1 ALLAN KARDEC -...

497

Transcript of 1 ALLAN KARDEC -...

1ALLAN KARDEC

LUZ NO LAR

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM1

2O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM2

3ALLAN KARDEC

O EVANGELHOSegundo

O ESPIRITISMO

ALLAN KARDEC

ContendoA EXPLICAÇÃO DAS MÁXIMAS

MORAIS DE CRISTO

E a concordância das máximas morais do Cristo com oEspiritismo e as suas aplicações às diversas circunstâncias

da vida

Versão populare atual

Van Moorsel Andrade & Cia. Ltda.Departamento Editorial Luz no Lar.

2004São Paulo - SP

LUZ NO LAR

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM3

4O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO

Copyright © Van Moorsel, Andrade & Cia. Ltda.

Capa: Trilha Brasil ComunicaçãoRevisão: Luiz Roberto Malta

Traduzido para o português por Roque Jacintho

2ª Edição

Todos os direitos desta edição reservados àVan Moorsel, Andrade & Cia. Ltda.Departamento Editorial Luz no Lar

Rua Souza Caldas, 343 - Pari03025-040 - São Paulo - SP

Fone: (11)6097-5710 - Fax: (11)6097-5711www.luznolar.com.br

[email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Jacintho, RoqueGabi e Kardec / Roque Jacintho. -- 2. ed.--São Paulo: Luz no Lar, 2002.

1. Gabi (Espírito) 2. Espiritismo3. Espiritismo - Filosofia 4. Kardec, Allan1804-1869 I. Título.

02-1032 CDD-133.901

Índices para catálogo sistemático:1. Doutrina espírita 133.9012. Espiritismo: Filosofia 133.9013. Filosofia espírita 133.901

Distribuição Gratuita

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM4

5ALLAN KARDEC

SUMÁRIO

Prefácio 21

I - Finalidade desta obra 23

II - Autoridade da Doutrina Espírita 27

Controle universal dos

ensinamentos dos espíritos 27

III - Notícias históricas 37

IV- Sócrates e Platão, precursores da

idéia cristã e do Espiritismo 44

Resumo da Doutrina de

Sócrates e Platão 46

UM Não Vim Destruir a Lei

Moisés 56

Cristo 58

O Espiritismo 60

Aliança da Ciência e da Religião 61

Instruções dos Espíritos:

A Nova Era 63

DOIS Meu Reino Não É Deste Mundo

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM5

6O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO

A vida futura 68

A realeza de Jesus 70

O ponto de vista 71

Instruções dos Espíritos:

Uma realeza terrestre 74

TRÊS Há Muitas Moradas na Casa de Meu Pai

Diferentes estados da alma

na espiritualidade 76

Diferentes categorias de mundos

habitados 77

Destinação da Terra

Causas das misérias humanas 79

Instruções dos Espíritos: Mundos

Inferiores e Mundos Superiores 80

Mundos de expiação e de provas 84

Mundos regeneradores 86

Progressão dos mundos 88

QUATRO Ninguém Poderá Ver o Reino de

Deus, se Não Nascer de Novo

Ressurreição e reencarnação 91

Os laços de família são fortalecidos

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM6

7ALLAN KARDEC

pela reencarnação e enfraquecidos

pela unicidade da existência 98

Instruções dos Espíritos:

Limites da encarnação 102

Necessidade da encarnação 103

CINCO Bem-Aventurados os Aflitos

Justiça das aflições 106

Causas atuais das aflições 107

Causas anteriores das aflições 110

Esquecimento do passado 114

Motivos de resignação 116

O suicídio e a loucura 118

Instruções dos Espíritos:

Bem e mal sofrer 121

O mal e o remédio 123

A felicidade não é deste mundo 125

Perda de pessoas amadas:

Desencarnações prematuras 127

Se fosse um homem de bem,

teria morrido 129

Os tormentos voluntários 131

A verdadeira infelicidade 132

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM7

8O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO

A melancolia 134

Provas voluntárias:

O verdadeiro cilício 135

Pôr fim nas provas 137

Abreviar a vida de um doente 139

Sacrifício da própria vida 140

Proveito dos sofrimentos para outros 142

SEIS O Cristo Consolador

O jugo suave 143

O Consolador prometido 144

Instruções dos Espíritos:

Advento do Espírito de Verdade 145

SETE Bem-Aventurados os Pobres de Espírito

O que se deve entender por

pobres de espírito 149

Aquele que se eleva será rebaixado 151

Mistérios ocultos aos sábios

e aos prudentes 153

Instruções dos Espíritos:

O orgulho e a humildade 155

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM8

9ALLAN KARDEC

Missão do homem inteligente

na Terra 163

OITO Bem-Aventurados os Puros de Coração

Deixai vir a mim os pequeninos 165

Pecado por pensamentos. Adultério 167

Verdadeira pureza. Mãos não lavadas 169

Cortar a mão 171

Instruções aos Espíritos: Deixai que

venham a mim as criancinhas 174

Os que têm os olhos fechados 176

NOVE Bem-Aventurados os Mansos e os Pacificadores

Injúrias e violências 179

Instruções dos Espíritos:

A afabilidade e a doçura 181

A paciência 182

Obediência e resignação 183

A cólera 184

DEZ Bem-Aventurados os Misericordiosos

Perdoai, para que Deus vos perdoe 187

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM9

10O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO

Reconciliar-se com os adversários 188

O sacrifício mais agradável a Deus 190

O argueiro e a trave no olho 191

Não julgueis 192

Instruções dos Espíritos:

Perdão das ofensas 194

A indulgência 197

Repreender e divulgar o mal 200

ONZE Amar o Próximo Como a Si Mesmo

O grande mandamento 203

A César o que é de César 204

Instruções dos Espíritos:

A lei do amor 206

O egoísmo 211

A fé e a caridade 213

Caridade com os criminosos 214

Expor a vida por um criminoso 216

DOZE Amai os Vossos Inimigos

Retribuir o mal com o bem 218

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM10

11ALLAN KARDEC

Inimigos desencarnados 221

Ferir na face direita 223

Instruções dos Espíritos: A vingança 225

O ódio 226

TREZE Não Saiba a Tua Mão Esquerda

o Que Faz a Tua Direita

Fazer o bem sem ostentação 228

Infortúnios ocultos 231

O óbolo da viúva 233

Convidar pobres e estropiados 235

Instruções dos Espíritos: A caridade

material e a caridade moral 236

A beneficência 239

A piedade 249

Os órfãos 251

Benefícios pagos com ingratidão 251

Beneficência exclusiva 253

QUATORZE Honrarás Pai e Mãe

Piedade filial 255

Quem é minha mãe e quem são

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM11

12O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO

meus irmãos 258

O parentesco corporal e o

parentesco espiritual 260

Instruções dos Espíritos: A ingratidão

dos filhos e os laços de família 262

QUINZE Fora da Caridade Não Há Salvação

O necessário para salvar-se

Parábola do bom samaritano 268

O grande mandamento 271

Necessidade da caridade, segundo

Paulo de Tarso 272

Fora da Igreja não há salvação;

Fora da caridade não há salvação 273

Instruções dos Espíritos: Fora da

caridade não há salvação 275

DEZESSEIS Não se Pode Servir a Deus e a Mamom

Salvação dos ricos 277

Guardar-se da avareza 278

Jesus na casa de Zaqueu 279

Parábola do mau rico 281

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM12

13ALLAN KARDEC

Parábola dos talentos 280

Utilidade providencial da riqueza 281

Desigualdade das riquezas 284

Instruções dos Espíritos:

A verdadeira propriedade 286

Emprego da fortuna 289

Desprendimento dos bens terrenos 292

Transmissão da riqueza 298

DEZESSETE Sede Perfeitos

Características da perfeição 299

O homem de bem 300

Os bons Espíritas 303

Parábola do Semeador 305

Instruções dos Espíritos: O dever 307

A virtude 309

Os superiores e os inferiores 310

O homem no mundo 313

Cuidar do corpo e do espírito 314

DEZOITO Muitos os Chamados, Poucos os Escolhidos

Parábola do festim das bodas 317

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM13

14O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO

A porta estreita 320

Os que dizem: Senhor! Senhor! 322

A quem muito foi dado 324

Instruções dos Espíritos: Dá-se ao

que já tem 327

O cristão e as obras 329

DEZENOVE A Fé Transporta Montanhas

O poder da fé 332

Condição da fé inabalável 334

Parábola da figueira que secou 337

Instruções dos Espíritos: A fé,

mãe da esperança e da caridade 339

A fé divina e a fé humana 340

VINTE Os Trabalhadores da Última Hora

Instruções dos Espíritos: Os últimos

serão os primeiros 343

Missão dos Espíritas 346

Os obreiros do Senhor 349

VINTE E UM Falsos Cristos e Falsos Profetas

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM14

15ALLAN KARDEC

Conhece-se a árvore pelo fruto 351

Missão dos profetas 352

Prodígios dos falsos profetas 352

Não creiam em todos os espíritos 354

Instruções dos Espíritos: Os falsos

profetas 356

Características do verdadeiro profeta 358

Os falsos profetas da espiritualidade 360

Jeremias e os falsos profetas 363

VINTE E DOIS Não Separeis o Que Deus Juntou

Indissolubilidade do casamento 366

O divórcio 369

VINTE E TRÊS Estranha Moral 371

Quem não odeia seu pai e sua mãe 371

Abandonar pai, mãe e filhos 373

Deixai aos mortos o cuidado de

enterrar seus mortos 376

Não vim trazer a paz 377

VINTE E QUATRO Não Pôr a Luz Debaixo do Velador

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM15

16O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO

Luz sob o velador. Jesus falava

por parábolas 383

Não ir aos gentios 388

Os que precisam de médico 390

Coragem da fé 392

Carregar a cruz. Salvar a vida 394

VINTE E CINCO Buscai e Achareis

Ajuda-te e o céu te ajudará 396

Olhai as aves do céu 399

Fadiga pelo ouro 401

VINTE E SEIS Dai de Graça o que de Graça Recebestes

Dom de curar 404

Preces pagas 404

Vendilhões expulsos do templo 406

Mediunidade gratuita 407

VINTE E SETE Pedi e Obtereis

Qualidades da prece 411

Eficácia da prece 412

Ação da prece. Transmissão do

pensamento 415

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM16

17ALLAN KARDEC

Preces compreensíveis 420

A prece pelos desencarnados e

pelos espíritos em sofrimento 421

Instruções dos Espíritos: Modo de orar 425

Felicidade da prece 427

VINTE E OITO Coleção de Preces Espíritas

Preâmbulo 429

I – PRECES GERAIS 431

Oração do Senhor 431

Reuniões Espíritas 440

Para os médiuns 443

II – PRECES PELA PRÓPRIA PESSOA QUE ORA 446

Aos Espíritos Protetores e aos Mentores

Espirituais 446

Para afastar os espíritos malfazejos 449

Para corrigir um erro 450

Para resistir a uma tentação 452

Na vitória sobre uma tentação 453

Para pedir conselhos 453

Nas aflições da vida 454

Favor obtido 455

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM17

18O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO

Submissão e resignação 456

Diante de um perigo 458

Por escapar de um perigo 459

Ao deitar para dormir 459

Prevendo a morte 460

III – PRECES PELOS ENCARNADOS 464

Por quem está aflito 464

Agradecendo por benefícios

concedidos a outra pessoa 465

Pelos inimigos e os que nos

querem mal 465

Agradecendo pelo bem concedido

aos inimigos 467

Pelos inimigos do Espiritismo 467

Por uma criança que nasce 470

Por um agonizante 472

IV – PRECES PELOS DESENCARNADOS 474

Pelo que acaba de desencarnar 474

Por quem temos amizade 477

Pelos sofredores que pedem preces 478

Por um inimigo desencarnado 480

Por um criminoso 481

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM18

19ALLAN KARDEC

Por um suicida 481

Pelos espíritos arrependidos 483

Pelos espíritos endurecidos 484

V – PRECES PELOS DOENTES E PELOS

OBSIDIADOS 488

Pelos doentes 488

Pelos obsidiados 490

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM19

20O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM20

21ALLAN KARDEC

Os Espíritos do Senhor, que são as virtudes dos Céus, qual imensalegião a movimentar-se sob as ordens do Senhor, espalham-se por sobretoda a Terra, semelhantes a luzes que descem dos céus, dentro danoite, vindo clarear o destino e abrir os olhos aos cegos.

Digo-lhe que são chegados os tempos.Todas as coisas, daqui para diante, terão o seu sentido real

restabelecido, visando a dissipar as sombras, confundir os orgulhosos eglorificar os justos.

As grandes vozes do Céu ressoam como o som de uma orquestrae o coro de anjos a elas se une.

Você está convidado ao divino concerto.Tome o seu instrumento e junte-se às nossas vozes, para que o

hino sagrado se espraie e vibre em todo o Universo.Você, irmão a quem amamos, sinta-nos junto de seu coração.Rogamos para que você vivencie o mandamento do Senhor:

“Amai-vos uns aos outros”.No Amor, faremos a vontade do Pai Celestial e você, então,

poderá dizer, do fundo de seu coração: “Senhor! Senhor!” e poderáentrar no reino dos Céus.

O Espírito da Verdade

Nota: Esta mensagem, recebida mediunicamente, resume o verdadeiro sentido do

Espiritismo e a finalidade desta obra também e, por isso, aqui é colocada como

prefácio.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM21

INTRODUÇÃO

22

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM22

23INTRODUÇÃO

Tomando os Evangelhos, poderemos classificar as matériasneles contidas em cinco partes: os atos comuns da vida do Cristo;os chamados milagres; as predições; as parábolas que foram tomadaspara estabelecer os dogmas da Igreja e os ensinamentos morais.

As quatro primeiras partes têm sido objeto de discussões.A quinta parte, porém, que se refere aos ensinamentos morais,

é inatacável e tais princípios estão acima de toda e qualquercontrovérsia.

A própria incredulidade se curva, respeitosa, diante do códigodivino proposto pelo Senhor, visto que sob seus fundamentos todosos cultos existentes podem reunir-se. São princípios sob os quaistodos podem colocar-se, sejam quais forem as suas crenças. Jamaisforam motivos para lutas religiosas, as quais sempre nasceram dasquestões dogmáticas.

As crenças que, porventura, viessem a discutir e questionarsobre os princípios morais dos Evangelhos, encontrariam nessaatitude a sua própria condenação, uma vez que elas tendem aprender-se mais à parte mística, já que a parte moral exige a mudançade hábitos viciosos de cada um.

Para você, e para cada um de nós, os princípios morais dosEvangelhos são uma regra de conduta aplicável a todas ascircunstâncias da vida comum e da vida pública. Elevam-se comobase fundamental de todas as relações sociais e fundamento da maisrigorosa justiça.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM23

INTRODUÇÃO

24

Os princípios morais dos Evangelhos são, finalmente, omanual de vida que nos assegurará a felicidade futura; um levantarda ponta do véu sobre o amanhã.

Esta parte é a finalidade desta obra.Todos admiram a moral evangélica e anunciam a sua

sublimidade e a sua necessidade para a nossa vida de relaçõeshumanas. Quase todos, porém, assim o fazem tão somente porcrença ou por terem ouvido falar ou, ainda, por aceitarem princípiosque se tornaram conhecidos popularmente. Entre esses todos,todavia, muitos poucos são aqueles que conhecem essa moral commais profundidade e que lhes deduzam as conseqüências para a vidadiária.

Em grande parte, a ausência de conhecimentos maiores resultada dificuldade que muitos encontram para a leitura do próprioEvangelho. Ficam embaraçados diante da forma alegórica, domisticismo intencional da linguagem e, não raro, a maioria irá lê-locomo um dever religioso, uma obrigação ritualística, assim comoquem lê preces sem compreendê-las, e, com isso, não aproveitamos frutos dessa árvore generosa.

Os princípios morais, respingados ao longo da leitura, paramuitos passam desapercebidos na massa das narrativas. Torna-sedifícil, assim, ao leitor menos avisado, apanhá-los em seu conjuntoe, com isso, sentem dificuldade em destacá-los para sobre elesmeditar.

Algumas obras existem, sobre a moral evangélica, em que osseus autores pretendem dar-lhe um arranjo moderno. O modo deexpô-la, porém, anula-lhe a primitiva simplicidade com que foicolocada por Jesus e, com isso, chega a esvaziá-la de seu encanto eautenticidade.

Outro tanto se faz com princípios que, reduzidos à sua maissimples expressão, perdem uma grande parte de sua significação ede seu valor, por serem apresentados sem os seus acessórios e sem ascircunstâncias em que foram anunciados.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM24

25INTRODUÇÃO

Para não recair nesses inconvenientes, reunimos nesta obra ostemas que podem constituir um código de moral universal, semdistinção de cultos e de crenças. Nas citações que faremos,conservamos tudo o que seja útil ao desenvolvimento dopensamento cristão, excluindo apenas o que seja estranho ao assuntoa ser exposto.

Respeitamos, nos Evangelhos, a tradução original de Sacy.Sem mantermos uma ordem cronológica, impossível e sem

interesse real para o estudo, agrupamos e classificamosmetodicamente as máximas morais segundo a sua natureza, paraque umas decorram das outras, numa seqüência natural.

Por conservamos a indicação dos números de ordem doscapítulos e dos versículos dos Evangelhos, se você quiser poderárecompor sua classificação comum, se julgar oportuno.

Essa recomposição, porém, é de utilidade secundária.O essencial é colocar o seu conhecimento ao alcance de todos,

com explicações sobre passagens de mais difícil compreensão. Fazer,também, o desdobramento de todas as suas conseqüências, envolvendoa sua aplicação às diferentes circunstâncias da vida.

Isso o fizemos com o amparo dos bons Espíritos que nosassistem.

Muitos pontos do Evangelho, da Bíblia e de autores sacrosem geral, são de difícil compreensão. Alguns até parecem sem muitosentido, tão somente pela falta de uma chave que lhes permitacompreender o verdadeiro sentido. Essa chave que falta, temo-lano Espiritismo. Disso já se convenceram aqueles que se puseram aestudá-lo seriamente, e como, mais tarde, todos o reconhecerão.

O Espiritismo, aliás, se nos depara em todas as épocas denossa Humanidade. Seus vestígios são transparentes em anotações,em monumentos, em inscrições. Através dele se descortinam oshorizontes novos do futuro e, por ele, são projetadas luzes muitofortes sobre os mistérios do passado.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM25

INTRODUÇÃO

26

Em complemento a cada preceito cristão estudado,adicionamos algumas instruções escolhidas entre as diversas ditadaspelos Espíritos em vários países e recolhidas por diferentes médiuns.Se essas instruções se originassem de uma única fonte mediúnica,elas poderiam ter sofrido a influência da personalidade do médiumou do meio. As diversas origens, assim, provam que os Espíritosdistribuem indistintamente os seus ensinamentos e que nenhumapessoa goza de qualquer privilégio (1).

Esta obra é para uso de todos.Através dela, você pode ajustar a sua conduta à moral do Cristo.Aos Espíritas, porém, oferece aplicações de modo especial.Graças às comunicações, estabelecidas de uma maneira

permanente entre você e o mundo invisível aos olhos comuns, a leievangélica, ensinada a todas as nações pelos Espíritos, é a mesma.Não são letras mortas. Você a compreenderá e será incessantementesolicitado a praticá-la, pelos próprios conselhos de seus guiasespirituais.

Os ensinamentos dos Espíritos são, verdadeiramente, as vozesdo céu, que vêm esclarecê-lo e convidá-lo para a vivência doEvangelho.

1. Poderíamos, sem dúvida, apresentar um maior número de comunicações obtidas em

muitas cidades e agrupamentos espíritas, além das que citamos. Queremos, porém,

evitar a monotonia de repetições que não acrescentariam noções novas. Limitamo-nos

àquelas que, pelo fundo e pela forma, se ajustam melhor ao propósito desta obra,

reservando-nos para publicar as demais em outras oportunidades.

Não citamos os nomes dos médiuns, porque a maioria deles próprios solicitaram que

não os designássemos. Assim, generalizamos para não fazer exceções. Os nomes dos

médiuns, inclusive, não acrescentariam coisa alguma ao trabalho dos Espíritos. Nomeá-

los seria dar-lhes uma satisfação ao amor-próprio, coisa que os médiuns sérios não

cultivam. Eles compreendem que, por serem passivos no papel que lhes toca, o valor

das comunicações não pode ser atribuído ao mérito pessoal deles. Seria pueril

repletarem-se de vaidade por um trabalho de inteligência que não lhes pertence e ao

qual prestaram um apoio mecânico.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM26

27INTRODUÇÃO

CONTROLE UNIVERSAL DOS ENSINAMENTOSDOS ESPÍRITOS

A Doutrina Espírita não é de criação humana.Se ela o fosse, teríamos por garantia somente as luzes de

inteligência de quem a houvera concebido e, na realidade, ninguémpoderia ter a pretensão de possuir a verdade absoluta. Se, por outrolado, os Espíritos que a revelaram viessem a manifestar-se a um sóhomem, coisa alguma lhe garantiria a origem, porque teríamos deacreditar, sob a sua palavra, em quem dissesse ter recebido osensinamentos.

Admitindo-se, em relação a esse homem, uma perfeitasinceridade, quando muito ele conseguiria convencer aqueles queprivassem de suas relações, reunindo alguns poucos prosélitos, masjamais chegaria a congregar todo o mundo.

Deus quis que a nova revelação alcançasse rapidamente oshomens. Por uma via mais autêntica, incumbiu os Espíritos de levá-la de um pólo a outro, manifestando-se para todos, sem atribuir aninguém o privilégio exclusivo de ouvir-lhes a palavra. Um homempode cometer abusos, enganando-se a si mesmo. Isso, porém, nãoocorrerá quando dezenas de milhares de outras criaturas ouvirem erecolherem as mesmas informações.

Nisso a garantia para um e para todos.Poderemos fazer desaparecer um homem, e com ele alguns

princípios. Mas não poderemos, ao mesmo tempo, fazer desapareceruma massa de homens. Poderemos queimar livros, destruirbibliotecas, mas não poderemos queimar os Espíritos.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM27

INTRODUÇÃO

28

Queimem-se, pois, todos os livros. A fonte geradora dadoutrina não será afetada, porque ela não tem a sua sede na Terra.Ela ressurgirá de todos os lugares e todos poderão dessedentar-senela.

Se os homens não puderem difundi-la, os Espíritos adifundirão.

Os Espíritos são os seus propagadores, com a colaboração degrande número de médiuns, que os próprios Espíritos vão multiplicandopor todos os lados.

Um único médium, mesmo servindo a diversos Espíritos, epor maior fosse a sua fidelidade, tornaria o Espiritismo malconhecido. Ele se tornaria motivo de prevenção para muitos e asdiversas nações não o teriam aceito.

Os Espíritos, por isso, comunicam-se em todas as partes.O intercâmbio dos Espíritos é estabelecido em todos os povos,

em todas as línguas, em todas as nações. Por isso o Espiritismo éaceito por todas as crenças e todas as pessoas.

A Doutrina Espírita não tem nacionalidade.Qualquer pessoa, independentemente de sua crença e de classe

social, poderá receber instruções de seus parentes e amigos que jádesencarnaram. Por isso, o Espiritismo pode conduzir todos àfraternidade, por estar em terreno neutro.

Na universalidade das comunicações dos Espíritos reside aforça mesma do Espiritismo. Igualmente, a razão de sua rápidapropagação. A palavra de um só homem, mesmo com o apoio detodos os meios de comunicação, atravessaria séculos para alcançar amuitos e fazer-se presente em todos os recantos do planeta com aforça da verdade. Ouvem-se, no entanto, milhares de vozesespirituais adentrando os lares, os círculos fechados, buscando adoutos e ignorantes, falando dos mesmos princípios redentores,sem que haja um só deserdado de sua luz e consolação.

Com essa vantagem nenhuma doutrina contou até hoje.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM28

29INTRODUÇÃO

O Espiritismo, portanto, nascendo dos Espíritos, não temeaos homens, nem as revoluções morais e científicas, nem as subversõesfísicas da Terra, uma vez que nada disso atinge os Espíritos.

Esse seu caráter, portanto, dá-lhe excepcional posição.Faculta-lhe, ainda, uma garantia contra os cismas que

pudessem nascer da ambição de alguns que lhe desposem osprincípios. Também, evita-lhe as contradições de certos Espíritosexclusivistas que pretendem fazer escolas próprias, uma vez que essasinevitáveis contradições, embora sendo uma ocorrênciacircunstancial, trazem consigo o próprio remédio para debelá-las.

Os Espíritos não estão na posse de toda a verdade.Pela diferença de seu estágio evolutivo, cada um deles alcançou

uma capacidade. Em decorrência nem todos estão aptos a penetrare dominar a todos os conhecimentos.

Os Espíritos vulgares não sabem mais do que muitos homens.Há, também, entre eles os presunçosos que julgam saber o

que ignoram e os sistemáticos que tomam por verdades as suaspróprias idéias, exatamente como ocorre entre os encarnados.

Somente os Espíritos de categoria mais elevada, os que sedesenfeixaram dos laços materiais, é que se encontram despojadosdas idéias e preconceitos terrenos.

Sabe-se, porém, que os Espíritos enganadores não temem enem guardam escrúpulos para tomar os nomes que não lhespertencem. Com tal denominação, comparecem para transmitirsuas idéias falsas, utópicas.

Observe, portanto, que todas as comunicações mediúnicasque estejam fora do campo moral, terão um caráter individual.Devem ser consideradas opiniões pessoais deste ou daquele Espírito.Será imprudente aceitá-las e propagá-las como se fossem verdadesdefinitivas.

Tais comunicações devem ser submetidas ao exame da razão.Sem exceção, todas as comunicações devem ter esse controle.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM29

INTRODUÇÃO

30

Toda teoria que contrarie, de modo manifesto, o bom senso,quando examinada com uma lógica rigorosa e com os elementospositivos já alcançados, mesmo que venha assinada por um nomerespeitável, deve ser rejeitada.

Poderá ocorrer, no entanto, que quem as submeta ao controle,tenha luzes insuficientes para interpretá-las, por ser daquelas pessoasque tomam as suas próprias opiniões pessoais para fazerem-se juízesdefinitivos.

Que fazer diante desse fato?Deve buscar-se o parecer da maioria e tomá-lo por guia.Os Espíritos são os primeiros a indicar tal solução.A concordância que existe entre o que ensinam os Espíritos,

é o melhor controle sobre as idéias expostas, mas isso dependerádas condições em que se faz tal exame.

Se, por exemplo, é um mesmo médium quem interroga váriosEspíritos, querendo esclarecer-se sobre questões duvidosas que foramexpostas, você estará diante do mais frágil exame.

Esse médium poderá estar sob uma obsessão ou, então, estarlidando com o espírito mistificador, que lhe dirá a mesma coisasob diferentes nomes. Nenhuma garantia, igualmente, oferece aconfirmação de instruções dentro de um mesmo agrupamentoEspírita, porque todos podem estar sob a mesma influência.

Uma única e séria garantia existe para validar os ensinamentosdos Espíritos e essa é a concordância que existe entre as revelaçõesrealizadas espontaneamente por intermédio de um grande númerode médiuns estranhos entre si e transmitidas em vários lugaresdiferentes.

Não cogitamos das instruções de interesse secundário.Tratamos daquelas que cogitam dos próprios princípios

doutrinários. Em verdade, a própria experiência tem provado que,quando um princípio novo tem de ser enunciado, tais idéias surgemespontaneamente em diferentes pontos, ao mesmo tempo, de uma

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM30

31INTRODUÇÃO

maneira idêntica, senão quanto à forma, mas quanto ao fundo,quanto a seu sentido.

Quando, portanto, surgir uma idéia excêntrica, baseadaunicamente nas idéias de um Espírito, com exclusão da verdade,esse princípio ficará circunscrito. Terminará por desaparecer diantedos verdadeiros ensinamentos que são dados, ao mesmo tempo,em todas as partes.

Essa unanimidade já fez cair por terra muitos sistemas parciaisque surgiram quando da origem do próprio Espiritismo. Cada uminterpretava os fenômenos segundo o seu ponto de vista, antesmesmo que conhecesse as leis que regem as relações entre o mundodos homens encarnados e o mundo invisível aos nossos olhos esentidos comuns.

A unanimidade é a base sobre a qual nos apoiamos.Quando formulamos um princípio da doutrina, não é porque

esteja de acordo com a nossa idéia, já que não somos o árbitro supremoda verdade e a ninguém jamais dissemos:

– Creia em tal coisa, porque somos nós que lhe dizemos.A nossa opinião, na realidade, não passa de uma opinião

pessoal. Poderá ser justa ou falsa, porque não somos mais infalíveisque os outros. Não é porque um princípio doutrinário nos foiensinado que ele passará a ser verdade. Nós o enunciamos tãosomente quando ele recebeu a sanção da concordância universal.

Recebemos comunicações de perto de mil centros espíritassérios, distribuídos pelos mais diversos pontos da Terra. De possede tão farto material, achamo-nos em condições de ajuizar sobrequais princípios revelados se estabelece a unanimidade. Essaobservação é que nos tem guiado e nos guiará ao encontro dosnovos campos que o Espiritismo será chamado a explorar. Éestudando atentamente as comunicações que nos vêm de diversaspartes, tanto da França quanto de outros países, que reconhecemosa natureza toda especial das revelações espirituais e a tendência do

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM31

INTRODUÇÃO

32

Espiritismo de adentrar por novo caminho e que lhe chegou omomento certo de dar um passo adiante.

As revelações dos Espíritos, algumas vezes feitas por palavrasveladas, enquanto para alguns que as obtêm passam desapercebidas,outros que as recebem julgam-se os únicos a tê-las.

Tomadas isoladamente elas pareceriam sem valor.A coincidência delas, vindas de tão diversas fontes, dá-lhes

seriedade. Inclusive, ao trazê-las ao conhecimento do público emgeral, muitos se lembram de terem alcançado instruções semelhantes,com o mesmo sentido.

É na observação desse movimento geral, e no seu estudo,com a assistência de nossos orientadores espirituais, que julgamos aoportunidade de fazer uma coisa ou de abster-nos de fazê-la.

O controle universal, assim adotado, é uma garantia para aunidade futura do Espiritismo. É, também, uma garantia de anulartodas as teorias contraditórias que alguns lhe queiram adicionar parasatisfação de seu gosto pessoal.

Esse é o critério da verdade.O que assegurou o sucesso da doutrina exposta em O Livro

dos Espíritos e O Livro dos Médiuns, foi o fato de que, em todaparte, todos receberam diretamente dos Espíritos a confirmaçãodos princípios expostos em tais obras.

Se, no entanto, de todos os lados os Espíritos viessem acontradizê-los, esses livros, depois de algum tempo, experimentariama sorte de todos os que fazem concepções fantásticas.

Nem o apoio dos meios de comunicação os salvaria.Privados, contudo, desse apoio, eles não apenas ficaram salvos

do naufrágio das obras fantásticas, como também avançaramrapidamente por terem o apoio dos Espíritos, cuja boa vontadecompensou a má vontade dos homens.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM32

33INTRODUÇÃO

Todas as idéias, pois, quer vindas dos Espíritos ou dos homens,que não se apóiem no controle universal, naufragam por nãocontarem com essa incontestável força.

Suponhamos que seja da vontade de um certo Espírito ditar,sob um título qualquer, um livro que seja de sentido contrário aosjá citados. Suponhamos mesmo que, em razão de intenção hostil, evisando desacreditar a doutrina, a maldade suscitasse comunicaçõesfalsas. Que influência poderiam exercer tais comunicações, se portodos os lados fossem desmentidas pelos Espíritos? É com acolaboração dos Espíritos, portanto, que se deve garantir todo aqueleque queira lançar um sistema qualquer em seu nome. Do sistemade um só, ao aceito por todos, vai a distância de uma opinião pessoalisolada, à opinião universal.

Que força terão os argumentos dos detratores, para desmenti-los, sobre a opinião das massas, quando milhares de vozes amigas,vindas da Espiritualidade, se fazem ouvidas em todo o Universo eno seio de cada família? As experiências não têm confirmado essesprincípios? Onde estão todas as publicações que pretendiam arrasaro Espiritismo? Quais as que, ao menos, atrasaram a sua marcha?Não se considerou, até agora, essa questão sob este ponto de vista,aliás um dos mais graves sem contestação, porque cada um doscontraditores contou consigo só, mas não contou com o apoio dosEspíritos.

A concordância universal, por outro lado, é uma garantiacontra alterações que seitas poderiam tentar com o Espiritismo,para ajustá-lo a seus interesses menores. Quem tentasse desviá-lo deseu providencial objetivo, pela universalidade dos ensinamentos dospróprios Espíritos veria cair por terra toda e qualquer modificaçãoque se separe da verdade.

Eis aí o ponto central!Quem quer que se oponha à corrente das idéias consagradas

pela universalidade das manifestações espirituais, poderá causar uma

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM33

INTRODUÇÃO

34

pequena perturbação local e momentânea. Jamais, porém,conseguirá atingir todo o conjunto e, muito menos, dominá-lopor inteiro, quer na hora presente, quer no futuro.

Há, portanto, atitude de cautela.As instruções dadas pelos Espíritos, sobre pontos da Doutrina

ainda não suficientemente elucidados, não se incorporarão ao conjuntode leis enquanto não forem sancionadas pela universalidade. A suaaceitação ficará sob reserva e a título de esclarecimento.

Antes de torná-las públicas, há necessidade de prudência.Se se julgar conveniente publicá-las, deverão ser apresentadas

como opiniões individuais, mais ou menos prováveis, porém quedevem aguardar confirmação. Essa confirmação é que se deveaguardar antes de apresentar um princípio como verdade absoluta,a fim de não ser acusado de leviandade ou credulidade cega.

Os Espíritos Superiores procedem, em suas revelações, comextrema sabedoria. Abordam as grandes questões da Doutrinagradualmente, sem precipitação, à medida que a inteligência estáapta a compreender uma verdade de ordem mais elevada. Aguardam,pois, as circunstâncias propícias para emitir uma idéia nova. Poresta cautela é que, logo no início das revelações, não disseram tudoe nem tudo disseram até agora, jamais cedendo à impaciênciadaqueles que querem colher os frutos antes do seu amadurecimento.É inútil querer avançar no tempo designado pela Providência, umavez que os Espíritos verdadeiramente sérios negam o seu concurso.Todavia, os Espíritos levianos, que pouco se ocupam da verdade,estes responderão a tudo, indiferentemente, vindo daí a causa derespostas contraditórias sobre questões prematuramente abordadas.

Esses princípios, acima expostos, não são uma teoria pessoal.São eles, pelo contrário, uma conseqüência forçada das

condições em que os Espíritos se manifestam. Torna-se evidente,pois, que se um Espírito diz uma coisa e outros milhares de Espíritosdizem o contrário em outros lugares, a presunção da verdade não

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM34

35INTRODUÇÃO

poderá estar com esse que emite idéias isoladamente. Querer alguémter razão contra todos seria uma falta de lógica da parte de umEspírito, tanto quanto o seriam da parte dos homens.

Os Espíritos sábios, quando não se sentem suficientementeesclarecidos sobre uma questão, jamais a resolvem de maneiraabsoluta. Preferem declarar que a tratam sob um ponto de vistaseu, pessoal, e aconselham mesmo que se aguarde a confirmação.

Mesmo que seja grande, bela e justa uma idéia, é impossívelque, desde o primeiro momento, ela polarize todas as opiniões. Osconflitos que ela desencadeia são conseqüência inevitável domovimento que se opera. Tais conflitos são mesmo necessários paramaior destaque da verdade e são extremamente úteis para que asidéias falsas sejam, de pronto, postas de lado. Os Espíritas quealimentassem qualquer temor por isso, podem ficar tranqüilos, umavez que todas as pretensões isoladas desaparecerão, pela força dascoisas, diante do grande e poderoso critério do controle universal.

Não será a opinião de um homem que se unirão os outros homens.A união se dará em torno da voz unânime dos Espíritos. Não

será este ou aquele homem, como não será qualquer outro homem,que criará o fundamento da ortodoxia espírita. Também não seráum Espírito que virá impô-la a quem quer que seja. Ela nascerá dauniversalidade dos Espíritos que se comunicam em toda a Terrapor ordem de Deus.

Esse é o caráter essencial da Doutrina Espírita.Essa é a sua força e aí está a sua autoridade.Deus quis que a sua lei assentasse em base sólida e, por isso,

não quis que o seu fundamento repousasse sobre a cabeça frágil deum só homem.

Sob tão poderosa assembléia de Espíritos Sábios, onde nãose cultivam facções, nem rivalidades ociosas, nem seitas, nem raçasou cores, é que virão quebrarem-se todas as oposições, todas asambições, todas as pretensões de supremacia individual. É que

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM35

INTRODUÇÃO

36

quebraremos a nós mesmos, na realidade, se pretendermos substituir,por nossas próprias idéias, os decretos soberanos do Pai. Somente aEle caberá decidir sobre as questões que causam litígio, impondosilêncio às dissidências e dando razão a quem a tenha. À frente desseportentoso acordo de todas as Vozes do Céu, o que pode a opiniãode um homem ou mesmo de um Espírito isolado? Poderá menosque uma gota que se perde no oceano, menos que a voz de umacriança, abafada pela tempestade.

A opinião universal é o juízo supremo.Ela é a última instância.A opinião universal forma-se pela soma de todas as opiniões

individuais. Se uma delas é verdadeira, tem o seu peso relativo nabalança da verdade. Se, porém, for falsa, ela não prevalecerá sobretodas as outras. Nesse imenso concurso, as personalidades se apagame, nisto, se encontra um novo insucesso para o orgulho humano.

Já se esboça, pois, o harmonioso conjunto.Este século não passará sem que o harmonioso conjunto

resplandeça em todas as suas luzes, de maneira a afastar todas assombras das incertezas. Poderosas vozes terão recebido a missão dese fazerem entender, a fim de congregar os homens sob uma mesmabandeira, tão logo o campo se ache suficientemente preparado paraa sementeira. Enquanto isso não se dá, o homem que estiverflutuando entre dois sistemas opostos poderá observar em quesentido se forma a opinião geral: a indicação certa será aquela emque se pronuncia a maioria dos Espíritos sobre os diversos princípiosda Doutrina, nos diversos pontos em que se comuniquem. É osinal certo de qual dos dois sistemas prevalecerá.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM36

37INTRODUÇÃO

Para bem compreender certas passagens dos Evangelhos, faz-se necessário conhecer o valor de algumas palavras que sãofreqüentemente empregadas. Elas caracterizam o estado doscostumes e da própria sociedade judia da época. Essas palavras, jánão tendo o mesmo sentido na atualidade, são freqüentementemal interpretadas e, por isso, resultam em alguma incerteza.

A significação delas, na época, lhe permitirá conhecer overdadeiro sentido de certas máximas que, sem o seu domínio, lheparecerão um tanto confusas.

Samaritanos – Após o cisma das dez tribos, Samaria tornou-se a capital do reino dissidente de Israel. Destruída e reconstruídamuitas vezes, ela se tornou, sob a administração dos romanos, acabeça da Samaria, sendo uma das quatro divisões da Palestina.Herodes, aquele chamado o Grande, chegou a embelezá-la comsuntuosos monumentos e, para ser agradável a Augusta, deu-lhe onome de Augusta, em grego Sebaste. Os samaritanos estiveram,quase sempre, em guerra com os reis de Judá. Uma aversão profunda,nascida desde a separação, perpetuava-se constantemente entre osdois povos que, por isso, evitavam relações entre si. Os samaritanos,ainda para aprofundar a separação e não terem de ir a Jerusalémpara a celebração das festas religiosas, construíram um temploparticular e adotaram algumas reformas. Admitiram apenas oPentateuco, que continha a lei de Moisés, e rejeitaram todos osdemais livros que lhe foram anexados.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM37

INTRODUÇÃO

38

Os seus livros sagrados eram escritos em caracteres hebraicosda mais alta antigüidade.

Para os judeus ortodoxos, os samaritanos eram consideradosheréticos e, por isso mesmo, menosprezados, anatematizados eperseguidos. O antagonismo das duas nações tinha, por únicofundamento, a divergência das opiniões religiosas, se bem que assuas crenças tivessem a mesma origem.

Eles eram os protestantes de seu tempo.Os samaritanos são encontrados, ainda hoje, em algumas

regiões do Oriente, particularmente em Nablusa e em Jafa.Observam com mais rigor a lei de Moisés do que os demais judeus.Só contraem aliança entre si.

Nazarenos – Este era o nome dado, na antiga lei, aos judeusque faziam voto, ou por toda a vida ou apenas temporariamente,de conservar uma pureza perfeita. Comprometiam-se, portanto, amanter a castidade, a não tomar bebidas alcoólicas e a conservar acabeleira. Sansão, Samuel e João Batista eram nazarenos. Os cristãos,mais tarde, receberam esse nome dos judeus, por alusão a Jesus deNazaré.

Essa foi, também, a denominação duma seita herética dosprimeiros séculos do cristianismo que, do mesmo modo que osebionitas, dos quais adotava certos princípios, mesclavam as práticasdo moisaísmo com dogmas cristãos. Esta seita desapareceu no séculoquarto.

Publicanos – Na antiga Roma, eram chamados de publicanosaqueles que eram arrendatários de tributos públicos, encarregadosda cobrança de impostos, taxas e rendas de qualquer natureza, naprópria Roma e em outras partes do Império Romano.

Eram análogos aos arrendatários do antigo regime francês eque ainda existem em certas regiões. Os riscos a que se sujeitavam,no desempenho de suas funções, levavam a que se fechassem osolhos para as riquezas que acumulavam e que, da parte de alguns,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM38

39INTRODUÇÃO

eram produtos de corrupção e benefícios escandalosos. Mais tarde,o nome de publicano se estendeu a todos os que manipulam odinheiro público e a seus auxiliares subalternos.

Atualmente esse é um designativo pejorativo, atribuído afinancistas e agentes pouco escrupulosos no trato com negócios.

Algumas vezes se diz: – “Ávido como um publicano ou ricocomo um publicano”, para indicar uma fortuna de má origem.

O tributo foi o que mais dificilmente os judeus aceitaram,de toda a dominação romana. Tornou-se a causa de muita irritação.Em razão dele nasceram muitas revoltas e, finalmente, transformaram-no em questão religiosa, apresentado como sendo contrário à lei.Formou-se, inclusive, um partido poderoso, à frente do qual secolocou um certo Judá, chamado “O gaulonita”, partido esse quetinha por base o não pagamento do tributo.

Os judeus tinham horror pelos tributos, e por conseqüência,por todos os que eram encarregados de recebê-los. Daí nascia aaversão deles pelos publicanos de todas as categorias, entre os quais,no entanto, podiam encontrar-se pessoas de bem. Mas em razão desuas funções, eram desprezadas, assim como as demais pessoas quecom elas mantinham relações, as quais eram atingidas pela mesmareprovação.

Os judeus mais distintos consideravam que se comprometeriamse tivessem alguma intimidade com os publicanos.

Os portageiros — Estes eram arrecadadores de baixacategoria, incumbidos, principalmente, da cobrança de direitos deentrada nas cidades. Suas funções correspondiam aproximadamenteàs dos empregados de alfândega e de recebedores de pedágio e dedireitos de barreira. Devotava-se-lhes a mesma repulsa que se davaaos publicanos em geral. É por esta razão que, nos Evangelhos, sedepara freqüentemente com a palavra publicano, seguida da expressãogente de má vida. Esta qualificação não implicava uma ponta dedeboche ou considerá-los vadios, mas era sinônimo de gente de má

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM39

INTRODUÇÃO

40

companhia, indigna de freqüentar a casa e a roda de pessoas muitodistintas.

Fariseus — (do hebreu parasch, significando divisão,separação). A tradição formava uma parte importante na teologiajudaica. Consistia numa compilação de interpretações sucessivamentedadas às Escrituras e que, por isso, se transformavam em dogmas.Tais interpretações, entre os doutores, se sujeitavam a intermináveisdiscussões, algumas vezes por simples questão de palavras ou deformas de colocá-las. Resultavam numa disputa teológica do mesmogênero que o das sutilezas escolásticas da Idade Média. Dessasdiscussões nasceram diferentes seitas que pretendiam trazer para si omonopólio da verdade. Como decorre desses acontecimentos, as seitasse detestavam cordialmente uma às outras.

A mais influente, dentre essas seitas, era a dos fariseus, queteve por chefe Hilel, doutor judeu nascido em Babilônia e fundadorduma escola célebre, cujos ensinamentos propunham que só se deviadepositar crença nas Escrituras. A origem desta seita remonta a 180ou 200 anos antes de Cristo.

Os fariseus foram perseguidos em diversas épocas,notadamente sob Hircano, soberano pontífice e rei dos judeus,Aristóbulo e Alexandre, rei da Síria. Releva notar que este último,Alexandre, conferiu honras e bens aos fariseus, que os conservaramaté a ruína de Jerusalém, no ano 70 da era cristã, época em que seapagou o nome deles com a dispersão dos judeus. Os fariseustomavam uma parte ativa nas discussões religiosas. Com atitudesde servis observadores das práticas exteriores do culto e decerimoniais, demonstravam zelo ardente por fazer prosélitos.Colocavam-se como inimigos dos invasores e afetavam uma grandeseveridade de princípios. Contudo, por trás dessa aparência de grandedevoção, ocultavam costumes dissolutos, excessivo orgulho,alimentando-se de grande desejo de dominação. A religião, para

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM40

41INTRODUÇÃO

eles, era simples meio para chegarem a outros fins, sem que tivessempela religião uma fé sincera.

A virtude, para eles, era mera aparência. Através dela exerciamgrande influência sobre o povo, por passarem diante do vulgo comopersonalidades santificadas.

Assim é que se tornaram muito poderosos em Jerusalém.Acreditavam, ou pelo menos fingiam acreditar, na Providência,

na imortalidade da alma, na eternidade das penas e na ressurreiçãodos mortos (cap. IV, n.º 4).

Jesus, que valorizava, sobretudo, a simplicidade e as qualidadesdos sentimentos, que preferia da Lei antes o espírito que vivifica doque a letra que mata, durante toda a sua missão se aplicou adesmascarar essa hipocrisia. Por conseqüência, tinha neles grandesinimigos, estando aqui, portanto, a razão principal pela qual osfariseus se uniram aos principais sacerdotes judeus para amotinar opovo contra Jesus, a fim de eliminá-lo.

Escribas — Este era o nome dado, em princípio, aossecretários dos reis de Judá, e, também, a certos intendentes dasforças armadas judaicas. Mais tarde, porém, passou a ser a designaçãoespecialmente aplicada aos doutores que ensinavam a Lei de Moisése a interpretavam para o povo. Eles faziam causa comum com osfariseus, abraçando-lhes os princípios e a antipatia contra osinovadores. Eis o motivo pelo qual Jesus os envolvia na mesmareprovação.

Sinagoga — (do grego synagoguê, significando assembléia,congregação). Não existia, em Jerusalém, nenhum outro templo,além do de Salomão onde eram celebradas as grandes cerimôniasdo culto. Os judeus, todos os anos, iam em peregrinação para asprincipais festas judaicas, tais como as da Páscoa, as da Dedicação eas dos Tabernáculos.

Por ocasião dessas festas, Jesus se dirigia também paraJerusalém.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM41

INTRODUÇÃO

42

As outras cidades na Judéia não possuíam templo, mas apenassinagogas. As sinagogas eram pequenas construções onde os judeusse congregavam aos sábados, a fim de fazerem preces públicas sob adireção dos Anciãos, dos escribas ou dos doutores da Lei. Eles faziamleituras dos livros sagrados e sobre elas ofereciam explicações ecomentários. Por isso é que Jesus, sem ser sacerdote, ensinava nassinagogas nos dias de sábado.

Depois da ruína de Jerusalém e da dispersão dos judeus, assinagogas, nas cidades por eles habitadas, servem de templo para asua celebração de culto.

Saduceus — Seita judia, formada cerca do ano 248 antes deCristo. Esse nome lhe veio de Sadoc, seu fundador. Os saduceusnão acreditavam nem na imortalidade da alma, nem na ressurreição,nem em bons ou maus anjos. Acreditavam, no entanto, em Deus.Nada, contudo, esperando após a morte, eles serviam a Deusesperando recompensas imediatas. Nisso, segundo eles, se reduzia aProvidência divina.

Por decorrência desse modo de pensar, tinham na satisfaçãodos sentidos físicos todo o seu objetivo central de vida. Quanto àsEscrituras, prendiam-se ao texto da lei antiga, não admitindoelementos da tradição e, menos ainda, quaisquer interpretações.Consagravam as boas obras e a execução pura e simples da Lei acimadas práticas exteriores do culto. Eram, como se deduz, os materialistas.os deístas e os sensualistas da época.

Esta seita não era muito numerosa, mas contava com personalidadesimportantes. Tornou-se um partido político constantemente em oposiçãoaos fariseus.

Essênios ou esseus — Seita judaica formada ali por 150anos antes de Cristo, ao tempo dos macabeus. Seus membros, quehabitavam uma espécie de mosteiro, formavam entre si umaassociação moral e religiosa. Eles se distinguiam pelos seus costumesbrandos e por virtudes austeras, ensinando o amor a Deus e aopróximo, a imortalidade da alma, e acreditavam na ressurreição. Viviam

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM42

43INTRODUÇÃO

em celibato, condenando a escravidão e a guerra, trazendo seus bensem comunidade, e trabalhavam na agricultura. Opondo-se aos saduceus,que negavam a imortalidade da alma, e aos fariseus rígidos apenas naspráticas exteriores e de qualidades apenas aparentes, jamais os essêniostomaram parte nas querelas que dividiam essas duas seitas.

O gênero de vida que levavam os fez assemelharem-se muitocom os primeiros cristãos e, pelos princípios morais que professavam,levaram muitas pessoas a pensar que Jesus fizera parte dessa seitaantes do início de sua missão pública.

Certamente Jesus teria conhecido essa seita, mas nada provaque a ela se filiara, sendo que tudo o que se escreveu a tal respeito éhipotético (1).

Terapeutas — (do grego thérapeutai, formado de thérapeuein,significando servir, curar, ou seja, servidores de Deus ou curadores).Sectários judeus contemporâneos do Cristo, estabelecidosprincipalmente em Alexandria, no Egito. Eles cultivavam grandesrelações com os essênios, adotando-lhes os princípios. Adotavam,também, a prática de todas as virtudes. Alimentavam-se frugalmente,sendo também celibatários, voltados à contemplação e à vida solitária.

Formavam uma verdadeira ordem religiosa.Fílon, filósofo judeu platônico, de Alexandria, foi o primeiro

a falar dos terapeutas, considerando-os uma seita do judaísmo.Eusébio, Jerônimo e outros Padres da Igreja* pensavam que eleseram cristãos.

Fossem judeus ou cristãos, o que se evidência é que, do mesmomodo que os essênios, eles formam um traço de união entre ojudaísmo e o cristianismo.

1. A morte de Jesus, supostamente escrita por um irmão essênio, é um livro completamente

apócrifo, escrito tão-somente para servir de apoio a uma opinião, trazendo em si mesmo a

prova de sua origem moderna.

(*) “Padres da Igreja” era a denominação dada aos autores de textos sagrados da

Igreja primitiva, mais ou menos do século primeiro ao século sétimo. Tais escritos

foram importantes no desenvolvimento do pensamento do início do cristianismo.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM43

INTRODUÇÃO

44

Jesus conheceu a seita dos essênios.Seria equivocado, porém, concluir-se que a sua doutrina foi

inspirada nessa seita e que, se houvera estado em outro meio, abraçariaoutros princípios.

As grandes idéias jamais surgem subitamente.Todas aquelas que têm por base a própria verdade contam

com precursores que lhes preparam parcialmente as sendas. Depois,quando chegar o tempo justo, Deus envia um homem com missãode resumir, coordenar e completar os elementos esparsos, formandoum corpo doutrinário.

Não surgindo bruscamente a idéia, ao aparecer encontraráalmas dispostas a aceitá-la. Assim, se deu, portanto, com a idéiacristã, que foi recolhida como que no ar séculos antes de Jesus e dosessênios, tendo em Sócrates e Platão os seus principais precursores.

Sócrates, assim como Jesus Cristo, nada escreveu ou, pelomenos, nenhum escrito pessoal deixou. Como Jesus, experimentoua morte imposta a criminosos, vítima de fanatismo, por tercombatido as crenças que encontrara e posto a virtude acima dahipocrisia e dos simulacros das formas, evidenciando os preconceitosreligiosos.

Assim como Jesus foi acusado pelos fariseus de corromper opovo com os seus ensinamentos, Sócrates foi acusado pelos fariseusde seu tempo, já que há fariseus em todas as épocas, de corrompera juventude ao proclamar a unidade de Deus, a imortalidade daalma e a existência da vida futura além do corpo físico.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM44

45INTRODUÇÃO

Igualmente como conhecemos a doutrina de Jesus pelosEvangelhos escritos pelos seus discípulos, nós somente conhecemosos pensamentos de Sócrates pelos escritos de seu discípulo Platão.

Cremos, por isso, ser útil que reunamos os pontos de maiordestaque dos ensinamentos de Sócrates, para demonstrar aconcordância desses princípios com os do cristianismo.

Alguns poderão considerar tal propósito uma profanação.Dirão que não se pode estabelecer um paralelo entre a doutrina

de um pagão e a do Cristo. Responderemos que a doutrina deSócrates não era paganismo, mas visava a combater o paganismo. Adoutrina do Cristo, por sinal mais completa e pura que a de Sócrates,não perderá coisa alguma na comparação. A grandeza da missãodivina do Cristo não poderá ser reduzida, uma vez que se trata deum fato da História que não é possível apagar.

O homem atingiu um ponto tal, hoje, em que a luz explodepor si mesma, indo ao encontro de todas as consciências. Acha-sevocê, portanto, em condição de encará-la face a face, graças à suamaturidade. Pior será para aqueles que não querem abrir os olhos evê-la. É tempo de ver as coisas mais largamente e de um modoelevado. Não mais, portanto, de um ponto de vista mesquinho econdicionado aos interesses de seitas e castas.

As citações que faremos, por isso, provarão que se Sócrates ePlatão pressentiram a idéia do cristianismo, pressentiram tambémos princípios fundamentais da Doutrina Espírita.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM45

INTRODUÇÃO

46

I. O homem é uma alma encarnada. Antes de sua encarnação,ela estava unida aos tipos primordiais, unida às idéias da verdade,do bem e do belo. Separando-se desse estado, ao encarnar, ela sesente mais ou menos atormentada ao recordar o seu passado, pordesejar voltar ao que era.

Seria quase impossível enunciar com mais clareza adistinção e independência entre o princípio inteligente e oprincípio material. Destaca-se, também, por outro lado, adoutrina da preexistência da alma; da vaga intuição que elaconserva de um mundo pelo qual aspira; da sua sobrevivênciaao corpo; de sua vinda do mundo espiritual para encarnar e deseu retorno a esse mesmo mundo de origem, após a morte.

Esse é o germe da doutrina dos Anjos decaídos ou depostos.II. A alma se extravia e se perturba, quando se utiliza do corpo

para contatar qualquer objeto. Sente vertigem, qual se estivesseembriagada, porque se une às coisas que são, pela própria natureza,sujeitas a mudanças. Quando, porém, ela contempla a sua própriaessência, ela contata com o que é puro, eterno, imortal e, portanto,igual à sua própria natureza, permanecendo aí unida pelo mais longotempo que possa. Cessam, aqui, os seus extravios e a sua perturbação,uma vez que ela está unida ao que é imutável e a esse estado é que sechama sabedoria.

Se você aprecia alguma coisa de modo terra a terra, doponto de vista material, criará em você mesmo uma ilusão. Paraapreciá-la, porém, com justeza, deverá examiná-la de modo mais

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM46

47INTRODUÇÃO

alto, menos terra a terra, partindo para considerá-la do pontode vista espiritual.

Você será verdadeiramente prudente se, em todas ascircunstâncias, isolar a alma do corpo para ver com os olhos doespírito.

Este é, também, um ensinamento do Espiritismo (cap. II,n.º 5).

III. Ao estarmos em nosso corpo e a alma permanecermergulhada na corrupção, jamais possuiremos o objeto de nossosdesejos: a verdade. O corpo nos cria mil obstáculos, pela necessidademesmo de cuidarmos dele com esmero. Ele nos enche de desejos,de apetites, de temores, de mil quimeras e de mil tolices, de talmodo que se torna impossível sermos de bom senso por alguminstante. Mas, se nos torna impossível conhecer puramente algumacoisa, enquanto a alma está unida ao corpo, entre essas duas coisashaverá uma: ou não conheceremos jamais a verdade ou iremosconhecê-la após a morte. Libertos dos grilhões do corpo,conversaremos então, é lícito esperá-lo, com outros homensigualmente livres, libertos, e conheceremos por nós mesmos a essênciadas coisas. Em decorrência disso é que os verdadeiros filósofos seexercitam em morrer e a morte não lhes parece, de nenhum modo,terrível.

Este é o princípio de obscurecimento das faculdades daalma, por ter de manifestar-se por intermédio dos órgãoscorporais e o da expansão de suas faculdades após a morte. Essaexpansão, contudo, se dará com almas elevadas, despojadas dasimpurezas, não ocorrendo o mesmo com as almas impuras (OCéu e o Inferno, 1ª parte, cap. II; 2ª parte, cap. I).

IV. A alma impura, nesse estado, sente-se oprimida e éarrastada para o mundo visível, pelo horror que sente pelo que éinvisível e imaterial. Ela vagueia, diz-se, em torno de monumentose de túmulos, junto aos quais já se tem visto tenebrosos fantasmas,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM47

INTRODUÇÃO

48

como devem ser as imagens das almas que deixaram os corpos físicossem terem alcançado a pureza. Conservando qualquer coisa da formamaterial, isso faz com que as vistas humanas possam percebê-las.Esses fantasmas não são as almas dos bons, mas dos impuros. Elasse vêem forçadas a vagar por tais lugares, carregando a pena de suaprimeira vida. Continuarão a vagar, até que os apetites inerentes àforma material de que se revestiram as reconduzam a um novocorpo. Elas retornarão, sem dúvida, aos mesmos costumes que, nocurso de sua primeira vida, foram o objeto de sua predileção.

Não temos aí, somente o princípio da reencarnação, intei-ramente e claramente expresso. Temos, também, o estado dasalmas que se mantêm presas à matéria, descrito da mesma formaque o Espiritismo mostra nas evocações. Diz-se, também, que areencarnação da alma num corpo material é uma conseqüênciada própria impureza da alma, enquanto que as almas purificadasestão livres, franqueadas de reencarnar.

O Espiritismo não diz outra coisa. Acrescenta-se, tão-somente, que a alma que boas resoluções tomou quando naerraticidade, e que possui conhecimentos adquiridos, trazconsigo, ao renascer, menos defeitos, mais virtudes e muitasidéias intuitivas de sua precedente existência. Assim é que cadaexistência significa para a alma um progresso intelectual e moral(O Céu e o Inferno, 2ª parte: Exemplos).

V. Após a nossa morte, o gênio (daimon, demônio) que nosacompanhou durante a nossa vida, leva-nos a um lugar onde sereúnem todos aqueles que devem ser conduzidos ao Hades paraserem julgados. As almas, após permanecerem no Hades o temponecessário, são trazidas a esta vida em numerosos e longos períodos.

A palavra daimon, da qual se originou o termo demônio,não se referia ao mal em si, na época em que era utilizada.Somente na era moderna tem ela esse sentido. Não designava,portanto, entidades malfazejas, mas os Espíritos de um modo

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM48

49INTRODUÇÃO

geral. Distinguiam-se, entre eles, os Espíritos Superiores,chamados de deuses, e os Espíritos menos elevados, estes osdemônios propriamente ditos, que se comunicavam diretamentecom os homens.

O Espiritismo diz, também, que os Espíritos povoam oespaço; que Deus não se comunica diretamente com os homense que são os puros Espíritos que se comunicam para transmitirem-lhes a vontade do Criador.

Substitua a palavra demônio pela Espíritos e você terá aDoutrina Espírita. Substitua a palavra demônio por anjo e vocêterá a doutrina cristã.

VI. Os demônios ocupam o espaço que separa o céu da Terra.Eles são o liame que une o Grande Todo a si mesmo. A divindadenão entra jamais em comunicação direta com o homem, a não serpor intermédio dos demônios. Através destes é que os deuses fazemo intercâmbio e se entretêm com os homens, quer durante a vigília,quer durante o sono.

Esta é a doutrina dos Anjos guardiães ou Espíritosprotetores e, também, das reencarnações sucessivas apósintervalos mais ou menos longos na erraticidade.

VII. A preocupação constante do filósofo (tal como acompreendiam Sócrates e Platão) é de tomar grande cuidado coma alma, menos pelo que ocorre nesta vida, que representa apenasum instante, porém mais pela própria eternidade. Se a alma é imortal,não será sabedoria viver em função da própria eternidade?

O cristianismo e o Espiritismo ensinam a mesma coisa.VIII. Se a alma é imaterial, ela tem de passar, após esta vida,

para um mundo igualmente invisível e imaterial, do mesmo modoque o corpo, por ser material, deverá entrar em decomposição eseus elementos retornarem à matéria. Importa, então, somentedistinguir a alma pura, verdadeiramente imaterial, que se alimenta,como Deus, de ciência e de pensamentos, da alma mais ou menos

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM49

INTRODUÇÃO

50

marcada por impurezas materiais, que a impedem de elevar-se aodivino e que a retêm nos mesmos lugares de sua estada na Terra.

Sócrates e Platão, como você pode ver, compreendiamperfeitamente os diferentes graus de desmaterialização da alma. Elesinsistem sobre a diferente situação que resulta para ela de sua maiorou menor pureza.

O que eles disseram por intuição, o Espiritismo prova pornumerosos exemplos que nos são postos diante dos olhos. (OCéu e o Inferno, 2ª parte.)

IX. Se a morte representasse a dissolução total do homem,isso seria um grande ganho para os maus, uma vez que após a morteeles se veriam, ao mesmo tempo, livres do corpo, da alma e dosvícios. Aquele, porém, que enriquecer a sua alma, não com valoresque lhe sejam estranhos, mas com valores que lhe são próprios,somente esse é que poderá aguardar tranqüilamente a hora de suapartida para o outro mundo.

Em outros termos, isto quer dizer que o materialismo, aoproclamar que nada existe após a morte, está anulando toda equalquer responsabilidade moral posterior à morte e, porconseqüência, estimulando o homem para o mal, significandoque o mau tem tudo a ganhar da existência do nada após a morte.No entanto, será apenas o homem que se enriqueceu de virtudesque poderá aguardar tranqüilamente o despertar na outra vida.

O Espiritismo lhe mostra, através de exemplos que todosos dias são postos debaixo de seus olhos, quanto é penoso parao mau a sua passagem desta vida para a outra. (O Céu e o Inferno,2ª parte, cap. I.)

X. Os corpos conservam os sinais bem marcados dos cuidadosrecebidos ou dos acidentes que sofreram. Dá-se a mesma coisa coma alma. Quando se despe do corpo, ela carrega os traços evidentesde seu caráter, de suas afeições e as marcas de todos os atos de suavida. Assim a grande infelicidade que pode acometer o homem é ir

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM50

51INTRODUÇÃO

para o outro mundo com a alma marcada de crimes. Veja, Cálicles,que nem você, nem Pólux, nem Górgias poderão provar quedevemos levar uma outra vida que nos seja útil quando estejamosdo outro lado. Entre tantas opiniões diversas, a única que permaneceinalterável é a de que vale mais receber do que cometer uma injustiça.Cuidemos, portanto, em aplicar-nos não a simplesmente parecerum homem de bem, mas a ser um homem de bem. (Diálogo deSócrates com seus discípulos, na prisão.)

Eis, aqui, um outro ponto capital, hoje confirmado pelaexperiência: a alma não depurada conserva as idéias, astendências, o caráter e as paixões de que se alimentou durantea sua vida na Terra. Já na máxima: vale mais receber do quecometer uma injustiça, não está por inteiro o cristianismo? Esseé o mesmo pensamento que Jesus expressou, utilizando aseguinte imagem: “Se alguém lhe bater numa face, ofereça-lhea outra”. (Cap. XII, n.º 7 e 8.)

XI. De duas coisas, uma: ou a morte é uma destruição absolutaou é a passagem da alma para outro lugar. Se a morte extinguetudo, poderemos torná-la como uma dessas raras noites quepassamos sem sonhos e sem consciência de nós mesmos. Porém, sea morte é apenas uma mudança de morada, a passagem para o lugaronde os mortos se reúnem será a felicidade de reencontrar-nos comaqueles a quem conhecemos! Meu maior prazer seria examinar deperto os habitantes dessa outra morada e de distinguir, qual meocorre aqui, os que são sábios daqueles que se dizem tais e não osão. É tempo, contudo, de separar-nos, eu para morrer e vocês paraviverem (Sócrates, falando a seus juízes).

Segundo Sócrates, os homens que viveram sobre a Terrase reencontram após a morte e se reconhecem. O Espiritismonos mostra continuamente que as relações que entre as criaturasse estabeleceram, prosseguem após a morte sem uma só

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM51

INTRODUÇÃO

52

interrupção, nem a cessação da vida, mas por uma transformaçãosem solução de continuidade.

Se Sócrates e Platão houvessem conhecido osensinamentos que o Cristo difundiu quinhentos anos mais tarde,e o que os Espíritos difundem, não teriam falado de outro modo.Não há, aqui, no entanto, nada que surpreenda, seconsiderarmos que as grandes verdades são eternas e que osgrandes Espíritos hão de tê-las conhecido antes de vir à Terrapara onde as trouxeram. Sócrates, Platão e os grandes filósofosdaquele tempo bem podem estar, mais tarde, entre aqueles quesecundaram o Cristo em sua divina missão, escolhidosprecisamente por se acharem, entre outros, em condições decompreenderem seus sublimes ensinamentos. Fazem eles, hoje,parte da plêiade de Espíritos encarregados de ensinar aoshomens as mesmas verdades.

XII. Jamais se deve retribuir uma injustiça com outra injustiça,nem fazer mal a qualquer pessoa, seja qual for o dano que nos hajafeito. Poucas serão as pessoas que admitirão este princípio e essestais, por certo, desprezarão uns aos outros.

Não está aí o que ensinamos, com base no princípio dacaridade, que não devemos retribuir o mal com o mal e quedevemos perdoar aos nossos inimigos?

XIII. Pelos frutos se conhece a árvore. Toda ação é qualificadapelo que produz: diremos ser má, quando dela provenha o mal;diremos ser boa, quando dela se origine o bem.

Esta máxima: “Pelos frutos se conhece a árvore” seencontra, textualmente, repetida muitas vezes no Evangelho.

XIV. A riqueza é um grande perigo. Todo homem que ama ariqueza não ama a si mesmo e nem o que é seu. Ama, por certo,uma coisa que lhe é ainda mais estranha do que aquilo que lhepertence (Cap. XVI).

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM52

53INTRODUÇÃO

XV. A mais bela das preces e os mais formosos sacrifícioscausam menos glorificação à Divindade que uma alma virtuosa quese esforça para assemelhar-se às virtudes sublimes. Seria uma coisamuito grave que os deuses dispensassem mais atenção às nossasoferendas que à nossa própria alma. Se tal acontecesse, os maisculpados poderiam se tornar os mais favorecidos. Mas tal não sedá, sendo que somente os verdadeiramente justos e sábios são osque, por suas palavras e atos, cumprem os seus deveres para com osdeuses e para com os homens. (Cap. X, n.º 7 e 8.)

XVI. Chamo de homem vicioso a esse amante vulgar, queama o seu próprio corpo, mais que a sua alma. O amor está portoda a natureza que nos convoca a exercer a nossa inteligência. Aténo movimento dos astros o encontramos. Esse amor é o que adornaa natureza de seus ricos tapetes. Ele se enfeita e fixa morada ondehaja flores e perfumes. É ainda o amor que traz paz aos homens,que acalma o mar, que silencia os ventos e abranda a dor.

O amor, que há de unir os homens por um liame fraternal,é uma conseqüência desta teoria de Platão sobre o amoruniversal como lei da natureza. Sócrates disse: “Amor não énem um deus, nem um mortal, mas é um grande demônio”.

Com isso, quis dizer que um grande espírito preside oamor universal, sendo que essa colocação lhe foi interpretadacomo crime.

XVII. A virtude não pode ser ensinada. Ela vem por um domde Deus aos que a possuem.

Isso é o que quase prega a doutrina cristã sobre a graça.Se, porém, a virtude é um dom de Deus, isso é um favor quenos levará a perguntar: “Por que Ele não a concede a todos?”.Por outro lado, se a virtude é um dom, não há mérito em quema possui.

O Espiritismo é mais claro a esse respeito, esclarecendoque aquele que possui a virtude a adquiriu por esforço próprio,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM53

INTRODUÇÃO

54

no curso de suas existências sucessivas, despojando-se, pouco apouco, de suas imperfeições. A graça, esta sim, é a força comque Deus favorece a todos os homens de boa vontade paradespojar-se do mal e para praticar o bem.

XVIII. É uma disposição natural em todos nós, a de não nosapercebermos bem de nossos próprios defeitos, vendo mais osdefeitos dos outros.

O Evangelho ensina: “Você vê a palha que está no olho deseu próximo e não vê a trave que está no seu”. (Cap. X, n.º 9 e 10.)

XIX. Se os médicos são mal-sucedidos ao tratar da maiorparte das moléstias é porque tratam do corpo sem tratar da alma. Éque, se o todo não está em bom estado, será impossível que partedele passe bem.

O Espiritismo dá a chave das relações que existem entre aalma e o corpo. Prova que há uma reação incessante de umsobre o outro. Abre assim um campo novo para a Ciência.Revelando a verdadeira causa de certas doenças, dá-lhe os meiosde as combater.

Quando a ciência, portanto, levar em conta a ação doelemento espiritual na sua técnica de curar, seus insucessos serãomenos freqüentes.

XX. Todos os homens, desde a infância, fazem mais o maldo que o bem.

Esta expressão de Sócrates aborda a grave questão dapredominância do mal sobre a Terra. Essa questão é insolúvelsem o conhecimento da pluralidade dos mundos e da destinaçãoda própria Terra, habitada que é por uma parte mínima daHumanidade.

O Espiritismo dá-lhe a solução, que se encontradesenvolvida nesta mesma obra, nos capítulos II, III e V.

XXI. Ajuizado você será, se não supuser saber o que vocêignora.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM54

55INTRODUÇÃO

Esta vai para os críticos apressados.Dirige-se, como princípio de sabedoria, aos que criticam

ao que desconhecem.Platão completa esse pensamento de Sócrates, dizendo:

“Tentemos primeiramente torná-los, se possível, mais honestosnas palavras. Se isso não conseguirmos, não nos ocupemos maiscom eles. Empenhemo-nos tão-somente em buscar a verdade.Cuidemos de instruir-nos, sem nos sentirmos injuriados”.

Os Espíritas devem proceder dessa forma diante dos seuscontraditores de boa ou de má-fé.

Se Platão revivesse hoje encontraria as coisas quase nomesmo pé das do seu tempo. Poderia, por isso, usar a mesmalinguagem que usou. Sócrates, por sua vez, voltaria a topar comcriaturas que zombariam de sua crença nos Espíritos e que otratariam como se ele fosse louco, dando esse mesmotratamento a seu discípulo Platão.

Por professar esses princípios é que Sócrates foiridicularizado, acusado impiedosamente e condenado a bebercicuta. As verdades novas levantam, contra si, os interesses e ospreconceitos que elas contrariam e, por isso, não se podemfirmar sem fazer mártires.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM55

NÃO VIM DESTRUIR A LEI

56

1. Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas; não os vimdestruir, mas cumpri-los. Porque, em verdade vos digo que, até que océu e a terra passem, nem um jota ou um til se omitirá da lei, sem quetudo seja cumprido. (Mateus, capítulo 5, versículos 17 e 18. )

MOISÉS

2. Há duas partes distintas na lei mosaica.Uma delas é a lei de Deus, promulgada no monte Sinai e, a

outra, é a lei civil ou disciplinar estabelecida pelo próprio Moisés.A primeira delas é invariável.A segunda, porém, era tão-somente apropriada para reger os

costumes e as características do povo hebreu, sendo, portanto,modificada com o tempo.

A lei de Deus está contida nos dez mandamentos seguintes:I. Eu sou o Senhor, vosso Deus, que vos retirei do Egito, da casa

da servidão. Não tereis outros deuses diante de mim. Não fareisimagem esculpida, nem figura alguma do que está em cima do céu,nem embaixo da terra, nem do que se encontra sob a terra. Não osadorareis e nem lhes prestareis culto soberano.

II. Não tomareis em vão o nome do Senhor, vosso Deus.III. Lembrai-vos de santificar o dia do sábado.IV. Honrai o vosso pai e a vossa mãe, a fim de viverdes longo

tempo na terra que o Senhor vos dará.

1

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM56

57CAPÍTULO I

V. Não mateis.VI. Não cometais adultério.VII. Não roubeis.VIII. Não presteis testemunho falso contra o vosso próximo.IX. Não desejeis a mulher do vosso próximo.X. Não cobiceis a casa do vosso próximo, nem o seu asno, nem

alguma outra coisa que lhe pertença.Esta Lei é de todos os tempos e de todos os países.Por ser a mesma para todos, tem um caráter divino.Todas as demais são leis estabelecidas por Moisés, que se via

obrigado a manter, pelo temor, um povo naturalmente turbulentoe indisciplinado. Esse povo, que ele retirara do Egito, adquirira,durante o período de servidão, maus costumes que se enraizaramna sua alma. E ele tinha de combater esses abusos e preconceitos.

Para dar autoridade às suas leis, Moisés lhes atribuía umaorigem divina, assim como faziam os demais legisladores de povosprimitivos.

Lá, a autoridade de um homem deveria apoiar-se na de Deus.Contudo, somente a idéia de um Deus terrível podia

impressionar homens ignorantes, nos quais o senso moral esentimento de uma reta justiça se encontravam pouco desenvolvidos.

Está suficientemente evidente que aquele que transmitira,entre seus mandamentos: “Não mateis; não causareis dano a vossopróximo”, não poderia contradizer-se fazendo da exterminação umdever.

As leis mosaicas, propriamente ditas, tinham característicasessencialmente transitórias.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM57

NÃO VIM DESTRUIR A LEI

58

CRISTO

3. Jesus não veio destruir a lei.Ele veio cumprir a lei de Deus, desenvolvendo-a, dando-lhe

o seu verdadeiro sentido e a apropriando ao degrau evolutivoalcançado, então, pelos homens.

Por isso é que, na base de sua doutrina, Ele estabelece oprincípio dos deveres para com Deus e para com o próximo.

Quanto às leis civis de Moisés, propriamente ditas, Ele asmodifica profundamente, quer quanto ao fundo, quer quanto àforma. Combate, também constantemente, todos os abusos daspráticas exteriores e das falsas interpretações.

Jesus não poderia submetê-las a uma reforma mais radical,do que as reduzindo as estas palavras: “Amar a Deus acima de todasas coisas e o próximo como a si mesmo” e lhes acrescentando: nistoestão toda a lei e os profetas.

Quando Jesus disse: “Até que o céu e a terra passem, nem umjota ou um til se omitirá da lei, sem que tudo esteja cumprido”,Ele estava a dizer que era necessário que a lei de Deus tivessecumprimento integral. Deveria ser praticada na Terra em toda a suapureza, com toda a extensão que se lhe possa dar e com todas as suasconseqüências.

De que serviria estabelecer aquela lei, se ela viesse a constituir-se o privilégio de alguns poucos homens ou mesmo de um simplespovo?

Todos os homens são filhos de Deus e são, por isso, semnenhuma distinção entre eles, objeto da mesma atenção, da mesmasolicitude da parte do Pai Celestial.

4. O papel de Jesus não foi simplesmente o de um legisladormoralista, cuja autoridade repousasse exclusivamente em sua própriapalavra. Cabia-lhe cumprir, também, as profecias que lhe anunciavama vinda.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM58

59CAPÍTULO I

A sua autoridade lhe vinha da natureza excepcional de seuEspírito e de sua missão divina. Ele veio fazer com que os homensaprendessem que a verdadeira vida não está sobre a Terra, mas ela seencontra no reino dos céus. Veio ensinar-lhes o verdadeiro caminhoque conduz a esse reino; os meios de reconciliar-se com Deus eensiná-los a pressentir no desenvolvimento das coisas futuras ocumprimento dos destinos humanos.

Jesus, porém, não pôde dizer tudo em seu tempo.Sobre muitos pontos de sua doutrina. Ele pôde lançar apenas

alguns germes de verdade que, segundo Ele próprio declarou, sópoderiam ser compreendidos no futuro.

Falou de tudo, mas em termos mais ou menos claros.Para alcançar-lhe o sentido de algumas palavras, fazia-se

necessário que novas idéias e novos conhecimentos viessem trazer-lhes a chave indispensável. Estas idéias, porém, não poderiam surgirantes que o espírito humano houvesse alcançado um certo grau dematuridade.

A ciência deveria contribuir poderosamente para a eclosão eo desenvolvimento de tais idéias e, em razão disso, deveria dar-se àCiência o tempo de progredir.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM59

NÃO VIM DESTRUIR A LEI

60

O ESPIRITISMO

5. O Espiritismo é a nova ciência que vem revelar aos homens,através de provas irrecusáveis, a existência e a natureza do mundoespiritual e as relações desse mundo espiritual com o mundocorporal.

O Espiritismo nos mostra o mundo espiritual, não comouma coisa sobrenatural, mas, ao contrário, como uma das forçasvivas e incessantemente atuantes da natureza. Fenômenosincompreendidos e, por decorrência, rejeitados e relegados aodomínio do fantástico e do maravilhoso, passam a ter nele umafonte de esclarecimentos.

São essas relações entre os dois mundos, a que o Cristo fazalusão em muitas circunstâncias, que fazem com que muitas dascoisas que Ele disse permaneçam pouco compreensíveis ou sejamfalsamente interpretadas.

O Espiritismo é a chave para explicar tudo de modo fácil.6. A Lei do Velho Testamento está personificada em Moisés.

A do Novo Testamento está personificada em Jesus Cristo. OEspiritismo, porém, como a terceira revelação da lei de Deus, nãoestá personificado em nenhum indivíduo.

O Espiritismo é fruto dos ensinamentos dados, não por umhomem, mas pelos Espíritos. Estes é que são As Vozes do Céu,manifestadas em todos os pontos da Terra, com a colaboração deuma multidão inumerável de médiuns.

O Espiritismo é, de certo modo, um ser coletivo, formadode seres do mundo espiritual. Estes vieram trazer aos homens acontribuição de suas luzes, para fazê-los conhecer este mundo e odestino que lhes está reservado.

7. O mesmo que Cristo disse: “Não cuideis que vim destruira lei ou os profetas; não os vim destruir, mas cumpri-los”, dirá

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM60

61CAPÍTULO I

igualmente o Espiritismo: “Não cuideis que vim destruir a lei cristã,mas cumpri-la”.

Coisa alguma o Espiritismo ensina contrário ao que ensinouo Cristo. Contudo, o Espiritismo desenvolve, completa e explica,em termos que sejam claros para todo mundo, o que foi dito sobforma alegórica. Vem, portanto, cumprir, no tempo previsto, oque Cristo anunciou, e preparar o cumprimento das coisas futuras.

O Espiritismo é, por conseqüência, obra do Cristo.É, pois, o próprio Cristo a presidir, consoante o que Ele

próprio anunciou, à regeneração que se opera, preparando a instalaçãodo reino de Deus sobre a Terra.

ALIANÇA DA CIÊNCIA E DA RELIGIÃO

8. Ciência e Religião são as duas alavancas da inteligênciahumana. Enquanto a primeira revela as leis do mundo material, asegunda revela as leis do mundo moral.

Essas leis, porém, vindo de um mesmo princípio, que é Deus,não podem contradizer-se entre si. Se elas forem a negação uma daoutra, uma estará necessariamente em erro e a outra com a razão,visto que Deus não pode pretender destruir a sua própria obra.

A incompatibilidade que se julgou existir entre essas duasordens de idéia resulta de um defeito de observação e do excesso deexclusivismo de cada uma das partes. Nasce, portanto, dessa falhahumana o conflito que deu origem à incredulidade e à intolerância.

São chegados os tempos em que os ensinamentos do Cristodevem receber a sua complementação. O véu, lançado intencionalmentesobre parte dos ensinamentos, deve ser levantado. A própria Ciência,deixando de ser exclusivamente materialista, deve completar-se como elemento espiritual. A Religião, por outro lado, deixando derejeitar as leis orgânicas e imutáveis da matéria, aceitando as duas

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM61

NÃO VIM DESTRUIR A LEI

62

forças da natureza, onde uma apóia a outra, estabelecerá o concertocom a Ciência, e ambas se apoiarão mutuamente.

A Religião, não mais negada pela Ciência, adquirirá uma forçaindestrutível, por colocar-se de acordo com a razão, não mais seopondo à lógica irresistível dos fatos.

Ciência e Religião não puderam, até hoje, entender-se.Cada uma examinando as coisas de seu ponto de vista

exclusivo, mutuamente se repeliam. Faltava qualquer coisa parapreencher o vazio que as separava. Faltava-lhes um traço de uniãoque as aproximasse. Esse traço de união está no conhecimento dasleis que regem o mundo espiritual e suas relações com o mundocorporal, leis estas tão imutáveis quanto aquelas que regulam omovimento dos astros e a existência dos seres.

Essas relações entre os dois mundos, uma vez constatadaspela experiência, são uma luz nova que se fez: a fé dirigiu-se à razãoe a razão coisa alguma encontrou de ilógico na fé.

O materialismo está vencido.Há pessoas, porém, que param no tempo.Como em todas as coisas, alguns tentam resistir a este

posicionamento. Surgem como estranhos diante do movimentogeral, tentando opor-lhe resistência, mas se não o acompanharemserão esmagados pelos fatos.

Esta é uma revolução moral que se realiza, trabalhada pelosEspíritos. Foi elaborada durante dezoito séculos e a sua realizaçãomarca uma nova era para a Humanidade.

As conseqüências desta revolução moral são fáceis de prever.Elas determinarão, nas relações sociais, inevitáveis modificações,diante das quais ninguém conseguirá opor-se, porque estão nosdesígnios de Deus e nascem da lei do progresso, que é uma lei deDeus.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM62

63CAPÍTULO I

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:A NOVA ERA

9. Deus é um só, único.Moisés é o Espírito que Deus enviou em missão para tornar

conhecido o princípio da unicidade divina, não somente dos hebreus,mas também de todos os povos pagãos.

O povo hebreu, aqui, comparece como o instrumento deque Deus se serviu para fazer tal revelação por Moisés e pelos profetas.

As próprias dificuldades pelas quais passou o povo hebreuforam para chamar a atenção de todos e, também, para fazer cair ovéu que ocultava aos homens o domínio desse princípio divino.

Os mandamentos de Deus, transmitidos através de Moisés,contêm o germe da moral que o cristianismo desdobrou. Oscomentários da Bíblia, porém, restringiam-lhe o sentido, porquese tivesse iniciado aquele povo em toda a sua pureza, não a teriacompreendido. Nem por isso, contudo, os dez mandamentos deDeus deixavam de ser como uma introdução brilhante, como umfarol a clarear a Humanidade sobre o caminho que deveria percorrer.

A moral ensinada por Moisés era apropriada ao estágioevolutivo daqueles povos.

Semi-selvagens, ainda, no tocante ao aperfeiçoamento da alma,não teriam compreendido que se pudesse adorar a Deus sem ser pormeio de holocausto, nem que se devesse perdoar a um inimigo.

A inteligência desse povo, embora notável do ponto de vistadas coisas materiais e, mesmo, das artes e das ciências, estava muitopouco desenvolvida sobre as questões de moralidade. Não lhes seriafácil converterem-se sob o domínio de uma religião inteiramenteespiritual.

Eles eram carentes de uma representação semimaterial.Isso é o que lhes ofertava a religião hebraica.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM63

NÃO VIM DESTRUIR A LEI

64

Os sacrifícios falavam-lhes aos sentidos grosseiros, enquantoque a idéia do Deus único lhes falava ao Espírito.

O Cristo foi o iniciador da moral mais pura, da mais sublime.A moral evangélica cristã renovará o mundo, aproximando

os homens por torná-los irmãos uns aos outros, fazendo germinarem todos os corações a caridade, o amor ao próximo, criando entretodos os homens uma solidariedade comum.

Essa moral transformará a Terra.Fará do nosso mundo uma morada de Espíritos superiores

aos que hoje a habitam, porque essa é a lei do progresso, a que anatureza está submetida, e que aqui se cumprirá.

O Espiritismo é a alavanca de que Deus se serve para fazeravançar a humanidade.

Os tempos são chegados, para que as idéias morais fermentemno coração humano, a fim de realizarem os progressos que estãonos desígnios de Deus. Essas idéias seguirão a mesma senda que asda liberdade, suas percursoras.

Não se pense, porém que será um progresso sem lutas.Elas não dispensam, para atingir a sua maturidade, os abalos

e as discussões, a fim de atrair a atenção das massas. Uma vez,contudo, centralizada a atenção das massas, a beleza e a santidade damoral tocarão os espíritos. Estes, aí, abraçarão uma ciência que lhesdoe a solução da vida futura e lhes abra as portas da felicidade eterna.

Moisés abriu o caminho; Jesus continuou a obra e oEspiritismo a completará. (Um Espírito israelita. Mulhouse, 1861.)

10. Um dia, Deus, em sua inesgotável caridade, permitiu aohomem ver a verdade atravessar as trevas. Esse dia foi o advento doCristo.

Após a Luz viva, voltaram as trevas.O mundo, ferido pelas alternativas de verdade e sombras em

que vivia, perdeu-se novamente. Foi quando que, semelhantes aosprofetas do Antigo Testamento, os Espíritos se puseram a falar e a

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM64

65CAPÍTULO I

lhe advertir. O seu mundo, a partir daí, está abalado em suas basese você ouvirá o ribombar dos trovões, mas seja firme!

O Espiritismo é de ordem divina.Ele repousa nas leis da própria natureza e, guarde certeza, que

tudo o que é de ordem divina tem um objetivo grande e útil. Naverdade, você sabe que o seu mundo se perdia. A ciência,desenvolvida com o sacrifício do que seja de ordem moral,conduzindo-o ao encontro do bem-estar material, tornava-se emproveito do espírito das sombras. Você sabe, como cristão, que ocoração e o amor devem marchar unidos à Ciência.

O reino do Cristo, apesar de passados dezoito séculos, e mes-mo com o sangue de tantos mártires, ainda não veio.

Cristãos, voltem-se para o Mestre que os quer salvar.Tudo é fácil para aquele que crê e ama.O amor o encherá de inefável ventura!Filhos, o mundo está abalado. Os bons Espíritos lhes dizem

de sobra. Dobrem-se diante da tempestade, a fim de não caírempor terra. Preparem-se para que não lhes seja dado imitarem asvirgens loucas, que estavam desatentas quando lhes chegou o esposo.

A transformação que surge é moral e não material.Os grandes Espíritos, mensageiros divinos, estimulam a fé,

para que todos vocês obreiros esclarecidos e ardorosos, façam comque a sua voz humilde seja ouvida. Vocês são minúsculos grãos deareia, mas sem os grãos de areia não se erguem as grandes montanhas.

Que a expressão “somos pequenos”, coisa alguma seja paravocês.

A cada um a sua missão e a cada um o seu trabalho.Não constrói a formiga a sua comunidade e pequenos

animaizinhos não elevam continentes?A nova cruzada está começando.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM65

NÃO VIM DESTRUIR A LEI

66

Apóstolos da paz universal, e não de uma guerra, modernosBernardos, levantem os olhos e sigam para frente: a lei dos mundosé a lei do progresso (Fénelon, Poitiers, 1861).

11. Agostinho é um dos grandes divulgadores do Espiritismo.Manifesta-se por quase toda parte.Vamos encontrar a razão dessa sua atividade espiritual de agora,

na própria vida desse grande filósofo cristão. Pertence ele a essavigorosa falange dos Pais da Igreja, a quem o cristianismo deve seusmais sólidos alicerces.

Assim como vários outros, ele foi arrancado do paganismoou, dizendo melhor, foi arrancado da impiedade mais profundapara o clarão da verdade. Quando entregue aos desvarios, sentiu emsua alma uma certa vibração que o fez voltar-se para si mesmo.Compreendeu, então, que a felicidade estava além dos prazeresenervantes e fugidios.

No seu caminho de Damasco, ele ouviu a voz santa a lhegritar: “Saulo, Saulo, por que me persegues?” e Agostinho clamou:“Meu Deus! Meu Deus! perdoai-me, eu creio, sou cristão!”.

Ele se tornou um dos firmes sustentáculos do Evangelho.Você poderá ler, nas marcantes confissões que nos deixou esse

eminente Espírito, as palavras características e proféticas ao mesmotempo, que pronunciou após a perda de Mônica: “Estou convencidode que a minha mãe, Mônica, voltará a visitar-me e a dar-meconselhos, em me revelando o que nos aguarda na vida futura”.

Que ensinamentos nessas palavras e que previsão brilhanteda futura doutrina!

Por isso é que hoje, vendo chegada a hora para a divulgaçãoda verdade que, no passado, pressentira, ele se faz o seu ardentepropagador e se multiplica, por assim dizer, para responder a todosque o chamam. (Erasto, discípulo de Paulo de Tarso, Paris, 1863.)

Nota – Agostinho, acaso, estaria demolindo aquilo queedificou? Seguramente que não! Como tantos outros, porém,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM66

67CAPÍTULO I

passou a ver com os olhos do espírito aquilo que não via comohomem. Sua alma, liberta, entreviu novas luzes. Compreende, agora,o que antes não compreendia. As novas idéias lhe revelam a verdadecontida em certas expressões. Enquanto encarnado, julgava as coisassegundo os conhecimentos que possuía. Mas, tão logo uma novaluz o iluminou, pôde ajuizá-las mais claramente. Abandonou, porisso, a crença referente a espíritos íncubos e súcubos e o anátemaque lançara contra a teoria dos antípodas. Agora que o cristianismolhe surge com toda a sua pureza, pode ele, sobre certos pontos,repensar diferentemente de quando na vida, sem deixar de ser oapóstolo cristão. Ele pôde, sem renegar a sua fé, fazer-se o propagadordo Espiritismo, porque vê cumprir as coisas que foram preditas.Com as suas colocações, faz-nos chegar a uma interpretação maissábia e mais lógica dos textos. Assim é, também, com outrosEspíritos, que se encontram em posição semelhante.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM67

MEU REINO NÃO É DESTE MUNDO

68

1. Tornou pois a entrar Pilatos na audiência, e chamou a Jesuse disse-lhe: Tu és o Rei dos judeus? Respondeu Jesus: O meu reino nãoé deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, pelejariam os meusservos para que eu não fosse entregue aos judeus. Mas agora o meureino não é daqui.

Disse-lhe pois Pilatos: Logo tu és rei? Jesus respondeu: Tu dizesque eu sou rei. Eu para isso nasci, e para isso vim ao mundo, a fim dedar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade ouve aminha voz. (João, capítulo 18, versículos 33, 36 e 37.)

A VIDA FUTURA

2. Jesus indica claramente a vida futura, que Ele apresentaem todas as circunstâncias como sendo a meta da Humanidade. Ohomem deverá fazê-la o objeto principal de suas preocupações naTerra.

Todas as máximas de Jesus reportam-se a esse princípio.Sem a vida futura, com efeito, a maior parte de seus preceitos

morais nenhuma razão teriam. Aos que não crêem na vida futura,por parecer-lhes que Ele fala da vida presente, seus preceitos moraisnão são bem compreendidos ou se tornam pueris.

A vida futura é o ponto fundamental de sua doutrina,podendo ser considerada o pivô dos ensinamentos do Cristo. Por

2

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM68

69CAPÍTULO II

tal motivo é que a colocamos entre os primeiros lugares desta obra.É que a vida futura tem de estar na mira de todos os homens.

Somente ela justifica as anomalias da vida terrena e asharmoniza com a Justiça Divina.

3. Os judeus tinham idéia muito vaga sobre a vida futura.Eles acreditavam nos anjos, quais se fossem seres privilegiados

da Criação. Não sabiam, porém, que os homens podem tornar-sefuturamente anjos e partilhar da felicidade deles.

Segundo os judeus, o cumprimento rigoroso das leis de Deuslhes traria como recompensa os bens materiais deste mundo, asupremacia de sua nação, a vitória sobre seus inimigos. Concluíam,portanto, que as calamidades públicas e as derrotas eramconseqüência direta do não cumprimento das leis divinas.

Moisés não pudera dizer outra coisa a um povo pastor eignorante, que deveria ser sensibilizado, antes de tudo, pelas coisasdeste mundo.

Jesus é quem veio, mais tarde, revelar-lhes que existe um outromundo, onde a justiça de Deus segue seu curso. E esse é o mundoque promete aos que vivenciam os mandamentos divinos, onde osbons recolherão seus frutos.

A vida futura é o reino de Jesus.Nesse mundo é que se encontra toda a glória e para onde Ele

voltaria após cumprir a sua missão na Terra.Entretanto, a ajustar os seus ensinamentos ao degrau evolutivo

dos homens na época em que lhes falava, não pôde dar-lhescompletamente a luz, que poderia ofuscá-los, visto que eles não ocompreendiam.

Jesus limitou-se, portanto, a apresentar a vida futura emtraços ligeiros, como uma lei da natureza da qual ninguém podeescapar. Hoje, porém, todo cristão forçosamente crê na vida futura,embora muitos façam dela uma idéia vaga e incompleta e, por issomesmo, falsa em muitos pontos.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM69

MEU REINO NÃO É DESTE MUNDO

70

Para muita gente, porém, a vida futura não é mais que umacrença, sem certeza absoluta e, por isso, alimentam-se de dúvidas emesmo de incredulidade.

O Espiritismo veio completar esse princípio, assim comomuitos outros dos ensinamentos do Cristo, no momento em queos homens alcançaram maturidade para compreender a verdade.

Com o Espiritismo, a vida futura não é, simplesmente, umartigo de fé, um dogma ou mera hipótese. É uma realidadedemonstrada pelos fatos. São as próprias testemunhas oculares quea descrevem em todas as suas fases e em todas as suas particularidades.

Excluem, pois, todas as dúvidas.Permite-se, assim, que até a mais vulgar inteligência possa

imaginá-la em seus verdadeiros aspectos, da mesma forma que sepoderá imaginar um determinado país do qual se leu uma descriçãodetalhada.

A descrição da vida futura, no Espiritismo, é minuciosa. Ascondições da existência feliz ou infeliz, relatadas pelos que nela seencontram, são tão racionais que qualquer um termina porconcordar que não poderia ser de outra forma e que essa vida futurabem representa a Justiça Divina.

A REALEZA DE JESUS

4. O reino de Jesus não é deste mundo.Se todos compreendem que o seu reino não é deste mundo,

não terá Jesus, sobre a Terra, também uma realeza?O título de rei não implica, necessariamente, o exercício de

um poder temporal. Esse título é atribuído, também, por umconsenso unânime, a todo aquele que, pelo seu gênio, alcança oprimeiro lugar numa ordem de idéias, quaisquer sejam elas. É título

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM70

71CAPÍTULO II

dado aos que dominam seu século e influem sobre o progresso daHumanidade.

É nesse sentido que se diz: o rei ou príncipe dos filósofos,dos artistas, dos poetas, dos escritores etc. Essa realeza, nascida domérito pessoal, consagrando a personalidade para a posteridade, nãorevela uma realeza bem maior do que aquela de quem porta umacoroa real?

A realeza do mérito é permanente.A realeza, contudo, que decorre de uma coroa real, essa está

sujeita a um jogo de circunstâncias, tanto que as gerações futuraspoderão bendizer a primeira e maldizer a segunda.

A realeza terrena finda com a vida.A realeza moral, porém, sobrevive à morte.Sob o título de realeza moral, não é Jesus mais rei do que

muitos dos poderosos da Terra? Com razão, portanto, disse Ele aPilatos: “Sou rei, mas o meu reino não é deste mundo”.

O PONTO DE VISTA

5. A idéia clara e precisa que se faça sobre a vida futura faznascer uma inabalável fé no porvir. Essa é a fé de conseqüênciasimensas para a moralização dos homens, porque mudacompletamente o ponto de vista sob o qual examinam a vida terrena.

Para quem examina, através de seu pensamento, a vidaespiritual que é infinita, a vida corporal se torna uma simplespassagem, uma curta estada num país hostil.

A partir daí, as dificuldades e tribulações da vida terrena nãopassam de incidentes que se aprende a suportar com paciência, porsaber que terão curta duração e deles virão a sua felicidade.

A morte não lhes é mais aterradora.Deixará a morte de ser a porta para o nada.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM71

MEU REINO NÃO É DESTE MUNDO

72

Será uma abertura para a libertação, através da qual o exiladoentra na morada da bem-aventurança e da paz.

Sabendo que a sua estada, no lugar onde se encontrar, étemporária e não definitiva, prende-se pouco às preocupações destavida, alcançando uma calma de espírito que o retira do campo doamargor constante.

Pelo simples fato de o homem duvidar da vida futura, osseus pensamentos. ficam limitados à vida terrestre. A incerteza sobreo seu futuro o faz prisioneiro do dia-a-dia. Não se apercebendo denenhum outro bem mais precioso que os da Terra, torna-sesemelhante a uma criança que nada mais vê além de seus brinquedos,e tudo faz para obtê-los.

Quando esse homem perde um só de seus bens, sente umamargo pesar. Para ele um engano, uma decepção, uma ambiçãonão satisfeita, uma injustiça que experimente, o próprio orgulhoou vaidade feridos lhe são tormentos, transformando-lhe a existêncianuma angústia perpétua, infligindo-se a si próprio uma verdadeiratortura a todos os instantes.

Por colocar a vida terrestre como o centro do seu ponto devista, tudo o que o rodeia alcança vastas proporções. O mal que oatinja, assim como o bem que chegue aos outros, adquirem a seusolhos uma grande importância. Assemelha-se àquele que se encontrano interior de uma cidade, onde tudo lhe parece grande: os homensque ocupam altas posições, os monumentos etc. Se ele, porém, setransportasse para uma montanha, os homens e as coisas lhepareceriam bem pequenos.

Aqueles, porém, que examinam a vida terrestre sob o pontode vista da vida futura, vêem que a Humanidade, tanto quanto asestrelas do firmamento, confundem-se com a imensidade. Percebeque grandes e pequenos estão, de certa forma, confundidos comoformigas sobre um monte de terra. Pobres e ricos são da mesmaestatura. Lamentam que as criaturas efêmeras se dêem a tantas

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM72

73CAPÍTULO II

canseiras para conquistar um lugar que pouco as elevará acima de sipróprias.

A importância dos bens terrenos está na razão inversa da fésobre a vida futura.

6. Alguns dirão que, se todos pensassem desta maneira, nãose ocupando das coisas terrenas, tudo periclitaria. Essa afirmativa,porém, não é verdadeira. O homem, instintivamente, procura oseu bem-estar. Mesmo sabendo que por pouco tempo permaneceránum lugar, cuida de estar aí mais bem ou o menos mal possível.

Não há quem, tendo um espinho em sua mão, não o retire.O desejo instintivo do bem-estar, por isso, obriga o homem

a melhorar todas as coisas, forçado que é pelo impulso do progressoe da conservação, já que esta é uma lei da natureza.

O homem trabalha por necessidade, por gosto ou por dever,com isso cumprindo os desígnios da Providência Divina que ocolocou na Terra com essa finalidade.

Aquele que tem os olhos voltados para a vida futura,simplesmente dá uma importância relativa ao tempo presente,consolando-se mais facilmente de seus insucessos, por pensar nodestino que o aguarda.

Deus não condena os gozos terrenos.Condena, porém, os abusos que prejudicam as coisas da alma.Libertam-se de tais abusos, portanto, os que aplicam a si

próprios estas palavras de Jesus: “Meu reino não é deste mundo”.Todo aquele que se identifica com a vida futura alcança

domínio sobre si próprio. Assemelha-se a um homem rico queperde uma pequena soma, mas que mantém o controle de suasemoções. Aquele outro, porém, que centraliza nesta vida presentetodos os seus pensamentos, é semelhante a um homem pobre que,perdendo tudo o que possui, entra em desespero.

