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Rio de Janeiro, 29 de julho de 2016. Á Sua Excelência o Senhor Dr. Felipe Sarmento Presidente da Coordenação Nacional do Exame de Ordem Unificado Secretário Geral do Conselho Federal da OAB Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil SAUS Qd. 05 Lt. 01 Bl. “M” Brasília-DF CEP: 70070-939 Assunto: Esclarecimentos sobre Petição Pública dos examinandos da disciplina de Direito Civil do XIX Exame de Ordem, ocorrido no dia 29.05.2016. Prezado Senhor, Na oportunidade em que temos a honra de cumprimentá-lo, acusamos o recebimento da Petição Pública em referência, motivo pelo qual Vossa Excelência solicita o envio de esclarecimentos, tudo relativo ao XIX Exame de Ordem Unificado. Primeiramente, no que diz respeito às respostas técnicas aos questionamentos judiciais, gostaríamos de reforçar o nosso compromisso de colaborar com esse Conselho na elucidação de todas as demandas judiciais que se apresentarem. No caso, como se verá, não houve inadequação da resposta. Como se pode ver, tem-se pleito de alteração do gabarito ou invalidação da 1ª (primeira) questão da prova prático-profissional de Direito Civil, que corresponde à peça processual a ser feita. As alegações postas dirigem-se ao enquadramento jurídico dado pela Banca Examinadora – responsabilidade pelo fato do produto e por vício do produto – e as consequências daí advindas – responsabilidade, prazo e solidariedade –, haja vista existir controvérsia jurídica sobre o tema. Esta a irresignação, que bem analisada, não procede, mesmo que se tenha a pré-falada controvérsia jurídica no âmbito do enquadramento do direito. Isto porque, para o caso, mesmo que exista tal controvérsia, apenas a linha de raciocínio desenvolvida no gabarito é possível. Tal se dá na medida em que o examinando é procurado para defender os interesses do cliente em grau de recurso. Ou seja, deverá defender a ocorrência de solidariedade, a acarretar a legitimidade passiva do produtor do bem, bem como do fornecedor do bem (tido por vendedor); a não ocorrência tanto da prescrição quanto de eventual decadência; e a necessidade de a reparação ser ampla. Logo, não se poderia admitir a cisão de teses, de tal sorte que, em sede de recurso, ou se admitiria uma parte da pretensão ou outra parte. Aqui, o examinando tinha que desenvolver a tese – orientação jurídica – que garantisse o êxito total da pretensão. Se há fundamento para o acolhimento integral da pretensão, não pode o examinando deixar de demonstrar tal conhecimento, postulando uma reforma apenas parcial da sentença.
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Aliás, cabe ver, como mostra a Banca de Direito Civil, que a tese hoje predominantemente no STJ, e defendida por doutrinadores de renome, é a preconizada no gabarito, e única para a defesa da pretensão do cliente que procura o examinando. Portanto, não houve erro ou equívoco no gabarito. Em virtude disso, a Banca de Direito Civil, no que concerne à resposta aos questionamentos, manifestou-se de acordo com o exposto em anexo a esta carta. Sendo o que tínhamos para o momento, colocamo-nos à disposição de Vossa Excelência para eventuais esclarecimentos que se façam necessários e firmamo-nos,
Respeitosamente,
FGV PROJETOS
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PARECER DA BANCA DE DIREITO CIVIL
“Requerem os examinandos a desconsideração dos itens 1 e 2 da Fundamentação
Jurídico/Legal, bem como do item 3 do Formular Corretamente os Pedidos do padrão
de resposta da Peça Prático-Profissional, e em consequência a atribuição da
respectiva pontuação a todos os examinandos.
Tais itens referem-se à solidariedade e à inclusão do comerciante no polo passivo da
ação proposta pelo autor consumidor Antonio Augusto em face do fabricante Max TV
S.A. e a loja comerciante Lojas Eletrodomésticos Ltda., requerendo:
a) A substituição do televisor por outro do mesmo modelo ou superior, em perfeito
estado;
b) Indenização de aproximadamente R$ 35.000,00 correspondentes ao valor dos
aparelhos danificados;
c) Indenização por danos morais, em virtude da situação não ter sido solucionada
em tempo razoável, razão pela qual a família ficou, durante algum tempo, sem
usar a TV.
Alegam, em suma, que “pela doutrina majoritária, entende-se que o presente caso
trata-se de fato de produto, entendido como o defeito que extrapola a esfera da coisa
ou do serviço prestado e atinge a incolumidade física ou psíquica da pessoa e gera um
dano (material ou moral) passível de reparação”, sendo que “vício do produto causa
inadequação (televisão que não liga) e o fato do produto gera insegurança (televisão
que explode)”.
Tratando-se de fato do produto, então i) “o gabarito estaria incorreto em relação à
solidariedade dos fornecedores”, considerando a dicção do art. 18 do CDC, e “a
exclusão da loja do polo passivo seria devida, já que por se tratar de fato, aplica-se o
art. 12 do CDC”, sendo “a responsabilidade integral do fabricante”; ii) “inaplicável
também o art. 26, § 2º, I, do CDC, pois o fato do produto se sujeita a regra
prescricional quinquenal, não decadencial”, sujeitando-se ao art. 27 do CDC.
Afirmam ainda que “supondo que se trata de vício de produto, o gabarito também
apresentará problemas”, isso porque passa a estar correto em relação à aplicação do
art. 18 do CDC, porém, a situação sujeita-se ao prazo decadencial do art. 26, II, CDC,
que “se contaria somente a partir da negativa da loja, que nunca aconteceu”.
Concluem que o entendimento da banca “trata-se de impossibilidade jurídica, uma vez
que não seria possível num mesmo evento danoso, tanto vício quanto defeito do
produto”.
