1. REDE COOPERATIVA DE PESQUISAS TRATAMENTO DE ESGOTOS
SANITRIOS POR PROCESSO ANAERBIO E DISPOSIO CONTROLADA NO SOLO
INSTITUIES PARTICIPANTES PUC-PR, UFMG, UFPb, UFRGS, UFRN, UNICAMP,
USP
2. AUTORES Adrianus C. Van Haandel UFPb Bruno Coraucci Filho
UNICAMP Carlos Augusto de Lemos Chernicharo UFMG Ccero Onofre de
Andrade Neto UFRN David da Motta Marques UFRGS Edson Abdul Nour
UNICAMP Eugenio Foresti USP Fabiana De Nadai Andreoli PUC-PR Hnio
Normando de Souza Melo UFRN Jos Roberto Campos USP Jos Almir
Rodrigues Pereira UFPA Josmar Davilson Pagliuso USP Lourdinha
Florncio UFPE Luis Fernando Cybis UFRGS Luiz Olinto Monteggia UFRGS
Manoel Lucas Filho UFRN Marcelo Zaiat USP Marcos Von Sperling UFMG
Mario Takayuki Kato UFPE Miguel Mansur Aisse PUC-PR Paula
Frassinetti Feitosa Cavalcanti UFPb Pedro Alm Sobrinho USP Roberto
Feij de Figueiredo UNICAMP Ronaldo Stefanutti UNICAMP
3. Apresentao Esta publicao um dos produtos resultantes da Rede
de Pesquisas formada no mbito do Edital 01 do Programa de Pesquisas
em Saneamento Bsico (PROSAB) em torno do tema Tratamento de Esgotos
Sanitrios por Processo Anaerbio e Disposio Controlada no Solo, e
que foi coordenada pelo Prof. Jos Roberto Campos, da Escola de
Engenharia de So Carlos-USP. Gerido pela FINEP, o PROSAB tem por
prioridade o desenvolvimento e o aperfeioamento de tecnologias
voltadas para a ampliao da cobertura dos servios de saneamento e,
conseqentemente, para a melhoria das condies de vida da populao
brasileira. Para tanto, o programa financia redes cooperativas de
pesquisas nas reas de guas de abastecimento, guas residurias e
resduos slidos que tenham por base a reviso do padro tecnolgico
atual, estabelecendo normas e padres adequados s particularidades
regionais e locais de um pas com escassez de recursos e de dimenso
continental como o Brasil, e que observem, sempre, a necessidade de
preservar ou recuperar o meio ambiente. A implementao do PROSAB por
meio de redes de pesquisas cooperativas se deve a mltiplos fatores,
dentre os quais destaca-se a abordagem integrada das aes dentro de
um determinado tema, o que otimiza a aplicao dos recursos e evita a
duplicidade e a pulverizao de iniciativas. As redes incentivam a
integrao entre os pesquisadores das diferentes instituies,
possibilitam a disseminao da informao entre seus integrantes e
promovem a capacitao permanente de instituies emergentes, alm de
permitir a padronizao de metodologias de anlise e estimular o
desenvolvimento de parcerias. Um grupo interinstitucional,
responsvel pela coordenao do PROSAB, orienta as aes de fomento,
definindo, periodicamente, os temas prioritrios para a formao das
redes cooperativas de pesquisas e que so tornados pblicos por meio
de editais. Esse grupo coordenador auxilia a FINEP e o CNPq na
tomada de decises, emitindo parecer sobre as propostas
apresentadas, indicando consultores ad hoc, acompanhando
permanentemente o programa e corrigindo desvios quando necessrio. J
foram lanados, at o momento, dois editais do PROSAB envolvendo 17 e
27 grupos de pesquisa, respectivamente, contando com recursos
financeiros da FINEP, CNPq, CAIXA e CAPES, e o apoio da ABES e da
SEPURB. A divulgao das realizaes do programa feita por meio da home
page do PROSAB (http://www.sanepar.pr.gov.br/prosab), da publicao
de artigos na revista BIO da ABES, da apresentao do programa em
diversos eventos da rea, do portflio dos projetos e da publicao de
livros e manuais para distribuio s prefeituras e aos rgos de
servios de saneamento. Os resultados finais dos projetos
desenvolvidos no mbito de cada edital tambm so publicados sob a
forma de coletnea de artigos.
4. GRUPO COORDENADOR DO PROSAB Prof. Jurandyr Povinelli EESC
[email protected] Prof. Ccero O. de Andrade Neto UFRN
[email protected] Deza Lara Pinto CNPq [email protected] Wilson
Auerswald CNPq [email protected] Marcos Helano
Montenegro CAESB [email protected] Anna Virgnia Machado ABES
[email protected] Sandra Bondarowsky CAIXA [email protected]
Dalmo Albuquerque Lima MCT [email protected] Elisabete Pinto Guedes
FINEP [email protected] Clia Maria Poppe de Figueiredo
[email protected] RECOPE REDE COOPERATIVA DE PESQUISA O RECOPE,
subprograma do PRODENGE, apoiado com recursos do contrato de
financiamento FINEP-BID 880-OC/BR, contempla o desenvolvimento de
redes de pesquisas em reas prioritrias da engenharia, envolvendo a
interao entre instituies de pesquisa e empresas. O PROSAB inclui-se
no RECOPE.
5. Jos Roberto Campos (coordenador) TRATAMENTO DE ESGOTOS
SANITRIOS POR PROCESSO ANAERBIO E DISPOSIO CONTROLADA NO SOLO Rio
de Janeiro RJ 1999
6. Copyright 1999 ABES RJ 1a Edio tiragem: 1.500 exemplares
Projeto grfico, reviso, editorao eletrnica e fotolitos: RiMa Artes
e Textos Av. Dr. Carlos Botelho, 1816, salas 30/31 CEP 13560-250 So
Carlos-SP Fone/Fax: (016) 272-5269 Coordenador e revisor tcnico:
Jos Roberto Campos AvpuhphhytisvphrhhqhryhTromqrUhhr
qhDshomqTrvoqr7viyvrph@@T8VTQ T776 Tratamento de esgotos sanitrios
por processo anaerbio e disposio controlada no solo / Jos Roberto
Campos (coordenador). -- Rio de Janeiro : ABES, 1999. 464 p. : il.
Projeto PROSAB. 1. Tratamento anaerbio. 2. Tratamento de esgotos.
3. Reatores anaerbios. 4. Disposio no solo. 5. Tratamento de esgoto
no solo. I. Campos, Jos Roberto.
7. Jos Roberto Campos (coordenador) Coordenadores de Projeto
PUC-PR: Miguel Mansur Aisse UFMG: Carlos Augusto L. Chernicharo
UFPb: Adrianus Van Haandel UFRGS: Luiz Olinto Monteggia UFRN: Hnio
Normando de Souza Melo UNICAMP: Bruno Coraucci Filho USP: Jos
Roberto Campos Consultores Pedro Alm Sobrinho USP Mario Takayuki
Kato UFPE
8. Nossa homenagem: Jurandyr Povinelli Pela sua capacidade de
concretizar planos, liderana e respeito ao ser humano e ao
trabalho. Clia Maria Poppe de Figueiredo e Elisabete Pinto Guedes
Com carinho, pela amizade, simpatia e sensibilidade; com respeito,
pela competncia, eficincia e colaborao. Os autores
9. Captulo 1 Introduo Ccero Onofre de Andrade Neto e Jos
Roberto Campos 1.1 Generalidades A disposio de esgotos brutos no
solo ou em corpos receptores naturais, como lagoas, rios, oceanos,
uma alternativa que foi e ainda empregada de forma muito intensa.
Dependendo da carga orgnica lanada, os esgotos provocam a total
degradao do ambiente (solo, gua e ar) ou, em outros casos, o meio
demonstra ter condies de receber e de decompor os contaminantes at
alcanar um nvel que no cause problemas ou alteraes acentuadas que
prejudiquem o ecossistema local e circunvizinho. Esse fato
demonstra que a natureza tem condies de promover o tratamento dos
esgotos, desde que no ocorra sobrecarga e que haja boas condies
ambientais que permitam a evoluo, reproduo e crescimento de
organismos que decompem a matria orgnica. Em outras palavras, o
tratamento biolgico de esgotos um fenmeno que pode ocorrer
naturalmente no solo ou na gua, desde que predominem condies
apropriadas. Uma estao de tratamento de esgotos , em essncia, um
sistema que explora esses mesmos organismos que proliferam no solo
e na gua. Em estaes de tratamento procura-se, no entanto, otimizar
os processos e minimizar custos, para que se consiga a maior
eficincia possvel, respeitando-se as restries que se impem pela
proteo do corpo receptor e pelas limitaes de recursos disponveis.
Em estaes de tratamento procura-se, geralmente, reduzir o tempo de
deteno hidrulica (tempo mdio que o esgoto fica retido no sistema) e
aumentar a eficincia 1
10. 2 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo das reaes bioqumicas, de maneira que se
atinja determinado nvel de reduo de carga orgnica, em tempo e espao
muito inferiores em relao ao que se espera que ocorra no ambiente
natural. Assim sendo, mesmo a disposio no solo pode constituir-se
em uma excelente forma de tratamento, desde que se respeite a
capacidade natural do meio e dos microrganismos decompositores
presentes. A evoluo da tecnologia de tratamento de esgotos em
ambiente confinado e controlado iniciou-se com a constatao de que
lagoas poderiam ser utilizadas para esse fim e tambm com as
proposies, em 1893 e 1914, de sistemas que hoje so conhecidos como
tanques spticos e lodos ativados aerbios, respectivamente. Durante
muito tempo, no passado, acreditava-se que guas residurias poderiam
ser tratadas com elevada eficincia apenas quando se empregavam
processos aerbios (oxignio presente na forma molecular O2) e que o
processo anaerbio (ausncia de oxignio) s se aplicava digesto de
lodos, com elevada concentrao de slidos orgnicos. Assim sendo, o
processo anaerbio s era utilizado na digesto de lodos concentrados
de estaes de tratamento, em certos tipos de lagoas e em digestores
rurais. Em certos casos, at se efetuava o aproveitamento de biogs,
que pode apresentar elevada concentrao de metano (CH4), que um gs
combustvel. A evoluo acelerada dos conhecimentos e do emprego de
reatores anaerbios no convencionais para o tratamento de despejos
lquidos contendo quantidades relativamente pequenas de matria
orgnica devida, em grande parte, contribuio inicial oriunda do
trabalho dos pesquisadores James C. Young e Perry L. McCarty, na
dcada de 1960. Vale lembrar que os esgotos sanitrios so
considerados como guas residurias com baixa concentrao. Os novos
reatores foram concebidos fundamentalmente com base no melhor
conhecimento do processo anaerbio e, principalmente, na verificao
da viabilidade de se dispor de diferentes maneiras para conseguir
tempo de reteno celular (tempo mdio que os microrganismos ficam
retidos no sistema) sensivelmente superior ao tempo de deteno
hidrulica nas unidades de tratamento anaerbio. O aumento do tempo
de reteno celular, em relao ao tempo de deteno hidrulica nos
reatores anaerbios no convencionais, tem sido conseguido por meio
da construo de unidades cuja concepo e operao apiam-se nos
conceitos que so descritos sucintamente a seguir: a) Reteno de
microrganismos nos interstcios existentes em leito de pedra ou de
outro material suporte adequado que constitui parte de um reator
(unidade na qual ocorre converso de algum material por processo
biolgico ou qumico) anaerbio com fluxo ascendente ou descendente.
