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FACULDADES DE ENSINO SUPERIOR DA PARAÍBA CURSO DE BACHARELADO EM DIREITO
DOUGLAS SANTOS DE ARAUJO
FILOSOFIA JURÍDICA: O PROBLEMA DA VIRTUDE E DA JUSTIÇA NA POLÍTICA DO PERÍODO DA IDADE ANTIGA À IDADE MODERNA
CABEDELO - PB 2017
DOUGLAS SANTOS DE ARAUJO
FILOSOFIA JURÍDICA: O PROBLEMA DA VIRTUDE E DA JUSTIÇA NA POLÍTICA DO PERÍODO DA IDADE ANTIGA À IDADE MODERNA
Trabalho de Conclusão de Curso em forma de Artigo Científico apresentado à Coordenação de Curso de Bacharelando em Direito, da Faculdade de Ensino Superior da Paraíba – FESP-FACULDADES, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito. Área: Filosofia Jurídica Orientador: Prof. Dr. Daniel Alves Magalhães
CABEDELO - PB 2017
DOUGLAS SANTOS DE ARAUJO
FILOSOFIA JURÍDICA: O PROBLEMA DA VIRTUDE E DA JUSTIÇA NA POLÍTICA DO PERÍODO DA IDADE ANTIGA À IDADE MODERNA
Artigo Científico apresentado à Banca Examinadora de Artigo Científico da Faculdade de Ensino Superior da Paraíba – FESP, como exigência para a obtenção do grau de Bacharel em Direito.
APROVADO EM ____/______2017
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________
Prof. Dr. Daniel Alves Magalhães ORIENTADOR - FESP
_________________________________________
Esp. Ricardo Sérvulo Fonseca da Costa MEMBRO - FESP
_________________________________________
Dr Gustavo Guimarães Lima MEMBRO - FESP
AGRADECIMENTOS
Gostaria, primeiramente, de agradecer ao Deus vivo que sempre na minha
vida e da minha família, nos dá força e coragem para que possamos carregar a
nossa cruz.
Não menos importante venho agradecer a minha mãe, por seus exemplos
virtuosos de justiça e honestidade para com o próximo e o seu companheiro, meu
pai.
Agradeço, também, as minhas irmãs, e em especial, minha irmã Fabiana que
cuidou de mim como um filho e sempre esteve presente na motivação para fazer o
curso de Direito.
A minha tinha Maria Darlene e Manuel de Castro e sua família, que me deram
apoio de extrema importância para conclusão neste curso de Direito, haja vista que
me encontrava em um vale, mas com o apoio da família e de Deus consegui passar.
Agradeço, também, a minha pátria amada que me deu meios necessários
para viver uma vida digna, numa sociedade onde quase nada ou nada de virtude
vinda dos nossos representantes.
E por fim, e também não menos importante, ao meu orientador professor
Daniel Alves Magalhães, que me mostrou o caminho da filosofia no princípio do
curso de Direito e que vem me ajudando em meio a tantas dificuldades na
elaboração deste trabalho.
Os que disseram que uma cega fatalidade produziu todos os efeitos que vemos no mundo disseram um grande absurdo; pois que maior absurdo há do que uma fatalidade cega que tivesse produzido ceres inteligentes?
(Montesquieu)
SUMÁRIO
1 CONSIDERAÇÕES INCIAIS...................................................................... 06
2 A VIRTUDE E JUSTIÇA NA POLÍTICA NA IDADE ANTIGA.................... 08
2.1 OS SOFISTAS: OS PRIMEIROS MESTRES NA
ARTE DA ARGUMENTAÇÃO..................................................................... 08
2.2 SÓCRATES: A VIRTUDE ÉTICA................................................................ 10
2.3 PLATÃO DE ATENAS: REI FILÓSOFO PARA A JUSTIÇA........................ 11
2.4 ARISTOTELES: O HOMEM COMO ANIMAL POLÍTICO........................... 14
3 A VIRTUDE E A JUSTIÇA NA POLÍTICA DA IDADE MÉDIA.................. 16
3.1 TOMÁS DE AQUINO: A TEORIA DO DIREITO DIVINO DE GOVERNAR. 17
4 A VIRTUDE E A JUSTIÇA NA IDADE MODERNA.................................... 18
4.1 NICOLAU MAQUIAVEL: O PRINCIPE VIRTUOSO.................................... 18
4.2 THOMAS HOBBES: O ESTADO PARA DOMAR O LOBO DO PRÓPRIO
HOMEM....................................................................................................... 19
4.3 JEAN JACQUES ROUSSEAU: O ESTADO DE NATUREZA..................... 21
4.4 MONTESQUIEU: A DIVISÃO DOS PODERES.......................................... 22
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................... 24
REFERÊNCIAS.......................................................................................... 26
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FILOSOFIA JURÍDICO: O PROBLEMA DA VIRTUDE E DA JUSTIÇA NA POLÍTICA DO PERÍODO DA IDADE ANTIGA À IDADE MODERNA
DOUGLAS SANTOS DE ARAUJO* DANIEL ALVES MAGALHÃES**
RESUMO
Este artigo tem o objetivo de abordar como a virtude e a justiça era tratada na política e como problemática em ponto de partida o seguinte questionamento: Como fazia o entendimento no antigo mundo grego, na idade média e na idade moderna sobre a virtude e justiça na política? Buscamos explicações com os filósofos e autores da Grécia Antiga até os renascentistas, sendo abordado o período da idade antiga à idade moderna, tendo como suma compreender como a virtude e justiça eram interpretadas, estudadas e aplicadas em cada um desses tempos por meio de obras de autores conhecidos e estudados até hoje, como por exemplo: Platão, Tomas de Aquino e Montesquieu. A metodologia utilizada para essa pesquisa foi por meio de bibliografias desses escritores, assim como escritores da ciência política do nosso tempo que nos ajudam a compreender esses autores e suas obras e como a virtude e justiça eram entendidas nas formas de governos democráticos, despóticos e monárquico. O resultado que mais importa neste presente trabalho é demonstrar como a virtude, justiça e política foram tratadas por autores como Aristóteles, São Tomás de Aquino, Tomas Hobbes, entre esses e os já citados anteriormente, que trataram sobre o assunto e que descrevem de formar diversa a virtude e justiça no sentido político e comportamental do indivíduo Palavras-chave: virtude. justiça das leis. virtude socrática. virtude e justiça para Montesquieu. 1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Ao definir filosofia política, no início desta pesquisa, percebamos que
diversas questões desdobram-se deste conhecimento, tais como: Qual seu objeto de
estudo? Qual a sua distinção e aproximação da ciência política? No significado
clássico moderno a palavra política tem sua origem na palavra grega polis, mais
especificamente na palavra politikós, que em strictu sensu se refere ao urbano, ao
* Aluno concluinte do Curso de Bacharelado em Direito da Fesp-Faculdades, do semestre 2017.2. E-
mail: douglas-santosaraujo@Outlook.com ** Professor de Filosofia Geral da Fesp-Faculdades. Especialista em Avaliação do Ensino Superior,
em 1999, pela Universidade de Brasília (UnB); Mestrado em Filosofia, em 2001, pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB); Doutorado em Educação, em 2008, pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) Atuou como orientador desse TCC. E-mail: danielmagalhasm@bol.com.br
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qual é civil e social, ao que é público, ou seja, relaciona-se com a cidade e a tudo o
que lhe diz respeito. Está muito ligado à ideia de poder.
