Post on 08-Oct-2015
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Arquitetura, Viso e Movimento
O discurso de Paulo Mendes da Rocha na
Pinacoteca do Estado de So Paulo
Mateus Paulo Beck
Autor
Dissertao apresentada ao Programa de Pesquisa e Ps-Graduao em Arquitetura
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
como requisito parcial para a obteno do grau de Mestre em Arquitetura
Prof. Dr. Benamy Turkienicz
Orientador
Porto Alegre, 2011
1
Agradecimentos
Agradeo a Deus pela vida e por todas as bnos recebidas.
Agradeo minha famlia, na pessoa dos meus pais Nestor e In,
pelo amor e suporte incondicionais.
Agradeo aos meus alunos e aos meus mestres, na pessoa dos professores
Germano Brune e Benamy Turkienicz, pela confiana em mim depositada.
Agradeo a todos os meus amigos, nas pessoas de Iara Prates e Luciana Snel,
pelo apoio direto e indireto ao longo dessa jornada.
Agradeo ao arquiteto Paulo Mendes da Rocha pela inspirao
e pela oportunidade de uma magistral aula de arquitetura
Agradeo nao brasileira pelas oportunidades de
aprendizado, crescimento e realizao profissional em suas instituies,
em especial a Universidade Federal do Rio Grande do Sul
e a Justia Federal do Rio Grande do Sul.
Os meus sinceros agradecimentos.
2
Sumrio
Agradecimentos ____________________________________________________ 1
Sumrio ___________________________________________________________ 2
Resumo ___________________________________________________________ 3
Abstract ___________________________________________________________ 4
Introduo _________________________________________________________ 5
1. Reviso da Literatura _____________________________________________ 14
1.1. Abordagem ecolgica da percepo visual ___________________________ 14 1.2. Isovistas _____________________________________________________ 18 1.3. Sintaxe espacial ________________________________________________ 21 1.4. Inteligibilidade _________________________________________________ 27 1.5. Grafos de Visibilidade ___________________________________________ 30 1.6. Agentes ______________________________________________________ 33 1.7. Paulo Mendes da Rocha e a Pinacoteca ______________________________ 35
2. Materiais e Mtodos ______________________________________________ 38
2.1. Situao Original _______________________________________________ 40 2.2. Situao de Projeto _____________________________________________ 44 2.3. Situao de Uso ________________________________________________ 47 2.4. Estruturao Espacial ___________________________________________ 50 2.4.1. Mapas Convexos ______________________________________________ 50 2.4.2. Mapas Axiais _________________________________________________ 51 2.5. Movimento de Visitantes _________________________________________ 52 2.5.1. Simulao Computacional ______________________________________ 52 2.5.2. Amostragem _________________________________________________ 53 2.6. Inteligibilidade _________________________________________________ 55 2.6.1. Informao Visual _____________________________________________ 55 2.6.2. Inteligibilidade do Pavimento ____________________________________ 57 2.6.3. Inteligibilidade de Percursos _____________________________________ 57
3. Resultados e Anlise ______________________________________________ 59
3.1. Estruturao Espacial ___________________________________________ 59 3.1.1. Mapas Convexos ______________________________________________ 59 3.1.2. Mapas Axiais _________________________________________________ 61 3.2. Movimento de Visitantes _________________________________________ 64 3.2.1. Simulao Computacional ______________________________________ 65 3.2.2. Amostragem _________________________________________________ 67 3.3. Inteligibilidade _________________________________________________ 70 3.3.1. Informao Visual _____________________________________________ 70 3.3.2. Inteligibilidade do Pavimento ____________________________________ 75 3.3.3. Inteligibilidade de Percursos _____________________________________ 80
4. Concluso ______________________________________________________ 93
Lista de Figuras ____________________________________________________ 98
Fontes das Figuras ________________________________________________ 101
Anexos _________________________________________________________ 102
Referncias Bibliogrficas ___________________________________________ 109
3
Resumo
Esta dissertao investiga o discurso de Paulo Mendes da Rocha a respeito da
arquitetura de museus em uma obra sua, a Pinacoteca do Estado de So Paulo. Os
aspectos do discurso do arquiteto dizem respeito estruturao espacial da
Pinacoteca, movimentao de seus visitantes e inteligibilidade do ambiente.
Esses aspectos foram discutidos atravs da anlise comparativa da Pinacoteca
antes e depois da reestruturao espacial proposta por Mendes da Rocha. O estudo
est baseado no modelo da sintaxe espacial e no modelo ecolgico da percepo
visual. O mtodo combina a anlise de mapas convexos e axiais, grafos de
visibilidade, agentes computacionais e isovistas. O trabalho tambm aborda a
interferncia da montagem de exposies na estruturao e inteligibilidade do
museu. Os resultados demonstram que a interveno de Paulo Mendes da Rocha
tornou o espao interno da Pinacoteca menos estruturado, ampliou a possibilidade
dos visitantes escolherem seus prprios percursos e estimulou a movimentao de
seus visitantes. A montagem de exposies aumentou a estruturao do espao,
demonstrando a flexibilidade do museu para receber diferentes tipos de exposio,
mas interferiu no movimento dos visitantes a na inteligibilidade do museu. A
reformulao da Pinacoteca tambm melhorou as condies de visualizao e
compreenso do ambiente, aumentando sua inteligibilidade. O trabalho conclui que
os aspectos analisados do discurso de Paulo Mendes da Rocha so efetivamente
confirmados na reformulao espacial da Pinacoteca do Estado de So Paulo.
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Abstract
This thesis examines the discourse of Paulo Mendes da Rocha, about the
architecture of museums in one of his works, the Pinacoteca Art Museum of the
State of So Paulo. The architect's speech concerns aspects such as the spatial
structure of the museum, visitor movement and the intelligibility of the building.
These aspects were discussed through comparative analysis of the museum before
and after the spatial restructuring proposed by Mendes da Rocha. The study is
based on the space syntax model and the ecological approach to perception visual.
The method combines the analysis of convex and axial maps, visibility graphs,
computational agents and isovists. The work also addresses the interference of
exhibitions in the spatial structure and intelligibility of the museum. The results
demonstrate that the intervention by Paulo Mendes da Rocha reduced the spatial
structuring of the building, stimulated visitor movement and improved the
conditions for visitors to choose their own pathway. The exhibitions increased the
structuring of space, demonstrating the flexibility of the museum to receive
different types of exhibits, however interfering with visitor movement and the
intelligibility of the museum. The spatial restructuring also improved the conditions
for visualization and understanding the building, increasing its intelligibility. The
paper concludes that the analyzed aspects of Paulo Mendes da Rochas discourse
are actually confirmed in the spatial restructuring of the museum.
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Introduo
A arquitetura de museus enquanto discurso especfico consiste no xito e graa da
imprevisibilidade. (Rocha, 2007)
Nas palavras do arquiteto Paulo Mendes da Rocha, a arquitetura uma
abstrao que no pode prescindir do conhecimento objetivo da tcnica, uma
filosofia enquanto consideraes de improbabilidade que temos que transformar em
algo til. O arquiteto afirma que os requisitos de funcionalidade de um museu so
imprevisveis, e que portanto no existem regras nem modelos ideais de museu,
apenas tentativas. Cada museu deve ser uma nova inveno, fruto da reflexo
sobre o que so, o que j se fez e o que j se pensou a respeito de museus. A
arquitetura de museus constitui assim um saber presumido com amparo histrico, e
deve estar mais voltada para a disponibilidade do que para a definio. A
edificao destinada a um museu deve ser disponvel e despojada, para que brilhe
a obra de arte. O museu algo que no , mas est l para acolher o que . A
obra no quer perturbao, ela quer falar sozinha. (Rocha, op. cit.)
Paulo Mendes da Rocha defende a mxima disponibilidade de recursos no
projeto de museus para ampliar a convenincia desta ou daquela exposio.
Desse modo a imprevisibilidade na arquitetura de museus tanto esttica quanto
tcnica, j que as edificaes destinadas a museus devem permitir a montagem de
exposies das mais variadas naturezas. As questes tcnicas incluem a
preservao do acervo, sua proteo na exibio e no transporte e a iluminao das
obras. Essencialmente artificial, a iluminao deve ser flexvel para permitir que se
defina a luz mais adequada para cada obra. Para Mendes da Rocha o sistema de
iluminao de museus deve prescindir da luz natural, cambiante, proveniente do
conjunto de fenmenos instveis representado pela natureza. A presena de
aberturas em museus est relacionada a uma presumida necessidade do homem de
lembrar-se de onde ele est, uma memria do l fora, que no resolve nada em
termos de iluminao das obras.
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Com relao ao usurio, Paulo Mendes da Rocha afirma que a arquitetura
deve configurar o livre-arbtrio, sobretudo em atividades ldicas como a fruio de
um museu. A arquitetura que obriga repudivel, e se justifica apenas no caso de
presdios. Na viso do arquiteto, o percurso de visitao em museus deve ser
varivel, para poder se modificar por convenincia da graa e do xito da
museologia. Mesmo em museus com acervo fixo no interessante para a
instituio manter um percurso fixo de visitao. E ainda que a cada montagem
determinados percursos sejam definidos, a graa em visitar um museu est
justamente em romper o didatismo formal da exposio. Desse modo quem
conhece arte pode atravessar o museu na diagonal em busca de suas obras
prediletas, possibilidade fundamental no caso de grandes museus, cuja visitao
completa demanda vrias horas. O arquiteto conclui que, excetuado o caso de
visitas guiadas ou em grupo, o ideal que cada indivduo escolha seu prprio
percurso de visitao.
