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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO EWA DANUTA CICHECKA DENARI SOFRIMENTO E ADAPTAÇÃO: ASPECTOS SOCIAIS E PSICO-AFETIVOS DE PACIENTES COM DOENÇA PERIODONTAL CRÔNICA São Bernardo do Campo 2004

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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

EWA DANUTA CICHECKA DENARI

SOFRIMENTO E ADAPTAÇÃO: ASPECTOS SOCIAIS E PSICO-AFETIVOS DE PACIENTES COM DOENÇA PERIODONTAL CRÔNICA

São Bernardo do Campo

2004

EWA DANUTA CICHECKA DENARI

SOFRIMENTO E ADAPTAÇÃO: ASPECTOS SOCIAIS E PSICO-AFETIVOS

DE PACIENTES COM DOENÇA PERIODONTAL CRÔNICA

Dissertação apresentada ao

Programa de Pós-Graduação, Mestrado –

em Psicologia da Saúde da Faculdade de

Psicologia e Fonoaudiologia da

Universidade Metodista de São Paulo como

requisito parcial para obtenção do Título de

Mestre.

Orientadora: Profª. Drª. Marília Martins Vizzotto

São Bernardo do Campo

2004

FICHA CATALOGRÁFICA Denari, Ewa Danuta Cichecka Aspectos sócio-demográficos e psico-afetivos de pacientes com doença periodontal crônica / Ewa Danuta Cichecka Denari ; Orientação de Marília Martins Vizzotto. – São Bernardo do Campo, 2003. 191 p. Dissertação (Mestrado) - Universidade Metodista de São Paulo. Faculdade de Psicologia e Fonoaudiologia, Curso de Psicologia da Saúde. 1. Psicossomática (Psicologia da saúde) 2. Epidemiologia (Psicologia da saúde) 3. Medicina Periodontal (Psicologia da saúde). I. Vizzotto, Marília Martins II. Título.

CDD 157.9

Sofrimento e Adaptação: Aspectos Sociais e Psico-afetivos de Pacientes com Doença Periodontal Crônica

Ewa Danuta Cichecka Denari

Banca Examinadora

___________________________________ Presidente: Profª. Drª. Marília Martins Vizzotto _________________________________________ 1º Examinador: Profª. Drª. Eda Custódio Marconi _________________________________________ 2º Examinador: Prof. Dr. Paulo Vaz de Arruda Dissertação defendida e aprovada em ____/_____/_____.

Dedico este trabalho ao meu querido

Nilson, que há 22 anos, é essencial para

minha vida.

Seu incansável apoio, cumplicidade e

solidariedade, mas acima de tudo, seu amor

foram decisivos para a concretização deste

estudo. Obrigada.

Uma homenagem especial à minha mãe,

Irena, sempre grande incentivadora e fã

número um dos filhos, e a meu pai, Jozef,

um modelo, ainda hoje, de amor à vida,

ao ser humano, à natureza e ao viver com

ética e dignidade, valores que sempre

nortearam, decisivamente, meus passos.

Amo muito vocês.

Ao meu querido mano Jerzy, que com

suas características de um ser humano tão

especial, sempre foi e é, sem dúvida, uma

das pessoas mais importantes da minha

vida.

À Dri, minha cunhada, amiga e cúmplice

de tantas voltas da vida.

Pedro.

Anita, Heitor e Hugo.

Alexandra e Felipe.

Suas existências são motivo suficiente

para que eu me renove constantemente e

um incentivo para querer ser sempre

melhor.

Agradecimentos especialíssimos

Obrigada pela compreensão e desculpas pelo meu afastamento, aos meus enteados Mô, Duda,

Luê e Celo, ao genro Marcos e às noras Karina, Renata e Lúcia. Também a toda minha

família muito querida, mas com quem tão menos me relacionei nestes dois anos.

Querida profª. Marília. Obrigada pelas contribuições inestimáveis que você me ofereceu

enquanto professora e orientadora. Entretanto, apesar do valor de seus conhecimentos, alguns

‘objetos bons’ seus me fizeram admirá-la mais ainda. O seu amor, respeito e preocupação

com o ser humano, a busca da coerência e da ética na postura do dia-a-dia, mas acima de tudo,

sua paixão pela docência e sua luta como verdadeira educadora. Eu agradeço-lhe tudo o que

você me fez pensar nestes últimos dois anos.

Aos queridos professores Eda, Vera, Paulo e Tolentino, um agradecimento especial pela

generosidade e paixão com que sempre compartilharam seus conhecimentos e experiências

conosco. Obrigada por tudo o que me acrescentaram, pois muito contribuíram para mudanças

decisivas em minha vida pessoal e profissional. Vocês foram imprescindíveis.

À professora Rosa, a quem nunca terei palavras suficientes para agradecer o carinho e a

atenção para com minha pesquisa, pelas mudanças repentinas de horário e pela paciência com

a lentidão do meu ‘quociente estatístico’, principalmente no início dos nossos trabalhos. Você

conseguiu, Rosa, transformar essa área tão árida (para mim) que é a estatística, de tal forma

que acabou por despertar minha motivação para entendê-la. Obrigada pela ajuda.

Obrigada ao Prof. Dr. Marco Giorgetti e sua equipe, pela acolhida calorosa às aulas teóricas

de Periodontia. A você, Dr. Marco, um agradecimento especial pelas palavras de incentivo

que foram muito importantes em determinados momentos da pesquisa. Obrigada também ao

Dr. Marcos Esquivel Denari, um dos integrantes da equipe, pelo empréstimo de literatura

sobre o assunto.

Um obrigada muito especial ao Prof. Dr. Antonio Wilson Sallum, que me concedeu o

privilégio de uma troca de idéias sobre a pesquisa, durante suas férias. Além de seu

indiscutível e flagrante conhecimento e amor pela Periodontia, Dr. Sallum revelou-se

extremamente generoso, ético e humilde. Obrigada por essa lição de vida.

Às queridíssimas Rosângela, Rosana e Penha, secretárias da maior eficiência e que primam

pelo calor humano em todos momentos. Entretanto, durante a execução deste trabalho,

conseguiram superar-se no carinho, na lealdade e na solidariedade. Vocês foram fundamentais

para a conclusão do estudo. Obrigada.

Aos queridos Poliana, Débora, Carla e Vitor. Obrigada pela paciência com que sempre me

receberam na recepção da clínica durante a fase de coleta de dados da pesquisa. Vocês nunca

se queixaram de que eu estava atrapalhando, muito pelo contrário, sempre fui recebida com

beijos, abraços e um papinho muito cordial. Vocês foram muito importantes para a realização

do meu trabalho.

Tereza, Roberta, Fabiana e Guaraciaba, minhas queridas e imprescindíveis incentivadoras,

com quem as conversas são sempre tão frutíferas e das quais saíram as primeiras idéias sobre

a realização do mestrado. Obrigada.

À querida amiga-irmã Osvaldina, peço desculpas pelas omissões durante a realização da

pesquisa. Obrigada pela paciência, pela compreensão, pela solidariedade, pelas palavras de

incentivo. Obrigada por estar sempre por perto, mesmo estando longe.

Obrigada ao Dr. Francisco Horta e Silva e ao Dr. João Baptista França, pelos caminhos

que me abriram para que eu pudesse conhecer mais profundamente o funcionamento psíquico

e, principalmente, a beleza do existir humano.

Obrigada a todos os grupos de estudos dos quais participei ou ainda participo, quer como

coordenadora, quer como aluna. Vocês foram e são fontes inesgotáveis de conhecimento e

aprendizado humano.

Minha querida Raquel, modelo de professora e mulher. Um ser humano excepcional, de

quem tive o privilégio de me tornar amiga. Obrigada por tudo o que você foi e ainda é para

mim.

Querida amiga Alcione. Você não imagina quanto aprendi com você. Sua garra, sua

sensibilidade e sua espontaneidade são sua marca registrada. Adoro você. Obrigada pelas

surpresas que já me proporcionou, demonstração de muito amor.

Obrigada, profª. Tânia, pela generosidade no empréstimo de livros para a confecção deste

trabalho.

Obrigada, querida amiga e vizinha Sônia. Você me surpreende a cada dia que passa com sua

generosidade e disponibilidade. É um privilégio ter você e sua família ao meu lado.

Obrigada, Siméia, Cinthia e Beth, as sempre carinhosas e disponíveis secretárias da pós,

prontas a nos ajudar toda vez que necessário.

Ao meu querido ‘mago’ das artes virtuais, Serginho (Insistente) Lombardi, que tão generosa

e carinhosamente preparou o datashow para a apresentação do trabalho.

Não posso deixar de agradecer aos queridos Insistentes, esta banda que, com suas músicas,

foi tão companheira durante as madrugadas, quando eu trabalhava ao computador. Prometo

que vou tentar reconquistar meu posto de fã nº 1...

A todos os meus pacientes, em especial aos que participaram deste estudo, pois são razão da

minha eterna busca, o meu muito obrigada.

A todos aqueles que diretamente ou indiretamente contribuíram com gestos ou palavras para

que eu concluísse o trabalho, mas que não estão aqui mencionados, aceitem meu

reconhecimento e minha gratidão.

RESUMO

OS OBJETIVOS DESTE ESTUDO FORAM: CARACTERIZAR A POPULAÇÃO DE PACIENTES DE UMA

CLÍNICA-ESCOLA; INVESTIGAR OS ASPECTOS PSICO-AFETIVOS ASSOCIADOS ÀS DOENÇAS

PERIODONTAIS DESSES PACIENTES, ALÉM DOS RECURSOS DEFENSIVOS UTILIZADOS POR ELES.

MÉTODO: LEVANTOU-SE DADOS SÓCIO-DEMOGRÁFICOS, DE SAÚDE GERAL E PERIODONTAL DE

789 PACIENTES ATENDIDOS NUM DEPARTAMENTO DE PERIODONTIA DE UMA CLÍNICA-ESCOLA DE

ODONTOLOGIA, DADOS ESTES QUE CONSTITUÍRAM A ETAPA QUANTITATIVA DO ESTUDO. ESSA

CARACTERIZAÇÃO FOI FEITA ATRAVÉS DE PLANILHAS ESPECIALMENTE ELABORADAS PARA A

PESQUISA. A PARTIR DESSAS PLANILHAS, FOI SELECIONADA UMA SUB-AMOSTRA DE 273

PACIENTES QUE APRESENTARAM QUEIXAS EM TRÊS OU MAIS SISTEMAS ORGÂNICOS, ALÉM DA

QUEIXA PERIODONTAL, OS QUAIS FORAM DENOMINADOS DE PACIENTES POLI-QUEIXOSOS. UMA

TERCEIRA SUB-AMOSTRA INTEGROU 59 PACIENTES POLI-QUEIXOSOS, DIAGNOSTICADOS COM

DOENÇA LEVE A MODERADA OU LEVE A SEVERA. DESSES PACIENTES, TRÊS FORAM ENTREVISTADOS

E INTEGRARAM A AMOSTRA DA ETAPA QUALITATIVA DA PESQUISA. OS RESULTADOS INDICARAM

QUE ENTRE PACIENTES POLI-QUEIXOSOS NÃO FOI ENCONTRADA CORRELAÇÃO SIGNIFICATIVA

ENTRE DOENÇA PERIODONTAL LEVE A MODERADA OU LEVE A SEVERA COM GÊNERO, IDADE,

ESTADO CIVIL, GRAU DE INSTRUÇÃO OU ATIVIDADE LABORAL. TAMBÉM NÃO HOUVE RELAÇÃO

SIGNIFICATIVA QUANTO À PRESENÇA DE TABAGISMO, BRUXISMO, ONICOFAGIA E XEROSTOMIA.

VERIFICAMOS QUE A DOENÇA PERIODONTAL CRÔNICA TEM SUAS ORIGENS NAS RELAÇÕES

OBJETAIS DA MAIS TENRA INFÂNCIA E QUE AS ANSIEDADES ESQUIZO-PARANÓIDES QUE

CARACTERIZAM ESSAS PRIMEIRAS RELAÇÕES, CONTINUAM PERMEANDO AS RELAÇÕES DURANTE

TODA A VIDA DAS PACIENTES. COMO OS RECURSOS DEFENSIVOS UTILIZADOS SÃO

PSIQUICAMENTE POUCO EVOLUÍDOS, O EQUILÍBRIO, A HOMEOSTASE É ENCONTRADA NA DOENÇA.

CONCLUÍMOS QUE A DINÂMICA INTRA-PSÍQUICA PODE ESTAR ASSOCIADA NÃO SÓ À DOENÇA

PERIODONTAL, MAS TAMBÉM AO ESTADO DE SAÚDE GERAL DESSES PACIENTES.

UNITERMOS: PSICOLOGIA; PSICANÁLISE; PSICOSSOMÁTICA, EPIDEMIOLOGIA, MEDICINA

PERIODONTAL.

ABSTRACT

The purpose of this study was to characterize the patients from a clinic of a dentistry school;

to investigate psychological and affectivity aspects related to periodontal diseases in those

patients, besides the defensive resources they use. Method: social and demographical basis as

well as general and periodontal health information of 789 patients looked after at a clinic of a

dentistry school were picked up, which composed the quantitative stage of the study. This

characterization was done throughout planning board specially worked out for the research.

From those planning board on, another sample were selected by 273 patients who were

denominated multi-complainant as they complained of three or more organic systems besides

the periodontal complaint. A third sample was composed by 59 multi-complainant patients

diagnosed with mild to moderate or mild to severe periodontal disease. Three of those patients

were interviewed who composed the qualitative stage of the research. The results showed that

among multi-complainant patients there were no significant association of mild to moderate

or mild to severe periodontal diseases with gender, age, civil state and level of education or

professional degree. It was not also find out a correlation with smocking, bruxism,

onychophagy and dry mouth. It was found out that inflammatory periodontal disease is

originated at the first relationships in the childhood and the schizoid anxiety which

characterizes those first relationships keeps permeating on along all life of the patients. As the

psychically defensive resources are less evoluted, the equilibrium is found through the illness.

It was concluded that psychical dynamics is associated not only to periodontal diseases, but

also to general health of those patients.

Key-words: Psychology, Psychoanalysis, Psychosomatics, Epidemiology, Periodontal

Medicine.

SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO................................................................................................................. 1.2. O que é Periodontia.................................................................................................... 1.3. Doença Periodontal.................................................................................................... 1.4. O Significado Psicanalítico da Boca.......................................................................... 1.5. O Significado Psicanalítico dos Dentes..................................................................... 1.6. Psicossomática........................................................................................................... 1.7. Doenças Psicossomáticas........................................................................................... 1.8. Depressão................................................................................................................... 1.9. Aspectos Sócio-demográficos, Emocionais, Comportamentais e Sócio-culturais Associados à doença Periodontal......................................................

• Objetivos................................................................................................................. 2. MÉTODO........................................................................................................................ 2.1. Amostra...................................................................................................................... 2.2. Ambiente.................................................................................................................... 2.3. Materiais e Instrumentos............................................................................................ 2.4. Procedimento............................................................................................................. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO............................................................................................ 3.1. Caracterização da Amostra........................................................................................ 3.2. Diagnóstico da Doença Periodontal........................................................................... 3.3. Severidade da Doença Periodontal............................................................................ 3.4. Paciente Poli-queixoso............................................................................................... 3.5. Avaliação dos Hábitos e Outras Manifestações do Paciente Poli-queixoso............................................................................................................. 3.6. Doença Leve a Moderada e Leve a Severa entre Pacientes Poli-queixosos............................................................................................................ 3.7. Avaliação dos Hábitos e Outras Manifestações do Paciente com Doença Periodontal Leve a Moderada e Leve a Severa............................................. ANÁLISE QUALITATIVA............................................................................................... Caso 1- Maria e o Narcisismo.................................................................................... Caso 2- Joana e a Evitação de Contatos..................................................................... Caso 3- Cristina e a Inveja......................................................................................... Análise Geral dos Casos........................................................................................... 4. CONCLUSÃO................................................................................................................... 5. REFERÊNCIAS................................................................................................................. ANEXOS Anexo A- Termo de Consentimento Livre e Esclarecido...................................... Anexo B- Ficha de Encaminhamento................................................................... Anexo C- Ficha de Triagem..................................................................................

Anexo D- Ficha Periodontal.................................................................................. Anexo E- Planilha de Registros 1: Identificação do Paciente............................... Anexo F- Planilha de Registros 2: Saúde Geral Atual.......................................... Anexo G- Planilha de Registros 3: Hábitos e Vícios............................................

01 04 05 22 26 28 60 64 66 72 73 73 73 74 79 82 82 91 93 97 107 114 118 120 120 132 143 153 164 167 175 176 177 183 187 188 189 190

Anexo H- Planilha de Registros 4: Saúde Odontológica...................................... Anexo I – Roteiro de Entrevista............................................................................ LISTA DE TABELAS Tabela 1- Distribuição de Pacientes quanto à Faixa Etária............................................... Tabela 2- Distribuição de Pacientes quanto ao Estado Civil............................................. Tabela 3- Distribuição de Pacientes quanto à Naturalidade.............................................. Tabela 4- Distribuição de Pacientes quanto ao Grau de Instrução.................................... Tabela 5- Distribuição de Pacientes quanto à Situação Laboral....................................... Tabela 6- Distribuição de Pacientes quanto à Raça........................................................... Tabela 7- Distribuição de Pacientes quanto ao Número de Filhos................................... Tabela 8- Diagnóstico das Doenças Periodontais quanto à Extensão............................... Tabela 9- Diagnóstico das Doenças Periodontais quanto à Severidade............................ Tabela 10- Diagnóstico de Severidade quanto à Faixa Etária........................................... Tabela 11- Diagnóstico de Severidade quanto ao Estado Civil........................................ Tabela 12- Diagnóstico de Severidade quanto ao Grau de Instrução................................ Tabela 13- Diagnóstico de Severidade quanto à Situação Laboral................................... Tabela 14- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto ao Gênero.......................... Tabela 15- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto à Faixa Etária.................... Tabela 16- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto ao Estado Civil.................. Tabela 17- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto ao Grau de Instrução......... Tabela 18- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto à Situação Laboral............. Tabela 19- Diagnóstico de Periodontite quanto à Extensão em Pacientes Poli-queixosos................................................................................. Tabela 20- Diagnóstico de Periodontite quanto à Severidade em Pacientes Poli-queixosos................................................................................. Tabela 21- Freqüência de Fumantes quanto à Severidade da Doença Periodontal........... Tabela 22- Freqüência de Bruxismo quanto à Severidade da Doença Periodontal........... Tabela 23- Freqüência de Stress quanto à Severidade da Doença Periodontal................. Tabela 24- Freqüência de Onicofagia quanto à Severidade da Doença Periodontal......... Tabela 25- Freqüência de Xerostomia quanto à Severidade da Doença Periodontal........ Tabela 26- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto à Doença Leve a Moderada e Leve a Severa ................................................................. Tabela 27- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto à Doença Leve a Moderada e Leve a Severa quanto ao Gênero..................................... Tabela 28- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto à Doença Leve a Moderada e Leve a Severa quanto à Faixa Etária............................... Tabela 29- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto à Doença Leve a Moderada e Leve a Severa quanto ao Estado Civil............................. Tabela 30- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto à Doença Leve a Moderada e Leve a Severa quanto ao Grau de Instrução.................... Tabela 31- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto à Doença Leve a Moderada e Leve a Severa quanto à Situação Laboral....................... Tabela 32- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto ao Tabagismo.................... Tabela 33- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto ao Bruxismo...................... Tabela 34- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto ao Stress............................

191 82 84 85 86 87 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 100 101 103 104 107 108 110 112 113 114 114 115 116 116 117 118 118 119 119 120

Tabela 35- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto à Onicofagia...................... Tabela 36- Distribuição de Pacientes Poli-queixosos quanto à Xerostomia.....................

1. INTRODUÇÃO

Temos entendido em nossa prática clínica que todo paciente deve ser tratado não só

com relação à sua disfunção bucal, mas devem ser consideradas as variáveis sócio-culturais,

comportamentais e orgânicas que circundam o fenômeno humano. Como entendem autores

consagrados como Groddeck (1966); Arruda (1990,1994); Rosa (1990); Perestrello (1996);

Eksterman (1996), uma doença ou um acidente não são frutos do acaso.

A doença periodontal acomete os pacientes geralmente em associação com outras

manifestações sistêmicas (AMERICAN ACADEMY OF PERIODONTOLOGY, 1996, 1999; BRETZ;

CHAVES, 1999; PAPAPANOU, LINDHE, 1999; GRISI, 2002; LORENZO; LORENZO, 2002;

SALLUM, 2002; GENCO, 2002; LAGERVALL; JANSSON; BERGSTRÖM, 2003). Segundo

Papapanou; Lindhe (1999), é discutível se a doença periodontal está aumentando ou

diminuindo. A dúvida reside no fato de que a doença varia de acordo com aspectos raciais e

geográficos. Além disso, os dados encontrados em pesquisas feitas nos países em

desenvolvimento não podem ser comparados às feitas em países desenvolvidos, por aqueles

apresentarem muitas vezes, insuficiência de dados. Entretanto, dizem os autores que, nos

últimos 20 anos, as pessoas tendem a conservar mais os dentes que suas gerações anteriores.

A grande maioria dos pacientes preserva sua dentição ao longo da vida quando há um

tratamento adequado, um controle razoável da placa bacteriana e uma contínua manutenção

através de cuidados específicos. Para tanto, todos os pacientes deveriam passar por um exame

periodontal compreensivo composto por uma discussão da queixa do paciente, revisão da sua

história médica e dental, exame clínico e análise radiográfica (AMERICAN ACADEMY OF

PERIODONTOLOGY, 1995; CAMPOS JR.; LOURENÇO; TABA JR.; ARAGONES, 1999; RODRIGUES,

2002; SALLUM, 2002). Em certos casos, a complementação com testes diagnósticos

microbiológicos, genéticos, bioquímicos ou outros podem ser úteis (AMERICAN ACADEMY OF

PERIODONTOLOGY [b] 2001). Além destes, é de fundamental importância que o cirurgião-

dentista esclareça aos pacientes quais os cuidados que devem tomar durante e após o

tratamento odontológico. Esses auto- cuidados referem-se, na sua maioria, a orientações sobre

higienização bucal correta, cuidados com a alimentação e controle dos fatores de risco como:

doenças sistêmicas, fumo e aspectos psicossociais (COUTO; COUTO, 1992; POMPEU; TOLEDO;

SAMPAIO, 1997; TODESCAN, 1993; AMERICAN ACADEMY OF PERIODONTOLOGY [a] 2001).

Para que tal orientação ocorra, o saber médico (no caso, o odontológico) não deve ser

apenas focado na identificação e correção dos processos orgânicos privilegiando o patológico

como referencial para a busca epistemológica. Essa postura atrapalha a compreensão do

organismo humano (OSÓRIO, 1993).

Uma visão mais abrangente do paciente que leva em conta seus componentes

emocionais e comportamentais pode ampliar significativamente a compreensão que o sujeito

tem de si próprio; fato que contribuiria, provavelmente, para a manutenção não só de sua

saúde bucal, mas também de sua saúde geral. Segundo Todescan (1993), a saúde não é

estática. Hoje acredita-se que doença é a queda do sistema imunológico que, por sua vez, é

influenciada pelos aspectos emocionais do paciente. Como refere Arruda (1990), o sistema

imunológico é um dos mecanismos que explica as interações entre stress e a doença, seja ela

uma doença de hiper-sensibilidade, auto-imune, infecciosa ou neoplásica.

Para Dunbar (1950), o enfoque psicossomático da doença “... é pensar qual é a

necessidade do organismo de manter um equilíbrio homeostático dentro de si mesmo e em

relação com seu campo ambiental” (p. 10). Para a autora, deve-se primeiro tratar do paciente,

depois da doença e, em terceiro lugar, o sintoma.

De acordo com Arruda (1990), o profissional que valoriza apenas os fenômenos de

natureza orgânica, deixa de ajudar seu paciente por não entender que ele está transformando

fenômenos de natureza psicológica em fenômenos de natureza somática. O paciente projeta

inconscientemente em seu corpo, suas dores morais ou emocionais, seus fracassos, suas

infelicidades e seus abandonos. Camargo Jr. (1992), alerta que os médicos não devem tratar a

doença como se fosse um objeto concreto e destituído de significado psíquico.

Todo paciente possui fantasias mais ou menos conscientes sobre sua doença

(CAMARGO JR., 1992). Segundo Totman (1982), acontecimentos da vida de uma pessoa

influenciam sua saúde, principalmente, pelo significado social que o indivíduo atribui a eles.

Como resume Serino (2001), considerar um paciente na totalidade de sua experiência é

receber não só seu corpo, mas toda sua dinâmica pessoal, suas referências próprias, suas

associações e reflexões frente à doença, situação difícil e específica em sua vida, e de valor

único.

Um paciente com dor de dente pode apresentar simultaneamente distúrbios emocionais

como depressão, irritabilidade. Se o profissional acudir apenas o sintoma oral, sem considerar

o distúrbio psíquico, o sintoma pode perpetuar-se, fazendo inclusive, que o paciente retorne

com a mesma queixa inúmeras vezes, no intuito de chamar a atenção para seu desconforto

(ARRUDA, 1990). Ainda sobre essa perspectiva, Lamey; Linden; Freeman (2000), escrevem

que o ser humano vive hoje num meio ambiente cada vez mais estressante. Assim, doença

mental pode ser entendida não só como aquela que requer um tratamento específico, mas

também como todo problema que afeta o periodonto. Observar a mente (psique) do paciente é

vital para entender a patogenia da enfermidade e a habilidade do paciente para lidar com o

tratamento proposto.

Sabe-se também que o stress ou eventos psicossociais podem interferir negativamente

na saúde bucal e/ou geral do indivíduo. Por isso, Todescan (1993), acredita ser importante que

o profissional conheça o mais profundamente possível o seu paciente, inclusive para saber

como motivá-lo adequadamente para a manutenção da saúde bucal, pois sem essa

“cooperação consciente” (adesão ao tratamento), qualquer esforço do dentista torna-se

improdutivo.

A periodontia é constituída por uma extensa variedade de tratamentos, não existindo

um que possa ser considerado padrão e aplicável a todos os pacientes ou a todas as doenças

periodontais. Frente aos dados obtidos nos testes diagnósticos, o profissional elabora um

plano de trabalho. A decisão sobre o tratamento e procedimentos indicados deve ser tomada

baseando-se nas circunstâncias apresentadas por cada paciente individualmente (TODESCAN,

1993; SALLUM; SALLUM; NOCITI JR.; NOGUEIRA FILHO, 1999; AMERICAN ACADEMY OF

PERIODONTOLOGY [a] 2001). A esse respeito, Campos Jr. et. al. (1999, p. 86), escrevem:

“As doenças periodontais afetam diferentes indivíduos, com

variabilidade na severidade, número de sítios afetados e no tipo de

atuação. Como conseqüência, a aplicação de um procedimento

padrão para a prevenção ou tratamento das doenças periodontites,

para todos os dentes de todos os pacientes, e sua repetição em

intervalos estereotipados, significa super-tratamento para alguns e

sub-tratamento para outros”.

Assim, para que o profissional possa oferecer esse tipo de tratamento individualizado

ao paciente, além do saber odontológico e periodontal, o próprio periodontista necessita de

um conhecimento a mais sobre o comportamento do ser humano.

Além da elaboração de diagnóstico e plano de tratamento mais assertivos, a

abordagem do paciente como um ser integral também facilitaria a relação dentista/paciente

em casos de pacientes considerados muitas vezes difíceis ou não colaboradores. Ao invés de

ser visto como um paciente ‘chato’ ou ‘irresponsável’, que acaba despertando sentimentos

adversos e, até hostis no profissional, esse paciente, poderá ser entendido como alguém em

sofrimento, que merece e precisa ser entendido e tratado. O tratamento poderia assim, ser tão

mais bem sucedido quanto mais o paciente sentir-se entendido pelo dentista (ROSA, 1990;

MELLO FILHO, 1992; RODRIGUES; GASPARINI, 1992; EKSTERMAN, 1992, 1996; PERESTRELLO,

1996; HOWARD; LEWIS, 1999). Além desses autores, também Totman, (1982); Arruda

(1990); Rodrigues; Gasparini (1992); Lipowski (1994), propõem a visão psicossomática de

homem, ou seja, o ser humano só pode ser compreendido se for observado na sua totalidade:

seu corpo e sua mente somados ao seu contexto ambiental e cultural. Por esta razão,

acreditamos que conhecimentos sobre o comportamento humano, coadjuvantes ao saber

odontológico, possibilitariam ao cirurgião-dentista, em especial ao periodontista, uma melhor

compreensão daquele que o procura para tratamento.

1.2 O que é Periodontia

Periodontia é a especialidade odontológica que se ocupa da prevenção, diagnóstico e

tratamento das doenças que suportam e envolvem os tecidos dos dentes e de implantes

dentais. Esta especialidade inclui a manutenção da saúde, função e estética de todas as

estruturas de suporte e tecidos periodontais, a saber: gengiva, ligamento periodontal, cemento

radicular, osso alveolar, além dos campos para reposição dental (CABRAL, 1998; AMERICAN

ACADEMY OF PERIODONTOLOGY [a] 2001).

As metas da terapia periodontal são preservar a dentição natural, o periodonto e os

tecidos perimplantados; manter e implementar a saúde periodontal e dos perimplantes, seu

conforto, estética e função (AMERICAN ACADEMY OF PERIODONTOLOGY [b] 2001). Grisi

(2002), escreve sobre as mudanças nos conceitos da Periodontia ocorrida nos últimos tempos

devido às fortes influências de áreas como Microbiologia, Patologia e Imunologia. A

Periodontia como especialidade da Odontologia tem sido descrita também como tratamento

preventivo de saúde bucal (MAGALHÃES; GOMES, 1996; POMPEU; TOLEDO; SAMPAIO, 1997).

1.3 Doença Periodontal

1.3.1 A evolução das terapias periodontais

A história da periodontia foi descrita por Marcos (1994); Ferraz (2001); Rodrigues

(2002), em eras históricas: 1- Período mágico religioso (4000 a.C. – 400 a. C.); 2- Período

racional (399 a. C. – 1500 d. C.); 3- Período científico (1501 – até o momento).

Segundo Marcos (1994); Ferraz (2001), as doenças periodontais já eram relacionadas

com resíduos orais e falta de higiene pelos sumerianos e pelos egípcios. Os hindus

preservavam seus dentes mascando extremidades de ramos de árvores, até que tomassem

estrutura semelhante à de uma escova macia para não machucar a gengiva e raspavam a

língua com partes do ramo. Na China, o tratamento das doenças gengivais era local e

sistêmico: usavam ervas medicinais, faziam fricção com um pó medicinal e aplicação de

óleos.

Na Idade Média, o conhecimento sobre as doenças bucais ficava a cargo dos monges,

auxiliados nas ‘cirurgias’ pelos barbeiros. Uma das intervenções muito comuns na época era a

sangria. Quando em 1163, o papa proibiu que os sacerdotes continuassem essa prática, houve

um crescimento dos ‘barbeiros-cirurgiões’, especialmente na França e na Inglaterra

(MARCOS,1994).

Segundo esse mesmo autor, o termo tártaro, concreções encontradas nos dentes, foi

descrito pela primeira vez por Celsus, físico romano do primeiro século. Ele reconheceu o

abscesso periodontal, descreveu a cirurgia do periodonto (gengiva) e a massagem gengival

com escova dental. Albucasis (936 –1031), grego, ilustrou os primeiros raspadores dentais em

seu livro “De Chirurgia”. Andréas Vesalius (1514 – 1564), fundador da anatomia moderna,

diferenciou as estruturas do dente e osso, periósteo e foramen apical.

Ainda sobre as descobertas da estrutura periodontal, Ferraz (2001), conta que nessa

mesma época, Gabrielle Fallopius (1523 – 1562) diferenciou coroa e raiz, além de mencionar

o termo folículo dental. Em 1574, Bartolomeus Eustachius comparou a adesão gengival ao

dente à da unha aos tecidos subjacentes. Ambroise Pare (1519 – 1590) determinou o número

de raízes de vários órgãos dentais e descreveu o aparelho de inserção ao osso via ligamento

fibroso. Além disso, enfatizou a importância da raspagem da substância amarelada arenosa

que se formava sobre os dentes, seguida por uma limpeza dental feita com uma mistura de

acqua fortis e acqua vitae para remover o material porventura não retirado pela raspagem.

A micro flora oral (microbiota bucal) foi descrita em 1683, pelo cientista holandês

Van Leeuwenhoek (CABRAL, 1998; FERRAZ, 2001). Utilizando-se de microscópio, ele

descreveu microorganismos coletados entre os dentes, demonstrando várias classes de

bactérias e a forma de movimentação dos microorganismos. Segundo Cabral (1998), com a

descoberta das bactérias, a microbiota bucal foi associada à cárie dental.

Em 1728, a Periodontia surgiu como disciplina distinta, quando Pierre Fauchard

reconheceu a relação entre higiene oral e a etiologia das doenças gengivais. Ele descreveu

gengivas inchadas e supuração sob pressão digital, além de estabelecer a necessidade da

remoção da placa bacteriana e do cálculo com instrumentos especiais (MARCOS, 1994;

FERRAZ, 2001).

John Hunter (1728 – 1793) demonstrou aspectos do crescimento ósseo, revelando que

“... a pressão constante sobre determinado dente poderia alterar sua posição, além da

contínua erupção dentária, formação e tipos de tártaro, recessão gengival e processos

alveolares” (FERRAZ, 2001, p.4). Segundo Marcos (1994), esse foi o início do esboço de

classificação da doença periodontal que até o fim do século XVIII não possuía terminologia

específica.

Cabral (1998), relata que em 1897, Williams denominou a presença de bactérias

aderidas à superfície do dente de “massa orgânica de microorganismos”. Em 1898, Black

referiu-se a essa massa microbiana gelatinosa como “placa”. O nome placa bacteriana passou

a ser utilizado a partir de 1902, por Miller. Marcos (1994), complementa que em 1924, Black

escreveu que as doenças periodontais tinham início na gengiva e envolviam a membrana

periodontal e o processo alveolar, quando progrediam. Black recomendava prevenção,

tratamento paliativo (manutenção dos tecidos bucais em boas condições) e tratamento radical

(retirada da raiz ou exodontia). Foi ele o autor da descrição evolutiva da ‘pericementite

crônica supurativa’, que hoje equivale à periodontite.

No final do século XIX, inicia-se um novo período da Periodontia através das novas

técnicas de tratamento: cirurgias de Kunstman, operações de retalho de Robiscek e a

curetagem de John Riggs (MARCOS, 1994). Segundo Ferraz (2001), apesar de Riggs ser muito

conhecido, seu método de repetidas raspagens e aplainamento radicular incluindo o osso

marginal, não eram sempre consenso.

De acordo com Ferraz (2001), em 1902, N. N. Znamensky, professor da Universidade

de Moscou, escreveu o artigo ‘Piorréia Alveolar – Anatomia, Patologia e Tratamento

Radical’. Nele, o autor citou dentes mal posicionados e impactação alimentar como fatores

predisponentes da doença periodontal, sendo o cálculo, o maior agente causal.

Ferraz (2001), cita ainda Willian J. Younger como um dos primeiros clínicos a

reconhecer a doença periodontal determinada por agentes bacterianos, em 1905, no artigo

‘Pyorrhea Alveolaris’ publicado em um periódico suíço. O tratamento proposto baseava-se

em meticulosa raspagem dental e posterior aplicação de ácido lático para higienizar a

superfície radicular. Younger utilizava instrumentos que levavam seu nome, modificados

mais tarde por Good e Sachs, nos EUA e na Alemanha, respectivamente. Esses instrumentos

serviram de modelo para os desenhos atuais. A terapia cirúrgica periodontal foi implementada

com a síntese do anestésico procaína (1905), com descoberta do raio-X (1895) e com os

estudos sobre a anatomia radiográfica da patologia periodontal, a partir de 1914.

O ‘periodontiu’como unidade funcional e estrutural dos tecidos de suporte foi

estabelecido por Weski, em 1937 (MARCOS, 1994).

Dentre os vários nomes que se destacaram na periodontia cirúrgica desde o início do

século, Ferraz (2001), cita os austríacos Robiscek, Ballesco, Weinmann, Orban, Gottlieb e

Sicher; os alemães Partsch, Sachs, Romer, Neimann e Weski, além do sueco Widman. Em

1959, Chawla e colaboradores, associaram o aparecimento da gengivite com a presença da

placa bacteriana e hábitos de higiene inadequados. Marcos (1994); Cabral (1998), relatam que

a partir da década de 60 ficou comprovado, através do clássico experimento de Löe, que a

placa bacteriana era o fator etiológico da doença periodontal. Nessa época, o termo

periodontose foi substituído por periodontite.

O conceito moderno de epidemiologia, ou seja, o estudo do processo saúde-doença na

população humana, através da análise da distribuição, das causas e dos riscos de diferentes

manifestações da doença trouxe grandes conhecimentos e avanços em Periodontia. Os estudos

longitudinais no controle e no conhecimento da história natural da doença tem sido decisivos

para a prática da prevenção bucal (MARCOS, 1994).

Segundo Ferraz (2001), a Periodontia tornou-se disciplina no Brasil em 1959 sendo

seu primeiro professor, Antonio Césio de Paula Lima, na Pontifícia Universidade Católica de

Campinas (PUCCAMP). Ensinava o professor, que a placa bacteriana e seus agentes

perpetuadores eram os agentes causais das doenças periodontais, cujo tratamento, consistia no

controle mecânico da placa após meticulosa raspagem e aplainamento radicular.

1.3.2 Anatomia do periodonto normal

Etmologicamente, peri = ‘em redor de’ e odontos = ‘dente’. Portanto, periodonto

refere-se ao conjunto de tecidos que recobrem e sustentam os dentes nas suas devidas

posições dentro da cavidade bucal, inserindo o dente no tecido ósseo dos maxilares e

mantendo a integridade da superfície da mucosa bucal. Também chamado de ‘aparelho de

inserção’ ou ‘tecido de suporte dos dentes’, o periodonto subdivide-se em periodonto de

proteção, representado pela gengiva e pelo periodonto de sustentação (ou de inserção)

compreendido pelo ligamento periodontal, cemento radicular e osso alveolar. A gengiva

recobre as estruturas do periodonto de sustentação. (CABRAL, 1998; LINDHE; KARRING, 1999;

COHEN; SLAVSKIN, 2002).

O periodonto é uma unidade de desenvolvimento, biológica e funcional, portanto,

sujeita a determinadas alterações morfológicas e funcionais. Modificações no meio ambiente

também podem resultar em alterações periodontais, dependendo da faixa etária (CABRAL,

1998; LINDHE; KARRING, 1999).

Segundo a American Academy of Periodontology ([a] 2001); CAMPOS JR. et. al.,

(1999), a saúde periodontal inclui a ausência de sinais de doença inflamatória como:

vermelhidão; edema; eritema; perda de inserção; supuração e sangramento à sondagem•;

funcionalidade do aparato periodontal e mínima ou nenhuma recessão por perda do osso

interproximal, alveolar e implantes dentais funcionais.

1.3.3 Caracterização da doença periodontal

Genco (2002), esclarece que atualmente, as doenças periodontais são reconhecidas

como infecções bacterianas encontrando-se entre as doenças mais comuns e crônicas do ser

humano. Além disso, são importantes causas de dor, desconforto e perda dental em adultos.

Em termos percentuais, 5 a 30% dos adultos na faixa etária entre 25 a 75 anos são portadores

de doenças periodontais.

As duas principais doenças bucais responsáveis pela perda dental são a cárie e a

doença periodontal. As duas formas mais comuns de doença periodontal são a gengivite e a

periodontite (CABRAL, 1998; LAMEY; LINDEN; FREEMAN, 2000; AMERICAN ACADEMY OF

PERIODONTOLOGY [a], 2001). • Sondagem é o procedimento para avaliar – através da sonda - o estado do periodonto quanto à presença e à severidade da doença periodontal e, na reavaliação, os efeitos da terapia (Campos Jr., et. al., 1999).

A gengivite é descrita por Cabral (1998); Cohen; Slavskin (2002), como a condição

periodontal que se limita à inflamação do periodonto de proteção, sem perda de inserção.

Pode ocorrer simplesmente pela presença da placa microbacteriana, sendo denominada

gengivite marginal. A gengivite também pode ser resultado de envolvimento sistêmico, como

no caso de pacientes portadores de HIV ou devido a hiperplasias gengivais por uso de certos

medicamentos.

Por outro lado, a periodontite caracteriza-se pela inflamação que envolve o periodonto

de proteção (gengiva) e o de sustentação (ligamento periodontal, cemento radicular e osso

alveolar) manifestando-se geralmente como periodontite crônica ou agressiva (CABRAL, 1998;

LAMEY; LINDEN; FREEMAN, 2000; HUJOEL; BERGSTRÖM; AGUILA; DEROUEN, 2003).

Comparando-se as duas doenças periodontais, Cabral (1998); Campos Jr. et. al.

(1999); Mariotti (2003), alertam que se a gengivite não for tratada pode levar à periodontite.

Entretanto, não necessariamente uma leva a outra. A gengivite pode ser evitada e é tratável,

enquanto a periodontite é passível apenas de controle, além de deixar seqüelas.

Ao descreverem a sintomatologia das periodontopatias em questão, Pompeu; Toledo;

Sampaio (1997); Cabral (1998), referem o sangramento gengival como sendo o sintoma

inicial tanto na gengivite como na periodontite. Enquanto na gengivite ocorre apenas

sangramento em diferentes graus e alteração na aparência da gengiva, a periodontite, doença

periodontal com formação de bolsas, é caracterizada por sintomas (geralmente não dolorosos)

como: dor ou sensação de pressão em regiões localizadas após comer, mas que vai gradual e

espontaneamente diminuindo; mau gosto em áreas localizadas; mau hálito, especialmente ao

levantar; sensação de coceira e necessidade de introduzir algum instrumento pontiagudo na

gengiva; alimento que se prende entre os dentes; dor irradiada ‘nos ossos’ e que aumenta com

frio ou umidade; insegurança em relação aos dentes e conseqüente preferência por “comer do

outro lado”; sensibilidade ao frio ou calor. Em fases mais avançadas, podem surgir: dor nos

dentes sem presença de cáries; extrusão e migração dentária; retração gengival.

1.3.4 Diagnóstico clínico das doenças periodontais

Até 1970, a periodontite era conceituada como uma doença induzida por placa

bacteriana e que se iniciava por uma gengivite associada à deficiente higienização bucal. Até

então, pensava-se que a causa da doença periodontal fosse um aumento do número de

microorganismos, sendo o cálculo, a retenção desses microorganismos. Isso gerou a hipótese

da placa não específica. Acreditava-se que quando a doença instalava-se e não era tratada, ela

progredia lenta e destrutivamente, podendo levar à perda dos dentes. Estudos epidemiológicos

transversais que embasavam esse conceito descreviam a população portadora da doença como

sendo adulta após 35 a 40 anos. Com as alterações nos projetos experimentais, metodologia e

análise (segunda metade da década de 70), os resultados passaram a evidenciar que tanto a

severidade da doença quanto à velocidade de sua progressão poderiam variar. Grupos

bacterianos específicos estariam associados com o desenvolvimento de diferentes tipos de

doenças periodontais, o que levou à formulação da hipótese de placa específica (CAMPOS JR.

et. al., 1999; RODRIGUES, 2002; SALLUM, 2002). Genco (2002), define as doenças

periodontais como infecções associadas a bactérias específicas que colonizam a área

subgengival, apesar dos mecanismos protetores dos hospedeiros. Assim, Vettore; Leão; Silva;

Quintanilha; Lamarca (2003), entendem a doença periodontal destrutiva como uma infecção

associada a microorganismos patogênicos específicos e alterações da resposta do hospedeiro.

De acordo com Cohen; Slavskin (2002); Schenkein (2003), bactérias normais e

comensais povoam a superfície dos dentes e/ou implantes protéticos, o interior do biofilme•

(complexo ecossistema) e a superfície das células epiteliais da mucosa que reveste a boca,

além do esôfago e dos tratos respiratório, intestinal e urinário. Esses microorganismos, sob

determinadas condições, tornam-se oportunistas e estão associados a infecções locais ou

sistêmicas. Sallum (2002, p. 54), esclarece: “O termo oportunista denota que bactérias

residentes normais induzem infecção em um hospedeiro local ou sistemicamente

comprometido”. Além disso, Cohen; Slavskin (2002, p. 2), alertam que: “A ecologia

microbiana oral é muito sensível às agressões potenciais que atingem o indivíduo hospedeiro,

durante o curso de sua vida”.

A boca contém quase metade das bactérias comensais do corpo humano: cerca de seis

bilhões de microorganismos representados por trezentas a quinhentas diferentes espécies.

Como explicam Sallum (2002); Cohen; Slavskin (2002), isso quer dizer que desde a vida fetal

até o fim da vida, a boca está sujeita a infecções oportunistas por um lado e pelas

complicações sistêmicas por outro. A essência da doença periodontal é essa interação

dinâmica entre a resposta do hospedeiro frente à presença de patógenos e de condições

ambientais. Kornman (2001), relata que à medida que os hábitos de higiene progrediram, bem

como as condições de mensuração da doença periodontal, observou-se que nem todo

• O conceito de biofilme foi introduzido na década de 90, por Costerton, para designar o aglomerado de bactérias que formam a placa bacteriana produzida pela microbiota bucal (Cabral 1998; Sallum, 2002).

indivíduo é igualmente suscetível ao processo da doença. Em concordância sobre a

suscetibilidade individual à enfermidade, Kornman (2001); Rodrigues (2002); Sallum (2002);

Schenkein (2003), concluem que a presença de bactérias é condição necessária, mas não

suficiente para o desenvolvimento da doença periodontal. Portanto, o diagnóstico da doença

periodontal deve seguir um modelo multifatorial, ou seja, vários fatores que influenciam a

severidade clínica do processo da doença devem ser considerados. Sallum (2002), menciona

os fatores ambientais, genéticos e adquiridos. Grisi (2002), cita os fatores locais, sistêmicos e

ambientais.

Como escrevem Sallum (2002); Cohen; Slavskin (2002), frente à complexidade das

interações orgânicas, suscetibilidade do hospedeiro, padrões comportamentais e condições

ambientais, os paradigmas da Odontologia Periodontal, mais recentemente, Medicina

Periodontal, tem buscado mais conhecimentos para compreensão e manuseio da saúde e da

doença.

1.3.5 Etiologia das doenças periodontais

Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001, p. 1271 e 1778), a palavra

etiologia originou-se do grego etio = ‘causa’, ‘motivo’ e logia = ‘ciência’, ‘arte’, ‘tratado’.

Ainda segundo o mesmo dicionário, etiologia é “um ramo do conhecimento cujo objetivo é a

pesquisa e a determinação das causas e origens de um determinado fenômeno 1.1 MED

estudo das causas das doenças” (p. 1271).

No Dicionário Aurélio (1999, p. 849), etiologia significa “o estudo sobre a origem das

coisas; a parte da medicina que trata da causa de cada doença”. Como as doenças

periodontais são aquelas que afetam os tecidos que revestem e sustentam os dentes, a etiologia

das doenças periodontais é o estudo dos fatores que propiciam o início e a progressão da

doença que afeta os tecidos que revestem e sustentam os dentes (CABRAL, 1998; TODESCAN,

2001).

A doença periodontal pode apresentar-se diferentemente na sua extensão e gravidade

no próprio indivíduo e entre indivíduos diferentes, pois a periodontopatia é multifatorial, ou

seja, vários fatores vão influenciar o desenvolvimento ou não da doença periodontal (KINANE;

LINDHE, 1999; TODESCAN, 2001; SALLUM, 2002; GRISI, 2002; BIMSTEIN, 2003). Campos Jr.

et. al. (1999), concordam com Sallum et. al. (1999, p. 63), quando estes escrevem que “...as

doenças periodontais estão basicamente caracterizadas por quatro atribuições fundamentais:

multifatoriais, episódicas, polimicrobiológicas e sítio-dependentes”•. Os autores acreditam

que essas características tornam a etiopatogenia da doença periodontal, alvo de constantes

questionamentos.

A doença periodontal é classificada etiologicamente pela presença de fatores

determinantes, predisponentes e modificadores da doença (CABRAL, 1998; TODESCAN,

2001). Cabral (1998); Sallum et. al. (1999), consideram de fundamental importância a

identificação desses três fatores, pois eles oferecem as diretrizes para a elaboração do

diagnóstico e do plano de tratamento adequado para cada paciente.

1.3.5.1 Fatores determinantes

Fator determinante é o responsável pelo início e desenvolvimento da doença. Sem ele,

não há doença (TODESCAN, 2001). Embora seja aceito amplamente que não existe doença

periodontal na ausência de agentes bacterianos patogênicos, a sua presença, mesmo que em

grandes quantidades, não significa, necessariamente, a expressão da doença. O fato de as

pessoas apresentarem suscetibilidade variável à doença deve-se a fatores herdados e

adquiridos do hospedeiro ou a outras influências ambientais (CAMPOS JR. et. al., 1999;

KORNMAN, 2001; RODRIGUES, 2002; SALLUM, 2002; GRISI, 2002; COHEN; SLAVSKIN, 2002;

SCHENKEIN, 2003).

O principal agente etiológico determinante da doença é o acúmulo de

microorganismos aderidos ao dente, isto é, a placa bacteriana ou biofilme. A placa

microbacteriana é essencial para o processo patológico periodontal (LANG; MOMBELLI;

ATTSTRÖM, 1999). Também Grisi (2002), descreve a placa dental como fator etiológico

primário na etiologia das doenças periodontais. A American Academy of Periodontology

(1996) define a placa ou biofilme como uma massa constituída principalmente de

microorganismos e que se adere ao dente, à próteses e à mucosa oral, sendo também

encontrada no sulco gengival e na bolsa periodontal (sulco gengival aprofundado

patologicamente). Kornman (2001); Rodrigues (2002); Schenkein (2003), concordam com

Sallum (2002, p.54):

“A placa bacteriana e seus produtos são considerados como fatores

etiológicos extrínsecos que interagem com a resposta do hospedeiro

e promovem a iniciação e persistência das doenças periodontais. A • Grifo dos autores.

presença das bactérias é necessária, mas não suficiente, para o

desenvolvimento da doença”.

As bactérias surgem e proliferam por uma série de fatores determinantes ecológicos: a

superfície do dente, saliva, fluido gengival, anaerobiose, relações interbacterianas e bactéria-

hospedeiro. A flora bucal saudável é constituída de uma placa bacteriana supragengival

composta por bactérias gram-positivas facultativas (coco ou bacilo). Estas, são consideradas

protetoras do periodonto, uma vez que antagonizam com as bactérias patogênicas, inibindo

sua proliferação. A doença periodontal é caracterizada por uma flora subgengival composta de

bacilos anaeróbicos gram-negativos. Os patógenos periodontais são um grupo restrito de

bactérias diretamente relacionadas à perda de inserção e progressão da doença periodontal

(RODRIGUES, 2002).

A placa supragengival é de fácil remoção e geralmente associada à gengivite. A

placa subgengival é de difícil controle pois sua aderência à superfície dos dentes é muito

firme. A placa bacteriana subgengival está relacionada às doenças periodontais mais graves.

De acordo com Sallum (2002, p.54), “um bom controle de placa é vantajoso porque impede a

placa supragengival de fornecer nutrientes e bactérias para a placa subgengival”.

Genco (2002), menciona a falta de clareza que ainda existe quanto à associação entre

placa bacteriana supragengival com a periodontite. A Research, Science and Therapy

Committee of the American Academy of Periodontology (1996), concluiu através de vários

estudos que a quantidade de acúmulo de placa está fracamente relacionada com periodontites,

bem como não é possível considerar depósito de placa como prognóstico de futuras perdas de

inserção.

Quando a placa bacteriana não é removida, ela se calcifica originando o cálculo dental.

Este, não é por si só, um fator causal da doença periodontal. Entretanto, por constituir-se de

depósitos calcificados de placa bacteriana sobre os dentes e de outras estruturas sólidas da

boca, a superfície rugosa do cálculo e sua porosidade aumentam a possibilidade de retenção

das bactérias e de seus produtos metabólicos, produtores da placa bacteriana (CABRAL, 1998;

TODESCAN, 2001, GENCO, 2002). Por isso, cálculos não controlados podem originar as

periodontopatias.

Segundo esses autores, assim como a placa, também o cálculo dental pode ser

supragengival, quando se localiza nas coroas visíveis dos dentes, acima da margem gengival,

ou subgengival, quando se forma na extremidade terminal da raiz do dente, dentro do sulco

gengival ou da bolsa periodontal. Ao contrário da placa bacteriana, o cálculo não é removível

através dos métodos tradicionais de higiene bucal.

As condições do sistema imunológico do hospedeiro é que vão permitir que o

organismo se defenda da periodontite ou então, que a inflamação se propague (GENCO, 2002).

1.3.5.2 Fatores predisponentes

Dos mais de 400 gêneros e espécies de microorganismos identificados, em média, na

flora oral dos humanos, somente alguns foram identificados na microbiota periodontal

subgengival como patógenos para iniciação e progressão da doença periodontal. Alguns

patógenos parecem apresentar maiores interferências em determinadas faixas etárias, outros

precedem a progressão da doença ou ainda podem ser marcadores para futura doença (GENCO,

2002; SALLUM, 2002).

