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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA – UNICURITIBA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSO EM DIREITO
EMPRESARIAL E CIDADANIA
GRAZIELA CRISTINA DA SILVA BORGES MACHADO
SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA DO ICMS: POSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO DA DIFERENÇA DO ICMS PAGO A MAIOR NAS OPERAÇÕES COM MERCADORIAS
CURITIBA 2016
CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA – UNICURITIBA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSO EM DIREITO
EMPRESARIAL E CIDADANIA
GRAZIELA CRISTINA DA SILVA BORGES MACHADO
SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA DO ICMS: POSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO DA DIFERENÇA DO ICMS PAGO A MAIOR NAS OPERAÇÕES COM MERCADORIAS
Dissertação apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Direito, do Centro Universitário Curitiba. Orientador: Demetrius Nichele Macei Co-orientador: Francisco Cardozo Oliveira
CURITIBA 2016
GRAZIELA CRISTINA DA SILVA BORGES MACHADO
DISSERTAÇÃO APROVADA COMO REQUISITO PARCIAL PARA A OBTENÇÃO DO TÍTULO DE MESTRE EM DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA,
PELA BANCA EXAMINADORA FORMADA PELOS PROFESSORES:
________________________________________
Orientador: Profº. Dr. Demetrius Nichele Macei
________________________________________
Co-orientador: Profº. Dr. Francisco Cardozo Oliveira
________________________________________________
Membro Externo: Profª. Dra. Betina Treiger Grupenmacher
Curitiba, 16 de Junho de 2016
Ao meu pai ERIVALDO (em memória),
A minha mãe CONCEIÇÃO, razão do meu existir.
Ao meu marido CRISTIANO,
pelo amor e compreensão.
Aos meus irmãos DINO e GREICE, por estarem sempre comigo.
A tia TETERA, ao tio SATIL e ao tio JUCA,
por serem meu ponto de apoio e auxílio.
A TIARA, CARLOS, CLARA, MARLI, família do coração.
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, pelo dom da vida.
A minha mãe, primeira incentivadora dos meus estudos, e aos meus irmãos,
Dino e Greice, por se manterem firmes ao meu lado.
Ao Cris, pelo apoio incondicional na minha escolha acadêmica, pela
compreensão e amor a mim dispensados nesta longa jornada.
A todos os familiares e amigos que sempre me apoiaram, torceram e torcem
por mim.
As amigas e sócias Tânia e Letícia, por compreenderem e suprirem minha
ausência no labor diário.
Agradecimento especial a Letícia, que me auxiliou, nas sugestões e correções
finais do trabalho.
A todos os professores, funcionários, amigos e colegas do Centro Universitário
Curitiba, que direta ou indiretamente contribuíram para esse momento.
A professora Dra. Betina Treiger Grupenmacher, minha primeira inspiração nos
estudos do direito tributário.
Ao professor Dr. Francisco Cardozo Oliveira, meu co-orientador, pelo apoio e
acolhimento recebido desde as primeiras aulas do mestrado.
Finalmente, ao meu orientador, Professor Dr. Demetrius Nichele Macei, pessoa
de caráter ilibado, verdadeiro porto “seguro”, que se fez presente em todos os
momentos dessa árdua caminhada e me instigou para o estudo da moralidade sobre
a perspectiva do direito tributário. Sem o seu apoio acadêmico, profissional e pessoal
nada disso seria possível.
“Sem impostos e contribuintes
não há como construir
um Estado, nem o Estado de Direito
nem muito menos algum Estado Social”.
(KLAUS TIPKE)
RESUMO
A substituição tributária progressiva do ICMS é utilizada pelos Estados como importante mecanismo de controle e arrecadação. Por meio deste regime, a lei atribui a terceiro a responsabilidade pela retenção e recolhimento do imposto devido nas etapas subsequentes, ou seja, o ICMS que seria devido em cada etapa do ciclo de comercialização passa a ser exigido antecipadamente do responsável por substituição, denominado substituto tributário. Por se referir a uma antecipação do imposto devido nas operações subsequentes, o seu cálculo ocorre por meio da aplicação de margem presumida, denominada MVA ou IVA-ST, sobre o valor da operação ou via valores fixos determinado pelo próprio Estado, pelo estabelecimento fabricante ou por órgão público competente. Em virtude desta presunção, os Estados permitiam aos contribuintes substituídos que efetuassem os pedidos de restituição quando comprovada a diferença entre a base de cálculo presumida e o valor real da operação, entretanto, após o julgamento da ADI 1.851-4/AL pelo Supremo Tribunal Federal em que se reconheceu que o fato gerador presumido não é provisório, mas definitivo, os Estados deixaram de restituir as diferenças. Nesse contexto, o presente estudo, tem por objetivo, identificar o conteúdo e o alcance do art. 150, § 7º, da CF, que prevê a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido. Visando atingir o objetivo proposto, proceder-se-á, análise sistemática do texto constitucional, utilizando-se da pesquisa bibliográfica e jurisprudencial. Palavras-chave: ICMS; substituição tributária; base de cálculo; fato gerador presumido; restituição.
ABSTRACT
The ICMS progressive tax substitution is used by States as an important mechanism of control and collection. When employing such system, the law imposes the third party the liability of retention and collection of due taxes in the subsequent steps; that is, the ICMS owed in each stage of the commercializing cycle is then charged in advance from the one liable for the substitution, named 'tax substitute'. Since it refers to a prepayment of taxes owed in the subsequent operations, its calculation is done with a presumed value margin, called MVA or IVA-ST, applied over the operation value or fixed operation values determined by the State itself, the manufacturer or competent public agency. Because of this presumption, States allowed substituted taxpayers to file for restitution whenever they prove the difference between the presumed tax basis and the actual operation value. However, after trial of the Direct Action of Unconstitutionality no. 1851-4/AL by the Brazilian Supreme Federal Court, in which the one recognized that the presumed taxable event is not provisory, the States stopped refunding such differences. In this context, the present study aims at identifying the content and scope of the Constitutional article 150, § 7th, which provides the immediate e preferential refund of paid amounts should the presumed taxable event dos not occur. In order to achieve the proposed goal, one shall analyse the systematic of the constitutional text by making use of bibliographical and jurisprudential research. Keywords: ICMS; tax substitution; tax basis; presumed taxable event; refund.
LISTA DE SIGLAS
ADI - Ação Direta de Inconstitucionalidade
AL - Alagoas
ADCT - Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
BC ST - Base de Cálculo do ICMS Substituição Tributária
CF/88 - Constituição Federal de 1988
CMED - Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos
CONFAZ - Conselho de Política Fazendária
CPC - Código de Processo Civil
CTN - Código Tributário Nacional
EC - Emenda Constitucional
ICMS
- Imposto sobre operações relativas à Circulação de
Mercadorias e sobre prestações de Serviços de transporte
interestadual e intermunicipal e de comunicação
ICMS ST - ICMS Substituição Tributária
ISS - Imposto sobre Serviços
IVA-ST - Índice de Valor Adicionado Setorial
IPI - Imposto sobre Produtos Industrializados
IR - Imposto de Renda
LC - Lei Complementar
LO - Lei Ordinária
MG - Minas Gerais
MVA - Margem de Valor Agregado
PMC - Preço Máximo a Consumidor
PR - Paraná
RE - Recurso Extraordinário
RICMS/PR - Regulamento do ICMS do Estado do Paraná
SP - São Paulo
STJ - Superior Tribunal de Justiça
STF - Superior Tribunal Federal
SUMÁRIO
RESUMO...............................................................................................................6
ABSTRACT...........................................................................................................7
LISTA DE SIGLAS................................................................................................8
INTRODUÇÃO ................................................................................................... 11
CAPÍTULO I – O ICMS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 ..................................... 15
1. O SISTEMA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO ........................................... 15
1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS ....................................................................... 15
1.2 O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA ..................................... 22
1.3 O PRINCÍPIO DA MORALIDADE.................................................................28
1.4 OUTROS PRINCÍPIOS CONECTADOS AO TEMA......................................34
1.4.1 Vedação ao Confisco.................................................................................34
1.4.2 Não-Cumulatividade...................................................................................37
1.4.3 Segurança Jurídica....................................................................................42
1.5 O PAPEL DA LEI COMPLEMENTAR NO DIREITO TRIBUTÁRIO .............. 45
2. A REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA DO ICMS ............................................ 51
2.1 COMPREENDENDO OS SEUS CRITÉRIOS .............................................. 51
2.2 A IMPORTÂNCIA DO “PRESCRITOR” PARA A COMPREENSÃO DA
SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA PROGRESSIVA DO ICMS ............................... 55
2.2.1 Considerações Iniciais.............................................................................. 55
2.2.2 Sujeito Passivo.......................................................................................... 56
2.2.3 Base de Cálculo........................................................................................ 59
CAPÍTULO II – RESPONSABILIDADE E SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA ....... 63
1. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA ........................................................... 63
2. A SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA .................................................................. 70
2.1 CONCEITO E ORIGEM ............................................................................... 70
2.2 AS ESPÉCIES DE SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA DO ICMS ...................... 74
2.2.1 Substituição Tributária Concomitante........................................................75
2.2.2 Substituição Tributária Regressiva ou "Para Trás" .....................................77
2.2.3 Substituição Tributária Progressiva ou "Para Frente".................................79
2.2.3.1 Legislação...............................................................................................79
2.2.3.2 Operacionalidade....................................................................................83
CAPÍTULO III – DIREITO A RESTITUIÇÃO DO ICMS PAGO A MAIOR ......... 90
1. ENTENDENDO O MECANISMO DE CÁLCULO DA SUBSTITUIÇÃO
TRIBUTÁRIA PROGRESSIVA .......................................................................... 90
2. CONSEQUÊNCIAS DA DECISÃO PROLATADA NA ANÁLISE DA AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – ADI 1.851-4/AL ......................... 100
3. ACEITAÇÃO DE REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO
EXTRAORDINÁRIO 593.849-2/MG – UMA LUZ NO FIM DO TÚNEL ............ 110
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 120
REFERÊNCIAS ............................................................................................... 129
INTRODUÇÃO
O estudo ora proposto, tem por objeto de análise a responsabilidade por
substituição, especificamente, a substituição tributária progressiva do ICMS.
O ICMS abrange um universo amplo ao incidir sobre operações relativas à
circulação de mercadorias e sobre prestações de serviço de transporte interestadual
e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações ou prestações se iniciem
no exterior, configurando-se um dos impostos mais complexos do sistema tributário
brasileiro1.
Dos impostos de competência dos Estados, ele é, o mais importante (do ponto
de vista econômico). Conforme leciona Carrazza2: “é ele que envolve maiores
quantias de dinheiro e, certamente por isso, aquele que, de longe, mais controvérsias
suscita”.
Para a correta compreensão da relação jurídica tributária que se estabelece
entre o Estado e o particular, é necessário, compreender a estrutura do imposto – o
vínculo que os une.
Para elucidar esse vínculo, Paulo de Barros Carvalho, apresentou uma
estrutura capaz de explicar o fenômeno jurídico-tributário, denominada de “Regra
Matriz de Incidência”.
A regra matriz de incidência apresenta duas partes: a primeira, denominada
“descritora” trará a previsão de um fato; a segunda, denominada de “prescritora”
prescreverá os efeitos jurídicos decorrente do acontecimento do fato cogitado.3
Cada uma das partes é formada por critérios, no descritor, têm-se os critérios:
“material”, “espacial” e “temporal”; no prescritor encontram-se os critérios:
“quantitativo” (base de cálculo e alíquota) e “pessoal” (sujeito ativo e sujeito passivo).4
É o critério pessoal que define os sujeitos da relação jurídica. No polo ativo,
identifica-se o titular do direito subjetivo de exigir a prestação pecuniária, e no polo
passivo, os sujeitos de quem se exige a obrigação tributária, identificado pelo
1COÊLHO. Sacha Calmon Navarro. Comentários à constituição de 1988: sistema tributário. Rio de
Janeiro: Forense, 2006, p. 440. 2 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 44. 3 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 262-263. 4 ibid., 262-263.
“contribuinte”, definido como o que mantém relação pessoal e direta com o fato
gerador, e, o “responsável”, cuja obrigação decorre de disposição expressa de lei.
Dentro da responsabilidade tributária, em sentido amplo, se insere a
substituição tributária do ICMS.
A substituição tributária progressiva, popularmente nominada “substituição
tributária para frente” ou “substituição tributária subsequente” do ICMS é aquela em
que a lei atribui a terceiro a responsabilidade pela retenção e recolhimento do imposto
devido nas etapas subsequentes, ou seja, o ICMS que seria devido em cada etapa do
ciclo de comercialização passa a ser exigido antecipadamente do responsável por
substituição, denominado “substituto tributário”, geralmente o primeiro
estabelecimento de uma rede de relações comerciais: indústrias, importadores, e, em
alguns casos, distribuidores.
Com a substituição tributária progressiva, o Estado, garante o recolhimento do
imposto antecipadamente. Exige-se do primeiro estabelecimento do ciclo de
comercialização, o montante do ICMS que seria devido até o consumidor final, por
meio de base de cálculo presumida, relativamente a fato futuro e incerto.
O cálculo para este recolhimento se dá através de valores, geralmente
expressos por percentuais5, que uma vez aplicados sobre o valor dos produtos
acabam por gerar uma base de cálculo presumida. Tais percentuais são denominados
MVA ou IVA-ST (Margem de Valor Agregado ou Índice de Valor Adicionado Setorial)
e incidem sobre o valor da operação praticado pelo substituto responsável.
Por se tratar de presunção, a base de cálculo utilizada para o cálculo do ICMS
a ser recolhido antecipadamente pelo “responsável por substituição”, geralmente,
diverge, do valor real da operação praticado pelo “contribuinte (substituído)”, quando
este efetua a venda do produto na etapa final de comercialização.
Nos últimos anos, os Estados, por questões de política econômica e tributária
interna, passaram a incluir na sistemática de substituição tributária progressiva do
ICMS, uma quantidade expressiva de produtos dos mais diferentes setores e
segmentos (eletrodomésticos, alimentos, peças, artigos de papelaria, cosméticos,
produtos eletrônicos, materiais de construção, etc.).
5 Também é possível, que o cálculo do ICMS substituição tributária ocorra por meio de valores fixos, determinado pelos Estados, sugeridos pelas empresas ou por órgão público competente, conforme se verificará no presente estudo.
Para agravar ainda mais este cenário, não é raro a empresa praticar a venda
da mercadoria a outra Unidade da Federação e quando da entrada desta no território
do Estado receptor, ser compelida ao recolhimento do imposto pelo fato da existência
da substituição tributária progressiva, decorrente de normas internas.
Este é outro problema decorrente da substituição tributária progressiva do
ICMS, que é a sua instituição por meio de “legislações internas”, “convênios” ou
“protocolos”.
Ainda que haja argumentos para questionar a validade da substituição tributária
progressiva, a jurisprudência pacificou o entendimento de que é possível a sua
aplicação6, entretanto, ainda reside a discussão em torno da exigência de base de
cálculo presumida que ao final do ciclo de comercialização pode se mostrar menor do
que a fixada anteriormente.
O Supremo Tribunal Federal já julgou, por unanimidade (ADI 1.851-4/AL, rel.
Min. Ilmar Galvão, 08.05.2002), que é válida a cláusula segunda do Convênio ICMS
nº 13/97, que determina a não restituição do ICMS quando a operação subsequente
à cobrança do imposto, sob a modalidade da substituição tributária, se realizar por
valor inferior ao presumido.
O argumento aceito pela maioria dos ministros, foi de que na substituição
tributária progressiva, o fato gerador presumido não é provisório, mas definitivo, não
se cogitando de restituição do imposto por recolhimento a maior, exceto, quando não
realizado o fato gerador presumido, ou seja, quando não houver operação
subsequente com a mercadoria sujeita ao referido regime.
Também se entende que o regime da substituição tributária progressiva do
ICMS, previsto no texto constitucional, é adotado para evitar a sonegação fiscal,
facilitar a fiscalização e controle do imposto, ou seja, tornar mais eficiente às
atividades de tributação e arrecadação.
Em virtude da identificação do problema gerado pela utilização de base de
cálculo presumida, no regime da substituição tributária progressiva, o presente estudo,
tem como intuito verificar a possibilidade de restituição do ICMS nas operações com
mercadorias, tendo como base o § 7º do art. 150, da CF/88, que determina a imediata
preferencial restituição, caso não se realize o fato gerador presumido.
6 Vide RE 213.396/SP. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1673054>. Acesso em: 05 abr. 2016.
Para trilhar o referido caminho, o estudo ora proposto, tem por objetivo geral
verificar primeiramente o enquadramento do ICMS dentro do sistema constitucional,
analisando os princípios constitucionais, a regra matriz de incidência, bem como o
papel que a Lei Complementar desempenha no campo tributário (Capítulo I).
Na sequência, analisar-se-á a responsabilidade tributária em sentido amplo,
com o objetivo de debruçar-se sobre a espécie de responsabilidade por substituição
(Capítulo II).
Adentrando a problemática levantada, tem-se como objetivo específico
identificar o conteúdo e o alcance do art. 150, § 7º, da CF, que prevê a imediata e
preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido
(Capítulo III).
Salienta-se que a constitucionalidade do direito a restituição, está sob análise
do Supremo Tribunal Federal, que no de 2009, aceitou o Recurso Extraordinário
593.849-2/MG, sob o rito da Repercussão Geral, ainda não julgado, mas que servirá
de paradigma não só para todos os demais processos em que se analisa o referido
tema, como para o legislador dos respectivos Estados, que atualmente não permitem
aos contribuintes reaver os valores recolhidos a maior.
Por isso, entende-se, que a pesquisa proposta, apresenta relevância não
apenas jurídica, por envolver a análise constitucional que o tema reclama, mas
também econômica, uma vez que sabidamente os tributos impactam nas atividades
das empresas e do próprio Estado.
Destaca-se, que a repercussão geral dada ao assunto pelo STF, demonstra a
sua importância, pois, para sua consideração é necessária a existência de questões
relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem
os interesses subjetivos da causa (§ 1º do art. 1.035, CPC).
A partir da pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, optou-se pelo método de
abordagem dedutivo, dialético e crítico do tema pesquisado.
CAPITULO I – O ICMS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988
1. O SISTEMA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO
1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS
A análise do sistema constitucional é a base para o estudo de qualquer tema
que se pretenda tratar dentro de um Estado Democrático de Direito7. Como pontifica
Carrazza8, “a Constituição é o limite do Poder Público e o fundamento de todo o
sistema jurídico”.
Regina Helena Costa, destaca que a Constituição abriga quatro temas
fundamentais no âmbito tributário: previsão das regras-matrizes de incidência;
classificação dos tributos; repartição das competências tributárias e as limitações ao
poder de tributar.9
Ao esclarecer sobre as normas constitucionais, Carrazza10, alerta que essas se
“caracterizam-se pela imperatividade de seus comandos, que obrigam – reiteramos –
não só as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou de direito privado, como
o próprio Estado”, logo, não há dúvidas de que todos se submetem a Constituição.
7 “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos”. (BRASIL, Constituição Federal (1988). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm> Acesso em: 05 abr. 2016). 8 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 37. 9 “A Constituição da República, à evidência, é a principal fonte do direito tributário no Brasil. Abriga os lineamentos para o adequado exercício da ação estatal de exigir tributos, cuidando, assim, de quatro temas fundamentais: (i) a previsão das regras-matrizes de incidência, isto é, das situações fáticas que poderão ser apreendidas pelo legislador infraconstitucional para a instituição de hipóteses de incidência tributária; (ii) a classificação dos tributos, estabelecendo suas espécies, consoante o critério da existência, ou não, de atuação estatal que dê suporte à exigência fiscal; (iii) a repartição de competências tributárias, decorrência da adoção da forma federativa de Estado, estatuindo a aptidão para instituir tributos outorgadas a cada pessoa política; e, finalmente, (iv) as limitações ao poder de tributar, traduzidas, essencialmente, na definição de princípios e imunidades”. (COSTA, Regina Helena. Praticabilidade e justiça tributária: exequibilidade da lei tributária e direitos do contribuinte. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 85). 10 CARRAZZA, op. cit., p. 37.
O “Sistema Tributário Nacional”, denominação prevista na Constituição, se
encontra inserido no Título VI (Tributação e Orçamento), Capítulo I (Sistema Tributário
Nacional).
Embora utilize-se a denominação “Sistema Tributário”, Paulo de Barros
Carvalho, observa que na verdade não se trata, propriamente, de um “sistema
tributário”, mas de um subsistema constitucional tributário11.
O Capítulo I (Sistema Tributário Nacional), por sua vez, está divido em seções
(I a VI), que abarcam os arts. 145 a 162 da Constituição Federal. São 17 artigos que
especificamente tratam da tributação, o que revela uma preocupação do legislador
constituinte com o detalhamento das normas de tributação.
Assim, percebe-se, que a Constituição dedicou importante espaço para dispor
sobre a tributação.12
Nesse contexto, importante observação é feita por Sacha Calmon Navarro
Coêlho13, ao comparar o sistema tributário brasileiro com o de outros países:
“O Brasil, ao contrário, inundou a Constituição com princípios e regras atinentes ao
Direito Tributário. Somos, indubitavelmente, o país cuja Constituição é a mais extensa
e minuciosa em tema de tributação”.
Para Humberto Ávila trata-se de um sistema rígido, pois, comporta de um lado
a repartição de competências e de receitas, e; do outro, a rigidez das normas inseridas
no texto constitucional14.
Paulo de Barros Carvalho15 também é determinante ao tratar da rigidez
constitucional alertando que: “para sua alteração existe um procedimento mais solene
e complexo do que o exigido par a elaboração das leis ordinárias”.
11 “Se é correto mencionarmos a Constituição brasileira, como sistema de proposições normativas, integrantes de outro sistema de amplitude global que é o ordenamento jurídico vigente, podemos, é claro, analisar os subconjuntos que nele existem. O que nos interessa agora é a subclasse, o subconjunto ou o subsistema constitucional tributário, formado pelo quadro orgânico das normas que versem matéria tributária, em nível constitucional”. (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 156). 12 “É ponto bem assentado que a Constituição Brasileira ocupou-se, de espaço, com a tributação, vale dizer, com a ação estatal de exigir tributos. Dito de outro modo, ela contém grande número de disposições que tratam, direta ou indiretamente, de matérias tributárias”. (CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 417). 13 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à constituição de 1988: sistema tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 4. 14 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva. 2012, p. 102. 15 CARVALHO, op. cit., p. 156.
Por isso, cada ente ao criar os respectivos tributos encontra-se subordinado
aos comandos dispostos no texto constitucional, não havendo espaço para inovação,
conforme destaca Carrazza16:
Portanto, no Brasil, o legislador de cada pessoa política (União, Estados, Municípios ou Distrito Federal), ao tributar, isto é, ao criar, in abstracto, tributos, vê-se a braços com o seguinte dilema: ou praticamente reproduz o que consta da Constituição – e, ao fazê-lo, apenas recria, num grau de concreção maior, aquilo que nela já se encontra previsto – ou, na ânsia de ser original, acaba ultrapassando as barreiras que ela lhe levantou e resvala para o campo da inconstitucionalidade.
Na Seção I (Dos Princípios Gerais) do Capítulo I (Do Sistema Tributário
Nacional) do Título VI (Da Tributação e do Orçamento) encontram-se as regras e
princípios que norteiam o poder de tributar.
Os princípios, pondera Paulo de Barros Carvalho17, são “como linhas diretivas
que iluminam a compreensão de setores normativos, imprimindo-lhes caráter de
unidade relativa e servindo de fator de agregação num dado feixe de normas”.
Também, Sacha Calmon Navarro Coêlho18, assevera que: “O que caracteriza
os princípios é que não estabelecem um comportamento específico, mas uma meta,
um padrão”.
O caput do art. 145 da CF/88 (primeiro do sistema tributário) traz importante
consideração em relação ao poder de tributar da União, Estados, Distrito Federal e
Municípios, dispondo que esses podem instituir impostos, taxas e contribuição de
melhoria.
Conforme observa Sacha Calmon Navarro Coêlho, é possível depreender do
art. 145, três importantes considerações: a) as pessoas políticas que detém a
competência para tributar (União, Estados, Distrito Federal e Municípios); b) as
espécies de tributo, neste caso, taxa, contribuição de melhoria e impostos, e; c) a
repartição das competências pela natureza dos fatos geradores19.
16 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 419. 17 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 163. 18 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à constituição de 1988: sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 65. 19 Ibid., p. 35-36.
Em relação a classificação dos tributos, depreende-se da leitura do art. 145,
que o tributo é gênero que tem como espécies: taxa, contribuição de melhoria e
impostos.
Então como seriam tratados os empréstimos compulsórios e as contribuições
que não de melhoria previstas no texto constitucional?
Luís Eduardo Schoueri20, adverte que: “o artigo 145 não declara que no Brasil
existem apenas três espécies de tributos; ele apenas arrola três espécies que podem
ser instituídas tanto pela União, como pelos Estados, Distrito Federal e Municípios”.
Igualmente, Paulsen21, assevera que “as contribuições e os empréstimos
compulsórios constituem espécies tributárias autônomas, não configurado simples
impostos com destinação ou impostos restituíveis”.
Estevão Horvath22, pondera haver cinco espécies de tributos no ordenamento
jurídico brasileiro: impostos, taxas, contribuição de melhoria, empréstimos
compulsórios e outras contribuições, tal entendimento explica o autor: “cremos que o
critério da vinculabilidade ou não do fato tributário a uma atuação do Estado é
imprescindível para classificar tributos, porém não mais suficiente”.
De maneira contrária, Carrazza23, pondera haver apenas três espécies
tributárias:
Apesar de o assunto ainda suscitar acaloradas discussões doutrinárias, continuamos entendendo que a destinação da receita proveniente da tributação não altera – pelo menos não necessariamente – a classificação supra. Nesse sentido, já adiantamos que os empréstimos compulsórios (tributos cuja receita há de ser devolvida ao contribuinte) e as ‘contribuições’ (tributos com destinação especificada nos arts. 149 e 195 da CF) podem ser reconduzidos às modalidades de imposto, taxa ou, no caso daqueles, até, contribuição de melhoria.
Para Sacha Calmon Navarro Coêlho, os tributos se dividem em vinculados
(atuação do Estado) e não vinculados (não atuação do Estado). Duas são as espécies
de tributos vinculados: taxas (de polícia e de serviços) e contribuições (de melhoria e
previdenciária). O tributo não vinculado refere-se aos impostos que se divide em:
20 SCHOUERI, Luís Eduardo. 2º ed. Direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 155. 21PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário: completo. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014, p. 44. 22HORVATH, Estevão. O princípio do não-confisco no direito tributário. São Paulo: Dialética, 2002, p. 127. 23CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros,
2011, p. 558
gerais; restituíveis; impostos especiais, afetados, finalísticos (contribuições
interventivas, corporativas e sociais).24
A Seção II do Capítulo I do Sistema Tributário dispõe sobre as limitações ao
poder de tributar.
Trata-se de um estatuto de proteção ao contribuinte, pois, relaciona regras e
princípios25. São eles: legalidade, isonomia, anterioridade anual e nonagesimal,
irretroatividade, confisco, limitação ao tráfego.
Também há princípios não expressos ou implícitos, como observa Paulsen26,
“há princípios que não constam expressamente no art. 150, como o da segurança
jurídica em matéria tributária”, mas cuja aferição, segundo Luís Eduardo Schouri27:
“decorrem de uma leitura atenta dos textos legais”.
Ainda no art. 150, VI da CF/88, encontram-se as imunidades28 constitucionais,
entretanto, importa destacar, que as demais situações imunizantes são verificadas no
decorrer do texto constitucional, como por exemplo, a que prevê a não incidência do
ICMS na exportação de mercadorias para o exterior (art. 155, § 2º, X, “a”).
Os impostos encontram-se nominados e repartidos no texto constitucional entre
a União, Estados e o Distrito Federal e os Municípios, todavia, o art. 154 dispõe que
a União poderá instituir outros impostos (impostos residuais), mediante lei
complementar, desde que não comportem hipótese tributária ou base de cálculo de
impostos já previstos na Constituição e sejam não cumulativos; também poderá
instituir impostos extraordinários na iminência ou no caso de guerra externa.
24COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à constituição de 1988: sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 46. 25 “Embora reconhecida, nestes termos, a diferenciação entre princípios e regras, importa mencionar que na literatura, as limitações constitucionais ao poder de tributar figuram como ‘princípios’ ainda que apresentadas como regras. Assim é que se fala no ‘Princípio’ da Legalidade, ‘Princípio’ da Anterioridade, ‘Princípio’ da Irretroatividade, ‘Princípio’ da Isonomia, ‘Princípio’ da Proibição do Confisco etc. Tão arraigada está a denominação que já não seria viável opor-se a ela. Melhor, apenas, convencionar que a expressão, quando utilizada como nome próprio (letras maiúsculas), referir-se-á à limitação constitucional que com ela se designa, independentemente de se dar luz à sua feição de princípio ou de regra; ademais, como já apontado, o dispositivo que alberga cada um desses ‘Princípios’ poderá ter conteúdo de princípio, de regra ou de ambos”. (SCHOUERI, Luís Eduardo. 2º ed. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 270). 26 PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário: completo. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014, p. 63. 27 SCHOUERI, op. cit., p. 267. 28 “O texto constitucional não se refere expressamente o termo ‘imunidade’ (grifo do autor). Utiliza-se de outras expressões: veda a instituição de tributo [...] Mas, em todos esses casos, em se tratando de norma constitucional, impede a tributação, estabelecendo, pois, o que se convencionou denominar imunidades”. (PAULSEN, op. cit., p. 94).
Nesta seara, coube aos Estados e ao Distrito Federal a competência para criar
o Imposto sobre operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre a
prestações de Serviço de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação
– ICMS, ainda que as operações e as prestações iniciem no exterior.29
O ICMS é sem dúvida, um dos impostos mais complexos do sistema tributário
brasileiro, pois, comporta numa única sigla, diversas hipóteses tributárias (imposto
sobre operações mercantis; imposto sobre serviço de transporte interestadual e
intermunicipal; imposto sobre serviço de comunicação; imposto sobre operações
mercantis com combustíveis e lubrificantes e energia elétrica; e, imposto sobre
operações mercantis com minerais)30; ademais, a sua disciplina constitucional e
infraconstitucional31 possui tantas normas, que exigem daquele que o estuda, um
constante labor.32
A Constituição Federal no art. 155, II, e §§ 2º a 5º da CF/88 disciplinou diversos
aspectos do ICMS, podendo destacar entre eles: o princípio da não-cumulatividade, a
seletividade, a cobrança do diferencial de alíquotas em operação interestadual, a
seletividade, a incidência na importação de mercadorias do exterior e a não incidência
na exportação de mercadorias para o exterior.
Também dispôs o art. 155, § 2º, XII, que cabe à Lei Complementar, definir seus
contribuintes; dispor sobre substituição tributária; disciplinar o regime de
compensação do imposto; fixar o local das operações e prestações, entre outras
situações.
29 “Portanto, a competência tributária é a possibilidade jurídica de criar, in abstracto, tributos, descrevendo, legislativamente, suas hipóteses de incidência, seus sujeitos ativos, seus sujeitos passivos, suas bases de cálculo e suas alíquotas. Como corolário disso, temos que exercitar a competência tributária é dar nascimento, no plano abstrato, a tributos”. (CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 34-35). 30CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 17ª ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 42-43. 31 “O ICMS em regramento infraconstitucional depende: A) do Senado (resoluções); B) do Congresso Nacional (leis complementares); C) das Assembleias Legislativas dos estados (leis ordinárias) D) dos convênios de estados (pré-disciplinação legislativa).” (COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à constituição de 1988: sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 444). 32 “Se fossem integralmente aplicadas as leis tributárias, todos os contribuintes seriam passíveis de sanções, inclusive de cárcere e isto não tanto em virtude da fraude, mas principalmente pela desorientação que o caos da legislação tributária provoca no contribuinte”. (BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do direito tributário. 6 ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 9).
Em relação ao poder de tributar, alerta Carrazza33: “parece certo que o Estado,
ao exercer a tributação, deve observar os limites que a ordem constitucional lhe impôs,
inclusive no que atina com os direitos subjetivos públicos das pessoas”.
Nesse sentido, alerta Regina Helena Costa34, “o grande desafio posto ao
legislador tributário consiste em encontrar o ponto de equilíbrio entre, de um lado, a
simplificação e a racionalização do sistema, para a melhoria da arrecadação, e, de
outro, o respeito aos direitos do contribuinte”.
Por isso, os princípios a que ele se subordina, não podem ser ignorados ou
relativizados pelo legislador infraconstitucional, sob pena de inconstitucionalidade da
norma editada.
A preeminência dos princípios na interpretação constitucional, foi observada
com muita propriedade por Luís Roberto Barroso35:
O ponto de partida do intérprete há que ser sempre os princípios constitucionais, que são o conjunto de normas que espelham a ideologia da Constituição, seus postulados básicos e seus fins. Dito de forma sumária, os princípios constitucionais são normas eleitas pelo constituinte como fundamento ou qualificações essenciais da ordem jurídica que institui. A atividade da interpretação da Constituição deve começar pela identificação do princípio maior que rege o tema a ser apreciado, descendo do mais genérico ao mais específico, até chegar a formulação da regra concreta que vai reger a espécie.
Assim, a legislação infraconstitucional do ICMS, deve ser elaborada a partir do
texto constitucional, sendo este um limite instransponível aos legisladores dos
respectivos Estados.
Contudo, em virtude da amplitude que o ICMS possui, optou-se, no presente
estudo, por tratar de tema específico em relação a ele, qual seja, a substituição
tributária, assim, em virtude deste corte metodológico, tratar-se-á de princípios que
tenham relevância para a problemática posta: o direito a restituição do ICMS pago a
maior nas operações com mercadorias sujeitas ao regime da substituição tributária
quando da utilização de bases de cálculos “presumidas” ou “fictas”.
33 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 447. 34COSTA, Regina Helena. Praticabilidade e justiça tributária: exequibilidade da lei tributária e direitos do contribuinte. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 386. 35 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 151.
1.2 O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA
Conforme aponta Regina Helena Costa36: “a noção de capacidade contributiva
remonta sua origem ao próprio surgimento do tributo”.
No Brasil, a noção de capacidade contributiva, já se apresentava na
Constituição do Império de 1824, especificamente no inciso XV do art. 17937 dispondo
que: “Ninguem será exempto de contribuir pera as despezas do Estado em proporção
dos seus haveres”, logo, já havia uma preocupação do legislador no sentido de que
ninguém deixasse de contribuir para as despesas do Estado, pois, essa deveria ser
proporcional aos seus haveres.
Marco Aurélio Greco38, ao tratar sobre o direito tributário brasileiro, alerta que:
“o grande desenvolvimento do Direito Tributário deu-se depois da Constituição de
1946 que, dentre outras importantes previsões, consagrou em seu art. 202 o princípio
da capacidade contributiva”.
Assim, o princípio da capacidade contributiva foi incorporado ao ordenamento
jurídico brasileiro por meio da Constituição de 1946 que determinava em seu art. 202
que: “Os tributos terão caráter pessoal, sempre que isso for possível, e serão
graduados conforme a capacidade econômica do contribuinte”, entretanto, com a
reforma do sistema tributário, promovida pela Emenda Constitucional nº 18/65, foi
revogado o art. 202 que dispunha sobre referido princípio, que acabou não
incorporado à Constituição seguinte, a de 1967, alterada de forma substancial pela
Emenda Constitucional nº 1, de 17 de Outubro de 196939.
Ainda que o princípio da capacidade contributiva não tenha sido reproduzido
na Emenda Constitucional nº 18 de 1965 e nem na Constituição de 1967, alterada
pela Emenda Constitucional nº 1 de 1969, observa Regina Helena Costa40 que: “a
doutrina mais atenta sempre proclamou a necessidade de sua observância, como
princípio implícito decorrente do ordenamento jurídico”, uma verdadeira barreira/limite
a ser observado pelo legislador.
36 COSTA, Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 15. 37 BRASIL, Constituição (1824). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao24.htm> Acesso em: 05 abr. 2016 38 GRECO, Marco Aurélio. Planejamento tributário. 3ª ed. São Paulo: Dialética, 2011, p. 58. 39 COSTA, Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 13-14. 40 Ibid., 2003, p. 13.