Em resumo, de acordo com Paulo Mendes da Rocha, a arquitetura de
museus deve conciliar a flexibilidade para a montagem de exposies com a
possibilidade dos visitantes escolherem seus prprios percursos, aspectos que
dependem fundamentalmente da estruturao espacial do museu. A montagem
de exposies de um museu requer flexibilidade em diferentes nveis de definio
espacial para atender a cada situao, j que a estruturao espacial est
diretamente relacionada ao modo com que o contedo exposto ser percebido e
compreendido pelo usurio (Pradinuk, 1986). A estruturao espacial de um museu
constituda por dois fatores: sucesso espacial e opo de percurso. A sucesso
espacial corresponde quantidade de espaos justapostos em sequncia nica, e
uma varivel topolgica. As opes de percurso, por sua vez, correspondem
quantidade de rotas alternativas a partir de cada espao. Um museu muito
estruturado possui claras separaes entre um nmero significativo de espaos
sucessivos e apresenta um percurso de visitao mais definido, com poucas ou
apenas uma opo de rota. J um museu pouco estruturado apresenta pouca
sucesso de espaos diferenciados em cada trajeto e percursos pouco definidos,
com vrias rotas alternativas de visitao.
Essas caractersticas podem ser aferidas atravs da anlise da configurao
espacial, representao baseada em unidades espaciais e nas relaes entre as
mesmas. Esse mtodo de anlise pertence Sintaxe Espacial, teoria proposta por
Hillier e Hanson (1984) a respeito da relao entre sociedade e espao. O mtodo
permite descrever relaes configuracionais de visibilidade e permeabilidade entre
unidades espaciais mnimas. Relaes de permeabilidade definem a possibilidade de
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um usurio se deslocar de uma unidade espacial para outra unidade contgua;
relaes de visibilidade possibilitam visualizar um espao ou parte de um espao a
partir de outro. As relaes estabelecidas entre apenas duas unidades espaciais
contguas podem ser consideradas relaes bsicas, enquanto as relaes
denominadas configuracionais requerem no mnimo trs unidades, pois descrevem
dois elementos em relao a um terceiro. Relaes configuracionais envolvem as
noes de simetria/assimetria e distribuio/no-distribuio. Simetria entre
espaos equivalncia de relaes costuma coincidir com a presena, nesses
espaos, de categorias sociais semelhantes. Assimetria no-equivalncia de
relaes espaciais pode ser forte indicador de segregao de categorias sociais.
Distribuio pluralidade de relaes entre pares de elementos indica tendncia
difuso do controle espacial. No-distribuio singularidade de relaes entre
pares de elementos indica tendncia ao aumento e concentrao do controle
espacial. Enquanto a noo de simetria/assimetria est relacionada sucesso
espacial, a noo de distribuio/no-distribuio est relacionada opo de
percurso. Assim, um museu muito estruturado tende assimetria e no-
distribuio e um museu pouco estruturado tende alta simetria e a grande
distribuio. Um museu flexvel deve permitir a estruturao de configuraes
espaciais predominantemente simtricas ou predominantemente assimtricas e/ou
predominantemente distribudas ou no distribudas.
A definio do percurso de visitao depende da percepo, por parte do
visitante, das alternativas de circulao, entrada e sada dos espaos do museu,
constituindo o que James Gibson denomina affordances, que constituem tudo
aquilo que o ambiente oferece, permite ou disponibiliza para um usurio especfico,
tanto em seu benefcio quanto em seu prejuzo (Gibson, 1986:127). O conceito de
affordances faz parte de uma teoria proposta por Gibson (op. cit.) denominada
Abordagem Ecolgica da Percepo Visual, que descreve as possibilidades do
ambiente atravs da percepo visual. Seguindo o conceito de Gibson, os fatores
de estruturao do espao em museus sucesso espacial e opo de percurso
constituem diferentes possibilidades do ambiente a serem oferecidas para o usurio
(affordances). Enquanto a sucesso espacial refere-se maior ou menor
quantidade de espaos visitveis em cada trajeto, a opo de percurso envolve o
nmero maior ou menor de rotas alternativas, de acordo com as restries
impostas pelo ambiente da exposio. Assim um museu mais estruturado tende a
oferecer menos alternativas de percurso com mais espaos sucessivos em cada
trajeto, e um museu menos estruturado tende a oferecer mais alternativas de
percurso com menos espaos diferenciados e sucessivos em cada trajeto.
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Refraseando Paulo Mendes da Rocha, a arquitetura de museus deve
conciliar a flexibilidade para a montagem de exposies com a possibilidade dos
visitantes escolherem seus prprios percursos, aspectos que dependem
fundamentalmente da estruturao espacial do museu. Em resumo, a estrutura
fsico-espacial fixa do museu contribui para a flexibilidade na montagem de
exposies e, uma vez montada a exposio, a estrutura espacial resultante
determina, em maior ou menor grau, as possibilidades dos visitantes escolherem
seus prprios percursos.
Presentes no discurso de Paulo Mendes da Rocha, esses dois aspectos
foram analisados em obra sua a Pinacoteca do Estado de So Paulo caracterizada
por reestruturao espacial de edificao histrica. De autoria do arquiteto
Francisco de Paula Ramos de Azevedo, o prdio da Pinacoteca destinou-se
originalmente ao Liceu de Artes e Ofcios, cuja construo se iniciou no final do
sculo XIX e nunca foi concluda. Em estilo neoclssico, o projeto original foi
criticado por Paulo Mendes da Rocha por ser um projeto padro, copiado de
antologias de arquitetura e com a mesma planta do museu de Berlim (Rocha,
1998, p. 47). Em 1905 foi criada a Pinacoteca do Estado de So Paulo e, a partir
da, o prdio foi sendo sucessivamente adaptado para abrigar a instituio. No final
dos anos 90 o prdio foi reformulado por Mendes da Rocha para funcionar
exclusivamente como museu.
Em trs pavimentos, o projeto original do prdio apresentava rigorosa
simetria bilateral, com salas organizadas em torno de dois ptios laterais e um trio
central coberto por uma cpula monumental que no chegou a ser executada. A
entrada principal localizava-se na fachada leste, atravs de escadarias que
conduziam a um hall no pavimento intermedirio. As circulaes horizontais
contornavam os ptios; as verticais se resumiam a quatro escadas dispostas nos
extremos. A interveno de Paulo Mendes da Rocha determinou uma completa
reestruturao espacial da Pinacoteca incluindo, entre outros aspectos, o
deslocamento do acesso e a reformulao do sistema interno de circulao. A
entrada principal foi deslocada para a fachada lateral sul, atravs de uma varanda
pr-existente, a escadaria original de acesso foi substituda por um belvedere e a
construo de passarelas atravessando os ptios estabeleceu um novo eixo de
circulao longitudinal no centro do prdio. Retiradas as esquadrias junto aos
ptios, os mesmos foram cobertos por zenitais e passaram a integrar o espao
interno do prdio. No trreo do trio central foi criado um auditrio, cuja laje de
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cobertura tornou o espao central acessvel no pavimento intermedirio. Foram
tambm instalados dois elevadores, um grande no ptio norte, para pblico e
transporte de obras, e outro menor para funcionrios, junto circulao perifrica
do trio.
Paulo Mendes da Rocha justifica a reestruturao espacial da Pinacoteca
nas citaes que seguem. A alterao da entrada se deveu ao estrangulamento
que havia entre o prdio e a Avenida Tiradentes, cujo trfego aumentara
excessivamente. J a construo das passarelas e a cobertura dos ptios, que antes
eram dois sombrios e midos poos, transformaram a espacialidade do prdio
criando grande transparncia. E a criao do novo eixo de circulao longitudinal,
seria para evitar a viso labirntica do projeto original, cuja circulao no flua.
(Rocha, op. cit., 1998, p. 47) Em resumo, as justificativas de Paulo Mendes da
Rocha para a reestruturao espacial da Pinacoteca, baseadas em parte na crtica
ao projeto original do prdio, ressaltam aspectos relacionados a visibilidade e
movimento. Enquanto no prdio original a circulao no flua, a interveno
arquitetnica criou novos eixos de deslocamento, com mais possibilidades de
movimento para os visitantes, permitiu uma grande transparncia e ampliou as
relaes de visibilidade entre os ambientes, ao passo que a situao anterior era
labirntica, ou seja, complexa e com visibilidade restrita.1 Assim a reestruturao
espacial da Pinacoteca teve por objetivo ampliar as possibilidades de movimentao
dos visitantes e ao mesmo tempo facilitar a compreenso por parte dos usurios da
organizao espacial do prdio.
A possibilidade de um sistema espacial complexo ser compreendido atravs
da experincia sucessiva das suas partes denominada inteligibilidade desse
sistema (Hillier 1996:338). Por outro lado, as possibilidades de ocupao,
movimento e controle em um dado espao determinam o seu potencial de uso para
diferentes atividades, ou de acordo com Hillier sua funcionalidade. Essas
possibilidades variam de acordo com as caractersticas dos espaos e com sua
organizao, s quais correspondem diferentes categorias sociais e formas de
controle do espao. Inteligibilidade e funcionalidade constituem o que Bill Hillier
denomina funo genrica das edificaes e aglomeraes humanas. Enquanto a
funcionalidade est primordialmente relacionada a comportamentos de ordem
social, a inteligibilidade corresponde ao comportamento individual de compreenso
dos espaos e de sua organizao.
1 Um labirinto um sistema espacial complexo, em que o movimento dos usurios fica comprometido pela dificuldade em compreender a estruturao do espao.
10
Na teoria ecolgica de Gibson (op. cit.), a compreenso da estrutura
espacial se inicia com a percepo visual do ambiente. Naquele modelo, a
percepo visual considerada um processo de coleta de informaes em um fluxo
contnuo de estmulo disponvel no ambiente. A informao visual disponvel para a
percepo ambiental corresponde arrumao ptica ambiente (ambient optic
array), que especifica as superfcies de diversos locais atravs de bordas oclusivas.
O movimento do observador permite a alternncia entre superfcies ocultas e
aparentes, de acordo com o princpio da ocluso reversvel. O modelo ecolgico
distingue as informaes variveis, relacionadas ao observador, das informaes
permanentes, relacionadas ao ambiente. As possibilidades para a movimentao do
usurio, em particular, dependem da disposio das superfcies no ambiente.