Segundo a American Academy of Periodontology (1996), a periodontite começa na

juventude ou no início da idade adulta, mais que em pessoas idosas. Não é comum que

pessoas mais velhas com dentição relativamente intacta tenham, repentinamente, uma

periodontite. Os indivíduos mais suscetíveis, inclusive à progressão mais rápida da doença,

são aqueles cuja doença começa na juventude. Campos Jr. et. al. (1999), esclarecem que, até

recentemente, o conceito de doença periodontal era baseado em estudos epidemiológicos

transversais feitos há 30, 40 anos atrás. Assim, a periodontite era entendida como doença

induzida por placa bacteriana que se iniciava por uma gengivite associada à deficiente higiene

bucal. A população mais afetada era, em sua maioria, de adultos após os 35 a 40 anos. A idéia

era que a gengivite sem tratamento adequado progredia lenta e destrutivamente, levando à

perda dental. Hoje, tanto os conceitos iniciais da evolução da doença quanto o grau de

severidade e sua progressão, são variáveis.

Os fatores predisponentes estão presentes antes do início e desenvolvimento da doença

e irão facilitar a sua instalação (TODESCAN, 2001). São considerados fatores predisponentes

para a doença periodontal, todos aqueles que, direta ou indiretamente, favorecem o acúmulo

de placa e/ou dificultam sua remoção, favorecendo o início e a progressão da doença. Os

fatores anatômicos que interferem na quantidade e na qualidade da placa são, na sua maioria,

fatores predisponentes.

Ainda segundo esse mesmo autor, os fatores predisponentes podem ser locais ou

sistêmicos. Aos locais, referem-se os fatores que vão facilitar o acúmulo de placa e/ou

dificultar sua remoção. Podem estar relacionados à morfologia do periodonto, ou seja, à

anatomia e forma do arco ou do dente, além de inclinações dos dentes e discrepâncias

anatômicas. Também estão inclusos os contatos inadequados entre dentes que causem

impactação alimentar, provocando injúria física. Nesses casos pode ocorrer do alimento ficar

retido favorecendo o acúmulo de microorganismos. Essas circunstâncias acima descritas

dificultam a higiene bucal, podendo levar à formação de placa bacteriana e, posteriormente,

aos cálculos. Pode ocorrer também que os fatores predisponentes locais originem-se em

procedimentos iatrogênicos do dentista, por exemplo, se uma restauração estiver inadequada e

propiciar o acúmulo de placa bacteriana e dificultar a higienização por parte do paciente.

A influência dos fatores predisponentes sistêmicos sobre a doença periodontal tem

sido amplamente citada e descrita. A American Academy of Periodontology (1996); Bretz;

Chaves (1999); Papapanou; Lindhe (1999); Lorenzo; Lorenzo (2002); Grisi (2002); Sallum

(2002), Lagervall; Jansson; Bergström (2003), entendem por fator predisponente sistêmico,

qualquer doença ou condição sistêmica que diminua a defesa do organismo, facilitando a

instalação da doença periodontal. Esses fatores devem-se às doenças ou alterações que

influenciam o mecanismo de defesa (sistema imunológico) orgânico, permitindo o início da

periodontopatia. Por exemplo, diabetes mellittus, HIV, doenças imuno-supressoras, entre

outras. Certos medicamentos utilizados nos tratamentos de desordens sistêmicas também

podem causar aumento do volume gengival (medicações para tratamento de problemas

neurológicos, diabetes, artrite reumatóide, psoríase, esclerose múltipla, para prevenir rejeição

pós-transplantes, doenças com base imunológica). Lagervall; Jansson; Bergström (2003), não

encontraram associação significativa entre desordens sistêmicas e severidade da doença

periodontal, em relação à profundidade de bolsa periodontal. Entretanto, os autores relataram

que doenças cardiovasculares, diabetes e doenças reumáticas estavam relacionadas com o

número de perdas dentais, que eles consideraram um aspecto da saúde periodontal.

A doença periodontal mais grave e destrutiva é mais freqüente quando existem

doenças sistêmicas que comprometem a capacidade do hospedeiro de se defender das

infecções. Além da AIDS, Genco (2002) cita a presença de candidíase oral, leucoplasia pilosa

oral, linfoma não-Hodgkin, eritema gengival linear e a periodontite ulcerativa necrosante.

Essas manifestações estão diretamente associadas à AIDS. A osteoporose, perda do conteúdo

mineral dos ossos pela perda de massa óssea e fragilidade, afeta principalmente, as mulheres.

O prejuízo da massa óssea inclui o processo alveolar associado à infecção periodontal.

Estudos recentes, como os citados pela American Academy of Periodontology (1999);

Tonetti; Mombelli (1999), têm demonstrado que a hereditariedade é também um fator

predisponente à doença periodontal. Segundo Bretz; Chaves (1999), os avanços da genética

molecular permitiram elucidar certos mecanismos imunológicos. Esse conhecimento

possibilitou compreender

“... que é possível que a resposta do hospedeiro nas doenças

periodontais a agressões microbianas ou a fatores ambientais, tenha

origem numa alteração genética do hospedeiro, a qual confere uma

maior suscetibilidade ao desenvolvimento de doenças periodontais

destrutivas” (BRETZ; CHAVES, 1999, p. 77).

Existem fatores genéticos que podem afetar as várias formas de condições orais:

esmalte e dentina; número, forma e tamanho dos dentes, anormalidades da polpa. Podem

ocorrer anormalidades genéticas que afetam especificamente o complexo orofacial ou que

estão associadas à doença periodontal. Genco (2002), cita, por exemplo, que pacientes com

deficiências neutrofílicas geralmente apresentam ulcerações na mucosa oral, gengivite e

periodontite. Essas alterações podem ser primárias (doença periodontal grave) ou secundárias

(associadas a outras doenças sistêmicas).

1.3.5.3 Fatores modificadores

Cabral (1998); Todescan (2001), definem os fatores modificadores como aqueles que

agravam a sintomatologia da doença periodontal já instalada, modificando ou agravando o

curso da doença; acelerando sua progressão e o processo destrutivo.

Cabral (1998), cita que entre os fatores modificadores encontram-se as condições

sistêmicas do paciente, além do stress, das condições ambientais, má nutrição e fatores

traumatizantes como: bruxismo, morder objetos como canetas, palitos, entre outros. Todescan

(2001) acrescenta aos fatores modificadores locais, os contatos oclusais excessivos e os

hábitos parafuncionais como: respiração bucal, interposição de língua. Os fatores

modificadores sistêmicos são: diabetes mellittus, tabagismo, stress, alterações hormonais,

imunológicas ou hematológicas, medicamentos e desnutrição.

1.3.6 Riscos para a doença periodontal

Campos Jr. et. al., (1999), comentam que apesar dos avanços da periodontia no que se

refere aos instrumentais para o exame clínico (sondas milimetradas e computadorizadas, lupas

e câmaras intra-orais, laser), ainda é muito difícil estabelecer um perfil de velocidade de

progressão da doença periodontal bem como identificar o paciente de risco, através dos dados

colhidos. Segundo o autor, “apesar da etiologia da doença periodontal ser infecciosa, nem

todos os indivíduos apresentando placa bacteriana, desenvolvem a doença dentro de uma

população” (CAMPOS JR. et. al., 1999, p. 87). Existem pessoas que possuem um risco mais

alto para desenvolver doenças periodontais que outras.

A American Academy of Periodontology (1996), descreve fator de risco, em pesquisas

epidemiológicas, como uma condição ambiental, aspecto do comportamento ou característica

herdada que pode modificar a doença periodontal. O fator de risco pode ser ou não ser causal,

embora o uso geralmente implique em causalidade.

Segundo Campos Jr. et. al., (1999), o termo risco perdeu seu caráter estritamente

epidemiológico, para descrever a probabilidade de certa doença desenvolver-se dentro de um

período de tempo. O risco é a descrição de eventos desfavoráveis ocorrerem. Em periodontia,

risco é a probabilidade de início ou progressão da doença.

Para Genco (2002), alguns fatores de risco podem ser modificados, outros, não. O

autor chamou esses fatores de risco que não podem ser modificados de fatores determinantes

ou de fundo. Os fatores de fundo, ou determinantes, citados pelo autor são: idade, raça e sexo.

De acordo com a American Academy of Periodontology (1996), a menor prevalência de

doença periodontal em pessoas mais velhas poderia ser explicada pelo fato de que a

periodontite é uma doença de progressão lenta e que o fator de risco pode ser cronológico, ou

seja, dentre os mais idosos suscetíveis à doenças severas, a maioria talvez, tenha perdido os

dentes. Em todos os níveis de severidade, a doença periodontal é mais prevalente nos homens

que nas mulheres. A hipótese justificativa dada pela referida Academia foi que a higiene bucal

masculina é mais pobre que a feminina e que as mulheres buscam o atendimento odontológico

com mais freqüência. O fator genético como explicação, foi descartado.

Pesquisas confirmam a maior procura do serviço odontológico por mulheres. Alconffe

(1989), teve sua pesquisa integrada por 56 mulheres e 28 homens. Croucher; Marcenes;

Torres; Hughes; Sheiham (1997) pesquisaram junto a 68 mulheres e 32 homens. Pompeu;

Toledo; Sampaio (1997), descreveram em trabalho realizado em clínica-escola no ano de

1989, que dos 210 pacientes que procuraram o serviço odontológico, 134 (63,8%) eram

mulheres, cuja faixa etária foi de 31 a 40 anos, correspondendo a 31% de todos os pacientes.

Em todas as faixas etárias, a maior procura foi de mulheres e adolescentes. A amostra de

Chambrone; Chambrone (2001), foi constituída de 114 mulheres e 66 homens. Machion;

Freitas; César Neto; Nogueira Filho; Nociti Jr. (2000), ao pesquisarem a influência do gênero

e da idade na prevalência de bolsas periodontais em 100 pacientes atendidos em uma clínica-

escola, observaram maior prevalência de bolsas entre homens que em mulheres. Os autores

concordam com a explicação de que a higiene bucal dos homens é mais empobrecida se

comparada com a das mulheres, o que favorece maiores depósitos de cálculo e placa

bacteriana. Em relação à faixa etária, a prevalência evidenciou-se maior em indivíduos com

idades de 31 a 50 anos. Wolf; Rieger; Boening; Walter (2001), também verificaram tais

diferenças quanto à higiene bucal entre os gêneros. O estudo de Lagervall; Jansson;

Bergström (2003), foi composto de 1006 pacientes, dos quais 580 eram mulheres e 426 eram

homens.

Quanto aos fatores de risco sistêmicos e fatores indicadores, Genco (2002), cita:

tabagismo, diabetes mellitus, síndrome da imunodeficiência adquirida e outras

imunodeficiências, alterações neutrofílicas, osteoporose, fatores da dieta, stress e desordens

psicológicas e fatores genéticos.

Esse mesmo autor esclarece a importância de se realizar estudos sobre o papel da dieta

e do uso de suprimentos nutricionais no metabolismo ósseo na resposta inflamatória, pois

quantidades de cálcio, vitamina C, por exemplo, podem aumentar o risco de doença

periodontal ou diminuir a capacidade de reparo. Efeitos de medicamentos também

influenciam a doença periodontal, além dos fatores de risco locais: microbiota periodontal,

higiene bucal, placa bacteriana e cálculo dental, sangramento à sondagem e doença

periodontal pré-existente.

A doença periodontal pode estar associada a uma saúde geral deficiente (LAGERVALL;

JANSSON; BERGSTRÖM, 2003). Aleksejuniene; Hoist; Eriksen; Germo (2002), relataram que

entre os sujeitos de nível sócio-econômico mais baixo, havia maior índice de perdas dentais e

mais problemas de saúde geral, especialmente nas pessoas mais velhas.

O tabagismo vem sendo confirmado como fator de risco (portanto, predisponente) para

doença periodontal há muito tempo, como mostram Couto; Couto (1992); Silva; Newman;

Oakley (1995); American Academy of Periodontology (1996, 1999, [b] 2001); Croucher et.

al., (1997); Pompeu; Toledo; Sampaio (1997); Papapanou; Lindhe (1999); Sallum et. al.

(1999); Bretz; Chaves (1999); Sallum (2002); Hugoson; Ljungquist; Breivik (2002); Daud

(2003); Hujoel et. al., (2003); Lagervall; Jansson; Bergström (2003). Nos fumantes ocorrem

maiores perdas de inserção, ósseas e de dentes, além de influir fortemente na progressão de

doença. Após o tratamento, foi evidenciado um maior índice de recidivas nos fumantes que

nos não fumantes.

Marcenes; Sheiham (1992); Silva; Newman; Oakley (1995), concordam com Genco

(2002), sobre o fato de que a resistência de certos indivíduos às formas graves de doença

periodontal é que leva à hipótese de que fatores de risco podem modular sua suscetibilidade

ou resistência para doenças periodontais destrutivas. Além disso, periodontites aumentam o

risco de outras doenças sistêmicas. Como declarou Genco (2002, p.12): “O fator de risco

para a doença periodontal é uma característica, um aspecto do comportamento ou uma

exposição ao meio ambiente, que esteja associado à periodontite destrutiva”.

A literatura mostra a importância de se considerar as influências do meio social sobre

a doença periodontal, pois elas podem provocar mudanças na defesa imunológica e prejudicar

o comportamento em relação à saúde. Marcenes; Sheiham (1992), demonstraram que certas

características do trabalho, como nível de demanda, monotonia, liberdade de ação, estão

associadas ao stress, e conseqüentemente, à saúde. Os autores concluíram que aspectos

psicossociais agem sobre o tecido periodontal. Lindey; Mullally; Freeman (1996), também

observaram que stress ocupacional pode ter relação com a progressão da doença periodontal.

Croucher et. al. (1997), verificaram que o desemprego foi significativamente associado com

doença periodontal. Os autores levantaram a hipótese de que o grau de instrução também pode

estar associado com a doença periodontal.

Sallum et. al. (1999), escrevem sobre a possível interferência dos fatores de risco bio-

emocionais no equilíbrio entre saúde e doença periodontal. Deinzer; Hilpert; Bach; Herfort

(2001); Aleksejuniene et. al. (2002); Hugoson; Ljungquist; Breivik (2002), verificaram

através de seus estudos que eventos vitais negativos levam o indivíduo ao ‘stress’, o que

diminui seus comportamentos de auto-cuidados e aumenta os comportamentos prejudiciais à

saúde, entre eles, o tabagismo, alcoolismo, consumo de drogas, por exemplo, posição também

suportada por Arruda (1994); Couto; Couto (1992); Pompeu; Toledo; Sampaio (1997);

Sallum et. al. (1999); American Academy of Periodontology ([a] 2001); Genco (2002).

O fator emocional e o stress já foram identificados como fatores de risco para a

gengivite ulcerativa necrosante aguda (GUNA) desde a II Guerra (SEGER, 1998). Outros

estudos sobre a influência dos fatores psicossocias na periodontite crônica têm demonstrado,

por exemplo, que stress, eventos vitais (HUGOSON; LJUNGQUIST; BREIVIK, 2002;

ALEKSEJUNIENE et. al., 2002), problemas financeiros, viuvez (HUGOSON; LJUNGQUIST;

BREIVIK, 2002), aumentam a possibilidade de ocorrência de doenças periodontais. Solidão e

depressão, muitas vezes, também estão associadas à periodontites mais graves. Os autores

explicam que uma maior ou menor capacidade individual de adaptação às situações de vida

também exercem influência na ocorrência e gravidade das doenças periodontais. Arruda

(1990), explica essa maior ou menor capacidade adaptativa individual aos eventos vitais

através do conceito de plasticidade individual, a ser tratado posteriormente. Vettore et. al.

(2003), concluíram em seu estudo sobre a relação do stress e da ansiedade com a periodontite

crônica, que indivíduos com traços mais elevados de ansiedade eram mais suscetíveis às

doenças periodontais. Solis (2002), entretanto, não encontrou associação da doença

periodontal com sintomas ansiosos, depressivos e sintomas psiquiátricos.

1.3.7 Classificação das doenças periodontais

As doenças periodontais compreendem uma variedade de condições que afetam a

saúde do periodonto. Em 1989, durante o World Workshop in Clinical Periodontics, foi

elaborada uma classificação das doenças periodontais de acordo com sub formas clinicamente

observáveis e que foi amplamente utilizada em todo o mundo. Entretanto, aos poucos,

pesquisadores e clínicos da área da periodontia verificavam dificuldades em categorizar os

pacientes de acordo com aqueles critérios, pois certas manifestações microbiológicas e

respostas do hospedeiro são comuns a várias formas de periodontite. Esse fato gerou um

consenso sobre a necessidade de uma revisão da classificação das doenças periodontais. Essa

revisão objetivava categorias de diagnóstico mais precisas e, cujas definições estivessem

baseadas no conhecimento da etiologia e patogenia das várias sub formas, além dos

parâmetros tradicionais como: sinais de inflamação, testes de profundidade, perda de inserção

e idade do paciente. Assim, durante o International Workshop for a Classification of

Periodontal Diseases and Conditions, realizado entre 30 de outubro a 2 de novembro de 1999,

foi elaborada a atual classificação (AMERICAN ACADEMY OF PERIODONTOLOGY, 1999).

Segundo a American Academy of Periodontology ([a] 2001), as doenças do

periodonto podem ser: doenças gengivais, periodontites, doenças periodontais necrosantes,

abscessos do periodonto e deformidades de desenvolvimento ou adquiridas. A gengivite e a

periodontite são as principais doenças inflamatórias que afetam o periodonto.

As doenças gengivais (item acrescentado à nova classificação) podem ser induzidas

ou não por placa bacteriana. A gengivite induzida por placa (com ou sem fatores

predisponentes locais) pode ser modificada por fatores sistêmicos, por discrasias sangüíneas,

pelo uso de certos medicamentos ou drogas e por má nutrição.

As lesões gengivais não induzidas por placa bacteriana podem ser doenças causadas

por um único organismo; por fungos; por origem viral ou genética, ou podem ser

manifestação gengival de doenças sistêmicas. Essas lesões podem também se originar por

reações alérgicas gengivais, por lesões traumáticas, por reações a corpos estranhos ou podem

ser lesões não especificadas.

A gengivite é reversível através de tratamento que reduza os fatores etiológicos da

inflamação, o que possibilita a recuperação gengival. Terminado o tratamento, é importante

manter uma terapia de suporte para evitar uma recidiva inflamatória. Essa terapia de

manutenção inclui cuidados profissionais e também do próprio paciente (AMERICAN

ACADEMY OF PERIODONTOLOGY, [b] 2001).

Quanto à periodontite, a referida Academia caracteriza-a como uma inflamação

gengival e de todo seu aparato adjacente tendo, como conseqüência, perda de inserção

progressiva e perda do osso alveolar. A periodontite pode apresentar-se de diferentes formas:

periodontite crônica (antiga periodontite do adulto), agressiva (antiga periodontite juvenil),

como manifestação de doenças sistêmicas, como doença periodontal necrosante, como

abscesso periodontal e como periodontite associada à lesões endodônticas. Rodrigues (2002),

esclarece que a periodontite crônica é a forma mais comum da doença periodontal destrutiva.

A periodontite crônica é caracterizada de acordo com sua extensão e severidade

(grau de perda de inserção). Quanto à extensão, a periodontite pode ser localizada (até 30%

dos sítios são afetados) ou generalizada (mais de 30% dos sítios são afetados). Quanto à

severidade, a periodontite pode ser leve (perda de inserção de 1-2 mm), moderada (perda de

inserção de 3-4 mm) ou severa (perda de inserção = 5 mm ou mais). A periodontite pode ser

classificada ainda como recorrente ou refratária, dependendo de seu status após o

tratamento.

A periodontite agressiva pode ser localizada ou generalizada.

A periodontite como manifestação de doenças sistêmicas (antiga periodontite pré-

puberal) pode ser associada a desordens hematológicas, genéticas ou outras não especificadas.

As doenças periodontais necrosantes (antiga gengivite ulcerativa necrosante aguda)

são: gengivite ulcerativa necrosante (NUG) ou periodontite ulcerativa necrosante (PUG).

Os abscessos• podem ser gengivais, periodontais ou pericoronarite.

Periodontites associadas a lesões endodônticas• são lesões periodonto-pulpares

combinadas.

As periodontites por deformidades, condições de desenvolvimento ou adquiridas

referem-se aos fatores relacionados ao dente que predispõem ou modificam a gengivite

induzida por placa ou periodontites; às deformidades mucogengivais e outras condições ao

redor dos dentes ou em rebordos edêntulos e ao trauma oclusal (AMERICAN ACADEMY OF

PERIODONTOLOGY, 1999).

O tratamento das periodontite proposta pela American Academy of Periodontology

([b] 2001) pressupõe duas etapas: a primeira compreende um tratamento antiinfecção, pela

remoção dos fatores etiológicos para estagnar a progressão da doença periodontal. A segunda

etapa é o tratamento regenerativo que inclui a terapia antiinfecção para restaurar as estruturas

destruídas pela doença. É essencial incluir em ambas etapas, procedimentos de manutenção.

1.4 O Significado Psicanalítico da Boca

O ser humano, além de sua constituição material e biológica, é também constituído por

manifestações que chamamos de sentimentos, sensações, percepções e desejos. A estas

manifestações chamamos de psiquismo (WOLF, 2002).

O psiquismo desenvolve-se a partir do início da vida da criança, através de suas

interações com o meio ambiente. Ao nascer, o bebê é um organismo dotado de mecanismos

instintivos. Klein (1936, 1946-1963), explica que à medida que as necessidades instintivas são

satisfeitas pelas pessoas que o rodeiam, produzem-se no recém-nascido, experiências e

sensações cujos registros começam a delinear sua vida mental ou psíquica. Essa também é a

visão de psiquismo, adotada por Soifer (1985); Briganti (1999); Wolf (2002).

Na teoria de Klein (1936), quando o bebê tem suas necessidades biológicas satisfeitas,

a possibilidade de sobrevivência é grande. Dessas necessidades, muitas são supridas

• Itens diagnósticos que não constavam na classificação diagnóstica de doença periodontal e que passaram a ser considerados a partir de 1999.

automaticamente por um processo homeostático de seu organismo. Entretanto, para a

satisfação da fome ou da sede, o bebê depende de pessoas com as quais vai estabelecer os

primeiros vínculos de sua vida. São esses vínculos iniciais que fornecem as experiências mais

importantes para a constituição de sua personalidade. Arruda (1990), entende que as

primeiras relações humanas constituem-se a partir da alimentação e da higiene, através das

quais o bebê vai experimentar a satisfação da fome e do conforto. A criança pode, às vezes,

rejeitar o alimento e, numa fase posterior, até mordê-lo. Assim, ao redor das satisfações orais

é que se organizam os primeiros laços afetivos e agressivos.

Ainda sobre o desenvolvimento do psiquismo, Klein (1936, 1946-1963); Segal (1982),

acreditam que a carga biológica em interação com a família, mais o grupo social, a história

pessoal de relacionamento com os outros e a constante estimulação ambiental concorrem para

o desenvolvimento das tendências comportamentais de um indivíduo. Estas, serão sua

característica pessoal e refletirão seu ajustamento no mundo durante toda sua existência. A

história pessoal e as primeiras relações mãe/bebê facilitam ou entravam o desenvolvimento do

direito à individualidade e do direito a uma vida adulta vivida com prazer. A força do

inconsciente parental pode dificultar ou até impedir as realizações na idade adulta.

A Psicanálise foi a primeira teoria psicológica que demonstrou ser a boca um órgão

fundamental para a sobrevivência e por onde se inicia a vida psíquica do ser humano, pois é a

região através da qual as primeiras relações com o mundo (WOLF, 2002).Como explicam

Marcchioni; Galli; Gallo (1998, p. 86):

“A boca constitui a primeira fonte de estimulação e excitação

sensorial, à qual estão associadas, por sua vez, as primeiras

experiências de prazer, frustração e dor. É um local de ampliação de

estímulos, tanto agradáveis quanto desagradáveis. É, portanto, pela

boca que vivenciamos as primeiras experiências de amor e satisfação

associadas às de frustração e agressividades”.

Sugar e deglutir são, segundo Klein (1936), mecanismos instintivos mais

desenvolvidos por ocasião do nascimento. Sugando e deglutindo o leite, a criança não só

recebe o alimento essencial para sua sobrevivência, mas também vivencia as primeiras

experiências de prazer, e como complementa Arruda (1990), sugar é também descarregar

tensões. São experiências que marcam o início da vida psíquica do ser humano. Assim,

acreditam Giordano; Cunha; Silveira; Nacif; Braz (2000); Wolf (2002), que a maturação

orgânica e as condições nas quais a criança é amamentada contribuem decisivamente para a

constituição psicológica do indivíduo.

Esses autores, baseando-se na teoria kleiniana, entendem que o interesse em conhecer

o mundo é fundamental para a criança. Desde o nascimento, as primeiras sensações

emocionais, intelectuais e de sobrevivência ocorrem através da boca. Este órgão é

considerado pelos autores como o lugar das primeiras necessidades psicológicas do bebê e de

suas primeiras gratificações emocionais, sendo a sucção, a atividade mais gratificante e

absorvente nos primeiros meses de vida, quando, além de alimentar, a criança passa a sentir o

‘gosto’ do mundo externo.

De acordo com Wolf (2002), a boca representa uma região muito importante do ponto

de vista sensorial e de exploração do mundo. Juntamente com os olhos e as mãos, o bebê

‘informa-se’ sobre as coisas do mundo ao levar os objetos à boca, mordendo-os ou chupando-

os. Atividades como mastigar, falar, beijar, chorar, sorrir, concorrem para o desenvolvimento

muscular, facial e psicológico. Assim como Klein (1936); Segal (1982), também Giglio

(1983); Giglio; Guedes-Pinto; Duarte (1997); Giordano et. al. (2000), acreditam que as

experiências pelas quais a criança passa, especialmente nos dois primeiros anos de vida vão

determinar muito de suas características de personalidade.

Ainda sobre a importância da boca para desenvolvimento humano, Sharpe (1936,

p. 55), escreve: “Embora a boca não tenha nunca o monopólio da sensação e da ação, ao

nascimento constitui o órgão mais agudamente sensível e mais eficientemente atuante do

corpo, e o comportamento do bebê se orienta em torno da sensação da boca”.

O desenvolvimento infantil nesse período de vida foi chamado por Freud, de ‘fase

oral’. Nos primeiros meses dessa fase, a parte do organismo mais desenvolvida é a boca, pois

os movimentos dos lábios e da língua possibilitam o funcionamento adequado dos reflexos de

sugar e deglutir o alimento fundamental para a sobrevivência. Por essa razão, o interesse da

criança fica centralizado nessa região do corpo onde a troca vital acontece; a sensação de

prazer de ser aliviada da desagradável tensão da fome fica registrada no psiquismo (KLEIN,

1936). Se as experiências de amamentação são agradáveis, a criança sente a presença da mãe

como amorosa, estabelecendo um contato gratificante e de confiança. Esse contato vai

contribuir para o futuro bem-estar e segurança emocional da criança (ARRUDA, 1990;

TOLEDO; ROCCA, 1996; GIORDANO et. al., 2000; WOLF, 2002), além de contribuir para o

desenvolvimento de uma estrutura psíquica saudável (KLEIN, 1936; BION, 1967).

Segundo Klein (1936); Bion (1967); Segal (1982), a criança sente e registra

inconscientemente, através da amamentação, o amor, a paciência e a compreensão da mãe.

Esses sentimentos favorecem um desenvolvimento positivo da criança. Esta, aprende a

receber e reter o que lhe é dado e tal sentimento de confiança favorece o desenvolvimento e

sua habilidade de fazer contatos. O seio materno ou tudo aquilo que o substitui é fundamental

nessa fase, pela forte relação que se cria entre mãe e filho, relação esta fundamental para todo

o desenvolvimento futuro. Quando essa continência afetiva da mãe não é sentida pelo bebê,

ele chora, recusa-se a mamar, vomita, evita contatos, grita parecendo muitas vezes,

inconsolável. Essa criança tende a ser desconfiada, insegura e com dificuldades de

relacionamentos no futuro.

Bion (1967), explica que nos primeiros instantes de vida, a dependência do bebê é

absolutamente natural. No início de sua evolução pós-natal, o recém-nascido precisa recorrer

a seus precários meios de comunicação para despertar na mãe, as sensações e os sentimentos

das necessidades que vivencia a cada momento. Como o bebê ainda não percebe seu

sentimento de necessidade como tal (embora sinta o desconforto), ele trata de libertar-se das

sensações corporais perturbadoras através do choro, da agitação. É a tentativa que o bebê faz

de comunicar sua necessidade. Seu desejo é despertar na mãe a mesma angústia que sente

para que ela venha acudí-lo, aliviá-lo do que é perturbador. Se a mãe é capaz de identificar

esse estado mental perturbado do bebê e lhe dá carinho, e se aos poucos ela vai aprendendo

quais são as necessidades do bebê, ele começa a estabelecer suas primeiras ‘relações

objetais’• positivas. Essas relações objetais vão despertar no bebê sentimentos de bem-estar,

segurança e amor mas, principalmente, uma sensação de que o mundo é bom, confiável. Bion

(1967), chamou de ‘réverie’ a este envolvimento materno voltado para a compreensão da

angústia do filho, a essa capacidade de identificação da mãe com o sofrimento da criança.

Pode ocorrer que a mãe amamente seu bebê, mas ele não consiga sentir-se amado e

suficientemente compreendido por ela, por sentí-la muito ansiosa. Ou ainda, que a mãe não

consiga decodificar a mensagem passada pelo bebê. Essa falta de ‘réverie’ materna é sentida

pelo bebê como sendo ela incapaz de identificar-se com ele. A conseqüência desse sentimento

de distância da mãe fará com que o bebê comece a formar relações objetais que ele sente

como ‘más’, ou seja, sua sensação será de que o mundo é mau e que as pessoas são pouco

confiáveis. Bion exemplifica que a mãe capaz de manifestar ‘réverie’ pelo bebê é aquela que • A palavra ‘objeto’ foi inicialmente utilizada por Freud para referir-se a pessoas, coisas ou situações. Relações objetais são relações afetivas. Relações objetais positivas referem-se àquelas relações gratificantes, prazerosas (LAPLANCHE; PONTALIS, 1970).

o ensina a mamar e não, simplesmente, coloca o seio em sua boca. Da mesma maneira, é

paciente com suas primeiras iniciativas de marcha e linguagem (RIVIÈRE, 1958; BION, 1967).

1.5 O Significado Psicanalítico dos Dentes

Klein (1946); Rivière (1958); Soifer (1985), consideram o nascimento dos dentes

como um marco muito importante na vida do indivíduo e de grande significado para seu

desenvolvimento emocional. Esse ponto de vista também é compartilhado por Giglio (1983);

Wolf (2002); Corrêa; Ulson (2002). O aparecimento dos dentes decíduos acontece geralmente,

por volta do sexto mês. Nesse momento, surgem novas experiências para o bebê, pois ele

agora pode atuar sobre o meio, seja modificando alimentos ou, principalmente, pela expressão

da agressividade através do ato de morder. Rivière (1958), esclarece que essas novas

vivências se fazem acompanhar por significativas mudanças na organização psíquica do bebê.

Giglio (1983, p. 39), descreve a mudança de atitude do bebê, “de passivo recebedor para

ativo destruidor, como sendo o principal aspecto psicológico da primeira dentição”. Segundo

Rivière (1958), como o nascimento dos primeiros dentes coincide com o desmame, os dentes

também simbolizam o sentimento de perda do amparo da mãe, a perda do estado simbiótico

com a mãe. Soifer (1985), denomina o período da fase oral em que surgem os dentes de ‘fase

oral canibalística’. Nesta, o amor ao seio é contrabalançado pelo sadismo oral derivado do

impulso de morder, triturar, destroçar. Ainda segundo as mesmas autoras, o prazer que era

obtido antes com a sucção passa a ser obtido através do ato de morder. Ao morder, o bebê

revela sinais do que sente: necessidade de atenção, frustração, stress, além de se aliviar,

descarregando suas tensões. O bebê, em condições normais de desenvolvimento, deixa de

morder quando aprende a falar, ou seja, passa a ter outra forma de comunicação.

Para teóricos como Rivière (1958), e para autores que têm essa mesma visão, como

Giglio (1983); Wolf (2002); Corrêa; Ulson (2002), além da força e potencial agressivo, os

dentes também são uma defesa para o bebê, à medida que ele pode causar danos ao meio

exterior. Como os dentes nascem no mesmo tempo que outras estruturas orgânicas estão

amadurecendo, o bebê já pode manifestar certos atos voluntários, o que lhe dá um certo

controle sobre o mundo. Os dentes passam a simbolizar força, agressão, atitude ativa,

independência. A agressão é muito positiva para a criança, pois ela passa a perceber seus

limites de ação à medida que ela vivencia as reações do mundo à sua agressividade (a criança

sente que pode destruir, mas também que esta agressividade pode fazê-la perder aquilo que

ama).

Durante a erupção dental, além das possíveis manifestações sistêmicas como coriza,

febre, diarréia, edemaciamento gengival, todas muito desconfortáveis para o bebê, às vezes

ocorrem transtornos emocionais que se apresentam como insônia, choro, humor irritadiço,

maior necessidade de colo, medos frente a estímulos inofensivos e ansiedade. O bebê precisa

ser ajudado a transpor essa etapa para que não resulte mais tarde em conflitos emocionais.

Embora as respostas comportamentais dos bebês variem nesta fase (mais exacerbada em uns

do que em outros), sabe-se que frustrações geradas pela incapacidade de lidar com situações

conflitantes na vida adulta podem ter sido geradas pela falta de atenção dos pais a esse

período. Corrêa; Machado (2002, p. 153), escrevem: “Vale lembrar que o bebê necessita de

ajuda para assimilar positivamente novas emoções experimentadas, principalmente se num

primeiro momento elas geram desconforto”.

Certos órgãos, sistemas e partes do corpo adquirem uma significação afetiva especial

dependendo dos acontecimentos marcantes durante as principais fases de desenvolvimento.

“Estes conhecimentos e progressos adquiridos no estudo da mente infantil e da relação da

criança com o ambiente, permitiram compreender a chamada linguagem dos órgãos”

(MELLO FILHO, 2002, p. 37). Dificuldades emocionais durante a fase oral podem fazer da boca

e dos dentes um órgão de choque, ou seja, quando em certas circunstâncias de vida, o ser

humano não consegue expressar-se através da linguagem verbal e das ações motoras, ele vai

utilizar-se da linguagem dos órgãos. Assim, de acordo com Osório (1993); Mello Filho

(2002), em situações de conflito, aqueles indivíduos que têm a boca como órgão de choque,

poderão apresentar sintomas físicos nessa região como forma de comunicar suas angústias.

A boca e/ou os dentes tornam-se ‘órgãos de choque’ se houver uma fixação na fase

oral. Soifer (1985), explica que situações traumáticas ocorridas na fase oral fazem com que as

defesas nesse momento evolutivo de vida inclinem-se para sustentar o ego, sendo que uma

parte dele, fica detida, ou seja, fixada, nessa fase.

Hoje, sabe-se que toda a região oral possui um significado muito profundo. Wolf

(2002), através de pesquisa sobre perdas dentais, concluiu que as doenças na região oral não

apenas indicam problemas de saúde física, mas também de postura do ser humano frente ao

mundo. De acordo com a autora:

“Evidenciaram-se os significados psicológicos do nascimento e da

perda dos dentes, tanto em sua dimensão estruturante da

personalidade, quanto em sua contribuição para a formação da

identidade do sujeito, constituída em conformidade com o grupo

cultural ao que pertence” (WOLF, 2002, p. 172).

Problemas nos dentes, portanto, podem ser profundamente danosos para o ser humano,

como sugere Wolf (2002, p. 156): “...se o nascimento dos dentes constitui etapa tão

importante na organização psíquica, sua perda poderá implicar em alterações com

conseqüências para a vida emocional do sujeito”.

1.6 Psicossomática

Um dos temas de importância cada vez maior para o entendimento do ser humano é a

relação mente-corpo. Esse é o objeto de estudo da Medicina Psicossomática, cujo estudo visa

ampliar a compreensão do fenômeno da saúde e da doença. Apesar dessa nomenclatura ser

recente, a interação mente-corpo, bem como dos problemas que caracterizam a natureza

humana são conhecimentos que acompanham a história da Medicina, o que pode ser

observado na literatura deixada pelos grandes pensadores, através dos tempos (PACHECO E

SILVA, 1976; HAYNAL; PASINI, 1983; LIPOWSKI, 1984; SCHWAB, 1985; ARRUDA, 1990;

VOLICH, 2000; MELLO FILHO, 2002).

Silva; Caldeira (1992); Rodrigues; Gasparini (1992), esclarecem que o termo

psicossomática foi introduzido em 1818, pelo psiquiatra alemão Heinroth, para designar as

doenças somáticas cuja etiologia encontrava-se nos aspectos mentais. Medrano (2002),

complementa que o próprio Heinroth introduziu, cerca de 20 anos mais tarde, a expressão

somato-psíquico. Segundo Lipowski (1984); Schwab (1985), o cientista Heinroth afirmava

que a insônia era geralmente psicossomática e que cada fase da vida poderia criar condições

para o surgimento da insônia. Já a expressão Medicina Psicossomática foi provavelmente

introduzida por Felix Deutsch, em 1922 (LIPOWSKI, 1984).

Psicossomática é um campo interdisciplinar que reúne profissionais de diferentes áreas

da saúde e que reconhecem a íntima relação entre funcionamento somático, seus

desequilíbrios, a vida psíquica do indivíduo e sua inserção no social (LEME; JUNGSTEDT;

ANTUNES; LOWENKRON; PROENÇA, 1988).

Lipowski (1984); Arruda (1990); Mello Filho (1992); Perestrello (1996), explicam que

a palavra psicossomática é considerada imprópria por vários autores, pois poderia impor o

psíquico sobre o somático, além de não abranger os fenômenos sociais e culturais que

influenciam o homem, quer na saúde, quer na doença. Segundo Arruda (1990), esse impasse

poderia ser resolvido com a expressão sócio-psicossomática. Entretanto, esta poderia sugerir

aos menos esclarecidos, uma maior predominância do social sobre a doença, assim como

doença psicossomática poderia sugerir predomínio do psíquico sobre o somático ou ainda

como poderia sugerir, na expressão doenças somato-psíquicas, o predomínio do somático

sobre o psíquico. Para Mello Filho (2002), o acréscimo dos fatores sociais ao termo

‘medicina’ poderia originar a medicina psico-sócio-somática. Entretanto, sugere o autor, em

concordância com Lipowski (1984) e Arruda (1990), que se mantenha o termo

psicossomática, embora incorreto, por ser este melhor entendido pelos clínicos.

1.6.1 Considerações históricas

Schwab (1985); Mello Filho (2002) relatam que uma das características da Grécia

Antiga foi a expansão do conhecimento humano que favoreceu o esboço de concepções e das

práticas médicas mais próximas do científico. Portanto, os autores sugerem que o movimento

da Psicossomática iniciou-se há 2500 anos.

Quanto aos aspectos históricos da Psicossomática, Mello Filho (2002), conta que a

medicina pré-helênica falava da natureza influenciando o homem, através de suas concepções

mágico-animistas. Na Grécia pré-hipocrática, a medicina ainda era mágica, porém, alguns

pensadores já se voltavam para observações e experimentações. Alcmeon pode ter sido o

primeiro a dissecar um cadáver e afirmar que o cérebro era o centro da alma e da razão.

Heráclito chamou a atenção para o homem enquanto uma identidade, idéia reforçada por

Protágoras, que acreditava ser o homem, a medida de todas as coisas. Empédocles valorizou

as emoções ao afirmar que amor e ódio eram as principais fontes da vida e de suas alterações.

Até então, a mente humana era considerada domínio da filosofia.

Ainda dentro do contexto histórico, Lipowski (1984); Schwab (1985); Volich (2000);

Mello Filho (2002), relatam que Hipócrates, o pai da medicina, alertou para a importância de

se examinar cuidadosamente o paciente e de se conversar com ele. A prática hipocrática

onsiderava de relevante importância perguntar sobre as circunstâncias nas quais se iniciaram

as queixas e quais eram os hábitos e condições de vida do paciente, além de buscar

informações junto a familiares do paciente, sobre o que sabiam a respeito da doença. Pacheco

e Silva (1976), escreve que durante as aulas para os estudantes de medicina, Hipócrates

orientava que, ao iniciarem o exercício profissional numa cidade, observassem sua topografia,

a natureza do solo, os ventos dominantes, a provisão de água, os costumes, as tendências e

inclinações do povo. Mello Filho (2002), acrescenta que Hipócrates preocupava-se com a

doença física e os problemas mentais. Para ele, a doença era um desequilíbrio humoral do

corpo como conseqüência do temperamento, das influências ambientais e das ações atuais do

paciente. Hipócrates também descreveu o cérebro como órgão do pensamento.

Ainda segundo Mello Filho (2002), Platão também contribuiu para a compreensão

integral do homem, intuitivamente. Apesar de suas concepções divisionistas e racionalistas•

tão diferentes das hipocráticas, Platão intuiu que quando a alma atuava fortemente no corpo,

aconteciam mudanças mentais que afetavam o corpo, podendo chegar, inclusive, à destruição.

Pacheco e Silva (1976), acrescenta que ele censurava a existência de médicos para o corpo e

outros para o espírito, já que o homem era considerado por ele, um todo integral e indivisível.

A concepção de que todas as afecções da alma afetavam o corpo foi compartilhada por

Aristóteles. Para este, quando amor, medo, ódio estivessem atuando, estariam afetando o

corpo.

Continuam contando Pacheco e Silva (1976); Volich (2000); Mello Filho (2002), que

as doutrinas racionalistas e a invasão da Grécia pelos romanos impediram maiores

contribuições psicológicas à medicina. As exceções deveram-se a Cícero, com sua descrição

dos distúrbios de caráter e a valorização do tratamento médico voltado para a alma. Também

Areteo demonstrou a mania e a depressão como possíveis fases de uma mesma doença e

defendeu a importância de ouvir o que pensava e sentia o paciente, para avaliar o seu estado

mental. Foi um dos primeiros a admitir a possibilidade de que doenças psicológicas poderiam

causar doenças físicas (mencionou paralisias causadas por perturbações emocionais). Já

Galeno, discípulo de Hipócrates, dizia que alcoolismo, adolescência, perturbações da

menstruação, fracassos econômicos e afetivos poderiam causar doenças mentais. Galeno

destacou as causas psicológicas da doença e o papel das emoções como fator etiológico em

uma extensa variedade de doenças, incluindo as contagiosas e as epidêmicas.

• Platão acreditava que o homem possuía duas almas, uma delas, racional e mortal, onde habitavam os afetos e as emoções, considerados inferiores (MELLO FILHO, 2002).

Quanto ao declínio geral da cultura e das artes da Idade Média, Schwab (1985);

Arruda (1990); Volich (2000); Mello Filho (2002), descrevem como as ciências e a prática da

Medicina foram afetadas. Com o domínio da Igreja, as estruturas sociais e as funções mentais

passaram a ser domínio dos sacerdotes. Os médicos só poderiam cuidar dos males do corpo.

Nessa época, vigorava a teoria cartesiana de entendimento do homem. Em seu Discurso do

Método, em 1637, Descartes escreveu que o estudo da mente era prerrogativa dos teólogos, já

que acreditava que só o corpo era passível de estudo científico. Para Descartes, o homem

constituía-se de mente (res cogitans) e corpo (res extensa), unidos pela glândula pineal. Com

isso, voltou a crença na divisão mente-corpo que predominou nos primórdios da medicina,

com exceção do período helênico. Esta dicotomia vigorou até muito recentemente nos meios

médicos. Segundo Lipowski (1984), a teoria cartesiana derrubou temporariamente a

concepção holística dentro da Medicina. Entretanto, não perturbou a concepção psicogênica

da doença. Mais tarde, Descartes reconheceu que as paixões eram fenômenos do corpo que

poderiam influenciar funções somáticas, inclusive, com efeitos patogênicos.

1.6.2 Precursores da Psicossomática

Pacheco e Silva (1967), cita o médico francês Pierre Jean Georges Cabanis como

merecedor do título de pai da Medicina Psicossomática. Em 1843, Cabanis publicou o livro

‘Relações do Físico e do Moral’, onde defendia a idéia de que as ciências morais deveriam

fundar-se no conhecimento físico do homem. Entretanto, esse conhecimento só seria completo

se o estudo das funções orgânicas não fosse negligenciado, pois elas concorrem para a

formação do pensamento e da vontade. Pensamento e vontade, por sua vez, exercem

influência sobre todo o corpo vivo.

Em 1859, Claude Bernard alertou para a necessidade de manutenção da estabilidade

do meio interno como condição para uma vida livre (ARRUDA, 1990).

Segundo esse mesmo autor, Darwin, em 1871, em sua teoria da evolução, propôs que

o cérebro humano desenvolvera mecanismos para a regulação das quatro funções fisiológicas

básicas: fome, agressividade, fuga e atividade sexual. Segundo a teoria darwiniana cada ser

animal adaptava-se ao seu meio ambiente buscando locais onde pudesse obter alimentação e

proteção para preservar sua vida. O local escolhido visava uma possibilidade de ataque aos

inimigos, ou fuga destes, se eles fossem mais poderosos. Além disso, a preservação da espécie

era mantida pela busca de uma companheira para a criação de descendentes.

Haynal; Pasini (1983), citam Maudsley, que em 1876, escreveu o livro ‘The

Pshysiology of Mind’. Nele, Maudsley defende, entre outras idéias, que se a emoção não é

liberada, ela se agarra aos órgãos, perturbando o seu funcionamento. Se o desgosto for

expresso por gemidos e lágrimas, é rapidamente esquecido. Porém, o sofrimento mudo que

fica remoendo o coração pode abatê-lo.

As descobertas da Microbiologia e da Anatomia Patológica na segunda metade do

século XIX e da Fisiopatologia, no século XX, reforçaram as concepções materialistas da

medicina (HAYNAL; PASINI,1983; MELLO FILHO, 2002). Complementam Schwab (1985);

Arruda (1990), que a tecnologia e a especialização adquiridas nessa época focaram o corpo e

excluíram a mente ou os fatores mentais. Os estudos sobre patologia celular de Virchow, as

descobertas bacteriológicas de Pasteur e Koch, contribuíram com que retornasse a teoria

cartesiana, ao propagarem que para cada doença havia uma única causa.

Apesar da obscuridade em que a Medicina Psicossomática penetrou no século XIX,

seus conceitos não desapareceram por completo. Schwab (1985), cita Sir William Osler, que

em 1893 reviu as afirmações platônicas e preconizou que no futuro, a medicina poderia

reconhecer a interdependência entre mente e corpo de maneira que naquela época se pensava

impossível. De fato, um ano após esse discurso de Osler, Hughes publicou um artigo no qual

explicava que as funções orgânicas eram influenciadas pelas emoções, tanto na saúde quanto

na doença, sendo mediadas pelos sistemas nervosos: central e vegetativo. Como postulou

mais tarde Lipowski (1984), um enfraquecimento significativo das resistências do sistema

nervoso central possibilitaria e precederia o surgimento de todos os tipos de câncer.

A ordem social no Ocidente foi convulsionada com a I Grande Guerra, mas o

movimento psicossomático voltou a crescer depois dos anos 20 (SCHWAB, 1985).

Selye, em 1936, realizou estudos sobre o stress e as doenças de adaptação, verificando

que o ser vivo tende a responder de forma uniforme e inespecífica, anatômica e

fisiologicamente falando, aos diferentes tipos de stress a que é submetido. Segundo Schwab

(1984), Selye sustentava que o stress poderia ser o denominador comum de todas as reações

adaptativas do corpo. Entretanto, ele alertava que tanto o stressor quanto o stress só poderiam

se mensurados a partir de respostas psicofisiológicas. Os fatores estressantes seriam, por

exemplo, perdas financeiras, familiares ou quaisquer outros eventos que levassem a mudanças

emocionais e freqüentemente físicas, levando ao stress. Qualquer ameaça à vida representaria

um stress e, portanto, provocava respostas adaptativas, das quais o organismo participava na

sua totalidade. Essa reação foi chamada de Síndrome Geral de Adaptação e é constituída por

três fases: alarme, resistência e esgotamento. Arruda (1990), esclarece que embora Selye não

atribuísse importância aos elementos de natureza emocional como causadores do stress, sua

teoria sobre adaptação influenciou substancialmente Cannon, que em 1939, propôs o Princípio

Geral da Homeostase. Sobre a importância dos trabalhos de Cannon, Schwab (1985), conta

que suas pesquisas sobre adrenalina, glândulas endócrinas e sistema nervoso autônomo

estimularam o desenvolvimento da Psicofisiologia, área que forneceu grande suporte aos

conceitos de Psicossomática.

Ainda esses mesmos autores relatam que foi no decurso da II Grande Guerra que ficou

comprovada a influência dos fatores psicógenos sobre o desencadeamento das doenças

somáticas, o que concorreu fortemente para o impulso da Medicina Psicossomática. Esse fato

é descrito na citação de Pacheco e Silva (1967, p. 16): “A Medicina Psicossomática sofreu,

desde aí, grande impulso, granjeando adeptos em toda parte”.

Em virtude da guerra, milhões de soldados e civis sofreram profundos abalos

emocionais, cujas conseqüências, próximas ou remotas, comprovaram os efeitos danosos das

desordens emocionais sobre a saúde física (SEGER, 1998). A autora descreve historicamente a

descoberta da doença gengival necrosante, por Plaut, em 1894, e por Vincent, em 1896, que

foi inicialmente conhecida como infecção de Vincent. A doença teve grande incidência entre

soldados durante a I Guerra Mundial sendo chamada de ‘boca de trincheira’. Supunha-se que

fosse contagiosa e que sua origem estivesse na falta de adequada higiene oral associada à

deficiente alimentação. Somente em 1949, durante a II Grande Guerra, é que Schluger

observou que era a tensão que aumentava a incidência da doença e não o contágio. Hoje, as

doenças periodontais graves estão associadas à história de ansiedade aguda.

Ainda sobre os precursores da Psicossomática, Arruda (1990), cita o médico internista

do primeiro quarto do século passado, Ludwig Krehl, quando ministrou uma aula inaugural

intitulada “Forma Mórbida e Personalidade”. Krehl enfatizou que o médico pouco ajudaria

seu paciente se seus conhecimentos baseassem-se apenas nas ciências naturais, reguladas

pelas noções de causa e efeito. Embora o médico não negasse a importância da fisiologia e

sua base proveniente das ciências naturais, ele julgava fundamental destacar que esse tipo de

conhecimento só seria suficiente para a eficácia clínica, se fosse acrescido de conhecimentos

histórico-culturais a respeito de seu paciente. Seu raciocínio foi exemplificado através de dois

pacientes hipotéticos, acometidos de tifo, de uma mesma espécie de bacilo. Krehl explicou

que apesar da mesma entidade mórbida e de semelhantes intensidade de infecção, não se

poderia prever que a evolução dos pacientes seria semelhante, visto que havia uma grande

diferença entre os dois casos: a individualidade de cada um, ou seja, sua constituição.

Lipowski (1984), comenta que em 1925 foi publicado um livro em Viena, contendo

argumentos filosóficos e descrições de observações clínicas de diversas áreas médicas, que

enfatizavam a negligência da Medicina quanto à importância dos fatores psicológicos na

etiologia da doença, bem como no tratamento de pacientes. Dentre os autores estavam

Schilder, Freud, Pavlov e Cannon, que defendiam que o enfoque da medicina deveria ser

sobre o organismo como uma unidade estrutural e funcional, incluindo a psique. Esta

publicação deu subsídios que fundamentaram importante literatura que surgiu dez anos

depois: o livro de Dunbar: “Emotions and Bodily Changes: A Survey of Literature on

Psychosomatic Interrelatonships: 1910-1933”.

Arruda (1990), chama a atenção para as descobertas sobre o funcionamento do sistema

imunológico, um dos mecanismos que explica as interações entre stress e doença, que

revolucionaram a medicina na década de 50. Esse importante avanço ocorreu através da

descoberta da substância reticular e dos estudos de Hess, Magoun, Moruzzi e Bremer.

Também Papez com seus trabalhos sobre o circuito emocional possibilitaram que McLean

descrevesse o funcionamento do ‘lobo’ límbico, mediador das emoções e o mais alto centro

regulador do funcionamento víscero-motor. Estes estudos ampliaram conhecimentos sobre o

mundo emocional humano, que acrescidos de conhecimentos sobre os neuro-hormônios e sua

atuação, possibilitaram uma visão integrada de todo o organismo.

