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    UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SULFACULDADE DE EDUCAO

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM INFORMTICA NA EDUCAOCURSO DE DOUTORADO EM INFORMTICA NA EDUCAO

    TESE DE DOUTORADO

    APRENDIZAGEM DEESCRITA DELNGUA DESINAIS PELO SISTEMASIGNWRITING: LINGUAS DESINAIS NO PAPEL E NO COMPUTADOR

    Marianne Rossi Stumpf

    Porto Alegre2005

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    Marianne Rossi Stumpf

    APRENDIZAGEM DEESCRITA DELNGUA DESINAIS PELO SISTEMASIGNWRITING: LNGUAS DESINAIS NO PAPEL E NO COMPUTADOR

    Tese apresentada ao Programa de Ps-graduao emInformtica na Educao do Centro Interdisciplinar de Novas Tecnologias na Educao da UniversidadeFederal do Rio Grande do Sul, para obteno do ttulo deDoutor em Informtica na Educao.

    Orientador: Prof. Dr. Antnio Carlos Rocha da CostaUFRGS

    Co-orientadora: Prof. Dra. Carla Beatris ValentiniUCS

    Porto Alegre2005

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    CIP CATALOGAO NA PUBLICAO

    STUMPF, Marianne Rossi.Aprendizagem de Escrita de Lngua de Sinais pelo sistema SignWriting: Lnguas de Sinaisno papel e no computador / Marianne Rossi Stumpf Porto Alegre: UFRGS, CINTED,PGIE, 2005.

    Tese (doutorado) Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Centro de EstudosInterdisciplinares em Novas Tecnologias na Educao. Curso de Ps-Graduao emInformtica na Educao. Porto Alegre, RS, 2005. Orientador: Prof Dr. Antnio CarlosRocha da Costa UFRGS. Co-orientador: Prof. Dra. Carla Beatris Valentini - UCS

    Tese: Educao de Surdos, Lngua de Sinais, Escrita de Lngua de Sinais. SistemaSignWriting

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    (TERMO DE APROVAO)

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    P ara meus pais,Mariana e Heitor, por todo

    carinho e apoio,sempre presentes.

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    AgradecimentosAo concluir este trabalho, gostaria de agradecer a todos os que contriburam e

    tornaram ele possvel.Ao Prof. Dr. Antnio Carlos da Rocha Costa, meu orientador, meu amigo. Sempre

    muito exigente, demonstrou otimismo e confiana em meus estudos, durante todo o tempo.Com sua motivao e incentivos me orientou a analisar os problemas por diferentes pontosde vista.

    Prof. Dra. Carla Beatris Valentini, minha co-orientadora que, com sensibilidadee interesse, sem se assustar com o tempo reduzido, disps-se a rever comigo todas asmincias de meu trabalho possibilitando a que ele se apresentasse mais correto e

    organizado. Prof. Dra. Margaret Axt, representando a Coordenao deste programa de Ps-Graduao em Informtica na Educao, por tornar possvel este curso de Doutorado.

    todos os professores de PGIE pela forma compreensiva e agradvel com que meensinaram em suas aulas.

    Maria do Carmo que emprestou sua experincia e compreenso a facilitar meustrmites burocrticos e a tornar a questo do intrprete e da concesso da bolsa dedoutorado possveis para mim.

    Dra. Mrcia Campos minha primeira mentora no mundo da informtica naeducao e minha amiga incondicional.

    Aos intrpretes de Libras por sua presena quando da traduo da novidade de

    sentido. Valerie Sutton pela amizade e pelos valiosos livros de SignWriting. Federao Nacional de Educao e Integrao dos Surdos FENEIS, aos colegas

    e aos funcionrios que me apoiaram com a fora e a inspirao para concluir o curso dedoutorado.

    De forma especial, a Escola de Ensino Fundamental Frei Pacfico e ao Institut deRecherches sur les Implications de la Langue des Signes de Toulouse - Frana que mereceberam de portas abertas, apostando nos meus projetos e compartilhando,solidariamente, minhas inquietaes.

    Aos professores Patrice Dalle e Michel Lamothe e s Doutoras Ivani Fusellier eBrigitte Garcia que me orientaram em terra estrangeira e at em suas casas me acolheram.

    s queridas colegas de Toulouse: Juliette Dalle e Mary Laurent que abraaramminha causa compartilhando comigo o mesmo desejo de contribuirmos, com um trabalhocuidadoso, para tornar mais conhecidas e valorizadas nossas lnguas de sinais.

    E a todos os meus amigos, cada um seu modo, pela presena constante nosdiferentes momentos vividos neste perodo.

    todos os que participaram dos experimentos desta pesquisa, pelo interesse,dedicao e riqueza de seus depoimentos. Muito obrigada! Deus, pela vida !

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    SUMRIO

    RESUMO............................................................................................................................14 ABSTRACT........................................................................................................................15 1 APRESENTAO .........................................................................................................16

    1.1 MINHA HISTRIA........................................................................................................161.2 ORIGEM DA PESQUISA.................................................................................................17

    2 INTRODUO E ESTUDOS TERICOS.................................................................22 2.1 NOVOS PARADIGMAS OFERECIDOS PELAS CINCIAS DA MENTE...................................262.2 AQUISIO DA LINGUAGEM........................................................................................282.3 ASPECTOS FORMAIS DA LNGUA DE SINAIS BRASILEIRA...............................................322.4 AQUISIO DA ESCRITA..............................................................................................342.5 ESCRITA ALFABETIZAO E LETRAMENTO..................................................................362.6 R EGISTRO DA CULTURA SURDA...................................................................................372.7 A ESCRITA DA LNGUA DE SINAIS................................................................................432.8 SISTEMAS DE NOTAESESCRITAS DELNGUAS DESINAIS........................................47

    2.8.1 A notao de Stokoe............................................................................................47 2.8.2 Notao de Franois Neve..................................................................................48 2.8.3 O Hamnosys - 1989.............................................................................................49 2.8.4 O Sistema D` Sing de Paul Jouison - 1990........................................................50 2.8.5 O Sistema SignWriting - 1974 ............................................................................51 2.8.6 Estrutura do sistema SignWriting - Representao da sinalizao e daespacializao..............................................................................................................53

    3 OBJETIVOS....................................................................................................................97 4 PROBLEMA DE PESQUISA........................................................................................98 5 MTODO ......................................................................................................................101

    5.1 PESQUISA-AO: UMA ESCOLHA DE PRTICA SOCIAL...............................................1016 RESULTADOS E ANLISE DOS DADOS...............................................................108

    6.1 PRIMEIROESTUDO....................................................................................................108

    6.2 R ELATOS...................................................................................................................1197 RESULTADOS E ANLISE.......................................................................................213

    7.1 PRIMEIROESTUDO....................................................................................................2147.2 SEGUNDOESTUDO....................................................................................................225

    8 SOFTWARES UTILIZADOS NA PESQUISA .........................................................226 8.1 O SIGNWRITER ........................................................................................................2288.2 SIGNPUDDLE1..........................................................................................................232

    9 RELATOS .....................................................................................................................234 9.1 R ELATOS DASTRANSCRIES...................................................................................244

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    10 CONCLUSES, LIMITAES E TRABALHOS FUTUROS.............................266 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS...........................................................................271 ANEXOS...........................................................................................................................277

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    NDICE DE FIGURAS

    FIGURA 1: CONFIGURAES DAS MOS STOKOE...........................................................................48 FIGURA 2: CONFIGURAES DAS MOS FRANOIS XAVIER NVE ........................................... 49 FIGURA 3: CONFIGURAES DAS MOS FORMAS BSICAS HAMNOSYS.............................. 50 FIGURA 4: EXEMPLO DE D`SIGN DE PAUL JOUISON...........................................................................51 FIGURA 5: A CABEA E O CORPO ESTO AO CENTRO ......................................................................55 FIGURA 6: O CORPO DESCOLA-SE PARA FORA DO CENTRO ............................................................ 55 FIGURA 7: UMA SENTENA EM COLUNA..............................................................................................56 FIGURA 8: SINAIS DE SURDOS..................................................................................................................57 FIGURA 9: PONTO DE VISTA EXPRESSIVO............................................................................................62 FIGURA 10: SINAL DE CERTO ................................................................................................................... 62 FIGURA 11: SMBOLOS DE CONFIGURAES DE MOS SEM ESPECIFICAR QUAL DELAS....... 63 FIGURA 12: A POSIO DO CONTATO....................................................................................................63

