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TEAMAJORMAR GLAUCO BEZERRA DE ALMEIDA
O DIREITO AUTORAL E A INTERNET: A QUESTÃO DA DISTRUBUIÇÃO DE FONOGRAMAS
Monografia final apresentada como exigência para obtenção do título de Bacharel em Direito, à Banca Examinadora da Universidade Católica Dom Bosco, sob orientação do Prof. Maucir Paulleti.
UNIVERSIDADE CATÓLICA DOM BOSCO CURSO DE DIREITO CAMPO GRANDE/MS
2005
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BANCA EXAMINADORA
_______________________________________________
Orientador – Prof. Maucir Pauletti _______________________________________________
Examinador – Prof.
_______________________________________________
Examinador – Prof.
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“Apenas se faz o verdadeiro elogio de um artista quando se fala o suficiente da sua obra para que se esqueçam dos louvores à sua pessoa”. (Gotthold Ephraim Lessing, 1729-1781)
5
Dedico a presente monografia à DEUS, aos meus pais Mário e Terezinha, ao meu avô Amabílio e ao mestre Adhemar, um exemplo de amor e dedicação ao magistério.
6
AGRADECIMENTOS
A Deus, Supremo Criador e Artista do Universo, que todas as coisas fez, com
perfeita simetria; Suma Fonte de Amor e Inteligência; Espírito que ilumina, inspira e tudo
cria.
Aos meus pais Terezinha e Mário; ela, pelas orações e apoio dedicado à mim,
na ocasião da escolha pela mudança de curso e opção pelo Direito; ele, por ter sido meu maior
incentivador, desde a minha tenra idade, e com o qual, compartilho a alegria de nos
formarmos ao mesmo tempo: eu, na ciência do Direito; ele, na ciência das Artes.
Ao meu avô Amabílio, homem simples mas de muito vigor e sabedoria, que
mesmo sem ter se formado em alguma faculdade, se formou na escola da vida; ele que, desde
os meus cinco anos de idade, insistentemente, cunhou ao meu apelido familiar, o título de
doutor, chamando-me sempre, “Doutô Mazinho”.
A todos meus professores que, com paciência e profissionalismo, souberam
transmitir todo o cabedal de conhecimentos que possuem, a mim e meus colegas, que, mais
das vezes, tentados pelo cansaço de um dia de trabalho, insistimos em não absorvê-los em sua
plenitude.
Ao meu orientador Maucir Pauletti pela presteza e boa vontade, sem o que as
dificuldades inerentes à realização desta monografia seriam ainda maiores.
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ABREVIATURAS
AOL – America On Line
ARPANET – Advanced Research Projects Agency Network
CSNET – Computer Science Net
FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
FTP – File Transfer Protocol
ICQ – I Seek You
IRC – Internet Really Chat
LDA/73 – Lei de Direitos Autorais de 1973 (Lei n° 5.988/73)
LDA/98 – Lei de Direitos Autorais de 1998 (Lei n° 9.610/98)
MILNET – Military Net
MSN – Microsoft Network
NSFNET – National Science Foudantion Network
P2P – Peer-to-peer
RIIA – Record Industry Association of America
STJ – Supremo Tribunal de Justiça.
STF – Supremo Tribunal Federal.
TCP/IP – Transfer Control Protocol / Internet Protocol
TJ – Tribunal de Alçada
TRIPS – Trade Related Intellectual Property Rights
USENET – Unix User Network
WWW – World Wide Web
8
ÍNDICE DE FIGURAS
FIGURA 1 ................... ......................................................................................................... 110
FIGURA 2 ................... ......................................................................................................... 112
FIGURA 3 ................... ......................................................................................................... 114
FIGURA 4 ................... ......................................................................................................... 115
FIGURA 5 ................... ......................................................................................................... 122
FIGURA 6 ................... ......................................................................................................... 122
FIGURA 7 ................... ......................................................................................................... 123
FIGURA 8 ................... ......................................................................................................... 123
FIGURA 9 ................... ......................................................................................................... 137
FIGURA 10 ................. ......................................................................................................... 138
FIGURA 11 ................. ......................................................................................................... 166
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RESUMO
Trabalho monográfico que apresenta o tema do Direito Autoral com um enfoque na Internet, e as repercussões práticas sobre a questão da distribuição de fonogramas musicais através de redes de compartilhamento de arquivos. Analisando, com detalhes, a origem e evolução histórica do direito autoral, sua tutela nos mais diversos níveis do ordenamento legal brasileiro, passando pela análise da Internet e suas nuances históricas, filosóficas e técnicas, este trabalho converge, enfim, para a obra musical, sua gravação e a pluralidade de titulares de direitos autorais e conexos relativos aos fonogramas. Por fim, descortina com simplicidade os horizontes da Internet e analisa a principal questão imposta pelo tema: trata-se, a distribuição de arquivos na Internet, de uma forma de pirataria? Pratica violação e crime contra direitos autorais quem baixa músicas da Internet? Ou quem as disponibiliza? É essa distribuição em redes como o Napster e Kazaa, a principal causa de prejuízos para as gravadoras e outros titulares de direitos autorais? Tudo isto está exposto neste trabalho. Palavras Chaves: Direito. Direito Autoral. Direito Eletrônico. Direito da Internet. Obra Musical. Fonogramas. MP3.
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SUMÁRIO
LISTA DE ABREVIATURAS
ÍNDICE DE FIGURAS
RESUMO
INTRODUÇÃO ......................................................................................................................13
1. O DIREITO AUTORAL....................................................................................................16
1.1. A EVOLUÇÃO DO DIREITO AUTORAL...................................................................16
1.1.1. O homem: ser criador. ............................................................................................16
1.1.2. Histórico ...................................................................................................................18
1.1.2.1. Direito autoral no mundo.....................................................................................18
1.1.2.2. Direito autoral no Brasil ......................................................................................25
1.2. DEFINIÇÃO E NATUREZA JURÍDICA......................................................................27
1.2.1. Posição enciclopédica ..............................................................................................27
1.2.3. Natureza jurídica e características essenciais.......................................................32
1.3. O DIREITO AUTORAL E SEUS ELEMENTOS .........................................................35
1.3.1. O sujeito do direito autoral (elemento subjetivo) .................................................36
1.3.2. O objeto do direito autoral (elemento objetivo) ...................................................46
2. O DIREITO AUTORAL E SUA TUTELA LEGAL.......................................................48
2.1. TUTELA CONSTITUCIONAL DO DIREITO AUTORAL .........................................48
2.1.1. Breve histórico .........................................................................................................49
2.1.2. As garantias na Constituição Federal de 1988......................................................53
2.1.3. A recepção de convenções internacionais..............................................................55
2.2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS LEIS ORDINÁRIAS AUTORAIS...........................57
2.2.1. O Código Civil de 1916 ...........................................................................................60
11
3.2.2. A Lei n° 5.988 de 14.12.1973...................................................................................61
2.2.3. A Lei n° 9.279 de 14.05.1996 – A propriedade industrial ....................................70
2.2.4. A Lei n° 9.609 de 1998 – A lei do Software ...........................................................72
2.2.5. A Lei n° 9.610 de 1998 – Os direitos do autor ......................................................74
2.2.6. O Novo Código Civil de 2002 .................................................................................75
2.3. A TUTELA PENAL DO DIREITO AUTORAL ...........................................................75
3. O DIREITO AUTORAL E A INTERNET ......................................................................81
3.1. O EXERCÍCIO DO DIREITO AUTORAL ...................................................................81
3.1.1. Os direitos morais do autor ....................................................................................83
3.1.2. Os direitos patrimoniais do autor ..........................................................................87
3.1.3. O direito de seqüência (droit de suíte)...................................................................94
3.1.4. O domínio público ...................................................................................................97
3.1.5. Os direitos conexos ..................................................................................................99
3.2. A INTERNET ...............................................................................................................102
3.2.1. Os “profetas” da Internet .....................................................................................103
3.2.1.1. Wells e seu “Cérebro Onipresente”. ..................................................................103
3.2.1.2. O jesuíta De Chardin e sua Noosfera.................................................................105
3.2.1.3. O visionário Bush e seu “Memex”. ...................................................................106
3.2.1.4. Engelbart e suas brilhantes invenções. ..............................................................107
3.2.2. História da Internet: da sua invenção ao grande “boom”.................................109
3.2.3. A utilidade da Internet: do WWW ao P2P. ........................................................115
3.2.3.1. A invenção da World Wide Web (WWW) ..........................................................116
3.2.3.2. As aplicações da Internet ...................................................................................119
3.2.3.3. A descoberta do Napster....................................................................................121
4. A DISTRIBUIÇÃO DE FONOGRAMAS PELA INTERNET ...................................125
4.1. O FONOGRAMA MUSICAL E SUA NATUREZA JURÍDICA...............................126
4.1.1. A obra musical .......................................................................................................127
4.1.2. Os sujeitos dos direitos sobre fonogramas musicais. .........................................131
4.1.2.1. O compositor musical e o compositor letrista ...................................................131
4.1.2.2. O arranjador e o compositor das variações........................................................132
4.1.2.3. Os artistas intérpretes e executantes ..................................................................134
4.1.2.4. Os produtores de fonogramas ............................................................................136
4.2. OS DIREITOS AUTORAIS E CONEXOS RELATIVOS AOS FONOGRAMAS MUSICAIS. .........................................................................................................................139
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4.2.1. Os contratos de edição, cessão e concessão .........................................................141
4.2.2. A titularidade originária dos produtores fonográficos ......................................145
4.2.3. Formas de utilização de fonogramas ...................................................................148
4.3. A DISTRIBUIÇÃO DE FONOGRAMAS NA INTERNET........................................151
4.4. AS NOVAS FRONTEIRAS DO DIREITO AUTORAL NA INTERNET..................156
4.5. CONCLUSÕES SOBRE A TROCA DE MÚSICAS PELA INTERNET ...................162
4.5.1. A transformação de fonogramas em arquivos MP3 é violação de direitos autorais? ...........................................................................................................................162 4.5.2. O compartilhamento de músicas em redes de arquivos é uma forma de publicação não-autorizada de obra intelectual?...........................................................163 4.5.3. Essa distribuição de arquivos pela Internet é a responsável pela crise na indústria fonográfica?.....................................................................................................163
CONCLUSÃO.......................................................................................................................168
ANEXOS................................................................................................................................172
Anexo 1 – Código de Processo Penal ................................................................................173
Anexo 2 – Convenção de Berna ........................................................................................174
Anexo 3 – Convenção de Roma ........................................................................................185
Anexo 4 – Lei de Direitos Autorais (Lei n° 9.610/98) .....................................................190
Anexo 5– Decreto n° 2.894/98 ...........................................................................................199
Anexo 6 – Decreto n° 4.533/2002 ......................................................................................200
Anexo 7 – Código Civil de 1916 ........................................................................................201
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................204
13
INTRODUÇÃO
O presente trabalho monográfico é fruto de uma insistente e inquietante busca
deste acadêmico em todas as fontes de referência possíveis sobre o Direito Autoral. Não
obstante, o Direito do Autor possui traços de um ramo sui generis, muito mais amplo,
revelando-se bem mais do que simples espécie de direito patrimonial: traz em seu substrato, a
essência das liberdades individuais.
Apesar de não serem raras as discussões práticas sobre o tema, para o operador do
Direito, as novas implicações jurídicas que a Internet traz para a seara dos direitos autorais,
ainda não foram completamente esgotadas nem são pontos pacíficos de entendimento. A
própria gênese da Grande Rede, que está em constante atualização e renovação, dificulta um
tratamento estanque e perene acerca de qualquer aspecto internético.
No mais, a própria humanidade atravessa um período na Historia, de intensa
revolução tecnológica, vindo à tona formas inovadoras – mormente, revolucionárias – , de se
expressar a inteligência do homem e sua natureza criativa. O homem reinventa a própria
forma de pensar o mundo e se reinventa a cada nova tecnologia descoberta.
Tentar entender o fenômeno jurídico que a Internet propicia no campo dos direitos
autorais, é o objetivo deste trabalho. Não nos socorre o pensamento de revolucionar os
estudos nesta área do Direito, mas colocamo-nos em compasso de trabalho e pesquisa com
todos os outros profissionais que, assim como o autor desta obra, vislumbra na Internet uma
nova fronteira para as relações humanas e suas vertentes, incluídas nestas, o próprio Direito.
14
No Capítulo I, onde nos detivemos aos detalhes históricos acerca da evolução
do direito autoral e seu estabelecimento como ramo autônomo, foi de muita valia a obra do
ilustre Professor Eduardo Vieira Manso, grande especialista na matéria autoral no Brasil, e
bibliografia obrigatória, sendo citado em todos os livros consultados por este acadêmico,
motivo pelo qual, tomamo-lo como obra basilar deste primeiro capítulo. Já na análise
hermenêutica do direito de autor, recorremos aos ensinamentos do grande professor lusitano
José de Oliveira Ascensão, sumidade mundial em direito autoral, pois ele, como nenhum
outro, conseguiu dissecar a teoria do direito autoral, de maneira científica, de tal modo que
sua obra consta nas referências bibliográficas de todos os livros publicados no Brasil, desde
1980, ano da publicação da 1ª edição de sua magnífica obra Direito Autoral.
No Capítulo II, dada a complexidade de temas abordados, procuramos buscar
especialistas diversos: os professores Carlos Fernando Mathias de Souza e José Carlos Costa
Netto, integrantes do extinto Conselho Nacional de Direito Autoral, descrevem com maestria
o longo processo evolutivo da legislação brasileira de direito autoral; as lições de Luis Alberto
David Araújo, por seu turno, nos ajudaram a entender a tutela constitucional do direito de
autor; Paulo Oliver, experiente advogado, nos brindou com uma obra específica sobre a
matéria da tutela penal do direito autoral, base dos estudos sobre o tema apresentado neste
trabalho monográfico.
No Capítulo II, ousamos tentar desvendar os mistérios da Internet, e explicar
em linguagem jurídica, os intricados conceitos e termos informáticos. Para tanto, socorremo-
nos a autores específicos da área informática: Maria Ercília e Érico Guizzo. Destacamos aqui
singular dificuldade em encontrar outros livros ou autores que tratassem do assunto, dada a
escassez no mercado editorial nacional de obras acadêmicas sobre a Internet. A obra A
Internet de Maria Ercília, revelou-se um verdadeiro achado, uma jóia rara, pois a autora, com
singular didática e linguagem simples, brinda-nos com um completo estudo da Internet, em
especial, sobre seus aspectos filosófico e sociológico, mais uma vez, no qual justificamos as
intensas citações ao longo do capítulo: foi, sem dúvida, nossa obra de referência neste estudo.
Já Érico Guizzo, brindou-nos com uma obra didaticamente rica em histórias e gráficos (um
deles reproduzido em sua íntegra no texto), que conseguem traduzir para leigos no assunto, os
aspectos técnicos sobre a Internet. Também, autores como Henrique Gandelman e Plínio
Cabral, especialistas da atualidade no direito autoral, foram nosso subsídio no tocante a
relação entre o direito e a Internet.
15
Por fim, no Capítulo IV, delimitando por vez o tema deste trabalho,
apresentamos um estudo detalhado sobre qual o impacto da Internet e das redes de
compartilhamento de arquivos, nos direitos autorais e conexos dos artistas compositores e
intérpretes de fonogramas, além dos produtores fonográficos. Destaca-se aqui, mais uma vez,
uma obra em especial: Direito Autoral no Brasil, de José Carlos Costa Netto, única obra
dentre a extensa lista de livros consultados, que tratava com a profundidade merecida o tema
da Obra Musical em todos os seus mínimos detalhes. Por seu turno, foi José de Oliveira
Ascensão, que muito nos ajudou a compreender o fenômeno de uma nova sociedade
cibernética, através da brilhante obra Direito da Internet na Sociedade da Informação, uma
coletânea de estudos deste renomado autor, sobre temas de direito ligados a Internet, não se
atendo somente ao Direito Autoral, demonstrando mais uma vez, a capacidade deste autor em
lidar com temas atuais e complexos.
16
1. O DIREITO AUTORAL
O que é o Direito Autoral? É, pois, um novo ramo do Direito? Como ele se
desenvolveu ao longo da história? Qual é o objeto de estudo do Direito Autoral? Quem é o
titular de direitos autorais? Que direitos podem ser chamados de autorais? Todas essas
perguntas serão respondidas neste primeiro capítulo, sendo este, nosso ponto de partida por
esta viagem que faremos pelo Direito Autoral, passando pela Internet, e desembocando,
finalmente, no mar de questionamentos que o mesmo suscita em relação à distribuição de
músicas pela Grande Rede Mundial. Bom Voyage!
1.1. A EVOLUÇÃO DO DIREITO AUTORAL
O Direito Autoral não nasceu pronto. É, pois, fruto de uma intensa evolução
histórica de conceitos e definições, que ainda nos dias atuais, não está totalmente concluída: a
própria Internet veio para renová-lo, dar novos contornos e modificar antigos princípios e
conceitos. Entender esta evolução, em todos os seus detalhes, é essencial, para que não nos
percamos neste novo caminho que a Internet representa para o Direito Autoral.
1.1.1. O homem: ser criador.
O homem é criatura, fruto da experiência de um Amor maior que o pôs no
mundo com o único propósito de aprender. E na busca pelo aprendizado, o homem descobriu-
se não apenas criatura, mas também criador. Nos traços que o distingue dos demais seres
17
vivos, encontra-se a essência de sua natureza humana: a inteligência. Não se trata de uma
inteligência repetidora, instintiva, que se desenvolve irracionalmente. É uma inteligência
querida, fruto da sua consciência e vontade, desenvolvida em um processo lógico e
encadeado, e que somente se finda com a morte do próprio ser.
Há os que justificam a natureza criadora do homem, como fruto de um
processo evolutivo, desenvolvida a partir de sobressaltos, verdadeiros surtos de inteligência,
que afastou o ser humano dos seus ancestrais primatas. Trata-se da teoria evolucionista1. O
homem, até então, um animal irracional, começou a perceber o mundo à sua volta e através de
sua memória, organizou logicamente os fatos que presenciava, desenvolvendo uma espécie de
raciocínio primitivo. Com isso, começou a evitar situações que colocavam sua vida em risco,
e a aproveitar as que lhe dava vantagem sobre os demais animais, o que o conduziu até o topo
da cadeia alimentar. E pouco a pouco, os conhecimentos observados, deixaram de ser apenas
utilitários, passando a ser também uma forma de expressar suas inquietações: deu-se a
descoberta da fala, da linguagem, dos símbolos, dos números, etc.
Preferimos a teoria de que o homem é fruto da sua própria evolução: o homem
é homem, sempre foi homem, e sempre será homem. Mais: já foi dotado de inteligência,
desde a sua criação, por um Criador Divino, e desde então, vem adquirindo mais
conhecimentos e reinventando sua própria forma de perceber o mundo ao seu redor, e de
como transformá-lo em seu proveito.
Na busca pela conquista do conhecimento, o homem descobriu a vida em
grupo, e com ela, as relações sociais nasceram e tomaram forma; deram origem a frutos, como
a fala e a escrita, pois se revelou a necessidade da comunicação; a linguagem e os números,
para organizar e armazenar o seu conhecimento e sua história; a política e o direito, como
forma de regular a vida em grupo; etc. A cultura, como forma de expressão de pensamento e
comunicação, é fruto deste longo processo evolutivo do homem. O homem descobriu as mais
variadas formas de exteriorizar os sopros de seu espírito criador: a literatura, a matemática, a
pintura, a música, etc. A esta verdadeira transmutação da idéia incorpórea, dessa matéria
metafísica em um objeto físico e corpóreo, fruto dessa inspiração, chama de obra.
1 A Teoria Evolucionista, proposta pelo biólogo inglês Charles Darwin (1809-1882) em seus livros “A origem das espécies” e “A descendência do homem”, afirma que a raça humana é uma evolução dos primatas (macacos), através de adaptações naturais, que se manifestaram para fins de sobrevivência da espécie, e que detonaram uma verdadeira mutação genética a ponto de se criar uma nova raça.
18
Obra é, pois, todo fruto do espírito criador do homem, revelado num objeto
corpóreo, que traz em sua essência o anseio do criador. O anseio do criador pode ter fins
culturais, artísticos, científicos ou industriais. Não importa o fim: o criador sempre terá
direitos sobre sua criação! Este é o preceito fundamental do Direito Autoral.
1.1.2. Histórico
Feito o prólogo, passamos agora para o estudo detalhado da evolução histórica
do Direito Autoral. Veremos que, desde a Revolução Iluminista na França, à famosa
Convenção de Berna, o Direito Autoral teve várias passagens históricas, que representaram
sempre inovações ao agregar novos conceitos e definições jurídicas a situações fáticas.
1.1.2.1. Direito autoral no mundo
Não temos como precisar o exato momento que o Direito Autoral nasceu. É
sabido que o direito autoral está intrinsecamente ligado à própria pessoa do autor, sendo certo
supor que, por tal sorte, o direito do autor tem raízes profundas nos direitos humanos e
naturais. Portanto, o direito do autor sempre existiu, mas nem sempre sua existência foi
reconhecida ou regulamentada por leis ou regras. Não há como duvidar que após mais de
2000 anos, A Odisséia continua pertencente a Ulisses: sua autoria permanece com a obra
enquanto ela existir.
O professor Vieira Manso, em sua obra2, traz um dado histórico muito
interessante: mesmo que o Direito Romano não tutelasse as violações dos direitos autorais
pelas leis da época, parecia sempre ter havido um repúdio público pela prática da contrafação
nos meios intelectuais. Porém, tal ponto ainda é controverso entre os romanistas, pois há os
que defendem a sua existência já nos tempos de Roma, baseados em fatos históricos, como a
proteção de Mecenas, ministro do Imperador Otávio Augusto, aos poetas Horácio e Virgílio,
pelos idos do ano 67, a.C. 2 Eduardo J. Vieira Manso, O que é Direito Autoral, p. 8.
19
Em brilhante artigo, Ratto Cavalheiro citando Piola Caselli3 e Medina Perez4,
descreve com propriedade, o princípio da actio injuriarium, e como estaria o direito do autor
salvaguardado por ela:
Há autores como Piola Caselli, não obstante o entendimento de o direito autoral ser de recente criação, que acreditam que se pode falar nesses direitos já no Direito Romano, tendo em vista a actio injuriarium. É que, pela tradução, in quer dizer não, enquanto que jus, juris, quer dizer direito, então ‘não direito’. Portanto, trata-se do direito de ação pelo não direito, ou seja, caberia ação contra tudo aquilo que se fizesse sem direito. A actio injuriarium, segundo Medina Perez, poderia ser utilizada para reprimir todos os atentados contra os direitos morais de nossos dias, e entre estes direitos morais, pode-se dizer que estão os direitos morais tutelados pelo Direito Positivo vigente. Então, como não admitir os Direitos Autorais no Direito Romano? Realmente é questão controvertida que merece discussão5.
Segundo Manso, a acepção do epíteto plagiarius é creditada ao escritor romano
Marcial, que ao comparar os usurpadores de obras alheias aos criminosos que cometiam o
crime de furto simples, definido com plagium por uma lei do século II a.C., conhecida como
Lex Fabia de Plagiris . Vejamos como Manso narra a atitude de Marcial:
[...] É o que se lê no seu Epigrama 52, Livro I, em que ele elege um tal de Quintiano como seu defensor dizendo: ‘Eu lhe recomendo meus versos, Quintiano, se é que eu posso denominá-los assim, desde que eles são recitados por certo poeta que se diz seu amigo. Se (meus versos) se queixam de sua penosa escravidão, seja o seu defensor e o seu apoio; e se esse outro (poeta) se diz ser seu dono, declare que (os versos) são meus e que eu os publiquei. Se isso é proclamado repetidas vezes, você imporá vergonha ao plagiário.´ [...] Também no epigrama seguinte, endereçado Ad Fidentinum, plagiarium, Marcial equipara essa prática ao furto em geral: ‘Não é preciso que anuncies, nem que defendas meus livros: a tua página se ergue contra ti e te diz: Tu és ladrão’6.
Como vemos, naqueles áureos tempos, o maior interesse em jogo era o fato de
ser o pai da criatura, o criador da obra, do que propriamente, o valor econômico que ela
porventura tivesse. Com o passar dos anos, mais precisamente com a invenção da imprensa 3 Eduardo Piola Caselli, Codigue Del Diritto di Auttore:, p. 1 apud Rodrigo da Costa Ratto Cavalheiro, História dos Direitos Autorais no Brasil e no Mundo, disponível na Internet em <http://www.unimep.br/fd/ppgd/ cadernosdedireitov11/16_Artigo.html> 4 Pedro Ismael Medina Perez, El Derecho Del Autor em la Cinematografia, p. 4 apud Rodrigo da Costa Ratto Cavalheiro, Op. cit.. 5 Rodrigo da Costa Ratto Cavalheiro, Op. cit. 6 Eduardo J. Vieira Manso, O que é Direito Autoral, p. 12, apresenta o texto de Marcial também em latim: “Commendo tibi, Quintiane, nostros: nostros dicere si tamen libellos possim, quos recitat tuus poeta: si de servitio gravi querentur, assertor venias, satisque praestes, et quum se dominum vocabit ille, dicas esse meos, manuque missos. Hoc si terque quaterque clamitaris, impones plagiario pudorem. Índice non opus est nostris, nec vindice libris: stat contra, dicitque tibi tua pagina: Fur es”
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por Hans Gutenberg em 1436, em pleno Século XV, a preocupação com o interesse
econômico, principalmente, das obras literárias, justificou a necessidade de se criar leis que
regulamentassem o assunto. Não por coincidência, os primeiros beneficiados com algum tipo
de proteção pelo Estado, dos direitos econômicos sobre a produção literária, foram os
editores, e não os autores das obras! Mais uma vez, socorremo-nos à obra do professor Manso
–exaustivamente citado, também em outras obras consultadas7 –, onde descreve com detalhes
o fenômeno da proteção aos editores na Idade Média:
Consta que um dos primeiros desses privilégios foi concedido pelo Senado de Veneza ao editor Aldo Manúcio (que também é o inventor dos caracteres itálicos) para a publicação das obras de Aristóteles, em 1495. Juristas, como Philipp Allfeld (Del Derecho Del Autor y Del Derecho de Inventor, trad. Ernesto Volkeining, Bogotá, Temis, 1982, p.10), admitem que esses privilégios partiam do pressuposto, em boa-fé, de que esses editores já haviam obtido a autorização dos autores, para a publicação da obra, restando apenas a do governante, tal como dispunha o Código de Direito Territorial Prussiano, ainda em 1794. Nada obstante, dissesse, também, que ‘a inclusão de um escrito impresso em uma compilação de textos requer o consentimento, não apenas do editor, mas também do autor, nada disse sobre o direito exclusivo do autor para reproduzir sua obra, nem sobre os recursos que teria para proteger-se contra a reprodução ilícita’8.
Oswaldo Santiago trata com propriedade o assunto do direito autoral, em suas
nuances históricas. Em seu texto, relata que na França entre 1507-08, o Rei Luiz XII
concedeu a Antonie Gerard, a autorização para impressão das Epístolas de São Paulo e São
Bruno. Já, o famoso pintor flamenco Rubens (falecido em 1649), conseguiu na Holanda,
Bélgica e na França, o direito à proteção contra reproduções de seu quadro A descida da cruz.
Notadamente, as conquistas dos autores estavam mais ligadas a seu prestígio junto à Corte, do
que propriamente ao direito em si.
Ainda na França, por volta de 1665, ocorreu o conflito entre as livrarias de
Paris e as das Províncias: as livrarias parisienses foram beneficiadas por um decreto real que
lhes outorgava o direito de exclusividade na publicação de obras inéditas; tal ato real foi
motivado pelo fato da dificuldade em fiscalizar as publicações provincianas, que poderiam
trazer conteúdos revolucionários ou simplesmente desmoralizantes da Corte, como bem
7 A obra “O que é direito autoral” é citada por outro autor consultado por este acadêmico: Como Henrique Gandelman, De Gutenberg à Internet – Direitos autorais na era digital, p. 29-31. 8 Eduardo J. Vieira Manso, Op. cit., p. 13.
21
lembra Santiago9, o caso dos panfletos clandestinos que narravam “la vie scandaleuse de
Marie Antoinette”, esposa de Luiz XVI, que mancharam de sangue a história da realeza
parisiense.
A situação desvantajosa do autor em relação a sua própria obra mudaria com a
edição da primeira lei que se tem notícia sobre Direitos Autorais: a Copyright Act10, que
entrou em vigor na Inglaterra em 10 de abril de 1710, após sua promulgação no ano anterior
pela Rainha Ana. Na observação do professor Vieira Manso, com o Copyright Act:
Entretanto, em 1709, por um ato da rainha Ana, da Inglaterra, já era reconhecido o direito exclusivo dos autores, para a publicação de suas obras, nada obstante, para tanto, tivessem eles de cumprir algumas formalidades administrativas, por meio das quais ainda era possível o exercício da censura governamental, principalmente de ordem religiosa11.
Interessante a descrição histórica e rica de detalhes, de como se dava tal
proteção dos direitos autorais, feita com muita propriedade, por Gandelman:
Na Inglaterra, começa-se reconhecer formalmente o copyright – e daí, também, a palavra royalty: o rei, isto é, a Coroa, concedia uma regalia (protegendo por 21 anos, e após o registro formal) para as cópias impressas de determinada obra. O prazo de proteção era contado da data de impressão, e as obras não impressas somente eram protegidas por 14 anos. Estamos nos referindo ao Copyright Act, de 1709, da Rainha Ana. Antes, contudo, o Licensing Act, de 1662, já proibia a impressão de qualquer livro que não estivesse licenciado ou registrado devidamente. Desta maneira, exercia-se sutilmente, também, uma forma de censura prévia, pois só eram licenciados aqueles livros que não ofendessem os interesses (políticos, principalmente) dos licenciadores12.
No esteio desta lei, vieram outras, cada qual regulamentando um aspecto novo
do direito autoral. Na própria Inglaterra, em 1735, foi editada nova lei regulamentando os
direitos autorais, desta vez, dos desenhistas: nenhuma estampa histórica seria publicada ou
importada, para fins de comércio, sem expressa anuência por escrito do autor, desenhista ou
9 Oswaldo Santiago, Aquarela do Direito Autoral: História – Legislação – Comentários., p. 11-13 apud Rodrigo C. Ratto Cavalheiro, Op. cit. 10 Rodrigo Cavalheiro, a título de enriquecimento, transcreve a epígrafe da referida Copyright Act (Lei do Direito de Cópia): “An Act for the Encouragement of Learning, by Vesting the Copies of printed Books in the Authors or Purchasers of such Copies during the time therein mentioned", cuja tradução seria: “Ato de estímulo da Cultura, conferindo aos autores e compradores o direito às cópias de seus livros pelo tempo mencionado”). 11Eduardo J. V. Manso, O que é direito autoral, p. 14. 12 Henrique Gandelman, De Gutenberg à Internet – direitos autorais na era digital, p. 31.
22
proprietário, sujeitando-se o infrator a penalidades como a perda ou destruição da matriz ou
multa por exemplar reproduzido.
Na Dinamarca, em 1741, foram baixadas normas que proibiam a reprodução
não-autorizada de obras literárias e artísticas. Na Espanha, no reinado de Carlos III (1762-
1788), leis consagraram a liberdade de comércio das livrarias e a exclusiva titularidade do
autor da obra sobre o direito de impressão, e falecendo, tal direito transmitir-se-ia aos seus
herdeiros13. Na Alemanha, em 1773, foram concedidos monopólios a editores e impressores,
obrigando-os a adquirir a obra do autor, pagando-lhe todos os seus direitos. Já nos Estados
Unidos, os estados de Massachusetts e Connecticut, em 1783, criaram leis que asseguravam o
direito exclusivo de reprodução das obras aos respectivos autores, sendo o mesmo direito
entendido a autores de outros estados que adotassem lei igual.
É necessário que apreciemos, com riqueza de detalhes, a evolução história do
direito autoral no mundo pós-medial e moderno, para que entendamos a própria natureza do
Direito do Autor. Nota-se que, ora leis dispensam um tratamento privilegiado aos editores e
impressores, ora asseguram o direito dos autores da obra a reproduzirem-na e gozar dos frutos
econômicos dela.
Importantes inovações seriam trazidas com a Revolução Francesa – Paris, de
novo! – que culminou com a tomada da Bastilha em 14 de Julho de 1789. Vale ressaltar que,
nessa época, o pensamento iluminista ganhou força e difundiu-se sobremaneira em toda a
Europa. O iluminismo foi um movimento intelectual surgido na metade do século XVIII –
marcado como o Século das Luzes – em resposta ao pensamento medieval da Igreja Católica;
para os iluministas, o universo estava em constante movimento, e somente a razão e a ciência
seriam capazes de explicá-lo. Daí dizer que iluminismo é sinônimo de esclarecimento ou do
racionalismo. E um dos grandes pensadores que influenciaram este movimento foi Rousseau.
A Encyclopedie Snyke traz uma síntese interessante sobre o papel de Rousseau
e sua influência no movimento, que viria a eclodir com a Revolução Francesa:
Em França, país de tradição católica, mas onde as correntes protestantes, nomeadamente os huguenotes, também desempenharam um papel
13 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 34
23
dinamizador, há uma tensão crescente entre as estructuras políticas conservadoras e os pensadores iluministas. Rousseau, por exemplo, originário de uma família huguenote e um contribuidor para a Encyclopédie, foi perseguido e obrigado a exilar-se em Inglaterra. Este conflito entre uma sociedade feudal e católica, e as forças modernas do esclarecimento, de pendor protestante e mercantil, acabará por culminar na Revolução Francesa14.
Tal conflito de idéias foi acentuado pelo Contrato Social de Rousseau, que na
lição de Bittar & Almeida, é um pacto entre sociedade civil e o Estado, estando nele o sentido
de justiça, onde a liberdade individual é posta em utilidade para um bem comum: “o contrato
aparece como forma de proteção e de garantia de liberdade, e não o contrário15”; na teoria
do contrato, Rousseau aponta a existência de dois tipos de direitos do homem: o direito
natural e o direito civil; “neste sentido, ruptura entre um estado primeiro, chamado de
natureza (status naturae), e um segundo, chamado cívico (status civitatis), se dá com a cessão
das liberdades individuais ao Estado, que é feito por meio do contrato social16”.
Note-se que, ao adentrarmos um pouco mais no cerne da teoria iluminista,
chegaremos a um ponto de extrema valia para o direito autoral, e que mais adiante, será
aprofundado em seus detalhes: a existência de direitos naturais, inerentes ao homem – e
portanto, direitos pessoais do autor – e dos direitos civis, conseqüências de um pacto – ou os
direitos patrimoniais, decorrentes da vontade das partes ou da própria lei.
Deslocada o centro da gênese das leis – de Deus para o próprio homem –,
estabeleceu-se uma nova ordem legal abrangendo direitos naturais, até então, desprezados
pelo Estado: inclusive, o direito do autor. Gandelman, mais uma vez, com maestria, faz
belíssima síntese sobre a influência da Revolução Francesa na seara dos direitos autorais:
A Revolução Francesa, de 1789, com sua exacerbação dos direitos individuais, adicionou ao conceito inglês a primazia do autor sobre a obra. O droit d’auteur enfoca também os aspectos morais, o direito que o autor tem ao ineditismo, à paternidade, à integralidade de sua obra, que não pode ser modificada sem o seu expresso consentimento. Mesmo que um autor ceda todos os seus direitos patrimoniais referente à sua obra, ele conserva em sua esfera esses direitos morais, que são inalienáveis e irrenunciáveis. A proteção se estende por toda a vida do autor, e até mesmo após sua morte,
14 Encyclopedie Snyke. Consultado em 16.6.2005. Disponível na Internet em http://encyclopedie-pt.snyke.com/ articles/iluminismo.html 15 Eduardo C. B. Bittar & Guilherme A. de Almeida, Curso de Filosofia do Direito, p. 231. 16 Idem, p. 235.
24
transferindo-se todos os direitos patrimoniais e morais para seus herdeiros e sucessores legais17.
No campo prático, em 19 de Janeiro de 1791 e 19 de Julho de 1793, foram
promulgadas leis, as quais o ilustre professor Vieira Manso cita em sua obra, como exemplo
da proteção legal aos direitos do autor na França iluminista:
O seu mais importante instituto se situa, exatamente, na regulamentação da publicação das obras intelectuais, tanto do ponto de vista das prerrogativas não-patrimoniais (o direito de manter “não publicada” a obra), como patrimoniais (o direito de sua publicação). Em 1791, a França publicou a lei que regulamentou a representação pública das obras nos teatros franceses; em 1793, a reprodução delas, declarando que ‘os autores dos escritos de qualquer gênero... gozarão, durante sua vida inteira, do direito exclusivo de vender, fazer vender, distribuir suas obras...’, bem como que ‘seus herdeiros ou cessionários gozarão do mesmo direito durante o espaço de dez anos após a morte dos autores’18.
Outros Estados seguiram o exemplo da França, e elaboraram leis semelhantes,
ora apenas reconhecendo o direito do autor, ora também o protegendo, inclusive, com
imposição de sanções aos infratores: na República Cisalpina, em 1797; na Holanda, em
08.12.1796, em seu Código Penal de 1794 e no Código Civil de 1811; na Confederação
Germânica, através do Código Geral da Prússia, de 1794; no Reino da Lombardia, em 1810;
no México, mesmo após sua independência em 1821; no Vaticano, em 1826, com autorização
do Papa Leão XIII; nos demais reinos que compunham a atual Itália, em 1811 (Reino das
Duas Cecilias), 1816 (Reino de Lombaro-Veneto) e 1826 (Reino da Sardenha); na Dinamarca
em 1828; na Grécia, em 1834; entre tantas outras, ricamente ilustrada por Cavalheiro em seu
magnífico artigo publicado na Internet19.
Exige-nos especial atenção, as datas das promulgações de leis de direitos
autorais em outros países da América Latina, pois, invariavelmente, importaram reflexos
importantes no Brasil, conforme será exposto no tópico a seguir.
17 Henrique Gandelman, Op. cit., p. 32. 18 Eduardo J. Vieira Manso. O que é direito autoral, p. 14. 19 Rodrigo da Costa Ratto Cavalheiro, Op. cit.
25
1.1.2.2. Direito autoral no Brasil
Na América Latina, não podemos olvidar das datas de criação de leis que
disciplinavam o direito autoral nos países latinos: no Chile, lei de 24 de julho de 1834; na
Venezuela, lei de 19 de abril de 1837; no Peru, lei de 03 de novembro de 1849; na Bolívia, lei
de 13 de agosto de 1879; e na Guatemala, lei de 29 de outubro de 1879. Tais datas assinalam
que, a segunda metade do século XIX, foi um importante período para o direito autoral, já na
América Latina; inclusive, no Brasil. Não obstante, as legislações latino-americanas tinham
forte influência das leis estrangeiras européias, dado que muitos intelectuais brasileiros
haviam estudado no exterior, e trouxeram para cá, muito do pensamento europeu, que acabou
influenciado as legislações aqui criadas.
No Brasil, a primeira lei que faz menção ao direito autoral, de que se tem
notícia, é o Decreto Imperial de 1827 que institui os dois primeiros cursos de Direito no país.
O relato do professor Vieira Manso20, apesar de sucinto, é esclarecedor; porém, parece-nos
mais detalhada a descrição do ilustre professor português José de Oliveira Ascensão, em sua
grandiosa obra, bibliografia basilar para quem se arrisca no campo do direito do autor, a qual
transcrevemos o seguinte trecho, dado a sua irritante clareza de detalhes e precisão histórica:
I – [...] A Lei de 11 de Agosto de 1927, que criou os Cursos de Direito em Olinda e São Paulo, atribuiu aos lentes um privilégio, com duração de 10 anos, sobre os cursos que publicassem21. [...] E o Código Criminal de 16 de Dezembro de 1830 proibia no ser art. 261 a reprodução de obras compostas ou traduzidas por cidadãos brasileiros durante a vida destes, e ainda 10 anos após a morte se deixassem herdeiros. II – Tardou a instauração do estatuto civil do direito do autor. Malograram-se as tentativas para o fazer vingar durante o império, embora já se encontrem decisões judiciais a consagrar direitos dos autores Coube a primeira a Aprígio Guimarães, professor da Faculdade de Direito do Recife. O Projeto reduzia-se a oito artigos, o último dos quais contém uma autorização ao governo para celebrar uma convenção literária com Portugal. Garante a ‘propriedade intelectual’ aos autores brasileiros, estendendo-se a proteção post mortem por 30 anos (art. 1). [...] O projeto foi depois analisado em comissão conjuntamente com um outro, da autoria de Gavião Peixoto, mas
20 Eduardo J. Vieira Manso, O que é direito autoral, p. 16-17. 21 Idem. O autor cita em nota de rodapé n° 11, à pagina 10: “É este o texto do art. 7: ‘Os lhentes farão as escolha dos compêndios da sua profissão, ou os arranjarão, contanto que as doutrinas estejam de acordo com o sistema jurado pela nação. Esses compêndios, depois de aprovados pela Congregação, servirão interinamente; submetendo-se porém à aprovação da Assembléia Geral, e o Governo os fará imprimir e fornecer às escolas, competindo aos seus autores o privilégio exclusivo da obra, por dez anos’.
26
ficou por aí. Outros projetos, da autoria de José de Alencar e Diogo Velho Cavalcante, não tiveram melhor sorte22.
Apesar das tentativas frustradas, um grande movimento internacional se
desenhava, visando estabelecer normas e regras atinentes ao direito de autor. Continua a
narrativa, o ilustre professor lusitano Ascensão:
III – Desencadeia-se entretanto o movimento internacional em matéria de direito do autor. O Brasil vota a Convenção de Montevidéu de 1889, mas não a ratifica. No mesmo ano de 1889 foi assinado um acordo com Portugal, introduzido na ordem interna pelo Decreto n° 10.353, de 14 de Setembro de 1889. Cada país concedia o tratamento nacional aos autores do outros pais. [...] Proclamada a República, o primeiro desenvolvimento legislativo em matéria de direito de autor surgiu com o Código Criminal de 1980. Logo a seguir, em 1891, a matéria ganha nível constitucional. A Constituição da República, no art. 72 § 26, consagra o direito exclusivo de reprodução aos autores e a proteção dos herdeiros. Com pequenas alterações, é este o texto que tem comandado a evolução do Direito do Autor no Brasil e consta ainda da Constituição vigente. Só a Constituição de 1937 o omitiu. IV – Enfim, no 1 ° de Agosto de 1989, surge a Lei n° 496, que ‘define e garante os direitos autorais’. Baseia-se em Projeto de autoria de A. Montenegro e teve como relator Medeiros e Albuquerque. A proteção é concedida aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Brasil. A partir daí cresce o movimento legislativo interno, em paralelo com o movimento de contratação internacional. O grande marco é representado a seguir pelo Código Civil que regula sistematicamente este domínio, sob a epígrafe ‘Da propriedade literária, científica e artística’, nos próprios arts. 649 a 673. A matéria é tratada com a firmeza científica própria do diploma em que se integrou. O direito do autor é protegido durante a vida deste, e ainda por um prazo de 60 anos em benefício dos herdeiros. Mas apesar da segurança do novo texto o movimento legislativo intensificou-se, através de intervenções casuísticas. O Decreto n° 4.790, de 2 de Janeiro de 1928, ‘regula os direitos autorais’: mas na realidade, a sua intervenção restringe-se ao domínio das sanções. A matéria dos diretos conexos ao direito de autor é regulada pela Lei n° 4.944, de 6 de Abril de 1966, regulamentada pelo Decreto n° 61.123, de 1 de Agosto de 196723.
Pelo relato acima feito, fica evidente que o direito autoral no Brasil, desde as
primeiras leis, tem sido tratado de forma sempre inovadora e dinâmica, não ficando alheio às
tendências internacionais, dada o próprio caráter mutante da criatividade humana, que tem
sido influenciada pela descoberta de tecnologias e novas formas de expressar sua atividade
intelectual. No entanto, o professor Vieira Manso entende de forma diferente, e assegura que:
[...] a perda de sua autonomia legislativa atrasou o desenvolvimento científico do Direito Autoral, no Brasil. Por isso, ainda agora, que ele já está
22 José de Oliveira Ascensão, Direito Autoral, p. 10-11. 23 Idem, p. 12-13.
27
plenamente desligado do corpo do Código Civil, a jurisprudência lhe aplica, sem nenhum temperamento, os institutos próprios do Direito Civil, prejudicando-lhe, muitas vezes, a sanção que se haveria de impor às violações dos direitos autorais24.
No tópico em que trataremos da posição enciclopédica do Direito Autoral, nos
ateremos a sua natureza científica, com o rigor necessário. Por hora, transcrevi o referido
texto, somente para ilustrar a diferença de pontos-de-vista entre dois dos maiores autoristas25
do Brasil, no que tange a qualidade da legislação brasileira sobre o assunto.
1.2. DEFINIÇÃO E NATUREZA JURÍDICA
O que é o Direito de Autor? Como ele se classifica entre os vários ramos do
Direito? Essas e outras perguntas serão respondidas neste sub-capítulo.
1.2.1. Posição enciclopédica
Como prólogo a este ponto, remetemo-nos ao breve intróito que Maria Helena
Diniz26 apresenta em seu compêndio – de maneira magnífica – onde afirma que o tema do
direito autoral ainda é controvertido. Há diversas posições doutrinárias divergentes –
diametralmente opostas, diga-se – desde os que negam a natureza jurídica do direito autoral,
por afirmarem que a idéia é um bem social, e não individual, como Manzini e Deboor; ou
ainda, os que, acreditam ser a obra artística ou científica, mero produto do meio cultural em
que o autor estava inserido, levando-se em conta o tempo e o lugar, como Malaplate; ou
aqueles que sequer entendem não ser um direito, mas verdadeiro privilégio de exclusividade
dado aos autores, como forma de incentivo e fomento cultural, como Gerber, Colin e
Capitant, Medeiros e Albuqueque27; até aqueles que, defendem veementemente, a natureza
24 Eduardo J. Vieira Manso, Op. cit., p. 18. 25 Data venia, a expressão “autoristas” trata de uma licença literária deste acadêmico para ilustrar os estudiosos do Direito Autoral, a exemplo dos que já ocorre com outros ramos do direito: civilistas, criminalistas, administrativistas, etc. 26 Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro: direitos das coisas., p. 310-312. 27 Conforme já foi dito, Medeiros e Albuquerque foi o responsável pelo projeto da primeira Lei que tratou dos Direitos Autorais no Brasil.
28
jurídica do direito autoral, conquanto sendo um direito da personalidade, como Bertand,
Dahn, Bluntschli, Heymann, Tobias Barreto e Gierke; porquanto sendo uma modalidade
especial de direito patrimonial, como Kohler, Escarra e Dabin, Ahrens, Ihering e Dernburg.
Após a história da evolução dos direitos autorais no mundo e no Brasil, é difícil
aceitar que o direito autoral seja um ramo de direito “sui generis” (sem gênero, ímpar).
Apesar de possuir objeto e princípios próprios, o direito autoral é um ramo relativamente
jovem dentro da ordem jurídica, por isso, ainda em desenvolvimento. Na lição do ilustre
professor Ascensão, “o Direito Autoral ganhou assim autonomia legislativa. Como por outro
lado a expressão não indica qual a natureza dos ‘direitos autorais’ que regula, deixa o
caminho aberto para uma qualificação doutrinária28”. Observamos que o critério muitas
vezes usado para a individualização de determinado ramo do direito, é a definição de
princípios próprios e autônomos deste, destacando-o dos demais ramos. No tônus do
problema colocado, a conclusão a que se chega é: a especialização do direito autoral, não se
dá pela existência de princípios próprios, mas pelo objeto jurídico que tutela.
No momento apropriado, quando tratarmos da natureza jurídica do direito
autoral, vamos nos ater a maiores detalhes acerca das diferentes teorias que tentam definir o
direito autoral e seu objeto de estudo. Por hora, basta-nos concluir que o Direito Autoral é
ramo do Direito Privado, por regular atos e direitos de particulares, não exteriorizando a
vontade do Estado nem o interesse público. Ademais, cumpre-nos saber se dentro do ramo do
Direito Privado, o Direito Autoral está inserido no Direito Privado Comum (o direito civil) ou
no Direito Privado Especial (direito comercial, direito do trabalho, etc). Vale a pena
transcrever, “ipsi letris” (na íntegra) o raciocínio do Professor Ascensão29:
Realizará o Direito de Autor a especialização, para certo setor, de princípios de Direito Civil?” A resposta deve ser negativa. O Direito de Autor não adapta, cria de novo. Não há nenhum instituto o qual possamos dizer que representa a adaptação a um setor particular de regras do direito comum. Não sendo um ramo especial, o Direito de Autor não pode ser um direito privado especial. É Direito comum, ou civil30.
28 José de Oliveira Ascensão, Op. cit., p. 16-18. O professor Ascensão discorre brilhantemente sobre o tema da especialização do direito autoral, fazendo pertinentes reflexões sobre o problema da “natureza jurídica” do direito autoral em um capítulo específico, já no final da sua obra, após ter esmiuçado o tema “direito do autor” nos demais capítulos anteriores. 29 José de Oliveira Ascensão, Op. cit., p. 20. 30 Idem, p. 20.
29
À luz do raciocínio apresentado pelo ilustre professor, entendemos que para se
constituir em ramo de direito comum especializado, o Direito Autoral teria que adaptar,
especializar regras típicas do direito civil em uma nova realidade fática, que conclamasse a
criação de novo tratamento jurídico diferenciado. E ele não o faz: ao contrário, ele empresta
ao Direito Civil novas realidades, novos princípios.
Dentro da divisão clássica do direito civil, feita por Savigny, o Direito Autoral
está parelho aos Direitos de Personalidade, cuja inclusão como novo ramo de direito, há muito
é reclamada pelos civilistas. Há ainda, no entanto, uma certa confusão entre Direitos Autorais
e Propriedade Industrial31. Apesar de ambos dizerem respeito a bens incorpóreos, o último
refere-se somente às marcas e aos inventos. Invenção e criação não são sinônimas: “a obra
literária ou artística é uma criação, a invenção é uma descoberta32”. Feita tal distinção, é
interessante a observação que o próprio Ascensão traz em sua doutrina:
A semelhança de situações levará a ter em atenção às soluções de um dos ramos quando se proceder a análise do outro. Assim o problema da obra de encomenda, no direito do autor, será resolvido considerando também o que sobre a invenção de empregado dispõe a lei da propriedade industrial (art. 6 § 2)33.
Prosseguindo nas lições do ilustre professor, aferimos que a principal fonte do
direito autoral é a Lei. É a ela quem definirá, abstratamente, o que se encontra no campo do
direito autoral e quais situações não haverão de encontrar guarida nele. É competência
exclusiva da União34 legislar sobre Direitos Autorais, pelo fato dele ser um ramo do Direito
Civil. Trataremos com maior riqueza de detalhes, no tópico específico sobre a legislação de
direitos autorais brasileiras, quais as leis em vigor. Por hora, cumpre saber, que as resoluções
do extinto Conselho Nacional de Direitos Autorais, tinha natureza regulamentar, ou seja,
apenas podiam complementar o sentido dos preceitos já existentes em lei, e que por vontade
da própria lei, delegavam ao conselho a prerrogativa de as regulamentarem; o Conselho, via
resolução, jamais poderia criar ou extinguir direitos: só a lei tinha – e continua tendo – tal
poder (princípio da legalidade). 31 Henrique Gandelman, Op. cit., pg. 41, traz de forma muito didática, uma tabela que ressalta as diferenças entre um direito autoral, uma marca e uma patente. A tabela encontra-se reproduzida em seu inteiro teor no subcapítulo 2.2.3., que trata deste tema. 32 José de Oliveira Ascensão, Op. cit., p. 21. 33 Idem, p. 21.O professor Ascensão refere-se ao art. 6° §2° da Lei n° 9.279, de 14 de Maio de 1996, conhecida como a Lei de Propriedade Industrial. 34 Trata-se da competência descrita no art. 22, I, CF/88: “Compete privativamente à União legislar sobre: (...) direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho”.
30
1.2.2. Conceito e nomenclatura.
Já esclarecida a natureza e a fonte do Direito Autoral, cabe-nos agora tentar
conceituá-lo. Não se trata de uma das tarefas mais fáceis. Por isso, faremos um breve passeio
por entre vários autores e suas definições sobre direito autoral, até chegarmos àquele que
julgamos ser o mais adequado.
Comecemos por Eduardo J. Vieira Manso e seu livro O que é direito autoral.
No capítulo dedicado à conceituação do direito autoral, Manso começa sua definição, citando
a máxima “juris praeceptae sunt haec: honeste vivere, alterum non laedere, suum cuique
triubuere35”. Segundo Manso, nada mais justo que o homem fazer o que quiser da sua própria
criação. Essa faculdade pode consistir em dois tipos de interesses: cultural ou econômico.
A exploração cultural é livre a partir do momento em que a obra vem a público,
não estando sujeita ao controle do autor. A exploração econômica – esta sim – reside no
direito dele tirar-lhe proveito patrimonial; conseqüentemente, o direito autoral seria, pois, uma
nova espécie de direito real: sendo o objeto do direito (a obra) uma coisa imaterial, temos uma
propriedade intelectual. Porém, tal entendimento foi posto de lado após as observações
kantianas, de que mais importante que o aspecto imaterial da obra, é o seu aspecto intelectual,
o fato de ser uma forma de expressão, fruto da própria personalidade do autor. Daí o novo
entendimento: o direito autoral é um direito da personalidade. Conclui Manso que, hoje em
dia, nenhuma das duas correntes tem razão, e classifica o direito autoral como um Direito
Intelectual.
Maria Helena Diniz, em sua obra Curso de direito civil brasileiro, traz várias
concepções diferentes de direito autoral. Para começar, cita o entendimento de Piola Caselli,
concluindo que “é, portanto, direito de autor um poder de senhoria de um bem intelectual que
contém poderes de ordem pessoal e patrimonial. Qualifica-se esse direito como um direito
pessoal-patrimonial36”. Mais adiante, citando Antônio Chaves, define o direito de autor:
35 Eduardo J. Viera Manso, Op. cit.,. p. 19. A tradução apresentada pelo autor é: “Os preceitos de direito são estes: viver honestamente, não lesar o próximo, dar a cada um o que é seu”. 36 Edoardo Piola Caseli, Trattato del diritto di autore e del contratto di edizione, apud Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das coisas, p. 312.
31
(...) como o conjunto de prerrogativas de ordem não-patrimonial e de ordem pecuniária que a lei reconhece a todo criador de obras literárias, artísticas e científicas, de alguma originalidade, no que diz respeito à sua paternidade e o seu ulterior aproveitamento, por qualquer meio durante toda a sua vida, e aos seus sucessores, ou pelo prazo que ela fixar37.
Vejamos como Silvio de Salvo Venosa, em seu Direito Civil – Direito das
Coisas, define o direito do autor:
Direito de autor consiste, pois, no complexo de normas que regulam a produção e divulgação intelectual de cunho artístico, literário, científico ou assemelhado, do ponto de vista moral e pecuniário. Trata-se de ramo de Direito que obteve fisionomia própria. O Direito de Autor disciplina as relações jurídicas entre o criador, sua obra e seu ofício. Leva-se em conta o aspecto estético e cultural nessa atividade38.
Fica evidente, em uma análise preliminar, que todos os autores até agora
citados, entendem ser o direito de autor um plexo de direitos, que se divide em direitos morais
e patrimoniais, cujo objeto tutelado não se trata de qualquer obra, mas sim, de uma criação
artística, literária ou científica. Justamente pela natureza controversa do direito autoral, não há
consenso acerca de uma definição ou conceito universal; até mesmo a nomenclatura, é por
vezes, confusa: há os que dizem ser direito autoral, e os outros que afirmam ser direito de
autor.
Há os que entendem que a expressão direitos autorais engloba os direitos de
autor e os direitos conexos; outros ainda, que entendem trata-se de Direitos Intelectuais,
gênero que abriga as espécies direitos autorais ou de autor e a propriedade industrial. Carlos
Fernando Mathias de Souza, por sua vez, esclarece que:
(...) a expressão direito autoral (inspirada por Tobias Barreto) é típica do direito brasileiro, posto que em outros sistemas jurídicos designa-se (…) por direito de autor, salvo nos países anglo-saxônicos onde, em geral, é esse direito conhecido como copyright39.
Para que não fiquemos sem uma definição concreta do que seja, por hora,
concluímos que direito autoral é aquele ramo do direito privado civil, que tem por objeto os
direitos do autor sobre a sua obra, que deve ser uma criação artística, literária ou científica,
37 Antônio Chaves, Direitos do Autor, in Enciclopédia Saraiva do Direito: n. 26, p. 107 apud Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das coisas, p. 314. 38 Sílvio de Salvo Venosa, Direito Civil: Direito Reais, p. 630. 39 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral, p. 32.
32
bem como, tem por escopo, disciplinar e assegurar a proteção dos direitos morais e
patrimoniais sobre a obra em si e seu gozo por seu autor. No próximo tópico, avançaremos
para águas mais profundas, sem temor de esmiuçar o grande problema sobre a natureza
jurídica e o objeto do direito autoral.
1.2.3. Natureza jurídica e características essenciais
Neste ponto do presente trabalho, socorremo-nos às obras de Plínio Cabral e de
José de Oliveira Ascensão, numa tentativa de esgotarmos o assunto, com toda a profundidade
e atenção que merece ser tratado, porém, de forma clara e objetiva.
Já sabemos que o direito autoral goza de autonomia científica e pode ser
considerado um ramo de direito civil autônomo, com características e princípios próprios.
Resta-nos saber que princípios são esses, e quais as características que individualizam os
direitos autorais dos demais direitos civis. Ascensão assegura que “a determinação da
essência do direito do autor é um dos temas que mais controvérsia levanta no mundo do
direito40”. Para ele, entender a natureza do direito, é saber analisar a forma e conteúdo. Para
tanto, apresenta duas teorias, que tentam explicar a essência do direito do autor: a teoria
monista, a dualista e a pluralista.
Para a teoria pluralista, segundo ensina o professor Ascensão, “não haveria um
único direito patrimonial, mas vários direitos patrimoniais, distintos entre si41”. Dessa forma,
seria o próprio direito pessoal também decomposto em vários direitos, resultando na
observação feita pelo ilustre professor: “quer o direito pessoal, quer o direito patrimonial são,
pois, hipoteticamente decomponíveis num feixe de direitos42”.
Na explicação do eminente professor, alguns artigos da Lei 5.98843, teriam
suscitado o entendimento de que a tese pluralista teria sido adotada pelo legislador, pelo fato
da lei dispor “que as várias formas de utilização da obra intelectual são independentes entre
40 José de Oliveira Ascensão, Op. Cit., p. 579. 41 Idem, p. 580. 42 Ibidem, p. 580. 43: Os artigos aos quais Ascensão refere-se são os artigos 35, 21 e 25 da Lei 5.988/73.
33
si”; e, também, pelo fato do legislador optar pelas expressões “direitos morais” e
“patrimoniais” (no plural), dando a entender que “os vários direitos parcelares, uma vez
alienados pelo autor, ficariam definitivamente perdidos para este, sem haver hipótese de
elasticidade44”. Então o titular dessas várias parcelas de direito, poderia transferir apenas
algumas delas; hipótese em que, extinguindo-se tal direito transferido a terceiro, não
retornaria este, ao plexo de direitos do autor cedente, contudo, tal parcela de direito cairia em
domínio publico.
Depois de tal discurso, fica evidente a crítica feita pelo eminente professor,
dizendo que o direito patrimonial do autor, é único: “o direito patrimonial representa um
exclusivo (direito) de utilização econômica da obra45”. O que é múltiplo, porém, são as
modalidades de utilização desse direito, que no caso da legislação brasileira, não são
enumeradas taxativamente, abrangendo, portanto, todas as formas possíveis. Quanto ao direito
pessoal do autor, o professor é ainda mais incisivo na sua crítica:
Não há vários direitos pessoais do autor, que tenham uma vida autônoma e se separem em diferentes titularidades. O direito pessoal está sempre na titularidade de um só. Esse só pode ser o criador intelectual. [...] nem todos os direitos pessoais se concretizam simultaneamente; mas isso significa que as várias faculdades que têm por fonte o direito pessoal podem concretizar-se em momentos distintos, e não que possam ter vida separada como direitos diferentes46.
Passamos agora, a discorrer sobre a análise que o professor Ascensão faz sobre
a teoria dualista. Para os adeptos dessa teoria, o direito do autor se constitui em dois direitos:
um direito patrimonial sobre o bem imaterial, e um direito de personalidade. Nas palavras do
professor Ascensão: “os dualistas defenderiam que o direito de autor em si é duplo, por ser a
soma de dois direitos, pessoal e patrimonial47”. Se observarmos melhor a teoria dualista, ela
difere da teoria plurista, no que entende apenas existir dois direitos distintos – o pessoal e
patrimonial –, e não dois plexos de direitos – que seriam a subdivisão desses dois direitos em
outros inúmeros direitos independentes.
44 Op. Cit., p. 580. O professor ao referir-se a expressão “elasticidade”, explica na p. 583, o que seria tal fenômeno: “Portanto, temos que concluir que o direito patrimonial é um direito unitário, e os vários poderes em que ele se manifesta são faculdades que emanam desse direito. Quando se concede um direito a terceiro não há em rigor transmissão, há sempre oneração: o direito do autor tem de sofrer a concorrência de um direito alheio, mas não fica definitivamente privado da faculdade em causa. Guarda, pois, a elasticidade, contrapartida da oneração: se o direito derivado se extinguir, o direito-base retoma seu conteúdo normal.” (grifos nosso) 45 Op. Cit., p. 583. 46 Idem p. 584 47 Ibidem, p. 584.
34
Trata-se de um direito complexo – e não, simples –, pois conjuga dois direitos
primários; e coletivo – e não, composto – , pelo fato desses dois direitos não se fundirem. Tal
observação feita pelo professor Ascensão, recorrendo à técnica de Carnelutti, é de extrema
valia, pois se trata do exato ponto de distinção entre as duas teorias. A crítica que o professor
Ascensão apresenta, é a que, no entender dos dualistas, os nascimentos do direito moral e do
direito patrimonial, se dão em momentos distintos: neste, somente com a divulgação da obra;
naquele, com a criação da mesma. Lembra o autor que o registro da obra, apenas cria uma
presunção de autoria, e que todos os direitos do autor, em sua totalidade, se constituem desde
o momento da criação da obra literária ou artística.
Outrossim, a teoria monista preocupa-se, tão somente, em contradizer a teoria
dualista. No entendimento dos monistas, o direito autoral constitui-se em um direito próprio,
nem sendo pessoal, nem patrimonial. O direito de explorar a obra está ligado à pessoa do
autor, que repercutirá, no aspecto patrimonial. A conclusão que se chega, é a de que Ascensão
estabelece como pano de fundo, duas correntes de pensamentos que tentam explicar a
natureza jurídica do direito patrimonial: a corrente personalística e a patrimonialística.
Em sua crítica à teoria personalística, explica que esta pressupõe um conceito
monista do direito de autor, estando o direito patrimonial incluso neste; porém, com o
argumento de que “as faculdades ligadas à personalidade extinguem-se por morte, mas o
direito de autor continua para além disso48”, Ascensão descarta tal entendimento.
Quanto à teoria patrimonalística, que pressupõe uma natureza meramente
patrimonial, Ascensão alega a obra é objeto tanto do direito pessoal quanto do patrimonial:
(...)se a obra é objeto do direito pessoal, por objeto ser aquilo a que o direito se refere ou que com o direito se afeta, igualmente pode ser o objeto do direito patrimonial, (...) a posição da obra é muito diversa da coisa nos direitos reais, por não ser admissível a exclusividade de domínio49”.
48 José de Oliveira Ascensão, Op. cit., p. 602. 49 Idem, p. 604. A insusceptibilidade de apropriação exclusiva do domínio da obra é tema de um sub-capítulo específico. Mas, a titulo de ilustração, podemos sintetizar que o “domínio” da obra não pertence exclusivamente ao autor, mas sim, a toda coletividade; “a obra intelectual não é um bem de produção (…), há utilizações de terceiros que continuam lícitas, e têm de o ser sempre, dada a destinação social do bem intelectual”. Como já havíamos dito no histórico, fica evidente a forte influência do pensamento iluminista neste conceito de propriedade intelectual.
35
Por fim, Ascensão também descarta o entendimento de que o direito do autor
seria uma espécie de propriedade espiritual ou que se trata de direito “sui generis”; naquele
caso, a propriedade espiritual teria uma noção ambígua, pois se refere à obra como objeto
específico do direito – o que em nada difere da noção de res (coisa) nos direitos reais – e a
ligação pessoal do autor com a coisa incorpórea – que por sua vez, seria improvável, pois a
propriedade intelectual pode se dividir em direitos autorais e propriedade industrial, sendo que
nesta última, inexiste qualquer traço de direitos pessoais. Já no último caso, não seria direito
“sui generis”, pois como já dissemos, o direito autoral tem sua posição enciclopédica situada
dentro do direito civil, e não justificaria que fosse colocado em um novo ramo jurídico
especial.
Para concluir, buscamos na obra do saudoso mestre Carlos Alberto Bittar, a
definição da natureza do direito autoral. Bittar, com raro brilhantismo, conseguiu sintetizar de
maneira sucinta, esta natureza do direito autoral:
O Direito de Autor, em conseqüência, é um direito especializado, sujeito a disciplinação própria, apartada das codificações, frente a princípios e a regras consagradas, universalmente, em sua esquematização estrutural. Com efeito, análise de sua conformação intrínseca demonstra, desde logo, a individualidade lógica e formal do Direito de Autor, na medida em que se reveste de características próprias, identificáveis na doutrina, na jurisprudência e na legislação nacional e internacional50.
Diante de tudo que expomos, entendemos ter o direito autoral a mesma
natureza jurídica do direito civil, dada a sua posição enciclopédica. Regula, pois, as relações
jurídicas do autor em relação sua obra, tendo por objeto essa sujeição da obra intelectual ao
seu criador.
1.3. O DIREITO AUTORAL E SEUS ELEMENTOS
Estabelecido a posição enciclopédica do Direito Autoral, falta evidenciar quais
são os elementos jurídicos que o compõe. Todo direito tem sujeitos; e quase sempre, recai
50 Carlos Alberto Bittar, Direito de Autor, p. 11.
36
sobre um objeto, um bem jurídico. Tentaremos delimitar quais são os sujeitos de direitos de
autor, e o que pode ser tutelado pelo direito autoral.
1.3.1. O sujeito do direito autoral (elemento subjetivo)
A primeira inferência que faríamos, é a de que o sujeito do direito autoral, é,
senão, o autor. Seria uma conseqüência lógica, da definição do objeto do direito autoral, que é
a relação entre o criador e sua obra. Entretanto, nem sempre o sujeito do direito autoral é,
necessariamente, o autor. Pelo que já vimos, o direito do autor é fracionado em dois direitos:
um direito pessoal e outro patrimonial, sobre a obra intelectual. Haverá situações em que, o
sujeito dos direitos autorais, será pessoa diversa do autor intelectual da obra: será o
cessionário dos direitos patrimoniais, os herdeiros e sucessores legais do autor falecido, a
coletividade, etc.
Portanto, para que possamos estudar cada caso, é necessário que definamos o
que é autor. Eduardo Vieira Manso define que autor é “aquele que cria, ou seja, aquele que
impregna uma idéia de um determinado conteúdo e lhe dá uma precisa e particular forma de
expressão51”. José de Oliveira Ascensão vai mais além, identificando toda uma problemática
na definição de autor:
‘Autor’ é palavra ambígua. Mesmo juridicamente, ela pode designar: a) o criador intelectual da obra; b) o titular originário desta; c) o titular atual. Esta terceira hipótese resulta da possibilidade de o direito de autor passar do titular originário a outras pessoas. Podemos dizer que, quando a lei tem em vista a criação, refere o criador intelectual. Assim (…) o autor é titular de direitos sobre a obra intelectual que produziu. Mas pode haver adquirentes derivados. Quando a lei refere o conteúdo do direito – por exemplo, quando fala na autorização do autor – abrange-se qualquer titular. Da mesma forma, quando se permite ao autor a defesa judicial do seu direito, abrange-se qualquer titular, e não apenas o originário52.
Para fins jurídicos, a própria lei definiu que “autor é a pessoa física criadora
de obra literária, artística ou científica53”. É o que Henrique Gandelman, afirma
categoricamente: “O sujeito do direito autoral é, portanto, o autor, ou ainda o titular de
51 Eduardo J. Vieira Manso, O que é direito autoral, p.34. 52 José de Oliveira Ascensão, Direito Autoral, p.69 53 Está assim disposto no artigo 11, da Lei n° 9.610, de 19 de fevereiro de 1998.
37
autoria de obra intelectual54”. Porém, a própria lei ao afirmar a regra no art. 11, tratou de
criar uma exceção, no parágrafo único: “a proteção concedida ao autor poderá aplicar-se às
pessoas jurídicas nos casos previstos em lei”. Não se trata esta da única exceção. Há várias
outras situações que se excetuam àquela regra.
É de extrema valia tal distinção, tendo em vista que a lei estabelece formas
distintas de tutela do direito autoral de acordo com o tipo de autoria. Eduardo Vieira Manso
trata com muita propriedade sobre a classificação das obras de acordo com as formas de
autoria.
Comecemos pelo autor individual ou autor original: é aquele que cria a sua
obra a duas mãos, estando sua autoria revestida da originalidade. Eduardo Vieira Manso
explica muito bem, que “a originalidade, para os efeitos do Direito Autoral, também consiste
na pessoal atuação do autor, na conformação nova de uma idéia, mesmo que esta já tenha
recebido uma determinada forma anteriormente55”. O requisito – a duas mãos – que
ilustramos, corresponde a essa tal atuação pessoal do autor. Relembrando o conceito de obra –
é aquela idéia, que exteriorizada pelo autor, tornou-se um objeto real, materializada –
consiste, portanto, a originalidade, na forma com que a idéia é materializada pelo autor, sendo
pacificamente possível, o reaproveitamento de uma idéia anterior. É o que Manso afirma:
“Tanto o autor como o tradutor são autores de obras originais: o primeiro, por ser o criador dela; o segundo, por ser criador de uma forma externa da mesma obra, que é elaborada com uma liberdade pessoal contida nos limites da forma interna da obra primígena56.
