UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o...
Transcript of UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SIMONE … · Simone Silva do Carmo Dissecando o...
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
SIMONE SILVA DO CARMO
DISSECANDO O ORNITORRINCO: A CRÔNICA MEXICANA
CONTEMPORÂNEA DE JUAN VILLORO
RIO DE JANEIRO
2017
Simone Silva do Carmo
Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de
Juan Villoro
Tese de Doutorado apresentada ao
Programa de Pós-graduação em Letras
Neolatinas da Universidade Federal do
Rio de Janeiro como parte dos quesitos
para obtenção do Título de Doutora em
Letras Neolatinas Estudos Literários
Neolatinos – Opção: Literaturas
hispânicas.
Orientador: Professor Doutor Víctor
Manuel Ramos Lemus.
Rio de Janeiro
Agosto de 2017
DISSECANDO O ORNITORRINCO: A CRÔNICA MEXICANA
CONTEMPORÂNEA DE JUAN VILLORO
Simone Silva do Carmo
Orientador: Professor Doutor Victor Manuel Ramos Lemus
Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Neolatinas
da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos
necessários para a obtenção do título de Doutora em Letras Neolatinas (Estudos
Literários Neolatinos – Opção: Literaturas hispânicas).
Aprovada por:
Presidente, Professor Doutor Victor Manuel Ramos Lemus – UFRJ – Estudos
Literários Neolatinos.
Professor Doutor Luís Alberto Nogueira Alves – UFRJ – Ciência da Literatura
Professor Doutor Rodrigo Fernández Labriola – UFF – Estudos da Literatura
Professora Doutora Silvia Inés Cárcamo de Arcuri – UFRJ – Estudos Literários
Neolatinos
Professor Doutor João Roberto Maia da Cruz – Fundação Oswaldo Cruz
Professor Doutor Ary Pimentel – UFRJ - Estudos Literários Neolatinos (Suplente)
Professor Doutor Renato Nogueira dos Santos Júnior – UFRRJ – Pós-graduação
contextos contemporâneos e demandas populares – PPGEDUc (Suplente)
FICHA CATALOGRÁFICA
Ao meu Deus do impossível, meu eterno
companheiro, que, ao longo dos anos, vem me
colocando à prova na superação das
dificuldades da vida. Obrigada por me permitir
cumprir mais essa etapa de minha jornada!
Aos meus amores, Luís Paulo, Paulo
Vinícius e Nycollas Henrique, pela
compreensão de tanta ausência, pelo carinho
constante, sempre me encorajando, me
incentivando e não me deixando fraquejar na
busca da realização deste sonho. Muito
obrigada por completarem minha vida e
serenarem meu ser. Amo vocês! A vitória é
nossa!
AGRADECIMENTOS
A meu pai, Diorge (in memoriam) e minha mãe, Maria Lúcia que na
modéstia do saber fizeram tantos sacrifícios para que eu chegasse até aqui. À minha avó, Altiva, amiga, confidente, mulher de coragem e profunda
sabedoria da vida. Aos meus irmãos, cunhados, sobrinhos, nora, todos os familiares e
amigos, pelo carinho e incentivo constante. Ao Professor Doutor Víctor Manuel Ramos Lemus pela sábia leitura,
paciência, tempo, tolerância, colaboração e conhecimento disponibilizado tão generosamente durante esses oito anos, desde a especialização. Nunca pensei que fosse capaz de chegar tão longe. Sei que minha caminhada continua, mas o percurso até aqui foi menos árduo por sua dedicação de professor e pesquisador. ¡Gracias por su amistad!
Aos meus amigos do grupo pesquisa da Pós-Graduação da UFRJ:
Professora Doutora Sylvia Helena de Carvalho Arcuri e Professor Doutor Tarciso Gomes do Rego que sempre estiveram dispostos a me ajudar, encorajando-me nas horas de desânimo. Sem vocês não teria conseguido. Obrigada por tudo!
À Banca de Qualificação, Ary Pimentel e Rodrigo Fernández Labriola,
pela leitura precisa e fundamental para o término desta pesquisa. A todo corpo docente e demais profissionais do Programa de Pós-
graduação em Letras Neolatinas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, que contribuíram para a realização de meus estudos.
À Professora Doutora Silvia Inés Cárcamo de Arcuri, ao Professor
Doutor Rodrigo Fernández Labriola, ao Professor Doutor João Roberto Maia da Cruz e ao Professor Doutor Luís Alberto Nogueira Alves, por terem gentilmente aceitado participar de minha banca.
A todos os servidores do Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Amazonas (IFAM), que contribuíram para a conclusão desse Curso de Doutorado nas pessoas do Reitor Antônio Venâncio Castelo Branco, Pró-reitor de Ensino António Ribeiro da Costa Neto, Pró-reitor de Pesquisa José Pinheiro de Queiroz Neto, Diretora Sistêmica de Ensino Lívia de Souza Camurça Lima e ao Diretor Geral do Campus Humaitá Jorge Nunes Pereira, meus sinceros agradecimentos.
A todos os meus companheiros de trabalho e alunos do IFAM/Campus
Humaitá, obrigada pela compreensão. E, a todos aqueles que me permitiram prosseguir e concluir esse estudo.
A estrada (Lazão/da Gama/Toni Garrido /Bino Farias)
Você não sabe o quanto
eu caminhei
Pra chegar até aqui
Percorri milhas e milhas
antes de dormir
Eu não cochilei.
SINOPSE
Análise da produção cronística de Juan Villoro, tendo
como eixo de leitura os textos que compõem: Tiempo
transcurrido: crónicas imaginarias (1986), Los once de la
tribu: crónicas (1995), Safari accidental (2005) e Dios es
redondo (2006), com o enfoque na caracterização da
crônica como um gênero estrutural do projeto de escrita
do autor. A centralidade dada por Villoro à crônica,
demonstra que esse gênero contribui para um debate
atual sobre a literatura, pois revela que se trata de uma
interpretação da realidade.
RESUMO
CARMO, Simone Silva do. Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana
contemporânea de Juan Villoro. Rio de Janeiro, 2017. Tese de Doutorado
em Letras Neolatinas (Área de concentração: Estudos Literários – Opção:
Literaturas Hispânicas) do Programa de Pós-graduação em Letras Neolatinas
da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ.
A presente tese propõe o estudo e a análise da produção cronística do
escritor mexicano Juan Villoro a partir dos textos que compõem: Tiempo
transcurrido: crónicas imaginarias (1986), Los once de latribu: crónicas
(1995), Safari accidental (2005) e Dios es redondo (2006), com o enfoque na
caracterização da crônica como um gênero estrutural do projeto de escrita do
autor. Essas obras compreendem um período do processo histórico, cultural e
literário mexicano da década de 1970 até os anos de 2000. Nesse intervalo,
observou-se, naquele país, além do aumento significativo da crônica como
gênero, a expansão dos meios massivos de comunicação. Villoro, herdeiro da
geração que impulsionou a crônica no México, recebeu influência de diversas
correntes, como os Modernistas, os Contemporáneos, a Generación del Medio
del Siglo, a geração do boom da literatura hispano-americana e o Novo
Jornalismo. A partir disso, este estudo tenta demonstrar que a centralidade
dada por Villoro à crônica em seu projeto de escrita serve para demonstrar a
importância da mesma para debater literatura, dado que é um gênero que
compartilha em muitos aspectos e características com o conto, o ensaio, o
teatro, a reportagem e o relato entre outros, destacando que, por seu caráter
híbrido, o cronista foi levado a utilizar uma metáfora, intitulando a crônica como
o “ornitorrinco da prosa”. Além disso, este estudo demonstra que o autor utiliza
diversos recursos estilísticos para compor seus textos, destacando, dentre os
quais: a ironia, o humor e o aforismo. Ao mesmo tempo, ele introduz temas
contemporâneos, tais como: a violência urbana, a expansão do narcotráfico e
sua reflexão sobre os limites entre “alta” e “baixa” cultura, por isso a ênfase no
futebol e no rock. A importância que Villoro dá à crônica em seu projeto de
escrita ocorre porque esse gênero contribui para um debate atual sobre a
literatura, pois revela, pela inserção de elementos ficcionais e não ficcionais,
que se trata de uma interpretação da realidade. Para auxiliar na construção
desse pensamento, fez-se necessária uma pesquisa apurada e o uso de
discussões apresentadas por alguns teóricos, que se articularão com a análise
das obras, dentre os quais: Susana Rotker, Julio Ramos, Carlos Monsiváis,
Linda Egan, Martin Caparrós e Darío Jaramillo Agudelo.
Palavras-chave: Juan Villoro - Literatura Mexicana Contemporânea – Crônica – Cultura de massa.
RESUMEN
CARMO, Simone Silva do. Disecando el ornitorrinco: la crónica mexicana
contemporánea de Juan Villoro. Río de Janeiro, 2017. Tesis Doctoral en
Letras Neolatinas (Área de concentración: Estudios Literarios – Opción:
Literaturas Hispánicas) del Programa de Postgrado en Letras Neolatinas de la
Facultad de Letras da Universidad Federal do Río de Janeiro - UFRJ.
Esta tese de doctorado propone el estudio y análisis de la producción
cronística del escritor mexicano Juan Villoro desde los textos que
componen: Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias (1986), Los once de la
tribu: crónicas (1995), Safari accidental (2005) y Dios es redondo (2006), con el
enfoque en la caracterización de la crónica como un género estrutural del
proyecto de escritura del autor. Esas obras comprenden un período del proceso
histórico, cultural y literario mexicano de la década de 1970 hasta los años de
2000. En ese intervalo, se observó, en aquel país, además del aumento
significativo del género crónica, la expansión de los medios masivos de
comunicación. Villoro, heredero de la generación que impulsó la crónica en
México, recibió influencia de diversas corrientes, como los Modernistas, los
Contemporáneos, de la Generación del Medio del Siglo, de la generación del
boom de la literatura hispanoamericana y del Nuevo Periodismo. Desde ahí,
este estudio intentará demonstrar que la centralidad dada por Villoro a la
crónica en su proyecto de escritura sirve para demonstrar la importancia de la
misma para debatir literatura, dado que es un género que comparte en muchos
aspectos y características con el cuento, el ensayo, el teatro, el reportaje, el
relato entre otros y que por su carácter híbrido llevó el cronista a utilizar la
metáfora, intitulando la crónica como el “ornitorrinco de la prosa”. Además, este
estudio demonstra que el autor utiliza diversos recursos estilísticos para
componer sus textos, entre los que cabe destacar: la ironía, el humor y el
aforismo, al mismo tiempo que introduce temas contemporáneos tales como: la
violencia urbana, la expansión del narcotráfico y su reflexión sobre los límites
entre “alta” y “baja” cultura, por lo que el énfase en el fútbol y el rock. La
importancia que Villoro da la crónica en su proyecto de escritura ocurre porque
ese género contribuye a un debate actual sobre la literatura, pues revela, por la
inserción de elementos ficcionales y no ficcionales que se trata de una
interpretación de la realidad. Para ayudar en la construcción de ese
pensamiento, se hizo necesario una investigación apurada y el uso de
discusiones presentadas por algunos teóricos que se articularán con el análisis
de las obras, entre ellos: Susana Rotker, Julio Ramos, Carlos Monsiváis, Linda
Egan, Martin Caparrós, Darío Jaramillo Agudelo entre otros.
Palabras-clave: Juan Villoro, Literatura Mexicana Contemporánea, Crónica,
Cultura de masa.
ABSTRACT
CARMO, Simone Silva do. Dissecando o ornitorrinco: a crônica mexicana contemporânea de Juan Villoro. Rio de Janeiro, 2017. Tese de Doutorado em Letras Neolatinas (Área de concentração: Estudos Literários – Opção: Literaturas Hispânicas) do Programa de Pós-graduação em Letras Neolatinas da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ.
This thesis proposes the study and the analysis of the chronological
production of the Mexican writer Juan Villoro from the texts that compose:
Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias (1986), Los once de latribu: crónicas
(1995), Safari accidental (2005) and Dios es redondo (2006), with the focus on
the characterization of the chronic as a structural genre of the author's writing
project. These works comprise a period of the Mexican historical, cultural, and
literary process from the 1970s to the 2000s. In this interval, it was observed the
significant increase of the chronicle as a genre and the expansion of the mass
media. Villoro, heir of the generation that developed the chronicle in Mexico,
was influenced by several currents, such as the Modernists, the
Contemporáneos, the Generación del Medio del Siglo, the generation of the
boom of Hispanic American literature and the New Journalism. From this, this
study will try to demonstrate that the centrality given by Villoro to the chronicle
in his writing project serves to demonstrate the importance of the same to
discuss literature, since it is a genre that shares, in many aspects and
characteristics, with the tale, the essay , the theater, the report and the story
among others, emphasizing that, because of its hybrid character, the chronicler
was led to use a metaphor, calling the chronicle the "platypus of prose." In
addition, this study will demonstrate that the author uses several stylistic
resources to compose his texts, highlighting, among them: irony, humor and
aphorism. At the same time, he introduces contemporary themes, such as
urban violence, the expansion of drug trafficking and his reflection on the
boundaries between "high" and "low" culture, so the emphasis on football and
rock. The importance that Villoro gives to the chronicle in his writing project
occurs because this genre contributes to a current debate about literature,
because it reveals, through the insertion of fictional and non-fictional elements,
that it is an interpretation of reality. In order to assist in the construction of this
thought, it will be used a detailed research and discussions presented by some
theorists, that will be articulated with the analysis of the works, such as: Susana
Rotker, Julio Ramos, Carlos Monsiváis, Linda Egan, Martin Caparrós and Darío
Jaramillo Agudelo.
Keywords: Juan Villoro - Contemporary Mexican Literature - Chronicle - Mass Culture.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..................................................................................................14 I – JUAN VILLORO E A CRÔNICA MEXICANA .............................................28 1.1 Juan Villoro: o cronista de ideias ..............................................................28 1.2 A linguagem cronística de Juan Villoro .......................................................45
1.2.1 Ironia e humor: uma forma de resistência .......................................46
1.2.2 Aforismos: um estudo liminar ...........................................................58 II. HISTÓRIA E ATUALIDADE DA CRÔNICA ...............................................69 2.1 Reflexões teórico-crítica sobre a crônica mexicana ...................................70
2.2 Para uma estética da crônica na atualidade ...............................................86
2.2.1 Escritores, leitores e mercado cronístico.............................................108
III. CRÔNICA E CULTURA ............................................................................131 3.1 Discussões sobre crônica e cultura de massa ..........................................131 3.2 México: paisagem do pós-apocalipse .......................................................139 3.2.1 DCMX: uma estética do fragmento .....................................................166 3.3 Rock e futebol: o massivo nas crônicas de Juan Villoro............................179 IV. CRÔNICA: O ORNITORRINCO DA PROSA ............................................203 4.2 Crônica: caminhos fronteiriços ..................................................................203 4.2.1 O ornitorrinco da prosa: ficção e realidade .........................................220 CONCLUSÃO …............................................................................................237 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................245 ANEXOS..........................................................................................................284
14
INTRODUÇÃO
¿Por qué el sitio tan marginal de la crónica en nuestra historia literaria? Ni el enorme prestigio de la poesía, ni la seducción omnipresente de la novela, son explicaciones suficientes del desdén casi absoluto por un género tan importante en las relaciones entre literatura y sociedad, entre historia y vida cotidiana, entre lector y formación del gusto literario, entre información y amenidad, entre testimonio y materia prima de la ficción, entre periodismo y proyecto de nación
1.
Carlos Monsiváis
Escribir sobre la crónica, insistir sobre la crónica... ¿Después de Darío y Morris? ¿Después de José Martí, Victor Segalen, Joseph Roth, José Gutiérrez Solana, Josep Pla, Rodolfo Walsh, George Weller, Truman Capote, Gabriel García Márquez, Hunter S. Thompson, Nicolas Bouvier, Elena Poniatowska, Carlos Monsiváis, Ryszard Kapuściński, Juan Goytisolo, Oriana Fallaci o Gay Talese? ¿Después de casi cien años de premios Pulitzer? ¿De revistas como The New Yorker que publican reportajes de investigación y ensayos literarios desde 1925? ¿De libros teóricos como La invención de la crónica, de Susana Rotker, o Literatura y periodismo, de Albert Chillón? ¿Después de los grandes fotoperiodistas y documentalistas cinematográficos y televisivos? ¿Todavía?
Más que nunca. No sólo porque es ésa la dinámica de la tradición artística: la constante relectura, la reescritura constante (cada cronista vuelve a visitar y a reformular los temas, los espacios, las estrategias narrativas de sus predecesores, sumándoles su propio pacto ético y su propia vuelta de tuerca estética); sobre todo porque la Historia avanza como un tanque y cada presente reclama sus testigos, sus intérpretes, sus cronistas
2.
Jorge Carrión
Esta tese, cuja abordagem se volta para as crônicas do escritor
mexicano Juan Villoro, está centrada nos textos que compõem: Tiempo
transcurrido: crónicas imaginarias, Los once de la tribu: crónicas, Safari
accidental e Dios es redondo, publicadas entre em 1986 e 2006. Através da
análise dessas obras, que compreendem um período do processo histórico,
cultural e literário mexicano, se observa que a situação social daquele país é
abordada por meio de um registro que não é estritamente informativo, mas que
1Fragmento do texto de Carlos Monsiváis em “De la Santa Doctrina al Espíritu Público (Sobre
las funciones de la crónica en México)”. Publicada en la Nueva Revista de Filología Hispánica, 1987, p. 753. 2Trecho do prólogo de Jorge Carrión em Mejor que ficción: crónicas ejemplares. Barcelona:
Editorial Anagrama, 2012, pp.13-14.
15
procura dar conta da vida cotidiana, colocando os assuntos e agentes
marginais como centro de sua temática, por meio de um gênero híbrido entre
literatura e jornalismo, ficção e não ficção, que desafia definições estabelecidas
e promove uma reflexão sobre o caráter literário e não literário de seus textos:
a crônica.
Este gênero heterogêneo, que aqui se referirá como “a crônica mexicana
atual”3 foi negligenciada e marginalizada por parte da crítica ao longo de quase
todo o século XX. No entanto, observa-se também, que a história literária, nos
últimos anos, tem tentado responder ou pelo menos refletir a respeito do
desafio lançado por Carlos Monsiváis na epígrafe, no final da década 1980.
Durante muitos anos, Monsiváis, considerado o cronista mexicano mais
destacado e um dos maiores estudiosos do gênero no país nas últimas
décadas, solicitou à comunidade literária que tomasse a crônica com a
seriedade dos gêneros canônicos, já que, em se tratando de México “La poesía
lo es todo” (MONSIVÁIS, 1976, p. 357), ainda mais que o romance. Ele notou
que esse fato era devido aos vínculos entre a cultura oral predominante no
país, a persistente religiosidade e o privilégio concedido ao gênero poético,
que, com frequência, invadiu a prosa.
É importante considerar também que há romances clássicos da literatura
mexicana, cuja leitura se pode perceber características da crônica, como
ocorre em El Periquillo Sarmiento (1816) de José Joaquín Fernández de
Lizardi; Los bandidos de Río Frío (1889-1891) publicada por entrega em
folhetim de Manuel Payno; El Zarco (1901) de Ignacio Manuel Altamirano e Los
de abajo (1916) de Mariano Azuela.
Na tradição literária mexicana há cronistas relevantes desde o
Modernismo4, como Manuel Gutiérrez Nájera, Amado Nervo, Ramón López
Velarde e Juan José Tablada, os quais, utilizando recursos do jornalismo e da
ficção, que haviam penetrado em sua poesia, formaram-se escrevendo
3 O que Carlos Monsiváis chama de “nueva crónica”, Egan denomina “la crónica actual de
México” (EGAN, 2004, p.24). Nessa pesquisa se utilizará a denominação de Egan com o intuito de valorizar o caráter literário do gênero nos escritos de Juan Villoro. 4 A expressão modernismo nesta tese, refere-se ao Modernismo Hispano-americano
compreendido no período entre 1880-1920. Tendo como expoentes: José Martí, Julián del Casal, Manuel Gutiérrez Nájera, Salvador Díaz Mirón, Enrique Gómez Carrillo, Manuel González Prada, Amado Nervo, José Asunción Silva, Rubén Darío, entre outros.
16
crônicas para jornais. Afinal, naquele momento, os escritores mais destacados
não eram romancistas, mas poetas. Ou seja, acontecia um movimento em que
o popular, o massivo, aquilo que era feito para ser publicado e consumido de
forma efêmera passou para a literatura considerada elitista, pois “cada
presente tiene un pasado que le es propio y toda historia es opinión” (ROTKER,
2005, p. 19). Assim, os critérios empregados pela crítica literária em uma
determinada época levaram em consideração uma gama de características e
argumentos específicos em detrimento de outros, pois a marginalização de um
determinado estilo ou gênero literário, algumas vezes, atende a um critério
subjetivo.
Mesmo com a dedicação dos modernistas à crônica, ao longo do século
XX, esse gênero, no México, não ocupou o centro das atenções no meio
literário, permanecendo à margem. É provável que um dos fatores que
contribuíram para isso tenha sido o carácter hegemônico do conceito de
literatura do Modernismo, ou seja, literatura como sinônimo de ficção, pois a
concepção de literatura era muito restrita, uma vez que “todo lo que no pasaba
por el libro no era literatura y todo aquello que pasaba por otros soportes no
entraba en la foto” (SASTURAIN apud VILLORO y SASTURAIN, 2014, p.2).
A partir dos anos finais da década de 1960, esse conceito de literatura
começa a ser questionado entre os escritores, aproximando-se de uma ideia
cujo objetivo era romper com esse conceito, considerado por eles como
tradicional. Impulsionado provavelmente pelo que Edgar Morin (2011)
denomina a Terceira Cultura, ou mass-culture, ou mass-media, pois segundo
ele, a intelligentsia literária daquele momento é despojada pelo advento cultural
no qual a criação é dessacralizada e desmantelada a concepção de cultura, de
arte, de literatura, pois “Tudo parece opor a cultura dos cultos à cultura de
massa: qualidade à quantidade, criação à produção, espiritualidade ao
materialismo, estética à mercadoria, elegância à grosseria, saber à ignorância”
(MORIN, 2011, p.8).
No México, além da evolução dos meios massivos de comunicação,
outros fatores contribuíram para a valorização da crônica, como a exposição
contínua de esportes populares, como o futebol, por exemplo, e fatos políticos
marcantes, como o massacre de Tlatelolco ocorrido em 1968, manifestações
17
da sociedade civil, como as reivindicações de professores e de operários, as
explosões nas instalações da PEMEX em San Juanico e o terremoto de 1985
na Cidade do México. Esses acontecimentos fizeram com que esse tipo de
texto se inserisse com mais vigor no cotidiano.
É importante ressaltar que já havia a circulação de gêneros
considerados menores, como o folhetim, o romance policial, as histórias em
quadrinhos e autores que valorizaram e acentuaram a presença da oralidade
como Luis Spota, José Alvarado, Renato Leduc, entre outros. Entretanto, a
partir desse período, há uma proliferação de autores que dialogam com a
cultura divulgada nos meios massivos de comunicação e é
En este punto es que ingresa otro factor significativo: si el pensamiento de izquierda consiste en el análisis de las circunstancias políticas y culturales de la nación en el sentido amplio y si las herramientas teóricas son insuficientes, es necesario el desarrollo de un nuevo género crítico, lo que será conocido como “la crónica” (SÁNCHEZ-PRADO, 2006, p. 335).
Nesse (re) surgimento da crônica no México, destacam-se então Carlos
Monsiváis, Elena Poniatowiska, José Emilio Pacheco, Vicente Leñero e Jorge
Ibargüengoitia, que, com seus estilos individuais de escrita e diversidade
ideológica, utilizaram a crônica como “modus literário” para dar conta da
realidade num momento de transformações políticas, sociais e culturais
importantes.
Percebe-se que nesses autores não existe esse ou aquele tema, mas
aflora uma consciência de que os escritores podem abordar temas que
envolvam política e literatura, economia e literatura, sociologia e literatura.
Autores que questionam a respeito de qual seria o lugar da literatura. Juan
Villoro, que pertence à geração posterior a que impulsionou a crônica no
México, é certamente um desses. Talvez por isso, ele evidencie em seus textos
formas culturais que questionam os limites entre alta e baixa cultura e
centralize sua escrita num gênero híbrido como a crônica.
A partir do exposto, esta tese propõe o estudo e a análise dos textos que
compõem as obras: Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias (1986), Los once
de la tribu: crónicas (1995), Safari accidental (2005) e Dios es redondo (2006),
18
do escritor mexicano Juan Villoro, com o enfoque na caracterização da crônica
como um gênero literário estrutural do projeto de escrita desse autor.
Ao selecionar esse corpus, que compreende um arco do processo
histórico, literário e cultural mexicano dos anos finais da década de 1970 até os
primeiros de 2000, evidencia-se o objetivo de apresentar uma amostra
representativa da produção cronística do autor dentro de um intervalo de tempo
que abarca mudanças importantes na sociedade mexicana e que foram
abordadas pelas crônicas de Villoro. É pertinente ressaltar que o movimento
estudantil de 1968, é um marco importante, como um divisor de águas capaz
de contribuir para a retomada da crônica como um meio de criticar a realidade
social naquele país.
Seria audacioso pretender analisar todas as crônicas ou todas as
coletâneas de crônicas de Juan Villoro, que são nove até o momento, não
apenas por serem muito extensas, mas por estarem dispersas. Sendo assim,
fez-se a opção por crônicas compiladas em formato de livro, e tal ocorre devido
à dificuldade para reunir textos publicados em diferentes meios. Far-se-á
referência a outras crônicas e ensaios ao longo do trabalho, incluídas na
bibliografia, procurando manejar uma estrutura livre que permitirá deter-se em
diferentes textos e obras com o intuito de contribuir para a análise do corpus,
de acordo com o tema abordado.
Juan Villoro iniciou sua história literária escrevendo contos e crônicas
nos finais da década de 1970. O início de sua escrita como cronista se dá
quando foi convidado para escrever crítica de rock no suplemento Sábado do
jornal Unomásuno, como declara no prólogo de Los once de la tribu: “Así se
inició mi trayectoria por las aguas de la crónica” (VILLORO, 1998, p.9). Nesse
período, Villoro se torna também roteirista radiofônico do programa El lado
oscuro de la luna na Rádio Educação. Foi cronista de futebol de várias Copas
do Mundo; escritor premiado de obras infanto-juvenis; autor dos romances El
disparo de argón (1991), Materia dispuesta (1997) El testigo (2004) e Arrecife
(2012b); dos livros de contos La noche navegable (1980), Albercas (1985), La
alcoba dormida (1992), La casa pierde (1999) e Los culpables (2007); roteirista
dos filmes El mapa movedizo e Vivir mata; autor das peças de teatro Muerte
parcial, El filósofo declara, Filosofia de Vida e Conferencia sobre la lluvia; além
19
de roteirista do livro de fotografias Migraciones, de Sebastião Salgado e El
suplicante – México 1971-2007, de Paolo Gasparini. Villoro já declarou em
entrevistas que o substrato massivo que primeiro influenciou sua escrita foram
as narrações de futebol do cronista Ángel Fernández “el locutor que renovó el
imaginario del fútbol y decidió mi vocación por la palabra” (VILLORO, 2006b, p.
218).
Desde o começo de sua trajetória, Villoro vai dando-se conta da
importância da crônica na construção de sua escrita. Em sua obra cronística, a
cultura divulgada nos meios massivos de comunicação é utilizada de forma
crítica. O autor demonstra que a importância da leitura de textos canônicos
como Hamlet, de William Shakespeare ou Don Quijote, de Miguel Cervantes,
chegam até as camadas mais simples de uma sociedade através das
telenovelas, das histórias em quadrinhos, do romance policial, dos livros de
bolso e dos filmes de gênero B. Ele ressalta através de suas crônicas que o
contato com o popular e com o massivo não desmerece a obra de um autor
diante da crítica, pois um escritor nutre sua narrativa de elementos de sua
época.
Villoro inicia sua produção literária num momento historicamente
complexo, devido às consequências do Massacre de Tlatelolco ocorrido em
1968, quando se faz questionamentos que interrogam sobre o “fim da
Revolução Mexicana” e da “filosofia do ser mexicano”, temas que aparecem em
toda sua obra e, principalmente, em suas crônicas. A “filosofia do ser
mexicano” se caracteriza pela busca do “ser nacional”, o qual esteve a cargo
do grupo Hiperión5 formado por estudantes mexicanos sob a influência do
filósofo espanhol José Gaos por volta de 1947 e encabeçado por Leopoldo Zea
e Luis Villoro (pai do escritor do qual se ocupa essa pesquisa), entre outros.
A busca do “ser nacional” ou da “”identidade nacional” aparece na
literatura mexicana desde os anos finais do século XIX, intensificando até a
primeira metade do XX. No caso de Villoro, talvez o que o tenha levado a
5Hiperión é a figura menor da Titanomaquia grega que foi recuperado com particular
intensidade durante o romantismo e, com clara filiação germânica, sobretudo de Hegel e Dilthey. Além dos dois membros mencionados pode-se destacar também Emilio Uranga, Joaquín Sánchez MacGregor, Ricardo Guerra e Jorge Portilla (SÁNCHEZ-PRADO, 2006, p. 191).
20
recorrer a esse elemento sejam as condições da vida no país durante esse
período, época de grandes transformações culturais, políticas e econômicas,
pois recebeu o impacto do auge e do colapso do Desenvolvimentismo surgido
nos anos 40 e 50, o aumento da vida urbana em que as heranças da cultura
promovida desde o Estado (e que se baseavam nos signos da Revolução
Mexicana e na discussão sobre “o nacional”), se veem complementadas e
contestadas pela contracultura. Nesses anos, as pressões sindicais, operárias
e estudantis convergem no emblemático 2 de outubro de 1968 e o massacre
dos estudantes na Plaza de lasTres Culturas, em Tlatelolco. As tensões não
resolvidas nesse período desembocam nos anos 70.
Os debates sobre a mexicanidade, que nos anos cinquenta foram
incorporadas à expressão cultural, ou melhor, na força do projeto hegemônico
do nacionalismo e no contexto do campo do poder, foram retomados por Juan
Villoro em sua escrita, e, na medida em que ocorre a identificação dos
mexicanos com a imagem de si mesmos no cinema, na literatura e na música
popular, essa foi a maneira através da qual o poder do Estado pôde neutralizar,
de forma bastante eficiente, a resistência. E é contra essa filosofia do “ser
mexicano” que ele se “rebela”, como deixa claro na entrevista Villoro en Villoro
Cuando yo empecé a escribir y leer por mi cuenta había una saturación de autodefinición nacionalista y creo que buena parte de las cosas que yo he escrito han sido un ejercicio de ironizar y de desmontar esos procesos. Creo que el camino que va de 1950 con el Laberinto de la soledad a fines del siglo veinte con la Jaula de la melancolía de Roger Bartra es el camino para entender que el mexicano es múltiple, es híbrido es provisional, que no hay un mexicano emanante […] todas las escrituras de mis cuentos, de mis novelas y de mis ensayos tienen que ver con ese proceso de desmontaje de una identidad unívoca y de una identidad retórica […] (VILLORO, 2009d, p. 1).
Esse processo a que se refere Villoro na entrevista, o de questionar
através de seus textos o discurso essencialista sobre a busca da “identidade
nacional mexicana”, aparece em muitos escritores de sua geração, ou seja, a
dos nascidos no México nos anos cinquenta e que receberam influência da
Generación de la Casa del Lago e dos escritores da Onda.
21
Villoro lê com muita atenção a tradição literária mexicana. E essas
referências podem ser percebidas em suas crônicas, pois convoca
constantemente obras e escritores paradigmáticos. Entretanto, esse autor
contribui para a reformulação do debate sobre o “ser nacional” e procura
abordar temas que envolvam a “alta” e a “baixa” cultura com a mesma
desenvoltura, tecendo autores e textos da tradição literária em uma prosa
elaborada que abarca o futebol e o rock. Por isso, para José Ramón
Ruisánchez, Villoro é herdeiro de três vertentes mexicanas:
primero, la que va de la novela de la Revolución a Carlos Fuentes, releyendo productivamente a Rulfo; en segundo lugar, el canon que recupera la manera heterodoxa de los Contemporáneos por medio de la Generación de la Casa del Lago y de sus excursiones a literaturas “marginales” que permiten regresar a la novela y al cuento desde la riqueza de una ruptura con el género rígido, lo que llamaron “escritura” siguiendo a los teóricos franceses de la écriture; finalmente, el atrevimiento progresista que bebe por una parte de las grandes narraciones sociales del 68 y del 85 y, por otra, de los hallazgos pop de la Onda (RUISÁNCHEZ, 2008, p. 144).
A Generación de la Casa del Lago6 ou Generación del Medio del Siglo
apresenta uma postura contrária às tendências nacionalistas dos anos
quarenta, sustentada pelos questionamentos dos pressupostos da Revolução
Mexicana e pela denúncia das promessas não cumpridas por parte do governo.
Essa geração composta por escritores como Inés Arredondo, Tomás Segovia,
Huberto Batis, Juan García Ponce, Juan Vicente Melo, Salvador Elizondo,
Carlos Monsiváis, Sergio Pitol, Jorge Ibargüengoitia, José Emilio Pacheco,
entre outros, que não somente desenvolveram obras próprias, mas um
destacado trabalho de crítica em diferentes campos (teatro, cinema, pintura,
música, romance, ensaio, crônica e poesia), além da participação em diversas
instituições culturais, como el Centro Mexicano de Escritores; nas Revista
Mexicana de Literatura (RML), Cuadernos del Viento, S.Nob e La palabra y el
hombre; nos suplementos "México en la Cultura" (do jornal Novedades) e "La
Cultura en México" (da revista Siempre!). É importante mencionar também o
apoio que receberam de diversas editorias, como a “Imprenta Universitaria de
la UNAM, Era, Empresas Editoriales, Joaquín Mortiz, el Fondo de Cultura
6 Essa geração recebe esse nome inspirada no primeiro centro cultural da UNAM situado fora
do campus universitário, fundado em 1959, tendo como diretor e fundador Juan José Arreola (ALBARRÁN, 1998, pp.1-7).
22
Económica (FCE) y la editorial de la Universidad Veracruzana” (ALBARRÁN,
1998, p.1), para citar alguns exemplos.
Na década de 1960, surgiu um movimento literário no México,
considerado em muitos aspectos como contracultural, denominado em sentido
pejorativo de Literatura de la Onda por Margo Glantz. Através de seus textos,
escritores demonstravam desacordo com o regime autoritário do Partido
Revolucionario Institucional (PRI), utilizando temas como: o rock and roll, a
Guerra do Vietnã, o sexo, as drogas entre outros. Seus integrantes mais
destacados foram: José Agustín, Gustavo Sainz e Parménides García Saldaña.
Ambos os movimentos tiveram influência na prosa cronística de Villoro
através dos temas que envolvem a cultura divulgada nos meios massivos de
comunicação; da prosa elaborada, irônica, repleta de humor e sátira; dos meios
utilizados para a publicação de seus textos, pois, das quatro obras que
compõem o corpus, uma foi publicado pela primeira vez em Fondo de Cultura
Económica (Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias), e a outra em Joaquín
Mortiz (Safari accidental), além de que, na sua composição cronística, podem-
se perceber a influência de José Emilio Pacheco, Jorge Ibargüengoitia, Carlos
Monsiváis, José Agustín entre outros.
Villoro discute, através de suas crônicas, a modernidade do país. No
entanto, observa-se a rejeição do termo “pós-modernidade”, utilizado por
alguns críticos a partir dos últimos anos do século passado, optando pela
expressão em chave irônica: “pós-apocalipse”. Esse termo é tomado
emprestado pelo cronista da obra Los rituales del caos (1995), de Carlos
Monsiváis, na qual ele denomina “México, ciudad post-apocalíptica”
(MONSIVÁIS, 1995, p. 21, grifo do autor).
Em uma paráfrase das ideias de Monsiváis e do título de Alfred
Hitchcock em Vértigo7, filme de 1958, que Villoro apresenta, posteriormente,
em seu ensaio, “El vértigo horizontal. La Ciudad de México como texto”
(2002a), esse autor demonstra preocupação com os conflitos gerados pela
busca da identidade do ser nacional, vistos através do espaço urbano da
megalópole, que é o Distrito Federal. Ele transfere ao espaço textual as
7 No Brasil esse filme foi traduzido com o título “O corpo que cai”.
23
dinâmicas e os conflitos inerentes do mundo contemporâneo, testemunhando a
novidade do presente e preservando as características essenciais da
modernidade: o fugitivo, o transitório e o contingente.
As obras corpus estão compostas de prólogos que, além de
apresentarem a obra, também discutem a crônica como gênero. Observa-se
que os textos têm como fio condutor a cultura divulgada nos meios massivos
de comunicação, utilizada como meio para discutir o consumo global e a
cultura contemporânea.
Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias, seu primeiro livro de crônicas,
publicado em 1986, é composto por dezoito textos que compreendem um
período entre 1968 a 1985, no qual relatos e retratos de uma geração se
confundem. Nessa obra, percebe-se um recorte in media res, apresentando um
painel de histórias do cotidiano e mudanças, que jovens mexicanos, de três
décadas, tiveram que passar. A vida cotidiana das pessoas comuns que não
ocuparam as páginas dos jornais nem o centro de nenhum fato histórico, mas
estavam ali, à margem dos acontecimentos.
Os capítulos dessa obra são intitulados pelas datas desse período,
durante o qual ocorreram fatos como o massacre de Tlatelolco, a grave crise
econômica a partir de 1970 e o terremoto de magnitude 8.1 sucedido naquele
país no dia 19 de setembro de 1985, além de diversos outros fatos
econômicos, políticos e culturais. Nessa obra, percebe-se a influência da Onda
com a aparição de personagens da classe média e a incorporação de
elementos da cultura pop, principalmente a influência da música rock, do
cinema e da televisão.
Em 1995, reunidos sob o título Los once de la tribu: crônicas surgiu uma
coletânea de textos escritos nos últimos oito anos. Nessa obra, o humor
aparece como ingrediente essencial, através de uma elaboração dicursiva
composta por diversos “aforismos” se percebe a cultura divulgada nos meios
massivos como fio condutor, no qual, nota-se pelo olhar oblíquo do autor, que a
realidade ocorre para ser narrada, para ser interpretada. Composta com textos
sobre o futebol, o boxe e uma visão crítica do rock, passando por Andy Warhol,
Jane Fonda, Ángel Fernández, Gabriel Vargas e o EZLN, pois, como comenta
24
o crítico Juan Antonio Masoliver Ródenas: “Aquí encontramos las claves que
explican toda la escritura de Villoro. Cada uno de los aspectos que hemos visto
de forma dispersa en sus otros libros aparecen ahora plenamente
desarrollados” (MASOLIVER RÓDENAS, 2011, p. 38). Nessa obra, Villoro
homenageia José Agustín, que “logró el rapto predilecto de los escritores;
ganar a alguien para la literatura: el lector ideal es el que hasta aquel momento
no ha leído un libro por gusto” (VILLORO, 1998, p. 17).
Dios es redondo, publicada em 2006, é uma coleção de instantes, no
qual a combinação de crônica com reflexões sociológicas e anedotas pessoais
do vivido e sentido no trabalho cotidiano, registra, de forma irônica, as
mitologias e superstições em torno do futebol. Nessa obra, Villoro ressalta que
o futebol para existir tem que ser narrado, que o faz a partir de uma linguagem
muito particular que envolve metáforas, aforismos e sentido de humor,
conectando realidade e imaginação, pois como comenta o autor que o jogo
ocorre no campo e na mente do público. Através de uma exploração narrativa,
ele aproxima futebol e literatura, sem, entretanto, afastar-se do compromisso
político.
Na composição de Safari accidental (2005), são vinte e três textos
publicados anteriormente em diversos meios, sendo que dois deles se
apresentam como prólogo e epílogo, e os demais estão divididos em cinco
partes. Aparentemente, trata-se de uma coletânea de temas separados, mas,
certamente, não são, pois, seja nos eventuais encontros com celebridades do
rock, seja em viagens pelo México ou até mesmo nas oficinas literárias de
Augusto Monterroso, Villoro tece a memória de eventos, faz uma reflexão sobre
a vida no México pós-68, promovendo uma profunda reflexão sobre a cultura
de massa, não só no México, mas também na América Latina. É uma obra
heterogênea, na qual o autor utiliza a crônica para estabelecer, ao mesmo
tempo, um cunho político e literário aos seus textos.
No prólogo dessa obra, “Ornitorrinco: notas sobre la crónica”, Villoro,
relembrando Alfonso Reyes, que renomeou o ensaio como o “centauro dos
gêneros”, cria uma metáfora que atravessará todo esse estudo, denominando a
crônica de o “ornitorrinco da prosa”. Ao equiparar a crônica a um ornitorrinco,
Villoro, está deliberadamente questionando a realidade. Segundo o poeta e
25
ensaísta nicaraguense, Moisés Elías Fuentes, “en el ideario colectivo y aun el
intelectivo los inexistentes centauros son más ciertos que los existentes
ornitorrincos. El centauro es un ideal, una aspiración, el ornitorrinco una
adaptación a necesidades concretas” (E. FUENTES, 2007, p.1). Ao ressaltar as
particularidades desse animal indefinido entre mamífero, réptil e ave, que mais
parece uma montagem, aproxima-se da crônica pela capacidade de absorver
características de vários gêneros literários e não literários presentes nesse
texto. Villoro destacou sete: a reportagem, a entrevista, o romance, o conto, o
ensaio, o teatro e a autobiografia, sem deixar de ser ela mesma. Ou seja, a
partir dessa metáfora, seria possível questionar: por que a crônica, esse gênero
híbrido, denominado por Juan Villoro como o ornitorrinco da prosa, é
importante para discutir literatura?
A hipótese que norteará esta tese será a de tentar demonstrar, através
da análise das obras Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias, Los once de la
tribu: crónicas, Safari accidental e Dios es redondo, publicadas entre 1986 e
2006, que a centralidade dada por Villoro à crônica em seu projeto de escrita é
para demonstrar que a crônica é importante para debater literatura, porque, em
sua essência, ressalta que ela não é a realidade, mas uma interpretação dessa
mesma realidade.
Este gênero é utilizado para representar o momento histórico, cultural e
literário mexicano dos anos finais da década de 1970 até os primeiros de 2000,
já que, no México, segundo a visão desse escritor, é o período de expansão da
cultura divulgada nos meios massivos de comunicação, da marca do “fim da
Revolução Mexicana”, de questionamento entre “alta” e “baixa cultura” (daí, por
exemplo, que muitas de suas crônicas sejam sobre futebol e convivam com
ensaios sobre Shakespeare, Thomas Bernhard, entre outros) e os debates
sobre os limites da modernidade, pós-modernidade e até “pós-apocalipse”.
Esse gênero híbrido é privilegiado em tempos “pós-apocalípticos” para contar
os “rituais do caos” no México. Villoro demonstra, desde o início de sua
trajetória literária, a relevância da crônica e da cultura de massa para sua
ficção: “Para mi lo popular es muy importante porque un autor se alimenta de
su época, un autor le devuelve algo a su época, pero usa el lenguaje de la
época” (VILLORO, 2016d). A crônica que se move às margens da literatura e
26
desafia definições estabelecidas é utilizada por Villoro para estabelecer, ao
mesmo tempo, um caráter político e literário de seus textos.
Esta tese está constituída de quatro capítulos. O primeiro, intitulado
“Juan Villoro e a crônica mexicana” está dividido em duas seções: na primeira,
se destacará a figura do escritor no cenário da cronística mexicana, sua
formação literária, o seu lugar de enunciação, mostrando que ele pertence à
geração posterior à que impulsionou a crônica no contexto histórico-cultural
mexicano a partir de 1968 e como esse período influencia o seu projeto de
escrita. A segunda parte está dedicada à linguagem das crônicas de Villoro.
Nessa parte, serão destacadas as particularidades da linguagem empregada
em suas crônicas, que envolvem o aforismo, a ironia e o humor.
Após situar Villoro no panorama da Literatura Mexicana Contemporânea,
essa pesquisa se estruturará a partir das leituras de críticos como Carlos
Monsiváis (2010), Julio Ramos (2008), Susana Rotker (2005) e Linda Egan
(2004), no capítulo “História e atualidade da crônica”. A partir da escrita
cronística de Juan Villoro, se traça um breve panorama com a evolução e as
principais características de suas crônicas que se pode observar nos
modernistas, nos vanguardistas, da influência da literatura de não ficção norte-
americana e do boom da literatura hispano-americana, procurando demonstrar
que esse é um gênero híbrido, com uma fronteira tênue entre literatura e
jornalismo, ficção e realidade, culto e popular, teoria e história. Na última parte
do capítulo, a análise se centrará no período histórico pós-68 até a atualidade,
focando nos leitores, nos escritores e no mercado cronístico, com o objetivo de
demonstrar que a composição desses três elementos contribuiu para a
evolução do gênero.
No terceiro capítulo “Literatura e Cultura” serão apresentadas
discussões sobre a cultura, principalmente a divulgada nos meios massivos de
comunicação, procurando demonstrar como o autor utiliza o esporte de massa
(o futebol) e a música (o rock) para falar da sociedade, da história, do consumo
e da modernidade no país. Nessa parte, será dado destaque à Cidade do
México como um lugar de debate, de organização da sociedade civil e de
desenvolvimento da cultura de massa. A crônica e a cidade compartilham
muitos sentidos, entre eles, como espaço importante para pensar literatura e
27
privilegiado para abarcar as interpretações dos fatos coletivos ocorridos no
cotidiano narrados nas crônicas de Juan Villoro. Os textos teóricos que servirão
de base para esta análise são dos críticos Fredric Jameson (2005), Terry
Eagleton (1998), Edgar Morin (2011), Carlos Monsiváis (1996), entre outros.
O último capítulo desta pesquisa, “Crônica: o ornitorrinco da prosa”,
procurará demonstrar que a centralidade que Juan Villoro dá à crônica em seu
projeto de escrita é para evidenciar que, para ele, a crônica debate literatura, e
em sua essência, ressalta que não é a realidade, muito menos um mero
escape para o entorno cotidiano, mas é uma interpretação dessa mesma
realidade. Procurar-se-á ressaltar que, embora o exercício literário proponha a
criação de realidades inexistentes, isto não significa que a literatura careça de
vínculos com o real. A crônica, afinal, é um gênero que permite perceber que
literatura e realidade se relacionam de diversas maneiras.
28
CAPÍTULO I - JUAN VILLORO E A CRÔNICA MEXICANA 1.1 Juan Villoro: o cronista de ideias
Villoro ha representado, en una proporción que con los años se tornaba preocupante, la crónica de una anomalía
8.
Christopher Domínguez Michael
O cronista, ensaísta e poeta mexicano José Joaquín Blanco9 comenta
que os escritores mais destacados de um país sempre procuram apreender as
correntes literárias anteriores, para que com isso possam criar uma nova voz,
rompendo assim certa tradição. Porém, não haverá totalmente uma ruptura
com tais influências anteriores. O que poderá ocorrer, de fato, será uma
renovação e, portanto, uma aquisição de novos procedimentos estéticos.
O que significa o nome de Juan Villoro na tradição da crônica mexicana?
Há de considerar-se que ele inicia sua trajetória literária na década de 1970, no
trânsito entre a contracultura e a cultura de massa. Período que muitos autores
como Carlos Monsiváis (2013), José Agustín (2007) e Ignacio Sánchez-Prado
(2006) acreditam que se deu o início da formação da sociedade civil mexicana.
É interessante refletir a respeito da influência desse momento em seu projeto
de escrita, já que o México, tradicionalmente, apresentou figuras públicas
exercendo o papel de cronistas: Manuel Gutiérrez Nájera, Ignacio Manuel
Altamirano, Martín Luis Guzmán, Amado Nervo, Luis G. Urbina, José Alvarado,
Salvador Novo, Jorge Ibargüengoitia e José Emilio Pacheco, dentre muitos
outros que, através de seus textos, procuraram apresentar uma visão crítica do
país. Na verdade, essa herança vem desde o início da colonização espanhola
com a presença da figura do cronista oficial:
En 1558 se solicitó al Rey el nombramiento de Francisco Cervantes de Salazar como cronista de la Nueva España, según consta en actas Del Cabildo del Ayuntamiento, el 24 de enero de ese año. Su labor principal era escribir la gran Crónica de la Nueva España (URRUTIA, 2007, p.1).
8 Trecho do artigo de Christopher Domínguez Michael “La vitalidad histórica de los muertos
mexicanos”: El testigo de Juan Villoro. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011, p. 190. 9 Reflexão presente no artigo de Anthony Stanton “Lo culto y lo coloquial en la poesía mexicana
contemporánea”. In: Cuadernos Hispanoamericanos, Madrid, 1991, nº 501, p. 108.
29
Francisco Cervantes de Salazar foi o primeiro cronista da Cidade do
México, porém não foi espontâneo, mas designado. No entanto, o cargo
continuou sendo ocupado por diversos cronistas anos após anos. Para citar
alguns exemplos, no século passado foram nomeados Luis González Obregón,
em 1911, Artemio de Valle Arizpe, em 1942, Salvador Novo, em 1965, e o
último, Guillermo Tovar de Teresa, indicado em 1985 pelo então presidente
Miguel de la Madrid, que, como destacou Novo, “con amor y brillo,
espontáneamente o por nombramiento” (NOVO apud URRUTIA, 2007, p.1),
seguiram o ofício. Compreendendo a impossibilidade de abarcar o todo, Tovar
de Teresa propôs a criação de um conselho, o que ocorreu em 1987, cujo
intuito era reunir os cronistas mais destacados, “cuyo amor por La Ciudad de
México los hiciera partícipes de una Crónica Colectiva en virtud de la
imposibilidad de que una ciudad de las dimensiones actuales estuviesen en un
solo cronista” (TOVAR DE TERESA apud URRUTIA, 2007, p.1).
Nessa visão literária, especificamente mexicana e ricamente
heterogênea, surge em cena o escritor Juan Villoro. Sua obra está intimamente
ligada à Cidade do México, e é exatamente em suas crônicas que se deve
encontrar o ponto de partida para entender sua escrita. Nascido no México em
1956, filho do filósofo mexicano-catalão Luis Villoro, foi educado numa escola
alemã na Cidade do México, cercado dos mais importantes intelectuais daquele
país. No entanto, além da formação erudita, na figura que o autor se empenha
em criar, observa-se em muitas de suas entrevistas e no prólogo de Los once
de la tribu (1998) menciona que, quando criança, não se interessava pelos
livros, mas pelos cronistas esportivos de rádio, como Ángel Fernández, que lhe
fizeram pensar:
Cuando yo le conocí, hablé con un gran nerviosismo, se me quebró la voz en el teléfono como se estuviera hablando con Borges porque él era el ídolo de mi infancia. Fue la persona que me reveló a mí que las palabras son símbolos mágicos. Las palabras reinventan la realidad y no sirven solamente para cosas utilitarias, para hacer trámites […], no. Las palabras pueden reinventar el mundo. […] Me quedé nerviosísimo de encontrar la persona que me había revelado que el mundo vale la pena porque se puede contar historias y que las palabras tienen un significado que altera la realidad. Cuando yo descubrí eso con Ángel Fernández, yo no sabía que existía la literatura pero que me sensibilizó para que cuando después descubrí la literatura, me di cuenta, claro, eso es como las narraciones que hacía este extraordinario cronista (VILLORO, 2016d).
30
O autor de Safari accidental cresceu ouvindo as radionovelas, assistindo
à programas de televisão: “En las tardes, yo visitaba a mi abuela para ver Don
Gato y su pandilla, El superagente 86, Mi Marciano favorito” (VILLORO, 2005a,
p.25), além das histórias em quadrinhos La familia Burrón, de Gabriel Vargas, e
escutando as anedotas da avó paterna, que era escritora de bestsellers de
autoajuda. Villoro viveu o declínio dos movimentos de contracultura nos finais
da década de 1970 e, como os escritores da Onda, “está el mundo de lo que en
el momento de su aparición se denominó, por lo que tenía de contestatario,
“contracultura” y que hoy podríamos llamar “cultura popular” o “cultura de
masas”” (MASOLIVER RÓDENAS, 2011, p. 35).
Juan Villoro, autor cuja qualidade cronística é aproximada por muitos à
de Carlos Monsiváis na crônica mexicana, assim como seus antepassados,
escreve ensaios que se assemelham a crônicas e crônicas que parecem
ensaios, sendo também, em alguns casos, próximos aos contos. O próprio
Monsiváis, em sua obra A ustedes les consta: antología de la crónica en
México (2010), destaca que Villoro é: “cronista de primer orden” (MONSIVÁIS,
2010, p.544). No entanto, quando questionado se é herdeiro de Carlos Fuentes
ou de Monsiváis, responde: “Por suerte, la literatura no es una dinastía y
puedes escribir sin suceder a nadie. Ante tu pregunta, me acuerdo de un verso
de otro Carlos, Pellicer: “Todo será posible, menos llamarse Carlos”” (VILLORO
apud BAUTISTA, 2016, p.2). Sobre esse tema, Sergio González Rodríguez em
seu artigo “El Safari cotidiano en esplendor”10, faz uma pequena fábula:
Para expresarlo a partir de personajes de la gran prosa mexicana del último siglo, es como si un día Alfonso Reyes hubiera soñado que era un pez que se comía a otro pez llamado Salvador Novo, que a su vez soñaba que era un pez que se comía a otro pez llamado Carlos Monsiváis, que a su vez soñaba que él terminaba cocinando en un platillo para día domingo en la mesa de Juan Villoro (GONZÁLEZ RODRÍGUEZ, 2011, p.122).
Certamente, a obra de Monsiváis exerce uma grande influência na
narrativa poliédrica de Juan Villoro, assim como Juan Rulfo, Octavio Paz,
Augusto Monterroso, José Agustín, José Emilio Pacheco, Sergio Pitol, Jorge
10
Esse artigo foi publicado originalmente no jornal Reforma, em 22 de outubro de 2005. Aqui se utiliza o formato compilado por José Ramón Ruisánchez y Oswaldo Zavala.
31
Ibargüengoitia, Salvador Novo, Salvador Elizondo, Juan García Ponce, entre
tantos outros. Na maioria das crônicas que compõem o corpus dessa pesquisa,
Villoro deixa transparecer essa influência, entrelaçando, na narrativa,
características de obras de diversos cronistas, principalmente de Novo e
Monsiváis, através do tema, com humor, ironia e sarcasmo. Outra influência
importante vem de dois polos continentais: a da chamada literatura fantástica
do Rio da Prata (Felisberto Hernández, Jorge Luís Borges, Adolfo Bioy
Casares, Julio Cortázar e Juan Carlos Onetti) e da literatura norte-americana,
exercendo o que se poderia chamar de literatura de velocidade, como declara
Villoro:
con ritmo cinematográfico, una yuxtaposición cinematográfica de escenas y una construcción de secuencias tomadas del montaje de los filmes, los posteriores a la «generación perdida»: Saúl Bellow, John Updike e Truman Capote fueron escritores que influenciaron mi generación (VILLORO, 1997, p.121).
Além dos mencionados, nessa mesma entrevista Villoro comenta a
respeito da tradição da crônica mexicana: “Algunos de nuestros mejores
escritores han sido, ante todo, cronistas. Pienso en el novelista Martín Luis
Guzmán, por ejemplo, cuyas novelas son novelas sin ficción, novelas-crónica
(VILLORO, 1997, p.124), que também influenciaram sua obra.
O autor de Tiempo transcurrido já havia mencionado a influência de
Capote em várias entrevistas, e parece que o que ele admira nesse autor
norte-americano é que, graças a sua obra A sangue frio (1966), hoje se pode
falar em literatura de não-ficção ou Novo Jornalismo. O conceito de ficção é
intrínseco à literatura, ou seja, mesmo quando se escreve sobre algo que
aconteceu de fato, ainda assim está se utilizando ficção. A maneira como
Capote explora esses conceitos é o que atrai o escritor mexicano.
Villoro se encontra cronologicamente entre a geração La Onda e a que
se denomina Generación del Crack11; no entanto, não pertence a nenhum dos
11
Movimento literário mexicano composto por Jorge Volpi, Pedro Ángel Palou, Vicente Herrasti, Ignacio Padilla, Ricardo Chávez Castañeda e Eloy Urroz que lançaram em 1996 um manifesto, inicialmente concebido como ruptura com o postboom latino-americano. Definido por Elena Poniatowska como: “una fisura, un hueso que se rompe, un vidrio que se estrella, una rama de árbol que cae y hace precisamente eso: crack” (PONIATOWSKA, 2003, p. 1). Crack é o mesmo que boom, só que para dentro, é o auge da derrota. Com o tempo os traços mais radicais
32
dois grupos, porém, como comenta Monsiváis, apresenta referências
geracionais com “Daniel Sada, David Toscana, Guillermo Fadanelli, Enrique
Serna y Mario Bellatín” (MONISVÁIS apud AZNÁREZ, 2003, p.1). Entre os
autores que cresceram no período pós-68, Juan Villoro é o que se encontra
hoje com maior projeção no meio literário, além de Daniel Sada.
As publicações do autor iniciam-se na década de 1970 com contos e
crônicas. Muitos deles, inclusive o livro Tiempo transcurrido, abordam as
mobilizações estudantis de 1968 e o massacre ocorrido na Plaza de las Tres
Culturas. Villoro tinha doze anos de idade nessa data, assim como o
protagonista da crônica que inicia a obra.
Na crônica intitulada “Carnaval y Apocalipsis”, Villoro reflete sobre ese
período: “Después del movimiento estudiantil del 68 y la matanza de Tlatelolco,
México se convirtió en una nación que proclamaba el cambio sin obtenerlo e
inauguraba invisibles modernidades” (VILLORO, 2010b, p.3). Esse evento
histórico foi o primeiro grande conflito urbano do México que demonstrou que o
país estava mudando e que, não somente os estudantes, mas também os
intelectuais e muitos outros profissionais ansiavam por mudanças:
después de 1968, la crónica ni se desvanece ni se repliega en la nostalgia. Entre sus funciones se hallan la consignación de las impresiones de la modernidad, el cultivo de leyendas y mitologías, los retratos de las clases medias detenidas en su ascenso, los personajes nuevos o ya producto de una mirada sin prejuicios tradicionalistas. La crónica también le corresponde reproducir el vértigo de masificación, las sensaciones de caos, la reubicación de la vida cotidiana, la racionalidad que se califica de “heterodoxa”. […] Además, la crónica mantiene la práctica de la literatura en un medio que prescinde de ella. Algunos cronistas atienden los movimientos populares y las expresiones de la sociedad civil. Además, y básicamente, la crónica reivindica la literatura en un medio antiintelectual (MONSIVÁIS, 2010, p. 112).
Em meados dos anos 70, as crônicas relatavam as mudanças de uma
sociedade que questionava a nação, a modernidade e a tradição vigente até
aquele momento. Carlos Monsiváis é, sem dúvida, uma voz que sobressai: “el
movimiento estudantil de 1968 es causa directa e indirecta de la toma de
foram suavizados e deram um abraço apertado aos seus “pais” e “avôs” literários: Salvador Elizondo, Juan García Ponce, Sergio Pitol, Fernando del Paso etc; e os “pais” José Agustín, Gustavo Sainz, Juan Tovar e Parménides García Saldaña (PONIATOWSKA, 2003, pp. 1-5).
33
consciencia” (MONSIVÁIS, 2013, p.240); no entanto, não está só, podendo
acrescentar escritores como Elena Poniatowska e José Joaquín Blanco que
empregaram também a crônica como “modus literário”. É, porém, uma
participação pequena, levando em consideração a proporção do evento, como
comenta o narrador da crônica “1969”, que diz: “En 1968 los periodistas,
transformados en inmunólogos, describían la revuelta estudantil como un vírus
que atacaba el rosado y saludable cuerpo social” (VILLORO, 2006a, p.20). Na
televisão, a crítica simplesmente não existia e, no rádio, estava muito vigiada.
No entanto, é importante destacar que 1968 é considerado como uma linha
mítica e não cultural “Tlatelolco es un fenómeno de consecuencias inmensas,
pero no exatamente literárias (MONSIVÁIS apud AZNÁREZ, 2003, p.8).
Desde o fim da Revolução Mexicana, que o PRI (Partido Revolucionario
Institucional), formado por membros vitoriosos do movimento armado em 1910,
manteve-se no poder. Com o irrestrito apoio do Congresso, havia-se tornado
absoluto, conseguindo exercer poder total sobre os Três Poderes, as Forças
Armadas, a mídia, as associações de trabalhadores, os empresários, os
sindicatos e os camponeses. Muitos acreditam, e Juan Villoro, inclusive,
compartilha essa ideia, que o fim da Revolução Mexicana se deu somente
quando concluídas as eleições presidenciais de 2000, exatamente quando o
PAN (partido de direita – conservador e cristão, capaz de estabelecer um
contato mais estreito entre Igreja e Estado) assumiu o poder, o que, em tese,
colocaria um fim aos 71 anos de hegemonia do PRI, prometendo instaurar,
finalmente, uma democracia. Tal fato não se concretizou, entretanto,
provocando uma profunda revisão do valor da Revolução Mexicana na
consolidação das instituições políticas e culturais, assim como dos poderes
econômicos do país.
Poucos anos na história do século passado estão impregnados de
acontecimentos políticos12 como o de 1968. Esse período é considerado por
Villoro “o momento decisivo para julgar a liberdade de expressão” (VILLORO,
12
Além do Massacre de Tlatelolco, pode-se ressaltar a intensificação da guerra entre EUA e Vietnã; o assassinato de Martin Luther King e Robert Kennedy e diversos movimentos estudantis: Maio de 68 na França, ocupações e passeatas de estudantes na Espanha, Itália e Alemanha; repressão a passeatas de estudantes no Rio de Janeiro e intensificação da repressão de ditaduras em vários países latino-americanos; fim da Primavera de Praga e Golpe Militar no Peru.
34
2002, p.65, tradução minha). Foi uma etapa na qual surgiram muitas crônicas,
principalmente sobre este tema, fato que levou Bencomo (2002) a batizar a
crônica de “hija de Tlatelolco” (BENCOMO, 2002, p. 612).
Para o México, “1968 fue un parteaguas, ya que la narrativa mexicana
regresó a criticar esa realidad social” (VILLORO apud AZ, 2013, p.1). No livro:
La crónica de un año maravilloso de Alberto Pulido Aranda, publicado pela
primeira vez 30 anos depois desta data, sendo reeditado e ampliado em 2008
ao completar 40 anos, o autor traça uma cronologia dos fatos ocorridos no
mundo naquele ano, com ênfase no massacre de Tlatelolco sucedido no dia 2
de outubro na Plaza de las Tres Culturas, destacando a música rock, a
cinematografia e a literatura produzidas naquele momento. No entanto, isso
não significa que havia liberdade de imprensa. É o que comenta Monsiváis,
tratando dos poucos avanços que aconteceram:
No es muy distinta la situación entre 1940 y 1968, con el autoritarismo que hace las veces de criterio valorativo. La prensa escribe – sin contradicción alguna – amplio crédito [...] y desconfianza notoria [...], y el que trabaja en periódicos es un ser especial y/o un vendido, un vocero popular y/o un cómplice del poder (MONSIVÁIS, 2010, p. 92).
Em 1968, a imprensa mexicana havia-se tornado um dos lugares
incondicionais de sustentação do regime, com críticas leves, poucas
reportagens de investigação e, por isso mesmo, os editoriais eram ignorados
pelos leitores. Desde o início de julho, os enfrentamentos de estudantes e
policiais, os ônibus incendiados e a entrada de policiais na Preparatoria
Nacional em 30 de julho eram prenúncios do massacre que aconteceria em 2
de outubro. No dia primeiro de agosto, o reitor da UNAM, Javier Barros Sierra
encabeçou uma marcha. A imprensa insistiu na conjura de elementos
subversivos infiltrados, e poucos jornais mantiveram a objetividade possível,
entre eles: ¡Siempre!, La cultura en México, Excélsior (todos parcialmente) e
¿Por qué? “la única que publicó in extenso fotografías de la matanza”
(VILLORO, 2005a, p.33). Julio Scherer assumiu a direção de Excélsior em
1968 e, com grande agudeza,
cancela en definitiva la práctica de vender las ocho columnas, y con rapidez rectifica el derechismo del diario (el anticomunismo como
35
persecución de los intentos de justicia social), y es cada vez más crítico del gobierno y su partido (MONSIVAIS, 2010, p.105).
Esse posicionamento desagrada o Presidente Echeverría, e Scherer
sofre um golpe em julho de 1976. Em novembro do mesmo ano, ele publicou o
primeiro número de Proceso. No ano seguinte, surgiu o jornal Unomásuno,
dirigido por Manuel Becerra Acosta, subdiretor de Excélsior junto com Sherer.
Em homenagem prestada pela Universidad Autónoma Benito Juárez a Julio
Sherer, Juan Villoro, em seu discurso, diz: “Para mi generación, el Excélsior de
Julio Scherer fue la universidad abierta en la que ni siquiera supimos que
estábamos inscritos” (VILLORO, 2007b, p.2).
Villoro iniciou sua trajetória literária como cronista escrevendo críticas de
rock para o suplemento de sábado do jornal Unomásuno. Um jornal que
assumiu um posicionamento crítico, mesmo sendo patrocinado pelo Estado,
como diz o narrador sobre o personagem Genaro da crônica “1980”, “Genaro
estaba tan dentro de la realidad que las secreciones de su cuerpo ya no
dependían de glándulas sino de las noticias del Unomásuno” (VILLORO,
2006a, p. 88) e com espaço para temas e categorias menores, utilizando a
crônica para dar conta das notícias divergentes:
En Unomásuno se inicia lo que el tradicionalismo impedía: el reconocimiento del carácter noticioso, de los temas y problemas de la vida cotidiana, entre ellos, las causas del feminismo, el análisis del machismo, los movimientos gays y lésbicos, los derechos de las asistentes domésticas (MONSIVÁIS, 2010, p.106).
A obra de Villoro transita por esses temas e também absorve outras
disciplinas, como a história, a sociologia, a filosofia, a psicanálise e as artes em
geral, tencionando as manifestações da chamada cultura popular, a
contracultura, a cultura de massa e a cultura erudita. Ele dá vazão à liberdade
que o registro da crônica proporciona.
Seus textos abordam diversos assuntos. O massacre de Tlatelolco, no
entanto, aparece explícita ou implicitamente em vários deles: romances,
artigos, ensaios e, principalmente, em suas crônicas. Esse foi um evento de tal
importância na vida do país que diversos autores escreveram textos sobre esse
tema, como a reflexão de Fabrizio Mejía Madrid:
36
El 68 mexicano se pensó como un pozo al que había que asomarse para gritar y que el eco te devolviera tu nombre. El precipicio sin fondo podía ser llenado con los nombres de las víctimas, de los muertos, de los desaparecidos, de los encarcelados, de sus historias, del mismo modo en que se le podía atribuir el inicio de la lucha democrática en México. Ese pozo que nos sigue devolviendo nuestro propio eco (MEJÍA MADRID, 2013, p. 3).
Diversos desdobramentos políticos e culturais surgiram desse evento.
Por um lado, ocorreu, através dos Halcones, o acirramento da repressão e da
coerção, como aparece na crônica “1969”, que inicia com o “bazukazo” que
explodiu a porta da Escola Preparatoria 1 no dia 30 de junho de 1968. Nesse
mesmo texto, há a descrição da prisão de Tomás “También él fue jaloneado.
Cayó al piso, recibió una patada, perdió la mariguana. [...] De reojo, alcanzó a
distinguir el brillo asesino que se aproximaba, las tijeras que entraban en su
pelo [...]” (VILLORO, 2006a, p. 21). Depois foi sequestrado, passou três dias
nos “separados policíacos” e, quando conseguiu fugir, foi para a serra
oaxaquenha, pois “se volvía cada vez más brutal y una bayoneta podía hacer
que sus entrañas corrieran la misma suerte que su pelo” (VILLORO, 2006a, p.
21). Por outro lado, há, nesse período, uma ampla distribuição de benefícios
através de bolsas e recursos a intelectuais e estudantes pelo governo de Luis
Echeverría Álvarez, como é o caso de publicações como Siempre!, na qual
apareceram vários escritores, incluindo Carlos Monsiváis, que “foi diretor do
suplemento cultural “La cultura en México”” (LEMUS, 2015, p.3). É, portanto,
nesse caldeirão cultural e político que Villoro inicia sua trajetória literária, e é
também esse momento histórico que permite a ampliação de um público leitor
e a expansão de um mercado editorial da crônica no México. Villoro seria então
o homem orquestra das Letras Mexicanas, e tal opinião é compartilhada por
Juan Antonio Masoliver Ródenas:
Pero la escritura de Villoro va mucho más allá de la crónica de un pasado muerto, un presente caótico y un futuro agonizante e inmóvil como es inmóvil el desierto de “Coyote” donde, sin embargo, se agita la violencia. Esta realidad que procede de la crónica se ve visiblemente transformada por la invención, por una serie de riesgos narrativos que convierten a Juan Villoro en uno de los escritores más audaces de la literatura mexicana actual (MASOLIVER RÓDENAS, 2011, p. 51).
37
Estudos recentes sugerem que, em linhas gerais, o cronista pode adotar
duas perspectivas: a do cronista-testemunho ou a do cronista-protagonista13.
No primeiro caso, o cronista define a si mesmo como um informante que
observa e documenta em primeira pessoa, mas não há uma participação
efetiva. Já o cronista-protagonista participa do texto, selecionando elementos,
diferenciando perspectivas no momento de apresentar ao público leitor,
podendo ou não estar em primeira pessoa, mas percebe-se sua participação.
Na maioria das crônicas, Villoro é principalmente um cronista-protagonista. No
entanto, ele se utiliza também da outra variante quando se coloca como
entrevistador. Assim como seus antecessores ilustres, desde Manuel Gutiérrez
Nájera a Salvador Novo, a Jorge Ibargüengoitia e a Carlos Monsiváis, não foge
do compromisso com a realidade que descreve e renuncia a uma interpretação
limitada, deixando lugar para diversas possibilidades de leituras, reinventando
a realidade através das palavras.
Villoro não foi escolhido para ocupar o cargo criado pelo rei Carlos I de
cronista da Cidade do México, porém foi selecionado com outros cidadãos
mexicanos para compor um grupo que irá construir um projeto que será levado
à Assembleia Constituinte para a criação da Constituição da Cidade do México,
que desde 2016 passou a ser intitulada oficialmente como CDMX. A respeito
desse tema, o autor comenta:
Creo que una Constitución debe ser un espejo en el que todos y todas nos podamos ver y nos sintamos incluidos. Debe ser un espejo moderno, que nos capte con nuestras diferencias y nos permita tener este sentido de la discrepancia en la unidad. Eso es lo que me llevó a participar. [...] Los grandes rezagos que tenemos tienen que ver con la violencia, con la falta de igualdad. Son dos rezagos extraordinarios. El historiador austriaco Friedrich Katz dijo que la única revolución del mundo que sigue teniendo vigencia intelectual es la mexicana, por una razón muy sencilla: sus principios no se han cumplido. Siguen siendo demandas diferidas. Mientras no haya justicia social, mientras no haya seguridad, la Revolución Mexicana seguirá siendo un lema vigente. De ahí que muchas fuerzas políticas reclamen su herencia: desde el Ejército Zapatista hasta el PRD, pasando por el PRI (VILLORO apud LAMMERS, 2016, p. 1, destaque do autor).
13
Anadeli Bencomo apresenta um estudo aprofundado dessas duas possibilidades na obra Voces y voceros de la megalópolis, Madrid, Iberoamericana, 2002, p. 36.
38
A mistura de política e literatura é certamente uma questão complexa,
mas que já faz parte do cenário social mexicano, pelo menos desde os anos
finais do século XIX. A mistura desses dois elementos frequentemente esteve
presente na vida de muitos intelectuais no México14. Na atualidade, é uma
postura que tem sido duramente criticada em jornais do país, assim como já
ocorrera com outros, como Salvador Novo e Carlos Monsiváis, por terem sido
nomeados cronistas da Cidade do México. Uma questão que ilumina o
comentado são as críticas emitidas a Juan Villoro referentes à sua participação
na marcha pelos estudantes desaparecidos15.
Além do já mencionado Unomásuno, Villoro já publicara seus escritos
em diversos periódicos na América Latina, como: Gatopardo, Malpensante,
Letras Libres, Etiqueta Negra, Reforma, El Mercurio, Vuelta, Nexos, Proceso,
Cambio e La Jornada, sendo que, neste último, foi editor entre 1995 e 1998.
Sobre La Jornada, destaca Monsiváis: “el diario percibe la intensidad de los
cambios sociales y comienza a registrarlos. Ya es hora de un diario
abiertamente de izquierda […]” (MONSIVÁIS, 2010, p. 119). Ao observar os
meios em que esse autor colaborou, é importante destacar o seu
posicionamento ideológico. La Jornada, fundada em 1984, foi o primeiro na
América Latina a lançar um suplemento, Letra S, que expôs os múltiplos lados
da SIDA, além do engajamento no combate à homofobia. Apoiou causas da
esquerda política mexicana, como: a campanha de Cuauhtémoc Cárdenas em
1988, o EZLN em 1994 e as manifestações contra a eleição de 2005. Além
desses jornais, é importante mencionar os espanhóis: El Periódico de
Catalunya e El País. Villoro, que por longos anos foi militante do Partido
Mexicano de los Trabajadores, quando entrevistado por Diego Henrique
Osorno, declarou-se de esquerda. No entanto, reconheceu as críticas
14
A tese de Ignacio Sánchez-Prado, intitulada Naciones intelectuales: la modernidad literaria mexicana de la constituición a la frontera (1917-2000), publicada em 2006 trata da relação dos intelectuais e o poder desde o porfiriato até os anos 2000. 15
O desaparecimento de 43 jovens de Ayotzinapa no dia 27 de setembro de 2014, no município de Iguala, Guerrero, a 220 km da Cidade do México, que supostamente foram sequestrados por policiais. Villoro, que publicou algumas crônicas a respeito do desaparecimento, participou de uma marcha juntamente com Taibo II e centenas de outros cidadãos. Através de uma foto publicada em La Razón, tirada da manifestação na qual Villoro sorri, dá origem a artigos, caricaturas (anexo I) e cobrança de sua postura ética. Com posicionamentos controversos a respeito da participação do escritor na marcha (LA RAZÓN, 2017), (VEINTICUATRO HORAS, 2014), (FRIERA, 2014).
39
recebidas da esquerda, que o acusou de ser direitista: “Sí. Uno de los grandes
problemas de la izquierda es que si no asumes la postura mayoritaria,
parecería que eres un traidor al interior del grupo (VILLORO apud OSORNO,
2013, p.5). Logo no início do artigo El cronista y la crónica en Safari accidental,
María Elvira Villamil relata:
Desde la perspectiva sociológica, el autor se acerca al polo heterónomo del campo de la producción cultural, el cual se asocia con toda una serie de beneficios simbólicos y económicos. En última instancia, esto implica que el autor evita asumir una posición consistentemente crítica frente al sistema socioeconómico vigente. Asimismo, su orientación política concuerda con el liberalismo como doctrina basada en teorías individualistas del ser humano y la sociedad, y por tanto en conflicto con el socialismo. A pesar de que Villoro asume una posición crítica en numerosas instancias, llegando a afirmar que “el intento de darles voz a los demás es un estímulo cardinal de la crónica”, las contradicciones que presenta Safari accidental lo sitúan en el centro del campo de la producción cultural y ésta manifiesta una postura acomodaticia (VILLAMIL, 2011, p. 66).
Ao analisar detidamente esse longo trecho, observa-se que Villamil
(2011) exige de Villoro um posicionamento sociológico, político e econômico a
partir de uma obra literária e considera sua postura complacente. Nota-se que,
nessa análise, há uma extrapolação das funções da literatura, ou seja, a
institucionalização da literatura, ainda hoje, não está separada da esfera
pública. Na América Latina, os obstáculos enfrentados por essa não separação
reproduzem discursos como os que aparecem no artigo de Villamil, os quais
extravasam os limites convencionais do campo literário. Certamente Villoro
entende o papel do intelectual e do escritor na América Latina, declarando “eu
jamais escrevi crônica fora de um senso de “responsabilidade social””
(VILLORO, 2002c, p.67, tradução minha). E certamente seus escritos sugerem
que a crítica literária não pode viver enclausurada em uma torre de marfim,
porque a sua matéria prima, a literatura, está inevitavelmente interligada à vida
política e às vertentes da história.
Em 2000, ano emblemático, principalmente para o cenário político
mexicano, Juan Villoro e Jorge Volpi, este último um dos fundadores do Crack,
são entrevistados pela revista El Cultural sobre muitos assuntos. Questionados
por que os intelectuais latino-americanos, tradicionalmente, estão
40
comprometidos com seu tempo, sempre refletindo de maneira lúcida sobre o
período em que se encontram, ambos respondem separadamente. Em
conjunto, no entanto, suas respostas traçam um perfil do intelectual latino-
americano que implica diretamente na delimitação do campo de atuação e da
autoridade social deste no cenário atual, como afirma Villoro:
El intelectual tiene un papel social protagónico en países atrasados. Como domina una forma de la dificultad (la escritura), a la que pocos tienen acceso, se convierte en intérprete de emergencia y gurú accidental de todos los asuntos. La participación de los intelectuales como profetas de lo real ha ayudado a evitar males peores y en muchas ocasiones ha sido heroica; sin embargo, también ha dotado al escritor de un aura casi religiosa. En el futuro, con más democracia e igualdad, los escritores mexicanos serán menos importantes como guías morales y más como poetas o contadores de historias (VILLORO, 2000b, p.3).
Villoro tornou-se professor de Literatura na Universidade Nacional
Autônoma do México (UNAM), sendo também professor convidado das
Universidades de Yale, de Boston, de Pompeu Fabra e de Princeton. Obteve o
reconhecimento de seu trabalho com prêmios importantes, como: Premio
Xavier Villaurrutia por La casa pierde em 1999; Premio Herralde de Novela por
El testigo em 2004 (com um jurado composto por Enrique Vila-Matas, Salvador
Clotas, Juan Cueto entre outros); obteve o Premio Internacional de Periodismo
Vázquez Montalbán na categoria de jornalismo esportivo por Dios es redondo,
livro de ensaio e crônicas sobre futebol em 2006; Premio Internacional de
Periodismo “Rey de España” por La Alfombra roja, el império del narcotráfico
em 2010; Premio Iberoamericano de Letras José Donoso em 2012, Homenaje
Nacional de Periodismo Cultural "Fernando Benítez" de la FIL-Guadalajara pela
"riqueza e a variedade" de sua obra como escritor e jornalista em 2013;
Premio de Excelencia José Emilio Pacheco em 2015; Premio Crónica en
México em 2015, entre outros.
As primeiras criações literárias de Villoro foram três contos incluídos em
Zeppelín compartido, uma coletânea organizada por Miguel Donoso Pareja,
tendo então se iniciado como escritor. Fez sua estreia na narrativa breve com
um conjunto de onze contos em seu primeiro livro La noche navegable (1980).
Aluno da oficina literária de Augusto Monterroso entre 1976 e 1977, exerceu o
41
cargo de adido cultural na Embaixada do México em Berlim, entre 1981 e 1984.
Além da narrativa, da crônica, dos artigos jornalísticos, do ensaio, das letras
para músicas, da literatura infantil, de traduzir a obra Aforismos (2012), de
Georg Christoph Lichtenberg e também a tradução de vários de textos de
Truman Capote, que certamente influenciaram seus escritos, ele escreveu
roteiro para teatro e cinema. Pode-se citar, então, o filme Vivir mata (2002),
dirigida por Nicolás Echevarría, para o qual, além do roteiro, escreveu as letras
das várias canções inéditas musicalizadas pelo grupo de rock Café Tacuba.
A leitura do romance De perfil (1966), de José Agustín16, o fundador da
corrente literária La Onda, foi “la que despertó su vocación literaria a los quince
años” (ESQUEMBRE, 2011, p.1). Villoro dedicou seu primeiro livro de crônicas
Tiempo transcurrido a esse escritor. Anos depois, na crônica “¡Hombre en la
inicial!”, de Los once de la tribu, o narrador disse: “Jorge y yo ignorábamos que
se podía escribir ficción en la primera persona; leímos De perfil como trozo de
vida” (VILLORO, 1998, p.18). Como declarou em entrevista a Elena
Poniatowska (2016), o cronista pensou que se tratava de confissões de um
adolescente.
Nota-se que em muitas crônicas do autor aparece sua biografia, porém
percebe-se também que ele não teve a pretensão de torná-las crônicas
autobiográficas. Apresentou-as como memórias, evocações de sua vida
pessoal, literária e de seu posicionamento político, que se tecem aos eventos
narrados. No prólogo de Safari accidental, menciona sua participação em um
jornal do colégio, impresso em mimeógrafo:
La primera crónica que escribí fue un recuento del incendio del edificio Aristos, en la Avenida Insurgentes. Esto ocurrió a principios de los años setenta del siglo pasado, yo tenía unos 13 ó 14 años y tomaba clases de guitarra en el edificio. [...] Cronistas de la más diversa índole han descubierto su vocación ante el fuego: Ángel Fernández, máximo narrador del fútbol mexicano, recibió su rito de paso en el incendio del Parque Asturias, y Canetti el suyo durante la quema del Palacio de Justicia de Viena (VILLORO, 2005a, pp. 18-19).
16
O crítico mexicano Marco Antonio Campos diz que a maneira de medir a grandeza da obra de um escritor é a importância literária de seus discípulos e conclui “Si sólo mencionáramos a Juan Villoro y a Enrique Serna, la tarea de José Agustín como escritor que se convierte en maestro estaría plenamente justificada” (CAMPOS, M. A., 2006, p.1).
42
Observando a relação de Villoro com a crônica, nota-se que está focado
numa sociedade heterogênea, na qual a dicotomia entre “alta” e “baixa” cultura
perde o sentido. Seus temas são amplos, porém com inclinação à cultura
divulgada nos meios massivos, não havendo assuntos menores ou
irrelevantes. Esse fato pode ser observado em seus nove livros de crônicas
publicados até o momento, mas principalmente nos quatro que fazem parte do
corpus dessa pesquisa.