Eksterman (1992), conta que a Medicina Psicossomática entrou para a história da

Medicina brasileira quando o Professor Clementino Fraga Filho autorizou Danilo Perestrello a

fundar a Divisão de Medicina Psicossomática, no Serviço de Clínica Médica do Hospital

Geral da Santa Casa do Rio de Janeiro, em 1958. Entretanto, muitos outros nomes se

destacaram, antes e depois dessa marcante data histórica, sempre buscando a compreensão do

ser humano e a humanização da Medicina. Dentre eles, Torres Homem, Aluízio de Castro,

Miguel Couto, Carlos Cruz Lima, José de Paula Lopes Pontes, Durval Marcondes, Pacheco e

Silva, José Fernandes Pontes, Helladio Francisco Capisano, Luiz Miller de Paiva, Abram

Eksterman, Júlio de Mello Filho.

1.6.3 Contribuições da Psicanálise para o entendimento dos quadros psicossomáticos

A Psicanálise sempre esteve voltada para o campo dos sintomas hipocondríacos,

conversivos e psicossomáticos (ROSA, 1990). Segundo Arruda (1990, p. 17), “Freud pode ser

considerado como pai da Medicina Psicossomática moderna”.

Lipowski (1984), explica que os estudos freudianos sobre a natureza das emoções e

sua influência na etiologia da doença trouxeram um novo instrumental teórico para o estudo

das relações psicossomáticas, através dos conceitos de conflitos inconscientes, regressão e

conversão. Segundo o autor, os sintomas histéricos tinham sua origem quando afetos eram

reprimidos devido a idéias conflitantes para o ego. O conteúdo reprimido era descarregado

através de inervações e sintomas somáticos. Esse processo foi denominado de conversão, ou

seja, a excitação psíquica era transformada em excitação somática. A conversão era

característica da histeria e não explicava a doença orgânica. Através da conversão histérica,

Freud demonstrou causa e cura de uma condição psicofisiológica. Schwab (1985), escreve

que apesar de Freud não ter utilizado a palavra psicossomática, muito do seu trabalho inspirou

colegas e alunos a utilizar princípios da Psicanálise para compreensão e tratamento de

doenças físicas.

Freud mostrou que as reações normais ou patológicas podem ser sempre

compreendidas pelas suas relações de sentido. “... a história do homem também pode ser

entendida como a história das nações pelo encadeamento sucessivo dos eventos. Daí sua

biografia ter enorme valor para compreensão de sua vida, de sua saúde e de seu adoecer”

(MELLO FILHO, 2002, p. 18).

Sobre a influência da teoria psicanalítica para a compreensão das psicossomatizações,

Lipowski (1984), cita também as grandes contribuições de Flanders Dunbar, da escola

psicanalítica de Chicago, que através do livro “Emotions and Bodily Changes”, popularizou o

termo psicossomática (apesar de considerá-lo inadequado) e introduziu a Medicina

Psicossomática como um campo de estudos científico organizado, que visava propagar a visão

holística na prática médica.

Leme et. al. (1988); Arruda (1990), escrevem que Dunbar acreditava que determinadas

características de personalidade estavam associadas à manifestação de certas doenças, o que

permitiria que se traçassem perfis personalidade-doença, ou seja, perfis dos asmáticos, dos

diabéticos, dos acidente-propensos, entre outros. Essa teoria foi sendo abandonada pela falta

de correspondência clínica, dando lugar aos trabalhos de Franz Alexander e seus discípulos,

iniciados em 1932.

Lipowski (1984); Leme et. al. (1988); Arruda (1990), comentam sobre as pesquisas de

Alexander, cujo objetivo era esclarecer o papel do emocional em diversas doenças crônicas de

etiologia desconhecida. Para ele, a doença psicossomática resultava de conflitos inconscientes

associados a fator(es) desencadeante(s) e à vulnerabilidade de um órgão. Alexander distinguiu

as doenças orgânicas dos sintomas conversivos. Para ele, os sintomas conversivos eram a

expressão simbólica do psicológico com manifestações somáticas das doenças orgânicas.

Estas, por sua vez, seriam respostas vegetativas a estados emocionais crônicos (sem qualquer

significado simbólico, portanto). Alexander atribuía essas desordens vegetativas a desordens

orgânicas psicogênicas, ou seja, a todo estado emocional corresponderia uma síndrome

fisiológica, e ambos seriam induzidos por um estímulo emocional. Alexander sustentava que

medo, agressão, culpa e desejos frustrados, se reprimidos, poderiam resultar em tensão

emocional crônica, o que levaria a uma conseqüente disfunção de órgãos do corpo. Conflitos

internos levariam à repressão de desejos e emoções, e conseqüentemente, a um distúrbio da

função de um órgão específico seguindo a analogia da afinidade de certos microorganismos

com partes específicas do corpo. Essa “teoria específica” afirmava que uma “constelação

dinâmica” específica consistia de um conflito nuclear, das defesas contra ele e das emoções

envolvidas, tendendo a uma correlação com uma resposta vegetativa específica.

Arruda (1990), cita ainda a escola de Wolf que, já em 1952, acreditava que cada

indivíduo reage com um sintoma específico frente a uma situação de stress. Assim, toda vez

que acometido de medo, angústia ou vivendo algum desconforto, o indivíduo reagiria com os

mesmos sintomas, como por exemplo, através de desarranjos intestinais. Como

complementam Rodrigues; Gasparini (1992), a doença era considerada uma reação ativa do

organismo e não apenas um efeito de estímulos nocivos.

Em relação à Odontologia, Lorch (1986), cita Freud, que falava do surgimento de

cáries de 24 horas. Uma forte tensão emocional propiciaria o surgimento de cáries.

1.6.4 Conceito atual de Psicossomática

Medicina Psicossomática não deve ser entendida como uma especialidade da

Medicina. De acordo com Lipowski (1984), o termo psicossomática incorpora duas antigas

concepções: a holística e a psicogênica. Esta última considera a função psicológica ou mental

do organismo como sendo o agente causador da doença. Entretanto, o autor acredita que esta

última concepção deve ser descartada, pois psicossomática não implica em causalidade, mas

sim, em relações recíprocas entre fatores psicossociais e biológicos, tanto na saúde, quanto na

doença.

A psicogênese dos transtornos somáticos teve sua origem na observação empírica da

aparente influência dos processos mentais sobre as funções somáticas. Como exemplifica

Eksterman (1992), quando estados emocionais são acompanhados de transformações

somáticas, é difícil resistir à tendência de buscar uma causalidade entre, por exemplo, raiva e

azia. Esse mesmo autor explica que os processos mentais e a própria existência da mente

resultam da atividade biológica e dos múltiplos dinamismos que concorrem para a adaptação

do indivíduo ao meio para manter sua identidade e para a perpetuação da espécie. Portanto, a

pergunta “o que é mental?”, é respondida pelo biológico. Essa é a razão da necessidade de se

entender o homem como um todo (holos) e que implica no estudo da mente como atividade

biológica. Essa visão “refuga as observações ingênuas de seqüências ou concomitâncias

físicas e mentais como indicadores de causalidade, tanto no psíquico para o somático, como

do somático para o psíquico” (EKSTERMAN, 1992, p. 87).

Lipowski (1984); Arruda (1990); Rodrigues; Gasparini (1992); Eksterman (1992);

Perestrello (1996), compartilham do conceito de psicossomática como uma visão holística ou,

principalmente, uma visão bio-psico-social do organismo humano. Mello Filho (2002),

acrescenta que psicossomática, é também um campo de pesquisa.

Segundo Lipowski (1984); Rodrigues; Gasparini (1992), o termo holístico é derivado

do grego “holos” e foi introduzido na literatura, em 1925, por Smuts. Apesar do recente

surgimento da palavra, seus postulados sobre a natureza humana e as recomendações sobre

cuidados médicos já eram encontrados nos discursos de filósofos gregos como Platão,

Aristóteles ou nos ensinamentos hipocráticos. Mesmo no período histórico em que vigorava a

dicotomia cartesiana, as concepções holísticas eram presentes na literatura médica. Lipowski

(1984), cita Gaub e Rush entre os vários defensores da visão holística de homem nessa época.

Conta Lipowski (1984), que Gaub, no século XVIII, acreditava que a razão pela qual

um organismo saudável adoecia ou que o organismo doente se recuperava estava na mente.

Num ensaio escrito em 1763, Gaub comentou sobre os efeitos danosos que sentimentos

reprimidos por muito tempo poderiam trazer ao corpo e à mente. Rush afirmava que a

indivisibilidade da alma e do corpo impossibilitava que um se modificasse sem uma mudança

no outro. Para ele, a mente influenciava muitas funções do corpo, na saúde e na doença.

O autor complementa que no final do século XVIII, Corp escreveu sobre os efeitos

benéficos e patogênicos da mente. Discorreu sobre pensamentos, atenção e emoções como:

esperança, prazer, raiva, medo, luto e ansiedade, enfatizando a dependência entre mente e

corpo. Explicava Corp, por exemplo, que indivíduos com medo ou pavor de doenças eram os

mais propensos a contraí-las durante uma epidemia. Por outro lado, a esperança

provavelmente protegeria o indivíduo, da epidemia.

O International College of Psychosomatic e a Associação Brasileira de Medicina

Psicossomática consideram a concepção de psicossomática como uma atitude da Medicina

Integral, cuja visão de ser humano é de um ser bio-psico-social, na saúde e na doença. Todo

profissional da área da saúde deve acrescentar ao seu saber tradicional sobre ciências naturais

(sinais e sintomas orgânicos), conhecimentos provenientes das ciências humanas e sociais.

Ficam, portanto, descartados os raciocínios etiológicos que tendem ao biologismo,

psicologismo ou sociologismo (RODRIGUES; GASPARINI, 1992).

Sobre a Medicina Psicossomática como atitude da Medicina Integral, Mello Filho

(1992, p. 19), escreve que Psicossomática “é uma ideologia sobre saúde, o adoecer e sobre as

práticas de saúde, é um campo de pesquisas sobre esses fatos e, ao mesmo tempo, uma

prática, a prática de uma Medicina Integral”. A psicossomática envolve o ensino ou a prática

de todo tipo de fenômenos da saúde; interações entre pessoas: sejam as relações humanas

entre membros de uma família ou instituição, ou a relação entre profissional e paciente; a

questão das doenças agudas e crônicas; as reações de adaptação às doenças, invalidez e morte.

A essência da visão holística de homem é entendida por Lipowski (1984); Arruda

(1990); Rodrigues; Gasparini (1992); Eksterman (1992); Perestrello (1996), como a noção de

corpo (soma) e mente (psique) como aspectos mutuamente dependentes e inseparáveis, o que

implica na necessidade de que o médico considere tanto os aspectos mentais ou psicológicos

quanto os físicos ou fisiológicos no estudo da doença e no tratamento dos pacientes. Como

exemplifica Rosa (1990), se uma doente faz uma cefaléia por tensão ou uma angina

coronariana, compreende-se que sua relação com o mundo está perturbada. Se essa

perturbação alcança níveis de lesão, de invasão de microorganismos, de reação imunológica,

de manifestações associadas a conflitos inconscientes, há conflitos com a realidade vivencial,

um grau de mal-adaptação do indivíduo com a vida.

Saúde e doença não são duas instâncias que se opõem. Ao contrário, coexistem num

mesmo organismo. Não existem estados puros de ‘saúde’ ou de ‘doença’. Osório (1993),

esclarece que um momento vital pode ser exteriorizado com predomínio de manifestação

psíquica ou somática, ou seja, cada circunstância do existir humano pressupõe a

preponderância de algum elemento sadio ou mórbido. Para o autor, soma e psique são dois

canais de expressão do mesmo fenômeno vital, o que não permite tomar manifestações

somáticas como tendo uma causa psíquica ou vice-versa. Qualquer que seja a natureza

etiológica do fenômeno, o indivíduo sempre será afetado como um todo e irá expressar-se

através do soma e da psique, simultaneamente, ainda que exteriorize predominantemente, por

um ou pelo outro:

“Um intenso quadro depressivo pode se manifestar somaticamente

apenas sob forma de discretas alterações bioquímicas até há pouco

inindenficáveis pela semiologia laboratorial, assim como o

crescimento de uma massa tumoral maligna pode acarretar apenas

leve alteração no estado de ânimo” (OSÓRIO, 1993 p. 634).

Osório (1993), comenta que para muitos profissionais, um transtorno neurótico parece

mais psicológico, ou uma lesão orgânica parece mais somática, exigindo, portanto, uma

orientação terapêutica, ora através de recursos mais psicológicos, ora através de recursos mais

físicos. O autor explica que o problema não está na patologia, mas na mente do pesquisador

ou do profissional, pois eles é que dissociam a enfermidade e o sofrimento, que são unitários

(psicossomáticos) em sua origem e nosologia.

Quanto à etiologia de uma doença Howard; Lewis (1999) acreditam serem todas

polietiológicas, o que quer dizer que tanto os fatores psicológicos quanto a predisposição

biológica e, em alguns casos, a hereditária, contribuem para o surgimento da enfermidade.

Todas as doenças são psicossomáticas, pois apresentam componentes emocionais na sua

gênese ou na sua manutenção. Porém, não entram nessa discussão, as manifestações

patológicas hereditárias nem moléstias causadas por fatores ambientais como intoxicações

alimentares ou por poluição. Nesses casos, entretanto, é possível que os danos sejam

aumentados em decorrência da tensão psíquica, “... já que o estado emocional da vítima

freqüentemente ajuda a determinar o curso da doença” (HOWARD; LEWIS, 1999, p. 11).

Já Perestrello (1996), entende que todas as doenças são psicossomáticas não existindo

uma distinção nítida e definitiva entre traços hereditários e ambientais, justificando que todos

os traços são hereditários e ambientais, ou seja, os genes, juntamente com o ambiente vão

determinar os caminhos que seguirá o desenvolvimento de uma pessoa. Sobre esse mesmo

assunto, Eksterman (1996, p.7), escreve: “As doenças podem ser ou não psicossomáticas; os

doentes são sempre psicossomáticos”. Também D’Epinay (1983), acredita que toda doença

física é psicossomática e vice-versa.

O atual conceito de Psicossomática, ainda que com pequenas divergências sobre

nomenclatura, é entendido por Lipowski (1984); Arruda (1990); Rodrigues; Gasparini (1992);

Perestrello, 1996; Howard; Lewis (1999); Mello Filho (2000), como o estudo do indivíduo

como ser histórico, como um sistema único constituído por três subsistemas: corpo, mente e

social (bio-psico-social). Por isso, os autores acreditam que a psicossomática busca

compreender o processo do adoecer como resposta de um sistema que vive em sociedade e

não como um evento isolado na vida de uma pessoa. O importante é levar em conta o doente e

não a doença; adoecer é um evento integrado à biografia de cada indivíduo. Numa linha de

raciocínio muito próxima à destes autores citados, porém com maior ênfase nos aspectos

sócio-ambientais, Totman (1982), acredita que instalação e desenvolvimento da doença estão

diretamente relacionados com mudanças de natureza social. Perdas significativas (financeiras,

status, mudanças de país) e o não ajustamento a um novo papel social podem favorecer a

incidência de enfermidades. Deste modo, a simples mudança não é suficiente para a

deterioração da saúde, mas sim, a pressão para mudar a perspectiva cultural, a exposição às

exigências e expectativas sociais desconhecidas é que aumentam o risco da doença. Com essa

posição é que este autor conclui que, indivíduos socialmente envolvidos, melhor ajustados a

um papel estável dentro de uma comunidade são mais resistentes a doenças.

Não importa se a patologia é expressa na área mental, corporal ou social; “o homem

deve ser sempre enfocado como uma unidade” (ROSA, 1990, p. 22), pois a conduta humana é

um fato biológico, psicológico e social e o desenvolvimento do ser é uma fato histórico em

sua totalidade. Rodrigues; Gasparini (1992), concordam e acrescentam que todos esses

componentes do fato histórico só podem ser compreendidos mediante conhecimentos

adequados.

Segundo Pacheco e Silva (1951), um dos precursores da Psicossomática no Brasil,

“Como há uma medicina psicossomática, há também uma odontologia psicossomática que

pode ser definida como as relações entre o bem-estar mental, a saúde e a integridade do

tecido oral” (p. 15). Lorch (1986), cita Mellars e Herms, que já em 1951, percebiam as

interferências do emocional sobre o periodonto de seus pacientes.

Portanto, “... o estado emocional de um indivíduo pode ser considerado como um

potente modificador do processo saúde-doença periodontal, sendo um achado importante na

anamnese” (SALLUM, 2002, p. 56).

1.6.5 Simbolização e mecanismo de formação de sintomas

1.6.5.1 Organização do ego

Klein (1936), descreve o início da organização do ego através de duas posições:

esquizo-paranóide e depressiva. Explica Segal (1981, 1982), que o termo posição refere-se

ao estado de organização do ego, ou seja, seu estado, a natureza de suas relações com o objeto

interno, a natureza da ansiedade e as defesas próprias.

A posição esquizo-paranóide tem como uma das características os ‘objetos

parciais’, ou seja, o bebê não tem o conceito de uma pessoa como um todo. Klein (1936,

1946-1963), Sharpe (1936), explicam que essa relação com objetos parciais deve-se ao fato de

que para o bebê, as partes de seu próprio corpo, das pessoas e de todas as coisas são

percebidas indistintamente. Continuam as autoras, dizendo que durante os dois ou três

primeiros meses de vida, o objeto parcial, primariamente, o seio, consiste em experiências do

mundo real, que são gratificantes ou hostis e perseguidoras. O medo de que perseguidores

possam invadir e destruir o eu (self) e o objeto ideal, gera a ‘ansiedade persecutória’. O

objetivo do bebê, então, é possuir e identificar-se com o objeto ideal, além de manter

afastados de si, os objetos maus, como por exemplo, seus próprios impulsos destrutivos.

Assim, a criança recorre ao mecanismo primitivo de ‘cisão’ para afastar-se dos objetos maus e

se identificar com o objeto bom, o que ocorre através da alucinação. A introjeção e a

projeção atuam como mecanismos de defesa (KLEIN, 1936, 1946-1963; SEGAL, 1982).

O mecanismo de identificação projetiva presente na posição esquizo-paranóide

consiste numa parte do ego do bebê que é projetada no objeto. Em suas fantasias

inconscientes, ao projetar suas características no outro, o bebê usa e acredita que o controla. A

identificação projetiva pode ser utilizada como mecanismo de defesa tal qual a projeção o é:

para livrar o self das partes não desejadas. Podem surgir então, sentimentos de ‘vazio’ interno,

pela falta da parte do ego que foi projetada (KLEIN, 1936, 1946-1963; SEGAL, 1982). Como

esclarece Ocampo (1995), a identificação projetiva é o mecanismo pelo qual um aspecto do

ego liga-se a um objeto através de uma fantasia especial. O objeto sobre o qual é feita a

projeção pode ser um objeto interno sendo então marcado pelas características que o ego

atribui-lhe. Se a identificação projetiva se faz sobre um objeto externo, o ego sente em

fantasia que uma parte sua passa a fazer parte daquele objeto.

Por volta dos três meses, início da posição depressiva, uma percepção cada vez mais

realística da mãe tem lugar, através das relações que a criança começa a fazer do rosto que

olha, com as mãos que acariciam e com o seio que satisfaz. Assim, a mãe que era sentida

como objeto parcial, agora passa a ser um ‘objeto total’. Aos poucos, essa percepção

expande-se para as pessoas em geral. Como explica Segal (1982, p. 31), a “mãe deixa de ser

uma coleção de partes anatômicas, seios que alimentam, mãos que cuidam...”, para ser uma

existência distinta do bebê, fonte de suas experiências, boas e más. Ainda sobre a relação da

criança com o seio, Sharpe (1936), explica que quando a criança deseja o seio e este não lhe é

dado, ela sente como se o tivesse perdido para sempre. Como a concepção de seio estende-se

à mãe, o sentimento de ter perdido o seio leva ao medo de ter perdido a mãe amada real e

também, a mãe boa introjetada. Essa fantasia origina sentimentos de culpa por ter destruído o

objeto total bom. O sentimento de ter destruído a mãe é fruto das fantasias onipotentes, uma

das características da posição depressiva. A perda da mãe é sentida como uma punição por

seu ato terrível. Assim, simples contrariedades tornam-se sofrimentos profundos devido à

associação entre os sentimentos perturbadores e conflitivos com a frustração. É por isso que a

ausência da mãe, muitas vezes, é vivenciada como uma morte.

Ainda segundo Sharpe (1936), nesse momento inicia-se uma integração do objeto

através de uma modificação na atitude emocional do bebê para com a mãe. O prazer sentido

pelo contato com o seio transforma-se em sentimentos para com a mãe como pessoa (objeto

total). O objeto não é mais, bom ou mau, mas bom e mau. Essas sensações experimentadas

em relação a uma mesma pessoa, e que são ao mesmo tempo, de natureza destrutiva (ódio) e

amorosa (amor), caracterizam o início de uma ambivalência afetiva, fonte de profundos e

perturbadores conflitos na mente infantil. Essa integração do objeto ocorre simultaneamente

com a integração do próprio self’. A ansiedade, que era persecutória pelo medo de ser

destruído, aniquilado por seus perseguidores, muda suas características. Agora, o bebê tem

medo que sua própria agressão possa destruir o objeto amado. A ansiedade passa a chamar-se

depressiva, caracterizando a posição depressiva.

Neste momento, em que surgem os mecanismos de controle das projeções que

permitem a diferenciação entre mundo externo e interno, além da diferenciação de aspectos

do ego e do objeto, a identificação projetiva visa conseguir a empatia com o objeto,

desenvolver a comunicação e conhecimento com o outro e a tentativa de reparação dos

objetos. A identificação projetiva é agora, fundamental para o processo de simbolização

(OCAMPO, 1995). A autora comenta que a dor e o sofrimento pelo medo de ter destruído

objetos queridos e valiosos, mobiliza impulsos reparatórios, de recriação dos objetos internos

e externos, que são de fundamental importância para a criatividade e sublimação. Sublimação

é a capacidade de reparar que implica no vínculo de amor com o objeto total e se expressa

através da criatividade, da capacidade de realizar e de se auto-reparar.

Quando a criança progride do medo de perseguição e da relação fantástica com o

objeto para uma relação com a mãe total e amorosa, surgem os sentimentos de culpa pelo

medo de seus próprios impulsos destrutivos, pelo temor de que eles possam destruir seu

objeto amado (mãe). O conflito e a preocupação com o objeto de amor são agravados pela

impossibilidade de controlar o sadismo (fusão entre as fantasias gratificantes e agressivas),

característica da posição depressiva. Qualquer frustração pode trazer à tona o conflito entre os

sentimentos de amor, ódio e culpa. Se o conflito manifestar-se insuportável, a criança não

consegue estabelecer uma relação feliz com a mãe comprometendo o desenvolvimento

subseqüente (SEGAL, 1982).

Sharpe (1936), entende que a depressão anormal surge pelo insucesso em lidar com

tais conflitos. Por outro lado, no caso de uma elaboração bem sucedida, devido aos

sentimentos de culpa e medo da morte da mãe (temidos por serem desejos inconscientes),

surge o desejo de reparação, expresso por numerosas fantasias de salvar a mãe. Tais

sentimentos são fundamentais para o bem-estar mental da criança, para o desenvolvimento de

sua capacidade de amar e de sua sociabilidade. Do mesmo modo como o bebê introjeta a mãe,

o pai e outras pessoas do ambiente, também são introjetadas, inicialmente em grau menor,

mas crescem e adquirem independência na mente da criança à medida que passa o tempo. O

sentimento de possuir os pais dentro de si é inconsciente. Eles são algo do interior da

personalidade que tem a natureza da bondade e da sabedoria, que proporcionam confiança em

si mesmo e ajudam a combater e vencer os sentimentos de ter figuras más dentro de si e de ser

movido por seu próprio ódio incontrolável. Os pais internalizados também permitem que a

criança possa ter confiança nas pessoas do mundo exterior.

Klein (1936, 1946-1963); Segal (1981, 82), entendem que as posições esquizo-

paranóide e depressiva são etapas do desenvolvimento humano, pois, constituem dois tipos de

organização e integração do ego, que mantém uma luta constante para sustentar esse estado de

integração. Durante toda a vida o indivíduo oscila entre uma organização interna esquizo-

paranóide e depressiva. Essas oscilações variam em força com cada psicopatologia individual.

Ainda durante a posição depressiva, Sharpe (1936), esclarece que começa a existir

uma melhor adaptação física e mental dos estímulos internos e externos em função de melhor

coordenação no exercício de certas funções corporais que a criança apresenta. Certos

estímulos que eram sentidos como desagradáveis, agora não são mais. Assim, a necessidade

de gratificação imediata se torna menos urgente. A diminuição na quantidade ou intensidade

de estímulos dolorosos e o aumento na capacidade de ajustar-se a eles contribuem para que

diminuam as fantasias de natureza aterradora, com conseqüente melhoria da adaptação da

criança à realidade. O bom desenvolvimento mental implica em perceber a mãe como um

todo. Essa percepção da mãe contribui decisivamente no desenvolvimento intelectual e

emocional da criança.

1.6.5.2 Fantasia

Klein (1936), cita a constatação de Freud sobre a existência de uma parte inconsciente

da mente, cujo núcleo se desenvolve na mais tenra infância como uma das descobertas mais

importantes da história da humanidade. O inconsciente é o local onde as fantasias infantis e

sentimentos são armazenados, permanecendo ativos e influindo contínua e poderosamente

sobre a vida emocional e intelectual do indivíduo. A autora deu grande importância às

fantasias inconscientes na vida psíquica considerando-as como expressão mental dos instintos

e que, como estes, existem desde o começo da vida. A manifestação instintiva relaciona-se

com a fantasia de um objeto adequado ao instinto. O desejo de comer tem sua correspondente

fantasia relativa a algo que oferece alimento (o seio, no caso do bebê). A alucinação dos

desejos está relacionada às fantasias inconscientes.

A natureza primitiva da mente do bebê é explicada por Sharpe (1936). No princípio, o

bebê não percebe que seu corpo lhe pertence. Sua vida inicia-se na boca, e todo seu

desenvolvimento corporal e psíquico irradia e se amplifica a partir dessa experiência oral.

Boca e seio unem os dois grandes instintos: amor e auto-preservação. Estes, constituem a

dinâmica que supre de energia toda atividade física e psíquica durante toda a vida.

Klein (1936), entende que os primeiros sentimentos surgem em conexão com

estímulos externos e internos. A primeira gratificação que o bebê sente é a satisfação de ser

alimentado, quer pela estimulação de sua boca ao sugar o leite, quer pela sensação prazerosa

do leite quente que escorre por sua garganta e enche o estômago. Sharpe (1936); Arruda

(1990), complementam dizendo que esse é o primeiro ato de união que, quando consolidada,

torna a criança disponível para progredir em direção a outras realizações criadoras.

Segundo Klein (1936), todo estímulo recebido pela criança gera fantasias que podem

ser prazerosas (gratificantes ou eróticas) ou agressivas. As primeiras são conseqüência de

estímulos gratificantes, enquanto as fantasias agressivas são resultado de estímulos

desagradáveis, por menor que seja a frustração. Os adultos, explica Sharpe (1936), têm o

sentido de realidade mais ou menos estabilizado, o que permite distinguir o real do

imaginário. A criança, porém, ‘imagina’ que certas coisas acontecem (pela sua falta de

sentido de realidade), e essa possibilidade produz horror. Ela passa a temer alguns dos seus

próprios impulsos agressivos e procura auxílio para conter essa violência.

Inicialmente, todas essas fantasias inconscientes têm por objeto, o seio da mãe. Esse

interesse localizado da criança em apenas uma parte da pessoa é explicado por Klein (1936,

1946-1963), através do fato de que nesse estágio, a capacidade de observação ainda não está

desenvolvida nem física, nem mentalmente. Assim, o seio que traz gratificação é sentido com

características do que é bom (seio bom). Por outro lado, o seio ausente que frustra ou nega

gratificação adquire as características daquilo que é mau (seio mau). O que na teoria kleiniana

é chamado de seio bom, representa o modelo do que é percebido como bom durante toda a

vida. O seio mau representa o que é mau e tem características de perseguidor (desperta ódio e

agressão). Isso quer dizer que ‘seio bom’ e ‘seio mau’ são experiências de vida.

Devido à sua falta de sentido de tempo e de experiência do bebê, ele não sabe que a

tensão será aliviada, que o sofrimento passará, nem compreende, no princípio, que se o seio

que ele quer não lhe for dado quando ele quer, será dado mais tarde, como esclarece Sharpe

(1936). Aquilo que o bebê não consegue entender pela falta de sentido de realidade vai

produzir-lhe horror, inclusive, de alguns impulsos próprios. Portanto, quanto mais nova a

criança, mais está presa a seus próprios terrores e medos da sua vida de fantasia.

Para lidar com seus terrores, o bebê utiliza-se de certos mecanismos de defesa. Um

deles, a projeção, Soifer (1985), em concordância com Klein (1936, 1946-1963), explica

como sendo o mecanismo pelo qual a criança dirige todo seu ódio ao ‘seio mau’, atribuindo

ao seio todo seu próprio ódio ativo contra ele. Em outras palavras, projeção é a capacidade de

colocar no mundo externo, as sensações, percepções e impulsos que são dolorosos ou

desagradáveis. Através desse mecanismo, a criança atribui aos objetos externos, seus

sentimentos, geralmente de amor, medo e ódio.

Já a introjeção, que se desenvolve no mesmo tempo que a projeção, é explicada por

Klein (1936, 1946-1963), através das fantasias que o bebê tem de que põe para dentro de si

tudo o que percebe no mundo exterior. Assim, o bebê não só incorpora o alimento, mas em

sua fantasia, ele também incorpora o mundo exterior. De certa forma, todos os sentidos e

funções do corpo participam desse processo. Na fantasia infantil, a criança suga o seio

(primeiro objeto de desejo) para dentro de si, mastiga e o engole, o que lhe dá a sensação que

tem o seio da mãe dentro de si, com seus aspectos bons e maus. Assim, a introjeção constitui-

se de uma série de processos através dos quais o mundo externo, seu impacto, objetos e

situações vividas são sentidos pelo bebê como externos, sendo também internalizados no

‘self’, convertendo-se em parte de sua vida interna. O bebê introjeta a imagem do seio que o

alimenta e a vivência satisfatória durante a amamentação. Tal introjeção permite-lhe construir

em seu mundo interno, um objeto com o qual se identificará posteriormente, e que também

servirá de base para novas identificações.

Ainda sobre os mecanismos de projeção e introjeção, Klein (1936, 1946-1963),

descreve-os ocorrendo simultaneamente, originando um terceiro mecanismo, a identificação

projetiva. Através deste, o ego apodera-se, por projeção, do objeto externo que é sentido como

idêntico ao sujeito ou este se sente idêntico ao objeto. Em outras palavras, o ego sente possuir

as características do objeto ou o objeto é vivido como se tivesse as peculiaridades do sujeito.

É importante lembrar que as defesas, segundo a autora, fazem parte do desenvolvimento

normal de todo ser humano. Sua utilização, dependendo da oportunidade, intensidade e

conseqüências, é que vão delimitar o normal e o patológico.

1.6.5.3 Mecanismos de defesa

Ocampo (1995), descreve que as defesas surgem a partir dos vínculos com os objetos.

São vivenciadas como fantasias inconscientes que enfatizam, depreciam, controlam, não vêem

determinados aspectos do ego e/ou do objeto, com a finalidade de diminuir a ansiedade e

preservar o equilíbrio. Essas fantasias traduzem-se em condutas frente aos objetos internos e

externos, dando a sensação de satisfazerem uma necessidade e que evitam os perigos

fantasiados. Por isso, toda defesa é uma solução que está enraizada na personalidade e pode

ser observada em toda forma de perceber e conectar-se com a realidade externa e interna.

Ainda segundo a mesma autora, determinadas fantasias são privilegiadas durante a

evolução e se estabilizam como formas comuns de vínculo com os objetos. Mecanismos de

defesa são as formas estáveis de preservação do equilíbrio dos vínculos com os objetos, que

se apóiam em fantasias e se expressam por condutas que valorizam certos aspectos da

realidade e do ego e neutralizam outros, para evitar o sofrimento psíquico.

1.6.5.3.1 Defesas maníacas

Segal (1982), explica que a dor e a ansiedade da posição depressiva mobilizam defesas

maníacas: regressão, dissociação, negação, idealização e projeção. Essas defesas são

mecanismos de natureza esquizóide, porém organizados em um sistema, na tentativa de

proteger o ego da experiência da ansiedade depressiva. Tal elaboração surge do

reconhecimento por parte do bebê, de que a mãe é um objeto total do qual depende e em

relação ao qual vivencia ambivalência (sentimentos alternados de amor e ódio) e

conseqüentes medos de perda e culpa. A autora continua explicando que essas defesas

maníacas conduzem a um círculo vicioso, da seguinte maneira: a elaboração da posição

depressiva leva à utilização das defesas maníacas que, por sua vez, afastam do ego a

experiência de depressão. A impossibilidade de elaboração leva o indivíduo a repetir os

ataques ao objeto, aumentando a depressão subjacente. Nas doenças depressivas devemos

procurar as defesas maníacas inconscientes que impedem a elaboração dos sentimentos

depressivos.

No desenvolvimento saudável, as ansiedades depressivas são elaboradas se o bebê

puder desenvolver sua capacidade de reparação. Essa capacidade, explicam Klein (1936,

1946-1963); Segal (1982), refere-se ao anseio e ao desejo de restaurar o objeto amado

perdido, que o bebê sente que destruiu com seu ódio. Assim, ele pode aplacar o intenso

sentimento de culpa e a perda do objeto externo e interno bom, recriando o bem-estar e a

harmonia perdidos. Para tanto, a criança precisa mobilizar todo seu amor e sua criatividade

para esse fim. O impulso reparador é a fonte mais importante do desenvolvimento mental e da

criatividade.

As autoras entendem que o sentimento de realidade desenvolve-se na posição

depressiva. Com as experiências repetidas de perda e recuperação (re-criação) de seu objeto, o

bebê adquire uma confiança crescente em seu objeto bom e no seu próprio amor e

criatividade. A ansiedade depressiva pelo objeto permite que o bebê diminua suas projeções e

seu objeto passa a ter uma existência mais independente e separada. Ao conhecer sua própria

ambivalência e fantasia, o bebê conscientiza-se de sua realidade interna e começa a

diferenciá-la da realidade externa de seu objeto. Uma elaboração bem sucedida na posição

depressiva é essencial à saúde mental. Nesse processo de elaboração, o ego de torna

integrado, apto para o teste de realidade e para a sublimação, além de se enriquecer mediante

a introjeção e assimilação de bons objetos. Isto, por sua vez, diminui a onipotência da criança

e, portanto, sua culpa e medo da perda.

1.6.5.3.1.1 Negação e controle onipotente

A impossibilidade de elaborar essa realidade origina a negação do objeto com a

necessidade de exercer o controle, o desprezo e a desvalorização sobre ele, dando lugar à

idealização de um self perfeito, além do sentimento de triunfo sobre o objeto (SEGAL, 1982).

Sobre a negação, Ocampo (1995), descreve-a como um mecanismo defensivo que

objetiva não perceber os conteúdos do ego e do objeto que aterrorizam, respondendo à

fantasia de que aquilo que não é visto não existe, portanto, não implica em perigo. A negação

está diretamente ligada ao controle onipotente, ou seja, à fantasia de possuir tanto o ego

quanto o objeto idealizado, capacidade de controle e de manipulação do objeto persecutório.

O grau dessa onipotência do ego e do objeto idealizado é diretamente proporcional ao grau de

destrutividade do ego agressivo e do objeto mau.

Durante a posição depressiva, negação e controle onipotente são as defesas maníacas

utilizadas pelo indivíduo para controlar a perseguição e a dor, ou seja, são negados a

destruição do objeto e os sentimentos de dor, dependência e necessidade do ego. Além disso,

a negação está ligada à fantasia de controle do objeto, o que possibilita que o indivíduo negue

o medo da separação e da dependência. Tal mecanismo implica em privação para o ego, pois

limita sua capacidade de conhecimento. Ocampo (1995, p. 207), descreve a fantasia

inconsciente que acompanha a negação: “Se vejo como destruí meus objetos e quanto os

necessito, cairei em desespero e solidão. Necessito não ver. Se não vejo, não estão

destruídos”.

1.6.5.3.1.2. Regressão

A regressão como mecanismo normal se expressa no cotidiano no sonhar. Em termos

evolutivos, regressão está ligada à necessidade de progresso, pois toda evolução processa-se

através de pequenas regressões a estados anteriores. Esse processo é conseqüência natural nas

situações dolorosas, sendo indispensável para sua elaboração. Nessas circunstâncias, a

regressão é a reatualização de vínculos objetais que foram bem sucedidos na manutenção do

equilíbrio do ego em momentos mais primitivos do ponto de vista evolutivo (Ocampo, 1995).

Ainda sobre a regressão, a autora explica que a regressão torna possível a conexão do

ego com as fantasias inconscientes, o que favorece com que ele se torne mais rico e, portanto,

mais criativo. Entretanto, se a regressão é patológica, há uma regressão estrutural a pontos

perturbados do desenvolvimento, por exemplo, para momentos de bloqueios que resultaram

em pontos de fixação.

1.6.5.3.1.3 Idealização

A finalidade da idealização do objeto bom é afastá-lo do persecutório e torná-lo

invulnerável. Essa negação mágica onipotente faz com que as características indesejáveis do

objeto sejam negadas, ao mesmo tempo em que são recobertas de características bondade.

Quanto maior é o sentimento de perseguição frente ao objeto, mais intensidade da idealização

(Ocampo, 1995).

Segundo a autora, a idealização também faz parte das defesas maníacas da posição

depressiva, ao atribuir ao objeto uma grande riqueza de conteúdo e grande capacidade

reparatória. Assim, se o objeto é perfeito e possui todas as características boas, não pode ser

destruído, não pode retaliar o ego (ansiedade persecutória), nem o ego precisa preocupar-se

com sua reparação (ansiedade depressiva).

Segundo Klein (1946-1963), a idealização é precursora de boas relações com o objeto,

desde que o objeto idealizado seja um objeto bom. Entretanto, uma idealização extrema, pode

impossibilitar a relação com o objeto real, pois passam a existir objetos idealizados e não

objetos ideais.

1.6.5.4 Complexo de Édipo

Embora o reconhecimento das pessoas como objetos totais, amplia as fontes de

gratificações para o bebê, o encontro mais importante é com os pais. Esse encontro

caracteriza uma relação objetal triangular e é passível de estímulos e excitações implícitas nas

relações entre três pessoas. Nesse momento, inicia-se o desenvolvimento do Complexo de

Édipo e da formação do superego (KLEIN, 1936; SEGAL, 1981, 1982).

O surgimento da culpa resulta da introjeção dos objetos de amor edipianos e da

formação do superego é sentido como muito ameaçador pelo ego, que ainda é muito frágil.

Klein (1936), explica que quando o bebê passa a sentir sua mãe como uma pessoa total e

separada, vivendo uma vida própria, tendo outras relações próprias, ele fica exposto à

experiência de ciúme sexual. O fato de que seu mundo ainda está colorido pelas projeções

onipotentes aumenta o seu ciúme porque quando sente o vínculo emocional entre seus pais,

ele fantasia um dando ao outro, exatamente aquelas satisfações que deseja para si. A criança

sente-se frustrada por não poder partilhar desse prazer do casal, donde surge a inveja e,

conseqüentemente, o ódio pelos pais. Nesse momento, começa a desenvolver-se o complexo

de Édipo, etapa evolutiva integrante da posição depressiva. O bebê experimenta desejos e

medos edipianos. Esses pais, objetos de desejo e de frustração, tornam-se objetos de ataque

em fantasia, mas devido à consciência do bebê de que ele depende dos pais e do seu amor por

eles, os ataques resultam em sentimentos de perda, culpa e ansiedade depressiva. Tal situação

mobiliza a repressão (defesa) aos modos esquizo-paranóides de funcionamento. Segal (1982),

exemplifica que os pais podem ser cindidos em um ideal e o outro totalmente mau. Os pais

então, além de serem internalizados como figuras individuais, também o são como ‘figura

parental combinada’. É a partir daí que surge a inveja dos pais, pois o bebê sente-se excluído

dos prazeres da figura parental.

Knobel (1987, apud VIZZOTTO, 1994, p. 6) explica que o triângulo amoroso, mãe-pai-

bebê, assim como no triângulo Laio-Jocasta-Édipo, interagem num ‘continuum helicoidal

indefinido’. Com isso, Knobel quer dizer que as relações triangulares e sentimentos delas

provenientes persistem por toda a vida. Ao nascimento de cada filho ou de cada neto, a

situação dramática é reativada.

1.6.5.5 Inveja

A inveja tem raízes muito primárias e desempenha também um papel primordial na

relação do bebê com o seio, pois o bebê inveja do seu conteúdo bom. Klein (1936), distinguiu

a inveja da voracidade e do ciúme. O ciúme, se fundamentado no amor, tem como objetivo a

posse do objeto amado e a remoção do rival. Pertence a uma relação triangular e, portanto, a

uma época de vida em que os objetos são claramente reconhecidos e diferenciados uns dos

outros, ou seja, o ciúme é necessariamente um relacionamento objetal total. A inveja é uma

relação dupla na qual o sujeito inveja o objeto por alguma posse ou qualidade e é

essencialmente vivenciada em termos de objetos parciais, embora persista nas relações

objetais totais. A voracidade almeja a posse de toda a bondade que possa ser extraída do

objeto, mesmo que isso possa implicar na destruição do objeto e estragar sua bondade.

Ainda sobre o mecanismo da inveja, Klein (1936, 1946-1963), continua dizendo que

por não conseguir atingir seu objetivo de ser tão bom quanto o objeto, os conteúdos bons

desse objeto são estragados para que seja removida, afastada a fonte da inveja. Este é o grande

dano da inveja no desenvolvimento mental, pois a fonte da bondade da qual o bebê depende

torna-se ruim, impossibilitando boas introjeções. A divisão entre um objeto ideal e um objeto

mau também não pode ser estabelecido já que o objeto ideal constitui o objeto da inveja, da

hostilidade. As defesas contra a inveja são igualmente prejudiciais ao crescimento. A

desvalorização do objeto e a projeção da inveja nesse objeto conduzem à formação de um

superego invejoso, que impede o desenvolvimento do ego. Uma das características da inveja é

o surgimento de sentimentos de desesperança. As experiências más são más, porém as

experiências boas também se tornam más, pela inveja que mobilizam. Como o objeto bom

não pode ser introjetado, não há esperança de uma boa experiência. Isso, por sua vez, aumenta

a inveja, conduzindo novamente à desesperança. A inveja expelida (split off) negada e

projetada é extremamente dolorosa e perturbadora.

1.6.5.6 Formação de símbolos

Serino (2001), explica que a palavra símbolo deriva do grego synbolon = syn (junto

com) e bolon (aquilo que foi colocado). Segal (1982), escreve que o sentido da palavra é

combinar, acasalar, integrar. Assim, um símbolo representa o objeto na sua ausência, sendo

responsável pela manutenção do equilíbrio psíquico.

Para a Psicanálise, simbolismo, em sentido lato, é um “...modo de representação

indireta e figurada de uma idéia, de um conflito, de um desejo inconscientes; neste sentido,

podemos em Psicanálise considerar simbólica qualquer formação substitutiva” (LAPLANCHE;

PONTALIS, 1970, p. 626).

Como o bebê não consegue representar simbolicamente suas vivências, ele não

distingue a dor física da dor afetiva, nem consegue pensar o próprio corpo e as sensações dele

provenientes; os sentimentos dolorosos não são reconhecidos como seus. A capacidade de

simbolizar a dor psíquica é que permite a elaboração mental e a conseqüente vivência do

sentimento e da dor. Simbolização é um processo que se inicia na mais tenra infância, através

da relação mãe/bebê (KLEIN, 1936; BION, 1967; SEGAL, 1981). Outros autores também

valorizam as relações precoces do desenvolvimento do bebê, conforme anteriormente

descrito: Sharpe (1936); Leme et. al., (1988); Arruda (1990); Toledo; Rocca (1996); Giglio;

Guedes-Pinto; Duarte (1997); Giordano et. al. (2000); Wolf (2002).

Sharpe (1936), escreve que ao nascer, o bebê é um ser predominantemente fisiológico

incapaz de integrar psicologicamente os estados de tensão que vivencia. A importância do

papel da mãe é que ela compensa essa insuficiência psíquica do bebê. A mãe pensa pelo bebê,

elaborando e integrando suas experiências. Assim, a mãe é a mediadora na relação do bebê

com o meio que o cerca. Essa função mediadora materna não deve ser excessiva nem super-

protetora, para que a criança não seja impedida de desenvolver seus próprios recursos para se

defrontar com a realidade e seus limites. A importância do papel materno para o

desenvolvimento dos recursos internos da criança também é citada por Lorch (1986); Leme

et. al. (1988).

Segundo esses mesmos autores, um dos recursos desenvolvidos pelo bebê é a

capacidade de elaboração de suas ansiedades. Esta capacidade relaciona-se às vivências de

necessidade e prazer experimentada no início da vida. Quando essas experiências e a

aproximação com a mãe não são satisfatórias, a criança alucina para tentar modificar uma

situação desprazerosa.

Soifer (1985), baseando-se na teoria kleiniana, entende que alucinação refere-se à

evocação do objeto de desejo que vai transformar o desprazer em gratificação. Segundo a

autora, existem duas formas de atividade mental: a alucinação e o pensamento. A primeira,

como já foi dito, evoca o objeto desejado sem recorrer à ação específica no mundo externo,

nem à identidade da percepção. Por exemplo, quando o bebê está com fome, ele alucina o

seio. Por outro lado, o pensamento relaciona-se com o conhecimento. Este, se inicia como

exploração e reconhecimento do objeto externo gratificante. A identidade da percepção

permite que o bebê constate que há uma coincidência entre o objeto evocado e percebido.

Resumindo, o pensamento, através da experiência, busca a informação necessária para a ação

específica que permita a satisfação de uma necessidade (a busca do seio).

Segal (1982), entende que os primeiros interesses e impulsos da criança direcionam-se

para seu próprio corpo e para os corpos de seus pais; esses objetos e impulsos existentes no

inconsciente é que possibilitam o surgimento de outros interesses através da simbolização.

Entretanto, tal fato só ocorre se é dado tempo suficiente para que o bebê sinta a falta. Esse

tempo deve ser tal, que a criança tome consciência de sua solidão e necessidade de substituí-la

por satisfações simbólicas. A partir da qualidade da relação inicial com a mãe e do próprio

processo de maturação, o bebê desenvolve aos poucos, recursos cada vez mais elaborados

para lidar com suas ansiedades e conflitos. Assim, desenvolve-se a capacidade de simbolizar.

De acordo com a mesma autora, os símbolos formam-se à medida que o ego tenta lidar

com as ansiedades persecutórias e pelo medo da perda ou inacessibilidade de objetos bons, na

sua relação com o objeto. Assim, perturbações na relação do ego com os objetos originam

perturbação na formação de símbolos. Defeitos na organização do simbolismo inconsciente

geram uma incapacidade de integrar e elaborar a dor psíquica, ou seja, a dor pode ser vivida

através do somático.

A formação de símbolos, ainda conforme Segal (1982), inicia-se junto com as relações

objetais. O conteúdo real e o modo como os símbolos se formam e são utilizados refletem o

estado de desenvolvimento do ego e seu modo de lidar com os objetos. Como o objeto é

sentido pelo bebê como idealmente bom ou totalmente mau, a meta do ego é unir-se ao objeto

bom e aniquilar o objeto mau, bem como as partes más do eu (self). Pela predominância do

pensamento onipotente aliado ao sentimento de realidade precário, a ausência praticamente

não existe. Se a união com o objeto ideal não existe, o sentimento não é de ausência do objeto

bom, mas presença de objeto mau. O bebê alucina o objeto mau que é vivenciado como real.

No desenvolvimento normal, com o reconhecimento do objeto bom e mau como um

só, o ego preocupa-se cada vez mais em salvar o objeto de sua possessividade, inibindo, de

certa forma, sua agressividade. Esta é uma situação estimulante para a criação de símbolos.

Eles servem para deslocar a agressividade do objeto original para minorar a culpa e o medo da

perda, preservando assim, o objeto. Nesse processo de simbolização, o símbolo não é

equivalente ao objeto original. Os símbolos criados no mundo interno servem para restaurar,

recriar e recapturar a possibilidade da posse do objeto original novamente (SEGAL, 1982).

Segundo Klein (1936); Rivière (1958); Segal (1982), toda comunicação é feita através

de símbolos. Estes, servem para comunicação externa e interna. Quando se diz que uma

pessoa está em ‘contato consigo mesma’, significa que ela tem uma comunicação com suas

fantasias inconscientes, o que só pode ocorrer através de símbolos. Esta é a base do

pensamento verbal.

Como explica Klein (1936), a capacidade de simbolizar, uma das características da

posição depressiva, possibilita a diminuição da ansiedade e a solução de conflitos. O processo

de formação de símbolos é um processo contínuo de unir e integrar o externo com o interno, o

sujeito com o objeto, as experiências anteriores com as posteriores.

1.6.5.6.1 O sintoma como símbolo

Sintomas são acontecimentos referidos durante a anamnese e que pertencem à função

simbólica. Já os sinais, referem-se a tudo que pode ser identificado durante o exame físico

(e/ou radiológico e/ou complementar). Sinais e sintomas são exteriorizações de uma

perturbação do processo vital: são duas linguagens diferentes e que exigem leituras próprias.

Uma comunicação pode ser eloqüente numa dessas linguagens e muda, na outra (OSÓRIO,

1993). Para Briganti (1999), o percurso simbólico denota que o homem possui uma estrutura

psíquica particular, o inconsciente.

Segundo Santos Filho (1994), as manifestações corporais tornam presentes, através do

sintoma, uma ausência necessária para a manifestação do equilíbrio psíquico. O sintoma é a

forma pela qual o indivíduo evita o sofrimento psíquico, a irrupção da ansiedade, ou seja, o

sintoma é a manifestação psíquica do reprimido através do somático; é a exteriorização dos

sentimentos e desejos reprimidos de maneira deformada, que, apesar de se manterem

inconscientes, podem ser notados pelo derivado consciente. A relação entre o reprimido e o

seu derivado consciente, o sintoma, é denominada de relação simbólica.

O ser humano vive em constante movimento, o que exige do homem, soluções frente

às circunstâncias que, a todo momento, se impõem. As ações do movimentar-se contínuo são

movidas pelas emoções, que buscam solucionar e satisfazer as necessidades inconscientes e as

exigências da cultura. Se esse processo for total ou parcialmente bloqueado, a solução não

será adequada, a ação fica comprometida, ou melhor, a emoção irá manifestar-se de forma

indireta, simbólica (RODRIGUES; GASPARINI, 1992).

O afeto presente nos fenômenos psíquicos ao deparar-se com uma frustração origina o

sofrimento causado pela dor mental. Se este afeto suporta o padecimento, ele se conserva e se

desenvolve, continuando suas buscas. Se o afeto teme a dor psíquica, surge a dor física

indicando a não superação da frustração. Nesse caso, o afeto não se conserva e não se

desenvolve, ao contrário, fica estilhaçado. O fenômeno que era psíquico passa a ser

psicossomático, ou seja, com o aparecimento do fenômeno somático, o fenômeno psíquico

esconde-se, fica reprimido. Assim, a enfermidade psicossomática é “resultante do

estilhaçamento do afeto” (CAPISANO, 1987, p. 331).

Na visão de Osório (1993), se a expressão psíquica encontra obstáculos, a mensagem é

expressa através do somático. Isso quer dizer que, como os conflitos envolvem dispêndio de

energia psíquica, frustrações e decepções, algumas pessoas, mesmo sob tais circunstâncias,

conseguem encontrar soluções e tornar a vida criativa. Outras, porém, só encontram soluções

às custas do bem-estar psíquico ou somático.

Para Rosa (1990), as primeiras relações mãe/bebê podem contribuir para o

desenvolvimento, posteriormente, de uma tendência do indivíduo a reações somáticas mais

que psíquicas, diante de situações de stress. A ordem simbólica bem estruturada, fruto da

maternagem é que vai possibilitar a formação da identidade daquela criança, para que, quando

adulta, possa distinguir seu corpo de seus sofrimentos mentais e também comunicar suas

vivências psíquicas. Se o simbolismo falhar, o conflito psíquico não é sentido como tal, não

pode ser comunicado podendo transformar-se em ameaça de desintegração da personalidade

ou em doença em algum órgão. Assim, dizem os autores, a doença hipocondríaca ou

psicossomática situa-se nas fases mais primitivas do desenvolvimento, envolvida em

dificuldades da relação mãe/bebê.

Frente ao até aqui exposto, entendemos que o exercício da vida adulta, na saúde ou na

doença, se faz a partir do desenvolvimento da vida infantil, com base na qualidade das

primeiras relações estabelecidas.

1.6.6 Homeostase

Homeostase “é o processo de auto-regulação através dos quais os sistemas biológicos

tendem a se manter estáveis, para ajustar as condições ótimas de sobrevivência. A

estabilidade é obtida através de um equilíbrio dinâmico” (ARRUDA, 1994, p. 23). Ao

contrário, adoecer é um problema de regulação homeostática que perturba o bom rendimento

das funções de órgãos, saudáveis ou lesionados.