A política possui sua ciência, a chamada ciência política. Os elementos
históricos que a humanidade denota mostram que o termo “ciência política” surgiu
com o pensamento de Nicolau Maquiavel. Entretanto, é inegável que a política era
discutida antes do pensador florentino.
Portanto, se considerarmos que ciência política tem o seu nascedouro,
terminologicamente, com o pensamento de Maquiavel, há que se considerar que o
pensamento político teve seus precursores, desde a mais alta antiguidade clássica,
principalmente desde Sócrates, Platão e Aristóteles, os assuntos políticos
impressionam o gênero humano, sequioso de conhecê-lo e aprofundá-los.
Feitas essas considerações, pretendemos apresentar o pensamento dos
filósofos políticos. Sabemos que é difícil a tarefa de descriminar quem são os
cientistas políticos e quem são os filósofos políticos. Não pretendemos propor tal
distinção, ficando o convite a conhecer o pensamento político da época proposto
pelos pensadores de cada período, sendo que todos têm uma base filosófica e um
conhecimento político.
Assim, o objetivo desta pesquisa, em última análise, é fornecer uma visão
clara do que seja um bom governo, que promova o bem comum. Mesmo que a
análises da história tenhamos um mau governo retrado, é a filosofia política que
apresentará críticas e modelos que devem ser seguidos a fim de buscar o já citado
bem comum.
A metodologia mais adequada aplica nesta pesquisa, constitui aquela que
não propicia apenas uma análise lógico-sistemática de determinada teoria ou
doutrina política, por mais que atraente que seja, mas uma rigorosa investigação dos
resultados concretos da aplicação de tal doutrina na prática, pois a política é como a
física, não há senão uma boa experimentação. Diante dessa assertiva, pode-se
perguntar: qual é o campo da experiência da política? Respondendo podemos
dizermos que: a história é a política experimental.
Daí dedicar-se tanto espaço à história das ideias políticas, em função das
realidades vividas, metodologia segura para afastar todo abstracionismo.
Raciocinando por analogia, podemos prever com certa segurança o que decorrera
hoje da aplicação de determinada teoria ou prática política que produziu tais ou
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quais efeitos no passado, feitas as devidas adaptações, a metodologia que
utilizaremos nesta pesquisa é, pois, o histórico-comparativo.
Assim, dividimos este trabalho, que tem como título, filosofia política: o
problema da virtude e da justiça na política do período da Idade Antiga à Idade
Moderna, em três tópicos: no primeiro que tem como título, a virtude e a justiça na
política na Idade Antiga, onde trataremos a virtude e justiça no entendimento dos
pensadores gregos.
No segundo tópico, que tem como título, a virtude e justiça na política na
Idade Média, realizamos uma breve passagem da política mesclada com a
influência do cristianismo na política. Enfim, no terceiro e último tópico, que tem
como título, a virtude e a justiça na Idade Moderna, analisaremos o que venha ser
um governo Virtuoso e a formar adequada de governar para que se tenha um
Estado Justo e equilibrado.
2 A VIRTUDE E JUSTIÇA NA POLÍTICA NA IDADE ANTIGA
Sob o comando do general Péricles, e tendo se beneficiado pela migração de
milhares de gregos de localidades na Magna Grécia (que era a designação da
região do sul da Itália) invadida pelos os persas, Atenas havia se tornado um
poderoso centro econômico. Atenas, por isso, era integrada por pessoas de diversas
culturas, que ajudavam a enriquecer a sociedade grega.
Mais que isso, Atenas estava sob regras políticas avançadas para a época.
Os cidadãos (habitantes que não fossem nem estrangeiros, nem escravos) eram os
que decidiam, em discussões públicas, as questões importantes para a
administração das comunidades. Nessas discussões, a habilidade da oratória era
importante para a formação de seguidores, de modo a fazer aprovar projetos.
2.1 OS SAFISTAS: OS PRIMEIROS MESTRES NA ARTE DA ARGUMENTAÇÃO
A partir dos Sofistas, o homem substitui a natureza como objeto principal da
reflexão filosófica. A filosofia torna-se antropológica, podemos dizer. A crítica social
e as discussões sobre as relações entre o homem e o Estado tornam-se primordiais,
principalmente na democracia da cidade de Atenas, no século V a.C. Ética e Política
passam a dominar agora a filosofia, em contraposição ao espírito de investigação da
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natureza dos pré-socráticos. Como afirma Jaeger (1989, p. 241), a sofistica não é
um movimento científico: “mas sim a invasão do espírito da antiga física e história
dos Jônicos por outros interesses da vida e sobretudo pelos problemas pedagógicos
e sociais que surgiram em consequências da transformação do estado econômico e
social”. Dessas transformações sociais podemos lembrar o grau de desenvolvimento
jurídico alcançado pelos gregos nesta época e o direito torna-se essencial como
princípio fundado na lei, em um sentido universal e abstrato.
Os sofistas são muitas vezes classificados como céticos, porque
desprezavam as discussões filosóficas que consideravam desnecessárias, para as
quais não se poderiam encontrar respostas ou soluções. Para muitos, os sofistas
fundam na filosofia um reino de relativismo filosófico e subjetivismo, pois o homem
passa a ser a medida de todas as coisas.
Quanto a esse aspecto, Castilho (2017, p. 45) afirma que: “Protágoras, o
idealizador da sofística, dizia que uma ideia só ganhava força quando era
compartilhado. Justamente por isso pregava a necessidade de um discurso forte e
convincente”. Assim, a participação dos cidadãos crescia, cada vez mais, na
administração das cidades. Era, praticamente, a decadência da aristocracia e o
alvorecer da democracia.
