas de uma sociedade capitalista,

seduzida pelo consumo e pela fugacidade da vida moderna do final do século.

Ramos argumenta ainda que os outros gêneros, como a poesia (o

principal gênero literário do período) ou o romance não possibilitavam essa

aproximação. Nos anos finais do século XIX, os cronistas modernistas

passaram a utilizá-la para narrar à modernidade apresentada pela cidade.

Nesse sentido, a vida urbana, as inúmeras transformações, os problemas

Page 74: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

74

políticos, a evolução dos meios de comunicação e a cultura popular são temas

reiterados pelos cronistas das décadas posteriores. No entanto, é importante

destacar também que os cronistas modernistas se especializaram mais como

críticos culturais, pensamento compartilhado tanto por Ramos (2008) quanto

por Rotker (2005). Assim, as crônicas modernistas procuraram a pluralidade de

temas, voltando-se para problemas e acontecimentos locais, destacando as

pequenas histórias e concretizando formas e estilos com uma perspectiva mais

experimental e personalizada de eventos, como por exemplo: Nervo e suas

crônicas de modas; as crônicas de viagens de Gutiérrez Nájera e Tablada.

Tratava-se, enfim, do discurso de modernidade, captando os acontecimentos

através de uma prosa cuidadosa.

É importante deter-se nas crônicas dos modernistas mexicanos porque

apresentam características que perfilam linhas de continuidade em relação às

que se produzem na atualidade. Isso não significa que são as mesmas, pois há

mudanças consideráveis ao longo da história: o modo de escrever de Gutiérrez

Nájera não é o mesmo de Novo; o de Prieto não é o mesmo de Poniatowska.

São crônicas diferentes em sua maneira de narrar, diferentes possibilidades de

convenções linguísticas, retórica e estilísticas de seu tempo, imaginário e

destinatário, porém mantiveram pelo menos dois aspectos: a intenção do texto

e sua função social. Os cronistas desse período apresentaram uma evidente

preocupação com a estética. No entanto, isso não impediu que sua escrita

mantivesse “un alto grado de referencialidad y actualidad (la noticia), como

material literario han logrado sobrevivir en la historia una vez que los hechos

narrados y su cercanía perdieron toda significación inmediata, para revelar el

valor textual” (ROTKER, 2005, 116).

Antes de começar a mostrar o papel dos cronistas modernistas

mexicanos, é preciso comentar a respeito do cenário jornalístico naquele

período. Se, por um lado, a imprensa mexicana foi utilizada por muitos

governos como uma forma de difundir leis e demonstrar poder, por outro, essa

mesma imprensa foi também “el freno para sujetar las demasías de los

gobernantes y poderosos, el apoyo más firme de la libertad y el medio más

eficaz de difundir conocimientos y popularizar la instrucción” (PRIETO apud

MONSIVÁIS, 2010, p. 43). Com Porfirio Díaz, que governou o país por mais de

Page 75: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

75

trinta anos, exatamente entre 1876 e 1911, isso se torna mais evidente através

do jornal El Imparcial, mantido por seu governo desde sua fundação em 1896.

Vale dizer que esse jornal aspirava à condição de “grande imprensa” com o uso

da tecnologia em super tiragens, com o manejo das informações e um alto

investimento financeiro que, como ele mesmo reconheceu, foi de cerca de “un

millón de pesos a lo largo de diez años y justifica su “dádiva” por la necesidad

de elevar la cultura en un medio donde el pueblo, analfabeta, no lee”

(MONSIVAIS, 2010, p. 46).

A ditadura de Díaz teve uma política econômica liberal voltada para o

estrangeiro, período durante o qual havia o seguinte provérbio “México, madre

para los extranjeros, madrastra para los mexicanos”. Tal se refletiu nas

inúmeras restrições impostas para a publicação nos jornais, e essa era uma

das razões por que muitos cronistas, entre eles, Gutiérrez Nájera e Guillermo

Prieto, por exemplo, não tenham focado na política especificamente, mas numa

temática mais ampla, voltada para os costumes, as relações humanas e a vida

social. Não eram, no entanto, crônicas inocentes, pois criticavam e mostravam

as carências e os fracassos da sociedade naquele período. Outro motivo para

essa temática é, como comenta Novo: “Si Gutiérrez Nájera consagraba la

mayor parte de su producción a ganarse una reputación de afrancesado, sería

porque también ganaba con ellos su pan de cada día; que era la mercancía

que le compraban a mejor precio” (NOVO apud MONSIVÁIS, 2010, p. 39).

Segundo Javier Romero, essa (12 de setembro de 1896, o nascimento

de El Imparcial) é a data de nascimento do jornalismo moderno mexicano, e

sobre esse evento afirma Carlos Fornaro no jornal México tal cuales em 1909,

que mais dano causou El Imparcial ao país que uma “inmensidad de culebras

de cascabel esparcidas en el territorio” (FORNARO apud MONSIVÁIS, 2010, p.

46). A crônica no México teve, não rara vez, uma dupla função, pois sempre se

colocou como reprodutor e legitimador do discurso hegemônico, como comenta

Villoro: “uma das formas de perpetuar o sistema político mexicano tem sido o

controle da informação” (VILLORO, 2002c, p.64, tradução minha). Por outro

lado, esse gênero produziu também um contra discurso, procurando dar

visibilidade a sujeitos marginais inviabilizados pelo discurso oficial. Em outras

Page 76: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

76

palavras: a crônica serviu também como meio para divulgar coisas que não

poderiam ser ditas de outra maneira.

Antônio Cândido explicita no prefácio da segunda edição de Formação

da Literatura Brasileira (2000) que um sistema literário articulado necessita de

um triângulo formado por autor-obra-público em dinâmica interação e de certa

continuidade de tradição. Segundo Cândido, isso passou a ocorrer no Brasil

após o Romantismo.

Pensando no sistema literário latino-americano, ainda que não

explicitamente, Rotker (2005) menciona a dura relação dos poetas

modernistas, principalmente Gutiérrez Nájera, Darío e Martí com o triângulo de

Cândido (2000), acrescentando a este, porém, mais um elemento: o mercado.

É importante observar que a relação mencionada por Rotker (2005),

principalmente com o mercado, ainda guardava certo pudor, porque também

era uma novidade. Bartolomé Mitre, diretor de La Nación, em carta enviada a

Martí, apesar do respeito extremo e até certa veneração pelo talento literário do

escritor, destacou:

No vaya Ud. tampoco a tomar esta carta como la pretenciosa lección que aspira a dar un escritor a otro. Habla a Ud.., un joven que tiene probablemente mucho más que aprender de Ud. que Ud. de él, pero que tratándose de mercancía – y perdone Ud. la brutalidad de la palabra, en obsequio a la exactitud - , que va a buscar favorable colocación en el mercado que sirve de base a sus operaciones , trata, como es su deber y su derecho, de ponerse de acuerdo con sus agentes y corresponsales en el exterior acerca de los medios más convenientes para dar todo el valor de que es susceptible (MITRE apud ROTKER, 2005, p. 103).

Além da relação com o mercado, esse trecho trata também da

profissionalização do escritor e do jornalista. Rotker (2005) destacou trechos de

cartas de diretores e editores enviadas aos escritores, nos quais relata as

expectativas do leitor, da relação com o mercado, da extensão dos textos e

também da exigência na moderação dos conteúdos políticos das publicações.

Em um trecho da carta do diretor do jornal La Opinión Nacional, Fausto

Teodoro Aldrey a Martí, em 1881, diz:

Page 77: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

77

el público se muestra quejoso por la extensión de sus últimas revistas sobre Darwin, Emerson, etc., pues los lectores de este país quieren noticias y anécdotas políticas y la menor literatura posible [...]. Por otra parte los párrafos son muy largos. Esta sección que deseo continuarla, debe ser de párrafos cortos (ALDREY apud ROTKER, 2005, p. 102).

Nos trechos destacados, nota-se que os diretores dos jornais assumiam

o interesse do diário por seu aspecto comercial, destacando o fato de, já

naquele momento, ter uma preocupação em não afastar o público consumidor,

que era uma pequena elite certamente, mas “menos reducida en términos

cuantitativos que lo que la imaginación actual y desprevenida pueda pensar”

(ROTKER, 2005, p. 105). Nesse período, havia ainda um entendimento de que

a profissionalização do escritor estava em conflito com princípios burgueses

“según los cuales arte y mercancía, lo útil y lo sublime, el dinero y la creación,

eran polos opuestos” (ROTKER, 2005, p. 103). Trata-se de uma situação

complexa, percebida na análise das crônicas modernistas, pois havia um tom

nostálgico envolvendo o fazer literário nos jornais “¡Qué mayor tormento quiere

usted que sentirse capaz de lo grandioso, y vivir obligado a lo pueril” (DARIO

apud ROTKER, 2005, p. 112) ou “No hay tormento comparable al del periodista

en México. El artesano se basta a sí mismo si conoce su oficio, pero el

periodista tiene que ser no sólo “homo duplex” sino el hombre que, como dice

Valhalla, puede dividirse en pedazos y permanecer entero” (GUTIÉRREZ

NÁJERA apud MONSIVÁIS, 2010, p. 48). No entanto, seria ingênuo também

imaginar que os modernistas não tinham consciência de que o jornalismo abria

aos escritores o mercado de livros. Entretanto, como comenta Rotker:

El problema es que en el fondo, como se ha visto, en ese entonces el arte seguía relacionado íntimamente con la idea de minoría, de “elegidos”; era demasiado difícil dar salto tan grande en la propia cultura como para que los modernistas pudieran comprender que en el periodismo estaban haciendo una versión propia de literatura popular, o al menos más masiva que sus textos poéticos. Demasiado quizá fue ya el hecho de haber sido capaces de amoldarse a su tiempo, produciendo – con o sin consciencia de ello – un nuevo género literario, que era signo de una época; es indudable que, además de las limitaciones editoriales, enfrentaron el prejuicio propio acerca de las divisiones establecidas entre arte y no arte, literatura y cultura de masas (ROTKER, 2005, p. 113).

Page 78: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

78

Percebe-se ainda que os diretores dos jornais sugerem uma delimitação

entre as funções que, naquele momento, estavam confusas entre o jornalista, o

repórter, o escritor e o literato. Gutiérrez Nájera também relata em suas

crônicas a relação entre literatos e repórteres nos jornais

La crónica [...] ha muerto a manos del repórter quien es tan ágil, diestro, ubicuo, invisible, instantáneo, que guisa la liebre antes que la atrapen”. Ante “esos trenes relámpago [...] la pobre crónica, de tracción animal, no puede competir”. Y se duele: “A medida que los escritores bajan, los repórters suben” (GUTIÉRREZ NÁJERA apud MONSIVÁIS, 2010, p. 51).

A distinção que buscavam, na verdade, era entre o cronista e o repórter,

pois ao primeiro se atribui o tratamento literário da notícia; ao segundo, a

consignação da atualidade. Outro cronista mexicano, Luis González Urbina

comenta a respeito da relação desse gênero, que mistura informação e

reportagem com a evocação do comum e do pitoresco, sem hierarquias, e diz:

Es cierto que un cronista no es un artista. Mas no sé qué diablos tiene este género periodístico que, sin ser superior, requiere una expresión pulcra, un temperamento vibrante, una observación atinada, y a ser posible, cierta dosis de fantasía para colorear las imágenes. Un cronista está a merced de los acontecimientos. La vida de los tiempos. El periodista los enfoca y los presenta con visualidad personal y, así, ofrece un panorama de la actualidad circundante elaborado por la sutileza de la observación y la brillantez del estilo (GONZÁLEZ URBINA apud MONSIVÁIS, 2010, p. 52).

A expansão da crônica modernista envolveu muitas perspectivas, pois

havia a profissionalização de escritores, mesmo que conflitante com princípios

burgueses, “pero es más riesgoso morir de hambre” (MONSIVÁIS, 2010, p. 48).

Havia, também, uma intensa disputa por espaço entre os repórteres e os

literatos. Claudia López Pedroza menciona que nesse período: “el hombre de

letras entrara en una lucha constante con el reporter. Esta competición entre el

literato y el reporter, así como entre la crónica y el reportaje” (LÓPEZ

PEDROZA, 2011, p. 4). Além do mais, é preciso ressaltar que, devido ao alto

índice de analfabetismo, a falta de um público leitor dificultou bastante a

ampliação do gênero.

Além dos poetas modernistas mexicanos já destacados, é preciso

destacar que muitos outros foram cronistas. No entanto, é recente a

Page 79: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

79

valorização e a análise crítica da obra cronística de Amado Nervo, José Juan

Tablada, Luis Gonzaga Urbina, Ramón López Velarde33, entre outros. Inclusive,

sobre o último, nota-se que suas crônicas ainda não receberam, até o

momento, uma análise mais criteriosa. Esse fato pode se observado no livro de

José Luís Martínez (1998), o qual reúne mais de setenta artigos e ensaios

publicados, todos dedicados a sua obra poética, percebendo-se que são raras

as análises das suas crônicas. Certamente a efemeridade do meio de

publicação contribuiu para isso. López Velarde, por exemplo, teve a maior parte

de suas crônicas publicadas em jornais provincianos, como El Observador, ou

na revista Bohemio.

Sobre a produção literária de López Velarde, cabe uma ponderação

mais cuidadosa devido ao sarcasmo e ironia de sua prosa, que o aproxima de

Juan Villoro. É o que se percebe em texto jornalístico publicado em 1916, no

qual declara que “El asunto civil ya hiede. Ya hedía en los puntos de la pluma

beatífica de aquellos señores que compusieron odas para Don Agustín de

Iturbide” (LÓPEZ VELARDE apud SÁNCHEZ-PRADO, 2006, p. 63), além da

variedade de temas, tons, estilo e, principalmente, porque, como comenta

Ernesto Emiliano Romero (2006), “la prosa de López Velarde participa de

elementos que fundaron la escritura del siglo XIX” (ROMERO, 2006, p.51).

Nesse sentido, é importante pensar na análise de Rotker a respeito de José

Martí, para avançar no tipo de prosa de López Velarde, na qual diz que

es la crónica el laboratorio de ensayo del ‘estilo’ — como diría Rubén Darío—modernista, el lugar del nacimiento y transformación de la escritura, el espacio de difusión y contagio de una sensibilidad y de una forma de entender lo literario que tiene que ver con la belleza, con la selección consciente del lenguaje, con el trabajo con imágenes sensoriales y símbolos, con la mixtura de lo extranjero y lo propio, de los estilos, de los géneros, de las artes, de la democracia, […] y de la realidad social e íntima (ROTKER, 2005, p. 230).

33

O poeta Ramón López Velarde (1888-1921), autor de La suave patria, foi resgatado por Villoro em seu romance El testigo, 2004, tornando uma espécie de personagem de sua obra. Com relação a sua obra prosística, cabe destacar que houve algumas investigações dispersas e uma compilação póstuma chamada El minutero (1923) mas, a compilação mais completa ocorreu depois de mais de trinta anos de sua morte, através do trabalho de Elena Molina Ortega, que publicou na Imprensa Universitaria três volumes: Ramón López Velarde: poesias, cartas, documentos e inoconografía (1952); El don de febrero y otras prosas (1953) e Prosa política (1953).

Page 80: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

80

É importante essa aproximação, porque nesse trecho está uma das

discussões a respeito da crônica que contribui para aproximar as

características da prosa lopevelardiana, pois quando se menciona beleza,

seleção vocabular e de imagens se trata da identificação do estético, porém

muitas vezes essa aproximação se confunde com o fictício que acaba

afastando e enfraquecendo o discurso literário do mundo dos acontecimentos,

fazendo com que o literário seja considerado uma atividade suplementaria e

prescindível. O factual não deve incluir ou excluir a crônica da literatura ou do

jornalismo, pois os dois principais requisitos da crônica são o referencial, ainda

que expresso por um sujeito literário, e o temporal (atualidade). Romero (2006)

destaca a qualidade e a perenidade dos seus textos:

el medio en que fueron publicadas esas prosas no demeritaba su carácter de textos con mayor perennidad que la momentánea que le otorgaba la publicación en cuestión. Muchas de esas crónicas es posibles leerlas hoy, a la luz del tiempo, como reflexiones y argumentaciones bien elaboradas, con una calidad estilística reconocible. En esta tradición es donde se inscribe López Velarde. La compilación de sus prosas por ello recibe como nombre general el de crónicas, a pesar de haber una multiplicidad de estilos y tonos tratados por el autor. Poemas en prosa, breves ensayos, análisis políticos, coronas fúnebres, crítica literaria, bosquejos, constituyen la amplia variedad —y maleabilidad— de su prosa (ROMERO, 2006, p. 52).

As crônicas de López Velarde apresentam uma variação estilística tão

marcante que Blanca Rodríguez comenta que sua obra “desborda los clichés

con que se clasificaban tradicionalmente las obras literarias” (RODRÍGUEZ,

1996, p.102). Em relação à coletânea de textos que aparecem no prólogo do

libro Ramón López Velarde: crónicas literarias, há a seguinte apresentação:

“Esta selección de algunas de sus crónicas, muchas de ellas imaginarias, y que

incluyen opiniones del zacatecano sobre otros escritores, nos da oportunidad

de verlo sin contagiarse de los versos, se le valora como el extraordinario

prosista que es […]” (ARGUELLES, 2001, p. 10, destaque nosso). Nota-se com

esse fragmento que a prosa do poeta é composta por uma mistura de gêneros

e elementos, podendo-se destacar que o mesmo ocorre com a composição em

prosa de Juan Villoro, como será abordado mais adiante. No momento, é

importante observar que há traços, ainda que sutis, na prosa dos dois autores.

Page 81: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

81

Além do hibridismo da prosa lopevelardiana, outra característica que se

pode ressaltar é a inclusão de elementos da cotidianidade da província, da

urbe e a prática econômica que aparece em sua prosa e poesia. Esse traço

não era comum naquele momento, uma vez que rompia com o ciclo do

paisagismo no México. Por isso, “López Velarde es un vanguardista avant la

lettre” (SÁNCHEZ-PRADO, 2006, p. 61).

Entre os anos de 1921 e 1927, surge o grupo que, inspirado no futurismo

de Maiakovski e Marinetti, entrará em combate pela hegemonia cultural e

literária: o Estridentismo. Certamente esse movimento, proveniente da cultura

urbana e procurando se estabelecer à base da modernidade tecnológica,

representou o primeiro passo dado pelas vanguardas no México. É um grupo

extremamente eclético, formado por pintores, fotógrafos, músicos, poetas e

romancistas. Nele, havia também cronistas importantes, como Manuel Maples

Arce e Arqueles Vela. No entanto, a obra mais conhecida de ambos é, sem

sombra de dúvida, a poética.

Os membros do grupo de vanguarda mexicano conhecido como

Contemporáneos, fundado em 1928 e inspirado na revista de mesmo nome, é

composto basicamente por poetas. De sua relação com a política naquele

momento, comenta Roger Bartra: “ellos serían las cigarras aldeanas que

prefirieron morir de frío antes que buscar refugio en la guarida de la estatolatría

nacionalista donde las hormigas revolucionarias habían construido su

santuario” (BARTRA, 2010, p.1).

Assim como ocorreu com os modernistas e os estridentistas, a obra

cronística dos Contemporáneos também recebeu pouca atenção da crítica. A

exceção é Salvador Novo, “cuyo idioma vitalísimo se desentiende del legado de

prosas poéticas y reconvenciones moralistas y funde en un solo género

crónica, artículo y ensayo. […] Con inteligencia y humor […]” (MONSIVÁIS,

2010, p. 53).

No entanto, esse “archipiélago de soledades” que percebeu Jaime

Torres Bodet ou “grupo sin grupo” como se referia Xavier Villaurrutia a esse

grupo, é importante na consolidação do exercício da tarefa literária e cultural no

Page 82: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

82

México nas primeiras décadas do século passado, como destaca Guillermo

Sheridan (1993):

La poesía, la crítica – siempre rigurosa – de las letras, las artes, la sociedad y la política, el teatro, la narrativa, la crónica sabiamente banal o exaltada de los más diversos sucesos culturales, los epistolarios y las autobiografías, en suma, cualquier expresión inteligente sobre cualquier acontecimiento inteligible e interpretable fue asumida por este “grupo” con un rigor inusitados dentro de nuestra tradición intelectual, no pocas veces en oposición a un medio agresivo siempre, hostil en ocasiones, cruel en su capacidad para el escarnio o la descalificación (SHERIDAN, 1993, p.9, grifo nosso).

Salvador Novo é o cronista mais destacado nas primeiras décadas do

século passado no México. Suas primeiras crônicas são aquelas nas quais

mais se podem encontrar referências em relação às de Villoro. Tal ocorre por

causa da composição textual envolvendo diversos gêneros os quais

estabelecem vasos comunicantes, mostrando a relação com a cidade do

México, a cultura popular, a ironia e o sarcasmo. O escritor marginal,

entretanto, com o passar dos anos, cedeu lugar ao conformismo e ao aspecto

oficial, como comenta Monsiváis (1986) a respeito de Novo e o Massacre de

Tlatelolco:

el presidente Gustavo Díaz Ordaz lo nombra Cronista de la Ciudad de México. En 1967 es Premio Nacional de Literatura. A principios de 1968, su nombre rebautiza la calle en donde vive. Tanta oficialización no es en vano: al ocurrir el movimiento estudiantil apoya sin reservas al régimen, estima justo y conveniente lo que se haga contra la subversión. […] al día siguiente de la ocupación militar de Ciudad Universitaria, le comenta a un reportero: “Es la primera buena noticia que recibo en el día” (MONSIVÁIS, 1986, p. 291).

Novo tem algumas crônicas dedicadas à cultura popular. Sabe-se que

ele chega a criticar o nacionalismo mais agudo, principalmente devido ao grupo

a que pertenceu. Pondo, entretanto, um olhar mais cuidadoso em sua obra

observa-se que, numa crônica de 1926, intitulada “¡Ya viene Pancho Pistolas”,

defenderá, por exemplo, o corrido: “expresión pura de sentimientos primitivos

de patriotismo o de amor filial o de ausencia, pero siempre de fuerza y de

esperanza y de creencias firmes y convictas; de sentimientos claros […]”

(NOVO, 1926, p.1). Novo é também o cronista que introduz elementos

autobiográficos e massivos em sua prosa, explica Monsiváis: “El Joven es la

irrupción formal en la literatura mexicana del estilo que luego será llamado pop.

Page 83: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

83

Moda, preliminares de la sociedad de consumo, ritmo y andares de las

multitudes, letreros, avisos oportunos y relación sonora y mímica con la capital”

(MONSIVÁIS, 1986, p. 271). Nesse trecho do texto de Novo, já se observam

características da crônica de Villoro, como a ênfase na sociedade de consumo,

na cultura e na incorporação de materiais diversos em sua prosa.

Cabe ressaltar ainda que, apesar da excelente prosa de Novo e da

posição de destaque que ocupa no jornalismo literário mexicano, nos anos de

1920 e 1930, o gênero dominante é o artigo político, e a opinião pública é ainda

patrimônio dos “instruídos”. Nesse contexto, publicar artigos é um sinal de

prestígio, e a notícia é um fato a ser interpretado “filosófica, cultural o

politicamente por José de Vasconcelos, Luis Cabrera, Antonio Caso o Vicente

Lombardo Toledano” (MONSIVÁIS, 2010, p. 66). No interior e na capital,

sentem-se os reflexos da Revolução de 1910 e, como destaca Monsiváis:

A provincia, la rigen, sin disimulo la intolerancia de caciques y jefes de armas, los asesinatos de reporteros y directores de periódicos, la improvisación inevitable del oficio periodístico, la autocensura como seguro de vida. El “periodismo nacional” dispone de la gran ventaja: la seguridad relativa de sus hacedores (MONSIVÁIS, 2010, p. 67).

Nesse trecho de Monsiváis, o qual se refere aos primeiros anos após o

fim da Revolução Mexicana34, dando continuidade nos anos seguintes, nota-se

o destaque dado à questão da violência e da repressão a jornalistas, atos

intensificados no governo de Plutarco Elías Calles (1924-1928), pois é o

período da Guerra Cristera35. Deste modo, menciona Monsiváis que o

presidente: “no tolera demostraciones periodísticas de simpatía a los cristeros y

34

A data do fim da Revolução Mexicana é controversa. Para alguns historiadores, é marcada pela a promulgação da Constituição de 1917; para o historiador inglês Alan Knight, o marco seria 1940 com o governo de Manuel Ávila Camacho (1940-1946), porém Villoro e outros intelectuais mexicanos consideram que o fim ocorre somente em 2000, quando termina o governo do PRI. 35

Cristiada ou Cristera ou Guerra Cristera consistiu num conflito armado que se prolongou entre os períodos de 1926 a 1929 e, posteriormente, entre 1934 a 1941 (As datas de início e término da Guerra Cristera, principalmente da Segunda são confusas. Aqui se baseia na tese de doutorado de Antonio Avitia Hernández defendida no México em 2006). Foi um assunto durante muito tempo esquecido por historiadores, silenciado por políticos, negligenciado pela crítica literária e renegado pelos eclesiásticos. De um lado, um exército composto em sua maior parte pelos camponeses pobres, descamisados e mortos de fome do Centro-Oeste do país, apoiados por organizações católicas que resistiram à aplicação da legislação e de políticas públicas orientadas para restringir a autonomia da Igreja Católica. Do outro, as tropas federais e os agraristas, ou seja, camponeses beneficiados pela reforma. Esses conflitos provocaram um imenso derramamento de sangue no país. Villoro retoma esse conflito mais explicitamente no romance El testigo e, indiretamente através da crônica “1979” de Tiempo transcurrido.

Page 84: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

84

no admite las incitaciones a la rebeldía politica” (MONSIVÁIS, 2010, p.70),

postura seguida por seus sucessores. Nos governos de Manuel Ávila Camacho

(1940-1946) e Miguel Alemán (1946-1952), segue a violência discreta,

traduzida em instrução moral, golpe, prisão ou difamação. Enfim, a censura é

implantada como fato natural até “fechas recientes” (MONSIVÁIS, 2010, p.73),

pois “El Estado es y debe ser intangible, y para garantizarlo no basta el perene

control de los periódicos sino, broche de oro, la conversión de la censura en

reflejo condicionado” (MONSIVÁIS, 2010, p.73).

Ao analisar a situação de jornalistas e repórteres no México nesses

primeiros anos do século passado e compará-la à das décadas de sessenta e

setenta e da época atual, parece que não avançou muito. Villoro publica em

2008, em uma crônica intitulada La alfombra roja del terror narco, na qual

destaca a situação de repórteres, jornalistas e editores mexicanos nos últimos

anos do século XX e diz:

Los medios de comunicación ampliaron su margen de libertad, pero trabajan en un entorno donde decir la verdad es progresivamente peligroso. De acuerdo con Reporteros sin Fronteras, México ha superado a Irak en número de secuestros y asesinatos de periodistas (VILLORO, 2008b, p.2).

Comparando o trecho destacado de Monsiváis referindo-se aos anos 20

e 30 do século passado ao de Villoro nos primeiros de 2000, observa-se que os

mesmos mecanismos de repressão continuam sendo utilizados. A matéria de

La Jornada, publicada em 2016, referente à marcha de jornalistas contra

colegas assassinados, diz: “México ocupa el quinto lugar en un listado de los

países más peligrosos para ejercer el periodismo, de acuerdo con un informe

publicado por la Unesco” (LA JORNADA, 2016, p.1).

Entre 1940 e 1968 ocorre no México o auge do autoritarismo: “No hay,

no puede haber libertad de prensa, si por ésta se entiende el examen del

funcionamiento real de los poderes y la defensa de los derechos de las

mayorías y minorías” (MONSIVÁIS, 2010, p. 91). Esse fato começa a ser

modificado com o avanço dos movimentos migratórios e da contracultura da

indústria cultural, como menciona Edgar Morin

Page 85: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

85

A indústria cultural utiliza e engana ao mesmo tempo em sua tríplice qualidade de artista, de intelectual e de criador. A indústria cultural atrai e prende por salários muito altos os jornalistas e escritores de talento; ela, porém, não faz frutificar senão a parte desse talento conciliável com os padrões. Constitui-se, portanto, no seio do mundo da cultura industrial, uma intelligentsia criadora, sobre a qual pesam grosseiramente a divisão do trabalho e a burocracia e cujas possibilidades são subdesenvolvidas (MORIN, 2011, p.22).

O avanço tecnológico e a inicial expansão dos meios de comunicação de

massas não foram suficientes para impedir o declive da crônica, e ela se tornou

um instrumento sutil e subliminar. Deste modo, é possível notar que, num país

como o México, o jornalismo, às vezes, deixa a crônica de lado por uma

questão de política dos meios e prefere gêneros mais domesticáveis, como a

nota informativa, o editorial e o artigo de opinião, já que, neles, a verdade pode

ser mais facilmente ocultada. No entanto, é importante mencionar também que,

ao se aproximar o fim do milênio e o debut do XXI, a crônica encontrou espaço

para desenvolver-se e “el poder antiguo de gobernantes, cardenales,

empresarios y obispos amengua o no se refrenda su eficacia intimidadoria”

(MONSIVÁIS, 2010, p. 103).

Considerando as crônicas do período do modernismo, as vanguardas e

as posteriores publicadas no México até os anos finais da década de sessenta,

há uma produção que certamente influenciou os cronistas contemporâneos.

Cabe ressaltar, porém, que os modernistas “no invocaron a los cronistas de

Índias como sus antepasados”(CARRIÓN, 2012, p.23) e, inclusive, nem todos

os autores contemporâneos se sentem herdeiros de seus antecessores do final

do século XIX e inícios do XX. No entanto, o objetivo é demonstrar que há um

longo percurso, acidentado talvez, de cronistas no México que contribuíram

para a evolução do gênero, o qual, na atualidade, muitos acreditam que se

encontra na fase do que se poderia denominar de boom da crônica mexicana e

talvez latino-americana, assunto que será abordado mais adiante. Nas crônicas

de Juan Villoro (e não somente desse autor), é possível observar a presença

da “notícia”, “da referencialidade” e do “selo” pessoal (estilo e opinião), que são

características compartilhadas, não apenas pela crônica modernista, mas

também pela contemporânea no México. Há que se considerar também a prosa

carregada de elementos de outras disciplinas e a mistura de gêneros que

aproximam a prosa de López Velarde e Villoro, da mesma forma que o

Page 86: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

86

sarcasmo, a ironia e as referências autobiográficas também são percebidos

nesses autores. No entanto, a velocidade e o fluxo de informação, a partir

principalmente dos anos oitenta, associados aos avanços da internet, mostram

que, certamente, não se pode comparar plenamente as crônicas do momento

atual com as do passado, uma vez que os modernistas e vanguardistas

contavam apenas com o telégrafo, único meio ao qual eles tinham acesso.

2.2 Para uma estética da crônica na atualidade

No México há uma tradição de cronistas que contribuíram para fundar as

bases da crônica mexicana atual, e essa tradição foi ampliada ao longo do

século XX. É importante ressaltar que não se trata de se etiquetar autores ou

obras, embora tal fato seja uma tendência no México, como por exemplo, “La

novela de la Revolución Mexicana”, “La Literatura del Medio del Siglo” ou “La

literatura de La Onda”, até porque a literatura não pode ser esgotada em listas

ou nomenclaturas, já que abarca os processos colaterais com os quais se

articula.

No entanto, além dos escritores mencionados na parte anterior, outros

dois movimentos são importantes para que se possa compreender a evolução

da crônica a partir da década de sessenta: o Novo Jornalismo e o denominado

Boom da Narrativa Latino-americana. Ambos são bastante controversos, e

cada estudioso apresenta argumentos para sustentar ou negar sua existência e

o período de sua aparição. Esta pesquisa não tem, por isso mesmo, a intenção

de traçar um marco para nenhum movimento ou tendência, mas entender e

identificar que influências podem ser percebidas nas crônicas de Juan Villoro.

O pesquisador Fernando Checa Montúfar (2014) comenta sobre essas

influências:

escritura de grandes figuras de la narrativa contemporánea en las que la práctica periodística no solo dejó una indeleble marca, sino que sin ella difícilmente habría sido posible: García Márquez, sin duda alguna, Vargas Llosa, Elena Poniatowska, Osvaldo Soriano. Y que la crónica contemporánea, heredera de la modernista, sigue siendo tan literaria como esta: allí están las crónicas que han escrito y siguen

Page 87: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

87

escribiendo algunos de los mencionados y otros como Rodolfo Walsh, Carlos Monsiváis, Germán Castro Caycedo, Pedro Lemebel, Juan Villoro, Alberto Salcedo, Martín Caparrós, Leila Guerriero y un largo etc.; que actualmente ha configurado lo que está siendo considerado como un nuevo boom de la literatura latinoamericana (CHECA

MONTÚFAR, 2014, pp. 64-65).

Para muitos escritores, entre eles Salcedo Ramos, Leila Guerriero,

Martín Caparrós e Juan Villoro, o novo boom da literatura é apenas uma

estratégia editorial (assunto que será retomado mais adiante). A perspectiva do

crítico Ángel Rama (1982) é de que o boom da literatura latino-americana dos

anos sessenta e setenta foi um fenômeno da sociedade de consumo.

Pensamento compartilhado por Vargas Llosa, que acentua o fato de esse

movimento literário não ter tido um ideário estético, político ou moral que os

vinculasse, assim afirmando:

Lo que se llama boom y que nadie sabe exactamente qué es –yo particularmente no lo sé– es un conjunto de escritores, tampoco se sabe exactamente quiénes, pues cada uno tiene su propia lista, que adquirieron de manera más o menos simultánea en el tiempo, cierta difusión, cierto reconocimiento por parte del público y de la crítica. Esto puede llamarse, tal vez, un accidente histórico (VARGAS LLOSA apud BENAVIDES, 2015b, p.4).

Cabe destacar, que esse movimento proporciona visibilidade aos

escritores da região, e não é por acaso que “en América Latina los grandes

escritores fueron alguna vez periodistas: Borges, García Márquez, Fuentes,

Onetti, Vargas Llosa, Asturias, Neruda, Paz, Cortázar” (MARTÍNEZ, 2002,

p.119), imprimindo em seus textos um estilo pessoal, com voz própria para

narrar à realidade socioeconômica de seus países. Eles desenvolveram um

processo de conexão entre as tradições locais, as lendas indígenas e as

paisagens rurais e urbanas com novas técnicas narrativas, nas quais

predominam a ruptura com a ordem cronológica, os jogos de palavras, o

monólogo interior e o fluxo de consciência. E assim afirma Benavides:

Las producciones de los autores del boom mostraban un lenguaje nuevo que les permitía narrar las respectivas problemáticas locales y trascender sus fronteras para exigir a sus lectores estar abiertos a nuevas formas de lectura que demandaban mayor compromiso y

participación (BENAVIDES, 2015b, p.6).

Page 88: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

88

Enquanto na América Latina surgia o “boom literário”, nos Estados

Unidos se desenvolvia o Novo Jornalismo ou Jornalismo Literário36, uma

tendência que envolveu uma longa discussão a respeito de seu surgimento,

pois, segundo Monsiváis (2010) ocorreu quando, “En 1965, Tom Wolfe, un

cronista de la revista Esquire, publica The Kandy-Kolored Tangerine-Flake-

StreamlineBaby, y con esto inicia un movimiento extraodinario que él llama

New Journalism” (MONSIVÁIS, 2010, p. 94). No entanto, o cronista reconhece

que a combinação de técnicas narrativas com informação jornalística já havia

acontecido em autores como John Hershey, Lilian Ross, Truman Capote e

George Orwell.

Dentro dessa tendência, cabe destacar Truman Capote quando, em

meados do século passado, ele começou a se aproximar de uma maneira de

escrever que foi denominada como non fiction novel. A partir dessa ideia,

Capote documentou um crime bem conhecido na época: a morte da família

Clutter no Kansas, Estados Unidos. Após cinco anos de investigação,

reconstituiu cenas dramáticas e envolveu seu texto em procedimentos

compositivos do romance realista, na obra A sangue frio, publicada em 1966.

Benavides comentou que seu objetivo era dominar técnicas narrativas para

elevar a não ficção à categoria de arte (BENAVIDES, 2016, p. 119). Capote

assinalou ao seu biógrafo, Gerald Clarke, esses procedimentos:

El periodismo se mueve siempre en un plano horizontal al contar una historia, mientras que la narrativa –la buena narrativa– se mueve verticalmente, profundizando en el personaje y en los acontecimientos. Al tratar un hecho real con técnicas narrativas (algo que un periodista puede realizar) es posible elaborar este tipo de síntesis. Como por lo general los buenos narradores habían desdeñado el reportaje y la mayoría de los reporteros no habían aprendido a escribir buena narrativa, no se había llegado a tal síntesis ni tampoco advertido el potencial de los relatos ceñidos a los hechos. Era como mármol aguardando al escultor, como la paleta aguardando al pintor (CLARKE apud BENAVIDES, 2016, p. 119).

Nesse contexto, o Novo Jornalismo significa uma possibilidade de

profundas modificações na maneira de fazer jornalismo, rejeitando a imperante

objetividade que circulava na maioria dos meios naquele momento. Entretanto, 36

A expressão “Novo Jornalismo” foi rebatizada em 1984 como “Jornalismo Literário” por Norman Sims, professor de jornalismo na Universidade de Massachusetts.

Page 89: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

89

alguns anos antes da publicação da obra de Capote, surgiu na Argentina

Operación Masacre (1957), de Rodolfo Walsh, que se adiantava ao romance

de não ficção, com todas as características que haviam dado lugar de destaque

aos norte-americanos. Walsh tomou conhecimento do fuzilamento clandestino

de civis num terreno abandonado no subúrbio de Buenos Aires. Seis meses

depois do fato, um informante lhe disse que havia sobreviventes. A partir daí,

ele iniciou uma investigação, e os depoimentos colhidos seriam a base de sua

obra.

Além da herança da escrita dos modernistas, das técnicas estruturais

dos textos sem ficção, da narrativa do boom latino-americano e do Novo

Jornalismo, é pertinente destacar que a crônica atual se desenvolveu em um

contexto conturbado, coincidindo com ditaduras militares em diversos países,

como Argentina, Uruguai, Guatemala, Honduras, Brasil, El Salvador e Chile,

além da chamada “ditadura perfeita”37 estabelecida no México. Deste modo, a

crônica:

es asumida, en un contexto convulso, entre el duelo por los desaparecidos y la irrupción del neoliberalismo, entre la muerte de la revolución y el nuevo imaginario global, entre el fin de la Ciudad Letrada y la transformación de Buenos Aires, Lima, Caracas o México D. F. en megalópolis difusas. Una posmodernidad herida (CARRIÓN, 2012, p.34).

Na busca de características da crônica atual, Jorge Carrión retrocede

ainda mais, pois acredita que a estrutura desse gênero, pelo menos como se

apresenta na atualidade, surgiu com Relato de un naufrago (1955), de Gabriel

García Márquez. Essa obra, publicada dois anos antes da de Walsh, escrita em

primeira pessoa, tem um vitalismo tão profundo que parece ter o próprio

protagonista vivido e escrito ele mesmo esta história, e acrescenta que:

37

Mario Vargas Llosa, em visita ao México em 1990, em seu discurso diz “Um partido que é inamovível, um partido que concede espaço à crítica na medida em que esta lhe serve, porque confirma que é um país democrático, mas suprime por todos os meios, inclusive os piores, aquela crítica que de alguma maneira põe em perigo sua permanência no poder” (VARGAS LLOSA apud FUSER, 1995, p. 14). Em Safari accidental, Villoro parafraseando o escritor peruano comenta que México passou da ditadura perfeita a caricatura perfeita (VILLORO, 2005a, p. 46).

Page 90: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

90

Hay que leer, por tanto, la llegada del periodismo narrativo latino-americano como la vanguardia silenciosa o el prólogo discreto a lo que después se llamará New Journalism. Porque la mayoría de las grandes crónicas de Truman Capote, Norman Mailer, Gay Talese o Tom Wolfe comienzan a ser publicadas en los años 60. Lo que diferencia a éstos de sus colegas sudamericanos es la conciencia de autoría y un programa estético respaldado por la industria” (CARRIÓN, 2012, p.24).

A consciência de se estar diante do novo e o apoio da indústria cultural

são relevantes para a expansão do Novo Jornalismo, pois não havia na

América Latina naquele momento jornais e revistas que pudessem competir

simbolicamente com The New York Times (1851), Esquire (1933), e Rolling

Stone (1967). No entanto, é importante destacar os esforços de Sur (1931) na

Argentina, Casa de las Américas (1960) em Cuba, Marcha (1939) no Uruguai e

as mexicanas Excélsior (1917), Vuelta (1976). Esses meios constituem um

lugar identitário na afirmação da consciência crítica latino-americana, e seu

valor estético-social ocupou muitas vezes o lugar dos livros.

Cada estudioso ou crítico acrescentará uma obra e um autor na

tendência de misturar técnicas jornalísticas e literárias. Inclusive, não se pode

esquecer, como comentado na parte anterior, que já se desenvolvia essa

técnica no final do XIX entre escritores latino-americanos, pois, como comenta

com acidez Caparrós:

El Nuevo Periodismo, queda dicho, fue la etiqueta que se inventaron unos cuantos escritores norteamericanos a fines de los cincuenta, principios de los sesenta, para definir una práctica que, sin ser nueva, ellos estaban renovando: usar herramientas de otros géneros literarios para contar la realidad (CAPARRÓS, 2015, p. 481).

O objetivo é tentar demonstrar de que técnicas e procedimentos se

alimenta o ornitorrinco de Villoro. As obras de García Márquez, Walsh e

Capote, embora tenham propósitos dissímiles, mudaram a maneira tradicional

de conceber o jornalismo, mostrando um caminho do chamado Novo

Jornalismo. Esses autores, a partir de investigações sérias e bem elaboradas,

serviram-se de recursos literários, etnográficos e reportagens investigativas

para narrar fatos reais. No entanto, como destaca Caparrós:

Page 91: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

91

El procedimiento [usar ferramentas de outros gêneros literários] fue fecundo; fue curioso que a partir de ese momento, casi todos dejáramos de usar el procedimiento y siguiéramos usando los resultados que ese procedimiento había tenido entonces. Hubo excepciones, por supuesto: pienso en Pedro Lemebel, en María Moreno, en Juan Villoro (CAPARRÓS, 2015, pp. 481-482).

Na crônica villoriana notam-se alguns traços de influências de recursos

utilizados no Novo Jornalismo, que, segundo Wolfe, são quatro: a construção

cena a cena, o registro do diálogo completo, o uso do ponto de vista da terceira

pessoa e a atenção especial ao status da vida do personagem (WOLFE, 1998,

pp.48-49). Notam-se, também, algumas técnicas narrativas da prosa dos

escritores do boom mencionados anteriormente. Villoro, porém, como comenta

Caparrós, procura usar o procedimento, a técnica usada por esses escritores, e

não a cópia da prosa deles em equilíbrio com outras práticas, incluindo temas

próprios, massivos, populares e em processo de legitimação via palavra

escrita: as histórias em quadrinhos, o futebol e o rock. Isso vai modificando a

prosa do autor e caracterizando uma nova escrita. Não se trata de uma colcha

de retalhos, mas de uma escrita harmônica.

Neste amplo cenário de técnicas e influências, três escritores

mexicanos: Elena Poniatowska, José Emilio Pacheco e Carlos Monsiváis são

importantes para entender a prosa de Villoro e, certamente, contribuirão para a

análise das crônicas do autor.

O resgate de vozes anônimas daqueles que não ocuparam lugar de

destaque na imprensa é uma das marcas da crônica a partir dos sessenta, que

adquiriram um caráter mais testemunhal devido ao período de intensa

repressão. Essa é a principal característica das crônicas de Elena

Poniatowska, que inicia nesse gênero com Todo empezó en el domingo (1963)

e que no Encuentro nuevos cronistas de Indias, em 2012, assegura que

La crónica en América Latina responde a una necesidad: manifestar lo oculto, denunciar lo indecible, observar lo que nadie quiere ver, escribir la historia de quienes aparentemente no la tienen, de los que no cuentan con la menor oportunidad de hacerse oír. La crónica refleja más que ningún otro género los problemas sociales, la corrupción de un país, la situación de los olvidados de siempre (PONIATOWSKA, 2012, p.1).

Page 92: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

92

Poniatowska não somente recria a linguagem da vida cotidiana, mas a

transforma em uma polifonia de vozes. Ela utiliza o testemunho para enfrentar

o status quo da sociedade mexicana, inclusive com motivos políticos, como se

observa em La noche de Tlatelolco: testimonios de la historia oral (1971), que

é, em sentido estrito, uma reportagem-colagem, pois recolhe uma série de

testemunhos contra a matança estudantil e também a favor dela ocorrida em

1968 durante o governo do PRI; e Fuerte es el silencio (1980), que trata do

relato da fundação de uma colônia popular no estado de Morelos e a história de

seu líder, Güero Medrano; e Nada, nadie: las voces del temblor (1988), que

gira em torno dos efeitos do terremoto ocorrido em 1985 e a ineficácia do

governo, ainda do PRI, para atender a população depois da catástrofe. Tanto o

massacre quanto o terremoto são temas tratados pelos textos de Juan Villoro,

nos quais se pode observar a polifonia de vozes utilizada por Poniatowska.

Enrique Krauze, em homenagem póstuma a José Emilio Pacheco,

menciona os principais temas de sua obra poética, ensaística e cronística: “la

pesadumbre, la melancolía, la desesperanza, el desconsuelo, el paso

implacable del tempo” (KRAUZE, 2014, p.1). Pacheco, considerado por seus

críticos como reservado e prudente, não estava, no entanto, preso a uma torre

de marfim, pois emitia sua opinião crítica da história mexicana e sobre o

espaço urbano, cuja “visão apocalíptica se expressa em toda sua obra” (SILVA

JÚNIOR, 2010, p.156). Ele praticou vários gêneros com precisão e alcançou

com seus textos não somente um público especializado senão o comum. Suas

crônicas expressam anedotas, biografias, episódios, cenas da vida cotidiana

mexicana e universal, pois “renueva la tradición de la crónica literaria”

(MONSIVÁIS, 2010, p. 113). A coluna “Inventario38”, na qual Pacheco publicou

seus textos entre 1973 a 1976, no jornal Excélsior e depois de 1976 até o seu

falecimento em 2014, na revista Proceso, é considerada por Villoro como um

meio que contribuiu para a sua formação e de sua geração (VILLORO apud

PALAPA QUIJAS, 2017). Além da visão apocalíptica percebida em diversas

crônicas e ensaios de Villoro, ele privilegia também a meditação subjetiva de

38

Os textos publicados nessa coluna compõem uma antologia que reúne 41 anos de publicações de José Emilio Pacheco. Publicada em três tomos: Inventario I. (1973-1983), Inventario II. (1984-1992) e Inventario III. (1993-2014).

Page 93: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

93

Pacheco, pois em seus textos “hay siempre alguien que recuerda”

(RUISÁNCHEZ & ZAVALA, 2011, p.13), alguém que ativa esses procedimentos

de memória. Afinal, como disse Villoro em entrevista certa vez, lembrar é um

dos grandes compromissos da literatura.

Em diversos escritores mencionados ao longo dessa pesquisa, podem-

se encontrar referências na prosa cronística de Villoro. Aquele que mais o

influenciou, porém, foi Carlos Monsiváis. Expressando uma forte resistência à

cultura dominante, os temas populares tornaram-se presentes através dos

fatos políticos e dos acontecimentos significativos do último quarto do século

XX, desde as lutas sociais até os espetáculos de massa, mesclando a

literatura, o cinema e a arte em geral. A respeito dessa referência, comenta

Ruisánchez & Zavala “Villoro lee al cronista Monsiváis no sólo como un

renovador de su género, sino como un precursor de la narrativa de las

generaciones posteriores” (RUISÁNCHEZ & ZAVALA, 2011, p.12).

A ironia, a sátira, a paródia, o humor, o estilo sentencioso e aforístico

são características da obra de Monsiváis e, através desses elementos, ele deu

voz à classe média emergente de Los de abajo de Azuela e a Los olvidados de

Bruñel. Em suas crônicas, estão os seres marginalizados da sociedade

mexicana. Não se trata, porém, de um olhar de miserabilidade, apenas dando

voz aos que não têm, mas de uma preocupação cristalizada em seus textos,

que, a partir do movimento estudantil, entende a crônica como uma

necessidade coletiva, a consciência crítica de uma geração. Egan insiste que

“Esa generación [a de Monsiváis e Poniatowska] se sintió, y se siente,

moralmente obligada a decir la verdad sobre las mentiras que el gobierno

mexicano defendería hasta el punto de torturar y “desaparecer” a ciudadanos

mexicanos” (EGAN, 2004, p.156). A esta reflexão de Egan acrescenta-se que,

não somente essa, mas as posteriores, aqueles que não participaram do

movimento, porque eram muito jovens, também se sentem convocados a

testemunhar através de seus textos, como declara constantemente Juan

Villoro.

Graciela Falbo, na introdução do livro Tras las huellas de una escritura

en tránsito: la crónica contemporánea en América Latina interroga “¿Es posible

una caracterización de la crónica como narrativa latinoamericana?” (FALBO,

Page 94: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

94

2007, p.11), e utilizando como exemplo o escritor Gabriel García Márquez,

menciona que, segundo este, recorrer à crônica é necessário se o que se quer

é dar conta de uma realidade complexa. Em um mundo midiático como o atual,

onde os formatos narrativos respondem a critérios de hiperinformação,

diversidade e velocidade dos meios e, portanto, uma padronização de fórmulas

narrativas, é importante perceber na crônica uma escrita que não se deixa

reduzir, pois ela é capaz de atravessar fronteiras de gênero, sem por isso

deixar de ser ela mesma. Não é uma questão de se instalar uma ideia de

gênero salvador, ou tábua de toque do jornalismo e/ou da literatura, mas é

preciso refletir de maneira crítica, como tem ocorrido, não só no meio

acadêmico, mas também entre os cronistas que escrevem sobre sua prática.

Daí a necessidade de buscar uma maneira de tentar entender esse gênero que

avança em grandes tiragens de livros e prêmios, mas conserva um tom

contestatário, heterotópico e transgressor. Diversos autores e estudiosos

ressaltaram em seus textos o preconceito em relação à crônica, destacando,

inclusive, que ela seria uma maneira pouco prestigiosa de se ganhar o

sustento.

A questão financeira aparece em Los once de la tribu e na primeira

crônica de Safari accidental “Aún hay jefes de redacción que ofrecen más

posteridad que dinero, pero quienes vivimos del oficio podemos al menos

someternos a un criterio agrícola: es un negocio de temporal, pero algo se

cosecha” (VILLORO, 2005a, p.11). Ao analisar a figura do cronista, Villoro o

localiza em uma encruzilhada entre a arte e o capital, destacando o seu valor

no espaço narrativo ficcional e a necessidade material da vida cotidiana.

Carlos Monsiváis em “De la santa doctrina al espítitu público: sobre las

funciones de la crónica en México”, publicado em 1987, menciona o

desprestigio da crônica diante de gêneros como o romance, o conto e a poesia.

Nesse mesmo texto, menciona que é recente a aceitação da qualidade literária

da crônica da conquista e questiona:

¿Quien hace periodismo pudiendo escribir cuentos y novelas? El auge de la narrativa provoca, una vez más, en el medio cultural, la arremetida contra el periodismo, “enemigo de la promesa”. Ante el

Page 95: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

95

prestigio de la ficción, la crónica se extravía en la nostalgia profesional” (MONSIVÁIS, 1987, p. 770).

Nas primeiras páginas da densa obra de Caparrós, denominada

Lacrónica39 (2015), ele menciona o descrédito do gênero na Argentina nos

anos finais da década de 1980. Em 1991, inaugura sua seção no jornal

Página/30, o qual denomina “Crónicas de fin de siglo”, e ressalta que “En esos

días, en Argentina, nadie hablaba de “crónica”: no era una palabra de nuestro

repertorio. O sí, pero decía otras cosas. La palabra “crónica” no tenía ningún

prestigio en el mundito periodístico argentino” (CAPARRÓS, 2015, p.21).

Inclusive, destaca que havia um jornal, Crónica, que, durante muitos anos,

ocupou o lugar de imprensa sensacionalista. “Crónica era un tabloide en una

época en que solo los diarios populares lo eran; solía tener un solo título

grande en la tapa y alguna foto más o menos escabrosa. Cuando había un

crimen importante […] sus ventas se disparaban” (CAPARRÓS, 2015, p.21).

Clarice Lispector, cronista do Jornal do Brasil na década de sessenta,

expôs constantemente as dificuldades que enfrentava com a escrita, como se

pode observar na crônica “O grito”: “Sei que o que escrevo aqui não se pode

chamar de crônica nem de coluna nem de artigo. Mas sei que hoje é um grito.

Um grito! (LISPECTOR, 1984, p. 124). Ela revelou também o enfrentamento

com os elementos que compunham o gênero em “Como se escreve": “Vamos

falar a verdade: isto aqui não é crônica coisa nenhuma. Isto é apenas. Não

entra em gêneros. Gêneros não me interessam mais” (LISPECTOR, 1984,

p.36).

Como se pode observar, muitos escritores abordaram em seus textos

discussões em relação ao descrédito destinado a esse gênero. Rotker comenta

a respeito do pouco prestígio das crônicas dos modernistas e menciona que

isso ocorreu devido à atenção dada à poesia e também à ideia de arte e

estética serem vistas como se tivessem valores absolutos, quando, na verdade,

estão distante disso, pois dependem de convenções aceitas pela sociedade

num determinado momento.

39

Caparrós unificou tudo em uma só palavra “lacrónica”, em sua obra de mesmo título.

Page 96: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

96

É importante escavar, observar de outros ângulos e ampliar territórios. A

marginalização da crônica é devida também a sua condição de gênero híbrido,

com a impossibilidade de situá-la dentro de um campo concreto, como

literatura ou jornalismo, como se os campos estivessem radicalmente opostos

ou separados. No entanto, não se pode negar que, nos últimos anos, a crônica

adquiriu visibilidade com congressos, prêmios, festivais, antologias e revistas

especializadas, penetrando, inclusive, nas academias, fato que não era comum

até a década de oitenta do século passado.

Não cabe dúvida de que a economia da crônica se estende cada vez

mais, levando a alguns questionamentos: há um boom da crônica nesses

primeiros anos do século XXI e, se isso ocorre, qual é o motivo? Há um número

expressivo de crônicas e escritores dedicados a esse gênero, e isso promove

um movimento no qual cabe uma análise mais cuidadosa e menos reducionista

a um termo. É complicado comparar esse momento a um novo auge das letras

latino-americanas, ainda que com matizes diferentes, pois, se o boom dos anos

sessenta e setenta tratava de explicar a tensa realidade da América Latina

através da ficção, nos días atuais, “la crónica se impone como el género que

mejor explica la realidad, que, por otra parte, no ha dejado de volverse más

compleja” (BONET, 2012, p.1). A cronista Leila Guerriero traça um marco ao

qual detecta o surgimento da crônica como se encontra na atualidade:

hubo un tiempo en que nada de lo que existe existía. Un tiempo —no tan remoto: 1996, 1997— en el que no existían los llamados “cronistas latinoamericanos” (ni revistas que los publicaran, ni antologías que los antologaran) y en el que la palabra “crónica” se usaba, en los países de América Latina, para mentar las más diversas cosas —los despachos urgentes, las notas policiales, las columnas—, pero en pocos o en ninguno designaba lo que hoy se conoce como tal: historias de no ficción que requieren largos trabajos de campo y que se narran utilizando recursos formales de la literatura de ficción (GUERRIERO, 2012a, p.1).

O período mencionado por Guerriero (2012a) trata de meados dos

noventa, quando em Cartagena de Índias surge a Fundación Nuevo Periodismo

Iberoamericano (FNPI)40, liderado por Gabriel García Márquez, cujo objetivo é

melhorar a prática jornalística através de oficinas, debates, congressos. Ele

40

A FNPI foi fundada em 1994 por García Márquez e um grupo de entusiastas, entre eles Jaime Abello, Tomás Eloy Martínez, Carlos Monsiváis e Alma Guillermoprieto.

Page 97: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

97

organizou, em 2001, a primeira edição do Premio Cemex-FNPI, que procurou

dar visibilidade à produção de crônicas na região, acabando por se torna um

incentivador do gênero. Além da FNPI e das revistas como Gatopardo, Etiqueta

Negra, Malpensante, para citar alguns exemplos, outros meios contribuem para

a expansão, debate e visibilidade da crônica na atualidade: o Premio Las

Nuevas Plumas, instaurada em 2010 pela Universidad de Guadalajara e a

Escuela de Periodismo Portátil; além dos meios eletrônicos: El Faro de El

Salvador, Plaza Pública de Guatemala, Periodistas de a Pie no México e a

revista do norte argentino Tucumán Zeta41.

A FNPI é importante para a crônica contemporânea porque tem

impulsionado sua evolução, e não sua mumificação, pois entende que o maior

desafio do gênero é construir uma narrativa sintonizada com a época atual,

fato, a princípio, inclusive, intrínseco ao gênero, já que se observava nele uma

maior experimentação da linguagem, além da mistura com outros gêneros e

demais estilos.

A expansão da crônica também pode ser percebida no cenário não

somente latino-americano, mas mundial, com o Prêmio Miguel de Cervantes

2013 à cronista e romancista Elena Poniatowska e o Nobel de Literatura 2015 à

bielorrussa Svetlana Aleksandrovna Aleksiévitch, a primeira cronista a ganhar

esse prêmio. No entanto, considerar esse momento como o auge da crônica,

principalmente na Hispano-américa, é relativo, pois tem que se levar em

consideração situações como a tiragem, o mercado e o espaço para a

publicação, e não somente antologias e número de cronistas. O editor da

Revista Etiqueta Negra e ganhador do Premio Las Plumas de 2011, Eliezer

Budasoff, destaca que, mesmo nos dias atuais, “nadie puede vivir

exclusivamente de escribir crónicas. Yo siempre hacía montón de cosas […].

Incluso los grandes cronistas, como Alberto Salcedo Ramos, hacen lo mismo”

(BUDASOFF apud SZADY, 2015, 176). Leila Guerriero também questiona o

rótulo de boom e, diz:

41

É importante lembrar que Tomás Eloy Martínez é tucumano. Essa revista tem como proposta produzir crônicas em Tucumán por tucumanos.

Page 98: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

98

Es raro, entonces, que se hable, como se habla, del auge de la crónica […] Y sin embargo, sin medios donde publicarla, sin medios dispuestos a pagarla y sin editores dispuestos a darles a los periodistas el tiempo necesario para escribirla, se habla de un auge arrasador de la crónica latinoamericana (GUERRIERO, 2012b, p. 620).

Quem financia a um ornitorrinco? Questiona Pablo de Llano em um

artigo sobre o Encuentro de Nuevos Cronistas de Indias 2, patrocinado pela

FNPI, em 2012 na Cidade do México, pois se consegue com certa facilidade

organizar um seminário, um congresso ou um prêmio sobre crônica, porém “Es

mucho más difícil que el ornitorrinco encuentre un río donde nadar” (VILLORO,

2011a, p. 23). A situação das principais revistas latino-americanas dedicadas a

este gênero e que surgiram na década de noventa e os primeiros de dois mil, é

bastante delicada: Etiqueta Negra (2002) é sem dúvida uma revista

extraordinária, que faz um trabalho de redação heroico graças a Julio

Villanueva Chang e à solidariedade de muitos jornalistas, inclusive Villoro. A

revista colombiana Soho (1999) é um híbrido curioso entre mulheres nuas com

composição de crônicas e outros gêneros, como conto, artigo e ensaio.

Gatopardo (2000) inicia oferecendo um prêmio para a melhor crônica, porém

não pôde manter. Malpensante (1996) e Anfibia (2012) somente na internet.

A sede física é certamente menos importante que o espaço cosmopolita

para as publicações, além de não limitar o texto em caracteres. Villoro, em

entrevista, quando questionado sobre se é possível pensar no auge de

publicação de crônicas devido a quantidade de revistas e meios, responde:

Creo que el prestigio de la crónica es mucho mayor a la posibilidad de ejercerla. Hoy es mucho más fácil hacer un seminario de crónica, participar en un premio de crónica, una antología de crónicas, que publicar crónicas en los periódicos. Hay algunos espacios pero no son suficientes. Tampoco hay una costumbre de que se asignen crónicas regularmente (VILLORO apud BENAVIDES, 2014, p. 4).

A falta de espaço para publicação certamente inviabiliza o

reconhecimento de auge do gênero. Outra questão que também aparece nessa

entrevista é a persistência no vício de denominar crônica a quase todas as

manifestações de jornalismo literário, pois muitos escritores estiveram e ainda

estão em ambos os lados. Soma-se a isso também o fato de que muitos

Page 99: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

99

críticos na América Latina e na Espanha lançaram mão da etiqueta “jornalismo

narrativo”. Nomenclatura complexa, uma vez que boa parte do jornalismo é

narrativo, ou seja, “llamar periodismo narrativo a las nuevas tendencias

creativas es reducir la riqueza y hablar con poca propiedad, ya que narrativo

vendría a ser todo tipo de periodismo (CHILLÓN apud BENAVIDES, 2015a,

p.13).

Todas as revistas mencionadas no trecho destacado são dedicadas à

crônica e têm tido dificuldades para permanecer no mercado. É importante

relembrar que é recente o aparecimento de uma quantidade expressiva de

revistas especializadas na publicação desse gênero. No entanto, alguns

estudiosos, como: Rogelio VIllarreal acredita que “el llamado boom es un tanto

artificioso y con fines comerciales, más un fenómeno de librería que

periodístico” (VILLARREAL, 2013, p. 1) e também Patricio Fernández (2013),

quando destaca que “El boom de la crónica es, a las finales, un título

comercial” (FERNÁNDEZ, 2013, p.2), ou ainda Sergio González Rodríguez

quando afirma “No creo que un par de antologías de cronistas publicadas en

tiempos recientes configuren un boom: la crónica ha estado y estará vigente al

margen de la atención de una o dos editoriales españolas” (GONZÁLEZ

RODRÍGUEZ apud TIRZO, 2013, p.2). Para esses e muitos outros autores, o

auge da crônica é uma estratégia de mercado.

Por outro lado, há àqueles como: Jaramillo Agudelo, Francisco Sierra

Caballero e a pesquisadora argentina Alicia Montes, que sustentam ter o auge

do gênero ocorrido a partir de dois mil, pois “Una serie de textos que fueron

publicados desde comienzos del año 2000, fecha a partir de la que el auge de

la crónica se hace más intenso” (MONTES, 2009, p. 4). Segundo ela, sem

eliminar seu contato com o jornalismo a crônica havia passado a ocupar um

lugar central na literatura. A fronteira tênue do gênero seria uma espécie de

membrana que filtra, pois o que está fora pode passar a estar dentro. Com

isso, Montes levanta uma pertinente preocupação de que, ao situar a crônica

no centro e não nas margens, pode acabar provocando no mercado, sempre

ansioso por novos produtos, uma estandardização de discursos, uma

aproximação perigosa da lógica dos meios e, por consequência, a eliminação

de seu caráter transgressor:

Page 100: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

100

la crónica, en tanto género contradictorio y proteico, tiene una vertiente normalizada que se somete a las demandas del mercado, siempre ansioso de productos nuevos y excitantes. En este tipo de escritura se despolitiza estetizando su carácter transgresor con el barniz de la nostalgia por el pasado, y construye un sistema de representación Kitsch y conformista, pródigo en estilizaciones y estereotipos consumibles sobre la vida cotidiana, las modas, lo raro, lo marginal o lo traumático (MONTES, 2009, pp.3-4).

