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A Inserção dos Comerciantes Ambulantes no Planejamento Turístico em Natal/RN: uma Realidade Possível? Sinthya Pinheiro COSTA Estudante de Mestrado Universidade Federal do Rio Grande do Norte Programa de Pos Graduação em Turismo UFRN/Brasil [email protected] Francisco Fransualdo de AZEVEDO Doutor Universidade Federal do Rio Grande do Norte Programa de Pos Graduação em Turismo UFRN/Brasil [email protected] Resumo Este trabalho tem por finalidade discutir a problemática da economia informal e do planejamento turístico, tendo como recorte empírico a cidade do Natal-RN. Aborda a falta de participação do comerciante ambulante no processo de planejamento por ser este restrito a organizações do setor público e privado, legalmente constituídos e contribuintes diretos de tributos. O universo da pesquisa abrange o setor informal da economia, sua definição e seu comportamento. A metodologia enquadra-se em uma análise descritiva e exploratória, e quanto aos meios é considerada uma pesquisa bibliográfica. Ademais, analisa-se a viabilidade da inserção dos comerciantes ambulantes no processo de planejamento turístico. O resultado obtido não só acredita que a inserção dos ambulantes é uma realidade possível como estimula a participação e o envolvimento cada vez maior deste público. Palavras-chave: Planejamento Turístico, Economia Informal, Participação. Abstrat This paper aims at presenting a summary of the problems of the informal economy and tourism planning, having as empirical cut the city of Natal/RN. Discusses the lack of participation of itinerant trader in the planning process because it is restricted to public sector organizations and private payers and legally constituted and contributors direct of taxes. The research goes through the informal sector, its definition and behavior. The methodology is based on a descriptive and exploratory analysis, and the means is considered a literature search. It aims to analyze the feasibility of the introduction of itinerant trader in the process of tourism planning. The result not only believes that the inclusion of street vendors is a reality as possible to encourage participation and the increasing involvement of the public. Keywords: Tourism Planning. Informal Economy. Participation.

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A Inserção dos Comerciantes Ambulantes no Planejamento Turístico em Natal/RN: uma Realidade Possível?

Sinthya Pinheiro COSTA Estudante de Mestrado

Universidade Federal do Rio Grande do Norte Programa de Pos Graduação em Turismo

UFRN/Brasil [email protected]

Francisco Fransualdo de AZEVEDO

Doutor Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Programa de Pos Graduação em Turismo UFRN/Brasil

[email protected] Resumo Este trabalho tem por finalidade discutir a problemática da economia informal e do planejamento turístico, tendo como recorte empírico a cidade do Natal-RN. Aborda a falta de participação do comerciante ambulante no processo de planejamento por ser este restrito a organizações do setor público e privado, legalmente constituídos e contribuintes diretos de tributos. O universo da pesquisa abrange o setor informal da economia, sua definição e seu comportamento. A metodologia enquadra-se em uma análise descritiva e exploratória, e quanto aos meios é considerada uma pesquisa bibliográfica. Ademais, analisa-se a viabilidade da inserção dos comerciantes ambulantes no processo de planejamento turístico. O resultado obtido não só acredita que a inserção dos ambulantes é uma realidade possível como estimula a participação e o envolvimento cada vez maior deste público. Palavras-chave: Planejamento Turístico, Economia Informal, Participação. Abstrat This paper aims at presenting a summary of the problems of the informal economy and tourism planning, having as empirical cut the city of Natal/RN. Discusses the lack of participation of itinerant trader in the planning process because it is restricted to public sector organizations and private payers and legally constituted and contributors direct of taxes. The research goes through the informal sector, its definition and behavior. The methodology is based on a descriptive and exploratory analysis, and the means is considered a literature search. It aims to analyze the feasibility of the introduction of itinerant trader in the process of tourism planning. The result not only believes that the inclusion of street vendors is a reality as possible to encourage participation and the increasing involvement of the public. Keywords: Tourism Planning. Informal Economy. Participation.