A modificação nos hábitos políticos, que resultaria em mudanças de costume
e até de atitudes, deixou clara a necessidade de investimento na educação do povo.
Os sofistas, considerados mestres da sabedoria, surgiram nesse período, tendo
como meta humanizar a cultura, ou seja, mostra de que modo, na prática, o homem
pode se beneficiar dos achados filosóficos.
Assim, passaram a pregar a responsabilidade do homem no cumprimento do
que fosse realmente justo (CASTILHO, 2017). Coube aos sofistas, no século V a.C.,
a função de justificar o ideal democrático. Foram eles que elaboraram teoricamente
e legitimaram o ideal democrático da nova classe em ascensão, a dos comerciantes
enriquecidos, os quais, desde que fossem cidadãos da polis, tinham direitos ao
exercício do poder.
A virtude (areté) da aristocracia guerreira opuseram a virtude do cidadão: a
principal delas é a justiça. Enquanto na aristocracia predominava a areté ética,
restrita à excelência do nobre guerreiro, no novo modelo a justiça tornou-se política
e mais objetiva que a anterior, pois o critério do justo e do injusto sustentava-se na
lei escrita, válida para todo cidadão.
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Como mestres da nova areté política, os sofistas recorreram à retórica, que é
a arte de bem falar, de utilizar a linguagem em um discurso persuasivo. É bem
verdade que essa educação não se destinava ao povo em geral, mas à elite
intelectual, àqueles bons oradores que poderiam nas assembleias públicas, fazer
uso da palavra livre e pronunciar discursos convincentes e oportunos.
Com o brilhantismo da participação no debate público, deslumbravam os
jovens do seu tempo. Os sofistas desenvolveram então o espírito crítico e
aprimoraram a expressão. A esse respeito, Jaeger (1989, p. 316), enfatiza que a
noção de virtude como virtude política era vista pelos sofistas, sobretudo como
aptidão intelectual e oratória, o que nas novas condições do século V a.C. era o
decisivo.
Entre os sofistas mais conhecidos que viveram no século V a.C., podemos
destacar Protágoras, Górgias, Hipias, Pródico, Crítias Antifonte e Trasímaco. Sobre
estes sofistas, possuímos apenas fragmentos de suas obras, o que torna difícil uma
abordagem profunda de seu pensamento.
2.2 SÓCRATES: A VIRTUDE ÉTICA
Sócrates viveu entre 470 e 399 a.C. e representou o novo pensamento grego,
uma revolução filosófica que ainda hoje influencia e inspira os pensadores. Era
pobre, filho de uma parteira. Não criou uma escola. Ensinava onde pudesse reunir
seus alunos. Sócrates percorria a cidade de Atenas, praticando a sua técnica do
diálogo com os jovens, sempre em lugares públicos. Essa técnica, chamada de
Ironia e Maiêutica, ou parto de ideias, consistia em manter um diálogo irônico que
conduzia o interlocutor a aprender e a atingir conclusões.
Seu pensamento tinha uma sólida base ética. Achava que o homem chegava
a ser virtuoso quando alcançava o conhecimento e em decorrência do conhecimento
inclinava-se à obediência da lei – para Sócrates, a obediência à lei era o que
diferenciava o homem civilizado do bárbaro (CASTILHO, 2017). Sócrates é uma das
figuras de maior importância e talvez a mais polêmica e enigmática da filosofia
ocidental, mesmo sem nada ter escrito. Sua filosofia, seus ensinamentos e sua vida
nos sãos transmitidos por seus discípulos, principalmente por intermédio dos
Diálogos de Platão. Isso nos traz muita dificuldade em precisar o sentido de sua
filosofia, tanto que podemos falar de vários Sócrates: o Sócrates histórico, que teria
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realmente existido; o Sócrates platônico, personagem dos Diálogos de Platão
(REALE, 2002, p. 77).
Assim, inúmeros são os diálogos em que Platão descreve as discussões de
Sócrates a respeito das virtudes e da natureza do bem. Neles, ressalta a convicção
de que a virtude se identifica com a sabedoria e o vício com a ignorância: portanto, a
virtude pode ser apreendida.
Na célebre passagem de A República em Platão descreve a alegoria da
caverna, reaparece essa ideia: “o sábio é o único capaz de se soltar das amarras
que o obrigavam a ver apenas sombras e, ao dirigir-se para fora, poder contemplar o
sol que representa a ideia do bem” (PLATÃO, 1983, p. 317).
Portanto, alcançar o bem relaciona-se com a capacidade de compreender
bem. A partir dessa concepção de cidade que imagina em sua obra, a Calípolis
(cidade bela), Platão distingue uma sociedade dividida em três classes sociais: os
governantes, os soldados (guardiões) e os produtores (artesões e comerciantes).
Em cada uma das classes, prevalece um aspecto da alma: o racional para os
governantes, a alma irascível para os guardas e a alma concupiscível para os
produtores (PLATÃO, 1983).
Como só o filósofo atinge o nível mais alto de sabedoria, cabe a ele exercer a
virtude maior da justiça e, portanto, a função de governar. Outras virtudes menores,
mas também importantes para a cidade destinam aos soldados defensores da polis
(a coragem) e aos trabalhadores comuns, artesões e comerciantes (a temperança,
ou moderação). Assim, na concepção de Platão, a cidade perfeita é aquela em que
predominam em cada classe as virtudes citadas e a justiça consiste na harmonia
entre as três virtudes (ARANHA; MARTINS, 2009).
2.3 PLATÃO DE ATENAS: REI-FILÓSOFO PARA A JUSTIÇA
O pensamento político de Platão (427-384 a.C.) está sobretudo nas obras A
República e Leis. Em estilo agradável, muitas vezes, Platão escreve em diálogos,
tendo sempre o seu mestre Sócrates como principal interlocutor.
No livro VII de A República, Platão ilustra o seu pensamento político no mito
da caverna, que resulta da dimensão política surgida da pergunta: Como influenciar
os homens que não veem? Cabe ao sábio ensinar e dirigir. Trata-se da necessidade
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da ação política, da transformação dos homens e da sociedade, desde que essa
ação seja dirigida pelo modelo contemplado.
É nesse sentido que Platão imagina uma cidade utópica, a Calipolis (Cidade
Bela). Platão imagina uma cidade que não existe, mas que deve ser o modelo da
cidade ideal. Partindo do princípio de que as pessoas são diferentes e por isso
devem ocupar funções diversas na sociedade, Platão imagina que o Estado, e não a
família, deveria se incumbir da educação das crianças. Para isso, propõe
estabelecer-se uma forma de governo em que é eliminada a propriedade e a família,
a fim de evitar a cobiça e os interesses decorrentes dos laços efetivos.
