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NOVAS TECNOLOGIAS, TRABALHO, ESCOLA E FAMÍLIA EM TEMPOS DE RIGIDEZ E FLEXIBILIDADE Celso Rogério Klammer 1 Universidade Positivo RESUMO Neste artigo, partiu-se do pressuposto de que toda sociedade, em épocas difer- entes, tem formas próprias de expressar sua cultura e de manifestar também a forma como os indivíduos se organizam, se relacionam, produzem e difundem o conheci- mento. Para tanto, tomou-se como referência o avanço da tecnologia da informação que sempre trouxe significativas transformações e um novo processo de aprendiza- gem e interação social. Sendo assim, dividiu-se o texto em três momentos. Inicial- mente procurou-se pensar a relação entre educação, sociedade e tecnologias, numa perspectiva histórica, entendendo que a educação se define no conjunto das relações sociais, que é, portanto, uma prática social e histórica. No segundo momento, to- mando como ponto de partida o desenvolvimento industrial, observou-se que, até os anos 1970, havia, e ainda há, um princípio educativo de base taylorista-fordista re- gendo, além das demandas do mundo trabalho, as relações na família e na escola. Nesta ótica refletiu-se que os indivíduos são formados numa perspectiva rígida, linear e hierárquica. No terceiro momento, analisou-se o avanço científico e tecnológico da contemporaneidade e o princípio educativo que passa a nortear as relações entre as pessoas no mundo do trabalho, na escola e na família. Esta análise aponta que estas relações são marcadas pela flexibilidade e pelo efêmero. E finalmente, à guisa de conclusão defende-se a necessidade de uma mudança de paradigma que provoque os indivíduos à indignação diante das injustiças sociais, que conduza-os à autonomia e à busca de alternativas para transformação da realidade. Palavras-chave: tecnologias da informação, taylorismo–fordismo, rigidez, flexibilidade. ABSTRACT In this article, it was taken for granted that every society, at different times, has its own ways of expressing its culture and also presents the different forms of individual organization; the way people relate, the way they produce and the way they spread out their knowledge. In order to do that, this text has been divide into three parts. First, The relationship among education, society and technology has been established using a historical approach, assuming that education is part of a social network, therefore, it is a social-historical praxis. Second, using the industrial development as a starting point, it has been noticed that, up to the 1970s, there was and still is an educational 1 Doutorando em Educação pela PUCPR. Mestre em Educação pela UFPR. Professor de Teoria e Método da Pesquisa em Comunicação e Metodologia da Pesquisa na Universidade Positivo e Coordenador de TCC nos cursos de Comunicação Social - Publicidade e Propaganda e Pedagogia. - [email protected]

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ABSTRACT Celso Rogério Klammer 1 Universidade Positivo 1 Doutorando em Educação pela PUCPR. Mestre em Educação pela UFPR. Professor de Teoria e Método da Pesquisa em Comunicação e Metodologia da Pesquisa na Universidade Positivo e Coordenador de TCC nos cursos de Comunicação Social - Publicidade e Propaganda e Pedagogia. - [email protected]

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NOVAS TECNOLOGIAS, TRABALHO, ESCOLA E FAMÍLIA EM TEMPOS DE RIGIDEZ E FLEXIBILIDADE

Celso Rogério Klammer1

Universidade Positivo

RESUMONeste artigo, partiu-se do pressuposto de que toda sociedade, em épocas difer-

entes, tem formas próprias de expressar sua cultura e de manifestar também a forma como os indivíduos se organizam, se relacionam, produzem e difundem o conheci-mento. Para tanto, tomou-se como referência o avanço da tecnologia da informação que sempre trouxe significativas transformações e um novo processo de aprendiza-gem e interação social. Sendo assim, dividiu-se o texto em três momentos. Inicial-mente procurou-se pensar a relação entre educação, sociedade e tecnologias, numa perspectiva histórica, entendendo que a educação se define no conjunto das relações sociais, que é, portanto, uma prática social e histórica. No segundo momento, to-mando como ponto de partida o desenvolvimento industrial, observou-se que, até os anos 1970, havia, e ainda há, um princípio educativo de base taylorista-fordista re-gendo, além das demandas do mundo trabalho, as relações na família e na escola. Nesta ótica refletiu-se que os indivíduos são formados numa perspectiva rígida, linear e hierárquica. No terceiro momento, analisou-se o avanço científico e tecnológico da contemporaneidade e o princípio educativo que passa a nortear as relações entre as pessoas no mundo do trabalho, na escola e na família. Esta análise aponta que estas relações são marcadas pela flexibilidade e pelo efêmero. E finalmente, à guisa de conclusão defende-se a necessidade de uma mudança de paradigma que provoque os indivíduos à indignação diante das injustiças sociais, que conduza-os à autonomia e à busca de alternativas para transformação da realidade.

Palavras-chave: tecnologias da informação, taylorismo–fordismo, rigidez, flexibilidade.

ABSTRACTIn this article, it was taken for granted that every society, at different times, has its

own ways of expressing its culture and also presents the different forms of individual organization; the way people relate, the way they produce and the way they spread out their knowledge. In order to do that, this text has been divide into three parts. First, The relationship among education, society and technology has been established using a historical approach, assuming that education is part of a social network, therefore, it is a social-historical praxis. Second, using the industrial development as a starting point, it has been noticed that, up to the 1970s, there was and still is an educational 1 Doutorando em Educação pela PUCPR. Mestre em Educação pela UFPR. Professor de Teoria e Método da Pesquisa em Comunicação e Metodologia da Pesquisa na Universidade Positivo e Coordenador de TCC nos cursos de Comunicação Social - Publicidade e Propaganda e Pedagogia. - [email protected]

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premise based on taylorism and fordism guidelines, which lead the world of work, family and education. Third and last, scientific and technological advances have been analyzed and the educational premise that guides the actual relationships within the world of work, family and school brought to light. The present analysis points out that these relationships are marked by flexibility and promptness. At last, the conclusion states the need for a change in patterns in order to bring the individuals to a state of indignation concerning the social injustices, providing and opportunity for an autonomous behavior and for research on alternatives for transformation in their reality.

Words-key: technologies of the information, taylorism, fordism, rigidity, flexibility.

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1 INTRODUÇÃOAcredita-se que o conteúdo desta reflexão pode trazer alguns elementos que

ajudariam a compreender o embate que se estabelece na sala de aula: por um lado, o professor que, na ânsia de explicar o que sabe, porque sente que pode contribuir para a formação dos jovens, se queixa de seu desinteresse, de sua falta de compromisso com o conhecimento e, por outro, os alunos que, muitas vezes rebeldes e apáticos, lutam para decifrar e entender os conteúdos que lhes são propostos.