Atualmente, o princípio da capacidade contributiva, encontra-se previsto no
§1º41 do art. 145 da Constituição de 1988.
Aliomar Baleeiro42, após detalhada análise sobre o princípio da capacidade
contributiva, ressalta ser este “o atributo que deve qualificar alguém aos olhos do
legislador para sujeito passivo da relação tributária”.
A capacidade contributiva se situa como princípio geral do sistema tributário,
se revelando nos dizeres de Paulsen (2014, p. 26): “como promotor e não como
violador do princípio da igualdade”, de tal forma que por meio dele se reconhece que
o tratamento diferenciado pode ser concedido em função da capacidade econômica
do contribuinte.
Também assevera Klaus Tipke43 que: “o princípio da capacidade contributiva é
o único princípio fundamental, que é adequado a todos os direitos fundamentais de
Constituições de Estados de Direito Social”, pois, todo contribuinte deseja ser
tributado dentro do limite do que ele pode dispor, não comprometendo assim o mínimo
necessário para a sua própria existência. É por isso, que atualmente, se destaca a
proteção ao mínimo existencial44.
Regina Helena Costa45, ressalta ainda, dois sentidos, que a “capacidade
contributiva” assume: absoluta ou objetiva, “quando se está diante de um fato que se
constitua numa manifestação de riqueza; e, relativa ou subjetiva, “reporta-se a um
sujeito individualmente considerado”.
O princípio da capacidade contributiva ainda que no texto constitucional se
utilize a expressão “sempre que possível”, deve ser entendido como obrigatório na
medida em que não havendo capacidade para contribuir, ou dizendo de outro modo,
onde o patrimônio do contribuinte se revelar necessário para o mínimo que lhe permita
41 “§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte”. (BRASIL, Constituição Federal (1988). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm> Acesso em: 05 abr. 2016). 42BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 5 ed. São Paulo: Forense, 1977, p. 357. 43 TIPKE, Klaus. Moral tributária do estado e dos contribuintes. 2012, p. 20. 44 “O princípio da capacidade contributiva é também uma regra de prudência, pois querer coletar onde nada existe não é inteligente”. (Ibid., p. 22). 45COSTA, Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 27.
subsistir, não deverá ocorrer a tributação, pois, faltaria ao ente tributante aptidão para
exigir a tributação.46
A capacidade contributiva é um princípio que norteia todo o sistema tributário
brasileiro.47
O princípio da capacidade contributiva tal como consta no texto Constitucional
trata de “impostos”, não se referindo às demais espécies tributárias, entretanto,
observa Paulsen48: “cuida-se de princípio fundamental de tributação aplicável a todas
as espécies tributárias, ainda que de modo distinto conforme as características de
cada qual”.
Para Sacha Calmon Navarro Coêlho49, o princípio da capacidade contributiva
é: “princípio constitucional de eficácia plena conferente de um direito subjetivo ao
cidadão-contribuinte, oponível ao legislador”.
Alfredo Augusto Becker observa a ambiguidade da locução “capacidade
contributiva”, advertindo que tal princípio é utilizado por diversas constituições, o que
resulta no seu entendimento em uma “constitucionalização do equívoco”, alertando
que há duas correntes doutrinárias sobre a sua natureza: uma que a considera
meramente “programática” e a outra de “regra jurídica”.50
A “natureza programática”, que reúne o maior número de juristas, refere-se
segundo Becker51: “Regra vazia de juridicidade. Regra de conduta à qual falece
coercibilidade. Não obriga, nem o legislador ordinário, nem o juiz. Oferece uma
orientação respeitável, porém não coercível”, assim, para essa corrente, o princípio
da capacidade contributiva serve como “orientação” e não “obrigação” a ser imposta
ao legislador ou ao juiz.
46 “O que precisa ficar bem claro é que o princípio da capacidade contributiva não é dispositivo programático, noção de resto superadíssima pelo moderno constitucionalismo, senão princípio constitucional de eficácia plena conferente de um direito público subjetivo ao cidadão-contribuinte, oponível ao legislador. (COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à constituição de 1988: sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 61). 47 “Trata-se de regra geral e abrangente, que vem condicionar toda a atividade legiferante no campo tributário, quer na eleição das hipóteses de incidência (no nosso sistema, observadas as regras matrizes já postas pela Constituição), quer no estabelecimento dos limites mínimo e máximo dentro dos quais a tributação pode atuar, quer ainda, na graduação dos impostos atendendo às condições pessoais dos sujeitos passivos”. (COSTA, Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 33-34). 48PAULSEN, Curso de direito tributário: completo. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014, p. 64. 49COÊLHO, op. cit., p. 62. 50 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do direito tributário. 6 ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 521. 51 Ibid., p. 521.
Como “regra de natureza jurídica”, o princípio da capacidade contributiva, alerta
Becker52: “vincula o legislador ordinário, obrigando-o a escolher para a composição
da hipótese de incidência das regras jurídicas tributárias, fatos que sejam signos
presuntivos de renda ou capital acima do mínimo indispensável”, nesse ponto, se
insere o conceito de “mínimo vital” ou “mínimo existencial”, em que se defende que a
tributação não pode atingir o mínimo necessário à existência; ademais, para a referida
corrente, o juiz também encontra-se vinculado a sua observância53.
Entretanto, adverte Becker54 que nenhuma das correntes são satisfatórias e
pecam por seus excessos: “(a primeira: negando qualquer eficácia jurídica; a segunda:
afirmando total eficácia jurídica, a ponto de vincular até o juiz)”, de modo que, não
logram a obter êxito.
O problema em relação às referidas correntes, consiste no fato de que ambas
são extremistas, ora por entenderem que não vinculam nem o legislador nem o juiz
(natureza programática), ora por entenderem que vinculam ambos (natureza jurídica).
Negar totalmente a aplicabilidade do princípio da capacidade contributiva, ainda
que se advirta tratar-se da “constitucionalização do equívoco” é ignorar a sua
praticabilidade; assim como vincular o juiz a aplicá-lo em cada caso concreto, significa
entre outras advertências55, ignorar a validade da lei tributária, que uma vez elaborada
atendendo as regras constitucionais deve ser aplicada56.
Ao dispor sobre a vinculação do juiz em aplicar o princípio da capacidade
contributiva (quando factível) ao caso concreto, Regina Helena Costa57 em oposição
à Alfredo Augusto Becker alerta que: “lógico reconhecer-se ao juiz a possibilidade de
apreciar se a mesma foi respeitada, à vista de pedido formulado nesse sentido”, ou
seja, cabe ao juiz também considerá-lo caso a caso.
52 BECKER. Alfredo Augusto. Teoria Geral do direito tributário. 6 ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 522. 53 Ibid., p. 522 54 Ibid., p. 523. 55“Permitir ao juiz, em cada caso concreto singular e sob o fundamento acima indicado ‘deixe de aplicar’ a lei tributária, significa: a) perder toda a certeza e praticabilidade do direito; b) desconhecer que a criação da regra jurídica necessariamente deforma a realidade e lhe imprime um determinismo artificial; c) substituir o Direito pela Moral; d) confundir validade e justiça da regra jurídica; e) inverter toda a fenomenologia jurídica, pois, a referida regra jurídica tributária tem estrutura lógica e atuação dinâmica idêntica à da regra jurídica que estabelece presunção juris et de jure.” (Ibid., p. 524). 56 Ibid., p. 523-524. 57 COSTA. Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 13.
Também destaca Regina Helena Costa58, que “a capacidade contributiva é um
subprincípio, uma derivação de um princípio mais geral, que é o da igualdade,
irradiador de efeitos em todos os setores do Direito”.
Por meio da capacidade contributiva, o princípio da igualdade se realiza, na
medida em que o legislador deve, sempre que possível, conceder tratamento
diferenciado àqueles que se encontram em situações distintas.59
Becker60 entende que o princípio da capacidade contributiva é uma regra de
Direito Natural, pois, àquele que o estuda: “desenvolve um trabalho que não é a
constatação objetiva de um fato, mas sim a valorização subjetiva deste fato em relação
ao conceito de bem comum (autêntico ou falso)”, o que converge à ideia de justiça
tributária.
Certo é que o princípio da capacidade contributiva se encontra inserido no texto
constitucional e, portanto, deve ser observado sem reservas pelo legislador e, quando
suscitado no pedido, pelo juiz.
Em relação ao conteúdo do princípio da capacidade contributiva, alerta Marçal
Justen Filho61 que:
Portanto, a ausência de critérios objetivos e científicos não significa que não seja aplicável o princípio da capacidade contributiva, como regulador da atividade legislativa tributária. Significa, tão só, que há uma presunção de concordância dessa atividade com aquele princípio. Mas basta haver critério científico evidenciador da incorreção da solução consagrada legislativamente para que se imponha o reconhecimento da inconstitucionalidade da lei, fraudadora do princípio constitucional de justiça social.
O princípio da capacidade contributiva no direito tributário brasileiro é realidade
que não se contesta, pois, ainda que se pondere sobre as dificuldades de implementá-
lo, em especial nos impostos sobre consumo, como é o caso do ICMS, certo é que,
não há justificativas à sua não adoção, ou, pior, pela sua violação.62
58 COSTA. op. cit., p. 41. 59 “Realiza, de certa forma, o princípio da igualdade, ao estabelecer um sistema de tributação que obrigue o legislador a diferenciar os contribuintes de acordo com sua maior ou menor capacidade de pagar tributos”. (FERRAGUT. Maria Rita, Presunções no direito tributário. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 175). 60 BECKER, op. cit., p. 525. 61 JUSTEN FILHO, Marçal. Sujeição passiva tributária. 1986, p. 260. 62 “A seletividade de alíquotas e a não-cumulatividade do IPI e do ICMS (...) são expedientes que demonstram que, mesmo não sendo viável considerar as condições pessoais dos contribuintes, é possível prestigiar a noção de capacidade contributiva. (COSTA, op. cit., p. 55).
Portanto, o princípio da capacidade contributiva, deve ser considerado tanto na
elaboração legislativa, quanto nas decisões judiciais, conforme observa Sacha
Calmon Navarro Coêlho63:
[...] o princípio da capacidade contributiva: “anima - enquanto afim da igualdade – tanto a produção das leis tributárias quanto a aplicação das mesmas aos casos concretos a partir do fundamento constitucional. É dizer, o legislador está obrigado a fazer leis fiscais, catando submissão ao princípio da capacidade contributiva em sentido positivo e negativo. E o juiz esta obrigado a examinar se a lei, em abstrato, está conformada à capacidade contributiva e, também, se, in concreto, a incidência da lei relativamente a dado contribuinte está ou não ferindo a sua, dele, capacidade contributiva.
Logo, em virtude da primazia do princípio da capacidade contributiva como
orientador da atividade tributária, Regina Helena Costa64, registra que ele:
“afastou as possibilidades de manipulação ou distorção da realidade econômica
mediante a utilização de expedientes como as presunções e ficções, impondo respeito
às efetivas condições econômicas dos contribuintes”.
Por isso, alerta Humberto Ávila65, que “pela Constituição Brasileira, o imposto
alcança a capacidade contributiva presente, não a capacidade contributiva futura”.
Paulsen66 observa, “que o princípio da capacidade contributiva tem importante
papel também na análise da legitimidade das normas de substituição e de
responsabilidades tributárias”, pois, dentro dessas figuras sempre haverá um
contribuinte, mas também um responsável.
Essa distinção é relevante, na medida em que, na responsabilidade por
substituição, como se verificará adiante, há uma relação de pertinência entre o
substituto (responsável) e o substituído (contribuinte).
Realmente, o substituto recolhe tributo alheio, pertencente ao substituído,
nesse sentido, a capacidade contributiva a ser considerada é do substituído e não do
substituto; sendo esta distinção fundamental para compreensão do problema
colocado no início do presente estudo: o direito à restituição do ICMS recolhido a maior
nas operações sujeitas ao regime da substituição tributária progressiva.
63 (COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à constituição de 1988: sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 53). 64COSTA, Regina Helena. Praticabilidade e justiça tributária: exequibilidade da lei tributária e direitos do contribuinte. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 240. 65ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva. 2012, p. 439. 66PAULSEN, Leandro. Responsabilidade e substituições tributária. 2014, p. 185.
1.3 O PRINCÍPIO DA MORALIDADE
O art. 3767 da Constituição Federal traz entre os princípios que regem a
administração pública a moralidade, que conforme leciona Celso Antônio Bandeira de
Mello68 : “compreendem-se em seu âmbito, como é evidente, os chamados princípios
da lealdade e da boa-fé”.
Vittorio Cassone69 observa que: “A moralidade é, em degrau maior, a prática
da fraternidade, e, em degrau menor, a prática da igualdade. O agir dentro dos limites
do meu direito. É o de cumprir, realmente, o meu dever. É o de ser solidário”.
Para Diva Malerbi70: “estão compreendidos no âmbito do princípio da
moralidade, os da lealdade e da boa-fé” e que esse princípio resulta da confiança que
o povo depositou nos administradores da coisa pública71.
Ao analisar o caput do art. 37 verifica-se que a “moralidade” se encontra
separada e ao lado de outro princípio, a “legalidade”, disso resulta que a moralidade
deve ser tratada como um princípio autônomo72 e não como elemento da legalidade,
todavia, alerta Celso Ribeiro Bastos73: “vários são os autores que sustentam,
tradicionalmente, o confinamento da ideia de moralidade ao campo da legalidade”,
arraigados na ideia de desvio de poder.
Assim, o princípio da moralidade não pode ser confundido com o da legalidade,
pois, tal raciocínio conduziria a um esvaziamento do conteúdo da moralidade, que por
certo não foi a intenção do legislador constituinte ao colocá-la entre os princípios
67“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:”. (BRASIL, Constituição Federal (1988). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm> Acesso em: 05 abr. 2016). 68MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de direito administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros, p. 109. 69 CASSONE, Vittorio. O princípio da moralidade no direito tributário. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). O princípio da moralidade no direito tributário. 2ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 151. 70 MALERBI, Diva. O princípio da moralidade no direito tributário. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva
(Coord.). O princípio da moralidade no direito tributário. 2ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 1998, p. 57. 71 Ibid., 57. 72 “O princípio insculpido na atual Carta Magna, em seu art. 37, não deixa dúvidas quanto à autonomia da moralidade enquanto realidade jurídica”. (BASTOS, Celso Ribeiro. O princípio da moralidade no direito tributário. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). O princípio da moralidade no direito tributário. 2ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 80). 73 Ibid., p. 79.
obrigatórios da administração pública, ou seja, como requisito de validade74. É por
isso que Marçal Justen Filho75 ao analisar o conteúdo jurídico do princípio da
moralidade destaca que:
O princípio da moralidade pública é, por assim dizer, um princípio jurídico ‘em branco’, o que significa que seu conteúdo não se exaure em comandos concretos e definidos, explícita ou implicitamente no Direito legislado. O princípio da moralidade pública contempla a determinação jurídica da observância de preceitos éticos produzidos pela sociedade, variáveis segundo as circunstâncias de cada caso.
Não é necessário entrar no mérito da intenção/finalidade do agente para tratar
da moralidade que deve ser identificável pelo objeto ou conteúdo do ato, ou dizendo
de outro modo, no resultado produzido por este, que demonstra o (s) meio (s)
escolhido (s) pela Administração para se alcançar um fim.76
Tercio Sampaio Ferraz Júnior77 pontifica que: “O direito, em suma, privado de
moralidade, perde sentido, embora não perca necessariamente império, validade,
eficácia”.
Por isso, a Constituição traz a moralidade como princípio da administração
pública, pois, cabe ao administrador agir dentro de um regramento universal de
conduta, no sentido de que seus atos tenham um padrão moral que seja aceito por
toda a sociedade.
Nesse sentido, Marçal Justen Filho78 fala em “moralidade pública” ao dispor
sobre o art. 37 da CF/88, ressaltando que: “com isso, consolidou-se entre nós a
concepção de que a atividade administrativa, porque orientada à consecução do bem
e do interesse público não poder ser eticamente reprovável”.
Ademais, o conteúdo da moralidade, segundo Hugo de Brito Machado79, “é
ditado pelas ideias de justiça e de honestidade dominantes na opinião pública”.
74 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade administrativa na Constituição de 1988. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 154 75JUSTEN FILHO, Marçal. O princípio da moralidade pública e o direito tributário. Revista de Direito Tributário, ed. 67. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 70. 76 DI PIETRO, op. cit., p. 154 77FERRAZ JÚNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 2 ed. São Paulo: Atlas, 1994, p. 358. 78JUSTEN FILHO. op. cit., p. 65. 79 MACHADO, Hugo de Brito. O princípio da moralidade no direito tributário. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). O princípio da moralidade no direito tributário. 2ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 65.
As diferenças entre o Direito e a Moral sempre foram destacadas pelos grandes
estudiosos do direito, entre eles, Hans Kelsen80 que assim descreve:
A necessidade de distinguir o Direito da Moral e a ciência jurídica da Ética significa que, do ponto de vista de um conhecimento científico do Direito positivo, a legitimação deste por uma ordem moral distinta da ordem jurídica é irrelevante, pois a ciência jurídica não tem de aprovar ou desaprovar o seu objeto, mas apenas tem de o conhecer e descrever. Embora as normas jurídicas, como prescrições de dever-ser, constituam valores, a tarefa da ciência jurídica não é de forma alguma uma valoração ou apreciação do seu objeto, mas uma descrição do mesmo alheia a valores (wertfreie). O jurista científico não se identifica com qualquer valor, nem mesmo com o valor jurídico por ele descrito.
Todavia, não ser quer afirmar que a Moral e o Direito podem ser confundidos,
apenas quer se destacar conforme observa Marçal Justen Filho81 que: “A existência
de um princípio jurídico da moralidade significa que algumas valorações morais do
grupo são recepcionadas pelo Direito Público”.
Maria Sylvia Di Pietro82 assevera que: “a moralidade administrativa exige do
administrador público comportamentos compatíveis com o interesse público que lhe
cumpre atingir, voltados para os ideais ou valores presentes no grupo social” por isso,
cabe ao agente público na execução das suas atividades atuar de maneira proba,
levando em conta o interesse dos administrados.
Para Hugo de Brito Machado83: “O princípio da moralidade empresta conteúdo
a todo o direito”.
Assim, se o conteúdo do ato for imoral, estar-se-á afrontando valores morais
aceitos pela sociedade, nesse sentido, importante consideração é feita por Maria
Sylvia Di Pietro84: “Isso ocorre quando o conteúdo de determinado ato contrariar o
senso comum de honestidade, retidão, equilíbrio, justiça, respeito à dignidade do ser
humano, à boa-fé, ao trabalho, à ética das instituições”, logo, tais atos não podem ser
validados.
80 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 48. 81JUSTEN FILHO, Marçal. op. cit., p. 66. 82 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade administrativa na Constituição de 1988. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 150. 83MACHADO, Hugo de Brito. O princípio da moralidade no direito tributário. In: MARTINS, Ives Gandra
da Silva (Coord.). O princípio da moralidade no direito tributário. 2ª. ed. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 1998, p. 68. 84 DI PIETRO, op. cit., p. 154
Entretanto, a pergunta que se coloca é a seguinte: Como invalidar um ato legal,
mas que não observou a moralidade pública? Essa resposta nos é dada por José
Afonso da Silva85:
[...] isso é possível porque a moralidade administrativa não é meramente subjetiva, porque não é puramente formal, porque tem conteúdo jurídico a partir de regras e princípios da Administração. A lei pode ser cumprida moralmente ou imoralmente.
Nesse mesmo sentido dispõe Marçal Justen Filho86: “isso significa que a
atuação administrativa do Fisco somente se configura válida quando compatível com
os postulados da moralidade pública”.
Celso Ribeiro Bastos87 alerta sobre a dificuldade em se conceituar a
moralidade, entretanto, esse obstáculo “não impede que a legislação venha a elencar
exemplificativamente casos em que inexoravelmente estaremos diante de uma
imoralidade tributária”.
Do princípio da moralidade, segundo adverte Regina Helena Costa88,
“defluem os deveres de respeito ao administrado, de atenção aos seus reclamos, de
resposta às suas postulações, de transparência das condutas administrativas, de
agilidade na apresentação de soluções aos problemas por ele apresentados”.
Klaus Tipke89, no seu livro “BesteureungsmoralundSteurmoral” traduzido para
o português como “Moral Tributária do Estado e dos Contribuintes”, também alerta
que:
Ao positivismo do Direito Tributário ou nihilismo do Direito Tributário deve ser oposta uma Ética fiscal do Estado e dos Contribuintes; isto também por motivo de direitos fundamentais, que fixam de antemão um mínimo ético disponível à sociedade pluralista.
85 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 21ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 648. 86JUSTEN FILHO, Marçal. O princípio da moralidade pública e o direito tributário. Revista de Direito Tributário, ed. 67. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 65. 87BASTOS, Celso Ribeiro. O princípio da moralidade no direito tributário. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). O princípio da moralidade no direito tributário. 2ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 85. 88 COSTA, Regina Helena. Praticabilidade e justiça tributária: exequibilidade da lei tributária e direitos do contribuinte. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 150. 89 TIPKE, Klaus; tradução FURQUIM. Luiz Dória. Moral tributária do estado e dos contribuintes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2012.
Para este autor, a moralidade diz respeito tanto ao Estado quanto ao
contribuinte, pois, ambos devem agir dentro da relação tributária observando os
princípios fundamentais.
José Eduardo Soares de Melo90, ao tratar da observância do princípio da
moralidade pela Administração, destaca que:
[...] não basta serem observados os requisitos (formais e materiais) dos atos administrativos, para que possam ser providos de eficácia; pois, necessariamente, requer-se um plus constitucional, qual seja, o atendimento às normas morais que regem o ato público.
Nesse sentido importante observação é feita por Marçal Justen Filho91: “cogita-
se da perfeição ética entre o Estado e os cidadãos. A moralidade significa que o
Estado é instrumento de realização do bem público e, não, de opressão social”.
Para Luiz Vicente Cernicchiaro92: “A moralidade administrativa não é setorial.
Vale dizer, acompanha a atuação dos agentes do Estado em todas as suas
manifestações executiva, legislativa e judiciária”.
Assim, ainda que o contribuinte tenha o dever de agir moralmente, cabe ao
Estado enquanto instrumento da sociedade voltado para alcançar os valores
estabelecidos no preâmbulo do texto constitucional, dar o exemplo do agir ético, de
uma atuação voltada ao interesse de toda a coletividade.93
Por isso, destaca Regina Helena Costa94, que o princípio da moralidade se
aplica tanto na seara legislativa, quanto na administrativa.
90 MELO, José Eduardo Soares de. O princípio da moralidade no direito tributário. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). O princípio da moralidade no direito tributário. 2ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 104-105. 91JUSTEN FILHO, Marçal. O princípio da moralidade pública e o direito tributário. Revista de Direito Tributário, ed. 67. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 73. 92 CERNICCHIARO, Luiz Vicente. O princípio da moralidade no direito tributário. In: MARTINS, Ives
Gandra da Silva (Coord.). O princípio da moralidade no direito tributário. 2ª. ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 1998, p. 44. 93 “[...] o assujeitamento do Estado à moral, é mais exigente que a perseguida pelo particular, pois se define não só de acordo com os padrões éticos retirados dos valores prevalecentes na sociedade, como também é obrigada a estar direcionada à realização dos fins do Estado. Isto porque o administrador da coisa pública – diferentemente da pessoa humana – é inteiramente carente de liberdade”. (MALERBI, Diva. O princípio da moralidade no direito tributário. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). O princípio da moralidade no direito tributário. 2ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 56). 94 “Efetivamente, o princípio em foco opera efeitos em dois planos distintos: no legislativo, orientando o legislador na busca de uma atividade tributária equilibrada e justa; e no administrativo, sempre reportado ao primeiro, norteando os agentes públicos para que procedam de modo ético no exercício de suas atribuições”. (COSTA, Regina Helena. Praticabilidade e justiça tributária: exequibilidade da lei tributária e direitos do contribuinte. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 152).
Com essa breve explanação sobre o princípio da moralidade insculpido no art.
37 da CF/88, quer se suscitar que, também ele pode ser considerado para resolver
questões que embora atendam os preceitos formais da constituição, não se pautam
na boa-fé e na lealdade.
Conforme assevera Ives Gandra da Silva Martins95, o conteúdo e alcance do
princípio da moralidade no âmbito tributário pode ser observado quando:
[...] a uma atuação do Fisco em orientar o contribuinte, mas do que persegui-lo, de exigir os tributos devidos de forma não vexatória, de devolver sem procrastinações as quantias que a título de tributo arrecadou indevidamente, a gerar leis que não sejam confiscatórias, nem políticas tributárias desarrazoadas, assim como não provocar publicidade indevida sobre a vida dos pagadores de tributos, visto que, de rigor, são servidores sustentados pelos contribuintes, a quem deve servir.
Nesse contexto, o agir do fisco deve ser orientado não apenas pelo
cumprimento da lei, mas também pelo respeito com os administrados, orientando-os
e auxiliando-os no cumprimento das obrigações tributárias, ou dizendo de outro modo,
a relação entre a Administração e os administrados deve ser pautada pela ética.
Em interessante análise sobre a invocação do princípio da moralidade na
interpretação da lei, pondera Hugo de Brito Machado96:
A rigor, a moralidade está implícita na legalidade. Ocorre que muitos interpretam a lei como expressão apenas formal. E assim, sustentam haver sido a lei observada, mesmo nos casos em que se respeitou apenas o sentido literal, gramatical, da norma, mas o seu verdadeiro alcance foi esquecido. A colocação da moralidade como princípio ao qual se submete a Administração Pública tem o mérito de afastar interpretações formalistas, desprovidas de valoração do conteúdo e dos fins da norma jurídica.
Assim, como “A lei pode ser cumprida moralmente ou imoralmente”, nos dizeres
de José Afonso da Silva97; ela também pode ser interpretada moral ou imoralmente,
a partir das lições de Hugo de Brito Machado.
95 MARTINS, Ives Gandra. O princípio da moralidade no direito tributário. In: MARTINS, Ives Gandra
da Silva (Coord.). O princípio da moralidade no direito tributário. 2ª. ed. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 1998, p. 21. 96 MACHADO, Hugo de Brito. O princípio da moralidade no direito tributário. In: MARTINS, Ives Gandra
da Silva (Coord.). O princípio da moralidade no direito tributário. 2ª. ed. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 1998, p. 63. 97 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 21ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 648
1.4 OUTROS PRINCÍPIOS CONECTADOS AO TEMA
Em virtude da existência de outros princípios conectados ao tema da
substituição tributária do ICMS, pretende-se, neste tópico, analisá-los, sob a
perspectiva do estudo, ora proposto.
1.4.1 Vedação ao Confisco
O art. 150, IV, da Constituição Federal, dispõe que é vedado a utilização do
tributo com efeito de confisco.
Mas o que determina o efeito confiscatório de um tributo?
Para Aliomar Baleeiro98, os tributos confiscatórios são aqueles “que absorvem
parte considerável do valor da propriedade, aniquilam a empresa ou impedem
exercício de atividade lícita e moral”.
Paulsen99 assevera que: “Costuma-se identificar o confisco com a tributação
excessivamente onerosa, insuportável, não razoável (grifo do autor), que absorve
a própria fonte de tributação”. Para Sacha Calmon Navarro Coêlho100: “o princípio do
não-confisco na medida que confronta os desvarios fiscalistas, é de grande
importância para combater as ficções e presunções fiscais abusivas”.
A vedação ao confisco relaciona-se com a proibição de tributação exagerada101
e também serve como parâmetro ao legislador102. Encontra-se entre as limitações ao
poder de tributar.
Paulo de Barros Carvalho alerta que o tema não foi desenvolvido de modo
satisfatório, seja em relação aos trabalhos científicos e mesmo em relação a
98 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 5ª ed. São Paulo: Forense, 1977, p. 262. 99 PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário: completo. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014, p. 122. 100 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988: Sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006. 101 SCHOUERI, Luís Eduardo. 2º ed. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 327. 102 HORVATH, Estevão. O princípio do não-confisco no direito tributário. São Paulo: Dialética,
2002, p. 45.
jurisprudência103, todavia, destaca que104: “qualquer excesso impositivo acarretará em
cada um de nós a sensação de confisco”.
Para Estevão Horvath105, ainda que não fosse expressamente previsto na
Constituição, o princípio da vedação ao confisco “decorreria implicitamente da
proteção que está atribui ao direito de propriedade e também ao princípio da
capacidade contributiva”.
Também, alerta Luís Eduardo Schoueri106, que o confisco é de difícil
identificação, sendo possível encontrar algumas indicações. Nesse sentido apresenta
exemplo de grande valia:
Assim, por exemplo, se a tributação atinge nível tão elevado a ponto de afetar o Princípio da Livre Iniciativa, i.e., quando a liberdade de empreender já não passa a produzir qualquer efeito prático, já que o empresário já não tem perspectiva de lucrar em sua atividade, independentemente de seu esforço ou talento, poder-se-á afirmar estar presente um efeito confiscatório de tributação.107
Celso Ribeiro Bastos108, verifica que o confisco pode ser identificado sob duas
modalidades: “uma consiste na tomada em consideração exclusiva da operação
tributária; a outra traduz-se na significação da cobrança daquela quantia ante a
situação patrimonial do contribuinte”.
A tributação interfere diretamente no direito de propriedade, por isso, a
Constituição veda a sua utilização com efeito de confisco.109
Logo, o poder de tributar não é livre, encontrando limitações no próprio direito
de propriedade, por isso, os tributos, na feliz observação de Carrazza, ao analisar o
princípio do não-confisco na atividade empresarial, “devem ser dosados com
razoabilidade, de modo a valorizar a livre inciativa, um dos fundamentos do nosso
Estado Democrático de Direito”.
103 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 181-182. 104 Ibid., p. 182. 105 HORVATH, Estevão. O princípio do não-confisco no direito tributário. São Paulo: Dialética, 2002, p. 32. 106 SCHOUERI, Luís Eduardo. 2º ed. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 327. 107 Nesse mesmo sentido, Roque Antonio Carrazza. (CARRAZZA. Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 111) 108 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito financeiro e de direito tributário. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 137. 109 CARRAZZA, op. cit., p. 419.
Por isso, é necessário averiguar em que medida a tributação prejudica ou
inviabiliza o desenvolvimento da atividade econômica.
Entretanto há exceções, em que a própria constituição permite a tributação
onerosa: razões extrafiscais (utilização da tributação para fins outros, que não apenas
o arrecadatório, como por exemplo, ocorre com o Imposto sobre Produtos
Industrializados – IPI, em relação aos produtos supérfluos) e o não atendimento da
função social da propriedade.110111
Em relação, a exceção, a proibição de tributo confiscatório em função da
extrafiscalidade, já alertava Aliomar Baleeiro112:
Mas não ofendem à Constituição impostos que, em função extrafiscal, são instituídos com o propósito de compelir ou afastar o indivíduo de certos atos ou atitudes. Nesse caso, o caráter destrutivo e agressivo é inerente a essa tributação admitida por tribunais americanos e argentinos e da qual há exemplos no Direito Fiscal brasileiro quando visa ao protecionismo à indústria, ao incentivo à natalidade, ao combate ao ausentismo, ao latifúndio etc.
A vedação ao confisco, observa Estevão Horvath113, está relacionada a
“atividade legiferante criadora ou majorada do tributo com o critério quantitativo da
regra-matriz de incidência tributária”.
O critério quantitativo é composto pela base de cálculo e pela alíquota do
tributo. Aplicada a alíquota sobre a base de cálculo, ter-se-á o valor do tributo devido;
assim, a vedação ao confisco está relacionada tanto a base de cálculo, quanto a
utilização de alíquota desproporcional, que impeça ou prejudique, por exemplo,
atividades comerciais.
Importante destacar, que a utilização de margens presumidas (situação
verificada no cálculo da substituição tributária progressiva ou “para frente” do ICMS)
em que se ignora o valor real da operação para tomar um outro valor “presumido”
como definitivo, sem comportar direito à restituição, caso o valor utilizado
110 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988: Sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 297. 111Estevão Horvath, analisando as considerações feitas por Sacha Calmon Navarro Coêlho, entende que a Constituição não fez exceção ao princípio em análise pelo fato do tributo ter função fiscal ou extrafiscal, por isso, alerta que: “O que buscamos demonstrar é a diferente elasticidade de sua aplicação às duas funções que a tributação pode exercer”. (HORVATH, Estevão. O princípio do não-confisco no direito tributário. São Paulo: Dialética, 2002, p. 92). 112 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 5 ed. São Paulo: Forense, 1977, p. 266. 113 HORVATH, op. cit., p. 38.
presumidamente seja maior que o valor efetivamente praticado, assume a natureza
de tributação com efeito confiscatório.114
Para elucidar essa pratica, apropriamo-nos do exemplo de Sacha Calmon
Navarro Coêlho115:
Em casos que tais uma fábrica de cerveja, v.g., ao vender a milhares de varejistas, paga o seu imposto e o que será devido pelos varejistas compradores. Nada contra o sistema, que é prático e racional. O que não pode ocorrer sem correção é estimar, v.g., uma margem de lucro de 60% sobre o preço fábrica, quando, em verdade, as margens não ultrapassam 20% ou 30%, dependendo do mercado.
Assim, tem-se que, a não restituição dos valores recolhidos a maior, assume
efeitos confiscatórios, na medida em que se tributa uma riqueza presumida, que ao
final pode se dar por um valor inferior.
1.4.2 Não-Cumulatividade
A não-cumulatividade, segundo Luís Eduardo Schoueri116: “implica que a cada
etapa considere-se a tributação já ocorrida em transações anteriores, recolhendo-se,
a cada transação, apenas o plus incidentte sobre o valor acrescido”.
Em relação ao ICMS, o art. 155, § 2º, I, da CF/88, determina que será não-
cumulativo, compensando-se o que for devido em cada fase com o montante cobrado
anteriormente117, ou seja, adotou-se o sistema de imposto contra imposto, em que se
permite deduzir do ICMS a recolher, o valor do ICMS incidente nas fases anteriores.118
114 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988: Sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 304. 115 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988: Sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 304. 116 SCHOUERI, Luís Eduardo. 2º ed. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 378. 117 “I - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal”. (BRASIL, Constituição Federal (1988). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm> Acesso em: 05 abr. 2016). 118 “O princípio da não-cumulatividade, posto na Constituição, no art. 155, § 2º, I, se assenta no método da diferença ou subtração, segundo o qual o valor do imposto a ser recolhido, em cada etapa, corresponderá à diferença entre o débito do imposto gerado pela promoção da operação de circulação de mercadorias-vendas, e o crédito fiscal oriundo do imposto incidente nas aquisições-compras no mesmo período. É a técnica do imposto contra imposto, adotada no Brasil e pela maioria dos demais
José Eduardo Soares de Melo119 lembra que: “Os princípios da igualdade e da
capacidade contributiva mantêm congruência com o princípio da não cumulatividade”.
Para Carrazza120, a não-cumulatividade “tem o escopo de evitar que a carga
econômica do tributo (i) distorça as formações dos preços”, bem como “(ii) afete a
competitividade das empresas”.
Assim, a não-cumulatividade, refere-se ao direito que o sujeito passivo do
produto ou serviço tem de deduzir do imposto devido o valor do ICMS da aquisição
operação anterior num período determinado121.
Abaixo, apresenta-se um exemplo, para elucidar a não-cumulatividade:
CÁLCULO DO ICMS OBSERVANDO A REGRA DA NÃO-CUMULATIVIDADE
INDUSTRIAL IMPORTADOR
COMÉRCIO ATACADISTA
COMÉRCIO VAREJISTA
Custo do Produto
500,00
820,00
984,00
Valor referente a
inclusão de tributos e a margem de lucro
desejado pela empresa
500,00
380,00
516,00
Preço do Produto
1.000,00
1.200,00
1.500,00
ICMS devido (18%)
180,00
216,00
270,00
ICMS a deduzir
(CRÉDITO)
-
180,00
216,00
ICMS a recolher 180,00 36,00 54,00
Preço Final do Produto: 1.500,00
países, para se calcular o montante do tributo a recolher aos cofres públicos por cada contribuin te”. (COÊLHO, op. cit., p. 462.) 119MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 211. 120 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 17ª ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 417. 121 “Assim, podemos afirmar – sem receio de incorrer em erro grosseiro – que o mencionado tributo nunca incidirá de maneira estrita sobre o valor agregado da mercadoria entrada, mas atingindo, dentro do interregno de um mês (período temporal do confronto), a soma das operações relativas às saídas dos produtos nele ocorridas, e do total do imposto incidente em tais operações será deduzido o correspondente mensal, aquelas pertinentes às entradas de mercadorias no mesmo período. (COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988: Sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 494).
