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Recomendando Produtos e Serviços: Uma Pesquisa Videográfica sobre o Uso de Blogs como Referência de Consumo Resumo Qual o melhor creme para meu tipo de cabelo? Aquele carro é tão bom quanto mostra a propaganda da televisão? Esses e outros questionamentos fazem parte do dia a dia de muitas pessoas que procuram produtos e serviços com os benefícios desejados. Saber quais fontes considerar na avaliação de um produto, porém, é uma tarefa árdua para os consumidores, já que eles têm à sua disposição uma gama cada vez maior de informações. Aqui entram em cena os blogs que tratam de produtos e experiências de consumo. Este trabalho visa a compreender de que forma os blogueiros e suas recomendações atuam como referências de consumo para seus leitores. A coleta de dados baseou-se em uma abordagem qualitativa com a realização de uma videografia junto a quatro blogueiras e onze leitoras. Esta técnica permitiu uma maior compreensão do comportamento das blogueiras e de suas leitoras, captando emoções e entonações perceptíveis apenas em vídeo. Foi possível perceber que, ao pesquisar e testar diversos produtos de beleza, as blogueiras assumem o papel de consultoras

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Recomendando Produtos e Serviços: Uma Pesquisa Videográfica sobre o Uso de Blogs

como Referência de Consumo

Resumo

Qual o melhor creme para meu tipo de cabelo? Aquele carro é tão bom quanto mostra

a propaganda da televisão? Esses e outros questionamentos fazem parte do dia a dia de muitas

pessoas que procuram produtos e serviços com os benefícios desejados. Saber quais fontes

considerar na avaliação de um produto, porém, é uma tarefa árdua para os consumidores, já

que eles têm à sua disposição uma gama cada vez maior de informações. Aqui entram em

cena os blogs que tratam de produtos e experiências de consumo. Este trabalho visa a

compreender de que forma os blogueiros e suas recomendações atuam como referências de

consumo para seus leitores. A coleta de dados baseou-se em uma abordagem qualitativa com

a realização de uma videografia junto a quatro blogueiras e onze leitoras. Esta técnica

permitiu uma maior compreensão do comportamento das blogueiras e de suas leitoras,

captando emoções e entonações perceptíveis apenas em vídeo. Foi possível perceber que, ao

pesquisar e testar diversos produtos de beleza, as blogueiras assumem o papel de consultoras

pessoais de suas leitoras e desfrutam de alta credibilidade, principalmente em função da

independência que mantêm em relação aos fabricantes dos produtos. Além disso, a interação

proporcionada pelos blogs é capaz de impactar tanto o processo de decisão de compra das

leitoras como o das próprias blogueiras.

Palavras-chave: blogs; referências de consumo; produtos de beleza; credibilidade;

videografia.

Abstract

Which cream is the best for my kind of hair? Is this car as good as shown on that TV

ad? These and other questions are frequent to many people who look for products and services

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that meet their desired benefits. However, knowing which fonts to consider when evaluating a

product is a hard task for consumers, once they have more information available everyday. It

is in this context that blogs dealing with products and experiences of consumption come to

scene. This work seeks to understand how bloggers and their recommendations act like

consumption references to their readers. Data collection is based on a qualitative approach,

using videography with four bloggers and eleven readers. This technique allows a better

understanding of bloggers and readers behavior, catching their emotions and intonations only

perceptible in video. It was possible to perceive that bloggers play the role of personal

consultants to their readers when searching and testing beauty products, and are granted great

credibility, specially because of their independence from corporate interests. Besides,

interaction allowed in blogs is capable of influencing the purchase decision process of readers

as well as of the bloggers themselves.

Keywords: blogs; consumption references; beauty products; credibility; videography.

1 INTRODUÇÃO

Que cores de batom são mais apropriadas para cada tom de pele? Qual é o notebook

mais leve fabricado no Brasil? Qual carro apresenta a melhor relação custo-benefício no

segmento popular? Com a enorme variedade de ofertas disponíveis aos consumidores, a

decisão a respeito de um produto torna-se cada vez mais complexa. Para tentar diminuir a

dissonância cognitiva relativa às diversas opções existentes, as pessoas podem buscar

informações em fontes distintas. O consumidor pode, por exemplo, pedir ajuda a um

profissional especializado no assunto. Pode também requerer a opinião de uma pessoa

próxima em razão da confiança. Entretanto, uma vez que as tecnologias de informação – que

têm na internet sua faceta mais representativa – tornam-se cada vez mais presentes na vida

dos indivíduos, uma nova fonte surge como referência de consumo: o blog.

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A difusão dos blogs faz com que essas ferramentas de comunicação tornem-se cada

vez mais presentes na vida dos usuários da internet, de modo que a prática de “blogar”

apresenta hoje um número crescente de adeptos. Segundo o Technorati (2008), portal de

busca que possui uma ferramenta para identificar e contabilizar blogs na internet, em junho de

2008 já eram contabilizados pelo menos 133 milhões de blogs em todo o mundo, criados

desde 2002. No Brasil, segundo o levantamento NetRatings (IBOPE, 2008), existem cerca de

12 milhões de leitores de blogs, dentro de um universo de 40 milhões de usuários de internet.

Não apenas a atividade se multiplica, mas também o seu poder de influência. No caso

de blogs que relatam experiências sobre a utilização de produtos e serviços, a informação

gerada pode ter um impacto significativo sobre o comportamento dos leitores. Segundo um

levantamento feito pelo Technorati (2009), 70% dos blogueiros comentam sobre produtos e

marcas em seus blogs, e 38% costumam publicar avaliações ou experiências com estes

produtos. Assim, o blogueiro passa a ser visto como uma potencial referência de consumo.

Frente a esse cenário, o presente trabalho visa compreender de que forma os

blogueiros atuam como referência de consumo no processo de tomada de decisão de seus

leitores. A fim de atingir tal compreensão, o estudo adotou uma abordagem qualitativa,

enfatizando seu caráter exploratório. Foram realizadas entrevistas em profundidade,

semiestruturadas, junto a um conjunto de blogueiras e suas leitoras. Todas as entrevistas

foram gravadas em vídeo e analisadas por meio da técnica videográfica, visto que a utilização

desse tipo de ferramenta de pesquisa é compreendida como capaz de prover um melhor

entendimento do fenômeno, ilustrando e enriquecendo os resultados da pesquisa.

O trabalho está estruturado em quatro etapas, além da introdução. Primeiramente, é

trazido um panorama geral de fundamentação teórica envolvendo o tema. Em seguida, a

metodologia é apresentada, para posteriormente serem demonstrados os resultados da

pesquisa. Por fim, os autores desenvolvem suas considerações finais em relação ao estudo.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Para buscar um maior entendimento de como os blogueiros atuam como referência de

consumo, é fundamental que as análises realizadas estejam contempladas dentro do âmbito

teórico existente. Dessa forma, foram buscados na literatura estudos relacionados aos tópicos

investigados, sendo eles: o impacto das mídias digitais na sociedade contemporânea; as

motivações dos blogueiros e dos indivíduos para ler blogs que relatam experiências de

consumo; as fontes de informação utilizadas pelos blogueiros; por que os leitores percebem os

blogs como referência de consumo; e o papel dos blogs no processo de tomada de decisão.