Tratemos agora da autoria coletiva. Note que já não usamos a denominação
autor, pois se trata de uma plêiade de autores, que reunidos em torno de uma idéia comum,
elaboram uma obra “a quatro, seis, oito… inúmeras mãos”. Ou melhor ainda, na lição de
Manso, “são as chamadas obras coletivas, que a lei brasileira definiu, deficientemente, como
sendo aquelas realizadas por diferentes pessoas, mas organizada por empresa singular ou
coletiva e em seu nome utilizada (conforme art. 15 da Lei n° 5.988/73)57”.
54 Henrique Gandelman, De Gutenberg à Internet: direito autoral na era digital, p. 38. 55 Eduardo J. Vieira Manso, O que é direito autoral, p. 35. 56 Idem, p. 35. 57 Ibidem, p. 36.
38
Esta hipótese – novamente, de exceção à regra geral do conceito de autor que
havíamos falado – está expressamente prevista no parágrafo único do artigo 11 da nova Lei de
Direitos Autorais. A nova lei 9.610/98, não repetiu a definição de obra coletiva presente na lei
anterior, mas, tão somente, deixou explícito, duas figuras distintas: a do organizador, papel
que cabe à pessoa jurídica; e a do participante ou colaborador. É cristalino o entendimento
acerca da obra coletiva, e da existência desses dois elementos substanciais, que são o
organizador e os colaboradores. Agora, podemos definir com maior rigor científico, o que é
obra coletiva, e conseqüentemente, o que a distingue da autoria individual e original:
Obra coletiva é, por sua vez, aquela em que cuja realização ingressam várias pessoas, cabendo a organização à pessoa natural ou jurídica, que em seu nome a utiliza posteriormente (art. 5°, VII, h). Os esforços dos elaboradores são reunidos e remunerados pela pessoa coletiva, a quem compete a coordenação de suas atividades, às quais se fundem, ao depois, no resultado objetivado (a obra em si: filme, novela); daí porque se lhe reconhecem direitos originários plenos sobre a obra resultante. A característica básica dessa espécie é a incindibilidade das diferentes elaborações (consoante princípio oriundo de decisão da jurisprudência no célebre caso da Enciclopédia francesa), que se justifica, quanto ao reconhecimento do trabalho criativo do organizador58.
No momento oportuno em que estudarmos com detalhes alguns pontos cruciais
da Lei de Direitos Autorais, apontaremos outras situações de autoria coletiva – como é o caso
da obra fonográfica. Por hora, cabe ressaltar o porquê da escolha do legislador, em atribuir
somente a uma pessoa jurídica, todos os direitos acerca de uma obra coletiva. Na lição do
eminente mestre Eduardo Vieira Manso:
Nota-se, portanto, que a atribuição da autoria da obra coletiva a uma pessoa distinta daquela que efetivamente a criou decorre de uma necessidade de ordem prática: a impossibilidade de ser atribuída aos seus diversos autores alguma prerrogativa pessoal sobre o conjunto, seja porque isso esfacelaria de tal forma a titularidade sobre tal obra, tornando praticamente impossível sua utilização econômica, que sempre exigiria verdadeiras assembléias gerais para decidir sobre isso, seja porque cada um haveria de caber uma participação econômica tão insignificante que nem mesmo justificaria os gastos para a administração dos respectivos contratos59.
É muito importante que todos os aspectos da obra coletiva sejam abordados,
pois veremos que, a lei abre um leque de regras sobre tal forma de criação. Talvez, por esse
motivo, é que a maioria das discussões e controvérsias judiciais seja acerca de direitos
58Carlos Alberto Bittar, Direito de Autor, p. 39. 59Eduardo J. Vieira Manso, O que é direito autoral, p. 36-37.
39
autorais sobre obras coletivas. A problemática da titularidade de obra coletiva, é dissecada por
Henrique Gandelman, em capítulo dedicado exclusivamente ao assunto.A titularidade de obra
por uma pessoa jurídica trata-se de uma ficção legal, que só opera conseqüências no mundo
real, por vontade expressa da lei. Veremos, na análise da lei, que os direitos autorais, para fins
legais, são considerados bens móveis (art. 3°, da LDA/98)60. Ora, as pessoas jurídicas
possuem capacidade para dispor e gozar de direitos reais, como bem observa Gandelman, ao
citar palavras do professor Antônio Chaves:
Nada impede que se lhes reconheça, também, direitos de autor, direitos de inventor, direitos sobre marcas de fábrica, de uso exclusivo de insígnias, do título de suas publicações etc. As pessoas jurídicas podem gozar de toda a espécie de direitos reais: posse, propriedade imóvel e móvel, condomínio, direitos reais sobre coisas alheias, direitos reais de garantias, etc., podendo valer-se das ações que dão margem para a sua defesa, formando o conjunto dessas relações o patrimônio das mesmas (grifos do autor)61.
Mais uma vez, ressalta-se o caráter patrimonial do direito autoral, e seu
exercício pelo titular do direito pelo criador da obra; neste caso, a pessoa jurídica. Mas,
poderíamos perguntar: como ficam os colaboradores da pessoa jurídica que criou a obra
coletiva? Porventura eles não teriam direitos pessoais sobre a criação que ajudaram a criar? A
resposta não é simples. Se o colaborador, no exercício da criação, estava subordinado à
vontade da pessoa jurídica – ou seja, como empregado62 – ele não terá qualquer direito sobre a
criação. Ele não agiu sob sua própria inspiração e vontade no ato da criação, mas sob a
vontade do seu empregador.
E não basta somente a subordinação: Carlos Alberto Bittar63, ao discorrer sobre
o tema, identifica três elementos caracterizadores da obra coletiva: 1° – Direção e coorde-
nação de quem a encomendou: cabe aqui, esclarecer que obra coletiva não se confunde com
obra sob encomenda. Veremos, logo a seguir, o conceito de obra sob encomenda, e a sua
distinção da obra coletiva; 2° – Trabalho intelectual remunerado de vários elaboradores, que
60 Vide no Anexo 4, a Lei 9.610/98. 61 Antonio Chaves, Nova lei brasileira de direitos autorais, p. 733 apud Henrique Gandelman, De Gutenberg à Internet: direito autoral na era digital, p. 107. 62 Recorrendo às lições de Direito do Trabalho de Amauri Mascaro Nascimento.(in Iniciação ao Direito do Trabalho, p. 196): “Empregado é um trabalhador cuja atividade é exercida sob a dependência de outrem para quem ela é dirigida. Nossa lei usa a palavra ‘dependência’. No entanto, no lugar dela, generalizou-se outra expressão, a palavra ‘subordinação’ (...); conceituamos subordinação como uma situação em que se encontra o trabalhador, decorrente da limitação contratual da autonomia da sua vontade, para o fim de transferir ao empregador o poder de direção sobre a atividade que desempenhará”. 63 Carlos Alberto Bittar, Direito de Autor, p. 43-44.
40
produzem em equipe: trata-se de trabalhadores assalariados, que ganham salário para o único
fim de criar; e um 3°– Fusão dos respectivos esforços na obra final de encomendada: a obra
pode ser filme, novela, música, texto, peça publicitária, “software” (programa de
computador), jornal, revista, enciclopédia, etc. A equipe de colaboradores, dirigida pelo
organizador, deve ter como finalidade a persecução de um objetivo comum, ou seja, a obra;
Para elucidar o entendimento acima descrito, afirma Bittar que “no conjunto
das elaborações, puder se destacar qualquer contribuição autônoma, os direitos próprios
pertencerão ao respectivo titular, sem prejuízo dos direitos sobre o conjunto64”. É aqui que se
revela a importância do vínculo de subordinação entre o colaborador e o contratante: a
remuneração que aquele recebe, nada mais é, que “a contrapartida pelo esforço desenvolvido
no fornecimento do serviço e pelo tempo que fica à disposição do contratante65”, não sendo
capaz de gerar direito algum sobre a obra criada.
Porém, se o colaborador, em algum momento, agiu com liberdade e vontades
próprias, só transferindo ulteriormente os direitos patrimoniais ao contratante, poderemos
afirmar que ele possuirá direitos pessoais sobre a sua criação. Para consolidarmos tal idéia,
parece-nos útil a transcrição que Gandelman faz da lição do argentino Isidoro Satanowsky,
citado por Henry Jessen, em sua obra:
En princípio se dice que cuando se trabaja por dinero, se loca la industria, existe un vínculo de subordinatión y se escribe uma obra bajo um encargo y orden, el derecho pertenence al que encargó la dirección o ejerce el comando. Para nosostros ello es así siempre que el que realice la obra no la impregna de su personalidad sin intervención del que la ordeno66.
Para concluir a classificação da autoria da obras, em razão da forma de sua
realização, resta-nos definir a obra em colaboração, a obra sob encomenda e a obra composta.
Ambas possuem muitas semelhanças, porém, existem tênues características que as
distinguem.
64 Carlos Alberto Bittar, Direito de Autor na obra feita sob encomenda, p. 46-48, apud Henrique Gandelman, Op. Cit., p. 112. 65 Idem, p.46-48. 66 Henry Jessen, Direitos Intelectuais, apud Henrique Gandelman, De Gutemberg à Internet, p. 107. Apresentamos nossa tradução: “A princípio se diz que, quando se trabalha por dinheiro loca-se o trabalho, existe um vínculo de subordinação, e se escreve uma obra sob um encargo e ordem, o direito pertence ao encarregado pela direção ou exerceu o comando. Para nós, é sempre assim: o que realiza a obra não a impregna de sua personalidade, sem a intervenção daquele que a ordenou”.
41
Obra em colaboração é aquela em que dois ou mais autores criam em regime
de parceria. Eduardo Vieira Manso discorre com maestria sob o tema. Para ele, a definição
legal de obra em colaboração é restritiva, na medida que se “refere a apenas um tipo de obra
criada por mais de um autor, que é aquela espécie que houve comunhão de criação entre
mais de uma pessoa67”, uma mútua colaboração dos diversos autores, distanciando, neste
ponto, das obras coletivas e meramente individuais. Porém a colaboração mútua, no seu
entender, não poderia ser fracionada. Explica Manso:
Não seriam, portanto, em colaboração, as obras que resultassem da atuação de autores que tivessem vivido em épocas diversas; ou as que decorressem da atuação em distintos momentos da realização de uma obra, fornecendo uma pessoa a idéia, os conselhos e a concepção e a outra efetivando esse idéia, segundo esses conselhos, e corporificando a concepção68.
Bem disse: não seriam... Há casos em que a lei excetua tal regra. A título de
ilustração, citamos alguns exemplos dados pelo próprio Manso, em sua primorosa obra –
como já dissemos – ponto de partida obrigatória para os aficionados pelo direito autoral:
a) Co-autoria em obra musical69: a princípio, é perfeitamente cabível que um
autor componha somente a melodia da música, permitindo que, posteriormente, outro venha a
compor uma letra sobre a mesma base melódica. O art. 24, da LDA/73, previa que “se a
contribuição de cada co-autor pertencer a gênero diverso, qualquer deles poderá explorá-la
separadamente, desde que não haja prejuízo comum”. Daí Manso ter citado o exemplo da
música Carinhoso, composta originalmente por Pixinguinha, e cuja letra foi criada por
Braguinha após a sua publicação: por este motivo, tornou-se obra em colaboração, e para ser
utilizada conjuntamente (letra e música). Porém, nada impediria que cada uma delas seja
utilizada separadamente, pois não haverá prejuízo para o conjunto da obra em colaboração.
b) Obra sob encomenda: é aquela onde “os co-autores atuam em diferentes
fases de realização: um, na sua concepção e outro, na execução70”. Aqui, o contratante é o
autor da idéia original, e o contratado, aquele que executará o trabalho de criação
propriamente dito; na realização da obra, o contratado agirá livremente, dentro do seu espírito
criativo, prendendo-se somente ao pedido do contratado, que deseja um produto final, que é a
67 Eduardo Vieira Manso, O que é direito autoral, p. 38. 68 Idem, p. 38. 69 No capítulo IV desta monografia, analisaremos com detalhes a Obra Musical. 70 Eduardo Vieira Manso, Ob. cit., p. 39.
42
obra pretendida. Abordaremos, a seguir, maiores detalhes sobre este tipo de obra. Por hora,
parece-nos interessante o relato histórico que Manso traz em sua obra, sobre um julgado da
Justiça Francesa, “por envolver esculturas de Augusto Renoir: no fim de sua vida, Renoir,
enfermo, já não dominava mais os instrumentos de sua arte e, por isso, se valia do auxílio de
seu amigo, discípulo e auxiliar, Richard Guino71”: Guino, após a morte de Renoir, quis
reproduzir algumas obras que ainda estavam em seu poder, porém encontrou resistência por
parte dos herdeiros de Renoir. A solução foi obter na justiça o reconhecimento da co-autoria,
pois na execução dos trabalhos sob supervisão do saudoso mestre, Guino tinha atuado com
grande liberdade de criação. A justiça deu ganho de causa à ele.
c) A produção cinematográfica: pode-se dizer que o verdadeiro autor de uma
obra de cinema é o seu diretor, “porque é a atuação deste que faz nascer essa obra que não
pode ser confundida com a obra literária nela empregada, nem com a musical, nem com
nenhuma outra obra utilizada para surgir o filme72”. Por isso, a lei designou que serão co-
autores – além do diretor – os roteiristas, os autores das trilhas sonoras e o produtor. Aliás, a
este último a lei reserva o direito de exclusividade na exploração econômica da obra, tendo
em vista que produzir, nada mais significa que, o ato de financiar os custos de produção do
filme. Por tanto, nada mais natural que aquele que tenha investido, possua a prerrogativa de
obter retorno financeiro do empreendimento feito.
A obra em colaboração, por fim, só cairá em domínio público, após o decurso
do prazo estabelecido pela lei, a contar da data da morte do último co-autor sobrevivente. A
exceção fica por conta da obra cinematográfica, que cai em domínio público após 60 anos
contados do ano de produção.
Retomemos agora o conceito de obra sob encomenda. Como já dissemos, ela
sempre ocorrerá quando duas pessoas interagirem: uma, concebendo, e outra, realizando. Ou
ainda, na definição de Henrique Gandelman, são “as que são criadas por solicitação de uma
pessoa física ou jurídica, que fornece e orienta o tema, e cujo pagamento prevê a
transferência da titularidade dos direitos patrimoniais para quem as encomendou73”.
E finalmente: qual seria diferença entre a obra coletiva e obra sob encomenda?
71 Eduardo Vieira Manso, Op. cit., p. 40. 72 Idem, p. 39. 73 Henrique Gandelman, Op. cit., p. 108.
43
Na obra sob encomenda, o artista contratado age com total liberdade de espírito
na consecução da solicitação que lhe foi feita; o seu único compromisso é entregar a obra de
acordo com aquilo que lhe foi encomendado. Ao artista contratado estão assegurados os
direitos morais sobre a obra, porém, por força do contrato de prestação de serviços, os direitos
patrimoniais são transferidos ao contratante, que disporá economicamente da obra como bem
lhe aprouver. Na obra coletiva, recorda-se, o colaborador não possui qualquer direito – quer
patrimonial, quer moral – sobre a obra, porque não a executou de forma autônoma, mas sim
subordinado à vontade do organizador, mesmo tendo recebido remuneração pelo feito.
Outrossim, obra composta é aquela cuja autoria consiste “em um trabalho de
seleção, coordenação e organização de uma obra composta de várias outras, já existentes
anteriormente, e sem o concurso dos autores destas outras obras74”. Não se trata,
obviamente, nem de obra em colaboração, nem tampouco obra coletiva. O titular da obra
composta é sempre uma pessoa física, ainda que tenha sido financiada ou editada por pessoa
jurídica: pressupõe-se que, somente uma pessoa natural, tenha capacidade intelectiva para
selecionar as obras que comporão o compêndio, que é a nova obra composta. Não é obra
coletiva, pois os titulares das demais obras que integram a obra composta, não as executou em
conjunto para esta finalidade, mas sim, as criaram isoladamente, de modo que cada obra tem
vida própria e autônoma, caso apartada da obra composta.
E por fim, falta tratar dos outros sujeitos titulares de direitos autorais. E neste
ponto, definiremos o que são os direitos conexos, pois se trata também de uma forma
excepcional de titularidade de autoria. Primeiro, convém conceituar o que é titularidade: “por
titularidade se entende a relação de pertinência dos direitos autorais de uma pessoa e a obra
que os gera75”. Titular de direito autoral não é sinônimo de proprietário, pois já vimos que o
direito de autor não é propriedade em sentido estrito, da forma que o direito autoral é
inusucapiável, mas é alienável, mediante cessão de direitos. Quanto a forma de aquisição de
direitos autorais, podemos estabelecer duas formas: a titularidade original e a titularidade
derivada.
Manso, ao definir o que seja titularidade original, assinala que “é a que decorre
do fato da criação da obra intelectual, muito embora nem sempre ela caiba ao próprio
74 Eduardo Vieira Manso, O que é direito autoral., p. 37. 75 Idem, p. 60.
44
criador da obra76”. Isto significa que, a titularidade original nada tem a ver com a execução
da obra em si, mas com a idéia que a gerou: é o caso das obras sob encomenda ou obras
coletivas, cujo titular original dos direitos é o contratante. Para o gozo da titularidade original
sobre sua criação, o autor independe de capacidade civil ou profissional; qualquer pessoa –
física ou jurídica –, pode ser autor (a criança ou o demente, por exemplo). O seu gozo77,
independe de maiores formalidades, e como Manso afirma, basta que estejam presentes os
requisitos da protegibilidade dos direitos do autor: originalidade, criatividade e possibilidade
de atender a um interesse intelectual; mas o exercício da titularidade original, porém, está
sujeita à regra geral da capacidade civil e aos casos que a lei estabelece.
Portanto, em regra, o autor intelectual da criação é o titular original dos direitos
do autor em sua totalidade. Há exceções, porém: 1ª – Na obra coletiva, a empresa que
organizou o processo de criação da obra intelectual, detém todos os direitos dela: como
dissemos, não apenas pessoas físicas podem ser titulares originais de direitos autorais;
2ª – Na obra em colaboração, sendo a obra divisível, cada autor goza da titularidade dos
direitos autorais na medida de sua colaboração; sendo indivisível, cada autor goza em parte
iguais os direitos autorais sobre a criação comum; 3ª – Na obra sob encomenda, conforme a
lei anterior estabelecia78, havendo silêncio entre as partes (o artista contratado e o contratante)
no contrato de trabalho ou prestação de serviço, a titularidade original sobre a obra pertenceria
tanto ao tomador de serviços (o patrão), quanto ao autor (empregado privado, público ou
autônomo) que criar obra sob encomenda daquele. Havendo a expressa previsão no contrato,
caberá ao autor titularidade original dos direitos morais sobre a criação, enquanto ao
contratante caberá os direitos patrimoniais sobre ela.
Para concluir, resta-nos saber o que é a titularidade derivada e quais os casos
de sua ocorrência, que a lei contempla. Manso a define como “aquela que resulta de um
negócio jurídico celebrado entre o titular original e outra pessoa (ato inter vivos) ou por
76 Eduardo Vieira Manso, Op. cit., p. 61. 77 Conforme a teoria da capacidade civil, há diferença entre o gozo e o exercício de direitos: o “gozo” é simples fruição, enquanto o “exercício” está atinente à capacidade civil do sujeito, e conforme seu grau de incapacidade, deverá ser assistido (relativamente incapaz) ou representado (absolutamente incapaz). 78 Lei Nº 5.988, de 14 De Dezembro de 1973, in verbis: “Art. 36. Se a obra intelectual for produzida em cumprimento a dever funcional ou a contrato de trabalho ou de prestação de serviços, os direitos do autor, salvo convenção em contrário, pertencerão a ambas as partes, conforme for estabelecido pelo Conselho Nacional de Direito do Autor”. A crítica que fazemos à nova lei 9.610/98 é o fato da mesma ter revogado expressamente todos os artigos da lei anterior, com a exceção do art. 17 e seus parágrafos. O legislador poderia tê-los inseridos no corpo da nova lei, e assim, revogar a antiga lei em sua totalidade.
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sucessão testamentária (ato causa mortis)79”. Por conseguinte, temos que analisar as duas
hipóteses de aquisição de titularidade derivada:
I – Negócio “inter vivos” (em vida): a titularidade pode ser transferida de
forma definitiva ou temporária: caso a transferência se dê de forma definitiva, haverá cessão
de direitos; caso se dê de forma temporária, haverá concessão de direitos.
A cessão de direitos deverá ser formalizada por contrato escrito, em caráter
oneroso; por ser contrato, estabelece obrigação do cessionário com o autor-cedente. A cessão
pode ser total ou parcial. Parcial, quando o autor-cedente estabelece no contrato, de forma
minuciosa, os direitos que estão sendo transmitidos. A cessão será total, quando não houver
qualquer estipulação em contrário, abrangendo, então, todos os direitos patrimoniais sobre a
obra. Deve, pois, o contrato de cessão ser averbado junto ao registro da obra, para que tenha
efeito “erga omnes” (perante todos).
A concessão de direitos é a alienação temporária da titularidade dos direitos,
celebrada mediante contrato, que pode ou não ser celebrado na forma escrita: é dispensável a
averbação do mesmo junto ao registro da obra, porém, para que surta efeito “erga omnes”,
deverá ser averbado. Manso explica que, o contrato de edição é o “verdadeiro protótipo dos
contratos de concessão de direitos80”, possuindo sempre prazo determinado (por tanto tempo)
ou prazo determinável (por tantas edições), sendo, portanto nula qualquer cláusula que
estabeleça prazo indeterminado; não havendo termo final ajustado, “sua terminação poderá
dar-se mediante simples denúncia vazia, depois de publicada pelo menos uma edição81”.
II – Negócio “mortis causa” (após a morte): trata-se daquela aquisição de
direitos autorais por instituto da sucessão, quer hereditária, quer testamentária. Os herdeiros
testamentários adquirem os direitos na exata medida do que foi declarado pelo autor falecido
em seu testamento. Já os herdeiros legítimos ou necessários, adquirem todos os direitos
patrimoniais e alguns direitos morais, em sua universalidade, a partir do momento da morte
do autor82. Os direitos morais personalíssimos do autor, como o de modificar a obra, retirá-la
79 Eduardo Vieira Manso, O que é direito autoral., p. 64.
80 Idem, p. 66. 81 Ibidem, p. 66. 82 Trata-se do princípio da Saisane, que estabelece a transferência imediata da universalidade dos direitos e deveres do falecido para seus sucessores legítimos, na ordem de vocação hereditária estabelecida no Código Civil.
46
de circulação, bem como de suspender qualquer forma de utilização já autorizada, não passam
para os herdeiros do autor falecido; ao contrário, perecem com ele por ocasião de sua morte.
1.3.2. O objeto do direito autoral (elemento objetivo)
Vimos que o direito do autor está baseado na capacidade criativa do criador e,
por conseguinte, deduz-se que o objeto do direito autoral não é a simples obra, mas sim, a
verdadeira criação intelectual. Decorrência lógica de toda uma evolução histórica, que
começou com a Revolução Francesa, e ainda não se encerrou nos dias atuais, o direito do
autor é deveras controverso. Fica latente, porém, o entendimento de que não é qualquer obra
que faz jus ao tratamento de criação intelectual. A obra, é a materialização do sopro de
inspiração, fruto da capacidade criativa do autor, que se utiliza dos mais diversos meios, para
atingir a consecução de seu objetivo: a de realizar algo novo, inédito, singular.
É comum a dificuldade em diferenciar “obras inventivas” de “obras
intelectuais”: aquelas estão atinadas ao Direito do Inventor, como são as marcas, patentes e
inventos industriais. Já as obras intelectuais, essas sim, estão abrangidas pela proteção típica
do Direito Autoral. São obras intelectuais, conforme definição na Lei, “as criações do
espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível,
conhecido ou que se invente no futuro83”.
Logo após, a lei estabelece um rol exemplificativo, de quais são tais obras.
Porém, de um modo geral, podemos deduzir da definição legal que obra intelectual, não é a
simples idéia. A idéia é o pré-elemento da obra intelectual. A idéia não precisa ser
necessariamente nova, original, inédita: mas a forma de que ela se reveste, esta sim, deve ser
criativa. É esse elemento o corpo místico da obra. Vieira Manso discorre de forma brilhante
sobre o tema:
Ninguém, a não ser o Criador, cria coisa nova, sob o Sol, porque, como dissera Lavoisier, ‘no mundo nada se cria, nada se perde, tudo se transforma’. A criatividade do conteúdo, portanto, residirá na forma dada à obra que, esta sim, haverá de ser nova. A criatividade requerida se refere à
83 Lei n° 9.610/98, art. 7°, caput.
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nova contextura que se dá a um tema, por mais velho que ele seja. Daí por que se diz que a criatividade diz respeito à forma interna da obra, que é como seu próprio tecido celular, seu verdadeiro ser, ou, como se diz, na linguagem do Direito Autoral, é seu corpus mysticum. A forma é a obra despojada de qualquer matéria 84.
Como afirmamos no prólogo, só um Criador, um Amor Maior, possui
capacidade para criar algo inteiramente novo, pois dele procede toda inteligência humana.
Concluímos que, quando a lei fala em “expressas por qualquer meio”, entende-se a forma, o
corpo místico da obra intelectual, que deve ser criativo.
Porém quando a norma legal diz “fixadas em qualquer suporte” se refere ao
corpo mecânico da obra intelectual. O suporte pode ser qualquer meio físico tangível (tocável,
visível) ou intangível (intocável, invisível), já conhecido ou que ainda está por ser inventado.
O suporte físico da obra deve ser original. Mais uma vez, recorremos a Manso e sua
primorosa redação:
A originalidade, de maneira muito análoga, reside na forma externa, isto é, no corpus mechanicum, que é a obra revestida de algum instrumento físico que lhe possibilita a comunicação pública duradouramente. A originalidade coincide, praticamente, com o estilo do autor, mediante o qual ele lhe empresta uma particular maneira de existir no mundo exterior. Numa obra literária, a forma interna é a idéia estruturada em uma determinada composição, na organização dada ao tema. De outro modo, a forma externa é a linguagem nela empregada, que pode variar, sem variar aquela estrutura, aquela organização, como ocorre, sempre, nas traduções ou nas adaptações de uma obra literária para o cinema ou televisão. A originalidade resulta do fato de a nova forma ter sido fruto do trabalho pessoal do autor; a criatividade, também85.
Para concluirmos, adotamos o entendimento de Eduardo Vieira Manso, que
sintetiza de forma especial, os elementos que devem existir para que a obra intelectual, seja
considerada como tal, e seja protegida pelo Direito Autoral. São eles: a idéia a ser
comunicada ao público, o seu conteúdo, suas formas interna e externa, e a finalidade de
publicação. Podemos abstrair que forma é uma equação composta pela soma dos dois fatores:
o “corpus mysticus” (corpo místico) e o “corpus mechanicum” (corpo mecânico).
84 Eduardo Vieira Manso, O que é direito autoral, p. 31. 85 Idem, p. 31-32.
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2. O DIREITO AUTORAL E SUA TUTELA LEGAL
No capítulo anterior, analisamos a história do direito autoral, desde a
Revolução Francesa até os dias de hoje. Vimos também que, como um ramo de direito
autônomo, possui objeto e regras próprias, cuja tutela e exercício encontram-se reguladas em
várias legislações esparsas, começando na Constituição Federal, passando por convenções
internacionais e leis específicas.
A partir deste momento, tentaremos expor as várias nuances do direito autoral
e de sua tutela legal; saber o quê, como e quando, será objeto de tutela do direito autoral,
específica situação ou fato, é o objetivo deste capítulo.
2.1. TUTELA CONSTITUCIONAL DO DIREITO AUTORAL
Já analisamos anteriormente, o longo processo evolutivo do direito autoral no
Brasil, desde a primeira menção legal que se tem notícia (a Lei Imperial de 1827 que criou os
dois primeiros cursos de Direito no país), até a sua proteção pela Constituição Federal
vigente.
Porém, não foi a primeira vez que o Constituinte quis assegurar e proteger os
direitos do autor de obras intelectuais. Veremos que desde os tempos da República Velha, as
Constituições que se outorgaram e promulgaram, de uma forma ou de outra, previram a tutela
dos direitos do autor como um direito fundamental.
49
2.1.1. Breve histórico
Carlos Fernando Mathias de Souza, em sua obra86, traz um sucinto relato
histórico acerca das disposições constitucionais sobre o Direito de Autor, que achamos por
bem, nos pautar nelas na explanação que haveremos de fazer. A primeira Constituição que
tratou do direito do autor, foi a Constituição Republicana de 1891, promulgada em 24.2.1891,
a primeira após a queda da Monarquia no Brasil. Trazia, em seu art. 72, §26, o seguinte texto:
Art 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: (...) §26 - Aos autores de obras literárias e artísticas é garantido o direito exclusivo de reproduzi-las pela imprensa ou por qualquer outro processo mecânico. Os herdeiros dos autores gozarão desse direito pelo tempo que a lei determina.
Na Constituição de 1934, promulgada em 16.7.1934, omitiu parte do texto
constitucional anterior, tendo disposto o art. 113, § 20, que:
Art 113 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à subsistência, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: (...) 20 - Aos autores de obras literárias e artísticas é garantido o direito exclusivo de reproduzi-las. Este direito transmitir-se-á aos seus herdeiros pelo tempo que a lei determinar.
A primeira análise que fazemos, é do porquê da omissão da expressão “pela
imprensa ou qualquer outro processo mecânico”. Se analisarmos a época em que a
Constituição entrou em vigor, o Brasil já experimentava a chamada Era de Ouro do Rádio, ou
seja, um novo meio de suporte material para criações intelectuais. O constituinte de 1934, ao
omitir qualquer especificação sobre formas de reprodução ou fixação material de obras
intelectuais, abriu um leque de opções para novas formas que estariam por ser criadas87.
86 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral, p. 113-116. 87 A título de curiosidade, ressaltamos a importância que tem o assunto. O constituinte, ao optar por termos específicos no mundo jurídico, pode criar situações controversas na vida real. Bom exemplo é o tema das imunidades tributárias, que na CF/88 aborda os “livros e o papel de imprensa”. Muito se discute entre os constitucionalistas e tributaristas, se tal imunidade estender-se-ia também aos chamados “livros virtuais”.
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A seguir, a Constituição de 1937 (outorgada em 10.11.1937), não elencava
direitos fundamentais, nem tampouco, deu ao direito de autor um tratamento privilegiado.
Porém, em seu art. 16, inciso XX, estabelecia que:
Art 16 - Compete privativamente à União o poder de legislar sobre as seguintes matérias: (...) XX - direito de autor; imprensa; direito de associação, de reunião, de ir e vir; as questões de estado civil, inclusive o registro civil e as mudanças de nome; XXI - os privilégios de invento, assim como a proteção dos modelos, marcas e outras designações de mercadorias.
Fica evidente o caráter não-democrático desta Constituição, porém, os autores
de inventos e obras intelectuais, não ficaram sem a devida proteção, pois a previsão
constitucional de competência legislativa exclusiva da União, abriu a possibilidade para que
novas leis fossem criadas, e as já existentes, fossem recepcionadas.
Finda a Era Vargas e restabelecida a democracia no país, foi promulgada uma
nova Constituição Federal em 1946 (18.09.1946), que assegurou novamente os direitos
fundamentais no escopo constitucional, inclusive, o direito do autor, em seu art. 141, § 1088:
Art 141 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: (...) § 17 - Os inventos industriais pertencem aos seus autores, aos quais a lei garantirá privilégio temporário ou, se a vulgarização convier à coletividade, concederá justo prêmio. § 18 - É assegurada a propriedade das marcas de indústria e comércio, bem como a exclusividade do uso do nome comercial. § 19 - Aos autores de obras literárias artísticas ou científicas pertence o direito exclusivo de reproduzi-las. Os herdeiros dos autores gozarão desse direito pelo tempo que a lei fixar.
Após o golpe de Estado de 1964, e o início da Ditadura Militar no Brasil,
através da EC 1ª/69, que alterou de tal maneira o texto constitucional anterior, que
praticamente se considera, de fato, uma nova Constituição. O país vivia sob a cortina-de-ferro
estendida pelos militares, e a censura era a principal arma do Governo contra seus opositores.
Sob o argumento da segurança nacional e o combate a subversão, muitos intelectuais 88 Carlos Fernando Mathias de Souza, em seu livro Direito Autoral, p. 114, equivocadamente, remete o leitor ao art. 141, § 10 da Constituição Federal de 1946. Nós, porém, em pesquisa ao texto constitucional de 46 disponível no site da Presidência da República (http://www.presidencia.gov.br), verificamos tratar-se, na verdade, do parágrafo 19 do referido artigo.
51
(escritores, atores, cantores, compositores, jornalistas, etc.) foram perseguidos, presos e
exilados. Mesmo assim, este período foi um fértil celeiro para novos talentos e criações
artísticas!
Mas, no tocante ao “status” (qualidade) de direito fundamental89, a
Constituição de 1964 manteve o direito autoral em seu art. 153, § 2590, ao dizer que:
Art 150 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) § 25 - Aos autores de obras literárias, artísticas e científicas pertence o direito exclusivo de utilizá-las. Esse direito é transmissível por herança, pelo tempo que a lei fixar.
Após o chamado processo de abertura lenta, gradual e segura promovida pelos
presidentes militares Ernesto Geisel e José Baptista Figueiredo, o movimento das Diretas Já
ganhou força e em 1985 foi eleito o primeiro presidente não-militar, Tancredo Neves, e
convocada nova Assembléia Nacional Constituinte. Em 5 de outubro de 1988, o Deputado
Federal por SP, Ulisses Guimarães, então presidente da Constituinte, promulgou a chamada
“Constituição Cidadã91”, que ainda hoje está em vigor.
Carlos Fernando Mathias de Souza, após sua exposição do histórico das
previsões constitucionais do Direito do Autor, conclui que o direito do autor não merecia
tratamento constitucional. Por ser interessante tal entendimento, transcrevemo-lo, na íntegra,
para que façamos uma análise:
A inclusão deste preceito, como dos exalados nos dois parágrafos anteriores, entre os direitos e garantias do homem, com solenidade na Constituição, como limites ao Poder Legislativo, ou Executivo, não tem razão de ser. Por serem direitos fundamentais, ou inquestionáveis? Em verdade, não é a
89 Merece aqui, transcrição da obra de Luis Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Junior (in Curso de Direito Constitucional p. 77): “O governo revolucionário queria um novo Texto Constitucional. A teoria da segurança nacional dominou o documento de 1967. O poder foi centralizado, com a redução das competências estaduais e municipais. O Poder Legislativo e o Judiciário também tiveram suas competências diminuídas. Quanto aos direitos individuais, sofreram duro golpe, pois havia a possibilidade de suspensão dos direitos políticos de forma exagerada”. 90 Mais uma vez, Mathias de Souza se equivoca ao referir-se ao art. 153, ao invés do art. 150. 91 A Constituição Federal de 1988 é chamada de “Constituição Cidadã”, pelo fato de ter sido a primeira
constituição promulgada no regime democrático, subseqüente à longa ditadura militar. Foi através dela que muitos direitos fundamentais foram restaurados (entre eles, o da liberdade de imprensa, expressão, associação para quais fins pacíficos e não-ilegais, etc.), após terem sido banidos durante a ditadura.
52
importância, a essenciabilidade, a imprescindibilidade de um direito que o lhe constitui a natureza constitucional. Muito menos passa a constitucional um direito só porque o legislador o meteu (sic) entre os preceitos constitucionais. Está no bom caminho a lição do art. 178 da Constituição Imperial; é só constitucional o que diz respeito aos limites e atribuições respectivas dos poderes políticos e aos direitos políticos e individuais dos cidadãos. ‘Em rigor, considerando que as Constituições devem ser síntese que durem, a bíblia política de um povo, nem todo direito individual é de preceito que figure na Constituição, senão apenas aqueles cujo exercício suscite abusos do poder, como a liberdade de imprensa, o direito de propriedade, a igualdade perante a lei. São direitos que limitam a competência ordinária dos poderes legislativos e executivos, em defesa dos direitos do homem. Ora, o direito de autor à reprodução de suas obras literárias, artísticas ou científicas, não sendo liberdade de imprensa, não é direito cujo exercício ponha em perigo a estabilidade, a tranqüilidade dos governos, excitando-os a reações ou abusos de poder. Salvo a hipótese longínqua de pôr um livro, uma estátua, uma ópera em perigo a estabilidade de um regime. Ou talvez a limitação da herança, restrição da propriedade (in Direito Constitucional – volume 4° - Comentários à Constituição de 1946, Max Limonad, 1960, p. 649/650)’ 92.
Data venia, discordamos da posição do ilustre professor Mathias de Souza e,
por conseguinte, do mestre Sampaio Dória, por ele citado. E para defendermos a motivação
do Constituinte de 1946, bem como o de 1988, devemos recorrer a História do Brasil: ambas
Constituições foram forjadas no fogo do desejo de democracia, foram, pois, constituintes que
se formaram após longos governos ditatoriais (Era Vargas 1930-1945; Ditadura Militar 1964-
1984).
Em uma ditadura, não há limites para a ação dos que estão no Poder: eles agem
a todo e qualquer custo. Muitas vezes, vimos no decorrer da história, que uma música ou um
jornal, conseguiram mobilizar toda uma massa de pessoas contra os desmandos do Poder.
Nada mais natural que a censura prévia como forma de evitar tais situações. E o que é a
censura prévia, senão, uma limitação do poder criativo do espírito humano? Certamente,
motivados por esse espírito é que o constituinte meteu (sic) os direitos autorais dentre os
direitos fundamentais constitucionais.
92 Carlos Fernando Mathias de Souza, Op. Cit., p. 115.
53
2.1.2. As garantias na Constituição Federal de 1988
A Constituição Federal de 1988 traz em seu texto, vários artigos que
configuram tutela dos direitos autorais. Vejamos quais são, cada um, explicando sob o ponto
de vista do direito constitucional a motivação da tutela constitucional do direito do autor:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar; XXVIII - são assegurados, nos termos da lei: a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas; b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas.
Antes de tudo, cabe analisarmos o que são direitos fundamentais para entender
o porquê do direito autoral figurar entre tais direitos. Na lição de David Araújo, “os direitos
fundamentais podem ser conceituados como a categoria jurídica instituída com a finalidade
de proteger a dignidade humana em todas as dimensões93”. Observa ainda David Araújo que
os direitos fundamentais possuem natureza multifacética94, pois busca resguardar o homem na
sua liberdade (por isso, os direitos individuais), nas suas necessidades (daí os direitos sociais,
econômicos e culturais) e na sua preservação (portanto, a garantia à fraternidade e
solidariedade). É uma categoria jurídica “sui generis”, e possui características próprias:
historicidade, universalidade, limitabilidade, concorrência e irrenunciabilidade.
Vejamos agora, como o Direito Autoral possui todas as características acima
descritas. Possui o direito autoral historicidade? Sim, pois demonstramos no capítulo anterior,
que o direito autoral é fruto de uma evolução, de teorias e leis aperfeiçoadas com o passar do
tempo, sempre atento às novas tecnologias que possibilitaram o desenvolvimento da
humanidade.
93 Luis Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Junior , Curso de Direito Constitucional, p. 81. 94 Op. cit., p. 82
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É o direito autoral universal? Sem sombras de dúvida, diríamos. O direito
autoral não faz qualquer distinção entre sexo, cor, raça, credo, condição social. A criatividade
do homem é livre de quaisquer amarras, e é exercido por qualquer pessoa. Vimos que o gozo
do direito de autor independe até mesmo de capacidade civil.
O direito autoral é limitado? Assim como os demais direitos fundamentais e
princípios constitucionais, o direito autoral está em condição de paridade em relação a outros
direitos e princípios. Não obstante, parece às vezes, chocar-se com algum deles. Exemplo
disso é o direito de criação intelectual e o direito de liberdade de pensamento. Eles se
complementam, mas por vezes, se opõem. Na nossa Constituição é vetada qualquer espécie de
discriminação, e logo, poderíamos dizer que mesmo sob o manto da liberdade de criação e
pensamento, ninguém de pode criar uma obra intelectual que tenha cunho racista, por
exemplo. Outra situação que pode, aparentemente, configurar um conflito de normas: a
vedação do anonimato na expressão do pensamento (art. 5°, IV)95 e o direito de pseudônimo
do autor.
Há concorrência do direito autoral com outros direitos? Um direito do autor
pode ser acumulado com outros direitos fundamentais existentes, ou até mesmo, outros
direitos autorais. É o caso, por exemplo, do direito à honra e o direito de retirada de obra pelo
autor. Ele cumula esses dois direitos, sem ter que renunciar a qualquer deles pra poder exercer
o outro. Assim, caso um escritor tenha feito sua autobiografia, e depois se arrependa de ter
revelado detalhes de sua vida íntima, pode retirar a obra de circulação.
Se, o direito autoral é, pois, concorrente com outros direitos, concluímos
também que ele é irrenunciável. Mais adiante, ao explicarmos os direitos pessoais ou morais
do autor sobre a sua criação, veremos que eles são inerentes à personalidade do criador. Não é
possível “arrancá-los” dele, separá-los da sua personalidade; por isso, são irrenunciáveis. Mas
o fato de serem irrenunciáveis, não significa que não possam ser cedidos. Vimos,
anteriormente que é possível a titularidade derivada dos direitos autorais por cessão ou
concessão de direitos. Ademais, ao tratarmos dos direitos morais e patrimoniais do autor,
explicaremos de forma abrangente quais são e como se operam.
95 Constituição Federal de 1988: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”.
55
2.1.3. A recepção de convenções internacionais
Este adendo é necessário, pois, precisamos explicar a Convenção de Berna e
outras tantas que, invariavelmente, foram introduzidas no ordenamento jurídico pátrio e que
influenciaram de forma substancial, as leis que regulamentam o direito autoral no Brasil.
Já vimos que, em meados do século XIX, começaram a surgir as primeiras leis
que tratavam dos direitos do autor. Apesar dessa verdadeira multiplicaram-se de legislações
nacionais sobre o tema, a grande maioria delas só protegia o autor nacional, mas nem todas o
autor estrangeiro domiciliado no país. Havia, porém, alguns países que adotaram leis
protecionistas aplicáveis às obras estrangeiras, mas tais leis dependiam, em muito, da
celebração de tratados bilaterais ou multilaterais por diferentes países.
O primeiro tratado bilateral que se tem notícia foi o tratado de comércio
franco-sardo, de 1843, que garantia o direito patrimonial dos autores. Mesmo havendo uma
variedade enorme de acordos bilaterais, assistia-se em alguns deles, o verdadeiro
favorecimento da nação mais poderosa, gerando dificuldades para se aplicar tais normas. Essa
dificuldade de se definir os contornos da proteção apropriada ao direito do autor, foi o que
gerou o desejo e a necessidade de se buscar uma uniformização, um único tratado96 de
natureza multilateral, que realmente regulamentasse de forma internacional o direito autoral, e
que possuísse um caráter universal e de equidade entre os signatários. A primeira tentativa
nesse sentido foi capitaneada pelos países europeus, que resultou na Convenção de Berna, que
instituiu em 1886 a “União Internacional para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas”,
mais conhecida como “União de Berna”.
96 Cabe salientar alguns conceitos de Direito Internacional Público. “Tratado é todo acordo formal concluído
entre pessoas jurídicas de direito internacional público, e destinado a produzir efeitos jurídicos. (...) A análise da experiência convencional brasileira ilustra, quase que à exaustão, as variantes terminológicas de tratado concebidas em português: acordo, ajuste, arranjo, ata, ato, carta, código, compromisso, constituição, contrato, convenção, convênio, declaração, estatuto, memorando, pacto, protocolo e regulamento” (Francisco Rezek, Direito Internacional público, p. 14; 16). Continua Rezek explicando que “(...) é possível detectar duas fases de expressão de consentimento das partes, este entendido como prenunciativo na primeira, a da assinatura, e como definitivo na segunda, a da ratificação...” (p. 25). A assinatura de um tratado é feita pelo Chefe de Estado (o Chefe do Executivo), quem possui legitimidade para representar o Estado no âmbito internacional (o Legislativo é Poder Interno). Quanto ao número de assinantes, pode-se ter um tratado bilateral (apenas dois) ou multilateral (vários consignatários). Por fim, o tratado começa a vigorar a partir de sua assinatura, salvo se, as partes convencionarem expressamente condições para vigência – como tempo ou referendo pelo legislativo. O texto do tratado é eterno, porém, pode ser revisado a qualquer instante pelos consignatários, porém, necessitará de novo procedimento (assinatura e ratificação) de aceitação por parte dos estados-membros.
56
A Convenção de Berna97 protegia as obras literárias e artísticas, e foi
promulgada em 9.9.1886, tendo entrado em vigor em 5.12.1887. Ela foi posteriormente
modificada e atualizada através da Ata adicional de Paris, em 4.5.1896, começando a vigorar
a partir de 9.12.1897. Posteriormente, em 13.11.1908 foi aprovada a Revisão de Berlim,
vigorando a partir de 9.9.1910, até a assinatura do Protocolo adicional de Berna, em
20.3.1914, com vigor a partir de 20.4.1915. Ainda houve duas revisões: a Revisão de Roma,
em 2.6.1923, com início de vigor em 1.8.1931 e a Revisão de Bruxelas, de 26.6.1948, com
vigor a partir de 1.8.1951.
Somente após todas essas alterações é que o Brasil a introduziu no
ordenamento jurídico pátrio, através do Decreto n° 34.954, de 18.1.1954. Após seu vigor em
território nacional, a Convenção de Berna sofreu nova alteração: trata-se da Revisão de
Estocolmo, aprovada em 14.6.1967 que, porém, não chegou a entrar em vigor as alterações
legais, mas tão somente, as administrativas. Ocorre que, somente na Revisão de Paris, em
24.7.1971, é que tais alterações foram novamente estudadas e aprovadas. Outras duas
convenções internacionais merecem ser citadas, pela sua importância ao tratar do tema: a
Convenção de Paris e a Convenção de Washington.
A Convenção Universal sobre o Direito de Autor, foi uma revisão completa da
Convenção de Berna, que conforme dissemos, aprovada em 24.7.1971 e com seu vigor a
partir de 10.10.1974. Trata-se na verdade, de um verdadeiro substitutivo à antiga Convenção
de Berna, e foi introduzida no sistema jurídico brasileiro a partir do Decreto Legislativo n° 55
de 28.7.1975, e ratificada pelo Brasil no mesmo ato. Já a Convenção Interamericana sobre os
Direitos de Autor em Obras Literárias, Científicas e Artísticas foi assinada em 22.6.1946 em
Washington-EUA, por ocasião da Conferência Interamericana de Peritos para a proteção do
direito de autor. Foi aprovada pelo Brasil através do Decreto Legislativo n° 12 de 22.06.1948,
posteriormente ratificada em 12.3.1949 e promulgada pelo Decreto n° 26.675 de 18.4.1949.
Ocorre que, além dos direitos autorais propriamente ditos, terem sido objeto de
regulamentação por tais tratados, há uma outra espécie de direitos que por ficção legal, se
assemelham aos direitos autorais: os chamados direitos conexos. Duas convenções
97 O texto atual da “Convenção de Berna” com as atualizações e modificações aludidas neste parágrafo, encontra-se no Anexo 2.
57
internacionais se destacam em matéria de direitos conexos: a Convenção de Roma e a
Convenção de Genebra.
A Convenção de Roma assinada em 26.10.1961, trata da proteção aos artistas
intérpretes ou executantes, aos produtores de fonogramas e aos organismos de radiodifusão,
entrou em vigor no Brasil a partir do Decreto Legislativo n° 26/64. Ratificada em 10.6.1965, e
a ratificação depositada junto à ONU em 29.6.1965, entrou em vigor nesta mesma data no
Brasil, sendo posteriormente promulgada pelo Decreto 57.125 de 19.10.1965.
Já a Convenção de Genebra trata da proteção de produtores de fonogramas
contra a reprodução não autorizada de seus fonogramas, foi concluída em 29.10.1971, tendo
sido aprovada pelo Decreto Legislativo n° 59 de 30.6.1975 e entrado em vigor no Brasil a
partir de 28.11.1975, com a posterior promulgação pelo Decreto 76.906 de 24.12.1975.
2.2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS LEIS ORDINÁRIAS AUTORAIS
No histórico do direito autoral do Brasil já falamos da evolução legislativa
desta matéria ao longo dos anos. Muitas normas foram criadas no ordenamento pátrio,
algumas por lei, outras introduzidas através de tratados e convenções internacionais, mas
somente algumas delas possuem uma forte significância, seja pela inovação que trouxe à
época, seja pelo caráter universal com que tratou o assunto.
José Carlos Costa Netto98 traz em sua obra uma breve – mas riquíssima –
descrição da evolução histórica das leis sobre direitos autorais editadas no Brasil, no qual nos
baseamos para fazer este breve intróito, antes de esmiuçarmos cada uma daquelas leis que
julgamos mais significantes.
A seguir, trazemos tabelas ilustrativas, contendo a evolução cronológica de
algumas das leis e decretos legislativos editados no Brasil sobre o tema dos direitos autorais
ou conexos:
98 José Carlos Costa Netto, O Direito Autoral no Brasil, p. 38-45.
58
Tabela 1: Tabela cronológica de legislação autoral no Brasil, do período referente à 1889-1793
Diploma Legal Descrição
Declaração entre Brasil e Portugal de 9.9.1889
onde previa a igualdade de tratamento entre autores portugueses e brasileiros entre as duas nações;
Decreto 10.353 de 14.9.1889 autoriza o início das negociações entra Brasil e Portugal sobre a propriedade de obras literárias e artísticas
Decretos 2.393 de 31.12.1910 e 9.190 de 6.12.1911
o primeiro aprova e o segundo promulga a Convenção do Rio de Janeiro de 23.8.1906, relativa a marcas e patentes de invenções, desenhos e modelos industriais, bem como o comércio de propriedade intelectual
Lei 2.577 de 17.1.1912 estende as disposições da antiga Lei Medeiros de Albuquerque (Lei 496 de 1.8.1889, exceto o art. 13) a todas obras científicas, literárias e artísticas produzidas no estrangeiro em países signatários de convenções internacionais ou tratados com o Brasil
Lei 2.738 de 4.1.1913 em seu artigo 25 autoriza o Governo brasileiro a aderir à Convenção Internacional de Berlim
Decretos 2.881 de 9.11.1914 e 11.588 de 19.5.1915
o primeiro aprova e o segundo promulga as resoluções e convenções assinadas pelos delegados brasileiros na IV Conferência Internacional Americana, em Buenos Aires, em 1910
Lei n° 3.071 de 1.1.1916 (Código Civil de 1916)
veremos a seguir, com maiores detalhes, o que esta lei trouxe de inovações na matéria do direito autoral;
Decreto 47.900 de 2.1.1924 define os direitos autorais e dá outras providências Decreto 5.492 de 16.7.1928 (Lei Getúlio Vargas)
regulamenta o mercado de diversão e locação de serviços teatrais
Decreto 18.527 de 10.12.1932 garantia a execução dos serviços de radiocomunicação no Brasil, previamente autorizados pelo Decreto-Lei 20.047 de 27.5.1931
Decreto Lei 2.848 de 7.2.1940 (Código Penal)
veremos com maiores detalhes, mais adiante, a tutela penal do Direito Autoral
Decreto 20.943 de 24.1.1946 aprovava o Regulamento do Serviço de Censura e Diversões Públicas do Departamento Federal de Segurança Pública; o seu artigo 133 revoga parcialmente o Decreto 5.942/28 (Lei Getúlio Vargas), sendo posteriormente ampliado durante a ditadura militar, através do Decreto 1.023 de 17.5.1962
Lei 2.415 de 9.2.1955 regulamenta as outorgas de licença autoral para realização de representação e execuções públicas, ou através de transmissão radiofônica ou televisiva, estabelecendo que o autor é titular originário do direito de conceder tais licenças, podendo exercê-lo pessoalmente ou através de associações de defesa de direitos de autores
Decreto 1.023 de 17.5.1967 que estende aos estados e territórios a proteção e fiscalização do direito autoral, que era somente realizado pelo Distrito Federal, dada a redação limitada do Decreto 18.527/2899
Lei 4.944 de 6.5.1966 dispunha sobre a proteção a artistas, produtores de fonogramas e empresas de radiodifusão
Decreto-Lei 980 de 20.10.1969 estabelecia a cobrança de direitos autorais na exibição de filmes cinematográficos
Lei 5.988 de 14.12.1973 foi a primeira Lei dos Direitos Autorais, e será estudada com maior atenção, mais adiante
Mesmo após a Lei 5.988/73, a matéria do direito autoral não ficou assentada
neste único diploma legal: várias outras leis foram editadas, visando regulamentar pontos
99 José Carlos Costa Netto, no tocante ao ano de edição do Decreto 18.527, parece contradizer-se: na alínea “c”, (p. 39, op. cit), ele afirma ter sido editado o Decreto em 10.12.1932; porém, mais adiante, na alínea “h” (p. 40, op. cit), ele afirma que o mesmo Decreto foi editado em 10.12.1928. Efetuamos pesquisas, mas não encontramos o texto legal do referido Decreto; porém, acreditamos ter sido o mesmo “editado em 1928”, porém, começou a vigorar com eficácia plena em 1932.
59
específicos, não devidamente esgotadas pelos dispositivos da referida lei. Continuemos a
enumeração da evolução legislativa sobre a matéria autoral no Brasil:
Tabela 2: Tabela cronológica de legislação autoral no Brasil, do período referente à 1978-1998
Diploma Legal Descrição
Lei 6.533 de 24.5.1978 trouxe duas inovações para o direito autoral brasileiro, sendo a primeira o reconhecimento das profissões de Artista e de Técnico em Espetáculos, e a segunda, a proibição expressa de cessão ou promessa de cessão de direitos conexos decorrentes da prestação de serviços profissionais, cujo seu art. 13 foi julgado constitucional em decisão do STF de 10.12.1980, em ação declaratória de inconstitucionalidade
Lei 6.800 de 25.6.1980 promoveu alterações nos artigos 83 e 117 da Lei 5.988/73, no tocante a utilização de fonogramas e fiscalização da reprodução e venda dos suportes físicos deles
Lei 6.895 de 17.12.1980 alterou dispositivos do Código Penal, que estudaremos com maior profundidade no estudo da tutela penal do direito autoral
Lei 7.123 de 12.9.1983 revogou o art. 93 da LDA/73 (Lei 5.988/73), abolindo o sistema de domínio público remunerado, que consistia na utilização comercial de obras intelectuais caídas em domínio público, cuja renda era revertida para o Fundo do Direito Autoral
Lei 7.646 de 18.12.1987 foi a primeira lei a tratar da propriedade intelectual de programas de computadores, posteriormente revogada pela Lei 9.609 de 19/2/98, ou chamada, Lei do Software
Lei 8.028 de 12.4.1990 extingue o Ministério da Cultura (art. 27, V), e todos os seus órgãos subordinados, inclusive o Conselho Nacional de Direito Autoral100 (criado pela LDA/73), criando uma nova Secretaria Nacional de Cultura (art. 10)
Lei 8.635 de 16.3.1993 alterou dispositivos do Código Penal anteriormente inseridos pela Lei 6.895/80
Lei 9.045 de 18.5.1995 estabelece a isenção de cobrança de direitos autorais por editoras cujo livros tenham sido reproduzidos em Braille, desde que os autores tenham dado prévia autorização para reprodução aos centros especializados de reprodução em método braille
Leis 9.609 e 9.610, ambas de 19.2.1998
respectivamente, as novas Lei do Software e Lei dos Direitos Autorais e Conexos
Após as Leis 9.609 e 9.610, ambas de 1998, foram editados os Decretos de n°
2.894/98, posteriormente revogado pelo de n° 4.533/2002, que regulamentam especificamente
o art. 113101 da Lei n° 9610/98.
100 Apesar de Costa Netto afirmar que o Conselho Nacional foi desativado por causa da extinção do Ministério da Cultura, em pesquisas efetuadas na Internet aos textos da Lei 8.028/90, verificamos que o parágrafo único do Art. 10 foi expressamente vetado pelo Presidente. A norma legal do referido parágrafo trazia o seguinte texto: "O Conselho Nacional de Política Cultural deliberará sobre as diretrizes da política cultural e absorverá as competências dos Conselho Nacional de Cinema, Conselho Nacional de Direito Autoral, Conselho Federal de Cultura e Conselho Consultivo do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional". A seguir, a razão do veto: "Essas disposições não se coadunam com a sistemática do próprio texto legal, no que diz respeito à atribuição de competência e à composição da estrutura básica dos órgãos da administração federal. Por isso contrariam o interesse público". (fonte: http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/ Leis/Mensagem_Veto/anterior_98/vep369-90.htm). 101 Lei n° 9.610 de 19.2.1998: “Art. 113: Os fonogramas, os livros e as obras audiovisuais sujeitar-se-ão a selos ou sinais de identificação sob a responsabilidade do produtor, distribuidor ou importador, sem ônus para o consumidor, com o fim de atestar o cumprimento das normas legais vigentes, conforme dispuser o regulamento”.
60
2.2.1. O Código Civil de 1916
Apesar da inclusão do direito autoral como propriedade intelectual no Código
Civil de 1916, ter representado um verdadeiro avanço na época, no tocante aos direitos dos
autores, posteriormente, muitos doutrinadores civilistas entendiam o legislador ter se
equivocado ao incluí-los no rol do direito das coisas. Não pretendemos nos delongar neste
debate, até porque, já falamos sobre isso no capítulo anterior, quando estudamos as teorias do
direito autoral. Por hora, achamos interessante transcrever um pequeno trecho da obra do
saudoso e ilustre Professor Washington de Barros Monteiro:
Censura-se o legislador pátrio por haver incluído no direito das coisas a propriedade literária, científica e artística. (...) Mantemos, porém, o que se disse anteriormente. Nosso direito das coisas ateve-se ao modelo clássico. Mostrou-se contraditório consigo mesmo, ao disciplinar a propriedade literária, científica e artística, de natureza incorpórea e imaterial. (...) Explicou o Prof. ORLANDO GOMES que a complexidade da regulamentação desses direitos indicava a conveniência de submetê-los ao regime normativo de leis especiais102.
Tivemos esta preocupação de consultar uma fonte de referência bibliográfica,
de um autor que viveu à época da plena vigência e eficácia do Antigo Código Civil e da
Antiga Lei de Direitos Autorais, para podermos entender a verdadeira preocupação que
tinham os estudiosos do tema. Mas é inegável afirmar alguns benefícios e avanços que o
Código Civil de 1916 trouxe para a seara do direito autoral.O artigo 48 do Código de 1916103
definia o direito autoral como um bem móvel. Trata-se de uma ficção jurídica para poder
justificar a sua inclusão como espécie de propriedade e passível de obrigações. As disposições
sobre Direito Autoral estavam basicamente concentradas em dois pontos104:
a) Parte Especial; Livro II – Do Direito das Coisas; Título II – Da Propriedade; Capítulo VI
– Da Propriedade Literária, Científica e Artística, Artigos 649 a 673105;
b) Parte Especial; Livro III – Do Direito das Obrigações; Título V – Das Várias Espécies de
Contratos; Capítulo IX – Da Edição, Artigos 1346 a 1358; Capítulo X – Da Representação
Dramática, Artigos 1359 a 1362; 102 Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil – Direito das coisas, p. 230-232. 103 Lei n° 3.071, de 1.1.1916: “Art. 48. Consideram-se móveis para os efeitos legais: (...) III - os direitos de autor.” 104 Teotônio Negrão (org), et al, Código Civil e legislação civil em vigor. 105 Os artigos do Código Civil de 1916 aos quais nos referimos neste momento, estão transcritos no Anexo 7.
61
Outra inovação importante do Código Civil de 1916 foi a fixação no artigo
178, parágrafo 10, inciso VII106, do tempo de cinco anos para prescrição do direito de ação
civil por ofensa a danos morais, contados a partir da data da contrafação. Como vimos na
introdução deste tópico, muitas leis se seguiram até a elaboração da Lei de Direitos Autorais
de 1973. Porém, o legislador do Código de 1916 foi muito feliz na redação das normas sobre
o direito autoral, tanto que, muitas delas foram transcritas na posterior LDA/73.
3.2.2. A Lei n° 5.988 de 14.12.1973
O panorama em que a Lei dos Direitos Autorais foi criada era interessante e
complexo. Mais uma vez, recorremos a lição do professor José Carlos Costa Netto, que traça
com singular lucidez, um olhar histórico sobre o panorama nacional e o contexto em que a
nova lei foi cunhada:
Nessa altura, às vésperas da década de 70, já estavam adiantados os estudos de planificação da lei que reuniria os principais mandamentos relacionados aos direitos autorais. No contexto reinante, de múltiplas leis e decretos regulamentadores da matéria, inclusive aqueles relativos à promulgação de convenções internacionais compatíveis com a legislação interna brasileira, e em face das conflituosas relações jurídicas desencadeadas com a afirmação desordenada dos direitos autorais, surgiu a idéia originária e ambiciosa de elaborar um verdadeiro Código de Direito de Autor e Direitos Conexos107.
Costa Netto continua descrevendo todo o processo de elaboração da lei e dos
desencontros, não poupando qualquer detalhe sobre o procedimento legislativo, motivo pelo
qual julgamos oportuno recorrermos às suas lições, buscando, porém, sintetizá-las ao máximo.
Num primeiro momento, o Ministro da Justiça Mem de Sá, designou o Desembargador Milton
Sebastião Barbosa para elaboração do Anteprojeto do Código de Direito do Autor e Direitos
Conexos, que foi publicado em 16.6.1967 no Diário Oficial da União, contendo 351 artigos
divididos em 16 títulos;
Já num segundo instante, o novo Ministro da Justiça Luiz Antonio da Gama e
Silva, nomeou uma comissão para revisão do Anteprojeto, tendo como presidente da 106 Lei n° 3.071, de 1.1.1916 “Art. 178. Prescreve: (...) § 10 - Em 5 (cinco) anos: (...)VII - A ação civil por ofensa a direitos de autor; contado o prazo da data da contrafação”. 107 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 40-41.
62
comissão o ministro do STF, Dr. Cândido da Mota Filho; que diante das inúmeras
divergências entre os membros, apresentou um substitutivo de 98 artigos ao Anteprojeto do
Código – rejeitado pela maioria dos membros da comissão, simpatizantes ao projeto do
Desembargador. Barbosa e do ilustre Antonio Chaves, que reunia em 198 artigos o que havia
de mais moderno nas legislações sobre direito autoral no mundo.
E por fim, o projeto Barbosa-Chaves também não vingou, motivo pelo qual o
Governo, convocou com urgência, o então Procurador Geral da República, o atual Ministro do
STF, José Carlos Moreira Alves, para solucionar o impasse; Alves apresentou um substitutivo
– de Código para de uma Lei –, que foi aprovado, dando origem à então LDA/73 com 134
artigos – e com poucas alterações, apesar das mais de 233 emendas apresentadas ao projeto de
Moreira Alves, que não foram apreciadas por decurso do prazo de 10 dias para conclusão do
projeto. E foi então que aquilo que era para ser um verdadeiro Código dos Direitos Autorais e
Conexos, foi reduzido a uma simples Lei. Mas mesmo assim, a Lei 5.988/73 trouxe
significativas inovações para a matéria do direito autoral, ficando os artigos dispostos em 9
(nove) títulos, a saber108:
I – Disposições preliminares: art. 1° à art. 5°, destacando-se o art 4°, que
define alguns termos técnicos que a lei utiliza, como por exemplo, a diferença entre
publicação, transmissão, retransmissão, reprodução e contrafação; a diferença entre
fonograma e videofonograma; as diversas modalidades de obra, além da diferença entre
produtor e editor, e quais ofícios se encaixam no conceito de artista;
II – Das Obras Intelectuais: art. 6° ao art. 20, dividido entre três capítulos – Das
obras intelectuais protegidas, Da autoria das obras intelectuais e Do registro das obras
intelectuais – com destaque para os art. 6° que traz um rol exemplificativo das obras
intelectuais protegidas pela lei, e do art. 17, que trata da forma do registro público das obras;
III – Dos Direitos do Autor: subdividido em 5 (cinco) capítulos: Disposições
preliminares (art. 21 a 24); Dos direitos morais do autor (art. 25 ao 28); Dos direitos
patrimoniais do autor e sua duração (art. 29 48); Das limitações ao Direito do Autor (art. 49
108 Todos os artigos citados neste momento, são apenas para ilustrar os intervalos dos Títulos da Lei n° 9.610/98, que encontra-se reproduzida na íntegra no Anexo 4.
63
ao 51); e Da cessão dos direitos do autor (art. 52 a 56) – trata-se do núcleo central da Lei, pois
estabelece os direitos do autor em seus dois aspectos: pessoal e patrimonial;
IV – Da Utilização das Obras Intelectuais: subdividido em 8 (oito) capítulos:
art. 57 ao 72 (Da edição), art. 73 ao 79 (Da representação e execução), art. 80 ao 81 (Da
utilização da obra de arte plástica), art. 82 (Da utilização de obra fotográfica), art. 83 (Da
utilização de fonograma), art. 84 ao 91 (Da utilização de obra cinematográfica), art 92 (Da
utilização da obra publicada em diários ou periódicos) e art. 93 (Da utilização de obras
pertencentes ao domínio público);
V – Dos Direitos Conexos: subdivididos em 5 (cinco) capítulos: Disposição
preliminar (art. 94); Dos direitos de artistas intérpretes ou executantes, e dos produtores de
fonogramas (art. 95 ao 98); Dos direitos das empresas de radiodifusão (art. 99); Do direito de
arena” (arts. 100 e 101); e Da duração dos direitos conexos (art. 102);
VI – Das Associações de Titulares de Direitos de Autor: art. 103 ao art. 115;
VII – Do Conselho Nacional de Direito Autoral: art. 116 ao art. 120;
importante inovação trazida pela Lei, além da criação do Fundo do Direito Autoral;
VIII – Das Sanções e Violações dos Direitos de Autor: art. 121 (Disposição
preliminar), art. 122 ao 130 (Das sanções civis e administrativas) e art. 131 (Da prescrição);
IX – Disposições finais e transitórias: art. 132 a 134;
A Lei 5.988/73 revogou os artigos 649 a 675 e 1.346 a 1.362 do Código Civil
de 1916109, que disciplinavam a matéria da Propriedade Imaterial, porém, Mathias de Souza
afirma que “há entendimento, no sentido de que o art. 131 da Lei 5.988/73 não teria
revogado, propriamente, o art. 178, § 10, VII do Código Civil110”, que por seu turno,
expressamente dizia: “Art. 178: Prescreve: (...) §5° - Em 5 (cinco) anos: (...) VII - A ação
civil por ofensa a direitos de autor; contado o prazo da data da contrafação”.
109 Estes artigos estão transcritos no Anexo 7. 110 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral, p. 105.
64
O art. 134 da Lei 5.988/73 trouxe grandes discussões acerca de sua redação:
“Esta lei entrará em vigor a 1° de janeiro de 1974, ressalvada a legislação especial que com
ela for compatível”. Carlos Fernando Mathias de Souza, trata de forma detalhada as
divergências de interpretação dos doutrinadores da época:
Desde logo estabeleceram-se algumas discussões, para saber-se qual o sentido preciso de legislação especial, ali empregados. Alguns autores continuaram a recorrer a preceitos do Código Civil, havendo mesmo quem, de início, sustentasse que o Código Civil não estaria totalmente revogado, no referente aos direitos de autor. A propósito comentou o Professor José de Oliveira Ascensão: ‘Temos assim que o aparecimento da nova lei não vai suprimir a dispersão de diplomas em matéria de direito de autor, persistindo problemas complexos de busca da legislação vigente, e agora também da sua compatibilidade com a nova lei. Para alem disso há ainda o tema mais substancial do que deve ser considerado legislação especial. Terá de ser examinado caso por caso, consoante as dúvidas que se possam suscitar’111.
A raiz de toda a discussão estava num fato: se a nova Lei de 1973 revogava por
completo as disposições do Código Civil de 1916, estas continuariam valendo, porém, em
caráter subsidiário, sendo somente aplicadas naquilo em que a nova Lei 5.988 silenciasse?
Carlos Fernando Mathias de Souza, continua seu pensamento:
Mas há um problema geral que tem o seu lugar aqui: respeita à subsistência das disposições do Código Civil que continham primeiro a disciplina geral do direito do autor. Estarão estas disposições revogadas? Ou pelo contrário deverão, considerar-se ‘legislação especial’, estando por isso em vigor na medida em que não forem contrariadas pelas novas regras? Será esta posição que justificará uma tendência, que notamos de vários lados, de continuar a recorrer aos preceitos do Código Civil ara a exposição da matéria. Não cremos, porém, que semelhante orientação possa ser acolhida. É verdade que o caráter geral ou especial de uma regra não se determina pelo diploma em que está inserida, mas pelo seu próprio conteúdo. Mas o art. 134 não fala em lei especial, fala em legislação especial, portanto atende aos diplomas e não às regras em si. E ao contrapor à legislação geral quer sem dúvida contrapor a legislação especial à legislação geral, quer sem dúvida contrapor a legislação extravagante à legislação codificada em matéria de direito de autor – portanto, à legislação do Código Civil. Esta foi, nos termos comuns, objeto de uma revogação global – a que resulta de toda a sua matéria te passado a ser regulada por uma nova lei. Não há assim que indagar, em relação a disposições singulares do Código Civil, se elas se mantém em vigor: todos os preceitos foram unitariamente revogados. Só leis extravagantes que não foram objetos de revogação expressa ou tácita subsistem ainda (in Direito Autoral, Forense, Rio, 1980, p. 5/6)112.
111 Carlos Fernando Mathias de Souza, Op. cit., p. 105. 112 Idem,, p. 106-107.
65
Portanto, a conclusão que se chega é que a Lei 5.988/73 revogou
completamente as disposições do antigo Código de 1916, mas recepcionou outras legislações
extravagantes de direito autoral, como por exemplo, as Leis n° 6.533/78 (que regulamenta a
profissão dos artistas) e 6.615/78 (que regulamenta a profissão dos radialistas).
Importante ressaltar as alterações trazidas pela Lei n° 6.800/80, que deu nova
redação ao art. 83 (que regulamenta a utilização de fonograma) e acrescentou os incisos IX, X
e XI ao art. 117, acrescenta novas atribuições ao extinto Conselho Nacional de Direito
Autoral, inovação trazida pela Lei 5.988/73. Henrique Gandelman destaca os artigos mais
importantes, em seu ponto de vista, da Lei 5.988/73:
a – Artigo 1°, §1° – Neste artigo expresso que o estrangeiros domiciliados no exterior gozarão da proteção dos tratados e convenções internacionais ratificadas pelo Brasil, concluindo-se que, por força do princípio da reciprocidade, os titulares de direitos autorais de obras cinematográficas brasileiras e estrangeiras têm suas obras protegidas respectivamente nos territórios onde as mesmas são utilizadas, e cujos países tenham aderido às convenções referidas. (...) No Brasil, portanto, e em se tratando da LDA/73 de lei nacional, os tribunais de Justiça estaduais são os competentes para julgar as respectivas ações civis, já existindo, a este respeito, farta e definitiva jurisprudência: Compete à justiça dos Estados julgar ação em que são pleiteados direitos autorais, constantes da legislação interna, ainda que oriunda de tratados internacionais. (5ª Câmara Cível do TJRJ, Agravo de Instrumento n° 5.720, decisão unânime, D.O. de 20/09/1982, fls 106-110) 113”.
