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Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos
Núcleo Especializado de Defesa do Consumidor
Suporte do NCDH e do NUDECON à Unidade de Franca
Tema: Cláusulas e Práticas Abusivas em Comunidades Terapêuticas
1) DO PEDIDO DE SUPORTE
Trata-se de pedido de suporte da Unidade da Unidade Franca ao Núcleo
Especializado de Cidadania e Direitos Humanos.
Este Núcleo Especializado foi contatado pelo Defensor Hamilton Neto
Funchal, o qual relatou o seguinte:
Um usuário da Unidade de Franca contratou serviço de internação
voluntária em comunidade terapêutica (CT) no Estado de Minas
Gerais, para seu filho, em razão de uso problemático de drogas.
No contrato foi estabelecido com um prazo mínimo de internação de 9
meses, e pagamento de mensalidades de R$ 900,00. Ele não estava
satisfeito com o tratamento, e em conjunto com o filho desistiram da
internação, retirando-o da CT antes desse prazo.
Em razão dessa saída antes do prazo contratual, a CT está cobrando
uma multa de 40% do valor do contrato por inadimplemento (a multa
tinha previsão contratual).
Do ponto de vista consumerista, a multa de 40% do valor total do
contrato é certamente abusiva.
Mas queria consultá-los se teriam algum material no sentido de que a
cobrança de qualquer valor de multa rescisória seria abusiva, do ponto
de vista da regulamentação específica das CTs.
Encontrei algumas resoluções da Anvisa e do Conselho Nacional de
Políticas sobre Drogas (CONAD) que disciplinam que é direito do
acolhido a interrupção da internação voluntária a qualquer tempo.
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Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos
Núcleo Especializado de Defesa do ConsumidorIsso foi respeitado. A CT
não tentou segurá-lo lá.
Porém essas normativas nada tratam do aspecto contratual entre o
internado e a CT. Busco por algo mais específico (precedente ou
norma) que amparasse a pretensão de não pagar qualquer multa
rescisória, como decorrência desse direito da pessoa à
interrupção/desistência da internação voluntária. Vocês teriam algo
nesse sentido?
Além disso o usuário relatou fatos que eu não tive segurança para
enquadrá-los como situações certamente ilegais, ficando com dúvidas
sobre elas:
- Cada "paciente" realizava um trabalho na comunidade como forma
de terapia. (Ex: cuidar das galinhas, restelar o campo, varrer o chão,
lavar os banheiros etc). Os serviços eram rotativos e, segundo disse,
não exaustivos.
- A família somente podia visitar os internados em 01 (um) domingo
específico por mês em horário pré-determinado. Ademais, só podiam se
comunicar por telefone por 05 (cinco) minutos a cada 15 (quinze) dias.
- Foi realizando o serviço de restelo que o filho do usuário caiu e
machucou o braço, sendo que demoraram 6 dias para levá-lo ao
hospital, o que levou à posterior desistência da internação.
Solicitadas informações complementares ao Defensor Hamilton, este
esclareceu que a pessoa internada não assinou termo de consentimento da internação.
Além disso, “a CT não era propriamente aberta o internado não podia sair no momento que
quisesse, justamente ‘para se evitar fugas’ (nas palavras dele). Além disso o usuário nos
informou que, acaso fosse necessária alguma saída (por exemplo para consulta médica), era
necessário o pagamento de uma taxa de R$ 150,00. Assim o internado era levado, para onde
fosse preciso, por um funcionário e van da CT”.
Foi solicitado parecer do NCDH sobre o assunto. Tendo em vista a
existência de questões atinentes à relação contratual, o NCDH acionou o NUDECON, que
também contribuiu na elaboração das orientações.Rua Boa Vista, 103 – 2º andar – São Paulo/SP – CEP: 01014-001 – Tel: (11) 3107-5080
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Núcleo Especializado de Defesa do Consumidor
2) DA LEGISLAÇÃO APLICÁVEL ÀS COMUNIDADES TERAPÊUTICAS
A comunidade terapêutica é um lugar cujo principal instrumento terapêutico é a
convivência entre os pares. Oferece uma rede de ajuda no processo de recuperação das
pessoas, resgatando a cidadania, buscando encontrar novas possibilidades de reabilitação
física e psicológica, e de reinserção social.
A regra vale mesmo para aquelas comunidades terapêuticas que não sejam
contratadas/conveniadas com o SUS, pois ao exercerem reconhecidamente ações de
atenção à saúde mental precisam observar as normas sanitárias específicas de
funcionamento, nos termos do art. 22 da Lei n. 8.080/90.