Enquanto superfcies horizontais permitem equilbrio e postura, superfcies verticais
podem ser obstculos, que permitem coliso, ou indicar aberturas, que permitem
passagem.
A disposio das superfcies em determinado local pode ser descrita
atravs de uma isovista, uma figura geomtrica formada pelo conjunto de todos
os pontos visveis a partir de determinado ponto de visada (Benedikt, 1979). Assim
como o modelo ecolgico, o mtodo de isovistas relaciona indivduo e ambiente e
permite descrever e quantificar atributos envolvidos na percepo visual e na
movimentao do usurio. Caractersticas qualitativas bsicas do espao tais como
amplitude, permeabilidade, complexidade, ordem e fechamento esto
correlacionadas a atributos quantitativos simples de isovistas (Franz e Wiener,
2005, Stamps, 2005). O mtodo das isovistas vem sendo utilizado, na anlise de
museus, para modelar o potencial de visualizao e a acessibilidade dos objetos
expostos (Peponis et al, 2004), bem como os padres de escolha de percursos e a
interao com os objetos expostos por parte dos visitantes (Kaynar, 2005,).
Isovistas permitem no apenas modelar as propriedades geomtricas locais,
relacionadas representao mental do ambiente (Meilinger et al, 2007), mas
tambm aspectos de percepo e cognio espacial relacionados interao entre
geometria e movimento (Batty, 2001).
A partir da percepo das caractersticas locais dos espaos, o movimento
do observador permite a compreenso da estrutura global do ambiente. Peponis et
al. (1990) prope um modelo que relaciona as propriedades inteligveis de sistemas
espaciais a regras de navegao para analisar os padres de navegao e
orientao humanos. De acordo com Dalton (2001), os indivduos tendem a
desenvolver um percurso o mais linear possvel, a fim de torn-lo menos complexo
e desse modo mais compreensvel. Esses so aspectos fundamentais do processo
11
de cognio espacial, que culmina na compreenso da configurao espacial pelo
indivduo (Hart & Moore, 1973, in Peponis et. al, 1990). Os padres de explorao
de sistemas espaciais so determinados pela configurao, pois a escolha de
percursos requer uma compreenso mais abstrata de como as partes locais se
relacionam de modo global (Peponis et al., op. cit., 1990). Essa relao expressa
pela inteligibilidade, propriedade da qual tambm depende a possibilidade de um
ambiente de ser reconhecido visualmente (Dalton e Bafna, 2003). A inteligibilidade
de um sistema espacial influencia tanto o movimento exploratrio quanto a
compreenso de sua configurao (Brsamle e Hlscher, 2007, Yun e Kim, 2007),
sendo a correlao entre movimento e configurao espacial maior em sistemas
mais inteligveis (Penn, 2001). Desse modo a inteligibilidade constitui no apenas
uma caracterstica fsica do ambiente, mas tambm um importante aspecto da
cognio espacial (Kim, 2001).
Hillier e Hanson (op. cit.) apresentam dois mtodos para a anlise de
sistemas espaciais complexos: o modelo alpha, para espaos abertos contnuos, e
o modelo gamma, para o espao interno das edificaes. O modelo alpha utiliza
dois tipos de unidades mnimas: espaos convexos e eixos. Espaos convexos
so unidades espaciais representadas por polgonos convexos, que correspondem
maior extenso local em duas dimenses. Com relao ao usurio, espaos
convexos permitem a um observador, que se encontre em qualquer um de seus
pontos, a visualizao completa do espao. Eixos so unidades espaciais lineares
que atravessam e interligam os espaos convexos e correspondem maior
extenso global em uma dimenso. Com relao ao usurio, eixos correspondem a
direes de visada, que podem ser escolhidas pelo observador como direes de
deslocamento. No modelo gamma as unidades espaciais mnimas correspondem s
unidades definidas pelos prprios limites espaciais, sejam os espaos convexos ou
no. Em ambos os mtodos, a configurao espacial pode ser representada por
grafos justificados, em que as unidades espaciais correspondem a ns, e as
relaes de permeabilidade ou visibilidade entre as mesmas representam conexes.
A partir de um espao-raiz, os grafos so estruturados em nveis sobrepostos,
correspondentes a passos sintticos que estabelecem a profundidade do sistema.
Assim, grafos justificados em forma de rvore correspondem a sistemas mais
profundos, em que a maioria dos ns est afastada da raiz. Configuraes do tipo
rvore apresentam tendncia assimetria e no-distribuio, sendo, portanto,
sistemas mais estruturados. J os grafos em forma de rede correspondem a
sistemas mais rasos, em que a maior parte dos ns est prxima raiz. Esses, por
sua vez, tendem simetria e distribuio, correspondendo a sistemas menos
estruturados.
12
A definio das unidades espaciais nos mtodos alpha e gamma no
absoluta, o que d margem a diferentes descries de um mesmo sistema. Em
funo disso foram desenvolvidos mtodos que permitem a gerao automtica de
descries. O all-line map um mtodo de gerao automtica de mapas axiais a
partir do desenho de eixos ligando todos os vrtices mutuamente visveis de um
determinado complexo espacial (Hillier, op. cit.). Outro mtodo a anlise do grafo
de visibilidade (visibility graph analysis VGA), que se baseia na construo de um
grafo de todas as posies mutuamente visveis de uma malha regular de pontos
prxima da escala humana (Turner et al, 2001). Alm de permitir uma descrio
mais refinada, ponto a ponto, as propriedades do grafo de visibilidade (VGA)
eventualmente podem estar mais bem correlacionadas ao movimento humano do
que os descritores sintticos baseados no mapa axial (Desyllas e Duxbury, 2001). A
integrao visual (VGA) um aspecto da morfologia espacial ao qual esto
relacionados os padres de uso do espao interno de prdios pblicos para a
exibio de espetculos (Doxa, 2001). Grafos de visibilidade so tambm utilizados
em outro modelo para a anlise do movimento humano denominado exosomatic
visual architecture (Turner e Penn, 2002). Baseado na teoria ecolgica de Gibson,
o modelo utiliza o conceito de affordances para estabelecer uma relao entre
ambientes virtuais e agentes computacionais. Como no enxergam literalmente,
os agentes so previamente informados das possibilidades de movimentao no
ambiente atravs de um grafo de visibilidade (VGA). O movimento dos agentes
aleatrio, seguindo decises individuais baseadas nas affordances espaciais
presentes na morfologia do campo visual local de cada agente, o que permite
simular os efeitos da configurao espacial sobre o movimento de pessoas (Penn e
Turner, 2002). Apesar de aleatrio, o movimento dos agentes direcional e est
correlacionado com as propriedades sintticas de mapas axiais e com o movimento
humano observado em estudos de sintaxe espacial. Assim, tanto a integrao axial
quanto o uso de agentes permitem modelar com sucesso o movimento humano no
espao, pois ambos os mtodos relacionam a dinmica visual do movimento
direcional com as propriedades configuracionais do ambiente (Turner, 2003).
Em resumo, o movimento humano no espao vem sendo largamente
investigado no mbito da Sintaxe Espacial, podendo ser modelado e analisado
atravs de mapas axiais, mapas convexos, grafos de visibilidade (VGA) e agentes
computacionais. No estudo de museus, em particular, as propriedades sintticas da
configurao espacial esto relacionadas ao movimento dos visitantes, com nfase
na inteligibilidade e no movimento exploratrio, visando compreenso e
reconhecimento da estruturao do espao. J o potencial de visualizao do
contedo exposto, sua acessibilidade, bem como os padres de escolha de
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percursos por parte dos visitantes e sua interao com os objetos expostos vm
sendo modelados atravs de isovistas e grafos de visibilidade (VGA).
O objetivo desta dissertao verificar se a reestruturao espacial da
Pinacoteca do Estado de So Paulo efetivamente ampliou a inteligibilidade do
ambiente e a flexibilidade para a montagem de exposies, conforme argumenta
Paulo Mendes da Rocha. O estudo se baseia nos modelos sinttico e ecolgico para
investigar a estruturao espacial da Pinacoteca quanto s alteraes na sucesso
espacial e nas opes de percursos e quanto aos padres de movimento de seus
visitantes. Esses atributos sero investigados atravs da anlise comparativa da
Pinacoteca antes e depois da reestruturao espacial proposta por Mendes da
Rocha. Ser tambm contemplada a interferncia da montagem de exposies na
estruturao e inteligibilidade do museu, analisando-se uma amostra do prdio em
uso, com exposies instaladas. O mtodo de anlise inclui a modelagem convexa e
axial das relaes de permeabilidade entre os espaos, a modelagem das relaes
de visibilidade com grafos de visibilidade (VGA) e isovistas, e a modelagem do
movimento dos visitantes utilizando-se agentes computacionais e amostragem feita
no local. A dissertao est organizada em quatro partes. O primeiro captulo
corresponde fundamentao terica, o segundo aos materiais e mtodos de
anlise, o terceiro aos resultados e o quarto s concluses do trabalho.
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1. Reviso da Literatura
A teoria ecolgica da percepo visual de Gibson (op. cit.) e a teoria da sintaxe
espacial, proposta por Hillier e Hanson (op. cit.), sero descritas neste captulo em
maior detalhe, com destaque para aspectos referentes ao processo de cognio
espacial. Sero tambm apresentados os modelos ecolgico e sinttico referidos
aos espaos de exposies e museus.
1.1. Abordagem ecolgica da percepo visual
A abordagem ecolgica da percepo visual, proposta por Gibson (op. cit.),
descreve a percepo visual como um processo de coleta de informaes em um
fluxo contnuo de estmulo disponvel no ambiente. O modelo ressalta a distino
entre informaes variveis, relacionadas ao observador, e informaes
permanentes, relacionadas ao ambiente. A percepo visual ecolgica descreve
comportamentos individuais, estabelecendo uma relao de reciprocidade entre
indivduo e ambiente.