No entanto, Montes reconhece que, apesar do que chama de lado

“oportunista”, a crônica é “un género que sin embargo, aún respondiendo a las

demandas del mercado editorial, no abandona su tono testimonial” (MONTES,

2009, p.4), comprometido, pois, como afirma mais adiante “si bien es verdad

que una de las condiciones de su actual centralidad es el gusto que demuestra

por la erosión de límites y la transgresión, como signo de combatividad política

y de creatividad en el terreno de la literatura (MONTES, 2009, p.5).

Há um número considerável de publicações, prêmios, oficinas e obras

desse gênero, porém isso não é suficiente para determinar sua expansão. É

certo que há uma ideia, uma febre quase generalizada e uma atitude que tem

atraído escritores para a crônica como para um esporte da moda. No entanto,

talvez fosse melhor pensar que se trata da (re) descoberta de um gênero que

ocupa um espaço numa escala de longo processo. Tratando-se do México,

então, seria possível levantar a hipótese que se inicia nos anos finais do século

dezenove e atravessa todo o século passado, com a influência de diversos

gêneros e cronistas comprometidos, que viram na crônica seu valor literário,

uma oportunidade de posicionamento político e não somente um trampolim

para a ficção, até se tornar na atualidade o que se está denominando na última

década como o boom da crônica. Ou ainda, talvez a reflexão mais pertinente

seja a de Juan Pablo Meneses42, que rememorando a José Donoso, diz:

la existencia del boom latinoamericano de los sesenta se debió, más que nada, a todos aquellos que trataron de negarlo. Con el boom de la crónica en América Latina pasa igual, en los últimos años todos lo niegan. Tanto se ha negado que ya parece real. Aunque esa realidad sea un presente donde se publican pocos libros y los medios llevan más notas sobre lo que es la crónica, que crónicas (MENESES apud M.RODRÍGUEZ, 2015, p. 2).

42

Juan Pablo Meneses – escritor e cronista chileno, autor de Equipaje de mano (2003); La vida de una vaca (2008); Niños futbolistas (2013); também é fundador da Escuela de Periodismo Portátil.

Page 101: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

101

É difícil imaginar que se está diante do ápice da publicação desse

gênero e encontrar obstáculos para publicá-la. Juan Villoro menciona a

dificuldade de se dedicar “Son pocos los escritores que, desde un principio,

deciden jugar todas sus cartas a la crónica” (VILLORO, 2005a, p.11).

Pensamento que se coaduna com Salcedo Ramos “¿cuántos pueden darse el

lujo de sobrevivir económicamente gracias al oficio de contar historias? Pocos,

en realidad. Creo que caben en los dedos de una mano y sobran dedos”

(SALCEDO RAMOS, 2013, p. 2). É complicado dedicar-se exclusivamente à

crônica, mesmo com a notoriedade atual, como segue mencionando Villoro:

Hay una inflación intelectual del género de la crónica, en el sentido de que cada vez son más frecuentes los encuentros de cronistas, los talleres, los premios; cada vez adquiere más prestigio la crónica. Tenemos que tener cuidado con esto. Hay un gran coro en torno a la crónica, pero hay enormes dificultades para ejercerla y pocos espacios. Es como los pájaros exóticos que llaman la atención pero rara vez se ven. Tengo miedo de que esto se convierta en algo que se habla académicamente pero no se ejerza, como una corriente que solo sirve para ser enseñada (VILLORO, 2010c, p.2).

No momento, é cedo ainda para afirmar que se está diante do auge da

crônica, mas pode deixar de ser visto como sintoma de um momento histórico.

Afinal, não se pode negar que o processo iniciado no século passado vem se

consolidando através de revistas especializadas, pesquisas feitas por

estudiosos, além do trabalho da FNPI. Acrescente-se a isso, cronistas

comprometidos, com sensibilidade própria da cultura da época, produzindo

textos de alta qualidade, os quais discutem a realidade e outorgam um lugar

preponderante à crônica. De algum modo, esses acontecimentos têm

contribuído para se formar, ainda que com algum tipo de reserva, um cânone.

Esse gênero tem demonstrado que não há temas específicos e muito

menos fórmulas fixas que administrem ou limitem os discursos textuais. É

considerado um gênero moderno por seu suporte: o jornal; por seu formato,

que vai do papel ao blog; por seu público: a massa e, principalmente, pela

consciência de finitude do tempo instaurado na modernidade.

Que desafios a crônica enfrenta no mundo digital? Esse gênero se

adapta bem às mudanças tecnológicas, pois a sua versatilidade, a

fragmentação e a mistura de informação e emoção contribuem inclusive para a

Page 102: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

102

sua evolução. No entanto, esse mesmo avanço tem provocado uma crise nos

jornais impressos, pois os leitores atuais consomem, de forma gratuita, o que

antes deveriam pagar. Villoro enfatiza que “los grandes obstáculos no son

tecnológicos, sino políticos y económicos” (VILLORO apud GARCÉS, 2002,

p.1), pois não são meios altruístas e desinteressados. Além disso, as novas

tecnologias apresentam também o desafio da estandardização da informação,

pois acabam filtrando a realidade. Nesse horizonte ao qual todos têm acesso

em tempo real às mesmas informações, a crônica se coloca nesse meio como

um elemento renovador, pois a sensibilidade, a subjetividade, enfim, de cada

escritor “No es una tarea menor en un mundo encriptado en simulacros”

(VILLORO, 2011a, p. 20), e isso será o diferencial da notícia.

É importante pensar que a rede está propondo outras formas de narrar,

com outros formatos, através de revistas digitais, páginas de descargas, blog,

microblogging e liveblogging43, que surgem também como una alternativa para

as crônicas, como uma demonstração de que é possível usar a linguagem

multimidiática hipertextual, como comenta o jornalista Jorge Tirzo: “Twitter,

Facebook, los blogs y las páginas refuerzan la idea de que el periodismo puede

ser un trabajo individual” (TIRZO, 2013, p. 6). Cronistas relevantes utilizam

esses meios como plataforma para expressar posicionamento político, como

Juan Villoro, ou para publicar textos que não foram publicados em livros ou

revistas. Caparrós publica em seu blog Plamplinas uma longa entrevista (de

aproximadamente quarenta páginas), ou seja, quase um pequeno livro, que fez

a Schoklender, o delinquente que apoiou Las Madres de la Plaza de Mayo,

intitulada “Muerto en vida (Una tarde con Sergio Schoklender)” e disponibiliza

para consulta, transferência e impressão. Na rede não tem limite de espaço e

há certa liberdade ideológica.

Os novos padrões econômicos e o avanço da internet modificaram

também os cronistas clássicos44, formados nas redações dos jornais e revistas,

43

É uma espécie de postagem no blog, mas com a mistura de texto e vídeo, semelhante a televisão ou rádio ao vivo (LEIVA-AGUILERA, 2008). 44

Gabriel García Márquez no discurso “El mejor oficio del mundo” inicia evocando os grupos de jornalistas que andavam sempre juntos, fala de sua formação e comenta que “Hace unos cincuenta años no estaban de moda las escuelas de periodismo. Se aprendía en las salas de redacción, en los talleres de imprenta, en el cafetín de enfrente, en las parrandas de los viernes. Todo el periódico era una fábrica que formaba e informaba sin equívocos, y generaba

Page 103: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

103

ou grupos de jornalistas que se reuniam em cafés para conversar sobre os

temas do dia. Na atualidade, a maioria são freelances desde o início, e a

“Internet ha sustituido los cafés y las reuniones, y la Ciudad Letrada es hoy un

proyecto de Ciudad Virtual” (MONSIVÁIS apud AZNÁREZ, 2003, p. 4). Essas

reflexões costumam ocorrer também em oficinas e nas faculdades de

comunicação, através da docência, como oportunidade laboral e reflexão sobre

o ofício.

Esse gênero que compartilha em muitos aspectos, características com o

conto, o ensaio, o teatro, a reportagem e o relato, entre outros, por seu caráter

híbrido, é uma das formas de testemunhar a realidade social contemporânea

da América Latina. Longe de produzir ambiguidade ou imprecisão estilística,

entretanto, esta plasticidade enriquece a crônica, já que permite oscilar entre

discursos diferentes, procurando, ao mesmo tempo, reconciliá-los.

Essa fronteira não é necessariamente entre gêneros distintos, mas entre

literatura e jornalismo, ficção e realidade, o culto e o popular, teoria e história,

arte e artesanato, tecnologia e rusticidade. A narrativa latino-americana é

atravessada por uma multiplicidade de formas, e a crônica tem-se constituído

nesse espaço. O resultado é um gênero flexível e original, com um

considerável público leitor, principalmente na América hispânica:

En el umbral del siglo XXI, cuando han colapsado todos nuestros preconceptos sobre qué es literatura, algunas escrituras exploran nuevos horizontes perceptivos a fin de transgredir la indiferencia y uniformidad que sobrevuela en buena parte del arte actual (BARBABÉ, 2006, p.7).

A crônica, tanto pelas esferas que atravessa como pelas características

de seus produtores, pela temática plural que aborda ou pelos procedimentos de

escrita, parece resistir a definições. Talvez seja por isso que há uma infinidade

de aproximações conceituais que não se apresentam como definitivas ou

conclusivas a respeito da crônica, pois, como comenta Patricio Fernández: “La

mejor manera de matar algo, es definiéndolo” (FERNÁNDEZ, 2013, p.1). Sendo

assim, a seguir se apresentam algumas reflexões, epigramas e metáforas de

opinión dentro de un ambiente de participación que mantenía la moral en su puesto” (GARCÍA MÁRQUEZ, 1996, p.1).

Page 104: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

104

cronistas e críticos que evidenciam a condição paradoxal do gênero e que

contribuem para manter o ornitorrinco vivo.

Para Carlos Monsiváis, porém, “literatura bajo la prisa” (MONSIVÁIS,

2010, p. 29), existem outras propostas na tentativa de definir esse gênero

escorregadio e, além de Monsiváis, merecem destaque Luis G. Urbina “una

literatura de pompa de jabón” (GONZÁLEZ URBINA apud MONSIVÁIS, 2010,

p. 48); para Gabriel García Márquez, “ La crónica es un cuento que es verdad”

(GARCÍA MÁRQUEZ apud ETHEL, 2008, p.1); para Antonio Cândido, a sua

perspectiva “é a [...] do simples rés-do-chão” (CÂNDIDO, 1992, p.14); para

Martín Caparrós, “un intento siempre fracasado de atrapar lo fugitivo del tiempo

en que uno vive” (CAPARRÓS, 2015, p.23); para Rossana Reguillo, “testimonio

del desasosiego latinoamericano” (REGUILLO, 2007, p.45); para Pedro

Lemebel, “género bastardo” (LEMEBEL apud LOJO, 2010, p. 1); já Jezreel

Salazar diz que se trata de “un género camaleónico” (SALAZAR, 2006, p.85); a

crítica Graciela Falbo afirma ser “una escritura en tránsito” (FALBO, 2007, p.1);

para Anadeli Bencomo, “escritura transgenérica de la violencia” (BENCOMO,

2007, p.21); para Alberto Salcedo Ramos, “La crónica: el rostro humano de la

noticia” (SALCEDO RAMOS, 2016, p.1) e, finalmente, para o escritor, Juan

Villoro, em Safari accidental (2005a), “la crónica reclama un símbolo más

complejo: el ornitorrinco de la prosa” (VILLORO, 2005a, p.14). Com esse

animal estranho, com características entre a pré-história e a pós-modernidade,

Villoro reivindica um híbrido de reportagem, entrevista, romance, ensaio e

conto como ferramenta para descrever a realidade social no México.

Assim como há uma série de tentativas de conceituação e metáforas a

respeito da crônica, há também uma variedade de nomes que se usam como

sinonímia. Em espanhol, os mais frequentes termos45 são:

periodismo de autor, ficción documental, sociología auxiliar, cronovela, socioliteratura, metaperiodismo, periosía, periodismo cultural, relato de no-ficción, periodismo interpretativo,

45

Vale a pena mencionar também alguns termos em inglês, para demostrar a controvérsia existente: transfiction, faction, transformation journalism, creative nonfiction, documentary narrative as art, apocalyptic documentary, paraliterary journalism, midfiction, metareportage, liminal literature, radical news analysis, higher journalism, journalit, postmodern journalism, parajournalism, participatory journalism, the New Nonfiction y poetic chronicle (EGAN, 2004, p. 142).

Page 105: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

105

neocostumbrismo y (el más difícil de manejar) “no (crónica)vela” (EGAN, 2004, p.142).

A linguagem coloquial, a subjetividade, o tom de intimidade com o leitor,

a curta extensão, a ampla temática, o estilo direto e a franqueza dos

comentários contribuíram para a dificuldade de conceituação e até

classificação, mas, como destaca Carlos Drummond de Andrade na crônica O

frívolo cronista, o importante é o equilíbrio:

Pode ser um pé de chinelo, uma pétala de flor, duas conchinhas da praia, o salto de um gafanhoto, uma caricatura, o rebolado da corista, o assobio do rapaz da lavanderia. Pode ser um verso, que não seja épico; uma citação literária isenta de pedantismo ou fingindo de pedante, mas brincando com a erudição; uma receita de doce incomível, em que figurem cantabiles de Haydn misturados com aletria e orvalho da floresta da Tijuca. Pode ser tanta coisa! Sem dosagem certa. Nunca, porém em doses cavalares. Respeitemos e amemos esse nobre animal, evitando o excesso de graça. Até a frivolidade carece ter medida, linha sutil que medeia entre o sorriso e o tédio pelo excesso de tintas ou pela repetição do efeito. Não pretendo fazer aqui a apologia do cronista, em proveito próprio. Reivindico apenas o seu direito ao espaço descompromissado, onde o jogo não visa ao triunfo, à reputação, à medalha; o jogo esgota-se em si, para recomeçar no dia seguinte, sem obrigação de sequência (ANDRADE apud COUTINHO, 1997, p.119).

Esse posicionamento de Andrade em relação à crônica também é

compartilhado por Villoro “El catálogo de influencia puede extenderse y

precisarse hasta competir con el infinito. Usado en exceso, cualquier de esos

recursos resulta letal” (VILLORO, 2005a, p. 14). Ou seja, esse gênero exige

harmonia, seja na composição com outros gêneros, na linguagem, na

abordagem do tema ou na função social de determinado texto.

É importante ressaltar que função social não significa denúncia, pois

houve tempo que o que mais importava era o costumbrismo de Prieto ou

afrancesamento de Gutiérrez Nájera ou estilo de Novo, e há outros mais

incisivos e analíticos, como o de Poniatowska e Monsiváis. Entretanto,

hay cosas que no cambiaron, por ejemplo, los temas que interesaron […]. [que] va de lo social y lo político a lo cultural, de lo histórico a lo presente, de lo nimio a lo trascendente, de lo cotidiano a lo excepcional, de los paisajes naturales a los íntimos, de lo profundo a lo superficial y hasta a lo frívolo, o sea, abarca todo lo que compone la vida […]” (SEFCHOVICH, 2015, p. 5).

Page 106: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

106

A crônica abarca variados temas que dizem respeito à vida cotidiana: o

transporte público dos bondes ao metrô; dos bairros periféricos aos grandes

centros urbanos; do bolero ao corrido; do rádio à internet; do mundo elegante e

aristocrático à negligência, indiferença e corrupção governamental. E,

certamente a Cidade do México, é o local exato onde acontece tudo que vale a

pena, como diziam Salvador Novo e Mariano Azuela (SEFCHOVICH, 2015).

Como se observa, os temas permanecem, a função social também, talvez o

que se modifica de uma época à outra é o tipo de explicação que os cronistas

apresentam para as situações sociais que relatam, pois, se os cronistas do

século XIX apoiavam-se em um viés mais moralista e costumbrista, os da

atualidade centram as discussões na desigualdade social. Isso, porém, não

afasta o compromisso desses escritores, principalmente em países com um

alto índice de analfabetismo, como no México. O cronista é, enfim, reflexo de

sua época, e seus textos põem em evidência sua sensibilidade estética e suas

concepções éticas. Deste modo, a crônica tem os limites éticos do jornalismo, o

que não impede uma interpretação subjetiva dos fatos.

Em linhas gerais, há duas vertentes para a crônica mexicana na

atualidade: a que privilegia o conteúdo mais extremo, como a violência urbana,

a delinquência, a prostituição infantil e a guerra contra o tráfico de drogas ou

aquela que aborda a história cotidiana, centrada na vida e na atividade das

pessoas comuns, anônimas. No entanto, isso não significa que haja

posicionamento ético diferente em uma ou em outra, pois, como diz Villoro: “El

secreto de la crónica depende de incluir lo que no es histórico, la vida cotidiana,

casi secreta, que respalda esa noticia” (VILLORO, 2009b, p. 12). O autor de

Safari accidental utiliza mais frequentemente essa segunda vertente, porém

isso não significa que ocorra um distanciamento de temas duros, mas que o

cronista utiliza um viés, o qual, na maioria das vezes, envolve a cultura

divulgada nos meios massivos como uma forma de aproximação com os temas

mais complexos. Percebe-se que seus textos não têm a pretensão de abarcar

a totalidade, pois opta por fragmentos, o que, de certa maneira, está à margem

da sociedade. Fogem dos procedimentos literários estereotipados, clichês

narrativos, procurando discutir, através da literatura e da cultura, versões

Page 107: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

107

distintas de fatos, desarticulando uma verdade cristalizada que, muito

frequentemente, circula nos meios massivos mexicanos.

O autor de Los once de la tribu percebe a crônica como um gênero que

se presta para expor o outro lado da lógica do capitalismo e se posiciona

criticamente. Em suas crônicas, em linhas gerais, o social se manifesta de

maneira mais espontânea que nas formas ficcionais, deixando transparecer um

gênero de dimensão diacrônica.

Em Villoro, essa forma de conhecimento avança criticamente na direção

de variados temas, utilizando, com maestria, o formato crônica-ensaio, o qual

aparece também em seus romances e contos. Como cronista, enfrenta o

desafio de equilibrar uma visão ética sem abandonar, entretanto, o caráter

estético do texto, posicionando-se como um jornalista atento, e não somente

como um escritor de informação. Seus textos podem obedecer, então, desde a

um propósito mais informativo, moralizador, até a uma crítica aberta ou mesmo

uma denúncia. De qualquer modo, o autor de Dios es redondo põe em tensão

máxima a capacidade de experimentação da crônica como um processo

discursivo ético-estético-político.

Em sua escrita, pode-se perceber um discurso de cronista que se arma

sobre um cabo de forças aparentemente contraditórias, como um Jano literário:

de um lado, está o desenvolvimento de um caráter irônico, aforístico,

fragmentado, o cultivo artístico da palavra e, do outro, Villoro constrói textos

críticos, mas sem se afastar do compromisso ético diante de fatos políticos,

sociais e culturais, principalmente do México. Percebe-se que essa estrutura se

torna mais fluida pela composição de crônicas cujo tema é a cultura popular a

qual, de certa maneira, transgride a cultura dominante, divulgando e levando à

reflexão aquela outra informação não divulgada pelos meios oficiais; mostrando

que esse tipo de texto é uma forma de resistência política. Como comenta

Salazar: “Al reconocer a la cultura popular como ámbito legítimo para criticar a

la cultura política dominante, el cronista promueve un cambio de signo para

todo aquello que se encuentra en el margen” (SALAZAR, 2005, p.6).

Page 108: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

108

2.2.1 Escritores, leitores e mercado cronístico

Escritores

Quando se analisa a crônica, é costume deter-se nas características

formais do gênero, numa tentativa de utilizar os (fluidos) limites ou os limiares

dos gêneros literários ou jornalísticos como caminhos analíticos, com o objetivo

de demonstrar uma constância na definição, para ressaltar possíveis

“transgressões” ou novas significações. No entanto, em meio a essa análise,

deixa-se em segundo plano, na maioria das vezes, um dos elementos

essenciais da crônica: a importância do sujeito cronista. Quem costuma

escrevê-la, enfim?

A crônica já foi produzida por diversos tipos de profissionais, não

necessariamente escritores, como professores, médicos, advogados, ou seja,

pessoas que ocupavam as mais diversas funções e, além disso, simplesmente

escreviam. Afinal, ser escritor puramente profissional é uma atividade recente.

Como ressalta García Canclini, referindo ao Brasil de 1930: “E durante muitas

décadas posteriores, os escritores não puderam viver de literatura, tendo que

trabalhar como docentes, funcionários públicos ou jornalistas [...]” (GARCÍA

CANCLINI, 2008, p. 68). Muitos exemplos podem ser citados, entre eles Jorge

Luis Borges, Octavio Paz, Juan Rulfo e Villoro, inclusive, que foi adido cultural

de embaixada e, na atualidade, ainda é professor. Deste modo, pode-se

afirmar que a crônica contribuiu para a ampliação de um mercado, não

necessariamente de livros, mas de jornais.

No entanto, é notório que ela colaborou também para ampliar o número

de leitores, como responde Darío Jaramillo Agudelo quando questionado sobre

a importância da crônica numa entrevista: “Como material de lectura: la crónica

ha ampliado la frontera de lectores. Crónica lee gente que no acostumbra leer

libros ni ir a las librerías y que llegará a ellas gracias al hábito inculcado por la

crónica” (JARAMILLO AGUDELO apud BARRÓN, 2012, p.1). A crônica,

realmente, havia passado a circular por âmbitos diversificados como uma forma

de reconhecer zonas da vida atual que antes não eram cobertas pela

linguagem literária: seres marginais, seres sem voz, delinquentes de todo tipo,

Page 109: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

109

ídolos pop, assassinos e outros que podem ser distinguidos de maneira não

usual.

Como são os novos cronistas latino-americanos? Observa-se na

atualidade a diminuição de escritores com uma grande participação na esfera

pública. No México, pode-se destacar a figura de Carlos Monsiváis, pois ele

representa o enfraquecimento do ideal associado ao “escritor comprometido”

ou o “intelectual revolucionário”. Em sua maioria, não são nem comprometidos

que polemizam ou denunciam desde o campo intelectual, marcando posição

nos editoriais, como escrevia Sartre em 1945, na Revista Les Temps Moderns.

“El escritor tiene una situación en su época; cada palabra suya repercute. Y

cada silencio también” (SARTRE apud LAGO, 2012, p. 65) e nem

correspondem ao perfil revolucionário dos anos sessenta e setenta, quando

muitos formaram parte de uma “intelligentsia politizada” que pensaram em

resolução de conflito através de vias violentas. Ou ainda o escritor que, por

uma escritura documental e testemunhal, denunciava os crimes do poder,

como ocorreu com Rodolfo Wash em Operación Masacre.

No entanto, a partir dos anos oitenta, pode-se destacar que, mesmo não

sendo o “escritor comprometido” ou o “intelectual revolucionário”, os relatos,

principalmente os dos cronistas, têm densidade e propõem um olhar particular,

microscópico e local sobre a realidade, como revela Bernabé (2006):

en los ochenta, frente a la pérdida de ciudadanía de vastos sectores sociales, algunos de ellos comenzaron a articular nuevas estrategias de apropiación cultural promoviendo el rescate de la memoria colectiva y otorgando visibilidad a lo borrado o ignorado de nuestras sociedades. De este modo, las narrativas del último fin de siglo retoman la senda abierta por las experiencias de la literatura de no-ficción en su apelación a una dimensión política que sobrepasa el deseo de testimoniar sobre lo real, lo que se revela en la distancia que establecen con la retórica del realismo y con un verosímil fundado en la ilusión referencial (BERNABÉ, 2006, p. 9).

Os cronistas, muitas vezes, recorrem ao humor, à ironia ou à memória,

tratando sempre de pôr em perigo um mundo administrado pela indiferença,

pela disciplina do consumo e pela esmagadora uniformidade social, pois, nesse

cenário do capitalismo tardio, as crônicas chegam a constituir “un acto de

intervención, en un sentido performativo, una operación de interpelación ética”

Page 110: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

110

que actúa e intercede para que se produzca el encuentro entre el lector y

aquello que permanece invisible a primera vista o aquello que no se quiere ver”

(BERNABÉ, 2006, p. 13). Villoro procura narrar sem produzir estereótipos, sem

cair no pauperismo extremo ou no populismo. Ele discute a realidade com as

“armas” da literatura, utilizando as margens e os interstícios, fugindo do lugar

comum, pois entende que a realidade é múltipla, complexa e, talvez por isso

mesmo, recorra, em suas crônicas, a figuras incomuns, como a mulher

barbuda, o pós-apocalipse e o ornitorrinco. Como destaca Carrión: “porque el

deber del periodista sigue siendo el de narrar las realidades candentes e

incómodas” (CARRIÓN, 2012, p.34).

O cronista é escritor ou jornalista? Muitos discutiram esse tema, pois,

devido ao caráter misto da crônica, composta por elementos literários e

jornalísticos, havia-se tornado uma arma de duplo fio, com discussões focadas

na legitimidade de seu valor literário e, inclusive, na tensão de que o cronista

seria escritor ou jornalista. Alejo Carpentier, em 1975, em uma oficina de

Alfredo López no Jornal Granma, disse:

Se suele decir escritor y periodista, o periodista más que escritor o escritor más que periodista. Yo nunca he creído que haya posibilidad de hacer un distingo entre ambas funciones, porque, para mí, el periodista y el escritor se integran en una sola personalidad. […] el periodista es una forma de historiador. Él es el cronista de su tiempo y el que recoge la participación inmediata del acontecimiento [...]. Cuando en el año 2000 alguien escriba una novela que quiera abarcar veinte años, pongamos, de nuestro proceso revolucionario, recurrirá a los periódicos actuales […]. El periodista es el novelista del futuro (CARPENTIER, 1975, p.1).

Assim como Alejo Carpentier (1975), esta pesquisa entende que não há

distinção entre escritores e jornalistas. No entanto, isto não significa que o

historiador ou o romancista também sejam o mesmo, mas que desempenham

modalidades técnicas distintas. Para o estudo da crônica, esta separação não é

frutífera, pois se acredita que não se deve classificar seus produtores em

escritores ou jornalistas, mas incorporar ambos.

Assim como há diversas metáforas para as crônicas, o cronista também

não fica isento dessas aproximações. A escolha geralmente é por seres

estranhos. Miguel Ángel Batenier fala da “teoria do marciano”, ou seja, olhar a

Page 111: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

111

realidade com assombro, estranhamento, como se acabasse de aterrizar na

Terra. Boris Muñoz diz que o cronista se parece mais a um morcego, porém um

morcego mutante:

En realidad, los cronistas son los X-Men de la prosa. ¿Por qué? Porque a pesar de ser mamíferos como la mayoría de los animales terrestres -no quiero implicar aquí que la mayoría de los periodistas sean unos animales terrestres, vuela. Volar, en este sentido figurado, significa usar el lenguaje para conferirle a la escritura cierta altivez verbal y un uso de la imaginación que la hacen literaria (MUÑOZ, 2012, p. 630).

Metáforas à parte, o certo é que a crônica, como gênero, exige a

assinatura de seus autores, pois, mesmo que eles usem pseudônimos, ela

concretiza sempre a expressão de uma interpretação pessoal. Muitos autores

utilizaram esse artificio, como Gutiérrez Nájera, que se passava por “El Duque

Job, Perico el de los Palotes, Puck, Junius, M. Can Can, Recamier, El Cura de

Jalatlaco, etcétera” (MONSIVÁIS, 1987, p. 760) ou Clarice Lispector, que

assinava como Tereza Quadros e Helen Palmer. Eles, como muitos outros,

utilizaram largamente esse artifício:

na passagem do século XIX para o XX, foi adotado por muitos escritores que se valiam desse disfarce para ocultar a verdadeira identidade no trabalho que desempenhavam nas redações. Um subterfúgio para o anonimato, explorado por Olavo Bilac, Machado de Assis, Manuel Antônio de Almeida e José de Alencar, entre outros (NUNES, 2010, p.70).

Seja para não sofrer represarias por seus escritos, seja para não

assumir que produzia textos em um gênero desprestigiado pela crítica, muitos

utilizaram essa artimanha. A exigência de um autor é uma relação particular

inerente ao gênero, desde sua relação com a história, passando pela literatura,

até desembocar no jornalismo. O cronista tem sido o sujeito que assina seus

escritos, e isso acrescenta uma responsabilidade, uma identificação do texto

com seu autor, um compromisso individual e um vínculo simbólico entre o

escritor e o leitor. Como menciona Foucault (1992): "hay que entender al autor

como principio de agrupación del discurso, como unidad y origen de sus

significaciones, como foco de su coherencia" (FOUCAULT, 1992, pp. 29-30).

Page 112: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

112

Na crônica “Rushdie en Tequila” sobre a visita à cidade de Tequila pelo

escritor Salman Rushdie, enquanto estava forçado a viver no anonimato, por

haver sido condenado por apostasia, devido a sua obra Os versos satânicos,

pelo aiatolá Khomeini, Villoro inicia destacando a responsabilidade que o

escritor tem ao assinar seus textos:

De acuerdo con Foucault, la noción de “autor” surge con la idea de que alguien puede ser castigado. No es el reconocimiento sino la necesidad de encontrar a un responsable lo que explica que se firmen las obras. Salman Ruhdie es la más dramática comprobación de esta teoría (VILLORO, 2005a, p. 211).

Nesse trecho percebe-se a responsabilidade da assinatura de um texto,

pois Rushdie foi perseguido pelo que escreveu em sua obra. Certamente há

autores que optam por usar pseudônimos, porém a crônica é um tipo de texto

que exige assinatura. A crônica e o cronista são elementos indissociáveis, já

que uma crônica anônima seria uma contradição de difícil explicação, posto

que o cronista também está presente no texto e, evidentemente, é parte dele.

Em uma conversa entre escritores, Cristián Alarcón pergunta a Villoro

“¿se ha quebrado todo el prejuicio que veía al escritor como artista y al

periodista como artesano?” (VILLORO y ALARCÓN, 2008c, p. 9) Ele responde

que, nos últimos anos, houve uma valorização dos jornalistas, recordando uma

frase que ouvia de um professor da UNAM, quando se graduava em Sociologia

e que aparece Safari accidental: “estudien, muchachos, o van a acabar de

periodistas! [...] Esto ocurría hacia 1976 […]” (VILLORO, 2005a, p.10). Villoro

relata ainda que parecia o último escalão social: “Lo recuerdo cada vez que

escribo crónicas” (VILLORO y ALARCÓN, 2008c, p. 9).

Essa reflexão também é compartilhada por Caparrós “el cronista, el

escalón más bajo de la escala zoológica; en la Argentina de 1991 decir que uno

hacía crónicas era una especie de chiste, una provocación. O, si caso, referirse

a una tradición casi perdida” (CAPARRÓS, 2015, p.22). Porém isso não

significa que não exista mais preconceito, apenas que há uma redução

significativa, pois, como comenta Salcedo Ramos, tal ainda ocorre na

atualidade, uma vez que, “Para escribir crónicas hay que tener algo de

kamicaze” (SALCEDO RAMOS, 2013, p.2) e, por isso, segue comentando que

Page 113: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

113

“Éste no es un género propicio para periodistas aburguesados” (SALCEDO

RAMOS, 2013, p.2). Já nas primeiras páginas de Safari accidental, (2005)

nota-se o tom irônico com que Villoro trata a questão entre jornalistas e

escritores:

La vida está hecha de malentendidos: los solteros y los casados se envidian por razones tristemente imaginarias. Lo mismo ocurre con escritores y periodistas. El fabulador “puro” suele envidiar las energías que el reportero absorbe de la realidad, la forma en que es reconocido por meseros y azafatas […]. Por su parte, el curtido periodista suele admirar el lento calvario de los narradores, entre otras cosas porque nunca se sometería a él (VILLORO, 2005a, p. 9).

Esse parágrafo é o que inicia Safari accidental, no qual Villoro usa a

expressão “malentendidos” para desenvolver uma discussão que demonstra a

complementaridade entre escritores e jornalistas. O “fabulador puro” inveja a

energia que o jornalista absorve da realidade enquanto o “periodista curtido” se

enciúma do tempo para escrever, além do prestígio que os escritores talvez

possam adquirir na posteridade. Mas adiante, num tom anedótico comenta a

relação entre a coroa espanhola e o jornalismo para demonstrar que, na

atualidade, ocorre a valorização da profissão, e diz:

La valorización social del periodismo dista mucho de ser la que tenía mi profesor de Sociología: los reyes ya no buscan princesas sino reporteras, según prueba la corona española. El prejuicio que veía al escritor como artista y al periodista como artesano resulta obsoleto (VILLORO, 2005a, p.13).

No entanto, é importante destacar que ainda há aqueles que veem os

jornalistas “como obrero o albañil y el escritor de ficción como gran arquitecto”

(VILLORO y ALARCÓN, 2008c, p. 9). Villoro, já declarou em entrevistas que,

durante muitos anos, colocava em suas fichas nos hotéis que era jornalista, e

não escritor, por acreditar pretensioso. Tal aparece na crônica “Velocidad

crucero: 850KM/H” em Palmeras de la brisa rápida, obra publicada

originalmente em 1989, diz: “Luego anoté la profesión que usurpo desde hace

años para llenar cuestionarios: “Periodista”. “Escritor” huele a pipa apagada,

apotegmas de dispéptico, edición intonsa, dedo ensalivado, pantuflas rancias”

(VILLORO, 2009a, p.35).

Page 114: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

114

Em uma entrevista publicada em 2012, Villoro, entretanto, parece

atualizar a discussão que aparece em Palmeras e diz: “Sin embargo ahora ya

me parecería negarme a mí mismo: he publicado más de quince libros, de

modo que ahora sí pongo “escritor”, ya no me suena pretensioso. Me suena a

una condena” (VILLORO apud CARRANZA, 2012, p.2).

Na maioria dos casos, a crônica é um texto curto narrado em primeira

pessoa, ou seja, o escritor e o leitor estão de certa maneira travando um

diálogo, pois “Escribir en primera persona, entonces, es solo una cuestión de

decencia: dejarlo claro. Cuando lo hace, la crónica toma una posición política

muy fuerte” (CAPARRÓS, 2015, p.141). Isso faz com que o texto tenha uma

visão pessoal de um determinado assunto, deixando transparecer que ela é o

olhar do cronista, seu foco e é onde está a sua lente, reflete Caparrós

La crónica es una mezcla, en proporciones tornadizas, de mirada y escritura. Mirar es central para el cronista – mirar en el sentido fuerte. Mirar y ver se han confundido, ya pocos saben cuál es cuál. Pero entre ver y mirar hay una diferencia radical (CAPARRÓS, 2015, p. 65).

Ver, perceber com os olhos, seria uma primeira acepção, enquanto,

olhar “es dirigir la vista a un objeto. Mirar es la búsqueda, la actitud consciente

y voluntaria de tratar de aprehender lo que hay alrededor – y de aprender. Para

el cronista mirar con toda la fuerza posible es decisivo” (CAPARRÓS, 2015,

p.65). E Villoro olha a realidade com assombro, como se observa no texto

“Cosas que escuché en La Habana”, no qual o autor considera a perplexidade

como um ponto de partida relevante para o cronista que enfrenta a experiência

de estar e narrar a cultura de outro país. “A diferencia del corresponsal

extranjero, que entiende o trata de entender lo que sucede, el cronista de viajes

escribe desde la perplejidad, con la mirada forzosamente distinta del

desinformado: en la sombra, mira lo que sale a la luz” (VILLORO, 2005a,

p.143-144). Como comenta Jon Lee Anderson neste aforismo “Si algo si vuelve

cotidiano, nos olvidamos de los detalles” (ANDERSON apud VILLORO, 2009b,

p.9). Ou seja, a crônica convida a exercitar olhar do que já foi visto, olhar por

outro ângulo, fugir da rotina. Caparrós menciona que ainda persiste o

Page 115: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

115

entendimento de que a terceira pessoa indica neutralidade, objetividade,

verdade enquanto a primeira a subjetividade, a manipulação e a mentira:

los grandes medios no están dispuestos a aceptarlo, porque equivaldría a aceptar que sus discursos dependen de sus subjetividades – que no están entregando “la verdad objetiva”. Y siguen, entonces, con su simulación. Para acentuarla insisten en que lo que se escribe en primera persona es una “opinión”; la tercera, en cambio, sería “información. El truco ha sido equiparar objetividad con honestidad y subjetividad con manipulación, con trampa (CAPARRÓS, 2015, p. 141).

As crônicas dos anos finais do século XX não expressam a intenção de

objetividade, imparcialidade e neutralidade. Contrariamente, há uma clara

tomada de posição e de compromisso, tendência detectada por Monsiváis nos

cronistas da geração posterior à sua, na qual está incluída Juan Villoro, de

quem escreve:

Se distinguem por seu atrevimento, por sua linguagem sem censuras, pelo recurso de falar desde um “eu” que anuncia uma reação mais democrática com o leitor sob a premissa: “Sou exatamente igual a você, exceto que eu tenho a palavra” (MONSIVÁIS, 2002, p. 34, tradução minha).

Pensamento compartilhado também por Jaramillo Agudelo, que afirma:

Los cronistas latinoamericanos de hoy encontraron la manera de hacer arte sin necesidad de inventar nada, simplemente contando en primera persona las realidades en las que se sumergen sin urgencia de producir noticias (JARAMILLO AGUDELO, 2012, p.11).

Villoro oscila a narração da maior parte de suas crônicas. Todas as de

Tiempo transcurrido estão em terceira pessoa, enquanto as que compõem

Safari accidental, Los once de la tribu e Dios es redondo variam entre a

primeira pessoa e a terceira. No entanto, é importante destacar que a voz

narrativa da crônica, mesmo estando em terceira pessoa, tem uma

aproximação com o autor, pois “El yo que cuenta lacrónica, cada crónica, es el

cronista y es, por supuesto, otro” (CAPARRÓS, 2015, p. 142). Certamente, o

cronista faz parte da crônica, porém a centralização da discussão não está

focada no eu cronista, mas no tema a ser abordado, já que falar de si mesmo o

tempo todo pode deixar a crônica desinteressante.

Page 116: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

116

É importante o posicionamento do cronista, a postura de assumir o risco

e entrar com osso e tudo, como diz Jaramillo Agudelo “es, a la vez la mayor

fortaleza y la mayor debilidad de la crónica como periodismo” (JARAMILLO

AGUDELO, 2012, p.21). Essa característica, porém, é quase obvia, pois ainda

que não anuncie, todo texto está em primeira pessoa. Ou seja, está escrito por

alguém que narra, relata e decide o que será relatado. É preciso convencer o

leitor de que o que se conta é a verdade e não uma das infinitas possibilidades.

É o mesmo que acontece quando alguém enquadra uma foto ou edita um texto.

É possível, então, notar as limitações do cronista para entender o que se

propõe a narrar. E é exatamente o que ocorre na epígrafe de Safari accidental,

pois, como diz o autor: “O ya no entendo lo que está pasando o ya no pasa lo

que estaba entendiento” (MONSIVÁIS apud VILLORO, 2005a, p.7).

É importante frisar que a crônica se concretiza através de uma seleção

muito particular de palavras nas quais o cronista transmite ao leitor a sua visão

de mundo e a sua forma pessoal de entender os acontecimentos que o cercam.

Não é fácil, pois tudo isso é feito a despeito de uma ideologia dos meios que

tratam de impor uma linguagem neutra, sem sujeito e concentrada na terceira

pessoa, como uma marca da suposta objetividade. Como diz Caparrós, não

existe a “Máquina-Periódico” que escreve, pois: “Todo relato es el relato de

alguien: toda descripción de cualquier situación es el recorte que hace quien

describe” (CAPARRÓS, 2015, p.139), no qual não se elimina o ponto de vista

do sujeito que olha. Por isso, é complexa a crítica da subjetividade da crônica

contra a objetividade de textos “puramente jornalísticos”, pois “Llevamos siglos

creyendo que existen relatos semiautomáticos producidos por ese ingenio

fantástico que se llama prensa; convencidos de que la que nos cuenta las

historias es esa entidad colectiva y veraz” (CAPARRÓS, 2015, p.139).

Page 117: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

117

Leitores

Suelo preguntarme por qué los editores de diarios y periódicos latino-americanos se empeñan en despreciar a sus lectores. O, mejor, en tratar de deshacerlos: en su desesperación por pelearle espacio a la radio y a la televisión, los editores latinoamericanos suelen pensar medios gráficos para una rara especie que ellos se inventaron: el lector que no lee. Es un problema: un lector se define por leer, y un lector que no lee es un ente confuso

46.

Martín Caparrós

No século XIX, o interesse dos leitores transformou-se no sustento

econômico dos jornais, atraindo prestigiosos escritores que desfilaram pelas

páginas dos diários, retomando a tradição do folhetim através do romance por

entregas e, mais tarde, através das crônicas.

Diversos países latino-americanos registraram na passagem do século

XIX para o XX um baixo número de pessoas alfabetizadas, produzindo,

consequentemente, poucos leitores. Pode-se citar o exemplo do Brasil que,

segundo Renato Ortiz, citado por Néstor García Canclini, diz que “em 1890

havia 84% de analfabetos, 75% em 1920, e, ainda 1940, 57%” (ORTIZ apud

GARCÍA CANCLINI, 2008, p. 68). Certamente esse quadro não é só do Brasil,

mas se estende a outros países latino-americanos, inclusive o México. Em

1932, diz Monsiváis: “70 por ciento de la población mexicana es analfabeta”

(MONSIVÁIS, 2010, p. 85). Porém, se a comparação for estabelecida com

países europeus no mesmo período, encontra-se: “Na França, o índice de

alfabetização, que era de 30% no Antigo Regime, sobe para 90% em 1890. A

Inglaterra, no início do século XX, tinha 97% de alfabetizados” (GARCÍA

CANCLINI, 2008, p. 68).

A partir da segunda metade do século XX, as diversas políticas públicas

reduziram consideravelmente essa situação e, nos dias atuais, a maioria dos

países que compõem a América Latina apresenta uma média de 10% de

46

Fragmento de “Por la crónica”, de Martín Caparrós. En Actas del IV Congreso de la Lengua Española. Cartagena en marzo de 2007. Disponível em: http://congresosdelalengua.es/cartagena/ponencias/seccion_1/13/caparros_martin.htm Último acesso em: 12.07.2015.

Page 118: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

118

pessoas não alfabetizadas47. Número alto, certamente, mas, levando em

consideração o público que consome crônicas, romances e que leem os

jornais, parece que a evolução do século passado tem sido lenta. Isso se

reflete na epígrafe citada, na qual Caparrós (2007) trata dos leitores que não

leem, fazendo com que os editores preencham os diários de fotos, quadros e

desenhos. Villoro, quando questionado em entrevista sobre a tendência dos

jornais de publicar cada vez mais fotos em detrimento dos textos, responde:

El rediseño general de los periódicos responde a una inseguridad respecto a los propios recursos del periodismo. Ante la enorme vigencia que están teniendo las plataformas digitales, el periodismo impreso pierde confianza en sí mismo y trata de imitar a las páginas web. Es decir, trata de publicar más imágenes con información más breve. Yo creo que se ha perdido un poco la brújula (VILLORO apud RICARDO, 2014, p.1).

Gabriel Zaid em seu ensaio “La lectura como fracaso del sistema

educativo” (2006) trata dos leitores mexicanos dos primeiros anos do século

XXI e destaca que o gosto pela leitura no país raramente vem de casa, sendo

normalmente adquirido na escola e na universidade. Ele ressalta também os

avanços e os investimentos governamentais que contribuíram com o aumento

do número de leitores. No entanto, os esforços não têm sido suficientes, pois

“según la Encuesta Nacional de Lectura del Consejo Nacional para la Cultura y

las Artes […] El 13% dice que jamás ha leído un libro. [...] También un 40%

dice que nunca ha estado en una librería” (ZAID, 2006, p.3). O mais espantoso

desse ensaio é a constatação de que também os universitários leem pouco:

Los entrevistados que han hecho estudios universitarios o de posgrado dieron respuestas todavía más notables. Según la ENIGH 2004, hay 8.8 millones de mexicanos en esa situación privilegiada […]. Pero el 18% (1.6 millones) dice que nunca ha ido a una librería; el 35% (3 millones), que no lee literatura en general; el 23% (2 millones), que no lee libros de ningún tipo; el 40% (3.5 millones), que no lee periódicos; el 48% (4.2 millones), que no lee revistas y el 7% (más de medio millón) que no lee nada: ni libros, ni periódicos, ni revistas (ZAID, 2006, p.4).

47

Esses dados são de 2010 e estão na página do Sistema de Información de Tendencias Educativas en América Latina (SITEL). Em El analfabetismo en América Latina, una deuda social, noviembre de 2010.

Page 119: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

119

A situação apresentada pelo ensaio de Zaid (2006) complementa o

quadro descrito por Caparrós (2007), pois se os editores preenchem com

imagem os espaços nos jornais e revistas, talvez seja porque sabem que seus

leitores não leem, sendo a imagem uma forma de disputar espaço com a

televisão. É importante considerar que a leitura de jornais no México ainda é

uma atividade elitista e concentrada na capital, contando nove entre os dez

jornais de maior tiragem no país (SÁNCHEZ RUIZ, 2005, p. 433). No entanto,

acredita-se que é equivocada a ideia de que dá para brigar com os meios

massivos de comunicação utilizando as mesmas armas, já que a arma de um

texto é a sua escrita, nada mais. A magia de uma bela crônica é trazer à luz

algo que, a princípio, não interessa ao leitor “la maravilla en la banalidad”

(CAPARRÓS, 2007, p.3). Como destaca Villoro “No se debe sacrificar la letra

simplemente por la imagen. […] Es como pensar que el periodismo es para los

que no leen. Es un contrasentido. El periodismo debe apostar por sus propios

recursos” (VILLORO apud RICARDO, 2014, p.1). Em todas as épocas

existiram livros para os que liam por exceção ou casualidade. Entretanto,

observa-se que, na atualidade, há uma tendência para fazer circular livros que

devem cativar os que geralmente não leem, porque, é patente, são a maioria.

Parece haver uma confusão por parte, não dos escritores, mas das editoras,

visto colocarem na mesma categoria leitores e clientes.

É uma relação complicada, pois não se pode negar a influência e até

certa facilidade oferecida pelos meios massivos de comunicação e como isso

tem contribuído para a ampliação das imagens e a diminuição das palavras nos

jornais. No entanto, é importante destacar que, mesmo com a expansão das

imagens em jornais e revistas, seja impressa ou por meios eletrônicos, a

crônica tem aumentado consideravelmente o número de publicações e

certamente de leitores. Por que tem aumentado esse número de publicações

de crônicas no México? Certamente não se pode apresentar uma resposta

exata sem uma ampla pesquisa de campo com os leitores e pretensos leitores,

porém é possível apontar alguns fatos que contribuíram para essa expansão.

Villoro, em uma longa entrevista em 1997, aborda as características dos

leitores mexicanos, principalmente os jovens:

Page 120: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

120

La crónica mantiene su importancia y ello se debe, según creo, a que la literatura de este género ha ocupado una zona de reflexión sobre el acontecer cotidiano. Quizá por falta de buenos periódicos o buenos medios masivos de comunicación, una gran parte de nuestros problemas políticos y sociales han sido ventilados por los cronistas. [...] El lector mexicano, sobre todo el joven, es alguien sin recursos económicos para comprar libros. De algún modo, los suplementos sustituyen la lectura de libros. Más que informar sobre las novedades editoriales y dar noticias para que el lector vaya a comprar libros o concurra al cine o al teatro o al concierto, los suplementos mexicanos son un punto de llegada y no de partida hacia otras manifestaciones de la cultura. Para muchos lectores, los suplementos son la única posibilidad de conocer literatura (VILLORO apud CUADERNOS HISPANOAMERICANOS, 1997, p.124).

Certamente, os apontamentos nesse trecho servem para pensar a

expansão do texto produzido em crônicas naquele país. Como destaca o autor,

devido à falta de meios confiáveis, os leitores acabaram centralizando nos

cronistas, já que podiam canalizar neles seus poucos recursos econômicos e

estabelecer com eles uma reflexão sobre o cotidiano, que é, afinal, a

característica intrínseca do gênero. Por isso, é possível acrescentar que isso

ocorre também pela maneira menos tensa através da qual os textos

jornalísticos, de forma mais engenhosa e sofisticada, utilizam como ferramenta

diferentes disciplinas, como a sociologia, a psicologia, a antropologia e a

filosofia. Além do mais, o olhar crítico do cronista se funde com a experiência e

com a subjetividade, dando ao texto uma tessitura lúdica, lírica, irônica e,

muitas vezes, transgressora e subversiva.

Jaramillo Agudelo dedica uma parte de sua obra para discutir a

importância da crônica como uma forma de arte. Para ele, esse gênero é uma

arte viva, em expansão, e isso se deve a dois motivos: “el primero es el

respecto por el lector y el segundo es el papel de lo insólito, mejor, del asombro

como ingrediente central de la crónica latinoamericana actual” (JARAMILLO

AGUDELO, 2012, p. 32).

Com relação ao respeito, a tese de Patrícia Trindade Nakagome,

intitulada “A vida e a vida do leitor: um conceito formado no espelho” (2015),

ressalta que “A questão central da tese é o respeito ao leitor e ao outro de

modo geral [...]. Falar em respeito parece comum demais a uma tese [...]. É o

que move a minha escrita, mas parece não ser digno dessa mesma escrita”

(NAKAGOME, 2015, p.17). Certamente, respeitar o leitor não é assunto banal,

Page 121: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

121

e muitos autores se preocuparam com ele. Jaramillo Agudelo (2012) acredita

que respeitar o leitor é não o entediar. O cronista Alberto Salcedo Ramos

compartilha com ele essa ideia, pois, quando questionado em entrevista sobre

as regras de ouro da crônica, diz:

La regla de oro número uno es por cortesía de Woody Allen: ‘todos los estilos son buenos, menos el aburrido’. Tú puedes hablar de lo que quieras, desde el Teorema de Pitágoras hasta la caspa del mico que acompaña a Tarzán; puedes escribir sobre lo triste, sobre lo folclórico, sobre lo trágico, sobre el frío, sobre el calor, sobre la levadura del pan francés o sobre la máquina de afeitar de Einstein. El lector te permite lo que sea, incluso que le mientes la madre, incluso que seas soberbio, pero no que lo aburras. A mí me parece que un buen prosista es, en esencia, un seductor, una persona que te atrapa irremediablemente con lo que escribe (SALCEDO RAMOS apud LAFUENTE PORTILLO, 2010, p.1).

O insólito, ou mesmo assombroso, mencionado por Jaramillo Agudelo,

parece por vezes arquétipo. No entanto, é preciso destacar que é no sentido de

busca ao inesperado, ao surpreendente, pois, como diz Salcedo Ramos “el reto

que tenemos no es inventar lo suprendente sino descubrirlo. Mi Nirvana no

empieza donde hay una noticia sino donde avisto una historia que me

conmueve o me asombra” (SALCEDO RAMOS apud JARAMILLO AGUDELO,

2012, p. 34).

Outra questão é o tema. Como saber qual assunto agradará mais ao

leitor? Os editores, não poucas vezes, determinam o tema da crônica, pois a

preocupação é aquilo que possa despertar interesse no leitor. Esse fato não

pode ser previsto por nenhum cronista, pois não é uma questão de experiência.

Como diz Alma Guillermoprieto, “Soñamos con un lector que no existe”

(GUILLERMOPRIETO apud VILLANUEVA CHANG, 2012, p.587), pois o leitor

não é um fantasma, é um enigma. E uma maneira de resolver esse enigma

talvez seja não entediá-lo: “He procurado ahorrarle al lector las molestias

necesarias para escribir estas crónicas” (VILLORO, 2005a, p. 255), pois “la

literatura necesita lectores y no sólo compradores de libros” (GARCÍA

CANCLINI, 1999, pp. 53-54).

Os textos de Villoro apresentam uma estrutura interessante, pois, se por

um lado, um leitor iniciante conseguirá compreendê-lo, por outro, um leitor mais

Page 122: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

122

experimentado não terá dificultado de extrair, do mesmo, diversas camadas de

leitura, visto serem textos que resistem a uma análise. Não se trata de

alegorias, senão de uma segunda história, não tão evidente. Villoro também

tem um cuidado para não deixar o texto emotivo, até porque ele se considera

assim. Por isso, utiliza uma linguagem mais contida, menos acelerada e

bastante equilibrada “Yo como persona he dado más renda suelta a la parte

emocional, tratando desde luego de no ser oportunista a las emociones del

lector. Es decir, de no ser sensiblero” (VILLORO apud BENAVIDES, 2014, p.2).

Em diversas crônicas, Juan Villoro ressalta a importância de ser leitor

antes que escritor e, na crônica, “Las enseñanzas de Augusto Monterroso”,

rememora os ensinamentos de seu professor, mencionando a visão

equivocada de que poderia ser escritor sem ler os clássicos:

Sin hacer el menor alarde erudito, Monterroso cerró de un portazo mi salida de emergencia favorita. Hasta entonces yo creía que podía ser escritor sin leer a los clásicos de esas lenguas afortunadamente muertas. Mi idea de la literatura tenía que ver más con la lucha libre: técnicos contra rudos. En esta esquina, los escritores que convertían sus libros en aventuras; en la otra, los que convertían sus aventuras en libros. El recurso Joyce vs. el recurso Hemingway (VILLORO, 2005a, pp.248-249).

Como mencionado, Villoro, desde os princípios de sua trajetória literária,

demonstra preferência pelas histórias em quadrinhos e pelo cronista de futebol

Ángel Fernández. Pensando nos dois tipos de leitores mencionados por Piglia

(2007), que toma por base leitores exemplares: Kafka e Joyce, poderia ser dito

que Villoro está mais para o segundo, disperso, movediço, que para Kafka,

recluso, fechado, como comenta Piglia sobre o escritor tcheco: “Me gustaría

estar en una catacumba, en un sótano y que me dejaran la comida en la puerta

para que yo pudiera caminar un poco y que después nadie me molestara”

(PIGLIA apud PIGLIA y VILLORO, 2007, p.6). No entanto, ao adentrar na

oficina literária de Monterrroso, Villoro teve que enfrentar os clássicos, pois,

antes de aprender a escrever teve que aprender a ler. Embora esteja ciente da

impossibilidade de ensinar a alguém esse ofício: “Aunque todo el mundo sabe

que no hay manera de enseñar a escribir, en la década de los setenta los

talleres se multiplicaban” (VILLORO, 2005a, p.247). Mais adiante diz:

Page 123: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

123

Aprender a escribir implica, obviamente, aprender a leer. En el taller, las lecturas se convirtieron en la red protectora de las acrobacias; sin embargo, como en el verso de Montes de Oca, Tito nos advirtió de que el verdadero peligro de caer consistía en “ser herido por la red” (VILLORO, 2005a, p. 251).

No trecho destacado, ele cita um verso do poeta mexicano, Marco

Antonio Montes Oca, a quem Tito (apelido de Monterroso) admirava e que

recebeu um poema “Redención de la noche” em sua homenagem. Era o perigo

de ser ferido pela rede das próprias acrobacias da linguagem, das repetições,

dos temas desinteressantes, pois, como diz Villoro: “Los lectores tienen la

mente poblada de los rifles de alto poder y los coches bomba que pueden

acabar con la vida del autor y buscan en cada párrafo una clave que explique

(o incluso justifique) la amenaza” (VILLORO, 2005a, p. 212, grifo do autor).

Mercado

O mercado é considerado a única instituição social que ordena sem coerção48

. Pierre Bourdieu

Parte da crítica literária costumou ler a crônica como um gênero

“contaminado” e, por isso mesmo, poetas e narradores do século XIX, por sua

relação com o jornal e, mais tarde, com a indústria cultural, tiveram sua obra

desvalorizada. Apesar disso, o cronista, como um habitante de fronteira, soube

mover-se na ambiguidade e produzir textos que ansiavam por valorização,

embora necessitassem de um comprador “En la larga lucha por la conquista de

la autonomia del arte, la crónica estuvo asociada a los estómagos antes que al

espíritu” (BERNABÉ, 2010, p.1).

Conforme já mencionado, a produção cronística dos modernistas, em

geral, foi lida como uma prosa menor, cuja maestria somente poderia ser

48

Fragmento do livro BOURDIEU, Pierre. Campo de poder, campo intelectual, itinerario de un

concepto. Buenos Aires: Colección Jungla Simbólica. Editorial Montressor. 2002.

Page 124: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

124

qualificada através de formas consagradas: romances, poemas e ensaios. Até

que ponto a crítica literária atual segue operando esses valores?

Até meados dos anos de 1960, o romance dominou o mercado editorial

mexicano, e o centro do jornalismo era, sem dúvida, a reportagem. Não

obstante, “después de 1968, la crónica ni se desvanece ni se repliega en la

nostalgia” (MONSIVÁIS, 2010, p. 112). Além de consignar as impressões da

modernidade, a ela também coube “reproduzir el vértigo de la masificación, las

sensaciones de caos, la reubicación de la vida cotidiana [...]” (MONSIVÁIS,

2010, p. 112). Quer dizer que, com o avanço tecnológico e a intensificação das

migrações e viagens, o México passou a ficar muito mais informado,

contribuindo para enfraquecer o domínio ideológico do PRI. Entretanto, como

comenta Mónica Bernabé

A partir de su inserción en el periodismo como mercancía, la crónica cumplió y cumple funciones decisivas en el campo cultural y literario. Podríamos decir que es un doble recurso: al mismo tiempo que representa la posibilidad de un ingreso de dinero es una estrategia para forjar un nombre de autor. Sin embargo, a la hora de evaluar una obra, rara vez la crónica fue considerada una práctica de escritura virtuosa (BERNABÉ, 2010, p.2).

Não cabe dúvida de que, a partir das décadas de oitenta e noventa, a

crônica, como se observa, foi reativada com a retomada de estudos nos quais

um setor da crítica inicia a releitura das crônicas modernistas, além da

presença da FNPI e das revistas especializadas. Mas também há uma

expansão gradual no mercado editorial de recopilações de textos desse

gênero.

O cronista contemporâneo se encontra diante de circunstâncias mais

complexas que a dos modernistas que transformavam a cidade do século XIX

em objeto. Na atualidade, não se trata mais da cidade, senão do mercado

como sistema; não é somente o jornal, senão o rádio, a televisão, a internet,

enfim, os meios de comunicação de massa em conjunto. O cronista é

convocado a narrar uma paisagem dispersa, violenta, heterogênea para dar

sentido a uma leitura excessivamente híbrida, com materiais diversos, de

origem popular, erudita ou de mercado, pois não há hierarquias. A respeito da

relação complicada da crônica com o mercado, comenta Villoro:

Page 125: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

125

Talvez llegará el día en que los periódicos compren la prosa “en línea”, a medida que se produce. Sin embargo, desde ahora es posible detectar la casi instantánea relación entre la escritura y en dinero, economías de signos y valores (VILLORO, 2005a, p.12).

Outra tendência que se observa com relação à crônica é o aumento

significativo de produções organizadas em livros, depois de terem sido

publicadas em jornais impressos ou digitais e que são, muitas vezes,

produções especificamente para livros, como é o caso de Tiempo transcurrido,

modificando uma característica que acompanha esse gênero há tempo. As

publicações em jornais e revistas permitiu a crônica funcionar com certa

liberdade, com amplitude de temas e modo de escrita flexível. Por que se

estão compilando tantas crônicas e por que esse tipo de texto tem sido lançado

como livro? É uma questão intrigante e Villoro comenta que essa é uma prática

que remonta à década de setenta no México, pois foi uma maneira que os

cronistas encontraram para fugir da censura mais dura dos jornais naquele

momento. Essa questão cabe para crônicas daquele período e talvez para a

sua primeira obra desse gênero. Mas por que as demais também foram

organizadas nesse formato? Ainda há censura de tema de crônicas nos meios

ou é possível pensar que se trata de uma questão de mercado?

Monsiváis, quando entrevistado em 2003 por Juan Jesús Aznárez sobre

o mercado editorial mexicano, fez uma análise do panorama literário no país,

tratando da aparição do “Mercado” com letra maiúscula e complementa:

Lo primero a destacar es la transformación que trae consigo el Mercado. Súbitamente, los escritores se descubren como productos, y como productos sujetos a una obsolescencia acelerada. Surgen los agentes literarios, en las librerías el período de gracia acordado a una novedad editorial es a lo sumo tres meses (después emprenden el largo camino que desemboca en los saldos y el reciclaje), las presentaciones de las novedades bibliográficas son más bien cócteles, bailes de quince años o ceremonias de graduación, etcétera (MONISVÁIS apud AZNÁREZ, 2003, p.2).

A complexa relação entre o cronista e o mercado não é uma questão

atual, como vem sendo demonstrado, e Villoro tem-se mostrado hábil para se

mover nesse meio. Por um lado, tenta manter um posicionamento crítico com

Page 126: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

126

relação aos temas de repercussão política, econômica e social. Por outro,

procura publicar em meios diversificados, independentemente de postura

ideológica. La Jornada, por exemplo, que é um jornal de esquerda e no qual se

percebe que estão concentradas muitas de suas produções, não impede que

publique também em Reforma, que apresenta uma postura neoliberal. E ele

declara em entrevista:

cuando yo empecé a escribir nosotros no buscábamos guetos de crónica, sino simplemente tratamos de publicar la crónica donde fuera. Yo creo que estamos apelando a cualquier tipo de lector y la apuesta para nosotros ha sido siempre hacer algo distinto en el lugar donde nos dejen hacerlo (VILLORO apud BENAVIDES, 2014, p. 4).

É uma questão complicada que envolve autonomia, não somente do

cronista, mas principalmente dos meios. Pierre Bourdieu relata em sua obra, As

regras da arte (1996), as ameaças à autonomia resultantes da “interpenetração

cada vez maior entre o mundo da arte e o mundo do dinheiro” (BOURDIEU,

1996, p. 375). A reivindicação de autonomia da literatura na América Latina

esbarra geralmente em poderes continuamente renovados, quer trate dos

poderes externos, como os da igreja, do Estado ou dos grandes

empreendimentos econômicos, quer seja de poderes internos, mediados pelo

controle dos instrumentos de produção e difusão específicos como a imprensa,

a edição, o rádio e a televisão. García Canclini, no prólogo da obra Sociología y

cultura, de Pierre Bourdieu, menciona que, ao aplicar os conceitos do autor

francês, a sociedade na América há que se ter atenção, pois eles não foram

pensados para essa sociedade.

En los países latinoamericanos, las relaciones económicas y políticas no han permitido la formación de un amplio mercado cultural de elite como en Europa ni la misma especialización de la producción intelectual ni instituciones artísticas y literarias con suficiente autonomía respecto de otras instancias de poder. Además de la subordinación a las estructuras económicas y políticas de la propia sociedad, el campo cultural sufre en estas naciones la dependencia de las metrópolis. Bajo esta múltiple determinación heterónoma de lo legítimo y lo valioso, el campo cultural se presenta con otro régimen de autonomía, dependencias y mediaciones (GARCÍA CANCLINI, 1990, p.36).

Page 127: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

127

No México, país que passou a maior parte do século passado sob o

domínio de um único partido, tal fato se torna ainda mais complexo, como

expressa Villoro nessa reflexão:

Durante mucho tiempo, los dueños de medios y periódicos de México consideraron que su fuerza derivaba de un adecuado uso del tráfico de influencias. En la medida en que servían de apropiadas plataformas al poder, contribuían a marcar la agenda nacional. “Soy un soldado del PRI”, dijo en forma emblemática Emilio Azcárraga Milmo

49 (VILLORO, 2011a, p. 16).