A compensação, lembra Carrazza122, “efetiva-se por intermédio da chamada
‘conta-corrente fiscal’, em que o saldo, se devedor é suportado pelo contribuinte e, se
credor, é transferido para aproveitamento em períodos subsequentes”.
Através do exemplo apresentado, verifica-se, que o ICMS é transferido em cada
uma das etapas aos adquirentes das mercadorias ou serviços (transporte
intermunicipal, interestadual e de comunicação), que acabam por compensar o valor
pago na fase anterior; isso ocorre até que se chegue a etapa final, quando então tal
ônus é suportado integralmente pelo adquirente.
Por meio da não-cumulatividade, evita-se o efeito cascata do ICMS, que
significa onerar, segundo Carrazza123, “repetida e sobrepostamente, todas as etapas
de circulação de bens e da prestação de serviços”.
Embora a Constituição tenha disposto claramente sobre o princípio da não-
cumulatividade no art. 155, § 2º, I, mais adiante no inciso XII, determinou que cabe à
lei complementar discipliná-lo.
Assim, coube à Lei Complementar nº 87/96, disciplinar o regime de
compensação do ICMS, todavia, observa Sacha Calmon Navarro Coêlho124 que,
“disciplinar é pôr disciplina no que já existe”, entretanto, uma passada de olhos no art.
33 da Lei Complementar125 já é suficiente para demonstrar que o legislador
122 CARRAZZA. op. cit., p. 454. 123 CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 417. 124 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988: Sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 475. 125 “Art. 33. Na aplicação do art. 20 observar-se-á o seguinte: I – somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento nele entradas a partir de 1º de janeiro de 2020; II – somente dará direito a crédito a entrada de energia elétrica no estabelecimento: a) quando for objeto de operação de saída de energia elétrica; b) quando consumida no processo de industrialização; c) quando seu consumo resultar em operação de saída ou prestação para o exterior, na proporção destas sobre as saídas ou prestações totais; e d) a partir de 1º de janeiro de 2020 nas demais hipóteses; III - somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao ativo permanente do estabelecimento, nele entradas a partir da data da entrada desta Lei Complementar em vigor. IV – somente dará direito a crédito o recebimento de serviços de comunicação utilizados pelo estabelecimento: a) ao qual tenham sido prestados na execução de serviços da mesma natureza; b) quando sua utilização resultar em operação de saída ou prestação para o exterior, na proporção desta sobre as saídas ou prestações totais; e c) a partir de 1º de janeiro de 2020 nas demais hipóteses”. (BRASIL. Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp87.htm> Acesso em: 05 abr. 2016).
infraconstitucional impôs uma série de limitações ao crédito, que não se verificam no
texto constitucional.126
Limitou o crédito da aquisição da energia elétrica, do serviço de comunicação,
do material de uso e consumo, e, em relação a aquisição de bens para o ativo
imobilizado, fracionou o crédito em 48 parcelas.127
Tais considerações, ainda que não sejam objeto do presente tudo, se faz
necessárias para esclarecer que ao disciplinar a não-cumulatividade no art. 155, § 2º,
I, a Constituição não fez nenhuma limitação em relação as quais a Lei Complementar
dispôs.
A única vedação ao crédito, refere-se a operações ou prestações amparadas
pela isenção ou não-incidência, que não implicará em direito de crédito, salvo
disposição em contrário. (art. 155, § 2º, II, “b”, da CF/88).
Por isso, alerta Sacha Calmon Navarro Coêlho128, que caberia a Lei
Complementar nº 87/96 dispor:
Coisas adjetivas, como por exemplo: (a) definir o período (mês, quinzena, trimestre) de apuração do imposto; (b) definir, em havendo saldo credor, não absorvível no mês imediato, outras formas de compensação, até mesmo a devolução em moeda (caso das empresas exportadoras). (c) definir quais os créditos excluídos da compensação por não estarem afetados às atividades específicas do sujeito passivo; (d) explicar a forma e o período em que os bens do ativo fixo devem ser amortizados e a respectiva proporção e assim por diante (nunca definir o princípio da não-cumulatividade, cujo habitat é a Constituição).
A “ofensa” ao princípio da não-cumulatividade, seja pela sua “vedação” ou
“limitação” (para além das hipóteses previstas na Constituição), é inconstitucional129;
ademais, conforme atentamente observou José Eduardo Soares de Melo130:
“Isto oneraria o custo de vida da população, e encareceria o processo produtivo e
126 Nesse mesmo sentido José Eduardo Soares de Melo. (MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 217). 127 “Consequentemente, a pureza e a higidez constitucional da não-cumulatividade do ICMS, premida pelas necessidades de caixa dos Governos Estaduais, foram completamente desvirtuadas e pervertidas no tempo pelas leis complementares que a ‘regraram’, seja (a) pelas proibições restrições feitas, (b) pela sua interpretação equivocada e (c) pelas suas omissões”. (MATTOS, Aroldo Gomes de. ICMS: (comentários à legislação nacional). São Paulo: Dialética, 2006, p. 279). 128 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988: Sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 475. 129 “Trata-se como é fácil perceber, de uma garantia constitucional do contribuinte, que, por força do disposto no art. 60, § 4º, IV, da Lei Maior, não pode ser desrespeitada ou ignorada por normas infraconstitucionais”. (CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 419). 130 MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 210.
comercial, reduzindo os investimentos empresarias, em face do aumento de custos
ocasionado por esse artificialismo tributário oriundo da cumulatividade”; afinal quem
acaba suportando economicamente o tributo é o consumidor final131.
Em virtude da não-cumulatividade, também destaca Sacha Calmon Navarro
Coêlho132, “a base de cálculo estimada pelo fisco não pode ser superior ao preço
efetivamente praticado”.
Destaca-se ainda, que as vedações ou limitações do crédito interferem
diretamente no desenvolvimento da atividade econômica das empresas, por isso,
alerta Aroldo Gomes de Mattos133:
Tais proibições, restrições, equívocos e omissões, por outro lado, importam num ônus para as empresas que participam do ciclo da circulação de mercadorias e da prestação de serviços, fulminando, assim, com o dogma da neutralidade do imposto e da sua exclusiva repercussão no consumidor final, que é um derivativo da não-cumulatividade do imposto.
Neste contexto, entende-se que à ofensa a não-cumulatividade reside na
ausência da devolução do valor a recolhido a maior.
Ao se calcular o imposto sobre uma base presumida, o responsável por
substituição antecipa o mesmo, sem conhecer o valor real da operação a ser realizada
no futuro, logo, se na operação futura não se confirmar a base de cálculo utilizada
presumidamente ou se esta se realizar por um valor inferior, deve o Estado garantir a
sua restituição.
Ao vedar o aproveitamento do crédito do valor excedente, o Estado
concomitantemente, confere efeitos cumulativos e confiscatórios ao tributo.134
131 “Com efeito, ao cabo do processo econômico (i) de produção, distribuição e comercialização da mercadoria e (ii) de prestação dos serviços de transporte transmunicipal e de comunicação, quem acaba suportando, por inteiro, a carga econômica do ICMS é o consumidor final”. (CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 418). 132 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988: Sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 503. 133 MATTOS, Aroldo Gomes de. ICMS: (comentários à legislação nacional). São Paulo: Dialética, 2006, p. 280. 134 “Supondo-se que em algum momento, ou em determinada operação, o ente tributante venha a estabelecer a proibição total ou parcial do dever-poder do contribuinte de creditar-se do imposto incidente nas operações anteriores, estará ele, a um só tempo, provocando o efeito cumulativo, condutor de um aumento artificial no preço das mercadorias, produtos e serviços, em prejuízo ao consumidor final. Do mesmo modo, também estará acarretando um efeito confiscatório, porque sobre o mesmo preço está ocorrendo mais de uma incidência do mesmo imposto, a retirar de cada um dos agentes do ciclo, mais imposto do que o efetivamente devido”. (MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 211.)
1.4.3 Segurança Jurídica
O princípio da segurança jurídica não se encontra expressamente previsto no
texto constitucional, situando-se entre os chamados princípios implícitos135.
Em relação ao princípio geral da segurança jurídica, pontifica J.J. Gomes
Canotilho136:
O homem necessita de segurança para conduzir, planificar e conformar autónoma e responsavelmente sua vida. Por isso, desde cedo se consideram os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança como elementos constitutivos do Estado de direito.
Ao se debruçar especificamente sobre este princípio, Paulsen137, destaca que:
“Constitui ao mesmo tempo, um subprincípio do princípio do Estado de Direito e um
sobreprincípio relativamente aos princípios decorrentes que se prestam à afirmação
de normas importantes para a efetivação da segurança”.
Humberto Ávila138 destaca que o princípio da segurança jurídica é construído
de duas formas:
Em primeiro lugar, pela interpretação dedutiva do princípio maior do Estado de Direito (art. 1º). Em segundo lugar, pela interpretação indutiva de outras regras constitucionais, nomeadamente as de proteção do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (art. 5º, XXXVI) e das regras da legalidade (art. 5º, II, e art. 150, I), da irretroatividade (art. 150, III, “a”) e da anterioridade (art. 150, III, “b”).
Para Carrazza139: “O princípio da segurança jurídica ajuda a promover os
valores supremos da sociedade, inspirando a edição e a boa aplicação das leis, dos
decretos, das portarias, das sentenças, dos atos administrativos etc”.
135 “Outras vezes, os princípios não são expressos, mas decorrem de uma leitura atenta dos textos legais. Por exemplo, o princípio da segurança jurídica não se encontra expresso em texto algum, mas, quando se estuda o tema da prescrição e decadência, vale-se daquele princípio para explicar a razão por que um tributo, embora devido, pode se tornar inexigível com o passar do tempo. (SCHOUERI. Luís Eduardo. 2º ed. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 267). 136 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 5ª ed. Coimbra: Livraria Almedina, 1997, p. 257. 137 PAULSEN, Leandro. Segurança jurídica, certeza do direito e tributação: a concretização da certeza quanto à instituição de tributos através das garantias da legalidade, da irretroatividade e da anterioridade. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2006, p.62 138 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva. 2012, p. 370. 139 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 455.
Ao tratar sobre os efeitos da segurança jurídica, pondera J.J. Gomes
Canotilho140:
As refrações mais importantes do princípio da segurança jurídica são as seguintes: (1) relativamente a actos normativos – proibição de normas retroactivas restritivas de direitos ou interesses juridicamente protegidos; (2) relativamente a actos jurisdicionais – inalterabilidade do caso julgado; (3) em relação a actos da administração – tendencial estabilidade dos casos decididos através dos actos administrativos constituivos de direitos.
Assim, o princípio da segurança jurídica tem como objetivo garantir a
estabilidade, previsibilidade e confiabilidade das relações jurídicas141, porém, alerta
Humberto Ávila142, que “a segurança jurídica não está necessariamente vinculada à
previsibilidade absoluta, pois, “a aplicação de qualquer norma jurídica depende de um
juízo sobre a realidade”.
Por isso, conclui o autor143, que “a segurança jurídica somente pode ser
representada como determinabilidade, não apenas da norma jurídica, mas sobretudo
dos critérios das decisões judiciais”.
Regina Helena Costa144 adverte que: “a segurança jurídica, valor maior do
ordenamento, constitui tanto um direito fundamental quanto uma garantia do exercício
de outros direitos fundamentais”.
Por isso, destaca Roque Carrazza145:
Portanto, o princípio da segurança jurídica, com seu corolário de proteção da confiança, submete o exercício do poder ao Direito, fazendo com que as pessoas possam prever, com relativa certeza, as consequências que advirão das situações jurídicas a que derem causa.
140CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 5ª ed. Coimbra: Livraria Almedina, 1997, p. 257. 141 “A segurança jurídica constitui-se num dos mais importantes princípios do nosso ordenamento. Com base nele é propagado na comunidade o sentimento de previsibilidade quanto aos efeitos jurídicos da regulação das condutas, permitindo que se planeje as ações futuras, a fim de se ter uma expectativa precisa dos direitos e deveres advindos da prática de um ato ou de uma situação jurídica, dos benefícios que serão concedidos ou dos encargos a serem suportados, bem como que se confie que os fatos ocorridos no passado sejam disciplinados segundo a lei vigente na data da prática do evento descrito no fato, com a preservação da coisa julgada, dos direitos adquiridos e da irretroatividade da lei. (FERRAGUT, Maria Rita. Presunções no direito tributário. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin. 2005, p. 167). 142 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva. 2012, p. 373-374. 143 Ibid., p. 375. 144 COSTA, Regina Helena. Praticabilidade e justiça tributária: exequibilidade da lei tributária e direitos do contribuinte. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 133. 145 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 457.
Infelizmente, não é o que ocorre na prática, pois, as incertezas dos
administrados são enormes; na medida em que, enfrentam constantes alterações
legislativas, bem como posicionamentos divergentes do próprio judiciário, inclusive
em relação a assuntos que a priori, não pareciam suscitar entendimentos ou
interpretações distintas – é o que ocorre com o tema, ora em análise - a substituição
tributária progressiva ou “para frente” -, como se observará nos capítulos seguintes.
Humberto Ávila146 ressalta ainda a existência de duas perspectivas em relação
ao princípio da segurança jurídica: dimensão formal-temporal147, “que diz respeito à
possibilidade de ‘cálculo prévio’ independente do conteúdo da lei”; e, dimensão
material148, “qualificado também como legalidade no sentido material”.
Paulo de Barros Carvalho149 fala em “bidirecionalidade passado/futuro” para
que se estabeleça o clima de segurança nas relações jurídicas, e explica:
Quanto ao passado, exige-se um único postulado: o da irretroatividade [...] No que aponta para o futuro, entretanto, muitos são os expedientes principiológicos necessários para que se possa falar na efetividade do primado da segurança jurídica.
Analisando, a Emenda Constitucional nº 03/93 que incluiu a responsabilidade
tributária por substituição para fato futuro no texto constitucional, por meio da
utilização de presunções face ao princípio da segura jurídica, esclarece Carrazza150:
Não estamos negando que o Direito cria suas próprias realidades e que, ao fazê-lo, pode, exatamente por meio de ficções e presunções, ignorar as realidades do mundo fenomênico. Há, porém, um limite para isso: a Constituição. Dito de outro modo, o emprego das ficções e presunções deve ser feito com critério e método, de modo a preservar direitos e garantias constitucionais.
146 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva. 2012, p. 372. 147 “Em primeiro lugar, os cidadãos devem saber de antemão quais normas são vigentes, o que é possível apenas se elas estão em vigor ‘antes’ que os fatos por ela regulamentados sejam concretizados (irretroatividade), e se os cidadãos dispuserem da possibilidade de conhecer ‘mais cedo’ o conteúdo das leis (anterioridade). (Ibid., p. 372). 148 “Em segundo lugar, a exigência de determinação demanda uma ‘certa medida’ de compreensibilidade, clareza, calculabilidade e controlabilidade conteudísticas para os destinatários da regulação. (Ibid., p. 372). 149CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 166. 150 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 492-493.
Neste contexto, a utilização ficções ou presunções, como será tratado nos
capítulos seguintes, não pode ser entendida como absoluta, mas sim relativa, na
medida em que, assiste ao contribuinte o direito de provar que a operação ocorreu por
valor diverso, e, a Administração Pública diante da situação concreta/real apurada
proceder a restituição dos valores – isso é segurança jurídica.
1.5 O PAPEL DA LEI COMPLEMENTAR NO DIREITO TRIBUTÁRIO
A figura da “Lei Complementar”, insinuou-se no ordenamento jurídico, por meio
da Emenda Constitucional nº 4/61, conforme observa José Afonso da Silva151.
Para Sacha Calmon Navarro Coêlho152: “as leis complementares funcionam
como manifestações de expansão da própria Constituição, daí o adjetivo,
complementar”. José Afonso da Silva153 define que as leis complementares:
“são leis integrativas de normas constitucionais de eficácia limitada, contendo princípio
institutivo154 ou de criação de órgãos e sujeitas à aprovação pela maioria absoluta dos
membros das suas Casas do Congresso Nacional”.
Ao analisar a definição dada por José Afonso da Silva, adverte Souto Maior
Borges155 que: “nem sempre as leis complementares são integrativas de normas
constitucionais de eficácia limitada156. Há leis complementares que podem ser
aprovadas em decorrência de normas constitucionais de eficácia contida157”.
151 “Com essa característica eficacial, esse tipo de lei complementar insinuou-se no direito constitucional brasileiro através do art. 22 da Emenda Constitucional nº 4/61, o chamado Ato Adicional que institui o parlamentarismo efêmero”. (SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 234). 152 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à constituição de 1988: Sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 82. 153 SILVA, op. cit., p. 244. 154 “São, pois, normas constitucionais de princípio institutivo aquelas através das quais o legislador constituinte traça esquemas gerais de estruturação e atribuições de órgãos, entidades ou institutos, para que o legislador ordinário os estruture em definitivo, mediante lei”. (Ibid., p. 126) 155 BORGES, José Souto Maior. Lei complementar tributária. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, EDUC, 1975, p. 35. 156“[...] aquelas que dependem de outras providências para que possam surtir os efeitos essenciais colimados pelo legislador constituinte”. (SILVA, op. cit., p. 126) 157 “Normas de eficácia contida, portanto, são aquelas em que o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a determinada matéria, mas deixou margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do Poder Público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos dos conceitos gerais nelas enunciados”. (Ibid., p. 116)
Paulo de Barros Carvalho158 ensina que a Lei Complementar é de “natureza
ontológico-formal”, pois, o art. 69 da Constituição Federal dispõe que elas devem ser
aprovadas por maioria absoluta (critério formal); e em relação ao conteúdo, se aplica
àquelas matérias expressas ou implicitamente159 indicadas na Constituição (critério
material ou ontológico).160
O papel geral da Lei Complementar em matéria tributária está disciplinado no
art. 146161 da CF/88, tendo como objetivo: a) dispor sobre conflitos de competência;
b) regular as limitações constitucionais ao poder de tributar, e; c) estabelecer normas
gerais.
O art. 146-A, incluído pela Emenda Constitucional nº 42/03, também determina
que a Lei complementar: “poderá estabelecer critérios especiais de tributação, com o
objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de
a União, por lei, estabelecer normas de igual objetivo”.
Também a União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos
compulsórios (art. 148 da CF/88).
Souto Maior Borges162 ensina que: “A lei complementar é, no direito brasileiro,
lei da União; consequentemente, lei da ordem central”.
158 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 226. 159 “Os assuntos que o constituinte reservou para o campo da lei complementar estão quase sempre expressos, inobstante possamos encontrar, em alguns passos, a simples alusão à lei, desacompanhada do qualificativo complementar. Em circunstâncias como essa, a bem empreendida análise do comando supremo apontará que a grandeza do tema somente pode ser objeto de lei complementar, visto que estão em pauta regulações diretas de preceito da Lei maior, que por outros estatutos não poderiam ser versadas”. (Ibid., p. 226-227). 160 Em sentido análogo, José Souto Maior Borges. (BORGES, José Souto Maior. Lei complementar tributária. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, EDUC, 1975, p. 73). 161“Art. 146. Cabe à lei complementar: I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar; III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes; b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas. d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239”. (BRASIL. Constituição Federal (1988). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm> Acesso em: 05 abr. 2016). 162BORGES, op. cit., p. 35.
As normas gerais de direito tributário orientam toda a tributação e, assim, lei
complementar que a discipline, são de aplicação obrigatória tanto para União,
Estados, Distrito Federal e Municípios.163
Para Paulo de Barros Carvalho164, a Lei Complementar tem uma única função:
“ser o veículo introdutório das normas gerais de direito tributário”; essas por sua vez
tem como objetivo: “a) dispor sobre conflitos de competência entre as entidades
tributantes; e b) regular as limitações constitucionais ao poder de tributar”; assim,
refuta a posição defendida pela denominada corrente ortodoxa ou tricotômica165 que
atribui uma função ampla da lei complementar em matéria tributária, o que para o
autor166: “continuavam a ser um canal livre de interferência da União nos interesses
jurídicos-tributários dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”.
Entretanto para Sérgio Benício, tanto a corrente dicotômica, quanto a
tricotômica são insuficientes para esclarecer as funções da lei complementar com
base no art. 146 da CF/88, porque construídas com base no sistema constitucional
anterior ao atual167. Para esse autor168 que justifica o seu entendimento apoiado em
Heleno Taveira Tôrres169, “a função precípua de tal espécie normativa é, sim, a edição
de normas gerais de direito tributário”, entretanto, o seu conteúdo não é aberto, pois,
está determinado nos incisos do art. 146.
163 BENÍCIO, Sérgio Gonini. ICMS: apontamentos teóricos e práticos sobre a substituição tributária. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 26. 164 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 222. 165 “(...) a maioria dos doutrinadores, formadores da corrente tricotômica empreendeu uma interpretação literal do transcrito dispositivo, entendendo ter a lei complementar tributária tantas funções quantas as descritas expressamente na Constituição Federal, a saber: a) edição de normas gerais de direito tributário; b) apontamentos de critérios de dirimência dos potenciais conflitos de competência entre os entes federados tributantes; e c) regulamentação das limitações constitucionais ao poder de tributar”. (BENÍCIO, op. cit., p. 27). 166 CARVALHO, op. cit., p. 230. 167 BENÍCIO, op. cit., p. 30-31. 168Ibid., p. 32. 169 “Assim, numa leitura sistemática do art. 146, que é regra típica de Constituição Nacional, ‘normas gerais’ somente serão aquelas que venham a ser criadas seguindo tal espírito; quando o legislativo da União, revestindo-se das magnas funções de legislador nacional, as introduzirá no ordenamento para: a) regular limitações constitucionais ao poder de tributar, detidamente àquelas que exigem lei específica para surtir seus efeitos; b) evitar conflitos de competência entre as pessoas tributantes, ao dispor sobre fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes dos impostos já identificados na Constituição; c) definir os tributos e suas espécies; d) harmonizar os procedimentos de cobrança e fiscalização dos tributos, tratando de obrigação, lançamento e crédito; e) uniformizar prazos de decadência e prescrição; f) fomentar, de modo harmonizado, adequando tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas”. (TÔRRES, Heleno Taveira. Prefácio. In: PINTO. Fabiana Lopes. SALIBA. Ricardo Berzosa. (Orgs.). Leis Complementares em matéria tributária: aspectos práticos atuais. v. 1. Barueri, SP: Manole, 2003. p. xxvi-xxvii).
Com a Constituição Federal de 1988, as normas do sistema tributário nacional
foram dispostas de forma mais detalhada, embora não se tenha revogado a Lei nº
5.172/66 (Código Tributário Nacional), que permanece com status de Lei
Complementar, exceto naquilo que for conflitante com as normas constitucionais.
Souto Maior Borges170 divide a lei complementar em dois grupos: “Umas,
funcionam como fundamento ou razão de validade de leis ordinárias, decretos
legislativos e convênios; outras, não exercem essa função, porque se colocam em
campos privativos”.
As Leis Complementares que veiculam normas gerais, nos dizeres de Heleno
Taveira Tôrres171: “prevalecerão, sempre, sobre a legislação federal, estadual, distrital
ou municipal, na medida em que estas legislações passam a ter que admiti-las (...)
como fundamento de validade material”172.
Ao tratar sobre o papel da Lei Complementar em matéria tributária, Sacha
Calmon Navarro Coêlho173, alerta que:
Quatro consequências devem ser ditas: a) o legislador não escolhe a matéria da lei complementar, fá-lo a Constituição; b) o legislador ordinário não pode adentrar matéria de lei complementar, torná-la-ia inútil; c) a lei complementar só é superior às leis ordinárias quando é o fundamento da validez destas; e d) a matéria sob reserva de lei complementar é indelegável.
Em relação ao ICMS, o inciso XII174 do § 2º do art. 155, determina que cabe à
lei complementar dispor sobre diversos assuntos inerente ao respectivo imposto, entre
170 BORGES, José Souto Maior. Lei complementar tributária. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, EDUC, 1975, p. 83 171 TÔRRES, Heleno Taveira. Prefácio. In: PINTO. Fabiana Lopes. SALIBA. Ricardo Berzosa. (Orgs.). Leis Complementares em matéria tributária: aspectos práticos atuais. v. 1. Barueri, SP: Manole, 2003. p. xxix). 172 Nesse mesmo sentido José Afonso da Silva. (SILVA, José Afonso. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 247) 173COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à constituição de 1988: Sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 84. 174 “XII - cabe à lei complementar: a) definir seus contribuintes; b) dispor sobre substituição tributária; c) disciplinar o regime de compensação do imposto; d) fixar, para efeito de sua cobrança e definição do estabelecimento responsável, o local das operações relativas à circulação de mercadorias e das prestações de serviços; e) excluir da incidência do imposto, nas exportações para o exterior, serviços e outros produtos além dos mencionados no inciso X, "a" f) prever casos de manutenção de crédito, relativamente à remessa para outro Estado e exportação para o exterior, de serviços e de mercadorias; g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados. h) definir os combustíveis e lubrificantes sobre os quais o imposto incidirá uma única vez, qualquer que seja a sua finalidade, hipótese em que não se aplicará o disposto no inciso X, b;
eles, definir seus contribuintes e disciplinar o regime da substituição tributária, objeto
central do presente estudo.
Todavia, conforme atentamente observa Carrazza175: “a lei complementar em
tela não ‘define’ propriamente contribuintes do ICMS. Apenas apresenta ‘sugestões’
ao legislador”, uma vez que estes já se encontram delineados no texto constitucional
ao definir a sua regra matriz de incidência.
A necessidade de lei complementar, à instituição de tributos, somente pode ser
vista como explanadora de critérios gerais, pois, tais normas, conforme alerta Sérgio
Benício176: “são em sua esmagadora maioria, preceitos de eficácia plena, os quais se
bastam, não obstante a possibilidade de sua apreensão pelo exegeta poder contar
com o valioso auxílio da lei complementar nacional aclaradora”.
Nesse sentido, é importante destacar, que a lei complementar não é um veículo
autônomo a complementar as matérias disciplinadas pela constituição, pois, como
assevera Souto Maior Borges:
[...] funda sua validade na Constituição por uma dupla via: 1ª) formalmente, enquanto deve ser ditada por autoridades criadas pela Constituição e dentro da esfera de competência a elas atribuída; 2ª) materialmente, enquanto o conteúdo dessas normas deve se ajustar à Constituição.
Em relação ao regime jurídico a que estão sujeitas as leis complementares,
tudo dependerá da matéria (somente àquelas previstas no texto constitucional), bem
como do rito legislativo (atender as formalidades previstas).
Nesse sentido, pode acontecer que a lei atenda apenas um dos requisitos:
somente processo formal (lei formalmente complementar), mas a matéria não é afeta
a Lei Complementar, nesta situação tratar-se-á de simples lei ordinária, ou; pode
acontecer da matéria ser reservada à lei complementar (lei materialmente
complementar), mas o processo formal não atendeu o requisito de maioria absoluta
disposto no art. 69, é o que ocorre com o CTN (Lei nº 5.172/66); nesta situação, em
i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço”. (BRASIL. Constituição Federal (1988). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm> Acesso em: 05 abr. 2016). 175 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 1056. 176 BENÍCIO, Sérgio Gonini. ICMS: apontamentos teóricos e práticos sobre a substituição tributária. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 41.
virtude da matéria ser afeta a lei complementar, somente poderá ser alterada por uma
lei complementar, em consonância com o disposto no art. 146 da CF/88.177
Por isso, não há que se falar em hierarquia da lei complementar sobre a lei
ordinária, o que ocorre na verdade é que determinadas matérias são reservadas pelo
texto constitucional à lei complementar, o que automaticamente exige critério formal
próprio, qual seja quórum especial, conforme disposto no art. 69178 da CF/88.179
Nesse sentido, salienta Souto Maior Borges180 que: “É o critério formal e
material adotado pela Constituição que dá a unidade de regime à lei complementar,
sem o que não se legitimaria o seu estudo como uma categoria jurídica autônoma”,
diga-se, é o que a diferencia não só da lei ordinária, como das demais categorias
legislativas.
Assim, foi publicada a Lei Complementar nº 87/96, para cumprir a determinação
constitucional.
Porém, conforme se verificará no decorrer do estudo, a referida Lei
Complementar, acabou por não atender, em alguns pontos, a demanda constitucional,
na medida em que, em vez de disciplinar e dispor sobre determinados assuntos, os
atribuiu ao legislativo estadual ou aos Convênios e Protocolos.181
Em relação ao disciplinamento do regime da substituição tributária pela Lei
Complementar, novamente merece atenção a observação feita por Carrazza182:
“Logo, a lei complementar não pode, sem reserva nem restrição, ir elegendo
substitutos tributários para este ICMS. Muito ao invés, deve fazê-lo de forma a
resguardá-los do ‘empobrecimento sem causa’”; ademais, não se deve perder de
vista, que regra geral, o imposto deve ser exigido e recolhido pelo contribuinte; a
177 MACEI, Demetrius Nichele. Ato cooperativo & tributação. 2ª ed. Curitiba: Juruá, 2014, p. 67. 178 “Art. 69. As leis complementares serão aprovadas por maioria absoluta”. (BRASIL, Constituição Federal de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm> Acesso em: 05 abr. 2016). 179 “[...] a lei complementar só é superior às leis ordinárias quando é o fundamento de validez destas”. (COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à constituição de 1988: sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 84). 180 BORGES, José Souto Maior. Lei complementar tributária. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, EDUC, 1975, p. 72. 181 Nesse sentido alerta Sacha Calmon Navarro Coêlho: “A Lei Complementar nº 87/96 tem méritos e deméritos e vem suscitando enormes problemas perante o judiciário. Assim, por ser complementar da Constituição (art. 68, § 1º, CF), toda matéria que delegar ao legislador ordinário será inconstitucional. Esta é, sem dúvida, uma macro questão. (COÊLHO. op. cit., p. 516). 182 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 1057.
atribuição à terceiros, como se verificará no Capítulo II, deve ser adotada com
cautelas.
Realizada breve análise sobre o papel da lei complementar no direito tributário,
passa-se agora a verificar a regra matriz de incidência do ICMS.
2. A REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA DO ICMS
2.1 COMPREENDENDO OS SEUS CRITÉRIOS
A regra-matriz de incidência tributária é uma regra de conduta. Conforme
leciona Paulo de Barros Carvalho183:
Ora, a regra matriz de incidência tributária é, por excelência, u’a norma de conduta, vertida imediatamente para disciplinar a relação do Estado com seus súditos, tendo em vista contribuições pecuniárias. Concretizando-se os fatos descritos na hipótese, deve-ser a consequência, e esta, por sua vez prescreve uma obrigação patrimonial. Nela, encontraremos uma pessoa (sujeito passivo) obrigada a cumprir uma prestação em dinheiro. Eis o dever-ser modalizado.
Analisando a relação jurídica tributária, Ataliba184, destaca que:
Assim, uma lei descreve hipoteticamente um estado de fato, um fato ou um conjunto de circunstâncias de fato, e dispõe que a realização concreta, no mundo fenomênico, do que foi descrito, determina o nascimento de uma obrigação de pagar um tributo. Portanto, temos primeiramente (lógica e cronologicamente) uma descrição legislativa (hipotética) de um fato; ulteriormente, ocorre, acontece, realiza-se este fato concretamente.
Nos dizeres de Maria Rita Ferragut185, a regra matriz de incidência tributária se
distingue das demais normas, apenas em virtude do seu conteúdo.
183 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.
378. 184 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 53. 185 Difere das demais normas existentes no direito positivo apenas em virtude do seu conteúdo, que descreve uma fato típico tributário e prescreve a relacional obrigacional que se estabelece entre os sujeitos ativo e passivo, tendo por objeto o pagamento de uma prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cuja valor nela se possa exprimir; não decorrente de ato ilícito (tributo)”. (FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o código civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 25
Paulo de Barros Carvalho186 ao desenvolver os conceitos da regra matriz de
incidência utilizou os termos: “descritor” e “prescritor”, o primeiro para designar o
antecedente normativo e o segundo para indicar o seu consequente.
Importante mencionar que tanto no descritor quanto no prescritor existem
referências a critérios, elementos ou dados identificativos, conforme menciona Paulo
de Barros Carvalho187:
[...] na hipótese (descritor), haveremos de encontrar um critério material (comportamento de uma pessoa), condicionado no tempo (critério temporal) e no espaço (critério espacial). Já na consequência (prescritor), depararemos com um critério pessoal (sujeito ativo e sujeito passivo) e um critério quantitativo (base de cálculo e alíquota). A conjugação desses dados indicativos nos oferece a possibilidade de exibir, na sua plenitude, o núcleo lógico-estrutural da norma-padrão de incidência tributária.
A hipótese para o ICMS, no que tange a circulação de mercadorias, trará a
previsão de um fato (se alguém realizar operação de circulação de mercadorias),
enquanto a consequência prescreverá a relação jurídica (obrigação tributária) que se
vai instaurar, onde e quando acontecer o fato cogitado no suposto (aquele alguém
deverá pagar à Fazenda Estadual um percentual do valor da mercadoria
comercializada).188
Por isso, assevera Carrazza189: “que a materialidade (o núcleo) da hipótese de
incidência do ICMS deve ser – porque assim o exige a Carta Constitucional - o ato de
realizar operações (negócios jurídicos) mercantis”.
Trazendo a referida teoria para a análise hipotética de uma operação de
circulação de mercadorias sujeita a incidência do ICMS, temos:
Hipótese (descritor) critério material (realizar operações relativas à
circulação de mercadorias); critério espacial (qualquer lugar do território do Estado) e
critério temporal (o momento da saída da mercadoria do estabelecimento)190.
Consequência (prescritor) critério pessoal: sujeito ativo (Estados e o Distrito
Federal) e sujeito passivo (a pessoa que pratica operação de circulação da
mercadoria); e, o critério quantitativo: base de cálculo (o valor da operação) e a
186 CARVALHO, op. cit., 263. 187 Ibid., p. 263. 188 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 262. 189 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 62. 190 CARVALHO, op. cit., p. 384.
alíquota (para as operações internas, o percentual fixado na legislação interna de cada
Estado e para as operações interestaduais o percentual de 4%, 7% ou 12%, conforme
previsto na Resoluções do Senado Federal nºs. 22/89 e 13/2012).191
Para que a descrição hipotética constante na lei irradie seus efeitos no mundo
real, é necessário que estejam presentes “todos os critérios identificadores tipificados
na hipótese da norma geral e abstrata”, conforme salienta Paulo de Barros
Carvalho192.
Em relação as operações relativas à circulação de mercadorias, Carrazza193,
alerta para a observância simultânea de pressupostos que ensejam o seu
recolhimento:
[...] a) a realização de operações (negócio jurídicos) mercantis; b) a circulação jurídica (transmissão da posse ou da propriedade); c) a existência de mercadoria enquanto objeto da operação; e, d) o propósito de lucro imediato, com a entrega (tradictio) da mercadoria.
Tais ponderações refletem a necessidade da adequada interpretação que deve
ser dada ao termo “operações relativas à circulação de mercadorias”, pois, na pratica
os agentes do Estado entendem que o termo abarca qualquer tipo circulação de
mercadoria, e, assim, exigem o ICMS de operações não revestidas de caráter
oneroso, como remessas, transferências dentro do próprio Estado194, entre outras.195
Importante ainda mencionar que comumente se utiliza a expressão “fato
gerador” tanto para designar a situação abstrata, quanto o próprio fato realizado,
entretanto, alerta Geraldo Ataliba196:
Tal é a razão pela qual sempre distinguimos estas duas coisas, denominando ‘hipótese de incidência’ ao conceito legal (descrição legal, hipotética de um fato, estado de fato ou conjunto de circunstâncias de fato) e ‘fato imponível’ ao fato efetivamente acontecido, num determinado tempo e lugar, configurando rigorosamente a hipótese de incidência.