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Introdução

omo atividade econômica, o turismo pode gerar postos de trabalho, riquezas, promover uma melhor distribuição de renda e inclusão social. Estas deveriam ser premissas básicas desta atividade, estando comumente presentes nos discursos de

quem espera no turismo, a salvação dos problemas socioeconômicos das localidades. Nos países subdesenvolvidos a atividade turística é muitas vezes induzida para a sociedade e seus principais beneficiários geralmente são as grandes empresas e instituições, as quais, geralmente, estão envolvidas politicamente e têm maior representatividade perante o Estado. Aproveitando os benefícios advindos do crescimento do número de turistas nas localidades e entendendo a dinâmica capitalista como esmagadora de postos de trabalho emerge o circuito inferior da economia, composto por atividades de pequeno porte, onde os trabalhadores exploram o seu próprio empreendimento, sozinha ou com sócio, sem ter empregado e contando, ou não, com ajuda de trabalhador não remunerado de membro da unidade domiciliar em que reside. Como exemplo de atividade desenvolvida no circuito inferior está o comércio ambulante, representado por trabalhadores “por conta própria” que utilizam os espaços públicos e principalmente os atrativos/pontos turísticos para o desenvolvimento de uma relação de trabalho. Estes trabalhadores encontram-se a margem do processo de planejamento do turismo sofrendo, muitas vezes, com a negação de sua existência e deixando de ser ouvidos, mesmo participando ativamente da dinâmica da atividade turística, o que é respaldado pelo contato direto com os turistas. Cabe ressaltar que a maioria dos ambulantes, quiçá todos, só possui este trabalho como fonte de geração de renda e por isso necessitam trabalhar diariamente nos lugares onde a demanda esteja, tais como: praias, porta de shoppings, pontos turísticos, dentre outros. Neste sentido, a participação dos ambulantes no processo de planejamento do turismo é cada vez menos incentivada, apesar deste processo ser chamado de participativo e os fóruns/reuniões abertos ao público. O tecnocratismo exacerbado, os locais onde as reuniões acontecem, a ausência de resolução do que se questiona, inibe cada vez mais a participação dos ambulantes, dos empresários de micro e pequenas empresas e da população em geral. Diante desses aspectos, o presente estudo busca analisar a viabilidade da inserção dos comerciantes ambulantes no processo de planejamento turístico. Para tanto foram delineados os seguintes objetivos específicos: a)Identificar como acontecem as reuniões de planejamento turístico e b)Analisar a participação dos comerciantes ambulantes no planejamento turístico. Com o intuito de atingir os objetivos almejados foi realizado um estudo descritivo-exploratório, essencialmente teórico, a partir de uma investigação bibliográfica que, de

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acordo com Prestes (2008), visa atender aos objetivos na construção de trabalhos inéditos que objetivem rever, reanalisar, interpretar e criticar considerações teóricas ou paradigmas. Desta forma, observa-se a importância de se planejar um destino turístico com responsabilidade e compromisso, preservando acima de tudo, a comunidade local. Assim, o desenvolvimento do turismo deve estar pautado nas questões legais e na relação social como forma de continuidade, de maneira sustentada, da atividade.

2 O Planejamento do Turismo e a sua relação relação com a economia informal 2.1 Como caracterizar o planejamento turístico? Antes de se entender o planejamento turístico é necessário refletir sobre o quem vem a ser planejamento dessa forma, o conceito pode ser formatado para todos os tipos de planejamento. Hall (2001, p. 24) define o planejamento como “um tipo de tomada de decisões e elaboração de políticas; ele lida, entretanto, com um conjunto de decisões interdependentes ou sistematicamente relacionadas e não com decisões individuais. Planejar é, portanto, apenas uma parte de um processo global de ‘planejamento – decisão - ação’”. Já Murphy (1985, p.156) afirma que “planejar tem a ver com prever e regular a mudança em um sistema e promover um crescimento ordenado a fim de aumentar os benefícios sociais, econômicos e ambientais do processo de desenvolvimento”. Souza (2010, p. 46), no entanto, entende o planejamento como sendo “a preparação para a gestão futura, buscando-se evitar ou minimizar problemas e ampliar margens de manobra.” Dessa forma, constitui-se como um elemento fundamental e “abrir mão disso equivaleria a saudar um caminhar errático, incompatível com a vida social organizada, independentemente do modelo e do grau de complexidade material da sociedade (...).” Ao analisar as visões dos autores acerca do planejamento, nota-se que todas o definem a partir de uma visão de longo prazo, que beneficie a comunidade de uma forma geral, sendo essencial para o desenvolvimento humano. Baseando-se em Cullingworth (1997), Souza (2010, p. 34) determina quatro elementos fundamentais para o planejamento, sendo eles: pensamento orientado para o futuro, escolha entre alternativas, consideração de limites, restrições e potencialidades; consideração de prejuízos e benefícios e possibilidade de diferentes cursos de ação, os quais dependem de condições e circunstâncias variáveis. Assim, o planejamento vai se consolidando como uma ação estratégica a ser desempenhada por aqueles que estão na incumbência de pensar o futuro a partir da visão do presente, usando elementos que envolvam a comunidade com o intuito de minimizar conflitos e potencializar ações que levem ao desenvolvimento. Neste sentido, Marine e Martins (2004, p.10) delineiam que “o primeiro passo rumo ao novo planejamento é a definição de opções estratégicas de desenvolvimento, o que envolve a