No mais, a opção pelo tratamento em comunidade terapêutica deve ser
condizente com os direitos da pessoa com transtorno mental, entre as quais se inclui
aquelas que fazem uso problemático de drogas lícitas e ilícitas, previstos na Lei n° 10.216,
de 6 de abril de 2001, entre eles: incisos VIII (“ser tratada em ambiente terapêutico pelos
meios menos invasivos possíveis”) e IX (“ser tratada, preferencialmente, em serviços
comunitários de saúde mental”) do Art. 2°; o Art. 4° (“A internação, em qualquer de suas
modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem
insuficientes”); o Art. 6° (“A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo
médico circunstanciado que caracterize os seus motivos”); o Art. 7° (“A pessoa que
solicita voluntariamente sua internação, ou que a consente, deve assinar, no
momento da admissão, uma declaração de que optou por esse regime de
tratamento”).
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Quadro sinótico da legislação aplicável às comunidades terapêuticas
Lei 10.216/2001 – Dispõe sobre a proteção e direitos das pessoas com transtornos mentais e redireciona o
modelo assistencial em saúde mental
Lei 8.078/1990 – Código de Defesa do Consumidor (na análise de práticas e de contratos quando há relação
de consumo)
Lei 13.146/2015 – Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com
Deficiência).
Código Civil, artigos 421, 422, 476, 1.740 a 1.747, 1.774.
Decreto nº. 7.179/2010 – Institui o Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas.
Portaria de Consolidação nº. 2, de 28 de setembro de 2017, do Ministério da Saúde, anexo II –
Consolidação das normas sobre as políticas nacionais de saúde do Sistema Único de Saúde (anexo tem
Regulamento da Política de Saúde Mental, instituída pela Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001).
Portaria de Consolidação nº. 3, de 28 de setembro de 2017, do Ministério da Saúde, anexo V –
Consolidação das Normas sobre as redes do Sistema Único de Saúde. O anexo V trata da RAPS (antiga Portaria
nº. 3.088/2011 do Ministério da Saúde, que institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com
sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no
âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
Portaria de Consolidação nº. 6, de 28 de setembro de 2017, do Ministério da Saúde – Consolidação das
normas sobre o financiamento e a transferência dos recursos federais para as ações e os serviços de saúde do
Sistema Único de Saúde (anexo trata de financiamento de rede e incentivos para instalação de equipamentos
como CAPS e RTs).
Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) nº. 29/2011 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(ANVISA) - Dispõe sobre os requisitos de segurança sanitária para o funcionamento de instituições que
prestem serviços de atenção a pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso ou dependência de
substâncias psicoativas.
Resolução CONAD Nº 01/2015 - Regulamenta, no âmbito do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre
Drogas (SISNAD), as entidades que realizam o acolhimento de pessoas, em caráter voluntário, com problemas
associados ao uso nocivo ou dependência de substância psicoativa, caracterizadas como comunidades
terapêuticas.
Resolução da Assembleia Geral da ONU n° A/46/49, de 17 de dezembro de 1991: trata da “Proteção de
Pessoas Acometidas de transtorno Mental e a Melhoria da assistência à Saúde Mental”
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Núcleo Especializado de Defesa do ConsumidorA) DA ABUSIVIDADE DE FIXAÇÃO DE
PRAZO DE INTERNAÇÃO/PERMANÊNCIA NA COMUNIDADE TERAPÊUTICA
No plano infraconstitucional, conforme dispõe a Lei Federal nº 10.216/01, as
internações psiquiátricas de qualquer natureza (inclusive as involuntárias ou
compulsórias) somente poderão ser realizadas mediante laudo médico
circunstanciado que caracterize os seus motivos e em estabelecimentos de saúde
que ofereçam leitos e serviços médicos ininterruptos.
O mesmo diploma estabelece que a pessoa com deficiência mental tem direito a
ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde,
visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade
(art. 2º, II); sendo protegida contra qualquer forma de abuso e exploração (art. 2º, III);
devendo o tratamento ser estruturado de forma a oferecer assistência integral à pessoa,
incluindo serviços médicos, de assistência social, psicólogos, ocupacionais, de lazer, e
outros.
Tais serviços têm por função a oferta de um ambiente protegido, técnica e
eticamente orientados, que forneça suporte e tratamento aos usuários abusivos e/ou
dependentes de substâncias psicoativas, durante período estabelecido de acordo com
programa terapêutico adaptado às necessidades de cada caso.
Embora as comunidades terapêuticas sejam serviços em regime residencial, as
disposições relacionadas a internação podem ser aplicadas às mesmas, tendo em vista que
igualmente visam à proteção do usuário do serviço. Além disso, no caso concreto, o serviço
de comunidade terapêutica mostrou-se desvirtuado quanto à liberdade de ir e vir do
paciente, uma vez que havia limitações de comunicação com a família e à realização de
visitas, assim como oferecia-se dificuldades para saída do local.