Nesse caso, so includos os
11. Cap. 1 Introduo 3 filtros anaerbios, nos quais tem sido
constatado que, apesar de ocorrer a aderncia de filme biolgico ao
meio suporte, a parcela significativa de microrganismos encontra-se
nos interstcios do leito. b) Produo de uma regio no reator com
elevada concentrao de microrganismos ativos que obrigatoriamente
atravessada (e misturada) pelo fluxo ascendente dos despejos a
serem tratados. Esse princpio explorado nos reatores anaerbios de
fluxo ascendente e manta de lodo (Upflow Anaerobic Sludge Blanket
UASB) e nos reatores anaerbios compartimentados. c) Imobilizao de
microrganismos mediante sua aderncia a superfcies fixas ou
superfcie de material particulado mvel. Os reatores de leito
expandido ou fluidificado fundamentam-se essencialmente nesse
princpio, tendo-se em vista que a grande parcela de microrganismos
ativos encontra-se aderida s partculas que constituem o seu leito.
Atualmente j se tem uma idia generalizada de que ambos os processos
biolgicos, aerbio e anaerbio, podem ser aplicados para o tratamento
de esgotos sanitrios, cada qual apresentando uma srie de aspectos
positivos e, naturalmente, outra srie de aspectos negativos. Assim
sendo, em cada caso, devem-se ponderar ambas as possibilidades para
que se chegue realmente soluo mais apropriada para uma determinada
cidade. Alm do crescimento do nmero de alternativas para
tratamento, tambm a tecnologia de projeto, construo e operao do
sistema evoluiu de forma aprecivel nos anos mais recentes. Durante
os ltimos 20 anos, verificou-se uma verdadeira revoluo nos
conceitos concernentes com o tratamento de guas residurias. Nesse
perodo, alm de ampliar e valorizar a aplicabilidade do processo
anaerbio, tambm foi aumentado significativamente o nmero de
alternativas para concepo fsica das unidades para converses
biolgicas. Os pesquisadores e os profissionais da rea aprenderam a
trabalhar em equipe e deixaram de apenas supervisionar as partes
puramente civil e eletromecnica das estaes de tratamento. A
conscincia atual coloca em destaque a importncia da
multidisciplinariedade do assunto e envolve elementos de biologia,
microbiologia, bioqumica, engenharias, arquitetura, economia,
poltica, sociologia e educao ambiental. As unidades j no so vistas
como simples tanques, em concreto, em chapa metlica etc. Hoje essas
unidades so estudadas como reatores em que ocorrem transformaes
complexas, com a participao de organismos vivos.
12. 4 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo H que se tentar a otimizao da construo,
da operao e da manuteno do reator (custos) fundamentada na otimizao
do processo biolgico. No que se refere a custos para implantao de
sistemas de tratamento, as cifras relacionadas com as necessidades
do Brasil so impressionantes, pois, atualmente, apenas cerca de 40%
da populao urbana servida com redes coletoras, sendo que a situao
da populao rural ainda grave. Outro fato, tambm decepcionante,
reside na constatao de que apenas cerca de 10% dos esgotos so
submetidos a algum tipo de tratamento. Estima-se, de maneira
aproximada, que atualmente, no Brasil, seria necessrio investir
mais de 40 bilhes de reais em saneamento bsico (gua, esgotos e
lixo), para que sejam atingidas condies adequadas e desejveis.
Finalizando essa introduo sobre o tema, pode-se sintetizar que h
muitas alternativas para tratamento de esgotos, desde uma simples,
porm controlada, disposio no solo at sofisticadas estaes
completamente automatizadas. Dentro desse contexto, conclui-se que,
para cada cidade, em funo de suas caractersticas prprias, deve-se
sempre escolher aquela soluo que corresponda a uma eficincia e a
custos compatveis com as circunstncias que prevalecem no local. 1.2
Caractersticas de Esgotos Sanitrios A primeira medida para iniciar
o levantamento de dados para elaborao de um projeto de sistema de
tratamento de esgotos relaciona-se com a determinao da qualidade e
da quantidade dos esgotos que sero encaminhados estao depuradora.
Deve-se determinar a variao da vazo e da qualidade dessas guas,
para que seja possvel um dimensionamento mais prximo da realidade e
no baseado apenas em dados obtidos em bibliografia. Devem-se
efetuar medies de vazo e coletar amostras representativas para que
se tenha uma caracterizao quantitativa real. Alm do mais, por meio
de extrapolaes fundamentadas no crescimento populacional e
industrial previsto para pelo menos 10 a 20 anos, obrigatria a
definio do alcance de projeto associado a estimativas, as mais
seguras possveis. De maneira geral, as vazes de esgotos variam
durante o dia, de acordo com os usos e costumes de uma dada
comunidade, porm uma idia geral dessa variao pode ser observada na
Figura 1.1, em que se mostra um hidrograma tpico bastante comum.
Naturalmente, a vazo mdia tambm varia nos diferentes dias da semana
e nas diferentes estaes do ano. Na figura, os valores de Qmn e Qmx
em relao a Qmd so apenas ilustrativas, pois podem variar caso a
caso.
13. Cap. 1 Introduo 5 Vazo Vazo mxima (Qmx) 1,5 Qmd Vazo mdia 0
Qmd 0,5 Qmd Vazo mnima (Qmn) 0 6 12 18 24h Figura 1.1 Variao diria
tpica de vazo de esgotos sanitrios. Alm das guas usadas em
atividades domsticas, tambm tm acesso rede coletora aquelas guas
provenientes de usos industriais, guas de infiltrao etc. No Brasil,
usa-se o sistema denominado separador absoluto, que no permite a
introduo de guas pluviais, porm, em ocasies de chuvas, sempre
ocorre a penetrao desse tipo de gua por meio de tampes de
poo-de-visita, de lanamentos clandestinos etc., atingindo vazes
considerveis. Esse fato exige que, junto chegada dos esgotos, em
estaes de tratamento, sempre seja previsto um extravasor para
impedir que a vazo que tem acesso instalao supere aquela
correspondente vazo de projeto. Evidentemente, a atitude correta
seria prever o tratamento dessa vazo excedente. De maneira geral,
as vazes de esgotos que tm acesso a uma estao de tratamento variam
aproximadamente de acordo com certos padres que podem ser
explicados, aproximadamente, pelas equaes que fornecem dados em
litros por segundo (l/s). l Vazo mnima: 4 PtQ = l & 32 3 T + /
, 1 ) + 4 ,1'01 + 2 8 7 5 2 6 Vazo mdia 4 PpG = & 32 3 T + / ,
1 ) + 4 ,1'0e' + 2 8 7 5 2 6
14. 6 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo l Vazo no dia de maior consumo: l &
32 3 T . + / ,1 ) + 4 GLD Vazo na hora de maior consumo: 4 = 4 KRUD
= em que: ,1'0e' + 2 8 752 6 & 32 3 T . . + / , 1 ) + 4 ,1'0; +
2 8 7 5 2 6 C: relao entre a vazo de esgotos que tem acesso ao
sistema coletor e a vazo de gua distribuda populao. Varia entre
0,70 a 1,30, mais comumente, C = 0,80 POP: populao a ser atendida
(habitantes) Q: consumo mdio dirio de gua per capita. l populao
permanente: 100 a 350 l/pessoa dia, geralmente l populao flutuante:
50 a 200 l/pessoa dia QIND: contribuio industrial (l/s) INF:
infiltrao na rede (0,20 a 10 l/s km, geralmente) L: comprimento da
rede (km) K1: coeficiente do dia de maior consumo, varia entre 1,20
e 1,50 (comumente: 1,25) K2: coeficiente da hora de maior consumo,
varia entre 1,50 e 1,30 (comumente: 1,50) Essas frmulas so
comumente utilizadas para estimativas de vazo para projeto, porm
importante que todos os parmetros inclusos nas mesmas sejam medidos
ou determinados in loco para que no se incorra em erros grosseiros.
Alm de estudos cuidadosos para avaliao de vazes atuais e futuras,
dentro do horizonte de projeto, deve-se fazer uma perfeita
caracterizao dos esgotos por meio de coleta e exame de amostras
representativas. De maneira geral, os esgotos sanitrios possuem
mais de 98% de sua composio constituda por gua, porm h
contaminantes, entre os quais destacam-se: slidos suspensos,
compostos orgnicos (protenas: 40% a 60%; carboidratos: 25% a 50%; e
leos e graxas: 10%), nutrientes (nitrognio e fsforo), metais,
slidos dissolvidos inorgnicos, slidos inertes, slidos grosseiros,
compostos no biodegradveis, organismos patognicos e,
ocasionalmente, contaminantes txicos decorrentes de atividades
industriais ou acidentais.
15. Cap. 1 Introduo 7 Dada a dificuldade em caracterizar todos
os patognicos presentes, adota-se como recurso a determinao da
densidade de microrganismos coliformes, NMP (nmero mais provvel de
coliformes/100 ml de amostra), que indiretamente constitui um
indicador da presena provvel de organismos patognicos nesse meio.
Organismos coliformes so bactrias que tm seu hbitat favorvel no
trato intestinal de animais de sangue quente. De maneira geral,
devem ser coletadas amostras e determinados pelo menos os seguintes
parmetros: pH, temperatura, DBO (Demanda Bioqumica de Oxignio), DQO
(Demanda Qumica de Oxignio), nitrognio (nas formas de nitrognio
orgnico, amoniacal, nitritos e nitratos), fsforo, alcalinidade,
materiais solveis em hexano, slidos sedimentveis, resduos (em suas
diferentes formas: suspensos, dissolvidos, fixos e volteis),
coliformes totais e coliformes fecais. Recentemente, tambm a
avaliao do nmero de nematides comeou a receber maior ateno. Quando
h lanamentos de guas residurias de indstrias, deve-se fazer
levantamento perfeito das cargas correspondentes e da natureza e
tipo de efluente com essa origem, pois pode ocorrer a presena de
substncias refratrias ao tratamento ou de substncias inibidoras ou
txicas. Em cada caso, deve-se definir alguns parmetros adicionais
para comporem o elenco de anlises e determinaes com amostras dos
esgotos que tero acesso ao tratamento, entre os quais podem-se
citar: metais pesados, pesticidas etc. Entre os parmetros citados
muito importante destacar algumas consideraes sobre a DBO. Em
esgotos sanitrios, a DBO geralmente varia na faixa de 150 a 600
mg/l, em mdia. Isso significa, de forma grosseira, que cada litro
de esgoto lanado em um corpo aqutico pode provocar consumo de 150 a
600 mg/l de oxignio disponvel nesse meio, por intermdio das reaes
bioqumicas (respirao de microrganismos, principalmente). Esse
ensaio padronizado para a temperatura de 20C e 5 dias de durao.