A observação feita por Henrique Gandelman ao comentar este dispositivo da
Lei de 1973 é extensa, e se justifica pela grande discussão naquela época: haveria, portanto,
sobrevalência de tratados internacionais sobre disposições da lei nacional que regulava a
matéria de direito autoral? Caso houvesse, neste caso, a justiça competente seria a Justiça
Federal? Gandelman demonstra que não, afirmando ser as justiças estaduais competentes para
julgar ações de direitos autorais. Ele destaca ainda outros artigos importantes da Lei 5.988:
b – Artigo 4°, VIII — Este artigo define e, portanto, protege o videofonograma (videocassete gravado); c – Artigo 4°, X, a e b — Caracterização do produtor de videofonogramas e cinematográfico; d – Artigo 6°, VI — As obras cinematográficas e análogas são obras intelectuais expressamente protegidas;
113 Henrique Gandelman, De Gutenberg à Internet, p. 92-94.
66
e – Artigo 15 — O reconhecimento da pessoa jurídica (empresa) como titular de autoria114”.
Pertinente o destaque do art. 15, pois já vimos no estudo das obras coletivas,
que uma pessoa jurídica pode ser titular de direitos autorais, numa exceção ao princípio de
que autor somente é pessoa física. Continua Gandelman:
f – Artigo 29 — A exclusividade do titular para poder utilizar, fruir e dispor de sua obra, bem como autorizar terceiros a fazê-lo. g – Artigo 30, IV, d — A autorização prévia e expressa do titular é sempre necessária para qualquer forma de utilização. h – Artigo 35 — As diversas formas de utilização são independentes entre si, e assim sendo, devem ser separadamente autorizadas (por exemplo: uma autorização de um escritor para que seja romance seja adaptado para uma produção cinematográfica ainda não significa que ele autorizou a utilização de sua obra em forma de novela de TV; da mesma maneira que para a utilização em vídeo de uma obra cinematográfica é necessária autorização expressa do titular, tanto para transferência de suporte físico, quanto para exibição pública). i – Artigo 37 — O produtor é quem administra os direitos patrimoniais da obra cinematográfica. j – Artigo 38 — A compra de um exemplar legítimo de uma obra – isto é, de seu suporte físico – não significa que, sem expressa autorização, o adquirente possa dar ao mesmo o uso que desejar, com intuito ou não de lucro115.
O artigo 38 acima citado trata do chamado fair use116, o direito de fazer cópias
únicas para fins domésticos e privados. Na lei 5.988/73, o uso privado não possuía limitação
quanto à extensão da cópia, que poderia ser uma cópia integral da obra reproduzida. Este tema
por si só, é controvertido e complexo demais para ser esgotado em alguns poucos parágrafos.
Mas, a título de conhecimento, recorremos às lições do Professor José de Oliveira Ascensão,
em especial, àquelas que traçam uma visão geral sobre o tema:
I – Reprografia. Este neologismo designaria os processos de reprodução gráfica. Antes de mais a reprodução fotográfica, mas também todos os processos análogos que permitem a reprodução maciça de documentos sem dependência de uma matriz. São processos incontroláveis, que estão hoje ao alcance de qualquer um. Entraram nos nossos hábitos com uma rapidez estonteante. Muitos biliões (sic) de fotocópias se produzem constantemente no mundo; substituímos os originais por reproduções; trocamos o papel químico pela distribuição de uma cópia a cada participante; estudamos por fotocópias que podemos riscar a vontade; e assim por diante. A evolução está no início. O computador dar-nos-á processos digitais de levar a reprodução a
114 Henrique Gandelman, Op. Cit., p. 95. 115 Henrique Gandelman, De Gutenberg à Internet, p. 95. 116 Fair use significa “uso livre”, ou ainda, a cópia para uso privado, sem fins lucrativos. O fair use, tem origem no direito anglo-saxão.
67
níveis de velocidade, quantidade e perfeição máximos. (...) Observe-se, porém, que a reprodução de gravações sonoras e audiovisuais tem sido considerada sob a referência à “cópia privada”, mas enganosamente. O uso privado continua a ser livre. A compensação que eventualmente se institua deve ser antes referida a utilizações abusivas e incontroláveis que a técnica propicia117.
Ascensão apresenta o problema da reprografia sob três pontos de vistas:
cultural e sociológico; econômico; e jurídico. Sob o ponto de vista sócio-cultural, Ascensão
assegura que seria um retrocesso tentar refrear a difusão do conhecimento, naquilo que ele
chama de Sociedade da Informação. Já, numa visão econômica, observa que as cópias
privadas ameaçam ao proveito econômico, tendo em vista que por vezes, não diminuem a
venda de cópias originais, como também, nem sempre o copiador faz qualquer uso econômico
da cópia privada.
Do ponto de vista jurídico, analisa Ascensão duas hipóteses acerca da cópia
privada: que não há obra ou prestação tutelada, ou que haja; neste caso, se há obra ou
prestação tutelada, o uso é privado ou não. Somente se não for, é que nos deparamos com um
problema jurídico. Há grande pressão por partes dos editores e produtores fonográficos e
cinematográficos, para que internacionalmente, sejam adotadas medidas que coíbam – ou pelo
menos – diminuam os prejuízos por eles alegados, com a disseminação de cópias de uso não
privado (pirataria).
Falaremos mais adiante, no tocante aos direitos morais e patrimoniais do autor,
bem como os direitos conexos, sobre a proteção legal da remuneração do artista ou
produtores. No mais, analisaremos com maior afinco, a questão da distribuição de fonogramas
pela Internet através de redes de compartilhamento de arquivos, entendendo o problema sob o
ponto de vista jurídico, e quiçá, apresentando soluções.
Outras duas figuras criadas pela Lei 5.988/73, exclusivas do ordenamento
jurídico pátrio, foram o direito de arena e o domínio público remunerado, não recepcionados
pela Nova Lei de Direitos Autorais de 1998. O direito de arena, trata-se de direito conexo
inserido impropriamente pelo legislador dentre os direitos autorais, com o intuito de assegurar
aos clubes e associações desportivas, remuneração pela fixação em meios vídeos-
117 José de Oliveira Ascensão, Direito Autoral, p. 244-245.
68
fonográficos, de espetáculos esportivos por eles protagonizados. Henrique Gandelman, faz um
interessante questionamento, que reproduzimos, por acharmos belíssimo seu texto:
Por que mesclar numa mesma moldura jurídica a interpretação de Graciliano Ramos e Picasso, as cenas de Ingmar Bergman e Marlon Brando, os sons de Stravinsky e Gilberto Gil, com a beleza dos gols de Zico, a criatividade de Pelé e os lances da nossa seleção campeã de vôlei? A razão desta inclusão, nos parece, é que a LDA/73 (sic) adotava o conceito abrangente de as interpretações – e, principalmente, o fato de sua fixação em algum suporte material – são também uma forma de criação, o que já foi admitido em varias legislações internacionais118.
Gandelman, a título de curiosidade, a origem do nome Direito de Arena, numa
alusão aos estádios e ginásios onde se realizam tais espetáculos esportivos. Continua ele,
discorrendo que o direito de arena, consistia no “direito de autorizar ou impedir a fixação,
transmissão ou retransmissão, por qualquer meio, de espetáculo desportivo, com entrada
paga119”, e só podia ser exercida pelas entidades esportivas (clubes, federações, associações).
A remuneração dar-se-ia na proporção de 20% (vinte por cento) do preço da autorização, caso
não houvesse estipulação alguma de valor, sendo repartido em partes iguais entre os atletas
participantes.
Carlos Fernando Mathias de Souza, na análise do direito de arena, traz a tona
uma discussão acerca da natureza híbrida desse direito, complementando a lição de
Gandelman:
Não se deve deixar levar-se em consideração que o direito de arena só se refere a espetáculo desportivo público ainda que, vez por outra, ouça-se falar também em direito de arena, por exemplo, com relação a transmissão de desfiles de escolas de samba. Talvez essa confusão se faca por vincular-se, de algum modo, pelo menos, também o direito de arena ao direito de imagem. Na realidade, a Carta de 1988 (art. 5°, XXVIII, a), prescreve que são assergurados, nos termos da lei a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução de imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas. A Lei Fundamental, como se vê, com maior amplitude e ainda mesclando um pouco de direito conexo (paticipação individual em obra coletiva), com a proteção à imagem e à voz humana (o que é, às escâncaras, outra coisa), não cuida especificamente, nesse ponto, do direito de arena. Tal direito é, com efeito, híbrido, mas não se confunde, repita-se, com o direito de proteção à imagem ou à voz humana120.”
118 Henrique Gandelman, De Gutenberg a Internet, p. 64. 119 Idem, p. 64. 120 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral – Legislação Básica, p. 66.
69
Por tudo que já foi dito, concluímos então que este direito foi elevado à
categoria de direito conexo ao de autor, por pura impropriedade do legislador, tanto que, a
nova Lei de Direitos Autorais de 1998 não repetiu o mesmo erro. Mathias de Souza, de forma
didática traz a informação necessária sobre como ficou tal direito após a nova lei:
Desse direito não cuida a lei nova dos direitos autorais (a Lei 9.610/98, evidentemente), ficando a matéria disciplinada totalmente pela legislação desportiva, hoje a Lei n° 9.615, de 24.3.98 (DOU de 25.3.98), que instituiu normas gerais sobre os desportos e dá outras providências e que, dentre outras, revogou expressamente a Lei 8.672, de 6 de julho de 1993 (lei que tratava das normas gerais do desporto e que disciplinava, ainda que sem denominá-lo assim, iterativamente, o direito de arena)121.
Por fim, falta falarmos do domínio público remunerado, definitivamente
extinto do ordenamento jurídico. No momento mais oportuno, explicaremos o que é o
domínio público e sua regulamentação legal. Por hora, importa saber que a regra geral é o uso
gratuito de obras caídas em domínio público. A exceção, é instituir qualquer prestação
pecuniária sobre obras de domínio público, e somente alguns poucos países adotaram tal
sistema. O Brasil foi um deles. Carlos Fernando Mathias de Souza, explica em seu livro de
que forma foi instituído o domínio público remunerado, sua forma de cobrança e sua
finalidade:
O Brasil mesmo chegou a introduzir na Lei dos Direitos Autorais de n° 5.988/73, o domínio público remunerado, o que foi revogado pela Lei n° 7.123, de 12.9.83. Estava lá, no seu artigo 93 com seu parágrafo único: ‘A utilização, por qualquer forma ou processo que não seja livre, das obras intelectuais pertencentes ao domínio público depende de autorização do Conselho Nacional de Direito Autoral. Se a utilização visar o lucro, deverá ser recolhida ao Conselho Nacional de Direito Autoral importância correspondente à 50% da que caberia ao autor da obra, salvo se destinar a fins didáticos, caso em que essa percentagem se reduzirá a 10%’. Os recursos advindos da utilização de obras do domínio público remunerado integrariam o Fundo de Direito Autoral, que tinha cinco finalidades: a) estimular a criação de obras intelectuais mediante instituição de prêmios e de bolsas de estudo e de pesquisa; b) auxiliar os órgãos de assistência social das associações e sindicatos de autores, intérpretes ou executantes; c) publicar obras de autores novos mediantes convênio com órgãos públicos ou editora privada; d) custear despesas do Conselho Nacional de Direito Autoral; e e) custear o funcionamento do Museu do Conselho Nacional de Direito Autoral122”.
121 Carlos Fernando Mathias de Souza, Op. Cit., p. 67. 122 Idem, p. 53-54.
70
Concordamos com a crítica apresentada por Mathias de Souza, ao citar as
palavras do ilustre Túlio Ascarelli, no que diz respeito a uma verdadeira instituição de
imposto sobre a produção intelectual com fins de subsidiar o funcionamento estatal, nem
tampouco, a beneficiar um grupo de artistas mediante os frutos das obras de outros autores.
Enfim, parece-me que o domínio público remunerado fere, de tal maneira, a garantia de
liberdade de pensamento e o princípio de isenção tributária sobre os livros e o papel destinado
a sua impressão123.
2.2.3. A Lei n° 9.279 de 14.05.1996 – A propriedade industrial
Apesar de, no início de nossos apontamentos, termos diferenciado o Direito do
Autor (ou Propriedade Intelectual) do Direito de Inventor (ou Propriedade Industrial), cabe
menção a Lei, justamente por este motivo: ela acentuou ainda mais a distinção entre essas
duas modalidades de direitos, reforçando a divisão clássica já defendida pela doutrina.
A própria lei estabelece qual é o objeto do direito da propriedade industrial, conforme rol
taxativo do art. 2°:
Art. 2º A proteção dos direitos relativos à propriedade industrial, considerado o seu interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País, efetua-se mediante: I - concessão de patentes de invenção e de modelo de utilidade; II - concessão de registro de desenho industrial; III - concessão de registro de marca; IV - repressão às falsas indicações geográficas; e V - repressão à concorrência desleal.
Face o exposto pela lei, cabe aqui diferenciarmos o que são marcas, patentes,
invenção, modelo de utilidade, desenho industrial. São termos específicos de propriedade
industrial, e em muito se confundem com obras intelectuais, apesar de não possuírem a
essência criativa e artística do espírito humano. Henrique Gandelman, traz uma tabela muito
didática em suas duas obras – De Gutenberg à Internet e O que você precisa saber sobre
Direitos Autorais – que demonstra muito bem as tênues diferenças entre marcas, patentes e
direito autoral, que reproduzimos em sua íntegra abaixo: 123 A isenção tributária de livros, e de seus assemelhados (defendido por alguns tributaristas ilustres, como o Prof. Roque Antonio Carraza), encontra-se previsto no art. 150, inciso “VI”, alínea “d” da Constituição Federal de 1988.
71
Tabela 3: Tabela comparativa entre Direito Autoral, Marca e Patente DIREITO AUTORAL MARCA PATENTE
REGISTRO Declaratório, optativo. Atributivo, obrigatório. Atributivo, obrigatório.
TITULARIDADE
Desde a primeira publicação ou
registro (que é uma presunção
juris tantum, i. e., até prova em
contrário).
Só após a verificação de eventuais
conflitos e registro definitivo.
Só após exame técnico aprovado e
registro definitivo.
REQUISITOS
BÁSICOS
Originalidade da forma de
expressão.
Novidade, criatividade fantasiosa
(nome ou logotipo) e identificação
com um produto ou serviço.
Novidade de conteúdo e utilidade.
PRAZO DE
PROTEÇÃO
Variável conforme a natureza da
obra
Sem limite, já que o registro pode
ser renovado periodicamente,
sujeito à prova de utilização.
Temporário, a partir do depósito.
CESSÃO DE
DIREITOS
Os direitos patrimoniais podem
ser totais ou parcialmente cedidos;
suas utilizações são independentes
entre si.
Só pode ser definitiva juntamente
com os produtos e serviços que
identifica; pode ser licenciada
para merchandising.
Igual a marca; pode ser licenciada
(transferência de tecnologia).
INTEGRIDADE Controle exercido por meio dos
direitos morais.
Controle de qualidade exercido
por cláusula contratual (no caso
de licença).
Igual a marca
DIVULGAÇÃO
Essencial após a primeira
publicação, visando incrementar a
venda de exemplares ou suportes
físicos.
Só após o depósito (quando se
cria uma expectativa de direito)
ou registro.
O segredo é fundamental para a
garantia de novidade, antes do
depósito ou registro formal.
RELAÇÃO
EMPREGADOR X
EMPREGADO
A titularidade dos direitos
patrimoniais deve ser previamente
estabelecida entre autor e
empregado (ou encomendante)
Geralmente a marca criada por
encomenda é cedida a quem
encomendou.
A titularidade é do empregador.
BENEFICIÁRIO
DO USO
Autores, artistas, criadores de
obras coletivas ou derivadas;
editores, produtores de
fonogramas, audiovisuais,
softwares; cessionários.
Titular, pessoa jurídica. Autores ou titular, pessoa jurídica.
PROTEÇÃO
INTERNACIONAL
Automática e independente de
registro; segundo reciprocidade de
tratados.
Não dispensa o depósito local nos
territórios desejados. Igual a marca.
Fonte: Henrique Gandelman, O que você precisa sobre Direitos Autorais, p. 21-22.
Como se vê, o assunto é extremamente complexo e esgotá-lo não é o objetivo
deste trabalho, mas tão somente, dar uma visão geral sobre o tema. Também consultamos a
Cartilha da Propriedade Intelectual, editada e distribuída gratuitamente pelo INPI – Instituto
Nacional da Propriedade Intelectual.
72
2.2.4. A Lei n° 9.609 de 1998 – A lei do Software
Os programas de computador também são considerados propriedade
intelectual, a exemplo das obras literárias, artísticas ou científicas. Apesar de, no início deste
estudo, termos optado pelo não-uso da expressão Propriedade Intelectual, dado o seu aspecto
restritivo e específico ao direito das coisas, faz-se necessário, neste momento, a utilização de
tal expressão, dado que o próprio legislador assim o disse no preâmbulo da Lei: “Dispõe
sobre a proteção da propriedade intelectual de programa de computador, sua
comercialização no país, e dá outras providências”.
Plínio Cabral, de forma primorosa, traz uma breve introdução, com um forte
rigor histórico e didático, explicando o inter-relacionamento entre as Leis 9.609 e 9.610:
As duas leis interligam-se pela natureza do objeto legal, o que é feito em duas referências. O art. 7° da lei 9.610, em seu item XII, declara que são obras intelectuais protegidas ‘os programas de computador’. E mais adiante, no parágrafo 1° desse mesmo artigo, lê-se: ‘Os programas de computador são objetos de legislação específica, observadas as disposições legais desta lei que lhes sejam aplicaveis’. Já a lei 9.609, conhecida simplesmente como “lei do Software”, estabelece em seu artigo 2°: ‘O regime de proteção à propriedade intelectual de programa de computador é o conferido às obras literárias pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no país, observado o disposto nesta lei’. O Brasil, portanto, confere aos programas de computador proteção autoral idêntica à que concede aos autores de obras literárias124.
Tal proteção aos programas de computador não é uma inovação legal
brasileira, mas tão somente, uma adaptação a outras disposições e tratados internacionais dos
quais o Brasil já era signatário, conforme explica Plínio Cabral:
Essa proteção decorre de dois estatutos legais e das convenções internacionais de que o Brasil é signatário, especialmente o chamado acordo TRIPS – ‘Acordo sobre aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio’. Assinado em abril de 1994, o acordo TRIPS acabou por determinar a própria lei 9.609. O que há de peculiar nesse acordo, e na própria lei 9.610, é o abandono dos direitos morais, já incorporado (sic) à tradição jurídica brasileira. Não havia necessidade disso, pois o próprio acordo TRIPS faculta aos signatários a manutenção dos termos da Convenção de Berna125”.
124 Plínio Cabral, Direito Autoral – Dúvidas e Controvérsias, p. 139. 125 Idem., p. 140.
73
Não é nosso objetivo aprofundarmo-nos neste tema, mas é essencial entender o
conceito de programa de computador, ou comumente chamado “Software” (programa de
computador). Plínio Cabral faz uma severa crítica a lei 9.609/98, por não delimitar com rigor
técnico a definição de Software:
A lei 9.609 define o que é um programa de computador. Mas o fez, infelizmente, sem o rigor técnico e científico desejado. Deise Fabiana Lange, em seu trabalho O impacto da Tecnologia Digital Sobre o Direito de Autor e Conexo, define com mais precisão e simplicidade o que é software: ‘O software nada mais é que um conjunto de instruções que, quando processadas pelo computador, mostram qual o caminho a ser percorrido para a execução de determinada tarefa ou resultado.’ (p. 63). Mas o programa de computador nem sempre é um produto pronto e acabado. Diz Denise Fabiana Lange: ‘existem vários tipos de programas no mercado. Pode-se classificá-los em prontos e semiprontos (sic). Os prontos têm uma tarefa específica e o usuário somente insere dados, faz consultas e recebe respostas, trata-se de programas desenvolvidos ou escritos em linguagens de programação de alto nível com aplicação profissional. Os semiprontos, ao contrário, possuem uma tarefa bastante ampla, e é o usuário quem escolhe as tarefas que pretende executar, podendo processar textos, fazer cálculos e gerenciar informações. São o que se denomina de aplicativos ou linguagem de quarta geração’ (Op. cit., p. 64)126 (grifos do autor).
A rigor científico, a definição de programa de computador muito se assemelha
a uma invenção científica, dada a sua finalidade comercial. Porém, há um conteúdo intelectual
na sua gênese: o pensamento lógico-matemático do programador, que ao fazer uso de
algoritmos – equações lógicas e matemáticas, que possuem um método para se alcançar a
solução de um problema proposto – escolhe a melhor forma de se processar determinada
operação. Há ainda, os que entendem ser a interface – a cara (a face) do programa, seu design
gráfico – ser uma criação artística.
Pelo sim, pelo não, o nosso legislador optou por inseri-lo no rol das obras
protegidas pelo direito de autor. Plínio Cabral observa essa relação do software com o direito
de inventor ou a chamada propriedade industrial:
A importância da definição correta do que seja um programa de computador reside, principalmente, no destino da relação contratual entre o autor do programa e o usuário, aquilo que ele comprou e os limites de sua utilização. A relação entre o produto e o usuário da obra de criação é importante, de um lado para preservar o direito autoral e, de outro, para garantir uma utilização plena do consumidor que adquiriu o produto. (...) Já o programa de computador é obra criativa para fins legais, mas que se destina a permitir uma
126 Plínio Cabral, Op. cit. p. 140.
74
atividade profissional, seja pessoal ou empresarial. Está mais próximo do produto industrial. (...) Embora inserido no rol das obras de criação, é um produto destinado a trabalho e deve, portanto, corresponder à expectativa do consumidor, respondendo o autor – pessoa física ou jurídica – pela sua qualidade, numa relação contratual protegida pelas leis brasileiras, inclusive pelo Código de Defesa do Consumidor. A lei, no caso, não protege apenas a integralidade da obra contra eventuais violações, mas protege, também, o consumidor contra falhas do produto. (...) Enquanto nas obras de criação, de um modo geral, tais obrigações são tênues e inespecíficas, no caso dos programas de computador elas são claras e específicas127.
A inclusão dos programas de computadores no rol de objetos tutelados pelo
direito autoral, não causa apenas uma certa discussão jurídica acerca da conveniência de tê-lo
tutelado como tal, mas também, lança lenha à fogueira da discussão do uso privado e seu
limite.
2.2.5. A Lei n° 9.610 de 1998 – Os direitos do autor
No estudo anterior da antiga lei n° 5.988/73 vimos diversos pontos e conceitos
importantes: alguns deles, que não foram mantidos pela nova lei de direitos autorais (como o
domínio público remunerado); outros que deixaram de ser regulados como direitos autorais
(como o direito de arena); e aqueles que, apesar de serem protegidos pela nova lei 9.610, não
são regulamentados por ela (como o software). Porém, em sua quase totalidade, a nova Lei de
Direitos Autorais reproduziu as disposições da lei anterior, inovando em alguns pontos
específicos. Carlos Fernando Mathias de Souza, em sua obra128, traz pertinentes informações
sobre leis revogadas pela nova Lei de Direitos Autorais de 1998:
Um ponto a ser discutido na nova Lei de Direitos Autorais, trata-se do limite da
cópia privada. Ascensão analisa muito bem tal problemática – como veremos no último
capítulo – ao entender que o princípio da liberdade do uso privado pode ser violentado graças
a faculdade que possui o criador de softwares, através de medidas como busca e apreensão de
computadores e cópias não-autorizadas, gerando uma flagrante exceção a este princípio
universal do direito autoral. Justamente por ser o “software” um estranho no ninho do direito
autoral, é que não se tem admitido – por enquanto – a possibilidade da aplicação – por
127 Plínio Cabral, Op. cit. p. 140-141. 128 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral – Legislação Básica.
75
analogia – de medidas cautelares para apreender computadores de quem possui fonogramas
armazenados em forma de arquivos computacionais.
De fato, o que a nova Lei 9.610/98 preconiza em seu artigo 46, inciso II que
“Não constitui ofensa aos direitos autorais: (...) II - a reprodução, em um só exemplar de
pequenos trechos, para uso privado do copista, desde que feita por este, sem intuito de
lucro”, num flagrante contraponto ao texto da antiga Lei 5.988/73, que dizia em seu artigo 49,
inciso II: “Não constitui ofensa aos direitos do autor: (...) II - A reprodução, em um só
exemplar, de qualquer obra, contando que não se destine à utilização com intuito de lucro”.
Destacamos este dispositivo, pela especial importância que ele representa para
o Direito Autoral nos dias atuais: é nele que se baseiam os autores, no ataque à contrafação
caseira, principalmente, no caso dos fonogramas. Não bastasse ser um duro golpe na
reprografia, a limitação da reprodução de apenas pequenos trechos da obra pode ser aplicada,–
como têm defendido alguns – ao caso dos fonogramas convertidos em arquivos de
computador. Há muito, ainda, o que ser discutido neste sentido. No capítulo derradeiro,
tentamos entender o que o futuro – leia-se: Internet – representa para o direito autoral.
2.2.6. O Novo Código Civil de 2002
A lei n° 10.406, de 10 de Janeiro de 2002, publicada no Diário Oficial da
União em 11.01.2002, em nada regulamenta os direitos autorais e a propriedade intelectual.
Só fizemos menção desta lei, para observarmos que com o advento da Lei n° 9.610/98, a
matéria de direitos autorais e conexos é tema de legislação especifica e especial.
2.3. A TUTELA PENAL DO DIREITO AUTORAL
Há que diferenciar as violações civis e violações penais do direito do autor.
Enquanto as violações civis e suas sanções estão reguladas pela lei 9.610/98, nos artigos 102 a
76
110129, as violações penais estão tipificadas na legislação penal. O próprio artigo 101, da Lei
9.610/98 estabelece que “as sanções civis de que trata este Capítulo aplicam-se sem prejuízo
das penas cabíveis”. Tais penas encontram-se tipificadas em nosso Código Penal, nos artigos
184 a 186, no Capítulo específico Dos crimes contra a propriedade intelectual, os quais,
analisaremos um-a-um neste trecho de nosso trabalho. Vejamos o texto legal do art. 185:
Usurpação de nome ou pseudônimo alheio Art. 185 - Atribuir falsamente a alguém, mediante o uso de nome, pseudônimo ou sinal por ele adotado para designar seus trabalhos, a autoria de obra literária, científica ou artística: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Antes de tudo, cabe ressaltar que o crime de usurpação de nome ou
pseudônimo alheio foi expressamente revogado pela Lei n° 10.695/03, conforme bem observa
Mathias de Souza em sua obra130. Porém, a título de conhecimento, reproduziremos a análise
que Celso Delmanto faz sobre os elementos deste tipo penal, em seu Código Penal
Anotado131:
Objeto Jurídico: O direito autoral. / Sujeito Ativo: Qualquer pessoa. / Sujeito Passivo: A pessoa, cujo nome, pseudônimo ou sinal é usurpado. / Tipo Objetivo: A conduta prevista é atribuir falsamente a alguém a autoria de obra literária, científica, ou artística, mediante o uso de nome, pseudônimo ou sinal por ele adotado. / Tipo Subjetivo: Dolo (vontade livre e consciente de atribuir falsamente). Para a doutrina tradicional é o ‘dolo genérico’. Não há modalidade culposa. / Consumação: Com a publicação ou divulgação da obra, independente-mente da finalidade do agente (lucro para si ou descrédito para a vítima). / Tentativa: Admite-se / Pena: Detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
Porém, esta mesma lei n° 10.695/03, alterou os artigos 184 e 185, que já
haviam sido alterados, anteriormente, pelas leis n° 6.895 de 17.12.1980 e n° 8.635 de
16.3.1993. É no artigo 184, com nova redação, onde encontram-se tipificadas as modalidade
de infrações penais cometidas contra o direito do autor e conexos, que abaixo transcrevemos,
para que, posteriormente, possamos estudá-las, esmiuçando os seus aspectos legais:
Violação de direito autoral. Art. 184. Violar direitos de autor e os que lhe são conexos: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.
129 A lei n° 9.610/98 encontra-se reproduzida no Anexo 4 deste trabalho. 130 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral – Legislação Básica, p. 117-118. 131 Celso Delmanto et al., Código Penal Comentado, p. 395.
77
§ 1o Se a violação consistir em reprodução total ou parcial, com intuito de lucro direto ou indireto, por qualquer meio ou processo, de obra intelectual, interpretação, execução ou fonograma, sem autorização expressa do autor, do artista intérprete ou executante, do produtor, conforme o caso, ou de quem os represente: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. § 2o Na mesma pena do § 1o incorre quem, com o intuito de lucro direto ou indireto, distribui, vende, expõe à venda, aluga, introduz no País, adquire, oculta, tem em depósito, original ou cópia de obra intelectual ou fonograma reproduzido com violação do direito de autor, do direito de artista intérprete ou executante ou do direito do produtor de fonograma, ou, ainda, aluga original ou cópia de obra intelectual ou fonograma, sem a expressa autorização dos titulares dos direitos ou de quem os represente. § 3o Se a violação consistir no oferecimento ao público, mediante cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou qualquer outro sistema que permita ao usuário realizar a seleção da obra ou produção para recebê-la em um tempo e lugar previamente determinados por quem formula a demanda, com intuito de lucro, direto ou indireto, sem autorização expressa, conforme o caso, do autor, do artista intérprete ou executante, do produtor de fonograma, ou de quem os represente: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. § 4o O disposto nos §§ 1o, 2o e 3o não se aplica quando se tratar de exceção ou limitação ao direito de autor ou os que lhe são conexos, em conformidade com o previsto na Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, nem a cópia de obra intelectual ou fonograma, em um só exemplar, para uso privado do copista, sem intuito de lucro direto ou indireto.
A análise deste tipo penal é confusa e cheia de meandros, que despertam
dúvidas e controvérsias entre os que estudam o direito autoral. Costumeiramente, resume-se a
violação de direito autoral à conduta de contrafação, ou mais popularmente conhecida como
pirataria. Porém, o artigo 184 do Código Penal não descreve apenas uma conduta — a
pirataria — mas um plexo de condutas que são tipificadas como violação de direito autoral.
Recorremos mais uma vez aos estudos de Celso Delmanto, por tratar do assunto com total
maestria e complexidade, ao explicar o tipo objetivo do delito:
Em sua atual redação, o art. 184 do CP contém três figuras: a) A primeira modalidade (caput) é violar (infringir, ofender, transgredir) direito autoral. Não é simples a conceituação do que seja direito autoral lembrando-se que a lei civil inclui não só os direitos de autor, como os conexos (Lei n° 5.988/73, arts 1° e 94 a 101). Observe-se que há limitações ao direito autoral que excluem a infração (Lei n° 5.988/73, arts 49 a 51, 102 etc). Pela mesma legislação, no caso de obra teatral ou composição musical, a transmissão, representação ou execução pública só são vedadas quando visar lucro (direto ou indireto). (...) Tipo subjetivo: a). Na 1ª figura (caput) é o dolo, que consiste na vontade livre e consciente de violar direito autoral. Nas modalidades de obra teatral e musical (acima
78
citadas), exige-se, ainda, o elemento subjetivo do tipo, que é a finalidade de lucro direto ou indireto132.
As exclusões de ilicitude as quais Demanto faz referência, hoje se encontram
no próprio Código Penal, no §4° do artigo 184, além dos artigos 46 e incisos ao 48 da Lei n°
9.610/98133. O art 101 da Lei n° 5.988/73 foi reeditado pela Lei n° 9.610/98 em seu artigo 96,
com a alteração do prazo de proteção aos direitos autorais e conexos, de sessenta para setenta
anos. Mas ainda há outra modalidade do tipo penal previsto no art. 184, nas palavras de
Delmanto:
(...) b) A outra figura (§ 1°) pune: 1.) a reprodução (cópia), por qualquer meio, de obra intelectual (criações exteriorizadas do espírito), no todo ou em parte, sem autorização expressa do autor ou de quem o represente; 2.) a reprodução de fonograma (som gravado em suporte material) ou vídeo-fonograma (imagem e som fixados em suporte material conhecido como videotape), sem autorização do produtor ou quem o represente. Quanto à extensão do que seja obra intelectual, lembre-se que trata de matéria bastante controvertida, devendo a lei penal ser aplicada com cuidado, em nome do princípio da taxatividade da lei (CP, art. 1°). Tanto com relação à obra intelectual como ao fonograma e videofonograma, a reprodução só é punível quando feita com intuito de lucro (vide tipo subjetivo), sendo atípica a duplicação ou reprodução sem tal finalidade (vide, também, Lei n° 5.988/73, art. 49, II). (...) Tipo subjetivo: (...) b) Na 2ª figura (§ 1°) é o dolo (vontade livre de reproduzir), com consciência da falta de autorização, e o elemento subjetivo, que é o fim de agir (com intuito de lucro); para os tradicionais é o ‘dolo específico’134.
Por fim, a última modalidade do delito de violação ao direito autoral
apresentada por Celso Demanto em sua magnífica obra:
c) Na derradeira modalidade (§ 2°), pune-se a conduta de quem vende (aliena a título oneroso), expõe a venda (mantém em exposição para indeterminado número de pessoas, com oferecimento, expresso ou tácito, de venda), aluga (loca), introduz no país (faz entrar em nosso território), adquire (obtém para si, onerosa ou gratuitamente), oculta (esconde), empresta (cede), troca (permuta) ou tem em depósito (tem à disposição ou sob guarda), original ou cópia de obra intelectual, fonograma ou vídeo-grama, produzidos ou reproduzidos com violação de direito autoral. É indispensável que haja o intuito de lucro (vide tipo subjetivo), pois, sem tal intenção, os comportamentos não são puníveis. (...) Tipo subjetivo:
132 Celso Delmanto et al., Código Penal Comentado. p. 393. Observação: A edição consultada era anterior à lei que deu nova redação aos artigos 184 e 186, porém, as lições sobre os §§ 1° e 2° do CP, permanecem as mesmas. 133 Vide estes artigos no Anexo 4. 134 Idem, p. 393.
79
(...) c) Na última figura (§ 2°) é o dolo, ou seja, a vontade de praticar aquelas ações, com consciência de que o original ou cópia foi produzido ou reproduzido ‘com violação de direito autoral’, e o elemento subjetivo do tipo é o intuito de lucro (‘dolo específico’ para os tradicionais). Na há forma culposa135.
Nestas duas modalidades é onde reside a idéia generalizada de que a única
forma de violação do direito de autor seja a reprografia (popularmente chamada de pirataria) e
a venda de exemplares falsos (ou produtos piratas). É aqui onde se concentram os debates
mais acalorados entre os defensores dos direitos autorais. A este respeito fala Paulo Oliver,
em sua obra que trata somente da tutela penal do direito autoral:
Em total desrespeito aos titulares de direitos, contrariando as normas, portarias, legislações aplicáveis à espécie, parte das fitas de videocassete, CD´s e fitas K7 encontradas no mercado de varejo espalhados nas capitais, são reproduções de má qualidade, ou por outra, são cópias elaboradas em laboratórios clandestinos, sem a autorização expressa dos titulares dos direitos autorais ou dos titulares dos direitos de distribuição das obras intelectuais editadas no original. Para essa consecução são utilizados os meios fraudulentos mais variáveis, desde o contrabando da obra original, distribuída no exterior, até a montagem de sofisticados laboratórios clandestinos que possuem dezenas de máquinas de reprodução, chamadas vulgarmente de ‘escravas’. A copiagem de vídeos, fitas K7, discos, CD´s, livros, esculturas, telas, acarretam prejuízos aos autores (pessoas físicas) e produtores, atingindo ainda os cofres públicos dos estados e municípios136.
Justifica-se tal preocupação com a extensão da lesão aos direitos autorais, ainda
que não se tenham estudos estáticos das reais proporções da produção de produtos falsificados
no país, e seu real impacto na economia. Porém, é questão de segurança pública, como bem
assinala Paulo Oliver, pois na consecução da pirataria, os falsificadores não agem sozinhos,
mas sim, organizados meticulosamente, com ramos infiltrados dentro das gravadoras,
distribuidoras, alfândegas e da própria polícia. Estamos diante, portanto, de uma modalidade
de crime organizado. Continua Paulo Oliver a descrever o assunto:
A pirataria significa um custo operacional baixo em relação ao produto legal, por isso que, além de sonegar impostos, coloca em plano inferior os que trabalham licitamente e beneficiam gratuitamente aqueles que aderem ao ilícito, que no dia-a-dia conseguem acumular riquezas. Os artistas, por exemplo, têm o seu trabalho reproduzido milhares de vezes, indevidamente, pois usam sua imagem, a voz, um trabalho completo, sem ter recebido autorização para isso. As obras piratas são comercializadas abertamente,
135 Celso Delmanto, Op. Cit, p. 393-394. 136 Paulo Oliver, Direito Autoral e sua Tutela Penal, p. 32.
80
mesmo porque para a apreensão desses será necessário a representação da vítima137.
A representação da vítima é exigência legal para que sejam tomadas as
providências necessárias, dentre elas, a apreensão das cópias ilegais. É o que o Código Penal
estabelece no artigo 186, com nova redação dada pela Lei n° 10.965 de 1.7.2003:
Art. 186. Procede-se mediante: I – queixa, nos crimes previstos no caput do art. 184; II – ação penal pública incondicionada, nos crimes previstos nos §§ 1o e 2o do art. 184; III – ação penal pública incondicionada, nos crimes cometidos em desfavor de entidades de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou fundação instituída pelo Poder Público; IV – ação penal pública condicionada à representação, nos crimes previstos no § 3o do art. 184.
A lei n° 10.695/03 inovou o Código Penal, criando a figura do § 3° do artigo
184 (supra citado) ou seja, tipificando também como contrafação a distribuição via sistemas
digitais – “cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou qualquer outro meio” – de obras protegidas
pelo direito autoral, sem a devida autorização dos titulares de direito ou quem os represente,
com o intuito de lucro direto ou indireto. A mesma lei também alterou o capítulo do Código
de Processo Penal que tratava do procedimento para julgar crimes contra a Propriedade
Imaterial (Livro II, Título II, Capítulo IX), acrescentando também, novos dispositivos (artigos
530-A ao 530-I), os quais reproduzimos na íntegra no anexo138 deste trabalho, por acharmos
oportuno a transcrição “ipsis letris” (cópia fiel), sem maiores análises, pelo fato do texto legal
ser o suficientemente claro.
137 Paulo Oliver, Idem, p. 32-33. 138 Os artigos descritos encontram-se no Anexo 1.
81
3. O DIREITO AUTORAL E A INTERNET
Nos capítulos anteriores, procuramos apontar as origens históricas e evolutivas
do direito autoral, e seu estabelecimento como disciplina autônoma, com objeto, natureza
jurídica e métodos de estudos próprios. Vimos também de que forma ele é tutelado no Brasil,
em todos os níveis de leis, partindo da Constituição Federal, passando pelas inúmeras leis
criadas e aquelas mais significativas, que continuam em vigor, tais como a Lei do Software e
a Nova Lei de Direitos Autorais. Também tratamos da tutela penal do direito autoral, e de
toda discussão acerca dos malefícios que a pirataria causa para o autor – imediatamente – e ao
Estado – mediatamente, quando da violação aos direitos autorais e conexos. Mais ainda: quais
são os mecanismos legais que temos a disposição atualmente para coibir e punir os infratores.
Agora é chegado o momento de estreitar ainda mais os estudos sobre o direito
autoral, direcionando a relação dos direitos do autor e conexos com a Internet. Faremos a
apresentação da teoria dualista do direito de autor, de forma pormenorizada, dos direitos
conexos e as limitações de tais direitos. E por fim, faremos um breve estudo da história e
arquitetura da Internet, tentando demonstrar todas as suas aplicações e sua relação com o
direito autoral, sem adentrarmos, porém, no rigor técnico da informática, mas sem deixar de
tratar da matéria com a devida atenção que merece.
3.1. O EXERCÍCIO DO DIREITO AUTORAL
O autor tem total direito sobre a obra que cria. Porém, qual ou quais são esses
direitos? E de que forme ele exerce tais direitos? Há limites de tais direitos? Todas essas
perguntas são inevitáveis, na medida em que aprofundamo-nos no estudo do direito autoral.
82
Carlos Fernando Mathias de Souza, ao transcrever as palavras do mestre Clóvis Bevilácqua,
consegue nos apontar um norte, um indício de solução para todas as perguntas acima
formuladas:
De Mestre Clóvis as observações: ‘Merece ser tratado à parte o direito autoral pela particularidade com que se apresenta, em face da ação dissolvente do tempo. Em primeiro lugar, há uma parte do direito autoral, mais íntima, a que se constitui atributo da pessoa, que não se pode perder por prescrição. Por mais longo que seja o decurso do tempo, um autor conserva a sua qualidade. Aristóteles é sempre autor da Moral à Nicômano; Lucrécio, de De Natura Rerum, Alencar, de O Guarani. Em segundo lugar, pelo simples decurso do tempo, extinguem-se, simultaneamente, o direito e a ação que o garante, não podendo acontecer, como em outras ações jurídicas, que o direito, desprovido de uma ação, ainda seja capaz de subsistir, e revelar a vida em dadas circunstâncias. É um direito temporário’139.
Do que falava afinal o mestre Bevilácqua? Daquilo que, mais adiante,
estudaremos sob a denominação de direitos morais do autor. Mas não basta para esgotarmos o
conteúdo e respondermos a todas as formulações feitas no início deste estudo. Atentamo-nos à
mais algumas palavras do professor Mathias de Souza, no qual ele parece apontar a raiz
histórica do exercício do direito autoral:
No ordenamento positivo brasileiro, a Lei n° 9.610 (art. 28), a exemplo do que já dispunha a Lei n° 5.988 (art. 29), prescreve que ‘cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica’. Não é difícil identificar-se tal disposição com o sentido positivo que os romanos emprestaram à propriedade expressa pelo clássico jus utendi, frutendi et abutendi, isto é, o direito de usar, fruir e dispor (abusar).140.
Se alguns direitos estão ligados intimamente à personalidade do autor, e não
perecem jamais, conforme bem ensinou Clóvis Bevilácqua, há outros direitos que estão
afetados à característica material do direito autoral, ou como alguns preferem chamar, à
propriedade intelectual: trata-se dos direitos patrimoniais.
139 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral – Legislação Básica, p. 36. 140 Idem, p. 36.
83
3.1.1. Os direitos morais do autor
Os chamados direitos morais do autor são direitos atinentes à sua
personalidade, inerentes à sua condição de criador. Eduardo Vieira Manso, no estudo dos
direitos morais, observa a impropriedade dos termos direitos morais e direitos patrimoniais:
Há duas classes de direitos autorais, reconhecidos pela doutrina em geral há muito tempo, mas que foram incluídos na legislação brasileira apenas com o advento da Lei n° 5.988, em 1973: os direitos morais e os direitos patrimoniais. Ambas as denominações não são felizes, embora já estejam plenamente consagradas nas doutrinas e nas jurisprudências de todos os povos, mesmo quando são empregadas apenas para sua própria negação. Com efeito, todo direito é ao mesmo tempo moral e patrimonial, porque em todo direito há de existir um substrato de ordem moral, assim como haverá de possibilitar resultados econômicos, ainda que a título de reparação de violações de suas regras141.
Se não temos como fugir da idéia de que os direitos autorais se sub-dividem em
dois aspectos, resta-nos tentar definir o que são os direitos morais do autor. Não é tarefa fácil,
pois alguns autores como Carlos Fernando Mathias de Souza, José Carlos Costa Netto,
Henrique Gandelman e Plínio Cabral, por exemplo, não trazem uma definição do direito
moral do autor, mas tão somente, limitam-se a dar um conceito geral. Para tentar definir o que
é direito moral, recorremos às lições do ilustre professor José de Oliveira Ascensão e do
brilhante Eduardo Vieira Manso. Começando pelas lições do eminente professor lusitano, que
prefere usar outra denominação para os direitos morais do autor:
Dizendo-se ‘direito moral’ quer-se significar simplesmente o direito pessoal, por oposição ao direito patrimonial. Falaremos, pois, exclusivamente em direito pessoal, para tornar a matéria mais facilmente compreensível. Outros falam em direitos ‘personalíssimos’ para abranger a mesma realidade, mas o superlativo não se justifica: dizendo direito pessoal, já dizemos tudo. O qualificativo personalíssimo poderia quando muito ficar reservado para um setor específico dentro dos direitos pessoais. Por outro lado, como veremos também, os direitos pessoais não são direitos de personalidade. Embora mantenham uma ligação, ao menos genética, aos direitos de personalidade, afastam-se destes no âmbito de tutela e no seu regime. Por isso, são admitidos negócios sobre direitos pessoais que não seriam admitidos sobre os direitos de personalidade. (...) Não sabemos se há um único direito, se dois, se muitos. Aceitamos a terminologia legal provisoriamente, só por ser
141 Eduardo Vieira Manso, O que é direito autoral, p. 50.
84
corrente. Mas não nos absteremos também de falar, como fizemos já, em faculdades, em vez de direitos142.
Vieira Manso prefere não se atentar a problemática da nomenclatura e da
natureza dúplice dos direitos autorais; prefere, pois, adotar uma abordagem mais didática e
objetiva:
Por ‘direito moral’, no entanto, se entende feixe de prerrogativas que tendem, primordialmente, a defender a personalidade do autor e à própria obra em si mesma. Há até quem diga que o direito moral é um direito de personalidade, equiparando-o ao direito de indentidade civil, ao direito à própria imagem, à honra, etc. Chama-se ‘moral’, porque, de regra, ele é irredutível a um valor patrimonial. Por isso é que se diz, e a lei confirma, que nenhum dos direitos morais é alienável, assim como também são irrenunciáveis143.
Como se vê, Manso acredita ser o direito moral do autor uma espécie de direito
da personalidade. Já Ascensão, faz questão de afirmar que os direitos personalíssimos são
uma espécie daquilo que ele denomina direitos pessoais do autor. Nas palavras de Manso, já
podemos abduzir algumas características essenciais dos direitos morais do autor: são eles
irrenunciáveis e inalienáveis144.
Plínio Cabral, ao citar Antônio Chaves, apresenta-nos outros aspectos dos
direitos morais do autor: “Reveste-se de quatro características fundamentais: é um direito
pessoal; é perpétuo; é um direito inalienável; é um direito imprescritível145”. Parece-nos que
as características essenciais dos direitos morais do autor estão perfeitamente definidos pela
doutrina autoralista. Porém, o debate sobre a essência dos direitos morais do autor permanece
um tema controvertido, e por esse motivo, nos parece oportuno não adentrarmos nas entranhas
da matéria.Nas palavras de José Carlos Costa Netto:
A matéria é, realmente, apaixonante. A sua evolução e complexidade têm sido objeto de exame acurado de inúmeros juristas, destacando-se, como um exemplo desse interesse, pela sua riqueza informativa, basicamente no contexto do Direito alemão, francês e escandinavo, a obra Lê Droit de l’Auteur de Stig Stromholm, desenvolvida em três volumes e 1.500 páginas146.
142 José de Oliveira Ascensão, Direito Autoral, p. 130. 143 Eduardo Vieira Manso, Op. cit., p. 51-52. 144 Todos os autores das obras consultadas fazem menção à estas características dos direitos morais: Ascensão (p. 131), Manso (p. 52), Mathias de Souza (p. 36), Costa Netto (p. 73), Cabral (p. 88). 145 Antonio Chaves apud Plínio Cabral, Direito Autorais – Dúvidas e Controvérsias, p. 88. 146 José Carlos Costa Netto, O Direito Autoral no Brasil, p. 73.
85
Mas, quais são os direitos morais do autor, previstos pela Lei n° 9.610/98
Houve inovação de direitos ou do exercício deles em relação a Lei de 1973? Para início dos
estudos, reproduzimos na tabela a seguir, os dois artigos das duas leis, lado-a-lado, para
compararmos os textos legais:
Tabela 5: Tabela comparativa entre as Leis 9.610/98 e 5.788/73 Lei 9.610/98 Lei 6.988/73
Art. 24. São direitos morais do autor: Art. 25. São direitos morais do autor:
I - o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra; I - o de reivindicar, a qualquer tempo, a paternidade da obra;
II - o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou
anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra;
II - o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional, indicado ou
anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra;
III - o de conservar a obra inédita; III - o de conservá-la inédita;
IV - o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer
modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam
prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;
IV - o de assegurar-lhe a integridade, opondo-se a quaisquer
modificações, ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-
la, ou atingí-lo, como autor, em sua reputação ou honra;
V - o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada; V - o de modificá-la, antes ou depois de utilizada;
VI - o de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma
de utilização já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem
afronta à sua reputação e imagem;
VI - o de retirá-la de circulação, ou de lhe suspender qualquer forma de
utilização já autorizada.
VII - o de ter acesso a exemplar único e raro da obra, quando se
encontre legitimamente em poder de outrem, para o fim de, por meio de
processo fotográfico ou assemelhado, ou audiovisual, preservar sua
memória, de forma que cause o menor inconveniente possível a seu
detentor, que, em todo caso, será indenizado de qualquer dano ou prejuízo
que lhe seja causado.
§ 1º Por morte do autor, transmitem-se a seus sucessores os direitos a que se
referem os incisos I a IV.
§ 1º Por morte do autor, transmitem-se a seus herdeiros os direitos a que se
referem os incisos I a IV deste artigo.
§ 2º Compete ao Estado a defesa da integridade e autoria da obra caída em
domínio público.
§ 2º Compete ao Estado, que a exercerá através de Conselho Nacional de
Direito Autoral, a defesa da integridade e genuinidade da obra caída em
domínio público.
§ 3º Nos casos dos incisos V e VI, ressalvam-se as prévias indenizações a
terceiros, quando couberem.
§ 3º Nos casos dos incisos V e VI deste artigo, ressalvam-se as indenizações a
terceiros, quando couberem.
Art. 25. Cabe exclusivamente ao diretor o exercício dos direitos morais
sobre a obra audiovisual.
Art. 26. Cabe exclusivamente ao diretor o exercício dos direitos morais sobre
a obra cinematográfica; mas ele só poderá impedir a utilização da película
após sentença judicial passada em julgado.
Art. 26. O autor poderá repudiar a autoria de projeto arquitetônico alterado
sem o seu consentimento durante a execução ou após a conclusão da
construção.
Parágrafo único. O proprietário da construção responde pelos danos que
causar ao autor sempre que, após o repúdio, der como sendo daquele a
autoria do projeto repudiado.
Art. 27. Se o dono da construção, executada segundo projeto arquitetônico
por ele aprovado, nela introduzir alterações, durante sua execução ou após a
conclusão, sem o consentimento do autor do projeto, poderá este repudiar a
paternidade da concepção da obra modificada, não sendo lícito ao
proprietário, a partir de então e em proveito próprio, dá-Ia como concebida
pelo autor do projeto inicial.
Art. 27. Os direitos morais do autor são inalienáveis e irrenunciáveis. Art. 28. Os direitos morais do autor são inalienáveis e irrenunciáveis.
Numa análise preliminar, podemos observar que a redação do artigo 24 da nova lei
9.610/98 praticamente repete o texto do artigo 25 da antiga Lei 6.988/73, com apenas
pequenas alterações em alguns dispositivos. Sendo assim, vejamos quais são os direitos
morais do autor, na lição de Vieira Manso:
86
Em espécie, são estes alguns dos direitos morais, que todavia não se esgotam nesta relação meramente exemplificativa, parte dos quais tipificados no art. 25 da Lei n° 5.988/73: ● o direito a paternidade, ou seja, o direito de ser reconhecido como o autor (‘pai’) da obra intelectual, implicando o direito de ter seu nome ligado à obra e aos exemplares em que ela venha a ser reproduzida, salvo a manifestação expressa do desejo de que ela seja publicada anonimamente, ou sob pseudônimo; ● o direito de conservar a obra inédita, faculdade que, do ponto de vista positivo, implica o direito de publicar a obra, que, dado seu caráter nitidamente econômico, é um dos direitos patrimoniais; ● o direito de definir a forma final da obra, o que envolve o direito de manter essa forma assim definida, impedindo qualquer alteração prejudicial à ela; ● o direito de renome autoral, ou seja, o direito de defender-se contra qualquer ato que possa prejudicar sua reputação ou sua honra, como produtor intelectual; ● o direito de modificação da obra, em qualquer tempo, desde que respeitados os direitos adquiridos por seus co-contratantes; ● o direito de publicar sua obra anonimamente, ou sob pseudônimo, ou qualquer outro sinal convencional, sem que isso implique a obrigação de manter-se anônimo ou ocultado por outros nomes definitivamente, porque poderá dar-se a conhecer em outra oportunidade, também respeitando-se os direitos adquiridos; ● o direito de arrependimento, ou direito de retrato, que autoriza o autor a retirar sua obra de circulação, bem como o de suspender-lhe qualquer forma de utilização já iniciada ou simplesmente autorizada, desde que responda pelos danos que essa decisão causar a terceiros 147.
Carlos Fernando Mathias de Souza, ao comentar os setes direitos morais do
autor elencados pela Lei 9.610/98, observa com muito primor a ressalva que o legislador fez
acerca do direito de arrependimento, tecendo ao final uma crítica à redação do dispositivo no
novo diploma legal, que ao seu entender, não foi tão benéfico ao autor quanto na lei anterior:
A lei n° 9.610/98 inovou em matéria de direito moral, criando, em parte, restrição ao seu exercício, no que diz respeito à retirada de circulação ou de suspensão de utilização já autorizada. A restrição reside no fato de limitar o exercício de tal direito moral a hipóteses em que a circulação ou utilização implicarem afronta à reputação ou à imagem do autor. É tema que, por certo, suscitará muita divergência, tanto no campo doutrinário quanto no próprio cumprimento da lei, não sendo difícil prever que daí advirão muitas demandas. Parece induvidoso que a disciplina do direito moral em destaque estava melhor resguardada no regime da Lei n° 5.988/73, eis que nessa sistemática, o autor podia retirar de circulação a obra ou suspender a utilização autorizada sem quaisquer limites, ficando, evidentemente, responsável pelas indenizações a terceiros, quando cabíveis148.
147 Eduardo Vieira Manso, O que é Direito Autoral, p. 53-54. 148 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral – Legislação Básica, p. 36.
87
Parece que Mathias de Souza tem razão, quando disse que tal direito seria alvo
de inúmeras discussões na justiça. José Carlos Costa Netto, em sua obra, nos traz justamente
em destaque, uma controvérsia discutida em juízo:
Possivelmente, no contexto dessas regras tutelares dos direitos morais de autor, uma das questões mais importantes seja reprimir o uso depreciativo da obra intelectual, em todas as nuances que possa resultar. A respeito, a decisão do Superior Tribunal de Justiça que condenou uma galeria a indenizar artista plástico pela realização de exposição de suas obras ‘em detrimento do respeito ao seu autor’: ‘Embora não se possa negar ao adquirente de uma obra de arte, especialmente em se tratando de galeria de arte, o direito de expô-la, não se pode deixar sem proteção outros direitos decorrentes da produção artística ou intelectual, tais como o da titularidade da autoria e o da intangibilidade da obra. A teleologia d Lei 5.988/73, ao garantir a integridade da obra artística ou intelectual, veda a utilização dessa em detrimento ao respeito de seu autor, ensejando reparação do dano causado’. (Ementa do acórdão proferido em 19/10/1991 no recurso especial 7.550-SP (91.0001018-9), por votação unânime de sua Quarta Turma, relator o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira)149 .
A grande importância dos direitos morais reside no fato de serem
imprescritíveis, inalienáveis e irrenunciáveis. Se assim não fossem, o autor de uma obra
poderia ter facilmente arrancado de si, direitos próprios somente daquele criador que conhece
sua criação, pois esta é fruto do seu espírito criativo. Tanto o é, que os herdeiros e sucessores
só adquirem alguns dos direitos morais do autor; são os relacionados nos incisos I a IV do art.
24 da Lei n° 9.610/98 (descritos na Tabela 4). E não o fazem em benefício próprio, mas em
memória do autor falecido, visando assegurar e garantir a integridade da autoria e da criação
literária, artística ou científica deixada pelo de cujus.
3.1.2. Os direitos patrimoniais do autor
Explicado os direitos morais – ou pessoais, como prefere Ascensão – passamos
agora a analisar a outra face do direito do autor: os direitos patrimoniais. Consiste no direito
que o autor tem de tirar proveito econômico de sua obra prima, da criação intelectual que
produziu. Eduardo Vieira Manso ensina:
149 José Carlos Costa Netto, O Direito Autoral no Brasil, p. 74.
88
Por ‘direito patrimonial’, ao contrário, se entende o conjunto de prerrogativas que permitem ao seu titular a utilização econômica da obra intelectual. Mediante o exercício de um direito patrimonial, o titular pode tirar dela algum proveito econômico, de conformidade com sua natureza e com a modalidade de sua exploração comercial. (...) Os direito patrimoniais, em verdade, não passam de um único tipo de direito: o direito de utilização econômica da obra intelectual, que, de resto, é o direito inscrito na Constituição Federal, como garantia constitucional. (...) É impossível desfilar os direitos patrimoniais, porque todos se resumem em tirar proveito econômico da obra intelectual, ou seja, todos consistem em utilizá-la. (...) No entanto, para fins de sistematização da matéria, é possível dizer que os direitos patrimoniais do autor são de duas modalidades genéricas: o direito de reprodução e o direito de representação, como, aliás, declara expressamente a lei francesa de 1957150.
Carlos Fernando Mathias de Souza, em sua obra, nos traz importante relato
sobre a controvérsia entre a natureza jurídica do direito autoral, e o embate entre a teoria
monista e dualista. José Carlos Costa Netto é mais enfático, afirmando com clareza didática
que o legislador brasileiro adotou a teoria dualista:
Assim é inegável a efetiva absorção – pelo direito brasileiro – da noção de ‘existência paralela’ de dois direitos de natureza diversa: um pessoal (intransferível e irrenunciável) e outro patrimonial (negociável), que nascem, simultaneamente, de um mesmo bem (a obra intelectual) – o que acarretaria a ‘hibridez’ do direito de autor – e se tornou consagrada, em definitivo, com o advento da Lei 5.988, de 14/12/1973, que regulou os direitos autorais no Brasil, princípio reeditado pela Lei 9.610 de 19/2/1998151.
Nos parece clara a escolha do legislador pela teoria dualista, e
conseqüentemente, a divisão clássica entre dois tipos de direitos patrimoniais do autor: o
direito de reprodução e o direito de representação. Ressalta Ascensão que o direito
patrimonial não é um simples direito de utilização, “mas sim num exclusivo (direito) de
exploração econômica da obra152” Sendo um direito exclusivo do autor, podemos dizer que
se trata de verdadeira faculdade, que o autor pode exercer em uma das formas que mais lhe
convier. José Carlos Costa Netto analisa muito bem porque esta tendência da doutrina
brasileira autoralista distinguir dois tipos de direitos patrimoniais:
Nesse contexto, quais seriam as possibilidades de utilização das obras intelectuais? A doutrina clássica ensina que são, basicamente, duas: a reprodução e a representação. Consideradas em sua origem, não é difícil
150 Eduardo Vieira Manso, O que é direito autoral, p. 52; 55-56. 151 José Carlos Costa Netto, O Direito Autoral no Brasil, p. 51. 152 José de Oliveira Ascensão, Direito Autoral, p. 164.
89
entender porque, do termo genérico e abrangente ‘utilização’, extraem-se apenas essas duas espécies, uma vez que o direito de reprodução (copyright) consistiu na origem conhecida de proteção legal ao direito de autor e o direito de representação, instituído legislativamente na Franca em 1791, se referia às obras dramáticas (ou teatrais), cuja proteção ou arrecadação de direitos patrimoniais motivou as primeiras iniciativas associativas entre autores. Assim, embora justificas essas duas abrangentes vertentes como espécies do gênero utilização, é necessário que se dê aos termos ‘reprodução’ e ‘representação’ uma elasticidade improvável para que possam conter não só as espécies de utilização de obras intelectuais que emergiram do inicio do século até agora, mas também o que ainda está para surgir com o incremento da evolução tecnológica e dos meios de comunicação153.
Vieira Manso, também parte desta visão da constante evolução tecnológica ao
qual o direito autoral está sujeito, explicando com sábia simplicidade:
A utilização econômica da obra intelectual depende do estado da técnica, porque é o desenvolvimento tecnológico que possibilita as mais variadas modalidades de sua exploração econômica, cujo ponto de partida foi o aprimoramento da imprensa. (...) Sempre que uma nova invenção possibilite a comunicação pública da obra intelectual, seja mediante a fabricação de novos exemplares, seja mediante sua apresentação direta, essa modalidade de utilizá-la competirá, exclusivamente, ao autor, ou aos seus sucessores, enquanto a obra não cair no domínio público154.
Parece-nos claro que qualquer nova forma de comunicação ao público da obra
pertence única e exclusivamente ao autor, quer através da representação, quer da reprodução.
Neste direito está o cerne da questão controversa sobre a livre distribuição de conteúdo
autoral pela Internet; porém, mais adiante, adentraremos com maiores detalhes neste
espinhoso tema.
Sendo o direito de reprodução um direito patrimonial do autor, em caso de
indício de violação de tais direitos, caberia alguma medida cautelar que poderia impedir tal
ilegalidade? Carlos Fernando Mathias de Souza, mais uma vez, nos traz uma preciosa
informação sobre a tendência dos tribunais acerca do interdito proibitório em face de ações
envolvendo direitos autorais:
Por ilustrativo, recorde-se que a tese de Piola Caselli estaria robustecida com decisões judiciais que não admitem o Interdito Proibitório (art. 932 do
153 José Carlos Costa Netto, Ob cit., p. 80. 154 EduardoVieira Manso, Op.cit., p.56-57
90
Código de Processo Civil155) para proteção autoral. (...) Sem embargo de tal julgado, há muitos juristas que entendem de forma diversa, e, na jurisprudência pátria, também encontram-se muitas outras decisões em sentido contrário à apontada orientação.(...) Sem embargo de respeitáveis opiniões, em sentido favorável ao uso do interdito proibitório ou proibitório, o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso Extraordinário n° 103.058/DF (relator ministro Soares Muñoz) entendeu não ser possível156”.
Não sendo possível o expediente do interdito proibitório para coibir iminente
lesão a direitos do autor, o ministro relator aponta outro norte, conforme apresenta-nos
Mathias de Souza:
Nessa linha, a ação cabível seria pela via prevista no art. 287 157do CPC. (...) Veja-se, por ilustrativo, o que consta do voto do relator sobre o particular em destaque: ‘Penso, contudo, que houve engano na petição inicial, quanto à denominação da ação. A ofensa à posse de invenção ou de direitos do autor, uma vez consumada, dificilmente se poder imaginar reparada por interditos proibitórios (Cf. Adroaldo Furtado Fabrício, in Comentários ao Código de Processo Civil, p. 454, 2ª ed.). No caso, o autor quer pôr fim ao uso indevido que o réu vem fazendo de irradiação de músicas sem o pagamento das contribuições devidas aos compositores. Cuida-se, na verdade, de ação ordinário de preceito cominatório, admitida no art. 287 do Código de Processo Civil e, como tal, não alcançável pelo veto regimental. A transformação da ação na adequada exige, na espécie ‘sub judice’, apenas retificação de sua denominação e, por isso, pode ser operada, inclusive, em grau de recurso, seja qual for, como acentua Moniz e Aragão (cf. Comentário ao Código de Processo Civil, II vol, p. 388, 4ª ed.)158.
Enfim, a última palavra ficou com o Superior Tribunal de Justiça que editou a
Súmula n° 288, vetando expressamente o uso do interdito proibitório para a proteção do
direito autoral. Diz a Súmula n° 288 que: “É inadmissível o interdito proibitório para a
proteção do direito autoral”. Portanto, no ordenamento jurídico brasileiro, a via processual
cabível é ação de conhecimento visando sentença constitutiva com caráter pecuniário de
natureza auto-executiva.
É através dos direitos patrimoniais que o autor exerce o seu direito de uso,
fruição e disposição sobre a obra intelectual que criou, nos termos do artigo 28 da Lei n° 155 Lei nº 5.869, de 11.1.1973: “Art. 932:O possuidor direto ou indireto, que tenha justo receio de ser molestado na posse, poderá impetrar ao juiz que o segure da turbação ou esbulho iminente, mediante mandado proibitório, em que se comine ao réu determinada pena pecuniária, caso transgrida o preceito”. 156 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral – Legislação Básica, p. 41, 124. 157 Lei nº 5.869, de 11.1.1973: “Art.287: Se o autor pedir a condenação do réu a abster-se da prática de algum ato, a tolerar alguma atividade, ou a prestar fato que não possa ser realizado por terceiro, constará da petição inicial a cominação da pena pecuniária para o caso de descumprimento da sentença (arts. 644 e 645).”. 158 Carlos Fernando Mathias de Souza, Ob. Cit, p. 124-125.
91
9.610/98. As formas de utilização da obra estão previstas no artigo 29, que abaixo
transcrevemos, comparando o texto da nova lei com a sua antecessora:
Tabela 6: Tabela comparativa entre as Leis 9.610/98 e 5.788/73 Lei 9.610/98 Lei 6.988/73*
Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como:
Art. 30. Depende de autorização do autor de obra literária, artística ou científica, qualquer forma de sua utilização, assim como:
I - a reprodução parcial ou integral; II - a edição; I - a edição; III - a adaptação, o arranjo musical e quaisquer outras transformações; III - a adaptação ou inclusão em fonograma ou película cinematográfica; IV - a tradução para qualquer idioma; II - a tradução para qualquer idioma;
V - a inclusão em fonograma ou produção audiovisual;
VI - a distribuição, quando não intrínseca ao contrato firmado pelo autor com terceiros para uso ou exploração da obra;
VII - a distribuição para oferta de obras ou produções mediante cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou qualquer outro sistema que permita ao usuário realizar a seleção da obra ou produção para percebê-la em um tempo e lugar previamente determinados por quem formula a demanda, e nos casos em que o acesso às obras ou produções se faça por qualquer sistema que importe em pagamento pelo usuário;
VIII - a utilização, direta ou indireta, da obra literária, artística ou científica, mediante: a) representação, recitação ou declamação; b) execução musical; c) emprego de alto-falante ou de sistemas análogos; d) radiodifusão sonora ou televisiva; e) captação de transmissão de radiodifusão em locais de freqüência coletiva; f) sonorização ambiental; g) a exibição audiovisual, cinematográfica ou por processo assemelhado; h) emprego de satélites artificiais; i) emprego de sistemas óticos, fios telefônicos ou não, cabos de qualquer tipo e meios de comunicação similares que venham a ser adotados; j) exposição de obras de artes plásticas e figurativas;
IV - a comunicação ao público, direta ou indireta, por qualquer forma ou processo, como: a) execução, representação, recitação ou declamação; b) radiodifusão sonora ou audiovisual; c) emprego de altofalantes, de telefonia com fio ou sem ele, ou de aparelhos análogos; d) videofonografia. Parágrafo único. Se essa fixação for autorizada, sua execução pública, por qualquer meio, só se poderá fazer com a permissão prévia, para cada vez, do titular dos direitos patrimoniais de autor.
IX - a inclusão em base de dados, o armazenamento em computador, a microfilmagem e as demais formas de arquivamento do gênero;
X - quaisquer outras modalidades de utilização existentes ou que venham a ser inventadas.
* Obs: Fizemos a correspondência entre os arquivos, por este motivo, não aparecem na exata ordem conforme consta do texto legal.
Evidente que se trata um rol exemplificativo, pois o próprio texto do artigo 29,
no inciso X (acima descrito), estabelece que dependerá de autorização do autor qualquer nova
forma de utilização que venha a ser inventada, bem como observou Manso, nos seus
ensinamento supra citados.Costa Netto ainda acentua no seu livro que, por influência do
direito francês, tende-se a admitir que o direito de reprodução seria forma de comunicação
indireta ao público, enquanto a representação, a comunicação direta. Sendo assim, podemos
tentar delimitar o que seja cada um desses direitos:
A comunicação indireta decorreria de estar a obra intelectual incorporada em um suporte material: um livro, por exemplo (uma ‘reprodução’ da obra), e a comunicação direta resultaria da representação (ou interpretação) da obra, o que não chega a justificar o critério: por que seria, por exemplo, ‘direta’ a audição da leitura (interpretada) de uma história e ‘indireta’ a sua leitura pelo próprio destinatário final? Não seria o contrário: a leitura da obra consistiria na sua comunicação direta ao leitor, e sua dramatização, numa comunicação indireta do texto e direta da obra dramática ou da interpretação? A
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diferenciação não resultaria – neste caso – mais da natureza da obra (literária, de um lado, e dramática ou teatral, do outro) do que a forma de comunicação ao público?159.