2.1 Impacto das mídias digitais na sociedade contemporânea: o caso dos blogs

A revolução na comunicação proporcionada pelas novas mídias, em especial a

internet, permitiu a proliferação de novos modos de interação social. É neste ambiente que os

blogs – corruptela da palavra em inglês weblog – vêm conquistando cada vez mais leitores e,

consequentemente, o interesse acadêmico.

Um blog designa um espaço virtual ocupado por conteúdo produzido e/ou publicado

por um indivíduo, grupo ou empresa responsável, que pode ser chamado de blogueiro ou

blogger, e onde estas pessoas e seus leitores se comunicam. Para Primo (2008), blogs são

meios de comunicação cuja criação não determina se seu conteúdo será mantido individual ou

coletivamente, ou se servirá a interesses lúdicos ou comerciais.

Conforme afirma Longo (2008), a internet tem uma vantagem impensável em

qualquer outra mídia: só ela permite ter informação, comunicação e transação num mesmo

veículo. De maneira única, a era eletrônica possibilita o compartilhamento do conhecimento

do processo criativo. Nela encontram-se representadas, senão todas, pelo menos grande parte

das estruturas sociais e dos fenômenos encontrados no “mundo real”, manifestados através do

crescente conjunto de ferramentas e linguagens constantemente inventadas, reproduzidas e

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renovadas (Paz, 2003). Uma dessas estruturas são os blogs. Para Rocha (2003), o que

caracteriza o blog como instrumento de comunicação de grande efeito é o fato de alcançar

inúmeros indivíduos por meio de uma narrativa particular – que pode variar desde a

confecção de relatos autobiográficos, situações cotidianas, artigos, crônicas, exposição de

interesses peculiares até a apresentação de experiências de consumo positivas e negativas.

Frente ao crescente papel que o consumo desempenha na vida das pessoas, as novas

tecnologias de informação e comunicação também podem ser analisadas sob a ótica dos

aspectos simbólicos e de espetacularização trazidos pela pós-modernidade. De acordo com

Vattimo (1992), as novas tecnologias permitem espetacularizações que não eram possíveis até

então. Firat e Venkatesh (1995) afirmam que os consumidores estão à procura de significados

e experiências, enquanto os profissionais de marketing seriam os produtores de tal espetáculo.

No caso do mundo dos blogs pessoais, entretanto, os geradores do espetáculo são os próprios

blogueiros, bem como seus leitores. Huang, Shen, Lin e Chang (2007) defendem que o ato de

“blogar” está diretamente relacionado ao conjunto de condições da pós-modernidade, visto

que o blogueiro se engaja em múltiplas experiências de consumo e se torna produtor ativo de

símbolos e sinais de consumo. Assim, a grande repercussão dos blogs na contemporaneidade

ocorre em função do seu caráter social de produção e reprodução de sentidos.

2.2 Motivações para ler e escrever blogs

Huang, Chou e Lin (2008) identificam quatro motivações principais para a leitura de

blogs: troca afetiva, procura de informações, entretenimento e efeito “manada” (ou

bandwagon effect, que ocorre quando pessoas começam a ler blogs atraídas por sua crescente

popularidade), sendo a troca afetiva identificada como a mais relevante, em geral, para os

leitores. Já em um estudo dentro da ótica do consumo, Hennig-Thurau e Walsh (2008)

afirmam que os indivíduos leem articulações de consumo online principalmente para poupar o

tempo exigido pelo processo de decisão e para tomar melhores decisões de compra. Tais

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articulações possuem alto grau de relevância para a situação específica de consumo do leitor,

pois permitem que os consumidores procurem informações de maneira individualizada. Além

disso, o aprendizado de como um determinado produto deve ser consumido e de quais novos

produtos estão no mercado também aparecem como motivações para a leitura de blogs.

Usando a internet, os consumidores são capazes de obter informações relacionadas a

produtos e serviços não apenas de amigos, conhecidos e colegas, mas também de uma

diversidade de outras pessoas que tiveram experiências com o produto e que, de outra forma,

seriam desconhecidas para eles (Ratchford, Talukdar & Lee, 2001). Wiedmann, Walsh e

Mitchell (2001) ratificam as motivações apresentadas, argumentando que:

[...] à medida que os mercados se tornam mais saturados de informações e produtos, torna-se

cada vez mais difícil para os consumidores conhecerem e processarem todas as alternativas

[...] nessas circunstâncias, conselheiros competentes podem ajudar os consumidores a se

informarem sem que eles tenham de se engajar em atividades de busca que lhes exijam

cognitivamente e consumam tempo (Wiedmann, Walsh, & Mitchell, 2001, p. 195, tradução

livre).

Quanto às motivações para escrever blogs, Nardi, Schiano, Gumbrbcht e Swartz

(2004), por meio de entrevistas etnográficas, chegaram a cinco principais tipos: (1)

documentar e registrar experiências de vida; (2) postar opiniões e comentários sobre assuntos

diversos (política, tecnologia, consumo, etc.); (3) expressar emoções profundas; (4) criar e

participar de comunidades relacionadas a algum assunto ou causa de seu interesse e (5)

articular ideias através da escrita, como um exercício para organizá-las com a presença dos

leitores e com o potencial de arquivar os textos. Cada blogueiro é um arranjo dessas

motivações, em maior ou menor grau. Baseados nesse estudo, Huang et al. (2007) adicionam

outra motivação relevante ao conjunto: a busca de informações. Os autores também advogam

que os escritores de blogs têm como motivação o uso de uma série de ferramentas que podem

ser utilizadas para compilar informações da internet de forma conveniente.

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No Brasil, um trabalho voltado para as motivações foi elaborado por DiLuccio e

Nicolaci-da-Costa (2007), no qual foi identificado entre os blogueiros o desejo comum de

publicar textos de forma livre e despretensiosa e de saber a opinião dos leitores a respeito.

Recuero (2008) ainda aponta que os blogueiros podem optar por divulgar informações

consideradas úteis a outras pessoas como forma de construir capital social. Pela divulgação de

informações sobre determinado assunto de interesse de várias pessoas, o blogueiro afirma sua

autoridade como especialista neste assunto, promovendo a sua popularidade e a do seu blog.

Mais especificamente no caso de blogs voltados para atividades de consumo, Schau e

Gilly (2003) afirmam que os escritores utilizam estratégias de autoexpressão que contêm um

discurso de autoapresentação e de posses. Segundo Xin e Belk (2007), essa autoexpressão

ocorre através da postagem de imagens de uma identidade ideal à que o blogueiro aspira.

Sendo assim, de acordo com esses autores, os blogs voltados para o consumo também

propiciam a extensão da identidade dentro do ciberespaço.