No mais, a regulamentação das Comunidades Terapêuticas (Portaria de
Consolidação nº. 3, de 28 de setembro de 2017, do Ministério da Saúde, anexo V , art. 9º, II)
é clara quanto à natureza do serviço, e estabelece que o tempo de internação pode ser de
até 9 meses: Rua Boa Vista, 103 – 2º andar – São Paulo/SP – CEP: 01014-001 – Tel: (11) 3107-5080
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II - Serviços de Atenção em Regime Residencial, entre os quais
Comunidades Terapêuticas: serviço de saúde destinado a oferecer
cuidados contínuos de saúde, de caráter residencial transitório por
até nove meses para adultos com necessidades clínicas estáveis
decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas (g.n.).
Tal prazo, portanto, não é estanque e nem pode ser considerado um prazo
mínimo, conforme dispõe o contrato.
Deste modo, jamais pode ser indicado um prazo padrão para todos os casos de
permanência na Comunidade Terapêutica, até mesmo pela própria natureza do contrato. O
prazo indicado deve constar de programa terapêutico individual, que não foi
fornecido ao paciente e aos seus familiares.
Além disso, tem-se que considerar que nem todas as pessoas se adaptam à
terapia proposta e nem todos os organismos respondem da mesma maneira, não sendo
possível, em contrato de estabelecimentos de saúde, pensar-se em imposição de tempo
mínimo de permanência.
O Superior Tribunal de Justiça já se posicionou pela abusividade de cláusulas
temporais em estabelecimento de saúde, ao julgar a limitação máxima de internação em
UTI de usuário de plano de saúde (súmula 302). É na fundamentação da decisão do
Tribunal que se verifica que o Poder Judiciário assevera que nem o usuário, e nem mesmo o
médico, são capazes de controlar os prazos de recuperação da saúde, advindo daí a
abusividade das cláusulas temporais no tema:
O consumidor não é senhor do prazo de sua recuperação, que, como é
curial, depende de muitos fatores, que nem mesmo os médicos são
capazes de controlar. (...) Não pode a estipulação contratual ofender o
princípio da razoabilidade, e se o faz, comete abusividade vedada pelo
art. 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor. Anote-se que a regra
protetiva, expressamente, refere-se a uma desvantagem exagerada do Rua Boa Vista, 103 – 2º andar – São Paulo/SP – CEP: 01014-001 – Tel: (11) 3107-5080
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Núcleo Especializado de Defesa do Consumidorconsumidor e, ainda, a
obrigações incompatíveis com a boa-fé e a equidade. (REsp n.
158.728-RJ, Terceira Turma, Relator Ministro Carlos Alberto
Menezes Direito, j. 16.3.1999)
Ao atentar contra a própria natureza do contrato, a cláusula que temporal nos
contratos de Comunidades Terapêuticas mostra-se abusiva, conforme determina o artigo
51, IV c/c §1º, II, do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90):
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas
contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (...)
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que
coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam
incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; (...)
§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que: (...)
II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza
do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio
contratual;
Além disso, a abusividade pode ser identificada desde o momento da
contratação, uma vez que se impõe o aceite da cláusula temporal para efetivação da
contratação. Conforme o artigo 39, I, do CDC, o condicionamento do fornecimento de
serviço a limites quantitativos é prática abusiva.
B) CONSIDERAÇÕES SOBRE O RECEBIMENTO DE PESSOA CURATELADA EM
COMUNIDADES TERAPÊUTICAS
Conforme a Portaria de Consolidação nº. 3, de 28 de setembro de 2017, do
Ministério da Saúde, anexo V, art. 9º, II, as Comunidades Terapêuticas são serviços que só
podem admitir adultos com necessidades clínicas estáveis decorrentes do uso de drogas,
não sendo permitida a admissão de casos de internação involuntária ou compulsória.
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Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos
Núcleo Especializado de Defesa do ConsumidorAlém disso, no Parecer n° 9, de 26 de
fevereiro de 2015, o Conselho Federal de Medicina não considera as Comunidades
Terapêuticas como ambientes seguros para internações involuntárias e compulsórias.
Assim sendo, as pessoas em avaliação que apresentarem grau de
comprometimento grave no âmbito orgânico e/ou psicológico não são elegíveis para
tratamento nestes serviços, devendo ser encaminhados a outras modalidades de
atenção, no caso, para clínicas especializadas. Recomenda-se a Comunidade
Terapêutica para paciente com comprometimento leve ou moderado.
Ressalta-se que o direito de escolha do tratamento não é ato da vida civil sobre o
qual o curador possui poderes para transigir, nos termos do artigo 6º da Lei 13.146/2015
c/c artigos 1.740 a 1.747, e 1.774, todos do Código Civil.