De acordo com o autor (1990, 1994), todo sistema em equilíbrio dinâmico busca seu

estado de equilíbrio, resistindo às modificações externas. Quando o estado de equilíbrio do

sistema é perturbado, os dispositivos reguladores buscam “um novo balanço” (1994, p. 23),

uma nova adaptação. A esses processos de integração e coordenação de função chamamos de

regulação homeostática.

Os fatores psicológicos como elementos estressantes começaram a ser estudados por

Pincus e Hoagland, em 1943, através de pesquisas feitas com pilotos após exercícios de vôo

verdadeiros ou simulados (MOREIRA; MELLO FILHO, 1992; ARRUDA, 1994). Nesse mesmo

ano, H. Mason demonstrou que fatores psicológicos atuam como stressores, principalmente

em contato com o novo, o imprevisível, determinando modificações neuro-endócrinas que,

por sua vez, causam alterações homeostáticas compensatórias. Arruda (1994), cita Miller, que

em 1970, demonstrou que a responsabilidade é um grande fator de desequilíbrio

homeostático.

Comenta o autor, que a homeostase depende de numerosos mecanismos, dentre os

quais, a ‘plasticidade’ individual, ou seja, “aquela capacidade que o organismo tem, de se

adaptar individualmente a situações diversas, dentro de determinados limites, sem adoecer

ou acusar sintomas” (ARRUDA, 1994, p. 25). Se a homeostase for quebrada, o indivíduo

adoece ou faz sintomas em algum (ou alguns) órgão do corpo. A resposta ao stress ocorre

através de uma integração neuro-endócrino-imunológica, num processo de alteração e

recuperação da homeostase. Se essa reação não for adequada ou suficiente, surge a doença,

mediada por alterações no funcionamento de algum sistema.

Quanto à homeostase psíquica, Leme et. al. (1988); Rosa (1990); Arruda (1994),

referem que passou a ser melhor compreendida quando descobriu-se que ocorrem respostas

individuais singulares frente a situações idênticas. Esse fenômeno ocorre em função da

referida plasticidade. Como explicam Totman (1982); Schwab (1984), mudanças não são

causa de deterioração orgânica. A não adaptação do indivíduo à novas exigências é que

podem aumentar o risco de doenças.

1.6.7 Distúrbios somatoformes

A Organização Mundial da saúde e a VIII Conferência Nacional de Saúde, realizada

em Brasília, divulgaram em sua Carta Magna de 7 de abril de 1948, a definição de saúde.

“Saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de

afecção ou doença” (MEDRANO, 2002). A partir daí, a Medicina Psicossomática foi

inaugurada. Em 1995, a DSM-IV (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders –

Forth Edition) substituiu a expressão psicossomática por distúrbios somatoformes ou

distúrbios psiconeurovegetativos. Entretanto, comenta Arruda (1990), que a primeira

expressão, psicossomática, continua consagrada pelo uso.

Distúrbios somatoformes referem-se a sintomas físicos que sugerem problemas

somáticos, mas para os quais não são encontradas anomalias demonstráveis ou mecanismos

fisiopatológicos conhecidos. A sintomatologia sugere forte ligação com fatores ou conflitos

psicológicos (LOBATO, 1992). Arruda (1994), esclarece que quando a homeostase psíquica é

recobrada, os sintomas cessam, só retornando em novos episódios stressantes como, por

exemplo, frustração, perdas afetivas.

1.6.7.1 Histeria

A histeria, assim como a hipocondria e os fenômenos somáticos, representa

articulações da psique com o corpo, mas que se expressam no corpo (SANTOS FILHO, 1994).

O autor explica que a histeria representa afetos intoleráveis, parte de uma situação

conflitiva. Os afetos, apesar de inconscientes, mantém um vínculo com a consciência através

do sintoma histérico. Assim, simultaneamente, o sintoma histérico revela e esconde o conflito.

Tal arranjo acontece via simbólica e não via anatômica. O afeto que corresponde ao conflito

retorna através do sintoma (conversão histérica), numa tentativa de solução simbólica para a

situação conflitante.

Os sintomas de conversão histérica relatados pelo paciente, cuja dor ultrapassa o que

se pode inferir do exame físico e para os quais não são encontradas justificativas

fisiopatológicas, têm relação com fatores psicológicos. Lobato (1992), enfatiza que não se

diagnostica tais distúrbios quando os sintomas limitam-se à dor. A característica fundamental

do quadro histérico é a perturbação predominante de perda ou alteração do funcionamento

físico. O distúrbio é somatoforme, mas trata-se de expressão de conflito ou necessidade

psíquica. A relação com o estado psíquico pode ser evidenciada pela relação temporal entre

um evento vital aparentemente ligado a um conflito, ou seja, uma necessidade psíquica está

ligada ao início ou à exacerbação da dor. Há um ganho secundário com o sintoma: o indivíduo

pode evitar atividades que lhe são nefastas, além de obter um apoio do ambiente que, de outra

forma, não seria oferecido. Hackett (1985, apud LOBATO, 1992, p. 175), menciona ser esse

quadro, mais comuns em mulheres.

Nas manifestações histéricas não há explicações física, anatômica nem biológica para

o sintoma, como, por exemplo, uma paralisia sem a presença de uma lesão nervosa que a

justifique. O sintoma histérico representa a dificuldade do indivíduo para lidar com os afetos,

pela angústia que produziriam. Pode ser a única maneira que o indivíduo encontra para buscar

soluções de conflitos entre as forças que se opõem no interior do seu psiquismo (SANTOS

FILHO, 1994).

1.6.7.2 Hipocondria

Santos Filho (1994), caracteriza o sintoma hipocondríaco como aquele que se

manifesta através de um distanciamento da realidade, por meio da qual, o paciente, muitas

vezes, consegue convencer o profissional a prescrever exames complementares

desnecessários para poder convencer o paciente de que ele não sofre de qualquer enfermidade,

séria ou não. O distanciamento da realidade é tão grande que o paciente acredita que está

dominado por um órgão inimigo ou por inimigos externos, como vírus, bactérias, câncer,

entre outros, e que todos vão destruí-lo. Por se tratar de um discurso ‘delirante’, não raro

acontece do profissional iludir-se com o discurso do paciente e só através dos resultados dos

exames clínicos pode perceber que se trata de paciente hipocondríaco.

Segundo Lobato (1992), essa crença irreal sobre a presença de um mal no organismo

apesar da normalidade dos exames clínicos, faz com que sensações físicas normais como, por

exemplo, suor, movimentos intestinais, sejam erroneamente interpretados, ou então, que

pequenos incômodos como tosse ou dores nas costas sejam exagerados, podendo inclusive,

tornar-se incapacitantes.

O hipocondríaco, na concepção de Rosa (1990), é um indivíduo tomado por ameaças

internas e, por isso, tem muitas dificuldades de se livrar de seu sofrimento. Ele teme a doença

ou somatiza os conflitos. O autor destaca o prazer masoquista (sofrimento auto-imposto como

punição) muito presente em pacientes hipocondríacos e somatizantes. Arruda (1994),

exemplifica citando que um indivíduo insatisfeito com sua situação profissional e portador de

problemas digestivos pode atribuir estes últimos, à qualidade do que come durante a semana.

Entretanto, esse mesmo indivíduo, durante o final de semana, come de tudo e os sintomas não

aparecem, o que sugere que, afastado de suas dificuldades (o ambiente profissional), não há

comprometimento do aparelho digestivo. Segundo Briganti (1999), o hipocondríaco quer ser

cuidado.

Os resultados normais encontrados nos exames clínicos apenas aliviam a angústia do

paciente, que geralmente, se recusa a aceitar a causa emocional de seus problemas (LOBATO,

1992; SANTOS FILHO, 1994). Segundo Lobato (1992), as queixas mais freqüentes em cerca de

¾ dos pacientes hipocondríacos são: cefaléia, dor facial, dor toráxica, dor dorsal e dores vagas

nos membros. Tais sintomas acabam limitando a vida social e o desempenho profissional do

indivíduo. Também são freqüentes os sintomas de ansiedade, humor depressivo e traços de

personalidade compulsiva. Santos Filho (1994), alerta para que não se confunda o paciente

efetivamente hipocondríaco (presença do delírio hipocondríaco) com aqueles que apresentam

idéias hipocondríacas, tão comuns em estados depressivos.

1.6.7.3 Somatização

Neste grupo, enquadram-se aquelas queixas somáticas múltiplas e recorrentes com

duração de vários anos, para as quais houve procura médica, sem, no entanto, ter sido

encontrado qualquer distúrbio físico. As queixas iniciam-se por volta dos 30 anos e sua

evolução é crônica e flutuante, freqüentemente acompanhadas por ansiedade e humor

depressivo. Ocorre em 1% das mulheres e raramente nos homens (SHORTES; ABBEY; GILLIES;

LIPOWSKI, 1992; LOBATO, 1992). Lipowski (1990), entretanto, entende que somatização

implica em sintomas que não formam uma síndrome consistente. Pessoas que somatizam são

prováveis hipocondríacos ou pelo menos, preocupados com sintomas orgânicos. São

prováveis candidatos à somatização persistente.

Rosa (1990), considera a somatização de emoções e conflitos parte da vida de

qualquer ser humano, entretanto, o grau de intensidade da tensão é que vai determinar a

patologia.

Ainda quanto à somatização como forma de comunicação, Lipowski (1990), entende

que aquele que somatiza tende a vivenciar e comunicar seu stress somático e os incontáveis

sintomas e patologias relevantes para justificar a necessidade da ajuda médica. Esse fato é

interpretado pelas pessoas como manifestação de stress psicossocial devido a eventos de vida

e situações que o indivíduo acha stressantes.

Arruda (1990); Rosa (1990), referem que a manifestação psicossomática é o fenômeno

em que a sensibilidade do indivíduo a doenças contagiosas é aumentada por razões

psicológicas, e compreende: dores lombares, cefalgias, cardiopatias e outras perturbações do

ritmo biológico sem causa orgânica (insônia, constipação, entre outras). Nos momentos de

tensão, o indivíduo também fica mais sujeito a provocar acidentes corporais.

Leme et. al. (1988); Rosa (1990), acreditam que o fenômeno psicossomático surge

onde não pode surgir o trabalho psíquico. A somatização é uma forma de descarregar a tensão

evitando a dor psíquica. A expressão psicossomática é uma regressão profunda e primária do

ser, pela impossibilidade de elaboração mental. Osório (1993), concorda com os autores e

afirma que a linguagem corporal é a forma mais arcaica de comunicação humana.

Nas manifestações psicossomáticas há uma correlação temporal com os

acontecimentos e datas que marcam uma periodicidade com uma situação traumática ocorrida

anteriormente: perda real por morte de uma pessoa próxima, migrações, desemprego,

divórcio, separações, crises vitais e até festas, de modo geral. Frente tais circunstâncias surge

o fenômeno psicossomático, pois o indivíduo sente-se incapaz de suportar a perda e a dor

emocional em que certas situações de vida implicam. Assim sendo, o fenômeno

psicossomático é a impossibilidade de vivenciar afetos de perda ou equivalentes (CAPISANO,

1987; ARRUDA, 1990; SANTOS FILHO, 1994).

Rosa (1990), resume explicando que o distúrbio histérico tem um significado

simbólico bem determinado, enquanto a manifestação somática é estável em um órgão do

corpo. Já o distúrbio hipocondríaco varia de órgão.

McDougall (1994), descreve a manifestação somática como uma resposta psíquica ao

aumento da tensão psíquica sendo também uma das respostas psíquicas mais comuns

manifestas por todo ser humano. O risco da somatização é maior quando circunstâncias

mobilizam um aumento de pressões afetivas, sejam elas provenientes da vida interna ou do

ambiente. Embora seja uma autora consagrada, McDougall está sendo citada, mas seu

referencial teórico não será considerado para análise, pois sua concepção de objeto é diferente

da concepção de Melanie Klein.

1.7 Doenças Psicossomáticas

Nos trinta primeiros anos do século XX, os estudos de psicofisiologia avançaram

muito. A premissa básica era que corpo e mente eram uma unidade psicobiológica em

interação com o meio ambiente. Deste modo, a doença era vista como um produto dessa

interação, envolvendo tanto os aspectos somáticos quanto os psicológicos (LIPOWSKI, 1984;

ARRUDA, 1990; KENNEDY; SCHWAB; HIDE, 2001). Entretanto, explicam os autores, toda

doença é psicossomática, uma vez que ocorre num ser cujos ‘soma e psique’ são inseparáveis

quanto à anatomia e funcionalidade. Toda doença orgânica sofre influências mentais e, por

outro lado, toda doença mental é traduzida por processos bioquímicos que acompanham todos

os momentos do viver. Como afirmam os autores, todo ser humano é bio-psico-social.

Autores têm se dedicado a entender o processo do adoecer humano. A doença

psicossomática não acontece, ela é provocada. Rosa (1990, p. 23), explica: “O corpo do

paciente psicossomático é um corpo amaldiçoado, alvo de maus tratos, que lhe são

inflingidos por sua mente perturbada. Isto nos leva a pensar em sérios distúrbios psíquicos

existentes por trás de transtornos manifestos”.

Para explicar a relação entre stress e distúrbio psicossomático, Schwab (1984),

esclarece que todo indivíduo que apresenta dificuldades de adaptação frente a circunstâncias

de vida pode apresentar reações substitutivas. A primeira delas poderia ser uma ruptura dos

mecanismos do ego e o desenvolvimento de uma psicose. Outra reação seria o

desencadeamento de mecanismos psíquicos mal elaborados para lidar com ansiedade ou

angústia, gerando comportamentos obsessivos, compulsivos e fóbicos. Numa tentativa de

controlar ou diminuir a ansiedade, o indivíduo poderia transformá-la em desvios de

comportamento como alcoolismo ou outras toxicomanias, promiscuidade, entre outros.

Finalmente, se nenhum desses mecanismos for utilizado, o indivíduo pode ‘internalizar’ o

stress, desenvolvendo a doença psicossomática.

Rodrigues; Gasparini (1992); Perestrello, (1996); Eksterman (1996), caracterizam o

adoecer como um processo histórico-biológico que se desenvolve em condições adversas.

Diagnosticar uma doença é detectar um modo particular de existir, “um existir doente”

(EKSTERMAN, 1996, p. 3). Para Arruda (1994), cada indivíduo faz sua doença. O adoecer é um

modo de sofrer e determina um grau de ansiedade e angústia. Estas, por sua vez, levam a uma

maior ou menor regressão psicológica, ou seja, ao surgimento da crise. Leme et. al.(1988),

entendem que se o indivíduo evita ou nega a dor psíquica, o conflito, o corpo responde.

Ainda sobre o mesmo assunto, Osório (1993), diz que soma e psique expressam

simultaneamente, o mesmo fenômeno vital, logo, todo fenômeno vital é psicossomático. O

corpo, através de seu estado visceral, expressa durante toda a vida do indivíduo, as

contingências do seu processo vital. Além das perturbações desse processo vital, a linguagem

corporal também traduz a homeostase, o bem-estar, o prazer psicossomático. O autor sugere

que sem a leitura corporal torna-se impossível compreender e penetrar na intimidade de certas

manifestações humanas, pois a linguagem corporal é a expressão somática concomitante,

equivalente e sinérgica com os processos mentais, e estes, são concomitantes, equivalentes e

sinérgicos com a expressão somática que os acompanha.

Perestrello (1996), explica o adoecer singular de cada indivíduo fazendo uma

comparação. Assim como cada indivíduo possui impressões digitais únicas que o diferenciam

de qualquer outro ser humano, o mesmo acontece com seus tecidos, órgãos, humores, sua

fisiologia e, conseqüentemente, sua fisiopatologia. Cada indivíduo possui seu mundo, sua

própria maneira de viver, agir e reagir, e de funcionar, seja ao nível dos pensamentos e

sentimentos, ou ao nível visceral. Sua homeostase e sua imunologia são únicas. Logo, cada

indivíduo é uma configuração única, com fisiologia e funcionamento próprios, portanto, sua

fisiopatologia possui um modo próprio de adoecer. Diz Perestrello (1996), que na saúde ou na

doença, o homem manifesta-se para comunicar o que se passa na sua profundeza. “Nada se

passa na intimidade de nossos tecidos e humores sem que as nossas emoções estejam

presentes, inclusive o pensamento, ainda que inconsciente” (PERESTRELLO, 1996, p. 68).

Osório (1993), considera doença e saúde como metáforas de comunicação através das quais o

processo vital expressa seu fluxo evolutivo e as respectivas vicissitudes. Briganti (1999),

expressa a mesma idéia ao afirmar que toda patologia possui uma lógica, um sentido que

precisa ser entendido.

As mudanças no meio do indivíduo, a “perda do objeto” (HOWARD; LEWIS, 1999,

p.35), e suas conseqüências intrapsíquicas vão desempenhar importante papel no surgimento

da doença ou de um sintoma, por mais banal que seja. Quando o indivíduo sente-se rejeitado,

suas defesas imunológicas e somáticas enfraquecem. É possível, inclusive, diagnosticar riscos

de agravamento agudo de doenças crônicas quando há sentimento de desesperança. Uma

perda importante seguida de renúncia pode estar relacionada a certas doenças, embora se

saiba que a tolerância individual é variável.

Moreira; Mello Filho (1992), escrevem que as células do sistema nervoso e do

sistema imune contribuem para a homeostase, na medida em que são dotados de memória e

possuem função defensiva. Porém, se funcionam adaptativamente mal, podem provocar

enfermidades.

A doença, segundo Rodrigues; Gasparini (1992); Arruda (1994), é uma reação do

organismo e não apenas um efeito aos estímulos nocivos. O homem tanto pode reagir às

ameaças concretas (microorganismos, por exemplo), como às ameaças simbólicas

provenientes da interação social. Assim, ruptura de laços familiares, privação de necessidades

básicas, obstáculos a realizações pessoais, separações, perda de emprego, viuvez,

aposentadoria, entre outros, podem ser tão prejudiciais ao indivíduo quanto as ameaças

concretas. Em relação às doenças periodontais, a literatura é bastante consistente na

demonstração desses fenômenos (MARCENES; SHEIHAM, 1992; SILVA; NEWMAN; OAKLEY,

1995; LINDEY; MULLALLY; FREEMAN, 1996; BREIVIK; THRANE; MURISON; GJERMO, 1996;

CROUCHER et. al., 1997; SALLUM et. al., 1999; DEINZER et. al., 2001; COHEN; SLAVSKIN,

2002; SALLUM, 2002; ALEKSEJUNIENE et. al., 2002; HUGOSON; LJUNGQUIST; BREIVIK, 2002;

SCHENKEIN, 2003).

O número de tais fatores presentes na vida de um indivíduo são um preditor de risco

de doença. Conflitos gerados por tais situações, sejam do indivíduo com ele mesmo, seja com

as circunstâncias com as quais está envolvido, geram emoções. Estas emoções originam

alterações funcionais que, se repetidas e persistentes, alteram as células, provocando a lesão

orgânica e suas complicações (ARRUDA,1990; RODRIGUES; GASPARINI, 1992; LINDEN;

MULLALLY; FREEMAN, 1996).

Sobre a emoção, Rodrigues; Gasparini (1992), dizem ser um fenômeno que ocorre no

nível corporal e dos processos mentais. Sentimentos como medo, raiva, dor, tristeza, alegria,

expressam-se no corpo através de funções motoras, secretoras e de irrigação sangüínea, nos

mais diferentes órgãos ou aparelhos orgânicos. Por exemplo, disfunções motoras no aparelho

digestivo são os vômitos, as diarréias, entre outros; no aparelho respiratório, podem ser

citadas a asma, a bronquite; no aparelho gênitourinário, a dismenorréia, a vaginite; no

aparelho circulatório, hipertensão, enxaqueca; na pele, eczema, prurido. Quando a disfunção é

secretora, há alterações na produção de muco, de secreções endócrinas, dos hormônios do

aparelho digestivo, da secreção gástrica, pancreática, biliar e entérica. No caso das disfunções

de irrigação sangüínea nos órgãos, ocorrem processos agudos e crônicos. Dependendo de sua

duração, repetição e intensidade, pode ocorrer a diminuição da resistência das mucosas a

outros agentes agressivos, originando hemorragias e ulcerações cuja extensão e profundidade

são variáveis. As alterações destas três funções, motora, secretora e de irrigação sangüínea

ocorrem em múltiplas combinações, gerando as mais diferentes manifestações clínicas.

Howard; Lewis, (1999), denominaram tais enfermidades de doenças de adaptação. Tal como

Arruda (1994), Perestrello (1996), alerta que toda a espécie humana possui as mesmas

estruturas anátomo-funcionais, mas cada indivíduo mobiliza-se de maneira diferente, de

acordo com sua própria biografia e estratégias de vida.

As doenças psicossomáticas devem ser devidamente diferenciadas da hipocondria, na

qual não são encontradas justificativas orgânicas para as queixas do paciente (TOTMAN,

1982). Ao contrário, existem indícios reais de patologia orgânica, a qual acredita-se, ter sido,

pelo menos em parte, originada por forças psicológicas.

Arruda (1990), esclarece que os sintomas da maioria das doenças são produto de

vários fatores concomitantes, cada um atuando em combinação com os outros (polietiologia

da doença). Esses fatores são: processos sociais amplos, fatores ambientais, influências

familiares, predisposição constitucional de natureza genética e inadequação na forma das

comunicações verbais e outras formas simbólicas.

1.8 Depressão

No decorrer dos séculos reconheceu-se uma próxima associação entre estados de

humor depressivo, queixas físicas e preocupações hipocondríacas (LIPOWSKI, 1990;

MOREIRA; MELLO FILHO, 1992). Galeno acreditava que a melancolia hipocondríaca era

causada por sintomas do trato digestivo, podendo afetar o cérebro. Ou seja, pacientes que

sofriam de melancolia hipocondríaca, queixavam-se de problemas digestivos. Até o século

XVIII, os termos melancolia e hipocondria foram utilizados indiscriminadamente. Com a

separação da depressão como uma entidade clínica distinta, surgiu a questão: com que

freqüência e de que modo os pacientes depressivos experienciavam e comunicavam seu

distress• emocional em termos somáticos ou psicológicos.

De acordo com Lipowski (1990), desordens depressivas com predominante queixa

somática representam provavelmente a mais comum forma de desordem afetiva. Isso ocorre

tanto nos países do Ocidente quanto nos em desenvolvimento.

Enquanto desordens depressivas são freqüentemente associadas a somatizações, estas

também são freqüentemente complicadas pela depressão. O paciente depressivo apresenta

sintomas somáticos vagos e preocupações hipocondríacas. Dor, fadiga, fraqueza, tontura,

dispnéia, palpitação, problemas intestinais, parestesias e disfunção sexual costumam ser as

queixas mais freqüentes, segundo Lipowski (1990).

O autor comenta que o critério diagnóstico para desordens depressivas que se

manifestam primeiramente por queixas somáticas não é uniforme dentre os pesquisadores. Há

uma ambigüidade na literatura sobre a natureza dos sintomas físicos encontrados em pacientes

com somatizações. Por exemplo: alguns autores incluem insônia, anorexia e diminuição do

apetite sexual como queixas somáticas. Outros usam o termo ‘somático’ para dor e outras

formas de desconforto corporal. Esta segunda é a opinião de Lipowski (1990).

Um levantamento teórico feito por Lipowski (1990), sobre a associação entre doença

depressiva e somatização, revelou, às vezes, dados bastante discrepantes. Enquanto alguns

autores acreditam que à medida que a mulher vai envelhecendo, naturalmente aumenta o

número de problemas orgânicos, outros acreditam que a mulher mais velha que parece

somatizar, pode estar queixando-se de sintomas físicos que podem ser imputados à doenças

físicas já desenvolvidas. Há pesquisadores que acreditam que queixas somáticas com

• A palavra stress entrou para a língua inglesa no século XIV como forma abreviada de distress (LIPOWSKI, 1990).

componentes depressivos tendem a diminuir com a idade, mas mesmo assim, são muito

comuns em mulheres.

Ainda segundo Lipowski (1990), experiências infantis, convivência com doenças ou

comportamento doentio, ou ainda, valorização de queixas orgânicas podem predispor um

indivíduo a usar a somatização como forma de comunicar seu stress emocional, como humor

depressivo ou como uma forma de tentar adaptar-se às relações interpessoais.

Apesar de acreditar que fatores sócio-culturais podem influenciar no processo de

somatização, especialmente em países em desenvolvimento, Lipowski (1990), cita pesquisas

já realizadas e que não confirmaram tal afirmação. Pesquisas realizadas na Grã-Bretanha,

Austrália e EUA demonstraram que apresentação somática da doença depressiva é regra. Em

países onde a expressão de stress emocional é reprimida, desencorajada, o stress acaba sendo

comunicado por via somática.

Ainda não está suficientemente conhecida a relação entre somatização, depressão e

condições crônicas, como fibromialgia, por exemplo. Lipowski (1990), sugere que ela é

associada à depressão e não a uma manifestação de somatização.

Esconder distúrbios de origem psíquica em desordens orgânicas caracteriza a

‘depressão mascarada’. Arruda (1990), explica que tal depressão pode manifestar-se em

qualquer idade, estando geralmente ligada a perdas materiais ou afetivas, a decepções em

relação aos outros ou a si mesmo. Freqüentemente observa-se o estado depressivo nos

períodos de mudança que provocam a perda do equilíbrio anterior e exigem uma nova

adaptação. Por exemplo, mudança de idade, início da escolaridade, início da adolescência,

casamento, nascimento do primeiro filho, aposentadoria, entre outros. Inicialmente, surge a

angústia, a ansiedade. Mais tarde, tais fatos podem levar a um estado depressivo que se

apresenta, muitas vezes, mascarado por sintomas hipocondríacos. “A cronicidade desses

sintomas podem fazer com que distúrbios orgânicos funcionais (reversíveis), possam tornar-

se ‘lesionais’ (não reversíveis)” (ARRUDA, 1990, p. 16).

Lipowski (1990), acredita que depressão mascarada é uma doença depressiva na qual

aspectos afetivos e cognitivos da depressão são mascarados por sintomas somáticos, ou

hipocondríacos ou ambos. Entretanto, o autor entende que a explicação é vaga, pois desordem

depressiva é uma síndrome, um conjunto de sintomas que ocorrem regularmente juntos, então,

vários sintomas ao menos devem estar juntos para fazer-se um diagnóstico.

Shortes et. al. (1992), pesquisaram a relação entre somatização persistente e

depressão. Consideraram a presença de componentes depressivos se houvesse evidência de

tristeza, idéias suicidas ou sinais neuro-vegetativos de depressão. Concluíram que os pacientes

que somatizavam, mas que não tinham sintomas depressivos, tinham conhecimento sobre a

natureza da doença, o que foi definido pelos autores pela habilidade que os paciente

demonstravam para explicar seu conhecimento sobre os fatores psicológicos ou psicossociais

de seus sintomas. Os pacientes deprimidos tinham pouco ou nenhum conhecimento dessa

ordem, além de estarem convencidos da natureza orgânica de seus sintomas psíquicos. A

negação do distúrbio de humor e a crença de que o problema é orgânico, segundo Arruda

(1990); Lipowski (1990); Santos Filho (1994), acaba fazendo com que esses pacientes sejam

mal diagnosticados, e conseqüentemente, erroneamente tratados. Essa afirmativa foi

confirmada através de pesquisas que indicaram que aproximadamente 80% de pacientes com

depressão quando avaliados pela primeira vez pelo médico clínico, apresentaram queixas

orgânicas e não psicológicas. Os autores concluíram que menos da metade desses pacientes

foram adequadamente diagnosticados e tratados (BRIDGES; GOLDBERG, 1985; DUER; CAYNE,

1988 apud LIPOWSKI, 1990).

Shortes et. al. (1992), observaram que pacientes que se sentiam como elemento de um

par e que não foram doentes na infância, apresentavam menos quadros depressivos. A

somatização persistente não foi associada a nível sócio econômico baixo nem a isolamento

social, pois mais de 50% da amostra foi composta de indivíduos de classe média que tinham

relações afetivas estáveis. Os autores concluíram que somatização persistente poderia ocorrer

em pessoas de famílias ‘normais’.

1.9 Aspectos Sócio-demográficos, Emocionais, Comportamentais e Sócio-

culturais Associados a Doenças Periodontais

A doença periodontal varia de paciente para paciente, ou seja, nem todo doente com

placa microbacteriana vai desenvolver a doença. Há pessoas com maiores riscos que outras

(CAMPOS JR. et. al., 1999; RODRIGUES, 2002; KORNMAN, 2002; SALLUM, 2002; COHEN;

SLAVSKIN, 2002; SCHENKEIN, 2003). Silva; Newman; Oakley (1995), observaram indivíduos

que aparentemente tinham uma vida feliz e organizada, faziam doenças periodontais,

enquanto outros, que passavam por momentos de stress, não adoeciam. Esta maior ou menor

vulnerabilidade a contrair doenças orgânicas deve-se à plasticidade individual (ARRUDA,

1994).

A vulnerabilidade é entendida como ausência da disposição pessoal e de recursos

sociais que previnem a ocorrência ou diminuem a intensidade da disforia (sentimentos de

ansiedade, insatisfação, estados depressivos) associada aos elementos estressores (SILVA;

NEWMAN; OAKLEY, 1995). Segue-se a descrição de alguns fatores relevantes para o

desenvolvimento e/ou agravamento da doença periodontal crônica.

1.9.1 Gênero

A American Academy of Periodontology (1996), descreve maior prevalência de

doença periodontal em todos os níveis de severidade em pessoas do gênero masculino. A

hipótese justificativa foi que, além da higiene oral ser mais deficiente nos homens que nas

mulheres, elas procuram atendimento odontológico com mais freqüência. O fator genético foi

descartado como explicação. Pesquisas confirmam essa maior procura de tratamentos

odontológico pelas mulheres (ALCONFFE, 1898; POMPEU; TOLEDO; SAMPAIO, 1997;

CROUCHER et. al., 1997; CHAMBRONE; CHAMBRONE, 1997; MACHION et. al., 2001; WOLF et.

al., 2001; LAGERVALL; JANSSON; BERGSTRÖM, 2003).

1.9.2 Idade

De acordo com a American Academy of Periodontology (1966), a periodontite inicia-

se geralmente na juventude ou na idade adulta, sendo que as pessoas mais velhas sujeitas à

doença periodontal severa tendem a perder os dentes.

A literatura mostra que a prevalência de doenças periodontais situa-se no grupo etário

de 31 a 50 anos (MARCENES; SHEIHAM, 1992; LINDEN; MULLALLY; FREEMAN, 1996;

CROUCHER et. al., 1997; POMPEU; TOLEDO; SAMPAIO, 1997; MACHION et. al., 2000;

HUGOSON; LJUNGQUIST; BREIVIK, 2002).

1.9.3 Estado civil

Pesquisas mostraram que existe relação entre qualidade da relação do casamento com

doença periodontal (MARCENES; SHEIHAM, 1992; CROUCHER et. al., 1997). A viuvez também

pode estar associada à saúde periodontal (HUGOSON; LJUNGQUIST; BERGSTRÖM, 2002).

1.9.4 Grau de instrução

A American Academy of Periodontology (1996), constatou que perdas de inserção de

4 mm. ou mais de 7 mm. estavam relacionadas com níveis educacionais. A referida Academia

sugeriu que o nível sócio-econômico e saúde gengival são função de melhor higiene entre

indivíduos de melhor instrução, que mais freqüentemente visitavam os dentistas e que

possuíam maiores conhecimentos sobre auto-cuidados quanto à saúde oral. Croucher et. al.

(1997), também verificaram uma associação entre doença periodontal e grau de instrução. Na

pesquisa de Chambrone; Chambrone (2001), evidenciou-se que indivíduos com grau de

instrução mais baixo tendem a desenvolver crenças sobre saúde bucal.

1.9.5 Situação laboral

A literatura refere uma associação entre doença periodontal e problemas financeiros,

pois estes podem causar um rebaixamento de auto-estima, sentimentos de desamparo,

desesperança, ansiedade, depressão, que por sua vez, podem levar a uma mal adaptação no

trabalho, rebaixamento da qualidade de higiene bucal e aumento de atitudes contrárias à

preservação da saúde (SCHWAB; TRAVEN, 1979; SCHWAB, 1984; AMERICAN ACADEMY OF

PERIODONTOLOGY, 1996; POMPEU; TOLEDO; SAMPAIO, 1997; KINANE; LINDHE, 1999;

HOWARD; LEWIS, 1999; KENNEDY; SCHWAB; HIDE, 2001; SALLUM, 2002; BIMSTEIN, 2003;

VETTORE et. al., 2003). Marcenes; Sheiham (1992), Linden; Mullally; Freeman (1996);

Croucher et. al. (1997), observaram uma relação entre doença periodontal com desemprego e

certas características das funções laborais.

1.9.6 Tabagismo

O tabagismo é o mais importante fator de risco associado à doença periodontal,

segundo Couto; Couto (1992); Silva; Newman; Oakley (1995); Croucher et. al. (1997);

Pompeu; Toledo; Sampaio (1997); American Academy of Periodontology (1999, [b] 2001);

Papapanou; Lindhe (1999); Sallum et. al. (1999); Bretz; Chaves (1999); Hujoel et. al. (2003);

Daud (2003).

Pesquisas demonstraram a associação do tabagismo com stress, eventos vitais

negativos e alteração de hábitos de higiene (BREIVIK et. al., 1996; DEINZER et. al., 2001;

HUGOSON; LJUNGQUIST; BERGSTRÖM, 2002; ALEKSEJUNIENE et. al., 2002).

O tabagismo também é um hábito que representa uma fixação na fase oral, segundo

Arruda (1990).

1.9.7 Bruxismo

Bahlis; Rodrigues; Ferrari (1999); Nóbilo; Pinto; Nóbilo; Mesquita; Henriques (2000),

descrevem o bruxismo como um hábito parafuncional muito destrutivo, pois pode danificar os

tecidos dentais e o periodonto. A força agindo sobre o periodonto pode levar à reabsorção

óssea (lesão traumática), que na presença de inflamação gengival pode aumentar a velocidade

da progressão dessa lesão. Ranger e/ou apertar os dentes também influencia a mobilidade

dental, formação de diastemas, recessão gengival, entre outras conseqüências.

Carvalhal Ribas; Montenegro (1980), verificaram a existência de elementos de

natureza agressiva ao realizarem uma pesquisa heredológica sobre o caráter epileptóide em 28

pacientes.

Etiologicamente falando, hoje não se sustentam mais teorias meramente oclusais para

justificar a presença da parafunção. Como explicam Bahlis; Rodrigues; Ferrari (1999), se a

etiologia do bruxismo estivesse unicamente na interferência oclusal, sua eliminação também

cessaria a parafunção, o que nem sempre acontece. Mesmo que haja uma elevação do tônus

muscular devido à condição oclusal, somente na presença de um fator adicional que contribua

para o aumento da atividade muscular é que se instala o bruxismo. Esse fator, acreditam os

autores, é o estado emocional. Assim, bruxismo é “tensão emocional e oclusão defletora,

sendo o processo iniciado pelo sistema nervoso central, que escolhe a má oclusão como

instrumento para desencadear o problema” (RUBIANO, 1990 apud BAHLIS; RODRIGUES;

FERRARI, 1990, p. 10).

A literatura tem demonstrado que a etiologia do bruxismo está associada ao stress

emocional e alterações psicossociais (SILVA; NEWMAN; OAKLEY, 1995; BAHLIS; RODRIGUES;

FERRARI, 1999; SALLUM et. al., 1999; ALEKSEJUNIENE et. al., 2002). O bruxismo também é

entendido como somatização de conflitos intrapsíquicos originados na fase oral (ARRUDA,

1990; NÓBILO et. al., 2000; MELLO FILHO, 2002). William; Dowrick; Hillon; Humpris;

Moulding; Ireland (2001); Torres; Lotti; Peixoto; Graça; Lima; Pina; Nucci; Uzeda (2002),

citam o bruxismo como possível manifestação psicofisiológica de depressão e resultado de

stress.

1.9.8 Stress

Embora a literatura mostre e os prontuários citem o stress, essa categoria não será

considerada em nosso estudo, pois entendemos que stress é uma doença psicológica e não foi

avaliada com instrumentos adequados. Como a conduta humana é um fator do homem

enquanto um ser bio-psico-social, seu adoecer só pode ser compreendido mediante

conhecimentos adequados (RODRIGUES; GASPARINI, 1992; MELLO FILHO, 1992; OSÓRIO,

1993; EKSTERMAN, 1996; PERESTRELLO, 1996).

Os conhecimentos atuais sobre mudanças sociais e doença foram intensificados nos

anos 70, com investigações sobre eventos de vida estressantes, buscando quantificar mais

precisamente os estressores, tais como: problemas de desempenho escolar ou profissional,

dificuldades de relacionamento de diferentes níveis afetivos, perdas, entre outros (SCHWAB,

1984). A interrelação entre vida social, cultura e crise de um lado, e as respostas individuais,

de outro, dependem pouco de atitudes ou valores, mas quase completamente, sobre a

definição da situação dada pelo indivíduo (TOTMAN, 1982; SCHWAB, 1984; ARRUDA, 1990).

O stress pode modificar a resposta imunológica (SILVA; NEWMAN; OAKLEY, 1995;

LINDEN; MULLALLY; FREEMAN, 1996; BREIVIK et. al., 1996). Estudos neuro-endócrinos já

demonstraram a queda das defesas imunológicas como possível quebra da homeostase facilita

a instalação da doença periodontal e doenças, de uma forma geral e, conseqüentemente, da

doença periodontal (ARRUDA, 1990; SILVA; NEWMAN; OAKLEY, 1995; BREIVIK et. al., 1996;

HUGOSON; LJUNGQUIST; BERGSTRÖM, 2002; ALEKSEJUNIENE et. al., 2002; COHEN; SLAVSKIN,

2002; SALLUM, 2002; SCHENKEIN, 2003, VETTORE et. al., 2003).

Esses estados afetivos negativos como medo, ansiedade, hostilidade, estados

depressivos (tristeza, solidão) representam fatores de risco para doenças. Segundo Breivik et.

al. (1996); Kennedy; Schwab; Hide (2001), concluíram que defesas mal adaptadas são mais

prevalentes em indivíduos com depressão maior, desordens de pânico, ansiedade generalizada

e fobia social. Aleksejuniene et. al. (2002); Deinzer et. al. (2003), observaram que falta de

suporte social aumenta o stress, o que, por sua vez, afeta a capacidade de adaptação aos

eventos de vida estressantes.

Muito têm sido escrito sobre a influência significativa dos fatores psicossocias sobre a

saúde bucal e sobre a doença periodontal inflamatória (SILVA; NEWMAN; OAKLEY, 1995;

MARCENES; SHEIHAM, 1996; BREIVIK et. al., 1996; CROUCHER et. al., 1997; SALLUM et. al.,

1999).

1.9.9 Onicofagia

A onicofagia pode ser descrita como expressão de conflito, fixação da fase oral, de

auto-agressividade que o indivíduo não consegue expressar de outra forma, como explica

Arruda (1990). Osório (1993), associou a onicofagia à ansiedade vinculada a grandes

responsabilidades. Arruda (1990); Sallum et. al. (1999); Aleksejuniene et. al. (2002),

acreditam que a roer unhas está associada a algum tipo de angústia que leva o indivíduo a

comportamentos prejudiciais à saúde.

1.9.10 Xerostomia

Williams et. al. (2001), alertam que o periodontista deve estar atento para

manifestações emocionais dos pacientes devido à associação com a doença periodontal. Entre

outros sintomas, os autores citam que a sensação de boca seca (xerostomia) pode ser uma

expressão psicofisiológica de depressão.

Torres et. al. (2002), citam, entre as várias causas comuns da xerostomia, os distúrbios

psicogênicos, mais especificamente: ‘stress’, depressão e ansiedade.

Frente ao exposto, os objetivos de estudo são:

1- Caracterizar a população dos pacientes periodontais de uma clínica-escola.

2- Investigar aspectos psico-afetivos desses pacientes, associados às doenças periodontais.

Objetivos específicos:

3- Identificar as principais patologias periodontais apresentadas por esses pacientes.

4- Identificar as patologias periodontais associando-as a variáveis comportamentais e psico-

afetivas.

5- Verificar os principais recursos defensivos utilizados por pacientes poliqueixosos.

2.MÉTODO

2.1 Amostra

A amostra foi composta, na primeira etapa deste estudo, de 789 prontuários, que

correspondem ao universo de pacientes atendidos ou encaminhados para a especialidade de

Periodontia de uma clínica-escola de uma Faculdade de Odontologia da cidade de Santos.

Essa amostra corresponde aos pacientes atendidos/encaminhados no período de setembro de

2001 (início de funcionamento da clínica) a maio de 2003. Após esse período foram

encerradas as inscrições para novos pacientes, vista a impossibilidade de atendimento da

demanda.

A amostra caracterizou-se por integrantes, na sua maioria mulheres (64,5%), pacientes

com faixa etária entre 30 a 39 anos (27,1%), casados (50,8%), brancos (79,9%) e com, no

máximo, 2 filhos (76,0%). A amostra caracterizou-se ainda por ter a maioria de seus

integrantes pertencentes à Baixada Santista (46,0%), com grau de instrução médio completo

(34,4%) e que não exercem atividades remuneradas (38,3%).

Numa segunda etapa, esta de investigação qualitativa, foram selecionados pacientes da

população acima descrita e que apresentaram variáveis comportamentais e psico-afetivas

hipoteticamente associadas à patologia e sintomatologia periodontal, conforme descritas na

introdução do presente estudo•.

2.2 Ambiente

A coleta de dados dos prontuários foi realizada nas dependências da recepção e

secretaria da clínica-escola da faculdade de Odontologia. As entrevistas da etapa qualitativa

ocorreram em sala especialmente cedida para esse fim, nas dependências da própria

faculdade.

• Todos os pacientes assinaram um ‘Termo de Consentimento Livre e Esclarecido’ (anexo I).

2.3 Material e Instrumentos

2.3.1 Prontuários

2.3.1.1 Fichas de Encaminhamento (indicação do setor): este material (anexo II), foi

utilizado para identificar os pacientes que estavam sendo atendidos, que foram encaminhados

ou que já haviam concluído o tratamento periodontal. A ficha de encaminhamento consta do

prontuário de cada paciente como ‘folha de rosto’, na qual encontram-se: nome do paciente,

telefone e o número de seu prontuário, além da descrição das especialidades odontológicas

que a clínica atende. Após a triagem, é (são) anotada(s) nessa ficha de encaminhamento, a(s)

especialidade(s) para as quais cada paciente é encaminhado.

2.3.1.2 Fichas de Triagem (dados de identificação do paciente): este material (anexo III),

foi utilizado para a caracterização sócio-demográfica dos pacientes selecionados para a

pesquisa. A ficha de triagem refere-se à primeira anamnese feita com o paciente, cujos dados

são preenchidos para posterior(es) encaminhamento(s) à(s) especialidade(s) necessária(s). Na

primeira parte, além da data do atendimento na Triagem e do número do prontuário do

paciente, encontra-se a Identificação do Paciente, onde constam os dados sócio-demográficos.

Nos itens seguintes, Dados Complementares e Anamnese, são encontradas informações sobre

tratamentos atuais e/ou queixas em diferentes sistemas orgânicos do paciente, dados sobre

quando realizou o último tratamento dentário, as cirurgias a que o paciente submeteu-se e se

já teve ou tem alguma doença grave. As queixas em diferentes sistemas orgânicos não

incluíram o sistema oral, que motivou a procura do serviço odontológico.

2.3.1.3 Ficha Periodontal: esse material (anexo IV), foi utilizado para a obtenção do

diagnóstico periodontal e de outras informações sobre o estado geral e bucal do paciente. A

ficha periodontal é preenchida durante o primeiro atendimento na especialidade, quando é

feita uma avaliação específica da área para elaboração do diagnóstico e para que sejam

pedidos os exames complementares que porventura se façam necessários. Além de

informações de identificação do paciente, encontram-se os itens: Saúde Geral, para

preenchimento com informações sobre cirurgias e tratamentos feitos ou em curso e Saúde

Bucal, onde constam informações específicas quanto à(s) queixa(s), informações gerais,

hábitos e vícios da região oral tais como: ingestão de comida e/ou doces em excesso, consumo

de bebidas, tabagismo, onicofagia (roer unhas), bruxismo (apertar e/ou ranger de dentes).

Encontram-se ainda, na referida ficha, o Diagnóstico Periodontal seguido da Análise

Radiográfica, da Avaliação Oclusal e do Plano de Tratamento.

2.3.2 Planilhas: foram elaboradas, especialmente para este trabalho, quatro planilhas com o

objetivo de reunir os dados relevantes dos pacientes. Cada paciente pode ser identificado em

todas as planilhas pelo mesmo número recebido na coluna ‘Sujeito’.

2.3.2.1 Planilha de Registros 1 - Identificação do Paciente: esta planilha (anexo V), tinha

por objetivo a identificação sócio-demográfica dos pacientes através dos seguintes dados:

sexo; idade; estado civil; naturalidade; profissão; grau de instrução, raça e número de filhos.

Essas informações foram retiradas da ficha de Triagem.

Para o registro desses dados foram utilizados códigos e faixas numéricas para facilitar

o controle da pesquisadora quanto à sistematização das informações, e para viabilizar o

tratamento estatístico. Foram estabelecidos códigos para cada classe ou categoria e, dentro

delas, as variáveis, a saber:

Sexo: 1- masculino 2- feminino. Idade: (foram selecionados para a pesquisa, pacientes a

partir dos 14 anos, pois aqueles com idade até 13 anos e 11 meses são triados através de

anamnese pediátrica): de 14 até 19 anos; de 20 a 29 anos; 30 a 39 anos; 40 a 49 anos, 50 a 59

anos e 60 anos e acima. Estado civil: (categorias descritas nos prontuários):1- solteiro

2- casado (foram consideradas as uniões estáveis) 3- viúvo 4- separado. Naturalidade: 1-

Baixada Santista 2- Estado de São Paulo (excluindo a Baixada Santista) 3- outro Estado

4- Nordeste 5- exterior. (As variáveis desta categoria foram assim determinadas por

apresentarem maior índice de pacientes nascidos nas referidas regiões). Profissão: (as

profissões nomeadas são as referidas pelos pacientes): 1- alta especialização (professor;

jornalista; despachante, analista de sistemas e engenheiro). 2- média especialização

(comerciante; farmacêutico; balconista; cabeleireiro; vendedor; autônomo; fotógrafo; técnico

de contabilidade; esteticista; bancário; músico; artista plástico; supervisor de informática;

conferente, auxiliar de laboratório; eletricista; auxiliar de despachante; auxiliar de

enfermagem; auxiliar de cartório; manicure; corretor; auxiliar de escritório; gerente; auxiliar

de expedição; artesão, auxiliar administrativo e oficial administrativo). 3- baixa

especialização (caseiro; costureira; garçonete; segurança; porteiro; ascensorista; mecânico;

vigilante; serviços gerais; ambulante, jornaleiro e operador de caldeira). 4- trabalho braçal

(doméstica; diarista, faxineira; estivador; cozinheira; pintor; pedreiro; lavador de carros e

marceneiro). 5- sem atividade remunerada (estudantes, do lar, aposentados). Grau de

instrução: 1- fundamental incompleto 2- fundamental completo (1ª à 8ª série completas)

3- ensino médio incompleto 4- ensino médio completo (colegial completo) 5- superior

incompleto 6- superior completo (curso universitário completo) 9991- escola especial

9999- analfabeto (nunca estudou). Raça: (as categorias descritas refletem a observação dos

alunos por ocasião da anamnese): 1- branca 2- negra 3- parda 4- amarela. Número de

filhos: sem filhos, 1 filho, 2 filhos e assim sucessivamente, até 7 filhos. Grávida: 90. Não

informado: 99 (este número indicou a ausência de dados em qualquer uma das categorias nos

prontuários dos pacientes).

2.3.2.2 Planilha de Registros 2 - Saúde Geral Atual: nesta planilha (anexo VI), foram

reunidos os dados sobre tratamentos e sintomas da saúde geral do sujeito por ocasião da

procura do tratamento dental. O objetivo da sistematização dessas informações visava

verificar possíveis relações entre características da doença periodontal com a quantidade de

queixas em diferentes sistemas orgânicos. Os tratamentos e sintomas, retirados das fichas de

triagem e periodontal, foram aleatoriamente numerados e registrados de acordo com os

principais sistemas de funcionamento orgânico. Para o tratamento estatístico, a presença de

um sintoma em qualquer das áreas era registrada como ‘1’ e sua ausência, como ‘2’. Segue-se

a descrição ordenada dos sistemas orgânicos e as queixas que fizeram parte de cada deles.

1 - Sistema cardiovascular: (problemas do coração; pressão, palpitações; sopro; arritmias;

colesterol; varizes, infarto e trombose). 2 - Sistema respiratório: (bronquite; asma; sinusite;

renite; pneumonia; tuberculose; tosse freqüente; enfizema pulmonar, amidalite e otite.

3 - Sistema gênito-urinário: (cálculos renais; infecções da bexiga; problemas nos rins;

nefrite, cistite e pielonefrite). 4 - Sistema reprodutor: (menopausa; cólicas menstruais;

mioma; problemas de ovário e/ou de útero; nódulo no seio; cisto; esterectomia; períneo;

laqueadura; bhartolinite, sífilis e curetagem). O registro de doenças características do gênero

feminino deve-se ao fato de nenhum dos homens da amostra referir-se à queixas neste sistema

orgânico. 5 - Sistema gastro-intestinal: (gastrite; úlcera; estômago; azia; hepatites; diarréia

crônica, hérnia e hemorróidas). 6 - Sistema ósteo-mio-articular: (artrite; artrose; osteoporose;

bursite; tendinite, febre reumática e ciático).

7 - Sistema neurológico: (tonturas; náuseas; esquecimento; zumbidos; labirintite; cefaléia;

enxaqueca; hérnia de disco; meningioma; derrame; esclerose múltipla, convulsões e

epilepsia). 8 - Sistema endócrino: (dietas, tireóide e diabetes). 9 - Sistema hematológico:

(anemia e câncer). 10 - Alergias: (pó; medicamento; alimentos; cremes, produtos químicos e

anestesia).11 - Stress: (stress, síndrome do pânico, depressão e anorexia nervosa).

Aqueles pacientes que apresentaram queixas em três ou mais sistemas orgânicos foram

denominados de ‘poliqueixosos’, com a finalidade de serem mais facilmente identificados

durante a descrição da pesquisa.

2.3.2.3 Planilha de Registros 3 - Hábitos e Vícios: esta planilha (anexo VII), visou verificar

se hábitos e vícios como: tabagismo, onicofagia, ingestão de comida e/ou doces em excesso,

apertar e/ou ranger dentes e consumo de bebida poderiam estar relacionados com aspectos

psico-afetivos dos pacientes, influenciando a evolução e o prognóstico da doença periodontal.

A pesquisa identificou os sujeitos tabagistas quanto à quantidade de cigarros fumados por dia

e o tempo que fuma em anos. Os não fumantes foram registrados com ‘0’.

Os hábitos sobre bebida foram subdivididos em: álcool e refrigerante e os hábitos

alimentares incluíram dados sobre comer muito e comer muito doce. Registrou-se ainda os

sujeitos onicofágicos. Todas essas informações foram anotadas com ‘1’ para presença do

hábito ou vício e ‘2’, para sua ausência.

2.3.2.4 Planilha de Registros 4 - Saúde Odontológica: esta planilha (anexo VIII), visou

obter dados quanto a queixas sobre o estado de saúde ou doença dos dentes, gengiva e boca,

além do diagnóstico periodontal. Quanto aos dentes, levantou-se dados sobre: dor, mobilidade

dental, bruxismo e sensibilidade dental. Em relação à gengiva, foram colhidos dados quanto à

dor, sangramento e sensibilidade gengival. Xerostomia (boca seca) e presença de feridas de

difícil cura (atuais ou não) foram os registros relativos à boca. O registro desses dados foi

codificado como ‘1’ para presença e como ‘2’, para ausência dos sintomas em questão.

A classificação das doenças periodontais quanto à extensão, severidade e presença ou

não de fatores modificadores foi feita segundo orientação da American Academy of

Periodontology. (1999). No início dos atendimentos na clínica-escola, os diagnósticos eram

descritos segundo a orientação da World Workshop in Clinic Periodontics, de 1989. No ano

de 2002, as doenças periodontais passaram a ser classificadas de acordo com a determinação

do International Workshop for a Classification of Periodontal Diseases and Conditions,

ocorrido em 1999. A nomenclatura utilizada no presente trabalho é a atual. Para tanto, a

classificação antiga foi atualizada para a de 1999, segundo o descrito na introdução do

presente trabalho.

Para que fosse considerado válido, o diagnóstico deveria constituir-se de: nome da

doença (gengivite ou periodontite), sua extensão (localizada ou generalizada) e/ou severidade

(leve, leve a moderada, moderada, moderada a severa, severa ou leve a severa) com

indicação da presença de fatores modificadores, quando existentes. Assim, as periodontites

crônicas foram classificadas para a sistematização de dados, conforme segue-se:

Extensão: ‘1’ para doença periodontal localizada e ‘2’ para generalizada.

