A epistemologia da complexidade Edgar Morin – CNRS, Paris
Os 13 mandamentos do paradigma da simplificação
1999
Edgar Morin Diretor honorário de pesquisas do CNRS, Paris, França
1999
A epistem
ologia
da com
plexidade
Edgar Morin
CNRS
‐ Paris
Conteúdo
Introdução 1
Mandamentos do paradigma da simplificação 4
1. Geral e universal X particular e singular. 5
2. Tempo reversível 6
3. Redução ou complementaridade 8
4. Ordem‐Rei 9
5. Causalidade linear 11
6. A problemática da organização 12
7. Separação Sujeito e Objeto 14
8. a 11. Ser e existência; formalização e quantificação 16
12. e 13 Confiança absoluta na lógica. 17
A epistemologia complexa 19
À guisa de conclusão 26
Resumo 29
Abstract 29
Notas 31
A epistemologia da complexidade
A epistemologia da complexidade Página 2
A epistemologia da complexidade
1
Introdução
questão da complexidade é complexa!
Em uma escola essa questão foi colocada a um grupo de crianças: “Que é a complexidade?” A resposta de uma aluna
foi: “a complexidade é uma complexidade que é complexa”. É evidente que se encontrava no âmago da questão. Mas antes de abordar essa dificuldade, é necessário dizer que o dogma, a evidência subjacente ao conhecimento científico clássico é, como dizia Jean Perrin, que o papel do conhecimento é explicar o visível complexo pelo invisível simples. Para além da agitação, da dispersão, da diversidade, há leis. Assim, pois, o princípio da ciência clássica é, evidentemente, o de legislar, estabelecer as leis que governam os elementos fundamentais da matéria, da vida; e para legislar, deve desunir, quer dizer, isolar efetivamente os objetos submetidos às leis. Legislar, desunir, reduzir, esses são os princípios fundamentais do pensamento clássico1. De modo algum pretendo decretar que esses princípios estejam a partir de agora abolidos.
Mas as práticas clássicas do conhecimento são insuficientes. Enquanto que a ciência de inspiração cartesiana ia muito logicamente do complexo ao simples, o pensamento científico contemporâneo intenciona ler a complexidade do real sob a aparência simples dos fenômenos. De início, não há fenômenos simples. Tomemos o exemplo do beijo. Pensemos na complexidade que é necessária para que nós, humanos, a partir da boca, possamos expressar uma mensagem de amor. Nada parece mais simples, mais evidente. E a despeito disso, para beijar, faz falta uma boca, a forma emergente da evolução do focinho. É necessário que tenha havido a relação própria nos mamíferos em que a criança mama da mãe, e a mãe que amamenta o filho. É necessário, pois, toda a evolução complexizante que transforma o mamífero em primata, e a seguir em humano, e anteriormente toda a evolução que vai do unicelular ao mamífero. O beijo, ademais, supõe uma mitologia subjacente que identifica a alma com o sopro que sai pela boca: depende de condições culturais que favorecem sua expressão. Assim, há cinqüenta anos, no Japão o beijo era inconcebível, incongruente.
Dito de outro modo, essa coisa tão simples surge de uma região distante de uma complexidade assombrosa. Temos crido que o conhecimento tinha um ponto de partida e um término; hoje penso que o conhecimento é uma aventura em espiral que tem um ponto de partida histórico, mas não tem término, que deve sem cessar realizar círculos concêntricos2; quer dizer, o descobrimento de um princípio simples não é o final; reenvia de novo ao princípio simples
A
Legislar, desunir, reduzir, esses são os princípios
fundamentais do pensamento clássico.
Enquanto que a ciência de inspiração cartesiana ia muito logicamente do complexo ao simples, o pensamento científico
comtemporâneo intenciona ler a
complexidade do real sob a aparência simples dos
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ao qual esclareceu em parte. Assim, pensemos no caso do código genético que, uma vez descoberto, nos reenvia à pergunta: Por que existe essa diversidade extraordinária de formas nos animais e nos vegetais? Cito uma frase de Dobzhansky, o biólogo, que diz: “Desgraçadamente a natureza não foi gentil o bastante para fazer as coisas tão simples como nós gostaríamos que fossem. Devemos afrontar a complexidade.” Um físico, que é ao mesmo tempo um pensador, David Bohm, e que ataca o dogma da elementaridade – sobre o qual retornarei – diz: “As leis físicas primárias jamais serão descobertas por uma ciência que procura fragmentar o mundo em seus constituintes”.
Ainda que Bachelard dissesse que, de início, a ciência contemporânea buscava – porque ele pensava na física – a complexidade, é evidente que os cientistas desconheciam que isso era o que lhes concernia. Freqüentemente têm uma consciência dupla; crêem sempre obedecer à mesma velha lógica e outros princípios do conhecimento3.
Mas custou até que a complexidade emergisse. Custou que ela emergisse, antes de tudo, porque ela não foi o centro de grandes debates e de grandes reflexões, como por exemplo, foi o caso da racionalidade com os debates entre Lakatos e Feyerabend ou Popper e Kuhn. A cientificidade, a falsabilidade são grandes debates dos quais falamos; mas a complexidade nunca foi debatida. A bibliografia sobre a complexidade é, ao menos pelo que conheço, muito limitada. Para mim, a contribuição importante é o artigo de Weaver, colaborador de Shannon, como vocês sabem, na teoria da informação, quem, em 1948, escreveu o artigo “Ciência e complexidade” no Scientific American, artigo que é um resumo de um estudo mais extenso. É Von Neumann quem, na teoria “On self reproducing automata” aborda com uma visão muito profunda essa questão da complexidade das máquinas, dos autômatas naturais em comparação com os automatas artificiais. Referiu‐se a ela Bachelard em “Le nouvel esprit scientifique”; Von Foerster em diversos escritos, particularmente em seu texto, agora bem conhecido, “On self organizing systems and their environment”. Temos H. A. Simon: “Architecture of complexity”, que foi primeiro um artigo autônomo e que foi a seguir compilado em seu livro. Podemos encontrar a complexidade, na França, nas obras de Henri Atlan: Entre Le cristal ET La fumée, e temos Hayek que escreveu um artigo entitulado “The theory of complex phenomena” em Studies in philosophy, politics and economics, que é bastante interessante. 4
Sem dúvida tratou‐se muito da complexidade no domínio teórico, físico, no domínio sistêmico; mas com freqüência, em minha opinião, tratou‐se, sobretudo do que Weaver chama a complexidade desorganizada que irrompeu no conhecimento com o segundo princípio da termodinâmica, o descobrimento dessa desordem
A idéia da complexidade é uma aventura. Eu diria
inclusive que não podemos tentar entrar na problemática da
complexidade se não entramos na da
simplicidade, porque a simplicidade não é tão
simples assim.
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microscópica, micro corpuscular, no universo. Mas a complexidade organizada é, com freqüência, reconduzida à complicação.5 Que é a complicação? Quando há um número incrível de interações, por exemplo, entre moléculas em uma célula ou neurônio em um cérebro, esse número incrível de interações e de inter‐retroações supera evidentemente toda a capacidade de computação – não somente para um espírito humano, mas também para um computador muito aperfeiçoado – e então efetivamente é melhor ater‐se ao input e ao output6. Dito de outro modo, é muito complicado; a complicação é o emaranhado de inter‐relações. Certamente, é um aspecto da complexidade, mas creio que a importância da noção está em outra parte. A complexidade é muito mais uma noção lógica do que quantitativa. Ela possui certamente muitos suportes e características quantitativos que desafiam efetivamente os modos de cálculo; mas é uma noção de outro tipo. É uma noção a explorar, a definir. A complexidade nos aparece, antes de tudo, efetivamente como irracionalidade, como incerteza, como angústia, como desordem.
Dito de outro modo, a complexidade parece primeiro desafiar o nosso conhecimento, e de algum modo, produzir nele uma regressão. Cada vez que há uma irrupção de complexidade precisamente sob a forma de incerteza, de aleatoriedade, se produz uma resistência muito forte. Houve uma resistência muito forte contra a física quântica, porque os físicos clássicos diziam: “é o retorno à barbárie, não é possível nos situarmos na indeterminação quando desde dois séculos todas as vitórias da ciência têm sido as do determinismo.” Foi necessário o êxito operacional da física quântica para que finalmente, se compreenda que a nova indeterminação constituía também um progresso no conhecimento da mesma determinação.7
A idéia da complexidade é uma aventura. Diria inclusive que não podemos tentar entrar na problemática da complexidade se não entramos na da simplicidade, porque a simplicidade não é tão simples assim. No meu texto “Os mandamentos da complexidade” publicado em Science avec conscience, tentei extrair treze princípios do paradigma da simplificação, quer dizer, princípios de intelecção mediante simplificação, para poder extrair de modo correspondente, complementar e antagonista ao mesmo tempo – eis aqui uma idéia tipicamente complexa – princípios de intelecção complexa. Vou simplesmente retomá‐los e fazer alguns comentários. Essa será a primeira parte de minha exposição; a segunda parte estará consagrada um pouco mais precisamente ao problema do conhecimento do conhecimento8 ou à epistemologia complexa que está relacionada a tudo isso.
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Mandamentos do paradigma da simplificação
1. Geral e universal X particular e singular 2. Tempo reversível
3. Redução ou complementaridade
4. Ordem‐Rei
5. Causalidade linear 6. A problemática da organização
7. Separação Sujeito e Objeto 8. a 11. Ser e existência; formalização e quantificação
12. e 13 Confiança absoluta na lógica.
