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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇAO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
Mediação e Administração de Conflitos nas Entrevistas Sociais
Por: Mônica Lucia Vianna Trindade
Orientador: Prof.ª MS. Maria Esther Araujo de Oliveira
Rio de Janeiro
2010
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇAO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
Mediação e Administração de Conflitos nas Entrevistas Sociais.
Monografia apresentada como pré requisito para conclusão do Curso de Mediação de Conflitos com Ênfase em Família, da Universidade Cândido Mendes Pós Graduação “Lato Sensu” Projeto a Vez do Mestre.
Por: Mônica Lucia Vianna Trindade
Rio de Janeiro
2010
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AGRADECIMENTOS
Agradeço em primeiro lugar a Deus, porque foi ele quem me possibilitou a
superar obstáculos e cumprir mais uma vez meu objetivo até o fim; Ao meu marido por
ter estado ao meu lado todo tempo. Às minhas filhas, pela paciência que tiveram. Aos
meus animais porque estiveram a todo instante ao meu lado, sem que a companhia deles
faltasse um só dia. A Professora Naura Americano que me deu estímulo para crescer
profissionalmente, acreditando em meu potencial.
Meus agradecimentos especiais a esta Faculdade e seus Professores que foram os
responsáveis por minha formação e um pedido de desculpas a todos que por algum
motivo tenha esquecido, mas que também tiveram grande importância em minha
caminhada.
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DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho a todas as pessoas que buscam enfrentar as diferenças de forma consensual, entendendo a necessidade de aceitar a visão do outro como exercício de construção, ganhando de forma mutua equilíbrio e discernimento para uma nova etapa.
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EPÍGRAFE
“O assunto mais importante do mundo pode ser simplificado até ao ponto em que todos possam apreciá-lo e compreendê-lo. Isso é, ou deveria ser a mais elevada forma de arte.”
Charles Chaplin
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RESUMO
O presente trabalho refere-se ao multiculturalismo e a interferência na relação
social exercida por ele. A construção de um novo paradigma requer esforço por parte
de pessoas com postura imparcial que respeitam o individualismo, suas diferenças e a
subjetividade de cada indivíduo. A mediação de conflitos aparece como instrumento de
pacificação e bem estar social, reformulando o pensar e agir de forma automática.
Desfazendo o preconceito concebido e enraizado pelo senso comum e concebendo as
partes em litígio a possibilidade de reflexão e novas escolhas. O desafio mais evidente
na contemporaneidade é a releitura da relação família x sociedade multifacetada,
tornando imprescindível o autoconhecimento e gerando uma autonomia consciente na
administração dos conflitos. Administrar conflitos é admitir que eles existam que são
necessários para a formação moral e que resultam também do crescimento do
sentimento de responsabilidade civil, de cidadania e de controle sobre os problemas
vivenciados. O foco principal perpassa por uma análise geral da relação familiar desde
sua constituição como família até o modelo familiar nos dias de hoje, abordando os
conflitos pertinentes geracionais, enfocando sobre a importância da comunicação como
técnica para a dissolução de conflitos, tais como a história da mediação, seu conceito, os
diferentes modelos de mediação e aplicabilidade de suas técnicas e ferramentas.
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METODOLOGIA
Esse trabalho foi desenvolvido a partir de pesquisas bibliográficas, livros,
entrevistas sociais, artigos e sites idôneos. O principal referencial teórico utilizado
foram apontamentos feitos em sala de aula, livros e textos sobre mediação e negociação,
baseados nos seguintes autores: FISHER, LOROSA, MOORE, ROSENBERG,
STONNE dentre outros.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 9
CAPÍTULO I - FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA NO BRASIL 11
CAPÍTULO II - MEDIAÇÃO DE CONFLITOS 29
CAPÍTULO III - O PAPEL DO MEDIADOR 39
CONCLUSÃO 47
BIBLIOGRAFIA 49
ÍNDICE 53
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INTRODUÇÃO
A escolha do tema para esse trabalho deu-se pelo envolvimento e participação
ativa, nas entrevistas sociais, na Associação Cristã de Moços – ACM. O trabalho é
realizado com famílias de baixa renda, moradoras de comunidade localizadas na zona
central do Rio de Janeiro. A comunicação muitas vezes ocorre de forma conflituosa e a
escuta gira em torno do interesse pessoal de cada usuário, sem uma critica lógica.
Através de relatos colhidos nas entrevistas sociais, percebe-se uma disputa indo além
dos seus próprios interesses, onde toda ação acaba originando uma reação e o impacto
sobre o resultado final de desejos e escolhas precisa ser o de uma relação de troca, não
de dominância, nem de antagonismo. Ponto este abordado muitas vezes para as
entrevistas. A mediação se faz presente cooperando com a pacificação e a administração
dos conflitos trazidos a cada entrevista, sendo capaz de introduzir a idéia de que a
relação não tem que ser "ganhar x perder". O ser humano é capaz, em sua sabedoria de
saber recuar e ponderar seus ganhos atingindo sua satisfação mediante reflexão. As
técnicas de resolução de conflitos usadas na negociação e conciliação tendem a
apaziguar as tensões de forma objetiva, através de uma comunicação clara, não
menosprezando o ponto de vista de cada sujeito, escutar sem preconceito mantendo a
neutralidade, atentando às necessidades e os interesses das partes, procurando de forma
linear e resolutiva a manutenção da comunicação e do relacionamento. Acima de tudo,
ponderando a capacidade analítica e comunicativa dos usuários entrevistados,
observando a disposição, a motivação e a capacidade de entendimento dos mesmos para
a resolução dos conflitos.
A mediação e administração de conflitos nas entrevistas sociais têm como base
a desordem estrutural e organizacional da família, apresentado nas entrevistas por cada
usuário. O desalinho e transtorno emocional trazido pelos mesmos acabam sendo por
parte daquilo que causam frustrações sobre o que não se pode mudar de imediato,
ocorrendo assim, a exigência de mudança de atitudes do outro para favorecimento
próprio, mantendo a postura de repetição de padrões. A mediação de conflitos dispõe de
ferramentas capazes de facilitar a resolução da demanda. Utilizadas nas entrevistas,
quando necessário, oportuniza o outro individuo perceber o poder da reflexão, mudando
a direção do pensamento, modificando também a maneira de visualizar a intenção do
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fato e obter novas colocações para a situação que o aflige, encontrando assim o objetivo
através do equilíbrio uma percepção clara para possível acordo onde ambos tendem a
ganhar.
Esse trabalho pretende através desses três objetivos descritos abaixo dar início
através da mediação à solução de pequenos conflitos existentes no dia a dia dos usuários
da ACM.
• Observar a disposição e a capacidade de entendimento dos usuários entrevistados na
resolução dos conflitos;
• Analisar a capacidade analítica e comunicativa dos usuários entrevistados;
• Avaliar a capacidade de motivação dos usuários entrevistados para a resolução dos
conflitos.
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CAPÍTULO I
FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA NO BRASIL
A intenção em ressaltar o conceito de família é levantar uma reflexão a respeito
da posição da família num contexto social e seus reais valores, mudanças e conflitos
geracionais, uma vez que a família vem se modificando com o passar do tempo e à
medida que novos arranjos familiares estão sendo formados apenas com a presença
materna como chefes de família devido à separação, divórcio, viuvez. Mas ainda
entende-se que a importância da família funciona como rede social de suporte, surgindo
como ponto de apoio emocional, social e financeiro.
1.1 – Análise Conceitual da Família.
A instituição família, historicamente falando, é uma das formações mais antigas
que se pode conceber. Embora existam varias culturas e conseqüentemente hábitos
diferentes é no enlace afetivo, presente em todas as formas de cultura, que podemos ver
sua constituição. Os quadros que se apresentam referindo à instituição familiar,
geralmente são monogâmicos e estão ligados intimamente pela cooperação mutua, pelo
econômico por uma afeição estreita entre o casal, entre homem e mulher.
Conseqüentemente existem filhos advindos dessa união. É através, desse grupo
formado, que são repassadas as informações culturais, políticas, econômicas e sociais,
com cada um dos membros com uma função, mas todos cooperando, num sistema como
um todo.
Segundo Foucault:
"A ordem é ao mesmo tempo aquilo que se oferece nas coisas
como sua lei interior, a rede secreta segundo a qual elas se
olham de algum modo umas às outras e aquilo que só existe
através do crivo de um olhar, de uma atenção, de uma
linguagem; e é somente nas casas brancas desse quadriculado
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que ela se manifesta em profundidade como já presente,
esperando em silêncio o momento de ser enunciada"
(Foucault, 1987: 10).
Não podemos deixar de analisar a definição de família numa visão biológica,
histórica e sociológica, visualizando cada indivíduo como um ser inserido dentro da
sociedade, onde a mesma se subdivide em pequenos grupos denominados família, que
ligam os membros por descendência, a partir de um ancestral comum, através do
matrimônio e também da adoção, podendo existir consangüinidade ou não.
A família, eticamente falando, é responsável diretamente pela construção dos
valores morais, sociais, políticos e, acima de tudo, pela construção da estrutura
emocional, econômica, pela formação da personalidade dos indivíduos mais novos,
dentro da sociedade em que se encontram. Uma vez inserido nela, como grupo social, o
indivíduo é moldado com o propósito da convivência em sociedade e da busca de sua
realização pessoal.
1.2 – A Importância da Família na Sociedade e a Relação Social de Gênero.
Para entendermos a importância da família dentro da sociedade contemporânea,
precisamos entender um pouco das relações sociais, familiares de gênero, analisando a
evolução histórica, percebida desde a família patriarcal greco-romana, até a nuclear,
presente na sociedade pós-industrial contemporânea. Muitos fatores levaram-na a fugir
dos moldes de uma construção tradicional, não permitindo mais a fixação em um
“modelo nuclear”, uniforme, que tem que ser analisado e compreendido, de acordo com
os movimentos que foram se formando ao longo do tempo e do espaço cultural. Essa
travessia histórica, dentro da realidade social, foi se modificando, sofrendo
transformações, que ocorreram dentro dos contextos sócio-cultural, tecnológico,
influenciado por variáveis ambientais, ou seja, aspectos sociais, econômicos, culturais,
políticos e religiosos, vieram a determinar mudanças estruturais, criar novas referências
e composições da instituição familiar.
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Fazendo uma breve análise de como eram os laços matrimoniais, nada melhor do
que uma pequena comparação, até mesmo para entendermos o modelo atual familiar.