Além das quatro17 obras já resenhadas na introdução, os outros livros de
crônicas do autor, por data de publicação são: Palmeras de la brisa rápida: un
viaje a Yucatán, 1989; 8.8: El miedo en el espejo: una crónica del terremoto en
Chile, 2010; ¿Hay vida en la tierra?, 2012; Espejo retrovisor (2013), Balón
dividido (2014), conforme anexo III, além de diversas outras crônicas dispersas
em jornais da América e Europa. É autor de contos, romances e ensaios, além
de letras de músicas para filmes e bandas de rock; porém, em todas essas
produções, a crônica e a cultura de massa estão ali, não como pano de fundo,
mas ocupando a centralidade das discussões. É o meio utilizado por Villoro
para falar do cidadão mexicano, de sua cultura, de sua história, das questões
sociais, econômicas, políticas e da modernidade no México.
Na obra Palmeras de la brisa rápida: un viaje al Yucatán (1989), o
narrador é um jovem cronista que percorre de carro a península de Yucatán e
apresenta com muita ironia seu ponto de vista. Nesse livro, além da peculiar
visão da identidade mexicana e da presença da cultura popular, nota-se sua
percepção da realidade desse país e sua própria biografia dentro dessa
realidade. Villoro, que recebeu influência dos escritores da Onda, os quais
rejeitavam a temática dominante no México a partir da Revolução Mexicana,
sobre a busca da “identidade do ser mexicano”, como se observa nas obras El
perfil del hombre (1934), de Samuel Ramos, ou El laberinto de la soledad
(1950), de Octavio Paz, tratando de desmontá-la através da ironia. Os
escritores da Onda foram os primeiros a romper com essa ideia, reivindicando
a nova cultura pop, que não necessariamente inclui a cultura popular presente
em Juan Villoro, como menciona Masoliver Ródenas:
17
Anexo II.
43
Lo interesante en el caso de Villoro es cómo partiendo de una biografía real ha inventado un personaje que es la voz narradora de sus libros, donde esta visión de lo popular coincide con su visión de un México que surge más de la realidad contemporánea que del fatalismo de la Historia (MASOLIVER RÓDENAS, 2011, p. 43).
Já o livro de crônicas 8.8: el miedo en el espejo (2011) relata o violento
terremoto ocorrido no Chile. Villoro se encontrava nesse país para assistir a um
evento literário, tornando-se testemunha do acontecimento, experiência que em
seu relato conecta com o vivido em 1985 no México, quando um terremoto
destruiu parte da cidade.
¿Hay vida en la tierra? (2012) está composto por cem crônicas que
foram publicadas em diversos meios: La Jornada Semanal, Letras Libres e
Reforma a partir de 1995 até a publicação e que estão a meio caminho da
narração costumbrista, o relato fantástico e a reflexão antropológica. São
relatos independentes, mas que podem ser lidos como um ciclo, pois muitos
personagens se repetem como a mãe do narrador e os amigos Cacho e Frank.
É interessante observar nas resenhas publicadas até o momento a respeito
dessa obra, que cada crítico a qualifica de uma maneira distinta, pois uns
acreditam ser relato; enquanto outros, artigo, conto ou crônica. Há quem a
denomine artigo-conto ou mini-crônica. Ignacio Chavarría a apresentou como
jornalismo experimental. Enfim, são textos que permitem redescobrir com
assombro o ordinário.
A partir de uma seleção de contos e crônicas dos últimos trinta anos, e
também com contos inéditos, surge Espejo retrovisor, publicado em 2013.
Neste arquivo narrativo se confrontam a condição humana da atualidade: a
família, a política, as viagens, o rock e uma análise dos mistérios da vida
literária.
Um esporte tão popular como o futebol está muito presente nas crônicas
de Villoro. Torcedor de uma equipe mexicana, "El mercurial Necaxa es el
equipo de mi calle. Poco importa que ese trozo de ciudad haya cambiado.
Tampoco importa que yo haya dejado de vivir ahí. […] Una calle es para
nosotros lo que estuvo (la infancia, el Necaxa). Por eso vale la pena"
(VILLORO, 2006b, p.21) e de uma espanhola “Mi primer regalo fue un llavero
del Barça. En 1962, a los seis años. Pude ver por primera vez a «mi» equipo en
44
su gira por México” (VILLORO, 2006b, p. 19), assim Villoro expõe sua conexão
com esse esporte. É realmente um aficionado por futebol. Além de Dios es
redondo (2006), Villoro reuniu em Balón dividido (2014) uma série de crônicas
que se conectam entre a literatura, a psicologia, a história, frases e
personagens da cultura popular através de figuras recentes do esporte como:
Messi, Cristiano Ronaldo, Pep Guardiola, Piqué entre outros.
Além das crônicas, contos e dos romances, Villoro publicou também dois
livros de ensaios, nos quais claramente se podem notar características de
crônicas: Efectos personales (2001), que reúne uma série de quinze ensaios
divididos em três partes. A primeira, sobre escritores de língua espanhola,
como: Alejandro Rossi, Augusto Monterroso, Carlos Fuentes, Ramón del Valle
Inclán, Roberto Arlt, Juan Rulfo, Sergio Pitol; na segunda, discute literaturas em
idiomas estrangeiros: Arthur Schnitzer, Italo Calvino, Thomas Bernhard, William
Burroughs, Vladimir Nabokov, Robert Louis Stevenson, propondo um fluido
diálogo entre as literaturas da América e da Europa. Entre ambas as partes
estão dois ensaios que questionam a exótica pré-noção europeia sobre a
literatura e a cultura latino-americanas. No prólogo dessa obra, esclarece que o
texto de Burroughs está “por momentos más cerca de la crónica que del
estudio literario” (VILLORO, 2001, p.9).
Já em De eso se trata (2008), Villoro amplia o arco, indo desde o
Renascimento até os autores hispano-americanos, os quais, ele mesmo relata,
são essenciais para sua formação: Onetti, Borges e Bioy Casares. Para Villoro,
o ensaísta é como um dedo indicador apontado para um fato de que não havia
sido visto e que não há como captar em fotografia o instante entre a mão que
aponta e o olhar de quem observa. E é desse gesto que depende o ensaio.
Além de De eso se trata e Efectos personales, Villoro tem uma série de
ensaios dispersos em variados meios. No ensaio publicado em 2012, em
Buenos Aires, Antología Esencial de Carlos Monsiváis, apresenta um intitulado
“Instantáneas hacia un cronista”, e nele relata que, se um cronista mexicano
tiver o atrevimento de consultar um tema sobre o qual pretenda escrever, irá
descobrir que alguém já havia se adiantado e declara: “Carlos Monsiváis es el
turista japonés de los tiempos que nos constan: ya tomó todas las fotos y ya
probó todos los platos típicos (VILLORO, 2012c, p. 1).
45
Juan Villoro, escritor que sobressai no contexto literário mexicano, tem
demonstrado em cada discurso, entrevista e em muitas de suas obras,
principalmente suas crônicas, um posicionamento crítico, como observado no
discurso proferido ao receber o Premio Excelencia en las Letras José Emilio
Pacheco 2015, declara que
la literatura no puede dejar de ejercer su valor político porque es la más eficaz ventanilla de quejas contra los desastres del mundo. […] el arte no cierra los ojos ante los agravios, pero también demuestra que incluso en el horror hay algo que no es horror. Preservar la ironía, la sensualidad y la experiencia lúdica, son tareas de resistencia” (VILLORO apud CAMPOS, 2016, p.1).
1.2 A linguagem cronística de Juan Villoro
A crônica oferece diversas características que a aproximam do leitor:
retomam um assunto que já foi discutido, é um texto curto, apresenta registro
do cotidiano, mas, principalmente, a linguagem informal, favorecida pelo
envolvimento das duas modalidades discursivas: oral e escrita, as quais
colaboram para essa maior conexão entre o leitor e a crônica. Essa linguagem
é constituída por um jogo de argumentação enredado em si mesmo, com o
objetivo de construir um mundo através das palavras e persuadir o interlocutor.
Ao destacar, nesse capítulo, elementos estilísticos como o humor, a
ironia e o aforismo, não significa que todas as crônicas de Villoro girem em
torno desses elementos, mas pretende-se apresentar uma rede de caminhos
possíveis para adentrar no espaço aberto, acidentado e sinuoso, que é sua
produção cronística.
46
1.2.1 Ironia e humor: uma forma de resistência
Ora, a crônica está sempre ajudando a estabelecer ou restabelecer a dimensão das coisas e das pessoas. Em lugar de oferecer um cenário excelso, numa revoada de adjetivos e períodos candentes, pega o miúdo e mostra nele uma grandeza, uma beleza ou uma singularidade insuspeitada. Ela é amiga da verdade e da poesia nas suas formas mais diretas e também nas suas formas mais fantásticas
– sobretudo porque quase sempre utiliza o humor18
. Antonio Candido
Yo creo que la literatura puede ser seria y hacer reír también19
.
Juan Villoro
Nessa parte da pesquisa, pretende-se apresentar uma breve análise de
como Juan Villoro utiliza a ironia e o humor como ferramenta de crítica e de
reflexão sobre um discurso essencial a respeito do mito da identidade nacional,
os paradoxos da vida cotidiana urbana e o consumo. Como comenta em
entrevista
Más que una construcción es una manera de ser. Hay algo que me parece terrible, que es cuando alguien se hace el chistoso, cuando alguien quiere causar gracia de manera forzada. Eso es lamentable. En cambio, cuando surge una opinión irónica y brota natural frente a lo que se está contando, creo que el efecto puede ser más interesante. Estoy convencido de que la función del sentido del humor no es tanto la risa como hacer pensar. Mostrar las cosas de otra manera (VILLORO apud LARA RAMOS, 2014, p.5).
O humor na literatura mexicana era um recurso utilizado com pouca
frequência até a década de sessenta do século passado. No entanto, já podia
ser percebida nos ensaios de JulioTorri, nos romances de Genaro Estrada, nas
poesias de Renato Leduc e nas crônicas de Salvador Novo e de Carlos
Monsiváis, que exploraram o registro humorístico em seus textos. Nota-se,
entretanto, que esse elemento nunca ocupou um espaço privilegiado na cultura
mexicana.
Carlos Monsiváis, no prólogo da Antología de la poesia mexicana del
siglo XX, comenta que a grande pendência da literatura mexicana era com o
humor. Esse fato pode ser observado em uma rápida análise dos títulos de
algumas obras clássicas: El luto humano (1943), de José Revueltas; Los dias 18
Fragmento do ensaio “A vida ao rés-do-chão” de Antonio Candido, 1992, p. 14. 19
Trecho da Conversa pública “Charlando con Juan Villoro”. Disponível em:https://www.youtube.com/watch?v=wURkL8KyBxg Último acesso em 28.08.2016.
47
enmascarados (1954), de Carlos Fuentes; El labirinto de la soledad (1950), de
Octavio Paz; Muerte sin fin (1939), de José Gorostiza; Nostalgia de la muerte
(1938), de Xavier Villaurrutia; El llano em llamas (1953), de Juan Rulfo, entre
outras que envolvem situações limite. No entanto, é a partir de Jorge
Ibargüengoitia, que se considera que o humor deixa de ter um caráter
ocasional para torna-se a concepção de toda uma obra. Villoro compilou suas
crônicas em uma antologia intitulada Revolución en el jardín (2009), fazendo,
também, o seu prólogo. Ibargüengoitia dedicou-se ao teatro, além de escrever
contos, romances, ensaios. Deste modo:
forjó una vasta obra periodística, que rebasa la caducidad del género y adquiere jerarquía literaria. De hecho, muchos de los procedimientos narrativos más celebrados en Ibargüengoitia pueden encontrarse en estas crónicas que poseen, en el mayor grado, poder de síntesis, distancia crítica, agudeza y amenidad (GONZÁLEZ TORRES, 2009, p.1).
A obra de Ibargüengoitia aborda variados temas e sua produção
cronística pode ser dividida em quatro grandes temas: “la complicada vida
cotidiana en México; las nimiedades del mundo intelectual; la mecánica del
viaje y el catálogo de las costumbres y manías nacionales” (GONZÁLEZ
TORRES, 2009, p.1). É importante destacar que Villoro, em suas crônicas,
reflete sobre a vida cotidiana e os costumes nacionais com um caráter de
humor, assim como o escritor de Guanajuato que, em seus escritos, propõe
mais que uma ética, enfatizando uma visão cética da condição humana.
Ibargüengoitia, assim como Villoro, não estão escarnecendo ou desdenhando
do México, senão das coisas que não estão bem e utilizam principalmente o
humor como um efeito de esclarecimento lúdico da linguagem. Assim afirma
Villoro sobre a obra desse escritor:
Su obra en un país tan dolido como el nuestro, pocas cosas son tan rebeldes y disidentes como sentirse bien, a veces todo conspira para que estemos bien, dispongamos de nuestro humor, alegría, ilusiones y sensualidad, eso es lo que nos da toda la obra de Jorge Ibargüengoitia (VILLORO apud LUIS, 2016, p.1, destaque do autor).
Esse escritor é importante para a formação literária de Villoro, a quem
dedica dois ensaios: “El diablo en el espejo” (2002c) e o prólogo “El cronista en
su jardín” (2009c). Logo no início do primeiro ensaio, ele destaca a
48
preocupação com os temas políticos que aparecem em suas crônicas e diz que
Ibargüengoitia
fue el cronista rebelde de una nación avergonzada de su intimidad e incapaz de ver en su Historia otra cosa que próceres de bronce. Para el escritor guanajuatense, los héroes no se forjan en el cumplimiento del deber sino en los avatares de su muy humana condición. Más de una batalla se ha ganado porque un general deseaba almorzar su guiso favorito en cierta hostería de la ciudad ocupada. La satisfacción de los deseos más nimios y los insondables azares provocan las peripecias que los políticos y la costumbre transforman en epopeyas. Desmitificador de tiempo completo, Ibargüengoitia buscó los vínculos entre la alcoba y el poder, los vapores de la cocina y el Palacio Nacional. Escribió a contrapelo en un país donde los gobiernos emanados de la Revolución definieron la vida pública de 1929 a 2000. Esos 71 años dejaron solemnes monumentos en todas las ciudades (VILLORO, 2002c, p. XXIII).
Nesse trecho, Villoro ressalta a solenidade do discurso revolucionário, o
qual havia imperado no México durante várias décadas, além de ressaltar a
maneira como esse “cronista rebelde” aborda esse tema em seus textos,
mostrando de que forma ele escapa de algumas vertentes da época. Afinal,
segundo Villoro, ele não se aproximava dos romances da Revolução, que
representavam o conflito armado com uma visão dramática, nem do boom, pois
A diferencia de Carpentier, Roa Bastos, Fuentes, Vargas Llosa o García Márquez, Ibargüengoitia no se interesa en la cara oculta de los acontecimientos (las tramas profundas tergiversadas por los ideólogos del poder); para él, la Historia es siempre un disparate, un colosal acto fallido. Este ataque frontal a las gestas sociales lo apartó, no sólo de la noción de «intelectual comprometido», tan en boga en los años sesenta, sino de la estética dominante en la narrativa latinoamericana, que emprendía a través de la novela el recuento alterno, seguramente más verídico, de episodios velados y silenciados por una larga sucesión de gobiernos autoritarios (VILLORO, 2002c, p. XXIV).
Villoro, mais adiante, chama a atenção para a etiqueta de “humorista”
colocada pela sociedade literária, que conduz os textos de Ibargüengoitia a
uma visão reducionista, acabando por marginalizar sua obra. É basicamente
como afirma Villoro, recorrendo à análise de Gustavo Santillán: “el tópico
humorístico sirvió para comprenderlo, pero usado sin freno ha contribuído a
mutilarlo” (SANTILLÁN apud VILLORO, 2002c, p. XXIV).
49
Ao utilizar a ironia e o humor em suas crônicas, Ibargüengoitia e,
certamente, Villoro percorrem entre o otimismo e o pessimismo na mesma
velocidade e fazem com que essa atitude contraditória seja explicada por uma
citação de Scott Fitzgerald utilizada por Monsiváis (cronista que também
recorre ao humor, à ironia e à sátira) para encerrar o prólogo de Entrada libre:
crónicas sobre la sociedad que se organiza, e diz “La verdadera prueba de una
inteligencia superior es poder conservar simultáneamente en la cabeza dos
ideas opuestas, y seguir funcionando. Admitir por ejemplo que las cosas no
tienen remedio y mantenerse sin embargo decidido a cambiarlas”
(MONSIVÁIS, 2013, p. 15). Essa reflexão parece condensar, de maneira
irônica, o encanto e o desencanto dos dois escritores mexicanos. Ou seja, a
ironia e o humor como atributo da inteligência, como uma forma de resistência
que permite encontrar no texto um segundo plano e acaba por proteger o leitor
da crueza dos fatos.
É importante destacar que caracterizar um texto ou um trecho como
humorístico é um juízo subjetivo e, por isso mesmo, arriscado, pois um leitor
pode interpretá-lo como cômico ou não observar nenhuma das duas
inclinações. Para melhor aclarar esses recursos estilísticos nas crônicas de
Villoro, se vale do estudo de Umberto Eco sobre a obra de Luigi Pirandello, El
humorismo (1908). Eco (1989) menciona que, para Pirandello, apesar das
inúmeras formas de pensar o cômico e o humorístico, a percepção do
“contrário” é a principal característica, ou seja, o desacordo entre o ideal e o
real. Ressalta ainda que a “percepção do contrário” pode tornar-se o
“sentimento do contrário”.
Para ilustrar a reflexão anterior, vale a pena recorrer ao elemento que
utiliza frequentemente por Villoro: a ironia de caráter pessoal, no qual aborda
com o intuito de reler os estereótipos da mexicanidade que as perspectivas
estrangeiras projetam sobre a literatura latino-americana e confessa
ironicamente que, na infância, foi uma espécie de mexicano profissional. Para
exemplificar, é pertinente destacar o relato do cronista em Safari accidental, no
qual menciona os primeiros anos numa escola alemã na Cidade do México que
destinava vagas para alunos nativos como parte de uma política de integração
cultural:
50
Un extraño examen de admisión me situó en un grupo donde todas las materias (salvo Lengua Nacional) se cursaban en alemán. Así las cosas, crecí en un ámbito donde mis compañeros se llamaban Helmut, Peter y Rudy, y donde teníamos que resolver problemas matemáticos relacionados con las paradas del tren entre Colonia y Hamburgo o la cantidad de semillas de amapola necesarias para hacer un Mohnkuchen, pastel tan exótico que había sido decomisado en la Pastelería Alemana Tacubaya por un comando antinarcóticos, convencido de que se trataba de venta clandestina de opiáceos (VILLORO, 2005a, p. 117).
Mais adiante continua a reflexão:
Como yo era de los pocos mexicanos en la clase, los maestros me consultaban sobre las tradiciones vernáculas. ¿Qué pensaba mi familia de los sacrificios humanos? ¿En verdad comíamos una salsa con cuarenta chiles sin que se inconformara el colon? ¿Las calaveras de azúcar que se regalaban el Día de Muertos eran un señal de aprecio o una ofensa horrible? Me gustaba dar una versión exagerada de la patria y tal vez por eso mis maestros me consultaban más que a otros compañeros. Crecí como un folklorista exaltado entre alemanes […] (VILLORO, 2005a, p. 117).
Nos trechos destacados, observa-se um personagem com traços de
humor que foge de um perfil ideal, aproximando-se de uma fixidez de alteridade
cultural e até do caricato, estabelecendo assim o primeiro contato com o
contrário. Essa primeira observação gera o cômico, o riso imediato. No entanto,
a partir do momento em que se passa a refletir sobre essa contradição, a
situação deixa de ser cômica e aproxima-se da humorística. Sendo assim, a
diferença básica entre o cômico e o humorístico estaria, segundo Pirandello
citado por Eco, na “advertência do contrário” e no “sentimento do contrário”
provocado por essas situações (ECO, 1989, p. 253).
Ao analisar o fragmento que inicialmente provoca o riso, percebe-se que,
com a reflexão, surge certo desconforto. É o que pode ser depreendido ao
deter-se somente na situação em que se encontra a criança diante de um
permanente disfarce ou exagero de características de sua identidade, o que
pode levar a um sentimento melancólico. Nesse momento, reflete Eco: “eu
perco a minha superioridade, porque penso que eu também poderia ser ele”
(ECO, 1989, p. 253). Constata-se assim uma mistura de humor e melancolia,
que, segundo Pirandello, são traços indissociáveis. Lélia Parreira Duarte, em
seu estudo sobre a ironia, retoma a ideia de Arthur Schopenhauer, que também
observa a seriedade por trás do humor, e diz:
51
Schopenhauer chama-o de humorismo (1991, pp. 77-83), explicando que, quando a brincadeira se esconde atrás da seriedade, surge a ironia, e quando a seriedade se esconde atrás da brincadeira, surge o humorismo. A inspiração do humorismo seria uma disposição subjetiva, séria e elevada, que involuntariamente se choca com um mundo brutal que lhe é heterogêneo ou hostil [...] (DUARTE, 1996, p.36).
O humor presente na maioria das crônicas de Villoro passa por essa
acepção, na capacidade de transformar o desagradável em risível, o qual
frequentemente dá lugar ao humor, à ironia e à melancolia.
Em “El escape de Disney World”, o narrador anuncia, desde o título, num
jogo com a preposição “de” em lugar de “a”, o intuito de relatar que havia
escapado de um dos espaços mais emblemáticos da cultura norte-americana.
Esta crônica é uma demonstração pertinente de como através de um texto
composto das vivências do cronista como viajante em terra estrangeira,
misturadas a impressões reais e imaginárias coletadas nesse ambiente, com
um viés de humor e ironia, converte-se em crítica ao capitalismo, ao
neoliberalismo e em análise sociológica da cultura de massa, procurando
observar como o turismo se torna uma grande viagem-espetáculo (MORIN,
2011). Logo no início, declara “En el siglo de las caricaturas no es extraño que
el Reino de la Fantasía tenga por logotipo a un roedor de manos enguantadas.
Como la estrella de Mercedes o el doble arco de McDonald’s, Mickey es una
marca registrada” (VILLORO, 2005a, p.171). Nela, Villoro adota um olhar
peculiar, no qual a viagem com a família se converte de diversão em
investigação e Disney World, parque infantil por antonomásia, governado por
um rato limpo “explicó Walt Disney, lo cual no significa que esté dispuesto a
lavarse las orejas” (VILLORO, 2005a, p. 172), representa os sonhos da
indústria do espetáculo, a hiper-realidade que transforma Mickey Mouse em um
emblema corporativo, e um parque se torna a primeira cidade “con copyright”
(VILLORO, 2005a, p.178). Anadeli Bencomo em seu artigo “Los enemigos del
Mickey” diz que Villoro “reitera sus impresiones e incriminaciones ante un
parque percibido como hábil manipulación mercadotécnica” (BENCOMO, 2012,
p. 203).
Outros escritores também retrataram em seus textos esse microcosmo
da indústria norte-americana do entretenimento
52
para Jean Baudrillard, por ejemplo, “Disneylandia es un modelo perfecto de todos los órdenes de simulacros entremezclados” (25), para Umberto Eco es un espacio hiperreal, para Marc Augé Disney ofrece la experiencia límite de libertad y vacío, mientras para Louis Marin Disneyland representa una utopía degenerada (BENCONO, 2012, p. 200).
Desde de o início dessa crônica, Villoro indica que o percurso será
acompanhado pela reflexão de “Umberto Eco [que] advirtió que cada atracción
de Disney World desemboca en un supermercado disfrazado donde compras
obsesivamente, creyendo que todavía estás jugando” (VILLORO, 2005a, p.
172) e também do escritor e urbanista estadunidense Michael Sorkin, “que
argumenta que el éxito de Disney World depende, en buena medida, de su
deliberada inautenticidad” (VILLORO, 2005a, p.178). Ou seja, o parque será
analisado como ícone da hiper-realidade, como um simulacro no qual o
consumismo fica subjacente ao cenário onírico em que “puedes pagar en
dólares o en moneda local, que parece acuñada por un banco de dibujos
animados. Aunque la equivalencia es de uno a uno, los Disneydólares
representan algo más que una divisa: el ingreso a otra realidad” (VILLORO,
2005a, p. 171). As lojas coloridas e repletas de desenhos induzem à compra de
maneira descontrolada, pois se entra na lógica da fantasia, e o dinheiro se
torna também um brinquedo, além de cumprir a função de “lembrancinha”, pois
muitos ficam com os Disneydólares, ou seja, decidem “não gastar”, guardar
como recordação, esquecendo que já gastaram.
Nessa micro-sociedade, na qual parece que há uma obrigação de
sensação de bem-estar, pois não querem parecer que gastaram dinheiro e não
se divertiram o suficiente, os pais cumprem todos os desejos dos filhos
comprando coisas desnecessárias. O país capitalista em miniatura tenta tirar o
máximo do visitante. Em um lugar em que o mais importante é mover-se,
ironicamente, comenta Villoro um dado estatístico: “Los sociólogos del
deterioro calculan que en un día promedio, una visita de ocho horas puede
estar compuesta por cinco horas de colas” (VILLORO, 2005a, p.176). Por isso
as filas são em forma labiríntica, há objetos bem colocados como plantas e
cartazes, além de estarem em lugares cobertos para dar a impressão de que
não são extensas. Tudo isso combinado, inclusive com música põe à prova os
53
nervos dos pais que, depois de tantas horas, como comenta o cronista com
uma dose a mais de humor:
Confieso que pasé por todas estas fases del lugar común e ingresé con mi hijo en un vagón vagamente vaquero que subió y bajó rieles en espiral hasta demostrarnos que la verdadera emoción consistía en recorrer de espaldas una rueda de 360 grados. Mientras apretaba los dientes en lo alto, también me apretaba el pecho para que no se me cayeran las tarjetas de crédito. La imagen revela algo más que los miedos del ciudadano capitalista ante el desplazamiento inmoderado: Disney World te sacude como muñeco de caricaturas hasta sacarte el último centavo (VILLORO, 2005a, p. 172).
No fechamento da crônica, Villoro narra os últimos momentos no parque
e a chegada ao aeroporto uma hora depois do horário previsto, quando já não
tem mais tempo de despachar as malas. Assim são obrigados a levá-las
consigo e, quando tentam passar por um detector de metais, “se dispara un
ruído atronador. Un comando descubre que el hijo lleva un revólver en la
maleta, junto a su cocodrilo de peluche. No importa que el arma sea una estafa
comprada en el galerón […]” (VILLORO, 2005a, p.180). Esse trecho demonstra
o quanto irônica é a situação, pois o parque vende as armas de brinquedo para
os turistas, que não podem levá-las e, como não conseguiram despachar,
comenta o cronista: “Hay que decir adiós a las armas y correr rumbo al tren sin
dejar de gritarle al huérfano de armamento: “¡en México podemos comprar una
AK-47!” (VILLORO, 2005a, p.180). Observa-se que, nesse momento,
abandona-se o simulacro, o mundo perfeito e os sentimentos descritos. Em
chave irônica, demonstra que voltam para o mundo real, ou seja, um mundo
autêntico, contrário do mundo inautêntico, mas nem todos ““¡Este juego si
estuvo genial!”, comenta el hijo, después de experimentar la única emoción real
que permite Disney World: el inesperado escape” (VILLORO, 2005a, p.180).
Juan Villoro nasceu na década de cinquenta, momento em que pairava
sobre a intelectualidade mexicana a filosofia do “ser mexicano”. Essa filosofia,
embalada por Octavio Paz, Luis Villoro e Leopoldo Zea, entre outros, partem da
premissa “de que un pueblo mexicano era sólo posible por una identidad
psicológica común” (SÁNCHEZ-PRADO, 2006, p. 371). Alguns escritores
54
contemporâneos20 prescindem intencionalmente deste tema, porém Villoro o
converte em assunto central de alguns de seus textos, recorrendo à sátira, ao
riso, ao humor e à ironia para desmontar estereótipos de uma identidade
nacional, local e de fronteira, revelando os excessos provocados pelo sistema
capitalista global.
O título da crônica “Nada que declarar: welcome to Tijuana” faz
referência ao trecho da música do cantor e compositor hispano-francês Mano
Chao, que é citada textualmente: “Welcome to Tijuana/ tequila, sexo y
mariguana/ con el coyote no hay aduana” (VILLORO, 2005a, p. 132). Com esse
trecho, o narrador introduz os chamados bichos da fronteira: o coiote “indica el
que habla mal y dispone del picaporte secreto para que los mexicanos entren a
Estados Unidos” (VILLORO, 2005a, p.132); a foca “animal indeciso entre el mar
y la tierra” (VILLORO, 2005a, p.132) e a “zebra” ou “burros pintados de cebras.
Por razones insondables, a los turistas les gusta retratarse junto a esta
arbitrariedad veterinaria” (VILLORO, 2005a, p.132), demonstrando a
construção de um imaginário coletivo, principalmente norte-americano, que
desenha Tijuana como uma cidade festiva, nascida para a recreação e
exploração do ócio consumista, como meio de transporte para a degradação
humana, com prostíbulos disfarçados de bares e salas de massagens, crianças
indigentes e policiais corruptos. Villoro, citando García Canclini, chama Tijuana
de “uno de los mayores laboratorios de la posmodernidad” (VILLORO, 2005a,
p.131). Percebe-se que, para o cronista, essa cidade fronteiriça é a foto da
globalização, inclusive pela presença da cultura chinesa: “Ahí los chinos fueron
bien venidos porque el terreno se consideraba inhabitable. Con el sigilo de una
tribu que generalmente vive en las cocinas, se extendieron por toda la frontera”
(VILLORO, 2005a, p. 134). Ou seja, os chineses somente foram quistos nessa
região porque era considerada a pior. Ironicamente, o cronista menciona que
não era, mas o fato permaneceu em segredo porque eles ocupavam posições
subalternas.
Ao evocar essas imagens sincréticas que, somadas a outras, como a da
economia informal, através da venda de objetos, como máscaras do
20
Entre os escritores mexicanos contemporâneos que rejeitam essa temática estão os do grupo Crack.
55
expresidente Salinas de Gortari e artesanatos como Bart Simpson, Pocahontas
e Aladin de gesso, Villoro representa a fronteira como uma realidade hiper-real,
pois não é o que parece ser e coloca em evidência a consolidação neoliberal
através de intervenção na cultura e na economia mexicana.
O cronista se fixa na falsa identidade ou na identidade imaginada
(inspirada em Comunidades imaginadas, Benedict Anderson) para refletir sobre
a construção de estereótipos a partir de diferentes ângulos, demonstrando o
exotismo imposto desde Estados Unidos e Europa e auto imposto por questões
de sobrevivência, como se observa com relação aos burros pintados de zebras,
nos quais García Canclini, ao recolher a fala de seus entrevistados na obra
Culturas Híbridas (2008) a respeito de Tijuana, comenta que:
Em várias esquinas da Avenida Revolución há zebras. Na realidade são burros pintados. Servem para que os turistas norte-americanos sejam fotografados com uma paisagem de fundo [...]. “Frente à falta de outro tipo de coisas, como no sul, que tem pirâmide, aqui não tem nada disso... a gente tem que inventar alguma coisa para os gringos”, disseram em um dos grupos (GARCÍA CANCLINI, 2008, p. 321).
Ao se aproximar de um fato como esse, é natural o riso. Analisando-se,
porém, os comentários daqueles que vivem desse ofício, observa-se que há
uma situação econômica grave por trás e que, ao abordar esse tema, o
cronista, assim como o antropólogo, não tem a pretensão de fazer rir, mas
denunciar, levar à reflexão.
Em “Retrato de grupo: 100 millones de mexicanos”, Villoro recorre à
imagem estereotipada de Tijuana nos filmes americanos, de maneira ácida, diz:
Definirse a sí mismo es un ejercicio de comparación. México y Estados Unidos comparten la frontera más cruzada del mundo y en buena medida lo “mexicano” sirve para distinguirnos de Gringolandia, esta Siberia donde el guacamole deja de picar. Hollywood padece el mismo afán de autoafirmación y ha codificado al mexicano como el hombre dormido junto a su burro, que despierta para traicionar a su madre por una botella de aguardiente, se arrepiente demasiado tarde y azota su sombrero contra el piso (siempre lleno de polvo). Las películas recientes repiten el canon. En Pulp Fiction, unos gángsters asaltan una cafetería de Los Ángeles al grito de: “¡Saquen a los mexicanos de la cocina!”, y en Traffic, las escenas que ocurren en Tijuana parecen reveladas en aceite para freír quesadillas: un amarillento refugio de narcos (VILLORO, 2005a, p. 39).
56
Há no tema Tijuana questões políticas subjacentes que, nas primeiras
linhas de “Nada que declarar”, são convocadas pelo cronista: “En una de sus
mejores parodias, Adolfo Bioy Casares y Jorge Luis Borges inventaron a un
escritor tan comprometido con su realidad que sólo describía lo que pasaba en
la esquina nor-noroeste de su mesa de trabajo” (VILLORO, 2005a, p. 131),
porém como ele é “Menos prudente que ese personaje, acepté escribir sobre
Tijuana, el ángulo nor-noroeste del país” (VILLORO, 2005a, p. 131). Nesse
trecho, está condensado implicitamente um plano oficial do governo de Miguel
de la Madrid, intitulado Programa Cultural de las Fronteras, cujo objetivo era
“afirmar a identidade mexicana na fronteira norte” (GARCÍA CANCLINI, 2008,
p. 325). Villoro, recorre ao humor para escrever a crônica e decide ir além do
que passa a noroeste de sua mesa de trabalho.
O projeto governamental recebeu alguns apoios, porém muitos
intelectuais locais se posicionaram contra, por não ser um programa
verdadeiramente inclusivo e por privilegiar projetos culturais e literários que
enfatizavam tradições da cultura nacional em detrimento das diferenças
regionais e “reforzaban el mito de la pureza de la identidad mexicana”
(TABUENCA CÓRDOBA, 1997, p. 93), entre eles, o jornalista Felix Miranda
que, como comenta o cronista “El Gato Félix promovió la campaña “chilangos
go home21” antes de ser asassinado (hasta donde se sabe, no por un
capitalino22)” (VILLORO, 2005a, p.132). Muitos escritores tijuanenses se
dedicaram a criticar, não só o governo, mas também os escritores que
abordaram, em seus textos, temas que tivessem envolvido Tijuana23.
Nessa crônica, Villoro recolhe diversos símbolos, como burro-zebra,
mexicanos cozinheiros, o sombreiro empoeirado, entre outros, que o turista
constrói no imaginário sobre a cultura da fronteira norte e da mexicana em
21
O título dessa campanha faz referência ao filme E.T – o extraterrestre, produção estadunidense de 1982, dirigido por Steven Spielberg. Em uma das principais cenas do filme, o protagonista diz Et go home. 22
O jornalista Félix Miranda foi assassinado em 1988. Na época se levantou a suspeita de que o motivo seria a sua militância contra esse projeto, segundo a reportagem publicada na revista eletrônica Sin embargo. No entanto, após cumprir vinte e cinco anos de prisão, o assassino confesso do jornalista foi liberto e recorreu a seu ex patrão, um importante político da região para solicitar apoio (SIN EMBARGO, 2015, p.1). 23
Certamente as críticas mais ácidas partiram de Heriberto Yépez em sua Tijuanologías, no qual critica a proliferação de escritos sobre Tijuana, não somente a Juan Villoro e Luis Humberto Crosthwaite, mas também à pesquisa de Néstor García Canclini em Culturas Híbridas, entre outros.
57
geral. A partir daí, vai promovendo essa desmontagem através do humor e da
ironia, demonstrando que a discussão é outra: “Lo primero que el visitante ve al
aterrizar en la ciudad donde los burros se disfarzan es el muro de metal que el
ejército de Estados Unidos usó para que sus vehículos avanzaran en las dunas
durante la tormenta del desierto24” (VILLORO, 2005a, p. 133, destaque do
autor), e que essas imagens eram pretextos para a aproximação de temas
duros.
O humor e a ironia presentes nas crônicas de Villoro avançam em
variados temas, dos quais somente dois foram destacados: o capitalismo e a
identidade nacional. Mas poderia ser o futebol, a cultura de massa ou o EZLN,
pois a utilização desses meios não limita nem impede uma aproximação crítica
com a realidade mexicana. Ao contrário, é o meio no qual este se apoia para
essa aproximação, pois, como menciona Hutcheon:
Muitos adversários do pós-modernismo consideram a ironia como sendo fundamentalmente contrária à seriedade, mas isso é um equívoco e uma interpretação errônea sobre a força crítica da dupla expressão [...]. Na verdade, talvez a ironia seja a única forma de podermos ser sérios nos dias de hoje (HUTCHEON, 1991, p. 62).
A respeito do líder do movimento zapatista, o cronista reflete como
ocorre a combinação de personagem de ficção e combatente de guerra criado
por Marcos:
Pero hay que matizar el entusiasmo que despierta el Tucídides de la jungla. El culto a la personalidad del subcomandante pasa por la literatura. Verlo sobre todo como un escritor, secuestrarlo al terreno de la ficción, significa un doble atentado: a sus objetivos políticos y a la literatura (VILLORO, 1998, p. 271).
Em “Iguanas y dinosaurios. América Latina como utopia del atraso”,
Villoro evoca um episódio de Materia dispuesta (1996), no qual um grupo de
artistas mexicanos contratados para ir ao estrangeiro atravessam um drama: o
de não parecerem tipicamente mexicanos, pois uns são brancos; outros,
mestiços ou loiros:
24
Esse foi o nome de um plano de ataque colocado em prática pelos Estados Unidos, comandado por George Bush (pai) e outras trinta e quatro nações contra Iraque em resposta à invasão do Iraque ao Kuwait, na década de noventa, cujo número de vítimas é incerto.
58
Una compañía de teatro mexicana es invitada a una gira europea. Antes de la partida, el promotor hace una recomendación: para tener éxito en ultramar, deben lucir más mexicanos. Los actores caen en un vértigo de la identidad: ¿cómo pueden disfrazarse de sí mismo? El director contrata a unos percusionistas caribeños, que nada tienen de mexicanos pero que en Europa parecerán salvajemente oriundos, y los actores se someten a sesiones de bronceado para ser dignos representantes de la «raza de bronce». En un travestismo cultural, los actores de la novela integran una nueva tribu, de pieles infrarrojas, pigmentadas para no decepcionar a los extranjeros. Estamos ante la más absurda autenticidad artificial (VILLORO, 2001, p.112).
Villoro lê atentamente a tradição literária mexicana. A ironia com que
aborda esse tema é para demonstrar que no momento em que foi pensado, ou
seja, no início do século passado, era válido, pois havia a necessidade de
fortalecer a identidade nacional em construção. No entanto, essa autenticidade
e tipicidade não são possíveis, pois “Nadie puede ser típico para si mismo”
(VILLORO apud GORODISCHER, 2008, p. 1). A crítica surge dessa sede de
exotismo sobre o mexicano e se poderia acrescentar também, o latino-
americano, que a cultura europeia e, principalmente, norte-americana tem
insistido em tentar identificar. Através da ironia e do humor, esse autor deixa
para trás as questões do “ser nacional” e avança com muita clareza para a
cultura de massa, tecendo elementos simbólicos da cultura popular mexicana,
com música, futebol e uma variação de cenários dissimiles entre o cinismo e o
disparate, que procuram demonstrar que conservar esses recursos estilísticos
em suas crônicas também é uma forma de resistência.
1.2.2 Aforismos: um estudo liminar
Un aforismo no coincide nunca con la verdad; es una media verdad o una verdad y media
25.
Karl Kraus
Villoro desenvolveu um estilo com uma linguagem fluida, sem
rebuscamento vocabular ou metáforas excessivas. Com temas literários,
25
Fragmento do ensaio de Juan Villoro “El arte de condenar”. Publicada en la Revista de la UNAM, en octubre de 2010d. Disponível em:
http://www.revistadelauniversidad.unam.mx/8010/villoro/80villoro.html Último acesso em: 23.10.2016.
59
jornalísticos e massivos, no entanto, essa aparente simplicidade disfarça uma
combinação elaborada, compacta, no qual, além das greguerías26, destaca-se
também a ironia, o humor e um elemento que faz com que sua prosa seja
diferenciada, pois utiliza em suas crônicas, com equilíbrio, o aforismo. É o que
ressalta o escritor Sergio González Rodríguez (2013), quando diz que em:
Sus crónicas muestran una voluntad de flexibilidad al incurrir en el registro de viajes, el retrato generacional, los sucesos de impacto colectivo, o las impresiones que condensan un diagnóstico de situaciones o tendencias. Allí hace renacer la influencia epigramática de Georg Christoph Lichtenberg o de Ramón Gómez de la Serna y sus greguerías, el atisbo irónico de Jorge Ibargüengoitia o Carlos Monsiváis, y el propósito tangencial de Norman Mailer o John Lee Anderson, que podría resumirse en una idea del primero: "Cuando un lenguaje se deteriora, se vuelve menos elocuente". Cada crónica de Juan Villoro es, ante todo, un homenaje a las posibilidades expresivas de la lengua (GONZÁLEZ RODRÍGUEZ, 2013, p. 1).
O autor de Safari accidental recebeu influência de muitos autores, como
Augusto Monterroso, considerado o mestre da narrativa curta através da oficina
de contos, da qual fez parte nos anos finais da década 1970 e também a partir
do trabalho de tradução da obra Aforismos (1989), de Georg Christoph
Lichtenberg. Villoro aproximou-se do gênero o qual, como diz Javier Perucho,
representa a maturidade literária:
[…] casi ningún escritor imberbe ha publicado aforismos, hasta ahora, en la historia literaria. La experiencia de vida, la práctica de la escritura, el bagaje intelectual y su consideración han de esperarse que se viertan en la forma inasible que da consistencia al género (PERUCHO, 2015, p. 1).
No entanto, a estrutura narrativa montada por Juan Villoro em suas
crônicas com uma tendência aforística não se trata apenas de coleção de
frases elaboradas ou simples ocorrências, mas de uma tecitura textual que
contribui para uma indagação capaz de permitir uma análise de seus textos
com uma nova imagem literária e conceitual. Na crônica, essa combinação está
mais evidente, mas ela também pode ser encontrada nos seus ensaios,
romances e contos.
26
São textos curtos como os aforismos. No entanto, nestes se condensa em uma única linha pensamentos filosóficos originais e bem-humorados. O escritor espanhol Ramón Gómez de la Serna, citado em diversas crônicas de Villoro, é considerado o criador desse gênero.
60
O crítico Mihalí Dés o chama de aforista metido a narrador e destaca
que seu humor não nasce de situações mais ou menos engraçadas, nem
cômicas, mas de um olhar particular e assim comenta:
Villoro es un aforista extraordinariamente agudo que hubiera sido digno protagonista de los más competitivos salones parisinos del Ancien Régime. Si no fuera por su formación germánica, y sobre todo, por el malicioso Lichtenberg, podríamos acusarle de afrancesado aventajado. No hay en las letras contemporáneas escritas en castellano nadie tan dotado para la frase feliz, la formulación axiomática, el resumen analítico. Ese don, unido a su peculiar sentido del humor grotesco, está en el núcleo de todos sus escritos. Por eso tiene importancia que Villoro transite varios géneros. Por eso es que trabaja narrativamente los géneros de no ficción […]. Sus crónicas o reportajes - mezcla feliz de una ágil estructura narrativa, virtudes periodísticas y brillantez dialéctica - […]. (DÉS, 2005, p. 3).
Neste estudo, ao apresentar nas crônicas de Villoro uma tendência
aforística, tem como objetivo apresentar um mecanismo de navegação, pontos
de partida para adentrar, para lidar com a densidade dos textos, pois, como diz
Villa-Matas (2010) a respeito do aforismo na obra desse autor: “la brillante
prosa de Villoro está sembrada de relampagueantes frases aforísticas que
puntúan sus textos a modo de inspirados latigazos” (VILA-MATAS, 2010, p.1).
Opinião compartilhada por González Rodríguez (2011) o qual, sobre Safari
accidental, destaca que:
Siempre un paso más allá del simple remilgo estilístico, la prosa de Juan Villoro se muestra hábil en la frase aforística o en la metáfora reveladora, en la búsqueda de las paradojas y la mirada oblicua que revela la fisura en el edificio de las apariencias (GONZÁLEZ RODRÍGUEZ, 2011, p.122).
Villoro aproxima-se do aforismo, esse gênero da tradição oral, de
condição efêmera, com a tradução de Lichtenberg, mas seu primeiro contato foi
através do Manual del distraído, de Alejandro Rossi. No entanto, esse gênero
já é praticado no México há muito tempo, como pode ser observado na obra
Lapidario. Antología del aforismo mexicano (1869-2014), de Jorge Hiram
Barrios, publicado em 2014. Nela, observa-se a prática deste tipo de texto no
México desde o século XIX, no qual se pode destacar: Ignacio Manuel
Altamirano, Amado Nervo, Renato Leduc, Octavio Paz, José Revueltas,
61
Augusto Monterroso, José Emilio Pacheco, Guillermo Samperio e Juan Villoro,
entre muitos outros que compõem essa antologia composta por cem autores
mexicanos e estrangeiros radicados no México, fato que, logo no início do
prólogo, comenta:
No ha existido pueblo que no haya cultivado algún tipo de expresión breve, concentrada y certera — o, para decirlo en términos lingüísticos, alguna forma de paremia
27—. El nombre que la bautiza
remite, casi siempre, a una herencia cultural específica: el proverbio es un legado del pueblo hebreo; la sentencia, del latino; el refrán, del hispano; el amtal, del árabe, como el machiotlahtolli del nahua o el libana del zapoteco. El aforismo, ya desde su etimología, apunta a una concepción particular del mundo: la de Grecia antigua, la del logos. Proviene de aphorízein (φορίζειν), propiamente ‘definición’, derivado a su vez de aphorízo: ‘yo separo, defino’ (BARRIOS, 2014, p. 15).
O aforismo é um gênero que tem muitos contornos e, assim como a
crônica, foi se modificando ao longo do tempo. A tradição literária considera
Hipócrates o fundador do gênero, que inicialmente era uma expressão
sentenciosa a qual haveria de aplicar-se à regra para a prevenção ou o
tratamento de sintomas e doenças diversas. A partir do século XX, Friedrich
Nietzsche passou a ocupar um lugar destacado no aforismo contemporâneo.
Como gênero literário, começa a afirmar-se em aproximadamente meados do
século passado com Ramón Gómez de la Serna, Antonio Porchia28, Emil
Cioran, Karl Kraus, a quem Villoro dedica o ensaio “El arte de condenar”
(2010d), entre outros. O aforismo foi uma atividade minoritária, considerado um
gênero subterrâneo e marginal, que privilegiava a visão individual e subjetiva
do autor.
Parece que, na atualidade, há um esforço de resgate desse gênero “Ya
desde la década de los noventa del siglo pasado, Gino Ruozzi impulso la tarea
de censar y compendiar la producción aforística de Italia” (BARRIOS, 2014, p.
18). Na Espanha, José Ramón González registrou um considerável incremento,
27
Paremia (del gr., Παροιμία): “refrán”, “proverbio”, “observación incidental”. Son enunciados breves, sentenciosos, mnemotécnicos a partir de su estructura estable. Con este término la disciplina lingüística conocida como paremiología refiere a todas las unidades fraseológicas, ya sean cultas o populares, según se trate de un ejercicio del intelecto individual (máximas, adagios, sentencias o aforismos de autor), o bien de una construcción del imaginario colectivo (refranes, adivinanzas o dichos anónimos). Una revisión de la taxonomía vigente puede consultarse en Herón Pérez Martínez, El hablar lapidario. Ensayo de paremiología mexicana, México, El Colegio de Michoacán, 1996, pp. 177-183. 28
Poeta argentino, autor de uma única obra Voces, um livro de aforismo. Uma das epígrafes do romance El testigo, de Juan Villoro, é deste autor.
62
inclusive com prêmios e entre 2000 e 2012: “han llegado a las librerías un total
de ochenta y ocho colecciones de textos breves de inclinación aforística”
(GONZÁLEZ apud BARRIOS, 2014, p. 18). Observa-se que Villoro aproxima
sua escrita a esse gênero que, assim como a crônica, não recebeu muita
atenção da crítica literária, de estudiosos e vem sendo valorizado a partir da
segunda metade do século XX. Praticado por poetas, narradores, jornalistas e
ensaístas, não deixou, porém, de ser “una escritura disidente, subrepticia y
minoritária” (BARRIOS, 2014, p. 43).
Estudos recentes apontam que o avanço nas tecnologias de informação
e de comunicação tem contribuído para o interesse de gêneros breves como o
aforismo. Inclusive o Twitter tem sido considerado “como punta de lanza para la
nueva escritura aforística” (BARRIOS, 2014, p. 18). Villoro é um escritor
assíduo dessa rede social e, como diz Manuel Lario Bastida (2016):
En Twitter, donde aparece como @JuanVilloro56, podemos encontrar, bajo la forma de exquisitos aforismos que nos recuerdan su condición de traductor […] de Lichtenberg, múltiples sentencias sobre sus temas habituales: el fútbol, la política, la identidad mexicana o la literatura (LARIO BASTIDA, 2016, p.19).
Por que Villoro publica no Twitter? Um cronista reflete a cultura de sua
época. Ele não está isolado e percebe que essa rede social tem contribuído
para a desconstrução de um conceito tradicional de literatura, aproximando o
culto e o popular, a escrita e a oralidade. Quando Mauricio Mejía pergunta se
ele acredita que a crônica publicada em diários perecerá diante dos avanços da
era digital, Villoro responde que:
Estamos a la orilla de un océano que desconocemos. La crónica es la mejor forma de mezclar un acontecimiento con la repercusión que tuvo en la vida de una persona o de un grupo de personas. No podemos renunciar a indagar la forma en que lo público afecta en lo privado, o en que la información se convierte en emoción. No creo que este tipo de experiencia se desvanezca en la esfera digital (VILLORO apud MEJÌA, 2014, p.1).
Além das crônicas, dos artigos e dos romances, muitos dos aforismos de
Villoro circulam em sua página eletrônica no Twitter. Quando iniciou, em
apenas quinze dias tinha mais de “once mil seguidores” (FRAGUAS, 2011,
63
p.2). Esse espaço virtual, com limite de cento e quarenta caracteres, parece ser
na atualidade, o lugar que deu uma nova vida a esse gênero literário e
filosófico de longa tradição. Esse gênero tem proporcionado renascimento de
autores, como, por exemplo, Samuel Johnson, que morreu em 1784 e já estava
praticamente esquecido pela crítica. Depois de mais de trinta mil seguidores na
rede social, sua obra aforística foi reeditada no Reino Unido.
Certamente há diferenças consideráveis entre o gênero que era
praticado por Hipócrates e o dos anos finais do século XX e primeiros do XXI.
Na atualidade, não há consenso entre os estudiosos das características que
identificam esse tipo de texto, apenas caracterizando um como clássico e o
outro contemporâneo. Essas expressões, entretanto, pouco ou quase nada
colaboram para um avanço teórico. Há aqueles, inclusive, que não encontram
distinção entre o clássico e o contemporâneo.
Afinal, definir o aforismo não é tarefa simples, pois rigor e determinação
não são suficientes para isolá-los. É escorregadio, pode enlaçar-se com vários
outros gêneros, exatamente como questiona Villa Matas “¿Qué es un
aforismo? Difícil ser preciso en la respuesta. Uno, en cualquier caso, cree
saber qué no es un aforismo” (VILA-MATAS, 2010, p.1). No entanto, aqueles
que melhor o definiram foram os próprios praticantes, como, por exemplo: “El
aforismo dice todo, aunque le falte decir lo demás” (GONZÁLEZ apud
BARRIOS, 2014, p.40). Assim propõe Francisco León González. Já para Raúl
Aceves, “El aforismo es un género breve, pero no menor” (ACEVES apud
BARRIOS, 2014, p.40), enquanto para Monsiváis, o aforismo: “es una frase que
no se termina nunca de interpretar, de carácter abierto, donde suele
proponerse una paradoja y sus condiciones son la sorpresa, la ironía y la
decisión de contradecir lo que suele ser una frase afirmativa” (MONSIVÁIS
apud EGAN, 2010, p. 24). Com os aforismos de suas crônicas, Villoro enfatiza
sua preferência por gêneros literários que se de esquivam definição ou talvez
sejam atrativos para acomodar sua escrita.
Devido à variedade de tendências e gêneros que se mesclam ao
aforismo na contemporaneidade, ele pode receber denominações diversas,
como: aforismo transgênico, aforismo filosófico, epigrama, provérbio, adágio,
apotegma, parêmia, entre outros. Para cada uma dessas tendências há
64
características diferentes. Como por exemplo, o aforismo com inclinação
filosófica que se vale do diálogo, do monólogo interno, da pergunta ou
exclamação interna, da piada e da maledicência.
Esse gênero, na atualidade, aproxima-se, inclusive, do ensaio, pois “Se
trata de una escritura prosística que suele asemejarse al ensayo por su
naturaleza híbrida. Es otra literatura de ideas” (BARRIOS, 2014, p. 20). Como
Gabriel Zaid tenta demostrar: “El ensayo más breve del mundo / No hay ensayo
más breve que un aforismo” (ZAID apud BARRIOS, 2014, p. 20). Essa
vinculação do aforismo ao ensaio é somente uma aproximação, pois o ensaio
exige argumentação enquanto que, no aforismo, não dá tempo de argumentar
devido à brevidade. Essa forma textual, porém, brinca, simula, generaliza,
provoca o ensaio. É exatamente assim que se observa em: “Uno de los
grandes misterios del fútbol es que ritualiza la pasión y la contiene” (VILLORO,
2006b, p. 24).
Nota-se que, apesar de que em Tiempo transcurrido, Palmeras de la
brisa rápida e Los once de la tribu, seus primeiros livros de crônicas, haja
frases extremamente elaboradas, de fino humor e sarcasmo, essa inclinação
aflora nas crônicas mais recentes publicadas em Safari accidental e Dios es
redondo, nas quais percebe-se a brevidade, a concisão, o efeito supressivo e o
desenlace irônico dos textos.
O aforismo é considerado um gênero que se impõe, devido à maneira de
se anunciar, com expressões como: todo, ninguém, nunca, sempre, que
costumam ser utilizados para afirmar ou negar categoricamente. É o que se
pode verificar em “Es obvio que no hay historia sin conflicto, y todo conflicto
que vale la pena es “serio” (VILLORO, 1998, p.74). No entanto, essa estratégia
é utilizada por Villoro sarcasticamente, pois não pretende construir ideias,
senão questioná-las, provocar as que existem ou replicá-las: “Publicar algo
bueno nunca es tan bueno como saber que nadie más lo publicó. Sin embargo,
aunque la exclusiva depende de su condición única, su mérito nunca es
individual” (VILLORO, 2005a, p.257) e até em sua obra infantojuvenil como em
El libro salvaje (2011b) há aforismos “Nada es tan aburrido como saber mucho
de tan poco” (VILLORO, 2011b, p. 46).
65
Na obra de Villoro, o aforismo funciona como um resumo impactante, um
fragmento involuntário, condensado, um instrumento político-sociológico-
engenhoso, que aproxima o texto de uma linguagem popular. Ele se intitula
como um aforista plebeu e declara: “sin la grandilocuencia de quien entrega
máximas para ser publicadas o esculpidas en mármol. Eso me divierte”
(VILLORO apud MÉNDEZ, 2012, p.5). Na expressão “aforista plebeu” está
condensado o entendimento de eliminação de fronteira “alta” e “baixa”. O
aforismo é considerado um gênero elitista. Para ele, porém, é importante
desfazer essa dicotomia; não tem pretensões de docência nem de porta-voz,
mas utiliza a combinação dos gêneros: crônica e aforismo, e se poderia arriscar
uma espécie de “aforiscrônica” ou “croniforismo”, como crítica a um sistema
que tenta impor essa divisão categórica.
A crônica funciona como uma ponte entre ficção e não-ficção, entre o
erudito e o popular, e essa tendência aforística contribui para a conexão destas
pontes, pois o aforismo é um gênero erudito, elitista e tradicional, o qual,
através das crônicas desse autor, ganha contornos populares, pluralizando e
aproximando sua escrita da tradição oral. Javier Perucho, por meio eletrônico,
entrevista, Villoro que comenta a respeito de sua prática no gênero:
En mi opinión hay dos clases de aforistas. Los que escriben deliberadamente con la intención de que esas frases funcionen sueltas y los que sumergen esas frases en textos más amplios, para que sean entresacadas por algún lector. Lichtenberg pertenece al segundo género. Dejó apuntes donde la posteridad encontró aforismos, al modo de lo que subrayamos en un autor favorito. Espero que ése sea mi caso. No he escrito nunca aforismo en forma directa (VILLORO apud PERUCHO, 2011, p.7).
Certamente, como Georg Christoph Lichtenberg, Juan Villoro pertence à
segunda classe de aforistas mencionados na entrevista. Seus aforismos não
estão soltos, mas misturados nos textos para serem captados por um leitor
mais atento. Muitas vezes, provocam dúvidas se determinada oração é
simplesmente boa escrita ou é um aforismo. A esse respeito, destaca-se a
reflexão de Mark Bell: “hay que considerar juntos texto, co-texto, y contexto
para establecer que una observación aislada pertenece al género del aforismo”
(BELL apud EGAN, 2010, p. 25). Ou seja, ainda que o aforismo seja autônomo,
66
é capaz de sobreviver, de guardar sentido e potência literária depois de ser
retirado do seu contexto original.
Cada aforista tem seu próprio estilo, personalidade e sua maneira de
criar um fragmento “consideravelmente memorável” capaz de convidar o leitor
para selecioná-lo. Como destaca Egan (2010): “uno de los marcadores que
distingue al aforismo del proverbio en la historia evolutiva de los refranes es el
carácter personal de aquél: el proverbio pertenece al dominio común, el
aforismo al autor que lo produce, con o sin premeditación” (EGAN, 2010, p. 25).
Villoro mescla com frequência em suas crônicas aforismos de escritores
que admira, que figuram, dead or alive, entre os quais: Francis Scott Fitzgerald:
“Toda vida es un proceso de demolición” (FITZGERALD apud VILLORO,
2005a, p.245); Truman Capote: “La diferencia entre la buena literatura y el
verdadero arte es sutil pero salvaje” (CAPOTE apud VILLORO, 2005a, p.251);
Carlos Monsiváis: “O ya no entiendo lo que está pasando o ya no pasa lo que
estaba entendiendo” (MONSIVÁIS apud VILLORO, 2005a, p.7); Martín Luis
Guzmán: “El que primero dispara, primero mata” (GUZMÁN apud VILLORO,
2008b, p.1); George Steiner: “el hombre acorralado se vuelve elocuente”
(STEINER apud VILLORO, 1998, p.72) e Samuel Beckett: "No hay juego de
vuelta entre el hombre y su destino" (BECKETT apud VILLORO, 1998, p. 130),
entre outros.
Entre os signos que mais distinguem os aforismos, destacam-se aqui
apenas cinco, baseados nos estudos de Egan (2010), exemplificadas com
aforismos das crônicas de Juan Villoro:
1) A brevidade, pois a concisão é uma característica essencial: “El
animal enjaulado sólo conoce una actividad: la espera” (VILLORO, 2005a,
p.192). Como a crônica é um gênero que normalmente tem um número limitado
de páginas ou caracteres, a brevidade do aforismo contribui para condensar
um pensamento, uma definição, uma paráfrase, favorecendo a fluidez do texto.
2) Caráter geral e definitivo, ou seja, resume uma verdade “universal” ou
aceita como um axioma: “Todo viajero contrasta lo que ve con su sitio de
procedencia” (VILLORO, 2005a, p.146). Esse tipo de aforismo convida o leitor
67
a respeitar a concisão e a precisão intelectual da frase ao mesmo tempo em
que exige a expansão ou a interpretação desta.
3) A temática ou profundidade filosófica: “Nuestro populoso labirinto es
un escenario perfecto para escapar hacia adentro” (VILLORO, 1998, p.67,
destaque do autor). Esse tipo de aforismo é um modo de explorar e
compreender a humanidade dentro das relações sociais, culturais, artísticas,
políticas e interpessoais;
4) A experiência vital, às vezes com um tom confessional ou marcas
autobiográficas
Aunque vivimos para cortejar la muerte, nos pasa como a los suicidas que se toman el botiquín entero y se salvan porque los somníferos son anulados por los estimulantes. En otras palabras: sobrevivimos porque recurrimos a demasiadas formas contradictorias de hacernos daño (VILLORO, 2005a, p.204).
5) Um artifício retórico, um giro estilístico, uma peculiaridade expressiva
que impacta: “A diferencia de las guías, las crónicas no proponen un estilo de
viaje sino el viaje a un estilo” (VILLORO, 2009a, p.60). Pode ser também por
uma figura de linguagem ou uma construção mais complexa, como uma
parodia ou uma mini-alegoria.
Os aforismos presentes nas crônicas de Villoro têm temas variados, que
vão desde a sociedade (civil) mexicana, pois “La sociedad democratiza las
partes que antes fueron íntimas y las despoja de misterio” (VILLORO, 2005a,
p.197); a história: “Vivida como presente, la historia es un amasijo que rara vez
cobra sentido” (VILLORO, 2005a, p.124); a cultura de massa: “La cultura de
masas no conoce castigos más dañino que el olvido” (VILLORO, 2005a, p.69);
a política: “El EZLN es un ejército al interior de su zona y un movimiento político
hacia el resto del país” (VILLORO, 2005a, p.58) ou “En Chiapas hay un pueblo
que se llama La Realidad. De manera apropiada, está lejos de todo” (VILLORO
apud LARIO BASTIDA, 2016, p.21); a identidade mexicana: “John Lennon dijo
que la gente que más sufre es la que tiene mejor sentido de humor. Si esto es
cierto, los mexicanos somos una superpotencia humorística” (VILLORO, 2005a,
p.42); o futebol: “Elegir un equipo es una forma de elegir cómo transcurren los
68
domingos” (VILLORO, 2006b, p. 17) ou “Con el fútbol pasa como con las dietas
ricas en fibras: no todo alimenta, pero la mezcla sirve para digerir” (VILLORO,
2006b, p. 33); o rock: “Los decanos del alto volumen son ante todo una imagen,
iconos que han adquirido la pétrea condición de las gárgolas de una catedral”
(VILLORO, 2005a, p.67) ou “La posteridad de Elvis es tan sólida que tiene
futuro en el pasado” (VILLORO, 2005a, p.65); e, certamente, muitos outros
temas que incluem a violencia e até o narcotráfico, porém sempre com um
caráter crítico, político, irônico e, muitas vezes, satírico. Os aforismos não são
frases reconfortantes e amistosas, já que, em sua maioria, são ásperos,
combativos e subversivos.
Assim como a crônica, o aforismo é um gênero considerado marginal, de
condição efêmera, narrativo, de difícil identificação, praticado por diversos tipos
de profissionais, literários e não literários. Também é publicado em diversos
meios: livros, jornais, revistas, suplementos diários e nas redes sociais. É um
gênero controverso, que suporta uma experiência empírica; por isso é
geralmente frequentado por escritores de maturidade literária.
69
CAPÍTULO II - HISTÓRIA E ATUALIDADE DA CRÔNICA
Haber elegido la crónica como vía no es simple casualidad. Ante alternativas desgastadas o anquilosadas, la elección de un estilo de escritura implica una moral. La elección del género no es políticamente inocente. No se pueden sacar conclusiones generales, pero lo cierto es que la narratividad es un intento por comprender, pero sobre todo, un impulso de moralizar la realidad
29.
Susana Rotker
Y, evidentemente, nadie puede escribir sin antecedentes30
. Juan Villoro
O capítulo que segue está dividido em três partes, que se conectam e se
interpretam. A divisão servirá para uma melhor compreensão de conceitos,
pensamentos e reflexões sobre um único assunto: a crônica mexicana atual. O
objetivo é apresentar um breve panorama desse gênero no México dos
primeiros anos do século vinte até a atualidade. Procurar-se-á demonstrar a
evolução, as características, os escritores, os leitores e o mercado criado por e
para esse gênero, além da problemática relação do gênero no espaço entre a
literatura e o jornalismo, principalmente a partir de 1968, período compreendido
por essa pesquisa. Esses elementos contribuirão para pensar sobre as
crônicas do corpus selecionado e, a partir disso, estabelecer argumentos para
a pesquisa.
Cabe destacar que, apesar da larga produção de crônicas, que “Es la
práctica escritural más popular, rica y duradera” (CORONA & JÖRGENSEN,
2002, p.3, tradução minha) da Literatura Mexicana, as análises críticas dessas
ocorreram com mais frequência nos últimos anos do século XX. Merece
destaque o estudo de Aníbal González com La crónica modernista
hispanoamericana, publicada em 1983; Desencuentros de la modernidad en
América Latina: literatura y política en el siglo XIX, de Julio Ramos, publicada
em 1989; La invención de la crónica, de Susana Rotker, em 2005; as três
voltadas para produções do século XIX, e, A ustedes les consta, em 1980, de
29
Trecho do livro La invención de la crónica. México: Fondo de Cultura Económica. Fundación para un Nuevo Periodismo Iberoamericano, 2005. 30
Fragmento da entrevista a BENAVIDES, Jeovanny. ¿Hay vida en la tierra? Publicada en 2014. Disponível em: https://archivond.wordpress.com/2014/10/25/villoro/ Último acesso: 10.09.2016.
70
Carlos Monsiváis, o qual compreende um panorama com recorte histórico-
crítico-analítico das crônicas mexicanas entre os anos finais do século XIX até
a década de 1970. O estudo de Darío Jaramillo Agudelo, Antología de crónica
latinoamericana actual, 2012 preocupa-se com as produções das crônicas
latino-americanas dos últimos vinte anos. Certamente, a partir da primeira
década de 2000, diversas dissertações e teses têm analisado criticamente as
crônicas recentes, principalmente nos Estados Unidos. É importante, porém, a
análise permanente de produções diversificadas para a construção, talvez em
um futuro próximo, de ampla teoria crítica dedicada ao gênero.
2.1 Reflexões teórico-crítica sobre a crônica mexicana
O que fica claro é que, efetivamente, toda definição é interpretação
seletiva, todo modo de contar a história da literatura é uma opinião e
que, como tal, é mutável com o tempo e a perspectiva atual31
.
Susana Rotker
A crônica na América Latina tem três momentos importantes, ainda que,
em suas remotas origens, não contivesse características jornalísticas que
possam demonstrar continuidade desde o período colonial até a atualidade. No
princípio, as Cartas de Relação, os poemas épicos e as crônicas de viagem
feitas por conquistadores-soldados-escritores das Índias, os quais realizavam
seu ofício sem preocupação literária, pois estavam mais interessados em
registros escritos com o propósito de dar a conhecer diversos feitos. É
importante destacar também que há uma proliferação, uma repetição constante
de que a Crônica de Índias é a antecessora da crônica contemporânea. É
preciso reconhecer que muitos textos dos séculos XVI e XVII possuem alto
valor literário, “Es decir, son crónicas porque utilizan el lenguaje literario para
describir el presente conflictivo; pero todavía están más cerca de la historia
antigua que del futuro periodismo” (CARRIÓN, 2012, p. 21). No entanto, o que
se ressalta na crônica atual, além da influência do jornalismo, é a figura dos
cronistas, que, no passado, eram sujeitos que relatavam as conquistas na
31
Trecho do livro La invención de la crónica. México: Fondo de Cultura Económica. Fundación para un Nuevo Periodismo Iberoamericano, 2005.
71
colônia, procurando justificar seus interesses e atropelos. Por outro lado, é
possível afirmar que os cronistas atuais podem ser destacados por terem uma
postura ética e uma preocupação com a função social desse tipo de texto.
Ocorre que, ao longo do tempo, esses autores foram substituídos por
homens de letras de tom modernista desenvolvido entre o fim do século XIX e
o início do XX. A partir daí, observa-se a o crescimento da crônica, tal como se
publica dos anos 60 até os dias atuais. Essa última está indissoluvelmente
marcada por três fatores: a explosão dos meios de comunicação de massa; as
mudanças provenientes do Jornalismo Literário; os processos políticos, sociais
e econômicos do continente, como as ditaduras e a implantação do sistema
neoliberal: “Estos tres factores convergen en la crónica, contaminándola o más
bien metamorfoseándola” (NAVARRETE, 2015, p. 1).
Desde as primeiras décadas do século XIX, nas academias literárias
mexicanas, já se observava a expansão de hommes de lettres, que, em geral,
já não eram sacerdotes. O saber fora da igreja permitiu outra visão da história,
novas interpretações e funções aos letrados como: “La interpretación de los
hechos colectivos, las pautas de la psicología individual reconocida, la
representación de la alta cultura, el conocimiento como la excepción, la
creación de atmosferas verbales como espejos de comunidad (MONSIVÁIS,
1987, p. 756).
Nota-se, nesse contexto que, há muitos anos, a situação social latino-
americana é retratada com registro que não é estritamente informativo, mas
que costuma guiar a prática jornalística nas redações. Como destaca Susana
Rotker “punto de inflexión entre el periodismo y la literatura” (ROTKER, 2005,
p. 25), referindo-se ao gênero crônica32 que, na América Latina, apresenta
características próprias que a põem mais próxima da literatura. A vida comum,
ou seja, aquilo que não é notícia, é posto em cena através de temas abordados
por cronistas para contar histórias capazes de assombrar, indignar e comover,
mantendo um diálogo permanente com a literatura e a análise sociocultural
através da arte de narrar o cotidiano.
32
Ao longo de todo o estudo não será apresentado distinção entre a crônica literária e a jornalística, porque a mistura é que a define.
72
A crônica dos modernistas foi, frequentemente, marginalizada por parte
da crítica literária com o argumento de que se tratava de relatos com pouco
valor artístico e por ter sido produzida sob as exigências de um jornalismo que
ansiava pela modernidade. Susana Rotker (2005), tratando da pouca atenção
dada aos textos jornalísticos dos modernistas hispano-americanos, destaca
que somente se levava em consideração sua produção poética como se ambas
estivessem separadas, como se um mesmo autor tivesse obras “puras” (leia-se
poesia) e obras “contaminadas” (leia-se crônica), porém
A pesar de la importancia de las crónicas periodísticas para comprender una etapa fundamental de la cultura hispano-americana, ese desinterés por parte de la crítica ha afectado no sólo la total valoración de la obra de Martí y Darío sino de los escritores modernistas en general (ROTKER, 2005, p. 15).
O contato com o jornalismo, a poesia, o conto, o romance e outros
gêneros promoveu uma estrutura flexível de ampla temática, que fizeram da
crônica um laboratório literário, um espaço para a experimentação da
linguagem. Daí a variedade de temas, que incluíram desde as diversões
públicas até os crimes, chegando a questionar uma sociedade em vias de
modernização. No entanto, esses também foram argumentos para a pouca
atenção da crítica ao gênero, como comenta Rotker
La marginación de las crónicas no responde a un criterio “científico” o inapelable; es el resultado de una interpretación selectiva, hecha a menudo como domesticación de la lectura y situada a su vez sobre capas sucesivas de otras lecturas. Hace falta excavar desde otros ángulos para ampliar el horizonte de comprensión (ROTKER, 2005, p.19).
É notável que os escritores modernistas contribuíram para apresentar
novos ângulos de análise de uma obra literária, além de influenciarem através
de sua poética em numerosos artigos, prólogos e crônicas. Não se pode deixar
de considerar, neste caso, o fato de que, nesse período, os homens de letras e
a política eram indissociáveis, como explica José Enrique Rodó:
Quizá no es usted ajeno a esta fatalidad de la vida sudamericana que nos empuja a la política a casi todos los que tenemos una pluma en la mano. Y yo no considero esto enteramente como un mal. Todo está en que no nos dejemos de despojar de nuestra personalidad (RODÓ apud ROTKER, 2005, p.63).
73
O escritor e político uruguaio Rodó percebe a relação entre a escrita e a
política como uma “fatalidade”. Ele faz uma advertência, afirmando que, no
momento de produzir literatura, é muito importante manter a personalidade e a
autonomia criadora.
A crônica, entretanto, percorreu um longo caminho. Esse termo, no início
do Cristianismo, apenas listava acontecimentos ordenados segundo a marcha
do tempo, mantendo basicamente uma sequência cronológica. Aproximou-se
da História a partir do Renascimento e, no início do desenvolvimento da
imprensa, concretizou-se no Journal de Débats até tomar a forma embrionária
que se tem hoje.
A palavra vem do grego chronikós, relativo a tempo (chrónos), e no latim
chronica (MOISÉS, 1982, p. 245). Originalmente, alinhava feitos, em ordem
cronológica, relativos a um povo. Há vários exemplos análogos de crônica
desde a Idade Antiga, sempre levando em consideração o caráter de relato
circunstanciado sobre feitos, cenários e personagens, a partir da observação
do próprio narrador, ou tomando como fonte, desde protagonistas, até
testemunhas oculares.
Por que se escrevem crônicas? Questionamento instigante feito pela
pesquisadora Valería de los Ríos (2006), que responde relatando que
“Históricamente, estas aparecen en períodos de cambio, cuando se acometen
empresas o surgen transformaciones que es necesario consignar” (Ríos, 2006,
p.128). No contexto modernista, Julio Ramos (2008) refere-se à crônica como
um “género de cambio” e levanta a hipótese de que ela, por ser um gênero
literário não elitista, permitiu “processar”, através da escrita, a vida cotidiana,
ilustrando as incertezas, as inquietações e as angustias do homem num
ambiente urbano, que refletia os sintomas de uma sociedade capitalista,
seduzida pelo consumo e pela fugacidade da vida moderna do final do século.
Ramos argumenta ainda que os outros gêneros, como a poesia (o
principal gênero literário do período) ou o romance não possibilitavam essa
aproximação. Nos anos finais do século XIX, os cronistas modernistas
passaram a utilizá-la para narrar à modernidade apresentada pela cidade.
Nesse sentido, a vida urbana, as inúmeras transformações, os problemas
74
políticos, a evolução dos meios de comunicação e a cultura popular são temas
reiterados pelos cronistas das décadas posteriores. No entanto, é importante
destacar também que os cronistas modernistas se especializaram mais como
críticos culturais, pensamento compartilhado tanto por Ramos (2008) quanto
por Rotker (2005). Assim, as crônicas modernistas procuraram a pluralidade de
temas, voltando-se para problemas e acontecimentos locais, destacando as
pequenas histórias e concretizando formas e estilos com uma perspectiva mais
experimental e personalizada de eventos, como por exemplo: Nervo e suas
crônicas de modas; as crônicas de viagens de Gutiérrez Nájera e Tablada.
Tratava-se, enfim, do discurso de modernidade, captando os acontecimentos
através de uma prosa cuidadosa.
É importante deter-se nas crônicas dos modernistas mexicanos porque
apresentam características que perfilam linhas de continuidade em relação às
que se produzem na atualidade. Isso não significa que são as mesmas, pois há
mudanças consideráveis ao longo da história: o modo de escrever de Gutiérrez
Nájera não é o mesmo de Novo; o de Prieto não é o mesmo de Poniatowska.
São crônicas diferentes em sua maneira de narrar, diferentes possibilidades de
convenções linguísticas, retórica e estilísticas de seu tempo, imaginário e
destinatário, porém mantiveram pelo menos dois aspectos: a intenção do texto
e sua função social. Os cronistas desse período apresentaram uma evidente
preocupação com a estética. No entanto, isso não impediu que sua escrita
mantivesse “un alto grado de referencialidad y actualidad (la noticia), como
material literario han logrado sobrevivir en la historia una vez que los hechos
narrados y su cercanía perdieron toda significación inmediata, para revelar el
valor textual” (ROTKER, 2005, 116).
Antes de começar a mostrar o papel dos cronistas modernistas
mexicanos, é preciso comentar a respeito do cenário jornalístico naquele
período. Se, por um lado, a imprensa mexicana foi utilizada por muitos
governos como uma forma de difundir leis e demonstrar poder, por outro, essa
mesma imprensa foi também “el freno para sujetar las demasías de los
gobernantes y poderosos, el apoyo más firme de la libertad y el medio más
eficaz de difundir conocimientos y popularizar la instrucción” (PRIETO apud
MONSIVÁIS, 2010, p. 43). Com Porfirio Díaz, que governou o país por mais de
75
trinta anos, exatamente entre 1876 e 1911, isso se torna mais evidente através
do jornal El Imparcial, mantido por seu governo desde sua fundação em 1896.
Vale dizer que esse jornal aspirava à condição de “grande imprensa” com o uso
da tecnologia em super tiragens, com o manejo das informações e um alto
investimento financeiro que, como ele mesmo reconheceu, foi de cerca de “un
millón de pesos a lo largo de diez años y justifica su “dádiva” por la necesidad
de elevar la cultura en un medio donde el pueblo, analfabeta, no lee”
(MONSIVAIS, 2010, p. 46).
A ditadura de Díaz teve uma política econômica liberal voltada para o
estrangeiro, período durante o qual havia o seguinte provérbio “México, madre
para los extranjeros, madrastra para los mexicanos”. Tal se refletiu nas
inúmeras restrições impostas para a publicação nos jornais, e essa era uma
das razões por que muitos cronistas, entre eles, Gutiérrez Nájera e Guillermo
Prieto, por exemplo, não tenham focado na política especificamente, mas numa
temática mais ampla, voltada para os costumes, as relações humanas e a vida
social. Não eram, no entanto, crônicas inocentes, pois criticavam e mostravam
as carências e os fracassos da sociedade naquele período. Outro motivo para
essa temática é, como comenta Novo: “Si Gutiérrez Nájera consagraba la
mayor parte de su producción a ganarse una reputación de afrancesado, sería
porque también ganaba con ellos su pan de cada día; que era la mercancía
que le compraban a mejor precio” (NOVO apud MONSIVÁIS, 2010, p. 39).
Segundo Javier Romero, essa (12 de setembro de 1896, o nascimento
de El Imparcial) é a data de nascimento do jornalismo moderno mexicano, e
sobre esse evento afirma Carlos Fornaro no jornal México tal cuales em 1909,
que mais dano causou El Imparcial ao país que uma “inmensidad de culebras
de cascabel esparcidas en el territorio” (FORNARO apud MONSIVÁIS, 2010, p.
46). A crônica no México teve, não rara vez, uma dupla função, pois sempre se
colocou como reprodutor e legitimador do discurso hegemônico, como comenta
Villoro: “uma das formas de perpetuar o sistema político mexicano tem sido o
controle da informação” (VILLORO, 2002c, p.64, tradução minha). Por outro
lado, esse gênero produziu também um contra discurso, procurando dar
visibilidade a sujeitos marginais inviabilizados pelo discurso oficial. Em outras
76
palavras: a crônica serviu também como meio para divulgar coisas que não
poderiam ser ditas de outra maneira.
Antônio Cândido explicita no prefácio da segunda edição de Formação
da Literatura Brasileira (2000) que um sistema literário articulado necessita de
um triângulo formado por autor-obra-público em dinâmica interação e de certa
continuidade de tradição. Segundo Cândido, isso passou a ocorrer no Brasil
após o Romantismo.
Pensando no sistema literário latino-americano, ainda que não
explicitamente, Rotker (2005) menciona a dura relação dos poetas
modernistas, principalmente Gutiérrez Nájera, Darío e Martí com o triângulo de
Cândido (2000), acrescentando a este, porém, mais um elemento: o mercado.
É importante observar que a relação mencionada por Rotker (2005),
principalmente com o mercado, ainda guardava certo pudor, porque também
era uma novidade. Bartolomé Mitre, diretor de La Nación, em carta enviada a
Martí, apesar do respeito extremo e até certa veneração pelo talento literário do
escritor, destacou:
No vaya Ud. tampoco a tomar esta carta como la pretenciosa lección que aspira a dar un escritor a otro. Habla a Ud.., un joven que tiene probablemente mucho más que aprender de Ud. que Ud. de él, pero que tratándose de mercancía – y perdone Ud. la brutalidad de la palabra, en obsequio a la exactitud - , que va a buscar favorable colocación en el mercado que sirve de base a sus operaciones , trata, como es su deber y su derecho, de ponerse de acuerdo con sus agentes y corresponsales en el exterior acerca de los medios más convenientes para dar todo el valor de que es susceptible (MITRE apud ROTKER, 2005, p. 103).
Além da relação com o mercado, esse trecho trata também da
profissionalização do escritor e do jornalista. Rotker (2005) destacou trechos de
cartas de diretores e editores enviadas aos escritores, nos quais relata as
expectativas do leitor, da relação com o mercado, da extensão dos textos e
também da exigência na moderação dos conteúdos políticos das publicações.
Em um trecho da carta do diretor do jornal La Opinión Nacional, Fausto
Teodoro Aldrey a Martí, em 1881, diz:
77
el público se muestra quejoso por la extensión de sus últimas revistas sobre Darwin, Emerson, etc., pues los lectores de este país quieren noticias y anécdotas políticas y la menor literatura posible [...]. Por otra parte los párrafos son muy largos. Esta sección que deseo continuarla, debe ser de párrafos cortos (ALDREY apud ROTKER, 2005, p. 102).
Nos trechos destacados, nota-se que os diretores dos jornais assumiam
o interesse do diário por seu aspecto comercial, destacando o fato de, já
naquele momento, ter uma preocupação em não afastar o público consumidor,
que era uma pequena elite certamente, mas “menos reducida en términos
cuantitativos que lo que la imaginación actual y desprevenida pueda pensar”
(ROTKER, 2005, p. 105). Nesse período, havia ainda um entendimento de que
a profissionalização do escritor estava em conflito com princípios burgueses
“según los cuales arte y mercancía, lo útil y lo sublime, el dinero y la creación,
eran polos opuestos” (ROTKER, 2005, p. 103). Trata-se de uma situação
complexa, percebida na análise das crônicas modernistas, pois havia um tom
nostálgico envolvendo o fazer literário nos jornais “¡Qué mayor tormento quiere
usted que sentirse capaz de lo grandioso, y vivir obligado a lo pueril” (DARIO
apud ROTKER, 2005, p. 112) ou “No hay tormento comparable al del periodista
en México. El artesano se basta a sí mismo si conoce su oficio, pero el
periodista tiene que ser no sólo “homo duplex” sino el hombre que, como dice
Valhalla, puede dividirse en pedazos y permanecer entero” (GUTIÉRREZ
NÁJERA apud MONSIVÁIS, 2010, p. 48). No entanto, seria ingênuo também
imaginar que os modernistas não tinham consciência de que o jornalismo abria
aos escritores o mercado de livros. Entretanto, como comenta Rotker:
El problema es que en el fondo, como se ha visto, en ese entonces el arte seguía relacionado íntimamente con la idea de minoría, de “elegidos”; era demasiado difícil dar salto tan grande en la propia cultura como para que los modernistas pudieran comprender que en el periodismo estaban haciendo una versión propia de literatura popular, o al menos más masiva que sus textos poéticos. Demasiado quizá fue ya el hecho de haber sido capaces de amoldarse a su tiempo, produciendo – con o sin consciencia de ello – un nuevo género literario, que era signo de una época; es indudable que, además de las limitaciones editoriales, enfrentaron el prejuicio propio acerca de las divisiones establecidas entre arte y no arte, literatura y cultura de masas (ROTKER, 2005, p. 113).