Não é por outra razão que a comunidade terapêutica se reveste das seguintes
características de abordagem:
Deve ser aceita voluntariamente. Não se destina a todo tipo de
dependente. Isso ressalta a importância fundamental da triagem,
como início do processo terapêutico. Muitas vezes, algumas CTs, por
meio de suas equipes, se sentem onipotentes e ‘adoecem’ acreditando
que, se o residente não quer ficar, é porque não quer recuperação. Não
consideram que o residente tem o direito de escolher como e onde quer
se tratar. Deve reproduzir, o melhor possível, a realidade exterior para
facilitar a reinserção. Deve fornecer um modelo de tratamento
residencial altamente estruturado. Atua por um sistema de pressões
provocadas de modo artificial. Estimula a explicação da patologia do
residente, diante dos pares. Os pares servem de espelho da
consequência social de atos do residente. Há um clima de tensão
afetiva. O residente é o principal ator do próprio tratamento. A equipe
oferece apenas apoio e ajuda. (DIEH, Alessandra; CORDEIRO, Daniel
Cruz; Laranjeira, Ronaldo (Orgs.). Comunidade Terapêuticas. In:
Dependência química, prevenção, tratamento e políticas públicas. Rua Boa Vista, 103 – 2º andar – São Paulo/SP – CEP: 01014-001 – Tel: (11) 3107-5080
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Núcleo Especializado de Defesa do ConsumidorPorto Alegre: Artmed,
2011, Cd Rom, p.63).
Desse modo, no caso concreto analisado, tendo em vista que se trata de pessoa
curatelada, é necessário verificar qual o nível de seu comprometimento e se havia
condições dela expressar sua vontade de tratamento na Comunidade Terapêutica. O fato de
não ter assinado o contrato ou não ter assinado um termo de consentimento é um forte
sinal negativo nesse ponto.
C) DA IMPOSSIBILIDADE DE CONTINUIDADE DO SERVIÇO EM RAZÃO DO
ACIDENTE SOFRIDO E DA RESPONSABILIDADE DA COMUNIDADE
TERAPÊUTICA
No caso concreto, deve-se também considerar que a descontinuidade do contrato se
deu em razão da ocorrência de fato do serviço, tendo em vista que o “paciente” se
machucou durante atividade de “laborterapia”, cuja regularidade é altamente questionável,
e deixou de receber atendimento médico adequado, permanecendo 6 dias com o braço
quebrado e sem o devido atendimento. A rescisão contratual, portanto, deu-se em
decorrência de ilícito da Comunidade Terapêutica.
Constituindo-se a Comunidade Terapêutica como pessoa jurídica de direito privado,
há que se observar também que, sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor (Lei
Federal nº 8.078/90), é fornecedora, nos moldes do seu art. 3º, pois desenvolve atividade
de prestação de serviços, e seus clientes ou “pacientes”, na qualidade de consumidores,
utilizam os serviços como destinatários finais (art. 2º). No que tange à proteção da saúde
do consumidor, necessário transcrever do mesmo diploma legal:
Art. 4º. A Política Nacional das Relações de Consumo tem por
objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o
respeito à dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus
interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem
como a transparência e harmonia das relações de consumo (...)”.Rua Boa Vista, 103 – 2º andar – São Paulo/SP – CEP: 01014-001 – Tel: (11) 3107-5080
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Núcleo Especializado de Defesa do Consumidor“Art. 8º. Os produtos e
serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão
riscos à saúde ou segurança dos consumidores (...).
Art.10. O fornecedor não poderá colocar no mercado de consumo
produto ou serviço que sabe ou que deveria saber apresentar alto
grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou segurança.
O sistema geral do Código de Defesa do Consumidor determina que a
responsabilidade do fornecedor por fato do serviço é objetiva, ou seja, independe de
qualquer discussão sobre a existência de culpa do fornecedor.
Nas relações de consumo, o fato (ou defeito) do serviço se difere do mero vício na
prestação do serviço por causar um dano maior ao patrimônio material, moral, estético ou
à imagem do consumidor. Em suma, o fato é “um acontecimento externo, que ocorre no
mundo exterior, que causa dano material ou moral ao consumidor (ou ambos)”
(CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. p. 498).
No caso em análise, a CT assumiu, ao admitir o paciente em suas dependências,
o compromisso de prestar a ele assistência médica e psicológica adequada, assim
como de devolvê-lo à família em perfeitas condições de saúde. Não só não prestou o
serviço adequadamente no tocante às assistências médica e psicológica necessárias
para a desintoxicação, como também foi negligente no cuidado com a sua
integridade física ao não prestar socorro adequado diante da lesão sofrida no braço.