Neste sentido, nota-se que, na sala de aula, se evidenciam, de forma mais explícita, as tensões, contradições e exigências da sociedade atual, marcada pela tecnologia da informação e da comunicação.

Por este viés pretende-se analisar a relação possível entre as tecnologias da informação e da comunicação, o mundo do trabalho, a escola e a família.

2 EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E TECNOLOGIAS Na análise deste tema, parte-se do pressuposto de que toda sociedade, em épocas

diferentes, tem formas próprias de expressar sua cultura e de manifestar também a forma como os indivíduos se organizam, se relacionam, produzem e difundem o conhecimento.

Defende-se que, com o avanço da tecnologia da informação, a sociedade, passando por significativas transformações, demanda um novo processo de aprendizagem e interação social. Enguita (2004, p. 19) afirma que “as mudanças constantes nas tecnologias e nas formas de organização (isto é, nos modos de relacionamento com as coisas e com as pessoas, respectivamente) requerem novas etapas de aprendizagem [...]”.

Para se compreender a importância que este tema ocupa na contemporaneidade, considera-se fundamental enfocá-lo numa perspectiva histórica, ainda que a partir de uma breve contextualização.

Para esta abordagem, defende-se que o ser humano, à medida que procurou produzir sua sobrevivência, sempre desenvolveu a capacidade de transformar a matéria existente na natureza em objetos para suprir suas necessidades.

Nas comunidades primitivas, por exemplo, ele podia transformar determinado objeto, retirado de seu estado natural, em ferramenta de trabalho. O fêmur de um animal morto poderia ser transformado em instrumento de trabalho para abater outro animal. O fogo também significou uma grande inovação tecnológica pois tornou o homem criador e permitiu-lhe o domínio sobre a natureza, como afirma Davis (1983, p. 369):

A tecnologia, então nova, com sua capacidade de emitir luz tem um efeito profundo na aprendizagem: proporciona calor e ao mesmo tempo dá aos alimentos sabores nunca antes alcançados. Emite luz na escuridão da noite, o que serve para manter afastados os animais depredadores.

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Estas transformações tecnológicas das comunidades primitivas levam a perceber que houve, não só uma profunda modificação na relação e organização dos homens e das mulheres, mas também uma nova forma de aprender. O fogo, por exemplo, além de aquecer e cozinhar alimentos, podia também oferecer mais segurança possibilitando, ao redor da fogueira, a troca de experiências através das histórias que podiam ser contadas. Sob esta ótica, os indivíduos são seres de relações e, à medida que se relacionam consigo mesmos e com os outros, transformam o seu agir.

É preciso conceber o homem como uma série de relações ativas (um processo) em que, se a individualidade tem a sua máxima importância, não é, porém,o único elemento a considerar. A humanidade que se reflete em cada individualidade é composta por diversos elementos: 1) o indivíduo; 2) os outros homens; 3) a natureza” (GRAMSCI, 1991, p. 48).

O ser humano é social e aprende no ambiente histórico. As crianças da comunidade primitiva aprendem sob a vigilância difusa deste ambiente. Por ser uma comunidade essencialmente igualitária, onde todos os membros ocupam a mesma posição na produção da sobrevivência, ninguém, em especial, se responsabiliza por ensiná-las. As crianças se educam fazendo parte da coletividade e segundo o princípio pedagógico nele vigente.

A sua consciência (da criança) era um fragmento da consciência social, e se desenvolvia dentro dela. Assim, antes de deixar as costas da mãe, ela já havia recebido, [...] o ideal pedagógico que o seu grupo considerava fundamental para a sua própria existência. Em que consistia esse ideal? Em adquirir, [...] o sentimento profundo de que não havia nada, [...] superior aos interesses e às necessidades da tribo (PONCE, 1996, p. 21).

Por este viés de análise pode-se afirmar que o indivíduo, na busca da sua sobrevivência, sempre foi inovando. Criou a ferramenta para que pudesse intervir e transformar a natureza. Mas ele também se transformou, pois, à medida que potencializou sua capacidade de intervenção, foi modificando outros elementos da natureza segundo as novas necessidades que iam surgindo a cada momento.

Essa intervenção do sujeito na natureza constituiu a sua prática produtiva, ou seja, o sujeito, ao compreender a natureza, pôde transformá-la e construir assim seu mundo histórico e a produção da sua sobrevivência.

Embora sejam os indivíduos que se relacionem concretamente com a natureza, sua ação é sempre uma ação coletiva. Pode-se dizer então que essa prática social está diretamente vinculada à prática produtiva, pois, à medida que o indivíduo se organiza socialmente, estabelecendo relações com seus pares, ele produz a sua sobrevivência.

E para produzir sua sobrevivência, retirando da natureza tudo de que necessita, o indivíduo pode aprender com a convivência coletiva. Neste sentido, Saviani (2001, p. 154), afirma:

[...] a educação praticamente coincide com a própria existência humana. Em outros termos, as origens da educação se confundem com as origens do

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próprio homem. À medida que determinado ser natural se destaca na natureza e é obrigado, para existir, a produzir sua própria vida é que ele se constitui propriamente enquanto homem [...]

Em sentido amplo, entende-se que a educação se define no conjunto das relações sociais, que é, portanto, uma prática social e histórica. O indivíduo se relaciona com os outros indivíduos, com a natureza, participa uma determinada concepção de mundo e produz sua existência pela aprendizagem.

A educação é concebida como uma prática social, uma atividade humana e histórica que se define no conjunto das relações sociais, no embate dos grupos ou classes sociais, sendo ela mesma forma específica da relação social (FRIGOTTO, 1995a, p. 31).

Nesta perspectiva, o indivíduo, ao longo da história da humanidade, para sobreviver, cria e aperfeiçoa tecnologias que também lhe garantem formas de aprendizagem: os sinais pictográficos, gravados, com estiletes, sobre tabletes de argila úmida, dão origem à escrita; a imprensa possibilita a reprodução de várias obras e o acesso de um maior número de pessoas aos livros; a bússola e as caravelas viabilizam as viagens marítimas que, por sua vez, contribuem para que se questionem as verdades tidas como absolutas, desmitificando o imaginário europeu quanto à existência de monstros marinhos; a industrialização altera a base técnica da sociedade.

3 SOCIEDADE, FAMÍLIA E ESCOLA EM TEMPOS DE RIGIDEZ

A produção e satisfação das necessidades do ser humano e da sua relação com o aperfeiçoamento tecnológico tem sua explicitação essencial com o desenvolvimento industrial em suas diferentes fases, alterando a base técnica da sociedade. De acordo com Sancho (1998, p. 29-30),

[...] é nas sociedades industriais e principalmente nas pós-industriais que a tecnologia se transforma em um fenômeno gerador. A interação do indivíduo com as suas tecnologias têm transformado profundamente o mundo e o próprio indivíduo.