Portanto, na lição de Costa Netto, o direito de reprodução são aqueles que
“decorrem da reprodução, em qualquer suporte, da obra intelectual160”. Aqui podemos
localizar os direitos do intérprete, do produtor de fonogramas e dos compositores musicais, e
onde se encontram mais ameaçados, com o advento de novas tecnologias. Hoje, com a
popularização do formato de arquivos digitais MP3161, nos deparamos com uma nova forma
de suporte, que porém, não é material, mas sim digital e abstrato, intocável e invisível aos
olhos humanos. Na obra de Costa Netto, temos a definição de direito de representação:
(...) decorrem da ‘interpretação (ou execução) de uma obra mediante ações, tais como encenação, canto, dança ou projeção, realizados na presença do espectador ou transmitido através de mecanismos ou processos técnicos, tais como microfones, radiodifusão ou televisão por cabo’162
Se já vimos que cabe ao autor a exclusividade da utilização desses direitos,
Costa Netto elenca ainda dois elementos essenciais para que seja efetivada a utilização de tais
direitos: a primeira é a “obrigatoriedade de autorização ou licença (concessão) ou cessão de
direitos”; a segunda, “a delimitação das condições de uso – nos dois casos: de concessão ou
cessão – da obra pelo licenciado”. A nova lei 9.610/98 regula de forma muito clara o instituto
da cessão ou concessão de direitos autorais, no seu Capítulo V, dos artigos 49 a 52163. De
acordo com a lei, na transferência de direitos autorais, devem ser obedecidas certas
exigências, que Costa Netto apresenta-nos em sua obra:
a) os direitos do autor podem ser, total ou parcialmente, transferidos a terceiros por ele ou por seus sucessores, a título universal ou singular, pessoalmente ou por meio de representante com poderes especiais, por meio de licenciamento, concessão, cessão ou outros meios admitidos em Direito; b) somente se admitirá transmissão total ou definitiva dos direitos (de autor) ‘mediante estipulação contratual escrita’; c) poderá a cessão ser averbada à margem do registro a que se refere o artigo 19 da Lei 9.610/98 (registro de obras intelectuais, de natureza presuntiva e não constitutiva de autoria); d)
159 José Carlos Costa Netto, Ob cit., p. 81. 160 Idem, p. 81. 161 “O MPEG Layer 3, popularmente conhecido com MP3, é um formato de áudio suportado por diversas plataformas. Qual sua maior vantagem? O MP3 reduz o tamanho dos arquivos de áudio a cerca de 1/12 do original, eliminando partes imperceptíveis ao ouvido humano. Isso se traduz em arquivos que podem ser facilmente transferidos, sem perdas notáveis de qualidade” (in André Valle, Cláudia Guimarães e Fabrício Chalub, MP3 – A Revolução do som via Internet, p. 2). 162 Ibidem, p. 81. 163 Os artigos estão reproduzidos no Anexo 4
93
constarão do instrumento de cessão como elementos essenciais seu objeto e as condições de exercício do direito quanto a tempo, lugar e espaço (grifo nosso); e) a cessão de direitos de autor sobre obras futuras abrangerá, no máximo, o período de cinco anos164.
Fica evidente que a transferência de direitos autorais é um negócio jurídico,
que deve atentar para os requisitos de validade dos atos jurídicos em geral: agente capaz – o
autor ou quem tenha poderes especiais, objeto lícito – a cessão deve recair apenas sobre
direitos patrimoniais, sendo nulas cláusulas que versem sobre direitos morais do autor – e
forma prescrita em lei – neste caso, o contrato deve ser escrito. A formalidade da averbação
junto ao registro da Biblioteca Nacional, que era obrigatório na vigência da Lei anterior,
passou a ser facultativo, sendo admitido, inclusive, registro em Cartório de Títulos e
Documentos.
Algumas inovações são apontadas por Costa Netto em sua obra, no que tange
ao tratamento que nova lei 9.610/98 dá à transferência de direitos autorais, em relação a
anterior, presentes nos incisos III a VI do artigo 49165:
a) na hipótese de não haver estipulação contratual escrita, o prazo máximo será de cinco anos; b) a cessão, caso não haja estipulação em contrário, será valida unicamente para o país em que se firmou o contrato; c) a cessão só operará para modalidades de utilização já existentes à data do contrato; e d) não havendo especificações quanto à modalidade de utilização, o contrato será interpretado restritivamente, entendendo-se como limitada apenas a uma que seja aquela indispensável ao cumprimento da finalidade do contrato166.
Conclui-se, com isso, que a nova lei é mais benéfica aos autores na proteção de
seus direitos, interpretando sempre a seu favor, cláusulas contratuais que sejam silentes, na
transmissão ou licença de direitos. Para ilustrar tal lição é que recorremos à obra de Mathias
de Souza, que transcreve decisão judicial:
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por sua 7ª Câmara Cível, entendeu que a republicação de trabalho artístico em fotonovela, em ocorrendo após o advento da Lei n° 6.533, garante pagamento aos artistas, mesmo que tivessem firmado documento autorizando a utilização. Na fundamentação do acórdão, dentre outros argumentos, consta o seguinte: ‘Muito embora haja a maioria dos artistas firmados recibos em que constava nada mais terem a reclamar, certo é que isso ocorreu em 1975, antes da vigência da Lei n° 6.533/78, constando de seu art. 13 que: Não será permitido a cessão ou
164 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 79-80. 165 Vide os artigos no Anexo 4. 166 Idem, p. 80.
94
promessa de cessão de direitos autorais e conexos, decorrentes da prestação de serviços profissionais. Parágrafo único – Os direitos autorais e conexos aos profissionais, serão devidos em decorrência de cada exibição da obra’’167.
Apesar de coerente a decisão do magistrado de segundo grau, o Supremo
Tribunal Federal, no julgamento deste Recurso Extraordinário de n° 101.280/RJ, tendo como
ministro relator Aldir Passarinho, somente reconheceu o direito à indenização àqueles artistas
que, não tendo recebido qualquer remuneração anterior, não tinham dado autorização para tal
reprodução:
O Supremo Tribunal Federal, contudo, agasalhou a tese contida na sentença de primeira instância: ‘Direitos Autorais e Conexos: reprodução de imagens de artistas profissionais. Se artistas autorizaram expressamente, mediante pagamento, que suas imagens de trabalho em fotonovelas fossem reproduzidas em revista especializada, não podem pretender receber novos valores apenas por terem tais publicações sido posteriores à Lei n° 6.533/78, e com a invocação no disposto no parágrafo único do seu art. 13. É que a lei não poderá atingir o ato jurídico perfeito, sob pena de maltrato ao §3° do art. 153 da Constituição Federal. Quanto a outros artistas, que não deram autorização para a reprodução, e nem receberam pagamento por ela, cabe-lhe direito ao recebimento da indenização’168.
Tal remuneração adicional por nova publicação ou retransmissão é uma
questão amplamente discutível. Seria o caso de atores de telenovela que, ao firmarem acordo
para gravação, consentiram com a exibição original dos capítulos; porém, se há nova
exibição pela própria produtora ou sua revenda para outra emissora no exterior ou no país,
seria o caso de nova remuneração de todo o “casting” (elenco) de atores que participaram do
videofonograma.
3.1.3. O direito de seqüência (droit de suíte)
Na definição de Carlos Fernando Mathias de Souza, o direito de seqüência é
“direito irrenunciável e inalienável, que tem o autor de perceber, no mínimo, cinco por cento
sobre o aumento do preço (mais valia), eventualmente verificável em cada revenda da obra
167 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral – Legislação Básica, p. 83. 168 Idem, p. 83-84.
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de arte e manuscritos, sendo originais, que houver alienado169”. Eduardo Vieira Manso inclui
o direito de seqüência entre os direitos patrimoniais, classificando-o como mais um tipo, além
dos já estudados direitos de representação e reprodução, além de fazer uma crítica à
nomenclatura utilizada:
Um terceiro tipo de direito patrimonial, de natureza autoral, existe, que, embora até esteja previsto na Convenção de Berna, desde o Ato de Estocolmo (que, aliás, nunca chegou a entrar em vigor, tendo sido inteiramente substituído pelo de Paris, de 1971), conforme o seu artigo 14-ter. Porém não está presente em todas as legislações nacionais dos paises signatários daquele tratado.É um direito que tem origem no direito autoral francês e, por isso, é muito mais conhecido pelo seu nome francês: droit de suíte. Muitos têm traduzido essa locução por ‘direito de seqüela’, ou ‘direito de seqüência’ (como faz, por exemplo, o artigo 54 do Código de Direito de Autor, de Portugal). Não parece boa, no entanto, essa tradução, porque no direito brasileiro o direito de seqüência é uma prerrogativa típica do direito de propriedade e confere ao proprietário o poder de seguir, ou reivindicar, sua coisa, nas mãos de quer que a possua sem justo título, como no caso do credor hipotecário170.
Para Manso, o “droit de suite” também não pode ser traduzido, de forma
equivocada, como direito de seqüela, apesar do autor possuir também tal direito; é graças a ele
que, o autor, consegue apreender exemplares provenientes de contrafação:
Assim também, semelhantemente o direito de seqüela. O autor, como qualquer outro titular de direito autoral, tem, é claro, o direito de seqüela sobre a própria obra, ou sobre os direitos autorais, porque estes são exclusivos. Assim, sempre que forem subtraídos de seus titulares, poderão estes reivindicá-los de quem injusta e indevidamente os retenha ou utilize a obra intelectual. Daí porque a reprodução não autorizada e a reprodução fraudulenta de obra permitem a busca e apreensão dos exemplares assim distribuídos171.
A apreensão de exemplares falsos ou não autorizados está prevista no art.
102172 da Lei n° 9.610/98, bem como a ação cabível está descrita no art. 287 do Código de
Processo Civil. Portanto, direito de seqüência recai somente sobre a revenda por mais-valia de
obra intelectual. Mas o que seria essa “mais-valia173”? Na lição de Mathias de Souza:
169 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral – Legislação Básica, p. 99. 170 Eduardo J. Vieira Manso, O que é direito autoral, p. 57. 171 Idem, p. 57. 172 Vide Anexo 4. 173 A “mais valia” é um conceito cunhado por Karl Marx. Consiste no resultado da equação econômica “Valor produzido pela força de trabalho” menos “Custo de manutenção da força de trabalho (salário do operário, custos de produção com maquinário, matéria-prima, etc)”. É, pois, o lucro indireto que o dono do Capital aufere às custas da mão-de-obra barata do trabalhador.
96
(...) a nova lei deu nova disciplina ao direito de seqüência (droit de suíte), qual seja o direito que tem o autor, em caráter irrenunciável e inalienável, de participação da mais-valia, que advier da alienação pelo autor de obra de arte ou manuscrito, sendo originais. O novo ordenamento reduziu a participação de 20% para 5% da mais-valia, excluiu a ressalva quanto ao acréscimo que decorresse da inflação, como na Lei n° 5.988/73, bem como o limite no referente ao valor. Como sabido, a Lei n° 5.988/73 excluía o direito em tela quando o aumento do preço resultasse apenas da desvalorização da moeda, ou quando o preço alcançado fosse inferior a cinco vezes o valor do maior salário-mínimo174.
Portanto, na nova lei, o aumento do preço de revenda deve ser real, e não
apenas, decorrente de atualização monetária. Mathias de Souza aponta que a nova Lei de 1998
deu efetiva utilidade prática ao direito de seqüência, uma vez que, na lei anterior, não havia
especificação expressa sobre quem haveria de recolher os valores referentes à mais-valia da
obra:
Como bem se sabe a Lei n° 5.988 limitou-se a criar o direito de seqüência, sem definir o responsável pelo recolhimento. É evidente que se poderia dizer que a obrigação é do vendedor, posto que é sobre a mais-valia advinda que incide a participação. Melhor seria, contudo,a disciplina expressa, inclusive (por que não?) fixando a responsabilidade solidária do vendedor e do comprador. Com a nova lei (parágrafo único do art. 39) pelo menos, ficou estabelecido que caso o autor não perceba seu direito de seqüência no ato da revenda, o vendedor é considerado depositário da quantia a ele devida, salvo se a operação for realizada por leiloeiro, quando será este o depositário175.
Chegamos à conclusão de que, apesar do direito de seqüência estar mais afeto
ao direito patrimonial, por outro lado possui forte ligação a própria pessoa do artista, por ser
irrenunciável e inalienável, características exclusivas dos direitos morais; neste caso, ele está
posicionado ao lado dos dois direitos, sem pertencer a quaisquer deles exclusivamente, como
bem acentuou Eduardo Vieira Manso:
Contudo, o direito à mais-valia (como também o droit de suite) não é um direito autoral de utilização. Não se compreende, portanto, na garantia constitucional brasileira, de modo que o legislador ordinário pode, se quiser, extingui-lo. Por essa razão, o seu exercício foge da vontade do autor, ou dos herdeiros deste. Estes não podem provocar nem impedir o seu nascimento. Ele resulta de atos de terceiros, que são absolutamente livres para praticá-los ou não, porque consistem na alienação de obras de arte, de manuscritos ou de direitos autorais regularmente adquiridos por terceiros. Trata-se, portanto, de
174 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral – Legislação Básica, p. 45. 175 Idem, p. 46.
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simples direito de crédito, que é, por isso, relativo, oponível apenas contra aquele que deu causa a esse mesmo crédito176”.
Conclui-se que este direito de seqüência é uma forma do legislador resguardar,
principalmente, o artista plástico ou escultor, tendo em vista que neste caso, a obra (corpo
místico) se confunde com o próprio suporte (corpo mecânico): daí que, na sobrevalorização
da obra a cada nova revenda, ser justo ao artista receber uma porcentagem da revenda. Porém,
no campo prático, ainda não vemos o seu efetivo exercício por parte dos titulares de tal
direito, dada a grande dificuldade, resultante do fato de que a maioria dos leilões de obras de
arte ocorre em outros países, que no mais das vezes, não consagram tal direito aos artistas.
3.1.4. O domínio público
Foi dito, quando do estudo da Lei n° 5.988/3, da extinção do direito público
remunerado. Porém, na oportunidade, nos limitamos a dizer apenas o fato, sem explicarmos o
que era domínio público. Mister se faz, pelo menos, conceituarmo-lo, e destacar alguns traços
importantes.
Na análise do conceito de domínio público, Mathias de Souza fala da diferença
entre o domínio público sob a ótica do direito administrativo e do direito autoral. Para tanto,
Mathias de Souza busca a lição de Hely Lopes Meireles:
E, acrescenta o festejado administrativista: ‘A equivocidade da expressão obriga-nos a conceituar o domínio público em sentido amplo e em seus desdobramentos políticos (domínio eminente) e jurídico (domínio patrimonial). O domínio público, em sentido amplo, é o poder de dominação ou de regulamentação que o Estado exerce sobre os bens do seu patrimônio (bens públicos), ou sobre bens do patrimônio privado (bens particulares de interesse público) ou sobre as coisas inapropriáveis individualmente, mas de fruição geral da coletividade (res nulluis). Neste sentido amplo e genérico, o domínio público abrande não só os bens das pessoas jurídicas de direito público interno, como as demais coisas que, por sua utilidade coletiva, merecem a proteção do Poder Público, tais como as águas, as jazidas, as florestas, a fauna, o espaço aéreo, e as que interessam ao patrimônio histórico e artístico nacional (in Direito Administrativo Brasileiro, 2ª edição revista e ampliada, págs. 431/432)’177.
176 Eduardo J. Vieira Manso, O que é direito autoral, p. 59. 177 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral – Legislação Básica, p. 50-51.
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Por fim, Mathias de Souza conclui sua lição, conceituando que domínio
público “refere-se em geral às obras que se constituem em uma espécie de res communis
ominium (coisa comum de todos), de modo que podem ser utilizadas livremente por quem
quer que seja, com ou sem intuito de lucro178”.
Plínio Cabral, por seu turno, afirma que “quando a obra cai em ‘domínio
público’ e fica à disposição da sociedade, cabe ao Estado defendê-la, para preservar sua
integridade179”. Cabral aponta a faculdade de qualquer do povo acionar – no sentido de
propor ação judicial contra o Estado – quando ele não exercer esta prerrogativa imposta pela
Lei: “O Estado não pode fugir, a não ser por incúria de quem o represente, às obrigações
impostas pela lei como é o caso do patrimônio cultural da nação. E, pela omissão, deverá ser
responsabilizado, cabendo, inclusive, o uso da ação popular180 ”
Conceituado o domínio público, podemos destacar em que hipóteses ele
necessariamente ocorrerá. Mathias de Souza aponta três hipóteses, enquanto Eduardo Vieira
Manso, já consegue vislumbrar quatro. Por isso, destaca-se a lição de Manso:
No Brasil há quatro circunstâncias em que uma obra intelectual, suscetível de ser protegida pelo Direito Autoral, não é mais geradora dos direitos exclusivos de utilização econômica: 1) quando decorreu o prazo de proteção, que, como se viu, não é uno porque será vitalício, se o herdeiro do autor for seu filho, pai ou cônjuge; será de 60 anos após sua morte, se outros forem seus sucessores (outros herdeiros até o segundo grau na linha reta ou colateral; ou legatários, ou cessionário); será de 60 anos, porém, contados da publicação em relação a algumas obras, e de 15 anos, quanto à modalidade de exploração desenvolvida pelas pessoas jurídicas de direito público181.
Cabe aqui, algumas observações importantes a título de atualização das lições
de ilustre professor, tendo em vista que as situações e prazos apresentados, baseavam-se no
artigo 42 da Lei n° 5988/73. A nova redação do artigo 41182 da Lei nº 9.610/98, suprimiu
qualquer diferenciação entre os sucessores, de modo que o novo prazo de proteção é de 70
(setenta) anos, contados a partir de 1° de janeiro, do ano subseqüente à morte do autor,
indistintivamente. E para afastar a polêmica que causaria, no caso de obras que no regime
anterior (de 60 anos), já haviam caído em domínio público, voltarem a ser de domínio dos
178 Carlos Fernando Mathias, Ob. cit, p. 51. 179 Plínio Cabral, Direito Autorais – Dúvidas e Controvérsias, p. 88. 180 Idem, p. 89 181 Eduardo J. Vieira Manso, O que é direito autoral, p. 81-82. 182 O artigo encontra-se transcrito no Anexo 4.
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herdeiros, a própria Lei nº 9.610, em seu artigo 112183, como esclarece Henrique
Gandelman184.
Retornando às lições de Manso, resta-nos verificarmos as outras hipóteses em
que ocorrerá o domínio público:
2) quando o autor falece, sem deixar herdeiro nem sucessor de outra espécie, porque o Estado, no Brasil, não herda direitos autorais, como herda os outros bens, no caso de herança vacante não reclamada dentro de cinco anos da abertura da sucessão; 3) quando se tratar de obra folclórica, ou que não tenha autor conhecido e seja transmitida pela tradição oral; 4) quando a obra tenha como país de origem, isto é, o país de sua primeira publicação, um país que não participa de tratado ou convenção internacional de que o Brasil participe, ou se não conferir, aos autores de obras publicadas no Brasil pela primeira vez, o mesmo tratamento que dispensa aos autores sob sua jurisdição185.
Nota-se, por fim, que esta última hipótese – não lembrada por Gandelman e
Mathias de Souza – é pura decorrência lógica do princípio da reciprocidade, na qual o Brasil
dispensa igual tratamento a estrangeiros, na exata medida em que o país estrangeiro também
trata aos brasileiros na mesma situação.
3.1.5. Os direitos conexos
Existem certos direitos, que por decorrem de algum direito de autor, são
também tuteladas pela lei de direitos autorais com se também o fossem. São direitos conexos
ao do autor. Como bem acentua Mathias de Souza:
Diz-se direito conexo ou vizinho, em matéria autoral, aquele, como o nome está a indicar, que tem conexão ou proximidade com o direito de autor. Assim, os direitos autorais dos artistas intérpretes ou executantes, os dos produtores de fonogramas e das emissoras de radiodifusão, entendidas estas como sendo as empresas de rádio ou de televisão, ou por meio análogo, que transmitem, com a utilização ou não de fio, programas ao público186.
183 Vide o Anexo 4. 184 Henrique Gandelman, O que você precisa saber sobre Direitos Autorais, p.117 185 Eduardo J. Vieira Manso, O que é direito autoral, p. 81-82. 186 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral – Legislação Básica, p. 64.
100
Não se trata de uma inovação da legislação brasileira, mas sim, da evolução
natural da matéria dos direitos autorais. José Carlos Costa Netto, em sua obra, traça um breve
– mas rico – histórico da origem dos direitos conexos:
Hermano Durval, a exemplo de Antonio Chaves, há mais de quarenta anos, portanto, anteriormente à primeira Convenção Internacional que trataria do tema (em Roma, no ano de 1961), já fornecia elementos sobre os direitos conexos ou vizinhos ao direito de autor. Explicou tratar-se de uma categoria que, se de um lado, decorreu da natural evolução da doutrina – notada-mente da doutrina germânica – por outro lado, teve a sua aceitação aumentada pela valorização das invenções modernas que, incontestavelmente, vieram da às obras artísticas, literárias, científicas e musicais uma repercussão até então desconhecidas. O jurista chileno Santiago L. Silva considerou que os direitos conexos ‘se definem como direitos vizinhos ao direito de autor, porém independentes deles’ 187.
Os direitos conexos estão regulados pela Lei 9.610/98 no Título V,
correspondendo cada capítulo a um direito conexo: a) Capítulo II – Dos Direitos dos Artistas
Intérpretes ou Executantes; b) Capítulo III – Dos Direitos dos Produtores Fonográficos; c)
Capítulo IV – Dos Direitos das Empresas de Radiodifusão. Como já dissemos no estudo sobre
o direito de arena, não foi repetida nesta lei o dispositivo da lei 6.988/73, que o incluía entre
os direitos conexos, optando o legislador a deixar que a legislação esportiva regulamentasse
tal matéria.
No artigo 97188 da Lei n° 9.610/98, fica assegura às empresas de radiodifusão
quaisquer direitos sobre suas emissões, ou seja, qualquer parte da sua programação que tenha
sido irradiada. Mathias de Souza, em sua obra, explica quais são as empresas que se inserem
no conceito de Empresa de Radiodifusão, nos termos da lei 9.610/98:
Já por radiodifusão, entende-se a transmissão sem fio, inclusive por satélite, de sons ou imagens e sons ou das representações desses, para recepção ao público e a transmissão de Sinai codificados, quando os meios de decodificação sejam oferecidos ao público, pelo organismo de radiodifusão ou com seu consentimento.189.
Não há maiores detalhes neste direito; analisemos agora o direito dos
produtores de fonogramas. Na lição de Mathias de Souza:
187 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 174. 188 Vide Anexo 4. 189 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral – Legislação Básica, p. 65.
101
Registre-se que produtor de fonogramas, é a pessoa física ou jurídica que toma a iniciativa e tem a responsabilidade econômica de sua primeira fixação, considerado fonograma como toda fixação de sons de uma execução ou interpretação ou de outros sons, ou de uma representação de sons, que não seja incluída em uma obra audiovisual190.
Os direitos dos produtores dos fonogramas estão descritos no artigo 93 da Lei
9.610/98, e basicamente consiste na remuneração sobre a exploração econômica dos
fonogramas, como bem estabelece este dispositivo legal: “O produtor de fonogramas tem o
direito exclusivo de, a título oneroso ou gratuito, a autorizar-lhes ou proibir-lhes...191”.
Qualquer reprodução (cópia direta ou indireta, parcial ou total), distribuição por meio da
venda ou locação de exemplares da reprodução, a comunicação ao público (execução
pública), inclusive por radiodifusão, além de quaisquer outros meios de utilização existentes
ou que venham a ser inventados, são direitos exclusivos do produtor de fonogramas, e devem
ser feitos somente sua autorização expressa.
Nesta linha de pensamento, se alinhavava as discussões sobre o direito ou não
das associações de produtores fonográficos, de processarem os integrantes de redes de
compartilhamento de arquivos na Internet. Mas isto é o tema do próximo capítulo, onde
estudaremos com profundidade esta realidade e suas repercussões no mundo jurídico.
Consoante aos direitos dos produtores de fonogramas e das empresas de radiodifusão, está o
direito dos artistas intérpretes ou executantes, pois é àqueles que estes firmam contratos, para
terem suas vozes, ou voz e imagens, fixados em meio físico ou distribuídos pelas ondas no ar.
Mathias de Souza observa que:
E para contemplar-se essa linha que se poderia designar conceitual, tenha-se os artistas intérpretes ou executantes que são todos os atores, cantores, músicos, bailarinos ou outras pessoas que representem um papel, cantem, recitem, declamem, interpretem ou executem em qualquer forma obras literárias ou artísticas ou expressões do folclore. Como se vê, o conceito de artista em direito autoral não é rigorosamente o mesmo que a está na Lei n° 6.533/78. Na Lei de Direitos Autorais, de forma mais ampla, estão sob o manto de artista, também os radialistas e os grupos folclóricos192.
Em tempo, o produtor de fonogramas tem o dever de repassar a parte da
remuneração auferida com utilização autorizada dos fonogramas, ao artista intérprete ou
190 Carlos Fernando Mathias de Souza, Direito Autoral – Legislação Básica, p. 65. 191 Lei n° 9.610 de 19 de Fevereiro de 1998, artigo 93, caput. 192 Idem, p. 65.
102
executante (art. 94 c.c. art. 68193). Os direitos dos artistas intérpretes estão constantes do artigo
68 da Lei 9.610/98.
Na seara dos fonogramas encontra-se a maior parte dos estudos do impacto da
Internet sobre os direitos autorais. Afinal, trata-se de um debate que envolve vários
personagens: dos produtores dos fonogramas, aos artistas que os interpretam, passando pelo
usuário comum, que adquiriu um suporte original e disponibilizou para outros usuários sem
intuito de lucro. Tentaremos abordar toda essa problemática no próximo capítulo, onde
estudaremos o fonograma musical, os sujeitos dos direitos e a questão da Internet.
3.2. A INTERNET
Afirmamos no início deste trabalho que o homem é um ser criativo, e
transformando o mundo ao seu redor, modifica sua própria essência. É a tônica do “homem
produto do meio”; não se trata mais do selvagem Homem de Nanderthal, mas de um ser
evoluído e em constante evolução.Desde a descoberta da escrita, da invenção da imprensa de
Gutenberg, passando pelos mais diversos experimentos, a Internet, sem dúvida, é a principal
invenção do homem neste fim-de-século. É tão importante que, muitos filósofos e sociólogos,
tendem a afirmar a existência de uma nova sociedade e uma forma de comunicação
globalizada: trata-se da cybercultura e da sociedade da informação. Mas como tudo isso
começou? É o que iremos desvendar a seguir.
Na busca de obras de referência sobre este tema – a Internet – nos deparamos
com uma realidade muito difícil para o pesquisador: a escassez de obras sobre o tema. A
Internet, apesar de ser algo real, até hoje, não foi objeto de muitos estudos quanto à sua faceta
sócio-cultural, o que acaba por determinar um certo desalento à quem é leigo na matéria.
Basicamente, a história da Internet está disposta em vários relatos em sites e
homepages, mas dificilmente, encontramos uma obra que condensasse tudo isto, com a
precisão histórica de um trabalho de pesquisa alicerçado num método científico. A exceção,
fica por conta de duas obras: A Internet de Maria Ercília – um pequeno livro, mas com um 193 Vide Anexo 4.
103
conteúdo riquíssimo em detalhes da história da Internet, onde a autora enfatiza aspectos
filosóficos e sociológicos deste fenômeno – e Internet – o que é, o que oferece, como
conectar-se de Érico Guizzo – um manual ao navegador de primeira viagem. É por este
motivo que, neste sub-capítulo, as referências bibliográficas remeterão a esses dois autores.
3.2.1. Os “profetas” da Internet
Antes mesmo dos primeiros projetos e iniciativas de se criar uma grande rede
de informações, houve pessoas que ousaram pensar – e escrever seus pensamentos – numa
realidade improvável no fim do Século XIX e início do Século XX; os chamadas “profetas da
Internet”, foram escritores e pensadores, que à frente do seu tempo, vislumbraram um “vulto”
daquilo que tornar-se-ia a Internet de hoje.
Maria Ercília, em seu livro A Internet, apresenta quatro dessas grandes figuras
– hoje míticas, mas tidas em seu tempo, como sonhadoras: H. G. Wells, Pierre Teilhard de
Chardin, Vanevar Bush e Douglas Engelbart. Cada qual com sua teoria ou invento, prestou
contribuições importantes, que foram bases para novas descobertas e tecnologias, que
possibilitaram o surgimento e a explosão da Internet.
3.2.1.1. Wells e seu “Cérebro Onipresente”.
Para o escritor Herbert George Wells (1866-1946), a microfilmagem consistiria
na base da revolução da organização do conhecimento da humanidade:
Ele previu o homem na Lua, a fissão atômica e a emancipação da mulher, além de outras que jamais se realizaram, como viagens no tempo. O que poucos sabem é que o escritor britânico H. G. Wells (1866-1946), autor de Guerra dos Mundos e A Máquina do Tempo, anteviu a internet com uma precisão surpreendente em textos que publicou em 1938, no primeiro volume World Brain: the Idea of a Permanent Encyclopedia (Cérebro Mundial: A Idéia de uma Enciclopédia Permanente).Wells acreditava que o microfilme poderia ser a mídia de arquivos do futuro. Ele descreve, em World Brain,
104
com o conhecimento humano poderia ser sintetizado e interligado em fac-símiles microfilmados de todas as obras conhecidas194.
A microfilmagem – técnica que consistia na fotografia microscópica de
documentos, armazenadas em fichas de papel fotográfico – para Wells, seria a base duma
revolução da forma de armazenar, organizar e distribuir o conhecimento humano. Maria
Ercília, reproduz um trecho da obra de Wells, onde podemos reconhecer, estupefatos, a
extraordinária visão profética deste escritor:
Não há nenhum obstáculo prático à criação de um índice eficiente de todo o conhecimento, idéias e conquistas humanos, à criação de uma completa memória planetária para toda a humanidade. E não simplesmente um índice; a reprodução direta da coisa em si pode ser invocada em qualquer lugar apropriadamente preparado. Um microfilme colorido, quando necessário, ocupando uma polegada de espaço e pesando pouco mais do que uma carta, pode ser duplicado a partir de arquivos e mandado a qualquer lugar. Isso é si um fato de tremenda significação. Antecipa uma verdadeira unificação intelectual de nossa espécie. Toda a memória humana, pode ser, e provavelmente num período muito curto será mesmo, acessível a qualquer individuo. E o que é também de grande importância neste mundo incerto, onde a destruição se torna cada vez mais freqüente e imprevisível, é isto: que a fotografia agora garante toda a facilidade para criar duplicatas deste – como podemos chamá-lo? – deste novo cerebrum totalmente feito pelo homem195.
Impressionante a capacidade de Wells prever, que os arquivos físicos,
poderiam ser lidos a partir de qualquer lugar do mundo, antevendo como seria a busca de
informações que a Internet de hoje possibilita. Vejamos o que disse Wells:
Não é necessário que fique concentrado num único lugar. Não precisa ser vulnerável como uma cabeça humana ou um coração humano são vulneráveis. Pode ser reproduzido, exata e completamente, no Peru, na China, na Islândia, na África Central ou onde quer que se possa garantir segurança contra o perigo e a interrupção196.
Wells previa que este grande cérebro seria onipresente – e não centralizado –
para evitar, justamente, que fosse alvo fácil da destruição; graças a tal capacidade de estar
dividido – mas ser uma coisa só – estaria a salvo de qualquer perigo e seria perpétuo, eterno –
diferentemente do cérebro humano e todo conhecimento que armazena, que perece com a
morte do indivíduo. Interessante notar que a Internet justamente nasceu duma experiência
194 Maria Ercília, A Internet, p. 22. 195 Idem., p. 24. 196 Ibidem, p. 24.
105
militar que visava criar uma rede de computadores descentralizada, que continuasse a trocar
dados e informações, ainda que uma parte fosse destruída; ou seja, Wells previu com exatidão
tal realidade.
3.2.1.2. O jesuíta De Chardin e sua Noosfera.
Para o místico jesuíta Pierre Teilhard de Chardin (1881-1955), importante
paleontólogo – ele participou da descoberta do Homem de Pequim, fóssil ancestral do homem
moderno, descoberto na China em 1927 – após uma visão espiritual, cunhou uma teoria, que
tentava unir fé e razão, e que despertou a ira de muitos de seu tempo (tanto de cientistas,
quanto da própria Igreja, o que quase resultou em sua excomunhão), como bem descreve
Maria Ercília:
Theilhard de Chardin cunhou – em 1925! – a palavra ‘noosfera’ (do grego noos, mente) para nomear a teia de informação e conhecimento que vislumbrava. O mundo teria primeiramente desenvolvido uma geosfera, depois uma biosfera, e o próximo estágio seria o da noosfera, que ele chamou de ‘circuito do pensamento’, uma ‘estupenda máquina de pensar’, um ‘envelope pensante’ e uma ‘consciência planetária’. Considerava que a evolução do pensamento humano obedecia a regras semelhantes às da evolução humana. Chardin acreditava que as forcas da mente vinham criando pedaços de noosfera havia tempos, e que em algum momento esses pedaços se reuniriam num coninuum. Ele relacionava a concretização desse fenômeno às comunicações – o que ele viu nos anos 50 foi o rádio e a TV – e antecipava o surgimento de ‘estonteantes computadores eletrônicos’197.
Forças da mente, nada mais é que o espírito criativo do homem, aquilo que o
diferencia dos animais, e o impulsiona a uma evolução e renovação constantes. Não por
acaso, acentua Maria Ercília:
Teilhard de Chardin batizou ‘energia tangencial’ a centelha que anima todos os seres vivos. Para ele, essa energia tenderia a uma complexidade cada vez maior, até chegar à capacidade de reflexão e autoconhecimento. A mesma energia impulsionaria formação da noosfera, uma rede de informação de complexidade também cada vez maior. Embora rejeitado em sua época, ele inspiraria Marshal McLuhan, nos anos 60, e seus textos foram novamente retomados por teóricos de comunicação no começo da década de 90198.
197 Maria Ercília, A Internet, p. 26. 198 Idem., p. 26-27.
106
De Chardin, foi mais além; saiu da simples filosofia, apontando uma realidade
sócio-econômica da sua noosfera:
Ninguém pode negar que uma rede (uma rede mundial) de filiações econômicas e psíquicas está sendo tecida numa velocidade que aumenta sempre, que abraça e constantemente penetra cada vez mais fundo em nós. A cada dia que passa, torna-se um pouco mais impossível para nos agir ou pensar de forma que não seja coletiva. [...] nós chegaremos ao princípio de uma nova era. A Terra ‘ganha nova pele’. Melhor ainda, encontra sua alma. (A formação da Noosfera, 1947). E aqui eu penso naquelas estonteantes máquinas eletrônicas (o ponto de partida e esperança da jovem ciência da cibernética), através das quais nossa capacidade mental de calcular e combinar é reforçada e multiplicada num grau que aponta para avanços estonteantes nessa direção, tanto quanto aqueles a ciência ótica já produziu para o nosso poder de visão.(O Lugar do Homem na Natureza, 1950)199.
Theilard de Chardin, com a maestria de um filósofo, foi além daquilo que
podia-se ver: enxergou uma nova era, onde a Terra se desenharia não apenas numa grande
crosta geofísica, mas sobretudo, num manto metafísico de idéias e do conhecimento humano,
universal.
3.2.1.3. O visionário Bush e seu “Memex”.
Vannevar Bush (1890-1974) foi um dos grandes incentivadores da pesquisa
científica norte-americana, sendo um dos principais responsáveis pela criação de avançados
laboratórios de pesquisas militares, numa odiável – mas surpreendente – simbiose da ciência
com o militarismo, da qual resultaria duas grandes invenções que marcaram a história da
humanidade: a bomba atômica e a Internet. Maria Ercília, descreve bem essa relação:
Em 1922, Bush participaria da fundação da manufatura de componentes eletrônicos Raytheon. Em 1939, sugeriu ao então presidente Roosevelt a criação de um Comitê de Pesquisa para a Defesa Nacional, que foi oficializado no ano seguinte, com um grande orçamento. Uma das pesquisas dirigidas por Bush foi o Projeto Manhattan, que deu origem à bomba atômica. Dali sairia no futuro a Advanced Research Projects Agency (que em 1969 colocaria em funcionamento a rede Arpanet, precursora da Internet). Bush acabou por temer a união de ciência e militares que tanto ajudou a forjar nos EUA. Em 1949, escreveu um livro que afirmava que a
199 Maria Ercília, A Internet, p. 27.
107
militarização da ciência acabaria por prejudicar a economia norte-americana200”.
Mas o escrito de Bush que mais marcaria sua história pessoal – e a da ciência –
seria o ensaio “As We May Think” (Como podemos pensar), publicado na revista Atlantic
Monthly, em 1945. Nele, tomado por um sentimento de pós-guerra, Bush vocifera contra esse
desastroso binômio ciência-militarismo, indicando novos horizontes para os cientistas. É neste
ensaio, porém, que ele lança a idéia do Memex, conforme nos explica Érico Guizzo:
Em 1945. Bush escreveu um memorável artigo intitulado As We May Think (Como podemos pensar). Nesse artigo, ele expunha sua visão sobre os rumos da produção científica do pós-guerra. Para ele, o homem deveria dedicar seus esforços não mais à produção de armas destruidoras e equipamentos bélicos, mas sim à difusão e à democratização do conhecimento. Ainda neste artigo, Bush propunha um equipamento revolucionário para armazenamento e consulta de informações, o qual chamou ‘memex’. O memex seria uma espécie de arquivo mecanizado, com telas, botões, alavancas e um teclado. Ele armazenaria – na forma de microfilmes – livros, documentos, discos, fotos, jornais, cartas, etc. Seu conteúdo poderia ser acessado de forma fácil e rápida. Mas a característica mais importante do memex seria sua capacidade de associar (interligar, relacionar, conectar) partes do conteúdo armazenado. Dessa forma, o texto de uma enciclopédia poderia estar associado a um artigo de jornal, uma palavra num documento poderia remeter a uma fotografia, e assim por diante201.
Evidentemente que, tal criação não foi possível de ser realizada, por limitações
tecnológicas que haviam naquela época. Porém a idéia de Bush seria retomada anos depois
por Ted Nelson, que criou na década de 70 o Projeto Xanadu, e cunhou no vocabulário
científico a expressão “hypertext” (hipertexto).
3.2.1.4. Engelbart e suas brilhantes invenções.
Douglas Engelbart (1925-), ex-técnico em radar da Marinha Norte-Americana,
profundamente tocado com as palavras de Vannevar Bush, resolveu se dedicar a estudos
objetivando dar forma a um invento semelhante ao proposto por Bush. Após a guerra de 1945,
foi trabalhar para o governo no Naca Ames Laboratory (futura NASA); lá, sempre a frente de
seu tempo, previa que os computadores – até então, monstrengos que ocupavam prédios 200 Maria Ercília, Op. cit., p. 28-29. 201 Érico Guizzo, Internet – O que é, como funciona, o que oferece, p. 69.
108
inteiros – seriam de uso comum e auxiliaria o homem nas suas atividades diárias. Com esta
meta em mente, Engelbert traçou uma brilhante história de vida:
Depois de algum tempo na Universidade de Berkeley, trabalhando num modelo teórico de computador, Engelbart foi para a Stanford Research Institute, onde participou de outros projetos ligados à computação, conseguindo pelo caminho 12 patentes. Em 1963, conseguiu financiamento para pesquisas e fundou seu próprio laboratório, o Augmentation Research Lab (“augmentation not automation” era o slogan – a idéia era aumentar a capacidade humana, em vez de simplesmente automatizar tarefas). Nesse ano, escreveu o artigo ‘A Conceptual Framework foi the Augmentation of Man´s Intellect’, em que dizia ser preciso ajudar as pessoas a ‘lidar melhor com questões complexas e urgentes e fazê-lo coletivamente’202.
Esta nova forma de potencializar a capacidade humana, ao invés de
automatizar tarefas, o levou a inventar uma série de inovações que revolucionariam a
informática, e que até hoje, fazem parte de nosso dia-a-dia:
Foi nesse laboratório, no decorrer dos anos 60 e com farto auxílio financeiro
do governo, que Engelbart produziu três artefatos revolucionários: o mouse,
as janelas múltiplas (precursoras das janelas usadas no sistema operacional
dos computadores Apple MacOS e do Windows) e um sistema de
teleconferência baseado em hipermídia (que ele chamou de NLS, de oNLine
System). ‘A palavra ‘hipertexto’ seria criada depois por Ted Nelson’ (...), diz
ele na mesma entrevista. ‘Nós pensamos em termos de ligações
[linkages]’203.
Maria Ercília bem observa que, apesar do grande estardalhaço causado pela
demonstração dos três inventos em 1968, numa conferência em San Francisco (EUA), o foco
de Engelbart não era aumentar a capacidade das máquinas, mas sim, potencializar a
capacidade dos seres humanos:
‘Sinto que essa tecnologia [a Internet] vai causar uma mudança em nossa sociedade maior do que tudo desde a transição para a agricultura’, declara ele (The Matrix). ‘Vou fazer uma analogia. Você tem esses organismos curiosos. São organismos sociais chamados de organizações humanas, e eles se vêm se desenvolvendo com conexões muito fracas entre eles, ao longo dos anos. Você pode falar, você pode acenar com as mãos, logo você pode escrever; depois, você pode imprimir, duplicar com máquinas Xerox e assim por
202 Maria Ercília, A Internet, p. 31. 203 Idem, p. 31.
109
diante. Subitamente, surgem o computador digital e a rede; eles trazem uma melhoria para o que você pode chamar de sistema nervoso organizacional. Isso é um grande passo. É como uma mutação que é simplesmente fantástica’204.
Enfim, conclui-se que Engelbart conseguiu sintetizar como ninguém todas as
teorias de Wells e De Chardin, bem como a preocupação de Bush. Maria Ercília, expõe de
forma brilhante, esta conclusão: “A visão mística de Theilhard de Chardin e a fantasia de
ficção científica de Wells acabaram por se objetivar no projeto de Bush e nos protótipos de
Engelbart205”.
3.2.2. História da Internet: da sua invenção ao grande “boom”
Relatos históricos apontam como a gênese daquilo que tornar-se-ia a Internet,
foi um experimento desenvolvido pela Raid Corporation, sob encomenda da DARPA
(Defense Advanced Research Projects Agency), agência de projetos de pesquisas avançadas
do Departamento de Defesa dos Estados Unidos da América.
Nos ano de 1962, em pleno período da chamada Guerra Fria, onde os Estados
Unidos investiam vultuosas quantias em logística de guerra contra sua arquiinimiga União
Soviética, a invenção de uma rede de computadores interligados que resistisse a um ataque
bélico era uma enorme vantagem sobre a rival, principalmente, para execução de complexos
algoritmos que codificassem ou decodificassem segredos de guerra.
Em 1969 foi inaugurada a ARPANet206 – Advanced Research Projects Agency
Net (Rede da Agência de Projetos de Pesquisa Avançada), cuja arquitetura fora desenvolvida
para que não houvesse um único computador central, de forma a garantir seu pleno
funcionamento, mesmo com eventuais danos a um de seus nós.
204 Douglas Engelbart, entrevistado por The Matrix, apud Maria Ercília, Ob Cit., p. 32. 205 Maria Ercília, A Internet, p. 33. 206 As redes que formam a Internet são interligadas por outras redes de alta capacidade, chamadas backbones (espinha dorsal). Um backbone é um conjunto de poderosos computadores conectados por linhas de grande largura de banda (ou seja, que conseguem transmitir grandes volumes de dados), como canais de fibra óptica, elos de satélite e elos de transmissão por rádio.
110
A Arpanet207 era uma rede muito arcaica: consistia na interligação de quatro
grandes computadores, espalhados em pontos geograficamente distantes. Este número tímido
de computadores aumentou nos anos 70, atingindo o patamar de 100 pontos interligados no
início dos anos 80.
Figura 1 : A ARPANET em 1969. Retirada em http://som.csudh.edu/cis/lpress/history/arpamaps/
Para que esses computadores se falassem de forma igual, foi desenvolvido um
protocolo de comunicação eletrônica padrão, em 1982, denominado TCP/IP – Transfer
Control Protocol / Internet Protocol, ou seja, Protocolo de Controle de Transferência de
dados / Protocolo Entre Redes. Aqui se encontra a origem do nome Internet para designar essa
forma de rede de computadores descentralizada.
Em 1983, outras redes de computadores adotaram o TCP/IP como protocolo de
comunicação: a CSNET (Computer Science NETwork) e a MILNET (MILitary NETwork),
sendo a primeira, uma rede de fins pacíficos e a segunda, de fins militares, todas localizadas
nos Estados Unidos. Não tardou muito para que as três redes Arpanet, CSNet e MilNet se
conectassem, e formassem o embrião daquele que seria a Rede das Redes: a Internet. O
207 A Internet surgiu a partir da criação do backbone original – o Arpanet – financiado pelo governo norte-americano. Três na Califórnia: em Stanford, na UCLA e na UC Santa Barbara. O quarto computador estava na Universidade de Utah.Em 1972 eram 37 os computadores ligados e, desde então, a Rede nunca deixou de crescer.
111
TCP/IP é a linguagem que permite que diversos computadores conectados troquem
informações em forma de pacotes. Vejamos como Érico Guizzo explica isso:
A interligação de todas essas redes só foi possível graças ao uso disseminado do protocolo TCP/IP. O TCP é a ‘língua’ falada por todos os computadores ligados à Internet e usa a comutação de pacotes para transmitir as informações. Esse método transmite informações em pequenos pedaços – chamados pacotes. O TCP/IP é composto por duas partes: TCP (Transmission Control Protocol) e IP (Internet Protocol). O TCP é responsável por quebrar a informação em pacotes, enviar esses pacotes através da rede, ordená-los e reagrupá-los no destino, bem como reenviar pacotes perdidos ou danificados. O IP, por sua vez, é responsável por encontrar uma rota através da rede que permita a cada pacote que chegue a seu destino. Ao viajar pela Internet, os pacotes passam por equipamentos chamados roteadores. Os roteadores208 examinam o endereço do destino de cada pacote enviam-nos para outros roteadores, até que os pacotes cheguem ao seu destino209.
Foi o TCP/IP o grande responsável pelo “boom” (explosão) da Internet. Antes
do TCP/IP, cada sistema de computadores possuía uma arquitetura e forma de comunicação
própria, exclusiva. Se não houvesse sido criado o TCP/IP, qualquer tentativa de integração
dessas redes, redundaria num grande fracasso, que poderia ser facilmente ilustrado num
exemplo simples: já imaginou uma central telefônica, no qual cada telefonista falasse num
idioma diferente? Quando alguém que falasse português ligasse, e caísse numa telefonista que
fala japonês, certamente o diálogo seria impossível. Da mesma forma ocorreria caso não
houvesse o TCP/IP.
O TCP/IP permite que todos os computadores falem na mesma língua, não
importando ao qual rede está conectado, que sistema operacional que ele usa, nem tampouco
o idioma do país do usuário que o utiliza. A partir do momento em que se conecta a Internet, o
computador passa a ser mais um terminal da grande rede, se comunicando na mesma forma
que todos os outros demais. Este processo ocorre em linguagem de baixo nível – em bits e
bytes, em sinais digitais eletromagnéticos, que somente as máquinas compreendem – mas, seu
princípio, porém, é simples, conforme demonstra a figura a seguir:
208 O roteador (ou router) é um equipamento utilizado em redes de maior porte, com a função de conectar um computador à Internet, e tem a capacidade de escolher a melhor rota que um determinado pacote de dados deve seguir para chegar em seu destino. É como se a rede fosse uma cidade grande e o roteador escolhesse os caminhos mais curtos e menos congestionados. Já o switch, é um aparelho que possibilita que a rede não fique "presa" a um único computador no envio de informações, já que a comunicação está sempre disponível, exceto quando dois ou mais computadores tentam enviar dados simultaneamente à mesma máquina, diminuindo a ocorrência de erros (colisões de pacotes, por exemplo). 209 Érico Guizzo, Internet – O que é, como funciona, o que oferece, p. 33.
112
Figura 2:: Como funciona a transmissão de dados pela Internet. Retirada de Érico Guizzo, Internet – O que é, como funciona, o que oferece, 1ª ed. São Paulo: Ática, 2000, p. 34.
113
Com o protocolo TCP/IP, e a invenção de equipamentos como os roteadores e
switchs, os dados não se perdem na Internet, já que há várias formas de um dado chegar ao
seu destino, por se tratar de uma rede descentralizada. O protocolo TCP/IP possibilitou a
padronização da forma de comunicação e possibilitou ainda nos anos 70, as primeiras trocas
de mensagens:
Nos anos 70, a Internet foi crescendo dentro dos institutos de pesquisas e do meio acadêmico. Quando surgiu o primeiro programa de correio eletrônico para a rede – que já usava o sinal @, os cientistas e estudantes começaram a usá-la mais para se comunicar, trocar informações e fofocas do que para compartilhar recursos de computadores, como era sua finalidade inicial. A Internet começava a ganhar vida própria, que nada tinha a ver com a concepção original de seus criadores, e que um dia a transformaria no que é hoje – um meio de comunicação e entretenimento210.
Em 1974 surgiu a Telenet – uma iniciativa privada de cunho comercial de criar
uma rede aberta de comunicação entre computadores – que não pegou e nem fez muito
sucesso. Ainda, em 1986, outra rede – a NSFnet – foi criada pela National Science
Foundation (Fundação Nacional de Ciência), com o intuito de facilitar o acesso de toda
comunidade científica a cinco grandes centros de super-computação, dado que o acesso a rede
Arpanet/Milnet/Csnet era muito burocrática. A NSFnet pode ser considerada a precursora da
Internet, nos moldes atuais, apesar de ter sido criada após a fusão das grandes três redes, pois
foi a partir dela que a Internet atual se desenvolveu. Vejamos o que diz Érico Guizzo:
Em 1986, a National Science Foundation (NSF) anunciou a criação da NSFNET, com a adoção do protocolo TCP/IP. A nova rede interligou centros de supercomputação e gerou um boom de conexões, principalmente por parte de universidades. A NSFNET tornou-se logo uma ampla rede acadêmica e o número de pontos interligados pulou de cinco mil para trinta mil. Seu crescimento foi tão expressivo que acabou englobando a Arpanet, a qual deixou de existir oficialmente em 1990. Ao mesmo tempo, instituições de um número cada vez maior de países passavam a conectar-se à NSFNET211.
E o Brasil não ficou para trás nesta corrida pelo acesso à esta rede de
informação e pesquisas. Em 1988, o Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC)
e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), conseguiram acesso à
BitNet; como bem observa Maria Ercília, “ainda não eram conexões diretas a computadores
210 Maria Ercília, A Internet, p. 17-18. 211 Érico Guizzo, Internet – O que é, como funciona, o que oferece, p. 20-21.
114
ligados à rede, mas à Bitnet, uma rede que trocava e-mails via Internet212”. Érico Guizzo,
descreve com detalhes, este capítulo tupiniquim da história da Internet:
Em setembro de 1988, o Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), localizado no Rio de Janeiro, conseguiu acesso à Bitnet, através de uma conexão de 9600 bits por segundo estabelecida com a Universidade de Maryland. Dois meses depois, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) também ligou-se à Bitnet, por meio de uma conexão com a Fermi National Accelator Laboratory (Fermilab), em Chicago. Essas foram as nossas únicas vias de acesso às redes internacionais até 1989. Naquele ano, a comunidade acadêmica, com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), criou a Rede Nacional de Pesquisas (RNP). A RNP implantou uma rede de abrangência nacional que, no final de 1992, já interligava diversas capitais brasileiras.213.
Figura 3: Diagrama da RNP. Retirado de Érico Guizzo, Internet – O que é, como funciona, o que oferece, 1ª ed. São Paulo: Ática, 2000, p 23.
Por fim, a grande NSFNET tornou-se uma rede aberta, não apenas para fins
educacionais e de pesquisa, mas para toda a coletividade geral. Érico Guizzo, descreve esta
abertura da NSFNET:
A NSFNET, que restringia o uso de sua estrutura exclusivamente para fins de educação e pesquisa, anunciou em 1991 a liberação de seu uso também para fins comerciais. Iniciava-se aí a chamada privatização da NSFNET, que alavancou grandes investimentos por parte do setor privado na estrutura da
212 Maria Ercília, Op. cit., p. 18. 213 Érico Guizzo, Internet – O que é, como funciona, o que oferece, p. 20-21.
115
rede. Numerosas empresas começaram a oferecer acesso à rede e a prestar serviços através dela. A rede manteve-se, assim, seu crescimento exponencial, dobrando de tamanho de tempos em tempos. Esse emaranhado de redes acadêmicas, comerciais e militares, tendo como espinha dorsal a NSFNET e como protocolo padrão o TCP/IP, acabou evoluindo para o que hoje conhecemos como Internet214.
E foi assim que a Internet nasceu: de uma iniciativa militar e científica que
cresceu em conjunto com a popularização dos PC´s – Personal Computers, os micro-
computadores pessoais, que ficaram cada vez mais baratos e acessíveis ao público em geral.
Figura 4: A representação da NSFNET, demonstrando o grande número de usuário conectados no inicio da década de 90. Retirada de http://www.neosoft.com/ gifs/nsfnet.lg.jpg.
3.2.3. A utilidade da Internet: do WWW ao P2P.
A Internet de hoje possui várias aplicações, várias utilidades: é instrumento de
pesquisa, de comunicação social e de entretenimento. Porém, até chegar ao seu atual estado, a
Internet passou por uma importante evolução: a invenção da WWW – World Wide Web, foi
apenas o primeiro passo para esta revolução na forma de informar; as redes P2P como o
214 Érico Guizzo, Internet – O que é, como funciona, o que oferece, p. 21-22.
116
Napster e o Kazaa, são hoje, uma nova versão de transmissão de conteúdo. Por tudo isso é que
vamos detalhar a Internet e sua utilidade.
3.2.3.1. A invenção da World Wide Web (WWW)
Três personagens são peças chaves na invenção da chamada World Wide Web
(Teia de Acesso Mundial): Ted Nelson, Tim Berners-Lee e Marc Anderseen. Cada qual, teve
sua participação de forma significativa, ajudando a construir a história da Internet.Ted Nelson
(1937-) foi o criador do termo hipertexto e a sua definição; tal conceito seria a base para a
WWW. Maria Ercília relata:
O termo ‘hipertexto’ foi cunhado por Ted Nelson, criador do Projeto Xanadu – uma tentativa, que nunca deu certo, de criar um gigantesco sistema de informação acessível no mundo inteiro, ainda em 1960. Nelson definiu hipertexto como ‘escrita não-seqüencial – texto que se ramifica e permite escolhas ao leitor, e que é lido de forma mais eficiente numa tela interativa’215.
Mas o que seria esse primeiro sistema de hipertexto? No que consistia
exatamente o Projeto Xanadu? Vejamos o que Érico Guizzo nos apresenta:
Nelson imaginou um sistema – batizado de Xanadu – no qual todas as publicações do mundo (livros, enciclopédias, jornais, revistas, documentos particulares e corporativos, etc.) estivessem disponíveis. Assim como o memex, o Xanadu teria partes de seu conteúdo interligadas, isto é, um texto não existiria isolado, mas associado a outros textos, documentos, imagens, etc. A leitura desses textos não seria seqüencial, mas arbitrária, oferecendo ao leitor diferentes caminhos de acessos. Essa maneira dinâmica de associar documentos ficou conhecida como hipertexto, palavra inventada por Nelson em 1965. O Xanadu ainda resolveria o problema de direitos autorais, pois haveria um sistema automático de cobrança pelo uso, leitura ou citação de uma informação. O ambicioso projeto de Nelson, em sua concepção completa, nunca saiu do papel. Mas as idéias, os conceitos e os termos inventados por ele exerceram grande influência na evolução dos sistemas de hipertexto216.
Somente em 1989 é que a noção de hipertexto de Ted Nelson seria posta em
prática por um jovem físico inglês chamado Tim Berners-Lee, que trabalhava no Laboratório
215 Maria Ercília, A internet, p. 37. 216 Érico Guizzo, Internet – O que é, como funciona, o que oferece, p. 70-71.
117
Europeu de Física de Partículas (CERN). Maria Ercília relata a iniciativa de Berners-Lee de
criar essa nova funcionalidade:
(...) em 1989, Beners-Lee escreveu uma proposta para criar um sistema de hipertexto para uso interno do Cern. A idéia era apenas facilitar a comunicação entre os pesquisadores e a documentação de projetos. A proposta foi aceita, e em 1990 ele concluiu um programa chamado ‘World Wide Web’. (...) Logo no início do projeto, Berners-Lee tomou a decisão de usar a World Wide Web em conjunto com a Internet, em vez de se valer do sistema usado pela rede do Cern. Isso se mostraria crucial para o sucesso de seu sistema. Ele começou a divulgar seu software para a comunidade de programadores de hipertexto, e colocou o primeiro servidor Web na Internet em 1991 – o endereço era info.cern.ch217.
Entre a iniciativa de Berners-Lee de criar um sistema de armazenagem de
informações para o Cern e a sua difusão pela grande rede foi um passo, como bem descreve
Érico Guizzo:
A World Wide Web foi criada em 1991 no CERN (Laboratório Europeu de Física de Partículas), na Suíça, pelo físico Tim Berners-Lee. O termo World Wide Web pode ser entendido como ‘teia de alcance mundial’. A World Wide Web, também conhecida como WWW, W3 ou Web, é uma aplicação da Internet que combina hipertexto e multimídia. Por isso, diz-se que ela é uma aplicação hipermídia. Texto, imagens, animações, som, vídeo e até cenários tridimensionais são exibidas em ‘páginas’, chamadas de ‘páginas Web’. Clicando-se com o mouse numa palavra ou numa imagem de uma página, vai-se para outro texto em outra página. Essas palavras ou imagens que fazem as ligações entre as páginas são chamadas de links. O hipertexto, portanto, permite interligar milhares de páginas Web através de links. A Web pode ser definida, pois, como uma vasta coleção de páginas interligadas por hipertexto que utiliza os mais diversos recursos de multimídia218.
Maria Ercília descreve em seu livro219 que o primeiro programa de navegação
Web de Berners-Lee ficou restrito a computadores de grande porte, que usavam o sistema
operacional NeXT. Após isso, em 1993, dois estudantes da Stanford criaram outros dois
programas para navegação na Web, que rodavam em sistema Unix: Pei Weng, criou o Viola;
e Tony Johnson, o Midas. Porém, quem conseguiu revolucionar o uso da Web, foi Marc
Andreessen, criador do Mozila. Maria Ercília aponta como principal colaborador de
Andreessen, o seu colega de faculdade, Eric Bina. Érico Guizzo relata:
217 Maria Ercília, A internet, p. 37-38. 218 Érico Guizzo, Internet – O que é, como funciona, o que oferece, p. 72. 219 Maria Ercília, Op. cit., p. 38.
118
Logo que foi criada por Berners-Lee, em 1991, a Web não era capaz de exibir imagens, apenas textos, e não possuía uma interface ‘amigável’. A navegacao era muito complicada para a maioria dos usuários. Logo essa situação mudaria radicalmente. Em 1993, Marc Andreessen e outros estudantes do NCSA (National Center for Supercomputing Applications), da Universidade de Illinois, desenvolveram o programa Mosaic. Este acabava com a navegação textual: funcionava em modo gráfico, exibia imagens e podia operar em PCs, Macintoshs e em máquinas Unix220.
Em 1994, Marc foi convidado por Jim Clark, fundador da Sillicon Graphics –
fabricante de supercomputadores para processamento de grandes informações, cujos clientes
são, por exemplo, a Lucas Arts Films (a empresa do diretor e produtor de filmes de cinema,
como Star Wars) e a NASA (a agência norte americana para estudos espaciais) – para
fundarem uma nova empresa: a Netscape. Maria Ercília narra com muita riqueza de detalhes
essa história:
Marc Andreessen foi então convidado por um executivo do Silicon Valley (a região californiana onde se concentram muitos dos mais importantes centros de pesquisa em novas tecnologias da informática), chamado Jim Clark, a montar uma empresa que produzisse uma versão comercial do Mosaic. O ano era 1994. O nome da empresa: Netscape. Jim Clark era um veterano da tecnologia. (...) Foi o primeiro homem de negócios a ter uma visão do enorme potencial da Web, que começaria a se realizar em poucos anos221.
Após isso, a Web se popularizou, graças ao fato do Netscape Mosaic (depois
chamado de Netscape Navigator) ser distribuído gratuitamente. Em outubro de 1994, foi
lançada a primeira versão do Netscape. Em 1994, a Microsoft222 de Bill Gates, lança o
concorrente Internet Explorer, dando início à aquilo que se chamaria de “Guerra dos
Browsers223”.
220 Érico Guizzo, Op. cit., p. 73. 221 Maria Ercília, Op. cit., p. 39. 222 MICROSOFT é a empresa fundada por Bill Gates, especializada em criar programas para microcomputadores. Tornou-se referência no mundo da informática, a ponto de ser acusada de monopólio comercial. É a criadora de programas como o Windows (o sistema operacional mais usado no mundo), do Word (editor de textos) e Excel (planilha de cálculos). 223 Browser é o termo em inglês que designa o programa de navegação Web. Site é o conjunto de páginas Web armazenadas em um servidor, enquanto Home Page, é a página inicial de um site.
119
3.2.3.2. As aplicações da Internet
Sem sombras de dúvidas, a primeira grande utilidade descoberta para a Internet
– ainda no tempo da Arpanet – foi o envio de mensagens eletrônicas, ou simplesmente, E-mail
(Eletronic Mail, correio eletrônico). O e-mail ganhou muitos adeptos, dada as inúmeras
facilidades em relação ao correio tradicional: mais rápido (instantâneo) e mais barato. Até
hoje, o e-mail é uma importante ferramenta que a Internet põe à nossa disposição.
Porém, o e-mail já suscita algumas discussões jurídicas importantes: a prática
do SPAM224 (enviar e-mails indesejados para milhares de pessoas, com oferecimento de
produtos ou serviços, ofensas pessoais ou propagação de correntes ou idéias), seria
penalmente punível? O e-mail gozaria da prerrogativa de inviolabilidade de correspondência?
O e-mail produz prova escrita, em caso de relações de consumo ou crimes contra honra? O e-
mail goza da proteção dadas às cartas missivas, em matéria de direito autoral? Todos esses
questionamentos ainda serão tema de inúmeros trabalhos científico-jurídicos, nos próximos
anos.
Ainda destaca-se a Usenet, uma invenção de dois estudantes da Universidade
de Duke, Tom Truscott e Jim Ellis, e outro estudante da Universidade da Carolina do Norte
(EUA), Steve Bollovin, em 1979225. Consistia num sistema de troca de mensagens eletrônicas
entre usuários do sistema Unix das duas universidades, batizado de Unix User Network – ou
apenas, Usenet. A partir de então, a Usenet cresceu e hoje conta com centenas de milhares de
grupos de discussão, onde os integrantes trocam e-mails sobre um tema ou assunto específico.
Acessar a Internet antes da invenção dos browsers, era algo muito técnico e
difícil para usuários leigos. Programas como o telnet e o gopher, foram tentativas preliminares
de se navegar pela grande rede. O telnet é um dos programas mais antigos da Internet, que
permite acessar remotamente (à distância), outro computador conectado à rede. Caiu em
desuso com a criação da Web. Já o Gopher, mais um precursor da WWW, é um sistema de
224 Érico Guizzo (Op. cit,, p. 87) narra o episódio mais antigo e famoso de SPAM, que foi praticado em 1994 por um escritório de advocacia do Arizona (EUA) chamado Canter & Siegel, que enviou uma mensagem para inúmeros grupos da Usenet. Já Maria Ercília, observa que o termo SPAM, vem do nome de uma presuntada em lata vendida nos EUA (Ob. Cit., p. 57). 225 Érico Guizzo, Internet – O que é, como funciona, o que oferece, p. 87.
120
navegação e busca de documentos armazenados em servidores Gopher espalhados pela
Internet, mas que, com o surgimento da Web (com muito mais recursos), perdeu espaço e hoje
praticamente não é mais usado.
Outra grande funcionalidade foi descoberta para a rede: a comunicação
instantânea. Não bastava mandar e-mails, e aguardar posteriormente a sua resposta: era
necessária outra forma de se comunicar em tempo real. Com isso, surgiram os chamados
Chats, ou salas de bate-papos virtuais, cujo IRC foi o maior expoente. Maria Ercília descreve
muito bem o IRC:
O IRC (Internet Really Chat) é o tipo de bate-papo mais antigo da Internet. Foi criado em 1988 por um programador finlandês chamado Jaime Oikarinen. Ele tem algumas vantagens sobre o bate-papo na Web: é bem mais rápido e permite o acesso a milhares de salas ao mesmo tempo. Além disso, é mundial – é possível encontrar gente de vários países a qualquer hora do dia ou da noite. Por outro lado, freqüentar o IRC dá um pouco mais de trabalho: é preciso copiar um programa que acesse seus servidores (um dos mais populares é o mIRC), instalá-lo no computador e aprender a usá-lo. Existem vários canais brasileiros nos servidores de IRC226.
Porém uma nova geração de programas de bate-papo sobrevieram ao IRC, sem,
porém, sepultá-lo de vez: trata-se dos comunicadores instantâneos; programas que não apenas
possibilitam a conversa eletrônica, como também, que incorporaram novas funções, como a
troca de imagens e arquivos, alem de suporte para vídeo-conferência através de webcams.
O primeiro dos comunicadores instantâneos foi o ICQ, desenvolvido por quatro
jovens israelenses, através da pequena empresa de software Mirabilis. Lançado em novembro
de 1996, o ICQ já contava com mais de 20 milhões de usuários no final de 1998. Mais uma
vez, a Microsoft de Bill Gates resolveu entrar em campo e lançou seu comunicador, o MSN
Messanger. Hoje assistimos a uma nova batalha entre ICQ (comprado pela AOL em 1998, por
287 milhões de dólares) e MSN Messanger, da Microsoft.
226 Maria Ercília, A Internet, p. 58-59.
121
3.2.3.3. A descoberta do Napster.
Por fim, deixamos para falar do FTP – File Transfer Protocol, em português,
Protocolo de Transferência de Arquivos. O FTP possibilitou o surgimento da troca de
arquivos pela Internet. Muito utilizado por criadores de websites, o FTP está caindo em
desuso pela maioria dos usuários, dado o fato dos comunicadores instantâneos terem
incorporado esta função de envio e recebimento de arquivos.
Porém, tal procedimento fica limitado a apenas duas pessoas – os interlocutores
da conversa, que devem usar o mesmo programa comunicador. Por isso, em 1999, um jovem
programador de apenas 18 anos, chamado Shawn Fanning, desenvolveu um programa
chamado Napster227, que abalou as estruturas do direito autoral na Internet: com ele, era
possível que alguém disponibilizasse todo o repertório de arquivos MP3 armazenados em seu
computador, para que outros usuários conectados à rede Napster, pudessem baixá-los em suas
máquinas também.
A estrutura do Napster baseava-se na chamada Arquitetura Ponto-a-Ponto, ou
em inglês, “Peer-to-peer” (ou simplesmente, P2P). Neste sistema, cada computador é
considerado um peer (“nó”, em português). Portanto, cada usuário cadastrado no sistema é um
nó da rede Napster. Ao se cadastrar e conectar no serviço, cada usuário disponibiliza a
informação de todos os arquivos que está disposto a compartilhar (em inglês, sharing). Por
sua vez, os “servers” (servidores, grandes computadores centrais) da Napster, recebia,
armazenava e organizava todas as informações enviadas de cada usuário, criando um grande
banco de dados.
Este banco de dados, basicamente, consistia no serviço da Napster: ao
armazenar, por exemplo, a lista de arquivos MP3 de um usuário, o sistema organiza os dados
básicos (artista, música, álbum) do arquivo e do usuário o “username” (nome do usuário), seu
endereço IP (o número que o identifica na Internet), sua “bandwidth” (taxa de velocidade da
conexão). De posses desses dados, os servidores Napster indicavam qual dos computadores
227 Informações retiradas do site <http://www.sean.co.uk/a/musicjournalism/var/historyoffilesharing.shtm>
122
conectados naquele momento, possuía tal informação solicitada por aquele determinado
usuário.
De posse dessa informação, o Napster conectava diretamente o computador do
usuário solicitante, com um ou mais usuários compartilhadores (os que possuem o arquivo
procurado), numa conexão direta, ponto a ponto, ou seja, o arquivo é transferido de usuário
para usuário.Vejamos nas figuras a seguir, como funciona didaticamente esse sistema:
Passo 1
O usuário se cadastra no Napster. Neste momento, ele
informa ao sistema quais arquivos vai compartilhar.
Figura 5: Montagem feita pelo acadêmico.
Passo 2
Conectado a rede Napster, o usuário se comunica com todos os demais usuários.
Suponha que o usuário queira baixar a música “Help” dos Beatles.
Figura 6: Montagem feita pelo acadêmico. Obs.: “User Machine” é a máquina do Usuário; “Central Server”, designa o Servidor Central, enquanto “Super-peer” são os nós-de-rede.
123
Passo 3
Help?
Beatl
es
O servidor do Napster busca a música solicitada em
todos os usuários conectados naquele momento.
Figura 7: Montagem feita pelo acadêmico. A busca, na verdade, é feita no banco de dados do Napster, que armazena as informações dos usuários, mesmo que estejam desconectados. Porém, a conexão preferencialmente dar-se-á com o(s) outro(s) usuário que esteja conectado no momento da solicitação.
Passo 4
O servidor do Napster “apresenta” os dois usuários, para que
se conectem e troquem o arquivo procurado.
Figura 8: A apresentação é feita de maneira automática, sem qualquer dos usuário ter que confirmar ou não a conexão.
124
Rapidamente o Napster se tornou um fenômeno, atraindo para si todas as
atenções, e o ódio da RIIA – The Record Industry Association of América –, a poderosa
associação de produtores fonográficos dos Estados Unidos. Maria Ercília, didaticamente,
explica o fenômeno:
(...) o Napster, software que permite a cópia da música diretamente do computador de outros usuários da Internet. O Napster funciona como uma cooperativa: concentra os nomes de todas as músicas disponíveis no computador dos usuários conectados a ele numa ‘biblioteca central’, para que possam ser localizadas com facilidade. A maior parte das músicas que podem ser encontradas com auxílio do Napster está sendo distribuída ilegalmente, o que constitui pirataria. Em apenas nove meses de funcionamento, o Napster chegou a 10 milhões de usuários cadastrados. Embora venha sendo alvo de muitos processos, continua funcionando228.
Após perder o processo movido pela RIIA, o Napster foi fechado, e
posteriormente, revendido para uma empresa que o relançou, mas de forma legal: cada
usuário paga uma mensalidade, a título de remuneração pelos direitos autorais das músicas
que distribui ou recebe dos outros usuários. No rastro do Napster, quando ele fechou, vieram
outros serviços baseados na arquitetura peer-to-peer: Gnutella, Audiogalaxy, Kazaa, E-mule,
etc. O que mais se destacou entre estes foi o Audiogalaxy, que possuía a mesma lógica de
funcionamento de seu antecessor, porém, a variedade do acervo disponível e a velocidade de
transferências, eram bem maiores que a do Napster e dos demais.
É neste ponto que concentramos nosso empenho e pesquisa em tentar entender
o fenômeno da troca de arquivos, e suas vicissitudes jurídicas. Saber o que motiva milhares de
pessoas e alguns poucos cérebros a inventarem, a cada dia, novas formas de distribuir
conteúdo de forma livre pela Internet: tudo isso é tema de poucos trabalhos e livros
publicados até o momento, sobre o qual nos debruçamos na tentativa de entender este
fenômeno.