Portanto, o descumprimento contratual se deu pela Comunidade Terapêutica
contratada, cujas omissões ensejaram a impossibilidade de continuidade do serviço
terapêutico supostamente fornecido. Nesse sentido:
Ementa: APELAÇÃO – Ação declaratória – Serviço de telefonia – Falha na
prestação do serviço – Exigência de multa– Pedido improcedente – Pleito
de reforma – Possibilidade – Ausência de fundamentação – Ocorrência -
Inteligência dos artigos 93, IX, da Constituição Federal e 489, do Código de
Processo Civil – Autora que não impugnou a cláusula de fidelidade, mas Rua Boa Vista, 103 – 2º andar – São Paulo/SP – CEP: 01014-001 – Tel: (11) 3107-5080
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Núcleo Especializado de Defesa do Consumidorimputou à ré a responsabilidade
pela rescisão antecipada – Fundamento principal da lide não analisado –
Decisão que se restringira à análise da legalidade da cláusula – Incidência
do inciso IV, §1º, do art. 489, da Lei Processual Relação de consumo –
Sentença anulada – Causa madura, possibilidade de prosseguir no
julgamento – Falha do serviço, fortuito interno e risco inerente ao negócio,
que não justificam a imposição de ônus ao consumidor – Deficiência na
prestação do serviço apontada no início da contratação, que não restou
impugnada de forma específica e deu ensejo à rescisão do contrato –
Protocolos de reclamação precisos – Multa, que a despeito de previsão
legal e contratual, na hipótese, não prevalece – Rescisão oriunda da
má prestação do serviço – Pedido procedente para declarar a
inexigibilidade da multa – Recurso provido (sem grifos no original – TJSP –
Apelação nº 1051677-56.2017.8.26.0002 – 19ª Câmara de Direito Privado
– Rel. Des. Claudia Grieco Tabosa Pessoa – Data do julgamento:
10/10/2018).
D) DA ABUSIVIDADE DA MULTA DE 40% DO VALOR DO CONTRATO POR
INADIMPLEMENTO
Conforme já ressaltado, o estabelecimento de prazo mínimo de internação em
contrato de prestação de serviço de CT é, por si só, uma cláusula abusiva, não sendo
admissível a cobrança de multa em razão do encerramento do contrato pelo contratante.
Além disso, a rescisão contratual deu-se em decorrência de ilícito da Comunidade
Terapêutica – fato do serviço.
Mesmo que admitida a cláusula que fixa multa pela rescisão do contrato pelo
consumidor, o percentual fixado é abusivo. Isso, por dois motivos.
O primeiro motivo da abusividade é a base de cálculo. O consumidor é a parte
vulnerável na relação de consumo (art. 4º, I, do CDC), sendo que umas das vulnerabilidades
mais evidentes é a técnica. Rua Boa Vista, 103 – 2º andar – São Paulo/SP – CEP: 01014-001 – Tel: (11) 3107-5080
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Núcleo Especializado de Defesa do Consumidor
A fixação de um prazo mínimo para internação, conforme já indicado, é
contrário ao escopo do contrato celebrado, que deveria ter por finalidade a prestação de
um serviço de saúde. Assim, para que houvesse a fixação de um prazo mínimo,
necessário que houvesse prescrição médica nesse sentido.
O consumidor não possui conhecimento técnico para saber qual o prazo
mínimo necessário para determinado tratamento. Assim, qualquer estipulação de
tempo mínimo é nula de pleno direito.
Dessa forma, a rescisão contratual antes do tempo indicado no instrumento
de contrato não poderia ter como parâmetro de cálculo a diferença entre o tempo de
permanência na Comunidade Terapêutica e aquele inicialmente indicado no
instrumento de contrato.
Além disso, a multa com percentual de 40% sobre a remuneração pelo
tempo em que o serviço não foi frequentado é abusiva.
O Superior Tribunal de Justiça entende que a o direito de resilição, apesar
de potestativo, pressupõe que eventuais gastos irrecuperáveis e prejuízos
extraordinários podem ser considerados na fixação do valor da multa:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO. CONTRATO.
TURISMO. RESILIÇÃO UNILATERAL. PREVISÃO EXPRESSA. MULTA
PENITENCIAL. VALOR. PARÂMETROS. ARTS. 413 E 473, PARÁGRAFO
ÚNICO, DO CC/02. APLICAÇÃO ANALÓGICA. EQUILÍBRIO CONTRATUAL.
RESTAURAÇÃO. ARTS. 6º V, 39, V, 51, IV e XV, do CDC. ABUSIVIDADE.
RECONHECIMENTO.
(...)
