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1 UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GENÉTICA E TOXICOLOGIA APLICADA HOMOCISTEÍNA EM PACIENTES COM DOENÇA DE PARKINSON: FATORES DETERMINANTES DE SUA CONCENTRAÇÃO PLASMÁTICA Dissertação para obtenção do Título de Mestre em Genética e Toxicologia Aplicada ELISEU FELIPPE DOS SANTOS Orientador: Prof. Dr. Moacir Wajner CANOAS 2007

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    UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM GENTICA E TOXICOLOGIA

    APLICADA

    HOMOCISTENA EM PACIENTES COM DOENA DE PARKINSON:

    FATORES DETERMINANTES DE SUA CONCENTRAO PLASMTICA

    Dissertao para obteno do Ttulo de Mestre em Gentica e Toxicologia Aplicada

    ELISEU FELIPPE DOS SANTOS

    Orientador: Prof. Dr. Moacir Wajner

    CANOAS 2007

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  • 2

    Este trabalho foi desenvolvido nas instalaes do Laboratrio de Erros Inatos do Metabolismo da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA), sendo financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (CNPq) e ULBRA.

  • 3

    Dedico este trabalho a minha querida

    esposa e amiga Denise, que sempre me

    incentivou e apoiou em minhas escolhas.

  • 4

    AGRADECIMENTOS

    Os teus olhos me viram como substncia ainda informe, e no teu livro

    foram escritos todos os meus dias, cada um deles escrito e determinado,

    quando nenhum deles havia ainda.

    Salmo 139:16

    Agradeo a Deus por tudo que sou e pelo que aprendi e aprenderei ao longo

    da vida.

    Agradeo a minha Famlia de sangue e de f.

    Ao Magnfico Reitor Ruben Eugen Becker, que com a coragem,

    espiritualidade, sabedoria e discernimento conduz brilhantemente a Universidade

    Luterana do Brasil.

    Na pessoa da Prof. Dr. Heloisa Helena Rodrigues de Andrade,

    Coordenadora do Programa de Ps-Graduao em Gentica e Toxicologia

    Aplicada, agradeo a todos os queridos professores, que no foram somente

    mestres, mas muito mais que isso, foram e continuam sendo amigos especiais.

    A todos os colegas da Gentica e Toxicologia Aplicada pelo convvio

    respeitoso e amigvel.

    A gentil e atenciosa Srt. Fernanda Kieling Moreira, secretria do curso de

    Ps-Graduao em Gentica e Toxicologia Aplicada.

    Ao querido amigo Alexandre Gomes de Melo, pelo apoio e grande ajuda.

    Ao querido amigo, deixo de lado todos seus ttulos para cham-lo apenas de

    amigo: simptico, acolhedor, orientador, protetor, benigno, companheiro, e colega

    da nossa querida ATM 73 FMUFRGS Prof. Dr. Moacir Wajner.

  • 5

    SUMRIO

    LISTA DE ABREVIATURAS

    LISTA DE FIGURAS

    LISTA DE TABELAS

    1. INTRODUO 19

    1.1 DOENA DE PARKINSON 19

    1.2 FATORES DE RISCO DA DOENA DE PARKINSON 21

    1.3 MANIFESTAES CLNICAS 24

    1.4 ETIOLOGIA (CAUSAS GENTICAS E AMBIENTAIS) 24

    1.4.1 Radicais Livres 24

    1.4.2 Estresse Oxidativo 25

    1.4.3 Disfuno Mitocndrial 25

    1.5 ACHADOS NEUROPATOLGICOS 26

    1.5.1 Corpos de Lewy 27

    1.5.2 Dopamina 28

    1.6 TRATAMENTO 30

    1.6.1 Levopoda 30

    1.6.2 Carbipoda / Levopoda 31

    1.6.3 Agonistas da Dopamina 31

    1.6.4 Inibidores de MAO B 32

    1.6.5 Inibidores da COMT 32

    1.6.6 Amandatina 33

    1.6.7 Anticolinrgicos 33

    1.7 HOMOCISTENA 33

    1.7.1 Metabolismo da Homocistena 35

    1.7.2 Hiperhomocisteinemia 37

    1.7.3 Homocistena e doenas Neurolgicas 39

    1.8 CIDO FLICO 41

    1.8.1 Metabolismo do cido Flico 44

    1.8.2 cido Flico e Neurodegenerao 48

  • 6

    1.9 VITAMINA B 12 49

    1.9.1 Metabolismo da Vitamina B12 50

    1.9.2 Deficincia de Vitamina B12 e Neurodegenerao 53

    2. OBJETIVOS 55

    2.1 GERAL 55

    2.2 ESPECFICOS 55

    3. MATERIAL E MTODOS 56

    3.1 MATERIAL 56

    3.2 MTODOS 57

    3.2.1 Determinao dos nveis plasmticos de Homocistena (Hcy) 57

    3.2.2 Determinao dos nveis sricos cido flico, Vitamina B12, Uria,

    Creatinina e cido rico 58

    3.3 ANLISE ESTATSTICA 60

    3.4 ASPECTOS TICOS 61

    4. RESULTADOS 62

    4.1 Caracterizao da amostra (controles e pacientes com doena de Parkinson)

    quanto idade, sexo, estado civil, hipertenso arterial sistmica, cardiopatia

    isqumica, diabete mlito, insuficincia renal, uso de tabaco e bebidas alcolicas

    62

    4.2 Comparao entre as concentraes sricas de homocistena, vitamina B12,

    cido flico, uria, creatinina, cido rico e a idade em pacientes com a doena

    de Parkinson em controles normais 63

    4.3 Influncia do sexo e do uso de bebidas alcolicas sobre as concentraes

    sricas de homocistena, vitamina B12, cido flico, uria, creatinina e cido rico

    em pacientes com a doena de Parkinson e em controles normais 68

    4.4. Influncia da hipertenso arterial sistmica, diabete mlito e uso de tabaco

    sobre as concentraes sricas de homocistena, vitamina B12, cido flico, uria,

    creatinina e cido rico em pacientes com a doena de Parkinson e em controles

    normais 72

  • 7

    4.5. Influncia dos nveis sricos de cido flico sobre os nveis plasmticos de

    homocistena em pacientes com doena de Parkinson e em indivduos normais 80

    4.6 Influncia dos nveis sricos de homocistena sobre os nveis de cido flico,

    vitamina B12, uria, creatinina e cido rico, bem como sobre a idade em

    pacientes com doena de Parkinson 81

    4.7 Influncia do uso de L-dopa sobre os nveis plasmticos de homocistena,

    cido flico e vitamina B12 em pacientes com doena de Parkinson 82

    4.8 Influncia do tempo de durao da doena sobre as concentraes

    plasmticas de homocistena, vitamina B12, cido flico, uria, creatinina e cido

    rico em pacientes com doena de Parkinson 83

    4.9 Correlao entre as concentraes sricas de homocistena com as de

    vitamina B12, cido flico, uria, creatinina, cido rico, bem como com a idade, o

    peso, a altura, o ndice de massa corporal em pacientes com a doena de

    Parkinson e em controles normais 84

    5. DISCUSSO 93

    6. CONCLUSES 101

    REFERNCIAS 103

    ANEXO I 114

    ANEXO II 119

  • 8

    LISTA DE ABREVIATURAS

    -CBT -Cetobutirato

    AA Aminocidos

    Ado B12 5Desoxiadenosil-Cobalamina

    AG cidos Graxos

    ATP Adenosina Trifosfato

    AVC Acidente Vascular Cerebral

    B2 Vitamina B2

    B6 Vitamina B6

    B9 Vitamina B9

    B12 Vitamina B12

    BHMT Homocistena Betana Metil Transferase

    C677T Mutao da Enzima MTHFR (Metilenetetrahidrofolato redutase)

    Cbl Cianocobalamina

    CBS Cistationina Sintase

    CH3THF Metiltetrahidrofolato

    CIS Cistena

    CL Corpos de Lewy

    COMP Catecol-o-metiltransferase

    CoQ10 Coenzima Q10

    Cu Cobre

    CYS Cistationina

    DA Doena de Alzheimer

    DCL Demncia com Corpos de Lewy

    DHFR Dihidrofolato Redutase

    DNA cido Desoxirribonuclico

    DOPAC cido Dihidroxifenilactico

    DP Doena de Parkinson

    DTMP Timidinamonofosfato

  • 9

    DTN Defeito do Tubo Neural

    DTT Ditiotreitol

    DUMP Deoxiuridinamonofosfato

    EDTA cido Etileno-Diamino-Tetra-Actico

    FI Fator Intrinseco

    GHS Glutatio Reduzido

    GLI Glicina

    H2O gua

    H2O2 Perxido de Hidrognio

    HAS Hipertenso Arterial Sistmica

    HCY Homocistena

    Hg Mercrio

    HHCY Hiperhomocistenemia

    HIV Vrus da Imunodefincia Humana

    HVA cido Homovanlico

    LCR Lquido Cefaloraquidiano

    L-Dopa Levodopa

    MAO Monoamidoxidase

    MAO-B Monoaminoxidase B

    Met Metionina

    Metila-B12 Metilcobalamina

    MMA cido Metilmalnico

    Mn Mangans

    MPP+ 1 Metil-4-Fenilpiridina

    MPTP 1 Metil 4 Fenil 1, 2, 3, 6 Tetrahidropiridina

    MS Metionina Sintase

    MTH Metiltetrahidrofolato

    MTHFR Metilenetetrahidrofolato Redutase

    NAD+ Nicotinamida Adenina Nucleotdeo (Forma Oxidada)