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1. Geral e universal X particular e singular.
odemos dizer que o princípio da ciência é: legislar. Corresponde ao princípio do direito, talvez. É uma legislação, mas não é anônima, que se encontra no universo, é a lei. E esse princípio é
um princípio universal que foi formulado pelo lugar comum: “Só há ciência no geral”, e que comporta a expulsão do local e do singular. Pois bem, o que é interessante é que, inclusive no universo, no universal, interveio a localidade. Quero dizer que hoje parece que nosso universo é um fenômeno singular, que comporta determinações singulares e que as grandes leis que o regem, que podemos chamar de leis de interação (como as interações gravitacionais, as interações eletromagnéticas, as interações fortes no seio dos núcleos atômicos) essas leis de interação não são leis em si, mas leis que somente se manifestam, somente atuam a partir do momento em que há elementos em interação; se não houvesse partículas materiais não haveria gravitação, a gravitação no existe em si. Essas leis não têm um caráter de abstração e estão ligadas às determinações singulares de nosso universo; tivesse podido haver outros universos possíveis – talvez os haja – e que tivessem outras características singulares. A singularidade está a partir de agora profundamente inscrita no universo; e ainda que o princípio da universalidade resida no universo, vale para um universo singular onde aparecem fenômenos singulares e o problema é combinar o reconhecimento do singular e local com a explicação universal. O local e singular devem cessar de serem rejeitados ou expulsos como resíduos a eliminar. 9
P ...o problema é combinar o
reconhecimento do singular e local com a explicação universal.
O local e singular devem cessar de serem rejeitados ou expulsos como resíduos
a eliminar.
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2. Tempo reversível
O segundo principio é a desconsideração do tempo como processo irreversível; as primeiras leis físicas puderam muito bem ser concebidas em um tempo reversível. E de alguma maneira, a explicação estava depurada de toda evolução, de toda historicidade. E também aqui há um problema muito importante: o do evolucionismo generalizado.10 Hoje o mundo, quer dizer o cosmos em seu conjunto e a matéria física em sua constituição (particular, nuclear, atômica, molecular), tem uma história. Já Ullumo, nessa epistemologia piagetiana com a qual François Meyer colaborou, dizia muito firmemente: “A matéria tem uma história”; hoje tudo o que é material é pensado, concebido através de sua gênese, sua história. O átomo é visto historicamente. O átomo de carbono é visto através de sua formação no interior de um sol, de um astro. Tudo é profundamente historicizado. A vida, a célula, ‐ François Jacob o sublinhava com freqüência ‐ uma célula é também um corte no tempo.
Dito de outro modo, contrariamente a essa visão que reinou durante um tempo nas ciências humanas e sociais, segundo a qual se acreditava poder estabelecer uma estrutura por eliminação de toda dimensão temporal e considerá‐la em si fora da história, hoje de todas as outras ciências chega a chamada profunda para ligar o estrutural ou organizacional (prefiro dizer este último e direi por que) com o histórico e evolutivo. E o que é importante efetivamente, é que o problema do tempo foi colocado de maneira totalmente paradoxal no último século.11
Com efeito, no mesmo momento em que se desenvolvia o evolucionismo ascensional sob sua forma darwiniana, quer dizer, uma idéia de evolução complexante e diversificante a partir de uma primeira protocélula vivente, no momento em que a história humana era vista como um processo de desenvolvimento e de progresso, nesse mesmo momento o segundo princípio da termodinâmica inscrevia, ele mesmo, uma espécie de corrupção inelutável, de degradação da energia que podia ser traduzida sob a ótica boltzmaniana como um crescimento da desordem e da desorganização. Estamos confrontados com uma dupla temporalidade; não é uma flecha do tempo o que surgiu, são duas flechas do tempo, e duas flechas que apontam em sentido contrário12. A despeito disso, é o mesmo tempo; e a mesma aventura cósmica:
• certamente, o segundo princípio da termodinâmica inscreve um princípio de corrupção, de dispersão do universo físico;
...hoje, de todas as outras ciências, chega a chamada
profunda para ligar o estrutural ou
organizacional, com o histórico e evolutivo.
... não é uma flecha do tempo o que surgiu, são duas flechas do tempo, e duas flechas que apontam em sentido contrário.
Há limites para a elementaridade; mas esses limites não são somente intrínsecos; têm também que ver com o fato de que, uma vez que tenhamos inscrito todo o tempo, a elementaridade aparece
também como eventualidade, quer dizer
que o elemento constitutivo de um sistema pode também ser visto
como evento.
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• mas ao mesmo tempo, esse universo físico, em um movimento de dispersão, constituiu‐se e continua se constituindo.
Constitui‐se de galáxias, de astros, de sóis, dito de outro modo desenvolve‐se mediante a organização ao mesmo tempo em que se produz mediante a desorganização. O mundo biológico é um mundo que evolui; é a vida; mas a vida, ao mesmo tempo, se faz através da morte das espécies. Houve quem quisesse justapor esses dois princípios; é o que Bergson fez; Bergson, um dos raros pensadores que olhou de frente o segundo princípio; mas, segundo ele, esse princípio era a prova de que a matéria biológica era diferente da matéria física, já que a matéria física tem algo de corrompido nela, enquanto que a substância biológica não padece o efeito do segundo princípio.
Desgraçadamente para ele, descobriu‐se a partir dos anos 50 que a originalidade da vida não está em sua matéria constitutiva, senão em sua complexidade organizacional.13
Estamos, pois, confrontados a esse tempo duplo que não somente tem duas flechas, senão que ademais pode ser a um só tempo irreversível e reiterativo. 14
Foi, evidentemente, a emergência do pensamento cibernético o que mostrou isso. Não era somente o fato de que, a partir de um fluxo irreversível, se pode criar um estado estacionário, por exemplo, o do turbilhão; no encontro de um fluxo irreversível e de um obstáculo fixo, como o arco de uma ponte, cria‐se uma espécie de sistema estacionário que é ao mesmo tempo móvel, já que cada molécula de água que turbilhoneia é arrastada de novo pelo fluxo, mas que manifesta uma estabilidade organizacional. Tudo isso se reencontra em todas as organizações vivas: irreversibilidade de um fluxo energético e a possibilidade de organização por regulação e, sobretudo por recursão, quer dizer, autoprodução de si. Assim temos o problema de uma temporalidade extremamente rica, extremamente múltipla e que é complexa.
Faz‐nos falta ligar a idéia de reversibilidade e de irreversibilidade, a idéia de organização de complexidade crescente e a idéia de desorganização crescente. Eis aqui o problema com o qual se defronta a complexidade!15 Enquanto que o pensamento simplificante elimina o tempo, ou mesmo não concebe mais do que um tempo único (o do progresso ou o da corrupção), o pensamento complexo se defronta não somente o tempo, mas o problema da politemporalidade na qual aparecem ligadas a repetição, o progresso, a decadência.
(...) proponho o tetragrama ODIO:
Ordem – Desordem – Interações – Organização
(...) este não poderá ser a ordem, nem uma lei, nem
uma fórmula mestra E = MC2,
nem a desordem pura.
Os princípios de ordem podem inclusive crescer ao mesmo tempo que os de desordem, ao mesmo
tempo que se desenvolve a organização.
Na linguagem, o discurso toma sentido em relação à palavra, mas a palavra só fixa seu sentido em relação aos discursos nos quais se encontra encadeada. Aqui também há uma ruptura
com toda visão simplificante na relação parte‐todo; faz‐nos falta ver como o todo está
presente nas partes e as partes presentes no todo.
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3. Redução ou complementaridade
O terceiro princípio da simplificação é o da redução ou também da elementaridade. O conhecimento dos sistemas pode ser reduzido às suas partes simples ou unidades elementares que os constituem. Sobre isso, serei muito breve.
Resumo. É no domínio físico onde esse princípio parecia haver triunfado de modo incontestável, domínio que, evidentemente, se encontra mais afetado por esse princípio. Fiz alusão ao problema da partícula que é aporética16 (onda e corpúsculo), e, portanto a substância é flutuante; demo‐nos conta de que naquilo que se acreditava ser o elemento puro e simples, a partir de agora existia a contradição, a incerteza, o composto – aludo à teoria do bootstrap.
Há limites para a elementaridade; mas esses limites não são somente intrínsecos; têm também que ver com o fato de que, uma vez que tenhamos inscrito todo o tempo, a elementaridade aparece também como eventualidade, quer dizer que o elemento constitutivo de um sistema pode também ser visto como evento.17 Por exemplo, existe uma visão estática que consiste em considerarmos nós mesmos enquanto organismos; estamos constituídos por de 30 a 50 bilhões de células. De algum modo, e creio no que Atlan justamente precisou; não estamos constituídos por células; estamos constituídos por interações entre essas células.18
Não são ladrilhos umas ao lado das outras; estão em interação.19 E essas interações, são acontecimentos, eles mesmos ligados por acontecimentos repetitivos que são estimulados pelo movimento do nosso coração, movimento ao mesmo tempo regular e inscrito em um fluxo irreversível. Todo elemento pode ser lido também como evento. E está, sobretudo o problema da sistematicidade; há níveis de emergência; os elementos associados formam parte de conjuntos organizados; ao nível da organização do conjunto, emergem qualidades que não existem no nível das partes.20
Certo, descobrimos que finalmente tudo isso se passa no nosso ser, não somente no nosso organismo, mas inclusive no pensamento, em nossas idéias, em nossas decisões, que podem reduzir‐se a turbilhões de elétrons. Mas é evidente que não se pode explicar a conquista da Gália por Júlio César somente pelos movimentos de turbilhões eletrônicos de seu cérebro, de seu corpo e do dos legionários romanos. Inclusive se um demônio conseguisse determinar essas interações físicas, nada compreenderia da conquista da Gália que somente pode ser compreendida ao nível da história romana e das tribos gaulesas. Do mesmo modo, eu diria, que em termos de
Faz‐nos falta ligar a idéia de reversibilidade e de
irreversibilidade, a idéia de organização de
complexidade crescente e a idéia de desorganização
crescente.