Pois bem.
O Superior Tribunal de Justiça já deixou claro em inúmeros julgados que em um
mesmo evento pode restar caracterizado tanto vício do produto, quanto fato do
produto. Veja-se:
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“Direito do Consumidor. Ação de indenização por danos materiais e morais
decorrentes de vícios no serviço. Prescrição. Cinco anos. Incidência do art. 27 do
CDC. 1. Escoado o prazo decadencial de 90 (noventa) dias previsto no art. 26, II,
do CDC, não poderá o consumidor exigir do fornecedor do serviço as
providências previstas no art. 20 do mesmo Diploma - reexecução do serviço,
restituição da quantia paga ou o abatimento proporcional do preço -, porém, a
pretensão de indenização dos danos por ele experimentados pode ser ajuizada
durante o prazo prescricional de 5 (cinco) anos, porquanto rege a hipótese o art.
27 do CDC. 2. Recurso especial conhecido e provido.” (REsp 683.809/RS, Rel.
Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 20/04/2010, DJe 03/05/2010)
“(...) ajuizaram ação de indenização contra Scooter Veículos Ltda., objetivando a
substituição ou o conserto do veículo adquirido da ré, bem como a reparação pelos
danos materiais e morais. (...) No mais, o julgador monocrático decidiu
acertadamente que "a decadência acima reconhecida somente atinge parte da
pretensão dos autores, ou seja, aquela estritamente vinculada ao vício
apresentado no bem (condenação em promover os consertos, em entregar novo
termo de garantia, de abater o valor do veículo - fls. 09), nada influindo na
reparação pelos danos materiais e morais pretendida na petição inicial" (fl. 22). A
pretensão referente à reparação pelos danos materiais e morais prescreve em
cinco anos, nos termos do artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor. Nego,
por isso, provimento ao agravo.” (Agravo de Instrumento nº 763.423 – RJ, Relator
Ministro Ari Pargendler, 30/06/2006)
“Tal qual o julgado colacionado na monocrática de fls. 222/223, o Tribunal de origem
(fls. 126-131 e 161-165) reconhece a possibilidade do processamento da pretensão
indenizatória por danos ajuizada pela agravada MARA GISELE DOS SANTOS DE
SOUZA, não havendo que se falar em decadência, como quer defender a recorrente.
No caso, a decadência reconhecida somente atinge parte da pretensão autoral,
nada influindo na reparação pelos danos materiais e morais pretendidos - art. 27
do CDC. (...) Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao presente agravo regimental.
(...) A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos
do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Massami
Uyeda (Presidente), Sidnei Beneti e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr.
Ministro Relator. ” (AgRg no Ag 1013943/RJ, Rel. Ministro Vasco Della Giustina
(Desembargador convocado do TJRS), Terceira Turma, julgado em 21/09/2010, DJe
30/09/2010)
A título de exemplo, veja-se o REsp 1.488.239, de relatoria do Min. Ricardo Villas
Bôas Cueva, julgado em 1° de março de 2016 por unanimidade pela Terceira
Turma. De início, destaca o relator a diferenciação entre vício do produto, de que trata
o art. 27, e vício de fácil constatação, disciplinado pelo art. 26, II, CDC, colacionando
acórdão de relatoria da Min. Nancy Andrighi muito semelhante ao trazido à baila pelos
peticionários.
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Em seguida, conclui que no caso julgado o vício “é de fácil constatação” e que,
“mesmo já tendo identificado o vício, não ficou comprovado que os autores teriam
tomado qualquer providência junto à empresa contratada para retificá-lo” e
acertadamente conclui que “aplica-se ao caso em apreço o prazo decadencial
estabelecido no art. 26, II, do CDC”, citando diversos precedentes da Corte nesse
sentido.
Após, assevera que “quanto ao pedido de condenação da ré em danos morais, não há
reparo a fazer no aresto de origem”, pois “a pretensão indenizatória pelos danos
morais experimentados pelo consumidor obedece ao prazo prescricional quinquenal
do art. 27 do mesmo Código”.
Corrobora o entendimento da jurisprudência acima identificada, a doutrina do Ministro
Paulo de Tarso Sanseverino que ensina que "apesar de esses dois elementos (defeito
e vicio) apresentarem regimes jurídicos distintos no próprio CDC, não há dicotomia
absoluta. O mesmo fato pode enquadra-se simultaneamente nos dois regimes. Ao
mesmo tempo que se apresenta viciado, o produto ou serviço pôde-se mostrar
defeituoso. Exemplo desta situação tem-se no caso de automóvel que, por apresentar
deficiência no sistema de freios, envolve-se em um acidente, causando lesões a seus
ocupantes. Nesta hipótese, é possível a utilização simultânea das pretensões
concedidas pelos dois regimes jurídicos, inclusive no mesmo processo" (Sanseverino,
Paulo de Tarso. Responsabilidade civil no Código de Defesa do Consumidor. São
Paulo: Saraiva, 2 edição, 2007, p. 166).
Em suma: o mesmo vício pode suscitar pretensões autorais distintas. Assim, no caso
tratado na Peça Prático-Profissional, o pedido (a) do consumidor Antonio Augusto, de
substituição do televisor por vício de produto, sujeitou-se ao prazo decadencial do art.
26, II, do CDC, e os pedidos (b) e (c), de indenização pelo fato do produto, ao prazo
prescricional do art. 27 do CDC.