    NADH Nicotinamida Adenina Nucleotdeo

    NADPH Nicotinamida Adenina Nucleotdeo Fosfato

  • 10

    O2 - Radical Superxido

    OH - Radical Hidroxila

    P5P Piridoxal 5Fosfato

    R5P Riboflavina 5Fosfato

    RL Radical Livre

    RNA cido Ribonuclico

    SAH S-Adenosilhomocistena

    SAM S-Adenosilmetionina

    SER Serina

    SNC Sistema Nervoso Central

    THF ou FH4 Tetrahidrofolato

  • 11

    LISTA DE FIGURAS

    Figura I.1. Sistema Dopaminrgico no Crebro Humano 21

    Figura I.2. Principais Vias do Metabolismo da Dopamina no Crebro 28

    Figura I.3. Biosntese das Catecolaminas 29

    Figura I.4. Aminocidos Sulfurosos e suas Estruturas Qumicas 34

    Figura I.5. Metabolismo da Homocistena. SAM, S-Adenosil Metionina; SAH, S-

    Adenosilhomocistena; HCY, Homocistena; Met, Metionina; Gly, Glicina, THF,

    Tetrahidrofolato, MTHF, 5 Metiltetrahidrofolato; GSH, Glutatio Reduzido 36

    Figura I.6. Estrutura Qumica do cido Flico 42

    Figura I.7. Reduo do Folato (F) a Dihidrofolato (FH2) e, em seguida, a

    Tetrahidrofolato (FH4), pela Enzima Dihidrofolato-redutase (DHFR) 44

    Figura I.8. Absoro e ativao do Folato no Intestino 45

    Figura I.9. Transferncia do grupo metila com a participao do Folato 47

    Figura I.10. Metabolismo da metionina com a participao do cido Flico 48

    Figura I.11. Estrutura da Vitamina B12 49

    Figura I.12. Participao da Vitamina B12 no Metabolismo do Folato 51

    Figura I.13. Formao de Sucinil-CoA 52

    Figura IV.1. Nveis plasmticos de Homocistena (Hcy) em controles saudveis e

    pacientes com doena de Parkinson(DP) 68

    Figura IV.2. Relao entre as concentraes plasmticas de Homocistena e a

    idade dos pacientes com doena de Parkinson 85

    Figura IV.3. Relao entre as concentraes plasmticas de Homocistena e os

    nveis sricos de cido rico em pacientes com doena de Parkinson 86

    Figura IV.4. Relao entre as concentraes plasmticas de Homocistena e os

    nveis sricos de cido Flico em pacientes com doena de Parkinson 87

    Figura IV.5. Relao entre as concentraes plasmticas de Homocistena e os

    nveis sricos de Vitamina B12 em controles normais 88

  • 12

    LISTA DE TABELAS

    Tabela I.1. Doses Recomendadas de Folato 44

    Tabela IV.1. Caracterizao da amostra estudada (Controles e Pacientes) quanto

    ao Sexo 64

    Tabela IV 2. Caracterizao da amostra estudada (Controles e Pacientes) quanto

    Raa 64

    Tabela IV 3. Caracterizao da amostra estudada (Controles e Pacientes) quanto

    ao Estado Civil 64

    Tabela IV 4. Caracterizao da amostra estudada (Controles e Pacientes) quanto

    Hipertenso Arterial Sistmica (HAS) 65

    Tabela IV 5. Caracterizao da amostra estudada (Controles e Pacientes) quanto

    a Cardiopatia Isqumica 65

    Tabela IV 6. Caracterizao da amostra estudada (Controles e Pacientes) quanto

    Diabete Mlito 65

    Tabela IV 7. Caracterizao da amostra estudada (Controles e Pacientes) quanto

    ao uso de Tabaco 66

    Tabela IV 8. Caracterizao da amostra estudada (Controles e Pacientes) quanto

    ao uso do lcool 66

    Tabela IV 9. Comparao entre as concentraes sricas de Homocistena,

    Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina, cido rico e idade em pacientes

    com doena Parkinson e controles normais 67

    Tabela IV 10. Influncia do sexo sobre os nveis plasmticos da Homocistena,

    Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina, cido rico e a idade em pacientes

    com doena de Parkinson 69

    Tabela IV 11. Influncia do sexo sobre os nveis plasmticos da Homocistena,

    Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina, cido rico e a idade em controles

    normais 70

    Tabela IV 12. Influncia do uso de bebidas alcolicas sobre os nveis plasmticos

    da Homocistena, Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina, cido rico e a

    idade em pacientes com doena de Parkinson 71

  • 13

    Tabela IV 13. Influncia do uso de bebidas alcolicas sobre os nveis plasmticos

    da Homocistena, Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina, cido rico e a

    idade em controles normais 72

    Tabela IV 14. Influncia da Hipertenso Arterial Sistmica (HAS) sobre os nveis

    Sanguneos de Homocistena, Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina,

    cido rico e a idade em pacientes com doena de Parkinson 74

    Tabela IV 15. Influncia da Hiperteno Arterial Sistmica (HAS) sobre os nveis

    plasmticos da Homocistena, Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina,

    cido rico e a idade em controles normais 75

    Tabela IV 16. Influncia da Diabete Mlito sobre os nveis plasmticos da

    Homocistena, Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina, cido rico e a

    idade em pacientes com doena de Parkinson 76

    Tabela IV 17. Influncia da Diabete Mlito sobre os nveis plasmticos da

    Homocistena, Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina, cido rico e a

    idade em controles normais 77

    Tabela IV 18. Influncia do fumo sobre os nveis plasmticos da Homocistena,

    Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina, cido rico e a idade em controles

    normais 78

    Tabela IV 19. Influncia do fumo sobre os nveis plasmticos da Homocistena,

    Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina, cido rico e a idade em pacientes

    com doena de Parkinson 79

    Tabela IV 20. Comparao entre os nveis plasmticos de Homocistena em

    pacientes com doena de Parkinson e controles normais com concentraes

    sricas de cido Flico inferiores ou superiores a 13 ng/mL 81

    Tabela IV 21. Efeitos dos nveis plasmticos de Homocistena sobre as

    concentraes sricas de cido Flico, Vitamina B12, Uria, Creatinina, cido

    rico e a idade dos pacientes com doena de Parkinson 82

    Tabela IV 22. Influncia do uso de L-DOPA sobre os nveis plasmticos de

    Homocistena, Vitamina B12 e cido Flico em pacientes com doena de

    Parkinson 83

  • 14

    Tabela IV 23. Influncia do tempo de durao da doena sobre as concentraes

    plasmticas de Homocistena, Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina e

    cido rico em pacientes com doena de Parkinson 89

    Tabela IV 24. Correlao entre as concentraes sanguneas de Homocistena (

    mol/L) com as de Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina, cido rico, bem

    como a idade em pacientes com doena de Parkinson 90

    Tabela IV 25. Correlao entre as concentraes plasmticas de Homocistena

    (mol/L) com as de Vitamina B12, cido Flico, Uria, Creatinina e cido rico,

    bem como a idade em controles normais 91

    Tabela IV 26. Regresso mltipla entre os nveis plasmticos de Homocistena

    (varivel dependente) com a idade e as concentraes sricas de Vitamina B12 e

    cido Flico (variveis independentes) em controles normais 92

    Tabela IV 27. Regresso mltipla entre os nveis plasmticos de homocistena

    (varivel dependente) com a idade e as concentraes sricas de vitamina B12 e

    cido flico (variveis independentes) em pacientes com doena de Parkinson

    92

  • 15

    RESUMO

    A doena de Parkinson (DP) uma doena neurolgica de etiologia

    multifatorial. caracterizada por degenerao progressiva dos neurnios

    dopaminrgicos da substncia nigra caracterizados pelo alto contedo de

    dopamina. A doena somente se manifesta quando h perda (morte) de 75%

    destes neurnios. Vrios fatores adquiridos, tais como exposio ambiental a

    pesticidas, metais e hidrocarbonetos, disfuno mitocondrial, alteraes

    relacionadas com a sntese, transporte e metabolismo da dopamina e a formao

    de radicais livres parecem estar envolvidos com o dano e morte dos neurnios da

    substncia nigra na DP. Mutaes no gene da alfa-sinuclena podem tambm ser

    encontradas em uma parcela de afetados pela DP. Tendo em vista que alguns

    trabalhos da literatura mostraram que o aminocido homocistena (Hcy)

    apresenta-se com concentraes elevadas no sangue de pacientes com DP, o

    presente trabalho visou verificar os nveis plasmticos no somente de Hcy, mas

    tambm de vitamina B12 e cido flico, e determinar os fatores envolvidos com as

    alteraes destes nveis, como o fumo, lcool, hipertenso arterial sistmica,

    diabete mlito, cardiopatia isqumica, ingesto de L-DOPA, durao da doena e

    outros. Enfatize-se que as associaes verificadas at agora entre os nveis de

    Hcy no plasma de pacientes afetados por DP ainda no esto bem esclarecidas e

    no estabeleceram se a Hcy fator causador da disfuno neurolgica ou apenas

    um marcador dessa doena decorrente de alteraes de outros fatores.

    Verificamos inicialmente que a Hcy estava aumentada em cerca de 30 % nos

    afetados por DP, relativamente aos controles da mesma idade, sem qualquer

    alterao nos nveis sricos de vitamina B12, cido flico, uria, creatinina e cido

    rico. Verificamos tambm que o uso de fumo estava associado com uma

    deficincia de cido flico nestes pacientes e nos controles normais e, que a

    deficincia desta vitamina estava inversamente associada ao aumento dos nveis

    de Hcy. Os nveis plasmticos de Hcy estavam tambm inversamente

    correlacionados com os de vitamina B12 e positivamente com a idade nos

    pacientes com DP. J nos controles, a nica correlao significantiva foi dos

  • 16

    nveis de Hcy com os de vitamina B12 de forma inversa. Verificamos ainda

    atravs de regresso mltipla que nos pacientes com DP o maior determinante

    dos nveis plasmticos de Hcy foram os nveis de cido flico, enquanto que nos

    controles normais foram os de vitamina B12. Alm disso, na comparao entre

    pacientes e controles, a diferena dos nveis plasmticos de Hcy entre esses dois

    grupos se acentuava (esses nveis aumentavam mais ainda nos pacientes)

    quando os nveis de cido flico eram mais baixos. Observamos tambm em

    nosso estudo que o uso de lcool, a diabete mlito, a hipertenso arterial

    sistmica, a cardiopatia isqumica, o sexo, o uso de L-DOPA e a durao da

    doena no alteraram os nveis plasmticos de Hcy, cido flico e vitamina B12

    nos pacientes. Desta forma, tendo em vista os efeitos deletrios da Hcy sobre o

    sistema nervoso central, preconiza-se que nos pacientes com DP seja

    administrado cido flico para que os nveis de Hcy se normalizem, deixando de

    ser um possvel agente neurotxico que juntamente com outros determinam uma

    pior evoluo da doena.

  • 17

    ABSTRACT

    Parkinsons disease (PD) is a neurological disorder of multifactorial etiology.

    It is characterized by progressive degeneration of dopaminergic neurons of the

    substantia nigra, which contains high amounts of dopamine. The disease is

    clinically manifested when 75 % or more of these neurons are lost. Various

    acquired factors, such as environmental exposure to pesticides, metals and

    hydrocarbonides, mitochondrial dysfunction, deficient synthesis, transport or

    metabolism of dopamine and free radical generation are involved in the damage

    and death of substantia nigra neurons. Mutations in the alpha-sinuclein gene may

    also be found in affectted patients with PD. Since some reports have shown that

    the blood concentrations of the amino acid homocysteine (Hcy) are increased in

    patients with PD, the present work aimed to measure the plasma levels of Hcy, as

    well as vitamin B12 and folic acid, and to determine the factors involved in

    alteration of these levels, such as smoke, hypertension, diabetes mellitus,

    isquemic cardiopathy, L-DOPA and others. It should be emphasized that the

    associations observed so far between Hcy plasma levels in patients with PD did

    not establish whether Hcy causes neurological dysfunction or is a marker of this

    disorder due to other factors. We initially observed that plasma Hcy levels were

    increased at around 30 % in patients affected by PD compared to age matched

    controls, without modifications on serum concentrations of vitamin B12, folic acid,

    urea, creatinine and uric acid between these groups. We also verified that smoke

    was associated with a deficit of folic acid in PD patients and in controls and that

    deficiency of this vitamin was inversely correlated to the increase of Hcy levels.

    Plasma Hcy levels were also inversely correlated with those of vitamin B12 and

    positively correlated with the age of the patients. In controls, we found an inverse

    correlation between plasma Hcy levels and vitamin B12 concentrations. We also

    found that the major determinant of plasma Hcy levels in PD patients were folic

    acid, whereas in the controls was vitamin B12. Besides, the difference between

    plasma Hcy concentrations in PD patients and controls increased when serum

    folic acid concentrations were low. We also observed in our investigation that

    alcool, diabetes mellitus, hypertension, isquemic cardiopathy, sex, L-DOPA and

  • 18

    duration of the disease did not alter plasma Hcy, folic acid and vitamin B12 levels

    in the patients. Therefore, considering the deleterious effects of Hcy on the central

    nervous sytem, we postulate that folic acid should be supplemented to patients

    affected by PD in order to normalize plasma Hcy levels, therefore avoiding a

    possible neurotoxic agent that together with others determine a worse evolution of

    this disease.

  • 19

    1. INTRODUO

    1.1. Doena de Parkinson

    A doena de Parkinson (DP) uma doena neurolgica de etiologia

    multifatorial dependente da idade, bem como de fatores ambientais e genticos.