No modelo patriarcal greco-romano, a associação conjugal era de base
puramente religiosa. Os membros deveriam obedecer ao genitor seguindo o mesmo
culto religioso, praticar os mesmos ritos e sacrifícios. O pai, chefe religioso, era quem
detinha o poder de decidir se reconheceria ou repudiaria o recém-nascido, de repudiar a
mulher, de casar o filho, a filha e de designar tutor à mulher e filhos, antes de morrer.
Tudo o que pertencesse à mulher e ao filho, mesmo o fruto do seu trabalho, pertenceria
ao pai. E um dos fatos marcantes, era a extensão desta família, pois eram numerosas.
Segundo Brauner:
“Mesmo que o modelo nuclear de família seja o signo da
modernidade, com a valorização do indivíduo e da liberdade,
nada prova que esta aparente uniformização das estruturas
familiares não demonstre, também, a permanência de um
modelo antigo, sobre os quais se apóiam, igualmente, as
mudanças econômicas e sociais.” (Brauner, 1998, p.137/153.)
Com o passar do tempo, os cognatos foram adquirindo certos direitos, direitos
esses constituídos ao longo do tempo e da história. Antes a família seguia um modelo
patriarcal, ditatorial, que no decorrer do tempo, das mudanças históricas e econômicas,
foi transformando-se em um modelo mais paternal.
A partir do século XIX, identifica-se a família nuclear burguesa originário da
Europa, como sendo um novo modelo de família nuclear, mas com um número menor
de filhos. O poder do homem ainda era soberano, mas a mulher começava a assumir a
postura de “rainha do lar”, de um espaço privado, onde era responsável direta pela
educação dos filhos, principalmente das filhas, tendo o cuidado de educá-las para
desempenhar o papel de mãe e esposa, para cuidar da educação dos filhos e do lar.
Ainda dentro de uma visão histórica e evolutiva, vemos surgir o “modelo
paternal”, procedendo diretamente do maternal, onde a mulher passa a ter acesso à
educação formal e à formação profissional, a obter direito à herança do cônjuge e à sua
própria herança. Com isso, ela passa a ocupar o espaço público, embora mantendo a
responsabilidade da criação dos filhos, ganha níveis de consciência reflexiva,
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possibilitada pelo advento da contracepção, cooptando assim, à transição para um novo
modelo familiar, “igualitário” cuja essência é o ideal de equidade na responsabilidade
parental, mas que, apesar dos avanços, ainda está longe de ser vivido realmente na
prática, pelo menos em nosso país.
Vemos que a cada momento histórico corresponde um modelo de família, mas
esse processo de modificação não leva a que um se acabe, enquanto o outro aparece; até
os dias de hoje, temos a presença de homens patriarcas e de mulheres submissas, como
donas do lar, ou a imagem de mulheres trabalhadoras, sustentando sua própria família.
Entendemos a família como sendo o berço da cultura e a base social da
sociedade, sendo a responsável direta pelo desenvolvimento da personalidade e do
caráter, como protetora e provedora de bens materiais e éticos das gerações futuras.
1.3 - A importância no Processo de Transmissão da Herança Cultural.
O homem por ter sua criação aos moldes de uma cultura patriarcal ainda hoje, de
forma geral, encontra-se em dificuldades para separar sua individualidade das funções
de pai, comprometendo muitas vezes, com seu silêncio, a possibilidade de um diálogo
familiar, por se colocar “acima” de uma contextura doméstica, constituída, sobretudo
pela mulher e pelos filhos. O distanciamento entre ele e os demais membros do núcleo
familiar, certamente, denuncia-se na fragilidade do vínculo estabelecido com os filhos,
principalmente quando se trata de crianças do sexo masculino, para quem, muitas vezes
pela distância que se estabelece, deixa de ser “exemplo”, “referência de valores”.
Mesmo se apoiando, no entanto, nessa cultura machista, o homem se vê aos poucos
obrigado a modificar-se, numa mudança necessária e ampla, de maneira lenta e
progressiva, onde não se separam sociedade e família.
Pelo que pesquisamos, esse processo de modificação teve como grande marco a
Segunda Grande Guerra Mundial, com a aceleração e consolidação do processo de
industrialização, também no Brasil. A mudança em nosso país do modelo econômico
agrário para outro, pré-industrial, ocorreu com a utilização da mão de obra extensiva,
provida de famílias numerosas, oriundas de um modelo patriarcal. Com a modificação
da forma de produtividade econômica, acontece processo imigratório, aonde as famílias
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vêm para a cidade desfazendo-se dos laços existentes, que traziam da convivência de
uma comunidade tradicional, com o predomínio de contatos diretos, face a face. Dessa
forma, a presença antes onipotente do marido abre espaço para que a mulher ocupe o
comando da casa e a educação dos filhos. Surge a introdução da mulher no mercado de
trabalho, ao lado do crescimento de movimentos sociais, preocupados com o seu bem
estar como o feminismo, num modelo europeu que tem campo de atuação aberto através
da industrialização, dando inicio a transformações socioculturais que atingem hoje a
família, que a levam a lutar pela conquistar de direitos, como instituição, com respeito a
cada um de seus membros.
A partir daí, com a expansão do modelo de industrialização urbana em nosso
país, na década de 1960, e a consolidação da indústria automobilística em São Paulo,
aceleram-se as transformações nas relações domésticas tradicionais. A inserção de
homens e mulheres no trabalho fabril caracteriza o surgimento do “camponês-operário”,
buscando “novos caminhos” na cidade, abandonando o campo. Acelera-se também, o
processo de favelização dos bairros periféricos e morros, especialmente na cidade do
Rio de Janeiro. Com a vinda de famílias de diversas partes do território nacional, passa
a se caracterizar um novo arranjo de estrutura familiar, onde, diante de um quadro de
carência, de exclusão social, homem e mulher, ainda que despreparados,
desqualificados, buscam juntos espaço, no mercado de trabalho. A convivência continua
com a diversidade de modelos de família nuclear1, modificado pela figura da mulher
como sendo arrimo do grupo e pela junção de novos elementos, vindos de diversas
regiões como força de trabalho, trazendo e incorporando o significado de negação,
manutenção e alteração de hábitos, tradições e atitudes, produzindo uma cultura paralela
advinda de uma nova construção de valores. Ao lado desses grupos familiares, ficariam
outros geralmente numerosos, que se apoiavam na exploração da pequena propriedade
rural. Os filhos, então, tinham um significado potencial de trabalho, constituindo a força
das atividades econômicas à exploração da pequena propriedade. Esse “potencial” e tal
1A família ampliada ou consanguínea é outra estrutura, que consiste na família nuclear, mais os parentes diretos ou
colaterais, existindo uma extensão das relações entre pais e filhos para avós. Wikipédia virtual
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organização doméstica consolidaram um modelo de família caracterizado pelo
compartilhamento das atividades produtivas e por outros aspectos e valores étnico-
culturais, ligados a forma da vida em comunidades pequenas, tradicionais.
Junto de uma nova realidade, com o movimento migratório, foi necessário
repensar a educação para uma melhor convivência.
Segundo BOITO
“A indústria precisava qualificar a força de trabalho operária,
os quadros administrativos, a mão-de-obra técnica, e precisava
também de infra-estrutura e de pesquisa tecnológica nacional;
o Estado populista precisava integrar os trabalhadores
urbanos, objetivo que exigia a ampliação do ensino público,
gratuito e laico. Como se sabe, essa foi à época, não da
implantação, mas da expansão da rede de escolas públicas e da
criação da rede de universidades federais e, em alguns casos,
estaduais. Foram também criados muitos institutos de pesquisa
vinculados ao Estado. Os interesses e as expectativas
apontavam para um projeto político de desenvolvimento de um
capitalismo de base minimamente nacional com um mínimo de
direitos sociais e de distribuição de renda.” (BOITO Jr. 1999,
p.78.)
Todo esse processo Industrial acabou posicionando a escola como “forma
principal e dominante de educação”, em substituição à família. Para esse fim, o
principal mecanismo foi à adoção do processo de universalização da escola primária,
onde com o simples ensino das letras e números, facilitou-se a socialização dos
indivíduos considerada formas de convivência próprias da sociedade moderna,
necessárias a uma nova realidade industrial em que a maquinaria e a introdução de
novas tecnologias solicitavam a escolarização da massa trabalhadora, para melhor
realização do processo produtivo. Não bastava mais que o migrante estivesse disponível
no centro industrial; além de sua “força”, era necessário que ele fosse treinado e
ajustado aquela nova realidade laboral.
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Como podemos perceber, a família foi o ponto de partida de todas essas
modificações, a responsável direta pelo processo de formação e construção de valores
étnicos, morais, sociais, culturais, emocionais e acima de tudo, propositores de uma
transformação que envolvesse realmente toda à sociedade.
Em uma análise geral, percebemos que o amadurecimento político e social, é
adquirido através da formação de consciência crítica, noções de certo e errado, voltada
para as questões sociais que surgem no decorrer do tempo e que é passado através da
estrutura familiar, exista ela por consangüinidade ou não, desde que se trate de uma
família estruturada. Em contrapartida, vemos também que o descaso e a falta de uma
política de governo, em função de um planejamento familiar, têm afetado essa mesma
estrutura. No Brasil não há uma política efetiva de planejamento familiar e observando
que acontece, de acordo com a classe social, verificamos que os métodos contraceptivos
mais eficazes são utilizados pelas classes médias e altas, enquanto que o proletariado
ainda experimenta a desconsideração de um Estado paternalista, pouco preocupado
verdadeiramente com o bem estar da população, exatamente por ser um “Estado
mínimo”, que não busca solucionar o problema da procriação responsável de fato, mas
sim buscar políticas compensatórias; repassa a sua responsabilidade para o terceiro
setor, e para a sociedade civil, se resguardando da responsabilidade social, construindo
programas de políticas focalistas, pouco eficientes. Podemos perceber, observando o
que se faz nas redes públicas de saúde, de educação e de assistência social, que os
programas existentes não permitem que as classes menos favorecidas se recoloquem de
maneira digna dentro de um processo capitalista de consumo, com emprego, moradia,
lazer, passível de uma reflexão, podendo fazer suas escolhas de procriação responsável,
sem recorrer à clandestinidade do aborto.