A responsabilidade solidária do comerciante, a Loja de Eletrodomésticos Ltda., quanto
ao pedido (a), de substituição, está prevista no art. 18 do CDC: “Art. 18. Os
fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem
solidariamente...” c/c art. 3° do CDC: “Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou
jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes
despersonalizados, que desenvolvem atividade de (...) comercialização de produtos ou
prestação de serviços”. Neste sentido, sustenta Paulo Luiz Neto Lôbo a prevalência
da solidariedade passiva de todos aqueles que tenham participado da cadeia
produtiva, concluindo que "é da natureza da responsabilidade solidária que a ação
proposta pelo consumidor contra um dos fornecedores (p. ex., o comerciante) não o
inibe de acionar outro (p.ex., o fabricante) (Neto Lôbo, Paulo Luiz. Responsabilidade
por vícios nas relações de consumo. Revista Direito do Consumidor, nº ¨, abril/junho
de 1993. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 40). De maneira semelhante, o
posicionamento de Cláudia Lima Marques para quem: "O CDC adota (...) uma
imputação, ou, atribuição objetiva, pois todos são responsáveis solidários,
responsáveis (...) por seu descumprimento do dever de qualidade, ao ajudar na
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introdução do bem viciado no mercado. A legitimação passiva se amplia com a
responsabilidade solidária e com um dever de qualidade que ultrapassa os limites do
vínculo contratual consumidor-fornecedor direto". Conclui a autora que "no sistema do
CDC, a escolha de qual dos fornecedores solidários será sujeito passivo da
reclamação do consumidor cabe a este último. Normalmente, o consumidor preferirá
reclamar do comerciante mais próximo a ele, mais conhecido, parceiro contratual
identificado, mas o fabricante, muitas vezes o único que possui o conhecimento
técnico pra suprir a falha no produto, será eventualmente demandado a sanar o vício".
(Marques, Claudia Lima. Código de Defesa do Consumidor comentado. 4 edição,
2013, São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 566). Ainda, segundo Antonio Herman
Benjamim, "a responsabilidade solidária é, sem dúvida, decorrência do direito básico
de "efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais", previsto no art. 6º,
VI, do CDC. De fato, muitas vezes a "efetiva reparação" só é possível em virtude da
existência de pluralidade de responsáveis". (Benjamim, Antonio V. Herman et al.
Manual de Direito do Consumidor, 4ª edição, São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 191)
O requerimento de inclusão do comerciante no polo passivo referia-se,
conforme explicitado no gabarito da banca, ao pedido (a) somente, e deveria ter
sido deduzido na apelação, já que a sentença de primeiro grau interpretou
erroneamente os pedidos autorais ao excluir a loja do polo passivo com fundamento
nos arts. 12 e 13, olvidando que a responsabilidade solidária subsiste, por força do art.
18, em relação ao pedido autoral de substituição.”
CAITLIN MULHOLLAND BANCA DE DIREITO CIVIL
João Pessoa, 26 de julho de 2016
PARECER CONSULTIVO: considerações sobre o abaixo assinado direcionado aos
coordenadores da Banca elaboradora do XIX EOU solicitando a desconsideração de itens
constantes do gabarito e consequente atribuição da pontuação pertinente a todos os
examinandos.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Trata de consulta resultande de manifestações públicas relacionadas à peça
do exame prático-profissional da área de Direito Civil objeto do XIX EOU. Embora toda
manifestação seja interessante, nem toda ele é acertada. No caso em espécie, notoriamente
se equivocam os peticionantes em diversos aspectos. Senão vejamos:
1. DA PROTEÇÃO INTEGRAL DO CONSUMIDOR
Embora a legislação tenha dois sistemas de responsabilidade derivados da
inadequação de introdução de produtos e serviços no mercado, quer pelo vício, quer pelo
fato, ambos estão intimamente ligados, permitindo, isto sim, a sua conjugação. A esfera
consumerista não é distinta das demais, o que leva necessariamente a conclusão de que
um ilícito penal também o seja na esfera cível, na tributária, na administrativa, etc.
Neste sentido, observe-se que o sistema de proteção integral do consumidor,
baseado no artigo 7° do CDC deverá ser observado antes de mais nada. Se bem é possível
enquadrar o caso proposto em fato do produto, a repartição da responsabilidade e o
primeiro pedido formulado permite sim que alternativamente o consumidor opte por
chamar como réu o comerciante para a reposição do produto perdido em virtude do evento
danoso.
Interessante é observar as inumeráveis decisões do STJ que taxativamente
vedam a denunciação à lide que tenham por objetivo eludir responsabilidade e derivá-la
a terceiro.
É mais, em sede de Resp já decidio o STJ e tratou da aplicabilidade do artigo
7º em casos de acidente de consumo. Senão vejamos:
[...]
Nas obrigações de indenizar decorrentes de acidentes de
consumo, todos os responsáveis são solidariamente responsáveis
pelos danos sofridos pelo consumidor, podendo ser demandados
individual ou coletivamente, conforme a opção da vítima, nos
termos do art. 7 o , § único, e do artigo 25, § 1 o , do CDC, verbis:
Art. 7 o , § único, do CDC: “Tendo mais de um autor a ofensa,
todos responderão solidariamente pelos danos previstos nas
normas de consumo.”.
Art. 25, § 1 o , do CDC: “Havendo mais de um responsável pela
causação do dano, todos responderão solidariamente pela
reparação prevista nesta e nas Seções anteriores.”
Note-se que a primeira regra guarda referência não apenas ao
capítulo referente à responsabilidade por acidentes de consumo e
por vícios, mas a todo o microssistema normativo de defesa do
consumidor instituído pela Lei n. 8078/90, enquanto a segunda
regra é restrita à responsabilidade por vícios e por acidentes de
consumo. [...] (RECURSO ESPECIAL Nº 1.165.279 - SP
(2009/0216843-0)).