    Foi descrita pela primeira vez, em 1817, pelo mdico ingls James Parkinson.

    caracterizada por degenerao progressiva dos neurnios dopaminrgicos na

    substncia negra, causando perda da pigmentao da substncia. Os neurnios

    da substncia nigra contm quantidades altas de dopamina, sendo necessrio

    que ocorra aproximadamente uma perda de mais ou menos 75% da dopamina ou

    neurnios que contem dopamina, para que ocorram sintomas da DP. H uma

    perda de axnios, que partem desta regio e se projetam para o neoestriado. A

    leso da via dopaminrgica nigroestrial determina diminuio da transmisso

    dopaminrgica no corpo estriado, especialmente no putmen (MARJAMA-LYONS

    E SHOMON, 2003).

    Vrios fatores adquiridos so suspeitos de estarem envolvidos com a DP,

    tais como exposio ambiental a pesticidas, metais e hidrocarbonetos, disfuno

    mitocondrial, alteraes relacionadas com a sntese, transporte e metabolismo da

    dopamina e a formao de radicais livres (MOLACE et al. 2003; KLODOWSKA

    DUDA et al 2005).

    Em uma parcela de portadores de DP observa-se mutao no gene da

    alfa-sinuclena, o que acarreta alterao molecular da protena, fazendo com que

    haja agregaes anmalas entre protenas da mesma ou de outras classes.

    Conforme estudos, em alguns grupos familiares portadores de doena de

    Parkinson familial, pde-se observar uma importante mutao no gene da alfa-

    sinuclena. Esta protena atpica possui uma substituio de uma alanina e uma

    treonina na posio 53 (A53T). Uma hiptese proposta para explicar o surgimento

    dos Corpos de Lewy (CL) seria que essa alterao molecular predisporia a alfa-

    sinuclena a agregar-se entre outras protenas da mesma classe ou entre

  • 20

    protenas de outras classes (por exemplo: subunidades neurofibrilares)

    (POLYMEROPOULOS et al., 1997). No entanto, em outro estudo, Higuchi et al.

    (1998) avaliaram a presena dessa mutao (A53T) em 329 casos espordicos

    de doena de Parkinson (DP), Demncia com Corpos de Lewy (DCL) e doena de

    Alzheimer e sua presena no foi observada em nenhum dos casos, o que sugere

    o no envolvimento dessa mutao nessas doenas neurolgicas.

    O termo parkinsonismo se refere a qualquer condio de anormalidade de

    movimentos, com destruio dos neurnios dopaminrgicos, semelhantes DP.

    O parkinsonismo secundrio pode ser causado por vrias situaes, tais como

    acidente vascular cerebral, encefalite ou meningite. Outras doenas neuro

    degenerativas tais como a paralisia supranuclear progressiva, a degenerao

    corticoestriatal, podem tambm lesar esses neurnios dopaminrgicos, causando

    essa patologia. Medicaes tais como o haloperidol, metoclopramida, fenotiazina,

    pimozide, cinarizina, flunarizina, reserpina e alfametildopa so outras causas

    comuns de parkinsonismo secundrio. Substncias txicas (MPTP, Cu, Mn, Hg),

    acidentes vasculares, traumticos e tumores cerebrais tambm so causas de

    parkinsonismo secundrio. Causas menos freqentes de parkinsonismo

    secundrio incluem overdose de narcticos ou anestsicos utilizados em cirurgia,

    exposio a toxinas e envenenamento por monxido de carbono, quando esses

    agentes lesam os neurnios dopaminrgicos. O parkinsonismo secundrio

    causado por antipsicticos geralmente reversvel, mas aquele causado por

    toxinas, infeces, drogas ou outras doenas com dano cerebral podem no ser

    reversveis. Os sintomas de parkinsonismo incluem a rigidez de tronco, braos,

    pernas e regio facial, tremor fino, algumas formas de paralisia e anormalidades

    de movimentos. O parkinsonismo secundrio mais freqentemente se associa a

    dficit cognitivo resultando em demncia (HANG. et al, 2004)

    Em resumo, fatores ambientais, exposio a substncias txicas,

    alteraes genticas, alteraes hormonais e outros fatores tambm podem

    desencadear a DP. A figura I.1 mostra o sistema dopaminrgico no crebro

    humano, distinguindo a localizao da substncia nigra.

  • 21

    Figura I.1. Sistema Dopaminrgico no Crebro Humano

    1.2. Fatores de Risco da doena de Parkinson

    Sexo

    A DP afeta ambos os sexos, mas vrios estudos encontraram a DP com

    predominncia maior em homens. Na China, a DP ocorre trs vezes mais em

    homens do que em mulheres (MARJAMA-LYONS E SHOMON, 2003).

    Outro estudo envolvendo africanos, hispnicos e caucasianos demonstrou

    menor incidncia de DP em mulheres. Uma pesquisa mostrou um aumento de

    duas vezes mais DP em homens italianos do que em mulheres italianas

    (MARJAMA-LYONS E SHOMON, 2003).

    O hormnio estrgeno pode atuar como agente neuroprotetor das clulas

    dopamnicas do crebro, evitando a morte das mesmas.

    Fonte: DAVIS & GECK, 1974

  • 22

    Em mulheres portadoras de DP, observa-se menopausa precoce e baixa

    reposio hormonal ps-menopausa (HIRAYAMA, 2006).

    Idade

    O envelhecimento est associado ao aumento do risco de adquirir-se a DP.

    A incidncia da doena, para pessoas com idade inferior a 50 anos, de 10 por

    100.000, entretanto a incidncia aumenta para 200 por 100.000 em pessoas com

    idade entre 60 a 80 anos.

    Estima-se que 5% a 10% de pacientes com DP experimentaram os

    primeiros sintomas antes dos 45 anos e o pico da incidncia dos sintomas entre

    55 e 60 anos. O nmero de pessoas diagnosticadas com DP diminui depois dos

    80 anos, mostrando que no s o envelhecimento que leva DP (HIRAYAMA,

    2006).

    Etnia

    Estudos mostram que h uma prevalncia maior da DP na populao

    caucasiana, em torno de 100 a 300 casos por 100.000 pessoas na Amrica do

    Norte e Europa. Na sia e na frica a prevalncia menor, com 50 casos por

    100.000. Entretanto recentes estudos com imigrantes asiticos e africanos,

    residentes na Amrica do Norte, mostram uma prevalncia e incidncias

    semelhantes aos caucasianos americanos, mostrando a importncia do meio

    ambiente e de outros fatores (HIRAYAMA, 2006).

    Geografia

    A DP mais predominante em certas regies. As causas podem ser muitas

    e devem ser mais bem estudadas. Neste particular, 31 por 100.000 pessoas, que

    residem na Lbia so portadores de DP, enquanto em Bombaim, na ndia, as

    taxas so de 328 por 100.000 pessoas. Alm disso, h um aumento da incidncia

  • 23

    de DP em pessoas que vivem no meio rural que pode, possivelmente, estar

    relacionado com o contato com herbicidas e outras substncias txicas

    (MARJAMA-LYONS E SHOMON, 2003).

    Produtos Txicos

    Herbicidas e pesticidas, drogas, alumnio, metais pesados (cobre, chumbo,

    ferro, mangans), monxido de carbono, solventes orgnicos e outras

    substncias txicas desencadeiam morte das clulas dopamnicas levando o

    aparecimento da DP.

    MPTP 1 Metil 4 Fenil 1,2,3,6 Tetrahidropiridina

    Em 1982, um grupo de viciados jovens na Califrnia repentinamente

    desenvolveu uma forma grave de DP (Sndrome do Viciado Congelado) e a causa

    foi atribuda MPTP (1 metil 4 fenil 1,2,3,6, tetrahidropiridina), droga substituta da

    herona, que causou a destruio irreversvel dos neurnios dopaminrgicos

    nigroestriatais.

    A droga MPTP metabolizada pela MAO-B (monoaminoxidase B)

    produzindo MPP+ e altas taxas de Radicais livres (RL), diminuindo formao de

    ATP, devido inibio da enzima NADH (nicotinamida adenina nucleotdeo

    hidrognio). Com a diminuio da formao de ATP, que a chave energtica

    molecular da clula, ocorre a morte celular (HANG. 2004)

    Genticos

    Alteraes genticas decorrentes de mutaes acarretam alteraes no

    DNA, alterando a sntese protica. Este parece ser a causa em algumas formas

    familiares de DP. Neste sentido, alguns estudos indicam que a DP pode dever-se

    a defeitos nas protenas envolvidas na degradao das protenas alfa-nuclena e

    ou parkina. Da, na DP considerada de origem gentica, o erro est localizado nos

  • 24

    genes da alfa-nuclena ou parkina. Tais defeitos levariam ao aumento dessas

    protenas, ao decorrer do tempo, sob a forma de Corpos de Lewy.

    1.3 Manifestaes Clnicas

    A DP caracterizada clinicamente por sintomas neurolgicos como tremor

    de repouso, rigidez muscular e lentido anormal de movimentos (bradicinesia).

    Encontramos tambm outros sintomas, como depresso, ansiedade, irritabilidade,

    perda olfatria, dificuldade na escrita, perda das funes cognitivas, alteraes da

    voz com dificuldade na articulao das palavras, alteraes urinrias, restrio

    respiratria com diminuio da amplitude torcica e disfuno ertil.

    1.4 Etiologia (Causas Genticas e Ambientais)

    As causas da DP esto relacionadas a vrios fatores, tais como a idade,

    vrus, substncias txicas (pesticidas, metais, hidrocarbonetos), mutaes que

    alteram a expresso gnica, estresse oxidativo e outros. O uso do tabaco,

    radiaes, processos inflamatrios e aumento de radicais livres tambm podem

    desencadear a DP.

    1.4.1 Radicais Livres (RL)

    So estruturas qumicas que possuem um eltron desemparelhado

    ocupando um orbital atmico ou molecular. So altamente reativos, podendo

    combinar-se com molculas integrantes da estrutura celular e agregarem-se

    anomalamente com protenas citoplasmticas causando neurodegenerao.

  • 25

    O metabolismo normal do neurotransmissor dopamina produz radicais

    hidroxilas (OH) e perxido de hidrognio (H2O2), os quais na presena de

    depsitos de ferro, no crebro, podem inibir a cadeia respiratria celular e

    ocasionar neurotoxicidade.

    1.4.2 Estresse Oxidativo

    Quando ocorre um desequilbrio entre a formao de RL e enzimas

    antioxidantes, ocorre o estresse oxidativo, devido ao aumento da quantidade de

    RL, acarretando alteraes celulares, com efeitos deletrios sobre o DNA,

    alterando a transcrio gnica e a sntese de protecas (LlESUY, 2002).

    Danos oxidativos em cidos nucleicos causam neurodegenerao

    dopaminrgica da substncia nigra, liberando a hidroxiguanosina (8-HGO) que

    est elevada em pacientes com DP.

    Quando a quantidade de dopamina na substncia nigra diminui, ocorre

    interao com vrias molculas (perxidos) formando RL txicos. O processo

    oxidativo com a formao aumentada de RL prejudicial aos neurnios da

    substncia nigra, podendo lev-los morte.

    No metabolismo da dopamina h gerao de perxido de hidrognio o qual

    forma RL e para combater a formao dos radicais hidroxilas e superxido

    existem processos que envolvem a enzima superxido-dismutase que catalisa a

    converso do radical superxido (O2) em H2O2, que sofrer ao da enzima

    glutationa peroxidase, liberando H2O e glutationa-disulfeto que a forma oxidada

    da glutationa. Em crebros saudveis, os perxidos so detoxificados na

    presena da glutationa.