Katz (1995, p. 22) também se refere à revolução industrial como “um acontecimento específico e original... a plataforma histórica das revoluções tecnológicas...”.

Pode-se então afirmar, aferindo, Frigotto (1995b, p. 18)2, que este processo aponta em direção a três grandes mudanças na base técnica da sociedade:

- 1780-1840: colimação de um grande processo de inúmeras mudanças técnicas a partir da máquina a vapor (Primeira Revolução Industrial).- 1860-1910: novas formas de energia - petróleo, eletricidade, química fina, etc. (Segunda Revolução Industrial)- a partir dos anos 1950 desenham-se mudanças marcadas fundamentalmente

2 Nessa abordagem, Frigotto refere-se à análise de Williams no texto Hacia al año 2000 (Barcelona: Gribaldo, 1975).

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pela microeletrônica associada à informática, microbiologia e engenharia genética, possibilitando criação de matéria prima e novas fontes de energia (Terceira Revolução Industrial).

Schaff (1996, p.22), referindo-se às mudanças tecnológicas contemporâneas, afirma que há uma segunda revolução técnico-industrial em curso:

A primeira, que pode ser situada entre o final do século XVIII e o início do século XIX e cujas transformações ninguém hesita em chamar de revolução, teve o grande mérito de substituir na produção a força física do homem pela energia das máquinas (primeiro pela utilização do vapor e mais adiante sobretudo pela utilização da eletricidade). A segunda revolução, que estamos assistindo agora, consiste em que as capacidades intelectuais do homem são ampliadas e inclusive substituídas por autômatos, que eliminam com êxito crescente o trabalho humano na produção e nos serviços.

Em que pesem as diferenças de abordagem dos autores acima citados, entende-se que todos enfocam a mudança na base técnica da sociedade, a partir da Revolução Industrial, e a relacionam com a produção do conhecimento humano. Pode-se assim compreender que tanto a Revolução Industrial do século XVIII como a do século XIX não significam somente uma mudança na base técnica. “A revolução industrial muda também as condições e as exigências da formação humana” (MANACORDA, 1996, p. 271).

No século XVIII, com a Primeira Revolução Industrial, a energia a vapor substitui a humana, surge uma nova classe social - o proletariado - e fortalece-se a burguesia. A partir do século XIX, com a Segunda Revolução Industrial, também ocorrem mudanças sociais como a nova organização do capitalismo, pautada por uma base técnica eletromecânica e princípios tayloristas/fordistas.

[...] entendemos o fordismo fundamentalmente como a forma pela qual a indústria e o processo de trabalho consolidaram-se ao longo deste século, cujos elementos constitutivos básicos eram dados pela produção em massa, através da linha de montagem e de produtos mais homogêneos; através do controle dos tempos e movimentos pelo cronômetro taylorista e produção em série fordista; pela existência do trabalho parcelar e pela fragmentação das funções; pela separação entre elaboração e execução no processo de trabalho; pela existência de unidades fabris concentradas e verticalizadas e pela constituição do operário-massa, o trabalhador coletivo fabril, entre outras dimensões... compreendemos o fordismo como o processo de trabalho que, junto com o taylorismo, predominou na grande indústria capitalista ao longo deste século (ANTUNES, 2000, p. 17).

Assim, no que se convencionou chamar de taylorismo-fordismo, implanta-se a produção em massa e investe-se no aumento do número de assalariados. No âmbito da administração, a gerência passa a controlar os movimentos do trabalhador, determinando até o tempo que deve gastar no desempenho de suas atividades. Neste sistema produtivo, cada um tem uma tarefa clara a desempenhar: o trabalhador executa

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sua tarefa; a máquina impõe, com suas esteiras automatizadas, o ritmo da produção; e a gerência planeja todo o processo produtivo, a partir do conhecimento elaborado, sistematizado e aprofundado.

É importante destacar os princípios que o próprio Taylor elaborou:

Primeiro: desenvolver para cada elemento do trabalho individual uma ciência que substitua os métodos empíricos.Segundo: selecionar cientificamente, depois treinar, ensinar e aperfeiçoar o trabalhador. No passado ele escolhia seu próprio trabalho treinava a si mesmo como podia.Terceiro: cooperar cordialmente com os trabalhadores para articular todo trabalho com os princípios da ciência que foi desenvolvida.Quarto: Manter a divisão eqüitativa de trabalho e de responsabilidades entre a direção e o operário. A direção incumbe-se de todas as atribuições para as quais esteja mais bem aparelhada do que o trabalhador, ao passo que no passado quase todo o trabalho e a maior parte das responsabilidades pesavam sobre o operário (TAYLOR, 1980, p. 49-50).

Dessa forma, ocorre a fragmentação do trabalho, e a divisão de funções entre o gerente da fábrica e os operários. Registram-se, portanto, uma nítida separação entre o saber e o fazer e uma rígida hierarquização no âmbito das relações de trabalho.

[...] o trabalho de cada homem é totalmente planejado pela gerência que fornece instruções por escrito acerca do que, como e em que tempo deve ser feito o trabalho. A gerência passa a ser científica: realiza estudos e coleta conhecimentos e informações acerca do trabalho, o que não ocorre com o trabalhador, dada a sua suposta incapacidade. Este monopólio do saber sobre o trabalho confere ao gerente poder para controlar cada fase do processo de trabalho que, quanto mais complexo, mais se separa do trabalhador (KUNZER, 1995, p. 30).

De acordo com este enfoque, o trabalhador não precisa explorar sua capacidade intelectiva nem buscar alternativas para resolver problemas porque a gerência determina o que e como fazer. Sua habilidade cognitiva fundamental é a capacidade de memorização para o desempenho de movimentos repetitivos. Portanto, basta possuir coordenação motora fina e acuidade visual.

Assim, a adaptação do trabalhador às novas formas de produção desenvolveu-se não só pela coerção imposta pelas necessidades de sobrevivência mas também por meio de instituições como a escola. Alguns teóricos da economia política afirmavam que a instrução escolar era importante para os trabalhadores pois os tornavam mais aptos às necessidades da vida moderna.

[...] a evolução da ‘moderníssima ciência da tecnologia’ leva a uma substituição cada vez mais rápida dos instrumentos e dos processos produtivos e, portanto, impõe-se o problema de que as massas operárias não se fossilizem nas operações repetitivas das máquinas obsoletas, mas que estejam disponíveis às mudanças tecnológicas, [...] até os próprios industriais são obrigados, pela realidade, a se colocarem o problema da instrução das massas operárias para atender às novas

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necessidades da moderna produção de fábrica (MANACORDA, 1996, p. 272).