Observe-se que é reiterado o entendimento da corte no sentido de que “O
consumidor lesado tem, como afirmado pelo acórdão recorrido, o direito de livremente
escolher contra quem exerce sua pretensão. Ao final, a demanda poderá ser julgada
improcedente, com todos os consectários dessa solução,[...]” (AgRg no RECURSO
ESPECIAL Nº 1.316.868 - DF (2012/0063360-2), pg. 03).
Veja-se também:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
DIREITO DO CONSUMIDOR. INGESTÃO DE PRODUTO IMPRÓPRIO PARA O
CONSUMO. FATO DO PRODUTO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO FABRICANTE E DO COMERCIANTE. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ.
JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. EVENTO DANOSO. SÚMULA Nº 54/STJ. (AgRg no
AREsp 265586 / SP
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
2012/0255548-0)
Importante, também, é a aplicabilidade do informativo de nº 0195 do STJ, já
de dezembro de 2003 que afirma que pode ser imputada ao comerciante a
responsabilidade pelo fato do produto.
Informativo nº 0195
Período: 8 a 12 de dezembro de 2003.
Terceira Turma
EXPLOSÃO. LOJA. FOGOS DE ARTIFÍCIO.
LEGITIMIDADE. PROCURADORIA. ASSISTÊNCIA
JUDICIÁRIA.
A Procuradoria de Assistência Judiciária do Estado de São Paulo
tem legitimidade para propor ação civil pública em busca da
indenização por danos materiais e morais decorrentes da explosão
de estabelecimento dedicado à venda de fogos de artifícios e
pólvora (art. 5º, XXXII, da CF/1988 e art. 82 do CDC). A explosão
resultou, além de vultosos prejuízos materiais, na lesão corporal e
na morte de diversas pessoas que, em razão de sofrerem os efeitos
danosos dos defeitos do produto ou serviço, são equiparadas aos
consumidores (art. 17 do CDC), mesmo não tendo participado
diretamente da relação de consumo. Note-se que a possível
responsabilidade civil decorre de fato do produto na modalidade
de vício de qualidade por insegurança (art. 12 do CDC), que pode
ser imputada ao comerciante, ora recorrente. REsp 181.580-SP,
Rel. Min. Castro Filho, julgado em 9/12/2003.
No tocante a literatura sobre o tema, fundamental é a lição de Rizzatto Nunes:
[...] São considerados vícios as características de qualidade ou quantidade que
tornem os serviços (ou os produtos) impróprios ou inadequados ao consumo
que se destinam e também que lhes diminuam o valor. Da mesma forma são considerados vícios os decorrentes da disparidade havida em relação às
indicações constantes do recipiente, embalagem, rotulagem, oferta ou
mensagem publicitária. (...) O defeito, por sua vez, pressupõe vício. Há vício
sem defeito, mas não há defeito sem vício. O vício é uma característica
inerente, intrínseca do produto ou serviço em si. O defeito é o vício acrescido
de um problema extra, alguma coisa extrínseca ao produto ou serviço, que
causa um dano maior do que simplesmente o mau funcionamento, o não
funcionamento, a quantidade errada, a perda do valor pago - já que o produto
ou o serviço não cumpriram com o fim ao qual se destinavam. O defeito causa,
além desse dano do vício, outro ou outros danos ao patrimônio jurídico
material ou moral do consumidor. Logo, o defeito tem ligação com o vício, mas, em termos de dano causado ao consumidor, ele é mais devastador. Temos,
então, que o vício pertence ao próprio produto ou serviço, jamais atingindo o
próprio consumidor ou outros bens seus. O defeito vai além do produto ou
serviço para atingir o consumidor em seu patrimônio jurídico material e/ou
moral. Por isso somente se fala propriamente em acidente de consumo em caso
de defeito. É no defeito que o consumidor é atingido1. (Grifos nossos)
Por este motivo, entendemos que deve permanecer o primeiro item da
fundamentação jurídica no quadro de distribuição de pontos.
1 Curso de Direito do Consumidor . 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, págs. 344-345.
2. DA DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO
Em primeiro lugar é necessário diferenciar decadência de prescrição. A
primeira se refere ao direito em si, que deve ser exercido em determinado lapso temporal:
o prazo. Por sua vez, a prescrição se refere ao exercício do direito de ação para buscar a
reparação por um direito violado.
Neste sentido, o prazo decadencial do artigo 26 do CDC se refere ao exercício
do direito de reclamar ante os fornecedores, independentemente do “local” em que se
encontre na cadeia de consumo. Coisa distinta é o prazo prescricional do artigo
subsequente que, por sua vez, se refere ao lapso temporal que tem o consuidor em
perseguir seu direito em juízo.
Ora, este raciocínio é lógico. Se passado o lapso temporal para reclamar de
determinado problema com produtos ou execuções de serviços ficando inerte o
consumidor, isto demonstra falta de interesse em tentar reparação (qualquer que seja). Por
este mesmo raciocínio é que foi introduzido o parágrafo único, que impõe um obstáculo
à chegada do termo final do prazo decadencial.
Na questão concreta, o acidente de consumo somente ocorreu trinta dias após
a aquisição do produto, havendo sido obstado o prazo decadencial cinco dias após seu
termo inicial.
Este aspecto não afeta diretamente o prazo prescricional. Ou seja, não pode
ser confundido o prazo para reclamar perante o fornecedor e o prazo para perseguir
ressarcimento na justiça, mormente em caso de inércia do fornecedor, como de fato é a
conclusão a qual se pode chegar da leitura do enunciado da peça na área de direito civil
proposta pela FGV.
Portanto, tanto o afastamento da decadência quanto a demonstração do
exercício legítimo e tempestivo do direito de ação são essenciais na construção da petição
recursal.
