O USO DO TRANSE RITUAL NA CLINICA HIPNOTERAPICA: … · O USO DO TRANSE RITUAL NA CLINICA...

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O USO DO TRANSE RITUAL NA CLINICA HIPNOTERAPICA: ESTUDO DE CASOS EM PSIQUIATRIA TRANSCULTURAL (*/

Madeleine Richeport**

I N T R O D U Ç Ã O

É u m prazer m u i t o grande ter a o p o r t u n i d a d e de apresentar algumas observações sobre a relação

ent re a ps iqu ia t r ia o f i c ia l e o sistema i n f o r m a l o u t r a d i c i o n a l de curas, p r i n c i p a l m e n t e nas seitas es­

p í r i tas que eu presenciei e m Nova I o r q u e , em Por to R i co d u r a n t e c inco anos, e no Brasi l du ran te u m

ano e m e i o .

Prof issionais na área de Saúde Menta l reconhecem a i m p o r t â n c i a d o sistema i n f o r m a l ou t r a d i ­

c ional de t r a t a m e n t o c o m o u m i m p o r t a n t e recurso e m ps iqu ia t r ia c o m u n i t á r i a .

Uma de f i n i ção operac iona l da med ic ina t r a d i c i o n a l i nc lu i todas prát icas de curande i ros que não

são inc lu ídas d e n t r o da med ic ina através da graduação de ins t i tu ições a lopát icas.

A med ic ina t r a d i c i o n a l é u m t e r m o usado para descrever a t o t a l i d a d e de prát icas ex is tentes e

concei tos que t ê m s ido t r a n s m i t i d o s através das gerações de curande i ros e que são p r o f u n d a m e n t e en­

raizados na "v isão d o m u n d o " das c o m u n i d a d e s e m que são u t i l i zadas. São c o n t í n u o s e entrosados

d e n t r o das est ru turas de v ida da f a m í l i a , d o parentesco, da organização p o l í t i c a e re l ig iosa. I1) A t u a l m e n t e , serviços ps iqu iá t r i cos estão se a b r i n d o para mais pessoas, e m b o r a estudos t ê m mos­

t r a d o que m u i t o s pacientes c o n t i n u a m o t r a t a m e n t o no sistema n ã o - m é d i c o e ao mesmo t e m p o con­

su l tam ps iquiat ras. ( 2 1 ' 2 3 e 3 0 ) . D i ferenças na e t i o l o g i a , noso log ia , d iagnose e t r a t a m e n t o i n t e r f e r e m

c o m a u t i l i zação d o sistema i n f o r m a l d e n t r o d o sistema ps iqu iá t r i co o f i c i a l . ( 3 1 )

De f o r m a a o b t e r a m á x i m a c o b e r t u r a , estratégias são necessárias para ligar os sistemas f o r m a l e

i n f o r m a l de t r a t a r n e n t o m e n t a l .

Na A m é r i c a La t ina e no Caribe méd iuns esp í r i tas f u n c i o n a m c o m o ps iquiat ras. Os cu l tos espí­

ritas d o Brasi l vão desde o r a m o e u r o p e u d o esp i r i t i smo Kardec is ta , c o m ênfase in te lec tua l de ensina­

men tos e discussões f i l osó f i cas c o m e s p í r i t o de i lustres pessoas m o r t a s , até a mais a f r icana f o r m a de

C a n d o m b l é . ( 3 4 e 3 S ) . O s inc ré t i co c u l t o da U m b a n d a t e m a lcançado as p roporções de rel ig ião nacio­

na l . ( 3 2 e 3 3 h

Essas crenças e prát icas supernatura is são i m p o r t a n t e s na expressão, in te rp re tação e t r a t a m e n t o

de d i s tú rb ios emoc iona is para u m a e n o r m e p r o p o r ç ã o da popu lação .

T r a b a l h o ap resen tado n o VIo. Congresso Pan Americano de Hipnologia e Medicina Psicossomática, R io de Ja­

n e i r o , 1 2 - 1 7 , m a r ç o , 1 9 7 8 .

Un ivers idade Federa! d o R io Grande d o N o r t e

Cons iderando o grande n ú m e r o de pessoas que e n t r a m e m t ranse cada d ia neste c o n t e x t o re­

l ig ioso, os estados de t ranse f o r n e c e m u m a p o n t e re ferencia l c o n e c t a n d o os t r a t a m e n t o s ps iqu iá t r i cos

f o r m a l e i n f o r m a l .

Este t r a b a l h o foca l i za o re lac ionamen to en t re os transes m e d i ú n i c o s nos cu l tos brasi le i ros e o

transe h i p n ó t i c o na s i tuação c l í n i c a . Mais espec i f i camente , eu anal isarei o papel d o h ipno te rap i s ta na

t ransladação d o t ranse r i t ua l para d e n t r o da prá t ica c l í n i c a , q u a n d o pacientes t ê m crenças mís t i cas .