    1.4.3 Disfuno Mitocondrial

  • 26

    Mitocndrias so organelas citoplasmticas que existem em todos vegetais

    e animais, em quantidades proporcionais s atividades aerbicas de cada um,

    sendo varivel nas diferentes clulas (CONRADT, 2006). A funo das

    mitocndrias fundamentalmente produo de energia, respirao celular com

    concomitante produo energtica, localizando-se preferencialmente nas regies

    onde existe grande consumo energtico (LY & VERSTREKEN, 2006).

    Alteraes no DNA mitocondrial, associadas ao estresse oxidativo,

    aumento das taxas de ferro e disfunes genticas contribuem para o surgimento

    da DP e de outras patologias neurodegenerativas. Descobriu-se que o uso da

    droga MPTP (1 metil 4 fenil 1, 2, 3, 6, tetrahidropiridina) em humanos e animais

    desencadeava a morte neuronal no crebro, com grande diminuio da taxa de

    dopamina.

    A droga MPTP metabolizada pela MAO-B (monoaminoxidase B),

    produzindo MPP+ e altas quantidades de RL, que diminuem formao de ATP,

    devido inibio da enzima NADH desidrogenase ou complexo I da cadeia

    respiratria. Com a diminuio da formao de ATP, ocorre a morte celular. Todo

    este processo ocorre no da mitocndria.

    A coenzima Q 10 (CoQ10) chamada de ubiquinona, que atua como

    antioxidante, captando os RL txicos, est deficiente na DP. Vrios herbicidas

    como a rotenona, que inibe o complexo I da cadeia respiratria, podem causar DP.

    1.5 Achados Neuropatolgicos

    Aps a manifestaes clinicas, a DP afeta os gnglios da base e mais

    especificamente a substncia nigra, caracterizando-se por perda de neurnios

    dopaminrgicos. Pode ocorrer tambm degenerao das terminaes nervosas

    no corpo estriado, acarretando diminuio de dopamina no corpo estriado. No

    crebro humano, os ncleos da base (substncia nigra, estriado, globus pallidus,

    ncleo subtalmico e tlamo) conectam entre si as partes do crebro que

    controlam as funes motoras com o crtex motor.

  • 27

    Quando uma parte deste sistema no funciona adequadamente, como

    acontece na DP, todo o sistema afetado. O resultado final com a diminuio da

    dopamina no sistema nervoso central a inibio dos sinais eltricos do crtex

    motor. Esta parte do crebro tem tantas conexes com funes motoras

    sensitivas e de raciocnio, incluindo o tronco cerebral, onde se pensa que muitas

    alteraes presentes na DP, incluindo as vrias conexes e sinais, possam levar

    aos sintomas motores tais como bradicinesia, tremores e rigidez e cognitivos da

    doena.

    Medicamentos e tratamento cirrgico tentam restaurar a atividade e funo

    dopaminrgica normal do circuito motor para permitir o retorno das habilidades

    motoras normais.

    1.5.1 Corpos de Lewy

    Os corpos de Lewy (CL) so formados por um grupo de protenas que

    pode ser encontrado dentro do citoplasma de algumas clulas cerebrais,

    tipicamente em pacientes com DP. Os CL so arredondados e identificados pela

    colorao hematoxilina-eosina ou atravs de imunocitoqumica pela antiubiquitina.

    Podem se apresentar fora dos neurnios com formas ovais ou alongadas em

    vrias regies do crebro, entretanto quando se localizam na via nigroestrial so

    patognomnicos da DP. Os CL, embora raramente, podem tambm ser

    visualizados em clulas neurais de pessoas no portadoras de DP, como por

    exemplo, em idosos com envelhecimento normal.

    As protenas que compem os CL so as alfa-sinuclena e a ubiquitina-

    ligase.

    A alfa-sinuclena, ou condies fisiolgicas, reage com fosfolipdios de

    membranas, regula a diferenciao celular, participando da morfologia e fisiologia

    sinptica e da neurotransmisso dopaminrgica.

  • 28

    A ubiquitina-ligase uma importante enzima que desdobra e decompe as

    cadeias polipeptdicas grandes e anormais, com a finalidade de eliminar essas

    protenas que no so necessrias para a funo cerebral.

    Acredita-se que os CL podem ser o resultado da degenerao dos

    neurnios.

    1.5.2 Dopamina

    Em um adulto normal existe cerca de 400.00 neurnios dopaminrgicos no

    Sistema Nervoso Central (SNC), os quais liberam dopamina para estimular os

    receptores do sistema motor. A dopamina elaborada por uma srie de reaes

    bioqumicas e degradada por duas importantes enzimas, a MAO

    (monoaminoxidase) e a COMT (catecol-o-metiltransferase), levando formao

    dos produtos o cido diidroxifenilactico (DOPAC) e o cido homovanlico (HVA).

    Figura I.2. Principais vias do Metabolismo da dopamina no crebro

    Fonte: HANG, 2004

  • 29

    A dopamina encontrada em quantidades mais abundantes no corpo

    estriado, relacionado com a coordenao dos movimentos, mas tambm ocorre

    em altas concentraes em certas partes do sistema lmbico e hipotlamo.

    A sntese da dopamina consiste na converso da tirosina em DOPA,

    seguida de descarboxilao para formar dopamina.

    Figura I.3. Biosntese das catecolaminas

    Fonte: HANG, 2004

  • 30

    1.6 Tratamento

    Os medicamentos usados para tratar a DP so divididos em:

    Medicamentos para substituir, estimular e aumentar a atividade

    dopaminrgica, com o objetivo de melhorar a funo motora (levodopa);

    Medicamentos que mimetizam a ao da dopamina nos receptores D1, D2

    ou D3 (bromocriptina, pergolida, lisurida, promipexol);

    Medicamentos que inibem a MAO - B (selegilina);

    Medicamentos que inibem a COMT (tolcapone e entacapone);

    Medicamentos que liberam a dopamina (amantadina);

    Medicamentos antagonistas do receptor colinrgico muscarnico

    (benzatropina).

    1.6.1 Levodopa

    um aminocido (3,4 dihidroxi - fenilalanina) precursor da dopamina,

    que sob a ao da enzima dopadescarboxilase d origem a dopamina. A

    administrao da Levodopa aumenta as quantidades de dopamina no crebro.

    No deve ser usada isoladamente no inicio da doena, ento se usam

    medicamentos menos potentes.

    uma droga importante, considerada de primeira linha, entretanto no

    passado foi usada, unicamente, com resultados no muito satisfatrios. Por isso

    usam-se de modo concomitante inibidores da dopadescarboxilase que agem

    perifericamente (carbidopa, benserazida).

    A levopoda bem absorvida na parte proximal do intestino delgado. No

    entanto, alimentos gordurosos e ricos em protena, ingeridos prximos ao horrio

    da ingesto do medicamento dificultam sua absoro. Uma poro importante da

  • 31

    levopoda metabolizada em dopamina antes de atingir o crebro, pela

    dopadescarboxilase.

    Alguns pacientes respondem bem ao tratamento nos primeiros 4 5 anos,

    pois ainda existem neurnios com condies de armazenar a dopamina produzida

    pela medicao. Com a evoluo da doena, diminui a capacidade de

    armazenamento de dopamina nas clulas cerebrais devido degenerao das

    mesmas e a eficcia do medicamento diminui.

    Novas drogas devem ento ser utilizadas para aumentar a ao da

    levodopa.

    1.6.2 Carbidopa / Levodopa

    considerado o mais efetivo medicamento para controlar tremor, rigidez e

    bradicinesia; esta associao reduz a dose necessria em 10 vezes menos,

    todavia, com o passar do tempo, a eficcia vai gradativamente diminuindo.

    bem absorvido no intestino delgado, embora uma poro importante seja

    desativada pela MAO da parede intestinal, entretanto, no geral muito benfica

    ao paciente.

    Apresenta alguns efeitos colaterais indesejados tais como discinesia

    (movimentos involuntrios de contoro), efeito liga-desliga (piora e melhora os

    sintomas em poucas horas), nuseas, anorexia, hipotenso e alteraes

    psicolgicas, na forma de alucinaes.

    1.6.3 Agonistas da Dopamina

    So substncias com aes semelhantes dopamina, entretanto no

    necessitam de transformaes enzimticas para atuarem. No so to potentes

  • 32

    como a dopamina. Agem nos receptores da dopamina que se localizam nas

    clulas do estriado. Existem receptores D1, D2, D3 e outros subtipos.

    Os principais agonistas utilizados foram os derivados do ergot (derivados

    do esporo do centeio). Os principais so: bromocriptina (Parlodel, Bagren),

    pergolida (Celance), lisurida (Dopergin) e cabergolina.

    Recentemente foram lanados agonistas no derivados do ergot tais como

    o pramipexol (Mirapex, Sifrol) e ropinerol (Requip), que possuem maior eficcia.

    1.6.4 Inibidores de MAO B

    A enzima MAO-B age no crebro, na transformao da dopamina em seu

    metablito, o cido homovanlico. responsvel pela remoo natural da

    dopamina e atua diminuindo a velocidade de remoo da dopamina, aumentando

    o tempo de vida til e elevando as taxas de dopamina.

    Pode ser administrada com a levopoda, aumentando a eficcia temporal da

    droga, entretanto no deve ser usada a noite, pois ocasiona insnia.

    1.6.5 Inibidores da COMT

    Outra enzima de grande importncia no metabolismo da dopamina catecol-

    o-metil-transferase (COMT) responsvel juntamente com a MAO-B pela

    remoo da dopamina, todavia tambm age sobre a levodopa, transformando-a

    em 3-o-metildopa, sem efeito teraputico, ocasionando perda significativa da

    levopoda. Medicamentos como o tolcapone (Tasmar) e o entacapone (Comtan)

    so utilizados para aumentar a eficcia da levodopa. O tolcapone atua tanto fora

    como dentro do crebro, o entacapone atua apenas fora do crebro. Os efeitos

    colaterais so semelhantes aos da levodopa, podendo surgir hipotenso arterial e

    diarria, que quase sempre obriga a retirada do medicamento.

  • 33

    1.6.6 Amandatina

    A amandatina foi introduzida como frmaco antiviral, sendo descoberta em

    1969, como benfica para a DP. Atua como antagonista de receptores excitatrios

    nos gnglios da base. A droga ainda est sendo estudada, sabe-se que menos

    eficaz que a levopoda ou bromocriptina e seus efeitos colaterais so semelhantes

    levodopa. tida como dopamina endgena e usada na busca de novas

    alternativas.

    1.6.7 Anticolinrgicos

    At a levodopa ser descoberta, a atropina e correlatos foram usados no

    tratamento da DP. Os receptores muscarnicos da acetilcolina exercem efeitos

    excitatrios, contrrios aos da dopamina, em neurnios do estriado e tambm

    desempenham papel inibitrio pr-sinptico sobre as terminaes dopaminrgicas.

    A supresso desses efeitos compensa os efeitos da dopamina, restabelecendo o

    equilbrio entre acetilcolina e dopamina.

    O biperdeno (Akineton, Akineton-R) e trihexifenedil (Artane) so as drogas

    disponveis deste grupo de medicamentos.

    1.7 Homocistena

    Homocistena (Hcy) um aminocido sulforoso que no um constituinte

    diettico e no forma protena. A Hcy exclusivamente derivada da desmetilao

    da metionina, um aminocido abundante em protenas de plantas e animais. H

    uma semelhana entre a Hcy com a metionina e a cistena, sendo os trs

  • 34

    aminocidos portadores de enxofre e esto metabolicamente ligados entre si

    (Figura I.4).