7. O Espiritismo alarga o pensamento.Abre-lhe novos horizontes.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM73

MEU REINO NÃO É DESTE MUNDO

74

No lugar da visão acanhada e mesquinha daquele que seconcentra tão-somente na vida presente, fazendo deste instante quepassa na Terra o único e frágil alicerce do futuro, o Espiritismomostra outra colocação, revelando que esta vida mais não é do queum elo no harmonioso e grandioso conjunto do Criador.

Desvenda a solidariedade que religa todas as existências deum mesmo ser, todos os seres de um mesmo mundo e dos seres detodos os mundos.

Cria a base e razão da fraternidade universal.Se a doutrina da criação da alma, no momento do nascimento

de cada corpo, faz com que todos os seres sejam estranhos uns aosoutros, com a solidariedade das partes de um mesmo todo oEspiritismo explica o inexplicável.

No tempo do Cristo, como os homens não conseguiriamcompreender o conjunto das vidas sucessivas, Jesus reservou essesconhecimentos para torná-los conhecidos noutros tempos.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:UMA REALEZA TERRESTRE

8. Quem, melhor do que eu, poderá compreender a verdadedestas palavras de Nosso Senhor: “O meu reino não é deste mundo”?

O orgulho me perdeu na Terra.Quem compreenderia o nenhum valor dos reinados terrenos,

se eu própria não o compreendia? Que trouxe eu, para este mundo,de minha realeza terrestre?

Eu coisa alguma trouxe, nada, absolutamente nada!E, como para tornar mais terrível a lição, a realeza nem sequer

me acompanhou ao túmulo!Rainha entre os homens, julguei que rainha seria ao entrar no

reino dos céus!

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM74

75CAPÍTULO II

Que desilusão! Que humilhação quando, ao contrário de aquiser recebida qual soberana, eu vi acima de mim, num plano muitomais alto, os homens que eu julgava serem insignificantes e que euhavia desprezado, por não terem linhagem nobre!

Compreendi, então, a nenhuma valia das honras e grandezasque são disputadas sobre a Terra com tanta sede de poder e glória!

Um lugar neste reino é conquistado com abnegação ehumildade e com a caridade vivenciada celestialmente e combenevolência para com todos.

Aqui não se pergunta o que fomos, nem qual posiçãoocupamos, mas tão-somente qual o bem que fizemos, quantaslágrimas de dor ajudamos a secar.

Oh! Jesus, disseste que teu reino não era deste mundo!Sei, hoje, que o sofrimento eleva ao céu.Os degraus de um trono não nos aproximam de teu reino,

Senhor.Somente pelas sendas mais penosas o atingiremos.Busque-lhe, portanto, a rota através de pedras e espinhos e

não pensando em caminhar por entre flores.Os homens esfalfam-se para possuir os bens terrestres, quais

se os pudessem guardar para sempre. Aqui, porém, todas as ilusõesdesaparecem. A luta por possuir é uma batalha para colher sombras,em prejuízo de deterem os únicos bens que são sólidos epermanentes. São estes os únicos que se aproveitam na moradaceleste, os únicos que nos abrem acesso a essa morada.

Apiede-se dos que não alcançaram o reino dos céus.Ajude-os com as suas preces, uma vez que a prece aproxima o

homem do Altíssimo, por ser o traço de união entre o céu e a Terra.Não esqueça o que lhe digo. (Uma rainha da França, Havre,

1863.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM75

HÁ MUITAS MORADAS NA CASA DE MEU PAI

76

1. Não se turbe o vosso coração. Credes em Deus, credes tambémem mim. Há muitas moradas na casa de meu Pai; se não fosse assim,eu vo-lo teria dito. Vou preparar-vos o lugar.

E quando eu for, e vos preparar o lugar, virei outra vez, e voslevarei para mim mesmo, para que onde eu estiver estejais vós também.(João, capítulo 14, versículos 1 a 3.)

DIFERENTES ESTADOS DA ALMA NAESPIRITUALIDADE

2. A casa do Pai é o Universo.As diferentes moradas são os mundos que circulam no espaço

infinito. Cada um deles oferece, aos Espíritos que nele encarnam,um estágio apropriado para a continuidade de seu desenvolvimento.

Independentemente, porém, da diversidade dos mundos, estaspalavras do Cristo podem ser interpretadas, também, como sendoo estado feliz ou infeliz dos Espíritos desencarnados. De acordocom o grau de sua evolução, estando eles mais ou menos purificadose mais ou menos desprendidos dos laços materiais, será o meio emque se encontrarão.

No mundo espiritual, o aspecto das coisas, as sensações que oEspírito experimenta, as suas próprias percepções, variam ao infinito.Enquanto uns não podem afastar-se dos locais onde viveram, outrostomam distância e percorrem o espaço e os mundos.

3

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM76

77CAPÍTULO III

Espíritos culpados vagueiam pelas sombras.Os bem-aventurados, porém, vivem em claridade

resplendente e se movem no sublime cenário do infinito.Enquanto o culpado sofre moralmente, aprisionado pelos

remorsos e pesares, muitas vezes só, sem consolação, separadodaqueles que eram alvo de sua afeição, o justo experimenta a doçurade uma felicidade indefinida, convivendo com aqueles a quem ama.

Essas são moradas da alma, sem localização geográfica.

DIFERENTES CATEGORIAS DE MUNDOS HABITADOS

3. Do ensinamento transmitido pelos Espíritos, conclui-seque são muito diferentes as condições de cada um dos mundos, noque se refere ao grau de evolução de seus habitantes.

Alguns deles são inferiores à Terra, física e moralmente.Outros estão no mesmo grau de evolução.Muitos, porém, são superiores à Terra em todos os sentidos.Nos mundos inferiores a existência é toda material, com as

paixões reinando soberanamente, com a vida moral quase nula. Ali,à medida que a vida moral se desenvolve, a influência da matériadiminui.

Nos mundos superiores a vida é, por assim dizer, todaespiritual.

4. Nos mundos que são intermediários entre os inferiores eos superiores, o bem e o mal estão mesclados. Predomina um ououtro, segundo o degrau evolutivo de seus habitantes.

Não se pode fazer uma classificação absoluta dos mundos.Poderemos, no entanto, considerando o estado em que se

encontram os seus habitantes e a sua destinação, tomar por base as

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM77

HÁ MUITAS MORADAS NA CASA DE MEU PAI

78

suas mais destacadas características e dividi-los, de um modo geralem:

- mundos primitivos, destinados às primeiras encarnações daalma humana;

- mundos de expiação e provas, onde o mal predomina;- mundos de regeneração, onde as almas, que ainda têm o

que expiar, recobram novas forças e repousam dos cansaços da luta;- mundos felizes, onde o bem supera o mal;- mundos celestes ou divinos, habitados por Espíritos

purificados e em que o bem reina sem as sombras do mal.A Terra pertence à categoria dos mundos de expiações e provas

e, por tal razão, o homem nela vive envolto por tantas misériasmorais.

5. Os Espíritos, encarnados num dos mundos, nãopermanecem a ele ligados indefinidamente. Não atravessarão,portanto, todas as fases de seu progresso, atados a esse mundo atéque alcancem a sua perfeição.

Quando atingem, nesse mundo em que estão encarnados,toda a evolução que ali se comporta, podem transferir-se para outromais desenvolvido, assim fazendo sucessivamente até queconquistem o estado de Espíritos puros.

Cada mundo é um estágio, fornecendo elementos deprogresso necessários para a evolução do Espírito que ali encarna. Éuma recompensa ao Espírito, portanto, transferir-se a um mundode ordem mais elevada. E soa como um castigo o terem de prolongara sua permanência num mundo infeliz ou, ainda, serem relegados aum mundo ainda mais infeliz, onde se vêem obrigados a ficarenquanto estão obstinados no mal.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM78

79CAPÍTULO III

DESTINAÇÃO DA TERRA.CAUSAS DAS MISÉRIAS HUMANAS

6. Admira-se haver na Terra tanta maldade e tantas paixõesgrosseiras, tantas misérias e enfermidades de todas as naturezas. Daíalguns concluem que a espécie humana é uma triste coisa.

Esse julgamento, porém, tem a sua origem no ponto de vistaem que se colocam os que assim pensam. O modo de observar ascoisas é que lhes dá uma falsa idéia do conjunto.

Falta-lhes considerar que sobre a Terra não está toda aHumanidade, mas apenas uma pequenina fração da Humanidade.

A espécie humana, a rigor, é a soma de todos os seresinteligentes que povoam os incontáveis mundos do Universo. Queé, pois, a população da Terra, confrontada com a população totalde todos os mundos? Nossa população é menor que a de uma aldeia,comparada com a de um grande império.

Não causa espanto, por conseguinte, a situação moral ematerial da humanidade terrestre, se se levar em consideração odestino ou finalidade da Terra, como um estágio da evolução, e,por decorrência, a natureza dos que aqui habitam.

7. Muito falsa idéia faria alguém, se julgasse os habitantes dauma grande metrópole, baseado na população de bairros pequeníssimose sórdidos.

Num hospital, vêem-se apenas doentes e estropiados. Numapenitenciária serão vistas as torpezas e todos os vícios reunidos. Nasregiões insalubres, a maior parte de seus habitantes são de pessoaspálidas, franzinas e doentes.

Imagine-se a Terra como sendo um pobre bairro de subúrbio,um hospital de acidentados, uma penitenciária, uma região malsã – e,na verdade, a Terra é tudo isso ao mesmo tempo – e se compreenderápor que as aflições se sobrepõem às alegrias.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM79

HÁ MUITAS MORADAS NA CASA DE MEU PAI

80

Nos hospitais não se internam os sãos, assim como numacasa de correção não se colocam os que não fizeram o mal. Nem oshospitais e nem as casas de correção podem ser lugares de delícias efelicidade.

Da mesma forma que toda a população de uma cidade nãoestá nos hospitais e nem nas prisões, também toda a Humanidadenão está na Terra. E, da mesma forma que saem dos hospitais osque alcançam a cura e saem das prisões os que cumpriram as suaspenas, o homem sairá da Terra, buscando mundos felizes, quandoestiver curado de suas enfermidades morais.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:MUNDOS INFERIORES E MUNDOS SUPERIORES

8. A qualificação dos mundos em inferiores e superiores é,antes, mais relativa do que absoluta. Assim é que deveremosconsiderar que tal mundo é inferior ou superior, como uma referênciafeita aos que estejam abaixo ou acima de um grau de uma escalaevolutiva.

A Terra pode ser tomada como ponto de comparação.A partir do conhecimento que temos de nossas populações,

poderemos fazer uma idéia do grau de evolução de mundo inferior.Supondo que sejam habitados por raças selvagens ou das naçõesbárbaras que ainda temos na Terra, saberemos o que seja esse mundoinferior.

Rudimentares serão os seres que os habitam.Revestem-se da forma humana, mas sem nenhuma beleza.Seus instintos não terão, a abrandá-los, um sentimento de

delicadeza ou de benevolência. Mínimas serão as suas noções dejustiça e de injustiça. A força bruta será a sua lei. Sem indústrias esem invenções, aplicarão seus dias na busca de alimentos.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM80

81CAPÍTULO III

Deus, porém, não abandonará essas criaturas.Nas sombras da inteligência dessa gente estará latente a vaga

intuição de um Ser Supremo, já mais ou menos desenvolvida. Essamesma intuição será suficiente para torná-los superiores uns aosoutros, e assim prepará-los para a eclosão de uma vida mais com-pleta.

Não serão seres degradados, mas crianças em crescimento.9. Entre mundos nesses graus primários e os mais elevados,

inúmeros outros existem. Se difícil é reconhecer nos Espíritos puros,desmaterializados e resplendentes de glória, os que já animaramentes assim tão primitivos, da mesma forma é difícil reconhecer nohomem adulto o embrião de ontem.

Os mundos que chegaram a um grau evolutivo superior têm,por outro lado, condições de vida moral e material muitodiferenciadas das que são observadas sobre a Terra.

A forma dos corpos, aí, é humana como em toda parte.Surge, porém, mais embelezada, aperfeiçoada e, sobretudo,

purificada. Não tendo os corpos, contudo, a materialidade terrestre,não estão sujeitos às mesmas necessidades, nem aos mesmos males,nem às mesmas deteriorações resultantes da predominância damatéria.

Os sentidos, mais apurados, permitem-lhes percepções queaqui não são possíveis pela grosseria do organismo. A própria levezaespecífica de seus corpos permite locomoção rápida e fácil.Contrariamente a arrastar-se penosamente sobre o solo, esses serescomo que deslizam sobre a sua face ou planam na atmosfera, poração mesmo da sua vontade.

Movimentam-se da forma que representavam os anjos ou damesma forma que os Anciães como que simbolizavam os manes(almas dos mortos) nos Campos Elísios.

Tais seres conservam, segundo o seu gosto pessoal, a aparênciaque tinham em sua anterior migração. Comparecem, diante de seus

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM81

HÁ MUITAS MORADAS NA CASA DE MEU PAI

82

amigos, tais quais estes os conheciam. Estão, porém, iluminadospor uma luz divina, transfigurados pelo seu interior mais elevado.

Não trazem o semblante apagado, abatido pelos sofrimentose paixões. A inteligência e a vida resplendem neles com clarões ouauréola dos santos com que os pintores os retratam no nimbo.

A pouca resistência que oferece a matéria para Espíritos jámuito evoluídos, torna muito rápido o desenvolvimento doscorpos. A infância, entre eles, é curta ou quase nula. A vida éproporcionalmente mais longa que na Terra, isenta de cuidados ede angústias.

O tempo de vida é proporcional ao grau de evolução dosmundos.

A morte não cria o horror da decomposição e, por isso, éacolhida por uma transformação feliz, não existindo, lá, nenhumadúvida sobre a imortalidade da alma.

A alma não está constringida pela matéria compacta.Gozam eles, portanto, da ampla lucidez que lhes dá o estado

permanente de emancipação do corpo físico, permitindo-lhes umalivre transmissão de pensamentos.

10. As relações entre os povos, nesses mundos felizes, sãomuito amigáveis. Não são perturbadas pela ambição de escravizarseus vizinhos, nem pela guerra que dessa ambição decorre.

Entre eles não há senhores e nem escravos, nem privilégiosoriginários de berço. A superioridade moral e intelectual é queestabelece a diferença de condições, dando a supremacia. Aautoridade, por isso, recebe o respeito de todos, porque é umaconquista do mérito individual, e por ser exercida sempre comjustiça.

O homem não luta por elevar-se acima dos outros homens,mas busca elevar-se acima de si mesmo, lutando por aperfeiçoar-se.Seu propósito é o de atingir o estado dos Espíritos puros, sem queesse desejo se lhe transforme num tormento. Esse propósito é uma

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM82

83CAPÍTULO III

nobre ambição que o faz estudar com ardor para igualar-se com osEspíritos Superiores.

Todos os sentimentos delicados e elevados da naturezahumana, entre eles, acham-se engrandecidos e purificados.Desconhecem os ódios, os ciúmes mesquinhos, as baixas cobiçasda inveja. Um liame de amor e de fraternidade une a todos oshomens, levando os mais fortes a ajudarem os mais fracos.

Estão na posse de bens, em maior ou menor quantidade,adquiridos, porém, por meio do exercício de sua inteligência.Ninguém, contudo, sofre a falta do necessário, porque nenhumdeles está em expiação.

Numa palavra, o mal não existe nesses mundos superiores.11. Na Terra, vocês precisam do mal para sentir o bem, da

noite para admirar a claridade, da maldade para apreciar a santidade.Nos mundos superiores esses contrastes são dispensados.A eterna luz, a eterna felicidade, a eterna calma da alma

produzem uma eterna alegria que está livre de ser abalada pelasangústias da vida material, nem pelo contato com os infelizes quenão encontram acesso a esses mundos.

Isso é o que o espírito terreno tem dificuldade de compreender.Ainda que seja bastante engenhoso para retratar os tormentos doinferno, revela-se incapaz de imaginar as alegrias do céu.

E por que essa dificuldade?É que, sendo inferior, endureceu-se nas dores e misérias, sem

ter entrevisto as claridades celestiais. Não pode, assim, falar do quedesconhece. À medida, contudo, que se elevar moralmente e que sedepurar, o seu horizonte alcançará claridades . Compreenderá, então,o bem que está diante de si, como compreendeu o mal que terádeixado em seu passado.

12. Os mundos felizes não são mundos privilegiados.Deus não é parcial com nenhum de seus filhos. Dá a todos os

mesmos direitos e as mesmas facilidades para evoluir. Faz, pois,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM83

HÁ MUITAS MORADAS NA CASA DE MEU PAI

84

que todos os seus filhos partam de um mesmo ponto, sem dotar aquem quer que seja melhor do que aos outros. Os primeiros postossão acessíveis a todos eles, cabendo a cada um conquistá-los peloseu trabalho.

Alcançar esses postos mais cedo, ou abandonar-se à inatividade,por séculos, confundindo-se com a escória da humanidade, é decisãode cada um. (Resumo dos ensinamentos de todos os EspíritosSuperiores.)

MUNDOS DE EXPIAÇÃO E DE PROVAS

13. Que lhes direi dos mundos de expiações?Vocês já os conhecem!Bastará que vocês examinem a própria Terra em que habitam.A grande inteligência, demonstrada por grande número de

seus habitantes, já estará a lhes indicar que a Terra não é um mundoprimitivo, destinado à encarnação de Espíritos que acabaram desair das mãos do Criador.

As qualidades inatas que os renascido viveram na Terra etrazem consigo, por si só constituem a prova de que já viveram eque alcançaram alguma evolução. Os numerosos vícios para os quaisestão inclinados, no entanto, são os indicadores de uma grandeimperfeição moral.

Colocou-os Deus, por isso, sobre um terreno ingrato, paraexpiarem aí suas faltas através de uma atividade penosa e pelas misériasda vida, até conquistarem o mérito de ascender para um mundomais feliz.

14. Nem todos os Espíritos reencarnados na Terra, porém,estão aí em expiação. As raças, que vocês chamam de selvagens, sãoconstituídas de Espíritos em fase de primeira infância. Estão sobre

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM84

85CAPÍTULO III

a Terra em princípio de educação, a fim de evoluírem pelo contatocom Espíritos mais avançados no conhecimento.

As raças semi-civilizadas são formadas desses mesmosEspíritos. São elas, de certo modo, as raças oriundas da própriaTerra, que cresceram, pouco a pouco, na seqüência de períodosseculares. Alguns, dentre eles, puderam atingir o aperfeiçoamentointelectual dos povos mais esclarecidos.

Os Espíritos em expiação, se podemos exprimir-nos assim,são estranhos à Terra. Já viveram em outros mundos. Dali foramexcluídos em conseqüência de sua obstinação no mal e por se teremtornado a causa de perturbação para os bons.

Foram degredados por uns tempos.Vindo ter com Espíritos atrasados, trouxeram a missão de

fazer com que essas almas primárias evoluíssem. Essa missão lhes épossível, uma vez que trazem a sua inteligência desenvolvida e osgermes dos conhecimentos adquiridos.

Os Espíritos que, por sua obstinação no mal, foram banidospara a Terra, também se encontram entre as raças mais inteligentes.É que estas raças experimentam mais amarguras com os infortúniosda vida. Havendo nelas mais sensibilidade, serão mais provadas peloatrito provocado pela presença de tais Espíritos, do que as própriasraças primitivas, cujo senso moral é ainda confuso.

15. A Terra é um dos tipos dos mundos de expiações.Eles são de uma variedade infinita. Têm, porém, o caráter

comum de servirem de campo de exílio aos Espíritos rebeldes à leide Deus.

Esses Espíritos têm, nesses mundos de expiações, de batalharcontra a perversidade dos homens e contra a aspereza da natureza.Esse duplo e árduo trabalho desenvolve-lhes, ao mesmo tempo, asqualidades do coração e as da inteligência.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM85

HÁ MUITAS MORADAS NA CASA DE MEU PAI

86

Assim é que Deus, em sua bondade, faz que a própria penade banimento que lhes foi imposta resulte em evolução do Espírito.(Agostinho, Paris, 1862.)

MUNDOS REGENERADORES

16. Por entre as estrelas que cintilam na abóbada celeste,quantos mundos não haverá como a Terra, destinados pelo Senhorpara expiações e provações!

Há, também, entre eles, mundos mais infelizes e outrosmelhores, como há os de transição, que poderemos chamar demundos regeneradores. Assim é que cada turbilhão planetário, adeslocar-se no espaço em torno de um centro comum, arrasta consigoseus mundos primários, os de exílio, os de prova, os de regeneraçãoe os de felicidade.

Já lhes foi falado de mundos onde a alma nascente, aindaignorante do bem e do mal, é ajustada para o seu desenvolvimento.Essa alma, embora simples e ignorante, pode caminhar para Deus,dona de si mesma, na posse de seu livre-arbítrio.

Já lhes foi dito, também, das amplas faculdades da alma parafazer o bem. Entre elas há, porém, as que fracassam. Mas mesmodiante da queda, Deus que não quer anulá-las, permite-lhes irempara esses mundos. De encarnação em encarnação elas se depuram,regeneram-se e retornam dignas da glória a que foram destinadas.

17. Os mundos de regeneração são moradas intermediáriasda alma. Servem de transição entre os mundos de expiação e osmundos felizes. Todo aquele que se arrepende, após a queda, e querdepurar-se das paixões infelizes, encontra nesses mundos deregeneração a calma e as condições necessárias para superar-se.

O homem, nesses mundos, ainda esta sujeito às leis que regema matéria. A parcela da Humanidade que neles encarna experimenta

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM86

87CAPÍTULO III

as sensações e os desejos que você registra em si mesmo. Está ela,porém, liberta das paixões desordenadas que escravizam a vocês.Está isenta do orgulho que faz calar o coração, da tortura da inveja,do ódio sufocante.

O amor está escrito em todas as frontes.Um perfeito respeito ao direito de cada um é o que rege as

relações sociais, uma vez que todos reconhecem Deus e esforçam-seem caminhar para ele, cumprindo-Lhe as leis.

Nos mundos de regeneração não existe a felicidade perfeita,mas uma certa aurora da felicidade. O homem ainda é de carne e,por isso mesmo, está sujeito às vicissitudes, das quais somente estãoisentos os seres completamente desmaterializados. Ele ainda estásujeito às provações libertadoras, mas estas não se lhe apresentamcom as dolorosas agonias das expiações.

Comparados com a Terra, os mundos de regeneração sãofelizes. Muitos, entre vocês, se sentiriam satisfeitos em habitá-los,uma vez que eles são a calma após a tempestade expiatória, a estaçãode recuperação após cruel moléstia.

Neles, os homens são menos solicitados pelas coisas materiais.Eles divisam, melhor do que vocês, o futuro.Compreendem que outras são as alegrias que o Senhor

promete aos que se tornam dignos, quando a morte lhes ceifarnovamente os corpos para dar-lhes a verdadeira vida.

A alma, liberta, alcançará novos horizontes.Sem as limitações dos sentidos materiais e grosseiros e já de

posse dos sentidos de um perispírito puro e celestial, aspirará asemanações do próprio Deus, em seus perfumes de amor e de caridadeque se expandem do seio celestial.

18. Nos mundos de regeneração, o homem ainda estásujeito a fraquejar. A sua inclinação para o mal ainda não perdeucompletamente o seu domínio.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM87

HÁ MUITAS MORADAS NA CASA DE MEU PAI

88

Se ele não evoluir, isso corresponderá a um recuo em relaçãoàs suas decisões de purificar-se. Se não perseverar, portanto,firmando-se na senda do bem, ele poderá novamente retornar aosmundos de expiação, candidatando-se a novas e mais dolorosasprovas.

Contemplem, pois, a abóbada celeste à noite, na hora de seurepouso e de suas preces e, das inúmeras esferas que brilham sobreas suas cabeças, indaguem-se quais as que conduzem a Deus e ro-guem para que um mundo regenerador lhes abra o seu seio, paraacolhê-los após a expiação na Terra. (Agostinho, Paris, 1862.)

PROGRESSÃO DOS MUNDOS

19. O progresso é uma das leis da natureza.Todos os seres da Criação, animados ou inanimados, estão

sujeitos à lei do progresso, pela bondade do Pai Celestial, que desejaque tudo se engrandeça e prospere.

A própria destruição, que parece ao homem ser o termo finaldas coisas, nada mais é que um meio de levá-las, pela transformação,a um estágio mais aperfeiçoado, uma vez que todas as coisas morrempara renascer e nada sofre o aniquilamento.

Ao mesmo tempo que os seres vivos evoluem moralmente,os mundos que eles habitam progridem materialmente.

Se você pudesse acompanhar um mundo em suas diversasfases, desde o instante em que os primeiros átomos se agregarampara constituí-lo, você o veria percorrer uma escala incessantementeprogressiva. Esses graus percorridos, no entanto, são imperceptíveispara cada geração de seres vivos, embora ofereçam aos seus habitantesuma morada mais agradável, à medida que eles mesmos avançamna senda do progresso.

Coisa alguma na natureza permanece estacionada.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM88

89CAPÍTULO III

Paralelamente ao progresso do homem, progridem os animaisdomésticos, os vegetais e a forma de suas habitações.

Quão grande é esta idéia e quanto é digna da majestade doCriador! E quanto, ao contrário, é pequena e indigna de seu podera idéia que concentra a sua solicitude e a sua providência sobre oimperceptível grão de areia que é a Terra e que restringe aHumanidade apenas aos poucos homens que habitam o nossomundo!

A Terra, segundo a lei do progresso, já desfrutou um estágiomaterial e moral inferior ao em que hoje se acha. Atingirá,igualmente, tanto no aspecto material quanto moral, um grau maisavançado.

A Terra chegou a um desses períodos de transformação.De mundo de expiação, ela passará a um mundo de

regeneração, onde os homens serão mais felizes, porque a lei deDeus nela imperará soberanamente. (Agostinho, Paris, 1862.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM89

NINGUÉM PODERÁ VER O REINO DE DEUS,

SE NÃO NASCER DE NOVO

90

1. Chegando Jesus às partes de Cesaréia de Filipe, interrogou aseus discípulos, dizendo: Quem dizem os homens ser o Filho do homem?E eles disseram: Uns, João Batista; outros, Elias, e outros, Jeremias ouum dos profetas. – Jesus lhes disse: E vós, quem dizeis que eu sou? – ESimão Pedro, respondendo, disse-lhe: Tu és o Cristo, o Filho de Deusvivo. – E Jesus, respondendo, disse-lhe: Bem-aventurado és tu, Simão,filho de João, porque isso não te foi revelado pela carne e pelo sangue,mas por meu Pai que está nos céus. (Mateus, capítulo 14, versículos13 a 17; Marcos, capítulo 8, versículos 27 a 30.)

2. O tetrarca Herodes ouvia tudo o que se passava, e estava emdúvida, porque diziam alguns que João ressuscitara dentre os mortos;e outros que Elias tinha aparecido; e outros que um profeta dos antigoshavia ressuscitado. – E disse Herodes: A João mandei eu degolar; quemé pois este de que ouço dizer tais coisas? (Lucas, capítulo 9, versículos 7a 9. Marcos, capítulo 6, versículos 14 e I5.)

3. (Após a transfiguração) Seus discípulos o interrogaram,dizendo: Por que dizem então os escribas que é mister que Elias venhaprimeiro? – E Jesus, respondendo, disse-lhes: Em verdade Elias viráprimeiro, e restaurará todas as coisas; mas digo-vos que Elias já veio, enão o conheceram, mas fizeram-lhe tudo o que quiseram. Assim farãoeles também padecer o Filho do homem. – Então entenderam osdiscípulos que Jesus lhes falara de João Batista. (Mateus, capítulo 17,versículos 10 a 13. Marcos, capítulo 9, versículos 10 a 12. )

4

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM90

91CAPÍTULO IV

RESSURREIÇÃO E REENCARNAÇÃO

4. A reencarnação fazia parte dos princípios de fé dos judeus,sob o nome de ressurreição. Somente os saduceus, que pensavamque tudo acaba com a morte, não acreditavam nela.

As idéias dos judeus sobre essa questão, assim como sobremuitas outras de seu ideário religioso, não eram claramente definidas.As suas noções sobre a alma e suas ligações com o corpo físico eramvagas e incompletas. Acreditavam que o homem poderia reviver,sem saberem precisamente de que maneira se daria esse fato.

Eles designavam como ressurreição o fenômeno que oEspiritismo de modo mais ajustado denomina de reencarnação.

A ressurreição supõe o retorno da vida ao corpo que estámorto. A ciência, por sua vez, demonstra que tal ocorrência ématerialmente impossível, notadamente quando os elementos dessecorpo já se acham, depois de algum tempo, dispersos e absorvidospela natureza.

A reencarnação é o retorno da alma ou Espírito para a vidacorporal, através de um novo corpo formado para ela. Esse novocorpo, portanto, nada tem de comum com o anterior.

Pode-se falar em ressurreição de Lázaro, mas não de Elias.Se, portanto, João Batista era Elias, segundo as crenças judaicas,

o corpo de João não poderia ser o de Elias, uma vez que João foravisto quando criança, e seu pai sua mãe eram conhecidos deles.

João, portanto, podia ser Elias reencarnado, mas nãoressuscitado.

5. Havia entre os fariseus um homem, chamado Nicodemos,príncipe dos judeus. Este foi ter de noite com Jesus, e disse-lhe:Rabi, bem sabemos que és Mestre, vindo de Deus, porque ninguémpode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus não estiver com ele.

Jesus respondeu-lhe, dizendo: Na verdade te digo que aqueleque não nascer de novo, não poderá ver o reino de Deus.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM91

NINGUÉM PODERÁ VER O REINO DE DEUS,

SE NÃO NASCER DE NOVO

92

Disse-lhe Nicodemos: Como pode um homem nascer, sendovelho? Pode, porventura, tornar a entrar no ventre de sua mãe, enascer?

Jesus respondeu: Na verdade te digo que aquele que não nascerda água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. O que énascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espirito.Não te maravilhes de eu ter dito: “Necessário vos é nascer de novo”.O Espírito assopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes deonde vem, nem para onde vai; assim é todo aquele que é nascidodo Espírito.

Nicodemos respondeu, e disse-lhe: Como pode ser isso?Jesus respondeu, e disse-lhe: Tu és mestre de Israel, e não

sabes isto? Na verdade te digo que nós dizemos o que sabemos, etestificamos o que vimos e não aceitas o nosso testemunho. Se tefalei de coisas terrestres, e não creste, como crerás, se te falar dascelestiais? (João, capítulo 3, versículos de 1 a 12.)

6. A idéia de que João Batista era Elias e a de que os profetaspoderiam reviver sobre a Terra, você a encontrará em muitaspassagens dos Evangelhos; notadamente nas reproduzidas acima (n.º1, 2 e 3). Se essa crença fosse um erro, Jesus não teria deixado decombatê-la, da mesma forma que combateu muitas outras. Ele,porém, com toda a sua autoridade a sanciona e a coloca por princípioe como uma condição necessária, ao dizer: “Aquele que não nascerde novo, não poderá ver o reino de Deus”. E, não bastasse isso, aindaacrescenta: “Não te maravilhes de te ter dito que necessário te é nascerde novo”.

7. Estas palavras: “aquele que não renascer da água e doEspírito” foram interpretadas como sendo a regeneração pela águado batismo. O texto primitivo, no entanto, dizia simplesmente:“não renascer da água e do Espírito”. Em algumas traduções as palavrasdo Espírito foram substituídas por: do Santo Espírito, desvirtuando-lhes a idéia inicial. Esse ponto capital destaca-se dos primeiros

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM92

93CAPÍTULO IV

comentários feitos sobre o Evangelho, como será comprovado umdia, sem o menor equívoco possível. (1)

8. Para compreender o verdadeiro sentido das palavras deJesus, faz-se necessário que nos voltemos para o termo água, cujasignificação no texto não é aquela mesma que você conhece.

O conhecimento dos antigos sobre as ciências físicas era muitoimperfeito. Acreditavam que a Terra saíra das águas. A água seria,para eles, como o elemento gerador de todas as coisas.

No livro Gênese, do Antigo Testamento, diz-se: “O Espíritode Deus era levado sobre as águas; flutuava sobre as águas” –“Juntem-se as águas que estão debaixo do céu e apareça o solo firme”– “Que as águas produzam viventes, que nadem na água, e pássarosque voem sobre a Terra e sob o firmamento”.

A água, segundo essa crença, tornara-se o símbolo da naturezamaterial, assim como Espírito era o símbolo da natureza inteligente.

Por isso é que a afirmação de Jesus: “Se o homem não renascerda água e do Espírito, ou em água e em Espírito” tem o seuverdadeiro sentido em: “Se o homem não renascer com seu corpo esua alma”.

Nesse último sentido é que os antigos entendiam a afirmação.A interrogação aqui levantada também se justifica pela seguinte

afirmação de Jesus na mesma passagem evangélica: “O que é nascidoda carne é carne e o que é nascido do Espírito é espírito”. Vê-se, aí,que Jesus faz uma distinção clara entre o espírito e o corpo.

O que é nascido da carne é carne indica, com absoluta clareza,que o corpo procede do corpo e que o espírito é independente docorpo.

9. O Espírito assopra onde quer, e ouves a sua voz, mas nãosabes de onde vem, nem para onde vai, no ensinamento de Jesus,

1. N.T. — Nas traduções atuais, com exceção de algumas católicas, não se inclui

mais a palavra SANTO, constando Espírito.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM93

NINGUÉM PODERÁ VER O REINO DE DEUS,

SE NÃO NASCER DE NOVO

94

permite-nos entender tratar-se do Espírito de Deus, que dá vida aquem quer ou, então, poderemos interpretá-lo como se referindo àalma do homem.

Neste último sentido, a afirmação“não sabes de onde vem,nem para onde vai”, significará que ninguém tem conhecimento desua origem e nem o que será o Espírito.

Se o Espírito, ou alma, fosse criado ao mesmo tempo que ocorpo, você saberia de onde ele veio, uma vez que estaria informadode seu começo.

De qualquer forma, porém, esta passagem evangélica é umaconseqüência do princípio da preexistência da alma e, conseqüentemente,do princípio da pluralidade das existências.

10. E, desde os dias de João Batista até agora, se faz violênciaao reino dos céus, e pela força se apoderam dele. Porque todos osprofetas e a lei profetizaram até João. E, se quereis dar crédito, éeste o mesmo Elias que havia de vir. Quem tem ouvidos para ouvir,ouça. (Jesus em Mateus, capítulo 11, versículos 12 a 15.)

11. Se o princípio da reencarnação, expresso através da narrativaextraída do Evangelho de João, pudesse, a rigor, ser interpretadonum sentido puramente místico, o mesmo não se poderá dizer dapassagem transcrita do Evangelho de Mateus, que não admitenenhum equívoco, por Jesus dizer expressamente: “É este o mesmoElias que havia de vir”.

Essa é uma afirmação positiva, sem alegoria.Examine-se, ainda, a afirmação: “E, desde os dias de João

Batista até agora, se faz violência ao reino dos céus, e pela força seapoderam dele”. Que significam estas palavras de Jesus, se JoãoBatista ainda vivia no momento em que foram ditas? Jesus mesmoas explica, dizendo: “Se quereis dar crédito, é este o mesmo Eliasque havia de vir”.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM94

95CAPÍTULO IV

Sendo João Batista não um outro espírito, mas o próprioElias, Jesus faz uma referência ao tempo em que João Batista viviacom o nome de Elias.

“Faz-se a violência ao reino dos céus e pela força se apoderamdele”, é uma outra alusão feita por Jesus à violência da lei mosaica,que ordenava o extermínio dos infiéis, para que os fiéis ganhassema Terra Prometida, Paraíso dos hebreus, enquanto que, segundo anova lei, ganha-se o céu pela caridade e pela brandura.

E ajuntou: “Quem tem ouvidos para ouvir, ouça”. Estas pa-lavras, tantas vezes repetidas por Jesus, dizem claramente que nemtodos estão em grau evolutivo para compreender certas verdades.

12. Aqueles de vosso povo que morreram, viverão de novo;aqueles que estavam em meio aos mortos, ressuscitarão. Despertaide vosso sono e erguei louvores a Deus, vós que habitais dentro dopó, porque o orvalho que se derrama sobre vós é um orvalho de luze vós arruinareis a Terra e o reino dos gigantes. (Isaías, capítulo 26,versículo 19.)

13. Esta passagem de Isaías é inteiramente clara: “Aqueles devosso povo que morreram, viverão de novo”. Se o profeta tivessequerido falar da vida espiritual, se fosse de sua vontade dizer que osque foram executados não estavam mortos em espírito, por certoque diria: ainda vivem, contrariamente ao dizer: viverão de novo.

“Viverão de novo”, se tomado em seu sentido espiritual, seriaum contra-senso, uma vez que implicaria uma interrupção da vidada alma. No sentido de regeneração moral, seria a negação das penaseternas, porque estabeleceria, em princípio, que todos os que estãomortos reviverão.

14. Mas, quando o homem está morto de vez e seu corpo,separado de seu espírito, foi consumido, que é feito dele? – Tendoo homem morrido de vez, poderia reviver de novo? Nesta guerra,em que me acho em todos os dias de minha vida, estou esperando

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM95

NINGUÉM PODERÁ VER O REINO DE DEUS,

SE NÃO NASCER DE NOVO

96

que chegue a minha mutação. (Jó, capítulo 14, versículo 10,tradução de Sacy.)

Quando o homem morre, perde toda a sua força, expira.Onde estará ele depois? – Se o homem morre, reviverá de novo?Esperarei todos os dias de meu combate, até que me venha algumamutação? (Idem, tradução protestante de Osterwald.)

Quando o homem está morto, ele vive sempre. Quandofindarem os dias de minha existência terrestre, esperarei, já que a elavoltarei de novo. (Idem, versão da Igreja grega.)

15. O princípio da pluralidade das existências está claramenteexpresso nas três versões acima. Ninguém poderá supor que Jó tenhaquerido falar de regeneração pela água do batismo, que ele certamentenem sequer conhecia.

“Tendo o homem morrido de vez, poderia reviver de novo?”Essa idéia de morrer e reviver traz em si a idéia de morrer e

reviver muitas vezes. A versão da Igreja grega é ainda mais explícitanessa idéia, se tal transparência maior fosse possível: “Quandofindarem os dias de minha existência terrestre, esperarei, já que a elavoltarei de novo, ou, voltarei a uma nova existência terrestre”.

Isso é tão claro, como dizer: “Sairei de minha casa, mas a elaretornarei”.

Nesta guerra, em que me acho em todos os dias de minha vida,estou esperando que chegue a minha mutação”. Jó, evidentemente aquifala das lutas que sustentava contra os sofrimentos da vida. Sente-se,porém, resignado, dizendo esperar a sua mutação. Na versão gregao esperarei, parece aplicar-se a uma nova existência: “Quandofindarem os dias de minha existência física, esperarei, já que a elavoltarei de novo”. Jó parece colocar-se, após a sua morte, no espaçoque separa uma existência da outra, e diz que espera voltar de novoà existência física.

16. Não paira nenhuma dúvida de que, com o nome deressurreição, o princípio da reencarnação era uma das crenças

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM96

97CAPÍTULO IV

fundamentais dos judeus. A reencarnação, por outro lado, estáconfirmada por Jesus e pelos profetas de um modo formal.

Quem, pois, negar a reencarnação, estará negando as palavrasdo Cristo. Quando, porém, as suas palavras forem meditadas, semidéias preconcebidas, será aceita a sua autoridade sobre esse princípio,assim como também sobre os outros.

17. Sobre essa autoridade, fundada sob o ponto de vistareligioso, vem reunir-se, sob o ponto de vista filosófico, a das provasresultantes de observações dos fatos. Quando dos efeitos deveremosremontar às causas, a reencarnação comparece como uma necessidadeabsoluta. É uma condição inerente à humanidade, ou seja, areencarnação é uma lei da Natureza.

A reencarnação revela-se pelos seus resultados, da mesmamaneira, por assim dizer material, que um motor se evidencia pelomovimento.

Somente a reencarnação pode dizer ao homem de onde elevem, para onde vai por que está na Terra. Justificam-se, com esseconhecimento, todas as anomalias e todas aparentes injustiças que avida apresenta. (1)

Sem o princípio da preexistência da alma e da pluralidade dasexistências, grande parte das máximas do Evangelho são incompreen-síveis. Pela ausência do conhecimento desses princípios é que lhe sãodadas interpretações contraditórias. Adicionem-se esses princípios eserão recuperados seus verdadeiros sentidos.

1. Veja, para ter mais informações sobre o princípio da reencarnação: O Livro dos

Espíritos, cap. 4 e 5; O que é o Espiritismo, cap. 2, ambos de Allan Kardec.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM97

NINGUÉM PODERÁ VER O REINO DE DEUS,

SE NÃO NASCER DE NOVO

98

OS LAÇOS DE FAMÍLIA SÃO FORTALECIDOSPELA REENCARNAÇÃO E ENFRAQUECIDOSPELA UNICIDADE DA EXISTÊNCIA

18. Os laços de família não são destruídos pela reencarnação,como pensam algumas pessoas. Contrariamente a isso, eles sãofortificados e mais apertados ainda.

Uma existência única é que os destruiria.Os Espíritos, na espiritualidade, formam grupos ou famílias

unidas pela afeição, pela simpatia e pela semelhança de suasinclinações. Esses Espíritos, felizes de estarem juntos, procuram-semutuamente.

A encarnação os separara temporariamente, mas ao regressaremà espiritualidade, reencontram-se como amigos que retornam deuma viagem. Muitas vezes, esses Espíritos seguem uns aos outros,encarnando numa mesma família ou, então, unem-se num mesmocírculo, trabalhando juntos para a própria evolução.

Se ocorre que, numa dada época, uns deles encarnam e outrosnão, eles continuam unidos pelos pensamentos. Aí, os que estãolivres dos liames da carne velam pelos que se acham no cativeiro.Os mais evoluídos esforçam-se, então, para que os retardatáriosprogridam.

Após cada existência, todos terão avançado na senda daperfeição. Cada vez menos aprisionados à matéria, as suas afeiçõestornam-se mais vivas e, por isso, estarão eles mais puros, não tendoa perturbá-los o egoísmo e nem as sombras das paixões.

Eles podem, assim, experimentar um número ilimitado deexistências corporais, sem que nenhum incidente lhes perturbe aafeição mútua a que se devotam.

Convém destacar que, aqui, estamos tratando de afeição real,verdadeiramente espiritual, de alma para alma. Essa afeição é a únicaque sobrevive após a morte do corpo físico. Os seres que se unem,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM98

99CAPÍTULO IV

na Terra, apenas pelos sentidos corporais, não têm motivo algumpara procurarem-se no mundo dos Espíritos.

Duráveis somente são as afeições espirituais.As afeições carnais se extinguem com a causa que as gerou.A causa que dá origem às afeições carnais não existe no mundo

espiritual, enquanto a alma existe sempre.Quanto a pessoas que se unem, movidas tão-somente pelos

seus interesses, essas realmente já nada são uma para as outras: amorte as separa na Terra e no céu.

19. A união e a afeição que existem entre parentes, numamesma família, são sinais evidentes da simpatia anterior que osaproximou. Quando há alguém que pelo seu caráter, pelos seusgostos e inclinação nenhuma semelhança tenha com seus parentespróximos, costuma-se dizer que ele não pertence àquela família.Ao falar isso, anuncia-se uma verdade maior do que se supõe.

Deus permite que, nas famílias, encarnem espíritos antipáticosou mesmo estranhos. Há, nisso, uma dupla finalidade: uns servemde provas para os outros e, por isso, tornam-se instrumentos deprogresso entre si. Os infelizes se melhoram, pouco a pouco, pelocontato com os bons e pelos cuidados que deles recebem. O caráterdos infelizes se abranda, seus costumes depuram-se, as antipatiasesmaecem.

Estabelece-se, dessa forma, a fusão entre diferentes categoriasde Espíritos, assim como se dá sobre a Terra a fusão entre raças epovos.

20. O receio de que a parentela aumente de um modoindefinido, em conseqüência da reencarnação, é um receio egoístico.Esse receio prova, naquele que o sente, que lhe falta um amor maisamplo para abranger um grande número de pessoas.

Um pai, que tenha muitos filhos, amaria a cada um delesmenos do que amaria um filho único?

Tranqüilizem-se, pois, os egoístas.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM99

NINGUÉM PODERÁ VER O REINO DE DEUS,

SE NÃO NASCER DE NOVO

100

Não há motivo para tais temores.Se um homem houver tido dez encarnações, isso não significa

que, ao retornar à espiritualidade, irá encontrar-se com dez pais,dez mães, dez esposas e uma quantidade indefinida de filhos e denovos parentes.

Esse homem, ao retornar à espiritualidade, voltará aos mesmosque foram alvos de sua afeição. Estes poderão ter-se ligado na Terraa qualquer título de parentela, pais, mães, filhos, esposas, ou, talvez,por outros laços.

21. Quais as conseqüências da doutrina anti-reencarnacionista ?Vejamo-las, a seguir.Essa doutrina anula, necessariamente, a preexistência da alma.Se a alma é criada ao mesmo tempo que o corpo, não existe

entre os que serão familiares nenhum laço anterior. Serão elescompletamente estranhos entre si. O pai é estranho a seus filhos. Afiliação das famílias ficará reduzida à filiação corporal, sem nenhumlaço espiritual anterior.

Nenhum motivo haverá para alguém glorificar-se de existiremem seus antepassados, estas ou aquelas personalidades ilustres.

Com a reencarnação ascendentes e descendentes podem já seter conhecido, ter vivido juntos, ter se amado e podem reunir-semais tarde, estreitando ainda mais os seus laços de simpatia.

22. Se tal ocorre em relação ao passado, no tocante ao futuroa situação não é mais esperançosa. Segundo um dos princípiosfundamentais que decorrem da não-reencarnação, a sorte das almasestará definitivamente selada após uma única existência.

A fixação definitiva da sorte da alma terá por conseqüência acessação de todo progresso, visto que se houver um progressoqualquer, já não haverá sorte definitiva.

Segundo tenham bem ou mal vivido, elas vão imediatamentepara a morada da bem-aventurança ou eternamente para o inferno.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM100

101CAPÍTULO IV

Ficam assim imediatamente separadas para sempre, semesperança de voltarem a reunir-se. Desta forma, pais, mães e filhos,maridos e esposas, irmãos, irmãs e amigos, jamais poderão estarcertos de voltarem a ver-se novamente: esta é ruptura mais queabsoluta dos laços de família.

Com a reencarnação, e o progresso que lhe é conseqüente,todos os que se amaram voltarão a encontrar-se sobre a Terra e,também, na espiritualidade. Juntos, crescerão para Deus. Se algunsdeles fraquejarem na senda, retardam o seu avanço e a sua felicidade,mas não perderão a esperança. Serão ajudados, encorajados esustentados pelos que os amam, até saírem do lodaçal em que seenterraram.

Com a reencarnação, enfim, existe uma solidariedadepermanente entre os encarnados e os desencarnados, o que resultaráno dadivoso fruto do estreitamento dos laços de afeição mútua.

23. Resumindo, quatro são as alternativas que são apresentadasao homem para seu futuro após a morte:

1) o nada, segundo a doutrina materialista;2) a absorção do homem no todo universal, segundo a

doutrina panteísta;3) a individualidade do homem após a morte com a fixação

definitiva de sua sorte, segundo a doutrina da Igreja;4) a individualidade do homem após a morte, com progressão

infinita, segundo a Doutrina Espírita.As duas primeiras alternativas apresentam o rompimento dos

laços de família após a morte e nenhuma esperança de reencontroentre os que se amaram. A terceira alternativa apresenta apossibilidade de reverem-se os que se devotaram alguma afeição,desde que sigam para a mesma região, e essa região tanto pode ser oinferno como o paraíso. A quarta alternativa, com a pluralidade dasexistências, que é inseparável da evolução gradativa, traz a certeza dacontinuidade das relações entre aqueles que se amaram, e isso é oque constitui a verdadeira família.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM101

NINGUÉM PODERÁ VER O REINO DE DEUS,

SE NÃO NASCER DE NOVO

102

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:LIMITES DA ENCARNAÇÃO

24. Quais são os limites da encarnação?A encarnação não tem limites nitidamente traçados.Não poderemos fixá-los sobre o envoltório que constitui o

corpo do Espírito, fundamentado em que a materialidade desseenvoltório diminui à medida que o Espírito se purifica. E issoporque se sabe que, em certos mundos mais evoluídos que a Terra,esse envoltório já é menos compacto, menos pesado, menosgrosseiro e, por conseqüência, menos sujeito a vicissitudes. Emmundos mais elevados ainda, esse envoltório é diáfano e quasefluídico. Crescendo a categoria dos mundos, o corpo de que sereveste o Espírito vai perdendo a materialidade, findando porconfundir-se com o perispírito.

De acordo com o mundo no qual o Espírito é levado a viver,ele se reveste do corpo apropriado à natureza desse mundo.

O próprio perispírito passa por transformações sucessivas.Purifica-se, pouco a pouco, até a depuração completa.A condição perispiritual dos Espíritos puros é essa.Se mundos especiais estão destinados, como estágios, aos

Espíritos muito evoluídos, estes não ficam sujeitos a tais mundos,como ocorre nos mundos inferiores. O estado de libertação que jáatingiram permitir-lhes-á transportarem-se por toda parte onde asmissões que lhes foram confiadas os chamarem.

Se considerarmos, porém, a encarnação do ponto de vistamaterial, tal qual ela se dá sobre a Terra, poderemos dizer que esse éo seu limite para os mundos inferiores.

O limite da encarnação, portanto, depende do próprio Espíri-to, que poderá libertar-se dela mais ou menos rapidamente,trabalhando pela sua purificação.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM102

103CAPÍTULO IV

Consideremos, ainda, que quando liberto do corpo e na espi-ritualidade, o Espírito estará no intervalo das existências corporais.A situação do Espírito está em relação com a natureza do mundo aque se liga, segundo o seu grau de evolução. Na espiritualidade, porconseqüência, ele será mais, ou menos feliz, livre e esclarecido,segundo esteja mais, ou menos desmaterializado. (Luís, Paris, 1859.)

NECESSIDADE DA ENCARNAÇÃO

25. A encarnação é uma punição e somente os Espíritosculpados é que lhe estão sujeitos?

A passagem dos Espíritos pela vida corporal é necessária.Através da encarnação, os Espíritos podem cumprir, por meio

de uma ação material, os propósitos que Deus lhes confiou paraserem executados.

Ela é necessária para bem deles mesmos, porque a atividadeque se obrigam a exercer lhes desenvolve a inteligência.

Deus, sendo soberanamente justo, doa partes iguais a todosos seus filhos. Estabeleceu para todos um mesmo ponto de partida,a mesma aptidão, as mesmas obrigações a cumprir e a mesma liberdadede agir.

Qualquer privilégio seria uma preferência e toda preferênciaé uma injustiça.

A encarnação, porém, é para todos os Espíritos um estágiotransitório. É uma tarefa que Deus lhes impõe, no seu início devida, como primeira experiência do uso que farão de seu livre-arbí-trio. Os que desempenham com zelo essa tarefa, alcançamrapidamente e menos penosamente os primeiros degraus da iniciaçãoe gozam mais cedo o fruto de seus labores.

Aqueles, porém, que usam mal a liberdade que Deus lhesconcede, retardam a sua própria evolução. Se se obstinarem nesse

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM103

NINGUÉM PODERÁ VER O REINO DE DEUS,

SE NÃO NASCER DE NOVO

104

mau uso, eles terão prolongada indefinidamente a necessidade de sereencarnarem e é quando a encarnação lhes parece um castigo (Luís,1859).

26. Observação. – Uma comparação vulgar permitirá quemelhor se compreenda a diferença acima. Nenhum escolar chegaaos estudos da Ciência, se não se submeter à série de classes que lheabrirão esses estudos. Essas classes, qualquer seja a atividade que lheexijam, são simplesmente um meio para o estudante alcançar seufim, não sendo, por isso, nenhuma espécie de punição. O estudanteaplicado abrevia o caminho a percorrer e nele encontra, por isso,menos espinhos. O estudante negligente, porém, obriga-se a repetir-se pelas mesmas classes. Para estes, não é o trabalho da classe queparece uma punição, mas a obrigação de recomeçar o mesmo trabalhoque não executou bem.

O mesmo acontece com o homem sobre a Terra.O espírito do selvagem, que está apenas no início da vida

espiritual, tem na encarnação o meio de desenvolver a suainteligência.

O homem esclarecido, porém, em que o senso moral estámais largamente desenvolvido, quando é obrigado a percorrer asetapas de uma vida corporal plena de angústias, quando já poderiater chegado ao fim, sente isso como um castigo, pela necessidadeque vê em prolongar a sua permanência em mundos inferiores einfelizes.

Aquele, contudo, que trabalha ativamente para o seuprogresso moral pode abreviar a duração da encarnação material.Pode também transpor de uma só vez os graus intermediários queo separam dos mundos superiores.

Os Espíritos não poderiam encarnar uma única vez, sobreum mesmo mundo e desenvolver as suas diversas existências emesferas diferentes?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM104

105CAPÍTULO IV

Esta pergunta seria admissível se os homens estivessem, naTerra, exatamente com o mesmo nível intelectual e moral. Asdiferenças que há, entre eles, desde o selvagem até o homem civiliza-do, mostram os graus que eles devem alcançar.

A encarnação, aliás, precisa ter um fim útil.Qual seria a finalidade da encarnação de crianças que morrem

em tenra idade? Teriam sofrido sem proveito para si e para outrem?Deus, cujas leis são soberanamente justas, coisa alguma faz

sem utilidade. Pela reencarnação sobre o mesmo globo, quis Eleque os mesmos Espíritos voltassem a relacionar-se, com ocasião dereparar as suas faltas recíprocas. Por efeitos de suas relações anteriores,quis, além disso, estabelecer os laços de família sobre uma baseespiritual e apoiar, sobre uma lei da Natureza, os princípios desolidariedade, de fraternidade e de igualdade.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM105

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

106

1. Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados.– Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque elesserão saciados. – Bem-aventurados os que sofrem perseguição por causada justiça, porque deles é o reino dos céus. (Mateus, capítulo 5, versículos4, 6 e 10.)

2. Bem-aventurados vós, os pobres, porque vosso é o reino deDeus. – Bem-aventurados vós, que agora tendes fome, porque sereissaciados. – Bem-aventurados vós, que agora chorais. porque haveis derir. (Lucas, capítulo 6, versículos 20 e 21.)

Mas ai de vós, ricos! porque já tendes a vossa consolação. – Ai devós, os que estais fartos, porque tereis fome. – Ai de vós, os que agorarides, porque vos lamentareis e chorareis. (Lucas, capítulo 6, versículos24 e 25.)

JUSTIÇA DAS AFLIÇÕES

3. As compensações que Jesus promete aos aflitos da Terra sópodem realizar-se na vida futura. Sem a certeza da vida futura, estasmáximas seriam um contra-senso, ou mais ainda, seriam umengodo.

Mesmo quando se guarda certeza da vida futura, dificilmentese compreende a utilidade do sofrimento para ser feliz. Dizem algunsque é para haver mérito.

5

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM106

107CAPÍTULO V

Pergunta-se, então: por que uns sofrem mais do que os outros?Por que uns nascem na miséria e outros na abundância, sem quecoisa alguma tenham feito para justificar essa posição? Por que parauns tudo parece sorrir, enquanto que outros nada conseguem?

O que ainda menos se compreende é que os bens e os malessejam desigualmente repartidos entre o vício e a virtude, com homensvirtuosos sofrendo ao lado dos maus que prosperam.

A fé na vida futura pode consolar e tornar paciente o homem,mas não explica essas anomalias que parecem desmentir a justiça deDeus.

Admitindo-se a existência de Deus, não se pode concebê-losem o infinito das perfeições. Ele deve ser o Todo-poderoso, toda ajustiça, toda a bondade, sem o que não seria Deus.

Se Deus é soberanamente bom e justo, ele não pode agir porcapricho e nem com parcialidade. As vicissitudes da vida, portanto,devem ter uma causa e, porque Deus é justo, essa causa deve ser justatambém. Disso cada um deve compenetrar-se.

Deus encaminhou os homens na direção dessa causa pelosensinamentos de Jesus. Hoje, por julgá-los bastante amadurecidos,para compreender a causa das vicissitudes da vida, vem revelá-la porinteiro através do Espiritismo, ou seja, pela voz dos Espíritos.

CAUSAS ATUAIS DAS AFLIÇÕES

4. Os acidentes desfavoráveis da vida são de duas espécies,ou, se você preferir, originam-se de duas fontes bem diferentes, eque é importante distinguir: alguns têm a sua causa na vida presentee outros têm a sua causa fora desta vida.

Se formos buscar a origem dos males terrestres, reconheceremosque muitos são a conseqüência natural do caráter e da conduta daquelesque os sofrem.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM107

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

108

Quantos não são os homens que caem por sua própria culpa!São vítimas de sua imprevidência, de seu orgulho e de sua ambição!

Quantos não são os que se arruínam por falta de ordem, deperseverança, por má conduta ou por não terem posto um freio aosseus desejos!

Quantas não são as uniões infelizes, porque resultaram deum cálculo de interesses ou de vaidade e nas quais o coração nãotomou nenhuma parte!

Quantas dissensões e disputas funestas poderiam ser evitadascom um pouco de moderação e menos suscetibilidade!

Quantos males e enfermidades não são frutos apenas daintemperança e dos excessos de todos os gêneros!

Quantos não são os pais infelizes com seus filhos, por nãoterem combatido as suas más tendências desde seu princípio! Porfraqueza ou indiferença, permitiram que neles se desenvolvessemos germes do orgulho, do egoísmo e da tola vaidade, que ressecamo coração. Mais tarde, quando colhem o que semearam, admiram-se e afligem-se com a falta de respeito e a ingratidão dos filhos.

Que todos esses que são feridos no coração pelos acontecimentosdesfavoráveis e pelas decepções da vida, interroguem friamente aprópria consciência. Reexaminem, passo a passo, a origem dos malesque os afligem. Verifiquem se não poderão dizer: Se eu tivesse feitoou não feito tal coisa, eu não estaria nesta situação.

A quem, portanto, atribuir todas as suas aflições, senão a elepróprio? O homem, assim, em grande número de casos, é o artesãode seus próprios infortúnios. Ao contrário, porém, de identificarem si mesmo a fonte de seus males, acha mais simples, menoshumilhante para a sua vaidade, acusar a sorte, acusar a ProvidênciaDivina, a má fortuna, sua má estrela, quando na verdade a sua máestrela é apenas a sua incúria.

Os males, das espécies a que nos referimos, fornecem,inegavelmente, um notável número de acidentes desfavoráveis para

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM108

109CAPÍTULO V

a sua vida. O homem, todavia, poderá evitá-los quando trabalharpor melhorar-se moralmente, tanto quanto trabalha para melhorar-se intelectualmente.

5. A lei humana define certas faltas e estabelece punições. Ocondenado, por isso, pode dizer que sofre as conseqüências do quefez. Essa lei, contudo, não define e nem alcança todas as faltas.

Determina apenas as que, especialmente, trazem prejuízo àsociedade. Não cuida, porém, daquelas que só prejudicam as pessoasque as cometem.

Mas Deus quer a evolução de todas as suas criaturas e, porisso, não deixa impune qualquer desvio do caminho reto.

Não há falta alguma, por mais leve que seja, que, em seconstituindo uma infração de sua lei, que não resulte emconseqüências forçosas e inevitáveis, mais, ou menos desagradáveis.Segue-se daí que, tanto nas pequenas como nas grandes coisas, ohomem sempre sente o efeito de seus erros.

Os sofrimentos, que decorrem do erro, são para o homemuma advertência de que ele andou mal. Isso lhe dará experiência,fazendo-lhe sentir a diferença entre o bem e o mal. Interiorizará anecessidade de melhorar-se, para evitar o que lhe causou tantasamarguras. Não fosse assim, motivo não existiria para que seemendasse. Se confiasse na impunidade, retardaria a sua evolução e,por conseqüência, a sua felicidade futura.

A experiência, porém, algumas vezes surge um pouco tarde.Quase sempre, quando ela chega, a vida já foi desperdiçada e,

perturbada. As forças estão gastas e sem remédio. É então que ohomem diz: “Se desde a minha juventude eu soubesse o que seihoje, quantas faltas teria evitado! Se pudesse recomeçar, eu faria tudode outra maneira. Agora, porém, já não há mais tempo!”.

Ele repete o que diz o obreiro preguiçoso: “Perdi o meu dia”,dizendo simplesmente: “Perdi a minha vida”. O Sol, porém, selevantará no dia seguinte para o obreiro, e uma nova jornada

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM109

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

110

começará, permitindo-lhe reparar o tempo perdido. E também parahomem que desperdiçou a vida, após a noite do túmulo brilhará osol de uma nova vida, na qual lhe será possível aproveitar a experiênciado passado e de suas boas resoluções para o futuro.

CAUSAS ANTERIORES DAS AFLIÇÕES

6. Se há males, nesta vida, cuja causa é o próprio homem, háoutros também que parecem atingi-lo como por uma fatalidade eque, pelo menos na aparência, lhe são completamente estranhos.

Entre esses, por exemplo, a perda de entes queridos que são oamparo da família. E, ainda, os acidentes que nenhuma previsãopoderia impedir; os reveses da fortuna, que contrariam todas asmedidas da prudência; os flagelos naturais; as enfermidade denascença, principalmente aquelas que impedem a tantos infelizesde ganhar a vida através do trabalho; as deformidades, a idiotia, ocretinismo etc.

Aqueles que nascem nessas condições seguramente nadafizeram na existência atual para merecer tão triste sorte, semnenhuma compensação. Não poderiam evitá-las e são impotentespara modificá-las, ficando entregues à piedade pública.

Por que seres tão infelizes? Por que nascem nessas condições,se na mesma família, sob o mesmo teto, convivem com outros quesão favorecidos em todos os sentidos?

Que dizer dessas crianças que morrem em tenra idade e queda vida só conheceram os sofrimentos?

Esses são problemas que nenhuma filosofia ainda pôderesolver.

As religiões, por outro lado, não explicam essas anomalias.Tais ocorrências, sem dúvida, se não justificadas, seriam a

negação da bondade, da justiça e da Providência Divina, diante da

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM110

111CAPÍTULO V

hipótese de a alma ser criada ao mesmo tempo que o corpo e coma sua sorte irrevogavelmente fixada após permanecer tão brevesinstantes sobre a Terra.

Que fizeram eles, que acabam de sair das mãos do Criador,para sofrerem tantas misérias, e merecerem, no futuro, umarecompensa ou uma punição qualquer, se não tiveram tempo defazer nem o bem e nem o mal?

Há um axioma que diz: Todo efeito tem uma causa.Se tomarmos tais misérias como um efeito que há de ter

uma causa e, admitindo-se que Deus é justo, a causa que dá origema tantos sofrimentos também há de ser justa.

Sabendo-se que todo efeito tem, antes de si, a sua causageradora, e se a causa de tais misérias não se encontra na vida atual,ela estará numa existência anterior a esta vida, ou seja, há de estarnuma existência precedente.

Deus não podendo recompensar pelo bem que não se fez enem aplicar a lei pelo mal que não se praticou, se alguém sofre ajustiça, é porque fez o mal. Se não fez esse mal nesta vida atual,deverá tê-lo feito numa existência anterior a esta.

Essa é uma alternativa a que ninguém pode escapar e em quea lógica nos dirá de que lado está a Justiça Divina.

O homem nem sempre será alcançado pela Justiça Divina,ou por ela buscado, na sua existência presente. Não escapará, porém,das conseqüências de suas faltas. A prosperidade do mau é apenasmomentânea e se ele não expiar os seus erros agora, virá a expiá-losfuturamente.

Aquele que hoje sofre está expiando o seu passado.O infortúnio que, à primeira vista, parece não merecido, tem

a sua razão de ser. Aquele que hoje sofre pode sempre dizer: “Perdoa-me, Senhor, porque errei”.

7. Os sofrimentos por causa de existências anteriores, comoos originários de faltas cometidas na existência atual, são muitas

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM111

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

112

vezes a conseqüência natural da falta cometida. O homem sofrerá oque fez sofrer aos outros, pela ação de uma justiça rigorosa que tempor fundamento o próprio erro cometido: se foi duro e desumano,poderá ser, por sua vez, tratado duramente e com desumanidade sefoi orgulhoso, poderá nascer em condição humilhante; se foi avaro,egoísta ou se fez mau uso de sua fortuna, poderá ver-se privado donecessário; se foi mau filho, poderá sofrer com a conduta de seuspróprios filhos etc.

As anomalias da distribuição da felicidade e da infelicidadeentre os bons e os maus neste mundo são explicadas pela pluralidadedas existências e pela destinação da Terra, como mundo expiatório.Estas anomalias existem somente na aparência e quando, ao examiná-las, estejamos presos sob o ponto de vista apenas da vida presente.

Eleve-se, porém, pelo pensamento, ao ponto de apreenderuma série de existências, e você verá que a cada um é dado o quemerece, sem prejuízo do que lhe caberá na espiritualidade, e veráque a Justiça Divina jamais falha.

O homem jamais deve esquecer-se de que está sobre ummundo inferior e que está aprisionado à Terra pelas suas imperfeições.Diante de cada acidente doloroso em sua vida, cabe-lhe lembrar-sede que, se pertencesse a um mundo mais evoluído, o sofrimentonão se daria e, lembrar-se também, que dependerá somente delenão voltar a este mundo, bastando para isso trabalhar pela sua própriamelhoria.

8. As tribulações da vida podem ser impostas aos Espíritosendurecidos no mal ou extremamente ignorantes, com a finalidadede levá-los a fazer uma escolha entre o bem e o mal, comconhecimento de causa.

Essas tribulações, porém, são livremente escolhidas e aceitaspelos Espíritos que se arrependeram de seus erros passados e quedesejam reparar o mal que hajam feito e queiram fazer o exercíciodo bem. É o caso, portanto, de um Espírito que, havendo feito

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM112

113CAPÍTULO V

mal a sua tarefa, pede para recomeçá-la para não perder o benefíciode seu próprio trabalho.

As tribulações, esses acontecimentos adversos da vida, são aum só tempo expiações de erros do passado, que através delas pedereparação, e provas que preparam o homem para o seu futuro.

Rendamos, pois, graças a Deus que, em sua bondade, concedeao homem a oportunidade de reparar seus erros, sem condená-loirrevogavelmente por uma primeira falta.

9. Nem todo sofrimento, porém, indica necessariamente umadeterminada falta. Alguns deles são simples provas, buscadas peloEspírito para concluir a sua depuração e ativar a sua evolução. Aexpiação serve sempre de prova, mas nem sempre a prova é umaexpiação de erros do passado.

Provas ou expiações, contudo, são sempre sinais de umainferioridade relativa, uma vez que o que é perfeito não precisa deser provado.

Um Espírito pode ter chegado a um certo grau de elevação e,querendo avançar mais, pode solicitar uma missão, uma tarefa aexecutar, pela qual será tanto mais recompensado, se sair vitorioso,quanto mais penosa tenha sido a luta.

Nessa posição de missão ou tarefa, estão especialmente essaspessoas de inclinações naturalmente boas, de alma elevada, de nobressentimentos inatos. Elas parecem, pelas suas qualidades, nada trazerde mau de suas existências anteriores. Sofrem com resignação todacristã as grandes dores, pedindo a Deus que as possam suportar semmurmurações.

Poderemos considerar, portanto, que estão em expiaçãoaqueles Espíritos que, diante das aflições, reagem com queixas erevoltas contra Deus.

O sofrimento que não estimula queixas pode ser umaexpiação, mas por ser aceito com resignação é um indício de quefoi buscado voluntariamente pelo Espírito, e não que lhe foi

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM113

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

114

imposto. E, por originar-se de uma decidida resolução do próprioEspírito, é um sinal de progresso.

10. Os Espíritos não podem aspirar por uma perfeita felicidadeenquanto não sejam puros. Qualquer mácula lhes interdita a entradaem mundos felizes.

Enquanto não ficarem puros assemelham-se aos passageirosde uma embarcação onde há os que contraíram moléstiascontagiosas, e que ficam proibidos de aportar numa cidade até queestejam livres de suas enfermidades.

Os Espíritos despojam-se, pouco a pouco, de suas imperfeições,através de suas diversas existências corpóreas. As provações da vida,quando bem suportadas, fazem-nos avançar. Como expiações, elasapagam as faltas e purificam, por serem o remédio que limpa as chagase cura o doente.

Para grandes males, grandes remédios.Aquele, pois, que muito sofre, deve dizer que tinha muito a

resgatar de seu passado, devendo alegrar-se com a sua própria cura.Dependerá de si mesmo, pela resignação, de tornar proveitoso parasi o seu sofrimento, a fim de não perder o fruto pelas suas queixas,uma vez que se perder a oportunidade, terá de começar de novo.

ESQUECIMENTO DO PASSADO

11. É em vão que se alega ser o esquecimento do passadouma dificuldade para que se possa aproveitar da experiênciaacumulada das existências anteriores. Se Deus lançou um véu sobreo passado, é que isso deve ser útil. Essa lembrança, por certo, trariagravíssimos inconvenientes. Em certos casos, essa lembrança poderiahumilhar-nos. Noutros poderiam exaltar-nos o orgulho. Por issoentravaria o nosso livre-arbítrio.

Traria, sempre, perturbação às nossas relações sociais.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM114

115CAPÍTULO V

O Espírito renasce, muitas vezes, no mesmo meio em que jáviveu. Volta a estabelecer relações com as mesmas pessoas, a fim dereparar qualquer mal que lhes haja feito. Se reconhecesse nessaspessoas as mesmas a quem houvesse odiado, talvez o ódio sedespertasse novamente em seu íntimo. Em qualquer caso, esse queali voltara a nascer se sentiria humilhado perante aquelas pessoas aquem já ofendera um dia.

Deus nos deu, para melhorar-nos, justamente o de quenecessitamos e nos será suficiente, nessa nova existência: a voz daconsciência e nossas tendências instintivas, despojando-nos de tudoo mais que nos poderia ser prejudicial.

O homem traz consigo, ao nascer, o que adquiriu.Ele nasce qual se fez.Cada existência é, para ele, um novo ponto de partida.Pouco lhe importa saber o que foi antes. Se hoje sofre é porque

fez o mal. As suas inclinações infelizes estão a indicar-lhe o que lheresta corrigir em si mesmo. Na correção de si próprio é que devecentralizar toda a sua atenção, uma vez que naquilo em que estácompletamente corrigido, nenhum traço mais lhe restará.

As boas resoluções que já tomou são a voz da consciência queo adverte de onde está o bem ou o mal, dando-lhe forças para resistiràs más tentações.

O esquecimento ocorre apenas durante a vida corpórea.O Espírito, ao reentrar na vida espiritual, readquire a lembrança

de seu passado. O esquecimento, durante a nova encarnação, não émais que uma interrupção momentânea, como aquela que se dá,durante a vida terrestre, durante o sono. O sono, como uma breveinterrupção de nossas lembranças, não nos impede de lembrar, nodia seguinte, do que fizemos na véspera e nos dias precedentes.

Não é somente após a morte que o Espírito recobra alembrança de seu passado. Pode dizer-se que ele jamais perde opassado. A experiência demonstra que, mesmo encarnado, durante

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM115

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

116

as horas de sono, quando goza uma certa liberdade, o Espírito temconsciência de seus atos anteriores. Ele, aí, sabe por que sofre e quesofre por justiça. A lembrança somente se apaga na sua vida derelações. A falta de uma lembrança exata, que lhe seria penosa eprejudicial para as suas relações sociais, vai permitir-lhe haurir forçasnovas nos instantes de emancipação da alma, durante o sono, se osabe aproveitar.

MOTIVOS DE RESIGNAÇÃO

12. Por estas palavras: Bem-aventurados os aflitos, porque elesserão consolados, Jesus indica a compensação que hão de ter os quesofrem e, ao mesmo tempo, a resignação que nos faz bendizer osofrimento como os primeiros passos da cura.

Estas mesmas palavras podem ser traduzidas assim: “Você deveconsiderar-se feliz por sofrer. As dores deste mundo são o débitodas faltas cometidas em suas vidas passada. Essas dores, suportadaspacientemente sobre a Terra, vão poupá-lo de séculos de sofrimentosna vida futura. Você deve, portanto, sentir-se feliz porque Deusestá reduzindo a sua dívida, permitindo-lhe pagá-la neste momento,o que lhe assegurará tranqüilidade no futuro”.

O homem que sofre é semelhante a um devedor de grandesoma, a quem o credor dissesse: “Se você me pagar, hoje mesmo, acentésima parte do que me deve, eu lhe quitarei todo o restante dadívida e você será livre. Se, porém, você não me pagar agora, vouatormentá-lo até que me pague até o último centavo.”

O devedor, aí, não se sentiria feliz, mesmo que tivesse desuportar toda espécie de privação para libertar-se da dívida, pagandoapenas uma centésima parte do que deve?

Contrariamente a queixar-se, não ficará agradecido?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM116

117CAPÍTULO V

É esse o sentido destas palavras: “Bem-aventurados os aflitos,porque eles serão consolados”. Eles serão felizes, porque resgatam oque devem e porque, após estarem quitados, estarão livres. Ohomem, porém, que ao quitar-se de um lado, contrai novas dívidasde outro lado, jamais alcançará a sua liberação de compromissos.Ocorre que cada nova falta corresponde a um aumento da dívida.E qualquer que seja a falta, ela trará consigo as conseqüências infelizese inevitáveis. Essas reações dolorosas, se não comparecerem hoje,surgirão amanhã, ou seja, se não se manifestarem na vida atual,surgirão na próxima existência.

Entre essas faltas, devemos colocar em primeiro plano o errode não nos submetermos à vontade de Deus. Se nos queixarmosdos sofrimentos; se não os aceitarmos com resignação, por considerá-los como uma coisa que não merecemos; se acusarmos Deus deinjusto, estaremos contraindo uma nova dívida, que nos fará perdero benefício que poderíamos recolher do sofrimento.

Essa nossa conduta obriga-nos a recomeçar.Ela nos coloca na posição daquele devedor que, diante do

credor que o atormenta, paga uma parcela de sua dívida, mas deimediato contrai um novo empréstimo, aumentando seuscompromissos.

Ao entrar no mundo espiritual, o homem ainda está como oobreiro que se apresenta no dia de receber o seu salário. A uns opatrão lhe dirá: “Aqui está o pagamento de seus dias de trabalho”. Aoutros, que são os felizes com as coisas terrenas, aos que tenhamvivido na ociosidade, aos que edificaram a sua felicidade na satisfaçãode seu amor-próprio e nos prazeres mundanos, o patrão lhes dirá:“Vocês nada têm a receber, porque vocês já receberam o seu saláriosobre a Terra. Voltem, portanto, e recomecem a tarefa”.

13. O homem pode abrandar ou aumentar o amargor desuas provas, pela maneira que encare a vida terrena. Ele sofre tantomais, quanto mais considerar que seu sofrimento seja longo.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM117

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

118

Se você encarar a vida do ponto de vista espiritual, entreveráinteiramente a significação da vida corporal. Você verá a vidacorporal como minúsculo ponto no infinito e compreenderá a suaextrema brevidade. Saberá que todo momento penoso passa bemdepressa. A certeza de um próximo futuro mais feliz lhe sustentaráo ânimo e lhe dará coragem. Ao contrário de queixar-se diante dossofrimentos, você agradecerá ao Céu as dores que o fazem evoluir.

Se você, porém, encarar a vida tão-somente do ponto de vistacorporal, esta lhe parecerá interminável. A dor, então, recairá sobrevocê com todo o seu peso.

O resultado de você encarar a vida do ponto de vista espiritualserá a diminuição da importância que você dará às coisas deste nossomundo; a moderação de seus desejos; a satisfação que você terá desua própria posição na vida, sem invejar a posição dos outros e acapacidade que você terá de abrandar o ânimo diante dos reveses edas decepções que experimentar.

Você alcançará, então, uma calma e uma resignação quebeneficiarão a saúde do corpo físico e o equilíbrio de sua própriaalma. Alimentando-se, porém, de inveja, de ciúme e de ambição,você voluntariamente se candidatará à tortura mental, aumentandoas misérias e as angústias de sua curta existência.

O SUICÍDIO E A LOUCURA

14. A calma e a resignação, hauridas pela maneira espiritualde encarar a vida terrena, e a sua fé no futuro, lhe darão a seu espíritouma serenidade ampla. Essa serenidade é a melhor vacina contra aloucura e o suicídio.

É certo que a maioria dos casos de loucura são resultantes daperturbação produzida pelos sofrimentos da vida, que o homemnão tem forças de suportar. Se, no entanto, esse homem passar a

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM118

119CAPÍTULO V

ver as coisas deste mundo pela maneira como o Espiritismo o farávê-las, ele passará a receber com indiferença, até com certa alegria,as contrariedades e desilusões que o levariam ao desespero em outrascircunstâncias.

É evidente que essa força, que o coloca acima dosacontecimentos, preservará a sua razão dos abalos que a poderiamperturbar.

15. O mesmo se dará com o suicídio.Excluindo os suicídios que se dão em estado de embriaguez

ou de loucura, e que poderemos chamar de atos inconscientes, écerto que, sejam quais forem os motivos particulares, eles terãosempre por causa um descontentamento.

Se você estiver certo de que será infeliz por um dia apenas eque melhores serão os dias futuros, você facilmente adquire paciência.Você somente se desesperará se não divisar um final para os seussofrimentos.

Que é a vida humana, em relação à eternidade, senão bemmenos que o espaço de tempo de um dia?

Mas, se você não crê na eternidade, julgando que tudo seacabará com a própria vida, findando com ela o sofrimento e osinfortúnios, você verá somente na morte o fim de seus pesares.Nada esperando do amanhã, você achará muito natural, muitológico mesmo, abreviar as suas misérias pelo suicídio.

16. A incredulidade, a simples dúvida sobre a vida eterna, asidéias materialistas numa palavra, são os grandes estimuladores aosuicídio. Tais idéias produzem a covardia moral.

Quando os homens da ciência, apoiados na autoridade deseu saber, esforçam-se para provar aos que os ouvem ou aos seusleitores, que eles nada têm a esperar depois da morte, não estarãolevando a deduzir que, se são infelizes, o melhor que podem fazer ématar-se? Que poderiam dizer-lhes, para desviá-los dessa conclusão?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM119

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

120

Que compensação podem oferecer-lhes? Que esperança podem dar-lhes? Nenhuma outra coisa, que não seja o nada.

Se o único remédio heróico, preparado pela idéia materialista,se a única perspectiva é o nada, mais vale atirar-se de imediato a ele,do que deixar para mais tarde e, assim, sofrer menos tempo.

A propagação das idéias materialistas é, portanto, o venenoque incute o pensamento de suicídio em grande número dos que sesuicidam. Aqueles, porém, que se fazem apóstolos dessa idéiaassumem uma terrível responsabilidade.

Com o conhecimento do Espiritismo, não sendo mais admitidaa dúvida sobre a vida futura, modifica-se a perspectiva da própriaexistência. O crente sabe que a vida se prolonga indefinidamente,para além do túmulo, mas em outras condições. Esta certeza resultana paciência e na resignação, que muito naturalmente o afastam dosuicídio, por dar-lhe a coragem moral.

17. O Espiritismo ainda produz, sob esse aspecto, um outroresultado igualmente positivo e talvez mais determinante. Mostra-nos os próprios suicidas a informar-nos das situações infelizes a quese arrojaram com seu ato, provando que ninguém viola,impunemente, a lei de Deus, que proíbe o homem de encurtar asua vida.

Entre os suicidas, alguns há cujos sofrimentos, emboratemporários e não eternos, não são menos terríveis do que aquelesque experimentavam em sua última existência. E a natureza de taissofrimentos é tamanha que dá o que pensar aos que queiram partir,antes do tempo ordenado por Deus.

O Espírita tem, portanto, para contrapor à idéia do suicídio,vários motivos, tais como: a certeza de uma vida futura na qual elesabe que será mais feliz, quanto mais infeliz e mais resignado tenhasido sobre a Terra; a certeza de que, abreviando a sua atual existência,alcançará um resultado exatamente oposto ao que poderia esperar;que se libertará de um mal menor, para cair noutro mal pior ainda,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM120

121CAPÍTULO V

mais longo e mais terrível; que se engana, pensando que ao matar-se irá mais depressa para o céu; que o suicídio é um obstáculo a queele se reúna no outro mundo com as pessoas a quem dedicou a suaafeição e as quais esperava encontrar; pelas conseqüências do suicídio,que lhe dá apenas decepções, contrariando a seus próprios interesses.

Considerável já é o número daqueles que têm sido, peloEspiritismo, contidos de suicidar-se. Conclui-se daí que quandotodos os homens forem espíritas, não haverá mais suicidasconscientes.

Comparando-se os resultados a que induzem a doutrinamaterialista e a Doutrina Espírita, somente do ponto de vista dosuicídio, você verá que a lógica do materialismo conduz ao suicídio,enquanto que a lógica Espírita afasta o homem do suicídio, fatoeste que é confirmado pela experiência.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:BEM E MAL SOFRER

18. Quando o Cristo disse: “Bem-aventurados os aflitos,porque o reino dos céus lhes pertence”, Ele não se referia, de modogeral, aos que sofrem. Todos os que estão na Terra sofrem, querestejam sobre o trono ou sobre o chão pisado de um barraco.

Mas, poucos sofrem bem!Poucos são os que compreendem que somente as provas bem

suportadas poderão conduzi-los ao reino de Deus.O desânimo é uma falta.Você não experimentará as consolações divinas, se lhe faltar

coragem para bem suportar as provas.A prece é um apoio para a sua alma, mas ela só não basta para

sustentá-lo no calor dos sofrimentos. Faz-se indispensável que vocêtenha por base uma fé viva na bondade de Deus.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM121

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

122

Jesus já lhe disse, convém recordar, que não coloca fardospesados sobre ombros fracos. O fardo será proporcional às suasforças, assim como a recompensa será proporcional à resignação e àcoragem de cada um. A recompensa será tanto mais esplêndida,quanto maior e penosa tenha sido a aflição.

Você tem de fazer por merecer a recompensa e, por isso, avida está repleta de tribulações.

O bom trabalhador que não é enviado ao campo de suasatividades profissionais, cai em descontentamento, porque o nãotrabalho o priva de alcançar promoções justas. Seja você, portanto,como esse trabalhador diligente e não aspire a um repouso queenfraqueceria a sua capacidade de realizações e entorpeceria a suaalma.

Alegre-se quando Deus o enviar às tarefas regeneradoras.Essas tarefas não serão aquelas em que você assegura o pão de

cada dia. Serão as amarguras da vida, onde muitas vezes necessitamosde mais coragem e resignação que nas atividades profissionais detodos os dias. Alguns suportarão as lutas em suas oficinas de trabalho,sem queda, mas poderão cair sob o impacto do sofrimento moral.

Pela coragem de vencer, em suas tarefas redentoras, sem cairdiante do sofrimento moral, o homem não receberá a recompensado mundo. Receberá, porém, de Deus, a coroa da Vida e um lugarglorioso.

Quando você for visitado pela dor ou pela contrariedade,coloque-se acima delas. E quando você dominar os impulsos daimpaciência, da cólera ou do desespero, diga, com justa satisfação:“Eu fui o mais forte!”.

Bem-aventurados os aflitos, poderá, então, ser traduzido daseguinte forma: Bem-aventurados são os que têm a oportunidadede provar sua fé, sua firmeza, sua perseverança e sua submissão àvontade de Deus porque esses terão centuplicada a alegria que lhes

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM122

123CAPÍTULO V

falta sobre a Terra e após o árduo trabalho, lhes virá o repouso.(Lacordaire, Havre, 1863.)

O MAL E O REMÉDIO

19. O mundo em que você vive será um lugar de alegria, umparaíso de delícias? A voz do profeta já não mais ressoa em seusouvidos? Não anunciou Jesus que haveria choro e ranger de dentespara os que nascessem neste vale de dores?

Vocês todos que vieram aí viver, aguardem lágrimas ardentese expiações amargosas e, quando mais agudas e profundas forem assuas dores, voltem os olhos para o céu e bendigam o Senhor, porter querido prová-los!

Vocês, por acaso, somente reconheceriam o poder de nossoMestre, quando Ele curasse as chagas de seus corpos e enchesse osseus dias de beatitude e de alegria? Vocês não reconheceriam o seuamor, senão quando Ele adornasse os seus corpos de todas as glóriase lhes desse o seu brilho e a sua luz?

Imitem aquele que lhes foi dado para exemplo. Descendoaté o último degrau da baixeza e da miséria, estendido sobre ummonte de lixo, ele disse a Deus: “Senhor! Conheci todas as alegriasda opulência e vós me reduzistes à miséria mais profunda! Eu vosagradeço, meu Deus, por muito fazer sofrer o vosso servo!”.

Até quando os seus olhos alcançarão apenas os horizonteslimitados pela morte? Quando a sua alma se decidirá, finalmente, aexaminar além dos limites de um túmulo? Mesmo que vocêschorassem e sofressem uma vida inteira, que seria isso diante daeterna glória reservada àquele que tenha sofrido a sua provação comfé, amor e resignação?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM123

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

124

Procurem, portanto, as consolações para os seus males nofuturo que Deus lhes prepara e, também, procurem a causa de seusmales no seu próprio passado.

Vocês, que mais sofrem, considerem-se os bem-aventuradosda Terra.

Quando vocês estavam na espiritualidade, como desencarnados,vocês mesmos escolheram o seu sofrimento, porque vocês se sentiamsuficientemente fortes para suportá-lo.

Por que queixar-se agora?Vocês que pediram a fortuna e a glória, queriam sustentar a

luta contra a tentação das seduções da fortuna e do poder, e queriamvencê-la.

Vocês que pediram para lutar, de alma e corpo, contra o malmoral e físico, sabiam que quanto mais forte fosse o sofrimento,tanto mais gloriosa seria a vitória. Se vocês saíssem vitoriosos, mesmoque a sua carne fosse lançada sobre um monte de lixo, no momentode sua morte dele se desprenderia uma alma resplendente de alvura.e purificada pelo batismo da expiação e do sofrimento.

Que remédio prescrever, então, para aqueles que foramatingidos por obsessões cruéis e por males dolorosos? Um só remédioé infalível e esse é a fé, e esse é voltar os olhos ao céu. Se, nosmomentos de seus mais cruéis sofrimentos, você bendisser o Senhor,um Espírito benevolente, refrigerando as suas lágrimas, lhe mostraráos sinais da salvação e o lugar que você deverá ocupar um dia.

A fé, este é remédio seguro para o sofrimento.Através dela você divisará todos os horizontes do infinito,

diante dos quais se dissolvem os poucos dias sombrios do presente.Não mais nos pergunte, portanto, qual é o remédio

apropriado para curar tal úlcera ou tal chaga, para curar esta tentaçãoou aquela provação. Lembre-se de que aquele que crê cresce emforças com o alívio haurido da própria fé. Aquele que duvida, porém,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM124

125CAPÍTULO V

por um segundo que seja, da eficácia da fé, aumentará o seu própriosofrimento, sentindo as angústias pungentes da aflição.

O Senhor apôs o seu selo em todos os que nele crêem.O Cristo lhes disse que a fé transporta montanhas. E eu lhes

digo que todo aquele que sofre e que tiver a fé por apoio ficará soba proteção do Senhor e não sofrerá demais. Os momentos das maisfortes dores serão, para quem se apóia na fé, as primeiras notas dealegria da eternidade. A sua alma se desprenderá de tal maneira deseu corpo que, enquanto este se torcer em convulsões, ela planaránas regiões celestes, bendizendo, com os Espíritos benfeitores, aglória do Senhor.

Felizes os que sofrem e choram! Que as suas almas se ale-grem, porque elas serão amparadas por Deus. (Agostinho, Paris,1863.)

A FELICIDADE NÃO É DESTE MUNDO

20. “Eu não sou feliz! A felicidade não foi feita para mim!”exclama geralmente o homem de todas as posições sociais.

Essa reclamação, meu caros filhos, prova, melhor que todosos arrazoados possíveis, a verdade da máxima do livro do VelhoTestamento, o Eclesiastes: “A felicidade não é deste mundo”.

Nem a riqueza, nem o poder, nem mesmo os anos primeirosda juventude são condições essenciais da felicidade. Digo ainda mais:nem mesmo a reunião dessas três condições tão desejadas produziráa felicidade. Temos ouvido, sem cessar, no meio das pessoas maisprivilegiadas, muitas delas, em todas idades, queixarem-se amargamenteda situação em que se encontram.

Diante de tal resultado da própria fortuna e poder, é quaseinconcebível que as classes trabalhadoras invejem, com tanta cobiça,a posição daqueles que são favorecidos pela riqueza. Neste mundo,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM125

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

126

por mais que se faça, cada um tem a sua parte de trabalho e demiséria, tem a sua parte de sofrimento e de desilusões. Por isso sechega facilmente à conclusão de que a Terra é um lugar de provas eexpiações e não de inteira felicidade.

Os que apregoam que a Terra é a única morada do homem eque somente nela e numa única existência se permitirá alcançar omais alto grau de felicidade que a sua natureza comporta, por certoque se iludem e enganam aqueles que os escutam. Está demonstra-do, por uma experiência milenar, que só excepcionalmente estemundo oferece as condições necessárias para a completa felicidadedo indivíduo.

Num sentido geral, pode-se afirmar que a felicidade é umautopia, uma espécie de sonho, a cuja posse se lançam as sucessivasgerações, sem jamais, porém conseguir alcançá-la. Se o homem sábioé uma raridade neste mundo, o homem absolutamente feliz não éencontrado em parte alguma nesse plano de vida.

Aquilo em que consiste a felicidade sobre a Terra é uma coisatão efêmera, para quem não se orientar pela sabedoria, que por umano, por um mês, por uma semana de completa satisfação, todo orestante da existência será marcado por uma série de amarguras edecepções.

E notem, meus caros filhos, que falo dos felizes da Terra,desses que são invejados pelas multidões.

A morada terrestre é um lugar de provas e expiações.Forçoso é, portanto, admitir que existem, além, outros

mundos mais favorecidos, onde o Espírito do homem, emboraainda aprisionado a um corpo de carne, desfruta na sua plenitude asalegrias inerentes à vida humana. Por isso é que Deus semeou, noseu turbilhão, esses belos planetas superiores. E os seus esforços e assuas tendências farão vocês um dia gravitar ao encontro deles, quandoestiverem suficientemente purificados e aperfeiçoados.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM126

127CAPÍTULO V

Não deduzam, contudo, das minhas palavras que a Terra estejasempre destinada a ser um cárcere! Certamente que não farão essadedução! Da evolução já alcançada vocês poderão facilmente deduziro progresso futuro. Dos avanços sociais conseguidos, serão alifecundados outros avanços mais. Essa é a tarefa imensa que deveráser executada pela nova doutrina que os Espíritos lhes revelaram.

Meus queridos filhos, para essa tarefa, que um santo estímuloos anime e que cada um de vocês se despoje do homem velho.Entreguem-se, por inteiro, à divulgação do Espiritismo, que já deucomeço com a sua própria regeneração. Este é um dever que vocêstêm, de fazer com que os seus irmãos de humanidade desfrutemtambém dos raios da sagrada luz.

Mãos à obra, meus muito queridos filhos!Que nesta reunião solene todos os seus corações aspirem a

este objetivo grandioso de preparar para as futuras gerações ummundo em que a felicidade não seja uma palavra vã. (FrançoisNicolas Madeleine, cardeal Morlot, Paris, 1863.)

PERDA DE PESSOAS AMADASDESENCARNAÇÕES PREMATURAS

21. Quando a morte vem ceifar em suas famílias, semrestrições, levando os jovens em lugar dos velhos, vocês costumamdizer: “Deus não é justo! Ele sacrificou o jovem, que está forte etem um grande futuro, e conservou os que já viveram longos anos,marcados por desilusões. Leva os que são úteis e deixa os que paranada mais servem. Parte o coração de uma mãe por privá-la dainocente criatura que fazia toda a sua alegria”.

Ó homens, é nesse juízo que vocês fazem que lhes cabe elevar-se do terra a terra da vida. É necessário compreender que o bemestá, muitas vezes, onde vocês julgam ver o mal. É preciso

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM127

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

128

compreender que, onde vocês estão vendo uma cega fatalidade dodestino, está justamente a manifestação da sábia Providência Divina.

Por que medir a justiça divina pela sua justiça?Pensam vocês que o Senhor dos mundos venha, por um

simples capricho, lhes aplicar penas cruéis? Nada se faz sem ummotivo inteligente. Seja o que for que aconteça, todas as coisas têma sua razão de ser. Se vocês estudassem melhor todas as dores que seinstalam em sua senda, nelas descobririam a razão divina, a razãoregeneradora. Seus miseráveis interesses, então, receberiam umaconsideração tão secundária, que vocês os rejeitariam para o últimoplano.

Podem crer que é preferível a morte, numa encarnação devinte anos, do que esses desregramentos dolorosos que entristecemfamílias respeitáveis, amargurando o coração de uma mãe e fazendo,antes do tempo, embranquecer os cabelos dos pais. A morteprematura é, quase sempre, um grande benefício que Deus concedeà alma que se vai. Ela ficará, assim, preservada das misérias da vidaou das seduções que poderiam levá-la a quedas morais.

Aquele que morre na flor da idade não é uma vítima dafatalidade. Foi Deus que julgou que lhe seria útil partir mais cedodo que permanecer um longo tempo na Terra.

Vocês poderiam dizer: “É uma terrível desgraça que uma vidatão repleta de esperanças seja cortada tão cedo!”. Mas, de queesperanças vocês estarão a falar? Será das esperanças da Terra, ondeaquele que se foi poderia brilhar, criar seus próprios caminhos econquistar riquezas?

Essa é uma visão acanhada, aprisionada às coisas materiais!Saberiam vocês, porventura, qual seria a sorte dessa vida que,

segundo vocês, era tão cheia de esperanças? Quem lhes diz que elanão seria até muito repleta de amarguras? Desprezam vocês, então,as esperanças da vida futura, preferindo trocá-las pela vida efêmeraque vocês arrastam na Terra? Vocês pensam que mais vale uma posição

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM128

129CAPÍTULO V

de destaque entre os homens, do que entre os espíritos bem-aventurados?

Elevem a visão da vida acima das coisas materiais!Alegrem-se muito, ao invés de se queixarem, quando praz a

Deus retirar um de seus filhos deste vale de misérias. Não seria umegoísmo de sua parte querer que ele permanecesse para sofrer comvocês? Ah! este gênero de dor somente se encontra naqueles a quemfalta a fé e que na morte vêem uma separação eterna.

Vocês, Espíritas, vocês sabem que a alma liberta vive melhor.Mães, vocês sabem que seus filhos bem-amados estão perto

de vocês. Sim! eles estão muito mais próximos de seu coração! Seuscorpos fluídicos envolvem a vocês, os pensamentos deles lhes dãoproteção. A doce lembrança que deles vocês guardam os enche dealegria. Por outro lado, porém, as suas dores, por não terem motivojusto, os levam ao sofrimento, porque tais dores revelam uma faltade fé e são um grito de revolta contra a vontade do Pai Celestial.

Vocês que compreendem a vida espiritual, escutem as pulsaçõesde seus próprios corações, chamando esses entes bem-amados. E sevocês pedirem a Deus que os abençoe, vocês sentirão em vocêsmesmos o poder das consolações que enxugam as lágrimas; sentirãoem vocês mesmos a grandeza das aspirações que lhes revelarão ofuturo prometido pelo soberano Mestre Jesus. (Sanson, ex-membroda Sociedade Espírita de Paris, 1863.)

SE FOSSE UM HOMEM DE BEM, TERIA MORRIDO

22. Falando de um homem maldoso, que escapa de umperigo, vocês dizem: “Se fosse um homem de bem, certamenteteria morrido”. E, assim falando, vocês dizem uma verdade. Deusconcede, muitas vezes, a um Espírito ainda jovem nas linhas da

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM129

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

130

evolução, uma prova mais alongada do que a um bom Espírito.Por mérito, o bom Espírito receberá a recompensa de demorar-se omenos possível nos quadros de provações.

Observem, pelo exposto, que quando vocês empregam aqueleaxioma, lamentando a não-morte do homem maldoso, vocês estãocometendo uma blasfêmia.

Se morreu um homem de bem, que tinha por vizinho umhomem maldoso, vocês logo dirão: “Seria bem melhor que tivessemorrido o maldoso”. Com isso, vocês cometem um grande erro,porque aquele que parte desta vida terá terminado a sua tarefaenquanto que o vizinho maldoso talvez nem sequer haja começadoa dele.

Por que vocês desejariam que ao maldoso faltasse o temponecessário para alcançar a sua redenção e que o bom permanecesseatado a este mundo? Que diriam vocês se libertasse um prisioneiroque não cumpriu a pena que lhe foi imposta e se conservasse presoaquele que já a cumpriu inteiramente? Saibam que a verdadeiraliberdade está em libertar-se dos laços que prendem a alma ao corpoe que enquanto vocês estiverem sobre a Terra, vocês estão emcativeiro.

Criem o hábito de não colocar-se contra o que vocês nãocompreendem. Creiam que Deus é justo em todas as coisas. Algumasvezes, o que lhes parece ser um grande mal é um bem.

Vocês possuem faculdades tão limitadas, que o conjunto dogrande todo escapa aos seus sentidos obtusos. Esforcem-se por sair,pelo pensamento, do estreito círculo de suas observações. À medidaque vocês se elevarem espiritualmente, a vida material diminuirá deimportância, ganhando a sua verdadeira dimensão. A vida material,então, só se apresentará a vocês como um incidente, diante daduração infinita de sua existência espiritual, a única verdadeira vida.(Fénelon, Sens, 1861.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM130

131CAPÍTULO V

OS TORMENTOS VOLUNTÁRIOS

23. O homem está, a toda hora, à procura da felicidade, quelhe escapa a todo instante, porque a felicidade sem a sombra dosofrimento não existe sobre a Terra. O homem, no entanto, apesardas contrariedades que formam o cortejo inevitável desta vida terrena,poderia pelo menos gozar de uma felicidade relativa. Essa felicidadelhe seria possível, se ele não a procurasse entre as coisas perecíveis esujeitas às mesmas contrariedades, ou seja, ele a procura nos gozosmateriais. Deveria procurá-la, isto sim, nos gozos da alma, que sãouma antecipação das imperecíveis alegrias celestiais. Contrariamentea procurar a paz do coração, única felicidade verdadeira neste mundo,ele se mostra ávido de tudo o que possa agitá-lo e perturbá-lo. E,coisa singular, ele parece criar para si os tormentos da vida, quesomente a ele caberia evitar.

Haverá tormentos maiores que aqueles causados pela inveja epelo ciúme? Para o invejoso e o ciumento não existe tranqüilidade.Ambos sofrem uma febre interminável. As coisas que os invejosose ciumentos não possuem, mas que os outros têm, são para eles acausa de suas insônias, de noites mal dormidas. O sucesso alcançadopelos seus rivais causa-lhes vertigens. O único interesse deles é superaros que lhes estão próximos. Toda a alegria que experimentam é deestimular, nos que se parecem com eles na falta de juízo, a mesmainveja e o mesmo ciúme que os devoram.

Esses são pobres insensatos que não imaginam, sequer, queno dia seguinte terão de abandonar todas as suas frivolidades, cujacobiça lhes envenena a vida! Não é para eles que se aplicam estaspalavras de Jesus: “Bem-aventurados os aflitos, porque serãoconsolados”, visto que os seus cuidados não são aqueles que no céutem compensações.

De que tormentos, ao contrário destes dos invejosos eciumentos, não se poupa aquele que sabe contentar-se com o que

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM131

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

132

tem, que vê sem inveja o que não possui, que não procura parecermais do que é!

Esse é sempre rico, uma vez que, olhando para os que estãoabaixo de si e não para os que lhe estão acima, vê sempre os quepossuem menos que ele.

Esse sempre está calmo, porque não cria para si próprionecessidades artificiais e sem valia. E não será a calma, em meio àstormentas da vida, uma felicidade? (Fénelon, Lyon, 1860.)

A VERDADEIRA INFELICIDADE

24. Todos falam da infelicidade, todos já a sentiram e julgamconhecer-lhe o caráter múltiplo. Venho eu dizer-lhes que quase todosse enganam e que a verdadeira infelicidade não é, absolutamente, oque os homens, ou seja, os infelizes a supõem ser.