    FIGURA 13: REGRA DE GRAFIA................................................................................................................64 FIGURA 14: SINAIS COMPOSTOS..............................................................................................................65 FIGURA 15: ORIENTAO DA PLANA.....................................................................................................65 FIGURA 16: ROTAO DE MO................................................................................................................65 FIGURA 17: TIPOS DE SMBOLOS DE MOVIMENTOS...........................................................................77 FIGURA 18: TIPOS DE SMBOLOS DE CONTATOS ................................................................................ 78 FIGURA 19: SEIS SMBOLOS DE MOVIMENTOS DOS DEDOS.............................................................79 FIGURA 20: SMBOLOS DE MOVIMENTOS DOS DEDOS......................................................................80 FIGURA 21: SOBRANCELHAS....................................................................................................................80 FIGURA 22: BOCA ........................................................................................................................................ 81 FIGURA 23: DENTES....................................................................................................................................82 FIGURA 24: LNGUA....................................................................................................................................82 FIGURA 25: OLHOS......................................................................................................................................83 FIGURA 26: BOCHECHA ............................................................................................................................. 83 FIGURA 27: NARIZ....................................................................................................................................... 84 FIGURA 28: OUTRO......................................................................................................................................84 FIGURA 29: MOVIMENTO DE CABEA ................................................................................................... 85 FIGURA 30: CORPO......................................................................................................................................85 FIGURA 31: EXEMPLOS DE CORPO..........................................................................................................86 FIGURA 32: POSIO DE CABEA...........................................................................................................86 FIGURA 33: OMBRO.....................................................................................................................................86 FIGURA 34: POSIO DE TRONCO...........................................................................................................87 FIGURA 35: POSIO DO BRAO.............................................................................................................87 FIGURA 36: PLANO PAREDE......................................................................................................................89 FIGURA 37: PLANO CHO..........................................................................................................................89 FIGURA 38: MOVIMENTO CIRCULAR......................................................................................................90 FIGURA 39: POSIES DE MOVIMENTO CIRCULAR............................................................................90 FIGURA 40: EXEMPLOS DE SMBOLOS DE MOVIMENTOS EM CRCULOS. .................................... 91 FIGURA 41: PONTUAO...........................................................................................................................91 FIGURA 42: EXEMPLO DE PONTUAO.................................................................................................92 FIGURA 43: ALFABETO MANUAL ............................................................................................................ 92 FIGURA 44:FORMA SIMPLIFICADA ......................................................................................................... 94 FIGURA 45: FORMA PADRO....................................................................................................................95 FIGURA 46: SINAL ESCRITO DE MARIANN.......................................................................................... 106 FIGURA 47: SINAL DE LOBO....................................................................................................................120 FIGURA 48: SINAL DE CASA E MOS FAZENDO O SINAL DE CASA..............................................120 FIGURA 49: SINAL DE COMER E DESENHO DE PRATO.....................................................................120 FIGURA 50: SINAL DE PSSARO............................................................................................................ 121 FIGURA 51: SINAL DE PSSARO COM EXPRESSO FACIAL ........................................................... 121 FIGURA 52: SINAL DE CASA....................................................................................................................122 FIGURA 53: SINAL DE PAPAI...................................................................................................................122 FIGURA 54: DESENHO DE BOLA.............................................................................................................122

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    FIGURA 55: SINAL DE BOLA....................................................................................................................122 FIGURA 56: SINAL DE FUTEBOL.............................................................................................................123 FIGURA 57: DEDO INDICADOR...............................................................................................................123 FIGURA 58: GRUPO 1.................................................................................................................................124 FIGURA 59: SINAIS DO GRUPO 1 ............................................................................................................ 124 FIGURA 60: GRUPO 2.................................................................................................................................125 FIGURA 61: SINAL DE SEGUNDA-FEIRA...............................................................................................125 FIGURA 62: SINAL DE NICOLE................................................................................................................125 FIGURA 63: SINAL DE ROSA....................................................................................................................125 FIGURA 64: GRUPO 3.................................................................................................................................127 FIGURA 65: GRUPO 4.................................................................................................................................128 FIGURA 66: JOGO DE DOMIN................................................................................................................128 FIGURA 67: JOGO DE MEMRIA.............................................................................................................129 FIGURA 68: GRUPO 5.................................................................................................................................130 FIGURA 69: GRUPO 6.................................................................................................................................131 FIGURA 70: REDAO EM SIGNWRITING............................................................................................133 FIGURA 71: GRUPO 7 E 8 .......................................................................................................................... 135 FIGURA 72: JOGO DE MEMRIA............................................................................................................ 136 FIGURA 73: GRUPO 9.................................................................................................................................137 FIGURA 74: GRUPO 10...............................................................................................................................138 FIGURA 75: SINAL DE MOTO...................................................................................................................139 FIGURA 76: CONFIGURAO DA MO.................................................................................................139 FIGURA 77: FRASE EM SIGNWRITING...................................................................................................140 FIGURA 78: JOGO DE MMICA.................................................................................................................141 FIGURA 79: SMBOLO DE MOVIMENTO .............................................................................................. 142 FIGURA 80: DIA DAS CRIANAS............................................................................................................ 143 FIGURA 81: ESPAO DE SINALIZAO................................................................................................157 FIGURA 82: OFICINA DE SIGNWRITING NA ASSOCIAO DE SURDOS EM TOULOUSE........... 168 FIGURA 83: O CARTAZ NO QUADRO-NEGRO......................................................................................173 FIGURA 84: O JOGO DE RECONHECER O NMERO............................................................................ 174 FIGURA 85: CADERNO DO ALUNO.........................................................................................................181 FIGURA 86: OS CARTAZES COM OS SEUS SINAIS ESCRITOS QUE OS ALUNOS PENDURARAM

    NO ARMRIO. ................................................................................................................................... 183 FIGURA 87: O ALUNO ESCREVEU A HISTRIA DO CAVALO COMPLETA....................................185 FIGURA 88: CADERNO DE MENINO.......................................................................................................186 FIGURA 89: OS SMBOLOS DE PERSONAGENS DO LIVRO................................................................187 FIGURA 90: OS TRS SINAIS ESCRITOS COM OS NOMES DOS ALUNOS....................................... 189 FIGURA 91: PRIMEIRO DIA, QUANDO DISTRIBU O RESUMO DO MANUAL DE SIGNWRITING

    ..............................................................................................................................................................193 FIGURA 92: ALUNA USOU RGUA.........................................................................................................193 FIGURA 93: A PROFESSORA AUXILIAR EXPLICA PARA A ALUNA COMO LER O SINAL

    ESCRITO.............................................................................................................................................194 FIGURA 94: A PROFESSORA AUXILIAR EXPLICA PARA OS ALUNOS USANDO O QUADRO.... 194 FIGURA 95: ALUNA ESCREVENDO UM SINAL ESCRITO NO QUADRO-BRANCO........................196 FIGURA 96: ONDE ESTOU EXPLICANDO SOBRE OS SMBOLOS DOS VRIOS TIPOS DE

    MOVIMENTOS...................................................................................................................................198 FIGURA 97: FRASES EM SIGNWRITING ............................................................................................... 199 FIGURA 98: ELAS ESTO LENDO A CARTA E SINALIZANDO..........................................................201 FIGURA 99: ELES ESTO CONSTRUINDO OS SINAIS ESCRITOS DOS SINAIS DOS SEUS NOMES

    NO QUADRO...................................................................................................................................... 202 FIGURA 100: ELE COLOCOU OS CARTAZES NA PAREDE ................................................................ 202 FIGURA 101: ELAS ESTO CONSTRUINDO O SINALRIO PARA O CARTAZ DE BEM -VINDO. 203 FIGURA 102: ESTE TRABALHO DE PROFESSORA AUXILIAR COM DUAS ALUNAS.................... 204 FIGURA 103: ELAS ESTO LENDO O TEXTO SOBRE MINHA VIAGEM A PARIS. ......................... 205 FIGURA 104: EU ESCREVI A PERGUNTA: O QUE PENSAM DA AULA DE SIGNWRITING, NO

    QUADRO BRANCO........................................................................................................................... 208

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    FIGURA 105: ALUNA RESPONDENDO A PERGUNTA NO QUADRO BRANCO...............................208 FIGURA 106: OUTRA ALUNA RESPONDENDO NO QUADRO BRANCO .......................................... 209 FIGURA 107: ALUNA COPIOU O QUADRO BRANCO .......................................................................... 209 FIGURA 108: ALUNA ESCREVEU A HISTRIA DO NIBUS..............................................................210 FIGURAS 109: DESENHO E SINAL DE CASA.........................................................................................217 FIGURA 110: SINAL DE SURDO...............................................................................................................218 FIGURA 111: SINAL DE MAME............................................................................................................. 219 FIGURA 112: O ALUNO ESCREVEU A HISTRIA DO CAVALO ........................................................ 224 FIGURA 113: SOFTWARE DE SW-EDIT .................................................................................................. 227 FIGURA 114: SMBOLO NO TEXTO.........................................................................................................227 FIGURA 115: ESCOLHA OS SIGNOS........................................................................................................228 FIGURA 116: SIGN WRITER OPO ESCRITA DE LNGUA DE SINAIS ........................................ 229 FIGURA 117: TECLAS ESPECIAIS............................................................................................................229 FIGURA 118: TECLADO DE SIGN WRITER............................................................................................230 FIGURA 119: LUGAR DOS DEDOS .......................................................................................................... 230 FIGURA 120: OS DEDOS NAS TECLAS...................................................................................................230 FIGURA 121: O SITE DE SIGNPUDDLE...................................................................................................233 FIGURA 122: E-MAIL EM SIGNWRITING...............................................................................................233 FIGURA 123: O EXERCCIO PARA LIGAR O DESENHO DA CONFIGURAO DA MO COM O

    SMBOLO CORRESPONDENTE ...................................................................................................... 235 FIGURA:124: POSIES SMBOLOS DAS CONFIGURAES DAS MOS.......................................236 FIGURA 125: COMPARANDO A MO COM O SMBOLO .................................................................... 238 FIGURA 126: SINAIS ESCRITOS PELAS DUAS ALUNAS.....................................................................239 FIGURA 127: MANUAL DO TECLADO....................................................................................................241 FIGURA 128: OS DILOGOS EM VDEO.................................................................................................255 FIGURA 129: A HISTRIA EM VDEO.....................................................................................................261

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    INDICE DE TABELAS

    TABELA 1: GRUPOS DE SMBOLOS NO SIGNWRITING ....................................................................... 60 TABELA 2: CONFIGURAES BSICAS DE MO NO SISTEMA SIGNWRITING............................. 61 TABELA 3: ADICIONAR LINHAS PARA OS DEDOS...............................................................................61 TABELA 4: GRUPO 1....................................................................................................................................66 TABELA 5: GRUPO 2....................................................................................................................................67 TABELA 6: GRUPO 3....................................................................................................................................68 TABELA 7: GRUPO 4....................................................................................................................................69 TABELA 8: GRUPO 5 PARTE 1 ................................................................................................................ 70 TABELA 9: GRUPO 5 PARTE 2 ................................................................................................................ 71 TABELA 10: GRUPO 5 PARTE 3 .............................................................................................................. 72 TABELA 11: GRUPO 6..................................................................................................................................73 TABELA 12: GRUPO 7..................................................................................................................................74

