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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
RESUMO
Cabo Verde: um pequeno Estado insular em desenvolvimento
Desde o fim da II Guerra Mundial todos os países têm procurado melhores rumos
para alcançarem um desenvolvimento consistente. Mas, alguns deles têm enfrentado no seu
progresso vários constrangimentos estruturais. É o caso dos chamados Pequenos Estados
Insulares em Desenvolvimento (PEID’S). Cabo Verde, Maurícias, São Tomé e Príncipe,
Bahamas, Barbados, Grenada, Nova Caledónia, são alguns exemplos de países pertencentes
ao grupo dos PEID’S.
A pequena dimensão territorial, demográfica e económica, o isolamento em relação ao
continente, a fragmentação territorial e a vulnerabilidade ambiental constituem as
características distintivas desses países.
Com um território inferior a 5000 km² e uma população residente que não supera meio
milhão de habitantes, uma economia muito dependente de fluxos externos e com um território
isolado e fragmentado, Cabo Verde está incluído na lista dos mais pequenos estados do
mundo e um dos mais vulneráveis, tanto económica como ambientalmente.
Essas características, que no seu conjunto se denominam de insularidade, fazem com
que Cabo Verde conheça a dureza dos seus efeitos negativos, acarretando custos acrescidos de
financiamento do seu próprio desenvolvimento, afectando todos os sectores de actividade.
O sector primário e sector secundário são dificultados pela pequena dimensão do
território, do mercado interno e da fragmentação do território. O sector terciário, pelo
contrário, aproveita algumas dessas características para tirar rendas da situação que doutra
forma seriam impossíveis.
A insularidade tem uma incidência, no cômputo geral, extremamente negativa no
processo de desenvolvimento socio-económico de Cabo Verde.
Portanto, a evolução socio-económica de Cabo Verde está condicionada por
características estruturais e debilidades intrínsecas que impõem dificuldades na prossecução
de um processo de desenvolvimento consistente e sustentável.
Mas, apesar disso, Cabo Verde tem conseguido, mesmo que de forma lenta e
debilitada, encontrar estratégias de resiliência, como as do tipo defensivo, adaptativo, reactivo
e ofensivo, que permitam minimizar os efeitos negativos da insularidade e aproveitar aqueles
que constituem oportunidades de desenvolvimento.
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
I – INTRODUÇÃO
O trabalho, que ora se apresenta, enquadra-se no âmbito do curso de licenciatura em
Geografia, ministrado pelo Instituto Superior de Educação, unidade associada à Universidade
de Cabo Verde e destina-se à obtenção do grau de Licenciatura.
Com esta tese pretende-se fazer um estudo sobre o tema “Incidência da Insularidade
no processo de Desenvolvimento socio-económico de Cabo Verde”, e apresentar algumas
pistas que possam servir de estímulos aos futuros investigadores.
1.1 - Justificativa
As razões da escolha deste tema prendem-se com o desejo de aplicar os conhecimentos
teórico – práticos adquiridos durante o curso de Geografia e fornecer subsídios para uma
melhor compreensão da situação socio-económica do país, apresentando contribuições para
ultrapassar os constrangimentos com que se depara o país no seu processo de
desenvolvimento.
O grupo de Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (PEID’S) inclui os
países que enfrentam difíceis problemas quanto ao seu processo de desenvolvimento. Muitos
desses problemas são estruturais e, como tal, é importante o engajamento de todos na procura
de melhores estratégias para minimiza-los. Cabo Verde, como um PEID, tem esses problemas
bem patentes no seu trajecto de ascensão socio-económica.
Desde a sua independência, em 1975, Cabo Verde tem procurado melhores vias para
alcançar um desenvolvimento consistente e sustentável. Para tal desiderato o país tem criado
paulatinamente meios que permitam driblar um conjunto de constrangimentos (político,
social, ambiental, e sobretudo económico) que tem condicionado a performance das
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
actividades económicas desenvolvidas nesse espaço. Muitos desses constrangimentos que se
fazem sentir em Cabo Verde são derivados da sua condição insular.
É comum a ideia de que a insularidade constitui um grande handicap para o
desenvolvimento de Cabo Verde. Todavia, escasseiam estudos que abordam esta problemática
no país. Os poucos estudos existentes incidem em aspectos sectoriais, que não permitem uma
visão de conjunto sobre os impactos socio-económico da insularidade (ALMADA, 2007).
1.2 - Perguntas de partida e hipóteses
As questões orientadoras e que serviram de fio condutor para o desenvolvimento deste
trabalho são as seguintes:
Quais são os impactes da insularidade no processo de
desenvolvimento socio-económico de Cabo Verde?
Quais as estratégias que permitem minimizar os efeitos da
insularidade?
Estas questões vão ser operacionalizada através das hipóteses a seguir levantadas:
H1. A insularidade dificulta o uso da economia de escala nas empresas do país;
H2. A insularidade afecta a competitividade económica de Cabo Verde;
H3. A insularidade constitui um entrave ao desenvolvimento socio-económico do país.
1.3 - Objectivos
O objectivo geral deste trabalho é analisar os impactes da insularidade no processo de
desenvolvimento socio-económico de Cabo Verde. Tem ainda como objectivos específicos os
seguintes:
Analisar os impactes da insularidade sobre o sector primário;
Compreender os impactes da insularidade sobre o sector secundário;
Perceber os impactes da insularidade sobre o sector terciário.
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1.4 - Estrutura da dissertação
Para além das notas introdutórias e conclusivas, este trabalho encontra-se estruturado
em quatro partes, sendo o primeiro referente à problemática de desenvolvimento dos
Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento, o segundo trata-se de enquadramento
geográfico e caracterização socio-económico de Cabo Verde, o terceiro relata sobre à
incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socioeconómico de Cabo Verde e
a quarta aponta recomendações para a resiliência económica.
Deste modo, na primeira parte foi apresentado um corpo teórico que, de forma geral,
demonstra as contrariedades que os Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento
enfrentam na consecução de um desenvolvimento sustentável. Especificamente foi dado o
conceito de desenvolvimento, a noção de Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento e
as suas principais características, com particular incidência nos estados africanos.
A segunda parte ocupou-se do enquadramento de Cabo Verde, salientando a sua
caracterização física (localização geográfica, caracterização climática, geomorfológica,
geológica, etc), bem como as características socio-económicas, como evolução, distribuição e
estrutura da população, análises intersectoriais (primário, secundário e terciário) e intra
sectoriais (agricultura, pesca, turismo, etc).
Na terceira parte procurou-se analisar a incidência da insularidade no processo de
desenvolvimento de Cabo Verde. Procurou-se demonstrar concretamente em que sectores há,
efectivamente, incidência da insularidade e como essa incidência se manifesta.
E, por último, procurou-se apresentar algumas recomendações consideradas
pertinentes para minorar esses efeitos.
1.5 - Metodologia
No que se refere à metodologia aplicada privilegiou-se o dedutivo, partindo do geral
para o particular. A partir de um conjunto de pressupostos gerais, tentou-se identificar e
explicar a incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico de
Cabo Verde, onde, por um lado, procurou-se confirmar os mecanismos gerais identificados
nos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento e, por outro lado, identificar os
mecanismos concretos em Cabo Verde
A pesquisa bibliográfica pode ser apresentada como a principal fonte de obtenção dos
dados. Mas também pode-se apontar outras fontes como INE (Instituto Nacional de
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Estatística) e a entrevista. Esta foi feita a um universo de 9 empresas/instituições, sendo três
de cada sector, segundo o guião apresentado em anexo. Enquanto que os dados da pesquisa
bibliográficas serviram essencialmente para a caracterização dos Pequenos Estados Insulares
em Desenvolvimento (2ª parte), os dados do INE foram utilizados fundamentalmente para a
caracterização socio-económica do país (3ª parte) e os dados da entrevista foram usados
principalmente para a constatar os efeitos da insularidade (4ª parte).
A seguir fez-se a análise e tratamento dos dados utilizando os métodos tanto da
estatística descritiva e recorreu-se a alguns gráficos e quadros para ilustrar os conteúdos a
apresentar.
No entanto enfrentou-se vários constrangimentos, sendo maior, a pouca bibliografia
disponível sobre o tema em estudo.
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II – PROBLEMÁTICA DE DESENVOLVIMENTO DOS PEQUENOS
ESTADOS INSULARES EM DESENVOLVIMENTO
Ultrapassado a fase de Guerras Mundiais, alguns países como os Estados Unidos da
América, França, Inglaterra, etc agregaram-se para fazerem desaparecer o cenário que
acabaram de vivenciar. Para isso apostaram fortemente no desenvolvimento por acreditarem
que este poderia ser o caminho para a paz duradoura que tanto almejavam. Por causa disso,
esse conceito (desenvolvimento) passou a ser muito difundido, desde da época até então.
2.1– Conceito de desenvolvimento
Desenvolvimento é um conceito que entrou em voga quando, após a 2ª Guerra
Mundial, emergiram novos estados independentes nascidos da descolonização efectuada pelas
potências europeias. Com a independência, esses estados confrontaram-se com grandes
desigualdades entre o nível de vida das suas populações com as da Europa e dos Estados
Unidos da América. E, a procura de resposta para melhoria do nível de vida daquelas
populações determinou o estudo sistemático de desenvolvimento (conferências, declarações,
etc) e as respectivas estratégias para alcança-lo (REIS, 2000).
O ponto auge, em matéria de desenvolvimento, no período pós guerra foi a Carta das
Nações Unidas, divulgada em Abril de 1945 e a consequente criação oficial da Organização
das Nações Unidas, nesse mesmo ano, com o propósito primeiro de, a par do interesse pela
manutenção da paz, contribuir para a elevação dos níveis de desenvolvimento em todos os
países pertencentes à dita organização (REIS, 2000).
No entanto, a ideia de desenvolvimento esteve, nessa época, muito ligada à dimensão
económica, pois identificava-se com o progresso tecnológico e o crescimento económico
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duma determinada sociedade. Este conceito de desenvolvimento reflectia uma visão
racionalista, baseada na relação causa-efeito, ou seja, o crescimento económico conduzia
automaticamente ao desenvolvimento (REIS, 2000).
Mas, segundo REIS (2000) a consideração de desenvolvimento como sinónimo de
crescimento económico foi alvo, bem cedo (décadas de 50, 60), de várias críticas:
O fracasso das estratégias de ajudas internacionais ao desenvolvimento
baseados apenas na cooperação técnico-financeira;
O agravamento da situação de dependência dos países em vias de
desenvolvimento;
O aumento da pobreza e das calamidades sociais que o acompanham (fome,
miséria, má nutrição, analfabetismo, etc) no seio das populações desses países;
Os problemas ambientais que afectam, principalmente, as populações dos
países desenvolvidos;
Etc.