Neste sentido os julgados: RECURSO ESPECIAL Nº 1.176.323 - SP
(2010/0008140-5); o STJ - REsp 967623-RJ; e o STJ - REsp 100710-SP, REsp 411535-
SP dentre outros.
Neste caso, tampouco merecendo reparo a régua do quadro de atribuição de
pontos.
3. FORMULAÇÃO DOS PEDIDOS
Consequência direta da fundamentação recursal são os pedidos elaborados a
partir destes. Neste sentido não merecendo reparo este quesito no quadro de distribuição
de pontos.
É nosso parecer.
Monica Lucia Cavalcanti de Albuquerque Duarte Mariz-Nóbrega
OAB-PB 10.278
BRUNO MIRAGEM Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
1
Exame de Ordem. Peça prático-profissional em que se exige
elaboração de recurso de apelação. Enunciado e gabarito
comentado que admitem pretensões distintas de um mesmo
evento (explosão de um aparelho de televisão), sob regimes
de responsabilidade variados, pelo fato do produto (art. 12
do Código de Defesa do Consumidor) e pelo vício do produto
(art. 18 do Código de Defesa do Consumidor). Possibilidade
e adequação do enunciado proposto e do gabarito
comentado.
1. Honra-nos o Doutor Felipe Sarmento Cordeiro, Diretor Secretário-Geral do
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e Presidente da Coordenação
Nacional do Exame de Ordem, com consulta acerca de contestação objeto de abaixo-
assinado e recursos de participantes do XIX Exame de Ordem, relativa ao enunciado e
gabarito da peça prático-profissional na área de Direito Civil.
2. A questão objeto de contestação era assim ementada:
“Antônio Augusto, ao se mudar para seu novo apartamento, recém-
comprado, adquiriu, em 20/10/2015, diversos eletrodomésticos de
última geração, dentre os quais uma TV de LED com sessenta
polegadas, acesso à Internet e outras facilidades, pelo preço de R$
5.000,00 (cinco mil reais). Depois de funcionar perfeitamente por
trinta dias, a TV apresentou superaquecimento que levou à explosão
da fonte de energia do equipamento, provocando danos irreparáveis a
todos os aparelhos eletrônicos que estavam conectados ao televisor.
Não obstante a reclamação que lhes foi apresentada em 25/11/2015,
tanto o fabricante (MaxTV S.A.) quanto o comerciante de quem o
produto fora adquirido (Lojas de Eletrodomésticos Ltda.)
permaneceram inertes, deixando de oferecer qualquer solução. Diante
disso, em 10/03/2016, Antônio Augusto propôs ação perante Vara
Cível em face tanto da fábrica do aparelho quanto da loja em que o
adquiriu, requerendo: (i) a substituição do televisor por outro do
mesmo modelo ou superior, em perfeito estado; (ii) indenização de
aproximadamente trinta e cinco mil reais, correspondente ao valor dos
demais aparelhos danificados; e (iii) indenização por danos morais,
em virtude de a situação não ter sido solucionada em tempo razoável,
motivo pelo qual a família ficou, durante algum tempo, sem usar a
TV. O juiz, porém, acolheu preliminar de ilegitimidade passiva
arguída, em contestação, pela loja que havia alienado a televisão ao
autor, excluindo-a do polo passivo, com fundamento nos artigos 12 e
13 do Código de Defesa do Consumidor. Além disso, reconheceu a
decadência do direito do autor, alegada em contestação pela fabricante
BRUNO MIRAGEM Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
do produto, com fundamento no Art. 26, inciso II, do CDC,
considerando que decorreram mais de noventa dias entre a data do
surgimento do defeito e a do ajuizamento da ação. A sentença não
transitou em julgado. Na qualidade de advogado(a) do autor da ação,
indique o meio processual adequado à tutela do seu direito,
elaborando a peça processual cabível no caso, excluindo-se a hipótese
de embargos de declaração, indicando os seus requisitos e
fundamentos nos termos da legislação vigente. (Valor: 5,00)”
3. O gabarito comentado à questão, de sua vez, se dá nestes termos:
“A decisão em questão tem natureza jurídica de sentença, na forma do
Art. 162, § 1º, do Art. 267, inciso VI, do Art. 269, inciso IV, e do Art.
459, todos do Código de Processo Civil. Com efeito, extinguiu-se o
processo, sem resolução do mérito, quanto ao comerciante, acolhendo-
se a sua ilegitimidade passiva, e com resolução do mérito, no tocante
ao fabricante, em cujo favor se reconheceu a decadência. Em virtude
disso, o meio processual adequado à impugnação do provimento
judicial, a fim de evitar que faça coisa julgada, é o recurso de
apelação, de acordo com o Art. 513 do CPC. Deve-se, para buscar a
tutela integral ao interesse do autor, impugnar cada um dos capítulos
da sentença, isto é, tanto a ilegitimidade do comerciante quanto a
decadência que aproveitou ao fabricante. Quanto ao primeiro ponto,
deve-se sustentar a solidariedade entre o varejista, que efetuou a venda
do produto, e o fabricante em admitir a propositura da ação em face de
ambos, na qualidade de litisconsortes passivos, conforme a
conveniência do autor. A responsabilidade do comerciante, ao menos
quanto ao primeiro pedido deduzido da petição inicial referente à
substituição do produto, encontra fundamento no Art. 18 do CDC.