78
Percebe-se ainda que os diretores dos jornais sugerem uma delimitação
entre as funções que, naquele momento, estavam confusas entre o jornalista, o
repórter, o escritor e o literato. Gutiérrez Nájera também relata em suas
crônicas a relação entre literatos e repórteres nos jornais
La crónica [...] ha muerto a manos del repórter quien es tan ágil, diestro, ubicuo, invisible, instantáneo, que guisa la liebre antes que la atrapen”. Ante “esos trenes relámpago [...] la pobre crónica, de tracción animal, no puede competir”. Y se duele: “A medida que los escritores bajan, los repórters suben” (GUTIÉRREZ NÁJERA apud MONSIVÁIS, 2010, p. 51).
A distinção que buscavam, na verdade, era entre o cronista e o repórter,
pois ao primeiro se atribui o tratamento literário da notícia; ao segundo, a
consignação da atualidade. Outro cronista mexicano, Luis González Urbina
comenta a respeito da relação desse gênero, que mistura informação e
reportagem com a evocação do comum e do pitoresco, sem hierarquias, e diz:
Es cierto que un cronista no es un artista. Mas no sé qué diablos tiene este género periodístico que, sin ser superior, requiere una expresión pulcra, un temperamento vibrante, una observación atinada, y a ser posible, cierta dosis de fantasía para colorear las imágenes. Un cronista está a merced de los acontecimientos. La vida de los tiempos. El periodista los enfoca y los presenta con visualidad personal y, así, ofrece un panorama de la actualidad circundante elaborado por la sutileza de la observación y la brillantez del estilo (GONZÁLEZ URBINA apud MONSIVÁIS, 2010, p. 52).
A expansão da crônica modernista envolveu muitas perspectivas, pois
havia a profissionalização de escritores, mesmo que conflitante com princípios
burgueses, “pero es más riesgoso morir de hambre” (MONSIVÁIS, 2010, p. 48).
Havia, também, uma intensa disputa por espaço entre os repórteres e os
literatos. Claudia López Pedroza menciona que nesse período: “el hombre de
letras entrara en una lucha constante con el reporter. Esta competición entre el
literato y el reporter, así como entre la crónica y el reportaje” (LÓPEZ
PEDROZA, 2011, p. 4). Além do mais, é preciso ressaltar que, devido ao alto
índice de analfabetismo, a falta de um público leitor dificultou bastante a
ampliação do gênero.
Além dos poetas modernistas mexicanos já destacados, é preciso
destacar que muitos outros foram cronistas. No entanto, é recente a
79
valorização e a análise crítica da obra cronística de Amado Nervo, José Juan
Tablada, Luis Gonzaga Urbina, Ramón López Velarde33, entre outros. Inclusive,
sobre o último, nota-se que suas crônicas ainda não receberam, até o
momento, uma análise mais criteriosa. Esse fato pode se observado no livro de
José Luís Martínez (1998), o qual reúne mais de setenta artigos e ensaios
publicados, todos dedicados a sua obra poética, percebendo-se que são raras
as análises das suas crônicas. Certamente a efemeridade do meio de
publicação contribuiu para isso. López Velarde, por exemplo, teve a maior parte
de suas crônicas publicadas em jornais provincianos, como El Observador, ou
na revista Bohemio.
Sobre a produção literária de López Velarde, cabe uma ponderação
mais cuidadosa devido ao sarcasmo e ironia de sua prosa, que o aproxima de
Juan Villoro. É o que se percebe em texto jornalístico publicado em 1916, no
qual declara que “El asunto civil ya hiede. Ya hedía en los puntos de la pluma
beatífica de aquellos señores que compusieron odas para Don Agustín de
Iturbide” (LÓPEZ VELARDE apud SÁNCHEZ-PRADO, 2006, p. 63), além da
variedade de temas, tons, estilo e, principalmente, porque, como comenta
Ernesto Emiliano Romero (2006), “la prosa de López Velarde participa de
elementos que fundaron la escritura del siglo XIX” (ROMERO, 2006, p.51).
Nesse sentido, é importante pensar na análise de Rotker a respeito de José
Martí, para avançar no tipo de prosa de López Velarde, na qual diz que
es la crónica el laboratorio de ensayo del ‘estilo’ — como diría Rubén Darío—modernista, el lugar del nacimiento y transformación de la escritura, el espacio de difusión y contagio de una sensibilidad y de una forma de entender lo literario que tiene que ver con la belleza, con la selección consciente del lenguaje, con el trabajo con imágenes sensoriales y símbolos, con la mixtura de lo extranjero y lo propio, de los estilos, de los géneros, de las artes, de la democracia, […] y de la realidad social e íntima (ROTKER, 2005, p. 230).
33
O poeta Ramón López Velarde (1888-1921), autor de La suave patria, foi resgatado por Villoro em seu romance El testigo, 2004, tornando uma espécie de personagem de sua obra. Com relação a sua obra prosística, cabe destacar que houve algumas investigações dispersas e uma compilação póstuma chamada El minutero (1923) mas, a compilação mais completa ocorreu depois de mais de trinta anos de sua morte, através do trabalho de Elena Molina Ortega, que publicou na Imprensa Universitaria três volumes: Ramón López Velarde: poesias, cartas, documentos e inoconografía (1952); El don de febrero y otras prosas (1953) e Prosa política (1953).
80
É importante essa aproximação, porque nesse trecho está uma das
discussões a respeito da crônica que contribui para aproximar as
características da prosa lopevelardiana, pois quando se menciona beleza,
seleção vocabular e de imagens se trata da identificação do estético, porém
muitas vezes essa aproximação se confunde com o fictício que acaba
afastando e enfraquecendo o discurso literário do mundo dos acontecimentos,
fazendo com que o literário seja considerado uma atividade suplementaria e
prescindível. O factual não deve incluir ou excluir a crônica da literatura ou do
jornalismo, pois os dois principais requisitos da crônica são o referencial, ainda
que expresso por um sujeito literário, e o temporal (atualidade). Romero (2006)
destaca a qualidade e a perenidade dos seus textos:
el medio en que fueron publicadas esas prosas no demeritaba su carácter de textos con mayor perennidad que la momentánea que le otorgaba la publicación en cuestión. Muchas de esas crónicas es posibles leerlas hoy, a la luz del tiempo, como reflexiones y argumentaciones bien elaboradas, con una calidad estilística reconocible. En esta tradición es donde se inscribe López Velarde. La compilación de sus prosas por ello recibe como nombre general el de crónicas, a pesar de haber una multiplicidad de estilos y tonos tratados por el autor. Poemas en prosa, breves ensayos, análisis políticos, coronas fúnebres, crítica literaria, bosquejos, constituyen la amplia variedad —y maleabilidad— de su prosa (ROMERO, 2006, p. 52).
As crônicas de López Velarde apresentam uma variação estilística tão
marcante que Blanca Rodríguez comenta que sua obra “desborda los clichés
con que se clasificaban tradicionalmente las obras literarias” (RODRÍGUEZ,
1996, p.102). Em relação à coletânea de textos que aparecem no prólogo do
libro Ramón López Velarde: crónicas literarias, há a seguinte apresentação:
“Esta selección de algunas de sus crónicas, muchas de ellas imaginarias, y que
incluyen opiniones del zacatecano sobre otros escritores, nos da oportunidad
de verlo sin contagiarse de los versos, se le valora como el extraordinario
prosista que es […]” (ARGUELLES, 2001, p. 10, destaque nosso). Nota-se com
esse fragmento que a prosa do poeta é composta por uma mistura de gêneros
e elementos, podendo-se destacar que o mesmo ocorre com a composição em
prosa de Juan Villoro, como será abordado mais adiante. No momento, é
importante observar que há traços, ainda que sutis, na prosa dos dois autores.
81
Além do hibridismo da prosa lopevelardiana, outra característica que se
pode ressaltar é a inclusão de elementos da cotidianidade da província, da
urbe e a prática econômica que aparece em sua prosa e poesia. Esse traço
não era comum naquele momento, uma vez que rompia com o ciclo do
paisagismo no México. Por isso, “López Velarde es un vanguardista avant la
lettre” (SÁNCHEZ-PRADO, 2006, p. 61).
Entre os anos de 1921 e 1927, surge o grupo que, inspirado no futurismo
de Maiakovski e Marinetti, entrará em combate pela hegemonia cultural e
literária: o Estridentismo. Certamente esse movimento, proveniente da cultura
urbana e procurando se estabelecer à base da modernidade tecnológica,
representou o primeiro passo dado pelas vanguardas no México. É um grupo
extremamente eclético, formado por pintores, fotógrafos, músicos, poetas e
romancistas. Nele, havia também cronistas importantes, como Manuel Maples
Arce e Arqueles Vela. No entanto, a obra mais conhecida de ambos é, sem
sombra de dúvida, a poética.
Os membros do grupo de vanguarda mexicano conhecido como
Contemporáneos, fundado em 1928 e inspirado na revista de mesmo nome, é
composto basicamente por poetas. De sua relação com a política naquele
momento, comenta Roger Bartra: “ellos serían las cigarras aldeanas que
prefirieron morir de frío antes que buscar refugio en la guarida de la estatolatría
nacionalista donde las hormigas revolucionarias habían construido su
santuario” (BARTRA, 2010, p.1).
Assim como ocorreu com os modernistas e os estridentistas, a obra
cronística dos Contemporáneos também recebeu pouca atenção da crítica. A
exceção é Salvador Novo, “cuyo idioma vitalísimo se desentiende del legado de
prosas poéticas y reconvenciones moralistas y funde en un solo género
crónica, artículo y ensayo. […] Con inteligencia y humor […]” (MONSIVÁIS,
2010, p. 53).
No entanto, esse “archipiélago de soledades” que percebeu Jaime
Torres Bodet ou “grupo sin grupo” como se referia Xavier Villaurrutia a esse
grupo, é importante na consolidação do exercício da tarefa literária e cultural no
82
México nas primeiras décadas do século passado, como destaca Guillermo
Sheridan (1993):
La poesía, la crítica – siempre rigurosa – de las letras, las artes, la sociedad y la política, el teatro, la narrativa, la crónica sabiamente banal o exaltada de los más diversos sucesos culturales, los epistolarios y las autobiografías, en suma, cualquier expresión inteligente sobre cualquier acontecimiento inteligible e interpretable fue asumida por este “grupo” con un rigor inusitados dentro de nuestra tradición intelectual, no pocas veces en oposición a un medio agresivo siempre, hostil en ocasiones, cruel en su capacidad para el escarnio o la descalificación (SHERIDAN, 1993, p.9, grifo nosso).
Salvador Novo é o cronista mais destacado nas primeiras décadas do
século passado no México. Suas primeiras crônicas são aquelas nas quais
mais se podem encontrar referências em relação às de Villoro. Tal ocorre por
causa da composição textual envolvendo diversos gêneros os quais
estabelecem vasos comunicantes, mostrando a relação com a cidade do
México, a cultura popular, a ironia e o sarcasmo. O escritor marginal,
entretanto, com o passar dos anos, cedeu lugar ao conformismo e ao aspecto
oficial, como comenta Monsiváis (1986) a respeito de Novo e o Massacre de
Tlatelolco:
el presidente Gustavo Díaz Ordaz lo nombra Cronista de la Ciudad de México. En 1967 es Premio Nacional de Literatura. A principios de 1968, su nombre rebautiza la calle en donde vive. Tanta oficialización no es en vano: al ocurrir el movimiento estudiantil apoya sin reservas al régimen, estima justo y conveniente lo que se haga contra la subversión. […] al día siguiente de la ocupación militar de Ciudad Universitaria, le comenta a un reportero: “Es la primera buena noticia que recibo en el día” (MONSIVÁIS, 1986, p. 291).
Novo tem algumas crônicas dedicadas à cultura popular. Sabe-se que
ele chega a criticar o nacionalismo mais agudo, principalmente devido ao grupo
a que pertenceu. Pondo, entretanto, um olhar mais cuidadoso em sua obra
observa-se que, numa crônica de 1926, intitulada “¡Ya viene Pancho Pistolas”,
defenderá, por exemplo, o corrido: “expresión pura de sentimientos primitivos
de patriotismo o de amor filial o de ausencia, pero siempre de fuerza y de
esperanza y de creencias firmes y convictas; de sentimientos claros […]”
(NOVO, 1926, p.1). Novo é também o cronista que introduz elementos
autobiográficos e massivos em sua prosa, explica Monsiváis: “El Joven es la
irrupción formal en la literatura mexicana del estilo que luego será llamado pop.
83
Moda, preliminares de la sociedad de consumo, ritmo y andares de las
multitudes, letreros, avisos oportunos y relación sonora y mímica con la capital”
(MONSIVÁIS, 1986, p. 271). Nesse trecho do texto de Novo, já se observam
características da crônica de Villoro, como a ênfase na sociedade de consumo,
na cultura e na incorporação de materiais diversos em sua prosa.
Cabe ressaltar ainda que, apesar da excelente prosa de Novo e da
posição de destaque que ocupa no jornalismo literário mexicano, nos anos de
1920 e 1930, o gênero dominante é o artigo político, e a opinião pública é ainda
patrimônio dos “instruídos”. Nesse contexto, publicar artigos é um sinal de
prestígio, e a notícia é um fato a ser interpretado “filosófica, cultural o
politicamente por José de Vasconcelos, Luis Cabrera, Antonio Caso o Vicente
Lombardo Toledano” (MONSIVÁIS, 2010, p. 66). No interior e na capital,
sentem-se os reflexos da Revolução de 1910 e, como destaca Monsiváis:
A provincia, la rigen, sin disimulo la intolerancia de caciques y jefes de armas, los asesinatos de reporteros y directores de periódicos, la improvisación inevitable del oficio periodístico, la autocensura como seguro de vida. El “periodismo nacional” dispone de la gran ventaja: la seguridad relativa de sus hacedores (MONSIVÁIS, 2010, p. 67).
Nesse trecho de Monsiváis, o qual se refere aos primeiros anos após o
fim da Revolução Mexicana34, dando continuidade nos anos seguintes, nota-se
o destaque dado à questão da violência e da repressão a jornalistas, atos
intensificados no governo de Plutarco Elías Calles (1924-1928), pois é o
período da Guerra Cristera35. Deste modo, menciona Monsiváis que o
presidente: “no tolera demostraciones periodísticas de simpatía a los cristeros y
34
A data do fim da Revolução Mexicana é controversa. Para alguns historiadores, é marcada pela a promulgação da Constituição de 1917; para o historiador inglês Alan Knight, o marco seria 1940 com o governo de Manuel Ávila Camacho (1940-1946), porém Villoro e outros intelectuais mexicanos consideram que o fim ocorre somente em 2000, quando termina o governo do PRI. 35
Cristiada ou Cristera ou Guerra Cristera consistiu num conflito armado que se prolongou entre os períodos de 1926 a 1929 e, posteriormente, entre 1934 a 1941 (As datas de início e término da Guerra Cristera, principalmente da Segunda são confusas. Aqui se baseia na tese de doutorado de Antonio Avitia Hernández defendida no México em 2006). Foi um assunto durante muito tempo esquecido por historiadores, silenciado por políticos, negligenciado pela crítica literária e renegado pelos eclesiásticos. De um lado, um exército composto em sua maior parte pelos camponeses pobres, descamisados e mortos de fome do Centro-Oeste do país, apoiados por organizações católicas que resistiram à aplicação da legislação e de políticas públicas orientadas para restringir a autonomia da Igreja Católica. Do outro, as tropas federais e os agraristas, ou seja, camponeses beneficiados pela reforma. Esses conflitos provocaram um imenso derramamento de sangue no país. Villoro retoma esse conflito mais explicitamente no romance El testigo e, indiretamente através da crônica “1979” de Tiempo transcurrido.
84
no admite las incitaciones a la rebeldía politica” (MONSIVÁIS, 2010, p.70),
postura seguida por seus sucessores. Nos governos de Manuel Ávila Camacho
(1940-1946) e Miguel Alemán (1946-1952), segue a violência discreta,
traduzida em instrução moral, golpe, prisão ou difamação. Enfim, a censura é
implantada como fato natural até “fechas recientes” (MONSIVÁIS, 2010, p.73),
pois “El Estado es y debe ser intangible, y para garantizarlo no basta el perene
control de los periódicos sino, broche de oro, la conversión de la censura en
reflejo condicionado” (MONSIVÁIS, 2010, p.73).
Ao analisar a situação de jornalistas e repórteres no México nesses
primeiros anos do século passado e compará-la à das décadas de sessenta e
setenta e da época atual, parece que não avançou muito. Villoro publica em
2008, em uma crônica intitulada La alfombra roja del terror narco, na qual
destaca a situação de repórteres, jornalistas e editores mexicanos nos últimos
anos do século XX e diz:
Los medios de comunicación ampliaron su margen de libertad, pero trabajan en un entorno donde decir la verdad es progresivamente peligroso. De acuerdo con Reporteros sin Fronteras, México ha superado a Irak en número de secuestros y asesinatos de periodistas (VILLORO, 2008b, p.2).
Comparando o trecho destacado de Monsiváis referindo-se aos anos 20
e 30 do século passado ao de Villoro nos primeiros de 2000, observa-se que os
mesmos mecanismos de repressão continuam sendo utilizados. A matéria de
La Jornada, publicada em 2016, referente à marcha de jornalistas contra
colegas assassinados, diz: “México ocupa el quinto lugar en un listado de los
países más peligrosos para ejercer el periodismo, de acuerdo con un informe
publicado por la Unesco” (LA JORNADA, 2016, p.1).
Entre 1940 e 1968 ocorre no México o auge do autoritarismo: “No hay,
no puede haber libertad de prensa, si por ésta se entiende el examen del
funcionamiento real de los poderes y la defensa de los derechos de las
mayorías y minorías” (MONSIVÁIS, 2010, p. 91). Esse fato começa a ser
modificado com o avanço dos movimentos migratórios e da contracultura da
indústria cultural, como menciona Edgar Morin
85
A indústria cultural utiliza e engana ao mesmo tempo em sua tríplice qualidade de artista, de intelectual e de criador. A indústria cultural atrai e prende por salários muito altos os jornalistas e escritores de talento; ela, porém, não faz frutificar senão a parte desse talento conciliável com os padrões. Constitui-se, portanto, no seio do mundo da cultura industrial, uma intelligentsia criadora, sobre a qual pesam grosseiramente a divisão do trabalho e a burocracia e cujas possibilidades são subdesenvolvidas (MORIN, 2011, p.22).
O avanço tecnológico e a inicial expansão dos meios de comunicação de
massas não foram suficientes para impedir o declive da crônica, e ela se tornou
um instrumento sutil e subliminar. Deste modo, é possível notar que, num país
como o México, o jornalismo, às vezes, deixa a crônica de lado por uma
questão de política dos meios e prefere gêneros mais domesticáveis, como a
nota informativa, o editorial e o artigo de opinião, já que, neles, a verdade pode
ser mais facilmente ocultada. No entanto, é importante mencionar também que,
ao se aproximar o fim do milênio e o debut do XXI, a crônica encontrou espaço
para desenvolver-se e “el poder antiguo de gobernantes, cardenales,
empresarios y obispos amengua o no se refrenda su eficacia intimidadoria”
(MONSIVÁIS, 2010, p. 103).
Considerando as crônicas do período do modernismo, as vanguardas e
as posteriores publicadas no México até os anos finais da década de sessenta,
há uma produção que certamente influenciou os cronistas contemporâneos.
Cabe ressaltar, porém, que os modernistas “no invocaron a los cronistas de
Índias como sus antepasados”(CARRIÓN, 2012, p.23) e, inclusive, nem todos
os autores contemporâneos se sentem herdeiros de seus antecessores do final
do século XIX e inícios do XX. No entanto, o objetivo é demonstrar que há um
longo percurso, acidentado talvez, de cronistas no México que contribuíram
para a evolução do gênero, o qual, na atualidade, muitos acreditam que se
encontra na fase do que se poderia denominar de boom da crônica mexicana e
talvez latino-americana, assunto que será abordado mais adiante. Nas crônicas
de Juan Villoro (e não somente desse autor), é possível observar a presença
da “notícia”, “da referencialidade” e do “selo” pessoal (estilo e opinião), que são
características compartilhadas, não apenas pela crônica modernista, mas
também pela contemporânea no México. Há que se considerar também a prosa
carregada de elementos de outras disciplinas e a mistura de gêneros que
aproximam a prosa de López Velarde e Villoro, da mesma forma que o
86
sarcasmo, a ironia e as referências autobiográficas também são percebidos
nesses autores. No entanto, a velocidade e o fluxo de informação, a partir
principalmente dos anos oitenta, associados aos avanços da internet, mostram
que, certamente, não se pode comparar plenamente as crônicas do momento
atual com as do passado, uma vez que os modernistas e vanguardistas
contavam apenas com o telégrafo, único meio ao qual eles tinham acesso.
2.2 Para uma estética da crônica na atualidade
No México há uma tradição de cronistas que contribuíram para fundar as
bases da crônica mexicana atual, e essa tradição foi ampliada ao longo do
século XX. É importante ressaltar que não se trata de se etiquetar autores ou
obras, embora tal fato seja uma tendência no México, como por exemplo, “La
novela de la Revolución Mexicana”, “La Literatura del Medio del Siglo” ou “La
literatura de La Onda”, até porque a literatura não pode ser esgotada em listas
ou nomenclaturas, já que abarca os processos colaterais com os quais se
articula.
No entanto, além dos escritores mencionados na parte anterior, outros
dois movimentos são importantes para que se possa compreender a evolução
da crônica a partir da década de sessenta: o Novo Jornalismo e o denominado
Boom da Narrativa Latino-americana. Ambos são bastante controversos, e
cada estudioso apresenta argumentos para sustentar ou negar sua existência e
o período de sua aparição. Esta pesquisa não tem, por isso mesmo, a intenção
de traçar um marco para nenhum movimento ou tendência, mas entender e
identificar que influências podem ser percebidas nas crônicas de Juan Villoro.
O pesquisador Fernando Checa Montúfar (2014) comenta sobre essas
influências:
escritura de grandes figuras de la narrativa contemporánea en las que la práctica periodística no solo dejó una indeleble marca, sino que sin ella difícilmente habría sido posible: García Márquez, sin duda alguna, Vargas Llosa, Elena Poniatowska, Osvaldo Soriano. Y que la crónica contemporánea, heredera de la modernista, sigue siendo tan literaria como esta: allí están las crónicas que han escrito y siguen
87
escribiendo algunos de los mencionados y otros como Rodolfo Walsh, Carlos Monsiváis, Germán Castro Caycedo, Pedro Lemebel, Juan Villoro, Alberto Salcedo, Martín Caparrós, Leila Guerriero y un largo etc.; que actualmente ha configurado lo que está siendo considerado como un nuevo boom de la literatura latinoamericana (CHECA
MONTÚFAR, 2014, pp. 64-65).
Para muitos escritores, entre eles Salcedo Ramos, Leila Guerriero,
Martín Caparrós e Juan Villoro, o novo boom da literatura é apenas uma
estratégia editorial (assunto que será retomado mais adiante). A perspectiva do
crítico Ángel Rama (1982) é de que o boom da literatura latino-americana dos
anos sessenta e setenta foi um fenômeno da sociedade de consumo.
Pensamento compartilhado por Vargas Llosa, que acentua o fato de esse
movimento literário não ter tido um ideário estético, político ou moral que os
vinculasse, assim afirmando:
Lo que se llama boom y que nadie sabe exactamente qué es –yo particularmente no lo sé– es un conjunto de escritores, tampoco se sabe exactamente quiénes, pues cada uno tiene su propia lista, que adquirieron de manera más o menos simultánea en el tiempo, cierta difusión, cierto reconocimiento por parte del público y de la crítica. Esto puede llamarse, tal vez, un accidente histórico (VARGAS LLOSA apud BENAVIDES, 2015b, p.4).
Cabe destacar, que esse movimento proporciona visibilidade aos
escritores da região, e não é por acaso que “en América Latina los grandes
escritores fueron alguna vez periodistas: Borges, García Márquez, Fuentes,
Onetti, Vargas Llosa, Asturias, Neruda, Paz, Cortázar” (MARTÍNEZ, 2002,
p.119), imprimindo em seus textos um estilo pessoal, com voz própria para
narrar à realidade socioeconômica de seus países. Eles desenvolveram um
processo de conexão entre as tradições locais, as lendas indígenas e as
paisagens rurais e urbanas com novas técnicas narrativas, nas quais
predominam a ruptura com a ordem cronológica, os jogos de palavras, o
monólogo interior e o fluxo de consciência. E assim afirma Benavides:
Las producciones de los autores del boom mostraban un lenguaje nuevo que les permitía narrar las respectivas problemáticas locales y trascender sus fronteras para exigir a sus lectores estar abiertos a nuevas formas de lectura que demandaban mayor compromiso y
participación (BENAVIDES, 2015b, p.6).
88
Enquanto na América Latina surgia o “boom literário”, nos Estados
Unidos se desenvolvia o Novo Jornalismo ou Jornalismo Literário36, uma
tendência que envolveu uma longa discussão a respeito de seu surgimento,
pois, segundo Monsiváis (2010) ocorreu quando, “En 1965, Tom Wolfe, un
cronista de la revista Esquire, publica The Kandy-Kolored Tangerine-Flake-
StreamlineBaby, y con esto inicia un movimiento extraodinario que él llama
New Journalism” (MONSIVÁIS, 2010, p. 94). No entanto, o cronista reconhece
que a combinação de técnicas narrativas com informação jornalística já havia
acontecido em autores como John Hershey, Lilian Ross, Truman Capote e
George Orwell.
Dentro dessa tendência, cabe destacar Truman Capote quando, em
meados do século passado, ele começou a se aproximar de uma maneira de
escrever que foi denominada como non fiction novel. A partir dessa ideia,
Capote documentou um crime bem conhecido na época: a morte da família
Clutter no Kansas, Estados Unidos. Após cinco anos de investigação,
reconstituiu cenas dramáticas e envolveu seu texto em procedimentos
compositivos do romance realista, na obra A sangue frio, publicada em 1966.
Benavides comentou que seu objetivo era dominar técnicas narrativas para
elevar a não ficção à categoria de arte (BENAVIDES, 2016, p. 119). Capote
assinalou ao seu biógrafo, Gerald Clarke, esses procedimentos:
El periodismo se mueve siempre en un plano horizontal al contar una historia, mientras que la narrativa –la buena narrativa– se mueve verticalmente, profundizando en el personaje y en los acontecimientos. Al tratar un hecho real con técnicas narrativas (algo que un periodista puede realizar) es posible elaborar este tipo de síntesis. Como por lo general los buenos narradores habían desdeñado el reportaje y la mayoría de los reporteros no habían aprendido a escribir buena narrativa, no se había llegado a tal síntesis ni tampoco advertido el potencial de los relatos ceñidos a los hechos. Era como mármol aguardando al escultor, como la paleta aguardando al pintor (CLARKE apud BENAVIDES, 2016, p. 119).
Nesse contexto, o Novo Jornalismo significa uma possibilidade de
profundas modificações na maneira de fazer jornalismo, rejeitando a imperante
objetividade que circulava na maioria dos meios naquele momento. Entretanto, 36
A expressão “Novo Jornalismo” foi rebatizada em 1984 como “Jornalismo Literário” por Norman Sims, professor de jornalismo na Universidade de Massachusetts.
89
alguns anos antes da publicação da obra de Capote, surgiu na Argentina
Operación Masacre (1957), de Rodolfo Walsh, que se adiantava ao romance
de não ficção, com todas as características que haviam dado lugar de destaque
aos norte-americanos. Walsh tomou conhecimento do fuzilamento clandestino
de civis num terreno abandonado no subúrbio de Buenos Aires. Seis meses
depois do fato, um informante lhe disse que havia sobreviventes. A partir daí,
ele iniciou uma investigação, e os depoimentos colhidos seriam a base de sua
obra.
Além da herança da escrita dos modernistas, das técnicas estruturais
dos textos sem ficção, da narrativa do boom latino-americano e do Novo
Jornalismo, é pertinente destacar que a crônica atual se desenvolveu em um
contexto conturbado, coincidindo com ditaduras militares em diversos países,
como Argentina, Uruguai, Guatemala, Honduras, Brasil, El Salvador e Chile,
além da chamada “ditadura perfeita”37 estabelecida no México. Deste modo, a
crônica:
es asumida, en un contexto convulso, entre el duelo por los desaparecidos y la irrupción del neoliberalismo, entre la muerte de la revolución y el nuevo imaginario global, entre el fin de la Ciudad Letrada y la transformación de Buenos Aires, Lima, Caracas o México D. F. en megalópolis difusas. Una posmodernidad herida (CARRIÓN, 2012, p.34).
Na busca de características da crônica atual, Jorge Carrión retrocede
ainda mais, pois acredita que a estrutura desse gênero, pelo menos como se
apresenta na atualidade, surgiu com Relato de un naufrago (1955), de Gabriel
García Márquez. Essa obra, publicada dois anos antes da de Walsh, escrita em
primeira pessoa, tem um vitalismo tão profundo que parece ter o próprio
protagonista vivido e escrito ele mesmo esta história, e acrescenta que:
37
Mario Vargas Llosa, em visita ao México em 1990, em seu discurso diz “Um partido que é inamovível, um partido que concede espaço à crítica na medida em que esta lhe serve, porque confirma que é um país democrático, mas suprime por todos os meios, inclusive os piores, aquela crítica que de alguma maneira põe em perigo sua permanência no poder” (VARGAS LLOSA apud FUSER, 1995, p. 14). Em Safari accidental, Villoro parafraseando o escritor peruano comenta que México passou da ditadura perfeita a caricatura perfeita (VILLORO, 2005a, p. 46).
90
Hay que leer, por tanto, la llegada del periodismo narrativo latino-americano como la vanguardia silenciosa o el prólogo discreto a lo que después se llamará New Journalism. Porque la mayoría de las grandes crónicas de Truman Capote, Norman Mailer, Gay Talese o Tom Wolfe comienzan a ser publicadas en los años 60. Lo que diferencia a éstos de sus colegas sudamericanos es la conciencia de autoría y un programa estético respaldado por la industria” (CARRIÓN, 2012, p.24).
A consciência de se estar diante do novo e o apoio da indústria cultural
são relevantes para a expansão do Novo Jornalismo, pois não havia na
América Latina naquele momento jornais e revistas que pudessem competir
simbolicamente com The New York Times (1851), Esquire (1933), e Rolling
Stone (1967). No entanto, é importante destacar os esforços de Sur (1931) na
Argentina, Casa de las Américas (1960) em Cuba, Marcha (1939) no Uruguai e
as mexicanas Excélsior (1917), Vuelta (1976). Esses meios constituem um
lugar identitário na afirmação da consciência crítica latino-americana, e seu
valor estético-social ocupou muitas vezes o lugar dos livros.
Cada estudioso ou crítico acrescentará uma obra e um autor na
tendência de misturar técnicas jornalísticas e literárias. Inclusive, não se pode
esquecer, como comentado na parte anterior, que já se desenvolvia essa
técnica no final do XIX entre escritores latino-americanos, pois, como comenta
com acidez Caparrós:
El Nuevo Periodismo, queda dicho, fue la etiqueta que se inventaron unos cuantos escritores norteamericanos a fines de los cincuenta, principios de los sesenta, para definir una práctica que, sin ser nueva, ellos estaban renovando: usar herramientas de otros géneros literarios para contar la realidad (CAPARRÓS, 2015, p. 481).
O objetivo é tentar demonstrar de que técnicas e procedimentos se
alimenta o ornitorrinco de Villoro. As obras de García Márquez, Walsh e
Capote, embora tenham propósitos dissímiles, mudaram a maneira tradicional
de conceber o jornalismo, mostrando um caminho do chamado Novo
Jornalismo. Esses autores, a partir de investigações sérias e bem elaboradas,
serviram-se de recursos literários, etnográficos e reportagens investigativas
para narrar fatos reais. No entanto, como destaca Caparrós:
91
El procedimiento [usar ferramentas de outros gêneros literários] fue fecundo; fue curioso que a partir de ese momento, casi todos dejáramos de usar el procedimiento y siguiéramos usando los resultados que ese procedimiento había tenido entonces. Hubo excepciones, por supuesto: pienso en Pedro Lemebel, en María Moreno, en Juan Villoro (CAPARRÓS, 2015, pp. 481-482).
Na crônica villoriana notam-se alguns traços de influências de recursos
utilizados no Novo Jornalismo, que, segundo Wolfe, são quatro: a construção
cena a cena, o registro do diálogo completo, o uso do ponto de vista da terceira
pessoa e a atenção especial ao status da vida do personagem (WOLFE, 1998,
pp.48-49). Notam-se, também, algumas técnicas narrativas da prosa dos
escritores do boom mencionados anteriormente. Villoro, porém, como comenta
Caparrós, procura usar o procedimento, a técnica usada por esses escritores, e
não a cópia da prosa deles em equilíbrio com outras práticas, incluindo temas
próprios, massivos, populares e em processo de legitimação via palavra
escrita: as histórias em quadrinhos, o futebol e o rock. Isso vai modificando a
prosa do autor e caracterizando uma nova escrita. Não se trata de uma colcha
de retalhos, mas de uma escrita harmônica.
Neste amplo cenário de técnicas e influências, três escritores
mexicanos: Elena Poniatowska, José Emilio Pacheco e Carlos Monsiváis são
importantes para entender a prosa de Villoro e, certamente, contribuirão para a
análise das crônicas do autor.
O resgate de vozes anônimas daqueles que não ocuparam lugar de
destaque na imprensa é uma das marcas da crônica a partir dos sessenta, que
adquiriram um caráter mais testemunhal devido ao período de intensa
repressão. Essa é a principal característica das crônicas de Elena
Poniatowska, que inicia nesse gênero com Todo empezó en el domingo (1963)
e que no Encuentro nuevos cronistas de Indias, em 2012, assegura que
La crónica en América Latina responde a una necesidad: manifestar lo oculto, denunciar lo indecible, observar lo que nadie quiere ver, escribir la historia de quienes aparentemente no la tienen, de los que no cuentan con la menor oportunidad de hacerse oír. La crónica refleja más que ningún otro género los problemas sociales, la corrupción de un país, la situación de los olvidados de siempre (PONIATOWSKA, 2012, p.1).
92
Poniatowska não somente recria a linguagem da vida cotidiana, mas a
transforma em uma polifonia de vozes. Ela utiliza o testemunho para enfrentar
o status quo da sociedade mexicana, inclusive com motivos políticos, como se
observa em La noche de Tlatelolco: testimonios de la historia oral (1971), que
é, em sentido estrito, uma reportagem-colagem, pois recolhe uma série de
testemunhos contra a matança estudantil e também a favor dela ocorrida em
1968 durante o governo do PRI; e Fuerte es el silencio (1980), que trata do
relato da fundação de uma colônia popular no estado de Morelos e a história de
seu líder, Güero Medrano; e Nada, nadie: las voces del temblor (1988), que
gira em torno dos efeitos do terremoto ocorrido em 1985 e a ineficácia do
governo, ainda do PRI, para atender a população depois da catástrofe. Tanto o
massacre quanto o terremoto são temas tratados pelos textos de Juan Villoro,
nos quais se pode observar a polifonia de vozes utilizada por Poniatowska.
Enrique Krauze, em homenagem póstuma a José Emilio Pacheco,
menciona os principais temas de sua obra poética, ensaística e cronística: “la
pesadumbre, la melancolía, la desesperanza, el desconsuelo, el paso
implacable del tempo” (KRAUZE, 2014, p.1). Pacheco, considerado por seus
críticos como reservado e prudente, não estava, no entanto, preso a uma torre
de marfim, pois emitia sua opinião crítica da história mexicana e sobre o
espaço urbano, cuja “visão apocalíptica se expressa em toda sua obra” (SILVA
JÚNIOR, 2010, p.156). Ele praticou vários gêneros com precisão e alcançou
com seus textos não somente um público especializado senão o comum. Suas
crônicas expressam anedotas, biografias, episódios, cenas da vida cotidiana
mexicana e universal, pois “renueva la tradición de la crónica literaria”
(MONSIVÁIS, 2010, p. 113). A coluna “Inventario38”, na qual Pacheco publicou
seus textos entre 1973 a 1976, no jornal Excélsior e depois de 1976 até o seu
falecimento em 2014, na revista Proceso, é considerada por Villoro como um
meio que contribuiu para a sua formação e de sua geração (VILLORO apud
PALAPA QUIJAS, 2017). Além da visão apocalíptica percebida em diversas
crônicas e ensaios de Villoro, ele privilegia também a meditação subjetiva de
38
Os textos publicados nessa coluna compõem uma antologia que reúne 41 anos de publicações de José Emilio Pacheco. Publicada em três tomos: Inventario I. (1973-1983), Inventario II. (1984-1992) e Inventario III. (1993-2014).
93
Pacheco, pois em seus textos “hay siempre alguien que recuerda”
(RUISÁNCHEZ & ZAVALA, 2011, p.13), alguém que ativa esses procedimentos
de memória. Afinal, como disse Villoro em entrevista certa vez, lembrar é um
dos grandes compromissos da literatura.
Em diversos escritores mencionados ao longo dessa pesquisa, podem-
se encontrar referências na prosa cronística de Villoro. Aquele que mais o
influenciou, porém, foi Carlos Monsiváis. Expressando uma forte resistência à
cultura dominante, os temas populares tornaram-se presentes através dos
fatos políticos e dos acontecimentos significativos do último quarto do século
XX, desde as lutas sociais até os espetáculos de massa, mesclando a
literatura, o cinema e a arte em geral. A respeito dessa referência, comenta
Ruisánchez & Zavala “Villoro lee al cronista Monsiváis no sólo como un
renovador de su género, sino como un precursor de la narrativa de las
generaciones posteriores” (RUISÁNCHEZ & ZAVALA, 2011, p.12).
A ironia, a sátira, a paródia, o humor, o estilo sentencioso e aforístico
são características da obra de Monsiváis e, através desses elementos, ele deu
voz à classe média emergente de Los de abajo de Azuela e a Los olvidados de
Bruñel. Em suas crônicas, estão os seres marginalizados da sociedade
mexicana. Não se trata, porém, de um olhar de miserabilidade, apenas dando
voz aos que não têm, mas de uma preocupação cristalizada em seus textos,
que, a partir do movimento estudantil, entende a crônica como uma
necessidade coletiva, a consciência crítica de uma geração. Egan insiste que
“Esa generación [a de Monsiváis e Poniatowska] se sintió, y se siente,
moralmente obligada a decir la verdad sobre las mentiras que el gobierno
mexicano defendería hasta el punto de torturar y “desaparecer” a ciudadanos
mexicanos” (EGAN, 2004, p.156). A esta reflexão de Egan acrescenta-se que,
não somente essa, mas as posteriores, aqueles que não participaram do
movimento, porque eram muito jovens, também se sentem convocados a
testemunhar através de seus textos, como declara constantemente Juan
Villoro.
Graciela Falbo, na introdução do livro Tras las huellas de una escritura
en tránsito: la crónica contemporánea en América Latina interroga “¿Es posible
una caracterización de la crónica como narrativa latinoamericana?” (FALBO,
94
2007, p.11), e utilizando como exemplo o escritor Gabriel García Márquez,
menciona que, segundo este, recorrer à crônica é necessário se o que se quer
é dar conta de uma realidade complexa. Em um mundo midiático como o atual,
onde os formatos narrativos respondem a critérios de hiperinformação,
diversidade e velocidade dos meios e, portanto, uma padronização de fórmulas
narrativas, é importante perceber na crônica uma escrita que não se deixa
reduzir, pois ela é capaz de atravessar fronteiras de gênero, sem por isso
deixar de ser ela mesma. Não é uma questão de se instalar uma ideia de
gênero salvador, ou tábua de toque do jornalismo e/ou da literatura, mas é
preciso refletir de maneira crítica, como tem ocorrido, não só no meio
acadêmico, mas também entre os cronistas que escrevem sobre sua prática.
Daí a necessidade de buscar uma maneira de tentar entender esse gênero que
avança em grandes tiragens de livros e prêmios, mas conserva um tom
contestatário, heterotópico e transgressor. Diversos autores e estudiosos
ressaltaram em seus textos o preconceito em relação à crônica, destacando,
inclusive, que ela seria uma maneira pouco prestigiosa de se ganhar o
sustento.
A questão financeira aparece em Los once de la tribu e na primeira
crônica de Safari accidental “Aún hay jefes de redacción que ofrecen más
posteridad que dinero, pero quienes vivimos del oficio podemos al menos
someternos a un criterio agrícola: es un negocio de temporal, pero algo se
cosecha” (VILLORO, 2005a, p.11). Ao analisar a figura do cronista, Villoro o
localiza em uma encruzilhada entre a arte e o capital, destacando o seu valor
no espaço narrativo ficcional e a necessidade material da vida cotidiana.
Carlos Monsiváis em “De la santa doctrina al espítitu público: sobre las
funciones de la crónica en México”, publicado em 1987, menciona o
desprestigio da crônica diante de gêneros como o romance, o conto e a poesia.
Nesse mesmo texto, menciona que é recente a aceitação da qualidade literária
da crônica da conquista e questiona:
¿Quien hace periodismo pudiendo escribir cuentos y novelas? El auge de la narrativa provoca, una vez más, en el medio cultural, la arremetida contra el periodismo, “enemigo de la promesa”. Ante el
95
prestigio de la ficción, la crónica se extravía en la nostalgia profesional” (MONSIVÁIS, 1987, p. 770).
Nas primeiras páginas da densa obra de Caparrós, denominada
Lacrónica39 (2015), ele menciona o descrédito do gênero na Argentina nos
anos finais da década de 1980. Em 1991, inaugura sua seção no jornal
Página/30, o qual denomina “Crónicas de fin de siglo”, e ressalta que “En esos
días, en Argentina, nadie hablaba de “crónica”: no era una palabra de nuestro
repertorio. O sí, pero decía otras cosas. La palabra “crónica” no tenía ningún
prestigio en el mundito periodístico argentino” (CAPARRÓS, 2015, p.21).
Inclusive, destaca que havia um jornal, Crónica, que, durante muitos anos,
ocupou o lugar de imprensa sensacionalista. “Crónica era un tabloide en una
época en que solo los diarios populares lo eran; solía tener un solo título
grande en la tapa y alguna foto más o menos escabrosa. Cuando había un
crimen importante […] sus ventas se disparaban” (CAPARRÓS, 2015, p.21).
Clarice Lispector, cronista do Jornal do Brasil na década de sessenta,
expôs constantemente as dificuldades que enfrentava com a escrita, como se
pode observar na crônica “O grito”: “Sei que o que escrevo aqui não se pode
chamar de crônica nem de coluna nem de artigo. Mas sei que hoje é um grito.
Um grito! (LISPECTOR, 1984, p. 124). Ela revelou também o enfrentamento
com os elementos que compunham o gênero em “Como se escreve": “Vamos
falar a verdade: isto aqui não é crônica coisa nenhuma. Isto é apenas. Não
entra em gêneros. Gêneros não me interessam mais” (LISPECTOR, 1984,
p.36).
Como se pode observar, muitos escritores abordaram em seus textos
discussões em relação ao descrédito destinado a esse gênero. Rotker comenta
a respeito do pouco prestígio das crônicas dos modernistas e menciona que
isso ocorreu devido à atenção dada à poesia e também à ideia de arte e
estética serem vistas como se tivessem valores absolutos, quando, na verdade,
estão distante disso, pois dependem de convenções aceitas pela sociedade
num determinado momento.
39
Caparrós unificou tudo em uma só palavra “lacrónica”, em sua obra de mesmo título.
96
É importante escavar, observar de outros ângulos e ampliar territórios. A
marginalização da crônica é devida também a sua condição de gênero híbrido,
com a impossibilidade de situá-la dentro de um campo concreto, como
literatura ou jornalismo, como se os campos estivessem radicalmente opostos
ou separados. No entanto, não se pode negar que, nos últimos anos, a crônica
adquiriu visibilidade com congressos, prêmios, festivais, antologias e revistas
especializadas, penetrando, inclusive, nas academias, fato que não era comum
até a década de oitenta do século passado.
Não cabe dúvida de que a economia da crônica se estende cada vez
mais, levando a alguns questionamentos: há um boom da crônica nesses
primeiros anos do século XXI e, se isso ocorre, qual é o motivo? Há um número
expressivo de crônicas e escritores dedicados a esse gênero, e isso promove
um movimento no qual cabe uma análise mais cuidadosa e menos reducionista
a um termo. É complicado comparar esse momento a um novo auge das letras
latino-americanas, ainda que com matizes diferentes, pois, se o boom dos anos
sessenta e setenta tratava de explicar a tensa realidade da América Latina
através da ficção, nos días atuais, “la crónica se impone como el género que
mejor explica la realidad, que, por otra parte, no ha dejado de volverse más
compleja” (BONET, 2012, p.1). A cronista Leila Guerriero traça um marco ao
qual detecta o surgimento da crônica como se encontra na atualidade:
hubo un tiempo en que nada de lo que existe existía. Un tiempo —no tan remoto: 1996, 1997— en el que no existían los llamados “cronistas latinoamericanos” (ni revistas que los publicaran, ni antologías que los antologaran) y en el que la palabra “crónica” se usaba, en los países de América Latina, para mentar las más diversas cosas —los despachos urgentes, las notas policiales, las columnas—, pero en pocos o en ninguno designaba lo que hoy se conoce como tal: historias de no ficción que requieren largos trabajos de campo y que se narran utilizando recursos formales de la literatura de ficción (GUERRIERO, 2012a, p.1).
O período mencionado por Guerriero (2012a) trata de meados dos
noventa, quando em Cartagena de Índias surge a Fundación Nuevo Periodismo
Iberoamericano (FNPI)40, liderado por Gabriel García Márquez, cujo objetivo é
melhorar a prática jornalística através de oficinas, debates, congressos. Ele
40
A FNPI foi fundada em 1994 por García Márquez e um grupo de entusiastas, entre eles Jaime Abello, Tomás Eloy Martínez, Carlos Monsiváis e Alma Guillermoprieto.
97
organizou, em 2001, a primeira edição do Premio Cemex-FNPI, que procurou
dar visibilidade à produção de crônicas na região, acabando por se torna um
incentivador do gênero. Além da FNPI e das revistas como Gatopardo, Etiqueta
Negra, Malpensante, para citar alguns exemplos, outros meios contribuem para
a expansão, debate e visibilidade da crônica na atualidade: o Premio Las
Nuevas Plumas, instaurada em 2010 pela Universidad de Guadalajara e a
Escuela de Periodismo Portátil; além dos meios eletrônicos: El Faro de El
Salvador, Plaza Pública de Guatemala, Periodistas de a Pie no México e a
revista do norte argentino Tucumán Zeta41.
A FNPI é importante para a crônica contemporânea porque tem
impulsionado sua evolução, e não sua mumificação, pois entende que o maior
desafio do gênero é construir uma narrativa sintonizada com a época atual,
fato, a princípio, inclusive, intrínseco ao gênero, já que se observava nele uma
maior experimentação da linguagem, além da mistura com outros gêneros e
demais estilos.
A expansão da crônica também pode ser percebida no cenário não
somente latino-americano, mas mundial, com o Prêmio Miguel de Cervantes
2013 à cronista e romancista Elena Poniatowska e o Nobel de Literatura 2015 à
bielorrussa Svetlana Aleksandrovna Aleksiévitch, a primeira cronista a ganhar
esse prêmio. No entanto, considerar esse momento como o auge da crônica,
principalmente na Hispano-américa, é relativo, pois tem que se levar em
consideração situações como a tiragem, o mercado e o espaço para a
publicação, e não somente antologias e número de cronistas. O editor da
Revista Etiqueta Negra e ganhador do Premio Las Plumas de 2011, Eliezer
Budasoff, destaca que, mesmo nos dias atuais, “nadie puede vivir
exclusivamente de escribir crónicas. Yo siempre hacía montón de cosas […].
Incluso los grandes cronistas, como Alberto Salcedo Ramos, hacen lo mismo”
(BUDASOFF apud SZADY, 2015, 176). Leila Guerriero também questiona o
rótulo de boom e, diz:
41
É importante lembrar que Tomás Eloy Martínez é tucumano. Essa revista tem como proposta produzir crônicas em Tucumán por tucumanos.
98
Es raro, entonces, que se hable, como se habla, del auge de la crónica […] Y sin embargo, sin medios donde publicarla, sin medios dispuestos a pagarla y sin editores dispuestos a darles a los periodistas el tiempo necesario para escribirla, se habla de un auge arrasador de la crónica latinoamericana (GUERRIERO, 2012b, p. 620).
Quem financia a um ornitorrinco? Questiona Pablo de Llano em um
artigo sobre o Encuentro de Nuevos Cronistas de Indias 2, patrocinado pela
FNPI, em 2012 na Cidade do México, pois se consegue com certa facilidade
organizar um seminário, um congresso ou um prêmio sobre crônica, porém “Es
mucho más difícil que el ornitorrinco encuentre un río donde nadar” (VILLORO,
2011a, p. 23). A situação das principais revistas latino-americanas dedicadas a
este gênero e que surgiram na década de noventa e os primeiros de dois mil, é
bastante delicada: Etiqueta Negra (2002) é sem dúvida uma revista
extraordinária, que faz um trabalho de redação heroico graças a Julio
Villanueva Chang e à solidariedade de muitos jornalistas, inclusive Villoro. A
revista colombiana Soho (1999) é um híbrido curioso entre mulheres nuas com
composição de crônicas e outros gêneros, como conto, artigo e ensaio.
Gatopardo (2000) inicia oferecendo um prêmio para a melhor crônica, porém
não pôde manter. Malpensante (1996) e Anfibia (2012) somente na internet.
A sede física é certamente menos importante que o espaço cosmopolita
para as publicações, além de não limitar o texto em caracteres. Villoro, em
entrevista, quando questionado sobre se é possível pensar no auge de
publicação de crônicas devido a quantidade de revistas e meios, responde:
Creo que el prestigio de la crónica es mucho mayor a la posibilidad de ejercerla. Hoy es mucho más fácil hacer un seminario de crónica, participar en un premio de crónica, una antología de crónicas, que publicar crónicas en los periódicos. Hay algunos espacios pero no son suficientes. Tampoco hay una costumbre de que se asignen crónicas regularmente (VILLORO apud BENAVIDES, 2014, p. 4).
A falta de espaço para publicação certamente inviabiliza o
reconhecimento de auge do gênero. Outra questão que também aparece nessa
entrevista é a persistência no vício de denominar crônica a quase todas as
manifestações de jornalismo literário, pois muitos escritores estiveram e ainda
estão em ambos os lados. Soma-se a isso também o fato de que muitos
99
críticos na América Latina e na Espanha lançaram mão da etiqueta “jornalismo
narrativo”. Nomenclatura complexa, uma vez que boa parte do jornalismo é
narrativo, ou seja, “llamar periodismo narrativo a las nuevas tendencias
creativas es reducir la riqueza y hablar con poca propiedad, ya que narrativo
vendría a ser todo tipo de periodismo (CHILLÓN apud BENAVIDES, 2015a,
p.13).
Todas as revistas mencionadas no trecho destacado são dedicadas à
crônica e têm tido dificuldades para permanecer no mercado. É importante
relembrar que é recente o aparecimento de uma quantidade expressiva de
revistas especializadas na publicação desse gênero. No entanto, alguns
estudiosos, como: Rogelio VIllarreal acredita que “el llamado boom es un tanto
artificioso y con fines comerciales, más un fenómeno de librería que
periodístico” (VILLARREAL, 2013, p. 1) e também Patricio Fernández (2013),
quando destaca que “El boom de la crónica es, a las finales, un título
comercial” (FERNÁNDEZ, 2013, p.2), ou ainda Sergio González Rodríguez
quando afirma “No creo que un par de antologías de cronistas publicadas en
tiempos recientes configuren un boom: la crónica ha estado y estará vigente al
margen de la atención de una o dos editoriales españolas” (GONZÁLEZ
RODRÍGUEZ apud TIRZO, 2013, p.2). Para esses e muitos outros autores, o
auge da crônica é uma estratégia de mercado.
Por outro lado, há àqueles como: Jaramillo Agudelo, Francisco Sierra
Caballero e a pesquisadora argentina Alicia Montes, que sustentam ter o auge
do gênero ocorrido a partir de dois mil, pois “Una serie de textos que fueron
publicados desde comienzos del año 2000, fecha a partir de la que el auge de
la crónica se hace más intenso” (MONTES, 2009, p. 4). Segundo ela, sem
eliminar seu contato com o jornalismo a crônica havia passado a ocupar um
lugar central na literatura. A fronteira tênue do gênero seria uma espécie de
membrana que filtra, pois o que está fora pode passar a estar dentro. Com
isso, Montes levanta uma pertinente preocupação de que, ao situar a crônica
no centro e não nas margens, pode acabar provocando no mercado, sempre
ansioso por novos produtos, uma estandardização de discursos, uma
aproximação perigosa da lógica dos meios e, por consequência, a eliminação
de seu caráter transgressor:
100
la crónica, en tanto género contradictorio y proteico, tiene una vertiente normalizada que se somete a las demandas del mercado, siempre ansioso de productos nuevos y excitantes. En este tipo de escritura se despolitiza estetizando su carácter transgresor con el barniz de la nostalgia por el pasado, y construye un sistema de representación Kitsch y conformista, pródigo en estilizaciones y estereotipos consumibles sobre la vida cotidiana, las modas, lo raro, lo marginal o lo traumático (MONTES, 2009, pp.3-4).
No entanto, Montes reconhece que, apesar do que chama de lado
“oportunista”, a crônica é “un género que sin embargo, aún respondiendo a las
demandas del mercado editorial, no abandona su tono testimonial” (MONTES,
2009, p.4), comprometido, pois, como afirma mais adiante “si bien es verdad
que una de las condiciones de su actual centralidad es el gusto que demuestra
por la erosión de límites y la transgresión, como signo de combatividad política
y de creatividad en el terreno de la literatura (MONTES, 2009, p.5).
Há um número considerável de publicações, prêmios, oficinas e obras
desse gênero, porém isso não é suficiente para determinar sua expansão. É
certo que há uma ideia, uma febre quase generalizada e uma atitude que tem
atraído escritores para a crônica como para um esporte da moda. No entanto,
talvez fosse melhor pensar que se trata da (re) descoberta de um gênero que
ocupa um espaço numa escala de longo processo. Tratando-se do México,
então, seria possível levantar a hipótese que se inicia nos anos finais do século
dezenove e atravessa todo o século passado, com a influência de diversos
gêneros e cronistas comprometidos, que viram na crônica seu valor literário,
uma oportunidade de posicionamento político e não somente um trampolim
para a ficção, até se tornar na atualidade o que se está denominando na última
década como o boom da crônica. Ou ainda, talvez a reflexão mais pertinente
seja a de Juan Pablo Meneses42, que rememorando a José Donoso, diz:
la existencia del boom latinoamericano de los sesenta se debió, más que nada, a todos aquellos que trataron de negarlo. Con el boom de la crónica en América Latina pasa igual, en los últimos años todos lo niegan. Tanto se ha negado que ya parece real. Aunque esa realidad sea un presente donde se publican pocos libros y los medios llevan más notas sobre lo que es la crónica, que crónicas (MENESES apud M.RODRÍGUEZ, 2015, p. 2).
42
Juan Pablo Meneses – escritor e cronista chileno, autor de Equipaje de mano (2003); La vida de una vaca (2008); Niños futbolistas (2013); também é fundador da Escuela de Periodismo Portátil.
101
É difícil imaginar que se está diante do ápice da publicação desse
gênero e encontrar obstáculos para publicá-la. Juan Villoro menciona a
dificuldade de se dedicar “Son pocos los escritores que, desde un principio,
deciden jugar todas sus cartas a la crónica” (VILLORO, 2005a, p.11).
Pensamento que se coaduna com Salcedo Ramos “¿cuántos pueden darse el
lujo de sobrevivir económicamente gracias al oficio de contar historias? Pocos,
en realidad. Creo que caben en los dedos de una mano y sobran dedos”
(SALCEDO RAMOS, 2013, p. 2). É complicado dedicar-se exclusivamente à
crônica, mesmo com a notoriedade atual, como segue mencionando Villoro:
Hay una inflación intelectual del género de la crónica, en el sentido de que cada vez son más frecuentes los encuentros de cronistas, los talleres, los premios; cada vez adquiere más prestigio la crónica. Tenemos que tener cuidado con esto. Hay un gran coro en torno a la crónica, pero hay enormes dificultades para ejercerla y pocos espacios. Es como los pájaros exóticos que llaman la atención pero rara vez se ven. Tengo miedo de que esto se convierta en algo que se habla académicamente pero no se ejerza, como una corriente que solo sirve para ser enseñada (VILLORO, 2010c, p.2).
No momento, é cedo ainda para afirmar que se está diante do auge da
crônica, mas pode deixar de ser visto como sintoma de um momento histórico.
Afinal, não se pode negar que o processo iniciado no século passado vem se
consolidando através de revistas especializadas, pesquisas feitas por
estudiosos, além do trabalho da FNPI. Acrescente-se a isso, cronistas
comprometidos, com sensibilidade própria da cultura da época, produzindo
textos de alta qualidade, os quais discutem a realidade e outorgam um lugar
preponderante à crônica. De algum modo, esses acontecimentos têm
contribuído para se formar, ainda que com algum tipo de reserva, um cânone.
Esse gênero tem demonstrado que não há temas específicos e muito
menos fórmulas fixas que administrem ou limitem os discursos textuais. É
considerado um gênero moderno por seu suporte: o jornal; por seu formato,
que vai do papel ao blog; por seu público: a massa e, principalmente, pela
consciência de finitude do tempo instaurado na modernidade.
Que desafios a crônica enfrenta no mundo digital? Esse gênero se
adapta bem às mudanças tecnológicas, pois a sua versatilidade, a
fragmentação e a mistura de informação e emoção contribuem inclusive para a
102
sua evolução. No entanto, esse mesmo avanço tem provocado uma crise nos
jornais impressos, pois os leitores atuais consomem, de forma gratuita, o que
antes deveriam pagar. Villoro enfatiza que “los grandes obstáculos no son
tecnológicos, sino políticos y económicos” (VILLORO apud GARCÉS, 2002,
p.1), pois não são meios altruístas e desinteressados. Além disso, as novas
tecnologias apresentam também o desafio da estandardização da informação,
pois acabam filtrando a realidade. Nesse horizonte ao qual todos têm acesso
em tempo real às mesmas informações, a crônica se coloca nesse meio como
um elemento renovador, pois a sensibilidade, a subjetividade, enfim, de cada
escritor “No es una tarea menor en un mundo encriptado en simulacros”
(VILLORO, 2011a, p. 20), e isso será o diferencial da notícia.
É importante pensar que a rede está propondo outras formas de narrar,
com outros formatos, através de revistas digitais, páginas de descargas, blog,
microblogging e liveblogging43, que surgem também como una alternativa para
as crônicas, como uma demonstração de que é possível usar a linguagem
multimidiática hipertextual, como comenta o jornalista Jorge Tirzo: “Twitter,
Facebook, los blogs y las páginas refuerzan la idea de que el periodismo puede
ser un trabajo individual” (TIRZO, 2013, p. 6). Cronistas relevantes utilizam
esses meios como plataforma para expressar posicionamento político, como
Juan Villoro, ou para publicar textos que não foram publicados em livros ou
revistas. Caparrós publica em seu blog Plamplinas uma longa entrevista (de
aproximadamente quarenta páginas), ou seja, quase um pequeno livro, que fez
a Schoklender, o delinquente que apoiou Las Madres de la Plaza de Mayo,
intitulada “Muerto en vida (Una tarde con Sergio Schoklender)” e disponibiliza
para consulta, transferência e impressão. Na rede não tem limite de espaço e
há certa liberdade ideológica.
Os novos padrões econômicos e o avanço da internet modificaram
também os cronistas clássicos44, formados nas redações dos jornais e revistas,
43
É uma espécie de postagem no blog, mas com a mistura de texto e vídeo, semelhante a televisão ou rádio ao vivo (LEIVA-AGUILERA, 2008). 44
Gabriel García Márquez no discurso “El mejor oficio del mundo” inicia evocando os grupos de jornalistas que andavam sempre juntos, fala de sua formação e comenta que “Hace unos cincuenta años no estaban de moda las escuelas de periodismo. Se aprendía en las salas de redacción, en los talleres de imprenta, en el cafetín de enfrente, en las parrandas de los viernes. Todo el periódico era una fábrica que formaba e informaba sin equívocos, y generaba
103
ou grupos de jornalistas que se reuniam em cafés para conversar sobre os
temas do dia. Na atualidade, a maioria são freelances desde o início, e a
“Internet ha sustituido los cafés y las reuniones, y la Ciudad Letrada es hoy un
proyecto de Ciudad Virtual” (MONSIVÁIS apud AZNÁREZ, 2003, p. 4). Essas
reflexões costumam ocorrer também em oficinas e nas faculdades de
comunicação, através da docência, como oportunidade laboral e reflexão sobre
o ofício.
Esse gênero que compartilha em muitos aspectos, características com o
conto, o ensaio, o teatro, a reportagem e o relato, entre outros, por seu caráter
híbrido, é uma das formas de testemunhar a realidade social contemporânea
da América Latina. Longe de produzir ambiguidade ou imprecisão estilística,
entretanto, esta plasticidade enriquece a crônica, já que permite oscilar entre
discursos diferentes, procurando, ao mesmo tempo, reconciliá-los.
Essa fronteira não é necessariamente entre gêneros distintos, mas entre
literatura e jornalismo, ficção e realidade, o culto e o popular, teoria e história,
arte e artesanato, tecnologia e rusticidade. A narrativa latino-americana é
atravessada por uma multiplicidade de formas, e a crônica tem-se constituído
nesse espaço. O resultado é um gênero flexível e original, com um
considerável público leitor, principalmente na América hispânica:
En el umbral del siglo XXI, cuando han colapsado todos nuestros preconceptos sobre qué es literatura, algunas escrituras exploran nuevos horizontes perceptivos a fin de transgredir la indiferencia y uniformidad que sobrevuela en buena parte del arte actual (BARBABÉ, 2006, p.7).
A crônica, tanto pelas esferas que atravessa como pelas características
de seus produtores, pela temática plural que aborda ou pelos procedimentos de
escrita, parece resistir a definições. Talvez seja por isso que há uma infinidade
de aproximações conceituais que não se apresentam como definitivas ou
conclusivas a respeito da crônica, pois, como comenta Patricio Fernández: “La
mejor manera de matar algo, es definiéndolo” (FERNÁNDEZ, 2013, p.1). Sendo
assim, a seguir se apresentam algumas reflexões, epigramas e metáforas de
opinión dentro de un ambiente de participación que mantenía la moral en su puesto” (GARCÍA MÁRQUEZ, 1996, p.1).
104
cronistas e críticos que evidenciam a condição paradoxal do gênero e que
contribuem para manter o ornitorrinco vivo.
Para Carlos Monsiváis, porém, “literatura bajo la prisa” (MONSIVÁIS,
2010, p. 29), existem outras propostas na tentativa de definir esse gênero
escorregadio e, além de Monsiváis, merecem destaque Luis G. Urbina “una
literatura de pompa de jabón” (GONZÁLEZ URBINA apud MONSIVÁIS, 2010,
p. 48); para Gabriel García Márquez, “ La crónica es un cuento que es verdad”
(GARCÍA MÁRQUEZ apud ETHEL, 2008, p.1); para Antonio Cândido, a sua
perspectiva “é a [...] do simples rés-do-chão” (CÂNDIDO, 1992, p.14); para
Martín Caparrós, “un intento siempre fracasado de atrapar lo fugitivo del tiempo
en que uno vive” (CAPARRÓS, 2015, p.23); para Rossana Reguillo, “testimonio
del desasosiego latinoamericano” (REGUILLO, 2007, p.45); para Pedro
Lemebel, “género bastardo” (LEMEBEL apud LOJO, 2010, p. 1); já Jezreel
Salazar diz que se trata de “un género camaleónico” (SALAZAR, 2006, p.85); a
crítica Graciela Falbo afirma ser “una escritura en tránsito” (FALBO, 2007, p.1);
para Anadeli Bencomo, “escritura transgenérica de la violencia” (BENCOMO,
2007, p.21); para Alberto Salcedo Ramos, “La crónica: el rostro humano de la
noticia” (SALCEDO RAMOS, 2016, p.1) e, finalmente, para o escritor, Juan
Villoro, em Safari accidental (2005a), “la crónica reclama un símbolo más
complejo: el ornitorrinco de la prosa” (VILLORO, 2005a, p.14). Com esse
animal estranho, com características entre a pré-história e a pós-modernidade,
Villoro reivindica um híbrido de reportagem, entrevista, romance, ensaio e
conto como ferramenta para descrever a realidade social no México.
Assim como há uma série de tentativas de conceituação e metáforas a
respeito da crônica, há também uma variedade de nomes que se usam como
sinonímia. Em espanhol, os mais frequentes termos45 são:
periodismo de autor, ficción documental, sociología auxiliar, cronovela, socioliteratura, metaperiodismo, periosía, periodismo cultural, relato de no-ficción, periodismo interpretativo,
45
Vale a pena mencionar também alguns termos em inglês, para demostrar a controvérsia existente: transfiction, faction, transformation journalism, creative nonfiction, documentary narrative as art, apocalyptic documentary, paraliterary journalism, midfiction, metareportage, liminal literature, radical news analysis, higher journalism, journalit, postmodern journalism, parajournalism, participatory journalism, the New Nonfiction y poetic chronicle (EGAN, 2004, p. 142).
105
neocostumbrismo y (el más difícil de manejar) “no (crónica)vela” (EGAN, 2004, p.142).
A linguagem coloquial, a subjetividade, o tom de intimidade com o leitor,
a curta extensão, a ampla temática, o estilo direto e a franqueza dos
comentários contribuíram para a dificuldade de conceituação e até
classificação, mas, como destaca Carlos Drummond de Andrade na crônica O
frívolo cronista, o importante é o equilíbrio:
Pode ser um pé de chinelo, uma pétala de flor, duas conchinhas da praia, o salto de um gafanhoto, uma caricatura, o rebolado da corista, o assobio do rapaz da lavanderia. Pode ser um verso, que não seja épico; uma citação literária isenta de pedantismo ou fingindo de pedante, mas brincando com a erudição; uma receita de doce incomível, em que figurem cantabiles de Haydn misturados com aletria e orvalho da floresta da Tijuca. Pode ser tanta coisa! Sem dosagem certa. Nunca, porém em doses cavalares. Respeitemos e amemos esse nobre animal, evitando o excesso de graça. Até a frivolidade carece ter medida, linha sutil que medeia entre o sorriso e o tédio pelo excesso de tintas ou pela repetição do efeito. Não pretendo fazer aqui a apologia do cronista, em proveito próprio. Reivindico apenas o seu direito ao espaço descompromissado, onde o jogo não visa ao triunfo, à reputação, à medalha; o jogo esgota-se em si, para recomeçar no dia seguinte, sem obrigação de sequência (ANDRADE apud COUTINHO, 1997, p.119).
Esse posicionamento de Andrade em relação à crônica também é
compartilhado por Villoro “El catálogo de influencia puede extenderse y
precisarse hasta competir con el infinito. Usado en exceso, cualquier de esos
recursos resulta letal” (VILLORO, 2005a, p. 14). Ou seja, esse gênero exige
harmonia, seja na composição com outros gêneros, na linguagem, na
abordagem do tema ou na função social de determinado texto.
É importante ressaltar que função social não significa denúncia, pois
houve tempo que o que mais importava era o costumbrismo de Prieto ou
afrancesamento de Gutiérrez Nájera ou estilo de Novo, e há outros mais
incisivos e analíticos, como o de Poniatowska e Monsiváis. Entretanto,
hay cosas que no cambiaron, por ejemplo, los temas que interesaron […]. [que] va de lo social y lo político a lo cultural, de lo histórico a lo presente, de lo nimio a lo trascendente, de lo cotidiano a lo excepcional, de los paisajes naturales a los íntimos, de lo profundo a lo superficial y hasta a lo frívolo, o sea, abarca todo lo que compone la vida […]” (SEFCHOVICH, 2015, p. 5).
106
A crônica abarca variados temas que dizem respeito à vida cotidiana: o
transporte público dos bondes ao metrô; dos bairros periféricos aos grandes
centros urbanos; do bolero ao corrido; do rádio à internet; do mundo elegante e
aristocrático à negligência, indiferença e corrupção governamental. E,
certamente a Cidade do México, é o local exato onde acontece tudo que vale a
pena, como diziam Salvador Novo e Mariano Azuela (SEFCHOVICH, 2015).
Como se observa, os temas permanecem, a função social também, talvez o
que se modifica de uma época à outra é o tipo de explicação que os cronistas
apresentam para as situações sociais que relatam, pois, se os cronistas do
século XIX apoiavam-se em um viés mais moralista e costumbrista, os da
atualidade centram as discussões na desigualdade social. Isso, porém, não
afasta o compromisso desses escritores, principalmente em países com um
alto índice de analfabetismo, como no México. O cronista é, enfim, reflexo de
sua época, e seus textos põem em evidência sua sensibilidade estética e suas
concepções éticas. Deste modo, a crônica tem os limites éticos do jornalismo, o
que não impede uma interpretação subjetiva dos fatos.
Em linhas gerais, há duas vertentes para a crônica mexicana na
atualidade: a que privilegia o conteúdo mais extremo, como a violência urbana,
a delinquência, a prostituição infantil e a guerra contra o tráfico de drogas ou
aquela que aborda a história cotidiana, centrada na vida e na atividade das
pessoas comuns, anônimas. No entanto, isso não significa que haja
posicionamento ético diferente em uma ou em outra, pois, como diz Villoro: “El
secreto de la crónica depende de incluir lo que no es histórico, la vida cotidiana,
casi secreta, que respalda esa noticia” (VILLORO, 2009b, p. 12). O autor de
Safari accidental utiliza mais frequentemente essa segunda vertente, porém
isso não significa que ocorra um distanciamento de temas duros, mas que o
cronista utiliza um viés, o qual, na maioria das vezes, envolve a cultura
divulgada nos meios massivos como uma forma de aproximação com os temas
mais complexos. Percebe-se que seus textos não têm a pretensão de abarcar
a totalidade, pois opta por fragmentos, o que, de certa maneira, está à margem
da sociedade. Fogem dos procedimentos literários estereotipados, clichês
narrativos, procurando discutir, através da literatura e da cultura, versões
107
distintas de fatos, desarticulando uma verdade cristalizada que, muito
frequentemente, circula nos meios massivos mexicanos.
O autor de Los once de la tribu percebe a crônica como um gênero que
se presta para expor o outro lado da lógica do capitalismo e se posiciona
criticamente. Em suas crônicas, em linhas gerais, o social se manifesta de
maneira mais espontânea que nas formas ficcionais, deixando transparecer um
gênero de dimensão diacrônica.
Em Villoro, essa forma de conhecimento avança criticamente na direção
de variados temas, utilizando, com maestria, o formato crônica-ensaio, o qual
aparece também em seus romances e contos. Como cronista, enfrenta o
desafio de equilibrar uma visão ética sem abandonar, entretanto, o caráter
estético do texto, posicionando-se como um jornalista atento, e não somente
como um escritor de informação. Seus textos podem obedecer, então, desde a
um propósito mais informativo, moralizador, até a uma crítica aberta ou mesmo
uma denúncia. De qualquer modo, o autor de Dios es redondo põe em tensão
máxima a capacidade de experimentação da crônica como um processo
discursivo ético-estético-político.
Em sua escrita, pode-se perceber um discurso de cronista que se arma
sobre um cabo de forças aparentemente contraditórias, como um Jano literário:
de um lado, está o desenvolvimento de um caráter irônico, aforístico,
fragmentado, o cultivo artístico da palavra e, do outro, Villoro constrói textos
críticos, mas sem se afastar do compromisso ético diante de fatos políticos,
sociais e culturais, principalmente do México. Percebe-se que essa estrutura se
torna mais fluida pela composição de crônicas cujo tema é a cultura popular a
qual, de certa maneira, transgride a cultura dominante, divulgando e levando à
reflexão aquela outra informação não divulgada pelos meios oficiais; mostrando
que esse tipo de texto é uma forma de resistência política. Como comenta
Salazar: “Al reconocer a la cultura popular como ámbito legítimo para criticar a
la cultura política dominante, el cronista promueve un cambio de signo para
todo aquello que se encuentra en el margen” (SALAZAR, 2005, p.6).
108
2.2.1 Escritores, leitores e mercado cronístico
Escritores
Quando se analisa a crônica, é costume deter-se nas características
formais do gênero, numa tentativa de utilizar os (fluidos) limites ou os limiares
dos gêneros literários ou jornalísticos como caminhos analíticos, com o objetivo
de demonstrar uma constância na definição, para ressaltar possíveis
“transgressões” ou novas significações. No entanto, em meio a essa análise,
deixa-se em segundo plano, na maioria das vezes, um dos elementos
essenciais da crônica: a importância do sujeito cronista. Quem costuma
escrevê-la, enfim?
A crônica já foi produzida por diversos tipos de profissionais, não
necessariamente escritores, como professores, médicos, advogados, ou seja,
pessoas que ocupavam as mais diversas funções e, além disso, simplesmente
escreviam. Afinal, ser escritor puramente profissional é uma atividade recente.
Como ressalta García Canclini, referindo ao Brasil de 1930: “E durante muitas
décadas posteriores, os escritores não puderam viver de literatura, tendo que
trabalhar como docentes, funcionários públicos ou jornalistas [...]” (GARCÍA
CANCLINI, 2008, p. 68). Muitos exemplos podem ser citados, entre eles Jorge
Luis Borges, Octavio Paz, Juan Rulfo e Villoro, inclusive, que foi adido cultural
de embaixada e, na atualidade, ainda é professor. Deste modo, pode-se
afirmar que a crônica contribuiu para a ampliação de um mercado, não
necessariamente de livros, mas de jornais.
No entanto, é notório que ela colaborou também para ampliar o número
de leitores, como responde Darío Jaramillo Agudelo quando questionado sobre
a importância da crônica numa entrevista: “Como material de lectura: la crónica
ha ampliado la frontera de lectores. Crónica lee gente que no acostumbra leer
libros ni ir a las librerías y que llegará a ellas gracias al hábito inculcado por la
crónica” (JARAMILLO AGUDELO apud BARRÓN, 2012, p.1). A crônica,
realmente, havia passado a circular por âmbitos diversificados como uma forma
de reconhecer zonas da vida atual que antes não eram cobertas pela
linguagem literária: seres marginais, seres sem voz, delinquentes de todo tipo,
109
ídolos pop, assassinos e outros que podem ser distinguidos de maneira não
usual.
Como são os novos cronistas latino-americanos? Observa-se na
atualidade a diminuição de escritores com uma grande participação na esfera
pública. No México, pode-se destacar a figura de Carlos Monsiváis, pois ele
representa o enfraquecimento do ideal associado ao “escritor comprometido”
ou o “intelectual revolucionário”. Em sua maioria, não são nem comprometidos
que polemizam ou denunciam desde o campo intelectual, marcando posição
nos editoriais, como escrevia Sartre em 1945, na Revista Les Temps Moderns.
“El escritor tiene una situación en su época; cada palabra suya repercute. Y
cada silencio también” (SARTRE apud LAGO, 2012, p. 65) e nem
correspondem ao perfil revolucionário dos anos sessenta e setenta, quando
muitos formaram parte de uma “intelligentsia politizada” que pensaram em
resolução de conflito através de vias violentas. Ou ainda o escritor que, por
uma escritura documental e testemunhal, denunciava os crimes do poder,
como ocorreu com Rodolfo Wash em Operación Masacre.
No entanto, a partir dos anos oitenta, pode-se destacar que, mesmo não
sendo o “escritor comprometido” ou o “intelectual revolucionário”, os relatos,
principalmente os dos cronistas, têm densidade e propõem um olhar particular,
microscópico e local sobre a realidade, como revela Bernabé (2006):
en los ochenta, frente a la pérdida de ciudadanía de vastos sectores sociales, algunos de ellos comenzaron a articular nuevas estrategias de apropiación cultural promoviendo el rescate de la memoria colectiva y otorgando visibilidad a lo borrado o ignorado de nuestras sociedades. De este modo, las narrativas del último fin de siglo retoman la senda abierta por las experiencias de la literatura de no-ficción en su apelación a una dimensión política que sobrepasa el deseo de testimoniar sobre lo real, lo que se revela en la distancia que establecen con la retórica del realismo y con un verosímil fundado en la ilusión referencial (BERNABÉ, 2006, p. 9).
Os cronistas, muitas vezes, recorrem ao humor, à ironia ou à memória,
tratando sempre de pôr em perigo um mundo administrado pela indiferença,
pela disciplina do consumo e pela esmagadora uniformidade social, pois, nesse
cenário do capitalismo tardio, as crônicas chegam a constituir “un acto de
intervención, en un sentido performativo, una operación de interpelación ética”
110
que actúa e intercede para que se produzca el encuentro entre el lector y
aquello que permanece invisible a primera vista o aquello que no se quiere ver”
(BERNABÉ, 2006, p. 13). Villoro procura narrar sem produzir estereótipos, sem
cair no pauperismo extremo ou no populismo. Ele discute a realidade com as
“armas” da literatura, utilizando as margens e os interstícios, fugindo do lugar
comum, pois entende que a realidade é múltipla, complexa e, talvez por isso
mesmo, recorra, em suas crônicas, a figuras incomuns, como a mulher
barbuda, o pós-apocalipse e o ornitorrinco. Como destaca Carrión: “porque el
deber del periodista sigue siendo el de narrar las realidades candentes e
incómodas” (CARRIÓN, 2012, p.34).
O cronista é escritor ou jornalista? Muitos discutiram esse tema, pois,
devido ao caráter misto da crônica, composta por elementos literários e
jornalísticos, havia-se tornado uma arma de duplo fio, com discussões focadas
na legitimidade de seu valor literário e, inclusive, na tensão de que o cronista
seria escritor ou jornalista. Alejo Carpentier, em 1975, em uma oficina de
Alfredo López no Jornal Granma, disse:
Se suele decir escritor y periodista, o periodista más que escritor o escritor más que periodista. Yo nunca he creído que haya posibilidad de hacer un distingo entre ambas funciones, porque, para mí, el periodista y el escritor se integran en una sola personalidad. […] el periodista es una forma de historiador. Él es el cronista de su tiempo y el que recoge la participación inmediata del acontecimiento [...]. Cuando en el año 2000 alguien escriba una novela que quiera abarcar veinte años, pongamos, de nuestro proceso revolucionario, recurrirá a los periódicos actuales […]. El periodista es el novelista del futuro (CARPENTIER, 1975, p.1).
Assim como Alejo Carpentier (1975), esta pesquisa entende que não há
distinção entre escritores e jornalistas. No entanto, isto não significa que o
historiador ou o romancista também sejam o mesmo, mas que desempenham
modalidades técnicas distintas. Para o estudo da crônica, esta separação não é
frutífera, pois se acredita que não se deve classificar seus produtores em
escritores ou jornalistas, mas incorporar ambos.
Assim como há diversas metáforas para as crônicas, o cronista também
não fica isento dessas aproximações. A escolha geralmente é por seres
estranhos. Miguel Ángel Batenier fala da “teoria do marciano”, ou seja, olhar a
111
realidade com assombro, estranhamento, como se acabasse de aterrizar na
Terra. Boris Muñoz diz que o cronista se parece mais a um morcego, porém um
morcego mutante:
En realidad, los cronistas son los X-Men de la prosa. ¿Por qué? Porque a pesar de ser mamíferos como la mayoría de los animales terrestres -no quiero implicar aquí que la mayoría de los periodistas sean unos animales terrestres, vuela. Volar, en este sentido figurado, significa usar el lenguaje para conferirle a la escritura cierta altivez verbal y un uso de la imaginación que la hacen literaria (MUÑOZ, 2012, p. 630).
Metáforas à parte, o certo é que a crônica, como gênero, exige a
assinatura de seus autores, pois, mesmo que eles usem pseudônimos, ela
concretiza sempre a expressão de uma interpretação pessoal. Muitos autores
utilizaram esse artificio, como Gutiérrez Nájera, que se passava por “El Duque
Job, Perico el de los Palotes, Puck, Junius, M. Can Can, Recamier, El Cura de
Jalatlaco, etcétera” (MONSIVÁIS, 1987, p. 760) ou Clarice Lispector, que
assinava como Tereza Quadros e Helen Palmer. Eles, como muitos outros,
utilizaram largamente esse artifício:
na passagem do século XIX para o XX, foi adotado por muitos escritores que se valiam desse disfarce para ocultar a verdadeira identidade no trabalho que desempenhavam nas redações. Um subterfúgio para o anonimato, explorado por Olavo Bilac, Machado de Assis, Manuel Antônio de Almeida e José de Alencar, entre outros (NUNES, 2010, p.70).
Seja para não sofrer represarias por seus escritos, seja para não
assumir que produzia textos em um gênero desprestigiado pela crítica, muitos
utilizaram essa artimanha. A exigência de um autor é uma relação particular
inerente ao gênero, desde sua relação com a história, passando pela literatura,
até desembocar no jornalismo. O cronista tem sido o sujeito que assina seus
escritos, e isso acrescenta uma responsabilidade, uma identificação do texto
com seu autor, um compromisso individual e um vínculo simbólico entre o
escritor e o leitor. Como menciona Foucault (1992): "hay que entender al autor
como principio de agrupación del discurso, como unidad y origen de sus
significaciones, como foco de su coherencia" (FOUCAULT, 1992, pp. 29-30).
112
Na crônica “Rushdie en Tequila” sobre a visita à cidade de Tequila pelo
escritor Salman Rushdie, enquanto estava forçado a viver no anonimato, por
haver sido condenado por apostasia, devido a sua obra Os versos satânicos,
pelo aiatolá Khomeini, Villoro inicia destacando a responsabilidade que o
escritor tem ao assinar seus textos:
De acuerdo con Foucault, la noción de “autor” surge con la idea de que alguien puede ser castigado. No es el reconocimiento sino la necesidad de encontrar a un responsable lo que explica que se firmen las obras. Salman Ruhdie es la más dramática comprobación de esta teoría (VILLORO, 2005a, p. 211).