Eis aqui o problema com o qual se defronta a complexidade!
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mudanças bioquímicas, os amores de César e Cleópatra são totalmente ininteligíveis. Assim, pois, é certo que não reduziremos os fenômenos antroposociais aos fenômenos biológicos, nem estes às interações físico‐químicas.
4. OrdemRei
quarto principio simplificador é o da Ordem‐Rei. O Universo obedece estritamente a leis deterministas, e tudo o que parece desordem (quer dizer, aleatório, agitador, dispersivo) é
somente uma aparência devida unicamente à insuficiência de nosso conhecimento.
As noções de ordem e de lei são necessárias, mas insuficientes. Sobre isso, Hayek, por exemplo, mostra bem que quanto mais complexidade houver, menos útil é a idéia de lei. Hayek pensa, obviamente, na complexidade socioeconômica; é o tipo de preocupação dele; mas ele se dá conta de que é muito difícil, porque são complexos, predizer os fenômenos sociais. É evidente que as “Leis” da Sociedade ou as “Leis” da História, são tão gerais, tão triviais, tão planas, que carecem de interesse. Hayek diz: “Portanto, a busca de leis não é a marca do procedimento científico, mas somente uma característica própria das teorias sobre fenômenos simples”21. Vincula muito fortemente a idéia de leis com a idéia de simplicidade. Eu penso que se esta visão é bastante justa no que concerne aos fenômenos sociais, não o é menos no mundo físico ou biológico, o conhecimento deve ao mesmo tempo detectar a ordem (as leis e determinações) e a desordem, e reconhecer as relações entre ordem e desordem. O que é interessante é que a ordem e a desordem têm uma relação de complementaridade e de complexidade. Tomemos o exemplo, que freqüentemente cito, de um fenômeno que apresenta, sob uma perspectiva, um caráter aleatório surpreendente, e, sob outra perspectiva, um caráter de necessidade; esse fenômeno é a constituição do átomo de carbono nas caldeiras solares. Para que esse átomo se constitua é necessário que ocorra o encontro, exatamente no mesmo momento, de três núcleos de hélio, o que é um acontecimento completamente aleatório e improvável. A despeito disso, desde que esse encontro se produza, uma lei entra em ação; uma regra, uma determinação muito estrita intervém; o átomo de carbono é criado. Assim, pois, o fenômeno tem um aspecto aleatório e um aspecto de determinação.22 Ademais, o número de interações entre núcleos de hélio é enorme no seio do Sol; e, além disso, houve muitas gerações de sóis no nosso sistema solar; finalmente com o tempo, se cria uma quantidade considerável de átomos de carbono, se cria em todo caso uma ampla reserva necessária para a criação e desenvolvimento da
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vida. Vemos como um fenômeno que parece ser extremamente improvável, pelo seu caráter aleatório, finalmente é quantitativamente bastante importante e pode entrar em uma categoria estatística. Tudo isso depende, pois, da perspectiva desde a qual se veja e eu diria, sobretudo que é interessante – é necessário – reunir todas essas perspectivas. É neste sentido que proponho um tetragrama, que de nenhum modo é um princípio de explicação, mas que é muito mais um modo de memorizar indispensável; é o tetragrama ODIO: Ordem – Desordem – Interações – Organização.
Também devo precisar bem isto; quando se diz tetragrama se pensa em um tetragrama muito famoso, aquele que o Eterno proporcionou a Moisés no Monte Sinai para revelar a ele seu nome, nome sagrado e impronunciável: JHVH. Aqui o tetragrama do qual falo não é a Fórmula suprema: expressa a idéia de que toda a explicação, toda a intelecção jamais poderá encontrar um princípio último; este não poderá ser a ordem, nem uma lei, nem uma fórmula mestra E = MC2, nem a desordem pura. Desde que consideramos um fenômeno organizado, desde o átomo até os seres humanos passando pelos astros, é necessário fazer intervir de modo específico princípios de ordem, princípios de desordem e princípios de organização23. Os princípios de ordem podem inclusive crescer ao mesmo tempo em que os de desordem, ao mesmo tempo em que se desenvolve a organização. Por exemplo, Lwoff escreveu um livro intitulado L’ordre biologique, é um livro muito interessante porque, com efeito, há princípios de ordem que são válidos para todos os seres viventes, para toda organização vivente. Apenas que esses princípios de ordem válidos para toda organização vivente podem existir se as organizações viventes são viventes; assim, pois, não existiam antes da existência de vida, senão em estado virtual, e quando a vida se extinga cessarão de existir. Eis aqui uma ordem que tem a necessidade de autoproduzir‐se mediante a organização e essa ordem é bastante particular já que tolera uma parte importante de desordem, inclusive até colabora com a desordem como Von Neumann o viu acertadamente na sua teoria dos autômatas. Assim, pois, há, ao mesmo tempo em que cresce a complexidade, crescimento da desordem, crescimento da ordem, crescimento da organização (e perdoem que utilize essa palavra quantitativa “crescimento”). É certo que a relação ordem‐desordem‐organização não é somente antagônica, é também complementar e de antagonismo onde encontramos a complexidade.
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5. Causalidade linear
antiga visão, a visão simplificante, é uma visão na qual evidentemente a causalidade é simples; é exterior aos objetos; é superior a eles; é linear. 24 Pois bem, há uma causalidade nova,
que introduz pela primeira vez a retroação cibernética, o feedback negativo, na qual o efeito faz anel com a causa e podemos dizer que o efeito retro atua com a causa. Esse tipo de complexidade se manifesta no exemplo de um sistema de aquecimento de uma casa provido de um termostato, no qual efetivamente o mesmo termostato inicia ou detém o funcionamento da máquina térmica. O que é interessante, é que não é somente esse tipo de causalidade em anel que se cria; é também uma endo‐exo‐causalidade, já que é efetivamente também o frio e o calor exterior o que vai desencadear a interrupção ou ativação do dispositivo de calefação central; mas neste caso, a causa exterior desencadeia um efeito interior inverso do seu efeito natural: o frio exterior provoca o calor interior. Porque faz frio fora, a casa fica quente. Claro, tudo isso pode ser explicado de maneira muito simples quando consideramos os segmentos constitutivos do fenômeno do anel de retroação; mas o anel que liga esses segmentos, o modo de ligar esses elementos resulta complexo. Faz aparecer a endo‐exo‐causalidade.
A visão simplificante, logo que se trata de máquinas viventes, busca primeiramente a exocausalidade simples; esta tem sido a obsessão condutivista, por exemplo. Pensa‐se que o estímulo que provocou uma resposta (como a saliva do cachorro) produziu essa resposta. Depois, nos demos conta de que o interessante era também saber o que se passava no interior do cachorro e reconhecer qual era a natureza organizadora da endocausalidade que estimulou o cachorro a alimentar‐se. Tudo o que é vivente, e a fortiori tudo o que é humano, deve ser compreendido a partir de um jogo complexo ou dialógico de endo‐exo‐causalidade25. Assim, é necessário superar, incluindo no desenvolvimento histórico, a alternativa estéril entre endocausalidade e exocausalidade.26 No que concerne à extinta URSS, por exemplo, duas visões simplificantes se enfrentam: a primeira concebe o estalinismo segundo uma causalidade puramente endógena que vai de Marx a Lenin e deste a Stalin como uma espécie de desenvolvimento quase dedutivo a partir de um quase‐gen doutrinário; ao contrário, outros vêem isso como um fenômeno acidental, quer dizer, vêem no estalinismo o efeito das determinações do passado czarista, da guerra civil, do cerco capitalista, etc.
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...na visão simplificante a causalidade é simples; é exterior aos objetos; é
superior a eles; é linear; há uma causalidade nova, que introduz pela primeira vez a retroação cibernética, o feedback negativo, na qual o efeito faz anel com a
causa.
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Resulta evidente que nem uma nem a outra dessas visões são suficientes; o interessante é ver a espiral, o anel de fortalecimento de causas endógenas e de causas exógenas que faz que em um momento o fenômeno se desenvolva em uma direção mais do que em outra, dando por pressuposto que existem desde o começo virtualidades de desenvolvimento múltiplas. Temos, pois, sobre o tema da causalidade uma revisão muito importante a fazer.
6. A problemática da organização
obre a problemática da organização, não quero insistir.
Direi que na origem está o princípio de emergência, quer dizer, que qualidades e propriedades que nascem da organização de um conjunto retro atuam sobre esse conjunto; há algo de não dedutivo no aparecimento de qualidades ou propriedades de todo o fenômeno organizado.
Quanto ao conhecimento de um conjunto, é necessário pensar na frase de Pascal que costumo citar:
“Tenho por impossível conceber as partes à margem do conhecimento do todo, tanto como conhecer o todo sem conhecer particularmente as partes”27.