Podemos observar que, estatisticamente, os índices de natalidade caíram, mas
apenas nas classes mais favorecidas, ainda colocadas dentro de um padrão de vida
aceitável pelo modelo capitalista, enquanto que nas famílias menos favorecidas a
atividade de procriar fica por conta, geralmente de um pensamento religioso retrógrado,
que impossibilita e afasta dos métodos modernos de contracepção, ampliando ainda
mais as condições de desigualdade social. Nesse modelo, crianças cada vez mais cedo
estão dando a luz a outras crianças, sem a aplicação de políticas de planejamento
familiar que podem até existir no papel, mas não são executadas de forma efetiva e
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universal, formando uma nova geração de brasileiros sem qualquer perspectiva, vivendo
desde a primeira infância com distorções de valores sociais e se tornando adolescentes
reprodutores dessa mesma situação .
O desemprego, a ociosidade dessas crianças, a falta de educação a nível público,
a degradação familiar pela perda de vínculos afetivos, causam perdas de referência de
valores sociais e afetivos. Os próprios programas sociais oferecidos pelo Estado,
tornam-se às vezes excludentes, tirando a característica e a dignidade de cidadão,
retirando-o do meio de produção, elevando-o a um patamar inferior onde se tornará
mais um componente de um exército de mão de obra ocioso, que apenas “recebe”
doações oferecidas. Com a ausência do Estado, a responsabilidade acaba sendo
repassada para a sociedade civil, como já dissemos, ficando esta com o encargo de
ajustamento desses indivíduos. A idéia de projetos surgidos dos intelectuais orgânicos2
que, por essa ausência do Estado, passam a ser responsáveis por programas sociais
compensatórios, apenas reforçam a situação de exclusão das classes desfavorecidas e
desprovidas, acabam sendo focalistas, atingindo apenas a uma pequena parcela da
população. Esses projetos atuam como um “recorte” do exercício da liberdade, da
responsabilidade social, da democratização de informações, quando ao contrário,
deveria ajudar a mudar, criando nos seus participantes um ideal de superação de
situação de comodismo, superando hábitos de um senso comum, reforçado a idéia de
desinteresse pessoal, em função da gratuidade do projeto, devido a um ideal de troca
mutua.
Ainda nessa seqüência de análise estrutural, podemos encontrar famílias onde o
descaso entre os membros torna-se um caos, pois não são vistos mais laços afetivos,
grupos numerosos sem vínculos e conhecimento, muitas das vezes, do que deve
representar a paternidade, em termos de responsabilização frente ao processo de
formação humana. Podemos afirmar que um projeto de planejamento familiar que se
entrelace com outro, educacional, é de suma importância, que o descaso do Estado
nesse nível está se tornando uma mazela para a população, acaba contribuindo, de forma
desordenada, para a construção de uma nova característica, negativa da formação
familiar, que acaba se reproduzindo sexualmente sem que se agregue a isso valores
2 Gramsci afirma como tese central que os intelectuais são um grupo social autônomo, com uma função social de porta-vozes dos grupos ligados ao mundo da produção. Wikipédia virtual.
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positivos, pessoais e da sociedade, descaracterizando, em suma, um ideal de família
estruturada, onde o relacionamento entre os membros se torne, realmente, “ponto de
partida” para uma sociedade justa, menos desigual e excludente.
1.4 – A Constituição Federal de 1988 e a Idéia de Família Igualitária.
Observamos que no nosso país, as mudanças dos moldes de uma sociedade
capitalista acabam sendo absorvidas mediante a necessidade de ir em busca de uma vida
melhor. A busca está por um emprego, ou até mesmo pela sobrevivência, vindo no
decorrer do tempo, de forma gradativa e constante, a transformar os valores pessoais e
sociais, por tudo o que já vimos até aqui. Dentre estes, está o padrão de estrutura
familiar, tanto na forma econômica, como modificando uma estrutura de relações entre
homem e mulher, dando origem e lugar a uma nova formação, capaz de assegurar a
ambos os cônjuges as mesmas responsabilidades cíveis com a prole.
Nos padrões de criação da prole de hoje, se vê como necessário criar conceitos
de igual participação, onde não é mais passada para os filhos a idéia de uma “hierarquia
doméstica”, onde o menino e a menina são criados sem obrigatoriedade de futuramente
virem a constituir um casamento, ou uma vida em comum e tendo como referência o
ideal de cooperação e divisão de responsabilidades, no plano da sociedade, tanto das
tarefas domésticas, quanto de uma economia estrutural. Respeito e obediência
ultrapassam os moldes da rigidez, transformando-se em respeito mútuo, em respeito à
individualidade de cada um dos cônjuges, de cada um dos membros do grupo.
Segundo o Artigo 5º da Constituição Federal, 1988:
“Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes: I - homens e mulheres são iguais em
direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.” (p.12)
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A Constituição Federal de 1988 é uma verdadeira “Constituição Cidadã”, onde
se destaca a importância dos direitos e garantias fundamentais, que são hoje a base de
um Estado Democrático de Direito, calçado nos cinco direitos invioláveis, o direito a
vida, à liberdade, à igualdade, á segurança e à propriedade, para todos os homens e
mulheres de qualquer raça, credo ou nacionalidade.
Desde a conquista e o aprimoramento possibilitando a educação primária para a
mulher, criou-se uma consciência que a levou à luta pela igualdade de direitos, abrindo
novas possibilidades de afirmação e de identidade pessoal, pela independência
financeira. Pelo que lemos, foi em 1994, na Conferência Mundial realizada no Cairo,
que a questão referente à sexualidade da mulher, reprodutivas e sexuais, passou a ser
considerada como um assunto de discussão e ganhou importância aos moldes de mais
uma conquista feminina na história. Já em 1998, reunisse cerca de 140 mulheres de 65
países, em Quebec3, iniciando-se o processo da “Marcha Mundial das Mulheres”, na
defesa de direitos de cidadania.
Através das lutas reivindicatórias e todo um processo de transformação que o
mundo vem passando, em especial no Brasil, após ter seus direitos referendados a partir
da atual Constituição Federal, foi que a mulher conquistou sua autonomia no papel; uma
formação escolar possibilitou-lhe uma consciência profissional, garantiu-lhe a abertura
de novas possibilidades de vida, a afirmação de uma identidade pessoal, de
independência financeira.
A entrada da mulher no mercado de trabalho veio a garantir, portanto, a ela,
devido que, num primeiro momento, no papel, como já dissemos, direitos sociais
“idênticos” aos do sexo masculino, dentre eles o do voto, o que acabou provocando, aos
homens, uma transformação comportamental de grandes proporções em nossa
sociedade. A idéia da igualdade entre homens e mulheres transformou até o modelo de
relacionamento conjugal e a estrutura familiar, que antes era a de uma mãe puramente
zelosa e a colocou como sendo a “mãe multifuncional”, aquela que é mãe, esposa,
provedora e acima de tudo, mais participativa na vida dos filhos, ocorrendo assim, uma
maior interação entre o casal e a prole. Com esse novo modelo de família igualitária,
tornando aos poucos realidade, foi possível que a criança e o adolescente ganhassem
3 Também chamado por vezes de Quebeque em português, é uma das dez províncias do Canadá. O Quebec é a maior província do país, e a segunda mais habitada do Canadá. Wikipédia virtual.
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mais espaço, dentro do lar e fora dele, passassem a ser respeitados como um “ser social
participativo”, a ser ouvido, sem que tenham que abaixar a cabeça para o autoritarismo
de outrora dos pais, na maioria das vezes.
Com o perpasso do tempo e a chegada dos novos padrões sociais houve,
portanto, uma ruptura quanto ao modelo arcaico, que trazia consigo normas sociais e
familiares disfuncionais, a serviço de uma ideologia dominante. O homem fez-se
adaptar dentro de um novo padrão de normas e conquistas, até mesmo porque a
industrialização o empurrara para um capitalismo desenfreado, dragado pelo
neoliberalismo onde padrões sócio-econômicos tiveram seu “enxugamento”. Fez-se
necessário a ele se adaptar ao feminismo e à divisão de tarefas com a figura da mulher
assumindo atividades, que, antes, eram apenas domésticas, que se somaram as tarefas
externas e à direção da economia interna do lar. A figura masculina teve que se adaptar
à rotina de também levar os filhos à escola, de participar mais da educação dos filhos,
dos afazeres domésticos em geral e, por vezes, até a trocar de papel com a mulher,
devido à situação de desemprego, ou até mesmo de aposentadoria.
Devido ao nosso enxugamento na economia doméstica, observamos que a
tendência dos filhos de classe média é de saírem de casa cada vez mais tarde. Retardam
o “processo de saída” devido à defasagem de campos de trabalho e, conseqüentemente,
por não conseguirem montar um novo lar; ficam dentro da casa paterna/materna, vindo
a “engrossar” assim, a renda familiar, ou, também, pela dissolução de um enlace
matrimonial, retornando à residência dos pais, em busca novamente de apoio, por
exemplo, em relação à educação dos filhos, enquanto saem à procura de emprego para
seu próprio sustento.
Hoje vemos que conta muito a condição sócio-econômica, a posição na
sociedade dos vários componentes do grupo familiar, do responsável legal pela prole,
pelo sustento, independente de gênero e que, em termos gerais, pode até recair em um
adolescente, diferenciando essa responsabilidade e atribuindo deveres com relação às
pessoas conviventes no núcleo familiar, independente da situação marital, associadas na
autoridade e sua responsabilidade ao papel de principal “fonte” de sustento.
Observamos que nas famílias de mais baixa renda, a importância é fundamental
da colaboração dos filhos, acaba sendo indispensável, forçando adolescentes a
ingressarem no mercado de trabalho cada vez mais cedo. Ao lado disso, com a vida
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corrida e competitiva, muitos os jovens também se emancipam mais cedo e se tornam
provedores estruturais de novas famílias, ou passam a servir de arrimo às suas famílias
originais.
1.5 – Família de Classe Popular Matriarcal e Família Monoparental.
Não é somente o capital, o responsável no processo de agregação ou
desagregação familiar. O apego, digo a convivência com outro núcleo familiar ou a
perda sem fundamentação, de um fator cultural familiar, onde os membros da família
não se encontram, não conversam, criando uma lacuna onde deveria acontecer uma
aproximação ligada ao afeto, também pode implicar neste processo. O modo de
socialização das famílias influencia no cotidiano de toda uma geração. Ao analisarmos
os conflitos, contradições, as tensões ocorridas hoje nas classes mais populares,
podemos perceber que as mesmas vêm se deteriorando durante anos, pela falta de um
olhar diferenciado do Estado em relação à questão social que as envolvem. Vemos um
descaso por parte do Estado em relação às condições de saúde física e mental, lazer,
educação, emprego. Repensar política de planejamento familiar, requer repensar de
forma abrangente, desigualdades sociais regionais, por tudo o que já dissemos até agora.