191 Ibid., p. 384. 192Ibid., p. 280. 193 CARRAZZA, Op. Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 63. 194 “Portanto, em homenagem ao princípio federativo e da autonomia do Distrito Federal há que se superar, nas transferências interestaduais, entre estabelecimentos de uma mesma empresa, a tese da inexistência de circulação de mercadorias”. (CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 70). 195 “A cega observância deste comando legal leva a inconstitucionalidade, porque ‘alarga’ a hipótese de incidência do ICMS, de modo a ‘permitir’ que o tributo alcance simples movimentações de mercadorias”. (CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 67). 196 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 54.
Paulo de Barros Carvalho197 optou por distinguir esses dois momentos
chamando-os de hipótese tributária e fato jurídico tributário, dispondo: “(...) a
construção de linguagem prescritiva geral e abstrata (hipótese tributária) e sua
projeção factual (fato jurídico tributário)”,
O próprio CTN em diversos artigos utiliza expressão “fato gerador”, como se
verifica por exemplo, da análise do art. 114 que trata da obrigação principal, dispondo
que o fato gerador é: “situação definida em lei como necessária e suficiente à sua
ocorrência”.
Ora, o legislador do CTN, por certo não teve a preocupação de separar esses
dois momentos, situação que não passou desapercebida por Paulo de Barros
Carvalho:198
Se escandirmos as palavras, na busca das proporções semânticas do art. 114, acharemos três interpretações possíveis: a) Numa reporta-se o legislador ao fato jurídico, concretamente concebido. A obrigação principal seria gerada pelo acontecimento de um fato e, como tal, haveria de representar, materialmente, a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. Ou, por outro giro, fato gerador da obrigação principal seria aquele específico evento do mundo físico exterior que preenche os pressupostos instituídos na lei, segundo o relato adequado em linguagem competente. b) Noutra, o dispositivo estaria se referindo à hipótese das regras jurídicas tributárias, ao proclamar que é a situação definida em lei. De ver está que uma situação definida em lei é um conceito normativo. E é o suposto da norma que descreve os acontecimentos factuais capazes de fazer brotar direitos e deveres correlatos. Teríamos aí, então, fato gerador da obrigação principal como equivalente a hipótese tributária. c) Num terceiro esforço de interpretação, o versículo relataria, a um só tempo, a conjugação das duas entidades: um acontecimento que se dá no campo real-social e um conceito que, seletor de propriedades, enuncia quais sejam as condições necessárias e suficientes para que ele possa efetivamente ocorrer.
Embora não seja adequada a utilização do termo “fato gerador”, verifica-se que
esse se apresenta na quase totalidade dos dispositivos legais em matéria tributária,
lembrando Geraldo Ataliba, que tal denominação, decorre de um artigo publicado na
RDA 2/50 pelo publicista francês, Gaston Jèze, cujo título foi “O fato gerador do
imposto”.199
197 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.
279. 198 Ibid., p. 304-305. 199 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 55.
Logo, ainda que a utilização do termo seja constante, o estudioso do direito,
deve saber separar a hipótese tributária (descrição legal do fato) do fato efetivamente
concretizado (fato jurídico tributário).
Em relação a importância da regra matriz de incidência para compreensão da
substituição tributária, que é uma forma de responsabilidade, Maria Rita Ferragut200,
lembra que: “Estudar a responsabilidade tributária requer que a investigação tenha
como ponto de partida a regra matriz de incidência, com enfoque na relação jurídica
constante de seu consequente”, por isso, feitas considerações gerais sobre a regra
matriz de incidência, analisar-se-á dois importantes critérios constantes no seu
“prescritor”: o sujeito passivo e base de cálculo.
2.2 A IMPORTÂNCIA DO “PRESCRITOR” PARA A COMPREENSÃO DA
SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA PROGRESSIVA DO ICMS
2.2.1 Considerações Iniciais
Becker ao analisar a construção jurídica das regras tributárias constata que o
legislador trabalha com dados das ciências das finanças públicas e da política fiscal,
que são pré-jurídicas, as quais reconhecem que: a) é impossível fazer com que a
realidade de cada indivíduo integre a hipótese de incidência; b) é possível a
repercussão econômica do tributo; c) a natureza da repercussão econômica do tributo
e a impossibilidade de identificar o contribuinte de fato.201
Para resolver tais problemas (conflito de interesses econômicos e
impraticabilidade científica) Becker202 leciona que “o legislador escolhe fatos que
sejam signos presuntivos de renda ou capital” e para sujeito passivo “toma aquele
determinado indivíduo de cuja renda ou capital a hipótese de incidência é signo
presuntivo”.
200 FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o código civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 25. 201 BECKER. Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 6 ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 586. 202 Ibid., p. 586.
Paulo de Barros Carvalho203 ao analisar o “prescritor” da regra matriz ensina
que: “Se a hipótese, funcionando como descritor, anuncia os critérios conceptuais
para o reconhecimento de um fato, o consequente, como prescritor, nos dá, também
critérios para a identificação do vínculo jurídico que nasce”.
É, pois, no prescritor, que encontrar-se-á os sujeitos da relação jurídico
tributária, bem como os elementos quantitativos que formam a relação obrigacional
tributária.
2.2.2 Sujeito Passivo
O art. 121, do CTN204, define: “sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa
obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária”.
O sujeito passivo, portanto, é a pessoa física ou jurídica obrigada ao pagamento
do tributo205. É aquele que fica na contingência de prestar ao sujeito ativo (União,
Estados e Municípios) o cumprimento da obrigação quando devida206. É o titular da
riqueza a ser tributada207.
Paulo de Barros Carvalho208 pontifica que:
Sujeito passivo da relação jurídica tributária é a pessoa – sujeito de direitos – física ou jurídica, privada ou pública, de quem se exige o cumprimento da prestação: pecuniária, nos nexos obrigacionais; e insuscetível de avaliação patrimonial, nas relações que veiculam meros deveres instrumentais ou formais. É no critério pessoal do consequente da regra-matriz de incidência que colhemos elementos informadores para a determinação do sujeito passivo.
203CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 316. 204 BRASIL, Código Tributário Nacional. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5172.htm> Acesso em: 05 abr. 2016. 205 SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Código tributário nacional: anotações à constituição, ao
código tributário nacional e as leis complementares 87/1996 e 116/03. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p.
233. 206 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 323. 207 FELDENS, Vivian. Sujeição tributária passiva indireta. In: MARINS, James; MARINS, Glaucia Vieira.
(Coords). Direito tributário atual. Curitiba: Juruá, 2000, p. 46. 208 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 335.
Na eleição do sujeito passivo o legislador só pode onerar quem participou do
fato jurídico tributário, ou seja, seria desarrazoado exigir o pagamento do tributo de
alguém que não tenha participado, de algum modo, da ocorrência do fato típico.209
O critério pessoal (sujeito passivo) divide-se em contribuinte e responsável,
conforme consta no parágrafo único, do art. 121, do CTN210. O primeiro designa
aquele que efetivamente pratica o fato jurídico tributário e que, portanto, tem relação
pessoal e direta com o fato; e o segundo (denominado responsável) é aquele que não
tendo praticado o fato jurídico tributário, se torna obrigado ao pagamento do tributo
por força da lei211.
José Eduardo Soares de Melo212, ao analisar a determinação de quem seja o
devedor do tributo, observa que:
Normalmente, a Constituição não indica a pessoa que deve ser caracterizada como devedora do tributo, mas apenas contempla as materialidades suscetíveis de incidência, outorgando as respectivas competências às pessoas públicas. Nessa situação, competiria à lei complementar (art. 146) estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, no que disporia sobre os contribuintes.
Também destaca Maria Rita Ferragut, que a Constituição não indica o sujeito
passivo, a escolha deste é infraconstitucional213.
Pela análise do texto constitucional é possível depreender quem será o
contribuinte de determinado tributo, isso decorre, da simples leitura da hipótese da
normal geral e abstrata, todavia, é sabido que, nem sempre este será o obrigado ao
pagamento do tributo, já que pela regra disposta no CTN, a atribuição pode recair
209CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 387. 210 “Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária. Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se: I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador; II - responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição
expressa de lei”. (BRASIL. Código Tributário Nacional. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5172.htm> Acesso em: 05 abr. 2016). 211 “O responsável diferencia-se do contribuinte por ser necessariamente um sujeito qualquer (i) que não tenha praticado o evento descrito no fato jurídico tributário; e (ii) que disponha de meios para ressarcir-se do tributo pago por conta de fato praticado por outrem”. (FERRAGUT. Maria Rita. Responsabilidade tributária e o código civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 34). 212 MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 145. 213 FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o código civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 30.
sobre um terceiro, dai, porque Maria Rita Ferragut, entende que a escolha do sujeito
passivo é infraconstitucional.
Nesse sentido, Paulo de Barros Carvalho214 pontifica que:
A Constituição não aponta quem deva ser o sujeito passivo das exações cuja competência legislativa faculta às pessoas políticas. Invariavelmente, o constituinte se reporta a um evento (operações relativas a circulação de mercadorias; transmissão de bens imóveis; importação; exportação; serviços de qualquer natureza etc.) ou a bens (produtos industrializados; propriedade territorial rural; propriedade predial e territorial urbana etc.), deixando a cargo do legislador ordinário não só estabelecer o desenho estrutural da hipótese normativa, que deverá girar em torno daquela referência constitucional, mas, além disso, escolher o sujeito que arcará com o peso da incidência fiscal, fazendo as vezes do devedor da prestação tributária.
Para Renato Lopes Becho215: “o sujeito passivo está umbilicalmente ligado ao
critério material, o qual já veio, em vários casos, arrolados na Constituição Federal”.
Carrazza216, observa que: “a Constituição não indica, de modo expresso, o
sujeito passivo de nenhum tributo. Todavia, sinaliza quem, ocorrido o fato imponível,
poderá ser compelido a ocupar esta posição”.
Por isso, observa Aroldo Gomes de Mattos217 que:
A sujeição passiva aos impostos está desenhada de modo explícito ou implícito quando da atribuição constitucional da competência impositiva conferida a cada ente político. Assim, há de ser ela rigorosamente obedecida pelo legislador complementar ao regrá-la, como também pelo legislador ordinário ao instituí-la.
Em relação ao ICMS, a Constituição Federal218 dispõe no art. 155, § 2º, XII, “a”
que: “cabe a Lei Complementar definir seus contribuintes”.
A definição do contribuinte do ICMS, está disposta no art. 4º da Lei
Complementar n° 87/96219.
214 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 353. 215 BECHO. Renato Lopes. Sujeição passiva e responsabilidade tributária. São Paulo: Dialética, 2000, p. 63. 216CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 462. 217 MATTOS, Aroldo Gomes de. ICMS: (comentários à legislação nacional). São Paulo: Dialética, 2006, p. 156. 218 BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm> Acesso em: 05 abr. 2016. 219 “Art. 4º. Contribuinte é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadoria ou prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.
Portanto, são contribuintes do ICMS, a pessoa física ou jurídica que pratica com
habitualidade ou intuito comercial operações relativas a circulação de mercadoria ou
que presta serviço de transporte intermunicipal, interestadual e de comunicação.220
Logo, inserem-se como contribuintes: o comerciante, o industrial, o importador,
o prestador de serviço de transporte interestadual e intermunicipal, bem como o
prestador de serviço de comunicação oneroso.
Todavia, observa Carrazza221, que “o Poder Público tem sentido a necessidade
de arrecadar o ICMS de terceiros, que não contribuintes”, por diversos motivos, entres
eles: da impossibilidade prática de cobrar de alguns contribuintes em determinadas
situações e o da eficiência na arrecadação.222
No âmbito do ICMS, em especial em relação a substituição tributária
progressiva ou “para frente”, o responsável, será analisado com detalhes no Capítulo
II.
2.2.3 Base de Cálculo
A base de cálculo de qualquer tributo é a quantificação da materialidade223. Ela
é o fundamento, o núcleo, o cerne da norma tributária224.
Para Ataliba 225: “é o conceito de peso, volume, comprimento, largura, altura,
valor, preço, custo, perímetro, capacidade, superfície, grossura ou qualquer outro
atributo de tamanho ou grandeza mensuráveis do próprio aspecto material da h.i.”.
Parágrafo único. É também contribuinte a pessoa física ou jurídica que, mesmo sem habitualidade ou intuito comercial: I – importe mercadorias ou bens do exterior, qualquer que seja a sua finalidade; II - seja destinatária de serviço prestado no exterior ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior; III – adquira em licitação mercadorias ou bens apreendidos ou abandonados; IV – adquira lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos derivados de petróleo e energia elétrica oriundos de outro Estado, quando não destinados à comercialização ou à industrialização. (BRASIL. Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp87.htm> Acesso em: 05 abr. 2016.) 220 Também se elege, como contribuinte do ICMS, as pessoas físicas ou jurídicas que mesmo sem habitualidade ou intuito comercial praticam as operações previstas nos respectivos incisos do parágrafo único do art. 4º da Lei Complementar nº 87/96. 221 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 128. 222 Ibid., p. 128 223 Ibid., 105. 224 MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 173. 225ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 109.
Paulo de Barros226 ensina que:
[...] a base de cálculo é a grandeza instituída na consequência da regra-matriz tributária, e que se destina, primordialmente, a dimensionar a intensidade do comportamento inserto no núcleo do fato jurídico, para que combinando-se à alíquota, seja determinado o valor da prestação pecuniária. Paralelamente, tem a virtude de confirmar, infirmar ou afirmar o critério material expresso na composição do suposto normativo. A versatilidade categorial desse instrumento jurídico se apresenta em três funções distintas: a) medir as proporções reais do fato; b) compor a específica determinação da dívida; e c) confirmar, infirmar ou afirmar o verdadeiro critério material da descrição contida no antecedente da norma.
A base de cálculo deve refletir a materialidade do tributo, logo, se o critério
material da regra matriz do Imposto sobre Serviços – ISS é “prestar serviços
constantes na lista da Lei Complementar nº 116/03”, a base de cálculo só pode ser o
“valor do serviço prestado”, não se admitindo que se eleja como base de cálculo,
aspectos estranhos a essa realidade, como por exemplo, o valor do reembolso,
despesas, entre outros.
Como elemento quantitativo do prescritor da regra matriz de incidência, a base
de cálculo, identifica a porção ou quantidade a ser tributada.
No âmbito do ICMS será a parcela da operação ou prestação que será gravada
pela tributação, por meio de aplicação de uma alíquota.
Para Paulo de Barros227:
A grandeza haverá de ser mensuradora adequada da materialidade do evento, constituindo-se, obrigatoriamente, de uma característica peculiar ao fato jurídico tributário. Eis a base de cálculo, na sua função comparativa, confirmando, infirmando ou afirmando o verdadeiro critério material da hipótese tributária. Confirmando, toda vez que houver perfeita sintonia entre o padrão de medida e o núcleo do fato dimensionado. Infirmando, quando for manifesta a incompatibilidade entre a grandeza eleita e o acontecimento que o legislador declara como a medula da previsão fáctica. Por fim, afirmando, na eventualidade de ser obscura a formulação legal, prevalecendo, então, como critério material da hipótese, a ação-tipo que esta sendo avaliada.
A base de cálculo, portanto, deve guardar uma identidade com a hipótese
tributária, logo, se o ICMS incide sobre operações relativas a circulação de
mercadorias e sobre prestação de serviço de transporte intermunicipal e interestadual
226 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 363. 227 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 366-367.
e de comunicação, a base a ser tributável deve refletir o valor da mercadoria no caso
de venda de produtos ou o valor da prestação, nas situações de serviço de transporte
ou de comunicação, pois, do contrário estaríamos dispondo de outro tributo que não
o ICMS.
Assim, merece destaque, a observação feita por Paulo de Barros Carvalho228
de que: “experimentando o binômio base de cálculo/hipótese de incidência, colhido no
texto constitucional para marcar a tipologia dos tributos, saberemos dizer, com rigor e
presteza, da espécie e da subespécie da figura tributária que investigamos”.
No ICMS, a base de cálculo é, em relação a mercadoria, o valor da operação
(art. 13, I, da Lei Complementar nº 87/96), embora o seu parágrafo primeiro determine
a inclusão de uma série de outros valores, inclusive do seu próprio valor229.
O fato da Constituição não dispor sobre a base de cálculo do tributo, não
significa que o legislador infraconstitucional possa quantifica-la livremente, pois, o seu
parâmetro está adstrito a hipótese tributária, bem como aos princípios constitucionais
que regem o tributo, como por exemplo, a vedação ao confisco e a capacidade
contributiva.
Para Marçal Justen Filho230: “o princípio da capacidade contributiva significa a
necessidade de que seja ela um instrumento adequado (grifo do autor) à medição da
riqueza indicada na hipótese de incidência”, sem se levar em conta o referido princípio,
desnaturada estará a hipótese de incidência.
A obrigatoriedade de considerar o princípio da capacidade contributiva dentro
da estrutura da norma tributária é, nos dizeres de Becker231, imperiosa “naqueles
países cujo sistema jurídico contiver regra jurídica constitucional, juridicizando o
‘princípio da capacidade contributiva’”.
228 Ibid., p. 381. 229“§ 1o Integra a base de cálculo do imposto, inclusive na hipótese do inciso V do caput deste artigo: I - o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle; II - o valor correspondente a: a) seguros, juros e demais importâncias pagas, recebidas ou debitadas, bem como descontos concedidos sob condição; b) frete, caso o transporte seja efetuado pelo próprio remetente ou por sua conta e ordem e seja cobrado em separado”. (BRASIL, Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp87.htm> Acesso em: 05 abr. 2016) 230 JUSTEN FILHO, Marçal. Sujeição passiva tributária. 1986, p. 253. 231 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 6 ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 282.
É o que ocorre com o sistema jurídico brasileiro, que conforme tratado em
tópico específico, adotou o princípio da capacidade contributiva.
Neste caso, observa Becker232 “o legislador tem o dever de escolher para a
composição da hipótese de incidência tributária fatos que sejam signos presuntivos
de renda ou capital acima do mínimo indispensável”.
Conforme a regra-matriz de incidência tributária a base de cálculo juntamente
com a hipótese de incidência revela o cerne do tributo, de forma a identificar a sua
natureza, por isso, cabe ao legislador do ICMS, ao fixar sua a base de cálculo, limitar-
se ao valor da operação ou prestação efetivamente praticados.
Nem se diga, no caso de utilização de bases presumidas, em que o legislador
considera para cálculo do tributo valor estranhos ao valor real da operação. Por isso,
Estevão Horvath233 alerta que:
Assim, na hipótese de a lei presumir um determinado valor para certas operações (sobre o qual será calculado o tributo), se o sujeito passivo deste imposto provar que vendeu a mercadoria por preço inferior, será sobre este
que deverá incidir e não sobre o presumido.
Tais presunções são usadas comumente no âmbito do ICMS e recebem o
nome de “pauta fiscal”. A pauta refere-se a valores previamente estabelecidos nas
legislações dos Estados e são utilizadas como base de cálculo do imposto, no lugar,
do valor real da operação.
Contudo, observa Aroldo Gomes234, que não se pode, “em hipóteses normais
e gerais, estimar a priori valores e preços de determinadas operações e prestações
futuras a serem adotados pelos sujeitos passivos”, pois, segundo Carrazza235, “a
manipulação da base de cálculo do tributo acaba fatalmente alterando sua regra-
matriz constitucional”.
A base de cálculo da substituição tributária progressiva, também se insere num
contexto de presunção, todavia, o seu estudo será realizado no Capítulo III.
Assim, após análise empreendida sobre a regra matriz de incidência do ICMS,
passa-se a estudar no Capítulo II, a figura da responsabilidade tributária.
232 Ibid., 282. 233 HORVATH, Estevão. O princípio do não-confisco no direito tributário. São Paulo: Dialética, 2002, p. 109. 234 MATTOS, Aroldo Gomes de. ICMS: (comentários à legislação nacional). São Paulo: Dialética, 2006, p. 259. 235 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 369.
CAPÍTULO II – RESPONSABILIDADE E SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA
1. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA
Observa Paulsen236 que “A palavra responsabilidade tem muitos significados,
mas todos complementares”.
O instituto da responsabilidade tributária, em que se atribui a um terceiro o
dever de recolher o tributo, é de expressiva utilização no ordenamento jurídico.
É o que se denomina na doutrina europeia de “privatização da gestão pública”,
conforme observa James Marins237.
Ao analisar, a figura da responsabilidade tributária, na obra de alguns autores
estrangeiros Paulsen238 revela que:
No Direito Tributário, desde o princípio, a responsabilidade tributária esteve associada à ideia de reponsabilidade de um terceiro por dívida alheia (Hensel, Giannini, Micheli), posto junto al sujeito principal ou contribuinte (Blumentein, Micheli). Ademais, já como detalhamento da responsabilidade tributária, aparece a necessidade de uma relação do terceiro com o fato imponível ou com o contribuinte (Hensel, Micheli) e em reconhecimento ao terceiro responsável do direito de ressarcimento ou regresso aquele (Blumentein, Giannini, Micheli).
A responsabilidade tributária diferencia-se da responsabilidade civil, como
observa Maria Rita Ferragut, pois, nem sempre decorre da prática de atos ilícitos239.
236 “Ora se fala de responsabilidade como a capacidade de uma pessoa para responder por seus atos, ora com o sentido de estar obrigado a algo ou ainda com o sentido de oferecer garantia e também com o sentido de dar resposta reparadora de um dano de modo a restabelecer o equilíbrio quebrado”. (PAULSEN, Leandro. Responsabilidade e substituições tributária. 2014, p.45). 237 “Semelhantes práticas são denominadas pela doutrina européia de ‘privatização da gestão tributária’, justamente porque transferem para terceiros, sobretudo para pessoas jurídicas de Direito Privado, funções de formalização e até mesmo de arrecadação que historicamente cumpriam às Administrações Tributárias”. (MARINS, James. A discussão judicial do funrural e garantias fundamentais – retido versus retentores. In.: ROCHA, Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes questões atuais do direito tributário. v.14. São Paulo: Dialética, 2010, p. 178). 238 PAULSEN, op. cit., p. 62. 239“Diferentemente da responsabilidade civil que, salvo nas exceções legais surge da prática de ato ilícito culposo ou doloso, que resulte em dano a terceiro, e que implica a obrigação de indenizar, a responsabilidade tributária, embora em alguns casos requeira a prática de atos ilícitos (artigos 134, 135 e 137 do CTN), por diversas vezes existe independentemente deles (artigos 129 ao 133 do CTN)”. (FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o código civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 32-33).
A responsabilidade tributária é tratada no Capítulo V do Código Tributário
Nacional, dividida em quatro seções: disposição geral (seção I), responsabilidade dos
sucessores (seção II), responsabilidade de terceiros (seção III) e responsabilidade por
infrações (seção IV).240
O art. 128 do CTN inicia o capítulo da “Responsabilidade Tributária”
determinando que: “Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de
modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada
ao fato gerador da respectiva obrigação”; nessa primeira parte dispositiva fica claro
que somente a lei pode atribuir a figura da responsabilidade, sem prejuízo das
hipóteses já previstas no Código.
Ao analisar o alcance do art. 128, no que tange a possibilidade de o legislador
ordinário atribuir responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, além das
hipóteses já previstas no próprio CTN, alerta Paulsen241 que: “Poderá cuidar de novos
casos; jamais dispor de modo diverso sobre casos já previstos no CTN”.
A segunda parte do art. 128 dispõe: “excluindo a responsabilidade do
contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou
parcial da referida obrigação”; nesse contexto, o legislador vislumbrou a possibilidade
de exclusão total da responsabilidade do contribuinte ou a atribuição a este em caráter
suplementar.
Da leitura do art. 128, pode-se destacar que a responsabilidade tributária em
“sentido amplo” se dará de duas formas: ou a lei atribuirá a terceiro o dever de recolher
o tributo, desde o início do fato jurídico tributário (responsável por substituição), ou,
haverá um deslocamento desta responsabilidade para outra pessoa (responsabilidade
por transferência), por força da lei.
Entretanto, não é qualquer pessoa que pode ser eleita responsável, como
destaca Maria Rita Ferragut242, mas apenas aquela: “pertencente ao conjunto de
indivíduos que estejam indiretamente vinculados ao fato jurídico tributário, ou direta
ou indiretamente vinculado ao sujeito passivo que o praticou”.243
240 PAULSEN, Leandro. Responsabilidade e substituições tributária. 2014, p.141. 241 PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário: completo. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014, p. 193. 242 FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o código civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 38. 243 Nesse mesmo sentido, dispõe Luciano Amaro: “Em suma, o ônus do tributo não pode ser deslocado arbitrariamente pela lei para qualquer pessoa (como responsável por substituição, solidariedade ou por subsidiariedade), ainda que vinculada ao fato gerador, se essa pessoa não puder agir no sentido de evitar esse ônus nem tiver como diligenciar no sentido de que o tributo seja recolhido à conta do
Neste contexto, importante exemplo é dado por Carrazza244, para ilustrar a
figura da responsabilidade:
A eleição da responsabilidade pelo débito tributário recai - é certo – sobre quem não tem relação pessoal e direta com o fato imponível, desde que (grifo do autor), porém vinculada, de algum modo, a ele (v.g., o empregador, que é responsável pelo recolhimento do imposto sobre a renda na fonte, incidente sobre o salário que paga a seu empregado).
O responsável nada mais é do que aquele que não sendo o contribuinte da
obrigação principal se vê compelindo ao pagamento do tributo por imposição da lei.
Paulo de Barros Carvalho245 alerta que o responsável pode ser qualquer pessoa
“desde que não tenha relação pessoal e direta com o fato jurídico tributário”.
Por isso, destaca Leandro Paulsen246 que:
A figura da responsabilidade tributária aparece na lei de normas gerais em matéria tributária como uma classe genérica que diz respeito não somente aqueles terceiros que garantem o pagamento dos tributos, como a quaisquer pessoas que a lei chame ao pagamento de tributos e que não seja o próprio contribuinte, ou seja, todos os terceiros, ainda que substitutos ou retentores.
Maria Rita Ferragut247 classifica as normas de responsabilidade tributária em:
“(i) substituição; (ii) solidariedade; (iii) sucessão; (iv) responsabilidade de terceiros; e
(v) responsabilidade por infrações”.
Ataliba fala em “sujeição passiva indireta” para designar a atribuição a um
outrem (terceiro) que não o contribuinte para efetuar o recolhimento do tributo.248
Paulo de Barros Carvalho249 alerta para as situações em que o responsável é
pessoa estranha ao fato, ou seja, são terceiros que não possuem ligação com o fato
jurídico tributado, e por isso questiona qual a natureza de tal vínculo? O próprio autor
após percorrer a análise dos artigos 130 a 134 do CTN responde: “Nosso
indivíduo que, dado o fato gerador, seria elegível como contribuinte”. (AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 338 244 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 387-388. 245 CARVALHO, Curso de direito tributário. 21ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 353. 246 PAULSEN, Leandro. Responsabilidade e substituições tributária. 2014, p. 140. 247 FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o código civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 56. 248 “Por razões metajurídicas – que não importa aqui recordar precisamente porque juridicamente irrelevante – o legislador muitas vezes dispõe que seja sujeito passivo pessoa que não corresponde rigorosamente à configuração supradescrita, ou ainda, desloca a qualidade de sujeito passivo de uma pessoa para outra, que fica na posição jurídica daquela”. (ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 2010, p. 89). 249 CARVALHO. op. cit., p. 355-359.
entendimento é no sentido de que as relações jurídicas integradas por sujeitos
passivos alheios ao fato tributado apresentam a natureza de sanções
administrativas”250.
Para Maria Rita Ferragut251 “a natureza jurídica da norma de responsabilidade
é sempre tributária, nas modalidades de norma primária dispositiva252 ou
sancionadora253”.
Paulsen254 assevera que: “As obrigações do substituto e do responsável não
estão fundadas na relação contributiva – substituto e responsável não são
contribuintes -, senão no dever geral de “colaboração” com a Fazenda”.
Becker255 diferencia “responsabilidade legal tributária” – que se dá apenas após
a não satisfação do cumprimento da obrigação pelo contribuinte de direito - do
“substituto legal tributário” – que seriam as outras hipóteses de atribuição a um terceiro
feito pelo legislador.
Alerta o referido autor256 que: “Não existe responsabilidade legal tributária, nos
casos em que o Estado pode exigir tributo somente de uma pessoa” ou ainda “quando
o Estado pode, simultaneamente, escolher entre dois indivíduos de qual deles se
exigirá a satisfação da prestação jurídico tributária”, neste caso, o que há é a
substituição legal tributária.
Becker destaca a natureza fiduciária da responsabilidade legal tributária, em
que o terceiro tem o dever de recolher tributo alheio, pois, para esse autor essa a
responsabilidade só pode ocorrer após o não cumprimento da obrigação pelo
contribuinte de direito.257
250 Nesse mesmo sentido filia-se Renato Lopes Becho. (BECHO, Renato Lopes. Sujeição passiva e responsabilidade tributária. São Paulo: Dialética, 2000, p. 152) 251 FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o código civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 51. 252 “Será primária dispositiva quando (i) submeter-se ao regime jurídico tributário, como, por exemplo, os prazos de prescrição e decadência, o princípio da legalidade, a não-cumulatividade etc.; (ii) possuir um antecedente lícito; (iii) a relação jurídica tiver por objeto a obrigação de pagar tributo; e (iv) o pagamento realizado tiver o condão de extinguir o crédito tributário”. (Ibid., p. 51). 253 “Será primária sancionadora quando o antecedente normativo descrever o descumprimento (-c) de uma conduta que competia ao sujeito (futuro responsável), implicando a consequência de passar a ser obrigado a entregar ao Estado – subsidiária ou pessoalmente – uma quantia equivalente àquela que a princípio seria devida pelo contribuinte, a título de tributo”. (Ibid., p. 51). 254 PAULSEN, Leandro. Responsabilidade e substituições tributária. 2014, p. 36. 255 “É possível distinguir entre substituto legal tributário e responsável legal tributário. Entretanto, na maior parte dos casos onde a doutrina julga ver um responsável legal tributário, existe o genuíno substituto legal tributário”. (BECKER, Alfredo. Teoria geral do direito tributário. 6 ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 595). 256 Ibid., p. 596-597. 257 “Por exemplo: A lei determina que o vendedor do imóvel, dentro de determinado prazo, deverá recolher o imposto de transmissão. Se, dentro deste prazo, o vendedor não recolheu o imposto de
Nos dizeres de Paulsen258, a responsabilidade apresenta-se com dois sentidos:
“Há, assim, um sentido amplo de responsabilidade tributária (responsabilidade de
terceiros, alcançando os substitutos, retentores e responsáveis propriamente) e outro
estrito (responsabilidade de terceiros com pura função de garantia)”.
Assim, Paulsen, distingue responsabilidade em “sentido amplo” – que
abrangeria todas as formas de responsabilidade - da responsabilidade em “sentido
estrito” – que se dá nas modalidades previstas nos arts. 129 a 138 do CTN.
Logo, o operador do direito ao empregar o termo “responsabilidade tributária”
deve se atentar para o sentido e o alcance deste, a fim de que os receptores
compreendam de que responsabilidade se fala.
É relevante, ainda, destacar, que o CTN, não faz qualquer distinção entre
responsável por substituição, retenção e outras modalidades, por isso, constata
Paulsen259 que: “A classificação constante do CTN, portanto, é muito simples, talvez
até simplista. Põe como responsáveis quaisquer ‘terceiros’ obrigados ao pagamento”.
Passando-se a análise das características da responsabilidade, tem-se que
está poderá ser: pessoal, subsidiária ou solidária. A responsabilidade pessoal se dá
quando o terceiro é colocado desde o início como obrigado a cumprir a obrigação
(responsabilidade de terceiros, por infrações e substituição); a responsabilidade
subsidiária surge quando o devedor originário se encontra impossibilitado de efetuar
o pagamento de tributo, obrigando, neste caso o terceiro a responder, e; por fim, a
responsabilidade é solidária, quando o legislador pode exigir o adimplemento da
obrigação de mais de uma pessoa.260
Luciano Amaro261 alerta que a responsabilidade tributária já admitia duas
modalidades: a responsabilidade por transferência e a responsabilidade por
transmissão e se a lei, somente depois de ocorrer este fato (não recolhimento pelo vendedor em determinado prazo do imposto de transmissão), permite ao Estado exigir aquele imposto do Tabelião, então, neste caso, e unicamente neste caso: existe a figura do responsável legal tributário”. BECKER. Alfredo. Teoria geral do direito tributário. 6 ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 598). 258 PAULSEN, Leandro. Responsabilidade e substituições tributária. 2014, p. 140. 259Ibid., p. 93. 260 FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o código civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 34-35. 261“[...] a doutrina pátria, já antes do advento do Código Tributário Nacional, costumava identificar duas modalidades básicas: a da substituição e a da transferência. A diferença entre ambas estaria em que, na substituição, a lei desde logo põe o ‘terceiro’ no lugar da pessoa que naturalmente seria definível como contribuinte, ou seja, a obrigação tributária já nasce com seu polo passivo ocupado por um substituto legal tributário. Diversamente, na transferência, a obrigação de um devedor (que pode ser um contribuinte ou um responsável) é deslocada para outra pessoa, em razão de algum evento. Por exemplo, incorporada a empresa ‘A’, a obrigação tributária de que ela era sujeito passivo (na condição de contribuinte ou responsável) é transferida para a incorporadora (que passa a figurar como
substituição. Luís Eduardo Schoueri262 classifica a figura da responsabilidade
tributária (sentido amplo) “em substituto e responsável stricto sensu (este, responsável
por ‘transferência’)”.
A responsabilidade por transferência ocorre quando a obrigação tributária, após
o surgimento contra uma pessoa determinada (que seria o sujeito passivo direto),
desloca-se, pela ocorrência de um fato posterior previsto em lei a pessoa diversa,
chamada de sujeito passivo indireto, como ocorre na solidariedade, sucessão e na
responsabilidade legal.263
Na modalidade da responsabilidade por substituição, o responsável é colocado
no polo passivo desde o início da obrigação tributária, formalizado com a ocorrência
do fato jurídico tributário.264
A dúvida que pode surgir neste momento é: Qual o motivo, que leva o legislador
a transformar uma relação que seria simples e direta (sujeito ativo x contribuinte), em
uma relação indireta (sujeito ativo x um terceiro)?
Para Maria Rita Ferragut265, são duas as causas de existência de
responsabilidade tributária: “arrecadatória, nas modalidades de conveniência e
necessidade, e sancionatória”.
A sancionatória, como o próprio nome sugere, decorre da sanção aplicada a
terceiro por atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, como
exemplo, a reponsabilidade prevista no art. 135266 do CTN. A arrecadatória na
modalidade “necessidade”, decorre do desaparecimento do sujeito passivo originário,
como por exemplo, na incorporação de empresas. Por fim, a modalidade de
“conveniência”, é aquela que tem como justificativa à sua instituição, a facilidade do
sujeito ativo em fiscalizar apenas alguns sujeitos e não milhares, é o que se passa por
responsável). (AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 333). 262 SCHOUERI, Luís Eduardo. 2º ed. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 505. 263 CARRAZZA, op. cit., p. 97. 264 BENÍCIO, Sérgio Gonini. ICMS: apontamentos teóricos e práticos sobre a substituição tributária. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 92. 265 FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o código civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 53. 266 “Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I - as pessoas referidas no artigo anterior; II - os mandatários, prepostos e empregados; III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado”. (BRASIL. CTN. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172Compilado.htm> Acesso em: 02 jun.16).
exemplo, com a substituição tributária progressiva do ICMS, objeto do presente
estudo.267
De um modo geral, a atribuição de responsabilidade a um “terceiro” se dá pela
facilidade do sujeito ativo cobrar tributo de “A” e não de “B” ou cobrar de ambos,
dependendo da espécie de responsabilidade atribuída.
Não resta dúvida que cobrar tributos de mais de uma pessoa possibilita ao fisco
ter maiores garantias de recolhimento e assim evitar a chamada evasão fiscal.
Nesse ponto, Betina Grupenmacher268 destaca que: “ao inserir tais regras no
mencionado diploma legal, o legislador intentou resguardar o seu direito à percepção
do tributo”.