Isso significa que, na realidade, o consumo de oxignio pode ser
maior ou menor do que aquele determinado em laboratrio, pois, no
meio natural, h outras variveis no ponderadas no ensaio. Para ter
uma idia grosseira da contribuio de cada pessoa na degradao da gua
de um corpo dgua natural interessante notar que as atividades
normais de um ser humano leva produo de cerca de 50 a 60 g de
DBO20C,5d por dia, ou seja, cada pessoa, por meio de seus esgotos,
provoca consumo de oxignio no corpo receptor da ordem de 50 a 60g.
Em termos grosseiros, se for considerado que um corpo receptor
sadio tem geralmente teor de oxignio dissolvido de aproximadamente
7 mg/l, cada pessoa provoca
16. 8 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo a reduo desse teor para zero mg/l,
correspondente a um volume de 8 m 3/dia, aproximadamente (54 g de
DBO20C,5d/pessoa dia). Extrapolando-se para uma cidade de 100.000
habitantes, por exemplo, chega-se a um volume da ordem de 800.000
m3/dia. No que se refere contaminao do corpo receptor por
microrganismos potencialmente patognicos, um nmero bastante
representativo refere-se ao NMP de coliformes por 100 ml,
caracterstico dos esgotos sanitrios. A faixa de valores mais comuns
encontra-se entre 106 e 108 NMP/100 ml. Isso significa que, em cada
litro de esgoto bruto lanado em um rio, tem-se de 107 a 10
organismos coliformes, que indiretamente podem estar relacionados
com a presena de patognicos. 9 1.3 Definio do Nmero de Estaes e do
Nvel de Tratamento Tanto o estabelecimento do nmero de estaes como
a definio de eficincia necessria para o tratamento so decises que
no podem ser tomadas sem avaliao muito cuidadosa de diversos
fatores locais, como classe, tipo e natureza do corpo receptor,
reas disponveis para implantao do sistema, recursos disponveis,
condies da rede coletora existente etc. A seguir, ser apresentado
um apanhado geral sobre os principais fatores que interferem nessas
condies bsicas. Como j foi mostrado anteriormente, ao se lanarem os
esgotos em um rio, por exemplo, poder ocorrer reduo acentuada do
oxignio presente nesse corpo receptor. Na Figura 1.2 apresenta-se
um exemplo de curva de variao do oxignio em um rio que recebeu uma
descarga concentrada de esgotos. Note que, nesse caso, ao longo do
curso do rio, a concentrao de oxignio foi reduzida de 8,0 g/l at
prximo a 2,0 mg/l e, depois, lentamente esse teor elevou-se at
alcanar valor prximo quele que havia previamente. Nesse caso, nas
guas desse rio continuou a prevalecer atividade aerbia em nvel
adequado para a sobrevivncia de um nmero significativo de peixes,
pois a concentrao de oxignio manteve-se superior a 2,0 mg/l. Como
todo rio tem uma capacidade de autodepurao compatvel com a sua
vazo, turbulncia das guas, temperatura etc., houve a reaerao dessas
guas (introduo do oxignio por meio da superfcie e tambm por
atividade de algas) e a recuperao natural desse corpo receptor,
depois de uma extenso que pode variar de algumas dezenas a centenas
de quilmetros.
17. Cap. 1 Introduo 9 Esgotos Oxignio dissolvido (mg/l) 8,0 6,0
4,0 2,0 0 Figura 1.2 Distncia (km) Efeito do lanamento de esgotos
em um rio. Em outros casos, a descarga de esgotos pode provocar
situao catastrfica para a vida aqutica que depende de meio aerbio.
O rio pode no ter condies de manter condies aerbias em toda a sua
extenso, pois mesmo ocorrendo a aerao natural, pode haver trecho
onde a concentrao de oxignio se reduz a zero. Nesse trecho, ento,
ocorre a anaerobiose e a morte de praticamente todos os peixes.
Esses comentrios demonstram claramente que, para cada caso, deve-se
determinar a mxima carga que se pode lanar em um rio para que no se
provoquem alteraes srias nesse ecossistema. Logicamente, o ideal
seria que a eficincia da estao fosse sempre de 100%, porm, medida
que se aumenta a eficincia de uma estao, a partir de 80%, os custos
de implantao e de operao crescem de maneira muito acentuada. Lanar,
por exemplo, os esgotos de uma cidade de 10.000 habitantes no rio
Amazonas algo completamente diferente de lan-los em um pequeno
crrego com 0,50 m de largura. No primeiro caso, os efeitos na vida
aqutica so quase desprezveis, porm, no segundo, so catastrficos.
Baseando-se nesses conceitos, a legislao em vigor estabelece padres
de qualidade associados s caractersticas que devem ser respeitadas
no corpo receptor, e padres de emisso relativos s caractersticas
que devem ser respeitadas nos efluentes industriais ou esgotos
sanitrios tratados, para ser possvel seu lanamento em um corpo
receptor. Sugere-se que todo administrador municipal tenha em mos
toda Legislao Federal sobre esse tema e, tambm, a Legislao
Estadual, mais especfica e objetiva, sobre a regio.
18. 10 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo Assim sendo, quando se quiser
determinar o nvel de tratamento necessrio, devese conhecer
paralelamente as caractersticas do corpo receptor e a classe qual
pertence, de acordo com deliberao do rgo Estadual de Controle de
Poluio e do Conama Conselho Nacional do Meio Ambiente.
Conhecendo-se sua classe, pode-se saber exatamente as
caractersticas que devem ser respeitadas nesse rio, mesmo aps o
lanamento de esgotos tratados. Com base na capacidade de
autodepurao do rio e em respeito aos padres de qualidade a serem
mantidos no mesmo, em funo da sua classe, pode-se definir as
caractersticas que devero ter os esgotos tratados. A fim de
obedecer aos padres de qualidade do corpo receptor, tambm deve-se
respeitar aos padres de emisso relativos s guas residurias
tratadas. Com base no exposto, fica claro que a eficincia do
tratamento s pode ser definida depois de consultar a legislao e ter
dados precisos sobre o corpo receptor em questo. Como diretriz
bsica e preliminar mnima, deve-se sempre procurar alcanar eficincia
na remoo de DBO superior a 80% ou deve-se procurar ter efluentes
tratados com DBO inferior a 60 mg/l. Naturalmente, alm de
considerar esse parmetro, tambm devem ser respeitados limites
associados a outros, como slidos suspensos, NMP de coliformes etc.,
constantes dos padres de emisso. Geralmente, na prtica, para
respeitar os padres de qualidade, as condies so mais restritivas.
Em relao ao nmero de estaes de tratamento de esgotos a ser
implantado em uma cidade, naturalmente, outra srie de fatores deve
ser levada em considerao para que se chegue a uma concluso que
oferea os melhores resultados em termos tcnicos, econmicos e
ambientais. Dois fatores que, em muitos casos, obrigam a direcionar
essa escolha se referem disponibilidade de espao e configurao do
sistema de coleta e de transporte de esgotos j existentes na
cidade. Por exemplo, pode ocorrer o caso, simplificadamente
mostrado na Figura 1.3, em que a cidade j possui implantados
coletores, interceptores e emissrios que conduzem todo o volume de
esgotos produzidos na rea urbana at um nico ponto, no qual h a opo
por uma nica estao de tratamento nesse referido local. At
recentemente, os projetistas geralmente optavam pela soluo mostrada
na Figura 1.3, sem qualquer estudo preliminar aprofundado, porm,
atualmente, tem-se a certeza de que para determinar a melhor
alternativa, no que concerne ao nmero de estaes a serem
implantadas, deve-se fazer um estudo econmico e ambiental cuidadoso
relativo anlise de costumes de obras, operao e manuteno. Nota-se
que, quando se procura concentrar todo o volume de esgotos de uma
cidade em um ponto nico,
19. Cap. 1 Introduo 11 preciso aumentar o dimetro das
canalizaes medida que aumenta a rea servida. Alm disso, geralmente,
tem-se de construir sistemas de bombeamento para, eventualmente,
lanar os esgotos de uma ou mais sub-bacias at canalizaes que
posteriormente conduzem os esgotos ao local de tratamento. Crrego
ou rio Interceptor, emissrio Estao de tratamento (ETE) Figura 1.3
Localizao de estao de tratamento de esgoto em cidades que dispem de
redes que concentram os esgotos em um nico local. Evidentemente,
esses componentes tm custos de construo e de operao considerveis,
que no devem ser ignorados no momento de fazer opes tcnicas e
econmicas. Na Figura 1.4 mostrado esquema para a mesma situao em
que se prev a construo de 3 estaes. Nota-se, nesse caso, que os
dimetros finais dos interceptores e emissrios so menores,
redundando em menor custo para transporte dos esgotos. Por outro
lado, geralmente o custo por metro cbico tratado pode diminuir,
dentro de certos limites, medida que aumenta a capacidade de uma
estao de tratamento de esgotos. Adicionalmente, caso haja diversas
estaes espalhadas, evidentemente tem-se de dispor de maior nmero de
funcionrios e, naturalmente, os servios de controle ficam mais
complexos. Isso demonstra que a escolha do nmero de estaes no algo
to fcil como aparenta e constitui uma deciso importante,
principalmente no que se refere otimizao de custos.
20. 12 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo Crrego ou rio Interceptor, emissrio ETE
1 ETE 2 ETE 3 Figura 1.4 Localizao de estaes de tratamento de
esgoto em cidades que dispem de rede projetada, prevendo-se a
construo de diversas estaes. Para encerrar essa abordagem, muito
importante citar o fato de que, independentemente do nmero de
estaes adotado, o projetista sempre deve pensar na possibilidade de
modular as estaes de tratamento para facilitar a ampliao da mesma e
otimizar sua operao e manuteno. Assim, por exemplo, se para uma
cidade que pretende tratar esgotos de 300.000 habitantes foram
previstas duas estaes, uma para atender a 180.000 habitantes e
outra para 120.000 habitantes, pode-se perfeitamente imaginar um
mdulo para tratar esgotos de 30.000 habitantes, de forma que seriam
construdas duas estaes, uma constituda de 4 mdulos e outra, de 6
mdulos. Evidentemente, ao escolher a capacidade do mdulo, tambm
deve-se ter justificativa tcnica e econmica. Nota-se que, ao
modular uma estao, reduz-se drasticamente a necessidade de
constru-la de uma s vez, eliminando a necessidade de grandes
emprstimos e diluindo a responsabilidade de sua evoluo, por
exemplo, em uma, duas ou trs gestes administrativas. Naturalmente,
primeira gesto caber a elaborao do projeto, desapropriao da rea e
implantao de um certo nmero inicial de mdulos. s gestes seguintes a
obrigao se restringir continuidade de implantao de novos
mdulos.