No modelo ecolgico o espao descrito como o meio em que vivemos,
nos movimentamos, vemos, ouvimos, etc. Para os seres humanos esse meio
corresponde atmosfera, que permite a reverberao da luz, a propagao de sons
e odores e tambm a locomoo. As demais substncias slidas, lquidas e
viscosas permitem outras possibilidades para o comportamento humano, como
resistncia locomoo, alimentao, manipulao, manufatura, etc. As superfcies
que separam essas substncias do meio permitem as trocas entre ambos, alm da
disperso, reflexo e absoro da luz, fenmenos que, por sua vez, criam a
iluminao ambiente. Enquanto a radiao corresponde luz divergente emitida
por uma fonte luminosa, a iluminao corresponde luz convergente em qualquer
ponto do ambiente. A radiao contm informao apenas a respeito da fonte
luminosa. J a iluminao tem estrutura estvel e uma direo predominante,
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contendo informao visual a respeito das superfcies que a refletem, tais como
disposio, textura, forma, refletncia e cor.
A informao visual disponvel para a percepo do ambiente corresponde
arrumao ptica ambiente (ambient optic array), uma estrutura que envolve
completamente um determinado ponto de observao, formada por um arranjo de
ngulos visuais intrincados (slidos piramidais ou cnicos) que correspondem s
superfcies do ambiente. A informao visual que especifica as superfcies est na
borda oclusiva, limite que separa superfcies visveis e ocultas e tambm as faces
anteriores e posteriores de objetos. As superfcies especificadas em uma dada
arrumao ptica definem uma poro de espao, um local. A cada local
corresponde uma srie de vistas constitudas por superfcies oclusivas, pertencentes
quele local, e superfcies parcialmente visveis e ocultas, pertencentes a outros
locais. Obtida atravs do movimento dos olhos e da cabea do observador, a
arrumao ptica de um local constitui a viso ambiente, que de natureza
sincrnica.
Figura 1 - arrumao ptica ambiente convergindo para um determinado ponto
Por outro lado o fluxo de informao resultante do movimento do
observador corresponde viso ambulatria, de natureza diacrnica. O
movimento do observador permite a alternncia entre superfcies ocultas e
aparentes, de acordo com o princpio da ocluso reversvel: as superfcies
ocultadas por um movimento so reveladas pelo movimento reverso. A abertura de
vistas em relao a bordas oclusivas permite ao observador, em movimento, a
visualizao das conexes entre superfcies visveis e ocultas e entre diferentes
locais, permitindo ainda a emergncia da estrutura invariante do ambiente. Atravs
da locomoo exploratria (way-finding), a abertura e o ordenamento de
sucessivas vistas no espao permitem tanto a cognio espacial (place-learning)
quanto a orientao espacial, que a relao entre a posio momentnea do
observador e as outras posies possveis no ambiente.
16
Figura 2 - arrumao ptica ambiente com o ponto de observao ocupado por um observador, alteraes na arrumao ptica ambiente devido movimento do observador
A percepo visual subsidia diversas formas de comportamento humano,
atravs da percepo simultnea do ambiente, denominada exterocepo, e do
prprio observador, denominada propriocepo. No caso da locomoo, a estrutura
varivel e em perspectiva do fluxo ptico ambiente especifica o movimento do
observador, enquanto a estrutura permanente especifica o espao percorrido.
Enquanto a estrutura varivel do fluxo de informao est relacionada noo de
tempo presente, passado e futuro, a arrumao ptica em um determinado ponto
de observao especifica apenas a posio momentnea do prprio observador no
ambiente. J o fluxo de informao ptica ao longo de um determinado percurso
especifica o ambiente e todas as posies que o mesmo oferece, atravs da
apreenso de sua estrutura permanente, no perspectivada, atemporal e contnua.
Em termos de percepo visual, a propriocepo est relacionada aos
limites do campo visual, amostra parcial da arrumao ptica ambiente resultante
da combinao do campo de viso dos dois olhos. O campo visual humano tem
limites precisos tanto superiores o nariz e as sobrancelhas quanto inferiores o
tronco e os membros. Esses limites constituem bordas oclusivas reversveis pelo
giro da cabea. A propriocepo envolve ainda a cinestesia, que a percepo do
movimento prprio, primordialmente visual. Enquanto o fluxo de informao
especifica movimento, a interrupo no mesmo indica repouso. Quando o
observador est em movimento, a perspectiva fluente divide a arrumao ptica
ambiente em dois hemisfrios, de acordo com o fluxo da informao. Enquanto a
fluxo centrfugo e a magnificao de estrutura especificam aproximao, o fluxo
centrpeto e a minimizao de estrutura especificam afastamento. O foco de
efluncia, de onde parte o fluxo de informao, especifica o destino do observador,
enquanto o foco de afluncia, para onde vai o fluxo de informao, especifica a
origem do observador. A linha de deslocamento do observador corresponde ao eixo
ligando ambos os focos, e o deslocamento desse eixo especifica a mudana de
direo do movimento.
17
As possibilidades de movimentao do usurio (affordances) dependem da
disposio das superfcies no ambiente, em especial das superfcies horizontais, que
permitem equilbrio e postura. As superfcies verticais, por sua vez,vez podem ser
obstculos, que permitem a coliso, o fechamento de vistas na aproximao ou a
abertura de vistas no afastamento, ou ainda indicar aberturas, que permitem a
passagem, a abertura de vistas na aproximao ou o fechamento de vistas no
afastamento. Obstculos e aberturas so especificados por bordas oclusivas, que se
alteram de acordo com o movimento do observador, de modo reversvel: na
aproximao a obstculos ocorre perda de estrutura fora de uma borda contnua;
no afastamento de obstculos ocorre ganho de estrutura fora de uma borda
contnua; na aproximao de uma abertura ocorre ganho de estrutura dentro de
uma borda contnua; no afastamento de uma abertura ocorre perda de estrutura
dentro de uma borda contnua.
Figura 3 - fluxo de informao visual durante a locomoo, em movimento paralelo ao solo
A exterocepo, por sua vez, consiste na percepo da estrutura
permanente do ambiente atravs da extrao de invariantes pticos no fluxo de
informao visual. A persistncia das superfcies, de sua disposio relativa e de
suas refletncias relativas constitui um invariante em relao a diferentes condies
de iluminao (quantidade de luz, direo e composio espectral). Tambm
constitui invariantes pticos a estrutura comum subjacente a variaes de diversas
naturezas tais como: - diferentes posies de observao, com transformaes nas
formas intrincadas da arrumao com incremento e decrescimento de estrutura em
bordas oclusivas; - variaes devidas a mltiplas amostragens; - distrbios locais
na estrutura da arrumao ptica, devidos a eventos locais, deslocamento ou
rotao de objetos desconectados ou ainda deformao de superfcies elsticas.
18
1.2. Isovistas
A disposio das superfcies em determinada arrumao ptica ambiente pode ser
descrita atravs de uma isovista, o conjunto de todos os pontos visveis a partir de
determinado ponto de visada. Assim como o modelo ecolgico, o mtodo de
isovistas, proposto por Benedikt (op. cit.), est baseado na relao entre usurio e
ambiente, permitindo descrever e quantificar atributos envolvidos na percepo
visual do ambiente. Uma isovista a figura bidimensional resultante da interseco
da forma tridimensional constituda por todos os pontos visveis e um plano
horizontal na altura dos olhos do observador. O tamanho e forma de uma isovista,
que se alteram com a mudana do ponto de observao, podem ser descritos por
determinados atributos expressos em medidas numricas:
rea: corresponde quantidade de espao visvel a partir do ponto de
vista;
permetro: corresponde quantidade de superfcies visveis do ambiente;
oclusividade: descreve a profundidade entre as superfcies visveis e
oclusas no ponto de observao;
variao: mede a disperso do permetro em relao ao ponto de vista;
dissimetria: indica a simetria da disperso do permetro;
circularidade: descreve o quanto uma isovista compacta ou complexa.
Figura 4 - isovistas com oclusividade crescente da esquerda para a direita
Traando-se uma srie de isovistas uniformemente distribudas sobre uma
malha de pontos podem-se desenhar mapas de campos de isovistas (isovist
fields). Nesses mapas as propriedades das isovistas so representadas como uma
topografia de valores escalares, permitindo mapear a informao visual
permanente disponvel no ambiente. Benedikt demonstra a utilizao do mtodo
para comparar espaos arquitetnicos compartimentados com outros mais abertos
e fluidos.
19
Figura 5 - mapas escalares demonstrando a variao da rea de isovistas : pavilho de
Barcelona de Mies Van Der Rohe, uma sala e sua circulao
Batty (op. cit.) prope a utilizao de uma malha regular de pontos para
programar computacionalmente o clculo de isovistas e campos de isovistas. Alm
de constituir os possveis pontos de visada, a malha serve para simplificar as
isovistas atravs de sua pixelizao sobre a malha. Assim, atributos como rea,
agrupamento (medida de convexidade), distncias mnima, mdia e mxima,
compacidade e relao rea permetro podem ser calculados em relao aos pontos
da malha, o que faz com que a preciso das medidas dependa do tamanho do
mdulo escolhido. Batty utiliza mapas e grficos para analisar as propriedades
geomtricas e estatsticas das isovistas no interior de um museu e em duas
amostras de parcelas urbanas, encontrando uma correlao entre variao da rea,
distncia mdia e permetro das isovistas. O estudo sugere ainda um mtodo para
a definio de um conjunto mnimo de isovistas que permita visualizar um
complexo espacial por inteiro e tambm a analisar a variao das isovistas ao longo
de um percurso. Como concluso, Batty afirma que as isovistas permitem ampliar a
descrio da morfologia espacial para aspectos de percepo e cognio espacial
ligados interao entre geometria e movimento.
Franz e Wiener (op. cit.) utilizam o modelo das isovistas para analisar a
influncia da morfologia e da configurao espacial no comportamento humano e
na experincia do espao. Partindo de experincias empricas envolvendo a
descrio do espao e a navegao em ambientes virtuais, o estudo correlaciona
caractersticas qualitativas bsicas do espao tais como amplitude, permeabilidade,
complexidade e ordem a atributos quantitativos simples de isovistas e grafos de
visibilidade (VGA). Stamps (op. cit.) utiliza isovistas para comparar diferentes
ambientes quanto ao seu fechamento. O autor conclui que essa propriedade do
espao, associada sensao de segurana e controle do indivduo, est tambm
relacionada a determinados atributos de isovistas.