Nesse trecho percebe-se a responsabilidade da assinatura de um texto,
pois Rushdie foi perseguido pelo que escreveu em sua obra. Certamente há
autores que optam por usar pseudônimos, porém a crônica é um tipo de texto
que exige assinatura. A crônica e o cronista são elementos indissociáveis, já
que uma crônica anônima seria uma contradição de difícil explicação, posto
que o cronista também está presente no texto e, evidentemente, é parte dele.
Em uma conversa entre escritores, Cristián Alarcón pergunta a Villoro
“¿se ha quebrado todo el prejuicio que veía al escritor como artista y al
periodista como artesano?” (VILLORO y ALARCÓN, 2008c, p. 9) Ele responde
que, nos últimos anos, houve uma valorização dos jornalistas, recordando uma
frase que ouvia de um professor da UNAM, quando se graduava em Sociologia
e que aparece Safari accidental: “estudien, muchachos, o van a acabar de
periodistas! [...] Esto ocurría hacia 1976 […]” (VILLORO, 2005a, p.10). Villoro
relata ainda que parecia o último escalão social: “Lo recuerdo cada vez que
escribo crónicas” (VILLORO y ALARCÓN, 2008c, p. 9).
Essa reflexão também é compartilhada por Caparrós “el cronista, el
escalón más bajo de la escala zoológica; en la Argentina de 1991 decir que uno
hacía crónicas era una especie de chiste, una provocación. O, si caso, referirse
a una tradición casi perdida” (CAPARRÓS, 2015, p.22). Porém isso não
significa que não exista mais preconceito, apenas que há uma redução
significativa, pois, como comenta Salcedo Ramos, tal ainda ocorre na
atualidade, uma vez que, “Para escribir crónicas hay que tener algo de
kamicaze” (SALCEDO RAMOS, 2013, p.2) e, por isso, segue comentando que
113
“Éste no es un género propicio para periodistas aburguesados” (SALCEDO
RAMOS, 2013, p.2). Já nas primeiras páginas de Safari accidental, (2005)
nota-se o tom irônico com que Villoro trata a questão entre jornalistas e
escritores:
La vida está hecha de malentendidos: los solteros y los casados se envidian por razones tristemente imaginarias. Lo mismo ocurre con escritores y periodistas. El fabulador “puro” suele envidiar las energías que el reportero absorbe de la realidad, la forma en que es reconocido por meseros y azafatas […]. Por su parte, el curtido periodista suele admirar el lento calvario de los narradores, entre otras cosas porque nunca se sometería a él (VILLORO, 2005a, p. 9).
Esse parágrafo é o que inicia Safari accidental, no qual Villoro usa a
expressão “malentendidos” para desenvolver uma discussão que demonstra a
complementaridade entre escritores e jornalistas. O “fabulador puro” inveja a
energia que o jornalista absorve da realidade enquanto o “periodista curtido” se
enciúma do tempo para escrever, além do prestígio que os escritores talvez
possam adquirir na posteridade. Mas adiante, num tom anedótico comenta a
relação entre a coroa espanhola e o jornalismo para demonstrar que, na
atualidade, ocorre a valorização da profissão, e diz:
La valorización social del periodismo dista mucho de ser la que tenía mi profesor de Sociología: los reyes ya no buscan princesas sino reporteras, según prueba la corona española. El prejuicio que veía al escritor como artista y al periodista como artesano resulta obsoleto (VILLORO, 2005a, p.13).
No entanto, é importante destacar que ainda há aqueles que veem os
jornalistas “como obrero o albañil y el escritor de ficción como gran arquitecto”
(VILLORO y ALARCÓN, 2008c, p. 9). Villoro, já declarou em entrevistas que,
durante muitos anos, colocava em suas fichas nos hotéis que era jornalista, e
não escritor, por acreditar pretensioso. Tal aparece na crônica “Velocidad
crucero: 850KM/H” em Palmeras de la brisa rápida, obra publicada
originalmente em 1989, diz: “Luego anoté la profesión que usurpo desde hace
años para llenar cuestionarios: “Periodista”. “Escritor” huele a pipa apagada,
apotegmas de dispéptico, edición intonsa, dedo ensalivado, pantuflas rancias”
(VILLORO, 2009a, p.35).
114
Em uma entrevista publicada em 2012, Villoro, entretanto, parece
atualizar a discussão que aparece em Palmeras e diz: “Sin embargo ahora ya
me parecería negarme a mí mismo: he publicado más de quince libros, de
modo que ahora sí pongo “escritor”, ya no me suena pretensioso. Me suena a
una condena” (VILLORO apud CARRANZA, 2012, p.2).
Na maioria dos casos, a crônica é um texto curto narrado em primeira
pessoa, ou seja, o escritor e o leitor estão de certa maneira travando um
diálogo, pois “Escribir en primera persona, entonces, es solo una cuestión de
decencia: dejarlo claro. Cuando lo hace, la crónica toma una posición política
muy fuerte” (CAPARRÓS, 2015, p.141). Isso faz com que o texto tenha uma
visão pessoal de um determinado assunto, deixando transparecer que ela é o
olhar do cronista, seu foco e é onde está a sua lente, reflete Caparrós
La crónica es una mezcla, en proporciones tornadizas, de mirada y escritura. Mirar es central para el cronista – mirar en el sentido fuerte. Mirar y ver se han confundido, ya pocos saben cuál es cuál. Pero entre ver y mirar hay una diferencia radical (CAPARRÓS, 2015, p. 65).
Ver, perceber com os olhos, seria uma primeira acepção, enquanto,
olhar “es dirigir la vista a un objeto. Mirar es la búsqueda, la actitud consciente
y voluntaria de tratar de aprehender lo que hay alrededor – y de aprender. Para
el cronista mirar con toda la fuerza posible es decisivo” (CAPARRÓS, 2015,
p.65). E Villoro olha a realidade com assombro, como se observa no texto
“Cosas que escuché en La Habana”, no qual o autor considera a perplexidade
como um ponto de partida relevante para o cronista que enfrenta a experiência
de estar e narrar a cultura de outro país. “A diferencia del corresponsal
extranjero, que entiende o trata de entender lo que sucede, el cronista de viajes
escribe desde la perplejidad, con la mirada forzosamente distinta del
desinformado: en la sombra, mira lo que sale a la luz” (VILLORO, 2005a,
p.143-144). Como comenta Jon Lee Anderson neste aforismo “Si algo si vuelve
cotidiano, nos olvidamos de los detalles” (ANDERSON apud VILLORO, 2009b,
p.9). Ou seja, a crônica convida a exercitar olhar do que já foi visto, olhar por
outro ângulo, fugir da rotina. Caparrós menciona que ainda persiste o
115
entendimento de que a terceira pessoa indica neutralidade, objetividade,
verdade enquanto a primeira a subjetividade, a manipulação e a mentira:
los grandes medios no están dispuestos a aceptarlo, porque equivaldría a aceptar que sus discursos dependen de sus subjetividades – que no están entregando “la verdad objetiva”. Y siguen, entonces, con su simulación. Para acentuarla insisten en que lo que se escribe en primera persona es una “opinión”; la tercera, en cambio, sería “información. El truco ha sido equiparar objetividad con honestidad y subjetividad con manipulación, con trampa (CAPARRÓS, 2015, p. 141).
As crônicas dos anos finais do século XX não expressam a intenção de
objetividade, imparcialidade e neutralidade. Contrariamente, há uma clara
tomada de posição e de compromisso, tendência detectada por Monsiváis nos
cronistas da geração posterior à sua, na qual está incluída Juan Villoro, de
quem escreve:
Se distinguem por seu atrevimento, por sua linguagem sem censuras, pelo recurso de falar desde um “eu” que anuncia uma reação mais democrática com o leitor sob a premissa: “Sou exatamente igual a você, exceto que eu tenho a palavra” (MONSIVÁIS, 2002, p. 34, tradução minha).
Pensamento compartilhado também por Jaramillo Agudelo, que afirma:
Los cronistas latinoamericanos de hoy encontraron la manera de hacer arte sin necesidad de inventar nada, simplemente contando en primera persona las realidades en las que se sumergen sin urgencia de producir noticias (JARAMILLO AGUDELO, 2012, p.11).
Villoro oscila a narração da maior parte de suas crônicas. Todas as de
Tiempo transcurrido estão em terceira pessoa, enquanto as que compõem
Safari accidental, Los once de la tribu e Dios es redondo variam entre a
primeira pessoa e a terceira. No entanto, é importante destacar que a voz
narrativa da crônica, mesmo estando em terceira pessoa, tem uma
aproximação com o autor, pois “El yo que cuenta lacrónica, cada crónica, es el
cronista y es, por supuesto, otro” (CAPARRÓS, 2015, p. 142). Certamente, o
cronista faz parte da crônica, porém a centralização da discussão não está
focada no eu cronista, mas no tema a ser abordado, já que falar de si mesmo o
tempo todo pode deixar a crônica desinteressante.
116
É importante o posicionamento do cronista, a postura de assumir o risco
e entrar com osso e tudo, como diz Jaramillo Agudelo “es, a la vez la mayor
fortaleza y la mayor debilidad de la crónica como periodismo” (JARAMILLO
AGUDELO, 2012, p.21). Essa característica, porém, é quase obvia, pois ainda
que não anuncie, todo texto está em primeira pessoa. Ou seja, está escrito por
alguém que narra, relata e decide o que será relatado. É preciso convencer o
leitor de que o que se conta é a verdade e não uma das infinitas possibilidades.
É o mesmo que acontece quando alguém enquadra uma foto ou edita um texto.
É possível, então, notar as limitações do cronista para entender o que se
propõe a narrar. E é exatamente o que ocorre na epígrafe de Safari accidental,
pois, como diz o autor: “O ya no entendo lo que está pasando o ya no pasa lo
que estaba entendiento” (MONSIVÁIS apud VILLORO, 2005a, p.7).
É importante frisar que a crônica se concretiza através de uma seleção
muito particular de palavras nas quais o cronista transmite ao leitor a sua visão
de mundo e a sua forma pessoal de entender os acontecimentos que o cercam.
Não é fácil, pois tudo isso é feito a despeito de uma ideologia dos meios que
tratam de impor uma linguagem neutra, sem sujeito e concentrada na terceira
pessoa, como uma marca da suposta objetividade. Como diz Caparrós, não
existe a “Máquina-Periódico” que escreve, pois: “Todo relato es el relato de
alguien: toda descripción de cualquier situación es el recorte que hace quien
describe” (CAPARRÓS, 2015, p.139), no qual não se elimina o ponto de vista
do sujeito que olha. Por isso, é complexa a crítica da subjetividade da crônica
contra a objetividade de textos “puramente jornalísticos”, pois “Llevamos siglos
creyendo que existen relatos semiautomáticos producidos por ese ingenio
fantástico que se llama prensa; convencidos de que la que nos cuenta las
historias es esa entidad colectiva y veraz” (CAPARRÓS, 2015, p.139).
117
Leitores
Suelo preguntarme por qué los editores de diarios y periódicos latino-americanos se empeñan en despreciar a sus lectores. O, mejor, en tratar de deshacerlos: en su desesperación por pelearle espacio a la radio y a la televisión, los editores latinoamericanos suelen pensar medios gráficos para una rara especie que ellos se inventaron: el lector que no lee. Es un problema: un lector se define por leer, y un lector que no lee es un ente confuso
46.
Martín Caparrós
No século XIX, o interesse dos leitores transformou-se no sustento
econômico dos jornais, atraindo prestigiosos escritores que desfilaram pelas
páginas dos diários, retomando a tradição do folhetim através do romance por
entregas e, mais tarde, através das crônicas.
Diversos países latino-americanos registraram na passagem do século
XIX para o XX um baixo número de pessoas alfabetizadas, produzindo,
consequentemente, poucos leitores. Pode-se citar o exemplo do Brasil que,
segundo Renato Ortiz, citado por Néstor García Canclini, diz que “em 1890
havia 84% de analfabetos, 75% em 1920, e, ainda 1940, 57%” (ORTIZ apud
GARCÍA CANCLINI, 2008, p. 68). Certamente esse quadro não é só do Brasil,
mas se estende a outros países latino-americanos, inclusive o México. Em
1932, diz Monsiváis: “70 por ciento de la población mexicana es analfabeta”
(MONSIVÁIS, 2010, p. 85). Porém, se a comparação for estabelecida com
países europeus no mesmo período, encontra-se: “Na França, o índice de
alfabetização, que era de 30% no Antigo Regime, sobe para 90% em 1890. A
Inglaterra, no início do século XX, tinha 97% de alfabetizados” (GARCÍA
CANCLINI, 2008, p. 68).
A partir da segunda metade do século XX, as diversas políticas públicas
reduziram consideravelmente essa situação e, nos dias atuais, a maioria dos
países que compõem a América Latina apresenta uma média de 10% de
46
Fragmento de “Por la crónica”, de Martín Caparrós. En Actas del IV Congreso de la Lengua Española. Cartagena en marzo de 2007. Disponível em: http://congresosdelalengua.es/cartagena/ponencias/seccion_1/13/caparros_martin.htm Último acesso em: 12.07.2015.
118
pessoas não alfabetizadas47. Número alto, certamente, mas, levando em
consideração o público que consome crônicas, romances e que leem os
jornais, parece que a evolução do século passado tem sido lenta. Isso se
reflete na epígrafe citada, na qual Caparrós (2007) trata dos leitores que não
leem, fazendo com que os editores preencham os diários de fotos, quadros e
desenhos. Villoro, quando questionado em entrevista sobre a tendência dos
jornais de publicar cada vez mais fotos em detrimento dos textos, responde:
El rediseño general de los periódicos responde a una inseguridad respecto a los propios recursos del periodismo. Ante la enorme vigencia que están teniendo las plataformas digitales, el periodismo impreso pierde confianza en sí mismo y trata de imitar a las páginas web. Es decir, trata de publicar más imágenes con información más breve. Yo creo que se ha perdido un poco la brújula (VILLORO apud RICARDO, 2014, p.1).
Gabriel Zaid em seu ensaio “La lectura como fracaso del sistema
educativo” (2006) trata dos leitores mexicanos dos primeiros anos do século
XXI e destaca que o gosto pela leitura no país raramente vem de casa, sendo
normalmente adquirido na escola e na universidade. Ele ressalta também os
avanços e os investimentos governamentais que contribuíram com o aumento
do número de leitores. No entanto, os esforços não têm sido suficientes, pois
“según la Encuesta Nacional de Lectura del Consejo Nacional para la Cultura y
las Artes […] El 13% dice que jamás ha leído un libro. [...] También un 40%
dice que nunca ha estado en una librería” (ZAID, 2006, p.3). O mais espantoso
desse ensaio é a constatação de que também os universitários leem pouco:
Los entrevistados que han hecho estudios universitarios o de posgrado dieron respuestas todavía más notables. Según la ENIGH 2004, hay 8.8 millones de mexicanos en esa situación privilegiada […]. Pero el 18% (1.6 millones) dice que nunca ha ido a una librería; el 35% (3 millones), que no lee literatura en general; el 23% (2 millones), que no lee libros de ningún tipo; el 40% (3.5 millones), que no lee periódicos; el 48% (4.2 millones), que no lee revistas y el 7% (más de medio millón) que no lee nada: ni libros, ni periódicos, ni revistas (ZAID, 2006, p.4).
47
Esses dados são de 2010 e estão na página do Sistema de Información de Tendencias Educativas en América Latina (SITEL). Em El analfabetismo en América Latina, una deuda social, noviembre de 2010.
119
A situação apresentada pelo ensaio de Zaid (2006) complementa o
quadro descrito por Caparrós (2007), pois se os editores preenchem com
imagem os espaços nos jornais e revistas, talvez seja porque sabem que seus
leitores não leem, sendo a imagem uma forma de disputar espaço com a
televisão. É importante considerar que a leitura de jornais no México ainda é
uma atividade elitista e concentrada na capital, contando nove entre os dez
jornais de maior tiragem no país (SÁNCHEZ RUIZ, 2005, p. 433). No entanto,
acredita-se que é equivocada a ideia de que dá para brigar com os meios
massivos de comunicação utilizando as mesmas armas, já que a arma de um
texto é a sua escrita, nada mais. A magia de uma bela crônica é trazer à luz
algo que, a princípio, não interessa ao leitor “la maravilla en la banalidad”
(CAPARRÓS, 2007, p.3). Como destaca Villoro “No se debe sacrificar la letra
simplemente por la imagen. […] Es como pensar que el periodismo es para los
que no leen. Es un contrasentido. El periodismo debe apostar por sus propios
recursos” (VILLORO apud RICARDO, 2014, p.1). Em todas as épocas
existiram livros para os que liam por exceção ou casualidade. Entretanto,
observa-se que, na atualidade, há uma tendência para fazer circular livros que
devem cativar os que geralmente não leem, porque, é patente, são a maioria.
Parece haver uma confusão por parte, não dos escritores, mas das editoras,
visto colocarem na mesma categoria leitores e clientes.
É uma relação complicada, pois não se pode negar a influência e até
certa facilidade oferecida pelos meios massivos de comunicação e como isso
tem contribuído para a ampliação das imagens e a diminuição das palavras nos
jornais. No entanto, é importante destacar que, mesmo com a expansão das
imagens em jornais e revistas, seja impressa ou por meios eletrônicos, a
crônica tem aumentado consideravelmente o número de publicações e
certamente de leitores. Por que tem aumentado esse número de publicações
de crônicas no México? Certamente não se pode apresentar uma resposta
exata sem uma ampla pesquisa de campo com os leitores e pretensos leitores,
porém é possível apontar alguns fatos que contribuíram para essa expansão.
Villoro, em uma longa entrevista em 1997, aborda as características dos
leitores mexicanos, principalmente os jovens:
120
La crónica mantiene su importancia y ello se debe, según creo, a que la literatura de este género ha ocupado una zona de reflexión sobre el acontecer cotidiano. Quizá por falta de buenos periódicos o buenos medios masivos de comunicación, una gran parte de nuestros problemas políticos y sociales han sido ventilados por los cronistas. [...] El lector mexicano, sobre todo el joven, es alguien sin recursos económicos para comprar libros. De algún modo, los suplementos sustituyen la lectura de libros. Más que informar sobre las novedades editoriales y dar noticias para que el lector vaya a comprar libros o concurra al cine o al teatro o al concierto, los suplementos mexicanos son un punto de llegada y no de partida hacia otras manifestaciones de la cultura. Para muchos lectores, los suplementos son la única posibilidad de conocer literatura (VILLORO apud CUADERNOS HISPANOAMERICANOS, 1997, p.124).
Certamente, os apontamentos nesse trecho servem para pensar a
expansão do texto produzido em crônicas naquele país. Como destaca o autor,
devido à falta de meios confiáveis, os leitores acabaram centralizando nos
cronistas, já que podiam canalizar neles seus poucos recursos econômicos e
estabelecer com eles uma reflexão sobre o cotidiano, que é, afinal, a
característica intrínseca do gênero. Por isso, é possível acrescentar que isso
ocorre também pela maneira menos tensa através da qual os textos
jornalísticos, de forma mais engenhosa e sofisticada, utilizam como ferramenta
diferentes disciplinas, como a sociologia, a psicologia, a antropologia e a
filosofia. Além do mais, o olhar crítico do cronista se funde com a experiência e
com a subjetividade, dando ao texto uma tessitura lúdica, lírica, irônica e,
muitas vezes, transgressora e subversiva.
Jaramillo Agudelo dedica uma parte de sua obra para discutir a
importância da crônica como uma forma de arte. Para ele, esse gênero é uma
arte viva, em expansão, e isso se deve a dois motivos: “el primero es el
respecto por el lector y el segundo es el papel de lo insólito, mejor, del asombro
como ingrediente central de la crónica latinoamericana actual” (JARAMILLO
AGUDELO, 2012, p. 32).
Com relação ao respeito, a tese de Patrícia Trindade Nakagome,
intitulada “A vida e a vida do leitor: um conceito formado no espelho” (2015),
ressalta que “A questão central da tese é o respeito ao leitor e ao outro de
modo geral [...]. Falar em respeito parece comum demais a uma tese [...]. É o
que move a minha escrita, mas parece não ser digno dessa mesma escrita”
(NAKAGOME, 2015, p.17). Certamente, respeitar o leitor não é assunto banal,
121
e muitos autores se preocuparam com ele. Jaramillo Agudelo (2012) acredita
que respeitar o leitor é não o entediar. O cronista Alberto Salcedo Ramos
compartilha com ele essa ideia, pois, quando questionado em entrevista sobre
as regras de ouro da crônica, diz:
La regla de oro número uno es por cortesía de Woody Allen: ‘todos los estilos son buenos, menos el aburrido’. Tú puedes hablar de lo que quieras, desde el Teorema de Pitágoras hasta la caspa del mico que acompaña a Tarzán; puedes escribir sobre lo triste, sobre lo folclórico, sobre lo trágico, sobre el frío, sobre el calor, sobre la levadura del pan francés o sobre la máquina de afeitar de Einstein. El lector te permite lo que sea, incluso que le mientes la madre, incluso que seas soberbio, pero no que lo aburras. A mí me parece que un buen prosista es, en esencia, un seductor, una persona que te atrapa irremediablemente con lo que escribe (SALCEDO RAMOS apud LAFUENTE PORTILLO, 2010, p.1).
O insólito, ou mesmo assombroso, mencionado por Jaramillo Agudelo,
parece por vezes arquétipo. No entanto, é preciso destacar que é no sentido de
busca ao inesperado, ao surpreendente, pois, como diz Salcedo Ramos “el reto
que tenemos no es inventar lo suprendente sino descubrirlo. Mi Nirvana no
empieza donde hay una noticia sino donde avisto una historia que me
conmueve o me asombra” (SALCEDO RAMOS apud JARAMILLO AGUDELO,
2012, p. 34).
Outra questão é o tema. Como saber qual assunto agradará mais ao
leitor? Os editores, não poucas vezes, determinam o tema da crônica, pois a
preocupação é aquilo que possa despertar interesse no leitor. Esse fato não
pode ser previsto por nenhum cronista, pois não é uma questão de experiência.
Como diz Alma Guillermoprieto, “Soñamos con un lector que no existe”
(GUILLERMOPRIETO apud VILLANUEVA CHANG, 2012, p.587), pois o leitor
não é um fantasma, é um enigma. E uma maneira de resolver esse enigma
talvez seja não entediá-lo: “He procurado ahorrarle al lector las molestias
necesarias para escribir estas crónicas” (VILLORO, 2005a, p. 255), pois “la
literatura necesita lectores y no sólo compradores de libros” (GARCÍA
CANCLINI, 1999, pp. 53-54).
Os textos de Villoro apresentam uma estrutura interessante, pois, se por
um lado, um leitor iniciante conseguirá compreendê-lo, por outro, um leitor mais
122
experimentado não terá dificultado de extrair, do mesmo, diversas camadas de
leitura, visto serem textos que resistem a uma análise. Não se trata de
alegorias, senão de uma segunda história, não tão evidente. Villoro também
tem um cuidado para não deixar o texto emotivo, até porque ele se considera
assim. Por isso, utiliza uma linguagem mais contida, menos acelerada e
bastante equilibrada “Yo como persona he dado más renda suelta a la parte
emocional, tratando desde luego de no ser oportunista a las emociones del
lector. Es decir, de no ser sensiblero” (VILLORO apud BENAVIDES, 2014, p.2).
Em diversas crônicas, Juan Villoro ressalta a importância de ser leitor
antes que escritor e, na crônica, “Las enseñanzas de Augusto Monterroso”,
rememora os ensinamentos de seu professor, mencionando a visão
equivocada de que poderia ser escritor sem ler os clássicos:
Sin hacer el menor alarde erudito, Monterroso cerró de un portazo mi salida de emergencia favorita. Hasta entonces yo creía que podía ser escritor sin leer a los clásicos de esas lenguas afortunadamente muertas. Mi idea de la literatura tenía que ver más con la lucha libre: técnicos contra rudos. En esta esquina, los escritores que convertían sus libros en aventuras; en la otra, los que convertían sus aventuras en libros. El recurso Joyce vs. el recurso Hemingway (VILLORO, 2005a, pp.248-249).
Como mencionado, Villoro, desde os princípios de sua trajetória literária,
demonstra preferência pelas histórias em quadrinhos e pelo cronista de futebol
Ángel Fernández. Pensando nos dois tipos de leitores mencionados por Piglia
(2007), que toma por base leitores exemplares: Kafka e Joyce, poderia ser dito
que Villoro está mais para o segundo, disperso, movediço, que para Kafka,
recluso, fechado, como comenta Piglia sobre o escritor tcheco: “Me gustaría
estar en una catacumba, en un sótano y que me dejaran la comida en la puerta
para que yo pudiera caminar un poco y que después nadie me molestara”
(PIGLIA apud PIGLIA y VILLORO, 2007, p.6). No entanto, ao adentrar na
oficina literária de Monterrroso, Villoro teve que enfrentar os clássicos, pois,
antes de aprender a escrever teve que aprender a ler. Embora esteja ciente da
impossibilidade de ensinar a alguém esse ofício: “Aunque todo el mundo sabe
que no hay manera de enseñar a escribir, en la década de los setenta los
talleres se multiplicaban” (VILLORO, 2005a, p.247). Mais adiante diz:
123
Aprender a escribir implica, obviamente, aprender a leer. En el taller, las lecturas se convirtieron en la red protectora de las acrobacias; sin embargo, como en el verso de Montes de Oca, Tito nos advirtió de que el verdadero peligro de caer consistía en “ser herido por la red” (VILLORO, 2005a, p. 251).
No trecho destacado, ele cita um verso do poeta mexicano, Marco
Antonio Montes Oca, a quem Tito (apelido de Monterroso) admirava e que
recebeu um poema “Redención de la noche” em sua homenagem. Era o perigo
de ser ferido pela rede das próprias acrobacias da linguagem, das repetições,
dos temas desinteressantes, pois, como diz Villoro: “Los lectores tienen la
mente poblada de los rifles de alto poder y los coches bomba que pueden
acabar con la vida del autor y buscan en cada párrafo una clave que explique
(o incluso justifique) la amenaza” (VILLORO, 2005a, p. 212, grifo do autor).
Mercado
O mercado é considerado a única instituição social que ordena sem coerção48
. Pierre Bourdieu
Parte da crítica literária costumou ler a crônica como um gênero
“contaminado” e, por isso mesmo, poetas e narradores do século XIX, por sua
relação com o jornal e, mais tarde, com a indústria cultural, tiveram sua obra
desvalorizada. Apesar disso, o cronista, como um habitante de fronteira, soube
mover-se na ambiguidade e produzir textos que ansiavam por valorização,
embora necessitassem de um comprador “En la larga lucha por la conquista de
la autonomia del arte, la crónica estuvo asociada a los estómagos antes que al
espíritu” (BERNABÉ, 2010, p.1).
Conforme já mencionado, a produção cronística dos modernistas, em
geral, foi lida como uma prosa menor, cuja maestria somente poderia ser
48
Fragmento do livro BOURDIEU, Pierre. Campo de poder, campo intelectual, itinerario de un
concepto. Buenos Aires: Colección Jungla Simbólica. Editorial Montressor. 2002.
124
qualificada através de formas consagradas: romances, poemas e ensaios. Até
que ponto a crítica literária atual segue operando esses valores?
Até meados dos anos de 1960, o romance dominou o mercado editorial
mexicano, e o centro do jornalismo era, sem dúvida, a reportagem. Não
obstante, “después de 1968, la crónica ni se desvanece ni se repliega en la
nostalgia” (MONSIVÁIS, 2010, p. 112). Além de consignar as impressões da
modernidade, a ela também coube “reproduzir el vértigo de la masificación, las
sensaciones de caos, la reubicación de la vida cotidiana [...]” (MONSIVÁIS,
2010, p. 112). Quer dizer que, com o avanço tecnológico e a intensificação das
migrações e viagens, o México passou a ficar muito mais informado,
contribuindo para enfraquecer o domínio ideológico do PRI. Entretanto, como
comenta Mónica Bernabé
A partir de su inserción en el periodismo como mercancía, la crónica cumplió y cumple funciones decisivas en el campo cultural y literario. Podríamos decir que es un doble recurso: al mismo tiempo que representa la posibilidad de un ingreso de dinero es una estrategia para forjar un nombre de autor. Sin embargo, a la hora de evaluar una obra, rara vez la crónica fue considerada una práctica de escritura virtuosa (BERNABÉ, 2010, p.2).
Não cabe dúvida de que, a partir das décadas de oitenta e noventa, a
crônica, como se observa, foi reativada com a retomada de estudos nos quais
um setor da crítica inicia a releitura das crônicas modernistas, além da
presença da FNPI e das revistas especializadas. Mas também há uma
expansão gradual no mercado editorial de recopilações de textos desse
gênero.
O cronista contemporâneo se encontra diante de circunstâncias mais
complexas que a dos modernistas que transformavam a cidade do século XIX
em objeto. Na atualidade, não se trata mais da cidade, senão do mercado
como sistema; não é somente o jornal, senão o rádio, a televisão, a internet,
enfim, os meios de comunicação de massa em conjunto. O cronista é
convocado a narrar uma paisagem dispersa, violenta, heterogênea para dar
sentido a uma leitura excessivamente híbrida, com materiais diversos, de
origem popular, erudita ou de mercado, pois não há hierarquias. A respeito da
relação complicada da crônica com o mercado, comenta Villoro:
125
Talvez llegará el día en que los periódicos compren la prosa “en línea”, a medida que se produce. Sin embargo, desde ahora es posible detectar la casi instantánea relación entre la escritura y en dinero, economías de signos y valores (VILLORO, 2005a, p.12).
Outra tendência que se observa com relação à crônica é o aumento
significativo de produções organizadas em livros, depois de terem sido
publicadas em jornais impressos ou digitais e que são, muitas vezes,
produções especificamente para livros, como é o caso de Tiempo transcurrido,
modificando uma característica que acompanha esse gênero há tempo. As
publicações em jornais e revistas permitiu a crônica funcionar com certa
liberdade, com amplitude de temas e modo de escrita flexível. Por que se
estão compilando tantas crônicas e por que esse tipo de texto tem sido lançado
como livro? É uma questão intrigante e Villoro comenta que essa é uma prática
que remonta à década de setenta no México, pois foi uma maneira que os
cronistas encontraram para fugir da censura mais dura dos jornais naquele
momento. Essa questão cabe para crônicas daquele período e talvez para a
sua primeira obra desse gênero. Mas por que as demais também foram
organizadas nesse formato? Ainda há censura de tema de crônicas nos meios
ou é possível pensar que se trata de uma questão de mercado?
Monsiváis, quando entrevistado em 2003 por Juan Jesús Aznárez sobre
o mercado editorial mexicano, fez uma análise do panorama literário no país,
tratando da aparição do “Mercado” com letra maiúscula e complementa:
Lo primero a destacar es la transformación que trae consigo el Mercado. Súbitamente, los escritores se descubren como productos, y como productos sujetos a una obsolescencia acelerada. Surgen los agentes literarios, en las librerías el período de gracia acordado a una novedad editorial es a lo sumo tres meses (después emprenden el largo camino que desemboca en los saldos y el reciclaje), las presentaciones de las novedades bibliográficas son más bien cócteles, bailes de quince años o ceremonias de graduación, etcétera (MONISVÁIS apud AZNÁREZ, 2003, p.2).
A complexa relação entre o cronista e o mercado não é uma questão
atual, como vem sendo demonstrado, e Villoro tem-se mostrado hábil para se
mover nesse meio. Por um lado, tenta manter um posicionamento crítico com
126
relação aos temas de repercussão política, econômica e social. Por outro,
procura publicar em meios diversificados, independentemente de postura
ideológica. La Jornada, por exemplo, que é um jornal de esquerda e no qual se
percebe que estão concentradas muitas de suas produções, não impede que
publique também em Reforma, que apresenta uma postura neoliberal. E ele
declara em entrevista:
cuando yo empecé a escribir nosotros no buscábamos guetos de crónica, sino simplemente tratamos de publicar la crónica donde fuera. Yo creo que estamos apelando a cualquier tipo de lector y la apuesta para nosotros ha sido siempre hacer algo distinto en el lugar donde nos dejen hacerlo (VILLORO apud BENAVIDES, 2014, p. 4).
É uma questão complicada que envolve autonomia, não somente do
cronista, mas principalmente dos meios. Pierre Bourdieu relata em sua obra, As
regras da arte (1996), as ameaças à autonomia resultantes da “interpenetração
cada vez maior entre o mundo da arte e o mundo do dinheiro” (BOURDIEU,
1996, p. 375). A reivindicação de autonomia da literatura na América Latina
esbarra geralmente em poderes continuamente renovados, quer trate dos
poderes externos, como os da igreja, do Estado ou dos grandes
empreendimentos econômicos, quer seja de poderes internos, mediados pelo
controle dos instrumentos de produção e difusão específicos como a imprensa,
a edição, o rádio e a televisão. García Canclini, no prólogo da obra Sociología y
cultura, de Pierre Bourdieu, menciona que, ao aplicar os conceitos do autor
francês, a sociedade na América há que se ter atenção, pois eles não foram
pensados para essa sociedade.
En los países latinoamericanos, las relaciones económicas y políticas no han permitido la formación de un amplio mercado cultural de elite como en Europa ni la misma especialización de la producción intelectual ni instituciones artísticas y literarias con suficiente autonomía respecto de otras instancias de poder. Además de la subordinación a las estructuras económicas y políticas de la propia sociedad, el campo cultural sufre en estas naciones la dependencia de las metrópolis. Bajo esta múltiple determinación heterónoma de lo legítimo y lo valioso, el campo cultural se presenta con otro régimen de autonomía, dependencias y mediaciones (GARCÍA CANCLINI, 1990, p.36).
127
No México, país que passou a maior parte do século passado sob o
domínio de um único partido, tal fato se torna ainda mais complexo, como
expressa Villoro nessa reflexão:
Durante mucho tiempo, los dueños de medios y periódicos de México consideraron que su fuerza derivaba de un adecuado uso del tráfico de influencias. En la medida en que servían de apropiadas plataformas al poder, contribuían a marcar la agenda nacional. “Soy un soldado del PRI”, dijo en forma emblemática Emilio Azcárraga Milmo
49 (VILLORO, 2011a, p. 16).
Na atualidade, o panorama mudou bastante, mas não o suficiente, pois
ainda há em muitos meios, principalmente no interior do país, com dificuldade
para exerce sua independência. Contudo, isso não é uma questão somente do
México, pois, como menciona Villoro a respeito de Vázquez Montalbán, que
disse: “La primera tarea del periodista consiste en saber quién es el dueño de
su periódico”, escribe Manuel Vázquez Montalbán. Si conoces los intereses del
dueño, conoces los límites de tu libertad” (VILLORO, 2011a, p. 16).
O mercado editorial latino-americano apresentou modificações
relevantes a partir de meados dos setenta. No entanto, antes de abordá-las, é
importante ressaltar algumas particularidades referentes ao termo que implica
parte dessa mudança, que é o conceito de globalização, pois é costume pensar
nessa noção como unificação e homogeneização de todas as sociedades. No
entanto, essa acepção não serve para discutir mercado editorial, e sim
financeiro. Isso ocorre devido ao enraizamento da literatura numa língua
particular, porque a difusão de obras tende a ser expandida dentro de um
mesmo contexto linguístico. Outra questão é o entendimento de globalização
como “americanização”, pois, no caso de editoras, principalmente na Argentina
e no México, a transnacionalização se deu em relação a empresas espanholas,
ou da área latina da Europa, como, por exemplo, o “grupo Mondadori, que
comprou as editoras Grijaldo, Planeta, Ariel e Seix Barral, e o grupo
Bertelsmann, a Sudamericana” (GARCÍA CANCLINI, 2007, p.140). Cabe
destacar também que o declínio nas economias da região nas últimas décadas
do século passado e o avanço das editoras espanholas no mesmo período
49
Empresário mexicano, filho do fundador da Televisa (maior conglomerado telecomunicações do país) e administrador desse empreendimento por quase trinta anos.
128
contribuíram para o fechamento de muitas editoras e livrarias latino-
americanas, além de que
jornais e revistas faliram ou reduziram suas páginas. O aumento internacional do preço do papel, agravado por bruscas desvalorizações da moeda nacional em quase todos os países latino-americanos, são algumas das causas dessa retração (GARCÍA CANCLINI, 2007, p. 141).
Ao observar as mudanças ocorridas nas editoras com a
transnacionalização, que acabaram influenciando os jornais e revistas, é
possível pensar que esse pode ser também um dos prováveis motivos para o
aumento da publicação dessas crônicas organizados em livros.
Villoro publica parte de seus escritos em editoras espanholas. No
entanto, não deixa de publicar em editoras menores, no México, na Argentina e
no Brasil. Piglia, em conversa com Villoro, menciona a relação dos escritores
com as pequenas editoras:
Lo primero que hizo hoy Juan, cuando me encontró, fue darme dos pequeñas ediciones de libros que él mismo tradujo. O sea que los escritores siempre estamos interesados en las pequeñas editoriales, en las editoriales que publican literatura, y cuando nos damos libros nos damos ese tipo de libros y estamos siempre interesados en ese tipo de circulación, porque eso es verdaderamente la literatura (PIGLIA apud PIGLIA y VILLORO, 2007, p. 2).
A relação discutida pelos escritores é complexa, pois não se pode
esquecer que eles vivem do mercado e, ao mesmo tempo, o mercado é o
limitador de sua literatura. Anadeli Bencomo relata em sua obra Entre héroes,
fantasmas y apocalípticos: testigos y paisajes en la crónica mexicana (2011)
que:
Juan Villoro es uno de los escritores mexicanos que ha logrado trascender de manera exitosa a otros mercados lectores gracias a sus crónicas transnacionales que registran comportamientos y escenarios familiares al lector globalizado de la postmodernidad. Sus textos sobre conciertos de rock, sobre los mundiales de fútbol y luminarias del espectáculo logran sintonizar con el imaginario dilatado de nuestro tiempo (BENCOMO, 2011, p.131).
Certamente o tema massivo da crônica de Villoro tem contribuído para
uma considerável aceitação no mercado leitor. Reduzir, porém, a prosa do
129
autor a somente a temática “globalizada” é complicado. Afinal, cabe
acrescentar também uma consciência da linguagem e da forma como valor
essencial de sua escrita, além do posicionamento crítico a respeito dos meios
de publicação de seus textos.
Na Feira Internacional do Livro de Guadalajara, o autor quando
entrevistado sobre o marketing do auge da indústria editorial, comenta:
La feria es un fenómeno de la industria, no de la cultura. Por supuesto que puede tener derivados culturales, como el originado en un encuentro casual de dos personas que se ponen a discutir sobre un título, pero en general la Feria del Libro está aquejada de gigantismo. Es una máquina de vomitar actividades y confunde la estadística con el éxito (VILLORO apud MELUSSI, 2016, p.1).
A respeito da propaganda da obra literária, Monsivais comenta que “es
tan decisivo el marketing que ya la publicidad parece integrarse a la obra”
(MONSIVÁIS apud AZNÁREZ, 2003, p.3). Ou seja, ocorre como se o sucesso
de uma publicação estivesse condicionado à propaganda que a acompanha.
Certamente isso não qualifica ou desqualifica uma obra, mas contribuiu para
alcançar um número maior de leitores, o que talvez não tivesse ocorrido, caso
o acesso fosse estabelecido apenas por pequenas editoras.
Villoro quando é questionado por que costuma fazer passagens
relâmpagos pela feira de Guadalajara e se detêm por muito mais tempo em
outras, como da Argentina ou do Chile, responde que, “Precisamente porque
es una feria muy aturdidora y uno se siente esclavo de esa dinámica
vertiginosa” (VILLORO apud MELUSSI, 2016, p. 1). E segue comentando como
as grandes editoras que comandam as feiras haviam criado um gigantismo tão
grande que acabaram por deixar de lado o que deveria ser o centro do evento:
a discussão sobre literatura e tudo que a envolvesse, fato que em eventos
menores não costuma acontecer. E diz:
En la Feria de Guadalajara he visto cómo alguien le pasaba un papel a José Saramago cuando ya era Nobel, diciéndole que terminara su charla porque tenía que pasar el siguiente conferencista. La cultura tiene un ritmo lento y las ferias son una aceleración artificial de ese ritmo (VILLORO apud MELUSSI, 2016, p.1).
130
A troca gradativa do estatuto de “puro objeto estético” pelo de
“mercadoria”, que vem acompanhando toda a história do capitalismo há muito
tempo, trouxe como consequência a progressiva redefinição das relações entre
a literatura, já que o autor, o leitor e a própria crítica, circulam no interior de um
todo estruturado de acordo com a lógica do mercado editorial (PELLEGRINI,
2016).
Dunia Gras Miravet no ano de 2000 entrevista Roberto Bolaño, que
acabara de ganhar o Premio Rómulo Gallegos por Los detectives Salvajes
(1999). Dentre os diversos temas discutidos, a entrevistadora aborda sobre o
olhar das editoras espanholas na direção dos jovens escritores hispano-
americanos. Neste contexto, menciona Bolaño:
No son tontas las editoriales: están apostando por autores que saben que van a crear una obra diferente, como Juan Villoro, por ejemplo. Yo creo que si de mi generación hay alguien que va ganar el Nobel, ese será Juan Villoro, lo digo completamente en serio. De mi generación hay dos que van a ganar el Nobel casi con toda probabilidad, uno es Javier Marías y el otro es Juan Villoro (BOLAÑO apud GRAS MIRAVET, 2000, p.64).
Observando o catálogo de editoras espanholas como a Anagrama,
Alfaguara, Planeta e Seix Barral, para citar alguns exemplos, há um grande
número de escritores latino-americanos e, dentre eles, está Villoro, porém não
se deve esquecer que as publicações reúnem interesses comerciais e culturais
envolvidos. Com relação ao Nobel, certamente não é possível prever um fato
como este, pois é muito subjetivo e político. É importante, porém, destacar a
consistente e constante obra literária que o cronista vem construindo ao longo
dos anos.
131
CAPÍTULO III - LITERATURA E CULTURA 3.1 Discussões sobre a crônica e a cultura de massa
A crônica, ao longo dos anos, tem sofrido preconceito por ter sido
considerada uma arte menor, principalmente devido a uma percepção restrita
que diferencia a escrita como criação, reservada aos artistas, e a escrita como
produção, encaminhadas às massas e, por isso mesmo, contaminada pelo
fator econômico. Assim, gêneros considerados de “alta cultura” estariam
reservados a uma pequena elite e a nichos universitários, enquanto a crônica,
que representaria um gênero popular, seria direcionada para as pessoas em
geral.
A ideia de “alta cultura” e “cultura popular” no México está presente na
formação e na evolução do capitalismo mais ou menos como uma luta
contínua, que toma a atenção de historiadores, antropólogos e estudiosos da
cultura de uma maneira geral, acabando por tornar-se, na literatura, um tema
que envolve termos complexos como: tradição, autonomia e cânones50.
A palavra cultura é certamente imprecisa e utilizada constantemente
com várias acepções. Como destaca Terry Eagleton, citando o estudo de
Raymond Williams, a expressão cultura já significou “civilidade”; depois, no
século XVIII, tornou-se mais ou menos sinônima de “civilização” para se tornar,
no século XIX, o seu oposto. Ou seja, cultura é “uma dessas raras ideias que
têm sido tão essenciais para a esquerda política quando vitais para a direita, o
que torna sua história social excepcionalmente confusa e ambivalente”
(EAGLETON, 2005, p. 11). Sendo assim, apoia-se aqui, na noção de Terry
Eagleton, no qual cultura “é uma espécie de pedagogia ética que nos torna
aptos para a cidadania política ao liberar o eu ideal ou coletivo escondido
dentro de cada um de nós, um eu que encontra sua representação suprema no
âmbito universal do Estado” (EAGLETON, 2005, p.17).
50
Frank Kermode em sua obra Apetite pela poesia (1993) explica que não há somente um
cânone, mais cânones. Ressalta que “os cânones são formados por exclusões assim como por inclusões, pois se você inclui qualquer coisa, é claro que se perde completamente a ideia de cânon” (KERMODE,1993, p.27). A utilização desse termo na pesquisa é para ilustrar os estudos críticos de uma época. No entanto, na atualidade a cultura e a literatura não cabe mais nesse termo.
132
Assim, como ocorre com o termo cultura, igualmente complexa é a
palavra “popular”. Peter Burke, em seu estudo sobre cultura popular entre 1500
e 1800, destaca que o termo popular naquele período referia-se ao povo
comum, ou seja, “ao conjunto da não elite, incluindo mulheres, crianças,
pastores, marinheiros, mendigos e demais grupos sociais” (BURKE, 1989,
p.11).
Cabe destacar que não há a intenção de se apresentar uma oposição
em que se deprecia a cultura popular e exalta a cultura elitista. Nem se
pretende ressaltar a autenticidade de uma, em detrimento da outra. É certo que
a cultura popular já foi classificada como não oficial, a cultura da não elite, das
“classes subalternas”, inculta e divertida. Em oposição à cultura erudita,
entendida como privilegiada pelos meios acadêmicos, produzida por uma elite
política, econômica e cultural, de comunicação e oficial.
A noção de cultura popular apresenta, desde sua origem, ambiguidade
semântica, o que torna difícil o debate, pois, por um lado, há o perigo do
reducionismo, no qual não se reconhece nenhum valor, e a cultura popular
seria apenas um subproduto inacabado. Por outro, no entanto, há uma
oposição à concepção anterior, visualizando a cultura popular como igual ou
superior à outra, tida como elitista. Entretanto, essas teses extremas são
superadas pela realidade na qual se excede qualquer uma dessas
classificações, pois a cultura popular não é inteiramente dependente, nem
autônoma, nem criação, ou pura imitação (CUCHE, 1999). Por trás de ambas,
há valores deslocados por simulações, interesses políticos e econômicos, com
evidentes problemas de classes.
Logo no início de seu artigo, “De las relaciones literarias entre “alta
cultura” y “cultura popular”” (1985), Carlos Monsiváis destacou que antes da
década de sessenta o reconhecimento da existência da cultura popular se
caracterizava como uma invenção, pois era difícil admitir que o “popular”
qualificasse de alguma maneira a cultura. Esses termos são inegavelmente
políticos, porque atendem à necessidade de controles, principalmente
mercadológicos, os quais ganharam força ao longo do século XX, para
diferenciar a “alta cultura” da ideia de cultura nas classes mais populares.
Nessa perspectiva, as diferenças que opõem a cultura popular à cultura de
133
referência são analisadas muitas vezes como deformações, incompreensões,
faltas ou apenas seus subprodutos.
A passagem da cultura popular para a cultura de massa se dá
lentamente, e não se pode atribuir aos meios eletrônicos a origem da
massificação das culturas populares, pois o massivo foi gerado a partir do
popular. Jesús Martín-Barbero (2003) especifica essa transição:
Massa designa, no movimento de mudança, o modo como as classes populares vivem as novas condições de existência, tanto no que elas têm de opressão quanto no que as novas relações contêm de demanda e aspirações de democratização social. E de massa será a chamada cultura popular. Isso porque no momento em que a cultura popular tender a converter-se em cultura de classe, será ela mesma minada por dentro, transformando-se em cultura de massa. Sabemos que essa inversão vinha sendo gerada há muito tempo, mas ela não podia tornar-se efetiva senão quando, ao se transformarem as massas em classe, a cultura mudou de profissão e se converteu em espaço estratégico da hegemonia, passando a mediar, isto é, encobrir as diferenças e reconciliar os gostos. […] Essa mediação e esse consentimento, no entanto, só foram historicamente possíveis na medida em que a cultura de massa foi constituída acionando e deformando ao mesmo tempo sinais de identidade da antiga cultura popular e integrando ao mercado as novas demandas das massas (MARTÍN-BARBERO, 2003, p. 175).
A Cultura de massa ou a Terceira cultura, como foi denominada por
Edgar Morin, surgiu com a revolução industrial, oriunda, inicialmente, a partir da
imprensa e, posteriormente, a partir do cinema, do rádio e da televisão. É
importante destacar que o texto de Morin foi escrito em 1962, quando a cultura
de massa não era elaborada por intelectuais, os quais tendiam a classificá-la
de maneira pejorativa, como subproduto da indústria moderna. Por um lado,
segundo o pensamento da direita, era vista como barbárie, ou simplesmente
diversão e, por isso mesmo, ligada à plebe; por outro, entretanto, numa visão
de esquerda, seria o ópio do povo, a mistificação deliberada, tendo o capital
como o responsável por desviar a massa dos seus problemas verdadeiros.
Para além dessa dialética entre esquerda e direita, a cultura de massa era
vista, principalmente pelos intelectuais, como mercadoria cultural ordinária, feia
e sem valor. No entanto, ainda existem os que percebem a cultura de massa
como tal e outros que não se envergonham de usá-la para se inserirem no
mercado.
134
Essa incorporação nos debates da cultura articulada nos meios
massivos parece ser um assunto que não envelhece, ao contrário, torna-se
mais atual a cada dia. O aumento das mídias em número e volume e as
discussões em torno da questão estão cada vez mais presentes no cenário
acadêmico. Ou seja, a discussão levantada por Umberto Eco em 1964, no livro
Apocalípticos e Integrados, está ainda latente. A questão discutida nessa obra
apresenta uma dicotomia entre aqueles que defendem uma literatura
considerada erudita e os que não veem problema em incorporar em seus
escritos a cultura que circula nos meios massivos. Trata-se, como denominou
Andreas Huyssen, em 2006, da “grande divisão”, acentuando um discurso que
promovia essa distinção categórica, atenuada, principalmente, a partir dos anos
setenta, com a proliferação de autores que incorporaram, em seus textos, o
futebol, os programas de televisão, as histórias em quadrinhos, os
personagens de cinema e a música, entre outros. No entanto, por que, ainda
hoje, essa discussão seria irrelevante? Por que no meio acadêmico, mesmo
com o crescimento do número de autores que dialogam com a cultura popular
e a cultura de massa, ainda há preconceito em relação às obras desses
autores?
É importante destacar que não se trata de levantar um debate sobre
“guerras culturais” ou uma defesa de “apocalípticos e integrados”, mas de
pensar que o escritor não está isolado de sua época, e que é pertinente a
incorporação em seus escritos da cultura do momento. No entanto, isso não
significa que não se possa manter um posicionamento crítico a respeito dessa
cultura. É preciso entender, então, que o valor estético não é absoluto, mas
uma interpretação ou “superinterpretação” individual e, portanto, suscetível a
mudanças.
A criação dessas barreiras imaginárias entre uma cultura elitista e outra
popular ou de massa contribui para criar seleções arbitrárias e sacralizadas. A
constituição de uma ideia de que, na popular ou de massa, encontram-se a
falta de exigências mínimas e critérios que testifiquem qualidade. Por isso
mesmo, é necessário demolir essas divisões que apresentam oposições
abruptas, envolvendo o tradicional, o moderno, além do culto, do popular e do
massivo, pois, como diz García Canclini “A noção de cultura massiva surge
135
quando as sociedades já estavam massificadas” (GARCÌA CANCLINI, 2008, p.
256). Necessita-se, na atualidade, de instrumentos de análise com vasos
comunicantes, capazes de circular entre esses vários pavimentos.
A cultura articulada pelos meios massivos como tema aparece
constantemente na escrita de Juan Villoro. Não se trata, porém, de um
posicionamento a favor ou contra, mas pode ser interpretado como um esforço
para a eliminação de rótulos como culto, popular ou massivo. Afinal, observa-
se em sua literatura, sempre, a mistura daquilo que García Canclini chama de
“cultura urbana para tratar de conter as forças dispersas da modernidade”
GARCÍA CANCLINI, 2008, p. 284).
Nota-se que, principalmente em suas crônicas, Villoro capta claramente
que seu projeto de escrita está situado em uma conjuntura social marcada pelo
mercado e pela massa, protagonista das histórias cotidianas que estabelecem
um diálogo com a modernidade e com o arcabouço institucional político-
econômico do México. Nesse contexto, as tecnologias de comunicação
desempenham um papel fundamental, seja cultural, social ou político.
A relação de Villoro com a cultura veiculada nos meios massivos de
comunicação demonstra uma forma consciente de promover uma síntese entre
esta e a cultura erudita, sem se afastar da cultura popular, pois, como
menciona Mihalí Dés sobre Villoro que,
como muchos intelectuales de su edad, padece la fascinación por la cultura popular: la música rock, las tiras de cómic, los deportes de masas… Pero esa fascinación no se agota en un juego paródico y/o metacultural […]. Para Villoro la cultura pop no es un programa, sino un paisaje; el medio ambiente en que se mueve con la misma naturalidad que Balzac, Tolstói o Proust en sus respectivos salones. En cualquier caso no es la única ni la más caudalosa fuente de la que se alimenta su prosa (DÉS, 2005, p.2).
Em suas crônicas, o escritor mexicano percorre a música rock, as
histórias em quadrinhos, os programas televisivos, a literatura infantil e os
esportes de massas: futebol e boxe, deixando transparecer sua formação
erudita, adquirida, não somente na universidade, mas certamente no substrato
massivo que o formara: o rádio, o jornal, a televisão e o cinema. O cronista
entende que não pode desenvolver sua obra à margem da cultura de massa,
136
“porque eso sería equivalente a salir de la ciudad, espacio fundamental de la
crónica” (GARCÍA TORRES, 2012, p.222). Esse é um dos traços que
caracterizam a geração da qual Villoro faz parte, produzindo em e para uma
indústria da informação.
Na atualidade se convive com um campo literário em que a cultura
concebe a imagem como elemento principal de representação, distanciando-se
da palavra escrita. Uma sociedade fragmentada, líquida, com barreiras fluidas
e com o predomínio do instantâneo, no qual se gera de forma constante a ideia
de um mundo cada vez menor através do avanço da tecnologia. O que
prevalece é o virtual, a imagem, o som e o texto em velocidade instantânea, o
individualismo e o consumismo. A publicidade manipula desejos, promove
sedução, cria novas imagens e signos. Transformou-se claramente na
“sociedade do espetáculo”, segundo Guy Debord. Deste modo, pode-se afirmar
que a crônica espelha esse momento. Ela está plenamente conectada a esse
espaço, pois está comprometida com a história em movimento, uma vez que
seu ritmo é a atualidade e seu consumo é efêmero, assim como a cultura de
massa.
São tempos de incerteza, pois a situação se radicaliza à medida que
valores universais como liberdade, justiça, razão, objetividade e verdade, estão
perdendo legitimidade e valor. Devido à abrangência das áreas (literatura,
cinema, arquitetura, teoria literária, artes visuais, história entre outras) da
sociedade que emprega o termo pós-modernismo, não há um consenso teórico
sobre a significação desse fenômeno que assim se convencionou chamar.
Linda Hutcheon, por exemplo, em seu livro, Poética do pós-modernismo:
história, teoria e ficção, publicado em 1991, procurou evitar as generalizações,
as imprecisões e as simplificações radicais comuns quando se trata de um
termo tão complexo. Nele, a autora abordou diversas perspectivas, como o
feminismo, o negro na sociedade, o nacionalismo, o homossexualismo, além
das questões étnicas, entre outras. Segundo ela, a cultura pós-moderna
envolveria tendências econômicas e ideológicas deste tempo. O que a autora
chama, enfim, de pós-moderno “é fundamentalmente contraditório,
deliberadamente histórico e inevitavelmente político” (HUTCHEON, 1995,
p.19).
137
Enquanto diversos autores tratam a expressão pós-modernismo como
ruptura, para Frederic Jameson, a modernidade continua acentuando que essa
ideia “não é um conceito, seja filosófico ou de outra espécie, mas sim uma
categoria narrativa” (JAMESON, 2005, p.53). Jameson acredita que o único
significado semântico satisfatório para a modernidade é a sua associação com
o capitalismo, o qual ele denomina como capitalismo tardio.
Gilles Lipovetsky declara que o termo “pós-modernidade” é problemático
porque parece indicar uma grande ruptura na história do individualismo
moderno. Para ele, porém, esse período representa:
o momento histórico preciso em que todos os freios institucionais que se opunham à emancipação individual se esboroam e desaparecem, dando lugar à manifestação dos desejos subjetivos, da realização individual, do amor próprio. As grandes estruturas socializantes perdem a autoridade, as grandes ideologias já não estão mais em expansão, os projetos históricos não mobilizam mais, o âmbito social não é mais que o prolongamento do privado – instala-se a era do vazio (LIPOVETSKY, 2004, p.23).
No entanto, Lipovetsky vê que nesse período ocorre a passagem da
modernidade para a pós-modernidade devido ao consumo de massa e aos
valores veiculados por esse processo. Para o autor, tal fato ocorre em três
etapas. De 1880 a 1950, com o aumento da produção industrial (taylorização),
que possibilita “o progresso dos transportes e da comunicação e,
posteriormente, ao aparecimento dos métodos comerciais que caracterizam o
capitalismo moderno (marketing, grandes lojas, marcas, publicidade)”
(LIPOVETSKY, 2004, pp.23-24). A segunda fase, que abarca o período entre
1950-1980, é caracterizada pela produção e pelo consumo de massa de uma
classe privilegiada, cada vez mais voltada para o presente e para as novidades
que ele traz, ou seja: “assiste-se aí à extensão a todas as camadas sociais do
gosto pelas novidades, da promoção do fútil e do frívolo, do culto ao
desenvolvimento pessoal e ao bem-estar” (LIPOVETSKY, 2004, p.24).
Contudo, o período a partir de 1980 até os dias atuais não cabe mais dentro da
expressão pós-modernidade, pois vários sinais indicam que a sociedade atual
está na era do hiper, caracterizada pelo hiperconsumo, criando, em outras
palavras, a hipermodernidade.
138
Terry Eagleton diferencia pós-modernismo de pós-modernidade, sendo
que o primeiro refere-se em geral a uma forma de cultura contemporânea,
enquanto que o segundo termo “é uma linha de pensamento que questiona as
noções clássicas de verdade, razão, identidade e objetividade, os sistemas
únicos, as grandes narrativas ou os fundamentos definitivos de explicação”
(EAGLETON, 1998, p. 7). Com o questionamento das grandes narrativas, a
pós-modernidade cede espaço a uma análise crítica de gêneros que já foram
considerados menores, como é o caso da crônica.
Cabe ressaltar que o termo pós-modernidade não abarca claramente o
que vem acontecendo no âmbito cultural, histórico, político, social e econômico.
No entanto, essa é a expressão mais popular utilizada nas últimas décadas,
tendo-se transformado num fenômeno cultural “que obscurece as fronteiras
entre a cultura “elitista” e a cultura “popular”” (EAGLETON, 1998, p. 7). Nas
últimas décadas do século XX e nas primeiras do XXI, tal conceito pôde ser
observado com nitidez, não apenas na narrativa (romance, conto, crônica e
cinema), mas também na filosofia, na historiografia, na música, na pintura e na
arquitetura, considerando as características de cada país ou região.
Entendendo a ficção pós-moderna como um espaço fronteiriço, observa-
se dentro da crítica dos estudos culturais nas últimas décadas uma corrente de
reivindicação que surgiu a partir da confluência de diferentes teorias e ramos
do pensamento. O estudo da crônica como gênero está presente nesse
contexto, pois ressaltou diferentes pontos de vista e enfoques interdisciplinares
próprios da pós-modernidade. Assim, a crônica se “re-coloca hoy frente al
logos pretendido de la modernidad como discurso comprensivo, al oponerle a
éste, otra racionalidad, en tanto ella puede hacerse cargo de la inestabilidad de
las disciplinas, de los géneros, de las fronteras que delimitan el discurso”
(REGUILLO, 2007, p.45).
139
3.2 México: paisagem do pós-apocalipse
Mihaly Dés em seu artigo “Juan Villoro, Paisaje del post-apocalipsis”
(2005), destaca que, desde os primeiros romances e em muitos de seus contos
e crônicas, Villoro revela:
un paisaje desolador en proceso de descomposición, un horizonte que se podría calificar de apocalíptico si no fuera porque el autor señalase que “una de las características centrales de la vida en México no es tanto el Apocalipsis, sino la noción de Post-Apocalipsis. La mayoría de los mexicanos, especialmente en la ciudad de México, se sienten más allá de la tragedia. Son el resultado de algo que ya ocurrió, un cataclismo impreciso que no podemos ver, pero no es el anuncio de algo que va a suceder” (DÉS, 2005, p. 5).
A ideia de “pós-apocalipse” Villoro compartilha com o influente cronista e
ensaísta Carlos Monsiváis que, em Los rituales del caos (1995), denominou
“México, ciudad post-apocalíptica” (MONSIVÁIS, 1996, p. 21, grifo do autor).
Na perfeita conexão com as ideias de Monsiváis, Juan Villoro, em entrevista
cedida ao escritor venezuelano Alberto BarreraTyszka (2010) e em seu ensaio
El vértigo horizontal, La ciudad como texto (2002a), afirma:
¿Qué distingue al D.F. de otros océanos? Nada lo define mejor que la noción de postapocalipsis, a la que se ha referido Carlos Monsiváis. Entre el vapor de los tamales y los gritos de los vendedores ambulantes, se cierne la certeza de que ningún daño es para nosotros. Nuestra mejor forma de combatir el drama consiste en replegarlo a un pasado en el que ya ocurrió. Este peculiar engaño colectivo permite pensar que estamos más allá del apocalipsis: somos el resultado y no la causa de los males. Los signos de peligro nos rodean pero no son para nosotros porque ya sobrevivimos de milagro. Imposible rastrear la radiación nuclear, el sismo de diez grados o la epidemia que nos dejó así. Lo decisivo es que estamos del otro lado de la desgracia. Diferir la tragedia hacia un impreciso pasado es nuestra habitual terapia. De ahí la vitalidad de un sitio amenazado, que desafía a la razón y a la ecología (VILLORO, 2002a, p. 4).
Tempos pós-apocalípticos – Carlos Monsiváis e Juan Villoro,
Hipermodernos – Gilles Lipovetsky, Modernidade líquida – Bauman ou Pós-
modernos para Terry Eagleton. Para Villoro, é um período de pós-ditaduras,
diásporas, globalização e neoliberalismo. A expressão pós-apocalipse, que ele
140
utiliza em chave irônica, é pensada com relação à capital mexicana, mas
certamente abarca o país, pois, como menciona, Villoro, o dinheiro que circula
“proviene en su mayoría de tres fuentes que complican la idea de patrimonio: el
narcotráfico, las remesas de los migrantes y el petróleo. Nada de esto tiene que
ver con un proyecto duradero de país” (VILLORO, 2010b, p. 27).
Com esse trecho da crônica “Carnaval y apocalipsis”, pode-se propor
uma aproximação ao prólogo de Rituales del caos. Nele, Monsiváis destaca
que no centro do caos está o consumo e que este é “uno entre tantos factores
en el espacio donde concurren las variedades del caos. Hay otro elemento
inevitable, ubicuo. Si, como se dice, el poder es la raíz de la noción misma de
espectáculo” (MONSIVÁIS, 1996, p. 15). E também, como complementa Diana
Palaversich, que é complicado tratar
de la lógica cultural postmoderna sin su sentido político neoliberal […]. Leer la producción cultural latinoamericana de esta manera significa inaugurar otros modos de lectura crítica consciente de la relación que existe entre texto literario y otros campos extra-literarios: historia, economía, política, cultura de masas, cultura electrónica, entre muchas otras (PALAVERSICH, 2005, pp. 10-11).
Nas crônicas do autor de Safari accidental aparecem diversos temas que
envolvem a cultura e a influências dos meios de comunicação em fomento à
vídeo-democracia comandada por grandes consórcios comunicativos. No
entanto, ele nunca se afasta de uma visão crítica nem deixar de incorporar em
seus escritos o aumento da violência e do narcotráfico, a crescente fuga de
mexicanos para os Estados Unidos em busca de sustento, o terremoto como
leimotiv para discutir a formação da sociedade civil e os movimentos sociais
como o EZLN, entre outros.
Para Villoro, esse gênero tem sido uma maneira de abordar temas
sociais sem enfastiar o leitor, como ressalta a crônica “1984”, quando o
protagonista Rodolfo, o qual pode ser lido como uma espécie de alter ego
ocasional de autor, descobre no Novo Jornalismo a possibilidade de escrever
sobre temas sociais de maneira atrativa. E não seria a conversão da
cotidianidade em literatura o que propõe por vezes o autor? Como uma forma
de transmitir a complexidade dos acontecimentos, incorporando a experiência
141
dos leitores personagens, aproximando o surpreendente, o cruel, o injusto e
uma longa lista de adjetivos, mostrando que a crônica pode ser uma maneira
de limpar os olhos. Como comenta o narrador: “Norman Mailer, Tom Wolfe y
Gore Vidal le revelaron que se podía escribir de temas sociales sin condenar al
lector a trabajos forzados” (VILLORO, 2006a, pp. 115-116). É interessante
observar que Rodolfo pretende construir uma obra a partir dos depoimentos
dos sobreviventes nos momentos antes das sucessivas explosões em San
Juan Ixhuatepec, utilizando as técnicas dos cronistas norte-americanos:
La tragedia parecía hecha para las metáforas de Rodolfo. Toda una colonia removida por las llamas. Los estallidos en la refinaría de Pemex y en la planta Unigás habían hecho que el aire ardiera como en el bombardeo de Dresde. De inmediato se le ocurrió reconstruir las vidas de algunas víctimas hasta unos segundos antes de la catástrofe (VILLORO, 2006a, p. 117).
Esse evento trágico ocorrido na região metropolitana da Cidade do
México em setembro de 1984, responsável pelo desaparecimento de mais de
quinhentas pessoas nas chamas, soma-se a diversos outros acontecimentos
discutidos em suas crônicas.
Em várias antologias de textos literários dedicados à Cidade do México,
como por exemplo, Páginas sobre la ciudad de México: 1469-1987, de José
Luís Martínez, nota-se a tensão entre o esplendor e a decadência. Relação que
se observa tanto no texto de Villoro “El vértigo horizontal: la Ciudad de México
como texto” (2002a), como em Los rituales del caos, de Monsiváis, no qual a
cidade vive a iminência do desastre, das ruínas, do tremor numa espécie de
“distopia”, uma utopia negativa. A cidade como signo do apocalipse nos textos
de ambos os autores ganha contornos de ironia, humor, ficção e hiper-
realidade “Lo peor ya ocurrió” (MONSIVÁIS, 1996, p. 21), ou seja, a cidade
“pós-apocalíptica” é constituída por essa sensação de estar depois do
cataclismo, vista como uma evidência ecológica (contaminação), demográfica
(multidão) e/ou social (violência).
Essa ideia de pós-catástrofe, como menciona Villoro na entrevista a
Alberto Barrera Tyszka (2010), ressalta o seguinte fato: os mexicanos,
principalmente os da Cidade do México, afirmam: “estamos más allá de la
142
tragedia, no somos la causa sino el resultado de una catástrofe, no es que
estemos viéndolo los signos de algo que va a venir, sino que ya somos
nosotros el saldo del que pasó” (VILLORO apud BARRERA TYSZKA, 2010). E
como menciona Monsiváis, essa sensação é devido a “demasiada gente [...],
las multitudes en el metro (casi seis millones de usuarios al día) […], las
multitudes en el Estadio de Ciudad Universitaria”, […] la economía subterránea
que desborda las aceras […]” (MONSIVÁIS, 1996, p.17).
Em diversas crônicas sobre a Cidade do México, aparecem problemas
recentes como a deterioração dos espaços públicos, o crescimento
desordenado, pois “La ciudad de México crece con el veloz desconcierto de las
epidemias y las invasiones” (VILLORO, 2002b, p.1), a violência (GARCÍA
CANCLINI, 1999), e a isso acrescentam-se dificuldades antigas e persistentes:
a luta contra as condições naturais, geográficas e climáticas e uma
organização sócio-política que supõe privilégios e exclusões (GONZÁLEZ
RODRÍGUEZ, 2009).
A questão da violência, das drogas e do narcotráfico aparece nos
romances El testigo e Arrecife e nos contos que compõem a obra Los
culpables, porém permeia a maioria de suas crônicas. Essa discussão está
presente em Safari accidental, Tiempo transcurrido, Los once de la tribu ou
Dios es redondo. Tiempo transcurrido, por exemplo, apresenta uma galeria de
personagens drogados: “Sus ojos eran de un azul profundo; cuando fumaba
mariguana se veían violáceos” (VILLORO, 2006a, p. 29). No entanto, é
importante observar que, nesse período, pois essa crônica se refere ao ano de
1970, ainda não se usava o termo narcotráfico. Como a atividade era composta
por pequenos grupos, a palavra tráfico resumia o embrião dos dois maiores
cartéis de drogas mexicanos da atualidade: Cartel de Sinaloa e Cartel de los
Zetas, que foram criados no final da década de 1980 e 1990, respectivamente.
É evidente, porém, já naquela época, a movimentação provocada pelo tráfico
de drogas. Essa evolução pode ser percebida no decorrer dos textos, como na
crônica “1972”, na qual se observa, da mesma forma que em várias outras, que
o personagem tem uma plantação “los lugareños cultivaban mariguana de la
mejor calidad” (VILLORO, 2006a, p. 40). Tal percepção ocorre também na
crônica “1969”, quando o personagem morre por causa do consumo de drogas
143
pesadas “La seguiente reunión del grupo fue por demás trágica: el Champiñon
quiso volar en pleno viaje de LSD y se tiró a la avenida Revolución desde un
doceavo piso. Se encontron en Gayosso51” (VILLORO, 2006a, p. 25).
Além dos textos mencionados, ele se deterá na crônica “La Alfombra
roja del terror narco” (2008b), além de mencionar o prólogo escrito por Villoro
para o livro de Diego Enrique Osorno, La guerra de los zetas: viaje por una
frontera de la necropolítica (2012). Há certamente uma série de reflexões
dispersas em outras crônicas. Em todas, porém, Villoro demonstra que não é
um tema, “El narcotráfico es un problema con numerosas aristas” (VILLORO,
2012d, p.4), visão compartilhada por Eduardo Antonio Parra:
los escritores del norte hemos señalado que ninguno de nosotros ha abordado el narcotráfico como tema. Si éste asoma en algunas páginas es porque se trata de una situación histórica, es decir, un contexto, no un tema, que envuelve todo el país, aunque se acentúa en ciertas regiones. No se trata, entonces, de una elección, sino de una realidad (PARRA, 2005, p. 2).
É importante relembrar que Villoro não é nortenho, mas citadino. No
entanto, como menciona Parra (2005), a violência do narcotráfico, ou seja, o
narcoterrorismo no México, não é um problema regional, mas de todo o país.
Susana Rotker no livro Bravo Pueblo. Poder, utopía y violencia (2005b), no
capítulo intitulado “La ciudad violenta”, ao referir-se à importância da crônica no
contexto latino-americano nos anos finais do século XX, comenta:
La crónica, género híbrido donde se encuentra el discurso literario y el discurso periodístico, es el espacio de la escritura que mejor registra los cambios sociales, las interrupciones, las experimentaciones del lenguaje y de la escritura misma. Más elaborada que los textos noticiosos, pero con un dinamismo y un sentido de urgencia que no tienen otras prácticas escriturarias de cocción mucho más lenta (como la novela, por ejemplo), la crónica ha sido un espacio privilegiado y marginal en la cultura latinoamericana desde hace un siglo, especialmente en los centros urbanos (ROTKER, 2006, p. 165).
Anadeli Bencomo em seu artigo “Violencia crónica o crónica de
violencia” menciona que, dentro do jornalismo, “el espacio de las narrativas
dedicadas a reseñar los actos violentos dentro del ámbito social se ha asociado
51
Agencia Funeraria Gayosso é uma das mais conhecidas do México, fundada em 1875.
144
tradicionalmente al género de la nota roja” (BENCOMO, 2007, p. 22), cuja
função predominante é a de natureza informativa. Trata-se de textos
tradicionalmente breves, concisos, com uso recorrente de fotografias com a
intenção de narrar os “sucesos fatales que acontecen cotidianamente y que
marcan la irrrupción de lo violento, lo torcido, lo criminal, dentro de un
determinado orden social” (BENCOMO, 2007, p. 22). Sobre o espaço
condensado a que tem que se submeter os jornalistas, principalmente na “Nota
roja”, Villoro comenta:
los periódicos y las revistas son sistemas de racionamiento donde nadie escapa a su cuota de caracteres. Curiosamente, el espacio como impedimento lleva a intensidades y condensaciones que no se lograrían por otra vía. La utopía del resumen: un diario que sólo conste de encabezados, frases autárquicas que no ameriten desarrollo. La nota roja suele ser la vanguardia de esta utopía. Sus titulares agotan las posibilidades de la historia: EL DESCUARTIZADO ERA UN HOMBRE ÍNTEGRO (VILLORO, 2005a, p. 13).
Na atualidade, o gênero crônica tem-se destacado nos periódicos e
livros. Focalizando a violência constante nas grandes cidades do México, e no
país como um todo, torna-se evidente a presença do narcotráfico, cuja
natureza do tema leva esse tipo de texto “a participar de una evidente función
comunicativa/interpretativa pues sus enunciados buscan sacudir al lector a
partir de la urgencia del mensaje de una crisis histórica, que acecha los
paradigmas mismos de la socialización urbana” (BENCOMO, 2007, p. 24).
No entanto, as já mencionadas crônicas de Villoro vão além das
caracterizações destacadas, pois ao vincular-se com a conformação do
imaginário social, analisa a situação global do país e os vínculos de poder do
narcotráfico e a violência disseminada por esses grupos. Elas problematizam
as estatísticas, analisando a relação estabelecida entre o narcotráfico e o
cidadão comum, a polícia, a política, a igreja e a representação da violência,
apresentada de maneira mecânica nos meios de comunicação, como se
observa nesse trecho de “La Alfombra roja del terror narco” (2008b):
¡Bienvenidos a la década del caos! A ocho años de la alternancia democrática, México es un país de sangre y plomo. El predominio de la violencia ha disuelto formas de relación y protocolos asentados desde hacía mucho tiempo. Los medios de comunicación ampliaron su margen de libertad, pero trabajan en un entorno donde decir la
145
verdad es progresivamente peligroso. […] Un ambiente de naufragio donde la ausencia de principios se disfraza de pragmatismo o medida de emergencia. Los trueques son los de una mascarada: el clero apoya al PAN en Jalisco y recibe a cambio una limosna inmoderada; el sindicato de trabajadores de la educación (el más grande América latina) ofrece más de un millón de votos a Felipe Calderón y obtiene puestos en áreas de gobierno tan decisivas como la seguridad nacional; los monopolios hacen una guerra sucia en los medios durante la campaña presidencial de 2006, presentando al candidato de la izquierda como “un peligro para México”, y reciben un trato que elimina la competencia. Al modo de los Cuatro Fantásticos, los Poderes Fácticos gobiernan en la sombra (VILLORO, 2008b, pp.2-3).
Através de uma linguagem fluida, versatilidade estilística e discursiva,
Villoro detém a análise na participação da mídia, demonstrando como esta
converte a todos em co-espectadores involuntários das atrocidades do
narcotráfico e da disputa pelo poder entre os representantes do poder que ele
denomina de “los Cuatro Fantásticos” ou “Poderes Fácticos, que, para Villoro,
trata-se do poder do narcotráfico, dos sindicatos, da mídia e da igreja. O
cronista afirma que o narcotráfico costuma golpear duas vezes: no mundo dos
fatos e no das notícias:
La televisión acrecienta el horror al difundir en close-up y cámara lenta crímenes con diseño “de autor”. Es posible distinguir las “firmas” de los cárteles: unos decapitan, otros cortan la lengua, otros dejan a los muertos en el maletero del automóvil, otros los envuelven en mantas. En ciertos casos, los criminales graban sus ejecuciones y envían videos a los medios o los suben a You Tube después de someterlos a una cuidadosa posproducción. La mediósfera es el duty-free del narco, la zona donde el ultraje cometido en la realidad se convierte en un informertial del terror (VILLORO, 2008b, p. 3).
Com a queda do PRI em 2000, os meios de comunicação ampliaram sua
margem de liberdade. Isso, no entanto, significa muito pouco, pois dizer a
verdade é progressivamente perigoso, transformando o México numa
Fobópole52. “En la nueva atmósfera del miedo, diez mil empresas ofrecen
servicios de seguridad y cerca de tres mil personas se han injertado un chip
bajo la piel del tamaño de un grano de arroz para ser detectados por radar en
caso de secuestro” (VILLORO, 2008b, p.8). Villoro, nessa crônica, menciona
52
Toma-se esse termo de Fobópole: o medo generalizado e a militarização da questão urbana (2008) de Marcelo Lopes de Souza; é o resultado da combinação de dois elementos de composição, derivados das palavras gregas phóbos, que significa “medo”, e pólis, que significa “cidade”. Esta obra trata dos motivos da violência urbana nas grandes cidades, principalmente Rio de Janeiro e São Paulo (SOUZA, 2008, p. 9).
146
também o perigo por que passam os jornalistas, como já foi mencionado. E
segue comentando sobre o discurso do medo que os meios de comunicação
ajudam a promover
El narco se apoya en el discurso de la crueldad (cruor: “sangre que corre”) donde las heridas trazan una condena para la víctima y una amenaza para los testigos. El jus sangui del narco depende de una inversión kafkiana de los episodios legales; la sentencia no es el fin sino el comienzo de un proceso; el anuncio de que otros podrán ser llamados a “juicio” (VILLORO, 2008b, p.3).
O jornalista mexicano Sérgio González Rodríguez, autor de Huesos en
el desierto (2005), que trata do feminicídio na Cidade de Juárez e El hombre
sin cabeza (2009), que investiga as diversas questões que estão por trás das
centenas de decapitações realizadas pelo narcotráfico nos últimos anos,
colhendo, inclusive, depoimento dos decapitadores53, foi “amenazado,
golpeado y perseguido” (PAVÓN, 2009, p.1). Essa situação demonstra que
todos podem ser chamados ao “juicio”.
Villoro aborda também a “narcocultura”, ressaltando ser esta, através
dos narcocorridos, uma realidade incrustada há bastante tempo na população
mexicana. E ele comenta:
La narcocultura amplió su radio de influencia a través de los narcocorridos, muchas veces pagados por los propios protagonistas. En la confusión ambiente, los trovadores vinculados al crimen gozan del dudoso prestigio de lo ilegal que reclama un carisma a contrapelo y se somete a la “moral del pueblo. Sus deprimentes acordeones acompañan una saga de la rapiña que, por más que lleve alumbrado y carreteras a las comunidades que cultivan la amapola, no resiste la comparación con Robin Hood. Aunque suene curioso o divertido o folklórico cantar las peripecias de quienes llevan “hierba mala” al otro lado, los narcocorridos pertenecen a un sector que mueve el 10% de la economía (lo mismo que el petróleo) y causa decenas de asesinatos al día” (VILLORO, 2008b, p. 3).
53
Primero me tomo cuatro o cinco tequilas antes de actuar, porque no sé si vamos a encontrar al candidato y ejecutarlo. Llegado el momento, con o sin testigos del grupo, todavía calentito el cuerpo, lo pongo boca abajo, en el borde de un sillón o silla, y le dejo caer el machete, siempre con las dos manos para tener fuerza y que no me rebote el golpe con el hueso de la columna. Después meto la cabeza en una toalla, o con las ropas del muerto la envuelvo para que le salga toda la sangre, porque me enseñaron que las venas del cuello están cargadas de sangre […].” Esta é a transcrição do relato de um decapitador a Sérgio González Rodríguez (GONZÁLEZ RODRÍGUEZ, 2009, p.151).
147
Nesse pequeno trecho, estão condensadas questões importantes: a
relação de naturalidade com que a população lida com os narcocorridos, pois
não são vistos como ilegais. Pelo contrário, são muito populares, sendo
bastante comum ouvi-los, cantá-los e comprá-los. Destaque-se também, neste
caso, a ação assistencialista dos narcotraficantes em seu relacionamento com
a população e a quantia significativa movimentada por esse tipo de música.
Para entender a questão do narcocorrido no México, vale recordar a
crônica “¡Ya viene Pancho Pistolas” (1926), de Salvador Novo, que comenta
sobre a popularidade destas músicas, mostrando também que, já naquela
época, havia uma forma um tanto pejorativa de tratar a cultura nortenha. É o
que se observa no trecho, logo após ele ter citado uma estrofe do corrido a
Pancho Villa:
Así comienza un reciente corrido, que cantan no aquí, no en otras ciudades con barrios influidos de lo que ya se clasifica como literatura popular; no aquí, donde cantar es el modo de vida de los rápsodas bebedores de pulque, sino en el genérico “norte” (NOVO, 1926, p. 1).
Como se pode observar, nessa crônica do início do século XX, há as
bases do corrido que aparece no texto de Villoro, assim como também a
fronteira norte do país, vista como uma só cultura, o qual Novo critica. Essa
crônica remete às memórias do autor no período da Revolução, retratando a
invasão de sua cidade pelo bando de Pancho Villa54, o assassinato de seu tio
no lugar do pai, o toque de recolher, o massacre dos chineses55 e os saques,
caracterizando o que se poderia chamar de crônicas imaginárias, uma vez que
perderam, não apenas o aspecto referencial, mas também a atualidade, pois
Novo narra os primeiros anos da Revolução, nos quais tinha menos de dez
anos. Outra questão, que também aparece na crônica de Novo e em “Nada que
declarar”, refere-se aparentemente a uma situação recente: a migração, sobre
a qual comenta Novo:
Y en unos cuantos años aquella región se puebla maravillosamente. Los chinos abren una lavandería y restaurantes; los españoles
54
Na Cidade da infância de Novo, Torreón, ocorreram quatro batalhas, em 1911, 1913, 1914 e
1916, no período da Revolução Mexicana. 55
Na crônica, Novo comenta o massacre efetuado pelas forças maderistas com a morte de mais de trezentos chineses, em 1911.
148
hoteles y tiendas de “comestibles”; donde irán a surtirse cada domingo los hombres de los ranchos de algodón (NOVO, 1926, p.1).
“Los chinos invisibles” é, como denomina Villoro, uma parte desse texto
que trata da imensa comunidade chinesa na fronteira norte do México. O
cronista se aproxima do tema, através de uma conversa com Daniel Sada e, de
maneira irônica, inicia com um questionamento sobre os restaurantes: _
¿Sabes qué cultura une a México y Estados Unidos? – Daniel Sada entrecerró
los ojos, como un pícher en el montículo, y lanzó la respuesta–: La comida
china” (VILLORO, 2005a, 134).