Na atualidade, o panorama mudou bastante, mas não o suficiente, pois

ainda há em muitos meios, principalmente no interior do país, com dificuldade

para exerce sua independência. Contudo, isso não é uma questão somente do

México, pois, como menciona Villoro a respeito de Vázquez Montalbán, que

disse: “La primera tarea del periodista consiste en saber quién es el dueño de

su periódico”, escribe Manuel Vázquez Montalbán. Si conoces los intereses del

dueño, conoces los límites de tu libertad” (VILLORO, 2011a, p. 16).

O mercado editorial latino-americano apresentou modificações

relevantes a partir de meados dos setenta. No entanto, antes de abordá-las, é

importante ressaltar algumas particularidades referentes ao termo que implica

parte dessa mudança, que é o conceito de globalização, pois é costume pensar

nessa noção como unificação e homogeneização de todas as sociedades. No

entanto, essa acepção não serve para discutir mercado editorial, e sim

financeiro. Isso ocorre devido ao enraizamento da literatura numa língua

particular, porque a difusão de obras tende a ser expandida dentro de um

mesmo contexto linguístico. Outra questão é o entendimento de globalização

como “americanização”, pois, no caso de editoras, principalmente na Argentina

e no México, a transnacionalização se deu em relação a empresas espanholas,

ou da área latina da Europa, como, por exemplo, o “grupo Mondadori, que

comprou as editoras Grijaldo, Planeta, Ariel e Seix Barral, e o grupo

Bertelsmann, a Sudamericana” (GARCÍA CANCLINI, 2007, p.140). Cabe

destacar também que o declínio nas economias da região nas últimas décadas

do século passado e o avanço das editoras espanholas no mesmo período

49

Empresário mexicano, filho do fundador da Televisa (maior conglomerado telecomunicações do país) e administrador desse empreendimento por quase trinta anos.

Page 128: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

128

contribuíram para o fechamento de muitas editoras e livrarias latino-

americanas, além de que

jornais e revistas faliram ou reduziram suas páginas. O aumento internacional do preço do papel, agravado por bruscas desvalorizações da moeda nacional em quase todos os países latino-americanos, são algumas das causas dessa retração (GARCÍA CANCLINI, 2007, p. 141).

Ao observar as mudanças ocorridas nas editoras com a

transnacionalização, que acabaram influenciando os jornais e revistas, é

possível pensar que esse pode ser também um dos prováveis motivos para o

aumento da publicação dessas crônicas organizados em livros.

Villoro publica parte de seus escritos em editoras espanholas. No

entanto, não deixa de publicar em editoras menores, no México, na Argentina e

no Brasil. Piglia, em conversa com Villoro, menciona a relação dos escritores

com as pequenas editoras:

Lo primero que hizo hoy Juan, cuando me encontró, fue darme dos pequeñas ediciones de libros que él mismo tradujo. O sea que los escritores siempre estamos interesados en las pequeñas editoriales, en las editoriales que publican literatura, y cuando nos damos libros nos damos ese tipo de libros y estamos siempre interesados en ese tipo de circulación, porque eso es verdaderamente la literatura (PIGLIA apud PIGLIA y VILLORO, 2007, p. 2).

A relação discutida pelos escritores é complexa, pois não se pode

esquecer que eles vivem do mercado e, ao mesmo tempo, o mercado é o

limitador de sua literatura. Anadeli Bencomo relata em sua obra Entre héroes,

fantasmas y apocalípticos: testigos y paisajes en la crónica mexicana (2011)

que:

Juan Villoro es uno de los escritores mexicanos que ha logrado trascender de manera exitosa a otros mercados lectores gracias a sus crónicas transnacionales que registran comportamientos y escenarios familiares al lector globalizado de la postmodernidad. Sus textos sobre conciertos de rock, sobre los mundiales de fútbol y luminarias del espectáculo logran sintonizar con el imaginario dilatado de nuestro tiempo (BENCOMO, 2011, p.131).

Certamente o tema massivo da crônica de Villoro tem contribuído para

uma considerável aceitação no mercado leitor. Reduzir, porém, a prosa do

Page 129: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

129

autor a somente a temática “globalizada” é complicado. Afinal, cabe

acrescentar também uma consciência da linguagem e da forma como valor

essencial de sua escrita, além do posicionamento crítico a respeito dos meios

de publicação de seus textos.

Na Feira Internacional do Livro de Guadalajara, o autor quando

entrevistado sobre o marketing do auge da indústria editorial, comenta:

La feria es un fenómeno de la industria, no de la cultura. Por supuesto que puede tener derivados culturales, como el originado en un encuentro casual de dos personas que se ponen a discutir sobre un título, pero en general la Feria del Libro está aquejada de gigantismo. Es una máquina de vomitar actividades y confunde la estadística con el éxito (VILLORO apud MELUSSI, 2016, p.1).

A respeito da propaganda da obra literária, Monsivais comenta que “es

tan decisivo el marketing que ya la publicidad parece integrarse a la obra”

(MONSIVÁIS apud AZNÁREZ, 2003, p.3). Ou seja, ocorre como se o sucesso

de uma publicação estivesse condicionado à propaganda que a acompanha.

Certamente isso não qualifica ou desqualifica uma obra, mas contribuiu para

alcançar um número maior de leitores, o que talvez não tivesse ocorrido, caso

o acesso fosse estabelecido apenas por pequenas editoras.

Villoro quando é questionado por que costuma fazer passagens

relâmpagos pela feira de Guadalajara e se detêm por muito mais tempo em

outras, como da Argentina ou do Chile, responde que, “Precisamente porque

es una feria muy aturdidora y uno se siente esclavo de esa dinámica

vertiginosa” (VILLORO apud MELUSSI, 2016, p. 1). E segue comentando como

as grandes editoras que comandam as feiras haviam criado um gigantismo tão

grande que acabaram por deixar de lado o que deveria ser o centro do evento:

a discussão sobre literatura e tudo que a envolvesse, fato que em eventos

menores não costuma acontecer. E diz:

En la Feria de Guadalajara he visto cómo alguien le pasaba un papel a José Saramago cuando ya era Nobel, diciéndole que terminara su charla porque tenía que pasar el siguiente conferencista. La cultura tiene un ritmo lento y las ferias son una aceleración artificial de ese ritmo (VILLORO apud MELUSSI, 2016, p.1).

Page 130: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

130

A troca gradativa do estatuto de “puro objeto estético” pelo de

“mercadoria”, que vem acompanhando toda a história do capitalismo há muito

tempo, trouxe como consequência a progressiva redefinição das relações entre

a literatura, já que o autor, o leitor e a própria crítica, circulam no interior de um

todo estruturado de acordo com a lógica do mercado editorial (PELLEGRINI,

2016).

Dunia Gras Miravet no ano de 2000 entrevista Roberto Bolaño, que

acabara de ganhar o Premio Rómulo Gallegos por Los detectives Salvajes

(1999). Dentre os diversos temas discutidos, a entrevistadora aborda sobre o

olhar das editoras espanholas na direção dos jovens escritores hispano-

americanos. Neste contexto, menciona Bolaño:

No son tontas las editoriales: están apostando por autores que saben que van a crear una obra diferente, como Juan Villoro, por ejemplo. Yo creo que si de mi generación hay alguien que va ganar el Nobel, ese será Juan Villoro, lo digo completamente en serio. De mi generación hay dos que van a ganar el Nobel casi con toda probabilidad, uno es Javier Marías y el otro es Juan Villoro (BOLAÑO apud GRAS MIRAVET, 2000, p.64).

Observando o catálogo de editoras espanholas como a Anagrama,

Alfaguara, Planeta e Seix Barral, para citar alguns exemplos, há um grande

número de escritores latino-americanos e, dentre eles, está Villoro, porém não

se deve esquecer que as publicações reúnem interesses comerciais e culturais

envolvidos. Com relação ao Nobel, certamente não é possível prever um fato

como este, pois é muito subjetivo e político. É importante, porém, destacar a

consistente e constante obra literária que o cronista vem construindo ao longo

dos anos.

Page 131: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

131

CAPÍTULO III - LITERATURA E CULTURA 3.1 Discussões sobre a crônica e a cultura de massa

A crônica, ao longo dos anos, tem sofrido preconceito por ter sido

considerada uma arte menor, principalmente devido a uma percepção restrita

que diferencia a escrita como criação, reservada aos artistas, e a escrita como

produção, encaminhadas às massas e, por isso mesmo, contaminada pelo

fator econômico. Assim, gêneros considerados de “alta cultura” estariam

reservados a uma pequena elite e a nichos universitários, enquanto a crônica,

que representaria um gênero popular, seria direcionada para as pessoas em

geral.

A ideia de “alta cultura” e “cultura popular” no México está presente na

formação e na evolução do capitalismo mais ou menos como uma luta

contínua, que toma a atenção de historiadores, antropólogos e estudiosos da

cultura de uma maneira geral, acabando por tornar-se, na literatura, um tema

que envolve termos complexos como: tradição, autonomia e cânones50.

A palavra cultura é certamente imprecisa e utilizada constantemente

com várias acepções. Como destaca Terry Eagleton, citando o estudo de

Raymond Williams, a expressão cultura já significou “civilidade”; depois, no

século XVIII, tornou-se mais ou menos sinônima de “civilização” para se tornar,

no século XIX, o seu oposto. Ou seja, cultura é “uma dessas raras ideias que

têm sido tão essenciais para a esquerda política quando vitais para a direita, o

que torna sua história social excepcionalmente confusa e ambivalente”

(EAGLETON, 2005, p. 11). Sendo assim, apoia-se aqui, na noção de Terry

Eagleton, no qual cultura “é uma espécie de pedagogia ética que nos torna

aptos para a cidadania política ao liberar o eu ideal ou coletivo escondido

dentro de cada um de nós, um eu que encontra sua representação suprema no

âmbito universal do Estado” (EAGLETON, 2005, p.17).

50

Frank Kermode em sua obra Apetite pela poesia (1993) explica que não há somente um

cânone, mais cânones. Ressalta que “os cânones são formados por exclusões assim como por inclusões, pois se você inclui qualquer coisa, é claro que se perde completamente a ideia de cânon” (KERMODE,1993, p.27). A utilização desse termo na pesquisa é para ilustrar os estudos críticos de uma época. No entanto, na atualidade a cultura e a literatura não cabe mais nesse termo.

Page 132: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

132

Assim, como ocorre com o termo cultura, igualmente complexa é a

palavra “popular”. Peter Burke, em seu estudo sobre cultura popular entre 1500

e 1800, destaca que o termo popular naquele período referia-se ao povo

comum, ou seja, “ao conjunto da não elite, incluindo mulheres, crianças,

pastores, marinheiros, mendigos e demais grupos sociais” (BURKE, 1989,

p.11).

Cabe destacar que não há a intenção de se apresentar uma oposição

em que se deprecia a cultura popular e exalta a cultura elitista. Nem se

pretende ressaltar a autenticidade de uma, em detrimento da outra. É certo que

a cultura popular já foi classificada como não oficial, a cultura da não elite, das

“classes subalternas”, inculta e divertida. Em oposição à cultura erudita,

entendida como privilegiada pelos meios acadêmicos, produzida por uma elite

política, econômica e cultural, de comunicação e oficial.

A noção de cultura popular apresenta, desde sua origem, ambiguidade

semântica, o que torna difícil o debate, pois, por um lado, há o perigo do

reducionismo, no qual não se reconhece nenhum valor, e a cultura popular

seria apenas um subproduto inacabado. Por outro, no entanto, há uma

oposição à concepção anterior, visualizando a cultura popular como igual ou

superior à outra, tida como elitista. Entretanto, essas teses extremas são

superadas pela realidade na qual se excede qualquer uma dessas

classificações, pois a cultura popular não é inteiramente dependente, nem

autônoma, nem criação, ou pura imitação (CUCHE, 1999). Por trás de ambas,

há valores deslocados por simulações, interesses políticos e econômicos, com

evidentes problemas de classes.

Logo no início de seu artigo, “De las relaciones literarias entre “alta

cultura” y “cultura popular”” (1985), Carlos Monsiváis destacou que antes da

década de sessenta o reconhecimento da existência da cultura popular se

caracterizava como uma invenção, pois era difícil admitir que o “popular”

qualificasse de alguma maneira a cultura. Esses termos são inegavelmente

políticos, porque atendem à necessidade de controles, principalmente

mercadológicos, os quais ganharam força ao longo do século XX, para

diferenciar a “alta cultura” da ideia de cultura nas classes mais populares.

Nessa perspectiva, as diferenças que opõem a cultura popular à cultura de

Page 133: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

133

referência são analisadas muitas vezes como deformações, incompreensões,

faltas ou apenas seus subprodutos.

A passagem da cultura popular para a cultura de massa se dá

lentamente, e não se pode atribuir aos meios eletrônicos a origem da

massificação das culturas populares, pois o massivo foi gerado a partir do

popular. Jesús Martín-Barbero (2003) especifica essa transição:

Massa designa, no movimento de mudança, o modo como as classes populares vivem as novas condições de existência, tanto no que elas têm de opressão quanto no que as novas relações contêm de demanda e aspirações de democratização social. E de massa será a chamada cultura popular. Isso porque no momento em que a cultura popular tender a converter-se em cultura de classe, será ela mesma minada por dentro, transformando-se em cultura de massa. Sabemos que essa inversão vinha sendo gerada há muito tempo, mas ela não podia tornar-se efetiva senão quando, ao se transformarem as massas em classe, a cultura mudou de profissão e se converteu em espaço estratégico da hegemonia, passando a mediar, isto é, encobrir as diferenças e reconciliar os gostos. […] Essa mediação e esse consentimento, no entanto, só foram historicamente possíveis na medida em que a cultura de massa foi constituída acionando e deformando ao mesmo tempo sinais de identidade da antiga cultura popular e integrando ao mercado as novas demandas das massas (MARTÍN-BARBERO, 2003, p. 175).

A Cultura de massa ou a Terceira cultura, como foi denominada por

Edgar Morin, surgiu com a revolução industrial, oriunda, inicialmente, a partir da

imprensa e, posteriormente, a partir do cinema, do rádio e da televisão. É

importante destacar que o texto de Morin foi escrito em 1962, quando a cultura

de massa não era elaborada por intelectuais, os quais tendiam a classificá-la

de maneira pejorativa, como subproduto da indústria moderna. Por um lado,

segundo o pensamento da direita, era vista como barbárie, ou simplesmente

diversão e, por isso mesmo, ligada à plebe; por outro, entretanto, numa visão

de esquerda, seria o ópio do povo, a mistificação deliberada, tendo o capital

como o responsável por desviar a massa dos seus problemas verdadeiros.

Para além dessa dialética entre esquerda e direita, a cultura de massa era

vista, principalmente pelos intelectuais, como mercadoria cultural ordinária, feia

e sem valor. No entanto, ainda existem os que percebem a cultura de massa

como tal e outros que não se envergonham de usá-la para se inserirem no

mercado.

Page 134: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

134

Essa incorporação nos debates da cultura articulada nos meios

massivos parece ser um assunto que não envelhece, ao contrário, torna-se

mais atual a cada dia. O aumento das mídias em número e volume e as

discussões em torno da questão estão cada vez mais presentes no cenário

acadêmico. Ou seja, a discussão levantada por Umberto Eco em 1964, no livro

Apocalípticos e Integrados, está ainda latente. A questão discutida nessa obra

apresenta uma dicotomia entre aqueles que defendem uma literatura

considerada erudita e os que não veem problema em incorporar em seus

escritos a cultura que circula nos meios massivos. Trata-se, como denominou

Andreas Huyssen, em 2006, da “grande divisão”, acentuando um discurso que

promovia essa distinção categórica, atenuada, principalmente, a partir dos anos

setenta, com a proliferação de autores que incorporaram, em seus textos, o

futebol, os programas de televisão, as histórias em quadrinhos, os

personagens de cinema e a música, entre outros. No entanto, por que, ainda

hoje, essa discussão seria irrelevante? Por que no meio acadêmico, mesmo

com o crescimento do número de autores que dialogam com a cultura popular

e a cultura de massa, ainda há preconceito em relação às obras desses

autores?

É importante destacar que não se trata de levantar um debate sobre

“guerras culturais” ou uma defesa de “apocalípticos e integrados”, mas de

pensar que o escritor não está isolado de sua época, e que é pertinente a

incorporação em seus escritos da cultura do momento. No entanto, isso não

significa que não se possa manter um posicionamento crítico a respeito dessa

cultura. É preciso entender, então, que o valor estético não é absoluto, mas

uma interpretação ou “superinterpretação” individual e, portanto, suscetível a

mudanças.

A criação dessas barreiras imaginárias entre uma cultura elitista e outra

popular ou de massa contribui para criar seleções arbitrárias e sacralizadas. A

constituição de uma ideia de que, na popular ou de massa, encontram-se a

falta de exigências mínimas e critérios que testifiquem qualidade. Por isso

mesmo, é necessário demolir essas divisões que apresentam oposições

abruptas, envolvendo o tradicional, o moderno, além do culto, do popular e do

massivo, pois, como diz García Canclini “A noção de cultura massiva surge

Page 135: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

135

quando as sociedades já estavam massificadas” (GARCÌA CANCLINI, 2008, p.

256). Necessita-se, na atualidade, de instrumentos de análise com vasos

comunicantes, capazes de circular entre esses vários pavimentos.

A cultura articulada pelos meios massivos como tema aparece

constantemente na escrita de Juan Villoro. Não se trata, porém, de um

posicionamento a favor ou contra, mas pode ser interpretado como um esforço

para a eliminação de rótulos como culto, popular ou massivo. Afinal, observa-

se em sua literatura, sempre, a mistura daquilo que García Canclini chama de

“cultura urbana para tratar de conter as forças dispersas da modernidade”

GARCÍA CANCLINI, 2008, p. 284).

Nota-se que, principalmente em suas crônicas, Villoro capta claramente

que seu projeto de escrita está situado em uma conjuntura social marcada pelo

mercado e pela massa, protagonista das histórias cotidianas que estabelecem

um diálogo com a modernidade e com o arcabouço institucional político-

econômico do México. Nesse contexto, as tecnologias de comunicação

desempenham um papel fundamental, seja cultural, social ou político.

A relação de Villoro com a cultura veiculada nos meios massivos de

comunicação demonstra uma forma consciente de promover uma síntese entre

esta e a cultura erudita, sem se afastar da cultura popular, pois, como

menciona Mihalí Dés sobre Villoro que,

como muchos intelectuales de su edad, padece la fascinación por la cultura popular: la música rock, las tiras de cómic, los deportes de masas… Pero esa fascinación no se agota en un juego paródico y/o metacultural […]. Para Villoro la cultura pop no es un programa, sino un paisaje; el medio ambiente en que se mueve con la misma naturalidad que Balzac, Tolstói o Proust en sus respectivos salones. En cualquier caso no es la única ni la más caudalosa fuente de la que se alimenta su prosa (DÉS, 2005, p.2).

Em suas crônicas, o escritor mexicano percorre a música rock, as

histórias em quadrinhos, os programas televisivos, a literatura infantil e os

esportes de massas: futebol e boxe, deixando transparecer sua formação

erudita, adquirida, não somente na universidade, mas certamente no substrato

massivo que o formara: o rádio, o jornal, a televisão e o cinema. O cronista

entende que não pode desenvolver sua obra à margem da cultura de massa,

Page 136: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

136

“porque eso sería equivalente a salir de la ciudad, espacio fundamental de la

crónica” (GARCÍA TORRES, 2012, p.222). Esse é um dos traços que

caracterizam a geração da qual Villoro faz parte, produzindo em e para uma

indústria da informação.

Na atualidade se convive com um campo literário em que a cultura

concebe a imagem como elemento principal de representação, distanciando-se

da palavra escrita. Uma sociedade fragmentada, líquida, com barreiras fluidas

e com o predomínio do instantâneo, no qual se gera de forma constante a ideia

de um mundo cada vez menor através do avanço da tecnologia. O que

prevalece é o virtual, a imagem, o som e o texto em velocidade instantânea, o

individualismo e o consumismo. A publicidade manipula desejos, promove

sedução, cria novas imagens e signos. Transformou-se claramente na

“sociedade do espetáculo”, segundo Guy Debord. Deste modo, pode-se afirmar

que a crônica espelha esse momento. Ela está plenamente conectada a esse

espaço, pois está comprometida com a história em movimento, uma vez que

seu ritmo é a atualidade e seu consumo é efêmero, assim como a cultura de

massa.

São tempos de incerteza, pois a situação se radicaliza à medida que

valores universais como liberdade, justiça, razão, objetividade e verdade, estão

perdendo legitimidade e valor. Devido à abrangência das áreas (literatura,

cinema, arquitetura, teoria literária, artes visuais, história entre outras) da

sociedade que emprega o termo pós-modernismo, não há um consenso teórico

sobre a significação desse fenômeno que assim se convencionou chamar.

Linda Hutcheon, por exemplo, em seu livro, Poética do pós-modernismo:

história, teoria e ficção, publicado em 1991, procurou evitar as generalizações,

as imprecisões e as simplificações radicais comuns quando se trata de um

termo tão complexo. Nele, a autora abordou diversas perspectivas, como o

feminismo, o negro na sociedade, o nacionalismo, o homossexualismo, além

das questões étnicas, entre outras. Segundo ela, a cultura pós-moderna

envolveria tendências econômicas e ideológicas deste tempo. O que a autora

chama, enfim, de pós-moderno “é fundamentalmente contraditório,

deliberadamente histórico e inevitavelmente político” (HUTCHEON, 1995,

p.19).

Page 137: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

137

Enquanto diversos autores tratam a expressão pós-modernismo como

ruptura, para Frederic Jameson, a modernidade continua acentuando que essa

ideia “não é um conceito, seja filosófico ou de outra espécie, mas sim uma

categoria narrativa” (JAMESON, 2005, p.53). Jameson acredita que o único

significado semântico satisfatório para a modernidade é a sua associação com

o capitalismo, o qual ele denomina como capitalismo tardio.

Gilles Lipovetsky declara que o termo “pós-modernidade” é problemático

porque parece indicar uma grande ruptura na história do individualismo

moderno. Para ele, porém, esse período representa:

o momento histórico preciso em que todos os freios institucionais que se opunham à emancipação individual se esboroam e desaparecem, dando lugar à manifestação dos desejos subjetivos, da realização individual, do amor próprio. As grandes estruturas socializantes perdem a autoridade, as grandes ideologias já não estão mais em expansão, os projetos históricos não mobilizam mais, o âmbito social não é mais que o prolongamento do privado – instala-se a era do vazio (LIPOVETSKY, 2004, p.23).

No entanto, Lipovetsky vê que nesse período ocorre a passagem da

modernidade para a pós-modernidade devido ao consumo de massa e aos

valores veiculados por esse processo. Para o autor, tal fato ocorre em três

etapas. De 1880 a 1950, com o aumento da produção industrial (taylorização),

que possibilita “o progresso dos transportes e da comunicação e,

posteriormente, ao aparecimento dos métodos comerciais que caracterizam o

capitalismo moderno (marketing, grandes lojas, marcas, publicidade)”

(LIPOVETSKY, 2004, pp.23-24). A segunda fase, que abarca o período entre

1950-1980, é caracterizada pela produção e pelo consumo de massa de uma

classe privilegiada, cada vez mais voltada para o presente e para as novidades

que ele traz, ou seja: “assiste-se aí à extensão a todas as camadas sociais do

gosto pelas novidades, da promoção do fútil e do frívolo, do culto ao

desenvolvimento pessoal e ao bem-estar” (LIPOVETSKY, 2004, p.24).

Contudo, o período a partir de 1980 até os dias atuais não cabe mais dentro da

expressão pós-modernidade, pois vários sinais indicam que a sociedade atual

está na era do hiper, caracterizada pelo hiperconsumo, criando, em outras

palavras, a hipermodernidade.

Page 138: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

138

Terry Eagleton diferencia pós-modernismo de pós-modernidade, sendo

que o primeiro refere-se em geral a uma forma de cultura contemporânea,

enquanto que o segundo termo “é uma linha de pensamento que questiona as

noções clássicas de verdade, razão, identidade e objetividade, os sistemas

únicos, as grandes narrativas ou os fundamentos definitivos de explicação”

(EAGLETON, 1998, p. 7). Com o questionamento das grandes narrativas, a

pós-modernidade cede espaço a uma análise crítica de gêneros que já foram

considerados menores, como é o caso da crônica.

Cabe ressaltar que o termo pós-modernidade não abarca claramente o

que vem acontecendo no âmbito cultural, histórico, político, social e econômico.

No entanto, essa é a expressão mais popular utilizada nas últimas décadas,

tendo-se transformado num fenômeno cultural “que obscurece as fronteiras

entre a cultura “elitista” e a cultura “popular”” (EAGLETON, 1998, p. 7). Nas

últimas décadas do século XX e nas primeiras do XXI, tal conceito pôde ser

observado com nitidez, não apenas na narrativa (romance, conto, crônica e

cinema), mas também na filosofia, na historiografia, na música, na pintura e na

arquitetura, considerando as características de cada país ou região.

Entendendo a ficção pós-moderna como um espaço fronteiriço, observa-

se dentro da crítica dos estudos culturais nas últimas décadas uma corrente de

reivindicação que surgiu a partir da confluência de diferentes teorias e ramos

do pensamento. O estudo da crônica como gênero está presente nesse

contexto, pois ressaltou diferentes pontos de vista e enfoques interdisciplinares

próprios da pós-modernidade. Assim, a crônica se “re-coloca hoy frente al

logos pretendido de la modernidad como discurso comprensivo, al oponerle a

éste, otra racionalidad, en tanto ella puede hacerse cargo de la inestabilidad de

las disciplinas, de los géneros, de las fronteras que delimitan el discurso”

(REGUILLO, 2007, p.45).

Page 139: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

139

3.2 México: paisagem do pós-apocalipse

Mihaly Dés em seu artigo “Juan Villoro, Paisaje del post-apocalipsis”

(2005), destaca que, desde os primeiros romances e em muitos de seus contos

e crônicas, Villoro revela:

un paisaje desolador en proceso de descomposición, un horizonte que se podría calificar de apocalíptico si no fuera porque el autor señalase que “una de las características centrales de la vida en México no es tanto el Apocalipsis, sino la noción de Post-Apocalipsis. La mayoría de los mexicanos, especialmente en la ciudad de México, se sienten más allá de la tragedia. Son el resultado de algo que ya ocurrió, un cataclismo impreciso que no podemos ver, pero no es el anuncio de algo que va a suceder” (DÉS, 2005, p. 5).

A ideia de “pós-apocalipse” Villoro compartilha com o influente cronista e

ensaísta Carlos Monsiváis que, em Los rituales del caos (1995), denominou

“México, ciudad post-apocalíptica” (MONSIVÁIS, 1996, p. 21, grifo do autor).

Na perfeita conexão com as ideias de Monsiváis, Juan Villoro, em entrevista

cedida ao escritor venezuelano Alberto BarreraTyszka (2010) e em seu ensaio

El vértigo horizontal, La ciudad como texto (2002a), afirma:

¿Qué distingue al D.F. de otros océanos? Nada lo define mejor que la noción de postapocalipsis, a la que se ha referido Carlos Monsiváis. Entre el vapor de los tamales y los gritos de los vendedores ambulantes, se cierne la certeza de que ningún daño es para nosotros. Nuestra mejor forma de combatir el drama consiste en replegarlo a un pasado en el que ya ocurrió. Este peculiar engaño colectivo permite pensar que estamos más allá del apocalipsis: somos el resultado y no la causa de los males. Los signos de peligro nos rodean pero no son para nosotros porque ya sobrevivimos de milagro. Imposible rastrear la radiación nuclear, el sismo de diez grados o la epidemia que nos dejó así. Lo decisivo es que estamos del otro lado de la desgracia. Diferir la tragedia hacia un impreciso pasado es nuestra habitual terapia. De ahí la vitalidad de un sitio amenazado, que desafía a la razón y a la ecología (VILLORO, 2002a, p. 4).

Tempos pós-apocalípticos – Carlos Monsiváis e Juan Villoro,

Hipermodernos – Gilles Lipovetsky, Modernidade líquida – Bauman ou Pós-

modernos para Terry Eagleton. Para Villoro, é um período de pós-ditaduras,

diásporas, globalização e neoliberalismo. A expressão pós-apocalipse, que ele

Page 140: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

140

utiliza em chave irônica, é pensada com relação à capital mexicana, mas

certamente abarca o país, pois, como menciona, Villoro, o dinheiro que circula

“proviene en su mayoría de tres fuentes que complican la idea de patrimonio: el

narcotráfico, las remesas de los migrantes y el petróleo. Nada de esto tiene que

ver con un proyecto duradero de país” (VILLORO, 2010b, p. 27).

Com esse trecho da crônica “Carnaval y apocalipsis”, pode-se propor

uma aproximação ao prólogo de Rituales del caos. Nele, Monsiváis destaca

que no centro do caos está o consumo e que este é “uno entre tantos factores

en el espacio donde concurren las variedades del caos. Hay otro elemento

inevitable, ubicuo. Si, como se dice, el poder es la raíz de la noción misma de

espectáculo” (MONSIVÁIS, 1996, p. 15). E também, como complementa Diana

Palaversich, que é complicado tratar

de la lógica cultural postmoderna sin su sentido político neoliberal […]. Leer la producción cultural latinoamericana de esta manera significa inaugurar otros modos de lectura crítica consciente de la relación que existe entre texto literario y otros campos extra-literarios: historia, economía, política, cultura de masas, cultura electrónica, entre muchas otras (PALAVERSICH, 2005, pp. 10-11).

Nas crônicas do autor de Safari accidental aparecem diversos temas que

envolvem a cultura e a influências dos meios de comunicação em fomento à

vídeo-democracia comandada por grandes consórcios comunicativos. No

entanto, ele nunca se afasta de uma visão crítica nem deixar de incorporar em

seus escritos o aumento da violência e do narcotráfico, a crescente fuga de

mexicanos para os Estados Unidos em busca de sustento, o terremoto como

leimotiv para discutir a formação da sociedade civil e os movimentos sociais

como o EZLN, entre outros.

Para Villoro, esse gênero tem sido uma maneira de abordar temas

sociais sem enfastiar o leitor, como ressalta a crônica “1984”, quando o

protagonista Rodolfo, o qual pode ser lido como uma espécie de alter ego

ocasional de autor, descobre no Novo Jornalismo a possibilidade de escrever

sobre temas sociais de maneira atrativa. E não seria a conversão da

cotidianidade em literatura o que propõe por vezes o autor? Como uma forma

de transmitir a complexidade dos acontecimentos, incorporando a experiência

Page 141: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

141

dos leitores personagens, aproximando o surpreendente, o cruel, o injusto e

uma longa lista de adjetivos, mostrando que a crônica pode ser uma maneira

de limpar os olhos. Como comenta o narrador: “Norman Mailer, Tom Wolfe y

Gore Vidal le revelaron que se podía escribir de temas sociales sin condenar al

lector a trabajos forzados” (VILLORO, 2006a, pp. 115-116). É interessante

observar que Rodolfo pretende construir uma obra a partir dos depoimentos

dos sobreviventes nos momentos antes das sucessivas explosões em San

Juan Ixhuatepec, utilizando as técnicas dos cronistas norte-americanos:

La tragedia parecía hecha para las metáforas de Rodolfo. Toda una colonia removida por las llamas. Los estallidos en la refinaría de Pemex y en la planta Unigás habían hecho que el aire ardiera como en el bombardeo de Dresde. De inmediato se le ocurrió reconstruir las vidas de algunas víctimas hasta unos segundos antes de la catástrofe (VILLORO, 2006a, p. 117).

Esse evento trágico ocorrido na região metropolitana da Cidade do

México em setembro de 1984, responsável pelo desaparecimento de mais de

quinhentas pessoas nas chamas, soma-se a diversos outros acontecimentos

discutidos em suas crônicas.

Em várias antologias de textos literários dedicados à Cidade do México,

como por exemplo, Páginas sobre la ciudad de México: 1469-1987, de José

Luís Martínez, nota-se a tensão entre o esplendor e a decadência. Relação que

se observa tanto no texto de Villoro “El vértigo horizontal: la Ciudad de México

como texto” (2002a), como em Los rituales del caos, de Monsiváis, no qual a

cidade vive a iminência do desastre, das ruínas, do tremor numa espécie de

“distopia”, uma utopia negativa. A cidade como signo do apocalipse nos textos

de ambos os autores ganha contornos de ironia, humor, ficção e hiper-

realidade “Lo peor ya ocurrió” (MONSIVÁIS, 1996, p. 21), ou seja, a cidade

“pós-apocalíptica” é constituída por essa sensação de estar depois do

cataclismo, vista como uma evidência ecológica (contaminação), demográfica

(multidão) e/ou social (violência).

Essa ideia de pós-catástrofe, como menciona Villoro na entrevista a

Alberto Barrera Tyszka (2010), ressalta o seguinte fato: os mexicanos,

principalmente os da Cidade do México, afirmam: “estamos más allá de la

Page 142: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

142

tragedia, no somos la causa sino el resultado de una catástrofe, no es que

estemos viéndolo los signos de algo que va a venir, sino que ya somos

nosotros el saldo del que pasó” (VILLORO apud BARRERA TYSZKA, 2010). E

como menciona Monsiváis, essa sensação é devido a “demasiada gente [...],

las multitudes en el metro (casi seis millones de usuarios al día) […], las

multitudes en el Estadio de Ciudad Universitaria”, […] la economía subterránea

que desborda las aceras […]” (MONSIVÁIS, 1996, p.17).

Em diversas crônicas sobre a Cidade do México, aparecem problemas

recentes como a deterioração dos espaços públicos, o crescimento

desordenado, pois “La ciudad de México crece con el veloz desconcierto de las

epidemias y las invasiones” (VILLORO, 2002b, p.1), a violência (GARCÍA

CANCLINI, 1999), e a isso acrescentam-se dificuldades antigas e persistentes:

a luta contra as condições naturais, geográficas e climáticas e uma

organização sócio-política que supõe privilégios e exclusões (GONZÁLEZ

RODRÍGUEZ, 2009).

A questão da violência, das drogas e do narcotráfico aparece nos

romances El testigo e Arrecife e nos contos que compõem a obra Los

culpables, porém permeia a maioria de suas crônicas. Essa discussão está

presente em Safari accidental, Tiempo transcurrido, Los once de la tribu ou

Dios es redondo. Tiempo transcurrido, por exemplo, apresenta uma galeria de

personagens drogados: “Sus ojos eran de un azul profundo; cuando fumaba

mariguana se veían violáceos” (VILLORO, 2006a, p. 29). No entanto, é

importante observar que, nesse período, pois essa crônica se refere ao ano de

1970, ainda não se usava o termo narcotráfico. Como a atividade era composta

por pequenos grupos, a palavra tráfico resumia o embrião dos dois maiores

cartéis de drogas mexicanos da atualidade: Cartel de Sinaloa e Cartel de los

Zetas, que foram criados no final da década de 1980 e 1990, respectivamente.

É evidente, porém, já naquela época, a movimentação provocada pelo tráfico

de drogas. Essa evolução pode ser percebida no decorrer dos textos, como na

crônica “1972”, na qual se observa, da mesma forma que em várias outras, que

o personagem tem uma plantação “los lugareños cultivaban mariguana de la

mejor calidad” (VILLORO, 2006a, p. 40). Tal percepção ocorre também na

crônica “1969”, quando o personagem morre por causa do consumo de drogas

Page 143: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

143

pesadas “La seguiente reunión del grupo fue por demás trágica: el Champiñon

quiso volar en pleno viaje de LSD y se tiró a la avenida Revolución desde un

doceavo piso. Se encontron en Gayosso51” (VILLORO, 2006a, p. 25).

Além dos textos mencionados, ele se deterá na crônica “La Alfombra

roja del terror narco” (2008b), além de mencionar o prólogo escrito por Villoro

para o livro de Diego Enrique Osorno, La guerra de los zetas: viaje por una

frontera de la necropolítica (2012). Há certamente uma série de reflexões

dispersas em outras crônicas. Em todas, porém, Villoro demonstra que não é

um tema, “El narcotráfico es un problema con numerosas aristas” (VILLORO,

2012d, p.4), visão compartilhada por Eduardo Antonio Parra:

los escritores del norte hemos señalado que ninguno de nosotros ha abordado el narcotráfico como tema. Si éste asoma en algunas páginas es porque se trata de una situación histórica, es decir, un contexto, no un tema, que envuelve todo el país, aunque se acentúa en ciertas regiones. No se trata, entonces, de una elección, sino de una realidad (PARRA, 2005, p. 2).

É importante relembrar que Villoro não é nortenho, mas citadino. No

entanto, como menciona Parra (2005), a violência do narcotráfico, ou seja, o

narcoterrorismo no México, não é um problema regional, mas de todo o país.

Susana Rotker no livro Bravo Pueblo. Poder, utopía y violencia (2005b), no

capítulo intitulado “La ciudad violenta”, ao referir-se à importância da crônica no

contexto latino-americano nos anos finais do século XX, comenta:

La crónica, género híbrido donde se encuentra el discurso literario y el discurso periodístico, es el espacio de la escritura que mejor registra los cambios sociales, las interrupciones, las experimentaciones del lenguaje y de la escritura misma. Más elaborada que los textos noticiosos, pero con un dinamismo y un sentido de urgencia que no tienen otras prácticas escriturarias de cocción mucho más lenta (como la novela, por ejemplo), la crónica ha sido un espacio privilegiado y marginal en la cultura latinoamericana desde hace un siglo, especialmente en los centros urbanos (ROTKER, 2006, p. 165).

Anadeli Bencomo em seu artigo “Violencia crónica o crónica de

violencia” menciona que, dentro do jornalismo, “el espacio de las narrativas

dedicadas a reseñar los actos violentos dentro del ámbito social se ha asociado

51

Agencia Funeraria Gayosso é uma das mais conhecidas do México, fundada em 1875.

Page 144: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

144

tradicionalmente al género de la nota roja” (BENCOMO, 2007, p. 22), cuja

função predominante é a de natureza informativa. Trata-se de textos

tradicionalmente breves, concisos, com uso recorrente de fotografias com a

intenção de narrar os “sucesos fatales que acontecen cotidianamente y que

marcan la irrrupción de lo violento, lo torcido, lo criminal, dentro de un

determinado orden social” (BENCOMO, 2007, p. 22). Sobre o espaço

condensado a que tem que se submeter os jornalistas, principalmente na “Nota

roja”, Villoro comenta:

los periódicos y las revistas son sistemas de racionamiento donde nadie escapa a su cuota de caracteres. Curiosamente, el espacio como impedimento lleva a intensidades y condensaciones que no se lograrían por otra vía. La utopía del resumen: un diario que sólo conste de encabezados, frases autárquicas que no ameriten desarrollo. La nota roja suele ser la vanguardia de esta utopía. Sus titulares agotan las posibilidades de la historia: EL DESCUARTIZADO ERA UN HOMBRE ÍNTEGRO (VILLORO, 2005a, p. 13).

Na atualidade, o gênero crônica tem-se destacado nos periódicos e

livros. Focalizando a violência constante nas grandes cidades do México, e no

país como um todo, torna-se evidente a presença do narcotráfico, cuja

natureza do tema leva esse tipo de texto “a participar de una evidente función

comunicativa/interpretativa pues sus enunciados buscan sacudir al lector a

partir de la urgencia del mensaje de una crisis histórica, que acecha los

paradigmas mismos de la socialización urbana” (BENCOMO, 2007, p. 24).

No entanto, as já mencionadas crônicas de Villoro vão além das

caracterizações destacadas, pois ao vincular-se com a conformação do

imaginário social, analisa a situação global do país e os vínculos de poder do

narcotráfico e a violência disseminada por esses grupos. Elas problematizam

as estatísticas, analisando a relação estabelecida entre o narcotráfico e o

cidadão comum, a polícia, a política, a igreja e a representação da violência,

apresentada de maneira mecânica nos meios de comunicação, como se

observa nesse trecho de “La Alfombra roja del terror narco” (2008b):

¡Bienvenidos a la década del caos! A ocho años de la alternancia democrática, México es un país de sangre y plomo. El predominio de la violencia ha disuelto formas de relación y protocolos asentados desde hacía mucho tiempo. Los medios de comunicación ampliaron su margen de libertad, pero trabajan en un entorno donde decir la

Page 145: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

145

verdad es progresivamente peligroso. […] Un ambiente de naufragio donde la ausencia de principios se disfraza de pragmatismo o medida de emergencia. Los trueques son los de una mascarada: el clero apoya al PAN en Jalisco y recibe a cambio una limosna inmoderada; el sindicato de trabajadores de la educación (el más grande América latina) ofrece más de un millón de votos a Felipe Calderón y obtiene puestos en áreas de gobierno tan decisivas como la seguridad nacional; los monopolios hacen una guerra sucia en los medios durante la campaña presidencial de 2006, presentando al candidato de la izquierda como “un peligro para México”, y reciben un trato que elimina la competencia. Al modo de los Cuatro Fantásticos, los Poderes Fácticos gobiernan en la sombra (VILLORO, 2008b, pp.2-3).

Através de uma linguagem fluida, versatilidade estilística e discursiva,

Villoro detém a análise na participação da mídia, demonstrando como esta

converte a todos em co-espectadores involuntários das atrocidades do

narcotráfico e da disputa pelo poder entre os representantes do poder que ele

denomina de “los Cuatro Fantásticos” ou “Poderes Fácticos, que, para Villoro,

trata-se do poder do narcotráfico, dos sindicatos, da mídia e da igreja. O

cronista afirma que o narcotráfico costuma golpear duas vezes: no mundo dos

fatos e no das notícias:

La televisión acrecienta el horror al difundir en close-up y cámara lenta crímenes con diseño “de autor”. Es posible distinguir las “firmas” de los cárteles: unos decapitan, otros cortan la lengua, otros dejan a los muertos en el maletero del automóvil, otros los envuelven en mantas. En ciertos casos, los criminales graban sus ejecuciones y envían videos a los medios o los suben a You Tube después de someterlos a una cuidadosa posproducción. La mediósfera es el duty-free del narco, la zona donde el ultraje cometido en la realidad se convierte en un informertial del terror (VILLORO, 2008b, p. 3).

Com a queda do PRI em 2000, os meios de comunicação ampliaram sua

margem de liberdade. Isso, no entanto, significa muito pouco, pois dizer a

verdade é progressivamente perigoso, transformando o México numa

Fobópole52. “En la nueva atmósfera del miedo, diez mil empresas ofrecen

servicios de seguridad y cerca de tres mil personas se han injertado un chip

bajo la piel del tamaño de un grano de arroz para ser detectados por radar en

caso de secuestro” (VILLORO, 2008b, p.8). Villoro, nessa crônica, menciona

52

Toma-se esse termo de Fobópole: o medo generalizado e a militarização da questão urbana (2008) de Marcelo Lopes de Souza; é o resultado da combinação de dois elementos de composição, derivados das palavras gregas phóbos, que significa “medo”, e pólis, que significa “cidade”. Esta obra trata dos motivos da violência urbana nas grandes cidades, principalmente Rio de Janeiro e São Paulo (SOUZA, 2008, p. 9).

Page 146: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

146

também o perigo por que passam os jornalistas, como já foi mencionado. E

segue comentando sobre o discurso do medo que os meios de comunicação

ajudam a promover

El narco se apoya en el discurso de la crueldad (cruor: “sangre que corre”) donde las heridas trazan una condena para la víctima y una amenaza para los testigos. El jus sangui del narco depende de una inversión kafkiana de los episodios legales; la sentencia no es el fin sino el comienzo de un proceso; el anuncio de que otros podrán ser llamados a “juicio” (VILLORO, 2008b, p.3).

O jornalista mexicano Sérgio González Rodríguez, autor de Huesos en

el desierto (2005), que trata do feminicídio na Cidade de Juárez e El hombre

sin cabeza (2009), que investiga as diversas questões que estão por trás das

centenas de decapitações realizadas pelo narcotráfico nos últimos anos,

colhendo, inclusive, depoimento dos decapitadores53, foi “amenazado,

golpeado y perseguido” (PAVÓN, 2009, p.1). Essa situação demonstra que

todos podem ser chamados ao “juicio”.

Villoro aborda também a “narcocultura”, ressaltando ser esta, através

dos narcocorridos, uma realidade incrustada há bastante tempo na população

mexicana. E ele comenta:

La narcocultura amplió su radio de influencia a través de los narcocorridos, muchas veces pagados por los propios protagonistas. En la confusión ambiente, los trovadores vinculados al crimen gozan del dudoso prestigio de lo ilegal que reclama un carisma a contrapelo y se somete a la “moral del pueblo. Sus deprimentes acordeones acompañan una saga de la rapiña que, por más que lleve alumbrado y carreteras a las comunidades que cultivan la amapola, no resiste la comparación con Robin Hood. Aunque suene curioso o divertido o folklórico cantar las peripecias de quienes llevan “hierba mala” al otro lado, los narcocorridos pertenecen a un sector que mueve el 10% de la economía (lo mismo que el petróleo) y causa decenas de asesinatos al día” (VILLORO, 2008b, p. 3).

53

Primero me tomo cuatro o cinco tequilas antes de actuar, porque no sé si vamos a encontrar al candidato y ejecutarlo. Llegado el momento, con o sin testigos del grupo, todavía calentito el cuerpo, lo pongo boca abajo, en el borde de un sillón o silla, y le dejo caer el machete, siempre con las dos manos para tener fuerza y que no me rebote el golpe con el hueso de la columna. Después meto la cabeza en una toalla, o con las ropas del muerto la envuelvo para que le salga toda la sangre, porque me enseñaron que las venas del cuello están cargadas de sangre […].” Esta é a transcrição do relato de um decapitador a Sérgio González Rodríguez (GONZÁLEZ RODRÍGUEZ, 2009, p.151).

Page 147: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

147

Nesse pequeno trecho, estão condensadas questões importantes: a

relação de naturalidade com que a população lida com os narcocorridos, pois

não são vistos como ilegais. Pelo contrário, são muito populares, sendo

bastante comum ouvi-los, cantá-los e comprá-los. Destaque-se também, neste

caso, a ação assistencialista dos narcotraficantes em seu relacionamento com

a população e a quantia significativa movimentada por esse tipo de música.

Para entender a questão do narcocorrido no México, vale recordar a

crônica “¡Ya viene Pancho Pistolas” (1926), de Salvador Novo, que comenta

sobre a popularidade destas músicas, mostrando também que, já naquela

época, havia uma forma um tanto pejorativa de tratar a cultura nortenha. É o

que se observa no trecho, logo após ele ter citado uma estrofe do corrido a

Pancho Villa:

Así comienza un reciente corrido, que cantan no aquí, no en otras ciudades con barrios influidos de lo que ya se clasifica como literatura popular; no aquí, donde cantar es el modo de vida de los rápsodas bebedores de pulque, sino en el genérico “norte” (NOVO, 1926, p. 1).

Como se pode observar, nessa crônica do início do século XX, há as

bases do corrido que aparece no texto de Villoro, assim como também a

fronteira norte do país, vista como uma só cultura, o qual Novo critica. Essa

crônica remete às memórias do autor no período da Revolução, retratando a

invasão de sua cidade pelo bando de Pancho Villa54, o assassinato de seu tio

no lugar do pai, o toque de recolher, o massacre dos chineses55 e os saques,

caracterizando o que se poderia chamar de crônicas imaginárias, uma vez que

perderam, não apenas o aspecto referencial, mas também a atualidade, pois

Novo narra os primeiros anos da Revolução, nos quais tinha menos de dez

anos. Outra questão, que também aparece na crônica de Novo e em “Nada que

declarar”, refere-se aparentemente a uma situação recente: a migração, sobre

a qual comenta Novo:

Y en unos cuantos años aquella región se puebla maravillosamente. Los chinos abren una lavandería y restaurantes; los españoles

54

Na Cidade da infância de Novo, Torreón, ocorreram quatro batalhas, em 1911, 1913, 1914 e

1916, no período da Revolução Mexicana. 55

Na crônica, Novo comenta o massacre efetuado pelas forças maderistas com a morte de mais de trezentos chineses, em 1911.

Page 148: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

148

hoteles y tiendas de “comestibles”; donde irán a surtirse cada domingo los hombres de los ranchos de algodón (NOVO, 1926, p.1).

“Los chinos invisibles” é, como denomina Villoro, uma parte desse texto

que trata da imensa comunidade chinesa na fronteira norte do México. O

cronista se aproxima do tema, através de uma conversa com Daniel Sada e, de

maneira irônica, inicia com um questionamento sobre os restaurantes: _

¿Sabes qué cultura une a México y Estados Unidos? – Daniel Sada entrecerró

los ojos, como un pícher en el montículo, y lanzó la respuesta–: La comida

china” (VILLORO, 2005a, 134).

Retomando a questão da “narcocultura”, percebe-se que esta vem

ganhando espaço nos meios de comunicação de massa, principalmente no

rádio, além de substituir também textos de escritores da tradição literária

mexicana, como se observa nesse trecho da crônica de Villoro:

Lo extraño es que han ganado espacio en las estaciones que transmiten música popular y aun en las antologías de literatura. En nombre de un incierto multiculturalismo, hace un par de años un grupo de escritores protestó porque dos narcocorridos fueron suprimidos de un libro de texto. En su queja pasaron por alto que esas letras no se estudiaban en una clase sobre problemas de México, sino sobre literatura, sustituyendo a Amado Nervo o Ramón López Velarde (VILLORO, 2008b, p. 4).

Como pode ser observar nos trechos destacados, Villoro apresenta uma

imagem de conjunto no qual se observam as diferentes perspectivas do

problema. Há certamente críticas a respeito da “narcocultura” disseminada nos

meios de comunicação de massas, assim como aos escritores que se dedicam

a escrever sobre esse problema como possíveis apologistas do narcotráfico.

Fato ocorrido com Julio Sherer devido à publicação de uma entrevista

concedida a ele pelo narcotraficante mais procurado do país naquele no

momento, Ismael Zambada García, El Mayo.

Para Juan Villoro, o desafio jornalístico na contemporaneidade é discutir

como e em que linguagem a violência deve ser noticiada na imprensa escrita

para não correr o risco de amplificá-la, como menciona em entrevista cedida a

Sylvia Colombo do jornal Folha de São Paulo:

Page 149: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

149

No México há uma grande discussão sobre como retratar a violência do narcotráfico, mas acho que ela se aplica a vários países, como a Colômbia e o Brasil, por causa do narcotráfico e do crime organizado, e até mesmo a Londres, para usar um exemplo mais recente. É inevitável que, ao publicarmos notícias e fotos, amplifiquemos o efeito de um ato violento. Penso que há limites que deveriam ser discutidos, sob o risco de fazermos mais propaganda da violência e alimentá-la. E o uso da linguagem tem um papel importante nisso. Por exemplo, em meu país, quando os traficantes dizem que sequestraram alguém, usam o termo "levantado". E os jornais passaram a fazer o mesmo. É um erro, porque se trata de uma expressão que ameniza o horror do fato. Por outro lado, há uma busca pela audiência, hoje potencializada pela internet, que faz com que tudo o que tenha sangue seja valorizado. A máxima "if it bleeds, it leads" [se sangra, tem destaque] nunca foi tão verdadeira. O que muitos editores não se dão conta é que, se você busca ressaltar apenas o mais sangrento, corre o risco de provocar uma distorção da verdade, na qual os acontecimentos mais importantes são os violentos. Na verdade, a violência é sempre consequência de alguma coisa, parte de um contexto que precisa ser explicado (VILLORO apud COLOMBO, 2011, p. 1).

A preocupação de Villoro também é compartilhada por González

Rodríguez (2011), que em uma dura crítica ao jornalismo mexicano, diz: “De

hecho, cuando uno abre las páginas de cualquier medio impreso del país, casi

se puede adivinar el trato a ciertas noticias [...]. ¿Quién se murió? ¿Cuántas

víctimas hubo? ¿Ya lo desmintió el vocero oficial? (GONZÁLEZ RODRÍGUEZ,

2011, p. 121). No entanto, é preciso reconhecer que é uma aproximação

complicada. Nessa relação difícil em que o jornalismo ocupa um papel

importantíssimo, pois não se pode negar que é imprescindível informar a

população, talvez seja possível pensar que a crônica tem contribuído para

atenuar essa tensão no meio jornalístico e por isso também esteja ocorrendo a

sua expansão. Isso não significa dizer que se deve transformar a violência em

ficção, mas que a mistura de gêneros propõe um equilíbrio que evita a

banalização e a teorização. Sergio González Rodríguez, ao criticar a maneira

como o jornalismo lida com o problema da violência, ressalta as características

da prosa de Villoro em um meio tão hostil, e diz:

En un medio semejante, Juan Villoro ha sido una y otra vez la excepción. Quizás porque ha logrado darle la vuelta a las inercias dominantes mediante un cortocircuito básico: hacer que la literatura sea instrumento del periodismo y vice-versa. Este distingo, al que muchos aspiran e incluso presumen sin cumplirlo, marca la diferencia entre dedicarse a periodista porque se falla en literatura, y asumir la literatura como un campo entero que ocupa también la prensa (GONZÁLEZ RODRÍGUEZ, 2011, p. 121).

Page 150: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

150

É importante salientar que, a partir de 1990, aumentou

consideravelmente a quantidade de publicações e escritores dedicados a

narrar a violência do narcotráfico por meio da crônica56. Como produto do

neoliberalismo, da globalização e das políticas de repressão contra as drogas,

esses textos muitas vezes representam a lógica de oferta e demanda de um

mercado capitalista, ao mesmo tempo uma crítica de incentivo às práticas de

consumo. Muitos deles apresentam características formais similares, como a

temática e a linguagem. Entretanto, não constituem um gênero literário em

particular, como ressalta Alberto Fonseca em sua tese Cuando llovió dinero en

Macondo: Literatura y narcotráfico en Colombia y México (2009): “desde el

punto de vista formal, las narconarrativas utilizan una gran variedad de

discursos y estrategias que impiden su definición a partir de reglas de

géneros”57 (FONSECA, 2009, p.11).

Em “La frontera de los ilegales” o cronista se ocupa da complexidade da

fronteira mais vigiada do mundo, da imensa quantidade de imigrantes hispanos

que conseguem atravessar e transformam Los Angeles na “segunda ciudad y

el guacamole es ya la segunda botana consumida” (VILLORO, 1995, p.1). Isso,

porém, não afasta o fato de que o trabalhador indocumentado seja chamado de

“la bestia que infundió el espanto en el espacio exterior; es alien” (VILLORO,

1995, p.1). Daí ele comentar mais adiante que a função das aduanas não é

controlar o fluxo de mercadorias, pois “lo importante es detener a la raza”

(VILLORO,1995, p.1). São seres em interstícios, em um movimento

exploratório incessante, que o termo francês au-delà capta muito bem, aqui e

lá, de todos os lados, fort/da, para lá e para cá; para frente e para trás, mas a

maioria ficará em um trânsito quase inerte (BHABHA, 1998). Ou ficarão ali

mesmos, pois “todos los días hace the body count, el conteo de los migrantes

56

Dentre os títulos de livros de crônicas na atualidade, destacam-se: El cártel incómodo (2006), de José Reveles; Marca de sangre (2011), de Héctor de Mauleón; Los señores del narco (2010), de Anabel Hernández; El narco en México (2012), do jornalista Ricardo Ravelo, entre muitos outros. 57

Há uma extensa e acirrada discussão sobre esse tema, porém a expectativa excede o objetivo dessa pesquisa. Para avançar na discussão a respeito da denominação específica do gênero que envolve a narrativa sobre o narcotráfico pode-se ler os textos críticos de Rafael Lemus “Balas de salva: notas sobre el narco y la narrativa mexicana” (2005), que denomina a narconarrativa como sub-gênero; e Eduardo Antonio Parra em “Norte, narcotráfico e literatura” (2005) que interroga sobre quantas narrativas são necessárias para que surja um gênero.

Page 151: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

151

que mueren tratando de llegar a un trabajo en Estados Unidos” (VILLORO,

2011a, p. 7).

A referência à criatura de Alien, o oitavo passageiro58, que aparece no

texto citado e também na crônica “Nada que declarar: welcome to Tijuana”,

permite ao autor uma aproximação com a cultura popular, que é uma

característica de sua prosa, a qual, desde os primeiros escritos, recorre a

imagens do cinema e da televisão, letreiros de anúncios publicitários59 e

canções populares. Porém, ao mencionar esse personagem, o cronista propõe

uma discussão que está centrada em dois temas: a presença do narcotráfico

na fronteira e a exploração dos “espaldas mojadas”, fazendo referência a

como são denominados os que tentam atravessar para “el otro lado”.

Numa parte denominada “Aliens”, o cronista inicia mencionando as

garrafas de vinho consumidas na Califórnia, uma vez que os degustadores

ignoram as condições de trabalho para a sua produção. Em seguida, aparece

um cruzamento de vozes recolhidas em um diálogo que oscila entre o medo, a

luta contra as autoridades, o desespero da pobreza e a esperança em alcançar

o outro lado da fronteira:

La frontera es una vasta operación narrativa; los relatos prueban que atravesar es posible, que Rubén y Chucho y Carmen y Ramona ya trabajan en la fresa o en la uva, que burlaron los aviones mosquito y el ojo de tigre, un aparato equipado con censores de calor. Pronto, uno de ellos será, felizmente un alien en Estados Unidos (VILLORO, 2005a, pp. 140-141).

Essas vozes que se misturam se sobrepõem e que se organizam nesse

espaço impreciso diante de uma realidade difícil não se negam a contar suas

histórias, suas angústias. “Pensé que sería difícil conversar con ellos, pero en

la ribera mexicana del río, antes de ser buscados por los fanales de los

helicópteros, los aprendices de indocumentados hablan sin parar” (VILLORO,

2005a, p. 140).

58

Alien, o oitavo passageiro, filme de EUA/Reino Unido, 1979, de Ridley Scott. 59

Nessa crônica, o narrador destaca um letreiro na fronteira que anuncia: “Afuera de una guarita, un enorme anuncio delata las consequencias del comercio entre los dos países: Herpes? Call 800 336 CURE” (VILLORO, 2005a, p. 135).

Page 152: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

152

A fronteira norte do país contempla muitos cronistas e romancistas que

abordam em seus textos o problema do narcotráfico, da imigração e da

violência: Daniel Sada, David Toscana, Cristina Rivera Garza, Luis Humberto

Crosthwaite, Élmer Mendoza, entre muitos outros. Essa é uma questão que

deve ser abordada pelos cronistas de fronteira? É um problema que atinge a

todos, porém certamente a fronteira tem sido muito afetada, como afirma Villoro

“En la zona menos documentada de México, donde Nuevo León y Tamaulipas

el rincón noreste del país, se encienden velas negras para pedir por las “cosas

difíciles”. ¿Quién responde a esas plegarias? La dama de los desiertos sin

nadie: la Santa Muerte60” (VILLORO, 2012d, p.1).

Outra questão abordada também nessas crônicas é o posicionamento

de vigilante que Estados Unidos exerce ou pensa exercer em relação ao

México, como aparece na parte chamada “Hierba mala” de “Nada que

declarar”:

Después de la guerra fría, Estados Unidos, incapaz de realizar sus virtudes sin enemigos arquetípicos, sustituyó al Comunista Devorador por el Capo Latino. El narcotráfico prospera en el continente gracias a las redes del crimen organizado, pero sabemos muy poco de los barones de la droga que operan más allá de la frontera norte. En cambio, una insistente propaganda nos pone en contacto con la vida íntima y las minuciosas fechorías de cada cártel latinoamericano (VILLORO, 2005a, p.238).

Por acreditar que o México não controla adequadamente o tráfico de

drogas no país, este sofre, consequentemente, um “processo de certificação”61,

como se observa nesse trecho, no qual José Manuel Torres cita Fernández

Menéndez, para relatar essa situação complexa a que o país é submetido:

El único gran centro del narcotráfico internacional que no es investigado, que no está sujeto a certificación alguna, es un país que consume 50% por ciento de las drogas ilegales que se producen

60

É uma figura popular que personifica a morte e é objeto de culto entre muitos

narcotraficantes, porém “Cabe aclarar que dicho culto no es exclusivo de grupos marginales o

excluídos. También hay creyentes de diversas posiciones económicas y estratos socio-

culturales” (GAYTÁN ALCALÁ, 2008, p. 41). 61

O tráfico de drogas é, entre outros, um problema de mercado e de demanda, concluindo que a política de “certificação”, no qual a Washington cabe “juzgar, evaluar y castigar a los regímenes de acuerdo con sus criterios de cumplimientos en la guerra contra las drogas” (PETRAS/VELTMEYER, 2003, p. 183). Faz com que o objetivo maior não venha a ser alcançado.

Page 153: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

153

mundialmente, que tiene 20 millones de consumidores habituales, seis millones de adictos, un país al cual el tráfico de drogas le genera, según las cifras oficiales y más conservadoras, utilidades por 60 mil millones de dólares anuales, que no sabe, oficialmente, quienes son los jefes de esas extensas redes y que considera que dentro de sus fronteras no hay cárteles: se trata de Estados Unidos el certificador descertificado (FERNÁNDEZ MENÉNDEZ apud TORRES TORRES, 2009, p. 3).

Villoro, mesmo diante de temas supostamente mais sérios, mantém

características muito peculiares às suas crônicas: o humor, o sarcasmo e as

tipologias caricaturescas. É o que ocorre quando ele menciona os apelidos dos

narcotraficantes e percebe-se que até parecem ficção:

el capo no requiere de más pasaporte que un apodo; puede asumir un sobrenombre de teodicea (el Señor de los Cielos), ranchería (Don Neto) o dibujos animados (el Azul). Los más temibles son los que insinúan una coquetería femenina que los hechos refutan con fiereza: la Barbie, el Ceja Güera (VILLORO, 2008b, p.7).

Alude-se também a uma mistura de humor e sarcasmo, quando

menciona o olhar de desprezo que alguns ainda nutrem a respeito do problema

das drogas e da violência: “La estrategia defensiva de no mirar o de asumir que

los atracos ocurren lejos, en un parque temático del ajuste de cuentas para el

que por suerte no tenemos entradas, se ha venido abajo” (VILLORO, 2008b,

p.8). Afinal, muitos acreditam que o narcotráfico é uma questão que ocorre

apenas na periferia, em locais abandonados dos grandes centros urbanos.

O final aberto, característica da crônica e não somente do autor,

possibilita um panorama de interpretação diante da matéria apresentada. No

entanto, em “La Alfombra roja del terror narco” (2008b), o cronista, após uma

longa discussão sobre o título da crônica, faz referência a uma instalação da

artista plástica sinaloense Rosa María Robles, que construiu um tapete com

oito cobertores sujos de sangue de vítimas da violência, que ela havia

conseguido clandestinamente numa delegacia de polícia. O autor encerra com

uma reflexão cheia de indignação, quase uma convocação “Todos tenemos

méritos para pisar esa alfombra. De manera simultánea, el terror se ha vuelto

más difuso y más próximo. Antes podíamos pensar que la sangre derramada

era de “ellos”. Ahora es nuestra” (VILLORO, 2008b, p.9).