2.3 Fontes de informação utilizadas pelos blogueiros

O conteúdo apresentado pelos escritores de blogs vem das mais variadas fontes:

experiências pessoais, mídia eletrônica, mídia impressa, televisão, outros blogs, etc. De

acordo com Huang et al. (2007), os escritores acumulam conhecimento, através do uso

longitudinal, com relação a suas fontes de informação e, como consequência, desenvolvem

um modelo cognitivo, um hábito de procura e um padrão de atividades no comportamento de

confecção do conteúdo. Esse mesmo autor afirma que os blogueiros, motivados a prover

comentários, desejam influenciar seus leitores e, com essa perspectiva, reúnem conteúdo da

blogosfera para suportar seus argumentos. Além disso, este conteúdo é desenhado de maneira

a poder ser citado por outros blogueiros, corroborando com a motivação para a postagem de

opiniões e comentários e para a participação em comunidades de seu interesse, relacionadas

pelo estudo de Nardi et al. (2004).

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2.4 Percepção dos leitores acerca da influência dos blogs no consumo

Armstrong (2006) observa que metade dos blogueiros fornece informações

relacionadas a marcas pelo menos uma vez por semana, enquanto 77% consideram os blogs

uma forma de obter informações relacionadas às marcas para suas compras pessoais. Um

estudo de Johnson e Kaye (2004) compara a credibilidade dos blogs com a mídia tradicional e

mostra que os leitores veem este canal de comunicação com mais credibilidade do que os

meios tradicionais. De forma similar, Hope (2002) afirma que as mensagens relacionadas com

marcas nos blogs são percebidas como de alta credibilidade, uma vez que os blogueiros são

interpretados como independentes de interesses corporativos.

Sendo a atitude crucial para predizer um comportamento futuro de compra (Johnson &

Kaye, 2004; Petty, Priester, & Wegener, 1994), é pertinente analisar a relação entre os leitores

de blogs, suas atitudes e a credibilidade percebida em relação aos blogueiros. Chu e Kamal

(2008), por exemplo, buscaram entender o papel da credibilidade do blogueiro e da qualidade

do argumento para a atitude de uma pessoa em relação a uma marca mencionada em um blog.

A relação entre credibilidade do escritor e qualidade do argumento já foi estudada por

diversos autores (Chu & Kamal, 2008; Chaiken, 1980; Petty, Cacioppo, & Goldman, 1981;

Ohanian, 1991). No caso dos blogs, quando a credibilidade percebida é baixa, o leitor pode

assumir uma postura mais crítica para escrutinar os argumentos de forma sistemática e, assim,

verificar se a mensagem contida no blog é válida. Em contraste, quando a confiança é alta, os

argumentos são mais facilmente aceitos como válidos (Chu & Kamal, 2008).

Por fim, os blogs viabilizam que o leitor possua entendimento sobre uma marca e/ou

empresa, facilitando assim, uma conexão emocional com a mesma. Essas atividades, por sua

vez, podem inspirar lealdade à marca e advocacia (Creamer, 2005) que, por consequência,

influenciam as intenções de compra.

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2.5 O papel dos blogs no processo de tomada de decisão

A internet fornece um ambiente rico e interativo na busca de informações para a

tomada de decisão dos consumidores. A revolução na comunicação proporcionada pelas

novas mídias possibilita que os tomadores de decisão tenham acesso a outras fontes de

referência, e é nesse ambiente que eles encontram um relevante conjunto de dados sobre as

opções de consumo.

O senso comum sugere que, quanto mais possibilidades de escolhas, mais o

consumidor se beneficia, porém pesquisas recentes questionam essa afirmação. Resultados

mostram que, na falta de certeza pela preferência, escolhas dentro de uma grande variedade

podem levar a uma menor probabilidade de escolha e uma fraca preferência pela escolha

selecionada (Chernev, 2006). Segundo Nagpal e Krishnamurthy (2008), a dificuldade para

chegar a uma decisão pode determinar se o sujeito continuará ou terminará o processo de

consumo. Chernev (2008) explica ainda que, muitas vezes, escolhas são orientadas pelo

desejo dos consumidores de evitar conflitos na decisão.

De acordo com Xu e Wyer Jr. (2007), decisões de compra frequentemente ocorrem em

duas etapas. Primeiro, os consumidores tentam decidir se querem realizar a compra baseados

nas opções disponíveis e em suas necessidades. Se essa decisão é afirmativa, em um segundo

momento eles consideram quais alternativas preferem. Segundo os autores, quando se

determina qual opção de compra é a preferida, a decisão de comprar algo já está feita.

No modelo proposto por Engel, Blackwell e Miniard (2000), o processo de tomada de

decisão consiste em sete etapas: (1) reconhecimento de necessidade, (2) busca de

informações, (3) avaliação de alternativas, (4) escolha ou compra, (5) consumo, (6) avaliação

pós-compra e (7) descarte.

À luz desse modelo, consideramos relevante a participação dos blogs que discutem

experiências de consumo, que impactam, essencialmente, sobre as três primeiras etapas do

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processo de tomada de decisão. Servindo como agentes de informação, podem conduzir os

leitores ao reconhecimento de necessidades. Já na busca por informações, os blogs podem

atuar ao aumentar a quantidade de alternativas para o leitor e, por fim, na avaliação de

alternativas, possuem poder de influência dada a sua credibilidade percebida.

Também, em alguns casos, essa ferramenta de comunicação pode fazer parte da fase

de compra (quando o consumidor pode realizá-la no próprio blog – etapa 4), da fase de

consumo (quando o objeto de consumo é o próprio blog, ou seja, o produto é o blog – etapa 5)

e da etapa de avaliação pós-compra (etapa 6, quando os leitores postam comentários com

opiniões sobre produtos após o uso dos mesmos).

Sendo assim, blogs que têm como foco experiências de consumo auxiliam os

consumidores na escolha entre as opções de compra disponíveis no mercado. Acredita-se,

portanto, que os blogs servem como aliados dos consumidores para aperfeiçoar o processo de

decisão e também para estimular novos desejos de consumo.

3 MÉTODO

A escolha do método para este estudo prezou a abordagem exploratória, qualitativa,

visando à profundidade da informação. Na pesquisa qualitativa, as interpretações são

construídas, não havendo uma única verdade interpretativa. Segundo Denzin e Lincoln

(2006), esse tipo de pesquisa implica uma ênfase sobre as qualidades das entidades e sobre o

processo e os significados que não são examinados ou medidos experimentalmente – se é que

são medidos de alguma forma –, ressaltando-se a natureza socialmente construída da realidade

e as limitações situacionais que influenciam a investigação. Levy (2006) destaca a

contribuição que os estudos qualitativos têm fornecido para o campo do Comportamento do

Consumidor desde a década de 70, quando a produção de trabalhos desta natureza começou a

adquirir maior volume e relevância.