Percebe-se com clareza que, neste contexto, a tarefa do trabalhador é desempenhar funções meramente manuais, que não demandam muita escolaridade. Sua formação deve limitar-se ao domínio de conhecimentos básicos sobre leitura, escrita e cálculo, que lhe garantam as ações repetitivas de seu fazer profissional.

Requer-se, no entanto, daqueles que exercem a função de dirigentes na sociedade, sob a ótica política ou técnica, outra postura nas relações com o trabalho: que sejam estas mediadas pelo conhecimento científico, por habilidades cognitivas mais elaboradas, enfim, por uma formação que priorize o domínio de conhecimentos mais profundos e sofisticados.

O taylorismo e o fordismo da produção em massa requeriam uma organização do trabalho hierarquizada de forma piramidal, na qual a criatividade e a inteligência concentravam-se na cúpula, enquanto o restante das pessoas devia executar mecanicamente as instruções recebidas (TEDESCO, 1998, p. 18).

Para dar sustentação a esta forma de administração, é preciso uma gerência que tenha “pulso firme” e tenha como categorias fundantes da sua prática a rigidez e a hierarquização. Ela é quem domina o conhecimento como um todo, sabe como melhor encaminhar as demandas do cotidiano profissional e determina como e quando as tarefas devem ser executadas.

Por este viés de análise, observa-se que, até os anos 1970, havia, na sociedade e ainda há - considerando a relação entre permanência e ruptura do movimento histórico - um princípio educativo regendo, além das demandas do mundo do trabalho, as relações na família e na escola.

Este princípio educativo, oriundo da base técnica de produção taylorista-fordista, procura manter a divisão social e técnica do trabalho ao dicotomizar as ações intelectuais e manuais no mundo da produção. Mantém-se uma estrutura bem definida, com mecanismos de controle, através da supervisão na produção, no planejamento e na gestão segundo os princípios da administração científica, além de estímulos comportamentalistas como treinamentos para liderança, motivação e satisfação no trabalho.

Considerando que cada sociedade, em épocas diferentes, possui maneiras próprias para formar seus intelectuais e entendendo que o objetivo da educação é preparar o cidadão para que participe da vida política e produtiva, defende-se que a escola também ocupa uma importante função na preparação desse cidadão. Portanto, ela não está isenta das exigências da sociedade para essa formação.

Levando em conta o projeto pedagógico de base taylorista-fordista, vigente até os anos 1970, percebe-se que há uma semelhança no encaminhamento metodológico das tendências pedagógicas conservadoras no espaço escolar. Neste sentido a escola também se organiza numa perspectiva rígida, linear e com mecanismos de controle bem definidos.

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Nada mais adequado do que uma escola que, para realizar o trabalho pedagógico assim definido, se organizasse de forma rigidamente hierarquizada e centralizada para assegurar o pré-disciplinamento necessário à vida social e produtiva. (KUENZER, 2000, p. 36).

A escola humanista tradicional, por exemplo, se propunha a formar os dirigentes do seu tempo, com boa oratória e ótima cultura geral, para que desenvolvessem a capacidade de pensar e de se comportar a partir de determinantes mais gerais da sociedade. O conteúdo ensinado visava à formação da personalidade e do caráter a partir da assimilação do passado cultural da civilização. Essa proposta era voltada para os filhos dos dirigentes, enquanto que para os filhos da classe trabalhadora a formação era para a profissionalização, uma vez que desempenhariam funções meramente manuais.

As noções singulares não eram aprendidas visando-se a uma imediata finalidade prático-profissional: esta finalidade não se revelava, pois o que contava era o desenvolvimento interior da personalidade, a formação do caráter através da absorção e da assimilação de todo o passado cultural da civilização européia moderna [...] Não se aprendia latim e o grego para saber falar estas línguas [...] (mas) a fim de ser e de conhecer conscientemente a si mesmo... Trabalhava-se com rapazolas, aos quais deve-se levar a que contrariam certos hábitos de diligências, de exatidão de compostura mesmo física, de concentração psíquica em determinados assuntos [...] (GRAMSCI, 1991, p. 3-4).

Neste sentido, nota-se que o compromisso da escola é com a transmissão de conteúdos que contemplem a verdade numa perspectiva formal e linear. O método de ensino é o expositivo e o mais importante é que o aluno memorize, para cumprir suas tarefas e reproduzir os conhecimentos nos testes avaliativos. O conhecimento está centralizado no livro didático e no professor que exerce sua autoridade de forma rígida e hierarquizada.

No contexto desse princípio educativo, pode-se refletir acerca da estrutura da família. Ela também encontra-se organizada segundo uma ordem hierárquica e rígida cujo poder decisório está centralizado na figura paterna.

A família burguesa, de características patriarcais, tem sua origem na Revolução Industrial e adapta-se às necessidades de uma sociedade de produção em massa. Para Adorno e Horkheimer (1976, p. 217) este tipo de família se torna um lugar de adestramento para a adequação social, ou seja, é um reflexo da sociedade capitalista, hierárquica e machista. Para Ariès (1981, p. 75), a mãe é a responsável pela educação dos filhos; ao pai, cabe apenas cuidar do custeio dos estudos e estabelecer os padrões e as regras de comportamento e aos filhos, obedecer ao que é determinado.

No Brasil, até os anos de 1970, os filhos dos trabalhadores são formados, sob uma perspectiva rígida, para exercer funções manuais na fábrica ou no campo. Para a classe média, Vaitsman (1994, p. 96) afirma que:

as carreiras mais esperadas para os filhos da classe média eram, além das militares, o tradicional trinômio: engenharia, medicina e direito. Uma profissão que

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viesse a possibilitar o bom desempenho como chefe de família era tudo que os pais queriam de um filho.

Quanto às mulheres da classe média, devem reproduzir os papéis que lhes são reservados na família e na vida privada. Em termos profissionais, podem exercer a função de professoras primárias, porque era condizente com a natureza feminina e não exigia tempo integral.

Para as famílias de classe média baixa ‘as meninas só precisavam fazer o primário, porque iam casar, não precisavam de estudo. Os meninos iam trabalhar, mas não eram estimulados a estudar’(VAITSMAN, 1994, p. 95).

À luz de Sennett (1999), pode-se dizer que, até os anos 1970, as relações entre as pessoas se estabelecem “longo prazo”, já que são duráveis e configuram um “senso de identidade sustentável”.