As mulheres de hoje já não são mais tão desinformadas, oprimidas, elas
possuem domínio sobre suas vontades e desejos, mas quanto às conseqüências da
“ausência” do Estado, precisam sim ser olhadas com mais carinho. A proporção de
meninas adolescentes grávidas de áreas carentes vem aumentando a cada ano em
determinados estados da federação, na razão inversa do acesso à educação. Isso implica
também a evasão escolar, pois as mesmas não retornaram às escolas, por motivos
óbvios, pois não têm com quem deixar os filhos, vindo a reproduzir um quadro que
antes elas mesmas já vivenciaram; são filhas do “descaso social”, criadas sem a
oportunidade de uma educação qualificada. Vemos então que, na situação delas, a
educação é o diferencial na hora de se fazer uma escolha, frente a possibilidade de
práticas sexuais não planejadas. Por outro lado, não pode ser negligenciada a
responsabilidade do homem na gestação precoce por que venham a passar. Ainda
circula o “discurso” de que a maior responsável por uma gravidez indesejada é a
23
mulher. O homem, muitas vezes, mantém dentro de si essa idéia como um fator
tradicional, oriundo do machismo. Para ele, geralmente, a reprodução eleva seu status
de “homem varão”, com uma sexualidade indiscutível, que busca, através dela, se impor
no meio do seu grupo social. Não se vê como responsável, também, por uma gravidez
fora de hora. Muitos ainda associam o uso do preservativo à prevenção das Doenças
Sexualmente Transmissíveis - DST e não a gravidez. Essa despreocupação acaba
gerando filhos e uniões precoces e frágeis, que muitas das vezes, terminam após o
nascimento do filho. Com o fortalecimento da mulher, frente à necessidade de se
sobrepor a isso, o homem muitas vezes já não se sente mais provedor e responsável pela
criação do filho, passando essa responsabilidade para a mulher.
Devido ao despreparo, tanto o homem quanto a mulher, muitas vezes, sofrem,
tendo os seus direitos básicos violados, pois acabam por adquirir uma responsabilidade
que na maioria das vezes não se vêem capazes de assumir, no caso de uma gravidez
indesejada, com a agravante de tantas outras responsabilidades, que acompanham o
casal, ao possibilitarem a formação de mais uma vida, sem que se tenham planejado,
querido. Entre adolescentes, é ainda pior, a situação, devido à falta de uma estrutura
financeira e logística e por morarem ainda com os pais, delegando, não raro, a eles, mais
uma responsabilidade de não poderem assumir financeiramente, os filhos, acabam
sendo “mais um” a se agregar a um quadro de uma economia doméstica “apertada”,
fragilizada.
Analisando também por outra ótica, podemos perceber que esse despreparo
também esta situado em um gostar sem amadurecimento, pois grandes partes desses
relacionamentos acabam logo após o nascimento do bebê, como já dissemos, pela “falta
do gostar”, acarretando a falta de vinculo do pai com o filho, já que “não pesa” sobre o
homem “o fardo” de assumir o seu sustento. Assim, famílias se formam, sem que haja
referência masculina, comandadas por mulheres, dando uma nova concepção à família,
como uma estrutura monoparental.
Segundo consta na Constituição federal (1988), no artigo 226, §4º, as famílias
monoparentais são definidas, como a “comunidade formada por qualquer dos pais e
seus descendentes”.
Por ser uma estrutura assumida por um único representante como responsável, o
mesmo acaba sendo sobrecarregado das funções de pai e mãe, assumindo toda a
24
responsabilidade que, “a priori”, seria dividida, agora voltada para uma única pessoa.
Isso pode vir a acarretar problemas estruturais, financeiros, para a educação dos filhos,
tornando mais difícil a conciliação entre trabalho e atenção ao lar, para o cônjuge,
geralmente a mulher, que se vê nessa situação.
Ao contrario do que podemos perceber, vemos que neste modelo de família,
basicamente liderado e chefiado por homossexuais, a estrutura econômica e psíquica, na
grande maioria, acaba sendo mais fortalecia devido à pressão exercida sobre eles no que
se referem aos valores morais que a sociedade impõe em relação ao que o adotante
deixará como legado para o adotado. Isto se refere basicamente porque pela visão da
nossa sociedade machista, a união homossexual é instável sendo a mesma de pouca
duração e que acarretaria maiores problemas emocionais e na estrutura de formação de
valores deste indivíduo em formação. Ao que podemos perceber, esta escolha pelo
homo sexual pela adoção, é feita quando opção sexual já está definida e estabelecida
como tal.
1.6 – Relação Conjugal em Declínio.
Dos primórdios da civilização humana até os dias de hoje, o que move
biologicamente a união entre duas pessoas é a necessidade de perpetuar a espécie. Mas,
mesmo lá no passado, o conceito de amor, já pode ser discutido, juntando sexo e
afeição. Era através dessa afeição que, já estão pessoas se uniam, formando uma
família.
Compreendemos que o conceito de amor varia em gênero, forma e intensidade,
conforme a sociedade em que é aplicado e o momento histórico em que os indivíduos
estão inseridos. Historicamente, existiram grupos sociais onde o “sentimento de posse”
fazia com que o homem agregasse à afeição um valor menor, surgindo daí, os
“casamentos arranjados”, como durante a idade média. Eram puramente por interesse,
entre famílias; filhos eram prometidos, para que riquezas não se dizimassem. Ainda o
amor é instinto, necessidade nata, que está muito voltada para a reprodução e para a
continuidade do ser, mas, com o passar do tempo, passou a imperar o sentimento, e os
vínculos constituídos por casamentos arranjados, foram sendo extintos. Com a mudança
25
histórica, mudam também os “ideais do casamento”, tornando românticos, espalhando-
se pela Europa e pela América, valorizando emoções, liberdade de criação, amor
platônico, temas religiosos, individualismo, nacionalismo e história. Esse período foi
fortemente influenciado pelos ideais do iluminismo4 e pela liberdade conquistada na
Revolução Francesa. Com as mudanças históricas, mudaram também os valores e não
se “comprou” mais o amor por dotes, famílias passaram a se formar por afeição.
Com o advento das duas Grandes Guerras Mundiais, para nós brasileiros a que
mais marcou foi a Segunda, a industrialização e a já citada migração de famílias do
campo para os grandes centros urbanos, a mulher se viu dentro de uma mudança
estrutural, principalmente, econômica. Muitas necessidades novas apresentavam-se,
mudanças na estrutura familiar tornaram-se significativas; a mulher com sua
emancipação passou a fazer dentre suas escolhas, uma, também, afetiva. Primeiro, na
segunda metade do século passado, veio a pílula anticoncepcional e, depois, com o
surgimento no país, do divórcio, em 1977, ela se viu livre, saindo de uma vida muitas
vezes clandestina amorosa, para outra, de liberdade conquistada a duras penas. Deu
vazão a sua ânsia de liberdade e caminhou sem se deixar deter pela depreciação
masculina.
Hoje vemos a mulher como uma figura plena, independente e capaz de decidir
dentro do que se constitui numa família igualitária, ou em uma “produção
independente”, aos moldes de uma família monoparental.
As meninas, desde muito cedo, estão criando uma consciência critica, a respeito
de si mesmas no mundo, inteiram-se a respeito de sexo e o experimentam, na mesma
proporção em que sentem a necessidade desse conhecimento prático, que acaba sendo
cada vez mais cedo. Cedo vão à busca de relacionamentos, não só para um namoro, mas
4 "Chamamos de Iluminismo o movimento cultural que se desenvolveu na Inglaterra, Holanda e França, nos séculos XVII e XVIII. Nessa época, o desenvolvimento intelectual, que vinha ocorrendo desde o Renascimento, deu origem a idéias de liberdade política e econômica, defendidas pela burguesia. Os filósofos e economistas que difundiam essas idéias julgavam-se propagadores da luz e do conhecimento, sendo, por isso, chamados de iluministas.
O Iluminismo trouxe consigo grandes avanços que, juntamente com a Revolução Industrial, abriram espaço para a profunda mudança política determinada pela Revolução Francesa. O precursor desse movimento foi o matemático francês René Descartes (1596-1650), considerado o pai do racionalismo. Em sua obra “Discurso do método”, ele recomenda, para se chegar à verdade, que se duvide de tudo, mesmo das coisas aparentemente verdadeiras. A partir da dúvida racional pode-se alcançar a compreensão do mundo, e mesmo de Deus”. (FILHO,1990)
26
numa convivência diária, habitando numa mesma residência, sem que constituam uma
união de direito. Muitas vivem em união estável, preferem tardar a ter filhos e se
moldam nesse processo de responsabilização mutua, onde ambos trabalham para manter
o lar, dividem tarefas e contas.
A respeito da evolução moral e social, sem essência, achamos que no amor nada
mudou, continuam-se tendo percalços, com alegrias, tristezas, dores e desilusões.
A rotina numa vida a dois é indispensável e benéfica, quando há uma auto-
vigilância quanto ao respeito “ao outro”. Homem e mulher trazem consigo,
isoladamente, vestígios de valores de suas famílias de origem, com características
diferenciadas, para construírem, a partir delas, o convívio de uma nova relação. O
conflito desses valores, dentro de uma rotina degradante, acaba culminando em
desgaste. Imperceptivelmente, essa rotina vai tomando conta do casal, às vezes sem que
ambos percebam, até gerar um mar de cobranças, tornando a convivência, antes
pacifica, em algo mecânico, sem vida, extinguindo a alegria do convívio, para dar lugar
a um comportamento de autômato, a uma rotina corrosiva.
Versos do poeta Vinícius de Moraes:
“ De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente”
Aparências podem ser mantidas, por algum tempo, o amor que antes era visto
como motivo de prazer e convivência acaba dando lugar a conflitos e crises constantes,
podendo gerar uma espécie de letargia. A motivação para um casamento hoje em dia
não se baseia mais em juras de amor, achamos, na pratica, que acontece a nível de
“afinidades de personalidade”: as expectativas ainda são as mesmas de outrora, as
pessoas se casam ou vivem juntas numa situação estável, desejando felicidade, sucesso,
a união ainda é constituída “por amor”, mas talvez sem muitos sonhos, mas voltado para
o realismo. De marido orgulhoso e provedor e de mulher submissa à senhora do lar,
abriram-se portas para um casal que se relaciona de forma a satisfazer suas necessidades
27
de ser humano, passou-se a uma busca pela satisfação de ambas as partes, procurando
prazer na forma de satisfação pessoal e realização como casal.