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Os sujeitos da investigação podem ser divididos em duas categorias: escritoras de

blogs e leitoras de blogs. Primeiramente foram selecionados três blogs pessoais, que tratam

sobre produtos de beleza (Tabela 1) e suas escritoras foram entrevistadas. A seleção dos blogs

foi realizada através de um ranking de popularidade em um site especializado1.

Tabela 1: Blogs abordados na pesquisa

Nome do blog Endereço na internet Temática principal

Tie Dye POA http://tiedyepoa.blogspot.com Produtos para cabelo

Vende na Farmácia http://www.vendenafarmacia.comCosméticos de preço acessível e

encontrados em farmácias

Galochas Roxas http://galochasroxas.blogspot.com Produtos para maquiagem

Em seguida, foram entrevistadas onze leitoras desses três blogs. Para a seleção das

leitoras, foi feito contato a partir de mensagens postadas por elas nos blogs e/ou através de

indicação da própria blogueira, obedecendo a duas condições: (1) ausência de contato fora da

internet entre leitor e blogueiro antes da interação no blog e (2) leitura frequente do blog por

parte do leitor. Em função da temática dos blogs, as entrevistadas (escritoras e leitoras), não

propositalmente, são todas do sexo feminino.

Tabela 2: Caracterização das participantes das entrevistas

Entrevistad

aCaracterísticas

Blogueira A Advogada, 30 anos, blogueira do Tie Dye POA, mora em Porto Alegre/RS

Blogueira B Analista de suporte, 27 anos, blogueira do Vende na Farmácia, mora em São Paulo/SP

Blogueira C Estudante, 30 anos, blogueira do Vende na Farmácia, mora em São Paulo/SP

Blogueira D Bióloga, 30 anos, blogueira do Galochas Roxas, mora em Porto Alegre/RS

Leitora 1 Professora, 19 anos, mora em Porto Alegre/RS

Leitora 2 Estudante e analista de processos, 25 anos, mora em São Leopoldo/RS

Leitora 3 Jornalista, 25 anos, mora em Porto Alegre/RS

Leitora 4 Estudante, 20 anos, mora em Porto Alegre/RS

Leitora 5 Jornalista, 32 anos, mora em Porto Alegre/RS1 BlogBlogs: http://blogblogs.com.br

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Leitora 6 Estudante, 22 anos, trabalha com moda, nora em Porto Alegre/RS

Leitora 7 Publicitária, 30 anos, mora em Porto Alegre/RS

Leitora 8 Maquiadora e professora de maquiagem, 29 anos, mora em Porto Alegre/RS

Leitora 9 Estudante, 21 anos, mora em Lajeado/RS

Leitora 10 Técnica em enfermagem, 26 anos, mora em Porto Alegre/RS

Leitora 11 Estudante, 23 anos, mora em Esteio/RS

A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas em profundidade, com base em

um roteiro semiestruturado, tendo em vista que esta ferramenta visa a revelar motivações,

crenças, atitudes ou sentimentos do sujeito sobre um determinado tópico (Malhotra, 2006).

Todas as entrevistas foram gravadas em vídeo, em função da escolha da videografia

como método de pesquisa. O uso da técnica videográfica em trabalhos acadêmicos tem se

difundido bastante nos últimos anos. Dentro da área de comportamento do consumidor,

podem-se citar os trabalhos de Smith, Fisher e Cole (2007), Kimura e Belk (2005), Bengtsson,

Ostberg e Kjeldgaard (2005) e McGrath, Sherry e Heisley (1993), entre outros.

A utilização de videografia permitiu uma maior compreensão do comportamento das

blogueiras e de suas leitoras, captando também as emoções e as entonações das falas. Outra

vantagem dessa técnica é abrir um maior número de avenidas interpretativas do que sua

contraparte escrita (Smith, Fisher, & Cole, 2007). É fato que informações visuais são

cognitivamente mais complexas do que as textuais e também que o aprendizado é facilitado

quando a informação é apresentada de formas variadas. Sendo assim, estudos que combinem

elementos visuais com textuais deveriam ser considerados melhores para a disseminação do

conhecimento (Heisley, 2001).

Além disso, no ambiente empresarial, a utilização de recursos audiovisuais para

conhecer o comportamento dos consumidores tem sido cada vez mais aceita, de tal forma que

alguns estudos são conduzidos unicamente por meio de vídeos, sem o acompanhamento de

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relatórios escritos (Belk & Kozinets, 2005). Movimento semelhante acontece nas salas de aula

das universidades, onde as apresentações multimídia tomam o lugar das exposições

meramente textuais. Dessa forma, como afirmam os autores:

[...] a procura por trabalhos videográficos está aumentando e pedidos de apresentações

videográficas tornaram-se lugar comum. Na sala de reuniões, assim como na sala de aula,

aqueles que desejam causar um impacto poderoso em sua audiência estão aprendendo a se

apoiar no poder e detalhes vívidos de materiais audiovisuais, ao invés de quadros negros e

apresentações de slides tradicionais. (Kozinets & Belk, 2006, pp. 336-337, tradução livre)

A natureza fílmica da videografia implica em novas exigências para a avaliação da sua

qualidade, além daquelas das demais técnicas qualitativas. Por esta razão, Kozinets & Belk

(2006), sugeriram um conjunto de recomendações conhecidas como 4 T’s da Videografia:

tópico: a videografia deve ser focada em um tópico ou problemática relevante para

a pesquisa em marketing;

teoria: a videografia deve contribuir para o entendimento do fenômeno do qual trata

e estar posicionada dentro do corpo de conhecimento em marketing;

teatralidade: a videografia deve ser dramaticamente atrativa para sua audiência,

seguindo um roteiro fílmico e possuindo um senso de tensão e desdobramento;

técnica: a videografia deve seguir padrões aceitáveis de produção, incluindo

trabalho de câmera, edição, trilha sonora e narrativa.

As entrevistas foram realizadas entre novembro de 2008 e janeiro de 2009. Seguindo

recomendações de Smith, Fisher e Cole (2007), o local das filmagens foi a residência das

entrevistadas, quando viável, com o cuidado de não invadir o espaço pessoal de cada uma.

De posse das informações recolhidas, o trabalho de análise de conteúdo foi feito com

base na metodologia proposta por Bardin (2004). Esta proposta se refere a uma decomposição

do discurso e identificação de unidades de análise ou grupos de representações para uma

categorização dos fenômenos, a partir da qual se torna possível uma reconstrução de

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significados que apresentem uma compreensão mais aprofundada da interpretação de

realidade, a partir das percepções dos entrevistados (Godoy,1995).

Além disso, o vídeo gerado pelo uso da técnica de videografia serviu como um

auxiliar na interpretação das entrevistas transcritas, denotando passagens interessantes das

mesmas e remetendo a aspectos visuais da entrevista, possibilitando a análise da entonação e

de manifestações faciais e físicas do sujeito entrevistado.