O Estado orientaria as formas de eugenia para evitar casamentos entre
desiguais, oferecendo melhores condições de reprodução e, ao mesmo tempo,
criando creches para a educação coletiva das crianças.
A educação promovida pelo Estado deveria, segundo Platão, ser igual para
todos até 20 anos, quando dar-se-ia o primeiro corte identificando as pessoas que,
por possuírem “alma de bronze”, têm a sensibilidade grosseira e por isto devem se
dedicar à agricultura, ao artesanato e ao comércio. Estes cuidariam da subsistência
da cidade.
Outros continuariam os estudos por mais dez anos, até o segundo corte.
Aqueles que tivessem a “alma de prata” e a virtude da coragem essencial aos
guerreiros constituiriam a guarda do Estado, os soldados que cuidariam da defesa
da cidade.
Os mais notáveis, que sobrariam desses cortes, por terem a “alma de ouro”,
seriam instruídos na arte de pensar a dois, ou seja, na arte de dialogar. Estudariam
filosofia, que eleva a alma até o conhecimento mais puro e é a fonte de toda a
verdade.
Aos cinquenta anos, aqueles que passassem com sucesso pela série de
provas estariam aptos a ser admitidos no corpo supremo dos magistrados. Caberia a
eles o governo da cidade, o exercício do poder, pois apenas eles teriam a ciência da
política. Sua função seria manter a cidade coesa. Por serem os mais sábios,
também seriam os mais justos, uma vez que justo é aquele que conhece a justiça. A
justiça constitui a principal virtude, a própria condição das outras virtudes.
Se para Platão a política é a arte de governar e o político é precisamente
aquele que conhece essa difícil arte, só poderá governar quem conhece a ciência
política. Por isso a democracia é inadequada, pois desconhece que a igualdade
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deve se dar apenas na repartição dos bens, mas nunca no igual direito ao poder.
Para que o Estado seja bem governado, é preciso que os filósofos se tornem reis, ou
que os reis se tornem filósofos.
Platão, com sua teoria política, propõe um modelo aristocrático de poder. No
entanto, não se trata de uma aristocracia da riqueza, mas da inteligência, em que o
poder é confiado aos melhores, ou seja, é uma sofocracia.
O rigor do Estado concebido por Platão ultrapassa de muito a proposta da
educação. Se a virtude suprema é a obediência à lei, o legislador tem de conseguir o
seu cumprimento pela persuasão em primeiro lugar, aguardando a atuação
consentida dos cidadãos livres e racionais. Caso não consiga, deve usar a força:
prisão, o exílio ou a morte. Da mesma forma, a censura é justificável quando visa
manter a integridade do Estado. Neste sentido, Platão (1973, p. 224), afirma que:
- Ouve, e considera o caso dos melhores dentre nós. Quando ouvimos Homero ou qualquer outro poeta trágico imitar um herói na dor, o qual, em meio de seus lamentos, se estende em longe tirada, ou canta, ou se golpeia no peito, sentindo, como sabes, prazer, abandonamo-nos para acompanhá-lo com nossa simpatia e, em nosso entusiasmo, louvamos como bom poeta aquele que, no mais alto grau possível, provocou em nós tais disposições. - Sei disso; como poderia ignorá-lo. - Mas, quando um infortúnio doméstico nos fere, já reparaste sem dúvida que temos como ponto de honra manter a atitude contrária, isto é, permanecer calmos e corajosos, porque assim age um homem e porque a conduta que há pouco aplaudimos só convém às mulheres.
Diante do que foi dito acima, podemos perguntar: como a justiça é aplicada na
cidade? Para Platão, cada indivíduo só poderá exercer uma única ocupação, aquela
para a qual se encontre naturalmente habilitado. Sendo assim, a justiça reside em
cada indivíduo, devendo zelar por suas atribuições, pois, deste modo, na cidade,
residirá a justiça como algo que deve ser partilhado por todos, vale dizer, produtores,
guardiões e sábios devem ser justos.
Muitos chamam essa teoria de Platão além de idealista, de utópica, ou seja,
algo inexistente, no caso topos significa lugar e com a partícula u significa sua
negação, em outros termos: um “não lugar”. Quantos aos magistrados, na teoria de
Platão, eles são produtores, guardiões ou filósofos/sábios? Entendemos que os
magistrados devem possuir não apenas uma, nem duas, mas todas as virtudes para
que possam exercer com plenitude o comando da polis. Assim, como para os
filósofos, a sabedoria deve guiar os magistrados para que sejam justos com
conhecimentos verdadeiros e não opiniões.
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2.4 ARISTÓTELES: O HOMEM COMO ANIMAL POLÍTICO
Aristóteles (384-322 a.C.) nasceu em Estagira (daí a forma pela qual também
é conhecido: “O Estagirita”), pode ser considerado como um dos maiores filósofos
da história da Grécia. Foi discípulo de Platão e rompeu com este apresentando sua
própria teoria.
Com isto, Aristóteles critica o autoritarismo de Platão, considerando sua teoria
política uma utopia impraticável e inumana. Recusa a sufocracia platônica que
atribui poder ilimitado a apenas uma parte do corpo social, os mais sábios, o que
torna a sociedade muito hierarquizada. Não aceita a proposta de dissolução da
família nem considera que a justiça, virtude por excelência do cidadão, possa vir
separada da amizade.
Assim, a reflexão aristotélica sobre a política não se separa da ética, pois a
vida individual está imbricada na vida comunitária. Se Aristóteles conclui que a
finalidade da ação moral é a felicidade do indivíduo, também a política tem por fim
organizar a cidade feliz.
Por isso, diante da noção fria de justiça proposta por Platão, Aristóteles
considera que a justiça não pode vir separada da philia. A palavra grega philia,
embora possa ser traduzida por “amizade”, é um conceito mais amplo quando se
refere à cidade. Significa a concordância entre as pessoas que têm ideias
semelhantes e interesses comuns, donde resulta a camaradagem, o
companheirismo. Daí a importância da educação na formação ética dos indivíduos,
preparando-os para a vida em comunidade.
Assim, a amizade não separa da justiça. Essas duas virtudes se relacionam e
se completam, fundamentando a unidade que deve existir na cidade. Se a cidade é
a associação de homens iguais, a justiça é o que garante o princípio de igualdade.
Justo, portanto, é o que se apodera de parte que lhe cabe, é o que distribui o que é
devido a cada um.
Portanto, a justiça está intimamente ligada ao império da lei, pela qual se faz
prevalecer a razão sobre as paixões. Retomando a tradição grega, a lei é para
Aristóteles o princípio que rege a ação dos cidadãos, é a expressão política da
ordem natural.