Paulsen269 : “aporta um outro fundamento jurídico de caráter mais técnico ao
chamamento de terceiros a colaborar com a Fazenda, que é o princípio tributário da
praticabilidade da tributação”.
A praticabilidade, refere-se aos instrumentos utilizados pelo legislador,
inclusive o da responsabilidade tributária, com intuito de tornar efetiva a tributação.270
Regina Helena Costa271, reconhece a praticabilidade como um princípio que
labora na “delimitação do âmbito de atuação do legislador infraconstitucional, bem
como na orientação dos agentes públicos acerca da interpretação e da aplicação a
serem dadas a outras normas jurídico-tributárias”.
Alerta-se, porém, que, em nome do praticabilidade não pode o legislador ferir
princípios básicos da tributação como a legalidade e a capacidade contributiva, nem
agir com excessos.272
267 FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o código civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 52-53. 268GRUPENMACHER, BetinaTreiger. Responsabilidade tributária do sócio e do administrador – nova sistemática. In: ROCHA, Valdir de Oliveira. (Org.). Grandes questões atuais do direito tributário. v. 14. São Paulo: Dialética, 2010. p. 29-30. 269 PAULSEN, Leandro. Responsabilidade e substituições tributária. 2014, p. 165. 270 “Os terceiros, ainda que não integrantes da relação tributária contributiva, são chamados a adotar medidas importantes para que as diversas atividades relacionadas à tributação – o lançamento, da fiscalização, a arrecadação e a cobrança – sejam mais simples e efetivas, ou seja, medidas que colaborem para a praticabilidade da tributação”. (Ibid., p. 175). 271COSTA, Regina Helena. Praticabilidade e justiça tributária: exequibilidade da lei tributária e direitos do contribuinte. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 93. 272Ibid., 176-177.
É que nestes casos, o legislador, está adstrito a agir com cautela, não podendo
simplesmente em nome de tornar eficiente à fiscalização, lançar mãos de mecanismos
que sabidamente ofendam direitos tanto do contribuinte, quanto do responsável.273
Ademais, ressalta Paulsen274, que a utilização do princípio “não é suficiente
para justificar obrigações que não fazem sentido, deveres que não sejam necessários,
que não sejam úteis para a Fazenda ou que sejam demasiadamente onerosos quando
comparados com a utilidade que têm”.
Passar-se-á a análise do instituto da substituição tributária - como espécie - do
gênero - responsabilidade tributária.
2. A SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA
2.1 CONCEITO E ORIGEM
A figura da substituição tributária, como instituto autônomo do direito tributário
tem sua origem nos estudos de Ernest Blumenstein275.
Brandão Machado apud Schoueri276 também destaca os estudos
empreendidos por Ernst Blumenstein sobre a substituição tributária revelando que ele
273 “A invocação do dever geral de colaborar com a Administração Tributária não é suficiente para que esta possa efetivamente exigir determinada conduta dos terceiros a título de substituição ou de responsabilidade tributária. Tampouco a referência à praticabilidade da tributação poderá justificar que, mediante decreto ou outros atos administrativos normativos, o contribuinte seja deslocado para a colocação de um substituto em seu lugar ou para que se imponha a terceiro que responda junto com o contribuinte pelo descumprimento da obrigação de pagar tributo”. (PAULSEN, Leandro. Responsabilidade e substituições tributária. 2014, p. 180). 274Ibid., p. 165. 275 “Ernest Blumenstein, por sua vez, responsável por elaborar a Abgabenordnung suíça (o Código Tributário suíço) valendo-se de critérios científicos que havia desenvolvido em suas obras, trouxe maior detalhamento na análise da substituição tributária, dando-lhe espaço próprio. (PAULSEN. op. cit., p. 40). 276 “A primeira vez que Blumenstein versou o assunto se deu em 1918, quando comentou a legislação suíça do imposto do selo (‘Kommentar zum Bundesgestzüber die Stempelabgaben’, Zurique 1918). Da exposição do professor de Zurique se conclui que ‘substituto’ é o devedor do imposto que exsurge de um fato imputável a outrem que deveria ser o contribuinte, mas que a lei não chega a incluir na relação tributária (p. 122). Entre os exemplos colhidos da lei comentada, cita-se para ilustração o caso da letra de câmbio. O imposto de selo é devido pelo emitente do título, pessoa a quem se imputa o fato gerador. Mas quando a cambial é emitida no exterior, a lei impõe a obrigação de pagar o imposto ao aceitante domiciliado no território suíço, a qual assume então o lugar de substituto (p. 152)”. (SCHOUERI. Luís Eduardo. 2º ed. Direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 509).
foi: “o primeiro autor, no mundo, que apreendeu e explicou o fenômeno da substituição
tributária”.
Paulsen277 analisando o termo substituição no direito comparado indica que:
“A palavra substituição mantém o mesmo radical em muitas línguas distintas, que vem
do latim substitutione. Em espanhol, sustitución; em português, substituição; em
alemão, substitution; em italiano, sostituzione”.
Becker278 utiliza a expressão “substituto legal tributário” e esclarece que tal
fenômeno se dá: “toda vez em que o legislador escolher para sujeito passivo da
relação jurídico tributária um outro qualquer indivíduo, em substituição daquele
determinado indivíduo de cuja renda ou capital a hipótese de incidência é fato-signo
presuntivo”.
O conceito de substituição tributária apresentado por Paulsen279, além de
completo é didático, por isso, optou-se pela sua completa transcrição:
[...] substituição tributária é o instituto de Direito Tributário que consiste na determinação por lei, à pessoa não contribuinte de determinado tributo (substituto tributário) que, em face da situação de ascendência que ostenta relativamente ao contribuinte (substituído) – situação essa que é pressuposto de fato da regra matriz de substituição -, verifique a ocorrência do fato gerador do tributo, calcule e efetue, com valores retidos ou exigidos do contribuinte e em nome do contribuinte, o pagamento do tributo devido em caráter definitivo ou de montante a título de mera antecipação por conta de tributo que ainda tenha de ser calculado e ajustado pelo contribuinte (valores esses que, não fosse a norma de substituição, seriam pagos diretamente pelo contribuinte), sob pena de ficar o substituto obrigado a responder com seu próprio patrimônio pela satisfação do montante que tenha deixado de recolher e que tampouco tenha sido pago pelo contribuinte.
A substituição tributária ocorre, quando o legislador atribui a terceiro
(substituto), desde do início da relação jurídico tributária a responsabilidade pelo
recolhimento do tributo. Por isso, deve ser utilizada com cautela para não violar
princípios constitucionais, como o da capacidade contributiva, moralidade, da vedação
ao confisco e da segurança jurídica.
É imprescindível que a atribuição decorra da lei, tal como assevera Marçal
Justen Filho280: “A substituição tributária não deriva de atos entre particulares, que são
inoponíveis ao Estado. Somente através da lei é que se pode assim configurar”.
277 PAULSEN, Leandro. Responsabilidade e substituições tributária. 2014, p. 36. 278 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 6 ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 589 279PAULSEN, op. cit., p. 45. 280 JUSTEN FILHO, Marçal. Sujeição passiva tributária. 1986, p. 104.
Ao eleger o “terceiro” (sujeito passivo indireto) como responsável pelo
recolhimento do imposto que pertence ao contribuinte (sujeito passivo direto), o
legislador deve aplicar a ele (responsável) as mesmas regras que seriam impostas ao
contribuinte, sob pena de desnaturar o instituto da substituição.
Faz-se necessário, observar, que a responsabilidade por substituição não deve
ser aplicada apenas pela facilidade que o administrador tem em exigir a cobrança do
tributo, nesse contexto, importante exemplo é dado por Geraldo Ataliba281:
[...] parece de evidência total que não pode a lei exigir de alguém – que mora no primeiro andar de um prédio – o imposto de renda devido por todos os moradores do prédio, simplesmente porque a cobrança, assim se torna mais fácil! Nem exigir de quem more na esquina, o imposto predial de todos os contribuintes daquele quarteirão – ou ainda que, depois, se lhe assegurem mecanismos de reembolso junto aos demais – só porque tal expediente é cômodo à Administração.
Conforme assevera Paulsen282: “O substituto atua, então, como um
intermediário entre o contribuinte e a Fazenda”. Tem o dever de colaboração, pois,
embora num primeiro momento se verifique um desembolso financeiro, que importa
em alteração do seu patrimônio, este acaba não se efetivando propriamente, uma vez
que ao efetuar a operação financeira, obtém reembolso deste valor junto ao
destinatário.283
Importante esclarecer que a palavra “substituto” é utilizada para designar o
terceiro que é eleito pela lei como responsável por reter e recolher o tributo aos cofres
públicos – que tem o dever de colaboração -; em contrapartida, denomina-se
“substituído”, o contribuinte que detém relação direta com o fato jurídico tributário.
Analisando a posição em que se encontra o substituído na relação jurídica
tributária alerta Becker284 que: “o único sujeito passivo da relação jurídica tributária (o
único cuja prestação jurídica reveste-se de natureza tributária) é o substituto (nunca o
substituído)”. De maneira diversa, Paulsen285 observa que o substituído: “continua
281 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 90. 282 PAULSEN, Leandro. Responsabilidade e substituições tributária. 2º ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014, p. 219. 283 “O objetivo do legislador, na substituição, portanto, é que o substituto colabore com a arrecadação, praticando atos que levem ao pagamento do tributo. Não se trata de fazer o pagamento com seus próprios recursos, nem que suporte a carga tributária. O que se quer é que cumpra obrigações formais como uma espécie de auxiliar do fisco, exercendo prerrogativas junto ao contribuinte substituído (retenção, exigência do valor do tributo) que levem a bom termo a arrecadação. (Ibid., 219) 284 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 6 ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 601. 285 PAULSEN, op. cit., p. 234.
sendo o sujeito passivo da relação contributiva que será satisfeita mediante o
pagamento que fará o substituto”.
Para Becker a natureza jurídica existente entre o substituo e o substituído é de
natureza privada286; enquanto que para Paulsen, o substituto somente estará
realizando o recolhimento do tributo em decorrência da existência de uma relação
entre o fisco e o contribuinte (substituído), ademais, para ele o substituído somente
poderia ser excluído da relação, caso a lei expressamente trouxesse essa
possibilidade287.
Ricardo Lobo Torres288 ao analisar a relação entre o substituto e do substituído
dispõe que:
[...] o substituto legal tributário tem não só a responsabilidade pela obrigação principal, como também pelas acessórias, incumbindo-lhe praticar todos os deveres instrumentais no interesse do Fisco. Assume com exclusividade a responsabilidade do contribuinte, que deixa de participar da relação tributária. Se o substituto não recolher o tributo, nenhuma responsabilidade terá o contribuinte substituído, embora certa parte da doutrina estrangeira veja com reserva tal assertiva. As reclamações e os recursos passam para a iniciativa do substituto, quer poderá impugnar os vícios de legalidade ou constitucionalidade da imposição. Mas o substituído não é totalmente estranho à relação tributária. Para que haja a substituição é necessário que o contribuinte e o substituto participem do mesmo processo econômico, de modo que entre as suas atividades haja algum nexo. As imunidades e as isenções pertencem ao substituído, e não ao substituto.
A Constituição Federal adota o princípio da capacidade contributiva, logo, se o
substituto tem a obrigação de reter e recolher tributo que seria devido pelo substituído,
a incidência do princípio da capacidade contributiva terá de ser analisada em relação
a este, já que o substituto não arcará com tributo alheio.
Assim, considerando que o critério pessoal, que indica o contribuinte do tributo
já está delineado no texto constitucional, a atribuição à um terceiro (responsabilidade
por substituição) do dever de recolher o tributo, deve considerar, as características e
condições da operação, tendo em conta o contribuinte (já que é deste que a
Constituição vislumbrou a exigência do tributo), sendo o terceiro um mero recolhedor
de valor devido por outrem.
286 Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 6 ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 601. 287 PAULSEN, Leandro. Responsabilidade e substituições tributária. 2º ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014, p. 234. 288 TORRES, Ricardo Lobo. Substituição tributária e cobrança antecipada do ICMS. In.: ROCHA, Valdir
de Oliveira (Coord.). ICMS problemas jurídicos. São Paulo: Dialética, 1996. p.187.
Dino Jarach289 destaca que: “si la ley expresamente no dispone lo contrario, la
administración podrá siempre hacer valer el crédito tributário contra el contribuyente,
cuando el sustituto resulte insolvente”.
Estevão Horvath290, pondera que: “Obrigar alguém que não seja destinatário
constitucional da carga tributária a pagar tributo – sem ressarcimento imediato, ao
menos – é confiscar (ou utilizar tributação com fim de confisco)”.
Portanto, a responsabilidade por substituição, ainda que fundada no dever de
colaboração, só pode prosperar, desde que substituto e substituído suportem apenas
o valor efetivamente devido pelas operações que praticar, ou seja, sem que haja
excessos ou distorções na tributação em virtude da substituição adotada.
A partir deste ponto tratar-se-á exclusivamente da substituição tributária do
ICMS, analisando as suas modalidades e operacionalidade.
2.2 AS ESPÉCIES DE SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA DO ICMS
Conforme já frisado, em virtude da relevância econômica que o ICMS possui
para fins de receita dos Estados, é que estes exercem sobre ele – o ICMS - uma
fiscalização rígida, e, muitas vezes, permanente em alguns setores/seguimentos
economicamente relevantes.
Também por conta desta importante fonte de receita, os Estados adotam a
responsabilidade por substituição em diversas operações ou prestações, com o intuito
principal de evitar a sonegação fiscal.291
É dentro da figura da responsabilidade tributária lato sensu que se insere toda
lógica que abarca o regime da substituição tributária do ICMS.
Tem-se então, que a substituição tributária do ICMS, é utilizada pelos
legisladores estaduais em diversas operações ou prestações com o objetivo de exigir
o recolhimento do imposto de pessoa diversa daquela que pratica o fato jurídico
289 JARACH, Dino. El hecho imponible: teoria general del derecho tributário substantivo. 3ª ed. Buenos Aires: ABELEDO-PERROT, 1971, p. 185. 290 HORVATH, Estevão. O princípio do não-confisco no direito tributário. São Paulo: Dialética, 2002, p. 100. 291 “Realmente, com o fito de estancar a sonegação deste imposto e, também, de facilitar os trabalhos fiscalizatórios, o ICMS está sendo cada vez mais exigido não do realizador do fato imponível, mas de terceira pessoa, antes mesmo da própria ocorrência da operação mercantil”. (CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 130).
tributário, muitas vezes por questões de praticidade ou comodidade, conforme
observa Clélio Chiesa292.
A substituição tributária do ICMS (gênero) divide-se nas seguintes espécies:
substituição antecedente, regressiva ou para trás; subsequente, progressiva ou para
frente e concomitante.
Com o objetivo de facilitar a compreensão, analisar-se-á, separadamente cada
uma das espécies apresentadas.
2.2.1 Substituição Tributária Concomitante
Na substituição tributária concomitante é atribuída a responsabilidade pelo
recolhimento do imposto a terceiro no momento da ocorrência do fato jurídico
tributário. Conforme assevera Benício293:
[...] o pagamento do débito deve ser feito já no momento em que se origina a obrigação, porém por pessoa diferente do contribuinte. Essa espécie é notadamente mais rara, no campo de arrecadação do ICMS, e é identificada pela denominação substituição tributária concomitante.
Exemplo de substituição tributária concomitante pode ser encontrada no art.
109 do Anexo X, do RICMS/PR, aprovado pelo Decreto nº 6.080/12294, amparada no
292 “[...] é cediço que as principais razões que levam o legislador a utilizar-se de institutos como o da substituição tributária são as de evitar a sonegação de impostos e facilitar ação de fiscalização do Estado. Todavia, é insustentável, juridicamente, que, invocando esses motivos, princípios constitucionais sejam violados, agredindo as garantias asseguradas aos contribuintes. É evidente que a substituição não é inconstitucional por si só, mas, quando instituída, deve circunscrever-se dentro de determinados limites, que observem o princípio da igualdade de todos perante a lei, em cujas dobras está contido o princípio da capacidade contributiva, o princípio constitucional que proíbe o confisco e que não seja desprezada a indicação do sujeito passivo feita pela Constituição, para a averiguação da capacidade contributiva. (CHIESA, Clélio. ICMS: sistema constitucional tributário: algumas inconstitucionalidades da LC 87/96. São Paulo: LTr, 1997, p.136). 293BENÍCIO, Sérgio Gonini. ICMS: apontamentos teóricos e práticos sobre a substituição tributária. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 134-135. 294“Art. 109. É atribuída a responsabilidade pelo pagamento do ICMS ao tomador do serviço, desde que seja remetente ou destinatário da mercadoria e contribuinte do imposto neste Estado, e à empresa transportadora contratante inscrita no CAD/ICMS, quando a prestação de serviço de transporte rodoviário de cargas for realizada por transportador autônomo ou por transportadoras estabelecidas em outras unidades federadas, não inscritos no CAD/ICMS, e que tenham optado pelo crédito presumido de que trata o item 48 do Anexo III (art. 18, inciso IV, da Lei n. 11.580/1996). (PARANÁ, Decreto nº 6.080, de 28 de setembro de 2012. Disponível em: <http://www.legislacaotributaria.pr.gov.br/sefacre/lpext.dll?f=templates&fn=main-j.htm> Acesso em 05 abr. 2016).
art. 18, X, da Lei nº 11.580/96 (Lei Orgânica do Estado do Paraná), em relação ao
serviço de transporte intermunicipal e interestadual de cargas, em que fica atribuída a
responsabilidade pelo recolhimento do ICMS no momento da ocorrência do fato
jurídico tributário ao tomador do serviço de transporte sempre que contratar
transportador autônomo ou transportador de outros Estados não inscrito no cadastro
de ICMS do Estado do Paraná.
Abaixo, ilustra-se a substituição tributária concomitante:
Conforme se observa da ilustração, havendo contratação de transportador
autônomo ou transportadora de outro Estado, o tomador do serviço é chamado a
substituí-lo, recolhendo, assim, o ICMS sobre o serviço de transporte.
A alíquota do ICMS é aplicada sobre o valor do serviço de transporte cobrado
pelo transportador, ou seja, o recolhimento do imposto se dá no mesmo valor que
ocorreria, caso o próprio transportador recolhesse.
Logo, sobre essa espécie de substituição tributária, não há questionamentos,
uma vez que não fere nenhum princípio constitucional aplicável ao ICMS, bem como
nenhum critério da regra matriz de incidência.
2.2.2 Substituição Tributária Regressiva ou “Para Trás"
José Eduardo Soares de Melo295, ao analisar essa espécie de substituição
tributária destaca que:
Na substituição tributária regressiva, a lei atribui a responsabilidade ao adquirente de uma determinada mercadoria, por razões de comodidade, praticidade ou pela circunstância de o real contribuinte não manter organização adequada de seus negócios.
Nessa modalidade de substituição tributária, o ICMS do ciclo de
comercialização em que o imposto seria devido é recolhido pela pessoa situada na
etapa seguinte ou nas etapas seguintes de comercialização, conforme regra da
legislação.
Para Roque Carrazza296:
Na chamada substituição para trás (grifo do autor), a lei, tendo em vista comodidades arrecadatórias, estabelece que o tributo será recolhido, pelo substituo, na próxima operação jurídica (em nome do substituído). Destarte, a carga econômica do tributo não será suportada pelo realizador da operação jurídica (o substituído), mas por quem levar a cabo a seguinte (o substituto).
Podemos citar como exemplo de substituição regressiva a hipótese
mencionada por José Eduardo Soares de Melo297, “nas operações com sucata (restos,
resíduos e fragmentos de metais, tecidos vidros, etc.), é comum exigir-se o ICMS em
etapa posterior, em lugar do próprio sucateiro (contribuinte)”.
Nesse contexto, observa Ricardo Lobo Torres298:
[...] aproxima-se da figura do diferimento, que implica o adiamento do recolhimento do tributo. Exemplo de substituição tributária ‘para trás’ é o da aquisição, pela indústria de laticínio, do leite ‘in natura’, em que o industrial melhor organizado empresarialmente, se torna substituto do produtor rural, que não tem possibilidade de emitir notas fiscais nem de manter escrituração contábil.
295MELO, José Eduardo Soares de .ICMS: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 155. 296CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 388. 297MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 155. 298 TORRES, Ricardo Lobo. Substituição tributária e cobrança antecipada do ICMS. In.: ROCHA. Valdir
de Oliveira (Coord.). ICMS problemas jurídicos. São Paulo: Dialética, 1996, p.188.
Feitos esclarecimentos a respeito da substituição tributária antecedente ou
regressiva que se aproxima, mas não se confunde com o diferimento, em virtude deste
representar um adiamento do imposto que será feito pelo próprio contribuinte, é
importante destacar que, as legislações estaduais, normalmente, quando atribuem a
terceiros o dever de recolher o ICMS devido na operação anterior, tais, como os
exemplos citados por José Eduardo Soares de Melo (operações com sucata) e
Ricardo Lobo Torres (operações com leite in natura), denominam-nas de
diferimento.299
Abaixo, ilustra-se a substituição tributária regressiva, utilizando-se como
exemplo, às operações antecedentes interestaduais com desperdícios e resíduos de
metais não-ferrosos e alumínio em formas brutas quando o produto for destinado a
estabelecimento industrial, prevista no Convênio ICMS nº 36/16300.
299 Nesse sentido dispõe o § 7º do art. 18 da Lei do ICMS no Estado do Paraná: “Art. 18 ............. § 7º Para os efeitos desta lei, entende-se por diferimento a substituição tributária em relação ao imposto incidente sobre uma ou mais operações ou prestações antecedentes”. (PARANÁ. Lei nº 11.580, de 14 de novembro de 1996. Disponível em <http://www.legislacaotributaria.pr.gov.br/sefacre/lpext.dll?f=templates&fn=main-j.htm> Acesso em 26 mai. 2016). 300 “Estabelece substituição tributária em relação às operações antecedentes interestaduais com
desperdícios e resíduos de metais não-ferrosos e alumínio em formas brutas quando o produto for
destinado a estabelecimento industrial”. (BRASIL. Convênio ICMS nº 36, de 03 de maio de 2016.
Disponível em <https://www.confaz.fazenda.gov.br/legislacao/convenios/2016/cv036_16> Acesso em
26 mai. 2016).
Nesta modalidade de substituição tributária, o ICMS é calculado sobre o valor
da operação praticado pelo substituído, ou seja, não se trata de utilizar uma base de
cálculo presumida, mas sim, o valor real da operação.
Ademais, como na substituição tributária regressiva ou “para trás” o legislador
atribui a responsabilidade pelo recolhimento do ICMS que seria devido no início do
ciclo comercial a uma pessoa colocada na etapa posterior, não há em relação a esta
figura, bem como já salientado em relação a substituição tributária concomitante,
dúvidas ou questionamentos que invalidem a sua aplicação e utilização301.
2.2.3 Substituição Tributária Progressiva ou “Para Frente”
2.2.3.1 Legislação
A fundamentação legal da substituição tributária progressiva do ICMS que
consiste em atribuir ao industrial, ao importador ou ao atacadista a responsabilidade
pelo recolhimento do imposto inerente às operações subsequentes se deu por meio
do art. 58, § 2º, do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/66). Posteriormente foi
publicado o Ato Complementar nº 34/67 que alterou o art. 58, § 2º, do CTN.302
Com a publicação do Decreto-Lei nº 406/68 foram revogados diversos
dispositivos do CTN, entre eles, o art. 58 que dispunha sobre o responsável por
substituição.303
Com a revogação, o ordenamento jurídico deixou de contar por algum tempo
com normas gerais sobre a substituição tributária, embora isso não tivesse afastado
a aplicação do instituto com base em normas infraordinárias estaduais (convênios e
protocolos).304
301 Nesse sentido dispõe José Eduardo Soares de Melo: “Aceitável a juridicidade desse expediente legislativo, uma vez que se verificam, concretamente, todos os elementos componentes do fato gerador da obrigação tributária”. (MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 156). 302 BENÍCIO, Sérgio Gonini. ICMS: apontamentos teóricos e práticos sobre a substituição tributária. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 121. 303 Ibid., p. 122 304 Ibid., p. 122.
Em 1983 foi editada a Lei Complementar nº 44/83 que alterou o art. 6º, do
Decreto-Lei nº 406/68 incluindo os §§ 3º e 4º que voltaram a disciplinar a figura do
responsável tributário por substituição.305
Nesse sentido, observa Sérgio Benício306:
[...] a partir da Lei Complementar n° 44/83, popularizou-se, definitivamente, a utilização da substituição tributária por conveniência como mecanismo facilitador da fiscalização e do recolhimento do ICMS, tanto nas operações intraestaduais quanto nas interestaduais.
Para Edvaldo Brito307: “[...] as regras da Lei Complementar nº 44/83 não foram
recebidas pela Constituição de 1988, tanto que os Estados tiveram de celebrar o
Convênio nº 66/88”.
Entretanto, observa Gabriel Troianelli308, que a substituição tributária
progressiva era utilizada pelos Estados, sem maiores problemas.
Com a Constituição de 1988, foi disposto no inciso XII do § 2º do art. 155,
conforme já analisado no Capítulo I, que caberia à lei Complementar dispor entre
outras situações, a respeito da substituição tributária do ICMS.
Entretanto, no art. 34, § 8º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
(ADCT) foi disposto que se, no prazo de 60 (sessenta) dias contados da promulgação
da Constituição, não fosse editada a lei Complementar necessária à instituição do
ICMS, os Estados e o Distrito Federal, fixariam mediante convênio celebrado nos
termos da Lei Complementar nº 24/75, normas para regular provisoriamente a matéria.
Em dezembro de 1988, os Estados, celebram o Convênio nº 66/88 a fim de
fixar provisoriamente normas para regular o ICMS, entretanto, o convênio que era para
ser provisório vigorou por aproximadamente 09 anos, pois, a lei complementar exigida
pela Constituição Federal para disciplinar o ICMS somente foi editada em 1996 (Lei
Complementar nº 87/96).
305 BENÍCIO, Sérgio Gonini. ICMS: apontamentos teóricos e práticos sobre a substituição tributária. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 122. 306 Ibid., p.123. 307 BRITO, Edvaldo. Problemas jurídicos atuais do ICMS. In: ROCHA. Valdir de Oliveira (Coord.). O
ICMS, a LC 87/96 e questões jurídicas atuais. São Paulo: Dialética, 1997, p. 100. 308 “[...] há que se considerar, entretanto, que a substituição tributária para frente já vinha sendo, de longa data, praticada no caso do ICMS, desde a Lei Complementar nº 44/83 -, com razoável sucesso, pelos entes tributantes, tendo, finalmente, tanto o Superior Tribunal de Justiça quanto o Supremo Tribunal Federal concluído pela sua legitimidade”. (TROIANELLI, Gabriel Lacerda. O direito à restituição do ICMS pago a maior no regime de substituição tributária. Revista dialética de direito tributário, São Paulo: Dialética, n. 66, mar/2001, p. 47).
Formatado: Fonte: Não Negrito
Formatado: Fonte: Negrito
Sobre o descabimento do Convênio para regulamentar a matéria, e da sua falta
de provisoriedade, observa Carrazza309:
[...] ao invés de assim procederem, os Estados e o distrito Federal celebraram o precitado Convênio 66/1988, que dentre outras esdruxularias: a) regulamentou definitivamente o que já estava regulamentado; b) invadiu searas que a Constituição reservou à lei complementar (art. 146 da CF); e c) sem qualquer amparo no texto constitucional, abriu espaço à mantença da malsinada substituição tributária para frente do ICMS.
Então o Convênio nº 66/88 disciplinou em seu art. 25310 a figura do responsável
tributário por substituição. Nos dizeres de Carrazza311: “‘criou’ uma teratologia jurídica
(a substituição tributária para frente no ICMS)”.
Em virtude das diversas controvérsias suscitadas pela regulamentação da
substituição tributária progressiva via Convênio, foi que, em 1993, foi edita a Emenda
Constitucional nº 3, que inseriu no texto constitucional o § 7º ao art. 150, dispondo
sobre a atribuição de responsabilidade referente a fato gerador futuro.
Com a inclusão do § 7º ao art. 150 da CF/88 pela Emenda Constitucional nº
03/93, os sujeitos passivos passaram a questionar o regime da substituição tributária
progressiva anterior a referida Emenda.
Entretanto, o STF, declarou a constitucionalidade do instituto da substituição
tributária progressiva, mesmo em período anterior à Emenda Constitucional nº 3/93,
fundamentando sua decisão no art. 6º do Decreto-Lei nº 406/68, alterado pela Lei
Complementar nº 44/83. A sentença dada em 02/08/99, foi proferida no julgamento do
Recurso Extraordinário nº 213.396-5/SP312 de relatoria do Ministro Ilmar Galvão.
Entretanto, observa Carrazza que mesmo após a Emenda Constitucional nº
03/93, a figura da substituição tributária progressiva é absurda ao dispor sobre fato
309 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 408. 310 “Art. 25. A lei poderá atribuir a condição de substituto tributário a: I - industrial, comerciante ou outra categoria de contribuinte, pelo pagamento do imposto devido na operação ou operações anteriores; II - produtor, extrator, gerador, inclusive de energia, industrial, distribuidor, comerciante ou transportador, pelo pagamento do imposto devido nas operações subsequentes; III - depositário, a qualquer título, em relação a mercadoria depositada por contribuinte; IV - contratante de serviço ou terceiro que participe da prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação”. (BRASIL. Convênio ICM 66, de 14 de dezembro de 1988. Disponível em: <https://www.confaz.fazenda.gov.br/legislacao/convenios/1988/cv066_8> Acesso em: 05 abr. 2016). 311CARRAZZA, op. cit., p. 407. 312 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 213.396. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=244778> Acesso em: 05 abr. 2016.
gerador futuro, pois, fere o princípio da segurança jurídica, que segundo o autor313: “É
assim, ‘cláusula pétrea’, e, nessa medida, não poderia ter sido amesquinhado por
emenda constitucional”, e arremata dispondo314: “Estamos, sim, em face de Emenda
Constitucional inconstitucional, por discrepar de cláusulas pétreas (grifos do
autor)”.
Decorridos nove anos, foi publicada a lei complementar necessária para
disciplinar a substituição tributária do ICMS, a Lei Complementar nº 87/96.
Assim, as regras gerais da substituição tributária progressiva, estão dispostas
na Lei Complementar nº 87/96 e em diversas normas infraconstitucionais e tem sido
considerada para as operações relativas as diversas mercadorias, tais como:
medicamentos, combustível, veículos novos, cerveja, refrigerantes, sorvetes, pneus
novos, produtos da indústria química, cimento, perfumes e cosméticos, produtos
eletrônicos, produtos alimentícios, entre outras.
Em virtude deste emaranhado de legislações que atualmente regulam o regime
da substituição tributária progressiva, importante são as palavras de Francesco
Carnelutti315:
[...] mas o que pode fazer um cidadão, hoje, para conhecer todas as leis do seu país? Não se trata mais somente do homem da rua; hoje, até mesmo os juristas, não estão em condições de conhecer mais do que uma pequena parte delas. O ordenamento jurídico, cujo maior mérito deveria ser a simplicidade, transformou-se, para nossa desgraça, em um complicado labirinto, no qual, até os que deveriam ser os guias, perdem-se.
Pode-se afirmar, contudo que, ainda que a substituição tributária progressiva
receba as mais ferrenhas críticas, certo é, que a sua exigência se dá por todas as
Unidades Federadas, sem maiores questionamentos.316
Após feita as considerações sobre a conturbada legislação que disciplina a
substituição progressiva, passar-se-á a analisar a sua operacionalidade.
313 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 391. 314 Ibid., p. 392. 315 CARNELUTTI, Francesco. Como nasce o direito. 4. ed. Campinas: Russell Editores, 2008, p. 47. 316 “Ora, a Constituição veda a tributação baseada em fatos de provável ocorrência. Para que o mecanismo da substituição venha adequadamente utilizado é preciso que se estribe em fatos concretamente ocorridos; nunca em fatos futuros, de ocorrência incerta. Esta é uma barreira constitucional inafastável, pois integra o conjunto de direitos e garantias que a Lei Maior confere ao contribuinte. (CARRAZZA, op. cit., 389)
2.2.3.2 Operacionalidade
A substituição tributária progressiva, conforme já pontuado, consiste em atribuir
a um terceiro, normalmente o primeiro do ciclo de comercialização, a responsabilidade
pelo cálculo e recolhimento do ICMS devido nas operações subsequentes.
Conforme ensina Ricardo Lobo Torres317:
[...] a substituição ‘para frente’ ocorre quando uma terceira pessoa, geralmente o industrial, se responsabiliza pelo pagamento do tributo devido pelo comerciante atacadista ou varejista, que revende a mercadoria por ele produzida. É o caso, por exemplo, da indústria do cigarro, que substitui o comerciante varejista na obrigação principal, recolhendo desde a saída da mercadoria do estabelecimento industrial o imposto incidente na ulterior operação com o consumidor final. Aproxima-se da antecipação do tributo.
A substituição tributária progressiva refere-se a operação futura, ou seja, se
exige o ICMS antecipadamente, normalmente do primeiro do ciclo comercial,
imaginando que o fato jurídico tributário das operações subsequentes ocorrerá em
algum momento. Pode-se afirmar que ocorre a exigência sobre operação ainda não
realizada.
Nas palavras de Betina Grupenmacher318:
[...] diversamente do que se dá com os impostos não sujeitos ao regime da substituição tributária para frente, em relação aos quais o dever de efetuar a prestação nasce após a ocorrência do fato imponível, para aqueles sujeitos ao regime estabelecido pelo parágrafo 7° do art. 150, o momento do nascimento da obrigação tributária é outro. Esta surge por antecipação, ou seja, antes da subsunção à norma tributária do fato lícito e jurídico praticado pelo sujeito passivo, em momento presumido e fixado por ato de natureza normativa, quando então deve ser efetuada a prestação.
Ao exigir o ICMS de forma antecipada sem que as operações subsequentes
tenham ocorrido, os Estados, invertem a sistemática deste imposto, que pelo critério
temporal da regra matriz de incidência, somente deve ocorrer quando da saída do
estabelecimento.
317TORRES, Ricardo Lobo. Substituição tributária e cobrança antecipada do ICMS. In.: ROCHA. Valdir de Oliveira (Coord.). ICMS problemas jurídicos. São Paulo: Dialética, 1996, p.188. 318 GRUPENMACHER, Betina Treiger. ICMS - Considerações sobre a base de cálculo. In: ROCHA,
Valdir de Oliveira. Grandes questões atuais do direito tributário. São Paulo: Dialética, 2006. v. 10.
p. 22.
Numa importante análise dos fatos pretéritos para fundamentar a substituição
tributária nos dias atuais, prescreve Roberto Ferraz319:
[...] num ambiente de forte sonegação que vivia o Nordeste, passaram as concessionárias nordestinas a concorrer diretamente com as concessionárias do Sul e Sudeste, em seus territórios, mas com a vantagem de praticar preços de venda ao consumidor inferiores aos preços de compra das concessionárias do Sul! As notas fiscais de venda de veículos emitidas pelas concessionárias nordestinas eram fiéis às operações realizadas mas nas cópias que remanesciam nos blocos constavam valores irrisórios, configurando a prática fraudulenta conhecida como ‘nota calçada’. Com a estrutura de exercício de poder pelas oligarquias nordestinas, nada se pagava de ICMS nem de nenhum outro imposto. O resultado foi que, pressionadas pela concorrência desleal praticada pelas concessionárias do Nordeste, as do Sul pressionaram seus fornecedores e os governos estaduais a estabelecer o regime de substituição tributária.
Verifica-se, que a instituição da substituição tributária progressiva, inicialmente,
foi motivada por um ambiente de ampla sonegação fiscal, em relação ao pagamento
do ICMS, devido na venda de mercadorias de determinadores setores da economia,
o que por certo acarretou grandes prejuízos na arrecadação dos Estados.
Entretanto, a atribuição da responsabilidade por substituição, que era para ser
disciplinada pela Lei Complementar nº 87/96, não foi, conforme se depreende da
leitura do seu art. 6º320: “Lei estadual poderá atribuir a contribuinte do imposto ou a
depositário a qualquer título a responsabilidade pelo seu pagamento, hipótese em que
assumirá a condição de substituto tributário”.