Quanto ao segundo aspecto, deve-se pretender o afastamento da
decadência. No que concerne ao primeiro pedido, referente à
substituição do produto, a pretensão recursal deve basear-se na
existência de reclamação oportuna do consumidor, a obstar a
decadência, na forma do Art. 26, § 2º, inciso I, do CDC. Além disso,
já no tocante aos demais pedidos, trata-se de responsabilidade civil
por fato do produto, não por vício, haja vista os danos sofridos pelo
autor da ação, a atrair a incidência dos artigos 12 e 27 do CDC, de
modo que a pretensão autoral não se submete à decadência, mas ao
prazo prescricional de cinco anos, estipulado no último dos
dispositivos ora mencionados. Nessa linha, deve-se requerer a reforma
da sentença para que o pedido seja desde logo apreciado, na hipótese
de a causa encontrar-se madura para o julgamento, segundo o Art.
515, § 3º, do CPC, ou, alternativamente, a sua reforma,mediante o
reconhecimento da legitimidade passiva do comerciante, e o
afastamento da decadência, determinando-se o retorno dos autos ao
juízo de primeira instância, para prosseguimento do feito.”
BRUNO MIRAGEM Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
3
4. Trata-se de questão que envolve a demonstração de conhecimentos, para além da
legislação processual, de normas de direito do consumidor, em especial, as previstas no
Código de Defesa do Consumidor (CDC).
5. O objeto da resposta será, nestes termos, a elaboração de recurso de apelação,
sustentando o interesse de Antônio Augusto, personagem do enunciado. O ponto da
controvérsia, contudo, diz respeito à qualificação do evento descrito, em relação ao
produto adquirido “explosão da fonte de energia do equipamento, provocando danos
irreparáveis a todos os aparelhos eletrônicos que estavam conectados ao televisor”.
6. Como bem se sabe, o regime de responsabilidade do fornecedor, segundo o CDC
distingue-se entre o regime da responsabilidade pelo fato do produto e do serviço, e da
responsabilidade pelo vício do produto e do serviço. O primeiro, relativo à violação do
dever de segurança pessoal e patrimonial do consumidor, com disciplina nos arts. 12 a
14 do CDC. O segundo, relativo à violação do dever de adequação dos produtos ou
serviços, quando há a frustração dos fins (utilidade) que deles legitimamente se espera.
7. A questão em exame faz referência a ação proposta pelo autor, nos seguintes
termos:
“Antônio Augusto propôs ação perante Vara Cível em face tanto da
fábrica do aparelho quanto da loja em que o adquiriu, requerendo: (i) a
substituição do televisor por outro do mesmo modelo ou superior, em
perfeito estado; (ii) indenização de aproximadamente trinta e cinco
mil reais, correspondente ao valor dos demais aparelhos danificados; e
(iii) indenização por danos morais, em virtude de a situação não ter
sido solucionada em tempo razoável, motivo pelo qual a família ficou,
durante algum tempo, sem usar a TV.”
8. Sobre a decisão do juiz em relação a mesma ação, refere:
“O juiz, porém, acolheu preliminar de ilegitimidade passiva arguída,
em contestação, pela loja que havia alienado a televisão ao autor,
excluindo-a do polo passivo, com fundamento nos artigos 12 e 13 do
Código de Defesa do Consumidor. Além disso, reconheceu a
decadência do direito do autor, alegada em contestação pela fabricante
do produto, com fundamento no Art. 26, inciso II, do CDC,
considerando que decorreram mais de noventa dias entre a data do
surgimento do defeito e a do ajuizamento da ação.”
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9. Estes os aspectos que deveriam resultar no recurso de apelação a ser elaborado
pelo candidato.
10. A controvérsia objeto de reclamação no abaixo-assinado submetido à OAB, se
deu em vista, sobretudo, à indicação do gabarito comentado da prova, que sobre a
questão de direito substancial assim se pronunciou:
“Deve-se, para buscar a tutela integral ao interesse do autor, impugnar
cada um dos capítulos da sentença, isto é, tanto a ilegitimidade do
comerciante quanto a decadência que aproveitou ao fabricante.
Quanto ao primeiro ponto, deve-se sustentar a solidariedade entre o
varejista, que efetuou a venda do produto, e o fabricante em admitir a
propositura da ação em face de ambos, na qualidade de litisconsortes
passivos, conforme a conveniência do autor. A responsabilidade do
comerciante, ao menos quanto ao primeiro pedido deduzido da petição
inicial referente à substituição do produto, encontra fundamento no
Art. 18 do CDC. Quanto ao segundo aspecto, deve-se pretender o
afastamento da decadência. No que concerne ao primeiro pedido,
referente à substituição do produto, a pretensão recursal deve basear-
se na existência de reclamação oportuna do consumidor, a obstar a
decadência, na forma do Art. 26, § 2º, inciso I, do CDC. Além disso,
já no tocante aos demais pedidos, trata-se de responsabilidade civil
por fato do produto, não por vício, haja vista os danos sofridos pelo
autor da ação, a atrair a incidência dos artigos 12 e 27 do CDC, de
modo que a pretensão autoral não se submete à decadência, mas ao
prazo prescricional de cinco anos, estipulado no último dos
dispositivos ora mencionados.”
11. Aponta o abaixo-assinado dos candidatos não aprovados, a ambiguidade do
gabarito, considerando a necessidade de qualificação do evento causa da pretensão do
autor – o superaquecimento e posterior explosão da TV de LED, e respectivos danos daí
decorrentes. Isso porque foram formulados pedidos, na petição inicial – integrante do
enunciado da questão –, tanto relativos efeitos do regime de responsabilidade pelo fato
do produto e do serviço (pretensão de indenização), quanto do regime de
responsabilidade pelo vício do produto e do serviço (pretensão de substituição do
produto).