Severidade: 1- leve; 2 - leve a moderada; 3 - moderada; 4 - moderada a severa, 5 - severa e

6 - leve a severa.

Constaram dessa planilha também os seguintes códigos:

9 - Gengivite: 90 - Tratamento não iniciado: (pacientes encaminhados ao setor de

Periodontia, mas que estavam em fila de espera, ou então, sendo atendidos em outra

especialidade). 99 - Não informado: (dados de diagnóstico ausentes ou incompletos na

anamnese periodontal, conforme critérios estabelecidos pela pesquisa).

2.3.3 Roteiro de Entrevista: o roteiro (anexo IX), foi elaborado especialmente para este

estudo. Sua finalidade foi abordar aspectos psicodinâmicos dos sujeitos, seguindo os quatro

setores adaptativos, propostos por Ryad (1989), para elaboração diagnóstica.

O autor entende que adaptação é o conjunto de respostas do indivíduo que permitam a

manutenção de sua organização, frente às situações que em todos os momentos modificam-se.

Para obter todas as situações psicológicas possíveis, Ryad (1989), estabeleceu quatro setores

de funcionamento principais, como se segue: afetivo-relacional, que compreende o conjunto

de sentimentos, atitudes e ações do sujeito em relação a si próprio e também em relação ao

semelhante; produtividade, que se refere ao conjunto de atitudes e ações do indivíduo frente

ao trabalho, estudo ou qualquer outra atividade produtiva, inclusive as de natureza artística,

filosófica ou religiosa, desde que seja considerada a atividade principal exercida; sócio-

cultural, conjunto de sentimentos, atitudes e ações relativos à organização social, recursos,

pressões e exigências comunitárias, além de costumes e valores do ambiente que vive.O

quarto setor é o orgânico, que abrange o estado e funcionamento total do organismo da

pessoa, bem como seus sentimentos em relação ao próprio corpo. Ryad (1989), justifica a

inclusão deste setor na avaliação da capacidade adaptativa do indivíduo por acreditar que toda

adaptação influi e é influenciada pelas condições orgânicas.

Embora não tenha sido utilizada a escala diagnóstica na sua íntegra, os quatro setores

de funcionamento pareceram-nos muito úteis frente à quantidade de informações possíveis de

serem obtidas em relação à psicodinâmica dos pacientes, ou seja, para a obtenção de dados

que possibilitariam uma melhor compreensão do processo saúde/doença dos pacientes.

A técnica de aplicação do roteiro foi a entrevista semidirigida, que segundo Ocampo e

Arzeno (1995), caracteriza-se pela liberdade do paciente em expor seus problemas

“... começando por onde preferir e incluindo o que desejar” (p. 23). Entretanto, o

entrevistador pode interferir, caso o entrevistado não saiba por onde começar ou como

continuar. Nessa circunstância, perguntas bem amplas podem ser feitas, de modo que

facilitem o entrevistado de expressar-se. O entrevistador também pode interferir se o

entrevistado for tomado por angústia tal que o impeça de fornecer dados considerados

importantes, ou se ficarem lacunas, contradições, ambigüidades ou verbalizações obscuras nas

informações do paciente e que possam atrapalhar a obtenção de dados necessários para o

cumprimento do objetivo da pesquisa.

2.4 Procedimento

Inicialmente, foi feito contato com a direção da escola e com o Professor Titular da

disciplina para solicitar a autorização para o desenvolvimento do estudo. Tendo sido

autorizada por ambos, o projeto da pesquisa foi encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa

da universidade. Face à aprovação pelo referido Comitê, deu-se início à coleta de dados.

Na etapa quantitativa: foram selecionados os prontuários de pacientes que tiveram

indicação de tratamento periodontal na ficha de encaminhamento. Parte desses pacientes

encontrava-se em tratamento na especialidade; outros terminaram ou interromperam o

tratamento para submeterem-se aos cuidados de outra especialidade. Havia ainda pacientes

que aguardavam em fila de espera, pelo início do tratamento. Em seguida, foram selecionadas

as anamneses feitas na Triagem e na primeira consulta em Periodontia. Dessas duas

anamneses foram retirados os dados que constituíram as quatro planilhas.

Os dados foram comparados em relação à proporção de ocorrência entre

categorias/grupos pelo teste qui-quadrado em um nível de significância de 5%. Os dados

foram analisados utilizando o pacote estatístico SPSS (Statistical Package for Social

Sciences), versão 11.0.

Dentre os 789 integrantes da amostra, 220 apresentaram diagnóstico completo quanto

à extensão da doença periodontal e 224, quanto à severidade. Também foram identificados

273 poli-queixosos, segundo os critérios estabelecidos pela pesquisa. Pelo alto índice de

diagnósticos de doença periodontal com severidade leve a moderada (61) ou leve a severa

(59), decidiu-se dar continuidade à pesquisa com aqueles pacientes que tivessem um dos dois

diagnósticos mencionados e que também fossem poli-queixosos, Assim, a sub-amostra final

foi composta por 30 pacientes poli-queixosos com doença leve a moderada e 29 poli-

queixosos com doença leve a severa.

Na etapa qualitativa: a coleta de dados da fase qualitativa ocorreu a partir dos dados

quantitativos. Deste modo, conforme os resultados preliminares, trabalhamos com pacientes

poli-queixosos portadores de periodontite crônica leve a moderada (n = 30) e leve a severa

(n = 29). Foram considerados sujeitos válidos para a amostra aqueles pacientes cujos

prontuários continham o diagnóstico da doença periodontal classificada quanto à extensão e

quanto à severidade, conforme o especificado anteriormente.

Nossa amostra é por conveniência. Apesar de terem sido apresentadas facilidades aos

pacientes quanto à hora e local para a realização das entrevistas, sempre com vistas ao

conforto do entrevistado, dentre os 59 pacientes que preenchiam os requisitos do estudo,

apenas três foram entrevistados. Com exceção de quatro pacientes cujos telefones haviam

mudado e não constavam em seus prontuários nenhuma outra pessoa ou local para contato,

todos os restantes foram convidados para participarem da pesquisa. Seis pacientes do gênero

masculino alegaram que não podiam participar, pois eram muito ocupados e mal tinham

tempo para terem seus dentes tratados ou até de ficarem com a família. Também se negaram a

participar sete mulheres: cinco alegaram que não tinham nada para falar, ou que eu não ia

gostar de ouví-las contando sua vida. Vinte e oito pacientes haviam desistido do tratamento

odontológico e não queriam vir para Santos (a maioria era de cidades da Baixada Santista).

Para cinco pacientes, foram deixados vários recados com pedido de retorno, o que não

aconteceu. Outros quatro pacientes enganaram-se sobre o dia e horário da entrevista, e não foi

possível agendar novo encontro, por dificuldades dos próprios pacientes. Dois pacientes

disseram que estavam doentes e que preferiam não assumir nenhum compromisso.

As entrevistas de Maria e Joana (nomes fictícios que utilizamos para identificar as

pacientes durante o estudo) foram marcadas na própria clínica, num dia de atendimento

odontológico. Feita a apresentação da entrevistadora, o objetivo da pesquisa era explicado e,

em seguida, feito o convite para participação. Foram esclarecidas todas as dúvidas e

curiosidades que as pacientes apresentaram. Maria pareceu muito interessada em participar.

Mas demonstrou preocupação se ela saberia responder adequadamente. Joana demonstrou-se

muito angustiada, deu desculpas de horário, de transporte, perguntou várias vezes sobre o

objetivo e se outras pessoas iriam participar também. Com a terceira paciente, Cristina, o

convite foi feito por telefone e imediatamente aceito, sem qualquer pergunta. Ao final das

entrevistas, Maria e Joana mostraram-se satisfeitas de terem conversado com uma psicóloga.

3. Resultados e Discussão

Primeira etapa: quantitativa

3.1 Caracterização da Amostra

Tabela 1 – Distribuição dos pacientes quanto ao gênero e faixa etária

Gênero Total Feminino Masculino

Idade (anos) F %* F %* F %

14 a 19

20 a 29

30 a 39

40 a 49

50 a 59

60 e acima

20 48,8

80 65,0

138 64,5

121 64,4

90 70,9

60 62,5

21 51,2

43 35,0

76 35,5

67 35,6

37 29,1

36 37,5

41

123

214

188

127

96

5,2

15,6

27,1

23,8

16,1

12,2

Total 509 64,5 280 35,5 789 100,0

* Porcentagens em relação ao total de pacientes em cada gênero e faixa etária.

A faixa etária dos sujeitos da amostra iniciou-se aos 14 anos, pois até 13 anos e 11 meses, o paciente é triado através das perguntas da anamnese odontopediátrica.

Verificou-se através da tabela 1, que a amostra deste estudo foi composta por 789

pacientes atendidos ou encaminhados à especialidade de Periodontia da clínica-escola, sendo

280 são homens e 509 são mulheres. O maior número de integrantes do gênero feminino

demonstrado pela amostra, confirma dados anteriores de que a maior procura de atendimento

odontológico se dá pelas mulheres. Alconffe (1989), encontrou em se trabalho, 66,6% (n =

56) de mulheres e 33,3% (n = 28) de homens. Pompeu; Toledo; Sampaio (1997), relataram

em seu estudo sobre os motivos que levam as pessoas a consultarem o periodontista, que dos

210 pacientes pesquisados, 134 (63,8%) eram mulheres. Croucher et. al. (1997), ao

pesquisarem sobre as conseqüências de determinados eventos da vida sobre a periodontite,

tiveram 68 mulheres e 32 homens participando do estudo. Chambrone; Chambrone (2001),

em seu trabalho sobre o conhecimento dos pacientes sobre a importância da saúde bucal,

tiveram amostra composta de 180 sujeitos, dos quais 114 eram mulheres e 66 eram homens.

No estudo de Machion et. al. (2000), sobre a prevalência de bolsas periodontais entre homens

e mulheres, dentre os 100 pacientes atendidos, 68 eram do gênero feminino e 32, do

masculino. Segundo os autores, a maior prevalência de bolsas periodontais nos homens que

nas mulheres deveu-se à higiene oral de pessoas do gênero masculino ser mais empobrecida, o

que favorece maiores depósitos de cálculo e placa bacteriana. Wolf et. al. (2001), também

observaram tais diferenças quanto a higiene oral entre os gêneros. Lagervall; Jansson;

Bergström (2003), apontam que de 1006 pacientes, 426 eram homens e 580 eram mulheres.

Isto dá indicativoos de que, além de melhor higienização, as mulheres parecem cuidar mais da

saúde pessoal e, por isso, procuram mais os serviços de saúde quando comparadas com os

homens.

De acordo com a American Academy of Periodontology (1996), qualquer que seja o

grau de severidade da doença periodontal, ele é sempre mais prevalente em homens que em

mulheres. A referida Academia descarta o fator genético como explicação, e atribui o fato à

higienização deficiente dos homens e à maior freqüência que as mulheres procuram

atendimento odontológico.

Quanto à faixa etária, as idades dos componentes da amostra variaram entre 14 e 81

anos, cuja média de idade geral foi de 41,64 anos (desvio padrão = 14,127 anos). A maior

concentração de pacientes (214) ocorreu na faixa de 30 a 39 anos (27,1%). Não foi verificada

uma concentração significativa de gênero em relação aos diferentes grupos etários (χ2 = 6,585;

p > 0,05), visto que houve uma distribuição estatisticamente semelhante entre homens e

mulheres.

Nossa amostra confirma dados de literatura sobre o grupo etário de pacientes que mais

procuram atendimento odontológico. Sobre esse aspecto, Pompeu, Toledo, Sampaio (1997),

ao estudarem os motivos que levam as pessoas a buscarem ajuda nos serviços de periodontia,

relataram que dos 210 pacientes de sua amostra, 31% encontravam-se na faixa etária de 31 a

40 anos. Machion et. al. (2000), observaram maior prevalência de bolsas periodontais em

pacientes com idades entre 31 e 50 anos. O estudo de Hugoson; Ljungquist; Breivik (2002),

mostrou que com o aumento da idade, aumenta a ocorrência de doenças moderadas ou perdas

ósseas mais significativas. Marcenes; Sheinam (1992), ao pesquisarem a influência do stress

profissional sobre a saúde periodontal, apesar de trabalharem apenas com pacientes do gênero

masculino, tiveram sua amostra composta por indivíduos cuja faixa etária era de 35 a 44 anos.

Linden; Mullally; Freeman (1996), investigaram o stress no trabalho e suas conseqüências

para a saúde bucal de 1325 pacientes, dos quais houve um predomínio do grupo etário de 20 a

50 anos. Croucher et. al. (1997), ao pesquisarem sobre os fatores psicossociais associados à

doença periodontal, trabalharam com pacientes com idades entre 30 e 59 anos. De acordo com

a American Academy of Periodontology (1996), a periodontite começa na juventude ou na

idade adulta. A doença periodontal severa em pessoas mais velhas aumenta a tendência à

perda dental. Essa pode ser uma explicação para a diminuição sucessiva do número de

pacientes nas faixas de 40 a 49 anos (n = 188), 50 a 59 anos (n = 127) e 60 anos ou acima

(n = 96), encontradas em nosso estudo. Talvez esses pacientes apresentem perdas dentais

progressivas e por isso, não procurem ou não necessitem de ajuda periodontal.

Tabela 2 – Distribuição dos pacientes quanto ao estado civil

Estado civil* Freqüência % % válida**

Solteiro 274 34,7 35,1

Casado 396 50,2 50,8

Viúvo 50 6,3 6,4

Separado 60 7,6 7,7

Total 780 98,9 100,0

Não informado 9 1,1

Total 789 100,0 * Foram mantidas as categorias encontradas nos prontuários. Especificamente para ‘casado’, foram consideradas as uniões estáveis. ** Considerou-se 780 pacientes como válidos para esta categoria, pois 9 prontuários (1,1%) não continham informações sobre estado civil dos pacientes

A tabela 2 indica que entre os pacientes atendidos ou encaminhados, a maior

concentração dos sujeitos é de pacientes casados, correspondendo a 50,8% dos pacientes

considerados válidos (n = 780).

Com relação ao estado civil, encontramos na literatura outros aspectos, diferentes

daqueles por nós levantados e que se referem à qualidade da relação no casamento, conforme

descrevem Marcenes, Sheiham (1992); Shortes et. al. (1992); Croucher et. al. (1997).

Hugoson, Ljungquist, Bergström (2002), verificaram que a viuvez poderia representar um

risco para doença periodontal severa, quando os indivíduos não apresentavam capacidade de

adaptação ao stress.

Tabela 3 – Distribuição dos pacientes quanto à naturalidade

Naturalidade* Freqüência % % válida**

Baixada Santista 359 45,5 46,0 Estado de São Paulo 167 21,2 21,4

Nordeste 123 15,6 15,8

Outros Estados 113 14,3 14,5

Exterior 18 2,3 2,3

Total 780 98,9 100,0

Não informado 9 1,1

Total 789 100,0 * As regiões dessa categoria foram definidas a partir das concentrações de pacientes verificadas nas planilhas de registro. Estado de São Paulo incluiu todas as cidades do Estado, que não a Baixada Santista. Outros estados referiu-se a todos os Estados, exceto São Paulo e os Estados do Nordeste.

** Não foi encontrada a informação ‘naturalidade’ em 9 (1,1%) dos prontuários o que levou a considerar 780 pacientes como 100% para esta categoria.

Quanto à naturalidade, a tabela 3 indica que quase metade dos pacientes (46,0%) são

provenientes da Baixada Santista, enquanto que a maior parte (54%), é de migrantes,

habitantes na região.

Tabela 4 – Distribuição dos pacientes quanto ao grau de instrução

Grau de instrução Freqüência % % válida**

Fundamental incompleto 194 24,6 25,7

Fundamental completo 115 14,6 15,3

Médio incompleto 74 9,4 9,8

Médio completo 259 32,8 34,4

Superior incompleto 43 5,4 5,7

Superior completo 62 7,9 8,2

Educação especial* 2 0,3 0,3

Analfabeto 5 0,6 0,6

Total 754 95,6 100,0

Não informado 35 4,4

Total 789 100,0

* Pacientes com necessidades especiais (algum tipo de deficiência).

** Foram considerados 754 pacientes válidos para a categoria, pois não foram encontradas referência quanto ao grau de instrução nos prontuários de 35 pacientes (4,4%).

Observou-se na tabela 4 que para a categoria ‘grau de instrução’, dentre os 754

pacientes que declararam sua escolaridade, as maiores concentrações foram encontradas nos

259 pacientes (34,4%) que completaram o ensino médio seguindo-se os 194 pacientes

(25,7%) que não completaram o curso fundamental. Assim, pudemos verificar em nossa

amostra que 383 pacientes (50,8%) não completaram o ensino fundamental.

A American Academy of Periodontology (1996), apontou que nos EUA, entre os anos

de 1985-86, foi constatado que a perda de inserção de 4 mm. ou mais e 7 mm. ou mais, em

pelo menos um site, estava relacionado com níveis educacionais. Entretanto, essa relação

mostrou-se mais fraca para perda de inserção de 2mm. ou mais, visto que esta medida era

muito comum. A Academia sugere que o nível sócio-econômico e saúde gengival relacionam-

se com melhor higiene e entre indivíduos de melhor instrução, que mais freqüentemente

visitam os dentistas e que possuem maiores conhecimentos sobre auto-cuidados quanto à

saúde oral. Pompeu; Toledo; Sampaio (1997), num trabalho sobre os motivos pelos quais uma

pessoa busca um serviço odontológico, verificaram que os sujeitos com menor capacidade de

se auto-cuidar possuíam grande desinformação ou apegavam-se em crendices populares sobre

saúde bucal (“minha gengiva está sangrando porque estou escovando os dentes com muita

força”, por exemplo). Estes autores associam desinformação e instalação de crença em saúde

com a classe social mais baixa. Mesmo depois de tratados, quase metade dos pacientes

voltava irregularmente ou por um curto período de tempo para terapia de manutenção.

Croucher et. al. (1997), também observaram uma associação entre doença periodontal e grau

de instrução.

Tabela 5 – Distribuição dos pacientes quanto à situação laboral

Situação laboral* Freqüência % % válida**

Alta especialização 39 4,9 5,1

Média especialização 199 25,2 26,2

Baixa especialização 171 21,7 22,5

Braçal 60 7,6 7,9

S/ atividade remunerada 291 36,9 38,3

Total 760 96,3 100,0

Não informado 29 3,7

Total 789 100,0 * Nível de especialização nas funções/cargos descritos. Para atividades de alta especialização foram registradas as seguintes profissões: professor; jornalista; despachante, analista de sistemas e engenheiro. Como média especialização, foram registradas as atividades profissionais de: comerciante; farmacêutico; balconista; cabeleireiro; vendedor; autônomo; fotógrafo; técnico de contabilidade; esteticista; bancário; músico; artista plástico; manicure; supervisor de informática; conferente; auxiliar de laboratório; eletricista; auxiliar de despachante; auxiliar de enfermagem; auxiliar de cartório; corretor; gerente; auxiliar de expedição; artesão, auxiliar administrativo e oficial administrativo. As atividades profissionais que requerem baixa especialização referiram-se à: costureira; caseiro; garçonete; segurança; porteiro; ascensorista; mecânico; vigilante; serviços gerais; ambulante; jornaleiro; operador de caldeira, manutenção de cabine telefônica e motorista. As atividades profissionais braçais foram: doméstica; diarista; faxineira; estivador; cozinheira; pintor; pedreiro, lavador de carros e marceneiro. Entre os pacientes sem atividade remunerada foram encontrados: estudantes, do lar, aposentados.

** Considerou-se 760 pacientes válidos para a categoria, pois em 29 prontuários (3,7%) não foram encontradas referências quanto às atividades laborais dos pacientes.

Pela tabela 5 verifica-se que 291 (38,3%) dos pacientes da amostra não exercem

atividade remunerada seguindo-se 199 (26,2%) que trabalham em atividades que exigem

média especialização.

Ao relacionarmos os dados desta tabela 5 com os da tabela 4, verificamos que 34,4%

dos pacientes completaram o grau médio, e 38,3% não exerce atividade remunerada.

Acrescenta-se que pouco mais da metade da amostra (50,9%; n = 402) é integrada por

indivíduos no grupo etário de 30 a 49 anos (tabela 1), período de vida em que as pessoas

habitualmente trabalham, todavia, na referida faixa etária, os sujeitos não possuem atividades

remuneradas. Cumpre ressaltar que durante a anamnese, o paciente pode ter declarado sua

profissão, mas poderia, por exemplo, estar desempregado ou exercendo atividades informais.

Ao compararmos estes dados com os da tabela 1, verificamos que 64,5% (n = 509) da amostra

são mulheres, 259 das quais situadas na acima faixa etária, pode-se sugerir que sejam

mulheres ‘do lar’.

A literatura é bastante consistente quanto à relação da doença periodontal em

associação com questões laborais. Segundo a American Academy of Periodontology (1996);

Kinane; Lindhe (1999); Howard; Lewis (1999); Todescan (2001); Sallum (2002); Grisi

(2002); Bimstein (2003), a característica multifatorial da doença periodontal deve considerar

que indivíduos que estejam enfrentando problemas financeiros ou sentem-se desvalorizados

profissionalmente tendem a um rebaixamento da auto-estima ou a sentimentos de

desesperança, ansiedade, depressão. Vettore et. al. (2003), observaram uma possível

associação entre traços de ansiedade e doença periodontal moderada com nível sócio-

econômico, já que o meio social pode afetar as características psicológicas, e estas, por sua

vez, influenciam os processos fisiológicos, aumentando a suscetibilidade à periodontopatia.

Howard; Lewis (1999); Rodrigues; Gasparini (1992), apontam para os prejuízos que os

sentimentos de perda e de rejeição causam ao indivíduo, pois causam alterações funcionais ao

organismo. Schwab; Traven (1979), verificaram maior freqüência de doenças de todo tipo

entre os indivíduos mais pobres; a hipótese foi um aumento da vulnerabilidade das pessoas

mais pobres devido às diferenças sócio-culturais. Segundo os autores, aquele que é mais

capaz, evolui hierarquicamente na sociedade e se adapta melhor do que as pessoas de níveis

sociais mais baixos. Além disso, indivíduos dessa última faixa social, têm menos fontes

mediadoras dos efeitos do stress do que os indivíduos de classes sociais mais privilegiadas.

Integrantes da classe social mais baixa simbolizam menos e têm reações mais primitivas, o

que leva a maiores dificuldades adaptativas no trabalho. Assim, entre os mais pobres, a

doença seria uma falha na adaptação. Para Totman (1982), os indivíduos privados de contatos

humanos significativos, ou ainda, não aceitos pela maioria dominante, correm mais riscos de

doenças. O indivíduo socialmente envolvido, mais bem ajustado a um papel estável dentro da

comunidade é mais resistente à doenças. Para Aleksejuniene et. al. (2002), status sócio-

econômico pode influenciar a saúde através de alterações de padrões comportamentais

negligentes quanto à higiene oral adequada ou ainda, um aumento de comportamentos

contrários à manutenção da saúde (bebida, tabagismo, etc). Pompeu; Toledo; Sampaio (1997),

associaram a falta de auto-cuidados à indivíduos de classe social mais baixa. Marcenes;

Sheiham (1992), verificaram significativa associação de certas características do trabalho com

saúde periodontal, observaram que pacientes com exigências mais altas no trabalho tinham

3,3 vezes mais bolsas periodontais e sangramento que aqueles cuja demanda profissional era

mais baixa. Linden; Mullally; Freeman (2000), também descreveram que stress ocupacional

pode ter relação com a progressão da doença periodontal. Observaram que aqueles indivíduos

que acreditavam ter controle sobre decisões e a situação ambiental apresentavam menos

mudanças periodontais. Croucher et. al. (1997), também descreveram, o status profissional

como sendo um importante fator de risco para doença periodontal.

Embora a placa microbiana seja essencial para a periodontite, sabe-se que ela não é

suficiente para o surgimento da doença. A queda das defesas do sistema imunológico

(CAMPOS JR. et. al., 1999; LANG; MOMBELLI; ATTSTRÖM, 1999; KORNMAN, 2001;

RODRIGUES, 2002; GRISI, 2002; COHEN; SLAVSKIN, 2002; SALLUM, 2002; SCHENKEIN, 2003),

e o conseqüente adoecer estariam sinalizando a relação do indivíduo consigo mesmo e com o

mundo naquele momento de sua vida. De acordo com Mello Filho (1992), essa é a ‘linguagem

dos órgãos’, ou ainda, como dizem Capisano (1987); Arruda (1990); Rosa (1990); Osório

(1993); Santos Filho (1994); Perestrello (1996); Eksterman (1996), o homem adoece para

comunicar o que se passa com ele, suas angústias e seu momento existencial.

Tabela 6 – Distribuição dos pacientes quanto à raça

Raça* Freqüência % % válida**

Branca 601 76,2 79,9

Negra 97 12,3 12,9

Parda 47 6,0 6,3

Amarela 7 0,9 0,9

Total 752 95,4 100,0

Não informado 37 4,7

Total 789 100,0 *As categorias mencionadas refletem a observação dos alunos, por ocasião da anamnese.

** Considerou-se 752 pacientes válidos para a categoria, pois não foram encontradas referências sobre raça em 37 prontuários (4,7%).

A tabela 6 mostra que a grande maioria (79,9%; n = 601) dos sujeitos que compõem a

amostra é de raça branca.

Tabela 7 – Distribuição dos pacientes quanto ao número de filhos

Número de filhos Freqüência % % válida*

Sem filhos 193 24,5 25,4

Grávida 1 0,1 0,1

1 176 22,3 23,2

2 207 26,2 27,3

3 121 15,3 15,9

4 43 5,4 5,7

5 12 1,5 1,6

6 2 0,3 0,3

7 4 0,5 0,5

Total 759 96,1 100,0

Não informado 30 3,8

Total 789 100,0

* Não foram encontradas referências sobre número de filhos em 30 prontuários (3,8%), havendo, portanto, 759 pacientes válidos para a categoria.

Observou-se na tabela 7 que cerca de ¾ dos sujeitos que responderam a esse item

declararam terem, no máximo, dois filhos.

De modo geral, ao visualizarmos os dados das tabelas 1 a 7, verificou-se que nossa

amostra foi composta em sua maioria por mulheres (64,5%), pacientes com faixa etária entre

30 a 39 anos (27,1%), casados (50,8%), brancos (79,9%) e com, no máximo, 2 filhos (76,0%).

A amostra caracterizou-se ainda por ter a maioria de seus integrantes pertencentes à Baixada

Santista (46,0%), com grau de instrução médio completo (34,4%) e que 56,6% dos pacientes

possuem atividades laborais de média especialização a trabalhos braçais, enquanto 38,3% não

exercem atividades remuneradas.

3.2 Diagnóstico da Doença Periodontal

Tabela 8 – Diagnóstico das doenças periodontais quanto à extensão

Extensão Freqüência % % válida*

Localizada 57 7,2 25,9

Generalizada 163 20,7 74,1

Total 220 27,9 100,0

58 7,4 Gengivite

s/diag. periodontal• 385 48,8

não informado ** 126 16,0

Total 569 72,2

Total 789 100,0

* Foram considerados válidos para esta categoria apenas os 220 pacientes que já foram atendidos pelo serviço de Periodontia e que continham diagnóstico periodontal descrito no prontuário.

** Preenchimento incompleto de diagnóstico.

• Pacientes encaminhados ao serviço de Periodontia, mas que ainda não haviam passado pela anamnese periodontal.

A tabela 8 mostra que entre os 220 pacientes com diagnóstico periodontal completo

quanto à extensão, 163 apresentaram doença generalizada, o que equivale a 74,1% dos

sujeitos.

Para o cumprimento dos objetivos da pesquisa, não foram incluídos entre os pacientes

válidos, aqueles que ainda não haviam passado pela anamnese periodontal e, portanto não

possuíam diagnóstico periodontal. Também foram excluídos aqueles pacientes que estavam

em tratamento (ou que já o tiveram concluído), mas cujos prontuários não continham

diagnósticos e/ou não estavam suficientemente descritos conforme critérios pré-estabelecidos.

Foram excluídos também, pacientes com diagnóstico de gengivite, de acordo com o objetivo

do estudo.

Tabela 9 – Diagnóstico das doenças periodontais quanto à severidade

Severidade Freqüência % % válida*

Leve 43 5,4 19,2

Leve a moderada 61 7,7 27,2

Moderada 21 2,7 9,4

Moderada a severa 25 3,2 11,2

Severa 15 1,9 6,7

Leve a severa 59 7,5 26,3

Total 224 28,4 100,0

Gengivite 58 7,4

s/ diagnóstico periodontal• 385 48,8

não informado ** 122 15,5

Total 565 71,6

Total 789 100,0 * Foram considerados válidos para esta categoria os 224 pacientes já atendidos pelo serviço de Periodontia e que continham diagnóstico periodontal descrito no prontuário.

** Preenchimento incompleto do diagnóstico.

• Pacientes encaminhados ao serviço de Periodontia, mas que ainda não haviam passado pela anamnese periodontal.

A tabela 9 demonstrou que as periodontites tiveram sua maior concentração de

diagnóstico quanto à severidade nas classificações leve a moderada (27,2%; n = 61) e leve a

severa (26,3%; n = 59). Os critérios para inclusão e exclusão de pacientes foi o mesmo

descrito na tabela 8.

Pela alta concentração de diagnósticos de severidade leve a moderada ou leve a

severa, estes pacientes foram selecionados para constituírem uma sub-amostra em nossa

pesquisa.

3.3 Severidade da Doença Periodontal Tabela 10 - Diagnóstico de severidade quanto à faixa etária (n = 224)

Severidade

Idade Leve

(anos) F %*

L a M

F %*

Moderada

F %*

M a S

F %*

Severa

F %*

L a S

F %*

Total

F % 14 a 19 3 100,0 _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 3 1,3

20 a 29 4 30,8 5 38,5 2 15,4 _ _ _ _ 2 15,4 13 5,8

30 a 39 18 25,7 20 28,6 5 7,1 9 12,9 2 2,9 16 22,9 70 31,3

40 a 49 10 21,3 14 29,8 4 8,5 4 8,5 5 10,6 10 21,3 47 21,0

50 a 59 6 12,8 15 31,9 4 8,5 5 10,6 3 6,4 14 29,8 47 21,0

60 e acima 2 4,5 7 15,9 6 13,6 7 15,9 5 11,4 17 38,6 44 19,6

Total 43 19,2 61 27,2 21 9,4 25 11,2 15 6,7 59 26,3 224 100,0

L a M (leve a moderada); M a S (moderada a severa); L a S (leve a severa).

* Porcentagens relativas ao total de pacientes em cada um dos diagnósticos de severidade quanto a cada faixa etária.

A tabela 10 mostrou a distribuição etária dos 224 pacientes diagnosticados quanto à

severidade da doença periodontal. Esses pacientes possuíam idades que variaram entre 14 e

81 anos. A média de idade foi de 46,46 anos (desvio padrão = 13,325 anos).

A maior concentração foi verificada na faixa etária dos 30 a 39 anos, ou seja, 70

pacientes representaram 31,3% da nossa sub-amostra.

Observou-se uma concentração significativa de sujeitos em alguns diagnósticos quanto

à severidade nos diferentes grupos etários (χ2 = 38,01; p < 0,05). No grupo etário de 20 a 29

anos, 5 pacientes (38,5%) foram diagnosticados com doença periodontal leve a moderada.

Dos 70 pacientes da faixa dos 30 a 39 anos, 18 (25,7%) têm doença leve e pouco mais da

metade dos pacientes concentrou-se entre dois graus de severidade, a saber, leve a moderada

(28,6%; n = 20) e leve a severa (22,9%; n = 16). Na faixa dos 40 a 49 anos, 14 (29,8%)

pacientes têm doença leve a moderada e 10 (21,3%), leve a severa. Situação semelhante foi

encontrada no grupo etário de 50 a 59 anos, no qual 61,7% (n = 29) desses pacientes foram

diagnosticados com periodontite leve a moderada ou leve a severa. Entre os pacientes com

idades 60 anos ou mais, 38,6% apresentaram doença leve a severa.

A prevalência da doença leve a moderada ou leve a severa chama a atenção: pouco

mais da metade (53,5%) dos pacientes apresentou esses dois graus de severidade diagnóstica.

Nossa sub-amostra novamente confirmou os dados de literatura quanto ao grupo etário

no qual a periodontopatia é mais freqüentemente encontrada, ou seja, parece haver uma maior

prevalência de periodontites em pacientes na faixa de 30 a 49 anos de idade (MARCENES;

SHEIHAM, 1992; AMERICAN ACADEMY OF PERIODONTOLOGY, 1996; CROUCHER et. al., 1997;

POMPEU; TOLEDO; SAMPAIO, 1997; MACHION et. al., 2000; CHAMBRONE; CHAMBRONE, 2001;

HUGOSON; LJUNGQUIST; BREIVIK, 2002).

Tabela 11 – Diagnóstico de severidade quanto ao estado civil (n = 224)

Severidade

Est. Leve

Civil F %*

L a M

F %*

Moderada

F %*

M a S

F %*

Severa

F %*

L a S

F %*

Total

F % Solt 16 27,6 19 32,8 6 10,3 4 6,9 4 6,9 9 15,5 58 25,9

Cas 20 16,4 34 27,9 11 9,0 14 11,5 6 4,9 37 30,3 122 54,5

Viúvo 1 5,9 3 17,6 1 5,9 4 23,5 2 11,8 6 10,2 17 7,6

Sep 6 22,2 5 18,5 3 11,1 3 11,1 3 11,1 7 25,9 27 12,1

Total 43 19,2 61 27,2 21 9,4 25 11,2 15 6,7 59 26,3 224 100,0

L a M (leve a moderada); M a S (moderada a severa); L a S (leve a severa).

Solt (solteiro), Cas (casado), Sep (separado).

* Porcentagens relativas ao total de pacientes em cada um dos diagnósticos de severidade quanto ao estado civil.

Verificou-se na tabela 11 que a maioria dos 224 pacientes (54,5%; n = 122) é casada.

Tal predomínio ocorreu em todos os graus de severidade. Assim, o estado civil dos pacientes

casados não estava associado a um diagnóstico distinto quanto à severidade da doença

periodontal (χ2 = 15,841; p > 0,05). Isso se deve, provavelmente, ao fato de que a faixa etária

em que se encontram esses pacientes casados é aquela em que a literatura mostra ser a de

maior prevalência de periodontites (MARCENES; SHEIHAM, 1992; AMERICAN ACADEMY OF

PERIODONTOLOGY, 1996; CROUCHER et. al., 1997; POMPEU; TOLEDO; SAMPAIO, 1997;

MACHION, et. al., 2000; CHAMBRONE; CHAMBRONE, 2001; HUGOSON; LJUNGQUIST; BREIVIK,

2002).

Tabela 12 – Diagnósticos de severidade quanto ao grau de instrução (n = 214)

Severidade

Grau Leve

Instr. F %*

L a M

F %*

Moderada

F %*

M a S

F %*

Severa

F %*

L a S

F %* Total•

F % FI 8 16,7 11 22,9 2 4,2 6 12,5 4 8,3 17 35,4 48 22,4

FC 8 19,0 10 23,8 6 14,3 5 11,9 2 4,8 11 19,0 42 19,6

MI 2 8,7 12 52,2 2 8,7 1 4,3 1 4,3 5 21,7 23 10,7

MC 17 23,6 16 22,2 7 9,7 9 12,5 5 6,9 18 25,0 72 33,6

SI 2 28,6 2 28,6 1 14,3 1 14,3 1 14,3 -- -- 7 3,3

SC 4 18,2 8 36,4 2 9,1 -- -- 1 4,5 7 31,8 22 10,3

Total 41 19,2 59 27,6 20 9,3 22 10,3 14 6,5 58 27,1 214 100,0

L a M (leve a moderada); M a S (moderada a severa); L a S (leve a severa).

FI (fundamental incompleto); FC (fundamental completo); MI (médio incompleto); MC (médio completo);

SI (superior incompleto); SC (superior completo).

* Porcentagens relativas ao total de pacientes em cada diagnóstico de severidade quanto ao grau de instrução.

• Foram considerados 214 pacientes para esta categoria, pois em 10 prontuários não havia referências quanto ao grau de instrução.

A tabela 12 mostrou que entre os pacientes diagnosticados para severidade e que

declararam sua escolaridade (n = 214), as concentrações quanto ao grau de instrução foram

encontradas entre os 48 pacientes (22,4%) que não completaram o ensino fundamental e 72

(33,6%) que completaram o ensino médio. Apesar de não ter sido constatada uma

concentração significativa de diagnóstico para severidade nos diferentes graus de instrução

(χ2 = 21,158; p > 0,05), observamos que 113 pacientes (52,7%) da nossa sub-amostra não

completaram o ensino médio.

Tais índices confirmam os dados da literatura, conforme a American Academy of

Periodontology (1996); Pompeu; Toledo; Sampaio (1997); Croucher et. al. (1997), que

observaram uma associação entre grau de instrução e classe social mais baixa com saúde oral.

Tabela 13 – Diagnóstico de severidade quanto à situação laboral (n = 222)

Severidade

Situação Leve

Laboral** F %*

L a M

F %*

Moderada

F %*

M a S

F %*

Severa

F %*

L a S

F %*

Total

F % Alta 3 23,1 5 38,5 1 7,7 _ _ _ _ 4 30,8 13 5,9

Média 9 22,0 11 26,8 3 7,3 5 12,2 4 9,8 9 22,0 41 18,5

Baixa 17 28,3 17 28,3 5 8,3 5 8,3 3 5,0 13 21,7 60 27,0

Braçal 2 11,1 3 16,7 3 16,7 4 22,2 1 5,6 5 27,8 18 8,1

S/R 12 13,3 24 26,7 8 8,9 11 12,2 7 7,8 28 31,1 90 40,5

Total 43 19,4 60 27,0 20 9,0 25 11,3 15 6,8 59 26,6 222 100,0

L a M (leve a moderada); M a S (moderada a severa); L a S (leve a severa).

* Porcentagens relativas ao total de pacientes em cada diagnóstico de severidade quanto à situação laboral.

** Nível de especialização nas funções/cargos descritos. S/R refere-se àquelas pessoas que não exercem atividades remuneradas.

Embora os dados da tabela 13 não tenham demonstrado relevância estatística

(χ2 = 15,283; p > 0,05), quanto à associação entre situação laboral e severidade da doença

periodontal, observou-se um predomínio de pessoas que não exercem atividades remuneradas,

em todas as faixas diagnósticas para severidade, excetuando-se a doença leve. Verificamos

que dentre os 90 pacientes (40,5%) que relataram não exercer atividade remunerada, 52

(57,8%) apresentaram doença leve a moderada ou leve a severa. A concentração seguinte

quanto à situação laboral foi encontrada entre os 60 pacientes (27%) que exercem atividades

que exigem baixa especialização, faixa onde exatamente a metade dos pacientes distribuiu-se

entre doença leve a moderada (28,3%; n = 17) e leve a severa (21,7%; n = 13),

respectivamente.

Pudemos ainda verificar que dos 222 pacientes com diagnósticos de severidade da

doença periodontal, 168 deles (75,6%) exercem atividades que exigem, no máximo, baixa

especialização. Esses dados, acrescidos com os da tabela 12, em que 113 (52,7%) dos

pacientes de nossa sub-amostra não completaram o ensino médio, coincidem com os

resultados de Pompeu; Toledo; Sampaio (1997), que verificaram que a desinformação e

crenças sobre saúde bucal estão associadas a classes sociais mais baixas, tendo como

conseqüência, a prática de higiene oral deficiente. Esta, por sua vez, constitui um fator de

risco para a saúde periodontal. Esta é também a posição adotada pela American Academy of

Periodontology (1996). Aleksejuniene et. al. (2002), também concluíram que o status sócio-

econômico influencia a saúde bucal, quer através de comportamentos negligentes quanto à

higiene oral, quer pela adoção de comportamentos contrários à saúde (bebida, tabagismo,

entre outros).

Vettore et. al. (2003), observaram que alterações no status sócio-econômico levam à

ansiedade, que pode estar associada com doença periodontal moderada. Segundo Totman

(1982), sentimentos de perda ou rejeição devido a dificuldades financeiras afetam a auto-

estima do indivíduo, sentimento este, que pode favorecer o surgimento de doenças. Embora o

autor não comente sobre a periodontite especificamente, acreditamos que ela possa estar

inclusa em tal ocorrência, pois como explicam Rodrigues; Gasparini (1992), alterações de

irrigação sangüínea podem acontecer mediante alterações da homeostase psíquica.

Ainda quanto à influência dos problemas laborais sobre a saúde, Schwab; Traven

(1979), verificaram que diferenças sócio-culturais contribuem para que indivíduos mais

pobres ficam doentes com mais freqüência. Marcenes; Sheiham (1992), por sua vez,

verificaram maior índice de bolsas periodontais em indivíduos para quem a exigência

profissional era mais baixa. Croucher et. al. (1997), também verificaram que status

profissional contribui para o desenvolvimento da doença periodontal, e Linden; Mallully;

Freeman (2000), demonstraram que stress ocupacional pode estar associado à periodontite.

3.4 Paciente Poli-queixoso

3.4.1 Caracterização dos pacientes poli-queixosos em relação à população total

Tabela 14 – Distribuição dos pacientes poli-queixosos quanto ao gênero (n = 789)

Gênero Feminino Masculino Total Nºde sistemas F %* F %* F %

Sem sintomas 71 13,9 71 25,4 142 18,0

Um sistema 88 17,3 82 29,3

Dois sistemas 128 25,1 76 27,1

Três sistemas 222 43,6 51 18,2

170 21,5

204 25,9

273 34,6

Total 509 100,0 280 100,0 789 100,0

* Porcentagens relativas ao total de mulheres e homens quanto ao número de queixas referidas.

Verificamos pela tabela 14 que dos 789 pacientes que compuseram nossa amostra, 273

(34,6%) apresentaram queixas em três ou mais sistemas orgânicos. Esses pacientes passaram

a integrar o grupo dos pacientes poli-queixosos.

Em nosso estudo, pudemos verificar também, que das 509 mulheres integrantes desse

estudo, 222 são poli-queixosas (43,6%). No entanto, dentre os 280 homens, os poli-queixosos

corresponderam à menor proporção (18,7%; n = 51). A maior concentração entre o gênero

masculino ocorreu entre os 82 pacientes (29,3%) que se queixaram de problemas em um

sistema. Esses dados demonstraram uma diferença significativa (χ2 = 59,089; p < 0,01) entre o

gênero dos pacientes e o número de sistemas com queixas por eles referidas. Observamos em

relação às mulheres, 350 delas (78,7%) apresentaram, no mínimo, duas queixas orgânicas,

além da periodontal. Esses dados corroboram com outros trabalhos que também verificaram

que os pacientes acometidos de doença periodontal geralmente apresentam outras

manifestações sistêmicas associadas (AMERICAN ACADEMY OF PERIODONTOLOGY, 1996,

1999; PAPAPANOU; LINDHE, 1999; GRISI, 2002; SALLUM, 2002; LORENZO; LORENZO, 2002;

GENCO, 2002; LAGERVALL; JANSSON; BERGSTRÖM (2003).

Tabela 15 – Distribuição dos pacientes poli-queixosos quanto à faixa etária (n = 789)

Número de sistemas S/S• Um Dois Três Total Idade (anos) F %* F %* F %* F %* F %

Até 19 anos 14 9,9 9 5,3 14 6,9 4 1,5 41 5,2

20 a 29 anos 25 17,6 35 20,6 28 13,7 35 12,8 123 15,6

30 a 39 anos 47 33,1 51 30,0 53 26,0 63 23,1 214 27,1

40 a 49 anos 32 22,5 33 19,4 57 27,9 66 24,2 188 23,8

50 a 59 anos 17 12,0 21 12,4 31 15,2 58 21,2 127 16,1

60 e acima 7 4,9 21 12,4 21 10,3 47 17,2 96 12,2

Total 142 100,0 170 100,0 204 100,0 273 100,0 789 100,0

• Sem sintomas.

* Porcentagens relativas ao total de pacientes em cada faixa etária quanto ao número de queixas referidas em cada um dos diagnósticos de severidade.

A tabela 15 mostrou que 47,3% (n = 129) dos pacientes poli-queixosos distribuiu-se

no grupo etário de 30 a 49 anos. O estudo demonstrou que idade está relacionada com a

condição sistêmica do paciente (χ2 = 46,335; p < 0,01). Um outro dado que se apresentou e

que merece atenção é o aumento do comprometimento sistêmico que acompanha o processo

de envelhecimento. Entre os 96 pacientes com 60 anos ou mais, 47 (17,2%), são poli-

queixosos.

Esses resultados estão de acordo com a literatura que se refere à prevalência de

pacientes com doença periodontal na faixa dos 30 a 49 anos (MARCENES; SHEIHAM, 1992;

AMERICAN ACADEMY OF PERIODONTOLOGY, 1996; POMPEU; TOLEDO; SAMPAIO, 1997;

CROUCHER et. al., 1997; CHAMBRONE; CHAMBRONE, 2001; MACHION et. al., 2001; HUGOSON;

LJUNGQUIST; BREIVIK, 2002). Schwab; Traven (1979), verificaram uma associação entre

idade e contrair doenças psicossomáticas, enquanto Aleksejuniene et. al. (2002), observaram

que mulheres mais velhas estão mais sujeitas a doenças de forma geral.

Tabela 16 – Distribuição dos pacientes poli-queixosos quanto ao estado civil

Número de Sistemas S/S• Um Dois Três ou mais Total

Est Civil F %* F %* F %* F %* F %

Solteiro 57 40,7 56 33,1 78 39,0 83 30,6 274 35,1

Casado 72 51,4 90 53,3 98 49,0 136 50,2 396 50,8

Viúvo 3 2,1 11 6,5 12 6,0 24 8,9 50 6,4

Separado 8 5,7 12 7,1 12 6,0 28 10,3 60 7,7

Total 140 100,0 169 100,0 200 100,0 271 100,0 780 100,0 * Porcentagens relativas ao total de pacientes em cada estado civil quanto ao número de queixas referidas.

• Sem sintomas.

Não havia referência ao estado civil em 9 prontuários (n = 780).

A tabela 16 mostrou que dos 780 pacientes de nossa população que se referiram ao

estado civil, 271 são poli-queixosos. Destes pacientes, a maior concentração foi encontrada

entre os casados (50,2%; n = 136). Embora os resultados não tenham demonstrado relevância

estatística (χ2 = 14,760; p > 0,05), verificou-se que os casados tiveram maior concentração em

todas as sub-categorias quanto ao números de sistemas com queixas referidas pelos pacientes.

Tabela 17 – Distribuição dos pacientes poli-queixosos quanto ao grau de instrução

FI (fundamental incompleto), FC (fundamental completo), MI (médio incompleto), MC (médio completo), SI (superior incompleto), SC (superior completo), EE (educação especial).

* Porcentagens relativas ao total de pacientes em cada grau de instrução quanto ao número de queixas referidas.

• Sem sintomas.

Não havia referência ao estado civil em 40 prontuários (n = 749).

A tabela 17 evidenciou que dos 749 pacientes da amostra que declararam o grau de

instrução, 194 deles (25,9%) não completaram o curso fundamental e 259 pacientes (34,6%)

completaram o ensino médio. Dentre os 259 pacientes poli-queixosos, cuja escolaridade é

conhecida, 80 (30,9%) não terminaram o curso fundamental. A segunda maior concentração

de pacientes poli-queixosos quanto ao grau de instrução foi encontrada entre os pacientes que

completaram o grau médio (29,3%; n = 76). Apesar de não ter sido constatada uma correlação

significativa entre grau de instrução e o número de queixas apresentadas pelos pacientes (χ2 =

21.996; p > 0,05), é interessante notar que dentre os pacientes poli-queixosos que se referiram

ao grau de instrução (n = 259), 145 deles (56,0%) não completaram o ensino médio.

Número de sistemas

Grau de S/S Um Dois Três Total

Instr. F %* F %* F %* F %* F %

FI 24 18,5 36 22,1 54 27,4 80 30,9 194 25,9

FC 18 13,8 20 12,3 34 17,3 43 16,6 115 15,4

MI 18 13,8 14 8,6 20 10,2 22 8,5 74 9,9

MC 49 37,7 70 42,9 64 32,5 76 29,3 259 34,6

SI 8 6,2 12 7,4 11 5,6 12 4,6 43 5,7

SC 13 10,0 11 6,7 13 6,6 25 9,7 62 8,3

EE - - - - 1 0,5 1 0,4 2 0,3

Total 130 100,0 163 100,0 197 100,0 259 100,0 749 100,0

Tabela 18- Distribuição dos pacientes poli-queixosos quanto à situação laboral

Número de sistemas

Grau de S/S

Especial. • F %*

Um

F %*

Dois

F %*

Três

F %*

Total

F %

Alta 7 5,2

Média 47 34,8

Baixa 32 23,7

Braçal 10 7,4

S/R 39 28,9

6 3,6

51 30,7

43 25,9

8 4,8

58 34,9

6 3,1

55 28,1

48 24,5

19 9,7

68 34,7

20 7,6

46 17,5

48 18,3

23 8,7

126 47,9

39 5,1

199 26,2

171 22,5

60 7,9

291 38,3

Total 135 100,0 166 100,0 196 100,0 263 100,0 760 100,0

• Alta, média e baixa referem-se ao nível de especialização das funções/cargos profissionais exercidos pelos pacientes. S/R foi utilizado para contabilizar pacientes que não exercem atividades remuneradas.

* Porcentagens relativas ao total de pacientes em cada função laboral quanto ao número de queixas referidas.

Não foram encontradas referências quanto ao grau de especialização laboral em 29 prontuários (n = 760).

Pudemos observar pela tabela 18 que entre os 760 pacientes da população que fizeram

referência à situação laboral, as maiores concentrações foram entre os 38,3% de pacientes

(n = 291) que não exercem atividade remunerada e os 26,2% (n = 199) que exercem

atividades que exigem média especialização. Já dentre os 263 pacientes poli-queixosos, quase

a metade (47,9% n = 126) não exerce atividade remunerada. A subcategoria que se segue para

os poli-queixosos é composta de 48 (18,3%) que trabalham em atividades que exigem baixa

especialização.

Observando-se a maior concentração em algumas das atividades de labor em relação

ao número de queixas referidas pelos pacientes, constatou-se uma correlação significativa de

sujeitos em algumas atividades laborais em relação ao número de sistemas apresentados com

queixas pelos pacientes (χ2 = 35,609; p < 0,01). Assim, verificou-se que as maiores

concentrações distribuíram-se entre os pacientes que possuem atividades laborais com média

exigência de especialização e os pacientes que referiram não exercer atividades remuneradas.

Esses pacientes eram os assintomáticos, ou queapresentaram queixas em um ou dois sistemas.

Entretanto, entre os poli-queixosos, observou-se que quase a metade deles (47,9%; n = 126),

não exercem atividades remuneradas, 23 pacientes (8,7%) têm atividades braçais como fonte

de renda e 48 (18,3%) trabalham em atividades que exigem baixa especialização.

Ao relacionarmos os dados obtidos nas tabelas 15, 17 e 18, verificamos que quase a

metade dos pacientes poli-queixosos (47,3%; n = 129), pertencem ao grupo etário de 30 a 49

anos; que mais da metade (56,0%; n = 145), não completou o ensino médio e, quanto à

situação laboral, 126 pacientes (47,9%) não exercem atividade remunerada e 71 deles

(27,0%), exercem funções que exigem, no máximo, baixa especialização, embora a tabela 17

tenha evidenciado que 114 pacientes (44,0%) completaram, no mínimo, o grau médio.

Considerando-se que esses pacientes integram um grupo etário num período de vida

em que usualmente as pessoas exercem alguma atividade laboral, novamente chamou-nos a

atenção, o número de pessoas que referiu não possuir fonte de renda ou trabalhar em funções

que exigem, no máximo, baixa especialização (74,9%; n = 197). Embora estejamos falando de

uma clientela que busca a clínica-escola, local em que os serviços são gratuitos, e portanto,

esta clientela é naturalmente constituída por pessoas de baixa renda, tais resultados

podemsugerir uma relação entre o grau de severidade da doença periodontal com possíveis

problemas financeiros enfrentados pelos pacientes. A literatura sobre a relação entre saúde

periodontal e questões laborais, como a American Academy of Periodontology (1996);

Kinane; Lindhe (1999); Howard; Lewis (1999); Todescan (2001); Sallum (2002); Grisi

(2002); Bimstein (2003), mostra que indivíduos que enfrentam problemas financeiros ou

sentem-se desvalorizados profissionalmente, têm sua auto-estima rebaixada com possíveis

sentimentos de desesperança, ansiedade e depressão, associados à doenças periodontais.

Totman (1982), acrescenta que indivíduos que não se sentem aceitos pela maioria dominante

são mais sujeitos a contrair doenças, de forma geral. Schwab; Traven (1979), também

referiram um aumento na freqüência de doenças em pessoas de classes sociais mais baixas,

por apresentarem maiores dificuldades adaptativas em suas funções laborais. Os autores

classificam essas doenças como ‘doenças de adaptação’. Resultados semelhantes foram

encontrados por Marcenes; Sheiham (1992); Linden; Mullally; Freeman, (2000); Vettore et.

al. (2003).