Observa-se que a Lei Complementar nº 87/96 não definiu quem seja o
responsável tributário por substituição, ao contrário deixou a cargo dos legisladores
estaduais essa importante atribuição, conforme salienta Sérgio Benício321, “O prejuízo
aos contribuintes de ICMS é flagrante”.322
319 FERRAZ, Roberto. O consumo, a concorrência, o mercado e as distorções da substituição tributária
(para frente). In: ROCHA, Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes questões atuais do direito tributário.
v.11. São Paulo: Dialética, 2007. p. 364. 320 BRASIL, Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp87.htm> Acesso em: 05 abr. 2016). 321BENÍCIO, Sérgio Gonini. ICMS: apontamentos teóricos e práticos sobre a substituição tributária. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 57. 322 Nesse mesmo sentido dispõe Sacha Calmon Navarro Coêlho: “as leis ordinárias não podem instituir terceiros como contribuintes, ou substitutos, ou responsáveis (art. 155, § 2º, XII, “a” e “b”); somente a Lei Complementar poderia fazê-lo). (COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988: Sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 516-517). Assim, também se posicionou José Eduardo Soares de Melo: “Ressalta-se, desde já, a inconstitucionalidade de delegação de competência à lei ordinária, porque esta matéria só deveria ser tratada por lei complementar”. (MELO, José Eduardo Soares. ICMS: teoria e prática. 6 ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 167).
Assim, tem-se que a implementação da substituição tributária nas operações
internas de cada Estado se dá por lei estadual e nas operações interestaduais por
meio de acordos celebrados entre os Estados, conforme disciplinado nos arts. 6º e 9º,
da Lei Complementar nº 87/96323.
Nesse contexto, importante observação é feita por Roque Carrazza324: “com
isto, frustrou-se o desígnio constitucional de assegurar que o regime da substituição
tributária do ICMS, seja uniforme em todas as unidades federativas”.
A instituição da substituição tributária progressiva em operações internas por
meio de lei e em operações interestaduais por meio da celebração de convênios ou
protocolos, possibilita que os legisladores estaduais tenham liberdade para instituir a
substituição tributária progressiva nos seus Estados, conforme sua conveniência.
Em relação a disposição feita pela Lei Complementar para a atribuição do
regime da substituição tributária progressiva por meio de “Lei Estadual” para a
operação interna e por meio de “acordos” celebrados entre os Estados para as
operações interestaduais, manifesta-se Fernando Scaff325:
[...] na hipótese de substituição tributária interestadual, de conformidade com o art. 9º, da Lei Complementar 87/96, é necessário haver um Convênio entre os Estados interessados; b) que deverá ser transformado em Lei ordinária estadual através de sua ratificação pela Assembléia Legislativa de cada qual dos Estados, conforme determina o art. 150, § 7º, da CF/88. Na hipótese da substituição interna, de conformidade com o art. 6º da lei Complementar 87/96, basta sua imposição através de lei ordinária estadual.
Ao possibilitar, a instituição da substituição tributária do ICMS, em operações
internas por meio de lei específica de cada Estado e nas operações interestaduais por
meio acordos (convênios ou protocolos), a Lei Complementar nº. 87/96, ensejou
conforme leciona Carrazza: “[...] o surgimento de substituições tributárias de ICMS
anômalas e inconciliáveis, capazes de criar verdadeiras guerras fiscais e de limitar,
ao arrepio do art. 150, V, da CF, o tráfego de bens pelo território nacional.”
323 “Art. 6o Lei estadual poderá atribuir a contribuinte do imposto ou a depositário a qualquer título a responsabilidade pelo seu pagamento, hipótese em que assumirá a condição de substituto tributário. ................................. Art. 9º A adoção do regime de substituição tributária em operações interestaduais dependerá de acordo específico celebrado pelos Estados interessados. (BRASIL. Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp87.htm> Acesso em: 05 abr. 2016). 324 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 395. 325 SCAFF, Fernando Facury. Substituição tributária e o resgate do princípio da estrita legalidade. Revista dialética de direito tributário, São Paulo: Dialética, n. 61, 2000, p. 50.
Neste contexto, cada Estado acaba por dispor sobre a substituição tributária de
maneira diversa, o que resulta em prejuízo aos contribuintes que pretendem
comercializar suas mercadorias com os demais Estados.
Os Convênios e Protocolos são atos elaborados pelo Conselho de Política
Fazendária (CONFAZ) que possui representantes de todos os Estados e do Governo
Federal.
Em relação a celebração dos “Convênios”, que entendemos ser aplicável
também aos chamados “Protocolos”, importante são as considerações de Sacha
Calmon Navarro Coêlho326 que empreendeu importante estudo sobre o tema:
É que os convênios, de início, são atos formalmente administrativos e materialmente legislativos. Sob o ponto de vista formal são atos administrativos porque dimanam de órgão administrativo colegiado (assembleia de funcionários representantes do Poder Executivo dos estados). Sob o ponto de vista material, são atos legislativos porque têm conteúdo de preceituação genérica e normativa (não há aplicação de norma a caso concreto). Como o princípio da legalidade para pôr e tirar o tributo exige lei em sentido formal – proveniente de órgão legislativo – a previsão de ratificação pelo Poder Legislativo dos estados teria precisamente esta finalidade: conferir aos convênios força de lei.
Importante salientar, que mesmo que tais atos sejam celebrados por
representantes do poder executivo, isso, de forma alguma significa que cabe ao
Executivo tratar de matéria que sabidamente é reservada à lei complementar, pois, tal
raciocínio conduziria a desobediência ao princípio da legalidade, bem como ao da
separação de poderes, por isso, a celebração no âmbito do CONFAZ é apenas o início
de um processo que somente se completará com a ratificação pelo Poder Legislativo
dos respectivos Estados.327
De maneira incisiva, também argumenta Souto Maior Borges328 que: “É
portanto manifestamente inconstitucional a prática de ratificação dos convênios
mediante Decreto do Poder Executivo”.
Das ponderações feitas, pode-se dizer que a instituição da substituição
tributária progressiva nos Estados segue o seguinte caminho:
326 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988: Sistema Tributário. Rio
de Janeiro: Forense, 2006, p. 231. 327 Ibid., p. 232-235. 328 BORGES, José Souto Maior. Lei complementar tributária. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, EDUC, 1975, p. 173.
1) primeiramente, é celebrado o Convênio ou o Protocolo na reunião do
CONFAZ (neste ato constará a relação de mercadorias que passará a se
sujeitar ao regime da substituição tributária progressiva, bem como será
estipulado os percentuais de Margem de Valor Agregado, denominado
MVA329);
2) na sequência, o Convênio ou o Protocolo é publicado no Diário Oficial da
União, com a indicação dos Estados signatários e início da vigência, e;
3) por último, cabe a cada Estado ratificar o Convênio ou o Protocolo,
estabelecendo o início da vigência em sua unidade federada.330
Verifica-se que a inserção das mercadorias no regime da substituição tributária,
segue um trâmite bastante burocrático, iniciando com a celebração do Convênio ou
Protocolo no CONFAZ e finalizando com a ratificação por parte dos Estados.
Atualmente, diversos produtos, estão sujeitos ao regime da substituição
tributária progressiva em todo o Brasil.
Certo é, que essa espécie de substituição tributária, tem sido utilizada de
maneira indiscriminada pelos Estados sob o argumento de evitar a sonegação fiscal.
Ocorre que, nos dias atuais, com a popularização e aumento considerável de
controle eletrônico a que os contribuintes estão sujeitos (Nota Fiscal Eletrônica,
Escrituração Fiscal Digital), tal argumento carece, em muito, de força probatória.
Toda vez que inclui produtos no regime da substituição tributária, utilizando-se
de bases presumidas, tem o legislador como ponto central, além de evitar a
sonegação fiscal, garantir a arrecadação do ICMS.
Roberto Ferraz331, ao analisar a substituição tributária progressiva, destaca
que, “somente pode ser adotada quando não exista alternativa de tributação mais
justa – do ponto de vista individual – sem que haja prejuízo coletivo superior; em
importância, àquelas injustiças trazidas pela adoção da sistemática da substituição”.
329 Será melhor detalhado no Capítulo 3. 330 Embora, a doutrina citada no presente estudo, observe a necessidade de que a ratificação do Convênio ou Protocolo se dê por ato da assembleia dos Estados, na prática a situação se passa de maneira diversa, e a ratificação ocorre via ato do poder Executivo. 331 FERRAZ, Roberto. O consumo, a concorrência, o mercado e as distorções da substituição tributária
(para frente). In: ROCHA, Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes questões atuais do direito tributário.
v.11. São Paulo: Dialética, 2007. p. 372.
Nesse sentido, alerta Sérgio Benício332:
[...] a responsabilidade do substituto, nessa situação, abarca tributos que nem sequer foram ainda gerados, em razão da não concretização dos fatos imponíveis. Em outras palavras, a substituição tributária progressiva se estrema das demais figuras subjetivas passivas em razão de o substituto ter que recolher valores atinentes a toda a incidência tributária do ICMS, ao longo da cadeia circulatória, não obstante ainda não tenha sequer ocorrido os respectivos fatos geradores.
O responsável pelo recolhimento do ICMS inerente às operações subsequentes
é chamado de “substituto tributário”, enquanto que o adquirente (contribuinte) que
recebe a mercadoria com o imposto retido é chamado de “substituído”.
Portanto, se inserem como substituto tributário, de um modo geral, o industrial,
o importador, bem como o distribuidor (para algumas mercadorias); e como
substituído, os demais contribuintes que recebem a mercadoria com o imposto retido
pelo substituto.
O substituto fica responsável por antecipar o ICMS que é devido até o
consumidor final, ou seja, em vez do ICMS ser cobrado em cada ciclo da
comercialização (industrial distribuidor varejista consumidor final), tem se o
recolhimento de todo o ICMS para o primeiro deste ciclo.
Abaixo, ilustra-se a substituição tributária progressiva:
332 BENÍCIO, Sérgio Gonini. ICMS: apontamentos teóricos e práticos sobre a substituição tributária. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 136.
Assinala Carrazza333, que “o emprego das ficções e presunções deve ser feito
com critério e método, de modo a preservar direitos e garantias fundamentais, como
o de somente ser tributado após a ocorrência do fato imponível”.
Em virtude do recolhimento antecipado pelo substituto, os Estados sob a
justificativa de evitar a sonegação fiscal, arrecadam o imposto antes mesmo da
ocorrência do fato jurídico tributário pelos demais integrantes do ciclo de
comercialização.
Nas palavras de Torres334: “a substituição, pela facilidade que oferece para a
arrecadação da receita tributária, vem sendo utilizada crescentemente nos últimos
anos.”
Roberto Ferraz335, observa que:
[..] certamente o Fisco enxergou nessa ocasião a oportunidade de estabelecer o sistema em benefício próprio, isto é, visando uma maior e mais fácil arrecadação mas, num primeiro momento ao menos, a força que tornou a prática aceita entre os contribuintes foi a necessidade prática para impedir aquelas práticas desleais de concorrência que afetavam radicalmente o mercado.
Embora existam diversas críticas ao regime da substituição tributária “para
frente” ou “progressiva”, principalmente em relação ao seu cunho arrecadatório por
partes dos Estados, a maior discussão versa sobre o seu cálculo, precisamente em
relação a aferição da sua base de cálculo.
Por isso, tratar-se-á no capítulo seguinte, do método adotado para cálculo da
base de cálculo da substituição tributária, bem como das situações em que os valores
calculados presumidamente não refletem o valor real da operação.
333 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 390. 334 TORRES, Ricardo Lobo. Substituição tributária e cobrança antecipada do ICMS. In.: ROCHA. Valdir de Oliveira (Coord.). ICMS problemas jurídicos. São Paulo: Dialética, 1996. p.187. 335 FERRAZ. Roberto. O consumo, a concorrência, o mercado e as distorções da substituição tributária
(para frente). In: ROCHA. Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes questões atuais do direito tributário.
v. 11. São Paulo: Dialética, 2007. p. 365.
CAPÍTULO III – DIREITO A RESTITUIÇÃO DO ICMS PAGO A MAIOR
1. ENTENDENDO O MECANISMO DE CÁLCULO DA SUBSTITUIÇÃO
TRIBUTÁRIA PROGRESSIVA
Na substituição tributária progressiva, conforme pontuado anteriormente, o
substituto fica responsável por recolher o ICMS que é devido até o consumidor final,
denominado, informalmente, de ICMS substituição tributária, que a partir deste ponto,
denominar-se-á, simplesmente ICMS ST.
Logo, o substituto (geralmente o industrial ou o importador) recolherá o ICMS
da sua própria operação (que é devido, em virtude da venda que realiza), bem como
o ICMS inerente as operações subsequentes até o consumidor final (ICMS ST).336
Numa análise do instituto da responsabilidade, da hipótese de incidência e o
princípio da capacidade contributiva, importante lição é dada por Marçal Justen
Filho337:
Portanto, não se pode usar de ficção para construir a hipótese de incidência tributária, porque isso acarretaria uma hipótese de incidência não tributária. Na medida em que a eleição de sujeito passivo não vinculado à situação contida na hipótese de incidência tributária significa haver uma ficção na construção da hipótese de incidência tributária ‘verdadeira’, o resultado que se chega é o de que não há figura tributária. Há, isto sim, uma distorção que afasta o princípio da capacidade contributiva, inerentemente necessário à configuração da hipótese de incidência.
Para efetuar o recolhimento do ICMS ST se faz necessário apurar a base de
cálculo a ser utilizada como parâmetro para fins de cálculo.
Nesse sentido, a Lei Complementar nº 87/96 em seu art. 8º338, estabelece
métodos que podem ser utilizados pelos Estados para aferição da base de cálculo da
substituição tributária em relação as operações subsequentes.
336 “A antecipação em alguns casos está ligada ao mecanismo da substituição tributária para frente, onde, por exemplo, um determinado contribuinte, além de recolher o tributo devido na operação da qual participa, recolherá também o tributo que será devido por outros contribuintes, quando da realização de operações subsequentes”. (PAOLA, Leonardo Sperb de. Presunções e ficções no direito tributário. Belo Horizonte: Del Rey, 1997, p. 239). 337 JUSTEN FILHO, Marçal. Sujeição passiva tributária. 1986, p. 104. 338 “Art. 8º A base de cálculo, para fins de substituição tributária, será:
..................................................................................................... II - em relação às operações ou prestações subsequentes, obtida pelo somatório das parcelas seguintes: a) o valor da operação ou prestação própria realizada pelo substituto tributário ou pelo substituído intermediário;
Contudo, ao analisar o art. 8º da Lei Complementar, Carrazza pondera que:
[..] ao cuidar da base de cálculo do ICMS, também vergasta o princípio da segurança jurídica, na medida em que permite que o Governo, dentre outras coisas, estime a margem de lucro do contribuinte substituído, em ‘operações ou prestações subsequentes’.
Assim, a Lei Complementar dispôs quatro formas de se apurar a base de
cálculo da substituição tributária progressiva do ICMS.
A primeira a ser analisada é a que determina que: “existindo preço final a
consumidor sugerido pelo fabricante ou importador, poderá a lei estabelecer como
base de cálculo este preço”. (§ 3º do art. 8º, da LC nº 87/96)
A utilização deste parâmetro para fins de apurar a base de cálculo da ST é a
que parece mais justa e plausível, embora não seja definitiva, pois, ainda que exista
preço final a consumidor indicado pelo fabricante ou importador, trata-se de uma
sugestão e como tal pode haver divergências quando efetivamente se concretizar o
fato jurídico tributário.
Essa base de cálculo é pouco utilizada pelos Estados, sendo basicamente
aplicada na chamada operação “porta-a-porta”, sistema adotado por empresas que
efetuam suas vendas por catálogos.
b) o montante dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou transferíveis aos adquirentes ou tomadores de serviço; c) a margem de valor agregado, inclusive lucro, relativa às operações ou prestações subsequentes. ................................................................................................. § 2º Tratando-se de mercadoria ou serviço cujo preço final a consumidor, único ou máximo, seja fixado por órgão público competente, a base de cálculo do imposto, para fins de substituição tributária, é o referido preço por ele estabelecido. § 3º Existindo preço final a consumidor sugerido pelo fabricante ou importador, poderá a lei estabelecer como base de cálculo este preço. § 4º A margem a que se refere a alínea c do inciso II do caput será estabelecida com base em preços usualmente praticados no mercado considerado, obtidos por levantamento, ainda que por amostragem ou através de informações e outros elementos fornecidos por entidades representativas dos respectivos setores, adotando-se a média ponderada dos preços coletados, devendo os critérios para sua fixação ser previstos em lei. § 5º O imposto a ser pago por substituição tributária, na hipótese do inciso II do caput, corresponderá à diferença entre o valor resultante da aplicação da alíquota prevista para as operações ou prestações internas do Estado de destino sobre a respectiva base de cálculo e o valor do imposto devido pela operação ou prestação própria do substituto. § 6o Em substituição ao disposto no inciso II do caput, a base de cálculo em relação às operações ou prestações subsequentes poderá ser o preço a consumidor final usualmente praticado no mercado considerado, relativamente ao serviço, à mercadoria ou sua similar, em condições de livre concorrência, adotando-se para sua apuração as regras estabelecidas no § 4o deste artigo”. (BRASIL. Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp87.htm> Acesso em: 05 abr. 2016.
Entretanto, para José Eduardo Soares de Melo339:
Todos os critérios, ou elementos consignados na lei complementar, especialmente ‘preço sugerido por fabricante ou importador’, ou ‘usualmente praticados no mercado considerado’, ‘levantamentos por amostragem’, e também, os noticiados por ‘entidades representativas de setores’, estão longe de oferecer segurança e certeza aos reais e verdadeiros valores que deveriam ser objeto de tributação.
A segunda forma de se mensurar a base de cálculo da substituição tributária,
disposta na Lei Complementar nº 87/96, é a que determina que tratando-se de
mercadoria ou serviço cujo preço final a consumidor, único ou máximo, seja fixado por
órgão público competente, “a base de cálculo do imposto, para fins de substituição
tributária, é o referido preço por ele estabelecido”, (§ 2º do art. 8º, da LC nº 87/96).
Essa forma de se apurar a base de cálculo da substituição tributária, também é
pouco utilizada, mas tem sua relevância para alguns setores como o de
medicamentos, cujo valor é fixado pela Câmara de Regulação do Mercado de
Medicamentos (CMED), por meio do Preço Máximo a Consumidor (PMC).340
Outra forma de se apurar a base de cálculo do ICMS ST, é que determina que
em substituição a utilização das margens de valor agregado, a base de cálculo poderá
ser o preço a consumidor final usualmente praticado, obtido por levantamento, ainda
que por amostragem ou através de informações e outros elementos fornecidos por
entidades representativas dos respectivos setores, (§ 6º do art. 8º, da LC nº 87/96).
339 MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 170. 340“Na verdade, o excesso de tributação existente nos remédios é resultado de uma outra distorção grave da economia brasileira, o ‘controle de preços’. É que ainda há controle de preços de remédios, exercido pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), ligados ao Ministério da Saúde. O resultado dessa anacrônica ‘regulação’ é que os preços fixados nessa Câmara são muito superiores aos praticados pelo mercado. Ocorre que somente o próprio governo pagava esse valor elevado, de alguma forma influenciado pela indústria farmacêutica, talvez com a desculpa de que o governo é mau pagador e de que frequentemente os fornecedores do governo são submetidos a ‘pedágios’ para receber seus pagamentos. Distorção sobre distorção; corrupção sobre corrupção, como não poderia deixar de ser (quem edifica sobre areia...). Foi recente a tomada de consciência do governo da aberração que criou: ‘fixou’ preços ‘regulando o mercado de medicamentos’ em patamar acima do mercado em 33%, ficando isolado como único a pagar tais valores excessivos por ele mesmo fixados. Tendo finalmente se dado conta do que todos no mercado sabiam, ‘fixou’ para si mesmo um ‘desconto’ de 24,69% para desfazer o excesso que ele mesmo ‘fixou’. É simplesmente ridículo, inacreditável”. (FERRAZ. Roberto. O consumo, a concorrência, o mercado e as distorções da substituição tributária (para frente). In: ROCHA. Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes questões atuais do direito tributário. v. 11. São Paulo: Dialética, 2007. p. 373).
Uma vez identificado o preço final a consumidor, por meio dos critérios
estabelecidos, o Estado divulga uma norma constando o preço de cada um dos
produtos considerados, que será utilizado com base de cálculo para fins do cálculo do
ICMS ST.341
Importante são as críticas a essa forma de cálculo feita por Hugo de Brito
Machado Segundo e Raquel Cavalcanti Machado342:
Ocorre que, como afirmado, o Estado estabelece uma ‘pauta fiscal’, não para presumir o preço final (o que é autorizado pelo art. 8º, § 6º, da LC 87/96), mas para substituir o preço praticado pelo próprio fabricante, que é conhecido e não precisaria, em princípio, ser ‘presumido’.
Nesse sentido, o STJ, editou em 2010, a Súmula 431343 com a seguinte redação
“É ilegal a cobrança de ICMS com base no valor da mercadoria submetido ao regime
de pauta fiscal”.344
Porém, os julgados pós súmula, passaram a diferenciar a pauta fiscal como
arbitramento (cuja possibilidade se dá apenas nos termos do art. 148 do CTN345), da
pauta fiscal utilizada para fins do regime da substituição tributária progressiva, que
neste caso, estaria autorizada nos termos do art. 8º da Lei Complementar nº 87/96.
Nesse sentido, é relevante transcrever, a ementa de um julgado que suscita tal
diferença:
341 Essa forma de cálculo para apurar a base de cálculo do ICMS ST, é normalmente adotada pelos Estados, para o setor de bebidas. 342 SEGUNDO, Hugo de Brito Machado; MACHADO, Raquel Cavalcanti Ramos. Substituição tributária, legalidade e coerência. In.: ROCHA. Valdir de Oliveira. Grandes questões atuais do direito tributário. São Paulo: Dialética, 2010, p. 157. 343 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Súmula 431. Disponível em
<http://www.stj.jus.br/SCON/sumanot/toc.jsp?materia=%27DIREITO+TRIBUT%C1RIO%27.mat.&b=T
EMA&p=true&t=&l=50&i=51&ordem=MAT,TIT,@SUB#TIT53TEMA0> Acesso em 02 jun 2016. 344 Interessante notar que a maioria dos julgados que deram origem a súmula tratavam da pauta fiscal utilizada para fixação da base de cálculo no regime da substituição tributária progressiva: AgRg no Resp 1.021.744/MA, Rel. Ministro Humberto Martins; RMS 13.294/MA, Rel. Ministro Paulo Medina;RMS 16.810/PA, Rel. Ministro Luiz Fux; RMS 25.605/SE, Rel. Ministro José Delgado. 345 “Art. 148. Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial”. (BRASIL. CTN. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172Compilado.htm> Acesso em 02 jun.16).
AgRg no AgRg no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 350.678 -
RS (2013⁄0163504-0)346
AGRAVO REGIMENTAL. DECISÃO QUE, EM SEDE DE AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL, RECONSIDEROU DECISÃO ANTERIOR. TRIBUTÁRIO. ICMS. MEDICAMENTOS. NÃO SE CONFUNDEM A PAUTA FISCAL E O REGIME DE VALOR AGREGADO ESTABELECIDO NO ART. 8o. DA LC 87⁄96, QUE CONSUBSTANCIA TÉCNICA ADOTADA PELO FISCO, A PARTIR DE DADOS CONCRETOS, PARA A FIXAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO NA SISTEMÁTICA DE SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA PARA FRENTE, SENDO POSSÍVEL, ADEMAIS, O USO DO PREÇO MÁXIMO AO CONSUMIDOR ESTABELECIDO PELA CÂMARA DE REGULAÇÃO DO MERCADO DE MEDICAMENTOS CMED. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1.É ilegal a cobrança de ICMS com base no valor da mercadoria submetido ao regime de pauta fiscal. Súmula 431⁄STJ. No caso dos autos, todavia, a base de cálculo do ICMS adotada pelo Fisco são os preços definidos pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), órgão público do Conselho do Governo da Presidência da República que foi criado pela Lei 10.742⁄03. 2.O STJ entende que não há que se confundir a pauta fiscal - valor fixado prévia e aleatoriamente para a apuração da base de cálculo do tributo - com o arbitramento de valores previsto no art. 148 do CTN, que é modalidade de lançamento, da mesma forma como também não se pode confundi-la com o regime de valor agregado estabelecido no art. 8o. da LC 87⁄96, que é técnica adotada para a fixação da base de cálculo do ICMS na sistemática de substituição tributária para frente, levando em consideração dados concretos de cada caso. Precedente: RMS 18.677⁄MT, Rel. Min. CASTRO MEIRA, DJ 20.06.2005, p. 175. 3.Dispõe o art. 8o., § 2o. da LC 87⁄96 que, tratando-se de mercadoria ou serviço cujo preço final a consumidor, único ou máximo, seja fixado por órgão público competente, a base de cálculo do imposto, para fins de substituição tributária, é o referido preço por ele estabelecido. 4.Nesse sentido, os arts. 4o., § 1o. e 6o., II da Lei 10.742⁄03, bem como os arts. 6o., 7o., e 8o. da Resolução CMED 04⁄2004 (vigente à época) autorizam a CMED a fixar, ano a ano, o Preço Máximo ao Consumidor (PMC) dos medicamentos, que deverá ser observado pelo comércio varejista, valendo-se este, inclusive, de publicação específica para o mercado do produto, que possibilite dar publicidade aos preços praticados pelos produtores, como a revista ABCFARMA, permitindo, assim, que o Fisco, amparado pelo art. 8o., § 2o. da LC 87⁄96, lance mão desses preços na apuração do ICMS devido na substituição tributária progressiva. Precedentes: RMS 20.381⁄SE, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJU 03.08.2006, p. 203, e RMS 21.844⁄SE, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, DJU 01.02.2007, p. 392. 5.Agravo Regimental do contribuinte desprovido.
Conforme pondera Sérgio Benício347: “No caso específico da substituição
tributária para frente, o arbitramento da base de cálculo é a única saída possível, uma
vez que ainda não se efetivou o fato gerador”, na verdade, nem sabe se um dia se
realizará e se realizado, tais valores refletirão a base de cálculo presumida.
346 Nesse mesmo sentido têm-se os seguintes julgados do STJ: RMS 20.381⁄SE, Rel. Min. Teori Albino Zavascki; RMS 31.526/GO, Rel. Min. Humberto Martins; RMS33.756/MS, Rel. Min. Humberto Martins. 347 BENÍCIO, Sérgio Gonini. ICMS: apontamentos teóricos e práticos sobre a substituição tributária. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 144.
O último, porém, o mais utilizado método de se apurar a base de cálculo da
substituição tributária, é o que determina que esta seja formada: pelo valor da
operação348 + montante dos valores de seguro, frete e de outros encargos cobrados
ou transferíveis aos adquirentes + margem de valor agregado, inclusive lucro. (art. 8º,
II, da LC 87/96).
As Margens de Valor Agregado, conhecidas como MVA ou IVA-ST (Índice de
Valor Adicionado Setorial, denominação adotada pelo Estado de São Paulo),
normalmente, são fixadas nos convênios e protocolos que instituem o regime da
substituição tributária para as mercadorias; entretanto, há casos em que as margens
são fixadas em atos normativos dos respectivos Estados.349
Em relação a aferição da MVA, ressalta, o § 4º do art. 8º da Lei Complementar
nº 87/96350:
A margem a que se refere a alínea c do inciso II do caput será estabelecida com base em preços usualmente praticados no mercado considerado, obtidos por levantamento, ainda que por amostragem ou através de informações e outros elementos fornecidos por entidades representativas dos respectivos setores, adotando-se a média ponderada dos preços coletados, devendo os critérios para sua fixação ser previstos em lei.
Entretanto, tais critérios não foram fixados em lei, mas sim, no Convênio ICMS
nº 70/97, que traz a metodologia que deve ser adotada para se chegar na MVA de
cada produto.351
Esta é mais uma situação de flagrante ofensa ao princípio da legalidade, bem
como dos demais princípios constitucionais (capacidade contributiva, segurança
jurídica, moralidade), uma vez que, ao não terem os critérios fixados por lei, que, por
seu processo, enseja maior controle, a determinação da MVA passa a ter aferição
duvidosa.
348 O valor da operação é o preço do produto na operação de venda 349 No Estado de São Paulo, por exemplo, as margens são fixadas em Portarias. 350 BRASIL, Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp87.htm> 351 “Cláusula segunda Identificado, pelas unidades federadas interessadas, o produto que se pretende colocar sob o regime de substituição tributária pelas operações subsequentes, a Comissão Técnica Permanente do ICMS - COTEPE/ICMS convocará as entidades representativas do setor envolvido na produção e comercialização daquele produto, a fim de que apresentem a margem de valor agregado sugerida a ser utilizada na composição da base de cálculo do ICMS devido por substituição tributária, bem como as informações que julgaram pertinentes para justificar a sua sugestão”. (BRASIL. Ministério da Fazenda. Convênio ICMS nº 70/97. Disponível em <https://www.confaz.fazenda.gov.br/legislacao/convenios/convenio-icms/1997/cv070_97> Acesso em 02/06/16).
Ao dispor sobre as margens de valor agregado, os convênios e protocolos
trazem tabelas com os percentuais de cada um dos produtos, ou atribuem aos
respectivos Estados, a função de estabelecer tais margens.
Portanto, o cálculo da substituição tributária em relação as operações
subsequentes, em que o remetente fica obrigado a antecipar o valor do ICMS devido
até consumidor final somente é possível com adoção de bases fictas/presumidas,
pois, não há como na saída da mercadoria da indústria, por exemplo, se ter o valor
exato do preço a ser praticado pelos varejistas quando da venda para o consumidor
final.
Nesse sentido, pertinente é a diferenciação feita por Becker entre ficção legal
e presunção legal, a presunção refere-se a um fato “verdadeiro” que provavelmente é
“verdadeiro”, enquanto na ficção, estabelece-se como “verdadeiro” um fato que
provavelmente é “falso”; entretanto, tal distinção só tem relevância no mundo pré-
jurídico, pois, ao se tornarem regra jurídica, tal diferenciação desaparece.352
Merece também destacar, a distinção entre “pauta como presunção” e “pauta
como ficção”, feita pelo Ministro Demócrito Reinaldo ao julgar os Embargos de
Divergência em Recurso Especial nº 33.808-3/SP353:
Surgiria, daí, a sutil distinção entre a pauta como presunção ou como ficção legal. Se o valor nela estabelecido é o valor real o produto ou pode ser provado como o valor correto, a pauta consistiria numa presunção legal. Se, do contrário, fosse reconhecidamente irreal ou se pudesse provar tal incorreção, caracterizar-se-ia como ficção da lei. Neste último caso, não se admitiria a pauta, porquanto ao direito tributário repugna a adoção de bases de cálculo que estejam completamente dissociadas do efetivo valor econômico do fenômeno tributado. ..... Caso, ao contrário, fosse entendida a pauta fiscal como uma presunção absoluta, incorria ela no mesmo problema, desvirtuando na essência o conceito do tributo. Se, porém, fosse presunção relativa, aparentemente estariam resolvidas as impugnações que se lhe fazem. Nessa situação, o efeito -- comum às presunções relativas - seria a inversão do ônus da prova, passando a caber ao contribuinte demonstrar que o valor constante da pauta é incorreto, apontando o valor apropriado para sofrer a tributação.
352 BECKER. Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 6 ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 544. 353 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Embargos de Divergência em Recurso Especial nº 33.808-3/SP. Disponível em <https://ww2.stj.jus.br/processo/ita/documento/mediado/?num_registro=199500194368&dt_publicacao=20-10-1997&cod_tipo_documento=3>Acesso em 02 jun. 2016.
A utilização de ficções/presunções deve receber especial atenção da
administração tributária. Nesse sentido, merece destaque a lição de Demetrius
Macei354, em relação ao princípio da verdade material:
A busca pela verdade material é princípio de observância indeclinável da Administração Tributária no âmbito de suas atividades procedimentais e processuais. Ela deve fiscalizar em busca da verdade; deve apurar e lançar com base na verdade; deve julgar com base na verdade.
Por isso, o princípio da verdade material é de suma relevância, pois, tem como
objetivo aproximar a Administração da realidade de fato por meio de diligências,
análise mais detalhada das operações, e com isso evitar arbitramentos, que
normalmente decorrem da falta de interesse do agente em buscar a verdade material,
ou até mesmo de enxergá-la355.
Também destaca José Eduardo Soares de Melo356:
A descoincidência entre o valor real (efetiva operação realizada entre o substituído e o consumidor), e o valor presumido (anterior situação existente entre substituto e substituído) caracteriza uma base de cálculo fictícia, resultando num ICMS fictício, que não pode prevalecer diante dos princípios da segurança e certeza do crédito tributário, indispensáveis no caso de intromissão patrimonial.
Ademais, alerta José Souto Maior Borges357 que: “a violação de um princípio
constitucional importa ruptura da própria Constituição”.
Em relação a utilização de uma base de cálculo presumida, que ao final pode
ou não se concretizar, importante consideração é feita por Betina Grupenmacher358:
Dentre os princípios gerais da atividade econômica (arts. 170 e seguinte da Constituição Federal) está o que assegura a todos aqueles que atuam no mercado o livre exercício da atividade econômica, bem como a total autonomia na fixação de preços relativamente às vendas que fazem e, bem assim, às operações que realizam. A efetividade de tal garantia representa obstáculo intransponível ao conhecimento do real preço praticado antes da ocorrência in concreto do fato gerador pelo agente da Administração Fazendária.
354 MACEI, Demetrius Nichele. A verdade material no direito tributário. São Paulo: Malheiros, 2013, p.177. 355 MARINS, James. Direito processual tributário brasileiro: (administrativo e judicial). 5. ed. São
Paulo: Dialética, 2010, p. 158. 356 MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 172. 357 BORGES, José Souto Maior. Lei complementar tributária. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, EDUC, 1975, p. 13. 358 GRUPENMACHER, BetinaTreiger. ICMS - Considerações sobre a base de cálculo. In: ROCHA,
Valdir de Oliveira. Grandes questões atuais do direito tributário. São Paulo: Dialética, 2006. v. 10.
p. 20-21.
Não há como negar, em especial no campo tributário, que o descontrole criado
a partir da substituição tributária progressiva, interfere no livre exercício da atividade
econômica, princípio de relevo dentro da ordem econômica.359
Por isso, destaca-se, as considerações feitas por Sacha Calmon360 analisando
a fixação de bases de cálculo presumidas:
Na prática, o valor real da operação perdeu o sentido, o imposto passou a ser prefixado por ato administrativo do Estado, contra o princípio da legalidade e a jurisprudência velha de décadas do STF, de que o ICMS e o IPI, os impostos, enfim, sobre a produção e a circulação de bens e serviços, são impostos que incidem sobre negócios jurídicos, proibida a tributação com espeque em pautas fiscais. A partir de então, em 99% dos casos, o Fisco passou a fixar bases de cálculo presumidas acima dos preços médios de mercado, tributando o nada, ou seja, passou a utilizar-se dos impostos para praticar o confisco, vedado pela Constituição, distorcendo o mercado, contra os princípios igualmente constitucionais da iniciativa e da autonomia privadas, em favor do enriquecimento sem causa e, pois, ilícito, do Estado.
Logo, com a utilização de uma base presumida o legislador acaba por exigir do
contribuinte um imposto também presumido que pode ou não se concretizar ao final
da cadeia comercial, bem como, se dar por um valor inferior ao inicialmente calculado.
Ao tratar sobre as bases presumidas, Gabiriel Troianelli361 destaca que está
“não é grandeza apta para fixar, em definitivo, o montante do tributo devido, devendo
prevalecer sempre, por último, o valor real da operação, único elemento apto para
servir de base de cálculo para o ICMS”.