Vocês vêem a infelicidade na miséria, no fogão sem lume, nocredor que exige seus direitos, no berço vazio em que seu filhodormia, nas lágrimas de dor, no acompanhamento de um enterroem que vocês seguem de coração despedaçado, na angústia da traição,na privação do orgulhoso que desejaria vestir-se de ouro e mal seveste com os farrapos da vaidade.

A essas situações, e muitas outras semelhantes, é que vocêschamam, na linguagem humana, de infelicidade ou desgraça. Sim,realmente são a desgraça ou infelicidade para os que têm olhos apenaspara a vida presente. Mas, a verdadeira infelicidade está mais nasconseqüências dessas situações, do que em cada uma das situaçõesem si.

Digam-me se um acontecimento, muito feliz num momento,mas que resultará em funestas conseqüências, não é, realmente, umainfelicidade maior do que um outro acontecimento que, emprincípio, causa uma viva contrariedade e, no final, resulta num

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM132

133CAPÍTULO V

bem. Digam-me se a tempestade que arranca as suas árvores, masque saneia o ar e dissipa os miasmas insalubres que poderiam ser acausa de suas mortes, não é antes uma felicidade que uma desgraça.

Para julgar uma coisa, é necessário ver-lhe as conseqüências.Assim é que para apreciar o que é realmente feliz ou infeliz para ohomem, é necessário transportar-se para além desta vida, porque élá que as conseqüências se fazem sentir. Tudo o que se chama miséria,segundo a curta visão humana, cessa com a vida terrena e tem suacompensação na vida futura.

Vou revelar-lhes a infelicidade sob uma nova forma. Sob aforma bela e florida que vocês acolhem e desejam com todas asforças de suas almas iludidas. A infelicidade sob nova forma é estaalegria, este prazer, este tumulto, esta vã agitação, esta louca satisfaçãoda vaidade, que fazem calar a consciência que oprimem a ação dopensamento, que confundem o homem sobre o seu futuro. Ainfelicidade é esse ópio do esquecimento que vocês ardentementebuscam.

Esperem, vocês que choram! Tremam, vocês que riem, porqueseus corpos estão satisfeitos!

A Deus não se engana e ninguém foge a seu destino.Provações dolorosas formam-se no horizonte daqueles que

se entregam ao repouso ilusório, para caírem como tempestades deinfelicidade sobre as almas entorpecidas pela indiferença do egoísmo.

Convém que vocês se esclareçam com o Espiritismo, quelhes restabelecerá o real sentido da verdade e do erro, tãoestranhamente desfigurados pela sua cegueira! Suficientementeesclarecidos, vocês agirão como o trabalhador especializado que,chamado a uma nova obra, longe de fugir dos desafios, prefereencará-los com todos os seus riscos, do que se confiar à acomodaçãoque não oferece nem glória e nem progresso.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM133

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

134

Que importa a esse trabalhador, ao aceitar os novos riscos,despender horas de sono e ser visitado pela fadiga, se, no final,terminar vitorioso a sua tarefa?

Que importa, pois, para quem tem fé no porvir, deixar sobreo campo de trabalho da vida a sua fortuna e a sua veste carnal, desdeque a sua alma entre radiosa no reino celeste? (Delphine de Girardin,Paris, 1861.)

A MELANCOLIA

25. Você sabe por que uma vaga tristeza invade o seu coraçãoe o faz sentir a vida amarga? É o seu Espírito que aspira à felicidadee à liberdade! Ligado ao corpo que lhe serve de prisão, ele se esgotano vão esforço que faz para libertar-se.

Reconhece serem inúteis esses esforços!Cai, então, no desalento e, como o corpo físico lhe sofre a

influência, o abatimento, o desânimo e uma espécie de apatia seapoderam de sua vontade e você, por isso, se julga infeliz.

Resista, porém, com energia a essas sensações que enfraquecema sua vontade. As aspirações por uma vida melhor são inerentes aosespíritos de todas as criaturas humanas. Mas não busque essa vidafeliz aqui na Terra.

Agora que Deus envia seus Espíritos para instruir você sobrea felicidade que Ele lhe reserva, aguarde pacientemente o espírito dalibertação que irá ajudá-lo a romper os laços que trazem a sua almacativa.

Lembre-se de que você tem a cumprir uma missão, duranteas suas provações sobre a Terra, e essa missão, da qual você nãopode duvidar, será pela sua dedicação à família, será pelo desempenhodos diversos deveres que Deus lhe confiou.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM134

135CAPÍTULO V

Se, no curso dessas provas e ao cumprir a sua tarefa, sobrevocê desabarem os cuidados, as inquietações, os pesares, seja forte ecorajoso para suportá-los.

Enfrente as adversidades bravamente.Elas são de curta duração e irão conduzi-lo ao encontro dos

amigos, pela companhia dos quais você chora. Esses amigos sesentirão felizes por vê-lo de novo entre eles e lhe estenderão seusbraços para conduzirem você a uma região onde não têm acesso asaflições da Terra. (Francisco de Genebra, Bordéus.)

PROVAS VOLUNTÁRIAS:O VERDADEIRO CILÍCIO

26. Vocês perguntam se é permitido ao homem abrandarsuas próprias provas.

Essa questão leva a estas outras: É permitido para aquele quese afoga, cuidar de se salvar? É admitido para aquele, em quementrou um espinho, retirá-lo? É lícito ao que está doente recorrer àmedicina?

As provações têm por finalidade útil o desenvolvimento dainteligência e, também, o despertar da paciência e da resignação.Um homem, portanto, poderá nascer numa situação penosa ecomplicada, precisamente para obrigar-se a encontrar os meios devencer essas dificuldades. O seu mérito consistirá em suportar, semqueixar-se, as conseqüências dos males que não pode evitar. Cabe-lhe perseverar na luta, sem se desesperar se não for bem-sucedido.Jamais, todavia, deve entregar-se à indiferença diante de suasprovações. Esse abandono voluntário às circunstâncias amargas émais preguiça do que virtude.

Esta questão nos conduz naturalmente para uma outra. Umavez que Jesus disse: “Bem-aventurados os aflitos”, haverá algum mérito

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM135

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

136

em você criar aflições para si próprio, agravando as suas provas porintermédio de sofrimentos voluntariamente buscados?

A essa indagação responderei afirmativamente: Sim! há umgrande mérito quando os sofrimentos e as privações tenham afinalidade de fazer o bem a seu próximo, uma vez que você vivenciaráa caridade pelo sacrifício. Direi que nenhum mérito haverá quandosofrimentos e privações visam somente o bem pessoal daquele quea si mesmo os inflige. Neste caso, contrariamente a um ato decaridade, temos aí somente o egoísmo inspirado por fanatismo.

Façamos, aqui, uma grande distinção.No que lhe toca pessoalmente, contente-se com as provas

que Deus lhe envia. Não queira aumentar o peso da sua própriacruz, já de si tão pesada. Aceite-as sem queixumes e com fé, eistudo o que de você se espera.

Não enfraqueça seu próprio corpo com privações inúteis esacrifícios sem propósito. Você necessita de todas as suas energiaspara cumprir a sua missão de trabalhar na Terra.

Torturar-se voluntariamente e martirizar o seu corpo écontrariar a lei de Deus. Deus o provê de meios de sustentar e tornarsaudável o seu corpo e, desgastá-lo sem necessidade, é um verda-deiro suicídio.

Use, mas não abuse, é a lei.O abuso das melhores coisas já traz, em si, a sua punição,

pelas conseqüências inevitáveis de cada abuso.Já outra é a questão dos sofrimentos que você se imponha,

visando a aliviar o sofrimento de seu próximo. Se você suportar ofrio e a fome para aquecer e alimentar aquele que necessita de aga-salho e de alimento, e se o seu corpo disso se ressentir, você fará osacrifício que é abençoado por Deus.

Você que deixa a sua moradia confortável para ir ao barracoinfeliz, a fim de levar consolação; você que suja as suas delicadasmãos, socorrendo as chagas alheias; você que se priva do sono para

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM136

137CAPÍTULO V

velar na cabeceira de um enfermo que é apenas um seu irmão emDeus; você, enfim, que usa a sua própria saúde para a prática deboas obras – todos vocês já têm, nesses gestos de amor, os sacrifí-cios voluntários abençoados pelo Pai de Misericórdia, porque aalegria do mundo não lhes secou os corações.

Vocês não se entorpecem no seio das volúpias atordoantes dariqueza. Contrariamente a isso, vocês se fizeram Espíritos consoladoresde pobres infelizes.

Você, porém, que se retirou do mundo para evitar as tentaçõese vive isoladamente, que utilidade você tem na Terra? Onde está asua coragem diante das provações, se você foge da luta e abandonao bom combate? Se você quer um sacrifício enobrecedor, antesmortifique a sua própria alma e não a carne. Fustigue o seu orgulho.Receba as humilhações sem se queixar. Mortifique o seu amor-próprio. Faça-se forte diante da dor da injúria e da calúnia, que sãodores mais profundas do que as que alcançam o corpo físico.

Somente aí você tem os verdadeiros sacrifícios voluntários,cujas feridas serão contadas em seu benefício, porque essas feridasatestam a sua coragem e a sua submissão à vontade de Deus. (UmEspírito Protetor, Paris, 1863.)

PÔR FIM NAS PROVAS

27. Pode-se pôr um fim nas provações do próximo, quando issoseja possível, ou devemos, para respeitar os desígnios de Deus, deixarque as provações sigam o seu curso?

Já lhes dissemos, e repetimos muitas vezes, que vocês estãoneste mundo de expiações para concluírem as suas provas. Tambémjá dissemos que tudo o que lhes acontece é uma conseqüência desuas vidas anteriores. Vocês pagam os juros da dívida de amor quetêm a resgatar.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM137

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

138

Colocar um termo nas provações do próximo, contudo, éum pensamento a ser ponderado. Ele provoca, em certas pessoas,resoluções que devemos combater, porque resultam em funestasconseqüências.

Alguns pensam que, já que estamos na Terra para expiações,as provas devem seguir o seu curso. Outros há, tão extremados,que vão além disso, pretendendo não somente fazê-las seguir o seucurso, nada fazendo para atenuá-las, mas ainda querem torná-lasmais vivas, a fim de fazê-las mais proveitosas!

Eis dois grandes erros!É certo que as provações devem seguir o curso que Deus lhes

traçou. Mas, porventura, vocês conhecem qual é o seu curso? Sa-bem vocês, por acaso, até que ponto elas devem ir e se o PaiMisericordioso não terá dito ao sofrimento deste ou daquele deseus irmãos: “Este sofrimento não irá mais longe”? Sabem vocês sea Providência Divina não os escolheu, não como um instrumentode suplício para agravar o sofrimento do culpado, mas como obálsamo da consolação para fazer cicatrizar as chagas que a Justiçaabrira?

Não digam, portanto, quando vocês virem um de seus irmãosem duras provas: “Esta é a justiça de Deus e necessário se faz seguiro seu curso”. Digam, porém, ao invés disso: “Vejamos que meiosmeu Pai Misericordioso me concedeu para abrandar o sofrimentodeste meu irmão. Vejamos se minha consolação moral, meu apoiomaterial, meus conselhos poderão ajudá-lo a transpor esta provacom mais energia, paciência e resignação. Vejamos mesmo se Deusnão me pôs em mim, nas minhas mãos, o meio de fazer cessar estesofrimento. Se Ele não me deu a mim, também como prova, talvezcomo expiação, deter o mal e substituí-lo pela paz”.

Auxiliem-se, pois, em suas respectivas provas. Não seconsiderem instrumentos de tortura. Contra essa idéia de aumentar

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM138

139CAPÍTULO V

o sofrimento do próximo, deve revoltar-se todo homem de bonssentimentos e, principalmente, todo Espírita.

O Espírita, mais do que qualquer outra pessoa, devecompreender a extensão infinita da bondade de Deus. O Espíritadeve pensar que a sua vida inteira tem de ser um ato de amor e deconsagração do bem.

O Espírita deve saber que, por mais que faça para contrariaros desígnios do Senhor, a Justiça Divina seguirá seus próprioscaminhos. Por isso, ele pode, sem receio, empenhar todos os seusesforços para atenuar o amargor da expiação de seu próximo, certode que somente Deus poderá detê-la ou prolongá-la, segundo oque Ele julgue ser melhor para quem sofre.

Não seria um grande orgulho do homem crer-se no direitode, por assim dizer, revolver a arma dentro da ferida? Não lhe seriaa manifestação de um grande orgulho aumentar a dose de venenonas vísceras daquele que já sofre, sob o pretexto de que essa é umaexpiação?

Considerem-se todos, sempre, como um instrumento parafazer cessar a dor. Que os seguintes princípios iluminem seus atos:todos vocês estão na Terra para expiar, mas todos, sem exceção,devem empregar todas as suas energias para abrandar a expiação deseus irmãos, segundo a lei do amor e da caridade. (Bernardino,Espírito Protetor, Bordéus, 1863.)

ABREVIAR A VIDA DE UM DOENTE

28. Um homem agoniza, aprisionado de cruéis sofrimentos. Sabe-se que o seu estado é sem esperanças de recuperação. Será permitidopoupá-lo de alguns instantes de angústias, abreviando-lhe o fim?

Quem lhes daria o direito de prejulgar os desígnios de Deus?Não pode Deus conduzir o homem até a beira de um

precipício, para daí o retirar, a fim de fazê-lo despertar para si mesmo

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM139

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

140

e trazê-lo para outro modo de pensar sobre os valores da verdadeiravida?

A qualquer extremo que chegue uma agonia, ninguém podedizer com absoluta certeza que a derradeira hora lhe é chegada.

A ciência, por acaso, nunca se enganou em suas previsões?Eu bem sei de casos que, com razão, podem ser considerados

desesperadores. Mas, se não há nenhuma esperança de retornodefinitivo para a vida e para a saúde, há também inumeráveisexemplos de, no momento de render-se ao último suspiro, o doentereanimar-se e recobrar as suas faculdades por alguns instantes! Estahora de graça que lhe é concedida, pode ser para ele de grandeimportância. Vocês ignoram as reflexões que pode fazer um Espíritonas convulsões da agonia e de quantos tormentos ele poderá poupar-se com um repentino clarão de arrependimento.

O materialista, que nada vê além do corpo físico e que nãoleva em consideração a existência da alma – esse materialista nãopode compreender estas coisas. Mas o Espírita, que sabe o que sepassa além do túmulo, conhece o valor dos últimos pensamentosde um agonizante.

Abrandem os últimos sofrimentos do enfermo, o quantovocês puderem. Guardem-se, porém, da idéia de abreviar-lhe a vida,mesmo que seja por um minuto, porque esse minuto pode evitarmuitas lágrimas no futuro espiritual daquele que parte. (Luís, Paris,1860.)

SACRIFÍCIO DA PRÓPRIA VIDA

29. Aquele que está aborrecido da vida, mas que não querextingui-la por suas próprias mãos, será culpado de procurar a morteem trabalhos acima de suas forças, com o pensamento de tornar útil asua morte?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM140

141CAPÍTULO V

Que o homem se entregue à morte por si mesmo ou busquea morte por outros meios, a sua finalidade será sempre abreviar asua vida e, por conseqüência, se não há um suicídio de fato, há umsuicídio intencional.

A idéia de que a sua morte servirá a qualquer coisa útil é umailusão. Isso não é mais que um pretexto para dar um coloridodiferente ao seu propósito de extinguir-se, para desculpá-lo diantede seus próprios olhos.

Se ele desejasse seriamente servir a seu próximo, cuidaria dealongar a sua vida. Não procuraria meios de morrer, porque umavez morto dessa forma, já não serve para nada.

O verdadeiro devotamento consiste em não temer a morte,quando se trate de ser útil. A verdadeira abnegação consiste emdefrontar-se com os desafios, aceitando o sacrifício de sua vida, senecessário. Mas a intenção premeditada de buscar a morte, atravésdo desgaste propositado de suas energias, ainda que para prestarserviços, anula todo o mérito de suas atividades. (Luís, Paris, 1860.)

30. Um homem que se exponha a um perigo iminente parasalvar a vida de um de seus semelhantes, sabendo antecipadamenteque sucumbirá, poderá ser considerado como um suicida?

Desde que não haja a intenção de buscar a morte, no seu atonão há suicídio. Há, isto sim, devotamento e abnegação, mesmocom a certeza de perecer.

Quem, porém, poderá ter essa certeza?Quem diz que a Providência Divina não reservará um

inesperado meio de salvação no momento mais crítico?Pode a Providência Divina, muitas vezes, levar a prova da

resignação até o extremo limite do risco da própria vida de quemqueira salvar a um de seus semelhantes, e, então, no último minuto,uma circunstância inesperada desvia o golpe fatal. (Luís, Paris, 1860.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM141

BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS

142

PROVEITO DOS SOFRIMENTOS PARA OUTROS

31. Os que aceitam seus sofrimentos com resignação, pelasubmissão à vontade de Deus e por terem em vista a felicidade futura,não trabalham apenas para si mesmos? Não poderiam tornar seussofrimentos proveitosos para os outros?

Estes sofrimentos podem tornar-se proveitosos para os outros,material e moralmente.

Materialmente serão proveitosos para outros se, pelo trabalho,pelas privações e pelos sacrifícios que se impõem a si mesmos aquelesque sofrem, eles contribuírem para o bem-estar material de seupróximo. Serão proveitosos moralmente, pelo exemplo que dãode sua submissão à vontade de Deus.

O exemplo da força da fé espírita pode induzir os infelizes àresignação, salvando-os do desespero e de suas funestas conseqüênciaspara o futuro. (Luís, Paris, 1860.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM142

143CAPÍTULO V

O JUGO SUAVE

1. Vinde a mim todos vós que estais cansados e oprimidos, e euvos aliviarei. – Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, quesou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para as vossasalmas, porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve. (Mateus,capítulo 11, versículos 28 a 30.)

2. Todos os sofrimentos, misérias, desilusões, dores físicas,perdas dos entes queridos, encontram consolação na fé no futuro, naconfiança na Justiça Divina, que o Cristo veio ensinar aos homens.

Sobre aquela criatura, porém, que nada espera além desta vida, ouque simplesmente duvida do futuro espiritual, as aflições pesam comtoda a força do nada. Nenhuma esperança lhe vem abrandar o amargor.

Foi isso o que levou Jesus a dizer: “Vinde a mim, vós todosque estais fatigados, e eu vos aliviarei”.

Jesus, no entanto, impõe uma condição para dar sua assistênciae para a felicidade que promete aos aflitos. Essa condição está naLei que Ele ensina. Seu jugo suave é a observação dessa Lei.

Mas esse jugo é suave e essa Lei é branda, uma vez que essaLei impõe, como dever, o amor e a caridade.

6

CAPITULO VI

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM143

O CRISTO CONSOLADOR

144

O CONSOLADOR PROMETIDO

3. Se me amardes, guardareis os meus mandamentos. E eurogarei ao Pai e ele vos dará outro Consolador, para que fiqueconvosco para sempre – o Espírito de Verdade, que o mundo nãopode receber, porque não o vê nem o conhece. Mas vós o conheceis,porque habita convosco, e estará em vós. – Mas aquele Consolador,o Santo Espírito, que o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinarátodas as coisas e vos fará relembrar de tudo quanto vos tenho dito.(João, capítulo 14, versículos 15 a 17 e 26.)

4. Jesus promete um outro Consolador: é o Espírito deVerdade, que o mundo ainda não conhece, por não estaramadurecido para compreendê-lo.

Esse Consolador é o que o Pai enviará para ensinar todas ascoisas, e para fazer serem relembrados os princípios que o Cristorevelara. Se, portanto, o Espírito de Verdade deveria vir, mais tarde,ensinar todas as coisas, é porque o Cristo não pudera ensiná-las emseu tempo. Se ele vem relembrar o que o Cristo disse, é porque oque Jesus ensinou foi esquecido ou mal compreendido.

O Espiritismo vem, no tempo assinalado, cumprir a promessado Cristo e o Espírito de Verdade dirige a sua realização. Os ho-mens são chamados à observância da Lei; todas as coisas ensinadaslevam à compreensão do que o Cristo colocou em suas parábolas.

O Cristo dissera: “Ouçam os que têm ouvidos para ouvir”.O Espiritismo vem abrir os olhos e os ouvidos, uma vez que falasem imagens e sem alegorias. Levanta o véu que foi intencionalmentelançado sobre certos mistérios. Vem, enfim, trazer uma supremaconsolação aos deserdados da Terra e a todos os que sofrem, revelandouma causa justa e um fim útil a todas as dores.

Jesus disse: “Bem-aventurados os aflitos, porque eles serãoconsolados”. Como, porém, poderá alguém sentir-se feliz por sofrer,se não sabe por que sofre?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM144

145CAPÍTULO VI

O Espiritismo revela as causas do sofrimento nas existênciasanteriores e na destinação da Terra como um mundo em que ohomem expia o seu passado. Revela, também, o fim útil dossofrimentos, como sendo as crises salutares que induzem à cura ecomo meio de depuração da alma, que lhe assegurará a felicidadenas existências futuras.

O homem compreende, então, que mereceu sofrer e aceita osofrimento por justo. Ele sabe que esse sofrimento é uma alavancapara a sua evolução e o aceita sem queixar-se, como o obreiro aceitao trabalho que lhe assegurará o salário.

O Espiritismo dá ao homem uma fé inabalável sobre o futuro.A dúvida dolorosa não mais lhe assalta a alma. Por permitir-lhe veras coisas do alto, a importância das contrariedades terrestres se per-de diante do vasto e esplendoroso horizonte que o homem passa adescortinar. A perspectiva da felicidade que o espera dá-lhe apaciência, a resignação e a coragem de enfrentar e vencer todos osobstáculos que o desafiem.

O Espiritismo, assim, realiza o que Jesus disse do Consoladorprometido: o conhecimento das coisas, fazendo com que o homemsaiba de onde vem, para onde vai e por que está sobre a Terra. Recordao homem dos verdadeiros princípios da Lei de Deus, da consolaçãopela fé e pela esperança.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:ADVENTO DO ESPÍRITO DE VERDADE

5. Eu venho, como outrora entre os filhos desgarrados deIsrael, trazer a verdade e dissipar as trevas.

Escutem-me!O Espiritismo, como outrora a minha palavra, deve relembrar

aos incrédulos que, acima deles, reina a imutável verdade: o Deus

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM145

O CRISTO CONSOLADOR

146

bom, o Deus grande, que faz germinar a planta e se levantarem asondas dos mares.

Eu revelei a Doutrina Divina. Como ceifeiro, reuni em feixeso bem esparso na Humanidade e disse: “Vinde a mim, vós todosque sofreis!”.

Os homens ingratos, porém, se extraviaram do caminho reto elargo que conduz ao reino do meu Pai, perdendo-se pelas ásperas sendasda impiedade. Meu Pai não quer aniquilar a raça humana. Ele quer quevocês, em se ajudando uns aos outros, mortos e vivos, ou seja, mortossegundo a carne uma vez que a morte não existe, sejam amparados.Não ouvirão novamente as vozes dos profetas e dos apóstolos, mas avoz daqueles que se foram, a clamar: “Orem e creiam! A morte é aressurreição, e a vida é a prova escolhida, durante a qual as virtudes quevocês cultivarem devem crescer e se desenvolver como o cedro”.

Homens fracos, que reconhecem existir sombras em suasinteligências, não afastem a luz que a clemência divina lhes acendenas mãos, para clarear a sua rota e os reconduzir, quais filhos perdidos,ao regaço de seu Pai.

Sinto-me tocado de compaixão pelas suas misérias, pela suaimensa fraqueza, para deixar de estender-lhes a mão em socorro aosinfelizes extraviados que, vendo o céu, caem nos abismos do erro.Creiam, amem, meditem sobre as coisas que lhes são reveladas.

Não misturem o joio com a boa semente, as fantasias com asverdades.

Espíritas! Amem-se, eis o primeiro ensinamento; instruam-se, eis o segundo. Todas as verdades se encontram no cristianismo;os erros que no cristianismo se enraizaram são de origem humana.

Eis que do além-túmulo, que vocês acreditavam vazio, vozesclamam: “Irmãos! Nada perece! Jesus Cristo é o vencedor do mal, sejamvocês os vencedores da impiedade!”. (O Espírito de Verdade, Paris, 1860.)

6. Venho ensinar e consolar os pobres deserdados. Venho dizer-lhes que elevem a sua resignação ao nível de suas provas. Que chorem,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM146

147CAPÍTULO VI

porque a dor foi consagrada no Jardim das Oliveiras. Mas queesperem, porque os Espíritos consoladores virão enxugar suas lágrimas.

Obreiros, tracem o seu sulco. Recomecem no dia seguinte arude jornada da véspera. O labor de suas mãos fornece o pão terrenopara os seus corpos, mas suas almas não estão esquecidas. E eu, odivino jardineiro, cultivo suas almas no silêncio de seuspensamentos. Quando soar o hora de seu repouso, quando a tramada vida escapar-se de suas mãos e seus olhos se fecharem para a luz,vocês sentirão surgir e germinar em seu interior a minha preciosasemente. Nada se perde no Reino de nosso Pai e os seus suores, suasmisérias formam o tesouro que os tornará ricos nas esferas espirituaissuperiores, onde a luz substitui as trevas e onde o mais desnudoentre vocês será talvez o mais resplandecente.

Em verdade lhes digo: aqueles que carregam os fardos de suasprovações e que assistem seus irmãos, são os meus bem-amados.

Instruam-se na preciosa doutrina que dissipa o erro das revoltascontra o Pai e que lhes ensina o objetivo sublime das provaçõeshumanas. Assim como o vento varre a poeira, também o sopro dosEspíritos varrerá seus ciúmes contra os ricos do mundo, que são,muitas vezes, muito miseráveis, porque as provações da riqueza sãomais perigosas do que aquelas que vocês sofrem.

Eu estou com vocês, e meu apóstolo os ensina. Bebam nafonte viva do amor e preparem-se, cativos da vida, a lançarem-seum dia, já livres e alegres, no seio daquele que os criou fracos paraos tornar perfeitos e que deseja que vocês mesmos se modelem, namaleável argila, a fim de que vocês sejam os artesãos de sua própriaimortalidade. (O Espírito de Verdade, Paris, 1861.)

7. Eu sou o grande médico das almas e venho trazer-lhes oremédio que lhes há de curar. Os fracos, os sofredores e os enfermossão meus filhos prediletos e venho salvá-los.

Venham, pois, a mim os que sofrem e que estão sobrecarregadosde aflições e vocês serão aliviados e consolados. Não procurem

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM147

O CRISTO CONSOLADOR

148

noutra parte a força e a consolação, porque o mundo é impotentepara dá-las.

Deus, através do Espiritismo, dirige um supremo apelo aosseus corações. Escutem-no! Que a impiedade, a mentira, o erro, aincredulidade sejam extirpados de suas almas sofridas. Esses sãomonstros que sugam o mais puro de seu sangue e que lhes abremchagas quase sempre mortais. Que no futuro, humildes e submissosao Cristo, vocês pratiquem a sua Lei Divina.

Amem e orem!Sejam dóceis aos Espíritos do Senhor!Invoquem o Pai de Misericórdia do fundo de seu coração. Ele,

então, lhes enviará seu Filho bem-amado, Jesus, para os instruir elhes dizer estas boas palavras: “Eis-me aqui! Eu venho até vocês, porquevocês me chamaram”. (O Espírito de Verdade, Bordéus, 1861.)

8. Deus consola os humildes e dá força aos aflitos que lhepedem. Seu poder sobre a Terra e, por toda parte, ao lado de cadalágrima, colocou um bálsamo que consola.

O devotamento e a abnegação são uma prece permanente etrazem em si um ensinamento profundo. A sabedoria humana residenessas duas qualidades da alma. Possam os Espíritos sofredorescompreender esta verdade, ao invés de se queixarem de suas dores, declamarem contra os sofrimentos morais que, neste mundo, nada maissão que a parte que vocês recebem de herança de seus próprios erros.

Tomem, pois, por símbolo de seus sentimentos estas duasvirtudes: devotamento e abnegação, e vocês terão energia e vitalidade,porque elas resumem todos os deveres que a caridade e a humildadelhes impõem.

O sentimento do dever cumprido lhes dará a paz do espíritoe a resignação. O coração palpita melhor, a alma se asserena e ocorpo já sente desfalecimentos, porque o corpo sofre tanto mais,quanto mais profundamente abalado estiver o espírito. (O Espíritode Verdade, Havre, 1863.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM148

149CAPÍTULO VI

O QUE SE DEVE ENTENDER POR POBRES DEESPÍRITO

1. Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reinodos céus. (Mateus, capítulo 5, versículo 3.)

2. A incredulidade zomba desta máxima: Bem-aventuradosos pobres de espírito, do mesmo modo que tem zombado de outrascoisas que não consegue compreender.

Por pobres de espírito, Jesus não se refere aos tolos, aos homensde pequena inteligência. Refere-se aos humildes, tanto que diz queo reino dos céus é para eles e não para os orgulhosos.

Os homens cultos e inteligentes, segundo o conceito domundo, em geral formam de si próprios uma tão alta opinião, a simesmos atribuem tão alto valor e superioridade, que consideramas coisas divinas indignas de sua atenção. Preocupam-se tanto coma sua própria personalidade que não podem elevar seus pensamentosa Deus.

Essa tendência de crerem-se superiores a tudo, leva-os a negaro que lhes esteja acima, pelo medo de rebaixarem-se. E os leva anegar, também, até mesmo a Divindade.

Se consentem em admitir a Divindade, eles lhe contestamum de seus mais belos atributos: a sua ação providencial sobre ascoisas deste mundo. É que eles estão convencidos de que sãosuficientes para bem governar todas as coisas. Tomando a sua própriainteligência para medida da inteligência universal, eles se julgam

7

CAPITULO VII

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM149

BEM-AVENTURADOS OS POBRES DE ESPÍRITO

150

capazes de tudo compreender e, por isso, não podem crer comosendo possível existir o que eles não conhecem.

Quando esses homens se pronunciam, sobre qualquer coisa,querem seus julgamentos por definitivos, sem nenhuma apelação.

Se se recusam a admitir o mundo espiritual e um poder acimado poder humano, não é que isso lhes esteja fora do alcance. É queo seu orgulho se revolta com a idéia de uma coisa acima da qualnão se possam colocar e que os faria descer alguns degraus de seupedestal.

Eis porque eles somente têm sorrisos de desdém para tudo oque não seja do mundo visível e tangível. Eles se atribuem tantacultura e inteligência, que crer nas coisas boas, segundo eles, é paragente simples. Tomam, pois aqueles que as levam a sério por pobresde espírito.

Entretanto, digam o que disserem, eles terão forçosamentede entrar, como todos os outros, no mundo invisível que tantoironizam. Será lá que os seus olhos se abrirão e eles reconhecerão oerro de suas ironias.

Mas Deus, que é justo, não pode receber da mesma maneiraaquele que desconheceu o seu poder e aquele que humildemente sesubmeteu às suas leis, nem dar-lhes partes iguais.

Em anunciando que o reino dos céus é dos simples, Jesus fazentender que ninguém nele será admitido sem a simplicidade docoração e a humildade do espírito. Ensina, também, que o ignoranteque possui essas qualidades terá preferência sobre o sábio que crêmais em si do que em Deus.

Em todas as circunstâncias, Jesus coloca a humildade nacategoria das virtudes que aproximam a criatura do seu Criador. Ecoloca o orgulho entre os vícios que afastam o homem de Deus. Eisso decorre de uma razão muito natural, visto que a humildade éum ato de ajuste às Leis de Deus, enquanto o orgulho é uma revoltacontra essas mesmas Leis.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM150

151CAPÍTULO VII

Mais vale, portanto, para a felicidade futura do homem, queeste seja pobre de espírito, até como o entende o mundo, mas ricoem qualidades morais.

AQUELE QUE SE ELEVA SERÁ REBAIXADO

3. Naquela mesma hora chegaram os discípulos até Jesus,dizendo: Quem é o maior no reino dos céus? – E Jesus, chamando ummenino, o pôs no meio deles e disse: Em verdade vos digo que, se nãovos converterdes e não vos fizerdes como meninos, de modo algumentrareis no reino dos céus. Portanto, aquele que se torna humildecomo este menino, esse é o maior no reino dos céus. E qualquer um quereceber em meu nome uma criança, tal como esta, a mim me recebe.(Mateus, capítulo 18, versículos 1 a 5.)

4. Então se aproximou dele a mãe dos filhos de Zebedeu, comseus filhos, adorando-o, e fazendo-lhe um pedido. – E ele diz-lhe:Que queres? Ela respondeu: Dize que estes meus dois filhos se assentem,um à tua direita e outro à tua esquerda, no teu reino. – Jesus, porém,respondendo, disse: Não sabeis o que pedis. Podeis vós beber o cáliceque eu hei de beber, e ser batizados com o batismo com que sou batizado?– Dizem-lhes eles: Podemos. – E diz-lhes ele: Não bebereis o meucálice, mas o assentar-se à minha direita ou à minha esquerda não mepertence dá-lo, mas é para aqueles para quem meu Pai o tem preparado.– E, quando os dez ouviram isso, indignaram-se contra os dois irmãos.– Então Jesus, chamando-os para junto de si, disse: Bem sabeis quepelos princípios dos gentios são estes dominados, e que os grandes exercemautoridade sobre eles. Não será assim entre vós. Mas todo aquele quequiser entre vós, fazer-se grande seja vosso serviçal. E, qualquer queentre vós quiser ser o primeiro, seja vosso servo, bem como o Filho dohomem não veio para ser servido, mas para servir, e para dar a suavida em resgate de muitos. (Mateus, capítulo 20, versículos 20 a 28.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM151

BEM-AVENTURADOS OS POBRES DE ESPÍRITO

152

5. Aconteceu num sábado que, entrando ele em casa de um dosprincipais fariseus para comer pão, eles o estavam observando. – Edisse aos convidados uma parábola, reparando como escolhiam osprimeiros assentos, dizendo-lhes: Quando por alguém fores convidadoàs bodas, não te assentes no primeiro lugar, para que não aconteça queesteja convidado outro mais digno do que tu e, vindo o que te convidoua ti e a ele, te diga: “Dá lugar a este” e, então, com vergonha, tenhasde tomar o derradeiro lugar. Mas, quando fores convidado, vai, eassenta-te no último lugar, para que, quando vier o que te convidou,te diga: Amigo, sobe mais acima. Então terás honra diante dos queestiverem contigo à mesa. Porquanto qualquer que a si mesmo se exaltarserá humilhado, e aquele que a si mesmo se humilhar será exaltado.(Lucas, capítulo 14, versículos 1 e 7 a 11.)

6. Estas máximas são a conseqüência do princípio dehumildade que Jesus não cessa de pôr como condição essencial dafelicidade prometida aos eleitos do Senhor. Ele a colocou da seguinteforma: “Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é oreino dos céus”.

Jesus toma uma criança por modelo da simplicidade decoração e diz: “Será o maior no reino dos céus aquele que se humilhare se fizer pequeno como uma criança”. Isso evidencia que o maiorserá aquele que não alimente nenhuma pretensão à superioridadeou à infalibilidade.

A mesma idéia fundamental está nesta outra máxima: “Aqueleque quiser ser o maior, seja o servo de todos”, e, também, nesta outramáxima: “Aquele que se humilha será elevado e aquele que se exaltaserá humilhado”.

O Espiritismo vem consagrar esse princípio pelo exemplorecolhido na própria espiritualidade, mostrando-nos aqueles queforam pequenos na Terra ocupando posições destacadas no mundoespiritual e, também, muitos que foram grandes e poderosos naTerra entre os bem pequenos nesse mundo. E que os primeiros, ao

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM152

153CAPÍTULO VII

morrerem, levaram consigo aquilo que faz a verdadeira grandeza, eque não se perde jamais: as virtudes. Os segundos, porém, tiveramde deixar a grandeza sobre a própria Terra e o que não se leva daqui:a fortuna, os títulos, a glória, a tradição de família.

Estes últimos, não tendo mais que isso, chegam ao mundoespiritual desprovidos de tudo, quais se fossem náufragos que tudoperderam, inclusive as suas próprias roupas. Conservam apenas oorgulho, o que torna a sua nova posição ainda mais humilhante. Éque vêem, acima deles, resplandecentes de glória, aqueles que elesespezinharam sobre a Terra.

O Espiritismo nos mostra uma outra aplicação deste mesmoprincípio nas encarnações sucessivas. Aqueles que mais se elevaramnuma existência, mas que se deixaram dominar pelo orgulho e pelaambição, são conduzidos até o último lugar, numa existência seguinte.

Não procure, pois, os primeiros lugares na Terra, nem secoloque acima de seus semelhantes, se você não quiser ser obrigadoa descer. Procure, contrariamente a isso, o lugar mais humilde emais modesto, porque Deus saberá dar-lhe um lugar mais elevadono céu, se você o merecer.

MISTÉRIOS OCULTOS AOS SÁBIOS E AOSPRUDENTES

Naquele tempo, respondendo Jesus disse: Graças te dou, ó Pai,Senhor do céu e da terra, que ocultaste estas coisas aos sábios eentendidos, e as revelaste aos pequeninos. (Mateus, capítulo 11,versículo 25. )

8. Poderá parecer singular que Jesus renda graças a Deus, porter revelado esses princípios aos simples e aos pequeninos, que são ospobres de espírito, e não os haver revelado aos sábios e aos prudentes,mais capazes, na aparência, de compreendê-los.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM153

BEM-AVENTURADOS OS POBRES DE ESPÍRITO

154

É que devemos entender que os primeiros são os humildes,são os que se rendem às Leis de Deus, e não se consideram superioresa todo mundo. Os segundos são os orgulhosos, envaidecidos como seu conhecimento mundano, que se acreditam prudentes porquenegam a Deus e o tratam de igual para igual, isso quando não serecusam a admitir a sua existência.

Deus deixa, aos segundos, a pesquisa dos segredos da Terra,revelando os segredos do céu aos simples e aos humildes, que seinclinam diante de suas leis.

9. O mesmo ocorre hoje com as grandes verdades reveladaspelo Espiritismo. Certos incrédulos se admiram que os Espíritosquase nenhum esforço fazem para convencê-los. É que os Espíritosse ocupam, de preferência, com aqueles que buscam esclarecer-sede boa fé e com humildade. Preferem a estes do que aqueles que sesupõem na posse de toda a luz e parecem pensar que Deus deveriasentir-se feliz de arrebanhá-los, provando-lhes a sua existência.

O poder de Deus brilha nas pequenas coisas e, também, nascoisas muito grandes. O Pai não coloca a luz sob um apoio, porquea derrama em ondas por todas as partes. Somente os que se fazemcegos não a vêem. Deus não quer, a estes, abrir-lhes os olhos à força,porque eles gostam de tê-los fechados.

A hora, dos que têm os olhos fechados, chegará. Mas é necessárioque antes eles sintam as angústias das sombras e reconheçam nas leisde Deus, e não no acaso, o que lhes fere o orgulho.

Deus emprega, para vencer a incredulidade, os meios que sejammais convenientes, segundo o estágio evolutivo de cada indivíduo.Não será o incrédulo que prescreverá a Deus o que Ele deva fazer. E éesse incrédulo que ainda diz ao Pai: “Se me quiser convencer de suaexistência, faça tal ou tal coisa, em tal momento e não em tal outro,porque esse é o momento de minha maior conveniência”.

Que os incrédulos não se espantem que nem Deus, e nem osEspíritos que são os agentes de sua vontade, não se submetam às

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM154

155CAPÍTULO VII

suas exigências. Que se indaguem o que diriam se o último de seusservidores lhes quisesse fazer imposições.

Deus já criou as suas condições, nas suas Leis, e não se submetea nenhuma outra. Ele escuta com bondade os que a Ele se dirigemcom humildade, e não os que se julgam mais do que Ele.

10. Deus, dir-se-á, não poderia tocar pessoalmente aosincrédulos, através de manifestações espetaculosas, perante as quaiso incrédulo mais endurecido teria de se inclinar? Sem dúvida queEle poderia, mas que méritos teriam eles e para que isso lhes serviria?Não os vemos, todos os dias, recusarem a evidência e até mesmodizerem: “Mesmo vendo eu não acredito, porque eu sei que éimpossível”? Se se recusam a reconhecer a verdade, é porque o seuespírito não está amadurecido para compreendê-la, nem o seucoração em condições de senti-la. O orgulho ainda lhes tapa a visãoe de que vale apresentar a luz a um cego?

Faz-se necessário, antes, curar a causa do mal. Eis porque Deus,como hábil médico, primeiramente lhes confunde o orgulho. OPai não deixa abandonados seus filhos que se perdem pelo orgulho.Sabe que, mais cedo ou mais tarde, seus olhos se abrirão para averdade. Quer, porém, que isso ocorra por um ato da própriavontade desses seus filhos, quando, vencidos pelos tormentos daincredulidade, eles venham, por si mesmos, lançarem-se nos braçosDivinos e, como o filho pródigo, busquem a conciliação paterna.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:O ORGULHO E A HUMILDADE

11. Que a paz do Senhor seja com vocês, meus queridosamigos! Venho até vocês para encorajá-los a seguir o bom caminho.

Aos pobres Espíritos que, outrora, habitaram a Terra, Deusconcedeu a missão de vir esclarecê-los. Bendito seja o Pai da graça

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM155

BEM-AVENTURADOS OS POBRES DE ESPÍRITO

156

que nos dá podermos ajudá-los na evolução. Que o Santo Espírito meilumine e me ajude a tornar minhas palavras compreensíveis e que medê a graça de pô-las ao alcance de todos! Por todos vocês encarnados,que estão em expiação e que buscam a luz, rogo que a bondade deDeus venha em meu auxílio, a fim de que eu possa fazer brilhar essa luzaos seus olhos.

A humildade é uma virtude bem esquecida entre vocês. Osgrandes exemplos de humildade que lhes são dados são bem poucoseguidos. E, no entanto, sem humildade poderão vocês ser caridososcom o seu próximo? De modo algum poderão ser caridosos semhumildade, porque a humildade é o sentimento que revela oshomens espiritualizados. É a humildade que, em nos fazendo ver atodos como iguais, nos leva a sentir-nos como irmãos que se devemajudar mutuamente e juntos encaminhar-nos para o Bem.

Sem humildade, vocês se enfeitam de virtudes que ainda nãopossuem, assemelhando-se às criaturas que vestem algumas roupastão-somente para ocultar as deformidades do corpo. Lembrem-sed’Aquele que nos salva, lembrando-se da humildade que o fez tãogrande e o colocou acima de todos os profetas.

O orgulho é o terrível adversário da humildade.Se o Cristo prometeu o reino dos céus aos pobres é porque

os grandes da Terra imaginam que os títulos e as riquezas sãorecompensas devidas a seu merecimento pessoal e que as suasqualidades são superiores às do pobre. Acreditam que as coisas deque dispõem lhes são devidas e, por isso, quando Deus as retira,acusam-no de injustiça.

Que zombaria e que cegueira!Deus faria, entre vocês, distinção pelos corpos? O envoltório

físico do pobre não é o mesmo que o do rico? Teria feito o Criadorduas espécies de homens?

Tudo o que Deus faz é grande e sábio. Não atribuam aoCriador, jamais, as idéias urdidas pelos seus cérebros orgulhosos.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM156

157CAPÍTULO VII

Rico, enquanto você dorme em moradas confortáveis, ao abrigodas intempéries, você não sabe que milhares de seus irmãos, que valemtanto quanto você, estão em barracos paupérrimos? O infeliz quepassa fome não é um seu irmão em Deus? Sei que, ao ouvir estacomparação, o seu orgulho se revolta! Você concordará em dar umaesmola ao pobre, mas a apertar-lhe a mão fraternalmente, jamais!

– O quê?! – exclamará você. – Eu, nascido de boa família,um dos grandes da Terra, ser igual a um desses miseráveis cobertosde trapos e sujeiras?! Essa é uma vã fantasia de falsos filósofos! Sefôssemos iguais, por que Deus os teria colocado tão abaixo e a mimem tão alta posição?

É verdade que as roupas com que você se veste não seassemelham àquelas que vestem os pobres. Mas se você e o pobre sedespirem, qual a diferença que haverá entre vocês dois? A origemda família, dirá você em resposta. Mas a química não descobrenenhuma diferença entre o sangue de quem vem da raiz de umafamília abastada e o do último do miseráveis; entre o sangue doempregador e o sangue do empregado.

Quem lhe diz que, também, você não foi tão pobre e infelizquanto ele? Que também não haja você pedido esmolas? Que nãopedirá, um dia, favores a esse mesmo que hoje você despreza?

As riquezas, porventura, são eternas? Se não antes, nãoterminam todas as riquezas com o próprio corpo físico, revestimentoperecível de seu Espírito?

Revista-se de humildade!Somente sob a luz da humildade os seus olhos se abrirão para

a realidade das coisas deste mundo, permitindo-lhe compreenderquais as que fazem a grandeza da alma e quais as que levam àhumilhação.

Reflita que a morte não poupará você, como não poupa anenhum outro homem. O seu renome não o preservará dela. Amorte poderá buscá-lo amanhã, hoje mesmo, a qualquer hora, e se,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM157

BEM-AVENTURADOS OS POBRES DE ESPÍRITO

158

quando ela chegar, você estiver amortalhado em seu orgulho, quantolamentarei, pois que você será digno de compaixão!

Orgulhosos! Que eram vocês antes do renome de família ede serem poderosos? Talvez vocês estivessem abaixo de seusempregados! Curvem, portanto, as suas cabeças altivas, porque Deuspode fazê-las rebaixarem-se justo no momento em que vocês aselevarem mais.

Todos os homens são iguais na Balança Divina. Somente asvirtudes os diferenciam aos olhos de Deus. Todos os espíritos sãoda mesma essência. Todos os corpos são feitos da mesma massa.Suas posições sociais e seus nomes, em nada modificam seu Espíritoe seu corpo. O que é da terra permanecerá no túmulo e não será oque fica no túmulo que lhes dará a felicidade prometida aos eleitos.

A caridade e a humildade são os únicos títulos de nobrezaespiritual.

Pobre criatura! Você é mãe, seus filhos sofrem! Eles sentemfrio; eles sentem fome! Você vai, curvada sob o peso de sua cruz,humilhar-se para conseguir um pedaço de pão para eles. Oh! Curvo-me diante de você! Quanto você é nobremente santa e grande aosmeus olhos! Espere e ore! A felicidade ainda não é deste mundo!Aos pobres oprimidos pelas aflições, mas confiantes em Deus, serádado o Reino dos céus.

E você, jovem menina, pobre criança muito cedo lançada emrudes trabalhos e a duras privações, por que estes tristes pensamentos?Por que você chora? Que seus olhos se elevem, piedosos e serenos,para o Pai Celestial, porque até aos pequeninos pássaros Ele dá oalimento. Tenha confiança na Providência Divina, que não aabandonará jamais. O ruído das festas, dos prazeres do mundo, fazbater o seu coração, bem o sei. Você desejaria vestir-se bem e viverentre os felizes da terra. Você diz que, como as demais mulheresque você vê passar despreocupadas e risonhas, você poderia ser ricatambém! Oh! Cale-se, criança! Se você soubesse quantas lágrimas e

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM158

159CAPÍTULO VII

dores se ocultam debaixo dessas roupas, quantos suspiros dolorosossão abafados debaixo dessa alegria ruidosa, você preferiria a suahumilde casinha e a sua pobreza. Conserve-se pura aos olhos deDeus, se você não quiser que o Espírito Benevolente que a protegesaia de seu lado e retorne ao seio do Senhor, deixando-a só, entreguea seus remorsos, sem orientação, sem amparo neste mundo, ondevocê ficará desorientada, e aguardando sofrer ainda mais na vidaespiritual.

Todos vocês que sofrem as injustiças dos homens, sejamindulgentes para com as faltas de seus irmãos. Lembrem-se de quevocês mesmos não estão isentos de erro. A indulgência é caridade,mas também é humildade.

Se vocês sofrem pelas calúnias, curvem suas cabeças diantedessa prova. Que lhes importa a calúnia do mundo? Se a sua condutaé pura e reta, Deus não poderá lhes recompensar? Suportar comcoragem as humilhações impostas pelos homens é ser humilde e,com isso, reconhecerão que somente Deus é grande e todo-poderoso.

Oh, meu Deus! Será preciso que o Cristo venha uma segundavez sobre a terra, para que os homens aprendam as leis que elesesqueceram? Deverá Jesus novamente expulsar os vendilhões dotemplo, que maculam a casa que é unicamente de orações? E quemsabe, ó homens, se Deus lhes conceder esta graça, se vocês nãorenegarão de novo a Jesus, como fizeram outrora? Se vocês não oacusariam de blasfemador porque Ele abateria o orgulho dos fariseusmodernos? É bem possível que, inclusive, vocês o obrigassem arefazer o caminho do Gólgota!

Quando Moisés foi ao Monte Sinai receber os mandamentosde Deus, o povo de Israel, entregue a si mesmo, abandonou overdadeiro Deus. Homens e mulheres entregaram ouro e jóias, paraser feito um ídolo que eles adoraram.

Homens de hoje, vocês fazem o mesmo que esses israelitas!

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM159

BEM-AVENTURADOS OS POBRES DE ESPÍRITO

160

O Cristo lhes legou uma doutrina, deu-lhes o exemplo detodas as virtudes e vocês abandonaram exemplos e preceitos. Cadaum de vocês, juntando as suas paixões criou um deus de acordocom a sua vontade: segundo uns, um deus terrível e sanguinário;segundo outros, um deus desinteressado das coisas do mundo. Odeus que vocês criaram é, ainda, o bezerro de ouro, que cada umapropria a seu gosto e às suas idéias.

Despertem, meus irmãos, meus amigos!Que a voz dos Espíritos lhes toque os corações.Sejam generosos e caridosos sem ostentação, ou seja, façam o

bem com humildade. Que cada um vá demolindo, pouco a pouco,os altares que vocês mesmos edificaram para o orgulho. Em resumo,conclamo-os para que sejam verdadeiramente cristãos e vocêsalcançarão o reino da verdade.

Não duvidem da bondade de Deus, no momento em queEle dá tantas provas de sua misericórdia. Viemos preparar oscaminhos para que as profecias se cumpram. Quando o Senhorlhes der uma manifestação mais esplendente de sua clemência, possao enviado celeste os encontrar formando uma grande família; queos seus corações dóceis e humildes sejam dignos de entender a palavradivina que ele lhes vem trazer; que o eleito não encontre sobre o seucaminho senão as flores que aí vocês depositaram, para o seu retornoao bem, à caridade, à fraternidade e, então, a Terra se tornará umparaíso.

Mas, se vocês permanecerem insensíveis à voz dos Espíritosenviados para purificar e renovar a sociedade civilizada de vocês,rica em conhecimentos e tão pobre de bons sentimentos, ah! entãonada mais nos restará do que chorar e gemer pelo destino de vocês.

Mas não, assim não será!Voltem-se para Deus, seu Pai, e, então, nós todos, que hou-

vermos sido instrumentos do cumprimento da Vontade Divina,entoaremos o cântico de gratidão ao Senhor, para agradecer pela

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM160

161CAPÍTULO VII

sua inesgotável bondade e para glorificá-lo por todos os séculos dosséculos. Assim seja. (Lacordaire, Constantina, 1863.)

12. Homens, por que se queixar das calamidades que vocêsmesmos amontoaram sobre as suas cabeças? Vocês desprezaram asanta e divina moral do Cristo. Não se espantem, pois, de que ataça da iniqüidade tenha transbordado por todos os lados.

O mal-estar generaliza-se! A quem transferir a culpa, se essemal se deve a vocês mesmos, que se aniquilam uns aos outros?Vocês não podem ser felizes, se não quiserem fazer o bem mutua-mente. Mas como a benevolência pode existir juntamente com oorgulho? O orgulho, eis aí a origem de todos os seus males.Apliquem-se, pois, em combatê-lo, se não quiserem perpetuar assuas funestas conseqüências.

Um único meio se oferece a vocês para destruir o orgulho,mas, embora único, é infalível. É tomarem por regra invariável deconduta a lei do Cristo, lei essa cuja interpretação vocês têm rejeitadoou falseado.

Por que vocês gostam tanto do que brilha e encanta os olhos,em lugar daquilo que toca o coração? Por que buscam tanto osvícios que nascem da opulência, enquanto vocês somente têm umolhar de desdém para o que é verdadeiramente meritório, mas quese oculta na humildade?

Quando um rico debochado, perdido de corpo e alma, seapresenta em qualquer parte, todas as portas se lhe abrem, todas asatenções se centralizam nele, enquanto vocês mal se dignam concederum gesto de proteção ao homem de bem, que vive de seu trabalho.

Quando a consideração que se concede às pessoas é medidapelo dinheiro que elas possuem ou pelo nome que trazem, queinteresse elas podem ter em se corrigir de seus defeitos morais?

Diferente seria, no entanto, se o vício dourado fosse rejeitadopela opinião geral dos homens, tanto quanto se tem rejeitado o

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM161

BEM-AVENTURADOS OS POBRES DE ESPÍRITO

162

vício em farrapos. Mas o orgulho é indulgente para com tudo oque lhe agrada.

Século de cupidez e de dinheiro, dizem vocês. Sem dúvida,mas por que vocês deixaram que as necessidades materiais setornassem mais importantes que o bom senso e a razão? Por quecada um há de querer colocar-se acima de seu irmão?

A sociedade sofre, de repente, as conseqüências dessasequivocadas noções de valores.

Não esqueçam, portanto, que esse estado de valores trocadosé um sinal de decadência moral. Quando o orgulho atinge seuslimites extremos, esse é o indicador de uma queda próxima. A Leide Deus nunca deixa os soberbos livres de conseqüências dolorosas.

Se lhes é permitido subir ao máximo do orgulho, é para quetenham tempo de refletir e de emendar-se sob os golpes que, detempo em tempo, a soberba sofre como advertência. Mas, ao invésde descerem de seu pedestal, eles se revoltam nas horas dos reveses.Então, quando a reflexão não lhes é suficiente para buscarem ahumildade, as reações dolorosas de sua conduta doentia os abateminteiramente. E a queda deles é de resultados tanto mais funestos,quanto mais alta tenha sido a posição que os orgulhosos alcançaram.

Pobre raça humana! O egoísmo lhe corrompeu todos oscaminhos! Tome novamente coragem, apesar de tudo! Na suamisericórdia infinita, Deus lhe envia um remédio eficaz para osseus males, um socorro inesperado para a sua aflição.

Abra os olhos para a luz!Eis aqui as almas dos que se foram e que voltam do mundo

espiritual para tornar a chamar os homens para os seus verdadeirosdeveres. Essas almas lhe dirão, com a autoridade da experiência,quanto as vaidades e as grandezas de sua existência transitória sãocoisas sem significação diante da eternidade. Essas almas lhes dirãoque, na espiritualidade, o maior é aquele que foi mais humildeentre os pequeninos da Terra; que aquele que mais amou seus irmãos

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM162

163CAPÍTULO VII

é o que será o mais amado no céu; que os poderosos da Terra, queabusaram de sua autoridade, terão as lições ásperas, a fim deaprenderem a servir; que a caridade e a humildade, essas duas irmãsque caminham de mãos dadas, são as qualidades mais eficazes paraobter-se a graça diante do Pai Eterno. (Adolfo, bispo de Argel,Marmande, 1862.)

MISSÃO DO HOMEM INTELIGENTE NA TERRA

13. Não se orgulhem do que vocês conhecem, porque esseconhecimento tem limites bem estreitos no mundo em que vocêshabitam. Mesmo supondo que sejam extremamente inteligentesneste planeta, vocês não têm o direito de se envaidecerem.

Se Deus, nos seus desígnios, fez vocês nascerem num meioque lhes favoreceu o desenvolvimento da sua inteligência, foi porquerer que vocês a usassem para o bem de todos. Essa é a missãoque Ele lhes dá, colocando-lhes nas mãos o instrumento certo, como qual vocês podem fazer evoluir, ao seu derredor, as inteligênciasque ainda estão germinando, e conduzi-las a Deus.

A natureza de um instrumento já não está a indicar o uso quese deve fazer dele? A enxada que o agricultor entrega às mãos de seuajudante, não lhe mostra que ele deve cavar? E que dirão vocês, seesse ajudante, ao invés de empregá-la no seu trabalho, levantasse aenxada para ferir o agricultor? Vocês diriam, por certo, que isso éuma conduta horrível e que o ajudante deveria ser destituído de seucargo.

A conclusão é certa!Não se dá o mesmo, portanto, com aqueles que se servem de

sua inteligência para destruir a idéia de Deus e da Providência Divinaentre os seus irmãos? Não levantam esses, contra o seu Senhor, oinstrumento que lhes foi dado para revolver o terreno de outras

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM163

BEM-AVENTURADOS OS POBRES DE ESPÍRITO

164

inteligências? Terá esse, que tão equivocadamente procede, direitoao salário prometido? Ou não merece, ao contrário, ser expulso desua missão? Por mau uso, ele será desligado de sua tarefa, não hádúvida alguma, e arrastará existências dolorosas, repletas dehumilhações, até se que integre nas Leis d’Aquele a quem tudo deve.

A inteligência é rica de méritos para o futuro, mas sob acondição de bem empregá-la na edificação dos mais carentes. Setodos os homens que dela são bem dotados a utilizassem segundoos desígnios de Deus, a tarefa dos Espíritos seria mais fácil, parafazer evoluir a humanidade.

Infelizmente, porém, muitos transformaram a inteligênciaem instrumento do orgulho e de perdição para si próprios. Ohomem abusa da sua inteligência, como tem abusado de todas assuas outras faculdades, mas não lhe faltam ensinamentos que oadvirtam de que uma poderosa mão lhe pode retirar aquilo que lheconcedeu. (Fernando, Espírito Protetor, Bordéus, 1862.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM164

165CAPÍTULO VII

DEIXAI VIR A MIM OS PEQUENINOS

1. Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão aDeus. (Mateus, capítulo 5, versículo 8.)

2. E traziam meninos para que os tocasse, mas os discípulosrepreendiam aos que os traziam. Jesus, porém, vendo isto, indignou-se, e disse-lhes: Deixai vir a mim os pequeninos, e não os impeçais,porque deles é o reino de Deus. Em verdade vos digo que qualquerum que não receber o reino de Deus como uma criança, de maneiranenhuma entrará nele. E, tomando-os nos seus braços, e impondo-lhes as mãos, os abençoou. (Marcos, capítulo 10, versículos 13 a 16.)

3. A pureza do coração é inseparável da simplicidade e dahumildade. Ela exclui toda idéia de egoísmo e de orgulho. Por issoé que Jesus toma a infância por modelo dessa pureza, da mesmaforma que já a tomara por símbolo da humildade.

Esta comparação poderia parecer não muito ajustada, se seconsiderar que o Espírito da criança pode ser muito antigo e que eletraz, ao renascer na vida corpórea, as imperfeições de que não setenha despojado nas suas existências anteriores. Somente um Espíritoque alcançou a perfeição nos poderia oferecer o modelo da verdadeirapureza. A comparação, no entanto, é exata do ponto de vista davida presente. A criança, enquanto criança, ainda não tendomanifestado nenhuma má tendência, oferece-nos a imagem dainocência e da candura. Daí Jesus não ter dito de uma maneira

8

CAPITULO VIII

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM165

BEM-AVENTURADOS OS PUROS DE CORAÇÃO

166

absoluta que o reino de Deus é para elas, mas para aqueles que a elasse assemelharem.

4. Se o espírito que anima o corpo de uma criança já viveuantes por que não se mostra, desde o nascimento, tal como ele é?

É que tudo é sábio nas obras de Deus.A criança necessita de cuidados delicados que só a ternura

maternal lhe pode dispensar. E essa ternura cresce quanto mais acriança seja frágil e ingênua. Para uma mãe, seu filho é sempre umanjo. Essa idéia de angelitude é necessária para atrair os cuidadosmaternos.

A mãe não poderia tratá-la com a mesma singeleza se, em vezde graça ingênua, divisasse, sob os traços infantis, um homem entrea adolescência e a velhice, com as idéias comuns dessa idade e, menosainda, se lhe conhecesse o passado.

É necessário, também, que a atividade do princípio inteligenteseja moderada na criança, aumentando tão-somente na medida emque o corpo se desenvolve. O corpo de uma criança não poderiaresistir a uma atividade muito grande do Espírito, como se verificanas pessoas precoces. É por isso que, ao aproximar-se da encarnação,o Espírito cai num estado de perda de consciência de si mesmo.Estará ele, durante um certo tempo, numa espécie de sono, duranteo qual todas as suas faculdades mantêm-se em estado latente.

Esse estado transitório é necessário para dar ao Espírito querenasce um novo ponto de início de vida. Assim é que esquecerá,durante a sua nova existência terrena, as coisas que poderiamembaraçá-lo nesse novo estágio evolutivo. Seu passado, no entanto,embora adormecido, reage sobre ele. Renasce, pois, para uma vidasuperior, mais forte moral e intelectualmente, alimentado esecundado pela vaga intuição que conserva das experiências adquiridasnas vidas anteriores.

A partir do nascimento, suas idéias anteriores gradualmentetomam de novo seu impulso, à medida que os órgãos se

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM166

167CAPÍTULO VIII

desenvolvem. Por isso, pode-se dizer que, no tempo de seusprimeiros anos de nova existência, o Espírito é verdadeiramentecriança, porque as idéias que formam o fundo de seu caráter estãoadormecidas.

Durante o tempo em que os seus instintos estão adormecidos,o Espírito é mais dócil e, por isso mesmo, mais acessível àsinfluências do meio que podem modificar a sua natureza e fazê-loevoluir, o que torna mais fácil a tarefa atribuída aos seus pais.

O Espírito se reveste, por algum tempo, da roupagem dainocência e, por tal razão, Jesus está com a verdade quando, apesarda anterioridade da alma, Ele toma a criança por símbolo da purezae da simplicidade.

PECADO POR PENSAMENTOS.ADULTÉRIO

5. Ouvistes que foi dito aos antigos: Não cometerás adultério. –Eu, porém, vos digo que qualquer que atentar numa mulher para acobiçar, já em seu coração cometeu adultério com ela. (Mateus, capítulo5, versículos 27 e 28.)

6. A palavra adultério, aqui, não deve ser entendida no sentidoexclusivo de sua acepção própria. Deveremos torná-la num sentidomais geral. Jesus, muitas vezes, a empregou de um modo maisamplo, para designar o mal, o erro moral e todos os mauspensamentos. Um exemplo desse emprego amplo está nestapassagem: “Porquanto, qualquer que, entre esta geração adúltera epecadora, se envergonhar de mim e de minhas palavras, também oFilho do homem se envergonhará dele, quando vier na glória deseu Pai, acompanhado dos santos anjos”. (Marcos, capítulo 8,versículo 38.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM167

BEM-AVENTURADOS OS PUROS DE CORAÇÃO

168

A verdadeira pureza não está somente nos atos. Está, também,no pensamento, porque aquele que tem puro o coração, nem sequerpensa no mal. Foi isso que Jesus quis dizer. Ele condena a quedamoral, mesmo quando ocorra no campo do pensamento, porque éum sinal de impureza espiritual.

7. Este princípio leva-nos naturalmente para a seguintequestão: Sofrem-se as conseqüências de um mau pensamento que nemsequer se tornou um ato?

Façamos, aqui, uma importante distinção. À medida que aalma engajada no mau caminho avança na vida espiritual, ela se vaiesclarecendo e se despojando, pouco a pouco, de suas imperfeições,segundo a maior ou menor boa vontade que demonstre, em virtudede seu livre-arbítrio. Todo mau pensamento é, portanto, o resultadoda imperfeição moral da alma. Mas, de acordo com o desejo queela tenha de depurar-se, até este mau pensamento se torna para elaum motivo de evolução, porque o repele com energia. Esta suareação é o indicador de que ela localiza em si uma mancha e seesforça por apagá-la. Ela não cederá à queda moral, se se apresentara ocasião de satisfazer a um mau desejo. Depois de ter resistido aum mau pensamento, ela se sentirá mais forte e contente com a suavitória sobre si mesma.

Aquela que, ao contrário, não tomou boas decisões morais,procura a oportunidade de praticar o mau ato e, se não o fizer, nãoterá sido por força de sua vontade, mas por falta de ocasião que lhefavorecesse os maus propósitos. Ela é, assim, tão culpada quanto seo tivesse praticado.

Em resumo, na pessoa que não cria sequer a idéia do mal, oprogresso está realizado. Naquela em que surge o pensamento domal, mas que o repele, o progresso está em vias de realizar-se.Naquela outra, porém, que pensa no mal e se alimenta dessa idéia,o mal ainda existe em toda a sua plenitude.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM168

169CAPÍTULO VIII

Nas primeiras dessas pessoas a evolução está realizada e, nasdemais, a evolução moral está por fazer-se. Deus, que é justo, levaem conta todas essas diferenças delicadas de conduta mental naresponsabilidade dos atos e das idéias do homem.

VERDADEIRA PUREZA.MÃOS NÃO LAVADAS

8. Então chegaram ao pé de Jesus uns escribas e fariseus deJerusalém, dizendo: Por que transgridem os teus discípulos a tradiçãodos anciãos? Pois que não lavam as mãos quando comem pão. – Ele,porém, respondendo, disse-lhes: Por que transgredis vós, também, omandamento de Deus pela vossa tradição? Porque Deus ordenou,dizendo: “Honra a teu pai e a tua mãe e quem maldisser ao pai ou àmãe, morra de morte”. Mas vós dizeis: “Qualquer um que disser aopai ou a mãe: ‘É oferta ao Senhor o que poderias aproveitar de mim’esse não precisa honrar nem a seu pai e nem à sua mãe”.

E assim invalidastes, pela vossa tradição, o mandamento deDeus.

Hipócritas, bem profetizou Isaías a vosso respeito, dizendo: ‘Estepovo se aproxima de mim com a sua boca e me honra com os seuslábios, mas o seu coração está longe de mim. Mas, em vão me adoram,ensinando doutrinas que são preceitos dos homens’.

E Jesus, chamando a si a multidão, disse-lhes: ‘Ouvi e entendei:O que contamina o homem não é o que entra pela boca, mas o que saida boca, isso é o que contamina o homem’.

Então, acercando-se dele os seus discípulos, disseram: Sabes queos fariseus, ouvindo essas palavras, se escandalizaram? – Ele, porém,respondendo, disse: Toda a planta, que meu Pai celestial não plantou,será arrancada. Deixai-os ir, porque são condutores cegos. Ora, se umcego guiar outro cego, ambos cairão na cova.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM169

BEM-AVENTURADOS OS PUROS DE CORAÇÃO

170

E Pedro, tomando a palavra, disse-lhe: Explica-nos essa parábola.Jesus, porém, disse: Até vós mesmos estais ainda sem entender?

Ainda não compreendeis que tudo o que entra pela boca desce para oventre, e é lançado fora? Mas, o que sai da boca procede do coração eisso contamina o homem. Porque do coração procedem os mauspensamentos, mortes, adultérios, prostituição, furtos, falsos testemunhose blasfêmias. São estas coisas que contaminam o homem; mas comersem lavar as mãos, isso não contamina o homem. (Mateus, capítulo15, versículos 1 a 20.)

9. E, estando ele ainda falando, rogou-lhe um fariseu que fossejantar com ele. E, entrando, assentou-se à mesa. Mas o fariseu admirou-se, vendo que não se lavara antes de jantar. E o Senhor lhe disse:Agora vós, os fariseus, limpais o exterior do copo e do prato, mas o vossointerior está cheio de rapina e maldade. Loucos! Quem fez o exteriornão faz também o interior? (Lucas, capítulo 11, versículos 37 a 40.)

10. Os judeus haviam negligenciado os verdadeiros mandamentosde Deus, por estarem aprisionados à prática de regras estabelecidaspelos homens. Da rígida observação dessas regras humanas, elesfaziam casos de consciência. O sentido verdadeiro dos mandamentosde Deus, muito simples, acabara por desaparecer debaixo dacomplicação das regras criadas pelo farisaísmo.

Por ser mais fácil praticar atos exteriores do que reformar-semoralmente, por ser mais fácil lavar as mãos do que limpar seuscorações, os homens se iludiam a si mesmos, crendo-se quites com aJustiça Divina, porque praticavam o ato exterior de lavar as própriasmãos, mantendo o restante de si o que em si já era, porque lhesensinavam que Deus não lhes exigia mais do que isso.

Em razão dessas falsas purezas é que o profeta disse: “É emvão que este povo me honra com os lábios, ensinando máximas eordenações humanas”.

Fez-se o mesmo com a doutrina moral do Cristo, que acabousendo relegada a um segundo plano, o que faz que muitos cristãos,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM170

171CAPÍTULO VIII

a exemplo dos antigos judeus, creiam que sua salvação está maisassegurada pelas práticas de atos exteriores do que pela prática dosprincípios morais ensinados por Jesus. É a esses acréscimos feitospelos homens à Lei de Deus, que Jesus se refere, quando diz: “Todaplanta que meu Pai Celestial não plantou, será arrancada”.

A finalidade da religião é fazer o homem voltar-se para Deus.O homem, porém, não se volta para Deus enquanto não se

fizer perfeito. Em decorrência, toda religião que sirva de anteparopara o homem fazer o mal é falsa ou está sendo falseada nos seusfundamentos.

Esse é, inclusive, o resultado de todas as religiões que dão àspráticas exteriores mais importância do que à sua base moral.

A crença na eficiência dos rituais exteriores é nula, se nãoimpedem os assassínios, os adultérios, a apropriação de coisas porfraude ou violência, as calúnias levantadas, o mal feito ao próximoseja qual for. Religiões, assim, fazem supersticiosos, hipócritas efanáticos, mas não fazem homens de bem.

Não basta ter aparência de pureza. Acima de tudo é necessárioter a pureza do coração.

CORTAR A MÃO

11. Mas, qualquer um que escandalizar um destes pequeninos,que crêem em mim, melhor seria que se pendurasse ao seu pescoçouma pedra de moinho, e se submergisse na profundeza do mar. Ai domundo, por causa dos escândalos, porque é mister que venham escândalos,mas ai daquele homem por quem o escândalo vem! – Portanto, se atua mão ou o teu pé te escandalizar, corta-o, e atira-o para longe de ti.Melhor te é entrar na vida coxo, ou aleijado, do que, tendo as suasmãos ou os dois pés, seres lançado no fogo eterno. – E se teu olho teescandalizar, arranca-o, e atira-o longe de ti. Melhor te é entrar na

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM171

BEM-AVENTURADOS OS PUROS DE CORAÇÃO

172

vida com um só olho, do que tendo dois olhos, seres lançado no fogo doinferno. (Mateus, capítulo 18, versículos 6 a 11 e capítulo 5, versículos29 e 30.)

12. No sentido comum, escândalo é toda ação do homemque choca à moral e aos bons costumes de um modo ostensivo. Oescândalo não está no próprio ato, mas nas repercussões que esseato possa ter.

A palavra escândalo implica sempre idéia de um certo tumulto.Muitas pessoas se contentam de evitar o escândalo, porque o seuorgulho sofreria com o alarido e o seu conceito pessoal seriadiminuído entre os homens. Desde que, porém, as suas torpezassejam ignoradas, isso lhes será suficiente para tranqüilizar-lhes aconsciência. Esses são, segundo as palavras de Jesus, “os túmulosbrancos por fora, mas cheios de podridões por dentro; os vasoslimpos por fora, mas sujos por dentro”.

No sentido evangélico, a acepção da palavra escândalo, tãofreqüentemente empregada, é muito mais generalizada. Por esteseu emprego é que, por vezes, não é compreendido o seu significadoem certas passagens dos Evangelhos.

Escândalo não é somente o que fere a consciência dos outros,mas também tudo o que resulta dos vícios e das imperfeiçõeshumanas. É toda reação má de um indivíduo para com outro, comou sem repercussões. O escândalo, neste caso, é o resultado efetivodo mal moral.

13. É necessário que haja escândalo no mundo, disse Jesus,porque na Terra os homens são imperfeitos, são inclinados a fazer omal e as árvores más somente dão maus frutos. Devemos, portanto,entender por estas palavras que o mal é uma conseqüência daimperfeição dos homens e não que os homens tenham a obrigaçãode praticar o mal.

14. É necessário que o escândalo venha, porque os homens,estando em expiação na Terra, punem-se a si mesmos pelo contato

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM172

173CAPÍTULO VIII

de seus próprios vícios. Resulta daí serem eles as suas primeirasvítimas e cujas inconveniências terminam por admitir. Aqueles queestiverem cansados de sofrer, devido ao mal, procurarão o remédiona vivência do bem.

A reação dos vícios sobre os homens serve, portanto, ao mesmotempo de expiação para uns e de provações para outros. É assim quese faz sair o bem do próprio mal e que os homens aproveitam ascoisas más e desagradáveis para precipitar a sua evolução.

15. Se é assim, você dirá: o mal é necessário e perdurará parasempre, uma vez que se viesse a desaparecer Deus ficaria privado deum poderoso meio de corrigir os que erram. E você aindacomplementará, dizendo: é inútil cuidar de melhorar os homens.

Mas, diremos nós, se não houver culpados, não haveránecessidade de dores. Supondo uma Humanidade toda transformadaem homens de bem, com nenhum homem querendo fazer mal aseu próximo, todos seriam felizes, porque todos seriam bons.

Esse é o estado dos mundos evoluídos, de onde o mal foiexcluído. E esse será o estado da Terra, quando os que nela encarnamhouverem evoluído suficientemente.

Mas, enquanto certos mundos avançam, outros são formados.Povoam-se de Espíritos primitivos, e servirão, também, dehabitação, de exílio e de lugar de expiação para os Espíritosimperfeitos, para os rebeldes e para os obstinados no mal, rejeitadostodos eles pelos mundos que se tornaram felizes.

16. Mas ai daqueles por quem vem o escândalo. Isto quer dizerque o mal sendo sempre o mal, aquele que serviu, sem o saber, deinstrumento para a Justiça Divina, cujos maus instintos foramutilizados, nem por isso deixou de fazer o mal e pelo mal expiaráseus erros.

É assim, por exemplo, que um filho ingrato é uma expiaçãoou uma provação para o pai que o suporta. Esse pai talvez tenhasido um mau filho que fez sofrer a seu pai. Agora ele sofre a pena de

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM173

BEM-AVENTURADOS OS PUROS DE CORAÇÃO

174

talião. Mas o filho não está justificado por isso e deverá, a seu turno,sofrer através de seus próprios filhos ou de uma outra maneira.

17. Se vossa mão é causa de escândalo, cortai-a. Esta figuraenérgica é, certamente, alegórica. Seria um absurdo tomá-la ao péda letra. Ela significa simplesmente que devemos destruir em nósmesmos todas as causas de escândalos, ou seja, todas as causas domal. Deve-se arrancar do coração todo sentimento impuro e todatendência viciosa. Em sentido figurado, quer dizer que vale maispara um homem evoluir sem uma das mãos, do que esta ser oinstrumento de uma ação má. Vale mais ficar sem a vista, do queseus olhos lhe servirem para conceber maus pensamentos.

Jesus nada disse de absurdo, para aquele que compreender osentido alegórico e profundo de suas palavras. Muito do que oSenhor disse, porém, não pode ser compreendido sem a chaveoferecida pelo Espiritismo.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:DEIXAI QUE VENHAM A MIM AS CRIANCINHAS

18. O Cristo disse: “Deixai que venham a mim as criancinhas”.Essas palavras profundas em sua simplicidade, não continham

apenas um apelo dirigido às crianças, mas também um chamamentoàs almas que se movem nas regiões menos felizes onde a dordesconhece a esperança.

Jesus chamou a si a infância intelectual da criatura humana: osfracos, os escravizados ao mal, os viciados de todas as procedências. OMestre nada poderia ensinar à infância física, aprisionada ao corpo carnal,submisso ao jugo do instinto, ainda não reintegrada no domínio darazão e da vontade, que se exercem em torno dela e por ela.

Jesus queria que os homens viessem a Ele com a confiançadesse pequeninos seres de passos vacilantes, cujo chamamento lhe

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM174

175CAPÍTULO VIII

conquistaria o coração de todas as mães. Ele, assim fazendo,submetia as almas à sua terna e misteriosa autoridade.

Jesus foi o sol que iluminou as trevas; o clarão matinal quechama ao despertar. Foi Ele o iniciador do Espiritismo que, por suavez, atrairá para Jesus não apenas as criancinhas, mas todos homensde boa vontade.

A ação vigorosa está iniciada.Já não se trata de crer instintivamente e obedecer maquinalmente.

É necessário que o homem siga a lei inteligente que lhe revela a suauniversalidade.

Meus bem-amados, eis chegados os tempos em que os erros,explicados, se transformarão em verdades. Nós lhes ensinaremos osentido exato das parábolas. Nós lhes mostraremos a grande correlaçãoque existe entre o que foi e o que será.

Eu lhes digo em verdade: a manifestação espírita amplia ohorizonte e eis aqui o seu enviado, que vai resplandecer como o Solsobre o cume dos montes. (João, o Evangelista, Paris, 1863.)

19. Deixai que venham a mim as criancinhas, porque eu tenhoo leite que alimenta os fracos. Deixai que venham a mim aquelesque, tímidos e débeis, necessitam de amparo e consolação. Deixaivenham a mim os que ignoram, para que eu os esclareça. Deixaivenham a mim todos os que sofrem, a multidão dos aflitos e dosinfelizes, que eu lhes ensinarei o sublime remédio para suavizar osmales da vida; eu lhes revelarei o segredo da cura de seus ferimentosmorais!

Qual é, meus amigos, esse bálsamo soberano que possui avirtude. por excelência, que se aplica sobre todas as chagas do coraçãoe as cicatriza?

Esse bálsamo é o amor, é a caridade!Se você tem esse fogo divino, o que você temerá?Sob a inspiração dessas virtudes sublimes, você dirá em todos

os instantes difíceis de sua vida: “Meu Pai, que a vossa vontade seja

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM175

BEM-AVENTURADOS OS PUROS DE CORAÇÃO

176

feita e não a minha! Se vos agrada experimentar-me pela dor e pelastribulações, bendito sejais, porque é para o meu bem, eu o sei, quea vossa mão sobre mim desce. Se é de vossa misericórdia, Senhor,apiedar-vos desta vossa frágil criatura, se é de vosso agrado dar-lheao coração as alegrias puras, bendito sejais também! Mas, fazei queo amor divino não adormeça dentro de minha alma e queincessantemente faça subir aos vossos pés a oração de gratidão!”.

Se você tem amor, você já tem tudo o que há de desejávelsobre a Terra. Você possui, então, a sublime pérola, que nem osacontecimentos adversos, nem as maldades daqueles que o odeiame perseguem poderão lhe arrebatar.

Se você tem amor, você terá colocado o seu tesouro onde osvermes e a ferrugem não o podem atingir. Você verá desaparecerinsensivelmente da sua alma tudo o que seja capaz de macular-lhe apureza. Você sentirá, dia a dia, que o fardo da matéria se toma maisleve. E, qual pássaro que plana no ar e que não mais se lembra daTerra, você subirá incessantemente, você subirá todos os dias, atéque a sua alma inebriada se sacie do elemento da vida, no seio doSenhor. (Um Espírito Protetor, Bordéus, 1861.)

OS QUE TÊM OS OLHOS FECHADOS (1)

20. Meus bons amigos, por que vocês me chamam? É paraque imponha as mãos sobre esta pobre sofredora que está aqui e acure? Ah! que sofrimento, bom Deus!

Ela perdeu a vista e as sombras desceram sobre ela! Pobrecriança! Que ore e espere! Eu não sei fazer milagres, sem amanifestação da vontade do bom Deus.

1. Esta comunicação foi transmitida pelo Espírito de J. B. Vianney, Cura de Ars,

evocado para falar sobre uma pessoa cega.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM176

177CAPÍTULO VIII

Todas as curas que alcancei obter, e que vocês conhecem, nãoas atribuam a outro que não seja o Pai de todos nós. Nas suas aflições,voltem os seus olhos ao céu e digam do fundo de seu coração:“Meu Pai, curai-me! Mas fazei que minha alma enferma se cureantes que as enfermidades do meu corpo. Que minha alma se elevepara vós com a claridade que possuía quando vós a criastes”.

Após essa prece, meus bons amigos, que o bom Deus ouvirásempre, a força e a coragem lhes serão dadas e, talvez, também, acura que vocês timidamente pediram, em resposta à sua abnegação.

Mas, uma vez que estou aqui, numa assembléia que, antes detudo, está voltada aos estudos, eu lhes direi que, aqueles que sãoprivados da vista, deveriam considerar-se como os bem-aventuradosda expiação. Relembrem-se de que o Cristo ensinou que valeriaarrancar seu olho se ele fosse mau, e que mais valeria atirá-lo nofogo do que ele tornar-se a causa da perdição do homem.

Ah! quantos há sobre a Terra que maldirão, um dia, quandoestiverem nas trevas, o terem visto a luz! Oh! como são felizes aquelesque, na expiação, são alcançados na vista! Seus olhos não lhes serãoas portas abertas para o escândalo e para a queda. Eles, de vistafechada para as coisas do mundo, poderão viver inteiramente a vidada alma. Poderão ver mais do que vocês que têm boa visão...

Quando Deus me permite descerrar as pálpebras de qualquerum desses pobres sofredores e lhe restabelecer a visão, digo a mimmesmo: “Alma querida, por que não preferes conhecer todas asdelícias do Espírito que vive de contemplação e de amor? Então, tunão pedirias para ti as imagens menos puras e menos suaves do queaquelas que se te são dadas entrever em tua cegueira”.

Oh! sim, bem-aventurado é o cego que quer viver com Deus.Mais feliz do que vocês que aqui estão, ele sente a felicidade, ele vêas almas e pode elevar-se com elas às regiões espirituais que nemmesmo os predestinados da Tetra conseguem divisar. O olho aberto

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM177

BEM-AVENTURADOS OS PUROS DE CORAÇÃO

178

está sempre pronto a fazer a alma falir. O olho fechado, ao contrário,está sempre pronto a fazê-la subir até Deus.

Creiam-me, meus bons e queridos amigos, a cegueira dos olhosé, muitas vezes, a verdadeira luz do coração, enquanto que a vista é,com freqüência, o anjo da sombra que conduz à morte espiritual.

E, agora, algumas palavras para ti, minha pobre sofredora:Espera e tem coragem! Se eu te dissesse: Minha filha, teus olhos sevão abrir, como tu serias feliz! E quem sabe se esta alegria não seriaa causa de tua queda? Confia, pois, no bom Deus que fez a felicidadee permite que se faça a tristeza! Eu farei tudo o que me for permitidofazer por ti. Mas, por tua vez, ora e pensa em tudo o que venho dete dizer.

Antes que me vá, vocês todos que aqui estão recebam a minhabênção. (Vianney, Cura de Ars, Paris, 1863.)

21. Nota – Quando uma aflição não é conseqüência de atosda vida presente, é necessário buscar-lhe a causa numa vida anterior.Aquilo que chamamos de caprichos da sorte, não são outros maisque os efeitos da Justiça Divina.

Deus não admite expiações arbitrárias. É de sua Lei que osofrimento esteja sempre em correlação com o erro praticado. Se, pelabondade Divina, foi lançado um véu sobre seus atos passados, Ele nosdesvenda a origem de toda dor, em nos dizendo: “Quem matou pelaespada, pela espada perecerá”, palavras essas que podem ser traduzidasassim: “Sofremos sempre naquilo que fizemos outros sofrerem”.

Se, pois, alguém sofre pela perda da vista, é porque a vista foipara ele uma causa de queda. Talvez tenha sido até por ter feitooutra pessoa perder a vista. Pode alguém ter ficado cego pelo excessode trabalho que esse alguém impôs a outras pessoas ou por maustratos ou por falta de cuidados etc. Sofre, então, a pena de talião.Ele mesmo, no seu arrependimento pelos erros do passado, poderáter escolhido esta expiação, aplicando a si próprio estas palavras deJesus: “Se vosso olho vos é motivo de escândalos, arrancai-o”.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM178

179CAPÍTULO VIII

INJÚRIAS E VIOLÊNCIAS

1. Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a Terra.(Mateus, capítulo 5, versículo 4.)

2. Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamadosfilhos de Deus. (Mateus, capítulo 5, versículo 9.)

3. Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás, mas qualquerum que matar será réu de juízo. – Eu, porém, vos digo que qualquerum que, sem motivo, se encolerizar contra seu irmão, será réu de juízo;e qualquer um que disser a seu irmão: Raca, será réu do sinédrio; equalquer que lhe disser: Louco, será réu do fogo do inferno. (Mateus,capítulo 5, versículos 21 e 22.)

4. Por estas máximas, Jesus faz da doçura, da moderação, damansuetude, da afabilidade e da paciência, uma lei. Ele condena,por conseqüência, a violência, a cólera e mesmo toda e qualquerexpressão mais grosseira que se possa usar contra os semelhantes.

Raca, entre os hebreus era um termo de menosprezo quesignificava homem que não presta. Pronunciava-se essa palavracuspindo e virando a cabeça de lado. Jesus vai mesmo mais longe,porque ameaçava com o fogo do inferno a quem dissesse a seuirmão: Você é um louco.

Está evidente, aqui, como em todas as circunstâncias, que aintenção que acompanha o ato agrava ou atenua a falta. Mas emque uma simples palavra pode revestir-se de tanta gravidade paramerecer uma reprovação tão severa? É que toda palavra ofensiva é

9

CAPITULO IX

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM179

BEM-AVENTURADOS OS MANSOS E OS PACIFICADORES

180

uma expressão de um sentimento contrário à lei do amor e dacaridade. E esta lei é que deve ser a regra das relações entre os homenspara manter, entre eles, a concórdia e a união.

Desrespeitar essa lei é jogar-se contra a benevolência recíprocae contra a fraternidade. Geram-se o ódio, a aversão, a má vontade,o rancor.

Aquele que é humilde para com Deus, deverá ter na caridadepara com o próximo a primeira lei de todos os cristãos.

5. Mas, que pretenderia Jesus dizer com estas palavras: “Bem-aventurados os que são brandos, porque eles possuirão a Terra”?Não ensinou Ele a renúncia aos bens deste mundo, prometendo osbens do céu?

Enquanto aguarda os bens do céu, o homem necessita dosbens da Terra para viver. Jesus somente ensinou que não se dê aosbens da Terra mais importância do que aos do céu.

Por estas palavras, Jesus quis dizer que, até agora, os bens daTerra são conquistados pelos violentos, em prejuízo dos que sãobrandos e pacificadores. Que para os brandos e pacificadores falta,muitas vezes, o necessário para a vida, enquanto que para os violentossobra até o que é supérfluo para a existência.

Jesus promete que será feita justiça aos violentos sobre a Terracomo no céu, porque os brandos e os pacificadores serão chamadosfilhos de Deus.

Quando a lei do amor e da caridade for lei da Humanidade,não haverá mais egoísmo, o fraco e pacífico não serão mais exploradose nem esmagados pelo forte e pelo violento. Tal será o estado daTerra, então, segundo a lei do progresso e a promessa de Jesus, queela se tornará um mundo feliz, pelo afastamento dos maus.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM180

181CAPÍTULO IX

INSTRUÇÃO DOS ESPÍRITOS:A AFABILIDADE E A DOÇURA

6. A benevolência para com os seus semelhantes, fruto doamor ao próximo, produz a afabilidade e a doçura que são a suaforma de manifestação.

Convém, no entanto, não se fiar no jogo das aparências. Aeducação e o traquejo do mundo podem dar o verniz dessasqualidades. Quantos há, cuja fingida bondade e simplicidade não émais que uma máscara para o uso externo, uma aparência bemcalculada que esconde os defeitos de caráter! O mundo está repletode pessoas que são só sorrisos nos lábios e que levam veneno emseus corações. Pessoas que são brandas enquanto nada as contrarie,mas que mordem à menor contrariedade. São de língua de ouro,quando falam pela frente, transformando-a em picada de serpentevenenosa quando estão por detrás.

A esta classe pertencem, também, esses homens que são sódoçura fora do lar, mas que são tiranos domésticos. Quando emcasa, fazem sofrer seus familiares e dependentes sob o peso de seuorgulho e de seu poder absoluto e arbitrário. Querem compensar,com essa má conduta, o constrangimento a que se submetem láfora. Não se atrevendo a usar de autoridade agressiva com osestranhos, que poderiam chamá-los à ordem, eles querem fazer-setemidos pelos que não lhes podem opor resistência. A vaidade delesé poderem dizer: “Aqui eu mando e sou obedecido”, sem pensarque poderiam acrescentar com muita razão: “E eu sou detestado”.

Não é suficiente, para ser brando e afável, que dos lábiosbrotem leite e mel. Se o coração está ausente daquilo que a pessoaaparenta ser, isso nada mais é que um falso sentimento.

Aquele cuja afabilidade e doçura não são fingidas, não sedesmente jamais. Ele é o mesmo diante de estranhos e na intimidadede seu lar. Sabe que se os homens podem ser enganados pelas

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM181

BEM-AVENTURADOS OS MANSOS E OS PACIFICADORES

182

aparências, mas as aparências não enganarão a Deus. (Lázaro, Paris,1861.)

A PACIÊNCIA

7. A dor é uma bênção que Deus envia a seus eleitos. Não seaflijam, pois, quando vocês sofrem. Mas bendigam a Deusonipotente que assinalou vocês pela dor neste mundo, para a glóriano céu.

Sejam pacientes!A paciência é, também, uma caridade e vocês devem praticar

a lei da caridade ensinada pelo Cristo, o enviado de Deus.A caridade que se exprime no dar esmolas aos pobres é a mais

fácil das caridades. Mas há uma bem mais penosa e, conseqüentemente,bem mais meritória que é a de perdoar aos que Deus colocou sobre o seucaminho para serem instrumentos de seus sofrimentos e submeter a suapaciência à provação.

A vida é difícil, eu sei! Ela se compõe de mil pequenas coisasque são como que picadas de agulha e que terminam por ferir. Masé necessário olhar para os deveres que nos são impostos e para asconsolações e compensações que recebemos por outro lado.Veremos, então, se pesarmos deveres e compensações, que as bên-çãos são mais numerosas do que as dores. O fardo sempre parecerámais leve do que quando vocês curvam a cabeça para o pó da Terra.

Coragem, amigos! O Cristo é o modelo para todas as criaturashumanas. Ele sofreu mais que qualquer um de vocês e, no entanto,nada tinha de que se acusar. Vocês sofrem, mas é por terem deexpiar o seu passado e se fortalecerem para o futuro.

Sejam, pois, pacientes!Sejam cristãos!

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM182

183CAPÍTULO IX

A palavra cristãos resume tudo. (Um Espírito Amigo, Havre,1862.)

OBEDIÊNCIA E RESIGNAÇÃO

8. A doutrina de Jesus ensina, em todos os seus princípios, aobediência e a resignação, duas virtudes companheiras da doçura.Essas são virtudes muito ativas, embora os homens as confundamerroneamente com a negação do sentimento e da vontade.

A obediência é o consentimento da razão e a resignação é oconsentimento do coração. Todas as duas, portanto, são forças ativas,porque carregam o fardo das provas que a revolta insensata deixacair. O covarde não pode ser resignado, do mesmo modo que oorgulhoso e o egoísta não podem ser obedientes.

Jesus foi a encarnação dessas virtudes desprezadas pelaantiguidade material. Ele veio no momento em que a sociedaderomana perecia nos desfalecimentos da corrupção. Jesus veio fazerbrilhar, no seio da humanidade abatida, os triunfos do sacrifício eda renúncia à sensualidade e às paixões sem freios.

Cada época está marcada com o cunho da virtude ou do vícioque deve salvá-la ou perdê-la. A virtude da geração atual é a atividadeintelectual; seu vício é a indiferença moral. Eu digo somenteatividade, porque o verdadeiro gênio se eleva de súbito e descobre,por si só, os horizontes que a multidão só verá depois dele. Aatividade, porém, é a reunião de esforços de todos para atingir umfim menos brilhante, mas que prova a elevação de sua época.

Submetam-se ao impulso que viemos dar a seus espíritos.Obedeçam à grande lei do progresso, que é a bandeira de sua

geração. Infeliz do espírito preguiçoso, ai daquele que fecha a suacapacidade de compreender! Infeliz, porque nós que somosorientadores da humanidade em marcha, nós os induziremos pela

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM183

BEM-AVENTURADOS OS MANSOS E OS PACIFICADORES

184

justiça divina a começar a sua marcha e ajudaremos a sua vontaderebelde com a dupla ação das desilusões que lhes darão o rumocerto e das instituições para o melhor que lhes fará apertar os passos.Toda resistência filha do orgulho deverá ceder, cedo ou tarde. Bem-aventurados, porém, serão os que são brandos, porque eles prestarãoouvidos dóceis aos nossos ensinamentos. 3.(Lázaro, Paris, 1863)

A CÓLERA

9. O orgulho induz vocês a se julgarem mais do que são.Vocês não suportam uma comparação que possa rebaixá-los. Vocêsse consideram tão acima de seus irmãos, quer em inteligência, querposição social, quer mesmo em vantagens pessoais, que o menorparalelo estabelecido com as demais criaturas humanas os irrita e osaborrece.

Que acontece então? Vocês se entregam à cólera!Procurem a origem desses acessos de demência passageira,

que os assemelham ao homem bruto e primitivo, e que os fazemperder o autocontrole e a razão; procurem-na e vocês a encontrarão,quase sempre, no orgulho ferido.

Não é senão o orgulho ferido por uma contrariedade o queos leva a rejeitar observações justas, o que os faz repelir, coléricos, osmais sábios conselhos? As próprias impaciências, que se originamde contrariedades pueris, decorrem da importância que vocês dão àsua própria personalidade, diante da qual vocês querem que todosse dobrem.

No seu delírio, o homem colérico atira-se contra tudo, comoum ser primitivo, quebrando objetos inanimados porque estes nãolhe obedecem. Ah! se nesses momentos ele pudesse observar-se comfrieza, de duas uma: ou teria medo de si mesmo ou se acharia bemridículo! Que julgue, por isso, a impressão de espanto e temor que

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM184

185CAPÍTULO IX

produz sobre os que estejam à sua volta. Quando não fosse pelorespeito devido a si próprio, ele deveria esforçar-se para domar essatendência que o torna digno de piedade.

Se examinasse com atenção que a cólera não soluciona coisaalguma, mas que desequilibra a sua saúde, comprometendo mesmoa sua vida, reconheceria ser ele próprio a primeira vítima de suacólera. Se isso não bastasse, uma outra consideração deveria contê-lo: a de que torna infelizes todos aqueles que com ele convivem.

Se o colérico tem sentimentos não registrará uma ponta deremorso por fazer sofrer os entes que ele mais ama? E que pesarmortal se, numa crise de fúria colérica, ele cometesse um ato de quese recriminasse por toda a sua vida!

Em resumo, a cólera não exclui certas qualidades do coração.Impede, porém, que muito se faça o bem e pode levar a muitofazer-se o mal. Isso deverá ser suficiente para induzir o colérico afazer um grande esforço para dominar-se.

O Espírita é convidado ao controle de si próprio por outromotivo: a cólera é contrária à caridade e à humildade cristãs. (UmEspírito Protetor, 1863.)

10. Partindo da falsa idéia de que não se pode reformar aprópria índole, o homem se crê dispensado de fazer esforços paracorrigir-se dos defeitos em que ele se compraz voluntariamente ouque lhe exigiriam muita perseverança para domá-los.

É assim que um homem com tendência para a cólera sedesculpa, atribuindo esse impulso latente ao seu temperamento.Ao invés de admitir que a cólera é sua, ele transfere a culpa para oseu organismo, acusando Deus dos defeitos que lhe são próprios.Esta atitude é, ainda, uma conseqüência do orgulho que estámesclado com todas as suas imperfeições.

É inegável que há temperamentos que se prestam mais doque outros para atos violentos, assim como há músculos mais

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM185

BEM-AVENTURADOS OS MANSOS E OS PACIFICADORES

186

flexíveis que se prestam melhor para os atos de força física. Não secreia, porém, que esta seja a causa fundamental da cólera.

Observem que um Espírito pacífico, mesmo num corpo quetenha muita bílis, será sempre pacífico. Aquele, contudo, que já éum Espírito violento tomará outras características. Não possuindoum físico apropriado para secundar-lhe a violência, a cólera não seexpandirá, como naquele em que o físico é mais avantajado.

O corpo não produz as crises de cólera, aos homens que nãosejam por si coléricos, do mesmo modo que o corpo não lhes é afonte de outros vícios. Todas as virtudes e todos os vícios se origi-nam da própria criatura.

Se não fosse assim, qual seria o mérito e a responsabilidadedo homem pelos seus atos? O homem que tem o corpo malformado não pode corrigi-lo, porque o Espírito não tem energiapara tanto. Mas poderá corrigir aquilo que é do Espírito, quando oquer com firme vontade.

A experiência não lhes prova, Espíritas, até onde pode ir aforça de vontade, pelas transformações morais espantosas que seoperam às suas vistas? Digam, pois, que o homem se conserva novício porque quer conservar-se no vício, uma vez que aquele que quisercorrigir-se, sempre o pode. Se fosse de outro modo, a lei doprogresso não existiria para o homem. (Hahnemann, Paris, 1863.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM186

187CAPÍTULO IX

PERDOAI, PARA QUE DEUS VOS PERDOE

1. Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarãomisericórdia. (Mateus, capítulo 5, versículo 7.)

2. Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, o vosso Paicelestial vos perdoará a vós. Se, porém, não perdoardes aos homens assuas ofensas, também o vosso Pai não vos perdoará as vossas ofensas.(Mateus, capítulo 6, versículos 14 e 15.)

3. Ora, se teu irmão pecar contra ti, vai, e repreendendo-oentre ti e ele só, se te ouvir, ganhaste a teu irmão. – Então Pedro,aproximando-se dele, disse: Senhor, até quantas vezes pecará meuirmão contra mim, e eu lhe perdoarei? Até sete? Jesus lhe disse: Não tedigo que até sete, mas até setenta vezes sete. (Mateus, capítulo 18,versículos 15, 21 e 22.)

4. A misericórdia é o complemento da doçura. Os que nãosão misericordiosos também não são brandos e pacificadores.

A misericórdia está no esquecimento e no perdão das ofensas.O ódio e o rancor revelam uma alma sem elevação e sem grandeza.Já o esquecimento das ofensas é próprio de uma alma elevadamoralmente que se coloca acima dos golpes que lhe desfiram.

Aquele que não tem misericórdia é sempre inquieto, comsua suscetibilidade sombria e cheia de fel. Aquele que a tem, porém,é calmo, cheio de mansidão e de caridade.

Infeliz é aquele que diz: “Não perdoarei jamais!”. Este, senão for censurado pelos homens, será, certamente, alcançado pela

10

CAPITULO X

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM187

BEM-AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS

188

Justiça Divina. Como poderá ele rogar perdão para suas própriasfaltas, se não perdoa as faltas dos outros?

Jesus nos ensina que a misericórdia não deve ter limites,quando disse para perdoar a seu irmão, não apenas sete vezes, massetenta vezes sete vezes.

Há, contudo, duas maneiras bem diferentes de perdoar. Aprimeira delas grande, nobre, verdadeiramente generosa, semsegunda intenção, que age sutilmente sem ferir o amor-próprio oua suscetibilidade do ofensor, mesmo quando o adversário for o únicoculpado pela ofensa. A segunda maneira de perdoar é aquela emque o ofendido, ou aquele que se julga ofendido, impõe ao adversáriocondições humilhantes, fazendo-o sentir um perdão que mais irritado que acalma. Se estende a mão, não é com benevolência, mascom ostentação, a fim de poder dizer a todas as demais pessoas:“Vejam quanto sou generoso!”. Diante de um perdão que fere, éimpossível que a reconciliação seja sincera entre o ofensor e oofendido. Não, não há aí generosidade, mas apenas uma maneirade satisfazer o orgulho daquele que aparentemente perdoa.

Em todas as contendas, aquele que se revela mais conciliador,que demonstra mais desinteresse, em quem se destacam a caridadee a verdadeira grandeza de alma, conquistará sempre a simpatia daspessoas imparciais.