Pompeu; Toledo; Sampaio (1997), Aleksejuniene et. al. (2002), observaram que

indivíduos de status sócio-econômico mais baixo tendem a negligenciar sua higiene oral,

aumentar comportamentos contrários à manutenção da saúde, além de possuírem crenças

sobre seus sintomas orais. Como concluíram Aleksjuniene et. al. (2002), pessoas de nível

sócio-econômico baixo apresentam maiores problemas de saúde em geral. Tais resultados

poderiam ser uma explicação para o índice de poli-queixosos encontrados nesta pesquisa.

Como descrevem Campos Jr. et. al. (1999); Kornman (2001); Sallum (2002); Grisi

(2002); Rodrigues (2002); Schenkein (2003), a placa microbacteriana é necessária, mas não

suficiente para o surgimento de uma periodontopatia. Segundo Rodrigues; Gasparini (1992),

as emoções podem levar à disfunções de irrigação sangüínea, que dependendo de sua duração,

repetição e intensidade, levam a processos agudos ou crônicos. A queda das defesas do

sistema imunológico, conforme Cohen; Slavskin (2002); Sallum (2002); Schenkein (2003),

culminam no adoecer. Essa ‘linguagem dos órgãos’, como chamou Mello Filho (1992), é

utilizada por aquele que adoece como uma forma para comunicar como está sua relação com

o mundo, para comunicar suas angústias. Essa é também a visão de Capisano (1987); Arruda

(1990); Rosa (1990); Osório (1993); Santos Filho (1994); Perestrello (1996); Eksterman

(1996).

3.4.2 Diagnóstico de doença periodontal entre pacientes poli-queixosos

Tabela 19 – Diagnósticos de periodontite quanto à extensão em pacientes poli-queixosos

Extensão Localizada Generalizada

Nº de sistemas F %* F %* Total F %

Sem sintomas 7 12,3 29 17,8

Um 13 22,8 31 19,0

36 16,4

44 20,0

Dois 14 24,6 34 20,9

Três ou mais 23 40,4 69 42,3

48 21,8

92 41,8

Total 57 100,0 163 100,0 220 100,0

* Porcentagens relativas ao número de sistemas com queixas referidas pelos pacientes em cada grau de extensão da doença periodontal.

Observou-se na tabela 19 que, dos 220 pacientes diagnosticados com extensão de

doença periodontal, quase a metade destes (41,8% n = 92) são poli-queixosos. Dentre os 57

pacientes com doença localizada, 23 (40,4%) são poli-queixosos. Quanto à doença

generalizada, de 163 pacientes, 69 deles (42,3%) referiram a queixas em três ou mais

sistemas. Verificou-se também que, apesar do número de pacientes com diagnóstico de

doença localizada ser praticamente um terço (57) do número de pacientes diagnosticados com

doenças generalizadas (163), não ficou evidenciada uma concentração significativa

(χ2 = 1,392; p > 0,05) quanto à extensão da doença periodontal relativa ao critério

estabelecido para o paciente poli-queixoso. Proporcionalmente, as porcentagens de queixas

em três ou mais sistemas além do bucal que prevaleceu para as doenças localizada e

generalizada foram muito similares, 40,4% e 42,3%, respectivamente.

Tabela 20 – Diagnósticos de periodontite quanto à severidade associados a queixas em outros

sistemas orgânicos (n = 224)

Severidade

Número de

Sistemas

Leve

F %*

L a M

F %*

Moderada

F %*

M a S

F %*

Severa

F %*

L a S

F %*

Total

F %

S/S• 8 18,6 9 14,8 2 9,5 3 12,0 4 26,7 7 11,9 33 14,7

Um 10 23,3 11 18,0 5 23,8 7 28,0 3 20,0 9 15,3 45 20,1

Dois 12 27,9 11 18,0 5 23,8 5 20,0 3 20,0 14 23,7 50 22,3

Três / mais 13 30,2 30 49,2 9 42,9 10 40,0 5 33,3 29 49,2 96 42,9

Total 43 100,0 61 100,0 21 100,0 25 100,0 15 100,0 59 100,0 224 100,0

• Sem sintomas.

L a M – leve a moderada; M a S – moderada a severa; L a S – leve a severa.

* Porcentagens relativas ao número de sistemas com queixas referidas pelos pacientes em cada grau de severidade de doença periodontal.

Observou-se pela tabela 20 que dos diagnósticos quanto à severidade (n = 224), 96

pacientes (42,9%) são poli-queixosos. Dos 61 pacientes diagnosticados com doença leve a

moderada, 30 são poli-queixosos (49,2%), e entre os 59 portadores de doença leve a severa,

29 pacientes (49,2%) são poli-queixosos. Embora os dados não tenham revelado uma

concentração significativa (χ2 = 9,036; p > 0,05) quanto ao número de sistemas com queixas

referidos pelos pacientes em relação à severidade da doença periodontal, verificamos que os

59 pacientes diagnosticados com as duas severidades acima descritas representaram quase a

metade do número de pacientes em cada uma das faixas de severidade na qual foram

diagnosticados, além de perfazerem mais que a metade dos poli-queixosos (n = 96), conforme

critérios estabelecidos pelo estudo. Estes 59 pacientes foram os selecionados para integrarem

a primeira parte qualitativa da pesquisa.

Segundo Genco (2002), a doença periodontal é mais grave quando doenças sistêmicas

comprometem as defesas imunológicas. Esse fato poderia explicar a prevalência de pacientes

poli-queixosos com doença leve a moderada ou leve a severa em nossa pesquisa. A

associação entre problemas sistêmicos e doença periodontal também são citados por Cabral

(1998); Bretz; Chaves (1999); Papapanou; Lindhe (1999); American Academy of Periodology

(1999); Sallum (2002); Lorenzo; Lorenzo (2002); Grisi (2002); Cohen; Slavskin (2002);

Lagervall; Jansson; Bergström et. al. (2003); Schenkein (2003).

Totman (1982); Arruda (1990); Rosa (1990); Mello Filho (1992); Osório (1993);

Perestrello (1996); Eksterman (1996), explicam o adoecer como forma de comunicação da

relação do indivíduo consigo e com seu ambiente. Rodrigues, Gasparini (1992), explicam

como as emoções podem levar à disfunções de irrigação sangüínea, responsáveis por

processos agudos e crônicos, entre eles, a periodontite.

Podemos observar pelos dados apresentados até então, que o presente estudo revelou

que entre os 789 pacientes integrantes da amostra total, houve uma prevalência de queixas

orgânicas em três ou mais sistemas, ou seja, 273 pacientes (34,6%) são poli-queixosos. Dentre

os 280 pacientes do gênero masculino, 51 (18,2%) são poli-queixosos. Quanto ao gênero

feminino, das 509 mulheres integrantes da pesquisa, 222 (43,6%) são poli-queixosas.

A pesquisa revelou ainda, maior concentração de pacientes poli-queixosos no grupo

etário entre 30 a 49 anos. De um total de 273 pacientes poli-queixosos, 129 deles (47,3%) têm

idades nessa faixa. Dentre os 780 pacientes válidos para a variável ‘poli-queixoso’ revelou

396 (50,8%) pacientes casados. Dentre os 271 poli-queixosos, 136 pacientes (34,3%) são

casados.

Quanto ao grau de instrução, dos 749 pacientes válidos para a categoria, 259 (34,6%)

pacientes completaram o grau médio. Dentre os 259 poli-queixosos que referiram o grau de

instrução, 80 pacientes (30,9%) não concluíram o ensino fundamental, seguindo-se 76

pacientes (29,3%) que completaram o ensino médio.

Dos 760 pacientes válidos para a categoria ‘situação laboral’, 291 (38,3%) não exerce

atividade remunerada. Quanto aos 263 poli-queixosos, 126 pacientes (47,9%) não exercem

atividades remuneradas e 48 (18,3%) desempenham atividades que exigem baixo grau de

especialização.

Quanto à extensão da doença periodontal, dos 220 pacientes válidos, 163 pacientes

(74,1%) apresentaram periodontite crônica generalizada e 57 (25,9%), periodontite crônica

localizada. Em ambos diagnósticos, verificou-se maior índice (41,8%; n = 92) de queixas em

três ou mais sistemas orgânicos. Dentre os 57 pacientes com doença localizada, 23 (40,4%)

são poli-queixosos e dentre os 163 diagnósticos de doença generalizada, 69 (42,3%) são poli-

queixosos.

Quanto à severidade da periodontite, verificou-se maior concentração de pacientes nas

categorias leve a moderada (61) e leve a severa (59) em relação aos 224 pacientes da nossa

sub-amostra, o que corresponde a 27,2% e 26,3%, respectivamente. Dos 61 diagnósticos de

periodontite leve a moderada, 30 pacientes (49,2%) são poli-queixosos. Dos 59 diagnósticos

de doença leve a severa, 29 pacientes (49,2%) referiram queixas em três ou mais sistemas

orgânicos. Como se pode perceber, o estudo tem demonstrado até agora, uma prevalência

geral nas periodontites leve a moderada e leve a severa.

O paciente ‘poli-queixoso’ foi caracterizado como sendo do gênero feminino, casado,

faixa etária de 30 a 39 anos, grau de instrução médio completo e não exerce atividade

remunerada. Quanto ao diagnóstico, dos 163 pacientes com doença generalizada, 69 (42,3%)

apresentaram queixas em três ou mais sistemas. Dentre os 59 pacientes com periodontite

crônica localizada, 23 (40,4%) também apresentaram queixas em três sistemas ou mais. A

severidade da periodontite dos pacientes mostrou maior prevalência em leve a moderada (n =

30) e leve a severa (n = 29) apesar das porcentagens apresentarem-se as mesmas: 49,2% e

49,2%, respectivamente. Isso quer dizer que entre as duas severidades de doença periodontal,

houve uma proporcionalidade quanto ao número de pacientes, tanto no geral quanto aos poli-

queixosos.

3.5 Avaliação dos Hábitos e outras Manifestações do Paciente Poli-queixoso

3.5.1 Freqüência do tabagismo quanto à severidade da doença periodontal

Tabela 21 – Freqüência de fumantes quanto à severidade da doença periodontal

Severidade Frequência Porcentagem

Leve 6

Leve a moderada 9

Moderada 6

Moderada a severa 7

Severa 2

Leve a severa 11

14,6

22,0

14,6

17,1

4,9

26,8

Total 41 100,0

Dentre os integrantes da amostra total (n = 789) da presente pesquisa, 78 pacientes

referiram ao tabagismo. A tabela 21 mostrou que de 41 desses pacientes, cujos diagnósticos

estavam completos segundo os critérios estabelecidos pelo estudo, quase a metade deles

(48,8%; n = 20) distribuiu-se entre doença leve a moderada (22,0%; n = 9) e leve a severa

(26,8%; n = 11). Embora a porcentagem de tabagistas em relação à amostra total (n = 789)

seja de 5,2%, e quanto aos pacientes poli-queixosos (n = 273) seja de 14,0%, chamou-nos a

tenção a distribuição de quase metade dos pacientes fumantes entre essas duas severidades de

doença periodontal.

A amostra confirma a literatura sobre a associação entre fumo e doença periodontal. O

tabagismo é considerado o maior risco para a periodontite (COUTO; COUTO, 1992; SILVA;

NEWMAN; OAKLEY, 1995; POMPEU; TOLEDO; SAMPAIO, 1997; CROUCHER et. al., 1997;

AMERICAN ASSOCIATION OF PERIONTOLOGY, 1999, [b] 2001; PAPAPANOU; LINDHE, 1999;

SALLUM et. al., 1999; BRETZ; CHAVES,1999; HUJOEL et. al., 2003; DAUD, 2003). Duas vezes

mais mulheres fumantes que as não fumantes necessitam de dentadura depois dos 50 anos

(AMERICAN ACADEMY OF PERIODONTOLOGY, 1996, [1] 1999).

Hugoson; Ljungquist; Bergström (2002); Aleksejuniene et. al. (2002), observaram que

o tabagismo está associado ao ‘stress’ e a eventos vitais negativos, que, por sua vez, levam a

uma deficiente higiene bucal, prejudicando a saúde periodontal. Eventos negativos

prolongados podem atrapalhar o funcionamento adequado da resposta imunológica (defesas)

levando o indivíduo estressado a desenvolver doenças crônicas. Esse processo de alteração

emocional que leva à disfunções sangüíneas, podendo originar doenças crônicas foi descrito

por Rodrigues; Gasparini (1992). Além disso, os hábitos de auto-cuidados ficam alterados,

prejudicando a manutenção do suporte periodontal. Schwab (1984); Arruda (1990); Breivik

et. al. (1996); Sallum et. al. (1999); Deinzer et. al. (2001), concordam que alterações

psicossociais podem aumentar a vulnerabilidade à doença periodontal através de higiene

negligenciada em períodos de ‘stress’, além do aumento de comportamentos nocivos à saúde

periodontal, como: tabagismo, bruxismo, uso de drogas e alterações na dieta (maior ingestão

de alimentos açucarados e macios). Arruda (1990), cita o tabagismo como um dos hábitos que

representam fixações da fase oral.

3.5.2 Freqüência do bruxismo quanto à severidade da doença periodontal

Tabela 22 – Freqüência de bruxismo quanto à severidade da doença periodontal

Severidade Freqüência Porcentagem

Leve 12 12,9

Leve a moderada 24 25,8

Moderada 10 10,8

Moderada a severa 8 8,6

Severa 8 8,6

Leve a severa 31 33,3

Total 93 100,0

Observou-se através da tabela 22, que dos 93 pacientes válidos para a análise da

categoria e que declararam ranger e/ou apertar os dentes, 55 (59,1%) distribuíram-se entre a

severidade leve a moderada (25,8%; n = 24) e leve a severa (33,3%; n = 31). Assim como em

relação ao tabagismo, observou-se uma grande concentração de pacientes bruxistas entre as

doenças leve a moderada e leve a severa. Esses resultados confirmam dados da literatura

sobre bruxismo.

O bruxismo é definido como um hábito parafuncional muito destrutivo, pois o

apertamento, fricção ou atrito dos dentes entre si com força excessiva e sem nenhum objetivo

funcional pode danificar os tecidos dentais e o periodonto. O bruxismo é chamado de crônico

quando acontece como forma de adequação biológica e funcional do organismo. Já o agudo, é

desencadeado por motivos emocionais ou sistêmicos fazendo com que o processo ultrapasse a

capacidade biológica de adaptação e defesa do sistema (BAHLIS; RODRIGUES; FERRARI, 1999;

NÓBILO et. al., 2000). Segundo esses últimos autores, a maioria dos indivíduos tem bruxismo

em algum momento da vida, em graus variados. Bahlis; Rodrigues; Ferrari (1999), enfatizam

a importância de uma anamnese detalhada sobre o sintoma, pois apenas 10,0% da população

adulta têm consciência desse hábito parafuncional.

Dentre as inúmeras manifestações clínicas associadas ao bruxismo estão as

implicações periodontais. Silva; Newman; Oakley (1995), acreditam que o bruxismo é

induzido por stress. Entretanto, pela falta de evidências científicas que suportem essa teoria, o

diagnóstico baseia-se em observações clínicas. Couto; Couto (1992); Pompeu; Toledo;

Sampaio (1997); Sallum et. al. (1999); American Academy of Periodontology ([a] 2001);

Genco (2002); Hugoson; Ljungquist; Breivik (2002); Aleksejuniene et. al. (2002), associam

alterações psicossociais com vulnerabilidade à doença periodontal pela higiene negligenciada

em períodos de ‘stress’, e também com aumento de comportamentos nocivos à saúde

periodontal, como: tabagismo, bruxismo, uso de drogas e alterações na dieta (maior ingestão

de alimentos açucarados e macios). Bahlis; Rodrigues; Ferrari (1999), também atribuem

bruxismo ao stress emocional, à ansiedade em momentos de pressão e crise emocional

(Bahlis; Rodrigues; Ferrari,1999). Arruda (1990); Nóbilo et. al. (2000) entendem que ranger

e/ou apertar os dentes representam uma somatização de conflitos intrapsíquicos gerados por

impulsos agressivos e repressivos oriundos de estímulos inconscientes e que expressam as

insatisfações do indivíduo na fase oral, que permanecem latentes e que são exteriorizados em

condições ambientais favoráveis. Williams et. al. (2001); Torres et. al. (2002), alertam para o

bruxismo como possível manifestação psicofisológica de depressão e resultado de stress.

3.5.3 Freqüência de stress quanto à severidade da doença periodontal

Tabela 23 – Freqüência de stress em diagnósticos quanto à severidade da doença periodontal

Severidade Frequência Porcentagem

Leve 14 18,7

Leve a moderada 21 28,0

Moderada 6 8,0

Moderada a severa 11 14,7

Severa 6 8,0

Leve a severa 17 22,7

Total 75 100,0

A tabela 23 mostrou que dos 75 pacientes válidos para análise do ‘stress’ associado à

severidade da doença periodontal, 21 deles (28%) foram diagnosticados com doença

periodontal leve a moderada, seguidos por 17 pacientes (22,7%) com doença periodontal leve

a severa. Esses dados indicam que pouco mais da metade (50,7%; n = 38) dos pacientes que

se consideraram stressados concentrou-se, novamente, nos graus de severidade de doença

periodontal leve a moderada ou leve a severa. Observou-se que a alta proporção aproximada

de pacientes que referiram ao tabagismo e ao bruxismo repetiu-se em relação ao stress, quanto

à distribuição nos graus de severidade das periodontites leve a moderada e leve severa. O

significado dos fatores de risco biológicos e comportamentais, incluindo condições

sistêmicas, tabagismo, higiene oral e idade têm sido amplamente estudados. Porém, esses

fatores não explicam a variação da severidade da doença periodontal. Essa variação pode ser

explicada, pelo menos em parte, por importantes fatores psicossociais (MARCENES; SHEIHAM,

1992).

Schwab (1984), explica a relação entre stress e distúrbio psicossomático como

dificuldades de adaptação frente a circunstâncias de vida para as quais o indivíduo pode

apresentar reações substitutivas: ruptura dos mecanismos do ego e o desenvolvimento de uma

psicose, ou o desencadeamento de mecanismos psíquicos mal elaborados para lidar com

ansiedade ou angústia, gerando comportamentos obsessivos, compulsivos e fóbicos. Numa

tentativa de controlar ou diminuir a ansiedade, o indivíduo poderia transformá-la em desvios

de comportamento como alcoolismo ou outras toxicomanias, promiscuidade, entre outros.

Finalmente, se nenhum desses mecanismos for utilizado, o indivíduo pode ‘internalizar’ o

stress, desenvolvendo a doença psicossomática. O stress pode ser entendido como uma parte

do sistema complexo e dinâmico da inter-relação entre o indivíduo e o meio. O problema

começa quando a resposta ao stress é incompatível com o tamanho do desafio (LINDEN;

MULLALLY; FREEMAN, 1996; BREIVIK et. al., 1996), pois o stress pode modificar a resposta

imune, de acordo com Arruda (1990); Silva; Newman; Oakley (1995); Hugoson; Ljungquist;

Bergström (2002); Sallum (2002); Cohen; Slavskin (2002); Schenkein (2003); Vettore et. al.

(2003).

Estudos neuro-endócrinos já demonstraram a queda das defesas imunológicas como

possível quebra da homeostase facilita a instalação da doença periodontal e doenças, de uma

forma geral (SILVA; NEWMAN; OAKLEY, 1995; BREIVIK et. al., 1996; COHEN; SLAVSKIN,

2002; SALLUM, 2002; SCHENKEIN, 2003, VETTORE et. al., 2003). Para Breivik et. al. (1996), já

é reconhecido que as reações do sistema nervoso e do sistema endócrino associadas ao stress

emocional influenciam as atividades imunes propiciando a doença, inclusive infecciosa. A

psico-neuro-endócrino-imunologia seria a abordagem mais completa para o entendimento do

mecanismo saúde-doença do ser humano (ARRUDA, 1990, 1994; SALLUM, 1999; HUGOSON;

LJUNGQUIST; BERGSTRÖM, 2002).

As mudanças comportamentais que ocorrem durante a adaptação aos fatores

estressantes influenciam o risco para doença, pois aumenta a quantidade de comportamentos

que afetam a saúde periodontal (SCHWAB, 1984; ARRUDA, 1990; BREIVIK et. al., 1996,

SALLUM et. al., 1999; DEINZER et. al., 2001). Segundo Kornman (2001), para a maioria das

doenças crônicas, há fatores modificadores que não causam diretamente a doença, mas podem

modificar alguns aspectos tornando-a clinicamente mais severa. O desafio da bactéria inicia a

inflamação no tecido. Riscos genéticos e fatores de risco adquiridos, como tabagismo, por

exemplo, amplia a resposta inflamatória nos tecidos e determinam a progressão e severidade

da doença que pode chegar à perda de osso e de inserção.

Embora a literatura mostre e os prontuários citem o ‘stress’, em nosso estudo, essa

categoria não será considerada como um dado fidedigno, pois o stress foi citado no prontuário

pelo profissional de Odontologia, ao ouvir seu paciente. Deste modo, como o stress é uma

doença psicológica e não foi avaliada com instrumentos adequados, julgamos necessário não

considerar esse dado como fidedigno. Sobre esse aspecto, lembramos Croucher et. al. (1997),

quando apontam que, entre as limitações em pesquisas sobre a influência de fatores

psicossociais na etiologia da doença periodontal, está o fato de que as respostas dos

entrevistados podem ser influenciadas por sua própria percepção sobre seus sintomas e

eventos de vida. Também Rodrigues; Gasparini (1992), alertam para a importância de

conhecimentos adequados sobre o paciente para que um diagnóstico diferencial possa ser

elaborado.

3.5.4 Freqüência da onicofagia quanto à severidade da doença periodontal

Tabela 24 – Freqüência de onicofagia quanto à severidade da doença periodontal

Severidade Frequência Porcentagem

Leve 9 31,0

Leve a moderada 5 17,2

Moderada 2 6,9

Moderada a severa 3 10,3

Severa 2 6,9

Leve a severa 8 27,6

Total 29 100,0

Dentre a amostra total de pacientes, 146 referiram à onicofagia. A tabela 24

evidenciou que dentre os 29 integrantes da pesquisa com diagnóstico de severidade e que

afirmaram roer unhas, 9 pacientes (31,0%) têm severidade leve, 8 (27,6%) têm severidade

leve a severa e 5 (17,2%), leve a moderada.

Acreditamos que o hábito de roer unhas possa estar associado a algum tipo de

ansiedade do paciente, ou segundo Arruda (1990); Sallum et. al., (1999); Aleksejuniene

(2002), a angústia pode levar o indivíduo a comportamentos prejudiciais à saúde.

Roer unhas pode ser a manifestação de algum conflito, de fixação na fase oral, de

auto-agressividade que o indivíduo não consegue expressar de outra forma (ARRUDA, 1990).

Osório (1993), associou a onicofagia de uma paciente, com um tipo particular de ansiedade

que ele chamou de ‘ansiedade de desempenho’, vinculada ao aumento das exigências

profissionais ou de responsabilidades no âmbito doméstico.

3.5.5 Freqüência da xerostomia quanto à severidade da doença periodontal

Tabela 25 – Freqüência de xerostomia quanto à severidade da doença periodontal

Severidade Frequência Porcentagem

Leve 6 17,1

Leve a moderada 13 37,1

Moderada 3 8,6

Moderada a severa 4 11,4

Severa 4 11,4

Leve a severa 4 14,3

Total 35 100,0

Podemos observar na tabela 25 que dos 35 pacientes diagnosticados para severidade e

que referiram à xerostomia, 13 deles (37,1%) têm periodontite leve a moderada, 6 (17,1%)

têm leve e 5 (14,3%), leve a severa.

Sobre esse aspecto, Williams et al. (2001) alertam para que o dentista fique atento às

manifestações emocionais dos pacientes devido à sua associação com a doença periodontal.

Entre outros sintomas, Torres et. al. (2002), citam que a sensação de boca seca (xerostomia)

como possível expressão psicofisiológica de depressão ou manifestação de stress e ansiedade.

Segundo Lamey; Linden; Freeman (2000), desordens mentais clínicas, são diferentes

das desordens de personalidade, pois a manipulação das primeiras envolve medicamentos que

podem levar a efeitos colaterais, entre eles, a xerostomia.

Verificamos assim, que os resultados obtidos nas tabelas 21 a 25, apontam para a

prevalência de tabagismo, bruxismo e referências ao stress (embora não avaliado

adequadamente) entre os pacientes poli-queixosos com doença periodontal crônica leve a

moderada e leve a severa.

3.6 Doença Leve a Moderada e Leve a Severa entre Pacientes Poli-queixosos

Tabela 26 – Distribuição de pacientes poli-queixosos quanto à doença leve a moderada e leve

a severa

Número de sistemas

Leve a Moderada F %

Leve a Severa F %

Total F %

Sem sintomas 9 14,8 7 11,9 16 13,3

Um 11 18,0 9 15,3 20 16,7

Dois

Três ou mais

11 18,0

30 49,2

14 23,7

29 49,2

25 20,8

59 49,2

Total 61 100,0 59 100,0 120 100,0

Apesar de não ter sido verificada uma correlação significativa entre severidade da

periodontite e queixas orgânicas (χ2 = 0,794; p > 0,5) referidas pelo paciente, a tabela 26

evidenciou que, tanto para a severidade leve a moderada quanto para a leve a severa, quase a

metade do número de pacientes diagnosticados em cada uma das referidas severidades de

doença, são poli-queixosos. Papapanou; Lindhe (1999); Bretz; Chaves (1999); American

Academy of Periodontology (1996); Genco (2002); Sallum (2002); Grisi (2002); Lorenzo;

Lorenzo (2002), também colocam a doença periodontal associada à outras manifestações

sistêmicas. Lagervall; Jansson; Bergström (2003), associaram pacientes portadores de doença

periodontal com saúde geral deficiente.

Tabela 27 – Distribuição dos pacientes poli-queixosos quanto ao gênero

Gênero

Leve a Moderada Freq. %

Leve a Severa Freq. %

Total Freq. %

Masculino 6 20,0 9 31,0 15 25,4

Feminino 24 80,0 20 69,0 44 74,6

Total 30 100,0 29 100,0 59 100,0

Através da tabela 27, observou-se que o número de mulheres de nossa amostra com

periodontite leve a moderada é quatro vezes o número de homens com esse mesmo

diagnóstico. Quanto aos portadores de doença leve a severa, as mulheres são mais que o

dobro do número de homens. Mesmo assim, não houve correlação significativa (χ2 = 0,947;

p > 0,5) entre gênero e severidade da periodontite.

Tabela 28 – Distribuição dos pacientes poli-queixosos quanto à faixa etária

Faixa etária

Leve a Moderada Freq. %

Leve a Severa Freq. %

Total Freq. %

20 a 29 anos 1 3,3 1 3,4 2 3,4

30 a 39 anos 8 26,7 5 17,2 3 22,0

40 a 49 anos 6 20,0 2 6,9 8 13,6

50 a 59 anos 10 33,3 10 34,5 20 33,9

60 e acima 5 16,7 11 37,9 16 27,1

Total 30 100,0 29 100,0 59 100,0

A tabela 28 demonstrou que em relação aos 59 pacientes poli-queixosos

diagnosticados com as duas severidades de doença periodontal, 36 desses pacientes (61,0%)

têm 50 anos ou mais. Porém, analisando apenas os pacientes com doença leve a moderada,

encontramos 18 (60,0%) pacientes distribuídos entre duas faixas etárias: 30 a 39 anos (26,7%;

n = 8) e 50 a 59 (33,3%; n = 10), respectivamente. Quanto aos pacientes com doença leve a

severa, 72,4% deles têm mais de 50 anos. Novamente, não houve correlação estatística entre

idade e severidade da doença periodontal (χ2 = 4,927; p > 0,05).

Esses resultados sobre os pacientes poli-queixosos com doença periodontal crônica

leve a moderada ou leve a severa não correspondem aos encontrados na literatura sobre a

associação entre faixa etária e a maior procura de atendimento odontológico, como

verificaram Marcenes; Sheiham (1992); Linden; Mullally; Freeman (1996); American

Academy of Periodontology (1996); Pompeu; Toledo; Sampaio (1997); Croucher et. al.

(1997); Machion et. al. (2000); Chambrone; Chambrone (2001); Hugoson; Ljungquist;

Bergström (2003). De acordo com esses autores, a faixa etária de pacientes que mais procura

ajuda odontológica situa-se entre 30 a 49 anos. Entretanto, Aleksejuniene et. al. (2002),

observaram que a saúde geral é prejudicada entre pessoas mais velhas, o que poderia explicar

os índices de periodontite leve a moderada e leve a severa entre os pacientes poli-queixosos a

partir dos 50 anos, encontrados em nossa pesquisa. Lipowski (1990), ao realizar um

levantamento teórico sobre uma possível associação entre doença depressiva e somatização,

encontrou dados discrepantes. Segundo o autor, alguns pesquisadores acreditam que os

problemas orgânicos aumentam à medida que a mulher envelhece. Outros, entretanto,

acreditam que as queixas orgânicas das mulheres mais velhas podem estar relacionadas a

problemas orgânicos já existentes.

Tabela 29 – Distribuição dos pacientes poli-queixoso quanto ao estado civil

Estado civil

Leve a Moderada Freq. %

Leve a Severa Freq. %

Total Freq. %

Solteiro 6 20,0 4 13,8 10 16,9

Casado 18 60,0 16 55,2 34 57,6

Viúvo 3 10,0 3 10,3 6 10,2

Desquitado 3 10,0 6 20,7 9 15,3

Total 30 100,0 29 100,0 59 100,0

Como nas tabelas anteriores que referiram o estado civil dos pacientes, a tabela 29

demonstrou a prevalência dos pacientes casados, independentemente do grau de severidade de

sua doença periodontal. Não houve significância (χ2 1,501; p > 0,05) entre estado civil e

severidade da doença.

Tabela 30 – Distribuição dos pacientes quanto ao grau de instrução

Grau de instrução

Leve a Moderada Freq.* %

Leve a Severa Freq.* %

Total Freq. %

F I 5 17,9 8 28,6 13 23,2

FC 4 14,3 6 21,4 10 17,9

MI 6 21,4 3 10,7 9 16,1

MC 8 28,6 7 25,0 15 26,8

SC 5 17,9 4 14,3 9 16,1

Total 28 100,0 28 100,0 56 100,0 FI – Fundamental Incompleto; FC – Fundamental Completo; MI – Médio Incompleto; MC – Médio Completo; SC – Superior Completo.

* Não havia referências quanto ao grau de instrução em 3 prontuários de pacientes com doença leve a moderada,e de 1 paciente com doença leve a severa.

Verificamos pelos dados da tabela 30 que as duas maiores concentrações quanto ao

grau de instrução entre os 28 pacientes com periodontite leve a moderada, que se referiram à

escolaridade, distribuíram se entre 6 pacientes (21,4%) que não completaram o ensino médio,

e mais 8 pacientes (28,6%) que completaram o referido grau de instrução. Quanto aos 28

pacientes com diagnóstico de doença leve a severa, 8 deles (28,6%) não completaram o

ensino fundamental e 7 (25,0%), terminaram o ensino médio. Também não foi verificada

correlação estatística entre severidade da doença periodontal e grau de instrução (χ2 = 2,270;

p > 0,05). Esses índices observados refletem os dados descritos nas tabelas 4, 12 e 17.

Tabela 31– Distribuição dos pacientes quanto à situação laboral

Grau de especialização*

Leve a Moderada Freq. %

Leve a Severa Freq. %

Total Freq. %

Alta 4 13,3 3 10,3 7 11,9

Média 4 13,3 3 10,3 7 11,9

Baixa 3 10,0 4 13,8 7 11,9

Braçal 1 3,3 4 13,8 5 8,5

S/R 18 60,0 15 51,7 33 55,9

Total 30 100,0 29 1 00,0 59 100,0

*Alta, média e baixa referem-se ao grau de especialização das funções/cargos profissionais exercidos pelos pacientes. S/R foi utilizado para contabilizar pacientes que referiram não exercer atividades remuneradas.

Embora não tenha sido evidenciada uma significância estatística entre severidade da

periodontite e o grau de especialização laboral (χ2 = 2,485; p > 0,05), em ambas severidades

em questão, mais da metade de pacientes em cada uma delas não exerce atividade

remunerada, dados que coincidem com os encontrados nas tabelas 5, 13 e 18, bem como com

a literatura nelas descrita.

3.7 Avaliação dos Hábitos e outras Manifestações do Paciente com Doença

Periodontal leve a moderada e leve a severa

3.7.1 Freqüência do tabagismo quanto à doença leve a moderada e leve a severa

Tabela 32 – Distribuição dos pacientes poli-queixosos quanto ao tabagismo

Tabagismo

Leve a Moderada Freq.* %

Leve a Severa Freq.* %

Total Freq. %

Ausência 22 78,6 23 88,5 45 83,3

Presença 6 21,4 3 11,5 9 16,7

Total 28 100,0 26 100,0 54 100,0

* Não foram encontradas referências quanto tabagismo em 2 prontuários de pacientes com doença leve a moderada e em 3 prontuários de pacientes diagnosticados com doença leve a severa.

A tabela 32 demonstrou que dentre os componentes da pesquisa que foram

diagnosticados com severidade leve a moderada ou leve a severa, muito poucos fumam. Não

houve relação significativa entre tabagismo e severidade de periodontite (χ2 = 0,949;

p > 0,05).

3.7.2 Freqüência de bruxismo em relação à doença leve a moderada e leve a severa

Tabela 33 – Distribuição dos pacientes poli-queixosos quanto ao bruxismo

Bruxismo

Leve a Moderada Freq. %

Leve a Severa Freq. %

Total Freq. %

Ausência 16 53,3 14 48,3 30 50,8

Presença 14 46,7 15 51,7 29 49,2

Total 30 100,0 29 100,0 59 100,0

Apesar da não evidência de significância estatística entre severidade da doença e

bruxismo (χ2 = 0,151; p > 0,05), observamos que na tabela 33, a metade dos integrantes de

cada grupo de severidade periodontal declarou ter bruxismo. A literatura sobre bruxismo

descrita na tabela 22 pode ser uma explicação para o número de bruxistas portadores de

doença periodontal leve a moderada ou leve a severa, encontrado em nossa pesquisa.

3.7.3 Freqüência de stress em relação à doença leve a moderada e leve a severa

Tabela 34 – Distribuição de pacientes poli-queixosos quanto ao stress

Stress

Leve a Moderada Freq. %

Leve a Severa Freq. %

Total Freq. %

Ausência 13 43,3 17 58,6 30 50,8

Presença 17 56,7 12 41,4 29 49,2

Total 30 50,8 29 49,2 59 100,0

Os dados da tabela 34 demonstraram que mais da metade dos pacientes que tiveram

diagnóstico de doença leve a moderada se referiram ao stress (56,7%; n = 17) e quase a

metade dos pacientes com periodontite leve a severa queixaram-se de stress (41,4%; n = 12).

Apesar disso, não houve significância estatística (χ2 = 1,379; p > 0,05).

3.7.4 Freqüência de onicofagia em relação à doença leve a moderada e leve a severa

Tabela 35 – Distribuição de pacientes poli-queixosos quanto à onicofagia

Onicofagia

Leve a Moderada Freq. %

Leve a Severa Freq. %

Total Freq. %

Ausência 30 100,0 26 89,7 56 94,9

Presença -- -- 3 10,3 3 100,0

Total 30 100,0 29 100,0 59 100,0

Como se pôde observar pela tabela 35, entre os integrantes de nossa amostra, a

onicofagia é quase inexistente. Deste modo, não há correlação estatística (χ2 = 3,270;

p > 0,05).

3.7.5 Freqüência de xerostomia em relação à doença periodontal leve a moderada e leve

a severa

Tabela 36 – Distribuição dos pacientes poli-queixosos quanto à xerostomia

Xerostomia

Leve a Moderada Freq. %

Leve a Severa Freq. %

Total Freq. %

Ausência 18 60,0 26 89,7 44 74,6

Presença 12 40,0 3 10,3 15 25,4

Total 30 100,0 29 100,0 59 100,0

Quanto à xerostomia, a tabela 36 mostrou que é quase inexistente entre os pacientes

com periodontite leve a severa. Porém, entre os pacientes com doença leve a moderada, a

xerostomia foi referida por quase metade dos pacientes. Não foi encontrada significância

estatística (χ2 = 6,840; p > 0,05).

Segunda etapa – Análise qualitativa

Nesta segunda parte do estudo, apresentamos a análise psicodinâmica de três casos,

com base nas entrevistas clínicas realizadas com os pacientes provenientes de uma amostra

por conveniência.

Caso 1 - Maria e o Narcisismo Identificação da paciente:

Maria tem 56 anos, branca, nasceu no interior de São Paulo, completou o ensino

médio e constava em sua anamnese como atividade laboral, que é do lar. Casada há 37 anos,

Maria tem um filho de 36 anos, solteiro e que mora sozinho. A segunda filha da paciente tem

35 anos, é casada e tem duas filhas.

Diagnóstico periodontal: periodontite crônica leve a severa agravada por fatores

modificadores (morfologia do periodonto, alteração hormonal e hábitos parafuncionais –

range e aperta os dentes).

Histórico da queixa:

Último tratamento odontológico antes de buscar tratamento na clínica-escola foi há 5

anos. Paciente relatou ser portadora de doença periodontal desde os 17 anos “mas nenhum

dentista falou direito o que era” (sic). Justificou dizendo: “Você sabe, naquela época, os

dentistas não conheciam, não tinham informações, vai ver até não se interessaram pelo meu

caso. Hoje, se não fosse a escola, eu não poderia fazer o tratamento, pois tratamento de

dentes é muito caro num consultório” (sic). Há cinco anos teve um problema “e tive que

extrair todos os dentes superiores. Agora, quando eu terminar esse tratamento, vou querer

fazer a estética, né?”. Disse estar muito animada para aproveitar tudo o que posso fazer na

clínica, “pois sou muito bem tratada, os alunos são maravilhosos, eles se preocupam comigo”

(sic). Disse que range e aperta os dentes, “desde que me conheço por gente” (sic). Mudava de

assunto todas as vezes que se tentou investigar sobre os tratamentos odontológicos passados,

por exemplo, o que os dentistas recomendavam, quanto tempo duraram os tratamentos, se ela

seguia as recomendações profissionais.

História médica:

Maria afirmara que sempre teve dores na coluna, mas que “naquela época, você sabe,

os médicos não se interessaram pelo meu caso e só há quatro anos atrás é que uma médica

diagnosticou fibromialgia. Essa médica é muito boa: só de olhar para mim, ela descobriu que

eu tenho um nódulo na tireóide. Um nódulo e um monte de nodulozinhos. E você vê, eu tenho

outros médicos, o ginecologista, mas ele nunca se interessou, nunca me falou nada. Quando

fui fazer RPG (reeducação de postura geral) por causa das dores, a fisioterapeuta me

encaminhou para a reumatologista e foi ela que diagnosticou a fibromialgia” (sic).

Maria relatou ainda que tem hipertensão por causa do hormônio que tomou para tratar

da menopausa. “Aí, tive que parar de tomar o hormônio e hoje tomo isoflavona” (sic). Maria

relatou ter entrado na menopausa aos 47 anos. Os médicos não gostam, mas eu fiquei feliz”

(sic). A paciente teve a vesícula operada há 7 anos e o médico “pediu para eu parar de

trabalhar, pois a costela comprimia a vesícula” (sic). Maria era manicure, na época. Nas

tentativas de esclarecer como foram esses tratamentos, a paciente mudava de assunto e dizia:

“Agora estou bem, não tenho do que me queixar, não gosto de me fazer de coitada. Minha fé

me ajuda e eu não me entrego. Minha sorte é que eu tenho muita coisa para fazer, senão,

acho que eu já tinha tido depressão” (sic). Quanto à vida sexual, Maria referiu ter altos e

baixos (sic). Nem poderia ser diferente, né? Do jeito que meu marido é... Você viu, ele é

grandão, tem 1,85m, fala grosso, você ouviu a voz dele, mas é assim como eu te contei” (sic)

(comentários da paciente sobre o marido estão descritos a seguir).

Atividades laborais e/ou de produtividade

Paciente afirmou que sempre trabalhou como manicure e diz: “nunca em salão, mas eu

fazia unhas nas casas das clientes, ou senão, elas iam na minha casa” (sic). Interrompeu essa

atividade por recomendação médica (após cirurgia de vesícula). Desde essa época, Maria faz

doces, salgados e bolos para vender. Verbaliza Maria: “A sra. sabe, não dá para parar de

trabalhar. Eu sempre trabalhei para ajudar no orçamento da casa. Não é fácil, pois ainda

por cima, tenho que cuidar das minhas netas. A pequenininha agora já vai para a escola

também, mas tem que levar, trazer, aquelas coisas. Mas hoje eu sou cozinheira”(sic). Acha

que trabalha muito e afirma: “Meu marido bem que podia dizer para eu trabalhar menos, mas

você sabe, não é fácil, então eu vou fazendo meus bolinhos. Graças a Deus, eu tenho cabeça

boa e força para levar minha vida como ela tem que ser. Minha fé me ajuda” (sic).

Relações afetivas:

Família mudou do interior para São Paulo quando tinha 17 anos. Referiu-se a uma

relação muito próxima com a mãe (75 anos) e com a irmã, até hoje. Disse que o ambiente em

sua casa sempre foi “muito alegre, de muita brincadeira, muita união, todos se compreendiam

muito. Tinha muito carinho” (sic). Quanto ao pai, manciona-o pouco, mas afirma que o

mesmo já é falecido.

Namorou o atual marido durante quase três anos. Durante o noivado, percebeu que não

era a pessoa com quem gostaria de se casar e falou que não queria casar com ele. “Até no dia

do casamento eu falei para o meu pai que não queria casar, mas ele disse que se já tinha

chegado até ali, não dava para voltar atrás” (sic). Neste momento da entrevista, o marido

bateu na sala onde estávamos para avisar que havia chegado e que esperaria por ela na

recepção e a paciente chamou-o de “bem”. Mas, em seguida refere-se a ele como uma pessoa

muito autoritária. “É ótimo pai, ótimo filho, ótimo avô, ótimo profissional, muito honesto e

trabalhador, ótimo tudo” (sic). Maria diz que marido nunca foi nada disso para ela, sempre

foi bravo e ciumento. “Mas minha fé sempre me ajudou a levar. E vai continuar sendo assim.

O que você acha!? Depois de 37 anos de casamento, vou fazer o que? Vou levando. Afirma

que o filho é igual ao pai quanto ao temperamento.

Entretanto, afirma que quer mudar e diz: “Eu já avisei que não vou ser mais a mesma.

Eles ficaram meio assustados, mas eu não quero nem saber. Vou começar a me permitir a

fazer o que eu quero. Meu marido é muito egoísta, só faz o que ele quer. Por exemplo, eu vou

com ele na missa, mas ele nunca quer ir comigo no meu grupo de estudos de espiritismo. Ele

não gosta de sair, de conversar com as pessoas e eu, adoro ter amigos, conversar” (sic).

Quando investigamos quem são os amigos da paciente, ela justificou não tê-los, pois é

muito ocupada. “Você vê, meu marido sabe que eu adoro dançar. Mas você pensa que ele me

convida? Não senhora, ele não iria me dar esse gostinho. Mas eu também não peço; depois

de 37 anos de casados, um marido não sabe do que a mulher gosta? Se ele quisesse, ele me

convidava. Mas minha religião faz com que eu entenda”.

Nesse momento, Maria começa a justificar o comportamento do marido pelas relações

com a família de origem: “Ele nunca recebeu carinho. Minha sogra é muito dura, ciumenta,

assim como ele é. Você vê, a família dele mora em São Paulo. Como eu não ando com

vontade de olhar para a cara dela, nem de ninguém da família, já faz oito meses que eu não

vou para lá, visitar a família do meu marido. Aí, ele também não vai”. Compara, em seguida,

com sua própria famólia e comsua mãe: “É tão diferente da minha relação com minha mãe e

com a minha irmã! Nós nos falamos quase todos os dias, no telefone. Se minha mãe tem

alguma coisa, lá em São Paulo, eu até sinto. Ele também só tem um irmão, mas se o irmão

não liga, meu marido também não liga. Eu estranhei muito quando saí da minha família e

entrei para a família do meu marido. Tudo para eles é feio: conversar, dançar” (sic).

Maria continua seu discurso em relação às projeções na figura do marido: “Quando eu

conto alguma coisa para minha filha das coisas que eu já passei com o pai dela, ela fala para

eu parar de falar por que eu passei por tudo isso porque eu deixei. Ela diz que se fosse ela,

não deixaria que nada disso acontecesse. Você vê, não posso nem falar nada” (sic). Volta a

falar da semelhança que o filho tem com o pai no que tange ao comportamento e justifica-o

também pelas relações primeiras de seu desenvolvimento, assim como fez ao justificar o

marido com sua mãe, porém, também justifica a si própria, pois acha que o filho é bravo por

causa da gravidez que foi muito tumultuada, devido a aborrecimentos com o marido. Afirma:

“Passei muito nervoso. Meu marido nunca passou a mão na minha barriga. Também,

naquela época não se usava fazer isso (repetiu várias vezes). Sabe como foi minha lua-de-

mel? Nós não viajamos e ele tinha que passar todos os dias na casa da mãe para dar um

beijo, antes de voltar para casa. Ou senão, ia jogar na casa do tio que estava mal. Mas eu

não culpo ninguém. Casei porque quis, ninguém me obrigou”. (Parece que culpa o pai, por

isso). “Como eu engravidei logo, aí é que ele ia para a casa dos outros, não importava nada

se eu estava grávida ou não. Ah, também gravidez não é doença. Mas que eu não tinha

qualquer privilégio por que estava grávida, lá isso, eu não tinha” (sic).

Após afirmar que já pensou em separar-se do marido por duas vezes, por causa desse

jeito bravo dele, continuou: “Quando ele fica bravo, de manhã, antes de sair para trabalhar,

eu digo para ele que ele tem que acordar e agradecer o emprego que tem, pois tem muita

gente desempregada. Mas ele bravo sai e bravo volta. Sabe, eu acho que para não criar

encrencas com ele, o melhor é não falar nada. É como agora, com esse negócio de visitar

minha sogra. Eu não tenho vontade nenhuma de ir, mas vou acabar indo. Falei para o meu

filho ir com ele, mas ele respondeu que a sogra é minha e que o marido é meu. A minha filha

diz que é casada e que se o marido dela não quiser que ela vá, ela não vai. A sra. me

entende? Vou ter que acabar indo para São Paulo com ele ver minha sogra, senão, ele

também não vai. Não tem jeito” (sic).

Quanto à filha, queixou-se que ela e o genro não saem de sua casa. Maria cuida das

netas para eles trabalharem e quando chega o final de semana, vão todos para sua casa. “Você

vê, eu criei meu genro até ele casar com a minha filha. Ele morava com uma tia, lá em São

Paulo, mas ele vivia mais na minha casa que na casa dela. No dia do casamento, você pensa

que ele quis sair da casa da tia? Que nada, ele quis sair da minha casa” (sic).

“Às vezes, eu gostaria de passar o domingo sem ter que fazer nada, sem ter que fazer

almoço para todo mundo, mas não adianta, minha filha e meu genro vão para lá. Aí, meu

lado mãe, meu lado gente entende que tem que ser assim. Nem sempre as coisas são como a

gente gostaria que fossem. Você sabe, eu estudo espiritismo e ele ajuda a explicar muitas

coisas. Então, eu sei que precisa ser assim. Minha fé me ajuda muito. Eu fui educada no

catolicismo, mas hoje eu sou espírita” (sic).

Atividades sócio-culturais

Paciente referiu que adora passear, ter amigos, mas não pode tê-los por que o marido é

muito egoísta. O fato de precisar trabalhar para ajudar no orçamento e ter que cuidar das netas

também impede que possa ter uma vida social mais diversificada. Conversa apenas com as

clientes que encomendam seus doces e salgados, quando ligam para fazer suas encomendas e

quando vão buscar. Também não perde as reuniões de estudo de espiritismo, pois elas ajudam

a entender e aceitar muitas coisas.

Observações

Foi feito um contato telefônico para agendar a entrevista. Explicado o objetivo da

entrevista, a paciente foi muito receptiva: “Pode contar comigo, terei muito prazer em

ajudar” (sic). Só depois, quis saber detalhes sobre o conteúdo do que teria que falar.

Durante a entrevista, manteve-se o tempo todo, contato de olhar comigo. Falava de

suas doenças e das dificuldades sorrindo, embora se referisse ao marido, aos filhos e às netas

como se fossem um peso. “E como se não bastasse, foram me comprar um apartamento bem

do lado do meu” (sic). (O sentido dado por Maria ao me, foi de algo ruim que estão fazendo a

ela). Enfatizou várias vezes a diferença da educação que recebeu dos pais e a educação que

marido teve. Considera-se uma pessoa “...de alto astral, graças à educação que recebeu e aos

ensinamentos da doutrina espírita” (sic). Quando falava de sua fé, parecia estar fazendo uma

‘pregação’ e sua voz era profundamente teatral. Colocava a mão no peito e em seguida

levantava a mão e o olhar para cima, como que olhando para Deus.

Quando o marido bateu à porta, seu tom de voz com ele foi bastante gentil: “Oi, bem,

me espere um pouquinho lá fora. Estou conversando e logo que eu acabar, procuro você lá

embaixo” (sic).

Fez elogios ao atendimento que recebe na clínica e ofereceu-se a participar de novas

entrevistas comigo, caso fosse necessário. “Nunca tinha conversado com uma psicóloga.

Gostei. Se precisar conversar mais vezes, estou à disposição. É, até que foi boa a conversa”

(sic).

A Projeção

Maria projeta suas insatisfações nos profissionais, no medicamento, no marido, nos

filhos, nas netas, no pai, na sogra, na vida. “Nenhum dentista falou direito o que era...eles não

sabiam o que era, não tinham informações, vai ver até não se interessaram pelo meu caso”

(sic). “...tive que extrair todos os dentes” (sic). “Você sabe, os médicos não se interessaram

pelo meu caso” (sic). O hormônio que tomou para tratamento da menopausa deu hipertensão.

“Os médicos não gostam, mas eu bem que gostei” (sic), referindo-se ao início da menopausa,

aos 47 anos. “Médico pediu para eu parar de trabalhar” (depois da cirurgia de vesícula) (sic).

“Não dá para parar de trabalhar...meu marido bem que podia dizer para eu trabalhar menos,

mas você sabe, não é fácil, então eu vou fazendo meus bolinhos” (sic). “Não é fácil, ainda por

cima, tenho que cuidar das minhas netas” (sic). “...falei para o meu pai que não queria

casar...mas ele disse...não dava para voltar atrás” (sic). “Meu marido é muito egoísta, só faz

o que ele quer” (sic). “Minha sogra é muito dura e ciumenta” (sic). “Você vê, não posso falar

nada” (quanto a desabafos que às vezes tenta fazer com a filha) (sic). Filho é bravo – igual ao

pai. Queixou-se da lua-de-mel e também porque o marido não passou a mão em sua barriga

quando estava grávida. “...eu não tinha qualquer privilégio porque estava grávida...” (sic).

Porque os filhos não querem acompanhar o pai em visita à família em São Paulo, falou

‘resignada’: “Vou ter que acabar indo...para ver minha sogra, senão, ele (marido) também

não vai” (sic).

A projeção é um mecanismo de defesa compreendido como uma tentativa do

indivíduo de livrar-se daquelas partes suas que percebe como más. O contato com estas partes

aterrorizantes causa dor e sofrimento, despertando assim, a ansiedade persecutória devido ao

medo do aniquilamento. Frente a esta fantasia inconsciente, as partes más são projetadas no

outro objeto, dando ao indivíduo, a sensação de que o ‘mau’ está no outro e não nele. Além

disso, sente que tem o controle sobre o outro (KLEIN, 1936, 1946-1963; SEGAL, 1985;

OCAMPO, 1995).

Outras projeções de Maria, responsabilizando os outros por sua impossibilidade de

promover mudanças internas podem ser verificadas quando diz: “Minha filha e meu genro

não saem da minha casa” (sic), inclusive nos finais de semana. “E como se não bastasse,

foram me comprar um apartamento bem do lado do meu” (sic). Maria refere que não gostaria

de fazer almoço todo final de semana, mas “...nem sempre as coisas são como a gente

gostaria que fossem” (sic). Teve os dentes superiores extraídos, há 5 anos, porém, reportou-se

de fato como se a ‘culpa’ das extrações fosse dos dentista e não da falta de cuidados com a

própria dentição. Não pode ter uma vida social mais intensa porque precisa trabalhar para

ajudar no orçamento, porque precisa cuidar das netas e porque o marido é muito egoísta. Sua

vida sexual também é insatisfatória por causa do marido.

Essas pessoas são sentidas como persecutórias, incompreensivas, incompetentes e

implacáveis. Representam objetos maus, que a perseguem, atacam e esvaziam de seus

conteúdos bons: ela não pode ser feliz – por causa dos outros. Seus relatos são como se

apenas os outros fossem responsáveis pelo seu sofrimento ou insatisfações, como se ela

própria não tivesse qualquer responsabilidade sobre o que acontece com sua vida.