Embora, a crítica que se faça a utilização de uma base presumida, e,
considerando, que a substituição tributária progressiva é realidade no sistema
tributário brasileiro, tem-se que, a adoção de presunções dentro do âmbito de
aplicação da substituição tributária do ICMS, somente pode prosperar, se o legislador
359 “Essa parafernália de elementos é facilmente passível de objeção, porque cada contribuinte apresenta condições peculiares em seus negócios relativamente aos resultados auferidos, podendo mesmo operar com prejuízo; além do fato da realidade econômica ser flexível, instável, observando usualmente a lei da oferta e da procura. Despiciendo, ainda, tecer maiores considerações críticas, a respeito do critério de ‘amostragem’, uma vez que espelharia uma parca e insignificante situação operacional. (MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 170) 360 COELHO. Sacha Calmon Navarro. Segurança jurídica e mutações legais. In: ROCHA. Valdir de
Oliveira. Grandes questões atuais do direito tributário. São Paulo: Dialética, 2006. v. 10. p. 403. 361 TROIANELLI. Gabriel Lacerda. O direito à restituição do ICMS pago a maior no regime de
substituição tributária. Revista dialética de direito tributário, São Paulo: Dialética, n. 66, 03/2001, p.
48.
fornecer meios rápidos e eficazes de restituição da diferença paga a maior, de forma
a não onerar o contribuinte.
Conforme esclarecem Hugo de Brito Machado Segundo e Raquel Cavalcanti
Ramos Machado362, o objetivo do fisco ao utilizar bases de cálculo presumidas:
“não deve ser o de arrecadar a maior quantia possível, mas sim a de chegar a um
‘valor presumido’ que seja o mais próximo possível do preço final efetivamente
praticado”.
A presunção de que o valor efetivamente calculado pelo substituto seja
absoluto não pode prevalecer, pois sabe-se, que durante o ciclo de comercialização
das mercadorias (imaginando o caminho que o produto percorre desde a saída do
fabricante ou importador até o consumidor final) o preço pode ser alterado por
inúmeros fatores: abatimentos; liquidações; crise econômica; etc. Sem contar no risco
que essa mercadoria possui de não ser comercializada, seja por perecimento,
extravio, roubo, furto ou força maior (enchente, fogo, tempestades, etc.).
Conforme pondera Carrazza363, ao tratar sobre a exigência de uma base
presumida: “Pode o contribuinte, em razão das ‘guerras do comércio’, ser obrigado a
‘queimar o estoque’, realizando ‘vendas com prejuízos’. Também neste caso não terá
como obter a ‘imediata e preferencial restituição da quantia paga’”.
As divergências existentes entre a base de cálculo real e a base de cálculo
presumida ocorrem e afetam o dia-a-dia dos contribuintes, pois, ao se adotar bases
presumidas, que geralmente são superiores aos preços efetivamente praticados no
ciclo de comercialização, o Estado acaba por onerar o produto e consequentemente
o contribuinte, ferindo os princípios constitucionais já dispostos no presente estudo.
Em virtude da utilização de base de cálculo presumida, que na maioria das
vezes não reflete o preço a ser praticado no ciclo final de comercialização do produto,
é que deve assistir ao contribuinte o direito de restituição, cabendo à Administração
Fazendária fornecer meios adequados para sua realização, conforme se verificará no
tópico seguinte.
362 SEGUNDO, Hugo de Brito Machado; MACHADO. Raquel Cavalcanti Ramos. Substituição tributária, legalidade e coerência. In: ROCHA. Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes questões atuais do direito tributário. v. 14. São Paulo: Dialética, 2010. p. 162. 363CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 400.
2. CONSEQUÊNCIAS DA DECISÃO PROLATADA NA ANÁLISE DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – ADI 1.851-4/AL
Com o intuito de validar a substituição tributária progressiva do ICMS e garantir
ao contribuinte mecanismos para reaver as diferenças existentes entre a base de
cálculo presumida e a base de cálculo real, foi publicada a Emenda Constitucional nº
03/93364, que acrescentou o § 7º ao art. 150, CF/88, dispondo que:
A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.
Analisando a Emenda Constitucional, Regina Helena Costa365, observa que
esta não criou a substituição tributária progressiva (que conforme visto anteriormente,
já era exigida, sem maiores objeções pelos Estados), ela sim “inovou na instituição do
fato gerador presumido, bem como no estabelecimento de garantia de reembolso
preferencial e imediato do tributo pago, quando não se tiver ele realizado”.
A problemática então se coloca basicamente em torno do significado do que
venha a ser “fato gerador presumido”. Para responder a essa questão, utilizar-se-á do
conceito elaborado por Maria Rita Ferragut366:
O ‘fato gerador presumidor’, como o próprio nome diz, consiste na suposição da ocorrência futura de um fato previsto em lei como apto a produzir consequências jurídicas tributárias. Tem a força de exigir antecipadamente imposto ou contribuição cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente ao nascimento da obrigação. Implica, realmente, a obrigatoriedade do recolhimento, por determinado indivíduo, do imposto ou contribuição que seria devido, no futuro, por outro quanto este realizasse certo fato legalmente previsto.
Assim, a Constituição Federal, ao dispor no art. 150, § 7º, sobre a atribuição de
responsabilidade pelo pagamento do imposto relativamente a fato futuro e incerto,
364 BRASIL, Presidência da República Federativa do Brasil. Emenda Constitucional nº 03, de 17 de mar. de 1993. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc/emc03.htm> Acesso em: 05 abr. 2016. 365 COSTA, Regina Helena. Praticabilidade e justiça tributária: exequibilidade da lei tributária e direitos do contribuinte. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 238. 366 FERRAGUT, Maria Rita. Fato gerador presumido. Caderno de direito tributário e finanças públicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, nº 16, 1996, p. 73.
possibilitou aos Estados exigirem o ICMS sobre situações não concretizadas, com
base em valores presumidos.367
Independentemente da disposição constitucional, a exigência do tributo com
base em fato futuro, nos dizeres de Maria Rita Ferragut368: “é incompatível com os
princípios da segurança jurídica e da capacidade contributiva, constitutivos dos
direitos e garantias individuais dos contribuintes”.
A inserção do § 7º ao art. 150 da CF, dentro do capítulo das limitações ao poder
de tributar, teve como objetivo garantir o direito de restituição referente as operações
com mercadorias sujeitas ao regime da substituição tributária progressiva, pois,
anteriormente a sua inclusão, os Estados não tinham o menor comprometimento com
a sua devolução.369
Estevão Horvath critica a alteração empreendida pela Emenda Constitucional
nº 03/93, pois, ao possibilitar a tributação sobre fato ainda não ocorrido, desrespeitou
a regra matriz de incidência, e, nesse sentido, assumiu natureza confiscatória.370
Nesse contexto, e com o objetivo de cumprir o comando constitucional, a Lei
Complementar nº 87/96, dispôs em seu art. 10371 que: “É assegurado ao contribuinte
substituído o direito à restituição do valor do imposto pago por força da substituição
tributária, correspondente ao fato gerador presumido que não se realizar”.372
367 BENÍCIO, Sérgio Gonini. ICMS: apontamentos teóricos e práticos sobre a substituição tributária. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 126 368 FERRAGUT,. Maria Rita. Responsabilidade tributária e o código civil de 2002. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 65. 369 “Por outro lado, a parte final do § 7º do artigo 150 da Constituição Federal, na qual se prevê ‘...a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido’, longe de ser inútil, fixa importante limitação ao poder de tributar, já que anteriormente os Estados utilizavam a substituição para frente sem o menor compromisso de que a tributação presumida guardasse qualquer relação com o fato gerador, se e quando ocorrido, impondo ao contribuinte, goela abaixo, a tributação com base nas denominadas ‘pautas fiscais’, em bases totalmente fictícias”. (TROIANELLI, Gabriel Lacerda. O direito à restituição do ICMS pago a maior no regime de substituição tributária. Revista dialética de direito tributário, São Paulo: Dialética, n. 66, mar/2001, p. 47). 370HORVATH,. Estevão. O princípio do não-confisco no direito tributário. São Paulo: Dialética, 2002, p. 114. 371 BRASIL. Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp87.htm> Acesso em: 05 abr. 2016. 372 “Realmente, o contribuinte que recolheu antecipadamente ICMS sobre venda que seria realizada no futuro, e que não se concretizou (desistência do negócio, por exemplo), certamente não terá meios de ressarcir-se do tributo ‘imediatamente’ (no mesmo dia do evento) e, ainda, com a devida atualização (juros e correção monetária). Em termos objetivos e práticos, é difícil conceber a presença do contribuinte no guichê da repartição para receber (no mesmo dia). Muitas vezes, deveria levar em conta os encargos financeiros no caso de ter sido obrigado a socorrer-se de financeiras para obter o numerário suficiente para liquidar o tributo. (MELO, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Dialética, 2003, p. 161).
Formatado: Fonte: Negrito
Formatado: Fonte: Negrito
Em virtude da legislação mencionada, os Estados, permitiam que os seus
contribuintes pleiteassem a restituição do ICMS pago a maior, quando comprovada a
diferença entre a base de cálculo presumida (utilizada para cálculo do ICMS ST pelo
substituto) e o valor real da operação (praticado pelo substituído).
Todavia, essa restituição não era imediata tal como disposto no texto
constitucional, pois, em virtude do § 1º373 do art. 10, da Lei Complementar nº 87/96, o
contribuinte somente se restituiria deste valor após 90 dias da formulação do pedido.
Neste contexto, a crítica fulminante de Ives Gandra da Silva Martins374:
E a Lei Complementar nº 87/96 considerou como ‘devolução preferencial e imediata’ aquela que ocorrer dentro do prazo de 90 dias!!! Posso imaginar, se pelo princípio da isonomia, pleitearem os contribuintes o mesmo direito de pagar seus tributos ‘imediata e preferencialmente’ em 90 dias do vencimento, o que ocorreria....
Contudo, sabe-se, que é impossível à Administração Tributária restituir
imediatamente, pois, trata-se de processo que exige análise para aferição correta dos
valores praticados, entretanto, estabelecer um prazo de noventa dias é tornar a
restituição não imediata, mas futura. O prejuízo aos contribuintes é flagrante.375
Mas não era só o prazo de 90 dias que inviabilizava a imediata restituição, pois,
além de toda a burocracia criada pelo legislador para que o contribuinte conseguisse
pleitear o seu pedido, a forma de reaver este valor não era em espécie, mas sim num
sistema de conta-corrente fiscal376.
373 “§ 1º Formulado o pedido de restituição e não havendo deliberação no prazo de noventa dias, o contribuinte substituído poderá se creditar, em sua escrita fiscal, do valor objeto do pedido, devidamente atualizado segundo os mesmos critérios aplicáveis ao tributo”. (BRASIL. Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp87.htm> Acesso em: 05 abr. 2016). 374 MARTINS. Ives Gandra da Silva. Substituição tributária sem fato gerador real – Imposição Confiscatória – Lei Complementar nº 87/96 – Inconstitucionalidades. Revista dialética de direito tributário, São Paulo: Dialética, n. 22, 1997. p. 80. 375 “Claro que a crítica ao interregno de 90 (noventa) dias não implica, necessariamente, a defesa de uma devolução automática, realizada no mesmo dia da formulação do pleito pelo contribuinte. É indispensável que seja concedida à Administração Pública a possibilidade de averiguar a licitude e a certeza do pedido, para que não se proliferem tentativas de fraudes. Por essa razão, poder-se-ia admitir prazo de até alguns dias para que o Fisco resolvesse pela restituição ou não, sem que, com isso, estivesse sendo desvirtuado o sentido do mandamento constitucional correlato. A única certeza existente no presente caso, todavia, é que a estipulação da noventena é desproporcional, sendo, por conseguinte, flagrantemente inconstitucional”. (BENÍCIO, Sérgio Gonini. ICMS: apontamentos teóricos e práticos sobre a substituição tributária. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 149). 376 “[...] no período de apuração (sistema de ‘conta-corrente fiscal’) o contribuinte terá pouquíssimo ICMS a recolher. Com isso, a utilização dos créditos, referida no art. 10 da Lei Complementar nº 87/1996, vai sendo procrastinada (de ‘período de apuração’ para ‘período de apuração’), podendo, mesmo, ‘ficar para as calendas gregas’ (sem falar, é claro, na possibilidade, sempre presente, da
Para exemplificar, o direito de restituição do ICMS pago a maior, quando a base
de cálculo presumida (calculada de acordo com os critérios dispostos na Lei
Complementar nº 87/96 e nas demais normas infraconstitucionais) apresenta-se maior
que a base real (utilizada pelo contribuinte, denominado substituído), ilustra-se abaixo
um exemplo de cálculo:
CÁLCULO DO ICMS CONSIDERANDO A SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA
PROGRESSIVA
INDUSTRIAL IMPORTADOR
COMÉRCIO ATACADISTA
COMÉRCIO VAREJISTA
Custo do Produto
-
1.090,00
1.300,00
Preço do Produto 1.000,00 1.300,00 1.400,00
MVA – 50%
500,00
-
-
BASE DE CÁLCULO
PRESUMIDA
1.500,00
-
-
ICMS ST devido (18%)
(1.500,00 x 18%) =
270,00
(1.000,00 x 18%)= 180,00
(270,00 – 180,00)=
90,00
-
-
Valor total da Nota Fiscal
1.090,00
1.300,00
1.400,00
Diferença apurada: (Base de Cálculo Presumida) – (Base de Cálculo Real):
1.500,00 – 1.400,00 = 100,00
Valor da Restituição: 100,00 x 18% = 18,00
fluência do prazo prescricional)”. (CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 400.)
Para compreensão da ilustração, importantes são as considerações feitas por
Carrazza377:
Assim, quando efetivamente se comprova que os preços praticados na operação mercantil para o consumidor final são inferiores ao valor da pauta, aqueles (e não este) é que devem figurar na base de cálculo do ICMS, sob pena de o tributo assumir feições confiscatórias, violando, destarte, o disposto no art. 150, IV, da CF. Caso o preço final efetivo seja inferior ao da pauta fiscal, há de haver ‘a imediata e preferencial restituição da quantia paga’, de aqui se cogita.
Logo, a substituição tributária subsequente só pode prosperar, se o reembolso
estiver garantido ao contribuinte, de tal forma que se preserve princípios importantes
do nosso ordenamento jurídico, tais como, capacidade contributiva, segurança jurídica
e vedação ao confisco.378
Assim, na substituição tributária progressiva, se o “sujeito ativo” impõe um
recolhimento sobre uma base de cálculo presumida, que resulta, em apuração
diferenciada do ICMS, pois, conforme visto no exemplo acima não há créditos aos
adquirentes dos produtos – essa sistemática só pode prevalecer, se houver restituição
do valor recolhido a maior -, pois, caso contrário, é melhor que o Estado volte a apurar
o imposto pela sistemática normal de apuração (conta-corrente fiscal), garantindo ao
contribuinte, o exercício do crédito em cada uma das etapas de comercialização, e
assim, prestigie o princípio da não-cumulatividade previsto na Constituição.
Nesse sentido, importante consideração é feita por Leonardo Paola379:
“Sem a possibilidade de devolução, não se está a antecipar um tributo devido
futuramente, mas se cria um tributo novo, o qual deve em si apresentar-se conforme
ao princípio da capacidade contributiva”.
377CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 415. 378 Nesse sentido, é o entendimento de Sacha Calmon Navarro Coêlho, inclusive citando a ele próprio e outros autores: “Sustenta, porém, a minoria (Hugo de Brito Machado, Heron Arzua, Sacha Calmon Navarro Coêlho, Aroldo Gomes de Matos, entre outros), que ao ser assegurada a ‘imediata e preferencial restituição’ do tributo pago, caso não seja realizado o fato gerador presumido, foram definitivamente superadas as inconstitucionalidades então arguidas”. (COÊLHO. Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988: Sistema Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 502) 379 PAOLA. Leonardo Sperb de. Presunções e ficções no direito tributário. Belo Horizonte: Del Rey,
1997, p. 244.
Porém, para Carrazza380, “mesmo com essa ‘garantia’, atropela o princípio da
segurança jurídica, que, aplicado ao direito tributário, exige dentre outras coisas, que
o tributo só nasça após a ocorrência real (efetiva) do fato imponível”.
Embora houvesse dificuldades para reaver os valores recolhidos a maior, os
Estados de um modo geral, traziam em suas legislações a possibilidade de restituição.
Podemos citar como exemplo a legislação do Paraná que dispunha em seu art.
24, § 3º (agora revogado) da Lei nº 11.580/96381, que “na hipótese da substituição
tributária far-se-á a complementação ou a restituição das quantias pagas com
insuficiência ou excesso, respectivamente”, bem como o art. 66-B da Lei nº
6.374/89382 do Estado de São Paulo.
Entretanto, em 2002, tivemos o julgamento da Ação Direta de
Inconstitucionalidade - ADI 1.851-4/AL, na qual o STF declarou a constitucionalidade
do Convênio ICMS nº 13/97 que dispõe em sua cláusula segunda que não caberá a
restituição do ICMS quando a operação ou prestação subsequente à cobrança do
imposto, sob a modalidade da substituição tributária, se realizar com valor inferior
àquele estabelecido com base no art. 8º, da Lei Complementar 87/96.
Em relação a essa decisão, importante observação é feita por Sérgio
Benício383:
[...] depois de um julgamento eminentemente político, em que prevaleceram interesses arrecadadores em detrimento de princípios e valores jurídicos, o Supremo Tribunal Federal confirmou a validade da Cláusula Segunda do Convênio ICMS n. 13/97, mantendo impossível a compensação de valores pagos a maior em decorrência de estimativas exacerbadas de base de cálculo, elaboradas pela própria Administração Fazendária dos estados e do Distrito Federal.
380CARRAZZA. Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros,
2011, p. 494. 381 PARANÁ. Lei nº 11.580, de 14 de novembro de 1996. Disponível em: <http://www.sefanet.pr.gov.br/SEFADocumento/Arquivos/7200511580.pdf> Acesso em: 05 abr. 2016. 382 “Artigo 66-B - Fica assegurada a restituição do imposto pago antecipadamente em razão da substituição tributária: I - caso não se efetive o fato gerador presumido na sujeição passiva; II – caso se comprove que na operação final com mercadoria ou serviço ficou configurada obrigação tributária de valor inferior à presumida”. (SÃO PAULO. Lei nº 6.374, de 01 de março de 1989. Disponível em: <http://info.fazenda.sp.gov.br/NXT/gateway.dll?f=templates&fn=default.htm&vid=sefaz_tributaria:vtribut>. Acesso em 05 abr. 2016. 383 BENÍCIO, Sérgio Gonini. ICMS: apontamentos teóricos e práticos sobre a substituição tributária. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 151.
Negar a restituição, é afirmar que o contribuinte está obrigado a arcar com
imposto maior do que aquele efetivamente devido384.
Por isso, importante crítica é feita por Ives Gandra da Silva Martins385: “A
Suprema Corte, ao admitir tal interpretação, hospedou, em matéria tributária, ‘o
princípio da legalidade mais ou menos’ ou da ‘legalidade tributária elástica’”.
Embora o julgamento tenha declarado válida a cláusula segunda do Convênio
ICMS nº 13/97 do qual são signatários os Estados do Acre, Alagoas, Amapá,
Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato
Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do
Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, Sergipe, Tocantins e
do Distrito Federal; os demais Estados que tinham previsão em suas legislações
permitindo a restituição do valor, como foi o caso do Estado do Paraná, revogaram os
dispositivos que autorizavam a restituição do ICMS ST pago a maior, por entenderem
que uma vez declarada a constitucionalidade da “cláusula segunda” do Convênio
ICMS nº 13/97 não mais tinham a obrigação de efetuar o ressarcimento aos seus
contribuintes.
Para Hugo de Brito Machado e Hugo de Brito Machado Segundo386:
[...] como a decisão reporta-se à validade de um convênio, que foi tido como válido, seus efeitos não podem ser outros que não o de tornar impositiva a observância do mesmo, que não há mais que ser reputado inconstitucional, observância que evidentemente só há de ser exigida daqueles que o subscreveram. Tal como uma decisão que afirma válido um contrato, que só obriga as partes desse mesmo contrato, uma ADI que afirma válido um convênio não pode obrigar entes políticos que desse convênio não são signatários. No máximo, o efeito que a decisão poderia ter, sobre terceiros não signatários do convênio, seria relativo e indireto, apenas no que toca aos seus fundamentos. Em suma, se nela se tivesse afirmado proibida constitucionalmente a restituição do excesso, no que tange ao ICMS cobrado por substituição tributária (ICMS-ST), seus fundamentos serviriam de base ou amparo para que se declarassem inválidas normas infraconstitucionais que determinassem ou autorizassem essa restituição. Mas, viu-se no item anterior, essa proibição constitucional de restituição não existe.
384 MELO. José Eduardo Soares. ICMS – base de cálculo – descontos, seguros, juros, multas, correção,
reajustes. Pautas na substituição tributária. Importações. Base reduzida e estorno de crédito. In:
ROCHA. Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes questões atuais do direito tributário. São Paulo:
Dialética, 2006. v.10. p. 295-296. 385 MARTINS. Ives Gandra da Silva. Substituição tributária e não-cumulatividade. In: ROCHA. Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes questões atuais do direito tributário. São Paulo: Dialética, 2010. v.14º. p. 170. 386 MACHADO, Hugo de Brito; SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Constitucional. ICMS. Substituição
tributária para frente. Preço final diverso do previsto na antecipação. ADI 1.851/AL. Efeitos. Revista
dialética de direito tributário, São Paulo: Dialética, n. 157, out/2008, p. 98.
Tudo isso se deve ao fato de que no julgamento da ADI 1.851-4/AL ficou
entendido que o art. 150, § 7º, da CF/88 não impõe ao Estado a obrigação de restituir
o valor eventualmente pago a maior.
Conforme observam Hugo de Brito Machado e Hugo de Brito Machado
Segundo387:
Com efeito, exame dos votos vencedores, no citado acórdão, mostra que em todos eles se considerou que a sistemática da substituição tributária para frente não impõe ao Estado o dever de restituir o excesso arrecadado, quando o preço final se dá por valor inferior ao da antecipação. Assim como também não impõe ao Estado que exija diferenças de imposto, quando o preço final for superior.
No entendimento do Egrégio Tribunal essa restituição somente ocorreria em
caso de não se realizar o fato gerador presumido.
Essa situação pode ser exemplificada, considerando o caso da farmácia que
compra medicamentos com o cálculo da substituição tributária, mas depois de um
tempo os retorna ao fabricante, por estarem com o prazo de validade vencido. Neste
caso não se concretizaria o fato gerador presumido, qual seja, a saída da mercadoria
do estabelecimento.
Ao analisar a decisão prolatada pelo STF, Carrazza388 observa que: “neste
caso, apenas foi declarada a constitucionalidade do uso das pautas fiscais no ICMS,
sem que fosse analisada nenhuma, específica”, o que por certo não conduz ao
entendimento de que a matéria já está superada ou liquidada.
Pelo exposto, pode se afirmar que o STF não proibiu a restituição, apenas
reconheceu que a Constituição não obriga os Estados à restituir, mas não dispôs que
a Constituição não permita reaver as diferenças existentes entre a base ficta calculada
pelo substituto e a efetivamente praticada pelo substituído quando da venda para o
consumidor final.389
Até porque tal ilação, conduziria, a desconsideração dos princípios
constitucionais que protegem a relação entre o contribuinte e a Administração Pública.
387Ibid., p. 98. 388CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 414. 389 MACHADO, op. cit., p. 98.
Para Ives Gandra da Silva Martins390: Nada me parece mais contra lógica, contra a garantia tributária e contra o desenvolvimento do país do que transformar uma garantia do contribuinte em privilégio do Fisco e admitir que se possam cobrar tributos sobre fatos geradores inexistentes, relações jurídicas não ocorridas, realidades não conformadas.
Embora a parte final do § 7º, do art. 150, utilize a expressão “caso não se realize
o fato gerador presumido”, não se deve interpretá-la apenas no sentido literal, a fim
de concluir que somente é possível a restituição caso não ocorra a operação
subsequente com o produto.
A interpretação a ser realizada deve ter como objetivo verificar a finalidade da
norma, que não pode ser outra, se não, a de permitir que ocorra a restituição da
diferença do ICMS pago a maior quando se verifique que a base de cálculo presumida
é maior do que o valor real da operação.391
Acertadamente, embora não se referindo a substituição tributária do ICMS,
Paulo de Barros Carvalho392 traz importante consideração a respeito da interpretação
das normas:
O desprestígio da chamada interpretação literal é algo que dispensa meditações mais profundas, bastando recordar que, prevalecendo como método de interpretação do direito, seríamos forçados a admitir que os meramente alfabetizados, quem sabe com o auxílio de um dicionário de tecnologia jurídica, estariam credenciados a identificar a substância das mensagens legisladas, explicitando as proporções de significado da lei. O reconhecimento de tal possibilidade roubaria à Hermenêutica Jurídica e a Ciência do Direito todo o teor de suas conquistas, relegando o ensino universitário a um esforço sem expressão e sentido prático de existência.
Também por conta da ADI 1.851-4/AL, o Governo do Estado de São Paulo
pediu a declaração da inconstitucionalidade (ADI 2.777/SP) do art. 66-B, II, da sua Lei
Orgânica de nº 6.374/80, que assegura a restituição do ICMS retido a maior no cálculo
da substituição tributária progressiva.
390 MARTINS. Ives Gandra da Silva. Substituição tributária sem ocorrência do fato gerador – Inconstitucionalidade por violar, a E.C. nº 3/93, cláusula pétrea vinculada ao princípio da legalidade. Revista dialética de direito tributário, São Paulo: Dialética, n. 13, 1996, p. 75. 391TROIANELLI, Gabriel Lacerda. O direito à restituição do ICMS pago a maior no regime de
substituição tributária. Revista dialética de direito tributário, São Paulo: Dialética, n. 66, 03/2001, p.
49. 392CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 265-266.
A interpretação dada pelos Estados por conta da ADI 1.851-4/AL foi de que os
valores recolhidos pelo regime da substituição tributária progressiva são definitivos e
por isso não há que se cogitar restituição de eventuais diferenças, pois, interpretar
diferente, seria contrariar todo o mecanismo de presunção adotado pelo regime. Esse
raciocínio, por certo, não pode prosperar.
Contudo, essa interpretação restritiva, viola diretamente o princípio da
capacidade contributiva, por isso, em relação ao controle que o judiciário deve exercer
sobre situações, tais, como a que se apresenta no presente trabalho, observa Regina
Helena Costa393:
Cremos que a atuação do Poder Judiciário na apreciação da constitucionalidade de uma lei tributária genericamente contestada deve ter em vista a noção de ‘capacidade contributiva absoluta’ antes mencionada, correspondente à aptidão abstrata de um sujeito para receber o impacto tributário, por ter promovido o fato descrito na lei como idôneo a provocar esse efeito. Logo, se a situação hipotética não se mostrar indicadora de tal aptidão a lei será irremediavelmente inconstitucional.
Na importante observação de Betina Grupenmacher394:
Com o reconhecimento da constitucionalidade da regra inserta no parágrafo 7° do art. 150 no âmbito de uma ação declaratória de inconstitucionalidade, na via concentrada, portanto, disseminou-se entendimento de que estariam esgotadas as possibilidades de questionamento a propósito da questão. Todavia, assim não entendemos. Pensamos ser não apenas possível, mas, sobretudo, desejável que se dê continuidade ao questionamento acerca da constitucionalidade da regra assim na via difusa como concentrada.
Portanto, como as bases utilizadas para o cálculo da substituição tributária
progressiva do ICMS são presumidas e nem sempre refletem o valor real da operação
a ser praticado na etapa final do ciclo de comercialização, os contribuintes, suscitam
novamente o direito de restituição, o que resultou na aceitação pelo STF, em 2009,
do Recurso Extraordinário 593.849-2/MG pelo rito da Repercussão Geral.
393 COSTA. Regina Helena. Princípio da capacidade contributiva. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 81. 394 GRUPENMACHER. BetinaTreiger. ICMS - Considerações sobre a base de cálculo. In: ROCHA. Valdir de Oliveira. Grandes questões atuais do direito tributário. São Paulo: Dialética, 2006. v. 10. p. 30-31.
3. ACEITAÇÃO DE REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 593.849-2/MG – UMA LUZ NO FIM DO TÚNEL
Com o intuito de diminuir a quantidade de recursos extraordinários a serem
julgados pelo Supremo Tribunal Federal, foi publicada a Emenda Constitucional nº
45/04, que inclui o § 3º395 ao art. 102, da Constituição Federal, dispondo sobre a
necessidade de demonstração de repercussão geral das questões suscitadas no
Recurso Extraordinário.
Em relação a alteração constitucional dispõe Betina Grupenmacher396:
Observa-se que a chamada ‘repercussão geral’ atua a um só tempo como ‘mecanismo de contenção’ ou de ‘filtragem’ dos recursos extraordinários a serem julgados pelo STF e também como instrumento que ‘fortalece’ os tribunais que integram o segundo grau de jurisdição, na medida em que, não reconhecida a repercussão geral da matéria objeto do recurso extraordinário, prevalecerão as decisões prolatadas no âmbito dos referidos tribunais.
Também, ressalta, Hugo de Brito Machado397:
Certamente ninguém pode negar que o parágrafo 3°, do art. 102, da Constituição Federal, deu ao Supremo Tribunal Federal um instrumento da maior relevância para impedir que o enorme volume de recursos extraordinários inviabilize o desempenho de sua função primordial. E certamente também ninguém dirá que tal instrumento não é mais adequado a essa finalidade. Não existem, portanto, razões para não alimentarmos a esperança de que o mesmo seja adequadamente utilizado, vale dizer, utilizado como substitutivo das fórmulas até agora utilizadas para negar seguimento ao apelo extremo.
O § 1º do art. 1.035 do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº
13.105/15 repete a redação constante do antigo CPC (§ 1º do art. 543-A), dispondo
que “Para efeito da repercussão geral, será considerada a existência, ou não, de
questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que
ultrapassem os interesses subjetivos da causa”.
395 “§ 3º No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.” (BRASIL. Constituição Federal (1988). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm> Acesso em: 05 abr. 2016). 396 GRUPENMACHER, Betina Treiger. Repercussão geral no direito tributário. In: ROCHA. Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes questões atuais do direito tributário. v. 11. São Paulo: Dialética, 2007. p. 23. 397 MACHADO, Hugo de Brito. Súmula vinculante, recurso extraordinário e repercussão geral, e recursos repetitivos perante o STJ, em matéria tributária. In: ROCHA. Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes questões atuais do direito tributário. v. 12. São Paulo: Dialética: 2008. p. 232.
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A exigência de repercussão geral para admissibilidade dos recursos
extraordinários a serem julgados pelo STF, é, sem dúvida, relevante para evitar a
subida de inúmeros recursos, muitas vezes de natureza protelatória que estavam
abarrotando o Egrégio Tribunal.
Portanto, a finalidade da Repercussão Geral conforme se extrai da legislação
que a regulamentou, é delimitar a competência do STF, no julgamento de recursos
extraordinários, às questões constitucionais com relevância social, política,
econômica ou jurídica, que transcendam os interesses subjetivos da causa e desta
forma uniformizar a interpretação constitucional sem exigir que o STF decida múltiplos
casos idênticos sobre a mesma questão constitucional.398
Conforme leciona James Marins399:
No campo tributário, havendo questionamento sobre a constitucionalidade de norma jurídica instituidora ou majoradora de tributo, é axiomática a caracterização da repercussão geral, pois, a decisão do STF influenciará necessariamente o conteúdo de milhões de relações obrigacionais fiscais qualitativamente idênticas, transcendendo, como regra os limites subjetivos da causa. Por tal razão tem o STF decidido pelo surgimento de repercussão geral em diversos temas fiscais, como, entre outros, exigência de lei complementar para dispor sobre prescrição e decadência em matéria tributária, progressividade da alíquota do ITCMD, alcance da imunidade da CSSL e, inclusive, responsabilidade solidária dos sócios ante contribuição social devida por pessoa jurídica.
Em virtude da relevância do tema, em 2009, o STF reconheceu a existência de
repercussão geral no Recurso Extraordinário 593.849-2/MG400 interposto contra
acórdão que entendeu ser indevida a restituição do ICMS pago antecipadamente no
regime de substituição tributária progressiva, quando for apurada diferença entre a
base de cálculo presumida e a base de cálculo real.
398 BRASIL,. Supremo Tribunal Federal. Repercussão Geral - Apresentação. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaRepercussaoGeral&pagina=apresentacao>. Acesso em 05 abr. 2016. 399 MARINS,. James. Direito processual tributário brasileiro: (administrativo e judicial).5 ed. São Paulo: Dialética, 2010, p. 456-457. 400 BRASIL,. Supremo Tribunal Federal. RE 593.849. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2642284> Acesso em: 05 abr. 2016.
Conforme observa Betina Grupenmacher401:
Especificamente no que toca às questões de índole tributária, cremos que, qualquer que seja o objeto da demanda, haverá repercussão geral, já que o que se discute nestes feitos é, sobretudo, a existência ou inexistência de relação jurídica tributária diante da constitucionalidade ou inconstitucionalidade da exação.
No referido Recurso Extraordinário, alegou-se, em suma, a constitucionalidade
da devolução do ICMS pago adiantadamente no regime da substituição tributária
progressiva, quando a base de cálculo efetiva da operação for inferior a presumida.
O reconhecimento da repercussão geral, conforme se verifica na justificativa
apresentada pelo Ministro Ricardo Lewandowski402, relator do processo à época, se
deu pela relevância jurídica e econômica do tema apresentado:
[...] Entendo que a controvérsia possui repercussão geral. Discute-se, no caso dos autos, a constitucionalidade da restituição da diferença de ICMS pago a mais no regime de substituição tributária, com base no art. 150, § 7°, da CF. A questão constitucional, com efeito, apresenta relevância do ponto de vista jurídico, uma vez que a definição sobre a constitucionalidade da referida restituição norteará o julgamento de inúmeros processos similares que tramitam nos tribunais brasileiros. Além disso, evidencia-se a repercussão econômica, porquanto a solução do caso em exame poderá implicar relevante impacto no orçamento dos estados federados e dos contribuintes do ICMS. Destaco, por fim, que a matéria em debate está em discussão no Plenário desta corte ¾ ADI 2.675/PE, Rel. Min. Carlos Velloso e ADI 2.777/SP, Rel. Min. Cezar Peluso, cujo julgamento já iniciado, mas não concluído. Isso posto, manifesto-me pela existência de repercussão geral neste recurso extraordinário, nos termos do art. 543-A, § 1°, do Código de Processo Civil, combinado com o art. 323, § 1°, do RISTF.
Mesmo com o julgamento da ADI 1.851-4/AL, em 2002, na qual se declarou a
constitucionalidade do Convênio ICMS nº 13/97 que dispõe em sua cláusula segunda
que não caberá a restituição do ICMS quando a operação ou prestação subsequente
à cobrança do imposto, sob a modalidade da substituição tributária, se realizar com
valor inferior àquele estabelecido, o STF aceitou a repercussão geral.
401 GRUPENMACHER, Betina Treiger. Repercussão geral no direito tributário. In: ROCHA. Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes questões atuais do direito tributário. v. 11. São Paulo: Dialética, 2007. p. 29. 402 BRASIL,. Supremo Tribunal Federal. RE 593.849. Disponível em <http://redir.stf.jus.br/paginadorpu b/paginador.jsp?docTP=AC&docID=603766>. Acesso em 05 abr. 2016.
Sobre a aceitação da repercussão geral sobre tema já decidido pelo STF, se
manifestou de forma favorável a Ministra Ellen Gracie403.
Com a aceitação da repercussão geral para analisar a possibilidade de
devolução do ICMS pago a maior quando for apurada diferença entre a base de
cálculo presumida e a base de cálculo real, abriu-se uma nova expectativa para
inúmeros contribuintes sujeitos ao regime da substituição tributária progressiva, de
verem reconhecido o direito que já lhe era previsto antes do julgamento da ADI 1.851-
4/AL.
Importante destacar, que a ADI 1.851-4/AL foi recebida dentro do controle
concentrado de constitucionalidade, enquanto o RE 593.849-2/MG, pelo controle
difuso.
Sobre o controle de constitucionalidade adotado pelo Brasil, esclarece,
Paulsen:
O difuso ocorre através de ‘recurso extraordinário’ (RE) interposto contra as decisões dos tribunais federais e estaduais e também dos tribunais superiores, especialmente do Superior Tribunal de Justiça. O concentrado é através de ações diretas de inconstitucionalidade (ADI) ou de constitucionalidade (ADC) e, ainda, da ‘Arguição de descumprimento de preceito fundamental’ (ADPF).