    Fonte: HANG, 2004

    Figura I.4. Aminocidos sulfurosos e suas estruturas qumicas

    Fonte: HANG, 2004

    DNA

  • 35

    1.7.1. Metabolismo da Homocistena

    O metabolismo da homocistena ocorre nos rins e no fgado. A nica fonte

    de Hcy em seres humanos a desmetilao do aminocido essencial metionina

    atravs de dois compostos intermedirios, a S-adenosilmetionina (SAM) e a S-

    adenosilhomocistena (SAH) (FINKESLTEIN e MARTIN, 1986). A SAM doadora

    de grupos metila para mais de 100 reaes qumicas envolvendo

    metiltransferases, incluindo aquelas do DNA, RNA, protenas e lipdios (SCOTT et

    al., 1994). A metilao do DNA tem um papel crtico na expresso e regulao

    gnicas (FRISO et al., 2002). Com a transferncia do grupo metila, a SAM

    transforma-se em SAH que depois de convertida em Hcy e adenosina pela SAH

    hidrolase que est amplamente distribuda nos tecidos. A Hcy pode ser

    metabolizada atravs de duas rotas alternativas: 1) sendo irreversivelmente

    degradada atravs de transulfurao em cistationina e aps em cistena (principal

    rota) ou 2) remetilada a partir de 5-metiltetrahidrofolato para metionina. Essas

    reaes ocorrem principalmente no fgado e no rim e utilizam os cofatores cido

    flico, vitamina B6 e vitamina B12. No entanto, a remetilao de Hcy uma fonte

    importante de grupamentos metila no crebro (SCOTT et al., 1994). Neste

    particular, numerosas reaes de metilao ocorrem no crebro, tais como a

    sntese e a degradao de neurotransmissores, fosfolipdos de membrana e

    metilao de DNA (Figura I.5). Alm disso, conhecido que a enzima cistationina

    sintase (CBS) tem sido detectada no crebro humano (ICHINOHE et al., 2005).

  • 36

    Figura I.5. Metabolismo da Homocistena. SAM, S-Adenosil Metionina; SAH, S-

    Adenosilhomocistena; HCY, Homocistena; Met, Metionina; Gly, Glicina, THF,

    Tetrahidrofolato, MTHF, 5 Metiltetrahidrofolato; GSH, Glutatio Reduzido.

    Fonte: PANIZ et al. 2005.

    As concentraes intracelulares de Hcy esto sob controle efetivo, que

    atuam principalmente nas enzimas de remetilao e transulfurao. Quando a

    Hcy penetra na corrente sanginea, devido alta reatividade do seu grupo tilico,

    rapidamente oxidada ou se une a outra molcula de Hcy, formando homocistina

    ou ento a grupos tilicos de outras molculas, tais como a cistena, gama-

    glutamilcistena, glutatio ou protenas, formando pontes dissulfetos. Em

    condies normais, apenas 1 a 2 % da Hcy se encontra no plasma como tal,

    sendo que a maior parte (98 %) est sob forma oxidada (ANDERSSON et al.,

    1995). O fgado e o rim so os rgos que mais degradam e excretam Hcy.

    No que se refere s concentraes de Hcy no plasma e no LCR, as

    concentraes plasmticas desse aminocido so cerca de 20 a 100 vezes

    maiores do que as do lquido cfalo raquidiano (LCR). Estudos em animais de

    experimentao indicam que a Hcy transportada para o crebro por um receptor

  • 37

    especfico saturvel e tambm por difuso simples (GRIEVE et al., 1992;

    GRIFFITHS et al., 1992). Esse transportador pode importar Hcy do plasma para o

    crebro e vice-versa, sendo considerado um transportador bidirecional (GRIEVE

    et al., 1992). Alm disso, foi demonstrado em cultura de neurnios que a Hcy

    pode ser produzida dentro do crebro e que esse aminocido pode alterar a

    integridade da barreira hemato-enceflica (HO et al., 2002).

    O metabolismo da Hcy envolve vrios cofatores, tais como folatos,

    vitaminas B2, B6 e B12, que so usados na remetilao. A vitamina B6 usada

    na via transulfurao. Carncia de folato, ou vitaminas B6 e B12, causam

    alteraes no metabolismo da homocistena, acarretando hiperhomocisteinemia.

    FIG. 1.5 .

    Mutaes genticas que envolvam as enzimas metilenetetrahidrofolato

    redutase (MTHFR), a metionina sintase (MS) e a cistationina--sintase (CBS)

    tambm produzem hiperhomocisteinemia. Mutaes que atinjam dois alelos

    idnticos podem desencadear alteraes, resultando uma severa

    hiperhomocisteinemia e levando a uma doena rara chamada homocistinria.

    A Hcy sintetizada atravs da S-adenosilmetionina (SAM) e S-

    adenosilhomosisteina (SAH). O grupo metila transferido para a homocistena

    formando a metionina, este processo realizado pelas enzimas metionina sintase

    (MS) e homocistena-betana metiltransferase (BHMT) dependentes de vitamina

    B12.

    A homocistena tambm convertida cistena atravs da via de

    transulfurao, iniciada pela vitamina B6 dependente-cistationina sintase (CBS).

    O ciclo de folato forma 5-metiltetrahidrofolato (CH3, THF) para a remetilao da

    Hcy para metionina.

    1.7.2 Hiperhomocisteinemia

    A hiperhomocisteinemia corresponde a uma situao com aumento das

    concentraes circulantes de Hcy total em jejum, devendo-se principalmente a

  • 38

    defeitos da remetilao da Hcy. Nveis elevados de Hcy geralmente resultam de

    um distrbio no metabolismo intracelular deste aminocido, que dependente da

    atividade das enzimas intimamente envolvidas com o seu metabolismo, bem

    como de seus cofatores cido flico, vitamina B12 e vitamina B6.

    A hiperhomocisteinemia se deve a fatores adquiridos e/ou genticos

    (FOWLER et al., 1987). Na primeira categoria a hiperhomocisteinemia leve a

    moderada, devendo-se a fatores nutricionais como concentraes baixas de

    algumas vitaminas do complexo B, que participam no metabolismo da Hcy, como

    cofatores ou substratos, sendo considerados estes como as mais comuns causas

    de hiperhomocisteinemia moderada (HAYNES, 2002). Neste particular, as

    concentraes plasmticas de Hcy esto inversamente correlacionadas com as

    concentraes plasmticas de vitamina B12, vitamina B6 e principalmente de

    folato, que dependem fundamentalmente da ingesto adequada dessas vitaminas

    (GRAHAM e OCALLAGHAN, 2002). Por outro lado, as concentraes

    plasmticas de Hcy em jejum, se regularizam nesses casos pela restrio

    diettica de Hcy e pela suplementao de cido flico e de vitamina B12, mas no

    de vitamina B6 (Homocysteine Lowering Trialists Collaboration, 1998). A

    insuficincia renal tambm provoca hipermocisteinemia devido a menor filtrao

    glomerular (WOLLESEN et al., 1999). O sexo tambm influncia os nveis

    plasmticos de Hcy, sendo maiores nos indivduos do sexo masculino e

    parecendo estar relacionado com a atividade da remetilao e transmetilao da

    Hcy (BOSTON e CULLETON, 1999). Neste particular, verificou-se um aumento

    dos nveis plasmticos de Hcy aps a menopausa e uma diminuio desses

    nveis aps suplementao de estrgenos a transexuais, refletindo a influncia de

    hormnios estrognios (GILTRAY et al., 1998). Alm disso, acredita-se que os

    nveis circulantes diferenciais de Hcy, em ambos os sexos, poderiam se dever a

    massa muscular maior nos homens. A idade outro fator que influencia os nveis

    plasmticos de Hcy, sendo que esses nveis praticamente dobram da

    adolescncia a velhice. Neste particular, no se pode ignorar a diminuio da

    funo renal e da ingesto de vitaminas como causa dos nveis elevados de Hcy

    no idoso. H outros fatores que alteram a concentrao plasmtica de Hcy que

    diminui durante a gestao e aumenta em tabagistas, sedentrios, bem como no

  • 39

    alcoolismo e com o uso de anticonvulsivantes. Outro achado interessante que

    consumidores moderados de lcool possuem nveis mais baixos de Hcy

    (LIEVERS et al., 2003).

    J a hiperhomocisteinemia severa ocorre em doenas genticas ou ento

    pelo tratamento com metotrexate, que provoca uma queda nos nveis de folato.

    Nestes casos, o quadro clnico caracterstico de sintomas neurolgicos agudos

    como convulses e psicose. As doenas genticas mais comuns que causam

    esta forma de hiperhomocisteinemia so as deficincias da cistationina sintase

    (CBS), conhecida como homocistinria, de 5,10-metilenotetrahidrofolato redutase

    (MTHFR) (SIBANI et al., 2000), deficincia funcional de metionina sintase (MS),

    metionina sintase redutase (MSR), bem como defeitos do metabolismo

    intracelular de cianocobalamina (Cbl) indiretamente afetando a atividade da MS.

    Os achados clnicos caractersticos de pacientes afetados por estes distrbios

    incluem problemas vasculares e neurolgicos.

    1.7.3 Homocistena e doenas Neurolgicas

    O efeito do metabolismo alterado da Hcy sobre o sistema nervoso central e

    perifrico uma rea de pesquisa nova que est se expandindo e que necessita

    ser mais bem explorada. Assim, pouco se tem investigado sobre o papel da Hcy e

    da hiperhomocisteinemia sobre doenas neurodegenerativas, embora haja alguns

    relatos na literatura demonstrando que a hiperhomocisteinemia leve a moderada

    est relacionada de alguma forma, no esclarecida, com algumas doenas

    neurodegenerativas. De particular interesse a evidncia recente de que

    pacientes confirmados histologicamente com doena de Alzheimer possuem

    nveis plasmticos significativamente maiores de Hcy do que grupos controles. Foi

    verificado tambm que nveis elevados de Hcy ocorrem no sangue de pacientes

    com doena de Parkinson, demncia vascular e nos distrbios cognitivos da idade,

    bem como em algumas doenas psiquiticas do tipo esquizofrenia e depresso

    (SELHUB et al., 2000; SESHADRI et al., 2002; ISOBE et al., 2005). A

  • 40

    hiperhomocisteinemia foi particularmente demonstrada em pacientes com doena

    de Parkinson tratados com levodopa e em pacientes epilpticos tratados com

    drogas anticonvulsivantes (LAMBERTI et al., 2005). Por outro lado, estudos

    epidemiolgicos e longitudinais sugerem uma relao causal entre Hcy e dficit

    cognitivo, no somente devido ao dano endotelial e cerebrovascular, mas tambm

    a mecanismos neurotxicos prprios da Hcy (NURK et al., 2005; SACHDEV,

    2005). Outros trabalhos demonstraram uma reduo dos nveis plasmticos de

    cido flico e vitamina B12 e/ou B6 na demncia do idoso, mas no evidenciaram

    se a deficincia dessas vitaminas ou a hiperhomocisteinemia secundria estaria

    relacionada com o dficit cognitivo nesses indivduos (GOODWIN et al., 1983). De

    fato, embora se saiba que deficincias de cido flico e vitamina B12 podem

    causar alteraes neurolgicas, pouco se sabe sobre as associaes dessas

    deficincias com o acmulo de Hcy sobre o dano cerebral. Alguns estudos

    sugerem que a Hcy est envolvida com dano cerebral e com o declnio cognitivo e

    da memria, porm no foi esclarecido se os aumentos desse aminocido ou se

    as deficincias nos cofatores que levam a esse acmulo, so os mecanismos

    fisiopatolgicos desses quadros clnicos.