12. Em relação ao fato do produto, em razão dos danos causados por defeito da TV
de LED mencionado na questão, resulta pretensão de indenização, exercida – em acordo
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com os fatos relatados na questão – contra o fabricante (art. 12 do CDC). Esta
pretensão, sob o ponto de vista técnico, não poderia, de acordo com as informações do
enunciado, ser dirigida contra o varejista, nos termos do art. 13 do CDC. Não há,
portanto, solidariedade entre eles. Todavia, a pretensão de substituição do produto é
efeito do regime da responsabilidade pelo vício, no qual se reconhece a solidariedade
dos membros da cadeia de fornecimento (art. 18 do CDC). Em relação a este pedido
sim, cabível a solidariedade passiva do fabricante e do varejista.
13. A distinção entre os regimes e suas consequências são didaticamente
explicitadas na jurisprudência:
“CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE PELO FATO OU VÍCIO
DO PRODUTO.
DISTINÇÃO. DIREITO DE RECLAMAR. PRAZOS. VÍCIO DE
ADEQUAÇÃO. PRAZO DECADENCIAL. DEFEITO DE
SEGURANÇA. PRAZO PRESCRICIONAL. GARANTIA LEGAL E
PRAZO DE RECLAMAÇÃO. DISTINÇÃO. GARANTIA
CONTRATUAL.
APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DOS PRAZOS DE
RECLAMAÇÃO ATINENTES À GARANTIA LEGAL.
- No sistema do CDC, a responsabilidade pela qualidade biparte-se na
exigência de adequação e segurança, segundo o que razoavelmente se
pode esperar dos produtos e serviços. Nesse contexto, fixa, de um
lado, a responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço, que
compreende os defeitos de segurança; e de outro, a responsabilidade
por vício do produto ou do serviço, que abrange os vícios por
inadequação.
- Observada a classificação utilizada pelo CDC, um produto ou
serviço apresentará vício de adequação sempre que não corresponder à
legítima expectativa do consumidor quanto à sua utilização ou fruição,
ou seja, quando a desconformidade do produto ou do serviço
comprometer a sua prestabilidade. Outrossim, um produto ou serviço
apresentará defeito de segurança quando, além de não corresponder à
expectativa do consumidor, sua utilização ou fruição for capaz de
adicionar riscos à sua incolumidade ou de terceiros.
- O CDC apresenta duas regras distintas para regular o direito de
reclamar, conforme se trate de vício de adequação ou defeito de
segurança. Na primeira hipótese, os prazos para reclamação são
decadenciais, nos termos do art. 26 do CDC, sendo de 30 (trinta) dias
para produto ou serviço não durável e de 90 (noventa) dias para
produto ou serviço durável. A pretensão à reparação pelos danos
causados por fato do produto ou serviço vem regulada no art. 27 do
CDC, prescrevendo em 05 (cinco) anos.
- A garantia legal é obrigatória, dela não podendo se esquivar o
fornecedor. Paralelamente a ela, porém, pode o fornecedor oferecer
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uma garantia contratual, alargando o prazo ou o alcance da garantia
legal.
- A lei não fixa expressamente um prazo de garantia legal. O que há é
prazo para reclamar contra o descumprimento dessa garantia, o qual,
em se tratando de vício de adequação, está previsto no art. 26 do CDC,
sendo de 90 (noventa) ou 30 (trinta) dias, conforme seja produto ou
serviço durável ou não.
- Diferentemente do que ocorre com a garantia legal contra vícios de
adequação, cujos prazos de reclamação estão contidos no art. 26 do
CDC, a lei não estabelece prazo de reclamação para a garantia
contratual. Nessas condições, uma interpretação teleológica e
sistemática do CDC permite integrar analogicamente a regra relativa à
garantia contratual, estendendo-lhe os prazos de reclamação atinentes
à garantia legal, ou seja, a partir do término da garantia contratual, o
consumidor terá 30 (bens não duráveis) ou 90 (bens duráveis) dias
para reclamar por vícios de adequação surgidos no decorrer do
período desta garantia.
Recurso especial conhecido e provido.”
(STJ, REsp 967.623/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j.
16/04/2009, DJe 29/06/2009)
14. Trata-se de saber, contudo, se é possível qualificar um mesmo evento de modo a
que possa fazer jus a eficácia (leia-se, pretensões exercíveis) em mais de um regime de
responsabilidade. A questão é de razoável complexidade jurídica, porém não está
equivocada nas suas premissas técnicas. Em princípio, não resulta da lei ou da
jurisprudência, expressa rejeição a que de um mesmo fato resultem pretensões diversas,
fundadas em ambos os regimes de responsabilidade previstos no CDC.
15. Eu mesmo escrevi a respeito, em obra de doutrina, sobre a hipótese de um
exemplo próximo ao indicado na questão:
“(...) ocorrendo danos decorrentes da existência de falhas no tocante à
qualidade, quantidade ou informação relativa ao produto oferecido, é
de se verificar sobre qual o dever violado, se simplesmente um dever
de adequação, ou o dever de segurança e integridade, pessoal e
patrimonial do consumidor. Isto porque, se da mesma falha imputável
ao consumidor decorrer violação ao dever de adequação (vício do
produto) e dever de segurança (fato do produto, em decorrência de um
defeito), o direito à indenização do consumidor por danos causados à
sua integridade pessoal e patrimonial vai ser regulada segundo o
regime da responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço. Neste
sentido, observe-se o seguinte exemplo: se um produto
eletroeletrônico, em razão de falha em seus circuitos elétricos,
simplesmente não funciona, ter-se-á hipótese de vício por inadequação
do produto, respondendo o fornecedor nos termos do artigo 18 do
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CDC. Se em razão desta mesma falha nos seus circuitos elétricos, um
determinado consumidor vem a ser eletrocutado quando manuseia o
produto, esta mesma falha deverá se caracterizar como defeito,
alterando-se o regime para a responsabilidade pelo fato do produto,
regulado pelo artigo 12 do CDC.