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adoção de posturas em relação as interdependências com o contexto, a análise prospectiva de cenários (...) e o estabelecimento de parcerias estratégicas”. Desta forma, o planejamento, na atualidade, deve traçar um rumo diferente das antigas formas de se planejar. Agora deve-se ter um pensamento estratégico, pautado na aliança entre os planejadores e a comunidade a quem se destina o planejamento, com vistas a se preparar para o futuro e integrar a sociedade. Além disso, ao tecnicismo deve ser incorporado o saber dos residentes que participam da dinâmica da sociedade e tem interesse nas melhorias futuras (ver quadro 1).

Quadro 1: Características do velho e do novo planejamento

Fonte: Martins (2000) In: Marine e Martins (2004, p.11)

As características do “novo” planejamento devem passar, então, a vigorar em todas as áreas. Pensar estrategicamente deixa de ser função apenas dos governos e passa a ser obrigação de todo cidadão. É nesse “novo” momento então, que se entra em definitivo no planejamento turístico, com seus conceitos e caracterizações. Para iniciar, Ruschmann (1999) afirma que o planejamento turístico é condição sine qua non para o desenvolvimento de um destino turístico, provendo-o de facilidades e serviços para que uma comunidade atenda suas necessidades, ou desenvolva estratégias que permitam a uma organização comercial conceber oportunidades de lucro em determinados segmentos de mercado. O processo de planejamento tem como

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finalidade ordenar as ações humanas sobre uma localidade turística, de forma adequada, evitando efeitos negativos nos recursos que possam destruir ou afetar a sua atratividade. Hall (2001), afirma que planejar o turismo não significa apenas decidir quais serão as ações futuras a serem desenvolvidas em certas comunidades. Para ela o planejamento é algo muito mais complexo que apenas definição de ações.

O planejamento turístico não se refere apenas especificamente à divulgação e ao desenvolvimento do setor, embora estes sejam aspectos importantes. O turismo deve ser integrado a processos de planejamento mais amplos a fim de promover determinadas metas de melhoria ou maximização econômica, social e ambiental que possam ser atingidas por meio do desenvolvimento turístico adequado. (HALL, 2001, p.34).

Corroborando com Hall, Ashton apresenta uma visão de planejamento como algo intimamente ligado a políticas de governo, que promovam melhorias e benefícios para as comunidades turísticas.

O planejamento turístico municipal está condicionado ao estabelecimento de políticas públicas nacionais, regionais e municipais para o setor. As políticas, por sua vez, são determinadas pelo setor público e devem considerar as características econômicas, sociais e culturais da sociedade local, bem como as estruturas formais do governo e do sistema político municipal (regional ou nacional). A política turística é a parte da política que se ocupa em estabelecer as diretrizes de ordenação, planificação, promoção e controle da atividade turística em uma região ou um país (...) (ASHTON, 2008, p.16).