RECONCILIAR-SE COM OS ADVERSÁRIOS

5. Concilia-te depressa com o teu adversário, enquanto estás nocaminho com ele, para que não aconteça que o adversário te entregueao juiz e o juiz te entregue ao oficial, e te encerrem na prisão. Emverdade te digo que de maneira alguma sairás dali enquanto nãopagares o último ceitil. (Mateus, capítulo 5, versículos 25 e 26.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM188

189CAPÍTULO X

6. No exercício do perdão, assim como no do bem em geral,não há somente um efeito moral, mas, também, um efeito material.

A morte, como você sabe, não irá livrá-lo de seus inimigos.Os Espíritos desejosos de vingança perseguem sempre, com o seuódio, na espiritualidade inferior, aquele contra os quais conservamo seu rancor. Eis porque o provérbio: “Morto o animal, morto oveneno”, é falso quando se quer aplicá-lo ao homem.

O Espírito desequilibrado pelo ódio espera que aquele a quemele odeia esteja encerrado no corpo físico e, assim, menos livre,pode atormentá-lo mais facilmente, alcançando-o nos seus interessese nas suas mais caras afeições.

Nessa ação dos Espíritos infelizes reside a causa da maioriadas obsessões, principalmente aquelas que apresentam uma certagravidade, como é a subjugação e a possessão. O obsidiado e opossesso são, quase sempre, atingidos por uma vingança que temraízes em existências anteriores a esta e que, provavelmente, é ofruto de sua própria conduta.

A Justiça Divina permite esse quadro de perseguição comoconseqüência do mal que obsessor e obsidiado fizeram a si mesmos,por se terem faltado com a indulgência e a caridade, em não seperdoando mutuamente.

Importa, portanto, tendo em vista a sua tranqüilidade futura,que você repare, o mais cedo possível, os males que possa ter causadoa seu próximo. É decisivo que você perdoe a seus inimigos, para que seapaguem, antes de sua morte, todos os motivos de desentendimento,todas as causas profundas de animosidade que poderiam ser carregadaspara a espiritualidade.

Somente com o perdão você poderá fazer de um inimigoencarnado neste mundo um amigo na espiritualidade. Aquele queassim procede, coloca a seu lado o bem e Deus não deixa que aqueleque perdoou fique entregue à perseguição da vingança.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM189

BEM-AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS

190

Quando Jesus lhe recomendou que se reconciliasse o maiscedo possível com o seu adversário, não é somente para evitar apermanência de atritos na vida atual, mas é para evitar que essesatritos se perpetuem em existências futuras.

Vocês não sairão das conseqüências do não perdão, disse Jesus,enquanto não houverem resgatado até o último centavo, ou seja,enquanto não se houver cumprido integralmente a Justiça Divina.

O SACRIFÍCIO MAIS AGRADÁVEL A DEUS

7. Portanto, se trouxeres a tua oferta ao altar, e aí te lembraresde que teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa diante do altar atua oferta, e vai reconciliar-te primeiro com o teu irmão, e, depois,vem e apresenta a tua oferenda. (Mateus, capítulo 5, versículos 23 e24.)

8. Quando Jesus diz: “Ide reconciliar-vos com vosso irmão,antes de depordes vossa oferenda no altar”, Ele está ensinando queo sacrifício mais agradável ao Senhor é o do seu próprioressentimento. Que antes de se apresentar para ser por Ele perdoado,deve o homem perdoar aos outros. E que se algum mal fez aqualquer um de seus irmãos, antes deve ir reparar o mal praticado.

Somente quando houver perdoado e reparado o mal é que asua oferenda será agradável ao Senhor, porque virá de um coraçãolimpo de todo pensamento mau.

Jesus citou um fato material para transmitir esse princípio,porque os judeus faziam suas oferendas ao altar através de sacrifíciosde aves, animais e outros bens materiais e, portanto, cabia-lhe ajustaras palavras ao que era de uso comum para os que o escutavam.

O cristão, porém, não oferece bens materiais.Jesus espiritualizou o sacrifício, mas com isso o preceito ainda

mais força ganha. O cristão oferece a sua alma a Deus e essa alma

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM190

191CAPÍTULO X

deve estar purificada. Entrando no templo do Senhor, o cristão devedeixar fora todo sentimento de ódio e animosidade, todo maupensamento contra um seu irmão.

Somente nesse estado de purificação espiritual, as suas oraçõesserão levadas pelos Espíritos Santificados aos pés do Eterno. Aí estáo ensinamento de Jesus por estas palavras: “Deixai vossas oferendasao pé do altar e ide primeiro reconciliar-vos com o vosso irmão, sequiserdes ser agradáveis ao Senhor”.

O ARGUEIRO E A TRAVE NO OLHO

9. E por que reparas tu no argueiro que está no olho do teuirmão, e não vês a trave que está no teu olho? Ou como dirás a teuirmão: Deixa-me tirar o argueiro de teu olho, estando uma trave noteu? Hipócrita, tira primeiro a trave de teu olho, e então cuidarás detirar o argueiro do olho de teu irmão. (Mateus, capítulo 7, versículos 3a 5.)

10. Um dos defeitos da criatura humana consiste em vocêver o mal nos outros, antes de ver o mal que está em você mesmo.Para examinar-se a si mesmo, você necessitaria ver o seu mundointerior num espelho, transportando-se de alguma forma para forade si mesmo e considerar-se como se fosse uma outra pessoa. Evocê, então, perguntaria a essa outra pessoa: “Que pensaria você sevisse alguém fazer o que faço?”.

Não há dúvida de que é o orgulho que induz o homem amascarar os seus próprios defeitos, tanto os morais como os físicos.Essa sua conduta caprichosa é essencialmente contrária à caridade,porque a verdadeira caridade é modesta, simples e indulgente.Caridade feita de orgulho é uma falta de juízo, porque esses doissentimentos, o orgulho e a caridade, se anulam um ao outro.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM191

BEM-AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS

192

Como poderá um homem, bastante tolo para acreditar naimportância de sua personalidade e na grandeza de suas qualidades,possuir ao mesmo tempo abnegação suficiente para fazer destacar,nos outros, o bem que lhe faria sombra, quando se ele destacar omal dos outros ele pareceria ficar superior aos demais?

Se o orgulho é o pai de muitos vícios, é também a negaçãode muitas virtudes. Vamos encontrá-lo na base e como o impulsoque dá movimento para quase todas as ações humanas.

Pela importância do orgulho na geração de atos desequilibradosé que Jesus se empenhou em combatê-lo, por sabê-lo o principalobstáculo para a evolução moral.

NÃO JULGUEIS

11. Não julgueis, para que não sejais julgados. Porque com ojuízo com que julgardes sereis julgados, e com a medida com que tiverdesmedido vos hão de medir a vós. (Mateus, capítulo 7, versículos 1 e 2.)

12. E os escribas e fariseus trouxeram-lhe uma mulher apanhadaem adultério; e, pondo-a no meio, disseram-lhe: Mestre, esta mulherfoi apanhada, no próprio ato, adulterando. E na lei nos mandou Moisésque as tais sejam apedrejadas. Tu, porém, que dizes? – Isto diziameles, tentando-o, para que tivessem do que o acusar. Mas Jesus,inclinando-se, escrevia com o dedo na terra. E como insistissemperguntando-lhe, endireitou-se, e disse-lhes: Aquele que dentre vósestá sem pecado, seja o primeiro que atire a pedra contra ela. – E,tornando a inclinar-se, escrevia na terra. – Quando ouviram isto,redargüidos pela consciência, saíram um a um, a começar pelos maisvelhos até aos últimos. Ficou só Jesus e a mulher que estava entre eles.– E, endireitando-se Jesus, e não vendo ninguém mais do que a mulher,disse-lhe: Mulher, onde estão aqueles teus acusadores? Ninguém tecondenou? – E ela disse: Ninguém Senhor. – E disse-lhe Jesus: Nem

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM192

193CAPÍTULO X

eu também te condeno: vai-te, e não peques mais. (João, capítulo 8,versículos 3 a 11.)

13. “Aquele que estiver sem pecado, atire-lhe a primeira pedra”,disse Jesus. Este convite fez da indulgência um dever, porque nãohá pessoa alguma que não necessite, para si própria, da indulgência.

Jesus, aí, nos ensina que não devemos julgar os outros muitoseveramente, sem que antes julguemos a nós mesmos. Nemdevemos condenar os outros, naquilo que nos desculpamos. Antesde denunciarmos uma falta de alguém, vejamos se a mesma censuranão pode recair sobre nós.

A censura feita sobre a conduta de outra pessoa pode ter doismotivos: redimir o mal ou desacreditar a pessoa cujos atos criticamos.Este último motivo não tem desculpas, porque nele só hámaledicência e maldade. O primeiro motivo pode ser louvável edeveria ser mesmo um dever em certas ocasiões, pois dele poderáresultar um bem e porque sem ele o mal não seria jamais reprimidona sociedade.

O homem não deve, aliás, ajudar a evolução de seus semelhantes?Sendo assim, não devemos tomar no seu sentido absoluto o princípio:“Não julgueis, se não quiserdes ser julgados”, porque ser escravo daletra mata o seu entendimento e só o espírito da letra dará vida àsua compreensão.

Jesus não poderia proibir de reprovar-se o mal, porque Elemesmo nos deu o exemplo dessa reprovação e a fez em termosenérgicos. Mas Ele quis dizer que a autoridade para censurar o malestá na razão da autoridade moral daquele que faz a censura. Cometeros mesmos erros que se condenam nos outros é perder a autoridademoral para a censura e, mais ainda, é perder o direito de repressão.

A consciência íntima, por outro lado, recusa todo respeito etoda submissão voluntária àquele que, estando investido de umpoder qualquer, viola as leis e os princípios que está encarregado deaplicar. A única autoridade legítima, aos olhos de Deus, é aquela que

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM193

BEM-AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS

194

se apóia sobre o exemplo que aquele que censura dá do bem. Estadedução é a que resulta, igualmente, das palavras de Jesus.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:PERDÃO DAS OFENSAS

14. Quantas vezes perdoarei a meu irmão?Você o perdoará não sete vezes, mas setenta vezes sete vezes.

Eis aí um dos ensinamentos de Jesus que deve calar muito fundona sua inteligência e falar mais alto ao seu coração.

Compare essas palavras de misericórdia com a oração tãosimples, tão resumida, e ao mesmo tempo, tão grande em suasaspirações que Jesus deu a seus discípulos. Você encontra nela asmesmas idéias. Jesus, o justo por excelência, responde a Pedro: “Tuperdoarás sempre e sem limites. Perdoarás cada ofensa tantas vezesquanto ela te seja feita. Tu ensinarás a teus irmãos esse esquecimentode si mesmos, que os torna invulneráveis às agressões, ao maus atosda vida e às injúrias. Tu serás brando e humilde de coração, semmedir jamais a tua mansuetude. Tu farás para os outros, enfim, oque desejas que o Pai Celestial faça por ti. Não está o Pai a te perdoarsempre? Teria Ele contado o número de vezes que o seu perdãocelestial desce para apagar as tuas faltas?”.

Escutem esta resposta de Jesus e, assim como fez Pedro,apliquem-na a vocês mesmos!

Perdoem, usem a indulgência, sejam caridosos, generosos,pródigos mesmo de seu amor. Dêem, porque o Senhor lhesrestituirá. Perdoem, porque lhes perdoará. Abaixem-se, porque oSenhor os elevará. Humilhem-se, porque o Senhor os fará sentar-seà sua direita.

Eia, meus bem-amados! Estudem e comentem as palavrasque lhes dirijo da parte d’Aquele que, do alto dos esplendores

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM194

195CAPÍTULO X

celestiais, tem seus olhos sempre voltados para vocês. Prossigamcom amor a tarefa ingrata que Jesus começou há dezoito séculos!

Perdoem a seus irmãos, assim como vocês precisam que elesperdoem a vocês mesmos. Se os atos deles lhes foram pessoalmenteprejudiciais, eis aí um motivo a mais para vocês serem indulgentes,porque o mérito do perdão é proporcional à gravidade do mal queos atingiu. Nenhum mérito vocês teriam em relevar as ofensas deseus irmãos, se essas ofensas não passassem de arranhões leves.

Espíritas, não esqueçam jamais que, tanto por palavras comopor atos, o perdão das injúrias não é um vão princípio moral. Sevocês se dizem Espíritas, sejam Espíritas. Esqueçam o mal que lhesfizeram e não pensem outra coisa que não seja no bem que vocêspodem fazer.

Aquele que entrou pela senda do Espiritismo não deve afastar-se dele nem mesmo por pensamento, porque vocês são respon-sáveis por seus pensamentos, os quais Deus conhece. Façam, pois,que os seus pensamentos sejam despojados de qualquer sentimentode rancor. Deus sabe o que mora no fundo do coração de cada umde seus filhos.

Feliz aquele que pode, todas as noites, adormecer dizendo: Eunada tenho contra o meu próximo. (Simeão, Bordéus, 1862.)

15. Perdoar a seus inimigos é pedir perdão para você mesmo.Perdoar a seus amigos é dar-lhes uma prova de amizade. Perdoar asofensas é descobrir-se melhor do que você era.

Perdoe sempre, meu amigo, a fim de que Deus o perdoe.Porque se você for duro de coração, exigente, inflexível; se vocêusar de rigor, mesmo para uma ligeira ofensa, como você quereráque Deus não esqueça que cada dia você tem grande necessidade deindulgência?

Oh! Infeliz é aquele que diz: “Eu não perdoarei jamais!” porquenisso ele pronuncia a sua própria sentença.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM195

BEM-AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS

196

Quem sabe, aliás, se examinando profundamente a vocêmesmo, não descobrirá aí o agressor? Quem sabe se, nessa luta quecomeçou por uma bagatela e que termina no rompimento deamizade, não foi você quem deu o primeiro golpe? Talvez por umasimples palavra com tom agressivo que escapou de seus lábios, tudocomeçou? Quem sabe se você deixou de usar a moderação necessária?

Sem dúvida, o seu adversário andou mal, por se mostrar tãosensível ao quase nada. Mas esta é mais uma razão para você serindulgente e para não merecer dele reprovação. Admitamos quevocê foi realmente ofendido em certa ocasião. Quem sabe se vocênão envenenou as coisas, com suas reações doentias, fazendo degenerarem querela séria aquilo que poderia facilmente cair no esquecimento?Se de você dependia impedir as conseqüências do pequenoacontecimento, e você não impediu, você é o culpado. Admitamos,enfim, que você nada tem a reprovar em sua conduta e, então,maior será o seu mérito se você se mostrar clemente.

Mas há duas maneiras bem diferentes de perdoar: há o perdãodos lábios e há o perdão do coração. Muitos dizem a seu adversário:“Eu o perdôo”, enquanto que, interiormente, sentem um secretoprazer pelo mal que acontecer ao faltoso, dizendo a si mesmos queesse seu adversário fez por merecer o castigo. Outros dizem: “Euperdoei”, e acrescentam: “mas não me reconciliarei jamais; não querovê-lo pelo resto de minha vida”.

E esse o perdão, segundo o Evangelho?Não! O verdadeiro perdão, o perdão cristão é aquele que lança

um véu sobre o passado. Este é o único que será levado em conta,porque Deus não se contenta com o perdão de mera aparência. OCriador escuta o fundo dos corações e lê os mais secretos pensamentos.A Deus ninguém se impõe por vãs palavras e fingimentos.

O esquecimento completo e absoluto das ofensas é própriodas grandes almas. O rancor é sempre um sinal de baixeza einferioridade moral. Não se esqueça, pois, que o verdadeiro perdão

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM196

197CAPÍTULO X

se reconhece muito mais pelos atos do que pelas palavras. (Paulo,Apóstolo, Lyon, 1861.)

A INDULGÊNCIA

16. Espíritas, queremos hoje falar-lhes da indulgência, essesentimento tão doce, tão fraternal que todo homem deve ter paracom os seus irmãos, mas do qual tão poucos fazem uso.

A indulgência não vê os defeitos dos outros. Se os vê,resguarda-se de neles falar, de propalá-los. Ela os oculta, a fim deque eles não se tornem conhecidos a não ser de si mesma. Se amaledicência os descobre, a indulgência tem sempre pronta umajustificativa para eles, mas uma justificativa plausível, séria, e nãodaquelas que, com aparência de atenuar as faltas, mais as fazemtransparecer com uma pérfida astúcia para salientá-las.

A indulgência não se ocupa jamais dos atos maus dos outros,a menos que seja para prestar um serviço. Porém, ainda assim, temo cuidado de atenuá-los tanto quanto possível. Ela não fazobservações chocantes, nem traz censuras em seus lábios, massomente conselhos quase sempre velados.

Quando você critica um irmão seu, que conseqüências devemser tiradas de suas palavras? A de que você, que censura, nunca teriafeito o que condena nos outros, a de que você vale mais do queaquele que errou.

Oh, homens! Quando será que vocês julgarão o seu própriocoração, os seus próprios pensamentos, os seus próprios atos, semse ocuparem do que fazem os seus irmãos? Quando vocês terãoolhos severos somente para vocês mesmos?

Sejam, pois, severos para com vocês e indulgentes para comos outros. Pensem naquele que julga em última instância, que vê osmais secretos pensamentos de cada coração e que, por conseqüência,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM197

BEM-AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS

198

desculpa freqüentemente as faltas que vocês censuram ou lamentaas que vocês desculpam, porque Ele conhece a intenção de todos osatos. Pensem, vocês que acusam: “Culpado!”, que talvez vocêstenham cometido falhas mais graves que essa.

Sejam indulgentes, mais amigos, porque a indulgência atrai,acalma, soergue, ao passo que o rigor desencoraja, afasta e irrita.(José, Espírito Protetor, Bordéus, 1863.)

17. Sejam indulgentes com as faltas dos outros, quaisquerque elas sejam. Não julguem com severidade a não ser as suas própriasações e o Senhor usará de indulgência para com vocês, como vocêsusaram de indulgência para com os outros.

Sustentem os fortes, estimulando-os à perseverança.Fortifiquem os fracos, mostrando-lhes a bondade de Deus, queleva em conta o menor arrependimento. Mostrem a angelitude doarrependimento das próprias culpas, cobrindo as faltas humanas, afim de ocultá-las dos olhares daqueles que não podem tolerar o queé impuro.

Compreendam toda a infinita misericórdia do Pai Celestial enão esqueçam jamais de lhe dizer por seus pensamentos, mas acimade tudo por suas ações no bem: “Perdoai as nossas ofensas, comoperdoamos àqueles que nos têm ofendido”. Compreendam bem ovalor dessas sublimes palavras, que não são admiráveis apenas naletra, mas principalmente pelo ensinamento que trazem em si.

Que solicitam vocês ao Senhor, quando lhe pedem o seuperdão? Será somente o esquecimento de suas ofensas? Esseesquecimento os deixaria no nada, porque se Deus se limitasse aesquecer as faltas que vocês cometem, a Justiça Divina não lhestraria a recompensa pelo bem que vocês fizessem. A recompensanão pode ser o prêmio do bem que não se fez e, menos ainda, domal que se haja praticado, mesmo que esse mal fosse esquecido.Pedindo-lhe perdão pelas suas transgressões da lei do amor, vocêslhe pedem o favor de suas graças para não caírem novamente; pedem

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM198

199CAPÍTULO X

a força necessária para vocês entrarem num novo caminho da vida,caminho de submissão e de amor no qual vocês podem juntar areparação de suas faltas ao arrependimento de cometê-las.

Quando vocês perdoarem a seus irmãos, não se contentemcom estender um véu de esquecimento sobre os erros deles. Esse véué, por vezes, muito transparente para os olhos de quem perdoa,permitindo-lhe continuar a ver e rever as faltas que perdoou.Perdoem-lhes, levando-lhes ao mesmo tempo o amor. Façam poreles o que vocês pedem que o Pai Celestial faça por vocês.

Substituam a cólera, que enodoa a alma, pelo amor que apurifica. Preguem, pelo exemplo, essa caridade ativa, operosa, quenão se cansa, que Jesus lhes ensinou. Preguem-na como Jesus mesmofez, durante todo o tempo que viveu sobre a Terra visível aos olhosdo corpo, e como prega ainda sem cessar, depois que se fez visívelapenas aos olhos do espírito.

Sigam esse divino modelo, Jesus. Caminhem pelos sinais quedeixou em sua passagem. Seguindo as suas pegadas, vocês encontrarãoo repouso após a luta. Como Jesus, tomem a sua cruz e subampenosamente, mas corajosamente, o seu calvário: no alto do seu calvárioestá a glorificação. (João, bispo de Bordéus, 1862.)

18. Queridos amigos, sejam severos com vocês mesmos eindulgentes com as fraquezas dos outros. Esta é, também, umaprática da santa caridade, que bem poucas pessoas cumprem.

Todos vocês têm más tendências a vencer, defeitos à corrigir,hábitos à reformar. Todos vocês têm um fardo mais ou menospesado para dele despojar-se, a fim de subir ao cume da montanhada evolução. Por que, então, vocês são tão clarividentes quando setrata de ver as faltas do próximo e são tão cegos quando se trata defaltas de vocês mesmos? Quando vocês deixarão de perceber, noolho de seus irmãos, o pequenino cisco que os incomoda, semprestar atenção na lasca de madeira que está em seus próprios olhos,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM199

BEM-AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS

200

tirando-lhes a visão de seu verdadeiro caminho e fazendo-ostropeçarem de queda em queda moral?

Creiam nestes seus irmãos, os Espíritos!Todo homem bastante orgulhoso para crer-se superior, em

virtudes e méritos, aos seus irmãos encarnados, é insensato e culpado.Deus o visitará no dia de sua Justiça. A verdadeira característica dacaridade é a modéstia e a humildade que consistem em não ver,senão superficialmente, os defeitos dos outros e, ao mesmo tempo,valorizar o que há de bom e virtuoso no seu próximo. Se o coraçãohumano é um abismo de devassidão, nele existe sempre, na suamais oculta intimidade, o germe dos bons sentimentos, centelhasvívidas da essência espiritual.

Espiritismo, doutrina consoladora e abençoada! Felizesdaqueles que te conhecem e que de ti extraem os salutaresensinamentos dos Espíritos do Senhor! Para esses, o caminho estáiluminado e, ao longo de sua jornada espiritual, eles podem lerestas palavras que lhes desvenda o meio de chegarem a seu destino:caridade vivida, caridade do coração, caridade para com o próximocomo para si mesmo. Em uma só palavra, caridade para com todose amor a Deus acima de todas as coisas, porque o amor a Deusresume todos os deveres e porque é impossível amar a Deus sempraticar a caridade, da qual Ele fez uma lei para todas as suas criaturas.(Dufrêtre, bispo de Nevers, Bordéus.)

REPREENDER E DIVULGAR O MAL

19. Ninguém sendo perfeito, seguir-se-á que ninguém tem odireito de repreender aquele que está mais próximo de si?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM200

201CAPÍTULO X

Certamente que não, porque cada um de vocês deve trabalharpela evolução de todos e, sobretudo, pelo progresso daqueles cujatutela lhes foi confiada. Mas essa tutela já é uma razão para vocêsagirem com moderação, com um propósito útil e não, comogeralmente se faz, repreender os mais próximos pelo prazer dedesacreditá-los.

Neste último caso, a censura é uma maldade e, no primeirocaso, é um dever que a caridade manda cumprir com todos oscuidados possíveis.

Vocês devem, por outro lado, utilizar todas as censuras quefaçam aos outros, para dirigi-las, ao mesmo tempo, para vocêsmesmos e observarem se não as merecem também. (Luís, Paris,1860.)

20. Será repreensível notarem-se as imperfeições dos outros,quando isso nenhum proveito possa resultar para eles, mesmo quenão venhamos a divulgá-las?

Tudo depende da intenção.Certamente que não é proibido ver o mal, quando o mal

existe. Seria mesmo inconveniente ver por toda parte somente obem. Essa ilusão prejudicaria o progresso. O erro está em fazer-seesta observação em prejuízo do próximo, desacreditando-o, semnecessidade, junto da opinião de muitas pessoas. Seria igualmenterepreensível fazer a observação das imperfeições com um sentimentode malevolência e de satisfação por encontrar os outros em faltas.Ocorre, porém, exatamente o oposto, quando, lançando um véusobre o mal para ocultá-lo dos olhos de outros, vocês anotem osdefeitos alheios para deles fazer um uso pessoal, ou seja, para estudá-los e para evitar de fazer aquilo que vocês acham condenável nosoutros. Essa observação, aliás, não é útil ao moralista? Como poderiao moralista descrever os defeitos humanos, se não estudasse os seusmodelos? (Luís, Paris, 1860.)

21. Há casos em que é útil revelar o mal de outrem?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM201

BEM-AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS

202

Esta questão é muito delicada.Para resolvê-la, devemos apelar para a caridade bem

compreendida.Se as imperfeições de uma pessoa só prejudicam a ela mesma,

não há jamais utilidade em torná-las conhecidas de todos. Mas seessas imperfeições puderem acarretar prejuízos a outras pessoas, deve-se atender, de preferência, ao interesse do maior número do que aointeresse de uma pessoa apenas.

De acordo com as circunstâncias, desmascarar a hipocrisia e amentira pode ser um dever. Mais vale que um homem caia, do quemuitos virem a ser enganados e se tornarem suas vítimas. Emsemelhante situação, é necessário pesar a soma de vantagens e a deinconvenientes. (Luís, Paris, 1860.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM202

203CAPÍTULO X

O GRANDE MANDAMENTO

1. E os fariseus, ouvindo que ele fizera calar os saduceus,reuniram-se no mesmo lugar. E um deles, doutor da lei, interrogou-opara o experimentar, dizendo: Mestre qual é o grande mandamentoda lei? – E Jesus disse-lhe: Amarás o Senhor teu Deus de todo o teucoração, e de toda a tua alma e de todo o teu pensamento. Este é oprimeiro e grande mandamento. E o segundo, semelhante a este é:Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Estes dois mandamentoscontêm toda a lei e os profetas. (Mateus, capítulo 22, versículos 34 a40.)

2. E como vós quereis que os homens vos façam, da mesmamaneira lhes fazei vós também. (Lucas, capítulo 6, versículo 31.)

3. Por isso, o reino dos céus pode comparar-se a um certo rei quequis ajustar contas com os seus servos. E começando a fazer contas, foi-lhe apresentado um que lhe devia dez mil talentos. E, não tendo comque pagar, o seu senhor mandou que ele e a sua mulher e seus filhosfossem vendidos, com o quanto tinha, para que a dívida fosse paga.Então aquele servo, prostrando-se, o reverenciava, dizendo: “Senhor,sê generoso para comigo, e tudo te pagarei”. Então o Senhor daqueleservo, movido de íntima compaixão, soltou-o e perdoou-lhe a dívida.

Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seuscompanheiros que lhe devia cem dinheiros e, lançando mão dele,sufocava-o, dizendo: “Paga-me o que me deves”. Então o seucompanheiro, prostrando-se a seus pés, rogava-lhe, dizendo: “Sê generoso

11

CAPITULO XI

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM203

AMAR O PRÓXIMO COMO A SI MESMO

204

para comigo, e tudo te pagarei”. Ele, porém, não quis e, antes, preferiuencerrá-lo na prisão, até que pagasse a dívida.

Vendo, pois, os seus outros companheiros o que acontecia,contristaram-se muito, e foram declarar ao seu senhor tudo o que sepassara. Então o seu senhor, chamando-o à sua presença, disse-lhe: “Servomalvado, perdoei-te toda aquela dívida, porque me suplicaste. Nãodevias tu, igualmente, ter compaixão de teu companheiro, como eutambém de ti tive misericórdia?.” E, indignado, o seu senhor o entregouaos capatazes, até que pagasse tudo o que devia. Assim vos fará também,meu Pai Celestial, se de coração não perdoardes, cada um a seu irmão,as suas ofensas. (Mateus, capítulo 18, versículos 23 a 35.)

4. “Amar o próximo como a si mesmo; fazer para os outroso que queremos que os outros façam por nós”, esta é a expressão damais completa caridade. Ela resume todos os deveres para com opróximo. Não se pode ter um orientador mais seguro, do que tomarpor medida do que se deve fazer aos outros, o que se deseja para simesmo.

Com que direito exigiríamos de nossos semelhantes melhorconduta, mais indulgência, mais benevolência e mais perseverança,do que nós mesmos damos para eles?

A prática dessas máximas tende à destruição do egoísmo.Quando os homens as tomarem por regra de conduta e por base desuas instituições, eles compreenderão a verdadeira fraternidade. Farão,então, reinar entre si a paz e a justiça. Não mais haverá ódios, nemdesentendimentos, mas união, concórdia e benevolência entre oshomens.

A CÉSAR O QUE É DE CÉSAR

5. Então, retirando-se os fariseus, consultaram entre si como osurpreenderiam nalguma palavra. E enviaram-lhe os seus discípulos,com os herodianos, dizendo: Mestre, bem sabemos que és verdadeiro,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM204

205CAPÍTULO XI

e ensinas o caminho de Deus segundo a verdade, e de ninguém se tedá, porque não olhas a aparência dos homens. Diz-nos, pois, que teparece? É lícito pagar o tributo a César, ou não?

Jesus, porém, conhecendo a sua malícia, disse: Por que meexperimentais, hipócritas? – Mostrai-me a moeda do tributo. – E eleslhe apresentaram um dinheiro. E Jesus lhes perguntou: De quem éesta efígie e esta inscrição? – Disseram-lhe eles: De César. – EntãoJesus lhes disse: Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é deDeus. –E eles, ouvindo isto maravilharam-se, e, deixando-o, seretiraram. (Mateus, capítulo 22, versículos 15 a 22), (Marcos, capítulo12, versículos 13 a 17.)

6. A questão proposta a Jesus era motivada pela circunstânciade que os judeus tinham horror ao tributo que lhes era exigidopelos romanos.

Os judeus fizeram do imposto uma questão religiosa. Umnumeroso partido se havia formado para rejeitar o pagamento deimpostos. Esse pagamento, por isso, era uma questão que originavamuita irritação entre eles, sem o que, a pergunta feita a Jesus: “Énos lícito pagar ou deixar de pagar impostos a César?”, não teriarazão de ser.

Essa questão, portanto, era uma armadilha para pegar Jesus,porque, conforme Ele respondesse, aqueles judeus atirariam contraJesus as autoridades romanas ou os judeus que eram contrários aopagamento de tributos. Mas “Jesus, conhecendo a sua malícia”,vence essa dificuldade dando-lhes uma lição de justiça, dizendo-lhes que dessem a cada um o que lhe era devido. (Ver na Introduçãodesta obra, a palavra Publicanos.)

7. Esta máxima: “Dai a César o que é de César”, não deve serentendida apenas no que se refere a pagamento de impostos. Comotodos os ensinamentos de Jesus, este é um princípio geral resumidosob uma forma prática e usual e extraída da questão proposta pelosjudeus.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM205

AMAR O PRÓXIMO COMO A SI MESMO

206

Este princípio é uma decorrência daquele que diz que devemosagir com os outros como quereríamos que os outros agissemconosco. Por ele, Jesus condena todo prejuízo material e moralcausado ao próximo, toda violação dos interesses dos outros. Jesusensina o respeito ao direito de cada um, como cada um deseja quese respeitem os seus. Esse princípio de respeito se estende aoscompromissos familiares, à sociedade, às autoridades, bem comoaos indivíduos em geral.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:A LEI DO AMOR

8. O amor resume a doutrina de Jesus por inteiro, uma vezque esse é o sentimento por excelência, e os sentimentos são osinstintos elevados à altura da evolução já realizada. Em seu princípio,a criatura humana só tem instintos; quando faz algum progresso,mas adquire vícios e alimenta paixões, só tem sensações; quandoalcança conhecimentos morais e vivencia o bem, purificando-se,tem sentimentos.

O máximo dos sentimentos é o amor!Não falamos do amor no sentido comum e popular dessa

palavra. Referimo-nos a esse verdadeiro sol interior que condensa ereúne em seu foco ardente todas as aspirações de evolução do homeme todas as revelações vindas do Mais Alto. A lei do amor substitui apersonalidade pela fusão de todos os seres e termina com as misériassociais.

Feliz daquele que, vencendo a sua etapa de egoísmo e orgulho,ama com imenso amor seus irmãos que estejam em sofrimentos!Feliz aquele que ama, porque não mais conviverá com as angústiasde sua alma nem com as de seu corpo. Seus pés são leves e ele vivecomo que transportado para fora de si mesmo.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM206

207CAPÍTULO XI

Quando Jesus pronunciou essa divina palavra: amor, essapalavra fez os povos estremecerem, e os mártires, inebriados deesperanças, submeteram-se aos sacrifícios para testemunharem aPalavra da Esperança.

O Espiritismo, por sua vez, vem pronunciar uma segundapalavra do dicionário divino. Estejam, pois, atentos, porque essapalavra soergue a cobertura dos túmulos vazios, e a reencarnação,abatendo a morte, revela ao homem deslumbrado toda a sua riquezamoral e de inteligência. Já não é mais ao sacrifício que ela conduz ohomem. Ela leva o homem à conquista de seu ser, elevado etransfigurado espiritualmente. O sangue dos sacrifícios livrou oespírito do cativeiro e, agora, o espírito alforriado deve libertar ohomem da prisão da matéria.

Eu já disse que o homem, no seu princípio, não possuía maisque instintos. Aquele, pois, que é dominado pelos instintos, estámais próximo de seu ponto de partida do que do seu ponto dechegada. Para avançar ao encontro de sua meta espiritual, é necessáriovencer os instintos, transformando-os em sentimentos, ou seja, deveo homem aperfeiçoar os seus instintos, sufocando o domínio damatéria sobre si mesmo.

Os instintos, no mecanismo divino, são as sementes de ondenascem os sentimentos. Os instintos trazem consigo o progresso,assim como a semente de uma laranja traz em si a laranjeira. Osseres menos evoluídos são os que, libertando-se, pouco a pouco,do seu estado latente, permanecem a serviço de seus instintos.

O Espírito, por isso, deve ser cultivado como um terreno deagricultura. Toda a colheita futura depende do trabalho de hoje. Emais que os bens terrenos, o seu trabalho no campo moral de suaalma o levará à gloriosa evolução. Será então que, compreendendoa lei do amor, que une todos os seres, nela você buscará os suavesprazeres da alma, que são os primeiros passos das alegrias celestiais.(Lázaro, Paris, 1862.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM207

AMAR O PRÓXIMO COMO A SI MESMO

208

9. O amor é de essência divina. Desde o mais elevado aomais primário, todos vocês têm, no fundo do coração, a centelhadesse fogo sagrado. Esse é um fato que vocês têm podido constatarmuitas vezes; o homem mais desprezível, o mais vil, o maiscriminoso, dedica por um ser ou por uma coisa qualquer, umaafeição viva e calorosa, à prova de tudo quanto pudesse diminuí-la,atingindo esse afeto, por vezes, tamanho sublime.

Eu disse por um ser ou uma coisa qualquer, porque existem,entre vocês, pessoas que empregam os tesouros do amor, que sederramam de seus corações, em animais, em plantas, e mesmo emobjetos materiais. Estas são criaturas que, preferindo a solidão e oisolamento de outras pessoas, queixando-se da humanidade em geral,oferecem resistência ao impulso natural de sua alma que busca, emtorno de si mesma, a afeição e a simpatia de seus semelhantes. Estas,portanto, rebaixam a lei de amor à condição do instinto.

Mas, por mais se queixem e se isolem no cultivo de suaspreferências, elas não conseguirão sufocar a semente viva que Deusdepositou no seu coração, no momento de sua criação. Essa se-mente germinará um dia e se desenvolverá, crescendo com amoralidade e a inteligência. Embora sufocada pelo egoísmo, essasemente é a origem das santas e doces virtudes que fazem nascer asafeições sinceras e duráveis e ajudam as criaturas a transpor o caminhoíngreme e árido da existência humana.

Há pessoas que sentem repugnância pela prova dareencarnação, pelo temor que outros venham participar das simpatiasdaqueles a quem dedicam o seu afeto. Pobres irmãos! O afeto devocês os torna egoístas. O amor que vocês cultivam está voltadoapenas ao círculo estreito de parentes ou de amigos e todas as demaispessoas lhes são indiferentes. Pois bem! Para viver a lei de amor,como Deus a quer, é necessário que vocês cheguem, passo a passo,a amar todos os seus irmãos indistintamente.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM208

209CAPÍTULO XI

Esse exercício de amor poderá ser longo e difícil, mas ele serealizará. Deus quer que seja assim. E a lei do amor é a primeira emais importante regra desta nova doutrina. Essa regra é que, umdia, extinguirá o egoísmo, sob qualquer forma que se apresente,uma vez que se existe o egoísmo pessoal, há também o egoísmo defamília, de casta, de nacionalidade.

Jesus disse: “Amai o vosso próximo como a vós mesmos”.Ora, qual é o limite do próximo? Será a família, a seita religiosa, anação? Não! O próximo é toda a humanidade, são todos os homens.Nos mundos superiores, é o amor recíproco que harmoniza e orientaos Espíritos Elevados que os habitam. A Terra, destinada à evoluçãoque se aproxima, pela transformação dos homens e da sociedade,verá os seus habitantes praticarem esta sublime lei de amor, reflexoda própria Divindade.

Os efeitos da lei de amor são o crescimento moral da raçahumana e a felicidade no curso da vida terrena. Os mais rebeldes eos mais viciosos deverão se reformar, quando eles virem os bene-fícios produzidos pela prática do princípio: “Não façais aos outroso que não quereis que os outros vos façam, mais fazei, ao contrário,todo o bem que esteja ao vosso alcance fazer”.

Caros e amados irmãos, utilizem com proveito essas lições.Colocá-las em prática é difícil, porém a alma retira delas um bemimenso. Creiam-me e façam o sublime esforço que eu lhes peço:“Amem-se”, e vocês verão logo a Terra transformada em um paraíso,onde as almas dos justos virão gozar o repouso. (Fénelon, Bordéus,1861.)

10. Meus caros condiscípulos, os Espíritos aqui presentes lhesdizem numa só voz: “Amem muito, a fim de vocês serem amados”.Este pensamento é tão justo, que vocês nele encontrarão todo oconsolo e a calma para as dores de cada dia. Melhor ainda será pôrem prática este sábio conselho, porque vocês se elevarão tanto acima

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM209

AMAR O PRÓXIMO COMO A SI MESMO

210

das coisas materiais, que se espiritualizarão antes mesmo de deixaremo corpo terreno.

Os conhecimentos Espíritas ampliam em vocês acompreensão do futuro, dando-lhes uma certeza: vocês evoluirãopara Deus, com todas as promessas que respondem às aspirações desua alma. Por isso, vocês devem elevar-se bem alto para julgaremsem as restrições criadas pelas coisas materiais e não mais condenaremseu próximo antes de dirigirem os seus pensamentos a Deus.

Amar, no sentido profundo da palavra, é vocês serem leais,corretos, conscienciosos, a fim de fazer aos outros o que queiramque os outros façam por vocês mesmos. É procurar em torno devocês o sentido íntimo de todas as dores que acabrunham seusirmãos, para suavizá-las. É considerar a grande família humana comoa sua própria, porque essa grande família vocês a encontrarão muitobreve em mundos mais evoluídos. Afinal, os espíritos que constituemessa grande família, assim como vocês, são filhos de Deus, destinadosa se elevarem ao Infinito.

Vocês não podem recusar a esses seus irmãos aquilo que Deuslhes deu liberalmente, porque, de sua parte, vocês seriam bem felizesse os seus irmãos lhes dessem aquilo de que vocês têm necessidade.Para todos os sofredores dêem uma palavra de esperança e de apoio,a fim de que vocês sejam todo amor e todo justiça.

Creiam que este sábio princípio: “Amem bastante para seremamados”, abrirá um novo caminho nas suas vidas. Esse princípio érevolucionário e segue a rota que é determinada, invariável.

Mas vocês, com esse conhecimento, já evoluíram, vocês queme escutaram. Vocês estão infinitamente melhores do que eram hácem anos. Vocês de tal maneira mudaram para melhor, que acei-tam, sem repelir, uma imensidade de idéias novas sobre a liberdadee a fraternidade, que vocês rejeitariam no passado. Por isso é que,daqui a cem anos, vocês aceitarão com a mesma facilidade aquelasidéias que ainda não puderam entrar na sua mente.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM210

211CAPÍTULO XI

Hoje, quando o movimento Espírita já deu um grande avanço,vejam com que rapidez as idéias de justiça e de renovação moral,contidas nas mensagens dos Espíritos, são aceitas pela maior partedas pessoas inteligentes. É que essas idéias são uma resposta a tudoo que há de divino em vocês. É que o campo de suas almas estápreparado por uma sementeira fecundada, que começou no séculopassado, implantando na sociedade as grandes idéias da evolução.

Como tudo segue uma ordenação do Altíssimo, todos osensinamentos que vocês acolheram e aceitaram, realizarão a mudançauniversal do amor ao próximo. Pela lei do amor, os espíritosencarnados, julgando melhor e sentindo melhor, dar-se-ão as mãosem todas as partes da Terra. Todos se reunirão, por se entenderem ese amarem, para extinguir todas as injustiças, todas as causas dedesentendimentos entre os povos.

Grande pensamento de renovação pelo Espiritismo, tão bemexposto em O Livro dos Espíritos, vocês produzirão o grande milagredo século futuro, que é a reunião de todos os interesses materiais eespirituais dos homens, pela aplicação deste ensinamento bemcompreendido: “Amai bastante, para serdes amados”. (Sansão, antigomembro da Sociedade Espírita de Paris, 1863.)

O EGOÍSMO

11. O egoísmo, esta chaga da humanidade, precisa desaparecerda Terra, porque impede a sua evolução moral. É ao Espiritismoque está reservada a tarefa de fazê-la ascender na hierarquia dosmundos.

O egoísmo é, portanto, a enfermidade contra a qual todosdevem aplicar os medicamentos necessários, com toda a sua fé etoda a sua perseverança, porque esta é a qualidade de que vocêsmais necessitam para vencer a si mesmos, sem se ocupar de querer

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM211

AMAR O PRÓXIMO COMO A SI MESMO

212

vencer o seu próximo. Que cada um, por conseguinte, empenhetodos os seus esforços para curar a ferida do egoísmo em si próprio,porque esse monstro devorador de todas as inteligências é filho doorgulho e é a origem de todas as misérias terrenas.

O egoísmo é a negação da caridade e, conseqüentemente, ogrande obstáculo para a felicidade dos homens.

Jesus lhes deu o exemplo da caridade e Pôncio Pilatos oexemplo do egoísmo, porque, enquanto o Justo vai percorrer assantas estações de seu martírio, Pilatos lava as mãos dizendo: “Estehomem é justo, por que o quereis crucificar?” – E, no entanto, eledeixa que conduzam Jesus ao suplício.

É por esse antagonismo entre a caridade e o egoísmo, estalepra que invadiu o coração do homem, que o cristianismo aindanão cumpriu toda a sua missão. É a vocês, novos apóstolos da fé,que os Espíritos Superiores esclarecem, que cabe a tarefa e o deverde extirpar esse mal. Só assim o cristianismo disporá de toda a suaforça para limpar o caminho que conduz à espiritualização. Só assimserão afastadas as pedras que entravam o desenvolvimento dadoutrina do Cristo.

Expulsem o egoísmo da Terra e ela subirá na escala dosmundos, pois já é tempo de a humanidade vestir a sua verdadeiraroupagem espiritual, mas para isso é necessário que primeiro vocêsexpulsem o egoísmo de seus corações. (Emmanuel, Paris, 1861.)

12. Se os homens se amassem uns aos outros com o mesmoamor, a caridade seria mais bem praticada. Mas, para isso, serianecessário que vocês se empenhassem em desembaraçar-se da couraçado egoísmo que recobre os seus corações, a fim de eles se tornaremmais sensíveis aos sofrimentos de seu próximo. A dureza do coraçãomata os bons sentimentos.

O Cristo nunca se esquivava daquele que o buscava, fossequem fosse, e não repelia a ninguém. A mulher adúltera, o

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM212

213CAPÍTULO XI

criminoso, todos eram amparados por Ele. Jesus, inclusive, nãotemeu jamais que a sua reputação sofresse por isso.

Quando vocês o tomarão por modelo de suas ações?Se a caridade reinasse sobre a Terra o mal não imperaria nela.

O mal fugiria envergonhado, ocultando-se, porque em toda parte se sentiriadeslocado. O mal, então, desapareceria, fiquem bem compenetrados nisso.

Comecem por dar o exemplo da caridade vocês mesmos.Sejam caridosos com todos, sem escolher pessoas. Esforcem-se paranão ficar notando aqueles que os olham com desdém. Deixem aDeus o cuidado de toda a Justiça, pois todos os dias, no seu reino,Ele separa o joio do trigo, separa o bom do mau.

O egoísmo é a negação da caridade. Sem caridade, porém,não haverá tranqüilidade na vida entre os homens e, digo mais, nãohaverá segurança. Com o egoísmo e o orgulho, que andam semprejuntos, a vida será sempre uma correria em que vence o espertalhão,uma luta de interesses pessoais em que se calcarão aos pés as maissantas afeições, em que nem os sagrados laços de família serão aomenos respeitados. (Pascal, Sens, 1862.)

A FÉ E A CARIDADE

13. Há pouco, eu lhes disse, meus queridos filhos, que acaridade sem a fé não será suficiente para manter entre os homensuma ordem social capaz de torná-los felizes. Eu deveria ter dito quea caridade é impossível sem a fé. Vocês poderão encontrar, é verdade,impulsos generosos, mesmo entre pessoas que não tenham religiãodefinida. Mas essa caridade séria, que só pode ser exercida comabnegação, com sacrifício diário de todo e qualquer interesseegoístico, essa somente a fé pode inspirá-la. Nada, além da fé, nosfará carregar com coragem e perseverança a cruz desta vida.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM213

AMAR O PRÓXIMO COMO A SI MESMO

214

Sim, meus filhos, é em vão que o homem, desejoso deprazeres fáceis, se ilude sobre o seu destino nesse mundo, pretendendoque lhe seja permitido ocupar-se apenas de sua própria felicidade. Écerto que Deus nos criou para sermos felizes na eternidade. A vidaterrena, porém, deve unicamente servir para o nosso aperfeiçoamentomoral, que se alcança mais facilmente com o auxílio do corpo físicoe das coisas materiais. Por isso as dificuldades da vida, a diversidadede gostos, de pendores, de necessidade, são meios utilizados paraque vocês evoluam moralmente, exercitando-se na caridade. Omotivo é que somente à custa de concessões e sacrifícios mútuos éque vocês podem manter a harmonia entre tendências tão diversasque vocês têm.

Vocês têm, contudo, razão em afirmar que a felicidade estádestinada ao homem nesse mundo, se ele a procurar, não nos prazeresmateriais, mas na prática do bem. A história do cristianismo fala demártires que caminhavam para o suplício com alegria. Hoje, porém,na sua sociedade, para vocês serem cristãos, não se faz necessárionem o sacrifício da fogueira, nem o sacrifício da vida, mas única esimplesmente o sacrifício de seu egoísmo, de seu orgulho e de suavaidade pessoal.

Vocês triunfarão, se a caridade os inspirar e se a fé os sustentar.(Um Espírito Protetor, Cracóvia, 1861.)

CARIDADE COM OS CRIMINOSOS

14. A verdadeira caridade é um os mais sublimes ensinamentosque Deus deu ao mundo. A caridade deve existir entre os verdadeirosdiscípulos da sua Doutrina na forma de uma completa fraternidade.

Vocês devem amar, também, os infelizes, os criminosos, comocriaturas de Deus, para os quais o perdão e a misericórdia serão

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM214

215CAPÍTULO XI

concedidos, se eles se arrependerem, como para vocês mesmos foramconcedidos para as faltas que vocês cometeram contra a Lei Divina.Pensem bem que vocês são mais sujeitos à repressão, mais culpadosdo que aqueles aos quais vocês recusam o perdão e a comiseração.Quase sempre eles não conhecem a Deus como vocês conhecem e,por isso, para eles será menos pedida a fidelidade à Lei Divina, doque a vocês que conhecem essa Lei.

Não julguem, oh! não julguem, meus queridos amigos,porque o julgamento que vocês fizerem lhes será aplicado aindamais severamente. Vocês têm necessidade de indulgência para asfaltas que vocês cometem todos os dias. Vocês não sabem que hámuitas ações que são crimes aos olhos do Deus de pureza, mas queo mundo as considera como se fossem erros leves?

A verdadeira caridade não consiste tão-somente na esmolaque vocês dão, nem mesmo tão-só de palavras de consolação quevocês fazem acompanhar a esmola dada. Não! Não é apenas isso oque Deus exige de vocês! A caridade sublime, ensinada por Jesus,consiste também na benevolência constante e em todas as coisasque vocês dêem ao seu próximo.

Vocês podem, ainda, praticar essa sublime virtude da caridadecom muitas criaturas que não necessitam de esmolas, mas são carentesde palavras de amor, de consolação, de encorajamento, para seremconduzidas ao Senhor.

Os tempos se aproximam, eu lhes repito, em que a grandefraternidade reinará sobre a Terra. A lei do Cristo será a que regerá aconduta entre os homens. Somente essa lei será o que conterá osdesvarios e fará nascer a esperança, e conduzirá as almas às moradasda bem-aventurança.

Amem-se, como filhos do mesmo Pai!Não façam diferenças entre vocês e os infelizes, porque Deus

quer que todos sejam iguais. Não menosprezem nenhuma pessoa.Deus quer que os grandes criminosos estejam entre vocês, a fim de

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM215

AMAR O PRÓXIMO COMO A SI MESMO

216

que eles lhes sirvam de aprendizagem. Dentro de pouco tempo,quando os homens serão levados às verdadeiras leis de Deus, já nãohaverá necessidade dessas chocantes lições do mal e, então, todos osEspíritos impuros e revoltados serão exilados para mundos inferioresque ainda se afinizam com essas inclinações infelizes.

Vocês devem, para esses que lhes falo, o amparo de suasorações. Essa é a verdadeira caridade. Vocês não devem dizer de umcriminoso: “Este é um miserável; deve ser extirpado da Terra; amorte que lhe apliquem é muito branda para uma pessoa dessaespécie”.

Não! Não é assim que vocês devem falar. Recordem-se doseu modelo, Jesus. Que diria Jesus se visse um infeliz desses ao seulado? Ele o lamentaria e o consideraria como um doente bem infeliz.

Jesus lhe estenderia a mão.Vocês não podem, na realidade, fazer o mesmo. Mas, pelo

menos, vocês podem orar por esse infeliz. Podem prestar-lheassistência espiritual, durante o tempo que ele haja de passar sobre aTerra. O arrependimento pode tocar o coração desse infeliz, se vocêsorarem com fé. Esse infeliz é tanto o seu próximo como o é omelhor dentre os homens. A alma desse infeliz transviado e revoltadofoi criada como a de vocês mesmos, destinada à perfeição. Ajudem-no, portanto, a sair do lodo e orem por ele. (lsabel da França, Havre,1862.)

EXPOR A VIDA POR UM CRIMINOSO

15. Um homem está em perigo de morte. Para salvá-lo, énecessário expor a própria vida. Mas, sabe-se que esse homem é ummalfeitor e que, se ele se salvar, poderá cometer outros crimes. Deve-se, apesar disso, arriscar a própria vida para salvá-lo?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM216

217CAPÍTULO XI

Esta é uma questão grave.Ela pode apresentar-se a você!Eu a responderei, segundo a minha evolução moral, pois o

que se trata é de saber se convém expor a sua vida, mesmo por ummalfeitor.

O devotamento é cego: socorre-se um inimigo e, deve-se,portanto, socorrer a um inimigo da sociedade, ou seja, um malfeitor.

Crêem vocês que é somente da morte que se vai salvar esseinfeliz? Talvez seja ele salvo de toda a sua vida passada. Porque,pensem nisso, nos rápidos instantes em que ocorrem os derradeirosminutos de vida, o homem revê toda a sua existência passada, ouseja, toda a sua última existência se levanta diante dos seus olhos. Amorte, talvez, lhe chegue muito cedo. A reencarnação, por isso,pode ser-lhe dolorosa.

Atirem-se, pois, ó homens! Atirem-se todos vocês que aciência Espírita esclareceu! Atirem-se e o arrebatem de suacondenação e, talvez, esse homem que teria morrido a maldizer-lhes, se lançará em seus braços.

Vocês, todavia, não devem perguntar se ele se lançará ou nãoaos seus braços, mas devem correr a seu socorro para, salvando-o,obedecerem a essa voz do coração que lhes diz: “Tu podes salvá-lo,salva-o!”. (Lamennais, Paris, 1862.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM217

AMAI OS VOSSOS INIMIGOS

218

RETRIBUIR O MAL COM O BEM

1. Porque em vos digo que se a vossa justiça não exceder a dosescribas e fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus. –Ouvistes que foi dito: Amarás o teu próximo, e aborrecerás o teu inimigo.Eu, porém, vos digo: Amai a vossos inimigos, bendizei os que vosmaldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratame vos perseguem, para que sejais filhos do vosso Pai que está nos céus;porque faz que o seu sol se levante sobre maus e bons, e a chuva desçasobre justos e injustos. Porque se amardes os que vos amam, que galardãotereis? Não fazem o mesmo os publicanos? E, se saudardes unicamenteos vossos irmãos, que fazeis de mais? Não fazem os publicanos tambémassim? (Mateus, capítulo 5, versículos 20 e 43 a 47.)

2. E se amardes aos que vos amam, que recompensa tereis?Também os pecadores amam aos que os amam. E se fizerdes bem aosque vos fazem o bem, que recompensas tereis? Também os pecadoresfazem o mesmo. E se emprestardes àqueles de quem esperais tornar areceber, que recompensa tereis? Também os pecadores emprestam aospecadores, para tornarem a receber outro tanto. Amai, pois, a vossosinimigos, e fazei o bem, e emprestai, sem nada esperardes, e será grandeo vosso galardão, e sereis filhos do Altíssimo; porque ele é benigno atépara com os ingratos e maus. Sede, pois, misericordiosos, como tambémvosso Pai é misericordioso. (Lucas, capítulo 6, versículos 32 a 36.)

12

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM218

219CAPÍTULO XII

3. Se o amor ao próximo é o princípio da caridade, amar aseus inimigos é a sua aplicação sublime, porque esta virtude é umadas grandes vitórias alcançadas sobre o egoísmo e o orgulho.

No entanto, geralmente nos confundimos sobre o sentidoda palavra amor, quando aplicada ao amor aos inimigos. Jesus nãopretendeu, na sua aplicação, que tivéssemos pelo inimigo a mesmaternura que temos por um irmão ou por um amigo. A ternura estáfundamentada na confiança. Mas ninguém pode depositar confiançanaquele que nos quer mal. Ninguém pode ter com o inimigo asdemonstrações de amizade, desde que se saiba que ele é capaz deabusar dessa amizade. Entre pessoas que desconfiam umas das outras,não poderão existir esses laços de simpatia que existem entre aquelesque partilham das mesmas idéias. Não se pode, enfim, sentir-se omesmo prazer ao encontrar um inimigo, que aquele que se sente aoencontrar um amigo.

Esse sentimento de desconforto, ao se encontrar um inimigo,resulta mesmo de uma lei física: a de assimilação e de repulsão defluidos. O mau pensamento irradia uma corrente fluídica queenvolve a outra criatura numa sensação penosa. O pensamentobenevolente envolve os demais numa sensação descontraída eagradável. Daí a diferença de sensações que se experimenta com aaproximação de um amigo ou de um inimigo.

Amar seus inimigos não pode, pois, significar que nenhumadiferença você fará entre eles e os seus amigos. Se esse princípio deamor parece difícil, até mesmo impossível de pôr em prática, éapenas por entender-se, falsamente, que se mandou dar aos amigose inimigos o mesmo lugar no coração.

A pobreza da linguagem humana obriga a que se sirva damesma palavra para exprimir diversas formas de sentimentos. Caberá,então, à razão estabelecer as diferenças necessárias dos sentimentos,para uma mesma palavra, segundo o emprego que se lhe dê.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM219

AMAI OS VOSSOS INIMIGOS

220

Amar seus inimigos não é, portanto, ter para com eles umaafeição que não é natural, porque a presença de um inimigo faz ocoração palpitar de uma outra maneira do que quando bate se vocêse encontra com um amigo. Amar os inimigos é não ter contra elesnem ódio, nem rancor e nem desejo de vingança. É perdoá-los semuma segunda intenção e sem nenhuma condição, pelo mal que nosfizeram. É não criar obstáculos para a reconciliação. É desejar-lhes obem e não o mal. É sentir alegria, e não aflição, com o bem que elesalcancem. É estender-lhes a mão amiga em caso de eles teremnecessidades. É abster-se, por palavras e por atos, de tudo que ospossa prejudicar. É, enfim, dar-lhes em tudo o mal com o bem,sem intenção de humilhá-los.

Aquele que assim faz, cumpre as condições do mandamento:“Amai os vossos inimigos”.

4. Amar seus inimigos é uma falta de senso para o incrédulo.Aquele para quem a vida presente é tudo, não vê no seu inimigomais do que uma criatura nociva que lhe perturba o repouso e daqual somente a morte, pensa o incrédulo, irá libertá-lo. Daí o desejode vingança.

O incrédulo não tem nenhum interesse em perdoá-lo, amenos que seja para satisfazer o seu orgulho aos olhos de outraspessoas. Perdoar mesmo, em certos casos, vai parecer-lhe umafraqueza indigna de sua personalidade. Se não se vinga, nem porisso deixa de guardar rancor e ter um secreto desejo de fazer o mal aseu inimigo.

Para o crente, e ainda mais para o Espírita, a maneira de ver étoda outra, porque o Espírita dirige o seu olhar sobre o passado esobre o futuro, sabendo que entre o passado e o futuro está a vidapresente como um estágio de aprendizagem. O Espírita sabe que,pela própria destinação da Terra como mundo de provas e expiações,ele deve esperar encontrar-se com homens maus e perversos. Sabeque maldades com que se depara fazem parte das provações que lhe

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM220

221CAPÍTULO XII

cabe suportar. Examinando a maldade por esse ângulo, ascontrariedades se tornam menos amargas, quer venham dos ho-mens, quer das coisas. Se ele não se queixa contra as provações, elenão deve queixar-se contra aqueles que são os instrumentos de suasprovas. Se, em lugar de lamentar, agradecer a Deus pelas provações,ele deve, também, agradecer a mão que lhe abre a oportunidade derevelar a sua paciência e a sua resignação.

Esse pensamento o disporá, naturalmente, ao exercício doperdão. O Espírita sente, então, que se tornou mais generoso ecresceu espiritualmente a seus próprios olhos e mais longe se põedo alcance dos dardos de seu inimigo.

O homem que ocupa uma posição elevada no mundo não sejulga ofendido pelos insultos daquele a quem considera como seuinferior. Assim também se dá com aquele que se eleva no mundomoral, colocando-se acima das pessoas que estão presas às coisasmateriais. Ele compreende, por isso, que o ódio e o rancor oaviltariam e o rebaixariam. Para ser, portanto, superior moralmentea seu adversário, faz-se necessário que ele tenha uma alma maior,mais nobre e mais generosa do que a de seu inimigo.

INIMIGOS DESENCARNADOS

5. O Espírita tem ainda outros motivos de indulgência paracom seus inimigos. Ele sabe, mais que os outros, que a maldadenão é um estado permanente dos homens. Ele sabe que a maldadeé uma imperfeição temporária e que, do mesmo modo que a criançase corrige de suas faltas, o homem desequilibrado espiritualmentereconhecerá um dia os seus erros e se tornará bom.

O Espírita sabe, também, que a morte somente o livrará dapresença física do seu inimigo. E sabe, igualmente, que morto, oseu inimigo poderá persegui-lo com o seu ódio, mesmo depois de

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM221

AMAI OS VOSSOS INIMIGOS

222

haver deixado a Terra. Sabe, assim, que a vingança tomada, falha aoseu objetivo. Que, ao contrário de distanciá-lo de seu inimigo, avingança gera uma irritação enorme que pode prosseguir de umaexistência para outra.

Caberia ao Espiritismo provar, pela experiência e pela lei querege as relações do mundo visível com o mundo invisível, que aexpressão: “Extinguir o ódio com o sangue”, é inteiramente falsa. Averdade é que o sangue alimenta o ódio, mesmo na vida espiritualinferior. O Espiritismo nos dá, por conseqüência, uma outra razãoefetiva e uma outra utilidade prática ao perdão e à sublime máximado Cristo: “Amai os vossos inimigos”.

Não há coração tão perverso que não se deixe tocar pelasboas ações, mesmo que seja a contragosto. Pelas boas ações, tira-sedo inimigo toda desculpa para as represálias. De um inimigo, en-tão, se pode fazer um amigo, antes e depois da morte.

Com as más ações o inimigo se irrita e é, então, que ele setorna o instrumento da Justiça Divina, para cobrar o amor nãovivido daquele que não perdoou.

6. Pode-se, pois, ter inimigos entre os encarnados e entre osdesencarnados.

Os inimigos do mundo espiritual manifestam maldades pelasobsessões e pelas subjugações a que tantas pessoas estão expostas.Tais desajustes são uma variedade das provações da vida. Estasprovações, como as outras, contribuem para a evolução moral edevem, por isso, ser aceitas com resignação e como conseqüênciada natureza inferior da Terra.

Se não existissem homens de caráter infeliz sobre a Terra, nãohaveria Espíritos infelizes nas regiões em torno da Terra. Se devemosser indulgentes e benévolos para com os inimigos encarnados, porconseqüência devemos ser igualmente indulgentes e benevolentespara com os inimigos desencarnados.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM222

223CAPÍTULO XII

No passado, eram sacrificadas vítimas num banho de sanguepara aplacar os gênios infernais, que não eram outros a não ser essesmesmos Espíritos infelizes a que nos referimos. A esses deusesinfernais sucederam os demônios, que são a mesma coisa.

O Espiritismo vem provar que esses antigos demônios nãosão mais que as almas dos homens perversos, que ainda não sedespojaram dos instintos materiais. Prova, também, que ninguémconsegue tranqüilizá-los a não ser pelo sacrifício do ódio existente, ouseja, pela caridade praticada.

A caridade não tem apenas o efeito de impedi-los de fazer omal, mas também o efeito de induzi-los no caminho do bem e decontribuir para a evolução deles. É assim que a máxima: “Amai osvossos inimigos” não fica limitada ao meio estreito da Terra e davida atual, porém faz parte da grande lei de solidariedade e da fra-ternidade universais.

FERIR NA FACE DIREITA

7. Ouvistes o que foi dito: Olho por olho, e dente por dente.Eu, porém, vos digo que não resistais ao mal, mas, se alguém vos baterna face direita oferecei também a outra; e ao que quiser pleitearconvosco, e tirar-vos o vestido, largai-lhe também a capa. E, se alguémvos obrigar a caminhar uma milha, ide com ele duas. Dai a quem vospedir, e não vos desvieis daquele que quiser que lhe empresteis. (Mateus,capítulo 5, versículos 38 a 42.)

8. A intolerância dos homens, sobre o que se chama de honrapessoal, criou uma sensibilidade doentia, nascida do orgulho e daexagerada importância que cada um dá a si mesmo. Isso leva ohomem a responder a uma ofensa com outra ofensa, um golpecom outro golpe. E a resposta do mal com outro mal, parece justapara aqueles cujo senso moral não se eleva acima das paixões terrenas.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM223

AMAI OS VOSSOS INIMIGOS

224

Por isso é que a lei mosaica dizia: “Olho por olho e dente pordente”, lei essa que estava em harmonia com os tempos em queMoisés vivia. Mas veio o Cristo e disse: “Retribuí o mal com obem”. E disse ainda: “Não resistais ao mal que vos queiram fazer; sealguém bater numa face, oferecei-lhe também a outra”.

Aos orgulhosos, esta máxima parecerá uma covardia, porqueeles não compreendem que há mais coragem em suportar um insultodo que em tomar uma vingança. E não compreendem pelo fato desua visão não ir além da vida atual.

Deve-se, entretanto, tomar essa máxima ao pé da letra? Não,da mesma maneira que não se toma ao pé da letra aquela em queJesus diz para arrancar o olho, se ele é uma causa de escândalo. Selevado até às suas últimas conseqüências, aquele ensinamentocondenaria toda repressão, mesmo a legal, e deixaria o campo livreaos maus, que nada teriam a temer.

Se não se colocasse um freio nas agressões dos maus, muitodepressa todos os homens bons seriam as suas vítimas. O próprioinstinto de conservação, que é uma lei da Natureza, impede quealguém entregue, de boa vontade, o seu pescoço ao assassino.

Compreenda-se, pois, que o ensinamento de Jesus não impedea defesa, mas condena a vingança. Ao dizer que apresentemos a outraface quando formos batidos numa, Ele disse, sob outra forma, quenão se deve retribuir o mal com o mal; que o homem deve aceitarcom humildade tudo o que lhe abata o orgulho; que é mais gloriosopara o homem ser ofendido do que ofender, suportar pacientementea injustiça do que ele mesmo ser injusto; que vale mais ser enganadodo que ser o enganador, arruinado do que arruinar os outros.

Temos aí, ao mesmo tempo, a condenação das rixas, quenada mais são do que a manifestação do orgulho ferido. A fé navida futura e na Justiça Divina, que jamais deixa o mal semconseqüências dolorosas, pode dar ao homem a força para suportar

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM224

225CAPÍTULO XII

pacientemente os golpes desferidos nos seus interesses e no seu amor-próprio.

Eis porque lhes dizemos sem cansar: “Lancem o seu olharpara o futuro! Quanto mais vocês se elevarem, pelo pensamento,acima de vida material, menos vocês se sentirão feridos pelas coisasda Terra”.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:A VINGANÇA

9. A vingança é uma das últimas manifestações de costumesprimitivos que estão a desaparecer no meio dos homens. Ela é umdos derradeiros vestígios dos hábitos selvagens, em que se debatia ahumanidade no começo da era cristã. Eis porque a vingança é umaindicação certa do estado de atraso dos homens que a ela se entregame dos espíritos que ainda podem inspirá-la.

Portanto, meus amigos, o sentimento de vingança não devejamais vibrar no coração daquele que se diz e se afirma Espírita.Vingar-se é, vocês o sabem, tão contrário a esta prescrição do Cristo:“Perdoai a vossos inimigos”, que aquele que se recusa a perdoar, nãosomente não é Espírita, como nem mesmo é cristão.

A vingança é um desejo tão funesto quanto a falsidade e abaixeza que são suas companheiras assíduas. Com efeito, aqueleque se abandona a essa fatal e cega paixão, quase nunca se vinga àluz do dia. Quando ele é o mais forte, cai como uma fera sobreaquele que considera seu inimigo, desde que a presença deste venhaa inflamar a sua paixão, a sua cólera e o seu ódio.

Na maioria das vezes, porém, o vingador assume aparênciahipócrita, ocultando no fundo de seu coração os maus sentimentosque o animam. Ele toma caminhos escusos; segue nas sombras deseu inimigo sem despertar desconfianças, esperando o momento

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM225

AMAI OS VOSSOS INIMIGOS

226

certo para feri-lo sem colocar-se, o vingador, em perigo. Esconde-se do outro, vigiando-o o tempo todo, preparando-lhe odiosasarmadilhas e, quando surge a ocasião, derrama-lhe veneno no copo.

Se o ódio do vingador, porém, não chega a tais extremos,aquele que deseja vingar-se ataca o perseguido na honra e nas suasafeições. Ele lança mão da calúnia e, no círculo de amizades e detrabalho do perseguido, vai insinuando maldades. Assim, quandoperseguido, comparece nos lugares onde o seu perseguidor destilouas maldosas insinuações, admira-se de encontrar semblantes friosnaquelas pessoas que antes eram amigas e bondosas. Fica estupefatoquando as mãos que se estendiam para a sua, agora se recusam aapertá-la. Enfim, o perseguido se sente aniquilado quando seusamigos mais caros e seus parentes se desviam e se afastam de si.

Ah! O covarde que se vinga assim é cem vezes mais criminosodo que aquele que vai direto ao inimigo e o insulta cara a cara!

Atire fora, portanto, esses costumes selvagens! Atire fora esseshábitos de outros tempos! Todo Espírita que pretendesse ter, aindahoje, o direito de vingar-se seria indigno de figurar por mais tempona falange que tomou por divisa: “Fora da caridade não há salvação!”.Mas, não, eu não posso deter-me na idéia que um membro dagrande família Espírita se atreva jamais a se render ao impulso devingança, porque diante do insulto ele se inclinará para o perdão.(Júlio Oliver, Paris, 1862.)

O ÓDIO

10. Amem-se uns aos outros, e vocês serão felizes. Empenhem-se sobretudo na tarefa de amar aqueles que lhes provocam umsentimento de indiferença, de ódio e de desprezo. O Cristo, que vocêsdevem fazer o seu modelo, já lhes deu o exemplo desse devotamento.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM226

227CAPÍTULO XII

Missionário do Amor, Ele amou até dar o seu sangue e a sua vidapor amor.

O sacrifício a que vocês se obrigam por amar aqueles que osultrajaram e perseguem é penoso, mas é exatamente esse sacrifícioque os torna superiores aos que ferem vocês. Se vocês os odiassemcomo eles os odeiam, não valeriam mais do que eles. É essa a oferendasem mácula que vocês oferecem a Deus no altar de seus corações,oferenda de agradável aroma, cujos perfumes sobem até Ele.

Se bem que a lei do amor mande que vocês amemindistintamente a todos os seus irmãos, essa lei não revestirá o seucoração contra os maus procedimentos. Essa é, ao contrário, aprovação mais penosa, eu o sei, porque na minha última existênciaterrena eu experimentei essa tortura.

Mas a Justiça Divina se cumpre nos que violam a lei do amor.Não esqueçam, meus queridos filhos, que o amor aproxima

de Deus e o ódio o distancia d’Ele. (Fénelon, Bordéus, 1861.)

* Nota do Tradutor – Por tratar-se de uma versão popular e atual, deixamos de incluir,

aqui, a tradução das páginas referentes ao duelo, que constam do original francês, por

ser essa uma etapa moral vencida pela humanidade e que hoje é apenas um doloroso

costume de um passado primitivo que, graças a Deus, já superamos!

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM227

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

228

FAZER O BEM SEM OSTENTAÇÃO

1. Guardai-vos de fazer a vossa esmola diante dos homens,para serdes vistos por eles. Aliás não tereis galardão junto de vosso Pai,que está nos céus. – Quando, pois, deres esmola, não faças tocar trombetadiante de ti, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas paraserem glorificados pelos homens. – Em verdade vos digo que járeceberam o seu galardão. Mas, quando tu deres esmola, não saiba atua mão esquerda o que faz a tua direita, para que a tua esmola sejadada ocultamente, e teu Pai, que vê em segredo, te recompensará.(Mateus, capítulo 6, versículos 1 a 4.)

2. E descendo Jesus do monte, seguiu-o uma grande multidão.E eis que veio um leproso, e o adorou dizendo: Senhor, se quiseres,podes tornar-me limpo. E Jesus, estendendo a mão, tocou-o, dizendo:Quero; sê limpo. – E logo ficou purificado da lepra. – Disse-lhe entãoJesus: Olha, não digas a ninguém, mas vai, mostra-te ao sacerdote, eapresenta a oferta que Moisés determinou, para lhes servir detestemunho. (Mateus, capítulo 8, versículos 1 a 4.)

3. Fazer o bem sem ostentação é um grande mérito. Escondera mão que dá é ainda mais meritório. Esta conduta é o sinal deuma grande superioridade moral. É que para ver as coisas de ummodo mais alto que o comum, é necessário separar-se mentalmenteda vida presente e ajustar-se com a vida futura. Por outras palavras,é necessário colocar-se acima da humanidade, para renunciar à

13

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM228

229CAPÍTULO XIII

satisfação que procura o testemunho dos homens, e esperar aaprovação de Deus.

Aquele que prefere a aprovação dos homens ao bem que faz,mais do que a aprovação de Deus, demonstra que tem mais fé noshomens do que em Deus. Demonstra, também, que a vida presenteé para ele mais do que a vida futura ou que até mesmo não crê navida futura. Se, no entanto, ele diz que crê na vida futura, age comose não acreditasse no que ele mesmo diz.

Quantos há que só fazem um benefício com a esperança deque o beneficiado vá anunciar por toda parte o benefício recebido!Quantos há que, à vista de todos, dão uma grande soma, mas seestiverem a sós não dariam uma só moeda! Foi para eles que Jesusdisse: “Aqueles que fazem o bem com ostentação já receberam a suarecompensa”. Com efeito, aqueles que buscam a sua glorificação naTerra, pelo bem que façam, já se pagaram a si mesmos. Deus nãolhes deve mais nada. Só lhes resta receber as desilusões que nascemdo orgulho.

Que a mão esquerda não saiba o que faz a direita é uma imagemsimbólica que caracteriza admiravelmente a beneficência modesta.Porém, se há modéstia verdadeira, há também modéstia falsa, umaimitação barata de modéstia. Pois há pessoas que escondem a mãoque dá o auxílio, mas têm o cuidado de deixar aparecer umpedacinho, olhando em volta para certificar-se se alguém não as viuocultá-la. Essa é uma comédia indigna dos ensinamentos de Cristo.

Se os benfeitores orgulhosos são desapreciados entre oshomens, o que não lhes acontecerá perante Deus? Também esses járeceberam a sua recompensa na Terra. Foram vistos e estão satisfeitosde terem sido vistos e isso lhes basta.

E qual será a recompensa daquele que faz pesar os seusbenefícios sobre o beneficiado, que lhe exige de algum modo ostestemunhos de reconhecimento, que lhe faz sentir a sua posição debenfeitor, destacando o preço dos sacrifícios que suportou pelo

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM229

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

230

beneficiado? Oh! Para esse, nem mesmo existe a recompensa terrena,porque está desprovido da doce satisfação de ouvir bendizer o seunome, e essa é a primeira desilusão de seu orgulho. As lágrimas queesse orgulhoso secou por vaidade, ao invés de subirem ao céu,recaíram sobre o coração do próprio aflito e abriram-lhe uma feridamaior. O bem que o vaidoso fez é sem proveito para ele mesmo,pois que ele o deplora e todo benefício deplorado é moeda falsa,sem nenhum valor.

A beneficência sem ostentação tem duplo merecimento. Alémde ser caridade material é também caridade moral. Ela não machucao sentimento do beneficiado. Ela leva o beneficiado a aceitá-la, semque o seu amor-próprio sofra, resguardando a sua dignidade pessoal.É que há alguém que aceita prestar um serviço, mas que rejeitareceber uma esmola. Porém converter um serviço em esmola, pelamaneira de exigi-lo, é humilhar aquele que o recebe. E há sempreorgulho e maldade em humilhar alguém.

A verdadeira caridade é delicada e engenhosa para dissimularo benefício, a fim de evitar até as menores aparências do benefíciocapazes de melindrar, porque toda mágoa moral aumenta osofrimento que nasce da necessidade.

A verdadeira caridade sabe encontrar palavras brandas e amigosque colocam o beneficiado à vontade diante do benfeitor, enquantoque a caridade orgulhosa esmaga o carente de amparo. O sublimeda verdadeira generosidade está no benfeitor saber inverter os papéis,encontrando um meio de parecer que ele mesmo é o beneficiadodiante daquele que lhe presta um serviço.

Eis, aqui, o que querem dizer estas palavras de Jesus: “Que amão esquerda não saiba o que faz a mão direita”.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM230

231CAPÍTULO XIII

INFORTÚNIOS OCULTOS

4. Nas grandes calamidades públicas, a caridade se agita evocê verá generosos impulsos para socorrer os desastres. Mas, aolado desses desastres gerais, há milhares de acidentes pessoais quepassam desapercebidos, como aqueles de gente que está numa camapobre sem se queixar. Estes são os infortúnios silenciosos e ocultosque a verdadeira generosidade sabe descobrir, sem esperar que aquelesque sofrem venham a suplicar por amparo.

Quem é esta senhora de ar distinto, de roupas simples, emborabem cuidadas, acompanhada de uma jovem filha vestida tambémmodestamente? Ela entra num casebre de dolorosa aparência, ondesem dúvida é conhecida, pois a sua chegada é saudada com respeito.

Aonde vai ela?Vai ao encontro de uma mãe de família, que está rodeada de

filhos pequenos. A sua presença faz a alegria brilhar naquelas facesdescoradas. É que ela vem ali acalmar todas as dores. Ela traz o quelhes é necessário, recoberto de doces e consoladoras palavras deânimo. Assim, faz que aceitem o benefício sem envergonharem-se,pois que esses infortunados não são profissionais de mendicância.O pai está num hospital e, enquanto lá permanece, a mãe não temo suficiente para atender as necessidades da família.

Graças a essa senhora, as pobres crianças não mais sentirãonem frio e nem fome. Irão para a escola agasalhadas e no seio damãe não faltará o leite para os menorzinhos. Se, entre essas sofridascriaturas, alguma adoece, ela não se sentirá mal em prestar-lhe oamparo material.

Daqui, essa senhora seguirá para o hospital, a fim de levar aopai algum reconforto e tranqüilizá-lo sobre a situação da família.

Numa esquina da rua, um veículo a espera, verdadeiroarmazém de tudo o que vai levar aos seus protegidos, que ela visitasempre. Ela não lhes pergunta nem a religião, nem quais são as suas

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM231

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

232

opiniões, pois que para ela todos os homens são seus irmãos e filhosde Deus.

Quando as visitas terminam, ela diz a si mesma: “Eu comeceibem o meu dia”.

Qual é o seu nome?Onde mora?Ninguém o sabe!Para os infelizes, o seu nome não é conhecido, mas ela é, para

todos eles, o anjo da consolação e, à noite, um coro de bênçãos seeleva para ela ao Pai Celestial. Católicos, judeus, evangélicos, todosa bendizem.

Por que esta roupa tão simples? É para não ferir a misériacom o luxo. Por que se faz acompanhar pela sua jovem filha? Épara esta aprender como se pratica a beneficência.

Sua filha também quer fazer a caridade, mas a sua mãe lhediz: “Que pode você doar, minha filha, se nada você tem de seu? Seeu lhe der qualquer coisa para passá-la a outros, qual será o seumérito? Na realidade, aí serei eu que farei a caridade e quemerecimento você teria nisso? Isso não é justo! Quando formosvisitar os doentes, você me ajudará a tratá-los. Ora, dispensarcuidados é dar alguma coisa. Isso não lhe parece suficiente? Se nãolhe parece suficiente, então nada mais simples do que você aprendera fazer obras úteis, costurando roupinhas para as criancinhas, porquedesse modo você doará alguma coisa que vem de você mesma”.

Assim é que esta mãe, verdadeiramente cristã, vai desenvolvendoa sua filha para a prática das virtudes ensinadas pelo Cristo.

Ela é Espírita?Que importa isso!No meio em que vive, é a mulher comum ao círculo de suas

relações, porque a sua posição social o exige. Mas ignoram o queela faz, porque ela não deseja outra aprovação às suas ações, que nãoseja a aprovação de Deus e a de sua própria consciência.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM232

233CAPÍTULO XIII

Porém, certo dia, uma ocorrência imprevista leva até à suacasa uma de suas protegidas, que andava a vender trabalhos manuais.Esta vendedora, ao vê-la, nela reconheceu a sua benfeitora. Mas elalhe disse: “Silêncio! Não digas a ninguém!”. – Assim falava Jesus.

O ÓBOLO DA VIÚVA

5. E olhando, Jesus viu os ricos lançarem as suas ofertas na arcado tesouro. E viu também uma pobre viúva lançar ali duas pequenasmoedas e disse: Em verdade vos digo que lançou mais do que todos,esta pobre viúva. Porque todos aqueles deitaram para as ofertas deDeus do que lhes sobeja, mas esta, da sua pobreza, deitou todo osustento que tinha. (Lucas, capítulo 21, versículos 1 a 4.)

6. Muita gente se queixa de não poder fazer todo o bem queteria vontade, por falta de recursos suficientes. Dizem que desejariamter uma grande fortuna para dela fazer uso no campo do bem.

Essa intenção, não há dúvida, é louvável. Pode até ser sincerada parte de alguns. Mas seria sincero da parte de todos um tãocompleto desinteresse pessoal? Não haveria quem, em desejandofazer o bem para os outros, se sentiria melhor se começasse a fazê-loa si próprio, dotando-se de mais alguns prazeres, de um pouco maisdo supérfluo que lhe falta, pronto a doar o resto aos pobres?

Esta segunda intenção, que alguns escondem de si mesmos,mas que eles encontrariam no fundo de seus corações se osexaminassem atentamente, anula o mérito da intenção. Com averdadeira caridade, o homem pensa nos outros, antes de pensarem si próprio.

O sublime da caridade, nesse caso, seria cada um procurar noseu próprio trabalho, pelo emprego de suas forças, de sua inteligênciae de seus talentos, os recursos de que necessita para realizar os seusplanos generosos. Haveria nisso o sacrifício mais agradável ao Senhor.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM233

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

234

Infelizmente, a maioria das pessoas vive a sonhar com os meiosmais fáceis de enriquecer de repente e sem sacrifícios. Correm atrásde quimeras, como a descoberta de um tesouro, uma oportunidadequalquer favorável, o recebimento de heranças inesperadas.

E que dizer daqueles que esperam encontrar, para os secundarnessas buscas do mais fácil, auxiliares entre os Espíritos? Seguramenteeles nem conhecem nem compreendem a finalidade sagrada doEspiritismo e, menos ainda a missão dos Espíritos a quem Deuspermite que se comuniquem com os homens. Daí virem a sofrercom as decepções. (O Livro dos Médiuns, questões 294 e 295.)

Aqueles, cuja intenção está despojada de toda idéia de interessepessoal, devem consolar-se de sua impotência de fazer todo o bemque desejariam, lembrando-se que o óbolo do pobre, que faz adoação se privando de alguma coisa, tem maior peso na BalançaDivina, do que a doação do rico que não lhe impõe privação alguma.

A satisfação seria grande, sem dúvida, de socorrer-se largamentea indigência. Mas se isso não nos é possível, devemos submeter-nose nos limitarmos a fazer o que seja possível. Aliás, não é somentecom o dinheiro que se podem enxugar lágrimas.

E devemos ficar inativos porque não temos dinheirosuficiente?

Ora, todo aquele que deseja sinceramente ser útil a seus irmãosencontrará mil formas diferentes de sê-lo. Que as procure e asencontrará. Se não for de uma maneira, será de outra, porque nãohá pessoa alguma, no livre gozo de suas faculdades, que não possaprestar um serviço qualquer, dar uma consolação, abrandar umsofrimento físico ou moral, tomar uma providência útil. Na faltade dinheiro, não dispõe cada um do seu trabalho, do seu tempo,do seu repouso para dar aos outros uma parte?

Também está aí a doação do pobre, o óbolo da viúva.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM234

235CAPÍTULO XIII

CONVIDAR POBRES E ESTROPIADOS

7. E dizia também ao que o tinha convidado: Quando deres umjantar ou uma ceia, não chames os teus amigos, nem os teus irmãos,nem os teus parentes, nem vizinhos ricos, para que não suceda quetambém eles te tornem a convidar, e te seja isso recompensado. Mas,quando fizeres convite, chama os pobres, aleijados, mancos e cegos, eserás bem-aventurado, porque eles não têm com que te recompensar,mas recompensado te será na ressurreição dos justos. E, ouvindo isto, umdos que estavam com Ele à mesa disse-lhe: Bem-aventurado o que comerpão no reino de Deus. (Lucas, capítulo 14, versículos 12 a 15.)

8. “Quando fizerdes um banquete – disse Jesus – nãoconvideis os vossos amigos, mas os pobres e estropiados.” Estaspalavras, absurdas se tomadas ao pé da letra, são sublimes, se lhesbuscarmos a sua significação espiritual. Jesus não poderia quererdizer, por elas, que em vez dos seus amigos, você deveria reunir àsua mesa os mendigos da rua. A linguagem d’Ele era, quase sempre,figurada. Para os homens incapazes de compreender os tons delicadosdo pensamento, Ele falava com imagens fortes produzindo os efeitosde um quadro berrante.

O fundo do pensamento de Jesus se revela nas palavras: “Vóssereis felizes, porque eles não terão meios de vos retribuir o que lhesoferecerdes”. Isso quer dizer que não se deve fazer o bem, visando auma retribuição, mas tão-somente pelo prazer de fazê-lo.

Para dar uma comparação clara, Jesus disse: “Convidai a vossosbanquetes os pobres, pois sabeis que eles não poderão vos retribuir”.E, por banquete, é necessário entender, não a refeição propriamentedita, mas a participação na abundância do que você desfruta.

Estas palavras, no entanto, podem ser aplicadas num sentidomais literal. Quanta gente não convida à sua mesa aqueles quepodem, como eles dizem, honrá-los ou retribuir-lhes o convite porsua vez! Outras, ao contrário, encontram satisfação de receber seus

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM235

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

236

parentes ou amigos que lhe sejam menos felizes. Ora, e quem nãoos têm entre os seus? Dessa forma presta-lhes um grande serviço,sem que pareça ajudá-los. Estes, que convidam os menos felizes,são os que trazem para si os cegos e os estropiados, praticando oensinamento de Jesus, se fazem o convite por benevolência, semostentação, e sabem disfarçar o benefício por meio de uma sinceracordialidade.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:A CARIDADE MATERIAL E A CARIDADE MORAL

9. “Amemo-nos uns aos outros e façamos ao próximo o quequereríamos que eles nos fizessem.” Toda religião, toda moral estãoencerradas nestes dois princípios. Se fossem observados na Terra,todos vocês seriam perfeitos. Vocês não teriam aí mais o ódio, nemressentimentos. Direi mais ainda: não haveria mais pobreza, porquedo excesso da mesa dos abastados muitos pobres se alimentariam.E vocês não mais veriam, nos bairros sombrios que habitei durantea minha última encarnação, as pobres mulheres arrastando consigomiseráveis crianças necessitadas de tudo.

Ricos! Pensem, um pouco que seja, em tudo isso! Ajudem osinfelizes o mais que vocês possam. Dêem, para que Deus lhesretribua, um dia, o bem que vocês fizeram. Vocês terão, então,quando saírem do corpo físico, um cortejo de Espíritos reconhecidosa recebê-los no portal de um mundo mais feliz.

Se vocês pudessem saber da alegria que eu provei ao encontrarno mundo espiritual aqueles a quem eu servi na minha últimaexistência!

Amem, pois, o seu próximo! Amem-no como a vocêsmesmos, pois vocês já sabem, agora, que o infeliz que vocêsrepelirem, pode ser, talvez, um irmão, um pai, um amigo que

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM236

237CAPÍTULO XIII

afastam para longe de vocês. E qual não será o seu desespero aoreconhecê-lo no mundo espiritual!

Quero que vocês compreendam bem o que é a caridade moral,que qualquer um pode praticar, porque não exige nenhum bemmaterial e, no entanto, é a mais difícil de pôr em prática.

A caridade moral consiste em vocês se suportarem uns aosoutros, e isto é o que vocês menos fazem nesse mundo inferioronde vocês, por um momento, estão encarnados. Há um grandemérito, creiam-me, em saber calar para deixar falar um mais toloque vocês. Isso é uma forma de caridade. Fazer-se de surdo quandouma palavra encarnecedora escapa de uma boca habituada a caçoar;não ver o sorriso de desdém com que vocês são recebidos por pessoasque, muitas vezes erradamente, se julgam superiores a vocês quando,em verdade, na vida espiritual, que é a única vida real, elas estão àsvezes bem abaixo de vocês.

Nessas atitudes vocês têm um mérito que não é o dahumildade, mas o mérito da caridade, pois não observar os errosdos outros e nem com eles ressentir-se, essa é a caridade moral.

Essa caridade, no entanto, não deve impedir que se pratiquea caridade material. Pensem, acima de tudo, em não desprezar o seusemelhante. Lembrem-se de tudo o que lhes tenho dito: não seesqueçam jamais que, no pobre que vocês repelem, vocês talvez repilamum Espírito que lhes foi caro e que se encontra, momentaneamente,numa posição social inferior à sua.

Reencontrei um dos pobres da Terra, a quem pude, porfelicidade, ajudar algumas vezes. A ele, agora, tenho de implorarfavores por minha vez, já que está acima de mim.

Lembrem-se que Jesus disse que nós somos todos irmãos.Pensem sempre nisso, antes de vocês repelirem o leproso ou omendigo.

Adeus!

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM237

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

238

Pensem naqueles que sofrem e orem! (Irmã Rosália, Paris,1860.)

10. Meus amigos, tenho ouvido muitos dentre vocês dizerem:“Como posso fazer a caridade se, muitas vezes, eu nem para mimmesmo tenho o necessário?”.

A caridade, meus amigos, se faz de muitos modos. Vocêspodem fazê-la por pensamentos, por palavras e por ações. Empensamentos, será caridade orar pelos pobres abandonados, quemorreram sem sequer ver a luz da existência, uma vez que umaprece de coração os aliviará.

Em palavras, será caridade dar a seus companheiros de todosos dias alguns bons conselhos, dizendo aos homens amarguradospelo desespero e privações e que clamam contra Deus: “Eu era comovós! Sofria, era infeliz, mas acreditei no Espiritismo e, vede, agorasou feliz!”.

Aos velhos que lhes disserem: “É inútil! Eu estou no fim davida. Vou morrer como vivi!”, diga-lhes: “A Justiça Divina é a mesmapara todos e para todas as idades. Lembrai-vos dos obreiros de últimahora, de que Jesus falou”.

Às crianças que, já viciadas pelas má companhias, seguempor descaminhos sombrios, quase a cair em dolorosas tentações,diga-lhes: “Deus vos vê, meus queridos pequeninos”, e não se cansede repetir-lhes sempre essas brandas palavras. Essas palavrasterminarão por germinar no pensamento jovem e, de pequenosvagabundos, vocês farão homens de bem.

Essas são formas de caridade moral.Muitos, entre vocês, dizem ainda: “Ora, somos incontáveis

sobre a Terra. Deus não nos pode ver a todos”. Escutem bem oseguinte, meus amigos: “Quando vocês sobem ao alto de um morro,o seu olhar não alcança os milhares de grãos de areia que cobremesse morro? Muito bem! Deus vê vocês da mesma maneira. Ele lhes

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM238

239CAPÍTULO XIII

deixa usar o livre-arbítrio, como vocês deixam esses grãos de areiaentregues ao vento que os dispersa”.

A diferença é que Deus, na sua infinita misericórdia, põe nofundo de seus corações uma sentinela vigilante que se chamaconsciência. Escutem-na! Dela vocês ouvirão bons conselhos! Porvezes, vocês a anestesiam, opondo-lhe o espírito do mal e ela secala! Mas fiquem seguros de que a pobre abandonada despertará ese fará ouvida, quando a sombra do remorso deitar-se em seuscorações.

Escutem-na, interroguem-na, e vocês freqüentemente serãoconsolados pelos conselhos que dela vocês receberem.

Meus amigos, a cada novo grupo de obreiros, o Senhor entregauma bandeira. Para essa bandeira que lhes é entregue, eu lhes douesta máxima do Cristo: “Amai-vos uns aos outros”.

Vivam esse princípio do amor!Reúnam-se todos sob essa bandeira e dela vocês receberão a

felicidade e a consolação. (Um Espírito Protetor, Lyon, 1860.)

A BENEFICÊNCIA

11. A beneficência, meus amigos, vos dará neste mundo osmais puros e os mais doces contentamentos, as alegrias do coraçãoque não são perturbadas nem pelo remorso, nem pela indiferença.

Oh! Se pudésseis compreender tudo o que encerra, de grandee de agradável, a generosidade das belas almas! É um sentimentoque faz que se olhe para os outros com o mesmo olhar generosoque deita sobre si mesmo, que faz que se dispa com alegria paravestir o seu irmão mais pobre.

Se pudésseis, meus amigos, ter apenas a doce ocupação defazer os outros felizes! Quais são as festas do mundo que vós podereiscomparar com essas festividades feitas de júbilos quando, como

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM239

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

240

representantes da Misericórdia Divina, levais a alegria a essas pobresfamílias que só conhecem da vida as adversidades e os amargores;quando vedes esses rostos marcados de dores brilharem sob a luz daesperança. É que, desprovidos de pão, esses infelizes e suas pequenascrianças, ignorando que viver é sofrer, gritavam, choravam e repetiamestas palavras que, como um fino punhal, penetravam no coraçãomaterno: “Eu tenho fome!”.

Oh! Compreendei quão deliciosa é a sensação daquele que vêrenascer a alegria onde, um momento antes, só havia desespero!Compreendei quais são as obrigações que tendes para com os vossosirmãos sofredores!

Ide, ide ao encontro dos infortunados! Ide ao socorro dasmisérias ocultas, que são as mais dolorosas! Ide, meus bem-amados,e lembrai-vos destas palavras do Salvador: “Quando vestires a umdestes pequeninos, lembrai-vos que é a mim que vestis!”.

Caridade, palavra sublime que resume todas as virtudes, és tuque deves conduzir todos os povos à felicidade. Em te praticando,eles criarão para si infinitas alegrias celestiais para o seu próprio futuroe, enquanto estiverem exilados na Terra, tu serás para eles a consolaçãoda alegria que viverão, mais tarde, quando se encontrarem reunidosno seio do Deus de amor.

Foste tu, caridade, virtude divina, que eu procurei para osmomentos de felicidade que gozei sobre a Terra. Possam os meusirmãos encarnados crer na voz do amigo que lhes fala e lhes diz: “Éna caridade que vós deveis buscar a paz do coração, o contentamentoda alma, o remédio contra as aflições da vida”.

Oh! Quando estiverdes a ponto de acusar Deus pelas vossasaflições, lançai um olhar para baixo de vós e vereis quanto de misériaa aliviar; quantas pobres crianças sem família; quantos velhinhossem qualquer mão amiga que os ampare e que lhes feche os olhosao serem chamados pela morte!

Quanto bem a fazer!

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM240

241CAPÍTULO XIII

Oh! Não vos queixeis mais; antes agradecei a Deus e distribuí, àsmãos cheias, a vossa simpatia, o vosso amor, o vosso dinheiro a todosos que, deserdados dos bens deste mundo, definham no sofrimento ena solidão.

Fazei isso e colherei nesse mundo as alegrias bem doces e...mais tarde, somente Deus o sabe!... (Adolfo, Bispo de Alger,Bordéus, 1861.)

12. Sede bons e caridosos, esta é a chave dos céus que tendesem vossas mãos. Toda a felicidade eterna se encerra nesta máxima:“Amai-vos uns aos outros”.

A alma não pode elevar-se aos planos espirituais a não serpelo devotamento ao próximo. Ela não encontra felicidade econsolação a não ser nos atos de caridade.

Sede, pois, bons, amparando a vossos irmãos, deixando delado a terrível chaga do egoísmo. Cumprindo este dever, vereis abrir-se o caminho da felicidade eterna para vós. Além disso, qual dentrevós não sentiu o coração palpitar, a vossa alegria interior crescerdiante da narrativa de um belo ato de devotamento, de uma obrade comovente caridade? Se buscásseis unicamente o grande prazerque proporciona uma boa ação, estaríeis sempre na linha de vossaevolução espiritual. Os exemplos não vos faltam! O que falta é aboa vontade, que é tão rara! Vede a multidão de homens de bem,de quem a vossa história guarda piedosa lembrança e fazei o mesmoque eles.

O Cristo não vos disse tudo o que é necessário sobre asvirtudes da caridade e do amor? Por que deixar de lado os seusdivinos ensinamentos? Por que não ouvir as suas divinas palavras enão abrir o coração a todos os seus doces preceitos de vida? Eudesejaria que tivésseis mais interesse e mais fé pelas leituras dosEvangelhos. Abandona-se, porém, esse livro, alegando ser deprincípios inaplicáveis na vida e de difícil leitura, deixando noesquecimento esse admirável manual de vida. Vossos males provêm

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM241

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

242

do abandono voluntário que fazeis desse resumo das Leis Divinas.Empenhai-vos em ler essas páginas ardentes do devotamento deJesus à redenção dos homens, e meditai-as.

Homens de ânimo e coragem, preparai-vos! Homens depouco vigor, fazei da vossa brandura, da vossa fé, a coragem de quenecessitais. Tende, todos, mais convicção e mais perseverança napropagação de vossa nova Doutrina. Este é apenas um encorajamentoque viemos vos dar.

É para estimular vosso zelo e as vossas virtudes que Deus nospermite manifestar-nos junto de vós. Mas, se cada um quisesse,bastaria a ajuda de Deus e de sua própria vontade para que tivessecoragem, porque as manifestações Espíritas se fazem somente paraos que têm os olhos fechados e os corações indóceis.

A caridade é a virtude fundamental que deve sustentar toda aedificação das demais virtudes terrenas. Sem a caridade não existemas outras virtudes. Sem a caridade não há que se esperar um futuromelhor, pois que não haverá um sentimento moral que nos oriente.Sem a caridade não há fé, pois a fé não é mais que a luz que tornaradiosa uma alma caridosa.

A caridade é a âncora eterna da salvação em todos os mundos.Ela é a mais pura emanação do próprio Criador. É a própria virtudede Deus, dada por Ele para a criatura. Como, pois, deixar noesquecimento esta suprema bondade divina? Qual seria, com estepensamento, o coração bastante perverso que sufocaria em si eexpulsaria esse sentimento tão divino? Qual seria o filho bastantemau para se revoltar contra esta doce carícia: a caridade?

Não me atrevo a falar do que fiz, porque os Espíritos tambémtêm um sentimento de mal-estar por ferir alguém com as obrasque fazem. Porém, as obras que iniciei na Terra, creio serem umadas que mais devem contribuir para o alívio de vossos semelhantes.

Vejo outros Espíritos, freqüentemente, pedirem a missão decontinuar a minha tarefa. Vejo-vos, minhas doces e queridas irmãs,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM242

243CAPÍTULO XIII

no piedoso e divino ministério. Vejo-vos praticando a virtude quevos recomendei, com toda a alegria que nasce dessa existência dededicação e de sacrifícios. Essa é, para mim, uma grande felicidade:de ver quanto se enobrecem as vossas almas, quanto essa missão éestimada e docemente protegida.

Homens de bem! Homens de boa e firme vontade, uni-vospara continuar a grande obra de propagação da caridade. Encontrareisa vossa recompensa dessa obra, no próprio exercício desse gênerode caridade. Não há alegria espiritual que a caridade não vos dênesta mesma existência. Sede unidos! Amai-vos uns aos outros,segundo os princípios do Cristo. Assim seja. (Vicente de Paulo,Paris, 1858.)

13. Chamo-me Caridade. Eu sou o caminho principal queconduz a Deus. Segui-me, porque eu sou a meta que todos vósdeveis alcançar.

Fiz, esta manhã, minha ronda habitual e, de coraçãoamargurado, venho vos dizer: “Oh! meus amigos, quantas misériase quantas lágrimas, e quanto vós haveis de fazer para enxugá-lastodas!”. Em vão procurei consolar pobres mães, dizendo-lhes aocoração: “Coragem! Há almas bondosas que velam por vós; não sereisabandonadas. Paciência! Deus existe e vós sois as suas amadas, vós soisas suas eleitas!”.

Elas pareciam entender-me e voltavam os seus olhosespantados para o meu lado. Eu li em seus pobres rostos que osseus corpos, esses tiranos do espírito, tinham fome e que, se asminhas palavras lhes asserenavam um pouco o coração, não lhesatendiam o estômago faminto. Então, eu lhes repetia: “Coragem!”.E uma pobre mãe, muito jovem ainda, que amamentava umacriancinha, tomou-a nos seus braços e a ergueu na direção do Alto,como a pedir-me que protegesse aquele pequenino ser, que nãoencontrava no seio estéril mais que uma alimentação insuficientepara as suas necessidades de vida.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM243

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

244

Noutros lugares, meus amigos, eu vi pobres velhos semtrabalho e sem abrigo, atormentados por todos os sofrimentos dequem não tem recursos e envergonhados de sua miséria. Nãodesejavam, eles que jamais mendigaram, estender as mãos e implorarpela piedade dos que passavam por eles. Com o meu coraçãocomovido de compaixão, eu que sou a caridade e nada tenho, mefiz de pedinte no lugar deles e vou por todas as partes estimular abeneficência, soprando esses bons pensamentos nos coraçõesgenerosos e compassivos.