20
Peponis et al (op. cit., 2004) utilizam isovistas e grafos de visibilidade
(VGA) em um modelo para anlise do efeito da montagem de exposies no
comportamento e definio de percursos em ambientes com planta livre, ou seja,
exposies cujo contedo est organizado em unidades conceituais que podem ser
visualizadas simultaneamente. O estudo est baseado na observao emprica do
comportamento dos visitantes na movimentao, aproximao aos objetos
expostos e contato efetivo com os mesmos, quando da interrupo do movimento.
O contedo exposto descrito quanto ao potencial de visualizao de cada objeto,
expresso pela rea de sua isovista, quanto sua relativa acessibilidade no espao
expositivo, descrita pela integrao visual (VGA) e quanto ao seu potencial de
visualizao simultnea, modelado com o uso de um grafo de visibilidade cruzada.
O estudo correlaciona a descrio espacial s diferentes formas de comportamento
observadas, permitindo analisar no apenas o modo como o movimento
influenciado pela disposio de obstculos e limites espaciais, mas tambm o modo
como o movimento propicia aspectos adicionais de informao visual, em especial
aqueles ligados ao arranjo conceitual da exposio.
Kaynar (op. cit.) tambm analisa o comportamento dos visitantes de
museus com planta livre, afirmando que a visibilidade influencia criticamente os
padres de escolha de percursos e interao com os objetos expostos. Os padres
de movimento e interao dos visitantes de um museu so comparados com sua
descrio atravs de isovistas, demonstrando que o nmero de visitantes em cada
sala diretamente proporcional ao tamanho da sala e ao nmero de objetos
expostos, mas o tempo de interao com os objetos expostos est relacionado a
isovistas mais irregulares, que indicam uma maior complexidade da informao
visual disponvel. Com relao escolha de percursos, o estudo conclui que a
abundncia de informao visual, indicada por isovistas de maior rea e com baixa
oclusividade, gera padres de movimento menos distribudos, enquanto isovistas
com maior oclusividade implicam em mudanas de direo, motivando um
movimento de explorao mais distribudo.
Meilinger et al (op. cit.) analisam a relao entre a representao mental
de caminhos, as caractersticas geomtricas das intersees desses, e o
comportamento humano observado em tarefas de navegao espacial em
ambientes virtuais. O estudo descreve as intersees entre os caminhos de um
ambiente virtual com o uso de isovistas parciais, correspondentes ao campo de
viso humano, que permitem identificar diferentes pontos de vista para um mesmo
local. Assim, as intersees so divididas em dois grupos: as intersees em forma
de T, e todas as demais. O desempenho observado inferior na chegada a
21
intersees em forma de T, tanto na tarefa de navegao, quanto em tarefas de
reconhecimento de locais e caminhos. J a passagem em linha reta por esse tipo de
interseo no prejudica o desempenho, o que foi atribudo a uma estratgia
padro de seguir em frente, sendo necessrio memorizar apenas as mudanas de
direo no percurso. Mesmo em locais com propriedades geomtricas e topolgicas
idnticas, o comportamento observado diferente para diferentes posies dos
usurios. Assim, Meilinger et al. concluem que existe uma correspondncia entre a
representao mental do ambiente e suas propriedades geomtricas, e que as
isovistas constituem uma poderosa ferramenta na identificao de caractersticas
espaciais relevantes ao comportamento humano.
Em resumo, a abordagem ecolgica da percepo uma teoria que
relaciona indivduo e ambiente atravs de uma srie de possibilidades ou
affordances, cuja identificao o objetivo maior do processo de percepo visual.
As possibilidades para a movimentao do usurio dependem da disposio das
superfcies no ambiente, que pode ser descrita atravs de isovistas. Caractersticas
qualitativas bsicas do espao como amplitude, permeabilidade, complexidade,
ordem e fechamento esto correlacionadas a atributos quantitativos simples de
isovistas e grafos de visibilidade (VGA). Na anlise de museus esses dois mtodos
vm sendo utilizados para modelar o potencial de visualizao e a acessibilidade
dos objetos expostos, bem como os padres de escolha de percursos e a interao
com os objetos expostos por parte dos visitantes. Isovistas permitem modelar no
apenas as propriedades geomtricas locais, relacionadas representao mental do
ambiente, mas tambm aspectos de percepo e cognio espacial, relacionados
interao entre geometria e movimento. De acordo com Gibson, a partir da
percepo da disposio das superfcies no ambiente, o observador identifica as
conexes entre diferentes locais. Atravs da locomoo, a abertura e o
ordenamento de vistas sucessivas permitem a compreenso da estrutura do
ambiente e a orientao do observador no espao.
1.3. Sintaxe espacial
Sintaxe espacial, teoria proposta por Hillier e Hanson (op. cit.) sobre a relao
entre sociedade e espao, est baseada em modelo que associa padres espaciais a
padres sociais. Na sintaxe espacial a sociedade, formada por uma coleo de
indivduos autnomos e mveis, um sistema discreto, no-contnuo, que pode ser
reconhecido atravs de suas manifestaes no espao-tempo, com nfase para a
relao entre morfologia local e padro global. Quando o sistema opera no modo
22
generativo, a evoluo da sociedade se d atravs de muitos encontros e poucas
regras de comportamento, o que permite o surgimento de novas relaes. Esse
modelo corresponde a um espao denso e integrado, e representa um sistema
probabilstico de produo social. Por outro lado quando o sistema opera no modo
conservativo, a manuteno da sociedade se d pela realizao de eventos
caracterizados por muitas regras estabelecidas. Esse modelo corresponde a um
espao disperso e segregado, e representa um sistema determinstico de
reproduo social. A sintaxe espacial assim um modelo que se refere a
comportamentos sociais, descritos atravs da relao entre sociedade e espao.
A sintaxe espacial utiliza um lxico reduzido de estruturas elementares,
que so objetos e relaes irredutveis, associado a determinados princpios
sintticos que combinam as estruturas elementares em sistemas coerentes de
maior complexidade. As relaes bsicas na sintaxe espacial so de visibilidade e
permeabilidade entre unidades espaciais mnimas, que podem ser eixos ou espaos,
convexos ou no. Relaes de permeabilidade representam a possibilidade de um
usurio se deslocar de uma unidade espacial para a outra; relaes de visibilidade
representam a possibilidade de se visualizar um espao ou parte de um espao a
partir de outro. Enquanto relaes bsicas podem ser estabelecidas entre apenas
duas unidades espaciais, relaes configuracionais requerem no mnimo trs
unidades espaciais, pois descrevem dois elementos em relao a um terceiro,
envolvendo as noes de simetria/assimetria e distribuio/no-distribuio.
O conceito de simetria envolve relaes equivalentes entre trs ou mais
elementos; o de assimetria envolve relaes no-equivalentes entre dois elementos
em face de um terceiro. Ambos os conceitos esto relacionados s noes de passo
sinttico e profundidade. O movimento atravs de sucessivas unidades discretas de
uma configurao espacial pode ser expresso em passos sintticos, que constituem
uma varivel topolgica. O menor percurso entre dois espaos, medido em passos
sintticos, representa a profundidade entre ambos. A assimetria ou profundidade de
complexos espaciais est relacionada definio de categorias espaciais, que por
sua vez podem estar relacionadas a diferentes comportamentos e categorias
sociais.
O conceito de distribuio envolve a pluralidade de relaes entre pares de
elementos, enquanto o de no-distribuio envolve a singularidade dessas. A noo
de distribuio est relacionada existncia de diferentes percursos em forma de
anel ligando pares de espaos. Assim, o sistema distribudo de uma configurao
espacial apresenta poucas possibilidades de controle espacial, facilitando o acesso
23
de estranhos ao local. J o sistema no-distribudo permite maiores possibilidades
de controle espacial, permitindo aos habitantes do complexo a superviso da
passagem de estranhos.
Figura 6 - relao de simetria entre a, b e c (1), assimetria entre a e c (2), distribuio
entre a e b (3) e no-distribuio entre b e c (4)
Hillier e Hanson (op. cit.) apresentam dois mtodos para anlise da relao
entre sociedade e espao: o modelo alpha, para espaos abertos contnuos, e o
modelo gamma, para a estrutura interna das edificaes. O modelo alpha descreve
assentamentos urbanos associando as categorias sociolgicas de habitantes e
estranhos s sucessivas interfaces estabelecidas por uma seqncia bipolar que vai
do local ao global. O domnio dos estranhos, que corresponde ao nvel mais global,
o espao contnuo e indefinido externo ao assentamento. J o domnio dos
habitantes, que corresponde ao nvel mais local do sistema, o espao interno
criado por algum limite artificial.
O modelo alpha baseia-se na diviso do espao aberto de assentamentos
urbanos em dois tipos de unidades espaciais: espaos convexos e eixos. O mtodo
consiste em dividir o espao aberto em espaos convexos, unidades espaciais em
que todos os pontos internos enxergam-se mutuamente, sendo que esses espaos
devem ser os maiores e em menor nmero possvel. A seguir so traados eixos
que cobrem todo o sistema, atravessando todos os espaos convexos, e que
estabelecem todas as ligaes entre os mesmos, sendo que os eixos devem ser os
mais longos e em menor nmero possvel. Espaos convexos correspondem maior
extenso local em duas dimenses, e esto relacionados ao movimento
probabilstico interno ao sistema. Eixos por sua vez correspondem mxima
extenso global e organizao com respeito ao grande entorno, estando
relacionados ao movimento externo de acesso e atravs do sistema. A partir da
representao em eixos e espaos convexos podem ser analisadas diversas
propriedades do sistema:
simetria: indica tendncia integrao de categorias sociais;
assimetria: indica tendncia segregao de categorias sociais;
distribuio: aponta tendncia difuso do controle espacial;
24
no-distribuio: indica tendncia ao aumento e concentrao do
controle espacial;
sincronia: descreve a quantidade de espao investido, ou a nfase dada a
cada unidade espacial dentro do sistema;
constituio: descreve as relaes de permeabilidade entre as unidades
espaciais e o interior das edificaes.
