Victor Assis Brasil em “Só tinha de ser com você"

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    II Congresso da Associao Brasileira de Performance Musical

    Vitria/ES 2014 // ABRAPEM UFES - FAMES

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    Projeto interpretativo de Victor Assis Brasil em S tinha de ser comvoc

    COMUNICAO

    Fernando Seiji SagawaUnicamp/[email protected]

    Regina MachadoUnicamp/[email protected]

    Resumo: Este trabalho tem por objetivo analisar a interpretao do saxofonista VictorAssis Brasil sobre a msica S tinha de ser com voc de Tom Jobim e Aloysio deOliveira. A partir de paralelos com o modelo de anlise do comportamento vocal proposto

    por Regina Machado, ser analisado o uso de recursos idiomticos do saxofone bem comorecursos de variao da melodia na tentativa de demonstrar a proximidade entre ossignificados da cano e o projeto interpretativo presente na gravao.

    Palavras-chave: Victor Assis Brasil. Saxofone. Comportamento vocal. Semitica dacano. Samba-jazz.

    Title of the Paper in English:Victor Assis Brasils interpretive Project in S tinha de sercom voc

    Abstract:This paper aims to examine the interpretation of saxophonist Victor Assis Brasilof the song "S tinha de ser com voc" by Aloysio de Oliveira and Tom Jobim. Using

    parallels with the analysis model of the vocal behavior proposed by Regina Machado, wewill analyze the use of saxophone idiomatic features and variation features of the melody inan attempt to demonstrate the proximity between the meanings of the song and theinterpretation in this recording.

    Keywords:Victor Assis Brasil. Saxophone. Vocal behavior. Song Semiotics. Samba-jazz.

    1.

    Introduo

    Saxofonista e compositor, Victor Assis Brasil (1945-1981) foi uma figura

    expressiva na msica instrumental brasileira dos anos 1960 e 1970. Sua produo

    musical, principalmente a registrada em discos, demonstra influncias marcantes da

    msica popular brasileira e do jazz norte-americano. Mais do que isso, podemos ouvir

    em suas gravaes um constante atrito entre procedimentos e elementos oriundos desses

    estilos.

    Principalmente no incio de sua carreira podemos observar a presena

    constante de um procedimento comum ao jazz e ao samba-jazz: o uso da melodia e

    harmonia de canes consagradas como uma base para improvisao. Em trs de seus

    quatro primeiros discos - Desenhos (1966), Trajeto (1968) e Victor Assis Brasil toca

    Tom Jobim (1970) a grande maioria do repertrio demonstra essa influncia

    apresentando interpretaes de canes brasileiras e norte-americanas. Nesse contexto

    de sua carreira, Victor grava em 1970 S tinha de ser com voc de Tom Jobim e

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    Aloysio de Oliveira. Apesar da evidente ligao com o universo do samba-jazz, essa

    interpretao de Victor demonstra particularidades que apontam para uma maior

    ateno aos significados da cano.

    1.1 Integrao melodia e letra

    Segundo a definio de TATIT (2008), o ncleo que define a identidade

    da cano formado pela relao entre melodia e letra, relao essa presente j na

    concepo feita pelo compositor. Mais especificamente, TATIT aponta trs possveis

    regimes de integrao entre melodia e letra: o de passionalizao, o de tematizaoe o

    de figurativizao. O regime de passionalizao est relacionado ao estado de

    disjuno, separao, entre sujeito e objeto e se manifesta na melodia e na letra atravs

    de metforas de busca, sendo uma possibilidade o desenvolvimento da melodia ao longode uma tessitura vasta e a presena de saltos intervalares longos. A tematizao est

    associada a conjuno entre sujeito e objeto e,grosso modo, se manifesta em melodias

    de tessitura pequena e repetio motvica. Afigurativizao, por sua vez, est associada

    proximidade com a fala e sua sobreposio a elementos musicais.

    Importante notar que nessa proposta de anlise semitica da cano, os

    regimes de integrao entre melodia e letra podem ser encontrados dentro de uma

    mesma cano, sendo, na maioria dos casos, um deles predominante. Essa coexistnciaentre os diversos regimes de integrao entre melodia e letra da vazo a atuao dos

    cantores em uma quantidade praticamente infinita de interpretaes.