Page 154: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

154

Já em “Nada que declarar”, o cronista, após uma discussão sobre o que

ele chama de “teatro de las simulaciones bilaterales”, faz referência ao governo

americano por ter endurecido a postura em relação à fronteira por motivos

políticos, contando, inclusive, com o apoio de mexicanos legalizados. Ele

destaca que esse governo pretende, com tal gesto: “conquistar el voto racista

(incluído el de muchos chicanos que ya tienen papeles en regla)” (VILLORO,

2005a, p. 142). Põe em evidência, também, o governo mexicano, que se

aproveita da situação, posicionando-se como vítima: “Los paisanos asfixiados

en un vagón de carga, los huesos descubiertos en un breñal y la xenofobia de

la policía de Los Ángeles permitieron al decano de los países sin democracia

protestar en nombre de los derechos humanos” (VILLORO, 2005a, p.142). No

final da crônica, retoma a imagem de norte-americanos desfrutando o vinho em

um terraço californiano, enquanto imigrantes recolhem uvas no Valle de Napa.

Ao fundo, está um neon com o slogan de promoção do filme Alien na época do

lançamento para demonstrar a impotência diante do terror “en el espacio

exterior, nadie puede oír tu grito” (VILLORO, 2005a, p. 142).

A alusão à pós-modernidade como algo fragmentado pode ser percebida

também nas primeiras linhas de Tiempo transcurrido ao mencionar que, no

México, os fatos históricos tradicionais ocorreram em números redondos, 1810,

1910, mas as crônicas romperam com essa tradição, pois “parece un reloj con

la carátula resquebrajada” (VILLORO, 2006a, p.9). Deste modo, Villoro, em vez

de focar nos grandes próceres ou datas de transições políticas, 1810, a data de

início da Independência mexicana encabeçada por Miguel Hidalgo y Costilla e

1910, o começo da Revolução Mexicana sob a liderança de Francisco I

Madero, propõe um recorte dentro do período de 1968 e 1985, nos quais as

crônicas apresentam em primeiro plano as vozes de personagens que podem

ter vivido no período que compreende os textos, mas que não aparecem nas

histórias oficiais.

Os personagens dessa obra são espectadores e, ao mesmo tempo,

protagonistas dos eventos ocorridos. Eles não estão alheios à História oficial,

pois fazem parte dela, porém a história pessoal está acima da nacional. A

importância das crônicas se encontra nesse ponto, uma vez que, ao retornar a

Page 155: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

155

um momento histórico, procura recuperar a memória coletiva, além de

apresentar outras versões através da literatura, pois os protagonistas:

se mueven entre ambos polos del binomio testigo/personaje, de manera tal que pertenecen por origen a los primeros y por reconstrucción, a los segundos. Habitan un presente que soporta estoicamente el lastre de un pasado del cual no puede, o no quiere deshacerse, pues hacer lo supone la cancelación de un tiempo seductor e idealizado, pleno de ilusiones y motivaciones (GUTIÉRREZ TORRES, 2013, p.1).

Gus, o protagonista da crônica “1968”, é um exemplo do comentado,

pois enquanto ocorria o massacre na Plaza de las Tres Culturas, ele, que tinha

apenas doze anos, recuperava-se de uma cirurgia nas amídalas e ficou

sabendo do ocorrido por amigos na escola. Ficou confuso com as diversas

informações recebidas, como se percebe nesse trecho:

Se enteró de un juego que había sustituido al de policías y ladrones: policías y estudiantes. Sus amigos le dieron versiones contradictorias de lo que pasó mientras estuvo en el hospital. Alguien decía que los rusos se habían “infiltrado” (Gus pensó en un gigantesco colador de café) en México, otro aseguraba que los estudiantes querían “boicotear” (la palabra “boicot” le sonaba a choque de trenes) la Olimpiada (VILLORO, 2006a, p.17).

Observa-se que Gus resgata os “años como vidrios rotos” (VILLORO,

2006a, p.9), como pode ser percebido ao longo deste texto, no qual o

protagonista vai tomando consciência do acontecido. No prólogo, o cronista

comenta a opção por esse período: “Mil novecientos sesenta y ocho fue el

punto de partida en la cuenta de los años” (VILLORO, 2006a, p. 10). Desde as

primeiras páginas, já se reconhece um locus histórico e uma “consciencia

política” (PRICE, 2011, p. 275). A data de novembro de 1985, que fecha o

prólogo, revela que o texto terminou dois meses após o sismo que afetou a

cidade:

Escribí la crónica de 1985 antes del terremoto. La destrucción de la ciudad hizo que esa fecha cobrara otro sentido. Sin embargo, no quise alterar el texto. No puedo pensar en el sismo como asunto literario; desconfío de los que en momentos de peligro tienen más opiniones que miedo. Pero tampoco puedo seguir acumulando años hasta llegar a un prestigiado múltiplo de 10 (VILLORO, 2006a, p. 11).

Page 156: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

156

Neste trecho, Villoro declara que já havia terminado o texto e que não

pensou em aproveitar o desastre para atualizar a crônica “1985”. O

protagonista é um jovem, Rick, cuja participação é finalizada numa cena

apocalíptica. Depois de assistir, por dezesseis horas seguidas na televisão

com antena parabólica, uma imensa novidade para a época, um espetáculo de

rock, ele passeia pela cidade. Ao parar no semáforo, é abordado por diversos

vendedores ambulantes, que “le ofrecieron mapas, conejitos vivos, lápices de

un metro, monos de peluche, chicles, calaveras de plástico, hules de uso

indefinido y macetas de cactos” (VILLORO, 2006a, p.125), além de crianças

que lavam para-brisas, dançarinos com aspectos de indígenas, palhaços e

cuspidores de fogo. Nada, porém, o comoveu. Baixou o vidro do carro poucos

centímetros e “dejó caer la moneda, como quien la deposita en un buzón”

(VILLORO, 2006a, 125) No auge de sua indiferença, em seguida, Rick

arrancou com o carro e “se secó el sudor de la frente con un klínex”, ignorando

a poeira e a miséria ao seu redor.

O fato de o cronista terminar o texto antes do sismo é interessante, pois

a crônica se alimenta do cotidiano, e o terremoto compreende esse requisito.

No entanto, Price (2011) acredita que “Villoro se declara en contra de utilizar el

desastre para fines personales. Es más, su reticencia frente al temblor subraya,

una declaración política de solidaridad” (PRICE, 2011, p. 276). Cabe ressaltar

também, como revela Monsiváis (2013) e José Agustín (2007), que o terremoto

contribuiu para a formação da “sociedade civil62” no México, e é este

posicionamento que emerge ao declarar que não se pode pensar o terremoto

somente como assunto literário.

Ao declarar que desconfia dos que têm mais opinião que medo, Villoro

ressalta questões políticas, sociais e econômicas que estão submersas nesse

pequeno trecho. Por um lado, há a mobilização espontânea da população,

formando uma imensa força tarefa de resgate: “Un extraordinario, inesperado y

62

Este é um termo que abrange muitas controvérsias e amplas definições, porém esse trabalho se apoia no conceito que John Keane oferece em seu livro Civil Society. Old Images, New Visions que diz“A sociedade civil [...] é uma categoria ideal-típica [...] que descreve e prevê um conjunto complexo e dinâmico de instituições não governamentais legalmente protegidas que tendem a ser não-violentas, auto-organizadas, auto-reflexivas e permanentemente em tensão entre si e com as instituições do Estado que "enquadram", constrangem e habilitam suas atividades” (KEANE, 1998, p. 6, tradução minha).

Page 157: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

157

oportuno sentimiento de solidaridad se dio entre muchos habitantes de la

ciudad de México. Se formaban cadenas humanas para salvar a las víctimas”

(AGUSTÍN, 2007, p.70). Sentimento que “jamás se imaginaron que un

terremoto se volvería mítico y que de entrada significaría el acta de nacimiento

oficial de la sociedad civil mexicana” (AGUSTÍN, 2007, p.72). E em seguida,

formando organizações para defender os direitos das vítimas, como por

exemplo, a Coordinadora Única de Dannificados (CUD), Coordinadora de

Luchas Urbanas (CLU), a Coordinadora Nacional del Movimiento Urbano

Popular (Conamup) e a Unión de Vecinos y Dannificados de 19 de sep.

(UVyD). Do outro, o governo priísta, que não sabia o que fazer, mas se

apressou a desmobilizar os grupos espontâneos de ajuda e distribuir volantes

que diziam “Malos mexicanos pretenden desorientarnos. Rechacemos

cualquier actitud que ponga en peligro la vida de nuestros hijos y familiares”

(AGUSTÍN, 2007, p.72). E como destaca Villoro em uma das poucas crônicas

sobre esse tema:

El terremoto desnudó tramas de corrupción y confirmó la inoperancia del Gobierno. Muchas cosas podían ser criticadas. Más allá de eso, nos dio una lección elemental, tan antigua como el primer asentamiento humano: no somos dueños de la ciudad; en todo caso, podemos lidiar con los desechos para que la ciudad exista (VILLORO, 2015a, p.5).

Como aparece no final do prólogo de Tiempo transcurrido, Villoro

demonstra resistência ao abordar o terremoto como tema de seus textos. O

sismo aparece como pano de fundo nas crônicas “Los convidados de agosto” e

“El olvido: un itinerario urbano en México DF”. No romance Materia dispuesta,

no qual o protagonista é ““hijo del sismo”: nace durante el temblor de 1957, que

derrumbó el Ángel de la Independencia en Paseo de la Reforma […]. El

desenlace ocurre en 1985, durante el temblor que destruyó la ciudad de

México” (VILLORO, 2010a, p. 18) e em sua primeira peça de teatro Muerte

parcial, porém em nenhuma dessas obras o terremoto ocupa o centro da

discussão. Ressalte-se que o autor já havia passado por três terremotos, no

México em 1979 e 1985 e, no Chile em 2010 quando participava do Congreso

Iberoamericana de Literatura Infantil y Juvenil, deste último publica 8.8: el

miedo en el espejo – una crónica del terremoto en Chile. Quando questionado

Page 158: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

158

em entrevista sobre a desconfiança de, nos momentos de perigo, ter mais

opinião que medo, responde:

Esa frase surgió en 1985. Acababa de concluir mi libro Tiempo transcurrido […] Abarca 18 años de la vida en México: del movimiento estudiantil del 68 a la víspera del terremoto. Pero no quise aprovechar esa tragedia porque le daba un desenlace sensacionalista al libro. Además, estaba demasiado cerca del tema. Fui brigadista después del terremoto, uno de mis mejores amigos murió ahí; me pareció oportunista opinar sobre algo que no era otra cosa que un espanto. Durante 25 años aludí al tema en cuentos y novelas pero nunca lo enfrenté en forma directa. El temblor de Santiago me obligó a hacerlo. Sentí que al fin podía encarar el miedo que llevaba dentro sin ser victimista o tremendista. Había convivido con esa sombra lo suficiente para saber que es una compañía que en cierta forma me define (VILLORO apud OJEDA, 2011, p. 1).

Com a publicação de 8.8, Villoro parece saldar uma dívida literária com o

tema terremoto e restabelecer conexões perdidas. O título da obra: “El miedo

en el espejo”, converte em reflexo o vivido no México em 1985 e permite

transcender ambos os eventos

El terremoto de Chile activó otro, el que destruyó mi ciudad, y que he evocado en la escritura de varios modos, todos ellos indirectos, tal vez por pudor ante un sufrimiento demasiado próximo, tal vez por superstición de no tentar la desgracia (esa aniquilación marcó un límite, un borde definitivo, algo que no debe traspasarse, la línea amarilla en el lugar del crimen, la zona adonde no llegan las palabras). La escritura elige distancias. El dolor cercano se vive mejor en el llanto que en la página. Tuve que ir al fin del mundo para encontrar otra “primera ocasión”: hablar de la Tierra que se abre (VILLORO, 2010a, p. 174).

Roberto González, em setembro de 2015, ao completar trinta anos do

terremoto, reúne testemunhos de pessoas reconhecidas no mundo da

literatura, do jornalismo, do teatro e do esporte que viveram o abalo 8.1 graus

no México, entre eles: o ator Daniel Giménez Cacho, a cantora Regina Orozco,

o ex-jogador Miguel España, Juan Villoro, dentre outros. Cada um revelou em

poucas palavras sua memória. O autor de Los once de la tribu declarou:

“Cuando ocurrió el sismo, yo estaba en Tlalpan, zona que no es sísmica, pero

donde también se sintió muy fuerte. Se fue la luz, también el teléfono. […] dos

cosas se me grabaron de inmediato: la devastación de la ciudad y la

solidaridad de la gente” (GONZÁLEZ apud VILLORO, 2015, p.2).

Page 159: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

159

O título Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias faz alusão à

mensagem dos telefones públicos que entraram em funcionamento em 1960 e

que, após a expansão dos telefones fixos e móveis, caíram em desuso. A frase

dizia: “tiempo transcurrido, para continuar, deposite sin colgar otra moneda”.

Villoro resgata essa mensagem no seu prólogo: “Hace tiempo recogí una

moneda que sólo compraba las cosas de antes. Agoté su valor en estas

crónicas. Como en los teléfonos públicos, ha llegado el tiempo de buscar otra

moneda” (VILLORO, 2006a, p.10-11).

Muitas crônicas de Villoro refletiram sobre momentos históricos. Entre as

mais frequentes estão as que mostram o movimento do Ejército Zapatista de

Libertación Nacional (EZLN), que aparecem em “Los convidados de agosto” e

“El guerrillero inexistente”, incluídas em Los once de la tribu e “Un mundo (muy)

raro: los zapatistas marchan”, de Safari accidental. Em “Los invitados de

agosto”, Villoro narra sua viagem da Cidade do México a Aguascalientes para

assistir à Convención Nacional Democrática (CND), com outras seis mil

pessoas e centenas de jornalistas. Como aparece no prólogo da crônica

carregada de humor e ironia a figura do subcomandante Marcos “Sua voz

controlada expresaba dominio escénico” (VILLORO, 1998, p.259). Ao lado do

olhar crítico, porém, coexiste o respeito pelos indígenas:

hombres, mujeres y niños, con los rostros cubiertos por pañuelos y un palo en la mano. […]. El EZLN tiene una estatura promedio de 1.55, una edad media de 20 años y obsoletos rifles de cacería. […] Es difícil imaginar un ejército más precario […] vestidos de civiles, para iniciar la más casera de nuestras rebeliones (VILLORO, 1998, p. 271).

Villoro, em todas as crônicas sobre o EZLN, destaca o culto à

personalidade do líder da rebelião: “Marcos no es un poeta lírico ni un

representante del realismo mágico; […] los muertos y la guerra son reales;”

(VILLORO, 1998, p. 272). Em “Un mundo (muy) raro: los zapatistas marchan”

segue criticando Marcos: “tan fanático como otros rebeldes de América Latina”

(VILLORO, 2005a, p.56). Critica sua estratégia também: “[…] en la toma de

Ocosingo, el EZLN mandó a una muerte segura a indígenas armados con rifles

de palo. Usar tropas “desechables” como estrategia de distracción es una

Page 160: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

160

cuestionable táctica de guerra” (VILLORO, 2005a, p. 56). Nas crônicas, fica

claro o apoio ao zapatismo, mas não à figura de Marcos. No entanto, não deixa

de reconhecer sua importância para a evolução, a renovação e até certo êxito

do movimento:

El subcomandante Marcos renovó el lenguaje político con sentido del humor, parábolas de la Biblia, leyendas mayas, realismo mágico y aforismos de la contracultura. Algunos dudaron de la legitimidad de un intelectual de clase media como vocero de los indios. Otros decidieron tomar en serio su propuesta de cambiar el país desde abajo, con los más débiles. Enemigo de la lucha armada y la izquierda dogmática […]. (EZLN) dio un giro sorprendente: la guerrilla con apariencia guevarista se transformó en el movimiento político que prosigue hasta la fecha (VILLORO, 2016a, p.1).

Outra característica destacada é o carácter tecnológico dos eventos. “La

Convención era una épica de la realidad virtual” (VILLORO, 1998, p. 262). É

importante também ressaltar o uso que o subcomandante faz dessa realidade

virtual: “Marcos, el evangelista armado de e-mail” (VILLORO, 1998, p. 261).

“El guerrillero inexistente” narra a tentativa governamental de, ao revelar

a verdadeira identidade de Marcos, eliminar o mito da máscara, com o objetivo

de acabar com sua popularidade. Tal procedimento foi aprofundado para se

contrapor à rebelião do EZLN pela entrada do México no Tratado de Livre

Comércio da América do Norte (TLCAN63). Em toda essa crônica, Villoro

demostra o desmantelamento das ilusões da classe média mexicana: “Era

obvio que eso no podía durar pero la clase media se sentía dichosa en el

nuevo país de Oz. En 1994, la rebelión zapatista nos sacó del sueño”

(VILLORO, 1998, p. 281). Destaca também a máscara como elemento de

construção da identidade, utilizando para isso elementos da cultura popular e

da cultura de massa: “la identidad fugada de los rebeldes, su condición de

vengadores anónimos, a la manera de Batman o los encapuchados del Popol

Vuh” (VILLORO, 1998, p. 281). Ressalta, porém, que a retirada da máscara

não fortaleceu o governo, como se observa neste trecho que narra uma

pequena biografia do subcomandante:

63

Esse termo apresenta siglas diferentes de acordo com o idioma. Em inglês: North American Free Trade Agreement (NAFTA); Opta-se aqui pela sigla em espanhol para Tratado de Libre Comercio de América del Norte (TLCAN).

Page 161: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

161

Rafael Guillén es hijo de empresarios, alumno de escuelas católicas, hermano de una diputada del PRI, fue premiado por el presidente López Portillo por su rendimiento académico, hizo estudios en la Sorbona, su director de tesis fue el filósofo Cesáreo Morales, que se convertiría en coordinador de asesores de Luis Donaldo Colosio. Al gobierno le convenía un troglodita de las ideologías, inscrito en algún programa de "viajero frecuente" a Corea del Norte, o un psicópata dispuesto a usar una sierra eléctrica según las indicaciones de Quentin Tarantino. En cambio, encontraba al hijo-cuñado-yerno-novio perfecto para la Gran Familia Mexicana. Para colmo, unos días antes del "destape" el secretario de Educación Fausto Alzati tuvo que renunciar por usurpar un doctorado que nunca cursó. Comparada con la trayectoria de los gobernantes, la vida de Marcos parecía un camino de virtud (VILLORO, 1998, pp. 283-284).

Aparece nesse texto que, ao contrário do que planejou o governo

quando revelou a identidade de Marcos e declarou a ofensiva contra o EZLN, a

pessoa desmascarada em nada parecia com o homem ameaçador imaginado

e, ao mesmo tempo, revelava-se um escândalo que transformava Marcos em

figura exemplar. A retirada da máscara contribuiu para que aumentasse a

empatia pela causa zapatista ao grito de “Todos somos Marcos”. Villoro termina

a crônica, suscitando a figura de Doroteo Arango64, que entrou para a história

com seu apelido e não com seu nome verdadeiro. Parafraseando o romance de

El caballero inexistente, de Ítalo Calvino, comenta o narrador: “el protagonista

de Italo Calvino es una armadura sin cuerpo. Las máscaras políticas están

hechas del mismo relleno; el pasamontañas no oculta sino aire, la nada en que

se diluyen los signos previos de las figuras públicas” (VILLORO, 1998, p.284).

Villoro se ocupa da TLCAN em diversas obras, porém, em “Los

convidados de agosto”, ressalta a mistura da grave situação econômica por

que passa o México e o uso da mídia por ambos os lados: governo e

zapatistas. Como diz Jaime Martínez Veloz: “Cuando las cosas no les salen

bien a los gobiernos, éstos recurren al manualito del escándalo y al show

mediático del discurso justiciero [...]” (MARTÍNEZ VELOZ, 2009, p.1). Afinal, no

século XX, a história do México tem sido a crônica do controle dos meios nas

mãos do PRI (LARIO BASTIDA, 2015) em uma “guerra” que poderia chamar-se

de virtual, se não fossem os mortos, destaca Villoro:

64

José Doroteo Arango Arámbula é o nome de Pancho Villa.

Page 162: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

162

Gabriel Zaid ha descrito el caso de Chiapas como "guerrilla posmoderna". Aunque los días de combate y los muertos fueron reales, la principal función de la guerrilla ha sido representarse a sí misma, poner en escena gestos, disfraces, textos políticos. En buena medida, su éxito se ha fincado en desmarcarse desde muy pronto de la violencia y proseguir la contienda en los comunicados salidos de la selva (VILLORO, 1998, p. 262).

Em Safari accidental, na crônica “Un mundo (muy) raro: los zapatistas

marchan”, Villoro narra a caminhada do EZLN de Chiapas à Cidade do México

na Marcha del Color de la Tierra para a intervenção zapatista no Congresso

para defender a aprovação da Ley de Cultura y Derechos indígenas. Nessa

crônica, Villoro descreve a situação do país com cem dias do governo de

Vicente Fox, o presidente da alternância que acabou com 71 anos de governos

priístas, como uma pátria convulsa, no qual Breton “encontró el surrealismo en

la vida diaria y las revueltas sociales son un magnífico pretexto para hacer

artesanías y renovar el repertorio de la canción ranchera” (VILLORO, 2005a, p.

45). A descrição inicial é vertiginosa e caótica

El México de la transición es un circo de diez pistas donde se improvisan excesos. Fox tachó 100 días en su calendario en los que ocurrieron cosas como estas: por unas horas el estado de Tabasco tuvo dos gobernadores, sacerdotes de Guanajuato e Hidalgo descubrieron que los Pokémones son diablos de juguetería y propusieron quemarlos en hogueras ejemplares, Amnistía Internacional informó que somos el máximo importador de instrumentos de tortura (invertimos 16 millones de dólares en los últimos tres años para parecernos a Hannibal Lecter) […], el jefe del gobierno de la ciudad de México descubrió que no hay causa más progresista que la astronomía y decidió implantar un horario distinto en los barrios controlados por su partido (los conservadores de la calle de enfrente vivirá con una hora de retraso). ¡Bienvenidos a Foxilandia, donde la paradoja sustituye el sentido común! De la dictadura perfecta, diagnosticada por Vargas Llosa, hemos pasado a la caricatura perfecta. No siempre en forma voluntaria, nuestra épica se mezcla con el humor y el apocalipsis con la diversión (VILLORO, 2005a, pp.45-46).

A situação narrada vai além da crítica à violência e ao conservadorismo

religioso. Villoro também destaca o poder da mídia, que era utilizada pelo

governo de Fox “Nuestro mandatario no conoce mejor ideología que el

marketing, y sus palabras suelen ser slogans” (VILLORO, 2005a, p.46). Na

crônica “México el reino de Oz” a respeito do presidente mexicano no sexênio

2012-2016, o cronista tece comentários muito próximos ao que fez a Fox com

relação ao uso da mídia: “Enrique Peña Nieto surgió como el perfecto

Page 163: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

163

telecandidato mexicano. Un hombre atractivo, de peinado imperturbable, que

aun al improvisar parece leer un teleprompter” (VILLORO, 2014b, p.1).

Certamente, entretanto, refere-se não apenas a Fox ou a Peña Nieto, mas

também a Marcos, destacando o enfrentamento midiático deste com o

presidente, Villoro denominou “el Vengador Anónimo vs. el Hombre de los Mil

rostros” (VILLORO, 2005a, p.47).

Quando Villoro destaca em suas crônicas a TLCAN, está ressaltando os

ecos de séculos de marginalização, exploração e miséria que a rebelião

indígena de Chiapas denunciou: “Durante dos siglos el México blanco ha

celebrado las pirámides para ignorar la miseria y el racismo del presente”

(VILLORO, 1998, p. 265). Esse pensamento é compartilhado com o de José

Emilio Pacheco, que, com lucidez, destaca o impacto que a rebelião do EZLN

teve na consciência nacional

Cerramos los ojos para suponer que el otro México desaparecería al no verlo. El primero de enero de 1994 despertamos en otro país. El día en que íbamos a celebrar nuestra entrada en el primer mundo retrocedimos un siglo hasta encontramos de nuevo con una rebelión como la de Tomóchic. Creímos y quisimos ser norteamericanos y nos salió al paso nuestro destino centroamericano (PACHECO apud PADUA, 1996, p.35).

Néstor García Canclini, em Culturas híbridas, também faz comentários a

respeito da modernidade no México, que serve para pensar a situação do

EZLN:

As oligarquias liberais do final do século XIX e início do XX teriam feito de conta que constituíam Estados, mas apenas organizaram algumas áreas da sociedade para promover um desenvolvimento subordinado e inconsistente; fizeram de conta que formavam culturas nacionais e mal constituíram culturas de elite, deixando de fora enormes populações indígenas e camponesas que evidenciam sua exclusão em mil revoltas e na migração que “transtorna” as cidades (GARCÍA CANCLINI, 2008, p. 25).

Além das três crônicas citadas, Villoro ao longo dos anos, publicou

muitas outras sobre o EZLN: “La frontera de los ilegales” (1995), “Chiapas: el

regreso de intocables” (2001), “La mirada de Zapata” (2004b), “La taquería

revolucionaria” (2013b), “Mi padre, el cartaginés”, incluída em Espero retrovisor

(2013a), “Los renunciantes” (2014d), “La estrella zapatista” (2016a), entre

Page 164: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

164

outras. Para explicar a seleção na pequena antologia com nove contos e uma

dezena de crônicas de Espejo retrovisor, afirma: “[…] no las ordené en forma

cronológica, entre otras cosas porque todos los temas son recurrentes para mí:

Chiapas, mi padre, el fútbol, el rock, los viajes […]” (VILLORO, 2013a, p.9).

Nesses últimos textos, percebe-se uma aproximação com a figura do

subcomandante Marcos, principalmente após a mudança do nome de guerra

para Galeano (em homenagem ao professor zapatista José Luis Solís López

assassinado em ataque paramilitar a La Realidad). Sobre este fato, escreve:

el subcomandante Marcos regresó a la escena luego de un largo alejamiento, pero sólo para transformarse en el subcomandante Galeano en homenaje al profesor […] asesinado. En este caso no estamos ante una desaparición sino ante una transfiguración. Dos décadas después del levantamiento zapatista, su vocero asume otra identidad (VILLORO, 2014d, p.1).

Cynthia Steele (2002), em seu estudo sobre o reflexo literário zapatista

no México, afirma que é exatamente na crônica onde mais se encontram

exemplos e onde o terreno é mais fértil. A autora destaca alguns autores:

Carlos Monsiváis, Elena Poniatowska, Vicente Leñero, Sergio Pitol e Efraín

Bartolomé. Na breve relação de Steele (2002), pode-se acrescentar Juan

Villoro, pois em sua ampla e variada obra se observam diversos textos sobre o

zapatismo, principalmente em suas crônicas e em outros textos que

concretizam suas colaborações com a imprensa. Como diz Brian L. Price a

respeito de Tiempo transcurrido, opinião que certamente abarca muitas de

suas outras crônicas: “A la par del retrato sociológico que Villoro nos presenta,

hay también una toma de postura política. Toda crónica es, en esencia, un

documento político, un testimonio de voces que no pueden hacerse escuchar

(o que esperan ser escuchadas a todo volumen)” (PRICE, 2011, p. 275).

Manuel Lario Bastida (2016) afirma que a opção de Villoro ao abordar o

tema do zapatismo em sua obra de não ficção “revela una opción ética que

explicaría su negativa a escribir ficción sobre el zapatismo” (LARIO BASTIDA,

2016, p.10). Certamente Villoro privilegiou o tema mais nas crônicas que em

seus romances ou contos, pois há uma pequena referência em El testigo

(2004), através da esposa do protagonista que colabora com uma ONG de

solidariedade a Chiapas e em Arrecife (2012b), um reality show, onde a

violência e a realidade são narradas com humor e ironia, cuja narrativa se

Page 165: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

165

passa em um hotel na costa maia caribenha chamado La Pirámide. O exótico

lugar proporciona perigos controlados a turistas europeus e norte-americanos:

“Estamos en zona guerrillera. De vez en cuando los turistas tienen contactos

con supuestos rebeldes. Se llevan algún susto y todo vuelve a la normalidad”

(VILLORO, 2012b, p. 60). Atores vestem uniformes camuflados, portam armas

e o protagonista “copiaba con descaro el estilo del subcomandante Marcos”

(VILLORO, 2012b, p. 72). O autor do artigo acredita que, quando Villoro

introduz o tema do zapatismo nesse romance, está mudando seu

posicionamento:

En 2012, varios elementos indican que algo está cambiando en Villoro en su consideración sobre el zapatismo. Precisamente el año en que la prensa sensacionalista habla del advenimiento del apocalipsis de las predicciones mayas, vemos cómo se diluyen sus antiguas resistencias éticas a utilizar el zapatismo como materia ficcional, con la publicación de su novela Arrecife (2012) (LARIO BASTIDA, 2016, p.18).

É importante destacar que a literatura trata dos mesmos temas que a

sociologia, a filosofia e a história, utilizando, porém, as ferramentas da própria

literatura. Quando Villoro utiliza a crônica para tratar do tema de Chiapas, isso

não significa que ele esteja criando uma seleção de temas “sérios” e “não

sérios”, temas para a ficção e outros para a não-ficção, apenas que, com a

crônica, há a possibilidade de uma escrita efêmera e com o desenvolvimento

mais livre. Um romance, por exemplo, não seria o local mais adequado para

um escritor tratar de temas urgentes, pois a confecção desse texto demandaria

anos, dentro de uma estrutura que impossibilitaria uma publicação mais

imediata. É possível pensar na essência política da crônica como construção

de sentido, onde o discurso é um terreno em disputa para construir forças

favoráveis de mudança social, e não o abrandamento da postura ética do

escritor, pois a constância de temas das crônicas, os espaços, os personagens,

ou seja, os elementos dos textos permitem descrever as particularidades de

uma sociedade complexa (como a maior parte das sociedades do século XXI),

que emergem de um passado traumático recente.

A prática literária de Villoro como exercício político pode ser percebida

na temática e no estilo da escrita dos textos. Não se refere aqui apenas à

Page 166: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

166

equiparação ingênua de motivação individual e relevância social “que pode,

ocasionalmente, ser encontrada na esquerda” (BURGER, 1989, p.24). Trata-se

mesmo de uma questão teórica que determina as conexões internas de sua

obra.

3.2.1 CDMX: uma estética do fragmento

Ciudad montón de palabras rotas […]

esculpida retórica de frases de cemento65

Octavio Paz

Concebendo a crônica como um espaço simbólico para ler o cotidiano, é

pertinente destacar a sua relação com a cidade, pois, como menciona Salazar:

“la ciudad es un lugar a la vez real e imaginario, que se construye y se

transforma de acuerdo a distintos modelos culturales” (SALAZAR, 2006, p.19).

Sendo assim, nas linhas que seguem, serão abordadas as crônicas de Villoro

numa perspectiva de crônica urbana, ou seja, como um tipo de texto

escrito que se caracteriza por la idea de que existe, por parte de un sujeto, al que denominaremos “cronista”, una focalización en una acción puntual, por parte de algún individuo, o un conjunto (reducido) de individuos, en algún espacio de la ciudad, ese espacio público por excelencia (BEKER, VESPA e AREN, 2010, p.1).

Segundo Monsiváis, o papel da escrita é fundamental na produção

espacial, na definição cultural da urbe e no imaginário que se constrói a seu

redor. No ensaio “Manuel Gutiérrez Nájera: crónica como utopía”, Carlos

Monsiváis define a crônica como espaço de utopia (MONSIVAIS, 1995, p.1).

Salazar menciona que os cronistas “han descrito a la ciudad y le han dado

permanencia en la literatura, de algún modo han reinventado su pasado y

delineado una ciudad futura, un espacio posible” (SALAZAR, 2006, p.19) e

65

Fragmento do poema “Vuelta” de Octavio Paz. In: SALAZAR, Jezreel. La ciudad como texto: La crónica urbana de Carlos Monsiváis. México: Senderos, 2006, p.6. Universidad Nacional Autónoma de Nuevo León. Disponível em:

www.academia.edu/18411513/La_ciudad_como_texto._La_cronica_urbana_de_Carlos_Monsivais_tesis

Page 167: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

167

acrescenta: “Desde Bernal Díaz del Castillo, la utopía ha sido un signo y un

sino, un rasgo ligado a la crónica de la urbe” (SALAZAR, 2006, p.19).

Dentro das realidades contemporâneas, a crônica, enquanto gênero

urbano reclama sua “marca de época”, ou seja, “asume su posibilidad de

articular lecturas plurales de la experiencia urbana” (BENCOMO, 2007, p. 37).

A crônica é um gênero privilegiado para narrar experiências dentro e no

entorno da cidade, pois, através do olhar atento do cronista, é possível uma

reflexão de determinada época, sua ideologia, seus conflitos e frustrações,

suas metas, modas e tendências. Néstor García Canclini (1999) propõe o

estudo da cidade a partir de interações: “Gran parte de lo que nos pasa [en la

ciudad] es imaginario, porque no surge de una interacción real. Toda

interacción tiene una cuota de imaginario, pero más aún en estas interacciones

evasivas y fugaces que propone una megalópolis” (GARCÍA CANCLINI, 1999,

p. 89). Essa interação mencionada pelo autor pode se dar através de textos

que procuram de alguma maneira construir esse imaginário. Referindo-se ao

México, diz:

Tratamos de estudiar esta diversidad de imaginarios urbanos viendo como la ciudad era construida en el discurso periodístico de cada día, en la radio y la televisión. En México, como en muchas grandes ciudades, hay suplementos especiales que aparecen semanalmente, y a veces todos los días en algunos diarios, que hablan de la ciudad y que dejan hablar a la ciudad (GARCÍA CANCLINI, 1999, p. 90).

Juan Villoro, tanto pelas características discursivas, pelos procedimentos

de escrita ou pela temática plural que aborda, apresenta um amplo repertório

crítico sobre vários aspectos da Cidade do México: história, espaços públicos,

habitantes, classes sociais, estações de metrô, poluição e ofícios. Em seus

escritos, observa-se a imagem de uma “cidade em decomposição”, e a crônica

como gênero mostrou ser o espaço adequado para articular leituras plurais da

experiência urbana.

García Canclini (1999) apresenta três definições de cidade, que se

tornam valiosas para entender a Cidade do México, a qual aparece em vários

romances, ensaios, artigos e, principalmente, nas crônicas de Juan Villoro. A

primeira aproximação com o tema, que teve um forte desenvolvimento durante

Page 168: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

168

a primeira metade do século XX, é a oposição entre o rural e o urbano, ou seja,

“concebir la ciudad como lo que no es el campo” (GARCÍA CANCLINI, 1999, p.

69).

A segunda definição sugerida por Canclini tem uma longa trajetória, que,

baseada na escola de Chicago, propõe critérios geográfico-espaciais, não

levando em conta os processos históricos e sociais.

O último critério para definir a cidade é especificamente econômico,

considerando o resultado do desenvolvimento industrial e a concentração

capitalista, definição compartilhada por Max Weber, quando afirma: “a cidade é

um estabelecimento de mercado” (WEBER,1987, p. 75). As definições de

cidade propostas, em sentidos variados, como oposição entre rural e urbano,

geográfico-espaciais ou economicistas, não abarcam a complexidade do

espaço urbano, pois “las ciudades no son sólo un fenómeno físico, un modo de

ocupar el espacio, de aglomerarse, sino también lugares donde ocurren

fenómenos expresivos que entran en tensión con la racionalización” (GARCÍA

CANCLINI, 1999, p. 72).

Cabe destacar que todas essas definições do urbano, quando se trata

de megacidades, são muito mais “vertiginosas”. A vertigem mencionada por

García Canclini (1999) se dá em certa medida pela demasiada quantidade de

pessoas. Essa questão é abordada por Villoro em vários textos, como se pode

observar no início de sua crônica “La ciudad de México: mujer barbuda”:

En México Distrito Federal el paso del tiempo significa una desaforada multiplicación de la especie. Nací en 1956, cuando la ciudad tenía cuatro millones de habitantes, y ahora tiene unos 18 o 20. Aunque los conteos de población son inciertos, no hay duda de que somos demasiados. Estamos ante un fenómeno insólito: la metrópoli nómada. Sin movernos de sitio, hemos cambiado de ciudad; por convención seguimos hablando de “México, D.F.”, pero es obvio que el paisaje anda suelto y se transfigura en otro y otro (VILLORO, 2005c, p.1).

Villoro relata como a literatura mudou a maneira de ver a paisagem

urbana mexicana ao longo dos anos: “¿Qué puede decir la ficción de urbes

como México, D. F., que en 1950 tenía 2.9 millones de habitantes; en 1970,

Page 169: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

169

11.8 millones, y en el año 2002 se acerca a un número que parece una llamada

de emergencia ante el apocalipsis: 20.000.000?” (VILLORO, 2002a, p. 2).

Carlos Fuentes, em seu artigo sobre a obra de Juan Villoro, destaca

também a população da Cidade do México, mencionando que, quando publicou

o seu primeiro romance, La región más transparente, em 1958, o número de

habitantes não chegava a cinco milhões e que, quando Villoro publica El

testigo, em 2004, os metropolitanos já ultrapassavam vinte milhões. Fuentes

relata também a perspicácia desse autor, que percebe a impossibilidade de

abarcar o todo, optando por uma cidade fragmentada:

Sabedor de que el Distrito Federal se ha vuelto inabarcable, Villoro opta, por crear una ciudad parcelada, más identificable por lo que no es que por lo que es; más, por sus maneras de engañarse a sí misma que por las verdades que se dice a sí misma o que se dicen de ella (FUENTES, 2011, p.166-117).

García Canclini (1999), em seus estudos culturais, reconhece também

essa impossibilidade, interrogando-se qual seria a cultura urbana da Cidade do

México e conclui: “Pareciera que en la actualidad la búsqueda no es entender

qué es lo específico de la cultura urbana, qué la diferencia de la cultura rural,

sino cómo se da la multiculturalidad, la coexistencia de múltiples culturas en un

espacio que llamamos todavía urbano (GARCÍA CANCLINI, 1999, p. 77).

E menciona que há pelo menos quatro cidades do México dentro do que

se reconhecem como CDMX. A primeira delas é a cidade histórico-territorial,

levando em conta principalmente a quantidade de edifícios construídos.

Cidade industrial, assim denominou a segunda, sendo a urbe que se opõe ao

histórico, ou seja, o crescimento industrial que amplia seu espaço, criando a

cidade industrial com bairros, transportes e serviços e vai, de certo modo,

quebrando o aspecto territorial do meio urbano. O terceiro processo destacado

por García Canclini é a cidade que se volta para a comunicação e a

informação. Neste caso, ela perde a experiência de conjunto, pois a metrópole

se conecta dentro e fora de si e com o estrangeiro, não somente por correios e

telefone, mas também por cabo, fax e satélite. Os três modelos de cidades

mencionados convivem, muitas vezes, dentro de um mesmo espaço, e essa

coexistência em ritmo acelerado faz surgir o último modelo, a cidade videoclipe.

Page 170: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

170

A Cidade do México aparece em todas as crônicas de Tiempo

transcurrido nas quais Villoro traça uma cartografia que inclui vários bairros da

cidade, as denominadas “colonias” (Roma, del Valle, Narvarte, Lindavista,

Aviación Civil, Azcapotzalco, Coyoacán, Ciudad Satélite, Pantitlán), as

principais avenidas e ruas (Insurgentes, Reforma, Piedras Negras, San Borja,

Contreras), os marcos (Basílica de Guadalupe, la Plaza de las Tres Culturas) e

também as universidades (Universidad Iberoamericana, Ciudad Universitaria,

Universidad Autónoma Metropolitana de Xochimilco). Nesse percurso, o autor

abarca bairros mais abastados como Jardines del Pedregal, os mais pobres

como Nezahualcóyotl, central como a Plaza de la Constituición (conhecida

informalmente como el Zócalo) e a periferia, como Ajusco. Narra também os

eventos, que nela ocorrem, como os Jogos Olímpicos, na crônica “1968”, e a

visita do Papa João Paulo II, na crônica “1979”, além de situações do cotidiano

de uma grande cidade, como violência, drogas e prostituição.

A versão irônica e até cômica da visita do Papa dissimula uma questão

complicada, pois o México não tem relações oficiais com a Santa Sé desde a

Cristiada. O protagonista da crônica “1979”, Nicolás, é comunista, aprendiz de

dançarino e cozinheiro de um restaurante polaco. Ele é convidado para

preparar uma sopa para o pontífice. No entanto, pensa em aproveitar a

oportunidade e organizar “una disyuntiva terrorista: asesinar o purgar al papa”

(VILLORO, 2006a, p. 82). Essa crônica faz referência à indiferença da Igreja

Católica diante do massacre acontecido naquele país: “La sopa tenía el color

de una húmeda bandera polaca. Sangre del día anterior” (VILLORO, 2006a,

p.84). No entanto, tanto nessa crônica como no romance El testigo, no qual

aparece mais explicitamente a questão religiosa no México, Villoro mantém a

distância necessária, pois, como menciona Mihalí Dés a respeito do romance,

mas que certamente compreende a crônica em questão, a: “religión sigue

siendo un asunto central y fascinante, y que la literatura no es un acto de fe”

(DÉS, 2005, p.8).

Nicolás não leva adiante seu plano para “no perjudicar su obra (a sopa)

con el laxante” (VILLORO, 2006a, p. 84) e a crônica termina com o

protagonista rasgando em pedaços bem pequenos a gorjeta que ganhou das

mãos do pontífice e caminhando em direção à Avenida Insurgentes.

Page 171: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

171

Nessas e em várias outras crônicas de Villoro, em obras diversas, a

cidade é o tema principal:

Me fascina la Ciudad de México. Tengo una relación intensísima con ella. Pienso que es como estar enamorado de la mujer barbuda del circo, que no es la más hermosa del mundo, pero, pues necesitas los besos con barba y bigote que sólo ella te puede dar. Buena parte de lo que he escrito tiene que ver con la Ciudad de México [...] (VILLORO apud SÁNCHEZ, 2001, p. 1).

Como se pode observar nesse trecho com a instigante metáfora da

mulher barbuda, a relação de Villoro com a Cidade do México é intensa, e

grande parte de suas histórias se desenvolvem nesse espaço visto muitas

vezes como exótico, cheio de defeitos, porém, mesmo quando está narrando

outros “Territorios”, como é intitulada a terceira parte de Safari accidental

(2005a), como Berlim, essa relação se destaca: “Mi desconocimiento de Berlín

era absoluto, pero sentía un poderoso anhelo de reparación. Durante nueve

años estudié en el Colegio Alexander von Humboldt de Ciudad de México”

(VILLORO, 2005a, p.117). Em Havana também: “De cualquier forma, aun

atemperadas por las injusticias que uno puede ver en México, las noticias

cubanas rara vez son alentadoras” (VILLORO, 2005a, p.147). Ou quando o

escritor Martin Amis, se posiciona a favor dos Estados Unidos com relação ao

terrorismo “”No estoy de acuerdo en pensar que Estados Unidos se inventa

enemigos”, respondió Amis. “Tiene un muy claro: el terrorismo islámico”

(VILLORO, 2005a, p. 233), na reflexão irônica do cronista, México está sempre

ali “Como los mexicanos ya le dimos a Estados Unidos la mitad de nuestro

territorio en señal de buena voluntad, tenemos dificultad en entender los

problemas a los que los lleva su política exterior” (VILLORO, 2005a, p.233),

pois o ponto de contraste do viajante é a sua terra natal. Entretanto, há que se

matizar que esse lugar não é necessariamente um território geográfico, mas

também um imaginário que o próprio cronista possui, mesmo antes de explorar

essas ou outras latitudes e culturas.

A cidade do México, em diferentes momentos da história, foi símbolo de

ordem, beleza, perfeição, civilização e modernidade. Atualmente, como

aparece em vários textos de Villoro, tornou-se espaço da violência, do céu

Page 172: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

172

cinzento, do metrô lotado, dos engarrafamentos intermináveis, resultando numa

confusão tão grande que até os taxistas se perdem:

Además las calles repiten sus nombres como si así pulieran la gloria de los héroes. Quien abra el popular plano de la capital conocido como Guía Roji encontrará 179 calles Zapata, 215 Juárez, 269 Hidalgo, lo cual basta para construir unas veinte urbes suficientemente patriotas. En nuestro mapa movedizo ni siquiera las estatuas son estables. El monumento ecuestre a Carlos IV ha ocupado tres lugares distintos al modo de un caballo de ajedrez (VILLORO, 2005c, p.2).

Os taxistas, membros incontestáveis da urbe, a quem Villoro chama de

“movedizos embajadores del lugar común” (VILLORO, 2006b, p. 90) aparecem

em várias crônicas do autor. Ora eles se perdem nesse palimpsesto

desordenado, ora ocupam um papel quase protagônico, como aqueles que

conduziam Julio César, o campeão do boxe mexicano em “La tempestad

superligera”, uma vez que sempre discutiam com o boxeador por causa do

valor da corrida.

No entanto, observa-se em muitas delas que o sentimento que o cronista

tem por essa cidade é o que o faz seguir vivendo nela, apesar de, como uma

galáxia desordenada, ocupar todo o vale e seguir crescendo

desordenadamente: “Y sin embargo, no podemos romper el cordón umbilical

con México (cuya posible etimología es "ombligo de la luna"). Lunáticos y

edípicos, nos parecemos al Don Juan de Rake's Progress, la ópera de

Stravinski con libreto de Auden: acabamos enamorados de la mujer barbuda

(VILLORO, 2005c, p. 2).

Retomando os quatro modelos de cidade culturais apresentados por

García Canclini (1999), destaca-se a cidade histórico-territorial. Ela pode ser

percebida através de edifícios construídos na época pré-colombiana e colonial,

que ainda podem ser vistos. Villoro, tratando também dessas construções,

destaca a destruição provocada desde a colonização, ressaltando que esta

havia promovido a seca do lago e dos rios:

Los aztecas fundaron su capital en un islote y ganaron terreno al agua. Los conquistadores españoles que habían hecho la guerra de Italia no vacilaron en comparar a Tenochtitlan con Venecia. La ciudad

Page 173: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

173

fue secada durante siglos y las calles surgieron del lecho de los ríos. En el casco urbano, el principal recuerdo lacustre son los edificios coloniales que se hunden como navíos a punto de naufragar (VILLORO, 2005c, p. 2).

Em “Días robados: el cielo artificial” (2002b), Villoro aborda a mistura de

períodos históricos na Cidade do México, na qual se podem observar

construções da cidade asteca ao lado de estruturais coloniais:

Aquí todas las eras se mezclan en un presente abigarrado. Nuestras vastas tuberías se hunden en la ciudadela azteca, las mansiones de la colonia ostentan pedacería de pirámides, los emblemas del metro son un contradictorio códice de la "modernidad prehispánica", las estatuas cambian de sitio y los edificios renuevan sus usos (los presos políticos del 68 regresan a sus antiguas celdas a estudiar sus expedientes; en un giro simbólico, la Cárcel de Lecumberri se convierte en el Archivo General de la Nación) (VILLORO, 2002b, p.1).

Nesse trecho, além da cidade histórico-territorial, pode ser destacado o

reaproveitamento do espaço público. Cabe ressaltar que, em muitos de seus

textos, Villoro faz uma análise crítica de momentos importantes ocorridos na

Cidade do México no período entre 1968 até 2000. Ele deu ênfase a eventos

vinculados a fatos como o massacre de Tlatelolco, a crise econômica a partir

de 1970, na qual os movimentos sociais correspondem a um cenário político e

econômico em ruínas. Trata-se da “década perdida”, diagnóstico dado à

América Latina pela CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o

Caribe), devido à imensa dívida externa, à inflação, à burocratização estatal e

ao desemprego, além do terremoto que assolou a Cidade do México em 1985,

o levantamento do EZLN em Chiapas e o fim do governo do PRI em 2000.

Expressou de forma contundente o fracasso do otimismo político e a confiança

no modelo de modernização. É o que ressalta Susel Gutiérrez Torres a respeito

de Tiempo transcurrido:

Ante la rigidez de los imaginarios sociales, la violencia policial, los estereotipos culturales y los desengaños individuales, encontramos en la mayoría de las crónicas una especie de revelación que viene de la mano de una experiencia traumática que sume a sus protagonistas, sino en el fracaso, al menos en la resignada frustración que supone para ellos descubrir que no hay posibilidades más allá de las normas estrictas establecidas por una sociedad conservadora, rígida y represiva como la suya (GUTIÉRREZ TORRES, 2013, p.2).

Page 174: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

174

Diante do cenário descrito, essas crônicas apresentam personagens

melancólicos, através dos quais a realidade aniquila a utopia e instaura em seu

lugar a nostalgia. A pancada que fere o joelho de Gus na crônica “1968” após

ser golpeado por uma espécie de taco de beisebol por um grupo de meninos

de rua “cuatro operaciones de los meniscos acabaron con ilusiones de superar

a Ruy Camacho. También lo sacaron de la adolescencia” (VILLORO, 2006a, p.

18). E ele também se converteu em um ser melancólico:

Como todas las heridas, la suya tiene una poderosa cualidad mnemotécnica. Ahora, cada vez que se agacha, Gus recuerda el golpe y luego se sume en un mundo prolijo, donde todos los mazapanes cuestan cincuenta centavos y Procol Harum sigue en primer lugar del hit parade. Su memoria es tan singular como el olvido de los otros (VILLORO, 2006a, p. 19).

Assim como Gus, muitos outros personagens percebem uma realidade

que não poderão mudar e, resignados, aceitam a derrota. Mais adiante, diz o

narrador: “Gus se siente obligado a pensar en las cosas que sucedieron

exclusivamente para que alguien se acordara de ellas” (VILLORO, 2006a, p.

19). Além dos personagens frequentemente melancólicos (Gus e Chata),

resignados (Toño, Nabor, Alvarito) ou passivos (Gato e Rocío), surge Magali, a

Madona de Guadalupe, protagonista da crônica “1983”. Através dessa

personagem, o autor critica a repressiva educação católica relacionada com a

violência social, onde um pequeno escândalo sexual “podía significar poco en

otros lados, pero en el Estado de México equivalía a la llegada de una división

nazi al gueto de Varsovia” (VILLORO, 2006a, p.107). A cena na qual a

personagem é violentada por vários policiais e seu namorado é assassinado

por eles com golpes de um picador de gelo, logo após saírem de uma festa a

fantasia na casa de amigos na Cidade Satélite é marcante. Apesar das várias

cenas de violência narradas nessa crônica, essa é, provavelmente, a

passagem mais terrível do livro.

Nemo fue noqueado con la cacha de una pistola. Lo arrastraron de un pie; su cabeza golpeó con el estribo del coche; un ruido sordo, laminoso. Lo pusieron de pie. Las barbas postizas se le habían pegado absurdamente en el pecho. Magali vio el picahielos. Había algo equívoco, una humillación adicional en esa arma de asesino de barrio. No pudo contar las puñaladas que recibía su amigo. Un policía la golpeó con tal fuerza que la sangre se mezcló con las lágrimas; un velo pastoso le impidió distinguir a los sucesivos violadores. Otro golpe le hizo perder el conocimiento. Despertó de madrugada, envuelta por un olor agrio que la hizo vomitar sobre el asiento. El pelo

Page 175: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

175

se le había formado coágulos de sangre. De su amigo sólo quedaran las barbas sobre el asfalto (VILLORO, 2006a, pp. 107-108).

Magali, após todo o ocorrido, apesar de toda a violência a que foi

submetida e da falta de apoio da família, não se resigna nem se torna passiva.

Convertida na Madona de Guadalupe, uma roqueira inspirada parodicamente

na Madonna americana, ela se vinga dos policiais:

Después de dos horas de encarnizada trifulca, la policía quedó reducida a un montón de bultos y gorras azules. […] Caminó despacio hasta el cuerpo desmayado. Su zapato rojo se posó con suavidad sobre la nariz del policía. Luego la trituró de un pisotón. Magali escuchó el agradable crujido del cartílago (VILLORO, 2006a, pp. 110-111).

A violência, o medo, a repressão policial e as drogas são o cenário a que

são submetidos vários jovens que transitam por esses textos. Com o avanço

das indústrias, o núcleo no qual se encontrava a cidade histórica, construída

em um território delimitado, é desterritorializada pela cidade industrial. Esta não

abarca um espaço específico e se expande com fábricas, bairros operários e

aeroportos, como aparece em “Espectros de la ciudad de México”. E diz o

narrador: “La dificultad de localizar una vastedad autocontenida, donde nada

queda afuera y el aeropuerto está casi en el centro, ha traído una peculiar

cultura compensatoria. Incapaz de lidiar con los desastres reales, el capitalino

los exagera para dominarlos como fábula (VILLORO, 2005b, p.7).

A desterritorialização é mencionada por Guy Debord como um

“transbordamento das cidades para um meio rural cheio de “massas informes

de resíduos urbanos” (Lewis Mumford), as quais são diretamente regidas pelos

imperativos do consumo” (DEBORD, 1997, p. 174). Em outras palavras, o

consumo provoca esse deslocamento.

Outro modelo de cidade de que trata García Canclini (1999) é a cidade

comunicacional, relatada por Villoro, levando em consideração que, para

construí-la, foi inevitável a destruição dos sítios arqueológicos

En un sitio donde la corteza terrestre responde a un pasado primigenio, ignorado por la superficie, no es de extrañar que las temporalidades se crucen. No hay forma de instalar líneas de teléfonos en el centro de la ciudad sin practicar una arqueología

Page 176: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

176

accidental. Aunque los técnicos no busquen otra cosa que un resquicio para sus cables de fibra óptica, encuentran puntas de obsidiana, noticias del mosaico indígena (VILLORO, 2005b, p.3).

A expansão da cidade através dos meios de comunicação aparece

também nesse texto, no qual se observa a necessidade de conexão para a

cidade continuar funcionando

La hipótesis de Virilio de que la ciudad moderna crece para derrotar el espacio y la posmoderna para apoderarse del tiempo ha encontrado un caso límite en México, DF. La velocidad se ha descartado del horizonte. Esto refuerza la importancia de la ciudad virtual: el 30% de la población ve televisión más de tres horas al día, y las principales formas de relación dependen de Internet y los teléfonos celulares, que en la última década superaron los diez millones de teléfonos fijos instalados a lo largo de un siglo (VILLORO, 2005b, p.5, grifo do autor).

Esse fato se dá principalmente porque os centros históricos perderam

habitantes nas últimas décadas, e a urbe se expandiu, multiplicando as

populações periféricas, onde a televisão e o rádio estão melhor distribuídos e

“difunden con más facilidad la información y el entretenimento a todos los

sectores” (GARCÍA CANCLINI, 1999, p.79). A cidade virtual da que trata Villoro

fora mencionada também por Milton Santos em Território e Sociedade (2000)

“O mundo entra em nossa casa com os jornais, as rádios, a telinha” (SANTOS,

2000, p.50). Toda essa conectividade leva ao último modelo de cidade

apresentado por García Canclini (1999), a cidade videoclipe, que aborda não

somente a relação física, mas também a imaginária e as múltiplas interações

que se geram na cidade. A literatura possui certamente uma parcela importante

na construção desse imaginário, destacando-se, então, a crônica, que se

caracteriza por sua condição híbrida, fronteiriça, ocupando o espaço entre a

literatura e o jornalismo.

O ritmo acelerado da cidade favorece a construção de suposições ou

viagens imaginárias provocadas por tanto tempo parado em engarrafamentos

dentro dos ônibus ou dos carros, ou deslocando-se em metrôs lotados.

La necesaria renuncia al movimiento ha traído extrañas formas de vida. La utopía del pasajero detenido no consiste en imaginar el imposible desahogo del tráfico sino que la ciudad se mueva en su beneficio. Llegará el día en que la mayoría de los habitantes estarán

Page 177: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

177

encallados y se vincularán a través de mensajeros capaces de correr largas distancias como los indios tarahumaras, o de repartidores de pizzas multiusos (en sus breves motocicletas llevarán un resumen del mundo, con hilo para coser y agua oxigenada) (VILLORO, 2005b, p.6).

Não há saída, tanto para aqueles que estão nos carros e ônibus, como

para os que se deslocam para os bairros periféricos de metrô, ou para os que

seguem para as zonas com bairros de classe alta. Todos estão presos nessa

longa viagem imaginária.

Por desgracia, la mayoría de los viajeros dormitan en la forzada convivencia del microbús o el vagón del metro, y el resto lucha por un trozo de ciudad abordo de un coche. Dos tribus inmensas se desplazan a diario, los sonámbulos y los insomnes: cinco millones de pasajeros van aletargados en el metro y cinco millones sufren ataques de nervios en los automóviles (VILLORO, 2007a, p. 2).

Neste cenário, os cidadãos são efetivamente interpelados por redes

midiáticas, que difundem imagens e leituras da cidade. No entanto, García

Canclini (1999), ao tentar averiguar a importância do imaginário na constituição

da cidade, principalmente no México, observa que a cidade se apresenta de

maneira diferente para diferentes habitantes e que há representações de

experiências comuns, mas também as disputas simbólicas “entre las clases, los

grupos y las etnias que componen una ciudad” (GARCÍA CANCLINI, 1999,

p.95). Villoro indaga sobre essa questão, tratando dos mais de seis milhões de

passageiros que viajam diariamente no metrô do México DF, destacando que

nesse meio de transporte são principalmente os menos favorecidos

financeiramente e que têm características muito específicas:

Pero el efecto último del metro no viene de la arquitectura sino de los hombres que viajan con rostros inexpresivos, como si los hubieran sobornado para trasladarse. Todos los días el Sistema de Transporte Colectivo desplaza a cinco millones de pasajeros. Aunque son muchos, han sido seleccionados. Bajar las escaleras eléctricas es ser testigo de una precisa segregación racial. Los que pueblan la ciudad subterránea son... -escoja su ultraje favorito- los morenos, los nacos, los indios, los mexicanos. [...] Para los dueños de la superficie el metro es algo que se toma en París. Abajo, la raza circula a velocidades posmodernas (VILLORO, 2002a, p.6).

Esses vagões superlotados possibilitam uma série de relações as quais

Villoro define nesses termos: “La ciudad es el cielo del metro. Bastión de la

Page 178: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

178

economía informal, sede de exposiciones, conciertos y ferias del libro, territorio

del faje, el suicidio o el nacimiento, el metro es una ciudad que se desplaza

(VILLORO, 2005d, p. 144).

Atualmente, o que deve levar em consideração não é mais a oposição

campo-cidade, mas a destruição de ambos, ou seja: “O desgaste recíproco da

cidade e do campo, produto da falha do movimento histórico pelo qual a

realidade urbana existente deveria ser superada, aparece nessa mistura

eclética de elementos decompostos que recobre as zonas mais adiantadas da

industrialização” (DEBORD, 1997, p. 174). Por um lado, a destruição da cidade,

que é o espaço da história e da concentração de poder, do outro, o campo,

com seu isolamento e separação como uma “forma de expressar o atraso de

uma subordinação da economia à consciência histórica” (DEBORD, 1997, p.

176). A noção de representação de conjunto da cidade se torna

frequentemente inviável.

Villoro parte da impossibilidade de abarcar o todo e enfatizando a ideia

de que sua cidade, muitas vezes, abarca várias dentro de uma, ou seja, é “un

territorio que excede la experiencia humana [...] un palimpsesto mil veces

corrigido [...] un caos [grifo nosso] que nos rebasa a diario con frenética

intensidad (VILLORO, 2002b, p. 1). Deste modo, afasta-se de Fuentes e

aproxima-se do “primer escritor libre del México moderno, el primero que

empieza a tomarse las grandes libertades y a decir las grandes barbaridades”

(BLANCO, 1982, p. 23). Trata-se de Carlos Monsiváis, o qual lê “no sólo como

un renovador de su género, sino como un precursor de la narrativa de las

generaciones posteriores” (RUISÁNCHEZ & ZAVALA, 2011, p.12), pois Villoro

sabe que necessita continuar narrando a cidade, não a de Fuentes, mas a

cidade em camadas, de céu cinzento, uma Blade Runner, talvez. Neste caso,

com improvisada imaginação política e estética, que inclui o artigo, a crônica e

o ensaio em sua composição prosística, com a mesma facilidade que absorve

os recursos da poesia, em um constante e consciente malabarismo

monsivaniano. Afinal, ele é o paisagista dessa cidade romanesca, pós-

apocalíptica, constituída por uma geografia insólita, quase irreal, na qual

passado e presente se entrelaçam, enquanto a Literatura e a História se

complementam.

Page 179: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

179

3.3 Rock e futebol: o massivo nas crônicas de Juan Villoro

En ambos casos, rock y fútbol, lo que me ha interesado más es cómo una forma de representar la realidad, transforma los hábitos, las emociones y el pensamiento de la gente

66.

Juan Villoro

É certo que muitas manifestações da cultura popular, por contornos

massivos que adquirem, tornam-se objeto de cobiça para o poder, e o rock e o

futebol como espetáculo não escapam disso. No entanto, não se pode deixar

de ler as manifestações massivas como objeto de crítica, principalmente

literária, pois é através do espetáculo que os conteúdos imaginários da cultura

se manifestam, ou seja, é através do estético que se estabelece a relação de

consumo (MORIN, 2011 e DEBORD, 1997). Deste modo, é possível afirmar

que a cultura de massa se apresenta como organizadora da crônica de uma

época. Neste capítulo, pretende-se apresentar uma discussão sobre a

influência dos meios massivos de comunicação através do gênero crônica nos

textos de Juan Villoro, utilizando o rock e o futebol.

Durante a década de 1950, surge nos EUA um movimento fascinante e

sedutor, que os sociólogos denominaram “contracultura”, a qual tinha como

proposta fundamental confrontar o sistema capitalista. Tal postura foi

estabelecida de maneira plena pela chamada Geração Beat. Os beats foram

identificados como um grupo de intelectuais inconformados com o pensamento

norte-americano da época, totalmente vertido para o consumismo, para a

aparência e para o descartável, pregavam a reafirmação do ser humano a

partir da espontaneidade, acentuando a busca de filosofias orientais e outros

tipos de conhecimentos.

A partir da década de 60 ocorreu o crescimento de movimentos

anticapitalistas provocados por diversas manifestações na Europa e nos

Estados Unidos. A geração beat, a explosão do rock, a revolta dos estudantes

franceses e as manifestações contra a guerra do Vietnam estavam

66

Trecho da entrevista cedida a Hugo Juárez em Futbol y rock, según Juan Villoro. Publicado en Revista Chilango de julio de 2016. Disponível em:

http://www.chilango.com/cultura/futbol-y-rock-segun-villoro/ Último acesso em: 29.05.2017.

Page 180: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

180

concretizando a consciência política dos jovens daquela geração, que exigiam

liberdade de expressão, tendo como resposta, entretanto, uma forte repressão

policial.

O rock é o resultado de uma manifestação sociocultural nascida nos

Estados Unidos e na Inglaterra em meados do século passado, simbolizada por

uma nova forma de música. Posteriormente, o rock and roll acabaria tendo

influencia em outras formas de cultura, como, por exemplo, a pop art na

América (os personagens de Andy Warhol). Já no início dos sessenta, o rock

havia se expandido por países europeus e latino-americanos. Esse fenômeno,

segundo Price (2011), “refleja en su contenido y forma cambios tecnológicos,

políticos y culturales” (PRICE, 2011, p. 262); por isso, é considerado uma

manifestação pós-moderna devido a:

su ubicación temporal, su identidad e [que] conserva todavía un

espíritu moderno, el espíritu de "la otra modernidad", pues surge

como revolucionario, contestatario, radical, innovador y lleno de

propuestas críticas y estéticas [...]. Las ideas de la modernidad

permanecen inmersas en su propia condición contracultural, aunque

su forma de existir se ubiquen la era posmoderna (VALDÉS

SAMPEDRO, 2009, p.2).