7. O valor correspondente ao exercício do direito à resilição unilateral
do contrato fica submetido à autonomia da vontade dos contratantes,
mas o exercício dessa liberdade contratual não é ilimitado, pois
balizado pela boa-fé objetiva e a função social do contrato a ser resilido. Rua Boa Vista, 103 – 2º andar – São Paulo/SP – CEP: 01014-001 – Tel: (11) 3107-5080
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Núcleo Especializado de Defesa do Consumidor8. Os limites ao exercício da
autonomia da vontade dos contratantes podem ser inferidos, por
analogia, do parágrafo único do art. 473 do CC/02, ficando o valor da
multa penitencial vinculado a: a) os investimentos irrecuperáveis – assim
entendidos aqueles que não possam ser reavidos pela cessão do objeto do
contrato a terceiros - realizados pelo contratante inocente; b) os prejuízos
extraordinários, que não alcançam a expetativa de lucro e não envolvem
a assunção dos riscos do negócio pelo contratante desistente, pois perdas
financeiras fazem parte da própria álea negocial; e c) o prazo do
exercício do direito potestativo – que deve ser hábil à recuperação dos
citados valores pelo contratante subsistente. (...)” (REsp 1580278/SP –
Terceira Turma - Rel. Min. Nancy Andrighi – Data do Julgamento:
21/08/2018)
Não há qualquer indicação de investimentos irrecuperáveis por parte da
Comunidade Terapêutica, uma vez que não há a possibilidade de cessão do objeto do
contrato a terceiros.
Também não há que se falar em prejuízos extraordinários, visto que, pelas
próprias características do contrato, o fim do tratamento poderia ocorrer a qualquer
momento, ante prescrição médica.
Sem que haja qualquer causa excepcional, como indicado acima, a
jurisprudência entende que a multa fixada acima do percentual de 10% não se
mostra razoável.
Ementa: APELAÇÃO. CONTRATO PARTICULAR DE PROMESSA DE
COMPRA E VENDA. RESCISÃO PELO COMPRADOR. Sentença de
procedência parcial. Insurgência pelas rés. Cabimento parcial.
ILEGITIMIDADE PASSIVA NÃO VERIFICADA. Rés que integram a cadeia
negocial de fornecimento em relação ao empreendimento imobiliário.
Código de Defesa do Consumidor, aplicável à espécie, que adota a teoria da
aparência, segundo o qual, sempre que aos olhos do consumidor houver a Rua Boa Vista, 103 – 2º andar – São Paulo/SP – CEP: 01014-001 – Tel: (11) 3107-5080
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Núcleo Especializado de Defesa do Consumidorpercepção de parceria nas
relações negociais, sem que possa identificar a especialização de tarefas e
atividades, na preservação da boa fé e dever de cooperação e lealdade que
se espera nas relações negociais, aceita-se a responsabilidade solidária de
todos os integrantes da cadeia de consumo, sem questionamento quanto
aos deveres imediatamente assumidos por cada uma deles ou destinação
de pagamentos, o que deve ser resolvido internamente. Aplicação, ainda,
da tese de legitimidade assentada em Recurso Repetitivo em relação às
despesas de intermediação. Impossibilidade Jurídica não verificada.
Possibilidade a restituição de valores pagos por força da rescisão que se
confunde com o mérito. RESCISÃO PELO COMPRADOR. Reconhecida a
desistência pelos compradores, devida a retenção de valores pela
vendedora para cobrir gastos operacionais com administração e
propaganda, a teor das Súmulas nº1 TJSP e nº 543 do STJ. Cláusula
contratual que prevê retenções de 40% do que foi pago. Disposição
nitidamente abusiva, violadora dos artigos 51, IV e §3º, III do CDC,
normas de ordem pública que se sobrepõem ao poder dispositivo das
partes. Jurisprudência do STJ que descreve possibilidade de retenção
dos valores pagos quando a rescisão é motivada pelo comprador, em
percentuais entre 10% a 25%, segundo as circunstâncias do caso
concreto. Percentual de 10% estabelecido na sentença que se revela
suficiente à remuneração dessas despesas operacionais, em
consideração ao valor do imóvel, percentual pago, tempo de rescisão e
propósito da retenção, além do pagamento autônomo pela intermediação.