[...] o tempo era linear em suas vidas: ano após ano trabalhando em empregos que raras vezes variavam de um dia para o outro. E nessa linha de tempo, a conquista era cumulativa: toda semana, [...] conferiam o aumento de suas poupanças, mediam a vida doméstica pelas várias melhorias e acréscimos que haviam feito na casa [...]. E finalmente, o tempo que viviam era previsível [...] os sindicatos protegiam seus empregos; [...] sabiam exatamente quando iam aposentar-se e o pecúlio que teriam (SENNETT, 1999, p. 14).

Tomando o longo prazo como categoria de análise, é possível entender como se constituíam os namoros e os casamentos. Os namoros eram longos e sérios, sempre sob a vigilância da família. Namoro “sério” significava um firme compromisso para o casamento, que na grande maioria das vezes era dissolvido somente com a morte de um dos cônjuges. Vaitsman (1994, p. 112) analisa:

[...] o ciclo típico ideal que levava ao casamento moderno, [...] começava com um namoro sob as vistas da família da moça, prosseguia com o noivado sob o mesmo controle e, após alguns anos, desembocava no casamento civil e religioso, com véu, grinalda, festa e convidados. Tudo isto tomando-se como pressuposto a virgindade da moça, defendida até o dia do casamento.

Neste sentido percebe-se que o princípio educativo presente no mundo do trabalho marca sua presença tanto na família quanto na escola. Neste caso, pode-se afirmar que trabalho, família e escola estão diretamente articulados no projeto pedagógico da sociedade do seu tempo e é, sob esta ótica, que as pessoas são formadas.

Para Tedesco (1998, p. 36-37)

Na situação típica do século XIX, a escola era uma continuação da família em tudo o que se referia à socialização moral e aos estilos de vida. A escola transformava a criança naqueles aspectos que fortaleciam a coesão social: adesão à nação, aceitação da disciplina e dos códigos de conduta, etc. Nesse processo, a criança passava de uma instituição de coesão a outra instituição de coesão, nas quais vigoravam as mesmas categorias: seqüência e hierarquia. A seqüência e a hierarquia supõem um modelo único, dominante, com base no qual são estabelecidos os graus e as etapas.

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4 SOCIEDADE, FAMÍLIA E ESCOLA EM TEMPOS DE FLEXIBILIDADEHoje, à medida que a sociedade se moderniza científica e tecnologicamente, a

escola humanista tradicional, fundamentada na divisão entre funções intelectuais e manuais, entra em crise. Se ela entra em crise, exige-se a mudança da escola atual pois, a própria sociedade está em transição e necessita de um outro tipo de educação. Cabe então observar que não se pode compreender a escola fora do contexto social, político, econômico e cultural em que está inserida.

Sendo assim, acredita-se que é preciso compreender as transformações da sociedade contemporânea e perceber a necessidade da formação de um sujeito que domine o conhecimento elaborado, desenvolva sua consciência crítica e compreenda as relações que estabelece com os outros indivíduos e com a natureza.

Entre outras coisas, a sociedade contemporânea exige um novo tipo de intelectual. Não somente aquele que desempenha a função de dirigente, mas todos os trabalhadores dos diferentes segmentos sociais. E também aquele que usava somente sua força de trabalho já não serve mais. O trabalhador de novo tipo deverá se apropriar do conhecimento elaborado que lhe possibilite agir prática e intelectualmente.

A este trabalhador de novo tipo já não bastam algumas técnicas parciais de uma tarefa fragmentada; além de ser especialista, ele deverá potencialmente estar preparado para ser dirigente, sendo ao mesmo tempo capaz de atuar praticamente e trabalhar intelectualmente, dominando ao mesmo tempo as tarefas específicas, as formas de organização e gestão do trabalho, e compreendendo as relações sociais amplas que constituem a sociedade onde exerce as funções de produtor e de cidadão (KUENZER, 1996, p. 3).

A contemporaneidade, caracterizada pelo avanço científico e tecnológico, pela expansão dos mass media e do acesso a estes meios de comunicação, pela microeletrônica e biotecnologia, coloca em crise a divisão entre funções intelectuais e instrumentais.

O desenvolvimento científico e tecnológico em diversas áreas, como Biotecnologia e Engenharia Genética, tem um papel relevante e revolucionário no campo da microeletrônica e das telecomunicações. A informática, por exemplo, ao criar novas possibilidades para o processo de automação, modifica o trabalho humano e traz conseqüências significativas para a qualificação do trabalhador, como novas formas de produzir, armazenar, processar, recuperar e transmitir informações.

Pode-se assim afirmar que as transformações vividas no mundo contemporâneo, resultantes das tecnologias da informação, invadem o cotidiano. Quando aqui se mencionam estas tecnologias, o que se pretende é enfocar os aparelhos da microeletrônica e das telecomunicações que produzem, processam, recuperam e transmitem informações, como televisor, videocassete, computador, rádio e internet, entre outros.

Todos os segmentos sociais têm acesso à televisão e ao rádio, que transmitem informações a uma velocidade meteórica.

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Elas estão nas salas de aula, nas famílias, nas conversas de trabalho, nos núcleos e grupos de educação não formal etc. E sua presença não depende do aparelho ligado. Sequer depende de o indivíduo possuir ou não o aparelho (de rádio, de televisão, de vídeo) ou ser assinante do jornal ou de revista. (BACCEGA, apud: KENSKI, 1996, p. 128).

O acesso a tais informações reformula as regras de convivência, gera novos hábitos e formas de pensar e agir, além de traçar um novo perfil de trabalhador com maior escolaridade e cultura mais sofisticada.

Neste contexto, mudam o processo de aprendizagem e de interação social, ou seja, não há somente uma mudança tecnológica, mas também uma transformação na organização e interação dos homens e mulheres. Assim sendo, entende-se que novas questões se colocam para o sistema de ensino e que a escola, inserida na sociedade, não pode ficar alheia a essas transformações.

Por esta vertente de análise, Soares (2006, p.25) observa que:

O avanço tecnológico que atingiu a sociedade nas últimas décadas no mundo e no Brasil caracteriza a mudança de comportamento nas relações interpessoais e do mundo do trabalho alterado em seus processos, incorporando novas rotinas e exigindo uma nova comunicação entre as pessoas e as atividades que as integram, refletindo novas relações de conhecimento individual e coletivo.

Tedesco (1998, p.19) também chama a atenção para o fato de que “as mudanças na sociedade atual estão intimamente vinculadas às novas tecnologias da informação. Essas tecnologias têm um impacto significativo não só na produção de bens e serviços, mas também no conjunto das relações sociais”.

Diante das inovações tecnológicas, exige-se, também, trabalho flexível e flexibilização das funções. O trabalho flexível procura reduzir os níveis de divisão e fragmentação do trabalho, ao oportunizar a rotatividade das funções. Assim o trabalhador deverá ser polivalente, desempenhar várias funções e desenvolver diferentes tarefas.