Isso remete a questão do conhecimento a um movimento circular ininterrupto. O conhecimento não se interrompe. 28 Conhecemos as partes o que nos permite conhecer melhor o todo, mas o todo volta a permitir conhecer melhor as partes.29 Nesse tipo de conhecimento, o conhecimento tem um ponto de partida quando se põe em movimento, mas não tem término. Temos que ver na natureza, não somente a biológica como a física, com fenômenos de auto‐organização que apresentam problemas enormes. Não insisto sobre isso. Os trabalhos de Pinson, que conhecemos e considero muito notáveis, dão origem, do ponto de vista organizacional, a uma concepção que podemos chamar de hologramática. O interessante é que temos dele um exemplo físico que é o holograma produzido pelo laser; no holograma cada parte contém a informação do todo. Não a contém, de qualquer modo, no seu todo; mas a contém em grande parte, o que faz que efetivamente possamos romper a imagem do holograma, reconstituindo outros micro‐todos fragmentários e atenuados. Thom disse: “A velha imagem do homem‐microcosmos, reflexo do macrocosmos, mantém todo seu valor; quem conheça o homem conhecerá o universo”. 30
Sem ir tão longe, é notável constatar que na organização biológica dos seres multicelulares cada célula contém a informação do todo. Contém potencialmente o todo. E nesse sentido é um modo
S
O produto é ao mesmo tempo o produtor; o que supõe uma ruptura total com nossa lógica das
máquinas artificiais na qual as máquinas produzem produtos que lhes são exteriores. Ver a nossa
sociedade à imagem dessas máquinas é esquecer que essas máquinas artificiais estão no interior de uma
sociedade que se autoproduz ela mesma.
Qual é nosso lugar, nós observadores‐
conceituadores, em um sistema do qual fazemos
parte?
Sem dúvida, em física, se pode prescindir da noção de sujeito, na condição de precisar bem que toda nossa visão do mundo físico se faz mediante a
intermediação de representações, de
conceitos ou de sistemas de idéias, quer dizer, de fenômenos próprios do
espírito humano.
Mas podemos prescindir da idéia de observador‐sujeito
em um mundo social constituído por interações
entre sujeitos?
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hologramático de organização. Na linguagem, o discurso toma sentido em relação à palavra, mas a palavra só fixa seu sentido em relação aos discursos nos quais se encontra encadeada. Aqui também há uma ruptura com toda visão simplificante na relação parte‐todo; faz‐nos falta ver como o todo está presente nas partes e as partes presentes no todo. Por exemplo, nas sociedades arcaicas, nas pequenas sociedades de caçadores‐coletores, nas sociedades que chamamos “primitivas”, a cultura estava entranhada em cada indivíduo. Havia nelas alguns que possuíam a totalidade da cultura, esses eram os sábios, eram os anciões; mas os outros membros da sociedade tinham em seu espírito o conhecimento de saberes, normas, regras fundamentais.
Hoje as sociedades nas sociedades nações, o Estado conserva nele as Normas e as Leis, e a Universidade contém o saber coletivo. Não obstante passamos muitos anos na família primeiro, e a seguir, sobretudo na escola, a adquirir a cultura do todo; assim cada indivíduo porta praticamente, de um modo vago, inacabado, toda a sociedade em si, toda a sua sociedade.
Os problemas de organização social só podem ser compreendidos a partir desse nível complexo da relação parte‐todo. Aqui intervém a idéia de recursão organizacional que, a meu ver, é absolutamente crucial para conceber a complexidade da relação entre partes e todo. As interações entre individualidades autônomas, como nas sociedades animais ou inclusive nas células, dado que as células têm cada uma sua autonomia, produzem um todo que retro atua sobre as partes para produzi‐las.31 Dito de outro modo, as interações entre indivíduos fazem a sociedade; de fato, a sociedade não teria nem um grama de existência sem os indivíduos viventes; se uma bomba muito limpa, como a bomba de nêutrons, aniquilasse toda a França, permaneceriam todos os monumentos: o Eliseu, a Câmara dos Deputados, o Palácio da Justiça, os Arquivos, a Educação Nacional, etc.; mas não haveria sociedade, porque evidentemente, os indivíduos produzem a sociedade. Não obstante, a sociedade mesma produz os indivíduos ou, ao menos, consuma a humanidade deles ministrando a eles a educação, a cultura, a linguagem. Sem a cultura seríamos rebaixados ao mais baixo nível dos primatas.
Dito de outro modo são as interações entre indivíduos que produzem a sociedade; mas é a sociedade que produz o indivíduo. Eis aqui um processo de recursividade organizacional; o recursivo se refere a processos nos quais os produtos e os efeitos são necessários para sua própria produção. O produto é ao mesmo tempo o produtor32; o que supõe uma ruptura total com nossa lógica das máquinas artificiais na qual as máquinas produzem produtos que lhes são exteriores. Ver a nossa sociedade à imagem dessas máquinas é esquecer que essas máquinas artificiais estão no interior de uma sociedade que se autoproduz ela mesma.
Por outra parte, o pensamento simplificante
se fundou sobre a disjunção absoluta entre o objeto e o sujeito que o percebe e concebe.
Nós devemos apresentar, pelo contrário, o princípio
de relação entre o observador conceituador e
o objeto observado, concebido.
E é um convite ao pensamento rotativo, da parte ao todo e do todo à
parte.
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7. Separação Sujeito e Objeto
pensamento simplificante foi fundado sobre a disjunção entre o objeto e o meio ambiente. Compreendia‐se o objeto isolando‐o do seu meio ambiente; era tanto mais necessário isolá‐lo como
era necessário extraí‐lo do meio ambiente para colocá‐lo em um novo meio ambiente artificial que controlava, que era o meio da experiência, da ciência experimental. Efetivamente, graças à experiência, podia‐se variar as condições do comportamento do objeto, e, pelo mesmo, conhecê‐lo melhor. A experimentação fez progredir consideravelmente nosso conhecimento. Mas há outro conhecimento que só pode progredir concebendo as interações com o meio ambiente. Este problema se encontra na física, onde as grandes leis são leis de interação. Encontra‐se também na biologia, onde o ser vivente é um sistema ao mesmo tempo fechado e aberto inseparável do seu meio ambiente do qual tem necessidade para alimentar‐se, informar‐se, desenvolver‐se. Faz‐nos falta, pois, não desunir, mas distinguir os seres de seu meio ambiente.33
Por outra parte, o pensamento simplificante se fundou sobre a disjunção absoluta entre o objeto e o sujeito que o percebe e concebe. Nós devemos apresentar, pelo contrário, o princípio de relação entre o observador conceituador e o objeto observado, concebido.
Mostramos que o conhecimento físico é inseparável da introdução de um dispositivo de observação, de experimentação (o aparelho, supressão, grade) e por isso inclui a presença do observador‐conceituador em toda a observação ou experimentação. Mesmo que não houvesse até o presente nenhuma virtude heurística no conhecimento astronômico, é interessante apontar aqui o princípio antrópico extraído por Brandon Carter: “A presença de observadores no universo impõe determinações, não somente sobre a idade do universo a partir da qual os observadores podem aparecer, mas também sobre o conjunto de suas características e dos parâmetros fundamentais da física que se depreende aí”. Acresce que a versão débil do princípio antrópico estipula que a presença de observadores no universo impõe determinações sobre a posição temporal destes últimos; a versão forte do princípio antrópico supõe que a presença de observadores no universo impõe determinações não somente sobre sua posição temporal, mas também sobre o conjunto de propriedades do universo.
Quer dizer, o universo pertence a uma classe de modelos de universo capazes de abrigar seres viventes e de ser estudado por eles. O que é uma coisa extraordinária, já que todo nosso conhecimento do cosmos, efetivamente, faz de nós seres cada vez mais periféricos e marginais. Não somente estamos em uma estrela de periferia, de
O
Dito de outro modo, estas categorias do ser e da existência que parecem
puramente metafísicas são reencontradas em nosso universo físico; mas o ser não é uma substância; o ser só pode existir a partir do momento em que há
auto‐organização.
Se podemos nos referir no que segue a princípios
científicos que permitem conceber o ser, a
existência, o indivíduo, o sujeito, é certo que o status, o problema das
ciências sociais e humanas se modifica.
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uma galáxia periférica, mas, além disso, somos seres viventes, quiçá os únicos seres viventes do universo – para abreviar, não temos prova de que haja outros nele – e desde o ponto de vista da vida, somos o único ramo onde apareceu essa forma de consciência reflexiva que dispõe de linguagem e que pode verificar cientificamente seus conhecimentos.34
O universo nos marginaliza totalmente.
Certamente, o princípio antrópico em absoluto suprime essa marginalidade; mas diz que é necessário, de uma determinada maneira, que o universo seja capaz, inclusive de um modo altamente improvável, de fazer seres vivos e seres conscientes. Na versão mais fraca, o exemplo que dá é bastante interessante; diz: “Nosso sol tem cinco bilhões de anos; é um adulto; tem assegurado, salvo erro, 10 bilhões de anos. A vida começou talvez há quatro bilhões de anos, quer dizer, praticamente no princípio do sistema solar. Nós, seres humanos, surgimos no meio da idade solar”. Há aqui algo que não é puramente arbitrário, ao azar. Supondo que a vida tivesse começado mais tarde, não haveria tido, sem dúvida, condições de desenvolvimento possível; mas, se a vida tivesse começado mais tarde, a consciência humana haveria aparecido no momento em que o sol tivesse começado a estinguir‐se, quer dizer, no momento em que quiçá não haveria sido mais do que um relâmpago antes do crepúsculo final. Dito de outro modo, tem certo interesse intentar pensar nosso sistema em relação a nós mesmos e nós mesmos em relação ao nosso sistema.