    1.2 Anlise do comportamento vocal

    Em sua tese de Doutorado, Regina Machado prope a anlise do

    comportamento vocal e de sua inter-relao com o conjunto de significados presentes no

    ncleo melodia e letra. Os elementos presentes em uma interpretao estejam eles

    associados aos nveis fsico, tcnico ou interpretativo (MACHADO, 2012: p. 48-55)

    so analisados em relao a sua concordncia com o regime de integrao predominante

    na cano ou em relao a sua capacidade de revelar regimes de integrao secundrios

    trazendo luz novos significados.

    A combinao de uma emisso vocal que valoriza harmnicos graves, a

    presena de vibratoe o prolongamento voclico, por exemplo, podem apontar para a

    inteno do intrprete de valorizar caractersticas de determinada cano associadas

    passionalizao. J uma escolha de andamento mais acelerado associada a uma

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    articulao rtmica (MACHADO, 2012: p. 52) com nfase nas consoantes, por sua vez,

    valoriza caractersticas ligadas tematizao.

    2. S tinha de ser com vocde Victor Assis Brasil

    A seguir ser apresentada uma breve anlise do projeto interpretativo de

    Victor Assis Brasil em sua verso de S tinha de ser com voc. Tal anlise se r feita

    de forma anloga a anlise proposta por MACHADO para o comportamento vocal, e

    apontar para as possveis relaes entre o comportamento do saxofonista enquanto

    intrprete e os regimes de integrao entre melodia e letra presentes na cano.

    (As indicaes de compasso (c.) se referem transcrio (partitura) anexa).

    2.1 Protocolo

    Ao analisar o comportamento vocal de intrpretes do cancioneiro brasileiro,MACHADO (2012) prope um protocolo inicial que, entre outras coisas, atenta para

    uma srie de decises que so tomadas antes da performance e que consequentemente

    fazem parte de seu projeto interpretativo. Dentre essas decises anteriores

    performance temos a escolha do andamento, da Forma, da tonalidade e da

    instrumentao. Adaptadas, quando necessrio, ao contexto do saxofone, essas escolhas

    sero identificadas e analisadas na execuo de Victor Assis Brasil no intuito de

    delinear mais claramente seu projeto interpretativo.Na gravao que ele realiza da cano S tinha de ser com voc (1970)

    ouvimos uma introduo muito breve de apenas um tempo de compasso 2/4, realizada

    pela bateria. De carter funcional, essa introduo indica o andamento e a subdiviso

    rtmica predominante na pea a de semicolcheia. O andamento em questo

    levemente mais acelerado do que o da maioria das gravaes anteriores i. Em termos

    genricos, andamentos mais rpidos evidenciam o carter rtmico das melodias ao

    mesmo tempo em que dificultam variaes aggicasperceptveisque juntamente com

    o deslocamento rtmico uma caracterstica frequente na interpretao de cantores

    associados Bossa-Nova. Tais caractersticas associadas a um andamento mais

    acelerado esto presentes na interpretao de Victor, que apresenta a rtmica da melodia

    apoiada na subdiviso de semicolcheias e quase nenhuma variao aggica.

    Em relao Forma, as escolhas do saxofonista apontam para uma tenso

    entre estruturas recorrentes no jazz e na cano. Assim como na execuo padro de um

    standardde jazz, na gravao de Victor Assis Brasil ouvimos a melodia original das

    trs estrofes de S tinha de ser com voc, seguida por uma seo central com

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    improviso sobre a harmonia da msica, depois pela reexposio da melodia (apenas das

    estrofes um e dois) e, por fim, por uma codaum improviso de saxofone em fade out

    sobre uma harmonia cclica de oito compassos. No entanto, dentro dessa estrutura

    formal, Victor opta por no improvisar na seo central, passando o solo para o

    guitarrista Hlio Delmiro. Dessa forma, Victor se coloca da mesma maneira que um

    cantor, interpretando a melodia principal e deixando a seo instrumental que

    contrasta com a seo cantada e ao mesmo tempo prepara sua volta a cargo de outro

    msico.

    De forma tambm anloga aos cantores, Victor escolhe uma tonalidade que

    torne a tessitura da melodia a ser tocada possvel para a tessitura de seu instrumento.