Perante essas constatações veio colocar a questão de se saber em que é que o
desenvolvimento se deveria centrar.
Vários contextos contribuíram para que se passe a ter um outro olhar sobre o
desenvolvimento. Hoje é-lhe atribuído um significado muito maior, envolvendo também
aspectos qualitativos, tais como o bem-estar da sociedade, o uso racional e equilibrado dos
recursos, a satisfação das necessidades básicas da população (alimentação, saúde educação,
etc). Mas, mesmo com tanta controvérsia, o crescimento económico, apesar de não ser
condição suficiente, é um requisito para superação da pobreza e construção de um padrão
digno de vida (REIS, 2000).
Assim, o desenvolvimento é actualmente entendido como sendo:
“Crescimento económico (incrementos positivos no produto) acompanhado
por melhorias do nível de vida dos cidadãos e por alterações estruturais na
economia” (SANDRONI, 1994: pag 40);
“A combinação de transformações mentais e sociais duma população que a
torna apta a fazer crescer cumulativamente e duravelmente, o seu produto real
global” (PERROUX, F, 1965 in: REIS 2000: pag 35);
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Das definições apresentadas é facilmente perceptível que o desenvolvimento
transcende o mero crescimento económico, pois, requer transformações profundas, ou mesmo
mudanças estruturais, em termos sociais e culturais, visando o bem-estar da população.
Com a crescente importância que os aspectos sociais e ambientais vêm conquistando
na senda internacional, o desenvolvimento não ficou alheio a eles. Assim, surgiram, centrado
na pessoa, o desenvolvimento humano, e, centrado nos recursos ambientais, o
desenvolvimento sustentável, como desenvolvimento alternativo.
Mas o desenvolvimento é, ainda hoje, um conceito não estabilizado e que apresenta
uma dimensão multidisciplinar. É, por outro lado, uma noção sempre inacabada, em
permanente desconstrução-reconstrução.
Com efeito, muitos países têm enfrentado vários constrangimentos que desafiam os
seus próprios processos de desenvolvimento. É o caso dos chamados Pequenos Estados
Insulares em Desenvolvimento.
2.2 – Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento: definição e caracterização
O advento dos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (PEID’S) na cena
internacional é um fenómeno relativamente recente e que se desenvolveu rapidamente.
Começou com a entrada da Islândia para a ONU, em 1946, mas o enfoque foi com as adesões
para a ONU na década de 70 de vários estados novos, fruto da “onda” de independência
política dessa época.
Apesar da inexistência de um quadro de conceitualização concreto e convincente,
entende-se por PEID`S, genericamente, países em desenvolvimento que ostentam reduzida
população, mercado, território, recursos naturais, e, em grande caso, com território
fragmentado e um baixo nível de actividade económica (CARDOSO, 2004).
Porém, tanto a dimensão populacional como o tamanho do território são aqui definidos de
forma qualitativa sem serem exactamente quantificados, permitindo uma certa promiscuidade.
Par ultrapassar esta confusão o Banco Mundial definiu PEID`S como sendo estados com
uma população absoluta que não ultrapassa um milhão de habitantes (ESTEVÃO, 2001). Mas
este conceito faz referência apenas ao componente populacional relegando para segundo
plano outras características importantes desses países, como a existência de poucos recursos,
etc.
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
Normalmente, no quadro conceptual combina-se a dimensão populacional com o
tamanho do território. Por isso, existem estados com esse estatuto que possuem uma
população superior ao limite imposto pelo Banco Mundial, mas com características
geográficas (insularidade e/ou fragmentação territorial) que enquadram na definição exposto
por CARDOSO (2004).
Contudo, constata-se que o conceito mais credível, embora impreciso em termos
quantitativos, é aquele apresentado por CARDOSO (2004) por albergar os traços que se
consideram capitais para identificar os estados insulares.
Tendo em conta a situação geográfica, constata-se que os PEID’S estão espalhados pelos
grandes espaços oceânicos do globo (Atlântico, Índico, Mediterrânico e Pacífico), mas com
uma relativa concentração no Mar das Caraíbas e no Pacífico Sul (quadro 1, página 10).
Os estados pertencentes ao grupo dos PEID’S apresentam características comuns que
definem a insularidade, como sendo:
Isolamento em relação ao continente (circunscrito pelo mar);
Pequena dimensão da área terrestre;
Fragmentação territorial;
População reduzida; e
Nível de desenvolvimento – em vias de desenvolvimento.
O isolamento constitui uma situação geográfica em que o país se encontra afastado do
continente (circunscrito pelo mar). Esta situação é um dos maiores handcap dos PEID’S por
afectar os custos de transportes tanto de matérias-primas, que na maior parte das vezes são
importadas, como de produto final, encarecidos pelo custo dos transportes contribuindo,
assim, para a perda de competitividade destes países. Em contrapartida a insularidade permite
a consolidação da nação, controlo das pragas, o surgimento de determinadas condições
passíveis de renda de situação, sobretudo na posse de algumas praias passíveis de exploração
turística (ESTEVÃO, 2001).
A pequena dimensão territorial faz com que esses estados têm carências em termos de
recursos naturais constituindo um grande entrave ao desenvolvimento de todos os sectores de
actividade, principalmente o sector secundário, pois obriga-o a apostar na importação de
matérias-primas com as consequências adversas inerentes. Para além de ser de pequena
dimensão, em muitos casos, são também territórios fragmentados, dividindo o território em
vários nichos de pequenos mercados (ESTEVÃO, 2001).
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
Quadro1 – Pequenos estados insulares, por regiões oceânicas, em 2007Regiões Países População
Absoluta (2002)
Área (km²)
Atlântico Antígua e Barbuda 65 000 442
Bahamas 312 000 13 878Barbados 269 000 430Cabo Verde 446 000 4 033Dominica 8 639 000 751Granada 94 000 344Jamaica 2 621 000 10 990Santa Lúcia 151 000 622São Cristóvão e Névis 38 000 261São Tomé e Príncipe 143 000 964São Vicente e Granadinas 115 000 388Trindade e Tobago 1 306 000 5 130
Índico Bahrain 677 886 622
Comoros 749 000 2 235Maldivas 309 000 298Maurício 1 210 000 2 040Seychelles 83 000 455
Mediterrâneo Chipre 746 740 9 251
Malta 375 000 316Pacífico Fiji 832 000 18 274
Kiribati 85 000 811Marshall 53 000 181Micronésia 129 000 702Nauru 13 000 21Palau 20 000 459Salomão 479 000 28 896Samoa 159 000 2 831Tonga 100 000 748Tuvalu 10 000 158Vanuatu 207 000 12 185Timor-Leste 1 019 252 15 007
Obs.: Os sombreados constituem alguns exemplos de estados insulares africanosFonte de dados: Site: www. Small Island Developing States Network List of Islands.htm Elaboração própria.
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
A reduzida população acarreta a formação de um mercado interno também reduzido, o
que traz como resultado um consumo interno limitado, encarecendo os custos de produção per
capita e dificultando o uso da economia de escala, o que inviabiliza o estabelecimento de
alguma secção de produção tendo em conta que algumas delas exigem grandes mercados para
se instalarem (BOUCHARD, 2004).
O nível de desenvolvimento, o facto de os PEID’S serem países em desenvolvimento,
tende a agravar os efeitos da insularidade sobre a economia, devido à falta de capacidade
financeira e tecnológica para fazer face aos constrangimentos (ESTEVÃO, 2001).
Nalguns casos, à essas quatro características associa-se a fragmentação territorial,
considerada como a dupla insularidade, que permite uma desmultiplicação e manutenção de
infra-estruturas independentes ou parcialmente independentes, como aeroportos, portos,
estradas, escolas, serviços de saúde, etc, em cada ilha encarecendo os custos de
funcionamento dos mesmos e bem como a prática da deseconomia de escala (BOUCHARD,
2004). Ainda, a descontinuidade territorial embarga o acesso, na íntegra, ao mercado interno
por exigir o uso de transporte marítimo e/ou aéreo, condicionando o custo final dos produtos.
Ao mesmo tempo a segmentação territorial oferece oportunidade de negócios, principalmente
nos sectores da pesca, transporte, etc. Mas, de uma forma geral, a separação do território
embaraça o equilíbrio regional, condicionando o desenvolvimento do conjunto nacional.
Todavia, segundo ESTEVÂO (2001) as condicionantes impostas pela insularidade não
resultam apenas da mera sobreposição dessas variáveis anteriormente citados. O seu resultado
é mais do que a soma das suas partes. Da acção sinérgica (acção conjunta e retroactiva) dos
aspectos peculiares (tamanho, isolamento, fragmentação territorial e nível de
desenvolvimento) surgem outros constrangimentos, como sendo:
Pouca diversificação do sistema produtivo;
Fraqueza da capacidade institucional;
Grande abertura do mercado; e
Forte dependência em relação ao exterior.
A atenuada diversificação do sistema produtivo interno é consequência tanto da pequena
dimensão da área geográfica, como da fraca dotação em recursos naturais, bem como da
estreiteza do mercado interno. Esta concentração na produção reflecte-se numa relativa
incapacidade para sustentar actividades industriais, especialmente aquelas que exigem uma
certa dimensão do mercado interno para se estabelecerem. E, a carência deste sector faz com
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
que esses estados tenham uma grande dependência em relação aos sectores primários e
terciários, enquanto fontes de produção, emprego e divisas externas (ESTEVÃO, 2001).
A capacidade institucional manifesta-se de uma forma fraca, tendo em conta que o
exercício da soberania implica o fornecimento de um amplo conjunto de bens e serviços
públicos (ex. governo, administração pública, segurança, sistema judicial, etc.), e os elevados
custos de infra-estruturas, para cobrir todo o território, constituem uma forte limitação á
implantação eficiente de todas as instituições acima referidas. Portanto, a criação de
capacidade institucional é, por isso, limitada pela escassez de recursos tanto financeiros como
humanos, fazendo-se sentir tanto no sector público, privado e das relações internacionais.