    TABELA 13: GRUPO 8..................................................................................................................................74 TABELA 14: GRUPO 9 PARTE 1 .............................................................................................................. 75 TABELA 15: GRUPO 9 PARTE 2 .............................................................................................................. 76 TABELA 16: GRUPO 10................................................................................................................................77 TABELA 17: DINMICAS............................................................................................................................88 TABELA 18: TURMA DE 2 SRIE............................................................................................................108 TABELA 19: TURMAS E ATENDIMENTOS DO PRIMRIO DA ESCOLA CENTRE DE

    RAMONVILLE ................................................................................................................................... 114 TABELA 20. TURMA E ATENDIMENTO DO MATERNAL DA ESCOLA SAJU DE RAMONVILLE 115 TABELA 21: TURMAS E ATENDIMENTOS DO ENSINO FUNDAMENTAL DO COLGIO ANDR

    MALRAUX DE RAMONVILLE........................................................................................................115 TABELA 22: ATIVIDADES NA ESCOLA CENTRE DE RAMONVILLE ............................................... 151 TABELA 23: ESCOLA CENTRE DE RAMONVILLE...............................................................................170 TABELA 24: TURMA DE CE2....................................................................................................................176 TABELA 25: TURMA DE CM1...................................................................................................................179 TABELA 26: TURMA DE MG/GS .............................................................................................................. 185 TABELA 27: TURMA DE COLGIO ......................................................................................................... 190

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    LISTA DEABREVIATURAS

    ASL American Sign LanguageELS Escrita de Lngua de SinaisLIBRAS Lngua Brasileira de SinasLS Lngua de SinaisLSF Lngua de Sinais FrancesaFENEIS Federao Nacional de Educao e Integrao dos SurdosTI Tecnologias de Informao

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    RESUMO

    APRENDIZAGEM DA ESCRITA DE LNGUA DE SINAIS PELO SISTEMASIGNWRITING: LNGUAS DE SINAIS NO PAPEL E NO COMPUTADOR

    Esta tese trata de como o sistema SignWriting pode servir de suporte a uma nova proposta pedaggica ao ensino da escrita de lngua de sinais e letramento para crianas surdasusurias da Lngua Brasileira de Sinais - Libras e da Lngua de Sinais Francesa - LSF.Escrever deve ser uma atividade significativa para a criana. No caso da criana surda, aescrita fundamenta-se em sua competncia na lngua de sinais, sem precisar daintermediao da lngua oral.A criana surda, quando em um ambiente onde ela e seus colegas se comunicam em lngua

    de sinais, efetivamente tenta escrever sinais, quando incentivada a faz-lo.Em nossos experimentos, usamos o sistema SignWriting para mostrar s crianas surdas (ea seus pais e professores) como escrever textos em lnguas de sinais de ambas as formas:manuscrita e impressa, usando o programa Sign Writer para editar textos em lnguas desinais.A base terica que apia a tese a abordagem bilnge para a educao de surdos, a lnguade sinais, a teoria de Piaget, e de Ferreiro quando trata das etapas da alfabetizao emlngua oral. Esta investigao possui um carter exploratrio, em que o delineamentometodolgico dado pela pesquisa-ao.O primeiro estudo apresenta um levantamento do processo de aquisio da escrita desinais, em sua forma manuscrita, pela criana e jovem surdo no Brasil e na Frana.

    O segundo estudo trata da ajuda que a informtica pode dar a essa aquisio e de comoutilizamos os softwares de escrita de lngua de sinais em aulas de introduo ao uso docomputador e em transcries da LSF de corpus vdeo para a escrita de lngua de sinais.Os resultados sugerem que as crianas evoluem em sua escrita, pois muitos signos que elasescreveram no foram sugeridos pela experimentadora, nem por outro meio, mas surgiramespontaneamente. A introduo de um software como o Sign Writer ou o SW-Edit nasclasses para introduzir as TI traz a essas aulas muito maior interesse do que quando usamosum editor de textos na lngua oral. Tambm as produes das crianas so maissofisticadas.As concluses indicam que a escrita de lngua de sinais incorporada educao dascrianas surdas pode significar um avano significativo na consolidao de uma educao

    realmente bilnge, na evoluo das lnguas de sinais e aponta para a possibilidade denovas abordagens ao ensino da lngua oral como segunda lngua.

    Palavras-chave: Educao de Surdos, Lngua de Sinais, Escrita de Lngua de Sinais,Informtica na Educao, Softwares em SignWriting.

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    ABSTRACT

    THE LEARNING PROCESS OF SIGN LANGUAGE WRITING THROUGH THE SIGNWRITING SYSTEM: SIGN LANGUAGES ON PAPER AND IN THE COMPUTER

    This thesis describes how the SignWriting system can support a new pedagogic proposal tothe teaching of written sign language and literacy for deaf children using the Brazilian SignLanguage Libras and the French Sign Language LSF.Writing should be a significant activity for the child. In the case of a deaf child, writing is based on his/her competence in sign language, needless of the intermediation of the spoken

    language.The deaf child, when in an environment where he/she and her colleagues communicateusing sign language, indeed tries to write using signs, when encouraged to do so.In our experiments, we used the SignWriting system to show the deaf children (and their parents and teachers) how to write texts in sign languages in both forms: handwritten and printed, using the SignWriter program to edit texts in sign languages.The theoretical basis supporting this thesis is the bilingual approach for the education ofthe deaf, sign language, and the theories of Piaget and of Ferreiro, with their approach ofthe stages of literacy in oral language.This investigation has an exploratory character, where the methodological alignment isgiven by research-action. The first study presents a description of the sign language writing

    acquisition process by the children and youngsters in Brazil and in France.The second study presents how information technology (I.T.) can support this acquisitionand the way sign language writing softwares can be used in introductory lessons ofcomputer skills and in transcriptions of LSF from corpus video to written sign language.The results observed suggest that children evolve in their writing, since many signs and phrases they wrote were not suggested by the researcher nor by other means, they ratherappeared spontaneously. The introduction of a software such as Sign Writer or SW-Editduring the I.T. classes brings significantly higher interest to these lessons when comparedto a text editor in oral language. Also the childrens productions are more sophisticate.The conclusion indicates that sign language writing, when incorporated to the education ofdeaf children, can represent a significant advance in the consolidation of a really bilingual

    education, as well as in the evolution of sign languages, and also indicates the possibilityof new approaches to the teaching of oral language as a second language.

    Key words: Education of the Deaf, Sign Language, Written Sign Language, InformationTechnology in Education, Sign Writing Softwares.

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    1 APRESENTAO

    1.1 Minha histria

    Em 11 de setembro de 1973 aconteceu uma revoluo em Santiago do Chile. Foionde e quando eu nasci, no dia 2 de outubro. Minha famlia brasileira, mas nessa pocameu pai trabalhava l como diretor do Banco do Brasil. Logo depois fui morar no Paraguaie em seguida na Espanha, tambm algum tempo na Argentina e Estados Unidos. Aos noveanos, vindo viver no Brasil, encontrei a minha lngua de sinais na escola de surdos, masantes, j usava muitos sinais inventados com a minha famlia. Tambm na escola desurdos de Madri, que era oralista, ns os pequenos, usvamos os sinais inventadosmisturados com os copiados dos grandes.

    Minha famlia toda ouvinte, sou a nica surda, mas respeitaram minha diferena eaprovaram a minha convivncia com a comunidade surda.

    Algumas vezes, quando minha famlia mudava de cidade estudei em escolas paraouvintes, sempre, no me sentia bem. Na escola de surdos me sentia muito feliz, queriaficar mais na escola e nas frias convidava amigos surdos.

    Durante minha adolescncia, participei de muitos campeonatos esportivos de surdos pelo Brasil e outros eventos dos surdos onde podia me comunicar em sinais. NaUniversidade cursei Tecnologia em Informtica. Tive intrpretes de lngua de sinais paraalgumas aulas mas no suficientes. Tive muitos professores particulares, minha me,escrevia os tapes que eu gravava em aula, me ajudava com as leituras e revisava meustextos, organizando as frases. Precisei me esforar bastante e muitas vezes sentia raiva.

    At chegar a este diploma a luta foi longa. Para os surdos de Porto Alegre que usama Lngua Brasileira de Sinais - Libras para se comunicar, esta luta comeou com a criaode um Ensino Mdio na Escola Especial Concrdia onde adotavam a filosofia daComunicao Total. Da primeira turma que terminou o Ensino Mdio em 1988, nenhumdos formandos conseguiu entrar na universidade, nem tentaram, j que as universidadesno ofereciam nenhum apoio aos surdos.

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    O seguinte passo importante, para ns surdos, foi quando a Universidade Luterana doBrasil - ULBRA concordou em colocar um intrprete da lngua de sinais na prova

    vestibular e a corrigir a redao dando mais valor ao contedo do que forma. A EscolaEspecial Concrdia, que tinha como diretora a professora Beatriz Raymann, empenhou semuito para conseguir isto.

    Eu fui desta primeira turma que comeou a cursar a universidade em 1995, comintrprete no vestibular. Antes alguns surdos cursaram a Universidade e no usaramintrpretes, pois que no exerciam sua identidade surda explicitada no uso da Libras. Hojeso quase 60 surdos usurios da Libras cursando sua graduao na ULBRA. Eles vm de

    muitos estados brasileiros. Nesse momento, h muitas outras universidades brasileiras quetrabalham com intrpretes de Libras.

    1.2 Origem da pesquisa

    Desde que entrei na escola de surdos de Porto Alegre participo da comunidade surda.Hoje trabalho como voluntria e sou diretora de polticas educacionais da Federao Nacional de Educao e Integrao dos Surdos - Feneis, para conquistar o respeito

    Lngua Brasileira de Sinais - Libras e aos direitos humanos dos surdos.