21. Cap. 1 Introduo 13 1.4 Etapas de Estudos para Concepo de
Sistemas de Tratamento de Esgotos Nos itens seguintes so destacados
alguns fatores que influenciam de maneira acentuada a concepo de
sistemas de tratamento de esgotos. A esses fatores se somam muitos
outros, que tornam as tomadas de deciso ainda mais complexas.
Nota-se que, ao implantar uma estao de tratamento, esse sistema
provocar certo impacto ambiental na rea circunvizinha, que pode ser
negativo ou quase desprezvel. Portanto, alm de pensar na parte
puramente tcnica, tambm preciso ponderar os aspectos ambientais e
esttico (arquitetura, urbanismo e paisagismo), para que essa obra
no venha a ser algo que agrida os sentimentos dos moradores da
regio e daqueles que venham visitar a estao de tratamento. Por
outro lado, essa obra pode tambm provocar alteraes no ambiente
vizinho em conseqncia da exalao de maus odores e pelo trfego de
veculos que fatalmente tero de afastar resduos slidos do local. A
esses fatores devem ser somados outros, entre os quais aqueles
relacionados com possibilidades de contaminao do lenol de gua
subterrnea, arraste de materiais pelas guas pluviais at corpos dgua
etc. Dois parmetros fundamentais que tambm no devem ser esquecidos
referemse produo de lodo e ao consumo de energia. No Brasil, e em
quase todos os pases do mundo, o problema de afastamento,
tratamento e de disposio de resduos slidos torna-se cada vez mais
grave; em algumas situaes atinge nvel dramtico. medida que se
implantam estaes de tratamento de guas residurias, evidentemente se
produz mais resduo slido, que retirado dessas guas ou que produzido
por meio da sntese das bactrias que promovem o tratamento biolgico.
A produo de lodos em uma estao de tratamento algo importante que
redunda na necessidade de ser considerado como um dos importantes
fatores que podem levar a problemas e a custos significativos.
Quanto ao consumo de energia, no h necessidade de acrescentar
muito, pois evidente que, quanto menor a demanda de energia
eltrica, menor ser o custo de operao. Apesar de ser evidente, em
muitos casos nota-se total desprezo por essa ponderao. Diante do
exposto, fica evidente a enorme responsabilidade do administrador
municipal ao decidir pela implantao do tratamento de esgotos em sua
cidade, pois,
22. 14 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo direta ou indiretamente, os erros
advindos de uma opo inadequada certamente sero atribudos gesto
durante a qual foram iniciados os estudos, sendo esquecida, muitas
vezes, a inteno nobre de salvaguardar o ambiente que deu impulso s
medidas tomadas. Assim sendo, recomendvel, sempre que possvel, e em
cidades que no disponham de dados e planos baseados em estudos
tcnicos, econmicos e ambientais sobre o sistema de esgotos, que
sejam seguidos alguns passos fundamentais na evoluo do planejamento
para implantao de estaes de tratamento de esgotos. Desse modo,
recomenda-se que pelo menos sejam observadas algumas etapas,
conforme enumeradas a seguir: a) Diagnstico do sistema existente.
Nesta fase deve-se levantar todos os dados concernentes com o
sistema existente, como cadastros, vazes, custos, receita,
problemas executivos e operacionais, divisores de sub-bacias,
populao atual e seu crescimento etc. Em sntese, deve-se coletar e
analisar todos os dados possveis para que se conhea perfeitamente
como o sistema existente est construdo, suas possibilidades de
expanso, suas condies operacionais etc. Adicionalmente, devem-se
conhecer vazes, locais de lanamento, classe e caractersticas do(s)
receptor(es), distribuio da populao servida etc. b) Estudo de
alternativas e escolha de melhor soluo. Esta fase muito importante,
e seu sucesso fundamentalmente apoiado na experincia e no
conhecimento do projetista e de seus consultores. Vale destacar que
recentemente est ocorrendo uma evoluo acentuada no nmero de
alternativas tecnicamente viveis para tratamento de esgotos. Cabe
queles aos quais recai a deciso a responsabilidade e a obrigao de
ponderarem sobre todas as alternativas viveis, envolvendo
tecnologias desde a mais simples at a mais complexa e desde a mais
antiga at a mais recente. Naturalmente, em funo das condies de cada
cidade, muitas alternativas podem ser eliminadas aps uma simples
avaliao inicial de fatores bsicos, como: rea disponvel, nvel
scio-econmico predominante, disponibilidade de energia a custo
razovel etc. Porm, aps essa pr-seleo, sempre h algumas alternativas
tecnicamente viveis que devero ser objeto de estudos para
determinao daquela que oferece as melhores condies econmicas. Os
estudos tcnico e econmico devero ser realizados com base em
informaes que surgiro por meio da anlise dos seguintes tpicos,
fases ou consideraes. l Conhecimento da classe e avaliao da
capacidade de autodepurao do corpo receptor. l Definio da eficincia
necessria para tratamento.
23. Cap. 1 Introduo 15 Espao disponvel para a implantao da(s)
estao(es). l Sondagem e estudos geofsicos na(s) rea(s) para
implantao da(s) estao(es). l Definio do nmero de estaes. l Definio
do mdulo que constitui a(s) estao(es). l Utilizao de tecnologias
disponveis e apropriadas. l Definio de critrios de projeto. l
Layout de anteprojetos. l Anlise sobre o balano de slidos para
avaliar problemas, solues e custos para transporte, tratamento e
destino final de lodos. l Anlise sobre o balano energtico para
avaliar consumo de energia e seus custos. l Anlise sobre as condies
tcnicas gerais de cada alternativa. l Anlise de custos (construo,
operao e manuteno) de cada alternativa (devem ser comparados os
valores presentes considerando-se a construo e a operao e manuteno
nos prximos 20 anos). l Anlise do impacto ambiental de cada
alternativa. l Escolha de melhor soluo. c) Projeto executivo. A
concluso de todos os trabalhos desenvolvidos para a implantao do
sistema de tratamento apresentada detalhadamente no projeto
executivo e tambm so fornecidos os projetos especficos em nvel
suficiente para a execuo da obra. Do projeto executivo constam,
pelo menos: memorial justificativo, escolha tcnico-econmica da
melhor soluo, memorial de clculo, manual de operao, lista bsica de
materiais de construo, especificaes para construo, projeto
estrutural, projeto de instalaes eltricas, projeto arquitetnico,
projeto de instrumentao e automatizao e estudo de paisagismo. Deve
tambm ser incorporado estudo sobre o impacto da estao no ambiente.
l 1.5 Funo de uma Estao de Tratamento de Esgotos Como se descreveu
anteriormente, a eficincia e a capacidade nominal de uma estao de
tratamento de esgotos so definidas a partir de uma srie complexa de
fatores especficos a cada caso estudado. O tratamento pode abranger
diferentes nveis, denominados tecnicamente de tratamento primrio,
secundrio ou tercirio. A Figura 1.5 mostra esquematicamente a
composio de uma estao de tratamento completa convencional, at a
desinfeco final.
24. 16 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo Nvel de tratamento Desinfeco Tercirio
Secundrio Remoo de nutrientes, de materiais no biodegradveis e do
lodo Primrio Remoo de lodo biolgico Degradao de compostos
carbonceos Lodo biolgico Lodo Esgotos Recirculao Areia e slidos
grosseiros gradeados Lodo secundrio Adensamento, digesto,
condicionamento, desidratao, secagem etc. Remoo de materiais
grosseiros, flutuantes e sedimentveis Lodo primrio Disposio
adequada Figura 1.5 Conceito de sistema convencional de tratamento
de esgotos. O tratamento primrio envolve a remoo de slidos
grosseiros, por meio de grades, geralmente, e a sedimentao (caixa
retentora de areia e decantadores) ou flotao de materiais
constitudos principalmente de partculas em suspenso. Essa fase
produz quantidade de slidos que devem ser dispostos adequadamente.
De maneira geral, os slidos retirados em caixas retentoras de areia
so enterrados e aqueles retirados em decantadores devem ser
adensados e digeridos adequadamente, para posterior secagem e
disposio em locais apropriados. As formas de tratamento desse lodo
variam de maneira bastante ampla. O tratamento secundrio, por sua
vez, destina-se degradao biolgica de compostos carbonceos. Quando
feita essa degradao, naturalmente ocorre a decomposio de
carboidratos, leos e graxas e de protenas a compostos mais simples,
como: CO2, H2O, NH3, H2S etc., dependendo do tipo de processo
predominante. As bactrias que efetuam o tratamento, por outro lado,
se reproduzem e tm a sua massa total aumentada em funo da
quantidade de matria degradada. Caso se empregue o processo aerbio,
para cada quilograma de DBO removido ocorre a formao de cerca de
0,4 a 0,7 kg e a formao de 0,02 a 0,20 kg de bactrias,
aproximadamente. A pequena formao de biomassa do processo anaerbio
em relao ao aerbio uma das grandes vantagens atribudas ao uso das
bactrias que proliferam em ambiente
25. Cap. 1 Introduo 17 anaerbio pelo tratamento de efluentes,
pois o custo e as dificuldades para tratamento, transporte e
disposio final dos lodos biolgicos so bastante reduzidos, no caso.
Geralmente, o volume de lodo no processo anaerbio, em termos
prticos, menor que 30% do volume produzido pelo processo aerbio,
para um mesmo afluente lquido. Aps a fase em que feita a degradao
biolgica, os slidos produzidos devem ser removidos em unidades
especficas para esse fim (lagoas de sedimentao, decantadores,
flotadores etc.) e, posteriormente, so submetidos a adensamento,
digesto, secagem e disposio adequada. No caso do uso de processo
anaerbio, o fluxograma para tratamento e destino do lodo
sensivelmente simplificado. Dependendo do tipo do processo adotado,
tambm pode-se recircular uma parcela da massa de bactrias ativas de
volta ao reator biolgico, conforme mostrado na Figura 1.5. Essa
alternativa permite o aumento na produtividade do sistema e maior
estabilidade no seu desempenho. De maneira geral, a maioria das
estaes construdas alcanam apenas o nvel de tratamento secundrio
aqui descrito, porm, em muitas situaes, obrigatrio que esse
tratamento alcance o nvel denominado tercirio. O efluente do
tratamento secundrio ainda possui nitrognio e fsforo em quantidade,
concentrao e formas que podem provocar problemas no corpo receptor,
dependendo de suas condies especficas, dando origem ao fenmeno
denominado eutrofizao, que sentido pela intensa proliferao de
algas. O tratamento tercirio tem por objetivo, no caso de esgotos
sanitrios, a reduo das concentraes de nitrognio e de fsforo e ,
geralmente, fundamentado em processos biolgicos realizados em fases
subseqentes denominadas nitrificao e desnitrificao. A remoo de
fsforo pode tambm ser efetuada por meio de tratamento qumico, com
sulfato de alumnio, por exemplo. Na nitrificao, o nitrognio levado
forma de nitrato e, posteriormente, na desnitrificao, levado produo
de N2, principalmente o que volatizado para o ar. O tratamento
tercirio tambm produz lodo, que deve ser adensado, digerido, secado
e disposto convenientemente. Em essncia, as operaes e processos
descritos destinam-se remoo de slidos em suspenso e de carga
orgnica, restando agora, para completar o tratamento, que se cuide
da remoo de organismos patognicos. Sistemas de tratamento que
envolvem disposio no solo ou lagoas de estabilizao, em muitos
casos, j tm a capacidade de efetuar reduo considervel no nmero de
patognicos, dispensando, assim, um sistema especfico para
desinfeco.
