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ESTADO DE SANTA CATARINA PODER JUDICIÁRIO Comarca -Criciúma2ª Vara da Fazenda
Endereço: Av. Santos Dumont, S/N, Prédio do Fórum, Milanese - CEP 88804-500, Fone: (48) 3431-5396, Criciúma-SC - E-mail: criciuma.fazenda2@tjsc.jus.br
Autos n° 0902103-61.2014.8.24.0020
Ação: Ação Civil Pública/aRevogação/Concessão de Licença Ambiental Autor: 'Ministério Público do Estado de Santa Catarina Réu: Construtora Peruch Ltda EPP e outro
Vistos etc.
Trata-se de Ação Civil Pública, com pedido de liminar, aforada pelo Ministério
Público do Estado de Santa Catarina em face de Construtora Peruch Ltda, que tem por
objetivo obter provimento jurisdicional que determine à ré a adoção de todas as
providências que se fizerem necessárias a fim de promover a recomposição da área de sua
propriedade, localizada na Rodovia Governador Jorge Lacerda, bairro Verdinho, em
Criciúma, além da condenação do réu à compensação ambiental.
O Dr. Promotor de Justiça informou que foi instaurado o Inquérito Civil Público n.
06.2013.00011237-6, que instrui a presente demanda, no qual restou apurado que, na
propriedade da ré, ocorreu a retificação de um curso d'água para um canal artificial retilíneo,
além de obras de implantação de aterro e terraplanagem, atingindo a área anteriormente
ocupada pelo canal natural do curso d'água.
Afirmou que a ré é responsável pela reparação dos danos no terreno de sua
propriedade, ainda que ocorridos antes da aquisição do imóvel, pois "no Direito Ambiental
prevalece a ideia de que a obrigação de reparar danos ambientais é propter rem".
Com base nisso, requereu, em liminar, seja determinado que a empresa
Construtora Peruch Ltda:
A) se abstenha, imediatamente, de realizar qualquer obra, serviço, limpeza de
vegetação, supressão, deslocamento ou qualquer outro ato que importe em modificação do
estado atual da área objeto da presente ação, ou seja, no imóvel situado na Rodovia
Governador Jorge Lacerda, Bairro Verdinho, Município de Criciúma (matrícula 73.871 do 1º
Ofício do Registro de Imóveis de Criciúma), e cesse as que eventualmente já foram
iniciadas, até decisão final transitada em julgado nesta ação;
B) no prazo de 120 dias, a contar da data da decisão liminar, proceda a integral
restituição do ecossistema anterior em relação ao curso d'água localizado no terreno,
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desfazendo inteiramente a retificação realizada;
C) após o cumprimento da medida determinada no item anterior, que a ré
promova a recomposição da mata ciliar existente na área de preservação permanente
(APP), através de aprovação de Projeto de Recuperação de Área Degradada (PRAD), por
profissional habilitado, que deverá ser aprovado pela Fundação do Meio Ambiente de
Criciúma – FAMCRI e implantado pela ré, às suas expensas, tomando-se a metragem
mínima de 30 metros dos cursos d'água;
D) promova a retirada dos restos de materiais decorrentes das obras de
reconstituição, para permitir a recuperação da área;
E) a averbação da citação desta ação à margem da matrícula n. 73.871, para
prevenir o direito de eventuais interessados de boa-fé na aquisição do imóvel ou de parte
dele;
F) ainda em tutela de urgência, seja determinado que a ré providencie a
colocação de placa, tamanho 4x2, em frente ao imóvel objeto desta demanda, anunciando o
ajuizamento desta ação civil pública, o número dos autos e o seu objeto, a fim de evitar que
terceiros desavisados venham adquirir o imóvel ou parte dele;
G) seja decretada a indisponibilidade dos bens móveis e imóveis pertencentes à
ré para garantia da obrigação de fazer, consistente na demolição de qualquer edificação
ilícita em área ambiental protegida por lei, e a recuperação da área degradada.