A reduzida diversificação da produção e a elevada concentração da exportação criam aos
Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento uma situação de grande abertura ao
mercado internacional, principalmente com os fluxos do comercio externo (sobretudo a
importação), e grande dependência (económica e política) em relação ao exterior, visto que
muitas vezes a dinâmica da economia interna depende fortemente do impulso externo, como
as remessas de emigrantes, ajuda pública ao desenvolvimento ou receitas de turismo. Essa
dependência leva a que esses países sejam influenciados pelas tendências de comércio
internacional, dado o seu pequeno volume de trocas relativamente aos mercados externos
(BRIGUGLIO, 2003).
As características acima apontadas, tanto as essenciais como as resultantes da acção
sinérgica, tornam os PEID’s extremamente frágeis, com uma grande vulnerabilidade, tanto do
ponto de vista económico como ambiental.
Do ponto de vista económico, estes estados estão muito dependentes dos mercados externos por vezes distantes, têm um capital humano escasso, frequentemente estão muito dependentes de um pequeno número de mercadorias tais como as bananas, o açúcar ou o turismo. A pequenez do mercado interno, resultante quer da reduzida população quer do seu baixo poder de compra, inviabiliza a existência de economias de aglomeração ou economias externas, ao mesmo tempo que não permitem que as actividades produtivas e infra-estruturas se dimensionem de modo a que se possam obter economias de escala (BOUCHARD, 2004).
Do ponto de vista ambiental, os limitados recursos naturais como as pescas, os recifes de
coral, a água potável ou a areia são ameaçadas pela população e pelas pressões comerciais.
Têm, por isso, que ser protegidos para fornecerem subsistências para as gerações presentes e
futuras. Zonas baixas e partes da costa das pequenas ilhas (representando com frequência o
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
total da área terrestre) são, também, ameaçados por fenómenos globais tais como a mudança
climática e a subida do nível do mar (BRIGUGLIO, 2003).
No entanto, mesmo internamente ao grupo dos PEID’S são diferentes os riscos a que cada
país está exposto.
Esta vulnerabilidade põe em dúvida a sua capacidade de desenvolvimento autónomo e
da sua sustentabilidade não só do ponto de vista ambiental mas, também, económico e social.
Por isso, os PEID’S foram alvos de vários estudos sistemáticos por parte de diferentes
autores.
Assim, DOSÍ (2002), analisando as regiões insulares e ultraperiféricas como os
Baleares, as Canárias, Ceuta e Melila, constatou que a situação insular trás como
consequência um aumento de dependência do ponto de vista económico, como sendo as
desvantagens locativas, aumento dos custos de mobilidade, limitação da capacidade de
produção e crescimento, aumento do preço dos transportes e os custos finais dos meios de
produção, mas também do ponto de vista social e psicológico, como maior dificuldade em
aceder à informação, elevada interacção e consequentemente maior “controlo” social.
Segundo FERREIRA (1998) a insularidade contribui para a existência de deseconomia
de escala associadas à necessidade de desmultiplicação das infraestruturas (aeroportos, portos,
estradas, escolas, serviços de saúde, etc.), dependência em relação aos fluxos financeiros
externos nomeadamente sob a forma da Ajuda Internacional, problemas de gestão (mais
difícil implementar decisões de forma isenta), etc.
De acordo com BASS e CLAYTON (1995) os Pequenos Estados Insulares têm
capacidade limitada tanto de produção como de consumo pelo que geram monopólios e não
conseguem fazer operações de larga escala e nem criar um grande capital financeiro dentro do
mercado interno.
Os pequenos estados insulares estão, portanto, perante árduos desafios de
desenvolvimento. Para atingir esse desenvolvimento terão que satisfazer três condições
fundamentais, segundo ESTEVÂO (2001) das quais, (i) uma articulação estreita com a
economia mundial, (ii) uma economia interna capaz de atrair investimento externo e (iii) uma
acção estratégica do Estado. A articulação é importantíssima porque é ela que permite
ultrapassar as limitações impostas pela pequena dimensão e pela insularidade. Quanto á
dinâmica interna, é necessário alcançar a dimensão e a diversificação dos investimentos
capazes de garantir o impulso adequado para a descolagem da economia e para a sustentação
do processo de acumulação de capital. E, ainda, é indispensável uma acção do Estado em
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
sintonia com o mercado, mas uma acção estratégica, capaz de assegurar a promoção e a
regulação do desenvolvimento.
O reconhecimento da comunidade internacional da situação peculiar dos PEID’S, no
processo de desenvolvimento, foi enfatizado com a realização, pelas Nações Unidas, da
Conferência de Barbados, em 1994, que permitiu a definição de um conjunto de normas e
políticas a serem implementadas pelos PEID’S a nível nacional, regional e mesmo
internacional para que possam alcançar um desenvolvimento sustentado.
Mas, antes da Conferência de Barbados, foram realizadas outras tantas conferências
preparatórias como a Conferência de Ramsar em 1971, a Conferência de Stockholm, em 1972,
a Cimeira de Rio de Janeiro, em 1992, sobre ambiente e desenvolvimento. Após a conferência
de Barbados, a Declaração de Valletta, em Malta (1998), o Fórum dos pequenos estados, em
2002, Conferencia das Maurícias, em 2005, foram outros tantos acontecimentos para a
chamada de atenção à comunidade internacional dos problemas dos PEID’S.
Perante a identidade dos pequenos estados insulares (isolamento, fragmentação
territorial, poucos recursos, pequena dimensão territorial e populacional e os que resultam da
acção sinérgica) constata-se que para todo pequeno estado insular em desenvolvimento, em
qualquer grupo ou região que esteja inserido, e comparado com outros Estados intra
continentais, o grau de desafios de desenvolvimento é muito maior, particularmente os
estados insulares africanos.
2.3– Pequenos Estados Insulares Africanos em Desenvolvimento
Os estados insulares africanos, inventariados no quadro1 (página 10) – sombreados,
encontram-se inseridos numa conjuntura política, económica e social muito grave que
compromete, ainda mais, os seus processos de desenvolvimento.
Assim, do ponto de vista político este continente padece de guerras e conflitos étnicos,
da corrupção, da ditadura política, da má governação, etc. que embaraçam as relações não só
intra estado mas também entre estados, contribuindo para os desequilíbrios político-
administrativos tanto dos estados em si como do continente como um todo. Ainda mais, essa
situação lesa a imagem e a credibilidade dos estados africanos afectando tanto as ajudas ao
desenvolvimento como as cooperações, unilaterais, bilaterais ou mesmo multilaterais, bem
como os investimentos externos, públicos ou privados.
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
No sector económico a África encontra-se, no cômputo geral, mergulhado em
estratégias falhadas, com grande endividamento público e em situação de dependência. O
sistema produtivo baseia-se fundamentalmente no sector primário, especialmente de matérias-
primas, feitos de forma tradicional e, por isso, comercializado a baixo preço no mercado
internacional ou então em pequenas unidades fabris com uso de tecnologia tradicional. Por
isso a economia dos estados africanos encontra grandes dificuldades na inserção na
globalização, que constitui um fenómeno cada vez mais assente na sociedade de então.
No que tange ao sector social, apresenta os piores índices a nível mundial. As
calamidades como a má nutrição, a fome, as doenças (VIH/Sida, tuberculose, lepra,
paludismo, droga, etc.), altas taxas de desemprego, altas taxas de analfabetismo, baixas taxas
de escolarização, baixo número de médicos por habitantes, altas taxas de mortalidade infantil
etc. afectam quase que todos os estados africanos.
De acordo com a Reunião dos Representantes dos Pequenos Estados Africanos1, esses
estados enfrentam problemas como a integração, tanto regional como global, por causa da
fraca capacidade de competitividade, a formação de capacidade e o investimento privado,
visto que necessitam não somente de capacidade técnica como também de capacidade física
básica como construção de estradas, portos, centrais geradoras de energia, etc e o problema
correlato de como atrair investimentos privados, dado que não há pronta assistência
necessariamente disponível e suficiente de fontes multilaterais como o Banco Mundial, a
União Europeia, etc.
Particularmente para os pequenos estados insulares africanos, inventariados no quadro
anteriormente apresentado (a sombreados), esta conjuntura torna-se mais perverso pelas
características inerentes a estes estados.
Ao contrário de outros espaços (Caraíbas, por exemplo), os pequenos estados insulares
africanos encontram-se dispersos por todo continente, dificultando, pelas distâncias, a
organização de grupos e, ainda, a falta de proximidade de um mercado maior, como os EUA
para os caribenhos e Ásia e Austrália para as ilhas do pacífico.
Apesar dessas características serem ainda incipientes em muitos dos países insulares
africanos, o certo é que estorvam a constituição de um bloco político-económico unido e forte
capaz de assumir os interesses do continente perante os interesses doutros blocos e projectar
um caminho coerente e consistente para todos os estados africanos, particularmente de Cabo
Verde.
1 - Reunião dos Representantes dos Pequenos Estados Africanos realizada em Valência (Espanha) a 27 de Maio de 2001.
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
III – ENQUADRAMENTO DE CABO VERDE
Cabo Verde foi descoberto no século XV, por volta de 1460, pelos navegadores
portugueses, numa das várias viagens de descobrimento feito por este povo. Como colónia
portuguesa, Cabo Verde foi povoado por gentes vinda fundamentalmente de África e em
menor escala da Europa. De entre as funções desempenhadas por Cabo Verde para a
metrópole portuguesa destaca-se a de ponto de escala para abastecimento dos navios que
cruzavam o Atlântico. Após cerca de cinco séculos de domínio português, Cabo Verde
alcançou a independência, no dia 5 de Julho de 1975, tornando-se num Estado soberano.
3.1 – Origem e localização geográfica
O arquipélago de Cabo Verde está localizado, conforme a figura 1 abaixo indicado, no
continente africano na margem oriental do Atlântico Norte, entre os paralelos14º48´N (Ponta
de Nho Martinho, ilha da Brava) e 17º12´N (Ponta Cais dos Fortes, ilha de Santo Antão) e os
meridianos 22º44´W (ilhéu Baluarte, ilha da Boavista) e 25º22´W (Ponta Chã de Mangrado,
ilha de Santo Antão), a uma distância aproximada de 450 km do cabo, na costa senegalesa,
que lhe deu o nome, e a cerca de 1400 km a SSW das Canárias. Fig 1 – Localização geográfica de Cabo Verde. (Fonte: www.google.mapas de cabo verde.com.)