    Em 1995 logo depois que entrei na ULBRA trabalhei como bolsista da FAPERGS junto professora Dra. Lucila Santarosa na UFRGS, era um trabalho com informticaaplicada construo de softwares educativos para os surdos. Eu servia como auxiliar dasfacilitadoras, comunicando em lngua de sinais, o que elas orientavam para os usurios do programa que eram alunos surdos do Ensino Fundamental. A dificuldade de escrever ecompreender o portugus era muito grande.

    De 1996 a 2001, enquanto ainda cursava minha graduao, fui auxiliar de pesquisana Pontifcia Universidade Catlica de Porto Alegre do professor Dr. Antnio CarlosRocha da Costa, para desenvolver o sistema de SignWriting, adaptando-o a Libras, foiquando me apaixonei pela escrita da lngua de sinais. Do trabalho resultou a construo deum manual que explica como escrever os sinais da nossa Lngua Brasileira de Sinais -Libras usando o sistema.

    Tambm fui auxiliar de pesquisa da professora Dra. Mrcia Campos que

    desenvolveu softwares da escrita de lngua de sinais, pelo mesmo sistema, construindo

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    sinais escritos no banco de dados dos softwares que ela desenvolveu. Apresentamos juntasalguns trabalhos em congressos de informtica e de educao de surdos.

    Desde 1996, quando iniciamos o trabalho com a escrita de lngua de sinais ligado informtica, tenho participado de muitos eventos sobre educao de surdos em todo oBrasil e at no exterior. Participei de muito poucos na rea de informtica. A grandedificuldade que nesses eventos no h contratao de intrprete. Nos poucos em que participei, a interpretao aconteceu de forma precria, contando com a boa vontade dealgum que conhecia a Libras e se dispunha a interpretar minha participao em lngua desinais. Esse dado demonstra como, na maioria das situaes, a incluso ainda apenas um

    conceito vazio de contedo real.A escrita de lngua de sinais importante para ns surdos que temos muita

    dificuldade de escrever em portugus. Meu pensamento se d nas duas lnguas, s vezesem lngua de sinais e s vezes em portugus. Como o texto deve ser escrito em portugus,minha me, que foi logopeda por muitos anos em escolas de surdos, l o texto j escrito eorganiza as frases colocando palavras de ligao, mudando tempos de verbos ou pedindo para eu escrever novamente pargrafos que no ficaram claros pelo mau uso da sintaxe queno a de um falante da lngua e s vezes, embaralha o sentido. Minha escrita do portugus melhorou muito, ao longo de meu doutorado e tambm minha compreenso dasleituras, eu relia vrias vezes meus prprios escritos e as teorias para chegar a um ponto emque podia compreender bem o que havia escrito.

    No ano de 2001 comecei a participar do Ncleo de Pesquisa em PolticasEducacionais para Surdos Nuppes, formado por um grupo de alunos e professores doPrograma de Ps-Graduao em Educao da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.Esse grupo foi criado no ano de 1996, com o objetivo de gerar um espao de reflexo,ao, participao e discusso em torno da Educao de Surdos.

    O grupo era orientado pelo Doutor Carlos Skliar, professor que com sua vinda paraPorto Alegre fez nascer os estudos surdos em nossa comunidade. Foi ele o primeiroeducador, entre ns, a propor uma nova abordagem para a surdez, substituindo a visomdico/clnica at ento incontestada, que nos tratava como deficientes, pouco capazes, pela viso scio/antropolgica/cultural que criou espaos para crescermos e assumirmosnossa diferena de forma consciente.

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    O Nuppes organizava um Frum de Discusso sobre Educao de Surdos queacontecia uma vez por ms no auditrio da UFRGS, dele participavam professores de

    surdos, intrpretes, pesquisadores, alunos surdos, famlias, alunos ouvintes etc. Uma dasdiscusses foi sobre escrita de lngua de sinais com o palestrante Charles Butler que americano com quem, e com a orientao do Dr. Antnio Carlos Rocha da Costa,construmos um dicionrio em quatro lnguas: duas escritas com o sistema SignWriting aLngua de Sinais Americana - ASL e a Lngua Brasileira de Sinais - Libras e duas com aescrita alfabtica do portugus e do ingls.

    Durante todo esse perodo participei como professora de vrios cursos de formao

    para professores de surdos, incluindo aulas de escrita de lngua de sinais e tambm aulas deInformtica na Educao de Surdos nos interiores do Rio Grande do Sul e em algumascidades de outros estados do Brasil.

    De 1996 at 2000 dei aulas na Escola Especial Concrdia-ULBRA, lecionando, deforma experimental, para as stimas sries, escrita de lngua de sinais utilizando o sistemaSignWriting, e de informtica, utilizando o programa Sign Writer que o editor de textosdo sistema.

    Em 2000 e 2001 trabalhei como professora de Informtica na Escola de EnsinoFundamental Frei Pacfico com as crianas do jardim at a quarta srie utilizandosoftwares educativos. Com a terceira srie usava o mesmo Sign Writer, editor de textos para lngua de sinais.

    Em agosto de 2001 iniciei meu trabalho de doutorado com dedicao integral, projeto que inclui essa proposta de pesquisa e a participao, como palestrante, eminmeros cursos, seminrios e encontros relacionados a ela.

    Em janeiro de 2004 apresentei minha proposta de tese, tendo a banca aprovado ecolocado inmeras questes pertinentes que serviram de guia para a continuao de meutrabalho.

    Em janeiro de 2005 parti para a cidade de Toulouse na Frana, convidada comoespecialista em SignWriting, para trabalhar junto com um grupo de pesquisa formado porlingistas da Sorbonne - Universidade Paris 8, educadores de surdos da cidade de Toulousee doutorandos da rea de informtica da Universidade Paul Sabatier, com propostas de

    teses na rea de informtica para a lngua de sinais francesa, orientados pelo Prof. PatriceDalle, tambm de Toulouse. L tive tambm oportunidade de participar de algumas

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    reunies com um grupo de pesquisa que est criando um sistema de escrita de lngua desinais, o qual no utiliza o sistema SignWriting, no Institut de Recherches sur les

    Implications de la Langue des Signes IRIS.A primeira parte, de minha pesquisa, consta de relatos de minha vida e

    apresentao de teorias sobre conhecimento, linguagem e surdez que estudei nas diversasdisciplinas cursadas durante meu trabalho de doutorado, de meus conhecimentos anteriorese de minhas experincias de lder surda. A universidade proporcionou-me uma intrpretede lngua de sinais para a assistncia s aulas das disciplinas cursadas que me permitiuacompanhar e participar. Minhas apresentaes de trabalhos contaram sempre com os

    recursos visuais de datashow e do trabalho da intrprete.Minhas produes escritas partiram das minhas leituras, resumos feitos das mesmas,

    anotaes nas aulas, construo de relaes entre diversos contedos, esquemas e demaisrecursos possveis de usar na construo de uma escrita que, partindo de meus estudos, pudesse dar conta da problemtica que me propus. Os relatrios constituem a narrativadetalhada e descritiva do trabalho de experimentao realizado com os diversos grupos desurdos que trabalharam comigo na tentativa de usar o sistema SignWriting na escrita daLibras, o editor de textos Sign Writer e o mesmo sistema SignWriting de escrita de lnguade sinais adaptado Lngua de Sinais Francesa - LSF.

    Com meu orientador e co-orientadora de doutorado trabalhei as teorias da construoda linguagem, da alfabetizao e do sistema de escrita SignWriting e a organizao da pesquisa ancorada nas praticas de difuso de um sistema de escrita para as lnguas desinais, nas formas manuscrita e no computador.

    Igualmente importantes, para minhas construes, foram as disciplinas tericasoferecidas pela UFRGS a seus doutorandos, e as escolas de surdos que me acolheram.

    Minha participao na Federao Nacional de Educao e Integrao de Surdos Feneis proporcionou o convvio permanente e responsvel com meus pares, de muitos lugares doBrasil, uma viso abrangente de nossa realidade educativa e experincias de vidacompartilhadas.

    O convite do grupo de pesquisa da Frana trouxe a possibilidade de acrescentar umcarter mais amplo s minhas observaes, sendo, como pude observar, um trabalho dequalidade aquele realizado junto populao surda, pelo pas que ofereceu ao mundo

    ocidental seus paradigmas modernos de humanismo e igualdade, e continua a representar,

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    mesmo no ps-moderno, resistncia significativa s tendncias de desrespeito pessoa emsua individualidade e massificao consumista e alienada.

    Trilhados os caminhos indicados pelo meu orientador, para por em prtica minhasmetas, as teorias postas e os dados coletados, submeti-os a minha co-orientadora. Muito bem, disse ela, est tudo aqui, vamos organizar. Finalmente, o texto completo, foi corrigido por uma professora de portugus.

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    2 INTRODUO E ESTUDOS TERICOS

    O reconhecimento formal do status lingstico das lnguas de sinais muito recente.A UNESCO somente em 1984 declarou: A lngua de sinais um sistema lingsticolegtimo e deveria merecer o mesmo status que os outros sistemas lingsticos.

    Atualmente, 20% da populao surda mundial tm algum nvel de escolarizao, eapenas, 1% recebe essa escolarizao na lngua de sinais, por isso a FMS (FederaoMundial dos Surdos) tem como prioridade o desenvolvimento de atividades para as

    comunidades surdas mais excludas.A Federao Mundial dos Surdos FMS1 uma organizao no governamental

    em nvel internacional e representa aproximadamente 70 milhes de surdos em todo omundo que fazem parte das comunidades surdas de 123 paises. Sua principal funo a decongregar as Associaes, Federaes e outras Organizaes Nacionais de Surdos. NoBrasil a Federao Nacional de Educao e Integrao de Surdos FENEIS suarepresentante e conta, por sua vez, com cerca de 130 filiadas brasileiras entre escolas e

    associaes de surdos. O surdo politizado no se considera deficiente e sim membro deuma comunidade cultural e lingstica. Por isso muito importante, para ele, divulgar sualngua, que sua maior especificidade, sendo essa atualmente sua luta maior.