O movimento roqueiro demonstrou que, além de representar um

fenômeno de caráter musical, sua ampla capacidade de comunicação através

da mídia, foi capaz de transformá-lo numa poderosa manifestação de caráter

sócio-cultural. Tal efusão também possibilitou à juventude da época opor-se a

determinadas formas culturais, estilos de vida e vínculos sociais considerados

ultrapassados. No entanto, como ressalta Adrián de Garay (1989), trata-se de

um fenômeno extremamente “complejo, articulado por múltiples discursos,

prácticas e intereses que escapa frecuentemente a esquemas y teorizaciones

generalizantes” (DE GARAY, 1989, p. 117).

A referência ao rock aparece em várias crônicas de Villoro. Em Tiempo

transcurrido, todas as crônicas referem-se a esse assunto, o que já pode ser

observado desde a capa (anexo II) composta pelo desenho de uma guitarra em

formato de melancia. Em Safari accidental, no capítulo intitulado “Alto

volumen”, há quatro textos dedicados ao rock: “Los reyes viejos”; “Supongamos

que no existen los Rolling Stones”; “Peter Gabriel: el regreso del explorador;

Page 181: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

181

“Me sentí como un burócrata de Kafka”. Já em Los once de la tribu, mais dois

textos: “El diablo en la ciudad” e “Las piedras tienen la edad del fuego”. Além

disso, aparecem pequenas reflexões sobre o rock em diversas outras crônicas.

Nas páginas de Tiempo transcurrido, a representação da música é

transformada em instrumento de crítica social (Price, 2011). Nela, circulam

diversos personagens fanáticos por rock, com algo de arquétipo, criando uma

espécie de espelho de uma época. Há também uma crítica à tentativa de

incorporação da cultura americana através das canções; no entanto, como

aparece na crônica “1974”, eles não conseguem traduzir as letras, como

George, o protagonista: “No entendia las canciones en inglés pero se las

imaginaba. A su manera, logro traducirla estética de la violencia promovida por

el rock pesado” (VILLORO, 2006a, p.52). A obra faz referência também a

vários programas de televisão, de estações de rádio, filmes e espetáculos de

rock. Observa-se um aparente conflito entre a adesão a diversas formas de

consumo, pois há muitos elementos que são símbolos de consumo da

modernidade de uma época, principalmente para jovens: antena parabólica,

calculadora, o vídeo game Atari ou “la obsesión de los setenta: el Volkswagen

arreglado” (VILLORO, 2006a, p. 71) e, em sentido oposto, a crítica que se pode

perceber a respeito dessa massificação.

Ao traçar o caminho entre 1968 e 1985, as crônicas seguem o percurso

dos anos, mas se distanciam da historiografia mexicana tradicional. A partir dos

eventos históricos ocorridos, o cronista vai montando um painel que leva em

consideração a influência do rock e dos movimentos de contracultura no

México nesse momento. Como comenta Price (2011) “Villoro ha hecho del rock

un cronómetro para medir los cambios en la sociedad mexicana” (PRICE, 2011,

p. 261) E, mesmo mencionando que a obra “no tiene pretensiones de fresco

histórico ni de panorama representativo de una generación. He tratado,

simplemente, de imaginar historias a partir de ciertos episodios reales y de un

puñado de canciones” (VILLORO, 2006a, p.10), o autor exibe um panorama de

fatos notórios que dão conta de um período concreto da história nacional. É

importante considerar que há uma crônica para cada ano, com destaque para

os acontecimentos marcantes de cada um deles, associando-a, geralmente, ao

Page 182: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

182

crescimento, surgimento ou decadência de um cantor, de uma banda ou de um

grupo de rock.

Os grupos musicais, muitas vezes desconhecidos, transitam seus álbuns

e títulos de canções pelas crônicas com diferentes gêneros: rock clássico,

disco, balada, punk, blue e psicodélico e, como comenta Gutiérrez Torres,

“Cones e background musical como telón de fondo, asistimos a un recorrido

guiado por figuras que podríamos llamar ahistóricas y que ofrecen su

testimonio sobre aquellos hechos que los marcaron en los planos individual y

colectivo” (GUTIÉRREZ TORRES, 2013, p.1).

Tiempo transcurrido67 é também o nome que um dos principais grupos

de rock no México, Café Tacuba, utilizaram no ano 2000 para denominar seu

CD e DVD recompilatório. A homenagem foi feita por Joselo, um dos

integrantes do grupo, que havia lido a obra anos atrás e com quem Villoro já

havia composto algumas músicas.

As crônicas contam com um narrador que observa os fatos narrados

desde uma perspectiva irônica, como se percebe a partir das reflexões sobre a

esquerda e o escárnio do fanatismo de Mónica, uma jovem que se associa

recentemente ao partido comunista e espera, enquanto seu namorado, Lalo,

picha numa parede a frase “La-música-es-un-arma-de-la-revolución”

(VILLORO, 2006a, p.33). Mónica, estudante de sociologia, começa a reunir

símbolos, cartazes e obras como signos de conversão política, porém ninguém

alcança o nível de entrega que exige a depuração de seus gostos musicais e

literários, considerando todos ““apertureros”, “reformistas” o “eurocomunistas””

(VILLORO, 2006a, p. 36). Quando foi convidada, já depois de formada a dar

uma palestra sobre “arte militante”, revisou suas fichas e até mesmo Marx, de

quem somente leu pequenas citações, está fora porque não emitiu uma frase

sobre a responsabilidade do artista de fazer patente seu compromisso político

em cada obra: “Empezó a leer en ese momento, con rabia, casi con inquina.

Sus dedos volteaban las hojas con rapidez, como si quisieran sacudirles un

67

Em comemoração aos trinta anos de lançamento da obra, Fondo de Cultura Económica incluiu a gravação ao vivo, feita no Museo Universitario del Chopo do projeto Mientras nos dure el veinte; a proposta foi unir música e literatura, contando com a participação dos músicos Diego Herrera, Alfonso André, Federico Fong e Javier Calderón que musicalizaram alguns textos de Tiempo transcurrido.

Page 183: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

183

contenido adicional. _ ¡Pinche Reformista! – decía Mónica, y seguía adelante”

(VILLORO, 2006a, p.37).

O narrador retrata Lalo com esse olhar de quem observa contradições,

pois “Lalo terminó la carrera tres años antes que Mónica. Como sus actividades

de izquierdista-sin-partido (ya que ninguno era estrictamente marxista-leninista)

fueron tan notorias, pronto recibió una oferta para trabajar en la Conasupo68”

(VILLORO, 2006a, p. 35) e, a partir daí, “sus palabras favoritas empezaron a

ser “consenso” y “equilibrio” (VILLORO, 2006a, p. 36). Com esse personagem,

o cronista analisa e critica o posicionamento da esquerda no país, pois, após

aceitar um emprego numa empresa estatal com fortes indícios de corrupção,

ele muda de discurso. O narrador busca traços da vida cotidiana e reflete sobre

elas, sem procurar outra realidade, nem pretender encontrar dimensões

secretas. Villoro já havia declarado em entrevistas que lhe agrada trabalhar

com essa dimensão:

La otra característica que a mí me interesa mucho explorar en la crónica es la dimensión de lo cotidiano. Yo creo que incluso en los grandes sucesos, en las sublevaciones o los golpes de estado, hay elementos cotidianos que deciden la realidad. Nosotros creemos que una crónica es real cuando la sentimos como vida realmente vivida. Cuando la sentimos como algo que ante nuestros ojos se convierte en algo irrepetible, y la vida cotidiana es esencial para eso. Entonces me gusta hacer tanto crónicas que directamente sean de vida cotidiana, como crónicas que sean más noticiosas pero donde la vida cotidiana tenga algo que decir (VILLORO, 2012e, p.1).

Com essas características, o cronista demonstra que, como movimento

socio-cultural, o rock é importante para os jovens mexicanos de um pouco mais

de meados do século passado, pois contribuiu para que pudessem exercer o

controle sobre suas roupas, seus quartos, clubes, bares e discotecas, como se

observa na descrição do cronista, sobre um jovem dos anos setenta:

Él [Joaquín] fue de los visionarios que descubrieron que el futuro estaba en el pelo y pasó antes que nadie del “casquete corto” al “casquete largo desvanecido” y de ahí a la greña loca. Sus papás tuvieron que tolerar la decoración de su cuarto en el departamento de

68

A Compañía Nacional de Subsistencias Populares (Conasupo) foi criada nos anos sessenta com o objetivo de ajudar a população mais pobre do país. Segundo Guillermo Correa, esta instituição “ en los últimos tres sexenios se destacó como fuente de corrupción” (CORREA, 1998, p. 2), envolvendo vários governos.

Page 184: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

184

la colonia Narvarte: luz roja en el techo y luz negra sobre el marco de la puerta, tocadiscos en el piso, pósters fosforescentes, un cojín de estambre con la bandera de Inglaterra, una botella de Coca-Cola alargada y retorcida de la que salían flores de papel, botellitas de pachuli en el buró, campanas tintineando en la perilla de la puerta, una pipa de agua en el escritorio y tres varitas de incienso que lanzaban un humo color de rosa desde la cima del televisor (VILLORO, 2006a, pp.27-28).

Na crônica “1973”, o autor narra a vestimenta dos jovens Toño, Nabor e

Alvarito preparados para ir ao cinema “con sacos de terciopelo negro y

pantalones de presunta piel de leopardo. Los zapatos eran de charol. En el

pelo y en las solapas tenían lentejuelas, como si hubieran sido rociados por un

chipi-chipi de glitter [...]” (VILLORO, 2006a, p.47). Em seguida, comenta que

“La sociedad mexicana era lo suficiente liberada para aceptar el carácter misto

de la economía, los barrenderos vestidos de anaranjado psicodélico […], pero

tres personas con la elegancia […] de Toño, Nabor y Alvarito eran, simple y

llanamente, unos putotes” (VILLORO, 2006a, p.47). Depois desse comentário,

o autor relata o encontro dos rapazes com uns tipos viris e conclui: “Con varios

premolares menos y algunas costillas rotas, Toño, Nabor y Alvarito

abandonaron su intento de asumir la moda glam” (VILLORO, 2006a, p.47).

Nessas passagens, observa-se que o rock, a roupa e a caracterização do

quarto funcionam como um pretexto ou um pano de fundo para camuflar a

repressão e até situações de violência por que passavam os jovens naqueles

anos, e esses fatos aparecem em diversas crônicas dessa obra.

A cultura rock tem, a princípio, um duplo significado. Por um lado, há

certamente uma necessidade real de jovens que procuram mais liberdade. Por

outro, não se pode ignorar que existe uma indústria da música, do espetáculo e

da moda “cortando y limando en lo posible el “discurso” subversivo de aquello

que se encuentra y puede producirle ganancias” (DE GARAY, 1989, p.129). É

um processo dialético interessante, pois a indústria cultural (HORKHEIMER &

ADORNO, 2011) e o sistema social ao que serve se convertem em elemento

difusor da cultura que pretende canalizar e reprimir. Ou seja, os grupos de rock

muitas vezes utilizam a indústria cultural posta a sua disposição para difundir

uma série de propostas revolucionárias contra o sistema social imperante.

Entretanto, esse mesmo sistema consegue, quase sempre, cooptar tais

Page 185: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

185

propostas e readaptá-las. A crônica “1970” apresenta uma crítica a esse

aspecto mercantil, como um dos fatores que afasta Joaquín do rock:

Para Joaquín el rock era un artículo de fe; [...] Pero en México el rock sólo existía fugazmente y a precios prohibitivos. Una asociación de beneficencia contrató a los Animals para actuar en el teatro Metropolitán: cien pesos los boletos de arriba y doscientos los de abajo (VILLORO, 2006a, p. 28).

Os outros fatores foram: a morte de um homem negro pelas mãos dos

Hell´s Angels, contratados pelos Rolling Stones como guarda-costas em

Altamont, as mortes por orverdose de Jimi Hendrix e de Janis Joplin e o exílio

de soldados americanos que procuraram refúgio no México. Tais

acontecimentos diminuíram a fé no rock, mas, como ressalta Price (2011): “la

gota que finalmente derrama el vaso es el rompimiento de los Beatles” (PRICE,

2011, p. 280). E Joaquín muda completamente:

Cuando supo que el cuarteto se había SEPARADO PARA SIEMPRE, puso un anuncio en el Aviso Oportuno de El Universal y la gente llegó a su departamento en la calle de Petén a llevarse discos a precios regalados. También vendió sus collares de chaquira y la placa de Carnaby Street que tenía en la pared. Por primera vez en años permitió que alguien le cortara el pelo como fuera, empezó a dejar la mariguana, entró a estudiar administración y se volvió fanático del fútbol (VILLORO, 2006a, p. 31, destaque do autor).

Segundo Adrián de Garay (1989) o rock mexicano tem três períodos

diferenciados. O primeiro ocorreu no final dos anos cinquenta e no início dos

sessenta. Caracterizou-se como uma cópia exata traduzida ao espanhol do

rock elaborado nos Estados Unidos e, sobre esse período, destaca: “Claro que

los grupos mexicanos tuvieron el mérito de haber sido los primeros en vocalizar

en castellano; pero también fueron, lamentablemente, los primeros en guardar

silencio cuando era necesario continuar con el grito” (DE GARAY, 1989, p.126).

O segundo, no final dos anos sessenta e princípios do setenta, surgiu em meio

ao movimento estudantil de 1968 com composições próprias, porém em inglês.

Sobre esse período, comenta Alberto Pulido Aranda (2008) “Durante el ya

mítico 1968, el rock se endurece y acelera. Las baladas y los cantos dedicados

a las flores, o al tan en boga binomio de la paz y el amor de los “hippies”,

empezaron a cederle terreno a los mensajes más violentos y contestatarios”

(PULIDO ARANDA, 2008, p.36). O último período ocorre no final dos anos

Page 186: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

186

setenta em diante. Nele, renascem grupos estrangeiros que acabaram

reforçando o rock mexicano, passando a caber aí também todas as tendências.

Em setembro de 1971 ocorreu o evento conhecido como Woodstock

mexicano: o Festival de Rock y Ruedas de Avándaro ou, simplesmente,

Festival de Avándaro. Esse concerto, que reuniu um número incerto entre

duzentas e trezentas mil pessoas (HERNÁNDEZ CHELICO, 2011;

CASTAÑEDA, 2014), apesar de não ter ocorrido nenhum problema grave

durante o festival, acabou contribuindo para que o rock no México fosse

renegado à clandestinidade, pois o governo, que já vinha endurecendo a

repressão sobre qualquer tipo de reunião de jovens, aproveitou alguns

episódios de falta de organização ocorridos no evento para impedir outros

espetáculos de rock no país:

Después del concierto se llevó a cabo una campaña en los medios de comunicación para difundir el supuesto libertinaje y desenfreno de más de 250 mil jóvenes. A partir de ese momento, el gobierno prohibió las presentaciones en vivo, lo que orilló a las bandas a crear espacios subterráneos que con el tiempo fueron conocidos como “hoyos funky”, que consistían en viejos edificios abandonados o en desuso, como bodegas o locales vacíos en distintos barrios (CASTAÑEDA, 2014, p.1).

O governo proibiu também as transmissões pelo rádio, a produção e a

venda dos discos de bandas de rock nacional, usando a polícia para reprimir os

roqueiros. Essa situação permaneceu durante algum tempo, pois “Fue apenas

en las décadas de los ochenta y noventa que se dio una gradual reinserción del

rock en la vida cultural nacional. Desde el concierto de Avándaro, en México no

se ha realizado un concierto de tales magnitudes” (CASTAÑEDA, 2014, p.1).

Por isso, é significativo que Villoro tenha sido roteirista radiofônico de um

programa de rock e também crítico desse tipo de música no final dos anos

setenta, como já declarou em entrevistas e como comenta o narrador sobre o

protagonista da crônica “1978”: “Chucho escogió una profesión suicida: ser

crítico de rock en México” (VILLORO, 2006a, p. 73), ou “Escribir al sol” de Los

once de la tribu: “En 1979 era guionista del programa de radio El lado oscuro

de la luna y fui invitado por Huberto Batís y Fernando Benítez a escribir crítica

de rock en el suplemento Sábado, de Unomásuno” (VILLORO, 1998, p.9).

Page 187: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

187

Villoro, como crítico de rock desde a década de 1970, deixa transparecer

alguns elementos autobiográficos, principalmente na crônica “1968”. Gus, o

protagonista, vive na Colonia del Valle e passa pela experiência desse período

desde as margens, pois tinha doze anos, a mesma idade que tinha o autor. Ele,

assim como Gus, tinha uma banda de rock denominada Fusifingus69 Pop, como

comenta o cronista em entrevista a Concepción Moreno (2009): “Era uno de los

muchos grupos de la colonia que había por entonces, estaba de moda hacer

conjuntos y tocar en fiestas. Nunca tuvimos siquiera una guitarra eléctrica: yo

tocaba la pandereta” (VILLORO apud MORENO, 2009, p.2). Além dessas

referências, há outras, como a que aparece na crônica “1984”, na qual o

protagonista leu De perfil, de José Agustín, a quem também é dedicada a obra.

As crônicas desse livro oferecem um pertinente painel social sobre

temas de repressão governamental, como o espancamento sofrido por Tomás

na crônica “1969”; a violência policial e a rigidez social que atinge Toño, Nabor

e Alvarito; a liberdade sexual das mulheres, com o início das pílulas

anticoncepcionais: “Rocío seguía siendo la misma: ni muy-muy ni tan-tan [...].

En su bolsa llevaba sus pastillas de Microgynon 21, y las tomaba sin poderse

decidir entre un rorro como Pedro, alguien tan ingenioso como Carlos o […]

como Jaime” (VILLORO, 2006a, p. 66); os castigos físicos, comuns,

principalmente nas escolas religiosas “[...] recibieron una educación católica,

acompañada de neolitazos, el castigo local del Tepeyac, que consistía en

azotar las nalgas del alumnado con una tira de auténtico hule Neolite”

(VILLORO, 2006a, p. 44) ou a repressão estudantil que se observa nas

primeiras crônicas e são substituías pela brutalidade da polícia nas demais,

além da decadência da esquerda e a impossibilidade de viver plenamente o

rock no México.

Além dos espaços públicos, nos textos aparece também o que García

Canclini (1999) chama de microespacios, que podem ser “los salones de baile,

que son importantes como lugares de agrupamiento geracional en la ciudad de

México, así como los sitios donde se hacen recitales rokeros, los hoyos fonkis y

otros semejantes” (GARCÍA CANCLINI, 1999, p. 92). Esses microespaços

69

O nome da banda foi inspirado em uma flor psicodélica da história em quadrinhos, publicada pela primeira vez em 1935, La pequena Lulú (Luluzinha).

Page 188: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

188

estão representados nas crônicas pelos “hoyos fonqui”, que aparecem em

Tiempo transcurrido e Los once de la tribu. Nelas, o cronista narra a

experiência urbana de sujeitos marginais, que fogem de um padrão

estereotipado de beleza, colocando-os no centro de uma estética

contracultural, como diz Alicia Susana Montes: “Lo antiestético estético, es un

bastión de lucha a nivel simbólico y un espacio de visibilidad que rechaza y

refuta los rótulos, y el programa de vida que las élites, que sienten horror o

piedad por las clases populares, les han asignado” (MONTES, 2012, p. 273).

Há uma irônica caracterização dos roqueiros, separando os que

frequentam os “hoyos fonquis”, como os dos bairros mais pobres daqueles de

famílias abastadas. Alfonso pertence a este segundo grupo, vive numa zona

geograficamente privilegiada nos Jardines del Pedregal, em um bairro onde as

ruas têm nomes bucólicos, não trabalha, estudante do “Ibero”, uma das escolas

mais caras da cidade e é cristão. A descrição da participação desses jovens

endinheirados no movimento punk é extremamente ácida e caricaturesca:

Logró que su rostro adquiriera una expresión desencajada, de enfermo de salmonelosis y se mandó traer de Inglaterra lentes de soldador, chamarras llenas de zíperes diagonales, tintes para el pelo y alfileres que simulaban atravesar la mejilla. Una vez equipado, viajó a Nueva York y a Londres (VILLORO, 2006a, p. 58).

No subúrbio, em San Cristóbol Ecatepec, está George em uma casa

com “techos de lámina” (VILLORO, 2006a, p. 49), trabalha em um pequeno

armazém que vende tintas e outros materiais de construção a varejo, material

este que também será usado para os jovens se drogarem: “George trabajaba

de mozo en una tlapalería. Entre semana se la pasaba sirviendo tíner en

botellas de Coca-Cola, y blanco de España en cucuruchos de periódico”

(VILLORO, 2006a, p. 49). Essa crônica demonstra como um jovem de bairros

mais afastados que assistia filmes de catástrofes e mulheres nuas em

pequenos cinemas, entra em contato com os “hoyos fonquis” e suas músicas

de protesto. Tudo isso passa a ser associado a uma situação econômica

desfavorável, transformando-o no personagem apresentado no trecho abaixo:

La sencilla brutalidad de ese sonido borraba las pegajosas jornadas en la tlapalería. [...] Poco a poco se fue adentrando en el mundo de los conjuntos ingleses y norteamericanos que eran imitados en los

Page 189: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

189

hoyos. [...] el contacto con el rock le hizo darse cuenta de que podía llevar un estilo de vida propio. Antes se vestía como fuera; si le regalaban un suéter lo usaba; si se le rompía el pantalón le cosía un parche. Ahora quería usar ropa estropeada a propósito: él era distinto: tenía una camisa rebanada en el ombligo, chaleco de mezclilla, un collar con una bala calibre 30-06 (VILLORO, 2006a, p. 51).

Essas crônicas demostram também que a experiência da música é

unificadora, sendo capaz de incluir pobre ou rico, indígena ou mestiço, além de

letrados e analfabetos. Nelas, aparecem diversas bandas que tocavam nos

“hoyos” “Enigma, Semilla de Amor, Ataúd Blindado, los Dug Dug´s, Hangar

Ambulante y Three Souls in My Mind” (VILLORO, 2006a, p. 50). Esta última é

considerada a mais radical “Hasta antes de los ochenta, sólo Three Souls in My

Mind realizó canciones con giros políticos, diciendo lo que pensaban sin temor

a represalias (DE GARAY, 1989, p.126). E também foi uma das bandas que

tocavam 1968: “Pocos lo recuerdan, pero el primer concierto de Alex Lora con

el Three Souls in my Mind fue el 12 de octubre de 1968 (Datos tomados de

Victor Roura en “Tri Souls: Negros del corazón”)” (PULIDO ARANDA, 2008,

p.49). No entanto, observa-se que as crônicas vão se transformando e

procurando demostrar que “el rock perdió su carácter rebelde y político y se

convirtió en un interminable ejercicio de narcisismo. Y, justamente, se nota la

pérdida de compromiso político en la música a medida que transcurren las

crónicas” (PRICE, 2011, p. 274). Fato que também pode ser visto nas crônicas

de Safari accidental. Em “Los reyes viejos”, o cronista inicia com uma

caracterização de Elvis para ressaltar a sua transformação em uma figura

midiática

las capas de satín vigorosamente tisú, el cetro de joyas de fantasía, la mansión tapizada de poliéster [...] y los pañales desechables que se vio obligado a usar en los últimos años de su mandato, el Rey del Rock & Roll tiene garantizado un nicho de terciopelo en el panteón de la cultura de masas (VILLORO, 2005a, p. 65).

De maneira um tanto nostálgica, o cronista comenta essa relação de

músicos do rock que, inicialmente, haviam tido uma postura política e a

expressavam através de suas canções; entretanto, com o tempo, houve um

abrandamento e até certo distanciamento desses temas, como se observa na

reflexão do autor entrecruzada com a voz de Peter Gabriel:

Page 190: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

190

Hoy en día las estrellas de rock con ansias de cambiar el mundo luchan lejos de sus escenarios habituales. Sting se adentra en el Amazonas, Bono recorre África en compañía del Secretario del Tesoro estadunidense, Gabriel colabora con Amnistía Internacional o las ramas filantrópicas de consorcios como Disney o Reebock. Se diría que los músicos se han vuelto políticos en sus horas extra: “La situación ha cambiado mucho desde los sesenta”, la voz de Gabriel no sube de tono al hablar de conflictos sociales; “ahora la música mueve menos cosas por sí misma: la radio depende de intereses comerciales, el pop ha dejado de ser radical y la televisión es un desastre. […] Pero precisamente porque es difícil cambiar las cosas hay que hacer algo” (VILLORO, 2005a, p. 102).

Em “El diablo en la ciudad”, uma crônica cujo cenário é 1995, alguns

dias antes do primeiro concerto dos Rolling Stones no México, é, assim como

outras crônicas do autor sobre essa banda, uma demonstração de humor,

ironia e escárnio. Enfim, uma diatribe como se observa:

El mejor instrumento para medir el atraso con que el rock ha llegado a México es la cara de Keith Richards: hoy conoceremos en vivo su cutis de reptil, el más célebre curtido facial de la cultura popular, lo que los incendios interiores pueden hacerle a una cara sin aniquilarla (VILLORO, 1998, p. 31).

O narrador compara o atraso da chegada do rock ao país com a falta de

vitalidade facial do roqueiro. É importante assinalar o contexto histórico em que

desembarcam os “Rolling Stones (o sus restos)” (VILLORO, 1998, p.31), pois,

meses antes, o México havia assinado a TLCAN e “llegan al país que se vende

a mitad de precio” (VILLORO, 1998, p.31), mencionando a desvalorização da

moeda mexicana em 1994. Em seguida, percebe que o cronista se identifica

com o narrador e faz uma longa reflexão do rock vernáculo, mencionando que

o rock pesado dos Stones se manteve vivo graças aos “hoyos fonquis” e a

grupos como o Three Souls in My Mind: “El rock vernáculo se refugió en

bodegas con techo de lámina mientras la petrolera clase media se abismaba en

la música disco y las voces constipadas de los Bee Gees”. Depois destaca que

os verdadeiros fãs não poderão entrar no espetáculo no país:

Hoy en la noche, muchos devotos del conjunto quedarán fuera de las alambradas por la sencilla razón de que los boletos equivalen al ingreso anual de una familia tzotzil o a la quincena de un profesor universitario. Quienes sí pudieron hacerse de una magna entrada, llegarán a la Magdalena atraídos por la pasión proustiana de revisar el pasado durante 22 canciones, la curiosidad de ver a los monstruos en su freak-show, la búsqueda de una elegante decepción: respirar el mal aliento de los héroes, quitarle vendas a las momias. El clima de expectación apenas tiene que ver con la música. El Gran

Page 191: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

191

Acontecimiento parece concebido por Franz Kafka & Asociados: la espera ha sido eterna; después de treinta años el agrimensor entra al castillo. ¿Qué chiste tiene ver a los archidecanos? Hace una década los Stones eran los cuarentones que no necesitaba el rock. Billonarios, embrutecidos por las drogas finas y las excelsas mayonesas del jet-set, los veteranos de un arte enemigo del envejecimiento parecían haber tomado en serio el graffiti situacionista: "Larga vida a lo efímero" (VILLORO, 1998, pp. 31-31).

Nesse parágrafo, o cronista critica a situação financeira em que se

encontra o país, a sociedade mexicana, a música e os músicos. E, como se

observa com a evocação do movimento situacionista, trata-se de uma reflexão

sobre o processo de reificação do rock através dos “reis velhos” e a desilusão

provocada pelo não cumprimento das promessas do rock and roll que o grupo

representa. Observa-se como o rock, que se iniciara como uma manifestação

contracultural, tornara-se popular e, com os anos, havia passado a ser um

produto em contato com a grande indústria do entretenimento, privilegiando

aqueles que pagam altos preços. No término da crônica, o autor rememora

uma frase do poeta Gottfried Benn e convida a sociedade do espetáculo a mais

um concerto, que, pela chamada, não parece ser de rock:

El poeta Gottfried Benn ofrece una clave para las pasiones de esta noche: "Quien ama las estrofas, también ama las catástrofes; quien está a favor de las estatuas, tiene que estar también a favor de las ruinas." En unas horas sabremos lo que hay detrás de la frase más conocida para conjurar el tiempo: "¡Damas y caballeros: los Rolling Stones!" (VILLORO, 1998, p. 37).

O rock, segundo Villoro, mesmo sendo expressão de uma cultura de

massa, não havia chegado ao México amplamente (VILLORO apud FLORES,

2014). Ele ressalta, então, que esse estilo musical havia começado como um

movimento contracultural, como uma oportunidade de mudar comportamentos,

mas havia perdido esse caráter ao longo dos anos, como pode ser observado

no transcurso das crônicas. Morin comenta (2011):

a cultura de massa se adapta aos já adaptados e adapta os adaptáveis; isto é, integra a vida social em que os desenvolvimentos econômicos e sociais lhe fornecem seus humos; a revolta adolescente não consegue resistir muito tempo e deve sofrer a integração na nova e grande camada consumidora que adere ao novo modo de vida (MORIN, 2011, p. 167).

Esse modo de vida mencionado por Morin (2011) é percebido também

nos textos de Villoro. Como as crônicas utilizadas como corpus traçam um

Page 192: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

192

percurso histórico entre os anos finais da década de setenta aos primeiros de

dois mil, com as quatro coletâneas de crônicas do autor, nota-se que, nelas,

também, ocorre essa “adaptação”. Seus escritos apresentam como tema cada

vez mais o imperialismo de uma sociedade consumidora, a ditadura da

aparência, não centrando a discussão somente na cultura de massa, mas nos

efeitos do capitalismo, da globalização e do neoliberalismo. Por isso, não

somente o rock, mas o futebol, a televisão, o concurso de miss, as marcas

como “apple”, o parque temático da Disney, o espetáculo, enfim, concentra os

temas de suas crônicas.

Na crônica “1970”, o narrador demonstra sutilmente o momento em que

o futebol vai ganhado espaço no imaginário mexicano, impulsionado

principalmente pelo campeonato Mundial realizado naquele país, “Cuando el

Halcón Peña70 cobró el penalti que no pudo detener aquel portero de shorts

negros y sudadera roja, México venció a Bélgica y Joaquín supo que había

encontrado una afición capaz de sustituir al rock” (VILLORO, 2006a, p. 27).

O futebol organizado e profissional é um produto do desenvolvimento do

capitalismo, um espetáculo e uma mercadoria, que, como menciona Eduardo

Santa Cruz (1991) “puede ser visto como análogo a otros fenómenos

generados por la industria cultural moderna” (SANTA CRUZ, 1991, p.13). Esse

esporte, ao longo dos anos, foi-se adequando a uma realidade mundial

caracterizada por alguns como própria para o capitalismo desenvolvido de

consumo. No entanto, observa-se que o futebol se colocou de maneira

contraditória desde a sua concepção inicial, uma vez que surgiu baseado em

organismos sociais próprios da sociedade civil, como sindicatos de operários.

Com o tempo, abandonou esse viés e transformou-se em empresa, objetivando

a rentabilidade e impulsionando preços no mercado futebolístico a nível

internacional. Por outro lado, muitos aficionados ainda guardam essa primeira

concepção do esporte, como as “peladas” com amigos e parentes nos

campinhos dos bairros. O narrador de Dios es redondo, em uma reflexão sobre

esse movimento contraditório diz:

70

Gustavo Peña Velasco, conhecido como Halcón Peña. Capitão da seleção mexicana da Copa de 1970.

Page 193: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

193

El arte de patear puede caer en la esfera de los placeres inofensivos o desembocar en el fanatismo del hooligan, la prepotencia del directivo, la mentira prefabricada de la televisión. Espejo del mundo que comienza más allá de los estadios, el juego de las patadas no es ajeno a la violencia, el racismo o la comercialización. La aporía del aficionado es la de una pasión pura, incontaminada, refractaria al efecto de la cerveza, las burlas de los enemigos y la manipulación de los medios. Eso, que rara vez existe, es el motor rescatable y esencial del fútbol. Lejos de los fichajes multimillonarios, en una playa sin nombre alguien patea una pelota o algo que la representa (un bulto de trapo, una lata, una bolsa llena de papeles) (VILLORO, 2006b, pp. 22-23).

Adorno e Horkheimer, entre outros, declaram em seus escritos que o

que se faz e o que se omite no tempo livre estão determinados pela sociedade

capitalista. Esse tempo é aproveitado pela indústria do entretenimento, que

controla e manipula os indivíduos. Seguindo nessa linha, o futebol organizado

seria uma parte dessa indústria, que impede o indivíduo de ser autônomo e

independente.

Não cabe dúvida de que as classes dominantes sempre tentarão manter

o controle sob as classes menos abastadas, principalmente nos espaços da

cotidianidade, e isso não é uma exclusividade do futebol, mas de qualquer

fenômeno cultural onde haja as massas populares. Ou seja, discriminar esse

esporte como um meio para discutir literatura, seria reduzi-lo a somente uma

dimensão, pois a leitura é, e não somente uma forma de mobilizar o lazer.

Que jogo e espetáculo impulsionam uma parte do lazer moderno não é

nenhuma novidade, talvez o novo seja, como diz Morin (2011): “é a extensão

televisionaria ou teleauditiva do espetáculo, abrindo-se até os horizontes

cósmicos, são os progressos de uma concepção lúdica da vida” (MORIN, 2011,

p.61). As técnicas dos meios massivos de comunicação contribuem para a

criação de uma espécie de espectador destacado fisicamente, passivo,

reduzido, impossibilitado de refletir “Também é espectador o leitor do jornal e

da revista” (MORIN, 2011, p. 61). Como no cenário descrito por Guy Debord

(1997), a sociedade não existe para ser vivida, mas para ser representada.

Observa-se que nos jogos de futebol, por exemplo, muitos preferem a

experiência mediada por anúncios publicitários, visualizar um drible importante

mais vezes, sem risco da violência dos estádios e assim por diante. A crítica de

Page 194: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

194

Debord encontra-se nesse momento, no qual um sujeito deixa de ser ator para

ser um receptor, um ente passivo.

Como comenta Villoro, citando o relato «Esse est percipi» de Borges e

Bioy Casares que “reúne dos defectos del fútbol: la supremacia de la televisión

y los engaños de la nostalgia” (VILLORO, 2006b, p.61). Talvez o problema não

seja a influência dos meios para afiançar ou manter a popularidade de

jogadores, equipes e treinadores, ainda que artificialmente, nem a dimensão de

espetáculo que adquire, mas até que ponto este articula com outros sentidos

de dimensão política, social e cultural.

A crônica sobre futebol, nesse sentido, por sua tessitura, pelo veículo de

circulação, a linguagem e o meio de divulgação dá ao torcedor-leitor e ao

narrador a possibilidade de escutar a voz coletiva de uma época e de uma

sociedade a partir de uma partida ou de um fato ocorrido com um jogador ou

time, onde está em jogo não somente a relação honra, perda e continuidade,

mas também o homem e a sociedade. Um exemplo do anterior é a crônica

“Barbosa: el hombre que murió dos veces”, no qual, a partir do enterro do

goleiro Moacyr Barbosa, o primeiro goleiro negro da seleção brasileira, o

cronista rememora a glória e a condenação a que ele foi submetido,

representado com o caixão coberto apenas com a bandeira do extinto

Ypiranga: “En un país donde los futbolistas alcanzan el rango de semi-dioses,

Moacyr Barbosa fue despedido como un fantasma” (VILLORO, 2006b, p.66). A

bandeira do Vasco da Gama, time que jogou por muitos anos e conquistou

vários títulos, chegou minutos antes do término do enterro. Ao resgatar essa

memória coletiva e discutir através do texto as questões econômicas, pois

Barbosa recebia “una pensión de 85 dólares mensuales” (VILLORO, 2006b,

p.68) e o preconceito racial que contribuiu para o esquecimento do jogador

“Los prejuiciosos que nunca faltan lo acusaron de carecer del temple de los

jugadores blancos” (VILLORO, 2006b, p.68), esta crônica possibilita reavivar

uma memória coletiva, inclusive de quem não estava no estádio e não assistiu

posteriormente a partida, pois “Más de medio siglo después, millones de

brasileños recuerdan el partido. Incluso quienes no lo vieron conocen el

episodio que paralizó a un país” (VILLORO, 2006b, p.68). Certamente, a

crônica contribuiu para manter viva essa memória.

Page 195: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

195

Villoro, que já jogou no futebol de base no Pumas, ressalta que,

frequentemente, um crítico se questiona por que não há grandes romances

sobre esse esporte e comenta: “La respuesta me parece bastante simple. El

sistema de referencias del fútbol está tan codificado e involucra de manera tan

eficaz a las emociones que contiene en sí mismo su propia épica, su propia

tragedia y su propia comedia” (VILLORO, 2006b, p.21). Supõe-se assim que o

futebol não deixa espaço para a inventiva do autor. Nesse contexto, a crônica

retoma o que já foi notícia através de um fragmento que permaneceria em

silêncio se não fosse através desse resgate. Assim como a música, o futebol

aos domingos, as noites de boxe, o cinema, recuperam toda essa cotidianidade

carregada de símbolos, como Marlon Brando e Marilyn Monroe, ídolos como

Pelé ou Garrincha e ícones como Elvis Presley ou Jimi Hendrix, que ficaram

em silêncio, são resgatados nessas narrações (DÍAZ ZULUAGA, 2014, p. 32).

O futebol, assim como outros elementos massivos, funciona como

veículo de construção e afirmação do imaginário cotidiano que entra em

contato com outro meio que também pretende ser cotidiano como, a televisão,

que Monsiváis denomina como “la caja idiota” e Villoro comenta que: “La

televisión es, en su mayoría, un territorio de la banalidad, un estímulo del

consumo, un proyecto de formación de conductas intrascendentes y una

colorida perpetuación de la nada (VILLORO, 2011a, p.19).

Alguns escritores, entre eles Osvaldo Soriano, Roberto Fontanarrosa e o

próprio Villoro, reconheceram a frustração de não terem conseguido ser

jogadores profissionais, e, no caso de Fontanarrosa, foi o que o levou à

literatura. De maneira concreta, ele comenta que seus heróis, quando era

adolescente, não foram os escritores, e sim os jogadores de futebol, como

Ermindo Onega71. Villoro comenta essa relação entre futebol e a literatura: “Y

es que el fútbol es, en sí mismo, asunto de la palabra. Pocas actividades

dependen tanto de lo que ya se sabe como el arte de reiterar las hazañas de la

cancha” (VILLORO, 2006b, p. 21).

Como se pode observar com ambos os trechos destacados, o futebol é

também palavra, ou seja, pode ser revelado como um ato de fala: “El juego

71

Ermindo Onega, jogador do River Plate.

Page 196: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

196

sucede dos veces, en la cancha y en la mente del público” (VILLORO, 2006b,

p.13). O escritor e o público leitor resgatam a oralidade e a memória coletiva

das glórias e fracassos compartilhados através do texto. Essa é uma

característica das crônicas de Villoro, não narra somente os acontecimentos,

mas as opiniões, as reflexões, muitas vezes coletiva, dos eventos.

É certo que nem todos os escritores nutrem apreço por esse esporte,

nem pela literatura sobre esse tema. Nas primeiras linhas da crônica “Los once

de la tribu”, cuja obra tem o mesmo nome, o cronista comenta: “Aunque no

todos lo confiesen, numerosos escritores leen el periódico a la manera de

Samuel Beckett: un veloz repaso a los desastres de la Tierra y un minucioso

estudio de la tabla de goleo” (VILLORO, 1998, p. 127). Nesse texto, segue

comentando as críticas feitas por Oscar Wilde e George Orwell sobre esse

esporte: “el gusto y el asco, los aficionados y los “sobrevivientes”, Beckett y

Orwell” (VILLORO, 1998, p. 128). Em uma conversa sobre futebol e literatura,

Jorge Valdano discorre sobre teorias da desconfiança de escritores com o

esporte e destaca três razões: “la desconfianza que la izquierda le tiene al

fútbol, la desconfianza que los intelectuales le tienen a las masas y la

desconfianza que la mente le tiene al cuerpo. Son sólo unos cuantos los

escritores que han sabido traspasar esas barreras” (VALDANO apud GÓMEZ,

2007, p.1).

Segundo Santa Cruz (1991), para aqueles que conseguem transpassar

a barreira da suspeita e da condenação, o futebol pode ser abordado por duas

dimensões: “como fenómeno propiamente histórico, pertenecen las estructuras

que lo gobiernan como espectáculo-mercancía y al fútbol, como fenómeno no

histórico, corresponde el sistema como ceremonia-acontecimiento” (SANTA

CRUZ, 1991, p.16). Na primeira dimensão, privilegia-se a História econômica e

social; na segunda, a vida simbólica e individual. No entanto, é importante

destacar que ambas são importantes, principalmente para a análise de

fenômenos culturais como o futebol, que apresentam práticas complexas e

multifacetadas. Por isso, “el fútbol como expresión cultural masiva no es

reductible a su dimensión de negocio o mecanismo evasivo, como tampoco es

posible olvidar estas facetas tras una mistificación idealizada (SANTA CRUZ,

1991, p.19). Para tentar dar conta desse fenômeno talvez seja adequado

Page 197: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

197

centrar a discussão na prática sócio-cultural. No entanto, como comenta Jaime

Marroquín, não se pode esquecer que, para Villoro, “Parte de la racionalización

del juego es mostrar su importancia política” (MARROQUÍN, 2011, p.252).

Em “Infancia en la Tierra”, Villoro apresenta quatro adversários do

esporte que preocupam a todos os que têm “devoción futbolera”: “La defensa

de hierro, el comercio del fútbol, el poder político y los aficionados de la sangre”

(VILLORO, 1998, p. 148). É certo que já houve tentativas e até êxito no

controle do esporte e também na sua utilização como arma política. Com

relação ao comércio do gol, o cronista destaca a participação de um dos mais

famosos diretores da FIFA “El eterno jerarca, Joao Havelange, ha subordinado

el fútbol a la caja registradora” (VILLORO, 1998, p. 148). Entre as propostas

apresentadas por Havelange para deixar o esporte mais rentável estão a

ampliação das traves e descansos a cada quinze minutos para abrir espaço

para comerciais. Com relação ao controle político, Villoro cita dois casos

emblemáticos: a operação “Mãos limpas”, que investigou a ligação entre o

futebol e o sistema político italiano na década de 1990 e o Mundial de 1978 na

Argentina. Como diz Beatriz Sarlo: “foi construído um apaziguamento popular

em um país de desaparecidos e de campos de tortura” (SARLO, 2005, p.122).

Villoro destaca que o Mundial

fue casi un “experimento controlado de manipulación política. [...] En lo que toca al uso del fútbol en la política exterior argentina, pocos análisis son tan precisos como el de la comunicóloga canadiense Joyce Nelson. […] Nelson rastrea el trabajo que la compañía West Nally Ltd, con sede en Montecarlo, realizó para mejorar la imagen pública de los militares durante el Mundial. Antes de la contienda, la prensa había insistido en el tema de los desaparecidos y los derechos humanos. En 1978 una hábil campaña de presiones y cabildeo en los medios transformó el panorama: en los 60 periódicos más importantes de Estados Unidos, las noticias de Argentina se relacionaron en 25 ocasiones con el fútbol y sólo en tres con los desaparecidos (VILLORO, 1998, pp. 149-150).

Como se observa nos trechos citados, Villoro é um autor que transcende

sua experiência futebolística conduzindo-a até outros assuntos, introduzindo

discussões e reflexões sobre a política, a economia e a cultura. Sobre a

inauguração do estádio Azteca no Mundial do México em 1986, o cronista

comenta que o futebol transformou a massa. Como comprova Elias Canetti

Page 198: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

198

(1995), nem sempre massa tem sentido negativo, pois ela pode descobrir uma

voz própria e uma consciência crítica. Ele cita, então, dois momentos ocorridos

no país nos quais se percebe o despertar da sociedade civil mexicana:

Un año antes, el presidente Miguel de la Madrid había sido incapaz de enfrentar la contingencia del terremoto en el Distrito Federal. Se negó a recibir ayuda exterior y aportó muy poco para solucionar la catástrofe. El pueblo se volcó a las calles y reordenó las piezas de la ciudad rota, rebasando con mucho los esfuerzos oficiales. Esa misma gente encaró al mandatario en el estadio Azteca y lo recibió con una zona rechifla. No es exagerado decir que ahí nació una sociedad civil consciente de su poder que emprendería la larga marcha para derrocar al PRI 14 años después (VILLORO, 2006b, p. 29).

Até o momento, Villoro publicou duas coletâneas de crônicas sobre

futebol: Dios es redondo (2006b), Balón dividido (2014c), além de Ida y vuelta,

publicada em 2010 com colaboração de Martín Caparrós, três em Los once de

la tribu (1998) e diversas reflexões sobre o esporte, em Safari accidental

(2005a), Tiempo transcurrido (2006a) e outros textos dispersos em diversos

meios. Entretanto, para quem se escrevem as crônicas de futebol? No prólogo

de Dios es redondo, comenta que:

He querido escribir para los seguidores del fútbol, pero también para sus críticos; para quienes no se interesan en los goles pero buscan comprender el delirio a través de la literatura. […]. Mi interés ha sido captar la pasión por el juego. Leo con fervor a los periodistas deportivos pero en el momento de narrar trato de seguir el épico consejo del dramaturgo y cronista Nelson Rodrigues: «y si los datos no nos acompañan, peor para los datos» (VILLORO, 2006b, p. 13).

Em “Los once de la tribu”, complementa que:

Las crónicas de fútbol son para la fanaticada, la masa circular de los estadios, la barra brava de Boca, los forofos que hinchan las cabeceras del Santiago Bernabeu, la torcida brasileña. Ninguna palabra define mejor al fanático que la italiana tifoso. En efecto, se trata de gente infectada, incurable (VILLORO, 1998, p. 128).

No entanto, Marroquín (2011) acredita que as crônicas de Villoro são

para leitores intelectualizados, com certo conhecimento literário devido as

referências feitas pelo autor a obras, escritores e expressões, como quando

comenta em “Los once de la tribu”, o romance Diario de la guerra del cerdo de

Bioy Casares, ao sugerir que a melhor forma de adquirir humor diante da

adversidade é ser torcedor de um clube perdedor; em Dios es redondo, o

Page 199: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

199

cronista cita a frase que o poeta Darío Jaramillo Agudelo que ao comentar a

respeito de Valderrama: “Nuestro fútbol es estupendo, pero en cámara lenta”

(VILLORO, 2006b, p.42); e ainda o motivo que fez da Alemanha campeã em

1954: “De acuerdo con Victor Hugo, Napoleón perdió en Waterloo porque la

lluvia arruinó su virtuosismo de artillero y sus cuidadas cargas de caballerías. El

mal clima favorece a los que se adaptan al lodo y la desorden” (VILLORO,

2006b, p. 38); ou em “Infancia en la Tierra”, quando diz que, durante muitos

anos, a liga mexicana teve um perfil claro: “Enrique Krauze ha trazado su mapa

histórico” (VILLORO, 1998, p. 146).

Além das referências literárias, observa-se também que a cultura

massiva é convocada frequentemente através de jogos de palabras nos quais

resgata, por exemplo, personagens de filmes, pois compara Diego Armando a

um robô da ficção científica hollywoodiana: “para el público es un mutable

Robocop, una máquina que se regenera al engullir una papilla, el monstruo

gordo con la zurda nítida, el semidiós que anota con la mano goles legales […]”

(VILLORO, 1998, p.140); canções populares mexicanas, como a de Omar

Chaparro: “El sentido de la tragedia inventa insólitos recursos; sin embargo, a

veces el fútbol se parece a la canción ranchera y lo bueno consiste,

precisamente, en salir ultrajado: «Qué manera de perder …!» (VILLORO,

2006b, p. 40); programas televisivos para criticar as declarações de jogador

José Luis Chilavert: “Sus desplantes estrafalarios ocurren lejos del pasto, en

las declaraciones donde describe como un Napoleón en Disneylandia («los

niños son mis ejércitos», dijo ante las cámaras de la cadena infantil

Nickelodeon)” (VILLORO, 2006b, p. 160); ou de manchetes de revistas, nas

quais o jogador Denilson, ao invés de prometer jogar bem, está preocupado em

ser nomeado o melhor do mundo para vender mais camisas. “El dinero otorga

tal pedigrí que Denilson declaró en la portada de la revista El Balón: «Quiero

volver a ser el más caro del mundo»” (VILLORO, 2006b, p. 90). Acredita-se que

essa mistura entre o erudito e popular é próprio da crônica de Villoro, mas

também é próprio da narração de futebol. O cronista elimina hierarquias, como

se observa desde a epígrafe na qual aparece respectivamente Rodrigo Navarro

Morales (menino de sete anos, aluno do Instituto Alexander Bain), Manuel

Vázquez Montálvan, Montaigne e Marco Aurelio. Neste caso, ele coloca lado a

Page 200: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

200

lado uma composição de voz desconhecida com a chamada “alta literatura” de

maneira homogênea, igualando-os de forma plural e dinâmica.

Em “Conversación con Ángel Fernández”, observa-se essa mistura entre

o erudito e o popular, pois o cronista radiofônico e, depois, televisivo, sempre

colocava apelidos nos times e jogadores narrados por ele. Foi denominado por

Villoro de o “Góngora de la fanaticada”, pois utiliza esse recurso em sua

narração, principalmente na televisão: “Aunque Ángel Fernández ha sido un

notable cronista de radio, su verdadero sello surgió en la televisión, donde hay

mayor espacio para la imaginación” (VILLORO, 1998, p. 154). Neste caso,

evidentemente, não existe a necessidade de contar ao espectador o que já

está assistindo; por isso, utiliza metáforas nas quais se percebe essa mistura,

principalmente entre termos históricos e a cultura de massa. "Hans Peter

Brigel, que en alemán quiere decir: Ferrocarriles Nacionales de Alemania."

Cristóbal Ortega72 debuta con el América: "¡América descubrió a Cristóbal!"

(VILLORO, 1998, p. 154) ou ainda “¡Qué manera de cucharear el envío de

Ubirajara, de destroncar al Confesor Cornero73, de jalar el gatillo cuando ya

Supermán Marín74 achicaba el ángulo, kriptonita pura!... ¡¡el Hijo del Coronel

manda al Confesor al Concilio de Trento!!... esto es ¡el juego del hombre!"

(VILLORO, 1998, p. 154).

Villoro considera Ángel Fernández um renovador da linguagem popular e

uma inspiração para sua escrita. “Años después, cuando empecé a escribir, me

pregunté si habría manera de narrar al modo de los locutores, en tiempo

presente” (VILLORO, 2006b, p. 129). O cronista costuma utilizar a narração

com verbos no presente como uma forma de aproximar o leitor e favorecer a

narração. Esse é um dos recursos que foram utilizados pelo Novo Jornalismo

norte-americano, que certamente se relaciona com a crônica mexicana atual.

Para se aproximar do novo Olimpo ou da Liga das Estrelas, que Morin

chamou, referindo-se aos atores de cinema, de “produto mais original do novo

curso da cultura de massa” (MORIN, 2011, p. 100), o cronista começa com as

72

Cristóbal Ortega jogador do Club América de 1974 a 1992. 73

Miguel Ángel Cornero zagueiro argentino apelidado por Ángel Fernández de “EL Confesor”, devido ao seu porte físico os atacantes deveriam rezar somente de vê-lo. 74

José Miguel Marín, goleiro argentino que defendeu as cores do Cruz Azul, apelidado por Fernández de Superman.

Page 201: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

201

filas de imigrantes no cais de Barcelona. Em meio a fogueiras, com restos de

materiais descartados, policiais a pé e a cavalo, narra as vozes que passam

dias e dias nas filas para conseguir um visto de trabalho e os empregos a que

são submetidos em troca de baixos salários. “Cualquier trabajo vale para

quienes han migrado sin más documentos que sus cicatrices, incluído el de

abridor de sobres de correo para detectar posibles polvos de ántrax”

(VILLORO, 2006b, p.89). Em outra fila, a dos estádios, estão aqueles que

também estão em fuga da miséria de seus países: “Lejos de ese corredor de

sombras duermen otros tránsfugas de la pobreza, los que se identifican por el

pie como los perros se identifican por el paladar” (VILLORO, 2006b, p.89). No

entanto, apesar de que aparentemente ambos terão vidas extremamente

diferentes naquela cidade, o cronista menciona que aos jogadores não lhes

aguarda somente dinheiro e glória, mas “una extraña vida de ultraje y

admiración y dinero y fracturas, los gladiadores del tercer milenio que los

estadios conocen como Ronaldinho, Makelele, Kluivert, Eto’o o Ronaldo”

(VILLORO, 2006b, p.89). Como é sabido, eles foram discriminados e

publicamente humilhados em diversas partidas.

Os olimpianos estão presentes em todos os setores da cultura de

massa, porém parece que, na atualidade, os jogadores de futebol têm ocupado

frequentemente esse espaço que esteve reservado às estrelas de cinema.

Villoro rememora um trecho da crônica de Vásquez Montalbán sobre Ronaldo

No es ni será nunca un jugador de club. Pertenece a las multinacionales y vive en los aviones que le llevan de y lo llevan a la samba. Es un mito creado por la FIFA para que sigamos creyendo en la religión del fútbol, y no hay religión sin Dios, vacante de la FIFA desde que Maradona comenzó a autodestruirse” (VÁSQUEZ MONTALBÁN apud VILLORO, 2006b, p.92).

A Maradona, Villoro dedica um capítulo em Dios es redondo além de

diversas outras reflexões sobre o jogador e sua relação com a mídia em outros

textos. Marronquín (2011) acredita (e somente ele) que Villoro presta

homenagem velada a Maradona nessa obra. Trata-se de uma forma retórica de

se manifestar no artigo. Após longo período afastado, essa figura midiática,

assim como os símbolos que carrega tatuado no corpo “Sus confusos ídolos

Page 202: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

202

cívicos son Fidel Castro, Carlos Saúl Menem y Che Guevara” (VILLORO,

2006b, p. 76), retorna em um programa televisivo em 2005, chamado La noche

del 10, que era uma mistura de “sambódromo, cancha de fútbol-playa, feria de

coches desportivos, concurso de belleza y comedia musical [...] un folletín de

escesos” (VILLORO, 2006b, 85). Nota-se, neste caso, essa complicada relação

entre os ídolos esportivos e a mídia, como demonstra o cronista nesse trecho,

mencionando que “Maradona confirmó la tela de la que están hechos los

héroes populares y la importancia del regreso en la imaginación de la gente.

Gran aficionado al fútbol, Samuel Beckett escribió: «No hay partido de vuelta

entre el hombre e su destino»” (VILLORO, 2006b, p. 86).

A mistura de ídolo e produtos a serem consumidos, como aparece no

trecho destacado anteriormente, mostra a pressão da indústria e do comércio

para derramarem seus produtos, e a publicidade é, evidentemente, o veículo

mais adequado para essa expansão. A cultura de massa e a publicidade

mantêm uma estreita relação, pois a primeira propõe produtos que induzem ao

bem-estar, ao prestígio e à libertação pessoal, enquanto a segunda

desenvolve, no imaginário, informação que sugere felicidade, amor e sedução.

No futebol, observa-se o avanço da publicidade, uma vez que as cores das

camisas dos jogadores quase desaparecem sob diversas propagandas. Tal

fato, no entanto, não apaga nem diminui o sentimento pelo clube: “Aunque la

camiseta sea infamada por anuncios comerciales [...]. Una vez elegido el club

que determina el pulso de la sangre no hay camino de regreso” (VILLORO,

2006b, p. 18).

Page 203: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

203

CAPÍTULO IV - CRÔNICA: O ORNITORRINCO DA PROSA 4.2 Crônica: caminhos fronteiriços

Y la crónica está allí, desde el principio, amenazando la claridad de esas fronteras

75.

Susana Rotker

Y aunque el procedimiento nunca es explícito, es notoria la abolición de las distancias entre realidad y ficción. Además, pierde terreno la prosa de intenciones clásicas, y gana lo que antes hubiese sido ruido o cacofonía

76.

Carlos Monsiváis

Em seu discurso, ao receber o Prêmio Nobel em 1982, Gabriel García

Márquez, inicia citando o navegante florentino Antonio Pigafetta que, ao passar

pela América, relata suas aventuras em detalhadas crônicas que mais parecem

peripécias da imaginação. Ao longo da exposição, ele menciona também que

os cronistas de Índias semearam o germe da literatura americana e narra uma

série de fatos verídicos que mais parecem ficção e ressalta:

Me atrevo a pensar que es esta realidad descomunal, y no sólo su expresión literaria, la que este año ha merecido la atención de la Academia Sueca de la Letras. Una realidad que no es la del papel, sino que vive con nosotros y determina cada instante de nuestras incontables muertes cotidianas, y que sustenta un manantial de creación insaciable, pleno de desdicha y de belleza, del cual éste colombiano errante y nostálgico no es más que una cifra más señalada por la suerte. Poetas y mendigos, músicos y profetas, guerreros y malandrines, todas las criaturas de aquella realidad desaforada hemos tenido que pedirle muy poco a la imaginación, porque el desafío mayor para nosotros ha sido la insuficiencia de los recursos convencionales para hacer creíble nuestra vida. Este es, amigos, el nudo de nuestra soledad (GARCÍA MÁRQUEZ, 1982, p. 2).

García Márquez menciona nesse trecho uma questão que acompanha a

crônica contemporânea: os limites entre ficção e realidade. Ressalta também a

insuficiência de recursos para fazer crível essa narração.

No prólogo da obra Mejor que ficción: crónicas ejemplares (2012), de

Jorge Carrión, intitulada “Mejor que real”, o autor centra sua reflexão na

dificuldade de separar ficção e não ficção na crônica latino-americana, pois

75

ROTKER, Susana. La invención de la crónica. México: FCE, Fundación para un Nuevo Periodismo Iberoamericano, 2005, p.226. 76

Fragmento da entrevista de Carlos Monsiváis a Juan Jesús Aznárez, em 2003.

Page 204: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

204

argumenta que “la fabulación es uno de nuestros mecanismos psicológicos [...]”

(CARRIÓN, 2012, p.26). Destaca ainda que o jornalismo e a ficção moderna

foram cultivados simultaneamente e por isso a crônica “no es un género, es un

debate” (CARRIÓN, 2012, p.26) e acrescenta que: “Cada crónica es, por tanto,

un debate que solo transcribe datos inmodificables y que reclama otras

palabras. Un debate inclusivo con los géneros y las formas textuales de cada

momento histórico” (CARRIÓN, 2012, p. 31).

Ao propor o termo debate está implícito o conflito entre Ficção e História,

Mentira e Verdade, Religião e Ciência, Utopia e Realidade, Especulação e

Demonstração. É preciso considerar que o jornalismo não é a imagem da

realidade, senão uma construção, uma interpretação desta. E que construção

significa que se trata de uma produção discursiva, com todas as características

que pode ter inclusive a representação de ficção, pois, desde ao menos os

“finales del siglo XIX, en ningún ámbito de representación encontramos

certezas incuestionables sobre qué es la realidad ni sobre cómo hay que

representarla” (CARRIÓN, 2012, p.27).

Em Safari accidental, Villoro a partir de aforismo, aclara que “La crónica

es la encrucijada de dos economías, la ficción y el reportaje” (VILLORO, 2005a,

p.12). Ou seja, a crônica é um instrumento narrativo que contribui para contar a

realidade mais imediata, um gênero resultado de uma mistura harmônica, não

necessariamente em partes iguais, de dado e ficção.

A questão da ficção e não ficção na crônica pode ser problemática, tanto

para estudiosos literários quanto para o leitor, principalmente para “Aquellos,

acostumbrados a igualar "literatura" con "ficción", de repente se encuentran con

la obligación de hacer una distinción teórica entre realidad e invención -

diferencia que por lo general han ignorado” (FABER, 1999, p.253), pois estão

diante de um texto que, por sua forma, parece ficcional, mas, por seu conteúdo,

realidade. Por isso, é importante destacar que “La realidad de la crónica es el

texto, y eso a muchos se les olvida” (VILLORO apud ALMOMENTO.MX, 2014,

p.1) e que “Todo texto es una construcción” (VILLORO, 2011a, p.9) que se

realiza através da linguagem, que é, na verdade, outra realidade e impõe leis

próprias nas quais, de algum modo, recorta, organiza e “ficcionaliza” o fato,

Page 205: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

205

porque a verossimilhança, a credibilidade e a autoridade da crônica dependem

da maneira como é apresentada a escrita.

A linguagem artística e o uso das técnicas da ficção, principalmente do

conto e do romance na crônica de Viilloro, não põem em dúvida a sua

veracidade, pois “Al absorber recursos de la narrativa, la crónica no pretende

“liberarse” de los hechos sino hacerlos verosímiles a través de un simulacro,

recuperarlos como si volvieran a suceder con detallada intensidad” (VILLORO,

2005a, p. 15). A linguagem mais elaborada não destrói a objetividade

necessária na crónica, pois “Su contrato con la verdad es inquebrantable. La

recreación subjetiva de los hechos puede tener cambiantes adverbios y

adjetivos, pero no puede alterar los datos” (VILLORO, 2011a, p. 10).

Em algumas crônicas, pode-se notar a citação de fontes e datas. No

entanto, isso não é uma obrigação, pois se celebra um pacto com o leitor, sem

a necessidade de um acúmulo de fontes, a realidade não está nos dados,

senão na (re) construção da trama, pois “La crónica es el género de no ficción

donde la escritura pesa más” (CAPARRÓS, 2007, p.2). Ou, como define

Monsiváis, “reconstrucción literaria de sucesos o figuras, género donde el

empeño formal domina sobre las urgencias informativas” (MONSIVÁIS, 2010,

p. 13).

Sebastiaan Faber (1999) comenta em seu artigo “La metonímia en una

crónica de Carlos Monsiváis. Hacia un periodismo democrático” que, para o

linguista John Searle, não há característica que distinga ficção de verdade,

visto que o autor de ficção “finge” contar uma história real. No entanto, para

Genette e Prince, existem sinais textuais que dão a indicação de veracidade

em um texto, como, por exemplo, a presença de diálogos transcritos em

extensão de detalhes. A transcrição de pensamentos alheios, porém, costuma

transgredir a verossimilhança de um texto narrativo que pretende ser

verdadeiro, ou seja, essa é uma transgressão utilizada pelo autor para dar

pistas ao leitor da “ficcionalização”.

A relação entre narrador e autor são elementos importantes e devem ser

observados na transgressão dessas fronteiras, pois, na ficção, o narrador pode

ser uma pessoa que representa um deles. Não se pode, no entanto, julgar o

Page 206: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

206

autor de ficção pelo que diz o narrador, ao contrário do jornalismo, quando o

autor se responsabiliza pelo que diz o narrador, e o jornalista, inclusive, é

chamado a corroborar com ele. Egan (2004) denomina essa voz do autor da

crônica de autoridade narrativa. Esse elemento sustenta o texto, independente

de dados sociológicos ou estatísticos, que podem ou não aparecer na crônica.

Linda Egan afirma que essa autoridade é proveniente de três fontes:

primero, el "contrato extratextual 'firmado' por el autor y manifestado en los títulos, las portadas de los libros, las fechas anotadas y los prólogos que prometen que los textos están hechos de hechos"; segundo, la "credibilidad" del autor, que es reforzada por su tono autocrítico y de su eficacia narrativa; y tercero, "la visibilidad del referente real y la técnica que puede transparentar o esconder este referente" (EGAN apud FABER, 1999 p. 7).

A autoridade narrativa mencionada por Egan pode ser encontrada nos

livros que compõem o corpus dessa pesquisa. O contrato extratextual aparece

no tílulo Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias, indicando que tipo de texto

será apresentado e também no prólogo intitulado “Rescate temporal”, no qual

discorre justificativas para um recorte entre 1968 a 198577, mas não em

números redondos, como costumam ser as obras no México. Ressalte-se

também o fato de o rock ser o fio condutor dos textos que são, basicamente,

crônicas imaginárias.