A P o l í t i c a M u n d i a l — Q u a n d o o Dr . Mahler , pres idente da Organização M u n d i a l de Saúde f a l o u e m

Bras í l ia , e m se tembro de 1 9 7 7 , ele re i te rou a p o l í t i c a m u n d i a l de saúde f r e n t e à med ic ina t r a d i c i o n a l :

" O recurso à med ic ina t r a d i c i o n a l é u m t e m a p o l é m i c o , que c o m certeza exc i ta rá o exc lus iv i smo f e r o z

dos " i m p e r a d o r e s " da m e d i c i n a ; mas, para que a assistência p r i m á r i a de saúde se r c f l i t a às forças de

v ida da c o m u n i d a d e e se sirva dos recursos locais, h u m a n o s , mater ia is e f i nance i ros — e eu es tou per­

suad ido de que terá que fazê- lo para não fracassar — se t e m de aprove i ta r todas as energias d ispon íve is

para a saúde: a con f iança que a popu lação em m u i t o s lugares t e m na prá t ica médica t r a d i c i o n a l é algo

que não se deve desfazer l ige i ramente . Conv ido ser iamente aos " i m p e r a d o r e s " para i rem às aldeias,

para que ve jam por si mesmos e sejam vistos c o m o s ã o " . ( 2 ) .

Para u m país conseguir f u n d o s ho je , t e m que most ra r que está u t i l i z a n d o t o d o s os recursos para

a saúde do p o v o .

U m recurso i m p o r t a n t e é o sistema i n f o r m a l e t r a d i c i o n a l .

Nos Estados Un idos , o I n s t i t u t o Nac iona l de Saúde Menta l dá a p o i o f i n a n c e i r o para os " M e d i ­

cine M e n " , cu rande i ros en t re os í n d i o s navajos, po rque sabem que f u n c i o n a m m e l h o r c o m a t r i b o que

os médicos oc identa is , e p o d e m ser t re inados para dar uma boa co laboração à med ic ina o f i c i a l ( 3 ) . E m

Nova I o r q u e , vários hospi ta is ps iqu iá t r i cos p r o c u r a m u t i l i za r esp í r i tas c o m os doentes cubanos e por-

t o r i q u e n h o s . ( 4 ) . A l g u n s países p ro f i ss iona l i za ram os sistemas t rad i c iona is . Na í n d i a , p o r e x e m p l o ,

coex is tem a med ic ina oc iden ta l c o m Universidades e hospi ta is que t r e i n a m médicos ind ianos na m e d i ­

cina ayurvéd ica . ( s )

Há alguns e x e m p l o s e m que a med ic ina o f i c i a l p rocu ra in tegrar o s istema i n f o r m a l ; D r . L a m b o

na Nigér ia u t i l i za curande i ros d e n t r o d o seu hosp i ta l ps iqu iá t r i co , ( 6 ) c o m o t a m b é m o Dr . C o l l o m b

no Senegal. ( 7 ) .

A te rap ia M o r i t a , n o Japão, p rocu ra u t i l i za r e lementos de Zen b u d i s m o , a fo ra c o n h e c i m e n t o s

c ien t í f i cos oc identa is e m vár ios t i p o s de neurose e nas s í n d r o m e s " c u l t u r a i s espec í f i cas . " ( 8 ) Médicos

ind ianos c o m b i n a m a Yoga c o m o t r a t a m e n t o clássico para t ra ta r desordens digest ivas, asma c rón i ca ,

d iabetes me l l i t us , e algumas al terações cardiovasculares. (9) A q u i n o Bras i l , Dav id A k s t e i n ( 1 C H 6 )

c r i o u uma técn ica de ps ico terap ia g rupa i , não-verba l , baseada nos transes c inét icos r i tua is da U m b a n d a

( T T T ) . Ele c o m p r o v o u que d u r a n t e os transes c iné t icos os i n d i v í d u o s o b t ê m a l iberação das tensões

emoc iona is represadas, m e l h o r a n d o as cond ições psíquicas e psicossomát icas. Ele se interessa t a m b é m

no p r o b l e m a de se é "poss íve l t rans fo rmar -se o i m p u l s o c o n c e n t r a t i v o m í s t i c o e m u m a possante con ­

centração n o desejo de u m a p e r f e i ç o a m e n t o das qual idades pessoais".

G e r a l m e n t e , aqu i no Brasi l a ps iqu ia t r ia o f i c ia l sempre p r o c u r o u separar-se da med ic ina p o p u ­

lar. É fác i l en tender esta pos ição, cons ide rando o p a r a d o x o e m que nos e n c o n t r a m o s . U m país gasta

m u i t a energia para i m p l a n t a r u m sistema " c i e n t í f i c o " de saúde e, logo e m seguida, a Organização

M u n d i a l de Saúde recomenda que agora se deva va lor izar os recursos que não estão baseados e m fa tos

b io -méd icos ver i f icáveis , mas baseados na f é , nas superst ições, e na magia .

A q u i n o Brasi l e e m m u i t o s o u t r o s países, ps iquiat ras já ace i tam a real idade de que m u i t o s de

seus doentes estão e m t r a t a m e n t o s i m u l t â n e o , ps iqu iá t r i co e j u n t o às seitas esp í r i tas .

É preciso se levar e m c o n t a que as prát icas religiosas p r i n c i p a l m e n t e esp í r i tas , c o m u m e n t e se

inserem na r o t i n a d iár ia de u m a par te considerável da popu lação bras i le i ra .