Nesse sentido, é aparente a visão do poder público como principal formulador de estratégias de planejamento. Contudo nos atuais processos de planejamento, a participação da sociedade passa a ser cada vez mais instigado, fato que se justifica pela importância e pelo conhecimento das rotinas e das necessidades a partir do seu modus vivendus. Hall (2001, p.43) afirma que “(...) residentes de destinos turísticos não se envolvem na tomada de decisões e processos de planejamento que cercam o desenvolvimento do turismo.” E segue afirmando: “se quisermos atingir um verdadeiro envolvimento público no planejamento, tal abordagem exigirá que os órgãos tomadores de decisão solicitem e considerem ativamente as atitudes da comunidade.” (p. 62). Já Marcelo Lopes de Souza, em seu livro “Mudar a cidade: uma introdução crítica ao planejamento e à gestão urbanos” é categórico quando afirma que:

(...) um planejamento crítico, enquanto pesquisa científica aplicada, deve, por um lado, manter-se vigilante diante do senso comum, desafiando-o e buscando ‘ultrapassá-lo ao interrogar o não-interrogado e duvidar de certezas não questionadas; ao mesmo tempo, um planejamento crítico não-arrogante não pode simplesmente ignorar os ‘saberes locais’ e os ‘mundos da vida’ (Lebenswelten) dos homens e mulheres concretos, como se as aspirações e necessidades destes devessem ser definidas por outros que não eles mesmos. (SOUZA, 2010, p. 180)

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Para o autor, a utilização dos “saberes locais” contribui para a formulação das estratégias do planejamento. Assim, o simples ato de ignorar a opinião dos residentes pode constituir-se em grande problema para o planejamento. Entretanto, Jenkins (1993) identificou alguns empecilhos à participação popular no planejamento turístico, sendo eles:

o público geralmente tem dificuldade em compreender questões de planejamento complexas e técnicas;

o público nem sempre está ciente do processo de tomada de decisões, nem o compreende;

a dificuldade em obter e manter a representatividade no processo de tomada de decisões;

a apatia dos cidadãos;

o aumento dos custos financeiros e de pessoal;

o prolongamento do processo de tomada de decisões;

efeitos negativos sobre a eficiência da tomada de decisões.

Apesar da existência de fatores contrários a participação popular no processo de elaboração de estratégias no âmbito do planejamento, a participação desses atores é fundamental. Cabe lembrar que a maior parte dos cidadãos são apáticos a esses processos por desacreditarem no poder público. Quanto aos aspectos técnicos, estes devem se moldar ao público que participa. Em momentos de planejamento participativo, deve-se atrelar a visão técnica a visão da sociedade, proporcionando uma interação entre as partes interessadas. 2.2 A Economia Informal no Brasil: o caso dos comerciantes ambulantes

A despeito do que se apresenta no senso comum, o trabalho informal não acontece apenas em países subdesenvolvidos tampouco é recente na história das civilizações. Autores e pintores nos remetem ao século XIX para desvendar o fenômeno do comércio ambulante que ocorria em países como França, Inglaterra e Brasil. Fato retratado nas obras do artista francês Jean-Baptiste Debret, mais conhecido como o retratista do Brasil Império, que em suas telas eternizou a sociedade brasileira, seus costumes, suas personalidades e o comércio ambulante, realizado em sua maioria pelos escravos. Considerando-se as principais mudanças econômicas, sociais e culturais que tem acontecido desde o final do século XX, em nível mundial, sendo elas: os novos hábitos e comportamentos dos consumidores, as novas relações de trabalho e de produção, decorrentes do processo de mundialização, e do desenvolvimento de novas técnicas e tecnologias de produção, de informatização, houve uma redução significativa dos postos de trabalho, provocando uma série de alterações que acabaram por incitar a expansão da economia informal (CLEPS, 2009). No Brasil, essas transformações ocorreram principalmente na década de 1990 a partir da reorientação do modelo brasileiro de desenvolvimento, que passou de industrialização protegida para uma economia aberta e competitiva. Outro fator contributivo foi a

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estabilização da moeda, que passou de Cruzeiro em 1990, para Cruzeiro Real em 1993 e Real em 1994i – moeda vigente até os dias atuais – contribuiu para as alterações sofridas no mercado de trabalho e a expansão da informalidade. O termo economia informal apresenta diversas possibilidades de interpretação, podendo estar ligado a fenômenos como: a evasão e a sonegação fiscal, a terceirização, a formação de microempresas, o comércio de rua ou ambulante, a contratação ilegal de trabalhadores assalariados nativos ou migrantes, o trabalho temporário, o trabalho em domicílio etc. Contudo, a sua definição relaciona-se “as atividades que operam com base no trabalho do proprietário do instrumento de trabalho, ajudado por mão de obra familiar e/ou alguns auxiliares” (Martins, 2003, p. 22).