    Relativamente aos mecanismos neurotxicos da Hcy, acredita-se que ela

    possa causar distrbios na metilao e/ou alterao no potencial redox celular,

    resultando em influxo de clcio, apoptose e morte neuronal. Alm disso, a Hcy

    um agonista de receptores ionotrpicos e metabotrpicos, alm de causar

    estresse oxidativo (HO et al., 2003) e dficit do metabolismo energtico em tecido

    cerebral (STRECK et al., 2002, 2003). Tambm foi verificado que alguns efeitos

    neurotxicos da Hcy podem ser prevenidos, ao menos parcialmente, pelo uso de

    suplementao de folato, enfatizando o papel neurotxico da deficincia de cido

    flico ou pela restaurao dos nveis normais de Hcy atravs da suplementao

    com esse cofator. Antagonistas de receptores glutamatrgicos ou antioxidantes

    tambm reduziram os efeitos neurotxicos da Hcy, refletindo a importncia do

    sistema glutamatrgico e da gerao de espcies reativas nesta ao. Por outro

    lado, no se pode tambm descartar que os metablitos da Hcy (cido

    homocisteico, etc.) tambm atuem como agentes neurotxicos, visto que eles

    tambm podem estar em concentraes elevadas em situaes com

  • 41

    hyperhomocisteinemia. Assim, foi demonstrado que a Hcy e alguns de seus

    metablitos parecem atuar sobre a funo neuronal ativando receptores

    glutamatrgicos ionotrpicos e metabotrpicos (LIPTON et al., 1997; SHI et al.,

    2003; ZIEMINSKA et al., 2003; SELLEY, 2003). No entanto, enfatize-se que no

    est ainda estabelecido se os metablitos da Hcy causam disfuno neuronal em

    menor ou maior grau que a prpria Hcy e tambm em que concentraes isso

    ocorre (fisiolgicas ou suprafisiolgicas). No entanto, devemos considerar que as

    maiorias dos estudos sobre os mecanismos neurotxicos da Hcy foram feitos em

    neurnios cultivados e com concentraes suprafisiolgicas de Hcy, assim como

    em animais de experimentao e no em seres humanos. Desta forma, as

    diferenas metablicas e genticas entre roedores e seres humanos podem

    limitar a extrapolao dos dados obtidos em roedores para a espcie humana, o

    que salienta o valor da presente investigao em seres humanos.

    Tendo em vista que alguns trabalhos da literatura mostraram que a Hcy

    induz a produo de radicais livres, produzindo dano oxidativo em crebro

    (STARKEBAUM e HARLAM, 1986; STRECK et al., 2003) e j que o estresse

    oxidativo tem sido encontrado em tecidos de pacientes com doenas

    neurodegenerativas e mais especificamente com a doena de Parkinson, o

    presente trabalho visou determinar os nveis plasmticos no somente de Hcy,

    mas tambm de vitamina B12 e cido flico, e determinar fatores envolvidos com

    alteraes destes nveis, como o fumo, lcool, hipertenso arterial sistmica,

    diabete mlito e outros nesta doena. Enfatize-se que as associaes verificadas

    at agora entre os nveis de Hcy no plasma de pacientes afetados pela doena de

    Parkinson no estabeleceram se a Hcy fator causador da disfuno neurolgica

    ou apenas um marcador dessa doena decorrente de alteraes de outros fatores.

    1.8 cido Flico

    O cido flico foi inicialmente estudado, na dcada de 1930, por Wills e

    colegas, sendo chamado de fator de Wills, o qual foi retirado de extratos crus de

  • 42

    fgado. Em 1943, o cido flico (pteroilglutmico) foi purificado por Stokstad. Foi

    cristalizado por Pfiffner e colegas tambm em 1943. Em 1945, Angier e colegas

    sintetizaram e determinaram a sua estrutura (Figura I.6).

    Figura I.6. Estrutura qumica do cido flico

    O cido flico, folacina ou cido pteroilglutmico um derivado da vitamina

    B, tambm conhecido por vitamina B9, hidrossolvel, eficiente no combate

    anemia e s doenas cardiovasculares. A carncia de cido flico acarreta

    diminuio do crescimento, anemia megaloblstica e outros distrbios sangneos,

    glossites e distrbios no trato gastrointestinal. O cido flico est envolvido em um

    grande nmero de processos bioqumicos essenciais para a vida, tem importante

    papel na metilao do DNA e na sntese de purinas e pirimidinas. Tem ao

    importante na converso de homocistena em metionina, tendo a vitamina B12

    como cofator, na converso da serina em glicina, na sntese do timidilato e no

    metabolismo da histidina.

    Vrios agentes quimioterpicos inibem a enzima dihidrofolato redutase, tais

    como: metotrexato, trimetoprim e pirimetamina. Os compostos mais conhecidos

    que interferem com a absoro, utilizao e armazenagem dos folatos so os

    contraceptivos orais, o lcool, a colestiramina (anticolesterolmico), os

    antiepilpticos (barbituratos e difenil-hidantona) e a sulfasalazina (sulfonamida

    usada no tratamento da colite ulcerativa). Medicamentos que reduzem a acidez

    intestinal, tais como anticidos e antiulcerosos, interferem na ao do cido flico.

    Fonte: Gregory, 1998

  • 43

    Vitaminas do grupo B e vitamina C contribuem para uma boa funo do cido

    flico.

    O cido flico pode diminuir o risco de mal-formaes congnitas. Tem

    grande importncia na diminuio das ocorrncias de defeitos no fechamento do

    tubo neural (DTN). Alm disso, o uso teraputico do cido flico reduz as

    concentraes de homocistena.

    O cido flico tambm age na preveno e na melhora da colite ulcerativa

    e tambm tem sido usado no tratamento do vitiligo e na diminuio dos processos

    inflamatrios bucais e gengivais.

    Causas genticas ou deficincia desta vitamina tm sido relacionadas ao

    cncer (BALUZ et al., 2002).

    Os folatos orais so geralmente disponveis em duas formas: cido flico e

    cido folnico. A administrao do cido folnico proporciona que sejam

    ultrapassadas as etapas de desdobramentos e reduo, requeridas para o cido

    flico, sendo, portanto mais metabolicamente ativo, capaz de aumentar a eficcia

    em relao ao cido flico, diminuindo o tempo intermedirio gasto na reduo

    dos folatos.

    O etilismo agudo ou crnico, o suplemento diettico inadequado e o

    estresse provocado por vrias doenas neoplsicas causam deficincia de folato.

    As fontes do cido flico so: espinafre, vegetais de folhas verdes, fgado,

    levedo de cerveja, feijes, fermento, sementes de trigo, beterraba, leite e

    derivados, po integral, suco de laranja, cenoura, gema de ovo, aveia e algumas

    frutas. O folato dos alimentos altamente sensvel a agentes fsico-qumicos

    como: oxidao, calor e luz ultravioleta. O cozimento prolongado pode destruir

    90% do folato destes alimentos. A absoro destes alimentos ocorre pela ao de

    uma carboxipeptidase das membranas das clulas mucosas. A forma reduzida

    absorvida metilada pela dihidrofolato redutase, presente em abundncia na

    poro proximal do intestino delgado (duodeno e jejuno proximal). Doenas que

    acometem o jejuno podem acarretar deficincia de folato (espru no-tropical e

    tropical).

    O cido flico a forma mais estvel de folato, mas no encontrada

    naturalmente em tecidos vivos; precisa ser reduzido in vivo, o que resulta em di-

  • 44

    hidrofolato e tetra-hidrofolato pela adio de tomos de hidrognio no anel

    pirazina da pteridina, nas posies 7, 8 e 5, 6, 7 e 8 respectivamente (Figura I.7).

    Figura I.7. Reduo do folato (F) a dihidrofolato (FH2) e, em seguida, a

    tetrahidrofolato (FH4), pela enzima dihidrofolato-redutase (DHFR)

    Fonte: HANG, 2004

    A tabela I.1 Doses dirias recomendadas de folato na alimentao.

    Tabela I.1. Doses recomendadas de folato

    Homens 200g/dia

    Mulheres 180 g/dia

    Gravidez 400 g/dia

    Lactao 600 g/dia (OMS)

    Bebs 20-40 g/dia

    Crianas 50-150 g/dia

    1.8.1. Metabolismo do cido Flico

    O cido flico age como coenzima de processos de oxidao, reduo e

    transferncia de radicais metila. Estes processos esto relacionados com a

  • 45

    ingesto de folato, vitaminas B6 e B12 e a ao da enzima MTHFR

    (Metilenetetrahidrofolatoredutase).

    O folato participa efetivamente de reaes de metilao, envolvidas nas

    etapas de sntese de purinas e pirimidinas, no metabolismo de aminocidos e na

    liberao do radical metila, onde a SAM (s-adenosilmetionina) participa em mais

    de uma centena de reaes de transferncia da metila, doando ou recebendo o

    radical. Na falta do folato as reaes de metilao ficam comprometidas.

    No plasma, o folato endgeno liga-se a protenas de baixa afinidade, tais

    como a albumina, que responsvel por mais de 50% do folato ligado. Nos

    tecidos, o folato liga-se a receptores de folato reduzidos e seus anlogos inativos.

    O cido flico geralmente bem absorvido pelo homem, entretanto o

    processo de converso para uma coenzima metabolicamente ativa complexo. O

    cido flico inicialmente desdobrado nas clulas da parede intestinal em

    monoglutamato (figura I.8).

    Figura I.8. Absoro e ativao do folato no intestino

    Fonte: GREGORY, 1998

  • 46

    No fgado, este composto reduzido a dihidrofolato (DHF, FH2) e

    tetraidrofolato (THF, FH4) atravs da ao da dihidrofolatoredutase. H

    necessidade de NADPH (nicotinamida adenina nucleotdeo fosfato) como cofator.

    O prximo passo requer o aminocido serina, para combinar com o fosfato de

    piridoxol (vitamina B6) e transmitir o grupo hidroximetil ao tetrafolato (FH4). O

    resultado a formao do composto 5-10 metilenetetrahidrofolato e glicina.

    O 5 -10 metilenetetrahidrofolato tm grande importncia neste processo,

    proporcionando que o precursor metabolicamente ativo, 5 metilenetetrahidrofolato,

    seja utilizado, na remetilao da homocistena.

    O folato sob as formas ativas e inativas excretado em mdia de 100

    g/dia na urina e bile dos humanos.

    A primeira metilao FH4 (THF) necessita da serina, que se converte em

    glicina, de grande importncia nas etapas de sntese do DNA. Nesta reao com

    a ao da enzima MTHFR (metilenetetrahidrofolatoredutase) ocorre sntese do

    composto 5 -10 metilenetetrahidrofolato, do qual ser doado o grupamento metila

    (5 metila THF) para a homocistena, sob ao catalizadora da enzima

    metilasintase (MS) formando a metionina. Esta etapa chamada de remetilao,

    um ciclo de regenerao metionina homocistena metionina.

    Na carncia de folato, ocorre o aumento das taxas de homocistena

    (hiperhomocisteinemia) e o mecanismo de regulao se faz atravs da

    transulfurao. Nesta via, a homocistena convertida em cistationina, na

    seqncia ocorre a transformao em -cetoglutarato e cistena, isto ocorre

    devido a ao da cistationina sintetase (CBS) e vitamina B6.

    A cistena participa de vrias vias metablicas, podendo dar origem

    taurina, ao sulfato inorgnico ou ser eliminada pela urina.

    O SAM (s-adenosilmetionina) age tanto na remetilao como na

    transulfurao, inibindo a MTHFR (remetilao) ou ativando a CBS

    (transulfurao), dependendo da quantidade da metionina ou folato ingerida. A

    SAM tem grande importncia na sntese do DNA, sendo o folato o cofator, doando

    metila para a metilao do DNA.