4 RESULTADOS

Entender melhor de que forma os blogueiros se tornam referências de consumo para

leitores é o foco principal desse trabalho. A partir da análise de conteúdo das entrevistas, nota-

se que as mensagens divulgadas nos blogs são consideradas ricas fontes de informação, que

influenciam de maneira ampla o processo de tomada de decisão. Especificamente, no caso dos

blogs de beleza, existem leitoras que acabam se tornando “seguidoras” das blogueiras no que

diz respeito à utilização de produtos. Isso se deve, em grande parte, à credibilidade das

opiniões e informações trazidas pelas blogueiras e complementadas pelas próprias leitoras.

Dessa forma, o blog configura-se como uma poderosa mídia, especialmente entre os usuários

mais adeptos ao mundo digital.

A configuração dos blogs como referência de consumo é percebida no discurso das

entrevistas especialmente em relação aos seguintes tópicos:

a capacidade que as informações disponibilizadas têm de facilitar o processo de

tomada de decisão;

a posição que os blogs ocupam como ferramentas de comunicação e divulgação de

produtos frente aos demais meios de comunicação;

o papel das blogueiras como produtoras ativas de sinais de consumo;

o papel das blogueiras como consultoras e especialistas em determinado assunto;

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a riqueza das interações gerada nesse ambiente, que transforma até mesmo as

leitoras em referências de consumo;

e a preocupação com a credibilidade por parte das blogueiras.

4.1 Influência no processo de tomada de decisão

Uma das razões pelas quais as leitoras afirmam buscar a opinião das blogueiras sobre

produtos e serviços é o fato de estas se informarem bastante sobre as opções disponíveis no

mercado – preço, qualidade, marcas e modelos –, além de realizarem testes com os produtos.

Tal opinião influencia as leitoras especialmente nas três primeiras etapas do processo de

tomada de decisão de compra, ou seja, no reconhecimento das necessidades, na busca de

informações e na avaliação das alternativas. Elas ajudam as consumidoras a se informarem

antes da compra, resolvendo dúvidas e poupando tempo e esforço cognitivo (Wiedmann,

Walsh & Mitchell, 2001). Assim, as leitoras podem realizar melhores decisões de compra,

como apontaram Hennig-Thurau e Walsh (2008).

Como é que eu vou usar uma coisa sem saber como é que vai reagir, sem saber como é que

funciona? Daí eu procuro os blogs e procuro opiniões de pessoas, mesmo que eu não conheça.

(Leitora 7)

O blog da Vica ‘linkou’ um site maravilhoso de compras na internet, um site americano, e

aquilo ali foi incrível. Descobri um mundinho novo pra mim. A possibilidade de comprar

coisas que eu não tinha como comprar normalmente, mas que tava ali disponível. (Leitora 1)

Acho interessante até pra ter outra visão que as pessoas têm também, né, e tu acaba vendo que

bastante gente pensa como tu pensa [...] Tu acaba tendo o conhecimento de alguma coisa que

tu não conhece, que tu quer conhecer, que tu tem curiosidade. (Leitora 2)

Além de serem utilizados nas três primeiras fases do processo decisório do

consumidor, o blog pode ser visto como uma ferramenta de comunicação que possibilita o

aprimoramento das fases de compra, consumo e avaliação pós-compra. Especificamente no

15

Page 16: file · Web viewResumo. Qual o melhor creme para meu tipo de cabelo? Aquele carro é tão bom quanto mostra a propaganda da televisão? Esses e outros questionamentos fazem parte

caso da avaliação pós-compra, é possível notar, em relatos de leitoras, a satisfação com a

indicação das blogueiras.

[...] foi através dele [blog] que eu comprei um creme e que eu fiquei encantada e até hoje eu

uso. (Leitora 11)

[...] tem muita coisa, por exemplo, se eu não tivesse conhecido o blog dela, eu não compraria.

(Leitora 2)

Meu Deus, todo mundo falava bem da base nos blogs. Todas as meninas que falaram desse

produto falaram bem. Daí eu disse ‘não, eu preciso conhecer!’. Então eu comprei e realmente é

maravilhoso. (Leitora 9)

Ainda assim, algumas leitoras enfatizam a necessidade de bom senso na utilização da

informação disponibilizada nos blogs. Muitas vezes, é uma questão de adequação da

indicação às reais necessidades da leitora. Talvez para essas leitoras, a capacidade de

persuasão dos comentários das blogueiras seja menor do que para outras leitoras.

Não é qualquer coisa que o blogueiro fala que eu vou usar [...] Eu tenho esse discernimento, de

utilizar as informações, de saber utilizar as informações a meu favor. (Leitora 5)

4.2 Blogs e os demais meios de comunicação

As opiniões das leitoras de blogs e de suas escritoras revelam considerações

importantes sobre a posição que os blogs ocupam para elas como ferramentas de comunicação

e divulgação de produtos frente aos demais meios de comunicação.

De maneira geral, a primeira opinião considerada pelas entrevistadas para a decisão de

compra é a de amigos, familiares, conhecidos, colegas de trabalho, etc. Em seguida, aparecem

as ferramentas da internet, como os blogs, os fóruns de debate e os sites. Só então aparecem

os demais veículos de comunicação, como a televisão, os jornais, as revistas, etc.

Eu vejo primeiro quais dos meus amigos já compraram, ou já experimentaram determinado

produto. E se nenhum deles experimentou, eu vou atrás de pessoas que já experimentaram, em

16

Page 17: file · Web viewResumo. Qual o melhor creme para meu tipo de cabelo? Aquele carro é tão bom quanto mostra a propaganda da televisão? Esses e outros questionamentos fazem parte

fóruns da internet. Que daí é o mesmo mecanismo do blog: são pessoas que testaram

determinado produto e estão dividindo suas opiniões, tão dizendo se é bom, se é ruim...

(Leitora 7)

O blog é legal, porque o blog, a internet, eu vou buscar quando estou interessada, não é que

nem a televisão, que eu estou assistindo ao programa, de repente vem um anúncio [...] Eu não

estou a fim de ver aquilo. (Leitora 9)

[...] o site de uma revista que indica ‘ah, esse produto é bom’... Eu acho que blog é uma coisa

mais pessoal... a pessoa foi lá e ‘ah, eu comprei isso, testei isso’. Bom, entre esses dois eu

confio mais no blog. (Leitora 4)

O que fica claro nas entrevistas realizadas é que as pessoas que utilizam o blog como

fonte de informação e referência consideram importante obter o maior número possível de

informações acerca do produto antes de realizar a compra. Nesse sentido, a circulação da

informação assume papel primordial.