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Porém, não devemos esquecermos que, mesmo considerando a importância
das leis escritas, Aristóteles valoriza o direito consuetudinário (as leis não-escritas,
trazidas pelo costume). Neste sentido, Aristóteles (1997, 78), afirma que: “Com
efeito, de nada serve possuir as melhores leis, mesmo que ratificadas por todo o
corpo de cidadãos, se estas últimas não estiverem submetidas a hábitos e a uma
educação presente no espírito da Constituição”. O fato de morar na mesma cidade
não torna seus habitantes igualmente cidadãos. Para Aristóteles, é necessário ter
qualidades que variam conforme as exigências da constituição aceitam pela cidade.
Assim, de forma geral, Aristóteles concorda que o bom governante deve ter a
virtude da prudência prática, pela qual será capaz de agir visando o bem comum.
Trata-se de virtude difícil, que não se acha disponível a muitas pessoas na
sociedade.
Por isso, Aristóteles exclui da cidadania a classe dos artesões, comerciantes
e trabalhadores braçais em geral, em primeiro lugar porque a ocupação não lhes
permite o tempo de ócio necessário para participar do governo e em segundo lugar
porque, reforçando o desprezo que os antigos tinham pelo trabalho manual,
Aristóteles pondera que esse tipo de atividade embrutece a alma e torna o indivíduo
incapaz da prática de uma virtude esclarecida.
Além de descrever as diversas constituições, Aristóteles estabelece uma
tipologia das formas de governo que se tornou clássica. Usa critério do número, da
quantidade, para distinguir a monarquia (governo de um só), a aristocracia (governo
de um pequeno grupo) e a politéia (governo da maioria).
Em seguida, usando o critério axiológico (valor), Aristóteles considera que as
três formas podem ser consideradas boas, quando visam o interesse comum e más,
corrompidas, degeneradas, quando têm como objetivo o interesse particular.
Portanto, a cada uma das três formas boas descritas correspondem
respectivamente três formas degeneradas: a tirania se refere ao governo de um só
quando visa o interesse próprio; a oligarquia prevalece quando vence o interesse
dos mais ricos ou nobres; e a democracia quando a maioria pobre governa em
detrimento da minoria rica.
Embora Aristóteles considere a monarquia, a aristocracia ou a politéia formas
corretas e adequadas ao exercício do poder, prefere a última. Talvez isso se dava à
constatação feita de que a tensão política sempre deriva da luta entre ricos e pobres;
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se um regime conseguir cociliar esses antagonismos, torna-se, mas propício para
assegurar a paz social.
Aqui Aristóteles retoma o critério já usado na sua obra Ética a nicômico, o de
que a virtude sempre está no meio termo. Aplicado-se o critério da mediania às
classes que compõem a sociedade, descobre na classe média – constituída pelos
indivíduos que não são nem muito ricos nem muito pobres – as condições de
virtudes para criar uma política estável.
3 A VIRTUDE E JUSTIÇA NA POLÍTICA NA IDADE MÉDIA
A Idade Média abarca um período tão extenso que é difícil caracterizá-lo
politicamente sem incorrer no risco da simplificação. Afinal, são mais de mil anos,
entre a queda do Império Romano do Ocidente e a tomada de Constantinopla pelos
turcos.
Nesse contexto de extrema fragmentação política e descentralização do
poder, a Igreja Católica exerce enorme influência, na medida em que mantém o
monopólio do saber. Desde a invasão dos bárbaros, a cultura Greco-latina
permanecera por muito tempo confinada aos mosteiros, resurgindo lentamente após
o século VIII, no período conhecido como renascimento, ocasião em que Carlos
Magno mandou fundar inúmeras escolas junto às igrejas e mosteiros.
Dessa forma, os intelectuais pertencem às ordens religiosas e,
consequentemente, as relações entre fé a razão, sendo que esta se encontra
sempre subordinada àquela. Se a fé é o conhecimento mais elevado e o critério
mais adequado da verdade, a filosofia não é a busca da verdade – pois esta já foi
encontrada – mas a ela cabe apenas o trabalho de demonstração racional dessa
verdade.
De início os religiosos têm receios quanto à produção dos gregos, por serem
eles pagãos, mas com as devidas interpretações e adaptações segundo a fé cristã,
o pensamento medieval é fertilizado inicialmente pelo pensamento de Platão (nas
obras da Patrística, sobretudo de Santo Agostinho) e depois pelo de Aristóteles (no
pensamento de Santo Tomás de Aquino).
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3.1 TOMÁS DE AQUINO: A TEORIA DO DIREITO DIVINO DE GOVERNAR
Tomás de Aquino (1225-1274) foi o maior representante da Escolástica,
tendência da filosofia medieval influenciada por Aristóteles. O pensamento tomista
se caracteriza por ter realizado a grande síntese do aristotelismo e as verdades
teológicas da fé cristã.
No século XIII os tempos já são outros, com o renascimento das cidades e a
intensificação do comércio, o debate das ideias nas universidades, o desafio das
heresias. Também Tomás de Aquino muda o enfoque dos temas políticos e, sob a
influência dos textos de Aristóteles, preocupa-se com as questões tais como a
natureza do poder e das leis e a questão clássica do melhor governo.
Como Aristóteles, Tomás de Aquino considera que o homem só encontra sua
realização na cidade, e o plano político é a instância possível em que o governo não-
tirânico pode aliar ordem e justiça na busca do bem comum. O poder político,
mesmo que seja de origem divina circunscreve-se na ordem das necessidades
naturais do homem enquanto ser social que necessita alcançar seus fins terrenos.
Daí que o estudo da política requer o uso da razão natural, não se circunscrevendo
apenas ao âmbito da teologia.
No entanto, coerente também com sua visão religiosa do mundo, Santo
Tomás de Aquino conclui que o Estado conduz o homem até um certo ponto,
quando então se exige o concurso do poder da Igreja, sem dúvida superior, e que
cuidará da dimensão sobrenatural do destino humano. Embora ainda mantendo a
hierarquia entre as duas instâncias, atenua sem dúvida os excessos da doutrina
nascida da luta das duas espadas (poder espiritual e poder temporal).