O Narcisismo

As qualidades que Maria atribui às pessoas são suas, porém, pela dificuldade de

assumí-las, a paciente atribui-as aos outros. Assim, as pessoas más passam a ser eles. Essa

identificação projetiva maciça surge como defesa contra a sensação de ser pressionada por

seus conteúdos internos insuportáveis que deseja afastar do ego (self). Maria tem a

necessidade de permanecer com os objetos bons e identificar-se com eles, por isso, projeta as

partes não desejadas do ego (self), para mantê-las afastadas.

O narcisimo, mecanismo diretamente ligado à negação e à idealização, é

compreendido como uma defesa empregada pelo indivíduo para aliviar-se dos sentimentos

que são para ele extremamente dolorosos referentes à necessidade e dependência do outro e

do medo da separação deste de quem depende (mas nega). Por sentir como impossível a

elaboração de tal realidade, o outro é desvalorizado e desprezado, dando lugar à auto-

idealização de um self perfeito (SEGAL, 1982; OCAMPO, 1995).

As Defesas

A projeção de suas partes doentias no marido origina o medo da retaliação que é

acompanhado do mecanismo de idealização do eu. Maria nega seus conteúdos internos maus

e se idealiza de forma onipotente, narcisista como uma pessoa totalmente boa, enquanto o

marido passa a ser totalmente mau. Nos estados narcísicos, as defesas onipotentes podem

gerar confusão entre o self e o objeto.Tal idealização permite que Maria separe seus aspectos

bons, por cisão, seguida pela negação dos seus aspectos maus, dando ilusão de perfeição. Essa

cisão, que leva à idealização de ser uma mãe perfeita, boa e sacrificada pela família, bem ao

contrário do egoísmo do marido, faz com que Maria tenha sua culpa e perseguição

inconscientes aplacadas. Esse mesmo mecanismo é utilizado em relação a outras pessoas,

também.

Pudemos observar essa dinâmica através do sentimento de satisfação e a teatralidade

com que conta sua história médica, colocando-se como uma pessoa sofredora e

incompreendida. Disse ranger e apertar os dentes “desde que me conheço por gente” (sic).

“Sempre tive dores na coluna (sic). Refere à vida sexual insatisfatória (como um sacrifício).

Maria diz que marido nunca a acompanha às reuniões de estudo de espiritismo, mas ela

acompanha-o à missa. “Vou ter que acabar indo para São Paulo ver minha sogra, senão, ele

também não vai. Não tem jeito” (sic). O mesmo mecanismo psíquico pode ser observado

quando diz tentar acalmar marido sobre questões profissionais e quando conta que “...criei

meu genro para casar com minha filha. Ele morava com uma tia...mas vivi mais na minha

casa que na casa dela. No dia do casamento, você pensa que ele quis sair da casa da tia?

Que nada, ele quis sair da minha casa”(sic). Ou ainda, quando Maria se refere aos almoços

que precisa fazer (mesmo sem vontade) aos domingos para toda família: “...meu lado mãe,

meu lado gente entende que tem que ser assim. Nem sempre as coisas são como a gente

gostaria que fossem”(sic). Ou ainda, quando diz que até ‘sente’ quando alguma coisa acontece

com sua mãe, que mora em São Paulo. Como se pode observar nesse discurso de Maria, ela

sente-se a mulher, a mãe, a paciente perfeita, solidária, abnegada. Essa mesma dinâmica foi

observada na disponibilidade que Maria manifestou ao final da entrevista para novos

encontros, se necessários. Apesar de tudo isso, Maria se refere como “uma pessoa de alto

astral” (sic).

Defesas são fantasias inconscientes que o indivíduo utiliza para diminuir a ansiedade e

preservar seu equilíbrio, pois dão a sensação de satisfação de uma necessidade e também de

afastar o perigo do aniquilamento, da retaliação. Ao projetar no outro aqueles conteúdos

sentidos como maus em si, o indivíduo protege-se, pois nega a possibilidade de existência de

qualquer objeto mau em si, o que seria intolerável para ele, ao mesmo tempo em que

atribuindo as qualidades más ao outro objeto, idealiza-se através do mecanismo de cisão,

como um ser perfeito. Assim, ‘eu sou bom e o outro é mau’, o que assegura ao indivíduo, a

sensação de pleno controle sobre o objeto (KLEIN, 1946-1963; SEGAL, 1981, 1982; OCAMPO,

1995).

As Defesas Maníacas

A paciente utiliza defesas maníacas contra essa idealização narcisista com a

finalidade de proteger seu ego da depressão e da elaboração mental (contato com sua

realidade interna, que seria doloroso). Por isso, constantes ataques às pessoas são necessários.

Assim, a negação da realidade de suas partes más é mantida, bem como a onipotência. Por

exemplo, quando recorre à fé e à religião para justificar porque seu sofrimento (e

acomodação) é constante e não pode ser mudado. “Não gosto de me fazer de coitada. Minha

fé me ajuda e eu não me entrego. Minha sorte é que eu tenho muita coisa para fazer, senão,

acho que já tinha entrado em depressão” (sic).. “Graças a Deus, eu tenho cabeça boa e força

para levar minha vida como ela tem que ser. Minha fé me ajuda” (sic). Parece que a paciente

acredita que as explicações da fé respondem a tudo, tirando-lhe a responsabilidade de fazer

suas escolhas e se responsabilizar por elas.

A negação de suas partes más também faz com que os objetos fiquem cindidos, o que

resulta numa ambivalência afetiva. Ou seja, a percepção é que as pessoas ou situações são

totalmente boas ou totalmente más. Refere à família na época de solteira como “muito alegre,

de muita brincadeira, muita união, todos se compreendiam muito. Tinha muito carinho” (sic).

Em contraste, sua família atual é vista como o oposto: marido e filhos só fazem o que querem;

filhos não são solidários; a filha não compartilha de suas idéias; marido e filho são bravos,

para a família do marido “tudo é feio: conversar, dançar” (sic). Esse mecanismo também

pode ser observado quando comenta sobre tratamentos odontológicos anteriores que não

foram satisfatórios, diferentemente da clínica-escola “...pois sou muito bem tratada, os alunos

são maravilhosos, eles se preocupam comigo” (sic). Quando relata dos vários médicos pelos

quais já passou durante a vida, mas “...só há 4 anos é que uma médica diagnosticou

fibromialgia....só de olhar para mim, ela descobriu...” (sic).

A Inveja

A inveja que Maria tem das pessoas faz com que ela as ataque e espolie, na tentativa

de internalizar com voracidade as partes boas do outro. Como Maria sente que seus objetos

internos são danificados, isso lhe causa muita angústia. Esse sentimento acontece por se sentir

desamparada e, ao mesmo tempo, dependente de seus objetos bons (mas que sente como

maus). Por isso, através dos ataques invejosos às pessoas, Maria pode preservar a onipotência

e a auto-idealização para preservar a segurança do ego. Maria continua achando-se perfeita

devido a todos os defeitos que os outros tem. Por exemplo, quando se refere ao marido como

“ótimo pai, ótimo filho, ótimo avô, ótimo profissional, muito honesto, trabalhador, ótimo

tudo. Mas para mim não é nada disso, não” (sic). Aqui começam os ataques ao marido, quer

responsabilizando pelos “altos e baixos” (sic) da vida sexual, ou porque não se esforça para

acompanhá-la aos grupos de espiritismo ou porque não a leva para dançar. Ou seja, o marido

não é tão bom assim, tem muitos defeitos. Na inveja, o sentimento é dirigido ao objeto bom

para tomá-lo e destruí-lo. Como Maria quer ser tão boa quanto o marido, mas não consegue,

surge o desejo de destruí-lo. Assim, Maria elimina a fonte dos sentimentos invejosos. Esses

ataques são feitos de maneira sádica, ou seja, o marido é desprezado e desapropriado de seu

poder. Quando alcança seu objetivo, Maria sente que triunfou. Essa sensação de triunfo é uma

forma de evitar a dependência e a valorização afetiva que tem pelo marido. A partir do

momento que o marido é esvaziado de seus conteúdos bons, Maria exerce controle sobre ele.

Maria demonstrou sua voracidade invejosa e necessidade de manter o controle da situação

quanto a mim, quando por ocasião do agendamento da entrevista disse que teria muito prazer

em contribuir com a pesquisa. Também ao final da entrevista comentou que nunca tinha

conversado com uma psicóloga, que tinha gostado da experiência e que estria disposta a voltar

mais vezes, se fosse necessário. Disse: “É, até que foi boa a conversa” (sic).

O mesmo mecanismo invejoso acontece em relação aos filhos, pois eles fazem o que

querem, por exemplo, quando alegam não quererem acompanhar o pai na visita à avó.

Entretanto, o medo de retaliação faz com que tente reparar essa inveja. Esse mecanismo pode

ser observado quando falou ‘manso’ com o marido, para que aguardasse por ela. Também

quando faz os almoços de domingo ou quando cuida das netas, ou quando diz entender que o

marido é “grosso”, “egoísta” (sic) por que nunca recebeu carinho da mãe.

A inveja, segundo Klein (1936, 1946-1963), faz com que o indivíduo tente destruir o

objeto, por acreditar que não consegue ser tão bom quanto o outro é. Assim, procura espoliar,

destruir o outro, eliminando assim, qualquer motivo para inveja.

Análise geral do caso

A relação de Maria com o outro se baseia na projeção de suas partes más, de forma

narcísica. Não há gratidão, não consegue atribuir às pessoas, qualidades como boas,

compreensivas, solidárias, éticas, ou outras semelhantes. Por sentir que seus objetos internos

são danificados e que a realidade é impossível de ser enfrentada, surge a inveja, da qual se

defende através da onipotência narcísica e de reparações maníacas. Sua onipotência pôde ser

verificada, inclusive durante a entrevista, quando ao ter sido perguntada sobre como foram os

tratamentos odontológicos que havia feito anteriormente à clínica, se seguiu as prescrições

dos dentistas, Maria mudava de assunto, ou seja, ela demonstrava que estava no controle da

situação.

Segundo o conteúdo da entrevista, parece que o único prazer que Maria encontra é

freqüentar médicos e a clínica-escola, onde diz ser muito bem tratada e “...muito animada

para aproveitar tudo o que posso fazer na clínica” (sic).

A identificação projetiva maciça utilizada pela paciente serve para protegê-la de sua

própria raiva e sentimentos destrutivos. Não suporta perceber em si mesma, a destrutividade

com que tem direcionado sua vida. Esse funcionamento psíquico impede que Maria possa

integrar suas partes boas e más, o que compromete sua vida interna.

Em linhas gerais, a periodontite de Maria é uma perturbação homeostática, conforme

explicam Arruda (1990) e Moreira; Mello Filho (1992), pois a paciente busca seu equilíbrio

psíquico na doença. Essa tentativa de expressar suas angústias através da linguagem corporal

(ROSA, 1990; ARRUDA, 1990; OSÓRIO, 1993; SANTOS FILHO, 1994; BRIGANTI, 1999; MELLO

FILHO, 2002), também pode ser explicada por Groddeck (1966); Arruda (1990, 1994); Rosa

(1990); Perestrello (1996); Eksterman (1996), quando afirmam que toda doença é provocada,

ou seja, não acontece por acaso. Saúde e doença são resultado da história de vida da cada

indivíduo, sendo que esta abordagem bio-psico-social evidencia o modo como cada um busca

seu equilíbrio, de acordo com D’Epinay (1983); Lipowski (1984); Rosa (1990); Osório

(1993); Rodrigues; Gasparini (1992); Eksterman (1992, 1996); Howard; Lewis (1999);

Haynal; Pasini (1999); Mello filho (2002). Assim, parece que a plasticidade (ARRUDA, 1990)

de Maria não é suficiente para elaborar suas crises vitais, ou como escrevem Klein (1946-

1963); Rivière (1958); Segal (1982), e também Soifer (1985); Ocampo (1995), não há

elaboração das ansiedades persecutórias originárias nos primórdios de sua infância. A

utilização de defesas contra a dor psíquica decorrente desta falha de elaboração mental leva,

entre outras conseqüências, ao adoecer, podendo entre outras, desenvolver-se a doença

periodontal.

Muito tem sido descrito na literatura sobre fatores psicossociais que concorrem para o

surgimento de crises vitais. Especificamente em relação à periodontite, defesas mal-adaptadas

frente a circunstâncias de vida podem ser um preditor de doença periodontal (VETTORE et. al.,

2003). Ainda quanto às defesas mal-adaptadas, Kennedy; Schwab; Hide (2001), observaram

que estas ocorrem em índices mais elevados em indivíduos com depressão. Cumpre lembrar

que Maria pareceu-nos ter traços depressivos, entre outros, pela queixa de fibromialgia, que

segundo Lipowski (1990), pode ser uma manifestação orgânica de traço depressivo.

Caso 2 – Joana e a Evitação dos Contatos

Identificação da paciente

Joana tem 45 anos, solteira, branca, nascida no interior de São Paulo, grau de instrução

superior completo e trabalha como oficial administrativo.

Diagnóstico periodontal: periodontite crônica leve a severa agravada por fatores

modificadores (stress, ranger de dentes, oclusão).

Histórico da queixa

Paciente relatou nunca ter reparado que tinha problemas periodontais. “Minha gengiva

era clarinha e não sangrava. Quando eu tinha 31 anos, um dia eu estava vendo umas fotos e

reparei que minha boca estava mudando, que os dentes vieram para frente, estavam ficando

separados e nunca foram assim, eram bem juntinhos. Aí, eu corri para o dentista” (sic). “Foi

quando ele me disse qual era o meu problema e de lá para cá, já fiz várias raspagens e

cirurgias” (sic). O último tratamento odontológico foi há 1 ano atrás.

História médica

Paciente não soube precisar a época, mas referiu-se a episódios recorrentes de cistite.

Joana fez os exames e tratamentos que o médico indicava e logo “ficava boa. Mas já faz

tempo que não tenho, graças a Deus” (sic).

A paciente disse sofrer de insônia, desde criança e afirma: “Acho que sou muito

ansiosa, mas não sei por que sou assim” (sic). Referiu-se a constantes dores de cabeça, “mas

que passam com aspirina” (sic). Dores de estômago também foram sintomas citados. “Nos

últimos anos parece que agravaram, são mais freqüentes. Será que tem alguma coisa com a

ansiedade? Diz que tem dor de estômago que é emocional, não é?” (sic). Disse nunca ter

procurado ajuda médica para esclarecer a insônia, as dores de cabeça nem o problema de

estômago.

Joana teve muita dificuldade em falar de vida sexual, passada ou atual. “Nunca tive

relacionamentos sérios o suficiente que justificassem relacionamento sexual. Também, já faz

tanto tempo que nem lembro mais”. “Ah, as coisas são difíceis, hoje em dia. Parece que ‘os

caras’ não querem nada sério hoje em dia” (sic).

Aspectos laborais e/ou produtividade

A paciente formou-se em Química e Pedagogia. Aos 21 anos, começou a trabalhar em

uma empresamultinacional, numa cidade próxima de sua terra natal, no setor químico. Depois

de alguns anos, foi transferida para a Baixada Santista. “Eu não queria vir, mas o lado

profissional falou mais alto. Eu sabia que eu tinha que me manter, não podia contar com

ninguém” (sic).

Há nove anos, a indústria fechou. Começou a lecionar à noite, numa escola que

fechou. Logo em seguida do fechamento da indústria, surgiu um concurso numa universidade,

também na Baixada, no qual foi aprovada. A paciente disse não gostar da região em que vive

e que não queria ficar, mas afirma: “...tive que optar: ou eu voltava para perto da família ou

ficaria por aqui mesmo e lutaria pela minha subsistência. Se eu voltasse para o interior, eu

não conseguiria arranjar emprego facilmente. A remuneração também não seria como a

daqui. E depois, minha relação com minha família sempre foi muito complicada. Aí, o lado

profissional falou mais alto e eu fiquei. Mas não estou satisfeita com o que faço. Agora então,

que estão tentando me passar a perna no trabalho, está muito difícil” (sic).

Relações afetivas

Paciente relata sempre ter tido grande incompatibilidade com a mãe. “Ela é uma alemã

grosseira e rígida”. “Meus pais brigavam muito. Eu acho que não conseguiria ter um

relacionamento assim. Não sei como ainda estão juntos, depois de 50 anos” (sic). Quanto ao

pai, foi citado como mais amoroso e cúmplice; a paciente disse que sentia que ele procurava

apoiá-la em seus empreendimentos. Entretanto, a paciente disse que nunca falou para o pai o

que sente pelo fato do pai nunca ter interferido a favor dela quando a mãe agredia (física e

verbalmente). “Se ele não tivesse concordado com as coisas que ela fazia, quem sabe, eu não

tivesse que ter saído de casa” (sic). Joana foi morar sozinha, quando tinha 20 anos. “Você vê,

quando eu falei que ia morar sozinha, meu pai me deu todo o apoio. Ele falou para mim que

seria o melhor que eu tinha a fazer” (sic).

Várias vezes, falou da importância que a família tem na vida de uma pessoa., como

por exemplo: “Família é tudo na vida de uma pessoa”. “Família é muito importante” (sic). “É

muito difícil lidar com a solidão pela ausência da família” (sic). “Adoro quando meus irmãos

(dois) vêm para cá passar uns dias comigo” (sic).

Durante sua adolescência freqüentava o clube, tinha amigos, namoros passageiros e

afirma: “Hoje nem sei o que é isso. Na verdade, pode ser que eu não deixo os homens se

aproximarem de mim. Pelo menos, é isso que falam os meus colegas de trabalho quando

pergunto para eles por que os homens são assim, esquisitos” (sic). Paciente disse que até hoje

não se acostumou com o jeito diferente das pessoas aqui, em Santos. “Aqui é muito difícil

fazer novas amizades. As pessoas são muito diferentes. Santos é bom porque aqui tudo é

muito informal. Você vê, eu jamais poderia ter saído na rua, à noite, na minha cidade, com

esta roupa. Tênis, cabelo assim, desse jeito. Teria que sair de salto, arrumadinha. Então, isso

eu gosto aqui, essa informalidade. Você sai na rua, e você é só mais um número, ninguém

nem ‘tá’ aí com você. Você vem e vai para onde quer, na hora que quer. Isso é bom. Se fosse

lá, eu ia sair na rua e todo mundo ia falar que eu sou a ‘fulana’, aquela, que ainda não

casou” (sic). Disse que está solteira, pois ainda não encontrou um ‘sapo’ para casar.

A paciente refere ter muito medo de ser traída pelas pessoas. Gostaria muito de ter

uma família (sic). Quando a gente é jovem, a gente acredita em tudo, em todos. Depois que a

gente fica mais velha, passa a não acreditar mais nas pessoas. Já me decepcionei muito com

namorado, com família. Tenho muito medo de sofrer” (sic). “As pessoas enganam” (sic). “A

solidão é muito triste” (sic).

“Já namorei alguns rapazes na minha cidade, mas nenhum era para casar. Só

queriam namorar, não queriam nada sério. Vai ver, eu também não queria, você não acha?”.

“O que eu acho engraçado nisso tudo, é que os mais jovens me cobram casamento e os mais

velhos, assim, depois dos 40, me dizem que eu estou certa, que é isso mesmo que eu tenho que

fazer. Primeiro, eles perguntam sobre namorado. Quando eu digo que não estou namorando,

eles falam que é a melhor coisa, pois minha liberdade fica preservada, eu posso fazer o que

quero, na hora que quero e não preciso dar satisfações para ninguém. Engraçado isso, não

é? Até hoje eu não entendi porque as pessoas mais velhas falam isso” (sic). Esse fragmento

do discurso foi repetido três vezes em momentos diferentes.

Joana considera-se uma pessoa “quadrada” (sic). “Você vê, tem um colega meu que

ficou dando em cima de mim durante uns dois meses. Ele entrava na sala, dava um jeito de

conversar comigo, às vezes fazia hora para sair no mesmo horário que eu, essas coisas

assim. Mas como ele não falava nada, eu também ficava na minha. E olha, que ele até que me

empolgava. Até estranhei, pois faz tempo que nenhum homem me chamava a atenção. Aí, um

dia, ele me convidou para jantar. Fomos, foi muito gostoso. No final de semana ele ligou

novamente e saímos outra vez. Depois disso, ele não ligou mais. Ah, eu é que não ia ligar

para ele, não é? Não aconteceu nada entre a gente, foi só bate-papo. Será que ele queria

alguma coisa mais? Mas ele tinha que saber que não é assim, não é? Será que hoje em dia

as coisas são assim, tão rápidas? Será que ele é mais um daqueles que não quer saber de

nada, só quer transar? Bom, eu sei é que eu não liguei para ele. Agora eu fico super sem-

graça quando ele vai na minha sala. Mas eu acho que se ele quisesse mesmo alguma coisa

comigo, ele insistiria. Afinal é o homem que deve tomar as iniciativas. Bom, pelo menos, é o

que eu acho. O pior, é que eu gostei dele. Aí, para tirar ele da minha cabeça, eu fico

pensando que ele pode ser casado, ou que pode ter alguma namorada, sei lá, qualquer coisa

assim. Mas é muito estranho. Quando eu perguntei para os meus colegas homens, que

trabalham lá na repartição comigo, eles disseram que eu sou muito rígida, que vai ver que eu

não dei abertura para o cara. Mas vou dar abertura como? Nós só estávamos nos

conhecendo. Eu sei que as coisas hoje em dia são diferentes, que a mulher também tem que

tomar a frente, às vezes. Acontece, que assim no começo, pôxa, acho que o homem é que deve

conquistar a mulher” (sic). “Meu relacionamento com o sexo oposto não é e nunca foi fácil”

(sic).

Quanto ao trabalho, Joana disse passar por problemas de relacionamento. Relatou uma

situação em que uma funcionária que está trabalhando há apenas 11 meses já está com

possibilidades de ser promovida e ela, que já trabalha há 9 anos, está há um “tempão sem

qualquer promoção. As minhas colegas dizem que é porque eu não luto pelo que quero, que

não vou atrás. Mas ir atrás, como? Eu não gosto que passem por cima de mim e também não

quero fazer isso com os outros. Acho isso anti-ético. Mas já vi que é assim que as pessoas

fazem. Não sei se vou conseguir. E estou muito mal com tudo isso” (sic). “Eu deixo as

pessoas passarem por cima de mim e não sei como reagir, o que fazer. Fico muito mal.

Gostaria de ser menos sensível” (sic).

Atividades sócio-culturais

Joana disse que não costuma aceitar convite das colegas para ir à casa delas para jogar,

bater uma papo, às vezes, até para a comemoração de algum aniversário. “Se eu não me dou

bem com elas, não adianta eu ir, não é? Dou uma desculpa e acabo não indo” (sic). “Eu acho

as pessoas aqui muito diferentes, não sei bem explicar porque” (sic).

Para “espantar a solidão” (sic), a paciente costuma andar na praia, ver TV, ler algum

livro e, às vezes, afirma que: “Vou em busca de palavras bonitas. Então, vou na igreja

budista, na seicho-no-ie, na católica, qualquer uma. E quando nada disso resolve, eu choro”

(sic).

Ao final da entrevista disse: “Eu quase não vinha. Saí de lá da universidade e fiquei

pensando: o que vou falar com ela? Mas aí, eu me lembrei que tinha dado minha palavra e

aí, não tinha mais jeito. Eu acho muito feio não cumprir a palavra dada. Eu cheguei 15

minutos atrasada porque parei ali no Super-centro para tomar um suco com a minha colega.

Mas agora, eu vejo que valeu ter vindo. Foi muito gostoso conversar com você. Eu nunca

tinha conversado com uma psicóloga antes. É bom, não é? Vai ver que é isso que eu estou

precisando” (sic). Ofereceu-se para novas entrevistas, caso fossem necessárias.

Observações

O contato para o agendamento da entrevista foi feito pessoalmente, após um dos

atendimentos odontológicos. A paciente mostrou-se bastante preocupada com o que seria

perguntado. Após as explicações sobre o objetivo da pesquisa, perguntou sobre detalhes:

“quem mais vai participar? Quem vai estar na sala? Você vai anotar o que eu vou falar?”

(sic). Colocou alguns empecilhos como: “olha, posso chegar atrasada; acho que no horário

que eu posso, você vai estar cansada” (sic). Finalmente, concordou em participar da

pesquisa.

Antes de começarmos a entrevista, buscou certificar-se sobre o objetivo do estudo: “é

um trabalho de mestrado seu, não é?” (sic). Novamente perguntou se haveria a participação

de outras pessoas.

Durante a entrevista, quando falava da relação com a mãe e da falta que sente da

família, por várias vezes ficou com os olhos marejados. Durante quase toda a entrevista ficou

manuseando a alça da bolsa ou esfregava as mãos. Por vezes sorria, mas era um sorriso

‘angustiado’ (especialmente quando falava de sua dificuldade de relacionamento). Em alguns

desses momentos, a paciente abaixou a cabeça ou falava olhando para o teto.

Quando a entrevista foi dada por encerrada, a paciente disse que “admiro muito, gente

como você, que consegue trabalhar e estudar. Eu gostaria de ser assim. Vê? Estou levando a

vida por levar” (sic).

Relações Objetais à Base de Identificações Projetivas

As relações objetais de Joana baseiam-se fundamentalmente em identificações

projetivas. Ela projeta seus conteúdos internos, que acredita estarem danificados, na cidade

onde mora atualmente, na mãe, no pai, na atividade laboral e no ambiente de trabalho, nas

pessoas em geral, no passado. Assim, os outros são responsabilizados por seus insucessos e

frustrações. Esse mecanismo defensivo pode ser observado nos trechos que se seguem da

entrevista. “Parece que os caras não querem nada sério, hoje em dia” (sic). Provavelmente, é

Joana que tem dificuldades de estabelecer vínculos afetivos com homens, mas projeta a

impossibilidade nos “caras” (sic). Devido a um Complexo de Édipo precoce, Joana nutre

desejo de ter o pai e por isso, não consegue namorar ou fazer novos vínculos. Joana utiliza-se

do mecanismo de formação reativa para negar seu desejo e projeta no outro. Outras

identificações projetivas podem ser verificadas nos discurso da paciente: “Eu não queria vir,

mas o lado profissional falou mais alto. Eu sabia que eu tinha que me manter, não podia

contar com ninguém” (sic). E depois, minha relação com minha família sempre foi muito

complicada. Aí, o lado profissional falou mais alto e eu fiquei. Mas não estou satisfeita com o

que faço. Agora então, que estão tentando me passar a perna no trabalho, está muito

difícil”(sic). “Se ele (pai) não tivesse concordado com as coisas que ela (mãe) fazia, quem

sabe, eu não tivesse que ter saído de casa” (sic). Através dessa fala, Joana fantasia que tudo

seria diferente se o pai intercedesse a favor dela. Como ele não o fez, ela ficou com raiva dele

e passa a ter inveja da mãe, tão horrorosa, pois sente que ela apoderou-se de seu objeto de

amor. “Aqui é muito difícil fazer novas amizades. As pessoas são muito diferentes” (sic). Já

me decepcionei muito com namorado, com família” (sic). “As pessoas enganam” (sic). “A

solidão é muito triste” (sic). “Tenho medo de sofrer” (sic). Sente que as pessoas não são

confiáveis, podem trair. Na verdade, Joana sente que foi traída pelo pai por ter ficado com a

mãe. Ainda observamos a identificação projetiva quando comenta que está trabalhando há 9

anos e nunca obteve qualquer promoção. No entanto, uma funcionária, com apenas 11 meses

de trabalho, está prestes a ser promovida. Sugere que a funcionária está “passando por cima”

(sic) dela. Quando diz que tem medo de sofrer, provavelmente está se referindo ao sofrimento

de abandono do pai.

Joana responsabiliza os pais pelo seu afastamento de casa, e conseqüentemente, por ter

que lutar tanto pela vida, por não ter amigos, por sua insatisfação profissional, da solidão que

sente, enfim, por boa parte das coisas ruins que tem acontecido em sua vida, desde que saiu de

casa. Podemos observar uma insatisfação de Joana de precisar sair de sua cidade e de assumir

sua vida. Tomar decisões, fazer escolhas é conflitante. Parece que existe o desejo de ser

cuidada.

Joana e o Pai

Quanto ao pai, é sentido como uma pessoa mais cúmplice e amorosa, pois sempre

procurou apoiá-la em seus empreendimentos. Entretanto, sentiu-se rejeitada por ele, quando

ele a incentivou a sair de casa para acalmar as brigas entre mãe e filha. A expectativa de Joana

era que o pai a defendesse e mostrasse para a mãe que ela era a errada, e não a filha. Essa

atitude do pai despertou raiva contra ele, mas como Joana ama o pai, surge a ambivalência

afetiva. Por isso, a ansiedade em relação ao pai é depressiva, ou seja, a persecutoriedade é

aliviada pela ajuda e pela preocupação com o pai. Joana pode reconhecer os conteúdos bons e

maus do pai, ela o ama e o odeia. Para reparar, ou seja, para não machucar, para cuidar desse

objeto de desejo, é que provavelmente, a paciente relatou nunca ter contado ao pai sobre seus

sentimentos em relação a ele, por não ter intercedido a seu favor quando a mãe a atacava

física ou verbalmente.

As Defesas

A projeção dos conteúdos indesejáveis leva ao temor de retaliação por parte dos

objetos, ao que se defende através da idealização de que é amorosa, ética e cumpridora de sua

palavra. “Família é tudo na vida de uma pessoa”. “Família é muito importante” (sic). “É

muito difícil lidar com a solidão pela ausência da família” (sic). “Adoro quando meus irmãos

(dois) vêm para cá passar uns dias comigo” (sic). “Eu não gosto que passem por cima de mim

e também não quero fazer isso com os outros. Acho isso anti-ético” (sic). Aqui, Joana

demonstra que, inconscientemente, sabe que a anti-ética é ela, por desejar o pai. “Gostaria de

ser menos sensível” (sic). Parece que é muito importante mostrar-se correta em tudo. A

evitação e a negação parecem ser as defesas que usa para que as pessoas não vejam aquelas

idéias, sentimentos ou desejos que Joana acredita que não são corretos, mas que existem

dentro dela. Joana se apresenta ‘certinha’ para esconder de si mesma e dos outros, aquilo que

não quer conhecer a seu respeito. Esta é mais uma tentativa de negar ser desejo, então, tenta

ser certinha. Sendo assim, ela não corre riscos de que esse objeto mau internalizado se

exponha.

A negação também gera uma cisão dos objetos, resultando numa ambivalência afetiva.

Esta se apresenta através de um discurso contraditório: ao mesmo tempo em que diz gostar da

informalidade de Santos, de que “ninguém tá nem aí com você” (sic), queixa-se de solidão.

Expressa assim, sua ambivalência afetiva: amor e ódio pelo pai.

A sensação de que seus objetos internos são maus levam Joana à necessidade de

sofrer. Isso pode ser observado pela falta de percepção de seu próprio corpo (só aos 31 anos é

que percebeu que seus dentes estavam modificados). Além disso, acredita que alguns de seus

sintomas orgânicos podem estar associadas ao estado emocional (insônia desde criança, dores

de estômago cada vez mais freqüentes), mas não procura ajuda. Às vezes, sente até alívio por

não precisar olhar para si, já que os sintomas há muito não se manifestam (cistite) ou cedem

com um analgésico (dores-de-cabeça). Parece que Joana não quer se cuidar, nem física, nem

emocionalmente. Para se livrar do amor doentio pelo pai, ela precisa deprimir para que, então,

ocorra a elaboração mental, mas seria muito doloroso.

Além disso, sua impossibilidade de ser feliz também é observada quando se queixa de

solidão, mas não se aproxima das pessoas nem permite que os outros se aproximem dela (só

quer o pai). Acha que as pessoas são esquisitas. Provavelmente, Joana acredita que seus

conteúdos internos são ‘esquisitos’, dificultando-lhe o estabelecimento de vínculos afetivos.

Por isso, fica mais confortável projetar essa característica nos outros e atribuir suas

dificuldades de não ter relacionamentos espontâneos, de não viver novas experiências às

pessoas e às experiências do passado. Em especial, à característica ‘traiçoeira’ existente nas

pessoas. Sente-se constantemente injustiçada (novamente, a fantasia que foi traída e

injustiçada pelo pai por ter preferido a mãe). Joana relata ter sido injustiçada pelos pais, por

namorados, por pessoas e assim por diante. Provavelmente, existe alguma parte da Joana, na

qual ela própria não confia (pois pode traí-la) e que ela atribui às pessoas. Esse movimento

também pode ser percebido através das perguntas e de certa resistência inicial a participar da

pesquisa. “Quem mais vai participar? Quem vai estar na sala? Você vai anotar o que eu vou

falar?” (sic). Colocou alguns empecilhos como: “olha, posso chegar atrasada; acho que no

horário que eu posso, você vai estar cansada” (sic). No dia marcado para a entrevista chegou

a pensar em não comparecer. “Eu quase não vinha. Saí de lá da universidade e fiquei

pensando: o que vou falar com ela? Mas aí, eu me lembrei que tinha dado minha palavra e

aí, não tinha mais jeito. Eu acho muito feio não cumprir a palavra dada. Eu cheguei 15

minutos atrasada porque parei ali no Super-centro para tomar um suco com a minha colega”

(sic). Porém, antes da entrevista iniciada, refez as mesmas perguntas, como quem quisesse

confirmar que não seria, mais uma vez, traída. Joana parece rechaçar qualquer iniciativa que

representa saúde: não se cuida, tem medo da entrevista, quer saber muitos detalhes.

Possivelmente isso aconteceu, pois a entrevistadora é uma pessoa que representa saúde. É

como se tivesse medo de que pudesse trair-se, revelando seu desejo incestuoso.

O Masoquismo como Conveniência

Manter essa postura masoquista é bastante confortável e conveniente para manter a

posição de ‘vítima’ que Joana parece ter estabelecido para sua vida. É uma forma de manter

um controle sobre os desejos proibidos. Devem existir culpas inconscientes pelo sentimento

que nutre pela figura do pai e, por isso, Joana pune-se e procura a posição de vítima. Esta

posição vitimizada é sua reação frente às situações que envolvem afetos. Podemos verificar

essa dinâmica psíquica através de alguns fragmentos de seu discurso em relação a convites

que às vezes recebe de colegas para sair. “Se eu não me dou bem com elas, não adianta eu ir,

não é? Dou uma desculpa e acabo não indo” (sic). “Eu acho as pessoas aqui muito

diferentes, não sei bem explicar porque” (sic). Ou então, quando se desculpa por seu novo

relacionamento não ter progredido: “Mas eu acho que se ele quisesse mesmo alguma coisa

comigo, ele insistiria. Afinal é o homem que deve tomar as iniciativas. Bom, pelo menos, é o

que eu acho. O pior, é que eu gostei dele. Aí, para tirar ele da minha cabeça, eu fico

pensando que ele pode ser casado, ou que pode ter alguma namorada, sei lá, qualquer coisa

assim” (sic). Aqui, parece que a história repete-se, como se o amigo tivesse feito a mesma

coisa que o pai fez um dia. As desculpas são defesas maníacas que Joana utiliza para se

afastar de elaboração mental, do contato com sua realidade interna, o que provavelmente,

seria doloroso.

O medo da retaliação também faz com que Joana recorra a defesas obsessivas, ou seja,

de ações repetitivas de cunho mágico, mas sem qualquer elemento criativo real. Para

“espantar a solidão” (sic), às vezes, “...vou em busca de palavras bonitas. Então, vou na

igreja budista, na seicho-no-ie, na católica, qualquer uma. E quando nada disso resolve, eu

choro” (sic). Joana chora porque deprime. Ela sabe que as buscas na igreja não resultam em

nada, sabe que empreende de maneira errada. Durante a entrevista, várias vezes afirmava algo

e, em seguida, colocava uma pergunta, como se quisesse algum esclarecimento, alguma

resposta para suas supostas buscas. “Você não acha?” (sic). “..., não é?” (sic). Aqui, podemos

perceber como Joana tem medo do que pode encontrar no seu mundo interno, quem sabe,

querendo certificar-se de que eu não percebi nada do seu segredo. Joana fica andando de uma

religião para outra, “em busca de palavras bonitas” (sic). Ficando com as palavras bonitas,

Joana não precisa se deparar com as ‘palavras feias’ a seu respeito, que encontraria caso fosse

procurar uma ajuda real.

Joana aparenta interessar-se em saber o que acontece com ela, o que pode fazer para

que suas relações dêem certo e, por isso, perguntou para seus colegas o que aconteceu com o

rapaz com quem saiu, por exemplo. Entretanto, suas perguntas são apenas para aliviar a

angústia e para preservar a segurança do ego ‘fazendo de conta’ que cuida de si. Assim, ela

mantém afastados seus objetos indesejáveis e confirma para si que os outros é que são

responsáveis pelos seus fracassos. Provavelmente, nada do que os colegas digam poderá fazê-

la mudar de postura, pois parece que Joana já tem opiniões rígidas formadas sobre si e sobre

os outros. Por exemplo, “Sou quadrada” (sic). Ou então, “As pessoas são esquisitas” (sic). “O

homem é que deve conquistar uma mulher” (sic). “Meu relacionamento com o sexo oposto

não é e nunca foi fácil” (sic). No caso do rapaz com quem saiu, aparentemente serviu para

confirmar a ‘teoria’ de Joana que as pessoas são esquisitas, que não são confiáveis. É como se

fosse mais uma experiência do passado que se repetiu.

Com essas ‘frases feitas’, Joana evita de entrar em contato com seu mundo psíquico,

ou seja, ela evita buscar esclarecimentos reais sobre o que acontece com ela, por que

acontece, qual é e como assumir a responsabilidade sobre suas escolhas, bem como sobre sua

vida.

A emoção básica presente em Joana é a inveja que pode ser verificada quando ela diz

que a mãe é “... é uma alemã grosseira e rígida” (sic) ou “Meus pais brigavam muito. Eu

acho que não conseguiria ter um relacionamento assim. Não sei como ainda estão juntos,

depois de 50 anos” (sic). Sua impossibilidade de modificar seus conteúdos internos para que

também possa construir a família que diz que gostaria de ter, parece trazer uma sensação de

vazio. Joana inveja a mãe, portanto odeia-a, e pelo mecanismo de cisão, ama o pai. Essa

sensação, por sua vez, enfraquece Joana e a torna incapaz de suportar a ansiedade proveniente

dessa sensação de esvaziamento. Para eliminar a fonte da inveja surge o desejo de destruir, no

caso, a relação dos pais. Também, quando diz que as pessoas mais velhas dizem que ela está

certa em não se casar. “Quando eu digo que não estou namorando, eles falam que é a melhor

coisa, pois minha liberdade fica preservada, eu posso fazer o que quero, na hora que quero e

não preciso dar satisfações para ninguém. Engraçado isso, não é? Até hoje eu não entendi

porque as pessoas mais velhas falam isso” (sic). De fato, parece muito difícil para Joana

entender que ela não está livre, ao contrário, presa, acorrentada, imobilizada pelo desejo de ter

o pai. Seria muito doloroso. E, por isso, ela fica imobilizada para crescer, criar, produzir.

Análise geral do caso

Joana atribui às pessoas todas as suas insatisfações, insucessos na vida e características

pessoais que considera ruins. Sua auto-estima rebaixada devido a prováveis culpas

inconscientes, faz com que ela se imponha um sofrimento, que pode ser verificado através de

dificuldades de se observar como pessoa, quer física como emocionalmente, além de impedí-

la de formar vínculos. Além disso, sabota as possibilidades de modificar seu psiquismo e sua

vida em geral, mantendo sua posição de vítima que, parece ter sido a escolhida para aliviar

suas culpas e ansiedades. Teme os desafios da vida, além de ter dificuldades de adaptação a

situações novas. Embora alegue medo de ser traída, de sofrer, caso se envolva com pessoas,

esse afastamento dos outros, ou o impedimento que as pessoas aproximem-se dela são uma

estratégia confortável e conveniente para não entrar em contato com sua realidade interna (o

desejo pelo pai, conteúdo interno que considera muito mau). Assim, Joana mantém afastadas

dela própria aquelas idéias, sentimentos e desejos que, inconscientemente considera

reprováveis, mas que fazem parte do seu ‘eu’. A inveja também pode ser observada quando se

refere à mãe como se fosse uma pessoa desqualificada. Entretanto, foi com ela que o pai

compôs a figura parental combinada, de quem Joana tem tanta inveja.

Esse arsenal defensivo protege esta paciente para que ela não morra, não se aniquile.

Portanto, o adoecer é uma forma de perturbação homeostática, mas também uma maneira de

evitar a morte psíquica. De acordo com a postura bio-psico-social para a compreensão das

condutas do ser humano, saúde e doença são conseqüências da maneira como o indivíduo

consegue buscar seu equilíbrio, ou seja, como ele se adapta às exigências vitais, o que pode

acontecer através da saúde ou da doença, como escrevem D’Epinay (1983); Lipowski (1984);

Rosa (1990); Osório (1993); Rodrigues; Gasparini (1992); Eksterman (1992, 1996); Howard;

Lewis (1999); Mello filho (2002).

As defesas psíquicas utilizadas por Joana resultam em problemas somatoformes

(LOBATO, 1992), de caráter hipocondríaco, que segundo Rosa (1990), é através da

hipocondria que o indivíduo perturbado por ameaças internas tenta livrar-se de seu

sofrimento. Esse prazer masoquista permite que Joana alivie-se daqueles objetos maus que

acredita existirem dentro dela (o sofrimento é seu perdão), bem como favorece a manutenção

de seu comportamento de afastamento de si mesma e dos outros. De acordo com Klein (1946-

1963), Rivière (1958); Segal (1981); Soifer (1985); Ocampo (1995), as ansiedades esquizo-

paranóides continuam permeando seu relacionamento com os objetos e com o mundo.

Segundo Leme et. al., (1988); Arruda (1990); Rosa (1990); Osório (1993); Santos Filho

(1994); Mello Filho (2002), as queixas orgânicas de Joana têm o objetivo de comunicar as

angústias de sua relação com seu mundo interno e externo.

Especificamente quanto à queixa periodontal, Wolf (2002), observa que as doenças da

região oral não indicam apenas problemas de saúde física, mas também de postura do ser

humano frente ao mundo. Como no caso da paciente Maria, Joana também pode ter seus

sintomas periodontais explicados através da literatura específica. Como por exemplo,

insatisfação e stress em ambiente profissional foram descritos por Marcenes; Sheiham (1992;

Lindey; Mullally; Freeman (1996); Croucher et. al. (1997). Também a influência de fatores

psicossociais como forte influência para o desenvolvimento de doenças periodontais pode ser

encontrado nos estudos de Marcenes; Sheiham (1992); Shortes et. al. (1992); Todescan

(1993); Silva; Newman; Oakley (1995); Breivik et. al. (1996); Lindey; Mullally; Freeman

(1996); Croucher et. al. (1997); Lindhe; Karring (1999); Sallum et. al. (1999); Lamey;

Linden; Freeman (2000); Deinzer et. al. (2001); American Academy of Periodontology [a]

(2001); Kennedy; Schwab; Hide (2001); Hugoson; Ljungquist; Breivik (2002); Vettore et. al.

(2003).

Caso 3 – Cristina e a Inveja

Identificação da paciente

Cristina tem 38 anos, negra, nascida em outro Estado, não completou o ensino

fundamental e trabalha como faxineira. É casada e tem 5 filhos do gênero masculino: 17

(adotado), 16, 15, 13 e 11 anos, respectivamente.

Diagnóstico periodontal: periodontite crônica generalizada leve a severa.

Histórico da queixa

A paciente atribui seus problemas dentais “...porque tive uma gravidez atrás da outra.

Os dentes ficam fracos, pelo menos é o que eu já ouvi falar” (sic). “Eu, por mim, arrancava

todos os dentes e mandava colocar uma dentadura. O tratamento dói muito. Mas aqui, eles

dizem que vão cuidar dos meus dentes até eles agüentarem. Eles acham que a gente tem que

cuidar dos dentes” (sic). Disse que cuida dos dentes, que escova como “eles mandam” (sic).

Pouco depois, entretanto, comentou que “A gengiva dói muito e sangra quando vai escovar e

às vezes, nem consigo de tanta dor. Por isso que eu acho que a dentadura resolvia tudo e

pronto” (sic). Relatou ter feito tratamento em sua cidade, mas não adiantou nada.

História médica

Teve anemia, pela primeira vez, quando criança. Depois disso, já teve várias vezes

(não lembra quantas), inclusive, “na semana que vem vou fazer novo exame de sangue por

que acabei de fazer tratamento essa semana” (sic). Atribuiu a anemia recorrente à “...falta de

comida boa para comer, quando eu era criança. Não tinha verdura, legumes, essas coisas.

Hoje tem, mas não é sempre” (sic).

Referiu-se às dores de cabeça, tonturas e zumbidos no ouvido, dizendo: “...mas na

semana que vem, vou buscar meus exames no neurologista e aí, ele vai dizer o que eu tenho”

(sic). Fez esses exames, pois levou um dos filhos ao neurologista para “...ver porque ele tem

muita dor de cabeça. Aí, eu aproveitei para falar da minha dor e o médico passou os exames

para mim também” (sic).

A paciente queixou-se de TPM (tensão pré-menstrual). Disse que sempre se sentiu

muito mal antes das menstruações e não sabia porque. Recentemente, lendo um artigo numa

revista, sobre o assunto, viu que “tudo o que eu sentia estava escrito ali. Aí, eu entendi o que

era. Até falei para os meus filhos, para os mais velhos, é claro, que era para eles não serem

igual o pai deles quando eles casarem. Que era para eles entenderem a mulher deles porque

a gente fica muito nervosa e precisa de atenção quando está na TPM” (sic).

O primeiro filho mais velho é adotivo, pois é um sobrinho do marido, “filho da irmã

dele que morreu” (sic). O segundo filho nasceu porque a camisinha estourou (sic). Começou a

tomar pílula, “...mas tive que para porque ficava muito nervosa” (sic). Por isso, teve a terceira

gravidez. O quarto filho nasceu porque “...a tabelinha falhou” (sic) e o quinto, porque “...a

pomada falhou” (sic). Agora, está usando o DIU (dispositivo intra-uterino).

Queixou-se de dor no pulso direito. “Não é todo movimento que atrapalha, mas tem

umas coisas que são difíceis de fazer porque dói” (sic).

A paciente considera-se uma pessoa estressada.

Quanto à vida sexual, a paciente disse que faz coisas que não gostaria de fazer, mas

faz para agradar o marido. “Eu não tenho vontade de sexo, não sinto falta nenhuma. Se ele me

toca, eu logo fico com vontade, mas eu sei que ele gostaria que eu tomasse iniciativa. Mas

não dá, ele é muito grosso, eu não tenho vontade. Mas se ele me toca, eu fico com vontade”

(sic).

Atividades laborais e/ou produtividade

Sempre trabalhou como faxineira. Em sua cidade, de onde veio há 9 anos, “tinha mais

casas. Aqui, agora, só estou com uma. Mas eu trabalho muito em casa. Só que eu sou muito

desorganizada. Não sei o que acontece: eu vou para o quarto, daí vou para a cozinha

adiantar o almoço, e nem terminei de arrumar o quarto. Aí, eu volto para o quarto. Depois

vou pendurar a roupa e sei lá, parece que eu nunca termino nada. Vai ver que eu sou muito

lerda. Quando chega o fim do dia, eu nunca consegui terminar o que tinha para fazer. O pior

é que meu marido reclama muito” (sic).

A paciente está fazendo curso de manicure porque “é de graça. Eu queria mesmo, era

fazer o curso de podóloga porque eu acho que ganha mais, mas é pago e precisa ter a 8ª série

completa. Eu ia fazer ao supletivo, mas acabei desistindo. Não sei se minha cabeça dá. Acho

que não vou aprender nada” (sic). Repetiu várias vezes que gostaria de fazer o curso, mas que

a cabeça não ajuda.

Relações afetivas

A mãe separou-se do pai quando a paciente tinha 8 anos porque ele bebia muito. A

paciente sempre teve muita raiva do pai (sic), “...mas como eu aceitei Deus como meu

Salvador, eu procurei meu pai há uns anos atrás, quando ele ficou com leucemia, e perdoei

ele. Ainda bem, porque logo depois, ele morreu. Já pensou, eu ficar com essa culpa? Ele

bebia e batia muito na minha mãe. Eu não gostava de ver isso. Mas depois, eu entendi que a

gente tem que perdoar os erros dos outros. Ele já estava pagando com a doença dele. Já

pensou ficar com essa doença que ele teve e não ter o perdão dos filhos?” (sic).

A paciente veio com a família para Praia Grande há 9 anos, depois que o marido

brigou com o pai e não queria mais ficar perto dele. Como a irmã da paciente já morava na

Praia Grande, “resolvemos ir para lá e tentar a vida. E foi muito bom. Lá, na minha cidade, a

gente morava num lugar muito ruim, que o banheiro era uma fossa. Aqui não, as coisas

melhoraram muito para nós. Meu marido logo arranjou emprego e a gente mora numa

casinha modesta, mas nem se compara com a que a gente tinha lá” (sic).

Quando o filho mais velho tinha 6 anos, uma cunhada “fez o favor de deixar escapar

para o moleque que ele era adotado e aí, ele cismou que queria saber quem era o pai e

queria ir morar com ele. Eu não queria que ele fosse. Eu criei ele desde que ele nasceu. A

mãe dele morreu de parto. Ele era como meu filho. Como que uma mãe deixa um filho ir

embora de casa? Mas não teve jeito, ele foi. Quando ele tinha 10 anos, quis voltar e até hoje,

mora com a gente. Mas ele veio tão diferente. Ele dá muito trabalho. Vive querendo bater no

caçula. Eu dou muito conselho, explico que não é assim, mas parece que não adianta nada.

Estou percebendo uma coisa: caráter não se muda. Ele é diferente, não sei. Eu sou muito

preocupada com meus filhos. Quero que estudem para ter uma vida melhor. Eu queria que

eles estudassem inglês. Hoje em dia, é importante. Se eu pudesse, eu estudaria inglês. Mas

não dá, não” (sic).

Refere-se ao marido como uma pessoa muito exigente. “Ele não ajuda, mas reclama

de tudo. Fala alto, está sempre gritando. Eu tinha muito medo dele, mas como aceitei Deus

como meu Salvador (repete esse ‘chavão’ freqüentemente), eu oro muito por ele” (sic). Disse

que marido trabalha à noite como vigia em um prédio e estuda à tarde. “Às vezes, eu peço

para Ele (Deus) para só ver o lado bom do meu marido, mas é difícil. Até que ele já melhorou

perto do que era. Os filhos têm medo dele e não respeito. Eu já falei isso para ele um monte

de vezes” (sic). Relatou situações em que marido reclamou que ela lava roupa e molha tudo

em volta e que ele alega que ela na cuida da casa nem da roupa direito. “Antes, eu não

respondia para não criar encrenca em casa. De um tempo para cá comecei a responder

porque não agüento ele berrando o tempo todo comigo. Só que acho que não dá certo, não.

Ele berra mais ainda. Bom, na verdade, acho que tenho que entender. Na Bíblia está escrito

que a gente tem que perdoar 49 vezes por dia. Então, o negócio é deixar pra lá. Mesmo não

tendo vontade, oro por ele. O pastor falou que quando uma mulher fala, entra por aqui e sai

por al,i no homem (fez os gestos como entrando por um ouvido e saindo pelo outro)”. “Na

mulher, não. Se o homem fala, entra por aqui (apontou o ouvido) e vai para o coração. Por

isso, o homem esquece logo e a mulher fica magoada e, às vezes, no fim do dia, ela ainda está

com isso na cabeça. Mesmo assim, eu faço tudo para agradar ele” (sic). Ao referir-se ao

relacionamento sexual, contou não ter vontade de tomar iniciativas sexuais, embora sinta

prazer quando o marido a toca. “Acho que preciso consultar uma psicóloga. Aliás, eu gostaria

de fazer psicologia, mas é muito tempo, não dá” (sic).

A paciente casou-se porque estava grávida. Afirma que, quando noivos, “ele era muito

carinhoso e eles saíam muito” (sic). Depois que casaram, marido “vivia no bar e na casa do

irmão, jogando. Não queria saber se eu estava grávida ou não. Ele ficava bravo comigo toda

vez que eu engravidava. A culpa era sempre minha. Até parece...” (sic). Contou que no dia

anterior, quando estava discutindo com o marido, o filho de 11 anos, mandou-a calar a boca.

A paciente brigou com ele. “Agora é você e seu pai contra mim?” (sic).

Paciente disse que já pensou, várias vezes, em separar-se. Mas todas as vezes que

tentou falar com o marido sobre o assunto, ele ficou muito nervoso e não quis conversar nada.

Disse que os filhos também ficaram muito nervosos, agitados todas as vezes que tentou falar

sobre o assunto em casa. “Mas sabe, eu fico pensando que o problema da separação é de

moral, de filhos sem pai. Já pensou os meninos sem um pai?” (sic). “Eu não tenho medo

nenhum de como eu ia fazer para sustentar meus filhos se eu separasse. Eu ia no fim da feira

e catava um monte de verduras e frutas, ia na padaria pedia pão velho e assim, eu ia dando

um jeito. Não ia ter problema nenhum” (sic).