Salermo (2001, p.59) afirma que, como polivalente, o trabalhador deverá ser multifuncional que “se caracteriza por operar mais de uma máquina com características semelhantes” e deverá também ser multiqualificado para desenvolver e incorporar diferentes repertórios e habilidades profissionais.

[...]seja um operário responsável pela operação de um equipamento flexível, seguindo o princípio da flexibilização esta função abrangerá a execução de várias tarefas tais como: inspeção da qualidade dos produtos fabricados, manutenção preventiva do equipamento, preparação dos serviços, limpeza e ordem do local de trabalho e supervisão geral do processo... a flexibilidade do trabalho também abrange as multifunções que um trabalhador está capacitado a exercer... este aspecto seria representado pela capacidade adquirida pelo operário, ou grupo de operários, de operar diversos equipamentos ao longo do processo de produção saber operar vários tipos de máquinas definiria o grau de polivalência do operário, atributo a ser considerado nos sistemas de avaliação e retribuição da organização (TORRES JUNIOR, 1994, p. 95).

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Observa-se que, quanto mais avança o desenvolvimento científico e tecnológico, mais simples se torna o fazer do trabalhador. Por outro lado, mais complexa fica a sua qualificação, pois implica um difícil acesso à ciência, uma apropriação quantitativa e qualitativamente nova do conhecimento científico.

Machado (1995, p. 185) afirma que, com a flexibilização funcional, mais se exige do trabalhador: escolaridade básica, capacidade de adaptação a novas situações e compreensão global de um conjunto de tarefas, o que, por sua vez, demanda capacidade de abstrair e selecionar, assim como de tratar e interpretar informações.

Assis (2001), referindo-se à pesquisa executada pelo Instituto de Economia Industrial da Universidade Federal do Rio de janeiro, que pretendia delinear o cenário para a formação profissional do ano 2000, discute o significado do nível de qualificação do trabalhador:

em um rol de 15 atributos de qualificação despontaram como os mais relevantes para o profissional do futuro os que se seguem [...]: raciocínio lógico; habilidade para aprender novas qualificações; conhecimento técnico geral; responsabilidade com o processo de produção; iniciativa para resolução de problemas. (ASSIS, 2001, p. 194).

Tudo indica que o avanço da base técnica industrial, provocada pela microeletrônica, trouxe a automação e com ele as novas tecnologias da informação, favorecendo, em boa parte, a superação do taylorismo/fordismo que divide o trabalho de forma parcelarizada e repetitiva.

Neste sentido, levando em conta as transformações tecnológicas, o trabalhador deverá ser mais qualificado

o novo trabalhador não poderá ser preparado apenas para o exercício de tarefas fragmentadas e repetitivas. No nível da atividade concreta do trabalhador tornam-se prioritários o novo paradigma, conhecimentos sobre o processo global de fabricação e gestão da produção, que se configuram como conhecimentos abrangentes e amplos do processo produtivo. (MACHADO, 1995, p.195).

Portanto, com o avanço das tecnologias da informação, passa-se a exigir não mais o bom orador com ótima cultura geral, mas o dirigente com capacidade de inovar e aprender cada vez mais. Entende-se que isso significa que do trabalhador de novo tipo exige-se conhecimentos que lhe possibilitem compreender o conjunto das tarefas que deve desempenhar; desenvolver a capacidade de resolver problemas e saber operacionalizar e interpretar as informações adquiridas.

O trabalhador tradicional que se limitava a executar as tarefas repetitivas não serve mais. O novo trabalhador deve se apropriar do conhecimento que a escola pode lhe oferecer e construir novas competências que lhe dêem condições de agir prática e intelectualmente.

Esses atributos, não são exigidos somente para o operário, mas também àqueles que exercem ou vão exercer funções de dirigentes. Para esses dirigentes também será necessária uma formação que lhes possibilite novas formas de organização e

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gerenciamento, que também são exigidas pelas mudanças da sociedade. Acredita-se, portanto, que a escola deve oferecer um ensino que permita ao aluno

dominar os princípios teórico-metodológicos para compreender a produção científica e tecnológica contemporâneas; apropriar-se de conteúdos histórico-críticos que lhe possibilite compreender as relações sociais no seu conjunto.

Neste sentido a escola não pode ser um espaço em que apenas se transmitam informações, mas um lugar da sua análise crítica, como bem afirma Kenski (1996, p. 143):

As informações vêm de forma global e desconexa através dos múltiplos apelos da sociedade tecnológica. A escola precisa aproveitar essa riqueza de recursos externos, não para reproduzi-los em sala de aula, mas para polarizar essas informações, orientar as discussões, preencher as lacunas do que não foi aprendido, ensinar os alunos a estabelecer distâncias críticas com o que é veiculado pelos meios de comunicação.

O objetivo da educação escolar é preparar os indivíduos para que participem da vida política e produtiva. Sendo assim, pode ser pensada a partir de um projeto pedagógico que expresse as transformações por eles vivenciadas e o compromisso com um sistema de ensino no qual se tenha claro o tipo de cidadão que se quer formar e para que sociedade.

As transformações da sociedade contemporânea, contudo, levam a questionar seriamente: os fins da educação; a responsabilidade dos que assumem o processo educativo em função daqueles que precisam de referências para suas relações sociais e produtivas e, ainda, as premissas, os valores, a concepção de mundo e de ser humano, a partir dos quais se pretende formar as gerações presentes e futuras.

Entende-se que este dinamismo do mundo, trazido pelas inovações tecnológicas, tem sido muito significativo, pois pode proporcionar uma vasta aprendizagem, mesmo que de forma assistemática. Quanto à escola, pode contribuir para a sistematização deste processo e ser também um espaço no qual se manifestem o modo de ser do estudante e as contradições da sua realidade vivenciada.

Conforme explicitado anteriormente, acredita-se que cada sociedade, em cada época, tem formas próprias de expressar sua cultura e também de manifestar como os seres humanos se organizam e se relacionam, produzem e difundem o conhecimento. Neste sentido, pode-se afirmar que a escola ocupa uma importante função na formação do ser humano, pois é seu dever garantir a todos o acesso aos requisitos fundamentais à vida em sociedade.

