Felix Araujo - ou o martirio de um lider

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Poesia de cordel do grande poeta Manoel Monteiro, sobre a vida e morte do lider Felix Araujo, assassinado em 1953, combatendo a corrupcao em Campina Grande.

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FÉLIX ARAÚJO- ou o martírio de um

líder!

Autor: Manoel Monteiro

Da Academia Brasileira de Literatura de Cordel e do IHGCP.

01- Todo aglomerado humanoUrbano, próximo ou distante,Que seja cosmopolitaOu insignificanteNão tem nada a seu contrárioA que venha ser berçárioDe filho muito importante.

02- VITAL BRASIL que nasceuNuma cidade tacanhaMas com suas descobertasInda hoje o mundo ganha;Contra picada de cobraO antídoto é obraDo MINEIRO DE CAMPANHA.

03- Nosso grande PEDRO AMÉRICOQue trouxe a arte na veiaNascido em plaga ignotaQue os braços do Brejo enleiaPelo seu dom magistralFEZ, de modo literal,UM MONUMENTO DE AREIA.

04- Exemplos neste sentidoTem de se perder a conta,A Bromélia mais bonitaNa laje agreste é que aponta,Quem tem amor dar carinhoQuem nasceu pra ser espinhoDe pequeno traz a ponta.

05- Estou começando assimEste cordel nas primeirasEstrofes para mostrarQue o mundo não tem fronteirasNem limites para o brilhoDe um valoroso filhoDas plagas de Cabaceiras.

06- Cabaceiras pequeninaCidade do Cariri,Semi-árido nordestino,Na Paraíba, e, aquiTem belezas naturais,Inscrições rupestres maisUm sol alegre que ri.

07- Pois foi nesta terra ondeO sol está “sempre a pino”Que aos 22 de dezembro,De 22, um menino,Veio alegre a famíliaDa jovem Dona NAUTÍLIAE FRANCISCO VIRGOLINO.

08- FÉLIX DE SOUSA ARAÚJOFoi esse o nome escolhidoQue os pais felizes deramAo garotinho nascidoDaquela doce uniãoE com sua apariçãoFez o casal mais unido.

09- Para suas brincadeirasFÉLIX não ficou sozinhoPois dentro de pouco tempoDeus mandou-lhe um irmãozinho,Os pais bastante felizesDispensaram aos dois petizesMuito amor, muito carinho.

10- O irmão de FÉLIX, Mário,Mário Araújo, um amigo,Que conheço há muitos anosPor isso mesmo lhe digo:- Mário é grande companheiroDos que servem ao parceiroMesmo correndo perigo.

11- Em 64 estiveNa “barcaça” que afundou,Perseguido, preso e umAmigo que não faltouApesar do grande riscoFoi – O FILHO DE FRANCISCO –Que aos meus afins ajudou.

12- Trago este depoimentoPois gratidão não se apaga,Coragem não tem à vendaE a mão que nos afagaFica satisfeita vendoQue estamos devolvendoUm obrigado por paga.

13- Mas vamos voltar a FÉLIXPrincipal objetivoNão para biografá-loSim, para mantê-lo vivoE mostrar ao circunstanteO quanto ele foi brilhanteTalentoso e combativo.

14- FÉLIX brincava na ruaCom os meninos do jeitoQue todo menino brincaRindo, alegre, satisfeito.De corrida, salto e bola,Até chegar à escolaPra mostrar do que foi feito.

15- Na Escola EstadualOnde foi matriculadoDeu prazer a professoraMaria Neuly DouradoLogo cedo demonstrandoRara inteligência dandoProva de super dotado.

16- Aquele garoto simplesDe aparência singularCompleição física mirradaMas de um brilho no olharInquieto, perscrutando,Como quem estava buscadoUm jeito bom de voar.