26. 18 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo Nos outros casos, ainda se faz
necessrio a previso de instalaes para desinfeco, que geralmente
efetuada por meio do uso de cloro, oznio e, mais recentemente,
radiao ultravioleta. 1.6 Alternativas para Tratamento Generalidades
No faz parte do escopo deste livro o enfoque completo sobre
alternativas para tratamento de esgotos, assim ser apenas
apresentada uma rpida abordagem sobre o tema. Antes de serem
citadas as principais alternativas para tratamento de esgotos
sanitrios, interessante que sejam destacadas algumas observaes
sobre o tratamento primrio e sobre alguns parmetros utilizados para
dimensionamento. Como j foi mencionado anteriormente, o tratamento
primrio visa remoo de slidos grosseiros, leos e graxas, e de slidos
em suspenso, com eficincia tal que permita o bom funcionamento das
partes seguintes que compem uma estao de tratamento. Dependendo do
tipo de tratamento adotado, os componentes do tratamento primrio
podem variar, conforme as alternativas destacadas a seguir, sendo,
porm, a caixa retentora de areia uma unidade que raramente pode ser
dispensada. l l l Alternativa 1: Grade Caixa retentora de areia
Medidor de vazo Decantador primrio Alternativa 2: Grade Caixa
retentora de areia Medidor de vazo Peneira esttica ou mecnica
Alternativa 3: Grade Caixa retentora de areia Medidor da vazo Em
certos casos em que se opta pelo tratamento por disposio no solo,
pode-se utilizar como tratamento preliminar apenas o gradeamento,
seguido de medidor de vazo, naturalmente. A dispensa de decantador
primrio e de peneira esttica geralmente admitida em sistemas de
lagoas de estabilizao e sistemas denominados de oxidao total ou
aerao prolongada. Mais recentemente, tambm tem-se eliminado o
decantador
27. Cap. 1 Introduo 19 quando se usam reatores anaerbios de
manta de lodo, porm, nesse caso, obrigatrio o uso de gradeamento
fino dos esgotos. Ainda como esclarecimento inicial, sero
apresentados, a seguir, a simbologia e alguns parmetros
fundamentais utilizados por projetistas para estudos e para o
dimensionamento de unidades de tratamento de esgotos. l Tempo de
deteno hidrulica (qh). o tempo mdio (geralmente expresso em dias)
em que os despejos lquidos permanecem em uma unidade ou sistema. K
= 3 8 9ROXPH GR UHDWRU P 9D]mR PpGLD GLiULD P GLD
28. ou K = l $ OXU W DRX FRP SUP H W G L Q R HXP DXQ G G P
29. LDH 9 HRFL D HP pG DG O G P G D O GG L R tTXL R L
30. Taxa volumtrica de carregamento orgnico (TCO). a quantidade
de DQO, DBO ou de outro parmetro, expressa em kg, que aplicada por
dia por unidade de volume de uma unidade. 7&2 = NJ '42 P GLD ou
7&2 = NJ '%2 P GLD ou 7&2 = NJ '42 KD GLD l Taxa de aplicao
superficial (TAS). a quantidade de efluente lquido que aplicada por
unidade de rea de uma unidade, durante um dia. 7$6 = l 9D RG ]m
RVHJ RW P G D V RV L
31. UDG H DXQ G G P
32. LDH L L P P G D= P G D Tempo de reteno celular (idade do
lodo). o tempo mdio que os organismos que efetuam o tratamento
permanecem em uma unidade (dia). Aps esses esclarecimentos bsicos,
considerados essenciais para o entendimento dos critrios
fundamentais para projeto, destaca-se o fato de que h muitas
alternativas para tratamento de esgotos, entre as quais,
destacam-se:
33. 20 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo Tabela 1.1 Alguns tipos de reatores ou
sistemas usados para tratamento de esgotos. Uv 9vvomy Ghthshpyhvh
Tvrhqryhthvhhyvh Ghthhrhqhyhthqrrqvrhom Gqhvhqprpvhv
Gqhvhqhrhomythqh Whyhqrvqhom Gqhvhqrrhqvihryhqh ihpu
Qosqhrhq9rrTuhs Avyivyytvphryiv Srhhryivqryrvsyvqvsvphq Avyhhryiv
Srhhhryivihryhqh 9rphqvtr 9rphqvtrsvyhhryiv Srhhhryivqrhhqryq
Srhhhryivphvrhqp puvphh Srhhhryivqryrvsyvqvsvphq rhqvq
8ivho}rqrprhhryivhryivr ivyytvpstvptvp Qprrqvhr 6ryivrhhryiv
6ryivrhhryiv 6ryivrhhryiv 6ryivrhhryiv 6ryiv 6ryiv 6ryiv 6ryiv
6ryiv 6ryiv 6ryiv 6hryiv 6hryiv 6hryiv 6hryiv 6hryiv 6hryiv 6hryiv
6hryivrhryiv 6hryivstvptvp 6ryivstvptvp Esses vrios tipos de
tratamento, e outros, podem tambm, em muitos casos, ser associados
em uma estao de tratamento, compondo sistemas mediante a combinao
de reatores anaerbios, de reatores aerbios e de reatores anaerbios
com reatores aerbios, assim como tambm podem ser combinados
reatores biolgicos com reatores fsico-qumicos. Neste livro, sero
focalizados apenas os processos anaerbios e a disposio controlada
no solo. Estaes projetadas recentemente tm demonstrado que o uso de
processo anaerbio seguido por processo aerbio pode trazer melhores
resultados em termos de eficincia e custos menores do que aquelas
concebidas em processos aerbios apenas, empregando-se aerao
mecnica. Por outro lado, a disposio controlada no solo pode
apresentar-se como interessante alternativa, quando se dispe de rea
adequada para esse fim.
34. Cap. 1 Introduo 21 Consideraes sobre Alternativas
Tecnolgicas para Tratamento de Esgotos Com base nas informaes
disponveis, pode-se estimar, seguramente, que apenas os esgotos de
10% da populao brasileira urbana, ou menos, passam por estaes de
tratamento (1999). Os baixos nveis de atendimento populao
brasileira com servios de saneamento bsico, sobretudo coleta e
tratamento de esgotos sanitrios, se devem principalmente a
problemas de ordem poltica e econmica. No h exatamente empecilho
tecnolgico. No tocante ao tratamento de esgotos, sempre houve a opo
preferencial de atuao nos grandes centros urbanos com tecnologia
geralmente importada, que em muitos casos no se teria necessidade
de utilizar adotando-se tecnologia adaptada s condies brasileiras.
A maior parte da pequena parcela dos esgotos que recebe tratamento,
no Brasil, passa por estaes de tratamento de grandes cidades, nas
quais se optou pela centralizao, mediante a reunio dos esgotos em
grandes volumes, pela adoo de tecnologias sofisticadas, que demanda
operao complexa e altos custos de execuo e gerao, e pela descarga
dos efluentes nos cursos dgua. H que se perceber a necessidade da
aplicao de tecnologia adequada realidade do Brasil, e que
possibilite o enfrentamento da questo, atendendo a situaes
presentes tanto em grandes cidades como em pequenos assentamentos
humanos. Tambm h que se perceber as vantagens de adotar solues
funcionalmente simples com alta relao benefcio/custo. Diante das
condies ambientais, culturais e econmicas do Brasil, solues
funcionalmente simples so as que utilizam os processos mais
naturais e os reatores menos mecanizados e mais fceis de serem
construdos e operados. Para viabilizar a universalizao do
atendimento, o caminho mais indicado certamente o do gradualismo,
priorizando a abrangncia e adotando a evoluo da eficcia a partir de
um patamar aceitvel de segurana sanitria. O Brasil detm tecnologia
bastante desenvolvida no campo da Engenharia Sanitria e Ambiental e
os tcnicos, engenheiros e cientistas brasileiros tm conhecimento,
competncia e criatividade suficientes para adequar e desenvolver
solues para os problemas de saneamento bsico de seu pas.
Infelizmente, esse potencial ainda no foi suficientemente
compreendido e difundido e no houve oportunidade de aplic-lo em
maior escala. No h um sistema de tratamento de esgotos que possa
ser indicado como o melhor para quaisquer condies, mas obtm-se a
mais alta relao custos/benefcios (respeitando-se o aspecto
ambiental) quando se escolhe criteriosamente um sistema que se
adapta s condies locais e aos objetivos em cada caso.