16
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
No seu conjunto as ilhas cobrem uma área emersa de cerca de 4.033 km², emparcelada
em dez ilhas e treze ilhéus divididos em dois grupos em conformidade com a posição relativa
ao vento (figura 2). O grupo de Barlavento, situado a Norte, é constituído pelas ilhas de Santo
Antão, São Vicente, Santa Luzia, São Nicolau, Sal e Boavista e os ilhéus Boi, Pássaros,
Branco, Raso, Rabo de Junco, Curral de Dado, Fragata, Chano e Baluarte e o grupo de
Sotavento, a Sul, é composto pelas ilhas de Maio, Santiago, Fogo e Brava e os ilhéus Santa
Maria, Grande, Luís Carneiro e de Cima.
Fig 2 – Arquipélago de Cabo Verde
Fonte: www. Google mapas de Cabo Verde.com
A dispersão das ilhas define uma vasta área marítima, tanto entre as ilhas como em
torno do arquipélago, concretizando uma zona económica exclusiva de cerca de 750 000 km².
17
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
A dimensão das ilhas que compõem o arquipélago é muito variável, sendo Santiago a
maior das ilhas, com 991 km², e Santa Luzia a mais pequena das ilhas, com apenas 35 km²,
conforme o quadro abaixo indicado.
Quadro 2 – Comparação das dimensões, populações e densidade populacionais das ilhas. Ilhas Superfície em
km²
% População
(2007) *
% Densidade
Populacional
Santo Antão 779 19.3 48 611 9.9 62.4 hab/ km²
São Vicente 227 5.6 76 736 15.6 338 hab/ km²
Santa Luzia 35 0.9 Não habitada 0 0 hab/ km²
São Nicolau 343 8.5 13 055 2.7 38 hab/ km²
Sal 216 5.4 18 785 3.8 87 hab/ km²
Boa Vista 620 15.4 5627 1.1 9 hab/ km²
Maio 269 6.7 7807 1.6 29 hab/ km²
Santiago 991 24.6 276 635 56.3 279.1 hab/ km²
Fogo 476 11.8 37 804 7.7 79.4 hab/ km²
Brava 64 1.6 6359 1.3 99.3 hab/ km²
Total 40332 100 491 419 100 121.8 hab/ km²
* Estimativa Fonte: Elaborado a partir de dados do INE.
3.2 – Meio Físico e Recursos Naturais
O meio físico e os recursos naturais cabo-verdianos são característicos da situação
geográfica mas, mesmo assim, apresentam algumas peculiaridades que os singularizam no
conjunto dos países desta região africana e que serão a seguir evidenciados.
3.2.1 – Aspectos climáticos
Cabo Verde está situado, em termos climatológicos, numa região de clima árido e
semi-árido, denominada região saheliana que se estende por toda a África Setentrional, desde
o Atlântico ao Mar Vermelho, no domínio dos ventos alísios de Nordeste, entre as altas
2 - O total é maior que a soma das parcelas por causa dos ilhéus que não estão presentes no quadro.
18
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
pressões subtropicais do Atlântico (Açores a Norte, Santa Helena a Sul) e as baixas pressões
equatoriais da Frente Inter-Tropical (FIT).
Deste modo, o clima de Cabo Verde é do tipo tropical seco, apresentando duas
estações do ano bem distintas, ligadas ao movimento da Convergência Inter-Tropical (CIT),
sendo a estação seca ou «tempo das brisas», vai de Dezembro a Junho e a estação das chuvas
ou “tempo das águas” vai de Agosto a Outubro. Os meses de Julho e Novembro são
considerados de transição, podendo apresentar características da estação húmida ou da estação
seca, consoante maior ou menor duração das precipitações, que por seu turno são fracas e
irregulares. As médias anuais não ultrapassam 300mm nas zonas situadas a menos de 400m
de altitude e nas zonas situadas a mais de 500m de altitude expostas aos alísios, pode se
verificar precipitações superiores a 700mm.
O clima de Cabo Verde é fortemente influenciado pelo relevo. É responsável pela
diferenciação do País em andares bio-climáticos, mais árido no litoral e mais húmido até a
altitude da ordem dos 1500 m, a partir da qual aparece um andar árido de altitude.
As ilhas orientais (Sal, Boa Vista e Maio), porque são baixas e planas, limitam-se
praticamente aos andares árido e semi-árido. As restantes ilhas registam uma variação
climática desde semi-árido, no litoral, ao húmido nas montanhas.
Nas ilhas montanhosas, as vertentes voltadas para norte e para Nordeste são mais
verdejantes, devendo-se às precipitações ocultas provocadas pelos nevoeiros de altitude,
resultante da subida do ar dos alísios.
3.2.2 – Aspectos geomorfológicos
A geomorfologia de Cabo Verde é bastante diversificada, apresentando cada ilha a sua
especificidade. O relevo é muito acidentado nalgumas ilhas, tais como Santo Antão, São
Nicolau, Santiago, Fogo e Brava com inúmeras cadeias montanhosas, notáveis aparelhos
vulcânicos, nomeadamente cones, crateras, caldeiras e profundos vales. Nas ilhas orientais,
também denominadas rasas, nomeadamente Sal, Boa Vista, Maio e Santa Luzia, predominam
formas de relevo atenuadas, com planuras mais ou menos extensas e pequenas elevações. A
ilha de São Vicente é considerada de posição intermédia.
Nas denominadas ilhas rasas podem observar-se zonas planas, tendo como exemplo,
Calheta, Morrinho, Cascabulho e Terrenos Salgados, todas na ilha do Maio, Vila do Sal Rei
na Boa Vista e terra Boa na do Sal. Nessas ilhas devido à erosão, as formas originais de relevo
vulcânico foram geralmente modificados, dando lugar a vales profundos, cutelos e achadas.
19
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
Na ilha do Fogo observam-se cones vulcânicos de várias dimensões, distinguindo-se o
pico do vulcão que corresponde ao ponto mais alto do Arquipélago, com 2829 m de altitude.
3.2.3 – Aspectos geológico
A geologia do Arquipélago é constituída fundamentalmente por rochas básicas. Para
além das rochas básicas existem também rochas fonotraquíticas e, ainda, produtos
piroclásticos (bombas, lapilli, tufos e areias).
Em todas as ilhas existem rochas sedimentares (areias, cascalhos da praia, aluviões,
depósitos de enxurradas e de vertente), com particular incidência na ilha do Maio, onde
afloram argilas, calcários Jurássico e Cretácico. É de referir que na ilha do Maio
contrariamente a todas as ilhas, a percentagem das rochas sedimentares é superior à das
rochas magmáticas.
Em Cabo Verde existem formações com dois tipos de magmatismo: Um «Tholeíticos»
evidenciado na ilha do Maio pela existência de lavas em almofada sob calcário Jurássico
Cretácico, que representam um segmento levantado da Crosta Oceânica. O outro é «alcalino»,
sub saturado e originou os edifícios vulcânicos que constituem as ilhas. É predominantemente
cenozóico, destacando-se a manifestação mais recente a erupção de 1995 (na ilha do Fogo).
As principais sequências vulcano-estratigráficas do magmatismo alcalino estão
representadas nas diversas ilhas. As sequências vulcânicas alcalinas incluem, essencialmente
nefelinitos, mililitos, basanitos e basaltos olivínicos, sendo as rochas fonolíticas e afins os
membros mais diferenciados.
3.2.4 – Os recursos naturais exploráveis
Por recursos naturais entende-se conjunto de todos os bens de que o homem pode
dispor na natureza para a satisfação das suas necessidades.
Cabo Verde é um país de escassos recursos naturais e dos poucos que existem não
têm, actualmente, um grande interesse de ponto de vista económico. Mas dentro do pequeno
universo destacam-se os recursos geológicos, os hídricos, os marinhos, orla costeira e os
recursos energéticos por serem esses os que oferecem maiores potencialidades de exploração
no país.
3.2.4.1 – Os recursos geológicos
20
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
Os recursos geológicos que apresentam maiores interesses económicos no país são o
basalto, o calcário, a areia, a argila, o gesso e a pozolana. Esses recursos, com a excepção do
basalto, existem em pequena quantidade sendo, por isso, insuficientes para a satisfação das
necessidades nacionais, tendo o país que recorrer muitas vezes à importação como é o caso da
areia. Quanto ao basalto, tendo em conta a natureza vulcânica das ilhas, encontra-se espalhado
por todas as ilhas.
Esses recursos são explorados num molde tradicional, visando essencialmente a
satisfação das necessidades locais em pedras, cascalho, brita e areia. A exploração industrial
resume-se à produção de cimento, na ilha de Santo Antão, a partir do calcário e da pozolana, à
extracção de areia para o uso na construção civil e à produção mecânica de areia e brita a
partir do basalto, em Santiago e São Vicente.
No que tange aos recursos geológicos minerais não existem registos com potencial
económico, passíveis de exploração, à excepção de magnetite e ilmenite, que podem ser
encontradas em todas as ilhas mas de pouco valor.
Ainda ligado aos recursos geológicos, regista-se a existência, em diversas ilhas, de
diferentes estruturas vulcânicas que apresentam um potencial e interesse científico e turístico.
3.2.4.2 - Os recursos hídricos
A água, enquanto recurso, entra como base de suporte do dia-a-dia dos cabo-verdianos
no abastecimento doméstico e como factor de produção nos diversos sectores da actividades
económica e social, com destaque para agricultura, pecuária, indústria, saneamento básico,
obras públicas e turismo.
Mas, pelas características climáticas que o país possui, áridas e semi-áridas, a água
assume uma importância particular.
O potencial hídrico tecnicamente explorável, segundo o Livro Branco sobre o Estado
do ambiente em Cabo Verde (LBEACV - 2004), concentra-se em 90% nas ilhas mais altas –
Santo Antão, Santiago e Fogo, demonstrando um tamanho desequilíbrio nacional.
As práticas de captação e armazenamento das águas superficiais são raras, destacando-
se a barragem de Poilão, e a produção natural é essencialmente de origem subterrânea, feita
através de nascentes, galerias escavadas horizontalmente nos basaltos, aquíferos aluvionares
(poços e drenos transversais) e furos profundos. Estima-se a existência de 2.304 nascentes e
galerias, 1.173 poços e 238 furos para um caudal diário de cerca de 99.400 m3. As nascentes
21
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
contribuem com 61%, contra 24% dos poços e 15% dos furos (SEPA3, 2000 In LBEACV-
2004).
Nas ilhas de Santo Antão, Santiago e Fogo, a água das nascentes de altitude e dos
aquíferos aluvionares são facilmente acessíveis, e daí se encontrarem plenamente explorados
ou mesmo sobre-explorados. Nas ilhas onde não existem recursos hídricos subterrâneos em
quantidade e qualidade suficientes a produção básica é assegurada pela dessalinização da água
do mar (SEPA, 2000 In LBEACV- 2004).