Muitos pesquisadores78 quando analisaram a obra cronística de Villoro,

excluíram Tiempo transcurrido por considerarem um livro de contos. Dentre os

77

São dezoito crônicas, assim como os dezoito meses que compõem o calendário solar asteca. 78

Entre eles é importante citar a tese de doutorado de Beatriz García Torres, intitulada “La crónica mexicana contemporánea a través de los textos de Juan Villoro y José Joaquín Blanco” (2012); e na tese de doutorado “Idea de Hispanoamérica en la obra de Juan Villoro”, de Manuel de Jesús Llanes García (2012) ambas as pesquisas, apesar de abordarem as crônicas do autor, não discutem o gênero de Tiempo transcurrido, mencionando que são contos. Já o artigo “Las crónicas de Tiempo transcurrido, de Juan Villoro, um soundtrack generacional” (2013), de Ricardo Camarena Castellanos tem como proposta a caracterização de Tiempo transcurrido como um livro de contos. Logo na introdução, Camarena Castellanos menciona o conceito de conto que está apoiado, e diz: “Este trabajo actúa bajo la premisa de una lectura posmoderna de dichas “crónicas imaginarias” que son la casi veintena de cuentos secuenciales de Villoro. Ele se baseia em Lauro Zavala, que diz “el sentido de un cuento cualquiera depende de la interpretación de cada lector, de tal manera que puede ser leído estableciendo asociaciones inéditas, lo cual depende del contexto (moderno o posmoderno) de cada lectura (ZAVALA, 2002)” (CAMARENA CASTELLANOS, p. 1). A partir desse conceito, ele traça uma série de considerações baseadas principalmente no que Lauro Zavala denomina de “período do conto mexicano”, e comenta que “Tiempo transcurrido está situado tras un período del cuento mexicano de 1971 a 1982, en el que caben “las voces urbanas, el tono lúdico y la brevedad”

Page 207: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

207

motivos estão: o alto grau de subjetividade dos textos; a presença de

personagens e o fato das crônicas terem sido publicadas em 1986, baseados

em acontecimentos ocorridos nos anos finais da década de sessenta, quando o

cronista tinha apenas doze anos, ou seja, ele não estava lá, como comenta no

prólogo: “Los que éramos niños en 1968 vimos la historia desde las banquetas”

(VILLORO, 2006a, p. 9). No entanto, é importante observar que todos os textos

partem de histórias do cotidiano, através de pessoas comuns, publicadas em

jornais da época e que o autor toma conhecimento posterior através de

pesquisas ou diálogos informais (fato que se pode inferir). A partir disso,

retoma a narração como fato presente, utilizando duas das quatro técnicas do

Novo Jornalismo, mencionadas por Wolfe:

El tercer procedimiento era el por llamarlo así «punto de vista en tercera persona», la técnica de presentar cada escena al lector a través de los ojos de un personaje particular, para dar al lector la sensación de estar metido en la piel del personaje y de experimentar la realidad emotiva de la escena tal como él la está experimentando (WOLFE, 1998, pp. 48-49).

Todas as crônicas dessa obra estão narradas em terceira pessoa. Nelas

se observa que Villoro utiliza essa técnica, pois ela contribui para afastar

possíveis questionamentos de que o autor não estava presente, além de

manter uma postura que admite certa limitação. A outra estratégia do Novo

Jornalismo explorada por Villoro é:

El cuarto procedimiento ha sido siempre el que menos se ha comprendido. Consiste en la relación de gestos cotidianos, hábitos, modales, costumbres, estilos de mobiliario, de vestir, de decoración, estilos de viajar, de comer, de llevar la casa, modos de comportamiento frente a niños, criados, superiores, inferiores,

(CAMARENA CASTELLANOS, p. 2). No entanto, Lauro Zavala (2007), em sua tese de doutorado reconhece que os textos de Villoro se encontram em uma fronteira bastante diversa “En la mayor parte de los casos, es una escritura que comparte elementos de al menos dos géneros literarios (distintos en el caso de cada cuento particular), y en ese sentido es también una escritura fronteriza. Además de la tensión estructural, la brevedad, el tratamiento cuidadoso del final, la construcción primordial de las situaciones y el ritmo de la escritura propios del cuento tradicional, estos relatos tienen claros elementos de otros géneros tradicionalmente alejados del cuento, como la crónica (Emiliano Pérez Cruz, Juan Villoro, Lorenzo León, Cristina Pacheco, Paco Ignacio Taibo II)” (ZAVALA, 2007, p.27).

Page 208: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

208

iguales, además de las diversas apariencias, miradas, pases, estilos de andar y otros detalles simbólicos que pueden existir en el interior de una escena (WOLFE, 1998, p.49).

Certamente ocorre a subjetividade com personagens fictícios, porém se

percebe que os textos foram construídos a partir de investigações e de uma

pesquisa minuciosa que enriquece a narrativa com detalhes que contribuem

para dar verossimilhança às cenas. Como comenta Wolfe, “La relación de tales

detalles no es meramente un modo de adornar la prosa. Se halla tan cerca del

núcleo de la fuerza del realismo como cualquier otro procedimiento en la

literatura (WOLFE, 1998, p. 49).

O trecho de Tiempo transcurrido mencionado no qual o cronista destaca

“àqueles que eram crianças em 1968”, remete a uma passagem do libro La

noche de Tlatelolco de Elena Poniatowska, o qual relata uma conversa com

Eduardo Valle, líder do movimento estudantil que se encontrava na prisão de

Lecumberri em 1970. Essa passagem, Villoro rememora em um diálogo com o

escritor Cristián Alarcón:

Nosotros somos cartuchos quemados. Estamos en la cárcel, no vamos a poder hacer nada. He tenido un derrotismo muy explicable, pero los herederos de esto, los que van a contar la historia son los niños que tenían entre 12 y 15 años, nuestros hermanos menores. La gente que vio las manifestaciones desde las aceras se dio cuenta de lo que pasaba pero era demasiado joven para participar. Ellos se salvaron gracias a su infancia pero recordarán lo que hicimos (VALLE apud VILLORO y ALARCÓN, 2008c, p. 2).

Em vários de seus textos, o autor retorna a esse período histórico,

relatado através de personagens do cotidiano que não fizeram parte

diretamente do movimento, como a personagem Mónica da crônica “1971”:

“Ella se sentía marcada por la “experiencia” del 68 (aunque sólo se hubiera

enterrado de los pormenores tres años después [...] y el descubrimiento de los

Halcones79 que se entrenaban karate en el Campo Militar Número 1”

(VILLORO, 2006a, pp. 33-34), assim como o próprio autor que, no momento do

79

Grupo de paramilitar mexicano fundado em 1966 de repressão contra a guerrilha urbana e a todo e qualquer movimento social contestatário. Apesar de nenhum governo ter assumido a contratação desses ex-militares, muitos deles após a saída do grupo foram presos por roubos (CASTILLO GARCÍA, 2008, p.1).

Page 209: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

209

massacre, não tinha consciência do ocorrido, pois era muito jovem. Nesse

mesmo diálogo com Alarcón, mais adiante, diz:

Pues depositó en mi generación - yo tenía 12 años exactamente - la responsabilidad de contar la historia y esta ardua responsabilidad que nos transfirió Eduardo Valle “El Búho” fue muy difícil de cumplir por muchas razones que yo he tratado de investigar (VILLORO apud VILLORO y ALARCÓN, 2008c, p.2).

As crônicas de Tiempo transcurrido estão deliberadamente testando os

limites entre ficção e história. Villoro, em conversa com Piglia sobre esses

limites, comenta que:

no se puede narrar sólo desde el pasado pero tampoco el presente es un horizonte que singularice la experiencia y adquiera inmediato sentido narrativo. Simplificando el argumento, podríamos decir que la experiencia que proviene del pasado (la historia) ha sido uniformada por los historiadores y la experiencia del presente ha sido estandarizada por la vida moderna. ¿Cómo encontrar lo irrepetible? Las líneas de fuerza que van de la historia a la ficción plantean este problema. […] Es posible que la crónica ofrezca una respuesta, pero no en la circulación habitual de los periódicos, que rara vez asimilan crónicas, sino más bien en el flujo lento de los libros. Curiosamente, creo que muchas de las crónicas interesantes que se están escribiendo ahora, especialmente en América Latina, no tienen la urgencia del presente ni ocupan un espacio del presente, sino que en cierta forma posponen sus lectores (VILLORO apud PIGLIA y VILLORO, 2007, p. 4).

Quando o autor afirma que Tiempo transcurrido são crônicas

imaginárias, está ressaltando, desde o título, um contrato com a realidade e

com a história, um compromisso, um duplo pacto que ocorre em toda crônica.

A intervenção da crônica, nesse sentido, oferece outro olhar, outra perspectiva.

Por isso as crônicas de Villoro funcionam em duas velocidades: o relato dos

fatos, a representação do ocorrido na mente das testemunhas e da opinião

pública, mas também a discussão, o comentário, a reflexão do acontecimento.

Como menciona ainda no prólogo: “Si el novelista busca la creación de un

mundo único, irrepetible, el cronista, en cambio, asimila todo tipo de lugares

comunes. Las crónicas imaginarias son una combinación de ambos

procedimientos” (VILLORO, 2006a, p. 10), ou seja, essa obra é como comenta

Caparrós:

La crónica aparece, entonces, como el género que quiere renovarse, buscar, y busca – muchas veces – dar cuenta de lo que pasa en esas sociedades. Por definición la crónica cuenta el presente: no puede sino contar el presente – o un pasado hecho presente por el hecho de

Page 210: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

210

contarlo. Y a muchos les interesa releer lo que ven todos los días. Para eso sirven, entre tantas otras cosas, los relatos: para rever, para mirar de otra manera aquello que estamos acostumbrados a mirar (CAPARRÓS, 2015, p. 478).

Em outra obra, Villoro interroga indiretamente se é preciso ter visto ou

viver em um determinado período para fazer uma crônica, para narrar como o

presente. Em Dios es redondo comenta:

Las crónicas comprometen tanto la imaginación que algunos de los grandes rapsodas han contado partidos que no vieron. Casi ciego, Cristino Lorenzo

80 fabulaba desde el Café Tupinamba de la ciudad de

México; el Mago Septién81

y otros locutores de embrujo lograron inventar gestas de béisbol, box o fútbol con todos sus detalles a partir de los escuetos datos que llegaban por telegrama a la estación de radio (VILLORO, 2006b, p. 22).

Os locutores não assistiram às partidas que narraram com riqueza de

detalhes, pois “El fútbol ocurre en la hierba y en la agitada consciencia de los

espectadores. La crónica vincula ambos territorios” (VILLORO, 2006b, p. 22).

Villoro também se utiliza dessa técnica na crónica: “Formas de la pasión”, na

qual narra diversos jogos importantes da seleção alemã, inclusive a partida

final da Copa de 1954, entre Alemanha e Hungria: “El sol en torno al cual

giraban era Ferenc Puskas, capaz de anotar de zurda a 35 metros de la

portería” (VILLORO, 2006b, p. 36). Em Safari, o cronista menciona que o filme

Rashomon, de Akira Kurosawa, que está baseado em dos contos de

Ryonosuke Akutagawa, põe em jogo as várias versões que um acontecimento

pode produzir. Mais adiante questiona a verdade que aparece na tela

afirmando que “Incluso las cámaras de televisión son proclives a la

discrepancia: un futbolista está en fuera de lugar en una toma y en posición

correcta en otra” (VILLORO, 2005a, p. 15). Para ilustrar, comenta sobre as

câmeras que, curiosamente, não mostram nada, “desde 1966 el gol fantasma

de la final en Wembley no ha acabado de entrar en la portería. En sentido

estricto, la “verdad” es la falta de datos en contra. Una categoría irrenunciable y

perfectible” (VILLORO, 2005a, p.15).

80

Cristino Lourenzo – cronista esportivo mexicano. 81

Pedro Septién Orozco conhecido como El Dinámico Mago Septién. Foi locutor e cronista esportivo mexicano por mais de setenta anos.

Page 211: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

211

Em “Monterroso, libretista de ópera”, crônica que compõe Los once de la

tribu, Villoro comenta que a ópera “ofrece la ventaja impagable de confundir al

máximo lo real con lo ficticio” (VILLORO, 1998, p. 101). Com essa introdução,

o cronista levanta vários questionamentos de por que não se tem óperas no

país, apesar do “poderío musical”, principalmente popular:

disponemos de la más vasta dotación de tunas y estudiantinas; de la orquestra mixe de Tlahuitoltepec, el Pueblo de la sierra de Oaxaca donde los niños aprenden a leer las notas antes que las letras; de los espléndidos cuartetos para cuerdas de Manuel Enríquez y las maravillas contemplativas de Mario Lavista; del kitsch de Juan Gabriel […], con todo este arsenal, ¿no será posible una ópera? (VILLORO, 1998, p. 102).

Em seguida, o cronista ouve uma resposta para suas indagações: “Es

que no hay libretistas” (VILLORO, 1998, p. 102). A partir daí Villoro descreve

uma adaptação como o libreto operístico de El dinossauro, o famoso micro

conto de Monterroso. No texto é detalhada toda a estrutura, as características

formais e as cenas de uma ópera que Monterroso parcialmente imaginou, mas

que nunca existiu. Pode-se inferir um caráter imaginário, pois, enquanto o leitor

se envolve nas diversas possibilidades de adaptações musicais e cênicas

apresentadas, não se atenta para uma indicação no prólogo do livro de que

essa crônica “merecería ser cierta” (VILLORO, 1998, p.10).

Esse texto remete ao segundo elemento destacado por Egan, que

contribui para a formação da autoridade narrativa do autor na crônica, uma vez

que, além do contrato extratextual, está a credibilidade reforçada pela

autocrítica. Essa credibilidade é construída a partir do verossímil, pois, como

escreveu Aristóteles, “devemos preferir aquilo que é impossível, mas

verossímil, ao possível, mas não convincente” (ARISTÓTELES apud

OLIVEIRA, 2009, p.14). Da mesma forma também afirma Villoro que “La

realidad, que ocurre sin pedir permiso, no tiene por qué parecer auténtica. Uno

de los mayores retos del cronista consiste en narrar lo real como un relato

cerrado (lo que ocurre está ―completo sin que eso parezca artificial”

(VILLORO, 2005a, p.18).

A autocrítica é exercida ao longo de todo discurso cronístico, através de

uma rede de comentários à margem, comparações irônicas e humorísticas,

Page 212: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

212

pois Villoro reflete sobre códigos culturais específicos, principalmente a cultura

popular vernácula, modas passageiras, informações desencontradas na mídia,

misturando com referências mais “eruditas” e que não estão “exentas de cierta

voluntad de entretenimiento o de la necesidad de una apurada puesta en

perspectiva (TAPIA, 2016, p. 11). Assim, ele procura marcar uma função

comunicativa e uma proximidade cultural e ideológica com o leitor.

O referente real, que pode ser explícito com datas específicas ou quase

imperceptíveis através de fatos do cotidiano, é o último elemento mencionado

por Egan para compor a voz de autoridade. Nas crônicas de Villoro, na maioria

das vezes, o referente aparece de maneira bastante sutil, como em “La

tempestade superligera”, na qual se pode precisar o dia exato com pequenas

informações: “Me cae mal", Julio César lo repitió una y otra vez. En las noches

soñaba con la risa burlona y la mirada oblicua de Greg Haugen. La pelea por el

campeonato mundial superligero era un acto de pasión” (VILLORO, 1998,

p.113). Ocorre também em “Escape de Disney World”, quando se pode indicar

apenas o período, mas não uma data: “En Semana Santa, 100 mil personas

recorren Disney World” (VILLORO, 2005a, p. 174). Em algumas, porém, já

inicia com datas explícitas, como “Un mundo (muy) raro”: “En marzo de 2001 el

presidente de México, Vicente Fox, cumplió 100 días en el poder” (VILLORO,

2005a, p.45). Pode-se citar também em “La apple del pecado”: “En 1986

desempaqué un aparato gris perla, con pantalla apenas más grande que una

tarjeta postal” (VILLORO, 2005a, p. 183).

Cabe atentar que os dados concretos, as fontes e as referências

utilizadas para dar verossimilhança ao texto, em uma época de múltiplas

informações como a atual, nas quais o leitor tem informação, ainda que muitas

vezes elementar, do objeto que toma o cronista, a informação concreta

contribui para centrar a discussão, diminuindo o risco da dúvida por parte do

leitor com relação à veracidade do que está sendo narrado. Mas quando

questionado sobre o porquê dessa mistura, Villoro responde que: “vivo del

periodismo y las aguas de la ficción se han dejado influir por mi mirada de

cronista. A veces esto es muy evidente. […] La observación minuciosa de la

realidad, tan esencial al periodismo, puede hacer que tu mirada sea más

aguda” (VILLORO apud IGLESIAS CONTÍN, 2015, p.1).

Page 213: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

213

A informação como se apresenta atualmente consiste em dizer para

muitos o que ocorre com poucos, pois a maioria da população nunca será

notícia, a menos que lhe ocorra uma tragédia. A crônica se rebela contra esse

poder que impõe uma ideia de informação, tratando da vida de qualquer um,

mostrando que aquilo que ela relata poderia acontecer com seus leitores. Ou

seja, a crônica se caracteriza como um lugar de resistência capaz de

descentrar o foco jornalístico, como “una manera de decir que el mundo

también puede ser otro. La crónica es política” (CAPARRÓS, 2007, p.3).

Villoro, de maneira irônica em Safari accidental diz:

La mayoría de las veces, el escritor de crónicas es un cuentista o un novelista en apuros económicos, alguien que preferiría estar haciendo otra cosa pero necesita un cheque a fin de mes. El principal truco del oficio consiste en transformar esta interrupción de la Obra en una necesidad estética. El primer pretexto que el cronista se susurra a sí mismo es que eso le ayudará a escribir ficción (VILLORO, 2005a, p.11).

No trecho verifica-se duas questões que envolvem as discussões sobre

a valorização da crônica. A questão financeira como motor para escrever esse

tipo de texto e a relação entre ficção e não ficção. Quando Villoro destaca em

letra maiúscula a “Obra”, está chamando a atenção para a valorização da obra

de ficção em detrimento a da não-ficção. Em outro trecho dessa mesma

crônica diz:

Como quiera que sea, el siglo XX volvió específico el oficio del cronista que no es un narrador arrepentido. Aunque ocasionalmente hayan practicado otros géneros, Egon Erwin Kisch, Bruce Chatwin Álvaro Cunqueiro, Ryszard Kapuscinski, Josep Pla y Carlos Monsiváis son heraldos que, como los grandes del jazz, improvisan la eternidad (VILLORO, 2005a, p.13).

Essa relação de valorização da obra ficcional e da não ficcional não é

recente. Tom Wolfe comenta que o objetivo de conseguir um emprego no jornal

era para

permanecer íntegro, pagar el alquiler, conocer «el mundo», acumular «experiencia», tal vez pulir algo del amaneramiento de tu estilo... luego, en un momento, dejar el empleo sin vacilar, decir adiós al periodismo, mudarse a una cabaña en cualquier parte, trabajar día y noche durante seis meses, e iluminar el cielo con el triunfo final. El triunfo final se solía llamar La Novela (WOLFE, 1998, p. 8).

Page 214: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

214

Salcedo Ramos rememora um pensamento de Tom Wolfe o qual

demostra que o Novo Jornalismo dos sessenta já passava pela questão de

produzir crônicas enquanto se aguarda ou escreve “a Obra” e diz:

Tom Wolfe usaba una analogía para referirse a aquellos escritores que en los años sesenta hacían periodismo narrativo sin convicción, sólo para tener algo a lo cual dedicarse mientras daban el gran golpe con una novela: decía que para esos escritores el periodismo narrativo era como entrar a un motel a pasar el tiempo con una chica transitoria, mientras conseguían una mujer respetable –es decir, una novela– y podían llevarla al altar. Pues bien: yo creo que en mi generación hay varios cronistas que la estamos pasando de maravilla en el motel con la chica mal vista (SALCEDO RAMOS, 2013, p.2).

Assim como Salcedo Ramos, Linda Egan (2004) dedica parte de seus

estudos para tratar dessa relação no texto cronístico: “Como la marginalización

de la crónica en la comunidad académica proviene en buena medida de la

aplicación anacrónica de un persistente criterio del siglo XIX según el cual

“literatura” es sinónimo de “ficción” (EGAN, 2004, p. 27). A crônica, por conter

essa mistura entre o ficcional e o não-ficcional, foge, ou fugia de determinado

padrão estabelecido. Talvez essa questão ainda esteja latente, pois, em 2012,

Alberto Salcedo Ramos escreve: “Hay todavía muchos escritores de ficción

convencidos de que quienes escriben no ficción son indignos del calificativo de

escritores” (SALCEDO RAMOS, 2012, p.632).

Não em vão, Villoro desmitifica a figura do cronista, propondo uma

reflexão e criticando a sua própria tarefa de escrever crônicas. Expõe, também,

a relação entre ficção e não ficção, já que muitos autores de ficção que migram

para a crônica usam as matérias jornalísticas como base para suas obras

ficcionais. Como destaca Villoro em uma conversa com Daniel Alarcón, na qual

iniciam uma discussão sobre ficção e realidade, comenta: “Es obviamente

imposible escribir ficción sin apelar a la realidad y escribir crónicas sin tener

una visión literaria de los hechos” (VILLORO y ALARCÓN, 2008c, p. 11).

Em Safari accidental, Villoro declara que, na crónica, o

comprometimento com os fatos deve ser também com a verdade, pois “Si el

periodismo apuesta a contar “lo que ocurrió”, la ficción prefiere imaginarlo

(VILLORO, 2005a, p. 14). Isto não significa uma oposição entre mentira e

verdade, apenas a ideia de que a ficção forma parte do “real”, não devendo,

Page 215: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

215

porém, ser confundida com a “realidade”, tal como no romance realista e

naturalista, pois é preciso entender que “La crónica es el único territorio donde

combaten con armas iguales la realidad y la imaginación” (MARTÍNEZ apud

SALCEDO RAMOS, 2016, p. 3). Em seguida, Villoro retoma a diferenciação

que Saer faz em sua obra sobre essas supostas dicotomias e diz:

Juan José Saer ha despejado el malentendido con elocuencia: la ficción no trabaja con la mentira sino con lo inverificable; las tramas literarias no aspiran a la falsificación, sino a ser ciertas de otro modo, a construir una segunda realidad: “La verdad no es necesariamente lo contrario de la ficción […] No se escriben ficciones para eludir, por inmadurez o irresponsabilidad, los rigores que exige el tratamiento de la ‘verdad’, sino justamente para poner en evidencia el carácter complejo de la situación […] La paradoja propia de la ficción reside en que, si recurre a lo falso, lo hace para aumentar su credibilidad” (El concepto de ficción) (VILLORO, 2005a, pp.14-15).

Nessa mesma obra, Saer menciona ainda que a ficção é uma

“antropología especulativa” (SAER, 1997, p. 6), porque a literatura apresenta,

propõe, especula possíveis formas de ser do homem, do mundo e da

sociedade, pois, como comenta em entrevista Lauro Zavala, a literatura “no

sólo es una forma de antropología especulativa, sino que construye su propio

sistema de verdad, que tiene efectos muy reales en sus lectores y

espectadores” (ZAVALA apud SALAZAR, 2011, p. 6).

Caparrós utiliza a expressão “literaturizar” para tratar da relação entre

ficção e não-ficção na crônica e diz que há “escritores reconvertidos en

periodistas y lo que en España se ha llamado la literaturalización del

periodismo” (SAMPER apud CAPARRÓS, 2007, p.1). Essa reflexão é

pertinente porque muitos cronistas latino-americanos, e certamente Caparrós e

Villoro estão entre eles, pois são cronistas que “literaturizam” o jornalismo, ou

seja, que veem na crônica um ramo da literatura. Caparrós (2007) segue

comentando que o que mais lhe interessa é o jornalismo cultural, porque cria

uma cultura “no habla sobre la que ya existe. Eso, creo, es la crónica”

(CAPARRÓS, 2007, p.1). “Literaturizar”, fazer literatura é colocar em prática

todos os recursos narrativos, a subjetividade do escritor, o seu olhar. No

entanto, Villoro chama a atenção para o perigo de “literaturizar” a realidade:

Page 216: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

216

no se debe novelizar la realidad; para eso es muy fácil dedicarse a la novela. En la novela se puede mentir con conocimiento de causa a partir de hechos reales. En la crónica no se puede ni se debe hacer esto (VILLORO, 2010c, p.2).

O cuidado com o estilo, com a prosa, não significa inventar dados, pois,

como ressalta Monsiváis, na crônica “se requiere el tratamiento artístico pero

no el maquillaje (MONSIVÁIS, 2010, p. 95). Para essa consideração do

cronista, cabe um questionamento: até onde se pode “ficcionalizar” a

realidade?

Jean Paul Sartre em seu livro, O que é literatura?, cuja primeira

publicação é datada de 1947, levanta três questionamentos: o que é escrever?

Por que escrever? Para quem escrever? Tais indagações propõem uma

reflexão sobre a essência da criação literária e como ela pode refletir e

transformar o homem e sua realidade, constituindo uma postura ética.

Na primeira parte da obra, Sartre, antes de se dedicar à literatura, trata

de explicar porque a escolha desta e não de outras formas de arte. Então, ele

diferencia a poesia, a prosa, a pintura, a música, a escultura, procurando situar

todas as formas de expressão. Em seguida, ele especifica mais detidamente a

prosa e a poesia, pois ambas estão conectadas à linguagem, à comunicação, e

essa distinção é importante para Sartre, pois ele centrará a discussão na

primeira e destaca: “La prosa es utilitaria por esencia: difiniría muy a gusto al

prosista como el hombre que se sirve de las palabras” (SARTRE, 1967, p.51).

Afinal, ele concebe a prosa como instrumento que se opera na busca de

engajamento82. Para Sartre, o próprio ato de escrever já indica um

posicionamento engajado, uma responsabilidade social.

Pedro Henríquez Ureña em seu estudo Corrientes Literarias de

Hispanoamérica (1945) menciona que a tradição hispano-americana, desde o

início do século XX, tem duas genealogias: uma com “fines puramente

artísticos y outra con fines sociales (UREÑA apud RUISÁNCHEZ y ZAVALA,

2011, p.15). Mas adiante Rui Sánchez e Zavala complementam: “Los últimos

veinte años, sin embargo, han sido cruciales para la superación de esta

dicotomía en apariencia insalvable” (RUISÁNCHEZ y ZAVALA, 2011, p.16).

82

É importante ressaltar que ao tratar do engajamento do prosador, Sartre não está excluindo o compromisso dos envolvidos nas outras formas de arte.

Page 217: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

217

Villoro experimenta em seus textos, principalmente em suas crônicas, o

equilíbrio entre essas duas vertentes da tradição hispano-americana.

Essa tensão entre arte/estética e posicionamento crítico com fins

sociais/ética passa pela reflexão de literatura engajada/comprometida versus

arte autônoma/livre. A crônica é um tipo de texto que se arma sobre essa

dicotomia. Por um lado, tem compromisso com o fato, com a verdade, com a

referencialidade, pois é jornalismo. Do outro, mantém a subjetividade porque

não deixa de ser literatura.

No México, a crônica, com muita frequência, tem sido utilizada pelos

escritores com esse intuito contestador, como forma de resistência. No entanto,

isso não significa que seja intrínseco ao gênero, pois há escritores que não

fizeram uso desse viés. Villoro acredita que a literatura é uma forma de

resistência (VILLORO apud CAMPOS, 2016, p.1), e a crônica tem sido um

meio utilizado por ele para “sair ao sol” (VILLORO, 1998, p.9), pois, para ele, a

literatura discute a realidade, assim como a sociologia, a filosofia, a economia,

a psicologia e a história, mas utilizando o registro da literatura. O escritor

espanhol Javier Marías expressa a ideia de literatura que compartilha com

Villoro:

Comparto con Juan Villoro la idea de que la literatura no debe servir como refugio o resguardo de la realidad, sino como parte de ella, algo que la acompaña; o como él lo señaló alguna vez, ambos, él y yo, vemos al mundo como una vasta oportunidad narrativa (MARÍAS apud CANTÚ, 2011, p.388).

Eagleton, ao comentar a respeito da função da literatura, esclarece que,

em muitas sociedades, ela já teve função, como, por exemplo, a função

religiosa. Mais adiante, afirma que, na época atual, “a literatura deixou de ter

grande função prática” (EAGLETON, 2006, p. 15). No entanto, acredita-se que

é possível que a crônica seja essa forma de resgate da função prática da

literatura, porém não se pode esquecer, como reforça Adorno (2004), sobre a

dificuldade de obras atuarem de maneira mais imediata: “El arte es una figura

de praxis y no tiene que pedir perdón por no actuar directamente: no podría

aunque quisiera; el efecto político de las obras «comprometidas» es muy

incierto” (ADORNO, 2004, p. 307).

Page 218: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

218

A crônica é o meio utilizado por Villoro para discutir a cultura relacionada

à lógica do capitalismo, a autonomia da literatura e a relação entre ficção e não

ficção, mostrando que não existe jornalismo totalmente objetivo nem literatura

literalmente subjetiva. Elas são fronteiras tênues, para as quais cabe uma

mediação.

O fato de Villoro ter iniciado como cronista, resgatando datas e eventos

emblemáticos com um caráter social, político e cultural, sugere uma

demonstração de preocupação em analisar as transformações de uma

sociedade ao longo de mais de três décadas. Essa atitude pode ser percebida

através da maneira como aborda, em suas crônicas, determinados temas,

como a poluição, os meios de transportes, a violência, os novos

empreendimentos imobiliários, o futebol e o boxe. Em 2008, Leonardo Tarifeño

em uma entrevista o questiona a respeito de como, sendo ele um intelectual de

ativa participação política no país, pode viver o “compromisso” político do

escritor em pleno século XXI. Ele responde que:

Es un asunto de ética individual, que pertenece a lo que un escritor hace como ciudadano. Las novelas que quieren mejorar la vida de los sindicatos suelen ser pésimas, pero resulta provechoso aclarar y debatir temas desde la prensa. Participo en los debates como lo que soy, un cronista de las ideas que trata de aclararse temas. Más que intervenir en la coyuntura, el cronista interviene en las lecturas por venir: busca que la sinrazón del presente se convierta en el sentido común del futuro. Vivo de la escritura en un país con pocos lectores y millones de analfabetos. Es un privilegio y un enigma social que en ocasiones me lleva a tratar de acercar la discusión política a gente que no pasa por los libros (VILLORO apud TARIFEÑO, 2008, p. 12, sublinhado nosso).

A fluidez na fronteira entre as diversas formas é uma das principais

características da obra de Juan Villoro, pois tenciona a realidade e a ficção em

variados gêneros. Muitos dos seus ensaios, contos e romances apresentam

características de crônicas. Brian L. Price (2011) afirma que as crônicas de

Villoro podem ser divididas em duas categorias: “las que lindan con la ficción y

las que se atienen más a la realidad” (PRICE, 2011, p. 266).

Para muitos cronistas latino-americanos, entre eles Caparrós, Guerriero,

Salcedo Ramos e, principalmente, Juan Villoro, o limite dessas fronteiras é a

Page 219: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

219

ética, ou seja, uma postura pessoal do autor diante do leitor, como destaca no

início de Safari:

La vida depara misterios insondables: el aguacate ya rebanado que entra con todo y hueso al refrigerador dura más. Algo parecido ocurre con la ética del cronista. Cuando pretende ofrecer los hechos con incontrovertible pureza, es decir, sin el hueso incomible que suele acompañarlos (las sospechas, las vacilaciones, los informes contradictorios), es menos convincente que cuando explicita las limitaciones de su punto de vista narrativo (VILLORO, 2005a, p.17).

É importante pensar que a ética da crônica não é uma opção que se

possa acatar ou rejeitar, mas uma obrigação, principalmente em países como o

México, no qual muito frequentemente há manipulação de informação nos

meios. Como elucida Sergio Hernández, “la ética no es simplemente un valor

moral, sino un principio de responsabilidad social” (HERNÁNDEZ apud

GARCÉS, 2012, p.2). No entanto, isso não significa que nesse gênero haja

uma valorização da ética em detrimento da estética, pois, na literatura, a ética

não se opõe a estética. No entanto, como afirma Zavala: “De hecho, la lectura

política es lo que está siempre en el fondo de toda discusión estética” (ZAVALA

apud SALAZAR, 2011, p. 17).

A utilização de recursos expressivos na crônica, para Villoro, não é mero

adorno estilístico para se aproximar do leitor, mas uma posição clara diante da

realidade, uma postura que procura demonstrar qual é o seu lugar na

enunciação e as suas limitações, como afirma “Por supuesto, es una postura

personal; hay quienes trasgreden con mayor flexibilidad este límite pero yo creo

que tenemos un compromiso ético con la verdad (VILLORO, 2010c, p.2).

O lugar de enunciação constitui uma característica da crônica desde

suas origens, pois é a condição do testemunho presencial do cronista com

relação ao fato narrado. Na atualidade, esta peculiaridade ainda estar em vigor,

porém depende do objeto da crônica e das condições para exercê-la. A crônica

de um evento social, uma manifestação política, cultural ou esportiva pode

exigir a figura do cronista, porém a presença ou não do cronista no fato narrado

não é impedimento para construir a crônica, pois esse gênero é “El intento de

darle voz a los demás – estímulo cardinal de la crónica – es un ejercicio de

aproximaciones (VILLORO, 2005a, p. 15).

Page 220: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

220

Em O que resta de O que resta de Auschwitz: o arquivo e a testemunha

(2008), texto com o qual Villoro dialoga em Safari accidental, Agamben

menciona que há dois termos em latim para representar etimologicamente o

vocábulo testemunha. O primeiro é testis, significando aquele que se põe como

terceiro em um processo entre duas partes, enquanto o segundo, superstes,

“indica aquele que viveu algo, atravessou até o final um evento e pode,

portanto, dar testemunho disso” (AGAMBEN, 2008, p. 27). O cronista é um

testis e, certamente, isso implica uma responsabilidade

La crónica es la restitución de esa palabra perdida. […] La voz del cronista es una voz delegada, producto de una “de subjetivación”: alguien perdió el habla o alguien la presta para que él diga en forma vicaria. Si reconoce esta limitación, su trabajo no sólo es posible sino necesario (VILLORO, 2005a, p. 16).

É importante compreender que, ao buscar os limites entre a informação

e a narração, entre a crônica e a ficção, não se trata de que o primeiro

represente certa objetividade e o segundo a subjetividade, ou uma oposição

entre mentira e verdade. Ambas contam histórias, e talvez seja melhor pensar

que a verossimilhança para a ficção significa dar a impressão de que o narrado

pode pertencer à realidade; na crônica, significa autorizar o cronista a emitir

reflexões ou opiniões a respeito do narrado. Tanto a crônica quanto a ficção

têm ou deveriam ter uma mensagem comprometida, serem um reflexo do

mundo em que se vive.

4.2.1 O ornitorrinco da prosa: ficção e realidade

Lo que propongo, para acercarme a la obra de Juan Villoro, es una crítica abierta, alentado, precisamente, por lo que de abierto hay en su escritura y la libertad de su proyecto, que cruza todos los géneros y que encuentra una expresión inconfundible

83.

José Antonio Masoliver Ródenas

A crônica recorre a procedimentos jornalísticos como uma necessidade

de mostrar a realidade a partir da subjetividade individual. Ao mesmo tempo,

83

MASOLIVER RÓDENAS, Juan Antonio. Juan Villoro: itinerarios de la invención. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona: Editorial Candaya, 2011, p.31.

Page 221: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

221

permite o uso de estratégias provenientes de diversos gêneros, constituindo o

que Tapia chama de “una suerte de género satelital, que se mueve en órbita

propia sin alejarse demasiado del campo magnético que la justifica y retiene:

los hechos de la realidad contemporánea” (TAPIA, 2016, p. 2). Isso leva Juan

Villoro, parafraseando Alfonso Reyes, que chama o ensaio de centauro dos

gêneros, a considerar a crônica o ornitorrinco da prosa, e assim o faz pela

capacidade plena que ela tem para se alimentar do romance, da reportagem,

da entrevista, do teatro, do ensaio, entre outros, como se observa:

Si Alfonso Reyes juzgó que el ensayo era el centauro de los géneros, la crónica reclama un símbolo más complejo: el ornitorrinco de la prosa. De la novela extrae la condición subjetiva ̶ el mecanismo de las emociones ̶ , la capacidad de narrar desde el mundo de los personajes y crear una ilusión de vida para situar al lector en el centro de los hechos; del reportaje, los datos inmodificables ̶ la “lección de cosas”, como anunciaban los manuales naturalistas del siglo XVIII ̶ ; del cuento, el sentido dramático en espacio corto y la sugerencia de que la realidad ocurre para contar un relato deliberado, con un final que lo justifica; de la entrevista, los diálogos; y del teatro moderno, la forma de montarlos; del teatro grecolatino, la polifonía de testigos, los parlamentos entendidos como debate: la "voz de proscenio", como la llama Wolfe, versión narrativa de la opinión pública cuyo antecedente fue el coro griego; del ensayo, la posibilidad de argumentar y conectar saberes dispersos; de la autobiografía, el tono memorioso y la reelaboración en primera persona (VILLORO, 2005a, p. 14).

Assim como o ornitorrinco, esse mamífero ovíparo originário da

Austrália, ao mesmo tempo da terra e da água, capaz de incorporar

característica de outros animais, pois é do tamanho de um coelho e coberto de

pelos, mas tem bico de pato, cauda de castor, patas espalmadas e se alimenta

de larvas e insetos; põe ovos, mas não é ave; passa a maior parte do tempo

debaixo d’ água, mas não é anfíbio e amamenta, embora não tenha mamilos.

Ele parece ser muitos animais possíveis, mas é genuinamente diferente. O

cronista se apropria dessa metáfora para se aproximar ao gênero de natureza

heterodoxa que tem características de diversos outros, e essa mistura está

convertida em uma unidade singular e autônoma (ROTKER, 2005). A crônica

se assemelha ao ornitorrinco, pois se beneficia de muitos gêneros literários e

não literários, mas na condição de não ser nenhum deles. É, na verdade, um

gênero próprio, que impõe coerência ao acolher os diferentes códigos, com os

quais não somente se contamina, mas também incorpora materiais

heterogêneos: letras de músicas, citações de outros autores, fragmentos de

Page 222: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

222

documentos oficiais, discursos, material fotográfico. Introduz, inclusive,

discursos de outras disciplinas, como a etnografia, a antropologia, a filosofia e

a sociologia.

Villoro recorre à metáfora do animal monstruoso, uma vez que, quando

de sua descoberta no século XVIII, cientistas da época acreditaram se tratar de

uma montagem de algum taxidermista, ou seja, não era real. Para ele, essa

narrativa cifrada na mistura de múltiplas formas, assim como o ornitorrinco,

questiona a própria realidade.

Aos gêneros mencionados por Villoro, seria possível incluir outros

aparentados, como a literatura de viagens, as memórias, o ensaio histórico e

etnográfico e até mesmo o poema. No entanto, o objetivo aqui não é

acrescentar mais um nome na lista dos prováveis gêneros com o qual a crônica

pode identificar-se, mas demonstrar que, nas últimas décadas, se tornou

evidente uma série textual. Deste modo, ela questiona essas fronteiras

supostamente sólidas, pois a crônica se apropria de recursos da literatura e do

jornalismo, reelaborando-os em um novo discurso. No entanto, isso não

significa dizer, de maneira simplista, que não há mais gêneros, pois é “A través

del género [que] un texto es y tiene sentido” (PRINCE apud EGAN, 2004, p.

146), apenas mostrar que as crônicas de Villoro tencionam essa divisão

categórica entre fato e ficção. A ficcionalidade não é um marcador suficiente de

literatura, e a não ficcionalidade também não é o suficiente para declarar que

uma obra não é literária, pois “Talvez seja necessária uma abordagem

totalmente diferente. É provável que a literatura seja definível, não pelo fato de

ser ficcional ou “imaginativa”, mas porque emprega a linguagem de forma

peculiar” (EAGLETON, 2006, p.13), ou seja, tem em conta que as palavras

podem alterar a realidade. Egan menciona em sua obra Carlos Monsiváis:

cultura y crónica en el México contemporáneo (2004) essa tendência e

comenta: “Lo que sorprende es la tenacidad con que la Academia se ha

aferrado a una línea de demarcación literaria que injustificadamente proscribió

los discursos de no ficción del terreno privilegiado de la “alta cultura” (EGAN,

2004, p. 148).

Quando Villoro seleciona esses sete gêneros, nitidamente está

questionando onde está a realidade. É possível afirmar que não há

Page 223: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

223

“contaminação” entre gêneros ficcionais e não ficcionais em um texto? É esse

questionamento que está em discussão quando recorre ao ornitorrinco, pois,

nesse terceiro milênio, a representação se confunde com o real, e a crônica é

um elemento importante para discutir outros gêneros. A caracterização de um

texto em um único gênero pode ser problemática porque sempre existe gênero

nos gêneros, e participar não significa pertencer.

Os textos de Juan Villoro tencionam essas fronteiras e um exemplo

pertinente para entender a escrita desse autor é “El rey duerme: crónica hacia

Hamlet”, publicado pela primeira vez no livro de ensaios De eso se trata

(2008a) e depois em 2013 na parte destinada à coletânea de crônicas em

Espejo retrovisor (2013a). É crônica ou ensaio? Nesse texto, podem-se

perceber todas as sete partes do ornitorrinco mencionadas pelo escritor, além

de características de outros “seres” que contribuem para formar sua escrita

cronística.

“El Rey duerme” inicia com pistas autobiográficas e narração em

primeira pessoa, além de um sutil questionamento a respeito dos romances

históricos ou da história no romance: “A fines de 1993 concluí en la UNAM un

curso sobre «la idea de la Historia en la novela mexicana», dedicado a explorar

las tensiones que la narrativa establece con los hechos” (VILLORO, 2008a,

p.13). Além dessa, o tom memorialista e a narração em primeira pessoa

aparecem em muitas outras crônicas do autor, às vezes em chave irônica, pois

“Sólo en el patio hablábamos español. Patear una pelota y gritar en mi idioma

eran actos idénticos. [...] El fútbol se presentó así como mi primer afán de

pertenencia” (VILLORO, 2006b, p. 19). Em outras, a carga autobiográfica é o

tema principal do texto, como em “El libro negro”: “Durante muchos años mi

familia pudo celebrar su sólida condición nacionalista: mi padre tenía prohibida

la entrada a Estados Unidos” (VILLORO, 2005a, p. 23). Nessa última, observa-

se que, a partir de referências pessoais, como o sobrepeso, o sonambulismo, o

divórcio dos pais e sua primeira viagem aos Estados Unidos, o cronista

entrelaça com a história nacional, mencionando os seis cadetes que morreram

defendendo o México na invasão norte-americana de 1847, os Jogos

Olímpicos, a participação de seu pai e da imprensa no movimento estudantil de

1968 e a prisão de intelectuais.

Page 224: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

224

O livro Palmeras de la brisa rápida: un viaje a Yucatán (1989) é a obra

com mais dados autobiográficos da vida pessoal de Villoro, no qual a viagem a

terra natal de sua família, é um encontro com a infância de sua mãe e com o

mundo de sua avó: Estela Milán, a heroína da obra “para nosotros Yucatán era

la peculiarísima forma de hablar de la abuela” (VILLORO, 2009a, p. 13) e, mais

adiante, ao comentar sobre sua morte, diz “No puedo pensar en mi abuela sin

sentir que mi infancia estaba escrita en sus ojos” (VILLORO, 2009a, p. 25).

Como ocorre nas crônicas do autor frequentemente, o recorrido por Yucatán é

o caminho para o narrador levantar alguns questionamentos históricos que

podem ser notado através de um diálogo arrastado e, por vezes, doloroso com

um homem bem idoso, trajando vestimenta precária. Ao mostrar uma velha

fábrica desativada, à qual se refere ao passado como presente, ele é

conduzido a algumas reflexões em chave irônica: “¿en qué momento se jodió

México? ¿Quién se levantó con el primer pie izquierdo?, ¿quién hizo añicos el

primer espejo? De los virreyes a los priístas, un país de sangre y polvo”

(VILLORO, 2009a, p. 113). Nesse contexto, nota-se a subjetividade da crônica

através do eu que recorda a história pessoal e a vincula à nacional, reforçando

a ideia de que esse tipo de texto deve ser colocado na categoria de crônica, e

não na de autobiografia.

O cronista vai da reportagem aos dados. A reportagem é a ampliação da

notícia, ou seja, os dados que não podem ser modificados, como comenta

Carrión (2012). Em “El Rey duerme”, Villoro, a partir de acontecimentos da

época, como a participação do México no Tratado de Livre Comércio, a

rebelião zapatista e o assassinato do candidato priísta à presidência, tece

questionamentos a respeito do momento histórico por que passa o país:

“¿Terminaba la época de los «espaldas mojadas» que trabajaban ilegalmente

en los campos de algodón para pasar a los «cérebros mojados» que disertarían

en las universidades?” (VILLORO, 2008a, p.13). No entanto, o que percebe,

como comenta o autor, trata-se de “otro espejismo de la relación entre México y

Estados Unidos” (VILLORO, 2008a, p.13). A realidade é diferente do

anunciado.

A reportagem é o gênero jornalístico que exige investigação e, através

da narração, reconstrói um fato (sobre o movimento zapatista), a vida de um

Page 225: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

225

lugar (“Cosas que escuché en La Habana”), a vida de um personagem

(“Rushdie en Tequila”, “Vida, muerte y resurrección de Diego Armando

Maradona”). É o gênero que procura responder interrogantes sem deixar cabos

soltos, além de usar uma linguagem criativa que engloba outras formas

jornalísticas e literárias. Em todas as crônicas que compõem a obra de Villoro,

observa-se que a notícia é o ponto de partida, porém se diferencia da

reportagem pela clara voz do cronista, que comenta, interpreta e opina sobre o

informado, e na reportagem não há espaço para comentários.

A referencialidade das crônicas de Villoro, que cumprem o que afirma

Linda Egan “El propio referente ha de ser un fenómeno que pertenezca al

dominio público fuera del texto” (EGAN, 2004, p. 168), aparecem repousadas

sobre o texto às vezes com datas explícitas: “En enero de 1994, Bloom escribía

Shakespeare. La invención de lo humano” (VILLORO, 2008a, p. 16) ou podem

ser rastreadas a partir de um tema disperso em meio ao texto

En ese invierno plagado de tormentas cometí el error de intentar una actividad que debería estar prohibida para culturas sin un dios de la nieve: aproveché las vacaciones de medio semestre para esquiar y fracturarme el tobillo. Volví al curso de Bloom en muletas. Mientras tanto, mi país se sumió en una tragedia shakespeareana. Luis Donaldo Colosio, candidato do PRI a la presidencia, fue asesinado. El sistema político instaurado en 1929 se tambaleaba en un drama de intrigas, venganzas, lealtades inciertas (VILLORO, 2008a, pp. 17-18).

Não obstante, é preciso evidenciar que o reconhecimento de um

referente na crônica é complicado, pois pode estar vinculado a um grupo

pequeno ou a um determinado espaço, por isso a inclusão de detalhes reforça

o referencial.

Da entrevista, “El Rey duerme” toma os diálogos que aparecem, não

como uma entrevista formal, mas em chave irônica na qual o autor de Dios es

redondo vai introduzindo frases emitidas por Bloom, que indiretamente atacam

o estruturalismo: “_ Si quieren un Shakespeare francés, éste no es el curso.

Por otra parte, si ya estudiaron conmigo y no les puse buena nota, les

recomiendo que se vayan. ¿Para qué repetir el encuentro con el monstruo?”

(BLOOM apud VILLORO, 2008a, p. 15) ou lança perguntas retóricas aos seus

alunos “–¿Qué sintieron después de su primer fracaso amoroso? ¿Sabían ya

Page 226: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

226

que estaban condenados a volverse a enamorar?” (BLOOM apud VILLORO,

2008a, p. 17). Esses questionamentos estão entrecruzados com comentários

críticos: “Estas preguntas, dignas de un psicólogo que habla en la radio,

convertían al clásico en árbitro de los problemas de los jóvenes sentados a la

mesa” (VILLORO, 2008a, p. 15), pois não esperaba respostas de seus

interlocutores, como demonstra Bloom em sua declaração de intenções:

“Bloom no pretendía monopolizar el magisterio sino discutir en clave socrática.

No se trataba de una cátedra sino de un seminario. Sin embargo,

compartíamos un acuerdo tácito: lo interesante era oírlo a él (VILLORO, 2008a,

p. 15). São diálogos que estão mais próximos do teatro que da entrevista.

Em Safari accidental, na parte denominada “Alto volumen”, aparecem

cinco crônicas de entrevistas, pois não consiste em diálogos formais entre duas

pessoas, mas perguntas, respostas e reflexões, ou seja, misturas que dão

ritmo ao texto. Como o nome já indica, os textos estão dedicados a figuras do

rock ou que tenham a ver com esse gênero musical, como é o caso de “La

destrucción tranquila: Yoko en México”. Na entrevista com Bono, por exemplo,

são intercaladas conversas coletivas com comentários. Essa hibridez faz com

que os textos tenham o que Ana María Amar Sánchez chama de

interdependência formal (AMAR SÁNCHEZ, 1990, p.449), pois a relação da

crônica com outros discursos promove uma conexão de dependência recíproca

que potencializa a escrita, como se observa no epílogo de Safari quando Villoro

comenta a respeito dessa composição em sua obra cronística:

Algunos textos podrían estar en un libro de entrevistas (los encuentros con Mick Jagger y Peter Gabriel) y algún otro en un libro de ensayos (la evocación memoriosa del romance entre Zelda y Francis Scott Fitzgerald). Me hubiera parecido rigorista expulsarlos de un libro que se funda, precisamente, en un género híbrido, que tanto depende de la impronta. Los patos que nacen entre los ornitorrincos se creen ornitorrincos. Así pasa con algunos textos de esta selva (VILLORO, 2005a, p. 257).

Pode-se dizer que também há patos em Los once de la tribu: “Las

hormigas son más terribles”, “Conversación con Ángel Fernández”, “El viajero

en su casa”, “Conversación con Günter Grass” e “Jane Fonda en media hora” e

em Dios es redondo: “Los responsables de azar. Conversaciones con Jorge

Page 227: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

227

Valdano”, essas crônicas estão tão próximas da entrevista quanto do ensaio,

pois, ao mesmo tempo que interroga seus interlocutores, tece comentários,

argumenta e reelabora a discussão. A respeito dos diálogos que compõem o

texto, o cronista apresenta uma maneira muito peculiar de realizá-las, como

escreve em Los once de la tribu:

Truman Capote recomendaba trabajar sin grabadora para mantener despiertos los reflejos literarios. Seguí el consejo en “La vida en cuadritos”, entrevista que transcribí sin mis preguntas. El recurso resulta esencial ante personas cuyo lenguaje se ignora –los giros, las muletillas, las vacilaciones se convierten en normas de carácter (VILLORO, 1998, p.10).

Na crônica “La vida en cuadritos o los dias inacabables de la familia

Burrón”, dedicada à entrevista com o caricaturista Gabriel Vargas, é

apresentada uma narração com voz única, quase um monólogo, no qual o

entrevistado responde sem perguntas. A voz narrativa do cronista aparece em

cursiva no início da crônica em uma apresentação da figura de Vargas, de sua

principal obra e a respeito da importância desta: “La infinita saga de los Burrón

es un espejo a bordo de un “huacal con ruedas”, la crónica informal de la

ciudad de México, el diccionario ambulante de su idioma” (VILLORO, 1998, p.

194). Ao final, ele comenta:

— ¿Nunca relee sus historietas? — ¡Ni lo mande Dios!— Gabriel Vargas se persigna. No le interesa lo que ya hizo, o en todo caso, le interesa más el cuadro que dibujó a los 13 años, escondido bajo la cama, con los lápices de la lavandería de chinos (VILLORO, 1998, p. 205).

A crônica dedicada a Martin Amis “Cómo salir de una botella y otras

ansiedades” consiste em um diálogo itinerante que inicia no Parque del Retiro

de Madrid com uma conversa formal, pública e se percebe que há um

deslocamento pela cidade até o escritório do escritor. O texto termina em um

jantar com vários interlocutores que se intercalam entre as palavras de Amis e

os comentários do cronista. Ao incluir outras vozes na entrevista, formato que

realiza em Amis, mas também com Yoko, Peter Gabriel e Mick Jagger, Villoro

tira o protagonismo do entrevistado, pois outros personagens contribuem para

entender a celebridade e dar ritmo à narração.

Page 228: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

228

“Jane Fonda en media hora” apresenta uma crônica composta de uma

entrevista formal, porém entre comentários e perguntas, nos quais o cronista

intercala a hora, como na série televisiva americana 24h, de Joel Surnow e

Robert Cochran. É um formato que, ao mesmo tempo em que transcorre o

diálogo, apresenta um relógio digital marcando o horário das perguntas em um

tempo não linear, pois o cronista demonstra que as perguntas foram realizadas

em uma determinada ordem e a crônica organizada em outra. Villoro apresenta

a limitação do tempo disponibilizado pelo entrevistado em uma crítica

pertinente e irônica.

Villoro também tem incursionado no gênero teatro com duas obras:

Muerte parcial e El filósofo declara, além do roteiro para o filme Vivir mata. As

características básicas desse gênero são incorporadas ao texto, como a

organização dos diálogos e na maneira como os atores interpretam histórias.

Pode-se aproximar esse gênero na crônica “El Rey duerme” pela maneira

como Bloom conduz o seminário, que, por vezes, induz à teatralidade. Ele não

lê os textos de Shakespeare, mas os recita de memória: “Nunca vimos al

maestro leer un fragmento de las tragedias. [...] Bloom cerraba los ojos, agitaba

la cabeza como si las palabras convocadas fueran un dolor y recitaba largas

tiradas con voz tonante” (VILLORO, 2008a, p. 16).

As técnicas teatrais também são utilizadas para imergir o leitor na

narração, construindo o texto a partir de uma trama com características que

contribuem para a sensação que às vezes estão tão próximas da dramaturgia

que beiram a comicidade, como se pode observar nas entrevistas: “Peter

Gabriel frota la punta de su barba hasta dejarla en forma de signo de

interrogación: “Sé cuál es la primera pregunta”, sonríe: “Porqué me tardé tanto

en hacer otro disco” (VILLORO, 2005a, p. 95) e também com o líder dos Rolling

Stones

Aos 58 años, Jagger sigue sin estar quieto en una silla. Cruza y descruza las piernas, gesticula como si tuviera que ser elocuente a treinta metros de distancia, cargado de una energía sin propósito definido. Sus facciones se han arrugado en forma decorativa, como el rictus de pistolero de Clint Eastwood o los inmersos rostros de piedra de Mount Rushmore (VILLORO, 2005a, p. 74).

Page 229: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

229

A voz de proscênio que menciona Villoro aparece através da polifonia de

vozes presente em “Nada que declarar” e nas crônicas dedicadas ao

movimento zapatista como “Un mundo (muy) raro” e “Los convidados de

agosto”, nas quais o cronista intercala a voz narrativa à de testemunhos

anônimos que interferem na narração, transformando a opinião pública em um

representante contemporâneo do coro grego.

Como os escritores da Onda, os contos de Villoro têm características de

crônica, o que se observa em La noche navegable (1980), Albercas (1985), La

alcoba dormida (1992), La casa pierde (1999) e Los culpables (2007). Todos os

sete contos que compõem essa última obra, por exemplo, estão em primeira

pessoa e partem de situações do cotidiano.

Do conto a crônica extrai o espaço curto, os personagens e a estrutura

de relato fechado que o justifica. Essa experiência ocorre com o pequeno

caderno de rascunho presenteado por uma aluna que percorre todo “El Rey

duerme”, no qual Villoro faz as anotações dos seminários de Harold Bloom,

mas depois o perde, como se observa nesses trechos: “Conservé el cuaderno

como un talismán de las relaciones no siempre explicables entre maestro y

alumno. [...] Anoté [...] observaciones que me parecieron esenciales”

(VILLORO, 2008a, p.18). Mais adiante, ele complementa: “Sin embargo, al

regresar a México me olvidé de las anotaciones y durante trece años no tuve

noticia de ellas” (VILLORO, 2008a, p.18). O caderno contribui para dar unidade

ao texto, ou seja, a ideia de que a história está completa, diferentemente da

crônica que, geralmente, conclui de maneira mais aberta.

Nota-se também que nos contos, assim como nas crônicas, Villoro

presta pequenas homenagens a seus autores preferidos: Onetti, Borges, Bioy

Casares e Cortázar. Fato que se percebe na última parte da crônica intitulada

“El otro cuaderno”. Nesta, aparece um duplo do caderno recebido de uma

aluna no início do texto. No primeiro faz anotações do seminário de Bloom; no

segundo, as outras discussões consideradas mais pertinentes por ele, como,

por exemplo, as reflexões sobre o conto de Borges “La memoria de

Shakespeare”, que fica evidente no trecho: “Como el rey Hamlet, el cuaderno

durmió una larga siesta. Volvió a mis manos justo cuando encontré el cuaderno

de apuntes. Uno había servido a las leyes del oído. El segundo, como el

Page 230: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

230

célebre fantasma, reclamaba otras palabras” (VILLORO, 2008a, p. 38). As

anotações do outro caderno retêm as discussões que envolvem a outra

literatura. Isso não significa uma exclusão da denominada “ literatura canônica”,

pois convoca Borges e Segovia, talvez seria mais adequado o entendimento de

que é possível discutir literatura a partir do popular, do que a primeira vista não

é literário, dos pequenos objetos, enfim, da crônica. Villoro, quando

questionado se o popular de alguma maneira desmerece o autor frente à

crítica, responde:

Yo no creo que un autor por tener éxito popular pierda la calidad. Cervantes era un autor enormemente disfrutado en su época. Cuando publica la primera parte de Quijote, aparecen Quijotes piratas, apócrifos y entonces para que no haya Quijotes piratas, él escribe la segunda parte y mata su personaje, para que nadie puede decir “otra aventura de Don Quijote de la Mancha”. […] Otro autor exitosísimo en su época fue Shakespeare […]. Él llenaba los teatros, él mismo actuaba en las obras y probablemente hoy día escribiría guiones de cines, series de televisión y usaría plataformas contemporáneas muy exitosamente. Entonces, yo creo que no necesariamente el éxito o el contacto popular demerita una obra pero hay las que hacen exclusivamente para tener éxito comercial y ahí sí yo ya me detengo […] cuando alguien intentar ser más sensacionalista que profundo (VILLORO, 2016d).

Em outras crônicas, também se percebe o deslocamento na direção dos

detalhes, dos pequenos objetos, de um dia em especial ou de uma moeda.

Esta última, inclusive, aparece em vários textos de Villoro, e Stefano Tedeschi

publica um artigo a respeito: “El testigo y las monedas en la obra narrativa de

Juan Villoro” (2006). Nesse texto, Tedeschi somente destaca as moedas nos

romances e contos, mas certamente poderia acrescentar as quatro obras que

compõem esta pesquisa.

Em 8.8 el miedo en el espejo, o elemento telúrico e literário aparece no

prólogo intitulado “Un modo de dormir”, no qual, a partir de uma anedota

pessoal e familiar, Villoro se aproxima do abalo sísmico: “Mi padre siempre ha

dormido en piyama […]. En adolescencia adquirí una costumbre que no pasó

por la reflexión […]: dormir sin piyama” (VILLORO, 2010a, p.13). Ele tece uma

reflexão sobre a vestimenta, o que, inicialmente, não tem importância: “Hay dos

clases de durmientes extremos: los que usan ropa específica y los que no usan

ninguna. En medio queda el resto, que durante anos supuse una abrumadora

Page 231: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

231

mayoría” (VILLORO, 2010a, p.15). Com o abalo, adquire pertinência, pois,

após o susto, o narrador se dá conta da vestimenta que todos estão usando no

lobby do hotel. No epílogo “Un regalo”, o cronista recupera essa simples peça

de dormir que percorre o texto e termina também com uma anedota, pois

Villoro recebe de presente de sua amiga Laura Lecuona, que também estava

no hotel durante o terremoto, diversos livros de uma editora e um pijama.

A partir desse pequeno objeto, o cronista incorpora em sua crônica,

juntamente com a memória pessoal e coletiva de outros terremotos ocorridos,

reais ou imaginários84, o comentário filosófico, político, literário, a narração

romanceada, o ponto de vista do autor e do narrador como testemunha para

reconstruir relatos de vidas a ponto de extinguir-se. E assim ele comenta:

Lo que el miedo destruye no se recupera en forma integral. Ésta es una crónica en fragmentos. Quise ser fiel a la manera en que percibimos el drama: la población flotante de un hotel reunida en un naufragio. No es un reportaje de un país que se quedó en su zona sur ni de una capital que resistió en forma admirable. Es la reconstrucción en partes de un microcosmos […] (VILLORO, 2010a, p. 23).

Os fragmentos da memória, a sensação de caos, a multiplicidade de

gêneros: ensaio, na parte intitulada “La abolición del azar”, no qual aborda a

vida e a obra do escritor alemão Heinrich von Kleist, cuja visão do caos e da

natureza do homem aparecem em seu romance El terremoto de Chile (1808);

romance: a maneira como apresenta os testemunhos, como, por exemplo, os

diálogos e a caracterização das assistentes do congresso que parecem

personagens de uma história ficcional; e crônica: através do testemunho de

outros escritores que participaram do evento, como as mensagens postadas no

Twitter por Francisco Hinojosa, a crônica de Gloria Hernández publicada em El

Periódico de Guatemala e os relatos do escritor argentino Marcelo Figueras,

que se serviu do blog para narrar sua experiência, contribuem para tecer e dar

unidade à composição dessa obra, que poderia passar por romance ou ensaio,

84

O terremoto no Chile remete o autor não somente aos terremotos acontecidos no México, mas também a um abalo ficcional, como comenta Villoro: “La literatura suele prefigurar enfermedades que no han sido diagnosticadas y cataclismos que no han sucedido, o no lo han hecho de ese modo. En 1807, Heinrich von Kleist escribió un relato lleno de significados: El terremoto en Chile” (VILLORO, 2010a, p. 24), referente a um abalo ocorrido no país em 1647, na cidade imaginária de St. Jago.

Page 232: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

232

mas que Villoro reitera tratar-se de uma crônica, numa tentativa de acomodar

sua escrita em um gênero.

Do romance, a crônica se apropria da condição subjetiva, a capacidade

de narrar e de promover a ilusão de vida para situar o leitor no centro da

narração. Em suas crônicas, o próprio autor se “ficcionaliza” ao se introduzir

como cronista no texto, juntamente com os outros personagens. Desta forma,

sem deixar de ser real, torna-se ficcional. Essa mistura harmônica, porém, nem

sempre em partes iguais, faz com que o dado e a ficção aproximem-se, como

pode ser percebido em suas crônicas já mencionadas. O estilo e a visão de

mundo dessas crônicas são transportados a seus romances e contos, como

comenta Tedeschi

la concisión y la precisión en el dibujo de los personajes, el gusto por la frase aforística, la capacidad de organizar la narración novelesca en unidades más puntuales, la técnica de la digresión, son todas características que Villoro transporta de la crónica a la novela, para construir máquinas narrativas intrigantes y complejas (TEDESCHI, 2006, p.6).