35. 22 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo No Brasil, so conhecidas vrias tcnicas
de tratamento de esgotos, desde sofisticados sistemas at os
processos mais simples. Conta-se com razovel experincia e, nos
ltimos anos, grande nmero de opes tecnolgicas para tratamento de
esgotos tem sido implementado na busca de sistemas mais adequados
nossa realidade, compatveis com a descentralizao, para propiciar a
resoluo dos problemas de forma gradual e eficaz. A experincia
brasileira recente, nesse domnio, contribuiu com o desenvolvimento
de tecnologias como: reatores anaerbios de fluxo ascendente por
meio do lodo; decanto-digestores seguidos de filtros anaerbios;
lagoas de estabilizao inovadoras; formas de disposio controlada no
solo; entre outras. Geralmente, quando se importava a concepo de um
projeto, at recentemente, prevalecia a adoo por processos aerbios
que envolvem grandes custos de execuo e de operao, decorrentes de
elevado consumo de energia eltrica. Por outro lado, em clima quente
os processos anaerbios so eficientes na remoo de matria orgnica e
de slidos suspensos e apresentam grandes vantagens: ocupam pequenas
reas; produzem pouco lodo estabilizado, no consomem energia; no
necessitam de equipamentos eletromecnicos; e requerem construo e
operao simples. Contudo, no removem satisfatoriamente
microrganismos patognicos nem nutrientes eutrofizantes. Mas os
processos aerbios compactos, custa de mecanizao e energia eltrica,
geralmente tambm no so eficientes na remoo de patognicos e
eutrofizantes e o que podem propiciar a mais, na remoo de matria
orgnica, no representa diferenas significativas na proteo do meio
ambiente e da sade pblica. Os reatores anaerbios, conforme
atualmente, geralmente podem remover, na prtica, at 80% (em geral,
valor prximo a 70%) da matria orgnica e, ademais, reatores aerbios
mecanizados produzem quantidades de lodo muito maiores que reatores
anaerbios, o que constitui uma dificuldade adicional. As lagoas de
estabilizao e a disposio no solo so os processos mais naturais de
depurao dos esgotos. Quando se pretendem sistemas para tratamento
de esgotos sanitrios eficientes na remoo de microrganismos
patognicos e de nutrientes eutrofizantes, lagoas de estabilizao e
disposio controlada no solo so as opes mais adequadas realidade
brasileira, quando se dispe rea adequada para tal. O Brasil oferece
condies extremamente favorveis para aplicao das lagoas de
estabilizao e da disposio controlada de esgotos e efluentes
tratados no solo tanto pela disponibilidade de rea como pelo clima,
entre outros fatores convenientes, inclusive socioculturais e
econmicos. Infelizmente, nem sempre vivel aplicar lagoas de
estabilizao ou disposio no solo como soluo para tratamento dos
esgotos, porque exigem grandes reas e
36. Cap. 1 Introduo 23 terreno adequado (tipo de solo e
relevo). Contudo, mesmo que seja necessrio o transporte dos esgotos
at um local adequado, essas opes devem ser sempre avaliadas como
alternativa. Reatores anaerbios, em certos casos, so suficientes
para resolver os problemas causados por esgotos, dependendo da
classe do corpo receptor. Quando no, so recomendveis para anteceder
unidades mais eficientes. Reduzem a carga orgnica e viabilizam a
utilizao de lagoas de estabilizao e da disposio controlada no solo,
em reas menores. Pelo mesmo motivo, remoo da carga orgnica com
produo de lodo relativamente baixa prestam-se, tambm, para
anteceder unidades de tratamento mais sofisticadas, reduzindo o
custo total. Se h necessidade de alto grau de tratamento e invivel
o uso de lagoas de estabilizao ou disposio no solo, mesmo precedido
de sistemas anaerbios, ento so aplicados sistemas mais complexos,
inclusive tcnicas de desinfeco. A anlise da relao custo/benefcio
deve ser vista do ngulo das rentabilidades social e ambiental,
considerando, inclusive, o retorno social do capital investido.
Recursos financeiros aplicados em equipamentos eletromecnicos tm
destino final muito diferente dos que so aplicados em sistemas que
incrementam a produo de alimentos ou fortalecem a economia local de
forma socializada distribuda. Em avaliao puramente financeira, o
custo de implantao de sistemas compostos por reatores anaerbios,
lagoas ou disposio no solo situa-se na faixa de R$ 25,00 a R$ 50,00
por pessoa, enquanto reatores aerbios mecanizados geralmente
necessitam de R$ 60,00 a R$ 150,00 por pessoa atendida, tendo-se
como referncia o ms de abril de 1999. Os reatores anaerbios
disponveis tecnologicamente no Brasil, para aplicao desde a
pequenos aglomerados humanos at a grandes cidades, so: o
decanto-digestor, o filtro anaerbio, o reator de manta de lodo, o
reator de leito expandido ou fluidificado e a lagoa anaerbia. Os
decanto-digestores so popularmente conhecidos como tanques spticos.
Podem ser de cmara nica, de cmaras em srie ou de cmaras
sobrepostas. O primeiro modelo utilizado para atender a residncias
e pequenos edifcios, mas os outros dois prestam-se tambm para
tratar volumes maiores de esgoto, sobretudo quando se constroem
vrias unidades conjugadas. O decanto-digestor no apresenta alta
eficincia, mas produz efluente de qualidade razovel, que pode, no
entanto, ser mais facilmente encaminhado a um ps-tratamento
complementar. Alm das vantagens do processo anaerbio, tem operao
muito simples e o custo extremamente baixo.
37. 24 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo Pode anteceder variados tipos de
unidades de tratamento de esgotos e muito vantajoso quando
associado s que removem matria orgnica dissolvida. H aplicaes de
grandes tanques spticos de cmaras em srie antecedendo sistemas de
pequenas lagoas de estabilizao, substituindo as lagoas anaerbias,
para evitar maus odores. Contudo, para ps-tratamento dos efluentes
de tanques spticos, o mais utilizado, no Brasil, o filtro anaerbio.
Os filtros anaerbios consistem basicamente em tanque contendo leito
de pedras ou outro material de enchimento. Na superfcie de cada pea
do material de enchimento ocorre a fixao e o desenvolvimento de
microrganismos na forma de biofilme e tambm agrupam-se
microrganismos, na forma de flocos ou grnulos, nos interstcios do
material de suporte do biofilme. Sendo o fluxo dos esgotos por meio
desses interstcios, em fluxo ascendente ou descendente, permite que
os microrganismos retidos no reator processem a bioconverso da
matria orgnica nos esgotos. Podem ser utilizados como a principal
unidade de tratamento, mas so mais adequados para pr-tratamento,
porque pode ocorrer obstruo dos interstcios do material de
enchimento quando o esgoto contm muitos slidos suspensos. Portanto,
so mais utilizados para remoo da parcela dissolvido da matria
orgnica, precedidos de reatores que removem slidos suspensos.
Evidentemente, o filtro anaerbio no se presta apenas para
ps-tratamento de tanque sptico. Sistemas que associam
decanto-digestor e filtro anaerbio, embora tenham sido mais
aplicados para pequenas vazes, prestam-se, tambm, para tratar vazes
mdias, principalmente quando construdos em mdulos. O reator de
fluxo ascendente atravs da manta de lodo , basicamente, um tanque
no qual os esgotos so introduzidos na parte inferior (fundo) e saem
na parte superior, estabelecendo um fluxo ascendente, por meio de
um leito constitudo por grnulos ou flocos que contm elevada
quantidade de microrganismos atuais. Com o funcionamento do reator,
h tendncia de separao de fases (slidos, lquidos e gases) nos
esgotos introduzidos. Devido s condies hidrulicas impostas, os
slidos suspensos so, em grande parte, retidos no reator. Os
microrganismos agrupam-se em flocos ou grnulos sedimentveis e,
assim, forma-se uma camada espessa de lodo, por meio da qual a
matria orgnica solvel sofre, tambm, a ao dos microrganismos,
presentes em alta concentrao. No final da dcada de 1970, foi
desenvolvida, na Holanda, uma verso moderna do reator de manta de
lodo, com distribuio do esgoto em vrios pontos do fundo do reator e
com separador de fases (decantador e defletor de gases) na parte
superior, que ficou conhecida como UASB. Os modelos mais utilizados
atualmente so variaes do UASB.
38. Cap. 1 Introduo 25 No Brasil, o reator de manta de lodo
utilizado para tratamento de esgotos desde o incio da dcada de
1980, principalmente no Paran, onde tem evoludo em forma e funo,
mediante a experincia de mais de 200 unidades construdas.
Atualmente, o Brasil o pas no qual esse tipo de reator mais tem
sido aplicado e evoludo tecnologicamente, tornando-se cada vez mais
popular. Encontram-se praticamente em todos os estados. No Estado
de So Paulo, tem-se muitas unidades em operao, sendo uma delas a
ETE Piracicamirim, Piracicaba, que atende populao de 92.000
habitantes (3 reatores com volume total de cerca de 7.500 m3). Em
Curitiba, PR, foram construdos 16 reatores de 2.000 m3, conjugados
em grupos de 4, compondo um nico sistema para o tratamento anaerbio
dos esgotos de 600 mil pessoas (sistema Atuba Sul). Em Braslia, DF,
surgem novos modelos simplificados, resultantes de uma nova escola
voltada para a simplificao tecnolgica e para a adequao realidade
brasileira. Em Belm, PA, encontram-se reatores de grande porte. No
Rio Grande do Norte, uma empresa produz e comercializa, para vrios
estados, um modelo com caixa de areia interna, construdo em resina
de polister estruturada com fibra de vidro. Em Minas Gerais,
Pernambuco e Paraba, aplicaes em escala real e pesquisas tambm tm
contribudo para o uso dos reatores de manta de lodo no Brasil. Os
reatores de manta de lodo permitem grande liberdade de projeto em
formas de modelos variados e ainda podem ser bastante aperfeioados
em detalhes construdos. Suas principais desvantagens, em comparao
com os tanques spticos e lagoa anaerbia, so: a grande interferncia
das flutuaes de vazes sobre o sistema; a dependncia da boa operao
do pr-tratamento; maior sensibilidade e esgotos txicos; e operao
mais complexa. Em compensao, o tempo de deteno bem menor que o das
lagoas anaerbias e o mau odor pode ser mais facilmente controlado;
apresenta eficincia maior que o tanque sptico, com tempo de deteno
menor. Em relao ao filtro anaerbio, apresenta a vantagem de no ter
recheio e de no ter problemas de colmatao. Evidentemente, o reator
de manta de lodo pode ser associado a outras unidades de
tratamento, como lagoa de estabilizao, disposio controlada no solo
e outros reatores compactos, anaerbios ou aerbios. A associao de
reatores anaerbios de manta de lodo com reatores aerbios, como
lodos ativados e reatores aerbios submersos, tem-se mostrado
eficaz. Tambm pode ser seguido de sistemas de desinfeco. Vrios
outros modelos, variantes e associaes, de reatores anaerbios tambm
j tm aplicao prtica no Brasil. Por exemplo, unidades compactas que
associam decanto-digestor com filtros anaerbios de fluxo ascendente
e descendente e novos modelos de reatores de manta de lodo, como o
reator compartimentado e o reator seqencial ou reator anaerbio com
chicanas, entre outros. Ademais, esto sendo pesquisadas e
desenvolvidas em escala piloto outras inovaes neste domnio.