Eis porque venho a vós, meus amigos, e vos digo: “Há portoda parte os infelizes sem pão na mesa, os fogões sem chama, e acama sem cobertores”. Eu que sou a caridade, não vos digo o quedeveis fazer. Deixo a iniciativa a vossos bons corações. Se eu vosditasse um programa de atividades nobres, não mais tereis o méritode vossa boa ação. Digo-vos somente: “Eu sou a caridade e estendoas vossas mãos para os vossos irmãos sofredores”.

Mas, se peço, eu também dou. E dou muito. Convido-vospara um grande banquete e vos forneço a árvore onde vós todos vossaciareis! Vede como é bela, como está carregada de flores e frutos!Ide, ide, colhei, apanhai todos os frutos dessa bela árvore que sechama beneficência! Em lugar dos ramos que lhe arrancardes,pendurarei todas as boas ações que fizerdes e levarei esta árvore paraDeus, para que Ele a carregue novamente, porque a beneficêncianão se esgota jamais.

Segui-me, pois, meus amigos, a fim de que eu vos conteentre aqueles que se ajustam sob a minha bandeira. Segui-me semreceio: eu vos conduzirei no caminho da salvação, porque eu sou aCaridade. (Cáritas, martirizada em Roma, Lyon, 1861.)

14. Há muitas maneiras de fazer a caridade, que muitos dentrevós confundem com a esmola. No entanto, entre a caridade e aesmola há uma grande diferença.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM244

245CAPÍTULO XIII

A esmola, meus amigos, algumas vezes é útil e necessária,porque dá alívio aos pobres. Mas quase sempre é humilhante, tantopara aquele que dá, quanto para aquele que a recebe.

A caridade, ao contrário, une o benfeitor ao beneficiado e,além disso, se disfarça de muitas maneiras! Pode-se ser caridosomesmo com os parentes e com seus amigos, sendo indulgentes unspara com os outros, perdoando-se mutuamente pelas suas fraquezase cuidando de não ferir o amor-próprio das pessoas.

Vós, Espíritas, podeis ser caridosos na vossa maneira de agircom os que não pensam como vós, induzindo os menos esclarecidosa crer, sem os chocar, sem atirar-se contra a convicção deles. Mas osatraindo amavelmente às nossas reuniões, onde eles poderão nosouvir. Saberemos descobrir a entrada dos corações deles para alipenetrarmos. Eis uma forma de caridade.

Escutai agora o que é a caridade para com os pobres, essesdeserdados do mundo, mas recompensados por Deus quando sabemaceitar as misérias sem queixas e murmurações e isso depende devós, como vos farei compreender por um exemplo.

Vejo, várias vezes na semana, uma reunião de senhoras detodas as idades. Para nós, vós sabeis, elas são todas nossas irmãs.Que fazem? Elas trabalham rápido, bem rápido. Seus dedos sãoágeis.

Vejo, também, como as fisionomias delas são risonhas e comoos seus corações palpitam unidos! Mas para que finalidadetrabalham assim ágeis, alegres, unidas? É que elas vêem aproximar-se os tempos que serão rudes para as famílias pobres. Essas famíliasnão puderam juntar provisões para as crises de mais penúria e seusutensílios já se perderam. As pobres mães já se inquietam e choram,pensando nos filhinhos que, certamente, sentirão abandono e fome!

Mas, paciência, pobres mães! Deus inspirou estas senhorasmenos infelizes que vós! Elas estão reunidas e juntam o necessáriopara ajudar-vos. Depois, num destes dias, quando a penúria vos

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM245

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

246

cobrir e murmurardes dizendo: “Deus não é justo!”, já que issodizeis em vossos dias de sofrimento, – vereis surgir a filha de umadessas obreiras da caridade. Sim, é para vós que elas trabalham e,assim, as vossas queixas se transformação em bênção, porque, noscorações dos infelizes, o amor acompanha bem de perto o ódio.

Como todas essas obreiras necessitam de apoio, vejo asmensagens dos bons Espíritos chegarem de todas as partes. Oshomens, que fazem parte desse agrupamento, trazem-lhes a suacolaboração. Fazem dessas leituras que agradam tanto, enquantoelas trabalham. E nós, para recompensar-lhes a dedicação às tarefasde todas e de cada uma em particular, prometemos a essas dedicadasobreiras uma boa clientela que lhes pagará à vista com as moedasdas bênçãos, única moeda que circula no céu. Asseguramo-lhes,ainda, sem medo de errar, que as bênçãos sagradas não lhes faltarão.(Cáritas, Lyon, 1861.)

15. Meus queridos amigos, cada dia ouço, entre vós, algunsdizerem: “Eu sou pobre; não posso fazer a caridade”. E cada diavejo que faltais com a indulgência com os semelhantes. Não perdoaiscoisa alguma que vos façam e vos mostrais juízes muitos severos,sem vos perguntar se ficaríeis satisfeitos que os outros vos fizessemo mesmo.

A indulgência não é também caridade?Vós que não podeis fazer mais que caridade-indulgência, fazei

pelo menos essa, mas fazei-a com grandeza.No que se refere à caridade material, vou contar-vos uma

história extraordinária.Dois homens acabavam de morrer. Deus havia dito:

“Enquanto esses dois homens viverem, coloquem, em dois sacosdiferentes cada uma de suas boas ações e, quando morrerem, essesdois sacos serão pesados”. Quando, pois, esses dois homens chegaramà sua última hora, Deus mandou que lhe trouxessem os dois sacosde boas ações de cada um. Um dos sacos estava repleto, grande,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM246

247CAPÍTULO XIII

volumoso, e as moedas que estavam dentro dele tilintavam. O outrosaco era tão pequeno, tão vazio, que se podia ver as poucas moedasque continha.

Um dos homens, de pronto, reconheceu o que lhe pertencia:– Este é meu! – disse de imediato. – Eu o reconheço, uma

vez que fui rico e doei muito dinheiro!– Aquele menor é meu! – disse o outro homem. – Fui sempre

pobre e quase nada tinha para repartir com os outros.Mas, ó surpresa! Os dois sacos foram colocados na balança e

o maior tornou-se leve e o pequeno se fez mais pesado, tão pesadoque fez o outro prato da balança levantar-se muito!

Então, disse Deus ao rico: “Tu doaste muito, é verdade, masdoaste por ostentação e para fazer o teu nome figurar em todos ostemplos do orgulho. Além disso, para fazer as tuas doações, não teprivaste de nada. Passa, pois, à minha esquerda e fica satisfeito queas tuas esmolas sejam contadas a teu favor, embora como qualquercoisa sem muito valor”.

Depois, Deus disse ao pobre: “Deste bem pouca coisa a teusemelhante, meu amigo. Mas cada uma das poucas moedas queestão, nesta balança representam uma privação para ti. Se não destemuitas esmolas, tu fizeste a caridade e isso é que vale mais. Tu fizestea caridade de modo natural, sem cuidar de que ela fosse contada ateu favor. Foste indulgente; não julgaste o teu semelhante e, aocontrário, desculpaste todas as más ações que te fizeram. Passa, pois,à minha direita e vai receber a tua recompensa”. (Um EspíritoProtetor, Lyon, 1861.)

16. A mulher mais abastada, feliz, que não precisa empregaro seu tempo no trabalho de sua casa, não poderia consagrar algu-mas horas de seu dia a trabalhos úteis para o seu semelhante? Que,com o que lhe sobre de sua abundância, compre roupas para vestiros infelizes. Que faça, com suas mãos delicadas, agasalhos aos quetêm frio. Que ajude a gestante pobre a cobrir o filho que vai nascer.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM247

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

248

Se, ao fazer isso, os seus filhos tiverem um pouco menos desupérfluo, os filhos dos pobres terão um pouco do que lhes falta.Trabalhar para os pobres, é trabalhar na vinha do Senhor.

E tu, pobre trabalhadora, que não dispões de sobras na tuabolsa, mas que queres, por amor a teus irmãos menos felizes, darum pouco do que possuis, dá algumas horas de teu dia, do teutempo que é a tua riqueza. Faze algumas dessas coisas bonitas queencantam os de mais recursos financeiros. Vende o produto desseteu trabalho e poderás, também, distribuir a teus irmãos a tua partede auxílio. Terás, talvez, algumas coisas a menos, mas darás calçadosa um que anda com os pés no chão.

E vós, mulheres dedicadas a Deus, trabalhai também para asua obra. Mas que vossos trabalhos delicados e caros não sejam tão-somente para adornar as capelas ou para atrair a atenção sobre avossa habilidade manual e paciência em fazê-los. Trabalhai, minhasfilhas, e que os valores obtidos com as vossas obras sejam consagradosao alívio de vossos irmãos em Deus.

Os pobres são os filhos bem-amados do Pai Celestial.Trabalhar por eles é glorificar o Criador. Sede, portanto, os braçosda Providência Divina, que diz: “Às aves do céu, Deus dá alimentos”.Que o ouro e a prata, que são tecidos pelos vossos dedos, setransformem em roupas e alimentos para aqueles que não os têm.

Fazei isso e o vosso trabalho será abençoado.E todos vós que podeis produzir alguma coisa, dai do que

fizerdes. Dai o vosso gênio, doai de vossas inspirações, doai de vossoscorações e Deus vos abençoará. Poetas, literatos, que sois lidos pelaspessoas mais cultas, satisfazei-lhes os lazeres, mas que com oresultado de algumas de vossas criações, sejam aliviados os infelizes!Pintores, escultores, artistas, que a vossa inteligência e a vossa artevenham, também, em auxílio a vossos irmãos. Não tereis menosglórias com isso, mas esses infelizes terão alguns sofrimentos amenos.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM248

249CAPÍTULO XIII

Todos vós podeis doar. A qualquer classe a que pertençais,vós dispondes de alguma coisa que podeis dividir. Seja o que forque Deus vos haja dado, deveis uma parte aos que não têm onecessário, porquanto, se estivésseis na mesma posição em que seencontram os infelizes, ficaríeis muito contentes se alguém dividissealguma coisa convosco. As vossas riquezas na Terra serão um poucomenores, mas as vossas riquezas no céu serão mais abundantes.Colhereis o cêntuplo do que houverdes semeado em benefício nessemundo. (João, Bordéus, 1861.)

A PIEDADE

17. A piedade é a virtude que mais vos aproxima dos EspíritosPuros. É a irmã da caridade que vos conduz a Deus.

Deixai o vosso coração enternecer-se diante dos quadros damiséria e do sofrimento de vossos semelhantes. Vossas lágrimas sãoum bálsamo que derramais sobre as suas chagas. E quando, poruma branda simpatia, chegais a devolver-lhes a esperança e aresignação, que ventura experimentais! Essa ventura que sentis, éverdade, tem um certo amargor, porque ela nasce ao lado da desgraçados outros. Mas, se não tem o sabor dos prazeres mundanos, elanão traz as dolorosas desilusões do vazio que os prazeres mundanosdeixam após a sua passagem. Essa ventura diante da dor tem umasuavidade penetrante que encanta a alma.

A piedade, uma piedade bem sentida, essa é o amor. O amoré devotamento. O devotamento é esquecimento de si mesmo. Esseesquecimento de si mesmo é abnegação em favor dos infelizes eesta é a virtude por excelência. É a mesma virtude praticada emtoda a sua vida pelo Divino Messias e que Ele ensinou na suadoutrina tão santa e tão sublime.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM249

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

250

Quando a doutrina de Jesus for restabelecida em sua purezaprimitiva, quando for aceita por todos os povos, ela trará a felicidadeà Terra, fazendo reinar, enfim, a concórdia, a paz e o amor.

O sentimento mais apropriado para vos fazer evoluir,domando o vosso egoísmo e o vosso orgulho; o sentimento quelevará a vossa alma à humildade, à beneficência e ao amor a vossopróximo – esse sentimento é a piedade! Essa piedade que vos comoveaté o mais íntimo do ser, diante dos sofrimentos de vossos irmãos,que vos faz estender-lhes uma mão para socorrê-los e vos arrancalágrimas de simpatia.

Jamais sufoqueis nos vossos corações esta emoção celestial.Não façais como esses egoístas endurecidos que se afastam

dos aflitos, querendo com isso que a visão da miséria não lhesperturbe, por um só momento, a sua feliz existência. Temei, antes,ficar indiferentes quando podeis ser úteis. A tranqüilidade compradaao preço da indiferença culposa, é a tranqüilidade do mar Morto,que oculta no fundo de suas águas a lama fétida e a putrefação.

Quanto a piedade está longe de causar a perturbação e oaborrecimento que teme o egoísta! Sem dúvida que a vossa almaexperimenta, no contato com a desgraça dos outros e ao senti-laem vós mesmos, um estremecimento natural e profundo, que farávibrar todo o vosso ser e vos envolverá penosamente. Mas, acompensação é grande, quando vós conseguirdes devolver a corageme a esperança a um irmão infeliz. Ele se comoverá com o aperto deuma mão amiga e seu olhar úmido, às vezes, de emoção ereconhecimento, se voltará docemente para vós, antes de elevar-seao céu para agradecer por lhe haver enviado um consolador, umamparo misericordioso.

A piedade é a melancólica mas celeste precursora da caridade,a primeira entre as virtudes de que ela é irmã e cujos benefícios elaprepara e enobrece. (Miguel, Bordéus, 1862.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM250

251CAPÍTULO XIII

OS ÓRFÃOS

18. Meus irmãos, amem os órfãos! Se vocês soubessem quantoé triste estar só e abandonado, sobretudo na infância!

Deus permite que haja órfãos, para nos estimular a servir-lhes de pais. Que divina caridade, a de ajudar a uma pobre criaturinhaabandonada, de evitar que ela sofra fome e frio e de orientar-lhe aalma, a fim de que não se perca nos vícios!

Quem estende a mão à criança abandonada é agradável a Deus,porque compreende e pratica a sua lei de fraternidade. Reflitam,também, que, muitas vezes, a criança que vocês amparam agora jálhes foi cara numa encarnação anterior. Se vocês pudessem recordaras vidas passadas, o amparo que hoje vocês oferecem a essa criança,não seria mais um ato de caridade, mas o cumprimento de um dever.

Assim, pois, meus amigos, todo sofredor é seu irmão e temdireito à sua caridade. Não a essa caridade que fere o coração, não aessa esmola que queima a mão daquele que a recebe, já que os óbolosque vocês distribuem são freqüentemente muito amargos! Quantasvezes eles seriam recusados se, no casebre, a enfermidade e a privaçãonão os estivessem esperando!

Doem com delicadeza, juntando ao benefício que vocêsfizerem, o mais precioso de todos os benefícios: uma palavra decarinho, um sorriso amigo. Evitem esse ar de proteção, que revolvea lâmina num coração que já está sangrando e pensem que, fazendoo bem, vocês trabalham para si mesmos e pelos seus irmãos. (Umespírito familiar, Paris, 1860.)

BENEFÍCIOS PAGOS COM INGRATIDÃO

19. Que pensar das pessoas que, recebendo a ingratidão emtroca dos benefícios prestados, não mais querem fazer o bem, commedo de reencontrar ingratos?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM251

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

252

Estas pessoas têm mais egoísmo do que caridade. Fazem obem somente para receber demonstrações de reconhecimento. Nãoestão fazendo o bem com desinteresse pessoal e, em verdade, somenteo bem feito sem esperar gratidão do beneficiado é que é agradável aDeus.

Há orgulho nos que fazem o bem esperando gratidão, porqueeles se comprazem com a humilhação do beneficiado que lhes venhadepor aos pés o seu reconhecimento. Aquele que busca sobre a Terraa recompensa pelo bem que faz, não a receberá no Céu. Mas Deusreservará recompensa para aqueles que não a buscam na Terra.

É necessário sempre ajudar os fracos, mesmo sabendo queaquele a quem você faz o bem não lhe virá agradecer. Fique certoque, se aquele a quem você prestou serviços esquecer o benefício,Deus valorizará ainda mais a sua ação, do que se você recebesse oreconhecimento do beneficiado. Deus permite, às vezes, que vocêseja pago com a ingratidão, para provar a sua perseverança em fazer obem desinteressadamente.

Como sabe você que esse benefício, esquecido por ummomento, não lhe produzirá mais tarde bons frutos? Fique certo,ao contrário, de que essa é uma semente que germinará com otempo.

Infelizmente, você não vê além do momento presente. Vocêtrabalha por você e não tem em vista o seu próximo. Os benefíciosprestados resultam no abrandamento dos corações mais endureci-dos. Tais benefícios poderão ficar esquecidos na Terra, mas quandoo Espírito daquele que foi beneficiado se desenfaixar da veste física,ele se lembrará da ingratidão diante de seus benfeitores e essalembrança lhe doerá no coração. Ele lamentará, então, a própriaingratidão. Quererá repará-la, como quem repara uma falta grave.Pagará a sua dívida de gratidão numa futura reencarnação, aceitandomesmo uma vida de dedicação ao seu benfeitor.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM252

253CAPÍTULO XIII

É assim que, sem você suspeitar, estará contribuindo para aevolução moral daquele que hoje se revela ingrato. Você reconhecerá,mais tarde, toda a verdade desta máxima: “Um benefício jamais seperde”. Mas, até lá, você terá trabalhado para o seu benefício pessoal,uma vez que terá o mérito de ter feito o bem com desinteresse, semse deixar desencorajar pelas decepções.

Ah, meu amigo, se você conhecesse todas as ligações que, navida atual, o atam às suas vidas anteriores! Se você pudesse ter umavisão ampla da multiplicidade de relações que ligam uns aos outrostodos os seres, para com progresso mútuo, você admiraria muitomais a sabedoria e a bondade do Criador, que lhe permite revivercom aqueles com quem você já viveu, a fim de você chegar até Ele.(Guia Protetor, Sens, 1862.)

BENEFICÊNCIA EXCLUSIVA

20. A beneficência está sendo bem entendida, quando ela ápraticada apenas entre as pessoas da mesma opinião, de uma mesmacrença ou de um mesmo partido?

Não! É sobretudo a esse espírito de seita e de partido que abeneficência vem abolir. Todos os homens são irmãos entre si. Overdadeiro cristão, portanto, vê irmãos entre si. O verdadeiro cristão,portanto, vê irmãos em todos os seus semelhantes. Para socorreraquele que está em necessidade, ele não pergunta nem a sua crença,nem a sua opinião, seja qual for.

Seguiria ele o preceito de Jesus Cristo, que diz para amar atémesmo os inimigos, se ele repelisse um infeliz tão-somente porqueeste tivesse uma fé religiosa diferente da sua? Que ampare, pois,sem pedir conta alguma das convicções do infeliz.

Se aquele que sofre for um inimigo da religião, o amparoque se lhe dê será o meio de fazer com que a ame. Em o repelindo,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM253

NÃO SAIBA A TUA MÃO ESQUERDA O

QUE FAZ A TUA DIREITA

254

sem prestar-lhe a beneficência, o cristão o faria odiar a religião quediscrimina os seres. (Luís, Paris, 1860) .

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM254

255CAPÍTULO XIII

1. Tu sabes os mandamentos: Não adulterarás; não matarás;não furtarás; não dirás falso testemunho; não defraudarás alguém;honra a teu pai e a tua mãe. (Marcos, capítulo 10, versículo 19.)(Lucas, capítulo 18, versículo 20 e Mateus, capítulo 9, versículo 19.)

2. Honrarás a teu pai e a tua mãe, para teres uma dilatadavida sobre a terra que o Senhor teu Deus te há de dar. (Decálogo,Êxodo, capítulo 20, versículo 12.)

PIEDADE FILIAL

3. O mandamento: “Honrarás teu pai e tua mãe”, é umaconseqüência da lei geral da caridade e do amor ao próximo, porquenão se pode amar o próximo sem amar a seu pai e a sua mãe.

O termo honrar, no entanto, amplia o dever para com ospais, levando-o para a piedade filial. Deus quis demonstrar, assim,que ao amor se deve juntar o respeito, a estima, a submissão e aconcordância espontânea. Isso tudo implica a obrigação de cumprirpara com os pais, de uma maneira mais completa, tudo o que acaridade manda seja feita ao próximo.

Esse dever se estende, naturalmente, às pessoas que ocupamo lugar do pai e da mãe, cujo mérito é tanto maior, quanto odevotamento dessas pessoas é menos obrigatório.

A Justiça Divina cobra a violação desse mandamento.

14

CAPITULO XIV

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM255

HONRARÁS PAI E MÃE

256

Honrar seu pai e sua mãe não será somente respeitá-los. Seráassisti-los em suas necessidades gerais. Será procurar dar-lhes repousona velhice. Será cercá-los de atenções assim como eles fizeram porvocê na sua infância.

É, sobretudo, com os pais sem recursos que se demonstra averdadeira piedade filial. Cumpririam esse mandamento aquelesque crêem fazer muito ao dar-lhes apenas o necessário para nãomorrerem de fome, enquanto eles mesmos não se privam de coisaalguma? Seria cumpri-lo, também, relegá-los a um quartinho dosfundos da moradia, apenas para não deixá-los na rua, enquanto quepara si reservam o que há de melhor e mais confortável? Ainda bemquando isso não é feito de má vontade e não os obriga a pagar otempo que lhes resta viver, descarregando sobre eles o peso dogoverno da casa! Será, então, aos pais velhos e fracos que caberáservir a filhos jovens e fortes? A sua mãe lhes teria vendido o leitequando eles estavam no berço? Contou ela, porventura, quando osfilhos caíam doentes, os passos que dava para lhes dar o necessário?

Não! Não é somente o estritamente necessário que os filhosdevem a seus pais pobres. Devem também, tanto quanto puderem,as pequeninas alegrias do supérfluo, as coisas amáveis, a atençãodelicada, que são apenas os juros do que receberam, o pagamentode uma dívida sagrada.

É somente essa piedade filial a aceita por Deus.Infeliz, portanto, daquele que se esquece do que deve aos que

o sustentaram na sua fraqueza infantil dos primeiros dias. Daquelesque com a vida material lhe doaram a vida moral e que, muitasvezes, se impuseram duras privações para lhe assegurar o bem-estar.Infeliz do ingrato, que sofrerá as conseqüências pela ingratidão epelo abandono demonstrado a seus pais. Por sua vez, será ferido nassuas mais caras afeições, talvez nesta mesma existência, mas comtoda a certeza numa reencarnação futura, em que sofrerá os mesmosdissabores que fez seus pais sofrerem.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM256

257CAPÍTULO XIV

Certos pais, é verdade, descuidam de seus deveres e não sãopara os seus filhos o que deveriam ser. Caberá, porém, à JustiçaDivina cobrá-los por esses deslizes e não a seus filhos. Não competeaos filhos censurarem os seus pais, porque eles mesmos fizeram issoem vidas passadas, para merecer esses pais tais quais são hoje. Se acaridade estabelece como lei que se pague o mal com o bem, desermos indulgentes com as imperfeições do próximo, de nãomaldizer o semelhante, de esquecer e perdoar as ofensas, de amar osinimigos, quanto essas obrigações não serão maiores, em relaçãoaos pais?!

Os filhos devem, por isso, ter por regra de conduta para comos pais todos os preceitos de Jesus referentes ao próximo, lembrando-se de que toda conduta que for censurável em relação aos estranhos,mais censurável será em relação a seus pais. Devem lembrar queaquilo que é uma falta em relação aos estranhos, será um verdadeirocrime moral quando alcança os pais, porque, neste último caso, àfalta de caridade se ajunta a ingratidão.

4. O Senhor disse: “Honrai o vosso pai e a vossa mãe, a fimde viverdes longo tempo sobre a terra que o Senhor vosso Deus vosdará”. Por que Ele prometeu como recompensa a vida sobre a terrae não no plano celestial? A explicação está nestas palavras: “que Deusvos dará”, que foram suprimidas na versão moderna do Decálogo eque, por isso, lhe desfiguraram o sentido.

Para compreender a promessa divina, é necessário que nosreportemos à situação e às idéias dos hebreus, na época em que foianunciada. Os hebreus, na realidade, não compreendiam a existênciada vida espiritual. A sua visão não ia além da vida física. Eles deveriamser mais sensibilizados pelas coisas que viam do que pelas que nãoviam. Em razão disso é que o Senhor lhes fala numa linguagemprópria a seu entendimento naquela época. E, como se estivesse adirigir-se a crianças, dá-lhes as esperanças que poderiam satisfazê-los.Achavam-se eles ainda no deserto. A terra que o Senhor lhes daria era

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM257

HONRARÁS PAI E MÃE

258

terra da Promissão, objeto de suas aspirações maiores. Eles nãodesejavam nada além disso e o Senhor lhes diz que viverão longotempo nessa terra, isto é, que a possuirão por longo tempo se elesobservassem seus mandamentos.

Mas, na chegada de Jesus, as idéias dos hebreus estavam maisdesenvolvidas. Tendo chegado o momento de lhes dar uma alimen-tação espiritual mais substanciosa e real, para iniciá-los na verdadeiravida, Jesus lhes diz: “Meu reino não é deste mundo. É lá, e nãosobre a terra, que recebereis a recompensa de vossas boas obras”.Com estas palavras, a terra de Promissão deixa de ser material e setransforma numa pátria celestial. Assim, quando o Mestre os chamaà observação do mandamento: “Honrai a vosso pai e a vossa mãe”,já não é a terra que lhes promete, mas o céu. (Ver capítulos II e III,desta mesma obra.)

QUEM É MINHA MÃE E QUEM SÃO MEUS IRMÃOS

5. E foram para uma casa. E afluiu outra vez a multidão, detal maneira que nem sequer podiam comer pão. E, quando os seusouviram isto, saíram para o prender, porque diziam: Está fora de si. –Chegaram então seus irmãos e sua mãe. E estando fora, mandaram-no chamar. E a multidão estava assentada ao redor dele e disseram-lhe: Eis que a tua mãe e teus irmãos te procuram, e estão lá fora. EJesus lhes respondeu: Quem é minha mãe e quem são meus irmãos? –E olhando em redor para os que estavam assentados junto dele, Jesusdisse: Eis aqui a minha mãe e meus irmãos. Porquanto, qualquer umque fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minhamãe. (Marcos, capítulo 3, versículos 20, 21 e 31 a 35.) (Mateus,capítulo 12, versículos 46 a 50.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM258

259CAPÍTULO XIV

6. Certas palavras parecem estranhas nos lábios de Jesus.Contrastam com a sua bondade e inalterável benevolência para comtodos.

Os incrédulos não deixam de fazer, desses aparentes contrastes,uma arma, para dizer que Ele se contradizia a si mesmo.

Um fato irrecusável, porém, é que a doutrina de Jesus tinhapor base essencial, por pedra angular desse edifício divino, a lei doamor e da caridade. Ele não poderia, pois, destruir de um lado oque construía do outro. Por isso é necessário tirar uma conseqüênciarigorosa de suas ações e de seus preceitos: se certas afirmativas deJesus estão em contradição com o princípio do amor e da caridade,é que as palavras que lhe foram atribuídas ou estão mal reproduzidas,mal compreendidas, ou não são dele.

7. Admira-se, e com razão, de ver, na narrativa da vinda desua mãe e dos seus irmãos, Jesus mostrar tanta indiferença paracom os seus parentes, ao extremo de renegar a sua mãe.

Pelo que se refere a seus irmãos, é sabido que eles jamais tiverammuita simpatia por Jesus. Espíritos pouco evoluídos que eram, elesnão haviam compreendido a sua missão. A conduta de Jesus, aosolhos de seus irmãos, era extravagante e os seus ensinamentos nãoos comoviam, tanto que nenhum de seus irmãos se fez seudiscípulo. Parecia mesmo que eles até participavam certo ponto,das mesmas prevenções que tinham os inimigos d’Ele. O fato éque eles acolhiam Jesus mais como um estranho do que como umirmão, quando Jesus se apresentava à família e, por isso, João, oEvangelista, diz, positivamente: “que nem mesmo os seus irmãosacreditavam nele”. (João, capítulo 7, versículo 5.)

Quanto à sua mãe, ninguém ousaria contestar a sua ternurapara com o seu Filho. É, porém, necessário convir, também, queela não parece ter feito uma idéia muito justa da missão de Jesus. Éque não se vê Maria seguindo os seus ensinamentos, nem dando

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM259

HONRARÁS PAI E MÃE

260

testemunho de Jesus, como fez João Batista. A solicitude maternalera, nela, o sentimento dominante.

No tocante a Jesus, supor que Ele houvesse renegado a suamãe, seria desconhecer-lhe o caráter. Um tal pensamento não poderiaanimar aquele que disse: “Honrai a vosso pai e a vossa mãe”. É, pois,necessário procurar outro motivo para as suas palavras, quase sempreenvoltas sob a forma alegórica.

Jesus não perdia nenhuma ocasião de dar um ensinamento.Serviu-se, portanto, daquela oportunidade que se lhe oferecia, coma chegada de sua família, para estabelecer a diferença que existe entreo parentesco corporal e o parentesco espiritual.

O PARENTESCO CORPORAL E OPARENTESCO ESPIRITUAL

8. Os laços do sangue não estabelecem, necessariamente, oslaços entre os espíritos. O corpo procede do corpo, mas o espíritonão procede do espírito, porque o espírito do reencarnante existiaantes da formação do corpo.

Não é o pai que cria o espírito de seu filho. O pai não fazmais que lhe fornecer o envoltório físico, mas deve ajudar o filhono seu desenvolvimento intelectual e moral, para fazê-lo evoluir.

Os espíritos que se encarnam numa mesma família, sobretudocomo parentes próximos, são, o mais freqüentemente, espíritossimpáticos entre si, unidos pelas relações anteriores que se revelampor suas afeições recíprocas durante a vida terrena. Mas podeacontecer que esses espíritos sejam completamente estranhos unsaos outros, separados por antipatias igualmente anteriores, que seexpressam também pelo seu antagonismo na Terra, para lhes servirde provações.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM260

261CAPÍTULO XIV

Os verdadeiros laços de família não são aqueles formadospela consangüinidade. São os que nascem da afinidade e dacomunhão de pensamentos, que unem os Espíritos antes, durantee após a sua encarnação. Por esta razão é que dois seres nascidos depais diferentes podem ser mais irmãos pelo espírito do que se fossemirmãos de sangue. Eles podem atrair-se, procuram-se, tornam-seamigos, enquanto que dois irmãos consangüíneos podem se repelir,assim como vemos todos os dias.

Este é um problema moral que só o Espiritismo poderiaresolver, pela pluralidade das existências. (Veja o capítulo IV, item13, desta mesma obra.)

Há, portanto, duas espécies de família: as famílias por laçosespirituais e as famílias por laços corporais. As primeiras são duráveis,fortificando-se pela depuração das almas e se perpetuam no mundoespiritual através das diversas migrações da alma. As segundas sãotão frágeis quanto a matéria, extinguindo-se com o tempo e, quasesempre, se dissolvem moralmente ainda na vida atual.

Foi este princípio de parentesco espiritual que Jesus quis fazercompreender existir, quando disse a seus discípulos: “Eis aí minhamãe e meus irmãos”, o que quer dizer: Esta é a minha família peloslaços do espírito, porque “qualquer um que faça a vontade de meuPai, que está nos céus, é meu irmão, minha irmã e minha mãe”.

A inimizade dos irmãos de Jesus está claramente expressana narração do Evangelho de Marcos, onde se escreve que eles sepropunham a apoderar-se do Mestre, sob a alegação de que Elehavia perdido o espírito. Informado Jesus da chegada deles, econhecendo os sentimentos que eles nutriam a seu respeito, eranatural que dissesse, ao falar de seus discípulos no sentidoespiritual: “Eis aí meus verdadeiros irmãos”. Como a mãe deJesus os acompanhava, Ele generalizou o ensinamento, sem queisso implicasse, de modo algum, que haja pretendido que a suamãe, segundo o corpo, nada lhe era como Espírito e que nada

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM261

HONRARÁS PAI E MÃE

262

merecia d’Ele senão a indiferença. A conduta de Jesus, em outrascircunstâncias, deixou suficientemente provado o carinho pelasua mãe.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:A INGRATIDÃO DOS FILHOS E OS LAÇOS DEFAMÍLIA

9. A ingratidão é um dos frutos mais diretos do egoísmo. Elarevolta sempre os corações honestos. Mas a ingratidão dos filhospara com os pais tem características ainda mais dolorosas.

É deste ponto de vista, mais especialmente, que vamos analisaras causas e os efeitos da ingratidão dos filhos. Nisto, como emoutras questões morais, o Espiritismo vem lançar a luz sobre umdos problemas do coração humano.

Quando o Espírito deixa o seu corpo terreno, leva consigo assuas paixões ou as suas virtudes, inerentes à sua natureza. Vai aomundo espiritual aperfeiçoar-se ou permanece estacionado em seuestágio evolutivo até que deseje se iluminar.

Alguns, portanto, levam consigo ódios violentos e desejos devingança muito vivos. Entre estes, alguns são mais avançados, oque lhes permitirá entrever uma partícula da verdade no mundodos Espíritos. Reconhecem, então, os funestos efeitos de suas paixõese são induzidos a tomar boas resoluções. Compreendem que, parachegarem a Deus, só existe um caminho: a caridade. Ora, não hácaridade sem esquecimento das ofensas e das injúrias; não há caridadecom ódio no coração e sem perdão.

É então que, por um grande esforço, eles voltam o seu olharpara aqueles a quem detestaram sobre a Terra. Mas, ao vê-los, a suainimizade desperta. Eles se revoltam contra a idéia de perdoá-los e,ainda mais, de renunciar a si mesmos. Rejeitam a idéia de amaraqueles que lhes destruíram talvez a fortuna, a honra, a família.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM262

263CAPÍTULO XIV

Apesar disso, o coração desses infortunados estará abalado.Eles hesitam, vacilam, sacudidos por sentimentos que conflitamentre o amor e o ódio, o perdão e o esquecimento. Se neles a boaresolução predominar, pedem a Deus, imploram aos bons Espíritosque lhes dêem força no momento mais decisivo da prova.

Enfim, depois de alguns anos de meditação e preces, um dessesespíritos se aproveita de uma gestação que está para iniciar-se na famíliadaquele a quem ele detestou, e pede aos Espíritos encarregados daJustiça Divina permissão para ocupar aquele corpo, prestes a formar-se, a fim de cumprir o seu destino.

Qual será, então, a sua conduta nessa família?A conduta dependerá de maior ou menor persistência de suas

boas resoluções. O contato incessante com os seres que ele odiou éuma provação dolorosa, sob a qual ele sucumbirá se a sua vontadenão for bastante forte. Assim, segundo a boa ou má resolução queprevaleça, ele será um amigo ou um inimigo daqueles entre os quaislhe foi dado viver.

É assim que se explicam esses ódios, essas repulsões instintivasque são notadas da parte de certas crianças e que nenhum fato anteriorparece justificar. Nada, com efeito, nesta existência, poderia terprovocado essa antipatia gratuita. Para se lhes apreender a causa,faz-se necessário voltar os olhos para as vidas anteriores.

Oh, Espíritas! Compreendei, nesse momento, o grande papelda humanidade! Compreendei que quando gerais um corpo, a almaque nele se reencarna vem do mundo espiritual para evoluir. Inteirai-vos de vossos deveres e colocai todo o vosso amor em aproximaressa alma de Deus. Esta é a missão que vos foi confiada e recebereisa vossa recompensa se a cumprirdes fielmente.

Vossos cuidados, a educação que lhes derdes, auxiliarão o seuaperfeiçoamento e a sua felicidade futura. Lembrai-vos de que acada pai e a cada mãe, o Senhor perguntará: “Que fizestes da criançaque confiei à vossa guarda?”. Se esse Espírito se conservou atrasado

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM263

HONRARÁS PAI E MÃE

264

moralmente por vossa culpa, o vosso sofrimento será o de vê-loentre os Espíritos mais infelizes, quando dependia de vós que elefosse feliz. Então, vós mesmos, sobrecarregados de remorsos, pedireispara reparar o vosso erro. Solicitareis uma nova encarnação para vóse para ele, na qual o cercareis de mais cuidados e, ele, repleto dereconhecimento, vos envolverá no seu amor.

Não escorraceis, portanto, a criancinha que, no berço, repelea mãe, e nem aquele filho que vos paga o amor com ingratidão.Não foi o acaso que os fez assim e que vo-lo deu. Uma intuiçãoimperfeita do passado se revela e podeis deduzir que um ou outrojá odiou muito ou foi muito ofendido; que um ou outro veio paraperdoar ou para expiar.

Mães! Abraçai a criança que vos causa lágrimas e dizei paravós mesmas: “Um de nós dois é o culpado”. Fazei jus às alegriasdivinas que Deus concedeu à maternidade, ensinando a essa criançaque ela está sobre a Terra para aperfeiçoar-se, amar e bendizer. Mas,muitas de vós, em vez de eliminar pela educação os maus princípiosinatos dos filhos, trazidos de encarnações anteriores, mantêm edesenvolvem essas inclinações viciosas por uma culposa fraquezaou por falta de cuidados. E, mais tarde, o vosso coração, ulceradopela ingratidão de vossos filhos, será para vós, a partir desta vida, ocomeço de vossa expiação.

A tarefa de educar vosso filho não é tão difícil quanto podereispensar. Ela não exige o saber do mundo. O ignorante, como osábio, podem realizá-la e o Espiritismo vem facilitá-la, ao tornarconhecida a causa da imperfeição do coração humano.

Desde o berço, a criança manifesta os instintos bons ou mausque traz de sua existência anterior. Os pais devem aplicar-se emestudá-los. Todos os males têm a sua origem no egoísmo e noorgulho. Espreitai, pois, os menores sinais que revelem os germesdesses vícios morais e cuidai de combatê-los, sem esperar que eles sedesenvolvam e que lancem raízes profundas. Fazei como o bom

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM264

265CAPÍTULO XIV

jardineiro que poda os brotos daninhos à medida que ele os vêaparecerem na árvore. Se deixardes que se desenvolvam o egoísmoe o orgulho em vossos filhos, não admireis, mais tarde, se vos pagarema vossa dedicação com a ingratidão.

Quando os pais fizerem tudo o que devem para oadiantamento moral de seus filhos, se não conseguiram êxito, elesnão têm do que se culpar. A sua consciência pode ficar tranqüila.Ao amargor muito natural que sentem pelo insucesso de seusesforços, Deus lhes reserva uma grande, uma imensa consolação. Éque o Pai lhes dá a certeza de que a ingratidão do filho é apenas umatraso momentâneo de evolução. Outra reencarnação seráproporcionada aos pais, para que terminem a obra começada e, umdia, o filho ingrato os recompensará com o seu amor. (Veja o capítuloXIII, item 19, desta obra.)

Deus não dá provas superiores às forças daquele que as pede.Ele somente permite as que possam ser cumpridas. Se a tarefa deeducação do filho parece estar acima de vossa capacidade, não é quevos foi entregue um fardo que não podeis carregar. Não haveráfalta de recursos para realizá-la, mas, sim, falta de vontade. Poisquantos existem que, em vez de resistirem aos maus pendores, secomprazem neles! Para estes, por certo, a Justiça Divina lhes reservareencarnações dolorosas em que se corrigirão desta sua inclinaçãodesajustada das leis.

Admirai, portanto, a bondade de Deus que jamais fecha aporta ao arrependimento. Um dia vem em que o culpado estarácansado de sofrer, o seu orgulho estará dominado. E eis que Deusabre seus braços paternais ao filho pródigo que se lança a seus pés.

As grandes provas – escutai-me bem – são quase sempre o sinaldo fim de sofrimento e de aperfeiçoamento do Espírito, quando sãoaceitas com o pensamento em Deus. Esse é um momento maior navida do Espírito e é nele que importa não fraquejar em conseqüênciade queixas e murmurações, se não se quiser perder o fruto de tais

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM265

HONRARÁS PAI E MÃE

266

provas e ter de recomeçá-las. – Ao invés de vos queixardes, agradeceia Deus, que vos oferece a oportunidade de vencer-vos, para vos daro prêmio da vitória. Então, quando sairdes do turbilhão do mundoterrestre, vós entrareis no mundo espiritual e sereis ali aclamadoscomo o obreiro que saiu vitorioso diante dos desafios e dos riscosde sua tarefa.

De todas as provações, as mais penosas são aquelas que ferem ocoração. Um que suporta com coragem as misérias e as privaçõesmateriais, cai sob o peso das amarguras domésticas, esmagado pelaingratidão de seus familiares. Oh! Esta é uma pungente angústia!Mas o que pode, nestas circunstâncias, reerguer a coragem moralabatida? O que a reerguerá será o conhecimento das causas do mal ea certeza de que, se há retaliações na alma, não há desesperos quedurem eternamente, porque Deus não pode querer que a sua criaturasofra para sempre! Que há de mais consolador, de mais encorajadordo que este pensamento de que depende de si mesmo, de seus própriosesforços, o abreviar o sofrimento através da destruição, em si próprio,das causas do mal?

Mas, para isso, faz-se necessário que o homem não retenha oseu olhar somente sobre a Terra e nem veja a vida como sendoapenas urna existência. E indispensável que o entendimento se amplie,pairando no infinito do passado e do futuro. Então a grande JustiçaDivina se revela aos seus olhos e ele esperará com paciência, porqueterá compreendido o que lhe parecia monstruosidade da Terra, quesão os conflitos familiares. Os ferimentos que ele recebeu nas provas,lhe parecerão, então, simples arranhões. Examinando o conjuntode vidas de cada um, os laços de família se apresentam em seuverdadeiro sentido, ou seja, não são os laços frágeis da matéria quereúnem os membros da família, mas são os laços duráveis do Espíritoos que se perpetuam e se consolidam com a purificação das almas,em vez de se romperem pela reencarnação.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM266

267CAPÍTULO XIV

Os Espíritos, cuja semelhança de gostos, de evolução moral eafetiva os identifica entre si, são induzidos a reunirem-se, formandofamílias. Esses mesmos Espíritos, nas suas migrações terrenas, sebuscam para se agrupar, como faziam no plano espiritual antes dareencarnação. Desse encontro é que nascem as famílias unidas ehomogêneas. Se, nas suas peregrinações, esses Espíritos sãotemporariamente separados, eles se reencontram mais tarde, felizespelos progressos que alcançam.

Mas, como eles não devem trabalhar apenas para si, Deuspermite que outros Espíritos, menos evoluídos, venham a encarnarentre eles, a fim de receberem conselhos e bons exemplos, nointeresse de sua própria evolução. Esses Espíritos menos evoluídosse tornam a causa, por vezes, da perturbação no meio daqueles queos acolhem, mas neles é que estão as provas e a tarefa a realizar.

Acolhei-os, portanto, como irmãos. Ajudai-os e, mais tarde,no mundo espiritual, a família espiritual se felicitará por haver salvodo naufrágio moral alguns desses Espíritos infelizes que, por suavez, poderão salvar outros. (Agostinho, Paris, 1862.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM267

FORA DA CARIDADE NÃO HÁ SALVAÇÃO

268

O NECESSÁRIO PARA SALVAR-SEPARÁBOLA DO BOM SAMARITANO

1. E quando o Filho do homem vier em sua glória, e todos ossantos anjos com ele, então se assentará no trono da sua glória. E estandotodas as nações reunidas diante dele, apartará uns dos outros, como opastor aparta dos bodes as ovelhas. E porá as ovelhas à sua direita e osbodes à sua esquerda. Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita:Vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos estápreparado desde a fundação do mundo. Porque tive fome e destes-mede comer; tive sede e destes-me de beber; era estrangeiro e mehospedastes; estava nu e me vestistes; estive na prisão e fostes ver-me. –Então, os justos lhe responderão, dizendo: Senhor, quando te vimoscom fome e te demos de comer? ou com sede e te demos de beber? Equando te vimos estrangeiro e te hospedamos? ou nu e te vestimos? Equando te vimos enfermo ou na prisão e te fomos ver? – E respondendoo Rei lhes dirá: Em verdade vos digo que, quando o fizestes a umdestes meus pequeninos irmãos, a mim fizestes. – Então dirá tambémaos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, parao fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos, porque tive fome enão me destes de comer, tive sede e não me destes de beber, sendoestrangeiro não me recolhestes, estando nu não me vestistes e enfermoe na prisão e não me visitastes. – Então eles também responderão,dizendo: Senhor, quando te vimos com fome ou com sede ou estrangeiroou nu ou enfermo ou na prisão e não te servimos? – Então lhes responderá

15

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM268

269CAPÍTULO XV

dizendo: Em verdade vos digo que, quando a um destes pequeninosnão o fizestes, não o fizestes a mim. – E irão esses para o tormentoeterno, mas os justos para a vida eterna. (Mateus, capítulo 25, versículos31 a 46.)

2. E eis que se levantou um certo doutor da lei, tentando-o, edizendo: Mestre, que farei para herdar a vida eterna? – E Jesus lhedisse: Que está escrito na lei? Como lês? – E, respondendo, disse ele:Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração e de toda a tuaalma, e de todas as tuas forças e de todo o teu entendimento, e ao teupróximo como a ti mesmo. – E disse-lhe Jesus: Respondeste bem; fazesisso e viverás. – Ele, porém, querendo justificar-se a si mesmo disse aJesus: E quem é o meu próximo? – E, respondendo Jesus, disse:

Descia um homem de Jerusalém para Jericó e caiu na mão dossalteadores, os quais o despojaram e, espancando-o, se retiraram,deixando-o meio morto. Ocasionalmente descia pelo mesmo caminhocerto sacerdote e, vendo-o, passou de largo. E de igual modo tambémum levita, chegando àquele lugar e, vendo-o, passou de largo.

Mas um samaritano, que ia de viagem, chegou ao pé dele, e,vendo-o, moveu-se de íntima compaixão. E, aproximando-se atou-lhes as feridas, deitando-lhe azeite e vinho. E, pondo-o sobre a suacavalgadura, levou-o para uma estalagem, e cuidou dele. E, partindono outro dia, tirou dois dinheiros e deu-os ao hospedeiro e disse-lhe:Cuida dele, e tudo o que de mais gastares eu te pagarei quando voltar.

Qual, pois, destes três te parece que foi o próximo daquele quecaiu nas mãos dos salteadores? – E o doutor da lei disse: O que usou demisericórdia para com ele. – Disse, pois, Jesus: Vai, e faze da mesmamaneira. (Lucas, capítulo 10, versículos 25 a, 37.)

3. Toda a moral de Jesus se resume na caridade e nahumildade, ou seja, nas duas virtudes contrárias ao egoísmo e aoorgulho.

Em todos os ensinamentos Jesus nos mostra essas virtudescomo sendo o caminho da felicidade eterna. Bem-aventurados, diz

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM269

FORA DA CARIDADE NÃO HÁ SALVAÇÃO

270

Ele, os pobres de espírito, isto é, os humildes, porque deles é oreino dos céus. Bem-aventurados os que são puros de coração. Bem-aventurados os que são brandos e pacificadores. Bem-aventuradosos que são misericordiosos. Amai vosso próximo como a vósmesmos. Fazei aos outros o que querereis que os outros vos fizessem.Amai os vossos inimigos. Perdoai as ofensas, se quiserdes serperdoados. Fazei o bem sem ostentação. Julgai-vos a vós mesmosem vez de julgar os outros.

Humildade e caridade, eis o que não cessa de recomendar edo que dá, Ele mesmo, o exemplo. Orgulho e egoísmo, eis o quenão cansa de combater.

Jesus, porém, fez mais do que recomendar a caridade comosalvação. Ele a coloca, em termos bastante claros, como a condiçãoúnica da felicidade futura.

No quadro que Jesus nos apresenta, do último julgamento,narrado por Mateus, é necessário, como em muitas outras coisasque Ele ensinou, separar o que faz parte da figuração e alegoria. Ahomens como os quais falava, ainda incapazes de compreenderemas coisas puramente espirituais. Ele deveria apresentar imagensmateriais chocantes, capazes de sensibilizá-los. Estas imagens, paraque pudessem ser aceitas, deveriam mesmo não se distanciaremmuito das idéias comuns, quanto à forma, reservando-se semprepara o futuro a verdadeira significação de suas palavras e dos pontosque, na época, Ele não poderia explicar de modo claro e direto.Mas, ao lado da parte acessória e figurada do quadro do juízo final,há uma idéia dominante: a da felicidade que espera o justo e dainfelicidade reservada ao mau.

No julgamento supremo, quais são os considerandos dasentença? Sobre o que se baseiam as indagações? Pergunta-se se foramcumpridas estas ou aquelas práticas exteriores? Não! Somente sepergunta uma coisa: a caridade praticada. E, em decorrência, sepronuncia dizendo: Vós que assististes a vossos irmãos, passai à

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM270

271CAPÍTULO XV

direita e vós que fostes indiferentes com vossos irmãos, passai àesquerda.

Informa-se, por acaso, sobre a não aceitação de novosprincípios ou idéias da fé? Faz alguma diferença entre aqueles quecrêem de um modo e os que crêem de outro modo? Não! PoisJesus coloca o samaritano, que era considerado como quem se punhacontra o culto exterior, mas que praticava o amor ao próximo, acimadaquele que, cheio de formalidades, faltava com a caridade.

Jesus não faz da caridade, portanto, apenas uma das condiçõesde salvação, mas a coloca como a condição única. Se outras condiçõeshouvesse para cumprir, Ele as teria anunciado. Se Ele coloca a caridadeno primeiro lugar entre as virtudes é porque ela já contém todas asdemais virtudes: a humildade, a brandura, a benevolência, aindulgência, a justiça, e porque a caridade é a total negação doorgulho e do egoísmo.

O GRANDE MANDAMENTO

4. E os fariseus, ouvindo que Jesus fizera emudecer os saduceus,reuniram-se no mesmo lugar. E um deles, doutor da lei, interrogou-opara o experimentar, dizendo: Mestre, qual é o grande mandamentona lei? – E Jesus disse-lhe: Amarás o Senhor teu Deus de todo o teucoração, e de toda a tua alma, e de todo o teu pensamento. Este é oprimeiro e grande mandamento. E o segundo, semelhante a este é:Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Estes dois mandamentoscontêm toda a lei e todos os profetas. (Mateus, capítulo 22, versículos34 a 40.)

5. Caridade e humildade, eis o caminho único da salvação.Egoísmo e orgulho, eis o caminho da perdição.

Este princípio está, em termos precisos, nas palavras: “Amarása Deus de toda a tua alma e teu próximo como a ti mesmo. Toda a

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM271

FORA DA CARIDADE NÃO HÁ SALVAÇÃO

272

lei e os profetas estão contidos, nestes dois mandamentos”. E, para nãodeixar dúvidas sobre o que seria o amor a Deus e ao próximo, Jesusajuntou: “E aqui está o segundo mandamento que é semelhante aoprimeiro”, ou seja, que não se pode amar a Deus sem amar opróximo, nem arear o próximo sem amar a Deus. Tudo o que sefaça contra o próximo, se está fazendo contra Deus.

Não podendo amar a Deus sem praticar a caridade para como próximo, todos os deveres do homem se resumem nesta máxima:Fora da caridade não há salvação.

NECESSIDADE DA CARIDADE,SEGUNDO PAULO DE TARSO

6. Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, senão tivesse caridade seria como o metal que soa ou como o sino quetine. E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos osmistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneiratal que transportasse os montes, se eu não tivesse caridade, nada seria.

E ainda que eu distribuísse toda a minha fortuna para o sustentodo pobres, e ainda entregasse o meu corpo para ser queimado, se eunão tivesse caridade, nada disso me aproveitaria.

A caridade é paciente, é benigna, a caridade não trata comleviandade, não se ensoberbece. Não se porta com indecência, nãobusca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal. A caridade nãofolga com a injustiça, mas se rejubila com a verdade.

A caridade tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e a caridade e, dentre

essas três, a maior destas é a caridade. (Paulo de Tarso, 1ª Epístola aosCoríntios, capítulo 13, versículos 1 a 7 e 13.)

7. Paulo de Tarso de tal modo compreendeu a grande verdadede caridade, que disse: “Ainda quando eu tivesse os dons da profecia

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM272

273CAPÍTULO XV

e que eu penetrasse todos os mistérios; ainda quando eu tivessetoda a fé possível para transportar montanhas, se eu não tivercaridade, eu nada serei. Entre estas três virtudes: a fé, a esperança e acaridade, a mais excelente é a caridade”.

Ele coloca assim, sem nenhuma dúvida, a caridade acimamesmo da fé. É que a caridade está ao alcance de todas as pessoas,do ignorante e do sábio, do rico e do pobre, e porque a caridadeindepende desta ou daquela crença em particular.

Paulo de Tarso vai além disso, definindo a verdadeira caridade.Ele a mostra não somente na beneficência, mas na reunião de todasas qualidades do coração: na bondade, na benevolência para com opróximo.

FORA DA IGREJA NÃO HÁ SALVAÇÃO;FORA DA CARIDADE NÃO HÁ SALVAÇÃO

8. Enquanto que a máxima: “Fora da caridade não hásalvação”, se apóia num princípio universal, abrindo para todos osfilhos de Deus o acesso à felicidade suprema, o dogma “fora daIgreja não há salvação” se apóia não sobre a fé fundamentada emDeus e na imortalidade da alma, fé que é comum a todas as religiões,mas se apóia em uma fé especial e baseada em dogmas particulares. Éum tipo de fé exclusiva e particular de uma seita. Em decorrência,ao invés de unir os filhos de Deus, ela os divide. Ao contrário deestimular o amor a todos os irmãos, ela alimenta e estimula adesavença entre os que abraçam diferentes seitas dos diversos cultosreligiosos, que se consideram reciprocamente como amaldiçoadosna eternidade, embora sejam parentes e amigos neste mundo.Menosprezando a grande lei de igualdade diante do túmulo, esseprincípio de fé particularista os afasta uns dos outros, até mesmonos cemitérios.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM273

FORA DA CARIDADE NÃO HÁ SALVAÇÃO

274

A máxima: Fora da caridade não há salvação é a consagraçãodo princípio de igualdade diante de Deus e da liberdade deconsciência e de culto. Tomando esta máxima por regra de conduta,todos os homens se sentem irmãos e, qualquer que seja a maneirade cada um adorar o Criador, eles se estendem as mãos e oram unspelos outros. Já com o dogma: Fora da Igreja não há salvação, oshomens se condenam entre si, perseguem-se uns aos outros e vivemem inimizades. O pai não ora pelo filho, nem o amigo ora peloamigo, desde que mutuamente se consideram condenados a uminferno e sem perdão para o pecado de ter uma fé diferente da deoutra pessoa. Este dogma é, pois, essencialmente contrário aosensinamentos do Cristo e da lei evangélica.

9. Fora da verdade não há salvação seria igual ao dogma deFora da Igreja não há salvação e, também, tão exclusivista comoeste último. É que não existe uma só seita religiosa que não pretendapossuir o privilégio da verdade.

Qual o homem que se pode vangloriar de possuir a verdadetoda, integralmente, quando todas as áreas do conhecimento crescemsem cessar e quando as idéias são retificadas a cada novo dia? Averdade total é o conjunto de conhecimentos dominados unicamentepelos Espíritos de ordem muito elevada. A humanidade terrenanão poderá pretendê-la, porque não lhe é dado saber tudo. Ahumanidade não pode aspirar mais que uma verdade parcial eproporcional à sua própria evolução.

Se Deus tivesse feito da posse da verdade total a condiçãoúnica da felicidade futura, isso seria uma sentença de sofrimentocompleto e geral para todos e para sempre. A caridade, no entanto,é o caminho para atingir esse estado de felicidade. É que a caridade,mesmo no seu sentido mais amplo, pode ser praticada por todos.

O Espiritismo, pondo-se de acordo com o Evangelho, admitea salvação para todos, independentemente da crença religiosa decada um. Bastaria que observem a lei de Deus. Por isso, não se diz:

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM274

275CAPÍTULO XV

Fora do Espiritismo não há salvação, e, como também o Espiritismonão pretende ensinar toda a verdade ainda, também não diz: Forada verdade não há salvação, princípio este que dividiria os homensao invés de uni-los e perpetuaria os antagonismos entre todas ascriaturas.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:FORA DA CARIDADE NÃO HÁ SALVAÇÃO

10. Meus filhos, na máxima: Fora da caridade não há salvação,estão contidos os destinos dos homens sobre a Terra e no céu. Sobrea Terra, porque à luz desse estandarte eles viverão em paz. No céu,porque aquele que houver praticado esse princípio encontrará graçadiante do Senhor.

Essa divisa é o facho celeste, a luminosa coluna que guia ohomem no deserto da vida para conduzi-lo à terra da Promissão.Ela brilha no céu como uma auréola santa na fronte dos eleitos esobre a Terra ela está gravada no coração daqueles para quem Jesusdirá: “Passai à direita vós que sois os benditos de meu Pai”. Podeisreconhecer os escolhidos para a felicidade futura pelo perfume dacaridade que se derrama em torno deles.

Nada exprime melhor o pensamento de Jesus, nada resumemais os deveres do homem, que essa máxima de ordem divina:“Fora da caridade não há salvação”. O Espiritismo não poderia provarmelhor a sua origem divina, do que a ofertando como regra deconduta, porque esse princípio espelha o mais puro cristianismo.

Tomando-a por guia, o homem jamais se transviará.Aplicai-vos, então, meus amigos, a penetrar no sentido

profundo e nas conseqüências da aplicação dessa máxima universale a descobrir por vós mesmos a maneira de praticar a caridade.Submetei todas as vossas ações ao controle da caridade e vossa

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM275

FORA DA CARIDADE NÃO HÁ SALVAÇÃO

276

consciência vos responderá sobre o bem e o mal. E a caridade nãosomente evitará que façais o mal, mas também vos levará a fazer obem. Não basta uma virtude negativa, fruto de não fazer o mal. Énecessário uma virtude ativa, que nasce de fazer o bem. Para fazer obem é sempre indispensável a ação da vontade; para não fazer omal, bastam a inércia e a omissão.

Meus amigos, agradecei a Deus que permitiu que pudésseisbeneficiar-vos da luz do Espiritismo. Não é que somente os que apossuem possam salvar-se, mas porque, em vos ajudando a com-preender melhor os ensinamentos do Cristo, o Espiritismo vos tornamelhores cristãos.

Agi de tal modo, como verdadeiros cristãos, que os que vosverem possam dizer que o verdadeiro Espírita e o verdadeiro cristãosão uma só e a mesma coisa, porque todos os que praticam a caridadesão discípulos de Jesus, qualquer que seja o culto a que pertençam.(Paulo, o Apóstolo, Paris, 1860.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM276

277CAPÍTULO XV

SALVAÇÃO DOS RICOS

1. Nenhum servo pode servir a dois senhores, porque ou há deaborrecer a um e amar o outro, ou se há de chegar a um e desprezar ooutro. Não podeis, servir a Deus e a Mamom. (Lucas, capítulo 16,versículo 13.)

2. E eis que, aproximando-se dele um mancebo, disse-lhe: BomMestre, que farei para conseguir a vida eterna? E Jesus lhe disse: Porque me chamas bom? Não há bom senão um só, que é Deus. Se queres,porém, entrar na vida eterna, guarda os mandamentos.

Indagou-lhe o moço: E quais mandamentos? E Jesus lherespondeu: Não matarás, não cometerás adultério, não furtarás, nãodirás falso testemunho, honra a teu pai e a tua mãe, e amarás opróximo como a ti mesmo.

Disse-lhe o moço: Tudo isso tenho guardado desde a minhainfância. Que me falta ainda? – Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito,vai, vende tudo o que tens e dá aos pobres, e terás um tesouro no céu;e vem e segue-me. – E o mancebo, ouvindo esta palavra, retirou-setriste, porque possuía muitas propriedades. – Disse, então, Jesus a seusdiscípulos: Em verdade vos digo que é difícil um rico entrar no reinodos céus. E, outra vez vos digo, que é mais fácil passar um camelo pelofundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus. – Osseus discípulos, ouvindo isto, admiraram-se muito, dizendo: Quempoderá, pois, salvar-se? – E Jesus, olhando para eles, disse-lhes: Aoshomens é isso impossível, mas a Deus tudo é possível. (1) (Mateus,

16

CAPITULO XVI

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM277

NÃO SE PODE SERVIR A DEUS E A MAMOM

278

capítulo 19, versículos 16 a 24 .) (Marcos, 10:17 a 25 e Lucas 18:18a 25.)

GUARDAR-SE DA AVAREZA

3. E disse-lhe um homem da multidão: Mestre, dize a meuirmão que reparta comigo a herança. – Mas Jesus lhe respondeu:Homem, quem me pôs a mim por juiz ou repartidor entre vós? Edisse-lhes: Acautelai-vos e guardai-vos da avareza, porque a vida dequalquer um não consiste na abundância do que possui. – E propôs-lhes uma parábola dizendo: A herdade de um homem rico tinhaproduzido em abundância. E arrazoava ele entre si, dizendo: Quefarei? Não tenho onde recolher meus frutos. E disse: Farei isto:derrubarei os meus celeiros e edificarei outros maiores e ali recolhereitudo o que tenho e os meus bens e direi à minha alma: Alma, tens emdepósito muitos bens para muitos anos; descansa, bebe e folga. – masDeus lhe disse: Louco! Esta noite te pedirão a tua alma e o que tenspreparado, para quem será? Assim é aquele que para si ajunta tesourose não é rico para com Deus. (Lucas, capítulo 12, versículos 13 a 21.)

1. Esta imagem arrojada pode parecer um tanto forçada, porque não se pode perceber

que relação existe entre um camelo e uma agulha. Ocorre que, em hebreu, a mesma

palavra se aplica para cabo e camelo. Na tradução do Evangelho lhe deram esta

última acepção. Mas é provável que ela tenha sido aplicada com o sentido de cabo, que

seria o pensamento de Jesus. Isto é, pelo menos, o mais natural.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM278

279CAPÍTULO XVI

JESUS NA CASA DE ZAQUEU

4. E tendo Jesus entrado em Jericó, ia passando. E eis que haviaali um homem chamado Zaqueu e era este um chefe dos publicanos eera rico. E procurava ver quem era Jesus e não podia, por causa damultidão, pois era de pequena estatura. E, correndo, adiante, subiunuma figueira brava para o ver, porque havia passar por ali. E quandoJesus chegou aquele lugar, olhando para cima, viu-o e disse-lhe: Zaqueu,desce depressa, porque hoje me convém pousar em tua casa. – Eapressando-se, Zaqueu desceu e, recebeu-o gostosamente. E vendo todosisto, murmuravam, dizendo que entrara para ser hóspede de umhomem pecador. – E levantando-se Zaqueu, disse ao Senhor: Senhor,eis que eu dou aos pobres metade dos meus bens e se em alguma coisatenho enganado alguém, o restituo quadruplicado. – E disse-lhe Jesus:Hoje veio a salvação a esta casa, pois também este é filho de Abraãoporque o filho do homem veio buscar e salvar o que se havia perdido.(Lucas, capítulo 19, versículos 1 a 10.)

PARÁBOLA DO MAU RICO

5. Ora, havia um homem rico que se vestia de púrpura e delinho finíssimo, e vivia todos os dias regalada e esplendidamente. Haviatambém um certo mendigo, chamado Lázaro, que jazia cheio de chagasà porta daquele rico e que desejava alimentar-se com as migalhas quecaíam da mesa do rico e os próprios cães vinham lamber-lhe as chagas.

E aconteceu que o mendigo morreu e foi levado pelos anjos parao seio de Abraão. E morreu também o rico e foi sepultado e no Hades,ergueu os olhos, estando em tormentos, e viu ao longe Abraão e Lázaroem seu seio e, clamando, disse ao rico: Pai Abraão, tem misericórdiade mim e manda Lázaro que molhe na água a ponta do dedo e merefresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. – Disse,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM279

NÃO SE PODE SERVIR A DEUS E A MAMOM

280

porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens emvida, e Lázaro somente males e agora este está consolado e tuatormentado. E, além disso, está posto um grande abismo entre nós eti, de sorte que os que quisessem passar daqui para aí não poderiam,nem tão pouco os daí passar para cá. – E disse ele: Rogo-te, ó Pai, quemandes Lázaro para a casa de meu pai, pois tenho cinco irmãos, a fimde que dê testemunho para que não venham também para este lugarde tormento. – Disse-lhe Abraão: Eles têm Moisés e os profetas; ouçam-nos. – E disse ele: Não, pai Abraão. Mas, se algum dentre os mortosfosse ter com eles, arrepender-se-iam. – Porém Abraão lhe disse: Senão ouvem a Moisés e aos profetas, tão pouco acreditarão ainda quealguns dos mortos ressuscitem. (Lucas, capítulo 16, versículos 19 a31.)

PARÁBOLA DOS TALENTOS

6. Porque isto é também como um homem que, partindo parafora da terra, chamou os seus servos, entregando-lhes os seus bens. E aum deu cinco talentos e a outro dois e a outro um, a cada qual segundoa sua capacidade, e ausentou-se logo para longe.

E tendo ele partido, o que recebeu cinco talentos negociou comeles, e granjeou outros cinco talentos. Da mesma forma, o que receberadois talentos, negociou com eles e recebeu outros dois. Mas o que receberaum talento, foi e cavou na terra e escondeu o dinheiro do seu senhor.

Muito tempo depois, veio o senhor daqueles servos, e fez contascom eles. Então aproximou-se o que recebera cinco talentos, e trouxe-lhe outros cinco talentos, dizendo-lhe: Senhor, entregaste-me cincotalentos. Eis aqui outros cinco talentos que ganhei com eles. – Então osenhor lhe disse: Bem está, servo bom e fiel, sobre o muito te colocarei.Entre no gozo de teu senhor. – E, chegando também o que tinharecebido dois talentos, disse: Senhor, entregaste-me dois talentos e eis

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM280

281CAPÍTULO XVI

que com eles ganhei outros dois talentos. – Disse-lhe o senhor: Bemestá, servo bom e fiel. Sobre o pouco foste fiel, sobre muito te colocarei.Entra no gozo do teu senhor. – Mas, chegando também o que receberaum talento, disse: Senhor, eu sabia que és um homem duro, que ceifasonde não semeaste e juntas onde não espalhaste. E, atemorizado,escondi na terra o seu talento. Aqui tens o que é teu. – Respondendo,porém, o seu senhor lhe disse: Mau e negligente servo. Se sabias queceifo onde não semeei e ajunto onde não espalhei, então devias terdado o meu dinheiro aos banqueiros e, quando eu viesse, receberia omeu com os juros. Tirai-lhe, pois, o talento e dai-o ao que tem os deztalentos, porque a qualquer que tiver será dado e terá em abundância,mas ao que não tiver, até o que tem lhe será tirado. Lançai, pois, oservo inútil nas trevas exteriores. Ali haverá pranto e ranger de dentes.E quando o Filho do homem vier em sua glória e todos os santos anjoscom ele, então se assentará no trono de sua glória. (Mateus, capítulo25, versículos 19 a 31.)

UTILIDADE PROVIDENCIAL DA RIQUEZA

7. Se a riqueza devesse ser um obstáculo total para a salvaçãodaqueles que a possuem, assim como se pode deduzir de certaspalavras de Jesus, interpretadas segundo a letra e não segundo o seusentido, Deus, que a concede, colocaria nas mãos de alguns uminstrumento de perdição, sem nenhuma outra alternativa.

Essa dedução, porém, se choca com a razão!A riqueza é, sem dúvida, uma prova muito arriscada. É mais

perigosa do que a prova de miséria. É que a riqueza sugere desvios,desperta tentações e exerce grande fascinação. É o supremoestimulante do orgulho, do egoísmo e da vida sensual. É um laçomuito forte que prende o homem à Terra e desvia os pensamentosdo céu. Ela produz uma tão grande alteração de comportamento

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM281

NÃO SE PODE SERVIR A DEUS E A MAMOM

282

que, muitas vezes, aquele que passa da miséria para a riqueza, depronto esquece a sua origem, esquece aqueles que o ajudaram, efaz-se insensível, egoísta e fútil.

Mas, por tornar o caminho do bem mais difícil, não se concluaque o torne impossível. Pode, por outro lado, tornar-se um meiode salvação nas mãos daquele que dela sabe servir-se, como certosvenenos que restabelecem a saúde, quando empregados com essepropósito e discernimento.

Jesus disse ao homem que lhe indagava sobre os meios deganhar a vida eterna: “Desfaze-te de teus e bens e segue-me”. Assimdizendo, Jesus não pretendeu estabelecer como princípio absolutoque cada um deva despojar-se do que possui e que a salvação só seconsegue ao preço desse sacrifício da fortuna. Mostrava-lhe, contudo,que o apego aos bens terrenos é um obstáculo à salvação.

Aquele jovem, com efeito, se julgava quite porque observaraalguns mandamentos. Portanto, recusou a idéia de abandonar seusbens. Seu desejo de obter a vida eterna não ia ao extremo do sacrifíciode se desapegar de seus bens.

O que Jesus lhe propunha, era uma prova decisiva, paradesnudar o fundo de seus pensamentos. O jovem podia, sem dúvida,ser um homem perfeitamente honesto, segundo o juízo da sociedade.Poderia não causar dano a ninguém e nem maldizer o seu próximo.Poderia não ser vazio de valores morais, nem orgulhoso, honrar aseu pai e a sua mãe. Mas não tinha a verdadeira caridade, pois que asua virtude não chegava até a abnegação. Eis o que Jesus quisdemonstrar. Era uma aplicação do princípio: “Fora da caridade nãohá salvação”.

A conseqüência dessas palavras de Jesus, se tomadas no seusignificado rigoroso, seria a abolição da riqueza, como prejudicial àfelicidade futura e como origem de incontáveis males sobre a Terra.Porém, isso seria a condenação do trabalho que a pode proporcionar.E essa condenação seria absurda porque faria o homem regredir à

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM282

283CAPÍTULO XVI

vida selvagem o que, por isso mesmo, estaria em contradição coma lei do progresso, que é uma lei de Deus.

Se a riqueza é a causa de muitos males, se ela estimula tantoas más paixões, se ela provoca mesmo tantos crimes, não é a ela quedevemos atribuir tais coisas. Atribuamo-las ao homem que delaabusa, como tem abusado de todos os dons de Deus. Pelo abuso ohomem torna pernicioso até aquilo que lhe poderia ser mais útil. Éuma conseqüência do estado inferior do mundo terrestre.

Se a riqueza, em si, não devesse mais do que produzir o mal,Deus não a poria sobre a Terra. Cabe ao homem, no entanto, delafazer sair o bem. Se ela não é um elemento de evolução moral, elaé, sem contestação, um poderoso elemento do desenvolvimentoda inteligência humana.

O homem, com efeito, tem a missão de trabalhar peloaprimoramento material da Terra. Cabe-lhe desbravá-la, saneá-la, afim de prepará-la para receber um dia toda a população que secomporta na sua extensão. Para alimentar essa população, que crescesem cessar, é necessário aumentar a produção de alimentos e bens.Se a produção de uma região for insuficiente para abastecer osconsumidores, o que faltar deve ser procurado noutras localidades.Por esse comércio de bens, as relações entre os povos tornam-seuma necessidade. Para tornar mais fáceis essas relações entre os povos,faz-se necessário desobstruir os acidentes geográficos que os separam,permitindo comunicações mais fáceis e rápidas.

Por essas atividades, que são obras que se realizam em séculos,o homem teria de extrair materiais das entranhas da terra. Eleprocurou, para que isso lhe fosse possível, na própria ciência osmeios de executar as suas obras mais segura e rapidamente. Maspara executá-las, precisa de recursos amoedados. Em decorrência,essa necessidade o fez criar a riqueza, como o fez estimular ocrescimento da ciência.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM283

NÃO SE PODE SERVIR A DEUS E A MAMOM

284

A atividade requerida para esses mesmos trabalhos a que seemprega trouxe-lhe o desenvolvimento de sua inteligência. Essainteligência que se concentra inicialmente sobre a satisfação dasnecessidades materiais, é o que o ajudará, mais tarde, a compreenderas grandes verdades morais.

Sendo, pois, a riqueza o primeiro meio de execução de suamissão sobre a Terra, e sem a qual não haveria grandes obras, grandesatividades, nem grandes estímulos e grandes pesquisas, ela pode serconsiderada, com razão, como um elemento de evolução do própriohomem.

DESIGUALDADE DAS RIQUEZAS

8. A desigualdade das riquezas, entre os homens, é um dessesproblemas que inutilmente se procurará solucionar, quando seconsiderar apenas a vida atual.

A primeira questão que se apresenta é esta: “Por que todos oshomens não são igualmente ricos?”. Eles não são igualmente ricospor uma razão bem simples: é que não são igualmente inteligentes,ativos e laboriosos para adquirir a fortuna, nem sóbrios e previdentespara conservá-la.

Considere-se, também, que é um princípio matematicamentedemonstrado que, se a riqueza fosse dividida em partes iguais paracada um, essa parte seria mínima e insuficiente. Supondo-se quefosse feita essa divisão, o seu equilíbrio seria rompido, em poucotempo, pela diversidade de características e de capacidade que háentre os homens.

Supondo-se, porém, que essa divisão da riqueza fosse possívele durável, tendo cada pessoa com o que viver, teríamos a extinçãode todos os grandes trabalhos que concorrem para o progresso e obem-estar da humanidade.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM284

285CAPÍTULO XVI

Supondo-se, ainda, que a cada um se dê o necessário paraalimentar-se, vestir-se e alcançar todo conforto material, já não haveriamais o estímulo necessário que impele o homem para as grandesdescobertas e para os grandes empreendimentos úteis à coletividade.

Se Deus a concentra sobre certos pontos, é para que daí seexpanda em quantidade suficiente, segundo as necessidades dasrealizações humanas.

Admitido isto, indaga-se por que Deus a concede a pessoasincapazes de fazê-la frutificar para o bem de todos. Está aí umaprova da sabedoria e da bondade da Providência Divina. Ao concederao homem o livre-arbítrio, Deus quis que o homem chegasse, porsua própria experiência e decisão, a discernir o bem e o mal e,conseqüentemente, a praticar o bem como resultado de seus esforçose de sua própria vontade.

O homem não deve ser fatalmente conduzido ao bem e nemao mal. Se assim fosse, ele não seria mais que um instrumentopassivo e sem responsabilidade como os animais. A riqueza é, assim,um meio de prová-lo moralmente. Mas como a riqueza é, aomesmo tempo, um poderoso meio de ação para o progresso, Deusnão quer que ela se torne por longo tempo improdutiva. Deus adesloca incessantemente de uma mão para a outra. Cada uma daspessoas deve possuí-la, para exercitar-se no seu uso e demonstrar oemprego que sabe dar-lhe.

Há, porém, a impossibilidade material de conceder a riquezaa todos ao mesmo tempo. Se todos a possuíssem ao mesmo tempo,ninguém trabalharia e o progresso da Terra sofreria com isso. Portal razão, cada um a possuirá por sua vez. Assim é que aquele quehoje não a tem, já a teve em outra existência anterior ou a terá nofuturo. E o que hoje a possui, não a terá amanhã.

Há ricos e pobres porque Deus, sendo justo, faz com quecada um trabalhe por sua vez. A pobreza é, para uns, a prova da

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM285

NÃO SE PODE SERVIR A DEUS E A MAMOM

286

paciência e da resignação. A riqueza é, para outros, a prova da caridadee da abnegação.

Lamenta-se, com razão, o triste uso que algumas pessoasfazem de sua fortuna, as lamentáveis paixões que a cobiça provocae, por isso, pergunta-se: Deus é justo ao conceder a riqueza para taispessoas? É certo que se o homem não tivesse outra existência, nadajustificaria uma tal distribuição de bens da Terra. Mas, se não noslimitar-nos tão-somente à vida atual, e considerarmos o conjuntode reencarnações, veremos que tudo se equilibra com justiça. Opobre não tem, portanto, motivos para acusar a Providência Divinae nem para invejar os ricos. Os ricos, por sua vez, não têm motivospara se glorificarem do que possuem.

Se os ricos abusam, não será com decretos e nem com leismaliciosas que se consertará o mal. As leis podem modificarmomentaneamente a aparência do mal, mas não podem modificara natureza dos sentimentos. Eis porque as leis injustas têm umaduração curta e são, quase sempre, seguidas de uma reaçãodesenfreada.

A origem do mal está no egoísmo e no orgulho. Os abusos,de qualquer natureza, cessarão por si mesmos, quando os homensorientarem suas ações sob a inspiração da lei de caridade.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:A VERDADEIRA PROPRIEDADE

9. O homem não possui como sua propriedade a não seraquilo que pode levar deste mundo. O que ele aqui encontra aochegar pela porta do berço e o que ele deixa ao partir pela porta dotúmulo, ele goza enquanto aqui permanecer. Mas, se ele estáobrigado a abandonar as coisas da Terra, na própria Terra, ele sótem o usufruto das coisas e não a sua propriedade real.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM286

287CAPÍTULO XVI

O que é, então, que ele possui?Ele nada possui daquilo que se usa sobre o corpo, mas somente

o que é de uso da alma. São dele a inteligência, os conhecimentos,as qualidades morais. Eis aí o que ele traz e não deixa no túmulo aopartir desta existência. Isso é o que ninguém lhe pode tirar e que lheservirá muito mais no plano espiritual do que lhe serve neste mundo.

Do homem, pois, dependerá estar mais enriquecido dequalidades pessoais ao partir do que quando chegou a este mundo.Do que tiver adquirido na prática do bem, dependerá a sua situaçãoespiritual no plano dos Espíritos.

Quando um homem vai a um país distante, ele fará a suabagagem com os objetos que sejam de uso no país para onde setransferirá. Ele não se carrega de coisas que lhe serão inúteis. Façam,pois, o mesmo, em relação à sua vida futura, aprovisionando-se detudo o que lá lhes poderá servir.

Ao viajante que chega a um hotel, dá-se um bom apartamentose ele puder pagar a diária. Para um outro, de pequenos recursos, oalojamento será menos confortável. E, quanto àquele que nada tem,esse dormirá no relento. Assim é, também, com o homem quandoele retorna ao mundo espiritual. O lugar para onde ele vai estásubordinado às suas posses, mas lá não se pode pagar com o dinheiroda Terra o lugar que ele ocupará.

Ninguém lhe perguntará “Quanto tinhas de riquezas sobre aTerra? Que posição ocupavas? Eras patrão ou empregado?”. – Lá, aúnica indagação que lhe farão será: “Que trazes contigo?”.

Não avaliarão os bens e os títulos de quem chega, mas a somade suas virtudes. Ora, nesta espécie de tomada de valores, oempregado poderá ser mais rico do que o patrão. Inutilmentealguém alegará, no mundo espiritual, que antes de sua partida elepagou a sua entrada no outro mundo a peso de ouro. É que terácomo resposta: “Os lugares aqui não são comprados. Eles sãoconquistados pelo bem que hajas feito. Com o dinheiro da Terra

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM287

NÃO SE PODE SERVIR A DEUS E A MAMOM

288

pudeste adquirir fazendas, casas, palacetes. Aqui, no entanto, tudose adquire com as qualidades do coração. És rico dessas qualidades?Se as tens, és bem-vindo e irás ao primeiro lugar, onde as venturaste esperam. És, porém, pobre dessas qualidades? Irás, então, ao lugar,onde serás tratado de acordo com a tua pobreza de sentimentos”.(Pascal, Genebra, 1860. )

10. Os bens da Terra pertencem a Deus, que os concede deacordo com os seus desígnios. O homem é, desses bens, apenas ousufrutuário, o administrador mais ou menos íntegro e inteligente.Esses bens não são propriedade individual do homem que os temana sua posse, tanto que Deus frustra, freqüentemente, todas as suasprevisões. A fortuna escapa das mãos daqueles mesmos que julgampossuí-la segura com os melhores títulos e os maiores cuidados.

Vocês dirão, no entanto, que isso ocorre somente com asriquezas recebidas por herança. Dirão que tal não acontece comaquela que vocês adquiriram com o seu trabalho. Sem nenhumadúvida, se há uma fortuna legítima, essa é aquela que se adquirehonestamente, porque uma propriedade só é legitimamente adquiridaquando, para ter a sua posse, não se prejudicou ninguém. O homemserá chamado a contas, porém, por todo dinheiro mal adquiridoou adquirido com prejuízo de outros.

Mas, do fato de um homem dever a sua fortuna a si próprio,tirará disso alguma vantagem ao morrer? Não são freqüentementeinúteis os seus cuidados ao transmitir a sua fortuna a seus descen-dentes? Na verdade esses cuidados chegam a ser inúteis, porque se aJustiça Divina não quiser que os herdeiros a recebam, nadaprevalecerá contra as disposições dessa Justiça.

Poderá o homem usar e abusar de sua fortuna, durante a suavida, impunemente, sem que tenha de prestar contas? Não! Pois aopermitir adquiri-la, a Justiça Divina pode ter querido recompensá-lo, durante essa existência, pelos seus esforços, pela sua coragem,pela sua perseverança. Mas essa fortuna não lhe terá sido concedida

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM288

289CAPÍTULO XVI

para servir de satisfação a seus sentidos grosseiros ou a seu orgulho.Se a riqueza em suas mãos tornar-se causa de sua queda, melhorfora não tê-la em sua posse. É que com o mau uso, esse homemperde de um lado o que ganhou do outro, anulando o mérito deseu trabalho. E quando deixar a Terra, Deus lhe dirá que ele já recebeua sua recompensa. (Um Espírito Protetor, Bruxelas, 1861.)

EMPREGO DA FORTUNA

11. “Não podeis servir a Deus e a Mamom.” – Guardai bemisso, vós que sois dominados pela paixão do ouro, vós que venderíeisa vossa alma para enriquecer, tão-somente porque isso vos elevariaaos olhos dos outros homens e vos concederia os prazeres das paixões.

Não! Não podeis servir a Deus e a Mamom!Se sentis, portanto, a vossa alma dominada pelas cobiças da

carne, dai-vos pressa de sacudir o jugo que vos esmaga. A JustiçaDivina, justa e correta, vos dirá: “Que fizeste, mordomo infiel, dosbens que te foram confiados? Esse poderoso meio de fazeres as boasobras, tu o colocaste somente a serviço de tuas satisfações pessoais?”.

Qual é, então, o melhor emprego da fortuna?Procurai a resposta nestas palavras de Jesus: “Amai-vos uns

aos outros”. Aí está a solução da questão levantada. Está aí o segredode bem empregar as riquezas. Aquele que se acha animado do amorao próximo, tem nesse amor traçada toda a linha de conduta doemprego da riqueza.

A aplicação da fortuna que mais agrada a Deus está na caridade.Não nos referimos a essa caridade fria e egoísta, que consiste emdistribuir, em torno de si, o supérfluo de uma existência repleta deluxo. Referimo-nos, isto sim, à caridade plena de amor, que buscaa desgraça e a ampara, sem humilhar.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM289

NÃO SE PODE SERVIR A DEUS E A MAMOM

290

Rico, dá do que te sobra! Faze mais: doa um pouco do que teé necessário, porque o que te é necessário é, quase sempre, osupérfluo. Mas dá com sabedoria! Não afastes de teu coração aqueleque chora, com medo de seres enganado. Mas vai à origem do malque provoca essas lágrimas. Alivia antes, informa-te depois. E vê-seo trabalho, os conselhos, a afeição mesmo, não serão muito maiseficazes do que a tua esmola. Propaga, por onde passares, com oamparo material que doares, o amor de Deus, o amor ao trabalho eo amor ao próximo. Coloca as tuas riquezas sobre uma base quenão te faltará jamais e que te trará de retorno muitos juros espirituais:a base das boas obras.

A riqueza da inteligência deve servir-te como a própria rique-za de bens da Terra. Distribui, em torno de ti, os bens da instrução.Distribui sobre os teus irmãos os recursos de teu amor e eles darão,a seu devido tempo, os seus próprios frutos. (Cheverus, Bordéus,1861.)

12. Quando eu considero a brevidade da vida, sou dolorosamenteimpressionado com a vossa incessante preocupação com o bem-estar material, que é para vós a razão de ser da vida. Dais poucaimportância e consagrais reduzido tempo à vossa evolução moral eesta é a que será mais levada em conta para a vossa eternidade.

Seria de crer, ao ver a atividade que desenvolveis, que o bem-estar material é uma questão do mais alto interesse para a humanidade.No entanto, quase sempre, a agitação a que vos entregais visa tão-somente atender a satisfação de vossas necessidades exageradas, devossa vaidade ou para vos entregardes a excessos de toda natureza.Que sofrimento, que cuidados, que tormentos cada um se impõepara o bem-estar material! Quantas noites de insônia, tão-somentepara aumentar uma fortuna freqüentemente mais do que suficientepara todas as necessidades e supérfluos! Por cúmulo de cegueira,não é raro o homem não ver que a sua imoderada paixão pela fortunae pelos prazeres que ele procura, aprisionam-no a um trabalho

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM290

291CAPÍTULO XVI

penoso. Vangloria-se de uma existência dita de sacrifícios e de mérito,como se ele trabalhasse pelos outros e não por si mesmo.

Insensatos! Credes, então, realmente, que vos serão levadosem conta os cuidados e os esforços que o egoísmo e a cupidez ou oorgulho sejam a motivação? Não vedes que, assim, negligenciais dovosso futuro, bem como dos deveres que a solidariedade fraternalimpõe a todos os que usufruem das vantagens da vida social?Pensastes apenas no vosso corpo perecível! Seu bem-estar, seusprazeres, foram o único alvo de vossa solicitude egoística. Por tudoo que morre, esquecestes o vosso Espírito que viverá para sempre.

Por isso esse senhor, tão mimado e acariciado, que é o vossocorpo, tornou-se o vosso tirano. É ele que dá ordens a vosso espírito.E o vosso espírito se faz o seu escravo submisso.

Seria essa a finalidade da existência que Deus vos concedeu?(Um Espírito Protetor, Cracóvia, 1861.)

13. O homem sendo o depositário, o gerente dos bens queDeus lhe depositou entre as mãos, lhe serão pedidas contas exatasdo emprego que dará a esses bens, em virtude de seu livre-arbítrio.O mau emprego desses bens consiste em utilizá-los exclusivamentepara a sua satisfação pessoal. Ao contrário, o seu emprego é bomtodas as vezes que resulta em algum benefício para os outros.

O merecimento de toda ação generosa está na quantidade desacrifícios que a pessoa se impõe para realizá-la. A beneficência éapenas um campo onde empregar a fortuna: alivia a miséria; aplacaa fome; livra do frio e dá um abrigo aos abandonados.

Há, porém, um dever tanto mais imperioso e tanto maismeritório, e que consiste em prevenir a miséria. E esta é a missãodas grandes fortunas, tendo por campo de aplicação a criação detrabalho de todos os gêneros para que os desvalidos os possamexecutar. E mesmo que desses trabalhos se retire um resultadolegítimo, o bem não deixaria de existir, porque o trabalho desenvolvea inteligência e exalta a dignidade do homem, sempre lhe permitindo

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM291

NÃO SE PODE SERVIR A DEUS E A MAMOM

292

dizer que ganha o pão que come, enquanto a esmola o humilha edegrada. A fortuna concentrada numa só mão deve ser como umafonte de água viva que espalha a vida farta e o bem-estar à sua volta.

Oh! Vós, ricos, que empregais a fortuna segundo os desejos doSenhor, o vosso próprio coração será o primeiro a beber da água dessafonte amorosa. Vós tereis, já nesta vida, os prazeres encantadores daalma, ao invés dos prazeres materiais do egoísta que deixam um vaziono coração.

Vosso nome será abençoado sobre a Terra e, quando adeixardes, o Soberano Senhor vos dirá, como na parábola dostalentos: “Oh! Bom e fiel servidor, entra na alegria do teu Senhor”.Nessa parábola, o servidor que colocou na terra o talento que lhefora confiado, não é a imagem dos avarentos, entre as mãos dosquais a fortuna nada produz? Se, entretanto, Jesus fala principalmentedas esmolas, é porque no tempo em que falava e no país em queEle vivia, não se conheciam os trabalhos que as técnicas e as atividadesviriam a criar mais tarde e nos quais a fortuna poderia ser aplicadautilmente para o benefício geral.

A todos aqueles que podem doar, pouco ou muito, eu direipois: “Dai esmola, quando ela seja necessária, mas tanto quantopossível, convertei-a em salário, a fim de que aquele que o recebenão se envergonhe dele”. (Fénelon, Alger, 1860.)

DESPRENDIMENTO DOS BENS TERRENOS

14. Eu venho, meus irmãos, meus amigos, trazer-vos o meuóbolo, para vos ajudar a avançar corajosamente no caminho daevolução em que vós entrastes. Nós nos devemos uns aos outros.Somente através de uma união sincera e fraternal entre Espíritos eencarnados é que a regeneração do homem será possível.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM292

293CAPÍTULO XVI

Vossa paixão pelos bens terrenos é um dos mais fortesobstáculos para a vossa evolução moral e espiritual. Pelo apego àposse de tais bens, destruís a vossa faculdade de amar, voltando-seinteiramente sobre as coisas materiais.

Sede sinceros: a fortuna dá-vos uma felicidade sem manchas?Quando os vossos bolsos estão cheios, não há sempre uma sensaçãode vazio no coração? No fundo dessa cesta de flores, não há sempreum réptil oculto? Eu compreendo que o homem que, pelo seutrabalho assíduo e honrado, ganhou uma fortuna, sinta umasatisfação bem justa. Mas dessa satisfação, muito natural e que Deusaprova, a um apego que absorve todos os outros sentimentos eparalisa os impulsos do coração, vai uma longa distância. É umadistância tão grande quanto aquela que separa a sovinice sórdida daprodigalidade exagerada, dois vícios entre os quais Deus colocou acaridade. É a caridade a santa e salutar virtude que ensina o rico adoar sem ostentação, para que o pobre receba sem rebaixar-se.

Quer a fortuna vos tenha vindo de vossa família, quer a tenhaisconquistado por vosso trabalho, há uma coisa que jamais deveisesquecer: tudo vem de Deus e a Deus retorna. Nada vos pertencena Terra, nem mesmo o vosso corpo físico: a morte vos despojadele, como vos despoja, também, dos bens materiais. Vós sois merosdepositários e não proprietários, não vos iludais. Deus vos emprestoue tereis de lhe restituir todos os empréstimos. E Ele vos emprestousob a condição de que o supérfluo, pelo menos, seja revertido paraaqueles que não possuem o necessário para a vida.

Um de vossos amigos vos emprestou uma quantia emdinheiro. Por menos honestos que sejais, tereis escrúpulo em lhepagar o valor tomado de empréstimo e, ainda, lhe ficareisagradecidos. Pois bem, eis a posição de todo homem rico diante daProvidência Divina. Deus, que é o Amigo Celestial, emprestou-lhea riqueza que ele tem. O Pai nada lhe pede além do amor e

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM293

NÃO SE PODE SERVIR A DEUS E A MAMOM

294

reconhecimento, mas exige, por sua vez, que o rico doe aos pobres,que são tão filhos de Deus quanto ele próprio.

Os bens que Deus vos confiou estimulam em vossos coraçõesuma ardente e desvairada cobiça. Já refletistes, quando vos apegaisapaixonadamente a uma fortuna tão perecível e passageira quantovós, que virá um dia em que devereis prestar contas ao Senhor daquiloque vos veio d’Ele? Esquecei-vos de que, pela riqueza que vos veio,fostes investidos da sagrada condição de ministros da caridade naTerra, para serdes da riqueza os distribuidores inteligentes? O quesereis, pois, quando usardes tão-somente em vosso proveito pessoala fortuna que vos foi confiada? Sereis, por certo, depositários infiéis!Que resulta deste esquecimento voluntário de vossos deveres?Resultará em que a morte inflexível, inevitável, virá rasgar o véusob o qual ocultáveis os vossos deveres de caridade. E vos forçará aprestar contas do mau uso da fortuna ao mesmo Amigo Divino,diante do qual tendes a obrigação de pagamento e que, nessemomento, se reveste do papel de credor.

É inútil que na Terra procureis iludir-vos a vós mesmos,colorindo com o nome de virtude aquilo que não é mais do queegoísmo. É inútil que chameis de economia e previdência o quenão é mais que cobiça e avareza e de generosidade ao que não passade gasto excessivo em proveito pessoal.

Um pai de família, por exemplo, deixa de praticar a caridade,e economizará, guardará dinheiro e tudo isso – diz ele – para deixara seus filhos a maior soma de bens que seja possível, a fim de evitarque os seus caiam na miséria. Isso é muito justo e próprio de umpai, eu aceito, e ninguém poderá censurá-lo por isso. Mas, serásempre esse o único propósito que o orienta para acumular bens? Asua desculpa para juntar bens não será um meio de tranqüilizar asua própria consciência? Com isso ele não quererá justificar-se aseus olhos e aos olhos de outras pessoas – o seu apego pessoal aosbens terrenos? Admitamos, porém, que o amor paternal é o seu

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM294

295CAPÍTULO XVI

único motivo. Será que esse motivo justifica o esquecimento deseus irmãos perante Deus? Quando esse pai já tem até o supérfluo,deixará seus filhos na miséria, por lhes ficar um pouco menos desseexcesso que tem? Não estará ensinando, esse pai, uma lição deegoísmo a seus filhos e endurecendo-lhes o coração contra os deveresda caridade? Não estará, com isso, afogando neles o amor aopróximo?

Pais e mães, cometeis um grande erro, se acreditais que, poramontoar bens, fareis crescer o afeto de vossos filhos por vós. Estais,isto sim, a ensinar-lhes a ser egoístas para com os outros e, também,estais a ensiná-los a ser egoístas com vós mesmos.

Quando um homem trabalha muito e com o suor de seurosto acumulou bens, é comum ouvires dizer que “quando odinheiro é ganho com o suor do rosto, conhece-se mais o seu valor”.Nada é mais verdadeiro que isso! Pois bem! Que esse homem quedeclara conhecer todo o valor do dinheiro, faça a caridade segundoas suas posses. Ele terá mais merecimento do que aquele que, nascidona abundância, desconhece as duras fadigas do trabalho para terbens. Mas, também, se esse mesmo homem que se recorda de suasdificuldades, de seus esforços, se fizer egoísta, impiedoso para comos pobres, ele é muito mais culpado do que os outros. É que quantomais cada um conhece as dores ocultas da miséria, mais deveremosinteressar-nos em socorrer aos outros que vivem o que já vivemos.

Infelizmente sempre há no homem que possui bens um outrosentimento, tão forte quanto o apego à fortuna, e esse sentimentoé o orgulho. Não é raro ver-se o novo rico atordoar o infeliz queimplora a sua assistência com a narrativa de seus trabalhos e das suashabilidades, ao invés de ajudá-lo. E termina por lhe dizer: “Faça oque eu fiz”. De acordo com o modo de ele ver, a bondade de Deusnão influiu em nada para ele obter seus bens. Somente a ele cabetodo o mérito! Seu orgulho lhe coloca uma venda sobre os olhos eensurdece-lhe os ouvidos. Ele não compreende, apesar de toda a

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM295

NÃO SE PODE SERVIR A DEUS E A MAMOM

296

sua inteligência e de sua capacidade, que a Justiça Divina podedespojá-lo de tudo num só minuto.

Esbanjar a riqueza não é desapego aos bens terrenos. Quasesempre é pouco caso e indiferença. O homem, como depositáriodesses bens, não tem o direito de os dissipar ou de apossar-se delesapenas para seu proveito pessoal.

Ser pródigo não é ser generoso. Esta é, freqüentemente, umaforma de egoísmo. Um que gasta muito dinheiro para satisfazeruma mera fantasia, talvez não dê um centavo para quem lhe prestaum serviço. O desapego aos bens terrenos consiste em saber avaliara fortuna no seu justo valor, em saber servir-se dela para beneficiaroutras pessoas e não utilizá-la apenas para si próprio. Consiste odesapego em não sacrificar os interesses da vida futura em troca dafortuna; em saber perdê-la sem queixar-se, se a Justiça Divina vemretirá-la de sua posse.

Se, por reveses imprevistos, vos tornardes um outro Jó, dizei,então, como ele: “Senhor, vós me havíeis doado, vós me tirastes;que a vossa vontade seja feita!”. Eis, aí, o verdadeiro desprendimento.Sede, antes de tudo, submissos às manifestações da Justiça Divina.Tende fé naquele que vos tendo dado e tirado, pode vos restituir.Resisti com coragem ao desânimo, ao desespero, que paralisariamas vossas forças.

Não esqueçais nunca, quando a Justiça Divina vos despojar,que ao lado de uma grande provação ela coloca sempre umaconsolação. Mas pensai, sobretudo, que há bens infinitamente maispreciosos que os da Terra. Este pensamento vos ajudará a desprender-vos destes últimos que perdestes. O pouco apreço que damos auma coisa faz com que sejamos menos sensíveis à sua perda.

O homem que se aprisiona aos bens da Terra é semelhante auma criança que só vê o momento presente. Aquele, porém, quedeles se desapega, é semelhante a um adulto que vê as coisas mais

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM296

297CAPÍTULO XVI

importantes, porque ele compreende estas palavras proféticas doSalvador: “Meu reino não é deste mundo”.

O Senhor não ordena que alguém se despoje dos bens quepossui, para reduzir-se a uma miséria voluntária. Aquele que assim ofizesse, se tornaria uma carga para a sociedade. Despojar-se dessa formaseria não compreender o desapego dos bens terrenos. Este é umegoísmo de um outro gênero. Corresponde a uma fuga daresponsabilidade que a fortuna faz pesar sobre aquele que a possui.Deus a dá a quem lhe parece bom para gerenciá-la em proveito detodos.

O rico tem, portanto, uma missão, missão que ele pode tornarbela e proveitosa para si mesmo. Rejeitar a fortuna, quando Deusvos dá, é renunciar aos benefícios do bem que poderíeis fazer, em aadministrando com sabedoria.

Saber passar sem a fortuna, quando não a temos; saberempregá-la utilmente, quando a recebemos; saber sacrificá-la,quando seja necessário, isso é agir segundo os desígnios do Senhor.Assim, aquele que receba o que o mundo chama de boa fortuna,que de pronto diga: “Meu Deus, vós me enviastes a um novoencargo; dai-me forças de desempenhá-lo segundo a vossa santavontade”.

Eis, meus amigos, o que eu vos queria ensinar sobre odesprendimento dos bens terrenos. Em resumo, direi: Sabeicontentar-vos com o pouco. Se sois pobres, não invejeis os ricos,porque a riqueza não é necessária para a felicidade. Se sois ricos, nãovos esqueçais de que esses bens vos são confiados e que deveisjustificar o seu emprego, como uma prestação de contas deadministração de bens que vos foram conferidos para proteger osque vos são menores.

Não sejais depositários infiéis.Não utilizeis tais bens a serviço da satisfação de vosso orgulho

e da vossa sensualidade. Não vos julgueis no direito de dispô-los

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM297

NÃO SE PODE SERVIR A DEUS E A MAMOM

298

para vós unicamente, pois os recebestes como empréstimo e nãocomo doação. Se não sabeis pagar, não tendes o direito de pedir.Lembrai-vos de que aquele que doa aos pobres está pagando a dívidaque contraiu com Deus. (Lacordaire, Constantina, 1863.)

TRANSMISSÃO DA RIQUEZA

15. O princípio segundo o qual o homem é apenas depositárioda fortuna de que Deus lhe permite gozar durante a sua vida, tira-lhe o direito de transmiti-la a seus descendentes?

O homem pode perfeitamente transmitir, após a sua morte,aquilo que gozou durante a vida. Porém, o efeito desse direito detransmissão será sempre subordinado aos desígnios divinos. E aJustiça Divina pode, quando necessário, impedir os herdeiros degozá-los. É por isso que vemos desmoronar fortunas que pareciammuito solidamente firmes. A vontade do homem de conservar suafortuna na sua família é, portanto, impotente. Isso, no entanto,não lhe retira o direito de transmitir o empréstimo que recebeu,uma vez que a Justiça Divina o retirará quando julgar conveniente,do ponto de vista espiritual e de provas e expiações. (Luís, Paris,1860.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM298

299CAPÍTULO XVI

CARACTERÍSTICAS DA PERFEIÇÃO

1. Eu, porém, vos digo: Amai a vossos inimigos, bendizei os quevos maldizem, fazei o bem aos que vos odeiam e orai pelos que vosmaltratam e vos perseguem, para que sejais filhos de vosso Pai que estános céus, porque Ele faz que o seu Sol se levante sobre bons e maus e achuva desça sobre justos e injustos. Se amardes apenas os que vos amam,que glória tereis nisso? Não fazem os publicanos o mesmo? E, se saudardesunicamente os vossos irmãos, que fazeis de mais? Não fazem ospublicanos também assim? Sede vós, pois, perfeitos como perfeito é ovosso Pai que está nos céus. (Mateus, capítulo 5, versículos 44 a 48.)