O crescimento do chamado setor informal, alimentado, sobretudo, pelo aumento do número de trabalhadores que não se enquadram na atual lógica capitalista, não pode mais ser entendido como resultante de um período de crise a ser superado pela retomada do crescimento econômico. Por sua dimensão e caráter estrutural, o crescimento dessas atividades já não pode ser explicado como fenômenos meramente conjunturais, cujos movimentos compensariam as variações do chamado setor formal. Segundo diversos estudos, a economia informal tende a crescer acompanhando o crescimento dos setores mais modernos da economia tradicional (CLEPS, 2009, p. 329).

Esse crescimento é comprovado pelo aumento dos valores arrecadados pelo setor informal nos últimos anos. De acordo com pesquisa realizada no ano de 2010, pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, o valor que circula na economia informal equivale ao Produto Interno Bruto da Argentina. Estes números são apresentados na Tabela 1.

Tabela 1: Valores da economia informal em milhões de reais

Ano % PIB Reais correntes Reais a preços de 2009

2003 21,0% 357 388.7 523 524.6

2004 20,9% 405 317.3 549 560.6

2005 20,4% 438 417.5 554 465.9

2006 20,2% 478 455.2 570 044.5

2007 19,5% 518 520.1 583 533.8

2008 18,8% 563 794.8 590 808.6

2009 18,4% 578 411.3 578 411.3

Fonte: Adaptado de ETCO, 2010.

Apesar da redução dos valores do ano de 2009 em relação aos anos de 2007 e 2008, o percentual arrecadado pela economia informal ainda é alto. De acordo com Schneider e Enste (2000), aproximadamente 66% da renda na economia informal é gasta no setor formal, o que contribui para o crescimento econômico e para receita com os impostos indiretos.

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Qualificado como setor informal da economia, o comércio ambulante ocorre nos interstícios da produção capitalista sendo forma de escoamento de bens e de fomento a outras atividades produtivas. Constitui-se, portanto como modalidade de integração econômica, estando submetido aos movimentos do capital que cria seu espaço e pode destruí-lo (Cacciamali, 1983).

A jornada de trabalho varia entre seis e doze horas, podendo estender-se ao período noturno para alguns. Ainda que haja uma rotina de horários que se busca seguir todos os dias, há variações determinadas, em geral, pelas condições climáticas que por sua vez influem no movimento das vendas. O fluxo de vendas não é regular. Além das variações climáticas, não há horários previsíveis de maior ou menor fluxo de clientela. Esta imprevisibilidade gera tensão, pois nunca se sabe ao certo se é hora de encerrar ou se vale a pena ficar mais um pouco. (Tissi, 2000, p. 80)

Os ambulantes fazem parte de um processo produtivo e, mais do que isso, de um processo social que se desdobra em múltiplas relações e dimensões sociais. A inserção no trabalho promove a integração econômica, permitindo renda e possibilitando a subsistência própria e da família, o acesso ao consumo e a recursos materiais, além de movimentar determinados segmentos da indústria, a exemplo do setor alimentício, produtos eletrônicos, têxtil, etc. 3 Os ambulantes como partícipes do processo de planejamento turístico de Natal /RN A cidade de Natal, capital do estado do Rio Grande do Norte, é rica em belezas naturais e em gente hospitaleira, dois pressupostos básicos para o desenvolvimento da atividade turística. Com uma população de 803.811 habitantes (IBGE, 2010) e uma área de 172 Km², tem sofrido com as pressões de expansão em seu território, o que tem ocasionando a intensificação do processo de conurbação com suas cidades vizinhas, sendo elas: Extremoz, Parnamirim, Macaíba, São Gonçalo do Amarante e Ceará Mirim, que constituem a Região Metropolitana de Natal [RMN]. A RMN é a região de maior dinamismo econômico e social do Rio Grande do Norte, com um número de habitantes que representa mais de 40% de toda a população do Estado. O acelerado processo de crescimento demográfico tem provocado algumas mudanças na região, sendo as principais: transformação das áreas centrais em bairros comerciais, com o deslocamento da população para a periferia; a ocupação de áreas inadequadas à habitação, a verticalização, um trânsito cada vez mais caótico; a exclusão social; entre outros fenômenos já observados nas grandes metrópoles brasileiras (Porpino, 2008). Outra mudança que tem ocorrido no Rio Grande do Norte é o crescimento da economia informal. Natal, por sua vez, é a cidade onde a informalidade é mais perceptível. Isso porque nesta cidade, o índice de desempregos tem aumentado significativamente, sendo este um fator propício para o desenvolvimento de atividades como o comércio ambulante, por exemplo. Analisando a tabela 2, fica evidente que as relações trabalhistas estão cada vez mais voláteis. Assim ao mesmo passo que se emprega também se desemprega e se dá margem para o desenvolvimento de novas atividades.