Majoração afastada. Precedentes da Câmara. CORRETAGEM. Validade da
cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de
pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e
venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde
que previamente informado o preço total da aquisição da unidade
autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem. Deveres
de informação e transparência observados no caso concreto, diante da
apresentação de proposta e relatório de venda com descrição do valor do
negócio, do imóvel e dos serviços, com sua pormenorização, repetida nos Rua Boa Vista, 103 – 2º andar – São Paulo/SP – CEP: 01014-001 – Tel: (11) 3107-5080
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Núcleo Especializado de Defesa do Consumidorrecibos de pagamento,
possibilitando o pleno conhecimento aos adquirentes do ônus financeiro
da intermediação. Dever de devolução afastado. Readequação da
sucumbência. RECURSO DAS RÉS CPV E GPEL PROVIDO, RECURSO DA
CORRÉ ESSER PARCIALMENTE PROVIDO (sem grifos no original - TJSP –
Apelação nº 1045760-24.2015.8.26.0100 – 9ª Câmara de Direito Privado –
Rel. Des. Mariella Ferraz de Arruda Pollice Nogueira – Data do julgamento:
09/10/2018)
Ementa: VENDA E COMPRA DE IMÓVEL. Ação declaratória de nulidade de
rescisão contratual, c.c. devolução de quantias pagas. Procedência.
Preliminar de falta de interesse de agir afastada. Distrato que faz lei entre
as partes. Possibilidade, no entanto, do Poder Judiciário verificar a
validade de suas cláusulas, afastando as que forem manifestamente
abusivas. Mérito. Retenção de 72% dos valores pagos. Cláusula contratual
que importa em desvantagem excessiva aos compradores, acarretando
enriquecimento ilícito da vendedora. Resolução contratual que opera
efeitos ex tunc. Determinação de devolução de 90% dos valores quitados.
Direito de retenção de 10% pela vendedora, sobre o montante pago, a
título de ressarcimento dos custos administrativos. Ausência de
comprovação de gastos com outras despesas, que justificariam retenção
maior de valores. Declaração de sua nulidade que se impõe. Taxa de
corretagem. Prescrição. Prazo trienal. Ação proposta após escoamento do
prazo. Entendimento consolidado pelo E. STJ em incidente de recurso
repetitivo. Sentença de extinção do processo, com exame do mérito, nos
termos do artigo 487, inciso II, do CPC/2015 mantida. Parcelas pagas,
descontada a devolução já efetuada, que deve ser devolvida de uma só vez.
Inteligência das Súmulas nºs. 1, 2 e 3 deste E. Tribunal e nº 543 do C. STJ.
Juros. Computados a partir do trânsito em julgado, porquanto a resolução
do contrato decorreu por desistência dos adquirentes, sem culpa da
vendedora. Impossibilidade de indenização pela fruição de lote de terreno.
Verba honorária mantida, porquanto observou os parâmetros do artigo 80
do CPC/2015. Litigância de má-fé não configurada. Requerida que apenas Rua Boa Vista, 103 – 2º andar – São Paulo/SP – CEP: 01014-001 – Tel: (11) 3107-5080
Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos
Núcleo Especializado de Defesa do Consumidorexerceu o seu direito de defesa.
Conduta que não se enquadra nas hipóteses do artigo 80 do CPC/2015.
Sentença reformada. RECURSO DA RÉ PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSP –
Apelação nbº 1027586-57.2016.8.26.0576 – 6ª Câmara de Direito Privado
– Rel. Des. Paulo Alcides – Data de Julgamento: 08/10/2018)
A rigor, em razão do descumprimento da obrigação contratual por parte
da Comunidade Terapêutica, seria possível veicular que a multa deve ser aplicada
contra ela. Trata-se de aplicação do princípio da isonomia na relação contratual.
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MULTA MORATÓRIA. PREVISÃO CONTRATUAL DE
COMINAÇÃO DE MULTA APENAS EM FACE DA MORA DO CONSUMIDOR.
ASSIMETRIA A MERECER CORREÇÃO. HARMONIA DAS RELAÇÕES DE
CONSUMO. EQUILÍBRIO CONTRATUAL A SER RESTABELECIDO. 1.
Necessidade de aplicação do mesmo entendimento a que chegou este
Colegiado quando do julgamento do REsp 1.548.189/SP em relação à
mesma sociedade empresária, mas, agora, no que toca aos produtos
vendidos pelas Casas Bahia. 2. Aplicação do enunciado 568/STJ.
Inexistência de nulidade no julgamento monocrático do especial. 3.
Possibilidade de intervenção judicial nos contratos padronizados de
consumo de modo a restabelecer o sinalagma negocial, fazendo
incidir a mesma multa prevista para a mora do consumidor aos
casos de atraso na entrega dos produtos ou de devolução imediata
dos valores pagos quando exercido o direito de arrependimento,
com fundamento tanto no CDC, como no próprio Código Civil (arts.
395, 394 e 422) ao estatuir os efeitos da mora e a submissão dos
contratantes à boa-fé objetiva. 4. Ausência de devida impugnação dos
fundamentos da decisão agravada.