Em 2011, o STF, solicitou à Procuradoria da Fazenda Nacional que se
manifestasse sobre o tema suscitado no Recurso Extraordinário. Nesse contexto, foi
elaborado o Parecer nº 5415/RJMB404, de autoria do Sub-procurador-Geral da
República, a época, Rodrigo Janot Monteiro de Barros, que se manifestou de forma
favorável, conforme se observa da ementa abaixo, a restituição das diferenças
apuradas na base de cálculo do ICMS decorrente do regime da substituição tributária
progressiva:
403 “Conforme relatado pela Min. Ellen Gracie na Questão de Ordem no RE 579.431(julgamento em 11-6-2008, Plenário, DJE de 24-10-2008): “1. Aplica-se, plenamente, o regime da repercussão geral às questões constitucionais já decididas pelo STF, cujos julgados sucessivos ensejaram a formação de súmula ou de jurisprudência dominante. 2. Há, nessas hipóteses, necessidade de pronunciamento expresso do Plenário desta Corte sobre a incidência dos efeitos da repercussão geral reconhecida para que, nas instâncias de origem, possam ser aplicadas as regras do novo regime, em especial, para fins de retratação ou declaração de prejudicialidade dos recursos sobre o mesmo tema (CPC, art. 543-B,§ 3º)”. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 579.431. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=557585>. Acesso em 05 abr. 2016). 404 BARROS, Rodrigo Janot Monteiro de. Parecer nº 5415. Documento obtido por e-mail por solicitação ao Ministério Público Federal.
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CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ICMS. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA “PARA FRENTE”. CF, ART. 150, § 7º: CLÁUSULAS DE VINCULAÇÃO E DE RESTITUIÇÃO. BASE DE CÁLCULO. DIMENSIONAMENTO DO ASPECTO MATERIAL DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA. NECESSÁRIA RELAÇÃO DE CORRESPONDÊNCIA COM O FATO GERADOR. DIFERENÇAS NAS BASES DE CÁLCULO. RESTITUIÇÃO DO IMPOSTO PAGO A MAIOR. 1. A substituição tributária “para frente” é técnica de arrecadação tributária que se aparta do modelo obrigacional, vez que a exigência do tributo se dá antes do fato previsto em lei como necessário ao surgimento da obrigação tributária. Tem por fim a praticidade, a otimização da fiscalização tributária e o combate à sonegação fiscal. 2. Há, na substituição tributária “para frente”, a presunção da ocorrência do pressuposto de fato e não do fato gerador propriamente dito, o qual somente ocorre com a concretização da hipótese descrita em lei como capaz de fazer emergir a obrigação tributária. Doutrina. 3. O pressuposto de fato e o fato gerador, embora distintos, devem ser compatíveis. A presunção de ocorrência das operações posteriores tem o efeito único de determinar o recolhimento do imposto pelo contribuinte substituto e deve guardar estrita relação de correspondência com o fato gerador definitivo. É a cláusula de vinculação extraída da expressão “cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente”. 4. A base de cálculo, como critério de dimensionamento da intensidade do aspecto material da hipótese de incidência, deve corresponder ao fato gerador. “É a base de cálculo que dá a exata dimensão da hipótese de incidência tributária, estabelecendo a correlação necessária entre o fato descrito na norma como pressuposto e a prestação tributária.” Doutrina. 5. Correta e irretorquível a afirmação de que o fato gerador tem, na base de cálculo, a sua expressão valorativa ou a sua dimensão material e deve se realizar nos termos dessa dimensão. Daí porque afirma Paulo de Barros que a base de cálculo é uma grandeza ínsita ao aspecto material e possui, além da função de dimensioná-lo, a de confirmá-lo, infirmá-lo ou afirmar o verdadeiro aspecto material da hipótese de incidência. 6. A vedação à restituição da diferença entre a base de cálculo estimada e a base de cálculo real, ao argumento de que o fato gerador ocorreu, ainda que em medida diversa, desnatura o critério material da hipótese de incidência e a própria base de cálculo do tributo. Doutrina. 7. A restituição das diferenças apuradas entre a base de cálculo estimada e a base de cálculo aplicada não despoja o instituto da substituição tributária para frente de suas vantagens, vez que estas se concretizam no momento do recolhimento antecipado do tributo devido pelo substituto. A ratio essendi do § 7º do art. 150 da CF fica preservada com a possibilidade de ajuste fiscal que se conforma ao modelo tributário desenhado pela Constituição. 8. A EC nº 3, de 1993, incluiu o § 7º ao art. 150 da CF entre as limitações constitucionais ao poder de tributar (Estatuto do Contribuinte), justamente porque consubstancia um direito e uma garantia do contribuinte de não ser tributado além do que devido pelo modelo tradicional de tributação. 9. A parte final do § 7º do art. 150 da CF deve ser lida no sentido de que a restituição do imposto pago deve ocorrer quando o fato gerador presumido não ocorrer, o que se dá sempre que o fato gerador definitivo se realizar de forma distinta daquele tributado na etapa inicial do ciclo econômico. 10. Parecer pelo conhecimento e provimento do recurso.
Atualmente, o Recurso Extraordinário de nº 593.849-2/MG, está sob a relatoria
do Ministro Edson Fachin.
Em virtude da repercussão geral aceita no RE 593.849-2/MG, a ADI
2.675/PE405 e a ADI 2.777/SP406 que tratam da mesma matéria e já tiveram o
julgamento iniciado no STF, mas não concluído, estão aguardando a decisão do
recurso extraordinário.
Certo é que, que esse julgamento pela via da repercussão geral terá efeitos
jurídicos e também econômicos, conforme alertou o relator à época, o Ministro Ricardo
Lewandowski407: “evidencia-se a repercussão econômica, porquanto a solução do
caso em exame poderá implicar relevante impacto no orçamento dos estados
federados e dos contribuintes do ICMS”; por isso, a controvérsia tem relevância tanto
para os Estados (que aguardam pelo posicionamento negativo da devolução), quanto
para os contribuintes (que almejam manifestação favorável do STF pela restituição).
Após, verificação, da situação em que se encontra a controvérsia na esfera
judicial, passa-se, a analisar, a pergunta colocada no início do presente estudo: “Qual
o conteúdo e o alcance do art. 150, § 7º, da CF, que prevê a imediata e preferencial
restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.
Conforme se verificou da decisão prolatada na ADI 1.851-4/AL, a maioria dos
ministros408 acompanharam o voto do Ministro-Relator Ilmar Galvão e se
manifestaram pela constitucionalidade da cláusula segunda do Convênio ICMS nº
13/97, que continua em vigor, inclusive com adesão recente do Estado de Santa
Catarina409.
405 O julgamento encontra-se empatado, todavia, em 18/12/2009, o Tribunal resolveu questão de ordem, suscitada pelo Senhor Ministro Carlos Britto, no sentido de sobrestar o julgamento da presente ação direta de inconstitucionalidade para que este seja realizado em conjunto com o RE nº 593.849-MG, da relatoria do Senhor Ministro Ricardo Lewandowski, no qual foi reconhecida a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada. 406 O julgamento encontra-se empatado, todavia, em 18/11/2010, o Tribunal resolveu questão de ordem, suscitada pelo Senhor Ministro Ayres Britto, no sentido de sobrestar o julgamento da presente ação direta de inconstitucionalidade para que esse seja realizado em conjunto com o RE nº 593.849, da relatoria do Senhor Ministro Ricardo Lewandowski, no qual foi reconhecida a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada. 407 BRASIL,. Supremo Tribunal Federal. RE 593.849. Disponível em <http://redir.stf.jus.br/paginadorpu b/paginador.jsp?docTP=AC&docID=603766>. Acesso em 05 abr. 2016. 408 Acompanharam o relator, os seguintes ministro (as): Ellen Gracie, Maurício Corrêa, Sepúlveda Pertence, Sydney Sanches, Moreira Alves. Votaram de maneira divergente os Ministros: Carlos Velloso, Celso de Mello e Marco Aurélio. 409 “CONVÊNIO ICMS 75, DE 27 DE JULHO DE 2015 Dispõe sobre a adesão do Estado de Santa Catarina ao Convênio ICMS 13/97, que harmoniza procedimento referente a aplicação do § 7º, artigo 150, da Constituição Federal e do artigo 10 da Lei Complementar 87/96, de 13.09.96”. (BRASIL, Convênio ICMS nº 75 de 15 de julho de 2015. Disponível em: <https://www.confaz.fazenda.gov.br/legislacao/convenios/2015/convenios-icms-75-15?
Para a maioria dos ministros e conforme já aventado no tópico 2 desse capítulo,
a restituição do ICMS pago a maior decorrente da substituição tributária progressiva,
somente se dá quando não ocorra o fato gerador presumidor, ou seja, quando a
mercadoria não tenha sido objeto de operação subsequente pelo substituído.
Contudo, nos casos, em que a mercadoria sujeita ao cálculo do ICMS ST é
objeto de saída pelo substituído, mas por um valor inferior ao considerado pelo
substituto, não há que se falar em direito a restituição, já que segundo consta na
decisão de julgamento, tal possibilidade retiraria todas as vantagens e praticidades da
substituição tributária progressiva, tais como: economia, eficiência e celeridade, a
chamada praticabilidade tributária.410
Em relação ao entendimento de que em nome da praticabilidade da
substituição tributária progressiva do ICMS, não há que cogitar de restituição de
valores recolhidos a maior, observa Regina Helena Costa411:
Em nossa opinião, a substituição tributária progressiva ou “para frente” apresenta-se como exemplo de inadequado emprego da praticabilidade, porquanto autoriza a utilização de presunção para ter como ocorrido fato jurídico tributário que provavelmente irá se realizar, fazendo surgir o nascimento da obrigação tributária antecipadamente. Em outras palavras, trata-se de hipótese de tributação por fato futuro – o que, a nosso ver, revela-se ofensivo ao princípio da capacidade contributiva, que se sobrepõe à diretriz da praticabilidade.
Sem desconsiderar as justificativas apresentadas pela maioria dos Ministros na
ADI 1.851-4/AL, que acompanharam o voto do Relator, deve se destacar o
entendimento exposto pelo Ministro Marco Aurélio412, em seu voto divergente: “Não
posso interpretar, de forma isolada, a parte final do § 7º, olvidando até mesmo a
natureza, os parâmetros do tributo, distanciando a interpretação desse parágrafo das
balizas do próprio tributo”.
410 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. ADI 1.851-4/AL. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=266781> Acesso em 20 abr. 2016 411COSTA, Regina Helena. Praticabilidade e justiça tributária: exequibilidade da lei tributária e direitos do contribuinte. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 239. 412 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. ADI 1.851-4/AL. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=266781> Acesso em 20 abr. 2016
Nesse sentido, importante observação é feita por Estevão Horvath413, ao
analisar a tributação confiscatória: “Com efeito, qualquer centavo cobrado a mais do
autorizado (a título de tributo), assim como qualquer exação imposta sem autorização
(‘consentimento’) deixa de constituir tributo”.
Também pondera Roque Carrazza414:
Uma pauta fiscal que contradiga significativamente a realidade, ou seja, que vá muito além dos preços a final praticados, nas operações mercantis futuras, deve ser posta em oblívio, até porque a distorção pode provocar efeitos negativos no livre exercício da atividade comercial, afetando a própria livre concorrência. Deveras, uma venda mercantil, por preço superior e com maior margem de lucro, sofrerá a mesma carga fiscal de outra, por preço inferior e com menor margem de lucro, em flagrante prejuízo para quem realiza esta última.
Não se pode analisar o § 7º do art. 150 dissociado das demais regras e
princípios constitucionais, por isso, se pautou o presente estudo na análise dos
princípios da capacidade contributiva, da moralidade, vedação ao confisco, da não-
cumulatividade, segurança jurídica, bem como da estrutura da regra matriz de
incidência e da responsabilidade tributária, que são matérias atinentes ao poder de
tributar, e, que tem por função, resguardar os administrados dos excessos e da
arbitrariedade do Estado.
Aroldo Gomes de Mattos415 analisando a interpretação que deve ser dada a
Emenda Constitucional nº 03/93, que inclui o § 7º ao art. 150 da CF/88, alerta que:
“segue-se que a inescusável obrigação legal e moral de a Fazenda Pública restituir o
excesso de ICMS cobrado prematuramente através do regime da substituição
tributária ‘para frente’ está atrelada aos princípios constitucionais”. Resumidamente,
os princípios citados pelo autor, são: não-cumulatividade, não-confisco, moralidade
da administração pública, isonomia, enriquecimento sem causa416.
413 HORVATH,. Estevão. O princípio do não-confisco no direito tributário. São Paulo: Dialética, 2002, p. 112. 414CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 413. 415 MATTOS,. Aroldo Gomes de. ICMS: (comentários à legislação nacional). São Paulo: Dialética, 2006, p. 200. 416 Ibid., p. 200.
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Nesse contexto, pertinente são as colocações feitas por Klaus Tipke417:
A moral tributária não exige, que as leis tributárias tenham uma tradição, mas que elas se harmonizem com a Constituição atual e com a Ética corporificada em seus direitos fundamentais. Se o legislador aprova dolosa ou levianamente leis que são inconstitucionais ou se ele não revoga ou modifica as leis que pela maioria são consideradas por boas razões inconstitucionais, então ele atua tributariamente de modo imoral.
Em relação ao princípio da moralidade, assevera ainda Aroldo Gomes de
Mattos418 que este: “impede o Estado de agir com esperteza, astúcia e improbidade,
ou seja, no caso, cobrar tributo a maior ou indevido mediante a instituição de
estratagemas que impedem ou obstaculizam sua restituição”.
Por isso, ao interpretar o § 7º do art. 150 da CF/88, não se deve fazê-lo
isoladamente, de tal sorte a afirmar que a intenção do legislador constitucional foi dar
ao “fato gerador presumido” um sentido restrito considerando apenas as situações de
não saídas subsequentes da mercadoria pelo substituído.
Sobre a relevância dos princípios constitucionais para a resolução de
problemas, desde os mais simples até o mais complexo, pondera Carrazza419:
Não é por outras razões que, na análise de qualquer problema jurídico – por mais trivial que seja (ou que pareça ser) -, o cultor do Direito deve, antes de mais nada, alçar-se ao altiplano dos princípios constitucionais, a fim de verificar em que sentido apontam. Nenhuma interpretação poderá ser havida por boa (e, portanto, por jurídica) se, direta ou indiretamente, vier a afrontar um princípio jurídico-constitucional.
A luz do princípio da moralidade previsto no art. 37, da CF/88, é possível
depreender, que a restrição ao direito de crédito é moralmente reprovável, pois, não
atende os objetivos de boa-fé e lealdade que o Administrador deve ter para com os
seus administrados.420
417TIPKE,. Klaus. Moral tributária do estado e dos contribuintes. 2012, p. 79. 418 MATTOS,. Aroldo Gomes de. ICMS: (comentários à legislação nacional). São Paulo: Dialética, 2006, p. 201-202. 419 CARRAZZA,. Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 49. 420 “De fato, também na esfera do direito tributário, a funcionalidade e a validade dos princípios têm sido sempre mais postas em evidência, a ponto de falar-se que eles moldam, interferem e, de um certo modo, até antecipam o conteúdo das leis tributárias”. (CARRAZZA,. Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 57).
Analisando a alteração empreendia pela Emenda Constitucional nº 03/93, em
relação ao princípio da segurança jurídica, observa Roque Carrazza421:
Em suma, emenda constitucional que desconsidere este postulado (como, sem dúvida, fez a Emenda Constitucional 3/1993) atropela garantia do contribuinte e, nesta medida, violenta a ‘cláusula pétrea’ do art. 60, § 4º, IV das Leis das Leis (‘não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais’).
Neste contexto, à ofensa ao princípio da segurança jurídica está justamente na
exigência do ICMS sobre um fato futuro, por isso, presumido, o que segundo Roque
Carrazza422, “já agride, de modo incontornável, o magno princípio da segurança
jurídica”.
A não restituição dos valores também ofende a não-cumulatividade, pois, é
certo que se o contribuinte estivesse sujeito ao regime normal de tributação (sem
sujeitar-se a substituição tributária progressiva), a ele assistiria o direito de recolher o
ICMS apenas sobre a diferença apurada entre as compras e as vendas.
De todo o arrazoado, tem-se que, a aceitação da repercussão geral no RE
593.849-2/MG, sobre o direito de restituição dos valores recolhidos a maior na
substituição tributária, apresentou-se com uma luz no fim do túnel para milhares de
contribuintes que aguardam ansiosamente uma decisão favorável por parte do STF.
Entretanto, após o caminho percorrido até aqui, pode-se dizer que o alcance e
o conteúdo do § 7º do art. 150 decorre de uma interpretação sistemática da
Constituição, cujo resultado só pode ser, o de se permitir aos contribuintes a
restituição dos valores recolhido a maior, decorrentes do cálculo da substituição
progressiva do ICMS, prestigiando os princípios aqui expostos.
421 CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. 17ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 61. 422 CARRAZZA. Op. cit., p. 61.
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A partir da análise empreendida, podem se deduzir, algumasassar-se-á às
considerações.
De plano, se analisou o sistema constitucional tributário, que rege as relações
entre o sujeito ativo (Estado) e o sujeito passivo (contribuinte e responsável).
A nossa Constituição, diferentemente do que ocorre em outros países, é
extensa na prescrição de normas tributárias, o que por certo, limita a liberdade do
legislador infraconstitucional.
Por adotar a forma Federal de Estado, as competências tributárias estão
repartidas entre a União, os Estados e os Municípios, o que garante autonomia para
que estes possam instituir os seus tributos, mas, sempre adstritos às normas
constitucionais.
Assim, coube aos Estados a competência para instituir o ICMS (art. 155, II, CF).
O ICMS é um imposto complexo, pois, além de conter hipóteses tributárias
distintas (operações com mercadorias; prestações de serviço de transporte
interestadual e intermunicipal; prestação de serviço de comunicação; operações com
combustíveis, lubrificantes e energia elétrica; operações com minerais), a legislação
infraconstitucional que o rege é complexa e extensa (lei Complementar, leis ordinárias,
decretos, portarias, resoluções, convênios, protocolos, etc.).
Por dedicar importante espaço a matéria tributária, em especial ao ICMS, toda
legislação infraconstitucional elaborada deve guardar pertinência com as regras e
princípios ali dispostos.
Os princípios, como se verificou no presente estudo, são linhas diretivas, meta,
fundamento da ordem jurídica, que orientam a realização dos valores dispostos na
nossa Constituição.
A análise empreendida sobre os princípios destacados (capacidade
contributiva, moralidade, vedação ao confisco, não-cumulatividade, segurança
jurídica), tiveram como objetivo alicerçar o presente estudo.
O princípio da capacidade contributiva, é sem dúvida, aquele que melhor
assegura a limitação do poder de tributante, isso porque, no direito tributário ele é o
realizador, o promotor do princípio da igualdade.
Por meio dele, o legislador deve escolher como signos presuntivos de riqueza
da hipótese tributária, renda ou capital acima do mínimo necessário para a existência
digna das pessoas ou para o desenvolvimento da atividade empresarial.
Também, em virtude da capacidade contributiva, o legislador deve agir com
parcimônia na utilização de presunções ou ficções e até mesmo na atribuição de
responsabilidade do tributo à terceiros, a fim de não distorcer a realidadeda operação
praticada.
O princípio da moralidade, embora previsto no art. 37 do texto constitucional, é
pouco invocado para a resolução de questões tributárias, e essa deficiência ocorre
em virtude da sua identificaçãoconexão com a ideia com o princípio da de i legalidade.
Diante dessa constatação, procurou-se no presente estudo, ampliar a visão
sobre a aplicação do referido princípio para além de uma análise formalista da lei,
imprimindo-lhe contornos mais abrangente.
O princípio da moralidade está conectado com os princípios da lealdade e da
boa-fé que a Administração deve exercer em todas as esferas em que atua.
Assim, este princípio, pode e deve ser considerando tanto na execução, quanto
na elaboração e interpretação das normas, auxiliando na realização dos valores
constitucionais, como por exemplo, a justiça e o desenvolvimento.
No âmbito tributário, embora, o princípio da moralidade devae orientar tanto a
atividade exercida pelo administrado, quanto pela Administração Pública – a essa –
sua observância é indeclinável, uma vez , que deve agir em todas as esferas em que
atua em nome de toda a coletividade pautada pela ética.
a) embora possuindo diversos caminhos para, por exemplo, exigir obrigações
do contribuinte, opte pelo mais simples, menos burocrático (fundamento
para o princípio da praticabilidade);
b) ao invés de criar leis complexas, simplifica, ( editando leis compreensíveis
a todos);
c) exija os tributos,, considerando de acordo com as particularidades de cada
tributo,-o mais próximo possível o princípio da capacidade contributiva;
d) nas diversas interpretações possíveis da norma, adote a que mais beneficia
o contribuinte;
e) simplifica e agiliza o direito de restituição, a que o contribuinte tenha direito,
em vez de lhe criar embaraços.
A vedação ao confisco juntamente com o princípio da capacidade contributiva,
fornecem a segurança jurídica necessária aos administrados de que a intromissão no
seu patrimônio via tributação deve ser proporcional, razoável, de tal forma que não
inviabilizem as suas atividades.
O princípio da segurança jurídica em matéria tributária, visa dar estabilidade as
relações praticadas entre o Estado e o sujeito passivo.
No âmbito do ICMS, o princípio da não-cumulatividade, visa evitar o efeito
cascata que o imposto teria, se cumulativo fosse, logo, ao não se respeitar a não-
cumulatividade o Estado acabe imprimindo efeitos indesejáveis a essa espécie
tributária.
Na sequência do estudo, analisou-se a Lei Complementar, pois, a essa espécie
normativa a Constituição reservou o disciplinamento várias matérias inerentes ao
ICMS, em especial, a substituição tributária.
Mesmo com a autorização para disciplinar as matérias atinentes ao ICMS, certo
é que, a lei complementaressa espécie normativa estará deve ter como parâmetro as
normas já dispostas nadstrita a Constituiçãoo texto constitucional, sob pena de
inconstitucionalidade dos seus comandos..
À Lei Complementar nº 87/96, coube o disciplinamento do ICMS, entretanto,
uma análise detalhada dos seus artigos revela que ela limitou direitos resguardados
no texto constitucional; ademais, delegou a outros atos normativos a tratativa de
assuntos constitucionalmente dispensados a ela.
A incidência do ICMS, foi analisada a partir da estrutura da regra matriz de
incidência tributária, que apresenta de um lado, a descrição normativa do fato,
representado pelo “descritor”; e do outro, a relação jurídica tributária que se
estabelece, representada pelo “prescritor”.
Em relação a substituição progressiva do ICMS, a análise dos critérios
constantes no prescritor: pessoal (com ênfase no sujeito passivo) e quantitativo (no
que diz respeito a base de cálculo) foram fundamentais para compreensão de dois
aspectos:
1) quem pode ser colocado no polo passivo da obrigação tributária;
2) qual a medida adequada para a base de cálculo.
O sujeito passivo encontra-se definido no art. 121 do CTN, dividido entre
contribuinte e responsável.
O contribuinte, embora não definido no texto constitucional, é passível de
apreensão a partir do critério material do tributo, logo, quando o art. 155, II, dispôs que
compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre operações relativas
à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte
interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as
prestações se iniciem no exterior; indicou as pessoas suscetíveis de serem
contribuintes do ICMS.
Entretanto, embora a figura do contribuinte seja de fácil identificação a partir do
critério material da hipótese tributária, certo é que, a lei pode atribuir a outras pessoas
o dever de recolhimento do tributo, o chamado “responsável tributário”.
Conforme se verificou, a responsabilidade tributária em sentido amplo está
prevista no CTN, especificamente nos arts. 128 a 138 e apresenta duas modalidades:
a responsabilidade por substituição, em que a lei desde o início estabelece que o
terceiro será o recolhedor do tributo; e, a responsabilidade por transferência, em que
a atribuição depois de ter nascido contra uma pessoa determinada, é transferida à
outra pessoa, pela ocorrência de um fato posterior previsto em lei.
A responsabilidade sobre qual se debruçou o presente estudo, é a
responsabilidade por substituição inerente ao ICMS, na modalidade progressiva, que
desde 1993 possui fundamento específico, no § 7º do art. 150 da CF.
Entretanto, ressalta-se, que coube a Lei Complementar nº 87/96, o
disciplinamento do regime da substituição tributária do ICMS.
Conforme se destacou no presente estudo, o regime da substituição tributária
do ICMS apresenta três espécies,: substituição concomitante, regressiva ou “para
trás” e substituição tributária progressiva ou “para frente”.
A substituição tributária concomitante (atribuição de responsabilidade pelo
pagamento do imposto a terceiro, quando da ocorrência do fato jurídico tributário); e,
a substituição tributária regressiva (atribuição de responsabilidade pelo pagamento do
ICMS a terceiro situado na etapa seguinte de comercialização) não suscitam maiores
dúvidas ou discussões.
É que nesses casos, mesmo ocorrendo a atribuição de responsabilidade pelo
pagamento do ICMS a um terceiro; a estrutura da regra matriz de incidência, bem
como os princípios gerais que norteiam o imposto são respeitados; não distorcendo a
realidade das operações e prestações praticadas.
Por sua vez, a substituição tributária progressiva ou para frente, consiste na
antecipação do recolhimento do imposto sobre fatos futuros, fatos passíveis de
realização, e, embora atípica a tributação sobre “fato futuro”, ela encontra-se prevista
no texto constitucional, conforme já salientado.
Para que a substituição tributária progressiva possa se realizar, é necessário
que a lei estabeleça mecanismos de presunção, sem os quais, não seria possível ao
responsável por substituição proceder o recolhimento do imposto.
Esses mecanismos de presunção foram, em certa parte dispostos na Lei
Complementar nº 87/96 (art. 8º), que estabelece diversas formas de se apurar a base
de cálculo do ICMS ST: fixação de preços por órgão público competente
(medicamentos); preço final a consumidor sugerido pelo fabricante (venda por
catálogos, denominada venda porta-a-porta); preço a consumidor final usualmente
praticado no mercado (bebidas); e, por fim, a forma mais comum, a utilização de
margens de valor agregado (MVA).
Embora, todas as formas apresentadas para se apurar a base de cálculo da ST
sejam presumidas, pois, não há como se afirmar que essa será a base real do ICMS
a ser praticada no futuro; é, sem dúvida, a fixação de margens via ato do poder
executivo dos Estados, a que de longe maiores distorções apresenta.
A MVA, de acordo com o disposto na Lei Complementar nº 87/96, é
estabelecida com base em preços usualmente praticados no mercado considerado,
obtidos por levantamento, ainda que por amostragem ou através de informações e
outros elementos fornecidos por entidades representativas dos respectivos setores,
adotando-se a média ponderada dos preços coletados, devendo os critérios para sua
fixação ser previstos em lei.
Entretanto, tais critérios não estão fixados em lei, mas sim, no Convênio ICMS
nº 70/97, que traz a metodologia que deve ser adotada para se chegar na MVA de
cada produto.
Trata-se de flagrante ofensa ao princípio da legalidade, bem como dos demais
princípios constitucionais (capacidade contributiva, segurança jurídica), uma vez que,
ao não terem os critérios fixados por lei, que notadamente exige critério formal mais
rígido para a sua aprovação e maior controle, a determinação da MVA passa a ter
controle duvidoso.
Assim, o regime da substituição tributária progressiva, se dá de maneira
extremamente complexa para os sujeitos passivos.
A sua adoção e utilização não é nova no ordenamento jurídico brasileiro, se
fazendo presente desde o Código Tributário Nacional, passando pelo Decreto-Lei nº
406/68, o polêmico Convênio ICMS nº 66/88 e a Lei Complementar nº 87/96.
Os argumentos para a sua instituição sempre foram pró-fisco: evitar a
sonegação, facilitar a fiscalização, tornar eficiente a arrecadação do ICMS; atributos
que hoje são incorporados a definição do chamado “princípio da praticabilidade
tributária”.
Contudo, não se pode em nome da praticabilidade, criar ficções, presunções
que claramente ofendam e desrespeitem os demais princípios que norteiam a
tributação, pois, flagrante seria o prejuízo aos sujeitos passivos da relação jurídica
tributária.
Até aqui, percebe-se, que o instituo da substituição tributária progressiva, longe
de facilitar, simplificar, acaba por complicar e confundir os administrados obrigados a
utilizá-la.
A utilização de base de cálculo presumida – algumas vezes até fictícia (muito
aquém da realidade) - não pode prosperar de maneira definitiva.
Como se verificou no presente estudo, o seu cálculo exige que sujeito passivo
conheça diversos atos normativos e dos mais diferentes Estados; isso, porque a Lei
Complementar nº 87/96 ao dispor sobre a matéria, acabou por delegar aos Estados e
ao Assembleia Legislativa dos Estados ( CONFAZ) (convênios e protocolos) essa
importante atribuição, o que foi suficiente para criar aos substitutos tributários
dificuldades para operacionalizar com suas mercadorias, especialmente, nas
operações entre Estados.
Apesar da deficiência que a substituição tributária progressiva apresenta, ela
se faz presente no ordenamento jurídico, principalmente após ainda mais depois daa
alteração empreendida pela Emenda Constitucional nº 03/93.
A referida emenda inseriu o § 7º ao art. 150, dispondo sobre a atribuição de
responsabilidade sobre fato gerador futuro.
Assim, os diversos questionamentos na esfera judicial pedindo a sua
inconstitucionalidade, não obtiveram êxito.
Ainda, que se tenha validado a substituição tributária progressiva, os problemas
em relação a ela permanecem, em especial, pela utilização de base de cálculo
presumida.
Para que fosse possível antecipar e exigir o recolhimento do ICMS referente a
operação futura, o legislador teve que estabelecer métodos de cálculo com base em
presunções.
Por isso, apresentou-se no presente trabalho, os diversos métodos dispostos
na legislação do ICMS que determinam a apuração da chamada “base de cálculo do
ICMS ST”, que é justamente a base de cálculo utilizada para aferir o “ICMS
Substituição Tributária”, conhecido como “ICMS ST”.
O problema reside justamente na apuração da base de cálculo do ICMS ST,
que na maioria das operações, é identificada a partir da aplicação da MVA estipulada
pelo Estado sobre o valor da operação praticado pelo substituto (responsável por
calcular e recolher o ICMS ST).
Ocorre que, essa base de cálculo é apurada quando da saída da mercadoria
do primeiro estabelecimento da cadeia de comercialização de mercadorias
(normalmente o industrial ou importador), ou seja, apura-se o ICMS antes das demais
etapas de comercialização ocorrerem (distribuidor varejista consumidor final).
Após, o cálculo realizado pelo substituto, a mercadoria segue para
comercialização até que atinja a etapa em que é vendida para o consumidor final
(considerado como aquele que não irá revender o produto, nem o aplicará-lo em
processo de industrialização), momento em que se encerra definitivamente a
operação.
Exatamente nesse momento em que a mercadoria é vendida para o
consumidor final, é possível afirmar que ocorre o último fato jurídico tributário passível
de tributação, ou seja, que se consuma o chamado “fato gerador presumido”.
Por isso, nesse instante é possível averiguar se o valor praticado na venda para
o consumidor final foi igual, menor ou maior àquele que foi utilizado pelo substituto
para aferir a base de cálculo do ICMS ST.
Dificilmente o valor será o mesmo, isso, porque embora a substituição tributária
se insira num contexto jurídico tributário, é a lei da oferta e da procura (aspectos
econômicos) que dita o preço dos produtos.
Para responder a essa questão, percorreu-se um longo caminho dentro do
presente estudo: sistema constitucional com ênfase nos princípios, regra matriz de
incidência do ICMS, responsabilidade tributária, substituição tributária, ou seja,
amparou-se o trabalho de conteúdo legislativo e doutrinário.
Por último, mas não menos importante, analisou-se a jurisprudência sobre o
assunto, e, verificou-se que ela, a par de resolver o questionamento, suscitou
entendimento equivocado por parte dos Estados.
Isto porque, em 2002, o STF, julgou a ADI 1.851-4/AL, em que se questionou a
validade da cláusula segundo do Convênio ICMS nº 13/97, que determina a não
restituição ou complementação do ICMS nas operações sujeitas a substituição
tributária progressiva, com valor inferior ou superior àquele estabelecido com base no
artigo 8º da Lei Complementar 87/96.
Nessa decisão, ficou assentado que a cláusula segunda do referido Convênio
não ofende o § 7º do art. 150 da CF, que assegura a imediata e preferencial restituição
da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.
Isso porque, no entendimento da maioria dos ministros, o fato gerador
presumido previsto na redação do § 7º do art. 150 é definitivo e não provisório, exceto,
na hipótese de sua não realização (furto, roubo, deterioração, extravio, etc.).
O que ocorre é que a partir desta decisão, diversos Estados, inclusive àqueles
não signatários do Convênio ICMS nº 13/97, revogaram as suas legislações internas
que traziam a previsão de restituição do valor recolhido a maior, caso a base de
cálculo real fosse inferior a base de cálculo presumida no cálculo da substituição
tributária progressivasubsequente. Eis, o motivo, do entendimentos equivocados.
Conclui-se que a intepretação de que o fato gerador presumido previsto no §
7º é definitivo, é dar uma interpretação restritiva ao comando.
Da análise empreendida no presente estudo, pode-se afirmar que a não
restituição da diferença apurada dos valores quando da adoção de base da base de
cálculo presumida que ao final da etapa de comercialização se realiza por um valor
inferior, ofende instantaneamente, os princípios:
a) da capacidade contributiva: exige-se o tributo, no caso o ICMS, sobre um
valor presumido/fictício, que não condiz com a realidade; ademais, ficou
assentado na pesquisa realizada, que nos casos de substituição tributária,
a capacidade contributiva a ser considerada não é do responsável
(substituto), mas sim do contribuinte (substituído);
b) da moralidade: ao interpretar-se restritivamente o § 7º, os ministros
restringiram um direito que deveria ter sido ampliado, pois, ainda que não
fosse prevista a restituição dos referidos valores, moralmente ela deveria
acontecer, em respeito aos contribuintes; ademais, importante destacar,
que também cabe ao judiciário exercer o controle sobre leis que
sabidamente são imorais, embora legais;
c) da segurança jurídica: num primeiro momento se restituía, depois, passou-
se a não restituir, ou seja, alteraram-se as regras no meio jogo;
d) da não-cumulatividade: ora, ao não restituir os valores recolhidos a maior, o
ICMS assume efeito cumulativo, o que prejudica o desenvolvimento da
atividade comercial e faz com que o preço do produto se eleve; o prejuízo é
de todos, e, por fim;;
e) da vedação ao confisco: a tributação excessivamente onerosa, prejudica o
desenvolvimento das atividades, à livre iniciativa, por isso, a não restituição,
nessa medida, assume efeitos confiscatórios. O Estado fica com um valor
que não lhe pertence.
Como ficou evidente no presente estudo, a não restituição do ICMS nas
operações sujeitas ao regime da substituição tributária progressiva causas não
apenas prejuízos não apenas jurídicos, mas também econômico aos contribuintes.
Por isso, em 2009, o tema da restituição chegou novamente ao STF (RE
593.849-2/MG), aceito pelo rito da repercussão geral.
Trata-se de um importante passo para novamente se colocar o tema, sob a
perspectiva de uma análise real, concreta (controle concentrado de
constitucionalidade), diferentemente do que ocorreu na ADI 1.851-4/AL (controle
difuso); ademais a decisão prolatada orientará não só outros questionamentos sobre
o mesmo tema que se encontram pendentes de decisão no STF, quanto aos Estados
e todos aos demais contribuintes.
Neste processo, já há manifestação favorável da Procuradoria Geral da
República pela restituição do valor recolhido a maior, quando o fato gerador definitivo
se apresentar distinto do fato gerador presumido.
Assim, se c
Por isso, espera-se que a decisão a ser prolatada pelo STF, volte a restabelecer
a segurança jurídica, garantido aos contribuintes, o direito antes assistido, de reaver
os valores do ICMS recolhido a maior decorrente do mecanismo de cálculo exigido
para se apurar a base de cálculo da substituição tributária progressiva.
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