    Paradoxalmente, para os surdos, no presente processo, a informao e a comunicaotm sido suas principais ferramentas. A forte coeso existente entre essa populao, frutodo isolamento construdo pela dificuldade de comunicao com o mundo ouvinte, formaum lao moral apertado e empurra suas lideranas a no admitir disfarces e a lutar pela suaautodeterminao.

    O objetivo das federaes servir desinteressadamente s pessoas surdas, tendocarter educacional, assistencial e scio-cultural. Nossos esforos tem sido peloreconhecimento da Libras que agora j o por lei, mas precisa ser difundida, respeitada eestudada. A comunidade surda que sofreu um grande crime, quando teve sua lnguadiscriminada por sculos, merece o apoio dos pesquisadores e lingistas para resgatar seu papel.

    1 World Federation of the Deaf - WFD

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    Na Conferncia Mundial de Educao para todos, realizado em 1994 na Espanha, odocumento resultante, denominado Declarao de Salamanca preconiza a necessidadeda educao dos surdos ser realizada a partir de sua lngua de sinais, essa necessidade tem

    sido muito pouco respeitada, pois, educar no tem a ver apenas com o que melhor para oeducando, educar tem tambm muito a ver com quais papis a ideologia dominante atribuiaos diversos atores que compe a cena educativa.

    Os professores ouvintes da nova escola de surdos centrada na lngua de sinais precisam saber usa-la de forma plena, no podem mais simplificar explicaes, facilitartextos e articular claramente em portugus ajudando com alguns sinais a exposio doscontedos, como se fazia na escola oralista ou na de comunicao total. Agora, devem

    interagir com o aluno em uma lngua que precisa ser plenamente dominada por ambos, professor e aluno, que devem ter a mesma possibilidade de comunicar-se.A competncia em lngua de sinais por parte dos professores ouvintes poucas vezes

    chega a ser a necessria. Ela uma lngua completa, no uma pantomima. Tem suagramtica e de carter viso-espacial a qual os ouvintes no esto habituados. Tornar-sefluente, como um professor precisa ser, uma tarefa sria e demanda tempo e dedicao. Novas percepes acompanham a necessidade do esforo por essa nova aquisio e umsentimento de inadequao se instala entre os professores, as resistncias embora veladas,

    ou disfaradas de mil maneiras, fazem-se muito presentes.Os pais do surdo, (90% dos pais de surdos so ouvintes) tambm precisam aprender

    uma nova lngua e embora muitos manifestem esse desejo a realidade mostra o contrrio.Aqueles com filhos j adultos que sabem a lngua de sinais so uma insignificante minoria.Com a melhor aceitao da lngua de sinais, alguns comeam a aprender junto com o filho pequeno, ainda poucos.

    Os preconceitos ligados ao rtulo de deficiente so fortes na sociedade, o medo de

    perder o filho para o grupo de surdos com o qual ele sempre quer estar, quandocompreende o quanto fcil comunicar com a lngua de sinais, latente nas famlias etambm o preconceito contra a lngua de sinais em razo de sua associao com a palavradeficincia.

    So poucas as orientaes dadas pelos mdicos aos pais ouvintes que tm umacriana diagnosticada surda e muito mais no sentido do oralismo, afinal esta uma condutaconsolidada. Os fonoaudilogos atentos e atualizados que preconizam a aquisioindispensvel da Libras concomitante ao treino da fala ainda no so os mais reconhecidos pela comunidade mdica, que envia os pacientes e tenta sempre consert-los. Para isso so

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    indicadas at medidas extremas de risco para sua sade global, como a dos implantescocleares que, praticados em crianas, so considerados uma violncia pelas comunidadessurdas organizadas.

    A questo complexa e as lideranas surdas que esto politizadas e tomam a frentedo processo buscam novas prticas que precisam ser apoiadas pelas instituies que pensam a educao com solues novas e criativas que levem em conta, no apenas osaspectos formais, mas tambm as relaes subjacentes de poder ainda que veladas,inconscientes ou travestidas de boas intenes.

    Geralmente os intrpretes da lngua de sinais so ligados s comunidades surdas,em contrapartida aos pais, professores, fonoaudilogos e mdicos que tm uma histria de

    dominao e m comunicao com os surdos. Os surdos sentem-se assegurados pelosintrpretes, pois esses, pelo poder de comunicao da lngua de sinais, corporificam a possibilidade de resgate da participao. O intrprete ou o tradutor, de qualquer lngua, temgrande poder em suas mos. Ele responsvel pela qualidade da comunicao. Os surdos precisam que esses profissionais sejam bem qualificados, por cursos especficos que seestruturem, associados a alguma comunidade surda idnea, isto para que o conhecimentoque tem da lngua de sinais seja autntico e para que esse profissional possa inserir-se nacomunidade surda e conhecer sua cultura. necessrio tambm, que essa profisso seja

    regulamentada.At hoje muitas famlias ouvintes no concordam com que seus filhos surdos

    participem das comunidades surdas. No valorizam esses espaos que podem construir aidentidade surda de seus filhos e dar a eles a possibilidade de exercer sua independncia eindividualidade mas, a comunidade ouvinte, com raras excees, no reconhece o ldersurdo como um interlocutor vlido.

    As aparncias sempre estiveram contra os surdos em relao s suas reais

    capacidades, por sua dificuldade de falar e de compreender aquilo que o ouvinte diz, atendncia natural desses, menosprezar a mensagem da pessoa surda, pela forma como elaaparece. Com a lngua de sinais os surdos podem, atravs do intrprete, compreender e sercompreendidos, e os ouvintes, so colocados no mesmo nvel, precisam tambm dointrprete ou de aprender uma lngua que no a sua lngua natural.

    O surdo que participa da comunidade surda, quando encontra o grupo de surdos ficamuitas horas na festa, ou no encontro de rua, ou em qualquer lugar, para dar-se bem

    comunicando com a lngua de sinais. As pessoas surdas que vivem na casa com a famlia

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    ouvinte se comunicam muito pouco durante a semana. A cultura da famlia um ambientehegemnico ouvinte.

    A coeso das comunidades surdas, embora suas profundas diferenas individuais,tem sua explicao na possibilidade da comunicao natural. Em muitas pocas, tachadasde guetos, sempre observadas com distanciamento e estranheza pela sociedade, devem suasobrevivncia a esse fator fundamental de ali poder encontrar uma lngua comum.

    O lder surdo sempre trabalha com o intrprete ou parente da famlia que lhe servede intrprete mas em muitos lugares a viso continua a ser a do colonizado, que muitossurdos aceitam. Muitos lderes surdos tm muitas coisas importantes para dizer mas ficam prejudicados por um entendimento diferente do intrprete. Por isso nos encontros, quandoso s surdos, utiliza-se a lngua de sinais para no haver dificuldades de interpretao.Acontece de surdos no entenderem algumas mensagens, por estar em outro nvel deevoluo poltica, ou mesmo ter pouco conhecimento da lngua de sinais, mas esta umaconstruo que a comunidade surda precisa fazer por si prpria.

    O que pretendo com minha proposta de pesquisa encontra identificao com aquiloque uma Pesquisa-Ao pretende que a transformao do objeto social, atravs datomada de conscincia, da construo dos objetivos e da organizao da ao. Na ao,

    essa transformao s pode se dar como prtica poltica, que unifique a prtica cientfica ea pedaggica em um objetivo comum.

    Minhas afirmaes esto baseadas na observao, nas discusses, nos documentos daliteratura impressa sobre o tema, e nas observaes obtidas em minhas intervenes, com oobjetivo de difundir entre os surdos e os educadores de surdos, o conhecimento e o respeito Lngua Brasileira de Sinais - Libras e a sua escrita. Intervenes essas sempreacompanhadas de discusses acerca de nossas realidades de vida surda.

    Os encontros pedaggicos semanais, com as crianas, aqui no Brasil, que constamdos relatos escolares, tiveram como objetivo especfico o conhecimento e o posteriordomnio da tecnologia do sistema de escrita SignWriting e do uso do computador com autilizao dos editores de textos Sign Writer e SW-Edit.

    Na Frana, o projeto das entidades francesas que me convidaram a participar dasensibilizao a uma escrita de lngua de sinais e a exercer o papel de facilitadora daapropriao do sistema SignWriting no inclua o uso da informtica com as crianas, comos jovens ou com os grupos de estudos e pesquisa de uma escrita para a LSF.

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    L, a parte de informtica, que me coube, se caracterizou pelo uso do editor de textosSW-Edit nos trabalhos de transcrio realizados na Universidade Paul Sabatier, queserviram de suporte para as aulas de SignWriting e de material de pesquisa para o grupo de

    lingistas da Universidade Paris 8.

    2.1 Novos paradigmas oferecidos pelas cincias da mente

    A partir dos anos 60, as pesquisas das neurocincias e as observaes das cinciascognitivas comearam a oferecer as bases cientficas para uma nova viso de como poderiaser a educao e a comunicao das pessoas surdas. Essas pesquisas, que reabilitaram as

    lnguas de sinais atribuindo-lhes o papel legtimo e insubstituvel de instrumento capaz dedar conta das necessidades comunicativas dos surdos, provocaram nas comunidades surdasmovimentos de luta pelo reconhecimento de suas lnguas, que haviam sido preservadas emassociaes de surdos, num clima de clandestinidade, desde seu banimento das escolas em1880.