Retomando a questão da “narcocultura”, percebe-se que esta vem
ganhando espaço nos meios de comunicação de massa, principalmente no
rádio, além de substituir também textos de escritores da tradição literária
mexicana, como se observa nesse trecho da crônica de Villoro:
Lo extraño es que han ganado espacio en las estaciones que transmiten música popular y aun en las antologías de literatura. En nombre de un incierto multiculturalismo, hace un par de años un grupo de escritores protestó porque dos narcocorridos fueron suprimidos de un libro de texto. En su queja pasaron por alto que esas letras no se estudiaban en una clase sobre problemas de México, sino sobre literatura, sustituyendo a Amado Nervo o Ramón López Velarde (VILLORO, 2008b, p. 4).
Como pode ser observar nos trechos destacados, Villoro apresenta uma
imagem de conjunto no qual se observam as diferentes perspectivas do
problema. Há certamente críticas a respeito da “narcocultura” disseminada nos
meios de comunicação de massas, assim como aos escritores que se dedicam
a escrever sobre esse problema como possíveis apologistas do narcotráfico.
Fato ocorrido com Julio Sherer devido à publicação de uma entrevista
concedida a ele pelo narcotraficante mais procurado do país naquele no
momento, Ismael Zambada García, El Mayo.
Para Juan Villoro, o desafio jornalístico na contemporaneidade é discutir
como e em que linguagem a violência deve ser noticiada na imprensa escrita
para não correr o risco de amplificá-la, como menciona em entrevista cedida a
Sylvia Colombo do jornal Folha de São Paulo:
149
No México há uma grande discussão sobre como retratar a violência do narcotráfico, mas acho que ela se aplica a vários países, como a Colômbia e o Brasil, por causa do narcotráfico e do crime organizado, e até mesmo a Londres, para usar um exemplo mais recente. É inevitável que, ao publicarmos notícias e fotos, amplifiquemos o efeito de um ato violento. Penso que há limites que deveriam ser discutidos, sob o risco de fazermos mais propaganda da violência e alimentá-la. E o uso da linguagem tem um papel importante nisso. Por exemplo, em meu país, quando os traficantes dizem que sequestraram alguém, usam o termo "levantado". E os jornais passaram a fazer o mesmo. É um erro, porque se trata de uma expressão que ameniza o horror do fato. Por outro lado, há uma busca pela audiência, hoje potencializada pela internet, que faz com que tudo o que tenha sangue seja valorizado. A máxima "if it bleeds, it leads" [se sangra, tem destaque] nunca foi tão verdadeira. O que muitos editores não se dão conta é que, se você busca ressaltar apenas o mais sangrento, corre o risco de provocar uma distorção da verdade, na qual os acontecimentos mais importantes são os violentos. Na verdade, a violência é sempre consequência de alguma coisa, parte de um contexto que precisa ser explicado (VILLORO apud COLOMBO, 2011, p. 1).
A preocupação de Villoro também é compartilhada por González
Rodríguez (2011), que em uma dura crítica ao jornalismo mexicano, diz: “De
hecho, cuando uno abre las páginas de cualquier medio impreso del país, casi
se puede adivinar el trato a ciertas noticias [...]. ¿Quién se murió? ¿Cuántas
víctimas hubo? ¿Ya lo desmintió el vocero oficial? (GONZÁLEZ RODRÍGUEZ,
2011, p. 121). No entanto, é preciso reconhecer que é uma aproximação
complicada. Nessa relação difícil em que o jornalismo ocupa um papel
importantíssimo, pois não se pode negar que é imprescindível informar a
população, talvez seja possível pensar que a crônica tem contribuído para
atenuar essa tensão no meio jornalístico e por isso também esteja ocorrendo a
sua expansão. Isso não significa dizer que se deve transformar a violência em
ficção, mas que a mistura de gêneros propõe um equilíbrio que evita a
banalização e a teorização. Sergio González Rodríguez, ao criticar a maneira
como o jornalismo lida com o problema da violência, ressalta as características
da prosa de Villoro em um meio tão hostil, e diz:
En un medio semejante, Juan Villoro ha sido una y otra vez la excepción. Quizás porque ha logrado darle la vuelta a las inercias dominantes mediante un cortocircuito básico: hacer que la literatura sea instrumento del periodismo y vice-versa. Este distingo, al que muchos aspiran e incluso presumen sin cumplirlo, marca la diferencia entre dedicarse a periodista porque se falla en literatura, y asumir la literatura como un campo entero que ocupa también la prensa (GONZÁLEZ RODRÍGUEZ, 2011, p. 121).
150
É importante salientar que, a partir de 1990, aumentou
consideravelmente a quantidade de publicações e escritores dedicados a
narrar a violência do narcotráfico por meio da crônica56. Como produto do
neoliberalismo, da globalização e das políticas de repressão contra as drogas,
esses textos muitas vezes representam a lógica de oferta e demanda de um
mercado capitalista, ao mesmo tempo uma crítica de incentivo às práticas de
consumo. Muitos deles apresentam características formais similares, como a
temática e a linguagem. Entretanto, não constituem um gênero literário em
particular, como ressalta Alberto Fonseca em sua tese Cuando llovió dinero en
Macondo: Literatura y narcotráfico en Colombia y México (2009): “desde el
punto de vista formal, las narconarrativas utilizan una gran variedad de
discursos y estrategias que impiden su definición a partir de reglas de
géneros”57 (FONSECA, 2009, p.11).
Em “La frontera de los ilegales” o cronista se ocupa da complexidade da
fronteira mais vigiada do mundo, da imensa quantidade de imigrantes hispanos
que conseguem atravessar e transformam Los Angeles na “segunda ciudad y
el guacamole es ya la segunda botana consumida” (VILLORO, 1995, p.1). Isso,
porém, não afasta o fato de que o trabalhador indocumentado seja chamado de
“la bestia que infundió el espanto en el espacio exterior; es alien” (VILLORO,
1995, p.1). Daí ele comentar mais adiante que a função das aduanas não é
controlar o fluxo de mercadorias, pois “lo importante es detener a la raza”
(VILLORO,1995, p.1). São seres em interstícios, em um movimento
exploratório incessante, que o termo francês au-delà capta muito bem, aqui e
lá, de todos os lados, fort/da, para lá e para cá; para frente e para trás, mas a
maioria ficará em um trânsito quase inerte (BHABHA, 1998). Ou ficarão ali
mesmos, pois “todos los días hace the body count, el conteo de los migrantes
56
Dentre os títulos de livros de crônicas na atualidade, destacam-se: El cártel incómodo (2006), de José Reveles; Marca de sangre (2011), de Héctor de Mauleón; Los señores del narco (2010), de Anabel Hernández; El narco en México (2012), do jornalista Ricardo Ravelo, entre muitos outros. 57
Há uma extensa e acirrada discussão sobre esse tema, porém a expectativa excede o objetivo dessa pesquisa. Para avançar na discussão a respeito da denominação específica do gênero que envolve a narrativa sobre o narcotráfico pode-se ler os textos críticos de Rafael Lemus “Balas de salva: notas sobre el narco y la narrativa mexicana” (2005), que denomina a narconarrativa como sub-gênero; e Eduardo Antonio Parra em “Norte, narcotráfico e literatura” (2005) que interroga sobre quantas narrativas são necessárias para que surja um gênero.
151
que mueren tratando de llegar a un trabajo en Estados Unidos” (VILLORO,
2011a, p. 7).
A referência à criatura de Alien, o oitavo passageiro58, que aparece no
texto citado e também na crônica “Nada que declarar: welcome to Tijuana”,
permite ao autor uma aproximação com a cultura popular, que é uma
característica de sua prosa, a qual, desde os primeiros escritos, recorre a
imagens do cinema e da televisão, letreiros de anúncios publicitários59 e
canções populares. Porém, ao mencionar esse personagem, o cronista propõe
uma discussão que está centrada em dois temas: a presença do narcotráfico
na fronteira e a exploração dos “espaldas mojadas”, fazendo referência a
como são denominados os que tentam atravessar para “el otro lado”.
Numa parte denominada “Aliens”, o cronista inicia mencionando as
garrafas de vinho consumidas na Califórnia, uma vez que os degustadores
ignoram as condições de trabalho para a sua produção. Em seguida, aparece
um cruzamento de vozes recolhidas em um diálogo que oscila entre o medo, a
luta contra as autoridades, o desespero da pobreza e a esperança em alcançar
o outro lado da fronteira:
La frontera es una vasta operación narrativa; los relatos prueban que atravesar es posible, que Rubén y Chucho y Carmen y Ramona ya trabajan en la fresa o en la uva, que burlaron los aviones mosquito y el ojo de tigre, un aparato equipado con censores de calor. Pronto, uno de ellos será, felizmente un alien en Estados Unidos (VILLORO, 2005a, pp. 140-141).
Essas vozes que se misturam se sobrepõem e que se organizam nesse
espaço impreciso diante de uma realidade difícil não se negam a contar suas
histórias, suas angústias. “Pensé que sería difícil conversar con ellos, pero en
la ribera mexicana del río, antes de ser buscados por los fanales de los
helicópteros, los aprendices de indocumentados hablan sin parar” (VILLORO,
2005a, p. 140).
58
Alien, o oitavo passageiro, filme de EUA/Reino Unido, 1979, de Ridley Scott. 59
Nessa crônica, o narrador destaca um letreiro na fronteira que anuncia: “Afuera de una guarita, un enorme anuncio delata las consequencias del comercio entre los dos países: Herpes? Call 800 336 CURE” (VILLORO, 2005a, p. 135).
152
A fronteira norte do país contempla muitos cronistas e romancistas que
abordam em seus textos o problema do narcotráfico, da imigração e da
violência: Daniel Sada, David Toscana, Cristina Rivera Garza, Luis Humberto
Crosthwaite, Élmer Mendoza, entre muitos outros. Essa é uma questão que
deve ser abordada pelos cronistas de fronteira? É um problema que atinge a
todos, porém certamente a fronteira tem sido muito afetada, como afirma Villoro
“En la zona menos documentada de México, donde Nuevo León y Tamaulipas
el rincón noreste del país, se encienden velas negras para pedir por las “cosas
difíciles”. ¿Quién responde a esas plegarias? La dama de los desiertos sin
nadie: la Santa Muerte60” (VILLORO, 2012d, p.1).
Outra questão abordada também nessas crônicas é o posicionamento
de vigilante que Estados Unidos exerce ou pensa exercer em relação ao
México, como aparece na parte chamada “Hierba mala” de “Nada que
declarar”:
Después de la guerra fría, Estados Unidos, incapaz de realizar sus virtudes sin enemigos arquetípicos, sustituyó al Comunista Devorador por el Capo Latino. El narcotráfico prospera en el continente gracias a las redes del crimen organizado, pero sabemos muy poco de los barones de la droga que operan más allá de la frontera norte. En cambio, una insistente propaganda nos pone en contacto con la vida íntima y las minuciosas fechorías de cada cártel latinoamericano (VILLORO, 2005a, p.238).
Por acreditar que o México não controla adequadamente o tráfico de
drogas no país, este sofre, consequentemente, um “processo de certificação”61,
como se observa nesse trecho, no qual José Manuel Torres cita Fernández
Menéndez, para relatar essa situação complexa a que o país é submetido:
El único gran centro del narcotráfico internacional que no es investigado, que no está sujeto a certificación alguna, es un país que consume 50% por ciento de las drogas ilegales que se producen
60
É uma figura popular que personifica a morte e é objeto de culto entre muitos
narcotraficantes, porém “Cabe aclarar que dicho culto no es exclusivo de grupos marginales o
excluídos. También hay creyentes de diversas posiciones económicas y estratos socio-
culturales” (GAYTÁN ALCALÁ, 2008, p. 41). 61
O tráfico de drogas é, entre outros, um problema de mercado e de demanda, concluindo que a política de “certificação”, no qual a Washington cabe “juzgar, evaluar y castigar a los regímenes de acuerdo con sus criterios de cumplimientos en la guerra contra las drogas” (PETRAS/VELTMEYER, 2003, p. 183). Faz com que o objetivo maior não venha a ser alcançado.
153
mundialmente, que tiene 20 millones de consumidores habituales, seis millones de adictos, un país al cual el tráfico de drogas le genera, según las cifras oficiales y más conservadoras, utilidades por 60 mil millones de dólares anuales, que no sabe, oficialmente, quienes son los jefes de esas extensas redes y que considera que dentro de sus fronteras no hay cárteles: se trata de Estados Unidos el certificador descertificado (FERNÁNDEZ MENÉNDEZ apud TORRES TORRES, 2009, p. 3).
Villoro, mesmo diante de temas supostamente mais sérios, mantém
características muito peculiares às suas crônicas: o humor, o sarcasmo e as
tipologias caricaturescas. É o que ocorre quando ele menciona os apelidos dos
narcotraficantes e percebe-se que até parecem ficção:
el capo no requiere de más pasaporte que un apodo; puede asumir un sobrenombre de teodicea (el Señor de los Cielos), ranchería (Don Neto) o dibujos animados (el Azul). Los más temibles son los que insinúan una coquetería femenina que los hechos refutan con fiereza: la Barbie, el Ceja Güera (VILLORO, 2008b, p.7).
Alude-se também a uma mistura de humor e sarcasmo, quando
menciona o olhar de desprezo que alguns ainda nutrem a respeito do problema
das drogas e da violência: “La estrategia defensiva de no mirar o de asumir que
los atracos ocurren lejos, en un parque temático del ajuste de cuentas para el
que por suerte no tenemos entradas, se ha venido abajo” (VILLORO, 2008b,
p.8). Afinal, muitos acreditam que o narcotráfico é uma questão que ocorre
apenas na periferia, em locais abandonados dos grandes centros urbanos.
O final aberto, característica da crônica e não somente do autor,
possibilita um panorama de interpretação diante da matéria apresentada. No
entanto, em “La Alfombra roja del terror narco” (2008b), o cronista, após uma
longa discussão sobre o título da crônica, faz referência a uma instalação da
artista plástica sinaloense Rosa María Robles, que construiu um tapete com
oito cobertores sujos de sangue de vítimas da violência, que ela havia
conseguido clandestinamente numa delegacia de polícia. O autor encerra com
uma reflexão cheia de indignação, quase uma convocação “Todos tenemos
méritos para pisar esa alfombra. De manera simultánea, el terror se ha vuelto
más difuso y más próximo. Antes podíamos pensar que la sangre derramada
era de “ellos”. Ahora es nuestra” (VILLORO, 2008b, p.9).
154
Já em “Nada que declarar”, o cronista, após uma discussão sobre o que
ele chama de “teatro de las simulaciones bilaterales”, faz referência ao governo
americano por ter endurecido a postura em relação à fronteira por motivos
políticos, contando, inclusive, com o apoio de mexicanos legalizados. Ele
destaca que esse governo pretende, com tal gesto: “conquistar el voto racista
(incluído el de muchos chicanos que ya tienen papeles en regla)” (VILLORO,
2005a, p. 142). Põe em evidência, também, o governo mexicano, que se
aproveita da situação, posicionando-se como vítima: “Los paisanos asfixiados
en un vagón de carga, los huesos descubiertos en un breñal y la xenofobia de
la policía de Los Ángeles permitieron al decano de los países sin democracia
protestar en nombre de los derechos humanos” (VILLORO, 2005a, p.142). No
final da crônica, retoma a imagem de norte-americanos desfrutando o vinho em
um terraço californiano, enquanto imigrantes recolhem uvas no Valle de Napa.
Ao fundo, está um neon com o slogan de promoção do filme Alien na época do
lançamento para demonstrar a impotência diante do terror “en el espacio
exterior, nadie puede oír tu grito” (VILLORO, 2005a, p. 142).
A alusão à pós-modernidade como algo fragmentado pode ser percebida
também nas primeiras linhas de Tiempo transcurrido ao mencionar que, no
México, os fatos históricos tradicionais ocorreram em números redondos, 1810,
1910, mas as crônicas romperam com essa tradição, pois “parece un reloj con
la carátula resquebrajada” (VILLORO, 2006a, p.9). Deste modo, Villoro, em vez
de focar nos grandes próceres ou datas de transições políticas, 1810, a data de
início da Independência mexicana encabeçada por Miguel Hidalgo y Costilla e
1910, o começo da Revolução Mexicana sob a liderança de Francisco I
Madero, propõe um recorte dentro do período de 1968 e 1985, nos quais as
crônicas apresentam em primeiro plano as vozes de personagens que podem
ter vivido no período que compreende os textos, mas que não aparecem nas
histórias oficiais.
Os personagens dessa obra são espectadores e, ao mesmo tempo,
protagonistas dos eventos ocorridos. Eles não estão alheios à História oficial,
pois fazem parte dela, porém a história pessoal está acima da nacional. A
importância das crônicas se encontra nesse ponto, uma vez que, ao retornar a
155
um momento histórico, procura recuperar a memória coletiva, além de
apresentar outras versões através da literatura, pois os protagonistas:
se mueven entre ambos polos del binomio testigo/personaje, de manera tal que pertenecen por origen a los primeros y por reconstrucción, a los segundos. Habitan un presente que soporta estoicamente el lastre de un pasado del cual no puede, o no quiere deshacerse, pues hacer lo supone la cancelación de un tiempo seductor e idealizado, pleno de ilusiones y motivaciones (GUTIÉRREZ TORRES, 2013, p.1).
Gus, o protagonista da crônica “1968”, é um exemplo do comentado,
pois enquanto ocorria o massacre na Plaza de las Tres Culturas, ele, que tinha
apenas doze anos, recuperava-se de uma cirurgia nas amídalas e ficou
sabendo do ocorrido por amigos na escola. Ficou confuso com as diversas
informações recebidas, como se percebe nesse trecho:
Se enteró de un juego que había sustituido al de policías y ladrones: policías y estudiantes. Sus amigos le dieron versiones contradictorias de lo que pasó mientras estuvo en el hospital. Alguien decía que los rusos se habían “infiltrado” (Gus pensó en un gigantesco colador de café) en México, otro aseguraba que los estudiantes querían “boicotear” (la palabra “boicot” le sonaba a choque de trenes) la Olimpiada (VILLORO, 2006a, p.17).
Observa-se que Gus resgata os “años como vidrios rotos” (VILLORO,
2006a, p.9), como pode ser percebido ao longo deste texto, no qual o
protagonista vai tomando consciência do acontecido. No prólogo, o cronista
comenta a opção por esse período: “Mil novecientos sesenta y ocho fue el
punto de partida en la cuenta de los años” (VILLORO, 2006a, p. 10). Desde as
primeiras páginas, já se reconhece um locus histórico e uma “consciencia
política” (PRICE, 2011, p. 275). A data de novembro de 1985, que fecha o
prólogo, revela que o texto terminou dois meses após o sismo que afetou a
cidade:
Escribí la crónica de 1985 antes del terremoto. La destrucción de la ciudad hizo que esa fecha cobrara otro sentido. Sin embargo, no quise alterar el texto. No puedo pensar en el sismo como asunto literario; desconfío de los que en momentos de peligro tienen más opiniones que miedo. Pero tampoco puedo seguir acumulando años hasta llegar a un prestigiado múltiplo de 10 (VILLORO, 2006a, p. 11).
156
Neste trecho, Villoro declara que já havia terminado o texto e que não
pensou em aproveitar o desastre para atualizar a crônica “1985”. O
protagonista é um jovem, Rick, cuja participação é finalizada numa cena
apocalíptica. Depois de assistir, por dezesseis horas seguidas na televisão
com antena parabólica, uma imensa novidade para a época, um espetáculo de
rock, ele passeia pela cidade. Ao parar no semáforo, é abordado por diversos
vendedores ambulantes, que “le ofrecieron mapas, conejitos vivos, lápices de
un metro, monos de peluche, chicles, calaveras de plástico, hules de uso
indefinido y macetas de cactos” (VILLORO, 2006a, p.125), além de crianças
que lavam para-brisas, dançarinos com aspectos de indígenas, palhaços e
cuspidores de fogo. Nada, porém, o comoveu. Baixou o vidro do carro poucos
centímetros e “dejó caer la moneda, como quien la deposita en un buzón”
(VILLORO, 2006a, 125) No auge de sua indiferença, em seguida, Rick
arrancou com o carro e “se secó el sudor de la frente con un klínex”, ignorando
a poeira e a miséria ao seu redor.
O fato de o cronista terminar o texto antes do sismo é interessante, pois
a crônica se alimenta do cotidiano, e o terremoto compreende esse requisito.
No entanto, Price (2011) acredita que “Villoro se declara en contra de utilizar el
desastre para fines personales. Es más, su reticencia frente al temblor subraya,
una declaración política de solidaridad” (PRICE, 2011, p. 276). Cabe ressaltar
também, como revela Monsiváis (2013) e José Agustín (2007), que o terremoto
contribuiu para a formação da “sociedade civil62” no México, e é este
posicionamento que emerge ao declarar que não se pode pensar o terremoto
somente como assunto literário.
Ao declarar que desconfia dos que têm mais opinião que medo, Villoro
ressalta questões políticas, sociais e econômicas que estão submersas nesse
pequeno trecho. Por um lado, há a mobilização espontânea da população,
formando uma imensa força tarefa de resgate: “Un extraordinario, inesperado y
62
Este é um termo que abrange muitas controvérsias e amplas definições, porém esse trabalho se apoia no conceito que John Keane oferece em seu livro Civil Society. Old Images, New Visions que diz“A sociedade civil [...] é uma categoria ideal-típica [...] que descreve e prevê um conjunto complexo e dinâmico de instituições não governamentais legalmente protegidas que tendem a ser não-violentas, auto-organizadas, auto-reflexivas e permanentemente em tensão entre si e com as instituições do Estado que "enquadram", constrangem e habilitam suas atividades” (KEANE, 1998, p. 6, tradução minha).
157
oportuno sentimiento de solidaridad se dio entre muchos habitantes de la
ciudad de México. Se formaban cadenas humanas para salvar a las víctimas”
(AGUSTÍN, 2007, p.70). Sentimento que “jamás se imaginaron que un
terremoto se volvería mítico y que de entrada significaría el acta de nacimiento
oficial de la sociedad civil mexicana” (AGUSTÍN, 2007, p.72). E em seguida,
formando organizações para defender os direitos das vítimas, como por
exemplo, a Coordinadora Única de Dannificados (CUD), Coordinadora de
Luchas Urbanas (CLU), a Coordinadora Nacional del Movimiento Urbano
Popular (Conamup) e a Unión de Vecinos y Dannificados de 19 de sep.
(UVyD). Do outro, o governo priísta, que não sabia o que fazer, mas se
apressou a desmobilizar os grupos espontâneos de ajuda e distribuir volantes
que diziam “Malos mexicanos pretenden desorientarnos. Rechacemos
cualquier actitud que ponga en peligro la vida de nuestros hijos y familiares”
(AGUSTÍN, 2007, p.72). E como destaca Villoro em uma das poucas crônicas
sobre esse tema:
El terremoto desnudó tramas de corrupción y confirmó la inoperancia del Gobierno. Muchas cosas podían ser criticadas. Más allá de eso, nos dio una lección elemental, tan antigua como el primer asentamiento humano: no somos dueños de la ciudad; en todo caso, podemos lidiar con los desechos para que la ciudad exista (VILLORO, 2015a, p.5).
Como aparece no final do prólogo de Tiempo transcurrido, Villoro
demonstra resistência ao abordar o terremoto como tema de seus textos. O
sismo aparece como pano de fundo nas crônicas “Los convidados de agosto” e
“El olvido: un itinerario urbano en México DF”. No romance Materia dispuesta,
no qual o protagonista é ““hijo del sismo”: nace durante el temblor de 1957, que
derrumbó el Ángel de la Independencia en Paseo de la Reforma […]. El
desenlace ocurre en 1985, durante el temblor que destruyó la ciudad de
México” (VILLORO, 2010a, p. 18) e em sua primeira peça de teatro Muerte
parcial, porém em nenhuma dessas obras o terremoto ocupa o centro da
discussão. Ressalte-se que o autor já havia passado por três terremotos, no
México em 1979 e 1985 e, no Chile em 2010 quando participava do Congreso
Iberoamericana de Literatura Infantil y Juvenil, deste último publica 8.8: el
miedo en el espejo – una crónica del terremoto en Chile. Quando questionado
158
em entrevista sobre a desconfiança de, nos momentos de perigo, ter mais
opinião que medo, responde:
Esa frase surgió en 1985. Acababa de concluir mi libro Tiempo transcurrido […] Abarca 18 años de la vida en México: del movimiento estudiantil del 68 a la víspera del terremoto. Pero no quise aprovechar esa tragedia porque le daba un desenlace sensacionalista al libro. Además, estaba demasiado cerca del tema. Fui brigadista después del terremoto, uno de mis mejores amigos murió ahí; me pareció oportunista opinar sobre algo que no era otra cosa que un espanto. Durante 25 años aludí al tema en cuentos y novelas pero nunca lo enfrenté en forma directa. El temblor de Santiago me obligó a hacerlo. Sentí que al fin podía encarar el miedo que llevaba dentro sin ser victimista o tremendista. Había convivido con esa sombra lo suficiente para saber que es una compañía que en cierta forma me define (VILLORO apud OJEDA, 2011, p. 1).
Com a publicação de 8.8, Villoro parece saldar uma dívida literária com o
tema terremoto e restabelecer conexões perdidas. O título da obra: “El miedo
en el espejo”, converte em reflexo o vivido no México em 1985 e permite
transcender ambos os eventos
El terremoto de Chile activó otro, el que destruyó mi ciudad, y que he evocado en la escritura de varios modos, todos ellos indirectos, tal vez por pudor ante un sufrimiento demasiado próximo, tal vez por superstición de no tentar la desgracia (esa aniquilación marcó un límite, un borde definitivo, algo que no debe traspasarse, la línea amarilla en el lugar del crimen, la zona adonde no llegan las palabras). La escritura elige distancias. El dolor cercano se vive mejor en el llanto que en la página. Tuve que ir al fin del mundo para encontrar otra “primera ocasión”: hablar de la Tierra que se abre (VILLORO, 2010a, p. 174).
Roberto González, em setembro de 2015, ao completar trinta anos do
terremoto, reúne testemunhos de pessoas reconhecidas no mundo da
literatura, do jornalismo, do teatro e do esporte que viveram o abalo 8.1 graus
no México, entre eles: o ator Daniel Giménez Cacho, a cantora Regina Orozco,
o ex-jogador Miguel España, Juan Villoro, dentre outros. Cada um revelou em
poucas palavras sua memória. O autor de Los once de la tribu declarou:
“Cuando ocurrió el sismo, yo estaba en Tlalpan, zona que no es sísmica, pero
donde también se sintió muy fuerte. Se fue la luz, también el teléfono. […] dos
cosas se me grabaron de inmediato: la devastación de la ciudad y la
solidaridad de la gente” (GONZÁLEZ apud VILLORO, 2015, p.2).
159
O título Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias faz alusão à
mensagem dos telefones públicos que entraram em funcionamento em 1960 e
que, após a expansão dos telefones fixos e móveis, caíram em desuso. A frase
dizia: “tiempo transcurrido, para continuar, deposite sin colgar otra moneda”.
Villoro resgata essa mensagem no seu prólogo: “Hace tiempo recogí una
moneda que sólo compraba las cosas de antes. Agoté su valor en estas
crónicas. Como en los teléfonos públicos, ha llegado el tiempo de buscar otra
moneda” (VILLORO, 2006a, p.10-11).
Muitas crônicas de Villoro refletiram sobre momentos históricos. Entre as
mais frequentes estão as que mostram o movimento do Ejército Zapatista de
Libertación Nacional (EZLN), que aparecem em “Los convidados de agosto” e
“El guerrillero inexistente”, incluídas em Los once de la tribu e “Un mundo (muy)
raro: los zapatistas marchan”, de Safari accidental. Em “Los invitados de
agosto”, Villoro narra sua viagem da Cidade do México a Aguascalientes para
assistir à Convención Nacional Democrática (CND), com outras seis mil
pessoas e centenas de jornalistas. Como aparece no prólogo da crônica
carregada de humor e ironia a figura do subcomandante Marcos “Sua voz
controlada expresaba dominio escénico” (VILLORO, 1998, p.259). Ao lado do
olhar crítico, porém, coexiste o respeito pelos indígenas:
hombres, mujeres y niños, con los rostros cubiertos por pañuelos y un palo en la mano. […]. El EZLN tiene una estatura promedio de 1.55, una edad media de 20 años y obsoletos rifles de cacería. […] Es difícil imaginar un ejército más precario […] vestidos de civiles, para iniciar la más casera de nuestras rebeliones (VILLORO, 1998, p. 271).
Villoro, em todas as crônicas sobre o EZLN, destaca o culto à
personalidade do líder da rebelião: “Marcos no es un poeta lírico ni un
representante del realismo mágico; […] los muertos y la guerra son reales;”
(VILLORO, 1998, p. 272). Em “Un mundo (muy) raro: los zapatistas marchan”
segue criticando Marcos: “tan fanático como otros rebeldes de América Latina”
(VILLORO, 2005a, p.56). Critica sua estratégia também: “[…] en la toma de
Ocosingo, el EZLN mandó a una muerte segura a indígenas armados con rifles
de palo. Usar tropas “desechables” como estrategia de distracción es una
160
cuestionable táctica de guerra” (VILLORO, 2005a, p. 56). Nas crônicas, fica
claro o apoio ao zapatismo, mas não à figura de Marcos. No entanto, não deixa
de reconhecer sua importância para a evolução, a renovação e até certo êxito
do movimento:
El subcomandante Marcos renovó el lenguaje político con sentido del humor, parábolas de la Biblia, leyendas mayas, realismo mágico y aforismos de la contracultura. Algunos dudaron de la legitimidad de un intelectual de clase media como vocero de los indios. Otros decidieron tomar en serio su propuesta de cambiar el país desde abajo, con los más débiles. Enemigo de la lucha armada y la izquierda dogmática […]. (EZLN) dio un giro sorprendente: la guerrilla con apariencia guevarista se transformó en el movimiento político que prosigue hasta la fecha (VILLORO, 2016a, p.1).
Outra característica destacada é o carácter tecnológico dos eventos. “La
Convención era una épica de la realidad virtual” (VILLORO, 1998, p. 262). É
importante também ressaltar o uso que o subcomandante faz dessa realidade
virtual: “Marcos, el evangelista armado de e-mail” (VILLORO, 1998, p. 261).
“El guerrillero inexistente” narra a tentativa governamental de, ao revelar
a verdadeira identidade de Marcos, eliminar o mito da máscara, com o objetivo
de acabar com sua popularidade. Tal procedimento foi aprofundado para se
contrapor à rebelião do EZLN pela entrada do México no Tratado de Livre
Comércio da América do Norte (TLCAN63). Em toda essa crônica, Villoro
demostra o desmantelamento das ilusões da classe média mexicana: “Era
obvio que eso no podía durar pero la clase media se sentía dichosa en el
nuevo país de Oz. En 1994, la rebelión zapatista nos sacó del sueño”
(VILLORO, 1998, p. 281). Destaca também a máscara como elemento de
construção da identidade, utilizando para isso elementos da cultura popular e
da cultura de massa: “la identidad fugada de los rebeldes, su condición de
vengadores anónimos, a la manera de Batman o los encapuchados del Popol
Vuh” (VILLORO, 1998, p. 281). Ressalta, porém, que a retirada da máscara
não fortaleceu o governo, como se observa neste trecho que narra uma
pequena biografia do subcomandante:
63
Esse termo apresenta siglas diferentes de acordo com o idioma. Em inglês: North American Free Trade Agreement (NAFTA); Opta-se aqui pela sigla em espanhol para Tratado de Libre Comercio de América del Norte (TLCAN).
161
Rafael Guillén es hijo de empresarios, alumno de escuelas católicas, hermano de una diputada del PRI, fue premiado por el presidente López Portillo por su rendimiento académico, hizo estudios en la Sorbona, su director de tesis fue el filósofo Cesáreo Morales, que se convertiría en coordinador de asesores de Luis Donaldo Colosio. Al gobierno le convenía un troglodita de las ideologías, inscrito en algún programa de "viajero frecuente" a Corea del Norte, o un psicópata dispuesto a usar una sierra eléctrica según las indicaciones de Quentin Tarantino. En cambio, encontraba al hijo-cuñado-yerno-novio perfecto para la Gran Familia Mexicana. Para colmo, unos días antes del "destape" el secretario de Educación Fausto Alzati tuvo que renunciar por usurpar un doctorado que nunca cursó. Comparada con la trayectoria de los gobernantes, la vida de Marcos parecía un camino de virtud (VILLORO, 1998, pp. 283-284).
Aparece nesse texto que, ao contrário do que planejou o governo
quando revelou a identidade de Marcos e declarou a ofensiva contra o EZLN, a
pessoa desmascarada em nada parecia com o homem ameaçador imaginado
e, ao mesmo tempo, revelava-se um escândalo que transformava Marcos em
figura exemplar. A retirada da máscara contribuiu para que aumentasse a
empatia pela causa zapatista ao grito de “Todos somos Marcos”. Villoro termina
a crônica, suscitando a figura de Doroteo Arango64, que entrou para a história
com seu apelido e não com seu nome verdadeiro. Parafraseando o romance de
El caballero inexistente, de Ítalo Calvino, comenta o narrador: “el protagonista
de Italo Calvino es una armadura sin cuerpo. Las máscaras políticas están
hechas del mismo relleno; el pasamontañas no oculta sino aire, la nada en que
se diluyen los signos previos de las figuras públicas” (VILLORO, 1998, p.284).
Villoro se ocupa da TLCAN em diversas obras, porém, em “Los
convidados de agosto”, ressalta a mistura da grave situação econômica por
que passa o México e o uso da mídia por ambos os lados: governo e
zapatistas. Como diz Jaime Martínez Veloz: “Cuando las cosas no les salen
bien a los gobiernos, éstos recurren al manualito del escándalo y al show
mediático del discurso justiciero [...]” (MARTÍNEZ VELOZ, 2009, p.1). Afinal, no
século XX, a história do México tem sido a crônica do controle dos meios nas
mãos do PRI (LARIO BASTIDA, 2015) em uma “guerra” que poderia chamar-se
de virtual, se não fossem os mortos, destaca Villoro:
64
José Doroteo Arango Arámbula é o nome de Pancho Villa.
162
Gabriel Zaid ha descrito el caso de Chiapas como "guerrilla posmoderna". Aunque los días de combate y los muertos fueron reales, la principal función de la guerrilla ha sido representarse a sí misma, poner en escena gestos, disfraces, textos políticos. En buena medida, su éxito se ha fincado en desmarcarse desde muy pronto de la violencia y proseguir la contienda en los comunicados salidos de la selva (VILLORO, 1998, p. 262).
Em Safari accidental, na crônica “Un mundo (muy) raro: los zapatistas
marchan”, Villoro narra a caminhada do EZLN de Chiapas à Cidade do México
na Marcha del Color de la Tierra para a intervenção zapatista no Congresso
para defender a aprovação da Ley de Cultura y Derechos indígenas. Nessa
crônica, Villoro descreve a situação do país com cem dias do governo de
Vicente Fox, o presidente da alternância que acabou com 71 anos de governos
priístas, como uma pátria convulsa, no qual Breton “encontró el surrealismo en
la vida diaria y las revueltas sociales son un magnífico pretexto para hacer
artesanías y renovar el repertorio de la canción ranchera” (VILLORO, 2005a, p.
45). A descrição inicial é vertiginosa e caótica
El México de la transición es un circo de diez pistas donde se improvisan excesos. Fox tachó 100 días en su calendario en los que ocurrieron cosas como estas: por unas horas el estado de Tabasco tuvo dos gobernadores, sacerdotes de Guanajuato e Hidalgo descubrieron que los Pokémones son diablos de juguetería y propusieron quemarlos en hogueras ejemplares, Amnistía Internacional informó que somos el máximo importador de instrumentos de tortura (invertimos 16 millones de dólares en los últimos tres años para parecernos a Hannibal Lecter) […], el jefe del gobierno de la ciudad de México descubrió que no hay causa más progresista que la astronomía y decidió implantar un horario distinto en los barrios controlados por su partido (los conservadores de la calle de enfrente vivirá con una hora de retraso). ¡Bienvenidos a Foxilandia, donde la paradoja sustituye el sentido común! De la dictadura perfecta, diagnosticada por Vargas Llosa, hemos pasado a la caricatura perfecta. No siempre en forma voluntaria, nuestra épica se mezcla con el humor y el apocalipsis con la diversión (VILLORO, 2005a, pp.45-46).
A situação narrada vai além da crítica à violência e ao conservadorismo
religioso. Villoro também destaca o poder da mídia, que era utilizada pelo
governo de Fox “Nuestro mandatario no conoce mejor ideología que el
marketing, y sus palabras suelen ser slogans” (VILLORO, 2005a, p.46). Na
crônica “México el reino de Oz” a respeito do presidente mexicano no sexênio
2012-2016, o cronista tece comentários muito próximos ao que fez a Fox com
relação ao uso da mídia: “Enrique Peña Nieto surgió como el perfecto
163
telecandidato mexicano. Un hombre atractivo, de peinado imperturbable, que
aun al improvisar parece leer un teleprompter” (VILLORO, 2014b, p.1).
Certamente, entretanto, refere-se não apenas a Fox ou a Peña Nieto, mas
também a Marcos, destacando o enfrentamento midiático deste com o
presidente, Villoro denominou “el Vengador Anónimo vs. el Hombre de los Mil
rostros” (VILLORO, 2005a, p.47).
Quando Villoro destaca em suas crônicas a TLCAN, está ressaltando os
ecos de séculos de marginalização, exploração e miséria que a rebelião
indígena de Chiapas denunciou: “Durante dos siglos el México blanco ha
celebrado las pirámides para ignorar la miseria y el racismo del presente”
(VILLORO, 1998, p. 265). Esse pensamento é compartilhado com o de José
Emilio Pacheco, que, com lucidez, destaca o impacto que a rebelião do EZLN
teve na consciência nacional
Cerramos los ojos para suponer que el otro México desaparecería al no verlo. El primero de enero de 1994 despertamos en otro país. El día en que íbamos a celebrar nuestra entrada en el primer mundo retrocedimos un siglo hasta encontramos de nuevo con una rebelión como la de Tomóchic. Creímos y quisimos ser norteamericanos y nos salió al paso nuestro destino centroamericano (PACHECO apud PADUA, 1996, p.35).
Néstor García Canclini, em Culturas híbridas, também faz comentários a
respeito da modernidade no México, que serve para pensar a situação do
EZLN:
As oligarquias liberais do final do século XIX e início do XX teriam feito de conta que constituíam Estados, mas apenas organizaram algumas áreas da sociedade para promover um desenvolvimento subordinado e inconsistente; fizeram de conta que formavam culturas nacionais e mal constituíram culturas de elite, deixando de fora enormes populações indígenas e camponesas que evidenciam sua exclusão em mil revoltas e na migração que “transtorna” as cidades (GARCÍA CANCLINI, 2008, p. 25).
Além das três crônicas citadas, Villoro ao longo dos anos, publicou
muitas outras sobre o EZLN: “La frontera de los ilegales” (1995), “Chiapas: el
regreso de intocables” (2001), “La mirada de Zapata” (2004b), “La taquería
revolucionaria” (2013b), “Mi padre, el cartaginés”, incluída em Espero retrovisor
(2013a), “Los renunciantes” (2014d), “La estrella zapatista” (2016a), entre
164
outras. Para explicar a seleção na pequena antologia com nove contos e uma
dezena de crônicas de Espejo retrovisor, afirma: “[…] no las ordené en forma
cronológica, entre otras cosas porque todos los temas son recurrentes para mí:
Chiapas, mi padre, el fútbol, el rock, los viajes […]” (VILLORO, 2013a, p.9).
Nesses últimos textos, percebe-se uma aproximação com a figura do
subcomandante Marcos, principalmente após a mudança do nome de guerra
para Galeano (em homenagem ao professor zapatista José Luis Solís López
assassinado em ataque paramilitar a La Realidad). Sobre este fato, escreve:
el subcomandante Marcos regresó a la escena luego de un largo alejamiento, pero sólo para transformarse en el subcomandante Galeano en homenaje al profesor […] asesinado. En este caso no estamos ante una desaparición sino ante una transfiguración. Dos décadas después del levantamiento zapatista, su vocero asume otra identidad (VILLORO, 2014d, p.1).
Cynthia Steele (2002), em seu estudo sobre o reflexo literário zapatista
no México, afirma que é exatamente na crônica onde mais se encontram
exemplos e onde o terreno é mais fértil. A autora destaca alguns autores:
Carlos Monsiváis, Elena Poniatowska, Vicente Leñero, Sergio Pitol e Efraín
Bartolomé. Na breve relação de Steele (2002), pode-se acrescentar Juan
Villoro, pois em sua ampla e variada obra se observam diversos textos sobre o
zapatismo, principalmente em suas crônicas e em outros textos que
concretizam suas colaborações com a imprensa. Como diz Brian L. Price a
respeito de Tiempo transcurrido, opinião que certamente abarca muitas de
suas outras crônicas: “A la par del retrato sociológico que Villoro nos presenta,
hay también una toma de postura política. Toda crónica es, en esencia, un
documento político, un testimonio de voces que no pueden hacerse escuchar
(o que esperan ser escuchadas a todo volumen)” (PRICE, 2011, p. 275).
Manuel Lario Bastida (2016) afirma que a opção de Villoro ao abordar o
tema do zapatismo em sua obra de não ficção “revela una opción ética que
explicaría su negativa a escribir ficción sobre el zapatismo” (LARIO BASTIDA,
2016, p.10). Certamente Villoro privilegiou o tema mais nas crônicas que em
seus romances ou contos, pois há uma pequena referência em El testigo
(2004), através da esposa do protagonista que colabora com uma ONG de
solidariedade a Chiapas e em Arrecife (2012b), um reality show, onde a
violência e a realidade são narradas com humor e ironia, cuja narrativa se
165
passa em um hotel na costa maia caribenha chamado La Pirámide. O exótico
lugar proporciona perigos controlados a turistas europeus e norte-americanos:
“Estamos en zona guerrillera. De vez en cuando los turistas tienen contactos
con supuestos rebeldes. Se llevan algún susto y todo vuelve a la normalidad”
(VILLORO, 2012b, p. 60). Atores vestem uniformes camuflados, portam armas
e o protagonista “copiaba con descaro el estilo del subcomandante Marcos”
(VILLORO, 2012b, p. 72). O autor do artigo acredita que, quando Villoro
introduz o tema do zapatismo nesse romance, está mudando seu
posicionamento:
En 2012, varios elementos indican que algo está cambiando en Villoro en su consideración sobre el zapatismo. Precisamente el año en que la prensa sensacionalista habla del advenimiento del apocalipsis de las predicciones mayas, vemos cómo se diluyen sus antiguas resistencias éticas a utilizar el zapatismo como materia ficcional, con la publicación de su novela Arrecife (2012) (LARIO BASTIDA, 2016, p.18).
É importante destacar que a literatura trata dos mesmos temas que a
sociologia, a filosofia e a história, utilizando, porém, as ferramentas da própria
literatura. Quando Villoro utiliza a crônica para tratar do tema de Chiapas, isso
não significa que ele esteja criando uma seleção de temas “sérios” e “não
sérios”, temas para a ficção e outros para a não-ficção, apenas que, com a
crônica, há a possibilidade de uma escrita efêmera e com o desenvolvimento
mais livre. Um romance, por exemplo, não seria o local mais adequado para
um escritor tratar de temas urgentes, pois a confecção desse texto demandaria
anos, dentro de uma estrutura que impossibilitaria uma publicação mais
imediata. É possível pensar na essência política da crônica como construção
de sentido, onde o discurso é um terreno em disputa para construir forças
favoráveis de mudança social, e não o abrandamento da postura ética do
escritor, pois a constância de temas das crônicas, os espaços, os personagens,
ou seja, os elementos dos textos permitem descrever as particularidades de
uma sociedade complexa (como a maior parte das sociedades do século XXI),
que emergem de um passado traumático recente.
A prática literária de Villoro como exercício político pode ser percebida
na temática e no estilo da escrita dos textos. Não se refere aqui apenas à
166
equiparação ingênua de motivação individual e relevância social “que pode,
ocasionalmente, ser encontrada na esquerda” (BURGER, 1989, p.24). Trata-se
mesmo de uma questão teórica que determina as conexões internas de sua
obra.
3.2.1 CDMX: uma estética do fragmento
Ciudad montón de palabras rotas […]
esculpida retórica de frases de cemento65
Octavio Paz
Concebendo a crônica como um espaço simbólico para ler o cotidiano, é
pertinente destacar a sua relação com a cidade, pois, como menciona Salazar:
“la ciudad es un lugar a la vez real e imaginario, que se construye y se
transforma de acuerdo a distintos modelos culturales” (SALAZAR, 2006, p.19).
Sendo assim, nas linhas que seguem, serão abordadas as crônicas de Villoro
numa perspectiva de crônica urbana, ou seja, como um tipo de texto
escrito que se caracteriza por la idea de que existe, por parte de un sujeto, al que denominaremos “cronista”, una focalización en una acción puntual, por parte de algún individuo, o un conjunto (reducido) de individuos, en algún espacio de la ciudad, ese espacio público por excelencia (BEKER, VESPA e AREN, 2010, p.1).
Segundo Monsiváis, o papel da escrita é fundamental na produção
espacial, na definição cultural da urbe e no imaginário que se constrói a seu
redor. No ensaio “Manuel Gutiérrez Nájera: crónica como utopía”, Carlos
Monsiváis define a crônica como espaço de utopia (MONSIVAIS, 1995, p.1).
Salazar menciona que os cronistas “han descrito a la ciudad y le han dado
permanencia en la literatura, de algún modo han reinventado su pasado y
delineado una ciudad futura, un espacio posible” (SALAZAR, 2006, p.19) e
65
Fragmento do poema “Vuelta” de Octavio Paz. In: SALAZAR, Jezreel. La ciudad como texto: La crónica urbana de Carlos Monsiváis. México: Senderos, 2006, p.6. Universidad Nacional Autónoma de Nuevo León. Disponível em:
www.academia.edu/18411513/La_ciudad_como_texto._La_cronica_urbana_de_Carlos_Monsivais_tesis
167
acrescenta: “Desde Bernal Díaz del Castillo, la utopía ha sido un signo y un
sino, un rasgo ligado a la crónica de la urbe” (SALAZAR, 2006, p.19).
Dentro das realidades contemporâneas, a crônica, enquanto gênero
urbano reclama sua “marca de época”, ou seja, “asume su posibilidad de
articular lecturas plurales de la experiencia urbana” (BENCOMO, 2007, p. 37).
A crônica é um gênero privilegiado para narrar experiências dentro e no
entorno da cidade, pois, através do olhar atento do cronista, é possível uma
reflexão de determinada época, sua ideologia, seus conflitos e frustrações,
suas metas, modas e tendências. Néstor García Canclini (1999) propõe o
estudo da cidade a partir de interações: “Gran parte de lo que nos pasa [en la
ciudad] es imaginario, porque no surge de una interacción real. Toda
interacción tiene una cuota de imaginario, pero más aún en estas interacciones
evasivas y fugaces que propone una megalópolis” (GARCÍA CANCLINI, 1999,
p. 89). Essa interação mencionada pelo autor pode se dar através de textos
que procuram de alguma maneira construir esse imaginário. Referindo-se ao
México, diz:
Tratamos de estudiar esta diversidad de imaginarios urbanos viendo como la ciudad era construida en el discurso periodístico de cada día, en la radio y la televisión. En México, como en muchas grandes ciudades, hay suplementos especiales que aparecen semanalmente, y a veces todos los días en algunos diarios, que hablan de la ciudad y que dejan hablar a la ciudad (GARCÍA CANCLINI, 1999, p. 90).
Juan Villoro, tanto pelas características discursivas, pelos procedimentos
de escrita ou pela temática plural que aborda, apresenta um amplo repertório
crítico sobre vários aspectos da Cidade do México: história, espaços públicos,
habitantes, classes sociais, estações de metrô, poluição e ofícios. Em seus
escritos, observa-se a imagem de uma “cidade em decomposição”, e a crônica
como gênero mostrou ser o espaço adequado para articular leituras plurais da
experiência urbana.
García Canclini (1999) apresenta três definições de cidade, que se
tornam valiosas para entender a Cidade do México, a qual aparece em vários
romances, ensaios, artigos e, principalmente, nas crônicas de Juan Villoro. A
primeira aproximação com o tema, que teve um forte desenvolvimento durante
168
a primeira metade do século XX, é a oposição entre o rural e o urbano, ou seja,
“concebir la ciudad como lo que no es el campo” (GARCÍA CANCLINI, 1999, p.
69).
A segunda definição sugerida por Canclini tem uma longa trajetória, que,
baseada na escola de Chicago, propõe critérios geográfico-espaciais, não
levando em conta os processos históricos e sociais.
O último critério para definir a cidade é especificamente econômico,
considerando o resultado do desenvolvimento industrial e a concentração
capitalista, definição compartilhada por Max Weber, quando afirma: “a cidade é
um estabelecimento de mercado” (WEBER,1987, p. 75). As definições de
cidade propostas, em sentidos variados, como oposição entre rural e urbano,
geográfico-espaciais ou economicistas, não abarcam a complexidade do
espaço urbano, pois “las ciudades no son sólo un fenómeno físico, un modo de
ocupar el espacio, de aglomerarse, sino también lugares donde ocurren
fenómenos expresivos que entran en tensión con la racionalización” (GARCÍA
CANCLINI, 1999, p. 72).
Cabe destacar que todas essas definições do urbano, quando se trata
de megacidades, são muito mais “vertiginosas”. A vertigem mencionada por
García Canclini (1999) se dá em certa medida pela demasiada quantidade de
pessoas. Essa questão é abordada por Villoro em vários textos, como se pode
observar no início de sua crônica “La ciudad de México: mujer barbuda”:
En México Distrito Federal el paso del tiempo significa una desaforada multiplicación de la especie. Nací en 1956, cuando la ciudad tenía cuatro millones de habitantes, y ahora tiene unos 18 o 20. Aunque los conteos de población son inciertos, no hay duda de que somos demasiados. Estamos ante un fenómeno insólito: la metrópoli nómada. Sin movernos de sitio, hemos cambiado de ciudad; por convención seguimos hablando de “México, D.F.”, pero es obvio que el paisaje anda suelto y se transfigura en otro y otro (VILLORO, 2005c, p.1).
Villoro relata como a literatura mudou a maneira de ver a paisagem
urbana mexicana ao longo dos anos: “¿Qué puede decir la ficción de urbes
como México, D. F., que en 1950 tenía 2.9 millones de habitantes; en 1970,
169
11.8 millones, y en el año 2002 se acerca a un número que parece una llamada
de emergencia ante el apocalipsis: 20.000.000?” (VILLORO, 2002a, p. 2).
Carlos Fuentes, em seu artigo sobre a obra de Juan Villoro, destaca
também a população da Cidade do México, mencionando que, quando publicou
o seu primeiro romance, La región más transparente, em 1958, o número de
habitantes não chegava a cinco milhões e que, quando Villoro publica El
testigo, em 2004, os metropolitanos já ultrapassavam vinte milhões. Fuentes
relata também a perspicácia desse autor, que percebe a impossibilidade de
abarcar o todo, optando por uma cidade fragmentada:
Sabedor de que el Distrito Federal se ha vuelto inabarcable, Villoro opta, por crear una ciudad parcelada, más identificable por lo que no es que por lo que es; más, por sus maneras de engañarse a sí misma que por las verdades que se dice a sí misma o que se dicen de ella (FUENTES, 2011, p.166-117).
García Canclini (1999), em seus estudos culturais, reconhece também
essa impossibilidade, interrogando-se qual seria a cultura urbana da Cidade do
México e conclui: “Pareciera que en la actualidad la búsqueda no es entender
qué es lo específico de la cultura urbana, qué la diferencia de la cultura rural,
sino cómo se da la multiculturalidad, la coexistencia de múltiples culturas en un
espacio que llamamos todavía urbano (GARCÍA CANCLINI, 1999, p. 77).
E menciona que há pelo menos quatro cidades do México dentro do que
se reconhecem como CDMX. A primeira delas é a cidade histórico-territorial,
levando em conta principalmente a quantidade de edifícios construídos.
Cidade industrial, assim denominou a segunda, sendo a urbe que se opõe ao
histórico, ou seja, o crescimento industrial que amplia seu espaço, criando a
cidade industrial com bairros, transportes e serviços e vai, de certo modo,
quebrando o aspecto territorial do meio urbano. O terceiro processo destacado
por García Canclini é a cidade que se volta para a comunicação e a
informação. Neste caso, ela perde a experiência de conjunto, pois a metrópole
se conecta dentro e fora de si e com o estrangeiro, não somente por correios e
telefone, mas também por cabo, fax e satélite. Os três modelos de cidades
mencionados convivem, muitas vezes, dentro de um mesmo espaço, e essa
coexistência em ritmo acelerado faz surgir o último modelo, a cidade videoclipe.
170
A Cidade do México aparece em todas as crônicas de Tiempo
transcurrido nas quais Villoro traça uma cartografia que inclui vários bairros da
cidade, as denominadas “colonias” (Roma, del Valle, Narvarte, Lindavista,
Aviación Civil, Azcapotzalco, Coyoacán, Ciudad Satélite, Pantitlán), as
principais avenidas e ruas (Insurgentes, Reforma, Piedras Negras, San Borja,
Contreras), os marcos (Basílica de Guadalupe, la Plaza de las Tres Culturas) e
também as universidades (Universidad Iberoamericana, Ciudad Universitaria,
Universidad Autónoma Metropolitana de Xochimilco). Nesse percurso, o autor
abarca bairros mais abastados como Jardines del Pedregal, os mais pobres
como Nezahualcóyotl, central como a Plaza de la Constituición (conhecida
informalmente como el Zócalo) e a periferia, como Ajusco. Narra também os
eventos, que nela ocorrem, como os Jogos Olímpicos, na crônica “1968”, e a
visita do Papa João Paulo II, na crônica “1979”, além de situações do cotidiano
de uma grande cidade, como violência, drogas e prostituição.
A versão irônica e até cômica da visita do Papa dissimula uma questão
complicada, pois o México não tem relações oficiais com a Santa Sé desde a
Cristiada. O protagonista da crônica “1979”, Nicolás, é comunista, aprendiz de
dançarino e cozinheiro de um restaurante polaco. Ele é convidado para
preparar uma sopa para o pontífice. No entanto, pensa em aproveitar a
oportunidade e organizar “una disyuntiva terrorista: asesinar o purgar al papa”
(VILLORO, 2006a, p. 82). Essa crônica faz referência à indiferença da Igreja
Católica diante do massacre acontecido naquele país: “La sopa tenía el color
de una húmeda bandera polaca. Sangre del día anterior” (VILLORO, 2006a,
p.84). No entanto, tanto nessa crônica como no romance El testigo, no qual
aparece mais explicitamente a questão religiosa no México, Villoro mantém a
distância necessária, pois, como menciona Mihalí Dés a respeito do romance,
mas que certamente compreende a crônica em questão, a: “religión sigue
siendo un asunto central y fascinante, y que la literatura no es un acto de fe”
(DÉS, 2005, p.8).
Nicolás não leva adiante seu plano para “no perjudicar su obra (a sopa)
con el laxante” (VILLORO, 2006a, p. 84) e a crônica termina com o
protagonista rasgando em pedaços bem pequenos a gorjeta que ganhou das
mãos do pontífice e caminhando em direção à Avenida Insurgentes.
171
Nessas e em várias outras crônicas de Villoro, em obras diversas, a
cidade é o tema principal:
Me fascina la Ciudad de México. Tengo una relación intensísima con ella. Pienso que es como estar enamorado de la mujer barbuda del circo, que no es la más hermosa del mundo, pero, pues necesitas los besos con barba y bigote que sólo ella te puede dar. Buena parte de lo que he escrito tiene que ver con la Ciudad de México [...] (VILLORO apud SÁNCHEZ, 2001, p. 1).
Como se pode observar nesse trecho com a instigante metáfora da
mulher barbuda, a relação de Villoro com a Cidade do México é intensa, e
grande parte de suas histórias se desenvolvem nesse espaço visto muitas
vezes como exótico, cheio de defeitos, porém, mesmo quando está narrando
outros “Territorios”, como é intitulada a terceira parte de Safari accidental
(2005a), como Berlim, essa relação se destaca: “Mi desconocimiento de Berlín
era absoluto, pero sentía un poderoso anhelo de reparación. Durante nueve
años estudié en el Colegio Alexander von Humboldt de Ciudad de México”
(VILLORO, 2005a, p.117). Em Havana também: “De cualquier forma, aun
atemperadas por las injusticias que uno puede ver en México, las noticias
cubanas rara vez son alentadoras” (VILLORO, 2005a, p.147). Ou quando o
escritor Martin Amis, se posiciona a favor dos Estados Unidos com relação ao
terrorismo “”No estoy de acuerdo en pensar que Estados Unidos se inventa
enemigos”, respondió Amis. “Tiene un muy claro: el terrorismo islámico”
(VILLORO, 2005a, p. 233), na reflexão irônica do cronista, México está sempre
ali “Como los mexicanos ya le dimos a Estados Unidos la mitad de nuestro
territorio en señal de buena voluntad, tenemos dificultad en entender los
problemas a los que los lleva su política exterior” (VILLORO, 2005a, p.233),
pois o ponto de contraste do viajante é a sua terra natal. Entretanto, há que se
matizar que esse lugar não é necessariamente um território geográfico, mas
também um imaginário que o próprio cronista possui, mesmo antes de explorar
essas ou outras latitudes e culturas.
A cidade do México, em diferentes momentos da história, foi símbolo de
ordem, beleza, perfeição, civilização e modernidade. Atualmente, como
aparece em vários textos de Villoro, tornou-se espaço da violência, do céu
172
cinzento, do metrô lotado, dos engarrafamentos intermináveis, resultando numa
confusão tão grande que até os taxistas se perdem:
Además las calles repiten sus nombres como si así pulieran la gloria de los héroes. Quien abra el popular plano de la capital conocido como Guía Roji encontrará 179 calles Zapata, 215 Juárez, 269 Hidalgo, lo cual basta para construir unas veinte urbes suficientemente patriotas. En nuestro mapa movedizo ni siquiera las estatuas son estables. El monumento ecuestre a Carlos IV ha ocupado tres lugares distintos al modo de un caballo de ajedrez (VILLORO, 2005c, p.2).
Os taxistas, membros incontestáveis da urbe, a quem Villoro chama de
“movedizos embajadores del lugar común” (VILLORO, 2006b, p. 90) aparecem
em várias crônicas do autor. Ora eles se perdem nesse palimpsesto
desordenado, ora ocupam um papel quase protagônico, como aqueles que
conduziam Julio César, o campeão do boxe mexicano em “La tempestad
superligera”, uma vez que sempre discutiam com o boxeador por causa do
valor da corrida.
No entanto, observa-se em muitas delas que o sentimento que o cronista
tem por essa cidade é o que o faz seguir vivendo nela, apesar de, como uma
galáxia desordenada, ocupar todo o vale e seguir crescendo
desordenadamente: “Y sin embargo, no podemos romper el cordón umbilical
con México (cuya posible etimología es "ombligo de la luna"). Lunáticos y
edípicos, nos parecemos al Don Juan de Rake's Progress, la ópera de
Stravinski con libreto de Auden: acabamos enamorados de la mujer barbuda
(VILLORO, 2005c, p. 2).
Retomando os quatro modelos de cidade culturais apresentados por
García Canclini (1999), destaca-se a cidade histórico-territorial. Ela pode ser
percebida através de edifícios construídos na época pré-colombiana e colonial,
que ainda podem ser vistos. Villoro, tratando também dessas construções,
destaca a destruição provocada desde a colonização, ressaltando que esta
havia promovido a seca do lago e dos rios:
Los aztecas fundaron su capital en un islote y ganaron terreno al agua. Los conquistadores españoles que habían hecho la guerra de Italia no vacilaron en comparar a Tenochtitlan con Venecia. La ciudad
173
fue secada durante siglos y las calles surgieron del lecho de los ríos. En el casco urbano, el principal recuerdo lacustre son los edificios coloniales que se hunden como navíos a punto de naufragar (VILLORO, 2005c, p. 2).
Em “Días robados: el cielo artificial” (2002b), Villoro aborda a mistura de
períodos históricos na Cidade do México, na qual se podem observar
construções da cidade asteca ao lado de estruturais coloniais:
Aquí todas las eras se mezclan en un presente abigarrado. Nuestras vastas tuberías se hunden en la ciudadela azteca, las mansiones de la colonia ostentan pedacería de pirámides, los emblemas del metro son un contradictorio códice de la "modernidad prehispánica", las estatuas cambian de sitio y los edificios renuevan sus usos (los presos políticos del 68 regresan a sus antiguas celdas a estudiar sus expedientes; en un giro simbólico, la Cárcel de Lecumberri se convierte en el Archivo General de la Nación) (VILLORO, 2002b, p.1).
Nesse trecho, além da cidade histórico-territorial, pode ser destacado o
reaproveitamento do espaço público. Cabe ressaltar que, em muitos de seus
textos, Villoro faz uma análise crítica de momentos importantes ocorridos na
Cidade do México no período entre 1968 até 2000. Ele deu ênfase a eventos
vinculados a fatos como o massacre de Tlatelolco, a crise econômica a partir
de 1970, na qual os movimentos sociais correspondem a um cenário político e
econômico em ruínas. Trata-se da “década perdida”, diagnóstico dado à
América Latina pela CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o
Caribe), devido à imensa dívida externa, à inflação, à burocratização estatal e
ao desemprego, além do terremoto que assolou a Cidade do México em 1985,
o levantamento do EZLN em Chiapas e o fim do governo do PRI em 2000.
Expressou de forma contundente o fracasso do otimismo político e a confiança
no modelo de modernização. É o que ressalta Susel Gutiérrez Torres a respeito
de Tiempo transcurrido:
Ante la rigidez de los imaginarios sociales, la violencia policial, los estereotipos culturales y los desengaños individuales, encontramos en la mayoría de las crónicas una especie de revelación que viene de la mano de una experiencia traumática que sume a sus protagonistas, sino en el fracaso, al menos en la resignada frustración que supone para ellos descubrir que no hay posibilidades más allá de las normas estrictas establecidas por una sociedad conservadora, rígida y represiva como la suya (GUTIÉRREZ TORRES, 2013, p.2).
174
Diante do cenário descrito, essas crônicas apresentam personagens
melancólicos, através dos quais a realidade aniquila a utopia e instaura em seu
lugar a nostalgia. A pancada que fere o joelho de Gus na crônica “1968” após
ser golpeado por uma espécie de taco de beisebol por um grupo de meninos
de rua “cuatro operaciones de los meniscos acabaron con ilusiones de superar
a Ruy Camacho. También lo sacaron de la adolescencia” (VILLORO, 2006a, p.
18). E ele também se converteu em um ser melancólico:
Como todas las heridas, la suya tiene una poderosa cualidad mnemotécnica. Ahora, cada vez que se agacha, Gus recuerda el golpe y luego se sume en un mundo prolijo, donde todos los mazapanes cuestan cincuenta centavos y Procol Harum sigue en primer lugar del hit parade. Su memoria es tan singular como el olvido de los otros (VILLORO, 2006a, p. 19).
Assim como Gus, muitos outros personagens percebem uma realidade
que não poderão mudar e, resignados, aceitam a derrota. Mais adiante, diz o
narrador: “Gus se siente obligado a pensar en las cosas que sucedieron
exclusivamente para que alguien se acordara de ellas” (VILLORO, 2006a, p.
19). Além dos personagens frequentemente melancólicos (Gus e Chata),
resignados (Toño, Nabor, Alvarito) ou passivos (Gato e Rocío), surge Magali, a
Madona de Guadalupe, protagonista da crônica “1983”. Através dessa
personagem, o autor critica a repressiva educação católica relacionada com a
violência social, onde um pequeno escândalo sexual “podía significar poco en
otros lados, pero en el Estado de México equivalía a la llegada de una división
nazi al gueto de Varsovia” (VILLORO, 2006a, p.107). A cena na qual a
personagem é violentada por vários policiais e seu namorado é assassinado
por eles com golpes de um picador de gelo, logo após saírem de uma festa a
fantasia na casa de amigos na Cidade Satélite é marcante. Apesar das várias
cenas de violência narradas nessa crônica, essa é, provavelmente, a
passagem mais terrível do livro.
Nemo fue noqueado con la cacha de una pistola. Lo arrastraron de un pie; su cabeza golpeó con el estribo del coche; un ruido sordo, laminoso. Lo pusieron de pie. Las barbas postizas se le habían pegado absurdamente en el pecho. Magali vio el picahielos. Había algo equívoco, una humillación adicional en esa arma de asesino de barrio. No pudo contar las puñaladas que recibía su amigo. Un policía la golpeó con tal fuerza que la sangre se mezcló con las lágrimas; un velo pastoso le impidió distinguir a los sucesivos violadores. Otro golpe le hizo perder el conocimiento. Despertó de madrugada, envuelta por un olor agrio que la hizo vomitar sobre el asiento. El pelo
175
se le había formado coágulos de sangre. De su amigo sólo quedaran las barbas sobre el asfalto (VILLORO, 2006a, pp. 107-108).
Magali, após todo o ocorrido, apesar de toda a violência a que foi
submetida e da falta de apoio da família, não se resigna nem se torna passiva.
Convertida na Madona de Guadalupe, uma roqueira inspirada parodicamente
na Madonna americana, ela se vinga dos policiais:
Después de dos horas de encarnizada trifulca, la policía quedó reducida a un montón de bultos y gorras azules. […] Caminó despacio hasta el cuerpo desmayado. Su zapato rojo se posó con suavidad sobre la nariz del policía. Luego la trituró de un pisotón. Magali escuchó el agradable crujido del cartílago (VILLORO, 2006a, pp. 110-111).
A violência, o medo, a repressão policial e as drogas são o cenário a que
são submetidos vários jovens que transitam por esses textos. Com o avanço
das indústrias, o núcleo no qual se encontrava a cidade histórica, construída
em um território delimitado, é desterritorializada pela cidade industrial. Esta não
abarca um espaço específico e se expande com fábricas, bairros operários e
aeroportos, como aparece em “Espectros de la ciudad de México”. E diz o
narrador: “La dificultad de localizar una vastedad autocontenida, donde nada
queda afuera y el aeropuerto está casi en el centro, ha traído una peculiar
cultura compensatoria. Incapaz de lidiar con los desastres reales, el capitalino
los exagera para dominarlos como fábula (VILLORO, 2005b, p.7).
A desterritorialização é mencionada por Guy Debord como um
“transbordamento das cidades para um meio rural cheio de “massas informes
de resíduos urbanos” (Lewis Mumford), as quais são diretamente regidas pelos
imperativos do consumo” (DEBORD, 1997, p. 174). Em outras palavras, o
consumo provoca esse deslocamento.
Outro modelo de cidade de que trata García Canclini (1999) é a cidade
comunicacional, relatada por Villoro, levando em consideração que, para
construí-la, foi inevitável a destruição dos sítios arqueológicos
En un sitio donde la corteza terrestre responde a un pasado primigenio, ignorado por la superficie, no es de extrañar que las temporalidades se crucen. No hay forma de instalar líneas de teléfonos en el centro de la ciudad sin practicar una arqueología
176
accidental. Aunque los técnicos no busquen otra cosa que un resquicio para sus cables de fibra óptica, encuentran puntas de obsidiana, noticias del mosaico indígena (VILLORO, 2005b, p.3).
A expansão da cidade através dos meios de comunicação aparece
também nesse texto, no qual se observa a necessidade de conexão para a
cidade continuar funcionando
La hipótesis de Virilio de que la ciudad moderna crece para derrotar el espacio y la posmoderna para apoderarse del tiempo ha encontrado un caso límite en México, DF. La velocidad se ha descartado del horizonte. Esto refuerza la importancia de la ciudad virtual: el 30% de la población ve televisión más de tres horas al día, y las principales formas de relación dependen de Internet y los teléfonos celulares, que en la última década superaron los diez millones de teléfonos fijos instalados a lo largo de un siglo (VILLORO, 2005b, p.5, grifo do autor).
Esse fato se dá principalmente porque os centros históricos perderam
habitantes nas últimas décadas, e a urbe se expandiu, multiplicando as
populações periféricas, onde a televisão e o rádio estão melhor distribuídos e
“difunden con más facilidad la información y el entretenimento a todos los
sectores” (GARCÍA CANCLINI, 1999, p.79). A cidade virtual da que trata Villoro
fora mencionada também por Milton Santos em Território e Sociedade (2000)
“O mundo entra em nossa casa com os jornais, as rádios, a telinha” (SANTOS,
2000, p.50). Toda essa conectividade leva ao último modelo de cidade
apresentado por García Canclini (1999), a cidade videoclipe, que aborda não
somente a relação física, mas também a imaginária e as múltiplas interações
que se geram na cidade. A literatura possui certamente uma parcela importante
na construção desse imaginário, destacando-se, então, a crônica, que se
caracteriza por sua condição híbrida, fronteiriça, ocupando o espaço entre a
literatura e o jornalismo.
O ritmo acelerado da cidade favorece a construção de suposições ou
viagens imaginárias provocadas por tanto tempo parado em engarrafamentos
dentro dos ônibus ou dos carros, ou deslocando-se em metrôs lotados.
La necesaria renuncia al movimiento ha traído extrañas formas de vida. La utopía del pasajero detenido no consiste en imaginar el imposible desahogo del tráfico sino que la ciudad se mueva en su beneficio. Llegará el día en que la mayoría de los habitantes estarán
177
encallados y se vincularán a través de mensajeros capaces de correr largas distancias como los indios tarahumaras, o de repartidores de pizzas multiusos (en sus breves motocicletas llevarán un resumen del mundo, con hilo para coser y agua oxigenada) (VILLORO, 2005b, p.6).
Não há saída, tanto para aqueles que estão nos carros e ônibus, como
para os que se deslocam para os bairros periféricos de metrô, ou para os que
seguem para as zonas com bairros de classe alta. Todos estão presos nessa
longa viagem imaginária.
Por desgracia, la mayoría de los viajeros dormitan en la forzada convivencia del microbús o el vagón del metro, y el resto lucha por un trozo de ciudad abordo de un coche. Dos tribus inmensas se desplazan a diario, los sonámbulos y los insomnes: cinco millones de pasajeros van aletargados en el metro y cinco millones sufren ataques de nervios en los automóviles (VILLORO, 2007a, p. 2).
Neste cenário, os cidadãos são efetivamente interpelados por redes
midiáticas, que difundem imagens e leituras da cidade. No entanto, García
Canclini (1999), ao tentar averiguar a importância do imaginário na constituição
da cidade, principalmente no México, observa que a cidade se apresenta de
maneira diferente para diferentes habitantes e que há representações de
experiências comuns, mas também as disputas simbólicas “entre las clases, los
grupos y las etnias que componen una ciudad” (GARCÍA CANCLINI, 1999,
p.95). Villoro indaga sobre essa questão, tratando dos mais de seis milhões de
passageiros que viajam diariamente no metrô do México DF, destacando que
nesse meio de transporte são principalmente os menos favorecidos
financeiramente e que têm características muito específicas:
Pero el efecto último del metro no viene de la arquitectura sino de los hombres que viajan con rostros inexpresivos, como si los hubieran sobornado para trasladarse. Todos los días el Sistema de Transporte Colectivo desplaza a cinco millones de pasajeros. Aunque son muchos, han sido seleccionados. Bajar las escaleras eléctricas es ser testigo de una precisa segregación racial. Los que pueblan la ciudad subterránea son... -escoja su ultraje favorito- los morenos, los nacos, los indios, los mexicanos. [...] Para los dueños de la superficie el metro es algo que se toma en París. Abajo, la raza circula a velocidades posmodernas (VILLORO, 2002a, p.6).
Esses vagões superlotados possibilitam uma série de relações as quais
Villoro define nesses termos: “La ciudad es el cielo del metro. Bastión de la
178
economía informal, sede de exposiciones, conciertos y ferias del libro, territorio
del faje, el suicidio o el nacimiento, el metro es una ciudad que se desplaza
(VILLORO, 2005d, p. 144).
Atualmente, o que deve levar em consideração não é mais a oposição
campo-cidade, mas a destruição de ambos, ou seja: “O desgaste recíproco da
cidade e do campo, produto da falha do movimento histórico pelo qual a
realidade urbana existente deveria ser superada, aparece nessa mistura
eclética de elementos decompostos que recobre as zonas mais adiantadas da
industrialização” (DEBORD, 1997, p. 174). Por um lado, a destruição da cidade,
que é o espaço da história e da concentração de poder, do outro, o campo,
com seu isolamento e separação como uma “forma de expressar o atraso de
uma subordinação da economia à consciência histórica” (DEBORD, 1997, p.
176). A noção de representação de conjunto da cidade se torna
frequentemente inviável.
Villoro parte da impossibilidade de abarcar o todo e enfatizando a ideia
de que sua cidade, muitas vezes, abarca várias dentro de uma, ou seja, é “un
territorio que excede la experiencia humana [...] un palimpsesto mil veces
corrigido [...] un caos [grifo nosso] que nos rebasa a diario con frenética
intensidad (VILLORO, 2002b, p. 1). Deste modo, afasta-se de Fuentes e
aproxima-se do “primer escritor libre del México moderno, el primero que
empieza a tomarse las grandes libertades y a decir las grandes barbaridades”
(BLANCO, 1982, p. 23). Trata-se de Carlos Monsiváis, o qual lê “no sólo como
un renovador de su género, sino como un precursor de la narrativa de las
generaciones posteriores” (RUISÁNCHEZ & ZAVALA, 2011, p.12), pois Villoro
sabe que necessita continuar narrando a cidade, não a de Fuentes, mas a
cidade em camadas, de céu cinzento, uma Blade Runner, talvez. Neste caso,
com improvisada imaginação política e estética, que inclui o artigo, a crônica e
o ensaio em sua composição prosística, com a mesma facilidade que absorve
os recursos da poesia, em um constante e consciente malabarismo
monsivaniano. Afinal, ele é o paisagista dessa cidade romanesca, pós-
apocalíptica, constituída por uma geografia insólita, quase irreal, na qual
passado e presente se entrelaçam, enquanto a Literatura e a História se
complementam.
179
3.3 Rock e futebol: o massivo nas crônicas de Juan Villoro
En ambos casos, rock y fútbol, lo que me ha interesado más es cómo una forma de representar la realidad, transforma los hábitos, las emociones y el pensamiento de la gente
66.
Juan Villoro
É certo que muitas manifestações da cultura popular, por contornos
massivos que adquirem, tornam-se objeto de cobiça para o poder, e o rock e o
futebol como espetáculo não escapam disso. No entanto, não se pode deixar
de ler as manifestações massivas como objeto de crítica, principalmente
literária, pois é através do espetáculo que os conteúdos imaginários da cultura
se manifestam, ou seja, é através do estético que se estabelece a relação de
consumo (MORIN, 2011 e DEBORD, 1997). Deste modo, é possível afirmar
que a cultura de massa se apresenta como organizadora da crônica de uma
época. Neste capítulo, pretende-se apresentar uma discussão sobre a
influência dos meios massivos de comunicação através do gênero crônica nos
textos de Juan Villoro, utilizando o rock e o futebol.
Durante a década de 1950, surge nos EUA um movimento fascinante e
sedutor, que os sociólogos denominaram “contracultura”, a qual tinha como
proposta fundamental confrontar o sistema capitalista. Tal postura foi
estabelecida de maneira plena pela chamada Geração Beat. Os beats foram
identificados como um grupo de intelectuais inconformados com o pensamento
norte-americano da época, totalmente vertido para o consumismo, para a
aparência e para o descartável, pregavam a reafirmação do ser humano a
partir da espontaneidade, acentuando a busca de filosofias orientais e outros
tipos de conhecimentos.
A partir da década de 60 ocorreu o crescimento de movimentos
anticapitalistas provocados por diversas manifestações na Europa e nos
Estados Unidos. A geração beat, a explosão do rock, a revolta dos estudantes
franceses e as manifestações contra a guerra do Vietnam estavam
66
Trecho da entrevista cedida a Hugo Juárez em Futbol y rock, según Juan Villoro. Publicado en Revista Chilango de julio de 2016. Disponível em:
http://www.chilango.com/cultura/futbol-y-rock-segun-villoro/ Último acesso em: 29.05.2017.
180
concretizando a consciência política dos jovens daquela geração, que exigiam
liberdade de expressão, tendo como resposta, entretanto, uma forte repressão
policial.
O rock é o resultado de uma manifestação sociocultural nascida nos
Estados Unidos e na Inglaterra em meados do século passado, simbolizada por
uma nova forma de música. Posteriormente, o rock and roll acabaria tendo
influencia em outras formas de cultura, como, por exemplo, a pop art na
América (os personagens de Andy Warhol). Já no início dos sessenta, o rock
havia se expandido por países europeus e latino-americanos. Esse fenômeno,
segundo Price (2011), “refleja en su contenido y forma cambios tecnológicos,
políticos y culturales” (PRICE, 2011, p. 262); por isso, é considerado uma
manifestação pós-moderna devido a:
su ubicación temporal, su identidad e [que] conserva todavía un
espíritu moderno, el espíritu de "la otra modernidad", pues surge
como revolucionario, contestatario, radical, innovador y lleno de
propuestas críticas y estéticas [...]. Las ideas de la modernidad
permanecen inmersas en su propia condición contracultural, aunque
su forma de existir se ubiquen la era posmoderna (VALDÉS
SAMPEDRO, 2009, p.2).
O movimento roqueiro demonstrou que, além de representar um
fenômeno de caráter musical, sua ampla capacidade de comunicação através
da mídia, foi capaz de transformá-lo numa poderosa manifestação de caráter
sócio-cultural. Tal efusão também possibilitou à juventude da época opor-se a
determinadas formas culturais, estilos de vida e vínculos sociais considerados
ultrapassados. No entanto, como ressalta Adrián de Garay (1989), trata-se de
um fenômeno extremamente “complejo, articulado por múltiples discursos,
prácticas e intereses que escapa frecuentemente a esquemas y teorizaciones
generalizantes” (DE GARAY, 1989, p. 117).
A referência ao rock aparece em várias crônicas de Villoro. Em Tiempo
transcurrido, todas as crônicas referem-se a esse assunto, o que já pode ser
observado desde a capa (anexo II) composta pelo desenho de uma guitarra em
formato de melancia. Em Safari accidental, no capítulo intitulado “Alto
volumen”, há quatro textos dedicados ao rock: “Los reyes viejos”; “Supongamos
que no existen los Rolling Stones”; “Peter Gabriel: el regreso del explorador;
181
“Me sentí como un burócrata de Kafka”. Já em Los once de la tribu, mais dois
textos: “El diablo en la ciudad” e “Las piedras tienen la edad del fuego”. Além
disso, aparecem pequenas reflexões sobre o rock em diversas outras crônicas.
Nas páginas de Tiempo transcurrido, a representação da música é
transformada em instrumento de crítica social (Price, 2011). Nela, circulam
diversos personagens fanáticos por rock, com algo de arquétipo, criando uma
espécie de espelho de uma época. Há também uma crítica à tentativa de
incorporação da cultura americana através das canções; no entanto, como
aparece na crônica “1974”, eles não conseguem traduzir as letras, como
George, o protagonista: “No entendia las canciones en inglés pero se las
imaginaba. A su manera, logro traducirla estética de la violencia promovida por
el rock pesado” (VILLORO, 2006a, p.52). A obra faz referência também a
vários programas de televisão, de estações de rádio, filmes e espetáculos de
rock. Observa-se um aparente conflito entre a adesão a diversas formas de
consumo, pois há muitos elementos que são símbolos de consumo da
modernidade de uma época, principalmente para jovens: antena parabólica,
calculadora, o vídeo game Atari ou “la obsesión de los setenta: el Volkswagen
arreglado” (VILLORO, 2006a, p. 71) e, em sentido oposto, a crítica que se pode
perceber a respeito dessa massificação.
Ao traçar o caminho entre 1968 e 1985, as crônicas seguem o percurso
dos anos, mas se distanciam da historiografia mexicana tradicional. A partir dos
eventos históricos ocorridos, o cronista vai montando um painel que leva em
consideração a influência do rock e dos movimentos de contracultura no
México nesse momento. Como comenta Price (2011) “Villoro ha hecho del rock
un cronómetro para medir los cambios en la sociedad mexicana” (PRICE, 2011,
p. 261) E, mesmo mencionando que a obra “no tiene pretensiones de fresco
histórico ni de panorama representativo de una generación. He tratado,
simplemente, de imaginar historias a partir de ciertos episodios reales y de un
puñado de canciones” (VILLORO, 2006a, p.10), o autor exibe um panorama de
fatos notórios que dão conta de um período concreto da história nacional. É
importante considerar que há uma crônica para cada ano, com destaque para
os acontecimentos marcantes de cada um deles, associando-a, geralmente, ao
182
crescimento, surgimento ou decadência de um cantor, de uma banda ou de um
grupo de rock.
Os grupos musicais, muitas vezes desconhecidos, transitam seus álbuns
e títulos de canções pelas crônicas com diferentes gêneros: rock clássico,
disco, balada, punk, blue e psicodélico e, como comenta Gutiérrez Torres,
“Cones e background musical como telón de fondo, asistimos a un recorrido
guiado por figuras que podríamos llamar ahistóricas y que ofrecen su
testimonio sobre aquellos hechos que los marcaron en los planos individual y
colectivo” (GUTIÉRREZ TORRES, 2013, p.1).
Tiempo transcurrido67 é também o nome que um dos principais grupos
de rock no México, Café Tacuba, utilizaram no ano 2000 para denominar seu
CD e DVD recompilatório. A homenagem foi feita por Joselo, um dos
integrantes do grupo, que havia lido a obra anos atrás e com quem Villoro já
havia composto algumas músicas.