Achamos que o processo de desconstrução de uma relação começa pela falta de
comunicação e a culpabilidade por problemas que vão surgindo. Em geral, a
responsabilidade é dos dois, mas acaba “apontando” para um único responsável, para o
que se considera o mais prejudicado ou até mesmo o mais passivo, por compartilhar ou
aceitar tal condição. Acaba acontecendo às vezes, um acordo inconsciente; poderá
ocorrer o momento em que um dos cônjuges, em geral o que toma a posição de passivo,
lute, para não entrar num processo de separação, esforçando-se para “corrigir defeitos”,
contornar dificuldades, evitar atritos; até mesmo, poderá esforçar-se mediante uma
manifestação excessiva de afeição e carinho. Mas nem sempre essa tentativa de uma
“nova reconstrução” acaba sendo bem sucedida, pois o desgaste já se apresenta tão
acentuado que apenas retarda o processo, que aparecerá mais a frente, eclodindo sob
outros motivos. Quando o amor dá lugar ao desconforto da convivência no mesmo lar,
acaba gerando uma ansiedade. O que era desentendimento e passível de um acordo vira
um somatório de diferenças, que com o tempo, acabam ficando difíceis de conciliar,
vindos a ocorrer o rompimento, a separação, de forma consensual, ou litigiosa.
1.7 – Responsabilidade Parental e o Desrespeito aos Direitos dos Filhos.
Entende-se como responsabilidade parental os direitos e obrigações que os pais
têm a garantir que a criança tenha moradia, alimentação, vestuário e educação. Em
decorrência do aumento de famílias monoparentais por circunstâncias alheia à vontade
humana, entre as quais a morte, separação, o abandono e mães solteiras. Tornam-se
visíveis o crescente empobrecimento do gênero feminino de classe baixa, enfrentando
quase sempre sozinhas o desafio de conciliar maternidade, atividades domésticas e
empregos de baixa remuneração e sem qualificação, com a obrigação de prover o seu
sustento e o de seus filhos, uma vez que o ex-companheiro por motivos diversos esteja
fora do mercado de trabalho formal, ou salário muito abaixo do mercado e muitas vezes
já ter constituído outra família, no que contribui para a diminuição do provento ou
escassez do mesmo, não suportando contribuir mensalmente com a pensão alimentícia.
28
Assim, as genitoras em grande maioria acabam por dispensar a participação da figura
paterna a ponto de desenvolverem um quadro típico de “alienação parental”.
Em relatos de entrevistas sociais o constrangimento acaba sendo visível uma vez
que a genitora demonstra sua ira e consternação relativa à falta da participação
financeira do ex-parceiro em face às despesas com os filhos, delegando ao mesmo o
afastamento em vista de que se não há contribuição financeira, não há participação na
criação da prole. O que fatalmente reincide com sobrecarga para a genitora na condição
de prover alimentos e moradia aos filhos. Em alguns casos o que se pode perceber em
detrimento da dificuldade de diálogo e acerto entre as partes, grandes desentendimentos
e atritos constantes, a comunicação violenta, falta de tolerância e a falta de um diálogo
conciso poderá arrastar essa batalha parental durante toda uma vida, sem que cheguem a
um acordo e entendimento, pois ambos possuem motivos plausíveis, mas não há acordo
nem mudança de posição delegando a prole a segundo plano, o que poderá transformar
os filhos em órfãos de pais vivos.
29
CAPÍTULO II
MEDIAÇÃO DE CONFLITOS
A mediação representa uma forma consensual de resolução de controvérsias, na
qual as partes, por meio de diálogo franco e pacífico, têm a possibilidade, elas próprias,
de solucionarem seu conflito, contando com a figura do mediador, terceiro imparcial
que facilitará a conversação entre elas.
A mediação possibilita a transformação da “cultura do conflito” em “cultura do
diálogo” na medida em que estimula a resolução dos problemas pelas próprias partes. A
valorização das pessoas é um ponto importante, uma vez que são elas os atores
principais e responsáveis pela resolução da divergência.
A busca do “ganha-ganha”, outro aspecto relevante da mediação, ocorre porque
se tenta chegar a um acordo benéfico para todos os envolvidos. A mediação de conflitos
propicia a retomada do diálogo franco, a escuta e o entendimento do outro.
2.1 – Teoria do Conflito.
A partir da década de 50 estudiosos como Max Gluckman, Ralf Dahrendorf,
Thomas Schelling, Kenneth Boulding, Stephen Robbins, dentre outros passaram a ter
um papel importante na reconstrução e denominação sobre o conflito, que até então não
eram sistematizados como Teoria do Conflito, apenas vistos como patologia social ou
como sintoma de uma patologia social. Entendia-se que a sociedade perfeita era uma
sociedade sem conflitos.
Segundo Stephen Robbins: “o conflito é um processo que se inicia quando uma
parte percebe que outra a afetou de maneira negativa ou que está a ponto de afetar de
maneira negativa, algum de seus interesses.
O conflito é apenas uma das possíveis formas de interação entre indivíduos,
grupos, organizações e coletividades, divergindo em razão de metas, interesses ou
objetivos individuais percebidos como mutuamente incompatíveis, onde cada indivíduo
sente a necessidade de expor as suas razões e ter suas necessidades atendidas. O conflito
30
também pode ser de ordem intrapsiquico de forças conflitantes do interior do indivíduo
que se dão, por exemplo, entre os impulsos de separação, individuação e autonomia e os
impulsos de integração, comunhão e submissão, originando um processo de
comunicação mais inconsciente e menos racional.
Em contrapartida o conflito tem o seu lado positivo abrindo espaço para
mudança de percepção podendo levar a discussões abertas, permitindo expressões e
exploração de diferentes pontos de vista, interesses e valores.
O lado positivo dos conflitos nas organizações é que, quando resolvidos com
base na razão e na natureza, a mobilização dos recursos e da energia entre as partes.
Promove a busca criativa de soluções, eleva a habilidade das pessoas para o trabalho em
equipe e, acima de tudo, estimula a confiança e o relacionamento entre as partes.
2.2 – A Importância da Comunicação.
A expressão facial, o movimento dos olhos, de cabeça, postura, a entonação e
outros movimentos involuntários do corpo, são sinais não-verbais com funções
específicas de regular e encadear as interações sociais e de expressar emoções e atitudes
interpessoais em determinados momentos. As pessoas não se comunicam apenas por
palavras. São formas de expressão importantes, pois são considerados elementos não
verbais da comunicação. Na mediação a comunicação verbal e a não verbal são
importantes para que o processo de comunicação seja eficiente.
O sucesso na comunicação não depende só da forma como a mensagem é
transmitida, a compreensão dela é fator fundamental. Por vivermos em uma sociedade
culturalmente diversificada, devemos entender que a linguagem não segue uma
liealidade o que permite uma interferência em se tratando de código e decodificação
desse código. A comunicação depois de transmitida de forma correta ao seu
interlocutor, deve ter um acompanhamento para ele saber se está agindo de forma
correta, ou se precisa corrigir ou melhorar. O mediador assume a função de oferecer as
partes um feedback de forma positiva desse entendimento.
31
2.3 – Breve História do Surgimento da Mediação de Conflitos.
A história da mediação não é recente consta em alguns escritos que a palavra
mediação antes de derivar de uma palavra latina (medium, medius, mediator) teve sua
origem na enciclopédia francesa em 1694, designando a intervenção humana entre duas
partes. Na China e Japão a mediação vem sendo feita desde o século XVI, na tentativa
de estabelecer as relações comerciais. Nos Estados Unidos o seu início deu-se nos anos
70, difundindo-se para o Canadá nos anos oitenta, levada por Howard Irving e outros
países da Europa, atuando em várias áreas como: familiar, comunitário, educacional,
comercial, trabalhista, meio ambiente e relações internacionais. Seus principais
introdutores foram Coogler (1978), Haynes (1981), Saponesk (1985) e Folberg (1984).
No Brasil, a mediação teve o seu início no final da década de 80. Por ser muito recente a
mediação aqui no Brasil é muito confundida com a arbitragem e a conciliação.
O campo dos conflitos trabalhistas foi o primeiro a organizar-se para utilizar os
meios alternativos de resolução de disputas, pela sua eficácia na negociação de greves.
Em Los Angeles - USA, foi criada a primeira Corte de Conciliação em 1939, com o
objetivo de preservar a vida familiar. Proporcionando soluções amigáveis para
controvérsias familiares, buscavam atingir a reconciliação o que posteriormente veio a
evoluir para a mediação. Nos últimos anos, a mediação tem ganhado um grande
impulso, caracterizando o chamado movimento da mediação (RAC - Resolução
Alternativa de Conflitos ou RAD - Resolução Alternativa de Disputas ). Portanto,
apenas muito recentemente é que este campo tem-se organizado profissionalmente,
pois, culturalmente, em situação de conflito os indivíduos estão habituados a recorrer ao
judiciário para resolver questões legais e à psicologia para lidar com questões pessoais.
2.4 - Conceito de Mediação.
Segundo Christopher W. Moore, mediador americano "A mediação é definida
como a interferência em uma negociação ou em um conflito, de uma terceira pessoa
aceitável, tendo o poder de decisão limitado ou não autoritário, e que ajuda as partes
32
envolvidas a chegarem, voluntariamente, a um acordo mutuamente aceitáveis em
relação às questões em disputa”.
A mediação é um procedimento que tem como finalidade facilitar o
entendimento de pequenos a grandes conflitos através da reflexão, buscando acordos
entre as partes. Sejam elas vizinhos, briga conjugal, briga entre crianças que tomam
proporções maiores que acabam se transformando em problema para os adultos, dentre
outros conflitos. Com o objetivo de intensificar a prevenção da violência e garantir
direitos, a Mediação entra em ação como um dos métodos alternativos para não chegar
a um processo judiciário ou encerrar um processo já iniciado. Com isso, diminuindo as
custas do processo facilitando muito a comunicação e diluindo o conflito, corroborando
a uma decisão satisfatória as partes a ser mediada. Mediar consiste na participação de
uma terceira pessoa imparcial assistindo e conduzindo duas ou mais partes negociantes
a identificarem os pontos de conflito e, posteriormente, desenvolverem de forma mútua
propostas que ponham fim ao conflito. E, em casos de impasse, intervindo de modo a
auxiliar a melhor compreensão e reflexão dos assuntos e propostas, melhorando a
comunicação a fim de não haver reincidência no conflito, sem impor às partes uma
solução ou sua opinião pessoal uma vez que o mesmo possui neutralidade. Conferido
após análise dos fatos sugestões para um possível acordo, avaliando das vantagens e
desvantagens que tal proposição traria a ambas as partes. A Mediação só poderá
acontecer se as partes concordarem.