    As cincias cognitivas esto relacionadas ao estudo interdisciplinar da aquisio e dautilizao do conhecimento. Elas tm por objeto descrever, explicar e s vezes simular as principais disposies e capacidades do esprito humano. As cincias cognitivas tm por

    objeto de estudo inmero programas de pesquisa, dependentes de mltiplas disciplinas, squais fornece sua principal caracterstica que uma determinada concepo das relaesentre os diferentes fenmenos visados e, em seguida, entre as disciplinas em questo.

    As disciplinas, parte integrante do conjunto das cincias cognitivas so a lingstica,a psicologia, a antropologia, as neurocincias, a inteligncia artificial, a lgica e a filosofia.

    O cognitivismo coloca trs proposies principais como paradigma para servir deobjeto de estudo e mtodo dentro dessas disciplinas. A primeira proposio define o

    funcionalismo no sentido estrito: o complexo mente/crebro suscetvel de uma dupladescrio, material ou fsica no sentido amplo (a fsica intervindo na realidade pelo visdas neurocincias) e informacional ou funcional. Esses dois nveis so interdependentes e arelao que se estabelece entre eles semelhante quela que une um computador, enquantosistema fsico, com a descrio do mesmo aparelho enquanto tratamento da informao. Asduas seguintes proposies caracterizam o aspecto computo representacional dadoutrina:

    No nvel informacional, o sistema cognitivo do homem caracterizado por seusestados internos ou mentais e pelos processos que conduzem de um estado ao

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    seguinte. Esses estados representacionais so dotados de um contedo remetendo aentidades externas (so tambm semanticamente avaliveis).

    Os estados ou representaes internas so frmulas de uma linguagem interna ou

    mentals, prxima das linguagens formais da lgica. Os processos so aquelesque a lgica qualifica efetivos: aes primitivas cuja execuo por uma mquina evidente (ela no exige nenhuma interpretao). Eles se identificam ao conjunto dasreceitas: procedimentos descritveis, sem ambigidade e realizveis em umnmero finito de etapas elementares, da ordem do reflexo.Quanto representao, a teoria interacionista coloca que na interao com o

    meio que o indivduo constitui seu mundo simblico.

    Dois importantes tericos Piaget e Vygotsky que se dedicaram a pesquisar comosurge o conhecimento chegaram mesma crena de que ele evolui das formas elementares para as formas superiores, sendo o desenvolvimento humano, um processo de inter-relao(interao) entre o meio social e as bases biolgicas. A tese principal de Piaget mostra queexiste uma continuidade, entre a inteligncia e os processos biolgicos, que ultrapassa ocondicionamento hereditrio.

    As comunicaes, com o advento da informtica, esto sendo totalmentemodificadas e a escola est tentando adequar-se introduzindo o computador. As novastecnologias associadas ao computador trazem vantagens para os surdos pois so de carter predominantemente visual. As dificuldades para o surdo esto no acesso s ferramentasque ele tem a sua disposio para trabalhar. A inacessibilidade do portugus dentro docontexto de leituras aparece como uma dificuldade importante.

    A grande maioria das pessoas surdas, aps completar sua vida escolar, no sabeutilizar a lngua escrita em toda a amplitude de suas possibilidades: como meio decomunicao, para a reflexo e enriquecimento do pensamento, como fonte de prazer. O

    problema se apresenta em todo o mundo. Nos Estados Unidos, o nvel mdio de proficincia em leitura, ao qual chegam os surdos, ao sair da escola, no lhes permite ler o jornal. Na maioria dos outros pases a situao a mesma, ou pior, inclusive no Brasil.

    Isto acontece porque as escolas de surdos tm sido objeto de orientaes pedaggicas profundamente equivocadas que no oportunizam, a grande maioria dossurdos, a apropriao de sua prpria lngua, nem a do portugus escrito com eficincia.

    Enquanto participantes do processo educacional, sentimos que era necessrio buscar uma nova postura pedaggica que aliasse o uso das tecnologias construo doconhecimento.

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    Como desafio, tanto para professores como para os alunos participantes, as metasforam voltadas para o desenvolvimento do sujeito ativo, dinmico, autnomo, crtico ecriativo, interagindo com seus colegas, em um ambiente que envolve a construo de suas

    aprendizagens e a manipulao dos materiais relacionados s tarefas. Essas posturasremetem ao termo construtivismo quando relacionado a sistemas computacionais.

    2.2 Aquisio da linguagem

    Na criana pequena a atividade fsica fundamental para toda a aprendizagem. Elaaprende a perceber e controlar a correo de suas prprias percepes por meio do manejode objetos e de movimentos do corpo.

    Em Crebro y Lenguaje, Lria (1974) diz que a linguagem essencial para odesenvolvimento cognitivo, pois a formao dos processos verbais est relacionada comimportantes mudanas nas estruturas dos sistemas funcionais do crebro. Surgida entre osmembros da sociedade primitiva para atender a necessidade de formas de comunicaomais complexas, a linguagem, demandou processos de desenvolvimento do organismo biolgico fazendo com que caractersticas fixas em vrias zonas do crebro dessem lugar auma concepo mais adequada de sistemas funcionais e mveis, mediante os quais, oorganismo se adapta ao ambiente. O perodo mximo de desenvolvimento da linguagem

    vai de mais ou menos um ano e meio at aos trs anos. Nesse perodo a criana precisaescutar a interpretao verbal daquilo que experimenta. A linguagem torna-se cada vezmais efetiva ao guiar as aes como instrumento da ao simblica.

    Primeiro a criana manipula, depois percebe e finalmente representasimbolicamente. As representaes de ordem superior e tambm coletivas, porque precisam ser objeto de convenes que lhe atribuem sentido culturalmente definido,constituem-se no signo verbal para as lnguas faladas e no sinal gestual para as lnguas de

    sinais.Piaget (1970) na obra: O Nascimento da Inteligncia na Criana, usa a expresso

    psicognese para falar da aprendizagem, pois acredita que esta uma construo psicolgica. Ele estudou detalhadamente, por meio da observao exaustiva de seus filhos,como se desenvolve a inteligncia na criana, como se d o processo da aprendizagem ecomo se constri a representao simblica que possibilita a ocorrncia da linguagem.

    Observou que certos instintos, reflexos, deixam de funcionar normalmente por faltade um meio apropriado. Nos bebs surdos podemos observar este fato, em relao aos

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    balbucios iniciais, comuns a todos os bebs, tambm aos surdos, que desaparecem ao invsde evoluir para a fala por falta do estmulo auditivo, que seria proporcionado pelo meio.

    O contato com o meio no tem por resultado apenas desenvolver reflexos, mas

    tambm coorden-los produzindo uma aprendizagem em funo da interao com o meio,assim a criana adapta sua conduta aos diferentes objetos. A criana chupa seus dedos,depois outros objetos como o brinquedo etc. Ela assimila estes objetos atividade doreflexo levando todos os objetos boca e finalmente vai usar esta conduta para reconheceros corpos.

    A fisiologia do organismo oferece uma montagem hereditria inteiramenteorganizada e virtualmente adaptada, mas que nunca funcionou. A psicologia comea com o

    funcionamento desse mecanismo. No beb o exerccio de suco um reflexo hereditrio. As manifestaes do beb,concomitantes s repeties do exerccio, expressando diferentes estados de conscincia(satisfao raiva calma agitao etc..) mostram que o mesmo estado de conscincia no sereproduz duas vezes idntico a si prprio e apontam para uma significao, pressupondouma utilizao individual da experincia e caracterizando o reflexo como um mecanismocausador de um exerccio significante, e por conseqncia, de uma aprendizagem.

    Quanto audio e a fonao Piaget (1970) ainda em O Nascimento da Inteligncia

    da Criana, diz que so reflexos hereditrios que por volta do segundo ms do lugar aadaptaes adquiridas. Claramente, durante o segundo ms, o som ouvido provoca uma parada, mesmo pouco duradoura, da ao em curso e uma busca clara.

    O ouvido e a voz esto ligados, para a criana, desde o incio da adaptaoadquirida, talvez haja at uma ligao hereditria, mais isso Piaget relata que no podecomprovar.

    A adaptao manifesta-se no esforo do beb para reencontrar o novo som

    descoberto por acaso; h uma acomodao perptua dos rgos vocais realidade fnica percebida pelo ouvido, seja, o som produzido por ele prprio ou imitao de sons produzidos por outros. Aparece a seguir a assimilao por repetio, na medida em quecada esquema vocal se consolida funcionando. H assimilao generalizadora, na medidaem que diversifica progressivamente os sons em combinaes indefinidas. H assimilaorecognitiva na medida em que a reao circular e a imitao nascente implicam nadiscriminao de determinado som em relao a outro.

    A fonao est organizada em dois sentidos complementares, primeiro na medidaem que o conjunto de sons produzidos constitui um sistema de articulaes

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    interdependentes, e depois, na medida em que a fonao se coordena com outros esquemas,sobretudo com os esquemas auditivos.

    O beb surdo quando exercita seus reflexos de balbucios iniciais no encontra o

    estmulo externo (sons) que tornaria seu exerccio significativo e, por conseguinte, capazde gerar a aprendizagem da fala.

    A montagem hereditria que se manifesta nos balbucios iniciais (reflexos) deixa defuncionar por falta do retorno auditivo impedindo a aprendizagem da fala que se daria natroca com o meio. Essa acomodao perptua dos rgos vocais realidade fnica, percebida pelo ouvido, deixa de existir no caso dos sujeitos surdos.

    Quanto ao ouvido, at o segundo ms, a nica reao que se observa na criana o

    interesse pela voz. A partir do segundo ms se estabelecem duas coordenaes essenciais:coordenao com a fonao e coordenao com a viso. No segundo ms a cabea se moveem direo ao som e, progressivamente, acontece uma assimilao, que iniciando pelosimples prazer de escutar progride para a discriminao e logo o reconhecimento de certossons.