    Durante o processo de doao do grupo metila (metila FH4) a homocistena,

    gerando a metionina, ocorre a utilizao do FH4 em outra etapa reativa, formando

  • 47

    o timidilato, que converte o DUMP (deoxiuridinamonofosfato) em DTMP

    (timidinamonofosfato) e em purinas (Figura I.9).

    Figura I.9. Transferncia do grupo metila com a participao do folato

    Fonte: HANG, 2004

  • 48

    Figura I.10. Metabolismo da metionina com a participao do cido flico

    Fonte: MOHAMED, 1999.

    1.8.2 cido Flico e Neurodegenerao

    H poucos estudos sobre a influncia da deficincia de cido flico nos

    processos neurodegenerativos. Neste contexto, acredita-se que a deficincia

    dessa vitamina um fator determinante da atrofia cortical na doena de Alzheimer

    (SNOWDOWN et al., 2000; HEIJER et al., 2003).

    O caminho metablico da metionina, THF tetrahidrofolato; 5-10-Me-THF, 5-10- metilenetetrahidrofolato; 5-10-Me-THFR, 5-10-metilenetetrahidrofolato redutase; 5-MTHF, 5-metiltetrahidrofolato.

  • 49

    1.9 Vitamina B12

    A vitamina B12 uma substncia complexa, que faz parte de uma famlia

    de compostos denominados genericamente de cobalaminas (figura I.11).

    Fonte:PANIZ,2005.

    uma vitamina hidrossolvel, sintetizada exclusivamente por

    microorganismos (GILLHAM, 1997) e encontrada em alimentos de origem animal,

    tais como a carne (fgado), peixes, ovos e lacticnios. A vitamina B12 utilizada

    como medicamento a hidroxicobalamina.

    Todas as cobalaminas, tanto dietticas quanto teraputicas, devem ser

    convertidas em metilcobalaminas (metila - B12) ou 5 desoxiadenosil-

    cobalamina (ado B12) para a sua ativao e ao no organismo.

    A vitamina B12 liga-se ao fator intrnseco (FI), protena produzida pelo

    estmago, formando um complexo resistente a enzimas proteolticas intestinais e

    ligando-se aps, aos receptores das clulas epiteliais do leo terminal, sendo

    finalmente ligada a um transportador plasmtico (transcobalamina) e lanada

    finalmente na circulao sangunea. A vitamina B12 absorvida no leo

    distribuda pelo corpo e o FI eliminado pelo intestino. A vitamina B12

    Figura I.11. Estrutura da vitamina B12

  • 50

    armazenada principalmente no fgado, sendo 4 mg a quantidade total de vitamina

    B12 no corpo.

    A vitamina B12 no organismo age como cofator humano para a realizao

    de duas reaes bioqumicas principais:

    Converso do metil FH4 em FH4

    Isomerizao do metilmalonil CoA em succinil-CoA

    A maioria das reaes em que a vitamina B 12 participa envolve a

    redistribuio de hidrognios e carbonos. Qualquer processo que altere a

    absoro da vitamina B12 acarreta deficincia da mesma, o que muito freqente

    em idosos, vegetarianos e em indivduos que adotam baixa dieta protica. Na

    deficincia gentica do FI, a absoro da vitamina B12 comprometida, tambm

    levando as baixas concentraes da mesma.

    Doenas gstricas, que reduzem as secrees gstricas importantes na

    absoro tambm ocasionam a diminuio da vitamina B12. A deficincia de

    vitamina B12 pode levar as alteraes hematolgicas (anemia perniciosa),

    neurolgicas, psiquitricas e gastrintestinais. As causas desta deficincia incluem:

    doena de Crohn e Whipple, gastrectomia parcial, espru, esclerodermia,

    alcoolismo, hipertoreoidismo, anemia hemoltica, alimentao exclusivamente

    vegetariana, linfoma, exposio a xido ntrico e HIV (VASCONCELLOS et al.,

    2002).

    1.9.1 Metabolismo da vitamina B12

    A vitamina B12 age como cofator essencial para duas enzimas: metionina

    sintase e L-metilmalonil-CoA mutase, ambas direta ou indiretamente envolvidas

    no metabolismo da homocistena (PANIZ, ET AL., 2005).

    A importncia da vitamina B12 na formao do folato est especificada

    abaixo (figura I.12).

  • 51

    Figura I.12. Participao da Vitamina B12 no Metabolismo do Folato

    Fonte: HANG, 2004

    A vitamina B12 e o cido flico participam da sntese do DNA. O processo

    inicial consiste na transformao da metila-FH4 em FH4 e metila-B12,

    convertendo a homocistena em metionina. A enzima envolvida na reao a

    homocistena-metionina-metiltransferase, sendo necessria a presena de

    vitamina B12 como cofator e de metila-FH4, sendo o grupo metila transferido para

    a homocistena, formando a metionina. O FH4 forma o formil-FH4 que finalmente

    origina o poliglutamato.

    Outra reao com a utilizao da vitamina B12 a isomerizao da

    metilmalonil-CoA em succinil-CoA. Este processo transforma o propionato em

    succinato. Os cidos graxos de cadeia mpar de carbonos, o colesterol, alguns

    aminocidos e a timina originam a metilmalonil-CoA que aps ser convertida em

    sucinil-CoA oxidada no ciclo de Krebs. Na deficincia de vitamina B12, ocorre

    acmulo de metilmalonil-CoA, com a conseqente formao do cido

    metilmalnico (MMA), levando a neurodegenerao (Figura I.13).

    DNA

  • 52

    Figura I.13. Formao de Sucinil-CoA

    Fonte: PANIZ, 2005.

    A metionina sintetase participa da metilao da homocistena

    transformando-a em metionina. O 5-metiltetraidrofolato (5MTHF) doador do

    grupo metila e a metila-B12 participa como cofator. A metionina interage com ATP

    formando a S-adenosilmetionina (SAM). A reao de desmetilao forma a S-

    adenosilhomocistena (SAH) para, aps a hidrolise, liberar a homocistena e a

    adenosina. A metilao da homocistena feita para compensar a baixa

    quantidade de metionina ingerida, elevando assim as quantidades do SAM, o qual

    doador do grupo metila. A deficincia da vitamina B12 acarreta aumento das

    quantidades de homocistena e diminuio da SAM, que levar a desmielinizao

    no sistema nervoso. Uma alterao diminuindo o processo de metilao,

    relacionado com a converso da homocistena em metionina, acarreta a no

    converso do 5MTHF em THF adequadamente.

    Quando h um aumento de metionina, por deficincia de vitamina B12, a

    reao de remetilao da homocistena comprometida e surge uma nova

    alternativa metablica (transulfurao) para a homocistena, que se combina com

    Reaes envolvendo a vitamina B12 e sntese de Hcy e MMA, 1. reao e metilao da homocistena (metionina sintase); 2. doao de grupamentos metil; 3. reao de isomerao do metilmalonil-coA para succinil-coA (L-metil malonil-CoA mutase); 4. reaes da via de transulfurao dependentes de vitamina B6 (cistationina--sintase e cistationina-y-liase) SAM, S-adenosil metionina; SAH, S-adenosil homocistena; CYS, cistationina; CIS, cistena; -CBT, -cetobutirato; PRP-CoA, propionil-CoA; THF, tetrahidrofolato; 5-MTHF, 5-metiltetrahidrofolato; 5,10-MTHF, 5,10 metileno tetrahidrofolato; AA, aminocidos; AG, cidos graxos

  • 53

    a serina formando cistationina, sendo esta reao catalisada pela cistationina

    sintase.

    A cistationina hidrolisada e forma cistena e cetobutirato. Estas etapas

    so dependentes da vitamina B6. A metionina e a SAM ativam a enzima

    cistationina sintase, para eliminar o excesso de homocistena e metionina. Na

    rota metablica da transulfurao ocorre a participao da enzima L-metilmalonil-

    CoA mutase a qual age catalisando a transformao da metilmalonil coenzima A,

    para succinil coenzima A, tendo adenosilcobalamina como cofator (HERRMANN

    et al, 2000).

    1.9.2 Deficincia de Vitamina B12 e Neurodegenerao

    A deficincia da vitamina B12 afeta os tecidos com rpida renovao

    celular, tais como a medula ssea. Assim, alteraes na diferenciao dos

    eritroblastos e eritropoiese defeituosa na medula ssea so decorrentes de

    deficincia de vitamina B12. A vitamina B12 tambm essencial para sntese do

    DNA. Com deficincia desta vitamina, ocorre diminuio na sntese do DNA e

    conseqentemente alteraes na proliferao celular. A anemia megaloblstica

    caracterizada por distrbio na diferenciao dos eritrcitos e na eritropoiese

    alterada, na medula ssea, com maturao anormal.

    As alteraes neurolgicas que a deficincia de vitamina B12 causa so

    decorrentes de danos crnicos e progressivos dos sistemas nervosos central e

    perifrico, manifestando-se com polineurites, ataxias, reflexo de Babinski,

    distrbios esfincterianos e diminuio da acuidade visual, devido a atrofia ptica.

    A carncia de vitamina B12, tambm se manifesta por alteraes

    neuropsiquitricas, sendo a mais comum degenerao combinada subaguda da

    medula espinhal. No sistema nervoso central, a ao patolgica mais acentuada

    na mielina, causando degenerao esponjosa e desmielinizao difusa das

    colunas lateral e posterior da medula, as mais tpicas alteraes patolgicas. Nos

    hemisfrios cerebrais as alteraes so semelhantes (SILVA, et al., 2000).

  • 54

    Na deficincia da vitamina B12, encontramos comumente alteraes de

    memria, disfunes cognitivas, demncia e alteraes depressivas.

    A deficincia de vitamina B12, em gestantes, aumenta o risco de m

    formao fetal, ocasionado defeito no tubo neural, constituindo-se numa das mais

    comuns alteraes congnitas (KIRKE, et al., 1993).

  • 55

    2. OBJETIVOS

    2.1 Geral

    Determinar os nveis plasmticos de homocistena e os fatores

    determinantes dos mesmos em pacientes com doena de Parkinson.

    2.2 Especficos

    1) Estudar se os nveis plasmticos de homocistena (Hcy), vitamina B12 e cido

    flico esto alterados em pacientes afetados pela doena de Parkinson (DP)

    quando comparados aos de controles normais com idade semelhante;

    2) Investigar se nveis plasmticos de Hcy se correlaciona com os nveis sricos

    de vitamina B12, cido flico, uria, creatinina e cido rico, bem como com a

    idade dos pacientes com DP;

    3) Investigar se nveis plasmticos de Hcy esto associados ao uso de L-DOPA e

    durao da doena;

    4) Investigar se nveis plasmticos de Hcy se correlacionam com o uso de

    bebidas alcolicas, tabagismo, raa, diabete mlito, cardiopatia isqumica ou

    hipertenso arterial sistmica.