Preocupado com a questão da tirania, Tomás de Aquino considera que a paz
social resulta da unidade do Estado, sendo importante a virtude do governante. Ao
abordar as formas de governo, indica suas preferências pela monarquia, desde que
temperada, em que o poder é repartido entre o rei e um grupo de homens especiais
escolhidos pela maioria. Neste sentido, Tomás de Aquino (1996, p. 149), diz:
Primeiro um chefe único, escolhido por sua virtude, que esteja à frente de todos; em seguida, abaixo dele, alguns chefes escolhidos por sua virtude, sendo a autoridade de alguns, a deles nem por isso deixa de ser a autoridade de todos, visto que podem ser escolhidos na totalidade o povo, ou realmente o são.
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No final do século XIV, o Grande Cisma acentua a divergência e a tentativa
do Estado de firmar sua soberania. Essas divergências culminam no século XVI com
a Reforma protestante.
4 A VIRTUDE E A JUSTIÇA NA IDADE MODERNA
Durante a Idade Média, como vimos no tópico anterior, o poder do rei era
sempre confrontado com os poderes da Igreja ou da nobreza. As monarquias
nacionais surgem com o fortalecimento do rei e, portanto, com a centralização do
poder, fenômeno este que se desenvolve desde o final do século XIV.
Desta forma surge o Estado moderno, que apresenta características
específicas, tais como o monopólio de fazer e aplicar as leis, recolher impostos,
conhar moeda, ter um exército. A novidade é que tudo isso se torna prerrogativa do
governo central, o único que passa a ter aparato administrativo para prestação dos
serviços públicos, bem como o monopólio legitimo da força (ARANHA; MARTINS,
1998).
Enquanto as nações europeias conseguem a centralização do poder, a Itália
se acha fragmentada em inúmeros Estados sujeitos a disputas intensas e a
hostilidades entre cidades visinhas. Assim, a ausência de unificação a expõe à
ganância de outros países como a Espanha e França, que reivindicam territórios e
assolam a península com ocupações intermináveis.
4.1 NICOLAU MAQUIAVEL: O PRÍNCIPE VIRTUOSO
É nessa Itália dividida que vive Nicolau Maquiavel (1469-1527) na república
de Florença. Diante deste caos, ele observa com apreensão a falta de estabilidade
política do seu país, dividida em principados e repúblicas onde cada um possui sua
própria milícia.
Maquiavel não foi apenas um intelectual que refletiu a respeito da política,
pois viveu intensamente a luta de poder no período em que Florença,
tradicionalmente vivia sob a influência da família Medici. Nessa época, Maquiavel
ocupa a segunda chancelaria do governo, função que o obriga a desempenhar
inúmeras missões diplomáticas na frança, Alemanha e pelos diversos Estados
italianos.
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Portanto, Maquiavel tem oportunidade de entrar em contato direto com reis,
papas e nobres, e também com César Bórgia, que estava empenhado na ampliação
dos Estados Pontifícios. Observando a maneira de Bórgia agir, Maquiavel o
considera o modelo de príncipe que a Itália precisava para ser unificada. Assim,
quando os Médici voltam à cena política, Maquiavel cai em desgraça e recolhe-se
para escrever a sua principal obra política: O Príncipe.
Escrito em 1513, O Príncipe tem provocado inúmeras interpretações e
controvérsias. Para descrever a ação do príncipe em sua obra, Maquiavel usa as
expressões italianas virtù e fortuna. Virtù significa virtude, no sentido grego de força,
valor, qualidade de lutador e guerreiro viril. Homens de virtù são homens especiais,
capazes de realizar grandes obras provocar mudanças na história.
Não se trata do príncipe virtuoso no sentido da Idade Média, enquanto bom e
justo segundo os preceitos da moral cristã, mas sim daquele que tem a capacidade
de perceber o jogo de forças que caracteriza a política para agir com energia a fim
de conquistar e manter o poder. O príncipe de virtù não deve se valer das normas
preestabelecidas da moral cristã, pois isso geralmente pode significar a sua ruína.
Implícita nessa afirmação se acha a noção de fortuna, aqui entendida como
ocasião, acaso. O príncipe não deve deixar escapar a fortuna, isto é, a ocasião. De
nada adiantaria um príncipe virtuoso, se não soubesse ser precavido ou ousado,
aguardando a ocasião propícia, aproveitando o acaso ou a sorte das circunstâncias,
como observar atento do curso da história. No entanto, a fortuna não deve existir
sem a virtù, sob pena, de se transformar em mero oportunismo. Neste sentido,
Maquiavel (2011, p. 62), alerta o príncipe: “É necessário a um príncipe, para se
manter, que aprenda a poder ser mau e que se valha ou deixe de valer-se disso
segundo a necessidade”.
4.2 THOMAS HOBBES: O ESTADO PARA DOMAR O LOBO DO PRÓPRIO HOMEM
A noção de Estado moderno começa a se configurar mais claramente no
Renascimento, tendo sido exaltado o Estado como potência plana desde Maquiavel.
Assim, a partir da tendência de secularização do pensamento político moderno, os
filósofos do século XVII estão preocupados em justificar racionalmente e legitimar o
poder do Estado sem recorrer à intervenção divina ou a qualquer explicação
religiosa. Daí a preocupação com a origem do Estado.
20
Assim, o primeiro filósofo a tomar iniciativa para estudar a origem do Estado
foi Thomas Hobbes (1588-1679). Em sua doutrina política e antropológica exposta
em sua principal obra O Leviatã (refere ao monstro bíblico citado no Livro de Jó,
Capítulos 40 e 41) o filósofo inglês partiu da crença no chamado “Estado de
Natureza”, durante o qual os homens teriam vivido em constante medo diante das
ameaças de guerras. Nessa fase que antecedeu à formação da sociedade atual não
havia limites à ação humana. O abandono da vida primitiva em favor do status social
se fizera por conveniência, pelo interesse em se obter garantia e tutela (COTRIM,
2000).
Portanto, Thomas Hobbes retratou o homem como um ser naturalmente
egoísta e agressivo, devendo apenas aos seus interesses e insensível à sorte de
seus semelhantes. Portanto, a criação do Estado, para este filósofo, teria reprimido a
tendência do homem de ser “o lobo do próprio homem” e evitando, assim, a guerra
total.
A fim de superar as adversidades do Estado de Natureza, os homens teriam,
para este autor, celebrado o contrato social e, em consequência, construído a
sociedade, o Estado e o Direito. Eles teriam renunciado ao seu primitivo “Estado de
Natureza”, para alcançarem a paz, a liberdade e o verdadeiro Direito.
Para que esses objetivos fossem atingidos, pensava Thomas Hobbes que o
Estado (O Leviatã ou Deus Moral) deveria ser suficientemente forte, como o monstro
citado na Bíblia, pois tinha como objetivo principal “domar o lobo do próprio homem”,
para pôr fim à anarquia e o caos da comunidade primitiva.