17- A escola é campo fértilOnde uma boa sementeNasce, flora e frutifica,Reproduz e vai em frenteComo pontos luminaresPara orgulhar os seus paresNum crescendo intermitente.

18- No primário distinguiu-seDos demais pelo QIApreendendo as matériasDum jeito com que NeulyAchava até que um diaAquele garoto iriaOrgulhar o Cariri.

19- Ao concluir o primárioCom louvor e distinçãoO professor ArielOliveira “deu-lhe a mão”E o direcionouDum jeito que ele passouDo Curso de Admissão.

20- Daí, em Campina Grande,Prosseguiu o ritualDe ingressar num colégioE ao tentar o portalPassou da primeira vezNo Pio XI onde fezO Curso Ginasial.

21- Durante o correr do cursoMostrou-se muito vivazSempre à frente nas matérias,Participante e loquaz,Pra tudo tinha um discursoTanto que ao final do cursoOrador dele se faz.

22- Do jovem cabaceirenseJá transbordavam pendoresDe uma palavra fluente,Revides devastadoresNa contra-argumentaçãoMéritos que só estarãoJunto aos grandes oradores.

23- O Curso Clássico ele fezNo Estadual da Prata,No Liceu Paraibano,No Pio XI e já trataDe mostrar para o que veioVibrante, inquieto e cheioDe aspiração democrata.

24- Sua aguerrida presençaNa política estudantilFazia imenso contrasteCom seu porte juvenil,Toda aparente fraquezaTinha o triplo de grandezaNa defesa do Brasil.

25- Dá-nos orgulho lembrarOs seus feitos pioneirosNo jornal cabaceirenseQue deu o nome CRUZEIROSPelos Cruzeiros da TerraNas páginas do qual descerraOs seus escritos primeiros.

26- Do comentário políticoIa a crônica socialLevando a letra de fôrmaTudo de bem e de malCom seu talento imanenteCaminhava um passo a frenteO que pra gênio é normal.

27- O pai de FÉLIX e MárioUm honesto ColetorEm cujo lar quem chegasseTinha pão e cobertorUm dia caiu doenteIndo embora de repenteDeixando saudade e dor.

28- Sem a ajuda do paiFÉLIX no estudo seguiaDando conferência pagasE o pouco que recebiaTinha de ser o bastantePara levar adianteO projeto que antevia.

29- (Quando ouço alguém dizerNão estudo porque não tenhoDinheiro e mesmo por queNo lugar de onde venhoNão tem jeito de ganharSou obrigado falar:- O que lhe falta é empenho.)

30- Vejam como um rapaz pobreRico dos bens da virtudeVencia dificuldadesE por ter essa atitudeNão se deixou abaterPodendo muito bem serExemplo pra juventude.

31- Ganhava pouco, mas davaPra prosseguir caminhandoPor João Pessoa e porCampina o verbo atirandoSobre o povo atento e pasmoVibrante de entusiasmoDo tributo lhes falando.

32- A breve vida de FÉLIXFoi efêmera, passageira,Como u’a estrela cadenteDesfez-se baça em poeiraMas enquanto estava acesaEra atalaia e defesaDa gente humilde e obreira.

33- Como estudante integrouToda campanha onde o pleitoFosse para conquistarO que se tinha direito,Nunca se omitiu da lutaPor mais ferrenha a disputaEnfrentava peito a peito.

34- Foi assim que integrouA FEB como pracinha,Voluntário apresentou-sePara lutar porque tinhaConsciência do perigoVisto que aquele inimigoContra a humanidade vinha.

35- Parou nos campos d’ItáliaComo mais um combatenteSimples soldado correndoTodo risco, consciente,Estava lá porque quis,Assim, estava feliz,Mesmo na linha de frente.

36- Com o Nº. 3 miltrezentos e sessenta e doisNa FEB o pracinha FÉLIXVoluntário se dispôsA ir lutar pela ordemE recompor a desordemQue o Nazi-Fascismo impôs.