Charlot (2001, p. 36) afirma que

a escola é o principal lugar de convivência social [...] alguns professores queixam-se de que, para muitos dos jovens, a escola é ‘apenas um ponto de encontro’ [...] No entanto, o encontro é uma das condições necessárias para que as relações de ensino/aprendizagem sejam realmente frutíferas,

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As instituições que outrora assumiam um papel de disciplinamento, socialização e moralização sofreram profundas transformações, inibiram-se ou perderam sua eficácia. No que diz respeito à escola, também se modificou. No dizer de Enguita (2004, p. 66):

Se antes ela ocupava apenas um lugar discreto na vida das pessoas (4 a 6 anos para a maioria, menos ou nada para muitos, e mais do que isso apenas para alguns poucos encaminhados às profissões liberais e burocráticas), passou a absorver praticamente a infância, a adolescência e boa parte da juventude [...] É desnecessário dizer que esse tempo a mais na escola é tempo a menos na família, na comunidade e no trabalho, o que por si só, já justifica um papel maior da escola na moralização das crianças.

Sendo assim, pode-se afirmar que, na contemporaneidade, também há um princípio educativo, baseado na flexibilidade, que norteia a relação das pessoas. A família, por exemplo, assume uma nova configuração. Devido às exigências da sociedade atual, cada um deve trabalhar muito para poder consumir e não há mais exclusividade para um provedor nem amparo para a concepção de relações eternas: casamentos e famílias desfazem-se e refazem-se continuamente.

Passa a predominar na sociedade o efêmero, o descartável, o flexível: na moda, nos produtos, nos processos de trabalho e até mesmo na instância dos valores como amizade, confiança e lealdade com ênfase para as celebridades instantâneas e para a descartabilidade. Esta flexibilização se percebe também nas relações afetivas, entre os jovens, caracterizadas como o “ficar”. De acordo com Almeida (2006, p.150):

[...] a prática do ‘ficar’ entre os jovens é captada em sua dimensão de instantaneidade, em seu traçado efêmero e seriado, em sua identidade volátil. [...] Esta prática é acionada, fundamentalmente, por encontros velozes e fugazes de jovens que têm no beijo sua expressividade mais radical.

No dizer de Vaitsman (1994, p. 48):

Estas transformações na organização socioeconômica e cultural, que atingiram boa parte do mundo contemporâneo, ajudariam a explicar por que as pessoas passaram a se descartar com muito mais facilidade não apenas dos bens, mas também dos valores, estilos de vida, relações estáveis e ligação com as coisas, construções, lugares, pessoas e modos herdados de fazer e ser: o sentido de que ‘tudo que é sólido desmancha no ar’ raramente teria sido tão penetrante.

Sennett (1999, p. 27) faz essa discussão, referindo-se ao “longo prazo”.

Como se podem buscar objetivos de longo prazo numa sociedade de curto prazo? Como se podem manter relações sociais duráveis? Como pode um ser humano desenvolver uma narrativa de identidade e história de vida numa sociedade composta de episódios e fragmentos?

Estas transformações pautadas na descartabilidade, na fragmentação, na flexibilidade, possuem um grande significado no desenvolvimento social, econômico

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e cultural da história do capitalismo, pois obriga a todos refletirem acerca das possibilidades de transformações e modificações das condições da sociedade atual.

Percebe-se que há uma positividade no avanço tecnológico marcado pela flexibilidade, como o acesso a informação, as conquistas emancipatórias das mulheres e as novas formas de aprendizagem. Ao mesmo tempo há uma preocupação das famílias quanto às condições em que podem formar seus filhos, especialmente considerando sua própria ausência, ainda que necessária: todos os seus membros precisam trabalhar, para consumir e suprir as suas necessidades. Assim sendo, a escola viria ao encontro dos anseios dos pais, como afirma Enguitta (2004, p. 64): “hoje, a escola complementa a família como fazia antes a pequena comunidade à sua volta”.

Pesquisas desenvolvidas por Souza, Bianchetti, Almeida (1994); Sallas et al. (1999; 2003); Spósito et al. (1989), entre outras coisas, indicam que o jovem valoriza a escola como condição necessária para o desempenho profissional e facilitadora de acesso ao mercado de trabalho.

Kuenzer (1995) mostrou, em pesquisa realizada junto a operários, que a escola é, para eles, a alternativa para a apropriação do saber socialmente produzido, que não só lhes permite compreender melhor seu mundo e sua situação de classe como lhes proporciona melhores condições de vida.

[...] reconhecem a importância desse saber (teórico), e a escola como local em que isso ocorre, Ou seja, percebem claramente que, embora a competência que a prática lhes confere seja suficiente para que ele realize seu trabalho com eficiência, o acesso a outras condições de vida e de trabalho depende da aquisição de um outro tipo de saber, conferido pela escola: o saber teórico. Ela (a escola) aparece aos operários como um local de efetiva democratização do saber e de humanização, a partir do que serão melhoradas suas condições de vida (KUENZER, 1995, 145 e 147).

Numa outra pesquisa, desenvolvida com alunos trabalhadores do 2° grau3, Kuenzer (1992) indica que eles reivindicam um ensino competente que lhes possibilite entrar no mundo do trabalho e prosseguir seus estudos, ingressando na universidade. Isso significa que o aluno vê na escola de segundo grau a mediação que lhe possibilita se apropriar do saber e lhe dá acesso a um emprego e à universidade. Nas expectativas do aluno trabalhador, está bem presente uma escola que lhe proporcione melhor compreensão do mundo em que vive e entendimento das transformações da sociedade trazidas pela ciência e pela tecnologia.

Os alunos trabalhadores procuram a escola para melhor compreender o mundo em que vivem, para conhecer, para entender as transformações causadas na sociedade pelo avanço da ciência e da tecnologia, para aprender novas formas de comunicação, para conhecer e participar de outros grupos e de outras experiências sociais e culturais... no horizonte da aspiração do aluno trabalhador está a universidade, ele tem clareza que é só através de uma escola de 2° grau que lhe

3 A nova Lei de Diretrizes e Bases, n° 9.394, de 20.12.1996, refere-se à etapa final da educação básica, como Ensino Mé-dio. Porém, opta-se pela expressão 2º grau, nessa discussão, respeitando o ano de publicação (1992), segunda edição, da obra de KUENZER: Ensino de 2° grau: o trabalho como princípio educativo.

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permita o acesso a um bom emprego que isto será possível. Será, pois, através da mediação de um 2° grau que lhe permita o acesso a algum saber sobre o trabalho que, apesar dos limites impostos pela sua origem de classe, o aluno trabalhador poderá assegurar as condições necessárias no financiamento do acesso e permanência nos cursos superiores (KUENZER, 1992, p. 101-102).

As referidas pesquisadoras na verdade nos mostram que alunos e trabalhadores reivindicam o acesso a um saber que lhes dê condições de conhecer as relações que determinam seu modo de vida e ainda de participar ativamente da vida política e produtiva. Portanto, acredita-se que a escola se torna o espaço que pode garantir a apropriação dos princípios teórico-metodológicos necessários ao incremento do fazer e do pensar dos seres humanos.