“A mediação é boa para administrar conflitos,
diminuir a violência, criar uma cultura de
paz,melhorar as relações humanas, gerar
possibilidades de crescimento individual e
comunitário, garantir direitos, enfim, tornar
efetivo o acesso à justiça, em seu mais amplo
sentido.” (Juspopuli, Guia de mediação popular,
p. 22)
Embora a mediação não se confunda com psicoterapia, não se pode perder de
vista que antes de tudo para ocorrer uma mediação é necessário uma comunicação clara
que possibilite o entendimento entre ambas as partes e as mesmas possam ter um poder
33
decisório razoável. Se uma das partes não possuir condições internas de realizar uma
mediação, não se deve insistir, pois uma percepção bastante distorcida da realidade e
certa incapacidade para lidar com questões emocionais poderão dar ao oponente maior
chance de ganho da situação a ser mediada e isso foge ao sentido de Mediação, onde
ambos devam ser beneficiados mediante a acordo proferido pelas próprias partes.
A mediação não deve ser indicada quando existem desníveis de poder entre os
mediandos; quando não existe interesse por parte de um ou ambos os lados em resolver
a disputa; quando há desrespeito por parte dos mediandos aos princípios e regras da
mediação; quando existem problemas graves e/ou crônicos de saúde mental em um ou
ambos os mediandos que impedem a comunicação e a tomada de decisões.
2.5 - Áreas de Atuação da Mediação.
Mediação Social: A Mediação Social tem como objetivo promover a cultura da paz,
a cidadania e o respeito aos direitos humanos. Com o intuito de facilitar as pessoas
de baixa renda que tem pouco ou nenhum acesso aos serviços públicos básicos,
foram implantados dentro dos Fóruns escritórios populares de mediação com o
propósito de facilitar o acesso aos direitos e a justiça, que devido às formalidades
acabam desistindo deixando de resolver de forma harmoniosa os conflitos de ordem
familiar, de vizinhança, de consumo. A mediação simplifica a evolução do conflito
antes que se transforme numa relação de violência. Incluir essas famílias carentes na
esfera do direito significa transformação. É uma oportunidade de reflexão sobre suas
questões, buscando um acordo com o auxilio do mediador, que visa resgatar a auto-
estima do mediando através da tomada de decisão vinda do próprio usuário. O
Mediador Popular é uma terceira pessoa imparcial, com formação básica em
mediação popular, com o intuito de prestar serviço em bairros carentes e associação
de moradores.
A Mediação Social incentiva a participação na gestão democrática das cidades,
na medida em que torna os cidadãos mais conscientes da sua realidade (apreensão
crítica da realidade) e desperta sentimentos e ações de co-responsabilidade pelo bem-
34
estar comum (sujeitos coletivos de direitos e de desejos), além de promover a
rejeição de todas as formas de violência.
Mediação Familiar: A mediação Familiar é uma técnica alternativa e não
substitutiva dos processos judiciais. É utilizada como um dos métodos para
desobstruir os processos nas varas de família e nas varas de sucessões, obtendo-se
assim, uma solução mais fácil, rápida e menos onerosa. Em alguns casos a mediação
poderá ocorrer antes da intervenção judicial de forma amigável propondo um diálogo
pacífico e positivo através de um acordo. A mediação propicia a construção de uma
nova realidade pelas partes amenizando os desentendimentos familiares, facilitando a
resolução do processo de separação consensual, a regulação de visitas, alteração de
guarda, revisão ou execução de alimentos, permitindo que cheguem a um consenso
sobre a questão conflitiva.
Mediação Escolar: O conceito de cidadania perdeu um pouco seu espaço cedendo
autonomia para o individualismo tornando as relações sociais mais complexas e
conflituosas. Com a sociedade em crescente transformação o individualismo ganhou
destaque deixando como conseqüência em nossas vidas a deterioração nas relações
humanas, caracterizando o aumento das diferentes formas de violência e de exclusão
social. O reflexo dessa desarmonia social chega às salas de aulas como
comportamentos indisciplinados e até hostis através das agressões verbais, físicas,
furtos e destruições de mobiliários, implicando desarmonia do ambiente acadêmico,
chegaram a desencadear o "bullying5”.
A Mediação Escolar é um método utilizado com o objetivo de discutir a
prática de resolução dos conflitos escolares, promover a redução da violência entre
alunos, melhorar a convivência no ambiente escolar, prevenir a delinqüência,
promover a inclusão, o diálogo, à autonomia, a participação coletiva. A mediação em
ambiente escolar é apresentada como uma ferramenta contribuitiva e positiva para
esses conflitos, com o intuito de auxiliar os indivíduos a negociar e a celebrar
5 é um termo inglês utilizado para descrever atos de violência física ou psicológica, intencionais e repetidos, praticados por um indivíduo (bully - «tiranete» ou «valentão») ou grupo de indivíduos com o objetivo de intimidar ou agredir outro indivíduo (ou grupo de indivíduos) incapaz(es) de se defender. Também existem as vítimas/agressoras, ou autores/alvos, que em determinados momentos cometem agressões, porém também são vítimas de bullying pela turma. Wikipédia virtual.
35
compromissos mutuamente satisfatórios através de uma comunicação clara e
acertiva, permitindo criar um sistema onde o conflito é encarado como natural, sendo
dado protagonismo aos intervenientes para que o possam resolver. São estimulados
os valores da solidariedade, tolerância, igualdade, bem como um juízo crítico, que
promove a capacidade para inovar com a procura de novas soluções. Com a
Mediação dá-se realce a princípios básicos como a cooperação, a co-responsabilidade
e o respeito, lutando-se, desta forma, contra a instabilidade emocional que afeta os
intervenientes na organização que é a escola.
Mediação Laboral: Também conhecida como mediação empresarial,
organizacional ou corporativa, a mediação laboral tem-se mostrado um instrumento
eficiente na gestão dos conflitos e na melhoria da qualidade de vida no ambiente de
trabalho. O Instituto Pró-Mediação colabora para a formação de mediadores e
promove a criação de espaços de mediação nas empresas públicas e privadas. No
ambiente profissional, o mediador tem o relevante papel de estimular práticas
dialógicas e motivar atitudes cooperativas. Para as empresas, significa investir na
manutenção do bom relacionamento interno – meio ambiente de trabalho saudável -
e externo - com usuários, clientes e consumidores - e na melhoria da qualidade de
produtos e serviços.
2.6 – Diferentes Formas de Resolução de Conflitos.
As formas de resolução dos conflitos são fórmulas de auto -composição, não
adversariais, de solução de controvérsias que fazem parte de um processo contínuo no
qual varia o grau de autonomia das decisões dos envolvidos, dentre as quais se
destacam: Negociação; Mediação; Conciliação e Arbitragem. Cada uma dessas formas
possui uma característica particular e nenhuma delas se comunica.
• Negociação - Não há a participação de terceiro conduzindo a negociação, as
próprias pessoas em conflito buscam, por elas mesmas, a resolução do problema
(autocomposição). Pode haver ou não a participação de representantes (ex:
advogados).
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• Mediação - Há uma “autocomposição assistida”, ou seja, são os próprios
envolvidos que discutirão e comporão o conflito, mas com a presença de um
terceiro imparcial, que não deve influenciar ou persuadir que as pessoas entrem
em um acordo. No processo de mediação existe a preocupação de (re)criar
vínculos entre as pessoas, estabelecer pontes de comunicação, transformar e
prevenir conflitos.
• Conciliação - A conciliação é bastante confundida com a mediação, mas são
institutos distintos. Na primeira, o (a) conciliador(a) faz sugestões, interfere,
oferece conselhos. Na segunda, o(a) mediador(a) facilita a comunicação, sem
induzir as partes ao acordo. Esse, aliás, é o objetivo primordial da conciliação;
na mediação, por outro lado, o acordo será apenas uma conseqüência e um sinal
de que a comunicação entre as pessoas foi bem desenvolvida.
• Arbitragem - As pessoas em conflito elegem um árbitro para decidir suas
divergências, utilizando critérios específicos. Não possuem, portanto, o poder de
decisão.
A negociação, mediação, conciliação e arbitragem, ainda que sejam formas
consensuais de solução de conflitos, possuem várias diferenças entre si, cabendo às
pessoas decidirem qual o método mais adequado ao seu caso.
2.7 – Ferramentas Utilizadas na Resolução de Conflitos.
A utilização das ferramentas próprias da mediação permite uma forma
mais interativa de se obter informações necessárias na produção do conhecimento sobre
as partes. Ajuda a disponibilizar de forma linear as informações inerentes a questão
trazida pelo usuário, propiciando a análise e negociação do conflito e possibilitando
variadas estratégias na aplicabilidade e feedback necessários para entendimento e
resolução do conflito. São elas: Recontextualização; Audição propostas implícitas;
Afago; Silêncio; Troca de papéis; Geração de opções; Normalização; Organização de
questões; Enfoque prospectivo; Teste de Realidade: Apresentar perguntas orientadas
para soluções.
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A postura ética do mediador e a observação exercida entre todos os envolvidos é
o ponto crucial que definirá o estabelecimento de confiança entre as partes e o
mediador. A mediação requer comprometimento numa relação de confiança na qual o
usuário ficará aberto a trocar informações (Rapport6). O mediador por ter o
conhecimento de muitas estratégias de atuação, ordena e organiza as informações de
forma clara e concisa, tendo como objetivo o controle do processo; o suporte às partes;
o estímulo à recontextualização da disputa como um fenômeno passível de resolução
das questões propriamente ditas.