[...] essa troca de opiniões eu acho que é a alma do negócio, dessa divulgação de produtos,

funciona. (Leitora 9)

[...] quanto mais informação eu conseguir sobre aquele produto que eu quero, melhor, pra eu

ter certeza se é bom mesmo e que não vou me arrepender. (Leitora 2)

Eu acho que o boca a boca [...] As pessoas, seja amigo, ou... pessoas como blogueiros [...] mas

é esse boca a boca, é o que as pessoas falam, não a propaganda, assim, simplesmente. (Leitora

5)

4.3 Blogueiras: produtoras ativas de sinais de consumo

Frente à ampla influência sobre as decisões de consumo das leitoras, a opinião das

blogueiras acaba conferindo a elas um papel de referência de consumo. Conforme sugerem

Huang et al. (2007), o ato de “blogar” está diretamente relacionado ao conjunto de condições

da pós-modernidade, visto que o blogueiro acaba engajando-se em múltiplas experiências de

consumo, tornando-se produtor ativo de símbolos e sinais de consumo.

17

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A opinião das blogueiras com certeza influencia o consumo porque eu já fiz várias compras

depois que eu comecei a ler os blogs. Tinha maquiagens que eu, passavam despercebidas ao

meu ver assim, na farmácia, principalmente. (Leitora 9)

Eu vejo um blog, sim, como uma referência para consumo [...] através de um blog que eu li e

que a blogueira colocou ali que o produto era maravilhoso e os seus benefícios, e eu acabei

comprando. (Leitora 11)

Nesse sentido, alguns trechos das entrevistas das blogueiras revelam que as mesmas

também se consideram referências de consumo, principalmente pelas experiências de

utilização de produtos e serviços que elas relatam em seus blogs e pela repercussão positiva

disso junto às leitoras.

Uma referência de consumo? Ai, eu acho que sim! [risos] Eu acho que sim, porque se tu olhar

pro meu banheiro ali, tu vai a quantidade de produto de cabelo que eu tenho só naquela

cestinha, fora o que está no box [...] E eu falo mesmo a respeito dos produtos que eu uso.

(Blogueira A)

[...] o blog cresceu muito mais que a gente esperava [...] Modéstia à parte, virou uma referência

sim [...] os blogs que a gente lia e gostava, que eram os melhores, os maiores assim, já citam

nosso blog. (Blogueira C)

4.4 Blogueiras: consultoras e especialistas

Um dos aspectos que aparece como delineador na configuração do papel das

blogueiras como influenciadoras do consumo diz respeito à identificação pessoal percebida

pelas leitoras em relação às blogueiras. Assim, apesar de estas serem vistas como especialistas

na área em que escrevem seus blogs, pelo fato de serem pessoas “comuns”, as leitoras acabam

identificando-se com elas, o que valoriza a importância da informação repassada.

[...] o fato de uma pessoa, teoricamente igual a mim – que tem casa, tem família, e tal – estar

ali colocando a sua opinião sobre determinado produto [...] é sinal que aquele produto merece

uma atenção. O profissional, eu sei que ele tá sendo pago pra comentar alguma coisa [...]

18

Page 19: file · Web viewResumo. Qual o melhor creme para meu tipo de cabelo? Aquele carro é tão bom quanto mostra a propaganda da televisão? Esses e outros questionamentos fazem parte

(Leitora 10)

A gente fala: ‘nós somos consumidoras como vocês’. Mas aí também eu acho elas [leitoras] se

identificam por isso. A gente também achava uma droga quando a gente comprava e achava

uma porcaria [...] acho que elas se identificam porque a gente não está simplesmente fazendo

propaganda, a gente usou [os produtos]. (Blogueira B)

Para algumas leitoras, a influência da opinião das blogueiras sobre o consumo ocorre,

mas a caracterização desse processo é vista de forma um pouco diferente. Para elas, a troca de

informação, de maneira informal, caracteriza um processo de compartilhamento de

experiências pessoais e até mesmo aconselhamento. Esse caráter de utilidade pública da

informação disponibilizada pelos blogs também é enfatizado no discurso das blogueiras.

[...] é um compartilhamento de experiências pessoais como nunca se teve antes. Dependendo

do que a pessoa coloca no blog, tu sabe o que ela come de manhã, tu sabe que tipo de perfume

ela usa, tu sabe que tipo de escova de dente ela usa [...] E sim, isso é uma referência de

consumo. (Leitora 7)

Alguns meses atrás aqui no Brasil começou a febre da maquiagem mineral dizendo que era

natural. Eu, pela minha formação, eu sei que aquilo não é verdade e eu gosto de abrir o olho

das pessoas. (Blogueira D)

Ainda, por meio do blog, os autores são transformados em especialistas em assuntos

nos quais muitas vezes têm apenas um grande interesse, e passam a ser vistos como

autoridades. Assim, as blogueiras acabam assumindo o papel de consultoras particulares de

beleza, via internet.

[...] a Vica [blogueira] é quase uma consultora mesmo, assim... Porque, ah, como é que hidrata

o cabelo, como é que... Ou sobre tintura: se tintura vai estragar ou não vai estragar, então era

esse tipo de curiosidade que eu tinha que me fez começar a ler esse blog, e... curiosidades que

foram sanadas, que foram respondidas [...] (Leitora 5)

Ela faz quase o trabalho de revista, da sessão de beleza, que testa os produtos, só que tu tem

um pouco mais de confiança. Tu não fica pensando ‘será que pagaram pra revista pra falar

19

Page 20: file · Web viewResumo. Qual o melhor creme para meu tipo de cabelo? Aquele carro é tão bom quanto mostra a propaganda da televisão? Esses e outros questionamentos fazem parte

bem?’. (Leitora 1)

4.5 Leitoras: elas também são referências de consumo

Além da ideia de que as blogueiras são referências de consumo, ao longo das

entrevistas as próprias leitoras aparecem como influenciadoras da opinião e das ações de

compra e consumo. Ao comentar sobre os posts criados pelas blogueiras, as leitoras também

expressam suas experiências com aqueles produtos. Isso faz com que as demais leitoras

consigam uma fonte de informação ampliada para guiar sua tomada de decisão.

Portanto, nota-se que a troca de informações pode acontecer no sentido blogueiras-

leitoras e blogueiras-blogueiras, como já relatado anteriormente, assim como de leitoras para

blogueiras e leitoras para leitoras, conforme pode ser visto nas citações abaixo. Esses achados

sugerem que não apenas quem escreve o blog atua como referência de consumo.

Era uma leitora do blog, falando sobre cabelo, hidratação de cabelos, e falava de um produto, e

ela contava a experiência dela com aquele produto, e eu acabei usando o produto, comprando o

produto e usando, e foi muito, foi perfeito, mas que não veio do post, não veio da Vica

[blogueira], veio de uma leitora dela! (Leitora 5)

[...] às vezes tu lê no blog, e vendo os comentários das outras pessoas, tu consegue escolher

realmente o que tu quer, o que tu vai comprar, o que é que serve pra ti, o que não dá na tua

pele [...] (Leitora 11)

Assim, tanto os depoimentos das blogueiras quanto o relato de outras leitoras

demonstram que as informações disponibilizadas nos blogs podem liberar o consumidor dos

custos de ter que testar produtos e serviços e, talvez, se decepcionar.