39. 26 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo Lagoas de estabilizao esto
perfeitamente aceitas e estabelecidas no Brasil. certamente o meio
mais utilizado. Tem-se evoludo nos procedimentos de projeto e j se
percebem grandes diferenas entre os vrios modelos, as vantagens da
associao em srie e das lagoas rasas e clarificadas para alcanar
alta remoo de patognicos e tambm remover nutrientes eutrofizantes,
se convenientemente projetadas. A disposio controlada no solo ainda
no alcanou seu merecido lugar de destaque h certa inrcia para sua
aceitao no Brasil. Mas j eleita como prioritria pela comunidade
cientfica e tem merecido muitas pesquisas e aplicaes prticas,
acumulando experincia suficiente para um salto de escala. A
disposio no solo a forma mais antiga de depurao controlada dos
esgotos, mas com a acelerao do processo de urbanizao, vrios
fatores, incentivados pela seduo de tecnologias sofisticadas,
levaram ao desenvolvimento de processos de tratamento mais
compactos e disposio dos esgotos nos corpos dgua, aparentemente
abundantes. A disposio de esgotos no solo essencialmente uma
atividade de reciclagem, inclusive para a gua, que viabiliza um
melhor aproveitamento do potencial hdrico e dos nutrientes
presentes nos esgotos, utilizando racionalmente a natureza como
receptora de resduos e geradora de riquezas, sobretudo quando se
explora o sistema solo-vegetais. Sempre que possvel, a disposio
controlada de esgotos ou efluentes tratados no solo uma excelente
providncia; seja como destino final ou antes que atinjam um corpo
dgua. No mnimo porque, dispostos no solo, os esgotos sofrem depurao
natural e, qualquer que seja o grau de tratamento alcanado, so
menos malficos s guas do corpo receptor. A disposio no solo
presta-se como destino final ou tratamento complementar dos
efluentes dos mais diversos sistemas de tratamento. Por si s
constitui tambm uma opo muito eficiente de tratamento (ou
reciclagem) e adequada como destino final. Contudo, mesmo sendo
incontestvel a excelncia do processo como alternativa, no se trata
de uma panacia para o problema do tratamento de esgotos. H restries
ao seu uso; principalmente quanto disponibilidade de rea e solo
adequado (tipo e relevo). O risco sanitrio, visto como restrio, na
verdade muito menor do que geralmente se imagina e pode ser
perfeitamente controlado. A depurao dos esgotos no solo ocorre,
principalmente, devido atividade biolgica, a sua infiltrao e
percolao ou por seu escoamento sobre a superfcie coberta por
vegetao.
40. Cap. 1 Introduo 27 As tcnicas utilizadas nos processos de
infiltrao-percolao so a irrigao de culturas e a infiltrao rpida. A
irrigao o mtodo que requer a maior rea superficial, mas o sistema
natural mais eficiente e de maior aproveitamento produtivo. A
infiltrao rpida presta-se para solos arenosos de alta taxa de
infiltrao, geralmente sem cobertura vegetal. O escoamento superfcie
empregado em solos menos permeveis, cobertos de vegetao. O esgoto
distribudo por meio de canais, tubos perfurados ou aspersores, na
faixa superior de um plano inclinado, sobre o qual escoa at ser
coletado por valas dispostas ao longo da parte inferior. Nos
processos de infiltrao-percolao, o solo e os microrganismos que
nele vivem, como um filtro vivo, atuam na reteno e transformao dos
slidos orgnicos, e a vegetao, quando existente, retira do solo os
nutrientes transformados, evitando a concentrao excessiva
(cumulativa) ao longo do tempo. A gua que no incorporada ao solo e
s plantas perde-se pela evapotranspirao e parte infiltra-se e
percola em direo aos lenis subterrneos. No escoamento sobre
superfcie, a vegetao que cobre o solo, alm de retirar parte dos
nutrientes, atua associada camada superficial do solo, tambm como
um filtro vivo, e ocorrem fenmenos semelhantes de reteno e
transformao da matria orgnica dos esgotos, porm em escoamento
horizontal. A gua que excede ao pouco que se incorpora ou evapora
coletada a jusante, para adequao no destino, ou continua em
rolamento superficial, mais purificada. A reteno fsica (filtrao),
nos processos de infiltrao-percolao, a sedimentao e filtrao
superficial, no escoamento, e a ao dos microrganismos, presentes
nos solos no estreis e nas plantas, so, tambm, os principais
fatores de remoo de microrganismos patognicos. A ao dos
microrganismos na remoo de patognicos tanto direta (competio vital)
como indireta, devido s transformaes bioqumicas do substrato. Outro
fator que determina a eficincia na remoo de patognicos, no sistema
solo-planta, o tempo durante o qual eles permanecem submetidos ao
biolgica e s condies adversas de sobrevivncia (temperatura, luz e
radiaes, pH etc.). Em verdade, na prtica da disposio de esgotos no
solo, ocorrem vrios processos ativos na depurao dos esgotos, quase
sempre de forma conjugada ou conjunta, concomitante. Afora as
bacias de infiltrao sem cobertura vegetal, todas as outras tcnicas
no deixam de ser formas de irrigao com esgoto, com ou sem excedente
de gua a ser drenada aps eficiente ao de transformao do sistema
solo-planta, no qual sempre ocorrem tambm certa infiltrao, evaporao
e formao de biomassa vegetal. So, via de regra, processos de
tratamento e reuso ao mesmo tempo.
41. 28 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo A retomada dos mtodos de disposio de
esgotos no solo faz-se atualmente em larga escala e com grande
sucesso em todo o mundo. Muitos so os exemplos de velhos casos,
ainda em pleno uso, e de novos sistemas que so implantados com
grande intensidade. Como se pode notar, so muitas as opes de
sistemas simples e adequados s condies brasileiras. No entanto, a
adequao realidade depende de condicionantes fsicos, ambientais,
epidemiolgicos, socioculturais e econmicos, que so muito variados.
Em decorrncia das vrias opes e dos inmeros condicionantes, so
muitas as variveis determinantes a serem consideradas na escolha de
alternativas tecnolgicas para tratamento dos esgotos sanitrios.
Devem ser analisadas, avaliadas e comparadas, no mnimo: a eficincia
na remoo de slidos, matria orgnica, microrganismos patognicos e
nutrientes eutrofizantes; a capacidade de observar as variaes
qualitativas e quantitativas do afluente; a capacidade do sistema
de se restabelecer de perturbaes funcionais e a estabilidade do
efluente; os riscos de maus odores e de proliferao de insetos; a
facilidade de modulao e expanso; a complexidade construtiva; as
facilidades e dificuldades para manuteno e operao; o potencial
produtivo e os benefcios econmicos diretos e indiretos, inclusive o
destino final do dinheiro investido e seu retorno social; e os
custos diretos na implantao, manuteno e operao. Em cada caso real,
umas ou outras dessas variveis se revelaro como mais importantes e
determinantes da opo a ser escolhida, sem se perder a viso do
conjunto de fatores intervenientes. Nas condies ambientais,
climticas e econmicas do Brasil, no se pode desprezar as vantagens
e convenincias da aplicao de reatores anaerbios para tratamento dos
esgotos, seja para atingir um primeiro patamar sanitrio de forma
massificada, seja para reduzir os custos de sistemas mais
eficientes; como tambm no se deve prescindir da utilizao da enorme
extenso de solo, para disposio dos esgotos com retorno econmico e
social do capital investido. Referncias Bibliogrficas ANDRADE NETO,
C.O. (1997). Leituras Simples para Tratamento de Esgotos Sanitrios
Experincia Brasileira. ABES. Rio de Janeiro, R5, 301p. CAMPOS, J.R.
(1994). Alternativas para Tratamento de Esgotos Pr-tratamento de
guas para Abastecimento. Assemae, Consrcio Intermunicipal das
Bacias dos Rios Piracicaba e Capivari, Americana, SP, 112p.
42. Captulo 2 Fundamentos do Tratamento Anaerbio Eugenio
Foresti, Lourdinha Florncio, Adrianus Van Haandel, Marcelo Zaiat e
Paula Frassinetti Feitosa Cavalcanti 2.1 Introduo Historicamente, o
homem aprendeu a utilizar os microrganismos anaerbios a seu favor,
como na produo de queijo, vinho e cerveja, muito antes de saber de
sua existncia. Atualmente, aps conhecimento razovel da atividade
dos microrganismos, os produtos das indstrias de derivados do leite
e de bebidas alcolicas constituem o setor mais importante da
bioindstria de alimentos (Zehnder & Svensson, 1986). Para o
tratamento de esgotos, a aplicao da biotecnologia anaerbia pode ser
considerada como relativamente recente, pois vem sendo utilizada de
forma sistemtica h pouco mais de cem anos. A primeira contribuio
significativa ao tratamento anaerbio dos esgotos sanitrios foi a
cmara vedada ao ar, desenvolvida em 1882, na Frana, denominada
Fossa Automtica Mouras, na qual o material em suspenso presente nos
esgotos era liquefeito. Embora essa unidade hoje seja reconhecida
como pouco eficaz, ela foi recebida com grande entusiasmo pelos
tcnicos na poca. A partir de ento, muitas outras cmaras foram
desenvolvidas, resultando no desenvolvimento de vrias concepes,
como: o tanque sptico, em 1895, na Inglaterra, o tanque Talbot, em
1894, nos Estados Unidos, e o tanque Imhoff (bicompartimentado), em
1905, na Alemanha (McCarty, 1982). Embora levassem vantagem sobre
os tanques spticos, os tanques Imhoff apresentavam alguns
problemas, pois alm de serem altos, tinham o tanque de digesto
intimamente conectado cmara de sedimentao. Para superar esse
problema, foram feitas tentativas de promover a digesto em tanque
separado, o que resultou, em 1927, na Alemanha, na instalao do
primeiro sistema de aquecimento de lodo em digestor separado, o
qual apresentava eficincia superior aos tanques Imhoff. A partir
da, a opo para digesto separada do lodo cresceu rapidamente em
popularidade, 29
43. 30 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo especialmente nas grandes cidades. O
aquecimento dos tanques de digesto era feito utilizando-se o prprio
metano produzido no processo (McCarty, 1982). Numerosos estudos
realizados nas dcadas de 1920 e 1930, como o da influncia da
temperatura sobre a velocidade de digesto, da importncia da
inoculao e do controle do pH em sistemas anaerbios, levaram a um
melhor entendimento do processo. Assim, ao final dos anos 30, j se
tinha um conhecimento acumulado razovel do processo para permitir a
sua aplicao prtica no tratamento de lodos de esgotos em digestores
aquecidos. Posteriormente, s durante a dcada de 1950 que ocorreu
significativo desenvolvimento do processo, quando foi reconhecida a
necessidade de manuteno de uma populao grande de bactrias
metanognicas nos digestores. Naquela poca, foi introduzida a
mistura mecanizada nos digestores, como tambm foi desenvolvido o
processo de contato anaerbio, o qual utilizou uma concepo similar a
do processo de lodos ativados, ou seja, foi adicionado um tanque de
sedimentao aps o digestor para coletar e reciclar a biomassa
anaerbia, tornando dessa forma independente o tempo de deteno
hidrulico do tempo de deteno da biomassa no reator (McCarty, 1982).
Foi a partir do final da dcada de 1960, por meio do trabalho
pioneiro de Young & McCarty (1969) sobre tratamento de matria
orgnica solvel utilizando filtros anaerbios ascendentes, que o
processo anaerbio ampliou sua perspectiva de aplicao, abrindo assim
a possibilidade do tratamento direto de guas residurias, ao
contrrio dos anteriores, os quais basicamente eram utilizados para
material mais particulado e concentrado. Na dcada de 1970 vrias
configuraes de reatores anaerbios de alta taxa foram desenvolvidas,
especialmente para o tratamento de guas residurias industriais,
como leito fluidizado e o reator anaerbio de fluxo ascendente
(upflow anaerobic sludge bed UASB). Os principais fundamentos que
levaram ao desenvolvimento dessas configuraes esto apresentados no
Captulo 3. Para os esgotos sanitrios, a aplicao de reatores
anaerbios como principal unidade de tratamento teve incio na dcada
de 1980, principalmente na Holanda, Brasil, Colmbia, ndia e Mxico.
interessante notar que a maior parte dos pases interessados nessa
aplicao dos processos anaerbios, com exceo da Holanda, sejam pases
em desenvolvimento nos quais as condies climticas so favorveis
operao de reatores temperatura ambiente. Alm disso, tem-se
observado tambm o desenvolvimento de novas tecnologias de
tratamento de baixo custo de esgotos sanitrios, somando-se s
existentes, como as lagoas de estabilizao. De qualquer forma, o
desenvolvimento da tecnologia anaerbia s foi possvel e melhor
utilizado com o concomitante desenvolvimento e conhecimento dos
aspectos microbiolgicos, bioqumicos, termodinmicos e cinticos dos
processos anaerbios, os quais so descritos neste captulo.