A popu la r idade da cura m í s t i c a não pode ser subest imada. U m a pesquisa de o p i n i ã o púb l i ca

I 1 7) r e p o r t o u que a metade da popu lação ent rev is tada no R i o e São Paulo aceita a d o u t r i n a da reen­

carnação e 6 0 % t ê m p r o c u r a d o os méd iuns para resolver os seus p rob lemas . Pressel ( 1 8 ) r e p o r t o u que

mais de 5 0 % da popu lação são esp í r i tas , e m b o r a a ma io r ia se r e p o r t a m c o m o catól icas o f i c i a l m e n t e .

Uma pesquisa recente e m N o v a Iguaçu mos t ra que 7 5 % da popu lação não-pro tes tan te é esp í r i t a I19).

40

O u t r o s índ ices de popu la r idade inc lu i o Livro dos Espíritas de Allan Kardec, que é mais l ido

que qua lquer o u t r a pub l i cação . ( 2 0 ) A q u i n o Brasi l várias pesquisas, na Bah ia , ( 2 1 ) na Z o n a N o r t e do

R i o , ( 2 ) e m N o v a Iguaçu, ( 1 9 ) e m Caruaru ( 2 3 ) m o s t r a m a pre ferênc ia pe lo sistema i n f o r m a l c o m o

p r i m e i r o recurso de t r a t a m e n t o ; e m o s t r a m a d u p l a u t i l i zação da ps iqu ia t r ia e seitas esp í r i tas .

A g o r a que a ps iqu ia t r ia está se t o r n a n d o mais aberta ao povo nos serviços ambu la to r i a i s , e não

só para a classe a l ta , que é t ra tada no c o n s u l t ó r i o pa r t i cu la r , vai ser m u i t o i m p o r t a n t e que os psiquia­

tras busquem estratégias para c o m p a t i b i l i z a r esses sistemas, cons iderando as grandes discrepâncias

na diagnose, nosologia e t r a t a m e n t o .

Para i lustrar alguns p rob lemas e soluções e m casos onde o d o e n t e está e m t r a t a m e n t o psiquiá­

t r i c o j u n t o c o m a U m b a n d a ou Ka rdec i smo , v o u apresentar t rês casos da prá t ica d o Dr . Dav id

A k s t e i n , que g e n t i l m e n t e t e m me p r o p o r c i o n a d o t o d o s os meios para chegar aos meus ob je t i vos de

investigação aqu i no Brasi l , inclusive a c o m p a n h a n d o a sua prá t ica d iá r ia . Eu observei setenta casos

no seu c o n s u l t ó r i o pa r t i cu la r e m 1976 . V i n t e t i n h a m e n v o l v i m e n t o c o m re l ig ião. Dessas, c inco eram

méd iuns esp í r i tas .

T R É S H I S T Ó R I A S D E C A S O

Caso Um — M a r l y

Mar l y é uma at ra t iva m u l h e r casada, 4 4 anos de idade, que m o r a c o m seu m a r i d o e sua f i l h a e m

u m ba i r ro elegante no R i o . Ela p r o c u r o u o t r a t a m e n t o ps iqu iá t r i co e m jane i ro de 1 9 7 5 , apresentando

s in tomas de depressão causadas por seu m a r i d o , que bebia m u i t o . A m b o s t i n h a m amantes, mas

n e n h u m dos dois q u e r i a m se desqu i ta r .

Mar ly i n f o r m o u ter começado a desenvolver sua med iun idade na U m b a n d a q u a n d o t i n h a 32

anos de idade. Sua exper iênc ia in ic ia l oco r reu no d ia p r i m e i r o de jane i ro depo is da festa de Iemanjá

q u a n d o ela, c o m o mi lhares de brasi le i ros, p a r t i c i p o u d o b a n h o r i t ua l na pra ia , onde m u i t o s deles en­

t r a m em t ranse. Q u a n d o Mar l y v o l t o u para casa, seus pais fa la ram para ela que sua pele f i c o u arrepia­

da, e que ela g r i t o u os nomes de vários o r i xás , m o v e n d o sua cabeça para f r e n t e e para t rás . Mar l y teve

amnésia dos fa tos o c o r r i d o s , du ran te duas semanas. Nessa ocasião sua f a m í l i a c h a m o u u m ps iqu ia t ra

que e m p r e g o u a sonoterap ia .

Sua f a m í l i a i n t e r p r e t o u sua c o n d u t a c o m o o desenvo lv imen to da m e d i u n i d a d e , sendo, por isso,

levada a u m a v i z inha , u m a m é d i u m u m b a n d i s t a . M a r l y f r e q u e n t o u sua casa regu la rmente e m consul tas

par t icu lares e sessões públ icas. T a m b é m , Mar ly es tudou as f i loso f ias Kardec is ta e o r i e n t a l , as quais

fo rneceram- lhe expl icações sat isfatór ias para suas mani festações. Mar l y i n f o r m o u que d u r a n t e os dez

anos seguintes sentiu-se c o m p l e t a m e n t e b e m . Pouco t e m p o antes de consu l ta r o Dr . A k s t e i n , ela co­

meçou a ter visões mís t icas nas sessões e f o r a delas. Q u e i x o u que sentia-se p io r depo is das sessões es­

p í r i t as . Sua f a m í l i a levou-a, e n t ã o , a u m cen t ro Kardec is ta e ela teve uma visão tão ameaçadora , que

d e i x o u de f r e q u e n t a r qua lquer c u l t o .

