Verdades e mentiras

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Pelos mestres, ou consultores, que Rhonda Byr- ne escolheu para entrevistar e pelo espaço que dá a cada tema, fica evidente que sua maior pre- ocupação era satisfazer o desejo das pessoas in- teressadas na prosperidade financeira. Apesar de estar passando um momento delicado em sua vida também no aspecto espiritual, a autora rele- gou-o a um plano secundário ao idealizar o fil- me. A maior parte dos escolhidos ensina a usar a força do pensamento positivo para criar oportu- nidades e alcançar a riqueza, o eterno sonho Os mestres de Rhonda

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Pelos mestres, ou consultores, que Rhonda Byr-ne escolheu para entrevistar e pelo espaço que dá a cada tema, fica evidente que sua maior pre-ocupação era satisfazer o desejo das pessoas in-teressadas na prosperidade financeira. Apesar de estar passando um momento delicado em sua vida também no aspecto espiritual, a autora rele-gou-o a um plano secundário ao idealizar o fil-me. A maior parte dos escolhidos ensina a usar a força do pensamento positivo para criar oportu-nidades e alcançar a riqueza, o eterno sonho

Os mestres de Rhonda

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americano. O público deve ter pensado: “Se es-ses especialistas em ganhar dinheiro defendem e adotam esta ‘Lei da atração’, então o caminho só pode ser esse mesmo”.

Mesmo numa época em que se discute se a busca desenfreada pelo enriquecimento material não é um dos fatores determinantes da degrada-ção da vida no planeta, vários dos “mestres” não têm qualquer pudor em se apresentar como au-tênticos profetas da riqueza. No breve resumo de suas biografias, Loral Langemeir é apresentada como alguém que “tem ajudado muita gente a se tornar milionária”; o autodidata James Arthur Ray e o corretor David Schirmer prometem ensi-nar como se obter “ganhos financeiros ilimitados”, e John Assaraf é definido como uma fonte de “idéias originais de como construir empresas e ganhar dinheiro”. Há ainda os escritores que ven-deram milhões de exemplares e os conferencistas que já ajudaram milhares e milhares de pessoas,

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tudo no superlativo, como os cifrões que esses trabalhos geraram.

Tudo na obra de Rhonda remete ao indivíduo, em oposição ao coletivo. Não está em jogo o de-senvolvimento da sociedade, do país ou da raça humana, mas sim o de cada espectador ou leitor. A palavra mais falada e lida é “você”. O que im-porta é a sua felicidade, a sua realização pessoal, o seu sucesso, a sua riqueza. Percebem-se tími-dos sinais de ética, de sacrifício pelo bem co-mum, logo abafados pelo clamor do dinheiro rápido e fácil.

Um dos raros exemplos de uma visão mais transcendental é o de Marci Schimoff, co-auto-ra de Chiken soup for the womans’s soul e Chi-ken soup for the mother’s soul, presidente da Es-teem Group, “empresa que oferece programas de auto-estima e inspiração para mulheres”. Marci deve ter tido a maioria de suas falas cor-tadas, pois aparece muito menos do que os ou-

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tros consultores, mas assina uma frase muito interessante no capítulo “O Segredo para o di-nheiro”. Diz ela:

“Muitas pessoas na cultura ocidental lutam pelo sucesso. Elas querem a melhor casa, que-rem que seus negócios prosperem, querem todas essas coisas externas. Mas o que descobrimos em nossa pesquisa foi que ter essas coisas externas não necessariamente garante o que realmente queremos, que é a felicidade. Então buscamos essas coisas externas pensando que elas nos da-rão felicidade, mas isso é um equívoco. Você precisa primeiramente buscar a alegria interior, a paz interior, a visão interior, e depois todas as coisas externas aparecem.”

Marci não chega a ter dez citações no livro – um terço das observações do marqueteiro Joe Vi-tale –, mas suas participações são sempre ponde-radas e buscam perscrutar além das aparências. Um livro sobre mentalização que priorizasse o

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equilíbrio emocional e a harmonia teria também de conter a filosofia de mestres orientais chineses e hindus, por exemplo, e especialistas nas ciências do comportamento. Mas o caráter comercial da obra e o foco no mercado norte-americano mos-tram que O Segredo provavelmente tenha nascido com pretensões regionais e acabou se universali-zando pelo inesperado apoio de Oprah Winfrey e a obsessão universal pela fortuna fácil.

Além de Wallace Wattles (1860-1911), um dos pioneiros do Novo Pensamento, inspirador de O Segredo através do livro The science of get-ting rich, Rhonda recheia seu livro com ensina-mentos de outras três lendas da auto-ajuda: Ge-nevieve Behrend (1881-1960), autora de Your invisible power e Attaining your hert’s desire; Charles Hannel (1866-1949), escritor do clássi-co The master key system; e Prentice Mulford (1834-1891), que escreveu Thoughts are things e The White cross library.

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Seus 24 mestres vivos, apresentados em mini-biografias ao final do livro, são os seguintes:

John Assaraf – Ex-menino de rua, hoje “com-partilha com empresários idéias originais de co-mo construir empresas e ganhar dinheiro”.