    Da associao entre um som e uma percepo visual pode-se dizer que os esquemasvisuais e auditivos se assimilam reciprocamente: a criana procura averiguarsistematicamente a que quadros visuais correspondem os sons ouvidos isto acontece

    porque ela se esfora para ver tudo.Uma vez adquirida a coordenao, do ouvido e da vista, a criana comea a

    procurar sistematicamente, a propsito de tudo, a correspondncia entre os sons e osquadros visuais. Nos bebs surdos os esquemas visuais e auditivos, pela ausncia desses,no podem assimilar-se reciprocamente. O beb se esfora para ver tudo, mas chama aateno de seus cuidadores falta de reao aos sons ambientes. O quadro de compensaose manifesta na hiper-vigilncia que caracteriza o comportamento de muitos surdos mesmo

    adultos.A me surda, trabalha sempre com a ateno visual da criana e jamais inicia um

    jogo ou brincadeira at que a criana olhe para ela. J, quando a me no surda, o bebque tenta resolver, pelos seus prprios meios, o problema da comunicao: os bebs surdosde pais ouvintes, no expostos lngua de sinais desde o nascimento, comeam adesenvolver gestos manuais para expressar seus pensamentos, desejos e necessidades. Acriana no sofre por parte do meio uma simples presso exterior mas, pelo contrrio, procura adaptar-se a ele. Portanto a experincia no recepo, mas ao e construo progressiva.

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    O fato fundamental, para a criana surda que est impedida de adaptar-seativamente ao meio sonoro o de que a lngua oral, cuja representao sonora a palavra,no pode ser adquirida naturalmente.

    Observaes realizadas por Karnopp (1999), na aquisio daLibras, investigam trs aspectos do desenvolvimento infantil: a questoda percepo visual, da produo manual e da importncia do inputvisual. O input em lngua de sinais , obviamente, importante para que o beb passe para etapas posteriores no desenvolvimento da linguagem.(Karnopp e Quadros, 2001 pg. 217).

    Sobre a aquisio da lngua de sinais, os primeiros sinais ou as primeiras palavrasaparecem, indiferentemente a qual seja a modalidade da lngua, entre os dez meses e o

    primeiro ano de idade. Esses mesmos estudos mostram que as crianas surdas com paissurdos, inicialmente balbuciam com as mos, comeam ento a produzir enunciados de umnico sinal, e em seguida, combinam sinais formando sentenas simples. Portanto asdiferenas na modalidade entre as lnguas orais auditivas e as lnguas gestuais-visuais noobstruem o processo de aquisio de uma lngua.

    A extino da atividade fnica reflexa uma pista importante na descoberta dasurdez congnita. O ouvido no d nenhum sinal exterior de sua ausncia, por isso, muitasvezes a surdez s descoberta quando, na idade apropriada, a criana no comea a falar.

    Testes simples podem ser realizados, ainda no hospital, quando do nascimento dos bebs que detectam a surdez, so preconizados pela Organizao Mundial da Sade ecomeam a ser realizados no Brasil, em alguns locais de excelncia.

    Em sua tese de mestrado (Karnopp, 1994) estabelece um paralelo entredesenvolvimento lingstico de crianas ouvintes e de crianas surdas filhas de pais surdos,usurios de Lngua Brasileira de Sinais Libras e conclui pela convergncia das diversasetapas de aquisio, incluindo o perodo pr-lingstico e evidenciando os mesmos

    princpios de aquisio compartilhados por crianas surdas e ouvintes.O construtivismo de Piaget teve o mrito de superar o empirismo que dizia ser o

    conhecimento fruto exclusivamente da experincia por via das percepes. Ele nos fez verque, entre o dado da realidade e o conhecimento, h uma importante elaborao doaprendiz. Conforme Costa (2003), Piaget abstraiu os fatores sociais no estudo dodesenvolvimento da criana por uma questo metodolgica, durante o processo deinvestigao, porm fica claro no conjunto de sua obra, que considerava odesenvolvimento cognitivo dependente de fatores sociais.

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    Outros pensadores, como Vygotsky, focaram mais a dimenso social dizendo que aaprendizagem um fenmeno grupal. O pesquisador russo Vygotsky j em 1925 em ensaiosobre a educao de surdos, havia percebido a necessidade do uso da lngua de sinais para

    possibilitar sua educao. Os ensaios infelizmente s foram publicados em ingls em 1989.Quando se trata do desenvolvimento das funes psicolgicas

    superiores, isto no algo que acontece de modo automtico, para seremabsorvidas precisam de mediao cultural. Os instrumentos culturaisforam desenvolvidos para as pessoas que tem todos os rgos dossentidos, todas as suas funes biolgicas. A chave para odesenvolvimento da pessoa diferente ser a compensao, o uso de uminstrumento cultural alternativo, para os surdos a lngua de sinais. Elaest voltada para as funes visuais que esto intactas. Constitui o modomais direto e mais simples de permitir o desenvolvimento pleno, o nico

    a respeitar a diferena, sua singularidade. (Vygotsky apud Sacks 1989, pg. 63).

    As questes que se referem ao que lngua e como ela est representada nocrebro, ainda colocam muitos interrogantes para os neurocientistas e lingistas. Quanto necessidade dos surdos utilizarem a lngua de sinais no se encontram mais argumentossrios de estudiosos que a contradigam.

    As lnguas de sinais so consideradas pela lingstica como sistemas lingsticoslegtimos, de modalidade gestual-visual, capazes de proporcionar aos surdos o meioapropriado para a realizao de todas suas potencialidades lingsticas.

    No Brasil, a Libras a lngua de sinais que se constitui naturalmente dentro dascomunidades surdas urbanas. A pesquisadora Ferreira Brito, em 1984, detectou existnciade outra lngua de sinais no Brasil, usada por ndios da floresta Amaznica, no Estado doMaranho a Lngua de Sinais Kaapor Brasileira (LKSB).

    A Libras possui suas regras prprias e apresenta estruturas sistemticas em todos os

    nveis lingsticos. Expressa sentimentos, estados psicolgicos, conceitos concretos eabstratos, processos de raciocnio.

    2.3 Aspectos formais da lngua de sinais brasileira 2

    1.Fonologia:

    - configuraes de mos;

    - alfabeto manual

    - uso de uma mo2 De acordo com Karnopp e Quadros, 2001

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    - usos de ambas as mos com a mesma configurao

    - uso de ambas as mos com configuraes diferentes,

    - uso de movimentos simtricos, uso de movimentos alternados,- explorao dos pontos de articulao dentro do espao de sinalizao

    2. Morfologia:

    - marcao de plural,

    - de intensidade,

    - de modo,

    - de tempo,

    - de forma,

    - de tamanho,

    - classificadores,

    - incorporao de negao

    3. Sintaxe:

    - explorao do uso do espao (organizao de objetos e referentes presentes e no- presentes);

    - uso da marcao de concordncia nos verbos com concordncia

    - uso dos elementos necessrios para marcao de concordncia com verbos semconcordncia (auxiliar, ordem linear, topicalizao, foco)

    - uso de estruturas complexas (interrogativas, relativas e condicionais)

    - uso de topicalizao

    - uso de estruturas com foco

    - uso de marcao no-manual gramatical para realizao de concordncia, perguntas QU e sim/no, negao, topicalizao e foco

    4. Semntica

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    - emprego de relaes de significado no nvel lexical (antonmia, sinonmia,homonmia, do polissemia, etc.)

    - explorao dos aspectos relacionados ao significado da sentena

    5. Pragmtica

    - explorao de implicaturas

    - figuras de linguagem

    - formas de polidez na linguagem

    2.4 Aquisio da escrita

    A evoluo da escrita3, que est intimamente ligada ao processo civilizatrio, nofoi linear, houve mistura de muitos sistemas e variantes ao longo do tempo. A evoluo daescrita, usada no mundo ocidental, corresponde a um aumento da geratividade, com areduo progressiva do nmero de unidades mnimas que se tem de aprender para poderescrever. Ela evoluiu, no sistema alfabtico, de milhares de ideogramas, a centenas deslabas para apenas cerca de quarenta relaes grafema-fonema.

    Os primeiros registros escritos so os pictogramas desenhos que representavamanalogicamente objetos e eventos.

    Seguiram-se os ideogramas ou logogramas representaes padronizadas quefacilitavam o reconhecimento por um maior nmero de pessoas.

    Surge ento, a idia de incorporar aos registros escritos elementos das lnguasfaladas para tornar o significado mais claro e unvoco, pois acontecia polissemia, isto :multiplicidade de significados possveis de se atribuir s figuras. O rebus, que ento surgiu,foi uma figura para evocar no os significados visualmente aparentes, mas sim aquelesformados pelo encadeamento dos sons da palavra. Ao tornar os sons visveis, o rebus passou a permitir representar conceitos abstratos com muito maior clareza. Os rebus jeram usados, junto aos hierglifos e misturados a ideogramas para acrescentar pistas. Porexemplo, um rebus de um ramo cujo som era (re) colocado junto figura que representava pagar para significar (reembolsar).

    3 Resgate histrico partir de Problemas de Leitura e escrita (Capovilla, 2000) e Alfabetizao e Lingstica(Cagliari, 2002).

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    Os silabrios, que foram etapa seguinte, ainda tinham uma baixa geratividade. Porexemplo, o sistema cuneiforme da Mesopotmia continha quase 600 sinais, o quedificultava muito sua aprendizagem.

    A inveno do sistema de escrita alfabtico foi devida percepo de que a escrita pode ser organizada mais eficientemente representando cada som da lngua por um sinalespecfico. Esse tipo de organizao reduz muitos os sinais necessrios, pois em umalngua os sons em geral somam menos de quarenta. A introduo das vogais surgiu apenasno primeiro milnio antes de Cristo na Grcia.