3.2.4.3 - Os recursos marinhos
Cabo Verde dispõe do mar como um recurso natural que deve ser estrategicamente
aproveitado no seu processo de desenvolvimento. De entre as principais utilizações deste
recurso, pela sua importância destaca-se a pesca, a produção de sal, água potável por
dessalinização e os transportes marítimos.
A produção de sal é feita, apesar da tradição histórica, em pequena escala
principalmente nas ilhas do Sal e do Maio, sendo uma das potencialidades a ser explorado. Fig 3 – Vista de salinas na ilha do Sal
Fonte: http//www.ly nxlab.com/personal/vimano/caboverde/sal_pedra de Lume/sourse/3.htm
A dessalinização tem vindo a ser implementado cada vez mais em maior quantidade de
ilhas, estando actualmente em Santiago, Sal, São Vicente e Boa Vista, sendo nalguns casos
cobrindo o total de consumo nessas ilhas.
O transporte marítimo é assegurado por unidades mistas de carga e passageiros, sendo
mais frequentes entre as ilhas mais próximas pelo que, como via de ligação entre as ilhas, o
mar não é ainda convenientemente explorado.
3 SEPA - Secretariado Executivo Para o Ambiente.
22
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
3.2.4.4 – A Orla Costeira
A orla costeira representa uma zona de transição entre os meios terrestre e marinho
sob influência das manifestações naturais que ocorrem num e noutro meio e, está
normalmente submetida a pressões humanas de natureza diversa fundamentalmente como a
urbanização (imobiliárias, estabelecimentos hoteleiros, infra-estruturas portuárias, etc).
A orla costeira apresenta uma grande diversidade devido ao facto das ilhas serem todas
diferentes umas das outras em termos de dimensão, morfologia, orografia e extensão da linha
de costa, estimada em 1.017,7 km para todo o arquipélago.
A diversidade existente ao nível da orla costeira, está relacionada com a natureza
geomorfológica, geofísica, pedológica e orográfica das praias e encostas, muito condicionada
por fenómenos físicos e oceanográficos dominantes – velocidade e a direcção dos ventos,
correntes marítimas, ondulação e marés.
Assim, a orla costeira é composta por arribas rochosas, praias de areia preta ou branca,
praias de calhau ou de cascalho, zonas de baixios rochosos, pedregosos e arenosos, zonas de
dunas e vales de ribeiras (DGMP4, 1997 In LBEACV - 2004).
3.2.4.5 – A energia
Apesar de ser um dos sectores em que o País apresenta grandes potencialidades em
termos de energias alternativas, a energia constitui um grande entrave ao desenvolvimento de
Cabo Verde
Este embaraço é provocado pela dependência em energia fósseis (petróleo e seus
derivados) de que o País não dispõe e pela incapacidade de desenvolver o uso de energias
alternativas principalmente a energia eólica, oceânica e a energia solar, que apresentam
óptimas condições de exploração em todo o território nacional.
A dependência energética em petróleo e seus derivados tem pesado muito no PIB
nacional, não só pela alta do preço no mercado internacional, e com tendência para um
aumento cada vez maior, como também pelo transporte dos mesmos até ao território nacional
e, daí, contaminando, directa ou indirectamente, todos os outros sectores pelo uso
generalizado da energia.
Mas, para além do petróleo e seus derivados o sector da energia é caracterizado por
uma pequena percentagem de energias renováveis (eólica e solar) e também uma alta procura
4 - DGMP – Direcção Geral da Marinha e Portos.
23
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
de combustíveis de madeira, incluindo lenha, carvão e outras biomassas principalmente no
mundo rural.
As potencialidades energéticas naturais do arquipélago são muito boas e com uma
margem de expansão ainda muito grande que poderá ser utilizada no aumento da contribuição
de energias renováveis para o balanço energético nacional. Destaca-se as potencialidades em
termos de energia eólica, solar, oceânica (ondas, marés e gradientes térmicos) e geotérmica.
Em termos de energia eólica existem no país cerca de 8 unidades localizadas em
Mindelo, Praia e Sal, com uma capacidade de cerca de 2,4 MW e uma produção de cerca de
10% da energia gerada nessas ilhas utilizadas, principalmente, na agricultura para bombagem
da água dos poços em zonas rurais (PANA, 2002).
A energia solar é explorada através do uso de painéis fotovoltaicos para alimentação
de faróis, funcionamento de telefones, bombas de água e iluminação em zonas rurais remotas.
Recentemente passou a ser utilizada também em instalações hoteleiras e habitações das zonas
urbanas, essencialmente para o aquecimento de água (PANA, 2002).
A energia lenhosa, é uma outra fonte de energia bastante utilizada nas zonas rurais,
estimando-se uma produção anual nacional entre 69.000 e 79.000 toneladas de lenha (PANA,
2002) limitada às áreas florestadas e algumas árvores e/ou arbustos disseminados pelos
campos agrícolas ou de pastagens. A urbanização crescente induziu a uma maior utilização do
gás butano, em substituição gradual da lenha, que é muito variável em função do preço dos
combustíveis no mercado nacional e internacional, assumindo em S. Vicente, Sal e Boavista,
contrariamente às demais ilhas, níveis muito baixos.
3.3 – Caracterização Demográfica e Social
A população de Cabo Verde está a crescer, pese embora a um ritmo de menor
intensidade nos últimos anos, pelo impacto do programa de controlo da natalidade levado a
cabo nos finais de 90 e princípios de 2000, pelo aumento do nível de instrução da população,
pela redução da taxa de mortalidade, estagnação do fenómeno da emigração e o aumento da
imigração dos africanos continentais. Mas a esse crescimento populacional não tem havido
uma resposta social sólida que permita melhorar as condições de vida dessas populações.
3.3.1 – Evolução demográfica
24
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
Desde do povoamento, em 1462, a população residente no país conheceu grandes
oscilações provocadas pelas crises crónicas de insegurança alimentar acompanhadas de
grandes fluxos migratórios. Mas, particularmente a partir da década de 50, a evolução da
população manteve-se a um ritmo crescente e regular, principalmente nos últimos anos.
Como se depreende da figura 4, abaixo indicada, na década de 40 registou-se um
crescimento negativo da população, passando de cento e oitenta e dois mil habitantes para
cerca de cento e cinquenta mil habitantes, representando um decréscimo de 31.769 habitantes
(17.5%).
Fig4 – Evolução da população de Cabo verde de 1940 a 2007
Fonte: Elaborado a partir de dados do INE.
Este período é bem destacado na história do país pois foi caracterizado por uma grande
calamidade social (fome, doenças, etc) que abalou todo o território nacional, com grandes
perdas de população.
Exceptuando esse período, a evolução da população é marcadamente positiva, sendo
de maior expressividade no período 1990/2000 com um aumento de cerca de noventa e cinco
mil habitantes (27.8%). De 2000 a 2007 a evolução da população é menos intensiva
efectivando um acréscimo de cerca de cinquenta e quatro mil e quinhentos e noventa e oito
habitantes (12.5%), correspondendo a 491 419 habitantes.
3.3.2 – Distribuição da população residente
Com uma densidade populacional de cerca de 122 hab/km² (2007), a população
distribui-se de uma forma assimétrica pelas diversas ilhas que compõem o país. É tão
acentuada essa assimetria que cerca de 67% da população reside nas ilhas que compõem o
25
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
grupo de Sotavento (Maio, Santiago, Fogo e Brava) e apenas cerca de 33% vive nas ilhas de
Barlavento. O grande peso populacional de Sotavento deve-se, principalmente, à contribuição
da ilha de Santiago que sozinha alberga cerca de 56.3% da população do país. Para além de
Santiago, é de se realçar a ilha de São Vicente com 15.6%, Santo Antão com 9.8%, Fogo com
7.6%, sendo as restantes ilhas, em conjunto, com apenas 10.8%, conforme o gráfico abaixo
apresentado.
Fig 5 – Distribuição da população residente por ilha em 2007.
Distribuição da população por ilhas (dados percentuais)
S Antão S Vicente S Nicolau Sal B Vista
Maio Santiago Fogo Brava
Fonte: Elaborado a partir de dados do INE
Esse desequilíbrio regional deve-se tanto a factores políticos como naturais. Assim, no
campo político, as ilhas mais povoadas são as mais infra-estruturadas (Santiago e S. Vicente)
e apresentam, por isso, melhores oportunidades tanto de emprego como de desenvolvimento
humano (Universidades, centros de formação profissional, etc). Em termos naturais,
exceptuando S. Vicente, são as que possuem melhores aptidões agrícolas (Santiago, Fogo e
Santo Antão). O caso concreto de S. Vicente está relacionado com o desenvolvimento do seu
porto (Porto Novo) que em tempos contribui muito para a ascensão económica da ilha.
Esses dois condicionantes (político e natural) contribuíram para que haja um forte
movimento migratório das ilhas sem essas condições para aquelas que possuem tais condições
(migrações internas), acentuando as desigualdades populacionais entre as ilhas.
Contudo, nos últimos anos, a prestação de serviços, principalmente o turismo, está a
contribuir grandemente para o aumento populacional das ilhas que, pela extrema aridez, eram
menos povoadas como Sal e Boa Vista.
3.3.3 – Estrutura etária da população
26
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
A população absoluta do país, em 2007, era estimada em 491 419 habitantes (INE,
2008), sendo 237 842 indivíduos de sexo masculino, correspondendo a cerca de 48.4%, e 253
577 indivíduos de sexo feminino (51.6%), o que demonstra uma relativa supremacia feminina.
Isto deve-se, entre outros factores, à preponderância masculina no fenómeno da emigração e à
menor esperança de vida masculina (68.3 anos - Homem, contra 76.1 anos - Mulher).
Da pirâmide de idade depreende-se que a população cabo-verdiana é muito jovem,
pois a base pirâmide é muito larga correspondendo a uma elevada taxa de natalidade (25.1%o
em 2007). A população activa (18 a 64 anos) corresponde a cerca de 50% da população.
Fig 6 – Pirâmide etário de Cabo Verde em 2007
3.3.4 – Infra-estruturas básicas
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
Cabo Verde confronta-se com situações graves de insuficiência de infra-estruturas
básicas indispensáveis ao padrão mínimo de qualidade de vida recomendado pelas
organizações internacionais vocacionadas para a problemática do desenvolvimento humano.
Esta situação de carência traz sérias implicações em termos do nível de conforto dos
agregados familiares, repercutindo negativamente em matéria de saúde pública.