4.6 Credibilidade nos blogs

A credibilidade desponta como um requisito fundamental para que o blog e sua

blogueira tornem-se referências de consumo. Essencialmente, ela proporciona o

desenvolvimento da confiança entre os atores envolvidos no processo. Corroborando as

20

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conclusões de Chaiken (1980), Petty, Cacioppo e Goldman (1981) e Ohanian (1991), a

credibilidade do divulgador da informação está diretamente ligada à qualidade do argumento

percebida pelo leitor.

As quatro blogueiras entrevistadas nesse trabalho têm entre suas preocupações o

desenvolvimento de uma ligação de confiança com suas leitoras. Para isso, as mesmas prezam

pelos seguintes comportamentos ao escreverem em seus blogs:

a publicação de fotos e especificação das fontes de referência utilizadas;

o apreço pela liberdade de expressão, com divulgação da opinião pessoal em

relação aos assuntos, seja ela positiva ou negativa;

a experimentação prévia do produto ou serviço, diminuindo o risco de frustração

das leitoras ao usar tal produto;

e por fim, a independência financeira, ou seja, nenhuma das blogueiras é

patrocinada por marca ou empresa.

4.6.1 Fotos e fontes de informação

Para ganhar a confiança das leitoras, os três blogs pesquisados utilizam fotografias

para ilustrar os produtos, indicando que a blogueira definitivamente comprou/usou

determinado produto antes de fazer o post – termo utilizado para se referir à publicação de um

texto no blog. A imagem opera como uma espécie de garantia de que o produto foi utilizado e

de que a informação prestada foi proveniente do uso do produto. Uma das blogueiras relata

que esse apreço à foto chega a reduzir o número de posts, visto que para produzir uma

imagem é preciso um esforço extra da sua parte.

Eu acho que a foto dá credibilidade. Às vezes a pessoa fala que comprou, mas, assim, não tem

nada pra provar que ela comprou. Pode ser que ela recebeu pra falar daquilo... eu tenho essa

visão porque sei que isso existe. (Blogueira C)

Além disso, a citação da fonte original de uma informação publicada é considerada

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essencial entre as blogueiras. As entrevistadas reforçam o seu comprometimento com as

fontes de informações e a necessidade de referenciá-las dentro do post.

[...] geralmente eu pego algumas informações, traduzo e coloco no blog, mas sempre dando a

referência de onde foi tirado e sempre colocando o link, dizendo: foi tirado de tal lugar, e o

link tá ali. Nunca plagio. [...] Eu sempre procuro citar o máximo possível de informação,

principalmente se eu peguei informação de outro lugar, porque a minha ideia não é roubar

informação de outros, é simplesmente traduzir porque tem muitas pessoas que não falam inglês

ou, quando é um vídeo, então, nem que tu faça a mesma versão em português e dê o crédito

pra pessoa. (Blogueira D)

Portanto, através do uso de imagens e citação de fontes, as blogueiras buscam se

assegurar da qualidade da informação. Como mencionam Xin e Belk (2007), as imagens

operam como autoexpressão e há a construção de uma identidade ideal pelo blogueiro: a de

especialista no assunto. É uma forma de incrementar o conteúdo publicado, uma vez que ele é

fruto, principalmente, da experiência pessoal, não especializada, das blogueiras.

4.6.2 Liberdade e transparência

Na opinião das blogueiras, a liberdade para escrever suas reais opiniões é um fator

crucial para a credibilidade do blog e necessário para mantê-lo crível diante das leitoras.

Eu falo dos produtos que uso e que gosto. É assim... se eu usar e não gostar eu vou dizer que

não gostei [...] (Blogueira A)

[...] sempre tem um ponto de vista meu, na história, o que eu acho daquilo, como é que eu saí

atrás, como eu fui atrás do produto, como eu descobri ele, qual é a composição química, o que

significa cada componente [...] dou a minha opinião, a opinião de outros sites. (Blogueira D)

A liberdade de opinião também é vista pelas leitoras como um ponto crucial para a

credibilidade da blogueira. Grande parte dos posts transmite credibilidade por serem

considerados frutos da livre expressão e não relacionados a opiniões externas ou a qualquer

outra forma de influência.

22

Page 23: file · Web viewResumo. Qual o melhor creme para meu tipo de cabelo? Aquele carro é tão bom quanto mostra a propaganda da televisão? Esses e outros questionamentos fazem parte

Assim como a liberdade, a transparência na comunicação com as leitoras é

considerada importante pelas blogueiras, uma vez que, pela exposição contínua, a falta de

transparência seria imediatamente percebida, resultando em perda de credibilidade.

4.6.3 Uso e conhecimento dos produtos

Os blogs investigados neste estudo lidam com a experimentação de produtos e, desta

experiência, resultam os posts com a opinião dos autores dos blogs. Algumas leitoras

abordaram como sendo essencial para a credibilidade do blog o fato de as blogueiras

experimentarem o produto e, só então, fornecerem suas opiniões.

O que é legal ali é a experiência pessoal que ela divide com os leitores. [...] Porque eu acho

que o consumo de produtos depende muito de experiência pessoal. (Leitora 7)

Outro ponto em comum em relação às blogueiras é o abrangente conhecimento

demonstrado e os detalhes na descrição do uso do produto. As leitoras entrevistadas apontam

como sendo bastante relevante o conhecimento que a blogueira tem ou representa ter.

[...] elas colocam a realidade do produto, o que aconteceu, se o cheiro é bom, se deu alergia, se

não deu, algumas coisas assim. Isso é bom. A gente acaba vendo além do que o fabricante do

produto mostra. [...] Elas aparentam ser especialistas. Então tu acaba considerando a opinião

delas. (Leitora 9)

As pessoas acabam indo e perguntando porque sabem que aquela pessoa tem informação, [...]

sabem dizer: isso aqui tem qualidade, isso aqui não. Porque o blog é a opinião de alguém [...]

(Leitora 1)

A construção da credibilidade do blog não é resultado exclusivo da reputação ou

credibilidade do blogueiro em si. Algumas entrevistadas afirmam que a decisão de seguir ou

não a dica do blogueiro é reflexo também de uma “verificação” dos comentários de outras

leitoras ou até mesmo de outros sites/blogs. Ou seja, há uma comparação entre o conteúdo

produzido pelo autor do blog e os seus leitores.

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Tu acaba criando uma rede social ali sobre aquela questão, então tu vai vendo: ah, fulana

comentou, ‘ah é bom’, outra falou que é bom. Então tu vai vendo, ‘ah, então realmente é bom’.

Não se trata realmente só dela, da resposta dela, do que ela tá passando, mas sim do contexto

geral do blog. (Leitora 2)

Eu acho que os blogs, eles servem muito pra que a gente possa absorver opiniões diferentes.

Porque daqui a pouco uma menina usou tal produto e funcionou perfeitamente pra ela, mas

isso não quer dizer que funcionou pra todo mundo. Então daqui a pouco já vem uma opinião

diversa, e outra, e outra e assim a gente vai... Eu vou tirando a minha opinião. (Leitora 9)

Estes achados corroboram o trabalho de Chu e Kamal (2008) sobre a credibilidade dos

blogueiros e a escrutinização dos argumentos do mesmo.