0 D r . A k s t e i n t ra tou -a c o m a medicação ant i -depressiva, te rap ia ve rba l , re laxação progressiva, e

h ipnose. E',z não f o i uma boa paciente para a h ipnose , o que ele achou ra ro , po rque os méd iuns geral­

mente e n t r a m e m transe h i p n ó t i c o . Por esta razão, o Dr . A k s t e i n suspei tou t ratar-se de u m caso de

esqu izo f ren ia mascarada d e n t r o das prát icas sócio-rel igiosas. N o in te rva lo ent re uma e o u t r a sessão

psicoterápica sof reu uma crise e seu amante fez questão de acompanhá- la , m u i t o p r e o c u p a d o c o m as

visões e as despersonal izações que ela t i n h a na rua e em casa. Mar l y passou então a dar i n te rp re ta ­

ções mís t icas a t u d o o que acontec ia na sua v ida . Ela t i n h a d i f i c u l d a d e de lembrar coisas, descon­

f i a n d o que as pessoas estavam fazendo mal c o n t r a e la. Ela não pôde responder às perguntas d o Dr . ,

e seus gestos estavam f o r a de s incron ia . Nessa ocasião, en tão , A k s t e i n rece i tou medicação ant i -ps i -

có t i ca e Mar l y m e l h o r o u m u i t o .

Hoje ela é a ler ta , a t i va , t e n d o v o l t a d o à sua prof issão de n u t r i c i o n i s t a . Ela v e m ao consu l tó r i o

uma vez por mês, q u a n d o en tão c o n t i n u a a fa lar de seu m a t r i m ó n i o insa t i s fa tó r io .

A k s t e i n r e c o m e n d o u , depois que ela f i c o u l ivre daqueles s in tomas, que ela exper imentasse

vo l ta r a u m cen t ro esp í r i t a para ver se apresentava algumas mani festações med iún icas . Ele acredi ta

que o que ela apresentou eram mani festações pato lóg icas mascaradas e m t e r m o s socio-rel ig iosos e

in terpretadas c o m o f e n ó m e n o s med iún icos por e la, por sua f a m í l i a e seus amigos.

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Caso Dois — R i c a r d o

R i c a r d o , v in te e do is anos de idade, chegou ao c o n s u l t ó r i o d o Dr . aks te in cheio de r i tua is obses­

sivos, abençoando-se c o n t i n u a m e n t e n o ôn ibus e sem c o n t r o l e da m i c ç ã o , enve rgonhando a sua f a m í ­

lia que lhe acompanhava . Ele se escondia n o chão de seu q u a r t o f e c h a d o , recusando t o d o c o n t a t o

socia l , inc lus ive d e i x a n d o de jogar f u t e b o l , que ele adorava.

Esta cr ise, segundo sua f a m í l i a , f o i p rec ip i tada por seu fracasso n o vest ibu lar .

De ixou-se , a pa r t i r d a í , de estudar . T o d a v i a , logo, ao mesmo t e m p o e m que c o m e ç o u a tera­

pia ps iqu iá t r i ca R i c a r d o passou a fazer u m curso de da t i l og ra f i a , que funcionou c o m o u m a d is t ração

o u labor te rap ia . Na mesma época , t a m b é m , ele c o m e ç o u a f r e q u e n t a r um c e n t r o Umband is ta -Karde -

cista duas vezes por semana, por recomendação de u m a v i z i n h a , que i n t e p r e t o u seu c o m p o r t a m e n t o

c o m o der i vado de causas esp i r i tua is . R i c a r d o não a c h o u nada i n c o m p a t í v e l ser assistido por esses do is

sistemas te rapêu t i cos s i m u l t a n e a m e n t e . Ele a c r e d i t o u que sua doença f o i causada por u m a en t idade

que d a n i f i c o u sua cabeça, e en tão ele prec isou de u m ps iqu ia t ra para curar sua cabeça (sic).

R i c a r d o teve uma boa m e l h o r a c o m uma medicação ans io l í t i ca e ant i -depressiva, mais relaxa­

ção e ps ico terap ia verba l . A t u a l m e n t e está levando uma v ida social n o r m a l e j o g a n d o f u t e b o l ; está

es tudando para fazer o vest ibu lar n o v a m e n t e .

Ele c o n t i n u a a assistir às sessões no cen t ro esp í r i t a u m a vez por semana " p a r a t o m a r passes".

Devo esclarecer que o Dr . A k s t e i n não enco ra jou essa par t i c ipação in tensiva na seita esp í r i t a po rque

ele ac red i t ou que seu paciente poss ive lmente ir ia subs t i tu i r o c o m p o r t a m e n t o obsess ivo-compuls ivo

p o r r i tua is espí r i tas igua lmente de f o r m a obsessiva-compuls iva. R ica rdo e sua f a m í l i a co r re lac ionaram

suas melhoras mais à a juda esp i r i tua l d o que ao t r a t a m e n t o ps iqu iá t r i co .