3.3.4.1 – Água
O abastecimento de água adequado aos vários sectores constitui, em Cabo Verde, uma séria dificuldade. Por todo o território nacional a disponibilidade deste precioso líquido, quer em quantidade como em qualidade, é um grande problema. Apenas cerca de 25% (INE, censo 2000) dos agregados familiares do país dispõem de água canalizada, sendo cerca de 50% (INE, censo 2000) abasteciam-se a partir de fontanários públicos (chafarizes).
Fig 7 – Agregados familiares por modo de abastecimento de água
Agregados familiares por modo de abastecimento de água
05
101520253035404550
Águacanalizada
da redepública
Cisterna Auto-tanque
Chafariz Poço Nascente Levada Outro NR
Fonte: Elaborado a partir de dados do INE (Censo 2000) – dados percentuais.
3.3.4.2 – Electricidade
Como fonte de energia a electricidade é a mais utilizada pela população mas somente a metade dos agregados familiares tem acesso a esse recurso, sendo o recurso alternativo mais usado o petróleo com cerca 36%, conforme o gráfico a seguir representado.
28
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
Fig 8 – Agregado familiar segundo energia para iluminação
Agregado familiar segundo energia para iluminação
0
10
20
30
40
50
60
Gás Electricidade Petróleo Outro
Fonte: Elaborado a partir de dados do INE (censo 2000) – dados percentuais.
A electrificação tem sido uma das grandes apostas dos sucessivos governos tendo em
conta que constitui um dos pilares básicos para o desenvolvimento de todos os outros sectores
de actividades, nomeadamente a indústrias e os serviços.
Urge, por isso, conceber um conjunto de intervenções que visem suprir as carências,
no País, em infra-estruturas básicas, principalmente no domínio de aumentar a disponibilidade
de água e no acesso à electricidade em todo o território nacional visto que constituem o
fundamento para o desenvolvimento.
3.3.5 – Equipamentos colectivos
Conforme a “Carta Social de Cabo Verde (2005)”, é considerado Equipamento Social,
toda estrutura física onde se desenvolvem uma ou mais respostas sociais ou estão instalados
serviços de enquadramento às respostas de natureza residencial, ambulatória ou mista, que se
destinam a diferentes grupos alvo/utentes.
Perante essa definição considera-se que o país dispõe de um número reduzido de
equipamentos colectivos e distribuídos de forma desequilibrado conforme a necessidade da
população, tendo em conta que os únicos que existem em todas as ilhas são Creche, Jardim-
de-infância, Centro de Saúde, escolas de ensino básico, escolas de ensino Secundário e Centro
Social Multiuso. Para além destes, nalgumas ilhas, encontram-se Centro de Juventude,
residencial de estudantes, Lar para idosos, etc (Carta Social de Cabo Verde - 2005).
É de se realçar a grande concentração nas ilhas de Santiago e São Vicente desses
equipamentos e ainda a concentração dos mais especializados como universidades, hospital
Centro de Terapia Ocupacional, Centro de Acolhimento, Reabilitação e Reinserção, centro de
Reabilitação para deficientes, entre outros.
29
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
3.4 – Caracterização Económica
Não obstante a entrada para o grupo de países de desenvolvimento médio, Cabo Verde
ainda não dispõe de uma base produtiva global capaz de se auto satisfazer-se. Pelo contrário, é
considerado frágil e estreita a base produtiva do país. Os constrangimentos climáticos aliados
às tecnologias e mentalidades prevalecentes, não têm estimulado a produtividade no país.
Assim sendo, apesar dos progressos significativos alcançados até então no seu
processo de desenvolvimento, o País continua a ter uma economia pouco diversificada e, por
isso, muito vulnerável que serão a seguir, por sectores, evidenciados.
3.4.1 – O Sector Primário
Este sector é dominado em Cabo Verde principalmente pela pesca, agricultura e
pecuária, sendo a extracção e a exploração florestal (silvicultura) poucos expressivos devido
ás características geológicas e climatéricas do País. Por isso, a sua contribuição para o PIB
nacional não transcende os 10% (INE, 2006), sendo um dos sectores que tem demonstrado
muitas fragilidades no desenvolvimento.
3.4.1.1 – A pesca
Apesar de estar bem enraizada no seio da população cabo-verdiana, a pesca tem uma
participação ínfima na formação do PIB com cerca de 1% (INE, 2006). Não obstante, o seu
papel social e económico tem sido mais relevante do que o papel reflectido por este indicador,
contribuindo para o emprego, equilíbrio da balança de pagamentos e a segurança alimentar.
De forma geral, o país possui possibilidades de desenvolvimento nesta actividade com
potencialidade haliêutica ponderada, em 2000, entre 36 mil a de 44 mil toneladas/ano
(FERREIRA, 1998). Estima-se que, dessa potencialidade, aproveitar-se apenas cerca de 20%
(FERREIRA, 1998) pelas circunstâncias em que é praticada:
Com frota pesqueira maioritariamente artesanal,
Utilização de métodos de pesca tradicional,
Fraca, ou mesmo nenhuma, preparação dos pescadores,
Ausência de um espírito empresarial,
30
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
A quase inexistência de incentivos financeiros,
Etc.
A exploração é assegurada por unidades de pesca artesanal, semi-industrial e
industrial, concentrando-se uma parte significativa das actividades empresariais nos domínios
da conservação, transformação e exportação.
A pesca artesanal é praticada por cerca de 4.283 pescadores distribuídos por cerca de
97 comunidades de pesca (PANA, 2002). Utilizam embarcações em madeira e/ou fibra de
vidro construídas localmente. Praticam a actividade utilizando linha de mão, redes de praia,
redes de emalhar e redes de cerco.
A pesca, industrial e semi-industrial, é praticada por cerca de 432 pescadores em 77
embarcações muito diferentes umas das outras (PANA, 2002). Os engenhos mais utilizados
são a vara, a linha à mão, redes de emalhar e de cerco e, covos.
3.4.1.2 – A agricultura
A agricultura caracteriza-se fundamentalmente por ser de forma tradicional e, por isso,
de baixa produtividade e fraco rendimento devido, principalmente, à baixa potencialidade
agrícola com escassos e adversos recursos naturais, condições climatéricas desfavoráveis,
com prolongados períodos de seca. Mas, de qualquer forma, convém salientar que esta
actividade desempenha um importante papel de estabilizador social que não deve ser
menosprezados, apesar do seu ínfimo contributo de cerca de 5% para o PIB nacional (INE.
2006).
É dominado pelo sistema de subsistência em que o cultivo destina-se primeiramente à
satisfação das necessidades alimentares do agricultor.
O sector empresarial da agricultura dedica-se quase exclusivamente à produção da
banana, principal produto agrícola de exportação, batata e cana de açúcar para o fabrico do
aguardente, através da adopção crescente de novas tecnologias, com destaque para trabalhos
de selecção genética e melhoramento vegetal, e a implementação de sistemas de micro-
irrigação, essencialmente gota a gota. Este último avanço tecnológico tem produzido um
impacto bastante positivo na produção agrícola, de uma forma geral, e hortícola em particular,
reduzindo as perdas em água e permitindo o aumento substancial das áreas irrigadas e,
consequentemente da produção.
31
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
Portanto, a agricultura cabo-verdiana é considerada como sendo uma actividade de
risco, completamente dependente do regime das chuvas e frequentemente praticada em terras
marginais e em zonas agro-climáticas sem aptidão para o seu cultivo. Estima-se que em anos
de boa pluviometria e boa produção agrícola, o país só poderia satisfazer cerca de 20% das
suas necessidades (PANA, 2002) em termos de cereais o que, apesar de ser insuficiente, reduz
a dependência ao exterior.
3.4.2 – O Sector Secundário
De uma forma geral, este sector tem desempenhado um papel limitado na economia
pela escassa quantidade e diversidade do parque industrial existente no país. Por isso a sua
contribuição para o PIB tem sido de cerca de 18% (INE, 2006), sendo este muito baixo pela
importância que sector desempenha na conjuntura económica do país.
O tecido industrial é constituído essencialmente por indústrias transformadoras, com
as suas principais unidades concentradas em Santiago e S. Vicente. Cobre essencialmente as
áreas de alimentação e bebidas, conservas de peixe, calçado, vestuário, construção e reparação
naval, metalomecânica ligeira, sabões, tintas e medicamentos.
Mas o sector vem, progressivamente, aumentando a sua contribuição para a formação
do PIB, com tendência a estruturar-se em torno de actividades ligeiras com maior peso em
informação do que em materiais e pouco intensivas no consumo da água e da energia.
3.4.3 – O Sector Terciário
Este constitui o sector catalisador da economia do país. O comércio, grossista e
retalhista, a utilização de portos e de aeroportos internacionais, os transportes e as
telecomunicações e, principalmente, o turismo desempenham um papel charneira no processo
de desenvolvimento de Cabo Verde, com uma contribuição da ordem dos 72% para o PIB
nacional (INE, 2006).
3.4.3.1 – Os Transportes e as Telecomunicações
Os transportes e as telecomunicações têm sido tradicionalmente considerados sectores
eminentes no progresso social e económico de todas as sociedades. As ilhas, pela sua
configuração geográfica sugerem a existência de um grave problema de comunicação não só
32
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
devido à separação por distâncias extremas dos dois grupos de ilhas (Barlavento e Sotavento),
como é o caso de Santiago e Sal ou Santiago e S. Vicente, respectivamente de cerca de 116 e
160 milhas marítimas (FERREIRA, 1998), como também por uma grande área marítima.
Perante este quadro, os transportes, marítimo e aéreo, bem como as telecomunicações
constituem grandes potencialidades de negócios a serem explorados.
O transporte marítimo desempenha um papel de relevo não só nas trocas comerciais
com o exterior como entre as ilhas.
3.4.3.2 – O Turismo
O turismo é frequentemente identificado como um sector muito promissor para o
desenvolvimento dos países insulares, particularmente para Cabo Verde. Representa uma das
poucas oportunidades de diversificação económica para o país. A diversidade paisagística
contrastante entre as praias do Sal e as montanhas de Santo Antão, as dunas da Boa Vista e os
vales verdejantes de Santiago, as singularidades culturais (gastronomia, música, etc), bem
como a posição geoestratégica fazem de Cabo Verde um destino turístico impar no mundo.