228 Maria Ercília, A internet, 2ª ed. São Paulo: Publifolha, 2001, p. 58-59.
125
4. A DISTRIBUIÇÃO DE FONOGRAMAS PELA INTERNET
Por fim chegamos à última fase deste trabalho monográfico. Depois de
estudarmos a história do Direito Autoral e sua definição como um ramo autônomo, com
objeto e método de estudos próprios, nos detivemos em sua tutela jurídica no âmbito
constitucional, cível e penal. A seguir, adentramos na teoria dualística do direito autoral,
estudando os direitos morais e patrimoniais do autor sobre a obra, e aqueles que lhe são
conexos.
Dos direitos que são conexos é de onde retiramos a matéria prima deste
trabalho: os fonogramas musicais. O fonograma é um direito conexo que possui vários
sujeitos: do compositor da música ao intérprete; do arranjador ao músico executante; do
produtor e do distribuidor; enfim, todos tem algum direito sobre o fonograma. Neste capítulo,
nosso estudo se concentra na obra de José Carlos Costa Netto, autor reconhecido por grandes
mestres do Direito Autoral no Brasil – como Antônio Chaves, que prefacia sua obra – como o
que fala com maior propriedade sobre o tema “Obra Musical”, nos tempos atuais.
Porém, a Internet representa um desafio à esse direito: a livre distribuição de
arquivos sonoros por redes de compartilhamento. Até que ponto, tais redes são uma ameaça
ou lesão a esses direitos? Quais as questões que envolvem esse paradigma que a Internet
propõe ao Direito, para que ele resolva? Isso é o que tentaremos demonstrar.
126
4.1. O FONOGRAMA MUSICAL E SUA NATUREZA JURÍDICA
Definir o que é fonograma, não é uma tarefa difícil: a própria Lei n° 9.610/98,
em seu artigo 5°, inciso IX, traz a sua definição: “fonograma - toda fixação de sons de uma
execução ou interpretação ou de outros sons, ou de uma representação de sons que não seja
uma fixação incluída em uma obra audiovisual”. De tal conceito legal, deduzimos dois
sujeitos de direitos sobre a obra fonográfica: o executante e o intérprete. José de Oliveira
Ascensão, ao debruçar-se sobre o estudo da definição de tais artistas, apresenta-nos um
panorama bastante emblemático:
Ora, a lei não fala em artistas, intérpretes e executantes: não contempla três categorias diferentes. O gênero comum é artistas, qualificados depois pela expressão ‘intérpretes ou executantes’. Também não se fala em artistas intérpretes e executantes: não há uma indiferenciação entre artistas que interpretam e executam. Fala-se antes em intérpretes ou executantes, pelo que só teremos de considerar duas subespécies: a dos artistas que interpretam e a dos artistas que executam. Como a expressão artistas rege os qualificativos intérpretes e executantes, todos são artistas, o que merece ser realçado. A lei não tem em vista prestações meramente técnicas, mas atividades a que se pode ser atribuído caráter artístico229.
De sorte que, podemos inferir da lição do ilustre mestre que, para fins da lei de
direitos autorais, o fonograma só será considerado obra protegida caso represente fixação
sonora de uma obra artística. A primeira questão que nos remete tal afirmação, é a de tentar
entender quais obras artísticas poderiam ser objeto de fixação fonográfica.
José de Oliveira Ascensão, de forma brilhante, esgota o conceito de
interpretação e execução, destacando exemplos de muitas obras artísticas e literárias que
poderiam ser objeto de tal fixação. Porém, nos atemos a somente uma: a obra musical. É a
obra musical a mais constantemente fixada em fonogramas, e também, a mais comum. Graças
à popularização dos antigos LP´s (Long Play, discos em vinil, com gravação analógica),
substituídos pelos atuais CD´s (Compact Disc, discos compactos, com gravação digital), tal
conceito de fonograma acabou sendo associado mais comumente às gravações musicais.
Antes de retomarmos o conceito de artista-intérprete e artista-executante, cabe
definirmos o que é obra musical, os sujeitos do direito sobre ela, e as formas de sua 229 José de Oliveira Ascensão, Direito Autoral, p. 471.
127
exploração. Só então, conseguiremos enxergar de forma mais cristalina, os conceitos de
intérpretes e executantes, bem como a figura dos produtores fonográficos. Do conceito legal
de fonograma, podemos observar uma palavra chave, sobre a qual se erguem todas as
questões controvertidas: o direito de fixação. É, pois, tal direito, desdobramento do direito de
reprodução do autor de sua obra, expressamente assegurado pelo artigo 28 da Lei n° 9.610/98.
4.1.1. A obra musical
José Carlos Costa Netto, ao definir o que seja obra musical, destaca os
elementos essenciais para se ter uma obra musical: “A orientação doutrinária predominante
consigna serem três os elementos constitutivos da obra musical: a melodia, a harmonia e o
ritmo230”.
Melodia, é a construção de uma seqüência de sons, usando-se uma lógica
musical, onde o compositor, com sua sensibilidade artística, objetiva um resultado final: uma
canção. Costa Netto, ao citar Henry Desbois, assinala que harmonia “é o que comumente se
chama l’air, o tema sobre o qual se edifica a composição musical. Ela consiste nos sons que
se engrenam uns após outros231”.
Harmonia, é a roupagem estética da canção; é o arranjo, a forma de se executar
tal seqüência de notas combinadas pelo compositor – a melodia – formando-se, na linguagem
musical, o chamado acompanhamento ou arranjo de base. Novamente Costa Netto:
Complementa ponderando que a harmonia fornecerá a ‘roupagem’, o ‘estofo’ e o ‘adorno’ da melodia – note-se a adjetivação do jurista na definição de ‘harmonia’ em contraposição ao tratamento da ‘melodia’ como substância, com essência da composição musical – que La Tarnec define como o resultado da emissão simultânea de vários sons: os acordes232.
Por fim, Ritmo, é o andamento, a forma de se tocar o binômio melodia +
harmonia; é o estilo da execução musical, com as mais diversas variantes, podendo-se tocar
230 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 100. 231 Idem, p. 100 232 Ibidem, p. 100.
128
num andamento mais lento ou rápido. Assinala José Carlos Costa Netto, ao citar Henry
Desbois, que “o ritmo seria ‘uma sensação determinada seja por diferentes sons
consecutivos, seja por diversas repetições periódicas de um mesmo som’, normalmente
marcando o andamento da melodia233”. Costa Netto, ao analisar esses três elementos
constitutivos da obra musical, destaca que o principal deles, o que dá identidade singular a
uma composição musical, é a melodia:
Assim, é inegável que, dos três elementos constitutivos da obra musical, a melodia é o mais essencial. É essa, justamente, a característica mais peculiar do processo de criação da obra musical em relação às demais obras intelectuais: mais acentuadamente na criação melódica incide a sensibilidade, a inspiração, e não a reflexão ou comparação. Assim, estaria afeta a melodia menos à inteligência do que à sensibilidade. Portanto, a melodia, principalmente no campo dos direitos de autor, norteará a tutela jurídica da obra originária exclusivamente musical234.
Com efeito, é sobre a melodia onde se concentram alguns memoráveis casos
judiciais, onde o compositor original reivindica para si, a co-autoria em canção plagiada por
outro compositor. Um ótimo exemplo, foi a ação movida por Sebastião Braga em face de
Roberto Carlos e Erasmo Carlos, acusando-os de, na composição da música O Careta, terem
plagiado a sua música Loucuras de Amor235.
Em outra ação também transcorrida no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro,
onde o saudoso compositor e maestro Antônio Carlos Jobim teria sido acusado de plágio, a
decisão da Justiça foi diferente:
1994.001.04864 – Apelação Cível – Des. Celso Guedes – 7ª Câmara Cível - Julgamento: 29/11/1994. Ementa: DIREITO AUTORAL - OBRA MUSICAL – PLÁGIO – INDENIZACAO: Apelação cível. Ordinária. Indenização em virtude de "plagio" na obra musical "Anos Dourados" que teria sido praticado por TOM JOBIM. Valoração da prova pericial. Afigura-se que todo o desenvolvimento das duas musicas e' distinto, ressalvadas as coincidências decorrentes de uma formula estrutural comum, característica de um tipo de composição musical popular que faz parte do inconsciente musical coletivo que não é propriedade de ninguém. Caráter meramente coincidente de utilização comum de um arpejo, que e', sem duvida, matéria
233 José Carlos Costa Netto, Op. cit., p. 100-101. 234 Idem, p. 101 235 Os advogados de Roberto Carlos recorreram ao Supremo Tribunal de Justiça, no Recurso Especial n° 618961, Autos 2003/0228535-8, porém, o Ministro Relator Barros Monteiro da 4ª Turma, devolveu o processo para a instância anterior, mantendo a decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que condenou Roberto Carlos de ter cometido plágio.
129
prima da linguagem musical. Pedido improcedente. Sentença confirmada. Recurso desprovido. (CLH).
No caso em tela, a acusação de plágio recaiu sobre o elemento harmonia, ou
seja, sobre um recurso de arranjo muito comum na música, que é o arpejo. Já no caso
anteriormente citado, Roberto e Erasmo Carlos teriam plagiado o elemento melodia de
composição alheia, o que reafirma o entendimento proposto por Costa Netto, de que ela – a
melodia – é o traço de identidade duma obra musical. Ele ainda observa mais dois elementos
constitutivos da obra musical: a letra e o título. Para tanto, ele assinala a existência de mais
uma forma de obra musical: a obra lítero-musical. Vejamos:
A conclusão de que a melodia é o elemento criativo essencial na obra musical deve receber outro enfoque no estudo da obra lítero-musical: a originalidade da letra – e sua integração à composição musical – também consistirá, a exemplo da melodia, elemento essencial à caracterização da criação intelectual. Assim, na obra lítero-musical, melodia e letra têm a mesma importância para o conteúdo constitutivo da obra intelectual e sua conseqüente proteção tanto em conjunto (música e letra integradas como um obra), quanto de forma independente (música, de um lado, e letra, de outro, ambos com proteção autônoma)236.
De fato, Costa Netto apresenta um interessante raciocínio sobre a simbiose
letra-música, e como e em que casos, tal binômio é fator determinante para se apurar se houve
ou não aproveitamento ilegal da obra (plágio). Porém, como não é nosso objetivo estudar tal
tema – pela complexidade de qual é revestido – nos importa destacar outras duas figuras de
autores: o compositor melódico e o compositor letrista. Quando se trata da fixação de uma
obra lítero-musical em fonogramas, tais autores (compositor musical e compositor letrista)
também concorrerão ao exercício dos direitos autorais pertinentes. Falta-nos, porém, definir o
que seja letra. Costa Netto explica:
Enfim, a ‘letra’ integrante da obra musical (ou ‘lítero-musical’) é de natureza sui generis, pois não se trata exatamente de um poema ou prosa, no aspecto literário, nem propriamente consiste em melodia (emissão de sons sucessivos), no campo musical. Não encerra apenas uma idéia, mas dá forma a esta em ligação estreita à sonoridade, ao tema melódico: reportando-se ao exposto em relação ao processo criativo musical estaria entre o plano da inteligência e o da sensibilidade (talvez por isso seja mais adequado denominar o ‘letrista’ como ‘compositor letrista’ do que como ‘poeta’, em sua acepção literária estrita)237.
236 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 102. 237 Idem, p. 103.
130
Relembramos, quando do estudo sobre obra em colaboração, do caso ilustrado
pelo mestre Eduardo Vieira Manso, sobre a música Carinhoso, cuja melodia de autoria de
Pixinguinha, teve posteriormente adicionada a letra, de autoria de Braguinha. Para concluir
nosso estudo sobre a obra musical, convém anotar uma classificação didática que Costa Netto
nos traz: a obra musical originária (a obra musical e a obra lítero-musical) e obras musicais
derivadas, da qual são espécies: os arranjos, a variação e a elaboração musical.
Costa Netto apresenta o arranjo como uma tradução musical, baseando-se nas
lições de Henry Deisbois. Em outras palavras, significa dizer que, ao arranjar uma música, o
maestro submete seus conhecimentos técnicos sobre música (em especial, de harmonia) à
serviço do autor da música ou do intérprete, buscando conciliar o espírito criativo da criação
ou interpretação musical, com sua construção inteligível de base harmônica.
Já a variação, é um arranjo musical que, devido a alterações sensíveis feitas na
melodia, altera-lhe a essência, resultando em uma verdadeira nova obra musical. Já a
elaboração musical, trata-se de somente uma nova forma de utilização da obra musical, não
alterando em nada sua essência original. Costa Netto, demonstra os traços distintivos entre
elas:
No tocante à variação musical, segundo Lê Tarnec: ‘Implica mais independência por parte de seu autor do que há no arranjo; a uma obra pré-existente, um compositor acrescenta elementos melódicos, modifica, às vezes, a harmonia e o ritmo. Assim, adquire (a variação) mais ‘personalidade’ do que o arranjo’. (...) Finalmente, além destas, relevante citar a posição de Bobbio, que – após ponderar que, para melhor compreensão, denomina como ‘elaboração’ todo e qualquer trabalho artístico musical em que o autor não cria ex novo, com originalidade formal e substancial, uma obra musical, mas manipula criação alheia, dando vida a algo que, embora com aquela não se confunda, todavia lhe conserva características individualizadoras – afirma que ‘a elaboração possui uma casuística praticamente infinita, cujos exemplos mais comuns são representados por: variações, adaptações ou arranjos – transcrições – reduções – combinações – estudos – rapsódias – pots pourris’, e que ‘a todas são comuns os mesmos requisitos e os mesmo efeitos’238.
Com efeito, o arranjo musical é uma forma diferente de execução dos
elementos ritmo e harmonia. O maestro ao arranjar uma música (instrumental) ou uma
canção, objetiva obter um resultado único e inédito: uma nova roupagem em uma velha
238 José Carlos Costa Netto, Op. cit., p. 104-105.
131
canção; uma nova interpretação para um velho clássico; ou ainda, uma forma de execução
para uma música inédita.
4.1.2. Os sujeitos dos direitos sobre fonogramas musicais.
José Fernandes de Oliveira – popularmente chamado de Padre Zezinho, scj –
consegue definir de forma simples e brilhante o papel do maestro arranjador, dos músicos
executantes, dos cantores intérpretes e da produtora fonográfica:
Continuo me sentindo desenhista de melodias. Os maestros são os arquitetos, os músicos trabalhadores, a Comep a construtora. Eu realmente não faço canções, apenas as arquiteto e imagino. Quem as faz são essa gente maravilhosa que as transforma em Disco, em Fitas, Cds e Vídeos, com a ajuda dessa gente linda de sentimentos, que são os músicos e os cantores239.
O conceito de artistas intérpretes ou executantes é muito amplo. Ele nos é
fornecido pela própria Lei n° 9.610 de 19 de fevereiro de 1998, em seu artigo 5°, inciso XIII:
todos os atores, cantores, músicos, bailarinos ou outras pessoas que representem um papel,
cantem, recitem, declamem, interpretem ou executem em qualquer forma obras literárias ou
artísticas ou expressões do folclore”. Porém o que nos importa é saber quais são os artistas
intérpretes ou executantes no contexto musical, bem como definir quais são os demais
titulares de direitos sobre obras musicais e suas fixações fonográficas, nestes inclusos, os
compositores das canções, os arranjadores e os produtores fonográficos.
4.1.2.1. O compositor musical e o compositor letrista
Costa Netto apresenta-os como titulares originários do direito de autor na obra
musical, pelo fato de adquirirem a condição de autor com a criação da obra em si, reunindo,
portanto, os direitos morais e patrimoniais, enquanto os titulares derivados de direitos de
autor, somente possuem os direitos econômicos. De fato:
239 José Fernandes de Oliveira, A canção e a mensagem – Partituras em 4 volumes, p. 1.
132
A titularidade originária nasce com a criação intelectual e independe de fixação (gravação sonora), da formalização através de registro nos órgãos competentes ou qualquer outro procedimento (a edição, por exemplo). Com efeito, nenhum desses procedimentos possui caráter constitutivo de direito de autor. Poderão, tão-somente, servir como meio de prova de autoria: a utilização de uma obra musical deverá ser protegida mesmo que a obra não tenha – ainda – sido objeto de fixação ou gravação sonora; o registro legal apenas pressupõe autoria, admitindo prova em contrário, e a edição consiste apenas em um dos elementos comprobatórios de autoria existentes240.
Com efeito, possuindo o compositor musical e o letrista tais direitos, fica a
dúvida de que forma poderão exercê-los. Há a possibilidade da autoria da melodia e da letra
pertencerem a uma única pessoa, a qual exercerá a totalidade dos direitos morais e autorais
sobre a obra musical. Porém, discute-se o que ocorre quando a música foi composta em co-
autoria entre musicista e letrista. Vejamos:
A opinião de Bobbio nos fornece essa orientação: ‘Doutrina e jurisprudência andaram um tanto incertas sobre se deviam prevalecer as normas que regem a colaboração ou co-autoria, ou se deveriam considerar como separados e autônomos os direitos do compositor e do escritor, e se, finalmente, havia de se conceder ao musicista um quê de superioridade. Creio que a hipótese não se enquadra nos princípios da colaboração. Esta pressupõe, até no seu próprio sentido gramatical, que a obra seja o produto de um labor comum a duas ou mais pessoas, de tal maneira entrosado que se não possa separar a contribuição individual no todo que resultou’ (...) a titularidade originária, em relação aos direitos patrimoniais, será dividida, em parte iguais, na utilização econômica da obra como um todo, e, em relação aos direitos morais, cada qual será detentor na íntegra de suas respectivas obras (divididas em música e letra), podendo utilizá-las separadamente241.
Tal discussão não tem grandes repercussões no campo prático: os direitos
patrimoniais serão divididos em parte iguais entre os autores da obra lítero-musical – mesmo
que seja mais de dois autores; nos direitos morais, a cada um deles (o musicista e o letrista)
pertence a totalidade dos direitos sobre a sua parte na criação da obra:
4.1.2.2. O arranjador e o compositor das variações
Muito se discute, se o maestro que arranja determinada canção, adquire direitos
autorais sobre o arranjo que compôs, pelo fato de pôr na criação dele, total empenho e 240 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 105-106. 241 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, 1ª ed. São Paulo: FTD, 1998, p. 106-107.
133
dedicação pessoal. Inclusive, Costa Netto traz em seu livro a opinião de João Máximo242, em
uma análise em que este, diz exatamente isto. Porém, para adquirir direitos autorais sobre
arranjo, é necessário o critério da novidade:
É relevante ressaltar, contudo, que o elemento essencial à tutela pelo direito de autor é – independentemente do grau de competência ou prestígio do arranjador – o fato de ter havido, efetivamente, uma criação intelectual nova. O que é certo, portanto, é que essa atividade – mesmo exercida por um compositor notório – não vai resultar, necessariamente, na criação de uma obra derivada, requisito essencial para atribuição da titularidade de direito de autor. Os arranjos só poderão ser protegidos se contiverem as características de verdadeira adaptação243.
Como já dissemos, o arranjo pode consistir em mera tradução da composição
original (que pode ser, por exemplo, uma sinfonia), em uma linguagem mais simples (uma
sonata, ou em um concerto apenas para cordas). Já a variação, contém um grau de
originalidade maior que o arranjo: o compositor da variação apenas toma emprestada uma
obra musical anterior, para criar algo novo. Costa Netto explica isto:
Por outro lado, o compositor das variações assume a titularidade originária da obra derivada com mais facilidade, uma vez considerada esta como empréstimo do tema de uma composição anterior combinada com novos desenvolvimentos, servido a obra anterior apenas como base à variação que o compositor da obra nova imagina e inova. A variação musical não é especificada na legislação brasileira, e, conforme lembra Henrique Gandelman, no tocante ao arranjo, a lei se refere somente a arranjo de obra em caído público244.
Em síntese, o arranjo incide diretamente sobre o elemento “harmonia”, pois
trata-se de uma forma diferente de execução, porém, não há alteração significativa dos
elementos ritmo e melodia; já a variação ou adaptação, pode atingir não apenas o elemento
harmonia, como também o elemento ritmo e – não raro – a melodia: daí, dizer-se que o
compositor da variação realmente criou algo novo, enquanto o arranjador, limitou-se a
executá-la – a música – de um modo diferente.
242 João Máximo diz: “Como Radamés, excelente compositor, também Peracchi, Panicalli, Gaya, Renato, Ciro, Simonetti eram capazes de criar suas próprias canções. E quando, por dever de ofício (em alguns casos até por sobrevivência), tinham de orquestrar, punham ali muito amor e esmero, já que exisita em suas almas um compositor fazendo força para ser ouvido”. 243 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 109. 244 Idem, p.109.
134
4.1.2.3. Os artistas intérpretes e executantes
Apresentado os titulares originários de direitos autorais sobre a obra musical ou
lítero-musical – compositores musical e letrista, e arranjador e compositor de variação – resta-
nos apresentar a outra classe: a dos titulares de direitos derivados (ou conexos) de obra
musical, notadamente os artistas intérpretes e executantes e os produtores de fonogramas. Na
lição de Costa Netto:
Portanto, se for seguida a orientação legal – nacional e internacional –, os titulares originários de direitos conexos aos de autor na interpretação ou execução de obra musical deveriam ser: os intérpretes (cantores ou instrumentistas solistas e regentes), os músicos executantes e os produtores de fonogramas. Embora o ponto de partida de explanação do tema para exame da titularidade originária decorra da área musical, é necessário observar que tanto a Convenção de Roma quanto a legislação brasileira, na utilização dessas expressões ‘artistas, intérpretes e executantes’, o fazem de forma conjunta, sem distinção (a Convenção de Roma define – conjuntamente – como ‘artistas, interpretes e executantes’ os atores, cantores, músicos, dançarinos e outras pessoas que representem, cantem, recitem, declamem, interpretem ou executem, por qualquer forma, obras literárias ou artísticas). Portanto, não distingue separadamente os titulares de direitos conexos aos de autor na esfera musical245.
Tal deficiência no texto legal não é empecilho para a definição do que seja
intérprete de obra musical. O artista intérprete, nas observações de Costa Netto, é o que impõe
uma marca pessoal sobre a forma de cantar ou executar determinada obra musical. Em suas
palavras:
Comentando a atividade do intérprete no campo musical, Henry Jessen entende que a designação de ‘intérprete’ só cabe ao artista que dê a execução o cunho de sua personalidade. Esta designação, ao seu ver, aplicar-se-ia automaticamente ao cantor. Conclui no sentido de que também poderá intitular-se ‘intérprete’ o músico solista que executa a totalidade ou maior parte da obra. Sobre essas considerações, Walter Morais observa que a conceituação é das melhores, mas merece reparo no sentido de que o cantor nem sempre é ‘automaticamente’ intérprete: o membro do coro, por exemplo246.
245 José Carlos Costa Netto, Op. cit., p. 176. 246 Idem, p. 176-177.
135
Já o artista executante, limita-se a tocar ou cantar a obra musical, sem imprimir
qualquer marca pessoal; é o caso de ser regido e fazer parte de uma orquestra ou coral, no
qual não se destaca dos demais músicos ou cantores participantes. Continua Costa Netto:
Entende, ainda, Jessen – ingressando no terreno da execução musical – que, excluindo o intérprete (cantor), os demais titulares de direitos conexos aos de autor, que apenas atuam no acompanhamento, executando breves solos ou fazendo as harmonias, deveriam ser denominados “acompanhantes”. Em seguida, argumenta que o músico acompanhante limita sua ação à correta leitura de uma parte da orquestração que tem sob os olhos e à correspondente emissão dos sons nela representados. Remata asseverando que sua atuação interpretativa é nula e, assim, considera que, nas execuções exclusivamente orquestrais – salvo na eventualidade de um solo instrumental que por sua extensão e liberdade de execução mereça a denominação de interpretação –, a designação ‘intérprete’ deverá ser dada ao regente, que, pela sua direção, imprime à execução o cunho de sua personalidade. Nesse aspecto, Moraes oferece a crítica de que – nessas considerações de Jessen – falta a conceituação de executante, que não coincide exatamente com a de acompanhante247.
José Carlos Costa Netto consegue demonstrar como são ínfimas as diferenças
entre intérprete, executante e acompanhante, demonstrando os diferentes pontos-de-vista de
dois grandes mestres do direito intelectual no Brasil: Henry Jessen e Walter Moraes. Mas,
acima de tudo, pela pureza científica, adotamos o entendimento de Moraes, cuja doutrina
também é base de lições do ilustre professor lusitano Ascensão:
a) a execução artística é coisa incorpórea reservada à disposição exclusiva da pessoa que a produza. A norma jurídica que assegura este direito contra todos impõe dever geral de preservação, incidindo, destarte, sobre uma relação jurídica de direito real. Esta é a natureza do direito da execução artística, compreendido em sua generalidade, e; b) a interpretação é o produto da elaboração intelectual do intérprete e, como tal, reflexo da sua personalidade indissoluvelmente ligado a ela. É bem que se coloca como objeto de um direito de personalidade de alcance absoluto, cuja disponibilidade é limitada pela impossibilidade de privar-se dele o sujeito. A norma que rege a relação jurídica, daí emergente, situa-se na esfera do direito de personalidade248.
Porém, tomando-se este conceito mais genérico de Moraes e aplicando-o ao
caso específico da obra musical, chega-se a conclusão de que o músico executante não tem
direitos sobre a obra – ao contrário do que Jessen afirma, pois mesmo sendo simples
acompanhante, faz jus a mesma proteção do intérprete – mas sim, apenas três categorias de 247 José Carlos Costa Netto, Op.cit., p. 177. 248 Walter Moraes, Artistas, Intérpretes e Executantes, p.291-292, apud José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 177.
136
titulares de direitos sobre a interpretação ou execução de obra musical. Costa Netto, mais uma
vez, nos apresenta:
Assim, pela sua natureza, conforme a linha de orientação doutrinária citada, a titularidade originária atinente à interpretação ou execução musical deverá ser atribuída às seguintes categorias: a) ao cantor solista, componente de um conjunto ou membro de um coro; b) ao musico solista, componente de um conjunto ou de orquestra; e c) ao regente de orquestra e coral. Tanto Jessen quanto Moraes, consideram, ao meu ver acertadamente, o regente como verdadeiro intérprete (e não musico executante) de obra musical executada por orquestra ou coral249.
Didaticamente, podemos concluir através de exemplos a conclusão acima
apresentada. São artistas intérpretes, portanto, Roberto Carlos, Frank Sinatra, Maria Betânia,
Padre Zezinho, etc., pois imprimem um traço característico de suas personalidades na
interpretação (a voz); são também intérpretes, mesmo quando se apresentam em
apresentações conjuntas com orquestras, os tenores e sopranos eruditos, como é o caso de
Luciano Pavarotti, Plácido Domingos, José Carreras, Montserrat Caballet, entre outros; são
intérpretes, os regentes de tais apresentações, como o famoso maestro Zubin Metha; são
intérpretes, também, músicos solistas, como Kenny G e Joe Satriani, por exemplo, que
possuem uma forma característica de tocarem seus instrumentos; mas, no entanto, são
executantes, todos os músicos participantes de orquestras ou cantores de corais.
Enfim, todos os artistas envolvidos na gravação de uma música – quer
interpretando, quer executando – possui direitos sobre a mesma, em regra; porém, como já
dissemos, caso haja estipulação em contrário, direitos patrimoniais sobre o fonograma
poderão ser cedidos, restando apenas ao artista, alguns direitos morais, dependendo do seu
grau de participação na criação da obra.
4.1.2.4. Os produtores de fonogramas
Feitas as devidas observações sobre os artistas intérpretes e executantes, resta-
nos esta última categoria de titulares originários de direitos conexos à obra musical: os
produtores de fonogramas. Podem ser pessoas físicas ou jurídicas – as chamadas, gravadoras 249 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 177-178.
137
ou selos musicais – e que firmam contrato de produção, gravação e distribuição dos
fonogramas com os artistas intérpretes e executantes, bem como, com os compositores das
respectivas obras musicais.
A questão da titularidade dos direitos conexos do produtor de fonogramas é
apresentada por José Carlos Costa Netto, onde ele analisa, a partir do conceito de fonogramas,
todo a gama de direitos e interesses em jogo:
A atividade de produção fonográfica, a exemplo da produção cinematográfica ou videofonográfica, envolve – e deve organizar e respeitar - uma série de direitos de autor e conexos para realização do produto final: o fonograma. O fonograma, segundo a definição legal é ‘toda fixação de sons de uma execução ou interpretação ou de outros sons, ou de uma representação de sons que não seja incluída em uma obra audiovisual. Não é correto afirmar que o titular exclusivo do fonograma é o produtor. Na verdade, a titularidade do produtor de fonograma limita-se aos direitos conexos aos de autor de produção fonográfica250.
Como já dito, há uma série de direitos autorais e conexos envolvidos na
produção de um fonograma. A pergunta que se faz é: quais são eles? A resposta, que não seria
simples, acaba sendo, graças aos gráficos apresentados por Costa Netto em suas lições, as
quais reproduzimos logo abaixo:
Direito Autoral
Direitos de Autor Direitos Conexos aos de Autor
- compositor(da música e da letra)
- intérprete(cantor ou músico solista)
- músicos acompanhantes(executantes)
- regente (maestro)
- produtor fonográfico
- arranjador(quando se tratar decriação intelectualoriginal)
Figura 9: Retirado do livro “Direito Autoral no Brasil”, de José Carlos Costa Neto, p. 178.
250 José Carlos Costa Netto, Op. cit., p. 178.
138
Identificamos, portanto, em que classe de titulares de direitos encontra-se o
produtor de fonogramas: a dos titulares de direitos conexos. É justamente esta conceituação
de titular de direitos conexos que é muito discutida por alguns autoralistas: é possível uma
empresa (pessoa jurídica) ser titular de direitos autorais? Deixamos para um segundo
momento a abordagem desta questão.
Por hora, importa-nos saber quais são os direitos autorais em jogo na produção
de fonogramas. E num segundo diagrama, Costa Neto elenca quais são:
Direito Autorais
Direitos Morais Direitos Patrimoniais
- paternidade do autor sobre asua obra
- a gravação ou fixação
- indicação do nome do autor(ou intérprete) na utilização de suaobra
- a extração de cópias para comer-cialização (venda) de discos, fitas, etc
- retirar a obra de circulação ou suspender utilização já autorizada
- execução pública (por emissorasde rádio, TV, shows etc.)
- ter acesso a exemplar único e raroda obra que esteja, legitimamente,em poder de outrem
- conservar a obra inédita- sincronização ou inserção em filmes(cinemas, vídeo, publicidade), etc
- assegurar a integridade da obra - a tradução, adaptação e outrastransformações- modificar a obra
Figura 10: Retirado do livro “Direito Autoral no Brasil”, de José Carlos Costa Neto, p. 179.
Como ensina Costa Netto, é o produtor de fonogramas o responsável por zelar
por todos esses direitos envolvidos numa produção fonográfica:
Normalmente, é o produtor de fonogramas que organiza – operacional e tecnicamente – essas criações e atividades que irão constituir o fonograma. A partir daí – em relação a direitos de terceiros – o produtor deverá estar munido documentalmente – de contratos ou termos de concessão ou cessão de direitos autorais de todos os titulares envolvidos na fixação fonográfica – para poder utilizá-lo, regularmente, e controlar a sua reprodução, distribuição, comercialização e, em sentido amplo, sua utilização por terceiros251.
251 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 179.
139
Convém destacar que a figura do produtor de fonogramas refere-se àquela
pessoa (física ou jurídica), que investe certa quantia para gravação de fonogramas em um
formato específico (seja um compacto simples – single – ou álbum completo, coletânea, etc.),
visando acima de tudo, obter lucro com esta atividade. Existe, no processo de produção
fonográfica, a figura do produtor musical.
É o produtor musical quem faz a ponte entre o artístico e o comercial: ele
define o repertório de um disco, conforme a tendência mercadológica e a aceitação do público
consumidor, moldando, inclusive, o estilo do intérprete, segundo este planejamento
comercial; é ele quem escolhe os maestros arranjadores e os músicos executantes; é quem
define o estúdio e os técnicos de gravação. Enfim, ele tenta obter o melhor resultado artístico
diante do quadro econômico desenhado pelo produtor fonográfico (que é a própria gravadora).
Ainda existe outra figura no processo: o produtor executivo. Este, mais das
vezes, é um cargo de alto executivo dentro dos quadros das gravadoras, desempenhado por
pessoas de reconhecido quilate no mundo artístico, mas que sobretudo, tenha um ótimo
relacionamento com os meios de comunicação (rádios, TV´s, revistas), para fazer daquele
produto fonográfico um sucesso de vendas.
4.2. OS DIREITOS AUTORAIS E CONEXOS RELATIVOS AOS FONOGRAMAS
MUSICAIS.
Identificados os sujeitos dos direitos autorais e conexos relativos à produção de
fonogramas musicais, é chegado o momento de estudar as relações jurídicas envolvidas em tal
atividade. Vimos que, há um verdadeiro plexo de direitos em interesses em jogo, na produção
e exploração econômica da atividade fonográfica. Conciliar e regulamentar tais interesses, é
das tarefas mais difíceis: exigem-se leis que tratem do tema, bem como, de institutos
contratuais de cessão, concessão e autorização de uso.
A Lei de Direitos Autorais (n° 9.610/98), traz vários dispositivos normativos
que regulamentam o uso de obras intelectuais, e mais precisamente, os direitos envolvidos na
atividade fonográfica. Porém, antes de tratarmos da utilização de fonogramas (artigos 53 a 76
140
da Lei n° 9.610/98), é necessário falar de dois pontos substanciais: os contratos de edição e a
titularidade originária dos produtores de fonogramas.
Para produzir um fonograma, a lei exige do produtor, autorizações específicas
para utilização das obras musicais, como bem explica Costa Netto:
Como a legislação autoral estabelece que as cessões de direito só terão validade se formalizadas por escrito (artigo 49, inciso II, da Lei 9.610/98, que reeditou a orientação do artigo 53 da Lei 5.988/73) e que interpretam-se restritivamente os negócios que envolvam direitos autorais (artigo 4° da Lei 9.610/98 que reproduziu textualmente o artigo 3° da Lei 5.988/73), dependerá dessa documentação e, como os direitos morais são intransferíveis, da conseqüente harmonia entre o produtor e os demais titulares de direitos de autor e os que lhe são conexos, o fortalecimento – sob o aspecto jurídico e prático – do produtor de fonogramas frente às diversas formas de utilização dos fonogramas252.
Enfim, na produção de um fonograma, desde de seu início – com a autorização
dos compositores da música, de contratos de cessão de direitos de intérpretes e executantes –
à sua finalização –gravação, reprodução e distribuição – o produtor fonográfico necessita
firmar contratos e acordos diversos. É o que veremos a seguir, como isso se procede. Para
concluirmos tal afirmação, vejamos as sábias palavras do mestre Carlos Alberto Bittar:
Anote-se, ainda, que, na edição (em partitura: gráfica ou litográfica) e na gravação da música, contratos próprios são firmados, normalmente de cessão de direitos para fixação e uso respectivo pelas empresas do setor, e com todos os titulares, desde compositores, letristas, músicos, orquestradores e arranjadores, enfim, todos os que participam na elaboração do fonograma253.
Porém como bem observa o ilustre mestre Bittar, os contratos de direitos
autorais são específicos e possuem características próprias, mas mesmo assim, podemos
localizar determinados modalidades de negócios jurídicos já consagrados em leis:
Além disso, podem interpenetrar-se, na prática, em um mesmo instrumento, cláusulas e condições de contratos típicos, em diferentes negócios complexos que o próprio dinamismo das comunicações vem provocando. Dentre as formas contratuais utilizadas, algumas são de Direito Comum (como a empreitada: Código Civil brasileiro, arts. 610 a 623; a locação de serviços, id, arts. 594 a 609; a doação, id., arts. 538 a 564) – e, quando há vinculo de emprego, contrato de trabalho, CLT, arts 442 e segs. – e outras são específicas de Direito de Autor (como a edição: Lei n°9.610/98, arts 53 a 67;
252 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 179. 253 Carlos Alberto Bittar, Direito de Autor, p.76.
141
representação: Lei n°9.610/98, arts. 68 a 76; cessão de direitos: Lei n°9610/98, arts. 49 a 52; produção: Lei n°9.610/98, art. 81 e segs.; gravação e outros introduzidos pela prática. Geralmente são reduzidos a escrito estes contratos, mas verifica-se, no entanto, que, na prática, muito comum se tornou a contratação verbal (a lei brasileira impõe a forma escrita ao contrato de cessão, art. 50)254.
Em relação a atividade fonográfica, somente alguns dos contratos acima são
utilizados, sendo os mais importantes, portanto, os contratos de edição (é a editora musical
quem recolhe os direitos autorais dos compositores), de cessão e concessão de direitos
(geralmente ocorre com os intérpretes que cedem, às gravadoras, os direitos econômicos sobre
os fonogramas, para que as mesmas utilize-os em outras coletâneas diversas do disco do
artista intérprete), além do contrato de gravação.
4.2.1. Os contratos de edição, cessão e concessão
Como bem lembra Costa Netto, o autor pode ceder seus direitos sobre a obra
para terceiros, seja por ato inter vivos, seja por mortis causa, no qual seus herdeiros adquirem
a titularidade dos direitos autorais. E essa titularidade derivada, pode abarcar não apenas
direitos patrimoniais, mas como alguns direitos morais. O expediente mais comum utilizado
pelo autor – em vida – para transferência de direitos, é o contrato de cessão. Vejamos o que
diz Costa Netto:
Na área musical, é prática corrente que a cessão de direitos – embora ressalve a participação percentual do compositor na exploração da obra – conste do contrato de edição. Assim, passaremos a examinar primeiramente essa modalidade obrigacional sob o aspecto genérico e, depois, em relação à obra musical e suas peculiaridades255.
Continuando sua lição, Costa Netto explica a etimologia da palavra Edição, e
do termo Editor, como aquele que não apenas edita a obra, mas que também é responsável
pela difusão de sua edição. Neste sentido, é que ao citar Fábio Maria de Mattia, Costa Netto
apresenta as características de um contrato de edição genérico:
254 Carlos Alberto Bittar, Op cit., p.94. 255 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, 1ª ed. São Paulo: FTD, 1998, p. 179.
142
E, nessa orientação, é o próprio De Mattia quem conclui que o conceito de contrato de edição deve conter os seguintes elementos: os riscos ficam a cargo do editor; o contrato visa à publicação da obra (impressão, divulgação e comercialização) e deve indicar a exclusividade da transferência do direito de utilização econômica da obra intelectual. (...) As tentativas de definição da natureza jurídica do contrato de edição se avolumam na doutrina, a ponto de ser considerado como espécie sui generis na classificação dos contratos, entendimento adotado, por exemplo, por Henry Jessen, complementando: ‘O contrato de edição é sinalagmático, consensual, aleatório e geralmente oneroso. Pagará o editor uma quantia global ao autor pela edição contratada ou uma participação, definida no contrato, sobre cada exemplar vendido, participação esta usualmente designada pelo termo inglês royalty (...), que poderá ser percentual sobre o preço de venda ou representada por um algarismo fixo256.
Portanto, seguindo a regra da lei autoral, toda e qualquer autorização ou cessão
de direitos autorais deve-se dar por contrato; e o contrato, por seu turno, deve prever cláusulas
expressas sobre o alcance da cessão dos direitos patrimoniais, bem como a remuneração do
autor no negócio. Mas a cláusula que possa ceder integralmente seus direitos, esta só pode ser
nula. Fábio Maria de Mattia, baseado nas lições de Pierre Alain Tache, faz uma primorosa
demonstração sobre este tema:
Importante é a posição de Tache segundo a qual o direito do autor é inalienável. Isso impede uma cessão total do direito patrimonial e admite apenas uma concessão dos direitos de utilização. Um acordo de vontades não pode romper, ainda que parcialmente, o liame jurídico que une o criador à sua obra. Assim mesmo, o contrato de edição, nesta perspectiva, exerce uma função constitutiva. Ele cria um novo direito, distinto do direito do autor e extremamente ligado à execução da obrigação principal do editor. Somos, integralmente, favoráveis à proibição da cessão dos direitos autorais. O Direito Positivo apenas deveria admitir contratos visando à utilização temporária e econômica da obra. Seria o único modo de resguardar, efetivamente, os direitos do editor257.
Tal característica de um contrato de edição genérico, em muita coisa se
distancia do contrato de edição musical. Para Costa Netto, o editor musical não adquire a
propriedade das obras musicais sob seu domínio, mas torna-se, tão somente, uma espécie de
mandatário ou administrador dos direitos patrimoniais da obra, que se refletem nas mais
diversas formas de utilização:
Habitualmente, nos contratos de edição musical não contém apenas as relações de edição gráfica (a impressão, publicação e divulgação da partitura correspondente à obra musical editada). E a condição sui generis da edição
256 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 110-111. 257 Fábio Maria de Mattia, O Autor e o Editor na Obra Gráfica, , apud José Carlos Costa Netto, Op. cit.,, p. 111.
143
musical está justamente neste aspecto: a obrigação da edição gráfica, em geral, quase que se dissipa em relação às demais atividades do editor musical no controle do vasto e complexo campo de utilização da obra musical (sincronização ou inclusão, reprodução fonomecânica e execução pública, principalmente)258.
Porém, assistiu-se em alguns tempos, um verdadeiro abuso por parte dos
editores musicais, na órbita dos contratos de cessão de direitos patrimoniais, de modo a
adquirir a totalidade do gozo econômico das mais diversas formas de utilização econômica da
obra musical. Costa Netto, apresenta severas críticas a este respeito:
Quase sempre, inclusive, o editor procura adquirir, abusivamente, a condição de verdadeiro cessionário dos direitos patrimoniais de autor, durante a íntegra do período legal de proteção da obra musical. Pretende, assim, substituir o autor no que tange à exclusividade na exploração econômica da obra, isolando este da sua disposição e controle. Daí a titularidade derivada de direitos de autor pelo ‘editor’, que, como já se expôs, só pode se referir aos direitos patrimoniais e – mesmo assim – restritivamente aos direitos específica e expressamente constantes do contrato259.
Esta prática abusiva e atentória à moral e aos direitos autorais, infelizmente,
tem sido prática corrente no mundo artístico brasileiro. Porém, cabe a nós, militantes da causa
autoral, apontarmos soluções para tal cenário temeroso; e Carlos Alberto Bittar o faz, de
forma genial, apontando princípios que devem ser observados ao elaborar e interpretar
contratos de direitos autorais. Vejamos o que nos ensina Bittar:
Verifica-se, assim, que o direito moral governa as obrigações no campo autoral. Daí, o princípio basilar que rege o direito das obrigações comum – o da autonomia de vontade – é limitado no Direito de Autor e, em conseqüência, também o da supletividade das normas legais. Com efeito, neste plano, as normas são, em geral, de ordem pública, porque ditadas por sua índole protecionista. Assim, do reconhecimento do aspecto moral, tem-se fixado as seguintes orientações no Direito de Autor: a) impossibilidade de cessão global e indefinida de obras, vedada em virtude de não se poder obrigar o autor a produzir determinada obra (daí, as limitações impostas a obras futuras, como veremos adiante); b) impossibilidade de execução específica, pela mesma razão, por isso importaria em tolher-se a liberdade individual; c) não-restrição, na obra sob encomenda, dos direitos do autor, que, ao revés, conserva os direitos morais e patrimoniais não expressamente compreendidos na convenção; d) não-restrição aos direitos do autor na obra de criador assalariado, o qual mantém, também, de regra, os direitos não explicitamente compreendidos no contexto do contrato. Dessas observações, defluem conseqüências práticas de extraordinário alcance, nos contratos firmados para a utilização econômica da obra, cujo desconhecimento tem
258 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 111-112. 259 Idem, p. 112.
144
levado a um aproveitamento indevido de obras protegidas, à ausência, ou à insuficiência, de retribuição ao autor e, mesmo, a soluções inadequadas em casos concretos260.
Por fim, mister se faz distinguir o contrato de edição musical – acima descrito
com detalhes – do contrato de cessão de direitos autorais – ao qual a doutrina autoralista
reserva severas críticas, em casos concretos.
Costa Netto, ao descrever a corriqueira situação, onde o Editor assume em um
mesmo contrato, as funções de Administrador, Mandatário e Cessionário em relação ao Autor,
que passa a figurar como Administrado, Mandante e Cedente – respectivamente – aponta um
princípio importante que vigora a favor do autor da obra musical:
Efetivamente, é relevante afirmar que não pode, de forma alguma, ser presumida, na edição musical, a cessão de direito de autor. Na verdade, se não estiver adequadamente expressa, não deve, de forma alguma, ser considerada. Vejamos, nesse sentido, a orientação de Bobbio: ‘O contrato de edição confere ao editor, única e exclusivamente, o direito de realizar a publicação e a explorar a publicação, não a obra. Não há, no contrato de edição propriamente dito, nenhuma ‘cessão de direito do autor’, a não ser que o próprio contrato o estipule expressamente261.
Sendo assim, o editor musical antes de qualquer sub-aproveitamento da obra
musical publicada por ele, deve solicitar expressa aquiescência do(s) autor(es) da obra sob
seus cuidados. Neste sentido, a própria lei de direitos autorais (artigo 50, §1°, Lei
9.610/98262), prevê que o contrato de cessão de direitos deve ser averbado junto ao registro da
obra, enquanto o simples contrato de edição, não.
Caso o editor extrapole dos poderes que lhe foi conferido pelo autor no
contrato – quer de edição musical, quer de cessão de direitos patrimoniais –, fazendo
utilizações extracontratuais da obra sob seu poder, está incorrendo em violação de direitos do
autor.
260 Carlos Alberto Bittar, Direitos do Autor, p.92. 261 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 112-113. 262 Este artigo encontra-se transcrito no Anexo 4 deste trabalho.
145
4.2.2. A titularidade originária dos produtores fonográficos
Vimos que o editor musical concentra em seu poder, a faculdade de editar e
publicar a obra musical sob seu poder. No mais, pode ocorrer de haver cessão dos direitos
patrimoniais da obra para si, como em não havendo, deve o editor solicitar expressa
autorização do autor para cada forma de utilização diversa extracontratual da obra musical.
Uma dessas formas, também já vimos, é a sua fixação em meio ótico ou digital,
ou seja, sua conversão em fonogramas. Interessante notar-se que, o fonograma, é figura
distinta da obra musical fixada; enquanto a obra musical está afeta ao autor, e este, possui
direitos de autor sobre ela, o fonograma trata-se de direito conexo, afeto ao produtor de
fonogramas. Seria o produtor fonográfico o titular originário dos direitos sobre os fonogramas
produzidos por ele.
Mas há uma forte discussão sobre a possibilidade ou não de, sendo o produtor
fonográfico, quase sempre uma pessoa jurídica, ser titular de direitos autorais, equiparado à
pessoa do artista que criou a obra musical original. Tal discussão, longe de ser mera
prosopopéia jurídico-doutrinária, tem importantes reflexos no cotidiano: afinal, há certas
faculdades e defesas processuais à violação de direitos autorais, que só podem ser exercidas,
senão, pelo titular dos direitos. Bittar enumera quais seriam essas faculdades:
No mais, em termos legislativos, os direitos conexos situam-se em plano equivalente aos de autor, gozando, pois, das prerrogativas correspondentes. Assim é que os titulares de direitos conexos desfrutam tanto de direitos morais, como patrimoniais, incluindo-se, dentre os de caráter descritos na lei, faculdades positivas e negativas: a) a menção do nome, em qualquer interpretação ou execução; b) o impedimento a gravações, reproduções ou transmissões ao produtor de fonogramas; c) a realização de fixações na radiodifusão (art. 91); d) a autorização de emissões e a comunicação pela televisão (art. 95); e) a autorização de reproduções na radiodifusão, a par de outras de ordem geral como o direito à integridade da interpretação; o direito de reivindicá-la; o de modificá-la, salvo restrições legais, e outros263.
Costa Netto, anota em seus estudos sobre a polêmica, a conclusão de Henry
Jessen acerca do relatório oficial da Conferência Diplomática de Roma, de outubro de 1961,
onde o mesmo conclui que nos direitos conexos aos fonogramas, “não seriam as pessoas
263 Carlos Alberto Bittar, Direitos do Autor, p.158.
146
físicas, que atuam como prepostos da empresa produtora, que adquirem o título ou o direito,
e sim a organização (a empresa fonográfica)264”.Porém, ao seu ver, haveria uma
incongruência neste fato: a produtora fonográfica (gravadora musical), como pessoa jurídica,
não poderia ser titular de tais direitos. Vejamos, o que diz Costa Netto:
Nesse ponto já reside a primeira contradição: a titularidade originária do direito seria atribuída a uma pessoa jurídica e não física, sendo que o resultado final da gravação fonográfico não é coletivo, e sim, normalmente, uma colaboração, com as respectivas participações perfeitamente identificáveis, o que não exclui a possibilidade de obra individual (quando o cantor ou instrumentista não se acompanha de outros músicos, e, inclusive, é o compositor das obras musicais utilizadas). Destarte, se atendidos os requisitos indispensáveis para atribuição de titularidade ao comitente ou empregador, a empresa fonográfica, vulgarmente conhecida como ‘gravadora’, não poderia ser titular originária de direitos autorais265.
Neste primeiro argumento, Costa Netto retoma o conceito de obra em
colaboração e obra coletiva – já foram apresentados no primeiro capítulo deste trabalho –;
para ele, o fonograma é uma obra em colaboração, portanto, cada participante (intérprete,
arranjador, regente, músicos acompanhantes, compositores) tem parcelas de direitos sobre a
obra, e não somente a produtora (gravadora musical). Aliás, esta não teria concebido a idéia
original, para que os outros apenas executassem o trabalho, sob sua coordenação – como
ocorre na obra coletiva.
É nesse sentido, que continua rumando Costa Netto, ao citar as figuras dos
produtores artísticos ou produtores executivos, sobre os quais já falamos anteriormente. Para
ele, o fato da gravadora ser pessoa jurídica, impossibilitaria a mesma de ser a titular de
direitos autorais sobre os fonogramas produzidos, sendo razoável propor, que, seriam os
produtores artísticos ou executivos, portanto, os titulares desses direitos. Vejamos:
Nesse caso, poderia até ser defensável – ao contrário das conclusões do referido relatório oficial da ‘Convenção de Roma’ – que a titularidade originária de direitos conexos aos de autor, relativa à ‘produção fonográfica’, fosse atribuída ao coordenador da produção, também designado ‘produtor artístico’ ou ‘produtor executivo’ ou – até – apenas como ‘produtor’, uma vez que sua participação efetiva influencie diretamente o direcionamento artístico e musical em todos os detalhes necessário à materialização da gravação, contribuindo, de forma criativa, para o resultado final da fixação da obra musical266.
264 José Carlos Costa Netto, Op. cit., p. 182. 265 Idem, p. 182. 266 Ibidem, p. 182..
147
Seria, portanto, o produtor o verdadeiro cérebro e alma por trás do trabalho
fonográfico, e não a gravadora musical, uma mera ficção jurídica. Mas, tal produção
fonográfica, é efetivamente, uma obra literária, musical ou artística, a ponto de merecer
proteção autoral? Costa Netto, ao citar Jessen, assegura que nem sempre um fonograma, é
uma fixação sonora de obras literárias ou artísticas; podem ser, às vezes, “produzidos à base
de quaisquer outros sons, como cantos de aves, ruídos de máquinas, de sons da selva e
outros267” sons não-artísticos.
Portanto, classificar o direito que possui o produtor fonográfico sobre o
fonograma, como espécie de direito conexo ao de autor, trata-se de uma impropriedade.
Endossa tal parecer, o eminente professor José de Oliveira Ascensão, ao qual reduz a
atividade fonográfica a simples técnica comercial:
O que caracteriza, então, a posição destes produtores? Reconhece-se, quando se ultrapassa o círculo da defesa sindical dos interessados***, que não há criação artística. Há uma técnica, extremamente complexa e valiosa, mas em todo caso industrial. E nunca seria possível fazer depender a proteção dos produtores de fonogramas ou de vídeo fonogramas da presença ou não de criação artística nos seus produtos: a lei não dá guarida a esta distinção. (...) ***Nota de rodapé: Têm estes defendido, como dissemos, que a sua atividade tem caráter criador, de tal modo que o que lhes cabe é ainda um verdadeiro direito de autor. O refinamento dos processos utilizados permitiria chegar a uma obra nova, pelo que o produtor de fonogramas ou de videofonogramas participaria da criação. Mas a ser assim, o autor seria o técnico de gravação, e não quem realiza uma mera prestação organizativa-financeira268.
Conclui-se, portanto, que o bem protegido como direito conexo, não é o
fonograma em si – que é um bem material – mas a sua utilização: “é sobre certas utilizações
desses sons a partir de fonograma ou videofonograma que se reconhece um direito do
produtor269”. É deste direito de utilização que surgem todas as discussões acerca do direito
conexo do produtor de fonogramas: não recaindo, portanto, a proteção jurídica sobre o suporte
material – que é o fonograma – sobre quais formas de utilização, então, recairiam? É o que
tentaremos responder no próximo tópico.
267 José Carlos Costa Netto, Op. cit., p. 183. 268 José de Oliveira Ascensão, Direito Autoral no Brasil, p. 492. 269 Idem, p. 494.
148
4.2.3. Formas de utilização de fonogramas
Apresentamos, agora, uma tabela que relaciona os artigos da Lei n° 9.610/98,
que trazem disposições aplicáveis aos fonogramas, acompanhados de um breve comentário
elaborado por este acadêmico, para que possamos fazer as análises pertinentes, à luz das
lições já apresentadas da doutrina autoralista, sobre as formas de utilização dos fonogramas
musicais.
Tabela 7: Quadro com artigos da Lei n° 9.610/98 referente aos fonogramas, comentados. Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da
obra, por quaisquer modalidades, tais como:
I - a reprodução parcial ou integral;
II - a edição;
III - a adaptação, o arranjo musical e quaisquer outras transformações;
IV - a tradução para qualquer idioma;
V - a inclusão em fonograma ou produção audiovisual;
VI - a distribuição, quando não intrínseca ao contrato firmado pelo autor
com terceiros para uso ou exploração da obra;
VII - a distribuição para oferta de obras ou produções mediante cabo, fibra
ótica, satélite, ondas ou qualquer outro sistema que permita ao usuário
realizar a seleção da obra ou produção para percebê-la em um tempo e
lugar previamente determinados por quem formula a demanda, e nos casos
em que o acesso às obras ou produções se faça por qualquer sistema que
importe em pagamento pelo usuário;
VIII - a utilização, direta ou indireta, da obra literária, artística ou
científica, mediante:
(...)
i) emprego de sistemas óticos, fios telefônicos ou não, cabos de qualquer
tipo e meios de comunicação similares que venham a ser adotados;
(...)
IX - a inclusão em base de dados, o armazenamento em computador, a
microfilmagem e as demais formas de arquivamento do gênero;
Como já foi dito, o contrato de produção fonográfica concentra vários direitos
autorais e conexos, e por isto mesmo, o produtor tem que se cercar de todas as
autorizações de cada titular de direitos autorais.
Neste artigo, destacamos mais o direito do autor compositor e letrista, no
tocante à suas obras musicais, que são a matéria-prima do fonograma. Por isto
mesmo, é necessária a sua autorização expressa para sua reprodução (o
fonograma não deixa de ser forma de reprodução, já que trata-se de fixação
em suporte material, que será reproduzido em vários exemplares), bem como,
para arranjos ou adaptações (neste caso, trata-se daquelas transformações que
alteram significativamente não somente a harmonia, mas como também a
melodia ou o ritmo).
Há ainda, a necessidade de autorização expressa para inclusão em fonograma
(deve estar previsto no contrato de edição musical, que o editor pode autorizar
qualquer produtor fonográfico a inclusão da obra musical em fonograma),
pois vigora o princípio da interpretação restritiva das cláusulas a favor do
autor.
Grande inovação desta lei, os incisos VII e alínea i) do inciso VIII, a
utilização de qualquer obra em sinais digitais ou eletromagnéticos, também
necessitam de autorização específica do autor. Veremos que, os arquivos
MP3, não tratam-se de fonogramas, no sentido estrito, mas de nova forma de
utilização de obra artística.
Art. 53. Mediante contrato de edição, o editor, obrigando-se a reproduzir e
a divulgar a obra literária, artística ou científica, fica autorizado, em
caráter de exclusividade, a publicá-la e a explorá-la pelo prazo e nas
condições pactuadas com o autor.
Parágrafo único. Em cada exemplar da obra o editor mencionará:
I - o título da obra e seu autor;
II - no caso de tradução, o título original e o nome do tradutor;
III - o ano de publicação;
IV - o seu nome ou marca que o identifique.
Parágrafo único. É vedada a publicação parcial, se o autor manifestou a
vontade de só publicá-la por inteiro ou se assim o decidirem seus
sucessores.
Por força do art. 89, o qual versa que se aplica aos direitos conexos, no que
couber, as mesmas regras do direito de autor. Por força do contrato de
produção, a gravadora (produtor fonográfico) adquire exclusividade na
exploração econômica dos fonogramas produzidos.
Em relação ao caput, explica Costa Netto: “Enfim, a cessão de direitos, total
ou parcial, incrustada no contrato de edição e sempre abrangendo somente
os aspectos pecuniários dos direitos de autor, é a forma mais habitual de
aquisição, por terceiros, da titularidade derivada de obras musicais270”.
Como nos demais contratos, caso o editor não cumpra com os termos, o
contrato será considerado rescindo; caso extrapole os termos, configurará
violação de direito autoral.
270 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 114.
149
Tabela 7: Tabela com comentários a artigos da Lei n° 9.610/98 referente aos fonogramas. Art. 56. Entende-se que o contrato versa apenas sobre uma edição, se não
houver cláusula expressa em contrário.
Parágrafo único. No silêncio do contrato, considera-se que cada edição se
constitui de três mil exemplares.
Art. 57. O preço da retribuição será arbitrado, com base nos usos e
costumes, sempre que no contrato não a tiver estipulado expressamente o
autor.
Art. 60. Ao editor compete fixar o preço da venda, sem, todavia, poder
elevá-lo a ponto de embaraçar a circulação da obra.
Trata-se de desdobramentos do princípio in dubio pro autor, no qual, sendo o
contrato silente ou obscuro, a interpretação será sempre em favor do autor, ou
seja, restritiva aos demais termos do contrato, e não extensiva, àquilo que não
está suficientemente claro.
No caso dos produtores de fonogramas, quase sempre, são eles que
estabelecem a tiragem inicial de cópias do álbum, bem como, o seu preço de
venda. Comumente, estabelecem-se percentuais sobre o preço de venda dos
discos, fitas e CD´s, a serem divididos entre os titulares de direitos autorais e
conexos envolvidos no trabalho de produção.
Art. 61. O editor será obrigado a prestar contas mensais ao autor sempre
que a retribuição deste estiver condicionada à venda da obra, salvo se
prazo diferente houver sido convencionado.
Art. 64. Somente decorrido um ano de lançamento da edição, o editor
poderá vender, como saldo, os exemplares restantes, desde que o autor seja
notificado de que, no prazo de trinta dias, terá prioridade na aquisição dos
referidos exemplares pelo preço de saldo.
A produtora fonográfica se assemelha à figura do editor, prevista nos artigos
61 e 68. Com a edição do Decreto n° 4.533, de 19/12/2002, ficou estabelecido
em seu artigo 3° que “O responsável pelo processo industrial de reprodução
deve informar ao produtor a quantidade de exemplares efetivamente
fabricados em cada tiragem, devendo o responsável pelo processo industrial
de reprodução e o produtor manter os registros dessas informações em seus
arquivos por um período mínimo de cinco anos, viabilizando assim o controle
do aproveitamento econômico da exploração pelo titular dos direitos autorais
ou pela entidade representativa de classe.”
Art. 68. Sem prévia e expressa autorização do autor ou titular, não poderão
ser utilizadas obras teatrais, composições musicais ou lítero-musicais e
fonogramas, em representações e execuções públicas.
§ 1º Considera-se representação pública a utilização de obras teatrais no
gênero drama, tragédia, comédia, ópera, opereta, balé, pantomimas e
assemelhadas, musicadas ou não, mediante a participação de artistas,
remunerados ou não, em locais de freqüência coletiva ou pela radiodifusão,
transmissão e exibição cinematográfica.
§ 2º Considera-se execução pública a utilização de composições musicais
ou lítero-musicais, mediante a participação de artistas, remunerados ou
não, ou a utilização de fonogramas e obras audiovisuais, em locais de
freqüência coletiva, por quaisquer processos, inclusive a radiodifusão ou
transmissão por qualquer modalidade, e a exibição cinematográfica.
§ 3º Consideram-se locais de freqüência coletiva os teatros, cinemas, salões
de baile ou concertos, boates, bares, clubes ou associações de qualquer
natureza, lojas, estabelecimentos comerciais e industriais, estádios, circos,
feiras, restaurantes, hotéis, motéis, clínicas, hospitais, órgãos públicos da
administração direta ou indireta, fundacionais e estatais, meios de
transporte de passageiros terrestre, marítimo, fluvial ou aéreo, ou onde
quer que se representem, executem ou transmitam obras literárias,
artísticas ou científicas.
Trata-se, neste caso, das chamadas execuções públicas de obras, quer sejam
teatrais, fonográficas, musicais ou lítero-musicais. Neste sentido, é importante
ressaltar a importância do Escritório Central de Arrecadação de Direitos
(ECAD): é ele quem deverá promover a vigilância e recolhimento dos direitos
devidos aos titulares, quando da utilização pública – autorizadas ou não – de
suas respectivas obras.
Merece comentário acalorado, o parágrafo 2°, no que concerne a radiodifusão
de fonogramas. É comum – embora não admitida oficialmente por ninguém –
a prática do jabaculê (ou jabá): o produtor fonográfico “compra” espaços nas
programações de emissoras de rádio, para veicular diversas vezes ao dia, seus
fonogramas, com a finalidade de alavancar a vendagem de exemplares em
lançamento. Brilhante relato sobre o tema “Indústria Fonográfica Brasileira”,
encontra-se na obra “Os donos da voz”, de Márcia Tosta Dias; obra esta que,
infelizmente, foi descoberta por este acadêmico somente nas revisões finais
desta monografia, mas que nem por isso, deixou de ser mencionada.
O parágrafo 3° têm suscitado muitas discussões, principalmente, no que
concerne a cobrança de direitos autorais pelo ECAD de lugares que executam
publicamente programação radiofônica. Seria, abusiva, tal cobrança? Se o
direito já foi pago – na teoria – pela emissora de rádio, aquele que apenas
capta as ondas sonoras e as executa, teria de pagar novamente? Seria isso uma
espécie de re-transmissao? Nada esta pacificado na doutrina.
Art. 80. Ao publicar o fonograma, o produtor mencionará em cada
exemplar:
I - o título da obra incluída e seu autor;
II - o nome ou pseudônimo do intérprete;
III - o ano de publicação;
IV - o seu nome ou marca que o identifique.
Trata-se, aqui, do consagrado direito de paternidade da obra pelo autor. No
caso dos fonogramas, destacam-se três figuras distintas de autores: o
intérprete (inciso II), os compositores das músicas (inciso I) e o produtor
fonográfico (inciso IV).
Art. 89. As normas relativas aos direitos de autor aplicam-se, no que
couber, aos direitos dos artistas intérpretes ou executantes, dos produtores
fonográficos e das empresas de radiodifusão.
Parágrafo único. A proteção desta Lei aos direitos previstos neste artigo
deixa intactas e não afeta as garantias asseguradas aos autores das obras
literárias, artísticas ou científicas.
Princípio da aplicação subsidiária das normas relativas aos direitos de autor,
também, aos direitos conexos – inclusive – o relativo a fonogramas.
150
Tabela 7: Tabela com comentários a artigos da Lei n° 9.610/98 referente aos fonogramas. Art. 90. Tem o artista intérprete ou executante o direito exclusivo de, a
título oneroso ou gratuito, autorizar ou proibir:
I - a fixação de suas interpretações ou execuções;
II - a reprodução, a execução pública e a locação das suas interpretações
ou execuções fixadas;
III - a radiodifusão das suas interpretações ou execuções, fixadas ou não;
IV - a colocação à disposição do público de suas interpretações ou
execuções, de maneira que qualquer pessoa a elas possa ter acesso, no
tempo e no lugar que individualmente escolherem;
V - qualquer outra modalidade de utilização de suas interpretações ou
execuções.
§ 1º Quando na interpretação ou na execução participarem vários artistas,
seus direitos serão exercidos pelo diretor do conjunto.
§ 2º A proteção aos artistas intérpretes ou executantes estende-se à
reprodução da voz e imagem, quando associadas às suas atuações.
Notadamente, os incisos IV e V têm despertado interesse por parte dos
autoralistas: poderia, aplicar-se, tais dispositivos legais, à questão da
distribuição de fonogramas pela Internet?
O inciso IV, ao invocar que “colocar a disposição do público suas
interpretações ou execuções”,é perfeitamente compatível com a conduta de
disponibilizar arquivos .MP3 numa rede como o Napster ou Kazaa, “de
maneira que qualquer pessoa a elas possa ter aceso, no tempo e no lugar que
individualmente escolherem”, ou seja, a pessoa pode acessar a qualquer
momento e de qualquer lugar do planeta, a música que desejar.
Já o inciso V, por ser muito genérico, ainda não suscita muitos debates
acalorados. Porém, qualquer outra modalidade de utilização não prevista nos
incisos anteriores, pode ser considerada inserida neste inciso, de acordo com o
caso concreto.
Art. 91. As empresas de radiodifusão poderão realizar fixações de
interpretação ou execução de artistas que as tenham permitido para
utilização em determinado número de emissões, facultada sua conservação
em arquivo público.
Parágrafo único. A reutilização subseqüente da fixação, no País ou no
exterior, somente será lícita mediante autorização escrita dos titulares de
bens intelectuais incluídos no programa, devida uma remuneração
adicional aos titulares para cada nova utilização.
Novamente a obra “Os donos da voz”, de Márcia Tosta Dias; retrata bem a
estratégia de marketing que algumas gravadoras adotam para divulgar os seus
artistas. Além do jabá – a prática mais costumeira – elas adotam ainda a
divulgação de spots: gravações curtas, que duram em média de 30 à 60
segundos, onde um trecho da música de trabalho do álbum (o carro-chefe do
disco) é mesclada com mensagens dos intérpretes (quase sempre,
conclamando os ouvintes da rádio a permanecerem ouvindo tal emissora, ou
ainda, convidando-os a participar de promoções ou a comprar o CD, etc).
Art. 92. Aos intérpretes cabem os direitos morais de integridade e
paternidade de suas interpretações, inclusive depois da cessão dos direitos
patrimoniais, sem prejuízo da redução, compactação, edição ou dublagem
da obra de que tenham participado, sob a responsabilidade do produtor,
que não poderá desfigurar a interpretação do artista.
Parágrafo único. O falecimento de qualquer participante de obra
audiovisual, concluída ou não, não obsta sua exibição e aproveitamento
econômico, nem exige autorização adicional, sendo a remuneração prevista
para o falecido, nos termos do contrato e da lei, efetuada a favor do espólio
ou dos sucessores.
Na obra “Os donos da voz”, Márcia Tosta Dias, ao entrevistar os mais experts
produtores artísticos de grandes gravadoras (as chamadas Majors; as
pequenas gravadoras, independentes, são chamadas Indies), traz uma
interessante tática de mercado: de relançar álbuns de coletânea de maiores
sucessos de um determinado intérprete já falecido, mesclando sua voz –
isolada em modernos processos técnicos das matrizes originais – a de artistas
vivos e de renome. Exemplos disso: Tributo à Paulo Sério (EMI), Clara Vive
(EMI), entre outros. Neste caso, cabe discussão se trata-se, na verdade, de
nova utilização dos fonogramas – pois geralmente, ganham nova roupagem,
descaracterizando o original.
Art. 93. O produtor de fonogramas tem o direito exclusivo de, a título
oneroso ou gratuito, autorizar-lhes ou proibir-lhes:
I - a reprodução direta ou indireta, total ou parcial;
II - a distribuição por meio da venda ou locação de exemplares da
reprodução;
III - a comunicação ao público por meio da execução pública, inclusive
pela radiodifusão;
IV - (VETADO)
V - quaisquer outras modalidades de utilização, existentes ou que venham a
ser inventadas.
Vale a pena lembrar que, trata-se de direito que o produtor fonográfico divide
com o intérprete e executante.
Art. 94. Cabe ao produtor fonográfico perceber dos usuários a que se
refere o art. 68, e parágrafos, desta Lei os proventos pecuniários
resultantes da execução pública dos fonogramas e reparti-los com os
artistas, na forma convencionada entre eles ou suas associações.
Ressalta-se aqui, a importância de contratos de concessão ou cessão de
direitos autorais, bem redigidos, de forma a proteger as partes mais fracas:
caso as Associações de Artistas assistissem aos intérpretes e executantes na
assinatura de contratos, reduzir-se-ia consideravelmente, as demandas
judiciais.
Art. 113. Os fonogramas, os livros e as obras audiovisuais sujeitar-se-ão a
selos ou sinais de identificação sob a responsabilidade do produtor,
distribuidor ou importador, sem ônus para o consumidor, com o fim de
atestar o cumprimento das normas legais vigentes, conforme dispuser o
regulamento
Vide Decreto n° 4.533, de 19/12/2002, no Anexo 5.
151
O motivo pela nossa preferência em trazer esta tabela no corpo do texto, ao
invés do anexo, deve-se ao fato dela não ser mera transcrição literal dos dispositivos da Lei n°
9.610/98 (esta sim, reproduzida em sua íntegra, no Anexo 4), mas sim, um estudo elaborado
pelo acadêmico sobre os artigos da Lei que se aplicam à atividade fonográfica, acompanhados
dos devidos comentários à luz das lições de diversos renomados autoralistas.
4.3. A DISTRIBUIÇÃO DE FONOGRAMAS NA INTERNET
No que consiste a distribuição de fonogramas pela Internet: uma violação aos
direitos do produtor de fonogramas, ou em mero uso privado sem fins lucrativos, nos termos
da idéia de fair use? A partir do momento em que, consideramos o fonograma como bem
corpóreo – materializado em fitas K7´s, CD´s ou outros meios “físicos” de fixação –
certamente a sua transformação em arquivos digitais sonoros – como o MP3 – trata-se de uma
nova realidade jurídica.
Em verdade, vimos que ao autor cabe a autorização de qualquer forma de
reprodução de sua obra; e ao produtor fonográfico, cabe o direito de explorar
economicamente todas as formas inventadas ou não, de utilização do fonograma. Henrique
Gandelman, em seu livro, aponta os paradigmas que a Internet propõe ao direito – em
especial, o direito autoral:
A propriedade intelectual, por suas características eminentemente imateriais, vem sofrendo um grande desafio na Internet, o que provoca comentários de especialistas preocupados com a sobrevivência do copyright. São vários os aspectos do ciberespaço (bits) que atingem frontalmente s conceitos básicos do direito autoral: • a extrema facilidade de se produzirem e distribuírem cópias não
autorizadas de textos, músicas, imagens; • a execução pública de obras protegidas, sem prévia autorização dos
titulares; • a manipulação não autorizada de obras originais digitalizadas, ‘criando-
se’, verdadeiras obras derivadas; • apropriação indébita de textos e imagens oferecidos por serviços on line
para distribuição de material informativo para clientes271.