E é um convite ao pensamento rotativo, da parte ao todo e do todo à parte. Já a reintrodução do observador na observação havia sido efetuada na micro‐física (Bohr, Heisenberg) e a teoria da informação (Brillouin). Ainda de modo mais profundo o problema se apresenta em sociologia e em antropologia: Qual é nosso lugar, nós observadores‐conceituadores, em um sistema do qual fazemos parte?
Atrás da noção de observador se esconde a noção, ainda que desonrosa, de sujeito.35 Sem dúvida, em física, se pode prescindir da noção de sujeito, na condição de precisar bem que toda nossa visão do mundo físico se faz mediante a intermediação de representações, de conceitos ou de sistemas de idéias, quer dizer, de fenômenos próprios do espírito humano.36
Mas podemos prescindir da idéia de observador‐sujeito em um mundo social constituído por interações entre sujeitos?
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8. a 11. Ser e existência; formalização e quantificação
á também uma outra questão que me parece importante, é que, no conhecimento simplificante, as noções de ser e de existência estavam totalmente eliminadas pela formalização e pela
quantificação.37 Pois bem, creio que foram reintroduzidas a partir da idéia de autoprodução que, ela mesma, é inseparável da idéia de recursão organizacional.
Tomemos um processo que se autoproduz e que assim produz o ser; cria o “si mesmo”.
O processo autoprodutor da vida produz seres viventes. Esses seres são, ao mesmo tempo em que sistemas abertos, dependentes do seu meio ambiente, submetidos a aleatoriedades, existentes. A categoria de existência não é uma categoria puramente metafísica; somos “seres‐aí”, como diz Heidegger, submetidos efetivamente à iminência ao mesmo tempo totalmente certa e totalmente incerta da morte.
Dito de outro modo, estas categorias do ser e da existência que parecem puramente metafísicas são reencontradas em nosso universo físico; mas o ser não é uma substância; o ser só pode existir a partir do momento em que há auto‐organização.
O sol é um ser que se auto‐organiza evidentemente a partir, não de nada, mas a partir de uma nuvem cósmica; e quando o sol explodir perderá seu ser...
Se podemos nos referir no que segue a princípios científicos que permitem conceber o ser, a existência, o indivíduo, o sujeito, é certo que o status, o problema das ciências sociais e humanas se modifica.38 É muito importante, já que o drama, a tragédia das ciências humanas e das ciências sociais especialmente, é que querendo fundar sua cientificidade sobre as ciências naturais, encontraram princípios simplificadores e mutilantes com os quais era impossível conceber o ser, impossível conceber a existência, impossível conceber a autonomia, impossível conceber o sujeito, impossível conceber a responsabilidade.39
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O verdadeiro problema é que é a mesma lógica que nos conduz a momentos
aporéticos os quais podem ser superados. O que
revela a contradição, se ela é insuperável, é a presença de um nível profundo da realidade que deixa de
obedecer à lógica clássica aristotélica.
Assim, no âmago do problema da
complexidade, aloja‐se um problema de princípio de pensamento ou paradigma, e no coração do paradigma
da complexidade se apresenta o problema da
insuficiência e da necessidade da lógica, do enfrentamento “dialético”
ou dialógico da contradição.
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12. e 13 Confiança absoluta na lógica.
gora chego ao último ponto, que é o mais dramático. O conhecimento simplificante se fundamenta sobre a confiança absoluta na lógica para estabelecer a verdade intrínseca das
teorias, uma vez que estas estão fundamentadas empiricamente segundo os procedimentos de verificação.
Pois bem, descobrimos, com o teorema de Gödel, a problemática da limitação da lógica. O teorema de Gödel demonstrou os limites da demonstração lógica no seio dos sistemas formalizados complexos; estes comportam ao menos uma proposição que é indecidível, o que faz que o conjunto do sistema seja indecidível.
O que é interessante nessa idéia, é que ela pode ser generalizada: todo sistema conceitual suficientemente rico inclui necessariamente questões às quais não pode responder desde ele próprio, mas às quais só pode responder referindo‐se ao exterior desse sistema.
Como diz expressamente Gödel: “O sistema só pode encontrar seus instrumentos de verificação em um sistema mais rico ou metasistema”.
Tarski disse isso também claramente para os sistemas semânticos. Os metasistemas, embora mais ricos, comportam também uma brecha e assim consecutivamente; a aventura do conhecimento não pode ser fechada; a limitação lógica nos faz abandonar o sonho de uma ciência absoluta e absolutamente certa, mas é necessário dizer que não era só um sonho. Era o sonho finalmente dos anos 20, o sonho do matemático Hilbert que acreditava efetivamente que se podia provar de modo absoluto pela matemática, matematicamente, logicamente, formalmente, a verdade de uma teoria. Era o sonho do positivismo lógico que acreditou fundar com certeza a teoria científica. Pois bem, Popper, depois Kuhn, cada um a seu modo, mostraram que o próprio de uma teoria científica é ser biodegradável. Há aqui uma brecha na lógica à qual se adiciona outra brecha, que é um problema da contradição. É um problema muito velho, já que o contraditório ou o antagonismo está presente em Heráclito, Hegel, Marx.
A questão está em saber se o aparecimento de uma contradição é sinal de erro, quer dizer, se é necessário abandonar o caminho que conduziu a ela ou se pelo contrário, nos revela níveis profundos ou desconhecidos da realidade.40 Existem contradições absurdas, às quais nos conduz a observação, como a partícula que se apresenta ao observador tanto como onda quanto como corpúsculo; esta contradição não é uma contradição absurda; ela se fundamenta sobre um desenvolvimento lógico; partindo de determinadas
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observações, se chega à conclusão de que o observado é algo imaterial, uma onda; mas outras observações, não menos verificadas, nos mostram que, em outras condições, o fenômeno se comporta como uma entidade discreta, um corpúsculo. É a lógica que nos conduz a essa contradição. O verdadeiro problema é que é a mesma lógica que nos conduz a momentos aporéticos os quais podem ser superados. O que revela a contradição, se ela é insuperável, é a presença de um nível profundo da realidade que deixa de obedecer à lógica clássica aristotélica.
Diria, em duas palavras, que o trabalho do pensamento, quando é criador, é realizar saltos, transgressões lógicas, mas que o trabalho da verificação é retornar à lógica clássica, ao nó dedutivo, o qual, efetivamente, só opera verificações segmentárias. Podemos formular proposições aparentemente contraditórias, como por exemplo: eu sou outro. Eu “sou” outro, como dizia Rimbaud, ou essa formosa frase de Tarde, para citar um precursor da sociologia, que reza: “O mais admirável de todas as sociedades, essa hierarquia da consciência, essa feudalidade de almas vassalas da qual nossa pessoa é a de cima”, quer dizer, essa multiplicidade de personalidades no eu; na identidade existe um tecido de noções extremamente diversas, existe a heterogeneidade no idêntico. Tudo isto é muito difícil de conceber, mas é assim.
Assim, no âmago do problema da complexidade, aloja‐se um problema de princípio de pensamento ou paradigma, e no coração do paradigma da complexidade se apresenta o problema da insuficiência e da necessidade da lógica, do enfrentamento “dialético” ou dialógico da contradição.
A primeira instância é o espírito.
Que é o espírito?
O espírito é a atividade de algo, de um órgão chamado cérebro.
A complexidade consiste em não reduzir nem o
espírito ao cérebro nem o cérebro ao espírito. O
cérebro, evidentemente, é um órgão que podemos
analisar, estudar, mas que nomeamos do mesmo modo pela atividade do
espírito.
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A epistemologia complexa
segundo problema é o da epistemologia complexa que, em última instância, é aproximadamente de uma mesma natureza que o problema do conhecimento do conhecimento. É uma
continuação de questões do que eu disse, mas ultrapassando‐as, englobando‐as.
Como conceber esse conhecimento do conhecimento?
Podemos dizer que o problema do conhecimento científico podia apresentar‐se em dois níveis.
• Havia o nível que podíamos chamar de empírico, e o conhecimento científico, graças às verificações mediante observações e experimentações múltiplas, extrai dados objetivos e, sobre estes dados objetivos, induz teorias que, se pensava, refletiam o real.
• Em um segundo nível, essas teorias se fundamentavam sobre a coerência lógica e assim fundavam sua verdade, os sistemas de idéias.
Tínhamos, então, dois tronos, o trono da realidade empírica e o trono da verdade lógica, desse modo se controlava o conhecimento.
Os princípios da epistemologia complexa são mais complexos: não há um trono; não há dois tronos; de modo algum há trono. Existem instâncias que permitem controlar os conhecimentos; cada uma é necessária; cada uma é insuficiente.
A primeira instância é o espírito.
Que é o espírito?
O espírito é a atividade de algo, de um órgão chamado cérebro.
A complexidade consiste em não reduzir nem o espírito ao cérebro nem o cérebro ao espírito. O cérebro, evidentemente, é um órgão que podemos analisar, estudar, mas que nomeamos do mesmo modo pela atividade do espírito.
Dito de outro modo, temos algo que podemos chamar o espírito‐cérebro ligado e recursivo já que um produz o outro de alguma maneira. Mas de todas as formas, este espírito‐cérebro surgiu de uma evolução biológica, via a hominização, até o homo chamado sapiens. Portanto, a problemática do conhecimento deve absolutamente integrar, cada vez que elas aparecem, as aquisições
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fundamentais da bioantropologia do conhecimento. E quais são essas aquisições fundamentais?
A primeira aquisição fundamental é que nossa máquina cerebral é hiper‐complexa.