J o modelo gamma foi proposto para analisar a estrutura interna das
edificaes, pela associao das categorias sociolgicas de habitantes e visitantes
s categorias e formas de controle criadas pelos limites espaciais. Assim, o espao
interno das edificaes organiza a experincia espacial e a interface entre
habitantes e visitantes, representando no espao as idiossincrasias de determinada
cultura. Nessa situao o habitante um indivduo com direito ao acesso e controle
da categoria espacial criada por limites espaciais, e cuja existncia social est
relacionada ao conhecimento social incorporado ao espao que habita. O visitante
por sua vez o indivduo, pertencente ao grupo de estranhos a uma determinada
edificao, que temporariamente recebe direito de acesso a ela, mas no detm o
controle sobre aquele espao.
O modelo gamma consiste em analisar as propriedades sintticas de uma
configurao espacial levando em conta os rtulos associados a cada unidade
espacial. As unidades espaciais por sua vez correspondem s divises criadas pelos
prprios limites espaciais, sejam os espaos convexos ou no. No espao interno
das edificaes a interface entre habitantes e visitantes muito mais precisa do
que no espao urbano. Assim, a estrutura distribuda estabelece a relao entre
visitantes e habitantes, enquanto a estrutura no-distribuda relaciona os
habitantes entre si.
Tanto no modelo alpha quanto no gamma, a representao de uma
configurao espacial em um grafo justificado permite perceber algumas de suas
propriedades, bem como calcular suas medidas sintticas. Nessa forma de
representao, as unidades espaciais correspondem a ns, e as relaes de
permeabilidade ou visibilidade representam conexes entre os ns. Os grafos so
estruturados em nveis sobrepostos, correspondendo a sucessivos passos sintticos
(profundidade) a partir de um espao-raiz. Assim, grafos justificados em forma de
rvore correspondem a sistemas mais profundos, em que a maioria dos ns esto
afastados da raiz. J grafos em forma de arbusto correspondem a sistemas mais
rasos, em que a maior parte dos ns est prxima raiz. As medidas sintticas,
por sua vez, descrevem propriedades locais e globais, estticas e dinmicas de
25
complexos espaciais. Essas propriedades, que podem ser representadas em mapas
atravs de uma escala de cores, incluem atributos tais como:
conectividade: medida local esttica, representa a quantidade de
conexes diretas de um espao com seus vizinhos;
integrao: medida global esttica, representa a profundidade mdia de
um espao a todos os outros espaos de um sistema, ou seja, a sua
relativa assimetria; os espaos mais simtricos ou rasos de uma
configurao espacial so mais integrados; os espaos mais assimtricos
ou profundos so mais segregados;
controle: medida local dinmica, representa o quanto um espao controla
o acesso aos seus vizinhos imediatos, em funo do numero de conexes
que esses tm;
escolha global: medida global dinmica, representa o fluxo de movimento
atravs de um espao, ou seja, o grau de utilizao de um espao no
menor percurso entre todos os pares de espaos de um sistema.
As principais concluses de Hillier (op. cit.) a respeito da relao entre
sociedade e espao de so os conceitos de movimento natural e comunidade
virtual. Movimento natural o principal correlativo da configurao espacial,
sobretudo em sistemas urbanos. O principal determinante do movimento urbano,
tanto veicular quanto peatonal a configurao espacial. Considerando todas as
possibilidades de origem e destino e todos os espaos podendo ser igualmente
percorridos, o potencial de movimento de determinada unidade espacial est
correlacionado com sua medida sinttica de integrao, global ou local. J o
potencial de encontro entre pessoas um subproduto do movimento em um
sistema urbano. A comunidade virtual assim um sistema natural de co-presena e
conscincia recproca criado pela configurao espacial e realizado pelo movimento
das pessoas. A comunidade virtual , portanto, um produto do espao, com
determinada densidade e estrutura, que estabelece interfaces probabilsticas entre
diferentes categorias de usurios, precedendo e por vezes prescindindo a interao
real entre as pessoas.
Hillier et al (1996) demonstram a utilizao de tcnicas de sintaxe espacial
na anlise de museus em um estudo feito para a Galeria Tate, em Londres.
Correlacionando as medidas sintticas do museu com padres de movimento e uso
nela observados, concluem que a configurao espacial o principal determinante
do movimento dos visitantes, mais do que a sinalizao, as orientaes dos guias
ou a atrao de obras especficas. O complexo espacial, facilmente compreendido a
partir dos espaos de acesso, se caracteriza pelo equilbrio entre eixos curtos e
26
longos, esses ltimos formando um ncleo de integrao bastante inteligvel, que
interliga os demais circuitos de salas de exposio. Assim, a prpria disposio dos
espaos guia os visitantes, resultando numa cultura espacial informal e
agradvel. A anlise de uma dada proposta de remodelao do museu, por sua vez,
revela que a alterao da configurao espacial existente resultaria na substituio
desse modo informal por uma cultura de sinalizao que, por ser mais controlada e
guiada, terminaria por tornar a Tate um museu menos atraente para o pblico.
Huang (2001) utiliza o modelo sinttico para relacionar os conceitos sociais
que orientam a organizao de museus sua descrio espacial. A partir da reviso
da literatura a respeito de museus enquanto entidades sociais, o estudo extrai as
principais idias que determinam a forma espacial dos museus em diferentes
pocas e locais, procurando associar a espacializao dessas idias descrio
sinttica dos exemplares analisados. Os conceitos revisados so reunidos em duas
dimenses principais do museu moderno: o percurso e a congregao de visitantes.
O percurso, que garante a classificao e leitura do contedo dos museus, est
relacionado fora da seqncia, calculada como a proporo de espaos com
duas conexes do sistema. J a congregao de visitantes, que visa ao exerccio e
formao de relaes sociais, est relacionada profundidade do ncleo de
integrao a partir do acesso dos museus. O estudo conclui que a necessidade de
congregar as pessoas em oposio necessidade de organizar o movimento das
mesmas constitui um conflito na estrutura comum dos museus modernos,
sugerindo a anlise sinttica como ferramenta para repensar essa situao em
novas tipologias de museus.
Choi (1999), por sua vez, analisa a relao entre a configurao espacial e
os padres de uso de oito museus de arte, enquadrando-os em dois modelos:
determinstico e probabilstico. O modelo determinstico se caracteriza por definir a
seqncia de visitao e limitar os encontros entre usurios. J o modelo
probabilstico regula a explorao espacial e os padres de encontro de acordo com
determinadas propriedades sintticas. Choi analisa uma amostra de museus
utilizando mapas de espaos convexos, eixos e isovistas, e correlaciona as
propriedades sintticas ao movimento de pessoas observado in loco. O estudo
conclui que a montagem de exposies pode controlar e definir a experincia do
visitante sem necessariamente implicar em um sistema pedaggico rgido. Alm de
estruturar a explorao espacial e do contedo exposto, a configurao espacial
tambm pode modular os padres de co-presena e encontro entre os visitantes,
acrescentando um papel social funo didtico-pedaggica dos museus.
27
1.4. Inteligibilidade
Em paralelo aos estudos relacionando sociedade e espao, as tcnicas de sintaxe
espacial vm sendo largamente utilizadas para modelar aspectos de cognio
espacial, processo que culmina na compreenso da configurao espacial pelo
indivduo (Hart & Moore, op. cit.). Como a navegao atravs de qualquer
complexo espacial no pode depender unicamente da percepo visual direta,
relativamente localizada, necessria uma compreenso mais abstrata do modo
em que as partes locais esto relacionadas de modo global. Desse modo, a
inteligibilidade considerada como a correlao entre as caractersticas locais,
expressas pela medida de conectividade, com as caractersticas globais do sistema,
expressa pela medida de integraco. Peponis et al. (op. cit.) utilizam tcnicas de
sintaxe espacial em estudos empricos de navegao e orientao espacial em
hospitais, comparando o desempenho na escolha de percursos (wayfinding
performance) s propriedades sintticas da configurao espacial. A medida de
integrao do complexo espacial correlacionada aos padres de navegao
observados atravs de uma estrutura de busca, um modelo que relaciona as
propriedades inteligveis de complexos espaciais s seguintes regras de navegao:
continue na mesma direo, a menos que uma mudana de direo
permita a viso mais longe, de mais espao ou atividades;
quando em dvida, v para um espao altamente integrado;
percorra os setores inexplorados, os mais complexos e os visitados h
muito tempo antes de retornar aos j percorridos, aos mais simples e aos
visitados recentemente.
O estudo conclui que os padres de explorao de complexos espaciais
seguem fortemente a configurao espacial, de modo que a j referida correlao
entre configurao e movimento (movimento natural) e densidade de uso
(comunidade virtual) acrescida de uma dimenso cognitiva, dada pelo paralelo
entre padres de navegao e orientao e a integrao de complexos espaciais.
Na anlise de ambientes urbanos, estudos comprovam que a configurao
espacial afeta a cognio espacial dos moradores. Kim (op. cit.) compara as
propriedades sintticas de mapas axiais de parcelas urbanas s suas respectivas
representaes cognitivas mapas esquemticos de ruas, prdios e espaos abertos
feitos pelos moradores. A principal correlao encontrada da integrao local com
as propriedades sintticas globais e a freqncia de presena de elementos nos
mapas cognitivos. O estudo analisa parcelas urbanas com diferentes graus de
inteligibilidade, concluindo que a correlao entre configurao e cognio espacial
28
maior em sistemas mais inteligveis. Assim, as propriedades da configurao
espacial afetam positivamente a aquisio de conhecimento espacial, e o processo
de cognio espacial pode ser facilitado ou dificultado pela inteligibilidade da
configurao espacial. A inteligibilidade , portanto, no apenas uma caracterstica
fsica do ambiente, mas passa a constituir um aspecto do processo de cognio
espacial, relacionada a dois tipos de conhecimento espacial complementares:
conhecimento intuitivo do ambiente imediato, que pode ser percebido
localmente;
conhecimento potencial da estrutura global do ambiente, que deve ser
construdo gradualmente com a presena mais prolongada do usurio no
ambiente.