    Mais do que isso, segundo MACHADO (2012, p. 59), a escolha de uma tonalidadeespecfica por parte do intrprete pode revelar a inteno de expor determinada regio

    de sua tessitura que possivelmente se compatibilizaria com o plano de contedo da

    cano. Guardadas as devidas propores entre a voz e o saxofone, o caso aqui

    analisado aponta para essa intencionalidade na escolha da tonalidade.

    Alm de simplesmente alocar a melodia em uma tessitura possvel para o

    saxofone alto, Victor escolhe a tonalidade de M bemol (som real) para que a parte mais

    aguda da melodia coincida com uma regio aguda da tessitura do saxofone. Maisprecisamente, devido escolha de tonalidade realizada por Victor, a melodia que

    acompanha os quatro primeiros versos da terceira estrofe (c. 34-41) iniciada pela nota

    F 5 (R 6 na transposio para o saxofone), que corresponde a uma regio aguda do

    saxofone. Dessa forma, o saxofonista acrescenta brilho e projeo ao timbre dessa seo

    clmax da melodia, intensificando a chegada regio aguda o que possibilita mais

    claramente a percepo do percurso meldico. Seguindo os preceitos da Semitica da

    Cano, o carter passional de uma melodia revela-se tambm pela percepo de um

    longo percurso meldico estabelecido pela distncia entre seus extremos, fato que

    materializa a distncia entre sujeito e objeto. No caso dessa cano, esse estado juntivo

    tratado na letra e reiterado pela melodia que realiza um salto em direo ao agudo e

    estabiliza a permanncia nessa regio atravs de movimentos repetitivos: voc que

    feita de azul/ me deixa morar nesse azul/ me deixa encontrar minha paz.

    No que diz respeito instrumentao, a gravao de Victor se encaixa na

    definio que GOMES (2010) prope para o Samba-Jazz no qual, segundo entendemos,

    o disco de Victor Assis Brasil em questo se encaixa ii. Segundo GOMES (2010: p. 47),

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    o Samba-Jazz abarca um processo de frico intenso entre o jazz e o samba. Nesse

    processo foram incorporados do jazz no apenas procedimentos como um tipo

    especfico de improviso, o compingiiie a Forma do standardmas tambm elementos

    de estilocomo comportamento meldico, repertrio e instrumentao. Na gravao

    em questo, ouvimos uma instrumentao de quarteto consagrada pelo jazz a partir dos

    anos 1940 saxofone, piano, baixo e bateria acrescido de guitarra, instrumento

    tambm bastante comum ao repertrio jazzstico.

    2.2 Recursos idiomticos do saxofone

    Ao ouvir um saxofone no contexto da msica popular, podemos destacar

    uma srie de recursos expressivos que so tidos como caractersticos do mesmo, seja

    por seu largo uso ou pela sua facilidade de serem produzidos pelo instrumento. Taisrecursos so chamados de idiomticos e a maneira como so produzidos e combinados

    tem papel importante na individuao de cada saxofonista. Na gravao de Victor de

    S tinha de ser com voc notamos a presena marcante de alguns desses recursos

    idiomticos tais como o bend, oglissando, notas mortas (ghost notes), a apojatura, o

    trinado e o som rouco (growling) (ROACH, 2009: p. 88-93). Devido pequena

    extenso desse trabalho, concentraremos nosso ateno apenas sobre o uso do bend.

    Produzido a partir da variao na presso dos lbios ao tocar uma nicanota, o bend tem como resultado sonoro a variao da afinao dessa nota. Bastante

    frequente nas gravaes de Victor Assis Brasil, aparece basicamente de trs maneiras

    diferentes na performance aqui analisada: variao de afinao ascendente que termina

    em uma nota alvo; inicio da nota afinado, variao de afinao para baixo e retorno para

    a afinao inicial; e queda da afinao no final de uma nota (essa ltima, menos

    frequente, no ser abordada aqui).

    O primeiro caso que chamaremos de bend de chegada aparece na

    interpretao de Victor (c. 5, 13, 37, 41 e 59) principalmente associado a saltos

    ascendentes para notas de tessitura aguda do saxofone alto. Essa combinao de saltos

    ascendentes e bend de chegadacausa uma sensao de atraso ou de dificuldade para

    chegar nessas notas agudas, gerando a ideia de prolongamento desses saltos. Como

    resultado, esse gesto interpretativo refora o carter de passionalizao presente no

    regime de integrao entre melodia e letra.