2. Sabendo-se que Deus é a perfeição infinita em todas ascoisas, esta máxima: “Sede perfeitos como o vosso Pai celestial éperfeito”, se tomada ao pé da letra, levaria a supor existir apossibilidade de o homem alcançar a perfeição total.

Se fosse dado à criatura ser assim tão perfeita quanto o Criador,ela deveria igualar-se a Ele, o que não é admissível. Mas, os homensaos quais Jesus se dirigia, não poderiam compreender essas tonalidadesda idéia. Jesus, portanto, limitou-se a lhes apresentar um modelo elhes disse que se esforçassem por copiá-lo.

Devemos, portanto, entender por essas palavras do Mestreque Ele se referia à perfeição relativa de que o homem é capaz. É oque mais pode aproximá-lo da perfeição da Divindade.

Em que consiste essa perfeição?

17

CAPITULO XVII

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM299

SEDE PERFEITOS

300

Jesus a indicou, dizendo: “Amar seus inimigos, fazer todo obem aos que nos odeiam, orar por aqueles que nos perseguem”. Elemostra, indicando esse comportamento, que a essência da perfeiçãoestá na caridade no seu mais amplo sentido, porque a caridade implicaa prática de todas as outras virtudes.

Com efeito, se observarmos as reações de todos os vícios, emesmo as de simples falhas de conduta, reconheceremos que nãohá um só que não altere mais ou menos o sentimento da caridade.Todos os erros têm o seu princípio no egoísmo e no orgulho, quesão a negação da caridade. Tudo o que exalta o sentimento dapersonalidade destrói ou, pelo menos, enfraquece os elementos daverdadeira caridade que são: a benevolência, a indulgência, aabnegação e o devotamento.

O amor ao próximo, elevado até ao amor aos inimigos, nãopode aliar-se com nenhum defeito contrário à caridade. É sempre,por si mesmo, o indício de uma maior ou menor superioridademoral da alma. Daí resulta que o grau de evolução do espírito estána razão direta da extensão do amor ao próximo. Foi isso que Jesus,após haver dado a seus discípulos as regras da caridade, no que temde mais sublime, lhes disse: “Sede perfeitos quanto perfeito é ovosso Pai Celestial”.

O HOMEM DE BEM

3. O verdadeiro homem de bem é aquele que pratica a lei dajustiça, do amor e da caridade na sua maior pureza. Se interroga asua própria consciência sobre seus próprios atos, ele se pergunta senão violou essa lei, se não fez o mal, se fez todo o bem que podia,se deixou escapar por vontade própria alguma ocasião de ser útil, seninguém tem do que se queixar dele, enfim, se ele fez aos outrostudo o que queria que os outros fizessem por ele.

,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM300

301CAPÍTULO XVII

Ele tem fé em Deus, na sua bondade, na sua justiça e na suasabedoria. Sabe que nada acontece sem a permissão Divina.Submete-se em todas as coisas aos desígnios do Pai Celestial.

Ele tem fé na vida futura e, por isso, coloca os bens espirituaisacima dos bens materiais passageiros.

Ele sabe que todas as dificuldades da vida, todas as dores,todas as desilusões, são provas e expiações. E a todas aceita semqueixar-se.

Esse homem, repleto do sentimento de caridade e de amorao próximo, faz o bem pelo bem, sem esperar recompensas. Retribuio mal com o bem. Toma a defesa do fraco contra o forte e sacrificasempre os seus interesses ao que seja justo.

Ele encontra a sua satisfação nos benefícios que espalha, nosserviços que presta, na felicidade que leva aos outros, nas lágrimasque enxuga, na consolação que dá aos aflitos. Seu primeiro impulsoé o de pensar nos outros, antes de pensar em si. É de cuidar dosinteresses dos outros antes de cuidar de seus próprios interesses. Oegoísta, ao contrário, calcula os proveitos e as perdas de toda açãogenerosa.

Ele é bom, humano e benevolente para com todas as pessoas,sem distinção de raças e nem crenças, porque ele vê todos os homenscomo irmãos.

Ele respeita nos outros todas as convicções sinceras e não lançanenhuma condenação contra os que não pensam como ele.

Em todas as situações, a caridade é o que orienta as suas ações.Ele considera que todo aquele que prejudica os outros com palavrasmaldosas, que fere a sensibilidade de alguém com o seu orgulho eseu desdém, que não desiste da idéia de causar um sofrimento aopróximo, uma contrariedade mesmo que pequena, quando poderiaevitá-la, que esse alguém está faltando com o dever do amor aopróximo e não merece a clemência da Justiça Divina.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM301

SEDE PERFEITOS

302

Ele não tem ódio, nem rancor, nem desejo de vingança. Aexemplo de Jesus, ele perdoa e esquece as ofensas. E apenas se lembrados benefícios que lhe fazem, porque ele sabe que será perdoadoassim como ele próprio tenha perdoado aos outros.

Ele é indulgente com as fraquezas dos outros, porque sabeque ele mesmo necessita de indulgência. E lembra destas palavrasdo Cristo: “Aquele que estiver sem pecado, atire a primeira pedra”.

Ele não se alegra em procurar os defeitos dos outros e nemem colocá-los em evidência. Se a necessidade o obriga a conhecê-los, ele procura sempre o bem que pode atenuar o mal.

Ele estuda as suas próprias imperfeições morais e trabalhasem cessar para combatê-las. Todo o seu empenho tende a que elepossa dizer, no dia seguinte, que traz alguma coisa de melhor, dentrode si, do que tinha na véspera.

Ele não procura dar valor à sua inteligência, nem a seustalentos, com sacrifício de outras pessoas. Aproveita, pelo contrário,todas as oportunidades de destacar as qualidades de seu próximo.

Ele não se envaidece de sua tarefa, nem de seus predicadospessoais, porque sabe que tudo o que lhe foi dado poderá ser lheretirado.

Ele usa, mas não abusa, dos bens que lhe são concedidos.porque sabe que são um depósito de que deverá prestar contas. Esabe que o emprego mais prejudicial que lhes poderia dar, será o deutilizá-los para a satisfação de suas paixões.

Se a ordem social coloca homens sob a sua dependência, eleos trata com bondade e benevolência. É que sabe que todos sãoiguais aos olhos de Deus. Ele usa de sua autoridade para lhes levantaro ânimo e não para os esmagar com o seu orgulho. Evita tudo oque lhes possa tornar mais sofrida a posição de subalternos.

Ele, quando ocupa a posição de subordinado, por sua vezcompreende os deveres de sua situação e se empenha em cumpri-los conscientemente. (Ver, neste mesmo capítulo, o item 9.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM302

303CAPÍTULO XVII

O homem de bem, enfim, respeita nos seus semelhantestodos os direitos que lhes deu a lei da Natureza, como desejaria quefossem respeitados os dele.

Não estão enumeradas, aqui, todas as qualidades que revelamo homem de bem. Mas, todos aqueles que se esforcem para adquiriraquelas que mencionamos, estarão no caminho que conduz a todasas outras.

OS BONS ESPÍRITAS

4. O Espiritismo bem compreendido, mas sobretudo bemsentido, conduz forçosamente aos resultados acima expostos. Asqualidades do homem de bem é que caracterizam o verdadeiroEspírita como o verdadeiro cristão, pois que um é o mesmo que ooutro. O Espiritismo não cria nenhuma nova moral. Ele facilitaaos homens a compreensão e a prática da moral do Cristo, ao daruma fé sólida e esclarecida aos que duvidam ou vacilam.

Muitos, no entanto, daqueles que crêem nos fatos dasmanifestações mediúnicas não compreendem nem as conseqüênciasnem o seu conteúdo moral ou, se os compreendem, não os aplicama si mesmos!

A que atribuir isso?Seria por uma falta de clareza da Doutrina Espírita?Não! Não é falta de precisão ou clareza, porque a Doutrina

Espírita não contém alegorias, nem imagens que pudessem levar afalsas ou fantasiosas interpretações. A clareza é mesmo de sua própriaessência. E este fato é que faz a sua força, porque ela vai direto paraa inteligência. Ela nada tem de misterioso e seus iniciados não estãona posse de nenhum segredo que seja oculto ao homem comum.

Para compreendê-la é necessário uma super-inteligência?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM303

SEDE PERFEITOS

304

De modo algum isso é necessário. Há homens de grandeinteligência que não a compreendem. Mas, por outro lado, háinteligências comuns, até mesmo de jovens saídos da adolescência,que lhe apreendem com uma admirável precisão as suas maisdelicadas nuanças.

Ocorre que a parte, por assim dizer, material da ciência nãopede mais que olhos para observar, enquanto que a parte essencialexige um certo grau de sensibilidade a que poderemos chamar dematuridade do senso moral. Essa maturidade independe da idade edo grau de instrução. Ela é conseqüência da evolução, em sentidoparticularmente moral, do Espírito encarnado.

Em algumas pessoas, os laços da matéria ainda são muitofortes, dificultando ao espírito ter uma compreensão das coisas acimada Terra. Aprisionadas a uma névoa, não têm uma visão do infinito.Eis porque não se desligam facilmente nem de seus gostos e nemdos seus hábitos, não compreendendo que possa haver qualquercoisa melhor do que aquilo que são os seus princípios pessoais. Acrença nos Espíritos, para essas pessoas, é um simples fato, mas quenada ou bem pouco lhes modifica as tendências instintivas. Numapalavra, elas não vêem mais do que um raio de luz espiritual,insuficiente para conduzi-las e dar-lhes uma vigorosa aspiração, capazde modificar-lhes os pendores.

Essas pessoas se prendem mais aos fenômenos mediúnicosdo que à moral de suas mensagens, a qual lhes parece banal ecansativa. Pedem sempre aos Espíritos para iniciá-las sem cessar emnovos segredos espirituais, sem procurar saber se já se tornaramdignas de penetrar nos segredos do Criador.

Esses são os Espíritas imperfeitos, alguns dos quais param nomeio do caminho ou se distanciam de seus irmãos de crença, porquerecuam ante a obrigação de reformarem-se a si mesmos ou, então,guardam as suas simpatias pessoais para aqueles que partilham desuas fraquezas ou de suas prevenções contra a moral Espírita.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM304

305CAPÍTULO XVII

Contudo, o fato de terem aceito os princípios da Doutrina, éum primeiro passo que lhes tornará mais fácil o segundo, napróxima reencarnação.

Aquele que se pode, com razão, qualificar de verdadeiro esincero Espírita, é o que se encontra num grau superior dedesenvolvimento moral. O Espírito, que nele domina maiscompletamente a matéria, dá-lhe uma visão mais clara da vidaespiritual. Os princípios da Doutrina fazem vibrar as fibras da almaque nos outros permanecem adormecidas. Numa palavra, ele foitocado no coração pela essência da Doutrina.

A sua fé é inabalável.Ele é como o músico que se sensibiliza com alguns acordes,

enquanto aquele, que será tocado no coração em reencarnaçõesfuturas, ao ouvir alguns acordes, apenas lhes ouve os sons.

Reconhece-se o verdadeiro Espírita pela sua transformação morale pelos esforços que faça para dominar as suas más inclinações.

O Espírita imperfeito se contenta com o seu horizontelimitado. O verdadeiro Espírita, que compreende existir algumacoisa melhor que a vida terrena, esforça-se por libertar-se de seupróprio horizonte. E sempre o consegue quando tem uma firmevontade.

PARÁBOLA DO SEMEADOR

5. Tendo Jesus saído de casa, naquele dia, estava assentado juntoao mar. E ajuntou-se muita gente ao seu redor, de sorte que, entrandonum barco, se assentou e toda a multidão estava em pé na praia. Efalou-lhe de muitas coisas por parábolas, dizendo: Eis que o semeadorsaiu a semear. E, quando semeava, uma parte da semente caiu noleito do caminho, e vieram as aves e as comeram. E outra parte caiuentre pedras, onde não havia terra bastante, e logo nasceu, porque

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM305

SEDE PERFEITOS

306

não tinha terra funda, mas vindo o Sol, queimou-se e se secou, poisnão tinha raiz. E outra caiu entre espinhos e os espinhos cresceram e asufocaram. E outra caiu em terra boa e deu frutos que rendiam a cempor um, outro a sessenta por um e outro a trinta por um.

Quem tiver ouvidos para ouvir ouça. (Mateus, capítulo 13,versículos 1 a 9.)

Escutai vós, pois, a parábola do semeador.Ouvindo alguém a palavra do reino, e não a entendendo, vem

o maligno e arrebata o que foi semeado no seu coração; esta é a sementeque foi semeada no leito do caminho. O que foi semeado entre pedrasé o que ouve a palavra e logo a recebe com alegria, mas não tem raizem si mesmo, antes é de pouca duração. E chegada a angústia e aperseguição, por causa da palavra, logo se ofende. E a que foi semeadaentre espinhos é o que ouve a palavra, mas os cuidados deste mundo ea sedução das riquezas sufocam a palavra e fica infrutífera.

Mas, a que foi semeada em boa terra é o que ouve e compreendea palavra e dá fruto e um produz cem por uma semente, outro sessentapor uma e outro trinta por uma. (Mateus, capítulo 13, versículos 18 a23. )

6. A parábola do semeador reproduz, de um modo perfeito,as nuanças que existem nas diversas maneiras de utilizar osensinamentos do Evangelho. Quantas pessoas há, realmente, paraas quais os ensinamentos de Jesus são letra morta, semelhantes àsemente caída sobre as pedras e que não produzem nenhum fruto!

Esta parábola do semeador encontra uma outra aplicação,não menos justa, nas diferentes categorias de Espíritas. Não está aío retrato daqueles que se apegam apenas aos fenômenos mediúnicose desses fenômenos não extraem nenhuma conseqüência moral,porque neles só vêem fatos curiosos? Não está aí o retrato daquelesque só buscam o brilho das mensagens dos Espíritos e que por elassó se interessam enquanto satisfazem a sua imaginação, mas que,depois de tê-las ouvido, continuam tão frios e indiferentes quanto

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM306

307CAPÍTULO XVII

eram? Não está aí o retrato daqueles que acham que as mensagensespirituais trazem muitos conselhos bons e os admiram, mas paraserem aplicados aos outros e não a si mesmos?

Não está aí o retrato daqueles, finalmente, para os quais essasmensagens educativas são como a semente que caiu em terreno fértile que produzirão frutos?

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:O DEVER

7. O dever é a obrigação moral, primeiramente consigomesmo e, em seguida, para com os outros. O dever é a lei da vida.Encontramo-lo nas menores ações e, também, nos atos maiselevados.

Venho falar, aqui, do dever moral e não daqueles deveresimpostos pelas diversas profissões.

No campo dos sentimentos, o dever moral é difícil de sercumprido, porque, quase sempre, se encontra em choque com asseduções dos interesses próprios e do coração desajustado. As suasvitórias não têm testemunhas e as suas derrotas não têm repressãona justiça da Terra.

O dever íntimo do homem está entregue a seu livre-arbítrio.O estímulo da consciência, essa guardiã da sua honra íntima, oadverte e o sustenta na linha do dever moral. Mas ele, freqüentemente,se mostra sem forças diante das falsidades brilhantes da paixão. Odever do coração, que se move na lei do amor, se for fielmenteobservado, eleva espiritualmente o homem.

Mas, como definir esse dever?Onde ele começa? Onde termina?O dever do coração começa exatamente no ponto em que você

ameaça a felicidade ou a tranqüilidade de seu próximo, e termina no

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM307

SEDE PERFEITOS

308

limite que você não desejaria ver ninguém transpor em relação a vocêmesmo.

Deus criou todos os homens iguais diante da dor. Pequenosou grandes, ignorantes ou esclarecidos, todos sofrem pelas mesmascoisas, a fim de que cada um examine o mal que pode ou não fazer.O mesmo critério de exame não existe para o bem porque este émuito mais variado nas suas manifestações. A igualdade diante dador é uma sublime providência de Deus que quer que os seus filhos,instruídos pela experiência comum, não cometam o mal, alegandodesconhecer os seus efeitos dolorosos.

O dever moral é o resumo prático de todas as indagaçõessobre o bem e o mal. O dever é um empenho total da alma queenfrenta as agonias da luta interior entre fazer o bem ou se deixararrastar para o mal. Ele é, por isso, severo e brando, pronto a dobrar-se diante das diversas complicações, mas indobrável diante dastentações nascidas do interior do próprio homem.

O homem que cumpre o seu dever, ama a Deus mais do queas criaturas e ama as criaturas mais do que a si mesmo. Ele é, aomesmo tempo, juiz e réu, julgando as suas próprias ações e secondenando naquelas em que agiu mal.

O dever moral é a mais bela conquista da razão. Ele nasce darazão, como o filho nasce da mãe. O homem deve amar o dever,não porque ele o preserva dos males da vida, males esses dos quaisos homens não podem excluir-se, mas deve amá-lo porque ele lhedará à alma o vigor necessário para a sua evolução.

O dever moral cresce e ganha luzes sob uma forma maiselevada, em cada um dos estágios superiores da humanidade. Aobrigação moral da criatura para com Deus não termina jamais,porque o homem deve espelhar em si as virtudes divinas. O Criadornão aceita as criaturas como rascunho imperfeito, pois quer que agrandeza de sua obra seja como um sol diante de si. (Lázaro, Paris,1863.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM308

309CAPÍTULO XVII

A VIRTUDE

8. A virtude, no seu mais alto grau, abrange o conjunto detodas as qualidades essenciais que revelam o homem de bem. Serbom, caridoso, trabalhador, sóbrio, modesto, são as qualidades dohomem virtuoso. Infelizmente, essas qualidades são acompanhadasde pequeninas enfermidades morais que lhes tiram o brilho e asenfraquecem.

Aquele que faz alarde de sua virtude, não é virtuoso. Falta-lhe a qualidade principal: a modéstia. E sobra-lhe o vício maiscontrário a todas as virtudes: o orgulho. A virtude, realmente dignadesse nome, não gosta de fazer alaridos. Temos de adivinhá-la, poisela se esconde dos olhos humanos e foge da admiração dasmultidões.

Vicente de Paulo era virtuoso.O digno cura D’Ars era virtuoso.Assim também eram virtuosos outros poucos conhecidos do

mundo, mas conhecidos de Deus. Todos esses homens de bemignoravam que eles mesmos fossem virtuosos. Eles se deixavam irna corrente mental de suas santas inspirações e praticavam o bemcom um completo desinteresse pessoal e com um inteiroesquecimento de si mesmos.

É para esta virtude, assim compreendida e praticada, que euvos convido, meus filhos. É para esta virtude realmente cristã everdadeiramente Espírita, que eu vos convido a consagrar-vos.

Mas, afastai de vossos corações a idéia do orgulho, da vaidade,do amor-próprio que sempre tiram a luz das mais belas qualidades.Não imiteis a esse homem que faz a pose de um modelo e anunciaele mesmo as suas próprias qualidade a todos os ouvidoscomplacentes. A virtude assim alardeada quase sempre esconde umainfinidade de pequenas desonestidades e de dolorosas covardias.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM309

SEDE PERFEITOS

310

O homem que se engrandece a si mesmo, que ergue umaestátua para a sua própria virtude, anula, por esse simples fato, todoo mérito que efetivamente poderia ter.

E que não direi eu, no entanto, sobre aquele cujo valor éparecer o que não é? Admito que o homem que faz o bem sinta, nofundo do coração, uma satisfação íntima. Mas, desde que essasatisfação se exteriorize para que ele receba elogios dos outros, eladegenera em amor-próprio.

Oh! Vós todos, a quem a fé Espírita aqueceu novamentepara o bem, e que sabeis com certeza que o homem está longe daperfeição, jamais penetreis por esses caminhos tão perigosos davaidade. A virtude é uma graça que eu desejo para todos os Espíritassinceros, mas eu lhes direi: “Mais valem poucas virtudes commodéstia, do que muitas virtudes com orgulho”.

Foi pelo orgulho que os homens sucessivamente se perderame é pela humildade que eles alcançarão a sua redenção um dia.(François-Nicolas-Madaleine, Paris, 1863.)

OS SUPERIORES E OS INFERIORES

9. A autoridade, igualmente como ocorre com a riqueza, éuma delegação de que terá de prestar contas aquele que dela estáinvestido. Não creia, porém, que ela seja dada para lhe proporcionaro inútil prazer de dar ordens para os outros. Nem lhe foi concedida,como crê falsamente a maioria dos poderosos da Terra, como umdireito ou uma propriedade de sua alma. A Justiça Divina, aliás,tem provado que não é nem uma coisa e nem outra, uma vez quedesses poderosos retira a autoridade, quando isso se mostra necessáriopara a correção de seu caminho e de sua aprendizagem espiritual.

Se a autoridade fosse um privilégio que fizesse parte dapersonalidade de quem a exerce, ela não lhe poderia ser retirada.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM310

311CAPÍTULO XVII

Ninguém pode dizer que uma coisa lhe pertence, quando essa coisalhe pode ser tirada sem o seu consentimento.

A autoridade é concedida a título de missão ou de prova,quando se torne conveniente para as experiências evolutivas da almae pela mesma causa poderá ser retirada.

Quem quer que seja depositário de autoridade, de qualquergrau ou abrangências que essa autoridade seja, desde a do patrãosobre o empregado, até a do governador sobre o povo, – esse quetem alguma autoridade não deve esquecer que tem almas sob a suaresponsabilidade. Ele responderá pela boa ou pela má direção queder aos que lhe estão subordinados. As faltas que os subordinadospossam cometer por serem mal dirigidos, os vícios a que foremarrastados em conseqüência dessa má diretriz ou dos maus exemplosdados pelos que os dirigem, recairão sobre o próprio dirigente. Poroutro lado, esse dirigente recolherá os frutos de seu zelo em direcioná-los para o bem.

Todo homem tem, sobre a Terra, uma missão pequena ougrande. Qualquer que seja a sua missão, ela sempre lhe é concedidapara o bem. Desviá-la do bem é, portanto, fracassar no seudesempenho.

Deus pergunta ao rico: “Que fizeste da fortuna que deveriaser nas tuas mãos a fonte de muita felicidade à tua volta?”. Eperguntará a quem foi concedida alguma autoridade: “Que usofizeste dessa autoridade? Que males evitaste? Que evoluçãoproduziste? Se eu te confiei almas que necessitavam de direção, nãofoi para torná-las escravas de tua vontade, nem instrumentos passivosde teus caprichos ou de tua cobiça. Eu te fiz forte e te confiei osfracos para que os amparasses e os ajudasses a subir até mim”.

O superior que esteja compenetrado das palavras do Cristo,não menospreza a nenhum daqueles que estejam submetidos a si,porque sabe que as diferenças sociais e profissionais não existemdiante de Deus. O Espiritismo lhe ensina que os que hoje lhe

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM311

SEDE PERFEITOS

312

obedecem, talvez já tenham sido seus dirigentes ou poderão dirigi-lo futuramente. O superior de hoje poderá ser tratado, mais tarde,assim como tem tratado hoje a seus subordinados.

Se o superior tem deveres morais a cumprir, o subordinado,por seu lado, também os tem e não menos sagrados. Se osubordinado for Espírita, sua consciência lhe dirá, ainda maisfortemente, que não está dispensado de cumpri-los, ainda mesmoque o seu dirigente não cumpra com os deveres dele. É que o Espíritasabe que não deve retribuir o mal com o mal e que as faltas de unsnão justificam as faltas de outros.

Se ele sofre na sua posição de dirigido, dirá que sem dúvida omerece, porque ele mesmo, talvez, terá abusado outrora de suaautoridade e que deve sentir, agora, as dificuldades que fez outrossofrerem. Se está forçado a suportar essa posição, por não encontraroutra melhor, o Espiritismo lhe ensina a resignação a essacircunstância como sendo uma prova para a sua humildade, provaessa necessária para a sua evolução espiritual.

A sua fé Espírita orienta a sua conduta.Ele deve agir como desejaria que os seus subordinados agissem

com ele, se ele fosse o superior. Por isso mesmo, ele se faz maisatencioso no cumprimento de suas obrigações, porque compreendeque todo relaxamento no trabalho que lhe é confiado é um prejuízopara aquele que lhe paga o salário e a quem ele deve o seu tempo eos seus cuidados.

Em outras palavras, o Espírita, quando subordinado ouencarregado, está requisitado pelo sentimento do dever moral quenasce de sua fé e pela certeza de que todo desvio do caminho retoserá uma dívida que ele terá de resgatar cedo ou tarde. (François-Nicolas-Madaleine, Cardeal Morlot, Paris, 1863.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM312

313CAPÍTULO XVII

O HOMEM NO MUNDO

10. Um sentimento de piedade sempre deve animar o coraçãodaqueles que se reúnem sob os olhos do Senhor, implorando aassistência dos bons Espíritos. Purifiquem, pois, os seus corações.Não deixem que nos seus corações permaneça nenhum pensamentomundano ou tolo.

Elevem seu espírito ao encontro daqueles a quem vocêschamam, a fim de que, encontrando eles as condições necessárias,possam semear em boa quantidade as sementes do bem que devemgerminar nos seus corações e produzir os frutos da caridade e dajustiça.

Não creiam, portanto, que ao estimulá-los constantementepara a prece e à evocação mental, queiramos conduzi-los a umavida mística, que os traga para fora das leis da sociedade, onde vocêsestão obrigados a viver. Não! Vivam com os homens de seu tempo,como devem viver os homens. Sacrifiquem-se às necessidades davida, até mesmo às coisas sem importância de cada dia. Mas dêem-se a essas coisas com um sentimento de pureza, capaz de santificá-las.

Vocês foram chamados a estar em relacionamento comEspíritos de naturezas diferentes das suas, de características atéopostas e, por isso, não choquem nenhum daqueles com os quaisvocês convivem. Sejam alegres, sejam felizes, mas com a alegria deuma consciência tranqüila pelo dever cumprido e uma felicidadeprópria do herdeiro do céu, que conta os dias que lhe faltam paraentrar na posse de sua herança celestial.

A virtude não consiste em vocês se revestirem de umaaparência severa e fúnebre e nem em vocês rejeitaram os prazeresque a sua condição humana lhes permite. Será suficiente que vocêselevem todos os atos de sua vida ao Criador que lhes concedeu avida. Bastará que, ao começar ou terminar uma obra, vocês elevem

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM313

SEDE PERFEITOS

314

o seu pensamento ao Criador e lhe peçam, num impulso da alma,a Proteção Celestial para fazê-la bem ou lhe ofereçam a sua gratidãopor tê-la feito bem. Ao fazerem qualquer coisa, nada façam sempensar em Deus. Nada façam sem que a lembrança de Deus venhapurificar e santificar as suas ações.

A perfeição está toda inteiramente, como disse o Cristo, naprática da caridade sem limites. Mas os deveres da caridade alcançamtodas as posições sociais, desde aqueles que estão abaixo quanto osque estão no topo dessas posições. O homem que vivesse isoladoda sociedade não poderia praticar nenhuma caridade. Somente nocontato com os seus semelhantes, nas lutas e nos sofrimentos, éque ele encontrará ocasião de pô-la em prática. Aquele que se isola,portanto, se priva voluntariamente de utilizar esse meio de evoluçãoespiritual e, por não pensar em ninguém a ser em si próprio, a suavida é a de um egoísta. (Ver capítulo V, item 26, desta mesmaobra.)

Não imaginem, portanto, que para viver constantemente emcomunicação conosco, para viver sob os olhos do Senhor, sejanecessário que vocês se torturem voluntariamente e que vocês serevistam de farrapos. Não! Não, ainda mais uma vez lhes dizemos!Sejam felizes, segundo as possibilidades da humanidade. Mas que,na sua felicidade, não entre jamais um pensamento, nem um ato,que possa ofender ou fazer que se entristeça a fisionomia daquelesque os amam e que os dirigem. Deus é amor e abençoa a todosaqueles que amam santamente. (Um Espírito Protetor, Bordéus,1863.)

CUIDAR DO CORPO E DO ESPÍRITO

11. A perfeição moral consiste em torturar o corpo físico?Para resolver esta questão, eu me basearei sobre princípios

elementares da Natureza. Começarei por demonstrar a necessidade

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM314

315CAPÍTULO XVII

de cuidar-se do corpo que, segundo as alternativas da saúde e deenfermidade, influi de uma maneira muito decisiva sobre a alma,que se deve considerar como prisioneira da carne.

Para que essa prisioneira, a alma, sinta a vida, movimente-see até conceba mesmo a sensação de liberdade, o corpo deverá estarsadio, disposto, vigoroso.

Façamos uma comparação: Eis que se acham ambos, corpo ealma, em bom estado. Que devem fazer para manter o equilíbriorecíproco entre as suas aptidões e necessidades tão diferentes? A lutaentre os dois parece inevitável e difícil é chegar-se ao segredo doequilíbrio entre ambos.

Dois sistemas se conflitam sobre o segredo do equilíbrio corpoe alma: o dos ascetas que querem aniquilar o corpo e o dosmaterialistas que querem rebaixar a alma. Estas são duas violências,uma tão insensata quanto a outra.

Ao lado dessas duas grandes correntes de pensamentos fervilhauma numerosa tribo de pessoas indiferentes que, sem nenhumaidéia sobre a questão e sem nenhum paixão, restringem-se a amarcom indolência e a desfrutar com moderação.

Onde, pois, está a sabedoria?Onde, pois, está a ciência de viver?Em nenhuma dessas correntes. E esse grande problema ficaria

sem solução, se o Espiritismo não viesse em auxílio dospesquisadores, demonstrando-lhes as relações que existem entre ocorpo e a alma e a dizer-lhes que, desde que eles são necessários umpara o outro, é indispensável cuidar de ambos.

Amem, pois, a sua alma, mas cuidem igualmente de seu corpo,que é o instrumento de evolução de sua alma. Desatender asnecessidades que são indicadas pela natureza do próprio corpo édesconhecer as leis de Deus.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM315

SEDE PERFEITOS

316

Não castiguem o seu corpo pelas faltas que o seu livre-arbítrioo induziu a cometer e pelas quais ele é tão responsável quanto oveículo mal dirigido o é pelos acidentes que causa.

Vocês seriam, por acaso, mais perfeitos se torturassem o corpo,sem que vocês se tornassem menos egoístas, menos orgulhosos emais caridosos para com o seu próximo? Não! A perfeição não seráalcançada pela tortura de seu corpo físico. A perfeição está toda, epor inteiro, nas reformas de hábitos que vocês impuserem a seuspróprios espíritos.

Dobrem-se, humilhem-se, mortifiquem-se a si própriosmoralmente, pela reforma interior de sua alma, porque esse é omeio de vocês se tornarem mais dóceis aos desígnios Divinos e oúnico de vocês alcançarem a perfeição. (Georges, Espírito Protetor,Paris, 1863.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM316

317CAPÍTULO XVII

PARÁBOLA DO FESTIM DAS BODAS

1. Então Jesus, tomando a palavra, tornou a falar-lhes. emparábolas, dizendo: O reino dos céus é semelhante a um certo rei quecelebrou as bodas de seu filho. E enviou os seus servos a chamar osconvidados para as bodas, e estes não quiseram vir. Depois enviououtros servos, dizendo: Dizei aos convidados: Eis que tenho o meujantar preparado, os meus bois e cevados já mortos, e tudo já pronto;vinde às bodas. – Eles, porém, não fazendo caso, foram um para o seucampo, outro para o seu negócio e outros, apoderando-se dos servos, osultrajaram e mataram. – E o rei, tendo notícia disto, encolerizou-se eenviando os seus exércitos, destruiu aqueles homicidas, e incendiou asua cidade. Então disse aos servos: As bodas, na verdade, estãopreparadas, mas os convidados não eram dignos. Ide, pois, às saídasdos caminhos, e convidai para as bodas a todos os que encontrardes. –E os servos, saindo pelos caminhos, ajuntaram todos quantosencontraram, tanto maus como bons e a festa nupcial foi cheia deconvidados. E o rei, entrando para ver os convidados, viu ali um homemque não estava trajado com o vestido de núpcias e disse-lhe: Amigo,como entraste aqui, não tendo vestido nupcial? – E ele emudeceu.Disse, então, o rei aos servos: Amarrai-o de pés e mãos, levai-o e lançai-o nas trevas exteriores; ali haverá pranto e ranger de dentes. Porquemuitos são chamados, mas poucos os escolhidos. (Mateus, capítulo 22,versículos 1 a 14.)

18

CAPITULO XVIII

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM317

MUITOS OS CHAMADOS, POUCOS OS ESCOLHIDOS

318

2. O incrédulo sorri diante desta parábola, que lhe parece deuma pueril ingenuidade. Ele não compreende que possa haver tantasdificuldades para participar de um banquete. E, ainda mais, que osconvidados possam opor-lhe tanta resistência, a ponto de massacraros portadores dos convites do dono da mansão.

“As parábolas – dizem os incrédulos – são sem dúvidarepresentações de uma idéia, mas não podem de modo algumultrapassar os limites de fatos possíveis.”

O mesmo se poderá dizer de todas as alegorias, das fábulasmais engenhosas se não as despojarmos de seu modo de apresentação,para descobrir-lhes o sentido oculto. Jesus compunha as suasparábolas com o que era mais usual e comum na vida do povo como qual falava e as adaptava ao meio e às características daquelas pessoasque o ouviam.

A maioria das parábolas tinha por finalidade fazer penetrar naspessoas que o ouviam a idéia da vida espiritual. O sentido do que Jesusdizia, por essas imagens, portanto, só não se torna compreensível paraaqueles que não se colocam sob esse ponto de vista.

Na parábola das bodas, Jesus compara o reino do céu, ondetudo é alegria e felicidade, a uma festa de casamento. Por primeirosconvidados, refere-se aos hebreus, que Deus convocou como oschamados em primeiro lugar para conhecerem as suas leis. Osenviados do rei são os profetas que vieram convidar os judeus paraseguirem o caminho da verdadeira felicidade. Mas as suas palavraseram pouco escutadas. Suas advertências foram desprezadas. Muitosdesses profetas foram mesmo massacrados, como os servos daparábola.

Os convidados que deixavam de comparecer, alegando quetinham de cuidar de seus campos e de seus negócios, são arepresentação das pessoas comuns do mundo que estão concentradassobre os bens terrenos, indiferentes às coisas celestiais.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM318

319CAPÍTULO XVIII

Era uma crença comum, entre os judeus daquele tempo, quea sua nação deveria alcançar um poder supremo sobre todos os outrospovos. Deus, efetivamente, não prometera a Abraão que os seusdescendentes cobririam toda a Terra? Mas, como sempre,aprisionados à forma da promessa, sem compreenderem a suasignificação, os judeus julgavam que alcançariam um domínio efetivoe material obre outras nações.

Antes da vinda do Cristo, com exclusão dos hebreus, todosos povos adoravam ídolos e acreditavam em muitos deuses. Se algunshomens mais sábios conceberam a idéia de existir um Deus único,essa idéia permanecia como um sistema pessoal. Em nenhuma parteera aceita como verdade fundamental, a não ser por alguns iniciadosque escondiam seus conhecimentos debaixo de um véu misteriosoe impenetrável para os homens comuns.

Os hebreus foram os primeiros que praticaram publicamenteo monoteísmo. É a eles, pois, que o Senhor transmite a sua lei,inicialmente através de Moisés e, mais tarde, através de Jesus. Foidesse pequeno agrupamento de homens que partiu a luz que deveriaexpandir-se pelo mundo inteiro, superando o paganismo, e dandoa Abraão uma posteridade espiritual “tão numerosa quanto as estrelasdo firmamento”.

Os judeus, porém, embora abandonando a idolatria, haviamdescuidado da lei moral. Inclinaram-se para a prática mais fácil doculto exterior. Este mal chegou ao extremo! A nação judaica, alémde dominada pelos romanos, passou a ser dividida por partidosreligiosos, nascidos das muitas seitas criadas entre os judeus comfundamento em práticas exteriores. A incredulidade cresceu tantoque penetrou mesmo no próprio santuário.

Foi nesse momento de esfacelamento da nação e da fé queJesus surgiu enviado por Deus para chamar os judeus para aobservação da lei divina e para lhes abrir os novos horizontes davida futura. Apesar de serem os primeiros convidados ao grande

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM319

MUITOS OS CHAMADOS, POUCOS OS ESCOLHIDOS

320

banquete da fé universal, eles rejeitaram a palavra do celeste Messiase o sacrificaram. Foi assim que eles perderam o fruto que deveriamter colhido da sementeira do monoteísmo e da lei que haviam feito.

Seria injusto, todavia, acusar o povo todo daquele estado decoisas. A responsabilidade dos acontecimentos coube principalmenteaos fariseus e aos saduceus. Estes é que puseram a perder a naçãojudaica pelo orgulho e fanatismo dos fariseus, por um lado, e pelaincredulidade dos saduceus do outro lado. É neles, sobretudo, queJesus identifica os convidados que se negaram a comparecer à festado casamento. E, depois, Jesus acrescenta: “O Senhor, vendo isso,mandou convidar todos aqueles que fossem encontrados noscaminhos, bons e maus”. Ele fazia entender, por isso, que a suaPalavra iria ser pregada a todos os outros povos, pagãos e idólatras.E que estes, ao aceitá-la, seriam admitidos no festim no lugar dosprimeiros convidados.

Mas não basta ser convidado. Não basta carregar o rótulo decristão, nem mesmo basta sentar-se à mesa para fazer parte dobanquete celestial. É necessário, antes de tudo e como condiçãoexpressa, estar revestido da roupa nupcial, ou seja, trazer a purezado coração e cumprir a lei segundo o seu sentido moral. Ora, estalei está inteiramente nestas palavras: Fora da caridade não há salvação.Porém, entre todos aqueles que ouvem a Palavra Divina, quãopoucos são aqueles que a guardam e a vivem realmente! Quão poucosse fazem dignos de entrar no reino dos céus! Eis porque Jesus disse:“Muitos serão os chamados e poucos os escolhidos.”

A PORTA ESTREITA

3. Entrai pela porta estreita, porque larga é a porta e espaçoso éo caminho que conduz à perdição, e muitos são os que entram por ela.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM320

321CAPÍTULO XVIII

E porque estreita é a porta, e apertado é o caminho que leva à vida,poucos há que a encontrem. (Mateus, capítulo 7, versículos 13 e 14. )

4. E disse-lhe um dos presentes: Senhor, são poucos os que sesalvam? E Ele lhes respondeu: Trabalhai por entrar pela porta estreita,porque eu vos digo que muitos procurarão entrar e não poderão. Quandoo pai de família se levantar e fechar a porta e começardes a estar defora e a bater à porta dizendo: Senhor, Senhor, abre-nos, respondendoele vos dirá: Não sei de onde vós sois. Então começareis a dizer: Temoscomido e bebido na tua presença e tu tens ensinado nas nossas ruas. –E ele vos responderá: Digo-vos que não sei de onde vós sois; apartai-vosde mim, vós todos os que praticais a iniqüidade. – Ali haverá choro eranger de dentes, quando virdes Abraão, Isaque, Jacó e todos os profetasdo reino de Deus e vós lançados fora. E virão do Oriente e do Ocidente,do norte e do sul, e assentar-se-ão no reino de Deus. – E eis que últimoshá que serão os primeiros e primeiros há que serão os últimos. (Lucas,capítulo 13, versículos 23 a 30.)

5. A porta da queda moral é larga, porque as más paixões sãonumerosas e porque o mau caminho é freqüentado por umamultidão de pessoas. A porta da salvação é estreita, porque o homemque desejar atravessá-la deve fazer um grande esforço sobre si mesmopara vencer as suas más tendências e poucos se entregam à tarefa dereformarem-se a si mesmos. Este é o complemento da máxima:“São muitos os chamados e poucos os escolhidos”.

Descreve-se, aí, o estado atual da humanidade terrena. A Terra,sendo um mundo de expiação, o mal nela predomina. Quando elase transformar num mundo melhor, o caminho do bem será omais freqüentado. Estas palavras, no entanto, devem ser entendidasno sentido relativo e não no absoluto. Se devesse ser esse o estadopermanente da humanidade terrena, Deus teria condenado à perdiçãoa maioria das criaturas encarnadas nesse mundo. E essa é umasuposição absurda, desde que se reconheça que Deus é todo justiçae todo bondade.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM321

MUITOS OS CHAMADOS, POUCOS OS ESCOLHIDOS

322

Mas de quais faltas a humanidade seria culpada para merecerum destino tão sombrio, no presente e no futuro? Estaria toda ahumanidade na terra e a alma não teria outras existências? Por quetantas dificuldades semeadas no caminho do homem? Por que essaporta estreita, que a tão poucas pessoas é dado passar? Por que asorte da alma estaria determinada para sempre após a morte?

Observa-se que, admitindo apenas uma existência para cadacriatura, estamos sempre em contradição conosco mesmos e com aJustiça Divina. Já quando admitimos a existência anterior da almae a pluralidade dos mundos habitados, o nosso horizonte se alarga.A luz se faz sobre as questões mais obscuras da fé. O presente e ofuturo se integram com o passado do homem. Somente, então,poderemos compreender toda a verdade e toda a sabedoria dosprincípios de vida ensinados pelo Cristo.

OS QUE DIZEM: SENHOR! SENHOR!

6. Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reinodos céus, mas sim aquele que faz a vontade de meu Pai, que está noscéus. Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamosnós em teu nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teunome não fizemos muitas maravilhas? – E, então, lhes direiabertamente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós quepraticastes a iniqüidade. (Mateus, capítulo 7, versículos 21 a 23.)

7. Todo aquele, pois, que escuta estas minhas palavras, e aspratica, eu os assemelharei ao homem prudente, que edificou a suacasa sobre a rocha. E desceu a chuva, e correram rios, e assopraramventos, e combateram aquela casa e ela não caiu, porque estavaedificada sobre a rocha. – E aquele que ouve estas minhas palavras, enão as cumpre, eu o compararei ao homem insensato, que edificou asua casa sobre a areia. E desceu a chuva, e correram os rios, e assopraram

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM322

323CAPÍTULO XVIII

os ventos e combateram aquela casa e ela caiu e foi grande a sua ruína(Mateus, capítulo 7, versículos 24 a 27.)

8. Qualquer um, pois, que violar um destes pequenosmandamentos, e assim ensinar aos homens, será chamado o menor noreino dos céus; aquele, porém, que os cumprir e ensinar aos homensserá chamado grande no reino dos céus. (Mateus, capítulo 5, versículo19.)

9. Todos os que reconhecem a missão de Jesus, dizem:“Senhor! Senhor!”. Mas que vale chamá-lo de Mestre ou Senhor, senão seguem os seus preceitos? Serão cristãos os que o honram atravésde atos exteriores de devoção e, ao mesmo tempo, fazem suasoferendas nos altares que erguem para os deuses do orgulho, doegoísmo, da cobiça e de todas as suas paixões? Serão seus discípulosaqueles que passam os dias em orações, mas que não se tornamnem melhores, nem mais caridosos, nem mais indulgentes paracom os seus semelhantes? Não! Não são, porque, do mesmo modoque faziam os fariseus, esses têm as preces nos lábios e não no coração.Com a aparência, eles podem enganar aos homens, mas nãoenganarão a Deus.

Inutilmente esses falsos cristãos dirão a Jesus: “Senhor, nósprofetizamos em vosso nome; expulsamos os demônios em vossonome; comemos e bebemos convosco”. Então, Jesus lhes responderá:“Não sei quem sois. Retirai-vos de mim, vós que cometeis perversidades,vós que desmentis as vossas palavras com os vossos maus atos, quecaluniais o vosso próximo, que empobreceis as viúvas e cometeisadultérios. Afastai-vos de mim, vós que tendes o coração destilandoódio e amargores, vós que derramais o sangue de vossos irmãosusando o meu nome, vós que provocais lágrimas ao invés de enxugá-las. Para vós, haverá choro e ranger de dentes, porque o reino docéu é para os que são brandos, humildes e caridosos. Não espereisdobrar a Justiça Divina a vosso favor, pela quantidade de vossaspalavras e pelo número de vezes que dobrais os joelhos e orais. A

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM323

MUITOS OS CHAMADOS, POUCOS OS ESCOLHIDOS

324

única porta que vos está aberta, para alcançardes graça diante deDeus, é aquela que conduz à prática sincera da lei do amor e dacaridade”.

As palavras de Jesus são eternas!Elas são a verdade!Elas não são somente a segurança para obterdes a vida celeste,

mas também a garantia da paz, da serenidade e do equilíbrio dohomem na vida terrena. Eis porque todas as instituições humanas,políticas, sociais e religiosas, que fundarem os seus alicerces sobre aspalavras de Jesus, serão permanentes como a casa construída sobre arocha. Os homens as conservarão, porque nelas encontrarão a suafelicidade. Mas aquelas instituições que sejam uma violação dosprincípios cristãos, essas serão como a casa construída sobre a areia:o vento das renovações e o rio da evolução as arrasta para o mar doesquecimento.

A QUEM MUITO FOI DADO

10. E o servo que soube a vontade do seu senhor, e não seaprontou, nem fez conforme a sua vontade, será castigado com muitosaçoites. Mas o que não a soube, e fez coisas dignas de açoites, compoucos açoites será castigado. E, a qualquer que muito for dado, muitose lhe pedirá, e ao que muito se lhe confiou, muito mais se lhe pedirá.(Lucas, capítulo 12, versículos 47 e 48.)

11. E disse-lhes Jesus: Eu vim a este mundo para juízo, a fimde que os que não vêem, vejam, e os que vêem sejam cegos. – Aquelesdos fariseus que estavam com ele, ouvindo isto, disseram-lhe: Tambémnós somos cegos? – Disse-lhes Jesus: Se fôsseis cegos, não teríeis pecado;mas como agora dizeis: Vemos, por isso o vosso pecado permanece. (João,capítulo 9, versículos 39 a 41.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM324

325CAPÍTULO XVIII

12. Estas máximas encontram a sua aplicação, sobretudo, nosensinamentos dos Espíritos. Alguém que conheça os preceitos doCristo é, seguramente, culpado se não colocá-los em prática.

Onde estão esses ensinamentos?Estão no Evangelho!O Evangelho, contudo, não é amplamente divulgado, a não

ser nas seitas cristãs. E mesmo dentro desses ramos do cristianismo,poucas pessoas o lêem. E entre as pessoas que o lêem, muitas não ocompreendem! Dessa falta de leitura e de entendimento, as própriaspalavras de Jesus ficam perdidas para uma grande maioria de cristãose não cristãos.

Os ensinamentos dos Espíritos reproduzem as máximas doCristo. Dão-lhes diversas formas; ao desenvolvê-las e comentá-las.Com isso, eles colocam os princípios do cristianismo ao alcance detodos. Trazem a particularidade de não os deixarem só ao alcancede algumas pessoas. Assim é que todos, alfabetizados ou analfabetos,crentes ou incrédulos, cristãos ou não cristãos, podem conheceresses princípios de Vida, porque os Espíritos se comunicam portodas as partes de nosso mundo.

Nenhum daqueles que recebam as mensagens dos Espíritos,diretamente ou por intermédio de outras pessoas, pode alegar ignoraros princípios ensinados por Jesus. Não se pode, sequer, alegar queos desconhece por falta de instrução, nem dizer que não os entendepor estarem difíceis em razão de seu sentido figurado ou alegórico.

Aquele, portanto, que não pratica esses ensinamentos para asua própria evolução espiritual, que apenas os admira como umacoisa interessante e curiosa, sem que se deixe tocar no coração, quenão se torne menos inútil, nem menos orgulhoso, nem menosegoísta, nem menos apegado aos bens materiais, nem melhor paracom o seu próximo, esse mais culpado é, por ter mais meios deconhecer a verdade.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM325

MUITOS OS CHAMADOS, POUCOS OS ESCOLHIDOS

326

Os médiuns que obtêm boas comunicações são ainda maisrepreensíveis se persistirem no mal. É que, muitas vezes, o que elesescrevem ou transmitem psicofonicamente condena os seus próprioshábitos viciosos. Se não estivessem cegos pelo orgulho,reconheceriam que é para eles mesmos que os Espíritos se dirigem.Mas, ao invés de tomarem para si as lições que transmitem, ou quesão transmitidas por outros médiuns, o seu único pensamento é deaplicá-las a outras pessoas. Com essa transferência das lições paraterceiros, eles realizam estas palavras de Jesus: “Vós vedes um grãode poeira no olho de vosso vizinho e não vedes a viga que está novosso”. (Ver o capítulo X, item 9, nesta obra.)

Por estas outras palavras: “Se fôsseis cegos, não teríeis culpa”,Jesus confirma que o tamanho da culpa é determinado pelaquantidade de conhecimentos que a criatura tenha. Tomemos osfariseus para exemplo. Eles que tinham a pretensão de ser, e realmenteeram, a parte mais esclarecida da nação judaica, tornavam-se maiscensuráveis diante da Justiça Divina do que o povo ignorante. Omesmo acontece hoje, em relação aos médiuns e aos Espíritasestudiosos em geral.

Aos Espíritas, portanto, muito será pedido de conduta reta,porque eles têm muito recebido. Mas, por outro lado, para os quesouberem praticar os ensinamentos, muito lhes será dado defelicidade.

O primeiro pensamento de todo Espírita sincero deve serprocurar saber se, nos conselhos dados pelos Espíritos, não há algunsque lhe digam sobre si mesmo.

O Espiritismo vem multiplicar o número dos chamados. Pelafé que desperta em cada um, multiplicará, também, o número dosescolhidos.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM326

327CAPÍTULO XVIII

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:DÁ-SE AO QUE JÁ TEM

13. E, acercando-se dele os discípulos, disseram-lhe: Por quelhes fala por parábolas? – E ele, respondendo, disse-lhes: Porque a vósé dado conhecer os mistérios do reino dos céus, mas a eles não lhes édado. Porque para aquele que tem, se lhe dará, e terá em abundância,mas para aquele que não tem, até aquilo que tem lhe será tirado. Porisso lhes falo por parábolas, porque eles vendo, não vêem e ouvindonão ouvem nem compreendem. E neles se cumpre a profecia de Isaíasque diz: Ouvindo, ouvireis, mas não compreendereis, e, vendo, vereis,mas não percebereis. (Mateus, capítulo 13, versículos 10 a 14.)

14. E Jesus lhes disse: Atentai ao que ides ouvir. Com a medidacom que medirdes vos medirão a vós, e ser-vos-á ainda acrescentada.Porque ao que tem, ser-lhe-á dado; e, ao que não tem, até o que temlhe será tirado. (Marcos, capítulo 4, versículos 24 e 25. )

15. “Dá-se ao que já tem e retira-se ao que não tem.” Meditemneste grande ensinamento, que algumas vezes lhes parececontraditório com a Justiça Divina.

Aquele que já recebeu é o que compreendeu a palavra divina.Ele recebeu mais, porque se empenhou em tornar-se digno dela. Éque o Senhor, no seu amor misericordioso, encoraja-lhe os esforçosque se inclinam para a prática do bem. Esses esforços resignados,perseverantes, atraem as graças do Senhor. São um ímã que atraipara si o melhor da evolução moral, as graças abundantes, que lhedão forças para subir a montanha sagrada, em cujo cume está a pazapós o trabalho.

“Tira-se ao que não tem ou que tem pouco.” Tomem estaafirmação como um ensino apenas figurado. A Justiça Divina nãoretira das criaturas o bem que se dignou conceder-lhes. Homenscegos e surdos: abram o entendimento e os corações! Vejam peloseu espírito e entendam pela alma! Não interpretem de um modo

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM327

MUITOS OS CHAMADOS, POUCOS OS ESCOLHIDOS

328

tão grosseiro e injusto as palavras de Jesus, que fez resplandecer nosolhos de vocês a Justiça Divina. Não é Deus que retira coisa algumadaquele que pouco recebeu. É a própria criatura que, por serdispersiva e descuidada, não sabe conservar o que recebeu deconhecimentos espirituais e, por não praticar esses princípios, nãoaumenta e nem faz germinar a dádiva divina que lhe caiu no coração.

Aquele que não cultiva o campo de trabalho que seu Pai lheconfiou, e que lhe coube por herança, verá esse campo cobrir-se deervas daninhas. Será o seu Pai que lhe retira as colheitas que ele nãopreparou? Se, por falta de cuidados com as sementes destinadas àprodução nesse campo, a sementeira morrer, poderá ele acusar oseu Pai se elas nada produzirem?

Não! Não! Ao invés de acusar aquele que tudo preparou parasi de retomar os seus dons, ele deve acusar o verdadeiro autor desuas misérias: ele mesmo! Deverá, arrependido de seu desleixo emais ativo, empenhar-se na obra de sua redenção com coragem.Que cultive o solo ingrato de seu coração com todo o empenho desua vontade. Que aprofunde os princípios divinos em si mesmo,com a ajuda do arrependimento e da esperança. Que semeie comconfiança as sementes que separou como boas, entre as más. Que asirrigue com a água do amor e da caridade. E Deus, o Deus do amore da caridade, lhe dará ainda mais do que ele já recebeu. Então, eleverá os seus esforços coroados de sucessos e cada semente do bemproduzir cem e outras mil.

Coragem, trabalhadores do bem! Tomem as suas grades e osseus arados! Trabalhem os seus próprios sentimentos! Livrem-nosdas tendências más. Neles semeiem as sementes generosas que oSenhor lhes confia no seu Evangelho e o orvalho do amor asacalentará e as fará produzir os frutos da caridade. (Um EspíritoAmigo, Bordéus, 1862.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM328

329CAPÍTULO XVIII

O CRISTÃO E AS OBRAS

16. “Nem todos os que me dizem: Senhor, Senhor! entrarãono reino dos céus, mas somente os que fazem a vontade de meu Paique está nos céus.”

Escutem estas palavras do Mestre, vocês todos que rejeitam aDoutrina Espírita como se fosse obra do demônio! Abram os seusouvidos, que é chegado ao momento de ouvir!

Bastará trazer a aparência do Evangelho para ser um fielservidor do Senhor? Bastará dizer: “Eu sou cristão”, para seguir oCristo? Procurem os verdadeiros cristãos e vocês os reconhecerãopelas suas obras no campo do bem.

“Uma árvore boa não dará maus frutos, nem uma árvore mádará bons frutos. Toda árvore que não dá bons frutos, será arrancadae lançada ao fogo.” – Eis as palavras do Mestre! Discípulos do Cristo,procurem compreendê-las corretamente!

Quais são os frutos que deve dar a árvore do cristianismo,árvore dadivosa, cujos ramos frondosos abrigam uma parte domundo, mas ainda não todos aqueles que devem abrigar-se em tornodo Evangelho? Os frutos dessa árvore da Vida são os frutos da Vida,da esperança e da fé. O cristianismo, tal como tem feito depois demuitos séculos, prega sempre essas virtudes divinas. Ele se empenhaem espalhar seus frutos, mas quão poucos os recolhem! A árvore ésempre boa, mas os seus fruticultores são maus. Os que deveriamcuidar dela, querem moldá-la segundo as suas próprias idéias,violentando-lhe a natureza. Querem modelá-la de acordo com assuas necessidades de bens materiais. Por isso, eles a cortaram, adiminuíram, a mutilaram! Agora, seus ramos estéreis não dão mausfrutos, porque já não dão nenhum fruto!

O viajor faminto, que se acolhe à sua sombra, procurando ofruto da esperança, que deve lhe restabelecer a força e a coragem,encontra apenas ramos áridos, que o fazem pressentir os ventos da

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM329

MUITOS OS CHAMADOS, POUCOS OS ESCOLHIDOS

330

renovação necessária. Inutilmente ele procura o fruto da Vida naárvore da Vida: as suas folhas caem secas, pois que a mão do homemde tal maneira as remexeu que as secou!

Abram, pois, os seus ouvidos e os seus corações, meus bem-amados! Cultivem essa árvore da Vida cujos frutos dão a vida eterna.Aquele que a plantou, convida-os a cultivá-la com amor. Vocês averão, ainda, produzir com fartura os seus frutos divinos.

Conservem-na, porém, assim como o Cristo as deu a vocês.Não mais a mutilem!A sua sombra imensa deve estender-se sobre o Universo. Não

lhe cortem os galhos. Seus frutos generosos caem com fartura paraalimentar o viajante da evolução que, faminto, deseja alcançar a suadestinação divina. Não guardem os seus frutos, porque eles perecerãoe não servirão a ninguém.

“Muitos os chamados e poucos os escolhidos.” É que há osque trazem apenas para si mesmo o pão da Vida, querendo privaras outras pessoas de partilhá-lo, da mesma forma que alguns fazemcom o pão material. Não se somem a esses infelizes. A árvore quedá bons frutos deve dá-los para todos. Vão, pois, procurar osnecessitados desses frutos do Evangelho. Tragam-nos para debaixodos ramos dessa árvore e repartam com eles o abrigo que ela lhesoferece a seus próprios corações.

“Não se colhem uvas nos espinheiros”, e, por isso, meusirmãos, afastem-se daqueles que os chamam para apresentar-lhes ostropeços do caminho divino e sigam com aqueles que os conduzirãoà sombra da árvore da Vida.

O Divino Salvador, o Justo por excelência, disse, e as suaspalavras não passarão sem que sejam cumpridas: “Aqueles que medizem: Senhor, Senhor! não entrarão no reino dos céus, mas so-mente aqueles que fazem a vontade de meu Pai que está nos céus,esses entrarão”.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM330

331CAPÍTULO XVIII

Que o Senhor das bênçãos os abençoe. Que o Deus da luz osilumine. Que a árvore da Vida derrame sobre vocês os seus frutoscom fartura! Creiam e orem. (Simeão, Bordéus, 1863.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM331

A FÉ TRANSPORTA MONTANHAS

332

O PODER DA FÉ

1. E, quando chegaram à multidão, aproximou-se-lhe umhomem, pondo-se de joelhos diante de Jesus, dizendo: Senhor, temmisericórdia de meu filho, que é lunático e sofre muito, pois muitasvezes cai no fogo e muitas vezes na água e trouxe-o aos teus discípulose não puderam curá-lo.

E Jesus, respondendo, disse: Ó geração incrédula e perversa! atéquando estarei eu convosco e até quando vos suportarei? Trazei-o aqui.– E repreendeu Jesus o demônio, que saiu dele, e desde aquela hora omenino sarou.

Então, os discípulos, aproximando-se de Jesus em particular,disseram: Por que não pudemos nós expulsá-lo? – E Jesus lhes disse:Por causa da vossa pouca fé. Porque em verdade vos digo que, se tiverdesfé do tamanho de um grão de mostarda, direis a este monte: Passadaqui para acolá, e há de passar e nada vos será impossível. (Mateus,capítulo 17, versículos 14 a 20.)

2. No sentido próprio, é certo que a confiança nas suaspróprias forças torna o homem capaz de realizar as coisas materiais,que não pode fazer quando ele duvida de si mesmo. Mas aqui éunicamente no sentido moral que se devem entender essas palavrasditas por Jesus.

As montanhas que a fé remove são as dificuldades, asresistências ao bem, a má vontade, em suma, que se encontramentre os homens, ainda mesmo quando se trate das melhores coisas.

19

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM332

333CAPÍTULO XIX

Os preconceitos da rotina, os interesses materiais, o egoísmo, acegueira do fanatismo, as paixões orgulhosas, são outras tantasmontanhas que atravancam o caminho daqueles que trabalham pelaevolução da humanidade. A fé robusta transmite a perseverança, asenergias e os recursos que permitirão vencer esses obstáculos, tantonos pequenos como nos grandes atravancamentos do caminho dobem. A fé vacilante produz a incerteza, a hesitação de que seaproveitam os adversários que devemos combater. Essa fé vacilantenem procura os meios de vencer, porque não crê na possibilidadeda vitória.

3. Num outro sentido, entende-se a fé como sendo aconfiança que se tem na realização de um determinada coisa, a certezade atingir um determinado objetivo. Neste caso, a fé daria umaespécie de lucidez que permitiria ver, em pensamento, a meta quese quer alcançar e os meios de alcançá-la, de modo que aquele que apossui avança, por assim dizer, com total segurança. Num e noutrodesses casos, a fé pode fazer que se realizem grandes coisas.

A fé sincera e verdadeira é sempre calma. Ela traz a paciênciaque sabe esperar o momento e as circunstâncias certas. Porque temo seu ponto de apoio na inteligência e na compreensão das coisas,tem a certeza de chegar ao objetivo visado. A fé vacilante já traz emsi a sua própria fraqueza. Quando é estimulada por interesses, ela setorna devastadora, por crer que pode suprir, com a violência, a forçaque lhe falta. A calma na luta é sempre um sinal de energia econfiança. A violência na luta, ao contrário, é sempre uma prova defraqueza e de falta de confiança em seus propósitos.

4. Não podemos confundir a fé com a vaidade do homem.A verdadeira fé está aliada à humildade. Aquele que a possui depositamais confiança em Deus do que em si próprio. É que sabe que,sendo um simples instrumento dos desígnios divinos, ele nada podesem o amparo da misericórdia. Eis por que os bons Espíritos vêmajudá-la. A vaidade, a presunção, é menos fé e mais orgulho. E o

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM333

A FÉ TRANSPORTA MONTANHAS

334

orgulho é sempre visitado, cedo ou tarde, pela decepção e pelosfracassos que lhe são impostos.

5. O poder da fé tem uma aplicação direta e especial na açãomagnética. Através dela, o homem age sobre o fluido, agenteuniversal. Ele modifica as suas qualidades e lhe dá uma impulsãopor assim dizer irresistível. Eis porque aquele que, a um grandepoder fluídico normal, ajunta uma fé calorosa, pode, pela suavontade dirigida ao bem, operar esses singulares fenômenos de curase outros mais que, antigamente, eram considerados prodígios,milagres, mas que não passam de reações operadas por uma leinatural. Por essa razão natural, base da ação fluídica, é que Jesusdisse a seus Apóstolos: “Se vós não o curastes, é que não tendes fé”.

Não admitindo ter de apresentar provas, a fé cega deixa noespírito um vazio, que gerará a dúvida. A fé raciocinada, que é aquelaque se baseia sobre fatos e na lógica, não deixa nada obscuro. Ohomem crê, porque tem a certeza e só tem certeza quando secompreendeu. Eis porque esse fé não se abala, pois fé inabalável sóé a que pode encarar a razão, frente a frente, em todas as épocas dahumanidade.

Esse é o resultado a que conduz o Espiritismo, assimtriunfando sobre a incredulidade todas as vezes que não encontraoposição sistemática e interessada em fazer prevalecer um dogma.

CONDIÇÃO DA FÉ INABALÁVEL

6. Do ponto de vista religioso, a fé é a crença em dogmasespeciais que constituem as diferentes religiões. Todas as religiõestêm os seus artigos de fé. Sob esse aspecto, a fé pode ser raciocinadaou cega. A fé cega nada examina, aceitando sem controle tanto ofalso como o verdadeiro e, a cada momento, choca-se contra aevidência e a razão. Levada ao extremo, essa fé produz o fanatismo.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM334

335CAPÍTULO XIX

Quando a fé se assenta sobre o erro, ela desmorona, cedo outarde. Aquela, porém, que tem por base a verdade é a única que seconsolida com o passar do tempo. É que nada tem a temer doprogresso das luzes do conhecimento humano, uma vez que o queé verdade durante as sombras, é igualmente verdade à luz do dia.

Cada religião pretende estar na posse exclusiva da verdade,mas preconizar a fé cega sobre uma questão de crença, é confessar aincapacidade de se demonstrar que está com a razão.

7. Diz-se, comumente, que a fé não se prescreve, o que levamuitas pessoas a dizerem que não lhes cabe a culpa de não ter fé.Sem dúvida, a fé não se doa e, o que é ainda mais justo: a fé nãopode ser imposta. Não! Ela não é imposta, mas se adquire e ninguémestá impedido de possuí-la, mesmo entre os que se recusam asubmeter-se a essa lei divina.

Falamos das verdades espirituais fundamentais e não destaou daquela crença particular. Não é a fé que deve procurar as pessoas.As pessoas é que devem buscar a fé e, se buscarem com sinceridade,elas a encontrarão. Tenham, pois, como certo que os que dizem:“Não queremos nada melhor do que crer, mas não o podemosfazer”, esses dizem isso da boca para fora e não do coração, pois istodizendo eles fecham os seus ouvidos para a verdade espiritual davida.

As provas contrárias ao que eles dizem são abundantes aoredor deles mesmos. Por que, pois, se recusam a vê-las? Da parte deuns é pela indiferença, da parte de outros é pelo temor de seremforçados a mudar seus hábitos. A maioria, contudo, é por esseorgulho de não aceitar um Poder Superior ao seu, porque teriam derender-se diante dele.

Em algumas pessoas, até parece de algum modo ter nascidojuntamente com elas. Uma faísca é bastante para desenvolvê-la. Essafacilidade de assimilar as verdades espirituais é um sinal evidente deevolução já realizada ao longo de reencarnações anteriores. Em outras

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM335

A FÉ TRANSPORTA MONTANHAS

336

pessoas, ao contrário, essas verdades penetram com muitadificuldade, o que é sinal, não menos evidente, de um naturalretardamento evolutivo. As primeiras dessas pessoas já creram ecompreenderam em existências anteriores e elas trazem, ao renascer,a intuição de suas conquistas e, por isso, estão com a educação feita.As segundas dessas pessoas ainda têm tudo para aprender, por isso asua educação espiritual está por fazer-se. Essa educação se fará e, senão ficar completa nesta existência, ela se completará numa outrareencarnação.

A resistência do incrédulo, convenhamos, muitas vezes nãonasce muito dele mesmo. Quase sempre tem origem na maneirapela qual lhe apresentam as coisas. A fé necessita de uma base e essabase é a compreensão perfeita daquilo em que se deve crer. Paracrer, não basta ver. É necessário, sobretudo, compreender.

A fé cega não é mais deste século. E é precisamente o dogmada fé cega que hoje produz o maior número de incrédulos. Eles nãoaceitam a fé imposta, que lhes exige o abandono de uma das maispreciosas qualidades do homem: o raciocínio e o livre-arbítrio. Écontra essa fé cega que se levanta o incrédulo e dela é que se podeverdadeiramente dizer que fé não se impõe.

Não admitindo ter de apresentar provas, a fé cega deixa noespírito um vazio, que gerará a dúvida. A fé raciocinada, que é aquelaque se baseia sobre fatos e na lógica, não deixa nada obscuro. Ohomem crê, porque tem a certeza e só tem certeza quando secompreendeu. Eis porque essa fé não se abala, pois fé inabalável sóé a que pode encarar a razão, frente a frente, em todas as épocas dahumanidade.

Esse é o resultado a que conduz o Espiritismo, assimtriunfando sobre a incredulidade todas as vezes que não encontraoposição sistemática e interessada em fazer prevalecer um dogma.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM336

337CAPÍTULO XIX

PARÁBOLA DA FIGUEIRAQUE SECOU

8. E, no dia seguinte, quando saíram de Betânia, teve fome. E,vendo de longe uma figueira que tinha folhas, foi ver se nela achariaalgum fruto. E, chegando a ela, não achou senão folhas, porque nãoera tempo de figos. E Jesus, falando, disse à figueira: Nunca maiscoma alguém frutos de ti. E os seus discípulos ouviram isso.

E eles, passando pela manhã, viram que a figueira tinha secadodesde as raízes. E Pedro, lembrando-se, disse-lhe: Mestre, eis que afigueira, que tu amaldiçoaste, secou. E Jesus, respondendo, disse-lhes:Tende fé em Deus, porque em verdade vos digo que qualquer quedisser a este monte: Ergue-te e lança-te ao mar, e não duvidar em seucoração, mas crer que se fará aquilo que diz, tudo o que disser lhe seráfeito. (Marcos, capítulo 11, versículos de 12 a 14 e de 20 a 23.)

9. A figueira seca é o símbolo das pessoas que só têm asaparências do bem, mas que na realidade nada produzem de bom.Representa esses oradores que têm mais brilho que base sólida, cujaspalavras trazem só um verniz na superfície. Essas palavras sãoagradáveis aos ouvidos, mas quando o que dizem é examinado, elasnão trazem nada de substancial ao coração. É de perguntar-se aosque as ouviram, que proveito poderão tirar delas para a sua vida.

É, também, o símbolo de todas as pessoas que têm meios deserem úteis e não o são. De todas as fantasias, de todos os sistemasvazios, de todas a doutrinas sem base sólida. O que lhes falta, namaior parte do tempo, é a verdadeira fé, a fé fecunda, a fé que abalaas fibras do coração. Em suma, falta-lhes a fé que removemontanhas.

São quais árvores cobertas de folhas, mas sem frutos. É porisso que Jesus reconhece que são estéreis, pois um dia virá em queficarão secas até a raiz.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM337

A FÉ TRANSPORTA MONTANHAS

338

Isto quer dizer que todos os sistemas, todas as doutrinas quenão produzem nenhum bem para os homens, cairão reduzidas aonada. Que todas as criaturas deliberadamente inúteis, por não teremutilizado os recursos que traziam consigo, serão tratadas como afigueira que secou.

10. Os médiuns são os intérpretes dos Espíritos. Eles supremos Espíritos com os órgãos materiais que faltam a estes para nostransmitirem os seus ensinamentos. É que os médiuns são dotadosde faculdades próprias para esse efeito. Nestes tempos de renovaçãomoral, os médiuns desempenham uma missão especial que é a deserem árvores que devem fornecer o alimento espiritual a seus irmãosda Terra. Os médiuns se multiplicam, para que o alimento espiritualseja abundante. Estão, portanto, por toda parte, em todos os países,em todas as raças e em todas as classes sociais. Estão entre os ricos eos pobres, entre os grandes e os pequenos, a fim de que em partealguma haja deserdados desses ensinamentos e para provar aoshomens que todos são chamados pelo Senhor.

Mas, se os médiuns se desviam da finalidade providencial afaculdade preciosa que lhes foi concedida, se a colocam a serviçodos interesses mundanos, se, ao invés de frutos salutares, eles dãomaus frutos, se recusam a torná-la proveitosa espiritualmente paraos outros, se dela tiram eles proveito para si mesmos e não para asua evolução moral, eles serão como a figueira estéril. Então a JustiçaDivina os privará dos Bons Espíritos que não mais utilizarão o domque se tornou inútil nesses médiuns. Por ser a árvore que eles nãosabem fazer dar bons frutos, eles se tornarão, a partir daí, presasfáceis de Espíritos tão desajustados quanto eles próprios.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM338

339CAPÍTULO XIX

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:A FÉ, MÃE DA ESPERANÇA E DA CARIDADE

11. A fé, para ser útil, deve ser ativa. Ela não pode adormecerno coração. Mãe de todas as virtudes que conduzem a Deus, eladeve desdobrar-se ativamente para desenvolver as suas próprias filhas.

A esperança e a caridade são frutos da fé. Elas, juntas, formamuma trindade inseparável. Não é a fé que nos alimenta a esperançade vermos cumpridas as promessas do Senhor? Se não tivermos fé,o que nos dará o amor? Se não tivermos a fé, que gratidão seria anossa e, por conseqüência, qual seria o nosso amor?

A fé, divina inspiração de Deus, desperta todos os sentimentosnobres que induzem o homem ao bem. Ela é a base da regeneraçãohumana. É necessário, portanto, que essa base seja sólida e durável,pois se a menor dúvida a abalar, que será do edifício de princípiosque construiremos sobre ela? Levantem, portanto, esse edifício sobrefundações que não sofram mudanças. Que a sua fé seja mais sólidado que os argumentos falsos e as zombarias dos incrédulos, pois afé que vacila diante do ridículo dos homens não é a verdadeira fé.

A fé sincera é empolgante, contagiosa. Ela se transmite aosque não a tenham ou, mesmo, aos que não desejariam tê-la. Elaencontra palavras persuasivas que vão ao fundo da alma, enquantoa fé aparente apenas se serve de palavra com sons e sem espírito, quedeixam frios e indiferentes aqueles que estejam à sua volta.

Preguem pelo exemplo de sua fé, para transmiti-la aoshomens. Preguem pelo exemplo de suas obras, para que vejam omérito de fé. Preguem pela sua esperança inabalável para que vejama confiança que lhes dá energias e, ao mesmo tempo, que lhes dáestímulo para que vocês enfrentem todas as dificuldades da vida.

Tenham, portanto, a fé com tudo o que ela contém de beloe de bom, na sua pureza, com a força de seu raciocínio. Não admitama fé sem comprovação, essa cega filha da cegueira da verdade

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM339

A FÉ TRANSPORTA MONTANHAS

340

espiritual. Amem a Deus, mas sabendo por que vocês amam. Creiamnas promessas divinas, mas sabendo por que vocês crêem. Sigam osnossos conselhos, mas compenetrados dos fins que lhes propomose dos meios que lhes indicamos para alcançá-los.

Creiam e esperem sem jamais enfraquecer na sua fé: osmilagres são obras da fé.(José, Espírito Protetor, Bordéus, 1862.)

A FÉ DIVINA E A FÉ HUMANA

12. A fé é o sentimento, inato ao homem, de sua destinaçãofutura. É a consciência que o homem tem das imensas faculdadesque, em germe, estão depositadas em seu íntimo. Essas faculdades,a princípio em estado latente, o homem deverá fazer que germineme cresçam, por ação e cuidado de sua vontade.

Até aqui, a fé só foi interpretada no seu sentido religioso,porque o Cristo a indicou como a alavanca com o poder pararemover montanhas e porque em Jesus somente viram o chefe deuma religião. Mas o Cristo, que realizou milagres materiais, nosmostrou, através desses mesmos fenômenos naturais, o que pode ohomem fazer, quando ele tem a fé, isto é, quando ele tem a vontadede querer e a certeza de que esse vontade pode ser realizada.

Os Apóstolos de Jesus, seguindo o exemplo do Mestre nãofizeram milagres também? Ora, que eram esses milagres? Essesmilagres eram os efeitos de leis da Natureza, cujas causas eramdesconhecidas dos homens daquela época, mas que são explicados,em grande parte, atualmente, e que serão compreendidos inteiramentepelo estudo do Espiritismo e do magnetismo.

A fé é humana ou divina, segundo a aplicação que o homemder às suas faculdades: na satisfação de suas necessidades terrenas ouna realização de suas aspirações celestes visando a vida futura. Ohomem de gênio, que se empenha na realização de um grande

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM340

341CAPÍTULO XIX

empreendimento, triunfa se tem fé, porque ele sente em si mesmoque o pode e deve realizar, e esta certeza lhe dá uma imensa força derealizar seu projeto. O homem de bem que, crendo no seu futuroceleste, deseja preencher a sua vida de nobres e belas ações, vai buscarna sua fé, na certeza da felicidade que o espera, a força necessáriapara realizar-se espiritualmente. E é aqui que se operam os milagresda caridade, do devotamento e da abnegação.

Com a fé você supera todas as más inclinações.O magnetismo é uma das grandes provas do poder da fé

operante. É pela fé que o magnetismo cura e produz esses fenômenosestranhos que, antigamente, eram qualificados de milagres.

Se todos os encarnados estivessem bem convencidos daenergia que trazem em si próprios, e quisessem pôr a sua vontade aserviço dessa energia, seriam capazes de realizar o que, até estemomento, alguns chamam de prodígios e que é simplesmente odesenvolvimento das faculdades humanas que, em germe, estãodepositadas em seu íntimo. (Um Espírito Protetor, Paris, 1863.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM341

OS TRABALHADORES DA ÚLTIMA HORA

342

1. Porque o reino dos céus é semelhante a um homem, pai defamília, que saiu de madrugada a assalariar trabalhadores para a suavinha. E, ajustando com os trabalhadores a um dinheiro por dia,mandou-os à sua vinha. E saindo perto da hora terceira, viu outrosque estavam ociosos na praça e lhes disse: Ide também vós para avinha e vos darei o que for justo. E eles foram. E saindo outra vezperto da hora sexta e nona, fez o mesmo. E saindo perto da horaundécima, encontrou outros que estavam ociosos e lhes perguntou: Porque estais ociosos todo o dia? Disseram-lhes eles: Porque ninguém nosassalariou. Disse-lhes ele: Ide vós também para a vinha e recebereis oque for justo.

Aproximando-se a noite, diz o senhor da vinha a seu mordomo:Chama os trabalhadores e paga-lhes o dia de trabalho, começandopelos últimos até os primeiros. E, chegando os que tinham ido perto dahora undécima, receberam um dinheiro cada um. Vindo, porém, osprimeiros, cuidaram que haviam de receber mais. Porém, do mesmomodo receberam um dinheiro cada um. E, recebendo-o, murmuravamcontra o pai de família, dizendo: Estes últimos trabalharam apenasuma hora e tu os igualaste conosco que suportamos a fadiga e a tarefade um dia inteiro.

Mas ele, respondendo, disse a um deles: Amigo, não te façoagravo; não ajustaste tu comigo um dinheiro? Toma o que é teu eretira-te. Eu quero dar a este último tanto quanto a ti. Ou não me élícito fazer o que quiser do que é meu? Ou mau é o teu olho, porque eusou bom?

20

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM342

343CAPÍTULO XX

Assim os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos,porque muitos são chamados mas poucos os escolhidos. (Mateus, capítulo20, versículos 1 a 16.) (Ver também a Parábola do Festim das Bodas,capítulo XVIII, item 1, desta mesma obra.)

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:OS ÚLTIMOS SERÃO OS PRIMEIROS

2. O trabalhador da última hora tem direito a seu salário.Para isso, porém, é necessário que a sua boa vontade o tenhaconservado à disposição do Senhor que devia empregá-lo. Que oseu atraso, por isso, não seja o fruto de sua preguiça ou de sua mávontade.

Ele tem direito ao salário porque, desde o início do dia, eleaguardava com impaciência aquele que, enfim, o chamaria para aobra a ser realizada. Ele é trabalhador, apenas que lhe faltava aatividade em que se empregasse.

Mas, se ele tivesse se recusado ao trabalho, a qualquermomento do dia; se ele tivesse dito: “Tenham paciência! Eu gostoé de não fazer nada! Quando chegar a minha última hora, pensareino que fazer e no salário que quero! Vou me importar eu por umsenhor que não conheço e que não estimo? Quanto mais tarde eucomeçar, melhor para as minhas paixões mundanas!” – este obreiro,meus amigos, não receberia o salário de uma jornada, mas receberiao pagamento de sua preguiça.

Que dizer, então, daquele que, ao invés de ficar simplesmentena inatividade, tivesse empregado as horas destinadas ao trabalhodo dia, para praticar atos culposos? Se ele tivesse blasfemado contraDeus, se tivesse derramado o sangue de seus irmãos, se tivesse lançadoa perturbação nas famílias, arruinado os homens de boa-fé, abusado

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM343

OS TRABALHADORES DA ÚLTIMA HORA

344

da inocência? Este teria, enfim, se enlameado em todas as desonrasda humanidade!

O que será dele?Bastará que ele diga, na última hora de vida nesta existência:

“Senhor, empreguei mal o meu tempo de vida. Toma-me até o fimdeste meu dia, para que eu faça um pouco, um pouquinho queseja, de minha tarefa e dê-me a recompensa do obreiro de boavontade!”. Bastará isso? Não, não! O Senhor lhe dirá: “Não tenhoagora nenhuma obra para ti! Atiraste fora o teu tempo de vida.Esqueceste o que tu havias aprendido! Não mais sabes trabalhar naminha vinha! Recomeça, portanto, a aprender de novo e, quandoestiveres mais disposto ao bem, vem ter comigo e te abrirei meuvasto campo de atividades nobres, onde poderás trabalhar a todasas horas de teu novo dia”.

Bons Espíritas, meus bem-amados, vocês todos são obreirosde última hora! Muito orgulhoso seria aquele, entre vocês, quedissesse: “Comecei o trabalho no romper do dia e vou terminá-loao anoitecer”. Todos vocês vieram quando foram chamados, unsmais cedo e outros mais tarde, nesta encarnação, arrastando as suasdificuldades. Mas há quantos séculos de séculos o Mestre os chamavapara a sua vinha, sem que vocês aceitassem o convite? Eis chegado,agora, o momento de receber a recompensa. Empreguem bem estahora que lhes resta na existência. Não esqueçam jamais que a suaexistência, por longa que lhes pareça, não é mais que um segundomuito breve na imensidade das horas que formam para vocês aeternidade. (Constantino, Espírito Protetor, Bordéus, 1863.)

3. Jesus tinha particular preferência pelos símbolos simples.Na sua vigorosa linguagem, os obreiros que chegaram na primeirahora do conhecimento das leis divinas, eram os Profetas. Entre elesMoisés e todos os iniciadores que demarcaram as etapas da evoluçãoespiritual, continuadas, através dos séculos, pelos Apóstolos, pelos

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM344

345CAPÍTULO XX

Mártires e pelos Padres da Igreja, pelos sábios, pelos filósofos e,finalmente, pelos Espíritas.

Os Espíritas, que vieram por último, foram anunciados epreditos desde o advento do Messias. Eles receberão a mesmarecompensa que foi dada aos que chegaram primeiro. Que digo eu?Digo que receberão até recompensa maior. Últimos a chegar, osEspíritas aproveitam a experiência acumulada das atividadesintelectuais dos seus antecessores, porque o homem deve herdar aexperiência do homem e porque os trabalhos e seus resultados sãoconquistas coletivas. Deus abençoa a solidariedade entre as gerações.

Muitos dos iniciadores de ontem, revivem hoje ou reviverãoamanhã, entre vocês, para terminarem a obra que eles começaramno passado. Mais de um patriarca, mais de um profeta, mais de umdiscípulo do Cristo, mais de um divulgador da fé cristã sereencontram no meio de vocês. Estão eles, porém, mais esclarecidos,mais evoluídos, trabalhando, não mais nos fundamentos, porém,complementando o edifício da redenção humana. A recompensadeles será proporcional ao mérito de sua obra.

A reencarnação, esse ponto fundamental e indiscutível daDoutrina Espírita, eterniza e esclarece a filiação espiritual. O espírito,chamado a prestar contas de sua missão na Terra, compreende acontinuidade da tarefa interrompida, mas sempre retomada paradar-lhe acabamento. Ele vê e sente que apanhou, de súbito, a essênciadas idéias de seus antecessores. Ele, então, entra de novo no trabalho,amadurecido pela experiência anterior, para evoluir mais. E todos,obreiros da primeira ou da última hora, de olhos bem abertos sobrea profunda Justiça Divina, não se queixam mais dos espinhos dastarefas, mas adoram a Deus.

Este é um dos verdadeiros sentidos da parábola dostrabalhadores da última hora. Essa parábola encerra, como todas asoutras que Jesus endereçou ao povo, a semente do futuro espiritual.E, também, contém sob todas as formas e sob todas as imagens, a

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM345

OS TRABALHADORES DA ÚLTIMA HORA

346

revelação da extraordinária unidade da vida através de sucessivasreencarnações, que harmoniza e explica todas as coisas do Universo.É essa solidariedade que liga todos os seres encarnados às existênciaspassadas e às existências futuras. (Henri Heine, Paris, 1863.)

MISSÃO DOS ESPÍRITAS

4. Vocês não entendem que já está fermentada a agitação moralque deve levar o mundo moral antigo a reduzir a nada o conjuntodas injustiças humanas? Ah! Bendigam o Senhor, todos vocês quepuseram a sua fé na sua soberana Justiça. Quais novos apóstolos dacrença revelada pelas superiores vozes proféticas, avancem para pregaro novo princípio da reencarnação e o novo princípio da evoluçãodos espíritos, os quais poderão alcançar estágios superiores conformeo bom ou o mau desempenho de suas missões pessoais e pelo modoque suportarem com resignação as suas provações terrenas.

Não mais se assustem! As línguas de fogo estão sobre as suascabeças (1)! Oh! Verdadeiros adeptos do Espiritismo, vocês são osescolhidos de Deus para o trabalho de redenção dos homens! Sigamadiante e preguem a palavra divina do bem e da esperança. É chegadaa hora em que vocês devem sacrificar os seus hábitos, os seustrabalhos, as suas futilidade, para a propagação da palavra divina.Vão adiante e preguem, que os Espíritos elevados estão com vocês.

Vocês falarão com pessoas que não querem escutar a voz deDeus, porque essa voz os convida incessantemente para a abnegação.

1. Nota do Tradutor — “Línguas de fogo” é alusão do Espírito de Erasto sobre o prometido

fenômeno mediúnico, coletivo, que serviu de introdução dos Apóstolos do Cristo na

mediunidade, conforme você verificará no capítulo 2, de Atos dos Apóstolos, no Novo

Testamento.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM346

347CAPÍTULO XX

Vocês pregarão o desinteresse aos avarentos, a abstinência aosdissolutos, a mansidão aos tiranos domésticos e aos déspotas.Palavras perdidas, eu sei! Mas, que importa isso?! É necessário irrigaros corações áridos com o suor que vocês vertam, porque eles nãofrutificarão e nem produzirão, senão sob os repetidos golpes daenxada e da charrua evangélicas.

Sigam adiante e preguem!Sim, vocês todos, homens de boa-fé, que aceitam a sua

inferioridade diante dos mundos espalhados no Infinito, partamem campanha contra a injustiça e a iniqüidade. Vão em frente eanulem o culto ao deus do ouro, que dia a dia mais se alastra. Sigamadiante que Deus os conduzirá! Homens simples e ignorantes, assuas línguas se soltarão e vocês falarão como nenhum orador sabefalar. Sigam adiante e preguem, porque as multidões atentas recolherãocom alegria as suas palavras de consolação, de fraternidade, de esperançae de paz.

Que importam as armadilhas que lançarem em seu caminho!Os lobos só caem nas armadilhas de lobo, mas o Pastor Divinosaberá defender as suas ovelhas do fogo sacrificial.

Sigam, homens que, grandes diante de Deus, mais felizes queTomé, crêem sem fazer questão de ver e aceitam os fatos damediunidade, mesmo quando vocês nenhuma comunicaçãoespiritual conseguiram obter por vocês mesmos.

Sigam, que o Espírito de Deus os conduz!Segue, pois, adiante, extraordinária falange da fé! E os grandes

grupos de incrédulos se dissiparão diante de vocês, como as sombrasda manhã aos primeiros raios do Sol.

A fé é a virtude que transporta as montanhas, disse-lhes Jesus.No entanto, mais pesados que as maiores montanhas, são os montesde todos os vícios da impureza que se encontram no coração doshomens impuros. Sigam, então, com muita coragem espiritual,para remover essa montanha de iniqüidade, que as gerações futuras

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM347

OS TRABALHADORES DA ÚLTIMA HORA

348

deverão conhecer apenas como pertencentes ao tempo das lendas,do mesmo modo que vocês só conhecem de uma maneira imperfeitaos acontecimentos anteriores da civilização pagã.

Sim, as transformações morais e filosóficas vão produzir-seem todos os pontos da Terra. Aproxima-se a hora em que a LuzDivina brilhará sobre esses dois universos da evolução humana.

Sigam, portanto, levando a palavra divina aos grandes, que adesprezarão; aos sábios, que exigirão provas materiais; aos simples epequeninos, que a aceitarão, porque principalmente entre os mártiresdo trabalho, nesta expiação terrena, vocês encontrarão dedicação efé. Caminhem com estes, pois que eles receberão com alegria,agradecendo e louvando a Deus, a consolação divina que vocês lheslevarem e, baixando a cabeça, renderão graças pelas aflições que naTerra encontraram.

Encha-se de decisão e coragem essa falange! Mãos à obra! Oarado está pronto, o solo está à sua espera: arem-no!

Sigam adiante e agradeçam a Deus a gloriosa tarefa que lhesfoi confiada. Mas muito cuidado, porque entre os chamados parao Espiritismo, muitos se desviaram desse caminho! Guardem-se,portanto, nesse caminho e sigam com a verdade.

Vocês perguntarão: se entre os chamados para o Espiritismomuitos se desviaram, como reconhecer os que estão no bomcaminho?

Responderemos que vocês podem reconhecê-los pelosprincípios da caridade que eles ensinarão e praticarão. Vocês osreconhecerão pelo número de aflitos que consolarem, pelo seu amorao próximo, pela sua abnegação, pelo seu desinteresse pessoal.Poderão reconhecê-los, finalmente, pela vitória de seus princípios,porque Deus quer que a sua lei triunfe. E os que seguem essa lei sãoos escolhidos e o Senhor lhes dará a vitória. Aqueles, porém, quefalseiam o sentido dessa lei e fazem do Espiritismo um degrau para

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM348

349CAPÍTULO XX

satisfazer sua vaidade e sua ambição, esses serão visitados pela JustiçaDivina que os corrigirá pela dor. (Erasto, Paris, 1863.)

OS OBREIROS DO SENHOR

5. Vós chegastes no tempo em que se cumprirão as coisasanunciadas para a transformação moral de todos os homens. Felizesserão aqueles que trabalharem no campo do Senhor com desinteressepessoal e sem outro motivo que não seja a própria caridade! Seusdias de trabalho serão recompensados mais de cem vezes do queesperam.

Felizes serão os que disseram a seus irmãos: “Irmãos,trabalhemos juntos. Unamos os nossos esforços, a fim de que oSenhor, ao chegar, encontre a obra realizada”, porque o Mestre lhesdirá: “Vinde a mim, vós que sois bons servidores, vós que soubestescalar vossos ciúmes e vossas discórdias, para que a obra não sofressedano algum”.

Mas, infelizes aqueles que, por suas divergências de opiniõesou de interesses pessoais, houverem retardado a hora da colheita. Aagitação moral virá e eles serão levados no turbilhão dos mausobreiros. Nessa hora clamarão: “Graça! Graça!”. Mas o Senhor lhesdirá: “Por que pedis graça, vós que não tivestes piedade de vossosirmãos, que vos recusastes a estender-lhes as mãos, vós queesmagastes o fraco ao invés de socorrê-lo? Por que pedis graça, vósque buscastes a vossa recompensa na alegria da Terra e na satisfaçãode vosso orgulho? Já recebestes a recompensa segundo a vossavontade. Nada mais tendes a pedir. As recompensas celestes sãopara aqueles que não houverem pedido as recompensas da Terra”.

A Justiça Divina faz, neste momento, a contagem dosservidores fiéis. Ela assinala aqueles que só têm aparência dedevotamento ao Espiritismo, a fim de que eles não se apossem

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM349

OS TRABALHADORES DA ÚLTIMA HORA

350

violentamente da recompensa dos servidores corajosos. É para esses,que não recuaram diante das suas tarefas, que serão confiados osencargos mais difíceis na grande obra de regeneração dos homenspelo Espiritismo. E é, aí, que se cumprirá esta palavra: Os primeirosserão os últimos e os últimos serão os primeiros no reino dos céus!(O Espírito de Verdade, Paris, 1862.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM350

351CAPÍTULO XX

CONHECE-SE A ÁRVORE PELO FRUTO

1. Por que não há boa árvore que dê mau fruto, nem má árvoreque dê bom fruto. Por que cada árvore se conhece pelo seu própriofruto, pois não se colhem figos dos espinheiros, nem se colhem uvas dosabrolhos. O homem bom, do bom tesouro do seu coração tira o bem,porque da abundância do seu coração fala a boca. (Lucas, capítulo 6,versículos 43 a 45.)

2. Acautelai-vos, porém, dos falsos profetas, que vêm até vósvestidos como ovelhas, mas, interiormente, são lobos devoradores. Porseus frutos os conhecereis. Porventura colhem-se uvas dos espinheiros,ou figos dos abrolhos? Assim, toda árvore boa produz bons frutos, etoda árvore má produz frutos maus. Não pode a árvore boa dar mausfrutos, nem a árvore má dar frutos bons. Toda a árvore que não dábom fruto corta-se e lança-se no fogo. Portanto, pelos seus frutos osconhecereis. (Mateus, capítulo 7, versículos 15 a 20.)

3. E Jesus, respondendo, disse-lhes: Acautelai-vos, que ninguémvos engane, porque muitos virão em meu nome, dizendo: Eu sou oCristo e enganarão a muitos. E surgirão muitos falsos profetas eenganarão a muitos. E, por se multiplicar a iniqüidade, o amor demuitos esfriará. Mas aquele que perseverar até o fim será salvo.

E se alguém vos disser: Eis que o Cristo está aqui, ou ali, não lhedeis crédito, porque surgirão falsos cristos e falsos profetas e farão tãograndes sinais e prodígios que, se possível fosse, enganariam até os

21

CAPITULO XXI

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM351

FALSOS CRISTOS E FALSOS PROFETAS

352

escolhidos. (Mateus, capítulo 24, versículos 4 e 5, 11 a 13 e 23 e 24.)(Marcos, capítulo 13, versículos 5 e 6, 21 e 22.)

MISSÃO DOS PROFETAS

4. Atribui-se comumente aos profetas o dom de revelar ofuturo. Em decorrência, as palavras profecia e predição se tornaramsinônimas. No sentido evangélico a palavra profeta tem umasignificação mais ampla. Ela se aplica a todo enviado de Deus commissão de instruir os homens e de lhes revelar as coisas ocultas e osmistérios da vida espiritual.

Um homem pode, no entanto, ser profeta sem fazer predições.Essa era a idéia dos judeus, no tempo de Jesus. Por tal razão é que,ao ser Jesus levado perante o sumo sacerdote Caifás, os escribas e osanciãos que ali estavam reunidos lhe cuspiram no rosto, lhe deramsocos e bofetadas, dizendo: “Cristo, profetiza para nós, e dize quemé este que te bateu”.

Houve, no entanto, profetas que tiveram a presciência dofuturo, quer por intuição, quer por revelação providencial, a fim detransmitirem avisos aos homens. Como os acontecimentos preditosse realizaram, o dom de predizer o futuro foi considerado comoum dos atributos da qualidade dos profetas.

PRODÍGIOS DOS FALSOS PROFETAS

5. “Levantar-se-ão falsos cristos e falsos profetas que farãograndes prodígios e maravilhas tais que seduziriam até os própriosescolhidos.” Estas palavras dão o verdadeiro sentido do termoprodígio. Na sua significação teológica, os prodígios e os milagressão fenômenos excepcionais, que fogem das leis da Natureza. As

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM352

353CAPÍTULO XXI

leis da Natureza, sendo obras de Deus exclusivamente, poderiamser por Ele anuladas, se fosse de sua vontade. Mas, o simples bomsenso nos diz que Ele não pode ter dado a seres inferiores e perversosum poder igual ao seu e, menos ainda, o direito de desfazerem oque Ele fez.

Jesus não poderia consagrar a existência de uma concessãodessa ordem. De acordo com o sentido que atribuem a estas palavras,um espírito mal-intencionado teria o poder de fazer prodígios, quepoderiam enganar até os próprios escolhidos. Isso nos levaria aadmitir que, podendo eles fazer o que Deus faz, os prodígios e osmilagres não seriam um privilégio exclusivo dos enviados de Deus.E tais prodígios nada provariam, pois que nada distingue osfenômenos provocados por Espíritos santificados dos fenômenosprovocados pelas criaturas perversas. É necessário, portanto, que seprocure um sentido mais inteligente para essas palavras.

Aos olhos do homem do povo, todo fenômeno, cuja causaseja desconhecida, passa por sobrenatural, maravilhoso e miraculoso.A causa do fenômeno, quando se torna conhecida, faz com que oaparente prodígio, por extraordinário que pareça, não seja outracoisa que a manifestação de uma lei da Natureza. É assim que a áreados fatos sobrenaturais diminui à medida que se amplia a área daCiência.

Em todos os tempos, os homens têm explorado, em proveitode sua ambição, de seu interesse pessoal e de seu desejo de poder,certos conhecimentos que possuíam, a fim de ganharem o prestígiode um poder supostamente sobre-humano ou de uma pretensamissão divina.

São esses os falsos cristos e falsos profetas.A difusão de conhecimentos mais amplos vem trazer-lhes o

descrédito. É por isso que o número de falsos profetas diminui àmedida que o homem comum se esclarece. O fato de realizaremaquilo que, aos olhos de certas pessoas, se considera como um

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM353

FALSOS CRISTOS E FALSOS PROFETAS

354

prodígio, não é, portanto, um sinal de missão divina. Isso que fazempode ser o produto de conhecimentos que qualquer um podeadquirir, ou de faculdades orgânicas próprias, que tanto o maisindigno como o mais digno dos homens pode possuir.

O verdadeiro profeta se reconhece por características maissérias que essas dos falsos profetas e tais características sãoexclusivamente morais.

NÃO CREIAM EM TODOS OS ESPÍRITOS

6. Amados, não acrediteis em todos os espíritos, mas provai se osespíritos são de Deus, porque já muitos falsos profetas se têm levantadono mundo. (João, Epístola 1, capítulo 4, versículo l.)

7. Os fenômenos mediúnicos, longe de confirmar os falsoscristos e os falsos profetas, como algumas pessoas dizem, vêm, aocontrário, dar-lhes um golpe mortal.

Não peça ao Espiritismo nem milagres e nem prodígios,porque ele declara de modo expresso que não os produz. Assimcomo a física, a química, a astronomia, a geologia vieram revelar asleis do mundo material, o Espiritismo vem revelar outras leisdesconhecidas, que regem as relações do mundo corporal com omundo espiritual. Essas leis, tanto quanto aquelas do domínio daCiência, não são mais que leis da Natureza. Permitindo a explicaçãode uma certa ordem de fenômenos, incompreendidos até agora,essas leis acabam com o que restava ainda nos domínios domaravilhoso.

Aquele, portanto, que se sentisse tentado a explorar osfenômenos mediúnicos em proveito próprio, em se fazendo passarpor um messias de Deus, não poderia abusar por longo tempo dacredulidade dos outros homens e muito rapidamente seria

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM354

355CAPÍTULO XXI

desmascarado. Aliás, como já se disse, esses fenômenos aparentementemaravilhosos, não provam coisa alguma por si mesmos. A verdadeiramissão se prova por efeitos morais, que não é qualquer um quepode produzir.

Este é um dos resultados do desenvolvimento da ciênciaEspírita. Examinando a causa de certos fenômenos, essa ciêncialevanta o véu que envolvia muitos mistérios, tornando conhecidasas suas causas.

Os que preferem a obscuridade, temendo a luz, são os únicosinteressados em combater a ciência Espírita. Mas a verdade é comoo Sol: dissipa os mais densos nevoeiros.

O Espiritismo vem revelar uma outra categoria, bem maisperigosa, de falsos cristos e falsos profetas, e que não se encontraentre os homens, mas entre os desencarnados. Essa categoria é a dosespíritos enganadores, dos hipócritas, dos orgulhosos e dos falsossábios da espiritualidade, que passaram da Terra para o mundoespiritual e tomam nomes respeitáveis para, debaixo dessa máscaraque usam, tornarem aceitáveis as idéias mais extravagantes e ab-surdas.

Antes que as relações mediúnicas fossem conhecidas, essesespíritos agiam de uma maneira menos evidente, através dainspiração, da mediunidade inconsciente, auditiva ou psicofônica.O número desses espíritos que, em diversas épocas, mas sobretudonestes últimos tempos, se apresentaram como alguns dos antigosprofetas, como o Cristo, como Maria, mãe de Jesus, e mesmo comose fossem o próprio Deus – esse número hoje é considerável!

João, o Evangelista, nos põe em alerta contra tais espíritos,quando diz: “Meus bem-amados, não creiais em todos os espíritos,mas experimentai se esses espíritos são de Deus, porque muitosfalsos profetas se têm levantado no mundo”. O Espiritismo nosoferece os meios de experimentar esses espíritos, indicando-nos ascaracterísticas pelas quais se conhecem os bons espíritos,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM355

FALSOS CRISTOS E FALSOS PROFETAS

356

características sempre morais e jamais materiais (1). É para essediscernimento dos bons e dos maus espíritos que podemos utilizarestas palavras de Jesus: “Reconhece-se a qualidade da árvore pelosseus frutos. Uma boa árvore não pode produzir frutos maus e umaárvore má não pode produzir bons frutos”.

Julgam-se os espíritos pela qualidade de suas obras, assimcomo se conhece a árvore pela qualidade de seus frutos.

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:OS FALSOS PROFETAS

8. Se lhe disserem: “O Cristo está aqui”, não o procure ondelhe indicaram. Mas, ao invés disso, ponha-se em estado de alerta,porque os falsos profetas são em grande quantidade.

Você não vê as folhas da figueira embranquecerem? Não vêos brotos que surgem na época da florada? Não lhe disse o Cristoque “reconhece-se a árvore pelos seus frutos”? Se os frutos não sãobons, você considerará a árvore como má. Se, porém, os frutosforem bons e saudáveis, você dirá: “Nada de tão puro poderia sairde um galho enfermo”.