Da inteligibilidade de um complexo espacial depende tambm a sua
imageabilidade, conceito de Kevin Lynch que representa o potencial de uma cidade
ser reconhecida visualmente. Dalton e Bafna (op. cit.) relacionam elementos de
anlise sinttica como eixos e isovistas s cinco categorias de elementos das
teorias de Lynch, reunidos em dois grupos:
ns, vias e distritos, considerados elementos de primeira ordem,
estruturalmente distintos e relacionados topologicamente ao observador;
limites e marcos, considerados elementos de segunda ordem, visualmente
distintos e relacionados geometricamente ao observador.
Em um estudo de caso a ocorrncia dos elementos de Lynch em mapas
cognitivos comparada s propriedades sintticas do respectivo complexo espacial,
descrito por eixos e isovistas. Assim, o conceito de imageabilidade de Lynch
relacionado ao conceito de inteligibilidade da sintaxe espacial, quando as
caractersticas locais de um sistema permitem antever suas propriedades globais.
Dalton e Bafna concluem que a imageabilidade de uma cidade depende de sua
inteligibilidade, mas que uma cidade inteligvel no precisa necessariamente ser
reconhecida visualmente com maior facilidade.
Em sistemas mais inteligveis, ou seja, aqueles em que os espaos mais
integrados so tambm os mais conectados, a correlao entre integrao espacial
e movimento maior. Apesar de a sintaxe espacial correlacionar com sucesso o
movimento de pessoas configurao espacial, a teoria no inclui nenhuma
representao explcita da cognio individual ou da motivao pessoal envolvidas
no uso do espao. Entretanto Penn (op. cit.) afirma que boa parte desses aspectos
exosomtica, ou seja, no esto no indivduo, mas no prprio ambiente, pelo que
estariam implcitos na teoria da sintaxe espacial. O espao cognoscvel complexo,
29
que deve ser apreendido para alm da viso local, um espao topolgico, no
mtrico. Por isso a correlao mais frequentemente encontrada entre medidas
sintticas do espao e fluxo observado de pessoas se d atravs do mapa axial.
Com destaque para a medida da integrao, o mapa axial descreve as relaes
topolgicas entre diferentes eixos ou direes de deslocamento, aspectos por sua
vez presentes nos comportamentos de explorao e orientao espacial.
Dalton (op. cit.) utiliza a imerso em ambientes virtuais na anlise do
comportamento humano em atividades de navegao. O autor desenvolve um
modelo baseado na tomada de decises ao longo do percurso, sendo esse ltimo
representado como a soma das mudanas de direo em sucessivas bifurcaes e
junes. Os indivduos tendem a desenvolver um percurso o mais linear possvel,
minimizando o desvio angular, desde que a direo da trajetria coincida com a
direo do destino em questo. Alm de tornar o percurso menos complexo,
portanto mais compreensvel, quanto menos mudanas de direo o indivduo fizer,
menor lhe parecer a distncia percorrida. Esse comportamento observado por
Dalton confirma a hiptese de Hillier de que as pessoas se movimentam ao longo
de eixos, procurando maximizar suas linhas de visada, o que corrobora o sucesso
de mapas axiais em correlacionar o movimento humano s propriedades da
configurao espacial.
Brsamle e Hlscher (op. cit.) tambm investigam a influncia da
inteligibilidade no movimento exploratrio a na compreenso de configuraes
espaciais sob o ponto de vista do indivduo. Para isso, comparam o desempenho de
seres humanos e agentes navegando em dois ambientes virtuais, um com alta
inteligibilidade e outro com baixa inteligibilidade, caracterizadas pela correlao
entre a conectividade e integrao dos sistemas descritos por mapas axiais.
Concluem que o desempenho das pessoas est menos correlacionado com as
propriedades sintticas das linhas axiais do que o desempenho de agentes com
movimento aleatrio. O comportamento das pessoas ainda marcado pela
capacidade de identificar os eixos conceitualmente mais importantes do sistema,
preferindo percorrer os eixos mais longos e integrados e evitando os eixos menores
e mais segregados.
Yun e Kim (op. cit.) por sua vez destacam a influncia de mudanas de
direo e da distncia mtrica na cognio espacial. Comparam a descrio
sinttica de um campus universitrio com mapas cognitivos feitos por usurios com
diferentes tempos de experincia do espao analisado. Nos mapas cognitivos
analisam a disposio de caminhos, prdios, seus acessos e seus nomes e a
30
distncia dos mesmos ao eixo principal, de maior integrao e que organiza todo o
complexo. A freqncia de ocorrncia de cada prdio nos mapas cognitivos
correlacionada integrao global do mapa axial, s mudanas de direo
(profundidade no mapa axial) e distncia mtrica do acesso dos prdios ao eixo
principal. O estudo conclui que tanto a profundidade quanto a distncia mtrica
influenciam no processo cognitivo, com predomnio daquela sobre essa. A descrio
mental do espao organizada a partir de um elemento central, sendo ampliada
medida que o conhecimento aumenta com o uso recorrente de determinado
complexo espacial.
1.5. Grafos de Visibilidade
Apesar de largamente utilizados em estudos tanto de parcelas urbanas quanto de
edificaes, a validade dos mtodos alpha e gamma tambm questionada, pois
em ambos os mtodos a diviso em unidades espaciais discretas no absoluta. A
diviso de um complexo espacial no menor nmero das maiores unidades possveis
pode variar em funo do ponto de vista do pesquisador. Em funo disso, Hillier
(op. cit.) apresenta um novo mtodo para anlise de configuraes espaciais,
denominado mapa de todas as linhas (all-line map). O mtodo consiste na
descrio do espao atravs de eixos ligando todos os vrtices mutuamente visveis
de determinado complexo espacial. Com o mapa axial de todas as linhas so
calculadas as medidas sintticas a exemplo dos modelos alpha e gamma. O
mapa de todas as linhas pode ainda ser reduzido a um conjunto mnimo de linhas
que descrevam a mesma configurao, denominado mapa de mnimas linhas
(fewest line map). Alm de poder ser executado automaticamente, o modelo all-
line tem a vantagem de permitir a anlise de espaos internos fluidos, cuja diviso
em unidades espaciais discretas no evidente. Ainda assim, o resultado no
mtodo all-line pode variar em funo da quantidade de vrtices que a envoltria
espacial apresentar.
Turner et al (op. cit.), por sua vez, desenvolvem uma outra tcnica para a
gerao automtica de mapas sintticos. Partindo do conceito de campos de
isovistas, prope a anlise de um grafo das posies mutuamente visveis de um
complexo espacial. Os possveis pontos de ocupao do complexo espacial sobre
uma malha regular prxima da escala humana so considerados os ns do grafo, e
suas conexes representam as relaes de visibilidade ou permeabilidade entre os
ns. Atravs da anlise desse grafo de visibilidade (visibility graph analysis VGA)
podem ser medidas propriedades espaciais locais e globais. O tamanho da
31
vizinhana (neighbourhood size) uma medida local que descreve a quantidade de
ns visveis a partir de cada ponto da malha, o que tambm corresponde rea de
sua isovista. O coeficiente de agrupamento (clustering coeficcient) uma medida
local que descreve a visibilidade entre os vizinhos de um determinado ponto, de
acordo com a convexidade da isovista naquele ponto. Considerando o movimento
do observador, o coeficiente de agrupamento se refere variao na quantidade de
informao visual disponvel entre posies vizinhas. Na movimentao entre
posies vizinhas com elevado coeficiente de agrupamento ocorre pouca variao
no campo visual, j na movimentao entre posies com baixo coeficiente de
agrupamento a informao visual disponvel se altera significativamente. Desse
modo, o coeficiente de agrupamento est relacionado tomada de decises nos
comportamentos humanos de navegao e orientao espacial, indicando pontos de
tomada de deciso em rtulas e bifurcaes de complexos espaciais. J a menor
distncia mdia (mean shortest path lenght) uma medida global que indica a
menor quantidade de passos visuais de um ponto do complexo para todos os
outros, correspondendo integrao visual do sistema. Na medida em que
relacionam todas as posies potenciais de ocupao de um complexo espacial, as
medidas do grafo de visibilidade esto ainda relacionadas ao potencial de co-
presena e interao entre diferentes usurios de um mesmo espao.
Figura 7 - exemplo de um grafo de visibilidade, destacando em preto as conexes de um
dos pontos, cuja isovista aparece em cinza
Desyllas e Duxbury (op. cit.) comparam as propriedades do grafo de
visibilidade (VGA) de parcelas urbanas s respectivas descries baseadas em
mapas axiais. O estudo conclui que a visibilidade descrita pela conectividade-VGA
est mais bem correlacionada ao movimento observado do que qualquer um dos
descritores sintticos baseados no mapa axial. Alm disso, enquanto no mapa axial
32
a correlao das propriedades sintticas deve ser feita com a mdia do fluxo ao
longo de todo um eixo, o mtodo VGA permite uma comparao muito mais exata,
por descrever a configurao espacial ponto a ponto.