Com relação ao Direito, o filósofo distinguiu as Leis Civis das Leis da
Natureza. Para ele, a Lei Civil, emanada do Estado, não pode ser contrária à razão,
entendida esta como a luz que levou o soberano a elaborar a Lei.
Assim, aplicada pelo juiz, a sentença será do próprio legislador; diversamente
aplicada, a sentença será do magistrado e injusta. As Leis da Natureza, para
Thomas Hobbes (1979, p. 28): “Consistem na equidade, na justiça, na gratidão e
outras virtudes morais destas dependentes na condição de simples natureza, não
são propriamente Leis, mas qualidades que predispõem os homens para a paz e a
obediência”.
Assim, as Leis da Natureza não seriam Leis propriamente dita, salve quando
encampadas pelo Estado, pois, para serem obrigatórias, é indispensável é que
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venham em ordenações do poder e acompanhadas de sanção. Thomas Hobbes foi
o precursor do positivismo moderno.
4.3 JEAN-JACQUES ROUSSEAU: O ESTADO DE NATUREZA
Assim como seus antecessores Thomas Hobbes, John Locke, Jean-Jacques
Rousseau (1712-1778) procura resolver a questão da legitimidade do poder fundado
no contrato social., no entanto, sua posição é, num aspecto, inovadora, na medida
em que distingue os conceitos de soberano e governo, atribuindo ao povo a
soberania inalienável.
Em seu livro Discurso Sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade
Entre os Homens, publicado 1753, expõe acerca do estado de natureza, época
primitiva em que os homens/mulheres seriam felizes, desfrutando de liberdade e de
igualdade. Assim, Rousseau diferente de Hobbes para quem o homem/mulher é
mau por natureza, admitiu, que tudo que vem da natureza é bom.
Para Rousseau, sem comando político, os seres humanos viviam no livre
exercício de seus direitos naturais, em uma Idade de Ouro, onde não havia
propriedade privada, nem corrupção. A desarmonia teria surgido quando alguns
homens, prevalecendo de sua força, impuseram o domínio.
Portanto, para este autor, a sociedade civil teria sido fundada pelo indivíduo
que, cercando um terreno (tomando posse da natureza), declarou: “Isto me
pertence!”. Para Rousseau, se naquele momento alguém houvesse gritado:
“Guardai-vos de escutar este impostor!”.
Em outra obra, O Contrato Social, publicada em 1762, obra complementar ao
Discurso Sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens,
Rousseau analisa a formação do Estado. Ele diz: “Visando a recuperar o seu bem-
estar primitivo, os homens teriam transferido seus direitos naturais ao Estado em
troca de direitos civis. Estes seriam os próprios direitos naturais, já então sob a
tutela do Estado” (ROUSSEAU, 1973, p 39).
Para Rousseau, não haveria, assim, renúncia á liberdade, pois tal ato “é
incompatível com a natureza humana”. Com a celebração do pacto (contrato), cujas
cláusulas são ditadas pela própria natureza humana do ato, os homens visavam:
“Encontrar uma forma de associação que defendesse e protegesse de toda a força
comum à pessoa e os bens de cada associado, e pela qual, cada um, unindo-se a
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todos, não obedecesse, portanto, senão a si mesmo, e permanecesse tão livre como
antes” (ROUSSEAU, p. 41).
Para Rousseau, enfim, a finalidade última do Direito e de toda legislação seria
a de promover a liberdade e a igualdade entre os homens. As Instituições Jurídicas
e o Estado, todavia, não deram continuidade à felicidade humana, já que
não lhe garantiram a liberdade e a igualdade.
4.4 MONTESQUIEU: A DIVISÃO DOS PODERES
A difusão das ideias iluministas na França foi facilitada pela ampla produção
intelectual de filósofos conhecidos como enciclopedistas. Entre estes, destacam
Charles-Louis de Secondat, barão de La Brède e posteriormente barão de
Montesquieu.
Explicando essas três espécies de governo, Montesquieu (2010, p. 27), fala
que cada um desses governos é regido conforme a natureza de governo. O
Monárquico é regido´ por um soberano que segue as leis estabelecidas no seu
Estado; o republicano é regido pelo controle de poucos (aristocracia) ou pelo povo
(democracia). Neste sentido, explicam Gonzaga e Azevedo (2013, p. 84):
A República aristocrática (do grego aristoi=melhores e kratos=poder) significa literalmente o governo dos melhores. A palavra aristoi corresponde a escola social, ou seja, os melhores da sociedade. Alguns entendem que a palavra Aristocracia deriva do termo grego aretê, virtude, e então, neste caso, a classe privilegiada seria composta por aqueles que detinham algum conhecimento ou virtude. Podemos citar como exemplo histórico a República Aristocrática de Veneza, que durou da Idade Média até o séc. XVIII, governada por uma elite de grandes donos de empresas náuticas, o que lhes dava posição de destaque num Estado voltado para o comercio marítimo, as índias. Outro exemplo mais ilustre é o da Republica Romana, governada por uma elite que compunha o Senado, embora ouvindo também as assembleias dos cidadãos. A república democrática consiste em uma forma de governo na qual todo poder emana do povo. Poder ser: direta, indireta ou semidireta.
E por fim o despótico, que assim como na monarquia é regido por um só
soberano, porém sem observar as leis do seu Estado, uma vez que ele está acima
da lei de tudo e de todos e tudo no seu Estado é determinado por sua vontade.
Tratando ainda sobre as três formas de governo, Montesquieu define os três
princípios basilares que cada um desses governos devem seguir para manter-se .
Consoante Montesquieu (2010, p. 44) o princípio que rege a monarquia é a honra,
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honra essa que difere os cidadãos, ou seja, é criadora de preconceitos de cada
pessoa ou diferenciando as posições que estão incluídos, seja do nobre ao
camponês.
Na república, Montesquieu (2010, p. 39), afirma que o que se tem como
fundamento é a virtude que é a mola propulsora na forma republicana democrática,
bem como na república aristocrata. Já no governo despótico é regido, como explica
Montesquieu (2010, p. 45): “o temor, a estima ao príncipe por parte dos seus
cidadãos e súditos”.
A virtude que tem como o princípio do governo republicano é definida por
Montesquieu no início do seu livro para que não haja interpretações estranhas ao
que ele pretende fundamentar o que é importante. Tal princípio para essa formar de
governo, como Montesquieu (2010, p. 17), explica é:
Para o entendimento dos quatros primeiros livros desta obra, cumpre observar que o que chamo de virtude na república é o amor da pátria, ou seja, o amor da igualdade. Não é uma virtude moral, nem uma virtude cristã, é uma virtude política, e essa é a mola que move o governo republicano, como a honra é a mola que move a monarquia.