O cérebro é uno e múltiplo. A menor palavra, a menor percepção, a menor representação põem em jogo, em ação e em conexão miríadas de neurônios e múltiplos estratos ou setores do cérebro. Este é bi hemisférico; e seu funcionamento favorável acontece na complementaridade e no antagonismo entre um hemisfério esquerdo mais polarizado sobre a abstração e a análise, e um hemisfério direito mais polarizado sobre a apreensão global e o concreto.
O cérebro é hipercomplexo igualmente no sentido em que é “triúnico”, segundo a expressão de Mac Lean; tem em si, não como a Trindade três pessoas em uma, mas três cérebros em um:41
• o cérebro reptiliano (preservação, agressão);
• o cérebro mamífero (afetividade);
• o neocórtex humano (inteligência lógica e conceitual),
sem que haja predominância de um sobre o outro. Ao contrário, há antagonismo entre essas três instâncias, e às vezes, amiúde, é o impulso quem governa a razão. Mas também, nesse e por esse equilíbrio, surge a imaginação.
O mais importante talvez na bioantropologia do conhecimento nos retorna às críticas kantianas, em minha opinião iniludíveis; efetivamente, descobriu‐se mediante novos meios de observação e de experimentação o que Kant descobriu mediante procedimentos intelectuais e reflexivos42. Nosso cérebro está em uma caixa preta que é o crânio, não tem comunicação direta com o universo.43 Essa comunicação se efetua indiretamente via a rede nervosa a partir de terminais sensoriais. Quê é o que chega à nossa retina, por exemplo? São estímulos, que na nossa linguagem atual chamamos fótons, que vão impressionar a retina e essas mensagens vão ser analisadas por células especializadas, depois transcritas em um código binário o qual vai chegar ao nosso cérebro aonde, de novo, vão, segundo processos que não conhecemos, traduzir‐se em representação. É a ruína da concepção do conhecimento‐reflexo.44
Nossas visões do mundo são traduções do mundo. Traduzimos a realidade em representações, noções, idéias, depois em teorias. Desde agora está experimentalmente demonstrado que não existe diferença intrínseca alguma entre a alucinação e a percepção. Podemos efetuar determinados estímulos sobre determinadas zonas do cérebro e fazer reviver impressões, lembranças com uma força alucinatória sentida como percepção. Dito de outro modo, o que
O cérebro é hipercomplexo igualmente no sentido em que é “triúnico”, segundo a expressão de Mac Lean. Tem em si, não como a
Trindade três pessoas em uma, mas três cérebros em um, o cérebro reptiliano (preservação, agressão), o
cérebro mamífero (afetividade), o neocórtex humano (inteligência lógica e conceitual), sem que haja
predominância de um sobre o outro.
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diferencia a percepção da alucinação é unicamente a intercomunicação humana. E talvez nem isso, pois há casos de alucinação coletiva. A menos que se admita a realidade da aparição de Fátima, é certo que milhares de pessoas, que uma multidão, podem produzir uma mesma alucinação.
Assim, do exame bioantropológico do conhecimento se depreende um princípio de incerteza fundamental; existe sempre uma relação incerta entre nosso espírito e o universo exterior.45 Só podemos traduzir sua linguagem desconhecida atribuindo‐lhe e a ele adaptando nossa linguagem. Assim, chamamos de “luz” ao que nos permite ver, e entendemos hoje por luz um fluxo de fótons que bombardeiam nossas retinas. É já a hora de que a epistemologia complexa reintegre um personagem que ignorou totalmente, quer dizer, o homem enquanto ser bioantropológico que tem um cérebro.46 Devemos conceber que o que permite o conhecimento é ao mesmo tempo o que o limita. Impomos ao mundo categorias que nos permitem captar o universo dos fenômenos. Assim, conhecemos realidades, mas ninguém pode pretender conhecer A Realidade com “A” e “R”.
Não há somente condições bioantropológicas do conhecimento.47 Existem, correlativamente, condições sócio‐culturais de produção de todo conhecimento, incluído o científico. Estamos nos começos balbuciantes da sociologia do conhecimento. Uma de suas enfermidades infantis é reduzir todo conhecimento, incluindo o científico, unicamente ao seu enraizamento sócio‐cultural; pois bem, desgraçadamente, não se pode fazer do conhecimento científico uma ideologia do mesmo tipo que as ideologias políticas, embora – e voltarei sobre isso – toda teoria seja uma ideologia, quer dizer, uma construção, um sistema de idéias, e ainda que todo sistema de idéias dependa por sua vez de capacidades próprias do cérebro, de condições sócio‐culturais, da problemática da linguagem. Nesse sentido, uma teoria científica comporta inevitavelmente um caráter ideológico. Existem sempre postulados metafísicos ocultos embaixo da atividade teórica (Popper, Holton).
Mas a ciência estabelece um diálogo crítico com a realidade, diálogo que a distingue de outras atividades cognitivas.48
Por outro lado, a sociologia do conhecimento está ainda pouco desenvolvida e comporta nela um paradoxo fundamental; seria necessário que a sociologia fosse mais potente que a ciência que estuda para poder tratá‐la de modo plenamente científico; pois bem, desgraçadamente a sociologia é cientificamente menos potente que a ciência que examina. Isso quer dizer evidentemente que é necessário desenvolver a sociologia do conhecimento. Existem estudos interessantes, mas muito limitados, que são estudos de sociologia dos laboratórios; afirmam eles que um laboratório é um
É já a hora de que a epistemologia complexa reintegre um personagem que ignorou totalmente, quer dizer, o homem
enquanto ser bioantropológico que tem um cérebro. Devemos conceber que o que
permite o conhecimento é ao mesmo tempo o que o limita. Impomos ao mundo
categorias que nos permitem captar o
universo dos fenômenos. Assim, conhecemos
realidades, mas ninguém pode pretender conhecer A Realidade com “A” e “R”.
É necessário, pois, ver o mundo das idéias, não só como um produto da
sociedade somente ou um produto do espírito, mas ver também que o produto
tem, no domínio do complexo, sempre uma autonomia relativa.
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micro‐meio humano onde fervem ambições, ciúmes, rivalidades, modas... Duvidava‐se um pouco disso. É verdadeiro que isto imerge novamente a atividade científica na vida social e cultural; mas não se trata somente disso. Há muito mais que fazer do ponto de vista da sociologia da cultura, da sociologia da intelligentsia (Mannheim). 49Há todo um domínio extremamente fecundo por prospectar. A este nível é preciso desenvolver uma sócio‐história do conhecimento, incluída nela a história do conhecimento científico. Acabamos de ver que toda teoria cognitiva, incluída a científica, é produzida pelo espírito humano e por uma realidade sócio‐cultural. Isso não basta.
É necessário também considerar os sistemas de idéias como realidade de um tipo particular, dotadas de uma determinada autonomia “objetiva” em relação aos espíritos que as nutrem e delas se nutrem. É necessário, pois, ver o mundo das idéias, não só como um produto da sociedade somente ou um produto do espírito, mas ver também que o produto tem, no domínio do complexo, sempre uma autonomia relativa.50 É o famoso problema da superestrutura ideológica que atormentou gerações de marxistas porque, evidentemente, o marxismo sumário e fechado, fazia da superestrutura um puro produto das infra‐estruturas, mas o marxismo complexo e dialético, começando por Marx, percebia que uma ideologia retro atuava, evidentemente, e jogava seu papel no processo histórico. É necessário ir ainda mais longe. Marx creu voltar a colocar a dialética de pé subordinando o papel das idéias. Mas a dialética não tem cabeça nem pés. É rotativa. 51
A partir do momento em que se toma a sério a idéia da recursão organizacional, os produtos são necessários para a produção dos processos.52
As sociedades humanas, as sociedades arcaicas, têm mitos funcionais, mitos comunitários, mitos sobre ancestrais comuns, mitos que lhes explicam sua situação no mundo. Pois bem, essas sociedades só podem constituir‐se como sociedades humanas se têm esse ingrediente mitológico; o ingrediente mitológico é tão necessário como o ingrediente material. Pode‐se dizer: não, claro que temos primeiro a necessidade de comer e depois ...os mitos, sim, mas não tanto! O mito mantém a comunidade, a identidade comum que é um vínculo indispensável para as sociedades humanas. Formam parte de um conjunto no qual cada momento do processo é capital para a produção do todo.53
Dito de outro modo, quero falar do grau de autonomia das idéias e tomarei dois exemplos extremos; um exemplo que sempre me impressionou resulta evidentemente de todas as religiões. Os deuses que são criados por interações entre os espíritos de uma comunidade de crentes têm uma existência plenamente real e plenamente objetiva; eles não têm certamente a mesma objetividade de uma
Os problemas fundamentais da
organização dos sistemas de idéias não resultam
somente da lógica, existe também o que chamo de paradigmatología. Esta
significa que os sistemas de idéias obedecem a alguns princípios fundamentais que são princípios de
associação ou de exclusão que os controlam e
comandam.
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mesa, do que uma casa; mas têm uma objetividade real na medida em que se crê neles: são seres que vivem como os crentes e estes operam com seus deuses um comércio, um intercâmbio de amor pago com amor. Demandam dos deuses ajuda ou proteção e, em contrapartida, fazem a eles oferendas. Melhor ainda: há muitos cultos nos quais os deuses aparecem, e o que sempre me fascinou na macumba é esse momento em que chegam os deuses, os espíritos, que se apoderam de tal ou qual pessoa, que bruscamente falam pela boca do deus, com a voz do deus, isto é, a existência real desses deuses é incontestável.