271 Henrique Gandelman, De Gutenberg à Internet, p. 182.
152
Porém, no tocante às obras musicais e seus fonogramas, resta-nos saber quem
são os titulares dos direitos violados, eventualmente violados por sua distribuição não-
autorizada na Internet. Vejamos, o que diz Gandelman:
Para as músicas preexistentes, é importante distinguir três direitos: o da obra musical em si, sua interpretação e sua fixação fonográfica. A música original tem duas titularidades: a de seu autor (ou autores) e a da editora musical, que nesse caso é quem fornece a respectiva licença de uso multimídia, estabelecendo as condições, prazos, forma de pagamento, etc. O direito de intérprete, geralmente, é exercido pela empresa gravadora, que é titular também dos direitos sobre a fixação (disco, fita ou qualquer outro suporte físico)272.
Estão relacionados, portanto, quem são os maiores debatedores do tema, e que
exercem forte pressão internacional para uma regulamentação quanto à distribuição de
conteúdo autoral na Internet: os editores musicais e os produtores fonográficos. Mas
Gandelman, numa análise primorosa, questiona sobre qual direito efetivamente estaria sendo
violado com tal atividade:
Um dos aspectos cruciais dos debates é a definição jurídica da transmissão eletrônica de obras protegidas pelo direito autoral. É uma reprodução, uma distribuição, ou ambas? E na era digital, os conceitos tradicionais de copiar ou distribuir estão sendo desafiados. Outra dúvida: de quem é a responsabilidade sobre as violações de direitos autorais na Internet? Do servidor de acesso, ou quem incorpora conteúdo e o transmite? E é possível que o servidor no qual o conteúdo pirateado esteja armazenado se localize em determinado país, o servidor por cujo intermédio ele é anunciado a outro, e o vendedor num terceiro. A equação (no caso, não matemática) esta aí para ser estudada e, se possível, solucionada273.
A solução para o problema está longe de ser encontrada. A Internet, por sua
própria essência, está em constante atualização e reinvenção, motivo pelo qual é difícil traçar
qualquer diretriz legal sobre ela. No mais, há apenas uma certeza: de que a Internet possui
reflexos diretos no processo criativo e de publicidade das obras intelectuais. Costa Netto,
também traça seu panorama sobre a Internet:
Outra questão de crucial importância para a proteção ao direito de autor, que já abordamos anteriormente, é a utilização de obras intelectuais através dos sistemas de computação em rede (Internet), cuja evolução tecnológica é de rapidez – a amplitude – vertiginosa e que envolve, além da reprodução, também a execução pública (principalmente de obras musicais). Antonio
272 Henrique Gandelman, Op. cit., p. 195. 273 Idem, p. 186.
153
Chaves, explicando ‘como é que a nova tecnologia digital entra no mundo da propriedade intelectual’, cita Mario Fabiani para concluir que ‘a informação digital permite separar o conteúdo da obra do suporte que tradicionalmente constitui seu meio de comunicação; a música, a obra visual ou literária não tem necessidade de um corpus especifico’ e complementa: ‘A tecnologia digital permite, assim, influir sobre reprodução e distribuicao de copias já existentes, utilizá-la para criar outras ou para retirar informações, a serem acrescentadas a outras informações e constituir dados temáticos de amplo espectro. O acesso a essas tecnologias será cada vez mais facilitado ao grande público graças aos novos achados com a realização de aparelhos mais sofisticados, mais potentes e de menor custo274.
Como se vê, as opiniões dos autoralistas sobre quais direitos são violados pela
Internet, ainda são bem divergentes; muitos enxergam apenas uma limitação ao direito de
livre utilização dos produtores fonográficos, como Ascensão assim classifica este direito.
Outros, como Gandelman, enxergam a violação de direitos de reprodução e distribuição,
invocando, para tanto, uma nova concepção de suporte material, para justificar a contrafação
virtual de exemplares. Já Costa Netto, direcionado pelas lições de Antonio Chaves, já
vislumbra outro direito violado, além da própria distribuição: a execução pública, sem
autorização do autor.
Hoje, muito se tem falado em liberdade de expressão na Internet, e que tal
liberdade, incluiria a não regulamentação do conteúdo disponível nela. E mais: tem-se
difundido, graças a Internet, um movimento antidireitos-autorais na Internet, chamado de
“copyleft” (em antítese ao termo inglês “copyright”, que representa o direito de remuneração
do autor sobre cópias de sua obra). Gandelman fala algo a respeito desta propalada liberdade
na Internet:
As violações de direitos autorais começam então a germinar violentamente, ocasionando assim um pessimismo generalizado sobre o desafio da Internet, uma nova fronteira de comunicação, que ainda não está regulada em legislação própria. O fato é que o ciberespaço modifica certos conceitos de propriedade, principalmente a da intelectual – atingindo também princípios éticos e morais tradicionais, o que vem dando origem a uma nova cultura baseada na ‘liberdade de informação’. No entanto, se os titulares de direitos autorais não forem integralmente respeitados, corremos o risco eminente de que não se criem e produzam novas obras num futuro próximo. Isso significaria um empobrecimento cultural de toda a humanidade. E como ser otimista diante do desafio?275.
274 José Carlos Costa Netto, Direito Autoral no Brasil, p. 132-133. 275 Henrique Gandelman, De Gutenberg à Internet, p. 183.
154
De fato, a preocupação demonstrada por Gandelman faz sentido, porém, “data
vênia”, ele reduz o problema do direito autoral na Internet à uma questão meramente
econômica. Inclusive, no título de um dos capítulos de seu livro, Gandelmam afirma que “o
conteúdo da Internet não é de domínio publico”. Para embasar tal conclusão, diz:
Como já foi observado neste livro, a grande novidade desta era digital foi a transformação de átomos em bits. E com isso, a possibilidade de eliminar alguns suportes físicos, tornando-os desnecessários para a comunicação de obras intelectuais, como, por exemplos, os textos, sons e imagens. (...) O importante é distinguir no conteúdo da Internet (que é um meio de informação e distribuição de conhecimento e não um fim em si mesma) o que é de domínio público e o que é protegido pelo direito autoral. (...) Como identificar autorias e direitos conexos de artistas e intérpretes, obter novas licenças de utilização, e quanto pagar de royalties aos respectivos titulares dos direitos autorais e conexos de obras que serão agora ‘publicadas’ no ciberespaço? Esta é a questão que apresenta alguma semelhança com indagação shakesperiana do ‘ser ou não ser’... 276.
Sendo a distribuição pela Internet, a principal forma de violação de direitos
autorais e conexos, é interessante a ponderação que Plínio Cabral faz sobre a reprodução na
Internet de obras, numa leitura do artigo 30277, da Lei 9.610/98:
Mas agora a obra chega à internet, o que provoca mudança substancial. Ao são mais páginas de livros. Não há exemplares. O conceito de espaço e quantidade é outro. Como cabe ao autor o privilégio de autorizar a reprodução de sua obra, nos termos do artigo 30 a disponibilidade na internet depende dessa autorização. Quanto à isso não há dúvida. Mas onde o problema surge é precisamente no parágrafo segundo desse artigo, ou seja, no registro do que foi reproduzido.Alias, esse parágrafo é curioso, pois pode ser dividido em duas partes que, infelizmente, não se completam nem coadunam. Na parte inicial ele fala ‘em qualquer modalidade de reprodução’ para logo falar em ‘quantidade de exemplares’, o que não existe no espaço cibernético. Ora, por ‘exemplares’ entendem-se páginas, livros, discos, CDs. Já na frase ‘por qualquer modalidade de reproducao’, entende-se tudo aquilo que, de uma forma ou outra, possa reproduzir uma obra de criação. (...) é evidente que, quando se trata de ‘modalidades de reprodução’, aí devemos incluir a internet278.
Plínio Cabral defende o entendimento que, a distribuição na Internet trata-se de
modalidade de reprodução, e que a idéia de exemplares pode ser atribuída analogicamente aos
arquivos que contenham conteúdo autoral na Internet. Mais adiante, ele assevera que “quem
276 Henrique Gandelman, De Gutenberg à Internet, p. 234-236. 277 O texto legal deste artigo encontra-se no Anexo 4. 278 Plínio Cabral, Direito Autoral – Dúvidas e Controvérsias, p. 100.
155
disponibiliza esse material, está na verdade, reproduzindo uma obra protegida e deve,
portanto, ‘manter registros que permitam, ao autor, a fiscalização do proveito econômico da
exploração’279”, mantendo para tanto, arquivos eletrônicos com tais informações. Muito útil
tal entendimento, quando se trata, logicamente, de distribuição autorizada de conteúdo autoral
– nisto, inclui-se os fonogramas – porém, não aponta a solução para o problema da
distribuição de músicas, por exemplo, feita através de rede de compartilhamentos de arquivos,
como o Napster ou Kazaa.
Logo, podemos observar que no caso de distribuição de música (fonogramas
em arquivos MP3) na Internet, se destacam dois responsáveis: o usuário que disponibiliza o
arquivo em si e, o provedor ou serviço de compartilhamento de arquivos, que armazena ou
distribui o conteúdo do usuário para outros. Gandelman reforça este entendimento:
Portanto, talvez o caminho mais acertado é exigir de tais provedores de
armazenamento de dados (hosts) ou que promovam a interligação de usuários que
compartilham arquivos com conteúdo autoral (redes P2P), que façam tal monitoramento, para
fins de recolhimento de direitos autorais sobre tudo que se distribuiu através de seus
servidores, sob pena de sofrerem ações judiciais – a exemplo do que ocorreu com o Napster.
Por outro lado, o usuário de seus serviços assinaria – digitalmente, é claro – um contrato de
licença de uso, nos moldes que Plínio Cabral – agora sim, acertadamente – propõe:
Em primeiro lugar é necessária a autorização do autor, o que pressupõe um contrato de licença. Como não estamos tratando de exemplares, mas de espaço e tempo, esse contrato deverá observar as características do novo meio de reprodução da obra, que é a internet. A licença contratual, portanto,t terá por base, entre outras coisas: 1) o material disponível e sua identificação; 2) o período – o tempo de duração – dessa disponibilidade; 3) o preço a ser pago; 4) as condições desse pagamento: por tempo de acesso ou por número de acessos; 5) o controle dos pagamentos através dos registros dos acessos ou tempo de uso; 6) as cláusulas penais: multas e outras sanções; 7) os instrumentos de bloqueio a acessos; 8) a identificação do usuário; 9) as formas de acesso ao material protegido; 10) os limites do material acessado280.
É lógico que um contrato de licença, nos moldes acima estabelecido, é apenas
um paliativo, porém, já é uma pista na solução do grande problema da distribuição – o que
Plínio, equivocadamente, entende ser reprodução – de músicas pela Internet. Mas sempre 279 Plínio Cabral, Op. cit., p. 100. 280 Idem, p. 101-102.
156
surgirão novas formas, novos meios de se burlar a proteção e o sistema de arrecadação sobre
uso de fonogramas na Internet.
4.4. AS NOVAS FRONTEIRAS DO DIREITO AUTORAL NA INTERNET
Finalizando os estudos sobre os direitos autorais na Internet – em especial,
sobre a polêmica distribuição de músicas pela grande rede – nos deparamos com um novo
horizonte, ainda sombrio e sem muitas perspectivas de soluções jurídicas para tal fato.
José de Oliveira Ascensão, em sua primorosa obra Direito da Internet e da
Sociedade da Informação, uma coletânea de artigos sobre diversos temas polêmicos
envolvendo o direito autoral e a Internet, ajuda-nos a lançar pequenos “flashs” sobre o escuro
horizonte jurídico que a grande rede nos impõe. Num primeiro momento, destacamos aquela
definição do que seria essa Sociedade da Informação, e a forma de comunicação que
Ascensão vislumbra com a Internet, concluindo com uma nova forma de comercialização de
obras:
(...) cabe-nos o espinhoso encargo de caracterizar a Sociedade da Informação que nos deu justamente o tema central. Na realidade, nesta intervenção recolhemos já os contributos que recaíram sobre elementos parcelares, e nomeadamente os relativos a: programas de computador; circuitos integrados; bases de dados eletrônicas; utilização de obras de computador. (...) Mas a Sociedade da Informação não vive só de novos produtos. É essencial a disponibilidade de veículos ou meios de comunicação aperfeiçoados. E com isto surge o papel decisivo das auto-estradas da informação. (...) Digamos que as auto-estradas da informação são meios de comunicação entre computadores, que seriam caracterizados por grande capacidade, rapidez e fidedignidade. Estes veículos permitiriam a comunicação fácil e intensa e trariam com isso grandes possibilidade de interatividade. (...) O ideal expresso na comunicação que se realizaria: não apenas de um para vários, sem interatividade, como na radiodifusão; ou de um para um, com interatividade, como ocorre no telefone; mas de todos para todos, com interatividade. (...) Tecnicamente, todo tipo de obra ou informação digitalmente comerciável estaria disponível na rede, à qual todos teriam virtualmente acesso281.
281 José de Oliveira Ascensão, O Direito da Internet e da Sociedade da Informação, p. 67-68
157
Assiste-se, no entanto, a um novo fenômeno: a digitalização de conteúdo
autoral. A obra intelectual, que materializava-se em um suporte material, ganha um novo
contorno imaterial, o que suscita dúvidas: afinal, o que se pretende proteger com o direito
autoral: é a obra em si ou os seus exemplares? Ascensão, retomando os conceitos elementares
de direito autoral, apresenta a resposta:
Produz-se seguramente um fenômeno de imaterialização. (...) O que se protege não é a obra incarnada (sic) mas a obra imaterial: não o livro, mas o texto, se assim podemos exprimir, que este contém. O que significa que toda obra é imaterial; e a imaterialização trazida pelo ambiente digital não contradiz em nada a essência do direto de autor. Não obstante, a digitalização, com os meios de desfrute de obras que lhe estão associados, implica modificações importantes neste ramo do Direito. O ponto fundamental, chave da solução de todos os outros problemas, é a determinação do estatuto das obras disponíveis em rede282.
Seguramente, demonstra-se que é o espírito das obras que o Direito Autoral
tende a proteger, e não apenas, o suporte material – ou pelo menos, o direito de cópias
reservadas (copyright) – motivo pelo qual, quando alguém adquire um exemplar de uma obra
(um livro, um CD), não adquire a obra e todos os direitos autorais (morais e patrimoniais),
mas apenas, um exemplar e o direito de uso privado. Ascensão assevera que, a utilização
comercial de obras na Internet necessita de autorização dos titulares de direitos sobre ela, e
identifica quais são os direitos de uso possíveis de obras:
Por isso, todas as formas de exploração da obra continuam reservadas ao autor. Por exemplo, ninguém poderá editá-la, sem autorização do autor. (...) Mas o problema fundamental, quando se contempla a possibilidade de colocação de obras em rede de informática à disposição do público, está em saber qual é a faculdade, contida no direito de autor, que está em causa com essa colocação em rede. (...) De fato, encontramos no conteúdo do direito de autor faculdades de: comunicação ao público; reprodução; distribuição. Enquanto a comunicação ao público é o dar a conhecer, a reprodução é a produção de cópias e a distribuição a facultação de exemplares283.
A grande discussão que se tem, portanto, é qual desses direitos supra citados,
estariam sendo violados pela distribuição de conteúdo autoral na Internet. São vários os
entendimentos, tendo cada nação, uma orientação diversa; todas essas opiniões são
apresentadas pelo próprio Ascensão:
282 José de Oliveira Ascensão, Op. cit., p. 99. 283 Idem, p. 100-101.
158
A orientação prevalente norte-americana é a de que se encontra aqui uma distribuição. A Comunidade Européia preferia a aproximação do direito de locação, sobre o qual emitira já uma diretiva. Outras falavam em reprodução, tendo em vista as reproduções meramente técnicas que se processam no âmago do computador e que poderíamos considerar também modalidade de fixação. A dificuldade comum a todas estas posições consiste em estas categorias pressuporem a produção ou facultação de exemplares, o que não parecia verificar-se. Em Dezembro de 1996 realizou-se uma Conferência Diplomática em Genebra, promovida pela OMPI, versando particularmente sobre esta matéria. Foram então aprovados os Tratados da OMPI, sobre direitos de autor e sobre interpretações ou execuções e fonogramas. A faculdade de direito de autor implicada é concebida como o ‘direito de colocação em rede à disposição do público’. É uma nova faculdade, parecendo realista a sua configuração284.
Chegou-se a uma nova forma de uso de obras intelectuais, criando-se um novo
uso aos três ora existentes. Mas, tal concecpçao é fruto de um Tratado Internacional. Mas e a
Lei Brasileira de Direitos Autorais: seguiu também este entendimento? Ascensão demonstra
que não:
Embora tenha surgido bem depois dos Tratados da OMPI de 1996, a lei brasileira de direitos autorais (Lei n° 9.610/98, de 19/2/98) toma orientação de todo diversa. Essa lei acolhe o conceito de direito de reprodução (que era só doutrinariamente conhecido na vigência da lei anterior). Logo no art. 5 VI a reprodução é definida como ‘a cópia de um ou vários exemplares de uma obra literária, artística ou científica ou de um fonograma, de qualquer forma tangível, incluindo qualquer armazenamento permanente ou temporário por meios eletrônicos ou qualquer outro meio de fixação que venha a ser desenvolvido’285.
Mas, ficaria ainda a dúvida sobre se, a distribuição na grande rede, seria um
direito exclusivo do autor, necessitando, portanto, de sua autorização; e que, a conseqüente
distribuição não-autorização, configuraria violação a tal direito. Ascensão arremata, de forma
espetacular, esta conclusão:
Temos, pois, uma noção amplíssima de reprodução, em que se considera tangível o armazenamento por meios eletrônicos. O armazenamento em computador é declarado dependente de autorização do autor no art. 29 IX: e isto não obstante o inciso I do mesmo artigo já contemplar ‘a reprodução parcial ou integral’. Mas o direito de colocação à disposição do público é expressamente previsto no art. 30, proêmio, em que se afirma: ‘No exercício do direito de reprodução, o titular dos direitos autorais poderá colocar à disposição do público a obra, na forma, local e pelo tempo que desejar, a título oneroso ou gratuito’. Embora não se refiram as redes eletrônicas, é claro que são estas que estão antes de mais contempladas. A lei brasileira
284 José de Oliveira Ascensão, Op. cit., p. 100-101. 285 Idem, p. 101-102.
159
toma assim a posição, isolada ou altamente minoritária nas leis nacionais, de qualificar o direito de colocação à disposição do público como uma modalidade de direito de reprodução286.
Porém, há de se definir os limites deste direito do autor: a partir de que
momento, a transformação de músicas (fonogramas) em arquivos de computador (MP3),
passa a configurar uma violação de direitos autorais? Mas Ascensão enxerga em tudo isso,
principalmente, uma desnaturação no princípio do uso privado, graças a enorme pressão
exercida pelas grandes gravadoras. Vejamos:
Um princípio fundamental do Direito de Autor é o da imunidade do uso privado. O direito de autor recai sobre formas de utilização pública da obra. Deixa de fora, por natureza, o uso privado. Não há aqui sequer um limite; há a própria fronteira entre domínio reservado e atividades que não são objeto do exclusivo. A agressão ao princípio da liberdade do uso privado foi-se, porém, gradualmente ampliando. O uso privado represente um campo extremamente apetecível para uma extensão do exclusivo atribuído ao autor. A quebra radical do princípio dá-se com a proteção do programas de computador. (...) Concluímos assim que a revolução digital traz, quanto muito, a restrição da liberdade de uso privado num caso de espécie; mas não implica a abolição da distinção radical entre uso público e privado, própria do Direito de Autor. Por isso, o art. 26 II da Lei n° 9.610 continua a afirmar que é livre ‘a reprodução, em um só exemplar de pequenos trechos, para uso privado do copista, desde que feita sem intuito de lucro’. Para além de todas as faculdades derivadas do recurso ao direito de reprodução, o que é seguro é que a reprodução meramente técnica feita pelo navegador da Internet estaria aqui compreendida, como uso privado287.
Partindo de um exemplo do produtor de programas de computador, que tem a
prerrogativa de promover a busca e apreensão de cópias piratas em computadores, Ascensão
demonstra o quanto o direito de uso privado tem sido limitado, cada vez mais, por força dos
interesses comerciais de grandes produtores. Porém, Ascensão demonstra que, tal posição é
minoritária e configura exceção à regra do livre uso privado, que continua valendo no regime
da nova lei de direitos autorais. E conclui Ascensão que a cópia digital está inclusa dentro de
tal liberdade, ou seja, copiar fonogramas em arquivos MP3, para uso individual, não configura
violação de direitos autorais, mas sim, faculdade de uso privado.
O problema, volta-se, portanto, para a distribuição deste conteúdo autoral na
Internet. Conseqüentemente, volta a cena, a questão da tutela penal do direito de autor e
conexos, como forma de inibir tais violações. Porém, como já dissemos anteriormente, a
286 José de Oliveira Ascensão, Op. cit., p. 102. 287 Idem, p. 102.
160
Internet possui uma arquitetura descentralizada, de modo que as informações trafegam entre
computadores diferentes, localizados em pontos geograficamente distantes – e mais das vezes,
localizados em países diferentes – de modo, que fica difícil a aplicação de uma coerção penal
sobre os violadores, quanto aos utentes. Ascensão, traça um panorama geral:
O Direito de Autor assenta no princípio da territorialidade. Dá um exclusivo, e os exclusivos são territoriais. A repressão das violações do Direito de Autor, particularmente a repressão penal, tem funcionado satisfatoriamente com base na mesma territorialidade. Com as utilizações se traduzem por atos que se praticam no interior das fronteiras, esses atos caem naturalmente no âmbito da lei interna. (...) Mas as redes informáticas mundiais põem em crise os padrões assentes. As redes ignoram fronteiras. A utilização de conteúdos em rede faz-se em iguais condições, seja qual for o servidor em que estiverem armazenados e seja qual for a localização deste. Surge então com freqüência a problemática da violação de direitos de autor, concedidos pela lei nacional, através de atos praticados no exterior. Uma vez que as leis territoriais divergem entre si, surge a possibilidade de o mesmo ato ser lícito nuns países e ilícito nos outros; e mesmo nos que o consideram ilícito, ser tipificado como crime nuns países e não o ser noutros288.
A arquitetura descentralizada da Internet, e a não-existência de barreiras físicas
– como fronteiras – permite a disseminação de conteúdo autoral, sem preocupação com uma
lei nacional e sua eventual coerção, uma vez que, há evidente choque de leis quanto ao
tratamento dado a um mesmo ato:
Daí resulta que a mesma utilização de obra literária ou artística, que navega sem necessidade de passaporte entre as fronteiras, recebe sucessivamente uma pluralidade contrastante de qualificações. E resulta mais: torna-se possível, dada a grande facilidade dos servidores, de colocá-los no âmbito dos países mais tolerantes neste domínio. Ameaçando assim tornar letra morte a proteção mais intensa outorgada noutros paises. Coloquemo-nos então no ponto de vista da lei nacional. Suponhamos que este considera o país de origem da obra literária ou artística; que atribui um direito de autor ou um direito conexo; e que sanciona criminalmente as violações; Essa obra ou prestação é, sem autorização, colocada à disposição do público no exterior. Passa a ser facilmente acessível aos nacionais do próprio país. Pode-se reagir penalmente contra os utilizadores?289.
É aqui que se concentram os principais debates, sobre a possibilidade – ou não
– de punir quem faz o “download” – o ato de copiar o arquivo da Internet para seu
computador. Estaria tal usuário cometendo violação de direitos autorais? São perguntas ainda
288 José de Oliveira Ascensão, O Direito da Internet e da Sociedade da Informação, p. 150-151. 289 José de Oliveira Ascensão, Op. cit., p. 151.
161
não respondidas pela tutela penal do Direito Autoral, mas que Ascensão consegue traçar um
olhar técnico e preciso:
Em princípio não. E isto porque entra em cena o princípio da territorialidade da lei penal. O lócus comissi delicti está no exterior. O delito está consumado com a colocação da obra em rede. O chamamento que se fizer aos computadores locais não adianta nada em relação a perfeição do delito. Pelo que não será em princípio relevante para atribuir competência ao juiz nacional. (...) Suscita-se nestes dias litígio judicial entre a indústria fonográfica americana e a Napster, que produz programas e dispositivos que permitem copiar arquivos em MP3. Foi pedida uma indenização muito elevada, ao que a Napster teria replicado que não é responsável, uma vez que os arquivos ilegais não são armazenados nos seus computadores. (...) A responsabilização de quem fabrica os dispositivos é completamente absurda. Basta pensar que esses dispositivos servem também para a realização de operações lícitas. Nem por violação direta nem por com-participação (sic) os fabricantes podem ser considerados infratores do direito de autor. É muito primário pretender travar o progresso tecnológico pela circunstância de esse progresso trazer consigo meios que podem ser usados para violar direitos de autor290.
Está posta a questão para ser discutida. Por um lado, Ascensão está correto no
pensamento de que, penalizar fabricantes de equipamentos que seja utilizados para violação
de direitos autorais, é um forte candidato à repressão do avanço tecnológico. Por outro lado, a
culpa de quem utiliza tais dispositivos, deve ser estudado a fundo, pois, há de se definir quem
pratica ato de violação “ipsu factus” (de fato), e quem apenas se beneficia, sem praticar ato
algum.
Finalmente, analisa Ascensão que a Internet representa nova perspectiva para o
Direito de Autoral, ao contrário dos mais pessimistas, que enxergam nela – a Internet – a
algoz da morte do Direito de Autor neste novo século:
Mas perante isso, pergunta-se se não estaríamos assistindo à morte do Direito de Autor. (...) Em contrário, afirma-se que a revolução tecnológica não implica uma alteração dos quadros fundamentais, mas apenas adaptações em matéria de Direito de Autor; e caminhar-se-ia para um reforço constante da proteção. Vimos como o problema – o da introdução das obras na rede – não tem encontrado qualquer resposta; e o segundo recebe apenas uma orientação, que aponta para a gestão coletiva necessária como a única solução admissível. Em qualquer caso, falar em morte do direito de autor representa sem dúvida um exagero. Mas o reforço do Direito de Autor a que se assiste esconde afinal uma grande ambigüidade. Teoricamente, é o autor quem é protegido. Na realidade, a proteção beneficia cada vez mais
290 José de Oliveira Ascensão, Op. cit., p. 151-152.
162
abertamente a empresa; ou até a beneficia exclusivamente, como no caso do direito sui generis sobre bases de dados291.
Mais ainda, no caso dos artistas – intérpretes, arranjadores, executantes,
compositores – tem-se sentido esta desvalia de interesses; os legisladores têm preferido olhar
com maior benevolência para as empresas fonográficas e editores gráficos, do que
propriamente, para os autores cuja obras são objeto dessas violações. Nos posicionamos
favoráveis a Internet, como meio democrático de difusão, comunicação, informação e
publicação de conhecimentos, porém, há de se buscar alternativas tecnológicas que diminuam
– uma vez que entendemos ser impossível eliminar, de vez – as violações aos direitos
autorais.
4.5. CONCLUSÕES SOBRE A TROCA DE MÚSICAS PELA INTERNET
Como forma de conclusão às questões formulados no início deste capítulo,
identificamos agora, as questões mais latentes ao problema do compartilhamento de arquivos
musicais na Internet, e sua interpretação sob a ótica da Lei n° 9.610/98.
4.5.1. A transformação de fonogramas em arquivos MP3 é violação de direitos autorais?
Não, tendo em vista tratar-se de reprodução parcial ou total, para fins privados,
sem intuito de lucro. Além do mais, a lei ao falar de reprodução de fonogramas, não faz
menção a suportes imateriais. Ou seja, converter fonogramas em arquivos de computador, não
é violação de direitos autorais, pelo fato do arquivo não ser um exemplar físico do fonograma.
Diferente situação se dá, quando se faz a conversão desses arquivos em CD graváveis, onde
efetivamente um novo corpo mecânico está sendo reproduzido.
291 José de Oliveira Ascensão, O Direito da Internet e da Sociedade da Informação, p. 119.
163
4.5.2. O compartilhamento de músicas em redes de arquivos é uma forma de publicação
não-autorizada de obra intelectual?
Pode-se dizer que sim, pois publicar é tornar público. Enquanto o arquivo
sonoro encontra-se apenas no computador do usuário, o uso permanece privado. A partir do
momento em que ele, ao se conectar a uma rede de compartilhamento de arquivos,
disponibiliza aquele arquivo para os demais usuários, está distribuindo publicamente uma
obra musical – ainda que não seja, necessariamente, um fonograma.
4.5.3. Essa distribuição de arquivos pela Internet é a responsável pela crise na indústria
fonográfica?
Talvez esta seja a grande questão a ser respondida. Partindo do pressuposto que
a propriedade na Constituição Federal, deve atender a uma finalidade social, a primeira
conclusão que chegamos é que, a propriedade intelectual – decorrência da propriedade, latu
sensu – também deveria, inclusive, os direitos do autor e conexos. Num segundo momento,
cumpre saber se a distribuição de músicas na Internet, é uma forma de violação, uma
ilegalidade, ante a legislação autoral brasileira. Concluímos que não, pois vigora entre nós o
princípio da estrita reserva legal, ou da interpretação restritiva da lei: não pode-se fazer uma
interpretação que vá além do que aquilo que o próprio texto legal diz.
Sendo assim, fonograma é a gravação física de uma música ou quaisquer sons,
em um suporte material, como por exemplo, uma fita K7, um CD, ou até mesmo, um DVD.
Um arquivo de computador – como o MP3 – exorbita da definição que a própria lei dá a
fonograma. Além do mais, ao produtor fonográfico e aos artistas intérpretes, cabe o direito de
remuneração sobre a reprodução de exemplares; ora, pela interpretação da lei, arquivo de
computador não é exemplar de obra musical ou fonograma, até que a própria lei assim o
defina.
164
Num terceiro momento, supõe-se que a distribuição de conteúdo autoral na
Internet – nisto inclui-se músicas em arquivos de computador – sem a devida autorização dos
titulares de direitos autorais ou conexos, seria forma de reprodução não autorizada, graças ao
dispositivo da lei que diz “ou qualquer outros meios que sejam inventados”. Neste ponto, há
ainda grande discussão sobre se, pode-se afirmar que a Internet, seja abrangida por tal
expressão genérica, ao qual a lei se refere.
Ademais, não conseguimos ter acesso, após as pesquisas realizadas, de uma
estatística oficial e confiável, no qual se demonstre a relação entre o aumento do tráfego de
dados em redes de compartilhamento, e a conseqüente diminuição na vendagem de
exemplares legais de obras fonográficas. Diante deste panorama, pode-se inferir ainda que, a
contrafação (pirataria) de exemplares de CDs, sejam, efetivamente, os maiores responsáveis
por tal impacto negativo nessa atividade.
Cumpre-nos, então, apenas propor um questionamento: estaria, portanto, a
estratégia mercadológica das empresas fonográficas, desgastada ou equivocada, perante o
novo cenário mundial e local? Arriscamos um palpite: sim, talvez esteja. Abaixo, ousamos
elaborar um pequeno roteiro, onde questionamos algumas práticas das indústrias fonográficas,
para enfim, apontarmos soluções quanto aos problemas apresentados:
1) Qual o perfil do comprador de material pirateado? Para tentar definir este
perfil, tomamos por base o preço médio de um CD, com 14 faixas de fonogramas, durante
preço promocional de lançamento, que custa em torno de R$ 22,00. Lembramos que, quanto
maior o número de faixas, maiores os custos com direitos autorais e conexos a ser distribuído
por cada fonograma, a cada participante da obra: compositores, letristas, arranjadores,
acompanhantes, intérpretes, etc.
Agora, tendo em vista o preço médio de um CD falsificado, que gira em torno
de R$ 4,00, concluímos que o consumidor de tal produto é: pessoa de baixa renda, baixo nível
de instrução, que apenas quer consumir músicas que estão nas paradas de sucesso das rádios.
Ficando somente com a primeira observação, vemos que o impacto que a compra de um CD
original, num orçamento familiar cujo valor seja de 01 salário mínimo (R$ 300,00) é bem
maior (algo em torno de 7,33%) do que a de um exemplar falsificado (aproximadamente
1,33%).
165
2) Qual a opção mercadológica para enfrentar o preço do produto pirata? Se tal
consumidor, faz apenas questão de preço e não de qualidade ou quantidade de faixas, a opção
mercadológica para se fazer frente à pirataria de fonogramas seja a redução da quantidade de
faixas por CD. Ou seja: através de uma média aritmética simples, chegamos à conclusão que o
custo geral de cada faixa musical, seria no valor de R$ 1,57. É lógico que, tal estimativa, não
contém rigor matemático, pois outros custos devem ser levados em consideração: as despesas
de prensagem, armazenamento, distribuição e divulgação dos exemplares; os custos gráficos
do CD: impressão de encartes, fotografia, maquiagem, figurino, etc.
Se reduzirmos a quantidade de faixas de 14 fonogramas (média atual), para 04
faixas, por exemplo, o preço do CD reduziria dos atuais R$ 22,00 para aproximados R$ 6,30.
Mais uma vez, é lógico que esta redução é apenas uma estimativa baseada numa média
aritimética simples, porém, deduz-se que esta “versão econômica” de CD não teria todos os
requintes dos atuais produtos fonográficos: o encarte poderia ser reduzido a uma simples capa
e contracapa, contendo apenas as informações exigidas pela lei (identificação do intérprete,
dos autores das músicas, dos arranjadores e músicos participantes, bem como a identificação
da gravadora).
3) Mas e os artistas intérpretes seriam prejudicados com tal iniciativa?
Entendemos que não. Nos dias atuais, os intérpretes estão à mercê da vontade das gravadoras
– com raras exceções, no caso de artistas consagrados, como Roberto Carlos, por exemplo,
que possui liberdade de negociação em cada álbum produzido – não significando, portanto,
nenhuma ruptura sensível nas relações jurídicas ora existentes. Ademais, poderia se retomar
às práticas comuns nas décadas de 50 e 60, onde eram lançados versões compactas: os
chamados singles – compactos simples, com duas faixas no total, uma em cada face – ou os
compactos duplos – com quatro faixas no total, duas em cada face. Lembre-se que, foi
justamente nesta época, que as atuais grandes gravadoras se estabeleceram no mercado e
cresceram de forma vertiginosa, graças as vendagens expressivas de exemplares.
Podia-se, ainda, estabelecer um contrato acessório a um contrato principal,
veiculado a uma cláusula condicional: caso a “versão compacta” atinja um número mínimo de
vendagem, ensejará no lançamento de uma “versão completa”, com maior quantidade de
fonogramas. Tal prática já é corrente no caso de softwares, onde as versões lite (econômicas),
166
já superam em muito a venda de edições full (completas), observando-se uma ligeira retomada
no índice de vendagem de versões oficiais.
4) E o Estado, poderia contribuir? Sim, pois todas as soluções acima apontadas,
podem ser adotadas somente pelas empresas fonográficas, bastando, para tanto, de uma
mudança na estratégia mercadológica das mesmas. Note-se que, não adentramos no campo da
redução de tributos que incidam sobre estes produtos. A contrapartida do Estado, no caso dos
fonogramas, dar-se-ia com a redução da carga tributária: quer seja com a equiparação dos
CDs ao status de livros (mediante emenda constitucional), para fazer jus à imunidade
tributária; quer seja, através da unificação dos impostos que incidem diretamente ou
indiretamente no preço final do produto (ICMS, IPI, ISS, Cofins, INSS) em um único
imposto, cujo impacto seja menor, e a destinação dos recursos seja aplicada em atividades de
incentivo e conscientização da população (a exemplo do ocorre com os livros).
Enfim, todas as medidas acima apontadas, podem parecer soluções fantasiosas,
pois carecem de um rigoroso estudo cientifico e estatístico por parte deste acadêmico, mas
não deixam de ser considerações fundado em tudo que foi lido e pesquisado na doutrina
autoralista e áreas afins. No mais, encerramos as seguintes deduções feitas acima, com um
gráfico, onde está demonstrado os custos de produção de um CD, e as sábias críticas de
Márcia Tosta Dias, em sua memorável dissertação sobre as indústrias fonográficas no Brasil.
Vejamos o gráfico, primeiramente:
Figura 11: Gráfico retirado do site <http://www.centralmp3.com.br>
167
Agora, o desfecho brilhante de Márcia Tosta Dias, ao falar da questão da
pirataria brasileira de fonogramas:
Outro fato importante diz respeito ao crescimento surpreendente da pirataria. Num mercado de 105,3 milhões de unidades vendidas em 1998, como o brasileiro, o sexto lugar no mundo, estima-se que 45% dessa quantia e 90% do mercado de fitas cassetes circulem ilegalmente (o segundo posto no ranking mundial da pirataria). Universalizadas as técnicas de produção dos formatos, a sofisticação da falsificação parece atingir de frente as grandes companhias. O fato é que a indústria fonográfica oferece um produto extremamente caro ao mercado, e neste, questões éticas a parte, o que importa é o preço. Para o consumidor de sucessos, que é quem compra o CD pirata, a lógica é pagar R$ 5,00 em vez de R$ 20,00. Por seu turno, a indústria levanta a bandeira dos direitos autorais. Mas vale lembrar que, com a pirataria, os seus próprios direitos são ainda mais lesados que os do artista, significativamente minoritários (em torno de 13,3% do valor total do disco, considerados o direito de autor e o direito de intérprete)292.
Enfim, parece-nos que a bandeira tem sido levantada pelas gravadoras, muito
mais motivado pelos prejuízos experimentados por elas, do que propriamente, a preocupação
com os direitos dos artistas. O problema, repita-se, é mais social e econômico, do que
necessariamente jurídico. Enfim, trata-se de política de governo do que de justiça.
292 Márcia Tosta Dias, Os donos da voz, p. 176.
168
CONCLUSÃO
Após os estudos apresentados, conseguimos, primeiramente, entender o quão
complexo e fascinante é a matéria Direito Autoral, e a escassez de bibliografias sobre o tema
em comparação com outros ramos do direito, o que nos motiva a continuar – após a graduação
– a atividade de pesquisa, e quiçá, o lançamento de livros sobre este tema.
Em segundo lugar, após compreender a autonomia que o Direito Autoral possui
em relação aos demais ramos do Direito Civil, conseguimos compreender com exatidão o
fenômeno da criação, a figura do autor – em todas as suas espécies - e todos os direitos
contidos nas relações jurídicas – sejam eles direitos de autor ou conexos.
Em terceiro, ao mergulharmos na tecnicidade do estudo da Internet,
descobrimos uma nova visão sobre ela: é muito mais que uma grande rede de computadores
conectados, trocando informações em forma de bits e bytes. É a Internet uma verdadeira
Sociedade Digital, um fenômeno sociológico ainda desconhecido – pioneiro é o estudo de
Pierre Levy em Cibercultura – que possui princípios e axiomas próprios, cujo reflexos no
direito, para serem compreendidos, deve-se voltar para tratados filosóficos, como os de
Thailard de Chardin.
Por fim, o estudo da obra musical, e sua transformação em fonogramas através
da fixação em suportes materiais, descortinaram uma realidade jurídica intensa – e pouco
pesquisada – o que revelou-se um desafio, dada a dificuldade em encontrar bibliografia
assente sobre o assunto: nisto, foi-nos de grande valia, a obra de Costa Netto, e
posteriormente, a de Márcia Tosta Dias. A pluralidade de sujeitos – conseqüentemente, de
direitos e interesses em jogo – na atividade fonográfica, demonstra-se ser, a principal causa
das discussões jurídicas sobre o tema.
169
Contratos – muitas vezes, leoninos – não são suficientes para o equilíbrio das
partes contratantes – compositores, intérpretes, gravadoras, músicos – e, mais das vezes, o
problema da pirataria, prejudica muito mais os interesses das produtoras fonográficas, do que
necessariamente, os direitos autorais dos artistas e intérpretes prejudicados.
Isto nos levou a uma indagação – e conclusão – sobre se, realmente, a
distribuição de fonogramas musicais pela Internet, revela-se uma ameaça aos artistas titulares
de direitos, ou somente trata-se, de mais uma variável negativa na equação financeira dos
lucros das grandes gravadoras.
Pelo que inferimos, os direitos autorais dos autores e intérpretes, nem sempre
são violados – sob a ótica da lei autoral brasileira – com a transformação dos fonogramas em
arquivos de computador (o uso privado é permitido). Quanto à sua disponibilização em redes
de compartilhamento de arquivos como o Kazaa e o Napster, trata-se de verdadeira forma de
publicação – no sentido lato, da expressão: pôr à disposição do público. Sendo assim,
eventualmente, os direitos autorais dos autores e intérpretes são violados, na medida da
ausência de autorizações deles para tal disposição ao público.
Porém, sobre a questão penal – quem baixa algum arquivos na Internet, estaria
cometendo violação de direitos autorais – repugnamos a tese de que há lucro “indireto” de
quem baixa um MP3, na medida que ele economiza dinheiro, ao não comprar um exemplar
original. Vigora em nosso sistema, a presunção de inocência – in dubio pro reu – e jamais,
pode-se interpretar a norma penal vigente, de forma mais rigorosa e prejudicial à quem
cometeria tal fato típico. E mais: não justifica-se que, um interesse privado – o das grandes
gravadoras – se sobreponha ao interesse público, a ponto de ditar a interpretação da lei de
forma mais prejudicial do que a letra legal preconiza.
Porém, há de se assegurar também os direitos conexos do produtor fonográfico,
que é atingido com a distribuição desses arquivos MP3 na Internet. A solução, como vimos,
não é nada fácil, nem simples. O problema da pirataria é social e econômico: busca e
apreensão de exemplares falsificados em um camelô, ou de computadores pessoais de
usuários conectados à redes de distribuição, são apenas meios coercitivos, porém, inócuos, na
atual conjuntura social do país.
170
O empobrecimento da população e a diminuição do poder de compra do salário
dos trabalhadores, é sem dúvida, um fator determinante na equação financeira da atividade
fonográfica: o CD pirata por ser mais barato, é largamente consumido pela classe mais pobre,
que por ser a mais expressiva em quantidade, representa um duro golpe nos lucros das
gravadoras. A alternativa apresentada foi o barateamento dos custos – e do conseqüente preço
final, mais baixo – como forma de inibir a atividade contrafatória. CD´s originais mais
baratos, seguramente, seriam mais atraentes que os exemplares falsificados; o consumidor
mudaria seu hábito, e o comércio ilegal tenderia a desaparecer com o passar do tempo.
Porém, tal redução nos custos, significa, mudança de estratégia por parte das
gravadoras (interesse privado) e diminuição da carga tributária sobre a produção, distribuição
e comércio de fonogramas (interesse público); o que revela a complexidade do problema, e
conseqüentemente, da solução para tal fato. Mas, é sabido que a distribuição de arquivos MP3
na Internet, nada tem a ver com a indústria ilegal da pirataria. É, pois, um problema cultural.
Cultural, no sentido de que, quem tem acesso à Internet, em sua grande
maioria, são as classes sociais de maior poder aquisitivo, e que teriam, em tese, condições de
adquirirem os exemplares originais, mas que, por algum motivo, não o faz. Analisar que
motivos o levam a distribuir e consumir arquivos MP3 nessas redes de compartilhamento de
dados, é seguramente, tema para uma dissertação ou tese.
Porém, como bem ilustra José de Oliveira Ascensão, há na Internet, certos
princípios ideológicos que motivam as ações dos Internautas. Sob o manto da propagada
liberdade de expressão da Internet, idéias como a do Copyleft – um contraponto ao Copyright
– revelam-se uma das causas deste problema. Seria, pois, a solução para inibir – ou pelo
menos, diminuir – o impacto dessas redes na vendagem de exemplares – e conseqüentemente,
sobre os lucros das gravadoras, artistas e intérpretes – uma campanha de conscientização dos
usuários dessas redes?
Acreditamos que o caminho talvez seja este. Se movimentos intelectuais –
como o próprio Copyleft – são capazes de mobilizar milhões de adeptos, porque um
movimento contrário de afirmação do Copyright, não seja um antídoto para este mal? Mas
não basta apenas uma campanha publicitária, esclarecendo os malefícios causados pela
distribuição de conteúdo autoral na Internet. É preciso, pois, transparência nas informações
171
prestadas ao público em geral, sobre os verdadeiros custos de produção de discos, a
remuneração dos envolvidos no processo, a estratégia mercadológica das gravadoras, etc.
Só de posse de tais dados, é que o público terá a liberdade de opção, entre
defender os direitos autorais e conexos dos artistas, e recusar-se a distribuir conteúdo autoral
sem a devida autorização e remuneração de seus titulares. Ou de continuar a praticar a livre
distribuição, se linchando para os prejuízos do setor fonográfico: agiria os usuários dessas
redes, como verdadeiros Robin Hood´s virtuais, que ao possibilitar o acesso gratuito à essas
obras musicais fixadas em arquivos ao público em geral, estariam democratizando o acesso ao
bem cultural, ali materializado.
A tônica da liberdade de expressão e informação na Internet, tem sim, seus
reflexos no Direito Autoral, e conseqüentemente, na questão da distribuição de músicas – um
bem cultural – em arquivos MP3. A Internet não representará uma ameaça ao Direito Autoral,
nem aos titulares de direitos de autor ou conexos, na medida em que forem repensados alguns
conceitos – como o fair use – e estratégias comerciais.
Não raro é o fato da ascensão às Hit Parades de artistas – então desconhecidos
– que encontraram na Internet uma forma de distribuição barata e democrática de seu trabalho
– em contraponto aos altos custos de divulgação (jabá) em meios de comunicação em massa,
com o Rádio e a TV. E ainda, se atendo a um exemplo brasileiro, de artistas que foram
beneficiados pela indústria pirata, como foi o caso da dupla sertaneja Bruno & Marrone,
catapultados ao estrelato, graças ao enorme sucesso de vendagem de um CD pirata, onde uma
apresentação da dupla em um programa de rádio, foi lançado como um “CD Acústico”,
colocando suas canções na boca de toda população.
A distribuição de arquivos MP3 na Internet é uma violação de direitos autorais,
sim; mas está longe de ser a principal causa do prejuízo dos artistas e intérpretes.
173
Anexo 1 – Código de Processo Penal
CAPÍTULO IV DO PROCESSO E DO JULGAMENTO DOS CRIMES
CONTRA A PROPRIEDADE IMATERIAL Art. 524. No processo e julgamento dos crimes contra a propriedade imaterial, observar-se-á o disposto nos Capítulos I e III do Título I deste Livro, com as modificações constantes dos artigos seguintes. Art. 525. No caso de haver o crime deixado vestígio, a queixa ou a denúncia não será recebida se não for instruída com o exame pericial dos objetos que constituam o corpo de delito. Art. 526. Sem a prova de direito à ação, não será recebida a queixa, nem ordenada qualquer diligência preliminarmente requerida pelo ofendido. Art. 527. A diligência de busca ou de apreensão será realizada por dois peritos nomeados pelo juiz, que verificarão a existência de fundamento para a apreensão, e quer esta se realize, quer não, o laudo pericial será apresentado dentro de 3 (três) dias após o encerramento da diligência. Parágrafo único. O requerente da diligência poderá impugnar o laudo contrário à apreensão, e o juiz ordenará que esta se efetue, se reconhecer a improcedência das razões aduzidas pelos peritos. Art. 528. Encerradas as diligências, os autos serão conclusos ao juiz para homologação do laudo. Art. 529. Nos crimes de ação privativa do ofendido, não será admitida queixa com fundamento em apreensão e em perícia, se decorrido o prazo de 30 (trinta) dias, após a homologação do laudo. Parágrafo único. Será dada vista ao Ministério Público dos autos de busca e apreensão requeridas pelo ofendido, se o crime for de ação pública e não tiver sido oferecida queixa no prazo fixado neste artigo. Art. 530. Se ocorrer prisão em flagrante e o réu não for posto em liberdade, o prazo a que se refere o artigo anterior será de 8 (oito) dias. Art. 530-A. O disposto nos arts. 524 a 530 será aplicável aos crimes em que se proceda mediante queixa. (Incluído pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003) Art. 530-B. Nos casos das infrações previstas nos §§ 1o, 2o e 3o do art. 184 do Código Penal, a autoridade policial procederá à apreensão dos bens ilicitamente produzidos ou reproduzidos, em sua totalidade, juntamente com os equipamentos, suportes e materiais que possibilitaram a sua existência, desde que estes se destinem
precipuamente à prática do ilícito. (Incluído pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003) Art. 530-C. Na ocasião da apreensão será lavrado termo, assinado por 2 (duas) ou mais testemunhas, com a descrição de todos os bens apreendidos e informações sobre suas origens, o qual deverá integrar o inquérito policial ou o processo. (Incluído pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003) Art. 530-D. Subseqüente à apreensão, será realizada, por perito oficial, ou, na falta deste, por pessoa tecnicamente habilitada, perícia sobre todos os bens apreendidos e elaborado o laudo que deverá integrar o inquérito policial ou o processo. (Incluído pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003) Art. 530-E. Os titulares de direito de autor e os que lhe são conexos serão os fiéis depositários de todos os bens apreendidos, devendo colocá-los à disposição do juiz quando do ajuizamento da ação. (Incluído pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003) Art. 530-F. Ressalvada a possibilidade de se preservar o corpo de delito, o juiz poderá determinar, a requerimento da vítima, a destruição da produção ou reprodução apreendida quando não houver impugnação quanto à sua ilicitude ou quando a ação penal não puder ser iniciada por falta de determinação de quem seja o autor do ilícito. (Incluído pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003) Art. 530-G. O juiz, ao prolatar a sentença condenatória, poderá determinar a destruição dos bens ilicitamente produzidos ou reproduzidos e o perdimento dos equipamentos apreendidos, desde que precipuamente destinados à produção e reprodução dos bens, em favor da Fazenda Nacional, que deverá destruí-los ou doá-los aos Estados, Municípios e Distrito Federal, a instituições públicas de ensino e pesquisa ou de assistência social, bem como incorporá-los, por economia ou interesse público, ao patrimônio da União, que não poderão retorná-los aos canais de comércio. (Incluído pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003) Art. 530-H. As associações de titulares de direitos de autor e os que lhes são conexos poderão, em seu próprio nome, funcionar como assistente da acusação nos crimes previstos no art. 184 do Código Penal, quando praticado em detrimento de qualquer de seus associados. (Incluído pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003) Art. 530-I. Nos crimes em que caiba ação penal pública incondicionada ou condicionada, observar-se-ão as normas constantes dos arts. 530-B, 530-C, 530-D, 530-E, 530-F, 530-G e 530-H. (Incluído pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003)
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Anexo 2 – Convenção de Berna
Convenção de Berna para a proteção das obras literárias e artísticas, de 9 de setembro de 1886,
completada em Paris a 4 de maio de 1896, revista em Berlim a 13 de novembro de 1908, completada em Berna a 20 de Março de 1914, revista
em Roma a 2 de Junho de 1928, em Bruxelas a 26 de Junho de 1948, em Estocolmo a 14 de Julho de 1967 e em Paris a 24 de Julho de 1971.
Os Países da União, igualmente animados do propósito de proteger de maneira tanto quanto possível eficaz e uniforme os direitos dos autores sobre as respectivas obras literárias e artísticas.
Reconhecendo a importância dos trabalhos da Conferência de revisão realizada em Estocolmo em 1967.
Resolveram rever o Ato adotado pela Conferência de Estocolmo, deixando entretanto sem modificação os artigos 1 a 20 e 22 a 26 do referido Ato.
Em conseqüência, os Plenipotenciários abaixo assinados, depois de apresentar seus plenos poderes, reconhecidos em boa e devida forma, acordaram no seguinte:
Artigo primeiro
Os países a que se aplica a presente convenção constituem-se em União para a proteção dos direitos dos autores sobre as suas obras literárias e artísticas.
Artigo 2
1) Os termos «obras literárias e artísticas» abrangem todas as produções do domínio literário, científico e artístico, qualquer que seja o modo ou a forma de expressão, tais como os livros, brochuras e outros escritos; as conferências, alocuções, sermões e outras obras da mesma natureza; as obras dramáticas ou dramático-musicais; as obras coreográficas e as pantomimas; as composições musicais, com ou sem palavras, as obras cinematográficas e as expressas por processo análogo ou da cinematografia; as obras de desenho, de pintura, de arquitetura, de escultura, de gravura e de litografia; as obras fotográficas e as expressas por um processo análogo ao da fotografia; as obras de arte aplicada; as ilustrações e os mapas geográficos; os projetos, esboços e obras plásticas relativos à geografia, à topografia, à arquitetura ou às ciências.
2) Os países da União reservam-se, entretanto, a faculdade de determinar, nas suas legislações respectivas, que as obras literárias e artísticas, ou ainda uma ou várias categorias delas, não são protegidas enquanto não tiverem sido fixadas num suporte material.
3) São protegidas como obras originais, sem prejuízo dos direitos do autor da obra original, as traduções, adaptações, arranjos de musicais e outras transformações de uma obra literária ou artística.
4) Os países da União reservam-se a faculdade de determinar, nas legislações nacionais, a proteção a conceder aos textos oficiais de caráter legislativo, administrativo ou judiciário, assim como as traduções oficiais desses textos.
5) As compilações de obras literárias ou artísticas, tais como enciclopédias e antologias, que, pela escolha ou disposição das matérias, constituem criações intelectuais, são como tais protegidas, sem prejuízo dos direitos dos autores sobre cada uma das obras que fazem parte dessas compilações.
6) As obras acima designadas gozam de proteção em todos os países unionistas. A proteção exerce-se em benefício dos autores e de seus legítimos representantes.
7) Os países da União reservam-se a faculdade de determinar, nas legislações nacionais, o âmbito de aplicação das leis referentes às obras de arte aplicada e aos desenhos e modelos industriais, assim como as condições de proteção de tais obras, desenhos e modelos, levando em conta as disposições do artigo 7.4 da presente Convenção. Para as obras protegidas exclusivamente como desenhos
e modelos no país de origem não pode ser reclamada, nos outros países unionistas, senão a proteção especial concedida aos desenhos e modelos nesses países; entretanto, se tal proteção especial não é concedida nesse país, estas obras serão protegidas como obras artísticas.
8) A proteção da presente convenção não se aplica às notícias do dia ou às ocorrências diversas que têm o caráter de simples informações de imprensa.
Artigo 2bis
1) Os países da União reservam-se a faculdade de excluir, nas legislações nacionais, parcial ou totalmente, da proteção do artigo anterior, os discursos políticos e os discursos pronunciados nos debates judiciários.
2) Os países da União reservam-se igualmente a faculdade de estabelecer nas suas leis internas as condições em que as conferências, alocuções, sermões e outras obras da mesma natureza, pronunciadas em público, poderão ser reproduzidas pela imprensa, transmitidas pelo rádio, pelo telégrafo para o público e constituir objeto de comunicações públicas mencionadas no artigo 11 bis 1, da presente Convenção, quando tal utilização é justificada pela finalidade da informação a ser atingida.
3) Todavia, o autor tem o direito exclusivo de reunir em coleção as suas obras mencionadas nos parágrafos anteriores.
Artigo 3
1) São protegidos por força da presente Convenção:
a) os autores nacionais de um dos países unionistas, quanto às suas obras, publicadas ou não;
b) os autores não nacionais de um dos países unionistas, quanto às obras que publicarem pela primeira vez num desses países ou simultaneamente em um país estranho à União e num país da União.
2) Os autores não nacionais de um dos países da União mas que têm sua residência habitual num deles são, para a aplicação da presente Convenção, assimilados aos autores nacionais do referido país.
3) Por «obras publicadas» devem-se entender as obras editadas com o consentimento de seus autores, seja qual for o modo de fabricação dos exemplares, contanto que sejam postos à disposição do público em quantidade suficiente para satisfazer-lhe as necessidades, levando em conta a natureza da obra. Não constituem publicação a representação de obras dramáticas, dramático-musicais ou cinematográficas, a execução de obras musicais, a recitação pública de obras literárias, a transmissão ou a radiodifusão de obras literárias ou artísticas, a exposição de obras de arte e a construção de obras de arquitetura.
4) Considera-se publicada simultaneamente em vários países toda e qualquer obra publicada em dois ou mais países dentro de trinta dias a contar da sua primeira publicação.
Artigo 4
Por força da presente Convenção, são protegidos, mesmo se as condições previstas no artigo 3 não forem preenchidas:
a) os autores das obras cinematográficas cujo produtor tenha sua sede ou sua residência habitual em um dos países da União;
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b)os autores das obras de arquitetura edificadas num país da União ou de obras de arte gráfica ou plástica incorporadas em um imóvel situado em um país da União.
Artigo 5
1) Os autores gozam, no que concerne às obras quanto às quais são protegidos por força da presente Convenção, nos países da União, exceto o de origem da obra, dos direitos que as respectivas leis concedem atualmente ou venham a conceder no futuro aos nacionais, assim como dos direitos especialmente concedidos pela presente Convenção.
2) O gozo e o exercício desses direitos não estão subordinados a qualquer formalidade; esse gozo e esse exercício independem da existência da proteção no país de origem das obras. Por conseguinte, afora as estipulações da presente Convenção, a extensão da proteção e os meios processuais garantidos ao autor para salvaguardar os seus direitos regulam-se exclusivamente pela legislação do País onde a proteção é reclamada.
3) A proteção no pais de origem é regulada pela legislação nacional. Entretanto, quando o autor não pertence ao país de origem da obra quanto à qual é protegido pela presente Convenção, ele terá nesse país, os mesmos direitos que os autores nacionais.
4) Considera-se país de origem:
a) quanto às obras publicadas pela primeira vez num dos países da União, este último país; entretanto, se se tratar de obras publicadas simultaneamente em vários países da União que concedam prazos de proteção diferentes, aquele dentre eles cuja lei conceda prazo de proteção menos extenso;
b) quanto às obras publicadas simultaneamente num país estranho à União e num país da União, este último país;
c) quanto às obras não publicadas ou quanto às obras publicadas pela primeira vez num país estranho à União, sem publicação simultânea num país da União, aquele a que pertence o autor; entretanto:
i)se se tratar de obras cinematográficas cujo produtor tenha sua sede ou sua residência habitual num país da União, o país de origem será este último; e
ii) se se tratar de obras de arquitetura edificadas num país da União ou de obras de artes gráficas e plásticas incorporadas num imóvel situado em um país da União, o país de origem será este último país.
Artigo 6
1) Quando um país estranho à União não proteger de maneira suficiente as obras dos autores pertencentes a qualquer dos países da União, este último país poderá restringir a proteção das obras cujos autores pertencem, à data da primeira publicação dessas obras, ao outro país, e não têm residência habitual em qualquer país unionistas. Se o país da primeira publicação exercer esta faculdade, os outros países da União não serão obrigados a conceder às obras submetidas a este regime especial uma proteção mais ampla do que aquela que lhes é concedida no país da primeira publicação.
2) Nenhuma restrição, determinada por força do parágrafo precedente, deverá prejudicar os direitos que o autor tenha adquirido sobre qualquer obra sua publicada em país unionista antes de entrar em vigor essa restrição.
3) Os países unionistas que, em virtude do presente artigo, restringirem a proteção dos direitos dos autores, notificá-lo-ão ao Diretor-Geral da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (abaixo designado «Diretor-Geral»), mediante declaração escrita em que se indiquem os países em relação aos quais a proteção se restringe, bem como as restrições a que os direitos dos autores pertencentes a esses países ficam sujeitos. O Diretor-Geral comunicará imediatamente o fato a todos os países da União.
Artigo 6bis
1) Independentemente dos direitos patrimoniais do autor, e mesmo depois da cessão dos citados direitos, o autor conserva o direito de reivindicar a paternidade da obra e de se opor a toda deformação, mutilação ou outra modificação dessa obra, ou a qualquer dano à mesma obra, prejudiciais à sua honra ou à sua reputação.
2) Os direitos reconhecidos ao autor por força do parágrafo 1 antecedente mantêm-se, depois de sua morte, pelo menos até à extinção dos direitos patrimoniais e são exercidos pelas pessoas físicas ou jurídicas a que a citada legislação reconhece qualidade para isso. Entretanto, os países cuja legislação, em vigor no momento da ratificação do presente Ato ou da adesão a ele, não contenha disposições assegurando a proteção, depois da morte do autor, de todos os direitos reconhecidos por força do parágrafo 1 acima, reservam-se a faculdade de estipular que alguns desses direitos não serão mantidos depois da morte do autor.
3) Os meios processuais destinados a salvaguardar os direitos reconhecidos no presente artigo regulam-se pela legislação do país onde é reclamada a proteção.
Artigo 7
1) A duração da proteção concedida pela presente convenção compreende a vida do autor e cinqüenta anos depois da sua morte.
2) Entretanto, quanto às obras cinematográficas, os países da União têm a faculdade de dispor que o prazo da proteção expira cinqüenta anos depois que a obra tiver se tornado acessível ao público com o consentimento do autor, ou que, se tal acontecimento não ocorrer nos cinqüenta anos a contar da realização de tal obra, a duração da proteção expira cinqüenta anos depois da referida realização.
3) Quanto às obras anônimas ou pseudônimas, a duração da proteção concedida pela presente Convenção expira cinqüenta anos após a obra ter se tornado licitamente acessível ao público. No entanto, quando o pseudônimo adotado pelo autor não deixa qualquer dúvida acerca da sua identidade, a duração da proteção é a prevista no parágrafo 1. Se o autor de uma obra anônima ou pseudônima revela a sua identidade durante o período acima indicado, o prazo de proteção aplicável é o previsto no parágrafo 1. Os países da União não estão obrigados a proteger as obras anônimas ou pseudônimas quanto às quais há razão de presumir-se que o seu autor morreu há cinqüenta anos.
4) Os países da União reservam-se, nas suas legislações nacionais, a faculdade de regular a duração da proteção das obras fotográficas e das obras de artes aplicadas protegidas como obras artísticas; entretanto, a referida duração não poderá ser inferior a um período de vinte e cinco anos contados da realização da referida obra.
5) O prazo de proteção posterior à morte do autor e os prazos previstos nos parágrafos 2, 3 e 4 precedentes começam a correr da morte ou da ocorrência mencionada nos referidos parágrafos, mas a duração desses prazos não se conta senão a partir do dia 1o. de Janeiro do ano seguinte àquele em que ocorreu a morte ou a ocorrência em questão.
6) Os países da União têm a faculdade de conceder uma duração de proteção superior àquelas previstas nos parágrafos precedentes.
7) Os países da União vinculados pelo Ato de Roma da presente Convenção e que concedem, nas suas legislações nacionais em vigor no momento da assinatura do presente Ato, durações inferiores àquelas previstas nos parágrafos precedentes têm a faculdade de conservá-las ao aderir ao presente Ato ou ao ratificá-lo.
8) Em quaisquer casos, a duração será regulada pela lei do país em que a proteção for reclamada; entretanto, a menos que a legislação deste último país resolva de outra maneira, a referida proteção não excederá a duração fixada no país de origem da obra.
Artigo 7bis
As disposições do artigo antecedente são igualmente aplicáveis quando o direito de autor pertence em comum aos colaboradores de uma obra, sob reserva de que os prazos consecutivos à morte do autor sejam calculados a partir da data da morte do último colaborador sobrevivente.
Artigo 8
Os autores de obras literárias e artísticas protegidos pela presente Convenção gozam, durante toda a vigência dos seus direitos sobre as suas obras originais, do direito exclusivo de fazer ou autorizar a tradução das suas obras.
Artigo 9
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1) Os autores de obras literárias e artísticas protegidas pela presente Convenção gozam do direito exclusivo de autorizar a reprodução destas obras, de qualquer modo ou sob qualquer forma que seja.
2) Às legislações dos países da União reserva-se a faculdade de permitir a reprodução das referidas obras em certos casos especiais, contanto que tal reprodução não afete a exploração normal da obra nem cause prejuízo injustificado aos interesses legítimos do autor.
3) Qualquer gravação sonora ou visual é considerada uma reprodução no sentido da presente Convenção.
Artigo 10
1) São lícitas as citações tiradas de uma obra já licitamente tornada acessível ao público, com a condição de que sejam conformes aos bons usos e na medida justificada pela finalidade a ser atingida, inclusive as citações de artigos de jornais e coleções periódicas sob forma de resumos de imprensa.
2) Os países da União reservam-se a faculdade de regular, nas suas leis nacionais e nos acordos particulares já celebrados ou a celebrar entre si, as condições em que podem ser utilizadas licitamente, na medida justificada pelo fim a atingir, obras literárias ou artísticas a título de ilustração do ensino em publicações, emissões radiofônicas ou gravações sonoras ou visuais, sob a condição de que tal utilização seja conforme aos bons usos.
3) As citações e utilizações mencionadas nos parágrafos antecedentes serão acompanhadas pela menção da fonte e do nome do autor, se esse nome figurar na fonte.
Artigo 10bis
1) Os países da União reservam-se a faculdade de regular nas suas leis internas as condições em que se pode proceder à reprodução na imprensa, ou à radiodifusão ou à transmissão por fio ao público, dos artigos de atualidade, de discussão econômica, política, religiosa, publicados em jornais ou revistas periódicas, ou das obras radiofônicas do mesmo caráter, nos casos em que a reprodução, a radiodifusão ou a referida transmissão não sejam expressamente reservadas. Entretanto, a fonte deve sempre ser claramente indicada; a sanção desta obrigação é determinada pela legislação do país em que a proteção é reclamada.
2) Os países da União reservam-se igualmente a faculdade de regular nas suas legislações as condições nas quais, por ocasião de relatos de acontecimentos da atualidade por meio de fotografia, cinematografia ou transmissão por fio ao público, as obras literárias ou artísticas, vistas ou ouvidas no decurso do acontecimento podem, na medida justificada pela finalidade de informação a atingir, ser reproduzidas e tornadas acessíveis ao público.
Artigo 11
1) Os autores de obras dramáticas, dramático-musicais e musicais gozam do direito exclusivo de autorizar: 1º a representação e a execução públicas das suas obras, inclusive a representação e a execução públicas por todos os meios e processos; 2º a transmissão pública por todos os meios da representação e da execução das suas obras.
2) Os mesmos direitos são concedidos aos autores de obras dramáticas ou dramático-musicais, por toda duração dos seu direitos sobre a obra original, no que respeita à tradução das suas obras.
Artigo 11bis
1) Os autores de obras literárias e artísticas gozam do direito exclusivo de autorizar; 1º- a radiodifusão de suas obras ou a comunicação pública das mesmas obras por qualquer outro meio que sirva para transmitir sem fio os sinais, os sons ou as imagens; 2º- qualquer comunicação pública, quer por fio, quer sem fio, da obra radiodifundida, quando a referida comunicação é feita por um outro organismo que não o da origem ; 3º- a comunicação pública, por meio de alto-falante ou por qualquer outro instrumento análogo transmissor de sinais, de sons ou imagem, da obra radiodifundida.
2) Compete às legislações dos países da União regular as condições de exercício dos direitos constantes do parágrafo 1 do presente Artigo, mas tais condições só terão um efeito estritamente limitado ao país que as tiver estabelecido. Essas condições não poderão, em
caso algum, afetar o direito moral do autor, ou o direito que lhe pertence de receber remuneração eqüitativa, fixada, na falta de acordo amigável, pela autoridade competente.
3) Salvo estipulação em contrário, as autorizações concedidas nos termos do parágrafo 1 do presente artigo não implicam autorização de gravar, por meio de instrumentos que fixem os sons ou as imagens, as obras radiodifundidas. Entretanto, os países da União reservam-se a faculdade de determinar nas suas legislações nacionais o regime das gravações efêmeras realizadas por um organismo de radiodifusão pelos seus próprios meios e para as suas emissões. Essas legislações poderão autorizar a conservação de tais gravações em arquivos oficiais, atendendo ao seu caráter excepcional de documentação.
Artigo 11ter
1) Os autores de obras literárias gozam do direito exclusivo de autorizar; 1º- a recitação pública de suas obras, inclusive a recitação pública por todos os meios ou processos; 2º- a transmissão pública por todos os meios da recitação de suas obras.
2) Os mesmos direitos são concedidos aos autores de obras literárias durante toda a duração de seus direitos sobre a obra original, no que respeita à tradução de suas obras.
Artigo 12
Os autores de obras literárias ou artísticas gozam do direito exclusivo de autorizar as adaptações, arranjos e outras transformações das mesmas obras.
Artigo 13
1) Cada país da União pode, no que lhe diz respeito, estabelecer reservas e condições relativas ao direito do autor de uma obra musical e do autor da letra cuja gravação juntamente com a obra musical já foi autorizada por este último, de autorizar a gravação sonora da referida obra musical , eventualmente com a letra; mas todas as reservas e condições desta natureza só terão um efeito estritamente limitado ao país que as tiver estabelecido e não poderão em caso algum afetar o direito que tem o autor de receber remuneração eqüitativa, fixada, na falta de acordo amigável, pela autoridade competente.
2) As gravações de obras musicais que tenham sido realizadas num país da União nos termos do artigo 13. 3 das Convenções assinadas em Roma a 2 de Junho de 1928 e em Bruxelas a 26 de Junho de 1948 poderão, naquele país, constituir objeto de reproduções sem o consentimento do autor da obra musical até a expiração de um período de dois anos contados da data na qual o referido país fica vinculado pelo presente ato.
3) As gravações feitas nos termos do parágrafo 1 e 2 do presente artigo e importadas, sem autorização das partes interessadas, para um país onde não sejam lícitas poderão nele ser ali apreendidas.
Artigo 14
1) Os autores de obras literárias ou artísticas têm o direito exclusivo de autorizar: 1º- a adaptação e reprodução cinematográfica dessa obra e a distribuição das obras assim adaptadas ou reproduzidas; 2º- a representação e a execução públicas e a transmissão por fio ao público das obras assim adaptadas ou reproduzidas.
2) A adaptação, sobre qualquer outra forma artística, das realizações cinematográficas extraídas de obras literárias ou artísticas fica submetida, sem prejuízo da autorização dos seus autores, à autorização dos autores das obras originais.
3) As disposições do artigo 13.1 não são aplicáveis.
Artigo 14bis
1) Sem prejuízo dos direitos de autor de qualquer obra que poderia ter sido adaptada ou reproduzida, a obra cinematográfica é protegida como uma obra original. O titular do direito de autor sobre a obra cinematográfica goza dos mesmos direitos que o autor de uma obra original, inclusive os direitos mencionados no artigo precedente.