5. AGRAVO INTERNO EM PARTE CONHECIDO E DESPROVIDO. (sem grifos
no original – STJ – AgInt no REsp 1568293/SP – Terceira Turma – Rel. Min.
Paulo de Tarso Sanseverino – Data do julgamento 27/02/2018)
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E) DA MÁ PRESTAÇÃO DO SERVIÇO
Não bastasse todo o já considerado, verifica-se no caso concreto a existência de
má prestação do serviço pela Comunidade Terapêutica. A “laborterapia” e a limitação de
contato com familiares são práticas abusivas que caracterizam vício do serviço, conforme
se passa a descrever.
a. SERVIÇOS DE “LABORTERAPIA”
A título de realizar “laborterapia”, a Comunidade Terapêutica obriga diariamente
todos os internos a realizar os serviços necessários. Ora, ainda que se possa sugerir a
dignificação da pessoa humana pelo trabalho, não poderiam os internos ser obrigados a
trabalhar. A própria Carta Magna veda a pena de “trabalhos forçados”.
No mais, ainda que se admitisse a laborterapia como uma terapia adequada –
o que não se faz aqui –, não se pode admitir a sua utilização em substituição da
contratação de mão de obra pela realização de serviços de faxina.
b. ABUSIVIDADE NA LIMITAÇÃO DAS VISITAS E TELEFONEMAS
A Resolução de Diretoria Colegiada n° 29/2011, da Agência Nacional de Vigilância
Sanitária, dispõe sobre os requisitos de segurança sanitária para instituições que prestem
serviços em regime de residência a pessoas com transtornos decorrentes do uso de
substâncias psicoativas. Além da necessidade de avaliação diagnóstica prévia (art. 6º), a
resolução determina, em seu art. 19, II, que ao usuário e ao seu responsável deve ser
prestada orientação clara sobre as normas e rotinas da instituição, incluindo critérios
relativos a visitas e comunicação com familiares e amigos, devendo a pessoa a ser admitida
declarar por escrito sua concordância.
Por sua vez, a Resolução da Assembleia Geral da ONU n° A/46/49, de 17 de
dezembro de 1991, que trata da “Proteção de Pessoas Acometidas de transtorno Mental e a
Melhoria da assistência à Saúde Mental”, na Alínea “c” do Item 1 do Princípio 13 fala em Rua Boa Vista, 103 – 2º andar – São Paulo/SP – CEP: 01014-001 – Tel: (11) 3107-5080
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Núcleo Especializado de Defesa do Consumidor“liberdade de enviar e receber comunicação
privada não censurada”.
Os relatos de limitação do contato do usuário com os seus parentes, portanto, são
outro indício da má prestação do serviço pela Comunidade Terapêutica e avalizam a ideia
de que foi o seu comportamento que deu azo à resilição do contrato.
No mais, embora no caso concreto não se possa adentrar na discussão sobre a
existência de outras irregularidades que caracterizam a má prestação do serviço fornecido,
cabe indicar que é corriqueiro identificar, em inspeções em Comunidades Terapêuticas,
outros problemas, como a inexistência de profissionais de saúde conforme determinam as
normas, a inadequação sanitária das instalações, ou o trancamento dos pacientes – sendo
que a Comunidade Terapêutica, por definição, deve ser um espaço de portas abertas e de
permanência voluntária.
ESTRATÉGIAS DE ATUAÇÃO
Diante de todas as considerações apresentadas, sugere-se, como encaminhamento,
que o/a assistido/a seja orientado/a sobre a ilegalidade da cláusula que estabelece multa
de 40% em caso de saída da Comunidade Terapêutica antes do prazo unilateralmente
estipulado. Inicialmente, dada a natureza do serviço contratado, não há que se falar em
fixação estanque de prazo de tratamento. Não bastasse, a análise das práticas da CT
demonstra que o contrato foi cancelado em razão do seu descumprimento pela
fornecedora.
São diversas as estratégias possíveis, a serem tomadas a depender da vontade do/a
interessado/a. Pode-se aguardar e verificar se haverá cobrança judicial da multa – e, nesse
caso, em reconvenção, a multa pode ser requerida em favor do consumidor. Outra
possibilidade é oficiar, desde já, a CT, indicando a denúncia do contrato pelo consumidor
em razão do seu descumprimento pela fornecedora.
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Núcleo Especializado de Defesa do ConsumidorRafael Lessa Vieira de Sá Menezes
Defensor Público do Estado de São Paulo
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Davi Quintanilha Failde de Azevedo
Defensor Público do Estado de São Paulo
Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos
Daniela Batalha Trettel
Defensora Pública do Estado de São Paulo
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Luiz Fernando Baby Miranda
Defensor Público do Estado de São Paulo
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Estela Waksberg Guerini
Defensora Pública do Estado de São Paulo
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