Cristina referiu-se a uma irmã alcoólatra e que foi mandada pela família para a Praia

Grande para ver se as duas irmãs que moram aqui poderiam “dar um jeito nessa irmã doente.

Eu e minha irmã tentamos de tudo: conselhos, tratamentos, internação. Acontece, que parece

que a minha irmã não quer se tratar, não quer que ninguém ajude ela. Ela não faz nada para

sair do vício. E ainda xinga quem quer ajudar. Foi por isso, que a família mandou ela para

cá. A minha irmã daqui cansou e disse que não ia mais ajudar, que se ela não quer se ajudar,

ela ia desistir, pois tinha muitas outras pessoas para cuidar. E nunca mais minha irmã foi na

casa dela. Eu não tenho coragem de fazer isso, não tenho coragem de abandonar minha

irmã. Eu vou visitar ela toda semana. Vou escondida do meu marido porque ele não quer que

eu vá. Eu fico muito chateada de ver como ela fica. Me parte o coração. Mas não adianta, ela

não aceita nenhum tipo de ajuda. Eu sempre oro por ela, mas ela também tem que ajudar...”

(sic).

Cristina tem um irmão que, segundo ela, é “meio ruim da cabeça. Acho que ele é

deficiente. Deve ter sido por causa de um chute que meu pai deu na barriga da minha mãe,

quando ela estava grávida dele” (sic). Esse irmão mora em Belo Horizonte.

Atividades sócio-culturais

A paciente relatou que, até mais ou menos um ano atrás, ela, o marido e as crianças

saíam muito para passear nos domingo. “Agora, nem sei o que é isso. Acho que a gente devia

voltar a sair. Faz bem a família sair junta para passear” (sic).

Marido não gosta que a paciente saia nem que tenha amigos. “Ele não gosta que eu

converse com ninguém”. “Eu tenho uma vizinha que tem uma patroa muito má e não deixa

ela levar a filha dela no médico, quando ela fica doente. Um dia, a menina estava com febre e

tinha que levar no posto e ela perguntou se eu podia levar. Eu disse que sim e levei. Meu

marido ficou muito bravo e disse que não queria mais que eu fizesse isso. Eu falo para ele

que não é assim, que um dia, a gente pode precisar da ajuda da vizinha, que não custa

ajudar, principalmente, porque era a criança que precisava de ajuda. Mas não adianta nada.

Ele só fica berrando. Essa minha vizinha vive falando que eu sou a irmã que ela nunca teve.

Se depender dele, eu não saio de casa para nada, só falo com ele e com os filhos” (sic).

Este ano, nas férias de julho, foi visitar a família na cidade onde nasceu. É a primeira

vez que fez a viagem, desde que mudou para a Baixa Santista. Levou os quatro filhos mais

novos. Eles brincaram muito, mas queriam voltar para casa. Disse que foi muito bom ter

reencontrado a família e que não sabe quando poderá ir novamente.

Observações

O primeiro contato com a entrevistadora foi por telefone. Depois de explicado o

objetivo do estudo, a paciente de imediato aceitou participar do estudo. A única pergunta que

fez foi sobre como iríamos nos encontrar. Depois de combinado o local (recepção da clínica-

escola), repetiu a hora e o local do encontro.

Durante a entrevista, manteve contato de olhar permanentemente comigo. A expressão

facial e seu tom de voz variaram entre sérios (quando falou dos pais e irmãos) insatisfeitos

(quando falou da preocupação com os filhos, da vizinha e dos cursos que gostaria de fazer) e

com raiva (toda vez que se referiu a situações que envolviam o marido). Falou de seu estado

físico (bucal, inclusive), com pesar.

A Projeção

A relação de Cristina com o mundo acontece através de identificações projetivas. Ela

projeta, por exemplo, sua anemia recorrente à falta de alimentos saudáveis na infância. Esse

fragmento do discurso da paciente revela que ela não foi ‘alimentada’ de carinho pelos pais,

que são, inconscientemente, pais objetos maus. Culpa o marido por ser stressada, o que pode

ser observado em partes de seu discurso: “(marido) é muito exigente. Ele não ajuda, mas

reclama de tudo. Fala alto, está sempre gritando” (sic). Também projeta e se identifica com a

irmã alcoólatra, sua própria falta de auto-cuidados e auto-preservação. “Parece que a minha

irmã não quer se tratar, não quer que ninguém ajude ela”. Parece que a paciente também não

faz questão de ser cuidada. Cristina gostaria de arrancar todos os dentes e colocaria dentadura,

mas “...aqui (clínica-escola) eles dizem que vão cuidar dos meus dentes até eles agüentarem.

Eles acham que a gente tem que cuidar dos dentes” (sic). Cristina também teve filhos

seguidamente e projeta sua falta de cuidados aos métodos contraceptivos, pois eles falharam.

Cristina ainda projeta na mesma irmã, sua auto-piedade, seu vazio e sua pobreza mental. “Eu

fico muito chateada de ver ela assim” (sic). Sua incapacidade de cuidar-se também é

projetada no marido quando diz que ele não gosta que ela fale com a vizinha, nem que a

ajude, por exemplo, levando a filha ao médico, quando a vizinha estava no trabalho. Durante a

entrevista, percebemos que quando se referia à saúde, o tom de voz de Cristina era pesaroso,

com auto-compaixão.

A paciente também se desculpa por não estudar: “Não sei se minha cabeça dá. Acho

que não vou aprender nada” (sic). A condição financeira também é responsabilizada por não

fazer o curso de podóloga, que afirma ser de seu interesse. O curso é pago e é necessário ter o

primeiro grau completo. Disse que ia fazer o supletivo, mas desistiu. Nessas falas, Cristina

demonstra sua pobreza interna, não consegue crescer. Se começa algo, não completa. Relatou

que um dia um dos filhos mandou-a calar a boca. A ansiedade persecutória fez com que

respondesse: “Agora é você e seu pai contra mim?” (sic). Parece que a figura masculina é

sentida como muito persecutória. O pai era mau, o marido também é, e são igualmente os

filhos. Embora afirme que perdoou o pai, parece que não é verdade. Sente-se culpada pelos

verdadeiros sentimentos que tem em relação a ele, por isso projeta os objetos maus.

Entretanto, ao projetá-los, os conteúdos bons vão junto e Joana não consegue conservar o que

é bom, amoroso,criativo, bondoso. Aqui, temos uma equação: os homens são maus e ela só

gerou homens, logo, só gerou objetos maus, fantasia que resultou num superego persecutório.

Essas projeções ocorrem porque Cristina sente que seus conteúdos internos são maus e

destrutivos, o que faz com que sinta necessidade de afastar-se deles. Ao projetar esse lado

doentio nos outros, que sente como persecutórios, surge o medo da retaliação, da qual se

defende através da idealização do seu self e da reparação maníaca e onipotente. A idealização

permite que Cristina afaste-se de seus conteúdos indesejados e embora tente uma reparação

para minimizar a ansiedade, através de soluções mágicas, não é bem sucedida.

Cristina e a Chantagem

Cristina se vê como uma mãe e mulher preocupada, boa, que ajuda, sem se importar

que isso implique em sacrifícios. Esses conteúdos aparecem quando ela comenta que não

queria que o sobrinho (filho mais velho) fosse morar com o pai: “Como que uma mãe deixa o

filho ir embora de casa? Mas não teve jeito... Mas ele veio diferente. Ele dá muito

trabalho...Eu dou muito conselho” (sic). Joana não consegue contê-lo, o filho tornou-se um

objeto mau. Provavelmente Joana não o adotou, de fato. Quando ele quis ir embora, ‘sentiu’

como que: “Vá lá e veja como é ruim. Assim, você voltará agradecido por eu ter criado

você”. Fantasia que cuida do filho e quer que ele mostre sua gratidão todos os dias. Outras

fantasias de Cristina: quando diz que gostaria que os filhos estudassem para ter uma vida

melhor. Ainda em relação aos filhos, ‘sacrifica-se’ por eles não se separando do marido,

conforme já pensou algumas vezes. Cristina relatou que tanto os filhos quanto o marido

ficaram muito nervosos todas as vezes que ela tentou falar sobre uma possível separação.

Comenta ainda: “Já pensou os meninos sem um pai?” (sic). Cristina relatou que também

orienta os filhos mais velhos a respeitarem a TPM das suas futuras esposas. Quanto ao

marido, disse fazer tudo para agradá-lo sexualmente, mesmo sem vontade, e que ora muito

por ele apesar dele ser “muito grosso” (sic), exigente, reclamar muito, falar muito alto e

despertar “medo e não respeito” (sic) nos filhos. Cristina contou também, muito feliz, que a

vizinha considera-a a irmã que não teve. Costuma ir às escondidas do marido, semanalmente,

visitar a irmã, pois não tem coragem de abandoná-la, como fez uma outra irmã. A paciente

também diz que entendeu através dos ensinamentos de Deus “que a gente tem que perdoar os

erros dos outros” (sic). É possível que, inconscientemente, Cristina precise se perdoar pelos

conteúdos terríveis que acredita povoarem sua mente. Entretanto, como já foi dito, ela projeta

tais conteúdos nos outros, então ela procura perdoar essas pessoas.

Tenta reparar..., mas não pode

A tentativa de reparação obsessiva onipotente para aplacar a angústia pelo medo de

destruir os objetos com seus sentimentos destrutivos pode ser observada no seu discurso sobre

sua fé. Cristina fez referências sobre a importância dos ensinamentos divinos para enfrentar as

dificuldades da vida. Citou comentário da Bíblia sobre o perdão, contou a explicação

(amplamente aceita por ela) que o pastor havia dado para explicar porque a mulher fica

magoada. Utilizou durante a entrevista, a expressão: “...como eu aceitei Deus como meu

Salvador...”(sic) para contar que os ensinamentos de Deus fizeram com que perdoasse o pai

por beber muito e por bater na mãe, para contar o quanto aceita o marido apesar dos defeitos

que ele tem. Cristina reza também pela irmã alcoólatra. Cristina necessita pedir a ‘Deus Pai,

Todo Poderoso’, para conter seu ódio. Parece que esse seu deus internalizado é um superego

vingador, a quem Joana deve reverências, satisfações. Essa atitude de rezar pelos outros tem

dupla finalidade: aplacar a ansiedade de que seus conteúdos maus podem destruir o outro e

também, para que Cristina possa manter afastados de si esses conteúdos destrutivos, o que lhe

dá a impressão de ser, de fato, muito boa, generosa, compreensiva. Entretanto, é uma

idealização, uma fantasia, pois essas ações de oração não possuem nenhum elemento criativo

real. Ou seja, apenas orar ou ler a Bíblia ou ser fiel aos ensinamentos do pastor não são

suficientes para que ocorra alguma mudança psíquica e, conseqüentemente, um crescimento

interno. Não há possibilidade de contato com a realidade, embora a fantasia seja de que a

bondade é imensurável.

Emoção Básica: a Inveja

A inveja também está presente no discurso de Cristina quando ela descreve o marido

apenas com qualidades como “grosso”, “muito exigente”, “reclama de tudo”, “está sempre

gritando” (sic). O desejo de encontrar um pai bondoso repete-se no casamento, pois

fantasiava que o encontraria. E parece que Joana encontrou um pai como era o dela: vai ao

bar, joga, não valoriza a gravidez. A desvalorização do marido é o mecanismo utilizado para

destruir as partes boas e construtivas dele. Ao retirar as qualidades valorosas do marido, não

há mais o que invejar, pois a paciente afastou-se dos sentimentos de valorização afetiva, ou

seja, da sua dependência do marido. Provavelmente, ela inveja a organização do marido, bem

como sua capacidade de realizar: ele trabalha de noite e estuda à tarde. Já Cristina referiu-se

como uma pessoa desorganizada, só tem um dia por semana ocupado com seu trabalho, acha

que não tem capacidade para aprender. Essa identificação projetiva maciça em relação ao

marido serve para protegê-la de sua própria raiva e sentimentos destrutivos. Provavelmente,

ela não suporta identificar em si mesma, a destrutividade com a qual vem direcionando sua

vida.

Uma característica importante do discurso da paciente foi encontrada no seu grande

distanciamento da realidade, através de discurso com características de voracidade e

onipotência. Diz que não tem medo nem teria problemas em sustentar os filhos caso separasse

do marido. “Eu não tenho medo nenhum de como eu ia fazer para sustentar meus filhos se eu

separasse. Eu ia no fim da feira e catava um monte de verduras e frutas, ia na padaria pedia

pão velho e assim, eu ia dando um jeito. Não ia ter problema nenhum” (sic). Ao se fantasiar

só, seus recursos são pobres, frágeis. Mesmo em fantasia não se vê capaz de produzir, criar,

reparar. Buscará restos na feira, como se fosse recolher os pedaços do splitting que antes fez.

Apesar das tentativas reparatórias, não consegue restaurar os pedaços numa peça só. A

paciente inveja a capacidade de quem se organiza, é amoroso e pode criar: quem produz:

marido, psicóloga. Cristina afirmou que “...acho que não vou aprender nada” (sic), referindo-

se às possíveis dificuldades de aprendizagem no curso supletivo, para poder matricular-se no

curso de podóloga, que poderia trazer-lhe um rendimento a mais, caso viesse a exercer a

profissão. No entanto, disse que gostaria de fazer inglês e psicologia. Esta última, alegou não

fazer por que “...é muito tempo, não dá” (sic). Convém lembrar que a paciente referiu

trabalhar apenas um dia na semana, atualmente. Parece que novamente pode-se observar

defesas maníacas contra a realidade interna que assusta. Ou seja, a dor do contato com sua

realidade interna é distanciada através dessas fantasias onipotentes de que conseguiria fazer

inglês e psicologia, se quisesse. Os impedimentos são sempre externos, circunstâncias da

vida.

A paciente relatou ainda que faz o curso de manicure porque é de graça. Também

referiu ter levado o filho ao neurologista e que “aproveitei para falar da minha dor ...” (sic).

No dia que tiver que se sustentar e/ou aos filhos, disse que vai pedir verduras e frutas na feira

e pão na padaria. Parece que esta acomodação associada à expectativa de que alguém possa

suprir suas necessidades denotam a pobreza do mundo mental da paciente.

Assim como as pacientes Maria e Joana, Cristina também utiliza um arsenal de

recursos defensivos para justificar sua conduta perante o mundo e distanciar-se da realidade

interna e externa. Assim, apesar de suas angústias serem amainadas, elas são expressas

através de um rol de queixas orgânicas, que por sua vez, servem como comunicação do seu

modo de existir no mundo. O equilíbrio de Cristina também é encontrado na doença e, como

no caso das outras duas pacientes, presumimos que sua doença periodontal pode representar

as ansiedades mal elaboradas ocorridas já nas primeiras relações objetais e que têm permeado

as relações se uma forma geral no decorrer de sua vida.

Análise Geral dos Casos

Pelo conteúdo apresentado por estas pacientes, Maria, Joana e Cristina, pudemos

observar alguns aspectos da dinâmica intra-psíquica que poderiam justificar suas

características de ‘poli-queixosas’, conforme critérios estabelecidos neste estudo. Ou seja,

além da peridontite, tal como descreve Genco (2002), uma infecção bacteriana considerada

frequente entre as doenças comuns e crônicas do ser humano, as pacientes referiram-se a

outras queixas que indicam outras reações sintomáticas e indicativos de outras doenças

associadas como: fibromialgia, nódulos na tireóide, hipertensão, bruxismo, cirurgia na

vesícula, vida sexual insatisfatória, cefaléia, insônia, ansiedade, dores toráxicas, anemia,

zumbido no ouvido, tonturas, TPM, stress, dor no pulso.

A história e a evolução da Psicossomática (PACHECO E SILVA, 1976; HAYNAL; PASINI,

1983; LIPOWSKI, 1984; SCHWAB, 1985; ARRUDA, 1990; SILVA; CALDEIRA, 1992; MELLO

FILHO, 2002), acrescidas à historiografia da Medicina Periodontal (MARCOS, 1994; FERRAZ,

2001), esclarecem porque esta última é considerada hoje, não apenas uma área de

conhecimento para tratamento, mas também como um campo de prevenção para saúde bucal e

geral (MAGALHÃES; GOMES, 1996).

A literatura é extensa quanto a esclarecimentos sobre a queda das defesas do sistema

imunológico favorecendo a instalação de doenças, bem como sobre a associação entre

manifestações sistêmicas e doença periodontal (AMERICAN ACADEMY OF PERIODONTOLOGY,

1996; BREIVIK et. al., 1996; KENNEDY; SCHWAB; HIDE, 1996; BRETZ; CHAVES, 1999;

PAPAPANOU; LINDHE, 1999; GENCO, 2002; SALLUM, 2002; GRISI, 2002; LORENZO; LORENZO,

2002; ALEKSEJUNIENE et. al., 2002; LAGERVALL; JANSSON; BERGSTRÖM, 2003; VETTORE et.

al., 2003).

Campos Jr. et. al., 1999; Kornman (2001); Sallum (2002); Rodrigues (2002); Cohen;

Slavskin (2002); Schenkein (2003), explicam que sem a presença do biofilme, não há doença

periodontal. Por outro lado Lang; Mombelli; Attström (1999); Kornman (2001); Sallum

(2002); Grisi (2002); Rodrigues (2002); Schenkein (2003), esclarecem que nem sempre a

presença de placa microbacteriana é sinônimo de periodontopatia. Embora a gengivite e a

periodontite sejam as duas doenças mais comuns que atingem o periodonto (CABRAL, 1998;

CAMPOS JR. et. al., 1999; MARIOTTI, 2003), a periodontite é uma enfermidade multifatorial

(KINANE; LINDHE, 1999; CAMPOS JR. et. al., 1999; SALLUM, 2002; GRISI, 2002; BIMSTEIN,

2003). Assim, a suscetibilidade individual deve-se a fatores herdados e adquiridos do

hospedeiro, além das influências ambientais (SALLUM et. al., 1999; KORNMAN, 2001;

RODRIGUES, 2002; GRISI, 2002; SCHENKEIN, 2003).

Do ponto de vista psicanalítico, essas características ‘poli-queixosas’ podem ser

explicadas de acordo com a qualidade de primeiras relações objetais experimentadas na mais

tenra infância e que parecem apresentar-se como um conteúdo recorrente (KLEIN, 1936, 1946-

1963; SHARPE, 1936; RIVIÈRE, 1958; BION, 1967; SEGAL, 1981, 1982). Também Soifer

(1985); Arruda (1990); Briganti (1999); Wolf (2002), entendem que as primeiras relações

objetais são conteúdos que se repetem ao longo da vida, polarizando-se como situações

conflituosas que se expressam por meio de recursos defensivos parcos, pobres, ante aos

objetos desejados – os quais tornam-se inatingíveis.

Diante do fato ou evento angustiante (que é um impasse entre os objetos desejados e o

medo da possível punição pela obtenção deste objeto de desejo), ocorre aquilo que também se

pode entender como crise. Segundo Capisano (1987), face à crise, o individuo poderá

caminhar para o crescimento, amadurecimento intra-psíquico, ou não. Na concepção de

Arruda (1990, 1994); Moreira, Melo Filho (1992), entendemos este quadro como uma

perturbação homeostática. Ante a tal situação, o sujeito empunhar-se-á de seus arranjos

defensivos, mais ou menos desenvolvidos para se proteger do sofrimento psíquico. Se estes

arranjos são primitivos, pobres, o individuo consegue seu equilíbrio na doença.

De acordo com Groddeck (1966); Arruda (1990, 1994); Rosa (1990); Perestrello

(1996); Eksterman (1996), toda doença é provocada, ou seja, não acontece por acaso. Como

esclarecem Leme et. al. (1988); Rosa (1990), a doença surge quando não há possibilidade de

elaboração psíquica, devido ao conteúdo doloroso da angústia originada nas situações

conflitantes. A impossibilidade de vivenciar essas angústias e os conflitos (CAPISANO, 1987;

ARRUDA, 1990; SANTOS FILHO, 1984), e expressá-los através de via verbal ou motora faz com

que o indivíduo utilize a linguagem dos órgãos para comunicar o que se passa com ele (ROSA,

1990; ARRUDA, 1990; OSÓRIO, 1993; SANTOS FILHO, 1994; BRIGANTI, 1999; MELLO FILHO,

2002). Para Soifer (1985); Osório (1993); Mello Filho (2002), certos órgãos, sistemas e partes

do corpo adquirem uma significação afetiva especial dependendo dos acontecimentos

marcantes que ocorrem durante as principais fases de desenvolvimento. Segundo os autores,

desta forma pode-se explicar como as primeiras relações psico-afetivas associam-se às

patologias orgânicas.

Numa linha congruente de pensamento sobre esta questão Totman (1982); Schwab

(1984), acreditam que eventos vitais, por si só, não causam deterioração orgânica, mas a não

adaptação do indivíduo a certas exigências, pelo significado que ele dá a elas é que pode

aumentar o risco da doença. Esse risco deve-se às modificações que ocorrem na resposta do

sistema imunológico (ARRUDA, 1990, RODRIGUES; GASPARINI, 1992). Howar;, Lewis (1999),

denominam tais enfermidades de ‘doenças de adaptação’. Rodrigues; Gasparini (1992),

esclarecem que a queda imunológica pode originar uma falha na irrigação sangüínea, o que

explicaria a ocorrência da doença periodontal. Além desses autores, também Arruda (1990);

Linden; Mallully; Freeman (1996), esclarecem que a queda das defesas orgânicas acontece

mediante a recorrência de emoções e sentimentos de desesperança, perda, ansiedade, e outros

equivalentes.

É nesta linha de raciocínio que compreendemos estes três casos de pacientes poli-

queixosas, já que apresentaram, conforme observamos na discussão de cada uma delas, as

queixas de doenças sempre relacionadas a eventos (internos ou externos) imbuídos de grande

carga de angústia. Maria apresenta fibromialgia, nódulos na tireóide, hipertensão, bruxismo,

cirurgia na vesícula e vida sexual insatisfatória. Tais sintomas são resultantes de desordens

afetivas, que a paciente expressa através das manifestações somáticas de natureza depressiva

com aspectos hipocondríacos. Suas relações objetais são predominantemente caracterizadas

pela posição esquizo-paranóide. Joana queixou-se de cefaléia, insônia, ansiedade e vida

sexual insatisfatória, sintomas hipocondríaca de seus conflitos. A paciente também tem um

estado mental predominantemente esquizo-paranóide. Cristina, ao queixar-se de anemia

recorrente, zumbidos nos ouvidos, tonturas, TPM, stress, dores no pulso, expressou suas

angústias hipocondríacas com algumas características histéricas. Assim como Maria e Joana,

Cristina também possui funcionamento mental permeado por ansiedade esquizo-paranóide,

além de utilizar-se também de defesas maníacas para aliviar seu sofrimento psíquico.

É assim que, considerando o conteúdo apresentado por Maria, Joana e Cristina,

encontramos o que Arruda (1990, 1994) considera uma perturbação da homeostase. Ao

observarmos suas sintomatologias (periodontite crônica) bem como as chamadas doenças

somatoformes (cefaléia, fibromialgia, dores nas juntas, dores de estômago), verificamos uma

associação destas com a própria dinâmica psíquica destas mulheres. Lobato (1992), define

distúrbios somatoformes como sintomas associados a conflitos psicológicos. Ainda,

compartilhando deste mesmo paradigma, pesquisadores como D’Epinay (1983); Lipowsky

(1984); Rosa (1990); Osório (1993); Rodrigues; Gasparini (1992); Eksterman (1992, 1996);

Perestrello (1996); Howard; Lewis (1999); Mello Filho (2002), acrescentam que tal equilíbrio

refere-se ao homem enquanto ser bio-psico-social, para o qual saúde e doença são resultados

de sua história de vida. Considerando-se como esses autores, que toda doença é

psicossomática, a homeostase psíquica pode ser recuperada ou não dependendo da

plasticidade individual frente às crises vitais (LEME et. al. 1988; ROSA,1990;

ARRUDA,1990; 1994).

Quanto à doença periodontal das pacientes, a literatura mostra que a boca e os dentes

são determinantes na formação do psiquismo do indivíduo, ou seja, a maneira de lidar

consigo, com os outros e com o mundo, inicia-se a partir da boca. Wolf (2002), observa que

as doenças da região oral não indicam apenas problemas de saúde física, mas também de

postura do ser humano frente ao mundo. Outros autores como Lorch (1986); Arruda (1990);

Toledo; Rocca (1996); Giglio (1983); Giglio; Guedes-Pinto; Duarte (1997); Marcchioni;

Galli; Gallo (1998); Corrêa; Ulson (2002); Corrêa; Machado (2002); Giordano et. al. (2000),

também enfatizam a importância da compreensão das primeiras relações infantis para que se

possa entender sua maneira de ser em relação ao mundo, e conseqüentemente, seu modo de

adoecer.

Embora Maria, Joana e Cristina não tenham precisado o início da doença periodontal,

parece que suas primeiras manifestações aconteceram na juventude. Lagervall; Jansson;

Bergström (2003), sugeriram que a doença periodontal pode estar associada à saúde geral

deficiente, o que nos permite entender, na linha de raciocínio dos pesquisadores do âmbito

psicossomático, que a saúde geral deficiente, também è uma forma de perturbação

homeostática.

A situação orgânica destas pacientes poli-queixosas está de acordo com a literatura

que demonstra como fatores psicossociais podem ser considerados fatores de risco para a

doença (TOTMAN, 1982; SCHWAB, 1984; LIPOWSKI, 1990; ARRUDA, 1990; ROSA, 1990;

RODRIGUES; GASPARINI, 1992; OSÓRIO, 1993; HOWARD; LEWIS, 1999, MELLO FILHO, 2002),

e conseqüentemente, para a doença periodontal (MARCENES; SHEIHAM, 1992; SHORTES et. al.,

1992; TODESCAN, 1993; SILVA; NEWMAN; OAKLEY, 1995; BREIVIK et. al., 1996; LINDEY;

MULLALLY; FREEMAN, 1996; CROUCHER et. al., 1997; LINDHE; KARRING, 1999; SALLUM et.

al., 1999; LAMEY; LINDEN; FREEMAN, 2000; DEINZER et. al., 2001; AMERICAN ACADEMY OF

PERIODONTOLOGY [a] 2001; KENNEDY; SCHWAB; HIDE, 2001; HUGOSON; LJUNGQUIST;

BREIVIK, 2002; VETTORE et. al., 2003).

A importância das crises que predispõe o indivíduo a uma diminuição dos seus

comportamentos de auto-cuidados e ao aumento de atitudes prejudiciais à saúde foram

descritos por Arruda (1990, 1994); Couto; Couto (1992); Silva; Newman; Oakley (1995);

Pompeu; Toledo; Sampaio (1997); Croucher et. al. (1997); Sallum et. al. (1999); Bretz;

Chaves (1999); Papapanou; Lindhe (1999); American Academy of Periodontology (1996,

1999, [a], [b] 2001); Aleksejuniene et. al. (2002); Hugoson; Lingquist; Breivik (2002); Genco

(2002); Daud (2003); Hujoel et. al. (2003). Embora esses autores tenham citado o tabagismo,

o alcoolismo e outros tipos de droga-adições, os resultados de nosso estudo sugerem que

Maria, Joana e Cristina manifestam comportamentos contrários à saúde pela falta de

percepção e interesse pelo próprio corpo. Maria relatou que teve que ter seus dentes

superiores extraídos, o que pode ser indicativo de descuido quanto à saúde oral. Joana só

percebeu que seus dentes estavam migrando, aos 31 anos de idade. Cristina optaria por uma

prótese total após a extração de todos os dentes, se os dentistas permitissem. Essa mesma

paciente engravidou seguidamente sob a alegação de que os contraceptivos falharam. Essa

falta de preservação, entendemos constituir-se de tais comportamentos prejudiciais à saúde.

Segundo Klein (1936); Sharpe (1936); Segal (1981, 1982), durante toda a vida o

indivíduo oscila entre a organização interna esquizo-paranóide e a depressiva. Os níveis de

oscilação devem-se às patologias individuais. Em relação à organização psíquica de Maria,

Joana e Cristina, observou-se que suas relações objetais ocorrem predominantemente através

da posição esquizo-paranóide. Tal organização egóica implica em ansiedades paranóides

provenientes da fantasia de possuírem objetos maus e destrutivos dentro de si. Esses

conteúdos internos maus são aterrorizadores, o que desperta a necessidade de mantê-los

afastados, pois o contato com eles seria muito doloroso e devastador. Por isso, as pacientes

utilizam-se de mecanismos defensivos mais primitivos como, idealização, cisão, identificação

projetiva e negação com grande freqüência. Sendo estes preponderantes, superam a utilização

de recursos mais evoluídos, típicos da posição depressiva.

Ao seguirmos o raciocínio destas mesmas autoras, verificamos, por exemplo, que a

idealização realiza-se através da cisão do objeto (objeto parcial). Assim, Maria, Joana e

Cristina idealizam-se como pessoas boas, solidárias, éticas - aquilo que gostariam de ser, mas

não conseguem. Essa idealização é mantida através das projeções das suas partes más no

outro, o que faz com que ele se torne totalmente mau, enquanto elas são detentoras de tudo o

que é bom (identificação projetiva). Assim, há a conseqüente negação de seus conteúdos

maus, já que estes objetos maus são sentidos como persecutórios, ou seja, podem esvaziá-las.

Neste sentido também podemos entender como Arruda (1994), que a doença é uma

reação do organismo às ameaças concretas (microorganismo) ou simbólicas. As queixas

orgânicas apresentadas por Maria, Joana e Cristina, além da doença periodontal, representam

simbolicamente, segundo Capisano (1987), o estilhaçamento de seus afetos, que não podem

ser vivenciados pela dor psíquica que causariam. A necessidade de se manterem afastadas da

dor psíquica é a maneira que as pacientes encontraram para manter sua homeostase. A

impossibilidade da elaboração mental origina o sintoma, forma simbólica de descarregar a

tensão, como entendem Leme et. al. (1988); Arruda (1990); Rosa (1990); Osório (1993);

Santos Filho (1994); Mello Filho (2002). Esta é a ‘linguagem dos órgãos’, segundo este

último autor.

Outro aspecto apresentado pelas pacientes é que a fantasia de serem incapazes, mas

por desejarem possuir objetos bons, desperta-lhes inveja. Por isso, para manter a idealização,

é necessário que espoliem as qualidades boas do objeto invejado para que ele se esvazie.

Esvaziado o objeto, ele não será mais fonte de inveja, além de manter a idealização de sua

bondade e a destrutividade torna-se parte de outrem e não delas.

Entretanto, ao espoliarem o objeto, surge a culpa de tê-lo destruído, o que desperta o

temor de uma retaliação por parte do objeto. Para se defenderem desse medo, Maria, Joana e

Cristina utilizam-se de defesas maníacas como: repressão, cisão, negação, idealização e

projeção. Segal (1981, 1982), explica que as defesas maníacas são tentativas de reparação

pelo ataque aos objetos e seu objetivo é proteger o ego da ansiedade depressiva, que levaria a

um contato com a realidade e conseqüente integração do ego num objeto total. Para nossas

pacientes, esse contato com a realidade é indesejado, pois causaria muita dor psíquica

‘descobrir’ que não são só boas, mas também possuem conteúdos maus (e muito maus). Por

isso, utilizam-se das defesas maníacas, o que as ajuda a manter a idealização de sua bondade,

fantasiando que podem criar, produzir, crescer. Na verdade, elas continuam mantendo o

controle sobre os objetos, sempre os responsabilizando pelas dores de suas vidas.

Segundo Klein (1936, 1946-1963), o impulso reparador é a fonte mais importante para

o desenvolvimento mental e da criatividade, o que pudemos observar ser bastante deficiente

em Maria, Joana e Cristina. Somente mediante a elaboração da ansiedade depressiva é que o

indivíduo pode integrar as partes boas e más do objeto e, conseqüentemente, desenvolver o

sentimento de realidade e adquirir confiança nos próprios objetos bons, no amor e na

criatividade. Sob tais condições, as projeções diminuem e os objetos internos passam a ter

uma existência mais independente.

Podemos supor que Maria, Joana e Cristina tiveram suas primeiras relações objetais

permeadas pela ansiedade persecutória, a qual não conseguiram elaborar e continuam

mantendo esse modelo de organização psíquica nas suas relações com o mundo e consigo

próprias. A história pessoal e as primeiras relações mãe/bebê, a dificuldade de rèverie da mãe,

podem impedir realizações na vida adulta, segundo Bion (1967). Para Rosa (1990), quando as

primeiras relações com a mãe são sentidas como insatisfatórias, elas poderão resultar em

reações mais somáticas do que psíquicas diante de situações de stress.

Outro aspecto a ser considerado no discurso das pacientes são suas insatisfações

sociais e profissionais.Totman (1982); Shortes et. al. (1992), entendem que pessoas que se

sentem integradas e valorizadas em seu meio e integrantes de um par são menos propensas a

doenças de uma forma geral. No caso das nossas pacientes, a afirmação dos autores pode

explicar, em parte, seus sintomas, visto que Maria, Joana e Cristina não se sentem integradas

nem socialmente, nem na relação a dois. Marcenes; Sheiham (1992); Croucher et. al. (1997),

observaram que as qualidades do casamento pode predispor o indivíduo à doença periodontal.

A questão laboral também parece estar contribuindo para o quadro poli-queixoso das

pacientes. Marcenes; Sheiham (1992); Lindey; Mullally; Freeman (1996); Croucher et. al.

(1997), ao pesquisarem pacientes com periodontite verificaram que seus sintomas estavam

associados ao desemprego, insatisfação profissional, grau de instrução e nível social baixo.

Sob esse aspecto, Maria demonstrou que trabalha, mas porque é ‘obrigada’ a ajudar no

orçamento doméstico. Joana enfrenta problemas de relacionamento em seu ambiente de

trabalho, além de não estar exercendo função compatível com sua formação. Quanto à

Cristina, queixou-se de não poder estudar, pois os cursos que deseja fazer são muito caros,

além de ter demonstrado desejo de ter seus dentes extraídos para a colocação de uma prótese

total. A explicação para esse discurso de Cristina pode ser dada através das observações de

Couto; Couto (1992); Pompeu; Toledo; Sampaio (1997); Chambrone; Chambrone (2001), de

que pessoas de grau de instrução mais baixo tendem a crenças sobre saúde bucal. Cristina

parece acreditar que uma prótese total seria melhor que cuidar dos dentes.

Embora entendamos que nossas três pacientes estão tentando comunicar suas

dificuldades internas, analisando-se cada uma das pacientes, pudemos observar algumas

características peculiares em cada uma delas.

As queixas de Maria foram: fibromialgia, nódulos na tireóide, hipertensão cirurgia da

vesícula, além de uma vida sexual insatisfatória. Assim, pareceu-nos que a paciente expressa

seus conflitos inconscientes através de manifestações somáticas de natureza depressiva, com

um ‘colorido’ hipocondríaco. Lipowski (1990), refere-se às desordens depressivas com

predominante queixa somática como a forma mais comum de desordem afetiva. O autor

entende que a fibromialgia é uma manifestação depressiva e não uma somatização. Lagervall;

Jansson; Bergström (2003), verificaram que doenças reumáticas estão associadas à doença

periodontal. Lobato (1992), acrescenta ainda que dor crônica é diretamente associada à

depressão. Podemos supor que as dores de coluna a que Maria referiu-se já tenham se tornado

crônicas, pois não soube precisar quando se iniciaram as dores: “Sempre senti dores na

coluna” (sic). Essa sintomatologia parece corresponder ao que Arruda (1990) define como

‘depressão mascarada’, na qual se observam distúrbios de ordem psíquica transformados em

desordens orgânicas. O estado depressivo relaciona-se a determinados eventos de vida que

provocam a perda do equilíbrio anterior, exigindo nova adaptação. Após a angústia decorrente

da necessidade da mudança pode surgir o estado depressivo, muitas vezes mascarado por

sintomas hipocondríacos. Lipowski (1990), embora acredite que a explicação de ‘depressão

mascarada’ seja vaga por não constituir uma síndrome, também entende que sintomas

somáticos e hipocondríacos associados podem indicar aspectos afetivos e cognitivos

mascarados da depressão. Embora Solis (2002), não tenha encontrado associação entre

periodontite crônica com traços depressivos ou ansiosos, Hugoson; Ljungquist; Breivik

(2002), observaram que pacientes depressivos e que referiram solidão apresentavam menor

capacidade adaptativa às circunstâncias vitais. Quanto à Maria, parece sentir-se solitária por

achar que o marido e os filhos não são companheiros e por não ter tempo de ter vida social

mais intensa, o que lhe dá a sensação de vida amarga, já que tudo são obrigações que faz

contra sua vontade. Ainda quanto a pacientes com traços de depressão, Shortes et. al. (1992),

concluíram que pacientes somatizantes deprimidos têm pouco ou nenhum conhecimento dos

fatores psicossociais de seus sintomas, além de estarem convencidos da natureza orgânica de

seus sintomas. Arruda (1990); Lipowski (1990); Santos Filho (1994), entendem que a negação

do distúrbio humoral e a crença de que o problema é orgânico, leva a erros diagnósticos e,

conseqüentemente, a tratamentos inadequados e ineficientes. O ‘colorido’ hipocondríaco

conferido à Maria deveu-se ao seu ‘conhecimento’ e familiaridade que demonstrou pelo

vocabulário utilizado sobre doenças e também ao tom de voz com que falava sobre elas.

Quanto ao bruxismo mencionado por Maria, a literatura define-o como um hábito

parafuncional destrutivo, pois danifica o periodonto, cuja etiologia está associada ao stress

emocional e alterações psicossociais, conforme Silva, Newman, Oakley (1995); Sallum et. al.

(1999); Bahlis; Rodrigues; Ferrari (1999); Nóbilo et. al. (2000); William et. al. (2001);

Aleksejuniene et. al. (2002); Torres et. al. (2002). Arruda (1990); Nóbilo et. al. (2000); Mello

Filho (2002), entendem que ranger os dentes é uma somatização de conflitos intra-psíquicos

originários de dificuldades ocorridas na fase oral.

Em relação à Joana, suas queixas foram dores de cabeça, insônia, ansiedade e dores de

estômago. Estas, parecem preencher a definição dada por Lobato (1992), aos distúrbios

somatoformes, que se referem a sintomas físicos sugestivos de problemas somáticos, mas para

os quais não é encontrada nenhuma explicação fisiopatológica. A natureza de suas queixas

parece hipocondríaca. De acordo com Rosa (1990), o hipocondríaco é um indivíduo

perturbado por ameaças internas e, por isso, tem muita dificuldade em livrar-se de seu

sofrimento. O autor cita ainda o prazer masoquista (sofrimento auto-imposto) muito presente

nos pacientes hipocondríacos e somatizantes, cujas principais manifestações são: cefaléia, dor

facial, dor toráxica, dor dorsal e dores vagas nos membros. Uma das grandes culpas

inconscientes (culpa edípica) de Joana reside no seu desejo pelo pai e no ódio que sente pela

mãe, nos moldes descritos por Klein (1936), e cujo ponto de vista é compartilhado por

Vizzotto (1994). Ressalta-se que a paciente nunca procurou ajuda médica para esclarecer a

etiologia de suas dores de cabeça e de estômago, embora reclame eternamente que as têm.

Quanto à insônia, Rosa (1990), cita-a como uma das perturbações do ritmo biológico sem

causa orgânica, através das quais o indivíduo somatiza suas emoções e conflitos internos, pela

impossibilidade de elaboração mental. Por isso, Leme et. al. (1988) Rosa (1990), entendem

que tal expressão somática é uma regressão profunda, visão esta de acordo também com

Osório (1993), quando afirma que a linguagem corporal é a forma mais arcaica de

comunicação humana para descarregar a tensão psíquica.

As queixas de Cristina, anemia, cefaléia, zumbido no ouvido, tonturas, tensão pré-

menstrual, stress, dor nos pulso, além de falta de desejo sexual, parecem preencher a definição

de Shortes et. al. (1992); Lobato (1992), sobre somatização. Explicam, os autores, que são

queixas somáticas múltiplas e recorrentes, que podem durar anos. Essas manifestações

somáticas motivam a busca médica sem, no entanto, haver distúrbio físico. Entretanto, nossa

visão aproxima-se mais da de Lipowski (1990), que entende que a somatização implica em

sintomas que não formam uma síndrome consistente. Na sua visão, pessoas que somatizam

são prováveis hipocondríacos, ou pelo menos, preocupados com seus sintomas orgânicos,

além de serem candidatos à somatização persistente. Em nossa análise, Cristina tende à

hipocondria pela quantidade de sintomas relatados. Porém, também sugerimos algo de

histérico nesses seus sintomas, pela forma que se referia a eles e por sua super-valorização,

em especial à TPM – tensão pré menstrual A definição de sintoma histérico inclui a perda ou

alteração do funcionamento físico e a possibilidade de obter ganhos secundários através do

sintoma (SANTOS FILHO, 1994). O primeiro aspecto não foi encontrado no discurso de

Cristina. Entretanto, pareceu-nos que ela faz tentativas freqüentes através do corpo, para

mobilizar sentimentos de que ela é uma ‘coitada’ em seus familiares. Com explica o autor, na

histeria, os afetos, apesar de inconscientes, mantém um vínculo com a consciência através do

sintoma histérico. Logo, o sintoma histérico revela e esconde o conflito.

Embora a American Academy of Periodontology (1999); Bretz; Chaves (1999);

Campos Jr. et. al. (1999); Kinane; Lindhe (1999); Tonetti; Mombelli (1999); Kornman

(2001); Grisi (2002); Sallum (2002); Schenkein (2003), comentem a hereditariedade como um

dos fatores predisponentes à doença periodontal, esse fenômeno não foi evidenciado em

nossas pacientes.

Frente aos dados até agora apresentados, acreditamos que se justifica dizer que as

variáveis sócio-culturais, comportamentais e orgânicas presentes no fenômeno humano

influenciam o processo saúde/doença. Considerar tais variáveis possibilita a elaboração de um

diagnóstico mais acertado e completo e, conseqüentemente, um plano de tratamento mais

adequado para cada ‘doente’. De acordo com Dunbar (1950); Arruda (1990); Rosa (1990);

Camargo Jr. (1992); Todescan (1993); Osório (1993); Eksterman (1992, 1996); Perestrello

(1996); Briganti (1999); Serino (2001), a doença não pode ser tratada como um objeto

concreto destituído de significado psíquico. Como explica Todescan (1993), a saúde não é

estática e as variáveis acima mencionadas influenciam o emocional provocando a queda das

defesas imunológicas (quebra da homeostase), do indivíduo, predispondo-o à doença

(LIPOWSKI, 1984; MELLO FILHO, 1992; RODRIGUES; GASPARINI, 1992; HOWARD; LEWIS,

1999). Essa postura frente ao fenômeno do adoecer é consistente na literatura, inclusive da

Medicina Periodontal (MARCENES; SHEIHAM, 1992; SILVA; NEWMAN; OAKLEY, 1995;

BREIVIK et. al., 1996; KENNEDY; SCHWAB,;HIDE, 1996; SALLUM et. al. 1999; PAPAPANOU;

LINDHE, 1999; KINANE; LINDHE, 1999; AMERICAN ACADEMY OF PERIODONTOLOGY , 1996 [a]

2001; GRISI, 2002; GENCO, 2002; LORENZO; LORENZO, 2002; ALEKSEJUNIENE et. al., 2002;

BIMSTEIN, 2003; LAGERVALL; JANSSON; BERGSTRÖM, 2003; VETTORE et. al., 2003).

Assim, como toda doença é polietiológica (ARRUDA, 1990), também a doença

periodontal crônica é uma doença multifatorial (CAMPOS JR. et. al., 1999; KINANE; LINDHE,

1999; SALLUM, 2002; GRISI, 2002; BIMSTEIN, 2003). Esse fenômeno, associado à plasticidade

individual (ARRUDA, 1990; SALLUM et. al., 1999; KORNMAN, 2001; RODRIGUES, 2002, GRISI,

2002, SCHENKEIN, 2003), exigem diagnósticos, planos de tratamento e manutenção

periodontal individualizados, como sugerem Todescan (1993); Sallum et. al. (1999); Campos

Jr. et. al. (1999); American Academy of Periodontology ([b] 2001).

Para tanto, o saber odontológico deve ser acrescido de conhecimentos sobre o

funcionamento psíquico humano, ou seja, todo periodontista deve aliar seus conhecimentos

sobre Medicina Periodontal aos de Psicologia. A partir dessa integração de conhecimentos, o

profissional poderá realizar uma anamnese mais adequada para que obtenha a ‘cooperação

consciente’ da qual fala Todescan (1993), sem a qual nenhum tratamento é efetivo e eficaz.

4. CONCLUSÃO

Este trabalho caracterizou uma população de pacientes que freqüentavam uma clínica-

escola de Odontologia e investigou relações entre doença periodontal crônica e aspectos

psico-afetivos destes pacientes. De modo que, na primeira etapa do estudo, quando da

realização da caracterização desta população, os dados revelaram que a amostra constituiu-se

de 789 pacientes, em sua maioria mulheres (64,5%), pacientes com faixa etária entre 30 a 49

anos (27,1%), casados (50,8%), brancos (79,9%) e com, no máximo, 2 filhos (76,0%). A

maioria desses integrantes pertence à Baixada Santista (46,0%), completou o grau médio

(34,4%) e não exerce atividade remunerada (38,3%). Desses pacientes, 220 tinham

diagnóstico completo de doença periodontal quanto à extensão conforme critérios

estabelecidos pela pesquisa, sendo que 163 pacientes foram diagnosticados com doença

generalizada e 57 pacientes eram portadores de doença localizada. Quanto à severidade da

periodontite, 224 pacientes possuíam o diagnóstico em seus prontuários, sendo que as maiores

concentrações foram encontradas entre pacientes com diagnóstico de doença leve a moderada

e leve a severa.

A partir desses pacientes, foram identificados os que também eram poli-queixosos, o

que resultou em 30 pacientes poli-queixosos com periodontite crônica leve a moderada e 29

pacientes com periodontite crônica leve a severa. Esta sub-amostra final resultante da etapa

quantitativa do estudo caracterizou-se como sendo em sua maioria composta de mulheres nos

dois graus de severidade de doença. Quanto ao grupo etário desses pacientes, a maior

concentração para a periodontite leve a moderada distribuiu-se na faixa de 30 a 59 anos.

Relativamente aos pacientes com doença leve a severa, a prevalência ocorreu entre

pacientes acima de 50 anos. Em ambos diagnósticos quanto à severidade, a maioria dos

pacientes é casada e não exerce atividade remunerada. Quanto ao grau de instrução, pacientes

com doença leve a moderada prevaleceram entre aqueles que completaram o grau médio ou

chegaram a iniciá-lo. Já entre pacientes com doença leve a severa, observou-se que metade

deles completou, no máximo, o ensino fundamental. Foi observada ainda nesses pacientes, a

presença de bruxismo além de queixas de stress.

A segunda etapa do estudo foi qualitativa e constituiu-se da entrevista de três

pacientes. Observou-se através dessas entrevistas que as primeiras relações objetais não foram

sentidas como satisfatórias, o que gerou ansiedades esquizo-paranóides e que têm permeado

suas relações desde a mais tenra infância. Esse fenômeno pôde ser observado através da

elaboração mental empobrecida das pacientes frente às angústias provenientes de seus

conflitos. A dificuldade de suportar a dor de suas angústias faz com que estas sejam expressas

pela via somática. Isso quer dizer que as insatisfações inconscientes das pacientes com elas

mesmas, com o outro e com o mundo são comunicadas através de seus sintomas orgânicos.

Dessa maneira, a homeostase é encontrada na doença em qualquer órgão, inclusive no

periodonto, visto que os recursos defensivos não são adequados para uma elaboração

depressiva. Assim, nossa pesquisa permitiu-nos levantar a hipótese de que não só as doenças

orgânicas de modo geral, mas também a doença periodontal crônica está associada às

primeiras relações objetais insatisfatórias.

Tal análise foi feita a partir do que propõe a postura psicossomática, ou seja, a visão

do homem enquanto um ser bio-psico-social, na qual, tanto saúde quanto doença só podem ser

compreendidas como um fenômeno multifatorial. Para que se possa entender um paciente na

sua integralidade, devem ser considerados sua hereditariedade, sua história de vida e os

fatores ambientais.

A prática da “Odontologia Psicossomática” pelo periodontista beneficiaria tanto o

paciente quanto o dentista. A atenção ao discurso dos pacientes, bem como para sua história

clínica geral poderão fornecer subsídios importantes ao profissional sobre a maneira com que

cada paciente lida com suas circunstâncias, o que possibilita a elaboração de diagnósticos e

tratamentos individualizados. Além disso, as orientações dadas pelo periodontista durante e

após o tratamento são fundamentais para a manutenção da saúde bucal. Aqui, novamente o

conhecimento de certas características psíquicas do paciente pode ajudar o profissional a

evitar iatrogenias, além de compreender melhor as reações orgânicas e/ou emocionais do

paciente, bem como da forma de sua adesão ou não ao tratamento. Finalmente, mediante uma

postura psicossomática, o vínculo profissional-paciente tende a tornar-se mais saudável,

condição fundamental para um tratamento eficaz.

Para tanto, acreditamos que uma anamnese na qual constem questões mais elaboradas

sobre a vida do paciente, além da história médica e bucal, seja um grande facilitador,

inclusive do vínculo dentista/paciente e de todos os procedimentos que envolvem o

tratamento periodontal. O tratamento será, provavelmente, tanto mais bem sucedido, quanto

menos a relação dentista/paciente reproduzir aquelas primeiras relações objetais

insatisfatórias.

Sugerimos que novas pesquisas sejam feitas sobre a possível influência dos fatores

psicossociais no desenvolvimento de doenças do periodonto. Uma anamnese que investigue

mais elementos referentes aos fatores mencionados, que preencha a abordagem bio-psico-

social de homem, podem contribuir para a realização de tais estudos.

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Anexo A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Anexo B – Ficha de Encaminhamento

Anexo C – Ficha de Triagem

Anexo D – Ficha Periodontal

Anexo E – Planilha de Registros 1: Identificação do Paciente

Anexo F – Planilha de Registros 2: Saúde Geral Atual

Anexo G – Planilha de Registros 3: Hábitos e Vícios

Anexo H – Planilha de Registros 4: Saúde Odontológica

Anexo I - Roteiro de Entrevista O rapport inicial buscou informações de como o paciente estava sentindo-se no dia da

entrevista.

Afetivo-relacional

Para obter informações sobre esta categoria buscou-se dados como: com quem o paciente mora e como é seu relacionamento com essas pessoas e familiares em geral. Também foram colhidos dados quanto à vida social, ou seja: se têm amigos, se gosta do contato com pessoas e quais são as figuras significativas em sua vida•; se tem ou não dificuldades para fazer novas amizades; se costuma confiar nas pessoas. Investigou-se sobre o modo como cada paciente se vê e como acha que os outros o vêem; se chora muito, se considera-se uma pessoa impulsiva, se sente-se injustiçado pelos outros; quais são seus medos e como lida com eles; se tem manias; se já foi e se tem medo de ser enganado pelas pessoas; se costuma ficar nervoso com freqüência e por que; o que considera uma situação difícil e como lida com ela; se é ciumento, de quem e quando essas situações ocorrem; se costuma ser muito criticado e como lida com críticas; se há satisfação ou não com a vida conjugal e sexual.

Sócio-cultural

Nessa categoria pesquisou-se sobre as qualidades e ‘defeitos’ que o paciente julga ter (por exemplo: honestidade, solidariedade, perseverança, se é supersticioso); como passa os finais de semana e se gosta deles; se costuma passear, onde e com quem; se gosta da companhia de pessoas ou se prefere ficar sozinho; se tem algum hobby e/ou lazer,

Produtividade

Foram colhidas informações tais como: gosta ou não do trabalho e da profissão; se não gosta, o que gostaria de exercer profissionalmente; há quanto tempo está trabalhando; se já teve outros empregos; se têm dificuldades para se manter num emprego; se gosta do ambiente de trabalho; se tem boa relação com os colegas de profissão; se está passando por problemas profissionais.

Orgânico

Buscaram-se informações sobre a saúde atual do paciente, ou seja, se ele estava fazendo algum tratamento. Caso estivesse, qual ou quais seriam eles; há quanto tempo; quando começaram os sintomas e a que o paciente os atribui e se é uma sintomatologia que costuma ser recorrente. Em caso de afirmativa, quais os tratamentos que já fez; por que acha que fica ‘doente’ e se segue às orientações médicas. O mesmo questionamento foi feito quanto à saúde bucal. Perguntou-se ainda sobre antecedentes médicos familiares, sobre hábitos e vícios, se come e dorme bem e se têm pesadelos.

• Quando necessário, a pesquisadora pediu exemplos que clarificassem o relato do paciente. Em alguns casos, as respostas dos pacientes foram seguidas por perguntas como: “por que”, “explique-me melhor”, ou outras equivalentes, sempre buscando esclarecimentos relevantes que atendessem o objetivo da pesquisa.