Falando ainda sobre virtude, Montesquieu (2010, p. 59), explica que a virtude
se trata de algo muito simples, pois para tê-la é só amar a república, não é
necessário ter conhecimento ou uma virtude Intelectual como defendia Aristóteles,
essa é um sentimento do democrata que está contida nos homens mais ricos e bem
instruídos como nos menos afortunado do Estado, também possuí esse sentimento.
Esse novo conceito de virtude vem vinculado como antes ao de justiça, sendo
essa uma justiça social que deve ter como fundamento na educação. Neste sentido,
Montesquieu (2010, p. 52), afirma que a educação na república deve vir com o
ensinamento de pensar no social, amar o seu povo, amar a sua pátria, amar a essa
forma de governo. Tudo na república dependerá desse amor que os cidadãos têm
com ela, pois serão eles que irão governar, não tendo tal amor ou virtude não se
conservará por muito tempo essa forma de governo.
Montesquieu ao falar como as leis devem ser na democracia volta a tomar
como exemplo os antigos, Licurgo e Rômulo, tratando-se em mantê-la e como
minimizar as diferenças sócias que nela podem se estabelecer se não houver lei que
com justeza mantenha essa forma de governo, como explicado por ele:
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Alguns legisladores antigos, como Licurgo e Rômulo, dividiram igualmente as terras. Isso só podia ocorrer na fundação de uma nova república; ou quando a antiga estava tão corrompida e os espíritos numa tal disposição que os pobres se acreditavam obrigados a usar, e os ricos obrigados a suportar tal remédio. Se quando o legislador fez semelhante partilha, não promulga leis para mantê-la, não faze se não uma constituição passageira; a desigualdade entrará pelo lado que as leis não tiveram protegido, e a república estará perdida (MONTESQUIEU, 2010, p. 61).
Os magistrados devem formular leis justas que cultivem a frugalidade dos que
vivem na democracia. Como explana Montesquieu (2010, p. 64), pois como a
frugalidade e a riqueza são causa e efeito onde quer que uma estiver acompanhará
a outra, visto que quando há comércios numa democracia os seus cidadãos que
praticam esse ofício terão riquezas, e isso vem junto com frugalidade e moderação,
bem como os seus regramentos.
A lei para ser justa, deve buscar fundamento na frase aristotélica:” Devemos
tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua
desigualdade”, pois como lembra Montesquieu (2010, p. 127):
O princípio democrático estará corrompido não só quando há desigualdade em excesso, assim como quando há excesso na sua igualdade tornando-se uma igualdade comunista, pois o povo não respeitará os poderes que delegam aos magistrados, querendo fazer tudo por si mesmos, com isso já não haverá mais uma gota de virtude.
Não sendo a lei justa o povo e os magistrados caem na desgraça da
corrupção, pois como explica Montesquieu (2010, p 128), o povo cai no erro quando
os magistrados que elegeram e confiaram, querendo esconder suas corrupções,
busca corromper o povo.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como vimos, neste trabalho, durante o período clássico da Grécia Antiga, os
filósofos elaboraram teorias sobre a política e a justiça, conceitos que para eles se
confundiam: não fazia sentido pensar uma política que não fosse ao mesmo tempo
justa.
Como vimos, neste trabalho, a reflexão política nascer na Grécia Antiga,
sobretudo fundamentada pelas obras de Platão e Aristóteles, que influenciaram toda
a filosofia política posterior. O aspecto principal dessas teorias é a convicção de que
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o bom governo depende de um regime baseado em leis que não sejam corrompidas,
bem como dependa das virtudes dos cidadãos e dos governantes.
Durante a Idade Média essas teorias políticas foram adaptadas pelos
religiosos, principalmente Tomás de Aquino, de modo a não conflitarem o
cristianismo. Assim, ao contrário das concepções da Idade Antiga, em que a função
do governo era assegurar a vida boa, na Idade Média predominou a concepção
negativa do Estado.
Por ser a natureza humana sujeita ao pecado e ao descontrole das paixões,
caberia ao Estado o papel de intimidação para todos agirem retamente. Daí a
estreita ligação entre política e moral, que exige a formação do governante justo,
não tirânico, capaz de obrigar todos a obedecer aos princípios da moral cristã.
Segundo essa concepção religiosa, configuram-se duas instâncias de poder: a do
Estado e a da Igreja.
Na gestação do que vieram a ser os tempos modernos, o novo paradigma da
filosofia política elaborou seus princípios ao romper com a ideia de bom governo que
predominou na Idade Antiga e na Idade Média. Baseada em uma postura realista,
pensadores como Nicolau Maquiavel buscaram compreender o sistema de forças
que atuam de fato no seio da sociedade e do poder.
Na sequência, Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rousseau, em
oposição à visão religiosa da Idade Média, procuravam a ordem racional e laica nos
conceitos de virtude, soberania e contrato social, consentimento e obediência
política, tendo em vista a coesão do Estado e a segurança dos indivíduos.
Em meio a posições muitas vezes divergentes, na Idade Moderna, foram
esboçadas as novas linhas que orientaram daí em diante as ideias liberais e os
primeiros passos em direção à conquista da cidadania e democracia.
LEGAL PHILOSOPHY: THE PROBLEM OF VIRTUE AND JUSTICE IN THE POLICY OF THE PERIOD OF OLD AGE TO THE MODERN AGE
ABSTRACT
This article aims to address how virtue and justice were treated in politics and as problematic in starting point the following question: How did the understanding in the ancient Greek world, the middle ages and the modern age about Virtue and Justice in the We sought explanations with the philosophers and authors of ancient Greece until the Renaissance, and the period from the old age to the modern age was
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approached, with the aim of understanding how virtue and justice were interpreted, studied and applied in each of these times through of works of authors known and studied until today as for example: Plato, Tomas de Aquino and Montesquieu. The methodology used for this research was through bibliographies of these writers, as well as writers of political science of our time who help us to understand these authors and their works and how Virtue and Justice were understood in the forms of Democratic, Despotic and Monarchical governments. The result that is most important in this present work is to demonstrate how virtue, justice, and politics have been treated by authors such as Aristotle, Thomas Aquinas, Thomas Hobbes, among those already mentioned, who have dealt with the subject and who describe it as forming different from Virtue and Justice in the political and behavioral sense of the individual.
Keywords: Virtue. Justice of the Laws. Socratic Virtue. Virtue and Justice for
Montesquieu.
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