Mas, apesar da existência de condições naturais e culturais favorecerem o turismo,
faltam ainda condições socioeconómicas para dar um maior impulso ao desenvolvimento
turístico. Estas reflectem, principalmente em défices nos recursos complementares do turismo
como transportes e comunicações, planeamento turístico integrado, bem como nas infra-
estruturas de base (hotéis, bares e restaurantes, espaços de entretenimento, etc).
Porém, apesar dessas deficiências as contribuições do sector turístico para a economia
nacional são significativas, cerca de 20% do PIB (INE, 2006), provendo tanto das
contribuições directas como indirectas. As contribuições directas são os valores acrescentados
das actividades turísticas. As contribuições indirectas são aquelas provenientes dos valores
acrescentados nos produtos e serviços produzidos para o sector do turismo por outros sectores
de actividade, como a imobiliária, etc.
33
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
IV – INCIDÊNCIA DA INSULARIDADE NO PROCESSO DE
DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÓMICO DE CABO VERDE
Perante a condição insular de Cabo Verde, não restam dúvidas de que os sectores
sociais e económicos têm deparado com alguns condicionalismos que têm sido estruturantes
para o desenvolvimento do país e que serão a seguir analisados por sectores.
4.1 - Sector Primário
No caso concreto do sector primário viu-se que as actividades predominantes são a
pesca e a agricultura. Essas duas actividades sofrem influências da insularidade.
4.1.1 – Pesca
Apesar do país usufruir de algumas condições, anteriormente apresentadas, que
proporcionam o desenvolvimento da pesca, esta está a ser condicionada pela insularidade
apresentando um rendimento muito aquém das reais potencialidades que apresentam em Cabo
Verde.
34
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
Cabo Verde possui uma plataforma continental bastante reduzida que afecta
grandemente esta actividade, visto que é usada, principalmente, para a desova dos peixes
condicionando a quantidade de peixes que se desovam nesse espaço.
As correntes frias de Canárias constituem outro factor limitante da quantidade de
peixes existentes na zona económica exclusiva nacional, visto que, essas correntes constituem
excelentes atractivos para os peixes, fazendo-os deslocarem para as Canárias.
A fragmentação do mercado de consumo bem como os deficientes meios de ligação
entre os vários nichos de mercado também têm pesado negativamente neste sector tendo em
conta que, principalmente nas ilhas do Maio e da Boa Vista, ocorrem alguns casos de
excessos de pescados que podiam ser comercializado noutras ilhas.
Mas, de forma geral, pensa-se ser a falta de recursos financeiros o principal
condicionador desta actividade pelas condições em que as mesmas são feitas, acarretando
baixa produtividade e, por causa disso, baixos rendimentos e essencialmente o não
aproveitamento da totalidade das oportunidades que oferece.
Da entrevista feita a empresas da área e da conversa informal com os pescadores ficou
a impressão de que o acesso a um mercado maior e a capacidade financeira são dois grandes
entraves ao desenvolvimento desta actividade. Se a capacidade financeira não é condicionada
pela insularidade, o acesso a um mercado maior é dificultado pelo isolamento que faz acrescer
o custo dos transportes ao produto, diminuindo a competitividade com empresas de outros
países.
4.1.2 – Agricultura
Pelo panorama da agricultura anteriormente apresentado pode-se constatar que a
agricultura em Cabo Verde enfrenta muitos constrangimentos. Alguns desses
constrangimentos devem-se à condição insular do país.
A exiguidade do território nacional (4033 Km2) fez com que se tenha escassez de solo
arável, com cerca de 10% do território nacional – 403 Km2. A condição científico-económico
do país ainda não permite que se ignore a presença de solo na agricultura, apesar de estar-se
perante alguns passos nesse sentido, e, por isso, a falta de solo arável constitui um grande
factor limitante do desenvolvimento agrícola. A par disso a reduzida quantidade de solo
arável não permite a mecanização agrícola sob pena de sofrer a deseconomia de escala.
Para além de ser em pouca quantidade, o solo arável disponível no país encontra-se
fragmentado em diversas porções agudizando ainda mais o problema agrícola.
35
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
A existência de um mercado interno reduzido e bastante aberto aos produtos agrícolas
do estrangeiro e a um preço bastante competitivo não constituem estímulos ao investimento
no sector.
A entrevista feita a empresas e pessoais singulares afectos à agricultura ditou que a
dependência climática, fruto da posse de pouca tecnologia (tradicional), e pouca
disponibilidade de terreno arável no país constituem o “calcanhar de Aquiles” para o
desenvolvimento da agricultura.
4.2 – Sector Secundário
No que se concerne a este sector padece pela existência de um mercado interno
diminuto, com menos de meio milhão de habitantes, e com um poder de compra muito baixo.
Para além de ser reduzido é também um mercado fragmentado em nove pequenos nichos com
grande maioria de ordem de dezenas de milhares de habitantes, sendo os de maiores
expressividades de Santiago e de São Vicente com centenas de milhares de habitantes. Por
causa disso são as duas ilhas onde se encontram mais de 90% das empresas existentes em
Cabo Verde (INE, Distribuição das Empresas).
O isolamento relativamente aos grandes mercados tanto consumidores como
abastecidores não permite que as empresas nacionais ultrapassem o constrangimento criado
pelo mercado interno.
A limitação dos recursos (naturais, técnicos e financeiros) constitui outro dos
constrangimentos que afectam este sector. A insuficiência de recursos naturais torna
necessário a importação dos mesmos acrescidos de custos de transporte, tendo em conta a
distância em relação aos principais mercados abastecidores, aumentando o preço do produto
final e afectando a competitividade. Também é de se fazer notar a carência de recursos
humanos, quer em termos de quantidades quer em termos de qualidade – técnicos
especializados – afectam negativamente. A existência de recursos financeiros limitados
constitui outro factor de entrave visto que diminui a capacidade de investimento.
Um outro entrave deste sector tem haver com a incapacidade para explorar a economia
de escala que nas empresas/instituições são dificultadas pela necessidade de desmultiplicação
e manutenção de infra-estruturas, aumentando os custos de produção e, por isso, de produto
final diminuindo a competitividade dessas empresas.
O próprio ambiente empresarial constitui um constrangimento visto que o país
apresenta défices nos sectores de água e energia, elevados custos de vários factores de
36
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
produção, dos quais se destacam a mão-de-obra, os transportes e as telecomunicações, pouca
tradição empreendedora da população cabo-verdiana, ausência de uma acção institucional
decidida para a promoção de uma actividade industrial, entre outros.
Na entrevista as empresas/instituições apontaram a falta de recursos, o isolamento, o
mercado reduzido e fragmentado como os principais embaraços ao desenvolvimento
empresarial em Cabo Verde. O pior é o efeito sinérgico resultante da soma de todos esses
factores, pois a falta de recursos impõe a necessidade de importação dos mesmos e o
isolamento e a fragmentação provocam o sobre-custos, que se repercute no preço do produto
final.
Portanto, todos esses condicionalismos supra citados fazem com que as empresas
cabo-verdianas não conseguem tirar partido das economia de escalas e de aglomeração,
fazendo com que tenham de suportar um conjunto de sobre-custos ao nível da produção,
transportes e distribuição, tornando-as menos competitivas comparativamente com outras
empresas continentais da mesma dimensão.
4.3 – Sector Terciário
Este constitui o sector em que os PEID’S devem apostar para impulsionar o
desenvolvimento socio-económico, visto que, a condição insular oferece várias oportunidades
de empreendimento, principalmente nos transportes, nas telecomunicações e no turismo.
4.3.1 – Transportes e Telecomunicações
O país constitui um campo fértil de desenvolvimento de empreendimentos nos
sectores de transportes e telecomunicações pela composição fragmentada do seu espaço e
dependência desses sectores para a mobilização inter ilhas como pelos contactos necessários
não só pelos constantes movimentos internos como pela necessidade de desmultiplicação de
várias infra estruturas dependentes entre si.
Assim, tanto os transportes como as telecomunicações desempenham um papel vital
no ordenamento do território, permitindo uma maior integração do espaço nacional,
unificando os vários nichos de pequenos mercados.
Apesar de serem uma oportunidade de empreendimento protegido naturalmente não
escapam ás condicionalismos insulares como um mercado reduzido tanto económica como
demograficamente.
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
A entrevista feita a empresas do ramo demonstrou que poderão constituir duas grandes
balizas para minimizar os efeitos da insularidade no país. Mas, até então, a capacidade do
mercado tem condicionado o investimento e, necessariamente, a sua capacidade de resposta.
Por isso, Cabo Verde não tem conseguido aproveitar as potencialidades tanto no que tange nas
telecomunicações como nos transportes.
4.3.2 – Turismo
Nessa actividade em particular a insularidade tem sido considerado um factor de
atracção, pois favorece a conservação dos espaços insulares associando-os a uma imagem de
exotismo. Os factores que estão por detrás desta atracção têm a ver com a sensação de
afastamento e de diferença que advêm não só da separação física do continente africano, mas
também das diferenças climatéricas, ambientais e culturais que Cabo Verde apresenta em
relação ao continente africano.
Essa separação física em relação ao continente africano fez com que o país fosse
circunscrito pelo mar e, daí a possibilidade de haver praias que, combinado com o clima (sol
durante quase todo o ano), constituem aspectos de excelência para o turismo convencional.
Para além disso, a fragmentação do território nacional e relativo afastamento entre as
ilhas fez com que o país fosse agraciado com uma diversidade paisagista contrastante
permitindo aceder a uma grande diversidade de segmento do mercado turístico (convencional
e alternativo).
E, como tal, deve ser assumido claramente como eixo central do desenvolvimento
nacional e a estratégia para o seu desenvolvimento deve ser traçada de modo a contribuir para
a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos e para o crescimento económico do país,
devendo contribuir para o equilíbrio das relações económicas com o exterior, gerar meios para
o seu auto financiamento, promover o emprego e a qualificação da mão-de-obra nacional,
desenvolver-se em harmonia com as condições ambientais, contribuir para o desenvolvimento
local e regional e, acima de tudo, respeitar a cultura cabo-verdiana.
Na entrevista ás empresas da área constatou-se que há plena consciência de que, para
este segmento, a insularidade trouxe vantagens competitivas para o país mas que precisam ser
melhor aproveitadas. Apontaram os transportes e as telecomunicações como duas áreas
complementares ao turismo e que tem embaraçado, pela alta dos preços, a competitividade
com outros espaços.