  • 56

    3. MATERIAL E MTODOS

    3.1 Material

    Nossa amostra consistiu de 69 pacientes com doena de Parkinson (DP) e

    52 indivduos controles com idade semelhante. O diagnstico de DP foi

    estabelecido por um neurologista dos Servios de Neurologia do Hospital de

    Clnicas de Porto Alegre ou do Hospital So Lucas de Porto Alegre e foi baseado

    na presena de pelo menos dois sinais cardinais e resposta ao tratamento com L-

    DOPA (Unified parkinsons disease Rating Scale (UDPRS) motor scale (FAHN et

    al., 1987; HOEHN e YAHR, 1967; GELB et al., 1999). Os critrios de excluso

    foram por algumas condies que poderiam afetar os nveis de Hcy, tais como

    depresso ou demncia, histria de toxicidade por drogas, com alucinaes,

    delrio ou confuso mental, histria de AVC e outra doena neurolgica do que a

    DP, ou outras doenas srias concomitantes, tais como insuficincia renal ou

    deficincias de vitaminas B6, B12 ou cido flico, doena vascular, psiquitrica,

    cncer, desnutrio, uso de anticonvulsivantes ou de antifolatos, e quando todas

    as causas de parkinsonismo secundrio (demncia, uso de neurolpticos, etc)

    tinham sido excludas. A maioria dos pacientes utilizava L-DOPA. Os grupos

    controles normais foram parentes ou amigos dos pacientes com idade semelhante

    aos mesmos, sem histria de doena neurolgica ou de outras condies que

    poderiam alterar os nveis plasmticos de Hcy. Durante as visitas aos Servios de

    Neurologia acima mencionados, foram preenchidos questionrios (Anexo I), bem

    como assinados Termos e Consentimento Livre e Esclarecido para todos os

    indivduos que concordaram com esta investigao (Anexo II) e a investigao

    somente foi realizada com os indivduos (DP e controles) que assinaram os

    termos).

  • 57

    3.2 Mtodos

    3.2.1 Determinao dos nveis plasmticos de Homocistena (Hcy)

    Amostras de sangue venoso perifrico foram colhidas aps 12 horas de

    jejum. Para a medida da Hcy plasmtica, as amostras de sangue foram coletadas

    em tubos, contendo EDTA e colocadas em um refrigerador a 4oC em tempo

    inferior a 15 min aps a coleta. As amostras de plasma foram separadas em

    menos de 2 horas da coleta e armazenadas a -70oC por menos de 2 meses at a

    anlise ser realizada.

    A determinao quantitativa de homocistena (Hcy) foi feita inicialmente

    pelo equipamento IMMULITE 2000 (APC Medlab.). O mtodo trata-se de um

    imunoensaio competitivo (nmero de catlogo L2KHO2 (200 testes), cdigo do

    teste: HCY). As amostras de plasma ou soro so inicialmente pr-incubadas por

    30 min com S-adenosilL-homocistena (SAH) hidrolase e ditiotreitol (DTT), sendo

    posteriormente transferidas para um tubo contendo SAH-ligada a partculas na

    fase slida (beads) e um anticorpo especfico para SAH marcado com fosfatase

    alcalina. Aps 30 min de incubao, a SAH da amostra de plasma ou soro

    compete com a SAH imobilizada pela ligao com o anticorpo. O conjugado de

    enzima no ligado removido por lavagem com centrifugao. O substrato

    adicionado e a quantidade de Hcy determinada pela emisso de luminescncia.

    Os nveis sricos de Hcy foram tambm medidos atravs de

    espectrometria de massa em Tandem de acordo com Magera e colaboradores

    (1999). O primeiro passo foi quantificar 40 amostras de plasma (20 de indivduos

    normais e 20 de pacientes com doena de Parksinson) pelos dois mtodos.

    Verificamos que as dosagens feitas pelos dois mtodos eram essencialmente as

    mesmas. Aps isto, utilizamos apenas a espectrometria em massa Tandem para

    quantificar as outras amostras de plasma. Brevemente, 100 l das amostras de

    plasma foram misturadas com 20 l da soluo do padro interno (2 nmol de

  • 58

    homocistina). A reduo dos disulfetos foi feita pela adio de 20 l de 500

    mmol/L de dieritritol com reao a temperatura ambiente de 15 min. Aps, as

    protenas da amostra foram precipitadas com 200 l de 1mL/L de cido frmico e

    0,5 mL/L de cido trifluoractico em acetonitrito. A amostra foi centrifugada e o

    sobrenadante utilizado para a medida de Hcy em um espectrmetro de massa em

    Tandem (perki-elmer). A curva de calibrao foi preparada com concentraes de

    Hcy variando de 0 a 60 mol/L. Os coeficientes de variao intra e intraensaios

    foram respectivamente de 2,1 e 3,2 respectivamente.

    3.2.2 Determinao dos nveis sricos cido flico, vitamina B12, uria,

    creatinina e cido rico

    Para a determinao de cido flico, vitamina B12, uria, creatinina e cido

    rico, o procedimento de armazenamento e separao das amostras foi

    semelhante ao utilizado para a dosagem de Hcy. No entanto os tubos de coleta

    no continham anticoagulante e as determinaes desses parmetros foram,

    portanto, feitas em soro. Todos esses parmetros foram medidos por mtodos

    automatizados usando um aparelho COBAS.

    A determinao quantitativa de cido flico foi feita pelo teste Folato ADVIA

    Centaur que um imunoenasio competitivo que utiliza tecnologia

    quimioluminescence direta. O folato na amostra compete com o folato marcado

    com ster de acridina no Reagente Lite por uma quantidade limitada de protena

    ligadora de folato marcada com biotina. A protena ligadora de folato marcada

    com biotina se liga a avidina, que covalentemente ligada a partculas

    paramagnticas na Fase Slida. No teste Folato ADVIA Centaur, a amostra pr-

    tratada para liberar o folato a partir das protenas ligadoras endgenas na amostra.

    O sistema realiza automaticamente as seguintes etapas:

    Adio 150L de amostra em uma cubeta;

    Adio 50L de DDT/agente de liberao;

  • 59

    Adio 100L de Protena ligadora de folato e 200L de Fase Slida e

    incuba durante 5,0 minutos a 37oC;

    Adio 100L de Reagente Lite e incuba durante 2,5 minutos a 37oC

    Separa, aspira e lava as cubetas com gua reagente;

    Adio 300L de Reagente cido e a mesma quantidade de

    Reagente Bsico para iniciar a reao quimiluminescncia;

    Adio os resultados de acordo com a opo selecionada, conforme

    descrito nas instrues operacionais do sistema ou no sistema de

    ajuda on-line.

    Existe uma relao inversa entre a quantidade de folato presente na

    amostra do paciente e a quantidade de unidades relativas de luz (RLUs)

    detectadas pelo sistema.

    Tendo em vista que os folatos so sensveis luz, exposio luz deve

    ser minimizada durante o manuseio e o armazenamento da amostra.

    Os nveis de vitamina B12 foram determinados pelo teste VB12 ADVIA

    Centaur que consiste em um imunoensaio competitivo que utiliza tecnologia

    quimioluminescente direta. Neste teste, a vitamina B12 proveniente da amostra do

    paciente compete com a vitamina B12 marcada com ster de acridina no reagente

    lite por uma quantidade limitada do fator intrnseco purificado, que est

    covalentemente ligado a partculas paramagnticas da Fase Slida. O teste utiliza

    um agente de liberao (hidrxido de sdio) e DTT para liberar a vitamina B12

    das protenas ligadoras endgenas na amostra e cobinamida para evitar a

    religao aps a adio da Fase Slida amostra.

    O sistema realiza automaticamente as seguintes etapas:

    Lava a sonda do reagente auxiliar com 100 L de reagente auxiliar

    para T3/T4/VB12;

    Adio 100L de amostra em uma cubeta;

    Adio 115L de DTT/agente de liberao;

    Adio 200L de Fase Slida e incuba durante 5,0 minutos a 37oC;

    Adio 200L de Reagente Lite e incuba durante 2,5 minutos a 37oC;

    Separa, aspira e lava as cubetas com gua reagente;

  • 60

    Adio 300L de Reagente cido e a mesma quantidade de

    Reagente Bsico;

    Mostra os resultados de acordo com a opo selecionada, conforme

    descrito nas instrues operacionais do sistema ou no sistema de

    ajuda on-line.

    Existe uma relao inversa entre a vitamina B12 na amostra e as unidades

    relativas de luz (RLUs) detectadas pelo sistema.

    Os coeficientes de variao intra e interensaio foram respectivamente 3,5 e

    3,8 % para a vitamina B12 e de 3,9 e 4,5 % para o cido flico.

    3.3. Anlise estatstica

    As variveis so apresentadas como mdias erro padro da mdia

    (contnua) ou nmero e percentagem (categricas). Para os objetivos desse

    estudo, definimos concentraes plasmticas altas de Hcy como superiores a 15

    mol/L. Uma vez que os nveis plasmticos de Hcy no diferiram

    significativamente por sexo, esse cut off foi utilizado para homens e mulheres. As

    concentraes sricas de cido flico foram categorizadas em altas quando acima

    de 13 nmol/L e de vitamina B12 superiores a 251 pmol/L.

    As associaes entre Hcy, cido flico, vitamina B12 e outros parmetros

    bioqumicos foram feitas por coeficiente de correlao linear e por anlise de

    regresso mltipla. O teste t de Student para amostras independentes e a anlise

    de varincia de uma via tambm foram utilizados para vrias anlises

    quantitativas, bem como o chi-quadrado para a comparao de variveis

    qualitativas. Todas as anlises foram feitas usando o programa SPSS verso 15.0.

    nveis de significncia foram considerados quando o P < 0,05.

  • 61

    3.4. Aspectos ticos

    A presente investigao foi aprovada pelo Comit de tica do Hospital de

    Clnicas de Porto Alegre (processo GPPG nmero 06-419). Todos os

    participantes (controles e pacientes com doena de Parkinson) do projeto

    assinaram Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

  • 62

    4. RESULTADOS

    4.1 Caracterizao da amostra (controles e pacientes com doena de

    Parkinson) quanto idade, sexo, estado civil, hipertenso alterial sistmica,

    cardiopatia isqumica, diabete mlito, insuficincia renal, uso de tabaco e

    bebidas alcolicas

    Inicialmente procuramos caracterizar nossa amostra (controle e pacientes

    com doena de Parkinson DP) em relao idade, sexo, estado civil, HAS,

    cardiopatia isqumica, diabete mlito e tabagismo e uso de lcool. As tabelas IV.1

    (sexo), 2 (cor), 3 (estado civil), 4 (HAS), 5 (cardiopatia isqumica), 6 (diabete

    mlito), 7 (uso de tabaco) e 8 (uso de bebidas alcolicas). Verificamos que havia

    mais indivduos do sexo masculino nos pacientes com DP do que nos controles

    [Chi-quadrado = 6,557; P < 0,01] e que os indivduos normais (controles)

    consumiam mais bebidas alcolicas (Chi-quadrado = 5,223; P < 0,05), enquanto

    os outros parmetros (idade, estado civil, HAS, cardiopatia isqumica, diabete

    mlito, insuficincia renal e uso de tabaco) no variaram entre os dois grupos.

  • 63

    4.2 Comparao entre as concentraes sricas de homocistena, vitamina

    B12, cido flico, uria, creatinina, cido rico e a idade em pacientes com a

    doena de Parkinson e em controles normais

    Logo a seguir investigamos se os nveis sricos de homocistena (Hcy) e

    de outros parmetros bioqumicos, tais como cido flico, vitamina B 12, uria,

    creatinina e cido rico, bem como a idade diferiam em indivduos portadores da

    doena de Parkinson (DP), quando comparados ao controle. Verificamos que as

    concentraes sricas de Hcy estavam significativamente maiores nos afetados

    pela doena de Parkinson (DP) do que nos controles (t (78)= 2,688; P < 0,01]

    (Figura IV.1), enquanto os outros parmetros bioqumicos e a idade no diferiram

    entre os dois grupos(Tabela IV.9).

    Tais resultados sugerem que o aumento da Hcy observado nos pacientes

    com DP provavelmente no se deveu idade, as alteraes nos nveis de

    vitamina B