37- Merecem destaques duasPassagens desse momento,Uma, quando o praça FÉLIXAo tomar conhecimentoQue no barco que os levavaPra o front de Itália estavaJOEL SILVEIRA, um talento.

38- JOEL como jornalistaE dos mais conceituadosEstava cobrindo a guerraPra os órgãos Associados,FÉLIX ao saber do fatoMandou-lhe extenso relatoLá do meio dos soldados.

39- Joel Silveira que eraExperiente e sagazAo ler as colocaçõesDaquele humilde rapazViu imediatamenteQue se tratava de genteInteligente e capaz.

40- Então foi falar com FÉLIXJá de igual pra igualPois sentiu no jovem umTipo muito especial Mas convenceu-se a ouvirO pracinha dirigirFalação ao pessoal.

41- Pois bem, um simples soldadoSem estrela e sem galãoFalando a seus companheirosNão era um ato padrãoDiante da novidadeA oficialidadeInterrompeu a sessão.

42- Porém aquele pracinhaDe oratória inflamadaFazia a tropa sentirA guerra justificada;Mandaram-no prosseguirPois todos queriam ouvirA voz do seu camarada.

43- Finda a guerra volta FÉLIXPara Campina e afeitoAs procelas do caminhoVai lutar do mesmo feitoTrabalhando pra viverE ao mesmo tempo fazerO seu Curso de Direito.

44- Na provecta FaculdadeOnde Rui também “baixou”,Tobias Barreto esteve,Castro Alves declamouFÉLIX se sentiu em casa,Cantou alto, bateu asa,Galhardamente voou.

45- Suas provas eram postasNo quadro para mostrarAos outros estudantesSeu modo de interpretarAs Leis, Códigos, Artigos,Para novos e antigosTerem nele um exemplar.

46- Além do Curso JurídicoAtuava febrilmenteJá defendendo no fórumQuem estivesse carenteDo amparo da justiçaEm FÉLIX via a premissaDe não pagar inocente.

47- Criador e criativo,Inquieto e sonhador,Jornalista de mancheia,Político por puro amor,Dedicadíssimo ao estudoTudo isso e sobretudoPoeta e grande escritor.

48- DOR, FOLHAS SOLTAS e maisO livro FRATERNIDADESão títulos que produziuPorém TAMAR, em verdade,É sua obra mais ternaPois nela o poeta externaToda sensibilidade.

49- Ele estava na ItáliaQuando TAMAR veio à lumeCom seu texto impregnadoDo mais plangente queixume,Doces sons e acalantos,Amontoados de cantosQue o estro ingente resume.

50- “TAMAR de FÉLIX é poemaQue ao leitor maravilha,Tem langor de sol poenteAlbor de manhã que brilha- Outro cordel asseguraTAMAR tem tanta ternuraQue foi ser nome de filha.”

51- Antes de falar de FÉLIXEleito VereadorVamos falar de MARIASOCORRO DUETTES, florQue o poeta escolheuE que dois filhos lhe deuFrutos do seu grande amor.

52- FÉLIX DE SOUSA ARAÚJOFILHO e MARIA TAMARSão a prova verdadeiraQue valeu a pena amarE gerar filhos por queOlhando os filhos se vêA vida continuar.

53- FÉLIX saiu candidatoEm um concorrido pleitoPelos serviços prestadosGanhou votos, foi eleito,Ao assumir o lugarComeçou a trabalharComo sempre havia feito.

54- Por conhecer a missãoPrópria do LegislativoQue é de fazer as LeisE ficar de olho vivoSempre a pequena distânciaPra ter sob vigilânciaO Poder Executivo.

55- Assim ele fez e foiFiscalizar o PrefeitoQue no acerto de contasNão estava agindo direitoPorque pegava o erárioDava novo itinerárioComo uns por ai têm feito.