Michael Bernard Beckwith – “Trans-reli-gioso progressista não-alinhado” que ensina meditação e prece científica.

Lee Brower – Consultor de empresas.

Jack Canfield – Escritor de auto-ajuda, autor do sucesso The Success Principle.

John Demartini – Na infância foi considerado retardado mental. Hoje é médico, filósofo, escri-tor e conferencista.

Marie Diamond – Professora de feng shui.

Mike Dooley – Empresário, define-se como “aventureiro da vida”.

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Bob Doyle – Criou um site que fala da aplica-ção prática da lei da atração.

Hale Dwoskin – Escritor, autor de The Sedo-na Method.

Morris Godman – Sobreviveu a um acidente de avião em 1981 e dá palestras sobre sua recu-peração.

John Gray – Escritor, autor de Homens são de marte, mulheres são de Vênus.

John Hagelin – Físico quântico e educador.

Bill Harris – Especialista em meditação pro-funda.

Ben Johnson – Médico, especializou-se em “cura energética” depois que ela o salvou de uma doença incurável.

Loral Langemeier – Consultora que ensina como ficar rico.

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Lisa Nichols – Dirige programas sociais de ca-pacitação.

Bob Proctor – Professor, conferencista, espe-cializado em poder mental.

James Arthur Ray – Criou uma empresa que ensina pessoas a “obter ganhos ilimitados em todas as áreas”.

David Schirmer – Corretor, investidor e con-sultor de investimentos.

Marci Shimoff – Líder transformacional, diri-ge seu trabalho especialmente à melhoria de vi-da das mulheres.

Joe Vitale – Ex-morador de rua, hoje doutor em ciência metafísica, hipnoterapeuta, pastor e adepto da cura Chi Kung.

Denis Waitley – Conferencista, consultor, trei-nou astronautas da Nasa e atletas olímpicos.

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Neale Donald Walsch – Escritor, escreveu “Conversando com Deus”.

Fred Alan Wolf – Físico, escritor e confe-rencista.

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Não se pode negar que o livro e o filme produzidos por Rhonda Byrne estão baseados em um fato au-têntico. Nem é preciso ser um cientista para saber e reconhecer que o poder mental existe e que ele tem o dom de alterar situações e produzir coisas. O que colocou o homem acima dos outros animais foi jus-tamente esta capacidade de aprender, compreender, adaptar-se e juntar esse conhecimento adquirido para imaginar novas soluções para velhos proble-mas. Da faísca do primeiro pensamento veio a cha-ma que iluminou o mundo. É só olhar ao redor para

O poder mental é uma realidade

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ver tudo o que ela criou – para o bem e para o mal. A cada dia dá-se mais um passo no entendimento dessa indomável propriedade humana, ainda longe de ser totalmente delimitada.

A comunidade científica está muito próxima de anunciar os primeiros aparelhos comandados pe-los impulsos emitidos pelo cérebro. Pesquisadores da Biocontrol Systems, em Palo Alto, Califórnia, trabalham há mais de dez anos no projeto e estão perto de construir o primeiro computador que funcionará obedecendo ordens básicas – sim, não, direita, esquerda, ligar, desligar – transmitidas por ondas cerebrais.

Médiuns a serviço do FBI – Federal Bureau of In-vestigation – têm encontrado vítimas e descrito cri-minosos com uma precisão que impressiona até os policiais mais céticos. Esses próprios videntes não sabem explicar por que têm essas visões, mas geral-mente precisam tocar objetos da vítima ou visitar o local para sentir as vibrações e “ver” as cenas, como

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se estivessem entrando em uma dimensão que os re-mete ao tempo em que o crime aconteceu.

Esse raro poder mental parece ser hereditário e fortalece interpretações de que o espaço está coa-lhado de faixas de tempo que se sobrepõem. As-sim, uma frase de Albert Einstein está passando bem debaixo do nosso nariz, enquanto a imagem de Cristóvão Colombo pisando o solo da América rompe entre nossas axilas. Grosso modo, um viden-te captaria momentos que já se foram, ou que estão por vir.

Saúde ou doença

Está comprovado que podemos gerar saúde ou doença em nosso corpo dependendo das direções tomadas por nosso pensamento. Pessoas deprimi-das têm maior possibilidade de adquirir doenças, enquanto as mais animadas geralmente são mais saudáveis. Hoje sabe-se que o humor está direta-

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mente ligado ao estado imunológico, e por isso o riso, a alegria têm sido tão difundidos nos hospi-tais, onde voluntários atuam inspirados no exem-plo do médico-palhaço Hunter “Patch” Adams, vi-vido por Robin Williams no filme Patch Adams – o amor é contagioso, de 1998.

Adams, que em suas palestras costuma afirmar que “o riso é tera pêutico”, certamente avalizaria a his-tória que aparece na página 128 de O Segredo, assina-da por Cathy Goodman: “Uma das coisas que fiz para me curar (de câncer de mama) era ver comédias. Tu-do o que fazíamos era rir sem parar. Nós não podía-mos colocar mais estresse na minha vida, pois sabía-mos que o estresse é uma das piores coisas que você pode ter quando está tentando se curar”.