Caso Três — Gladis

Gladis é u m a a t ra t i va m e l h o r casada, c o m t r i n t a e nove anos de idade, que apresentou s in tomas

c o m o , ton te i ras , náuseas e m e d o de sair soz inha à rua . Por isso, ela estava sempre acompanhada de

seu m a r i d o , F e r n a n d o , ou p o r sua f i l h a , S ô n i a , de doze anos de i dade.

Depois de consu l ta r vários especialistas ( c l í n i cos , o f t a l m o l o g i s t a e o t o r r i n o l a r i n g o l o g i s t a ) , ela

c o n c o r d o u e m ver u m ps iqu ia t ra , c o m re lu tânc ia , p o r q u e não acredi tava que seus s in tomas t ivessem

causas psicológicas.

Gladis é u m a m é d i u m u m b a n d i s t a . Ela usa v in te e uma pulseiras de prata e m seu braço e fa la

dos r i tua is que faz d ia r i amen te para pro teger a ela e a sua f a m í l i a .

A n t e s de começar a te rap ia ps iqu iá t r i ca , ela disse que seus Caboclos lhe avisaram para de ixa r

a sua prá t ica m e d i ú n i c a , a qua l ela faz ia e m sua p r ó p r i a casa, c o m u m a grande c l ien te la . Os guias lhe

disseram que ela estava m u i t o cansada p o r estar recebendo bastante c l ientes, mu i tas vezes a no i te

t o d a , sem recompensa.

O u t r o p r o b l e m a que ela re la tou f o i sua hos t i l i dade para c o m sua mãe, que m o r a n u m a casa e m

f ren te e que o lhava t u d o o que ela fazia através da janela .

Gladis se c o m p o r t a v a t i m i d a m e n t e , subord inando-se à seu m a r i d o . Ela i m p u n h a pouca d isc i ­

p l ina à sua f i l h a , ma lc r iada , h ipe ra t i va , que sempre i n t e r r o m p i a a sessão ps ico te rapêu t i ca .

O Dr . A k s t e i n a t r a t o u c o m medicação n o r m a l i z a d o r a d o e q u i l í b r i o neurovege ta t i vo e ansio­

l í t i c a , a lém de ps icoterap ia verba l , técnicas h ipnó t i cas de re laxamen to e dessensibi l ização s is temát ica.

Na sua técn ica de re laxamen to ele pede à pac iente para se concen t ra r e m cada par te de seu c o r p o ,

de b a i x o para c i m a , p r i m e i r o fazendo-o tenso e depo is a f r o u x a n d o - o . Depo is ele dá sugestão de b e m -

estar e, p o s t e r i o r m e n t e , ensina a pac iente a fazer o r e l a x a m e n t o de i t ado e m sua cama, e m sua casa;

mais ta rde é ens inado a fazê- lo , de m o d o mais parc ia l , sentado, e m pé, o u q u a n d o precisar. A técn ica

de dessensibi l ização e m casos c o m o os de f o b i a p rocu ra fazer o pac iente visualizar-se na s i tuação

f ó b i c a e, e m seguida, d a n d o sugestões de b e m estar para e l im ina r a angúst ia . O paciente dessensibi l iza

o m e d o g radua lmente depois de várias sessões.

Gladis m e l h o r o u , mas sua t o n t e i r a e f o b i a de sair à rua não desapareceram c o m p l e t a m e n t e .

A k s t e i n , e n t ã o , c o m e ç o u a encorajá- la para vo l ta r às prát icas med iún icas .

D u r a n t e uma consu l ta ele, quase b r i n c a n d o , a g i r o u c o m a cabeça co locada n u m a posição an t i ­

n a t u r a l , para t rás, uma técn ica de i ndução t í p i c a da U m b a n d a . Gladis e n t r o u e m transe m e d i ú n i c o , o

que nunca o c o r r e u a n t e r i o r m e n t e q u a n d o ela f o i submet ida à induções h ipnó t i cas segundo técnicas

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clássicas. D u r a n t e as seguintes sessões, q u e f o r a m gravadas, Glad is f o i i nco rpo rada por onze das v in te

e sete en t idades que ela recebe.

A k s t e i n conversa c o m o f o r t e e agressivo Caboc lo B o i a d e i r o , ped indo- lhe para a judá- lo no seu

t r a b a l h o de me'dico e ped indo - lhe t a m b é m para a judar o seu cavalo, " o qua l é m u i t o sensível , c o m

m u i t o s p rob lemas fami l ia res e f a t i g a d o por m u i t o s t raba lhos de c a r i d a d e " . A k s t e i n pede às ent idades

para protegê- la q u a n d o sair à rua e aceita g e n t i l m e n t e as obr igações e os passes. O m a r i d o se t o r n a seu

aux i l i a r , o cambono, e recebe u m tapa na tes ta , d o caboc lo , po rque não deu su f ic ien te atenção à

Gladis. O caboc lo d iz ia à Sôn ia para se p o r t a r b e m e estudar na escola. Sôn ia mos t ra en tão m u i t o res­

pe i to e aceita a d isc ip l ina dos guias espi r i tua is . Glad is parece sair d o t ranse, mas recebe o u t r a e n t i d a ­

de , u m E x ú . Essa en t idade x i n g a , bebe cachaça, dá u m a " c a n t a d a " n o Dr . A k s t e i n , é re laxan te , e t o d o

0 m u n d o acha graça.