    O segundo tipo de bend descrito acima que ser chamado de bend de

    repetiopode ser ouvido nos c. 9, 23, 29, 31, 35, 45 e 71. De maneira geral o bend

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    de repetiosugere uma repetio de nota sem a interrupo da coluna de ar e sem um

    toque de lngua. Na interpretao aqui analisada, esse bend utilizado como recurso de

    variao nas duas primeiras notas da figura rtmica marcante no material

    meldico da composio e que se apoia em um padro rtmico comum Bossa-Novaiv.

    Semelhante a verses instrumentais anteriores como a de Eumir Deodato

    (1964), do Trio 3-D (1965) e a presente no disco Bossa Nova York (1967) de Sergio

    Mendes Victor reitera com frequncia essa figura rtmica, com ou sem o bend de

    repetio. Tal comportamento, potencializado pela escolha de um andamento um pouco

    mais acelerado, sugere um reforo do carter motvico da melodia e consequentemente

    uma valorizao do regime secundrio de integrao entre melodia e letra presente na

    cano, a tematizao.2.3 Variaes e recorrncias

    Alm da possvel intencionalidade j mencionada na escolha da

    tonalidade e no uso dos recursos idiomticos do saxofone, existem ainda dois

    procedimentos estruturais na interpretao de Victor que apontam para uma construo

    de coerncia em seu projeto interpretativoainda que esse tenha sido inconsciente.

    O primeiro desses procedimentos est relacionado ao uso de recursos

    interpretativos de maneira recorrente na exposio e reexposio do tema. Apesar deessa ltima ser menos extensa, deixando a melodia da terceira estrofe de fora

    podemos listar uma srie dessas recorrncias. Logo na passagem do c. 2 para o c. 3

    ouvimos um glissando do Sol para o Sb que se repete na reexposio (c. 57). Esse

    caminho em direo ao agudo, suavizado pelo glissando, reforado adiante de forma

    contrastante no c. 5 com um bend de chegadana nota S, sendo esse recurso repetido na

    reexposio no c. 59. Podemos citar ainda o preenchimento (fill) tambm recorrente de

    espaos da melodia nos c. 8 e 15 em relao aos c. 62 e 69.Outro ponto estrutural diz respeito s variaes que o saxofonista faz sobre

    a melodia da cano. De forma resumida, Victor Assis Brasil no acrescenta notas no

    decorrer da melodia, apenas nos momentos de descanso, de pausa. Tal

    comportamento se assemelha ao que no jazz comumente chamado de fill e que,

    como o termo sugere, significa preencher os espaos de pausa de uma melodia, no geral

    preparando a sua volta. Esse procedimento se faz presente durante toda a parte tocada

    por Victor, porm mais evidente nos c. 8, 15 e 69. Nesses dois ltimos casos, esses

    comentrios feitos por Victor chamam a ateno mais uma vez para a distancia

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    percorrida pela melodia na tessitura, reforando o alinhamento entre a interpretao e a

    ideia de disjuno entre sujeito e objeto presente na cano.

    Em relao variao rtmica da melodia, Victor se utiliza de recursos

    tambm utilizados por interpretes vocais. Dentre eles ouvimos a alterao da rtmica de

    notas repetidas, como se o saxofonista alterasse a diviso rtmica das slabas. Podemos

    apontar tambm o adiantamento ou postergao de resolues da melodia. A primeira

    dessas possibilidades pode ser ouvida nos c. 36 e 38, por exemplo, ao passo que a

    segunda possibilidade marcante nos c. 41-42, 57 e 59-60.

    Apesar de algumas excees (como nos c. 28, 30 e 47), essas decises em

    relao a variao da melodia figuram durante toda a parte tocada por Victor e podem

    sugerir um entrelaamento entre duas propostas distintas de seu plano interpretativo: amanuteno da melodia original no intuito de se manter prximo da cano e de seus

    significados; e uma performance interessante do ponto de vista do instrumentista e da

    tcnica do saxofone e que aqui entendemos como o uso combinado de recursos

    idiomticos do saxofone e da capacidade de improvisao do intrprete na construo

    de sentido no plano expressivo.

    3. Consideraes finais

    Quando dissociada da letra, a cano adquiri relativa flexibilidade emrelao s suas significaes. Nessa situao, o intrprete toma decises que direcionam

    sua performance para algum ponto entre dois extremos: o resgate ou reconstruo dos

    significados originais da cano a partir desse novo meio instrumental; ou, assumindo o

    carter abstrato desse meio, o abandono desses significados originais e o uso de todos os

    recursos disponveis na construo de novos significados a partir desse material

    revisitado.