2) a) a determinação dos titulares do direito de autor sobre a obra cinematográfica é reservada à legislação do país em que a proteção é reclamada;
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b) entretanto, nos países da União nos quais a legislação reconhece entre estes titulares os autores das contribuições prestadas à realização da obra cinematográfica, estes últimos, se comprometeram a prestar tais contribuições, não poderão, salvo estipulação contrária ou particular, se opor à reprodução, à distribuição, à representação e à execução públicas, à transmissão por fio ao público, à radiodifusão, à comunicação ao público, à colocação de legendas e à dublagem dos textos, da obra cinematográfica;
c) a questão de saber se a forma de compromisso acima referido deve, para a aplicação da alínea "b" precedente, ser ou não um contrato escrito ou ato escrito equivalente, é regulada pela legislação do país da União em que o produtor da obra cinematográfica tem sua sede ou a sua residência habitual. Todavia, à legislação dos países da União onde a proteção é reclamada fica reservada a faculdade de dispor que tal compromisso deve ser um contrato escrito ou um ato escrito equivalente. Os países que fazem uso desta faculdade deverão notificá-lo ao Diretor-Geral, por uma declaração escrita que será imediatamente comunicada por este último a todos os outros países da União;
d) por «estipulação contrária ou particular» deve entender-se toda condição restritiva que possa acompanhar o referido compromisso.
3) A menos que a legislação nacional decida de outra maneira, a disposição do parágrafo 2 "b" acima não são aplicáveis nem aos autores dos argumentos, dos diálogos e das obras musicais, criados para a realização da obra cinematográfica, nem ao realizador principal da mesma. Entretanto os países da União cuja legislação não contenha disposições prevendo a aplicação do parágrafo 2, «b», pré-citado, ao referido realizador, deverão notifica-lo ao Diretor-Geral mediante uma declaração escrita que será imediatamente comunicada por este último a todos os outros países da União.
Artigo 14ter
1) Quanto às obras de arte originais e aos manuscritos originais dos escritores e compositores, o autor - ou, depois da sua morte, as pessoas físicas ou jurídicas como tais qualificadas pela legislação nacional - goza de um direito inalienável de ser interessado nas operações de venda de que a obra for objeto depois da primeira cessão efetuada pelo autor.
2) A proteção prevista no parágrafo anterior só é exigível em cada país unionista se a legislação do país a que pertence o autor admite essa proteção e na medida em que o permite a legislação do país onde tal proteção é reclamada.
3) As modalidades e as taxas de percepção são determinadas em cada legislação nacional.
Artigo 15
1) Para que os autores das obras literárias e artísticas protegidas pela presente Convenção sejam, até prova em contrário considerados como tais e admitidos em conseqüência, perante os tribunais dos países da União, a proceder judicialmente contra os contrafatores, basta que seus nomes venham indicados nas obras pela forma usual. O presente parágrafo é aplicável mesmo quando os nomes são pseudônimos , desde que os pseudônimos adotados não deixem quaisquer dúvidas acerca da identidade dos autores.
2) Presume-se produtor da obra cinematográfica, salvo prova em contrário, a pessoa física ou jurídica cujo nome é indicado na referida obra na forma habitual.
3) Quanto às obras anônimas, e às pseudônimas que não sejam as mencionadas no parágrafo 1 anterior, o editor cujo nome vem indicado na obra é, sem necessidade de outra prova, considerado representante do autor; nesta qualidade tem poderes para salvaguardar e fazer valer os direitos deste. A disposição do presente parágrafo deixa de aplicar-se quando o autor revelou a sua identidade e justificou a sua qualidade.
4)a) Quanto às obras não publicadas cujo o autor é de identidade desconhecida, mas, segundo tudo leva a presumir, nacional de um país da União, é reservada à legislação desse país a faculdade de designar a autoridade competente para representar esse autor e com poderes para salvaguardar e fazer valer os direitos do mesmo nos países da União.
b) Os países da União, que, por força desta disposição, procederem a tal designação, notificá-lo-ão ao Diretor-Geral mediante uma declaração escrita em que serão indicadas todas as informações relativas à autoridade assim designada. O Diretor-Geral comunicará imediatamente a referida declaração a todos os outros países da União.
Artigo 16
1) Toda obra contrafeita pode ser apreendida nos países da União onde a obra original tem direito à proteção legal.
2) As disposições do parágrafo precedente são igualmente aplicáveis às reproduções provenientes de um país onde a obra não é protegida ou deixou de sê-lo.
3) A apreensão efetua-se de acordo com a legislação interna de cada país.
Artigo 17
As disposições da presente Convenção não podem prejudicar, seja no que for, o direito que tem o Governo de qualquer dos países da União de permitir, vigiar ou proibir, por medidas de legislação ou de polícia interna, a circulação, a representação ou a exposição de qualquer obra ou produção a respeito das quais a autoridade competente julgue necessário exercer esse direito.
Artigo 18
1) A presente Convenção aplica-se a todas as obras que na data da entrada em vigor deste instrumento, não caíram ainda no domínio público nos seus países de origem por ter expirado o prazo de proteção.
2) Todavia, se uma obra, por ter expirado o prazo de proteção que lhe era anteriormente reconhecido, caiu no domínio público no país onde a proteção é reclamada, não voltará a ser ali protegida.
3) A aplicação deste princípio efetuar-se-á de acordo com as estipulações contidas nas convenções especiais já celebradas ou a celebrar neste sentido entre países da União. Na falta de semelhantes estipulações, os países respectivos regularão, cada qual no que lhe disser respeito, as modalidades relativas a tal aplicação.
4) As disposições precedentes aplicam-se igualmente em caso de novas adesões à União e quando a proteção for ampliada por aplicação do artigo 7 ou por abandono de reservas.
Artigo 19
A disposições da presente Convenção não impedem que se reivindique a aplicação de disposições mais amplas que venham a ser promulgadas na legislação de qualquer país unionista.
Artigo 20
Os governos dos países da União reservam-se o direito de celebrar entre si acordos particulares, desde que tais acordos concedam aos autores direitos mais extensos do que aqueles conferidos pela Convenção ou que contenham estipulações diferentes não contrárias à mesma. As disposições dos acordos existentes que correspondem às condições acima indicadas continuam em vigor.
Artigo 21
1) Figuram em Anexo disposições especiais relativas aos países em vias de desenvolvimento.
2) Sob reserva das disposições do artigo 28,1, «b», o Anexo forma parte integrante do presente Ato.
Artigo 22
1) a) a União tem uma Assembléia composta dos países da União vinculados pelos artigos 22 a 26.
b) o Governo de cada país é representado por um delegado, que pode ser assessorado por suplentes, conselheiros e peritos.
c) os ônus de cada delegação são suportados pelo Governo que a designou.
2) a) a Assembléia:
i) trata de todas as questões relativas à manutenção e ao desenvolvimento da União e à aplicação da presente Convenção;
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ii) dá ao ,«Bureau international de la propriété intellectuelle» (abaixo denominada o "Bureau international"), mencionado na convenção que instituiu a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (abaixo denominada «a Organização»), diretrizes relativas à preparação das conferências de revisão, levando devidamente em conta as observações dos países da União que não estão vinculados pelos artigos 22 a 26;
iii) examina e aprova os relatórios e as atividade do Diretor-Geral da Organização relativos à União e lhe dá todas as diretrizes úteis referentes às questões da competência da União;
iv) elege os membros da Comissão Executiva da Assembléia;
v) examina e aprova os relatórios e as atividades de sua Comissão Executiva e lhe dá diretrizes;
vi) baixa o programa, adota o orçamento trienal da União e aprova suas contas de encerramento;
vii) adota o regimento financeiro da União;
viii) cria os comissões de peritos e grupos de trabalho que julgar úteis à realização dos objetivos da União;
ix) decide quais os países não membros da União e quais as organizações intergovernamentais e internacionais não governamentais que podem ser admitidas nas suas reuniões na qualidade de observadores;
x) adota as modificações dos artigos 22 a 26;
xi) empreende qualquer outra ação apropriada a fim de alcançar os objetivos da União;
xii) executa quaisquer outras tarefas decorrentes da presente Convenção;
xiii) exerce, com a ressalva de que os aceite, os direitos que lhe são conferidos pela convenção que institui a Organização.
b) Em questões que interessem igualmente outras uniões administrativas pela Organização, a Assembléia estatui após tomar conhecimento do parecer da Comissão de Coordenação da Organização.
3) a) cada País Membro da assembléia dispõe de um voto.
b)O «quorum» é constituído pela metade dos Países Membros da Assembléia.
c) Não obstante as disposições da alínea «b», se, por ocasião de uma sessão, o número dos países representados for inferior à metade mas igual ou superior a um terço dos Países Membros da Assembléia, esta poderá tomar decisões; entretanto, as decisões da Assembléia, com exceção daquelas relativas ao processamento dos trabalhos, só se tornarão executórias quando as condições enunciadas abaixo forem cumpridas. O "Bureau International" comunica as referidas decisões aos Países Membros da Assembléia que não estavam representados, convidando-os a expressar por escrito, num prazo de três meses contados da data da referida comunicação, seu voto ou sua abstenção. Se, expirado este prazo, o número dos países que assim exprimiram seu voto ou sua abstenção for pelo menos igual ao número de países que faltavam para que «o quorum» fosse alcançado por ocasião da sessão, as referidas decisões tornar-se-ão executórias- contanto que se mantenha ao mesmo tempo a maioria necessária.
d) Ressalvadas as disposições do artigo 26.2, as decisões da Assembléia são tomadas por maioria de dois terços dos votos expressos.
e) A abstenção não é computada como voto.
f) Um delegado não pode representar senão um só país e somente pode votar em nome dele.
g) Os países da União que não são membros da Assembléia são admitidos às suas reuniões na qualidade de observadores.
4) a) A Assembléia se reúne uma vez em cada três anos em sessão ordinária, mediante convocação feita pelo Diretor-Geral e, salvo casos excepcionais, durante o mesmo período e no mesmo lugar que a Assembléia Geral da Organização.
b) A Assembléia se reúne em sessão extraordinária mediante convocação feita pelo Diretor-Geral, a pedido da Comissão Executiva ou a pedido de um quarto dos Países Membros da Assembléia.
5) A Assembléia adotará seu próprio regimento interno.
Artigo 23
1) A Assembléia tem um Comissão Executiva.
2) a) a Comissão Executiva é composta dos países eleitos pela Assembléia dentre os Países Membros desta última. Além disso, o país em cujo território a Organização tem a sua sede dispõe, «ex officio», de um lugar na Comissão, ressalvadas as disposições do artigo 25.7, «b»".
b) o Governo de cada País Membro da Comissão Executiva é representado por um delegado que pode ser assessorado por suplentes, conselheiros e peritos.
c) as despesas de cada delegação são custeadas pelo governo que a designou.
3) O número de Países Membros da Comissão Executiva corresponde à quarta parte do número dos Países Membros da Assembléia. No cálculo das vagas a preencher, o resto que fica depois da divisão por quatro não é tomado em consideração.
4) Por ocasião da eleição dos membros da Comissão Executiva, a Assembléia levará em conta uma distribuição geográfica eqüitativa e a necessidade de estarem os países que são partes nos Acordos Especiais que possam ser estabelecidos sem relação com a União entre os países que constituem a Comissão Executiva.
5) a) os membros da Comissão Executiva permanecem nas suas funções a partir do encerramento da sessão da Assembléia no decurso da qual foram eleitos até o término da sessão ordinária seguinte da Assembléia.
b) os membros da Comissão Executiva são reelegíveis no limite máximo de dois terços deles.
c) a Assembléia regulamenta as modalidades da eleição e da eventual reeleição dos membros da Comissão Executiva.
6) a) A Comissão Executiva;
i) prepara o projeto de ordem do dia da Assembléia;
ii) submete à Assembléia propostas relativas aos projetos de programa e de orçamento trienal da União preparados pelo Diretor-Geral;
iii) dá seu parecer, nos limites do programa e do orçamento trienal, sobre os programas e os orçamentos anuais preparados pelo Diretor Geral
iv) submete à Assembléia, com os comentários apropriados, os relatórios periódicos do Diretor-Geral e os relatórios anuais de verificação das contas;
v) toma todas as medidas úteis com vistas à execução do programa da União pelo Diretor-Geral, nos termos das decisões da Assembléia e levando em conta as circunstâncias sobrevindas entre duas sessões ordinárias da referida Assembléia;
vi) se desencumbe de quaisquer outras tarefas que lhe sejam atribuídas no âmbito da presente Convenção.
b) relativamente às questões que interessem igualmente outras Uniões administradas pela Organização, a Comissão Executiva estatui depois de tomar conhecimento do parecer do Conselho de Coordenação da Organização.
7) a) a Comissão Executiva reúne-se uma vez por ano em sessão ordinária, mediante convocação feita pelo Diretor-Geral, na medida do possível durante o mesmo período e no mesmo lugar que a Comissão de Coordenação da Organização;
b) A Comissão Executiva se reúne em sessão extraordinária mediante convocação feita pelo Diretor-Geral, seja por iniciativa deste último, seja a pedido de seu Presidente ou de um quarto de seus membros.
8) a) cada País Membro da Comissão Executiva dispõe de um voto;
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b) a metade dos Países Membros da Comissão Executiva constitui o «quorum»;
c) as decisões são tomadas por maioria simples dos votos expressos;
d) a abstenção não pode ser considerada como voto;
e) um delegado não pode representar senão um só país e somente pode votar em nome dele;
9) os países da União que não sejam membros da Comissão Executiva são admitidos às suas reuniões na qualidade de observadores.
10) A comissão executiva adotará seu próprio regulamento interno.
Artigo 24
1) a) as tarefas administrativas que incumbem à União são asseguradas pelo "Bureau International", que sucede ao "Bureau da União" unido com o "Bureau da União" instituído pela Convenção Internacional para a Proteção da Propriedade Industrial.
b) O "Bureau International" encarrega-se especialmente do secretariado dos diversos órgãos da União.
c) O Diretor-Geral da Organização é o mais alto funcionário da União e a representa.
2) O "Bureau International" reúne e publica as informações relativas à proteção do direito de autor. Cada país da União comunica, logo que possível ao "Bureau International" o texto de qualquer nova lei assim como de quaisquer textos oficiais relativos à proteção do direito de autor.
3) O "Bureau International" publica um periódico mensal.
4) O "Bureau International" fornece a qualquer país da União, a seu pedido, informações do direito de autor.
5) O "Bureau International" realiza estudos e fornece serviços destinados a facilitar a proteção do direito de autor.
6) O Diretor-Geral e qualquer membro do pessoal por ele designado participam, sem direito de voto, de todas as reuniões da Assembléia da Comissão Executiva e qualquer outra comissão de peritos ou grupo de trabalho. O Diretor-Geral ou um membro do pessoal por ele é, «ex officio», secretário dos referidos órgãos.
7) a) o "Bureau International", em conformidade com as diretrizes da Assembléia e em Cooperação com a Comissão Executiva, prepara as conferências de revisão das disposições da Convenção que não sejam aquelas compreendidas nos artigos 22 a 26;
b) O "Bureau International" pode consultar órgãos intergovernamentais e internacionais não governamentais relativamente à preparação das conferências de revisão.
c) O Diretor-Geral e as pessoas designadas por ele participam, sem direito de voto, das deliberações dessas conferências.
8) O "Bureau International" executa quaisquer outras tarefas que lhe sejam atribuídas.
Artigo 25
1) a) a União tem um orçamento.
b) o orçamento da União abrange as receitas e as despesas próprias da União, sua contribuição para o orçamento das despesas comuns às Uniões, assim como, eventualmente, a quantia posta à disposição do orçamento da Conferência da Organização.
c) Consideram-se despesas comuns às Uniões as despesas que não são exclusivamente atribuídas à União, mas igualmente a uma ou várias outras Uniões administradas pela Organização. A parte da União nessas despesas comuns é proporcional ao interesse que ditas despesas apresentam para ela.
2) O orçamento da União é estabelecido levando-se em conta as exigências de coordenação com os orçamentos das outras Uniões administradas pela Organização.
3) O orçamento da União é financiado com os seguintes recursos:
i) as contribuições dos países da União ;
ii) as taxas e quantias devidas pelos serviços prestados pelo "Bureau International" por conta da União;
iii) o produto da venda das publicações do "Bureau International" relativas à União e os direitos correspondentes a essas publicações;
iv) os donativos, legados e subvenções;
v) os aluguéis, juros e outras rendas diversas.
4) a) a fim de determinar sua parte de contribuição ao orçamento, cada país da União é incluído numa classe e paga suas contribuições anuais com base em num número de unidades fixado como segue:
Classe I 25
Classe II 20
Classe III 15
Classe VI 10
Classe V 5
Classe VI 3
Classe VII 1
b) a menos que já o tenha feito antes, cada país declarará, no momento do depósito do seu instrumento de ratificação ou de adesão, em qual das mencionadas classes deseja ser incluído. Pode mudar de classe. Se escolher uma classe inferior, deve comunicar o fato à Assembléia por ocasião de uma de suas sessões ordinárias. Tal mudança entrará em vigor no início do ano civil seguinte à referida sessão;
c) a contribuição anual de cada país consiste numa quantia cuja relação à soma total das contribuições anuais ao orçamento da União, de todos os países, é a mesma que a relação entre o número de unidades da classe na qual está incluído e o número total das unidades do conjunto dos países.
d) As contribuições vencem no dia 1o. de Janeiro de cada ano.
e) Um país atrasado no pagamento de suas contribuições não pode exercer seu direito de voto, em qualquer dos órgãos da União do qual é membro, se o montante de seus atrasados é igual ou superior ao das contribuições das quais é devedor pelos dois anos completos esgotados. Entretanto, qualquer um desses órgãos pode permitir que tal país continue exercendo seu direito de voto no órgão enquanto julgar que o atraso resulta de circunstâncias excepcionais e inevitáveis.
f) No caso em que o orçamento não haja sido adotado antes do inicio do novo exercício, continuará a ser aplicado, conforme as modalidades previstas pelo regimento financeiro, o orçamento do ano anterior.
5) O montante das taxas e quantias devidas por serviços prestados pelo "Bureau International" por conta da União é fixado pelo Diretor-Geral, que informa sobre isso a Assembléia e a Comissão Executiva.
6) a) A União possui um fundo de giro constituído por um pagamento único, efetuado por cada país da União. Se o fundo se torna insuficiente, a Assembléia decide seu aumento.
b) O montante do pagamento inicial de cada país para o citado fundo ou de sua participação no aumento deste último é proporcional à contribuição desse país para o ano no curso do qual se constituiu o fundo ou se resolveu o aumento.
c) A proporção e as modalidades de pagamento são determinadas pela assembléia, mediante proposta do Diretor-Geral e após parecer da Comissão de Coordenação da Organização.
7) a) o acordo de sede concluído com o país em cujo território a Organização tem sua sede prevê que, se o fundo de giro for insuficiente, este país concederá adiantamentos. O montante desses adiantamentos e a condições nas quais são concedidos constituem objeto, em cada caso, de acordos separados entre o país em questão e a Organização. Enquanto tal país tiver obrigação de conceder adiantamentos, disporá ele, «ex officio», de uma cadeira na comissão executiva.
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b) o país mencionado na alínea «a» e a Organização têm, cada um, o direito de denunciar o compromisso de conceder adiantamentos, mediante notificação por escrito. A denúncia entra em vigor três anos depois do fim do ano no curso do qual ela foi notificada.
8) A verificação das contas é assegurada, segundo as modalidades previstas pelo regimento financeiro, por um ou vários países da União ou por técnicos de controle externo, que são, com o consentimento deles, designados pela Assembléia.
Artigo 26
1) Propostas de modificação dos artigos, 22, 23, 24, 25, e do presente artigo, podem ser apresentados por qualquer País Membro da Assembléia, pela Comissão Executiva ou pelo Diretor-Geral. Estas propostas são comunicadas por este último aos Países Membros da Assembléia seis meses pelo menos antes de serem submetidas à Assembléia para exame.
2) Toda modificação dos artigos mencionados no parágrafo 1 é adotada pela Assembléia. A adoção requer três-quartos dos votos expressos; entretanto, qualquer modificação do artigo 22 e do presente parágrafo requer quatro quintos dos votos expressos.
3) Qualquer modificação dos artigos mencionados na alínea 1 entra em vigor um mês depois do recebimento pelo Diretor-Geral das notificações escritas de aceitação efetuadas em conformidade com suas respectivas normas constitucionais, de três quartos dos países que eram membros da Assembléia no momento em que a modificação foi adotada. Qualquer modificação dos referidos artigos assim aceita vincula todos os países que sejam membros da Assembléia no momento em que a modificação entra em vigor ou que se tornam membros numa data ulterior; entretanto, qualquer modificação que aumente as obrigações financeiras dos países da União não vincula senão aquele dentre eles que notificaram sus aceitação de tal modificação.
Artigo 27
1) A presente convenção será submetida a revisões a fim de nela introduzirem melhoramentos que possam aperfeiçoar o sistema da União.
2) Para tal efeito, realizar-se-ão conferências, sucessivamente, num dos países da União, entre os delegados dos referidos países.
3) Sem prejuízo das disposições do artigo 26 aplicáveis à modificação dos artigos 22 a 26, qualquer revisão do presente Ato, inclusive o Anexo, requer a unanimidade dos votos expressos.
Artigo 28
1) a) qualquer dos países da União que tenha assinado o presente Ato pode ratificá-lo e, se não o tiver assinado, pode a ele aderir. Os instrumentos de ratificação ou de adesão são depositados junto ao Diretor-Geral.
b) qualquer dos países da União pode declarar no seu instrumento de ratificação ou de adesão que a sua ratificação ou sua adesão não é aplicável aos artigos 1 a 21 e ao Anexo; entretanto se tal país já fez uma declaração de acordo com o artigo VI, 1, do Anexo, só pode declarar no referido instrumento que sua ratificação ou sua adesão não se aplica aos artigos 1 a 20.
c) qualquer dos países da União que, de acordo com a alínea «b», excluiu dos efeitos da sua ratificação ou de sua adesão às disposições mencionadas na referida alínea pode, a qualquer momento posterior, declarar que estende os efeitos de sua ratificação ou de sua adesão a estas disposições. Tal declaração é depositada junto ao Diretor-Geral.
2) a) os artigos 1 a 21 e o Anexo entram em vigor três meses depois que as duas condições seguintes foram preenchidas:
i) cinco países da União pelo menos ratificaram o presente Ato ou a ele aderiram sem fazerem declaração segundo o parágrafo 1,"«b»;
ii) a Espanha, os Estados Unidos da América, a França e o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte ficaram vinculados pela Convenção Universal sobre o direito de autor, tal como foi revista em Paris a 24 de Julho de 1971.
b) A entrada em vigor mencionada na alínea "a" é efetiva em relação aos países da União que, três meses pelo menos antes da referida
entrada em vigor, depositaram instrumentos de ratificação ou de adesão que não contêm declaração segundo o parágrafo 1, "b".
c) Em relação a qualquer dos países da União ao qual a alínea "b" não é aplicável e que ratifica o presente Ato ou a ele adere sem fazer declaração segundo o parágrafo 1, «b», os artigos 1 a 21 e o Anexo entram em vigor três meses depois da data em que o Diretor-Geral notificou o depósito do instrumento de ratificação ou de adesão em causa, a menos que uma data posterior tenha sido indicada no instrumento depositado. Nesse último caso, os artigos 1 e 21 e o Anexo entram em vigor em relação a este país na data assim indicada.
d) As disposições das alíneas«a» e «c» não afetam a aplicação do artigo VI do Anexo.
3) Em relação a qualquer país da União que ratifique o presente Ato ou a ele adira com ou sem declaração segundo o parágrafo 1, "b", os artigos 22 a 38 entram em vigor três meses depois da data em que o Diretor-Geral houver notificado o depósito do instrumento de ratificação ou de adesão em causa, a menos que uma data posterior tenha sido indicada no instrumento depositado. Neste último caso, os artigos 22 a 38 entram em vigor em relação a este país na data assim indicada.
Artigo 29
1) Qualquer país estranho à União pode aderir ao presente Ato e tornar-se, assim, parte na presente Convenção e membro da União. Os instrumentos de adesão são depositados junto ao Diretor-Geral.
2) a) ressalvada a alínea "b", a presente Convenção entra em vigor em relação a qualquer país estranho à União três meses depois da data em que o Diretor-Geral notificou o depósito de seu instrumento de adesão, a menos que uma data posterior tenha sido indicada no instrumento depositado. Neste último caso, a presente Convenção entra em vigor em relação a esse país na data assim indicada.
b) Se a entrada em vigor em aplicação da alínea «a» precede a entrada em vigor dos artigos 1 a 21 e do Anexo por aplicação do artigo 28.2, «a», o referido país será vinculado, no intervalo, pelos artigos 1 a 20 do ato de Bruxelas da presente Convenção que passam a substituir os artigos 1 a 21 e o anexo.
Artigo 29bis
A ratificação do presente Ato ou a adesão a este Ato por qualquer país não vinculado pelos artigos 22 a 38 do Ato de Estocolmo da presente Convenção eqüivale, para o único fim de poder-se aplicar o artigo 14.2 da convenção que institui a Organização, à ratificação do ato de Estocolmo ou à adesão a este Ato com a limitação prevista pelo artigo 28.1, «b», (i) de tal ato.
Artigo 30
1) Ressalvadas as exceções permitidas pelo parágrafo 2 do presente artigo, pelo artigo 28.1, «b», pelo artigo 33.2, assim como pelo Anexo, a ratificação ou a adesão importa, de pleno direito, em acessão a todas as cláusulas e admissão a todas as vantagens estipuladas pela presente Convenção.
2) a) qualquer país da União que ratifica o presente Ato ou que a ele adere pode, sem prejuízo do artigo V.2 do Anexo, conservar o benefício das ressalvas que formulou anteriormente, com condição de declará-lo ao fazer o depósito de seu instrumento de ratificação ou de adesão.
b) qualquer país estranho à União pode declarar, ao aderir à presente Convenção, e sem prejuízo do artigo V.2 do anexo, que entende substituir, provisoriamente pelo menos, ao artigo 8 do presente Ato, relativo ao direito de tradução, as disposições do artigo 5 da convenção da União de 1886, completada em Paris em 1896, ficando bem entendido que estas disposições visam somente a tradução numa língua de uso geral no referido país. Sem prejuízo do artigo 1.6, «b», do Anexo, qualquer país tem a faculdade de aplicar, relativamente ao direito de tradução das obras que têm como país de origem que faça uso de tal ressalva, uma proteção equivalente à concedida por este último país.
c) qualquer país pode, em qualquer momento, retirar as referidas ressalvas, mediante notificação dirigida ao Diretor-Geral.
181
Artigo 31
1) Qualquer país pode declarar em seu instrumento de ratificação ou de adesão, ou pode informar ao Diretor-Geral mediante notificação escrita em qualquer momento posterior, que a presente Convenção é aplicável à totalidade ou a parte dos territórios, designados na declaração ou na notificação, pelos quais assume a responsabilidade das relações exteriores.
2) Qualquer país que tenha feito tal declaração ou efetuado tal notificação pode, em qualquer momento, notificar o Diretor-Geral que a presente Convenção deixa de ser aplicável à totalidade ou a parte dos referidos territórios.
3) a) qualquer declaração feita por força do parágrafo 1 entra em vigor na mesma data em que a ratificação ou a adesão em cujo instrumento ela foi incluída, e qualquer notificação efetuada por força deste parágrafo entra em vigor três meses depois de sua notificação pelo Diretor-Geral.
b) qualquer notificação efetuada por força do parágrafo 2 entra em vigor doze meses depois de seu recebimento pelo Diretor-Geral.
4) O presente artigo não poderá ser interpretado como acarretando o reconhecimento ou a aceitação tácita por qualquer dos países da União da situação de fato de qualquer território ao qual a presente convenção é tornada aplicável por um outro país da União por força de uma declaração feita em aplicação do parágrafo 1.
Artigo 32
1) O presente Ato substitui, nas relações entre os países da União, e na medida em que se aplica, a Convenção de Berna de 9 de Setembro de 1886 e os Atos de revisão subsequentes. Os Atos que vigoravam anteriormente continuam sendo aplicáveis, em sua totalidade ou na medida em que o presente Ato não os substitui por força da frase anterior, nas relações com os países da União que não ratifiquem o presente Ato ou que a ele não adiram.
2) Os países estranhos à União, que passem a ser partes no presente Ato aplicá-lo-ão, sem prejuízo das disposições do parágrafo 3, relativamente a qualquer país da União que não seja parte deste Ato, ou que, sendo parte do mesmo, tenha feito a declaração prevista no artigo 28.1, «b». Os referidos países admitirão que tal país, em suas relações com ele:
i) aplique as disposições do Ato mais recente do qual seja parte; e
ii) sem prejuízo do disposto no artigo I.6 do Anexo, tenha a faculdade de adaptar a proteção ao nível previsto pelo presente Ato.
3) Os países que invocaram o benefício de qualquer das faculdades previstas no Anexo podem aplicar as disposições do Anexo que dizem respeito à faculdade ou às faculdades cujo benefício invocaram, em suas relações com qualquer país da União que não esteja vinculado pelo presente Ato, com a condição de que este último país tenha aceito à aplicação de tais disposições.
Artigo 33
1) Todos os litígios entre dois ou mais países da União, que digam respeito à interpretação ou à aplicação da presente Convenção e que não sejam solucionados por via de negociações, serão submetidos à Corte Internacional de Justiça, por qualquer dos países em causa, mediante petição redigida em conformidade com o Estatuto da Corte, salvo se os países em causa acordarem em qualquer outra forma de solução. O "Bureau International" será informado pelo país requerente do litígio submetido ao Tribunal e disso dará conhecimento aos outros países da União.
2) No momento em que firmar o presente Ato ou depositar seu instrumento de ratificação ou de adesão, qualquer país poderá declarar que não se considera vinculado pelas disposições do parágrafo 1. As disposições do parágrafo 1 não são aplicáveis no que diz respeito a qualquer litígio entre tal país e os demais países da União.
3) Qualquer país que tenha feito uma declaração segundo o disposto no parágrafo 2 pode retirá-la, em qualquer tempo, mediante notificação dirigida ao Diretor-Geral.
Artigo 34
1) Sem prejuízo do disposto no artigo 29, bis, depois da entrada em vigor dos artigos 1, a 21 e do Anexo, nenhum país pode aderir a Atos anteriores à presente Convenção ou ratificá-los.
2) A partir da entrada em vigor dos artigos 1 a 21 e do Anexo, nenhum país pode fazer declaração por força do disposto no artigo 5 do Protocolo relativo aos países em vias de desenvolvimento, anexo ao Ato de Estocolmo.
Artigo 35
1) A presente convenção manter-se-á em vigor por tempo indeterminado.
2) Qualquer país pode denunciar o presente Ato mediante notificação dirigida ao Diretor-Geral. Esta denúncia implica também em denúncia de todos os atos anteriores e não produzirá efeito senão com referência ao país que a tenha apresentado, permanecendo a Convenção em vigor e executiva com relação aos outros países da União.
3) A denúncia produzirá efeito um ano depois da data em que o Diretor-Geral recebeu a notificação.
4) O direito de denúncia previsto no presente artigo não poderá ser exercido por qualquer país antes de expirado o prazo de cinco anos a contar da data em que tal país se tenha tornado membro da União.
Artigo 36
1) Todo país parte na presente Convenção se compromete a adotar, de conformidade com sua Constituição, as medidas necessárias para assegurar a aplicação da presente Convenção.
2) Entende-se que, no momento em que um país se vincula pela presente Convenção, deve estar em condições, de conformidade com sua legislação interna, aplicar as disposições da presente Convenção.
Artigo 37
1) a) o presente Ato é assinado em um único exemplar nas línguas inglesa e francesa e, sem prejuízo do parágrafo 2, é depositado junto ao Diretor-Geral.
b) textos oficiais são elaborados pelo Diretor-Geral, depois de consultados os governos interessados, nas línguas alemã, árabe, espanhola, italiana e portuguesa, e nas outras línguas que poderão ser indicadas pela Assembléia.
c) em caso de divergência quanto à interpretação dos diversos textos, fará fé o texto francês.
2) O presente ato permanece aberto à assinatura até 31 de Janeiro de 1972. Até esta data, o exemplar mencionado no parágrafo 1, «a», será depositado junto do Governo da República francesa.
3) O Diretor-Geral transmitirá duas cópias certificadas conforme do texto assinado do presente Ato aos Governos de todos os países da União e, a pedido, ao Governo de qualquer outro país.
4) O Diretor-Geral fará registrar o presente Ato junto ao Secretariado da Organização das Nações Unidas.
5) O Diretor-Geral notificará aos Governos de todos os países da União as assinaturas, os depósitos de instrumentos de ratificação ou de adesão e de declarações compreendidas nesses instrumentos ou efetuadas em aplicação dos artigos 28.1, «c», 30.2, «a» e «b» e 33.2, a entrada em vigor de quaisquer disposições do presente Ato, as notificações de denúncia e as notificações feitas em aplicação dos artigos 30.2, "c" 31.1 e 2, 33.3 e 38.1, assim como as notificações mencionadas no Anexo.
Artigo 38
1) Os países da União que não ratificaram o presente Ato ou que não aderiram a ele e que não são vinculados pelos artigos 22 a 26 do Ato de Estocolmo podem exercer até o dia 26 de Abril de 1975, se o desejarem, os direitos previstos pelos referidos artigos, como se fossem por eles vinculados. Qualquer país que deseje exercer os referidos direitos deposita para este fim, junto ao Diretor-Geral, uma notificação escrita que entra em vigor na data de seu recebimento. Tais países são considerados membros da Assembléia até a referida data.
182
2) Enquanto todos os países da União não se tiverem tornado membros da Organização, o "Bureau International" da Organização funcionará igualmente como Secretaria da União e o Diretor-Geral como diretor de tal Secretaria.
3) Quando todos os países da União se tiverem tornado membros da Organização, os direitos, obrigações e bens da Secretaria da União passarão para o "Bureau International" da Organização.
Anexo
Artigo primeiro
1) Qualquer país considerado de conformidade com a prática estabelecida na Assembléia Geral das Nações Unidas, como país em vias de desenvolvimento, que ratifique o presente Ato, do qual o presente Anexo forma parte integrante, ou que a ele adira, e que, em vista de sua situação econômica e de suas necessidades sociais e culturais, não se considere estar, de imediato, em condições de tomar as disposições próprias para assegurar a proteção de todos os direitos, tais como previstos no presente Ato, pode, mediante notificação depositada junto do Diretor-Geral, no momento do depósito do seu instrumento de ratificação ou de adesão, ou, sem prejuízo do deposito no artigo V.1, «c», em qualquer data ulterior, declarar que invocará o benefício da faculdade prevista pelo artigo II ou daquela prevista pelo artigo III ou de ambas as faculdades. Pode, em lugar de invocar o benefício da faculdade prevista pelo artigo II, fazer uma declaração conforme o artigo V.1, «a».
2) a) qualquer declaração feita por força do parágrafo 1 e notificada antes de expirado um período de dez anos, contados da entrada em vigor dos artigos 1 a 21 e do presente Anexo, de acordo com o artigo 28.2, permanecerá válida até que tenha expirado o referido período. Poderá ser renovada na sua totalidade ou parcialmente por outros períodos sucessivos de dez anos, mediante notificação depositada junto ao Diretor-Geral, não mais de quinze meses mas não menos de três meses antes de ter expirado o período decenal em curso.
b) qualquer declaração feita nos termos do parágrafo 1 e notificada depois de ter expirado um período de dez anos, contados da entrada em vigor dos artigos 1 a 21 e do presente Anexo, de acordo com o artigo 28.2, permanece válida até que tenha expirado o período decenal em curso. Pode ser renovada como previsto na segunda frase da alínea «a».
3) Qualquer país da União que tenha deixado de ser considerado como um país em vias de desenvolvimento de acordo com o disposto na alínea 1, não estará mais habilitado a renovar sua declaração tal qual prevista na alínea 2 e quer retire ou não oficialmente sua declaração, tal país perderá a possibilidade de invocar o benefício das faculdades mencionadas no parágrafo 1, seja ao expirar o período decenal em curso, seja três anos depois que tenha deixado de ser considerado um país em vias de desenvolvimento, devendo ser aplicado o prazo que mais tarde vença.
4) Se, na época em que a declaração feita em virtude do parágrafo 1 ou do parágrafo 2 deixa de vigorar, houve em estoque exemplares produzidos sob o regime de uma licença concedida por força das disposições do presente Anexo, tais exemplares poderão continuar a ser postos em circulação até seu esgotamento.
5) Qualquer país que seja vinculado pelas disposições do presente Ato e que tenha depositado uma declaração ou uma notificação de acordo com o artigo 31.1 relativamente a aplicação do referido Ato a determinado território cuja situação pode ser considerada como análoga àquela dos países mencionados no parágrafo 1, pode, em relação a esse território, fazer a declaração mencionada no parágrafo 1 e a notificação de renovação indicada no parágrafo 2. Enquanto vigorar esta declaração ou esta notificação, as disposições do presente Anexo aplicar-se-ão ao território em relação ao qual a mesma foi feita.
6) a) O fato de que um país invoca o benefício de uma das faculdades mencionadas no parágrafo 1 não autoriza outro país a dar às obras, cujo país de origem é o primeiro país em questão, uma proteção inferior àquela que é obrigado a conceder de acordo com os artigos 1 a 20.
b) A faculdade de reciprocidade prevista pelo artigo 30.2, «b», segunda frase, não pode, até à data em que expira o prazo aplicável de acordo com o artigo I.3, ser exercida para obras cujo país de
origem é um país que fez declaração de acordo com o artigo V.1, «a».
Artigo II
1) Todo país que tenha declarado que invocará o benefício da faculdade prevista pelo presente artigo será habilitado, relativamente às obras publicadas sob forma impressa ou sob qualquer outra forma análoga de reprodução, a substituir o direito exclusivo de tradução previsto no artigo 8 por um regime de licenças não exclusivas e intransferíveis, concedidas pela autoridade competente nas condições indicadas a seguir e de acordo com o artigo IV.
2) a) sem prejuízo do disposto no parágrafo 3, quando, ao expirar um período de três anos ou um período mais longo determinado pela legislação nacional do referido país contado da primeira publicação de uma obra, a tradução não foi publicada numa língua de uso geral nesse país, pelo titular do direito de tradução ou com sua autorização, qualquer nacional do referido país poderá obter uma licença para traduzir a obra na referida língua e publicar essa tradução sob forma impressa ou sob qualquer outra forma análoga de reprodução.
b) uma licença também pode ser concedida em virtude do presente artigo se estiverem esgotadas todas as edições da tradução publicada na língua em apreço.
3) a) no caso de traduções numa língua que não é de uso geral num ou em vários países desenvolvidos, membros da União, o período de um ano substituirá o período de três anos mencionados no parágrafo 2, «a».
b) qualquer país mencionado no parágrafo 1 pode, com o acordo unânime dos países desenvolvidos, membros da União, nos quais a mesma língua é de uso geral, substituir, no caso de tradução para a referida língua, o período de três anos mencionados no parágrafo 2, «a», por um período mais curto, fixado de conformidade com o referido acordo, não podendo, todavia, tal período ser inferior a um ano. Entretanto, as disposições da frase precedente não são aplicáveis quando se trata de inglês, espanhol ou francês. Qualquer acordo neste sentido será notificado ao Diretor-Geral pelos governos que o tiverem concluído.
4) a) Nenhuma licença mencionada no presente artigo poderá ser concedida antes de expirado um prazo suplementar de seis meses , no caso em que ela possa ser obtida ao expirar de um período de três anos, e de nove meses, no caso em que possa ser obtida ao expirar de um período de um ano:
i) contados da data em que o requerente cumpre as formalidades previstas pelo artigo IV. 1;
ii) ou então, se a identidade ou o endereço do titular do direito de tradução não for conhecido, contados da data em que o requerente procede, como previsto no artigo IV.2, ao envio das cópias do requerimento apresentado por ele à autoridade competente a fim de obter a licença.
b) se, no decurso de um prazo de seis ou de nove meses, uma tradução na língua para a qual o requerimento foi apresentado é publicada pelo titular do direito de tradução ou com a sua autorização, nenhuma licença será concedida por força do presente artigo.
5) Qualquer licença mencionada no presente artigo somente poderá ser concedida para fins escolares, universitário ou de pesquisa.
6) Se a tradução de uma obra for publicada pelo titular do direito de tradução ou com sua autorização por um preço comparável àquele em uso no país em causa para obras análogas, qualquer licença concedida por força do presente artigo cessará se tal tradução for na mesma língua e tiver, em essência, o mesmo conteúdo que a tradução publicada por força da licença. Poder-se-á continuar a distribuição de todos os exemplares já produzidos antes da expiração da licença, até o esgotamento dos mesmos.
7) Para as obras que são compostas principalmente de ilustrações, uma licença para realizar e publicar uma tradução do texto e para reproduzir e publicar ilustrações somente poderá ser concedida se as condições do artigo III forem igualmente preenchidas.
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8) Nenhuma licença poderá ser concedida por força do presente artigo quando o autor tiver retirado da circulação todos os exemplares da sua obra.
9) a) Uma licença para traduzir uma obra que tenha sido publicada sob forma impressa ou sob qualquer forma análoga de reprodução pode também ser concedida a qualquer órgão de radiodifusão que tenha sua sede num país mencionado no parágrafo 1, em conseqüência de um pedido feito à autoridade competente do país do referido organismo, contanto que tenham sido preenchidas todas as seguintes condições:
i) a tradução seja feita a partir de um exemplar produzido e adquirido de acordo com a legislação do referido país;
ii) a tradução seja utilizada somente em emissões destinadas ao ensino ou à difusão de informações de caráter científico ou técnico destinadas aos peritos de determinada profissão;
iii) a tradução seja utilizada exclusivamente para os fins enumerados no ponto (ii) em emissões feitas licitamente e destinadas aos beneficiários no território do referido país, inclusive as emissões feitas mediante registros sonoros e visuais realizados licitamente e exclusivamente para tais emissões;
iv) os usos feitos da tradução não tenham caráter lucrativo.
b) registros sonoros ou visuais de uma tradução feita por um órgão de radiodifusão sob o regime de uma licença concedida por força da presente alínea podem, para os fins e sem prejuízo das condições enumeradas na alínea «a» e com o acordo desse órgão, ser também utilizados por qualquer outro órgão de radiodifusão como sede no país cuja autoridade competente concedeu a licença em questão;
c) sempre que todos os critérios e condições enumerados na alínea «a» sejam respeitados, uma licença pode igualmente ser concedida a um órgão de radiodifusão para traduzir qualquer texto incorporado numa fixação audiovisual feita e publicada unicamente para uso escolar e universitário.
d) sem prejuízo das alíneas «a» a «c», as disposições dos parágrafos precedentes são aplicáveis à concessão e ao exercício de qualquer licença concedida por força do presente parágrafo.
Artigo III
1) Qualquer país que tenha declarado que invocará o benefício da faculdade prevista no presente artigo terá direito, para substituir o direito exclusivo de reprodução previsto no artigo 9 por um regime de licenças não exclusivas e intransferíveis, concedidas pela autoridade competente nas condições indicadas a seguir e de acordo com o artigo IV.
2) a) com relação a uma obra à qual o presente artigo é aplicável por força do parágrafo 7 e quando, ao expirar:
i) do período fixado no parágrafo 3 e contado a partir da primeira publicação de uma edição determinada de uma tal obra; ou
ii) de um período mais longo fixado pela legislação nacional do país mencionado a partir da mesma data, exemplares dessa edição não foram postos à venda, no referido país, para atender às necessidades, quer do público, quer do ensino escolar e universitário, pelo titular do direito de reprodução ou com a sua autorização, por um preço comparável ao em uso em tal país para obras análogas, qualquer nacional do referido país poderá obter uma licença para reproduzir e publicar essa edição, por esse preço ou por preço inferior, afim de atender às necessidades do ensino escolar e universitário;
b) uma licença para reproduzir e publicar uma edição que foi posta em circulação como o descreve a alínea «a» pode também ser concedida por força das condições previstas pelo presente artigo se, depois de expirado o período aplicável, exemplares autorizados dessa edição não estão mais à venda no país em questão, durante um período de seis meses para responder às necessidades, quer do público, quer do ensino escolar e universitário, a um preço comparável àquele que é pedido no referido país para obras análogas.
3) O período a que se refere o parágrafo 2, «a», (i) é de cinco anos. Entretanto,
i) para as obras que tratem de ciências exatas e naturais e da tecnologia, será de três anos;
ii) para as obras que pertençam ao campo de imaginação, como romances, obras poéticas, dramáticas e musicais e para os livros de arte, será de sete anos.
4) a) no caso em que possa ser obtida no termo de um período de três anos, a licença não poderá ser concedida em virtude do presente artigo antes de expirar um prazo de seis meses;
i- a contar da data em que o requerente cumpre as formalidades previstas pelo artigo IV. 1;
ii- ou então, se a identidade ou o endereço do titular do direito de reprodução não for conhecido, a contar da data em que o requerente precede, como previsto no artigo IV. 2, ao envio das cópias do requerimento apresentado por ele à autoridade competente a fim de obter a licença.
b) nos outros casos e se o artigo IV. 2. é aplicável a licença não poderá ser concedida antes de expirado um prazo de três meses contados do envio das cópias do requerimento.
c) se durante o prazo de seis ou de três meses mencionado nas alíneas "a" e" b" houve uma distribuição, como descrito no parágrafo 2, «a», nenhuma licença poderá ser concedida por força do presente artigo.
d) nenhuma licença poderá ser concedida quando o autor tiver retirado da circulação todos os exemplares da edição para cuja reprodução e publicação a licença foi requerida.
5) Uma licença para reproduzir e publicar uma tradução de uma obra não será concedida, por força do presente artigo, nos casos abaixo:
i) quando a tradução em causa não for publicada pelo titular do direito da tradução ou com sua autorização;
ii) quando a tradução não é feita numa língua de uso geral no país onde a licença é requerida.
6) Caso sejam postos à venda exemplares de uma edição de uma obra no país mencionado no parágrafo 1 para responder às necessidades, quer do público, quer do ensino secundário e universitário, pelo titular do direito de reprodução ou com sua autorização, por um preço comparável àquele em uso no referido país para obras análogas qualquer licença concedida por força do presente artigo caducará se essa edição for na mesma língua e tiver essencialmente o mesmo conteúdo que a edição publicada por força da licença. Poder-se-á continuar a distribuição de todos os exemplares já produzidos antes da expiração da licença até o esgotamento dos mesmos.
7) a) sem prejuízo da alínea «b», as obras às quais o presente artigo é aplicável são apenas as obras publicadas sob forma impressa ou sob qualquer outra forma análoga de reprodução.
b) o presente artigo é igualmente aplicável à reprodução audiovisual de fixações lícitas audiovisuais que constituam ou incorporem obras protegidas assim como à tradução do texto que as acompanha numa língua de uso geral no país em que a licença é requerida, ficando bem entendido que as fixações audiovisuais em questão foram concebidas e publicadas unicamente para fins escolares e universitários.
Artigo IV
1) Qualquer licença mencionada no artigo II ou no artigo III somente poderá ser concedida se o requerente, de acordo com as disposições em vigor no país em causa, provar ter pedido ao titular do direito a autorização de fazer uma tradução e de publicá-la ou de reproduzir e publicar a edição, conforme o caso, e, depois das devidas diligências de sua parte, não tiver podido encontrá-lo ou não tiver podido obter sua autorização. Ao mesmo tempo em que faz tal pedido ao titular do direito, o requerente deve informar qualquer centro nacional ou internacional de informação de que se trata o parágrafo 2.
2) Se o titular do direito não tiver podido ser encontrado pelo requerente, este deve dirigir, pelo correio aéreo, em carta registrada, cópias do requerimento, apresentado por ele à autoridade competente com a finalidade de obter a licença, ao editor cujo nome figura na obra e a qualquer centro nacional ou internacional de informação que possa ter sido designado, numa notificação
184
depositada para este fim junto ao Diretor-Geral pelo governo do país em que se presuma que o editor tenha seu lugar principal de atividades.
3) O nome do autor deve ser indicado em todos os exemplares da tradução ou da reprodução publicada sob o regime de uma licença concedida por força do artigo II ou do artigo III. O título da obra deve figurar em todos os exemplares. Se se tratar de uma tradução, o título original da obra deve, em qualquer caso, figurar em todos os exemplares.
4) a) qualquer licença concedida por força do artigo II ou do artigo III não se estenderá à exportação de exemplares e só será válida para a publicação da tradução ou da reprodução, conforme o caso, no interior do território do país em que a licença é requerida;
b) para os fins da aplicação da alínea "a", deve ser considerado como exportação o envio de exemplares de um território para um país que, para esse território, fez uma declaração de acordo com o artigo I.5;
c) quando um órgão governamental ou qualquer outro órgão público de um país que concedeu, de acordo com o artigo II, uma licença para fazer uma tradução numa língua que não seja o inglês, o espanhol ou o francês, envia exemplares da tradução publicada por força de tal licença a um outro país tal expedição não será considerada, para os fins da alínea «a», como sendo uma exportação se todas as condições seguintes forem preenchidas:
i) os destinatários são particulares nacionais do país cuja autoridade competente concedeu a licença, ou organizações que agrupem tais nacionais;
ii) os exemplares são utilizados exclusivamente para fins escolares, universitários ou de pesquisa;
iii) o envio de exemplares e a sua distribuição ulterior aos destinatários não se revestem de qualquer caráter lucrativo; e
iv) o país para o qual os exemplares foram enviados concluiu um acordo com o país cuja autoridade competente outorgou a licença para autorizar a recepção dos mesmos, ou a distribuição, ou esta duas operações, e o governo deste último país notificou o Diretor-Geral tal acordo:
5) Todo exemplar publicado sob o regime de uma licença concedida por força do artigo II ou do artigo III deve conter uma menção na língua apropriada indicando que o exemplar é posto em circulação somente no país ou no território a que se aplica a referida licença.
6) a) medidas adequadas serão tomadas no plano nacional para que:
i) a licença preveja em favor do titular do direito de tradução ou de reprodução, conforme o caso, uma remuneração eqüitativa e de acordo com a tabela dos pagamentos normalmente efetuados no caso de licenças livremente negociadas, entre os interessados nos dois países em causa; e
ii) sejam assegurados o pagamento e a remessa desta remuneração; se existir uma regulamentação nacional relativa a divisas, a autoridade competente não poupará esforços, recorrendo aos mecanismos internacionais, para assegurar a remessa da remuneração em moeda internacionalmente conversível ou em seu equivalente.
b) medidas adequadas serão tomadas no âmbito da legislação nacional para que seja garantida uma tradução correta da obra ou uma reprodução exata da edição em causa, conforme o caso.
Artigo V
1) a) qualquer país habilitado a declarar que invocará o benefício da faculdade prevista no artigo II pode, ao ratificar o presente Ato, ou a ele aderir, substituir tal declaração por:
i) se for um país ao qual o artigo 30.2, «a» é aplicável, uma declaração nos termos desta disposição, no que diz respeito ao direito de tradução;
ii) se for um país ao qual o artigo 30.2 "a" não for aplicável, e mesmo se não for um país estranho à União, uma declaração como previsto no artigo 30.2 «b», primeira frase.
b) no caso de um país que deixou de ser considerado como país em vias de desenvolvimento, tal como mencionado no artigo I.1, uma declaração feita em conformidade com o presente parágrafo permanece válida até a data na qual expira o prazo aplicável de acordo com o artigo I.3.
c) nenhum país que faça uma declaração em conformidade com o presente parágrafo não poderá invocar ulteriormente o benefício da faculdade prevista pelo artigo II, mesmo se retirar tal declaração.
2) Sem prejuízo do parágrafo 3, nenhum país que tiver invocado o benefício da faculdade prevista no artigo II poderá posteriormente fazer uma declaração conforme o parágrafo 1.
3) Qualquer país que tenha deixado de ser considerado como país em vias de desenvolvimento tal como mencionado no artigo I.1 poderá, o mais tardar dois anos antes de expirar o prazo aplicável de conformidade com o artigo I.3, fazer uma declaração no sentido do artigo 30.2 «b», primeira frase, não obstante o fato de não se tratar de um país estranho à União. Esta declaração entrará em vigor na data na qual expirar o prazo aplicável de acordo com o artigo I.3.
Artigo VI
1) Qualquer país da União pode declarar, a partir da data do presente Ato e a qualquer momento antes de tornar-se vinculado pelos artigos 1 a 21 e pelo presente Anexo:
i) se se tratar de um país que, se fosse vinculado pelos artigos 1 a 21 e pelo presente Anexo, estaria habilitado a invocar o benefício das faculdades mencionadas no artigo I.1, que aplicará as disposições do artigo II ou do artigo III, ou dos ambos, às obras cujo país de origem é um país que, em aplicação do item (ii) abaixo, aceita a aplicação destes artigos para tais obras, ou que é vinculado pelos artigos 1 a 21 e pelo presente Anexo; tal declaração pode se referir ao artigo V em lugar do artigo II;
ii) que aceita a aplicação do presente Anexo às obras das quais é ele o país de origem pelos países que fizeram uma declaração por força do item (i) acima ou uma notificação por força do artigo I.
2) Qualquer declaração em conformidade com o parágrafo I deve ser feita por escrito e depositada junto do Diretor-Geral, e entrará em vigor na data do seu depósito.
Em fé do que, os abaixo assinados, devidamente autorizados para este fim, assinaram o presente Ato.
Feito em Paris, em 24 de Julho de 1971.
185
Anexo 3 – Convenção de Roma
CONVENÇÃO INTERNACIONAL PARA PROTEÇÃO AOS ARTISTAS INTÉRPRETES OU EXECUTANTES,
AOS PRODUTORES DE FONOGRAMAS E AOS ORGANISMOS DE RADIODIFUSÃO.
Os Estados contratantes, animados do desejo de proteger os direitos dos artistas intérpretes ou executantes, dos produtores de fonogramas e dos organismos de radiodifusão, acordaram no seguinte: Artigo1° A proteção prevista pela presente Convenção deixa intacta e não afeta, de qualquer modo, a proteção do direito de autor sobre as obras literárias e artísticas. Deste modo, nenhuma disposição da presente Convenção poderá ser interpretada em prejuízo dessa proteção. Artigo 2 1. Para os fins da presente Convenção, entende-se por tratamento nacional o tratamento concedido pela legislação nacional do Estado Contratante, onde a proteção é pedida: a) aos artistas intérpretes ou executantes seus nacionais, para as execuções realizadas, fixadas pela primeira vez ou radiodifundidas no seu território; b) aos produtores de fonogramas seus nacionais, para os fonogramas publicados ou fixados pela primeira vez no seu território; c) aos organismos de radiodifusão cuja sede social esteja situada no seu território, para as emissões radiodifundidas pelos emissores situados nesse mesmo território. 2. O tratamento nacional será concedido nos termos da proteção expressamente garantida e das limitações expressamente previstas na presente Convenção. Artigo 3 Para os fins da presente Convenção, entende-se por: a) "artistas intérpretes ou executantes", os atores, cantores, músicos, dançarinos e outras pessoas que representem, cantem, recitem, declamem, interpretem ou executem, por qualquer forma, obras literárias ou artísticas; b) "fonograma", toda a fixação exclusivamente sonora dos sons de uma execução ou de outros sons, num suporte material; c) "produtor de fonogramas", a pessoa física ou jurídica que, pela primeira vez, fixa os sons de uma execução ou outros sons; d) "publicação", o fato de pôr à disposição do público, exemplares de um fonograma, em quantidade suficiente; e) "reprodução", a realização da cópia ou de várias cópias de uma fixação; f) "emissão de radiodifusão", a difusão de sons ou de imagens e sons, por meio de ondas radioelétricas, destinadas à recepção pelo público; g) "retransmissão", a emissão simultânea da emissão de um organismo de radiodifusão, efetuada por outro organismo de radiodifusão.
Artigo 4 Cada Estado Contratante concederá o tratamento nacional aos artistas intérpretes ou executantes sempre que se verifique uma das seguintes condições: a) se a execução se realizar num outro Estado Contratante; b) se a execução for fixada num fonograma protegido pelo artigo 5 da presente Convenção; c) se a execução, não fixada num fonograma, for radiodifundida através de uma emissão de radiodifusão protegida pelo artigo 6 da presente Convenção. Artigo 5 1. Cada Estado Contratante concederá o tratamento nacional aos produtores de fonogramas sempre que se verifique uma das seguintes condições: a) se o produtor do fonograma for nacional de outro Estado Contratante (critério da nacionalidade); b) se a primeira fixação de som for realizada num outro Estado Contratante (critério da fixação); c) se o fonograma for publicado pela primeira vez num outro Estado Contratante (critério da publicação). 2. Se um fonograma for publicado pela primeira vez num Estado não Contratante e, dentro dos trinta dias seguintes à primeira publicação, for também publicado num Estado Contratante (publicação simultânea), considerar-se-á como tendo sido publicado pela primeira vez num Estado Contratante. 3. Qualquer Estado Contratante pode declarar, por uma notificação dirigida ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, que não aplicará, ou o critério da publicação, ou o critério da fixação. Esta notificação poderá fazer-se no momento da ratificação, da aceitação ou da adesão ou, posteriormente, em qualquer outro momento; neste último caso, a declaração só terá efeito seis meses depois da data da notificação. Artigo 6 1. Cada Estado Contratante concederá o tratamento nacional aos organismos de radiodifusão, sempre que se verifique uma das seguintes condições: a) se a sede social do organismo de radiodifusão estiver situada num outro Estado Contratante; b) se a emissão for transmitida por um emissor situado no território de um outro Estado Contratante. 2. Qualquer Estado Contratante pode declarar, por uma notificação dirigida ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, que só concederá a proteção às emissões, se a sede social do organismo de radiodifusão estiver situada num outro Estado Contratante e a emissão for transmitida por um emissor situado no território do mesmo Estado Contratante. Esta notificação poderá fazer-se no momento da ratificação, da aceitação ou da adesão ou,
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posteriormente, em qualquer outro momento; neste último caso, a declaração só terá efeito seis meses depois da notificação. Artigo 7 1. A proteção aos artistas intérpretes ou executantes prevista na presente Convenção, compreenderá a faculdade de impedir: a) a radiodifusão e a comunicação ao público das suas execuções sem seu consentimento, exceto quando a execução utilizada para a radiodifusão ou para a comunicação ao público já seja uma execução radiodifundida ou fixada num fonograma; b) a fixação num suporte material sem seu consentimento, da sua execução não fixada; c) a reprodução sem seu consentimento de uma fixação da sua execução: (i) se a primeira fixação for feita sem seu consentimento; (ii) se a reprodução for feita para fins diferentes daqueles para os quais foi dado o consentimento; (iii) quando a primeira fixação, feita em virtude das disposições do artigo 15 da presente Convenção, for reproduzida para fins diferentes dos previstos nesse artigo; 2. (1) Compete à legislação nacional do Estado Contratante onde a proteção for pedida, regular a proteção contra a retransmissão, a fixação para fins de radiodifusão e a reprodução dessa fixação para fins de radiodifusão, quando o artista intérprete ou executante tenha autorizado a radiodifusão da execução. (2) As modalidades de utilização pelos organismos de radiodifusão das fixações feitas para fins de radiodifusão, serão reguladas pela legislação nacional do Estado Contratante onde a proteção for pedida. (3) Todavia, nos casos previstos nas alíneas (1) e (2) deste parágrafo, a legislação nacional não poderá privar os artistas intérpretes ou executantes da faculdade de estabelecer relações contratuais com os organismos de radiodifusão. Artigo 8 Um Estado Contratante pode determinar, na sua legislação nacional, o modo como serão representados no exercício dos seus direitos os artistas intérpretes ou executantes, quando vários artistas participem na mesma execução. Artigo 9 Qualquer Estado Contratante, pela sua legislação nacional, pode tornar extensiva a proteção prevista na presente Convenção aos artistas que não executem obras literárias ou artísticas. Artigo 10 Os produtores de fonogramas gozam do direito de autorizar ou proibir a reprodução direta ou indireta dos seus fonogramas. Artigo 11 Quando na sua legislação nacional um Estado Contratante exigir o cumprimento de formalidades, como condição para a proteção dos direitos dos produtores de fonogramas, dos artistas intérpretes ou executantes ou de ambos, em relação aos fonogramas, estas considerar-se-ão satisfeitas se todos os exemplares ou invólucros dos fonogramas publicados e existentes no comércio contiverem uma indicação constituída pelo símbolo P e pelo ano da primeira publicação, colocada de modo a indicar claramente que existe o direito de reclamar a proteção. Se os exemplares ou os invólucros não permitirem identificar o produtor ou o titular da licença concedida pelo produtor (pelo nome, marca ou outra designação apropriada), a menção deverá igualmente compreender o nome do
titular dos direitos do produtor do fonograma. Além disso, se os exemplares ou os invólucros não permitirem identificar os principais intérpretes ou executantes, a menção deverá compreender também o nome do titular dos direitos dos artistas, no país onde se realizou a fixação. Artigo 12 Quando um fonograma publicado com fins comerciais ou uma reprodução desse fonograma forem utilizados diretamente pela radiodifusão ou para qualquer comunicação ao público, o utilizador pagará uma remuneração eqüitativa e única aos artistas intérpretes ou executantes ou aos produtores de fonogramas ou aos dois. Na falta de acordo entre eles, a legislação nacional poderá determinar as condições de repartição desta remuneração. Artigo 13 Os organismos de radiodifusão gozam do direito de autorizar ou proibir: a) a retransmissão das suas emissões; b) a fixação das suas emissões num suporte material; c) a reprodução: (i) das fixações das suas emissões, sem seu consentimento; (ii) das fixações das suas emissões, feitas em virtude das disposições do artigo 15 da presente Convenção, se forem reproduzidas para fins diferentes dos previstos nesse artigo; d) a comunicação ao público das suas emissões de televisão, quando se efetue em lugares acessíveis ao público, mediante o pagamento de um direito de entrada; compete à legislação nacional do país onde a proteção deste direito é pedida, determinar as condições do exercício do mesmo direito. Artigo 14 A duração da proteção a conceder pela presente Convenção não poderá ser inferior a um período de vinte anos: a) para os fonogramas e para as execuções fixadas nestes fonogramas, a partir do fim do ano em que a fixação foi realizada; b) para as execuções não fixadas em fonogramas, a partir do fim do ano em que se realizou a execução; c) para as emissões de radiodifusão, a partir do fim do ano em que se realizou a emissão. Artigo 15 1. Qualquer Estado Contratante pode estabelecer na sua legislação nacional exceções à proteção concedida pela presente Convenção no caso de: a) utilização para uso privado; b) curtos fragmentos em relatos de acontecimentos de atualidade; c) fixação efêmera realizada por um organismo de radiodifusão, pelos seus próprios meios e para as suas próprias emissões; d) utilização destinada exclusivamente ao ensino ou à investigação científica. 2. Sem prejuízo das disposições do parágrafo 1 deste artigo, qualquer Estado Contratante tem a faculdade de prever, na sua legislação nacional de proteção aos artistas intérpretes ou executantes, aos produtores de fonogramas e aos organismos de radiodifusão, limitações da mesma natureza das que também são previstas na sua legislação nacional de proteção ao direito do autor sobre as obras literárias e artísticas. No entanto, não podem
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instituir-se licenças ou autorizações obrigatórias, senão na medida em que forem compatíveis com as disposições da presente Convenção. Artigo 16 1. Um Estado, ao tornar-se parte da presente Convenção, sujeita-se a todas as obrigações e goza de todas as vantagens nela previstas. Todavia, cada Estado poderá declarar, em qualquer momento, por uma notificação dirigida ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas: a) em relação ao artigo 12: (i) que não aplicará nenhuma das disposições do mesmo artigo 12; (ii) que não aplicará as disposições do artigo 12 quanto a determinadas utilizações; (iii) que não aplicará as disposições do artigo 12 quanto aos fonogramas cujo produtor não seja nacional de um Estado Contratante; (iv) que limitará a extensão e a duração da proteção prevista no artigo 12, quanto aos fonogramas cujo produtor seja nacional de outro Estado Contratante, na medida em que este Estado Contratante protege os fonogramas fixados pela primeira vez pelo nacional do Estado que fez a declaração; porém, se o Estado Contratante de que é nacional o produtor não conceder a proteção ao mesmo ou aos mesmos beneficiários como concede o Estado Contratante autor da declaração, não se considerará esta circunstância como constituindo uma diferença na extensão da proteção; b) em relação ao artigo 13, que não aplicará as disposições da alínea d) deste artigo; se um Estado contratante fizer tal declaração, os outros Estados Contratantes não ficam obrigados a conceder o direito previsto na alínea d) do artigo 13 aos organismos de radiodifusão que tenham a sede social situada no território daquele Estado. 2. A notificação prevista no parágrafo 1 do presente artigo, feita em data posterior à do depósito do instrumento de ratificação, de aceitação ou de adesão, só terá efeito seis meses depois de recebida a notificação. Artigo 17 Qualquer Estado que, nos termos da sua legislação nacional em vigor em 26 de Outubro de 1961, conceder uma proteção aos produtores de fonogramas apenas em função do critério da fixação, poderá declarar por uma notificação dirigida ao Secretário Geral das Nações Unidas com o instrumento de ratificação, de aceitação ou de adesão, que aplicará unicamente o critério da fixação para o efeito do artigo 5 da presente Convenção e que aplicará o critério da fixação em vez do critério da nacionalidade do produtor, para fins do parágrafo 1, alínea a), iii) e iv), do artigo 16 da presente Convenção. Artigo 18 O Estado Contratante que tenha feito as declarações previstas no parágrafo 3 do artigo 5, no parágrafo 2 do artigo 6, no parágrafo 1 do artigo 16, ou no artigo 17, poderá limitá-las ou retirá-las mediante nova notificação dirigida ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas. Artigo 19 Não obstante quaisquer outras disposições da presente Convenção, não será aplicável a artigo 7 quando um artista intérprete ou executante haja consentido a inclusão da sua execução numa fixação de imagens ou de imagens e sons. Artigo 20
1. A presente Convenção não prejudicará os direitos adquiridos em qualquer Estado Contratante antes da entrada em vigor da Convenção nesse Estado. 2. Nenhum Estado Contratante será obrigado a aplicar as disposições da presente Convenção às execuções ou às emissões de radiodifusão realizadas ou aos fonogramas gravados antes da entrada em vigor da presente Convenção nesse Estado. Artigo 21 A proteção concedida pela presente Convenção não poderá prejudicar qualquer outra proteção de que já se beneficiem os artistas intérpretes ou executantes, os produtores de fonogramas e os organismos de radiodifusão. Artigo 22 Os Estados Contratantes reservam-se o direito de estabelecer entre si acordos particulares, desde que tais acordos concedam aos artistas intérpretes ou executantes, aos produtores de fonogramas ou aos organismos de radiodifusão direitos mais amplos dos que são concedidos pela presente Convenção ou contenham outras disposições que não sejam contrárias à mesma. Artigo 23 A presente Convenção será depositada em poder do Secretário Geral da Organização das Nações Unidas. Até 30 de Junho de 1962, ficará aberta à assinatura dos Estados convidados para a Conferência Diplomática sobre a Proteção Internacional aos Artistas Intérpretes ou Executantes, aos produtores de fonogramas e aos organismos de radiodifusão, que sejam partes da Convenção Universal sobre o Direito de Autor ou membros da União Internacional para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas. Artigo 24 1. A presente Convenção será submetida à ratificação ou à aceitação dos Estados signatários. 2. A presente Convenção ficará aberta à adesão dos Estados convidados para a Conferência designada no artigo 23, assim como à adesão de todos os Estados membros da Organização das Nações Unidas, desde que o Estado aderente seja parte da Convenção Universal sobre Direito de Autor ou membro da União internacional para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas. 3. A ratificação, a aceitação ou a adesão far-se-ão pelo depósito de um instrumento bastante, entregue ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas. Artigo 25 1. A presente Convenção entrará em vigor três meses depois da data do depósito do sexto instrumento de ratificação, de aceitação ou de adesão. 2. Posteriormente, e em relação a cada Estado, a Convenção entrará em vigor três meses depois da data do depósito do respectivo instrumento de ratificação, de aceitação ou de adesão. Artigo 26 1. Cada Estado Contratante obriga-se a tomar as medidas necessárias para assegurar a aplicação da presente Convenção, segundo as disposições da sua legislação constitucional. 2. No momento do depósito do instrumento de ratificação, de aceitação ou de adesão, cada Estado deve estar em condições de aplicar as disposições da presente Convenção, em conformidade com a sua legislação nacional. Artigo 27
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1. Cada Estado poderá, no momento da ratificação, da aceitação ou da adesão ou posteriormente, declarar, por uma notificação dirigida ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, que a presente Convenção abrangerá o conjunto ou qualquer dos territórios por cujas relações internacionais seja responsável, com a condição de que seja aplicável a esses territórios a Convenção Universal sobre o Direito de Autor ou Convenção Internacional para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas. Essa notificação produzirá efeito três meses depois da data da sua recepção. 2. As declarações e notificações referidas no parágrafo 3 do artigo 5, no parágrafo 2 do artigo 6, no parágrafo 1 do artigo 16, no artigo 17 ou no artigo 18, poderão abranger o conjunto ou qualquer dos territórios referidos no parágrafo anterior deste artigo. Artigo 28 1. Qualquer Estado Contratante poderá denunciar a presente Convenção em nome próprio, ou em nome do conjunto ou qualquer dos territórios referidos no artigo 27 da presente Convenção . 2. A denúncia será feita por uma notificação dirigida ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, e terá efeito doze meses depois da data em que for recebida a notificação. 3. A faculdade de denúncia prevista no presente artigo não poderá ser exercida por um Estado Contratante antes de expirar um período de cinco anos, a partir da data em que a Convenção entrou em vigor no referido Estado. 4. Um Estado Contratante deixará se ser parte da presente Convenção desde que deixe de ser parte da Convenção Universal sobre o Direito de Autor ou membro da União Internacional para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas. 5. A presente Convenção deixará de ser aplicável aos territórios referidos no artigo 27, no momento em que também deixe de ser aplicável nestes territórios a Convenção Universal sobre o Direito de Autor ou a Convenção Internacional para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas. Artigo 29 1. Depois da presente Convenção estar em vigor durante cinco anos, qualquer Estado Contratante poderá pedir a convocação de uma conferência com o fim de rever a Convenção, mediante notificação dirigida ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas. O Secretário Geral notificará do pedido todos os Estados Contratantes. Se num prazo de seis meses depois da notificação dirigida pelo Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, pelo menos metade dos Estados Contratantes concordarem com o pedido formulado, o Secretário Geral informará do fato o Diretor Geral da Organização Internacional do Trabalho, o Diretor Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura e o Diretor da Repartição da União Internacional para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, que convocarão uma conferência de revisão, em colaboração com a Comissão intergovernamental prevista no artigo 32 da presente Convenção. 2. Todas as revisões da presente Convenção deverão ser adotadas pela maioria de dois terços dos Estados presentes à Conferência de revisão. Esta maioria deve compreender dois terços dos Estados que, à data da Conferência de revisão, sejam partes da Convenção. 3. Se for aprovada uma nova Convenção que importe a revisão total ou parcial da presente Convenção e se a nova Convenção não contiver disposições em contrário: a) a presente Convenção deixará de estar aberta à ratificação, à aceitação ou à adesão, a partir da data da entrada em vigor da nova Convenção revista;
b) a presente Convenção continuará em vigor nas relações entre os Estados Contratantes que não se tornarem partes da nova Convenção revista. Artigo 30 Todas as controvérsias entre dois ou mais Estados Contratantes, referentes à interpretação ou à aplicação da presente Convenção e que não sejam resolvidas por meio de negociações, serão submetidas, a pedido de uma das partes no diferendo, à Corte Internacional de Justiça, para esta se pronunciar sobre elas, salvo se os Estados em litígio acordarem em qualquer outra forma de solução. Artigo 31 Sem prejuízo do disposto no parágrafo 3 do artigo 5, no parágrafo 2 do artigo 6, no parágrafo 1 do artigo 16 e no artigo 17, não pode ser feita qualquer reserva à presente Convenção. Artigo 32 1. É instituída uma Comissão intergovernamental com o fim de: a) examinar as questões relativas à aplicação e ao funcionamento da presente Convenção; b) reunir as propostas e preparar a documentação para eventuais revisões da presente Convenção. 2. A Comissão de que trata este artigo será composta por representantes dos Estados Contratantes, escolhidos segundo uma repartição geográfica eqüitativa. O número dos membros da Comissão será de seis, se for de doze ou de menos de doze o número dos Estados Contratantes; de nove, se o número de Estados Contratantes for de treze a dezoito; e de doze, se o número de Estados Contratantes for superior a dezoito. 3. A Comissão constituir-se-á doze meses depois da Convenção entrar em vigor por eleição entre os Estados Contratantes que disporão de um voto cada um, eleição que será organizada pelo Diretor Geral da Organização Internacional do Trabalho, pelo Diretor Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, e pelo Diretor da Repartição da União Internacional para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, de acordo com as regras que tiverem sido aprovadas previamente pela maioria absoluta dos Estados Contratantes. 4. A Comissão elegerá um presidente e a mesa estabelecerá o regulamento visando especialmente o funcionamento futuro e a forma de renovação dos seus membros, de modo a assegurar o respeito pelo princípio da rotação entre os diversos Estados Contratantes. 5. A Secretaria da Comissão será composta por funcionários da Organização Internacional do Trabalho, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura e da Repartição da União internacional para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, designados respectivamente pelos Diretores Gerais e pelo Diretor das três instituições referidas. 6. A Comissão será convocada sempre que a maioria dos seus membros o julgue necessário, devendo as reuniões celebrar-se sucessivamente nas sedes da Organização Internacional do Trabalho, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, e da Repartição da União internacional para a proteção das obras literárias e artísticas. 7. As despesas dos membros da Comissão ficarão a cargo dos respectivos governos. Artigo 33 1. Os textos da presente Convenção, redigidos em francês, em inglês e em espanhol, serão igualmente autênticos.