56- Quem surrupia não gostaQuando o furto é descobertoFoi isso que aconteceuE o prefeitinho espertoMandou um atiradorCalar o VereadorQue estava falando certo.

57- Não vou declinar o nomeDo mandante ou do bandidoPra tanto um quanto o outroPermanecer esquecido,Anula-los é prementeFalar nome dessa genteÉ tempo e papel perdido.

58- Com a voz embargada vamosTrazer pra todos vocêsAquela manhã de julho,13 de 53;Quando o poeta aguerridoFoi mortalmente feridoPor perversa insensatez.

59- (Eu era recém chegadoA esta terra louçã,Vendia versos nas feirasE nessa infausta manhãLembro-me perfeitamenteNa hora do incidenteEstava em Puxinanã.)

60- Lá na Maciel PinheiroFÉLIX tombou baleadoProntamente socorridoAo hospital foi levado,Operado com urgênciaMas a fatídica ocorrênciaHavia só começado.

61- A bala insana alojou-seNa coluna vertebralNão pôde ser retiradaCausando um terrível mal,Grandes dores, agonias,Passados 14 diasFoi-se o poeta. Final.

62- Foi embora como veioCalmo, ledo, livre, leve,Deixando uma vasta obraEm sua passagem breve,Morreu, mas, é imortalPorque este capitalSó o possui quem escreveu.

63- Ele vive em sua esposa,Vive nos filhos bonitos,Na saudade dos amigos,No coração dos aflitosQue ele tanto defendeu,Nos poemas que verteuNas páginas dos seus escritos.

PALAVRA DE IRMÃO.

(*)

FÉLIX ARAÚJO, como intelectual, embora tenha vivido pouco menos de 32 anos, teve uma atividade intensa. Escreveu TAMAR, um poema em prosa, editado quando se

encontrava na Itália como soldado brasileiro na guerra que destruiu o Nazismo. Deixou, ao morrer, os livros FRATERNIDADE, DOR, FOLHAS SOLTAS e uma gema enorme de belos sonetos e poemas. Durante os mais de 50 anos de sua morte, e obra literária de Félix Araújo

encantou aqueles que a conheceram...

Sua atuação no rádio é sempre lembrada. Criou e apresentou, na Rádio Borborema, o programa A VOZ DOS MUNICÍPIOS, que popularizou a presença das populações citadinas e rurais na comunicação radiofônica, trazendo ao

vivo sua voz e seus problemas. Escreveu, por muito tempo, crônicas diárias, apresentadas, à noite, pela Rádio Borborema, sob a denominação de CARROSSEL DA VIDA, com grande repercussão.

Na juventude, fundou em Cabaceiras, o jornal CRUZEIROS, cujo nome

era uma homenagem a sua terra natal, Cabaceiras, conhecida como CIDADE DOS CRUZEIROS.

FÉLIX, na Itália, como integrante da FEB, teve inusitada participação. Quebrando rígidos padrões de disciplina, conseguiu várias vezes falar para a tropa, em vibrantes discursos em

defesa dos ideais antifascistas e de estímulo à luta dos compatriotas em operação de guerra. Fiel à sua vocação jornalística, fundou o jornal CRUZEIRO DO SUL, com esses mesmos objetivos de liberdade.

Tombou, varado por uma bala assassina no dia 13 de julho de 1953,

vindo a falecer no dia 27; crime executado por um pistoleiro profissional. O infeliz acontecimento ocorreu em pleno centro da cidade, quando no cumprimento do seu dever o inditoso jovem Vereador saía da Câmara sobraçando documentos com que se comprovariam irregularidades e

malversação do dinheiro público. Este atentado fatal chocou Campina Grande e a Paraíba e repercutiu em todo Brasil.

Eis aí, de forma resumida, os traços marcantes do patrono da cadeira que vou ocupar...

Mário de Sousa Araújo.(*)

Tópicos do discurso de posse à sua cadeira do IHCGP em 08/12/2006.