44. Cap. 2 Fundamentos do Tratamento Anaerbio 31 2.2 Aspectos
Gerais da Digesto Anaerbia A digesto anaerbia um processo biolgico
no qual um consrcio de diferentes tipos de microrganismos, na
ausncia de oxignio molecular, promove a transformao de compostos
orgnicos complexos (carboidratos, protenas e lipdios) em produtos
mais simples como metano e gs carbnico. Os microrganismos
envolvidos na digesto anaerbia so muito especializados e cada grupo
atua em reaes especficas. Nos reatores anaerbios, a formao de
metano altamente desejvel, uma vez que a matria orgnica, geralmente
medida como demanda qumica de oxignio (DQO), efetivamente removida
da fase lquida, pois o metano apresenta baixa solubilidade na gua.
Assim, a converso dos compostos orgnicos em metano eficaz na remoo
do material orgnico, apesar de no promover a sua oxidao completa, a
exemplo de sistemas bioqumicos aerbios. Nos sistemas de tratamento
anaerbio procura-se acelerar o processo da digesto, criando-se
condies favorveis. Essas condies se referem tanto ao prprio projeto
do sistema de tratamento como s condies operacionais nele
existentes. Em relao ao projeto de sistemas de tratamento tm-se
duas prerrogativas bsicas: (a) o sistema de tratamento deve manter
grande massa de bactrias ativas que atue no processo da digesto
anaerbia e (b) necessrio que haja contato intenso entre o material
orgnico presente no afluente e a massa bacteriana no sistema.
Quanto s condies operacionais, os fatores que mais influem so a
temperatura, o pH, a presena de elementos nutrientes e a ausncia de
materiais txicos no afluente. O desenvolvimento de reatores
fundamentados no processo anaerbio, ocorrido nas ltimas dcadas, vem
provocando mudanas profundas na concepo dos sistemas de tratamento
de guas residurias. A maior aceitao de sistemas de tratamento
anaerbio se deve a dois fatores principais: as vantagens
consideradas inerentes ao processo da digesto anaerbia em comparao
com o tratamento aerbio e a melhoria do desempenho dos sistemas
anaerbios modernos, tendo-se um aumento muito grande no somente da
velocidade de remoo do material orgnico, mas tambm da porcentagem
de material orgnico digerido. O melhor desempenho dos sistemas
anaerbios, por sua vez, o resultado da melhor compreenso do
processo da digesto anaerbia, que permitiu o desenvolvimento de
sistemas modernos, muito mais eficientes que os sistemas clssicos.
A tendncia de uso do reator anaerbio como principal unidade de
tratamento biolgico de esgoto deve-se, principalmente, constatao de
que frao considervel do material orgnico (em geral prxima de 70%)
pode ser removida, nessa unidade, sem o dispndio de energia ou adio
de substncias qumicas auxiliares. Unidades de ps-tratamento podem
ser usadas para a remoo de parcela da frao remanescente de material
orgnico, de forma a permitir a produo de efluente final com
qualidade
45. 32 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo compatvel com as necessidades que se
impem pelos padres legais de emisso de efluentes e a preservao do
meio ambiente. Dentre as vantagens amplamente reconhecidas dessa
concepo de sistemas de tratamento podem ser citadas: a) Baixo
consumo de energia. b) Menor produo de lodo de excesso e, portanto,
economia considervel no manejo e destino final desse tipo de resduo
dos sistemas de tratamento. c) Possibilidade de recuperao e
utilizao do gs metano como combustvel. d) Possibilidade de
funcionar bem mesmo aps longos perodos de interrupo (importante
para efluentes sazonais). Os principais aspectos negativos esto
relacionados com: a) Longo perodo de partida do sistema se no h
disponibilidade de inculo adequado. b) Sensibilidade do processo a
mudanas das condies ambientais (pH, temperatura, sobrecargas
orgnicas e hidrulicas). c) Possvel emisso de odores ofensivos.
Neste captulo so discutidos alguns aspectos importantes da digesto
anaerbia, incluindo o metabolismo bacteriano, os processos de
converso, os aspectos termodinmicos, a cintica do processo e os
fatores ambientais. 2.3 Metabolismo Bacteriano Em sistemas de
tratamento biolgico, o material orgnico presente na gua residuria
convertido pela ao bioqumica de microrganismos, principalmente
bactrias hetertrofas. A utilizao do material orgnico pelas
bactrias, tambm chamada de metabolismo bacteriano, se d por dois
mecanismos distintos, chamados de anabolismo e catabolismo. No
anabolismo, as bactrias hetertrofas usam o material orgnico como
fonte material para a sntese de material celular, o que resulta no
aumento da massa bacteriana. No catabolismo, o material orgnico
usado como fonte de energia por meio de sua converso em produtos
estveis, liberando energia, parte da qual usada pelas bactrias no
processo de anabolismo. A natureza dos produtos catablicos depende
da natureza das bactrias hetertrofas, que por sua vez depende do
ambiente que prevalece no sistema de tratamento. Distinguem-se,
basicamente, dois ambientes diferentes: o aerbio, no qual h presena
de oxignio que pode funcionar como oxidante de material orgnico, e
o anaerbio, no qual tal oxidante no existe. No ambiente aerbio, o
material orgnico mineralizado pelo oxidante para produtos
inorgnicos, principalmente dixido de carbono e gua. No ambiente
anaerbio se desenvolvem processos alternativos chamados de
fermentaes que se caracterizam
46. Cap. 2 Fundamentos do Tratamento Anaerbio 33 pelo fato de o
material orgnico sofrer transformaes sem contudo ser mineralizado
(oxidado). A digesto anaerbia o processo fermentativo que tem entre
seus produtos finais o metano e o dixido de carbono. Como grande
parte dos produtos da digesto anaerbia constituda por gases, estes
se desprendem da gua residuria, formando uma fase gasosa, o biogs.
Dessa forma, h remoo do material orgnico na fase lquida por meio da
sua transferncia para a fase gasosa, embora o material orgnico no
seja mineralizado como no caso do catabolismo oxidativo. 2.4
Processos de Converso em Sistemas Anaerbios A digesto anaerbia um
processo bioqumico complexo, composto por vrias reaes seqenciais,
cada uma com sua populao bacteriana especfica. A Figura 2.1 mostra
uma representao esquemtica dos vrios processos que ocorrem na
digesto anaerbia, sugerida por vrios autores (Kaspar &
Wuhrmann, 1978; Gujer & Zehnder, 1983; Zinder & Koch, 1984;
entre outros). Para digesto anaerbia de material orgnico complexo,
como protenas, carboidratos e lipdios (a maior parte da composio do
material orgnico em guas residurias formada por esses grupos),
podem-se distinguir quatro etapas diferentes no processo global da
converso. Hidrlise Neste processo, o material orgnico particulado
convertido em compostos dissolvidos de menor peso molecular. O
processo requer a interferncia das chamadas exo-enzimas que so
excretadas pelas bactrias fermentativas. As protenas so degradadas
por meio de (poli)peptdios para formar aminocidos. Os carboidratos
se transformam em acares solveis (mono e dissacardeos) e os lipdios
so convertidos em cidos graxos de longa cadeia de carbono (C15 a
C17) e glicerina. Em muitos casos, na prtica, a velocidade de
hidrlise pode ser a etapa limitativa para todo o processo da
digesto anaerbia, isto , a velocidade da converso do material
orgnico complexo para biogs limitada pela velocidade da hidrlise.
Acidognese Os compostos dissolvidos, gerados no processo de
hidrlise ou liquefao, so absorvidos nas clulas das bactrias
fermentativas e, aps a acidognese, excretadas como substncias
orgnicas simples como cidos graxos volteis de cadeia curta (AGV),
lcoois, cido ltico e compostos minerais como CO2, H2, NH3, H2S etc.
A fermentao acidognica realizada por um grupo diversificado de
bactrias, das quais a maioria anaerbia obrigatria. Entretanto,
algumas espcies so facultativas e podem
47. 34 Tratamento de Esgotos Sanitrios por Processo Anaerbio e
Disposio Controlada no Solo metabolizar material orgnico por via
oxidativa. Isso importante nos sistemas de tratamento anaerbio de
esgoto, porque o oxignio dissolvido, eventualmente presente,
poderia se tornar uma substncia txica para as bactrias metanognicas
se no fosse removido pelas bactrias acidognicas facultativas.
MATERIAL ORGNICO EM SUSPENSO PROTENAS, CARBOIDRATOS, LIPDIOS 21 39
5 40 AMINOCIDOS, ACARES 34 CIDOS GRAXOS 66 46 34 OUTROS 1 11 35
Acidognese 15 5 PIRUVATO Hidrlise PROPIONATO CIDOS GRAXOS 23 9
Acetognese 6 4 ACETATO 11 HIDROGNIO Metanognese 30 Hidrogenotrfica
70 Acetotrfica METANO 100% DQO Figura 2.1 A seqncia de processos na
digesto anaerbia de macro molculas complexas (os nmeros referem-se
a percentagens, expressas como DQO). Acetognese A acetognese a
converso dos produtos da acidognese em compostos que formam os
substratos para produo de metano: acetato, hidrognio e dixido de
carbono. Conforme indicado na Figura 2.1, aproximadamente 70% da
DQO digerida convertida em cido actico, enquanto o restante da DQO
concentrado no hidrognio formado. Pela estequiometria, dependendo
do estado de oxidao do material orgnico a ser digerido, a formao de
cido actico pode ser acompanhada pelo surgimento de dixido de
carbono ou hidrognio. Entretanto, o dixido de carbono tambm gerado
na prpria metanognese. Na presena de dixido de carbono e hidrognio,
um terceiro
48. Cap. 2 Fundamentos do Tratamento Anaerbio 35 processo da
acetognese pode se desenvolver: a homoacetognese, ou seja, a reduo
de dixido de carbono para cido actico pelo hidrognio. Entretanto,
por razes termodinmicas que sero apresentadas no item a seguir, nos
reatores anaerbios essa rota metablica pouco provvel de acontecer,
pois as bactrias acetognicas so superadas pelas bactrias
metanognica