Acreditar no sucesso – o que em alguns casos significa acreditar na própria sobrevivência – é o primeiro passo para ser bem-sucedido, não há dú-vida. Isto fica claro em situações extremas, de peri-go iminente. A maioria dos que sobrevivem é dos

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que se mexem, fazem alguma coisa, tentam alguma saída, por mais improvável que ela seja. A quase totalidade das vítimas se conforma com a situação e se deixa abater.

Também há muitas evidências de que o definha-mento provocado pela tristeza profunda pode levar à morte. Indigenistas, pesquisadores e desbravado-res recheiam seus relatos com casos assim entre os índios sul-americanos, principalmente quando estes perdem um filho, já que têm verdadeira adoração por suas crianças. Mesmo a sociedade moderna tem histórias parecidas. Por exemplo: faz parte da sabe-doria popular a crença de que se um casal de velhi-nhos que vive feliz há muito tempo é separado pela morte de um deles, o outro invariavelmente não de-mora muito a ter o mesmo destino. A não ser que encontre outras razões para viver.

Coloque a mão na frente dos seus olhos e come-ce a mexer os dedos. Ao mesmo tempo mexa os dedos dos pés, contraia e solte o abdômen, abra e

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feche a boca, pisque os olhos, erga as sobrancelhas, vire o rosto de um lado a outro... O.k Pode parar. Viu quantos comandos seu cérebro deu a seus mús-culos ao mesmo tempo? Se nossa musculatura de-pende tanto dessas ordens, que levam apenas mi-lionésimos de segundo para chegar ao seu destino, será que nossas células também não são movidas por comandos do cérebro?

Não se pode afirmar sobre cada cédula, mas, que alguns órgãos do corpo obedecem fielmente às de-terminações que vêm de cima, não há a menor dú-vida. Há dez anos, entrevistando um conceituado urologista, surpreendi-me quando ele disse que o órgão sexual mais importante do nosso corpo é o cérebro. Logo, porém, entendi a lógica absoluta.

Ora, é o cérebro que decide quando e por quem você sentirá desejo. Há pessoas altamente desejáveis para alguns que não provocam qualquer reação em outras. Não há racionalidade no desejo, apesar de a sociedade nos impor padrões de beleza e sensualida-

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de. Eu diria que é mais difícil resistir a Sandra Bullock do que a Julia Roberts, mas mesmo Oprah Winfrey deve ter fãs ardorosos.

Por outro lado, o maior fator de impotência é o medo da impotência. A incerteza vem do cérebro, e aquilo que era para ser uma reação natural do corpo a uma situação potencial de prazer se transforma em medo do fracasso, enfim, num drama. Em suma, vo-cê atrai para si o que quer e o que não quer, desde que coloque isso – voluntária ou involuntariamente – no centro de seus pensamentos.

O Segredo é a Neurolingüística?

O uso do pensamento positivo para obter resul-tados práticos é evidente na aplicação da Neurolín-güística, ou Programação Neurolingüística, PNL, definida por Joseph O’Connor e John Seymur co-mo “a arte e a ciência da excelência das qualidades pessoais”. A PNL foi desenvolvida a partir do início

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dos anos 70 por John Grinder, professor de Lingü-ística, e Richard Bandler, psicólogo que também se interessava por psicoterapia. Juntos, eles estuda-ram os respeitados terapeutas Fritz Perls, Virginia Satir e Milton Erickson com a intenção de identifi-car os padrões utilizados por eles que pudessem ser ensinados a outras pessoas.

Grinder e Bandler acabaram descobrindo que os três terapeutas avaliados, apesar de ter personalida-des muito diferentes, usavam padrões semelhantes em seu trabalho. Os resultados da pesquisa foram di-vulgados e analisados em quatro livros publicados entre 1975 e 1977. Em 1976 os autores resolveram ba-tizar sua descoberta de Programação Neurolingüísti-ca, que, se você já leu O Segredo, perceberá que expri-me exatamente o que Rhonda Byrne tenta reinventar em seu livro.

A expressão cunhada por Grinder e Blander compreende três idéias: a Neuro, que reconhece o fato de que todo comportamento nasce de proces-

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so neurológico; a Lingüística, que indica que usa-mos a linguagem para ordenar pensamentos e comportamentos e nos comunicarmos com os ou-tros; e Programação, que se refere à maneira como organizamos nossas idéias e ações a fim de produ-zir resultados.

Em suma, a Programação Neurolingüística ex-plica como nossa cabeça funciona para nos deixar alegres ou tristes, o que fazemos para gostar de nós mesmos, como usamos nossos recursos para sermos mais felizes e realizados e nos tornarmos mais bem-sucedidos profissionalmente e nos re-lacionamentos com a família e os amigos. Enfim, todos os pontos tocados por Rhonda Byrne em seu filme e livro.

Vitória ou derrota

Desde a revelação de Grinder e Bandler a Neu-rolingüística foi adotada em várias áreas que de-