Doxa (op. cit.) demonstra a utilizao do mtodo VGA para investigar a
relao entre os padres de co-presena, o uso e a configurao de espaos
internos com planta livre. O estudo analisa os sagues de edifcios pblicos
destinados exibio de espetculos, descrevendo suas propriedades morfolgicas
atravs da anlise de grafos de visibilidade (VGA), com destaque para os seguintes
atributos:
conectividade: tamanho da vizinhana de cada ponto, equivalente ao seu
campo de viso ou isovista;
profundidade do ponto (point depth): o nmero de mudanas de direo
para um usurio se deslocar entre dois pontos da malha;
integrao: derivada da menor distncia mdia de um n a todos os
outros pontos do sistema;
coeficiente de agrupamento: grau de inter-visibilidade entre os vizinhos
de cada ponto;
tamanho de grupo (clique size): maior grupo convexo de pontos da
vizinhana de um n em que o mesmo faa parte;
profundidade configuracional (configurational depth): profundidade do
ncleo de integrao visual ou profundidade do acesso.
O estudo correlaciona as medidas sintticas aos padres de uso do espao,
de acordo com a movimentao de pessoas observada in loco. O trajeto dos
usurios registrado a partir dos acessos, bem como a posio relativa dos
mesmos entre si em diversos momentos, sendo os padres de uso analisados com
base nas das seguintes propriedades:
conscincia mtua (co-awareness): medida como o nmero de relaes
visuais formadas entre pessoas a cada instante;
co-presena (co-presence): nmero de pessoas diretamente acessveis a
partir do ponto em que o usurio se encontra;
relaes convexas (convexity relations): calculadas como o nmero de
ocupantes da vizinhana de um usurio que forma um grupo convexo.
Doxa conclui que a integrao visual est correlacionada ao padro de co-
presena dos visitantes, cuja percepo a partir dos acessos influenciada pela
relativa integrao ou segregao dos mesmos. Alm disso, a morfologia espacial e
33
a distribuio das atividades podem modular os padres de uso do espao e ainda
gerar diferentes modos de socializao e transmisso da cultura.
1.6. Agentes
Outra aplicao dos grafos de visibilidade na simulao do movimento humano
com o uso de agentes computacionais. Turner e Penn (op. cit.) desenvolvem um
modelo comportamental com regras de movimento baseadas na teoria ecolgica de
Gibson, em que o movimento dos agentes guiado pela percepo direta das
propriedades do ambiente. Utilizando o conceito de affordances, o modelo,
denominado exosomatic visual architecture (EVA), estabelece a relao entre
agentes computacionais e um ambiente virtual, procurando reproduzir o movimento
de pessoas observado em situaes reais. Como os agentes no enxergam
literalmente, eles so previamente informados das possibilidades de movimentao
atravs de uma lista de todas as posies mutuamente visveis do ambiente (VGA).
O modelo permite o ajuste de parmetros tais como a escolha de destinos, o campo
de viso dos agentes e a distncia percorrida entre os pontos de tomada de
deciso. Assim o modelo EVA baseia-se apenas na configurao espacial do
ambiente, descrita pelo grafo de visibilidade, simulando o movimento natural
proposto pela sintaxe espacial, porm sem levar em conta a cognio dos caminhos
percorridos, nem as origens e destinos dos agentes.
Contudo Penn e Turner (op. cit.) afirmam que o fato dos agentes terem
acesso ao grafo de visibilidade do espao no apenas estabelece seu modo de
viso, mas tambm lhes confere uma forma de memria ou cognio. Isso porque
o grafo de visibilidade oferece, alm da informao local a respeito das
possibilidades de deslocamento, informaes globais a respeito de todo o complexo.
O movimento dos agentes pode ser programado por regras simples com sucessivos
passos aleatrios, prescindindo de regras mais complexas baseadas em sistemas de
origem-destino. A regra aleatria permite aos agentes, por exemplo, circular ao
longo de corredores quando a maior parte do espao estiver frente de si, o que
est de acordo com o movimento humano real naquele tipo de espao. Os destinos
subseqentes so escolhidos entre todas as possibilidades visveis a partir do ponto
onde se est independentemente da distncia em que se encontrem, e as decises
so revistas continuamente ao longo do trajeto. Com isso Penn e Turner (op. cit.)
concluem que os efeitos da configurao espacial sobre o movimento de pessoas,
largamente observado pelos estudos de sintaxe espacial, so consistentes com um
modelo de deciso individual baseado nas affordances espaciais presentes na
34
morfologia do campo visual local. Essas possibilidades dependem do local e da
orientao em questo, pois um mesmo ambiente oferece diferentes possibilidades
a partir de diferentes pontos de vista. As decises de pessoas em movimento a
respeito dos prximos passos so tomadas com base na viso de possibilidades de
percurso a longa distncia. Por isso a configurao espacial influencia o movimento
humano com base em seu arranjo linear, gerando e organizando padres lineares
de movimento ao longo de suas maiores dimenses, o que justifica o sucesso
emprico do mapa axial em explicar os padres de movimentao humana.
Apesar da grande quantidade de estudos de sintaxe espacial voltados para
a relao entre indivduo e ambiente, Turner (2007) identifica a falta de uma
ligao formal entre a linha axial, utilizada na descrio de configuraes espaciais,
e o indivduo. Em funo disso, Turner prope um novo modelo que visa a
relacionar de modo mais consistente os modelos de agentes orientados pela viso
s anlises topolgicas baseadas em mapas axiais. Baseado em grafos de
visibilidade (VGA), o modelo transforma as linhas de intervisibilidade entre todos os
pontos em pixels, ou seja, fragmentada as mesmas em seqncias de pontos que
passam a constituir linhas de viso atravs. Considerando-se a contribuio de
todas as linhas para cada ponto da malha elaborado um mapa de viso atravs
(trough vision). Em diversas situaes de estudo so encontradas boas correlaes
entre os valores do mapa de viso atravs e o movimento de agentes, sugerindo a
utilizao das linhas de viso atravs para a elaborao de mapas axiais. Esses,
por sua vez, poderiam ser reduzidos a mapas de linhas mnimas, a exemplo do
procedimento aplicado aos mapas de todas as linhas (all-line map).
Turner (op. cit., 2003) justifica o uso de agentes para analisar a relao
entre usurio e espao porque o modelo com agentes, assim como o modelo
ecolgico, permite excluir do modelo tanto variveis sociais quanto experincias
individuais que poderiam afetar a validade da hiptese apresentada. O modelo com
agentes estabelece a relao entre ambiente e homem como possibilidades que o
primeiro oferece ao segundo (affordances), nesse caso a viso e a possibilidade de
locomoo, permitindo simular tarefas de explorao espacial. Turner (op. cit.,
2003) utiliza o modelo tambm em estudos do movimento humano em ambientes
urbanos. Com base em experincias anteriores, os agentes so programados para
se movimentarem para posies potenciais informadas por um grafo de visibilidade,
re-selecionando seu destino a cada trs passos em um campo de viso de
aproximadamente 170. Turner compara o movimento dos agentes com o
movimento real de pessoas observado em uma determinada parcela urbana, e
tambm com as propriedades sintticas da mesma, descrita atravs de eixos,
35
grafos de visibilidade (VGA) e isovistas. Enquanto o movimento observado de
pessoas est bem correlacionado ao movimento dos agentes e descrio sinttica
atravs de eixos, a correlao daquele com a integrao visual (VGA) e com a rea
das isovistas muito inferior. O estudo tambm compara o movimento dos agentes
s propriedades sintticas, encontrando-se uma boa correlao com a integrao
axial. Como o movimento dos agentes direcional, apesar de aleatrio, e as
posies subseqentes so escolhidas a partir de um campo de viso frontal, a
correlao encontrada se deve ao aspecto dinmico que subjaz a medida de
integrao axial. Turner conclui que tanto a integrao axial quanto o uso de
agentes permitem modelar com sucesso o movimento humano no espao, pois
ambos os mtodos relacionam a dinmica visual do movimento direcional com as
propriedades configuracionais do ambiente.
Em resumo, a sintaxe espacial permite descrever as propriedades locais e
globais de sistemas espaciais, expressas atravs de sua configurao espacial, e
tambm avaliar a inteligibilidade do sistema, expressa pela relao entre essas
propriedades. A inteligibilidade influencia o movimento exploratrio humano, a
compreenso e o reconhecimento de configuraes espaciais, sendo a correlao
entre integrao espacial e movimento maior em sistemas mais inteligveis. Assim,
a inteligibilidade constitui no apenas uma caracterstica fsica do ambiente, mas
tambm um aspecto da cognio espacial, processo que culmina na compreenso
da configurao espacial. Considerada o principal determinante do movimento
peatonal e veicular urbano, a configurao espacial est tambm relacionada ao
movimento dos visitantes em museus, podendo articular de modo determinstico ou
probabilstico os padres de co-presena e encontro entre os usurios. As
propriedades globais e locais de determinado complexo espacial podem ser
analisadas atravs de mapas axiais, de mapas convexos, e de grafos de visibilidade
(VGA). Esses ltimos so tambm utilizados em modelos baseados em affordances
com agentes computacionais. O movimento humano no espao tem sido modelado
com sucesso com o uso de mapas axiais e agentes, pois ambos os mtodos
relacionam a dinmica visual do movimento direcional com as propriedades
configuracionais do ambiente.
1.7. Paulo Mendes da Rocha e a Pinacoteca
O projeto de reformulao da Pinacoteca do Estado de So Paulo tem especial
relevncia na trajetria profissional de Paulo Mendes da Rocha, que se formou em
1954, em So Paulo, na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade
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Mackenzie. O incio de sua atuao foi marcado pela vitria em concursos nacionais
de arquitetura. O arquiteto atua em parceria com diversos profissionais e
escritrios, alm de ter lecionado na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade de So Paulo. Recebeu diversos prmios, com destaque para o
Pritzker de 2006 e o Prmio Mies van der Rohe para a Amrica Latina, recebido em
2001 pelo projeto de reforma da Pinacoteca do Estado de So Paulo. Segue uma
relao cronolgica das principais obras de Paulo Mendes da Rocha, com destaque
para os projetos de museus, espaos de exibio e montagens de exposies.
Palcio da Assemblia Legislativa do Estado de Santa Catarina, projeto
vencedor de concurso nacional (Florianpolis, 1957);
Ginsio, piscina e praa de esportes do Clube Atltico Paulistano (So
Paulo, 1957/1958);
Fru