Gladis t a m b é m recebeu Pretos Ve lhos e Cr ianças.

Discussão:

Q u a n d o ps iqu ia t ras u t i l i z a m l inguagem esp i r i tua l is ta e t ranse de possessão, os prof iss ionais mé­

d icos não-espí r i tas vêm is to c o m o não-é t i co . Is to é lamentáve l , p o r q u e estes p reconce i tos ev i tam o uso

de u m dos mais i m p o r t a n t e s recursos para o pac ien te , isto é, a hab i l idade para en t ra r e u t i l i za r o

p r o c e d i m e n t o d o t ranse. A k s t e i n , conhecedor da h ipnose e u m es tud ioso d o t ranse r i t ua l p o r mais de

v in te e c inco anos, i l u s t r o u , através destes casos, que a h ipnose fo rnece uma ad ic iona ! opção pa ra :

1 — d i fe renc ia r s índ romes patogênicas de s í n d r o m e s pa top lás t i cos ;

2 — desenvolver o c r i t é r i o adequado para r e f e r i m e n t o ao sistema f o r m a l ;

3 — e n c o n t r a r as técnicas te rapêut icas mais adequadas para os pacientes esp í r i tas .

1 — A hipnose como ajuda para diferenciar os síndromes patogênicos dos síndromes patoplás­

ticos — A s a luc inações mís t i cas são s in tomas chaves da esqu izo f ren ia . Pa radoxa lmen te , são b e m valo­

rizadas d e n t r o da "v isão d o m u n d o " Ca tó l i co L a t i n o . A h is tó r ia d o Cr is t ian ismo t e m nos mos t rado

is to, através dos mi lagres, curas pela fé e pelas en t idades sobrenatura is .

Cons iderando esta real idade, os ps iquiat ras t ê m o p r o b l e m a de d i fe renc ia r as a luc inações p a t o l ó

gicas das condu tas aceitáveis c u l t u r a l m e n t e . M a r l y e Gladis r e p o r t a r a m que e ram méd iuns . A l é m d o

q u a d r o c l í n i c o , A k s t e i n u t i l i za o c r i t é r i o seguinte: se o pac ien te , que t e m a luc inações, não en t ra e m

transe h i p n ó t i c o , isto c o n f i r m a u m d iagnós t i co de esqu izo f ren ia o u de falsa m e d i u n i d a d e . A h ipnose

e l im ina a barre i ra da consciênc ia e p e r m i t e que o " e u v e r d a d e i r o " apareça. E n t ã o , se o paciente que

se d iz m é d i u m não en t ra e m transe apesar dos e s t í m u l o s associados c o m a exper iênc ia r i t u a l , en tão ,

devemos considerar que o t ranse representa u m o u t r o c r i t é r i o para d i fe renc ia r pa to log ia de c o n d u t a

c o m padrão c u l t u r a l .

A k s t e i n reconheceu que M a r l y mascarou u m a psicose e m t e r m o s sócio-rel ig iosos, usando os

seguintes i n d í c i o s : ela que ixou-se de sent i r p io r depo is d o t ranse em cent ros esp í r i tas , o c o n t r á r i o

de todas as exper iênc ias que A k s t e i n havia t i d o c o m o u t r o s casos que t ê m m o s t r a d o que o t ranse

t raz ao m é d i u m u m e q u i l í b r i o b io-ps ico-soc ia l . Glad is , por o u t r o lado , e n t r o u t a n t o e m transe h ip ­

n ó t i c o c o m o e m m e d i ú n i c o f a c i l m e n t e e sentia m e l h o r depo is . Mar l y nunca e n t r o u e m transe h ipnó ­

t i c o e n e m n o t ranse c iné t i co da T T T . Precisamos iden t i f i ca r mais c r i té r ios através da d o c u m e n t a ç ã o

de casos.

2 — Desenvolvendo o critério para referimentos ao sistema informal.

Depois de acertar u m d iagnós t i co t e m o s que i den t i f i ca r c r i té r ios sobre quais casos podemos

t i ra r bene f í c i os d o sistema i n f o r m a l . Ex is te uma d i fe rença de o p i n i ã o sobre quais casos p o d e m se

aprove i ta r d o esp i r i t i smo . Eugene B r o d y ( 2 S ) p o r e x e m p l o , r e p o r t o u que " o t r a t a m e n t o não-méd i -

co pode só at rapalhar o t r a t a m e n t o p s i q u i á t r i c o , resu l tando na c ron i f i cação de d o e n t e esquizof ré­

n ico e a lcoo l i s ta . M u i t o s o u t r o s ps iqu ia t ras não t ê m o mesmo p o n t o de v is ta . Os bene f í c i os e os per i ­

gos da par t i c ipação das seitas esp í r i tas e m d i fe ren tes etapas das doenças nervosas não t ê m sido quase

estudados.