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2. Além disso, serão redigidos textos oficiais da presente Convenção em alemão, em italiano e em português. Artigo 34 1. O Secretário Geral da Organização das Nações Unidas notificará os Estados convidados para a Conferência designada no artigo 23 da presente Convenção, e todos os Estados membros da Organização das Nações Unidas e, bem assim, o Diretor Geral da Organização Internacional do Trabalho, o Diretor Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, e o Diretor Geral da Repartição da União Internacional para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas: a) do depósito de cada instrumento de ratificação, de aceitação ou de adesão; b) da data da entrada em vigor da presente Convenção; c) de todas as notificações, declarações ou comunicações previstas na presente Convenção. d) De qualquer das situações previstas nos parágrafos 4 e 5 do artigo 28 da presente Convenção.
2. O Secretário Geral da Organização das Nações Unidas informará igualmente o Diretor Geral da Organização Internacional do Trabalho, o Diretor Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, e o Diretor da Repartição da União Internacional para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, das petições que lhe forem notificadas nos termos do artigo 29 da presente Convenção, assim como de toda a comunicação recebida dos Estados Contratantes para a revisão da presente Convenção. Em fé que os plenipotenciários abaixo assinados firmaram a presente Convenção. Feita em Roma, aos 26 de Outubro de 1961, num só exemplar em francês, em inglês e em espanhol. O Secretário Geral da Organização das Nações Unidas remeterá cópias autênticas, devidamente certificadas, a todos os Estados convidados para a Conferência designada no artigo 23 da presente Convenção e a todos os Estados membros da Organização das Nações Unidas, assim como ao Diretor Geral da Organização Internacional do Trabalho, ao Diretor Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, e ao Diretor Geral da Organização da União Internacional para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas
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Anexo 4 – Lei de Direitos Autorais (Lei n° 9.610/98)
LEI Nº 9.610, DE 19 DE FEVEREIRO DE 1998.
Altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Título I Disposições Preliminares
Art. 1º Esta Lei regula os direitos autorais, entendendo-se sob esta denominação os direitos de autor e os que lhes são conexos. Art. 2º Os estrangeiros domiciliados no exterior gozarão da proteção assegurada nos acordos, convenções e tratados em vigor no Brasil. Parágrafo único. Aplica-se o disposto nesta Lei aos nacionais ou pessoas domiciliadas em país que assegure aos brasileiros ou pessoas domiciliadas no Brasil a reciprocidade na proteção aos direitos autorais ou equivalentes. Art. 3º Os direitos autorais reputam-se, para os efeitos legais, bens móveis. Art. 4º Interpretam-se restritivamente os negócios jurídicos sobre os direitos autorais. Art. 5º Para os efeitos desta Lei, considera-se: I - publicação - o oferecimento de obra literária, artística ou científica ao conhecimento do público, com o consentimento do autor, ou de qualquer outro titular de direito de autor, por qualquer forma ou processo; II - transmissão ou emissão - a difusão de sons ou de sons e imagens, por meio de ondas radioelétricas; sinais de satélite; fio, cabo ou outro condutor; meios óticos ou qualquer outro processo eletromagnético; III - retransmissão - a emissão simultânea da transmissão de uma empresa por outra; IV - distribuição - a colocação à disposição do público do original ou cópia de obras literárias, artísticas ou científicas, interpretações ou execuções fixadas e fonogramas, mediante a venda, locação ou qualquer outra forma de transferência de propriedade ou posse; V - comunicação ao público - ato mediante o qual a obra é colocada ao alcance do público, por qualquer meio ou procedimento e que não consista na distribuição de exemplares; VI - reprodução - a cópia de um ou vários exemplares de uma obra literária, artística ou científica ou de um fonograma, de qualquer forma tangível, incluindo qualquer armazenamento permanente ou temporário por meios eletrônicos ou qualquer outro meio de fixação que venha a ser desenvolvido; VII - contrafação - a reprodução não autorizada; VIII - obra: a) em co-autoria - quando é criada em comum, por dois ou mais autores; b) anônima - quando não se indica o nome do autor, por sua vontade ou por ser desconhecido;
c) pseudônima - quando o autor se oculta sob nome suposto; d) inédita - a que não haja sido objeto de publicação; e) póstuma - a que se publique após a morte do autor; f) originária - a criação primígena; g) derivada - a que, constituindo criação intelectual nova, resulta da transformação de obra originária; h) coletiva - a criada por iniciativa, organização e responsabilidade de uma pessoa física ou jurídica, que a publica sob seu nome ou marca e que é constituída pela participação de diferentes autores, cujas contribuições se fundem numa criação autônoma; i) audiovisual - a que resulta da fixação de imagens com ou sem som, que tenha a finalidade de criar, por meio de sua reprodução, a impressão de movimento, independentemente dos processos de sua captação, do suporte usado inicial ou posteriormente para fixá-lo, bem como dos meios utilizados para sua veiculação; IX - fonograma - toda fixação de sons de uma execução ou interpretação ou de outros sons, ou de uma representação de sons que não seja uma fixação incluída em uma obra audiovisual; X - editor - a pessoa física ou jurídica à qual se atribui o direito exclusivo de reprodução da obra e o dever de divulgá-la, nos limites previstos no contrato de edição; XI - produtor - a pessoa física ou jurídica que toma a iniciativa e tem a responsabilidade econômica da primeira fixação do fonograma ou da obra audiovisual, qualquer que seja a natureza do suporte utilizado; XII - radiodifusão - a transmissão sem fio, inclusive por satélites, de sons ou imagens e sons ou das representações desses, para recepção ao público e a transmissão de sinais codificados, quando os meios de decodificação sejam oferecidos ao público pelo organismo de radiodifusão ou com seu consentimento; XIII - artistas intérpretes ou executantes - todos os atores, cantores, músicos, bailarinos ou outras pessoas que representem um papel, cantem, recitem, declamem, interpretem ou executem em qualquer forma obras literárias ou artísticas ou expressões do folclore. Art. 6º Não serão de domínio da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios as obras por eles simplesmente subvencionadas.
Título II Das Obras Intelectuais
Capítulo I
Das Obras Protegidas Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como:
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I - os textos de obras literárias, artísticas ou científicas; II - as conferências, alocuções, sermões e outras obras da mesma natureza; III - as obras dramáticas e dramático-musicais; IV - as obras coreográficas e pantomímicas, cuja execução cênica se fixe por escrito ou por outra qualquer forma; V - as composições musicais, tenham ou não letra; VI - as obras audiovisuais, sonorizadas ou não, inclusive as cinematográficas; VII - as obras fotográficas e as produzidas por qualquer processo análogo ao da fotografia; VIII - as obras de desenho, pintura, gravura, escultura, litografia e arte cinética; IX - as ilustrações, cartas geográficas e outras obras da mesma natureza; X - os projetos, esboços e obras plásticas concernentes à geografia, engenharia, topografia, arquitetura, paisagismo, cenografia e ciência; XI - as adaptações, traduções e outras transformações de obras originais, apresentadas como criação intelectual nova; XII - os programas de computador; XIII - as coletâneas ou compilações, antologias, enciclopédias, dicionários, bases de dados e outras obras, que, por sua seleção, organização ou disposição de seu conteúdo, constituam uma criação intelectual. § 1º Os programas de computador são objeto de legislação específica, observadas as disposições desta Lei que lhes sejam aplicáveis. § 2º A proteção concedida no inciso XIII não abarca os dados ou materiais em si mesmos e se entende sem prejuízo de quaisquer direitos autorais que subsistam a respeito dos dados ou materiais contidos nas obras. § 3º No domínio das ciências, a proteção recairá sobre a forma literária ou artística, não abrangendo o seu conteúdo científico ou técnico, sem prejuízo dos direitos que protegem os demais campos da propriedade imaterial. Art. 8º Não são objeto de proteção como direitos autorais de que trata esta Lei: I - as idéias, procedimentos normativos, sistemas, métodos, projetos ou conceitos matemáticos como tais; II - os esquemas, planos ou regras para realizar atos mentais, jogos ou negócios; III - os formulários em branco para serem preenchidos por qualquer tipo de informação, científica ou não, e suas instruções; IV - os textos de tratados ou convenções, leis, decretos, regulamentos, decisões judiciais e demais atos oficiais; V - as informações de uso comum tais como calendários, agendas, cadastros ou legendas; VI - os nomes e títulos isolados; VII - o aproveitamento industrial ou comercial das idéias contidas nas obras.
Art. 9º À cópia de obra de arte plástica feita pelo próprio autor é assegurada a mesma proteção de que goza o original. Art. 10. A proteção à obra intelectual abrange o seu título, se original e inconfundível com o de obra do mesmo gênero, divulgada anteriormente por outro autor. Parágrafo único. O título de publicações periódicas, inclusive jornais, é protegido até um ano após a saída do seu último número, salvo se forem anuais, caso em que esse prazo se elevará a dois anos.
Capítulo II Da Autoria das Obras Intelectuais
Art. 11. Autor é a pessoa física criadora de obra literária, artística ou científica. Parágrafo único. A proteção concedida ao autor poderá aplicar-se às pessoas jurídicas nos casos previstos nesta Lei. Art. 12. Para se identificar como autor, poderá o criador da obra literária, artística ou científica usar de seu nome civil, completo ou abreviado até por suas iniciais, de pseudônimo ou qualquer outro sinal convencional. Art. 13. Considera-se autor da obra intelectual, não havendo prova em contrário, aquele que, por uma das modalidades de identificação referidas no artigo anterior, tiver, em conformidade com o uso, indicada ou anunciada essa qualidade na sua utilização. Art. 14. É titular de direitos de autor quem adapta, traduz, arranja ou orquestra obra caída no domínio público, não podendo opor-se a outra adaptação, arranjo, orquestração ou tradução, salvo se for cópia da sua. Art. 15. A co-autoria da obra é atribuída àqueles em cujo nome, pseudônimo ou sinal convencional for utilizada. § 1º Não se considera co-autor quem simplesmente auxiliou o autor na produção da obra literária, artística ou científica, revendo-a, atualizando-a, bem como fiscalizando ou dirigindo sua edição ou apresentação por qualquer meio. § 2º Ao co-autor, cuja contribuição possa ser utilizada separadamente, são asseguradas todas as faculdades inerentes à sua criação como obra individual, vedada, porém, a utilização que possa acarretar prejuízo à exploração da obra comum. Art. 16. São co-autores da obra audiovisual o autor do assunto ou argumento literário, musical ou lítero-musical e o diretor. Parágrafo único. Consideram-se co-autores de desenhos animados os que criam os desenhos utilizados na obra audiovisual. Art. 17. É assegurada a proteção às participações individuais em obras coletivas. § 1º Qualquer dos participantes, no exercício de seus direitos morais, poderá proibir que se indique ou anuncie seu nome na obra coletiva, sem prejuízo do direito de haver a remuneração contratada. § 2º Cabe ao organizador a titularidade dos direitos patrimoniais sobre o conjunto da obra coletiva. § 3º O contrato com o organizador especificará a contribuição do participante, o prazo para entrega ou realização, a remuneração e demais condições para sua execução.
Capítulo III Do Registro das Obras Intelectuais
Art. 18. A proteção aos direitos de que trata esta Lei independe de registro.
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Art. 19. É facultado ao autor registrar a sua obra no órgão público definido no caput e no § 1º do art. 17 da Lei nº 5.988, de 14 de dezembro de 1973. Art. 20. Para os serviços de registro previstos nesta Lei será cobrada retribuição, cujo valor e processo de recolhimento serão estabelecidos por ato do titular do órgão da administração pública federal a que estiver vinculado o registro das obras intelectuais. Art. 21. Os serviços de registro de que trata esta Lei serão organizados conforme preceitua o § 2º do art. 17 da Lei nº 5.988, de 14 de dezembro de 1973.
Título III Dos Direitos do Autor
Capítulo I
Disposições Preliminares Art. 22. Pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que criou. Art. 23. Os co-autores da obra intelectual exercerão, de comum acordo, os seus direitos, salvo convenção em contrário.
Capítulo II Dos Direitos Morais do Autor
Art. 24. São direitos morais do autor: I - o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra; II - o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra; III - o de conservar a obra inédita; IV - o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra; V - o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada; VI - o de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma de utilização já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem afronta à sua reputação e imagem; VII - o de ter acesso a exemplar único e raro da obra, quando se encontre legitimamente em poder de outrem, para o fim de, por meio de processo fotográfico ou assemelhado, ou audiovisual, preservar sua memória, de forma que cause o menor inconveniente possível a seu detentor, que, em todo caso, será indenizado de qualquer dano ou prejuízo que lhe seja causado. § 1º Por morte do autor, transmitem-se a seus sucessores os direitos a que se referem os incisos I a IV. § 2º Compete ao Estado a defesa da integridade e autoria da obra caída em domínio público. § 3º Nos casos dos incisos V e VI, ressalvam-se as prévias indenizações a terceiros, quando couberem. Art. 25. Cabe exclusivamente ao diretor o exercício dos direitos morais sobre a obra audiovisual. Art. 26. O autor poderá repudiar a autoria de projeto arquitetônico alterado sem o seu consentimento durante a execução ou após a conclusão da construção. Parágrafo único. O proprietário da construção responde pelos danos que causar ao autor sempre que, após o repúdio, der como sendo daquele a autoria do projeto repudiado.
Art. 27. Os direitos morais do autor são inalienáveis e irrenunciáveis.
Capítulo III Dos Direitos Patrimoniais do Autor e de sua Duração
Art. 28. Cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica. Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como: I - a reprodução parcial ou integral; II - a edição; III - a adaptação, o arranjo musical e quaisquer outras transformações; IV - a tradução para qualquer idioma; V - a inclusão em fonograma ou produção audiovisual; VI - a distribuição, quando não intrínseca ao contrato firmado pelo autor com terceiros para uso ou exploração da obra; VII - a distribuição para oferta de obras ou produções mediante cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou qualquer outro sistema que permita ao usuário realizar a seleção da obra ou produção para percebê-la em um tempo e lugar previamente determinados por quem formula a demanda, e nos casos em que o acesso às obras ou produções se faça por qualquer sistema que importe em pagamento pelo usuário; VIII - a utilização, direta ou indireta, da obra literária, artística ou científica, mediante: a) representação, recitação ou declamação; b) execução musical; c) emprego de alto-falante ou de sistemas análogos; d) radiodifusão sonora ou televisiva; e) captação de transmissão de radiodifusão em locais de freqüência coletiva; f) sonorização ambiental; g) a exibição audiovisual, cinematográfica ou por processo assemelhado; h) emprego de satélites artificiais; i) emprego de sistemas óticos, fios telefônicos ou não, cabos de qualquer tipo e meios de comunicação similares que venham a ser adotados; j) exposição de obras de artes plásticas e figurativas; IX - a inclusão em base de dados, o armazenamento em computador, a microfilmagem e as demais formas de arquivamento do gênero; X - quaisquer outras modalidades de utilização existentes ou que venham a ser inventadas. Art. 30. No exercício do direito de reprodução, o titular dos direitos autorais poderá colocar à disposição do público a obra, na forma, local e pelo tempo que desejar, a título oneroso ou gratuito. § 1º O direito de exclusividade de reprodução não será aplicável quando ela for temporária e apenas tiver o propósito de tornar a obra, fonograma ou interpretação perceptível em meio eletrônico ou quando for de natureza transitória e incidental, desde
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que ocorra no curso do uso devidamente autorizado da obra, pelo titular. § 2º Em qualquer modalidade de reprodução, a quantidade de exemplares será informada e controlada, cabendo a quem reproduzir a obra a responsabilidade de manter os registros que permitam, ao autor, a fiscalização do aproveitamento econômico da exploração. Art. 31. As diversas modalidades de utilização de obras literárias, artísticas ou científicas ou de fonogramas são independentes entre si, e a autorização concedida pelo autor, ou pelo produtor, respectivamente, não se estende a quaisquer das demais. Art. 32. Quando uma obra feita em regime de co-autoria não for divisível, nenhum dos co-autores, sob pena de responder por perdas e danos, poderá, sem consentimento dos demais, publicá-la ou autorizar-lhe a publicação, salvo na coleção de suas obras completas. § 1º Havendo divergência, os co-autores decidirão por maioria. § 2º Ao co-autor dissidente é assegurado o direito de não contribuir para as despesas de publicação, renunciando a sua parte nos lucros, e o de vedar que se inscreva seu nome na obra. § 3º Cada co-autor pode, individualmente, sem aquiescência dos outros, registrar a obra e defender os próprios direitos contra terceiros. Art. 33. Ninguém pode reproduzir obra que não pertença ao domínio público, a pretexto de anotá-la, comentá-la ou melhorá-la, sem permissão do autor. Parágrafo único. Os comentários ou anotações poderão ser publicados separadamente. Art. 34. As cartas missivas, cuja publicação está condicionada à permissão do autor, poderão ser juntadas como documento de prova em processos administrativos e judiciais. Art. 35. Quando o autor, em virtude de revisão, tiver dado à obra versão definitiva, não poderão seus sucessores reproduzir versões anteriores. Art. 36. O direito de utilização econômica dos escritos publicados pela imprensa, diária ou periódica, com exceção dos assinados ou que apresentem sinal de reserva, pertence ao editor, salvo convenção em contrário. Parágrafo único. A autorização para utilização econômica de artigos assinados, para publicação em diários e periódicos, não produz efeito além do prazo da periodicidade acrescido de vinte dias, a contar de sua publicação, findo o qual recobra o autor o seu direito. Art. 37. A aquisição do original de uma obra, ou de exemplar, não confere ao adquirente qualquer dos direitos patrimoniais do autor, salvo convenção em contrário entre as partes e os casos previstos nesta Lei. Art. 38. O autor tem o direito, irrenunciável e inalienável, de perceber, no mínimo, cinco por cento sobre o aumento do preço eventualmente verificável em cada revenda de obra de arte ou manuscrito, sendo originais, que houver alienado. Parágrafo único. Caso o autor não perceba o seu direito de seqüência no ato da revenda, o vendedor é considerado depositário da quantia a ele devida, salvo se a operação for realizada por leiloeiro, quando será este o depositário. Art. 39. Os direitos patrimoniais do autor, excetuados os rendimentos resultantes de sua exploração, não se comunicam, salvo pacto antenupcial em contrário.
Art. 40. Tratando-se de obra anônima ou pseudônima, caberá a quem publicá-la o exercício dos direitos patrimoniais do autor. Parágrafo único. O autor que se der a conhecer assumirá o exercício dos direitos patrimoniais, ressalvados os direitos adquiridos por terceiros. Art. 41. Os direitos patrimoniais do autor perduram por setenta anos contados de 1° de janeiro do ano subseqüente ao de seu falecimento, obedecida a ordem sucessória da lei civil. Parágrafo único. Aplica-se às obras póstumas o prazo de proteção a que alude o caput deste artigo. Art. 42. Quando a obra literária, artística ou científica realizada em co-autoria for indivisível, o prazo previsto no artigo anterior será contado da morte do último dos co-autores sobreviventes. Parágrafo único. Acrescer-se-ão aos dos sobreviventes os direitos do co-autor que falecer sem sucessores. Art. 43. Será de setenta anos o prazo de proteção aos direitos patrimoniais sobre as obras anônimas ou pseudônimas, contado de 1° de janeiro do ano imediatamente posterior ao da primeira publicação. Parágrafo único. Aplicar-se-á o disposto no art. 41 e seu parágrafo único, sempre que o autor se der a conhecer antes do termo do prazo previsto no caput deste artigo. Art. 44. O prazo de proteção aos direitos patrimoniais sobre obras audiovisuais e fotográficas será de setenta anos, a contar de 1° de janeiro do ano subseqüente ao de sua divulgação. Art. 45. Além das obras em relação às quais decorreu o prazo de proteção aos direitos patrimoniais, pertencem ao domínio público: I - as de autores falecidos que não tenham deixado sucessores; II - as de autor desconhecido, ressalvada a proteção legal aos conhecimentos étnicos e tradicionais.
Capítulo IV Das Limitações aos Direitos Autorais
Art. 46. Não constitui ofensa aos direitos autorais: I - a reprodução: a) na imprensa diária ou periódica, de notícia ou de artigo informativo, publicado em diários ou periódicos, com a menção do nome do autor, se assinados, e da publicação de onde foram transcritos; b) em diários ou periódicos, de discursos pronunciados em reuniões públicas de qualquer natureza; c) de retratos, ou de outra forma de representação da imagem, feitos sob encomenda, quando realizada pelo proprietário do objeto encomendado, não havendo a oposição da pessoa neles representada ou de seus herdeiros; d) de obras literárias, artísticas ou científicas, para uso exclusivo de deficientes visuais, sempre que a reprodução, sem fins comerciais, seja feita mediante o sistema Braille ou outro procedimento em qualquer suporte para esses destinatários; II - a reprodução, em um só exemplar de pequenos trechos, para uso privado do copista, desde que feita por este, sem intuito de lucro;
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III - a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra; IV - o apanhado de lições em estabelecimentos de ensino por aqueles a quem elas se dirigem, vedada sua publicação, integral ou parcial, sem autorização prévia e expressa de quem as ministrou; V - a utilização de obras literárias, artísticas ou científicas, fonogramas e transmissão de rádio e televisão em estabelecimentos comerciais, exclusivamente para demonstração à clientela, desde que esses estabelecimentos comercializem os suportes ou equipamentos que permitam a sua utilização; VI - a representação teatral e a execução musical, quando realizadas no recesso familiar ou, para fins exclusivamente didáticos, nos estabelecimentos de ensino, não havendo em qualquer caso intuito de lucro; VII - a utilização de obras literárias, artísticas ou científicas para produzir prova judiciária ou administrativa; VIII - a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores. Art. 47. São livres as paráfrases e paródias que não forem verdadeiras reproduções da obra originária nem lhe implicarem descrédito. Art. 48. As obras situadas permanentemente em logradouros públicos podem ser representadas livremente, por meio de pinturas, desenhos, fotografias e procedimentos audiovisuais.
Capítulo V Da Transferência dos Direitos de Autor
Art. 49. Os direitos de autor poderão ser total ou parcialmente transferidos a terceiros, por ele ou por seus sucessores, a título universal ou singular, pessoalmente ou por meio de representantes com poderes especiais, por meio de licenciamento, concessão, cessão ou por outros meios admitidos em Direito, obedecidas as seguintes limitações: I - a transmissão total compreende todos os direitos de autor, salvo os de natureza moral e os expressamente excluídos por lei; II - somente se admitirá transmissão total e definitiva dos direitos mediante estipulação contratual escrita; III - na hipótese de não haver estipulação contratual escrita, o prazo máximo será de cinco anos; IV - a cessão será válida unicamente para o país em que se firmou o contrato, salvo estipulação em contrário; V - a cessão só se operará para modalidades de utilização já existentes à data do contrato; VI - não havendo especificações quanto à modalidade de utilização, o contrato será interpretado restritivamente, entendendo-se como limitada apenas a uma que seja aquela indispensável ao cumprimento da finalidade do contrato. Art. 50. A cessão total ou parcial dos direitos de autor, que se fará sempre por escrito, presume-se onerosa. § 1º Poderá a cessão ser averbada à margem do registro a que se refere o art. 19 desta Lei, ou, não estando a obra registrada, poderá o instrumento ser registrado em Cartório de Títulos e Documentos.
§ 2º Constarão do instrumento de cessão como elementos essenciais seu objeto e as condições de exercício do direito quanto a tempo, lugar e preço. Art. 51. A cessão dos direitos de autor sobre obras futuras abrangerá, no máximo, o período de cinco anos. Parágrafo único. O prazo será reduzido a cinco anos sempre que indeterminado ou superior, diminuindo-se, na devida proporção, o preço estipulado. Art. 52. A omissão do nome do autor, ou de co-autor, na divulgação da obra não presume o anonimato ou a cessão de seus direitos.
Título IV Da Utilização de Obras Intelectuais e dos Fonogramas
Capítulo I Da Edição
Art. 53. Mediante contrato de edição, o editor, obrigando-se a reproduzir e a divulgar a obra literária, artística ou científica, fica autorizado, em caráter de exclusividade, a publicá-la e a explorá-la pelo prazo e nas condições pactuadas com o autor. Parágrafo único. Em cada exemplar da obra o editor mencionará: I - o título da obra e seu autor; II - no caso de tradução, o título original e o nome do tradutor; III - o ano de publicação; IV - o seu nome ou marca que o identifique. Art. 54. Pelo mesmo contrato pode o autor obrigar-se à feitura de obra literária, artística ou científica em cuja publicação e divulgação se empenha o editor. Art. 55. Em caso de falecimento ou de impedimento do autor para concluir a obra, o editor poderá: I - considerar resolvido o contrato, mesmo que tenha sido entregue parte considerável da obra; II - editar a obra, sendo autônoma, mediante pagamento proporcional do preço; III - mandar que outro a termine, desde que consintam os sucessores e seja o fato indicado na edição. Parágrafo único. É vedada a publicação parcial, se o autor manifestou a vontade de só publicá-la por inteiro ou se assim o decidirem seus sucessores. Art. 56. Entende-se que o contrato versa apenas sobre uma edição, se não houver cláusula expressa em contrário. Parágrafo único. No silêncio do contrato, considera-se que cada edição se constitui de três mil exemplares. Art. 57. O preço da retribuição será arbitrado, com base nos usos e costumes, sempre que no contrato não a tiver estipulado expressamente o autor. Art. 58. Se os originais forem entregues em desacordo com o ajustado e o editor não os recusar nos trinta dias seguintes ao do recebimento, ter-se-ão por aceitas as alterações introduzidas pelo autor. Art. 59. Quaisquer que sejam as condições do contrato, o editor é obrigado a facultar ao autor o exame da escrituração na
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parte que lhe corresponde, bem como a informá-lo sobre o estado da edição. Art. 60. Ao editor compete fixar o preço da venda, sem, todavia, poder elevá-lo a ponto de embaraçar a circulação da obra. Art. 61. O editor será obrigado a prestar contas mensais ao autor sempre que a retribuição deste estiver condicionada à venda da obra, salvo se prazo diferente houver sido convencionado. Art. 62. A obra deverá ser editada em dois anos da celebração do contrato, salvo prazo diverso estipulado em convenção. Parágrafo único. Não havendo edição da obra no prazo legal ou contratual, poderá ser rescindido o contrato, respondendo o editor por danos causados. Art. 63. Enquanto não se esgotarem as edições a que tiver direito o editor, não poderá o autor dispor de sua obra, cabendo ao editor o ônus da prova. § 1º Na vigência do contrato de edição, assiste ao editor o direito de exigir que se retire de circulação edição da mesma obra feita por outrem. § 2º Considera-se esgotada a edição quando restarem em estoque, em poder do editor, exemplares em número inferior a dez por cento do total da edição. Art. 64. Somente decorrido um ano de lançamento da edição, o editor poderá vender, como saldo, os exemplares restantes, desde que o autor seja notificado de que, no prazo de trinta dias, terá prioridade na aquisição dos referidos exemplares pelo preço de saldo. Art. 65. Esgotada a edição, e o editor, com direito a outra, não a publicar, poderá o autor notificá-lo a que o faça em certo prazo, sob pena de perder aquele direito, além de responder por danos. Art. 66. O autor tem o direito de fazer, nas edições sucessivas de suas obras, as emendas e alterações que bem lhe aprouver. Parágrafo único. O editor poderá opor-se às alterações que lhe prejudiquem os interesses, ofendam sua reputação ou aumentem sua responsabilidade. Art. 67. Se, em virtude de sua natureza, for imprescindível a atualização da obra em novas edições, o editor, negando-se o autor a fazê-la, dela poderá encarregar outrem, mencionando o fato na edição.
Capítulo II Da Comunicação ao Público
Art. 68. Sem prévia e expressa autorização do autor ou titular, não poderão ser utilizadas obras teatrais, composições musicais ou lítero-musicais e fonogramas, em representações e execuções públicas. § 1º Considera-se representação pública a utilização de obras teatrais no gênero drama, tragédia, comédia, ópera, opereta, balé, pantomimas e assemelhadas, musicadas ou não, mediante a participação de artistas, remunerados ou não, em locais de freqüência coletiva ou pela radiodifusão, transmissão e exibição cinematográfica. § 2º Considera-se execução pública a utilização de composições musicais ou lítero-musicais, mediante a participação de artistas, remunerados ou não, ou a utilização de fonogramas e obras audiovisuais, em locais de freqüência coletiva, por quaisquer processos, inclusive a radiodifusão ou transmissão por qualquer modalidade, e a exibição cinematográfica. § 3º Consideram-se locais de freqüência coletiva os teatros, cinemas, salões de baile ou concertos, boates, bares, clubes ou associações de qualquer natureza, lojas, estabelecimentos
comerciais e industriais, estádios, circos, feiras, restaurantes, hotéis, motéis, clínicas, hospitais, órgãos públicos da administração direta ou indireta, fundacionais e estatais, meios de transporte de passageiros terrestre, marítimo, fluvial ou aéreo, ou onde quer que se representem, executem ou transmitam obras literárias, artísticas ou científicas. § 4º Previamente à realização da execução pública, o empresário deverá apresentar ao escritório central, previsto no art. 99, a comprovação dos recolhimentos relativos aos direitos autorais. § 5º Quando a remuneração depender da freqüência do público, poderá o empresário, por convênio com o escritório central, pagar o preço após a realização da execução pública. § 6º O empresário entregará ao escritório central, imediatamente após a execução pública ou transmissão, relação completa das obras e fonogramas utilizados, indicando os nomes dos respectivos autores, artistas e produtores. § 7º As empresas cinematográficas e de radiodifusão manterão à imediata disposição dos interessados, cópia autêntica dos contratos, ajustes ou acordos, individuais ou coletivos, autorizando e disciplinando a remuneração por execução pública das obras musicais e fonogramas contidas em seus programas ou obras audiovisuais. Art. 69. O autor, observados os usos locais, notificará o empresário do prazo para a representação ou execução, salvo prévia estipulação convencional. Art. 70. Ao autor assiste o direito de opor-se à representação ou execução que não seja suficientemente ensaiada, bem como fiscalizá-la, tendo, para isso, livre acesso durante as representações ou execuções, no local onde se realizam. Art. 71. O autor da obra não pode alterar-lhe a substância, sem acordo com o empresário que a faz representar. Art. 72. O empresário, sem licença do autor, não pode entregar a obra a pessoa estranha à representação ou à execução. Art. 73. Os principais intérpretes e os diretores de orquestras ou coro, escolhidos de comum acordo pelo autor e pelo produtor, não podem ser substituídos por ordem deste, sem que aquele consinta. Art. 74. O autor de obra teatral, ao autorizar a sua tradução ou adaptação, poderá fixar prazo para utilização dela em representações públicas. Parágrafo único. Após o decurso do prazo a que se refere este artigo, não poderá opor-se o tradutor ou adaptador à utilização de outra tradução ou adaptação autorizada, salvo se for cópia da sua. Art. 75. Autorizada a representação de obra teatral feita em co-autoria, não poderá qualquer dos co-autores revogar a autorização dada, provocando a suspensão da temporada contratualmente ajustada. Art. 76. É impenhorável a parte do produto dos espetáculos reservada ao autor e aos artistas.
Capítulo III Da Utilização da Obra de Arte Plástica
Art. 77. Salvo convenção em contrário, o autor de obra de arte plástica, ao alienar o objeto em que ela se materializa, transmite o direito de expô-la, mas não transmite ao adquirente o direito de reproduzi-la. Art. 78. A autorização para reproduzir obra de arte plástica, por qualquer processo, deve se fazer por escrito e se presume onerosa.
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Capítulo IV Da Utilização da Obra Fotográfica
Art. 79. O autor de obra fotográfica tem direito a reproduzi-la e colocá-la à venda, observadas as restrições à exposição, reprodução e venda de retratos, e sem prejuízo dos direitos de autor sobre a obra fotografada, se de artes plásticas protegidas. § 1º A fotografia, quando utilizada por terceiros, indicará de forma legível o nome do seu autor. § 2º É vedada a reprodução de obra fotográfica que não esteja em absoluta consonância com o original, salvo prévia autorização do autor.
Capítulo V Da Utilização de Fonograma
Art. 80. Ao publicar o fonograma, o produtor mencionará em cada exemplar: I - o título da obra incluída e seu autor; II - o nome ou pseudônimo do intérprete; III - o ano de publicação; IV - o seu nome ou marca que o identifique.
Capítulo VI Da Utilização da Obra Audiovisual
Art. 81. A autorização do autor e do intérprete de obra literária, artística ou científica para produção audiovisual implica, salvo disposição em contrário, consentimento para sua utilização econômica. § 1º A exclusividade da autorização depende de cláusula expressa e cessa dez anos após a celebração do contrato. § 2º Em cada cópia da obra audiovisual, mencionará o produtor: I - o título da obra audiovisual; II - os nomes ou pseudônimos do diretor e dos demais co-autores; III - o título da obra adaptada e seu autor, se for o caso; IV - os artistas intérpretes; V - o ano de publicação; VI - o seu nome ou marca que o identifique. Art. 82. O contrato de produção audiovisual deve estabelecer: I - a remuneração devida pelo produtor aos co-autores da obra e aos artistas intérpretes e executantes, bem como o tempo, lugar e forma de pagamento; II - o prazo de conclusão da obra; III - a responsabilidade do produtor para com os co-autores, artistas intérpretes ou executantes, no caso de co-produção. Art. 83. O participante da produção da obra audiovisual que interromper, temporária ou definitivamente, sua atuação, não poderá opor-se a que esta seja utilizada na obra nem a que terceiro o substitua, resguardados os direitos que adquiriu quanto à parte já executada. Art. 84. Caso a remuneração dos co-autores da obra audiovisual dependa dos rendimentos de sua utilização econômica,
o produtor lhes prestará contas semestralmente, se outro prazo não houver sido pactuado. Art. 85. Não havendo disposição em contrário, poderão os co-autores da obra audiovisual utilizar-se, em gênero diverso, da parte que constitua sua contribuição pessoal. Parágrafo único. Se o produtor não concluir a obra audiovisual no prazo ajustado ou não iniciar sua exploração dentro de dois anos, a contar de sua conclusão, a utilização a que se refere este artigo será livre. Art. 86. Os direitos autorais de execução musical relativos a obras musicais, lítero-musicais e fonogramas incluídos em obras audiovisuais serão devidos aos seus titulares pelos responsáveis dos locais ou estabelecimentos a que alude o § 3o do art. 68 desta Lei, que as exibirem, ou pelas emissoras de televisão que as transmitirem.
Capítulo VII Da Utilização de Bases de Dados
Art. 87. O titular do direito patrimonial sobre uma base de dados terá o direito exclusivo, a respeito da forma de expressão da estrutura da referida base, de autorizar ou proibir: I - sua reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo; II - sua tradução, adaptação, reordenação ou qualquer outra modificação; III - a distribuição do original ou cópias da base de dados ou a sua comunicação ao público; IV - a reprodução, distribuição ou comunicação ao público dos resultados das operações mencionadas no inciso II deste artigo.
Capítulo VIII Da Utilização da Obra Coletiva
Art. 88. Ao publicar a obra coletiva, o organizador mencionará em cada exemplar: I - o título da obra; II - a relação de todos os participantes, em ordem alfabética, se outra não houver sido convencionada; III - o ano de publicação; IV - o seu nome ou marca que o identifique. Parágrafo único. Para valer-se do disposto no § 1º do art. 17, deverá o participante notificar o organizador, por escrito, até a entrega de sua participação.
Título V Dos Direitos Conexos
Capítulo I
Disposições Preliminares Art. 89. As normas relativas aos direitos de autor aplicam-se, no que couber, aos direitos dos artistas intérpretes ou executantes, dos produtores fonográficos e das empresas de radiodifusão. Parágrafo único. A proteção desta Lei aos direitos previstos neste artigo deixa intactas e não afeta as garantias asseguradas aos autores das obras literárias, artísticas ou científicas.
Capítulo II Dos Direitos dos Artistas Intérpretes ou Executantes
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Art. 90. Tem o artista intérprete ou executante o direito exclusivo de, a título oneroso ou gratuito, autorizar ou proibir: I - a fixação de suas interpretações ou execuções; II - a reprodução, a execução pública e a locação das suas interpretações ou execuções fixadas; III - a radiodifusão das suas interpretações ou execuções, fixadas ou não; IV - a colocação à disposição do público de suas interpretações ou execuções, de maneira que qualquer pessoa a elas possa ter acesso, no tempo e no lugar que individualmente escolherem; V - qualquer outra modalidade de utilização de suas interpretações ou execuções. § 1º Quando na interpretação ou na execução participarem vários artistas, seus direitos serão exercidos pelo diretor do conjunto. § 2º A proteção aos artistas intérpretes ou executantes estende-se à reprodução da voz e imagem, quando associadas às suas atuações. Art. 91. As empresas de radiodifusão poderão realizar fixações de interpretação ou execução de artistas que as tenham permitido para utilização em determinado número de emissões, facultada sua conservação em arquivo público. Parágrafo único. A reutilização subseqüente da fixação, no País ou no exterior, somente será lícita mediante autorização escrita dos titulares de bens intelectuais incluídos no programa, devida uma remuneração adicional aos titulares para cada nova utilização. Art. 92. Aos intérpretes cabem os direitos morais de integridade e paternidade de suas interpretações, inclusive depois da cessão dos direitos patrimoniais, sem prejuízo da redução, compactação, edição ou dublagem da obra de que tenham participado, sob a responsabilidade do produtor, que não poderá desfigurar a interpretação do artista. Parágrafo único. O falecimento de qualquer participante de obra audiovisual, concluída ou não, não obsta sua exibição e aproveitamento econômico, nem exige autorização adicional, sendo a remuneração prevista para o falecido, nos termos do contrato e da lei, efetuada a favor do espólio ou dos sucessores.
Capítulo III Dos Direitos dos Produtores Fonográficos
Art. 93. O produtor de fonogramas tem o direito exclusivo de, a título oneroso ou gratuito, autorizar-lhes ou proibir-lhes: I - a reprodução direta ou indireta, total ou parcial; II - a distribuição por meio da venda ou locação de exemplares da reprodução; III - a comunicação ao público por meio da execução pública, inclusive pela radiodifusão; IV - (VETADO) V - quaisquer outras modalidades de utilização, existentes ou que venham a ser inventadas. Art. 94. Cabe ao produtor fonográfico perceber dos usuários a que se refere o art. 68, e parágrafos, desta Lei os proventos pecuniários resultantes da execução pública dos fonogramas e reparti-los com os artistas, na forma convencionada entre eles ou suas associações.
Capítulo IV Dos Direitos das Empresas de Radiodifusão
Art. 95. Cabe às empresas de radiodifusão o direito exclusivo de autorizar ou proibir a retransmissão, fixação e reprodução de suas emissões, bem como a comunicação ao público, pela televisão, em locais de freqüência coletiva, sem prejuízo dos direitos dos titulares de bens intelectuais incluídos na programação.
Capítulo V Da Duração dos Direitos Conexos
Art. 96. É de setenta anos o prazo de proteção aos direitos conexos, contados a partir de 1º de janeiro do ano subseqüente à fixação, para os fonogramas; à transmissão, para as emissões das empresas de radiodifusão; e à execução e representação pública, para os demais casos.
Título VI Das Associações de Titulares de Direitos de Autor e dos que lhes
são Conexos Art. 97. Para o exercício e defesa de seus direitos, podem os autores e os titulares de direitos conexos associar-se sem intuito de lucro. § 1º É vedado pertencer a mais de uma associação para a gestão coletiva de direitos da mesma natureza. § 2º Pode o titular transferir-se, a qualquer momento, para outra associação, devendo comunicar o fato, por escrito, à associação de origem. § 3º As associações com sede no exterior far-se-ão representar, no País, por associações nacionais constituídas na forma prevista nesta Lei. Art. 98. Com o ato de filiação, as associações tornam-se mandatárias de seus associados para a prática de todos os atos necessários à defesa judicial ou extrajudicial de seus direitos autorais, bem como para sua cobrança. Parágrafo único. Os titulares de direitos autorais poderão praticar, pessoalmente, os atos referidos neste artigo, mediante comunicação prévia à associação a que estiverem filiados. Art. 99. As associações manterão um único escritório central para a arrecadação e distribuição, em comum, dos direitos relativos à execução pública das obras musicais e lítero-musicais e de fonogramas, inclusive por meio da radiodifusão e transmissão por qualquer modalidade, e da exibição de obras audiovisuais. § 1º O escritório central organizado na forma prevista neste artigo não terá finalidade de lucro e será dirigido e administrado pelas associações que o integrem. § 2º O escritório central e as associações a que se refere este Título atuarão em juízo e fora dele em seus próprios nomes como substitutos processuais dos titulares a eles vinculados. § 3º O recolhimento de quaisquer valores pelo escritório central somente se fará por depósito bancário. § 4º O escritório central poderá manter fiscais, aos quais é vedado receber do empresário numerário a qualquer título. § 5º A inobservância da norma do parágrafo anterior tornará o faltoso inabilitado à função de fiscal, sem prejuízo das sanções civis e penais cabíveis. Art. 100. O sindicato ou associação profissional que congregue não menos de um terço dos filiados de uma associação autoral poderá, uma vez por ano, após notificação, com oito dias de antecedência, fiscalizar, por intermédio de auditor, a exatidão das contas prestadas a seus representados.
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Título VII
Das Sanções às Violações dos Direitos Autorais
Capítulo I Disposição Preliminar
Art. 101. As sanções civis de que trata este Capítulo aplicam-se sem prejuízo das penas cabíveis.
Capítulo II Das Sanções Civis
Art. 102. O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada, poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação, sem prejuízo da indenização cabível. Art. 103. Quem editar obra literária, artística ou científica, sem autorização do titular, perderá para este os exemplares que se apreenderem e pagar-lhe-á o preço dos que tiver vendido. Parágrafo único. Não se conhecendo o número de exemplares que constituem a edição fraudulenta, pagará o transgressor o valor de três mil exemplares, além dos apreendidos. Art. 104. Quem vender, expuser a venda, ocultar, adquirir, distribuir, tiver em depósito ou utilizar obra ou fonograma reproduzidos com fraude, com a finalidade de vender, obter ganho, vantagem, proveito, lucro direto ou indireto, para si ou para outrem, será solidariamente responsável com o contrafator, nos termos dos artigos precedentes, respondendo como contrafatores o importador e o distribuidor em caso de reprodução no exterior. Art. 105. A transmissão e a retransmissão, por qualquer meio ou processo, e a comunicação ao público de obras artísticas, literárias e científicas, de interpretações e de fonogramas, realizadas mediante violação aos direitos de seus titulares, deverão ser imediatamente suspensas ou interrompidas pela autoridade judicial competente, sem prejuízo da multa diária pelo descumprimento e das demais indenizações cabíveis, independentemente das sanções penais aplicáveis; caso se comprove que o infrator é reincidente na violação aos direitos dos titulares de direitos de autor e conexos, o valor da multa poderá ser aumentado até o dobro. Art. 106. A sentença condenatória poderá determinar a destruição de todos os exemplares ilícitos, bem como as matrizes, moldes, negativos e demais elementos utilizados para praticar o ilícito civil, assim como a perda de máquinas, equipamentos e insumos destinados a tal fim ou, servindo eles unicamente para o fim ilícito, sua destruição. Art. 107. Independentemente da perda dos equipamentos utilizados, responderá por perdas e danos, nunca inferiores ao valor que resultaria da aplicação do disposto no art. 103 e seu parágrafo único, quem: I - alterar, suprimir, modificar ou inutilizar, de qualquer maneira, dispositivos técnicos introduzidos nos exemplares das obras e produções protegidas para evitar ou restringir sua cópia; II - alterar, suprimir ou inutilizar, de qualquer maneira, os sinais codificados destinados a restringir a comunicação ao público de obras, produções ou emissões protegidas ou a evitar a sua cópia; III - suprimir ou alterar, sem autorização, qualquer informação sobre a gestão de direitos;
IV - distribuir, importar para distribuição, emitir, comunicar ou puser à disposição do público, sem autorização, obras, interpretações ou execuções, exemplares de interpretações fixadas em fonogramas e emissões, sabendo que a informação sobre a gestão de direitos, sinais codificados e dispositivos técnicos foram suprimidos ou alterados sem autorização. Art. 108. Quem, na utilização, por qualquer modalidade, de obra intelectual, deixar de indicar ou de anunciar, como tal, o nome, pseudônimo ou sinal convencional do autor e do intérprete, além de responder por danos morais, está obrigado a divulgar-lhes a identidade da seguinte forma: I - tratando-se de empresa de radiodifusão, no mesmo horário em que tiver ocorrido a infração, por três dias consecutivos; II - tratando-se de publicação gráfica ou fonográfica, mediante inclusão de errata nos exemplares ainda não distribuídos, sem prejuízo de comunicação, com destaque, por três vezes consecutivas em jornal de grande circulação, dos domicílios do autor, do intérprete e do editor ou produtor; III - tratando-se de outra forma de utilização, por intermédio da imprensa, na forma a que se refere o inciso anterior. Art. 109. A execução pública feita em desacordo com os arts. 68, 97, 98 e 99 desta Lei sujeitará os responsáveis a multa de vinte vezes o valor que deveria ser originariamente pago. Art. 110. Pela violação de direitos autorais nos espetáculos e audições públicas, realizados nos locais ou estabelecimentos a que alude o art. 68, seus proprietários, diretores, gerentes, empresários e arrendatários respondem solidariamente com os organizadores dos espetáculos.
Capítulo III Da Prescrição da Ação
Art. 111. (VETADO)
Título VIII Disposições Finais e Transitórias
Art. 112. Se uma obra, em conseqüência de ter expirado o prazo de proteção que lhe era anteriormente reconhecido pelo § 2º do art. 42 da Lei nº. 5.988, de 14 de dezembro de 1973, caiu no domínio público, não terá o prazo de proteção dos direitos patrimoniais ampliado por força do art. 41 desta Lei. Art. 113. Os fonogramas, os livros e as obras audiovisuais sujeitar-se-ão a selos ou sinais de identificação sob a responsabilidade do produtor, distribuidor ou importador, sem ônus para o consumidor, com o fim de atestar o cumprimento das normas legais vigentes, conforme dispuser o regulamento. Art. 114. Esta Lei entra em vigor cento e vinte dias após sua publicação. Art. 115. Ficam revogados os arts. 649 a 673 e 1.346 a 1.362 do Código Civil e as Leis nºs 4.944, de 6 de abril de 1966; 5.988, de 14 de dezembro de 1973, excetuando-se o art. 17 e seus §§ 1º e 2º; 6.800, de 25 de junho de 1980; 7.123, de 12 de setembro de 1983; 9.045, de 18 de maio de 1995, e demais disposições em contrário, mantidos em vigor as Leis nºs 6.533, de 24 de maio de 1978 e 6.615, de 16 de dezembro de 1978. Brasília, 19 de fevereiro de 1998; 177º da Independência e 110º da República. FERNANDO HENRIQUE CARDOSO Francisco Weffort
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Anexo 5– Decreto n° 2.894/98
DECRETO Nº 2.894, DE 22 DE DEZEMBRO DE 1998. Revogado pelo Decreto nº 4.533, de 19.12.2002
Regulamenta a emissão e o fornecimento de selo
ou sinal de identificação dos fonogramas e das obras audiovisuais, previstos no art. 113 da Lei no 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, que altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais
e dá outras providências. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 113 da Lei no 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, no art. 46 da Lei no 4.502, de 30 de novembro de 1964, e no art. 3o do Decreto-Lei no 1.437, de 17 de dezembro de 1975, DECRETA : Art. 1o A emissão e o fornecimento do selo de controle de fonogramas e das obras audiovisuais, previstos no art. 113 da Lei no 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, obedecerão às disposições deste Decreto. Art. 2o O selo de controle será confeccionado pela Casa da Moeda do Brasil, que se encarregará de sua distribuição às unidades da Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda. Art. 3o À Secretaria da Receita Federal compete o fornecimento do selo de controle a ser obrigatoriamente aposto nos fonogramas e nas obras audiovisuais. § 1o A obrigatoriedade de aposição do selo de controle aplica-se a partir de 1o de abril de 1999. § 2o Para as obras audiovisuais, a aquisição do selo de que trata este artigo será precedida, ainda, da comprovação do registro junto ao órgão competente, nos termos do art. 19 da Lei no 8.401, de 8 de janeiro de 1992. Art. 4o O selo será numerado seqüencialmente, devendo ser afixado em cada exemplar. Art. 5o A Secretaria da Receita Federal fornecerá o selo de controle aos produtores e importadores, mediante ressarcimento de custos, segundo os critérios e condições que estabelecer.
Art. 6o Os selos de controle de que trata este Decreto deverão atender às exigências previstas no Regulamento do Imposto sobre Produtos Industrializados, aprovado pelo Decreto no 2.637, de 25 de junho de 1998, e às demais normas estabelecidas pela Secretaria da Receita Federal. Art. 7o A Secretaria da Receita Federal tornará disponível ao público as informações relativas à quantidade de selos de controle fornecida a cada solicitante, bem assim a respectiva identificação numérica seqüencial dos fonogramas e das obras audiovisuais a que se destinam tais selos. Art. 8o Os autores ou os titulares de direitos sobre os fonogramas e as obras audiovisuais poderão dispor de outros mecanismos de fiscalização do seu aproveitamento econômico. Art. 9o Os autores e os titulares de direitos sobre os livros poderão estabelecer mecanismos de fiscalização do seu aproveitamento econômico a serem pactuados em instrumentos firmados com os editores. Art. 10. A Secretaria da Receita Federal disciplinará os procedimentos necessários à execução deste Decreto. Art. 11. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 22 de dezembro de 1998; 177o da Independência e 110o da República. FERNANDO HENRIQUE CARDOSO Pedro Malan Francisco Weffort José Botafogo Gonçalves Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 23.12.1998
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Anexo 6 – Decreto n° 4.533/2002
DECRETO Nº 4.533, DE 19 DE DEZEMBRO DE 2002.
Regulamenta o art. 113 da Lei no 9.610, de 19 de fevereiro de 1998,
no que se refere a fonogramas, e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 113 da Lei no 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, DECRETA: Art. 1o Em cada exemplar do suporte material que contenha fonograma deve constar, obrigatoriamente, os seguintes sinais de identificação: I - na face do suporte material que permite a leitura ótica: a) do número da matriz, em código de barras ou em código alfanumérico; b) do nome da empresa responsável pelo processo industrial de reprodução, em código binário; c) do número de catálogo do produto, em código binário; II - na face do suporte material que não permite a leitura ótica: a) do nome, marca registrada ou logomarca do responsável pelo processo industrial de reprodução que a identifique; b) do nome, marca registrada, logomarca, ou número do CPF ou do CNPJ do produtor; c) do número de catálogo do produto; d) da identificação do lote e a respectiva quantidade de exemplares nele mandada reproduzir; III - na lombada, capa ou encarte de envoltório do suporte material, a identificação do lote e a respectiva quantidade nele mandada reproduzir. § 1o A aposição das informações em qualquer parte da embalagem não dispensa sua aposição no suporte material propriamente dito. § 2o O suporte material deve conter um código digital - International Standard Recording Code - onde se identifique o fonograma e os respectivos autores, artistas intérpretes ou executantes, de forma permanente e individualizada, segundo as informações fornecidas pelo produtor. § 3o A identificação do lote e a respectiva quantidade de exemplares nele mandada reproduzir, prevista na alínea "d", inciso II, e no inciso III, serão estampadas por meio de código alfanumérico, constante de duas letras que indiquem a ordem seqüencial das tiragens, além de numeral que indique a quantidade de exemplares da respectiva tiragem. § 4o O conjunto de duas letras que inicia o código alfanumérico será alterado a cada tiragem, seguindo a ordem do alfabeto, de forma que a primeira tiragem seja representada pelas
letras AA, a segunda por AB, a terceira por AC e assim sucessivamente. Art. 2o Quando o fonograma for fixado em suporte distinto daquele previsto no art. 1o, os sinais de identificação estabelecidos neste Decreto serão consignados na capa dos exemplares, nos encartes ou nos próprios suportes. Art. 3o O responsável pelo processo industrial de reprodução deve informar ao produtor a quantidade de exemplares efetivamente fabricados em cada tiragem, devendo o responsável pelo processo industrial de reprodução e o produtor manter os registros dessas informações em seus arquivos por um período mínimo de cinco anos, viabilizando assim o controle do aproveitamento econômico da exploração pelo titular dos direitos autorais ou pela entidade representativa de classe. Art. 4o O produtor deverá manter em seu arquivo registro de exemplares devolvidos por qualquer razão. Art. 5o O autor e o artista intérprete ou executante, diretamente, ou por meio de sindicato ou de associação, terá acesso aos registros referidos nos arts. 3o e 4o. Art. 6o O produtor deverá comunicar ao autor e ao artista intérprete ou executante, bem assim ao sindicato ou à associação a que se refere o art. 5o, conforme estabelecido pelas partes interessadas, a destruição de exemplares, com a antecedência mínima de dez dias, possibilitando ao interessado, e a seu exclusivo juízo, enviar representante para presenciar o ato. Art. 7o Este Decreto aplica-se aos fonogramas, com ou sem imagens, assim entendidos os que não se enquadrem na definição de obra audiovisual de que trata a Lei no 9.610, de 1998. Art. 8o As despesas necessárias para atender aos custos decorrentes da identificação, numeração e fiscalização previstas neste Decreto deverão ser objeto de instrumento particular a ser firmado entre as partes interessadas, sem ônus para o consumidor. Art. 9o Este Decreto entra em vigor em 22 de abril de 2003. Art. 10. Fica revogado o Decreto no 2.894, de 22 de dezembro de 1998. Brasília, 19 de dezembro de 2002; 181o da Independência e 114o da República. FERNANDO HENRIQUE CARDOSO Sérgio Silva do Amaral Francisco Weffort José Bonifácio Borges de Andrada Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 20.12.2002
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Anexo 7 – Código Civil de 1916
DECRETO Nº 4.533, DE 19 DE DEZEMBRO DE 2002.
Regulamenta o art. 113 da Lei no 9.610, de 19 de fevereiro de 1998,
no que se refere a fonogramas, e dá outras providências.
CAPÍTULO VI
DA PROPRIEDADE LITERÁRIA, CIENTÍFICA E ARTÍSTICA Art. 649. Ao autor de obra literária, científica ou artística pertence o direito exclusivo de reproduzi-la. (Redação dada pela Lei nº 3.447, de 23.10.1958) § 1º Os herdeiros e sucessores do autor gozarão desse direito pelo tempo de 60 (sessenta) anos, a contar do dia de seu falecimento. § 2º Se morrer o autor, sem herdeiros ou sucessores até o 2º grau, a obra cairá no domínio comum. § 3º No caso de caber a sucessão aos filhos, aos pais ou ao cônjuge do autor, não prevalecerá o prazo do § 1º e o direito só extinguirá com a morte do suucessor. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 3.447, de 23.10.1958) Art. 650. Goza dos direitos de autor, para os efeitos economicos por este Código assegurados, o editor de publicação composta de artigos ou trechos de autores diversos, reunidos num todo, ou distribuídos em series, tais como jornais, revistas, dicionários, enciclopedias e seletas. Parágrafo único. Cada autor conserva, neste caso, o seu direito sobre a sua produção, e poderá reproduzi-la em separado. Art. 651. O editor exerce tambem os direitos a que se refere o artigo antecedente, quando a obra for anônima ou pseudônima. Parágrafo único. Mas, neste caso, quando o autor se der a conhecer, assumirá o exercício de seus direitos, sem prejuizo dos adquiridos pelo editor. Art. 652. Tem o mesmo direito de autor o tradutor de obra já entregue ao domínio comum e o escritor de versões permitidas pelo autor da obra original, ou, em sua falta, pelos seus herdeiros e sucessores. Mas o tradutor não se pode opor à nova tradução, salvo se for simples reprodução da sua, ou se tal direito lhe deu o autor. Art. 653. Quando uma obra, feita em colaboração, não for divisível, nem couber na disposição do art. 651, os colaboradores, não havendo convenção em contrário, terão entre si direitos iguais; não podendo, sob pena de responder por perdas e danos, nenhum deles, sem consentimento dos outros, reproduzí-la, nem lhe autorizar a reprodução, exceto quando feita na coleção de suas obras completas. Parágrafo único. Falecendo um dos colaboradores sem herdeiros ou sucessores, o seu direito acresce aos sobreviventes. Art. 654. No caso do artigo anterior, divergindo os colaboradores, decidirá a maioria numerica, e, em falta desta, o juiz, a requerimento de qualquer deles. § 1º Ao colaborador dissidente, porém, fica o direito de não contribuir para as despesas de reprodução, renunciando a sua parte nos lucros, bem como o de vedar que o seu nome se inscreva na obra. § 2º Cada colaborador pode, entretanto, individualmente, sem aquiescência dos outros, defender os próprios direitos contra terceiros, que daqueles não sejam legítimos representantes.
Art. 655. O autor de composição musical, feita sobre texto poético, pode executá-la, publicá-la ou transmitir o seu direito, independente de autorização do escritor, indenizando, porém, a este, que conservará direito à reprodução do texto sem a música. Art. 656. Aquele, que, legalmente autorizado, reproduzir obra de arte mediante processo artístico diferente, ou pelo mesmo processo, havendo na composição novidade, será quanto à cópia, considerado autor. Parágrafo único. Goza, igualmente, dos direitos de autor, sem dependência de autorização, o que assim reproduzir obra já entregue ao domínio comum. Art. 657. Publicada e exposta à venda uma obra teatral ou musical, entende-se anuir o autor a que se represente, ou execute, onde quer que a sua audição não for retribuída. Art. 658. Aquele, que, com autorização do compositor de uma obra musical, sobre os seus motivos escrever combinações, ou variações, tem, a respeito destas, os mesmos direitos, e com as mesmas garantias, que sobre aquela o seu autor. Art. 659. A cessão, ou a herança, quer dos direitos de autor, quer da obra de arte, literatura ou ciência, não transmite o direito de modificá-la. Mas este poderá ser exercido pelo autor, em cada edição sucessiva, respeitados os do editor. Parágrafo único. A cessão de artigos jornalísticos não produz efeito, salvo convenção em contrário, além do prazo de vinte dias, a contar da sua publicação. Findo ele, recobra o autor em toda a plenitude o seu direito. Art. 660. A União e os Estados poderão desapropriar por utilidade pública, mediante indenização prévia, qualquer obra publicada, cujo dono a não quizer reeditar. Art. 661. Pertencem à União, aos Estados, ou aos Municípios: I - Os manuscritos de seus arquivos, bibliotecas e repartições. II - As obras encomendadas pelos respectivos governos, e publicadas à custa dos cofres públicos. Parágrafo único. Não caem, porém, no domínio da União, do Estado, ou do Município, as obras simplesmente por eles subvencionadas. Art. 662. As obras publicadas pelo Governo Federal, Estadual ou Municipal, não sendo atos públicos e documentos oficiais, caem, quinze anos depois da publicação, no domínio comum. Art. 663. Ninguém pode reproduzir obra, que ainda não tenha caído no domínio comum, a pretexto de anotá-la, comentá-la, ou melhorá-la, sem permissão do autor ou seu representante. § 1º Podem, porém, publicar-se em separado, formando obra sobre si, os comentários ou anotações. § 2º A permissão confere ao reprodutor os direitos do autor da obra original.
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Art. 664. A permissão do autor, necessária também para se lhe reduzir a obra a compêndio ou resumo, atribui, quanto a estes, ao resumidor ou compendiador, os mesmos direitos daquele sobre o trabalho original. Art. 665. É igualmente necessária, e produz os mesmo efeitos da permissão de que trata o artigo antecedente, a licença do autor da obra primitiva a outrem, para de um romance extrair peça teatral, reduzir a verso obra em prosa, e vice-versa, ou dela desenvolver os episódios, o assunto e o plano geral. Parágrafo único. São livres as parafrases, que não forem verdadeira reprodução da obra original. Art. 666. Não se considera ofensa aos direitos de autor: I - A reprodução de passagens ou trechos de obras já publicadas e a inserção, ainda integral, de pequenas composições alheias no corpo de obra maior, contanto que esta apresente carater científico, ou seja compilação destinada a fim literário, didático, ou religioso, indicando-se, porém a origem, de onde se tomarem os excertos, bem como o nome dos autores. II - A reprodução, em diários ou periódicos, de notícias e artigos sem carater literário ou científico, publicados em outros diários, ou periódicos, mencionando-se os nomes dos autores e os dos periódicos, ou jornais, de onde forem transcritos. III - A reprodução, em diários e periódicos, de discursos pronunciados em reuniões publicas, de qualquer natureza. IV - A reprodução de todos os atos publicos e documentos oficiais da União, dos estados e dos Municípios. V - a citação em livros, jornais ou revistas, de passagens de qualquer obra com intuito de critica ou polêmica. VI - A cópia, feita à mão, de uma obra qualquer, contanto que se não destine à venda. VII - A reprodução, no corpo de um escrito, de obras de artes figurativas, contanto que o escrito seja o principal, e as figuras sirvam somente para explicar o texto, não se podendo, porém, deixar de indicar os nomes do autores, ou as fontes utilizadas. VIII - A utilização de um trabalho de arte figurativa, para se obter obra nova. IX - A reprodução de obra de arte existente nas ruas e praças. X - A reprodução de retratos ou bustos de encomenda particular, quando feita pelo proprietário dos objetos encomendados. A pessoa representada e seus sucessores imediatos podem opor-se a reprodução ou publica exposição do retrato ou busto. Art. 667. É suscetível de cessão o direito, que assiste ao autor, de ligar o nome a todos os seus produtos intelectuais. § 1º Dará lugar à indenização por perdas e danos a usurpação do nome do autor ou a sua substituição por outro, não havendo convenção que a legitime. § 2º O autor da usurpação, ou substituição, será outrosim, obrigado a inserir na obra o nome do verdadeiro autor. Art. 668. Não firmam direito de autor, para desfrutar a garantia da lei, os escritos por esta defesos, que forem por sentença mandados retirar da circulação. Art. 669. Quem publicar obra inédita, ou reproduzir obra em via de publicação ou já publicada, pertencente a outrem, sem outorga ou aquiescencia deste, além de perder, em benefício do autor, ou proprietário, os exemplares da reprodução fraudulenta, que se apreenderem, pagar-lhe-á o valor de toda a edição, menos esses exemplares, ao preço por que estiverem à venda os genuínos, ou em que forem avaliados.
Parágrafo único. Não se conhecendo o número de exemplares fraudulentamente impressos e destribuídos, pagará o transgressor o valor de mil exempalres, além dos apreendidos. Art. 670. Quem vender ou expuser à venda ou à leitura pública e remunerada uma obra impressa com fraude, será solidariamente responsável, com o editor, nos termos do artigo antecedente; e , se a obra for estampada no estrangeiro, responderá como editor o vendedor, ou o expositor. Art. 671. Quem publicar qualquer manuscrito, sem permissão do autor ou de seus herdeiros ou representantes, será responsável por perdas e danos. Parágrafo único. As cartas-missivas não podem ser publicadas sem permissão dos seus autores ou de quem os representem, mas podem ser juntas como documentos em autos judiciais. Art. 672. O autor, ou proprietário, cuja obra se reproduzir fraudulentamente, poderá, tanto que o saiba, requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos, subsistindo-lhe o direito à indenização de perdas e danos, ainda que nenhum exemplar se encontre. Art. 673. Para segurança de seu direito, o proprietário da obra divulgada por tipografia, litografia, gravura, moldagem, ou qualquer outro sistema de reprodução, depositará, com destino ao registro, dois exemplares na Biblioteca Nacional, no Instituto Nacional de Música ou na Escola Nacional de Belas-Artes do Distrito Federal, conforme a natureza da produção. Parágrafo único. As certidões do registro induzem a propriedade da obra, salvo prova em contrario.
CAPÍTULO IX DA EDIÇÃO
Art. 1.346. Mediante o contrato de edição, o editor, obrigando-se a reproduzir mecanicamente e divulgar a obra científica, literária, artística, ou industrial, que o autor lhe confia, adquire o direito exclusivo a publicá-la, e explorá-la. Art. 1.347. Pelo mesmo contrato pode o autor obrigar-se a feitura de uma obra literária, científica ou artística, em cuja publicação e divulgação se empenha o editor. Art. 1.348. Não havendo termo fixado para a entrega da obra, entende-se que o autor pode entregá-la quando lhe convier; mas o editor poderá fixar-lhe prazo, com a cominação de rescindir o contrato. Art. 1.349. Enquanto não se esgotarem as edições a que tiver direito o editor, não poderá o autor dispor da obra no todo, ou em parte. Art. 1.350. Tem direito o autor a fazer, nas edições sucessivas de suas obras, as emendas e alterações, que bem lhe parecer; mas, se elas impuzerem gastos extraordinários ao editor, este haverá direito a indenização. Parágafo único. O editor poderá opor-se às alterações que lhe prejudiquem os interesses, ofendam a reputação, ou aumentem a responsabilidade. Art. 1.351. No caso de nova edição ou tiragem, não havendo acordo entre as partes contratantes sobre a maneira de exercerem seus direitos, poderá qualquer delas rescindir o contrato, sem prejuízo da edição anterior. Art. 1.352. Se, esgotada a última edição, o editor, com direito a outra, a não levar a efeito, poderá o autor intimá-lo judicialmetne a que o faça em certo prazo, sob pena de perder aquele direito. Art. 1.353. Se, no contrato, ou ao tempo do contrato, o autor não tiver estipulado retribuição pelo seu trabalho, será determinada por arbitramento.
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Art. 1.354. Se a retribuição do autor ficar dependente do exito da venda, será obrigado o editor, como qualquer comissário, a lhe apresentar a sua conta. Art. 1.355. Cabe ao editor fixar o número de exemplares a cada edição. Não poderá, porém mau grado ao autor, reduzir-lhes o número, de modo que a obra não tenha circulação bastante. Art. 1.356. Entende-se que o contrato versa apenas sobre uma edição, se o contrário não resultar expressa ou implicitamente do seu contexto. Art. 1.357. O editor não pode fazer abreviações, adições, ou modificações na obra, sem premissão do autor. Art. 1.358. Ao editor compete fixar o preço de venda, sem, todavia, poder elevá-lo a ponto que embarace a circulação da obra.
CAPÍTULO X
DA REPRESENTAÇÃO DRAMÁTICA Art. 1.359. O autor de uma obra dramática não lhe pode fazer alteração na substância, sem acôrdo com o empresário que a faz representar. Art. 1.360. Se não se fixou prazo à representação, pode o autor intimar o empresário a que o fixe, cominando-lhe em pena a recisão do contrato. Art. 1.361. Os credores de uma empresa de teatro não podem fazer penhora na parte do produto dos espetáculos reservada ao autor. Art. 1.362. Se licença do autor, não pode o empresário comunicar o manuscrito da obra a pessoa estranha ao teatro, onde se representa.
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REFERÊNCIAS
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Renovar, 1997. ________. O Direito da Internet e da Sociedade da Informação: estudos. São Paulo:
Forense, 2002. BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 5ª ed. atual. São Paulo: Saraiva,
2001. BITTAR, Carlos Alberto. Direito de Autor. 4. ed. rev. amp. atual. Rio de Janeiro: Forense
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