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
V – RECOMENDAÇÕES
Estando perante forças que ultrapassam em muito a capacidade de resposta da débil
economia cabo-verdiana, e não podendo eliminar totalmente os seus impactes, podem ser
geridos, no intuito de minimizar os seus aspectos negativos e potenciar os seus aspectos
positivos (ALMADA, 2008). Para tal, deve-se recorrer a um conjunto de medidas estratégicas
do tipo defensivo e adaptativo, mas também reactivo e ofensivo (Adaptado de ALMADA,
2008).
Das estratégias consideradas defensivas destacam-se: apostar na criação de uma base
produtiva estratégica nacional mínima; promover a inserção de empresas nacionais em redes
internacionais (centrais de compra e venda); terminar com as barreiras que inibem a livre
circulação do capital, com vista a tornar o país mais atractivo à fixação do capital estrangeiro;
um Estado mais flexível e menos burocrático.
Dentre as vista como estratégias reactivas apontam-se: estabelecer parcerias
tecnológicas com vários pólos, procurando diversificar; desenvolver capacidade tecnológica
endógena; combater a emigração clandestina e a criminalidade transnacional.
Das estratégias encaradas como adaptativas evidenciam-se: diversificar as fontes de
importação e de exportação; apostar em sectores não sujeitos há economias de escala e
grandes consumidores de energia, caso dos serviços pessoais; aliviar a pressão demográfica
sobre os recursos, fazendo uso de novas soluções tecnológicas; conservar o meio ambiente e
39
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
promover o ordenamento do território; fomentar a diversificação das fontes de transferências
externas; promover a concorrência entre os operadores de transporte nacionais e
internacionais.
E, como estratégias ofensivas: celebrar acordos comerciais com vários blocos
económicos, diversificando as parcerias; potenciar o desenvolvimento do sector dos serviços
avançados (finanças, novas tecnologias de comunicação e informação, comunicações,
comércio electrónico, consultadoria, etc.); fomentar o desenvolvimento tecnológico,
apostando no sector das energias renováveis e sectores ligados ao mar; promover o
aparecimento de indústrias que produzem para nichos de mercados; apostar num turismo de
qualidade, que tira partido da diversidade ecológica e territorial dos países; incentivar uma
emigração qualificada, bem como a atracção de quadros qualificados oriundos de outros
espaços; fomentar o capital social da população com investimentos na educação, saúde,
habitação, etc.
Tendo em conta o mundo globalizado em que hoje se vive, a economia cabo-verdiana tem
que procurar a melhor forma de inserir na economia global. Para alcançar uma perfeita
inserção Cabo Verde deve apostar na melhoria da produtividade e da competitividade da sua
economia com recurso principalmente ao uso de novas tecnologias de informação e de
comunicação nos processos de trabalho e na exploração do potencial do negócio electrónico
de modo a poder concorrer nos mercados internacionais. É que o recurso às novas tecnologias
de informação e comunicação permitem a prestação de serviços desintermediados
geograficamente (teletrabalho), como os serviços associados a call centers, desenvolvimento
de sofware, produção de conteúdos multimédia, aplicações web, etc uma vez que minimizam
as limitações da periferia e do isolamento territorial de Cabo Verde.
Por outro lado, é de capital importância a tomada de medidas pelas entidades competentes,
nomeadamente o governo, a fim de criarem um conjunto de incentivos que, por um lado,
contribuísse para tirar as empresas nacionais do sufoco financeiro em que vivem permitindo
novos investimentos e, por outro lado, trará maior facilidade na capitação de investimentos
externos. De entre essas medidas destaca-se:
Uma aposta séria nas energias alternativas (eólica, solar ou mesmo
nuclear) afim de alcançar uma redução do tarifário eléctrico nacional e, com
isso, diminuir o custo de produção;
40
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
Uma melhoria na ligação interna e externa combinada com baixa dos
preços dos transportes aéreos e marítimos, permitindo uma melhor
acessibilidade ao mercado nacional como um todo e maior liberdade na
localização das empresas;
Um significativo abaixamento de impostos quer para as pessoas
singulares, quer para as empresas;
O reforço da qualidade de educação, principalmente, da via técnica para
melhoramento da qualidade dos recursos humanos no país.
É relevante apontar que a implementação dessas medidas, consideradas de estratégicas
para o desenvolvimento, terá como consequência uma melhoria do ambiente socio-económico
no país que poderá traduzir num aumento tanto do volume de investimentos externos, pelas
facilidades fiscais, como da capacidade de investimento interno, pela possibilidade do
aumento do lucro e da poupança.
É importante salientar que qualquer estratégia de desenvolvimento da economia cabo-
verdiana, para ser credível, deve assentar no estreitamento de relações comerciais com o
exterior através de fortalecimento do sector exportador, tendo em conta o reduzido mercado.
Assim as entidades competentes devem apoiar as empresas no esforço de alcançarem os
mercados estrangeiros, de forma competitiva, e na procura constante de diversificação dos
produtos e dos destinos das exportações.
Tendo em conta o espaço da Macaronésia a que Cabo Verde pertence, deve apostar
numa maior integração, com uma estratégia conjunta de cooperação entre os arquipélagos que
compõem esse espaço, essencialmente nos sectores dos transportes, do turismo ou da energia
em que podiam funcionar em forma de complementaridade.
Mas, o principal desafio dos PEID’S passa, segundo Kofii Annan5, pela mobilização da
atenção mundial para a necessidade de soluções para as principais dificuldades que esse grupo
de nações faz face.
5- Em 2005 na sua intervenção na conferência dos estados insulares nas Maurícias como Secretário-Geral das Nações Unidas.
41
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
VI – CONCLUSÃO
Do exposto pode-se concluir que os constrangimentos específicos de um Pequeno
Estado Insular em Desenvolvimento, nomeadamente a pequena dimensão territorial,
demográfica e económica e o isolamento e fragmentação territorial, impõem-lhes uma
realidade intrínseca e permanente de que não podem libertar-se.
Essas especificidades dos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento fazem
com que Cabo Verde padeça de uma vulnerabilidade socio-económica estrutural, que se
manifesta em todos os sectores de actividades.
O sector primário é afectado principalmente pela reduzida extensão territorial e
fragmentação do mesmo, acarretando escassez de terreno arável, pela seca e desertificação
(vulnerabilidade ambiental) e falta de capacidades financeiras e humanas que, conjugados,
exercem uma acção sinérgica extremamente negativa sobre todas as actividades do sector.
O sector secundário, que constitui o motor de desenvolvimento de muitos países, é, em
Cabo Verde, condicionado por um mercado interno diminuto e fragmentado e pelo isolamento
em relação aos grandes mercados consumidores e abastecidores reduzindo a sua
competitividade comparado com países continentais.
O sector terciário, contrariamente aos restantes sectores, sofre no cômputo geral uma
influência positiva da insularidade através da ocorrência de rendas de situação oriundas das
42
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
vantagens comparativas principalmente no sector turístico, apresentando uma vasta gama de
oportunidades de empreendimentos.
Desta forma, a estrutura produtiva de Cabo Verde encontra-se orientada
principalmente para o segmento dos serviços com destaque para o comércio, transportes e
telecomunicações e o turismo com um peso superior a 72% na formação do PIB.
Tendo em conta as hipóteses anteriormente formuladas julga-se todas elas
confirmadas. Conforme visto anteriormente a insularidade dificulta o uso da economia de
escala nas empresas do país (H1) pela necessidade de multiplicação e manutenção de infra-
estruturas em quase todas as ilhas, com uma produtividade muito aquém do limite óptimo de
produção, fazendo aumentar o custo por unidade de produção. Desta forma, a insularidade
afecta a competitividade económica do país (H2) que acrescido ao preço do isolamento em
relação aos grandes mercados abastecidores/consumidores fazem com que o país perca
competitividade em relação aos continentais. E, perante esses factos pode-se concluir, em
suma, que a insularidade constitui um entrave ao desenvolvimento socioeconómico do país
(H3) tendo em conta que apesar de trazer algumas consequências positivas para o país estas
são largamente suplantadas palas negativas.
Perante essas constatações deve procurar estratégias de resiliência a fim de minimizar
os efeitos negativos da insularidade e maximizar as potencialidades e oportunidades que
oferece. Assim, o país, apesar das restrições, tem vindo a crescer de forma sustentada embora
seja um crescimento dependente dos fluxos externos.
Portanto, conclui-se que, para a saúde da economia nacional, o Estado deve ter um
papel muito interventivo afim de auxiliar o tecido empresarial nacional a minimizar os efeitos
da insularidade, principalmente no sector dos transportes interno, para a ligação do território
nacional, com tarifas mais baratas. Assim, haverá ganhos para todos os sectores em alcançar
na íntegra os vários nichos que compõem o mercado nacional e a sociedade também ganha
por aceder a produtos a um preço mais acessível, para além de proporcionar maior deslocação
turística – por afeito de complementaridade – entre as ilhas.
43
Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
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Site: www htpp:// dacessdds.un.org
www.lusotopie.sciencespobordeaux.fr
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
ANEXOGUIÃO DE ENTREVISTA ÀS EMPRESAS
O presente questionário destina-se, pura e exclusivamente, para a recolha de dados concretos para a realização de
um estudo, meramente académico, sobre a incidência da insularidade no processo de desenvolvimento
socioeconómico de Cabo Verde, pelo que agradecia a colaboração da sua empresa no preenchimento do mesmo.
1 – Qual é a actividade da sua empresa?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
2 – Como adquire matérias-primas para a actividade da sua empresa?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
3 – Se tivesse esses recursos no país facilitaria a sua empresa? Não _____ Sim ____
a) Se sim, como?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
b) O que tem feito para minimizar esse efeito?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
4 – De algum modo o isolamento de Cabo Verde em relação ao continente afecta a actividade
da sua empresa? Sim _____ Não ______
a) Se sim, como?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
b) O que a empresa faz para minimizar esse efeito?
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
5 - A existência de um mercado interno pequeno afecta o negócio da sua empresa?
Sim ____ Não______
a) Se sim, como?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
b) O que tem feito para ultrapassar esse constrangimento?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
6 – A fragmentação do mercado cabo-verdiano em pequenos nichos afecta o negócio da sua
empresa? Sim _______ Não ________
a) Se sim, como?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
b) O que a empresa tem feito para superar esse constrangimento?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
7 - Na sua opinião, o quê que o governo tem feito para minimizar os efeitos da insularidade?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
8 – Que proposta deixa ao governo para facilitar a sua actividade?
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Cabo Verde – Incidência da insularidade no processo de desenvolvimento socio-económico
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
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Saudações académicas, MUITO OBRIGADO!
Obs: Estas questões são meramente orientadoras, tendo surgido outras questões no decurso da entrevista.
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