A recontextualização faz-se necessária para o estímulo das partes a partir de
uma diferente perspectiva gerada por indagações do mediador. Parafraseando de forma
positiva a mesma indagação permite o usuário um enfoque diferente, aguçando a
atenção do mesmo sobre sua fala. Ao ouvir, com atenção, o relato, muitas vezes o
mediador consegue perceber que há dentro da fala, mesmo carregada de sentimentos,
uma proposta de solução. Cabe ao mediador decodificar e explicitar essa proposta de
forma que as partes consigam entender, devendo oferecer sempre um reforço positivo
em cada entendimento o que possibilita o bom andamento da mediação. Respeitar o
silêncio também faz parte do rol de ferramentas utilizadas pela mediação o que
sinalizará que o propósito foi atingido, pois houve reflexão. Retirar da fala do usuário o
sentimento de culpa, caso o tenha, fazendo-o perceber que para cada problema haverá
uma solução (normatização). Os questionamentos poderão ser comuns aos dois desde
que as partes respeitem a ordem das falas. O mediador deverá conduzir a mediação num
enfoque prospectivo, conduzindo a reflexão e construir uma história alternativa, ou um
futuro alternativo. Grande parte das ferramentas apresentadas poderá ser usada em uma
sessão conjunta, salvo o teste de realidade e a troca de papéis, que requer a necessidade
de uma das partes se colocar no lugar do outro visualizando a própria história com outro
perspectiva. A necessidade de se fazer esta técnica em sessão individual é devido
manter as partes em níveis iguais de autonomia e emocionalmente capazes de dar
continuidade a mediação.
6 palavra francesa que significa padrão) é o padrão mínimo da estrutura de entrelaçamento dum tecido, por extensão pode ser o padrão mínimo das cores quando fazem parte do entrelaçamento. Exemplo é o tartan que tem seu raporte no "xadrez" caracteristico e pode ser tela ou derivado desta no entrelaçamento fundamental. Na estamparia continua também o conceito é reutilizado para confeccionar quadros (rolos) serigraficos. Wikipédia virtual.
38
O teste de realidade é aplicado individualmente, mediante a necessidade de
chamar atenção sobre questões importantes e que interferem de forma negativa ao
andamento da mediação.
39
CAPÍTULO III
O PAPEL DO MEDIADOR
O mediador é uma terceira pessoa imparcial comprometida com a
confidencialidade, com formação profissional em nível superior de diferentes áreas,
capaz de auxiliar as partes em conflito ou em litígio a negociarem suas divergências,
tanto para prevenção quanto para a resolução do conflito. Deverá ter conhecimento em
Mediação, sua estrutura e processo, além de noções sobre conciliação, negociação e
arbitragem.
O Mediador não possui o poder outorgado pela sociedade para decidir pelos
demais; não é um negociador que toma parte na negociação com interesse direto nos
resultados; não é um árbitro, pois não emite nenhum parecer técnico, mas tem a função
de facilitar a comunicação entre as partes utilizando-se de técnicas próprias
desenvolvidas, com o intuito de proporcionar através da reflexão um acordo baseado em
autocomposição e ganhos compartilhados.
O processo de Mediação é voluntário e poderá ser encerrado pelas partes em
qualquer momento e pelo mediador, caso o Mediador perceba a necessidade de
interromper as sessões mediante desentendimentos onde ficará entendida pelo mesmo, a
incapacidade de continuidade e ou em caso de risco apresentado para cada uma das
partes, em que uma delas através de relato (situação de assedio moral, abuso sexual e
violência doméstica), onde uma das partes esteja correndo risco e ou em submissão a
outra parte. Nesses casos subentende-se que seja imediável.
O Mediador deverá aceitará o encargo somente se estiver imbuído do propósito
de atuar de acordo com os Princípios Fundamentais estabelecidos e Normas Éticas,
mantendo íntegro o processo de Mediação. O resultado da mediação depende tanto do
caráter moral e ético do mediador quanto do conhecimento e informação que ele detém.
O mediador deverá seguir as seguintes fases distintas, são elas:
1ª Fase Inicial – Pré – Mediação (sessão de abertura ou declaração de abertura) – A pré
mediação é a fase de esclarecimento, onde será explicado às partes interessadas o que é
mediação. Nessa fase será definindo as regras e a forma que será utilizada no processo.
A fase de abertura tem o objetivo de fazer com que as partes se habituem a sentar uma
40
ao lado da outra. Após o discurso de abertura é dada a escolha as partes para prosseguir
ou não com a mediação.
2ª Fase – Definição do Problema, desenvolvimento dos objetivos, necessidades e
interesses, reorganização.
3ª Fase – Reunião interna da equipe mediadora para refletir sobre o problema
apresentado com a finalidade de realmente entender o conflito e assim poder construir
uma ou mais histórias alternativas.
4ª Fase – Reunião com as partes para a narrativa da história alternativa visando à
construção do acordo com a legitimação dos envolvidos, apresentação de novas
alternativas, tudo com uma discussão clara e respeitosa.
5ª Fase – Encontrar uma solução para o conflito.
3.1 – Princípios Fundamentais da Mediação.
Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello:
“Princípio é, por definição, mandamento nuclear
de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição
fundamental que se irradia sobre diferentes normas
compondo-lhes o espírito e servindo de critério para
sua exata compreensão e inteligência, exatamente
por definir a lógica e a racionalidade do sistema
normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá
sentido harmônico” (Mello, 1991, p. 230.)
O papel do mediador é fundamental para a realização do acordo e deverá
pautar sua conduta compreendendo a sua importância e relevância nos seguintes
princípios:
I. O caráter voluntário;
II. O poder dispositivo das partes, respeitando o princípio da autonomia da vontade,
desde que não contrarie os princípios de ordem pública;
III. A complementariedade do conhecimento;
41
IV. A credibilidade e a imparcialidade do Mediador; o mediador deve construir e
manter a credibilidade perante as partes, sendo independente, franco e coerente.
V. A competência do Mediador, obtida pela formação adequada e permanente;
VI. A diligência dos procedimentos;
VII. A boa fé e a lealdade das práticas aplicadas;
VIII. A flexibilidade, a clareza, a concisão e a simplicidade, tanto na linguagem quanto
nos procedimentos, de modo que atenda à compreensão e às necessidades do
mercado para o qual se volta;
IX. A possibilidade de oferecer segurança jurídica, em contraponto à perturbação e ao
prejuízo que as controvérsias geram nas relações sociais;
X. A confidencialidade do processo. Os fatos, situações e propostas, ocorridos durante a
Mediação, são sigilosos e privilegiados. Aqueles que participarem do processo
devem obrigatoriamente manter o sigilo sobre todo conteúdo a ele referente, não
podendo ser testemunhas do caso, respeitado o princípio da autonomia da vontade
das partes, nos termos por elas convencionados, desde que não contrarie a ordem
pública.
3.1.1 - Notas Explicativas do CONIMA – Conselho Nacional de Mediação e
Arbitragem:
Estas regras são aplicáveis para o Processo de Mediação de controvérsias
surgidas de contratos e outras relações sociais, escolhido pelas partes que buscam um
acordo.
O presente regulamento, em conjunto com o Código de Ética dos Mediadores, se
aplica a todas as Mediações, ou seja, àquelas organizadas por instituições ou entidades
especializadas e, “ad hoc”, assim entendida a Mediação que for realizada por
profissional escolhido pelas partes, desvinculado de qualquer instituição ou entidade,
em tudo o que for compatível.
Recomenda-se a todas as instituições e entidades, governamentais e privadas,
organizadas para o serviço da Mediação, assim como a todos os Mediadores "ad hoc",
que pautem sua atuação pelo Regulamento Modelo da Mediação e o Código de Ética
dos Mediadores.
42
3.2 - Os Diferentes Modelos de Mediação.
a) Modelo Tradicional de Havard
A comunicação estabelecida entre os mediados é linear. As funções do
mediador são voltadas para facilitar o diálogo centrado no verbal e estabelecer a ordem
a partir do caos de pensamentos, percepções e sentimentos. O conflito tem uma causa,
contudo, o contexto onde ele se estabeleceu não é considerado. O mediador trabalha na
transformação da percepção de erros passados que prejudicam a compreensão do
presente e, conseqüentemente, a percepção do acordo futuro. Os interesses das pessoas
são investigados sem focar no relacionamento.
A compreensão e o atendimento dos interesses de todos os envolvidos podem
garantir sucesso no relacionamento futuro. A expressão de pensamentos e sentimentos
pelas partes conflitantes é vista como muito importante já no início do processo,
liberando as emoções como se fosse um processo de catarse, para que as emoções
represadas não pressionem o processo mais adiante.
A neutralidade por parte do mediador é efetivada através da imparcialidade por
este e pela ausência de juízos de valor, crenças e preconceitos. O conflito existe por
causa das diferenças, portanto, diminuindo-as o conflito é aliviado ou extinto.
O conteúdo da comunicação é o mais apreciado no processo. A interdependência
é conscientizada e fortalecida com o conhecimento das normas sociais, crenças que o
grupo possui e define como comportamentos aceitáveis.
O mediador considera o processo de negociação em que duas ou mais pessoas
tomam decisões conjuntas a respeito de um impasse ou alocação de recursos e, portanto,
buscam resolver conflito de interesses.
b) Modelo Transformativo
Na mediação transformativa há dois objetivos principais, o primeiro é facilitar a
força das partes mediadas e o segundo é reconhecimento de uma parte pela outra.
Existe o reconhecimento do outro, as pessoas são agentes e protagonistas de suas
vidas. O mediador procura fortalecer a capacidade das partes de analisar situações e de
tomarem, elas mesmas, decisões eficazes.
43
O modelo transformativo se baseia nas estruturas políticas, educacionais e
econômicas que fortalecem comportamentos com base na força e na compaixão
individual levando a uma transformação do ambiente social.
O conflito pode se transformar através da compreensão clara do tipo de ajuda
que as partes querem do mediador, da real causa do conflito e do significado que este
tem para as partes.
c) Modelo Circular Narrativo
A comunicação é circular, todas as partes se comunicam com influência
constante e recíproca através de mensagens.
Os objetivos principais são cuidar dos vínculos das partes envolvidas, estimular
a reflexão do conflito e da reação das partes, construir uma ou mais histórias
alternativas para a solução do conflito para que as partes possam construir um acordo
em conjunto.
Para alcançar os objetivos é estimulada a reflexão, são modificados os
significados de fatos ocorridos, um outro lado das histórias levadas é considerado para
facilitar um acordo, ressaltando que esse não é o objetivo principal.
O interesse é baseado nos relacionamentos e acordos. É baseado na terapia
sistêmica que começou trabalhando com famílias.
Todos os modelos de mediação objetivam a dissolução do conflito. Os métodos
apresentados não são métodos fechados, podendo perfeitamente ser aplicados de acordo
com cada caso.