E m var iados casos, A k s t e i n t e m encora jado a par t i c ipação no esp i r i t i smo. N o caso de Gladis,

c o m a cond i ção de que ela fizesse a l im i tação d o t e m p o de seu t r a b a l h o m e d i ú n i c o , para ev i tar o can-

43

saco que ela sent iu a n t e r i o r m e n t e . Para a judar a canal izar esta pac iente d e n t r o d o esp i r i t i smo ,

A k s t e i n conv ido-a para a judar o u t r o pac iente e s p í r i t a , dando- lhe , assim, p res t íg io .

N o caso de R i c a r d o , u m a personal idade obsess ivo-compuls iva, A k s t e i n não pôde p r o i b i r suas

at iv idades esp í r i tas , mas através de l inguagem estratégica ele l i m i t o u sua par t i c ipação , para que ele

não subst i tuísse r i tua is obsessivos por r i tua is rel ig iosos. T o d a v i a , A k s t e i n acred i ta que na crise o c u i t o

deu a p o i o à R i c a r d o , u t i l i z a n d o uma l inguagem que ele pode compreender . N o caso de M a r l y , A k s t e i n

acred i ta que q u a n d o uma doença não está na fase c r í t i c a e pode ser absorv ida pelo c u l t o , ele não

p r o í b e a assistência. A s s i m , A k s t e i n sugeriu duas hipóteses para o d iagnós t ico de la . Que ela demons­

t r o u sua doença depois que ela d e i x o u de par t i c ipa r das sessões, po rque ela não pôde canal izar seus

s in tomas d e n t r o de u m m e i o sóc io -cu l tu ra l , o u que ela e n t r o u e m u m a etapa mais séria de sua doença .

Precisamos pesquisar quais os casos que m e l h o r a m e os que p i o r a m nos centos esp í r i tas .

3—A hipnose permite o emprego de técnicas mais adequadas com os pacientes espíritas.

C o n f o r m e Lassa e R u b i n de P i n h o ( 2 6 ) "nossa exper iênc ia t e m m o s t r a d o que os t r a t a m e n t o s

méd icos convenc iona is não levam à resul tados pos i t ivos q u a n d o o pac iente t e m as mani festações má-

gicas-religiosas de doença c o m o os t ranses, os êxtases, encarnações e out ras mani festações e s p í r i t a s " .

Parece que a h ipnose oferece u m a p o n t e referencia l p e r m i t i n d o ao te rapeu ta aprove i ta r u m re­

curso i m p o r t a n t e d o p r ó p r i o pac ien te , sua capacidade de en t ra r e m t ranse. A k s t e i n u t i l i z o u o t ranse

m e d i ú n i c o de Gladis para f ac i l i t a r ma io r c o m u n i c a ç ã o , re forçar suas sugestões, receber mais i n f o r m a ­

ções, e m o b i l i z a r todas as facetas de sua personal idade. U t i l i z a n d o o t ranse m e d i ú n i c o de seus pacien­

tes, ele apl ica u m a técn ica ps icoteráp ica de dois m o d o s : 1) pede à en t idade esp í r i t a ( c a b o c l o , p r e t o

ve lho , etc.) que dê a p o i o , que o r ien te e que aux i l ie ao seu cavalo no t r a t a m e n t o ; 2) e m segunda ins­

tânc ia , pede à en t idade que lhe aux i l i e n o t r a t a m e n t o de seu cavalo.

Ana l isare i ( 2 7 ) a m e d i u n i d a d e c o m o u m processo de re-síntese, onde d u r a n t e o t ranse os ind i ­

v í d u o s f u n c i o n a m em m ú l t i p l o s n íve is de consc iênc ia , i n t e r r o m p e n d o associações habi tua is sem as l i ­

mi tações própr ias dos padrões da a t iv idade consc ien te , e p e r m i t i n d o aprend izagem v ivenc ia l , não

t a n t o i n te lec tua l , e p r o p i c i a n d o a reest ru turação da personal idade. Desempenhando var iados papéis

d e n t r o de sua prá t ica m e d i ú n i c a , t e m o s v is to c o m o os méd iuns t ê m o p o r t u n i d a d e s de resolver p rob le ­

mas em u m n íve l s i m b ó l i c o .

V i v e n c i a n d o o u t r o s " e u s " desempenhando papéis de E x ú , Preto V e l h o , o u Caboc lo , p e r m i t e

que os " e u s " possam contemplar -se d u m a perspect iva mais a m p l a , f u n c i o n a n d o e m m ú l t i p l o s n íveis

de consc iênc ia , o c o r r e n d o assim, uma verdadei ra dessensibi l ização das crises emoc iona is . Os ind iv í ­

duos, en tão , conseguem m a i o r c o n t r o l e sobre os " e u s " a l te rnados consegu indo assim a judar aos que

os p r o c u r a m ; são personal idades sociais ad ic ionais mant idas d e n t r o d o m e i o esp í r i t a , e sua atuação

t e m grande i m p o r t â n c i a nas decisões de m u i t a gente.