Além dessas características, podem ser citados os romances de Villoro

publicados até o momento: El disparo de argón (1991), Materia dispuesta

(1997) El testigo (2004) e Arrecife (2012b). Eles compartilham com as crônicas

os espaços e os lugares, principalmente a Cidade do México, onde se

desenvolve a maior parte de sua obra ficcional e não ficcional. Juan Antonio

Masoliver Ródenas, em seu artigo “Juan Villoro: itinerarios de la invención”,

afirma que “La escritura de Villoro va mucho más allá de la crónica de un

pasado muerto, un presente caótico y un futuro agonizante e inmóvil”

(MASOLIVER RÓDENAS, 2011, p. 48). Nesses romances, o autor utiliza uma

das principais características da crônica: o relato de situações do cotidiano em

um intervalo de tempo, além de reforçar outros como a aproximação aos

detalhes, a justaposição de elementos heterogêneos e os objetos

aparentemente insignificantes que adquirem sentidos, já que contribuem para

formar a realidade.

Outro recurso da prosa ficcional compartilhada com a crônica é a

invenção de personagens, que o cronista utiliza em todas as crônicas de

Page 233: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

233

Tiempo transcurrido, pois todos os protagonistas são personagens ficcionais e

em algumas de Safari, Dios es redondo e Los once de la tribu. Eles estão

misturados aos personagens reais e em geral apresentam características

peculiares, pois são figuras que desmontam os estereótipos nacionais, e

geralmente são de classe média.

No prólogo de De eso se trata, Villoro menciona que escrever ficção é

uma forma de leitura solitária, como em “Ensayar: leer en compañía”

(VILLORO, 2008a, p. 10). Em “Escribir al sol”, que é o prólogo de Los once de

la tribu, o cronista destaca que escrever crônicas é uma maneira de sair ao sol,

de se aproximar da realidade. Dentre as muitas fronteiras que a crônica

villoriana transborda, sem dúvida, a principal delas é o ensaio, inclusive porque

“son los géneros híbridos que más habitualmente se leen como sinónimos”

(EGAN, 2004, p. 162). Isso se deve ao debate de ideias, à manifestação de

tomadas de posição nos debates culturais, ao discurso criativo, crítico,

persuasivo e confessional, que aproveita a dupla dimensão expositiva e

argumentativa do ensaio na crônica. Juntando as duas acepções propostas

pelo autor, poder-se-ia dizer que suas crônicas são uma forma de ler em

companhia ao ar livre, uma forma de refletir sobre literatura, questionando

outras possibilidades de sua prática estabelecida.

A aproximação entre a crônica e o ensaio em Villoro nota-se pela

subjetividade e o idêntico movimento do “eu” que, frequentemente, através da

evocação de uma vivência pessoal, em estreita relação com o tema proposto,

impulsiona o processo de escrita, mas, como comenta Massaud Moisés:

“enquanto o ensaio guarda sempre uma intenção, ainda que sob o disfarce da

informalidade, a crônica, ou repele a intencionalidade ou deixa de ser crônica”

(MOISÉS, 1982, p. 251).

Theodor W. Adorno em O ensaio como forma (2003), destaca algumas

características do ensaio que podem ser observadas na crônica, como a

liberdade de espírito; a não admissão de competência, ou seja, pode tratar de

qualquer assunto; a comicidade; começar e terminar onde quiser; permitir a

superinterpretação; não proceder de um pensamento linear e possuir uma

relativa independência estética. Essas características podem ser encontradas

Page 234: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

234

nas crônicas de Villoro, mas principalmente nas que compõem o corpus dessa

pesquisa.

Ao invés de tentar identificar “El Rey duerme” como crônica ou ensaio,

talvez seria adequado pensar que é uma crônica sobre o ensaio ou na frase de

Darío parafraseada por Rotker: “la crónica es el laboratório del ensayo”

(ROTKER, 2005, p.108). Essa crônica não é um ensaio sobre a obra de

Shakespeare, mas uma reflexão do momento de escrita de um ensaio e o que

pode influenciar na construção deste. É certo que Villoro se aproxima da obra

do escritor inglês a partir de três referências: a leitura crítica de Harold Bloom, o

conto “La memoria de Shakespeare”, de Jorge Luis Borges e a tradução ao

espanhol de Hamlet, de Tomás Segovia. Observa-se, porém, que a questão

central do texto é como essas referências podem se conectar com a narração

no momento exato em que ele está procurando abordar em sua crônica, que

remete ao final de 1994, tudo o que está ocorrendo no México, quando o país

passa por sérios problemas políticos, como o assassinato do candidato à

presidência, Luis Donaldo Colosio, a entrada do país na TLCAN e a Rebelião

zapatista.

O texto trata de como esses acontecimentos se conectam com a viagem

do autor para dar aulas nos Estados Unidos e acaba por se torna aluno de

Harold Bloom (Villoro não se apresenta como escritor) no momento em que ele

estava preparando Shakespeare, la invención de lo humano; o lançamento da

tradução de Hamlet realizada por Segovia, que resulta no nome do livro, devido

a maneira como o poeta, que nasceu na Espanha e se naturalizou mexicano,

revoluciona a tradução da famosa frase “Ser o no ser” ou “He ahí el dilema” ou

“Ésa es la cuestión”. Segovia evita os clichês idiomáticos que

monumentalizaram a obra inglesa, aproxima-a de uma linguagem mais íntima e

diz: “De eso se trata”. Ou seja, ele mostra como tudo isso aproxima tramas tão

longínquas como as que aparecem na obra de Shakespeare com o momento

histórico por que passa seu país. Segundo Villoro, é possível entender México

e “las intrigas políticas en clave shakespeariana” (VILLORO apud RUIZ

MONDRAGÓN p. 2).

Nessa crônica, Villoro reúne termos e obras que em sua produção,

principalmente cronística, ele questiona. Harold Bloom é o autor de O cânone

Page 235: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

235

ocidental. Esse livro relaciona as obras que pertencem a essa lista imaginária

do que é literatura, e que cada qual possui a sua. Nela, Shakespeare é

considerado “a figura central do Cânone Ocidental” (BLOOM, 2001, p. 11) e

Hamlet, Rei Lear e Macbeth, (BLOOM, 2001, p. 69), a expressão máxima do

que significa uma obra literária. Bloom, certamente não introduziu nenhuma

crônica em seu livro. Villoro produz textos com características que,

indiretamente, questionam essa tradição que Bloom defende. Como comenta

em chave irônica que o crítico transforma a obra de Shakespeare em “una

alegoría sobre el núcleo cultural de Occidente y a la manera de preservarlo”

(VILLORO, 2008a, p.33). Ou seja, ao monumentalizar a obra do autor inglês,

Bloom lhe atribui nada menos que “a invenção do humano”.

Ao convocar Borges e Segovia, o cronista está questionando essa

perspectiva eurocêntrica do crítico americano, pois, desde a ficção e da

tradução, deslocam o clássico inglês dessa posição centralizadora. No conto

de Borges, um homem ao ser habitado pela memória de Shakespeare,

descobre que não se trata da memória de um grande autor ou grande

dramaturgo, mas de um homem com as lembranças mais cotidianas, e reflete

Villoro sobre o protagonista do conto: “Escribir como Shakespeare es una

desmesura, ser Shakespeare es banal” (VILLORO, 2008a, p. 36). Na ficção

borgeana, a universalidade destacada por Bloom, adquire um tom menor, pois

Borges percibe una ética de la creación al entregarse con gratuidad a la escritura, al margen del siglo y de espaldas a la ignorada posteridad. Un hombre común deja que el idioma fluya. La normalidad del punto de partida exalta el resultado: los cristales surgen de la arena (VILLORO, 2008a, p. 37).

Villoro percebe no conto de Borges a desmonumentalização da figura

canônica, pois trata da memória de Shakespeare como a de um homem

comum “La perspectiva borgeana atenuaría, así, la potencia simbólica de la

obra de Shakespeare como emblema de lo humano forjado desde posiciones

eurocéntricas” (OLMOS, 2017, p.47). Ao resgatar em sua crônica todos esses

elementos, o cronista procurar ressaltar que a crônica é um gênero que

possibilita a discussão sobre o caráter literário e não literário de seus textos.

Page 236: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

236

A crônica para Juan Villoro não é simplesmente uma mistura de

jornalismo e ficção. Incluiu todos os gêneros conto, romance, autobiografia,

ensaio, reportagem, entrevistas, teatro clássico e moderno, manuais, entre

outros; é uma partícula elementar de toda a sua escrita; funciona como uma

espécie de prototexto de todos os seus textos, é um tipo de prosa muito

peculiar. Quando Villoro compara a sua crônica ao ornitorrinco, ele destaca

uma prosa que absorve elementos do real ao mesmo tempo que da ficção,

como se sua escrita estivesse, assim como o animal em um continente isolado,

ou seja, que evoluiu de maneira diferente, com uma linguagem que mistura

características que o aproximam da oralidade, com o aforismo, com temas que

analisam a cultura divulgada nos meios massivos e publicadas em

diversificados meios que vão do jornal impresso ao twitter. A crônica villoriana,

como toda obra de arte, não se limita a um gênero específico, procurando

conjugar-se com todo tipo de disciplina e de conhecimento.

Page 237: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

237

CONCLUSÂO

Aunque toda metrópoli se erige contra la naturaleza, pocas han tenido la furia destructora de México D. F. Una vez anulada el agua, el horizonte de destrucción fue el cielo. El paisaje urbano está determinado por estas pérdidas fundamentales. Hace algunos años, al visitar una exposición de dibujos infantiles, comprobé que ningún niño usaba el azul para el cielo; sus crayones escogían otro matiz para la realidad: el café celeste. Quien aterriza de noche en la ciudad de México siente que llega a una galaxia desordenada. Sin embargo, esa marea encendida, que ocupa el valle entero, sigue creciendo. Su lógica exige la expansión continua. ¿Hacia dónde puede proseguir? Todas las flechas apuntan hacia abajo. El subsuelo recorrido por el metro es nuestra última frontera. Más allá de los imperativos geológicos, esta dinámica tiene una fuerte carga simbólica. En la mitología prehispánica, la vida comienza y termina bajo la tierra. Borges resumió en dos versos su atribulado fervor por Buenos Aires: "No nos une el amor sino el espanto/ será por eso que la quiero tanto". Los contradictorios placeres de la ciudad de México son de este tipo. A diario juramos abandonarla y a diario nos entregamos a su abrazo; es la irrenunciable compañía que merecemos. Que otros vivan en las ciudadelas del orden y el tránsito feliz. Nosotros exigimos el carácter complicado y la belleza ambigua de la mujer barbuda

85.

Juan Villoro

A produção cronística de Juan Villoro tem sido uma voz constante na

literatura mexicana dos anos finais do século XX e primeiros do XXI em

diversificados meios. Ele é um artesão que desenha em letra impressa os

acontecimentos de que é testemunho, tendo sido, inclusive, em muitas

ocasiões, partícipe.

Os textos deste autor iluminam o gênero. Em suas crônicas, Villoro

retrata os acontecimentos através de variados elementos estéticos, não apenas

estrutural. Ele destaca, neste caso, a configuração de tempo-espaço e a

linguagem, mas também o aspecto ideológico e a função do discurso

estabelecido pela crônica como meio para exercer a crítica sobre a realidade

social, principalmente no México, através de um mecanismo de “não-ficção”.

Ao observar esse trecho de “La ciudad de México: mujer barbuda”, percebe-se

que a crônica não tira o leitor da dimensão da realidade dos fatos, pois o

85

Trecho de La ciudad de México: mujer barbuda. Publicada en La nación en 21.08.2005c.

Disponívelem: http://www.clubcultura.com/clubliteratura/clubescritores/villoro/mapas/mex-ven02.html Último acessoem: 12.12.2015.

Page 238: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

238

introduz nesse plano de uma forma crítica, reflexiva, sem perder, entretanto o

valor referencial.

Essa crônica menciona uma série de problemas cotidianos da Cidade do

México, como a escassez de água, a poluição do ar e o subsolo como último

subterfúgio. O entrecurzamento com trechos da obra de Borges, com uma

linguagem elaborada composta de metáforas e ironia, demonstra que o

aumento do estético e do literário não diminui a relação com o referencial ou o

social, pois “A literatura en cuanto arte no se la puede ver como una categoría

separada del proceso social que la contiene: es un acto de solidaridad histórica

y participa de la multiplicidad de la práctica cultural” (ROTKER, 2005, pp. 228-

229).

Para Villoro, a crônica é um gênero literário porque sua qualidade de

escrita lhe é consubstancial, constituindo um elemento definitivo encontrado

desde suas origens. Por essa razão, privilegiou-se, nesse estudo, a

identificação, em sua prosa cronística, do que Hayden White chama de “o

conteúdo da forma”, ou seja, a maneira particular de representar o real através

de recursos ficcionais, porém sem destruir o status jornalístico. Através da

crônica, ele constantemente explica, raciocina e constrói textos de modo que,

na interpretação, prime a informação. Não se trata de notícia comentada, mas

da apresentação de uma narrativa em movimento, intercalando o fato, o

testemunho, uma linguagem elaborada e, talvez por isso, muitas de suas

crônicas sejam em primeira pessoa, com recursos estilísticos, obras literárias,

reflexões sociológicas, cultura popular massiva, interpretando o visto, o ouvido

e o sentido na cotidianidade, sempre para dar maior sentido ao texto.

Ao longo desta pesquisa foram levantados elementos que contribuíram

para confirmar a hipótese. Pode-se perceber que seu projeto de escrita leva em

consideração atributos que se revelam nesse gênero como: o autor, a

linguagem, o tema, o veículo, a tradição e o ângulo adequados, pois Villoro

pertence à geração que vai conectar-se com a esfera pública, que não é

necessariamente acadêmica, ou seja, a elite letrada, aquela que escreve para

poucos e se baseia na tradição europeia, mas que, a partir da década de 60,

começará a ter seu espaço invadido pela cultura de massa.

Page 239: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

239

Na primeira parte deste estudo, procurou-se demonstrar o início de sua

trajetória literária, quando Villoro já estava atento às mudanças e queria

reproduzi-las em seus textos. O autor, nos idos dos anos de 1970, pretendia

responder a questionamentos relevantes e por isso retoma alguns, como as

consequências do massacre de Tlatelolco, a crítica pela busca obsessiva da

“identidade nacional comum”, a análise de elementos mais próximos da

culturas divulgada nos meios massivos de comunicação como: o rock, o

futebol, o boxe, as celebridades, além de dedicar-se a crítica ao consumo e a

violência urbana, principalmente do narcotráfico.

Nessa parte também, discorreu-se, sobre a formação de Villoro, que é

sociólogo, mas teve, como um de seus primeiros ofícios, jornalista de uma

emissora de rádio, ao mesmo tempo que publicava contos e crônicas. Esse

fato adquire relevância para demostrar que, desde o início, ele trabalha com a

tensão entre jornalismo e literatura. Seu primeiro livro de crônica, Tiempo

transcurrido: crónicas imaginarias, abre e fecha com duas tragédias: o

massacre de Tlatelolco e o terremoto de 1985. Nele, há um percurso de três

diferentes décadas, recolhendo fatos históricos, sociais e culturais com a

intenção de resignificar a realidade.

A importância do processo histórico se observa também nas outras

obras cronísticas do autor, seja através da cultura, como acontece em Los

once de la tribu e Dios es redondo, ou da influência do consumo e do

neoliberalismo, como ocorre em Safari accidental, pois, para Villoro, o cronista

é o historiador do presente que escreve para o futuro. Quando ele retoma

temas que envolvem a cultura divulgada nos meios massivos de comunicação,

não abandona o processo histórico em que esse fato está inserido, pois “A

cultura de massa é animada por esse duplo movimento do imaginário

arremedando o real e do real pegando as cores do imaginário” (MORIN, 2011,

p.27). Observa-se que em sua obra cronística o ficcional não diminuiu a

importância do dado histórico, já que ele trabalha a ficção e a não ficção,

entendendo que uma não se sobrepõe à outra, uma vez que a ficção não se

confunde com a realidade.

Durante as análises, percebeu-se que para melhor compreensão de sua

produção cronística era importante analisar as características da linguagem

Page 240: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

240

empregada por este autor, no qual, se percebe que, por trás de uma prosa

aparentemente simples, encontra-se uma escrita composta de elementos

estéticos que ressaltam a linguagem é outra realidade e impõe suas leis ao

fato. Assim, aquilo a que chamamos realidade factual nunca estaria a salvo de

uma construção da linguagem. Ao utilizar, em suas crônicas, recursos como o

humor e a ironia, Villoro reforça que são uma forma de preservar o caráter de

resistência de seus textos. O aforismo, que é material inflamável em suas

mãos, contribuiu para uma composição, na qual, se percebe uma tentativa de

eliminação de divisões categóricas entre “alta” e “baixa” cultura. A utilização

desses recursos na sua produção cronística são para o autor uma forma

oblíqua de iluminar a realidade, pois “la realidad mejora a través de las

palabras” (VILLORO apud TORRES, 2016, p.1). Dando a impressão de que

não está tratando de “temas sérios”, ele analisa o processo político do país,

como se observa nesse trecho em que reflete sobre o período entre 1970 e

2000

Si alguien resucitara hoy en Alemania, Irak, China o Chile después de pasar treinta años en coma se sentiría como un extraterrestre. La historia y sus efectos especiales han convertido esas locaciones en algo muy distinto de lo que eran hace tiempo: planetas singulares. En cambio, si el paciente volviera en sí en México, se sentiría como un zombi al que le bastan dos tequilas para adaptarse y un tercero para desear volver al coma. […] Los treinta años que van de 1970 a 2000 representaron la restauración crónica de lo mismo, una transición en cámara lenta, un capitalismo que se reiteraba con cambiante aspecto. Un baile de disfraces e ideologías. El nacionalismo, la libre competencia, el estatismo y aun el liberalismo social tuvieron su oportunidad en esa mascarada. El resultado fue un país estable en la desigualdad, que se ahorró los efectos de una dictadura al elevado precio de carecer de una democracia auténtica (VILLORO, 2010b, p.25).

No segundo capítulo deste estudo, foram identificadas as influências

encontradas na produção cronística de Villoro e sua relação com a tradição

com o intuito de demostrar que sua proposta crítica não surge do vazio. Ao se

observar detidamente suas crônicas, ensaios, entrevistas e palestras, percebe-

se que ele é um estudioso da cultura e da literatura, pois revelaram-se, em sua

prosa cronística, características de modernistas como Amado Nervo, Ramón

López Velarde e Manuel Gutiérrez Nájera; assim como a influência da literatura

Page 241: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

241

do boom, principalmente de Gabriel García Márquez; além dos norte-

americanos Tom Wolfe e Truman Capote. Percebe-se, então, que a tradição

cronística que interessa a esse autor está visivelmente preocupada com a

realidade. Ele retoma constantemente autores como Jorge Ibargüengoitia e

Carlos Monsiváis cujas obras estão intrinsecamente relacionadas com a

história, pois são autores que, através do humor, da ironia, da carnavalização e

da sátira, discutem, criticam e analisam a história do México.

A relação entre ficção e não ficção recebeu muitas denominações ao

longo dos anos. O que na América Latina denomina-se crônica, Tom Wolfe

chamou de Novo Jornalismo e Truman Capote de Non fiction novel. Logo se

começou a chamar tudo isso de Jornalismo Narrativo ou Jornalismo Literário.

No entanto, é importante relembrar que borda clara não existe: no jornalismo,

com reportagens e textos de interesse humano; na literatura, com contos e

ensaios. É possível, como foi demostrado, destacar estruturalmente algumas

características, porém não se pode esquecer que são gêneros intimamente

relacionados e permeáveis.

Em uma época de aceleradas mudanças, de construção de muros e de

intolerância, a crônica, esse gênero flexível, que na atualidade tem ganhado

destaque, demonstra que tem capacidade de adaptar-se a circunstâncias

diversas, como por exemplo, o avanço tecnológico. A crítica menciona que a

crônica está no auge, e tal ocorre devido aos frequentes encontros de

cronistas, oficinas, congressos e prêmios. Percebe-se, porém, que ainda há

poucos espaços para a publicação, pois os cronistas são “como los cascos

azules de la ONU, que tienen un gran prestigio simbólico, pero pocas

oportunidades de entrar en acción” (VILLORO, 2010c, p.3). Esse gênero

contribui para uma reflexão do que seja o “literário”, promovendo uma

discussão que envolve a linguagem, os gêneros, os estilos, a ideia de

“representatividade e tipicidade” nacional e, inclusive, o papel dos escritores,

dos leitores, do mercado e da crítica no México.

A tríade escritor, leitor e mercado, quando se trata de crônica no México,

adquire relevada importância. Ao contrário de escritores de ficção que, na

atualidade, em sua maioria, podem dedicar-se à função de escrever, o cronista

ainda ocupa variadas funções, pois são poucos os que podem se dedicar

Page 242: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

242

exclusivamente a produzir crônicas. Entretanto, já não se pode pensar que um

jornalista, certamente, não é mais um romancista que não conseguiu produzir

uma grande obra, como mencionou reiteradamente Villoro em entrevistas.

Em um país cujo índice de pessoas que não sabem ler corresponde a

aproximadamente 10%, a crônica ocupa um espaço importante. Contra uma

tendência de preencher as páginas dos diários com imagens, o mercado da

crônica no México tem tentado se manter, utilizando principalmente o formato

de livro. Afinal, ela educa, informa, faz refletir e, para muitos leitores, é uma

forma de contato com a literatura naquele país.

Os temas das crônicas de Villoro revelam que ele é um observador e

crítico persistente das questões políticas e sociais do seu país, como aparece

na terceira parte dessa pesquisa. Além disso, são uma demonstração de que

tanto a “alta” cultura quanto a “baixa” estão fundidas sem fissuras. Em suas

crônicas, percebe-se que não se trata de um “utopismo estético” (BEVERLEY,

1993, p.19), mas que a cultura popular não é a cultura da elite disfarçada nem

quer ser. Desde o início, o autor percebeu que a cultura não podia se resumir

ao discurso oficial, às grandes instituições e aos discursos civilizatórios, mas

tinha que incorporar as dinâmicas dos grupos emergentes, a influência dos

meios de comunicação, a cultura popular, as questões mais cotidianas, que

aparecem em suas crônicas de maneira personificada.

A cidade é sem dúvida o tema de muitas das crônicas de Villoro.

Entretanto, observa-se que não é mais a cidade espaçosa de Salvador Novo,

mas a cidade vertiginosa, poluída, palco de tragédias coletivas, metrô lotado,

de eventos culturais, como os concertos de rock, esportivos, como o boxe e o

futebol, de movimentos sociais, como a rebelião zapatista, de sub-empregados

criados pela crise econômica, a violência urbana, enfim, uma vertigem

imparável. O cronista procura, através da análise de objetos, lugares e

comportamentos, revelar as contradições da globalização e demonstrar como a

cultura foi afetada pelas mudanças neoliberais.

Villoro publica em diversificados meios, que pode ser do jornal impresso

ao blog, passando por redes sociais, como o Twitter. Esses meios eletrônicos

têm sido constantes para experimentação, construção de sua escrita e,

Page 243: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

243

principalmente, de uma conexão com o real. Seria o avanço da tecnologia um

perigo para a crônica? O futuro certamente é incerto, pois, se por um lado a

crônica tem-se beneficiado dessas novas tecnologias, por outro, há cada vez

mais dificuldade de publicação, pois são poucos os que querem financiar esse

tipo de texto.

Villoro se utiliza da metáfora do ornitorrinco para falar da crônica pela

diversidade de elementos que confluem em sua criação, mas, principalmente,

pela sua maneira própria de narrar a realidade. Posto sobre a mesa de

dissecação, onde foram separadas e analisadas minuciosamente as partes

desse membro da família Ornithorhynchidae, a espécie mostrou “ser un

verdadero rompe cabezas biológico en el que se pueden encontrar

características de la novela, el cuento, la entrevista, el teatro, el ensayo y otras

familias taxonômicas del orden escrito” (RICCARDI DORIA apud VILLORO,

2010c, p.1).

Quando Villoro recorrer a esse animal para se aproximar ao gênero,

expõe uma preocupação com o risco que implica divisões que afastam ou

excluem do campo literário ou do jornalístico textos que tratam dessa tensão. O

cronista procura demonstrar que há vasos comunicantes entre diferentes

gêneros e que aproximação não significa justaposição. Quando ele produz

crônicas com muitos elementos ficcionais, não significa que se está diante de

uma mentira, mas de um discurso inverificável, pois às vezes se coloca um

posicionamento incisivo em questões muito fluidas. Talvez seria interessante

pensar que a oposição mais significativa não está entre mentira e verdade,

mais muito provavelmente entre informação e narração; por isso, a relevância

da crônica contemporânea, pois através da inserção de recursos de outros

gêneros, é possível tecer uma reflexão.

Assim como para Andreas Huyssen e Raymond Williams, para Villoro,

as divisões categóricas expressam uma visão burguesa nas quais a distinção

entre alta cultura e cultura popular ou de massa ainda servem de dispositivo

legitimador do que significa a arte e a não arte, baseados no conceito de ficção

e não-ficção. A crônica, como mencionam Susana Rotker e Villoro, é “literatura

bajo presión, mas no por eso menos literatura” (ROTKER, 2005, p.115;

VILLORO, 2005a, p.13). A literatura nem sempre trabalha com elementos que

Page 244: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

244

pertencem ao mundo dos fatos, mas, certamente, contribui para a construção

de sua posteridade.

Page 245: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

245

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

TEXTOS DE JUAN VILLORO: VILLORO, Juan. (Prólogo) La voz en el desierto. In: LICHTENBERG, Georg Christoph. Aforismos. Selección, traducción, prólogo y notas de Juan Villoro. México: FCE, 1989. __________. La frontera de los ilegales. Publicado en los Anales de Literatura Hispanoamericana, número 24, UCM – Madrid, 1995. Disponível em: http://revistas.ucm.es/index.php/ALHI/article/view/ALHI9595110067A/23282 Último acesso em 10.05.2015. __________. Los once de la tribu: crónicas. México: Editora Aguilar, 1998. _________. Villoro habla de la literatura y la ciudad contemporánea. El País - Cultura. I. Vidal-Folch, 10/10/2000a. Disponível em: http://www.sololiteratura.com/vill/villpahabla.htm Último acesso em: 05.04.2012. __________. Conversación entre Jorge Volpi y Juan Villoro. Revista eletrónica

de actualidad cultural “El Cultural” 29.11.2000b. Disponível

em:http://www.elcultural.es/version_papel/LETRAS/3126/Jorge_Golpi_y_Juan_

Villoro. Último acesso em: 06.04.2015.

__________. Efectos personales. Barcelona: Editorial Anagrama, 2001. __________. El vértigo horizontal. La Ciudad de México como texto. Debats 78 Otoño 2002a Quadern. Disponível em: http://www.alfonselmagnanim.com/debats/78/quadern02.htm Último acesso em: 20.05.2012. _________.Días robados: el cielo artificial. Publicado en Letras Libres en agosto 2002b. Disponível em: http://letraslibres.com/sites/default/files/pdfs_articulos/pdf_art_7719_6658.pdf Último acesso em: 26/12/2014. _________. El diablo en espejo. Publicado en 2002c. Disponível em: http://www.mshs.univ-poitiers.fr/crla/contenidos/Archivos/introduc/intro_53.pdf Último acesso em: 01.02. 2017. _________. Questioning the Chronicle: José Joaquín Blanco, Vicente Leñero and Juan Villoro. In: CORONA, Ignacio. and JÖRGENSEN, Beth E.. The Contemporary Mexican Chronicle: theoretical perspectives on the liminal genre. State University of New York Press, 2002c. pp. 61-68. _________. El esplendor postal de Borola Burrón. Publicada en Letras Libres, 31 de agosto de 2004a. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico/el-esplendor-postal-borola-burron Último acesso em: 02.10.2015.

Page 246: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

246

_________. La mirada de Zapata. Publicada en Letras libres, Número 62, 2004b. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico-espana/la-mirada-zapata Último acesso em 24.12.2016. _________. Safari accidental. México: Editorial Joaquín Mortiz, 2005a. _________. Espectros de la ciudad de México. Publicada en Café de las ciudades. Año4, número 36 – Octubre 2005b. Disponível em: http://www.cafedelasciudades.com.ar/cultura_36.htm Último acesso em: 24.12.2013. __________. La ciudad de México: mujer barbuda. Publicada en La nación en 21.08.2005c. Disponível em: http://www.clubcultura.com/clubliteratura/clubescritores/villoro/mapas/mex-ven02.html Último acesso em: 12.12.2015. ___________. La ciudad es el cielo del metro. México DF: Lecturas para paseantes. Rubén Gallo, ed. Madrid: Turner, 2005d. 137-145. ___________. Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias. México: Fondo de Cultura Económica, 2006a. ___________. Dios es redondo. México: Editorial Planeta, 2006b. _________. El olvido: un itinerario urbano en México DF. Publicada en la revista Nueva Sociedad no. 212, noviembre-diciembre de 2007a. Disponível em: http://www.nuso.org/upload/articulos/3487_1.pdf Último acesso em: 26.12.2013. __________. Leyenda y verdad: Julio Scherer. Publicada en Nueva Época. Número 46, diciembre de 2007b. Disponível em: http://www.revistadelauniversidad.unam.mx/4607/villoro/46villoro04.html Último acesso: 08.11.2015. _________. De eso se trata. Barcelona: Editorial Anagrama, 2008a. __________. La alfombra roja del terror narco. Revista de Cultura en el Clarín, 29/11/2008b. Disponível em: http://edant.revistaenie.clarin.com/notas/2008/11/29/01811480.htm Último acesso em: 20.05.2010. ___________. y ALARCÓN, Daniel. La crónica, periodismo portátil de autor.

Publicada em: Filba 2008c. Disponível em:

https://tallerexpresion1.files.wordpress.com/2010/03/la-crc3b3nica-malba-

alarcc3b3n-villoro.pdf Último acesso em: 13.12.2015.

__________. Palmeras de la brisa rápida: un viaje a Yucatán. México: Almadía, 2009a.

Page 247: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

247

__________. (Prólogo) El americano impaciente. In: ANDERSON, Jon Lee. El

dictador, los demonios y otras crónicas. Barcelona: Editorial Anagrama, 2009b.

_________. (Prólogo) El cronista en el jardín. In: IBARGÜENGOITIA, Jorge.

Revolución en el jardín. Madrid: Ediciones Reino de Redonda, 2009c.

__________. 8.8: El miedo en el espejo: una crónica del terremoto en Chile. México: Almadía, 2010a. __________. Carnaval y apocalipsis. Publicado en enero 2010b, Libro de fotografías de Paolo Gasparini. Disponível em: http://www.clubcultura.com/clubliteratura/clubescritores/villoro/teatro_mirada/CARNA AL_Y_APOCALIPSIS.pdf Último acesso em: 20.08.2012. __________. Disección de un ornitorrinco. (Relator Marcelo Riccardi Doria) Publicada na Sala de Prensa: web para profesionales de la comunicación iberoamericanos, Ano XI. Vol.6, agosto de 2010c. Disponível em: http://www.saladeprensa.org/art1040.htm Último acesso em: 10.12. 2014. _________. El arte de condenar. Publicada en la Revista de la UNAM, en octubre de 2010d. Disponível em: http://www.revistadelauniversidad.unam.mx/8010/villoro/80villoro.html Último acesso em: 23.10.2016. _________. Itinerarios del ornitorrinco. Hacia un periodismo cultural. Conferencia de Juan Villoro en el “Seminario nuevas rutas para el periodismo cultural”, Ciudad de México, septiembre 23 de 2011a. Disponível em: http://www.fnpi.org/es/fnpi/itinerarios-del-ornitorrinco-hacia-un-periodismo-cultural Último acesso: 18.04.2017. __________. El libro salvaje. México: Fondo de Cultura Económica, 2011b.

__________. ¿Hay vida en la tierra? México: Editorial Almadía, 2012a. __________. Arrecife. Barcelona: Editorial Anagrama, 2012b. __________. Instantáneas hacia un cronista. In: Antología Esencial, Carlos Monsiváis. Buenos Aires: Editorial Mar Dulce, 2012c. _________. (Prólogo) La guerra de los zetas: viaje por una frontera de la necropolítica, de Diego Enrique Osorno. Publicada en Cosecha roja, 31.08.2012d. Disponível em: http://cosecharoja.org/la-guerra-de-los-zetas-prologo-de-juan-villoro/ Último acesso em: 01.02.2017. __________. Juan Villoro Habla de su trabajo como cronista. Publicada en Red

Iberoamericana de Periodismo Cultural FNPI en 22 de octubre de 2012e.

Disponível em: http://reddeperiodismocultural.fnpi.org/video/juan-villoro-habla-

de-su-trabajo-com-cronista/ Último acesso: 07.07.2016.

__________. Espejo retrovisor. México: Editorial Planeta, 2013a.

Page 248: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

248

__________. La taquería revolucionaria. Publicada en La Jornada Semanal, No. 979, 2013b. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2013/12/08/sem-juan.html Último acesso em: 28.12.2016. __________. Itinerários extraterritoriais. (Trad. Luis Carlos Cabral). Publicada na Revista Serrote em 2014a. Disponível em: http://www.revistaserrote.com.br/2014/08/itinerarios-extraterritoriais/ Último acesso em: 01.10.2016. __________. y SASTURAIN, Juan. Villoro y Sasturain dialogaron sobre cómo la cultura popular se metió en la literatura.2014b Disponível em: http://www.telam.com.ar/notas/201411/87226-villoro-sasturain-cultura-popular-literatura-guadalajara-fil.html Último acesso em: 12.02.2015.

__________. Balón dividido. México: Planeta, 2014c.

__________. Los renunciantes. Publicado en Reforma, en 06 de junio de 2014. Disponível em: http://www.reforma.com/editoriales/editorial.aspx?id=28358 Último acesso em: 14.12.2016.

__________. El reino de Oz. Publicada en 22 de noviembre de 2014b. Disponível em: http://www.sopitas.com/408387-juan-villoro-nos-recuerda-por-que-mexico-es-el-reino-de-oz/ Último acesso em: 22.12.2016.

__________. Resistencia en la tierra. Publicada en El País, en 19 de septiembre de 2015a. Disponível em: http://elpais.com/elpais/2015/09/14/opinion/1442239766_526677.html?id_externo_rsoc=TW_CM Último acesso em: 02.01.2017. __________. Sócrates jubilado. Publicado em El País, em 10 oct de 2015b. Disponível em: http://elpais.com/elpais/2015/10/09/opinion/1444401955_949330.html Último acesso em: 10.10.2016.

_________. Amado Nervo, “fundador del sentimentalismo”. Publicado em El Universal, em 26.05.2015c. Disponível: http://www.eluniversal.com.mx/articulo/cultura/letras/2015/05/26/amado-nervo-fundador-del-sentimentalismo-villoro Último acesso em: 10.10.2016.

_________. La estrella zapatista. Publicada en El País, en 03 de enero de 2016a. Disponível em: http://elpais.com/elpais/2015/12/24/opinion/1450949512_043782.html Último acesso em: 25.12.2016. _________. Conferencia en CompArte por la Humanidad. Ponencia en CIDECI San Cristóbal de Las Casas, Chiapas, México, en 25 de julio de 2016b. Disponível em: http://radiozapatista.org/Audios/rzchiapas/juanvillorodos.mp3 Último acesso em: 10.12.2016.

Page 249: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

249

_________. El nombre de la cosa. Publicado en Mural: Opinión, 22 de enero de 2016c. Disponível em: http://www.mural.com/aplicacioneslibre/editoriales/editorial.aspx?id=80425&md5=ea30e6601efc10a378c25ed8a3c5f3bc&ta=0dfdbac11765226904c16cb9ad1b2efe&lcmd5=dd520d23707c4a7f8e0222629e4b63af Último acesso em 10.01.2017. ENTREVISTAS COM JUAN VILLORO: ALMOMENTO.MX. En México, grandes periodistas y malos periódicos. Publicada en Almomento.MX, en 30 de octubre de 2014. Disponível em: http://almomento.mx/en-mexico-grandes-periodistas-y-malos-periodicos-entrevista-con-juan-villoro/ Último acesso em: 01.03.2016. AZ Revista. Villoro: hay una crisis de la ficción. Publicada en AZ Revista de

Educación y Cultura, en 2013. Disponível em:

http://www.educacionyculturaaz.com/cultura/villoro-hay-una-crisis-de-la-

ficcion#respond Último acesso em: 10.08.16.

BAUTISTA, Virginia. Viejo, cuando cumplí 30: Juan Villoro. Publicada en Excelsior en 07.03.2016. Disponível em: http://www.excelsior.com.mx/expresiones/2016/03/07/1079264 Último acesso em: 15.12.2016. BENAVIDES, Jeovanny. ¿Hay vida en la tierra? Publicada en 2014. Disponível em: https://archivond.wordpress.com/2014/10/25/villoro/ Último acesso: 10.09.2016. CARRANZA, José Israel. El trabajo de testigo. Publicado en Magis Iteso –

Universidad Jesuíta de Guadalajara, em junio de 2006. Disponível em:

http://www.magis.iteso.mx/anteriores/012/012_colloquium_villoro.htm Último

acesso em: 07.12.2014.

COLOMBO, Sylvia. Para além da tragédia. Publicada no Folha de São Paulo, em 21 de agosto de 2011. Disponível em: ˂http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrissima/il2108201104.htm˃ Último acesso em: 07.07.2016. CUADERNOS HISPANOAMERICANOS, 561, pp. 119-124, 1997. Disponível em: http://bib.cervantesvirtual.com/servlet/SirveObras/public/01478518912325195209079/210073_0029.pdf Último acesso em: 10.03. 2015. FLORES, Arturo J. “Voy a muchos concierto, hasta al de Miley Cyrus”. Publicado en Playboy en México, en 2014. Disponível em: http://www.playboy.com.mx/entretenimiento/entrevista-a-juan-villoro/ Último acesso em 10.08.2016.

Page 250: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

250

GARCÉS, Claudia C. La ética no puede perder vigencia. Publicada en El Tiempo, en 10 de febrero de 2012. Disponível em: http://www.eltiempo.com/archivo/documento/CMS-11106222 Último acesso em: 10.10.2013. GORODISCHER, Julián. Juan Villoro y la crónica latinoamericana. Publicada em El Observatorio Fucatel, en 28 de noviembre de 2008. Disponível em: http://www.observatoriofucatel.cl/juan-villoro-y-la-cronica-latinoamericana/ Último acesso em: 23.05.2017. JUÁREZ, Hugo. Futbol y rock, según Juan Villoro. Publicado en Revista Chilango de julio de 2016. Disponível em: http://www.chilango.com/cultura/futbol-y-rock-segun-villoro/ Último acesso em: 29.05.2017. LAMMERS, Gerardo. ¿Qué demonios hará Juan Villoro con la nueva constitución chilanga? Publicada en Revista Chilango en julio de 2016. Disponível em: http://www.chilango.com/cultura/nota/2016/07/18/que-demonios-hara-juan-villoro-con-la-nueva-constitucion-chilanga Último acesso em: 07.03.2017.

LARA RAMOS, David. De frente con Juan Villoro. Publicado en Revista de la Universidad Autónoma del Caribe, 2014. Disponível em: http://repositorio.uac.edu.co/handle/11619/1768 Último acesso em: 01.05.2017.

LUIS, Bárbara. Resalta Villoro el humor de Jorge Ibargüengoitia. Publicado en El Popular de México, en 19 de noviembre de 2016. Disponível em: http://www.elpopular.mx/2016/11/19/cultura/resalta-villoro-el-humor-de-jorge-ibarguengoitia-153861 Último acesso em: 19.01.2017.

MEJÍA, Mauricio. Juan Villoro, el cronista del sublime. Publicado en El Financiero en 01.02.2014. Disponível em: http://www.elfinanciero.com.mx/after-office/juan-villoro-el-cronista-sublime.html Último acesso em: 12.11.2015. MELUSSI, Beatriz. La feria del libro es un fenómeno de la industria, no de la cultura. Publicada en El Diario de Coahuila, en 06 de diciembre de 2016. Disponível em: http://www.eldiariodecoahuila.com.mx/sociales/2016/12/6/feria-libro-fenomeno-industria-cultura-entrevista-juan-villoro-621654.html Último acesso em: 07.03.2017. MÉNDEZ, María Gabriela. “Me gusta ser un aforista plebeyo”. Publicado en El Universal de Caracas, en 06 de mayo 2012. Disponível em: http://www.eluniversal.com/que-hay/120506/me-gusta-ser-un-aforista-plebeyo Último acesso em: 05.08.2014. MORENO, Concepción. Domador de historias. Publicada en Fondo de Cultura Económica, em 30.01.2009. Disponível em: Último acesso: 02.02.2015. OJEDA, Alberto. Las grandes catástrofes generan literatura. Publicada en El Cultural, en 06.07.2011. Disponível em:

Page 251: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

251

http://www.elcultural.com/noticias/buenos-dias/Juan-Villoro/1825 Último acesso em: 31.12.2016. PALAPA QUIJAS, Fabiola. Presentan antología de ‘Inventario’ de José Emilio Pacheco. Publicada en La Jornada, en 29 de mazo de 2017. Disponível: http://www.jornada.unam.mx/ultimas/2017/03/29/presentan-antologia-inventario-con-la-obra-de-jose-emilio-pacheco Último acesso em: 10.04.2017. PONIATOWSKA, Elena. Conversación con Juan Villoro: astronomía, rock, futbol … y demás. Publicada en Revista de la Universidad de México, No. 146, 2016, pp. 17-23. Disponível em: http://www.revistadelauniversidad.unam.mx/ojs_rum/index.php/rum/article/view/17127/19839 Último acesso em: 07.02.2017. RICARDO, Jorge. Juan Villoro hablando de prosa, poesía, tradición y caos. Publicado en febrero de 2014. Disponível em: http://lapaginadebetobuzali.blogspot.com.br/2014/02/juan-villoro-hablando-de-prosa-poesia.html Último acesso em: 02.01.2017. RUIZ MONDRAGÓN, Ariel. Razonar las pasiones literarias. Publicado en Lectores secretos, 2013. Disponível em: https://lectoresecretos.wordpress.com/2013/11/13/razonar-las-pasiones-literarias-entrevista-con-juan-villoro/ Último acesso em: 25.04.2017. SÁNCHEZ, Alberto. Mudarse para mejorarse. Publicada em La Jornada em 23.09.2001. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2001/09/23/sem-alberto.html Último acesso em: 02.12.2015. TARIFEÑO, Leonardo. “Soy un cronista de la ideas”. Publicada en La Nación: “Lecturas de fin de semana [65]. 16 de marzo de 2008. In. http://www.elojofisgon.com/2008/03/lecturas-de-fin-de-semana-65-entrevista-a-juan-villoro. Último acesso em: 19.05.2015. OUTROS TEXTOS CITADOS: ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma. In: Notas de literatura I. São Paulo: Duas Cidades, Ed, 34, 2003. _________ Teoría estética. Obra completa, 7. Trad. Rolf Tiedemann. Madrid: Akal Básica de bolsillo, 2004. AGAMBEN, Giorgio. O que resta de Auschwitz: o arquivo e a testemunha. Trad. Selvino J. Assmann. São Paulo: Boitempo, 2008. AGUSTÍN, José. Tragicomedia mexicana 3: la vida en México de 1982 a 1994. México: Editorial Planeta Mexicana, 2007. ALBARRÁN, Claudia. La generación de Inés Arredondo. Publicada na Revista Difusión Cultural em setembro de 1998. Disponível em:

Page 252: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

252

http://www.uam.mx/difusion/revista/septiembre98/albarran.html Último acesso em: 17. 06. 2017. AMAR SÁNCHEZ, Ana María. La ficción del testimonio. Publicado en Revista Iberoamericana, 1990. Disponível em: https://revista-iberoamericana.pitt.edu/ojs/index.php/Iberoamericana/article/download/4724/4886 Último acesso em: 31.12.2016. AVITIA HERNÁNDEZ, Antonio. La narrativa de las Cristiadas. Novela, cuento, teatro, cine y corrido de las Rebeliones Cristeras. 2006. 879f. Tese (Doutorado em Humanidades) División de Ciencias Sociales y Humanidades – UAM –Unidad Iztapalapa, México D.F. 2006. Disponível em: http://www.bibliotecas.tv/avitia/La_Narrativa_de_las_Cristiadas.pdf Último acesso em: 15.10. 2015. AZNÁREZ, Juan Jesús. México ha dejado de ser oficialmente homogéneo para ser, desde los años noventa, oficialmente diverso. Entrevista con Carlos Monsiváis. Publicada em El País – Suplemento Babelia, em 29 nov 2003. Disponível em: http://elpais.com/diario/2003/11/29/babelia/1070066350_850215.html Último acesso em: 10.07.2016. BERNABÉ, Mónica. Sobre márgenes, crónica y mercancía. Publicado en octubre de 2010. Disponível em: http://www.celarg.org/int/arch_publi/bernabeb15.pdf Último acesso em: 07.02.2016. __________. (Prólogo) Idea Crónica. Literatura de no ficción iberoamericana. In: CRISTOFF, María Sonia, editora. Rosario, 2006. Disponível em: http://issuu.com/monicabernabe/docs/prologo_idea_cronica_-_monica_bernabe Último acesso em: 07.02.2016. BARRIOS, Jorge Hiram. Lapidario. Antología del aforismo mexicano. (1869-2014). México: FOEM, 2014. BARRÓN, Daniel. Crónica: arte sin invención. Entrevista con Darío Jaramillo Agudelo. Publicada em Sin Embargo, em 28 de jul de 2012. Disponível em: http://www.sinembargo.mx/28-07-2012/310173 Último acesso em: 10.05.2014. BARTRA, Roger. El festín de la mimesis. Política y literatura en el México de siglo XX. Publicado en Letras Libres, en 28 de octubre de 2010. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico-espana/el-festin-la-mimesis-politica-y-literatura-en-el-mexico-del-siglo-xx Último acesso em: 25.11.2016. BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Trad. Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. BEKER, Osvaldo; VESPA, Claudia e AREN, Fernanda. Apuntes sobre el trabajo con la crónica urbana en el taller de escritura. Publicado en actas del IV Congreso Internacional de Letras, 2010. Disponível

Page 253: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

253

em: http://2010.cil.filo.uba.ar/sites/2010.cil.filo.uba.ar/files/295.Beker-Vespa-Aren.pdf.Último acesso em: 10.01.2017. BENAVIDES, Jeovanny. Procedimientos narrativos, procesos creativos y de producción de los cronistas ecuatorianos en las revistas de periodismo literario. Un estudio de los casos Mundo Diners, SoHo y Gatopardo. 2016. 435f. Tese de Doctorado. Facultad de Periodismo y Comunicación Social. Universidad Nacional de la Plata, 2016. Disponível em: http://sedici.unlp.edu.ar/handle/10915/53407 Último acesso em: 01.05.2017. _________. La tradicción periodística y literaria en América Latina. Publicada en la Revista Académica de la Federación Latinoamericana de Facultades de Comunicación Social en febrero de 2015a. Disponível em: http://dialogosfelafacs.net/la-tradicion-periodistica-literaria-en-america-latina/ Último acesso: 10.10.2015. _________. Origen, evolución y auge del periodismo literario latinoamericano: desde las crónicas de Índias y el modernismo hasta las revistas especializadas. Publicada en la Revista Questión, Vol.1, No. 45 (enero-marzo de 2015b). Disponível em: http://perio.unlp.edu.ar/ojs/index.php/question/article/view/2352 Último acesso: 10.09.2016. BENCOMO, Anadeli. Violencia crónica o crónica de violencia: José Duque y Rossana Reguillo. In: FALBO, Graciela. (ed). Tras las huellas de una escritura en tránsito. La crónica contemporánea en América Latina (pp 21-40). La Plata: Al Margen, 2007. _________. Los enemigos de Mickey. Publicada en Cuadernos de Literatura de la Revista Javeriana, no.31, enero-junio de 2012. Disponível em: http://revistas.javeriana.edu.co/index.php/cualit/article/download/3991/2986 Último acesso em: 10.10.2014.

__________. Entre héroes, fantasmas y apocalípticos: testigos y paisajes en la crónica mexicana. Colombia: Ediciones Pluma de Mompox, 2011. __________. Voces y voceros de la megalópolis, Madrid: Iberoamericana, 2002. BEVERLEY, John. Against Literature. University of Minnesota Press, Minneapolis y Londres, 1993. BHABHA, Homi K. O local da cultura. Trad. Myriam Ávila, Eliana Lourenço de

Lima Reis e Gláucia Renate Gonçalves. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1998.

BLANCO, José Joaquín. Aguafuertes de narrativa mexicana 1950-1980.

Publicada em Nexos, número 56 em agosto de 1982. Disponível em:

http://www.nexos.com.mx/?P=leerarticulo&Article=266531 Último acesso em:

24.02.2016.

BLOOM, Harold. O cânone ocidental. Os Livros e a Escola do Tempo. Trad. Marcos Santarrita. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2001.

Page 254: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

254

BONET, Rubén. Literatura bajo presión. Reseña de la Antología de la crónica

latinoamericana actual, Jaramillo Agudelo. Publicada en la Revista Replicante

en 13 de junio de 2012. Disponível em: http://revistareplicante.com/literatura-

bajo-presion/ Último acesso em 13.07.2016.

BORGES, Jorge Luis. La memoria de Shakespeare. España: Editorial Alianza,

1998.

BOURDIEU, Pierre. As regras da arte: gênese e estrutura do campo literário.

São Paulo: Companhia das Letras, 1996.

BURKE, Peter. Em busca da cultura popular. In: Cultura popular na Idade Moderna: Europa 1500-1800. Trad. Denise Bottmann. 2ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1989, pp. 31-114. CAMARENA CASTELLANOS, Ricardo. Las crónicas de Tiempo transcurrido,

de Juan Villoro, un soundtrack generacional. Ponencia en la University

Montreal, en 01 de febrero de 2013. Disponível em:

https://sites.google.com/site/ricardocamarenacastellanos/videos/las-crnicas-de-

tiempo-transcurrido-de-juan-villoro-un-soundtrack-generacional Último acesso

em: 10.02.2015.

CAMPOS, Néstor. La literatura no puede dejar de ejercer su valor político, señala Juan Villoro. Publicado em Crónica, em 13.03.2016. Disponível em: http://www.cronica.com.mx/notas/2016/949986.html Último acesso em: 12.07.2016.

CAMPOS, Marco Antonio. José Agustín. Publicada en la Revista de UNAM em 2006. Disponível em: http://www.revistas.unam.mx/index.php/archipielago/article/viewFile/20290/19279 Último acesso em: 04.07.2015.

CÂNDIDO, Antonio. A vida ao rés-do-chão. In: CÂNDIDO, Antonio et al. A crônica: o gênero, sua fixação e suas transformações no Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa,1992. _________. A formação da literatura brasileira: momentos decisivos. 6.ed. Belo Horizonte: Editora Itatiaia Ltda, 2000. CANETTI, Elias. A massa. In: Massa e poder. Trad. Sérgio Tellaroli. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, pp. 13-92. CANTÚ, Irma. Villoro y la escritura de viaje: Palmeras de la brisa rápida y Safari accidental y la mirada periférica. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. y ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona: Editorial Candaya, 2011, pp.387-408. CAPARRÓS, Martín. Lacrónica. Madrid: Círculo de Tiza, 2015.

Page 255: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

255

__________. Por la crónica. En Actas del IV Congreso de la Lengua Española. Cartagena en marzo de 2007. Disponível em: http://congresosdelalengua.es/cartagena/ponencias/seccion_1/13/caparros_martin.htm Último acesso em: 12.07.2015. CARPENTIER, Alejo. El periodista: un cronista de su tiempo. Conferencia de

Carpentier en el taller “Alfredo López” del periódico Granma en 1975. Publicada

en Semanario Aquí en mayo de 2013. Disponível em:

http://www.pagina12.com.ar/diario/cultura/7-45224-2004-12-26.html Último

acesso em: 07.07.2016.

CARRIÓN, Jorge. Mejor que ficción: crónicas ejemplares. Barcelona: Editorial Anagrama, 2012. CASTAÑEDA, Ulises. Avándaro: del auge a la marginalización del rock mexicano. Publicado en Crónica.com.mx, en 09.11.2014. Disponível em: http://www.cronica.com.mx/notas/2014/856239.html Último acesso em: 07.02.2017. CASTILLO GARCÍA, Gustavo. El halconazo, historia de represión, cinismo y mentiras se mantiene impune. Publicada en La Jornada en 09.08.2008. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2008/06/09/index.php?article=018n1pol&section=politica Último acesso em: 05.02.2016. CHECA MONTÚFAR, Fernando. Crónica y [semi] modernidad en América Latina. Publicado em 2014. Disponível em: http://www.academia.edu/8735288/Cr%C3%B3nica_y_semi_modernidad_en_Am%C3%A9rica_Latina Último acesso em: 16.03.2016. CORONA, Ignacio. and JÖRGENSEN, Beth E. The Contemporary Mexican Chronicle: theoretical perspectives on the liminal genre. State University of New York Press, 2002. CORREA, Guillermo. Con la desaparición de Conasupo, quedarían sepultadas las pruebas de corrupción de tres sexenios. Publicada en Proceso, en 21 de noviembre de 1998. Disponível em: http://www.proceso.com.mx/179498/con-la-desaparicion-de-conasupo-quedarian-sepultadas-las-pruebas-de-corrupcion-de-tres-sexenios Último acesso: 10.01.2017. COUTINHO, Afrânio. Ensaio e crônica. In: COUTINHO, Afrânio; COUTINHO, Eduardo de Faria (orgs). A literatura no Brasil. 4 ed. São Paulo: Global, 1997. v. 6, p. 117-43.

CUCHE, Denys. A Noção de Cultura nas Ciências Sociais. Trad. Viviane

Ribeiro. 2ª Ed. Bauru: EDUSC, 1999.

DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Trad. Estela dos Santos Abreu.

RJ: Contraponto, 1997.

Page 256: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

256

DE LLANO, Pablo. ¿Quién financia a un ornitorrinco? Publicado en El País, en

12 de octubre de 2012. Disponível em:

http://cultura.elpais.com/cultura/2012/10/12/actualidad/1350033860_064860.ht

ml Último acesso em: 07.11.2016.

DÉS, Mihály. Juan Villoro: Paisaje del post-apocalipsis. Publicado na Revista de Cultura Lateral. Fevereiro, 2005. Disponível em: http://www.lateral.ed.es/revista/articulos/122.villoro.htm Último acesso em: 07.02.2014. DE GARAY, Adrián. Prolegómenos al estudio de la cultura rock. En Estudios sobre la cultura contemporánea, N.° 6, Vol. II. México, 1989. Disponível em: http://www.culturascontemporaneas.com/contenidos/cultura_rock.pdf Último acesso em: 10.01.2017. DÍAZ ZULUAGA, Luis Alejandro. Literatura y fútbol: otros horizontes de la literatura en España y Hispanoamérica. 2014. 406f. Tese. (Facultad de Filosofía y Letras). Universidad Autónoma de Barcelona, Barcelona, 2014. Disponível:http://www.tdx.cat/bitstream/handle/10803/285423/ladz1de1.pdf?sequence=1 Último acesso em: 10.02.2017. DOMÍNGUEZ MICHAEL, Christopher. De eso se trata: ensayos literarios de Juan Villoro. Publicado en Letras Libres en junio de 2008. Disponível em: http://www.letraslibres.com/revista/libros/de-eso-se-trata-ensayos-literarios-de-juan-villoro Último acesso em: 10.09.2013. __________. “La vitalidad histórica de los muertos mexicanos”: El testigo de Juan Villoro. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011. DUARTE, Lélia Parreira. “Missa do galo”: ironia romântica, humor e leveza. Periódicos PUC Minas, abril de 1996. Disponível em: periodicos.pucminas.br/index.php/cadernoscespuc/article/download/15042/11640 Último acesso em: 17.07.2016. EAGLETON, Terry. As ilusões do pós-modernismo. Tradução Elisabeth

Barbosa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998.

_________. A ideia de cultura. Tradução Sandra Castello Branco. São Paulo:

Editora UNESP, 2005.

_________. Teoria da literatura: uma introdução. Trad. Waltensir Dutra. São

Paulo: Editora Martins Fontes, 2006.

ECO, Umberto. Pirandello ridens. In: Sobre os espelhos e outros ensaios. Trad.

Beatriz Borges. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989, pp.250-258.

Page 257: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

257

EGAN, Linda. Reseña de Voces y voceros de la megalópolis: la crónica periodístico-literaria en México, de Anadeli Bencomo, Madrid: Iberoamericana; Frankfurt am Main: Vervuert, 2002. __________. Carlos Monsiváis. Cultura y crónica en el México contemporáneo. Trad. Isabel Vericar. México: FCE, 2004. _________. Monsivaisiana: aforismos de un pueblo que quiere ser ciudadano. München: Martin Meidenbauer Verlagsbuchhandlung, 2010. __________. Play on words: chronicling the essay. In: CORONA, Ignacio. and JÖRGENSEN, Beth E. The Contemporary Mexican Chronicle: theoretical perspectives on the liminal genre. State University of New York Press, 2002. pp. 95-122. E. FUENTES, Móises. Safari accidental: Juan Villoro y el desafecto a la

precisión. Publicado en la Revista de UNAM, 2007. Disponível em:

http://www.uam.mx.difusion/revista/revcasa2007.html Último acesso em:

21.08.2012.

ESQUEMBRE, María Asunción. Juan Villoro: apunte bibliográfico. (2011) Disponível em: http://bib.cervantesvirtual.com/bib_autor/juanvilloro/pcuartonivel.jsp?conten=autor Último acesso em: 01.06.2012. ETHEL, Carolina. La invención de la realidad. Publicada en El País, en 12 de julio de 2008. Disponível em: http://elpais.com/diario/2008/07/12/babelia/1215819552_850215.html Último acesso em: 01.07.2017.

FABER, Sebastiaan. La metonimia en una crónica de Carlos Monsiváis. Hacia un periodismo democrático. Publicado en Literatura Mexicana, 1999, pp. 249-280. Disponível em: http://www.oberlin.edu/faculty/sfaber/Monsivais.pdf Último acesso em: 23.03.2017.

FALBO, Graciela. Introducción. In: Tras las huellas de una escritura en tránsito: La crónica contemporánea en América Latina. Argentina: Ediciones Al Margen, 2007. FERNÁNDEZ, Patricio. El boom de la crónica es un título comercial. Publicado en Revista Mexicana de Comunicación, en 21 de octubre de 2013. Disponível em: http://mexicanadecomunicacion.com.mx/rmc/2013/10/21/el-boom-de-la-cronica-es-un-titulo-comercial-patricio-fernandez/ Último acesso em: 10.03.2017. FONSECA, Alberto. Cuando llovió dinero en Macondo: Literatura y narcotráfico en Colombia y México. 2009. 299f. Tesis (Department of Spanish and Portuguese). University of Kansas, Kansas, 2009. Disponível em: ˂http://kuscholarworks.ku.edu/dspace/bitstream/1808/5646/1/Fonseca_ku_0099D_10395_DATA_1.pdf˃ Acesso em: 10.05.2015.

Page 258: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

258

FOUCAULT, Michel. El orden del discurso. Trad. Alberto González Troyano. Buenos Aires: Tusquets Editoras, 1992. FRAGUAS, Antonio. La filosofía del “pienso, luego ‘tuiteo’”. Twitter y otras herramientas de Internet insuflan nuevos aires al aforismo. Publicado en El País, en 3 de abril de 2011. Disponível em: http://elpais.com/diario/2011/04/03/cultura/1301781601_850215.html Último acesso em: 10.07.2015. FRIERA, Silvina. Cuando la letra se convierte en acción. Publicado en Página 12 en 03 de diciembre de 2014. Disponível em: https://www.pagina12.com.ar/diario/suplementos/espectaculos/17-34140-2014-12-

03.html Último acesso em: 10.02.2017. FUSER, Igor. México em transe. São Paulo: Editora Página Aberta, 1995. FUENTES, Carlos. Valiente mundo nuevo. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011. GARCÍA CANCLINI, Néstor. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. Trad. Ana Regina Lessa e Heloísa Pezza Clintrão. São Paulo: Edusp, 2008. _________. A globalização imaginada. Trad. Sérgio Molina. São Paulo: Iluminuras, 2007. _________. Imaginarios urbanos. Buenos Aires: Eudeba, 1999. _________. Introducción: la sociología de la cultura. In: Sociología y cultura, BOURDIEU, Pierre. Trad. Martha Pou. México: Editorial Grijalbo, 1990. GARCÍA MÁRQUEZ, Gabriel. El mejor oficio del mundo. Discurso pronunciado en la Sociedad Interamericana de Prensa, en 1996. Publicado em Fundación para el Nuevo Periodismo Iberoamericano. Disponível em: http://especialgabo.fnpi.org/las-ideas-de-gabo/el-mejor-oficio-del-mundo/ Último acesso em: 21.03.2017. _________. Discurso de aceptación del Premio Nobel en 1982. Disponível em: http://cvc.cervantes.es/actcult/garcia_marquez/audios/gm_nobel.htm Último acesso em: 13.07.2016. GARCÍA TORRES, Beatriz. La crónica mexicana contemporánea a través de los textos de Juan Villoro y José Joaquín Blanco. 2012. 340f. Tesis doctoral. (Facultad de Filología) Universidad Complutense de Madrid, Madrid, 2012. Disponível em: http://eprints.ucm.es/22364/1/T34647.pdf Último acesso: 26.07.2013. GLANTZ, Margo. La onda diez años después: ¿epitafio o revalorización? Publicado en 1976. Disponível em:

Page 259: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

259

http://cdigital.uv.mx/bitstream/123456789/7265/1/19765P88.pdf Último acesso em: 14.08.2013. GAYTÁN ALCALÁ, Felipe. Santa entre los malditos cultos de la Santa Muerte en el México del siglo XXI. Publicado en Revista Livinia de Estudios solicales y humanísticos, 2008. Disponível em: http://www.redalyc.org/html/745/74511188004/ Último acesso em: 10.03.2017. GÓMEZ, Catalina. El fútbol es lo más importante de lo no importante. Publicado em Semana, em 25 de enero de 2007. Disponível em: http://www.semana.com/on-line/articulo/el-futbol-mas-importante-no-importante/83131-3 Último acesso em: 12.10.2015. GONZÁLEZ, Roberto. El sismo de 1985 en los ojos de Villoro, Fadanelli, Giménez Cacho y más... . Publicado en Más por más, 18.09.2015. Disponível en: https://www.maspormas.com/2015/09/18/el-sismo-de-1985-en-los-ojos-de-villoro-fadanelli-gimenez-cacho-y-mas/ Último acesso em 31.12.2016.

GONZÁLEZ RODRÍGUEZ, Sergio. Juan Villoro, periodista. Publicado en La

Opinión, en 07 de diciembre de 2013. Disponível em:

http://www.reforma.com/aplicacioneslibre/editoriales/editorial.aspx?id=18185&

md5=298b2d426353b5cdd700bf56333b683f&ta=0dfdbac11765226904c16cb9a

d1b2efe Último acesso em: 07.12.2016.

__________. El safari cotidiano en esplendor. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón.

& ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la

crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011, pp.120-123).