    A escrita alfabtica um sistema funcional complexo que tem sua origem naanlise dos sons da linguagem, da separao de certos sons do fluxo da linguagem e de suatransformao em fonemas constantes e generalizados. Esse primeiro passo que implica afuno integrada do sistema udio-articulatrio cria a potencialidade para a escrita. O passo seguinte a identificao desses sons, nos diversos contextos sonoros em queaparecem, e a anlise de sua dependncia das posies que ocupam nas diferentes palavras.Apenas quando correm essas condies torna-se possvel traduzir os fonemas em grafemas,que podem ser representados mediante aes motoras e desenvolver o sistema demovimentos uniformemente conexos, caractersticos da escrita, quando convertida em uma

    atividade automtica. necessrio pontuar que em todo o desenrolar desse complexo funcionamento

    participam as conexes preliminares que se estabelecem em relao com a linguageminterna e que, por meio de um feedback contnuo jogam o papel de alimentador e reguladordo processo. A escrita tem a inteno de poder ser lida por algum por isso a escrita temsempre uma motivao.

    A escrita alfabtica um sistema gerativo que possibilita ler qualquer palavra nova.

    Ela permite a auto-aprendizagem pelo leitor. O processo aos poucos contribui para criaruma representao ortogrfica de cada palavra, que ser ento lida pela rota lexical, o queacontece com as palavras j bem conhecidas e que aparecem com freqncia.

    A configurao atual de uma lngua est na relao entre os seus elementos e nono valor intrnseco deles. Os elementos individuais adquirem sentido, conforme se posicionam, dentro da configurao particular que constitui uma determinada lngua.

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    Quanto ao significado dos elementos, ele arbitrrio, atribudo pela comunidadefalante, ou sinalizante, que vai incorporando novos vocabulrios, ou no caso das lnguas desinais novos sinalrios4, em uma construo que social.

    2.5 Escrita alfabetizao e letramento

    O modelo descrito de evoluo da escrita ao longo da evoluo cultural dahumanidade parece se repetir na ontognese, durante o processo de alfabetizao.

    A criana comea desenhando e contando histrias longas sobre seus desenhos,nessa fase, para ela, o desenho e a escrita so indiferenciados. Aos poucos a escrita vai se

    diferenciando do desenho, a criana vai construindo hipteses e fazendo experimentaesat chegar a busca de uma correspondncia termo a termo entre os fragmentos grficos esegmentaes sonoras, sendo conforme Ferreiro e Teberosky....a considerao das propriedades formais da escrita e a correspondncia com segmentos sonoros o final dagnese. (Ferreiro 1999, pg. 103)

    A passagem de uma estratgia para a seguinte durante o processo da aquisio acompanhada de um aumento na competncia da leitura e escrita. A alfabetizao apenas

    o primeiro passo no exerccio da leitura e da escrita, a capacidade mnima de ler eescrever em uma determinada lngua.

    O letramento difere do simples ler e escrever porque pressupe um entendimentodo uso apropriado dessas capacidades dentro de uma sociedade que est fundamentada notexto impresso. Assim a lectoescrita requer um envolvimento autnomo e ativo com otexto impresso e destaca o papel do indivduo no gerar, receber e atribuir interpretaesindependentes s mensagens.

    Signorini assim define o letramento, conjunto de prticas de comunicao socialrelacionadas ao uso de materiais escritos, e que envolvem aes de natureza no s fsica,mental e lingstico discursivas como tambm social e poltico ideolgica(Signorini,2001, apud, Lodi,et al, 2002, pg. 35)

    O nvel de letramento que permite um bom funcionamento social varia de umacultura para a outra e tambm dentro de uma mesma cultura. Assim os nveis de letramentonecessrios ao funcionamento social podem variar. importante, porm que exista uma

    interao entre as exigncias sociais e a competncia individual. Para que isso ocorra, a4 Sinalrio: conjunto de expresses que compe o lxico de uma determinada lngua de sinais

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    escola precisa proporcionar ao indivduo a condio de leitor ativo suficientemente apto para que, a partir de suas prprias necessidades, consiga gerar, receber e atribuirinterpretaes independentes s mensagem.

    2.6 Registro da cultura surda

    Do ponto de vista da cultura surda, o uso da lngua oral de seu pas, como nicaopo de escrita significa no s que as relaes pessoais entre surdos que socontemporneos uns dos outros, mas que esto distanciados no espao, bem como, asmanifestaes dos surdos de outras pocas, precisam ser mediadas e registradas em formaescrita numa lngua que no a prpria, o que implica, necessariamente, na interveno deum processo de adaptao entre as lnguas de sinais e falada que esto em questo.

    Para compreender a leitura preciso haver uma complementao entre o conhecido,que est na nossa cabea, e o desconhecido, que est no papel; entre o que est atrs e oque est diante dos olhos. Teatro, narrativas, literatura surda em geral, s podem serescritos aps serem vertidos para uma lngua falada, mesmo quando criados originalmenteem lngua de sinais. Os surdos no podem construir sua prpria escrita de acordo com sua

    maneira de sinalizar.As pessoas surdas tambm acham a lngua de sinais, como

    qualquer outra lngua, uma maneira poderosa de expandir suacriatividade e prazer artstico. Teatros nacionais de surdos em vrios paises fizeram programas de grande sucesso. Artistas surdos tmconseguido mostrar linguagem de sinais em suas pinturas, ilustraes outrabalhos esculturais. Pessoas surdas de talento criam poesia e humor emlngua de sinais. (YERKER, Anderson, ex-presidente da FMS, 1981).

    A escrita, o poder e a tecnologia so parceiros nas narrativas ocidentais da origem da

    civilizao. A Cultura Surda est minimamente registrada, porque as situaes que ossurdos vivem, no conseguem escrever em sua prpria lngua. No decurso da ltima dcada, apesar da contnua relutncia dos defensores do

    mtodo oral, programas bilnges/biculturais foram incrementados em vrios paiseseuropeus. Diferentes abordagens pedaggicas tm caracterizado esses programas. NaAlemanha um projeto piloto contempla um bilingismo contnuo dentro da sala de aulas. Na Sucia a lngua de sinais a nica lngua de instruo e a lngua oral/escrita do pas vista em termos de segunda lngua estrangeira. Na Frana o programaDeux langues pour

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    une Educatin oferece criana surda uma rea de suporte em lngua de sinais de tempointegral.

    Com esses enfoques, o desenvolvimento intelectual e cultural dessas comunidades

    surdas tem evoludo e o caminho natural dessa evoluo passa pela aquisio de umaescrita prpria que pode proporcionar o acesso a um novo patamar em suas expressesculturais e comunicativas. Com a aprendizagem da escrita de sinais, os surdos vo ter aoportunidade de desenvolver uma nova cultura, que a cultura surda escrita, um poucodiferente da cultura surda sinalizada.

    No presente trabalho o ponto de partida a identidade situacional da pesquisadora,que toma a deciso de tentar posicionar-se a partir da consistncia de padres percebidos

    que tm sentido para si e para outros, mas muitas vezes no esto em conformidade comnormas culturais vigentes.

    O MEC5 est patrocinando uma grande mudana na educao dos surdos no Brasil,cujo projeto de implementao est previsto para se estender por dez anos e cujo objetivo primeiro a incluso da populao surda nas escolas de ouvintes. Com esse objetivo iniciaa capacitao de professores ouvintes no uso da lngua de sinais e introduz a figura doinstrutor surdo.

    As lideranas surdas, embora reconheam o avano que constitui validar a lnguade sinais, e o esforo feito pelos responsveis pelo ensino especial para promover umagrande mudana na educao dos surdos no Brasil, pontuam que as mudanas precisam serestruturais. O poder de deciso nas escolas e classes para surdos continua s com osouvintes e os surdos ainda so vistos, em muitas escolas, apenas como instrutores de lnguade sinais, ainda assim, substituveis por professores ouvintes que muitas vezes, dominammuito mal essa lngua. A incluso, conceito bonito e desejvel, pode funcionar comoexcluso. Excluso da plena comunicao e da real participao.

    O concurso e apoio de educadores ouvintes so indispensveis, mas esses devemestar comprometidos com as mudanas necessrias, que esto aliceradas em paradigmascientficos comprovados e verdades j bem conhecidas, mas que, algumas vezes,continuam longe da prtica das escolas que recebem surdos.

    Se h o que reconstruir, no o surdo, mas sim, o projetoeducacional destinado a ele. E, nesse sentido, apenas os integrantes dessacomunidade, como surdos, podem contribuir, de modo efetivo, para aeducao das crianas surdas. Ignorar sua competncia, neste momento

    5 MEC Ministrio da Educao e Cultura.

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    de nossa histria, passou a ser encobrir uma evidncia. A adoo de umafilosofia educacional, consistente, que d conta de um projetoeducacional para surdos, no pode ignorar a interlocuo constante. Noh apenas surdos a ensinar, mas ouvintes e surdos a aprender como

    educar surdos. Os ltimos 100 anos de educao de surdos no Brasil,foram mais do que suficientes para aprendermos como no educar surdose, tambm, como no formar educadores de surdos. (Fernandes, 2003. pg. 55).

    Passadas mais de quatro dcadas dos movimentos surdos, respaldados pelosachados cientficos, estarem mobilizados em favor do respeito sua especificidade culturale lingstica, o processo mostra dificuldade de avanar e por em prtica aquilo que ossurdos consideram seu direito: o de aprender e se expressar em sua prpria lngua edesenvolver, j a partir da escola, sua prpria cultura.

    Uma educao de qualidade para os surdos no pode ignorar todo o contexto dacultura surda, privilegiando a deficincia e esquecendo o mecanismo de compensao, alngua de sinais, que os prprios surdos, historicamente, j demonstraram utilizar comn