    Victor Assis Brasil localiza seu projeto interpretativo de S tinha de ser

    com voc em um ponto entre os dois extremos, porm mais prximo dos significados

    originais da cano. Em escolhas como a instrumentao e o tipo de acompanhamento,

    a gravao de Victor se aproxima do samba-jazz, o que a primeira vista sugere um

    distanciamento principalmente em relao letra. No entanto, seu projeto interpretativo

    sugere a todo o momento dilogos com os significados presentes na relao entre

    melodia e letra da cano.

    Anteriormente a performance, o saxofonista opta pela Forma standard

    porm essa aparece bastante concisa, com a seo de improviso to extensa quanto a

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    exposio do tema, o que resulta em um tempo total (4min) mais comum a uma

    gravao de cano do que a uma de samba-jazz ou jazz. Alm disso, executando a

    exposio e reexposio do tema mas no o improviso, Victor sugere uma aproximao

    de sua performance com a de um cantor.

    No decorrer da performance, assumindo que a cano em questo j era na

    poca consagrada e que por isso a audio de sua melodia e harmonia deixam implcita

    a letra, Victor Assis Brasil dialoga com os significados da cano em seu gesto

    interpretativo. Atravs do uso de recursos idiomticos do saxofone e de recursos de

    variao da melodia, refora elementos da composio que materializam o carter de

    passionalizao e de tematizao presentes no regime de integrao entre melodia e

    letra.

    Referncias

    GOMES, Marcelo Silva. Samba-Jazz aqum e alm da Bossa-nova: trs arranjos paraCu e mar de Johnny Alf. Campinas, 2010. 213 pginas. Doutorado em msica.Instituto de Artes, Unicamp, Campinas, 2010.LEVINE, Mark. The Jazz Theory Book. Petaluma, CA: Sher Music Co., 1995.MACHADO, Regina. Da inteno ao gesto interpretativo: Anlise semitica do canto

    popular brasileiro. So Paulo, 2012. 192 pginas. Doutorado em Lingustica. Faculdadede Filosofia, Letras e Cincias Humanas, USP, So Paulo, 2012.

    ROACH, David. Jazz and Rock techniques. In: INGHAM, Richard. The CambridgeCompanion to the saxophone. 7 reimpresso. Nova York: Cambridge University Press,1998. p. 88-93.SO TINHA DE SER COM VOC. Antnio Carlos Jobim (compositor). Aloysio deOliveira (compositor). Victor Assis Brasil (Intrprete, saxofone). Gravadora Forma,1970. Long Play. Segunda faixa do disco Victor Assis Brasil toca Tom Jobim.TATIT, Luiz; LOPES, Ivan C. Elos de Melodia e letra: anlise semitica de seiscanes.So Paulo: Ateli Editorial, 2008.

    Notas

    iForam ouvidas as verses presentes nos seguintes discos: Caymmi visita Tom(1964),Antnio CarlosJobim & Sergio Mendes(1964), The Astrud Gilberto Album With Antnio Carlos Jobim (1965), Trio 3-Dconvida(1965),Bossa Nova York(Sergio Mendes, 1967) eIntil Paisagem(Eumir Deodato, 1964).iiApesar de o disco Victor Assis Brasil toca Tom Jobim (1970) estar fora da periodizao do Samba -Jazz proposta por GOMES (p. 82-89), a saber 1952-1967, entendemos que esse disco dialoguediretamente com o Samba-Jazz e suas caractersticas.iiiForma de acompanhamento harmnico e/ou rtmico, improvisado e caracterstico do Jazz ps-anos1940. Com frequncia no cclico e se apoia (determina) (n)a subdiviso rtmica da pea musical.Segundo LEVINE, o compingtem a funo de dar suporte e estimular harmonicamente e ritmicamenteum solista.ivA ideia aqui usada de padres rtmicos caractersticos da Bossa-nova se alinha com a definio deGOMES (2010, p. 41-43) que entende esses padres como resultado de um processo de diluio, deuso conciso da matriz rtmica do samba o que resulta, por exemplo, na batida de violo caracterstica

    de Joo Gilberto.

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    Anexo Icontinuao