__________. El hombre sin cabeza. Barcelona: Anagrama, 2009.

GONZÁLEZ TORRES, Armando. Revolución en el jardín, de Jorge Ibargüengoitia. Publicado en Letras Libres, en 30 de noviembre de 2009. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico-espana/libros/revolucion-en-el-jardin-jorge-ibarguengoitia Último acesso em: 31.12.2016. GRAS MIRAVET, Dunia. Del lado de allá, del lado de acá: estrategias editoriales y el campo literario de la narrativa hispanoamericana actual de España. In: Cuadernos Hispanoamericanos, Nº 604, Octubre 2000, p.14-42. Disponível em: http://www.cervantesvirtual.com/descargaPdf/ Último acesso em:12.07.2016. GUERRIERO, Leila. La verdad y el estilo. Publicado en El País, en 18 de febrero de 2012a. Disponível en: http://cultura.elpais.com/cultura/2012/02/15/actualidad/1329307919_560267.html Último acesso: 10.03.2107. __________. Sobre algunas mentiras del periodismo. In: JARAMILLO AGUDELO, Darío. (ed.) Antología de crónica latinoamericana actual. México: Alfaguara, 2012b. pp. 616-626.

Page 260: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

260

GUTIÉRREZ TORRES, Susel. Tiempo transcurrido: Calendario azteca de una generación de testigos/personajes. Publicado em 2013. Disponível em: http://laventana.casa.cult.cu/modules.php?name=News&file=print&sid=7935 Último acesso em: 11.12.2016.

HERNÁNDEZ CHELICO, Javier. Avándaro, hace 40 años. Publicado en La Jornada en 11 de septiembre de 2011. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2011/09/11/opinion/a09a1esp Último acesso em: 15.10.2016. HUTCHEON, Linda. Poética do Pós-modernismo: história, teoria e ficção. Trad.

Ricardo Cruz. Rio de Janeiro: Imago Ed, 1991.

HUYSSEN, Andreas. Después de la gran división. Modernismo, cultura de masas, posmodernismo. Trad. Pablo Gianera. Buenos Aires: Adriana Hidalgo, 2006. IGLESIAS CONTÍN, Leonardo. Juan Villoro, cronista de la realidad mejicana. Publicado em La Voz, em 12/05/2015. Disponível em: http://www.lavoz.com.ar/temas/juan-villoro-cronista-de-la-realidad-mejicana-0 Último acesso em: 10.08.2016. JAMESON, Fredric. Modernidade singular. Ensaio sobre a ontologia do presente. Trad. Roberto Franco Valente. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. JARAMILLO AGUDELO, Darío. (ed.) Antología de crónica latinoamericana actual. México: Alfaguara, 2012. KEANE, John. Civil Society. Old Images, New Visions. Stanford: Stanford UP,

1998.

KERMODE, Frank. Apetite pela poesia. Trad. Sebastião Uchoa Leite. São Paulo: Edusp, 1993.

KRAUZE, Enrique. Palabras de homenaje al poeta José Emilio Pacheco.

Publicado en Letras Libres en 27 de enero de 2014. Disponível em:

http://www.letraslibres.com/mexico-espana/literatura/palabras-homenaje-al-

poeta-jose-emilio-pacheco Último acesso em: 23.03.2017.

LAFUENTE PORTILLO, Sandra. Alberto Salcedo Ramos, sobre la crónica.

(Entrevista con Alberto Salcedo Ramos) Publicado em 06.01.2010. Disponível

em: https://tambienamaresbueno.wordpress.com/2010/01/06/alberto-salcedo-

ramos-sobre-la-cronica/ Último acesso em: 08.12.2016.

LA JORNADA, México, quinto país más peligroso para periodistas: Unesco. Publicado em La Jornada, en 02 de noviembre de 2016. Disponível em: Último

Page 261: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

261

acesso em: http://www.jornada.unam.mx/ultimas/2016/11/02/mexico-quinto-pais-mas-peligroso-para-periodistas-unesco Último acesso em: 31.12.2015. LAGO, María Cristina. La Crónica latinoamerica a través de la mirada de Walter Benjamin. Publicada Questión, Vol. 1, No. 33, Año 2012. Disponível em: http://perio.unlp.edu.ar/ojs/index.php/question/article/view/1337 Último acesso em: 01.01.2015.

LA RAZÓN. ¿Por que te ríes Juan Villoro? Publicado en 27 de enero de 2017.

Disponível em: http://razon.mx/spip.php?article239716 Último acesso em

02.02.2017.

LARIO BASTIDA, Manuel. Los armados de la palabra. Análisis comunicativo de la autonomía zapatista. 2015. 636f. Tesis Doctoral. Departamento de Lengua Española y Lingüística General – Universidad de Murcia, Murcia, 2015. Disponível em: https://digitum.um.es/xmlui/bitstream/10201/47392/1/Los%20armados%20de%20la%20palabra.%20An%C3%A1lisis%20comunicativo%20de%20la%20auton.pdf Último acesso em 10.11.2016. _________. El zapatismo en la literatura mexicana: el caso de Juan Villoro. Publicada en Pensamiento al margen, No. 5, 2016. Disponível em: http://www.pensamientoalmargen.com/app/download/13182594223/Juan_Villoro_y_zapatismo.pdf?t=1475857362 Último acesso em: 23.12.2016. LEIVA-AGUILERA. Microblogging y liveblogging: ¿Qué estás haciendo? Publicado en Dialnet, en 17 de marzo de 2008. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/3013077.pdf%20- Último acesso em 12.11.2015. LEMUS, Rafael. Balas de salva: notas sobre el narco y la narrativa mexicana.

Publicada en Revista Letras Libres, septiembre 2005. Disponível em:

http://www.letraslibres.com/revista/convivio/balas-de-salva Úlltimo acesso em:

12.10.2015.

LIPOVETSKY, Gilles. Os tempos hipermodernos. Trad. Mário Vilela. São Paulo: Barcarolla, 2004. LISPECTOR, Clarice. A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,

1984.

LLANES GARCÍA, Manuel de Jesús. Idea de Hispanoamérica en la obra de

Juan Villoro. 2012. 351f. Tesis de Doctorado. Departamento de Filología

Hispánica. Universidad de Barcelona, Barcelona, 2012. Disponível em:

http://www.tdx.cat/bitstream/handle/10803/98342/MJLLG_TESIS.pdf?sequence

=1 Último acesso em: 16.09.2015.

LOJO, Martín. Mi escritura es un género bastardo. (Entrevista con Pedro Lemebel) Publicado em La Nación. Buenos Aires, 13 de marzo 2010.

Page 262: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

262

Disponível em: http://www.lanacion.com.ar/1241380-mi-escritura-es-un-genero-bastardo Último acesso em: 05.04.2016.

LÓPEZ PEDROZA, Claudia. La crónica de finales del siglo XIX en México: un

matrimonio entre literatura y periodismo. Publicado en Dialnet, 2011. Disponível

en: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/4988844.pdf. Último acesso em:

01.04.2016.

LYOTARD, Jean-François. La condición postmoderna. Informe sobre el saber.

Trad. Mariano Antolín Rato. Madrid: Editora Cátedra, 1987.

MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia. Trad. Ronald Polito e Sérgio Alcides. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2003. MARTÍNEZ, José Luis. (coord.) Ramón López Velarde. Obra poética. Edición Crítica. CEP de la Biblioteca Nacional. ALLCA XX. (Colección Archivos: 1ª. e., 36), España, 1998. MARTÍNEZ, Tomás Eloy. Periodismo y narración: desafíos para el siglo XXI. Publicado en Cuadernos de Literatura, Bogotá, 2002. Disponível em: http://revistas.javeriana.edu.co/index.php/cualit/article/view/7993/6340 Último acesso em: 01.04.2017. MARTÍNEZ VELOZ, Jaime. EZLN: el fantasma de 9 de febrero de 1995. Publicada en La Jornada, en 05 de junio de 2009. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2009/06/05/opinion/019a2pol Último acesso em: 27.12.2016. MARROQUÍN, Jaime. Montaigne y el escritor de fútbol: una lectura de Dios es redondo, de Juan Villoro. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. y ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica.Barcelona, Editorial Candaya, 2011, pp.247-260. MASOLIVER RÓDENAS, Juan Antonio. Juan Villoro: itinerarios de la invención. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona: Editorial Candaya, 2011, pp.31-65. _________. Soñar el 68. Publicado en Letras Libres em 11 de octubre de 2013. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico/sonar-el-68 Último acesso em: 01.10.2016. MOISÉS, Massaud. A criação literária. Volume 2. São Paulo: Cultrix, 1982. MONSIVÁIS, Carlos. A ustedes les consta. Antología de la crónica en México. México: Ediciones Era, 2010. __________. On the Chronicle in Mexico In: CORONA, Ignacio. And JÖRGENSEN, Beth E. The Contemporary Mexican Chronicle: theoretical

Page 263: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

263

perspectives on the liminal genre. State University of New York Press, 2002. pp. 25-35. __________. Rituales del caos. México: Fondo de Cultura Mexicana, 1996. __________. Manuel Gutiérrez Nájera: la crónica como utopía. Publicada en Literatura Mexicana, vol. 4, núm. 1, UNAM, IFFL, CEL, México, 1995, pp. 27-43. Disponível em: https://revistas-filologicas.unam.mx/literatura-mexicana/index.php/lm/article/view/171/171 Último acesso em: 30.01.2017. __________. De la Santa Doctrina al Espíritu Público (Sobre las funciones de la crónica en México). Publicada en la Nueva Revista de Filología Hispánica, 1987. pp. 753-771. __________. Entrada libre: crónicas de la sociedad que se organiza. México: Ediciones Era, 2013. _________. Amor perdido. México: Ediciones Era, 1986. __________. El vigor de la agonía. La ciudad de México en los albores del Siglo XXI. Letras Libres, año IV, núm. 44, agosto de 2002, pp. 12-17. Disponível em: http://www.letraslibres.com/revista/convivio/el-vigor-de-la-agonia-la-ciudad-de-mexico-en-los-albores-del-siglo-xxi Último acesso: 05.12.2015. _________. Notas sobre la cultura mexicana en el siglo XX. In: Historia general de México, vol.4 de 4, El Colegio de México. México, 1976, pp.303-476). MONTES, Alicia. Carlos Monsiváis y los monstruos de la cultura popular. Publicado em Crítica Cultural Palhoça, em 2012. http://www.portaldeperiodicos.unisul.br/index.php/Critica_Cultural/article/download/1192/984. Último acesso em: 14.12.2016.

_________. Esto no es una pipa: la crónica urbana y el problema del género.

Publicada en Sedici, en 2009. Disponível em:

http://sedici.unlp.edu.ar/handle/10915/17469 Último acesso em: 13.04.2015.

MORIN, Edgar. Cultura de massas no século XX: o espírito do tempo. Neurose. Vol. 01. Trad. Maura Ribeiro Sardinha. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. M. RODRÍGUEZ, Juan. La crónica como género literario. Publicado en El

Mercurio, en 26 de julio de 2015. Disponível em:

http://diario.elmercurio.com/detalle/index.asp?id={4189f27f-f168-4428-b246-

fa114adb1328} Último acesso em: 03.04.2017.

Page 264: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

264

TORRES TORRES, José Manuel. Las articulaciones del poder en la literatura mexicana del narcotráfico. Publicado en la Ogigia Revista electrónica de estudios hispánicos, 6 – 2009. Disponível em: ˂http://www.ogigia.es/OGIGIA6_files/OGIGIA6_Torres.pdf˃ Acesso em: 19.08.2016. MUÑOZ, Boris. Notas desabotonadas. La crónica latino-americana. In:

JARAMILLO AGUDELO, Darío. (ed.) Antología de crónica latinoamericana

actual. México: Alfaguara, 2012. pp.626-631.

NAKAGOME, Patrícia Trindade. A via e a vida do leitor: um conceito formado no espelho. 2015. 397f. Tese de Doutorado. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Universidade São Paulo, 2015. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8151/tde-09102015-131731/ Último acesso em: 21.08.2013. NAVARRETE, Carolina. La crónica literaria: un género híbrido por excelencia. Publicado em: Revista Cultural Ventana Latina, em 01 de abril de 2015. Disponível em: http://www.ventanalatina.co.uk/2015/04/la-cronica-literaria-un-genero-hibrido-por-excelencia/ NOVO, Salvador. ¡Ya viene Pancho Pistolas! Publicado en Atlantica en 1926. Disponível em: http://digital.iai.spk-berlin.de/viewer/content/?action=pdf&metsFile=820567663.xml&targetFileName=Ya_viene_Pancho_Pistolas.pdf&divID=LOG_0032. Último acesso em: 10.03.2017. NUNES, Aparecida Maria. Dissimulações de Clarice Lispector. Publicada em Revista Olho d’água, 2010. Disponível em: http://www.olhodagua.ibilce.unesp.br/index.php/Olhodagua/article/view/67/81 Último acesso em: 11.09.2013. OLMOS, Ana Cecilia. Literatura latino-americana e novas cartografias (a perspectiva dos escritores) Publicada na Revista da USP, 2012. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/ls/article/download/64567/67209 Último acesso em: 24.04.2016. _________. Lecturas errantes y cartografias críticas. In: Transnacionalidad e hibridez en el ensayo hispánico: un género sin orillas. Boston: BRILL, 2017. OLIVEIRA, João Vicente Ganzarolli de. Estética em Aristóteles. Publicado em Phoimix, 2009. Disponível em: http://phoinix.historia.ufrj.br/media/uploads/artigos/6_-_Estetica_em_Aristoteles_-_Joao_Ganzarolli.pdf Último acesso em: 16.03.2017. ________. Lecturas errantes y cartografías críticas. In: DHONDT, Reindert. & VANDEBOSCH, Dagmar. Transnacionalidad e hibridez en el ensayo hispánico: un género sin orillas. Boston: Brill, 2017.

Page 265: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

265

OSORNO, Diego Henrique. El escritor que no se volvió cobarde ni caníbal. Publicada na Revista Gatopardo em fevereiro de 2013. Disponível em: http://www.gatopardo.com/ReportajesGP.php?R=176 Último acesso em: 12.12.2014. PADUA, María Eugenia. El apocalipsis mexicano. Publicada na Revista da UNAM, No. 12, julio-septiembre de 1996. Disponível em: http://www.revistas.unam.mx/index.php/rep/article/download/37103/33692 Último acesso em: 25.12.2016. PALAVERSICH, Diana. De Macondo a McOndo: senderos de la postmodernidad latinoamericana. México: Editora Plaza y Valdés, 2005. PARRA, Eduardo Antonio. Norte, narcotráfico e literatura. Publicada en Revista Letras Libres, octubre 2005. Disponível em:http://www.letraslibres.com/revista/convivio/norte-narcotrafico-y-literatura Último acesso em: 12.10.2015. PAVÓN, Héctor. El horror es lo cotidiano. Publicado en Revista de Cultura de Clarín en 18 de julio de 2009. Disponível em: ˂http://edant.revistaenie.clarin.com/notas/2009/07/18/_-01960384.htm˃ Acesso em: 20 julho 2014.

PELLEGRINI, Tania. A literatura e o leitor em tempos de mídia e mercado.

Publicado em Doc Slide em 21 de janeiro de 2016. Disponível em:

http://docslide.com.br/documents/a-literatura-e-o-leitor-em-tempos-de-midia-e-

mercado.html Último acesso em: 07.08.2016.

_________. Cultura de massa: o caso José Agustín. Publicado em Estudos de

Literatura Brasileira Contemporânea, no. 29. Brasília, 2007, pp.253-266.

Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/4846108.pdf. Último

acesso em: 19.06.2017.

PERUCHO, Javier. Carlos Barrera y el aforismo mexicano. Publicado en la

Revista Electrónica de Estudios sobre la Ficción Breve, en 30 oct de 2015.

Disponível em: http://148.206.107.15/biblioteca_digital/articulos/10-708-

10332pac.pdf Último acesso em: 10.10.2016.

________. Escrituras privadas, lecturas públicas: el aforismo en México.

Publicado en Lejana, Revista de Narrativa Breve, no. 3, 2011. Disponível em:

http://lejana.elte.hu/PDF_3/Javier%20Perucho.pdf Último acesso em:

22.10.2016.

PETRAS, James. & VELTMEYER, Henry. Imperio y narcocapitalismo. In:

______.La globalización desenmascarada. El imperialismo en el siglo XXI.

México: Ed. Universidad Autónoma de Zacatecas, 2003. pp. 181-189.

_________. y VILLORO, Juan. Escribir es conversar. Publicado en Letras Libres, setiembre de 2007. Disponível em: http://www.letraslibres.com/revista/convivio/escribir-esconversar Último acesso em: 20.05. 2016.

Page 266: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

266

PONIATOWSKA, Elena. Box y literatura del crack. La Jornada, jueves 26 de junio de 2003. Disponível em:http://www.jornada.unam.mx/2003/06/26/03aa1cul.php?origen=index.html&fly=1Último acesso em: 01.12. 2015. _________. Encuentro de nuevos cronistas de Indias. Publicado en La Jornada, en 12 de octubre de 2012. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2012/10/12/opinion/a08a1cul Último acesso: 25.11.2015. PRICE, Brian L. Juan Villoro y las crónicas nostálgicas del rock and roll. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. y ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011, pp. 261-288. PULIDO ARANDA, Alberto. A los 40 años de 1968: la crónica de un año maravilloso. Publicado en 2008. Disponível: http://www.stunam.org.mx/22historia/acuarenta/cronica.pdf Último acesso em: 27.06.2015. RAMA, Ángel. La novela latinoamericana 1920-1980. Bogotá: Procultura, 1982. RAMOS, Julio. Desencontros da modernidade na América Latina: literatura e política no século 19. Trad. Rômulo Monte Alto. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008. RAMOS LEMUS, Víctor Manuel. De amor perdido a Rituales del caos: a

crónica ensaística de Carlos Monsiváis. Publicado em Cadernos Neolatinas,

Ano XIV – No. 8, 2015. Disponível em:

http://www.letras.ufrj.br/neolatinas/media/publicacoes/cadernos/a14n8/LEMUS_

_Victor._DE_AMOR_PERDIDO_A_LOS_RITUALES_DEL_CAOS._A_CR%C3

%94NICA_ENSAISTICA_DE_CARLOS_MONSIV%C3%81IS.pdf Último acesso

em: 10.10.2015.

REGUILLO, Rossana. Textos fronterizos. La crónica una escritura a la intemperie. In: FALBO, Graciela. (ed). Tras las huellas de una escritura en tránsito. La crónica contemporánea en América Latina (pp. 41-50). La Plata: Al Margen, 2007. RÍOS, Valería de los. Crónica chilena contemporánea: Roberto Merino y Pedro Lemebel, de lo real y sus cicatrices. Publicada en la Revista Persona y Sociedad, Vol. XX, no. 2, 2006. Disponível em: http://biblioteca.uahurtado.cl/ujah/pys/docs/2006/agosto/20_2_pp127_141.pdf Último acesso em 17.07.2016. ROTKER, Susana. La invención de la crónica. México: Fondo de Cultura Económica. Fundación para un Nuevo Periodismo Iberoamericano, 2005.

Page 267: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

267

________. Bravo Pueblo. Poder, utopía y violencia. Editorial La Nave Va. Caracas, 2006. RODRÍGUEZ, Blanca. El imaginario poético de Ramón López Velarde, México, UNAM, 1996 (Biblioteca de Letras). ROMERO, Ernerto Emiliano. Ensayo bajo demanda. México: Creative Commons, 2006. RUISÁNCHEZ, José Ramón. y ZAVALA, Oswaldo. “El malabarista: las genealogías de Juan Villoro”. In: (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona: Editorial Candaya, 2011. SAER, Juan José. El concepto de ficción. In: El concepto de ficción. Buenos Aires, Ariel, 1997. SALAZAR, Jezreel. La ciudad como texto: La crónica urbana de Carlos Monsiváis. México: Senderos, 2006. Universidad Nacional Autónoma de Nuevo León. Disponível em: www.academia.edu/18411513/La_ciudad_como_texto._La_cronica_urbana_de_Carlos_Monsivais_tesis Último acesso em: 21.03.2017. __________. La crónica: una estética de la transgresión. Revista Electrónica Razón y palabra, no. 47 octubre-noviembre 2005. Disponível em: http://www.razonypalabra.org.mx/anteriores/n47/jsalazar.html Último acesso em: 04.05.2013. _________. Perspectivas sobre teoría, historia y crítica literaria en América Latina. Entrevista con Lauro Zavala. Publicado en Textos Híbridos, Vol1, No. 1. (julio 2011) Disponível em: http://escholarship.org/uc/item/7s70d29t Último acesso em: 01.02.2015.

SALCEDO RAMOS, Alberto. Lacrónica:el rostrohumanodela noticia.

Publicada FNPI, en 2016. Disponível em: http://bicentenario.fnpi.org/meteriales/la_cronica_el_rostro_humano_de_la_noticia.pdf Último acesso em: 20.04.2017. _________. Para escribir crónicas hay que tener algo de kamikaze. Publicado na Revista Mexicana de Comunicación en 16 de octubre de 2013. Disponível em: http://mexicanadecomunicacion.com.mx/rmc/2013/10/16/para-escribir-cronicas-hay-que-tener-algo-de-kamikaze/ Último acesso em: 10.01.2015. __________. Del periodismo narrativo. In: JARAMILLO AGUDELO, Darío. (ed.) Antología de crónica latinoamericana actual. México: Alfaguara, 2012. pp. 632-633. SALGADO, Sebastião. y VILLORO, Juan. Éxodos. Publicado en Letras libres en octubre de 2002. Disponível em: http://www.letraslibres.com/revista/portafolios/exodos?page=full Último acesso em: 18.10.2015

Page 268: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

268

SÁNCHEZ-PRADO, Ignacio M. Naciones intelectuales: la modernidad literaria mexicana de la constituición a la frontera (1917-2000). 2006. 422f. Tese de Ph.D. (Hispanic Languages and Literatures). Uviversity of Pittsburgh, Pittsburgh, 2006. Disponível em:http://d-scholarship.pitt.edu/7769/1/Sanchez_Prado_ETD_2006.pdf Último acesso em: 21.08.2013. SÁNCHEZ RUIZ, Enrique E. Los medios de comunicación masiva en México 1968-2000, en Ilán Bizberg e Lorenzo Meyer (coords.): Una historia contemporánea de México: Actores. México D.F.: Editorial Océano, 2005, pp. 402-552. SANTA CRUZ, Eduardo. Crónica de un encuentro: fútbol y cultura popular. Santiago de Chile: Ediciones Instituto Profesional Arcos, 1991. SANTOS, Milton. Território e sociedade. Entrevista com Milton Santos. 2ª. Ed. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2001. SARLO, Beatriz. Tempo presente: notas sobre a mudança de uma cultura. Trad. Luís Carlos Cabral. Rio de Janeiro: José Olympio, 2005. SARTRE, Jean-Paul. ¿Qué es la literatura? Trad. Aurora Bernárdez. Buenos Aires: Editorial Losada, 1967. SEFCHOVICH, Sara. Cronistas de fin del siglo XX. Publicado en la Revista de Estudios sobre la crónica latinoamericana, 2015. Disponível em: http://www.textoshibridos.com/index.php/th/article/download/45/27 Último acesso em: 02.08.2016. SHERIDAN, Guillermo. Los contemporáneos ayer. México: Fondo de Cultura Económica, 1993. SILVA JÚNIOR, Antonio Ferreira. Leituras do caos urbano na obra de José Emilio Pacheco. 2010. 422f. Tese de Doutorado. Faculdade de Letras. Programa de Pós-Graduação em Letras Neolatinas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. Disponível em: http://www.letras.ufrj.br/pgneolatinas/media/bancoteses/antonioferreiradoutorado.pdf Último acesso em: 24.03.2017. SIN EMBARGO.MX. Asesino del periodista “El Gato” Félix sale libre y acude a su ex patrón: Jorge Hank Rhon. Publicado en 12 de mayo de 2015. Disponível em: http://www.sinembargo.mx/12-05-2015/1342606 Último acesso em: 07.05.2016. STEELE, Cynthia. The Rainforest Chronicles of Subcomandante Marcos In: CORONA, Ignacio. and JÖRGENSEN, Beth E. The Contemporary Mexican Chronicle: theoretical perspectives on the liminal genre. State University of New York Press, 2002. pp. 245-255.

Page 269: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

269

SITEL. El alfabetismo en América Latina, una deuda social. Publicado em:

SITEL (Sistema de Información de Tendencias Educativas en América Latina),

noviembre de 2010. Disponível em: http://www.siteal.iipe-

oei.org/sites/default/files/datodestacado_furosevich_20101130.pdf Último

acesso em: 16.03.2016.

SOUZA, Marcelo Lopes de. Fobópole: o medo generalizado e a militarização da questão urbana. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2008. STANTON, Anthony. Lo culto y lo coloquial en la poesía mexicana contemporánea. In: Cuadernos Hispanoamericanos, Madrid, 1991, nº 501, p. 101 – 112. SZADY, Beata. La crónica en América Latina. El caso de Etiqueta Negra.

Publicado em Correspondencias & Analisis, No. 5, año 2015. Disponível

em: http://www.correspondenciasyanalisis.com/es/pdf/v5/pe/3_la_cronica_en_

america_latina.pdf Último acesso em: 21.03.2017.

TABUENCA CÓRDOBA, María Socoro. Aproximaciones críticas sobre las literaturas de las fronteras. Frontera Norte, Vol. 9, Número 19, 1997. Pp.85-110. Disponível em: https://www.colef.mx/fronteranorte/wp-content/uploads/2014/03/5-f18_Aproximaciones_critcas_literaturas_de_las_fronteras.pdf.Último acesso em: 10.02.2017. TAPIA, Miguel. La construcción de la verosimilitud en la crónica contemporánea. Reflexión en torno a la obra de Juan Villoro y Fabrizio Mejía Madrid. Publicada en America Revues, 2016. Disponível em: https://america.revues.org/1768 Último acesso em: 10.02.2016.

TEDESCHI, Stefano. El testigo y las monedas en la obra narrativa de Juan

Villoro. Revista Artifara. Dezembro, 2006. Disponível em:

http://www.cisi.unito.it/artifara/rivista6/testi/villoro.asp Último acesso em:

17.01.2012.

TIRZO, Jorge. ¿Nueva? Crónica latinoamericana. Publicado en Revista Mexicana de Comunicación, en 21 de octubre de 2013. Disponível em: http://mexicanadecomunicacion.com.mx/rmc/read-offline/20823/nueva-cronica-latinoamericana.pdf. Último acesso em: 10.03.2017.

TUCUMÁN ZETA. ¿Qué es Tucumán Zeta? Publicado en 2012. Disponível em: http://tucumanzeta.com/que-es-tucuman-zeta/ Último acesso em: 07.03.2017. URRUTIA, Elena. La crónica del siglo XXI. Publicada em La Jornada em 3 de marzo de 2007. Disponível em:http://www.jornada.unam.mx/2007/03/03/index.php?section=opinion&article=a06a1cul Último acesso em: 21.09.2013.

Page 270: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

270

VILA-MATAS, Enrique. El arte de no terminar nada (Lichtenberg). Publicado en

El País, suplemento Babelia, en 14 ago de 2010. Disponível em:

http://elpais.com/diario/2010/08/14/babelia/1281744768_850215.html Último

acesso em: 23.10.2016.

VILLAMIL, María Elvira. El cronista y la crónica en Safari accidental. In: RÍOS BAEZA, Felipe A. (Editor) Juan Villoro: rondas al vigía. México: Ediciones Eón, 2011. VILLARREAL, Rogelio. La crónica es el gran retrato de nuestro tiempo. Publicado na Revista Mexicana de Comunicación en 28 de octubre de 2013. Disponível em: http://mexicanadecomunicacion.com.mx/rmc/read-offline/20084/la-cronica-es-el-gran-retrato-de-nuestro-tiempo-rogelio-villarreal.pdf. Último acesso em: 01.11.2016. VILLANUEVA CHANG, Julio. El que enciende la luz. ¿Qué significa escribir una crónica hoy? In: JARAMILLO AGUDELO, Darío. (ed.) Antología de crónica latinoamericana actual. México: Alfaguara, 2012. pp. 582-606.

VEINTICUATRO HORAS. Villoro y Taibo II marchan desde FIL Guadalajara; 60 ciudades protestan por 43 normalistas. Publicado em 01 de diciembre de 2014. Disponível em: http://www.24-horas.mx/villoro-y-taibo-ii-marchan-desde-fil-guadalajara-60-ciudades-protestan-por-43-normalistas/ Último acesso em: 10.02.2017.

WOLFE, Tom. El nuevo periodismo. Trad. José Luis Guarner. Barcelona:

Anagrama, 1998.

YÉPEZ, Heriberto. Tijuanologías: ensayo urbano en diez postales. México:

Universidad Autónoma Baja California, 2006. Disponível em:

https://www.academia.edu/18125871/TIJUANOLOGIAS_1999-2006_ Último

acesso em: 10.02.2017.

ZAID, Gabriel. Citas e aforismos. Publicado en Letras Libres en 31 de enero de

2004. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico-espana/citas-y-

aforismos Último acesso em: 29.11.2015.

__________. La lectura como fracaso del sistema educativo. Publicado em

Letras Libres, noviembre de 2006. Disponível em:

http://www.letraslibres.com/revista/convivio/la -lectura-como-fracaso-

del-sistema-educativo Último acesso: 08.12.2016.

ZAVALA, Lauro. La ficción posmoderna como espacio fronterizo. Teoría y análisis de la narrativa en literatura y en cine hispanoamericanos. 2007. 340f. Tese de Doctorado en Literatura Hispánica. Colegio de México, Ciudad de México, 2007. Disponível em: http://www.sepancine.mx/attachments/Lauro_Zavala_Doctorado.pdf Último acesso em: 03.03.2016.

Page 271: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

271

VÍDEOS CITADOS:

BARRERA TYSZKA, Alberto. Juan Villoro – miradas urbanas. Publicado em 22.03.2010. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=iqkK3BHTKHk Último acesso em: 15.12.2016. VILLORO, Juan. Charlando con Juan Villoro. Publicado en 12 de junio de 2016d. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=wURkL8KyBxg Último acesso: 28.08.2016. __________. Villoro en Villoro. Producción de Juan Carlos Colín, 2009d. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. y ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011. OUTROS TEXTOS CONSULTADOS: ACÍZELO DE SOUZA, Roberto. Estudos Culturais: Descrição de um Conceito e Crítica de sua Prática. Publicada na Revista Matraga, Rio de Janeiro: UERJ,

Dez de 2005, no.17, p.62‐70. _________. Tempo livre. In: Indústria cultural e sociedade. São Paulo: Editora Paz & Terra, 2002. _________ & HORKHEIMER, Max. A indústria cultural: o Iluminismo como mistificação da massa. In: LIMA, Luis Costa. Teoria da cultura de massa. 8ª ed. São Paulo: Paz & Terra, 2011, pp. 179-238. ALABARCES, Pablo. (Compilador) Futbologías: fútbol, identidad y violencia en América Latina. Publicado por Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales – CLACSO, en 2003. Disponível em:http://biblioteca.clacso.edu.ar/clacso/gt/20100919010923/alabarces.pdf Último acesso em: 20.02.2017. ANDRADE, Teresa. “La crónica es una marca de época”. Entrevista con Rossana Reguillo. Publicada en la Revista Vértice en 4 de julio de 2004. Disponível em: http://www.elsalvador.com/vertice/2004/040704/entrevista.html Último acesso em: 01.12.2013. APPADURAI, Arjun. La modernidad desbordada: dimensiones culturales de La globalización. Trad. Gustavo Remedi. Argentina: Fondo de Cultura Económica de Argentina, 2001. AVERBUCK, Ligia. (org.) Literatura em Tempo de Cultura de Massa. São Paulo: Nobel, 1984.

Page 272: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

272

AZEVEDO, Carlos. O lugar da literatura. Publicada na Revista da Faculdade de Letras: Línguas e Literaturas, Porto, XVI, 1999. pp. 9-22. Disponível em: http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/2802.pdf Último acesso em: 11.07.2016 BARTRA, Roger. Dos visiones del 68. Publicado en Letras Libres, en 02 de octubre de 2007. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico-espana/dos-

visiones-del-68 Último acesso em: 04.07.2015. BELLVER SAEZ, Pilar. Tijuana en los cuentos de Luis Humberto Crosthwaite:el reto a la utopía de las culturas híbridas en la frontera. Publicado em Ciber Letras, diciembre de 2008. Disponível em: http://www.lehman.cuny.edu/ciberletras/v20.html Último acesso em: 10.02.2017. BENCOMO, Anadeli. Subjetividades urbanas: mirar/contar la urbe desde la crónica. Publicada en la Revista Iberoamericana, Vol.3, No. 11, 2003 Disponível em: https://journals.iai.spk-

berlin.de/index.php/iberoamericana/article/view/621 Último acesso: 25.01.2016. __________. La crónica periodístico-literaria mexicana del siglo XX. Publicada em 2006. Disponível em: http://kagiz.org/la-crnica-periodstico-literaria-mexicana-

del-siglo-xx.html Último acesso em: 19.03.2016. BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica. In: LIMA, Luis Costa. Teoria da cultura de massa. 8ª ed. São Paulo: Paz & Terra, 2011, pp. 239-284. ________. Origem do drama trágico alemão. Trad. João Barrento. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2013. BERMAN, Marshall. Tudo que é sólido desmancha no ar. A aventura da

modernidade. Trad. Carlos Felipe Moisés e Ana Maria L. Ioriatti. São Paulo:

Companhia das Letras, 2007.

BEKER, Osvaldo. Apuntes sobre el trabajo con la crónica urbana en el taller

de escritura. Publicada no IV Congresso Internacional de Letras das UFBA em

2010. Disponível em: http://2010.cil.filo.uba.ar/ponencia/apuntes-sobre-el-trabajo-

con-la-cr%C3%B3nica-urbana-en-el-taller-de-escritura Último acesso em:

20.02.2016.

BLAS GARCÍA, Manuel. Arte-Artesanía, interacción histórica. Publicada na Revista Bibliográfica de Geografía y Ciencias Sociales, Vol. X, no. 599, 5 de agosto de 2005). Disponível em: http://www.ub.edu/geocrit/b3w-599.htm Último acesso em: 10.08.2016. BORSÒ, Vittoria. Fronteras de poder y umbrales corporales. Sobre el poder

performativo de lo popular en la literatura y la cultura de masas de México

(Rulfo, Monsiváis, Poniatowska). Publicada en la Revista Iberoamericana, Vol

4., Madrid, pp. 87-106. Disponível em: https://journals.iai.spk-

Page 273: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

273

berlin.de/index.php/iberoamericana/article/view/1020/700 Último acesso em:

12.07.2016.

BOURDIEU, Pierre. Campo de poder, campo intelectual, itinerario de un

concepto. Buenos Aires: Colección Jungla Simbólica. Editorial Montressor.

2002.

________. El campo literario. Prerrequisitos críticos y principios de método.

Trad. Desiderio Navarro. Revista Criterios, La Habana, nº 25-28, enero 1989-

diciembre 1990, pp. 20-42. Disponível em:

http://www.criterios.es/pdf/bourdieucampo.pdf Último acesso em: 06.04.2016.

BRANDER, Miriam Lay. “¿Gracias a Twitter, reviven los aforismos?” – Las

formas breves en Internet. Publicada en la Revista Chilena de Estudios

Latinoamericanos, 5 de octubre de 2015. Disponível em:

http://www.revistas.uchile.cl/index.php/MRD/article/viewFile/37442/39078 Último

acesso em: 22.10.2016.

BUENO, Isabella. La crónica según Juan Villoro. Disponível em: https://sites.google.com/site/isabellabuenof91tallerdeperiod/la-cronica-segun-juan-

villoro Último acesso em: 07.02.2013. CABRERA LÓPEZ, Patricia. El campo literario mexicano desde el enfoque de Bourdieu. In: GALLEGOS, Carlos. GÓMEZ, Luis E. IMAZ, Cecilia et al. Pierre Bourdieu. Campos de conocimiento: teoría social, educación y cultura. México: Centro de Investigaciones Humanísticas de la Facultad de Humanidades, UNACH, Centro de Estudios Básicos de la Facultad de Ciencias Políticas y Sociales, UNAM, 2005. pp. 259-277. CAPARRÓS, Martín. Contra los cronistas. In: JARAMILLO AGUDELO, Darío. (ed.) Antología de crónica latinoamericana actual. México: Alfaguara, 2012. pp.613-615. __________. Muerto en vida (Una tarde con Sergio Schoklender). Publicado en el Blog Plamplinas, en 16 de diciembre de 2011. Disponível em: http://blogs.elpais.com/pamplinas/2011/12/muerto-en-vida.html Último acesso em: 01.01.2017. CAREY, John. Os intelectuais e as massas. Tradução Ronald Kyrmse. São

Paulo: ArsPoetica, 1993.

CARNEIRO, SARISSA. La (pos) moderna Tenochtitlan: notas sobre la ciudad

en Materia dispuesta de Juan Villoro. Publicada en la Revista Iberoamericana

Vol. LXXIII, Núm. 218, enero-marzo 2007, 69-77. Disponível em: http://revista-

iberoamericana.pitt.edu/ojs/index.php/Iberoamericana/article/viewFile/5369/5525

Último acesso em: 07.03.2016.

CARRIÓN, Jorge. El extranjero como caricatura. La crónica de viaje según Villoro. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. y ZAVALA, Oswaldo. (Compilación)

Page 274: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

274

Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona: Editorial Candaya, 2011. CHILLÓN, Albert. Literatura y periodismo una tradición de relaciones promiscuas. Bellatera, Castelló de la Plana, València : Universitat Autònoma de Barcelona, Publicacions de la Universitat Jaume I, Universitat de València, 1999. DARRIGRANDI, Claudia. Crónica Latinoamericana: algunos apuntes sobre su

estudio. Publicado em: Cuadernos de Literatura Vol.XVII, No.34 – julio-

diciembre de 2013. Disponível em:

http://revistas.javeriana.edu.co/index.php/cualit/article/view/6242/4974 Último acesso

em: 16.02.2016.

DE LA LLOSA, Alvar. 1968 en América Latina: aparición de nuevos actores.

Publicado en Haol, no. 19, 2009. Disponível

em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/3065995.pdf. Último acesso em:

10.03.2016.

ECHEVERRÍA, Bolívar. La modernidad de lo barroco. México: Ediciones Era,

2000.

ESCALANTE, Evodio. Recuento de la crítica literaria en México. Publicada en

Fondo de Cultura Económica en 14 de marzo de 2009. Disponível em: http://www.fondodeculturaeconomica.com/editorial/prensa/Detalle.aspx?seccion=Detall

e&id_desplegado=24301 Último acesso em: 13.02.2016.

ESCOBAR, Ticio. Estética de las artes populares: cuestiones sobre el arte

popular. In: SOBREVILLA, David y XIRAU, Ramón. Estética. Madrid: Editorial

Trotta, 2003.

ESQUIVADA, Gabriela. Los nuevos cronistas de América. Autores en busca de un género. In: FALBO, Graciela. (ed). Tras las huellas de una escritura en tránsito. La crónica contemporánea en América Latina (pp 21-40). La Plata: Al Margen, 2007.

FABRY, Geneviève. Los imaginarios apocalípticos en la literatura hispanoamericana contemporánea: Suíza, Peter Lang, 2010. FAJARDO, Carlos Fajardo. Estética y sensibilidades posmodernas: estudio de sus nuevos contextos y categorías. México: Iteso, 2005. FIENGO VILLENA, Sergio. Utopías. Ensayos sobre fútbol y nación en América Latina. Publicado em Cuaderno de Ciencias Sociales, 160, FLACSO, Costa Rica, 2012. Disponível: https://www.academia.edu/3637671/Futop%C3%ADas._Ensayos_sobre_f%C3%BAtbo

l_y_naci%C3%B3n_en_Am%C3%A9rica_Latina?auto=download Último acesso em: 14.02.2017.

Page 275: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

275

FREUD, Sigmund. Psicologia das massas e análise do eu. In: Obras completas de Sigmund Freud. v. 9. Trad. I. Izecksohn. Rio de Janeiro: Delta, s.d., pp. 7-105. GADEA, Carlos A. Especulações analíticas em torno da pós-modernidade na América Latina. Publicada na Revista Interseções, vol. 12, n. 2 p. 264-282, dez 2010. Disponível em: http://www.e-

publicacoes.uerj.br/index.php/intersecoes/article/view/4590 Último acesso em: 07.03.2016. GARCÍA, Alejandro. La crónica es un ornitorrinco. Charlando con Juan Villoro. Publicado en 04.08.2016. Disponível em: https://iletradoperocuerdo.com/2016/04/08/la-cronica-es-un-ornitorrinco-charlando-con-

juan-villoro/ Último acesso em: 20.04.2017. GIL GONZÁLEZ, Juan Carlos. La crónica periodística. Evolución, desarrollo y nueva perspectiva. Publicado en Global Media Journal Edición, Volumen 1, Número 1, pp. 26-39 en 2004. Disponível em: http://www.gmjei.com/index.php/GMJ_EI/article/view/146/143 Último acesso em: 12.07.2013. GÓMEZ GARCÍA, Gabriela Alejandra. Un testimonio más de la onda de José Agustín. Publicada em: Revista UNAM em 20.08.2012. Disponível em: http://www.uaemex.mx/fhumanidades/monedero/onda.html Último acesso em: 06.12.2015. GONZÁLEZ, H. Sin ética no hay periodismo. (Entrevista con Alberto Salcedo Ramos). Publicado en Aristegui Noticias, en 06 de marzo de 2016. Disponível em: http://aristeguinoticias.com/0603/lomasdestacado/sin-etica-no-hay-periodismo-

alberto-salcedo-ramos/ Último acesso em: 01.04.2016. GRANDÍO PÉREZ, María del Mar. Tiempo y perspectiva en la película de Akira Kurosawa. Publicado en Vivat Academian, No. 111, junio, 2010. Disponível em: http://pendientedemigracion.ucm.es/info/vivataca/numeros/n111/PDFs/Grandiocopp.pdf Último acesso em: 31.12.2016. HARGUINDEGUY, Laura Collin. y MOLINA, Rafael. Las Organizaciones de la Sociedad Civil en México: de la invisibilidad al protagonismo. Análisis interdisciplinarios – Facultad de Filosofía y Letras - BUAP y El Colegio de Tlaxcala, Publicada en 17.01.2009. Disponível em:http://nuevomundo.revues.org/47723 Último acesso em: 28.07.2013. HECKE, An Van. La cultura del post-apocalipsis en Los rituales del caos de Carlos Monsiváis. In: FABRY, Geneviève. Los imaginarios apocalípticos en la literatura hispanoamericana contemporánea: Suíza, Peter Lang, 2010. HERRALDE, Jorge. Juan Villoro, México-Barcelona-México-Barcelona-México etcétera. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011, pp.73-78.

Page 276: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

276

HUYSSEN, Andreas. Mapeando o pós-moderno. In: Pós-modernismo e política. Rio de Janeiro: Rocco, 1991. IGLESIAS, Jorge. Así es el país vecino: las crónicas de frontera de Luis Arturo Ramos. Publicado em: Textos Híbridos: Revista de Estudios sobre la Crónica Latinoamericana. Vol 1, No. 2, diciembre de 2011. Disponível em: http://escholarship.org/uc/item/07p949nv Último acesso: 14.12.2015. ___________. A virada cultural: reflexões sobre o pós-moderno. Tradução.

Carolina Araújo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006.

KARAM, Tanius. Representaciones de la ciudad de México en la crónica.

Publicada en la Revista de Investigación Social, núm. 1, otoño-invierno, 2004,

pp. 51-76, Universidad Autónoma de la Ciudad de México. Disponível em:

http://www.redalyc.org/pdf/628/62800102.pdf Último acesso em: 22.11.2013.

__________. La crónica y los Estudios Culturales. Notas para un debate

compartido. Publicado na Revista da Associação Nacional dos Programas de

Pós-Graduação em Comunicação, agosto de 2006. Disponível em:

http://www.compos.org.br/seer/index.php/e-compos/article/viewFile/75/75 Último

acesso em: 29/08/2016.

KRACAUER, Siegfried. O ornamento da massa. Tradução Carlos Eduardo J.

Machado e Marlene Holzhausen. São Paulo: Cosac Naify. 2009.

KIRCHOF, Edgar Roberto. Estética e semiótica: de Baumgarten e Kant a

Umberto Eco. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003.

LAGUNA-CORREA, Francisco. Canon nacional, circulación literaria y

estrategias de socialización en la narrativa mexicana contemporánea: las

óperas primas de Daniel Sada y Juan Villoro. Apresentado no Congreso

Internacional del Latin American Studies Association (LASA) em mayo de 2016.

Publicada em: https://www.academia.edu/25779039/Canon_nacional_circulación_literaria_y_estrategi

as_de_socialización_en_la_narrativa_mexicana_contemporánea_las_óperas_primas_

de_Daniel_Sada_y_Juan_Villoro Último acesso em: 11.07.2016

LEZAMA LIMA, José. Imagem da América Latina. Trad. Luiz João Gaio. In:

FERNÁNDEZ MORENO, César. (Introdução e coordenação). América Latina

em sua literatura. São Paulo: Editora Perspectiva, 1979.

LIMA, Luiz Costa. Teoria da Cultura de Massa. São Paulo: Paz e Terra, 2011.

LINK, Daniel. (compilador) El juego de los cautos: Literatura policial de Edgar

A. Poe a P.D. James. Buenos Aires: Editora La Marca, 2003.

Page 277: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

277

LLANES GARCÍA, Manuel de Jesús. Idea de Hispanoamérica en la obra de

Juan Villoro. Publicada en la Revista Catoblepas, no. 139 en septiembre de

2013. Disponível em: http://www.nodulo.org/ec/2013/n139p01.htm Último acesso

em: 12.112.2013.

LÓPEZ, Alij Aquetza Anaya. Lo popular urbano y sus expresiones en la

narrativa breve: oralidad y abyección en Ni farra ni vieja ni sombreros de charro

de Juan Maya Nóesis. Publicada en la Revista de Ciencias Sociales y

Humanidades, vol. 20, núm. 40, agosto-diciembre, 2011, pp. 168-191, Instituto

de Ciencias Sociales y Administración México. Disponível em:

http://www.redalyc.org/pdf/859/85921351010.pdf Último acesso em: 09.10.2013.

LUDMER, Josefina. Literaturas post-autónomas. Publicado na Ciberletras - Revista de crítica literaria y de cultura, n. 17, julho de 2007. Disponível em: http://www.lehman.cuny.edu/ciberletras/v17/ludmer.htm Acesso em: 10/03/2015. ________. Literaturas post-autónomas: otro estado de la escritura. Publicado Revista Dossier, 17, 2014. Disponível em: http://www.revistadossier.cl/literaturas-postautonomas-otro-estado-de-la-escritura/ Último acesso em: 24.04.2016. MAGRI, Ieda. Literatura e autonomia: uma leitura a partir do posicionamento de

Roberto Bolaño. Publicado Revista Landa, Vol. 1, No. 2, 2013. Disponível em:

https://www.academia.edu/9809122/Literatura_e_autonomia?auto=download Último

acesso em: 24.04.2016.

MANCINI, Pablo. Crónica: trabajar sobre la experimentación. Publicado en

Revista Mexicana de Comunicación, en 21 de octubre de 2013. Disponível em: http://mexicanadecomunicacion.com.mx/rmc/2013/10/14/cronica-trabajar-sobre-la-

experimentacion/ Último acesso em: 24.03.2017.

MEJÍA MADRID, Fabrizio. ¿Piedra o polvo? Escenas del consumo de a pie. Publicada en Letras Libres, septiempre de 2005. Disponível em: http://www.letraslibres.com/revista/convivio/piedra-o-polvo-escenas-del-consumo-de-

pie?page=full Último acesso em: 07.12.2015. MERTON, Robert K., LAZARSFELD, Paul F. Comunicação de massa, gosto popular e a organização da ação social. In: LIMA, Luis Costa. Teoria da cultura de massa. 8ª ed. São Paulo: Paz & Terra, 2011, pp. 117-148. MEYER, Jean. La Cristiada. México: Fondo de Cultura Mexicana, 2008. MONSIVÁIS, Carlos. Apocalipstick. México: Editorial Debate, 2011. __________. Aires de familia. Cultura y sociedad en América Latina. Barcelona: Editorial Anagrama, 2000.

Page 278: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

278

_________. El 68: las ceremonias del agravio y la memoria. En Julio Scherer García y Carlos Monsiváis, Parte de guerra. Tlatelolco 1968. México: Aguilar, 1999: 119–264. ___________.De las relaciones literarias entre ‘alta cultura’ y ‘cultura popular’. Texto Crítico, vol. 11, núm. 33, Xalapa, Veracruz, México, Septiembre- Diciembre de 1985, pp. 46-61. ___________. Apocalipsis y utopías. Publicado em: La Jornada Semanal, nueva época, núm. 213, abril 4 de 1999, pp. 3-5. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/1999/04/04/sem-monsi.html Último acesso em:13.12.2015 __________. Duración de la eternidad. Publicada em: Nexos, núm. 172, abril de 1992, pp. 37-45. Disponível em: http://www.nexos.com.mx/?p=6474 Último acesso: 07.12. 2015. __________. La tarde en que murió el Distrito Federal” (Impresiones). Eros. Tu Yo Es El Mundo, vol. I, núm 1, julio de 1975, pp. 26, 139. __________. Los espacios de las masas”. México a fines de siglo, tomo 1. Compilación de José Joaquín Blanco y José Woldenberg. México, CONACULTA/FCE, 1993, pp. 267-308. __________. México, ciudad del apocalipsis a plazos, en Marina Heck, compiladora, Grandes metrópolis de América, Fundação Memorial da América-Fondo de Cultura Económica, São Paulo, 1993. MONTES, Alicia. La riqueza de la pobreza: una estética de lo disponible. Las crónicas de Carlos Monsiváis y la mirada doble en torno a la cultura popular. En Actas V Congreso Internacional Orbis Tertius de Teoría y Crítica Literaria. La Plata. Agosto, 2003. Disponível em: www.memoria.fahce.unlp.edu.ar/trab_eventos/ev.30/ev.30.pdf Último acesso em: 16.03.2015. MORALES, Héctor Alfonso. La reseña de un “Tiempo Transcurrido”. Publicado em: Periodista sin pluma, em 22.08.2009. Disponível em: http://periodistasinpluma.blogspot.com.br/2009/06/la-resena-de-un-tiempo-

transcurrido.html Último acesso em: 15.12.2014 MORAÑA, Mabel. & PRADO, Sánchez Ignacio. El arte de la ironía: Carlos Monsiváis ante la crítica. México: Ediciones Era, 2007. ________. El culturalismo de Carlos Monsiváis: ideología y carnavalización en tiempos globales. In: MORAÑA, Mabel. & PRADO, Sánchez Ignacio. El arte de la ironía: Carlos Monsiváis ante la crítica. México: Ediciones Era, 2007. MOREIRA, João Paulo. Problemas da cultura de massas. Publicada na Revista Crítica de Ciências Sociais, no. 13, fevereiro de 1984. Disponível em: http://www.ces.uc.pt/publicacoes/rccs/artigos/13/_Joao%20Paulo%20Moreira%20-

Page 279: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

279

%20Problemas%20da%20Cultura%20de%20Massas.pdf Último acesso em:03.03.2016. MUÑIZ-HUBERMAN, Angelina. El siglo del desencanto. México: Fondo de Cultura Económica. Lengua y Estudios Literarios, 2002. OLIVAL, Moema de Castro e Silva. O espaço da crítica II - Crônica: dimensão literária e implicações dialéticas. Goiânia, IGL: AGEPEL, 2002. OLIVEIRA, Aline Cristina de. Crônica: um gênero menor? Indagações acerca do texto lítero-jornalístico. Publicado no II Colóquio da Pós-graduação em Letras de 26 a 28 de maio de 2010. Disponível em: http://www.assis.unesp.br/Home/SitesInternos/ColoquiodeLetras/cadernoderesumos.p

df Último acesso em: 16.11.2016. ORTEGA Y GASSET, José. A rebelião das massas. Trad. Marylene Pinto Michael. São Paulo: Martins Fontes, 1987. PADRÓN, Leonardo. La crónica y sus afanes. Publicado em El Nacional de Venezuela em 24.03.2013. Disponível em:http://www.el-

nacional.com/siete_dias/cronica-afanes_0_158984167.htmlÚltimo acesso em: 12.07.2013 PADURA, Leonardo. Yo quisiera ser Paul Auster. Publicado en Cuba Debate en 7 de febrero de 2012. Disponível em: http://www.cubadebate.cu/noticias/2012/02/07/leonardo-padura-yo-quisiera-ser-paul-

auster/#.Vx71jtQrJdg Último acesso em:25.04.2016. PEREIRA, Helena Bonito Couto. Cultura de massa na ficção contemporânea.

Publicada na Revista Olho d´água, 2012. Disponível em: http://www.olhodagua.ibilce.unesp.br/index.php/Olhodagua/article/viewFile/66/80

Último acesso em: 25.01.2016.

PETERS, Michaela. ¿Apocalipsis o utopía? Contraposiciones de la cultura

popular en México en el marco del Bicentenario: Volpi y Monsiváis. Publicado

em: iMex. México Interdisciplinario. Interdisciplinary Mexico, año 2, n° 3,

invierno/winter 2012. Disponível em: http://www.imex-revista.download.php?

Último acesso: 20.03.2016.

PIGLIA, Ricardo. El lector y la lectura del escritor. La jornada semanal, n. 551,

septiembre, 2005. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2005/09/25/sem-

carlos.html. Acesso em: 26.04.2015.

PIMENTEL, Ary. Nações e tribos de torcedores em três contos de narradores

argentinos. Publicado nos Anais do XIII Congresso Internacional ABRALIC,

2013. Disponível em: http://www.abralic.org.br/anais/arquivos/2013_1434328766.pdf

Último acesso: 07.05.2015.

PINHEIRO, Tiago Guilherme. O próprio, a propriedade e o apropriado:

variações em torno da ideia de “Literaturas pós-autônomas” de Josefina

Page 280: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

280

Ludmer. Publicada Revista Landa, VOL. 1, nº2 2013. Disponível em:

http://www.revistalanda.ufsc.br/Edicoes/v1ed2-2013.html Último acesso em:

24.04.2016.

POBLETE, Juan. Crónica y ciudadanía en tiempos de globalización neoliberal: la escritura callejera. In: FALBO, Graciela. (ed). Tras las huellas de una escritura en tránsito. La crónica contemporánea en América Latina (pp. 71-88). La Plata: Al Margen, 2007. PUERTA MOLINA, Andrés Alexander. La crónica latino-americana actual: lo maravilloso real. Análisis del periodismo narrativo de Alberto Salcedo Ramos. 2016. 530f. Tese de Doctorado. Facultad de Filosofía y Letras. Universidad Autónoma de Madrid, 2016. Disponível em: Tesis Salcedo https://repositorio.uam.es/bitstream/handle/10486/673229/puerta_molina_andres_alex

ander.pdf?sequence=1 Último acesso em: 01.05.2017. QUEIROZ, Thiago Bittencourt. Uma defesa do cânone literário por dos apocalípticos. Publicada em Repositórios UFPE, Vol.26, no.1, janeiro de 2013. Disponível em: http://www.repositorios.ufpe.br/revistas/index.php/INV/article/download/375/316. Último acesso em: 11.07.2016. RAMÍREZ PARRA, Patricia. Sentir postmoderno o la puerta de entrada para el

neoliberalismo. In: Reflexión Política. Ano. 3, nº6. Universidad Autónoma de

Bucaramanga. Colombia. Dezembro de 2001, p. 1-12. Disponível em: http://revistas.unab.edu.co/index.php?journal=reflexion&page=article&op=viewArticle&

path%5B%5D=825. Acesso em: 19.04.2015.

RODRÍGUEZ MARCOS, Javier. ¿El boom de la crónica latinoamericana? Diario El País, 18 fev. 2012. Disponível em: http://blogs.elpais.com/papeles-

perdidos/2012/02/el-boom-de-la-cronica-latinoamericana.html Último acesso em: 28.08.2015. SÁ, Jorge de. A crônica. São Paulo: Ática, 2001. SANTOS, Joaquim Ferreira dos (org.). As cem melhores crônicas brasileiras. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007. SARAMAGO, José. Sobre literatura, compromisso e transformação social. Colóquio em Málaga, publicado originalmente na Revista Quimera, em 18.05.2010. Disponível em: https://www.josesaramago.org/sobre-literatura-

compromisso-e-transformacao-social/ Último acesso em: 31.12.2016. SARLO, Beatriz. Siete ensayos sobre Walter Benjamin. Buenos Aires, FCE, 2000. _________. Literatura y política. Punto de Vista, vol. 6, núm. 19, diciembre de 1983, pp. 8-11.

Page 281: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

281

SCHMIDT, Bettina E. Teorías culturais pós-modernas de Latinoamérica. Publicado na Revista Indiana em 2002. Disponível em: http://www.iai.spk-

berlin.de/fileadmin/dokumentenbibliothek/Indiana/Indiana_19_20/02schmidt.pdf Último acesso em: 19.02.2016. SCHNEIDER, Luis Mario. El estridentismo. México 1921-1927. Introducción. México: UNAM, 1985. Disponível em: http://www.revistaiberoamericana.pitt.edu/ojs/index.../2941Último acesso em: 19.08.2012. SCHWARTZ, Jorge. Vanguardas latino-americanas: polêmicas, manifestos e textos críticos. São Paulo: Editora Iluminuras, 1995. SCHILLER, F. A educação estética do homem. Tradução de Roberto Schwarz e Marcio Suzuki, São Paulo: Iluminuras, 2002. SIGNORELLI, Amalia. Cultura popular y cultura de masas: notas para debate. Publicado en: Estudios sobre las culturas contemporáneas, año/vol I, número 002, México, 1987. pp. 109-122. Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=31610205 Último acesso em: 31.12.2016. STIERLE, Karlheinz. A ficção. Tradução. Luiz Costa Lima. Rio de Janeiro:

Caetés, 2006.

SUBIRATS, Eduardo. Da vanguarda ao pós-moderno. Tradução. Luiz Carlos Deher, Adélia Bezerra de Meneses e Beatriz A. Cannabrava. São Paulo: Nobel. 1987.

T. MOREIRA, Terezinha. Estética, ética e literatura. Publicado em Caderno Cespuc, Belo Horizonte, 2002. Disponível em: http://periodicos.pucminas.br/index.php/cadernoscespuc/article/view/8111 Último acesso: 01.04.2017. VALDÉS SAMPEDRO, Octavio. El rock y la modernidad: hacia una nueva experiencia. Publicada en La Colmeia, no. 61/62 de 2009. Disponível em: http://web.uaemex.mx/plin/colmena/Colmena%2061-62/Aguijon/OVS.html Último acesso em: 12.02.2017.

VANDEBOSCH, Dagmar. Escritores hispanoamericanos en España. Publicado en Aleph, No. 25, 2012. Disponível em: https://lirias.kuleuven.be/bitstream/123456789/287480/2/ALEPH+25-

+Escritores+hispanoamericanos+en+Espana.pdf Último acesso em: 19.11.2016

VARGAS LLOSA. Mario. La civilización del espectáculo. Ecuador: Alfaguara,

2012.

VEGA ZARAGOZA, Guillermo. Juan Villoro – Nuevo corte de caja. Publicado

em: Nueva Época-Revista de la Universidad de México, número 114, agosto

2013. Disponível em: http://www.revistadelauniversidad.unam.mx/articulo.php?publicacion=21&art=698&sec

=Columnistas Último acesso em: 21.03.2016.

Page 282: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

282

VILAS, Manuel. Juan Villoro y los terremotos reales. In: RUISÁNCHEZ, José

Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro

ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011, pp. 140-144.

VILLARRUEL OVIEDO, Antonio. Ciudad y derrota: memoria urbana liminar en

la narrativa hispano-americana. Ecuador: Ediciones Abya-Yala. FLACSO,

2011.

VILLENA, Francisco. La posmodernidad como problemática en la teoría cultural latinoamericana. Publicada em 2005. Disponível em: https://pendientedemigracion.ucm.es/info/especulo/numero30/posmolat.html Último acesso em:18.02.2016.

WALKER, Carlos. Juan Villoro: miradas del ensayo. Publicado en el VII

Congreso Internacional Orbis Tertius de Teoría y Crítica Literaria en 2009.

Disponível em:

http://www.memoria.fahce.unlp.edu.ar/trab_eventos/ev.3631/ev.3631.pdf Último

acesso em 27.03.2016.

WINN, Peter. A Revolução Chilena. Trad. Magda Lopes. São Paulo: Editora

UNESP, 2010.

YÚDICE, George. A conveniência da cultura: usos da cultura na era global.

Tradução Marie-Anne Kremer. 2.ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2013.

ZAIDAN, Junia Claudia Santana de Mattos Mattos. SOARES, Luis Eustáquio.

AMARAL, Sérgio da Fonseca. Marxismo e Modernismo em época de literatura

pós-autônoma. Vitória: Editora Aquarius, 2015.

ZAMORA PARKINSON, Lois. Narrar el apocalipsis: la visión histórica en la literatura estadunidense y latinoamericana contemporánea. México: Fondo de Cultura Económica, 1994. ZÁRATE, Julio. 8.8 o la crónica de un instante caótico, de Juan Villoro. Publicado en los Anales de la Literatura Hispanoamerica, Vol. 42, 2013. Disponível em: https://revistas.ucm.es/index.php/ALHI/article/view/43035/40844 Último acesso em: 20.02.2016. ŽIŽEK, Slavoj. Primeiro como tragédia, depois como farsa. Tradução Maria

Beatriz de Medina. São Paulo: Boitempo, 2011.

ZIMMERMAN, Mario A. (director) La crónica latino-americana como espacio de

resistencia al periodismo hegemónico. Proyecto de la Universidad Nacional de

La Matanza, 2010-2011: Argentina. Disponível em:

http://humanidades.unlam.edu.ar/descargas/4_A145.pdf Último acesso em:

07.02.2016.

Page 283: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

283

VÍDEOS CONSULTADOS:

DISCUTAMOS MÉXICO. Ensayo y crónica. Programa conmemorativo del bicentenario de independencia, 2010. Programa no. 81 – (Canal once IPN). Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=0pslKmd7zGg Último acesso: 10.02.2016. VILLORO, Juan. Ciudad de México y cultura mexicana. Una mirada contemporánea. Producción de Eliseo Álvarez. Publicado em 27.10.2011. Disponível em: http://refletor.tal.tv/noticias/america-latina/argentina/ciudad-de-

mexico-y-cultura-mexicana-una-mirada-contemporanea-por-juan-villoro-3 Último acesso: 25.11.2013. _________. Juan Villoro. La obra de Jorge Ibargüengoitia. Programa Café de nadie. Publicado em 14 de março de 2014. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=2T6sfxIztkA Último acesso em 18.04.2017.

Page 284: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

284

ANEXO I

FRIERA, Silvina. Cuando la letra se convierte en acción. Publicado en Página

12 en 03 de diciembre de 2014. Disponível em:

https://www.pagina12.com.ar/diario/suplementos/espectaculos/17-34140-2014-

12-03.html Último acesso em: 10.02.2017.

Ilustração de Francisco Lagos em LA RAZÓN. ¿Por que te ríes Juan Villoro?

Publicado en 27 de enero de 2017. Disponível em:

http://razon.mx/spip.php?article239716 Último acesso em 02.02.2017.

Page 285: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

285

ANEXO II

Page 286: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

286

Page 287: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

287

Page 288: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

288

Page 289: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

289

ANEXO III

Page 290: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

290

Page 291: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

291

Page 292: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

292

Page 293: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro Tese de Doutorado apresentada

293