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Tabela 2: Perfil do Município Natal

Período: Janeiro a Janeiro

Ano Admitidos Desligados Saldo

2005 4.542 3.833 709

2006 5.480 4.737 743

2007 5.460 5.537 -77

2008 6.265 5.941 324

2009 6.322 7.598 -1.276

2010 6.718 6.220 498

2011 7.119 7.388 -269

Fonte: MTE, 2011

Como opção para os trabalhadores que se encontram fora do mercado de trabalho, emerge o turismo - principal atividade econômica da cidade do Natal/RN - que proporciona trabalho em diversos campos. Desta forma, a atividade turística, tem se estabelecido cada vez mais como agente minimizador das discrepâncias sociais que assolam a região. Contudo, o processo de planejamento do turismo tem acontecido de maneira restritiva àqueles que pertencem a esfera pública ou privada, inclusive na cidade de Natal/RN. Pensar que qualquer cidadão poderá ter suas solicitações contempladas nas ações que resultam do planejamento é mera especulação. Tem direito a voto quem, formalmente, participa de uma associação ou entidade que lute pelos direitos da coletividade que representa. Nesses termos, mais uma vez os ambulantes permanecem à margem do processo. Entretanto, grande parte das ações que são desenvolvidas em prol dos destinos turísticos, são planejadas previamente pelo Ministério do turismo e seus órgãos de assessoramento. Desta forma, a exclusão dos comerciantes ambulantes acontece no topo da cadeia produtiva do turismo. Por exemplo: o Conselho Nacional de Turismo, órgão de assessoria do ministro de Estado do turismo, é formado por 71 representantes do governo federal e dos diversos segmentos do turismo, entre eles: hoteleiros, guias de turismo, agentes de viagem etc. Nenhuma cadeira é destinada aos artesãos, as associações de moradores, de trabalhadores informais ou de buggeiros.ii Em nível municipal, o planejamento turístico fica a cargo dos Conselhos Municipais de Turismo. Criado em 30 de dezembro de 2009, pela Lei nº 6.027, O Conselho Municipal de Turismo de Natal é um “órgão deliberativo, consultivo, fiscalizador e de controle social da Política Municipal de Turismo” (DIÁRIO OFICIAL DO MUNICÍPIO, 2009, p. 1), estando vinculado a Secretaria Municipal de Turismo e Desenvolvimento Econômico - SETURDE. Tem composição paritária entre o Poder Público, órgãos representativos do turismo e trabalhadores do setor

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turístico. Possui 36 membros, entre representantes das três esferas, estando dividido da seguinte forma (DIÁRIO OFICIAL DO MUNICÍPIO, 2009, p. 1): I – Representando o Poder Público: a) 01 (um) representante da Secretaria Municipal de Turismo e Desenvolvimento Econômico – SETURDE; b) 01 (um) representante da Secretaria Municipal da Juventude, do Esporte e do Lazer – SEJEL; c) 01 (um) representante da Fundação Cultural Capitania das Artes – FUNCARTE; d) 01 (um) representante da Secretaria Municipal de Segurança Pública e Defesa Social – SEMDES; e) 01 (um) representante da Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social – SEMTAS; f) 01 (um) representante do Poder Legislativo Municipal; g) 01 (um) representante do Governo do Estado do Rio Grande do Norte. II – Representando a Iniciativa Privada e Empresas fomentadoras do Turismo: a) 01 (um) representante dos segmentos de hotéis, bares, restaurantes e similares; b) 01 (um) representante das instituições formadoras de profissionais para o turismo; c) 01 (um) representante do segmento de Agências de Viagens; d) 01 (um) representante do segmento de Turismo Náutico; e) 01 (um) representante do segmento de Empresas de Turismo e Eventos; f) 01 (um) representante do segmento do Comércio; g) 01 (um) representante do segmento Financeiro fomentador da atividade turística. III – Representando os Sindicatos, Associações e Cooperativas de Trabalhadores da Área de Turismo: a) 01 (um) representante do segmento de Artesão; b) 01 (um) representante do segmento de Bugueiros; c) 01 (um) representante do segmento dos Guias de Turismo; d) 01 (um) representante do segmento dos Condutores Autônomos de Veículos Rodoviários; e) 01 (um) representante dos Preparadores de Comidas Típicas; f) 01 (um) representante do segmento artístico e promotores culturais; g) 01 (um) representante do segmento dos trabalhadores de hotéis, bares, restaurantes e similares. Este conselho se reúne uma vez por mês para discutir as ações a serem implantadas no turismo natalense. As reuniões são abertas ao público, porém as ações e os debates em torno do planejamento turístico ficam a cargo dos representantes das três esferas, previamente selecionados. Na figura 1 é apresentado um retrato de como as reuniões acontecem.