Requereu, ainda, a fixação de multa diária no valor de R$ 10.000,00 para o caso
de descumprimento da decisão liminar.
Vieram-me os autos conclusos.
DECIDO.
Como sabido, a ação civil pública tem por escopo a proteção de interesses
difusos ou coletivos.
Para garantir desde logo a preservação dos interesses tutelados pela ação civil
pública, o legislador pátrio previu a possibilidade de concessão de medida liminar pela Lei n.
7.347/85: "Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia,
em decisão sujeita a agravo".
A concessão da medida liminar depende da presença de dois requisitos, quais
sejam, o fumus boni juris e o periculum in mora, ou seja, faz-se mister a presença da
plausibilidade do alegado e do potencial prejuízo à efetividade da demanda, na hipótese de
demora.
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A Constituição Federal, nos termos do art. 225, garante a todos o direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, cabendo tanto ao Poder Público, como à coletividade,
o dever de zelar pela sua conservação e preservação, in verbis:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-
se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo
para as presentes e futuras gerações.
Como é sabido, a legislação pátria impõe uma restrição ao direito de construir
em áreas fronteiriças a cursos d'água naturais, estabelecendo um recuo mínimo para a
edificação. Dentro desse limite a área é considerada non aedificandi, ou seja, não é
permitida a edificação por se tratar de faixa de preservação permanente. A intenção do
legislador foi de proteger e preservar os recursos naturais encontrados às margens de rios,
riachos, etc.
A Lei Federal n. 4.771/65 (antigo Código Florestal) disciplinava a matéria no
artigo 2º, identificando as Áreas de Preservação Permanente, definição encontrada
atualmente no art. 4º do Novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012). Veja-se:
Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será:
1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura;
2 - de 50 (cinquenta) metros para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;
3 - de 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;
4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;
5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;
[...]
In casu, conforme se verifica a folhas 33, em vistoria realizada pela FAMCRI no
imóvel situado na Rodovia Jorge Lacerda, Bairro Verdinho, em Criciúma, foi constatada a
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presença de um curso d'água no terreno em questão, de propriedade da empresa ré. Foi
verificado pelo órgão ambiental que "o referido curso sofreu intervenções no ano de 2012,
sendo desviado para outro local", e que, embora a retificação de cursos d'água seja uma
atividade passível de licenciamento ambiental, as licenças ambientais não foram
encaminhadas à FAMCRI (Parecer Técnico n. 474/2013).
Além das informações obtidas pela FAMCRI, o Laudo Pericial n. 9113.13.00368,
elaborado pelo Instituto Geral de Perícias, confirma que “no terreno examinado foi realizada
a retificação de um curso d'água existente no local para um canal artificial retilíneo, além de
obras de implantação de aterro e terraplanagem, as quais atingiram a área anteriormente
ocupada pelo canal natural do curso d'água" (folhas 136).
O perito aponta, ainda, que "através da análise de imagens históricas
capturadas do programa Google Earth, pôde-se verificar que a referida obra de aterro teve
início após o mês de outubro de 2007, enquanto a escavação do canal artificial e a
retificação do curso d'água ocorreu após o mês de outubro de 2010" (folhas 135).
Diante desse cenário, entendo que os elementos constantes dos autos trazem
indícios veementes de que, na área de terras pertencente à ré, localizada na Rodovia
Governador Jorge Lacerda, bairro Verdinho, em Criciúma, foi realizada a retificação de
curso d'água, em desconformidade com a legislação ambiental.
Presente, pois, a fumaça do bom direito.
Do mesmo modo, o perigo da demora exsurge da premente necessidade de se
evitar intervenções mais agressivas ao meio ambiente, o que poderia ensejar danos de
difícil recuperação.