Mas esses deuses não existiriam sem os humanos que os protegem: eis aqui a restrição que é necessária fazer para sua existência! No limite, essa mesa pode ainda existir sem a nossa vida, nosso aniquilamento, ainda que não tivesse já a função de mesa; isso seria o que continuaria sua existência. Mas os deuses morreriam todos desde que deixássemos de existir.
Então, eis aí seu tipo de existência!
Do mesmo modo, diria que as ideologias existem com muita força. A idéia trivial de que podemos morrer por uma idéia é muito verdadeira! Claro está, mantemos uma relação muito equivocada com a ideologia. Uma ideologia, segundo a visão marxista, é um instrumento que mascara interesses particulares sob interesses universais.
Tudo isso é verdade; mas a ideologia não é apenas um instrumento; ela nos instrumentaliza. Somos possuídos por ela. Somos capazes de atuar por ela. Assim, existe o problema da autonomia relativa do mundo das idéias e o problema da organização do mundo das idéias.
Existe a necessidade de elaborar uma ciência nova que será indispensável para o conhecimento do conhecimento. Essa ciência seria uma noologia, ciência das coisas do espírito, das entidades mitológicas e dos sistemas de idéias, entendidos em sua organização e seu modo de ser específico.
Os problemas fundamentais da organização dos sistemas de idéias não resultam somente da lógica, existe também o que chamo de paradigmatología. Esta significa que os sistemas de idéias obedecem a alguns princípios fundamentais que são princípios de associação ou de exclusão que os controlam e comandam.54
Assim, por exemplo, o que podemos chamar o grande paradigma do Ocidente, bem formulado por Descartes, já citado, que consiste na disjunção entre objeto e sujeito, a ciência e a filosofia; é um paradigma que não somente controla a ciência, mas controla também a filosofia. Os filósofos admitem a disjunção com o conhecimento científico tanto quanto os cientistas a disjunção com a filosofia. Eis aqui, pois, um paradigma que controla tipos de
O mito mantém a comunidade, a identidade comum que é um vínculo indispensável para as sociedades humanas. Formam parte de um conjunto no qual cada momento do processo é
capital para a produção do todo.
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pensamento totalmente diferentes, inclusive antagonistas, mas que são igualmente obedecidos. Pois bem, tomemos a natureza humana como exemplo do paradigma. Ou bem o paradigma faz que essas duas noções, as de natureza e homem, estejam associadas,55 como ocorre de fato em Rousseau, quer dizer, que só podemos compreender o humano em associação com a natureza; ou bem essas duas noções estão disjuntas, quer dizer, que somente podemos compreender o humano por exclusão da natureza; este é o ponto de vista da antropologia cultural ainda existente.
Um paradigma complexo, pelo contrário, pode compreender o humano ao mesmo tempo em associação e em oposição com a natureza. Foi Kuhn quem colocou em relevo fortemente a importância crucial dos paradigmas, ainda que haja definido mal essa noção. Ele a utiliza no sentido vulgar anglo saxão de “princípio fundamental”. Eu a emprego em um sentido intermediário entre seu sentido lingüístico e seu sentido kuhniano, quer dizer que esse princípio fundamental se define pelo tipo de relações que existem entre alguns conceitos mestres extremamente limitados, mas cujo tipo de relações controla todo o conjunto dos discursos incluindo a lógica dos discursos.
Quando digo lógica, é necessário ver que de fato cremos na lógica aristotélica; mas nesse tipo de discurso que é o discurso do nosso conhecimento ocidental, é a lógica aristotélica a que nos faz obedecer, sem que o saibamos, a esse paradigma de disjunção, de simplificação e de legislação soberana; e o mundo do paradigma é evidentemente algo muito importante que merece ser estudado em si mesmo, mas com a condição de abri‐lo sempre sobre um conjunto das condições sócio‐culturais e de introduzi‐lo no coração mesmo da idéia de cultura.
O paradigma que produz uma cultura é ao mesmo tempo o paradigma que reproduz essa cultura.
Hoje, o princípio de disjunção, de distinção, de associação, de oposição que governa a ciência não somente controla as teorias, mas ao mesmo tempo comanda a organização tecno‐burocrática da sociedade. 56
Essa divisão, essa hiperdivisão do trabalho científico aparece de um lado, evidentemente, como uma espécie de necessidade de desenvolvimento intrínseco, porque desde que uma organização complexa se desenvolve, o trabalho se especializa enquanto que as tarefas se multiplicam para chegar a uma riqueza mais complexa. Mas esse processo, não somente é paralelo, mas também está ligado ao processo de heterogeneização de tarefas, ao processo da não‐comunicação, do parcelamento, da fragmentação das atividades humanas em nossa sociedade industrial; resulta evidente que há
Existe a necessidade de elaborar uma ciência nova que será indispensável para o conhecimento do
conhecimento. Essa ciência seria uma noologia, ciência das coisas do espírito, das entidades mitológicas e dos sistemas de idéias, entendidos em sua
organização e seu modo de ser específico.
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nisso uma relação muito profunda entre o modo como organizamos o conhecimento e o modo como a sociedade se organiza.
A ausência de complexidade nas teorias científicas, políticas e mitológicas está ela mesma ligada a uma determinada carência de complexidade na própria organização social, quer dizer, que o problema do paradigmático é extremamente profundo porque remete a algo muito profundo na organização social, que não é evidente em princípio; remete a algo muito profundo sem dúvida, na organização do espírito e do mundo noológico.
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À guisa de conclusão
oncluo: O que seria uma epistemologia complexa? Não é a existência de uma instância soberana que seria o Senhor epistemólogo controlando de modo irredutível e irremediável todo o saber; não há trono soberano. Há uma pluralidade de
instâncias. Cada uma dessas instâncias é decisiva; cada uma é insuficiente. Cada uma dessas instâncias comporta seu princípio de incerteza. Falei do princípio da incerteza. Falei do princípio da incerteza na bio‐antropologia do conhecimento. É necessário também falar do princípio da incerteza da sociologia do conhecimento; uma sociedade produz uma ideologia, uma idéia; mas isso não é sinal de que ela seja verdadeira ou falsa. Por exemplo, na época em que Laurent Casanova (é uma recordação pessoal) estigmatizava o existencialismo sartreano dizendo dele: “É a expressão da pequena burguesia espremida entre o proletariado e a burguesia”, o desafortunado Sartre dizia: “Sim, pode ser; é verdade; mas isso não quer dizer, entretanto, que o existencialismo seja verdadeiro ou falso”. Do mesmo modo, as conclusões “sociológicas” de Lucien Glodmann sobre Pascal, inclusive se elas estiverem fundamentadas, não afetam aos Pensées.
Lucien Glodmann dizia: “A ideologia de Pascal e de Port‐Royal é a ideologia da nobreza de toga espremida entre a monarquia e a burguesia ascendente”. Talvez, mas será que a angústia de Pascal diante dos dois infinitos pode reduzir‐se ao drama da nobreza de toga que está para perder sua toga? Não está tão claro.
Dito de outro modo: inclusive as condições mais singulares, as mais localizadas, as mais particulares, as mais históricas da emergência de uma idéia, de uma teoria, não são prova de sua verdade – isso está claro – nem tampouco sua falsidade. Dito de outro modo, há um princípio de incerteza no fundo da verdade. É o problema da epistemologia; é o problema da dialética; é o problema da verdade. Mas também aqui a verdade se escapa; e também aqui o dia em que se houver constituído uma faculdade de noologia, com seu departamento de paradigmatologia, esse não será o lugar central de onde se poderia promulgar a verdade.
Há um princípio de incerteza e, como dizia há instantes, há um princípio de incerteza no coração mesmo da lógica. Não há incerteza no silogismo; mas no momento da montagem de um sistema de idéias, há um princípio de incerteza. Assim, há um princípio de incerteza no exame de cada instância constitutiva do conhecimento. E o problema da epistemologia é fazer comunicar essas instâncias separadas; é de alguma forma fazer o circuito. Não quero dizer que
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Tudo isso é verdade; mas a ideologia não é apenas um
instrumento; ela nos instrumentaliza. Somos possuídos por ela. Somos capazes de atuar por ela. Assim, existe o problema da autonomia relativa do mundo das idéias e o
problema da organização do mundo das idéias.
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cada um deva passar o seu tempo lendo, informando‐se sobre todos os domínios. Não! Mas o que digo é que se apresenta o problema do conhecimento, e, portanto o problema do conhecimento do conhecimento, estamos obrigados a conceber os problemas que acabo de enumerar. São inelutáveis; e não porque seja muito difícil informar‐se conhecer, verificar, etc., seja necessário eliminar esses problemas. É necessário, com efeito, dar‐se conta de que é muito difícil e que não é uma tarefa individual; ´[e uma tarefa que necessitaria o encontro, o intercâmbio, entre todos os investigadores e universitários que trabalham em domínios disjuntos, e que se encerram, para sua desgraça, como ostras quando são solicitados. Ao mesmo tempo, devemos saber que não há mais privilégios, mais tronos, mais soberanias epistemológicas; os resultados das ciências do cérebro, do espírito, das ciências sociais, das histórias das idéias, etc., devem retro atuar sobre o estudo dos princípios que determinam tais resultados. O problema não é que cada um perca sua competência. É que se desenvolva bastante para articulá‐la com outras competências as quais, encadeadas, formariam um anel completo e dinâmico, um anel do conhecimento do conhecimento. Esta é a problemática da epistemologia complexa e não a chave mestra da complexidade, da qual o próprio, desgraçadamente, é que não facilita chave mestra alguma.