Essas soluções gera lmente são mostradas através dos desempenhos s imbó l i cos que podemos ver

t raduz idos na v ida o r d i n á r i a . A nossa análise das gravações a p o i a m esta i n te rp re tação . Observamos que

mu i tas das condu tas , as quais Gladis p r i m e i r o expressou n o t ranse m e d i ú n i c o — a f o r ç a , a agressivida­

de, a l iberação f e m i n i n a — f o r a m expressadas na te rap ia fe i ta f o r a do t ranse, e f o r a m depois t r a d u z i ­

das e m sua v ida o r d i n á r i a . Ela f o i capaz de sentir-se f o r t e para sair soz inha , para expressar suas insatis­

fações c o m respei to a seu m a r i d o , para d isc ip l inar a sua f i l h a e para reconhecer que sua t o n t e i r a estava

re lac ionada c o m sua f o b i a . E n c o r a j a n d o o transe m e d i ú n i c o , A k s t e i n p e r m i t i u que fosse u t i l i zada uma

exper iênc ia i m p o r t a n t e na v ida de sua paciente e pe rm i t i u - l he u m d iá logo c o m seus " e u s " a l te rna t ivos .

D o mesmo m o d o , os psicólogos humanis tas e os ps iquiat ras u t i l i z a m a imaginação a t iva , as f a n ­

tasias d i r ig idas, a h ipnos ín tese , " r e d r e a m i n g " , ensaio, e ou t ras técnicas que empregam o c o n d i c i o n a ­

m e n t o da imagem para cu l t i va r as mudanças da personal idade e a ps icos íntese. A h ipnose p r o p o r c i o n a

uma pon te re ferencia l para os pacientes espí r i tas se expressaram, pois que m u i t o s dos f e n ó m e n o s es­

p í r i tas são rep roduz íve i s na h ipnose, e se o paciente já t e m capacidade de u t i l i za r o t ranse, en tão o

ps iqu ia t ra poderá to rná - l o u m grande recurso t e r a p ê u t i c o .

4 4

Modelo Universal da Interação Psicoterapêutica — Q u a n d o os ps iqu ia t ras brasi le i ros p r o c u r a m u t i ­

l izar a l inguagem e os s í m b o l o s r i tua is , o u o t ranse m e d i ú n i c o e m seu c o n s u l t ó r i o , a ps iqu ia t r ia o f i c ia l ,

poderá ver nisso uma si tuação c o n t r a a é t ica méd ica " c i e n t í f i c a " . Mas, se nós anal isarmos a c o m u n i ­

cação e m qua lquer in teração ps ico terapêut ica u t i l i z a n d o a c iênc ia l i n g u í s t i c a , poderemos cons t ru i r

|2 8-2 9 | u m m o d e l o de es t ru tu ra básica e universal da ps ico terap ia .

Estamos empregando esta análise c o m as gravações dos casos c i tados . P r i m e i r o , terapistas iden­

t i f i c a m a exper iênc ia v ivencia l t o t a l dos doentes . Os seres h u m a n o s c r i am mapas o u representações de

seu m u n d o . Esses mapas servem para guiar sua c o n d u t a e para predizer a c o n d u t a dos o u t r o s . Segun­

d o , os terapistas desaf iam os mode los dos doen tes , empregando os mesmos e lementos da c o n d u t a de­

les. Parece u m p a r a d o x o , p o r é m oferece m e n o r chance de resistência por par te d o paciente.

0 te rce i ro e l e m e n t o daque la es t ru tu ra básica da c o m u n i c a ç ã o é que os doentes p o d e m :

a) cr iar novas est ru turas de referência o u ;

b) canal izar sua c o n d u t a n u m a área sem se c o n t r a p o r c o m sua v ida m u n d a n a (po r e x e m p l o , encora jar

a prá t ica m e d i ú n i c a ) .

U m as tu to te rap is ta c o m o A K S T E I N , arranja as c i rcunstânc ias que f a c i l i t a m a recept iv idade do pa­

c iente a suas associações in ter io res , a suas destrezas menta is mu i tas vezes expressadas nos transes de

possessão.

Para t e r m i n a r gostar ia de abordar a lgumas l inhas de pesquisa através de estudos dos casos e m

t r a t a m e n t o ps iqu iá t r i co e popu la r .

1 - Estratégias ps icoterapêut icas dos ps iquiat ras inovadores que f a z e m a l igação en t re sistemas

a l te rnat ivos de cura . Por e x e m p l o , as relações en t re o t ranse m e d i ú n i c o e ou t ras terapias populares ,

b e m c o m o seu e n t r o s a m e n t o c o m a h ipnose c l í n i c a e ou t ras técnicas ps icoterápicas.

2 — Espécie de f o r m a ç ã o , t r e i n a m e n t o e exper iênc ia ú t i l ao p ro f iss iona l para a u m e n t a r sua e f i ­

cácia te rapêu t i ca .

3 — Es t ru tu ras organizac ionais , sistemas de referências, e relações cooperat iv is tas en t re p ra t i ­

cantes prof iss ionais méd icos e não-méd icos .

4 — A t i t u d e s , crenças e o u t r o s fa to res cu l tu ra is i m p o r t a n t e s para in f l uenc ia r essas técnicas.

5 — A s congruênc ias e c o n f l i t o s na d iagnose, e t i o l o g i a , nosologia e prát icas de sistemas comp le ­

mentares de c u r a .

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