Esta distinção, todavia, não elimina por si a possibilidade do
consumidor, em razão de vício do produto, realizar despesas para
sanar o mesmo, assim como observar determinados prejuízos
decorrentes da falha apresentada pelo produto em questão. Nestas
circunstâncias, ainda que o consumidor venha a fazer uso de uma
das alternativas previstas no CDC, em vista do regime de
responsabilidade por vício previsto na norma, isto não elimina a
possibilidade de que venha a reclamar, conjuntamente ou após a
satisfação do seu interesse imediato no negócio, a indenização dos
prejuízos causados em razão do vício e consequente violação do
dever de adequação do produto. A regra, em direito do
consumidor, será sempre a do artigo 6º, VI, do CDC, que assegura
o direito básico à efetiva prevenção e reparação de danos ao
consumidor.” (Bruno Miragem, Curso de direito do consumidor. 6ª
ed. São Paulo: RT, 2016, p. 667)
16. Antônio Herman Benjamin, em seus Comentários doutrinários, refere:
“Não obstante esteja a previsão de indenização por perdas e danos
mencionada apenas no inciso II do art. 18, §1º, sua aplicação,
conforme temos afirmado, cobre todas as alternativas colocadas à
disposição do consumidor. Faz jus, como direito básico, à
indenização integral pelos danos, parimoniais e morais, que sofrer
(art. 6, VII)
...
De se lembrar, todavia, que havendo dano à pessoa do consumidor,
tem este a sua disposição o regime jurídico da Seção II
(responsabilidade civil pelo fato do produto e do serviço), onde lhe
é lícito – desde que igualmente presente um atentado a sua
incolumidade físico-psíquica – pedir ressarcimento não só para os
danos pessoais que sofreu com o acidente de consumo, mas
também para os prejuízos causados pelo produto em si mesmo e
em outros bens e seu patrimônio.” (Antônio Herman de
Vasconcellos e Benjamin, comentário aos arts. 12 a 27, in: Juarez
Oliveira (Org.) Comentários ao Código de Proteção do Consumidor.
São Paulo: Saraiva, 1991, p. 94).
17. Refira-se, ainda, a lição de Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, em reputado
estudo monográfico ao afirmar:
“(...) os vícios e os defeitos apresentam regimes jurídicos diversos.
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Nos vícios a responsabilidade do fornecedor de produtos e serviços é
mais restrita: substituição do produto, reexecução do serviço, rescisão
do contrato, abatimento no preço, perdas e danos. Nos defeitos a
responsabilidade é mais extensa, devedor ser reparada a totalidade dos
danos patrimoiais e extrapatrimoniais sofridos pelo consumidor.
Apesar de esses dois elementos apresentarem regimes jurídicos
distintos no próprio CDC, não há dicotomia absoluta. O mesmo fato
pode enquadrar-se simultaneamente nos dois regimes. Ao mesmo
tempo que se apresenta viciado, o produto ou serviço pode-se
mostrar defeituoso. Exemplo dessa situação tem-se no caso de
automóvel que, por apresentar deficiência no sistema de freios,
envolve-se em um acidente, causando lesões a seus ocupantes. Nessa
hipótese, é possível a utilização simultânea das pretensões
concedidas pelos dois regimes jurídicos, inclusive no mesmo
processo. Portanto, os regimes dos dois institutos jurídicos são
absolutamente diversos.” (Paulo de Tarso Vieira Sanseverino,
Responsabilidade civil do Código do consumidor e a defesa do
fornecedor. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 166).
18. Nestes termos, ainda que se possa ponderar sobre o nível de complexidade da
questão para os fins a que se destina, o gabarito comentado não apresenta
impropriedade, uma vez admitidas pretensões sob fundamentos legais distintos, a saber:
a) em relação ao pedido de substituição do produto (art. 18, §1º, I), admitida a
solidariedade legal do fabricante e do varejista, e tendo a reclamação ao
fornecedor sido feita no prazo legal (em 26 de novembro de 2015, dentro do
prazo de 90 dias a que se refere o art. 26 do CDC), alguma discussão poderia ser
sucitada em relação ao sentido do verbo “obstar” constante na lei, se hipótese de
impedimento suspensão ou interrupção do prazo o que influencia na existência
ou não da pretensão de substituição quando da propositura da ação judicial. Eu
sustento, em vista da interpretação mais favorável ao consumidor, que aqui se
entenda pela natureza interruptiva da causa (Bruno Miragem, Curso de direito do
consumidor, 6ª ed., São Paulo: RT, 2016, p. 678).
O art. 26, §1º, I, do CDC, contudo, refere como causa que obsta a decadência, “a
reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor
de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser
transmitida de forma inequívoca”. Não há, no enunciado da questão, menção à
resposta negativa do varejista, de modo que é correto considerar, na hipótese,
que uma vez feita a reclamação, o prazo não voltou a fluir, seja inteiro (como na
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interrupção), seja no que lhe faltava (caso se entendesse como suspensão).
b) em relação à pretensão de indenização pelos danos causados pela explosão do
produto, a ser exercida exclusivamente contra o fabricante – e não contra o
varejista – para o que não se cogita de extinção pelo tempo, em vista de se
encontrar no prazo de seu regular exercício quando da propositura da ação (em
10/03/2016), conforme a regra do art. 27 do CDC.
Entendo, deste modo, pela adequação entre o enunciado e o gabarito comentado, em
acordo com as considerações expendidas.
Porto Alegre, 23 de julho de 2016.
BRUNO MIRAGEM Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
OAB/RS 51.573