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Nota: Este texto corresponde às páginas 43‐77 de L'intelligence de la complexité, editado por L'Harmattan, París, 1999. Agradecemos a Edgar Morin sua amável autorização para traduzi‐lo e publicá‐lo. Tradução para o espanhol de José Luis Solana Ruiz.
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Edgar Morin. Diretor honorário de pesquisas do CNRS. París, França.
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Resumo
A epistemologia da complexidade
As teorias da complexidade às quais estão relacionadas não poucas disciplinas, tanto nas ciências físicas como nas biológicas, nas matemáticas ou nas ciências sócio‐culturais, estão apontando para um cenário no qual se constrói uma nova epistemologia: a epistemologia da complexidade. Como entendê‐la?
Abstract
Epistemology of complexity
The theories of complexity developed in many disciplines ‐like physics, biological sciences, mathematics or socio‐cultural sciences, are aiming at a background in which to construct a new epistemology: the epistemology of complexity. How to understand it? ________________________________________
epistemologia | complexidade | paradigma | noología | Edgar Morin
epistemology | complexity | paradigme | noology | Edgar Morin
2004‐02
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Notas
1 Há um pensamento clássico cujos princípios são legislar, desunir, reduzir 2 OK que o pensamento realize círculos concêntricos na geração de conhecimento, mas para que possa
ser utilizado, em um dado momento depois do seu início, deve haver uma versão do conhecimento, aquela adotada para uso provisório
3 Mas se há uma velha lógica, então há um modo de ser do pensamento que precisa ser enterrado, substituído por outro.
4 (!) John Dewey, Michel Foucault, et alii. Todas as citações de autores pioneiros da complexidade são no campo da ciência!
5 Complexidade organizada será o tipo de ordem a que se refere Ilya Prigogine?
6 A opção de ater‐se ao input‐output é sugerida como alternativa possível em decorrência da superação do limite de computabilidade.
7 Menção da física quântica como exemplo de complexidade, em contraposição à opinião de Prigogine, que coloca a opção de formalização da física quântica entre as formalizações deterministas.
8 Epistemologia: conhecimento do conhecimento (formada por cacarterísticas de características dos modelos.
9 Parece‐me uma suposição de que haja universos com características diferentes das que o que vemos apresenta.
10 Temos que considerar também o desaparecimento de espécies e não apenas o seu desenvolvimento complexizante.
11 Quais ciências humanas, e quando? Não seria o mesmo que dizer que tais produções nessas ciências ditas ‘humanas’ destoavam da própria razão de ser da criação dessa nova classe de saberes?
12 São mecanismos diferentes. A evolução relaciona‐se aos organismos vivos, e a flecha do tempo ao contexto em que tudo acontece, incluindo a evolução das espécies. Preciso pensar melhor sobre isso. A flecha do tempo relaciona‐se com as descontinuidades temporais de fenômenos (todos eles) que evoluem no tempo em séries complexas; em certos trechos tudo se comporta deterministicamente, e há pontos em que se apresentam descontinuidades.
13 ? ... mas não é isso mesmo o que ele dizia? 14 A reiteração não é característica do tempo, mas do tipo de ordem (do fenômeno) que evolui no tempo
apresentando séries complexas. 15 A ligação das reversibilidades e das irreversibilidades que surgem no contexto é o ponto. A ligação é
feita vendo o que acontece no mundo como eventos separados por histórias, etc. etc. de John Dewey. Essa visão tem o que mesmo a ver com a evolução?
16 Aporética – estudo sistemático das aporias.
Aporia:
1. Rubrica: filosofia.
dificuldade ou dúvida racional decorrente de uma impossibilidade objetiva na obtenção de uma resposta ou conclusão para uma determinada indagação filosófica [As aporias foram cultivadas pelo ceticismo pirrônico como demonstração da ausência de qualquer verdade absoluta ou certeza filosófica definitiva.]
2 Rubrica: filosofia.
em Aristóteles (384 a.C.‐322 a.C.), problema lógico, contradição, paradoxo nascido da existência de raciocínios igualmente coerentes e plausíveis que alcançam conclusões contrárias
3 Derivação: por extensão de sentido. Estatística: pouco usado.
situação insolúvel, sem saída
4 Rubrica: retórica.
figura pela qual o orador simula uma hesitação a propósito daquilo que pretende dizer
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17 “uma vez que tenhamos inscrito todo o tempo...” a visão do mundo com homem e experiência e natureza juntos, como séries de eventos separados por histórias, de John Dewey.
18 Total consistência com a visão de Humberto Maturana sobre o ser vivo, com os dois domínios, o da dinâmica das interações, e o do suporte físico dado pelos órgãos.
19 Exitem analogia e sucessão em vez de caráter e similitude. 20 Nem toda interação entre o que quer que seja é um evento. Daí a necessidade dos níveis
21 Claramente, as teorias sobre fenômenos não‐simples exigem um outro tipo de formalização. 22 Está sendo desconsiderado, aparentemente, o caráter da outra flecha do tempo, que leve em
consideração algo análogo ao que o átomo de carbono apresentará, depois de criado, ‐ de ser um átomo que facilmente se liga a muitos outros átomos fazendo parte das cadeias orgânicas – só que para os átomos de hélio.
23 Está falando de um certo tipo de ordem, em vez de desordem, porque está falando de uma desordem que tem seus princípios, o que evidentemente não é desordem pura. É o que Prigogine explica, em poucas palavras.
24 Princípios organizadores Análise e Síntese. É exterior aos objetos porque não inclui o propósito em relação ao qual se faz a analogia. Os princípios organizadores limitam‐se ao [É UM], em vez de [E UM] e [É PARTE DE].
25 Parece‐me ser uma exo‐endo‐exo causalidade. 26 O elemento de ligação entre endo e exo causalidade é o propósito, e seus estados, cujas histórias que
os separam permitem fazer a ligação. 27 Impossível conhecer as partes sem a visão do todo. Elementar, meu caro Pascal. 28 Um movimento de ida e de volta, circular mas com paradas provisórias tidas provisoriamente como
boas. 29 É necessária a visão global das operações de obtenção de um ‘algo’. Para ver a relação entre os
elementos.
30 A visão global das operações de obtenção de um ‘algo’ mostra claramente essa característica hologramática.
31 Recursão oranizacional – SSS Simetria, Sinergia e Simbiose.
32 É a negociação entre a Visão do produto e as estratégias disponíveis para produção que dá origem ao componente factível na realidade que pode substituir o produto.
33 “disjunção” está sendo usada no sentido não de separação, desunião, mas no de oposição. A separação do objeto de seu meio ambiente corresponde à desconsideração das negociações entre Visão e Estratégias de produção disponívbeis.
34 Limitação à verificação do conhecimento pela ciência. Falta de compreensão do funcionamento do pensamento.
35 Parece uma alusão a palavras de Foucault, só que para o papel do homem trocado!!! Morin reputa desonroso o papel de sujeito, e Foucault, o papel de elemento do que é empírico, ou raiz de toda positividade.
36 Por que mesmo na física se pode prescindir da noção de sujeito??? 37 Ser e existência eliminados pela formalização e quantificação, dado que o que existia era restrito à
quantificação na estrutura intpu‐output.
38 Uma modificação que ocorreu na virada dos séculos XVIII para o XIX. 39 Essa situação foi exatamente objeto da mudança na configuração geral do saber ocorrida entre 1775 e
1825.
40 Podem ser as duas coisas. 41 Os três tipos de cérebro: reptiliano (preservação e agressão), mamífeto (afetividade) e neocórtex
humano (inteligência lógica e conceitual) correspondem aos prpincípios constituintes das ciências humanas Vida(biologia) [função‐nomra]; Trabalho (economia) [conflito‐regra]; Linguagem(filologia) [significação‐sistema].
42 Caminhos diferentes dos apresentados para a ciência (experimentação e lógica) mas ainda assim permitindo encontrar aspectos da realidade.
43 Por que colocar os terminais nervosos fora do cérebro? Não é a velha e boa compartimentação do paradigma da simplificação?
44 A ruína do conhecimento reflexo estabelece‐se a partir de um desconhecimento, em vez de um conhecimento.
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45 O conhecimento é o resultado de CCCC – coordenações de coordenações consensuais de condutas. 46 O modelo constituinte das ciências humanas descrito por Michel Foucault corresponde termo a termo
às áreas do cérebro descritas.
47 Parece que estão sendo deixados de fora os aspectos da economia e da linguagem, ao falar de uma bioantropologia.
48 Filosofia também, e principalmente.
49 Deve ser feita uma ampliação no modelo constituinte da sociologia para adequá‐lo ao modelo constituinte de uma ciência humana Vida, Trabalho e Linguagem.
50 ECA’s – Estruturas Conceituais Abstratas
51 Mas deve haver estações de parada da dialética, para que o conhecimento levado até esses estados, possa ser utilizado na prática, ainda que de modo provisório.
52 Como funciona isso de ‘produtos são necessários para a produção de processos’? Não pode ser que já tenhamos o produto, e que ainda assim desencadeemos o esforço da produção patrocinando as operações necessárias, que envolvem os processos. O produto que é necessário para para a produção dos processos (definição, seleção, configuração das operações) é o resultado das negociações Visão X Estratégias de produção disponíveis.
53 ? 54 EDR mais o edifício das ciências, com as configurações do saber descritas por Foucault arranjadas 55 Experiência e homem, e natureza, segundo John Dewey.
56 Disjunção, distinção, associação, oposição
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