4.6.4 Ganho financeiro

A existência ou não de patrocínio é um tópico latente dentro da temática em questão.

Nota-se que aqueles blogs que adquirem fama e prestígio geralmente acabam sendo

procurados por empresas que têm interesse em patrociná-los. O discurso das quatro blogueiras

entrevistadas converge em um ponto: o retorno financeiro não compensa a perda de liberdade

de expressão. Isso vai ao encontro das afirmações de Hope (2002) que indicam que os blogs

possuem credibilidade ao falar de marcas porque os blogueiros são considerados

independentes de interesses empresariais. Apesar de nenhuma das blogueiras entrevistadas

receberem dinheiro para escrever, todas já refletiram sobre o tema.

Tô achando que o caminho é ser autêntico mesmo, é não aceitar jabá [apoio financeiro] [...] Aí

perde o objetivo do blog que é de compartilhar experiências, né? É tu falar livremente dos

produtos [...] Depois se eu quiser falar mal, eu não vou poder falar mal, e eu quero poder falar

mal sabe. (Blogueira A)

Na visão da maioria das leitoras entrevistadas, o apoio financeiro pode minar a

credibilidade do blog, porque faz com que as opiniões do blogueiro sejam percebidas como

elaboradas para agradar aqueles que o apoiam financeiramente.

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[...] Aí já mudaria um pouco minha visão [...] Tu fica sem saber na realidade se ela tá falando

aquilo porque é aquilo mesmo ou se porque ela tá falando aquilo porque tão pagando [...] Aí já

perde um pouco a credibilidade realmente. (Leitora 2)

Ok, legal pra divulgar um novo produto, mas eu não confio tanto na opinião da pessoa.

Principalmente se ressaltar muito, tipo: ‘ah, esse produto é maravilhoso, faz milagres’, porque

ela tá sendo paga [...] Se não for pago, por que ela vai mentir? Ela vai tá sujando a imagem

dela, porque tipo, provavelmente elas tão colocando ali a cara a tapa. (Leitora 4)

Apenas uma das leitoras disse não se importar com o patrocínio do blog, pois

existiriam outras fontes passíveis de comparação na internet e que poderiam definir a validade

da opinião da blogueira. Outra leitora declarou que aprovaria o patrocínio, desde que fosse

mantida a liberdade nas opiniões sobre os produtos. Assim, de forma geral, evidencia-se a

preocupação com a restrição que o patrocínio poderia impor sobre a liberdade do blogueiro

em comunicar sua verdadeira opinião.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A utilização dos blogs no processo de tomada de decisão é um fenômeno cada vez

mais recorrente entre os consumidores. Como alguns autores já apontaram, a busca de

informações em blogs acarreta em redução do tempo exigido pelo processo de decisão, além

de diminuir o nível de esforço cognitivo necessário (Hennig-Thurau & Walsh, 2008;

Wiedmann, Walsh & Mitchell, 2001). Com o auxílio da técnica videográfica – que possibilita

uma experiência muito mais rica no contato com o objeto pesquisado, permitindo a captura de

informações que, de outra forma, seriam perdidas –, alguns achados puderam ser feitos em

relação ao papel dos blogueiros como referências de consumo.

De fato, a gravação das entrevistas em vídeo – e sua posterior transformação em peça

audiovisual – traz duas importantes contribuições para um estudo sobre comportamento do

consumidor. Primeiro, a observação, por parte dos pesquisadores, de informações que

25

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extrapolam os elementos textuais permite que outras nuances e significados sejam percebidos

no objeto de estudo, tornando a análise mais profunda. Por outro lado, a apresentação dos

resultados do estudo em vídeo (Rossi et al., 2009) adiciona novos elementos ao trabalho

escrito, possibilitando uma percepção diferente por parte da audiência. Assim, a utilização

conjunta de texto e vídeo enriquece a compreensão, tornando os dois recursos

complementares.

Em primeiro lugar, é interessante perceber como as leitoras dos blogs conferem

credibilidade a pessoas que não conhecem pessoalmente. Mesmo que não haja contato

presencial com os blogueiros, esses atuam como influenciadores na tomada de decisão de seus

leitores. Umas das causas para que isso ocorra pôde ser percebida ao longo do discurso das

leitoras e está relacionada à percepção dos blogueiros como pessoas comuns, que consomem e

enfrentam os mesmos problemas de tomada de decisão de consumo das leitoras. Devido a

essa identificação com as blogueiras e também ao reconhecimento de que são pessoas com

alto conhecimento naquele assunto, as leitoras acabam valorizando a informação transmitida

por meio do blog.

O caráter pessoal do blog (ou seja, sem ligação aparente ou patrocínio de empresas)

também parece conferir maior credibilidade às blogueiras e às opiniões publicadas, como

afirmou Hope (2002). Este fato acarreta um aparente dilema na exploração dos blogs por parte

das empresas. Ao mesmo tempo em que existe uma oportunidade de aproveitar a

credibilidade dos blogs para promover produtos e fazer lançamentos, a percepção por parte

dos leitores de que há uma associação da empresa com o blog pode vir justamente a

prejudicar tal credibilidade.

Ainda em relação ao interesse corporativo sobre blogs pessoais, as empresas deparam-

se com uma possível ameaça, uma vez que o conteúdo destes blogs é personalizado e difícil

de ser controlado. Estes podem apresentar críticas a produtos e serviços, a ponto de

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influenciar negativamente a opinião dos consumidores acerca de determinada marca, criando

um ambiente apto a prejudicar uma imagem.

Outra observação interessante dentro desse trabalho é a constatação de que as leitoras

podem ser tão importantes quanto as blogueiras no processo de disponibilização de

informações sobre produtos. Ambas relatam suas experiências de consumo e suas opiniões no

blog, sendo que esse se torna um veículo de comunicação que permite grande interação entre

os sujeitos. Por conta desta ampla troca de informações os leitores acabam se envolvendo de

forma mais intensa nesta experiência, voltando sua atenção para os blogs em detrimento de

outros tipos de mídia em suas decisões de consumo.

Por fim, é importante ressaltar que, no momento em que os consumidores têm à sua

disposição uma imensa quantidade de informações, saber como selecioná-las torna-se uma

tarefa árdua. Anderson (2006) coloca bem esse problema ao afirmar que a dificuldade hoje

não está em obter as informações em si, mas em tomar decisões inteligentes a partir delas, e

defende que as recomendações servem como “atalhos”, facilitando a seleção das informações

que as pessoas procuram. Por esta razão, os blogs, em virtude da credibilidade associada aos

seus escritores, se tornam referências de consumo recorrentes, apresentando novas formas de

interação e recomendando produtos e serviços. Isso, por sua vez, acaba estimulando empresas

e veículos de comunicação tradicionais a se adaptarem a essa nova configuração.

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