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Figura 1: Reunião de Planejamento do Turismo em Natal

Fonte: próprio autor, 2011

Analisando a composição do Conselho, verifica-se que não há representação dos trabalhadores informais. No entanto, estes trabalhadores participam da dinâmica do turismo, estão em contato direto com os turistas e com os lazeristas e são, em sua maioria, cidadãos locais; verdadeiros detentores de conhecimento dos “saberes locais”, que tendem a contribuir junto as estratégias para o desenvolvimento do turismo nas localidades. Ademais, Santos (2008, p. 23) afirma ser necessário “levar em conta o circuito inferior [formado por atividades de pequeno porte e de interesse da população pobre] como elemento indispensável à apreensão da realidade urbana e encontrar as medidas a serem adotadas para atribuir a esse circuito uma produtividade mais elevada e um crescimento sustentado, ao mesmo tempo conservando o seu papel de fornecedor privilegiado de empregos”. Entretanto, os comerciantes ambulantes, enquadrados no circuito inferior da economia, são considerados irrelevantes sendo vistos como algo a ser abolido, já que concorrem diretamente com o setor formal. Não há propostas de parcerias e sim de extinção. Este fato justifica o conservadorismo do planejamento atual que parte de um pensamento estratégico empresarialista. Diversos autores, entre eles Hall e Souza, vem trabalhando na teoria de que a inserção da comunidade e a participação de todos só tende a contribuir com o planejamento. Souza (2010, p. 27) afirma que “o planejamento (...) teria por missão criar as condições para uma sobrevivência do sistema a longo prazo – mesmo que, para isso, fosse necessário, algumas vezes, ir contra os interesses imediatos de alguns capitalistas ou mesmo de frações inteiras da classe capitalista”.

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A práxis planejadora ou gestora e antes dela já a própria atividade de pesquisa, deveria, idealmente, encarnar a fusão criativa do saber dos atores sociais com os balizamentos técnico-científicos trazidos, na qualidade de consultores populares, pelos profissionais de planejamento e gestão (Souza, 2010, p. 69, grifo do autor).

Assim, é necessário que o poder público entenda que para se pensar o turismo a longo prazo é imprescindível que todos estejam envolvidos, mesmo que para isso a parcela menor da sociedade, aqueles que de fato detêm o poder econômico hegemônico, sejam colocados frente a frente com os menos favorecidos para que todos possam trabalhar juntos em função de um bem comum, neste caso a sustentabilidade de uma atividade.

Os diversos subníveis da escala microlocal são de cristalina importância para o planejamento e a gestão, especialmente quando se deseja propiciar uma genuína participação popular direta; afinal, é nessa escala que os indivíduos, em processos participativos, poderão constituir instâncias primárias de tomada de decisão (plenárias, assembléias etc), e é também nessa escala que eles poderão monitorar mais eficientemente a implementação de decisões que influenciam sua qualidade de vida no quotidiano (Souza, 2010, p. 107).