As crônicas contam com um narrador que observa os fatos narrados
desde uma perspectiva irônica, como se percebe a partir das reflexões sobre a
esquerda e o escárnio do fanatismo de Mónica, uma jovem que se associa
recentemente ao partido comunista e espera, enquanto seu namorado, Lalo,
picha numa parede a frase “La-música-es-un-arma-de-la-revolución”
(VILLORO, 2006a, p.33). Mónica, estudante de sociologia, começa a reunir
símbolos, cartazes e obras como signos de conversão política, porém ninguém
alcança o nível de entrega que exige a depuração de seus gostos musicais e
literários, considerando todos ““apertureros”, “reformistas” o “eurocomunistas””
(VILLORO, 2006a, p. 36). Quando foi convidada, já depois de formada a dar
uma palestra sobre “arte militante”, revisou suas fichas e até mesmo Marx, de
quem somente leu pequenas citações, está fora porque não emitiu uma frase
sobre a responsabilidade do artista de fazer patente seu compromisso político
em cada obra: “Empezó a leer en ese momento, con rabia, casi con inquina.
Sus dedos volteaban las hojas con rapidez, como si quisieran sacudirles un
67
Em comemoração aos trinta anos de lançamento da obra, Fondo de Cultura Económica incluiu a gravação ao vivo, feita no Museo Universitario del Chopo do projeto Mientras nos dure el veinte; a proposta foi unir música e literatura, contando com a participação dos músicos Diego Herrera, Alfonso André, Federico Fong e Javier Calderón que musicalizaram alguns textos de Tiempo transcurrido.
183
contenido adicional. _ ¡Pinche Reformista! – decía Mónica, y seguía adelante”
(VILLORO, 2006a, p.37).
O narrador retrata Lalo com esse olhar de quem observa contradições,
pois “Lalo terminó la carrera tres años antes que Mónica. Como sus actividades
de izquierdista-sin-partido (ya que ninguno era estrictamente marxista-leninista)
fueron tan notorias, pronto recibió una oferta para trabajar en la Conasupo68”
(VILLORO, 2006a, p. 35) e, a partir daí, “sus palabras favoritas empezaron a
ser “consenso” y “equilibrio” (VILLORO, 2006a, p. 36). Com esse personagem,
o cronista analisa e critica o posicionamento da esquerda no país, pois, após
aceitar um emprego numa empresa estatal com fortes indícios de corrupção,
ele muda de discurso. O narrador busca traços da vida cotidiana e reflete sobre
elas, sem procurar outra realidade, nem pretender encontrar dimensões
secretas. Villoro já havia declarado em entrevistas que lhe agrada trabalhar
com essa dimensão:
La otra característica que a mí me interesa mucho explorar en la crónica es la dimensión de lo cotidiano. Yo creo que incluso en los grandes sucesos, en las sublevaciones o los golpes de estado, hay elementos cotidianos que deciden la realidad. Nosotros creemos que una crónica es real cuando la sentimos como vida realmente vivida. Cuando la sentimos como algo que ante nuestros ojos se convierte en algo irrepetible, y la vida cotidiana es esencial para eso. Entonces me gusta hacer tanto crónicas que directamente sean de vida cotidiana, como crónicas que sean más noticiosas pero donde la vida cotidiana tenga algo que decir (VILLORO, 2012e, p.1).
Com essas características, o cronista demonstra que, como movimento
socio-cultural, o rock é importante para os jovens mexicanos de um pouco mais
de meados do século passado, pois contribuiu para que pudessem exercer o
controle sobre suas roupas, seus quartos, clubes, bares e discotecas, como se
observa na descrição do cronista, sobre um jovem dos anos setenta:
Él [Joaquín] fue de los visionarios que descubrieron que el futuro estaba en el pelo y pasó antes que nadie del “casquete corto” al “casquete largo desvanecido” y de ahí a la greña loca. Sus papás tuvieron que tolerar la decoración de su cuarto en el departamento de
68
A Compañía Nacional de Subsistencias Populares (Conasupo) foi criada nos anos sessenta com o objetivo de ajudar a população mais pobre do país. Segundo Guillermo Correa, esta instituição “ en los últimos tres sexenios se destacó como fuente de corrupción” (CORREA, 1998, p. 2), envolvendo vários governos.
184
la colonia Narvarte: luz roja en el techo y luz negra sobre el marco de la puerta, tocadiscos en el piso, pósters fosforescentes, un cojín de estambre con la bandera de Inglaterra, una botella de Coca-Cola alargada y retorcida de la que salían flores de papel, botellitas de pachuli en el buró, campanas tintineando en la perilla de la puerta, una pipa de agua en el escritorio y tres varitas de incienso que lanzaban un humo color de rosa desde la cima del televisor (VILLORO, 2006a, pp.27-28).
Na crônica “1973”, o autor narra a vestimenta dos jovens Toño, Nabor e
Alvarito preparados para ir ao cinema “con sacos de terciopelo negro y
pantalones de presunta piel de leopardo. Los zapatos eran de charol. En el
pelo y en las solapas tenían lentejuelas, como si hubieran sido rociados por un
chipi-chipi de glitter [...]” (VILLORO, 2006a, p.47). Em seguida, comenta que
“La sociedad mexicana era lo suficiente liberada para aceptar el carácter misto
de la economía, los barrenderos vestidos de anaranjado psicodélico […], pero
tres personas con la elegancia […] de Toño, Nabor y Alvarito eran, simple y
llanamente, unos putotes” (VILLORO, 2006a, p.47). Depois desse comentário,
o autor relata o encontro dos rapazes com uns tipos viris e conclui: “Con varios
premolares menos y algunas costillas rotas, Toño, Nabor y Alvarito
abandonaron su intento de asumir la moda glam” (VILLORO, 2006a, p.47).
Nessas passagens, observa-se que o rock, a roupa e a caracterização do
quarto funcionam como um pretexto ou um pano de fundo para camuflar a
repressão e até situações de violência por que passavam os jovens naqueles
anos, e esses fatos aparecem em diversas crônicas dessa obra.
A cultura rock tem, a princípio, um duplo significado. Por um lado, há
certamente uma necessidade real de jovens que procuram mais liberdade. Por
outro, não se pode ignorar que existe uma indústria da música, do espetáculo e
da moda “cortando y limando en lo posible el “discurso” subversivo de aquello
que se encuentra y puede producirle ganancias” (DE GARAY, 1989, p.129). É
um processo dialético interessante, pois a indústria cultural (HORKHEIMER &
ADORNO, 2011) e o sistema social ao que serve se convertem em elemento
difusor da cultura que pretende canalizar e reprimir. Ou seja, os grupos de rock
muitas vezes utilizam a indústria cultural posta a sua disposição para difundir
uma série de propostas revolucionárias contra o sistema social imperante.
Entretanto, esse mesmo sistema consegue, quase sempre, cooptar tais
185
propostas e readaptá-las. A crônica “1970” apresenta uma crítica a esse
aspecto mercantil, como um dos fatores que afasta Joaquín do rock:
Para Joaquín el rock era un artículo de fe; [...] Pero en México el rock sólo existía fugazmente y a precios prohibitivos. Una asociación de beneficencia contrató a los Animals para actuar en el teatro Metropolitán: cien pesos los boletos de arriba y doscientos los de abajo (VILLORO, 2006a, p. 28).
Os outros fatores foram: a morte de um homem negro pelas mãos dos
Hell´s Angels, contratados pelos Rolling Stones como guarda-costas em
Altamont, as mortes por orverdose de Jimi Hendrix e de Janis Joplin e o exílio
de soldados americanos que procuraram refúgio no México. Tais
acontecimentos diminuíram a fé no rock, mas, como ressalta Price (2011): “la
gota que finalmente derrama el vaso es el rompimiento de los Beatles” (PRICE,
2011, p. 280). E Joaquín muda completamente:
Cuando supo que el cuarteto se había SEPARADO PARA SIEMPRE, puso un anuncio en el Aviso Oportuno de El Universal y la gente llegó a su departamento en la calle de Petén a llevarse discos a precios regalados. También vendió sus collares de chaquira y la placa de Carnaby Street que tenía en la pared. Por primera vez en años permitió que alguien le cortara el pelo como fuera, empezó a dejar la mariguana, entró a estudiar administración y se volvió fanático del fútbol (VILLORO, 2006a, p. 31, destaque do autor).
Segundo Adrián de Garay (1989) o rock mexicano tem três períodos
diferenciados. O primeiro ocorreu no final dos anos cinquenta e no início dos
sessenta. Caracterizou-se como uma cópia exata traduzida ao espanhol do
rock elaborado nos Estados Unidos e, sobre esse período, destaca: “Claro que
los grupos mexicanos tuvieron el mérito de haber sido los primeros en vocalizar
en castellano; pero también fueron, lamentablemente, los primeros en guardar
silencio cuando era necesario continuar con el grito” (DE GARAY, 1989, p.126).
O segundo, no final dos anos sessenta e princípios do setenta, surgiu em meio
ao movimento estudantil de 1968 com composições próprias, porém em inglês.
Sobre esse período, comenta Alberto Pulido Aranda (2008) “Durante el ya
mítico 1968, el rock se endurece y acelera. Las baladas y los cantos dedicados
a las flores, o al tan en boga binomio de la paz y el amor de los “hippies”,
empezaron a cederle terreno a los mensajes más violentos y contestatarios”
(PULIDO ARANDA, 2008, p.36). O último período ocorre no final dos anos
186
setenta em diante. Nele, renascem grupos estrangeiros que acabaram
reforçando o rock mexicano, passando a caber aí também todas as tendências.
Em setembro de 1971 ocorreu o evento conhecido como Woodstock
mexicano: o Festival de Rock y Ruedas de Avándaro ou, simplesmente,
Festival de Avándaro. Esse concerto, que reuniu um número incerto entre
duzentas e trezentas mil pessoas (HERNÁNDEZ CHELICO, 2011;
CASTAÑEDA, 2014), apesar de não ter ocorrido nenhum problema grave
durante o festival, acabou contribuindo para que o rock no México fosse
renegado à clandestinidade, pois o governo, que já vinha endurecendo a
repressão sobre qualquer tipo de reunião de jovens, aproveitou alguns
episódios de falta de organização ocorridos no evento para impedir outros
espetáculos de rock no país:
Después del concierto se llevó a cabo una campaña en los medios de comunicación para difundir el supuesto libertinaje y desenfreno de más de 250 mil jóvenes. A partir de ese momento, el gobierno prohibió las presentaciones en vivo, lo que orilló a las bandas a crear espacios subterráneos que con el tiempo fueron conocidos como “hoyos funky”, que consistían en viejos edificios abandonados o en desuso, como bodegas o locales vacíos en distintos barrios (CASTAÑEDA, 2014, p.1).
O governo proibiu também as transmissões pelo rádio, a produção e a
venda dos discos de bandas de rock nacional, usando a polícia para reprimir os
roqueiros. Essa situação permaneceu durante algum tempo, pois “Fue apenas
en las décadas de los ochenta y noventa que se dio una gradual reinserción del
rock en la vida cultural nacional. Desde el concierto de Avándaro, en México no
se ha realizado un concierto de tales magnitudes” (CASTAÑEDA, 2014, p.1).
Por isso, é significativo que Villoro tenha sido roteirista radiofônico de um
programa de rock e também crítico desse tipo de música no final dos anos
setenta, como já declarou em entrevistas e como comenta o narrador sobre o
protagonista da crônica “1978”: “Chucho escogió una profesión suicida: ser
crítico de rock en México” (VILLORO, 2006a, p. 73), ou “Escribir al sol” de Los
once de la tribu: “En 1979 era guionista del programa de radio El lado oscuro
de la luna y fui invitado por Huberto Batís y Fernando Benítez a escribir crítica
de rock en el suplemento Sábado, de Unomásuno” (VILLORO, 1998, p.9).
187
Villoro, como crítico de rock desde a década de 1970, deixa transparecer
alguns elementos autobiográficos, principalmente na crônica “1968”. Gus, o
protagonista, vive na Colonia del Valle e passa pela experiência desse período
desde as margens, pois tinha doze anos, a mesma idade que tinha o autor. Ele,
assim como Gus, tinha uma banda de rock denominada Fusifingus69 Pop, como
comenta o cronista em entrevista a Concepción Moreno (2009): “Era uno de los
muchos grupos de la colonia que había por entonces, estaba de moda hacer
conjuntos y tocar en fiestas. Nunca tuvimos siquiera una guitarra eléctrica: yo
tocaba la pandereta” (VILLORO apud MORENO, 2009, p.2). Além dessas
referências, há outras, como a que aparece na crônica “1984”, na qual o
protagonista leu De perfil, de José Agustín, a quem também é dedicada a obra.
As crônicas desse livro oferecem um pertinente painel social sobre
temas de repressão governamental, como o espancamento sofrido por Tomás
na crônica “1969”; a violência policial e a rigidez social que atinge Toño, Nabor
e Alvarito; a liberdade sexual das mulheres, com o início das pílulas
anticoncepcionais: “Rocío seguía siendo la misma: ni muy-muy ni tan-tan [...].
En su bolsa llevaba sus pastillas de Microgynon 21, y las tomaba sin poderse
decidir entre un rorro como Pedro, alguien tan ingenioso como Carlos o […]
como Jaime” (VILLORO, 2006a, p. 66); os castigos físicos, comuns,
principalmente nas escolas religiosas “[...] recibieron una educación católica,
acompañada de neolitazos, el castigo local del Tepeyac, que consistía en
azotar las nalgas del alumnado con una tira de auténtico hule Neolite”
(VILLORO, 2006a, p. 44) ou a repressão estudantil que se observa nas
primeiras crônicas e são substituías pela brutalidade da polícia nas demais,
além da decadência da esquerda e a impossibilidade de viver plenamente o
rock no México.
Além dos espaços públicos, nos textos aparece também o que García
Canclini (1999) chama de microespacios, que podem ser “los salones de baile,
que son importantes como lugares de agrupamiento geracional en la ciudad de
México, así como los sitios donde se hacen recitales rokeros, los hoyos fonkis y
otros semejantes” (GARCÍA CANCLINI, 1999, p. 92). Esses microespaços
69
O nome da banda foi inspirado em uma flor psicodélica da história em quadrinhos, publicada pela primeira vez em 1935, La pequena Lulú (Luluzinha).
188
estão representados nas crônicas pelos “hoyos fonqui”, que aparecem em
Tiempo transcurrido e Los once de la tribu. Nelas, o cronista narra a
experiência urbana de sujeitos marginais, que fogem de um padrão
estereotipado de beleza, colocando-os no centro de uma estética
contracultural, como diz Alicia Susana Montes: “Lo antiestético estético, es un
bastión de lucha a nivel simbólico y un espacio de visibilidad que rechaza y
refuta los rótulos, y el programa de vida que las élites, que sienten horror o
piedad por las clases populares, les han asignado” (MONTES, 2012, p. 273).
Há uma irônica caracterização dos roqueiros, separando os que
frequentam os “hoyos fonquis”, como os dos bairros mais pobres daqueles de
famílias abastadas. Alfonso pertence a este segundo grupo, vive numa zona
geograficamente privilegiada nos Jardines del Pedregal, em um bairro onde as
ruas têm nomes bucólicos, não trabalha, estudante do “Ibero”, uma das escolas
mais caras da cidade e é cristão. A descrição da participação desses jovens
endinheirados no movimento punk é extremamente ácida e caricaturesca:
Logró que su rostro adquiriera una expresión desencajada, de enfermo de salmonelosis y se mandó traer de Inglaterra lentes de soldador, chamarras llenas de zíperes diagonales, tintes para el pelo y alfileres que simulaban atravesar la mejilla. Una vez equipado, viajó a Nueva York y a Londres (VILLORO, 2006a, p. 58).
No subúrbio, em San Cristóbol Ecatepec, está George em uma casa
com “techos de lámina” (VILLORO, 2006a, p. 49), trabalha em um pequeno
armazém que vende tintas e outros materiais de construção a varejo, material
este que também será usado para os jovens se drogarem: “George trabajaba
de mozo en una tlapalería. Entre semana se la pasaba sirviendo tíner en
botellas de Coca-Cola, y blanco de España en cucuruchos de periódico”
(VILLORO, 2006a, p. 49). Essa crônica demonstra como um jovem de bairros
mais afastados que assistia filmes de catástrofes e mulheres nuas em
pequenos cinemas, entra em contato com os “hoyos fonquis” e suas músicas
de protesto. Tudo isso passa a ser associado a uma situação econômica
desfavorável, transformando-o no personagem apresentado no trecho abaixo:
La sencilla brutalidad de ese sonido borraba las pegajosas jornadas en la tlapalería. [...] Poco a poco se fue adentrando en el mundo de los conjuntos ingleses y norteamericanos que eran imitados en los
189
hoyos. [...] el contacto con el rock le hizo darse cuenta de que podía llevar un estilo de vida propio. Antes se vestía como fuera; si le regalaban un suéter lo usaba; si se le rompía el pantalón le cosía un parche. Ahora quería usar ropa estropeada a propósito: él era distinto: tenía una camisa rebanada en el ombligo, chaleco de mezclilla, un collar con una bala calibre 30-06 (VILLORO, 2006a, p. 51).
Essas crônicas demostram também que a experiência da música é
unificadora, sendo capaz de incluir pobre ou rico, indígena ou mestiço, além de
letrados e analfabetos. Nelas, aparecem diversas bandas que tocavam nos
“hoyos” “Enigma, Semilla de Amor, Ataúd Blindado, los Dug Dug´s, Hangar
Ambulante y Three Souls in My Mind” (VILLORO, 2006a, p. 50). Esta última é
considerada a mais radical “Hasta antes de los ochenta, sólo Three Souls in My
Mind realizó canciones con giros políticos, diciendo lo que pensaban sin temor
a represalias (DE GARAY, 1989, p.126). E também foi uma das bandas que
tocavam 1968: “Pocos lo recuerdan, pero el primer concierto de Alex Lora con
el Three Souls in my Mind fue el 12 de octubre de 1968 (Datos tomados de
Victor Roura en “Tri Souls: Negros del corazón”)” (PULIDO ARANDA, 2008,
p.49). No entanto, observa-se que as crônicas vão se transformando e
procurando demostrar que “el rock perdió su carácter rebelde y político y se
convirtió en un interminable ejercicio de narcisismo. Y, justamente, se nota la
pérdida de compromiso político en la música a medida que transcurren las
crónicas” (PRICE, 2011, p. 274). Fato que também pode ser visto nas crônicas
de Safari accidental. Em “Los reyes viejos”, o cronista inicia com uma
caracterização de Elvis para ressaltar a sua transformação em uma figura
midiática
las capas de satín vigorosamente tisú, el cetro de joyas de fantasía, la mansión tapizada de poliéster [...] y los pañales desechables que se vio obligado a usar en los últimos años de su mandato, el Rey del Rock & Roll tiene garantizado un nicho de terciopelo en el panteón de la cultura de masas (VILLORO, 2005a, p. 65).
De maneira um tanto nostálgica, o cronista comenta essa relação de
músicos do rock que, inicialmente, haviam tido uma postura política e a
expressavam através de suas canções; entretanto, com o tempo, houve um
abrandamento e até certo distanciamento desses temas, como se observa na
reflexão do autor entrecruzada com a voz de Peter Gabriel:
190
Hoy en día las estrellas de rock con ansias de cambiar el mundo luchan lejos de sus escenarios habituales. Sting se adentra en el Amazonas, Bono recorre África en compañía del Secretario del Tesoro estadunidense, Gabriel colabora con Amnistía Internacional o las ramas filantrópicas de consorcios como Disney o Reebock. Se diría que los músicos se han vuelto políticos en sus horas extra: “La situación ha cambiado mucho desde los sesenta”, la voz de Gabriel no sube de tono al hablar de conflictos sociales; “ahora la música mueve menos cosas por sí misma: la radio depende de intereses comerciales, el pop ha dejado de ser radical y la televisión es un desastre. […] Pero precisamente porque es difícil cambiar las cosas hay que hacer algo” (VILLORO, 2005a, p. 102).
Em “El diablo en la ciudad”, uma crônica cujo cenário é 1995, alguns
dias antes do primeiro concerto dos Rolling Stones no México, é, assim como
outras crônicas do autor sobre essa banda, uma demonstração de humor,
ironia e escárnio. Enfim, uma diatribe como se observa:
El mejor instrumento para medir el atraso con que el rock ha llegado a México es la cara de Keith Richards: hoy conoceremos en vivo su cutis de reptil, el más célebre curtido facial de la cultura popular, lo que los incendios interiores pueden hacerle a una cara sin aniquilarla (VILLORO, 1998, p. 31).
O narrador compara o atraso da chegada do rock ao país com a falta de
vitalidade facial do roqueiro. É importante assinalar o contexto histórico em que
desembarcam os “Rolling Stones (o sus restos)” (VILLORO, 1998, p.31), pois,
meses antes, o México havia assinado a TLCAN e “llegan al país que se vende
a mitad de precio” (VILLORO, 1998, p.31), mencionando a desvalorização da
moeda mexicana em 1994. Em seguida, percebe que o cronista se identifica
com o narrador e faz uma longa reflexão do rock vernáculo, mencionando que
o rock pesado dos Stones se manteve vivo graças aos “hoyos fonquis” e a
grupos como o Three Souls in My Mind: “El rock vernáculo se refugió en
bodegas con techo de lámina mientras la petrolera clase media se abismaba en
la música disco y las voces constipadas de los Bee Gees”. Depois destaca que
os verdadeiros fãs não poderão entrar no espetáculo no país:
Hoy en la noche, muchos devotos del conjunto quedarán fuera de las alambradas por la sencilla razón de que los boletos equivalen al ingreso anual de una familia tzotzil o a la quincena de un profesor universitario. Quienes sí pudieron hacerse de una magna entrada, llegarán a la Magdalena atraídos por la pasión proustiana de revisar el pasado durante 22 canciones, la curiosidad de ver a los monstruos en su freak-show, la búsqueda de una elegante decepción: respirar el mal aliento de los héroes, quitarle vendas a las momias. El clima de expectación apenas tiene que ver con la música. El Gran
191
Acontecimiento parece concebido por Franz Kafka & Asociados: la espera ha sido eterna; después de treinta años el agrimensor entra al castillo. ¿Qué chiste tiene ver a los archidecanos? Hace una década los Stones eran los cuarentones que no necesitaba el rock. Billonarios, embrutecidos por las drogas finas y las excelsas mayonesas del jet-set, los veteranos de un arte enemigo del envejecimiento parecían haber tomado en serio el graffiti situacionista: "Larga vida a lo efímero" (VILLORO, 1998, pp. 31-31).
Nesse parágrafo, o cronista critica a situação financeira em que se
encontra o país, a sociedade mexicana, a música e os músicos. E, como se
observa com a evocação do movimento situacionista, trata-se de uma reflexão
sobre o processo de reificação do rock através dos “reis velhos” e a desilusão
provocada pelo não cumprimento das promessas do rock and roll que o grupo
representa. Observa-se como o rock, que se iniciara como uma manifestação
contracultural, tornara-se popular e, com os anos, havia passado a ser um
produto em contato com a grande indústria do entretenimento, privilegiando
aqueles que pagam altos preços. No término da crônica, o autor rememora
uma frase do poeta Gottfried Benn e convida a sociedade do espetáculo a mais
um concerto, que, pela chamada, não parece ser de rock:
El poeta Gottfried Benn ofrece una clave para las pasiones de esta noche: "Quien ama las estrofas, también ama las catástrofes; quien está a favor de las estatuas, tiene que estar también a favor de las ruinas." En unas horas sabremos lo que hay detrás de la frase más conocida para conjurar el tiempo: "¡Damas y caballeros: los Rolling Stones!" (VILLORO, 1998, p. 37).
O rock, segundo Villoro, mesmo sendo expressão de uma cultura de
massa, não havia chegado ao México amplamente (VILLORO apud FLORES,
2014). Ele ressalta, então, que esse estilo musical havia começado como um
movimento contracultural, como uma oportunidade de mudar comportamentos,
mas havia perdido esse caráter ao longo dos anos, como pode ser observado
no transcurso das crônicas. Morin comenta (2011):
a cultura de massa se adapta aos já adaptados e adapta os adaptáveis; isto é, integra a vida social em que os desenvolvimentos econômicos e sociais lhe fornecem seus humos; a revolta adolescente não consegue resistir muito tempo e deve sofrer a integração na nova e grande camada consumidora que adere ao novo modo de vida (MORIN, 2011, p. 167).
Esse modo de vida mencionado por Morin (2011) é percebido também
nos textos de Villoro. Como as crônicas utilizadas como corpus traçam um
192
percurso histórico entre os anos finais da década de setenta aos primeiros de
dois mil, com as quatro coletâneas de crônicas do autor, nota-se que, nelas,
também, ocorre essa “adaptação”. Seus escritos apresentam como tema cada
vez mais o imperialismo de uma sociedade consumidora, a ditadura da
aparência, não centrando a discussão somente na cultura de massa, mas nos
efeitos do capitalismo, da globalização e do neoliberalismo. Por isso, não
somente o rock, mas o futebol, a televisão, o concurso de miss, as marcas
como “apple”, o parque temático da Disney, o espetáculo, enfim, concentra os
temas de suas crônicas.
Na crônica “1970”, o narrador demonstra sutilmente o momento em que
o futebol vai ganhado espaço no imaginário mexicano, impulsionado
principalmente pelo campeonato Mundial realizado naquele país, “Cuando el
Halcón Peña70 cobró el penalti que no pudo detener aquel portero de shorts
negros y sudadera roja, México venció a Bélgica y Joaquín supo que había
encontrado una afición capaz de sustituir al rock” (VILLORO, 2006a, p. 27).
O futebol organizado e profissional é um produto do desenvolvimento do
capitalismo, um espetáculo e uma mercadoria, que, como menciona Eduardo
Santa Cruz (1991) “puede ser visto como análogo a otros fenómenos
generados por la industria cultural moderna” (SANTA CRUZ, 1991, p.13). Esse
esporte, ao longo dos anos, foi-se adequando a uma realidade mundial
caracterizada por alguns como própria para o capitalismo desenvolvido de
consumo. No entanto, observa-se que o futebol se colocou de maneira
contraditória desde a sua concepção inicial, uma vez que surgiu baseado em
organismos sociais próprios da sociedade civil, como sindicatos de operários.
Com o tempo, abandonou esse viés e transformou-se em empresa, objetivando
a rentabilidade e impulsionando preços no mercado futebolístico a nível
internacional. Por outro lado, muitos aficionados ainda guardam essa primeira
concepção do esporte, como as “peladas” com amigos e parentes nos
campinhos dos bairros. O narrador de Dios es redondo, em uma reflexão sobre
esse movimento contraditório diz:
70
Gustavo Peña Velasco, conhecido como Halcón Peña. Capitão da seleção mexicana da Copa de 1970.
193
El arte de patear puede caer en la esfera de los placeres inofensivos o desembocar en el fanatismo del hooligan, la prepotencia del directivo, la mentira prefabricada de la televisión. Espejo del mundo que comienza más allá de los estadios, el juego de las patadas no es ajeno a la violencia, el racismo o la comercialización. La aporía del aficionado es la de una pasión pura, incontaminada, refractaria al efecto de la cerveza, las burlas de los enemigos y la manipulación de los medios. Eso, que rara vez existe, es el motor rescatable y esencial del fútbol. Lejos de los fichajes multimillonarios, en una playa sin nombre alguien patea una pelota o algo que la representa (un bulto de trapo, una lata, una bolsa llena de papeles) (VILLORO, 2006b, pp. 22-23).
Adorno e Horkheimer, entre outros, declaram em seus escritos que o
que se faz e o que se omite no tempo livre estão determinados pela sociedade
capitalista. Esse tempo é aproveitado pela indústria do entretenimento, que
controla e manipula os indivíduos. Seguindo nessa linha, o futebol organizado
seria uma parte dessa indústria, que impede o indivíduo de ser autônomo e
independente.
Não cabe dúvida de que as classes dominantes sempre tentarão manter
o controle sob as classes menos abastadas, principalmente nos espaços da
cotidianidade, e isso não é uma exclusividade do futebol, mas de qualquer
fenômeno cultural onde haja as massas populares. Ou seja, discriminar esse
esporte como um meio para discutir literatura, seria reduzi-lo a somente uma
dimensão, pois a leitura é, e não somente uma forma de mobilizar o lazer.
Que jogo e espetáculo impulsionam uma parte do lazer moderno não é
nenhuma novidade, talvez o novo seja, como diz Morin (2011): “é a extensão
televisionaria ou teleauditiva do espetáculo, abrindo-se até os horizontes
cósmicos, são os progressos de uma concepção lúdica da vida” (MORIN, 2011,
p.61). As técnicas dos meios massivos de comunicação contribuem para a
criação de uma espécie de espectador destacado fisicamente, passivo,
reduzido, impossibilitado de refletir “Também é espectador o leitor do jornal e
da revista” (MORIN, 2011, p. 61). Como no cenário descrito por Guy Debord
(1997), a sociedade não existe para ser vivida, mas para ser representada.
Observa-se que nos jogos de futebol, por exemplo, muitos preferem a
experiência mediada por anúncios publicitários, visualizar um drible importante
mais vezes, sem risco da violência dos estádios e assim por diante. A crítica de
194
Debord encontra-se nesse momento, no qual um sujeito deixa de ser ator para
ser um receptor, um ente passivo.
Como comenta Villoro, citando o relato «Esse est percipi» de Borges e
Bioy Casares que “reúne dos defectos del fútbol: la supremacia de la televisión
y los engaños de la nostalgia” (VILLORO, 2006b, p.61). Talvez o problema não
seja a influência dos meios para afiançar ou manter a popularidade de
jogadores, equipes e treinadores, ainda que artificialmente, nem a dimensão de
espetáculo que adquire, mas até que ponto este articula com outros sentidos
de dimensão política, social e cultural.
A crônica sobre futebol, nesse sentido, por sua tessitura, pelo veículo de
circulação, a linguagem e o meio de divulgação dá ao torcedor-leitor e ao
narrador a possibilidade de escutar a voz coletiva de uma época e de uma
sociedade a partir de uma partida ou de um fato ocorrido com um jogador ou
time, onde está em jogo não somente a relação honra, perda e continuidade,
mas também o homem e a sociedade. Um exemplo do anterior é a crônica
“Barbosa: el hombre que murió dos veces”, no qual, a partir do enterro do
goleiro Moacyr Barbosa, o primeiro goleiro negro da seleção brasileira, o
cronista rememora a glória e a condenação a que ele foi submetido,
representado com o caixão coberto apenas com a bandeira do extinto
Ypiranga: “En un país donde los futbolistas alcanzan el rango de semi-dioses,
Moacyr Barbosa fue despedido como un fantasma” (VILLORO, 2006b, p.66). A
bandeira do Vasco da Gama, time que jogou por muitos anos e conquistou
vários títulos, chegou minutos antes do término do enterro. Ao resgatar essa
memória coletiva e discutir através do texto as questões econômicas, pois
Barbosa recebia “una pensión de 85 dólares mensuales” (VILLORO, 2006b,
p.68) e o preconceito racial que contribuiu para o esquecimento do jogador
“Los prejuiciosos que nunca faltan lo acusaron de carecer del temple de los
jugadores blancos” (VILLORO, 2006b, p.68), esta crônica possibilita reavivar
uma memória coletiva, inclusive de quem não estava no estádio e não assistiu
posteriormente a partida, pois “Más de medio siglo después, millones de
brasileños recuerdan el partido. Incluso quienes no lo vieron conocen el
episodio que paralizó a un país” (VILLORO, 2006b, p.68). Certamente, a
crônica contribuiu para manter viva essa memória.
195
Villoro, que já jogou no futebol de base no Pumas, ressalta que,
frequentemente, um crítico se questiona por que não há grandes romances
sobre esse esporte e comenta: “La respuesta me parece bastante simple. El
sistema de referencias del fútbol está tan codificado e involucra de manera tan
eficaz a las emociones que contiene en sí mismo su propia épica, su propia
tragedia y su propia comedia” (VILLORO, 2006b, p.21). Supõe-se assim que o
futebol não deixa espaço para a inventiva do autor. Nesse contexto, a crônica
retoma o que já foi notícia através de um fragmento que permaneceria em
silêncio se não fosse através desse resgate. Assim como a música, o futebol
aos domingos, as noites de boxe, o cinema, recuperam toda essa cotidianidade
carregada de símbolos, como Marlon Brando e Marilyn Monroe, ídolos como
Pelé ou Garrincha e ícones como Elvis Presley ou Jimi Hendrix, que ficaram
em silêncio, são resgatados nessas narrações (DÍAZ ZULUAGA, 2014, p. 32).
O futebol, assim como outros elementos massivos, funciona como
veículo de construção e afirmação do imaginário cotidiano que entra em
contato com outro meio que também pretende ser cotidiano como, a televisão,
que Monsiváis denomina como “la caja idiota” e Villoro comenta que: “La
televisión es, en su mayoría, un territorio de la banalidad, un estímulo del
consumo, un proyecto de formación de conductas intrascendentes y una
colorida perpetuación de la nada (VILLORO, 2011a, p.19).
Alguns escritores, entre eles Osvaldo Soriano, Roberto Fontanarrosa e o
próprio Villoro, reconheceram a frustração de não terem conseguido ser
jogadores profissionais, e, no caso de Fontanarrosa, foi o que o levou à
literatura. De maneira concreta, ele comenta que seus heróis, quando era
adolescente, não foram os escritores, e sim os jogadores de futebol, como
Ermindo Onega71. Villoro comenta essa relação entre futebol e a literatura: “Y
es que el fútbol es, en sí mismo, asunto de la palabra. Pocas actividades
dependen tanto de lo que ya se sabe como el arte de reiterar las hazañas de la
cancha” (VILLORO, 2006b, p. 21).
Como se pode observar com ambos os trechos destacados, o futebol é
também palavra, ou seja, pode ser revelado como um ato de fala: “El juego
71
Ermindo Onega, jogador do River Plate.
196
sucede dos veces, en la cancha y en la mente del público” (VILLORO, 2006b,
p.13). O escritor e o público leitor resgatam a oralidade e a memória coletiva
das glórias e fracassos compartilhados através do texto. Essa é uma
característica das crônicas de Villoro, não narra somente os acontecimentos,
mas as opiniões, as reflexões, muitas vezes coletiva, dos eventos.
É certo que nem todos os escritores nutrem apreço por esse esporte,
nem pela literatura sobre esse tema. Nas primeiras linhas da crônica “Los once
de la tribu”, cuja obra tem o mesmo nome, o cronista comenta: “Aunque no
todos lo confiesen, numerosos escritores leen el periódico a la manera de
Samuel Beckett: un veloz repaso a los desastres de la Tierra y un minucioso
estudio de la tabla de goleo” (VILLORO, 1998, p. 127). Nesse texto, segue
comentando as críticas feitas por Oscar Wilde e George Orwell sobre esse
esporte: “el gusto y el asco, los aficionados y los “sobrevivientes”, Beckett y
Orwell” (VILLORO, 1998, p. 128). Em uma conversa sobre futebol e literatura,
Jorge Valdano discorre sobre teorias da desconfiança de escritores com o
esporte e destaca três razões: “la desconfianza que la izquierda le tiene al
fútbol, la desconfianza que los intelectuales le tienen a las masas y la
desconfianza que la mente le tiene al cuerpo. Son sólo unos cuantos los
escritores que han sabido traspasar esas barreras” (VALDANO apud GÓMEZ,
2007, p.1).
Segundo Santa Cruz (1991), para aqueles que conseguem transpassar
a barreira da suspeita e da condenação, o futebol pode ser abordado por duas
dimensões: “como fenómeno propiamente histórico, pertenecen las estructuras
que lo gobiernan como espectáculo-mercancía y al fútbol, como fenómeno no
histórico, corresponde el sistema como ceremonia-acontecimiento” (SANTA
CRUZ, 1991, p.16). Na primeira dimensão, privilegia-se a História econômica e
social; na segunda, a vida simbólica e individual. No entanto, é importante
destacar que ambas são importantes, principalmente para a análise de
fenômenos culturais como o futebol, que apresentam práticas complexas e
multifacetadas. Por isso, “el fútbol como expresión cultural masiva no es
reductible a su dimensión de negocio o mecanismo evasivo, como tampoco es
posible olvidar estas facetas tras una mistificación idealizada (SANTA CRUZ,
1991, p.19). Para tentar dar conta desse fenômeno talvez seja adequado
197
centrar a discussão na prática sócio-cultural. No entanto, como comenta Jaime
Marroquín, não se pode esquecer que, para Villoro, “Parte de la racionalización
del juego es mostrar su importancia política” (MARROQUÍN, 2011, p.252).
Em “Infancia en la Tierra”, Villoro apresenta quatro adversários do
esporte que preocupam a todos os que têm “devoción futbolera”: “La defensa
de hierro, el comercio del fútbol, el poder político y los aficionados de la sangre”
(VILLORO, 1998, p. 148). É certo que já houve tentativas e até êxito no
controle do esporte e também na sua utilização como arma política. Com
relação ao comércio do gol, o cronista destaca a participação de um dos mais
famosos diretores da FIFA “El eterno jerarca, Joao Havelange, ha subordinado
el fútbol a la caja registradora” (VILLORO, 1998, p. 148). Entre as propostas
apresentadas por Havelange para deixar o esporte mais rentável estão a
ampliação das traves e descansos a cada quinze minutos para abrir espaço
para comerciais. Com relação ao controle político, Villoro cita dois casos
emblemáticos: a operação “Mãos limpas”, que investigou a ligação entre o
futebol e o sistema político italiano na década de 1990 e o Mundial de 1978 na
Argentina. Como diz Beatriz Sarlo: “foi construído um apaziguamento popular
em um país de desaparecidos e de campos de tortura” (SARLO, 2005, p.122).
Villoro destaca que o Mundial
fue casi un “experimento controlado de manipulación política. [...] En lo que toca al uso del fútbol en la política exterior argentina, pocos análisis son tan precisos como el de la comunicóloga canadiense Joyce Nelson. […] Nelson rastrea el trabajo que la compañía West Nally Ltd, con sede en Montecarlo, realizó para mejorar la imagen pública de los militares durante el Mundial. Antes de la contienda, la prensa había insistido en el tema de los desaparecidos y los derechos humanos. En 1978 una hábil campaña de presiones y cabildeo en los medios transformó el panorama: en los 60 periódicos más importantes de Estados Unidos, las noticias de Argentina se relacionaron en 25 ocasiones con el fútbol y sólo en tres con los desaparecidos (VILLORO, 1998, pp. 149-150).
Como se observa nos trechos citados, Villoro é um autor que transcende
sua experiência futebolística conduzindo-a até outros assuntos, introduzindo
discussões e reflexões sobre a política, a economia e a cultura. Sobre a
inauguração do estádio Azteca no Mundial do México em 1986, o cronista
comenta que o futebol transformou a massa. Como comprova Elias Canetti
198
(1995), nem sempre massa tem sentido negativo, pois ela pode descobrir uma
voz própria e uma consciência crítica. Ele cita, então, dois momentos ocorridos
no país nos quais se percebe o despertar da sociedade civil mexicana:
Un año antes, el presidente Miguel de la Madrid había sido incapaz de enfrentar la contingencia del terremoto en el Distrito Federal. Se negó a recibir ayuda exterior y aportó muy poco para solucionar la catástrofe. El pueblo se volcó a las calles y reordenó las piezas de la ciudad rota, rebasando con mucho los esfuerzos oficiales. Esa misma gente encaró al mandatario en el estadio Azteca y lo recibió con una zona rechifla. No es exagerado decir que ahí nació una sociedad civil consciente de su poder que emprendería la larga marcha para derrocar al PRI 14 años después (VILLORO, 2006b, p. 29).
Até o momento, Villoro publicou duas coletâneas de crônicas sobre
futebol: Dios es redondo (2006b), Balón dividido (2014c), além de Ida y vuelta,
publicada em 2010 com colaboração de Martín Caparrós, três em Los once de
la tribu (1998) e diversas reflexões sobre o esporte, em Safari accidental
(2005a), Tiempo transcurrido (2006a) e outros textos dispersos em diversos
meios. Entretanto, para quem se escrevem as crônicas de futebol? No prólogo
de Dios es redondo, comenta que:
He querido escribir para los seguidores del fútbol, pero también para sus críticos; para quienes no se interesan en los goles pero buscan comprender el delirio a través de la literatura. […]. Mi interés ha sido captar la pasión por el juego. Leo con fervor a los periodistas deportivos pero en el momento de narrar trato de seguir el épico consejo del dramaturgo y cronista Nelson Rodrigues: «y si los datos no nos acompañan, peor para los datos» (VILLORO, 2006b, p. 13).
Em “Los once de la tribu”, complementa que:
Las crónicas de fútbol son para la fanaticada, la masa circular de los estadios, la barra brava de Boca, los forofos que hinchan las cabeceras del Santiago Bernabeu, la torcida brasileña. Ninguna palabra define mejor al fanático que la italiana tifoso. En efecto, se trata de gente infectada, incurable (VILLORO, 1998, p. 128).
No entanto, Marroquín (2011) acredita que as crônicas de Villoro são
para leitores intelectualizados, com certo conhecimento literário devido as
referências feitas pelo autor a obras, escritores e expressões, como quando
comenta em “Los once de la tribu”, o romance Diario de la guerra del cerdo de
Bioy Casares, ao sugerir que a melhor forma de adquirir humor diante da
adversidade é ser torcedor de um clube perdedor; em Dios es redondo, o
199
cronista cita a frase que o poeta Darío Jaramillo Agudelo que ao comentar a
respeito de Valderrama: “Nuestro fútbol es estupendo, pero en cámara lenta”
(VILLORO, 2006b, p.42); e ainda o motivo que fez da Alemanha campeã em
1954: “De acuerdo con Victor Hugo, Napoleón perdió en Waterloo porque la
lluvia arruinó su virtuosismo de artillero y sus cuidadas cargas de caballerías. El
mal clima favorece a los que se adaptan al lodo y la desorden” (VILLORO,
2006b, p. 38); ou em “Infancia en la Tierra”, quando diz que, durante muitos
anos, a liga mexicana teve um perfil claro: “Enrique Krauze ha trazado su mapa
histórico” (VILLORO, 1998, p. 146).
Além das referências literárias, observa-se também que a cultura
massiva é convocada frequentemente através de jogos de palabras nos quais
resgata, por exemplo, personagens de filmes, pois compara Diego Armando a
um robô da ficção científica hollywoodiana: “para el público es un mutable
Robocop, una máquina que se regenera al engullir una papilla, el monstruo
gordo con la zurda nítida, el semidiós que anota con la mano goles legales […]”
(VILLORO, 1998, p.140); canções populares mexicanas, como a de Omar
Chaparro: “El sentido de la tragedia inventa insólitos recursos; sin embargo, a
veces el fútbol se parece a la canción ranchera y lo bueno consiste,
precisamente, en salir ultrajado: «Qué manera de perder …!» (VILLORO,
2006b, p. 40); programas televisivos para criticar as declarações de jogador
José Luis Chilavert: “Sus desplantes estrafalarios ocurren lejos del pasto, en
las declaraciones donde describe como un Napoleón en Disneylandia («los
niños son mis ejércitos», dijo ante las cámaras de la cadena infantil
Nickelodeon)” (VILLORO, 2006b, p. 160); ou de manchetes de revistas, nas
quais o jogador Denilson, ao invés de prometer jogar bem, está preocupado em
ser nomeado o melhor do mundo para vender mais camisas. “El dinero otorga
tal pedigrí que Denilson declaró en la portada de la revista El Balón: «Quiero
volver a ser el más caro del mundo»” (VILLORO, 2006b, p. 90). Acredita-se que
essa mistura entre o erudito e popular é próprio da crônica de Villoro, mas
também é próprio da narração de futebol. O cronista elimina hierarquias, como
se observa desde a epígrafe na qual aparece respectivamente Rodrigo Navarro
Morales (menino de sete anos, aluno do Instituto Alexander Bain), Manuel
Vázquez Montálvan, Montaigne e Marco Aurelio. Neste caso, ele coloca lado a
200
lado uma composição de voz desconhecida com a chamada “alta literatura” de
maneira homogênea, igualando-os de forma plural e dinâmica.
Em “Conversación con Ángel Fernández”, observa-se essa mistura entre
o erudito e o popular, pois o cronista radiofônico e, depois, televisivo, sempre
colocava apelidos nos times e jogadores narrados por ele. Foi denominado por
Villoro de o “Góngora de la fanaticada”, pois utiliza esse recurso em sua
narração, principalmente na televisão: “Aunque Ángel Fernández ha sido un
notable cronista de radio, su verdadero sello surgió en la televisión, donde hay
mayor espacio para la imaginación” (VILLORO, 1998, p. 154). Neste caso,
evidentemente, não existe a necessidade de contar ao espectador o que já
está assistindo; por isso, utiliza metáforas nas quais se percebe essa mistura,
principalmente entre termos históricos e a cultura de massa. "Hans Peter
Brigel, que en alemán quiere decir: Ferrocarriles Nacionales de Alemania."
Cristóbal Ortega72 debuta con el América: "¡América descubrió a Cristóbal!"
(VILLORO, 1998, p. 154) ou ainda “¡Qué manera de cucharear el envío de
Ubirajara, de destroncar al Confesor Cornero73, de jalar el gatillo cuando ya
Supermán Marín74 achicaba el ángulo, kriptonita pura!... ¡¡el Hijo del Coronel
manda al Confesor al Concilio de Trento!!... esto es ¡el juego del hombre!"
(VILLORO, 1998, p. 154).
Villoro considera Ángel Fernández um renovador da linguagem popular e
uma inspiração para sua escrita. “Años después, cuando empecé a escribir, me
pregunté si habría manera de narrar al modo de los locutores, en tiempo
presente” (VILLORO, 2006b, p. 129). O cronista costuma utilizar a narração
com verbos no presente como uma forma de aproximar o leitor e favorecer a
narração. Esse é um dos recursos que foram utilizados pelo Novo Jornalismo
norte-americano, que certamente se relaciona com a crônica mexicana atual.
Para se aproximar do novo Olimpo ou da Liga das Estrelas, que Morin
chamou, referindo-se aos atores de cinema, de “produto mais original do novo
curso da cultura de massa” (MORIN, 2011, p. 100), o cronista começa com as
72
Cristóbal Ortega jogador do Club América de 1974 a 1992. 73
Miguel Ángel Cornero zagueiro argentino apelidado por Ángel Fernández de “EL Confesor”, devido ao seu porte físico os atacantes deveriam rezar somente de vê-lo. 74
José Miguel Marín, goleiro argentino que defendeu as cores do Cruz Azul, apelidado por Fernández de Superman.
201
filas de imigrantes no cais de Barcelona. Em meio a fogueiras, com restos de
materiais descartados, policiais a pé e a cavalo, narra as vozes que passam
dias e dias nas filas para conseguir um visto de trabalho e os empregos a que
são submetidos em troca de baixos salários. “Cualquier trabajo vale para
quienes han migrado sin más documentos que sus cicatrices, incluído el de
abridor de sobres de correo para detectar posibles polvos de ántrax”
(VILLORO, 2006b, p.89). Em outra fila, a dos estádios, estão aqueles que
também estão em fuga da miséria de seus países: “Lejos de ese corredor de
sombras duermen otros tránsfugas de la pobreza, los que se identifican por el
pie como los perros se identifican por el paladar” (VILLORO, 2006b, p.89). No
entanto, apesar de que aparentemente ambos terão vidas extremamente
diferentes naquela cidade, o cronista menciona que aos jogadores não lhes
aguarda somente dinheiro e glória, mas “una extraña vida de ultraje y
admiración y dinero y fracturas, los gladiadores del tercer milenio que los
estadios conocen como Ronaldinho, Makelele, Kluivert, Eto’o o Ronaldo”
(VILLORO, 2006b, p.89). Como é sabido, eles foram discriminados e
publicamente humilhados em diversas partidas.
Os olimpianos estão presentes em todos os setores da cultura de
massa, porém parece que, na atualidade, os jogadores de futebol têm ocupado
frequentemente esse espaço que esteve reservado às estrelas de cinema.
Villoro rememora um trecho da crônica de Vásquez Montalbán sobre Ronaldo
No es ni será nunca un jugador de club. Pertenece a las multinacionales y vive en los aviones que le llevan de y lo llevan a la samba. Es un mito creado por la FIFA para que sigamos creyendo en la religión del fútbol, y no hay religión sin Dios, vacante de la FIFA desde que Maradona comenzó a autodestruirse” (VÁSQUEZ MONTALBÁN apud VILLORO, 2006b, p.92).
A Maradona, Villoro dedica um capítulo em Dios es redondo além de
diversas outras reflexões sobre o jogador e sua relação com a mídia em outros
textos. Marronquín (2011) acredita (e somente ele) que Villoro presta
homenagem velada a Maradona nessa obra. Trata-se de uma forma retórica de
se manifestar no artigo. Após longo período afastado, essa figura midiática,
assim como os símbolos que carrega tatuado no corpo “Sus confusos ídolos
202
cívicos son Fidel Castro, Carlos Saúl Menem y Che Guevara” (VILLORO,
2006b, p. 76), retorna em um programa televisivo em 2005, chamado La noche
del 10, que era uma mistura de “sambódromo, cancha de fútbol-playa, feria de
coches desportivos, concurso de belleza y comedia musical [...] un folletín de
escesos” (VILLORO, 2006b, 85). Nota-se, neste caso, essa complicada relação
entre os ídolos esportivos e a mídia, como demonstra o cronista nesse trecho,
mencionando que “Maradona confirmó la tela de la que están hechos los
héroes populares y la importancia del regreso en la imaginación de la gente.
Gran aficionado al fútbol, Samuel Beckett escribió: «No hay partido de vuelta
entre el hombre e su destino»” (VILLORO, 2006b, p. 86).
A mistura de ídolo e produtos a serem consumidos, como aparece no
trecho destacado anteriormente, mostra a pressão da indústria e do comércio
para derramarem seus produtos, e a publicidade é, evidentemente, o veículo
mais adequado para essa expansão. A cultura de massa e a publicidade
mantêm uma estreita relação, pois a primeira propõe produtos que induzem ao
bem-estar, ao prestígio e à libertação pessoal, enquanto a segunda
desenvolve, no imaginário, informação que sugere felicidade, amor e sedução.
No futebol, observa-se o avanço da publicidade, uma vez que as cores das
camisas dos jogadores quase desaparecem sob diversas propagandas. Tal
fato, no entanto, não apaga nem diminui o sentimento pelo clube: “Aunque la
camiseta sea infamada por anuncios comerciales [...]. Una vez elegido el club
que determina el pulso de la sangre no hay camino de regreso” (VILLORO,
2006b, p. 18).
203
CAPÍTULO IV - CRÔNICA: O ORNITORRINCO DA PROSA 4.2 Crônica: caminhos fronteiriços
Y la crónica está allí, desde el principio, amenazando la claridad de esas fronteras
75.
Susana Rotker
Y aunque el procedimiento nunca es explícito, es notoria la abolición de las distancias entre realidad y ficción. Además, pierde terreno la prosa de intenciones clásicas, y gana lo que antes hubiese sido ruido o cacofonía
76.
Carlos Monsiváis
Em seu discurso, ao receber o Prêmio Nobel em 1982, Gabriel García
Márquez, inicia citando o navegante florentino Antonio Pigafetta que, ao passar
pela América, relata suas aventuras em detalhadas crônicas que mais parecem
peripécias da imaginação. Ao longo da exposição, ele menciona também que
os cronistas de Índias semearam o germe da literatura americana e narra uma
série de fatos verídicos que mais parecem ficção e ressalta:
Me atrevo a pensar que es esta realidad descomunal, y no sólo su expresión literaria, la que este año ha merecido la atención de la Academia Sueca de la Letras. Una realidad que no es la del papel, sino que vive con nosotros y determina cada instante de nuestras incontables muertes cotidianas, y que sustenta un manantial de creación insaciable, pleno de desdicha y de belleza, del cual éste colombiano errante y nostálgico no es más que una cifra más señalada por la suerte. Poetas y mendigos, músicos y profetas, guerreros y malandrines, todas las criaturas de aquella realidad desaforada hemos tenido que pedirle muy poco a la imaginación, porque el desafío mayor para nosotros ha sido la insuficiencia de los recursos convencionales para hacer creíble nuestra vida. Este es, amigos, el nudo de nuestra soledad (GARCÍA MÁRQUEZ, 1982, p. 2).
García Márquez menciona nesse trecho uma questão que acompanha a
crônica contemporânea: os limites entre ficção e realidade. Ressalta também a
insuficiência de recursos para fazer crível essa narração.
No prólogo da obra Mejor que ficción: crónicas ejemplares (2012), de
Jorge Carrión, intitulada “Mejor que real”, o autor centra sua reflexão na
dificuldade de separar ficção e não ficção na crônica latino-americana, pois
75
ROTKER, Susana. La invención de la crónica. México: FCE, Fundación para un Nuevo Periodismo Iberoamericano, 2005, p.226. 76
Fragmento da entrevista de Carlos Monsiváis a Juan Jesús Aznárez, em 2003.
204
argumenta que “la fabulación es uno de nuestros mecanismos psicológicos [...]”
(CARRIÓN, 2012, p.26). Destaca ainda que o jornalismo e a ficção moderna
foram cultivados simultaneamente e por isso a crônica “no es un género, es un
debate” (CARRIÓN, 2012, p.26) e acrescenta que: “Cada crónica es, por tanto,
un debate que solo transcribe datos inmodificables y que reclama otras
palabras. Un debate inclusivo con los géneros y las formas textuales de cada
momento histórico” (CARRIÓN, 2012, p. 31).
Ao propor o termo debate está implícito o conflito entre Ficção e História,
Mentira e Verdade, Religião e Ciência, Utopia e Realidade, Especulação e
Demonstração. É preciso considerar que o jornalismo não é a imagem da
realidade, senão uma construção, uma interpretação desta. E que construção
significa que se trata de uma produção discursiva, com todas as características
que pode ter inclusive a representação de ficção, pois, desde ao menos os
“finales del siglo XIX, en ningún ámbito de representación encontramos
certezas incuestionables sobre qué es la realidad ni sobre cómo hay que
representarla” (CARRIÓN, 2012, p.27).
Em Safari accidental, Villoro a partir de aforismo, aclara que “La crónica
es la encrucijada de dos economías, la ficción y el reportaje” (VILLORO, 2005a,
p.12). Ou seja, a crônica é um instrumento narrativo que contribui para contar a
realidade mais imediata, um gênero resultado de uma mistura harmônica, não
necessariamente em partes iguais, de dado e ficção.
A questão da ficção e não ficção na crônica pode ser problemática, tanto
para estudiosos literários quanto para o leitor, principalmente para “Aquellos,
acostumbrados a igualar "literatura" con "ficción", de repente se encuentran con
la obligación de hacer una distinción teórica entre realidad e invención -
diferencia que por lo general han ignorado” (FABER, 1999, p.253), pois estão
diante de um texto que, por sua forma, parece ficcional, mas, por seu conteúdo,
realidade. Por isso, é importante destacar que “La realidad de la crónica es el
texto, y eso a muchos se les olvida” (VILLORO apud ALMOMENTO.MX, 2014,
p.1) e que “Todo texto es una construcción” (VILLORO, 2011a, p.9) que se
realiza através da linguagem, que é, na verdade, outra realidade e impõe leis
próprias nas quais, de algum modo, recorta, organiza e “ficcionaliza” o fato,
205
porque a verossimilhança, a credibilidade e a autoridade da crônica dependem
da maneira como é apresentada a escrita.
A linguagem artística e o uso das técnicas da ficção, principalmente do
conto e do romance na crônica de Viilloro, não põem em dúvida a sua
veracidade, pois “Al absorber recursos de la narrativa, la crónica no pretende
“liberarse” de los hechos sino hacerlos verosímiles a través de un simulacro,
recuperarlos como si volvieran a suceder con detallada intensidad” (VILLORO,
2005a, p. 15). A linguagem mais elaborada não destrói a objetividade
necessária na crónica, pois “Su contrato con la verdad es inquebrantable. La
recreación subjetiva de los hechos puede tener cambiantes adverbios y
adjetivos, pero no puede alterar los datos” (VILLORO, 2011a, p. 10).
Em algumas crônicas, pode-se notar a citação de fontes e datas. No
entanto, isso não é uma obrigação, pois se celebra um pacto com o leitor, sem
a necessidade de um acúmulo de fontes, a realidade não está nos dados,
senão na (re) construção da trama, pois “La crónica es el género de no ficción
donde la escritura pesa más” (CAPARRÓS, 2007, p.2). Ou, como define
Monsiváis, “reconstrucción literaria de sucesos o figuras, género donde el
empeño formal domina sobre las urgencias informativas” (MONSIVÁIS, 2010,
p. 13).
Sebastiaan Faber (1999) comenta em seu artigo “La metonímia en una
crónica de Carlos Monsiváis. Hacia un periodismo democrático” que, para o
linguista John Searle, não há característica que distinga ficção de verdade,
visto que o autor de ficção “finge” contar uma história real. No entanto, para
Genette e Prince, existem sinais textuais que dão a indicação de veracidade
em um texto, como, por exemplo, a presença de diálogos transcritos em
extensão de detalhes. A transcrição de pensamentos alheios, porém, costuma
transgredir a verossimilhança de um texto narrativo que pretende ser
verdadeiro, ou seja, essa é uma transgressão utilizada pelo autor para dar
pistas ao leitor da “ficcionalização”.
A relação entre narrador e autor são elementos importantes e devem ser
observados na transgressão dessas fronteiras, pois, na ficção, o narrador pode
ser uma pessoa que representa um deles. Não se pode, no entanto, julgar o
206
autor de ficção pelo que diz o narrador, ao contrário do jornalismo, quando o
autor se responsabiliza pelo que diz o narrador, e o jornalista, inclusive, é
chamado a corroborar com ele. Egan (2004) denomina essa voz do autor da
crônica de autoridade narrativa. Esse elemento sustenta o texto, independente
de dados sociológicos ou estatísticos, que podem ou não aparecer na crônica.
Linda Egan afirma que essa autoridade é proveniente de três fontes:
primero, el "contrato extratextual 'firmado' por el autor y manifestado en los títulos, las portadas de los libros, las fechas anotadas y los prólogos que prometen que los textos están hechos de hechos"; segundo, la "credibilidad" del autor, que es reforzada por su tono autocrítico y de su eficacia narrativa; y tercero, "la visibilidad del referente real y la técnica que puede transparentar o esconder este referente" (EGAN apud FABER, 1999 p. 7).
A autoridade narrativa mencionada por Egan pode ser encontrada nos
livros que compõem o corpus dessa pesquisa. O contrato extratextual aparece
no tílulo Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias, indicando que tipo de texto
será apresentado e também no prólogo intitulado “Rescate temporal”, no qual
discorre justificativas para um recorte entre 1968 a 198577, mas não em
números redondos, como costumam ser as obras no México. Ressalte-se
também o fato de o rock ser o fio condutor dos textos que são, basicamente,
crônicas imaginárias.
Muitos pesquisadores78 quando analisaram a obra cronística de Villoro,
excluíram Tiempo transcurrido por considerarem um livro de contos. Dentre os
77
São dezoito crônicas, assim como os dezoito meses que compõem o calendário solar asteca. 78
Entre eles é importante citar a tese de doutorado de Beatriz García Torres, intitulada “La crónica mexicana contemporánea a través de los textos de Juan Villoro y José Joaquín Blanco” (2012); e na tese de doutorado “Idea de Hispanoamérica en la obra de Juan Villoro”, de Manuel de Jesús Llanes García (2012) ambas as pesquisas, apesar de abordarem as crônicas do autor, não discutem o gênero de Tiempo transcurrido, mencionando que são contos. Já o artigo “Las crónicas de Tiempo transcurrido, de Juan Villoro, um soundtrack generacional” (2013), de Ricardo Camarena Castellanos tem como proposta a caracterização de Tiempo transcurrido como um livro de contos. Logo na introdução, Camarena Castellanos menciona o conceito de conto que está apoiado, e diz: “Este trabajo actúa bajo la premisa de una lectura posmoderna de dichas “crónicas imaginarias” que son la casi veintena de cuentos secuenciales de Villoro. Ele se baseia em Lauro Zavala, que diz “el sentido de un cuento cualquiera depende de la interpretación de cada lector, de tal manera que puede ser leído estableciendo asociaciones inéditas, lo cual depende del contexto (moderno o posmoderno) de cada lectura (ZAVALA, 2002)” (CAMARENA CASTELLANOS, p. 1). A partir desse conceito, ele traça uma série de considerações baseadas principalmente no que Lauro Zavala denomina de “período do conto mexicano”, e comenta que “Tiempo transcurrido está situado tras un período del cuento mexicano de 1971 a 1982, en el que caben “las voces urbanas, el tono lúdico y la brevedad”
207
motivos estão: o alto grau de subjetividade dos textos; a presença de
personagens e o fato das crônicas terem sido publicadas em 1986, baseados
em acontecimentos ocorridos nos anos finais da década de sessenta, quando o
cronista tinha apenas doze anos, ou seja, ele não estava lá, como comenta no
prólogo: “Los que éramos niños en 1968 vimos la historia desde las banquetas”
(VILLORO, 2006a, p. 9). No entanto, é importante observar que todos os textos
partem de histórias do cotidiano, através de pessoas comuns, publicadas em
jornais da época e que o autor toma conhecimento posterior através de
pesquisas ou diálogos informais (fato que se pode inferir). A partir disso,
retoma a narração como fato presente, utilizando duas das quatro técnicas do
Novo Jornalismo, mencionadas por Wolfe:
El tercer procedimiento era el por llamarlo así «punto de vista en tercera persona», la técnica de presentar cada escena al lector a través de los ojos de un personaje particular, para dar al lector la sensación de estar metido en la piel del personaje y de experimentar la realidad emotiva de la escena tal como él la está experimentando (WOLFE, 1998, pp. 48-49).
Todas as crônicas dessa obra estão narradas em terceira pessoa. Nelas
se observa que Villoro utiliza essa técnica, pois ela contribui para afastar
possíveis questionamentos de que o autor não estava presente, além de
manter uma postura que admite certa limitação. A outra estratégia do Novo
Jornalismo explorada por Villoro é:
El cuarto procedimiento ha sido siempre el que menos se ha comprendido. Consiste en la relación de gestos cotidianos, hábitos, modales, costumbres, estilos de mobiliario, de vestir, de decoración, estilos de viajar, de comer, de llevar la casa, modos de comportamiento frente a niños, criados, superiores, inferiores,
(CAMARENA CASTELLANOS, p. 2). No entanto, Lauro Zavala (2007), em sua tese de doutorado reconhece que os textos de Villoro se encontram em uma fronteira bastante diversa “En la mayor parte de los casos, es una escritura que comparte elementos de al menos dos géneros literarios (distintos en el caso de cada cuento particular), y en ese sentido es también una escritura fronteriza. Además de la tensión estructural, la brevedad, el tratamiento cuidadoso del final, la construcción primordial de las situaciones y el ritmo de la escritura propios del cuento tradicional, estos relatos tienen claros elementos de otros géneros tradicionalmente alejados del cuento, como la crónica (Emiliano Pérez Cruz, Juan Villoro, Lorenzo León, Cristina Pacheco, Paco Ignacio Taibo II)” (ZAVALA, 2007, p.27).
208
iguales, además de las diversas apariencias, miradas, pases, estilos de andar y otros detalles simbólicos que pueden existir en el interior de una escena (WOLFE, 1998, p.49).
Certamente ocorre a subjetividade com personagens fictícios, porém se
percebe que os textos foram construídos a partir de investigações e de uma
pesquisa minuciosa que enriquece a narrativa com detalhes que contribuem
para dar verossimilhança às cenas. Como comenta Wolfe, “La relación de tales
detalles no es meramente un modo de adornar la prosa. Se halla tan cerca del
núcleo de la fuerza del realismo como cualquier otro procedimiento en la
literatura (WOLFE, 1998, p. 49).
O trecho de Tiempo transcurrido mencionado no qual o cronista destaca
“àqueles que eram crianças em 1968”, remete a uma passagem do libro La
noche de Tlatelolco de Elena Poniatowska, o qual relata uma conversa com
Eduardo Valle, líder do movimento estudantil que se encontrava na prisão de
Lecumberri em 1970. Essa passagem, Villoro rememora em um diálogo com o
escritor Cristián Alarcón:
Nosotros somos cartuchos quemados. Estamos en la cárcel, no vamos a poder hacer nada. He tenido un derrotismo muy explicable, pero los herederos de esto, los que van a contar la historia son los niños que tenían entre 12 y 15 años, nuestros hermanos menores. La gente que vio las manifestaciones desde las aceras se dio cuenta de lo que pasaba pero era demasiado joven para participar. Ellos se salvaron gracias a su infancia pero recordarán lo que hicimos (VALLE apud VILLORO y ALARCÓN, 2008c, p. 2).
Em vários de seus textos, o autor retorna a esse período histórico,
relatado através de personagens do cotidiano que não fizeram parte
diretamente do movimento, como a personagem Mónica da crônica “1971”:
“Ella se sentía marcada por la “experiencia” del 68 (aunque sólo se hubiera
enterrado de los pormenores tres años después [...] y el descubrimiento de los
Halcones79 que se entrenaban karate en el Campo Militar Número 1”
(VILLORO, 2006a, pp. 33-34), assim como o próprio autor que, no momento do
79
Grupo de paramilitar mexicano fundado em 1966 de repressão contra a guerrilha urbana e a todo e qualquer movimento social contestatário. Apesar de nenhum governo ter assumido a contratação desses ex-militares, muitos deles após a saída do grupo foram presos por roubos (CASTILLO GARCÍA, 2008, p.1).
209
massacre, não tinha consciência do ocorrido, pois era muito jovem. Nesse
mesmo diálogo com Alarcón, mais adiante, diz:
Pues depositó en mi generación - yo tenía 12 años exactamente - la responsabilidad de contar la historia y esta ardua responsabilidad que nos transfirió Eduardo Valle “El Búho” fue muy difícil de cumplir por muchas razones que yo he tratado de investigar (VILLORO apud VILLORO y ALARCÓN, 2008c, p.2).
As crônicas de Tiempo transcurrido estão deliberadamente testando os
limites entre ficção e história. Villoro, em conversa com Piglia sobre esses
limites, comenta que:
no se puede narrar sólo desde el pasado pero tampoco el presente es un horizonte que singularice la experiencia y adquiera inmediato sentido narrativo. Simplificando el argumento, podríamos decir que la experiencia que proviene del pasado (la historia) ha sido uniformada por los historiadores y la experiencia del presente ha sido estandarizada por la vida moderna. ¿Cómo encontrar lo irrepetible? Las líneas de fuerza que van de la historia a la ficción plantean este problema. […] Es posible que la crónica ofrezca una respuesta, pero no en la circulación habitual de los periódicos, que rara vez asimilan crónicas, sino más bien en el flujo lento de los libros. Curiosamente, creo que muchas de las crónicas interesantes que se están escribiendo ahora, especialmente en América Latina, no tienen la urgencia del presente ni ocupan un espacio del presente, sino que en cierta forma posponen sus lectores (VILLORO apud PIGLIA y VILLORO, 2007, p. 4).
Quando o autor afirma que Tiempo transcurrido são crônicas
imaginárias, está ressaltando, desde o título, um contrato com a realidade e
com a história, um compromisso, um duplo pacto que ocorre em toda crônica.
A intervenção da crônica, nesse sentido, oferece outro olhar, outra perspectiva.
Por isso as crônicas de Villoro funcionam em duas velocidades: o relato dos
fatos, a representação do ocorrido na mente das testemunhas e da opinião
pública, mas também a discussão, o comentário, a reflexão do acontecimento.
Como menciona ainda no prólogo: “Si el novelista busca la creación de un
mundo único, irrepetible, el cronista, en cambio, asimila todo tipo de lugares
comunes. Las crónicas imaginarias son una combinación de ambos
procedimientos” (VILLORO, 2006a, p. 10), ou seja, essa obra é como comenta
Caparrós:
La crónica aparece, entonces, como el género que quiere renovarse, buscar, y busca – muchas veces – dar cuenta de lo que pasa en esas sociedades. Por definición la crónica cuenta el presente: no puede sino contar el presente – o un pasado hecho presente por el hecho de
210
contarlo. Y a muchos les interesa releer lo que ven todos los días. Para eso sirven, entre tantas otras cosas, los relatos: para rever, para mirar de otra manera aquello que estamos acostumbrados a mirar (CAPARRÓS, 2015, p. 478).
Em outra obra, Villoro interroga indiretamente se é preciso ter visto ou
viver em um determinado período para fazer uma crônica, para narrar como o
presente. Em Dios es redondo comenta:
Las crónicas comprometen tanto la imaginación que algunos de los grandes rapsodas han contado partidos que no vieron. Casi ciego, Cristino Lorenzo
80 fabulaba desde el Café Tupinamba de la ciudad de
México; el Mago Septién81
y otros locutores de embrujo lograron inventar gestas de béisbol, box o fútbol con todos sus detalles a partir de los escuetos datos que llegaban por telegrama a la estación de radio (VILLORO, 2006b, p. 22).
Os locutores não assistiram às partidas que narraram com riqueza de
detalhes, pois “El fútbol ocurre en la hierba y en la agitada consciencia de los
espectadores. La crónica vincula ambos territorios” (VILLORO, 2006b, p. 22).
Villoro também se utiliza dessa técnica na crónica: “Formas de la pasión”, na
qual narra diversos jogos importantes da seleção alemã, inclusive a partida
final da Copa de 1954, entre Alemanha e Hungria: “El sol en torno al cual
giraban era Ferenc Puskas, capaz de anotar de zurda a 35 metros de la
portería” (VILLORO, 2006b, p. 36). Em Safari, o cronista menciona que o filme
Rashomon, de Akira Kurosawa, que está baseado em dos contos de
Ryonosuke Akutagawa, põe em jogo as várias versões que um acontecimento
pode produzir. Mais adiante questiona a verdade que aparece na tela
afirmando que “Incluso las cámaras de televisión son proclives a la
discrepancia: un futbolista está en fuera de lugar en una toma y en posición
correcta en otra” (VILLORO, 2005a, p. 15). Para ilustrar, comenta sobre as
câmeras que, curiosamente, não mostram nada, “desde 1966 el gol fantasma
de la final en Wembley no ha acabado de entrar en la portería. En sentido
estricto, la “verdad” es la falta de datos en contra. Una categoría irrenunciable y
perfectible” (VILLORO, 2005a, p.15).
80
Cristino Lourenzo – cronista esportivo mexicano. 81
Pedro Septién Orozco conhecido como El Dinámico Mago Septién. Foi locutor e cronista esportivo mexicano por mais de setenta anos.
211
Em “Monterroso, libretista de ópera”, crônica que compõe Los once de la
tribu, Villoro comenta que a ópera “ofrece la ventaja impagable de confundir al
máximo lo real con lo ficticio” (VILLORO, 1998, p. 101). Com essa introdução,
o cronista levanta vários questionamentos de por que não se tem óperas no
país, apesar do “poderío musical”, principalmente popular:
disponemos de la más vasta dotación de tunas y estudiantinas; de la orquestra mixe de Tlahuitoltepec, el Pueblo de la sierra de Oaxaca donde los niños aprenden a leer las notas antes que las letras; de los espléndidos cuartetos para cuerdas de Manuel Enríquez y las maravillas contemplativas de Mario Lavista; del kitsch de Juan Gabriel […], con todo este arsenal, ¿no será posible una ópera? (VILLORO, 1998, p. 102).
Em seguida, o cronista ouve uma resposta para suas indagações: “Es
que no hay libretistas” (VILLORO, 1998, p. 102). A partir daí Villoro descreve
uma adaptação como o libreto operístico de El dinossauro, o famoso micro
conto de Monterroso. No texto é detalhada toda a estrutura, as características
formais e as cenas de uma ópera que Monterroso parcialmente imaginou, mas
que nunca existiu. Pode-se inferir um caráter imaginário, pois, enquanto o leitor
se envolve nas diversas possibilidades de adaptações musicais e cênicas
apresentadas, não se atenta para uma indicação no prólogo do livro de que
essa crônica “merecería ser cierta” (VILLORO, 1998, p.10).
Esse texto remete ao segundo elemento destacado por Egan, que
contribui para a formação da autoridade narrativa do autor na crônica, uma vez
que, além do contrato extratextual, está a credibilidade reforçada pela
autocrítica. Essa credibilidade é construída a partir do verossímil, pois, como
escreveu Aristóteles, “devemos preferir aquilo que é impossível, mas
verossímil, ao possível, mas não convincente” (ARISTÓTELES apud
OLIVEIRA, 2009, p.14). Da mesma forma também afirma Villoro que “La
realidad, que ocurre sin pedir permiso, no tiene por qué parecer auténtica. Uno
de los mayores retos del cronista consiste en narrar lo real como un relato
cerrado (lo que ocurre está ―completo sin que eso parezca artificial”
(VILLORO, 2005a, p.18).
A autocrítica é exercida ao longo de todo discurso cronístico, através de
uma rede de comentários à margem, comparações irônicas e humorísticas,
212
pois Villoro reflete sobre códigos culturais específicos, principalmente a cultura
popular vernácula, modas passageiras, informações desencontradas na mídia,
misturando com referências mais “eruditas” e que não estão “exentas de cierta
voluntad de entretenimiento o de la necesidad de una apurada puesta en
perspectiva (TAPIA, 2016, p. 11). Assim, ele procura marcar uma função
comunicativa e uma proximidade cultural e ideológica com o leitor.
O referente real, que pode ser explícito com datas específicas ou quase
imperceptíveis através de fatos do cotidiano, é o último elemento mencionado
por Egan para compor a voz de autoridade. Nas crônicas de Villoro, na maioria
das vezes, o referente aparece de maneira bastante sutil, como em “La
tempestade superligera”, na qual se pode precisar o dia exato com pequenas
informações: “Me cae mal", Julio César lo repitió una y otra vez. En las noches
soñaba con la risa burlona y la mirada oblicua de Greg Haugen. La pelea por el
campeonato mundial superligero era un acto de pasión” (VILLORO, 1998,
p.113). Ocorre também em “Escape de Disney World”, quando se pode indicar
apenas o período, mas não uma data: “En Semana Santa, 100 mil personas
recorren Disney World” (VILLORO, 2005a, p. 174). Em algumas, porém, já
inicia com datas explícitas, como “Un mundo (muy) raro”: “En marzo de 2001 el
presidente de México, Vicente Fox, cumplió 100 días en el poder” (VILLORO,
2005a, p.45). Pode-se citar também em “La apple del pecado”: “En 1986
desempaqué un aparato gris perla, con pantalla apenas más grande que una
tarjeta postal” (VILLORO, 2005a, p. 183).
Cabe atentar que os dados concretos, as fontes e as referências
utilizadas para dar verossimilhança ao texto, em uma época de múltiplas
informações como a atual, nas quais o leitor tem informação, ainda que muitas
vezes elementar, do objeto que toma o cronista, a informação concreta
contribui para centrar a discussão, diminuindo o risco da dúvida por parte do
leitor com relação à veracidade do que está sendo narrado. Mas quando
questionado sobre o porquê dessa mistura, Villoro responde que: “vivo del
periodismo y las aguas de la ficción se han dejado influir por mi mirada de
cronista. A veces esto es muy evidente. […] La observación minuciosa de la
realidad, tan esencial al periodismo, puede hacer que tu mirada sea más
aguda” (VILLORO apud IGLESIAS CONTÍN, 2015, p.1).
213
A informação como se apresenta atualmente consiste em dizer para
muitos o que ocorre com poucos, pois a maioria da população nunca será
notícia, a menos que lhe ocorra uma tragédia. A crônica se rebela contra esse
poder que impõe uma ideia de informação, tratando da vida de qualquer um,
mostrando que aquilo que ela relata poderia acontecer com seus leitores. Ou
seja, a crônica se caracteriza como um lugar de resistência capaz de
descentrar o foco jornalístico, como “una manera de decir que el mundo
también puede ser otro. La crónica es política” (CAPARRÓS, 2007, p.3).
Villoro, de maneira irônica em Safari accidental diz:
La mayoría de las veces, el escritor de crónicas es un cuentista o un novelista en apuros económicos, alguien que preferiría estar haciendo otra cosa pero necesita un cheque a fin de mes. El principal truco del oficio consiste en transformar esta interrupción de la Obra en una necesidad estética. El primer pretexto que el cronista se susurra a sí mismo es que eso le ayudará a escribir ficción (VILLORO, 2005a, p.11).
No trecho verifica-se duas questões que envolvem as discussões sobre
a valorização da crônica. A questão financeira como motor para escrever esse
tipo de texto e a relação entre ficção e não ficção. Quando Villoro destaca em
letra maiúscula a “Obra”, está chamando a atenção para a valorização da obra
de ficção em detrimento a da não-ficção. Em outro trecho dessa mesma
crônica diz:
Como quiera que sea, el siglo XX volvió específico el oficio del cronista que no es un narrador arrepentido. Aunque ocasionalmente hayan practicado otros géneros, Egon Erwin Kisch, Bruce Chatwin Álvaro Cunqueiro, Ryszard Kapuscinski, Josep Pla y Carlos Monsiváis son heraldos que, como los grandes del jazz, improvisan la eternidad (VILLORO, 2005a, p.13).
Essa relação de valorização da obra ficcional e da não ficcional não é
recente. Tom Wolfe comenta que o objetivo de conseguir um emprego no jornal
era para
permanecer íntegro, pagar el alquiler, conocer «el mundo», acumular «experiencia», tal vez pulir algo del amaneramiento de tu estilo... luego, en un momento, dejar el empleo sin vacilar, decir adiós al periodismo, mudarse a una cabaña en cualquier parte, trabajar día y noche durante seis meses, e iluminar el cielo con el triunfo final. El triunfo final se solía llamar La Novela (WOLFE, 1998, p. 8).
214
Salcedo Ramos rememora um pensamento de Tom Wolfe o qual
demostra que o Novo Jornalismo dos sessenta já passava pela questão de
produzir crônicas enquanto se aguarda ou escreve “a Obra” e diz:
Tom Wolfe usaba una analogía para referirse a aquellos escritores que en los años sesenta hacían periodismo narrativo sin convicción, sólo para tener algo a lo cual dedicarse mientras daban el gran golpe con una novela: decía que para esos escritores el periodismo narrativo era como entrar a un motel a pasar el tiempo con una chica transitoria, mientras conseguían una mujer respetable –es decir, una novela– y podían llevarla al altar. Pues bien: yo creo que en mi generación hay varios cronistas que la estamos pasando de maravilla en el motel con la chica mal vista (SALCEDO RAMOS, 2013, p.2).
Assim como Salcedo Ramos, Linda Egan (2004) dedica parte de seus
estudos para tratar dessa relação no texto cronístico: “Como la marginalización
de la crónica en la comunidad académica proviene en buena medida de la
aplicación anacrónica de un persistente criterio del siglo XIX según el cual
“literatura” es sinónimo de “ficción” (EGAN, 2004, p. 27). A crônica, por conter
essa mistura entre o ficcional e o não-ficcional, foge, ou fugia de determinado
padrão estabelecido. Talvez essa questão ainda esteja latente, pois, em 2012,
Alberto Salcedo Ramos escreve: “Hay todavía muchos escritores de ficción
convencidos de que quienes escriben no ficción son indignos del calificativo de
escritores” (SALCEDO RAMOS, 2012, p.632).
Não em vão, Villoro desmitifica a figura do cronista, propondo uma
reflexão e criticando a sua própria tarefa de escrever crônicas. Expõe, também,
a relação entre ficção e não ficção, já que muitos autores de ficção que migram
para a crônica usam as matérias jornalísticas como base para suas obras
ficcionais. Como destaca Villoro em uma conversa com Daniel Alarcón, na qual
iniciam uma discussão sobre ficção e realidade, comenta: “Es obviamente
imposible escribir ficción sin apelar a la realidad y escribir crónicas sin tener
una visión literaria de los hechos” (VILLORO y ALARCÓN, 2008c, p. 11).
Em Safari accidental, Villoro declara que, na crónica, o
comprometimento com os fatos deve ser também com a verdade, pois “Si el
periodismo apuesta a contar “lo que ocurrió”, la ficción prefiere imaginarlo
(VILLORO, 2005a, p. 14). Isto não significa uma oposição entre mentira e
verdade, apenas a ideia de que a ficção forma parte do “real”, não devendo,
215
porém, ser confundida com a “realidade”, tal como no romance realista e
naturalista, pois é preciso entender que “La crónica es el único territorio donde
combaten con armas iguales la realidad y la imaginación” (MARTÍNEZ apud
SALCEDO RAMOS, 2016, p. 3). Em seguida, Villoro retoma a diferenciação
que Saer faz em sua obra sobre essas supostas dicotomias e diz:
Juan José Saer ha despejado el malentendido con elocuencia: la ficción no trabaja con la mentira sino con lo inverificable; las tramas literarias no aspiran a la falsificación, sino a ser ciertas de otro modo, a construir una segunda realidad: “La verdad no es necesariamente lo contrario de la ficción […] No se escriben ficciones para eludir, por inmadurez o irresponsabilidad, los rigores que exige el tratamiento de la ‘verdad’, sino justamente para poner en evidencia el carácter complejo de la situación […] La paradoja propia de la ficción reside en que, si recurre a lo falso, lo hace para aumentar su credibilidad” (El concepto de ficción) (VILLORO, 2005a, pp.14-15).
Nessa mesma obra, Saer menciona ainda que a ficção é uma
“antropología especulativa” (SAER, 1997, p. 6), porque a literatura apresenta,
propõe, especula possíveis formas de ser do homem, do mundo e da
sociedade, pois, como comenta em entrevista Lauro Zavala, a literatura “no
sólo es una forma de antropología especulativa, sino que construye su propio
sistema de verdad, que tiene efectos muy reales en sus lectores y
espectadores” (ZAVALA apud SALAZAR, 2011, p. 6).
Caparrós utiliza a expressão “literaturizar” para tratar da relação entre
ficção e não-ficção na crônica e diz que há “escritores reconvertidos en
periodistas y lo que en España se ha llamado la literaturalización del
periodismo” (SAMPER apud CAPARRÓS, 2007, p.1). Essa reflexão é
pertinente porque muitos cronistas latino-americanos, e certamente Caparrós e
Villoro estão entre eles, pois são cronistas que “literaturizam” o jornalismo, ou
seja, que veem na crônica um ramo da literatura. Caparrós (2007) segue
comentando que o que mais lhe interessa é o jornalismo cultural, porque cria
uma cultura “no habla sobre la que ya existe. Eso, creo, es la crónica”
(CAPARRÓS, 2007, p.1). “Literaturizar”, fazer literatura é colocar em prática
todos os recursos narrativos, a subjetividade do escritor, o seu olhar. No
entanto, Villoro chama a atenção para o perigo de “literaturizar” a realidade:
216
no se debe novelizar la realidad; para eso es muy fácil dedicarse a la novela. En la novela se puede mentir con conocimiento de causa a partir de hechos reales. En la crónica no se puede ni se debe hacer esto (VILLORO, 2010c, p.2).