É assim, meu irmão, que você deve examinar o que fazem osespíritos. São as obras deles que devem ser examinadas. Se aqueleque se diz revestido de um poder, se faz acompanhado de todos ossinais morais próprios de semelhantes missões, ou seja, se ele revelano mais alto grau as eternas virtudes cristãs: a caridade, o amor, aindulgência, a bondade que concilia todos os corações; se,confirmando as suas palavras, ele junta os atos a que essas palavras

1. Ver, para a distinção dos espíritos, a 2ª parte, capítulo XXIV e seguintes de O Livro

dos Médiuns.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM356

357CAPÍTULO XXI

conduzem, então você poderá dizer: “Este aqui é, realmente, umenviado de Deus”.

Desconfie, porém, das palavras muito doces e suaves.Desconfie daqueles escribas e fariseus que pregam virtudes que nãopraticam, mas trazem a aparência falsa de praticá-las. Desconfiedaqueles que pretendem estar na posse exclusiva e única da verdade!

Não! Não! O Cristo não está entre esses, porque os que Eleenvia para propagar a sua santa doutrina, e ajudar a regeneração dohomem, serão, a exemplo do próprio Mestre, brandos e humildesde coração, acima de todas as coisas. São esses os que devem, porseus exemplos e por seus conselhos, salvar as criaturas humanas quecorrem para a perdição e que levam uma vida ociosa nos caminhostortuosos da existência. Os que servem com Jesus são modestos ehumildes.

Diante de todo aquele que revela um grão que seja de orgulho,fuja desse assim como quem foge de uma doença contagiosa, porqueele torna enfermo tudo o que toca. Lembre-se de que cada criaturatraz sob a sua cabeça, mas sobretudo no que faz, o sinal de sua grandezaou de sua inferioridade espiritual.

Vá, pois, meu filho bem-amado, seguindo para a frente semvacilações e sem segundas intenções, no caminho bendito que vocêtomou. Vá, vá sempre sem temor. Afaste corajosamente tudo oque possa embaraçar a sua caminhada para o objetivo eterno. Vocêestá como um viajante que só por curto tempo está nas trevas e nasdores das provações. Se você abrir o seu coração para essa suavedoutrina, que lhe vem revelar as leis eternas, você verá realizadastodas as aspirações de sua alma diante do Infinito.

Desde já você poderá vivenciar essas paisagens celestiais vistasnos seus sonhos e que, por serem passageiras, alegravam o seuespírito, mas não moravam no seu coração! Agora, meu amado, amorte desapareceu, dando lugar aos Espíritos de Luz, que vocêconhece. Esse é o espírito da luz do novo encontro e da reunião

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM357

FALSOS CRISTOS E FALSOS PROFETAS

358

com o Plano Espiritual Superior. Agora, você que bem cumpriu atarefa que o Senhor lhe concedeu, você nada mais tem a temer daJustiça Divina. É que o Pai perdoa os filhos que se desgarraram eque rogam por misericórdia. Que a sua divisa seja, portanto, a daevolução, da evolução contínua de todas as coisas, até que vocêchegue ao final feliz, em que o esperam todos aqueles que chegaramantes de você aos Campos da Paz. (Luís, Bordéus, 1861.)

CARACTERÍSTICAS DO VERDADEIRO PROFETA

9. Desconfiem dos falsos profetas. Esta recordação é útil emtodos os tempos. É mais útil ainda nos momentos de transição devalores em que, como no atual, se elabora uma transformação mo-ral de todos os homens. É que, nestes momentos, uma multidãode ambiciosos e intrigantes se levantam como se fossemreformadores e messias. É contra esses impostores que devemosestar prevenidos. E é um dever de todos os homens honestosdesmascará-los.

Vocês perguntarão, sem dúvida, como reconhecê-los.Vou dar-lhes os sinais de identificação.Só se confia a direção de uma grande empresa a um adminis-

trador hábil, capaz de dirigi-la. Vocês julgam que Deus seja menosprudente que os homens? Estejam certos de que Ele só confia mis-sões importantes aos que sabem que são capazes de realizá-las. Éque as grandes missões são pesados encargos que esmagariam ohomem necessitado de sabedoria para cumpri-las.

Como em todas as coisas, o mestre deve saber mais do queos aprendizes. Para fazer os homens avançarem moral e intelectualmentehá necessidade de homens superiores em inteligência e em moralidade.Por isso, para essas missões, são sempre escolhidos os Espíritos jámuito evoluídos, que fizeram as suas provas em outras existências,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM358

359CAPÍTULO XXI

e que reencarnam com esse objetivo. Se esses Espíritos não fossemsuperiores ao meio em que eles devem atuar, a sua atividade serianula.

Pelo exposto, vocês deverão concluir que o verdadeiromissionário de Deus deve provar a sua missão pela sua superioridadeespiritual, pelas suas virtudes, pela sua grandeza de alma, peloresultado e influência moralizadora de sua obra. Tirem, também,esta outra conseqüência: se ele estiver por seu caráter, por suasvirtudes, por sua inteligência abaixo do papel que se atribuiu, oudo personagem sob o nome de quem ele se apresenta, ele não passade um farsante de má qualidade que não sabe nem ao menos imitaro modelo divino que escolheu.

Outra consideração a fazer é que a maior parte dos verdadeirosmissionários de Deus ignoram-se a si mesmos como tais. Elesrealizam aquilo para o que foram chamados por força de suadeterminação, secundados pelo poder oculto que os inspira e osdirige à sua revelia, sem que premeditem o que a missão lhes pede.Em resumo, os verdadeiros missionários se revelam pelos seus atos esão identificados pelas outras pessoas, enquanto que os falsos missionáriosse apresentam a si mesmos como os enviados de Deus.

Os verdadeiros missionários são humildes e modestos. Osfalsos missionários são orgulhosos e cheios de si, falando comarrogância e, como todos os mentirosos, parecem sempre temerososde não serem reconhecidos como missionários.

Já foram vistos desses impostores, alguns querendo passarpor apóstolos do Cristo e outros querendo passar pelo próprio Cristo.E, para vergonha da raça humana, eles encontraram pessoas bastantecrédulas para se ajuntarem nas suas indignidades. Uma ponderaçãobastante simples, no entanto, deveria abrir os olhos dos mais cegosdos homens: se o Cristo voltasse a encarnar sobre a Terra, viria comtodo o seu poder e todas as suas virtudes, a menos que se admita, oque seria um absurdo, que Ele houvesse regredido de suas conquistas.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM359

FALSOS CRISTOS E FALSOS PROFETAS

360

Ora, do mesmo modo que se vocês tirarem de Deus um só de seusatributos vocês já não teriam mais Deus, se vocês tirarem uma sódas virtudes do Cristo, vocês não teriam o Cristo.

Esses que se apresentam por Cristo, têm todas as virtudes doSenhor? Eis a questão! Observem-nos, examinem as suas idéias e osseus atos, e vocês reconhecerão que, acima de tudo, lhes faltam asqualidades que distinguem o Cristo: a humildade e a caridade,enquanto que lhes sobram as que Jesus não tinha: a ambição e oorgulho.

Notem, também, que neste momento existem, em diferentescidades do mundo, muitos pretensos apóstolos do Cristo comotambém muitos pretensos Elias, João Batista ou Simão Pedro eque, necessariamente, eles não podem ser todos verdadeiros. Tenhampor certo que essas são pessoas que exploram a credulidade dosmais ingênuos e que querem viver às custas daqueles que lhes dãoouvidos.

Desconfiem, portanto, dos falsos profetas e falsos missionários,sobretudo nestes tempos de renovação moral. É que muitos dessesimpostores se dirão enviados de Deus. Eles buscam uma vaidosasatisfação na Terra mas a Justiça Divina os espera, podem estar certos.(Erasto, Paris, 1862.)

OS FALSOS PROFETAS DA ESPIRITUALIDADE

10. Os falsos profetas não estão somente entre os encarnados.Eles existem, e em maior número, entre os Espíritos orgulhososque, aparentando amor e caridade, semeiam a desunião e retardama obra de emancipação dos homens dos vícios morais. Para isso,levam muitas pessoas a acreditar em princípios fantasiosos eabsurdos, através dos médiuns que lhes dão guarida. E para melhorfascinar os que eles desejam enganar, para dar maior importância às

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM360

361CAPÍTULO XXI

suas teorias, eles se disfarçam sob nomes exóticos ou que os homenssó pronunciam com muito respeito.

São eles que semeiam os fermentos das discórdias entreagrupamentos Espíritas. São eles que sugerem que esses agrupamentosse isolem uns dos outros e que conflitem entre si e se olhem comoconcorrentes de uma missão que não existe. Bastaria isso que fazem,de fermentar a desunião, para os desmascarar. É que, agindo assim,eles mesmos dão o mais completo desmentido do que dizem ser.Cegos, portanto, são os homens que se deixam prender em tãogrosseiro embuste.

Mas há, ainda, muitos outros meios de os reconhecer comofalsos profetas. Os Espíritos da ordem a que eles dizem pertencer,devem ser não somente bons, mas, também, muito racionais. Poisbem! Pensem no que eles dizem, os princípios que pregam, pelapeneira da razão e do bom senso e vocês verão o que restará de joio.Admitam, então, comigo, que todas as vezes que um Espíritorecomenda como remédio para os males morais dos homens, oucomo meio de alcançar a sua transformação moral, coisas fantasiosas,que não sejam meios para alcançar esse objetivo, e coisas pueris eridículas, ou quando formula um sistema de princípios contraditóriocom as mais rudimentares noções da Ciência, esse não pode sermais que um Espírito ignorante e mentiroso.

Por outro lado, lembrem-se bem de que se a verdade não éentendida por uma pessoa, ela será sempre entendida pelo bomsenso da maioria dos Espíritas. Este entendimento se constitui,também, em mais um meio de examinar a verdade. Se doisprincípios se contradizem, vocês terão a medida do valor de cadaum desses princípios, verificando qual dos dois encontra maissimpatia entre os Espíritas de bom senso doutrinário. Seria falta delógica, realmente, admitir que princípios que vêm diminuir o númerode seus participantes sejam mais verdadeiros do que aqueles princípiosque vêm aumentar o número de seus adeptos.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM361

FALSOS CRISTOS E FALSOS PROFETAS

362

Deus, querendo que a verdade espiritual alcance a todos, nãoiria limitá-la a um círculo restrito. Ele a faz surgir em diferentespontos, a fim de que, por toda a parte, a luz dos conhecimentosdivinos esteja ao lado das trevas da mentira.

Repilam, sem piedade, todos esses Espíritos que se apresentamcomo conselheiros exclusivos, sugerindo a divisão e o isolamento.Esses são, quase sempre, Espíritos vaidosos e medíocres, que tentaminsinuar-se e impor-se a homens fracos de conhecimentos e devontade e, também, muito crédulos. Ao derramarem-lhes exageradoselogios, querem fasciná-los e terem-nos sob o seu domínio.

Esses são, geralmente, Espíritos desejosos de poder que, tendosido tiranos do povo ou da família, quando encarnados, aindaquerem vítimas para tiranizar após a sua desencarnação. De ummodo geral, portanto, desconfiem das comunicações mediúnicas quetrazem uma característica de misticismo e de coisas extravagantes ouque prescrevem cerimônias e práticas estranhas aos princípios docristianismo.

Há, nesses casos, motivo legítimo de suspeitas.Lembrem-se de que quando uma verdade deve ser revelada

aos homens, ela será transmitida, ao mesmo tempo, em todos osgrupos sérios que contem com médiuns igualmente sérios. Ela nãoserá comunicada apenas a este ou àquele agrupamento, com exclusãodos outros. Nenhum médium é perfeito se estiver obsidiado. E háobsessão clara quando um médium é apto somente para recebermensagens de um determinado Espírito, por mais importante queesse Espírito queira se fazer.

Por conseqüência, todo médium e todo agrupamento Espíritaque se julguem privilegiados pelas comunicações que somente elespodem receber e que, por outro lado, se sujeitam a práticas queinclinam para as superstições e soluções mágicas – esses todos estão,sem dúvida aprisionados a uma obsessão muito bem evidenciada.E, mais ainda, a obsessão se evidência quando o Espírito que domina

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM362

363CAPÍTULO XXI

o médium ou o grupo se pavoneia com um nome que todos,encarnados e desencarnados, devemos honrar e respeitar e nãopermitir que seja pronunciado sem um propósito nobre.

É incontestável que, passando pela peneira da razão e da lógica,todos os conselhos e todas as mensagens dos Espíritos, será fácilrejeitar o absurdo e o erro.

Um médium pode ser fascinado, um grupo pode serenganado. Mas o exame rigoroso de outros grupos, o conhecimentoEspírita já adquirido, a alta autoridade moral dos dirigentes ativosdos agrupamentos Espíritas, as comunicações que os principaismédiuns de todos os lugares recebam, com sinais de lógica e daautenticidade dos melhores Espíritos, desmascararão essas mensagensmentirosas e astuciosas, emanadas de uma turba de Espíritosmistificadores e maldosos. (Erasto, discípulo de Paulo de Tarso,Paris, 1862. )

(Ver, nesta mesma obra, na Introdução, o item II, sob o título“Controle Universal dos Ensinamentos dos Espíritos” .Veja, também,O Livro dos Médiuns, o capítulo XXIII, sob o título “Da obsessão”.)

JEREMIAS E OS FALSOS PROFETAS

11. Assim diz o Senhor Todo-Poderoso: Não ouçais os palavrasdos profetas que vos profetizam! Eles vos enganam, anunciando visõesque provêm de seu coração e não da boca do Senhor. Ousam dizer aosque desprezam a palavra do Senhor: “A paz está convosco!” e a todosque seguem com obstinação de seu coração: “Não vos aconteceránenhuma desgraça” . – Quem esteve presente no conselho do Senhorpara ver e ouvir a sua palavra? Quem prestou atenção à sua palavra ea ouviu? Eu não enviei os profetas, e eles correram! Eu não lhes falei,e eles profetizaram! – Ouvi o que dizem os profetas que profetizammentiras em meu nome, dizendo: “Tive um sonho! Tive um sonho.”

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM363

FALSOS CRISTOS E FALSOS PROFETAS

364

Até quando haverá entre os profetas os que profetizam mentiras e osque profetizam os enganos de seu coração? – E quando este povo, ouum profeta ou sacerdote, te perguntar: “Qual é o fardo do Senhor?” tulhes dirás: “Vós sois o fardo e eu vos rejeitarei”. (Jeremias, capítulo 23,versículos 16 a 18; 21; 25 e 26 e 33, no Antigo Testamento.)

É sobre essa passagem do profeta Jeremias que eu vou lhescentralizar a atenção, meus amigos. Deus, falando pela boca doprofeta, disse: “É a visão do coração deles que os faz falar”. Essaspalavras indicam claramente que, desde aquela época até esta, oscharlatães e os vaidosos abusavam do dom das profecias e exploravamesse dom em seu proveito próprio.

Eles abusavam, por conseqüência, da fé simples e quase cegado povo, predizendo, por dinheiro, as coisas boas e agradáveis aseus consulentes. Esta forma de fraude era bastante comum na naçãojudaica. É fácil compreender que o pobre povo, na sua ignorância,não tinha nenhum meio de distinguir os bons dos maus profetas. Eera sempre mais ou menos enganado pelos impostores ou fanáticosque se diziam profetas.

Nada mais significativo que estas palavras: “Eu não envieiesses profetas e eles se fizeram por si mesmos. Eu não lhes falava eeles profetizavam!”. Mais adiante encontramos: “Eu ouvi essesprofetas profetizarem a mentira em meu nome, dizendo: ‘Sonhei,sonhei!’. Jeremias indicava, assim, os meios empregados para explorara confiança do povo.

A multidão, sempre crédula, não pensava em lhes contestar averacidade de seus sonhos ou de suas visões. Ela achava tudo muitonatural e convidava sempre os profetas a falar.

Após as palavras do profeta Jeremias, escutem os sábios con-selhos do Apóstolo João, quando diz: “Não acrediteis em todos osespíritos, mas experimentai se os espíritos são de Deus”. É que,entre os desencarnados, há também os que gostam de enganar,quando deparam com ocasião favorável para isso.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM364

365CAPÍTULO XXI

Os enganados são, bem entendido, os médiuns que não secuidam doutrinária e moralmente o bastante para não serem presasdesses espíritos. Aí se encontra, sem contradição, uma das grandesdificuldades contra as quais muitos médiuns vêm esbarrar, sobretu-do quando são novatos no Espiritismo. Esta é, para esses novatos,uma prova de que não podem triunfar, a não ser quando tenhammuita prudência.

Aprendam, pois, antes de tudo, a distinguir os bons Espíritosdaqueles que são falsos e mentirosos, para não virem vocês mesmosa se tornarem outros falsos profetas. (Luís, Espírito Protetor,Carlsruhe, 1861.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM365

NÃO SEPAREIS O QUE DEUS JUNTOU

366

INDISSOLUBILIDADE DO CASAMENTO

1. E chegaram-se a Jesus os fariseus, tentando-o e dizendo: Élícito ao homem repudiar sua mulher por qualquer motivo? – Ele,porém, respondendo, disse-lhes: Não tendes lido que aquele que criouo homem, desde o princípio os fez macho e fêmea? Portanto, deixará ohomem pai e mãe, e se unirá com a sua mulher, e serão dois numa sócarne? Assim já não são dois, mas uma só carne. Por isso o que Deusjuntou não o separe o homem. – Disseram-lhe eles: Então, por queMoisés mandou dar-lhe carta de divórcio e repudiá-la? – Disse-lhesele: Moisés, por causa da dureza dos vossos corações, vos permitiurepudiar vossas mulheres, mas no princípio não foi assim. Eu vos digo,porém, que qualquer um que repudiar sua mulher, se não for porcausa de adultério, e casar com outra, comete adultério, e o que secasar com a que o outro repudiou, comete adultério. (Mateus, capítulo19, versículos 3 a 9.)

2. Nada é imutável, a não ser o que vem de Deus. Porconseqüência, tudo o que seja obra dos homens está sujeito amudanças. As leis da Natureza são as mesmas em todos os tempose em todos os lugares. As leis humanas, porém, sofrem modificaçõessegundo a época e em cada lugar em que são elaboradas e aplicadas,e segundo a evolução da compreensão dos homens.

No casamento, o que é de ordenação divina, é a união dossexos para que se realize, através da reencarnação, a renovação dosseres que morreram. Mas, as condições que regulam essa união são

22

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM366

367CAPÍTULO XXII

de ordem exclusivamente humana. Não há no mundo inteiro, nemmesmo na cristandade, dois países onde as leis humanas sejamtotalmente as mesmas. E em nenhum desses países há um só emque essas leis não tenham sofrido mudanças com o tempo.

Daí resulta que, diante da lei civil que regula o casamento, oque é legítimo num país e em certa época, é adultério num outropaís e noutro tempo. Isso ocorre porque a lei civil tem por objetivoregular os interesses das famílias. E esses interesses sofrem mudançassegundo os costumes e as necessidades locais. É assim, por exemplo,que em alguns países o casamento religioso é o único legítimo,enquanto em outros países bastará o casamento civil para legitimara união do casal.

3. A união dos sexos é uma lei divina material, comum atodos os seres vivos. Mas, há uma outra lei divina, imutável comotodas as leis de Deus, e exclusivamente moral: a lei do amor. Deusquer que os seres se unam não somente pelos laços da carne, mastambém pelos da alma, a fim de que a afeição mútua dos espososenvolva os filhos do casal, para que sejam dois, e não apenas um,para amar os filhos, cuidar deles, e fazê-los evoluir espiritualmente.

Nas condições comuns do casamento, é tida em conta aimportância da lei do amor? De modo algum! Não se examina,antes de decidir-se pelo casamento, a afeição dos dois seres que, porsentimentos mútuos se atraem entre si. Na maioria das vezes essaafeição é ignorada. O que se procura não é a satisfação do coração,mas a do orgulho, da vaidade, da cobiça – numa palavra, o que seprocura é a realização de todos os interesses materiais.

Nessas uniões, quando tudo corre bem, segundo os interessesmateriais, diz-se que o casamento é feliz. E quando os bens materiaissão suficientes para que o casal realize os seus caprichos, diz-se queos esposos são ajustados e que devem ser bem felizes!

Mas, nem a lei civil, nem os compromissos que por essa leisão contratados, podem substituir a lei do amor, se esta não for a lei

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM367

NÃO SEPAREIS O QUE DEUS JUNTOU

368

que oriente essa união de seres. Na falta da lei do amor, o queresulta do casamento, freqüentemente, é que aqueles que se unirampor força de interesses, por si mesmos se separam. O juramentopronunciado no ato do matrimônio se torna um juramento falso,se foi tomado como uma fórmula banal.

Dessa atitude é que nascem as uniões infelizes, que findampor tornarem-se culposas por resultarem da imprudência. Duplainfelicidade que se evitaria se, entre as condições para o casamento,não se esquecesse de incluir a única condição que consagra a uniãodos esposos aos olhos de Deus: a lei do amor.

Quando Deus disse: “Não sereis mais que uma só carne” equando Jesus falou: “Não separeis o que Deus uniu”, essas palavrasdevem ser compreendidas com referência à união consagradasegundo a lei imutável de Deus, a lei do amor, e não segundo a leiinconstante dos homens.

4. A lei civil, que rege o casamento, seria tão superficial quedeveríamos voltar aos casamentos segundo a Natureza? Não,certamente! A lei civil tem por objetivo regular as relações sociais eos interesses das famílias, de acordo com as exigências da civilização.Por isso ela é útil, necessária e variável segundo as épocas e países.Essa lei deve conter a sabedoria da época e dos costumes, para que ohomem civilizado não viva como o selvagem. Mas nada,absolutamente nada se opõe a que ela seja uma conseqüência da leide Deus.

Os obstáculos ao cumprimento da lei divina se originam dospreconceitos e não da lei civil. Esses preconceitos, embora aindamuito vivos nos casamentos por interesse, já se dissolveram empessoas mais. esclarecidas. Eles desaparecerão com a evolução moraldos homens, abrindo, finalmente, os olhos das criaturas para osmales incontáveis, para os erros, para os próprios crimes que resultamdessas uniões contraídas com a atenção voltada apenas para osinteresses materiais.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM368

369CAPÍTULO XXII

Um dia o homem se perguntará se é mais humano, maiscaridoso, mais moral que se anulem mutuamente os seres que nãopodem viver juntos ou se é mais justo restituir-lhes a liberdade. Ohomem se indagará, também, se a expectativa de um casamentoque não pode ser dissolvido, não é o que aumenta o número deuniões irregulares.

O DIVÓRCIO

5. O divórcio é uma lei humana que tem por finalidade separarlegalmente o que já estava separado de fato. Se já houver a separaçãode fato o divórcio não é contrário à lei de Deus. É que, neste caso,ele apenas confirma o que as criaturas já fizeram. Ele só é aplicávelnos casos em que a divina lei do amor não foi observada.

Se o divórcio fosse contrário à lei do amor, a própria Igrejaseria obrigada a considerar que teriam faltado com os seus deveresmorais alguns de seus chefes que, por autoridade própria e em nomede sua religião, têm, em muitas ocasiões, aplicado a lei do divórcio.Essa falta de dever moral é dupla, aliás, porque nesses casos o divórciotem em vista apenas atender aos interesses materiais dos divorciados,sem cogitar de cumprir a lei do amor.

Mas, nem mesmo Jesus consagrou a indissolubilidadeabsoluta do casamento. Não disse ele: “Foi por causa da dureza devossos corações que Moisés vos permitiu repudiar vossas mulheres”?Isso significa que, desde os tempos de Moisés, não sendo o amormútuo a base única do casamento, a separação dos cônjuges poderiafazer-se necessária. Jesus, porém, acrescenta: “No princípio não foiassim”, ou seja, na origem da humanidade, quando os homens nãoestavam ainda pervertidos pelo egoísmo e pelo orgulho, e viviamsegundo a lei de Deus, as uniões nasciam da simpatia e não da vaidade

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM369

NÃO SEPAREIS O QUE DEUS JUNTOU

370

ou da ambição e, por isso, não davam causa ao repúdio entre oscasais.

Jesus vai ainda mais longe, estabelecendo o único caso emque o repúdio pode ser dado: o adultério. Ora, o adultério nãoexiste onde reina uma afeição recíproca e sincera. Ele proíbe, éverdade, a todo homem desposar uma mulher repudiada. Mas énecessário considerar os costumes e o caráter dos homens daquelaépoca. A lei mosaica, no caso de adultério, determinava matar-se amulher a pedradas! Querendo abolir esse costume bárbaro, Jesusnecessitava estabelecer uma outra penalidade e essa penalidade estavana desonra conseqüente da proibição de um segundo casamento.Esta era, certamente, uma lei igualmente civil, substituindo a outralei civil que prescrevia a lapidação. Mas, assim como todas as leiscivis, esta deveria submeter-se à prova do tempo e dos costumes.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM370

371CAPÍTULO XXII

QUEM NÃO ODEIA SEU PAI E SUA MÃE

1. Ia com Jesus uma grande multidão e, voltando-se, disse-lhe:Se alguém vem a mim e não odeia a seu pai e mãe e mulher e filhos eirmãos e irmãs, também a sua própria vida, não pode ser meu discípulo.E qualquer que não leva a sua cruz, e não vier após mim, não pode sermeu discípulo. Assim, pois, qualquer de vós que não renuncia a tudoquanto tem, não pode ser meu discípulo. (Lucas, capítulo 14, versículos25 a 27 e 33).

2. Quem ama o pai ou a mãe mais do que a mim não é dignode mim. E quem ama o filho ou a filha mais do que a mim, não édigno de mim. (Mateus. capítulo 10, versículo 37.)

3. Certas palavras, aliás muito raras, formam um contrastetão estranho com o modo de ser do Cristo que, instintivamente,repelimos o sentido que elas apresentam em suas letras. E, comisso, a sublimidade da doutrina do Cristo não sofre qualquerdesfiguração.

O que Jesus disse foi escrito após a sua crucificação. NenhumEvangelho foi escrito enquanto Ele vivia entre os homens. Podemos,assim, supor que, em alguns casos como os versículos transcritos doEvangelho de Lucas, acima, o verdadeiro pensamento de Jesus nãofoi bem reproduzido. Ou, talvez, o que não é menos provável, osentido original de seu pensamento sofreu alteração, quando foitraduzido de uma língua para outra. Nas traduções, basta que umerro seja cometido uma primeira vez, para que os copistas venham

23

CAPITULO XXIII

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM371

ESTRANHA MORAL

372

a reproduzi-lo nas cópias seguintes, como se vê freqüentementenos fatos históricos.

O termo odiar, nesta frase de Lucas: “Se alguém quer vir amim e não odeia a seu pai e a sua mãe...”, está num desses casos demá tradução. Ninguém teria a idéia de atribuí-lo a Jesus. Será, então,supérfluo discuti-lo e mesmo ainda querer justificá-lo. Serianecessário, primeiro, saber se Ele pronunciou o termo odiar e, nocaso afirmativo, saber se, na língua em que Jesus se exprimia, nãoteria esse termo um outro significado, diferente do que tem nanossa língua.

Anote nesta passagem de João, o Evangelista: “Aquele queodeia a sua vida, neste mundo, a conserva para a vida eterna”, ondeé evidente que a palavra odeia não significa ter raiva, rancor poralguém, que é o sentido que atribuímos ao termo odiar.

A língua hebraica não era rica. Algumas de suas palavrastinham vários sentidos diferentes entre si. É o que ocorre, porexemplo com aquelas palavras que no livro Gênese (1), designavamas fases da criação divina e que serviam, ao mesmo tempo, paraexprimir um período qualquer de tempo e qualquer período dodia. Disso resultou, mais tarde, a sua tradução pela palavra dia e acrença de que o mundo fora feito em seis dias de vinte e quatrohoras cada um. É isso também que ocorre com a palavra com quese nomeava um camelo e um cabo, porque os cabos eram feitos depêlos de camelo, e que foi traduzido por camelo, na alegoria dofundo da agulha e do rico. (Veja o capítulo XVI, item 2, nessa obra,onde essa parábola está reproduzida.)

É necessário, ainda, considerar os costumes e as característicasdos povos que influenciam, em alto grau, as peculiaridades de sualinguagem. Sem esse conhecimento o sentido real de certas palavrasfoge do entendimento. De uma língua para outra, o mesmo termo

1. N.T.— Primeiro livro da Bíblia, que se ocupa das origens da Terra.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM372

373CAPÍTULO XXIII

tem um sentido menos enérgico ou mais enérgico. Aquela palavraque numa região ou povo pode ser uma ofensa ou uma blasfêmia,pode não ser nem ofensa e nem blasfêmia numa outra região ounum outro povo, conforme a idéia que essa palavra exprima. Numamesma língua, certos termos perdem a sua significação com o passardos séculos. É por isso que uma tradução rigorosamente literal, ouseja, feita palavra por palavra, nem sempre exprime corretamente aidéia inicial. E é por isso que, para a tradução ser fiel, faz-se necessárioempregar não as palavras contidas no texto, mas outras quereproduzam o pensamento, acrescidas, algumas vezes, de outraspalavras explicativas ou complementares.

Estas observações têm uma especial aplicação na interpretaçãoda Bíblia e mais particularmente, na interpretação dos Evangelhos.Se não se considerarem os costumes e as características dominantesno meio em que Jesus vivia, ficaremos sujeitos aos enganos dasignificação de algumas expressões e de alguns fatos, pelo hábitoque temos de transferir para os outros aquilo que somos. Diantedisso, é necessário que despojemos do termo odiar, a sua significaçãocomum entre nós, correspondente a ter rancor, desprezo, desejo devingança, porque isso é contrário ao sentido do ensinamento deJesus. (Veja, também o capítulo XIV, item 5 e seguintes, desta mesmaobra.)

ABANDONAR PAI, MÃE E FILHOS

4. E todo aquele que tiver deixado casas, irmãos ou irmãs oupai ou mãe ou mulher ou filhos ou terras, por amor de meu nome,receberá cem vezes tanto, e herdará a vida eterna. (Mateus, capítulo19, versículo 29.)

5. E disse Pedro: Eis que nós deixamos tudo e te seguimos. – EJesus lhes disse: Na verdade vos digo que ninguém há, que tenhadeixado casa, ou pais ou irmãos ou mulher ou filhos, pelo reino de

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM373

ESTRANHA MORAL

374

Deus, que não haja de receber muito mais neste mundo e no futuro avida eterna. (Lucas, capítulo 18, versículos 28 a 30.)

6. Disse também outro: Senhor, eu te seguirei, mas deixa-medespedir primeiro dos que estão em minha casa. – E Jesus lhe disse:Ninguém que lança mão do arado e olha para trás, é digno do reinode Deus. (Lucas, capítulo 9, versículos 61 e 62.)

Sem discutir a significação das palavras, é necessário que, nestaspassagens evangélicas, busquemos compreender o sentido dessepensamento de Jesus, que era evidentemente o seguinte: “Osinteresses da vida futura têm uma importância maior do que todosos interesses e toda a importância atribuída às coisas humanas”,porque isso é o que está de acordo com a essência da doutrina deJesus. A idéia do abandono da família seria a negação de sua doutrinade amor.

Não temos, aliás, sob os nossos olhos, a aplicação dessesprincípios, no sacrifício dos interesses materiais e das afeiçõesfamiliares, naqueles que se entregam a uma causa nobre? Condena-se o filho por abandona seu pai, sua mãe e seus irmãos, sua mulhere seus próprios filhos, para entregar-se a pesquisas científicasperigosas, mas que resultam na saúde de muitos enfermos? Não lhereconhecemos, ao contrário, o mérito de deixar as doçuras do lar eo valor das amizades, para realizar uma missão assim tão arriscada?

Há deveres que superam a outros deveres.Não impõe a lei a obrigação de uma filha deixar os seus pais,

para seguir com o seu marido a vida conjugal?O nosso mundo está repleto de casos em que as separações

mais dolorosas são necessárias. Mas as afeições não se interrompempor isso. O afastamento não diminui nem o respeito e nem asatenções devidas aos pais, nem a ternura dos pais para com essesfilhos que se afastam. Vê-se, portanto, que mesmo aprisionado aosentido das palavras de Jesus, com exceção do termo odiar, essesensinamentos não são a negação do mandamento que determina

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM374

375CAPÍTULO XXIII

ao homem honrar a seu pai e a sua mãe, nem são a negação daternura dos pais. E, com mais fortes razões, não são negação dessemandamento, se as examinarmos no seu sentido espiritual.

Estas expressões do Cristo tinham por finalidade demonstrar,por meio de uma figura que exagerasse a verdade das coisas, comoera importante o dever de ocupar-se da vida espiritual futura. Elasdeveriam, aliás, ser menos chocantes do que são hoje. É que foramditas a um povo e numa época em que, por força dos costumes, oslaços de família eram menos fortes que os existentes numa civilizaçãomais avançada moralmente. Esses laços de família, mais fracos nospovos primitivos, tornam-se mais acentuados com odesenvolvimento da sensibilidade e do senso moral.

A própria separação da família é necessária para o progresso.E isso tanto para o progresso das famílias como das raças. As

famílias e as raças degeneram se elas não se misturarem entre si. Estaé uma lei da Natureza, de interesse da evolução moral e doaprimoramento físico do homem.

Esses fatos não são, aqui, encarados apenas do ponto de vistaterreno. O Espiritismo nos faz vê-los de um plano mais alto. Mostra-nos que os verdadeiros laços de afeição são os do Espírito e não osdo corpo físico. Esses laços não se rompem nem pela separação,nem mesmo pela morte do corpo. Eles se tornam mais fortes navida espiritual, pela depuração do próprio Espírito.

Essa é uma verdade consoladora que nos dá uma grande forçapara suportar as contrariedades da vida. (Veja o capítulo IV, item18 e o capítulo XIV item, 8, nesta mesma obra.)

DEIXAI AOS MORTOS O CUIDADODE ENTERRAR SEUS MORTOS

7. E disse a outro: Segue-me. – Mas o outro respondeu a Jesus:Senhor, deixa primeiro que eu vá enterrar o meu pai. – Mas Jesus

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM375

ESTRANHA MORAL

376

observou: Deixa aos mortos os cuidados de enterrar os seus mortos.Porém, vai e anuncia o reino de Deus. (Lucas, capítulo 9, versículos59 e 60.)

8. O que podem significar estas palavras: “Deixai aos mortoso cuidado de enterrar os seus mortos”? O que já estudamos, nestecapítulo, mostra que, antes de tudo, nas circunstâncias em que forampronunciadas estas palavras por Jesus, elas não continham umacensura contra aquele que considerava como um dever de piedadefilial, ir sepultar o seu pai. Elas encerram, no entanto, um sentidoprofundo que só o conhecimento mais completo da vida espiritualpode tornar compreensível.

A vida espiritual é, realmente, a verdadeira vida. Essa é a vidanormal do Espírito. A existência terrena é transitória e passageira.Essa existência é uma espécie de morte do espírito, se comparadacom o esplendor e com a atividade da vida espiritual. O corpo éuma vestimenta grosseira de que se reveste temporariamente oEspírito, uma verdadeira prisão que o imanta ao mundo terreno.Desta prisão o Espírito se sente feliz em libertar-se.

O respeito que temos pelos corpos mortos não é inspiradopela matéria. É inspirado pela lembrança do Espírito que se ausentadaquele corpo. É um respeito igual ao que temos pelos objetos quepertenceram ao desencarnado, nos que ele tocou, e que as pessoasque lhe eram afeiçoadas guardam como lembranças.

Essa situação é a que aquele homem, o que queria sepultar ocorpo do pai, da passagem evangélica acima, não podia compreenderpor si mesmo. E, para que pudesse compreendê-la, Jesus lhe ensina,dizendo-lhe: “Não vos inquieteis com o corpo mas pensai, antes,no Espírito. Ide, pois, ensinar o reino de Deus. Ide dizer aos homensque a pátria deles não está sobre a Terra mas no céu, porque somentelá está a verdadeira vida”.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM376

377CAPÍTULO XXIII

NÃO VIM TRAZER A PAZ

9. Não cuideis que vim trazer a paz à Terra. Não vim trazer apaz, mas a espada, porque vim trazer a divisão do homem contra seupai, e da filha contra a sua mãe, da nora contra sua sogra. E assim osinimigos do homem serão os seus familiares. (Mateus, capítulo 10,versículos 34 a 36.)

10. Vim lançar fogo na Terra e o que mais quero, se já estáaceso? Importa, porém, que seja batizado por um certo batismo, e comome angustio que venha a cumprir-se! Cuidais vós que vim trazer pazà Terra? Não, vos digo, mas antes dissensão, porque daqui em dianteestarão cinco divididos numa casa: três contra dois e dois contra três.O pai estará dividido contra o filho, e o filho contra o pai; a mãecontra a filha, e a filha contra a mãe; a sogra contra sua nora e a noracontra sua sogra. (Lucas, capítulo 12, versículos 49 a 53.)

11. Será que foi Jesus, a pessoa que representou a doçura e abondade, que exemplificou e pregou o amor ao próximo, quemterá dito: “Eu não vim trazer a paz, mas a espada; eu vim separar osfilhos do pai, o esposo da esposa; eu vim lançar o fogo sobre aTema e tenho pressa que ele se acenda”?

Essas palavras não contradizem os seus ensinamentos?Não é uma blasfêmia atribuir-lhe a linguagem de um

conquistador sanguinário e devastador?Não! Essas palavras não são uma blasfêmia e nem estão em

contradição com os seus ensinamentos, porque foi Ele mesmo quemas pronunciou. Elas, ao contrário, dão um testemunho de sua altasabedoria. Convém notar, no entanto, que somente a forma emque essas palavras foram colocada contém um engano. E, por isso,não exprimem corretamente o seu pensamento. E esse fato é queprovocou alguns enganos sobre o seu verdadeiro sentido. Se tomadasao pé da letra, tenderiam a transformar a missão de Jesus, todapacificadora, em uma tarefa de perturbações e discórdias. E esta

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM377

ESTRANHA MORAL

378

seria uma conseqüência absurda que o bom senso nos faz afastar,porque Jesus não poderia se desmentir. (Veja o capítulo XIV, item6, nesta mesma obra.)

12. Toda idéia nova encontra forçosamente oposição. Nãohouve uma só que não se estabelecesse sem lutas. A resistênciaoferecida à idéia nova, em todos os casos, é sempre proporcional àimportância dos efeitos conseqüentes dela. Quanto maiores foremos seus efeitos, tantos mais interesses serão abalados. Se a idéia novaé notoriamente falsa, se for julgada como sem efeitos, ninguém seatemoriza com ela e a deixam passar. É que ficam certos de sua faltade vitalidade. Mas se ela é verdadeira, se ela está assentada em basessólidas, se for possível entrever o seu futuro entre os homens, umsecreto pressentimento adverte seus antagonistas de que ela é umperigo para eles e para a ordem de coisas por cuja manutenção elesse interessam. Eis porque eles se atiram contra a idéia e contra osseus adeptos, visando a defesa de seus interesses pessoais.

A medida da importância e dos efeitos de uma idéia nova seencontra, portanto, na emoção que ela causa no seu aparecimento,na violência da oposição que ela provoca e no grau e na persistênciada cólera de seus adversários.

13. Jesus vinha anunciar uma doutrina que solapava, na base,os abusos em que viviam os fariseus, os escribas e os sacerdotes deseu tempo. Por isso, estes O fizeram morrer, julgando matar aquelasidéias com a morte de quem as propagava. Mas as idéias de Jesussobreviveram, porque elas são verdadeiras. Elas se engrandeceramcom a Cruz, porque elas estão nos desígnios de Deus. E essas idéias,anunciadas a partir de uma apagada cidadezinha da Judéia, foramplantar a sua bandeira na própria Roma dos césares, a capital domundo pagão. Colocaram-se entre os seus inimigos mais ferozes,aqueles que tinham o maior interesse em combatê-las. É que essasidéias de Jesus rejeitavam as crenças seculares a que os pagãos se

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM378

379CAPÍTULO XXIII

apegavam muito mais por interesses materiais do que por convicçãoreligiosa.

As lutas mais terríveis esperavam, na capital do paganismo,os Apóstolos de Jesus. As vítimas foram numerosas, mas a idéiagrandiosa cresceu sempre e saiu triunfante, porque ela superava,como verdade, todas as idéias do paganismo.

14. É de notar-se que o cristianismo surgiu quando opaganismo já entrara em decadência e se debatia contra as luzes darazão. O paganismo era praticado por tradição, mas a crença neledesaparecera. Somente o interesse pessoal o sustentava. Ora, ointeresse segura com firmeza as suas coisas e não cede jamais nemdiante dos fatos. O interesse irrita-se tanto mais, quanto maisrazoáveis são as idéias que se lhe opõem e que melhor demonstramos seus erros. Ele sabe muito bem que está errado, mas isso poucolhe importa, porque a verdadeira fé não está em sua alma. O que ointeresse mais teme é a luz que abre os olhos dos cegos e dosincrédulos. A falta de conhecimento lhe é proveitosa e, por isso, elese aferra à ignorância e a patrocina.

Sócrates, o filósofo grego, não ensinava também uma doutrinaquase igual, até certo ponto, à doutrina do Cristo? Por que, então,a sua doutrina não se implantou naquela época, no meio de umdos povos mais inteligentes da Terra? É porque o tempo não erachegado para isso. Sócrates semeou aquela doutrina num camponão preparado para receber aquela sementeira. O paganismo nãoestava ainda bastante desgastado.

O Cristo desempenhou a sua missão no tempo certo. Nemtodos os homens estavam, no seu tempo, à altura de recolher asidéias cristãs. Mas havia entre eles um clima espiritual mais geralque os favorecia para assimilar essas idéias, porque eles já começavama sentir o vazio que as crenças tradicionais deixavam na alma.

Sócrates e Platão abriram o caminho e criaram essa predisposiçãonos espíritos cansados das religiões moldadas pelos homens. (Ver em

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM379

ESTRANHA MORAL

380

“Introdução” , o parágrafo IV, intitulado “Sócrates e Platão, precursores daidéia cristã e do Espiritismo”, nesta mesma obra.)

15. Infelizmente os adeptos da nova doutrina do Cristo nãose entenderam sobre a interpretação das palavras do Mestre Jesus,as quais estavam, na maioria das vezes, veladas por alegorias edeturpações de linguagem. Daí surgiram, desde o princípio de suasinterpretações, as numerosas seitas cristãs que pretendiam, cada umadelas, ser a dona exclusiva da verdade e, desde então e até agora, nãose puseram de acordo com o Evangelho.

Esqueceram o mais importante dos divinos preceitos, aqueleque Jesus havia feito a pedra angular do seu edifício moral e acondição expressa da salvação: a caridade, a fraternidade e o amorao próximo. E, por isso, essa seitas se condenaram umas às outras,e se atiraram umas sobre as outras, com as mais fortes esmagandoas mais fracas, afogando-as em sangue, em torturas e nas chamasdas fogueiras.

Os cristãos, vencedores do paganismo, de perseguidospassaram a perseguidores. Foi com ferro e fogo que passaram aimpor a Cruz do Cordeiro Divino sem mácula, nos dois mundos.É um fato indiscutível que as guerras de religião sempre foram asmais cruéis e as que fizeram mais vítimas que as guerras políticas eque em nenhuma outra foram praticados tantos atos de atrocidadee de terror!

Cabe culpa à doutrina do Cristo?Não! Certamente não lhe cabe a culpa, porque Ele condena

formalmente toda violência. Disse Jesus, alguma vez, a seus discípulos:“Ide, matai, massacrai, queimai todos aqueles que não creiam comovós”? – Não, não disse isso, pois lhes disse o contrário: “Todos oshomens são irmãos e Deus é soberanamente misericordioso; amaio vosso próximo; amai os vossos inimigos; fazei o bem para todosaqueles que vos perseguem”. E lhes disse ainda: “Quem matar coma espada, pela espada perecerá”.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM380

381CAPÍTULO XXIII

A responsabilidade pelas guerras religiosas e pelas perseguiçõesinfamantes movidas por algumas seitas cristãs não pode ser atribuídaà doutrina de Jesus. Os culpados, porém, são aqueles que falsamenteinterpretaram a doutrina cristã, dela fazendo um instrumento paraservir as suas paixões pessoais. Esses são os que fizeram pordesconhecer estas palavras de Jesus: “O meu reino não é destemundo”.

Jesus, na sua profunda sabedoria, previu o que deveriaacontecer. Mas essas coisas eram inevitáveis, porque nasciam dainferioridade dos homens, que não poderiam transformar-semoralmente num repente. Era necessário que o cristianismo passassepor essa prova longa e cruel de dezoito séculos, para mostrar toda aforça de sua verdade. É que, apesar de todo o mal praticado em seunome, o cristianismo saiu puro. O cristianismo, em si, jamais estevenessas questões das seitas e dos homens. As acusações do mal semprecaíram sobre aqueles que do cristianismo abusaram. A cada ato deintolerância, sempre se disse: “Se o cristianismo fosse melhorcompreendido e mais praticado, isso não teria acontecido”.

16. Quando Jesus disse: – Não creiais que eu tenha vindotrazer a paz, mas a divisão” – o seu pensamento era o seguinte:

“Não pensem que a minha doutrina se estabeleça de modopacifico. Ela trará lutas sangrentas, para as quais o meu nome será adesculpa para desencadeá-las. É que os homens não me terãocompreendido ou não terão querido me compreender.

“Os irmãos, separados pelas suas crenças, lançarão a espada unscontra os outros, e a divisão reinará entre os membros de uma mesmafamília, que não partilhem da mesma crença. Eu vim lançar o fogosobre a Terra, para fazê-la consumir os erros e os preconceitos, do mesmomodo que se põe fogo num campo para queimar as ervas daninhas. Etenho pressa para que o fogo se acenda, para que a depuração seja maisrápida. Desse conflito a verdade sairá triunfante.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM381

ESTRANHA MORAL

382

“À guerra sucederá a paz. Aos ódios dos partidos religiosos sucederáa fraternidade universal. Às trevas do fanatismo sucederá a luz da féesclarecida.

“Então, quando o campo dos corações humanos estiver preparadopara a verdade, eu lhes enviarei o Consolador, o Espírito de Verdade,que virá restabelecer todas as coisas, ou seja, que os fará conhecer overdadeiro sentido de minhas palavras.

“Os homens, passando a ser mais esclarecidos, poderãocompreendê-las e, com isso, colocarão um final na luta em que irmãosmatam seus próprios irmãos, por estarem divididos esses irmãos comose fossem inimigos, quando são filhos do mesmo Deus.

“Cansados, enfim, de um combate sem solução, que só resultaem desolação e perturbação no seio das famílias, os homens reconhecerãoonde se encontram os seus verdadeiros interesses, no que se refere a estemundo e ao mundo espiritual. Eles verão de que lado estão os amigose os inimigos de sua tranqüilidade. Todos, então, virão abrigar-se sob amesma bandeira: a da caridade. E as coisas serão restabelecidas sobrea Terra, segundo a verdade e os princípios que eu, aí, lhes ensinei”.

17. O Espiritismo vem realizar, no tempo predito, aspromessas do Cristo. No entanto, não pode realizá-las sem destruiros abusos. Do mesmo modo que ocorreu com Jesus, o Espiritismoenfrenta o orgulho, o egoísmo, a ambição, a cobiça, o fanatismoreligioso cego que, cercados em seus últimos refúgios, tentam barrar-lhe o caminho e levantam contra ele os entraves e perseguições. Porisso ele também tem de lutar.

A época, porém, das lutas e perseguições sanguinolentas jápassou. As lutas que o Espiritismo tem de suportar são de ordemmoral e o final dessas lutas está próximo. As lutas do cristianismoduraram séculos. As do Espiritismo durarão apenas alguns anos,porque a luz, ao invés de partir de um só foco, agora surge emtodos os pontos da Terra e abrirá mais rápido os olhos aos cegos.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM382

383CAPÍTULO XXIII

18. Aquelas palavras de Jesus devem, portanto, ser entendidascomo as cóleras que, segundo o próprio Mestre previa, a sua doutrinaprovocaria, os conflitos temporários que surgiriam pelas conseqüênciasmorais, as lutas que teria que sustentar até se estabilizar, do mesmomodo que aconteceu com os hebreus antes de entrarem na Terra daPromissão.

Não há, conseqüentemente, nesses conflitos, nenhum desejopremeditado de semear desordens e confusões. O mal deveria virdos homens e não d’Ele. Jesus estava na posição de médico dasalmas, que vem para curar, mas cujos remédios provocam uma crisesalutar, agitando o discernimento dos enfermos morais.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM383

NÃO PÔR A LUZ DEBAIXO DO VELADOR

384

LUZ SOB O VELADOR.JESUS FALAVA POR PARÁBOLAS

1. Nem se acende a candeia e se coloca debaixo do alqueire,mas no velador, e dá luz a todos os que estão em casa. (Mateus, capítulo5, versículo 15.)

2. E ninguém, acendendo uma candeia, a cobre com algumvaso, ou a põe debaixo da cama, mas põe-na no velador, para que osque entram vejam a luz. Porque não há coisa oculta que não haja demanifestar-se, nem escondida que não haja de saber-se e vir à luz.(Lucas, capítulo 8, versículos 16 e 17.)

3. E acercando-se dele os discípulos, disseram-lhe: Por que falaspor parábolas? Ele, respondendo, disse-lhes: Porque a vós é dado conheceros mistérios do reino dos céus, mas a eles não lhes é dado; porqueàquele que não tem, até aquilo que tem lhe será tirado. Por isso lhesfalo por parábolas, porque eles, vendo, não vêem, e ouvindo não ouvemnem compreendem. E neles se cumpre a profecia de Isaías que diz:Ouvindo, ouvireis, mas não compreendereis, e, vendo, vereis, mas nãopercebereis. Porque o coração deste povo está endurecido, e ouviram demau grado com os seus ouvidos, e fecharam seus olhos, para que nãovejam com os olhos, e ouçam com os ouvidos e compreendam com ocoração e se convertam e os cure. (Mateus, capítulo 13, versículos 10 a15.)

4. Jesus diz que não se deve colocar a luz debaixo de qualquercoisa que possa esconder-lhe o brilho. No entanto, Ele mesmo

24

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM384

385CAPÍTULO XXIV

esconde, a todo momento, o sentido de suas palavras sob o véu dealegorias, que não podem ser compreendidas por todas as pessoas.

Jesus, contudo, se explica, dizendo a seus discípulos: “Eu lhesfalo por parábolas (1), porque eles não estão no estágio decompreender algumas coisas. Eles vêem, olham, ouvem e nãocompreendem. Assim, dizer-lhes tudo seria inútil neste momento.Mas, a vós eu vo-lo digo, porque a vós é dado compreender estesmistérios”. Jesus procedia, portanto, com o povo como se faz comas crianças, cujas idéias ainda não são muito desenvolvidas. Por esseseu modo de agir, Jesus revela o verdadeiro sentido da máxima:“Não se deve pôr a candeia debaixo do alqueire, mas sobre ocandeeiro, a fim de que todos os que entram possam vê-la”. Estamáxima não significa que Jesus deveria revelar todas as coisas semexaminar a capacidade de entendimento dos que o ouviam. Todoensinamento deve ser proporcional à inteligência daquele a quemse quer ensinar, porque há pessoas que, com uma luz muito forte,ficariam deslumbradas, mas não esclarecidas.

Essa ocorrência alcança os homens, no seu conjunto, assimcomo os indivíduos isoladamente considerados. O conjunto dehomens nascidos na mesma época também tem a sua fase de infânciaespiritual, a sua fase de juventude e a sua fase de maturidade. Porisso é que cada coisa lhes deve vir na fase certa em que se encontram.A semente, quando semeada fora de seu tempo certo, não germinae não dá frutos. Mas os ensinamentos que a prudência mandasilenciar num momento, cedo ou tarde serão descobertos. É que,chegando a um certo grau de desenvolvimento da inteligência e dosenso moral, os homens procuram por si mesmos a luz viva. Aobscuridade, então, lhes é incômoda.

1. Nota do Tradutor: parábolas são pequenas histórias criadas para fazerem uma

comparação entre duas situações. Desse confronto é que se deve tirar o ensinamento.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM385

NÃO PÔR A LUZ DEBAIXO DO VELADOR

386

Deus concedeu aos homens a inteligência para compreendereme para se orientarem entre as coisas da Terra e as coisas do céu e, porisso, os homens querem uma fé que raciocine. É nessa fase doraciocínio que não se deve pôr a luz do conhecimento moral debaixodo velador, porque sem a luz da razão, a fé se enfraquece. (Ver ocapítulo XIX, item 7, nesta mesma obra.)

5. Se, pois, na sua cautelosa sabedoria, a Providência Divinasomente revela as verdades gradualmente, é porque sempre retiraráo véu que as cobre à medida que os homens amadurecerem pararecebê-las. A Sabedoria Divina mantém as verdades em reserva enão debaixo do velador.

Há homens, porém, que estão na posse das verdades divinas,mas as ocultam do povo, na maior parte do tempo, com a intençãode dominá-lo. São esses, portanto, os que verdadeiramente escondema luz debaixo do velador. É por isso que todas as religiões tiveramos seus mistérios, cujo estudo minucioso proíbem. Mas, enquantoessas religiões de mistérios impenetráveis a seus crentes iam ficandopara trás, a Ciência e a inteligência avançavam e romperam o véudos mistérios da Natureza. Os homens, que se tornaram adultosespirituais, entenderam de penetrar no sentido das coisas e rejeitaramde sua fé tudo aquilo que estivesse em oposição ao que puderamobservar das leis divinas.

Não podem existir mistérios absolutos para que semantenha a fé.

Jesus está com a razão quando diz que não há nada secretoque não deva ser conhecido. Tudo o que está oculto será posto adescoberto um dia. O que o homem não pode, agora, compreendersobre a Terra lhe será progressivamente revelado nos mundos maisadiantados, à medida que ele se purificar. Aqui na Terra, o homemainda se encontra em pleno nevoeiro.

6. Pergunta-se: que proveito o povo pode extrair dessamultidão de parábolas, cujo sentido está oculto para ele?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM386

387CAPÍTULO XXIV

Observe-se que Jesus somente utilizou parábola sobrequestões que eram de difícil compreensão para a época em queensinava a sua doutrina. Mas, tendo feito da caridade para com opróximo e da humildade, a condição básica da salvação, tudo o queEle disse a esse respeito é perfeitamente claro, explícito e sem nenhumduplo sentido. Assim devia ser, porque se tratava de regras de condutamoral, regras que todos os homens deveriam compreender, parapoderem vivê-las. Isso era essencial para a multidão pouco esclarecida,para a qual Ele se limitava a dizer: “Eis o que é necessário que sefaça, para ganhar o reino dos céus”.

Sobre as outras partes de sua doutrina, Jesus só as expunha aseus discípulos, em reuniões mais íntimas. Por serem os seus discípulosmais evoluídos moral e intelectualmente, Jesus podia iniciá-los nasverdades que o povo ainda não podia entender. Eis porque Jesusdisse: “Aos que já têm, ainda mais se lhes dará e terão em abundância”.(Ver o capítulo XVIII, item 15, desta mesma obra.)

Entretanto, mesmo com os seus Apóstolos, Jesus tratou demodo vago alguns pontos de sua doutrina, cuja compreensão ficavareservada para tempos futuros. Foram essas questões que deramlugar a interpretações diversificadas, até que a Ciência, de um lado,e o Espiritismo, do outro lado, vieram revelar as novas leis da Natu-reza, cujo verdadeiro sentido tornaram compreensível.

7. O Espiritismo, hoje, vem projetar luz sobre uma porçãode pontos obscuros da doutrina de Jesus. Mas não a lança de umamaneira imprudente. Os Espíritos procedem, nas suas instruções,com uma admirável prudência. É de modo contínuo e gradual queeles têm abordado as diversas partes já conhecidas da doutrina cristãe as demais partes serão reveladas no futuro, à medida que chegue omomento certo para que elas possam sair da obscuridade para a luzdo dia. Se os Espíritos houvessem apresentado por completo, desdeo início, esses pontos da doutrina cristã, eles poderiam ser acessíveis

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM387

NÃO PÔR A LUZ DEBAIXO DO VELADOR

388

somente a um pequeno número de pessoas. Talvez, até, essasrevelações tivessem assustado aqueles que não estivessem prepara-dos moral e intelectualmente para recebê-las, o que seria prejudicialpara a sua propagação.

Se os Espíritos, portanto, não dizem tudo abertamente, nãoé porque a doutrina tenha mistérios reservados aos privilegiados,nem que os Espíritos estejam pondo a luz debaixo do velador. Éque cada coisa deve vir no tempo certo. Os Espíritos dão a cadaidéia o tempo de amadurecer e de se tornar conhecida, antes deapresentarem outras e deixam aos acontecimentos, o tempo de preparara aceitação das novas idéias.

NÃO IR AOS GENTIOS

8. Jesus enviou estes doze, e lhes ordenou, dizendo: Não ireispelo caminho dos gentios, nem entrareis em cidade de samaritanos.Mas ide antes às ovelhas perdidas da casa de Israel; e indo, pregai,dizendo: É chegado o reino dos céus. (Mateus, capítulo 10, versículos5 a 7.)

9. Jesus demonstra, em muitas circunstâncias, que a suadoutrina não se limitava apenas ao povo judeu, mas que ela sedestinava para toda a humanidade.

Se, portanto, Jesus diz a seus Apóstolos que não fossem tercom os pagãos, não foi por desdenhar da conversão deles. E issoseria até pouco caridoso de sua parte. Mas era porque os judeus,que aceitavam a idéia do Deus único e aguardavam a vinda doMessias, é que estavam preparados, pela lei de Moisés e dos profetas,para receberem a sua palavra. Entre os pagãos, faltava até mesmoessa base, e tudo ainda estava por fazer-se. Por outro lado, osApóstolos não estavam suficientemente esclarecidos para uma tarefa

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM388

389CAPÍTULO XXIV

assim tão pesada. Por isso é que Jesus lhes disse: “Ide às ovelhasdesgarradas de Israel”, ou seja, “Ide semear no terreno já preparado”.

Jesus sabia que a conversão dos gentios viria a seu tempo.Mais tarde, com efeito, em Roma, no centro do próprio paganismo,os Apóstolos foram plantar a Cruz do cristianismo.

10. Essas palavras podem ser aplicadas, também, aos adeptose propagadores do Espiritismo. Os incrédulos sistemáticos, oszombadores obstinados, os adversários que defendem interessespessoais, são para os Espíritas ativos o mesmo que os gentios forampara os Apóstolos. Que, portanto, a exemplo do que fizeram osApóstolos, os Espíritas procurem prosélitos entre pessoas de boavontade, aquelas que desejam a luz, nas quais se encontra umasemente já germinada e que são em grande número. Não se percatempo com aqueles que não querem ver, nem ouvir, e tanto seprendem mais no orgulho, quanto mais se pareça importante a suaconversão.

Mais vale abrir os olhos a cem cegos que desejam ver comclareza as coisas espirituais, que a uma só pessoa que se satisfaçacom as trevas. É que, agindo com essa prudência, o Espírita faráaumentar o número dos que sustentam a causa. Deixar os outrostranqüilos não é ser-lhes indiferentes, mas é uma boa medida. Avez deles chegará, quando forem influenciados pela opinião damaioria, por ouvirem a mesma coisa repetida por muitos à suavolta. Eles julgarão, então, que aceitam a idéia voluntariamente,por si mesmos e não sob a pressão de outros.

Em verdade, as idéias são como as sementes: não podemgerminar fora da época que lhes é própria e exigem terreno preparado.Por isso é melhor esperar o tempo propício e cultivar primeiroaquelas que estão em condições de germinar, a fim de evitar abortaras outras pela precipitação.

Na época de Jesus, e em conseqüência da visão acanhada ematerial das pessoas daquele tempo, tudo era limitado e localizado:

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM389

NÃO PÔR A LUZ DEBAIXO DO VELADOR

390

a casa de Israel era um pequenino povoado; os gentios eram pequenospovos vizinhos. Hoje as idéias ganham todo o Universo e levam aespiritualização aos povos. A nova luz não é privilégio de nenhumanação. Para ela não existem mais fronteiras. O seu foco se distribuipor toda parte e todos os homens são irmãos. Mas, também, osgentios não são mais um povo localizado numa pequena região daTerra, porém são uma opinião que se encontra em toda parte esobre a qual a verdade triunfa pouco a pouco, da mesma maneiraque o cristianismo triunfou do paganismo. E não é mais com armasde guerra que se combate o paganismo, mas é com o poder da idéiaEspírita cristã.

OS QUE PRECISAM DE MÉDICO

11. E aconteceu que, estando Jesus em casa sentado à mesa,chegaram muitos publicanos e pecadores e sentaram-se juntamentecom Ele e com seus discípulos. E os fariseus, vendo isto, disseram aosdiscípulos do Mestre: Por que come o vosso Mestre com os publicanos epecadores? – Jesus, porém, ouvindo, disse-lhes: Os sãos não têmnecessidade de médico e, sim, os doentes. (Mateus, capítulo 9, versículos10 a 12.)

12. Jesus buscava, sobretudo, os pobres e os deserdados,porque são os que mais necessitam de consolações. Buscava os cegosdóceis e de boa-fé, porque eles pedem que lhes abram os olhosespirituais. Porém, não buscava os orgulhosos, que julgam possuirtoda a luz e que julgam não necessitar de nada. (Veja na,“Introdução”, o artigo: Publicanos, Portageiros.)

Estas palavras, transcritas de Mateus, como tantas outras,encontram a sua aplicação no Espiritismo. Há quem se admire, porvezes, que a mediunidade seja concedida a pessoas indignas e capazesde fazer mau uso dessa faculdade. Costumam algumas pessoas dizer

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM390

391CAPÍTULO XXIV

que uma faculdade tão preciosa deveria ser atribuída exclusivamenteaos que tivessem mais qualidades morais.

Digamos, inicialmente, que a mediunidade é inerente a umadisposição orgânica, de que todos os homens podem ser dotados,como a faculdade de ver, de ouvir, de falar. Não há, porém, nenhumafaculdade de que o homem, em razão de seu livre-arbítrio, nãopossa abusar. E se Deus não tivesse concedido a faculdade de falar,por exemplo, a não ser para os que não dirão más coisas, teríamosmais mudos do que falantes. Deus, no entanto, concede as faculdadesao homem, dando-lhe a liberdade de usá-las, mas a Justiça Divinacobra sempre o mau uso que dela fizer a criatura humana.

Se a faculdade de comunicar-se com os Espíritos só fosseconcedida aos mais dignos, quem ousaria pretendê-la? E onde estáo limite entre a dignidade e a indignidade? A mediunidade éconcedida sem distinção de inferioridade ou superioridade moral, afim de que os Espíritos possam trazer a luz a todas as camadas, atodas as classes sociais, alcançando o pobre e o rico.

A luz para os virtuosos há de fortalecê-los no bem. A luz paraos viciosos há de corrigi-los. Não são os viciosos os doentes moraisque mais necessitam do Médico das Almas? Por que Deus, que nãoquer a morte do pecador, os privaria do socorro que os pode tirarda lama? Os bons Espíritos vêm, assim, em auxílio dos viciosos eos seus conselhos, que eles recebem diretamente, são de natureza aimpressioná-los mais vivamente do que se os recebessem de maneiraindireta. Deus, na sua bondade, para poupá-los do sacrifício de irembuscar a luz mais longe, a coloca em suas próprias mãos!

Não serão os viciosos bem mais culpados se não quiseremver a luz que recebem em si mesmos? Eles, antes dessa ocorrênciamediúnica, poderiam desculpar-se com o fato de ignorá-la. Masquando a verdade é transmitida por eles mesmos, vista com seuspróprios olhos, ouvida pelos seus próprios ouvidos, não estariampronunciando a censura que deverá despertá-los para o bem, através

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM391

NÃO PÔR A LUZ DEBAIXO DO VELADOR

392

de suas próprias bocas? Se eles não as aproveitarem para si mesmos,sofrerão com a perda e a perversão da faculdade mediúnica que lhesfoi concedida. Então, os Espíritos inferiores se apoderarão dessamediunidade para obsidiá-los e os enganar. E assim será, sem prejuízodas aflições comuns com que a Justiça Divina procura despertar osservidores indignos e os corações endurecidos pelo orgulho e peloegoísmo.

A mediunidade não implica, necessariamente, relaçõeshabituais apenas com os Espíritos Superiores. Ela é, apenas, umaaptidão para servir de intermediário, mais ou menos fácil demanejar, aos Espíritos de qualquer categoria. O bom médium nãoé, portanto, aquele que tem facilidade para as comunicações. Bommédium é aquele que é simpático aos bons Espíritos e que é poresses bons Espíritos assistido em sua mediunidade. É nesse sentidode relacionamento com os Espíritos Superiores, que as altasqualidades morais ganham importância para a mediunidade.

CORAGEM DA FÉ

13. Portanto, qualquer um que me confessar diante dos homenseu o confessarei diante de meu Pai que está nos céus. Mas qualquerum que me negar diante dos homens, eu o negarei também diantede meu Pai que está nos céus. (Mateus, capítulo 10, versículos 32 e33.)

14. Porque, qualquer que de mim e das minhas palavras seenvergonhar, dele se envergonhará o Filho do homem, quando vierna sua glória e na do Pai e dos santos anjos. (Lucas, capítulo 9, versículo26.)

15. A coragem da opinião sempre mereceu o respeito entreos homens. É uma expressão de dignidade enfrentar os perigos, asperseguições, as contradições e mesmo o simples sarcasmo, aos quais

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM392

393CAPÍTULO XXIV

se expõe aquele que não teme expor abertamente as idéias que nãosão aceitas por todas as pessoas. Aqui, como em tudo, o mérito estána razão das circunstâncias em que as idéias são expostas e nasconseqüências que resultam dessa atitude de sua propagação. Hásempre fraqueza moral quando alguém recua diante das conseqüênciasde sustentar a sua opinião e de renegá-la. Há casos em que essaomissão ou recuo equivale a uma covardia tão grande, quanto a defugir no momento dos desafios da vida.

Jesus censura essa covardia, no que se refere especialmente asua doutrina, ao dizer que, se alguém se envergonhar de suas palavras,Ele se envergonhará também dessa pessoa; que renegará aquele queO houver renegado; que aquele que o confessar diante dos homens,Ele o reconhecerá diante de seu Pai que está nos céus. Em outrostermos, Jesus disse: Aqueles que tiverem receio de se confessaremdiscípulos da verdade, não são dignos de serem admitidos no mundoda verdade. Eles perderão o beneficio de sua fé, porque esta é umafé egoísta, que eles guardam para si próprios, ocultando-a, commedo do que possa prejudicá-los em seus interesses pessoais nestemundo.

Ganharão os benefícios de sua fé, todos aqueles que colocama idade acima de seus interesses materiais e a proclamamabertamente, trabalhando ao mesmo tempo para o seu futuroespiritual e pelo futuro espiritual dos outros.

16. Assim será, também, com os adeptos do Espiritismo. Éque a doutrina Espírita não é nenhuma doutrina nova, mas é tão-somente o desenvolvimento e a aplicação da doutrina do Evangelho.E, por isso, aos Espíritas, também, se dirigem as palavras do Cristo.Eles semeiam sobre a Terra o que recolherão na vida espiritual. Lá,na vida espiritual, os Espíritas colherão os frutos da sua coragem ouda sua fraqueza moral.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM393

NÃO PÔR A LUZ DEBAIXO DO VELADOR

394

CARREGAR A CRUZ.SALVAR A VIDA

17. Bem-aventurados sereis quando os homens vos odiarem equando vos separarem e vos injuriarem e rejeitarem o vosso nomecomo mau, por causa do Filho do homem. Alegrai-vos nesse dia,exultai, porque eis que grande é o vosso galardão no céu, pois assimfaziam os seus pais aos profetas. (Lucas, capítulo 6, versículos 22 e23.)

18.E chamando a si a multidão, com os seus discípulos, disse-lhes: Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome asua cruz e siga-me. Porque aquele que quiser salvar a sua vida, aperderá e qualquer que perder a sua vida por amor a mim e doEvangelho, esse a salvará, pois que aproveitaria ao homem ganhartodo o mundo e perder a sua alma? (Marcos, capítulo 8, versículos 34a 36; Lucas, capítulo 9, versículos 23 a 25; Mateus, capítulo 10,versículo 39 e João, capítulo 12, versículos 24 e 25.)

19. Alegrai-vos muito, disse Jesus, quando os homens vosodiarem e vos perseguirem por minha causa, porque sereisrecompensados no céu. Estas palavras podem ser traduzidas doseguinte modo: “Sede felizes quando os homens, pela má vontadeque vos demonstrarem, vos derem oportunidade de provar asinceridade de vossa fé. O mal que eles vos façam resultará emestímulo para a vossa evolução espiritual. Lamentai a cegueira dosque vos perseguem, mas não os condeneis”.

Após isso, Jesus acrescenta: “Aquele que quiser me seguir,tome a sua cruz”, ou seja, que suporte corajosamente as contrariedadesque a sua fé provocar. E que aquele que quiser salvar a sua vida e osseus bens materiais, em me renunciando, perderá as vantagens doreino dos céus, enquanto que aqueles que houverem tudo perdidoneste mundo, mesmo a própria vida física, para a vitória da verdade,receberão na vida espiritual o prêmio de sua coragem, de sua

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM394

395CAPÍTULO XXIV

perseverança e de sua abnegação. Mas aos que sacrificam os benscelestiais aos prazeres terrenos, Deus lhes dirá: “Já recebestes a vossarecompensa”.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM395

BUSCAI E ACHAREIS

396

AJUDA-TE E O CÉU TE AJUDARÁ

1. Pedi e vos será dado; buscai e encontrareis; batei e se abrirápara vós. Porque todo aquele que pede, recebe; e o que busca encontra,e ao que bate, se abre. E qual dentre vós é o homem que, pedindo-lhepão o seu filho, lhe dará uma pedra? E pedindo-lhe peixe, lhe daráuma serpente? Se vós, pois, sendo maus, sabeis dar boas coisas aos vossosfilhos, quanto mais vosso Pai, que está nos céus, dará bens aos que lhepedirem? (Mateus, capítulo 7, versículos 7 a 11.)

2. Segundo a visão terrena do homem, a máxima: Buscai eachareis é semelhante a esta outra: Ajuda-te que o céu te ajudará.Este é o princípio da lei do trabalho e, por conseqüência, da lei doprogresso, porque a evolução é filha do trabalho, uma vez que otrabalho desperta as forças da inteligência.

Na infância espiritual da humanidade, o homem emprega asua inteligência na busca do alimento, dos meios de preservar-se domau tempo e de se defender de tudo o que ameace a suasobrevivência. Mas Deus lhe deu, mais que aos animais irracionais,o desejo constante do melhor. E esse desejo do melhor é o que o levaa estudar os meios de melhorar a sua situação. É o que o conduz àsdescobertas, às invenções, ao aperfeiçoamento das Ciências, porquea Ciência é que lhe proporciona o que lhe falta.

É por efeito das pesquisas a que se obriga, que a inteligênciado homem se desenvolve e que a sua evolução moral se processa.Após as necessidades do corpo físico, surgem as necessidades do

25

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM396

397CAPÍTULO XXV

espírito. Após a busca dos bens e do conforto materiais, torna-senecessária a busca dos bens e do conforto espirituais. E é por essesciclos de desenvolvimento, que o homem transita da selvageria paraa civilização.

Mas a evolução que cada homem realiza individualmentedurante a sua existência terrena é quase insignificante. É quase nempercebida em grande número de homens. De que modo, então, ahumanidade poderia evoluir, sem a preexistência e a sobrevivênciada alma? Se as almas todos os dias deixassem a Terra, para não maisvoltarem a viver aqui as que passaram pela Terra, a humanidadeseria permanentemente formada com seres primitivos. Esses seresteriam tudo por fazer em si mesmos, teriam tudo a aprender apartir de suas necessidades rudimentares.

Se assim fosse, não haveria justificativa para que o homemestivesse, hoje, mais adiantado que os homens das primeiras erasdeste nosso mundo. É que a cada nascimento de uma criatura, todoo trabalho intelectual teria de ser recomeçado.

A alma, porém, adquirindo experiências numa existência e,após a desencarnação, voltando para uma nova existência no corpofísico, com o progresso que realizou na encarnação anterior, e ad-quirindo nesta nova existência alguma experiência a mais, vaipermitindo que, gradativamente, se passe do estágio primitivo parao de uma civilização material e desta para a civilização moral. (Veja ocapítulo IV, item 17, desta mesma obra.)

3. Se Deus tivesse liberado o homem do trabalho físico, seusmembros se atrofiariam. Se Ele o tivesse liberado do trabalho dainteligência, o espírito do homem permaneceria na infância, nascondições próprias dos instintos animais. Por isso é que Deus fezdo trabalho uma necessidade e disse ao homem: “Busca e acharás;trabalha e produzirás. De algum modo, tu serás o produto de tuasobras. Terás o mérito de teu trabalho. Serás recompensado segundoo que hajas feito”.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM397

BUSCAI E ACHAREIS

398

4. É pela necessidade da vivência desses princípios da lei dotrabalho, que os Espíritos Superiores não vêm poupar o homem desuas atividades de pesquisas, trazendo-lhe descobertas e invençõestodas já feitas e prontas para serem utilizadas. Se fizessem o contrário,os homens só teriam de tomá-las nas sua mãos, sem nem sequer oincômodo de um leve esforço, nem mesmo o esforço de pensar. E,se assim fosse, o mais preguiçoso poderia enriquecer-se e o maisignorante poderia tornar-se sábio ao preço de nada, e ambos seatribuiriam o mérito daquilo que nenhum deles fez.

Não! Os Espíritos Superiores não vêm liberar o homem da leido trabalho, mas lhe demonstrar a meta que ele deve atingir e ocaminho que a ela conduz, dizendo-lhe: Siga adiante e chegarás.Encontrarás pedras na tua caminhada. Afasta-as por teu próprio esforço.Nós te daremos a energia necessária, se quiseres empregá-la para a tuaprópria realização”. (Veja em O Livro dos Médiuns, cap. XXVI,questão 291 e seguintes.)

5. Segundo a interpretação moral, estas palavras de Jesussignificam: Peça a luz que deverá iluminar o seu caminho e ela lheserá dada; peça a força para resistir ao mal e você a terá; peça oamparo dos bons Espíritos e eles virão acompanhá-lo e, como sefossem os protetores espirituais de Tobias, eles lhe servirão deorientadores morais; peça-lhes os bons conselhos e eles jamais lheserão recusados. Bata à nossa porta e ela lhe será aberta.

Mas, sempre que pedir, peça sinceramente, com fé, com fervore confiança. Apresente-se, no seu pedido, com humildade e nãocom arrogância, sem o que você será abandonado às suas própriasforças. E as próprias quedas que você sofrer serão a conseqüência deseu orgulho.

Este é o sentido dessas palavras: “Buscai e achareis, batei e seabrirá para vós”.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM398

399CAPÍTULO XXV

OLHAI AS AVES DO CÉU

6. Por isso vos digo: Não andeis cuidadosos quanto à vossa vida,pelo que haveis de beber, nem quanto ao vosso corpo, pelo que haveisde vestir. Não é a vida mais do que o alimento e o corpo mais do quea roupa? Olhai as aves do céu, que nem semeiam, nem segam, nemajuntam em celeiros e vosso Pai Celestial as alimenta. Não tendes vósmuito mais valor do que elas? E qual de vós poderá, com todos os seuscuidados, acrescentar um côvado à sua estatura? E, quanto àsvestimentas, por que andais aflitos? Olhai para os lírios do campo,como eles crescem: não trabalham nem fiam. E eu vos digo que nemmesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer umdeles. Pois se Deus assim veste a erva do campo, que hoje existe, eamanhã será lançada ao fogo, não vos vestirá muito mais a vós, homensde pouca fé? Não andeis inquietos, dizendo: ‘O que comeremos, ou‘O que beberemos ou com que nos vestiremos?’ Porque estas coisas osgentios procuram. Decerto que vosso Pai celestial bem sabe quenecessitais de todas estas coisas, mas, buscai primeiramente o reino deDeus e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas. Nãovos inquieteis, pois, pelo dia de amanhã, porque o dia de amanhãtrará seu cuidado. Basta para cada dia a sua própria aflição. (Mateus,capítulo 6, versículos 25 a 34.)

7. Estas palavras de Jesus, interpretadas somente nas letras,seriam a negação de toda previdência, de todo trabalho e, porconseqüência, a negação de todo progresso. Se aceitasse um princípiocomo esse, o homem se reduziria a uma passividade improdutiva.Suas forças físicas e intelectuais não entrariam em funcionamento.Se essa tivesse sido a sua condição normal na Terra, ele não emergiriajamais de seu estágio de um ser primitivo e, se dessa condição ohomem fizesse a sua lei atual, a ele só caberia viver sem fazer coisaalguma.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM399

BUSCAI E ACHAREIS

400

Esse não poderia ter sido o pensamento de Jesus, porque talprincípio seria uma contradição com o que Ele disse outras vezes euma negação das próprias leis da Natureza.

Deus criou o homem sem roupas e sem abrigo mas lhe deu ainteligência para que as produzisse, a fim de atender as suasnecessidades naturais. (Veja capítulo XIV, item 6 e o item 2 destecapítulo.)

Não se deve, portanto, ver nestas palavras mais que umaalegoria poética da Providência Divina, que não abandona nuncaaqueles que nela confiam. Quer a Providência Divina, no entanto,que os que nela confiem, também cumpram com a lei do trabalho.E por isso é que a Providência, se nem sempre os socorre com umadireta ajuda material, inspira-lhes as idéias com as quais elesencontram os meios de eles mesmos saírem de suas dificuldades.(Veja o capítulo XXVII, item 8, nesta mesma obra.)

Deus conhece as nossas necessidades.O Pai nos atende, segundo aquilo que nos é necessário, tendo

em vista a nossa destinação espiritual.O homem, porém, insaciável nos seus desejos, nem sempre

sabe contentar-se com o que tem. O necessário não lhe basta. Elequer também o supérfluo, que diz ser necessário. É, então, que aJustiça Divina o leva a sofrer as conseqüências de seus caprichos, afim de que isso lhe sirva de lição para o futuro. (Ver capítulo V,item 4, nesta mesma obra.)

8. A Terra produzirá o suficiente para alimentar todos os seushabitantes quando os homens souberem administrar os bens que aTerra lhes dá, segundo as leis da justiça, da caridade e do amor aopróximo. Quando a fraternidade governar os diversos povos, comose fossem cidades de um mesmo país, o excesso de produção dealimentos num desses povos suprirá a falta de alimentos num outrodesses povos. E, assim, a ninguém faltará o necessário.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM400

401CAPÍTULO XXV

O homem rico, então, se considerará como alguém que temuma grande quantidade de sementes. Se ele as distribuir em outrasmãos, essas sementes produzirão o cêntuplo, tanto para ele quantopara os outros. Mas, se ele comer sozinho essas sementes, se asdesperdiçar e deixar que se perca o excedente do que haja comido,elas não produzirão coisa alguma e todos ficarão em necessidade.Se esse rico trancar as sementes em seu armazém, os vermes asdevorarão.

Eis porque Jesus disse: “Não amontoeis tesouros na Terra,pois que são perecíveis, mas ajuntai os vossos tesouros no céu, porquesão eternos”. Em outros termos, Jesus disse: “Não deis aos bensmateriais mais valor que aos bens espirituais e sabei sacrificar osprimeiros em favor dos segundos”. (Veja capítulo XVI, item 7 eseguintes, nesta mesma obra.)

Não é com leis humanas que se decretam a caridade e afraternidade. Se essas virtudes não estiverem nos corações doshomens, o egoísmo dominará sempre os sentimentos. Fazer essasvirtudes penetrar nos corações dos homens, eis o que é a obra doEspiritismo.

FADIGA PELO OURO

9. Não possuais ouro, nem prata, nem cobre, em vossos cintos.Nem leveis alforjes para o caminho, nem duas túnicas, nem alpargatas,nem bordão, porque digno é o trabalhador do seu alimento (Mateus,capítulo 10, versículos 9 e 10.)

10. E, em qualquer cidade ou aldeia em que entrardes, procuraisaber quem nela seja digno, e hospedai-vos aí, até que vos retireis. E,quando entrardes em alguma casa, saudai-a. E se a casa for digna,desça sobre ela a vossa paz, mas, se não for digna, torne para vós a

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM401

BUSCAI E ACHAREIS

402

vossa paz. E se ninguém vos receber, nem escutar as vossas palavras,saindo daquela casa ou cidade, sacudi o pó de vossos pés.

Em verdade vos digo que, no dia do juízo, haverá menos rigorpara o país de Sodoma e Gomorra do que para aquela cidade. (Mateus,capítulo 10, versículos 11 a 15. )

11. Estas palavras que Jesus dirigiu a seus Apóstolos, ao enviá-los, pela primeira vez, para anunciar a Boa-Nova, nada continhamde estranho naquela época. Estavam dentro dos costumes patriarcaisdo Oriente, onde os viajantes eram bem recebidos nas suas moradias.

Os viajantes, então, eram poucos.Entre os povos modernos, o aumento das viagens criou novos

costumes de hospedagem. Só encontramos, agora, aqueles hábitosde hospedagem dos tempos antigos, em países distantes, onde ogrande movimento de viajores ainda não penetrou. Se Jesus voltassehoje à Terra, não poderia mais dizer a seus Apóstolos: “Ponde-vos acaminho sem provisões”.

Ao lado do sentido próprio, estas palavras de Jesus têm umsentido moral muito profundo. Com elas Jesus ensinava seusdiscípulos a se entregarem à ação da Providência Divina. É que eles,nada tendo, não despertariam a cobiça daqueles que os acolhessem.Esse era um meio de distinguir, entre os que os receberiam, oscaridosos dos egoístas. Por isso Jesus lhes disse: “Procurai saber quemé digno de vos acolher”, ou seja, procurem distinguir quem é bastantehumano para albergar o viajor que não lhe poderá pagar. Será poressa qualidade da alma que vocês conhecerão quais estão emcondições espirituais de ouvir as palavras da Boa Nova. É pelacaridade que vocês os reconhecerão.

Quanto aos que não os quisessem receber, nem os escutar,recomendou Jesus a seus Apóstolos que os amaldiçoassem? Teriarecomendado que os constrangessem com a Boa-Nova, que usassemde violência moral para os converter? Não! Jesus recomendou-lhes,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM402

403CAPÍTULO XXV

pura e simplesmente, que se retirassem e fossem à procura de pessoasde boa vontade.

O mesmo diz, hoje, o Espiritismo a seus adeptos: “Nãoviolentem a consciência religiosa de ninguém. Não constranjamninguém a deixar a crença que abraça para adotar a de vocês. Nãolancem nenhuma condenação sobre aquele que não pensa comovocês e deixem em serenidade aqueles que os repelem. Lembrem-sedestas palavras do Cristo: ‘Antes da Boa-Nova, o céu era tomadopela violência, mas hoje o será pela brandura’”. (Veja capítulo IV,itens 10 e 11, nesta mesma obra.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM403

DAI DE GRAÇA O QUE DE GRAÇA RECEBESTES

404

DOM DE CURAR

1. Curai os enfermos, limpai os leprosos, ressuscitai os mortos,expulsai os demônios, mas dai de graça o que de graça recebestes.(Mateus, capítulo 10, versículo 8.)

2. “Dai de graça o que haveis recebido de graça”, diz Jesus aseus discípulos. Por esse ensinamento, Ele ordena de maneira ex-pressa que nenhuma pessoa deve receber pagamento por aquilo queela mesma não pagou. Ora, o que os discípulos haviam recebido degraça, sem nenhum pagamento, era a faculdade de curar os doentese de afastar os Espíritos perturbadores, ou seja, de afastar dosobsidiados os Espíritos obsessores.

Esse dom lhes fora dado gratuitamente por Deus para aliviaros que sofriam e para ajudar a propagação da fé cristã. Jesus lhes dizque não façam dessa faculdade um comércio, nem se valham delapara tirar vantagens pessoais e que nem a transformem num meiode vida.

PRECES PAGAS

3. E, ouvindo-o todo o povo, disse Jesus aos seus discípulos:Guardai-vos dos escribas, que querem andar com trajes compridos eamam as saudações nas praças e querem os principais assentos nassinagogas e os primeiros lugares nos banquetes. Eles devoram a casa

26

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM404

405CAPÍTULO XXVI

das viúvas, fazendo, como pretexto, longas orações. Estes receberão maiorcondenação. (Lucas, capítulo 20, versículos 45 a 47; Marcos 12,versículos 38 a 40 e Mateus 23 versículo 14.)

4. Jesus também disse: “Não façais que paguem pelas vossaspreces; não façais como os escribas que, sob a desculpa de longas preces,devoram as casas das viúvas”, ou seja, apoderam-se astuciosamente dosbens dos que sofrem.

A prece é um ato de caridade, um impulso do coração. Cobrarpelas preces que dirigimos a Deus, a pedido de outras pessoas, serianos transformarmos em intermediários assalariados. A prece, então,passa a ser uma espécie de requerimento que será cobrado de acordocom o seu tamanho.

Ora, de duas coisas, apenas uma é certa: Deus mede ou nãomede as suas graças pelo número de palavras contadas em cadaoração. Se fossem necessárias muitas palavras para obter uma graçadivina, por que dizê-la com um pequeno número, ou quasenenhuma palavra, para aqueles que não podem pagá-la? Isso é umafalta de caridade! E se uma só palavra basta para uma prece, as demaisserão inúteis e, então, por que cobrá-las? Isso é faltar com o deverda caridade por má-fé.

Deus não vende os benefícios que concede.Por que, então, aquele que nem é mesmo o distribuidor dos

benefícios, que nem pode garantir que esses benefícios serãoconcedidos, cobra um preço por um pedido que pode não ternenhum efeito? Deus não pode estabelecer a dependência de umato de clemência, de bondade ou de justiça, que se pede de suamisericórdia, a um valor em dinheiro.

Se Deus assim o fizesse, isso resultaria em que, se não houvessepagamento pela prece ou se o valor pago fosse pouco, a justiça, abondade e a clemência de Deus ficariam em suspenso! A razão, obom senso, a lógica dizem que Deus, a perfeição absoluta, não pode

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM405

DAI DE GRAÇA O QUE DE GRAÇA RECEBESTES

406

transmitir poderes a criaturas imperfeitas, para que estas tenham odireito de criar uma tabela de preços para a Justiça Divina!

A Justiça Divina é como o Sol. Ela se estende sobre todas aspessoas, tanto sobre os pobres, quanto sobre os ricos, sem fazerdistinção de nenhuma natureza.

Se consideramos imoral fazer negócios fraudulentos com asautoridades públicas que governam a Terra, seria moral negociarcom as graças que podem vir do Soberano do Universo?

As preces pagas têm um outro inconveniente.Aquele que as compra se julga, muitas vezes, dispensado de

ele próprio fazer a sua oração. Ele se considera livre dessa obrigação,desde que já fez o pagamento da prece. Sabe-se, no entanto, que osEspíritos são sensibilizados pelo fervor do pensamento daquele quese interessa por eles. E qual pode ser o fervor daquele que paga a umterceiro para orar por ele? E que fervor tem esse terceiro que vendeua oração? E que fervor terá esse terceiro, quando transferir para umoutro a obrigação de orar, no lugar de quem pagou a prece, e esseterceiro ainda transfere essa obrigação a um outro? Não será issoreduzir a prece a uma espécie de dinheiro falso sem nenhum valor?

VENDILHÕES EXPULSOS DO TEMPLO

5. E vieram a Jerusalém. E Jesus, entrando no templo, começou aexpulsar os que vendiam e compravam no templo. E derrubou as mesasdos cambistas e as cadeiras dos que vendiam pombas. E não consentiaque ninguém levasse algum vaso pelo templo. E os ensinava dizendo:Não está escrito: A minha casa será chamada por todas as nações decasa de oração? Mas vós fizestes dela um covil de ladrões. E os escribase sacerdotes, tendo ouvido isto, buscavam ocasião para o matar, poiseles o temiam, porque toda a multidão admirava a sua doutrina.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM406

407CAPÍTULO XXVI

(Marcos, capítulo 11, versículos 13 a 18; Mateus, capítulo 21, versículos12 e 13.)

6. Jesus expulsou os vendilhões do templo. Por esse fato, oMestre condena a comercialização das coisas santas sob qualquerforma que seja feita. Deus não vende nem a sua bênção, nem o seuperdão, nem o ingresso para entrar no reino dos céus. O homem,por conseguinte, não tem o direito de cobrar coisa alguma pelo queé concessão divina.

MEDIUNIDADE GRATUITA

7. Os médiuns de hoje em dia – uma vez que os Apóstolosdo Cristo também tinham mediunidade –, como os discípulos deJesus, receberam de Deus um dom gratuito. É o de serem intérpretesdos Espíritos, a fim de instruírem os homens, para demonstrar-lhes o caminho do bem e levá-los à consolação da fé. Não foi, paraesses médiuns, concedido o dom para que vendam a palavra quenão lhes pertence. As mensagens que os médiuns intermedeiamnão se originam nem de suas pesquisas, nem de seu trabalho pessoal.

Deus quer que a luz seja para todos.O Pai não quer que o mais pobre seja deserdado de sua luz e

possa dizer: “Eu não tenho fé, porque não tive dinheiro para comprá-la. Eu não tive a consolação de receber o encorajamento e asdemonstrações de afeto daqueles por quem choro, porque eu soupobre”.

Eis porque a mediunidade não é privilégio de alguns e seencontra entre todos os homens. Cobrar pelo exercício da mediunidadeseria, portanto, desviá-la de seus fins providenciais.

8. Quem conhece as condições em que os bons Espíritos secomunicam, sabe a aversão que eles sentem por todo e qualquerinteresse egoístico. Sabe, também, que pouca coisa é suficiente para

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM407

DAI DE GRAÇA O QUE DE GRAÇA RECEBESTES

408

que eles se afastem. E, tudo isso sabendo, não poderá jamais admitirque os Espíritos Superiores estejam à disposição da primeira pessoaque apareça e os convoque às comunicações com uma tabela depreços na mão.

O simples bom senso rejeita essa idéia.Não seria, também, um desrespeito querermos chamar para

comunicações, a um preço determinado, os seres que respeitamos eque são amados pelos nossos corações? Não há dúvida de que, assim,poderemos obter as manifestações dos Espíritos, mas quem, nospoderia garantir a autenticidade do comunicante? Os Espíritoslevianos, mentirosos, brincalhões e toda a multidão de Espíritosinfelizes, e que são de pouco escrúpulo, atendem sempre. Estes é queestão sempre prontos a responder a tudo o que lhes perguntarem,sem se preocuparem com a verdade.

Aquele, portanto, que deseja comunicações espirituais sérias,deve primeiramente procurá-las com seriedade. Deverá instruir-sesobre a natureza das ligações do médium com os seres do mundoespiritual, uma vez que a primeira condição para se conseguir oafeto dos bons Espíritos é a humildade, o devotamento, a abnegaçãoe o mais completo desinteresse moral e material do médium.

9. Ao lado da questão moral, apresenta-se uma outra consideraçãonão menos importante. E a que se refere à própria natureza dafaculdade mediúnica. A mediunidade séria não pode ser e nem jamaisserá uma profissão. Profissionalizá-la seria desacreditá-la moralmentee levá-la a confundir os médiuns com os que lêem a sorte. Mas,existe, contra isso, ainda uma outra dificuldade material. É que amediunidade é uma faculdade essencialmente instável, fugidia,variável, com a qual ninguém pode contar na certa.

A mediunidade será, portanto, para quem pretenda explorá-la profissionalmente, um campo feito de incertezas, que lhe poderáfaltar no momento em que lhe seria o mais necessário. Ela é bemdiferente dos talentos adquiridos pelo estudo e pelo trabalho e que,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM408

409CAPÍTULO XXVI

pela sua própria origem, é um patrimônio do qual é lícito tirar-seproveito pessoal. Mas a mediunidade, em si, não é uma arte, nemum talento do médium e, por isso, não pode tornar-se uma profissão.Ela não existe sem a participação dos Espíritos. Se os Espíritos sefizerem ausentes, não há mais fenômeno mediúnico. Poderá, então,a aptidão mediúnica continuar existindo, mas o seu exercício estaráanulado.

Não há um único médium no mundo que possa garantir aobtenção de um fenômeno mediúnico no momento em que elequiser. Explorar a mediunidade é, por conseqüência, querer disporde uma coisa que realmente não pertence ao médium.

Afirmar o contrário é enganar os que pagam. E, ainda, hámais: não é de si mesmo que o explorador necessitará para ofenômeno. Ele precisará contar com os Espíritos, com as almas dosdesencarnados, cuja colaboração é posta numa tabela de preços.

Esta idéia causa uma repugnância instintiva!Foi esse comércio, degenerado em abuso, explorado pelo

charlatanismo, pela ignorância, pela credulidade e pela superstição,que levou Moisés a proibi-lo. O Espiritismo atual, compreendendoo lado sério dessas questões, para desacreditar aqueles que se lançama este tipo de exploração dos incautos, elevou a mediunidade àcategoria de missão. (Ver em O Livro dos Médiuns, o capítulo XXVIIIe na obra O Céu e o Inferno, o capítulo XI.)

10. A mediunidade é um dom sagrado, que deve ser praticadosagradamente, religiosamente. Se há um gênero de mediunidadeque requer esta condição de um modo ainda mais total, essa é amediunidade de cura.

O médico humano dá o produto de seus estudos, que sãofeitos ao peso de sacrifícios por vezes penosos. O magnetizador doaseu próprio fluido e, não raro, a sua própria saúde.

Estes dois podem pôr preços em seus serviços.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM409

DAI DE GRAÇA O QUE DE GRAÇA RECEBESTES

410

Já o médium de cura transmite o fluido salutar dos bonsEspíritos. Isto ele não tem o direito de vender. Jesus e seus Apóstolos,embora fossem pobres, nada cobravam das curas que operavam.

Que aquele, pois, que não tem do que viver, procure os recursosque necessita no campo do trabalho, mas nunca na mediunidade.Que ele consagre à mediunidade, se assim for preciso, apenas otempo de que possa dispor materialmente. Os Espíritos levarão emconta o seu devotamento e os seus sacrifícios pessoais, mas seafastarão daqueles que esperam fazer deles degraus de uma escadapara alcançar os seus objetivos comerciais.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM410

411CAPÍTULO XXVI

QUALIDADES DA PRECE

1. E, quando orares, não sejas como os hipócritas, pois secomprazem em orar em pé nas sinagogas, e nas esquinas das ruas, paraserem vistos pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam oseu galardão. Mas tu, quando orares, entra no teu aposento e fechandoa tua porta, ora a teu Pai que está em oculto. E teu Pai, que te vêsecretamente, te recompensará. E, orando, não useis de vãs repetições,como os gentios, que pensam que, por muito falarem, serão ouvidos.Não te assemelhes a eles, porque o teu Pai sabe o que te é necessário,antes de lhe pedires. (Mateus, capítulo 6, versículos 5 a 8.)

2. E, quando estiverdes orando, perdoai, se tiverdes algumacoisa contra alguém, para que o vosso Pai, que está nos céus, vos perdoeas vossas ofensas. Mas, se vós não perdoardes, também o vosso Pai nãovos perdoará as vossas ofensas. (Marcos, capítulo 11, versículos 25 e26.)

3. E disse Jesus também esta parábola a uns que confiavam emsi mesmos, crendo que eram justos, e desprezavam os outros: Doishomens subiram ao templo para orar, um fariseu e o outro umpublicano. O fariseu, estando de pé, orava consigo desta maneira: ÓDeus, graças te dou, porque não sou como os demais homens ladrões,injustos, adúlteros, nem sou como este publicano. Jejuo duas vezes porsemana e dou os dízimos de tudo quanto possuo. – O publicano, porém,estando em pé, de longe nem ainda queria levantar os olhos ao céu,mas batia no peito, dizendo: Ó Deus, tem misericórdia de mim,

27

CAPITULO XXVII

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM411

PEDI E OBTEREIS

412

pecador! – Digo-vos que o publicano desceu justificado para sua casa enão o fariseu, porque qualquer um que a si se exalta será humilhadoe qualquer que a si mesmo se humilha será exaltado. (Lucas, capítulo18, versículos 9 a 14.)

4. As condições da prece são claramente definidas por Jesus.Quando você orar – diz Jesus –, não se coloque onde todos o vejam,mas ore no silêncio de seu coração. Não finja orar muito, porquenão será pela quantidade de palavras que você se fará ouvido. Vocêserá ouvido pela sua sinceridade. Antes de orar, se você tiver algumacoisa contra alguém, perdoe-lhe, porque a prece não pode seragradável a Deus, se ela não nascer de um coração despojado detodo sentimento contrário à caridade. Ore, enfim, com a humildadedo publicano e não com o orgulho do fariseu. Analise os seuspróprios defeitos, sem querer destacar as suas qualidades e, se vocêse comparar com alguma pessoa, procure o que existe de mau emvocê mesmo. (Veja o capítulo X, itens 7 e 8, nesta mesma obra.)

EFICÁCIA DA PRECE

5. Por isso vos digo que tudo o que pedirdes, orando, crede queo recebereis, e tê-lo-eis. (Marcos, capítulo 11, versículo 24.)

6. Há pessoas que contestam a eficácia da prece. Para isso,elas se fundamentam no princípio de que Deus, conhecendo nossasnecessidades, faz inútil que as exponhamos. Acrescentam, ainda,que tudo estando regido no Universo por leis eternas, os nossospedidos não podem mudar os desígnios de Deus.

Sem dúvida alguma que há leis naturais e imutáveis que Deusnão pode mudar segundo os caprichos de cada um. Mas, daí a julgarque todas as circunstâncias da vida estão sujeitas a uma fatalidade, adistância é grande. Se fosse dessa forma, o homem seria um simples

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM412

413CAPÍTULO XXVII

instrumento passivo, sem livre-arbítrio e sem direito a ter iniciativasdiante de acontecimentos favoráveis ou desfavoráveis.

Neste caso, ao homem nada mais caberia do que curvar acabeça diante dos acontecimentos, sem procurar evitá-los. Nãodeveria procurar desviar-se dos perigos.

Deus não deu ao homem o entendimento e a inteligência,para que não se servisse dessas qualidades. Deus não lhe deu a vontadepara o não querer e nem a atividade para cair na inanição.

O homem, estando livre para agir, tomará resoluções boasou más. E seus atos têm, para ele mesmo e para as outras pessoas, asconseqüências boas ou más do que ele faz ou deixa de fazer. Pordecorrência de sua iniciativa, há acontecimentos que escapamforçosamente da fatalidade. Essa ocorrência, no entanto, não quebraa harmonia das leis universais, da mesma maneira que fazer avançarou retardar os ponteiros de um relógio não anula a lei do movimentosobre o qual foi criado o seu mecanismo.

Deus pode, portanto, concordar com certos pedidos semalterar a imutabilidade das leis que regem o conjunto da vida. Maso atendimento dependerá sempre dos fundamentos da JustiçaDivina.

7. Seria, portanto, falta de juízo concluir desta máxima:“Aquilo que pedirdes pela prece, vos será concedido”, que bastapedir para receber. E injusto é acusar a Providência Divina se nãosão concedidos todos os pedidos que se fazem, porque ela sabe,melhor do que nós, o que é necessário para o nosso bem espiritual.

A Providência Divina procede como um pai sábio que nega aseus filhos aquilo que seja contrário a seus verdadeiros interesses.

O homem, geralmente, só vê o momento presente.Se o sofrimento, porém, é útil para a criatura, tendo em vista

a sua felicidade futura, Deus o deixará sofrer, assim como faz umcirurgião que deixa um doente sofrer com uma operação que devetrazer-lhe a cura.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM413

PEDI E OBTEREIS

414

O que Deus concederá, se o homem pedir com confiança é acoragem, a paciência e a resignação. Também lhe concederá os meiosde ele mesmo sair das dificuldades, com a ajuda de idéias que faráque os bons Espíritos lhe sugiram intuitivamente, deixando-lhe omérito de colocá-las em prática.