Diante disso, observa-se que a forma de atuação do poder público é primordial para atingir com excelência a qualidade do produto turístico, definindo o marco de competitividade do destino turístico (Fonseca, 2005). Esse é responsável pela elaboração de políticas que estejam em consonância com o planejamento e que no caso do turismo, direcione a atividade concedendo diretrizes, como a ordenação territorial, promoção, controle da atividade e inserção da comunidade local, fortalecendo e integrando os elos da cadeia produtiva. 4 Conclusão Nessa relação entre o planejamento e o turismo, cresce a necessidade de se inserir uma parcela da população que utiliza o espaço urbano para dinamizar a economia, garantindo a sobrevivência enquanto ser humano que precisa ter as suas necessidades atendidas e viabiliza a demanda do turismo, sendo estes os comerciantes informais.

Que o turismo é uma prática social importante no contexto social contemporâneo e uma atividade economicamente rentável para as localidades, isso não se pode negar. Contudo, as comunidades receptoras devem opinar no tipo de turismo que acredita ser mais benéfico, nas formas como a atividade vai se dar, nas ações a serem desenvolvidas etc, visto que a ênfase dada pelos agentes envolvidos com o turismo é a geração de riqueza e supostamente melhoria da qualidade de vida da comunidade. Assim, não se pode negar que o envolvimento da comunidade no processo de escolha e de tomada de decisão das estratégias a serem desenvolvidas é de extrema importância para o fortalecimento da atividade. Entretanto, para se atingir um verdadeiro envolvimento público no planejamento, é necessário que os órgãos tomadores de decisão solicitem e considerem ativamente as atitudes da comunidade.

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Desta forma, uma parcela significativa da comunidade, os agentes informais, que estão excluídos do processo de planejamento e gestão do turismo por não pertencerem efetivamente a cadeia do turismo – não na teoria, porque na prática eles contribuem e participam do desenvolvimento da atividade - devem ser levados em consideração no processo de tomada de decisão. Considerar que os ambulantes não podem participar do planejamento por não terem uma constituição formalizada perante o Estado pode ser considerado um retrocesso social. Um verdadeiro planejamento participativo é aquele que não exclui nenhuma parte e que procura ouvir todos os cidadãos, minimizando o tecnocratismo presente nas esferas públicas e maximizando o potencial existente nos discursos locais, incentivando assim a colaboração. Abrir as portas do planejamento para essa parcela da população que trabalha na informalidade é estreitar as barreiras existentes em vistas a alcançar um objetivo comum: o desenvolvimento do turismo e melhoria da qualidade de vida da população, inclusive daqueles que não dispõe de um trabalho formal. Conclui-se, portanto, que a inserção do ambulante no planejamento turístico é uma realidade possível, de fundamental importância, que precisa ser incentivada e melhor trabalhada pelos planejadores locais. Referências ASHTON, Mary Sandra Guerra (2008) In CÂNDIDO, Luciane Aparecida; ZOTTIS, Alexandra Marcella (orgs.) Turismo: múltiplas abordagens. Novo Hamburgo: Feevale. CACCIAMALI, M.C. (1983) Setor informal urbano e formas de participação na produção. São Paulo, IPE/USP. Ensaios econômicos,nº 26. CLEPS, Geisa Daise Gumiero (2009) Comércio Informal e a Produção do espaço urbano e a produção do espaço urbano em Uberlândia (MG). Sociedade & Natureza, Uberlândia, 21 (3): 327-339, dez. 2009 DANTAS, E. W. (2005) C. Apropiação do espaço público pelo comércio ambulante: Fortaleza-Ceará-Brasil em evidência (1975 a 1995). Geo Crítica / Scripta Nova. Revista electrónica de geografía y ciencias sociales. Barcelona: Universidad de Barcelona, 1 de diciembre de 2005, vol. IX, núm. 202. DIÁRIO OFICIAL DO MUNICÍPIO. Poder Executivo. Ano IX - nº. 1713 - Natal/RN, quinta-feira, 31 de dezembro de 2009 FONSECA, Maria Aparecida (2005) Pontes da. Espaço, políticas de turismo e competitividade. Natal: EDURFN. HALL, Colin Michael (2001) Planejamento turístico: políticas, processos e relacionamentos. São Paulo: Contexto.

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i Dados disponíveis no site: http://portalmatematico.com/moedas/reformassistemamonetario.shtml iiMaiores informações sobre os membros dos conselhos estão disponíveis no site:

http://www.turismo.gov.br/turismo/conselhos/conselho_nacional/