O cuidado com o estilo, com a prosa, não significa inventar dados, pois,
como ressalta Monsiváis, na crônica “se requiere el tratamiento artístico pero
no el maquillaje (MONSIVÁIS, 2010, p. 95). Para essa consideração do
cronista, cabe um questionamento: até onde se pode “ficcionalizar” a
realidade?
Jean Paul Sartre em seu livro, O que é literatura?, cuja primeira
publicação é datada de 1947, levanta três questionamentos: o que é escrever?
Por que escrever? Para quem escrever? Tais indagações propõem uma
reflexão sobre a essência da criação literária e como ela pode refletir e
transformar o homem e sua realidade, constituindo uma postura ética.
Na primeira parte da obra, Sartre, antes de se dedicar à literatura, trata
de explicar porque a escolha desta e não de outras formas de arte. Então, ele
diferencia a poesia, a prosa, a pintura, a música, a escultura, procurando situar
todas as formas de expressão. Em seguida, ele especifica mais detidamente a
prosa e a poesia, pois ambas estão conectadas à linguagem, à comunicação, e
essa distinção é importante para Sartre, pois ele centrará a discussão na
primeira e destaca: “La prosa es utilitaria por esencia: difiniría muy a gusto al
prosista como el hombre que se sirve de las palabras” (SARTRE, 1967, p.51).
Afinal, ele concebe a prosa como instrumento que se opera na busca de
engajamento82. Para Sartre, o próprio ato de escrever já indica um
posicionamento engajado, uma responsabilidade social.
Pedro Henríquez Ureña em seu estudo Corrientes Literarias de
Hispanoamérica (1945) menciona que a tradição hispano-americana, desde o
início do século XX, tem duas genealogias: uma com “fines puramente
artísticos y outra con fines sociales (UREÑA apud RUISÁNCHEZ y ZAVALA,
2011, p.15). Mas adiante Rui Sánchez e Zavala complementam: “Los últimos
veinte años, sin embargo, han sido cruciales para la superación de esta
dicotomía en apariencia insalvable” (RUISÁNCHEZ y ZAVALA, 2011, p.16).
82
É importante ressaltar que ao tratar do engajamento do prosador, Sartre não está excluindo o compromisso dos envolvidos nas outras formas de arte.
217
Villoro experimenta em seus textos, principalmente em suas crônicas, o
equilíbrio entre essas duas vertentes da tradição hispano-americana.
Essa tensão entre arte/estética e posicionamento crítico com fins
sociais/ética passa pela reflexão de literatura engajada/comprometida versus
arte autônoma/livre. A crônica é um tipo de texto que se arma sobre essa
dicotomia. Por um lado, tem compromisso com o fato, com a verdade, com a
referencialidade, pois é jornalismo. Do outro, mantém a subjetividade porque
não deixa de ser literatura.
No México, a crônica, com muita frequência, tem sido utilizada pelos
escritores com esse intuito contestador, como forma de resistência. No entanto,
isso não significa que seja intrínseco ao gênero, pois há escritores que não
fizeram uso desse viés. Villoro acredita que a literatura é uma forma de
resistência (VILLORO apud CAMPOS, 2016, p.1), e a crônica tem sido um
meio utilizado por ele para “sair ao sol” (VILLORO, 1998, p.9), pois, para ele, a
literatura discute a realidade, assim como a sociologia, a filosofia, a economia,
a psicologia e a história, mas utilizando o registro da literatura. O escritor
espanhol Javier Marías expressa a ideia de literatura que compartilha com
Villoro:
Comparto con Juan Villoro la idea de que la literatura no debe servir como refugio o resguardo de la realidad, sino como parte de ella, algo que la acompaña; o como él lo señaló alguna vez, ambos, él y yo, vemos al mundo como una vasta oportunidad narrativa (MARÍAS apud CANTÚ, 2011, p.388).
Eagleton, ao comentar a respeito da função da literatura, esclarece que,
em muitas sociedades, ela já teve função, como, por exemplo, a função
religiosa. Mais adiante, afirma que, na época atual, “a literatura deixou de ter
grande função prática” (EAGLETON, 2006, p. 15). No entanto, acredita-se que
é possível que a crônica seja essa forma de resgate da função prática da
literatura, porém não se pode esquecer, como reforça Adorno (2004), sobre a
dificuldade de obras atuarem de maneira mais imediata: “El arte es una figura
de praxis y no tiene que pedir perdón por no actuar directamente: no podría
aunque quisiera; el efecto político de las obras «comprometidas» es muy
incierto” (ADORNO, 2004, p. 307).
218
A crônica é o meio utilizado por Villoro para discutir a cultura relacionada
à lógica do capitalismo, a autonomia da literatura e a relação entre ficção e não
ficção, mostrando que não existe jornalismo totalmente objetivo nem literatura
literalmente subjetiva. Elas são fronteiras tênues, para as quais cabe uma
mediação.
O fato de Villoro ter iniciado como cronista, resgatando datas e eventos
emblemáticos com um caráter social, político e cultural, sugere uma
demonstração de preocupação em analisar as transformações de uma
sociedade ao longo de mais de três décadas. Essa atitude pode ser percebida
através da maneira como aborda, em suas crônicas, determinados temas,
como a poluição, os meios de transportes, a violência, os novos
empreendimentos imobiliários, o futebol e o boxe. Em 2008, Leonardo Tarifeño
em uma entrevista o questiona a respeito de como, sendo ele um intelectual de
ativa participação política no país, pode viver o “compromisso” político do
escritor em pleno século XXI. Ele responde que:
Es un asunto de ética individual, que pertenece a lo que un escritor hace como ciudadano. Las novelas que quieren mejorar la vida de los sindicatos suelen ser pésimas, pero resulta provechoso aclarar y debatir temas desde la prensa. Participo en los debates como lo que soy, un cronista de las ideas que trata de aclararse temas. Más que intervenir en la coyuntura, el cronista interviene en las lecturas por venir: busca que la sinrazón del presente se convierta en el sentido común del futuro. Vivo de la escritura en un país con pocos lectores y millones de analfabetos. Es un privilegio y un enigma social que en ocasiones me lleva a tratar de acercar la discusión política a gente que no pasa por los libros (VILLORO apud TARIFEÑO, 2008, p. 12, sublinhado nosso).
A fluidez na fronteira entre as diversas formas é uma das principais
características da obra de Juan Villoro, pois tenciona a realidade e a ficção em
variados gêneros. Muitos dos seus ensaios, contos e romances apresentam
características de crônicas. Brian L. Price (2011) afirma que as crônicas de
Villoro podem ser divididas em duas categorias: “las que lindan con la ficción y
las que se atienen más a la realidad” (PRICE, 2011, p. 266).
Para muitos cronistas latino-americanos, entre eles Caparrós, Guerriero,
Salcedo Ramos e, principalmente, Juan Villoro, o limite dessas fronteiras é a
219
ética, ou seja, uma postura pessoal do autor diante do leitor, como destaca no
início de Safari:
La vida depara misterios insondables: el aguacate ya rebanado que entra con todo y hueso al refrigerador dura más. Algo parecido ocurre con la ética del cronista. Cuando pretende ofrecer los hechos con incontrovertible pureza, es decir, sin el hueso incomible que suele acompañarlos (las sospechas, las vacilaciones, los informes contradictorios), es menos convincente que cuando explicita las limitaciones de su punto de vista narrativo (VILLORO, 2005a, p.17).
É importante pensar que a ética da crônica não é uma opção que se
possa acatar ou rejeitar, mas uma obrigação, principalmente em países como o
México, no qual muito frequentemente há manipulação de informação nos
meios. Como elucida Sergio Hernández, “la ética no es simplemente un valor
moral, sino un principio de responsabilidad social” (HERNÁNDEZ apud
GARCÉS, 2012, p.2). No entanto, isso não significa que nesse gênero haja
uma valorização da ética em detrimento da estética, pois, na literatura, a ética
não se opõe a estética. No entanto, como afirma Zavala: “De hecho, la lectura
política es lo que está siempre en el fondo de toda discusión estética” (ZAVALA
apud SALAZAR, 2011, p. 17).
A utilização de recursos expressivos na crônica, para Villoro, não é mero
adorno estilístico para se aproximar do leitor, mas uma posição clara diante da
realidade, uma postura que procura demonstrar qual é o seu lugar na
enunciação e as suas limitações, como afirma “Por supuesto, es una postura
personal; hay quienes trasgreden con mayor flexibilidad este límite pero yo creo
que tenemos un compromiso ético con la verdad (VILLORO, 2010c, p.2).
O lugar de enunciação constitui uma característica da crônica desde
suas origens, pois é a condição do testemunho presencial do cronista com
relação ao fato narrado. Na atualidade, esta peculiaridade ainda estar em vigor,
porém depende do objeto da crônica e das condições para exercê-la. A crônica
de um evento social, uma manifestação política, cultural ou esportiva pode
exigir a figura do cronista, porém a presença ou não do cronista no fato narrado
não é impedimento para construir a crônica, pois esse gênero é “El intento de
darle voz a los demás – estímulo cardinal de la crónica – es un ejercicio de
aproximaciones (VILLORO, 2005a, p. 15).
220
Em O que resta de O que resta de Auschwitz: o arquivo e a testemunha
(2008), texto com o qual Villoro dialoga em Safari accidental, Agamben
menciona que há dois termos em latim para representar etimologicamente o
vocábulo testemunha. O primeiro é testis, significando aquele que se põe como
terceiro em um processo entre duas partes, enquanto o segundo, superstes,
“indica aquele que viveu algo, atravessou até o final um evento e pode,
portanto, dar testemunho disso” (AGAMBEN, 2008, p. 27). O cronista é um
testis e, certamente, isso implica uma responsabilidade
La crónica es la restitución de esa palabra perdida. […] La voz del cronista es una voz delegada, producto de una “de subjetivación”: alguien perdió el habla o alguien la presta para que él diga en forma vicaria. Si reconoce esta limitación, su trabajo no sólo es posible sino necesario (VILLORO, 2005a, p. 16).
É importante compreender que, ao buscar os limites entre a informação
e a narração, entre a crônica e a ficção, não se trata de que o primeiro
represente certa objetividade e o segundo a subjetividade, ou uma oposição
entre mentira e verdade. Ambas contam histórias, e talvez seja melhor pensar
que a verossimilhança para a ficção significa dar a impressão de que o narrado
pode pertencer à realidade; na crônica, significa autorizar o cronista a emitir
reflexões ou opiniões a respeito do narrado. Tanto a crônica quanto a ficção
têm ou deveriam ter uma mensagem comprometida, serem um reflexo do
mundo em que se vive.
4.2.1 O ornitorrinco da prosa: ficção e realidade
Lo que propongo, para acercarme a la obra de Juan Villoro, es una crítica abierta, alentado, precisamente, por lo que de abierto hay en su escritura y la libertad de su proyecto, que cruza todos los géneros y que encuentra una expresión inconfundible
83.
José Antonio Masoliver Ródenas
A crônica recorre a procedimentos jornalísticos como uma necessidade
de mostrar a realidade a partir da subjetividade individual. Ao mesmo tempo,
83
MASOLIVER RÓDENAS, Juan Antonio. Juan Villoro: itinerarios de la invención. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona: Editorial Candaya, 2011, p.31.
221
permite o uso de estratégias provenientes de diversos gêneros, constituindo o
que Tapia chama de “una suerte de género satelital, que se mueve en órbita
propia sin alejarse demasiado del campo magnético que la justifica y retiene:
los hechos de la realidad contemporánea” (TAPIA, 2016, p. 2). Isso leva Juan
Villoro, parafraseando Alfonso Reyes, que chama o ensaio de centauro dos
gêneros, a considerar a crônica o ornitorrinco da prosa, e assim o faz pela
capacidade plena que ela tem para se alimentar do romance, da reportagem,
da entrevista, do teatro, do ensaio, entre outros, como se observa:
Si Alfonso Reyes juzgó que el ensayo era el centauro de los géneros, la crónica reclama un símbolo más complejo: el ornitorrinco de la prosa. De la novela extrae la condición subjetiva ̶ el mecanismo de las emociones ̶ , la capacidad de narrar desde el mundo de los personajes y crear una ilusión de vida para situar al lector en el centro de los hechos; del reportaje, los datos inmodificables ̶ la “lección de cosas”, como anunciaban los manuales naturalistas del siglo XVIII ̶ ; del cuento, el sentido dramático en espacio corto y la sugerencia de que la realidad ocurre para contar un relato deliberado, con un final que lo justifica; de la entrevista, los diálogos; y del teatro moderno, la forma de montarlos; del teatro grecolatino, la polifonía de testigos, los parlamentos entendidos como debate: la "voz de proscenio", como la llama Wolfe, versión narrativa de la opinión pública cuyo antecedente fue el coro griego; del ensayo, la posibilidad de argumentar y conectar saberes dispersos; de la autobiografía, el tono memorioso y la reelaboración en primera persona (VILLORO, 2005a, p. 14).
Assim como o ornitorrinco, esse mamífero ovíparo originário da
Austrália, ao mesmo tempo da terra e da água, capaz de incorporar
característica de outros animais, pois é do tamanho de um coelho e coberto de
pelos, mas tem bico de pato, cauda de castor, patas espalmadas e se alimenta
de larvas e insetos; põe ovos, mas não é ave; passa a maior parte do tempo
debaixo d’ água, mas não é anfíbio e amamenta, embora não tenha mamilos.
Ele parece ser muitos animais possíveis, mas é genuinamente diferente. O
cronista se apropria dessa metáfora para se aproximar ao gênero de natureza
heterodoxa que tem características de diversos outros, e essa mistura está
convertida em uma unidade singular e autônoma (ROTKER, 2005). A crônica
se assemelha ao ornitorrinco, pois se beneficia de muitos gêneros literários e
não literários, mas na condição de não ser nenhum deles. É, na verdade, um
gênero próprio, que impõe coerência ao acolher os diferentes códigos, com os
quais não somente se contamina, mas também incorpora materiais
heterogêneos: letras de músicas, citações de outros autores, fragmentos de
222
documentos oficiais, discursos, material fotográfico. Introduz, inclusive,
discursos de outras disciplinas, como a etnografia, a antropologia, a filosofia e
a sociologia.
Villoro recorre à metáfora do animal monstruoso, uma vez que, quando
de sua descoberta no século XVIII, cientistas da época acreditaram se tratar de
uma montagem de algum taxidermista, ou seja, não era real. Para ele, essa
narrativa cifrada na mistura de múltiplas formas, assim como o ornitorrinco,
questiona a própria realidade.
Aos gêneros mencionados por Villoro, seria possível incluir outros
aparentados, como a literatura de viagens, as memórias, o ensaio histórico e
etnográfico e até mesmo o poema. No entanto, o objetivo aqui não é
acrescentar mais um nome na lista dos prováveis gêneros com o qual a crônica
pode identificar-se, mas demonstrar que, nas últimas décadas, se tornou
evidente uma série textual. Deste modo, ela questiona essas fronteiras
supostamente sólidas, pois a crônica se apropria de recursos da literatura e do
jornalismo, reelaborando-os em um novo discurso. No entanto, isso não
significa dizer, de maneira simplista, que não há mais gêneros, pois é “A través
del género [que] un texto es y tiene sentido” (PRINCE apud EGAN, 2004, p.
146), apenas mostrar que as crônicas de Villoro tencionam essa divisão
categórica entre fato e ficção. A ficcionalidade não é um marcador suficiente de
literatura, e a não ficcionalidade também não é o suficiente para declarar que
uma obra não é literária, pois “Talvez seja necessária uma abordagem
totalmente diferente. É provável que a literatura seja definível, não pelo fato de
ser ficcional ou “imaginativa”, mas porque emprega a linguagem de forma
peculiar” (EAGLETON, 2006, p.13), ou seja, tem em conta que as palavras
podem alterar a realidade. Egan menciona em sua obra Carlos Monsiváis:
cultura y crónica en el México contemporáneo (2004) essa tendência e
comenta: “Lo que sorprende es la tenacidad con que la Academia se ha
aferrado a una línea de demarcación literaria que injustificadamente proscribió
los discursos de no ficción del terreno privilegiado de la “alta cultura” (EGAN,
2004, p. 148).
Quando Villoro seleciona esses sete gêneros, nitidamente está
questionando onde está a realidade. É possível afirmar que não há
223
“contaminação” entre gêneros ficcionais e não ficcionais em um texto? É esse
questionamento que está em discussão quando recorre ao ornitorrinco, pois,
nesse terceiro milênio, a representação se confunde com o real, e a crônica é
um elemento importante para discutir outros gêneros. A caracterização de um
texto em um único gênero pode ser problemática porque sempre existe gênero
nos gêneros, e participar não significa pertencer.
Os textos de Juan Villoro tencionam essas fronteiras e um exemplo
pertinente para entender a escrita desse autor é “El rey duerme: crónica hacia
Hamlet”, publicado pela primeira vez no livro de ensaios De eso se trata
(2008a) e depois em 2013 na parte destinada à coletânea de crônicas em
Espejo retrovisor (2013a). É crônica ou ensaio? Nesse texto, podem-se
perceber todas as sete partes do ornitorrinco mencionadas pelo escritor, além
de características de outros “seres” que contribuem para formar sua escrita
cronística.
“El Rey duerme” inicia com pistas autobiográficas e narração em
primeira pessoa, além de um sutil questionamento a respeito dos romances
históricos ou da história no romance: “A fines de 1993 concluí en la UNAM un
curso sobre «la idea de la Historia en la novela mexicana», dedicado a explorar
las tensiones que la narrativa establece con los hechos” (VILLORO, 2008a,
p.13). Além dessa, o tom memorialista e a narração em primeira pessoa
aparecem em muitas outras crônicas do autor, às vezes em chave irônica, pois
“Sólo en el patio hablábamos español. Patear una pelota y gritar en mi idioma
eran actos idénticos. [...] El fútbol se presentó así como mi primer afán de
pertenencia” (VILLORO, 2006b, p. 19). Em outras, a carga autobiográfica é o
tema principal do texto, como em “El libro negro”: “Durante muchos años mi
familia pudo celebrar su sólida condición nacionalista: mi padre tenía prohibida
la entrada a Estados Unidos” (VILLORO, 2005a, p. 23). Nessa última, observa-
se que, a partir de referências pessoais, como o sobrepeso, o sonambulismo, o
divórcio dos pais e sua primeira viagem aos Estados Unidos, o cronista
entrelaça com a história nacional, mencionando os seis cadetes que morreram
defendendo o México na invasão norte-americana de 1847, os Jogos
Olímpicos, a participação de seu pai e da imprensa no movimento estudantil de
1968 e a prisão de intelectuais.
224
O livro Palmeras de la brisa rápida: un viaje a Yucatán (1989) é a obra
com mais dados autobiográficos da vida pessoal de Villoro, no qual a viagem a
terra natal de sua família, é um encontro com a infância de sua mãe e com o
mundo de sua avó: Estela Milán, a heroína da obra “para nosotros Yucatán era
la peculiarísima forma de hablar de la abuela” (VILLORO, 2009a, p. 13) e, mais
adiante, ao comentar sobre sua morte, diz “No puedo pensar en mi abuela sin
sentir que mi infancia estaba escrita en sus ojos” (VILLORO, 2009a, p. 25).
Como ocorre nas crônicas do autor frequentemente, o recorrido por Yucatán é
o caminho para o narrador levantar alguns questionamentos históricos que
podem ser notado através de um diálogo arrastado e, por vezes, doloroso com
um homem bem idoso, trajando vestimenta precária. Ao mostrar uma velha
fábrica desativada, à qual se refere ao passado como presente, ele é
conduzido a algumas reflexões em chave irônica: “¿en qué momento se jodió
México? ¿Quién se levantó con el primer pie izquierdo?, ¿quién hizo añicos el
primer espejo? De los virreyes a los priístas, un país de sangre y polvo”
(VILLORO, 2009a, p. 113). Nesse contexto, nota-se a subjetividade da crônica
através do eu que recorda a história pessoal e a vincula à nacional, reforçando
a ideia de que esse tipo de texto deve ser colocado na categoria de crônica, e
não na de autobiografia.
O cronista vai da reportagem aos dados. A reportagem é a ampliação da
notícia, ou seja, os dados que não podem ser modificados, como comenta
Carrión (2012). Em “El Rey duerme”, Villoro, a partir de acontecimentos da
época, como a participação do México no Tratado de Livre Comércio, a
rebelião zapatista e o assassinato do candidato priísta à presidência, tece
questionamentos a respeito do momento histórico por que passa o país:
“¿Terminaba la época de los «espaldas mojadas» que trabajaban ilegalmente
en los campos de algodón para pasar a los «cérebros mojados» que disertarían
en las universidades?” (VILLORO, 2008a, p.13). No entanto, o que percebe,
como comenta o autor, trata-se de “otro espejismo de la relación entre México y
Estados Unidos” (VILLORO, 2008a, p.13). A realidade é diferente do
anunciado.
A reportagem é o gênero jornalístico que exige investigação e, através
da narração, reconstrói um fato (sobre o movimento zapatista), a vida de um
225
lugar (“Cosas que escuché en La Habana”), a vida de um personagem
(“Rushdie en Tequila”, “Vida, muerte y resurrección de Diego Armando
Maradona”). É o gênero que procura responder interrogantes sem deixar cabos
soltos, além de usar uma linguagem criativa que engloba outras formas
jornalísticas e literárias. Em todas as crônicas que compõem a obra de Villoro,
observa-se que a notícia é o ponto de partida, porém se diferencia da
reportagem pela clara voz do cronista, que comenta, interpreta e opina sobre o
informado, e na reportagem não há espaço para comentários.
A referencialidade das crônicas de Villoro, que cumprem o que afirma
Linda Egan “El propio referente ha de ser un fenómeno que pertenezca al
dominio público fuera del texto” (EGAN, 2004, p. 168), aparecem repousadas
sobre o texto às vezes com datas explícitas: “En enero de 1994, Bloom escribía
Shakespeare. La invención de lo humano” (VILLORO, 2008a, p. 16) ou podem
ser rastreadas a partir de um tema disperso em meio ao texto
En ese invierno plagado de tormentas cometí el error de intentar una actividad que debería estar prohibida para culturas sin un dios de la nieve: aproveché las vacaciones de medio semestre para esquiar y fracturarme el tobillo. Volví al curso de Bloom en muletas. Mientras tanto, mi país se sumió en una tragedia shakespeareana. Luis Donaldo Colosio, candidato do PRI a la presidencia, fue asesinado. El sistema político instaurado en 1929 se tambaleaba en un drama de intrigas, venganzas, lealtades inciertas (VILLORO, 2008a, pp. 17-18).
Não obstante, é preciso evidenciar que o reconhecimento de um
referente na crônica é complicado, pois pode estar vinculado a um grupo
pequeno ou a um determinado espaço, por isso a inclusão de detalhes reforça
o referencial.
Da entrevista, “El Rey duerme” toma os diálogos que aparecem, não
como uma entrevista formal, mas em chave irônica na qual o autor de Dios es
redondo vai introduzindo frases emitidas por Bloom, que indiretamente atacam
o estruturalismo: “_ Si quieren un Shakespeare francés, éste no es el curso.
Por otra parte, si ya estudiaron conmigo y no les puse buena nota, les
recomiendo que se vayan. ¿Para qué repetir el encuentro con el monstruo?”
(BLOOM apud VILLORO, 2008a, p. 15) ou lança perguntas retóricas aos seus
alunos “–¿Qué sintieron después de su primer fracaso amoroso? ¿Sabían ya
226
que estaban condenados a volverse a enamorar?” (BLOOM apud VILLORO,
2008a, p. 17). Esses questionamentos estão entrecruzados com comentários
críticos: “Estas preguntas, dignas de un psicólogo que habla en la radio,
convertían al clásico en árbitro de los problemas de los jóvenes sentados a la
mesa” (VILLORO, 2008a, p. 15), pois não esperaba respostas de seus
interlocutores, como demonstra Bloom em sua declaração de intenções:
“Bloom no pretendía monopolizar el magisterio sino discutir en clave socrática.
No se trataba de una cátedra sino de un seminario. Sin embargo,
compartíamos un acuerdo tácito: lo interesante era oírlo a él (VILLORO, 2008a,
p. 15). São diálogos que estão mais próximos do teatro que da entrevista.
Em Safari accidental, na parte denominada “Alto volumen”, aparecem
cinco crônicas de entrevistas, pois não consiste em diálogos formais entre duas
pessoas, mas perguntas, respostas e reflexões, ou seja, misturas que dão
ritmo ao texto. Como o nome já indica, os textos estão dedicados a figuras do
rock ou que tenham a ver com esse gênero musical, como é o caso de “La
destrucción tranquila: Yoko en México”. Na entrevista com Bono, por exemplo,
são intercaladas conversas coletivas com comentários. Essa hibridez faz com
que os textos tenham o que Ana María Amar Sánchez chama de
interdependência formal (AMAR SÁNCHEZ, 1990, p.449), pois a relação da
crônica com outros discursos promove uma conexão de dependência recíproca
que potencializa a escrita, como se observa no epílogo de Safari quando Villoro
comenta a respeito dessa composição em sua obra cronística:
Algunos textos podrían estar en un libro de entrevistas (los encuentros con Mick Jagger y Peter Gabriel) y algún otro en un libro de ensayos (la evocación memoriosa del romance entre Zelda y Francis Scott Fitzgerald). Me hubiera parecido rigorista expulsarlos de un libro que se funda, precisamente, en un género híbrido, que tanto depende de la impronta. Los patos que nacen entre los ornitorrincos se creen ornitorrincos. Así pasa con algunos textos de esta selva (VILLORO, 2005a, p. 257).
Pode-se dizer que também há patos em Los once de la tribu: “Las
hormigas son más terribles”, “Conversación con Ángel Fernández”, “El viajero
en su casa”, “Conversación con Günter Grass” e “Jane Fonda en media hora” e
em Dios es redondo: “Los responsables de azar. Conversaciones con Jorge
227
Valdano”, essas crônicas estão tão próximas da entrevista quanto do ensaio,
pois, ao mesmo tempo que interroga seus interlocutores, tece comentários,
argumenta e reelabora a discussão. A respeito dos diálogos que compõem o
texto, o cronista apresenta uma maneira muito peculiar de realizá-las, como
escreve em Los once de la tribu:
Truman Capote recomendaba trabajar sin grabadora para mantener despiertos los reflejos literarios. Seguí el consejo en “La vida en cuadritos”, entrevista que transcribí sin mis preguntas. El recurso resulta esencial ante personas cuyo lenguaje se ignora –los giros, las muletillas, las vacilaciones se convierten en normas de carácter (VILLORO, 1998, p.10).
Na crônica “La vida en cuadritos o los dias inacabables de la familia
Burrón”, dedicada à entrevista com o caricaturista Gabriel Vargas, é
apresentada uma narração com voz única, quase um monólogo, no qual o
entrevistado responde sem perguntas. A voz narrativa do cronista aparece em
cursiva no início da crônica em uma apresentação da figura de Vargas, de sua
principal obra e a respeito da importância desta: “La infinita saga de los Burrón
es un espejo a bordo de un “huacal con ruedas”, la crónica informal de la
ciudad de México, el diccionario ambulante de su idioma” (VILLORO, 1998, p.
194). Ao final, ele comenta:
— ¿Nunca relee sus historietas? — ¡Ni lo mande Dios!— Gabriel Vargas se persigna. No le interesa lo que ya hizo, o en todo caso, le interesa más el cuadro que dibujó a los 13 años, escondido bajo la cama, con los lápices de la lavandería de chinos (VILLORO, 1998, p. 205).
A crônica dedicada a Martin Amis “Cómo salir de una botella y otras
ansiedades” consiste em um diálogo itinerante que inicia no Parque del Retiro
de Madrid com uma conversa formal, pública e se percebe que há um
deslocamento pela cidade até o escritório do escritor. O texto termina em um
jantar com vários interlocutores que se intercalam entre as palavras de Amis e
os comentários do cronista. Ao incluir outras vozes na entrevista, formato que
realiza em Amis, mas também com Yoko, Peter Gabriel e Mick Jagger, Villoro
tira o protagonismo do entrevistado, pois outros personagens contribuem para
entender a celebridade e dar ritmo à narração.
228
“Jane Fonda en media hora” apresenta uma crônica composta de uma
entrevista formal, porém entre comentários e perguntas, nos quais o cronista
intercala a hora, como na série televisiva americana 24h, de Joel Surnow e
Robert Cochran. É um formato que, ao mesmo tempo em que transcorre o
diálogo, apresenta um relógio digital marcando o horário das perguntas em um
tempo não linear, pois o cronista demonstra que as perguntas foram realizadas
em uma determinada ordem e a crônica organizada em outra. Villoro apresenta
a limitação do tempo disponibilizado pelo entrevistado em uma crítica
pertinente e irônica.
Villoro também tem incursionado no gênero teatro com duas obras:
Muerte parcial e El filósofo declara, além do roteiro para o filme Vivir mata. As
características básicas desse gênero são incorporadas ao texto, como a
organização dos diálogos e na maneira como os atores interpretam histórias.
Pode-se aproximar esse gênero na crônica “El Rey duerme” pela maneira
como Bloom conduz o seminário, que, por vezes, induz à teatralidade. Ele não
lê os textos de Shakespeare, mas os recita de memória: “Nunca vimos al
maestro leer un fragmento de las tragedias. [...] Bloom cerraba los ojos, agitaba
la cabeza como si las palabras convocadas fueran un dolor y recitaba largas
tiradas con voz tonante” (VILLORO, 2008a, p. 16).
As técnicas teatrais também são utilizadas para imergir o leitor na
narração, construindo o texto a partir de uma trama com características que
contribuem para a sensação que às vezes estão tão próximas da dramaturgia
que beiram a comicidade, como se pode observar nas entrevistas: “Peter
Gabriel frota la punta de su barba hasta dejarla en forma de signo de
interrogación: “Sé cuál es la primera pregunta”, sonríe: “Porqué me tardé tanto
en hacer otro disco” (VILLORO, 2005a, p. 95) e também com o líder dos Rolling
Stones
Aos 58 años, Jagger sigue sin estar quieto en una silla. Cruza y descruza las piernas, gesticula como si tuviera que ser elocuente a treinta metros de distancia, cargado de una energía sin propósito definido. Sus facciones se han arrugado en forma decorativa, como el rictus de pistolero de Clint Eastwood o los inmersos rostros de piedra de Mount Rushmore (VILLORO, 2005a, p. 74).
229
A voz de proscênio que menciona Villoro aparece através da polifonia de
vozes presente em “Nada que declarar” e nas crônicas dedicadas ao
movimento zapatista como “Un mundo (muy) raro” e “Los convidados de
agosto”, nas quais o cronista intercala a voz narrativa à de testemunhos
anônimos que interferem na narração, transformando a opinião pública em um
representante contemporâneo do coro grego.
Como os escritores da Onda, os contos de Villoro têm características de
crônica, o que se observa em La noche navegable (1980), Albercas (1985), La
alcoba dormida (1992), La casa pierde (1999) e Los culpables (2007). Todos os
sete contos que compõem essa última obra, por exemplo, estão em primeira
pessoa e partem de situações do cotidiano.
Do conto a crônica extrai o espaço curto, os personagens e a estrutura
de relato fechado que o justifica. Essa experiência ocorre com o pequeno
caderno de rascunho presenteado por uma aluna que percorre todo “El Rey
duerme”, no qual Villoro faz as anotações dos seminários de Harold Bloom,
mas depois o perde, como se observa nesses trechos: “Conservé el cuaderno
como un talismán de las relaciones no siempre explicables entre maestro y
alumno. [...] Anoté [...] observaciones que me parecieron esenciales”
(VILLORO, 2008a, p.18). Mais adiante, ele complementa: “Sin embargo, al
regresar a México me olvidé de las anotaciones y durante trece años no tuve
noticia de ellas” (VILLORO, 2008a, p.18). O caderno contribui para dar unidade
ao texto, ou seja, a ideia de que a história está completa, diferentemente da
crônica que, geralmente, conclui de maneira mais aberta.
Nota-se também que nos contos, assim como nas crônicas, Villoro
presta pequenas homenagens a seus autores preferidos: Onetti, Borges, Bioy
Casares e Cortázar. Fato que se percebe na última parte da crônica intitulada
“El otro cuaderno”. Nesta, aparece um duplo do caderno recebido de uma
aluna no início do texto. No primeiro faz anotações do seminário de Bloom; no
segundo, as outras discussões consideradas mais pertinentes por ele, como,
por exemplo, as reflexões sobre o conto de Borges “La memoria de
Shakespeare”, que fica evidente no trecho: “Como el rey Hamlet, el cuaderno
durmió una larga siesta. Volvió a mis manos justo cuando encontré el cuaderno
de apuntes. Uno había servido a las leyes del oído. El segundo, como el
230
célebre fantasma, reclamaba otras palabras” (VILLORO, 2008a, p. 38). As
anotações do outro caderno retêm as discussões que envolvem a outra
literatura. Isso não significa uma exclusão da denominada “ literatura canônica”,
pois convoca Borges e Segovia, talvez seria mais adequado o entendimento de
que é possível discutir literatura a partir do popular, do que a primeira vista não
é literário, dos pequenos objetos, enfim, da crônica. Villoro, quando
questionado se o popular de alguma maneira desmerece o autor frente à
crítica, responde:
Yo no creo que un autor por tener éxito popular pierda la calidad. Cervantes era un autor enormemente disfrutado en su época. Cuando publica la primera parte de Quijote, aparecen Quijotes piratas, apócrifos y entonces para que no haya Quijotes piratas, él escribe la segunda parte y mata su personaje, para que nadie puede decir “otra aventura de Don Quijote de la Mancha”. […] Otro autor exitosísimo en su época fue Shakespeare […]. Él llenaba los teatros, él mismo actuaba en las obras y probablemente hoy día escribiría guiones de cines, series de televisión y usaría plataformas contemporáneas muy exitosamente. Entonces, yo creo que no necesariamente el éxito o el contacto popular demerita una obra pero hay las que hacen exclusivamente para tener éxito comercial y ahí sí yo ya me detengo […] cuando alguien intentar ser más sensacionalista que profundo (VILLORO, 2016d).
Em outras crônicas, também se percebe o deslocamento na direção dos
detalhes, dos pequenos objetos, de um dia em especial ou de uma moeda.
Esta última, inclusive, aparece em vários textos de Villoro, e Stefano Tedeschi
publica um artigo a respeito: “El testigo y las monedas en la obra narrativa de
Juan Villoro” (2006). Nesse texto, Tedeschi somente destaca as moedas nos
romances e contos, mas certamente poderia acrescentar as quatro obras que
compõem esta pesquisa.
Em 8.8 el miedo en el espejo, o elemento telúrico e literário aparece no
prólogo intitulado “Un modo de dormir”, no qual, a partir de uma anedota
pessoal e familiar, Villoro se aproxima do abalo sísmico: “Mi padre siempre ha
dormido en piyama […]. En adolescencia adquirí una costumbre que no pasó
por la reflexión […]: dormir sin piyama” (VILLORO, 2010a, p.13). Ele tece uma
reflexão sobre a vestimenta, o que, inicialmente, não tem importância: “Hay dos
clases de durmientes extremos: los que usan ropa específica y los que no usan
ninguna. En medio queda el resto, que durante anos supuse una abrumadora
231
mayoría” (VILLORO, 2010a, p.15). Com o abalo, adquire pertinência, pois,
após o susto, o narrador se dá conta da vestimenta que todos estão usando no
lobby do hotel. No epílogo “Un regalo”, o cronista recupera essa simples peça
de dormir que percorre o texto e termina também com uma anedota, pois
Villoro recebe de presente de sua amiga Laura Lecuona, que também estava
no hotel durante o terremoto, diversos livros de uma editora e um pijama.
A partir desse pequeno objeto, o cronista incorpora em sua crônica,
juntamente com a memória pessoal e coletiva de outros terremotos ocorridos,
reais ou imaginários84, o comentário filosófico, político, literário, a narração
romanceada, o ponto de vista do autor e do narrador como testemunha para
reconstruir relatos de vidas a ponto de extinguir-se. E assim ele comenta:
Lo que el miedo destruye no se recupera en forma integral. Ésta es una crónica en fragmentos. Quise ser fiel a la manera en que percibimos el drama: la población flotante de un hotel reunida en un naufragio. No es un reportaje de un país que se quedó en su zona sur ni de una capital que resistió en forma admirable. Es la reconstrucción en partes de un microcosmos […] (VILLORO, 2010a, p. 23).
Os fragmentos da memória, a sensação de caos, a multiplicidade de
gêneros: ensaio, na parte intitulada “La abolición del azar”, no qual aborda a
vida e a obra do escritor alemão Heinrich von Kleist, cuja visão do caos e da
natureza do homem aparecem em seu romance El terremoto de Chile (1808);
romance: a maneira como apresenta os testemunhos, como, por exemplo, os
diálogos e a caracterização das assistentes do congresso que parecem
personagens de uma história ficcional; e crônica: através do testemunho de
outros escritores que participaram do evento, como as mensagens postadas no
Twitter por Francisco Hinojosa, a crônica de Gloria Hernández publicada em El
Periódico de Guatemala e os relatos do escritor argentino Marcelo Figueras,
que se serviu do blog para narrar sua experiência, contribuem para tecer e dar
unidade à composição dessa obra, que poderia passar por romance ou ensaio,
84
O terremoto no Chile remete o autor não somente aos terremotos acontecidos no México, mas também a um abalo ficcional, como comenta Villoro: “La literatura suele prefigurar enfermedades que no han sido diagnosticadas y cataclismos que no han sucedido, o no lo han hecho de ese modo. En 1807, Heinrich von Kleist escribió un relato lleno de significados: El terremoto en Chile” (VILLORO, 2010a, p. 24), referente a um abalo ocorrido no país em 1647, na cidade imaginária de St. Jago.
232
mas que Villoro reitera tratar-se de uma crônica, numa tentativa de acomodar
sua escrita em um gênero.
Do romance, a crônica se apropria da condição subjetiva, a capacidade
de narrar e de promover a ilusão de vida para situar o leitor no centro da
narração. Em suas crônicas, o próprio autor se “ficcionaliza” ao se introduzir
como cronista no texto, juntamente com os outros personagens. Desta forma,
sem deixar de ser real, torna-se ficcional. Essa mistura harmônica, porém, nem
sempre em partes iguais, faz com que o dado e a ficção aproximem-se, como
pode ser percebido em suas crônicas já mencionadas. O estilo e a visão de
mundo dessas crônicas são transportados a seus romances e contos, como
comenta Tedeschi
la concisión y la precisión en el dibujo de los personajes, el gusto por la frase aforística, la capacidad de organizar la narración novelesca en unidades más puntuales, la técnica de la digresión, son todas características que Villoro transporta de la crónica a la novela, para construir máquinas narrativas intrigantes y complejas (TEDESCHI, 2006, p.6).
Além dessas características, podem ser citados os romances de Villoro
publicados até o momento: El disparo de argón (1991), Materia dispuesta
(1997) El testigo (2004) e Arrecife (2012b). Eles compartilham com as crônicas
os espaços e os lugares, principalmente a Cidade do México, onde se
desenvolve a maior parte de sua obra ficcional e não ficcional. Juan Antonio
Masoliver Ródenas, em seu artigo “Juan Villoro: itinerarios de la invención”,
afirma que “La escritura de Villoro va mucho más allá de la crónica de un
pasado muerto, un presente caótico y un futuro agonizante e inmóvil”
(MASOLIVER RÓDENAS, 2011, p. 48). Nesses romances, o autor utiliza uma
das principais características da crônica: o relato de situações do cotidiano em
um intervalo de tempo, além de reforçar outros como a aproximação aos
detalhes, a justaposição de elementos heterogêneos e os objetos
aparentemente insignificantes que adquirem sentidos, já que contribuem para
formar a realidade.
Outro recurso da prosa ficcional compartilhada com a crônica é a
invenção de personagens, que o cronista utiliza em todas as crônicas de
233
Tiempo transcurrido, pois todos os protagonistas são personagens ficcionais e
em algumas de Safari, Dios es redondo e Los once de la tribu. Eles estão
misturados aos personagens reais e em geral apresentam características
peculiares, pois são figuras que desmontam os estereótipos nacionais, e
geralmente são de classe média.
No prólogo de De eso se trata, Villoro menciona que escrever ficção é
uma forma de leitura solitária, como em “Ensayar: leer en compañía”
(VILLORO, 2008a, p. 10). Em “Escribir al sol”, que é o prólogo de Los once de
la tribu, o cronista destaca que escrever crônicas é uma maneira de sair ao sol,
de se aproximar da realidade. Dentre as muitas fronteiras que a crônica
villoriana transborda, sem dúvida, a principal delas é o ensaio, inclusive porque
“son los géneros híbridos que más habitualmente se leen como sinónimos”
(EGAN, 2004, p. 162). Isso se deve ao debate de ideias, à manifestação de
tomadas de posição nos debates culturais, ao discurso criativo, crítico,
persuasivo e confessional, que aproveita a dupla dimensão expositiva e
argumentativa do ensaio na crônica. Juntando as duas acepções propostas
pelo autor, poder-se-ia dizer que suas crônicas são uma forma de ler em
companhia ao ar livre, uma forma de refletir sobre literatura, questionando
outras possibilidades de sua prática estabelecida.
A aproximação entre a crônica e o ensaio em Villoro nota-se pela
subjetividade e o idêntico movimento do “eu” que, frequentemente, através da
evocação de uma vivência pessoal, em estreita relação com o tema proposto,
impulsiona o processo de escrita, mas, como comenta Massaud Moisés:
“enquanto o ensaio guarda sempre uma intenção, ainda que sob o disfarce da
informalidade, a crônica, ou repele a intencionalidade ou deixa de ser crônica”
(MOISÉS, 1982, p. 251).
Theodor W. Adorno em O ensaio como forma (2003), destaca algumas
características do ensaio que podem ser observadas na crônica, como a
liberdade de espírito; a não admissão de competência, ou seja, pode tratar de
qualquer assunto; a comicidade; começar e terminar onde quiser; permitir a
superinterpretação; não proceder de um pensamento linear e possuir uma
relativa independência estética. Essas características podem ser encontradas
234
nas crônicas de Villoro, mas principalmente nas que compõem o corpus dessa
pesquisa.
Ao invés de tentar identificar “El Rey duerme” como crônica ou ensaio,
talvez seria adequado pensar que é uma crônica sobre o ensaio ou na frase de
Darío parafraseada por Rotker: “la crónica es el laboratório del ensayo”
(ROTKER, 2005, p.108). Essa crônica não é um ensaio sobre a obra de
Shakespeare, mas uma reflexão do momento de escrita de um ensaio e o que
pode influenciar na construção deste. É certo que Villoro se aproxima da obra
do escritor inglês a partir de três referências: a leitura crítica de Harold Bloom, o
conto “La memoria de Shakespeare”, de Jorge Luis Borges e a tradução ao
espanhol de Hamlet, de Tomás Segovia. Observa-se, porém, que a questão
central do texto é como essas referências podem se conectar com a narração
no momento exato em que ele está procurando abordar em sua crônica, que
remete ao final de 1994, tudo o que está ocorrendo no México, quando o país
passa por sérios problemas políticos, como o assassinato do candidato à
presidência, Luis Donaldo Colosio, a entrada do país na TLCAN e a Rebelião
zapatista.
O texto trata de como esses acontecimentos se conectam com a viagem
do autor para dar aulas nos Estados Unidos e acaba por se torna aluno de
Harold Bloom (Villoro não se apresenta como escritor) no momento em que ele
estava preparando Shakespeare, la invención de lo humano; o lançamento da
tradução de Hamlet realizada por Segovia, que resulta no nome do livro, devido
a maneira como o poeta, que nasceu na Espanha e se naturalizou mexicano,
revoluciona a tradução da famosa frase “Ser o no ser” ou “He ahí el dilema” ou
“Ésa es la cuestión”. Segovia evita os clichês idiomáticos que
monumentalizaram a obra inglesa, aproxima-a de uma linguagem mais íntima e
diz: “De eso se trata”. Ou seja, ele mostra como tudo isso aproxima tramas tão
longínquas como as que aparecem na obra de Shakespeare com o momento
histórico por que passa seu país. Segundo Villoro, é possível entender México
e “las intrigas políticas en clave shakespeariana” (VILLORO apud RUIZ
MONDRAGÓN p. 2).
Nessa crônica, Villoro reúne termos e obras que em sua produção,
principalmente cronística, ele questiona. Harold Bloom é o autor de O cânone
235
ocidental. Esse livro relaciona as obras que pertencem a essa lista imaginária
do que é literatura, e que cada qual possui a sua. Nela, Shakespeare é
considerado “a figura central do Cânone Ocidental” (BLOOM, 2001, p. 11) e
Hamlet, Rei Lear e Macbeth, (BLOOM, 2001, p. 69), a expressão máxima do
que significa uma obra literária. Bloom, certamente não introduziu nenhuma
crônica em seu livro. Villoro produz textos com características que,
indiretamente, questionam essa tradição que Bloom defende. Como comenta
em chave irônica que o crítico transforma a obra de Shakespeare em “una
alegoría sobre el núcleo cultural de Occidente y a la manera de preservarlo”
(VILLORO, 2008a, p.33). Ou seja, ao monumentalizar a obra do autor inglês,
Bloom lhe atribui nada menos que “a invenção do humano”.
Ao convocar Borges e Segovia, o cronista está questionando essa
perspectiva eurocêntrica do crítico americano, pois, desde a ficção e da
tradução, deslocam o clássico inglês dessa posição centralizadora. No conto
de Borges, um homem ao ser habitado pela memória de Shakespeare,
descobre que não se trata da memória de um grande autor ou grande
dramaturgo, mas de um homem com as lembranças mais cotidianas, e reflete
Villoro sobre o protagonista do conto: “Escribir como Shakespeare es una
desmesura, ser Shakespeare es banal” (VILLORO, 2008a, p. 36). Na ficção
borgeana, a universalidade destacada por Bloom, adquire um tom menor, pois
Borges percibe una ética de la creación al entregarse con gratuidad a la escritura, al margen del siglo y de espaldas a la ignorada posteridad. Un hombre común deja que el idioma fluya. La normalidad del punto de partida exalta el resultado: los cristales surgen de la arena (VILLORO, 2008a, p. 37).
Villoro percebe no conto de Borges a desmonumentalização da figura
canônica, pois trata da memória de Shakespeare como a de um homem
comum “La perspectiva borgeana atenuaría, así, la potencia simbólica de la
obra de Shakespeare como emblema de lo humano forjado desde posiciones
eurocéntricas” (OLMOS, 2017, p.47). Ao resgatar em sua crônica todos esses
elementos, o cronista procurar ressaltar que a crônica é um gênero que
possibilita a discussão sobre o caráter literário e não literário de seus textos.
236
A crônica para Juan Villoro não é simplesmente uma mistura de
jornalismo e ficção. Incluiu todos os gêneros conto, romance, autobiografia,
ensaio, reportagem, entrevistas, teatro clássico e moderno, manuais, entre
outros; é uma partícula elementar de toda a sua escrita; funciona como uma
espécie de prototexto de todos os seus textos, é um tipo de prosa muito
peculiar. Quando Villoro compara a sua crônica ao ornitorrinco, ele destaca
uma prosa que absorve elementos do real ao mesmo tempo que da ficção,
como se sua escrita estivesse, assim como o animal em um continente isolado,
ou seja, que evoluiu de maneira diferente, com uma linguagem que mistura
características que o aproximam da oralidade, com o aforismo, com temas que
analisam a cultura divulgada nos meios massivos e publicadas em
diversificados meios que vão do jornal impresso ao twitter. A crônica villoriana,
como toda obra de arte, não se limita a um gênero específico, procurando
conjugar-se com todo tipo de disciplina e de conhecimento.
237
CONCLUSÂO
Aunque toda metrópoli se erige contra la naturaleza, pocas han tenido la furia destructora de México D. F. Una vez anulada el agua, el horizonte de destrucción fue el cielo. El paisaje urbano está determinado por estas pérdidas fundamentales. Hace algunos años, al visitar una exposición de dibujos infantiles, comprobé que ningún niño usaba el azul para el cielo; sus crayones escogían otro matiz para la realidad: el café celeste. Quien aterriza de noche en la ciudad de México siente que llega a una galaxia desordenada. Sin embargo, esa marea encendida, que ocupa el valle entero, sigue creciendo. Su lógica exige la expansión continua. ¿Hacia dónde puede proseguir? Todas las flechas apuntan hacia abajo. El subsuelo recorrido por el metro es nuestra última frontera. Más allá de los imperativos geológicos, esta dinámica tiene una fuerte carga simbólica. En la mitología prehispánica, la vida comienza y termina bajo la tierra. Borges resumió en dos versos su atribulado fervor por Buenos Aires: "No nos une el amor sino el espanto/ será por eso que la quiero tanto". Los contradictorios placeres de la ciudad de México son de este tipo. A diario juramos abandonarla y a diario nos entregamos a su abrazo; es la irrenunciable compañía que merecemos. Que otros vivan en las ciudadelas del orden y el tránsito feliz. Nosotros exigimos el carácter complicado y la belleza ambigua de la mujer barbuda
85.
Juan Villoro
A produção cronística de Juan Villoro tem sido uma voz constante na
literatura mexicana dos anos finais do século XX e primeiros do XXI em
diversificados meios. Ele é um artesão que desenha em letra impressa os
acontecimentos de que é testemunho, tendo sido, inclusive, em muitas
ocasiões, partícipe.
Os textos deste autor iluminam o gênero. Em suas crônicas, Villoro
retrata os acontecimentos através de variados elementos estéticos, não apenas
estrutural. Ele destaca, neste caso, a configuração de tempo-espaço e a
linguagem, mas também o aspecto ideológico e a função do discurso
estabelecido pela crônica como meio para exercer a crítica sobre a realidade
social, principalmente no México, através de um mecanismo de “não-ficção”.
Ao observar esse trecho de “La ciudad de México: mujer barbuda”, percebe-se
que a crônica não tira o leitor da dimensão da realidade dos fatos, pois o
85
Trecho de La ciudad de México: mujer barbuda. Publicada en La nación en 21.08.2005c.
Disponívelem: http://www.clubcultura.com/clubliteratura/clubescritores/villoro/mapas/mex-ven02.html Último acessoem: 12.12.2015.
238
introduz nesse plano de uma forma crítica, reflexiva, sem perder, entretanto o
valor referencial.
Essa crônica menciona uma série de problemas cotidianos da Cidade do
México, como a escassez de água, a poluição do ar e o subsolo como último
subterfúgio. O entrecurzamento com trechos da obra de Borges, com uma
linguagem elaborada composta de metáforas e ironia, demonstra que o
aumento do estético e do literário não diminui a relação com o referencial ou o
social, pois “A literatura en cuanto arte no se la puede ver como una categoría
separada del proceso social que la contiene: es un acto de solidaridad histórica
y participa de la multiplicidad de la práctica cultural” (ROTKER, 2005, pp. 228-
229).
Para Villoro, a crônica é um gênero literário porque sua qualidade de
escrita lhe é consubstancial, constituindo um elemento definitivo encontrado
desde suas origens. Por essa razão, privilegiou-se, nesse estudo, a
identificação, em sua prosa cronística, do que Hayden White chama de “o
conteúdo da forma”, ou seja, a maneira particular de representar o real através
de recursos ficcionais, porém sem destruir o status jornalístico. Através da
crônica, ele constantemente explica, raciocina e constrói textos de modo que,
na interpretação, prime a informação. Não se trata de notícia comentada, mas
da apresentação de uma narrativa em movimento, intercalando o fato, o
testemunho, uma linguagem elaborada e, talvez por isso, muitas de suas
crônicas sejam em primeira pessoa, com recursos estilísticos, obras literárias,
reflexões sociológicas, cultura popular massiva, interpretando o visto, o ouvido
e o sentido na cotidianidade, sempre para dar maior sentido ao texto.
Ao longo desta pesquisa foram levantados elementos que contribuíram
para confirmar a hipótese. Pode-se perceber que seu projeto de escrita leva em
consideração atributos que se revelam nesse gênero como: o autor, a
linguagem, o tema, o veículo, a tradição e o ângulo adequados, pois Villoro
pertence à geração que vai conectar-se com a esfera pública, que não é
necessariamente acadêmica, ou seja, a elite letrada, aquela que escreve para
poucos e se baseia na tradição europeia, mas que, a partir da década de 60,
começará a ter seu espaço invadido pela cultura de massa.
239
Na primeira parte deste estudo, procurou-se demonstrar o início de sua
trajetória literária, quando Villoro já estava atento às mudanças e queria
reproduzi-las em seus textos. O autor, nos idos dos anos de 1970, pretendia
responder a questionamentos relevantes e por isso retoma alguns, como as
consequências do massacre de Tlatelolco, a crítica pela busca obsessiva da
“identidade nacional comum”, a análise de elementos mais próximos da
culturas divulgada nos meios massivos de comunicação como: o rock, o
futebol, o boxe, as celebridades, além de dedicar-se a crítica ao consumo e a
violência urbana, principalmente do narcotráfico.
Nessa parte também, discorreu-se, sobre a formação de Villoro, que é
sociólogo, mas teve, como um de seus primeiros ofícios, jornalista de uma
emissora de rádio, ao mesmo tempo que publicava contos e crônicas. Esse
fato adquire relevância para demostrar que, desde o início, ele trabalha com a
tensão entre jornalismo e literatura. Seu primeiro livro de crônica, Tiempo
transcurrido: crónicas imaginarias, abre e fecha com duas tragédias: o
massacre de Tlatelolco e o terremoto de 1985. Nele, há um percurso de três
diferentes décadas, recolhendo fatos históricos, sociais e culturais com a
intenção de resignificar a realidade.
A importância do processo histórico se observa também nas outras
obras cronísticas do autor, seja através da cultura, como acontece em Los
once de la tribu e Dios es redondo, ou da influência do consumo e do
neoliberalismo, como ocorre em Safari accidental, pois, para Villoro, o cronista
é o historiador do presente que escreve para o futuro. Quando ele retoma
temas que envolvem a cultura divulgada nos meios massivos de comunicação,
não abandona o processo histórico em que esse fato está inserido, pois “A
cultura de massa é animada por esse duplo movimento do imaginário
arremedando o real e do real pegando as cores do imaginário” (MORIN, 2011,
p.27). Observa-se que em sua obra cronística o ficcional não diminuiu a
importância do dado histórico, já que ele trabalha a ficção e a não ficção,
entendendo que uma não se sobrepõe à outra, uma vez que a ficção não se
confunde com a realidade.
Durante as análises, percebeu-se que para melhor compreensão de sua
produção cronística era importante analisar as características da linguagem
240
empregada por este autor, no qual, se percebe que, por trás de uma prosa
aparentemente simples, encontra-se uma escrita composta de elementos
estéticos que ressaltam a linguagem é outra realidade e impõe suas leis ao
fato. Assim, aquilo a que chamamos realidade factual nunca estaria a salvo de
uma construção da linguagem. Ao utilizar, em suas crônicas, recursos como o
humor e a ironia, Villoro reforça que são uma forma de preservar o caráter de
resistência de seus textos. O aforismo, que é material inflamável em suas
mãos, contribuiu para uma composição, na qual, se percebe uma tentativa de
eliminação de divisões categóricas entre “alta” e “baixa” cultura. A utilização
desses recursos na sua produção cronística são para o autor uma forma
oblíqua de iluminar a realidade, pois “la realidad mejora a través de las
palabras” (VILLORO apud TORRES, 2016, p.1). Dando a impressão de que
não está tratando de “temas sérios”, ele analisa o processo político do país,
como se observa nesse trecho em que reflete sobre o período entre 1970 e
2000
Si alguien resucitara hoy en Alemania, Irak, China o Chile después de pasar treinta años en coma se sentiría como un extraterrestre. La historia y sus efectos especiales han convertido esas locaciones en algo muy distinto de lo que eran hace tiempo: planetas singulares. En cambio, si el paciente volviera en sí en México, se sentiría como un zombi al que le bastan dos tequilas para adaptarse y un tercero para desear volver al coma. […] Los treinta años que van de 1970 a 2000 representaron la restauración crónica de lo mismo, una transición en cámara lenta, un capitalismo que se reiteraba con cambiante aspecto. Un baile de disfraces e ideologías. El nacionalismo, la libre competencia, el estatismo y aun el liberalismo social tuvieron su oportunidad en esa mascarada. El resultado fue un país estable en la desigualdad, que se ahorró los efectos de una dictadura al elevado precio de carecer de una democracia auténtica (VILLORO, 2010b, p.25).
No segundo capítulo deste estudo, foram identificadas as influências
encontradas na produção cronística de Villoro e sua relação com a tradição
com o intuito de demostrar que sua proposta crítica não surge do vazio. Ao se
observar detidamente suas crônicas, ensaios, entrevistas e palestras, percebe-
se que ele é um estudioso da cultura e da literatura, pois revelaram-se, em sua
prosa cronística, características de modernistas como Amado Nervo, Ramón
López Velarde e Manuel Gutiérrez Nájera; assim como a influência da literatura
241
do boom, principalmente de Gabriel García Márquez; além dos norte-
americanos Tom Wolfe e Truman Capote. Percebe-se, então, que a tradição
cronística que interessa a esse autor está visivelmente preocupada com a
realidade. Ele retoma constantemente autores como Jorge Ibargüengoitia e
Carlos Monsiváis cujas obras estão intrinsecamente relacionadas com a
história, pois são autores que, através do humor, da ironia, da carnavalização e
da sátira, discutem, criticam e analisam a história do México.
A relação entre ficção e não ficção recebeu muitas denominações ao
longo dos anos. O que na América Latina denomina-se crônica, Tom Wolfe
chamou de Novo Jornalismo e Truman Capote de Non fiction novel. Logo se
começou a chamar tudo isso de Jornalismo Narrativo ou Jornalismo Literário.
No entanto, é importante relembrar que borda clara não existe: no jornalismo,
com reportagens e textos de interesse humano; na literatura, com contos e
ensaios. É possível, como foi demostrado, destacar estruturalmente algumas
características, porém não se pode esquecer que são gêneros intimamente
relacionados e permeáveis.
Em uma época de aceleradas mudanças, de construção de muros e de
intolerância, a crônica, esse gênero flexível, que na atualidade tem ganhado
destaque, demonstra que tem capacidade de adaptar-se a circunstâncias
diversas, como por exemplo, o avanço tecnológico. A crítica menciona que a
crônica está no auge, e tal ocorre devido aos frequentes encontros de
cronistas, oficinas, congressos e prêmios. Percebe-se, porém, que ainda há
poucos espaços para a publicação, pois os cronistas são “como los cascos
azules de la ONU, que tienen un gran prestigio simbólico, pero pocas
oportunidades de entrar en acción” (VILLORO, 2010c, p.3). Esse gênero
contribui para uma reflexão do que seja o “literário”, promovendo uma
discussão que envolve a linguagem, os gêneros, os estilos, a ideia de
“representatividade e tipicidade” nacional e, inclusive, o papel dos escritores,
dos leitores, do mercado e da crítica no México.
A tríade escritor, leitor e mercado, quando se trata de crônica no México,
adquire relevada importância. Ao contrário de escritores de ficção que, na
atualidade, em sua maioria, podem dedicar-se à função de escrever, o cronista
ainda ocupa variadas funções, pois são poucos os que podem se dedicar
242
exclusivamente a produzir crônicas. Entretanto, já não se pode pensar que um
jornalista, certamente, não é mais um romancista que não conseguiu produzir
uma grande obra, como mencionou reiteradamente Villoro em entrevistas.
Em um país cujo índice de pessoas que não sabem ler corresponde a
aproximadamente 10%, a crônica ocupa um espaço importante. Contra uma
tendência de preencher as páginas dos diários com imagens, o mercado da
crônica no México tem tentado se manter, utilizando principalmente o formato
de livro. Afinal, ela educa, informa, faz refletir e, para muitos leitores, é uma
forma de contato com a literatura naquele país.
Os temas das crônicas de Villoro revelam que ele é um observador e
crítico persistente das questões políticas e sociais do seu país, como aparece
na terceira parte dessa pesquisa. Além disso, são uma demonstração de que
tanto a “alta” cultura quanto a “baixa” estão fundidas sem fissuras. Em suas
crônicas, percebe-se que não se trata de um “utopismo estético” (BEVERLEY,
1993, p.19), mas que a cultura popular não é a cultura da elite disfarçada nem
quer ser. Desde o início, o autor percebeu que a cultura não podia se resumir
ao discurso oficial, às grandes instituições e aos discursos civilizatórios, mas
tinha que incorporar as dinâmicas dos grupos emergentes, a influência dos
meios de comunicação, a cultura popular, as questões mais cotidianas, que
aparecem em suas crônicas de maneira personificada.
A cidade é sem dúvida o tema de muitas das crônicas de Villoro.
Entretanto, observa-se que não é mais a cidade espaçosa de Salvador Novo,
mas a cidade vertiginosa, poluída, palco de tragédias coletivas, metrô lotado,
de eventos culturais, como os concertos de rock, esportivos, como o boxe e o
futebol, de movimentos sociais, como a rebelião zapatista, de sub-empregados
criados pela crise econômica, a violência urbana, enfim, uma vertigem
imparável. O cronista procura, através da análise de objetos, lugares e
comportamentos, revelar as contradições da globalização e demonstrar como a
cultura foi afetada pelas mudanças neoliberais.
Villoro publica em diversificados meios, que pode ser do jornal impresso
ao blog, passando por redes sociais, como o Twitter. Esses meios eletrônicos
têm sido constantes para experimentação, construção de sua escrita e,
243
principalmente, de uma conexão com o real. Seria o avanço da tecnologia um
perigo para a crônica? O futuro certamente é incerto, pois, se por um lado a
crônica tem-se beneficiado dessas novas tecnologias, por outro, há cada vez
mais dificuldade de publicação, pois são poucos os que querem financiar esse
tipo de texto.
Villoro se utiliza da metáfora do ornitorrinco para falar da crônica pela
diversidade de elementos que confluem em sua criação, mas, principalmente,
pela sua maneira própria de narrar a realidade. Posto sobre a mesa de
dissecação, onde foram separadas e analisadas minuciosamente as partes
desse membro da família Ornithorhynchidae, a espécie mostrou “ser un
verdadero rompe cabezas biológico en el que se pueden encontrar
características de la novela, el cuento, la entrevista, el teatro, el ensayo y otras
familias taxonômicas del orden escrito” (RICCARDI DORIA apud VILLORO,
2010c, p.1).
Quando Villoro recorrer a esse animal para se aproximar ao gênero,
expõe uma preocupação com o risco que implica divisões que afastam ou
excluem do campo literário ou do jornalístico textos que tratam dessa tensão. O
cronista procura demonstrar que há vasos comunicantes entre diferentes
gêneros e que aproximação não significa justaposição. Quando ele produz
crônicas com muitos elementos ficcionais, não significa que se está diante de
uma mentira, mas de um discurso inverificável, pois às vezes se coloca um
posicionamento incisivo em questões muito fluidas. Talvez seria interessante
pensar que a oposição mais significativa não está entre mentira e verdade,
mais muito provavelmente entre informação e narração; por isso, a relevância
da crônica contemporânea, pois através da inserção de recursos de outros
gêneros, é possível tecer uma reflexão.
Assim como para Andreas Huyssen e Raymond Williams, para Villoro,
as divisões categóricas expressam uma visão burguesa nas quais a distinção
entre alta cultura e cultura popular ou de massa ainda servem de dispositivo
legitimador do que significa a arte e a não arte, baseados no conceito de ficção
e não-ficção. A crônica, como mencionam Susana Rotker e Villoro, é “literatura
bajo presión, mas no por eso menos literatura” (ROTKER, 2005, p.115;
VILLORO, 2005a, p.13). A literatura nem sempre trabalha com elementos que
244
pertencem ao mundo dos fatos, mas, certamente, contribui para a construção
de sua posteridade.
245
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
TEXTOS DE JUAN VILLORO: VILLORO, Juan. (Prólogo) La voz en el desierto. In: LICHTENBERG, Georg Christoph. Aforismos. Selección, traducción, prólogo y notas de Juan Villoro. México: FCE, 1989. __________. La frontera de los ilegales. Publicado en los Anales de Literatura Hispanoamericana, número 24, UCM – Madrid, 1995. Disponível em: http://revistas.ucm.es/index.php/ALHI/article/view/ALHI9595110067A/23282 Último acesso em 10.05.2015. __________. Los once de la tribu: crónicas. México: Editora Aguilar, 1998. _________. Villoro habla de la literatura y la ciudad contemporánea. El País - Cultura. I. Vidal-Folch, 10/10/2000a. Disponível em: http://www.sololiteratura.com/vill/villpahabla.htm Último acesso em: 05.04.2012. __________. Conversación entre Jorge Volpi y Juan Villoro. Revista eletrónica
de actualidad cultural “El Cultural” 29.11.2000b. Disponível
em:http://www.elcultural.es/version_papel/LETRAS/3126/Jorge_Golpi_y_Juan_
Villoro. Último acesso em: 06.04.2015.
__________. Efectos personales. Barcelona: Editorial Anagrama, 2001. __________. El vértigo horizontal. La Ciudad de México como texto. Debats 78 Otoño 2002a Quadern. Disponível em: http://www.alfonselmagnanim.com/debats/78/quadern02.htm Último acesso em: 20.05.2012. _________.Días robados: el cielo artificial. Publicado en Letras Libres en agosto 2002b. Disponível em: http://letraslibres.com/sites/default/files/pdfs_articulos/pdf_art_7719_6658.pdf Último acesso em: 26/12/2014. _________. El diablo en espejo. Publicado en 2002c. Disponível em: http://www.mshs.univ-poitiers.fr/crla/contenidos/Archivos/introduc/intro_53.pdf Último acesso em: 01.02. 2017. _________. Questioning the Chronicle: José Joaquín Blanco, Vicente Leñero and Juan Villoro. In: CORONA, Ignacio. and JÖRGENSEN, Beth E.. The Contemporary Mexican Chronicle: theoretical perspectives on the liminal genre. State University of New York Press, 2002c. pp. 61-68. _________. El esplendor postal de Borola Burrón. Publicada en Letras Libres, 31 de agosto de 2004a. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico/el-esplendor-postal-borola-burron Último acesso em: 02.10.2015.
246
_________. La mirada de Zapata. Publicada en Letras libres, Número 62, 2004b. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico-espana/la-mirada-zapata Último acesso em 24.12.2016. _________. Safari accidental. México: Editorial Joaquín Mortiz, 2005a. _________. Espectros de la ciudad de México. Publicada en Café de las ciudades. Año4, número 36 – Octubre 2005b. Disponível em: http://www.cafedelasciudades.com.ar/cultura_36.htm Último acesso em: 24.12.2013. __________. La ciudad de México: mujer barbuda. Publicada en La nación en 21.08.2005c. Disponível em: http://www.clubcultura.com/clubliteratura/clubescritores/villoro/mapas/mex-ven02.html Último acesso em: 12.12.2015. ___________. La ciudad es el cielo del metro. México DF: Lecturas para paseantes. Rubén Gallo, ed. Madrid: Turner, 2005d. 137-145. ___________. Tiempo transcurrido: crónicas imaginarias. México: Fondo de Cultura Económica, 2006a. ___________. Dios es redondo. México: Editorial Planeta, 2006b. _________. El olvido: un itinerario urbano en México DF. Publicada en la revista Nueva Sociedad no. 212, noviembre-diciembre de 2007a. Disponível em: http://www.nuso.org/upload/articulos/3487_1.pdf Último acesso em: 26.12.2013. __________. Leyenda y verdad: Julio Scherer. Publicada en Nueva Época. Número 46, diciembre de 2007b. Disponível em: http://www.revistadelauniversidad.unam.mx/4607/villoro/46villoro04.html Último acesso: 08.11.2015. _________. De eso se trata. Barcelona: Editorial Anagrama, 2008a. __________. La alfombra roja del terror narco. Revista de Cultura en el Clarín, 29/11/2008b. Disponível em: http://edant.revistaenie.clarin.com/notas/2008/11/29/01811480.htm Último acesso em: 20.05.2010. ___________. y ALARCÓN, Daniel. La crónica, periodismo portátil de autor.
Publicada em: Filba 2008c. Disponível em:
https://tallerexpresion1.files.wordpress.com/2010/03/la-crc3b3nica-malba-
alarcc3b3n-villoro.pdf Último acesso em: 13.12.2015.
__________. Palmeras de la brisa rápida: un viaje a Yucatán. México: Almadía, 2009a.
247
__________. (Prólogo) El americano impaciente. In: ANDERSON, Jon Lee. El
dictador, los demonios y otras crónicas. Barcelona: Editorial Anagrama, 2009b.
_________. (Prólogo) El cronista en el jardín. In: IBARGÜENGOITIA, Jorge.
Revolución en el jardín. Madrid: Ediciones Reino de Redonda, 2009c.
__________. 8.8: El miedo en el espejo: una crónica del terremoto en Chile. México: Almadía, 2010a. __________. Carnaval y apocalipsis. Publicado en enero 2010b, Libro de fotografías de Paolo Gasparini. Disponível em: http://www.clubcultura.com/clubliteratura/clubescritores/villoro/teatro_mirada/CARNA AL_Y_APOCALIPSIS.pdf Último acesso em: 20.08.2012. __________. Disección de un ornitorrinco. (Relator Marcelo Riccardi Doria) Publicada na Sala de Prensa: web para profesionales de la comunicación iberoamericanos, Ano XI. Vol.6, agosto de 2010c. Disponível em: http://www.saladeprensa.org/art1040.htm Último acesso em: 10.12. 2014. _________. El arte de condenar. Publicada en la Revista de la UNAM, en octubre de 2010d. Disponível em: http://www.revistadelauniversidad.unam.mx/8010/villoro/80villoro.html Último acesso em: 23.10.2016. _________. Itinerarios del ornitorrinco. Hacia un periodismo cultural. Conferencia de Juan Villoro en el “Seminario nuevas rutas para el periodismo cultural”, Ciudad de México, septiembre 23 de 2011a. Disponível em: http://www.fnpi.org/es/fnpi/itinerarios-del-ornitorrinco-hacia-un-periodismo-cultural Último acesso: 18.04.2017. __________. El libro salvaje. México: Fondo de Cultura Económica, 2011b.
__________. ¿Hay vida en la tierra? México: Editorial Almadía, 2012a. __________. Arrecife. Barcelona: Editorial Anagrama, 2012b. __________. Instantáneas hacia un cronista. In: Antología Esencial, Carlos Monsiváis. Buenos Aires: Editorial Mar Dulce, 2012c. _________. (Prólogo) La guerra de los zetas: viaje por una frontera de la necropolítica, de Diego Enrique Osorno. Publicada en Cosecha roja, 31.08.2012d. Disponível em: http://cosecharoja.org/la-guerra-de-los-zetas-prologo-de-juan-villoro/ Último acesso em: 01.02.2017. __________. Juan Villoro Habla de su trabajo como cronista. Publicada en Red
Iberoamericana de Periodismo Cultural FNPI en 22 de octubre de 2012e.
Disponível em: http://reddeperiodismocultural.fnpi.org/video/juan-villoro-habla-
de-su-trabajo-com-cronista/ Último acesso: 07.07.2016.
__________. Espejo retrovisor. México: Editorial Planeta, 2013a.
248
__________. La taquería revolucionaria. Publicada en La Jornada Semanal, No. 979, 2013b. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2013/12/08/sem-juan.html Último acesso em: 28.12.2016. __________. Itinerários extraterritoriais. (Trad. Luis Carlos Cabral). Publicada na Revista Serrote em 2014a. Disponível em: http://www.revistaserrote.com.br/2014/08/itinerarios-extraterritoriais/ Último acesso em: 01.10.2016. __________. y SASTURAIN, Juan. Villoro y Sasturain dialogaron sobre cómo la cultura popular se metió en la literatura.2014b Disponível em: http://www.telam.com.ar/notas/201411/87226-villoro-sasturain-cultura-popular-literatura-guadalajara-fil.html Último acesso em: 12.02.2015.
__________. Balón dividido. México: Planeta, 2014c.
__________. Los renunciantes. Publicado en Reforma, en 06 de junio de 2014. Disponível em: http://www.reforma.com/editoriales/editorial.aspx?id=28358 Último acesso em: 14.12.2016.
__________. El reino de Oz. Publicada en 22 de noviembre de 2014b. Disponível em: http://www.sopitas.com/408387-juan-villoro-nos-recuerda-por-que-mexico-es-el-reino-de-oz/ Último acesso em: 22.12.2016.
__________. Resistencia en la tierra. Publicada en El País, en 19 de septiembre de 2015a. Disponível em: http://elpais.com/elpais/2015/09/14/opinion/1442239766_526677.html?id_externo_rsoc=TW_CM Último acesso em: 02.01.2017. __________. Sócrates jubilado. Publicado em El País, em 10 oct de 2015b. Disponível em: http://elpais.com/elpais/2015/10/09/opinion/1444401955_949330.html Último acesso em: 10.10.2016.
_________. Amado Nervo, “fundador del sentimentalismo”. Publicado em El Universal, em 26.05.2015c. Disponível: http://www.eluniversal.com.mx/articulo/cultura/letras/2015/05/26/amado-nervo-fundador-del-sentimentalismo-villoro Último acesso em: 10.10.2016.
_________. La estrella zapatista. Publicada en El País, en 03 de enero de 2016a. Disponível em: http://elpais.com/elpais/2015/12/24/opinion/1450949512_043782.html Último acesso em: 25.12.2016. _________. Conferencia en CompArte por la Humanidad. Ponencia en CIDECI San Cristóbal de Las Casas, Chiapas, México, en 25 de julio de 2016b. Disponível em: http://radiozapatista.org/Audios/rzchiapas/juanvillorodos.mp3 Último acesso em: 10.12.2016.
249
_________. El nombre de la cosa. Publicado en Mural: Opinión, 22 de enero de 2016c. Disponível em: http://www.mural.com/aplicacioneslibre/editoriales/editorial.aspx?id=80425&md5=ea30e6601efc10a378c25ed8a3c5f3bc&ta=0dfdbac11765226904c16cb9ad1b2efe&lcmd5=dd520d23707c4a7f8e0222629e4b63af Último acesso em 10.01.2017. ENTREVISTAS COM JUAN VILLORO: ALMOMENTO.MX. En México, grandes periodistas y malos periódicos. Publicada en Almomento.MX, en 30 de octubre de 2014. Disponível em: http://almomento.mx/en-mexico-grandes-periodistas-y-malos-periodicos-entrevista-con-juan-villoro/ Último acesso em: 01.03.2016. AZ Revista. Villoro: hay una crisis de la ficción. Publicada en AZ Revista de
Educación y Cultura, en 2013. Disponível em:
http://www.educacionyculturaaz.com/cultura/villoro-hay-una-crisis-de-la-
ficcion#respond Último acesso em: 10.08.16.
BAUTISTA, Virginia. Viejo, cuando cumplí 30: Juan Villoro. Publicada en Excelsior en 07.03.2016. Disponível em: http://www.excelsior.com.mx/expresiones/2016/03/07/1079264 Último acesso em: 15.12.2016. BENAVIDES, Jeovanny. ¿Hay vida en la tierra? Publicada en 2014. Disponível em: https://archivond.wordpress.com/2014/10/25/villoro/ Último acesso: 10.09.2016. CARRANZA, José Israel. El trabajo de testigo. Publicado en Magis Iteso –
Universidad Jesuíta de Guadalajara, em junio de 2006. Disponível em:
http://www.magis.iteso.mx/anteriores/012/012_colloquium_villoro.htm Último
acesso em: 07.12.2014.
COLOMBO, Sylvia. Para além da tragédia. Publicada no Folha de São Paulo, em 21 de agosto de 2011. Disponível em: ˂http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrissima/il2108201104.htm˃ Último acesso em: 07.07.2016. CUADERNOS HISPANOAMERICANOS, 561, pp. 119-124, 1997. Disponível em: http://bib.cervantesvirtual.com/servlet/SirveObras/public/01478518912325195209079/210073_0029.pdf Último acesso em: 10.03. 2015. FLORES, Arturo J. “Voy a muchos concierto, hasta al de Miley Cyrus”. Publicado en Playboy en México, en 2014. Disponível em: http://www.playboy.com.mx/entretenimiento/entrevista-a-juan-villoro/ Último acesso em 10.08.2016.
250
GARCÉS, Claudia C. La ética no puede perder vigencia. Publicada en El Tiempo, en 10 de febrero de 2012. Disponível em: http://www.eltiempo.com/archivo/documento/CMS-11106222 Último acesso em: 10.10.2013. GORODISCHER, Julián. Juan Villoro y la crónica latinoamericana. Publicada em El Observatorio Fucatel, en 28 de noviembre de 2008. Disponível em: http://www.observatoriofucatel.cl/juan-villoro-y-la-cronica-latinoamericana/ Último acesso em: 23.05.2017. JUÁREZ, Hugo. Futbol y rock, según Juan Villoro. Publicado en Revista Chilango de julio de 2016. Disponível em: http://www.chilango.com/cultura/futbol-y-rock-segun-villoro/ Último acesso em: 29.05.2017. LAMMERS, Gerardo. ¿Qué demonios hará Juan Villoro con la nueva constitución chilanga? Publicada en Revista Chilango en julio de 2016. Disponível em: http://www.chilango.com/cultura/nota/2016/07/18/que-demonios-hara-juan-villoro-con-la-nueva-constitucion-chilanga Último acesso em: 07.03.2017.
LARA RAMOS, David. De frente con Juan Villoro. Publicado en Revista de la Universidad Autónoma del Caribe, 2014. Disponível em: http://repositorio.uac.edu.co/handle/11619/1768 Último acesso em: 01.05.2017.
LUIS, Bárbara. Resalta Villoro el humor de Jorge Ibargüengoitia. Publicado en El Popular de México, en 19 de noviembre de 2016. Disponível em: http://www.elpopular.mx/2016/11/19/cultura/resalta-villoro-el-humor-de-jorge-ibarguengoitia-153861 Último acesso em: 19.01.2017.
MEJÍA, Mauricio. Juan Villoro, el cronista del sublime. Publicado en El Financiero en 01.02.2014. Disponível em: http://www.elfinanciero.com.mx/after-office/juan-villoro-el-cronista-sublime.html Último acesso em: 12.11.2015. MELUSSI, Beatriz. La feria del libro es un fenómeno de la industria, no de la cultura. Publicada en El Diario de Coahuila, en 06 de diciembre de 2016. Disponível em: http://www.eldiariodecoahuila.com.mx/sociales/2016/12/6/feria-libro-fenomeno-industria-cultura-entrevista-juan-villoro-621654.html Último acesso em: 07.03.2017. MÉNDEZ, María Gabriela. “Me gusta ser un aforista plebeyo”. Publicado en El Universal de Caracas, en 06 de mayo 2012. Disponível em: http://www.eluniversal.com/que-hay/120506/me-gusta-ser-un-aforista-plebeyo Último acesso em: 05.08.2014. MORENO, Concepción. Domador de historias. Publicada en Fondo de Cultura Económica, em 30.01.2009. Disponível em: Último acesso: 02.02.2015. OJEDA, Alberto. Las grandes catástrofes generan literatura. Publicada en El Cultural, en 06.07.2011. Disponível em:
251
http://www.elcultural.com/noticias/buenos-dias/Juan-Villoro/1825 Último acesso em: 31.12.2016. PALAPA QUIJAS, Fabiola. Presentan antología de ‘Inventario’ de José Emilio Pacheco. Publicada en La Jornada, en 29 de mazo de 2017. Disponível: http://www.jornada.unam.mx/ultimas/2017/03/29/presentan-antologia-inventario-con-la-obra-de-jose-emilio-pacheco Último acesso em: 10.04.2017. PONIATOWSKA, Elena. Conversación con Juan Villoro: astronomía, rock, futbol … y demás. Publicada en Revista de la Universidad de México, No. 146, 2016, pp. 17-23. Disponível em: http://www.revistadelauniversidad.unam.mx/ojs_rum/index.php/rum/article/view/17127/19839 Último acesso em: 07.02.2017. RICARDO, Jorge. Juan Villoro hablando de prosa, poesía, tradición y caos. Publicado en febrero de 2014. Disponível em: http://lapaginadebetobuzali.blogspot.com.br/2014/02/juan-villoro-hablando-de-prosa-poesia.html Último acesso em: 02.01.2017. RUIZ MONDRAGÓN, Ariel. Razonar las pasiones literarias. Publicado en Lectores secretos, 2013. Disponível em: https://lectoresecretos.wordpress.com/2013/11/13/razonar-las-pasiones-literarias-entrevista-con-juan-villoro/ Último acesso em: 25.04.2017. SÁNCHEZ, Alberto. Mudarse para mejorarse. Publicada em La Jornada em 23.09.2001. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2001/09/23/sem-alberto.html Último acesso em: 02.12.2015. TARIFEÑO, Leonardo. “Soy un cronista de la ideas”. Publicada en La Nación: “Lecturas de fin de semana [65]. 16 de marzo de 2008. In. http://www.elojofisgon.com/2008/03/lecturas-de-fin-de-semana-65-entrevista-a-juan-villoro. Último acesso em: 19.05.2015. OUTROS TEXTOS CITADOS: ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma. In: Notas de literatura I. São Paulo: Duas Cidades, Ed, 34, 2003. _________ Teoría estética. Obra completa, 7. Trad. Rolf Tiedemann. Madrid: Akal Básica de bolsillo, 2004. AGAMBEN, Giorgio. O que resta de Auschwitz: o arquivo e a testemunha. Trad. Selvino J. Assmann. São Paulo: Boitempo, 2008. AGUSTÍN, José. Tragicomedia mexicana 3: la vida en México de 1982 a 1994. México: Editorial Planeta Mexicana, 2007. ALBARRÁN, Claudia. La generación de Inés Arredondo. Publicada na Revista Difusión Cultural em setembro de 1998. Disponível em:
252
http://www.uam.mx/difusion/revista/septiembre98/albarran.html Último acesso em: 17. 06. 2017. AMAR SÁNCHEZ, Ana María. La ficción del testimonio. Publicado en Revista Iberoamericana, 1990. Disponível em: https://revista-iberoamericana.pitt.edu/ojs/index.php/Iberoamericana/article/download/4724/4886 Último acesso em: 31.12.2016. AVITIA HERNÁNDEZ, Antonio. La narrativa de las Cristiadas. Novela, cuento, teatro, cine y corrido de las Rebeliones Cristeras. 2006. 879f. Tese (Doutorado em Humanidades) División de Ciencias Sociales y Humanidades – UAM –Unidad Iztapalapa, México D.F. 2006. Disponível em: http://www.bibliotecas.tv/avitia/La_Narrativa_de_las_Cristiadas.pdf Último acesso em: 15.10. 2015. AZNÁREZ, Juan Jesús. México ha dejado de ser oficialmente homogéneo para ser, desde los años noventa, oficialmente diverso. Entrevista con Carlos Monsiváis. Publicada em El País – Suplemento Babelia, em 29 nov 2003. Disponível em: http://elpais.com/diario/2003/11/29/babelia/1070066350_850215.html Último acesso em: 10.07.2016. BERNABÉ, Mónica. Sobre márgenes, crónica y mercancía. Publicado en octubre de 2010. Disponível em: http://www.celarg.org/int/arch_publi/bernabeb15.pdf Último acesso em: 07.02.2016. __________. (Prólogo) Idea Crónica. Literatura de no ficción iberoamericana. In: CRISTOFF, María Sonia, editora. Rosario, 2006. Disponível em: http://issuu.com/monicabernabe/docs/prologo_idea_cronica_-_monica_bernabe Último acesso em: 07.02.2016. BARRIOS, Jorge Hiram. Lapidario. Antología del aforismo mexicano. (1869-2014). México: FOEM, 2014. BARRÓN, Daniel. Crónica: arte sin invención. Entrevista con Darío Jaramillo Agudelo. Publicada em Sin Embargo, em 28 de jul de 2012. Disponível em: http://www.sinembargo.mx/28-07-2012/310173 Último acesso em: 10.05.2014. BARTRA, Roger. El festín de la mimesis. Política y literatura en el México de siglo XX. Publicado en Letras Libres, en 28 de octubre de 2010. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico-espana/el-festin-la-mimesis-politica-y-literatura-en-el-mexico-del-siglo-xx Último acesso em: 25.11.2016. BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Trad. Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. BEKER, Osvaldo; VESPA, Claudia e AREN, Fernanda. Apuntes sobre el trabajo con la crónica urbana en el taller de escritura. Publicado en actas del IV Congreso Internacional de Letras, 2010. Disponível
253
em: http://2010.cil.filo.uba.ar/sites/2010.cil.filo.uba.ar/files/295.Beker-Vespa-Aren.pdf.Último acesso em: 10.01.2017. BENAVIDES, Jeovanny. Procedimientos narrativos, procesos creativos y de producción de los cronistas ecuatorianos en las revistas de periodismo literario. Un estudio de los casos Mundo Diners, SoHo y Gatopardo. 2016. 435f. Tese de Doctorado. Facultad de Periodismo y Comunicación Social. Universidad Nacional de la Plata, 2016. Disponível em: http://sedici.unlp.edu.ar/handle/10915/53407 Último acesso em: 01.05.2017. _________. La tradicción periodística y literaria en América Latina. Publicada en la Revista Académica de la Federación Latinoamericana de Facultades de Comunicación Social en febrero de 2015a. Disponível em: http://dialogosfelafacs.net/la-tradicion-periodistica-literaria-en-america-latina/ Último acesso: 10.10.2015. _________. Origen, evolución y auge del periodismo literario latinoamericano: desde las crónicas de Índias y el modernismo hasta las revistas especializadas. Publicada en la Revista Questión, Vol.1, No. 45 (enero-marzo de 2015b). Disponível em: http://perio.unlp.edu.ar/ojs/index.php/question/article/view/2352 Último acesso: 10.09.2016. BENCOMO, Anadeli. Violencia crónica o crónica de violencia: José Duque y Rossana Reguillo. In: FALBO, Graciela. (ed). Tras las huellas de una escritura en tránsito. La crónica contemporánea en América Latina (pp 21-40). La Plata: Al Margen, 2007. _________. Los enemigos de Mickey. Publicada en Cuadernos de Literatura de la Revista Javeriana, no.31, enero-junio de 2012. Disponível em: http://revistas.javeriana.edu.co/index.php/cualit/article/download/3991/2986 Último acesso em: 10.10.2014.