Considerando as reflexões até aqui realizadas, entende-se que:1) novas questões se colocam para o sistema de ensino, pois não só mudanças

tecnológicas acontecem, mas também se transforma o modo de os sujeitos se relacionarem com o conhecimento, interagirem e se organizarem;

2) ocorre uma ampliação dos espaços pedagógicos, em conseqüência do uso das tecnologias da informação e comunicação, que leva o processo de aprender para além dos muros escolares, afetando significativamente as relações dos indivíduos consigo mesmos e com os outros.

3) o princípio educativo presente no mundo do trabalho marca sua presença tanto na família quanto na escola. Neste caso, pode-se afirmar que trabalho, família e escola estão diretamente articulados no projeto pedagógico da sociedade do seu tempo e é, sob esta égide, que as pessoas são formadas.

No âmbito da educação, não se podem ignorar tais mudanças, que afetam as relações entre o mundo do trabalho, família e escola. O mundo do trabalho exige um profissional flexível e multifuncional. A família já não possui as características patriarcais em que a rigidez e a hierarquização imperavam: o pai ditava as normas e os filhos deviam apenas obedecer. A escola não é mais a continuação da família, “o segundo lar”. Atualmente a criança não mais passa de uma instituição rígida e hierárquica para outra semelhante. Reitere-se que as transformações da sociedade, acima explicitadas, afetam diretamente as relações entre família e escola. Observa-se que é preciso refletir seriamente sobre o fato de que crianças e jovens passam (de acordo com a lei) onze anos na escola básica e pelo menos mais quatro anos na Educação Superior: um longo tempo de permanência, que confere à instituição escolar grande responsabilidade na formação de sua identidade e no seu preparo para participar ativamente da vida em sociedade.

Por isso, defende-se a necessidade de uma mudança de paradigma que provoque os indivíduos à indignação diante das injustiças sociais, que os conduza à autonomia e à busca de alternativas para transformação da realidade. “Esse novo paradigma exige uma formação docente e discente que supere a visão linear e torne-se mais integradora, crítica e participativa.” (BEHRENS, 2006, p.20)

Este novo paradigma, denominado por Morin de complexidade,

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conduz à superação da visão linear e disciplinar na escola e leva a buscar a interconexão das diversas áreas do conhecimento. Com vistas a consolidar essa interconexão e a unificação, aponta para processos de aprendizagens que envolvam a produção do conhecimento crítica, reflexiva e transformadora. (BEHRENS, 2006, p. 26)

Segundo Morin (2004, p.89), torna-se necessário “substituir um pensamento que isola e separa por um pensamento que distingue e une, um pensamento disjuntivo e redutor por um pensamento complexo, no sentido originário do termo complexus: o que é tecido junto”. No contexto educacional essa perspectiva é um grande desafio e exige investimentos profundos na constituição de referenciais confiáveis.

Por esta vertente de análise, acredita-se que a ação do professor é indispensável no sentido de rever a sua ação e tomar o novo paradigma como uma possibilidade concreta de transformação da sociedade através das ações individuais e coletivas, especialmente através do investimento na sua formação profissional.

Como afirmou Freire (1994, p. 29):

O professor, como sujeito direcionador da práxis pedagógica escolar, tem que, no seu trabalho, estar atento a todos os elementos necessários para que o aluno efetivamente aprenda e se desenvolva. Para isso, o professor deverá ter presentes os resultados das ciências pedagógicas, da didática e das metodologias específicas de cada disciplina, ou seja, um profissional que estará sempre se atualizando.

Entende-se que a ação do professor em sala de aula consiste num conjunto de atitudes que revelam o seu fazer e o seu pensar pedagógico seja no processo de ensino propriamente dito, na avaliação, na seleção de conteúdos ou no uso de recursos tecnológicos.

Sendo assim, o professor deve estar atento ao sentido e ao significado da sua ação revelando, na sua prática cotidiana, o seu projeto de ser humano e de sociedade, ou seja, o conteúdo ensinado contribui para a formação de que tipo de sujeito e de profissional para atuar em qual sociedade?

Neste sentido entende-se que, além do domínio do conteúdo técnico e científico que se propõe a ensinar, o professor deve ser comprometido politicamente com o que faz. É neste compromisso que ele revela seu projeto de sociedade e de sujeito que pretende formar por meio da sua forma de organizar a realidade e as suas ações diárias. Quando o professor não elabora um sentido específico para a sua ação, ele apenas assegura a manutenção do ritual tradicional da docência: transmissão do conteúdo; controle da disciplina e rigorosos instrumentos de avaliação para que os alunos reproduzam o que foi ensinado.

Neste sentido Masetto (2002, p. 23) afirma que

O professor, ao entrar na sala de aula para ensinar uma disciplina, não deixa de ser um cidadão, alguém que faz parte de um povo, de uma nação [...] Ele tem uma visão de homem, de mundo, de sociedade, de cultura e de educação

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que dirige suas opções e suas ações mais ou menos conscientemente. Ele é um cidadão, um ‘político’, alguém comprometido com seu tempo, sua civilização e sua comunidade, e isso não desprega de sua pele no instante em que ele entra em sala de aula. Pode até querer omitir esse aspecto em nome da ciência que deve transmitir, e que, talvez ingenuamente, ainda entenda que possa fazê-lo de forma neutra. Mas o professor continua cidadão e político e, como profissional da docência, não poderá deixar de sê-lo.

Para tanto, ele deve estar constantemente ocupado consigo mesmo em rever, analisar e inventariar a sua concepção de mundo, ou seja, aquilo que dá sustentação à sua ação docente, para torná-la a cada dia mais unitária, coerente e consistente. Como diria Gramsci (1986, p.12):

Criticar a própria concepção do mundo, portanto, significa torná-la unitária e coerente e elevá-la até o ponto atingido pelo pensamento mundial mais desenvolvido. Significa, portanto, criticar, também, toda a filosofia até hoje existente, na medida em que ela deixou estratificações consolidadas na filosofia popular. O início da elaboração crítica é a consciência daquilo que somos realmente, isto é, um ‘conhece-te a ti mesmo’ como produto do processo histórico até hoje desenvolvido, que deixou em ti uma infinidade de traços recebidos sem benefício no inventário. Deve-se fazer, inicialmente, este inventário.

Se o professor estiver em contato com o seu tempo poderá compreender a sociedade na qual vive, detectando o seu movimento histórico; sua cultura; a forma como os seres humanos estabelecem as relações entre si e as possibilidades de transformação e, assim, identificar seu aluno nesse contexto.

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