“Embora praticamente todos os métodos de mediação possam ser utilizados nos
casos é importante observar que a mediação, tanto na sua formulação teórica quanto na
sua técnica, deve ter em vista o respeito à família e à cultura da sociedade. Como a
família é o pilar da sociedade, a mediação vem em sua defesa e em seu fortalecimento,
podendo-se estimular o seu valor para o exercício da cidadania.” (ALMEIDA p. 29)
Frank Sander e Lukasz Rozdeiczer elaboraram um estudo que sistematizou o
processo de análise objetivando determinar o melhor método para a resolução de
44
controvérsia baseado na velocidade, privacidade, custo baixo, criação de soluções
alternativas e controle pelas partes do processo.
A mediação só é possível quando as partes estão predispostas a ouvirem umas as
outras, encontrando possibilidades de se chegar a uma solução criativa mutuamente
benéfica e manter ou melhorar o relacionamento das partes.
3.3 - A Atuação do Assistente Social como Mediador.
Envolvido com os interesses das diversas classes sociais que compõem nossa
sociedade, o assistente social possui a característica de mediador entre ambas as classes.
Através da pesquisa e análise da realidade social atua de forma investigativa na
formulação, execução e avaliação de serviços no conjunto de desigualdades,
contornando as insatisfações e pauperismo populares advindos da relação capital x
trabalho, visando a preservação do bem estar a partir de uma análise da realidade social.
O Assistente Social tem como objeto de intervenção as várias expressões das questões
sociais, voltadas para o despertar político e contestador adquiridos devido após anos de
conscientização dos direitos sociais, que desde o Movimento de Reconceituação tem se
voltado para a reforma social e, nos dias atuais, voltadas para a transformação interior,
menos contestadora e mais reflexiva de cada indivíduo.
O Assistente Social baseia sua teoria nas Ciências Sociais para inserir-se nos
fenômenos em transição, procurando capacitar o homem para que lute, construa e
contribua para as reformas sociais através do sentido da auto-observação, promovendo
mudanças internas significativas. Predomina no exercício profissional ações dirigidas às
questões pautadas na transformação do indivíduo, em seu meio social, através da quebra
de paradigmas. Ao trabalhar nesse aspecto o assistente social modifica o seu modo de
intervir, sai de uma postura conservadora para uma mais participativa. Deixa de ser
propositivo para ser um facilitador, através da mudança de perspectiva de visão e,
coordenador de decisões inerentes ao próprio usuário. Da ênfase e reforça a realização
de mudanças de comportamento dos indivíduos.
Nesse aspecto o assistente social utiliza-se da mediação, como ferramenta, nas
entrevistas sociais, buscando ampliar o conhecimento sobre a narrativa do usuário e
45
levando-o a uma compreenção de seus sentimentos e ações através de uma colocação
mais consciente. Apoia e facilita que ele tenha uma visão totalizadora da problemática
que enfrenta, sem se basear no senso comum. Ao atuar como facilitador de forma
imparcial, o assistente social promove um intercâmbio entre as pessoas que conversam,
filtrando de forma harmônica as mensagens das partes a serem atendidas, diluindo o
sentimento enraigado que impede a busca pelo consenso.
O assistente Social ao utilizar a técnica da mediação deve se comprometer com
os seus princípios no decorrer das suas entrevistas sociais, dentre eles a Imparcialidade,
Credibilidade, Competência, Confidencialidade e Diligência descritos acima. Esses são
e devem ser sempre os princípios norteadores de toda profissão envolvidas com as
expressões sociais.
3. 4 - Mediação em Entrevistas Sociais.
A entrevista realizada pelo assistente social, que possui a técnica da mediação é
aperfeiçoada pela prática contínua do pensar. O usuário, a partir da orientação do
assistente social, que é um facilitador da comunicação, é levado a pensar sobre suas
questões e conflitos chegando ele mesmo a melhor solução para os seus problemas. É
um processo muitas vezes longo de escuta e de transformação gradativa, constituindo
vínculos e compromissos que norteiam os projetos de intervenção.
A entrevista é uma metodologia utilizada pelo assistente social que possibilita
maior aproximação e entendimento entre o indivíduo, suas relações sociais na
coletividade e na sua individualidade, devendo o mesmo ser respeitado dentro de sua
singularidade.
O assistente social em cada entrevista estabelece uma relação de entendimento
mútuo, onde através de dados ofertados para o usuário, transformados em reflexão,
através de perguntas orientadas, recebe como retorno uma nova percepção desse
usuário. Os problemas apresentados geralmente são interligados, misturando as posições
e interesses de cada uma das partes dentro de uma entrevista. A orientação dá lugar a
um norteador e tira da figura do assistente social a imposição de mudança de
perspectiva, ofertando ao usuário a visão de conjunto, onde ele próprio está inserido a
46
ponto de não atribuir uma verdade exagerada a sua própria história, vindo a
comprometer a percepção do assistente social em uma situação de entrevista.
O elo forma-se a partir do contato com o usuário mediante entrevista,
formalizando assim, uma conexão de sigilo e confiança entre as partes onde através de
relatos o assistente social executa a compreensão na leitura da fala até alcançar uma
transformação orientada pelo próprio indivíduo.
Garret (1988). Enfatizava que a entrevista é apenas um meio do qual se serve o
assistente social para executar a experiência da compreensão na leitura da fala originária
do gesto. Para ela, é na entrevista que se realiza a leitura da verdade.
A entrevista em Serviço Social consiste no reconhecimento do individuo e sua
realidade para que o Assistente Social possa mediar alternativas à demanda apresentada,
redefinindo os objetivos propostos, aprendendo a pensar e a refletir sobre a natureza de
suas relações. O assistente social exerce a função de um terceiro imparcial que devolve
para os mediandos perguntas reflexivas que possibilitam que os mesmos percebam e se
coloquem em uma postura diferenciada a sua de origem, dando lugar ao outro.
47
CONCLUSÃO
A família é de longe a maior e mais antiga instituição formada pelo homem e
não está muito distante de encontrarmos nesta instituição conflitos gerados por
diferenças de interesses e posições. Muitas famílias se formam e se desfazem gerando
mais conflitos por guarda de filhos, por divisão de bens e até mesmo por não
conseguirem chegar a um acordo sobre o que e o porquê está se separando. Muitos
litigam por anos e outros preferem mediar e manter a relação mais cordial com a
intenção de preservar os filhos.
No Brasil é comum que os processos se arrastarem por anos até alcançarem uma
decisão definitiva devido ao alto custo do processo com diligências, perícias e outras
provas, baixo número de servidores e magistrados, grande número de causas e falta de
infra-estrutura que necessita de modernização. A utilização da mediação como
método de resolução de conflitos, permite que esses processos sejam agilizados e na
maioria dos casos o conflito eliminado de forma harmônica. Assim, uma situação que
poderia levar vários anos para ser resolvia no âmbito do Poder Judiciário tem a
possibilidade de ser resolvida em uma ou algumas sessões de mediação. Em um
processo judicial ou administrativo a sentença ou decisão pode vir a favor de uma ou de
outra parte, havendo incertezas sobre os rumos do processo.
A mediação é uma forma de resolução de conflitos que busca encontrar as
causas que deram início ao conflito para por fim de forma definitiva ao problema, não
por imposição, mas por mudança ocorrida a partir da reflexão das partes, objetivando
um acordo sólido e duradouro e o restabelecimento do diálogo e a comunicação entre as
partes, oferecendo-lhes autonomia e possibilitando que as soluções dos seus problemas
sejam apresentadas por eles próprios. A falta de comunicação entre os familiares
dificulta ou torna impossível a convivência pacífica, podendo gerar violência e ou
separação, trazendo a tona, além dos problemas já existentes, complicações psicológicas
desencadeadas.
Por ter sido reconhecida devido a sua real eficácia em resolução dos mais
diversos conflitos, a mediação difundiu-se em diversos âmbitos, tais como mediação
social, familiar, escolar, empresarial e laboral. Sendo o mediador uma terceira pessoa
48
imparcial, de diferentes formações profissionais, amplia ainda mais o campo de
percepção uma vez que atua em uma equipe multiprofissional. Como cada mediador
vem de uma formação profissional diferente essa diversidade ajuda a fortalecer a
percepção no processo de mediação.
Assistentes sociais se utilizam da mediação como forma resolução de conflito
em suas entrevistas. O sujeito é levado a pensar e a buscar a decisão por si só, apenas
sendo orientado buscando ampliar o conhecimento sobre a narrativa do usuário levando-
o a uma compreenção de seus sentimentos e ações através de uma colocação mais
consciente.
49
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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(Conima) 24 de novembro de 1997 realizado no Superior Tribunal de
Justiça com a presença Vice-Presidente da República, Dr. Marco
Antônio de Oliveira Maciel, em cuja ata de fundação constam as 20
mais representativas entidades voltadas à mediação e arbitragem no
País.
50
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Artmed, 2005.
53
ÍNDICE
INTRODUÇÃO 9
CAPÍTULO I - FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA NO BRASIL 11
1.1 - Análise Conceitual da Família 11
1.2 - Importância da Família na Sociedade e Relação Social de Gênero 12
1.3 - A importância no Processo de Transmissão da Herança Cultural 14
1.4 - A Constituição Federal de 1988 e a Idéia de Família Igualitária 19
1.5 - Família de Classe Popular Matriarcal e Família Monoparental 22
1.6 - Relação Conjugal em Declínio 24
1.7 – Responsabilidade Parental e o Desrespeito aos Direitos dos Filhos 27
CAPÍTULO II - MEDIAÇÃO DE CONFLITOS 29
2.1 - Teoria do Conflito 29
2.2 - A Importância da Comunicação 30
2.3 - Breve História do Surgimento da Mediação de Conflitos 31
2.4 - Conceito de Mediação 31
2.5 - Áreas de Atuação da Mediação 33
2.6 - Diferentes Formas de Resolução de Conflitos 35
2.7 - Ferramentas Utilizadas na Resolução de Conflitos 36
CAPÍTULO III - O PAPEL DO MEDIADOR
39
3.1 - Princípios Fundamentais da Mediação 40
3.1.1 - Notas Explicativas do CONIMA 41
3.2 - Os Diferentes Modelos de Mediação 42
3.3 - A atuação do Assistente Social como Mediador 44
3.4 - Mediação nas Entrevistas Sociais 45
CONCLUSÃO 47
BIBLIOGRAFIA 49
ÍNDICE 53