__________. Entre héroes, fantasmas y apocalípticos: testigos y paisajes en la crónica mexicana. Colombia: Ediciones Pluma de Mompox, 2011. __________. Voces y voceros de la megalópolis, Madrid: Iberoamericana, 2002. BEVERLEY, John. Against Literature. University of Minnesota Press, Minneapolis y Londres, 1993. BHABHA, Homi K. O local da cultura. Trad. Myriam Ávila, Eliana Lourenço de
Lima Reis e Gláucia Renate Gonçalves. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1998.
BLANCO, José Joaquín. Aguafuertes de narrativa mexicana 1950-1980.
Publicada em Nexos, número 56 em agosto de 1982. Disponível em:
http://www.nexos.com.mx/?P=leerarticulo&Article=266531 Último acesso em:
24.02.2016.
BLOOM, Harold. O cânone ocidental. Os Livros e a Escola do Tempo. Trad. Marcos Santarrita. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2001.
254
BONET, Rubén. Literatura bajo presión. Reseña de la Antología de la crónica
latinoamericana actual, Jaramillo Agudelo. Publicada en la Revista Replicante
en 13 de junio de 2012. Disponível em: http://revistareplicante.com/literatura-
bajo-presion/ Último acesso em 13.07.2016.
BORGES, Jorge Luis. La memoria de Shakespeare. España: Editorial Alianza,
1998.
BOURDIEU, Pierre. As regras da arte: gênese e estrutura do campo literário.
São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
BURKE, Peter. Em busca da cultura popular. In: Cultura popular na Idade Moderna: Europa 1500-1800. Trad. Denise Bottmann. 2ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1989, pp. 31-114. CAMARENA CASTELLANOS, Ricardo. Las crónicas de Tiempo transcurrido,
de Juan Villoro, un soundtrack generacional. Ponencia en la University
Montreal, en 01 de febrero de 2013. Disponível em:
https://sites.google.com/site/ricardocamarenacastellanos/videos/las-crnicas-de-
tiempo-transcurrido-de-juan-villoro-un-soundtrack-generacional Último acesso
em: 10.02.2015.
CAMPOS, Néstor. La literatura no puede dejar de ejercer su valor político, señala Juan Villoro. Publicado em Crónica, em 13.03.2016. Disponível em: http://www.cronica.com.mx/notas/2016/949986.html Último acesso em: 12.07.2016.
CAMPOS, Marco Antonio. José Agustín. Publicada en la Revista de UNAM em 2006. Disponível em: http://www.revistas.unam.mx/index.php/archipielago/article/viewFile/20290/19279 Último acesso em: 04.07.2015.
CÂNDIDO, Antonio. A vida ao rés-do-chão. In: CÂNDIDO, Antonio et al. A crônica: o gênero, sua fixação e suas transformações no Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa,1992. _________. A formação da literatura brasileira: momentos decisivos. 6.ed. Belo Horizonte: Editora Itatiaia Ltda, 2000. CANETTI, Elias. A massa. In: Massa e poder. Trad. Sérgio Tellaroli. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, pp. 13-92. CANTÚ, Irma. Villoro y la escritura de viaje: Palmeras de la brisa rápida y Safari accidental y la mirada periférica. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. y ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona: Editorial Candaya, 2011, pp.387-408. CAPARRÓS, Martín. Lacrónica. Madrid: Círculo de Tiza, 2015.
255
__________. Por la crónica. En Actas del IV Congreso de la Lengua Española. Cartagena en marzo de 2007. Disponível em: http://congresosdelalengua.es/cartagena/ponencias/seccion_1/13/caparros_martin.htm Último acesso em: 12.07.2015. CARPENTIER, Alejo. El periodista: un cronista de su tiempo. Conferencia de
Carpentier en el taller “Alfredo López” del periódico Granma en 1975. Publicada
en Semanario Aquí en mayo de 2013. Disponível em:
http://www.pagina12.com.ar/diario/cultura/7-45224-2004-12-26.html Último
acesso em: 07.07.2016.
CARRIÓN, Jorge. Mejor que ficción: crónicas ejemplares. Barcelona: Editorial Anagrama, 2012. CASTAÑEDA, Ulises. Avándaro: del auge a la marginalización del rock mexicano. Publicado en Crónica.com.mx, en 09.11.2014. Disponível em: http://www.cronica.com.mx/notas/2014/856239.html Último acesso em: 07.02.2017. CASTILLO GARCÍA, Gustavo. El halconazo, historia de represión, cinismo y mentiras se mantiene impune. Publicada en La Jornada en 09.08.2008. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2008/06/09/index.php?article=018n1pol§ion=politica Último acesso em: 05.02.2016. CHECA MONTÚFAR, Fernando. Crónica y [semi] modernidad en América Latina. Publicado em 2014. Disponível em: http://www.academia.edu/8735288/Cr%C3%B3nica_y_semi_modernidad_en_Am%C3%A9rica_Latina Último acesso em: 16.03.2016. CORONA, Ignacio. and JÖRGENSEN, Beth E. The Contemporary Mexican Chronicle: theoretical perspectives on the liminal genre. State University of New York Press, 2002. CORREA, Guillermo. Con la desaparición de Conasupo, quedarían sepultadas las pruebas de corrupción de tres sexenios. Publicada en Proceso, en 21 de noviembre de 1998. Disponível em: http://www.proceso.com.mx/179498/con-la-desaparicion-de-conasupo-quedarian-sepultadas-las-pruebas-de-corrupcion-de-tres-sexenios Último acesso: 10.01.2017. COUTINHO, Afrânio. Ensaio e crônica. In: COUTINHO, Afrânio; COUTINHO, Eduardo de Faria (orgs). A literatura no Brasil. 4 ed. São Paulo: Global, 1997. v. 6, p. 117-43.
CUCHE, Denys. A Noção de Cultura nas Ciências Sociais. Trad. Viviane
Ribeiro. 2ª Ed. Bauru: EDUSC, 1999.
DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Trad. Estela dos Santos Abreu.
RJ: Contraponto, 1997.
256
DE LLANO, Pablo. ¿Quién financia a un ornitorrinco? Publicado en El País, en
12 de octubre de 2012. Disponível em:
http://cultura.elpais.com/cultura/2012/10/12/actualidad/1350033860_064860.ht
ml Último acesso em: 07.11.2016.
DÉS, Mihály. Juan Villoro: Paisaje del post-apocalipsis. Publicado na Revista de Cultura Lateral. Fevereiro, 2005. Disponível em: http://www.lateral.ed.es/revista/articulos/122.villoro.htm Último acesso em: 07.02.2014. DE GARAY, Adrián. Prolegómenos al estudio de la cultura rock. En Estudios sobre la cultura contemporánea, N.° 6, Vol. II. México, 1989. Disponível em: http://www.culturascontemporaneas.com/contenidos/cultura_rock.pdf Último acesso em: 10.01.2017. DÍAZ ZULUAGA, Luis Alejandro. Literatura y fútbol: otros horizontes de la literatura en España y Hispanoamérica. 2014. 406f. Tese. (Facultad de Filosofía y Letras). Universidad Autónoma de Barcelona, Barcelona, 2014. Disponível:http://www.tdx.cat/bitstream/handle/10803/285423/ladz1de1.pdf?sequence=1 Último acesso em: 10.02.2017. DOMÍNGUEZ MICHAEL, Christopher. De eso se trata: ensayos literarios de Juan Villoro. Publicado en Letras Libres en junio de 2008. Disponível em: http://www.letraslibres.com/revista/libros/de-eso-se-trata-ensayos-literarios-de-juan-villoro Último acesso em: 10.09.2013. __________. “La vitalidad histórica de los muertos mexicanos”: El testigo de Juan Villoro. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011. DUARTE, Lélia Parreira. “Missa do galo”: ironia romântica, humor e leveza. Periódicos PUC Minas, abril de 1996. Disponível em: periodicos.pucminas.br/index.php/cadernoscespuc/article/download/15042/11640 Último acesso em: 17.07.2016. EAGLETON, Terry. As ilusões do pós-modernismo. Tradução Elisabeth
Barbosa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998.
_________. A ideia de cultura. Tradução Sandra Castello Branco. São Paulo:
Editora UNESP, 2005.
_________. Teoria da literatura: uma introdução. Trad. Waltensir Dutra. São
Paulo: Editora Martins Fontes, 2006.
ECO, Umberto. Pirandello ridens. In: Sobre os espelhos e outros ensaios. Trad.
Beatriz Borges. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989, pp.250-258.
257
EGAN, Linda. Reseña de Voces y voceros de la megalópolis: la crónica periodístico-literaria en México, de Anadeli Bencomo, Madrid: Iberoamericana; Frankfurt am Main: Vervuert, 2002. __________. Carlos Monsiváis. Cultura y crónica en el México contemporáneo. Trad. Isabel Vericar. México: FCE, 2004. _________. Monsivaisiana: aforismos de un pueblo que quiere ser ciudadano. München: Martin Meidenbauer Verlagsbuchhandlung, 2010. __________. Play on words: chronicling the essay. In: CORONA, Ignacio. and JÖRGENSEN, Beth E. The Contemporary Mexican Chronicle: theoretical perspectives on the liminal genre. State University of New York Press, 2002. pp. 95-122. E. FUENTES, Móises. Safari accidental: Juan Villoro y el desafecto a la
precisión. Publicado en la Revista de UNAM, 2007. Disponível em:
http://www.uam.mx.difusion/revista/revcasa2007.html Último acesso em:
21.08.2012.
ESQUEMBRE, María Asunción. Juan Villoro: apunte bibliográfico. (2011) Disponível em: http://bib.cervantesvirtual.com/bib_autor/juanvilloro/pcuartonivel.jsp?conten=autor Último acesso em: 01.06.2012. ETHEL, Carolina. La invención de la realidad. Publicada en El País, en 12 de julio de 2008. Disponível em: http://elpais.com/diario/2008/07/12/babelia/1215819552_850215.html Último acesso em: 01.07.2017.
FABER, Sebastiaan. La metonimia en una crónica de Carlos Monsiváis. Hacia un periodismo democrático. Publicado en Literatura Mexicana, 1999, pp. 249-280. Disponível em: http://www.oberlin.edu/faculty/sfaber/Monsivais.pdf Último acesso em: 23.03.2017.
FALBO, Graciela. Introducción. In: Tras las huellas de una escritura en tránsito: La crónica contemporánea en América Latina. Argentina: Ediciones Al Margen, 2007. FERNÁNDEZ, Patricio. El boom de la crónica es un título comercial. Publicado en Revista Mexicana de Comunicación, en 21 de octubre de 2013. Disponível em: http://mexicanadecomunicacion.com.mx/rmc/2013/10/21/el-boom-de-la-cronica-es-un-titulo-comercial-patricio-fernandez/ Último acesso em: 10.03.2017. FONSECA, Alberto. Cuando llovió dinero en Macondo: Literatura y narcotráfico en Colombia y México. 2009. 299f. Tesis (Department of Spanish and Portuguese). University of Kansas, Kansas, 2009. Disponível em: ˂http://kuscholarworks.ku.edu/dspace/bitstream/1808/5646/1/Fonseca_ku_0099D_10395_DATA_1.pdf˃ Acesso em: 10.05.2015.
258
FOUCAULT, Michel. El orden del discurso. Trad. Alberto González Troyano. Buenos Aires: Tusquets Editoras, 1992. FRAGUAS, Antonio. La filosofía del “pienso, luego ‘tuiteo’”. Twitter y otras herramientas de Internet insuflan nuevos aires al aforismo. Publicado en El País, en 3 de abril de 2011. Disponível em: http://elpais.com/diario/2011/04/03/cultura/1301781601_850215.html Último acesso em: 10.07.2015. FRIERA, Silvina. Cuando la letra se convierte en acción. Publicado en Página 12 en 03 de diciembre de 2014. Disponível em: https://www.pagina12.com.ar/diario/suplementos/espectaculos/17-34140-2014-12-
03.html Último acesso em: 10.02.2017. FUSER, Igor. México em transe. São Paulo: Editora Página Aberta, 1995. FUENTES, Carlos. Valiente mundo nuevo. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011. GARCÍA CANCLINI, Néstor. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. Trad. Ana Regina Lessa e Heloísa Pezza Clintrão. São Paulo: Edusp, 2008. _________. A globalização imaginada. Trad. Sérgio Molina. São Paulo: Iluminuras, 2007. _________. Imaginarios urbanos. Buenos Aires: Eudeba, 1999. _________. Introducción: la sociología de la cultura. In: Sociología y cultura, BOURDIEU, Pierre. Trad. Martha Pou. México: Editorial Grijalbo, 1990. GARCÍA MÁRQUEZ, Gabriel. El mejor oficio del mundo. Discurso pronunciado en la Sociedad Interamericana de Prensa, en 1996. Publicado em Fundación para el Nuevo Periodismo Iberoamericano. Disponível em: http://especialgabo.fnpi.org/las-ideas-de-gabo/el-mejor-oficio-del-mundo/ Último acesso em: 21.03.2017. _________. Discurso de aceptación del Premio Nobel en 1982. Disponível em: http://cvc.cervantes.es/actcult/garcia_marquez/audios/gm_nobel.htm Último acesso em: 13.07.2016. GARCÍA TORRES, Beatriz. La crónica mexicana contemporánea a través de los textos de Juan Villoro y José Joaquín Blanco. 2012. 340f. Tesis doctoral. (Facultad de Filología) Universidad Complutense de Madrid, Madrid, 2012. Disponível em: http://eprints.ucm.es/22364/1/T34647.pdf Último acesso: 26.07.2013. GLANTZ, Margo. La onda diez años después: ¿epitafio o revalorización? Publicado en 1976. Disponível em:
259
http://cdigital.uv.mx/bitstream/123456789/7265/1/19765P88.pdf Último acesso em: 14.08.2013. GAYTÁN ALCALÁ, Felipe. Santa entre los malditos cultos de la Santa Muerte en el México del siglo XXI. Publicado en Revista Livinia de Estudios solicales y humanísticos, 2008. Disponível em: http://www.redalyc.org/html/745/74511188004/ Último acesso em: 10.03.2017. GÓMEZ, Catalina. El fútbol es lo más importante de lo no importante. Publicado em Semana, em 25 de enero de 2007. Disponível em: http://www.semana.com/on-line/articulo/el-futbol-mas-importante-no-importante/83131-3 Último acesso em: 12.10.2015. GONZÁLEZ, Roberto. El sismo de 1985 en los ojos de Villoro, Fadanelli, Giménez Cacho y más... . Publicado en Más por más, 18.09.2015. Disponível en: https://www.maspormas.com/2015/09/18/el-sismo-de-1985-en-los-ojos-de-villoro-fadanelli-gimenez-cacho-y-mas/ Último acesso em 31.12.2016.
GONZÁLEZ RODRÍGUEZ, Sergio. Juan Villoro, periodista. Publicado en La
Opinión, en 07 de diciembre de 2013. Disponível em:
http://www.reforma.com/aplicacioneslibre/editoriales/editorial.aspx?id=18185&
md5=298b2d426353b5cdd700bf56333b683f&ta=0dfdbac11765226904c16cb9a
d1b2efe Último acesso em: 07.12.2016.
__________. El safari cotidiano en esplendor. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón.
& ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la
crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011, pp.120-123).
__________. El hombre sin cabeza. Barcelona: Anagrama, 2009.
GONZÁLEZ TORRES, Armando. Revolución en el jardín, de Jorge Ibargüengoitia. Publicado en Letras Libres, en 30 de noviembre de 2009. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico-espana/libros/revolucion-en-el-jardin-jorge-ibarguengoitia Último acesso em: 31.12.2016. GRAS MIRAVET, Dunia. Del lado de allá, del lado de acá: estrategias editoriales y el campo literario de la narrativa hispanoamericana actual de España. In: Cuadernos Hispanoamericanos, Nº 604, Octubre 2000, p.14-42. Disponível em: http://www.cervantesvirtual.com/descargaPdf/ Último acesso em:12.07.2016. GUERRIERO, Leila. La verdad y el estilo. Publicado en El País, en 18 de febrero de 2012a. Disponível en: http://cultura.elpais.com/cultura/2012/02/15/actualidad/1329307919_560267.html Último acesso: 10.03.2107. __________. Sobre algunas mentiras del periodismo. In: JARAMILLO AGUDELO, Darío. (ed.) Antología de crónica latinoamericana actual. México: Alfaguara, 2012b. pp. 616-626.
260
GUTIÉRREZ TORRES, Susel. Tiempo transcurrido: Calendario azteca de una generación de testigos/personajes. Publicado em 2013. Disponível em: http://laventana.casa.cult.cu/modules.php?name=News&file=print&sid=7935 Último acesso em: 11.12.2016.
HERNÁNDEZ CHELICO, Javier. Avándaro, hace 40 años. Publicado en La Jornada en 11 de septiembre de 2011. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2011/09/11/opinion/a09a1esp Último acesso em: 15.10.2016. HUTCHEON, Linda. Poética do Pós-modernismo: história, teoria e ficção. Trad.
Ricardo Cruz. Rio de Janeiro: Imago Ed, 1991.
HUYSSEN, Andreas. Después de la gran división. Modernismo, cultura de masas, posmodernismo. Trad. Pablo Gianera. Buenos Aires: Adriana Hidalgo, 2006. IGLESIAS CONTÍN, Leonardo. Juan Villoro, cronista de la realidad mejicana. Publicado em La Voz, em 12/05/2015. Disponível em: http://www.lavoz.com.ar/temas/juan-villoro-cronista-de-la-realidad-mejicana-0 Último acesso em: 10.08.2016. JAMESON, Fredric. Modernidade singular. Ensaio sobre a ontologia do presente. Trad. Roberto Franco Valente. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. JARAMILLO AGUDELO, Darío. (ed.) Antología de crónica latinoamericana actual. México: Alfaguara, 2012. KEANE, John. Civil Society. Old Images, New Visions. Stanford: Stanford UP,
1998.
KERMODE, Frank. Apetite pela poesia. Trad. Sebastião Uchoa Leite. São Paulo: Edusp, 1993.
KRAUZE, Enrique. Palabras de homenaje al poeta José Emilio Pacheco.
Publicado en Letras Libres en 27 de enero de 2014. Disponível em:
http://www.letraslibres.com/mexico-espana/literatura/palabras-homenaje-al-
poeta-jose-emilio-pacheco Último acesso em: 23.03.2017.
LAFUENTE PORTILLO, Sandra. Alberto Salcedo Ramos, sobre la crónica.
(Entrevista con Alberto Salcedo Ramos) Publicado em 06.01.2010. Disponível
em: https://tambienamaresbueno.wordpress.com/2010/01/06/alberto-salcedo-
ramos-sobre-la-cronica/ Último acesso em: 08.12.2016.
LA JORNADA, México, quinto país más peligroso para periodistas: Unesco. Publicado em La Jornada, en 02 de noviembre de 2016. Disponível em: Último
261
acesso em: http://www.jornada.unam.mx/ultimas/2016/11/02/mexico-quinto-pais-mas-peligroso-para-periodistas-unesco Último acesso em: 31.12.2015. LAGO, María Cristina. La Crónica latinoamerica a través de la mirada de Walter Benjamin. Publicada Questión, Vol. 1, No. 33, Año 2012. Disponível em: http://perio.unlp.edu.ar/ojs/index.php/question/article/view/1337 Último acesso em: 01.01.2015.
LA RAZÓN. ¿Por que te ríes Juan Villoro? Publicado en 27 de enero de 2017.
Disponível em: http://razon.mx/spip.php?article239716 Último acesso em
02.02.2017.
LARIO BASTIDA, Manuel. Los armados de la palabra. Análisis comunicativo de la autonomía zapatista. 2015. 636f. Tesis Doctoral. Departamento de Lengua Española y Lingüística General – Universidad de Murcia, Murcia, 2015. Disponível em: https://digitum.um.es/xmlui/bitstream/10201/47392/1/Los%20armados%20de%20la%20palabra.%20An%C3%A1lisis%20comunicativo%20de%20la%20auton.pdf Último acesso em 10.11.2016. _________. El zapatismo en la literatura mexicana: el caso de Juan Villoro. Publicada en Pensamiento al margen, No. 5, 2016. Disponível em: http://www.pensamientoalmargen.com/app/download/13182594223/Juan_Villoro_y_zapatismo.pdf?t=1475857362 Último acesso em: 23.12.2016. LEIVA-AGUILERA. Microblogging y liveblogging: ¿Qué estás haciendo? Publicado en Dialnet, en 17 de marzo de 2008. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/3013077.pdf%20- Último acesso em 12.11.2015. LEMUS, Rafael. Balas de salva: notas sobre el narco y la narrativa mexicana.
Publicada en Revista Letras Libres, septiembre 2005. Disponível em:
http://www.letraslibres.com/revista/convivio/balas-de-salva Úlltimo acesso em:
12.10.2015.
LIPOVETSKY, Gilles. Os tempos hipermodernos. Trad. Mário Vilela. São Paulo: Barcarolla, 2004. LISPECTOR, Clarice. A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1984.
LLANES GARCÍA, Manuel de Jesús. Idea de Hispanoamérica en la obra de
Juan Villoro. 2012. 351f. Tesis de Doctorado. Departamento de Filología
Hispánica. Universidad de Barcelona, Barcelona, 2012. Disponível em:
http://www.tdx.cat/bitstream/handle/10803/98342/MJLLG_TESIS.pdf?sequence
=1 Último acesso em: 16.09.2015.
LOJO, Martín. Mi escritura es un género bastardo. (Entrevista con Pedro Lemebel) Publicado em La Nación. Buenos Aires, 13 de marzo 2010.
262
Disponível em: http://www.lanacion.com.ar/1241380-mi-escritura-es-un-genero-bastardo Último acesso em: 05.04.2016.
LÓPEZ PEDROZA, Claudia. La crónica de finales del siglo XIX en México: un
matrimonio entre literatura y periodismo. Publicado en Dialnet, 2011. Disponível
en: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/4988844.pdf. Último acesso em:
01.04.2016.
LYOTARD, Jean-François. La condición postmoderna. Informe sobre el saber.
Trad. Mariano Antolín Rato. Madrid: Editora Cátedra, 1987.
MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia. Trad. Ronald Polito e Sérgio Alcides. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2003. MARTÍNEZ, José Luis. (coord.) Ramón López Velarde. Obra poética. Edición Crítica. CEP de la Biblioteca Nacional. ALLCA XX. (Colección Archivos: 1ª. e., 36), España, 1998. MARTÍNEZ, Tomás Eloy. Periodismo y narración: desafíos para el siglo XXI. Publicado en Cuadernos de Literatura, Bogotá, 2002. Disponível em: http://revistas.javeriana.edu.co/index.php/cualit/article/view/7993/6340 Último acesso em: 01.04.2017. MARTÍNEZ VELOZ, Jaime. EZLN: el fantasma de 9 de febrero de 1995. Publicada en La Jornada, en 05 de junio de 2009. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2009/06/05/opinion/019a2pol Último acesso em: 27.12.2016. MARROQUÍN, Jaime. Montaigne y el escritor de fútbol: una lectura de Dios es redondo, de Juan Villoro. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. y ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica.Barcelona, Editorial Candaya, 2011, pp.247-260. MASOLIVER RÓDENAS, Juan Antonio. Juan Villoro: itinerarios de la invención. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona: Editorial Candaya, 2011, pp.31-65. _________. Soñar el 68. Publicado en Letras Libres em 11 de octubre de 2013. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico/sonar-el-68 Último acesso em: 01.10.2016. MOISÉS, Massaud. A criação literária. Volume 2. São Paulo: Cultrix, 1982. MONSIVÁIS, Carlos. A ustedes les consta. Antología de la crónica en México. México: Ediciones Era, 2010. __________. On the Chronicle in Mexico In: CORONA, Ignacio. And JÖRGENSEN, Beth E. The Contemporary Mexican Chronicle: theoretical
263
perspectives on the liminal genre. State University of New York Press, 2002. pp. 25-35. __________. Rituales del caos. México: Fondo de Cultura Mexicana, 1996. __________. Manuel Gutiérrez Nájera: la crónica como utopía. Publicada en Literatura Mexicana, vol. 4, núm. 1, UNAM, IFFL, CEL, México, 1995, pp. 27-43. Disponível em: https://revistas-filologicas.unam.mx/literatura-mexicana/index.php/lm/article/view/171/171 Último acesso em: 30.01.2017. __________. De la Santa Doctrina al Espíritu Público (Sobre las funciones de la crónica en México). Publicada en la Nueva Revista de Filología Hispánica, 1987. pp. 753-771. __________. Entrada libre: crónicas de la sociedad que se organiza. México: Ediciones Era, 2013. _________. Amor perdido. México: Ediciones Era, 1986. __________. El vigor de la agonía. La ciudad de México en los albores del Siglo XXI. Letras Libres, año IV, núm. 44, agosto de 2002, pp. 12-17. Disponível em: http://www.letraslibres.com/revista/convivio/el-vigor-de-la-agonia-la-ciudad-de-mexico-en-los-albores-del-siglo-xxi Último acesso: 05.12.2015. _________. Notas sobre la cultura mexicana en el siglo XX. In: Historia general de México, vol.4 de 4, El Colegio de México. México, 1976, pp.303-476). MONTES, Alicia. Carlos Monsiváis y los monstruos de la cultura popular. Publicado em Crítica Cultural Palhoça, em 2012. http://www.portaldeperiodicos.unisul.br/index.php/Critica_Cultural/article/download/1192/984. Último acesso em: 14.12.2016.
_________. Esto no es una pipa: la crónica urbana y el problema del género.
Publicada en Sedici, en 2009. Disponível em:
http://sedici.unlp.edu.ar/handle/10915/17469 Último acesso em: 13.04.2015.
MORIN, Edgar. Cultura de massas no século XX: o espírito do tempo. Neurose. Vol. 01. Trad. Maura Ribeiro Sardinha. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. M. RODRÍGUEZ, Juan. La crónica como género literario. Publicado en El
Mercurio, en 26 de julio de 2015. Disponível em:
http://diario.elmercurio.com/detalle/index.asp?id={4189f27f-f168-4428-b246-
fa114adb1328} Último acesso em: 03.04.2017.
264
TORRES TORRES, José Manuel. Las articulaciones del poder en la literatura mexicana del narcotráfico. Publicado en la Ogigia Revista electrónica de estudios hispánicos, 6 – 2009. Disponível em: ˂http://www.ogigia.es/OGIGIA6_files/OGIGIA6_Torres.pdf˃ Acesso em: 19.08.2016. MUÑOZ, Boris. Notas desabotonadas. La crónica latino-americana. In:
JARAMILLO AGUDELO, Darío. (ed.) Antología de crónica latinoamericana
actual. México: Alfaguara, 2012. pp.626-631.
NAKAGOME, Patrícia Trindade. A via e a vida do leitor: um conceito formado no espelho. 2015. 397f. Tese de Doutorado. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Universidade São Paulo, 2015. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8151/tde-09102015-131731/ Último acesso em: 21.08.2013. NAVARRETE, Carolina. La crónica literaria: un género híbrido por excelencia. Publicado em: Revista Cultural Ventana Latina, em 01 de abril de 2015. Disponível em: http://www.ventanalatina.co.uk/2015/04/la-cronica-literaria-un-genero-hibrido-por-excelencia/ NOVO, Salvador. ¡Ya viene Pancho Pistolas! Publicado en Atlantica en 1926. Disponível em: http://digital.iai.spk-berlin.de/viewer/content/?action=pdf&metsFile=820567663.xml&targetFileName=Ya_viene_Pancho_Pistolas.pdf&divID=LOG_0032. Último acesso em: 10.03.2017. NUNES, Aparecida Maria. Dissimulações de Clarice Lispector. Publicada em Revista Olho d’água, 2010. Disponível em: http://www.olhodagua.ibilce.unesp.br/index.php/Olhodagua/article/view/67/81 Último acesso em: 11.09.2013. OLMOS, Ana Cecilia. Literatura latino-americana e novas cartografias (a perspectiva dos escritores) Publicada na Revista da USP, 2012. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/ls/article/download/64567/67209 Último acesso em: 24.04.2016. _________. Lecturas errantes y cartografias críticas. In: Transnacionalidad e hibridez en el ensayo hispánico: un género sin orillas. Boston: BRILL, 2017. OLIVEIRA, João Vicente Ganzarolli de. Estética em Aristóteles. Publicado em Phoimix, 2009. Disponível em: http://phoinix.historia.ufrj.br/media/uploads/artigos/6_-_Estetica_em_Aristoteles_-_Joao_Ganzarolli.pdf Último acesso em: 16.03.2017. ________. Lecturas errantes y cartografías críticas. In: DHONDT, Reindert. & VANDEBOSCH, Dagmar. Transnacionalidad e hibridez en el ensayo hispánico: un género sin orillas. Boston: Brill, 2017.
265
OSORNO, Diego Henrique. El escritor que no se volvió cobarde ni caníbal. Publicada na Revista Gatopardo em fevereiro de 2013. Disponível em: http://www.gatopardo.com/ReportajesGP.php?R=176 Último acesso em: 12.12.2014. PADUA, María Eugenia. El apocalipsis mexicano. Publicada na Revista da UNAM, No. 12, julio-septiembre de 1996. Disponível em: http://www.revistas.unam.mx/index.php/rep/article/download/37103/33692 Último acesso em: 25.12.2016. PALAVERSICH, Diana. De Macondo a McOndo: senderos de la postmodernidad latinoamericana. México: Editora Plaza y Valdés, 2005. PARRA, Eduardo Antonio. Norte, narcotráfico e literatura. Publicada en Revista Letras Libres, octubre 2005. Disponível em:http://www.letraslibres.com/revista/convivio/norte-narcotrafico-y-literatura Último acesso em: 12.10.2015. PAVÓN, Héctor. El horror es lo cotidiano. Publicado en Revista de Cultura de Clarín en 18 de julio de 2009. Disponível em: ˂http://edant.revistaenie.clarin.com/notas/2009/07/18/_-01960384.htm˃ Acesso em: 20 julho 2014.
PELLEGRINI, Tania. A literatura e o leitor em tempos de mídia e mercado.
Publicado em Doc Slide em 21 de janeiro de 2016. Disponível em:
http://docslide.com.br/documents/a-literatura-e-o-leitor-em-tempos-de-midia-e-
mercado.html Último acesso em: 07.08.2016.
_________. Cultura de massa: o caso José Agustín. Publicado em Estudos de
Literatura Brasileira Contemporânea, no. 29. Brasília, 2007, pp.253-266.
Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/4846108.pdf. Último
acesso em: 19.06.2017.
PERUCHO, Javier. Carlos Barrera y el aforismo mexicano. Publicado en la
Revista Electrónica de Estudios sobre la Ficción Breve, en 30 oct de 2015.
Disponível em: http://148.206.107.15/biblioteca_digital/articulos/10-708-
10332pac.pdf Último acesso em: 10.10.2016.
________. Escrituras privadas, lecturas públicas: el aforismo en México.
Publicado en Lejana, Revista de Narrativa Breve, no. 3, 2011. Disponível em:
http://lejana.elte.hu/PDF_3/Javier%20Perucho.pdf Último acesso em:
22.10.2016.
PETRAS, James. & VELTMEYER, Henry. Imperio y narcocapitalismo. In:
______.La globalización desenmascarada. El imperialismo en el siglo XXI.
México: Ed. Universidad Autónoma de Zacatecas, 2003. pp. 181-189.
_________. y VILLORO, Juan. Escribir es conversar. Publicado en Letras Libres, setiembre de 2007. Disponível em: http://www.letraslibres.com/revista/convivio/escribir-esconversar Último acesso em: 20.05. 2016.
266
PONIATOWSKA, Elena. Box y literatura del crack. La Jornada, jueves 26 de junio de 2003. Disponível em:http://www.jornada.unam.mx/2003/06/26/03aa1cul.php?origen=index.html&fly=1Último acesso em: 01.12. 2015. _________. Encuentro de nuevos cronistas de Indias. Publicado en La Jornada, en 12 de octubre de 2012. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2012/10/12/opinion/a08a1cul Último acesso: 25.11.2015. PRICE, Brian L. Juan Villoro y las crónicas nostálgicas del rock and roll. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. y ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011, pp. 261-288. PULIDO ARANDA, Alberto. A los 40 años de 1968: la crónica de un año maravilloso. Publicado en 2008. Disponível: http://www.stunam.org.mx/22historia/acuarenta/cronica.pdf Último acesso em: 27.06.2015. RAMA, Ángel. La novela latinoamericana 1920-1980. Bogotá: Procultura, 1982. RAMOS, Julio. Desencontros da modernidade na América Latina: literatura e política no século 19. Trad. Rômulo Monte Alto. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008. RAMOS LEMUS, Víctor Manuel. De amor perdido a Rituales del caos: a
crónica ensaística de Carlos Monsiváis. Publicado em Cadernos Neolatinas,
Ano XIV – No. 8, 2015. Disponível em:
http://www.letras.ufrj.br/neolatinas/media/publicacoes/cadernos/a14n8/LEMUS_
_Victor._DE_AMOR_PERDIDO_A_LOS_RITUALES_DEL_CAOS._A_CR%C3
%94NICA_ENSAISTICA_DE_CARLOS_MONSIV%C3%81IS.pdf Último acesso
em: 10.10.2015.
REGUILLO, Rossana. Textos fronterizos. La crónica una escritura a la intemperie. In: FALBO, Graciela. (ed). Tras las huellas de una escritura en tránsito. La crónica contemporánea en América Latina (pp. 41-50). La Plata: Al Margen, 2007. RÍOS, Valería de los. Crónica chilena contemporánea: Roberto Merino y Pedro Lemebel, de lo real y sus cicatrices. Publicada en la Revista Persona y Sociedad, Vol. XX, no. 2, 2006. Disponível em: http://biblioteca.uahurtado.cl/ujah/pys/docs/2006/agosto/20_2_pp127_141.pdf Último acesso em 17.07.2016. ROTKER, Susana. La invención de la crónica. México: Fondo de Cultura Económica. Fundación para un Nuevo Periodismo Iberoamericano, 2005.
267
________. Bravo Pueblo. Poder, utopía y violencia. Editorial La Nave Va. Caracas, 2006. RODRÍGUEZ, Blanca. El imaginario poético de Ramón López Velarde, México, UNAM, 1996 (Biblioteca de Letras). ROMERO, Ernerto Emiliano. Ensayo bajo demanda. México: Creative Commons, 2006. RUISÁNCHEZ, José Ramón. y ZAVALA, Oswaldo. “El malabarista: las genealogías de Juan Villoro”. In: (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona: Editorial Candaya, 2011. SAER, Juan José. El concepto de ficción. In: El concepto de ficción. Buenos Aires, Ariel, 1997. SALAZAR, Jezreel. La ciudad como texto: La crónica urbana de Carlos Monsiváis. México: Senderos, 2006. Universidad Nacional Autónoma de Nuevo León. Disponível em: www.academia.edu/18411513/La_ciudad_como_texto._La_cronica_urbana_de_Carlos_Monsivais_tesis Último acesso em: 21.03.2017. __________. La crónica: una estética de la transgresión. Revista Electrónica Razón y palabra, no. 47 octubre-noviembre 2005. Disponível em: http://www.razonypalabra.org.mx/anteriores/n47/jsalazar.html Último acesso em: 04.05.2013. _________. Perspectivas sobre teoría, historia y crítica literaria en América Latina. Entrevista con Lauro Zavala. Publicado en Textos Híbridos, Vol1, No. 1. (julio 2011) Disponível em: http://escholarship.org/uc/item/7s70d29t Último acesso em: 01.02.2015.
SALCEDO RAMOS, Alberto. Lacrónica:el rostrohumanodela noticia.
Publicada FNPI, en 2016. Disponível em: http://bicentenario.fnpi.org/meteriales/la_cronica_el_rostro_humano_de_la_noticia.pdf Último acesso em: 20.04.2017. _________. Para escribir crónicas hay que tener algo de kamikaze. Publicado na Revista Mexicana de Comunicación en 16 de octubre de 2013. Disponível em: http://mexicanadecomunicacion.com.mx/rmc/2013/10/16/para-escribir-cronicas-hay-que-tener-algo-de-kamikaze/ Último acesso em: 10.01.2015. __________. Del periodismo narrativo. In: JARAMILLO AGUDELO, Darío. (ed.) Antología de crónica latinoamericana actual. México: Alfaguara, 2012. pp. 632-633. SALGADO, Sebastião. y VILLORO, Juan. Éxodos. Publicado en Letras libres en octubre de 2002. Disponível em: http://www.letraslibres.com/revista/portafolios/exodos?page=full Último acesso em: 18.10.2015
268
SÁNCHEZ-PRADO, Ignacio M. Naciones intelectuales: la modernidad literaria mexicana de la constituición a la frontera (1917-2000). 2006. 422f. Tese de Ph.D. (Hispanic Languages and Literatures). Uviversity of Pittsburgh, Pittsburgh, 2006. Disponível em:http://d-scholarship.pitt.edu/7769/1/Sanchez_Prado_ETD_2006.pdf Último acesso em: 21.08.2013. SÁNCHEZ RUIZ, Enrique E. Los medios de comunicación masiva en México 1968-2000, en Ilán Bizberg e Lorenzo Meyer (coords.): Una historia contemporánea de México: Actores. México D.F.: Editorial Océano, 2005, pp. 402-552. SANTA CRUZ, Eduardo. Crónica de un encuentro: fútbol y cultura popular. Santiago de Chile: Ediciones Instituto Profesional Arcos, 1991. SANTOS, Milton. Território e sociedade. Entrevista com Milton Santos. 2ª. Ed. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2001. SARLO, Beatriz. Tempo presente: notas sobre a mudança de uma cultura. Trad. Luís Carlos Cabral. Rio de Janeiro: José Olympio, 2005. SARTRE, Jean-Paul. ¿Qué es la literatura? Trad. Aurora Bernárdez. Buenos Aires: Editorial Losada, 1967. SEFCHOVICH, Sara. Cronistas de fin del siglo XX. Publicado en la Revista de Estudios sobre la crónica latinoamericana, 2015. Disponível em: http://www.textoshibridos.com/index.php/th/article/download/45/27 Último acesso em: 02.08.2016. SHERIDAN, Guillermo. Los contemporáneos ayer. México: Fondo de Cultura Económica, 1993. SILVA JÚNIOR, Antonio Ferreira. Leituras do caos urbano na obra de José Emilio Pacheco. 2010. 422f. Tese de Doutorado. Faculdade de Letras. Programa de Pós-Graduação em Letras Neolatinas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. Disponível em: http://www.letras.ufrj.br/pgneolatinas/media/bancoteses/antonioferreiradoutorado.pdf Último acesso em: 24.03.2017. SIN EMBARGO.MX. Asesino del periodista “El Gato” Félix sale libre y acude a su ex patrón: Jorge Hank Rhon. Publicado en 12 de mayo de 2015. Disponível em: http://www.sinembargo.mx/12-05-2015/1342606 Último acesso em: 07.05.2016. STEELE, Cynthia. The Rainforest Chronicles of Subcomandante Marcos In: CORONA, Ignacio. and JÖRGENSEN, Beth E. The Contemporary Mexican Chronicle: theoretical perspectives on the liminal genre. State University of New York Press, 2002. pp. 245-255.
269
SITEL. El alfabetismo en América Latina, una deuda social. Publicado em:
SITEL (Sistema de Información de Tendencias Educativas en América Latina),
noviembre de 2010. Disponível em: http://www.siteal.iipe-
oei.org/sites/default/files/datodestacado_furosevich_20101130.pdf Último
acesso em: 16.03.2016.
SOUZA, Marcelo Lopes de. Fobópole: o medo generalizado e a militarização da questão urbana. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2008. STANTON, Anthony. Lo culto y lo coloquial en la poesía mexicana contemporánea. In: Cuadernos Hispanoamericanos, Madrid, 1991, nº 501, p. 101 – 112. SZADY, Beata. La crónica en América Latina. El caso de Etiqueta Negra.
Publicado em Correspondencias & Analisis, No. 5, año 2015. Disponível
em: http://www.correspondenciasyanalisis.com/es/pdf/v5/pe/3_la_cronica_en_
america_latina.pdf Último acesso em: 21.03.2017.
TABUENCA CÓRDOBA, María Socoro. Aproximaciones críticas sobre las literaturas de las fronteras. Frontera Norte, Vol. 9, Número 19, 1997. Pp.85-110. Disponível em: https://www.colef.mx/fronteranorte/wp-content/uploads/2014/03/5-f18_Aproximaciones_critcas_literaturas_de_las_fronteras.pdf.Último acesso em: 10.02.2017. TAPIA, Miguel. La construcción de la verosimilitud en la crónica contemporánea. Reflexión en torno a la obra de Juan Villoro y Fabrizio Mejía Madrid. Publicada en America Revues, 2016. Disponível em: https://america.revues.org/1768 Último acesso em: 10.02.2016.
TEDESCHI, Stefano. El testigo y las monedas en la obra narrativa de Juan
Villoro. Revista Artifara. Dezembro, 2006. Disponível em:
http://www.cisi.unito.it/artifara/rivista6/testi/villoro.asp Último acesso em:
17.01.2012.
TIRZO, Jorge. ¿Nueva? Crónica latinoamericana. Publicado en Revista Mexicana de Comunicación, en 21 de octubre de 2013. Disponível em: http://mexicanadecomunicacion.com.mx/rmc/read-offline/20823/nueva-cronica-latinoamericana.pdf. Último acesso em: 10.03.2017.
TUCUMÁN ZETA. ¿Qué es Tucumán Zeta? Publicado en 2012. Disponível em: http://tucumanzeta.com/que-es-tucuman-zeta/ Último acesso em: 07.03.2017. URRUTIA, Elena. La crónica del siglo XXI. Publicada em La Jornada em 3 de marzo de 2007. Disponível em:http://www.jornada.unam.mx/2007/03/03/index.php?section=opinion&article=a06a1cul Último acesso em: 21.09.2013.
270
VILA-MATAS, Enrique. El arte de no terminar nada (Lichtenberg). Publicado en
El País, suplemento Babelia, en 14 ago de 2010. Disponível em:
http://elpais.com/diario/2010/08/14/babelia/1281744768_850215.html Último
acesso em: 23.10.2016.
VILLAMIL, María Elvira. El cronista y la crónica en Safari accidental. In: RÍOS BAEZA, Felipe A. (Editor) Juan Villoro: rondas al vigía. México: Ediciones Eón, 2011. VILLARREAL, Rogelio. La crónica es el gran retrato de nuestro tiempo. Publicado na Revista Mexicana de Comunicación en 28 de octubre de 2013. Disponível em: http://mexicanadecomunicacion.com.mx/rmc/read-offline/20084/la-cronica-es-el-gran-retrato-de-nuestro-tiempo-rogelio-villarreal.pdf. Último acesso em: 01.11.2016. VILLANUEVA CHANG, Julio. El que enciende la luz. ¿Qué significa escribir una crónica hoy? In: JARAMILLO AGUDELO, Darío. (ed.) Antología de crónica latinoamericana actual. México: Alfaguara, 2012. pp. 582-606.
VEINTICUATRO HORAS. Villoro y Taibo II marchan desde FIL Guadalajara; 60 ciudades protestan por 43 normalistas. Publicado em 01 de diciembre de 2014. Disponível em: http://www.24-horas.mx/villoro-y-taibo-ii-marchan-desde-fil-guadalajara-60-ciudades-protestan-por-43-normalistas/ Último acesso em: 10.02.2017.
WOLFE, Tom. El nuevo periodismo. Trad. José Luis Guarner. Barcelona:
Anagrama, 1998.
YÉPEZ, Heriberto. Tijuanologías: ensayo urbano en diez postales. México:
Universidad Autónoma Baja California, 2006. Disponível em:
https://www.academia.edu/18125871/TIJUANOLOGIAS_1999-2006_ Último
acesso em: 10.02.2017.
ZAID, Gabriel. Citas e aforismos. Publicado en Letras Libres en 31 de enero de
2004. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico-espana/citas-y-
aforismos Último acesso em: 29.11.2015.
__________. La lectura como fracaso del sistema educativo. Publicado em
Letras Libres, noviembre de 2006. Disponível em:
http://www.letraslibres.com/revista/convivio/la -lectura-como-fracaso-
del-sistema-educativo Último acesso: 08.12.2016.
ZAVALA, Lauro. La ficción posmoderna como espacio fronterizo. Teoría y análisis de la narrativa en literatura y en cine hispanoamericanos. 2007. 340f. Tese de Doctorado en Literatura Hispánica. Colegio de México, Ciudad de México, 2007. Disponível em: http://www.sepancine.mx/attachments/Lauro_Zavala_Doctorado.pdf Último acesso em: 03.03.2016.
271
VÍDEOS CITADOS:
BARRERA TYSZKA, Alberto. Juan Villoro – miradas urbanas. Publicado em 22.03.2010. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=iqkK3BHTKHk Último acesso em: 15.12.2016. VILLORO, Juan. Charlando con Juan Villoro. Publicado en 12 de junio de 2016d. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=wURkL8KyBxg Último acesso: 28.08.2016. __________. Villoro en Villoro. Producción de Juan Carlos Colín, 2009d. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. y ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011. OUTROS TEXTOS CONSULTADOS: ACÍZELO DE SOUZA, Roberto. Estudos Culturais: Descrição de um Conceito e Crítica de sua Prática. Publicada na Revista Matraga, Rio de Janeiro: UERJ,
Dez de 2005, no.17, p.62‐70. _________. Tempo livre. In: Indústria cultural e sociedade. São Paulo: Editora Paz & Terra, 2002. _________ & HORKHEIMER, Max. A indústria cultural: o Iluminismo como mistificação da massa. In: LIMA, Luis Costa. Teoria da cultura de massa. 8ª ed. São Paulo: Paz & Terra, 2011, pp. 179-238. ALABARCES, Pablo. (Compilador) Futbologías: fútbol, identidad y violencia en América Latina. Publicado por Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales – CLACSO, en 2003. Disponível em:http://biblioteca.clacso.edu.ar/clacso/gt/20100919010923/alabarces.pdf Último acesso em: 20.02.2017. ANDRADE, Teresa. “La crónica es una marca de época”. Entrevista con Rossana Reguillo. Publicada en la Revista Vértice en 4 de julio de 2004. Disponível em: http://www.elsalvador.com/vertice/2004/040704/entrevista.html Último acesso em: 01.12.2013. APPADURAI, Arjun. La modernidad desbordada: dimensiones culturales de La globalización. Trad. Gustavo Remedi. Argentina: Fondo de Cultura Económica de Argentina, 2001. AVERBUCK, Ligia. (org.) Literatura em Tempo de Cultura de Massa. São Paulo: Nobel, 1984.
272
AZEVEDO, Carlos. O lugar da literatura. Publicada na Revista da Faculdade de Letras: Línguas e Literaturas, Porto, XVI, 1999. pp. 9-22. Disponível em: http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/2802.pdf Último acesso em: 11.07.2016 BARTRA, Roger. Dos visiones del 68. Publicado en Letras Libres, en 02 de octubre de 2007. Disponível em: http://www.letraslibres.com/mexico-espana/dos-
visiones-del-68 Último acesso em: 04.07.2015. BELLVER SAEZ, Pilar. Tijuana en los cuentos de Luis Humberto Crosthwaite:el reto a la utopía de las culturas híbridas en la frontera. Publicado em Ciber Letras, diciembre de 2008. Disponível em: http://www.lehman.cuny.edu/ciberletras/v20.html Último acesso em: 10.02.2017. BENCOMO, Anadeli. Subjetividades urbanas: mirar/contar la urbe desde la crónica. Publicada en la Revista Iberoamericana, Vol.3, No. 11, 2003 Disponível em: https://journals.iai.spk-
berlin.de/index.php/iberoamericana/article/view/621 Último acesso: 25.01.2016. __________. La crónica periodístico-literaria mexicana del siglo XX. Publicada em 2006. Disponível em: http://kagiz.org/la-crnica-periodstico-literaria-mexicana-
del-siglo-xx.html Último acesso em: 19.03.2016. BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica. In: LIMA, Luis Costa. Teoria da cultura de massa. 8ª ed. São Paulo: Paz & Terra, 2011, pp. 239-284. ________. Origem do drama trágico alemão. Trad. João Barrento. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2013. BERMAN, Marshall. Tudo que é sólido desmancha no ar. A aventura da
modernidade. Trad. Carlos Felipe Moisés e Ana Maria L. Ioriatti. São Paulo:
Companhia das Letras, 2007.
BEKER, Osvaldo. Apuntes sobre el trabajo con la crónica urbana en el taller
de escritura. Publicada no IV Congresso Internacional de Letras das UFBA em
2010. Disponível em: http://2010.cil.filo.uba.ar/ponencia/apuntes-sobre-el-trabajo-
con-la-cr%C3%B3nica-urbana-en-el-taller-de-escritura Último acesso em:
20.02.2016.
BLAS GARCÍA, Manuel. Arte-Artesanía, interacción histórica. Publicada na Revista Bibliográfica de Geografía y Ciencias Sociales, Vol. X, no. 599, 5 de agosto de 2005). Disponível em: http://www.ub.edu/geocrit/b3w-599.htm Último acesso em: 10.08.2016. BORSÒ, Vittoria. Fronteras de poder y umbrales corporales. Sobre el poder
performativo de lo popular en la literatura y la cultura de masas de México
(Rulfo, Monsiváis, Poniatowska). Publicada en la Revista Iberoamericana, Vol
4., Madrid, pp. 87-106. Disponível em: https://journals.iai.spk-
273
berlin.de/index.php/iberoamericana/article/view/1020/700 Último acesso em:
12.07.2016.
BOURDIEU, Pierre. Campo de poder, campo intelectual, itinerario de un
concepto. Buenos Aires: Colección Jungla Simbólica. Editorial Montressor.
2002.
________. El campo literario. Prerrequisitos críticos y principios de método.
Trad. Desiderio Navarro. Revista Criterios, La Habana, nº 25-28, enero 1989-
diciembre 1990, pp. 20-42. Disponível em:
http://www.criterios.es/pdf/bourdieucampo.pdf Último acesso em: 06.04.2016.
BRANDER, Miriam Lay. “¿Gracias a Twitter, reviven los aforismos?” – Las
formas breves en Internet. Publicada en la Revista Chilena de Estudios
Latinoamericanos, 5 de octubre de 2015. Disponível em:
http://www.revistas.uchile.cl/index.php/MRD/article/viewFile/37442/39078 Último
acesso em: 22.10.2016.
BUENO, Isabella. La crónica según Juan Villoro. Disponível em: https://sites.google.com/site/isabellabuenof91tallerdeperiod/la-cronica-segun-juan-
villoro Último acesso em: 07.02.2013. CABRERA LÓPEZ, Patricia. El campo literario mexicano desde el enfoque de Bourdieu. In: GALLEGOS, Carlos. GÓMEZ, Luis E. IMAZ, Cecilia et al. Pierre Bourdieu. Campos de conocimiento: teoría social, educación y cultura. México: Centro de Investigaciones Humanísticas de la Facultad de Humanidades, UNACH, Centro de Estudios Básicos de la Facultad de Ciencias Políticas y Sociales, UNAM, 2005. pp. 259-277. CAPARRÓS, Martín. Contra los cronistas. In: JARAMILLO AGUDELO, Darío. (ed.) Antología de crónica latinoamericana actual. México: Alfaguara, 2012. pp.613-615. __________. Muerto en vida (Una tarde con Sergio Schoklender). Publicado en el Blog Plamplinas, en 16 de diciembre de 2011. Disponível em: http://blogs.elpais.com/pamplinas/2011/12/muerto-en-vida.html Último acesso em: 01.01.2017. CAREY, John. Os intelectuais e as massas. Tradução Ronald Kyrmse. São
Paulo: ArsPoetica, 1993.
CARNEIRO, SARISSA. La (pos) moderna Tenochtitlan: notas sobre la ciudad
en Materia dispuesta de Juan Villoro. Publicada en la Revista Iberoamericana
Vol. LXXIII, Núm. 218, enero-marzo 2007, 69-77. Disponível em: http://revista-
iberoamericana.pitt.edu/ojs/index.php/Iberoamericana/article/viewFile/5369/5525
Último acesso em: 07.03.2016.
CARRIÓN, Jorge. El extranjero como caricatura. La crónica de viaje según Villoro. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. y ZAVALA, Oswaldo. (Compilación)
274
Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona: Editorial Candaya, 2011. CHILLÓN, Albert. Literatura y periodismo una tradición de relaciones promiscuas. Bellatera, Castelló de la Plana, València : Universitat Autònoma de Barcelona, Publicacions de la Universitat Jaume I, Universitat de València, 1999. DARRIGRANDI, Claudia. Crónica Latinoamericana: algunos apuntes sobre su
estudio. Publicado em: Cuadernos de Literatura Vol.XVII, No.34 – julio-
diciembre de 2013. Disponível em:
http://revistas.javeriana.edu.co/index.php/cualit/article/view/6242/4974 Último acesso
em: 16.02.2016.
DE LA LLOSA, Alvar. 1968 en América Latina: aparición de nuevos actores.
Publicado en Haol, no. 19, 2009. Disponível
em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/3065995.pdf. Último acesso em:
10.03.2016.
ECHEVERRÍA, Bolívar. La modernidad de lo barroco. México: Ediciones Era,
2000.
ESCALANTE, Evodio. Recuento de la crítica literaria en México. Publicada en
Fondo de Cultura Económica en 14 de marzo de 2009. Disponível em: http://www.fondodeculturaeconomica.com/editorial/prensa/Detalle.aspx?seccion=Detall
e&id_desplegado=24301 Último acesso em: 13.02.2016.
ESCOBAR, Ticio. Estética de las artes populares: cuestiones sobre el arte
popular. In: SOBREVILLA, David y XIRAU, Ramón. Estética. Madrid: Editorial
Trotta, 2003.
ESQUIVADA, Gabriela. Los nuevos cronistas de América. Autores en busca de un género. In: FALBO, Graciela. (ed). Tras las huellas de una escritura en tránsito. La crónica contemporánea en América Latina (pp 21-40). La Plata: Al Margen, 2007.
FABRY, Geneviève. Los imaginarios apocalípticos en la literatura hispanoamericana contemporánea: Suíza, Peter Lang, 2010. FAJARDO, Carlos Fajardo. Estética y sensibilidades posmodernas: estudio de sus nuevos contextos y categorías. México: Iteso, 2005. FIENGO VILLENA, Sergio. Utopías. Ensayos sobre fútbol y nación en América Latina. Publicado em Cuaderno de Ciencias Sociales, 160, FLACSO, Costa Rica, 2012. Disponível: https://www.academia.edu/3637671/Futop%C3%ADas._Ensayos_sobre_f%C3%BAtbo
l_y_naci%C3%B3n_en_Am%C3%A9rica_Latina?auto=download Último acesso em: 14.02.2017.
275
FREUD, Sigmund. Psicologia das massas e análise do eu. In: Obras completas de Sigmund Freud. v. 9. Trad. I. Izecksohn. Rio de Janeiro: Delta, s.d., pp. 7-105. GADEA, Carlos A. Especulações analíticas em torno da pós-modernidade na América Latina. Publicada na Revista Interseções, vol. 12, n. 2 p. 264-282, dez 2010. Disponível em: http://www.e-
publicacoes.uerj.br/index.php/intersecoes/article/view/4590 Último acesso em: 07.03.2016. GARCÍA, Alejandro. La crónica es un ornitorrinco. Charlando con Juan Villoro. Publicado en 04.08.2016. Disponível em: https://iletradoperocuerdo.com/2016/04/08/la-cronica-es-un-ornitorrinco-charlando-con-
juan-villoro/ Último acesso em: 20.04.2017. GIL GONZÁLEZ, Juan Carlos. La crónica periodística. Evolución, desarrollo y nueva perspectiva. Publicado en Global Media Journal Edición, Volumen 1, Número 1, pp. 26-39 en 2004. Disponível em: http://www.gmjei.com/index.php/GMJ_EI/article/view/146/143 Último acesso em: 12.07.2013. GÓMEZ GARCÍA, Gabriela Alejandra. Un testimonio más de la onda de José Agustín. Publicada em: Revista UNAM em 20.08.2012. Disponível em: http://www.uaemex.mx/fhumanidades/monedero/onda.html Último acesso em: 06.12.2015. GONZÁLEZ, H. Sin ética no hay periodismo. (Entrevista con Alberto Salcedo Ramos). Publicado en Aristegui Noticias, en 06 de marzo de 2016. Disponível em: http://aristeguinoticias.com/0603/lomasdestacado/sin-etica-no-hay-periodismo-
alberto-salcedo-ramos/ Último acesso em: 01.04.2016. GRANDÍO PÉREZ, María del Mar. Tiempo y perspectiva en la película de Akira Kurosawa. Publicado en Vivat Academian, No. 111, junio, 2010. Disponível em: http://pendientedemigracion.ucm.es/info/vivataca/numeros/n111/PDFs/Grandiocopp.pdf Último acesso em: 31.12.2016. HARGUINDEGUY, Laura Collin. y MOLINA, Rafael. Las Organizaciones de la Sociedad Civil en México: de la invisibilidad al protagonismo. Análisis interdisciplinarios – Facultad de Filosofía y Letras - BUAP y El Colegio de Tlaxcala, Publicada en 17.01.2009. Disponível em:http://nuevomundo.revues.org/47723 Último acesso em: 28.07.2013. HECKE, An Van. La cultura del post-apocalipsis en Los rituales del caos de Carlos Monsiváis. In: FABRY, Geneviève. Los imaginarios apocalípticos en la literatura hispanoamericana contemporánea: Suíza, Peter Lang, 2010. HERRALDE, Jorge. Juan Villoro, México-Barcelona-México-Barcelona-México etcétera. In: RUISÁNCHEZ, José Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011, pp.73-78.
276
HUYSSEN, Andreas. Mapeando o pós-moderno. In: Pós-modernismo e política. Rio de Janeiro: Rocco, 1991. IGLESIAS, Jorge. Así es el país vecino: las crónicas de frontera de Luis Arturo Ramos. Publicado em: Textos Híbridos: Revista de Estudios sobre la Crónica Latinoamericana. Vol 1, No. 2, diciembre de 2011. Disponível em: http://escholarship.org/uc/item/07p949nv Último acesso: 14.12.2015. ___________. A virada cultural: reflexões sobre o pós-moderno. Tradução.
Carolina Araújo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006.
KARAM, Tanius. Representaciones de la ciudad de México en la crónica.
Publicada en la Revista de Investigación Social, núm. 1, otoño-invierno, 2004,
pp. 51-76, Universidad Autónoma de la Ciudad de México. Disponível em:
http://www.redalyc.org/pdf/628/62800102.pdf Último acesso em: 22.11.2013.
__________. La crónica y los Estudios Culturales. Notas para un debate
compartido. Publicado na Revista da Associação Nacional dos Programas de
Pós-Graduação em Comunicação, agosto de 2006. Disponível em:
http://www.compos.org.br/seer/index.php/e-compos/article/viewFile/75/75 Último
acesso em: 29/08/2016.
KRACAUER, Siegfried. O ornamento da massa. Tradução Carlos Eduardo J.
Machado e Marlene Holzhausen. São Paulo: Cosac Naify. 2009.
KIRCHOF, Edgar Roberto. Estética e semiótica: de Baumgarten e Kant a
Umberto Eco. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003.
LAGUNA-CORREA, Francisco. Canon nacional, circulación literaria y
estrategias de socialización en la narrativa mexicana contemporánea: las
óperas primas de Daniel Sada y Juan Villoro. Apresentado no Congreso
Internacional del Latin American Studies Association (LASA) em mayo de 2016.
Publicada em: https://www.academia.edu/25779039/Canon_nacional_circulación_literaria_y_estrategi
as_de_socialización_en_la_narrativa_mexicana_contemporánea_las_óperas_primas_
de_Daniel_Sada_y_Juan_Villoro Último acesso em: 11.07.2016
LEZAMA LIMA, José. Imagem da América Latina. Trad. Luiz João Gaio. In:
FERNÁNDEZ MORENO, César. (Introdução e coordenação). América Latina
em sua literatura. São Paulo: Editora Perspectiva, 1979.
LIMA, Luiz Costa. Teoria da Cultura de Massa. São Paulo: Paz e Terra, 2011.
LINK, Daniel. (compilador) El juego de los cautos: Literatura policial de Edgar
A. Poe a P.D. James. Buenos Aires: Editora La Marca, 2003.
277
LLANES GARCÍA, Manuel de Jesús. Idea de Hispanoamérica en la obra de
Juan Villoro. Publicada en la Revista Catoblepas, no. 139 en septiembre de
2013. Disponível em: http://www.nodulo.org/ec/2013/n139p01.htm Último acesso
em: 12.112.2013.
LÓPEZ, Alij Aquetza Anaya. Lo popular urbano y sus expresiones en la
narrativa breve: oralidad y abyección en Ni farra ni vieja ni sombreros de charro
de Juan Maya Nóesis. Publicada en la Revista de Ciencias Sociales y
Humanidades, vol. 20, núm. 40, agosto-diciembre, 2011, pp. 168-191, Instituto
de Ciencias Sociales y Administración México. Disponível em:
http://www.redalyc.org/pdf/859/85921351010.pdf Último acesso em: 09.10.2013.
LUDMER, Josefina. Literaturas post-autónomas. Publicado na Ciberletras - Revista de crítica literaria y de cultura, n. 17, julho de 2007. Disponível em: http://www.lehman.cuny.edu/ciberletras/v17/ludmer.htm Acesso em: 10/03/2015. ________. Literaturas post-autónomas: otro estado de la escritura. Publicado Revista Dossier, 17, 2014. Disponível em: http://www.revistadossier.cl/literaturas-postautonomas-otro-estado-de-la-escritura/ Último acesso em: 24.04.2016. MAGRI, Ieda. Literatura e autonomia: uma leitura a partir do posicionamento de
Roberto Bolaño. Publicado Revista Landa, Vol. 1, No. 2, 2013. Disponível em:
https://www.academia.edu/9809122/Literatura_e_autonomia?auto=download Último
acesso em: 24.04.2016.
MANCINI, Pablo. Crónica: trabajar sobre la experimentación. Publicado en
Revista Mexicana de Comunicación, en 21 de octubre de 2013. Disponível em: http://mexicanadecomunicacion.com.mx/rmc/2013/10/14/cronica-trabajar-sobre-la-
experimentacion/ Último acesso em: 24.03.2017.
MEJÍA MADRID, Fabrizio. ¿Piedra o polvo? Escenas del consumo de a pie. Publicada en Letras Libres, septiempre de 2005. Disponível em: http://www.letraslibres.com/revista/convivio/piedra-o-polvo-escenas-del-consumo-de-
pie?page=full Último acesso em: 07.12.2015. MERTON, Robert K., LAZARSFELD, Paul F. Comunicação de massa, gosto popular e a organização da ação social. In: LIMA, Luis Costa. Teoria da cultura de massa. 8ª ed. São Paulo: Paz & Terra, 2011, pp. 117-148. MEYER, Jean. La Cristiada. México: Fondo de Cultura Mexicana, 2008. MONSIVÁIS, Carlos. Apocalipstick. México: Editorial Debate, 2011. __________. Aires de familia. Cultura y sociedad en América Latina. Barcelona: Editorial Anagrama, 2000.
278
_________. El 68: las ceremonias del agravio y la memoria. En Julio Scherer García y Carlos Monsiváis, Parte de guerra. Tlatelolco 1968. México: Aguilar, 1999: 119–264. ___________.De las relaciones literarias entre ‘alta cultura’ y ‘cultura popular’. Texto Crítico, vol. 11, núm. 33, Xalapa, Veracruz, México, Septiembre- Diciembre de 1985, pp. 46-61. ___________. Apocalipsis y utopías. Publicado em: La Jornada Semanal, nueva época, núm. 213, abril 4 de 1999, pp. 3-5. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/1999/04/04/sem-monsi.html Último acesso em:13.12.2015 __________. Duración de la eternidad. Publicada em: Nexos, núm. 172, abril de 1992, pp. 37-45. Disponível em: http://www.nexos.com.mx/?p=6474 Último acesso: 07.12. 2015. __________. La tarde en que murió el Distrito Federal” (Impresiones). Eros. Tu Yo Es El Mundo, vol. I, núm 1, julio de 1975, pp. 26, 139. __________. Los espacios de las masas”. México a fines de siglo, tomo 1. Compilación de José Joaquín Blanco y José Woldenberg. México, CONACULTA/FCE, 1993, pp. 267-308. __________. México, ciudad del apocalipsis a plazos, en Marina Heck, compiladora, Grandes metrópolis de América, Fundação Memorial da América-Fondo de Cultura Económica, São Paulo, 1993. MONTES, Alicia. La riqueza de la pobreza: una estética de lo disponible. Las crónicas de Carlos Monsiváis y la mirada doble en torno a la cultura popular. En Actas V Congreso Internacional Orbis Tertius de Teoría y Crítica Literaria. La Plata. Agosto, 2003. Disponível em: www.memoria.fahce.unlp.edu.ar/trab_eventos/ev.30/ev.30.pdf Último acesso em: 16.03.2015. MORALES, Héctor Alfonso. La reseña de un “Tiempo Transcurrido”. Publicado em: Periodista sin pluma, em 22.08.2009. Disponível em: http://periodistasinpluma.blogspot.com.br/2009/06/la-resena-de-un-tiempo-
transcurrido.html Último acesso em: 15.12.2014 MORAÑA, Mabel. & PRADO, Sánchez Ignacio. El arte de la ironía: Carlos Monsiváis ante la crítica. México: Ediciones Era, 2007. ________. El culturalismo de Carlos Monsiváis: ideología y carnavalización en tiempos globales. In: MORAÑA, Mabel. & PRADO, Sánchez Ignacio. El arte de la ironía: Carlos Monsiváis ante la crítica. México: Ediciones Era, 2007. MOREIRA, João Paulo. Problemas da cultura de massas. Publicada na Revista Crítica de Ciências Sociais, no. 13, fevereiro de 1984. Disponível em: http://www.ces.uc.pt/publicacoes/rccs/artigos/13/_Joao%20Paulo%20Moreira%20-
279
%20Problemas%20da%20Cultura%20de%20Massas.pdf Último acesso em:03.03.2016. MUÑIZ-HUBERMAN, Angelina. El siglo del desencanto. México: Fondo de Cultura Económica. Lengua y Estudios Literarios, 2002. OLIVAL, Moema de Castro e Silva. O espaço da crítica II - Crônica: dimensão literária e implicações dialéticas. Goiânia, IGL: AGEPEL, 2002. OLIVEIRA, Aline Cristina de. Crônica: um gênero menor? Indagações acerca do texto lítero-jornalístico. Publicado no II Colóquio da Pós-graduação em Letras de 26 a 28 de maio de 2010. Disponível em: http://www.assis.unesp.br/Home/SitesInternos/ColoquiodeLetras/cadernoderesumos.p
df Último acesso em: 16.11.2016. ORTEGA Y GASSET, José. A rebelião das massas. Trad. Marylene Pinto Michael. São Paulo: Martins Fontes, 1987. PADRÓN, Leonardo. La crónica y sus afanes. Publicado em El Nacional de Venezuela em 24.03.2013. Disponível em:http://www.el-
nacional.com/siete_dias/cronica-afanes_0_158984167.htmlÚltimo acesso em: 12.07.2013 PADURA, Leonardo. Yo quisiera ser Paul Auster. Publicado en Cuba Debate en 7 de febrero de 2012. Disponível em: http://www.cubadebate.cu/noticias/2012/02/07/leonardo-padura-yo-quisiera-ser-paul-
auster/#.Vx71jtQrJdg Último acesso em:25.04.2016. PEREIRA, Helena Bonito Couto. Cultura de massa na ficção contemporânea.
Publicada na Revista Olho d´água, 2012. Disponível em: http://www.olhodagua.ibilce.unesp.br/index.php/Olhodagua/article/viewFile/66/80
Último acesso em: 25.01.2016.
PETERS, Michaela. ¿Apocalipsis o utopía? Contraposiciones de la cultura
popular en México en el marco del Bicentenario: Volpi y Monsiváis. Publicado
em: iMex. México Interdisciplinario. Interdisciplinary Mexico, año 2, n° 3,
invierno/winter 2012. Disponível em: http://www.imex-revista.download.php?
Último acesso: 20.03.2016.
PIGLIA, Ricardo. El lector y la lectura del escritor. La jornada semanal, n. 551,
septiembre, 2005. Disponível em: http://www.jornada.unam.mx/2005/09/25/sem-
carlos.html. Acesso em: 26.04.2015.
PIMENTEL, Ary. Nações e tribos de torcedores em três contos de narradores
argentinos. Publicado nos Anais do XIII Congresso Internacional ABRALIC,
2013. Disponível em: http://www.abralic.org.br/anais/arquivos/2013_1434328766.pdf
Último acesso: 07.05.2015.
PINHEIRO, Tiago Guilherme. O próprio, a propriedade e o apropriado:
variações em torno da ideia de “Literaturas pós-autônomas” de Josefina
280
Ludmer. Publicada Revista Landa, VOL. 1, nº2 2013. Disponível em:
http://www.revistalanda.ufsc.br/Edicoes/v1ed2-2013.html Último acesso em:
24.04.2016.
POBLETE, Juan. Crónica y ciudadanía en tiempos de globalización neoliberal: la escritura callejera. In: FALBO, Graciela. (ed). Tras las huellas de una escritura en tránsito. La crónica contemporánea en América Latina (pp. 71-88). La Plata: Al Margen, 2007. PUERTA MOLINA, Andrés Alexander. La crónica latino-americana actual: lo maravilloso real. Análisis del periodismo narrativo de Alberto Salcedo Ramos. 2016. 530f. Tese de Doctorado. Facultad de Filosofía y Letras. Universidad Autónoma de Madrid, 2016. Disponível em: Tesis Salcedo https://repositorio.uam.es/bitstream/handle/10486/673229/puerta_molina_andres_alex
ander.pdf?sequence=1 Último acesso em: 01.05.2017. QUEIROZ, Thiago Bittencourt. Uma defesa do cânone literário por dos apocalípticos. Publicada em Repositórios UFPE, Vol.26, no.1, janeiro de 2013. Disponível em: http://www.repositorios.ufpe.br/revistas/index.php/INV/article/download/375/316. Último acesso em: 11.07.2016. RAMÍREZ PARRA, Patricia. Sentir postmoderno o la puerta de entrada para el
neoliberalismo. In: Reflexión Política. Ano. 3, nº6. Universidad Autónoma de
Bucaramanga. Colombia. Dezembro de 2001, p. 1-12. Disponível em: http://revistas.unab.edu.co/index.php?journal=reflexion&page=article&op=viewArticle&
path%5B%5D=825. Acesso em: 19.04.2015.
RODRÍGUEZ MARCOS, Javier. ¿El boom de la crónica latinoamericana? Diario El País, 18 fev. 2012. Disponível em: http://blogs.elpais.com/papeles-
perdidos/2012/02/el-boom-de-la-cronica-latinoamericana.html Último acesso em: 28.08.2015. SÁ, Jorge de. A crônica. São Paulo: Ática, 2001. SANTOS, Joaquim Ferreira dos (org.). As cem melhores crônicas brasileiras. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007. SARAMAGO, José. Sobre literatura, compromisso e transformação social. Colóquio em Málaga, publicado originalmente na Revista Quimera, em 18.05.2010. Disponível em: https://www.josesaramago.org/sobre-literatura-
compromisso-e-transformacao-social/ Último acesso em: 31.12.2016. SARLO, Beatriz. Siete ensayos sobre Walter Benjamin. Buenos Aires, FCE, 2000. _________. Literatura y política. Punto de Vista, vol. 6, núm. 19, diciembre de 1983, pp. 8-11.
281
SCHMIDT, Bettina E. Teorías culturais pós-modernas de Latinoamérica. Publicado na Revista Indiana em 2002. Disponível em: http://www.iai.spk-
berlin.de/fileadmin/dokumentenbibliothek/Indiana/Indiana_19_20/02schmidt.pdf Último acesso em: 19.02.2016. SCHNEIDER, Luis Mario. El estridentismo. México 1921-1927. Introducción. México: UNAM, 1985. Disponível em: http://www.revistaiberoamericana.pitt.edu/ojs/index.../2941Último acesso em: 19.08.2012. SCHWARTZ, Jorge. Vanguardas latino-americanas: polêmicas, manifestos e textos críticos. São Paulo: Editora Iluminuras, 1995. SCHILLER, F. A educação estética do homem. Tradução de Roberto Schwarz e Marcio Suzuki, São Paulo: Iluminuras, 2002. SIGNORELLI, Amalia. Cultura popular y cultura de masas: notas para debate. Publicado en: Estudios sobre las culturas contemporáneas, año/vol I, número 002, México, 1987. pp. 109-122. Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=31610205 Último acesso em: 31.12.2016. STIERLE, Karlheinz. A ficção. Tradução. Luiz Costa Lima. Rio de Janeiro:
Caetés, 2006.
SUBIRATS, Eduardo. Da vanguarda ao pós-moderno. Tradução. Luiz Carlos Deher, Adélia Bezerra de Meneses e Beatriz A. Cannabrava. São Paulo: Nobel. 1987.
T. MOREIRA, Terezinha. Estética, ética e literatura. Publicado em Caderno Cespuc, Belo Horizonte, 2002. Disponível em: http://periodicos.pucminas.br/index.php/cadernoscespuc/article/view/8111 Último acesso: 01.04.2017. VALDÉS SAMPEDRO, Octavio. El rock y la modernidad: hacia una nueva experiencia. Publicada en La Colmeia, no. 61/62 de 2009. Disponível em: http://web.uaemex.mx/plin/colmena/Colmena%2061-62/Aguijon/OVS.html Último acesso em: 12.02.2017.
VANDEBOSCH, Dagmar. Escritores hispanoamericanos en España. Publicado en Aleph, No. 25, 2012. Disponível em: https://lirias.kuleuven.be/bitstream/123456789/287480/2/ALEPH+25-
+Escritores+hispanoamericanos+en+Espana.pdf Último acesso em: 19.11.2016
VARGAS LLOSA. Mario. La civilización del espectáculo. Ecuador: Alfaguara,
2012.
VEGA ZARAGOZA, Guillermo. Juan Villoro – Nuevo corte de caja. Publicado
em: Nueva Época-Revista de la Universidad de México, número 114, agosto
2013. Disponível em: http://www.revistadelauniversidad.unam.mx/articulo.php?publicacion=21&art=698&sec
=Columnistas Último acesso em: 21.03.2016.
282
VILAS, Manuel. Juan Villoro y los terremotos reales. In: RUISÁNCHEZ, José
Ramón. & ZAVALA, Oswaldo. (Compilación) Materias dispuestas: Juan Villoro
ante la crítica. Barcelona, Editorial Candaya, 2011, pp. 140-144.
VILLARRUEL OVIEDO, Antonio. Ciudad y derrota: memoria urbana liminar en
la narrativa hispano-americana. Ecuador: Ediciones Abya-Yala. FLACSO,
2011.
VILLENA, Francisco. La posmodernidad como problemática en la teoría cultural latinoamericana. Publicada em 2005. Disponível em: https://pendientedemigracion.ucm.es/info/especulo/numero30/posmolat.html Último acesso em:18.02.2016.
WALKER, Carlos. Juan Villoro: miradas del ensayo. Publicado en el VII
Congreso Internacional Orbis Tertius de Teoría y Crítica Literaria en 2009.
Disponível em:
http://www.memoria.fahce.unlp.edu.ar/trab_eventos/ev.3631/ev.3631.pdf Último
acesso em 27.03.2016.
WINN, Peter. A Revolução Chilena. Trad. Magda Lopes. São Paulo: Editora
UNESP, 2010.
YÚDICE, George. A conveniência da cultura: usos da cultura na era global.
Tradução Marie-Anne Kremer. 2.ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2013.
ZAIDAN, Junia Claudia Santana de Mattos Mattos. SOARES, Luis Eustáquio.
AMARAL, Sérgio da Fonseca. Marxismo e Modernismo em época de literatura
pós-autônoma. Vitória: Editora Aquarius, 2015.
ZAMORA PARKINSON, Lois. Narrar el apocalipsis: la visión histórica en la literatura estadunidense y latinoamericana contemporánea. México: Fondo de Cultura Económica, 1994. ZÁRATE, Julio. 8.8 o la crónica de un instante caótico, de Juan Villoro. Publicado en los Anales de la Literatura Hispanoamerica, Vol. 42, 2013. Disponível em: https://revistas.ucm.es/index.php/ALHI/article/view/43035/40844 Último acesso em: 20.02.2016. ŽIŽEK, Slavoj. Primeiro como tragédia, depois como farsa. Tradução Maria
Beatriz de Medina. São Paulo: Boitempo, 2011.
ZIMMERMAN, Mario A. (director) La crónica latino-americana como espacio de
resistencia al periodismo hegemónico. Proyecto de la Universidad Nacional de
La Matanza, 2010-2011: Argentina. Disponível em:
http://humanidades.unlam.edu.ar/descargas/4_A145.pdf Último acesso em:
07.02.2016.
283
VÍDEOS CONSULTADOS:
DISCUTAMOS MÉXICO. Ensayo y crónica. Programa conmemorativo del bicentenario de independencia, 2010. Programa no. 81 – (Canal once IPN). Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=0pslKmd7zGg Último acesso: 10.02.2016. VILLORO, Juan. Ciudad de México y cultura mexicana. Una mirada contemporánea. Producción de Eliseo Álvarez. Publicado em 27.10.2011. Disponível em: http://refletor.tal.tv/noticias/america-latina/argentina/ciudad-de-
mexico-y-cultura-mexicana-una-mirada-contemporanea-por-juan-villoro-3 Último acesso: 25.11.2013. _________. Juan Villoro. La obra de Jorge Ibargüengoitia. Programa Café de nadie. Publicado em 14 de março de 2014. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=2T6sfxIztkA Último acesso em 18.04.2017.
284
ANEXO I
FRIERA, Silvina. Cuando la letra se convierte en acción. Publicado en Página
12 en 03 de diciembre de 2014. Disponível em:
https://www.pagina12.com.ar/diario/suplementos/espectaculos/17-34140-2014-
12-03.html Último acesso em: 10.02.2017.
Ilustração de Francisco Lagos em LA RAZÓN. ¿Por que te ríes Juan Villoro?
Publicado en 27 de enero de 2017. Disponível em:
http://razon.mx/spip.php?article239716 Último acesso em 02.02.2017.
285
ANEXO II
286
287
288
289
ANEXO III
290
291
292
293