Mutatis mutandis, é oportuno registrar que, para a concessão de liminar em
matéria ambiental, é dispensável a comprovação efetiva do dano ambiental, bastando haver
elementos que revelem a probabilidade de o meio ambiente restar afetado, notadamente
em virtude dos princípios da prevenção e da precaução.
Enfim, presentes os pressupostos legais, traduzidos, essencialmente, na
fumaça do bom direito e no perigo da demora, tem a parte autora direito subjetivo à
concessão da liminar pleiteada, especialmente as medidas requeridas nos itens 1.1 a 1.6
dos pedidos (folhas 17/18), destinadas à recuperação da área degradada.
Por outro lado, entendo desnecessária a determinação para que a ré promova a
colocação de placa em frente ao imóvel, pois a averbação da citação desta demanda à
margem da matrícula do bem é medida suficiente para prevenir o direito de eventuais
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interessados de boa fé na aquisição do imóvel, bem como a indisponibilidade dos bens
móveis e imóveis pertencentes à empresa ré, pois não houve, ainda, o dimensionamento
dos valores a serem despendidos pela réu com a recuperação da área degradada, nem
com eventual condenação à reparação por danos morais e/ou patrimoniais.
Ademais, como é sabido, “A decretação da indisponibilidade e o seqüestro de
bens, por ser medida extrema, há de ser devida e juridicamente fundamentada, com apoio
nas regras impostas pelo devido processo legal, sob pena de se tornar nula” (AgRg no
REsp 433357/RS).
Assim, temerário tornar indisponíveis todos os bens móveis e imóveis da ré,
pois, além de configurar medida excessivamente gravosa, o pedido não veio devidamente
fundamentado, inexistindo elementos nos autos que indiquem a intenção da ré de se
desfazer de seu patrimônio para frustrar a execução do título judicial, em caso de eventual
procedência dos pedidos formulados desta demanda.
Diante do exposto, DEFIRO EM PARTE o pedido de liminar para determinar
que a empresa Construtora Peruch Ltda:
A) se abstenha, imediatamente, de realizar qualquer obra, serviço, limpeza de
vegetação, supressão, deslocamento ou qualquer outro ato que importe em modificação do
estado atual da área objeto da presente ação, ou seja, no imóvel situado na Rodovia
Governador Jorge Lacerda, Bairro Verdinho, no Município de Criciúma (matrícula 73.871), e
cesse as que eventualmente já foram iniciadas, até decisão final transitada em julgado
nesta ação;
B) no prazo de 120 dias, a contar da intimação da decisão liminar, proceda a
integral restituição do ecossistema anterior em relação ao curso d'água localizado no
terreno, desfazendo inteiramente a retificação realizada;
C) após o cumprimento da medida determinada no item anterior, que a ré
promova a recomposição da mata ciliar existente na área de preservação permanente
(APP), através de aprovação de Projeto de Recuperação de Área Degradada (PRAD), por
profissional habilitado, que deverá ser aprovado pela Fundação do Meio Ambiente de
Criciúma (FAMCRI) e implantado pela ré, às suas expensas, tomando-se a metragem
mínima definida na legislação ambiental (30 metros);
D) providencie a retirada dos restos de materiais decorrentes das obras de
reconstituição, para permitir a recuperação da área.
Determino, ainda, a averbação da citação desta ação à margem da matrícula n.
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73.871 do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Criciúma, para prevenir o direito de eventuais
interessados de boa-fé na aquisição do imóvel.
Fixo multa diária de R$ 1.000,00 (um mil reais) para a hipótese de
descumprimento desta decisão, a ser revertida em prol do Fundo de Reconstituição dos
Bens Lesados.
Expeça-se mandado para cumprimento da liminar.
Cite-se com as advertências legais.
Retifique-se o registro para excluir Natal Peruch Neto do polo passivo, pois a
demanda foi proposta apenas em face da pessoa jurídica (Construtora Peruch Ltda).
Intime-se.
Criciúma, 13 de novembro de 2014.
Pedro Aujor Furtado Júnior Juiz de Direito
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