A Providência Divina ampara aqueles que se ajudam a simesmos, segundo esta máxima: “Ajuda-te e o céu te ajudará”. AProvidência Divina não poderá, portanto, ajudar aqueles que tudoesperam de um socorro alheio, sem usarem as suas próprias faculdades.Mas, na maioria das vezes, preferimos ser atendidos por um milagre,sem empregarmos o mínimo esforço para fazermos que as leisdivinas funcionem em nosso próprio benefício. (Veja o capítuloXXV, item 1 e seguintes, desta mesma obra.)

8. Tomemos um exemplo, para esclarecer esses princípios.Um homem se perdeu num deserto.Ele sofre uma terrível sede. Sente-se desfalecer e se deixa cair

na areia escaldante.Ele pede a Deus que o socorra e espera.Porém, nenhum anjo do céu lhe vem dar água para beber.

No entanto, um bom Espírito lhe sugere a idéia de levantar-se tomarum dos rumos que tem diante de si. Então, por um movimentoinstintivo, reúne todas as suas forças, soergue-se e avança aparentementesem rumo certo.

Alcançando uma elevação, descobre ao longe um regato. Aovê-lo ganha coragem. Se ele tem fé, exclamará: “Obrigado, meuDeus, pela idéia que me inspiraste!”. Se, porém, ele não tiver fé,dirá para si mesmo: “Que boa idéia eu tive! Que sorte a minha detomar o rumo à direita, ao invés da esquerda! O acaso, algumasvezes, nos socorre muito bem! Quanto me felicito pela minhacoragem e por não me haver deixado abater”.

Mas – dirão alguns –, por que o bom Espírito não lhe disseclaramente: “Siga nessa direção e, no fim, encontrarás o de que

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM414

415CAPÍTULO XXVII

necessitas”? Por que não se materializou para guiá-lo e sustentá-lono seu abatimento? Dessa maneira – concluirão alguns – ele ficariaconvencido do socorro da Providência Divina!

Reflitamos com mais profundidade!Agindo através da inspiração, a Providência Divina estava a

ensinar-lhe que é necessário ajudar a si mesmo para superar asadversidades e a fazer uso de suas próprias forças. Além disso, ele,pela incerteza de receber o socorro pedido, submete-se à prova deconfiança e de submissão aos desígnios divinos.

Esse homem está na situação da criança que caiu e que, vendoaproximar-se alguma pessoa, põe-se a gritar e fica à espera de que avenham levantar e, se não vê pessoa alguma por perto, faz esforçospor si mesma e se levanta sozinha.

Se o Espírito de Luz que acompanhou Tobias lhe tivesse dito:“Fui enviado por Deus para te guiar na tua viagem e te preservar detodo perigo”, Tobias não teria nenhum mérito. Confiando-se aoseu companheiro, não necessitaria nem mesmo pensar. Por isso éque o Espírito de Luz só se deu a conhecer no regresso.

AÇÃO DA PRECE.TRANSMISSÃO DO PENSAMENTO

9. A prece é uma invocação. Através dela o homem se põeem comunhão de pensamento com o ser a quem se dirige. Elapode ter por finalidade fazer um pedido, um agradecimento ouuma homenagem. A criatura pode orar por si mesma ou por outraspessoas, pelos que estão encarnados e pelos desencarnados.

As orações endereçadas a Deus são ouvidas pelos Espíritosencarregados da execução da vontade do Pai Celestial. Aquelas quesão endereçadas aos bons Espíritos são transferidas para a JustiçaDivina. Quando oramos para outros seres e não para Deus, os seres

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM415

PEDI E OBTEREIS

416

a quem nos dirigimos servem de intermediários, de intercessores,porque nada pode ser feito sem a vontade de Deus.

10. O Espiritismo nos faz compreender a ação da prece, aorevelar o mecanismo da transmissão do pensamento, quer quandoo ser a quem oramos venha a nosso socorro, quer quando apenas onosso pensamento se eleva a esse ser.

Para se compreender o que ocorre nessas situações, é necessárioimaginar todos os seres encarnados e desencarnados mergulhadosno fluido universal que toma todo o espaço, assim como na Terraestamos todos mergulhados na atmosfera. Esse fluido universalrecebe um estímulo da vontade. Esse fluido é o condutor do pensamento,assim como o ar é condutor do som. Há, porém, uma variante, umavez que as vibrações do ar são limitadas, enquanto que as vibraçõesdo fluido universal se propagam ao infinito. Quando, portanto, opensamento é dirigido a qualquer ser, na Terra ou no espaço, seja deencarnado para desencarnado, seja de desencarnado para encarnado,uma onda fluídica se irradia de um para outro, transmitindo opensamento, como o ar transmite o som.

A energia dessa onda fluídica está na intensidade do pensamentoe da vontade de quem pensa. É assim que a prece é ouvida pelosEspíritos, qualquer seja o lugar em que se encontrem. É assim,também, que os Espíritos se comunicam entre si e que nostransmitem as suas inspirações. E pelo mesmo mecanismo, é que seestabelecem as relações de pensamentos entre encarnados que estãodistantes entre si.

Esta explicação se dirige, sobretudo, aos que não compreendema utilidade da prece exclusivamente mística. Não temos porfinalidade materializar a prece, mas tornar os seus efeitoscompreensíveis, ao evidenciar que ela pode exercer uma ação diretae positiva. Nem por isso estará menos subordinada aos desígniosDivinos, juiz supremo de todas as coisas, e que é o único que podetornar a ação da prece eficaz.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM416

417CAPÍTULO XXVII

11. Pela prece, o homem atrai o amparo dos bons Espíritosque o vêm sustentar nos seus bons propósitos e lhe inspirar bonspensamentos. Ele ganha, assim, a força moral necessária para venceras dificuldades e retornar ao caminho reto, se dele se afastou.

Pela prece, o homem pode afastar de si os males que atrairiapor suas próprias faltas. Um homem, por exemplo, vê a sua saúdearruinada pelos excessos que praticou e arrasta, até o fim de seusdias, uma vida de sofrimentos. Terá ele o direito de queixar-se, senão obtiver a sua cura? Não, porque poderia ter encontrado naprece a força para resistir às tentações que o levaram ao excesso.

12. Divida em duas partes os males da vida: uma, com osmales que o homem não pode evitar e outra com as atribulaçõesque ele mesmo provoca por sua falta de cuidados e pelos seusexcessos. (Veja capítulo V, item 4, nesta mesma obra.) Você veráque os males da segunda parte são muito mais numerosos que osmales que o homem não pode evitar.

Fica bastante evidente que o homem é o autor da maior partede suas aflições e que ele as evitaria se agisse com sabedoria eprudência.

O estado deplorável do homem é a conseqüência do desrespeitoàs leis divinas. Se cumpríssemos rigorosamente essas leis, seríamosinteiramente felizes. Se não desejássemos além do limite do que énecessário para a satisfação de nossas necessidades, não teríamos asdoenças que são provocadas pelos excessos de nossos desejos, nemsentiríamos as alterações que as doenças determinam em nossas vidas.Se impuséssemos um limite à nossa ambição, não temeríamos aruína. Se não quiséssemos subir mais alto do que podem as nossasforças, não temeríamos a queda. Se fôssemos humildes, nãosofreríamos as decepções do orgulho abatido. Se praticássemos a leida caridade, não seríamos maledicentes, nem invejosos, nemciumentos e, assim, evitaríamos as discussões e os desentendimentos.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM417

PEDI E OBTEREIS

418

Se não fizéssemos nenhum mal a ninguém, não teríamos de temeras vinganças.

Os males da vida são conseqüência do desrespeito às leis divinasque governam as nossas vidas.

Admitamos que o homem nada pudesse fazer em relação aosmales que não dependam de sua conduta atual. Admitamos, ainda,que todas as orações que faça, sejam inúteis para livrar-se dessesmales. Não seria muito desejável orar, para ficar liberado dasconseqüências que decorrem de sua própria conduta? Neste caso, aação da prece pode ser entendida facilmente. É que ela tem porefeito atrair a inspiração salutar dos bons Espíritos, quando lhepedirmos a força para resistir às más inclinações, a fim de evitarmosde praticá-las por nos serem prejudiciais. Estaremos, então, pedindonão que afastem o mal de nós, mas para que eles nos afastem dosmaus pensamentos que nos podem levar ao mal. Com isso, eles nãoembaraçam em nada os desígnios de Deus e nem alteram o curso dasleis da Natureza, mas evitam que desrespeitemos essas leis, orientandoo nosso livre-arbítrio.

Os bons Espíritos, porém, agem sem que os percebamos,duma maneira oculta, para não interferirem em nossa vontade. Ohomem se encontra, então, na mesma posição daquele que pedebons conselhos e os coloca em prática, mas que está sempre livre desegui-los ou não. Deus quer que seja assim, para que cada um sejaresponsável por seus atos e tenha o mérito de escolha entre o bem eo mal. É isso que o homem poderá estar certo de que semprereceberá, se ele o pedir com fervor, e ao que se pode, sobretudo,aplicar estas palavras: “Pedi e obtereis”.

A eficácia da prece, mesmo reduzida a essas proporções, nãodaria para o homem um resultado benéfico? Estava reservado aoEspiritismo demonstrar a ação da prece, pela revelação das relaçõesque existem entre o mundo corporal e o mundo espiritual. Masnão se limitam somente a isso os seus efeitos.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM418

419CAPÍTULO XXVII

A prece é recomendada por todos os Espíritos.Renunciar à prece é desconhecer a bondade de Deus. É

renunciar para si mesmo à assistência da Providência Divina. E nãoorar pelas outras pessoas é renunciar ao bem que se lhes pode fazer.

13. Ao atender ao pedido que lhe é dirigido, Deus temnormalmente em vista recompensar a intenção, o devotamento e afé daquele que ora. Eis porque a prece do homem de bem tem maismérito aos olhos de Deus, e sempre é mais eficaz, porque o homemvicioso e mau não pode orar com o fervor e a confiança que nascemdo sentimento da verdadeira piedade.

Do coração do homem egoísta, daquele que ora só com oslábios, não poderiam sair senão palavras. Não saem desse coração asradiações da caridade que dinamizam a prece em toda a sua intensidade.Compreende-se isso tão bem que, por um movimento intuitivo, osque querem que outras pessoas orem por eles, procuram, depreferência, as pessoas que tenham uma conduta que seja maisagradável a Deus, porque as preces deles serão melhor ouvidas.

14. Se a prece exerce uma espécie de ação magnética,poderíamos supor que o seu efeito estivesse condicionado à qualidadedos fluidos emanados do homem que ora. Entretanto, não é assim.Desde que os Espíritos exercem essa influência fluídica sobre oshomens, eles podem suprir, quando for necessário, a insuficiênciadaquele que ora, seja por substituírem diretamente o que ora, sejapor dar-lhe momentaneamente uma força excepcional, quandojulgarem que a pessoa que ora é digna desse benefício ou quandojulgam que isso lhe possa ser útil.

O homem que não se considera bom para exercer uma influênciabenéfica, não deve renunciar a orar pelas outras pessoas, por alimentar-se com a idéia de que não é digno de ser ouvido em seus pedidos. Aprópria consciência que tem de sua inferioridade é uma demonstraçãode humildade sempre agradável a Deus, que levará em consideração aintenção caridosa que o anima. O seu fervor e a sua confiança em Deus

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM419

PEDI E OBTEREIS

420

são os seus primeiros passos para o seu retorno ao bem, retorno esseque os bons Espíritos se sentem felizes de incentivar.

A prece que não se libera do homem é aquela dos orgulhosos,que só têm fé no seu poder e nas suas qualidades pessoais e que julgampoder substituir os desígnios do Eterno.

15. O poder da prece está no pensamento. Esse poder nãodepende nem das palavras, nem do lugar e nem do momento emque a prece é feita. Pode-se, portanto, orar em qualquer lugar, aqualquer hora, sozinho ou junto com outras pessoas. A influênciado lugar e do momento em que se ora é exclusivamente em relaçãoao que possa facilitar o recolhimento interior daquele que faz aprece. A prece em conjunto com outras pessoas tem uma ação maispoderosa somente quando todos aqueles que oram estão unidos decoração a um mesmo pensamento e a uma mesma finalidade nobre,porque, então, é como se muitos clamassem juntos e numa só súplica.Mas, que adiantaria se as pessoas estivessem reunidas em grandenúmero, e cada uma delas agisse isoladamente e por interesse sópessoal? Uma centena de pessoas reunidas pode orar como egoístas,enquanto que duas ou três, unidas numa mesma aspiração, orarãocomo verdadeiros irmãos em Deus, e a sua prece terá mais força doque a prece daqueles cem egoístas. (Ver capítulo XVIII, itens 4 e 5,desta mesma obra.)

PRECES COMPREENSÍVEIS

16. Se eu, portanto, não entender o que significam as palavras,serei como um bárbaro para aquele a quem falo e o que fala sê-lo-ápara mim do mesmo modo. Porque se eu orar numa língua estrangeira,verdade é que o meu espírito ora, mas o meu entendimento fica semfruto. Mas se louvares com o espírito, o que ocupa o lugar do simplespovo dirá Assim Seja, sobre a sua bênção, visto não entender ele o que

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM420

421CAPÍTULO XXVII

dizes? Verdade é que tu dás bens as graças, mas o outro não éedificado.(Paulo de Tarso, I Coríntios, capítulo 14, versículos 11, 14,16 e 17.)

17. A prece só tem valor pelo pensamento de onde ela nasce.Ora, é impossível fazer nascer uma idéia qualquer daquilo que nãose compreende, pois o que não se compreende, não pode sensibilizaro coração.

Para a grande maioria das pessoas, as preces com palavrasdesconhecidas não passam de uma mistura de coisas que não lhesdizem nada para o espírito. Para que a prece toque o coração, énecessário que cada palavra desperte uma idéia. Mas se nãocompreendermos o que quer dizer cada palavra, a palavra não podedespertar em nós nenhuma idéia. Poderemos repetir as palavras deuma oração, como se fosse uma simples maneira de pedir e comose a qualidade do pedido estivesse apenas no menor ou maiornúmero de vezes que o repitamos.

Muitos são os que oram por mero dever. Outros, apenas paraseguir os costumes. Por isso eles se julgam desobrigados dessaobrigação de orar, já que recitaram uma prece um determinadonúmero de vezes e numa determinada ordem.

Deus lê o íntimo dos corações.Ele nos lê os pensamentos e examina a nossa sinceridade. Julgar

que Deus seja mais sensível à nossa forma de orar do que à essênciaíntima da fé, seria desconsiderar a Justiça Divina. (Veja capítuloXVIII, item 2, nesta mesma obra.)

A PRECE PELOS DESENCARNADOSE PELOS ESPÍRITOS EM SOFRIMENTO

18. A prece é solicitada pelos Espíritos que sofrem após adesencarnação. Toda prece lhes é um alívio, porque ao verem que

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM421

PEDI E OBTEREIS

422

são lembrados, eles se sentem menos infelizes. A prece tem, paraeles, uma ação mais direta: dá-lhes novo ânimo, estimulando-lheso desejo de se elevarem pelo arrependimento de suas faltas e pelodesejo de repará-las, e pode desviá-los da idéia do mal.

É nesse sentido que a prece pode não somente aliviar, mastambém abrandar os seus sofrimentos. (Veja em O Céu e o Inferno,a parte: “Exemplos”.)

19. Algumas pessoas não admitem as preces pelos desencarnados,porque, segundo a crença dessas pessoas, não há para a alma maisque duas alternativas: ser salva ou ser condenada às penas eternas! E,para essas pessoas, qualquer que seja a alternativa, a prece será inútil.

Sem discutir o valor dessa crença, admitamos, por algunsinstantes, que as penas eternas fossem reais e sem apelação, e que asnossas preces fossem incapazes de interrompê-las. Perguntamos se,nessa situação, é lógico, é caridoso, é cristão recusar orar peloscondenados? Essas preces, mesmo que incapazes de libertá-los, nãoseriam para eles um sinal de piedade, que poderia abrandar seussofrimentos?

Na Terra, quando um homem é condenado à prisão perpétua,mesmo que não haja nenhuma esperança de obter-se a graça dalibertação para ele, é proibido a uma pessoa caridosa dar-lhe algumaconsolação para que ele carregue a cruz de seus enganos mais aliviado?Quando alguém contrai um mal incurável, se não houver para essedoente alguma esperança de cura, deve-se abandoná-lo sem nenhumalívio?

Lembrem-se de que, entre os condenados, pode haver umapessoa que lhes foi cara. Pode haver um amigo, talvez um pai, umamãe ou um filho. E só porque, segundo vocês que aceitam as penaseternas, essa pessoa não pode esperar o perdão, vocês poderiamrecusar-lhe um copo d’água para mitigar-lhe a sede? Um bálsamoque lhe seque as chagas? Vocês não fariam por esse ser amado, o quefariam por um prisioneiro? Não lhe dariam uma prova de amor,uma consolação?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM422

423CAPÍTULO XXVII

Não! Recusar-se a ampará-la não seria de um cristão!Uma crença que endurece o coração, não pode ser a mesma

que se fundamenta num Deus que coloca em primeiro lugar osdeveres do amor ao próximo!

A não-eternidade das penas não implica a negação de umadolorosa conseqüência temporária para as transgressões das leisdivinas. A Justiça Divina não confunde o bem com o mal. Negar,neste caso, a eficácia da prece seria negar a eficácia da consolação, dolevantar do ânimo e dos bons conselhos. Seria negar mesmo a energiaque haurimos da assistência moral dos que nos querem bem.

20. Outros não admitem a prece, fundando-se num motivoque, com aparência de verdade, induz ao erro: a imutabilidade dosdesígnios divinos. Deus – dizem esses outros – não pode mudar assuas decisões a pedido de suas criaturas. Se não fosse assim, nadaseria estável no mundo, alegam eles. E o homem, portanto, nadatem de pedir a Deus e lhe cabe apenas submeter-se às leis divinas eadorar o Senhor.

Há nessa idéia uma falsa colocação do princípio da imutabilidadeda lei divina, ou melhor, há falta de conhecimento da lei, no que serefere à penalidade futura. Essa lei é revelada pelos Espíritos doSenhor, a partir do momento em que o homem esteja amadurecidoespiritualmente para compreender o que, na fé religiosa, é conformeou contrário aos atributos divinos.

Segundo o dogma da eternidade absoluta das penas, não sãoconsiderados a favor do culpado nem os seus remorsos e nem osseus arrependimentos! Para o que errou, qualquer desejo de melhoraré inútil. Ele está condenado a permanecer no mal eternamente. Seele estiver condenado por um prazo determinado, a pena seextinguirá no final desse tempo. Mas quem poderá afirmar que, nofinal de suas penas, ele melhorou seus sentimentos? Quem poderádizer que, a exemplo de muitos condenados da Terra, ao saírem daprisão, ele não será tão mau quanto antes? No primeiro caso, seria

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM423

PEDI E OBTEREIS

424

manter na dor do castigo um homem que se voltou para o bem. Eno segundo caso, seria agraciar aquele que continua se alimentandodo desejo do mal.

A Justiça Divina é mais previdente. Sempre justa, equitativae misericordiosa, ela não estabelece nenhum prazo de sofrimentopara quem transgride as leis divinas.

A Justiça Divina se resume assim:21. O homem sempre sofre a conseqüência de seus erros. Não

há uma só infração da lei de Deus, que não resulte em conseqüênciasamargas.

A intensidade do sofrimento é proporcional à gravidade do erromoral.

A duração do sofrimento, para qualquer erro moral, é nãodeterminada. Ficará subordinada ao arrependimento daquele queerrou e ao seu retorno ao campo do bem. O sofrimento, por isso,durará tanto quanto seja a sua obstinação no mal. Parecerá umsofrimento eterno, se a obstinação no mal parecer eterna. Será, porém,de curta duração se a criatura se arrepender logo.

Assim que o sofredor rogue por misericórdia, ele será ouvido ereceberá a luz da esperança. Mas, para que se liberte das dores morais,o simples remorso não basta: é necessário a reparação dos males causadospara os outros. Eis porque o que errou moralmente se vê submetido anovas provações, nas quais ele pode, sempre por sua livre vontade,fazer o bem a quem fez o mal, reparando assim os seus erros.

O homem é, assim, constantemente o autor de seu própriodestino. Ele pode abreviar os seus sofrimentos ou prolongá-los por umtempo indefinido. A sua felicidade ou o seu sofrimento dependem dasua vontade de fazer o bem.

Tal é a lei!É lei imutável e reflete inteiramente a bondade e a justiça de

Deus.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM424

425CAPÍTULO XXVII

O Espírito culpado e infeliz, ajustado a essa lei magnânima,pode sempre salvar-se a si mesmo. A Justiça Divina lhe revela quaissão as condições em que ele poderá fazer com que os seus sofrimentosse abrandem. O que lhe falta, no mais das vezes, é a vontade, aforça, a coragem. Se, pelas nossas preces, lhe inspiramos essavontade, se o ampararmos e o encorajarmos; se, pelos nossosconselhos, lhe dermos as luzes que lhe são necessárias, ao invés desolicitar a Deus que revogue a sua lei, nós nos tornaremos os instrumentospara a execução da lei do amor e da caridade, da qual a Justiça Divinanos torna seus participantes, para que doemos de nós mesmos umaprova da caridade. (Veja O Céu e o Inferno, 1ª parte, capítulos IV,VII e VIII.)

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS:MODO DE ORAR

22. O primeiro dever de toda criatura humana, o primeiroato que deve marcar para ela o retorno à vida ativa de cada novodia, é o dever da prece.

Quase todos vocês oram, mas quão poucos sabem orar! Queimportam ao Senhor as palavras que vocês pronunciam, sem sabero que dizem, porque vocês já se habituaram a repeti-las assim comoquem cumpre uma obrigação e que, como toda obrigação, é umpeso incômodo!

A prece do cristão, do Espírita, ou do adepto de qualqueroutro culto religioso, deve ser feita no momento em que o Espíritoretorna ao corpo físico. Ele deve elevar-se aos pés da MajestadeDivina com humildade, com todas as forças de seu coração, comuma expressão de gratidão por todos os benefícios recebidos atéaquela hora. Agradecer, também, pela noite transcorrida e durantea qual lhe foi permitido, embora disso não se lembre, retornar junto

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM425

PEDI E OBTEREIS

426

de seus amigos, de seus orientadores espirituais, para haurir, nocontato com eles, mais energia e perseverança no campo do bem.

A prece deve elevar-se humilde aos pés do Senhor,reconhecendo as fraquezas morais de quem ora e rogando o amparo,a indulgência, a misericórdia divinas. A prece deve sair do interiordo coração porque é a alma que deve elevar-se para o Criador. Évocê que deve se transfigurar como fez Jesus, orando, no Tabor, afim de você chegar até Ele com a alma branca e radiosa de esperançae de amor.

A sua prece deve conter o pedido de graças de que vocênecessita realmente. Inútil, portanto, pedir ao Senhor que lhe abrevieas suas provas, que lhe dê alegrias e a riqueza. Peça-lhe, antes, quelhe conceda os bens mais preciosos da paciência, da resignação e dafé. Não diga, como fazem muitos: “Não vale a pena orar, porqueDeus não me atende”.

O que você pede a Deus, na maioria das vezes? Já se lembroude pedir-lhe o seu aprimoramento moral? Oh! Não! poucas vezesvocê pede pela sua evolução espiritual! O que mais você se lembrade pedir é o sucesso nos seus empreendimentos materiais e, depois,você reclama: “Deus não me olha! Se tivesse preocupação comigo,não existiriam tantas injustiças em minha vida”.

Insensato! Ingrato! Se você examinar o fundo de sua cons-ciência, quase sempre ali você encontrará as causas dos males de quevocê se queixa. Peça, então, acima de todos os seus interessesmateriais, o seu aprimoramento moral, e você verá que torrente degraças e de consolações se derramará sobre você. (Veja o capítulo V,item 4, desta mesma obra.)

Você deve orar incessantemente, sem que, para isso, vocêprecise recolher-se num lugar especial e nem que você caia de joelhospelas ruas. A prece diária é o cumprimento de seus deveres, massem excluir os outros deveres de sua vida diária, qualquer seja anatureza desses deveres.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM426

427CAPÍTULO XXVII

Não é, também, um ato de amor ao Senhor, quando vocêcumpre o dever de assistir seus irmãos numa necessidade qualquer,seja moral ou física? Não é um ato de gratidão ao Senhor elevar-lheo pensamento quando uma felicidade chega a você, quando umacidente é evitado, quando mesmo uma simples contrariedade otoca e você diz: “Graças a Deus!”? Não é um gesto de arrependimentovocê se humilhar diante do Juiz Supremo, quando sente que caiumoralmente, mesmo que seja tão só por um desejo infeliz, e vocêlhe diz: “Desculpe-me, meu Deus, porque errei! (por orgulho, poregoísmo ou por faltar com a caridade)? Ajude-me a não errar maise me dê, forças para corrigir meu erro”?

Esses fatos independem de suas orações regulares da manhã,da noite e dos dias consagrados a Deus. Como você observa, a precepode ser de todos os minutos de sua vida comum, sem necessidadede nenhuma interrupção de seus trabalhos diários. O pensamento-oração, no curso de seu dia, santifica as suas atividades. Tenha certezade que um só desses pensamentos, partido do coração, é mais ouvidopelo seu Pai Celestial do que as longas orações recitadas por hábito,quase sempre sem motivação espiritual, apenas porque a horaconvencional chama para rezar, dizendo palavras que não saem doseu coração. (V. Momod, Bordéus, 1862.)

FELICIDADE DA PRECE

23. Venham, todos vocês que desejam crer. Os Espíritos Celestiaischegam e vêm lhes anunciar grandes coisas!

Deus, meus, filhos, abre as suas riquezas espirituais, para lhesdistribuir todos os benefícios.

Homens incrédulos! Se vocês soubessem quanto a fé faz bemao coração e quando induz a alma ao arrependimento de seus erros

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM427

PEDI E OBTEREIS

428

e induz, também, à oração! A prece! Ah! Como são tocantes aspalavras que saem da boca e do coração no momento da prece!

A prece é o orvalho divino que abranda o grande fogo daspaixões. Filha dileta da fé, a prece nos ajusta no caminho que conduza Deus. No recolhimento e na solidão da oração, vocês se encontramcom Deus. Para vocês, então, já não há mais mistérios, uma vezque os mistérios lhes são revelados.

Apóstolos desta idéia, para vocês a verdadeira vida se abre. Asua alma se despoja do jugo das paixões e cresce para esses mundosinfinitos e etéreos que os homens comuns desconhecem.

Avancem, avancem pelos caminhos da prece e vocês ouvirãoas Vozes dos Céus. Que harmonia! Já não são os sons confusos eprimários e estridentes da Terra. É a harmonia celestial. São as vozessuaves e doces dos que amam, mais leves que as brisas matinais queroçam as folhagens de seus arvoredos.

Com que brandura, então, vocês caminharão!A linguagem da Terra não poderia exprimir essa ventura, que

os envolve por todos os poros, tão viva e repousante é a energia querecolhemos na fonte das orações! Doces vozes, inebriantes perfumesque a alma ouve e aspira quando, pela prece, ela se eleva a regiõescelestiais, habitadas por Seres de Luz!

Sem a mistura dos desejos carnais, todas as aspirações sãodivinas.

E vocês, também, orem como o Cristo. Orem carregando asua cruz para o seu Calvário. Carreguem a sua cruz e vocês sentirãoas doces emoções que banhavam a alma de Jesus, embora Elecarregasse o madeiro infamante.

Ele, o Mestre, seguia para morrer na Terra, mas para da Cruzviver na vida celestial, na morada de seu Pai. (Agostinho, Paris, II1861.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM428

429CAPÍTULO XXVII

PREÂMBULO

1. Os Espíritos têm sempre dito: “A forma da prece nadavale. O pensamento é tudo. Ore cada um segundo as suas convicçõesreligiosas, desde que essa oração toque muito o coração. Um bompensamento vale mais que mil palavras que não saiam do coração”.

Os Espíritos não estabelecem nenhuma fórmula exata paraas preces. Quando sugerem alguma prece, eles têm por finalidadeorientar as idéias de quem ora e, sobretudo, assim fazem para chamara atenção sobre certos princípios da Doutrina Espírita.

Fazem-no, pois, com a finalidade de ajudar as pessoas quesentem dificuldades para exprimir suas idéias, porque essas pessoastêm a sensação de não terem orado realmente, porque os seuspensamentos não estavam ordenados e claros.

A coleção de preces, que constam desta parte da obra, é umaescolha feita entre muitas daquelas preces que foram transmitidaspelos Espíritos em diferentes ocasiões. Os Espíritos podem tertransmitido outras, e com outras palavras, apropriadas a certas idéiasou a casos especiais. Mas pouco ou nada importa a forma das orações,se o pensamento fundamental é o mesmo.

A finalidade da prece é elevar a nossa alma a Deus.A diversidade das fórmulas não deve estabelecer nenhuma

diferença entre aqueles que crêem em Deus e, menos ainda, nenhumadiferença entre os Espíritas, porque Deus aceita todas as preces quesejam sinceras.

28

CAPITULO XXVIII

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM429

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

430

Não se deve, portanto; considerar esta coleção de preces comouma espécie de formulário único, mas, tão-somente, como umavariedade de orações recolhidas das mensagens transmitidas pelosEspíritos. É um meio de aplicação dos princípios da moral evangélicadesenvolvida neste livro, um complemento às suas comunicaçõessobre os deveres para com Deus e com o próximo e no qual serãolembrados todos os princípios da Doutrina Espírita.

O Espiritismo reconhece como boas as preces de todos oscultos religiosos, quando elas saem do coração e não sejam ditasapenas pelos lábios. O Espiritismo não impõe nenhuma e nãocondena nenhuma oração. Deus é sumamente grande, segundo aDoutrina Espírita, para repelir a voz que implora ou que lhe cantelouvores, não fazendo distinção entre as criaturas que oram de umaou de outra maneira. Quem quer que condene as preces que nãoconstem de seu formulário, demonstrará que desconhece a grandezade Deus. Acreditar que Deus esteja preso a uma fórmula de prece, éemprestar-lhe a pequenez e as paixões características do homem.

Uma condição essencial para a prece, segundo Paulo de Tarso(Cap. XXVII, item 16), é a oração ser compreensível, a fim de queela possa falar ao nosso coração. Para que a prece seja entendidapelo coração, não basta que seja proferida em uma língua que aqueleque ora compreenda. Há preces em linguagem popular que nãodizem ao nosso pensamento muito mais do que uma oração feitanuma língua que nos seja estranha e que, por isso mesmo, nãochegam ao coração. As raras idéias que elas contêm são, em geral,sufocadas pelo excesso de palavras e pelo misticismo da linguagem.

A principal qualidade da prece é ser clara, simples e resumida,sem frases inúteis ou falsas idéias, que são apenas coisas vazias e semsignificação. Cada palavra deve ter o seu valor, revelar uma idéia,tocar fundo no coração.

Em resumo, a prece deve levar à meditação serena. É somenteassim que a prece pode alcançar a sua finalidade. De outro modo,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM430

431CAPÍTULO XXVIII

não passa de sons sem sentido. Notem, entretanto, com que ar dedistração e com que descaso as orações são proferidas na maioriadas vezes. Movem-se os lábios e há um surdo e rápido sussurro.Mas pela expressão do rosto, que acompanha o sussurro dos lábios,reconhece-se um ato mecânico, puramente exterior, que não sai docoração.

As preces reunidas nesta coleção estão divididas em cincocategorias:

1) Preces gerais;2) Preces pela própria pessoa que ora;3) Preces pelos encarnados;4) Preces pelos desencarnados e5) Preces pelos doentes e pelos obsidiados.Com a finalidade de chamar mais particularmente a atenção

sobre o objetivo de cada prece, e para fazer mais compreensível oconteúdo de cada uma delas, todas as categorias de preces sãoprecedidas de uma mensagem de abertura, uma espécie de exposiçãode motivos, sob o título de prefácio.

I – PRECES GERAIS

ORAÇÃO DO SENHOR(Pai-Nosso)

2. Prefácio. Os Espíritos recomendaram colocar a Oração doSenhor (Pai-Nosso), na abertura desta coleção, não somente comoprece, mas também como símbolo. De todas as preces, esta é a queeles colocam em primeiro lugar, seja porque vem do próprio Jesus(Mateus, 5: 9 a 13), seja porque ela pode substituir todas as outras,conforme os pensamentos que a ela unam os que oram.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM431

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

432

Esta oração é o mais perfeito modelo de síntese, verdadeiraobra-prima da sublimidade na sua simplicidade. Com efeito, sob aforma mais reduzida, ela resume todos os deveres do homem paracom Deus, para com o próprio que ora, para com o próximo. Elacorresponde a uma confissão de fé, um ato de adoração e desubmissão a Deus. Ela traz o pedido das coisas necessárias para avida e o princípio da caridade. Quem a diga, em intenção de alguém,está pedindo para esse alguém o que pediria para si mesmo.

Todavia, por causa mesmo de essa oração ser curta, o sentidoprofundo encerrado em algumas das palavras de que ela se compõe,não é entendido pela maior parte das pessoas. Por isso, essas palavrassão repetidas, por algumas pessoas, de um modo muito vago egeral, sem que elas compreendam o sentido de cada uma de suasfrases. Recitam-na como uma fórmula mística, cuja eficácia éproporcional ao número de vezes que seja repetida. É esse númerode vezes, quase sempre, é cabalístico: três, sete ou nove vezes. Essesnúmeros foram retirados de antiga crença supersticiosa, alimentadasobre o poder mágico dos números e do uso desses números nosrituais de magia.

Para preencher o vazio que a brevidade dessa prece deixa nopensamento de alguns, ajuntamos a cada uma de suas proposições,seguindo o conselho e com a assistência dos bons Espíritos, umcomentário que lhe esclarece o sentido e mostra as suas aplicaçõesna vida diária.

De acordo, portanto, com a situação e o tempo disponível,aquele que ore poderá dizer a Oração do Senhor ou na sua formaoriginal ou na forma comentada que aqui apresentamos.

3. PRECE – I. Pai-nosso, que estais no céu, santificado seja ovosso nome!

Cremos em vós, Senhor, porque tudo nos revela o vosso podere a vossa bondade. A harmonia do Universo é a demonstração deuma sabedoria, de uma prudência, de uma previdência, que estão

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM432

433CAPÍTULO XXVIII

acima de todas as faculdades dos homens. O nome de um SerSoberanamente grandioso e sábio está inscrito em todas as obras daCriação, desde o raminho da pequenina erva e do menor dos insetosaté aqueles astros que se movem no infinito do espaço. Por todaparte vemos a prova de vossa atenção paternal. Por isso cego é aqueleque não vos reconhece pelas vossas obras. Orgulhoso é aquele quenão vos glorifica e ingrato é aquele que não vos rende graças.

II. Venha a nós o vosso Reino!Senhor, destes aos homens leis repletas de sabedoria e que

fariam a felicidade deles, se eles se ajustassem a essas leis divinas.Com essas leis, eles fariam reinar, entre eles, a paz e a justiça. Eles seajudariam uns aos outros, ao invés de se prejudicarem, como ofazem. O forte ampararia o fraco, ao invés de esmagá-lo. Elesevitariam os males que geram os abusos e os excessos de todanatureza. Todos os sofrimentos deste mundo nascem do desrespeitoàs vossas leis, Senhor, porque não há um só desrespeito a essas leisque não traga conseqüências dolorosas.

Destes ao animal irracional o conjunto de instintos que lhemostra o limite do que lhe é necessário para a existência, e ele a issose ajusta. Ao homem, porém, além desses instintos, destes a in-teligência e a razão. Destes-lhe, também, a liberdade de cumprir oudesrespeitar aquelas de vossas leis que pessoalmente dizem respeitoà sua evolução, ou seja, a liberdade de escolher entre o bem e o mal,a fim de que seja dele o mérito e a responsabilidade de suas ações.

Ninguém pode alegar ignorância de vossas leis, pois, na vossaprevidência paternal, quisestes que essas leis fossem gravadas naconsciência de cada homem, sem distinção de culto religioso ou denacionalidade. Aqueles que violam essas leis é porque queremdesrespeitá-las, mas não porque não as conheçam.

Dia virá em que, segundo a vossa promessa, todos aspraticarão. A própria incredulidade, então, desaparecerá nesse dia.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM433

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

434

Todos vos reconhecerão por soberano Mestre de todas as coisas e oreinado de vossas leis estabelecerá o vosso Reino na Terra.

Dignai-vos, Senhor, de apressar a vinda desse Reino para aTerra, dando aos homens a luz necessária para conduzi-los aocaminho da verdade.

III. Seja feita a vossa vontade, assim na Terra como no Céu!Se a submissão é um dever do filho para com o pai, do

subordinado para com o seu superior hierárquico, quanto maiornão devem ser os deveres da criatura para com o Criador! Fazer avossa vontade, Senhor, é praticar as vossas leis e se submeter, semqueixas, aos vossos desígnios divinos. O homem se submeterá àsdisposições da Justiça Divina, quando compreender que sois a fontede toda a sabedoria e que sem vós ele nada pode fazer. Então, elecumprirá a vossa vontade na Terra, como a cumprem os eleitos,que estão no Céu.

IV. Dai-nos o nosso pão de cada dia.Dai-nos o alimento necessário para a sustentação das forças

de nosso corpo físico. Dai-nos, também, o alimento espiritualnecessário para a evolução moral de nosso espírito.

O animal selvagem encontra o seu alimento, mas o homemdeverá obtê-lo através de suas próprias atividades e utilizando osrecursos de sua inteligência, porque o criastes livre para escolher osmeios de sua existência.

Vós lhe dissestes: “Tu tirarás o alimento da terra, com o suorde teu rosto”. Com isto, fizestes do trabalho uma obrigação, a fimde que se desenvolva a inteligência na busca dos meios de atender aspróprias necessidades vitais e o bem-estar da criatura humana, unspelo trabalho manual e outros pelo trabalho intelectual. Sem otrabalho o homem se manteria estacionado na escalada evolutiva enão poderia aspirar à felicidade dos Espíritos Superiores.

Ajudais o homem de boa vontade que se confia a vós para tero necessário para a existência. Não ajudais, porém, àquele que se

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM434

435CAPÍTULO XXVIII

contenta com a ociosidade e que gostaria de tudo obter sem nenhumtrabalho, nem àquele que busca o supérfluo. (Cap. XXV.)

Quantos não são os que caem por seus próprios erros, peloseu descuido, pela sua imprevidência ou pela sua ambição e por nãoquererem contentar-se com o que lhes destes! São esses os artesõesdo seu próprio infortúnio e que não têm o direito de se queixarem.Eles sofrem naquilo que fizeram sofrer os outros. Porém, a essesmesmos vós não os abandonais, porque sois infinitamentemisericordioso. Estendei-lhes as mãos para socorrê-los desde que,como filhos pródigos, eles retornem sinceramente à vossa presençapaternal. (Cap. V, item 4.)

Antes de queixar-nos do nosso destino, indaguemo-nos se odestino não é o resultado de nossas próprias obras. A cada infelicidadeque nos chegue, indaguemo-nos se não dependeu de nossas decisõestê-la evitado. Digamos a nós mesmos, também, que Deus nosconcedeu a inteligência para sairmos das dificuldades, mas que issodependerá do uso que fizemos de nosso livre-arbítrio.

Já que da lei do trabalho depende o estado do homem sobrea Terra, dai-nos a coragem e a força de cumprir essa lei. Dai-nos,também, a prudência, a previdência e a moderação das nossasnecessidades, a fim de não perdermos o fruto de nossas obras.

Dai-nos, pois, Senhor, nosso pão de cada dia, ou seja, os meiosde adquirir, pelo trabalho, as coisas necessárias para a vida, porqueninguém deve pedir o supérfluo.

Se estivermos impossibilitados de trabalhar, nós nos entregamosao socorro da Providência Divina.

Se está nos desígnios da Justiça nos provar pelas mais durasprivações, apesar de nossos esforços no bem, nós as aceitaremoscomo uma justa expiação dos erros que cometemos nesta vida ouem reencarnações passadas, porque as leis divinas são justas. Sabemosque não há expiação não merecida e que não sofremos senão asconseqüências de nossos próprios enganos.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM435

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

436

Livrai-nos, ó Senhor, de invejarmos aquilo que os outros tême que nós não temos ou mesmo as coisas que os outros tenhamacima de suas necessidades, ainda que a nós nos falte o necessáriopara a vida. E perdoai-lhes, Senhor, se eles esquecem a lei da caridadee a do amor ao próximo, que lhes ensinastes. (Cap. XVI, item 8.)

Afastai também, de nosso espírito a idéia de negar a vossaJustiça quando vemos a prosperidade dos maus e a infelicidade quecai, por vezes, sobre os homens que trabalham no campo do bem.Já sabemos, graças às novas luzes espirituais, que nos destes sobre asvossas leis, que a vossa justiça sempre se cumpre e não excluinenhuma pessoa. Assim é que sabemos que a prosperidade materialdo maldoso é tão passageira quanto a sua existência corporal, e queele experimentará dolorosas decepções, enquanto que a alegriareservada ao que sofre com resignação será eterna. (Cap. V, itens 7,9, 12 e 18.)

V. Perdoai as nossas dívidas, assim como perdoamos aos que nosdevem. – Perdoai as nossas ofensas, assim como perdoamos aos que nosofenderam.

Cada uma de nossas infrações à vossa lei, Senhor, é uma ofensacontra a nossa própria natureza divina. É um dívida contraída coma lei de amor que, cedo ou tarde, teremos de resgatar. Rogamos quenos perdoeis com a vossa infinita misericórdia, sob a promessa defazermos esforços para não contrair novos compromissos pordesrespeito às vossas leis.

Fizestes, para todos nós, a lei decisiva da caridade. Mas, acaridade não está somente em amparar o semelhante nas suasnecessidades. Ela está, também no esquecimento e no perdão dasofensas. Com que direito suplicaremos por vossa indulgência, sefaltarmos com a indulgência para com aqueles de quem nosqueixamos?

Dai-nos, Senhor, a força de sufocar em nossa alma todo oressentimento, todo o ódio e todo o rancor. Fazei com que a

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM436

437CAPÍTULO XXVIII

desencarnação não nos surpreenda com um desejo de vingança nocoração. Se for de vossa vontade retirar-nos hoje mesmo destemundo, fazei que possamos apresentar-nos diante de Vós despojadosde toda má vontade, de todo o rancor, a exemplo do Cristo, cujasúltimas palavras foram em benefício de seus algozes. (Cap. X.)

As perseguições que os maus promovem contra nós fazemparte de nossas provações terrenas. Devemos aceitá-las semmurmurar, assim como devemos aceitar todas as outras provas semmaldizer aqueles que, por suas maldades, nos abrem, assim, o ca-minho da felicidade eterna. É que nos dissestes, através de Jesus:“Bem-aventurados os que sofrem pela justiça!”. Bendizemos,portanto, a mão que nos fere e nos humilha, porque os sofrimentosimpostos ao corpo nos fortalecem a alma e seremos elevados com ahumildade que assim conquistarmos. (Cap. XII, 4.)

Bendito seja o vosso nome, Senhor, por nos ter revelado queo nosso destino não está irrevogavelmente fixado após a desencar-nação. Por nos ter revelado que teremos, numa outra existência, osmeios de resgatar e de reparar os nossos erros morais passados. Derealizar numa nova reencarnação o que não pudermos fazer nestapara a nossa evolução espiritual. (Cap. IV e Cap. V, item 5.)

Essas revelações, afinal, esclarecem todas as aparentes ano-malias da vida. Essa é a luz que se faz sobre o nosso passado e sobreo nosso futuro eterno. É um sinal luminoso de vossa soberana justiçae de vossa bondade infinita.

VI. Não nos deixeis cair na tentação, mas livrai-nos do mal! (1)

1. Algumas traduções trazem: “Não nos induzais às tentações (et ne nos inducas in

tentationem). Essa expressão daria a entender que a tentação vem de Deus, que Deus

impeliria voluntariamente o homem para o mal. Essa idéia é um ultraje e nem poderia ter

sido de Jesus. Essa idéia é da doutrina vulgar sobre o papel dos demônios. (Ver em O Céu

e o Inferno, capítulo X, “Os demônios”.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM437

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

438

Dai-nos, Senhor, a força de resistir às más sugestões de algunsEspíritos que tentarão desviar-nos da senda do bem, inspirando-nos pensamentos infelizes.

Mas, nós mesmos, somos Espíritos imperfeitos, reencarnadosneste mundo para resgatar nossas dívidas morais e evoluirmos. Acausa primeira do mal, por isso, está em nós mesmos. Os Espíritosque nos queiram induzir às más inclinações que trazemos em nósmesmos nada mais fazem que ampliar as nossas tendências viciosas,nas quais buscam conservar-nos, para que nos arrojemos a novasquedas morais.

Cada imperfeição é porta aberta para essas influências, tantoque eles são impotentes e renunciam a qualquer tentativa de perturbaras almas perfeitas. Tudo o que fizermos para distanciar-nos delesserá inútil, se não lhes opusermos uma vontade inabalável depermanecermos no campo do bem e uma total renúncia do mal. É,pois, contra as nossas próprias inclinações infelizes que devemosdirigir todos os nossos esforços para dominá-las e reformá-las.Somente com isso é que os Espíritos maldosos se distanciarão,porque o mal que está em nós é que os atrai, enquanto que o bemos distancia de nós. (Ver, adiante, “Preces pelos Obsidiados”.)

Senhor, amparai-nos em nossas fraquezas morais. Inspirai-nos, pelo voz de nossos mentores Espirituais e de todos os bonsEspíritos a vontade de nos corrigir em nossas imperfeições, a fimde impedirmos aos Espíritos inferiores o acesso à intimidade denosso coração. (Veja-se, adiante, o item 11.)

O mal não é obra vossa, Senhor, porque a fonte de todo obem não poderia gerar o mal. Somos nós mesmos os criadores domal, ao desrespeitarmos as vossas leis e pelo mau uso que fazemosda liberdade que nos concedestes. Quando os homens respeitaremas vossas leis, o mal desaparecerá da Terra, como já desapareceu dosmundos mais evoluídos.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM438

439CAPÍTULO XXVIII

O mal não é uma necessidade fatal para nenhuma pessoa. Elesó parece irresistível para aqueles que se abandonaram com agradopessoal ao próprio mal. Se é por nossa própria vontade que fazemoso mal, então será pela nossa própria vontade que poderemos fazer obem. Eis porque, ó meu Deus, nós solicitamos a vossa assistência ea amparo dos bons Espíritos para resistir às nossas próprias tentações.

VII. Assim seja.Determinai, Senhor, que os nossos bons desejos se realizem!

Curvamo-nos, porém, diante de vossa sabedoria infinita. Que todasas coisas que não possamos compreender sejam feitas segundo avossa santa vontade, e não segundo a nossa. É que sabeis, mais doque nós, o que nos convém espiritualmente.

Nós vos dirigimos esta prece, ó meu Deus! por nós mesmos,mas também a dirigimos por todas as almas sofredoras, encarnadasou desencarnadas; por todos os nossos amigos e inimigos, por todosaqueles que solicitam a nossa assistência e, em particular por .....(diz o nome da pessoa por quem se ora).

Suplicamos para todos a vossa misericórdia e as vossas bênçãos.

Nota – Aqui podem ser feitos os agradecimentos a Deus pelas graças recebidas,

e o que se deseja pedir para si e para as outras pessoas. (Veja as preces dos

itens 26 e 27.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM439

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

440

REUNIÕES ESPÍRITAS

4. Onde quer que se encontrem duas ou três pessoas reunidasem meu nome, eu estarei no meio delas. (Mateus, capítulo 18,versículo 20.)

5. Prefácio. Para estarem reunidas em nome de Jesus, nãobasta que as pessoas estejam fisicamente de corpo presente. Énecessário estarem reunidas espiritualmente, pela comunhão deintenções e de pensamentos, voltadas para o bem. Jesus, então, seencontrará no meio dessa reunião, Ele mesmo ou os Espíritos Purosque O representam.

O Espiritismo nos faz compreender a maneira pela qual osEspíritos podem estar entre nós. Eles comparecem com o seu corpofluídico ou espiritual e com as características pessoais que nos fariamreconhecê-los, se eles se tornassem visíveis. Quanto mais elevadosna hierarquia moral e intelectual, maior é o seu poder de radiação.É assim que, dominando o dom da ubiqüidade, podem estar emmuitos lugares ao mesmo tempo. Basta, para isso, que enviem umaonda de seus pensamentos para cada lugar em que queiram estar ouem que os chamem.

Pelas palavras de Jesus, anotadas por Mateus, o Mestre quisdemonstrar o efeito da união dos bons pensamentos e a força dafraternidade. Veja-se que não é a reunião de muitas ou de poucaspessoas que o atrairá, porque, ao invés de dizer duas ou três pessoasEle poderia ter dito dez ou vinte. Mas o que atrai os Espíritos Purose o próprio Senhor é o sentimento de caridade que anima os que sereúnem. Ora, para alimentar esse sentimento de caridade recíproca,bastará que sejam duas as pessoas reunidas.

Mas, se essas duas pessoas, embora fisicamente juntas, oraremcada uma em separado, mesmo se dirigindo a Jesus, elas não estarãoem comunhão de idéias. E não estarão, em comunhão de idéias se,principalmente, não estiverem movidas de um sentimento de mútuo

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM440

441CAPÍTULO XXVIII

afeto. Se ambas se olharem com prevenção, com ódio, inveja ouciúmes, as ondas fluídicas de seus pensamentos se repelem ao invésde se unirem por um impulso de mútua simpatia. Então, não estãoreunidas em nome de Jesus. Jesus aí não é mais que uma desculpapara a reunião, não sendo o Mestre o verdadeiro objetivo. (Cap.XXVII, item 9.)

Isso não quer dizer que Jesus se faça surdo ao chamado deuma pessoa só. Se ele não disse: “Eu atenderei a qualquer um queme chamar”, é porque Jesus quer, antes de tudo, o amor ao próximo.E desse amor, podem ser dadas mais provas quando vários se reúneme comungam entre si os mesmos sentimentos nobres. Aquele quese isola está cultuando um sentimento pessoal, que nega seu amorao próximo. Por conseqüência se, numa reunião de muitas pessoas,duas ou três estiverem ligadas pelo coração, com o sentimento daverdadeira caridade fraternal, enquanto que as muitas outras estejamcultuando idéias egoísticas ou mundanas, Jesus estaria com aquelasduas ou três pessoas e não com as demais.

Jesus está onde estiver o amor fraternal.Não é, portanto, pelas palavras recitadas juntamente por todos

ou pelos hinos cantados em conjunto ou pelos atos ritualísticosque se constitui uma reunião em nome de Jesus. A reunião em seunome tem os sinais da comunhão de pensamentos dentro dosentimento de caridade, tão bem vivida pelo próprio Mestre. (Cap.X, itens 7 e 8; Cap. XXVII, itens 2 e 4.)

Essa deve ser a característica das reuniões Espíritas sérias, ouseja, daquelas reuniões em que se deseja sinceramente a contribuiçãodos bons Espíritos.

6. PRECE (no começo da reunião) – Suplicamos ao SenhorDeus, todo-poderoso, enviar-nos os bons Espíritos para nos amparar,afastando aqueles que poderiam induzir-nos ao erro. Suplicamos paranos dar o conhecimento necessário para distinguir a verdade da mentira.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM441

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

442

Afastai, também os Espíritos maldosos, encarnados edesencarnados que poderiam tentar lançar a desunião entre nós e nosdesviar da caridade e do amor ao próximo. Se alguns deles procuraremintroduzir-se aqui, fazei que eles não encontrem acesso no coração denenhum de nós.

Bons Espíritos, que vos dignais de vir nos instruir, tornai-nosdóceis aos vossos conselhos. Libertai-nos de toda idéia de egoísmo, deinveja e de ciúmes, inspirando-nos a indulgência e a benevolênciapara com todos os nossos semelhantes, presentes ou ausentes, para comos nossos amigos ou inimigos. Fazei, enfim, que pelos sentimentos deque somos animados, reconheçamos a vossa salutar influência.

Dai aos médiuns que encarregardes de nos transmitir os vossosensinamentos a consciência da santidade do mandato que lhes éconfiado e a gravidade do ato que vão praticar, a fim de que eles ofaçam com o fervor e o recolhimento necessários.

Se, em nossa reunião, estiverem pessoas movidas por outrossentimentos que não sejam os do bem, abri os seus olhos à luz darevelação e perdoai-lhes, como nós as perdoamos, se elas vieram commás intenções.

Pedimos especialmente ao Espírito... (diz o nome do Espíritoque é o orientador das reuniões), nosso mentor Espiritual, de nos assistire velar por nós.

7. PRECE (para o fim da reunião) – Agradecemos aos bonsEspíritos que se dignaram vir comunicarem-se conosco. Pedimos quenos ajudem a colocar em prática as instruções que nos deram e façamque, ao sair daqui, cada um de nós se sinta fortalecido para a práticado bem e do amor ao próximo.

Desejamos, igualmente, que essas instruções sejam proveitosasaos Espíritos sofredores, ignorantes ou viciosos, que puderam assistir aesta reunião e para os quais imploramos a misericórdia de Deus.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM442

443CAPÍTULO XXVIII

PARA OS MÉDIUNS

8. Nos últimos tempos, diz o Senhor, eu derramarei do meuEspírito sobre toda a carne; e os vossos filhos e vossas filhasprofetizarão, os vossos jovens terão visões e os vossos anciãos sonharãosonhos. – E também do meu Espírito derramarei sobre os meusservos e as minhas servas, naqueles dias, e profetizarão. (Atos dosApóstolos, Cap. 2, versículos 17 e 18.)

9. Prefácio. O Senhor quis que a luz se fizesse por sobre todosos homens e penetrasse por todas as partes pela voz dos Espíritos.Assim, cada um poderia adquirir a prova da imortalidade da alma.Com essa finalidade é que os Espíritos se manifestam hoje em todosos lugares da Terra e, por isso, é que a mediunidade desponta empessoas de todas as idades e de todas as condições, nos homens e nasmulheres, nas crianças e nos velhos. É um dos sinais de que chegaramos tempos anunciados pelos profetas da Antigüidade.

Para conhecer as coisas do mundo visível e descobrir ossegredos da natureza material, Deus concede ao homem a vida docorpo físico, os sentidos e os instrumentos próprios para pesquisas.Com o telescópio, o homem mergulha o seu olhar nas profundezasdo espaço celestial e, com o microscópio, o homem descobre omundo dos infinitamente pequenos.

E, para que o homem penetre na pesquisa do mundoespiritual, invisível e inacessível a seus sentidos comuns, Deus lheconcedeu a mediunidade.

Os médiuns são os intérpretes encarregados de transmitir aoshomens os ensinamentos dos Espíritos. Poderemos dizer que osmédiuns são os órgãos materiais pelos quais se exprimem os Espíritos,para se expressarem de maneira inteligível aos homens. A missãodesempenhada pelos médiuns é santa, porque ela tem por finalidadeabrir os horizontes da vida eterna para todos os encarnados.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM443

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

444

Os Espíritos vêm instruir os homens sobre o seu destinofuturo, a fim de reconduzi-los à senda do bem e não para liberá-losdo trabalho material, que o homem deve executar neste mundopara desenvolver a sua inteligência e não para favorecê-lo na suaambição ou cobiça.

Eis aí do que os médiuns devem compenetrar-se bem, paranão fazerem mau uso de sua faculdade. Aquele que se compenetrada gravidade do mandato de que está investido, deverá realizá-loreligiosamente. Sua consciência o condenaria, como um atoverdadeiramente condenável, se transformasse a sua faculdade emdivertimento ou distração para si ou para outras pessoas, uma vezque ela lhe foi concedida para uma finalidade bastante séria e que ocoloca em comunicação com os seres do mundo espiritual.

Como intérpretes dos ensinamentos dos Espíritos, os médiunsdevem desempenhar um papel importante na transformação moraldos homens, que se opera neste momento. Os serviços que osmédiuns podem prestar guardam relação com a boa orientação quederem à sua faculdade. É que aqueles médiuns que seguem o maucaminho são mais prejudiciais que úteis para a causa do Espiritismo.Pelas más impressões que estes médiuns produzem, eles retardammais de uma conversão. Eis por que eles terão de prestar contas domau uso que fizeram das faculdades que lhes foram concedidaspara o bem de seus semelhantes.

O médium que quer conservar a assistência dos bons Espíritosdeve trabalhar pela sua própria melhoria moral e intelectual. Aqueleque deseja ver tornar-se útil e desenvolvida a sua faculdade deve, elemesmo, crescer moralmente e abster-se de tudo o que possa desviá-la de seu fim providencial.

Se os bons Espíritos se servem às vezes, de médiuns imperfeitosmoralmente, é para dar-lhes bons conselhos e procurar levá-los aocampo do bem. Mas se esses Espíritos se encontram com coraçõesendurecidos no mal, e se os seus conselhos não são seguidos, eles se

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM444

445CAPÍTULO XXVIII

retiram e os Espíritos maldosos têm, então, o campo livre para asua influência infeliz. (Cap. XXIV, itens 11 e 12.)

A experiência demonstra que entre os que não aproveitam osbons conselhos que recebem dos bons Espíritos, as comunicações,após trazerem alguns clarões da verdade durante um certo tempo,degeneram, pouco a pouco, e terminam caindo no erro, no palavrea-do sem muito sentido e no ridículo, sinais indiscutíveis doafastamento dos bons Espíritos.

Obter a assistência dos bons Espíritos e despojar-se dosEspíritos levianos e mentirosos, esse deve ser o objetivo dos esforçosconstantes de todos os médiuns sérios. Sem isso, a mediunidadeserá uma faculdade estéril que pode mesmo tornar-se em prejuízodaquele a quem foi concedida, porque ela pode degenerar em umaobsessão perigosa.

O médium que compreende o seu dever, ao invés de orgulhar-se de uma faculdade que não lhe pertence, desde que lhe pode serretirada, atribui a Deus as boas coisas que obtém através dela. Se asmensagens que recebe merecem elogios, que o médium não seenvaideça com isso, porque ele sabe que essas comunicações nãodependem de suas qualidades pessoais. Antes, agradeça a Deus porter permitido que bons Espíritos viessem se manifestar através dele.Se as mensagens que transmite são passivas de crítica, que o médiumnão se ofenda, porque a comunicação não é obra de seu próprioespírito. Antes reconheça não ter sido um bom intermediário e quenão possui todas as qualidades necessárias para impedir a intromissãodos Espíritos maldosos. Eis por que esse médium deve tratar deadquirir as qualidades que lhe faltam e pedir, em prece, a forçamoral que lhe falta para atrair os bons Espíritos.

10. Prece – Deus Todo-Poderoso, permiti que os bonsEspíritos me assistam na comunicação que eu solicito. Preservai-me da presunção de me julgar livre dos Espíritos sofredores; doorgulho que me induza a enganar-me sobre o valor do que eu

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM445

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

446

obtenha, e de todo sentimento contrário à caridade para com osoutros médiuns.

Se eu for induzido ao erro, inspirai a alguém a idéia de mealertar sobre o erro e inspirai a mim a humildade que me faça aceitara crítica com gratidão e aceitar para mim mesmo, e não para osoutros, os conselhos que os bons Espíritos transmitirem por meuintermédio.

Se eu me sentir tentado a enganar, seja no que for, ou se meenvaidecer da faculdade mediúnica que vos agradou conceder-me,eu vos peço que a retireis de mim, o que é preferível do que vê-ladesviada de sua finalidade providencial, que é a do bem de todos e daminha própria evolução moral.

II – PRECES PELA PRÓPRIA PESSOA QUE ORA

AOS ESPÍRITOS PROTETORESE AOS MENTORES ESPIRITUAIS

11. Prefácio. Todos nós temos um bom Espírito que estáligado a nós desde o nosso nascimento e que nos tomou sob a suaguarda e proteção. Ele desempenha, junto de nós, a missão de umpai diante de um seu filho, que é a de induzir-nos ao caminho dobem e da evolução moral através das provas da vida. Ele se sentefeliz quando nós correspondemos aos seus cuidados e sofre quandonos vê cair em erros.

O nome dele pouco importa porque pode ocorrer que elenão tenha um nome que nos seja de alguém conhecido na Terra.Poderemos invocá-lo, então, como nosso Espírito Protetor, nossobom gênio. Poderemos mesmo invocá-lo sob o nome de umEspírito Superior, pelo qual sintamos simpatia.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM446

447CAPÍTULO XXVIII

Além de nosso Espírito Protetor, que é sempre um Espíritosuperior a nós mesmos, temos os mentores Espirituais que, porserem de categoria menos elevada, não são menos bons e benevolentes.Os Mentores Espirituais são parentes ou amigos ou, algumas vezes,são pessoas que conhecemos em reencarnações anteriores. Eles nosamparam com os seus conselhos e, com freqüência, com a suaintervenção nos acontecimentos de nossa vida.

Os Espíritos familiares são aqueles que se ligam a nós pelaafinidade de gostos e de pendores. Os Espíritos familiares podemser bons ou maldosos segundo a natureza de nossos inclinações, asquais serviram como foco de atração deles para nós.

Os Espíritos infelizes se esforçam para nos desviar do campodo bem, sugerindo-nos pensamentos infelizes. Aproveitam-se detodas as nossas fraquezas morais para acentuá-las, como de muitasoutras tantas portas abertas, que lhes dão entrada em nossaintimidade. Há, entre eles, alguns que se imantam a nós comoparasitas em plantas, mas que se afastam quando reconhecem a suafalta de força para lutar contra a nossa vontade decidida de manter-nos no campo do bem.

Deus nos deu um orientador principal e superior em nossoEspírito Protetor. Como orientadores complementares, Deus nosconcedeu os Mentores Espirituais e os Espíritos familiares. É, porém,um erro julgarmos que Deus nos tenha dado um Espírito maldosopara que vivamos no clima do bem e do mal, entre as boas e as másinfluências espirituais.

Os Espíritos maldosos que nos procuram, para realizar osseus objetivos pessoais e infelizes, são atraídos pelas nossas própriasfraquezas morais ou pela nossa desatenção em seguir as inspiraçõesdos bons Espíritos. Isso é que lhes dá os meios de dominar ouinfluir sobre a nossa vontade. Somos nós mesmos, portanto, queos atraímos. Por conseqüência desse fato, devemos saber que jamais

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM447

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

448

estaremos sem o amparo dos bons Espíritos e que é de nós quedependerá o distanciamento dos Espíritos maldosos.

Pelas suas imperfeições morais, o homem é o principal criadorde seus próprios sofrimentos e é, quase sempre, ele mesmo o espíritoque o perturba. (Cap. V, item 4.)

A prece aos Espíritos Protetores e aos Mentores Espirituaisdeve ter por finalidade solicitar a intercessão deles junto de Deus,pedindo-lhes as forças que nos são necessárias para resistir às mássugestões e para que nos amparem nas necessidades da vida.

12. PRECE – Espíritos sábios e benevolentes, mensageiros deDeus, cuja missão é amparar os homens e conduzi-los ao bom caminho,sustentai-me nas provações desta vida. Dai-me a força de suportá-las,sem queixas. Desviai de mim os maus pensamentos e fazei que eu nãodê acesso a nenhum dos Espíritos maldosos que tentariam induzir-meao mal. Esclarecei a minha consciência sobre os meus próprios defeitos.Tirai-me de sobre meus olhos o véu do orgulho que poderia impedir-me de perceber os meus erros e meu orgulho e de admiti-los em mimmesmo.

Vós, sobretudo.....( diz o nome dado ao Espírito Protetor), meuEspírito Protetor, que mais particularmente cuidais de mim, e vósoutros, Espíritos amigos que vos interessais por mim, fazei que eu metorne digno de vossa benevolência. Vós conheceis minhas necessidadesespirituais e que elas sejam atendidas, segundo a vontade de Deus.

13. PRECE (outra) – Meu Deus, permiti que os bons Espíritosque me cercam venham ajudar-me, quando eu me achar em sofrimentoe que me amparem se eu desfalecer. Fazei, Senhor, que eles me inspirema fé, a esperança e a caridade. Que eles sejam para mim um apoio,uma esperança e uma demonstração da vossa misericórdia. Fazei,enfim, que eu neles encontre a força que me faltar nas provas da vidae, para resistir as sugestões do mal, que eu encontre neles a fé que salvae o amor que consola.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM448

449CAPÍTULO XXVIII

14. PRECE (outra) – Espíritos bem-amados, Espíritos Protetores,vós a quem Deus, na infinita misericórdia, permite velarem peloshomens, sede o nosso amparo nas provas da vida terrena. Dai-nos aforça, a coragem e a resignação. Inspirai-nos com tudo o que é bom,freando-nos na descida para o mal. Que a vossa doce influência nospenetre na alma. Fazei que sintamos que um amigo devotado está aonosso lado, que vê os nossos sofrimentos e que participa de nossas alegrias.

E vós, meu bom Espírito Protetor, não me abandoneis nunca.Eu necessito de toda a vossa proteção para suportar com fé e amor asprovas que a Justiça Divina me enviar.

PARA AFASTAROS ESPÍRITOS MALFAZEJOS

15. Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas! pois que limpaiso exterior do copo e do prato, mas que trazem o interior cheio derapina e de iniqüidade. Fariseu cego! Limpa primeiro o interior docopo e do prato, para que também o exterior fique limpo. Ai devós, escribas e fariseus hipócritas! pois que sois semelhantes aossepulcros caiados que, por fora, realmente parecem formosos, masinteriormente estão cheios de ossos de mortos e de toda a imundície.Assim vós exteriormente pareceis justos aos homens, mas interiormenteestais cheios de hipocrisia e de iniqüidade. (Mateus, capítulo 23,versículos 25 e 28.)

16. Prefácio. Os Espíritos maldosos somente estão ondepossam encontrar a satisfação de suas maldades. Para distanciá-losde sua vida, não basta pedir, nem mesmo ordenar que se afastem. Énecessário eliminar em você mesmo aquilo que os atrai. Os Espíritosmaldosos pressentem as chagas da alma, como as moscas pressentemas chagas do corpo. Assim como você limpa o corpo para evitarinfecções, limpe também a sua alma de todas as impurezas morais,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM449

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

450

para evitar a influência dos Espíritos maldosos. Como vivemos nummundo onde existem muitos Espíritos desequilibrados moralmente,as boas qualidades do coração nem sempre bastam para resguardar-nos de suas tentativas de dominar-nos, mas essas qualidades são aforça para resistir às influências doentias.

17. PRECE – Em nome de Deus Todo-Poderoso, convido a queos Espíritos infelizes se afastem de mim, e que os bons Espíritos mesirvam de resguardo contra eles!

Espíritos malfazejos, que inspirais maus pensamentos aos homens;Espíritos enganadores e mentirosos, que os enganais; Espíritoszombeteiros, que vos divertis com a credulidade dos homens, eu vosconvido a afastar-vos com todas as, forças morais de minha alma efecho meus ouvidos às vossas sugestões infelizes, mas imploro por vós amisericórdia de Deus.

Bons Espíritos que me assistis, dai-me, força de resistir à influênciamenos feliz desses Espíritos malfazejos e dai-me as luzes necessáriaspara eu não cair em suas intrigas. Preservai-me do orgulho e dapresunção. Afastai de meu coração o ciúme, o ódio, a maldade e todosentimento contrário à caridade, que são outras tantas portas abertaspara a influência do espírito do mal.

PARA CORRIGIR UM ERRO

18. Prefácio. As nossas más tendências são uma conseqüênciada nossa própria imperfeição moral, e não do nosso organismofísico. Se assim não fosse, o homem não teria nenhuma espécie deresponsabilidade por seus erros pessoais. A nossa evolução espiri-tual, por isso, depende de nós mesmos, uma vez que todo homemque se acha na posse de suas faculdades morais tem, perante todosos acontecimentos, a liberdade de fazer ou não fazer o bem. Parafazer o bem só lhe falta a vontade de fazê-lo.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM450

451CAPÍTULO XXVIII

19. PRECE – Destes-me, ó meu Deus, a inteligência necessáriapara discernir o que é bem e o que é mal. Assim, a partir do momentoem que reconheço que uma coisa é má, eu sou culpado se não meesforçar para resistir a praticá-la.

Preservai-me do orgulho que poderia impedir-me de ver os meuspróprios erros e dos Espíritos malfazejos que poderiam induzir-me aperseverar nos meus defeitos pessoais.

Entre as minhas imperfeições, eu reconheço que eu souparticularmente inclinado a ..... (diz a principal má inclinação quecompromete a sua vida moral) e se não resisto à sua influência é porcausa do costume que adquiri de por ela me deixar atrair.

Vós não me criastes para o erro, porque sois justo, mas me criastescom igual aptidão para o bem e para o mal. Se eu preferi o maucaminho, foi por efeito de meu livre-arbítrio. Mas, se pelo livre-arbítrioeu tive a liberdade de fazer o mal, pelo próprio livre-arbítrio tenho aliberdade de fazer o bem e, por efeito do bem que eu faça, podereimudar do caminho do mal para o campo do bem.

Meus atuais defeitos são o que resta das imperfeições espirituaisque conservo de reencarnações anteriores. São elas os pecados que seoriginam de mim mesmo e dos quais posso libertar-me por um esforçodecidido de minha vontade e com o amparo dos bons Espíritos.

Bons Espíritos que me protegeis, e principalmente vós, meuEspírito Protetor, dai-me a força de resistir às más sugestões e para sairvitorioso da luta que travo comigo mesmo.

Os defeitos são abismos que nos separam de Deus e cada defeitoque eu supere é uma ponte que construo para aproximar-me do Criador.

O Senhor, na sua infinita misericórdia, concedeu-me areencarnação atual para que dela me sirva, a fim de evoluir moralmente.Bons Espíritos, ajudai-me a aproveitar esta reencarnação, para que eunão perca esta nova oportunidade de regeneração e para que, quando oSenhor dela me retirar, eu possa sair melhor do que quando aqui cheguei.(Cap. V, item 5 e Cap. XVII, item 3.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM451

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

452

PARA RESISTIR A UMA TENTAÇÃO

20. Prefácio. Todo mau pensamento pode ter duas fontes deorigem: a própria imperfeição de nossa alma ou uma prejudicialinfluência que se exerce sobre a nossa vida íntima. Neste últimocaso, há sempre o indício de uma fraqueza moral que nos tornasujeitos a recolher essa influência perniciosa e, por conseqüência,também é o indício de nossas imperfeições. Por isso é que aqueleque praticar um erro, não deverá desculpar-se querendo atribuí-lo àinfluência de um Espírito estranho, porque esse Espírito não poderiaarrastá-lo ao mal, se o julgasse inacessível à sedução.

Quando um mau pensamento surge em nós, poderemos suporque ele represente a presença de um Espírito malfazejo a solicitar-nos para o mal, ao qual nós somos livres para ceder ou resistir,como se estivéssemos diante de sugestões de uma pessoa encarnada.Devemos, portanto, ao mesmo tempo em que supomos a presençadesse Espírito, supor também a presença de nosso Espírito Protetorque, por sua vez, combate em nós a má influência e espera comansiedade a decisão que vamos tomar.

A nossa hesitação em praticar o mal é a voz do bom Espíritoque se faz ouvir pela voz de nossa consciência.

Reconhece-se que um pensamento é mau, quando ele nosafasta da caridade, que está na base de toda verdadeira moral. É,também, mau todo pensamento que possa ocasionar algum danopara as outras pessoas. É mau o pensamento, finalmente, quandoele nos induz a fazer aos outros o que não quereríamos que os outrosnos fizessem. (Item 15 desta parte e Cap. XV, item 10.)

21. PRECE – Deus Todo-Poderoso, não me deixeis cair natentação que me impele ao erro moral. Espíritos benevolentes, que meprotegeis, afastai de mim este mau pensamento e dai-me força pararesistir às sugestões do mal. Se eu sucumbir a essas tentações, merecerei

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM452

453CAPÍTULO XXVIII

a expiação de meu erro nesta vida e na outra, porque eu tenho aliberdade de escolher entre fazer o mal e fazer o bem.

NA VITÓRIA SOBRE UMA TENTAÇÃO

22. Prefácio. Aquele que resistiu a uma tentação, deve essefato à assistência dos bons Espíritos, a cuja voz escutou. Ele, portanto,deve agradecer a Deus e a seu Espírito Protetor.

23. PRECE – Meu Deus, eu vos agradeço de me haverdespermitido sair vitorioso nesta luta que tive de sustentar contra a atraçãodo mal. Fazei que esta vitória me dê forças para resistir a novastentações.

E a vós, meu Espírito Protetor, eu vos agradeço o amparo queme haveis dado. Possa a minha submissão aos vossos conselhos me fazercredor de vossa proteção!

PARA PEDIR CONSELHOS

24. Prefácio. Quando estamos indecisos em fazer ou deixarde fazer alguma coisa, devemos, antes de tudo, propor a nós mesmosas seguintes questões:

1) A coisa que eu hesito fazer, pode ser prejudicial a qualqueroutra pessoa?

2) Essa coisa poderá ser proveitosa para alguém?3) Se alguém fizesse essa coisa comigo, eu ficaria satisfeito?Se o que temos de fazer só interessa a nós mesmos, é nos

permitido pesar as vantagens e desvantagens e os inconvenientespessoais que daí resultariam.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM453

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

454

Se interessa a outras pessoas, e se fizer o bem a um e o mal aoutro, é igualmente necessário pesar a soma de bem e a soma domal para abster-nos de fazê-la, ou, então, para fazê-la.

Afinal, mesmo para as melhores coisas, é necessário queconsideremos a oportunidade de fazê-la e as circunstânciascomplementares. É que uma coisa boa, em si mesma, pode darmaus resultados em mãos não habilitadas para realizá-la e se não seconduzir com prudência e com um exame demorado. Antes deempreendê-la, convém consultar friamente as próprias forças e osseus meios de execução.

Em todos os casos, pode-se sempre pedir o amparo de seusEspíritos Protetores, lembrando-se deste sábio conselho: Na dúvida,abstenha-se. (Veja o item 38 desta parte.)

25. PRECE – Em nome de Deus Todo-Poderoso, Bons Espíritosque me protegem, inspirai-me a melhor decisão a tomar, na incertezaem que me encontro. Dirigi o meu pensamento para o bem e desviaia influência daqueles que tentarem me desviar do bom caminho.

NAS AFLIÇÕES DA VIDA

26. Prefácio. Podemos pedir a Deus benefícios materiais. EDeus pode atender-nos naqueles que tenham um fim útil e sério.Mas como julgamos as utilidades das coisas dentro de uma visãoacanhada e imediatista, e só vemos o momento presente, nem semprevemos o lado mau daquilo que desejamos. Deus, que vê mais doque nós, e que só vê o nosso bem espiritual, pode recusar o quepeçamos, como um bom pai recusa ao filho o que lhe poderia serprejudicial. Se aquilo que pedimos não nos é concedido, nãodevemos por isso entregar-nos ao desânimo. Devemos pensar, pelocontrário, que a privação do que desejamos nos é imposta como

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM454

455CAPÍTULO XXVIII

prova ou como expiação, e que a nossa recompensa será proporcionalà resignação com que a houvermos suportado. (Cap. XXVII, item6 e, nesta parte, itens 5, 6 e 7.)

27. PRECE – Deus Todo-Poderoso, que vedes os nossossofrimentos, dignai-vos ouvir, favoravelmente, a súplica que vos dirijoneste momento. Se meu pedido é inconveniente, perdoai-me. Se ele éjusto e útil aos vossos olhos, que os bons Espíritos que executam os vossosdesígnios me venham em ajuda para a sua realização.

Seja como for, meu Deus, que se faça a vossa vontade e não aminha. Se os meus desejos não forem atendidos, é que está em vossosdesígnios o querer experimentar-me e eu a eles me submeto semqueixar-me. Fazei que de modo algum eu desanime e que nem aminha fé, nem a minha resignação sejam abaladas.

(apresentar o que queira pedir)

FAVOR OBTIDO

28. Prefácio. Não se deve considerar somente como sucessosfelizes os acontecimentos de grande importância. Os fatos deaparência pequena são, muitas vezes, aqueles que têm mais influênciasobre o nosso destino. O homem esquece facilmente o bem e selembra, de preferência, do mal que o aflige. Se anotássemos, todosos dias, os benefícios que recebemos, sem havê-los pedido,ficaríamos muitas vezes admirados de ter recebido tantos que nemconstam mais de nossa memória. E, pelo esquecimento, nossentiríamos humilhados com a nossa ingratidão para com aProvidência Divina.

Cada noite, ao elevar a nossa alma a Deus, devemos recordarem nosso íntimo os favores que nos foram concedidos durante odia e agradecê-los.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM455

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

456

É sobretudo, no momento mesmo em que experimentamosos efeitos da bondade e da proteção divinas que, num ato espontâneo,devemos lhe demonstrar a nossa gratidão. Basta, para isso, que lheergamos um pensamento, atribuindo-lhe o benefício, sem que nosseja necessário interromper o nosso trabalho.

Os benefícios vindos de Deus não consistem apenas em coi-sas materiais. Devemos agradecer-lhe, também, as boas idéias, asinspirações felizes que nos foram sugeridas. Enquanto o orgulhosotudo atribui às suas próprias qualidades e o incrédulo as atribui aoacaso, aquele que tem fé rende graças a Deus e aos bons Espíritospelo que recebeu. Para isso, são inúteis as grandes frases. “Obrigado,meu Deus, pelo bom pensamento que me inspirastes”, fala mais quemuitas palavras. O impulso espontâneo, que nos leva a atribuir aDeus tudo o que nos sucede de bom, revela em nós mesmos umhábito de reconhecimento e de humildade, que nos traz a simpatiados bons Espíritos (Cap. XXVII, itens 7 e 8.)

29. PRECE – Deus infinitamente bom, que o vosso nome sejabendito pelos benefícios que me haveis concedido. Eu seria indigno seos atribuísse ao acaso dos acontecimentos ou a meus próprios méritos.Bons Espíritos que fostes os executores da vontade de Deus, e vós,sobretudo, meu Espírito Protetor, aceitai meus agradecimentos. Afastaide mim a idéia de orgulhar-me do que recebi e de não fazer dessaconcessão um uso que não seja para o bem.

Agradeço-vos, em particular..... (citar o benefício recebido).

SUBMISSÃO E RESIGNAÇÃO

30. Prefácio. Quando uma aflição nos chega, se lhe procurarmosa causa, vamos encontrá-la, quase sempre, em nossa imprudênciaou em nossa imprevidência ou numa ação anterior que desencadeou

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM456

457CAPÍTULO XXVIII

a conseqüência infeliz. Em qualquer desses casos, só de nós mesmosteremos de nos queixar. Se a causa de um infortúnio não se originade um nosso ato atual, trata-se, por certo, de uma prova para estaexistência, ou será a expiação por atos de existências passadas. E,neste último caso, a natureza da expiação nos permitirá conhecer anatureza do erro praticado. E que nós sempre sofremos aquilo quefizemos os outros sofrerem. (Cap. V, itens 4, 6 e seguintes.)

No que nos aflige, vemos em geral apenas o mal presente enão os efeitos favoráveis futuros que nos poderão vir daí. O bem é,muitas vezes, a conseqüência de um mal passageiro, como a cura deuma enfermidade é o resultado dos meios dolorosos que foramempregados para alcançá-la. Em todos os casos de aflição, devemosnos render aos desígnios de Deus, suportando com resignação asatribulações da vida, se quisermos aproveitá-las para a nossaregeneração. É a nós que se aplicam estas palavras do Cristo:

“Bem-aventurados os que sofrem.” (Cap. V, item 18.)31. PRECE – Meu Deus, vós sois soberanamente justo. Todo

sofrimento neste mundo deve, portanto, ter uma causa justa e umautilidade igualmente justa. Aceito a aflição que eu estou sofrendocomo uma expiação de meus erros passados e como uma prova para omeu futuro espiritual.

Bons Espíritos que me protegeis, dai-me forças para suportar asaflições sem queixas. Fazei que elas sejam, para mim, um aviso salutar.Que elas se somem com as minhas experiências anteriores. Que elasabatam o meu orgulho, a minha ambição, a minha tola vaidade e omeu egoísmo, e que contribuam, assim, para a minha evolução moral.

32. PRECE (outra) – Eu sinto, ó meu Deus, a necessidade devos pedir que me deis força para suportar as provações a que mesubmeteis. Permiti que a luz se faça intensamente viva em minhaalma, a fim de que eu possa valorizar toda a grandeza do vosso amorque me permite a aflição, por querer salvar-me do mal. Eu me submetocom resignação, ó meu Deus, mas, como criatura fraca e falível, se não

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM457

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

458

me amparardes, temo sucumbir. Não me abandoneis, Senhor, porquesem vós eu nada posso.

33. PRECE (outra) – Eu elevei o meu olhar para Ti, ó Eterno,e me senti fortalecido. Tu és minha força, não me abandones jamais.Ó meu Deus! Sinto-me esmagado sob o peso de minhas injustiças!Ajuda-me! Tu conheces a fraqueza de minha carne e não desvies demim o teu olhar!

Eu sou devorado por urna sede ardente. Faz brotar a fonte daágua viva e me dessedentarei. Que a minha boca se abra para tecantar louvores e não para queixar-me das aflições de minha vida.Sou fraco moralmente, Senhor, mas teu amor me sustentará.

O Eterno! só tu és grande, só tu és o motivo e a finalidade deminha vida. Bendito seja o teu nome, se me fazes sofrer, pois tu és oSenhor e eu o teu servidor infiel. Curvarei a fronte e sem me queixar,porque só tu és grande, só tu és a meta de nossas vidas!

DIANTE DE UM PERIGO

34. Prefácio. Pelos perigos que corremos, Deus nos alerta sobrea fraqueza e a fragilidade de nossa existência. Ele nos mostra quenossa vida está nas mãos d’Ele e que essa vida se acha ligada por umfio que se pode romper a qualquer hora, num momento que menosesperarmos. Sob esse aspecto, não existe privilégio para ninguém.Os poderosos e os pequenos estão submetidos às mesmos leisdivinas.

Se examinarmos a natureza e as conseqüências do perigo quenos ameaça, veremos que, muitas vezes, essas conseqüências caso severificassem, seriam os efeitos de erros praticados ou de um devernão cumprido.

35. PRECE – Deus Todo-Poderoso, e vós, meu Espírito Protetor,socorrei-me! Se devo sucumbir, que se faça a vontade de Deus. Se for

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM458

459CAPÍTULO XXVIII

salvo, que no restante de minha vida eu repare o mal que eu fiz e doqual me arrependo.

POR ESCAPAR DE UM PERIGO

36. Prefácio. Pelo perigo que tenhamos corrido, Deus nosrevela que, de um momento para outro, podemos ser chamados aprestar contas à Justiça Divina sobre o emprego que demos para anossa vida. Avisa-nos, assim, que devemos examinar a nós mesmose emendar-nos, corrigindo os nossos erros e reparando os malesque tenhamos praticado.

37. PRECE – Meu Deus, e vós, meu Espírito Protetor, eu vosagradeço o socorro que me enviastes no perigo que me ameaçou. Queesse perigo me seja um aviso e que me esclareça sobre os erros que oatraíram para meu caminho. Compreendo, Senhor, que a minha vidaestá em vossas mãos e que podeis retirá-la quando quiserdes. Inspirai-me, através dos bons Espíritos que me assistem, a idéia de empregarde modo útil o tempo que me concedestes de vida neste mundo.

Meu Espírito Protetor, sustentai-me na decisão que tomo dereparar os meus erros e de fazer todo o bem que estiver ao meu alcance,a fim de chegar com menos imperfeições no mundo dos espíritos, quandoDeus quiser me chamar desta existência.

AO DEITAR PARA DORMIR

38. Prefácio. O sono é feito para o repouso do corpo. OEspírito, porém, não tem necessidade de repousar. Enquanto ossentidos físicos entram em dormência, a alma se libera parcialmentedo invólucro corporal e desperta as faculdades do Espírito. O sonofoi dado ao homem para a reposição das energias orgânicas e,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM459

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

460

também, para retemperar as forças morais. Enquanto o corpo serecupera dos elementos desgastados pela atividade da vigília, oEspírito se vai retemperar entre os outros Espíritos. É, então, queele haure no que vê, no que ouve e nos conselhos que lhe são dados,as idéias que, ao despertar, lhe ocorrem na forma de intuição. Esseé o retorno temporário do exilado para a sua verdadeira pátria, omundo dos espíritos. Esse é o prisioneiro momentaneamenterestituído à liberdade.

Mas acontece, como se dá com o condenado reincidente noserros, que o Espírito nem sempre aproveita o momento de liberdadepara a sua evolução. Se ele conserva inclinações más, ao invés debuscar a companhia dos bons Espíritos, ele busca a companhia dosseus iguais e vai visitar os lugares onde ele pode liberar as suas máspaixões.

Aquele que se acha compenetrado desta verdade, eleve seupensamento a Deus, no momento em que sente a aproximação dosono. Solicite os conselhos dos bons Espíritos e de todos aquelesEspíritos que sejam caros ao seu coração, a fim de que venhamencontrar-se com ele, nos curtos instantes em que ele estiver despertona espiritualidade. E, assim, ao acordar, ele se sentirá fortalecidocontra o mal, mais corajoso para enfrentar as adversidades daexistência.

39. PRECE – Eu vou estar, em Espírito, por alguns instantesentre outros Espíritos. Que aqueles que são bons venham me ajudarcom os seus conselhos. Meu Espírito Protetor, fazei que, ao acordar, eupossa conservar uma impressão durável e salutar desse encontro.

PREVENDO A MORTE

40. Prefácio. A fé no futuro espiritual, a elevação dopensamento a Deus, durante a vida, na direção dos destinos superiores

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM460

461CAPÍTULO XXVIII

da alma, ajudam a liberação do Espírito, afrouxando o laço fluídicoque o retém no corpo físico. É muito freqüente que a vida corporalainda não se extinguiu de todo e a alma, impaciente, já o abandonae parte na direção do Infinito.

No homem que, pelo contrário, concentra todos os seuspensamentos sobre as coisas e valores do mundo material, o laçofluídico que o retém no corpo físico é muito forte e a separação docorpo é sofrida e dolorosa, seguida de um despertar no além-túmulorepleto de perturbação e ansiedade.

41. PRECE – Meu Deus, eu creio em vós e na vossa bondadeinfinita. Eis porque não creio que haveis concedido ao homem ainteligência de vos conhecer e a aspiração na direção do futuro, paradepois mergulhá-lo no nada.

Eu creio que meu corpo não é mais que um envoltório perecívelde minha alma e que, quando o corpo tenha deixado de viver,despertarei no mundo espiritual.

Deus Todo-Poderoso, sinto que se rompem os laços que me unema meu corpo físico e bem logo eu prestarei contas à Justiça Divina davida que levei e de tudo o que fiz e que deixei de fazer.

Vou experimentar as conseqüências do bem e do mal quepratiquei. No mundo espiritual não haverá mais ilusões, nem maisdesculpismos possíveis. Todo o meu passado se erguerá diante de mime a minha consciência me julgará segundo as minhas obras.

Não levarei nenhum dos bens da Terra. Honrarias, riquezas,satisfações da vaidade e do orgulho, tudo enfim, que se refere à vidado corpo permanecerá neste mundo. Nem a menor parcela de tudo oque eu possuía me valerá e nem será de utilidade no Mundo Espiritual.Só levarei as boas e as más qualidades que serão pesadas pela JustiçaDivina, no campo de minha própria consciência. Serei cobrado, comtanto mais severidade, quanto mais a minha posição na existência mefavoreceu com oportunidades de fazer o bem e que eu não o fiz. (Cap.XVI, item 9.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM461

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

462

Deus de misericórdia, que o meu arrependimento suba até vós!Dignai-vos estender sobre mim a vossa indulgência.

Se for de vossos desígnios alongar a minha existência, que otempo que me restar seja empregado em reparar, quanto me sejapossível, o mal que eu tenha feito! Se minha hora chegou, sem maisoutras oportunidades, que eu leve comigo a idéia consoladora de queme será permitido resgatar meus erros através de novas provas, a fimde que eu possa conquistar um dia a felicidade dos eleitos.

Se não me é permitido gozar imediatamente dessa felicidadesem manchas de sofrimentos, de que só participam os verdadeiramentejustos, eu sei que a esperança de tê-la não me é proibida para sempre.Pelo trabalho alcançarei essa meta, mais cedo ou mais tarde, de acordocom a minha dedicação ao campo do bem.

Sei que os bons Espíritos, e meu Espírito Protetor, estão perto demim e me receberão no mundo espiritual. Em breve os verei, comoeles me vêem. Sei que reencontrarei aqueles a quem amei na Terra, seeu o merecer, e que aqueles que aqui deixo irão juntar-se a mim epara sempre estaremos juntos. E sei que, enquanto esperar por essemomento de união, poderei vir visitá-los neste mundo.

Sei, também, que vou rever aqueles a quem ofendi. Possam elesme perdoar o que lhes fiz. Meu orgulho, minha dureza, minhasinjustiças, que sejam esquecidas, para que a minha vergonha não meabata na presença deles.

Perdôo aos que me tenham feito ou tenham querido fazer omal na Terra. Eu não levo nenhum ódio contra eles e peço a Deus queos perdoe.

Senhor, dai-me a força de deixar sem pena as alegrias grosseirasdeste mundo, que nada são diante das alegrias puras do mundo emque vou entrar!

Nesse mundo espiritual, para os justos não há mais tormentos,nem mais sofrimentos, nem mais misérias. Nesse mundo, somente o

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM462

463CAPÍTULO XXVIII

culpado sofre, mas para ele resta o consolo da esperança de redenção evida nova.

Bons Espíritos, e vós, meu Espírito Protetor, não me deixeisfalir neste momento supremo! Fazei brilhar, diante de meus olhos,a Divina Luz, a fim de que se reanime a minha fé, se a minha févacilar.

(Nota – Ver adiante, no subcapítulo V: “Preces pelos doentes e pelos obsidiados.” )

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM463

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

464

III - PRECES PELOS ENCARNADOS

POR QUEM ESTÁ AFLITO

42. Prefácio. Se é benéfico espiritualmente para o aflito queas provações sigam o seu curso, elas não serão abreviadas com onosso pedido. Mas será um ato de impiedade perdermos o ânimopela prece a seu favor, tão-somente porque o nosso pedido não foiatendido por inteiro. Lembremos que se a provação não forinterrompida, o aflito poderá obter uma consolação que lhe abrandeas amarguras. O que é verdadeiramente útil, para quem está emaflição, é a coragem e a resignação, sem as quais as lições de vida queele recebe não serão apreendidas e ele será obrigado a passarnovamente por elas.

É nessa direção, portanto, que devemos encaminhar os nossosesforços, quer pedindo aos bons Espíritos que o ajudem, querlevantando o ânimo do aflito através de nossos conselhos eencorajamento, quer, enfim, dando-lhe assistência material, se issofor necessário e possível. A prece, neste caso, pode ter ainda umoutro efeito direto, por envolver a pessoa por quem se ora numclima fluídico que lhe fortalece o ânimo. (Cap. V, itens 5 e 27;Cap. XXVII, itens 6 e 10.)

43. PRECE – Meu Deus, de infinita bondade, dignai-vossuavizar o sofrimento de ..... (diz o nome da pessoa por quem seora), se assim for de vossa vontade.

Bons Espíritos, em nome de Deus Todo-Poderoso, eu vos suplicopara ampará-lo em suas aflições. Se, para o seu benefício espiritual,essas provas não possam ser diminuídas, fazei-lhe compreender que

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM464

465CAPÍTULO XXVIII

elas lhe são necessárias para a sua evolução espiritual. Dai-lhe, então,a confiança em Deus e no futuro, o que tornará essas provas menosamargas. Dai-lhe, assim, a energia espiritual para não cair no desespero,o que o faria perder o fruto de seus sofrimentos e tornaria a sua situaçãofutura ainda mais dolorosa. Envolvei-o no meu pensamento de ânimoe de fraternidade e que, assim, eu possa ajudá-lo a sustentar a coragemde que necessita para esta hora de aflição.

AGRADECENDO POR BENEFÍCIOSCONCEDIDOS A OUTRA PESSOA

44. Prefácio. Quem não se encontra dominado pelo egoísmo,alegra-se com o bem que beneficia a seu próximo, mesmo que elenão o tenha solicitado pela prece.

45. PRECE – Meu Deus, sejais bendito pela felicidadeconcedida a ..... (diz o nome de quem recebeu o benefício).

Bons Espíritos, fazei que ele veja nesse benefício um efeito dabondade de Deus. Se o bem que lhe é concedido é uma prova, inspirai-lhe a idéia de bem aplicá-lo e de não se envaidecer, a fim de que essebem não se transforme em prejuízo espiritual para o seu futuro. Vós,meu bom Espírito que me protegeis e que desejais a minha felicidade,afastai de meu pensamento todo sentimento de inveja e de ciúmes.

PELOS INIMIGOS E AOS QUE NOS QUEREM MAL

46. Prefácio. Jesus disse: Amai os vossos próprios inimigos. Estamáxima é sublimação da caridade cristã. Mas, por ela, Jesus nãoqueria dizer que devemos ter pelos nossos inimigos a mesma ternuraque temos pelos nossos amigos. Ele nos diz, por essas palavras, paraesquecer as ofensas, para perdoá-los do mal que nos tenham feito,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM465

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

466

para retribuir o mal com o bem. Além do merecimento que oamor aos inimigos tem aos olhos de Deus, ele serve para mostraraos olhos dos homens o que é a verdadeira superioridade espiritual.(Cap. XII itens 3 e 4.)

47. PRECE – Meu Deus, eu perdôo a ..... (diz o nome deofensor), o mal que ele me fez e aquele que ele venha a fazer-me,como eu desejo que me perdoeis e que ele, por sua vez, me perdoe asfaltas que eu tenha cometido. Se o pusestes em meu caminho comoprova, que seja feita a vossa vontade.

Afastai de mim, ó meu Deus, a idéia de maldizê-lo e tododesejo malévolo meu contra ele. Fazei que eu não me alegre com osmales que possam atingi-lo e nem qualquer pesar pelos bens que lhesejam concedidos, a fim de eu não macular a minha alma compensamentos indignos de um cristão.

Que possa a vossa bondade, Senhor, estender-se sobre ele einduzi-lo a ter melhores sentimentos para comigo!

Bons Espíritos, inspirai-me o esquecimento do mal e a lembrançado bem. Que nem o ódio, nem o rancor, nem o desejo de lhe retribuiro mal com o mal, não se abriguem em meu coração. O ódio e a vingançasão próprios unicamente dos Espíritos malevolentes, encarnados edesencarnados! Que eu esteja pronto, pelo contrário, a lhe estender amão fraternal, a lhe retribuir o mal com o bem e a ir-lhe em ajuda, seisso estiver ao meu alcance.

Eu desejo, para mostrar a sinceridade de minhas palavras, quese me apresente uma oportunidade de ser-lhe útil. Mas, acima detudo, ó meu Deus, preservai-me de agir por orgulho ou ostentação,abatendo-o com uma generosidade humilhante. Isso me fará perder ofruto de minha ação fraternal. Neste caso, eu mereceria que me fosseaplicada esta palavra do Cristo: Já recebestes a vossa recompensa. (Cap.XIII, item 1 e seguintes.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM466

467CAPÍTULO XXVIII

AGRADECENDO PELO BEMCONCEDIDO AOS INIMIGOS

48. Prefácio. Não desejar o mal aos seus inimigos é ser caridosoapenas pela metade. A verdadeira caridade quer que lhes desejemoso bem e que sejamos felizes com o bem que lhes seja concedido.(Cap. XII, itens 7 e 8.)

49. PRECE – Meu Deus, na vossa Justiça decidistes dar alegriasao coração de ..... (diz o nome do inimigo). Eu vos agradeço por isso,apesar do mal que ele me fez e do que me poderá fazer. Se desse bemele se aproveitar para humilhar-me, eu aceitarei a humilhação comouma prova para a minha caridade.

Bons Espíritos que me protegeis, não permitais que eu sintanenhum pesar por isso. Livrai-me da inveja e do ciúme que rebaixamo sentimento fraternal. Inspirai-me, pelo contrário, o sentimento degenerosidade que eleva a alma acima das coisas e da Terra. Ahumilhação está no mal e não no bem, e nós sabemos que, cedo outarde, a Justiça será feita a cada um segundo as suas obras.

PELOS INIMIGOS DO ESPIRITISMO

50. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça,porque serão fartos. Bem-aventurados os que sofrem perseguiçãopor causa da Justiça, porque deles é o reino dos céus. Bem-aventurados sois vós quando vos injuriarem e perseguirem, e,mentindo, disserem todo o mal contra vós por minha causa. Exultaie alegrai-vos, porque é grande o vosso galardão nos céus, porqueassim perseguiram os profetas que vieram antes que vós. (Mateus,capítulo 5, versículos 6, 10 a 12.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM467

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

468

E não temais os que matam o corpo e não podem matar aalma. Temei antes aquele que pode fazer perecer no inferno a almae o corpo. (Mateus, capítulo 10, versículo 28.)

51. Prefácio. De todas as liberdades, a mais inviolável é a depensar, que envolve a liberdade de consciência. Lançar condenaçãoaos que não pensam como nós, é querer essa liberdade de consciênciapara si e recusá-la para os outros. E com essa conduta, viola-se omaior mandamento de Jesus: a caridade e o amor ao próximo.

Perseguir os outros pela crença que abraçam é ferir o direitomais sagrado do homem que é o de crer no que mais convém paraa sua consciência e de adorar a Deus como lhe pareça melhor.Obrigá-los à prática de atos exteriores que sejam semelhantes aosnossos, é mostrar que damos mais importância à forma externa doculto do que para a essência dos princípios religiosos, maisimportância às aparências que à convicção da fé.

A renúncia forçada da crença que se abraça jamais deu umaoutra fé a quem quer que seja. Ela não pode produzir mais quehomens com falsos sentimentos. É um abuso da força material,que não revela nenhuma verdade. A verdade é senhora de si mesma:ela convence e não persegue, porque não tem necessidade de perseguirpara impor-se.

O Espiritismo é uma opinião, uma crença. Sendo mesmouma religião, por que não teriam os seus adeptos a liberdade de sedizerem Espíritas, como os outros têm de se dizerem católicos,judeus ou evangélicos, por serem adeptos desta ou daquela doutrinareligiosa, deste ou daquela sistema econômico?

A alternativa proposta para a razão é: ou a crença Espírita éfalsa ou ela é verdadeira. Se ela é falsa, cairá por si mesma, porque oerro não sobrevive à verdade quando o seu conhecimento real se faznas inteligências. Mas se ela é verdadeira, a perseguição não atransformará em crença falsa.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM468

469CAPÍTULO XXVIII

A perseguição é a iniciação de toda idéia nova, grande e justa.Essa perseguição cresce com a grandeza e o valor da idéia. O furor ea cólera de seus inimigos, equivalem ao temor que ela lhes inspira,por contrariar-lhes os interesses profissionais. Pelo mesmo motivoo cristianismo foi perseguido na época de seu advento e o Espiritismoé hoje perseguido, apenas que com a diferença de que o cristianismofoi perseguido pelos pagãos, enquanto que o Espiritismo o é peloscristãos.

O tempo das perseguições sanguinolentas já passou, esta é averdade. Mas se hoje não matam o corpo, torturam a alma. Ferem-na nos seus sentimentos mais íntimos, nas suas afeições mais caras.As famílias são divididas, jogando-se a mãe contra a filha, a mulhercontra o marido. E mesmo a agressão física não falta, ferindo-se asnecessidades materiais, ao tirarem das pessoas o trabalho que lhespermite o ganha-pão, para reduzi-las à fome. (Cap. XXIII, itens 9 eseguintes.)

Espíritas, não se aflijam com os golpes que lhes desferem,pois eles revelam que vocês estão com a verdade. Se vocês estivessemcom a mentira, eles os deixariam tranqüilos e não os agrediriam.Essa é uma prova para a sua fé, porque é pela sua coragem, pela suaresignação, pela sua perseverança que Deus os recolherá entre seusfiéis servidores, os quais já são conhecidos até hoje, para dar a cadaum a parte que lhe cabe no reino dos céus, segundo as suas obras.

A exemplo dos primeiros cristãos, carreguem com altivez asua Cruz. Creiam na palavra do Cristo, que disse: “Bem-aventuradosos que sofrem perseguição por amor à Justiça, porque deles é oreino dos céus. Não temais os que matam o corpo, mas não podemmatar a alma”. E Jesus ainda acrescentou: – “Amai os vossosinimigos; fazei o bem aos que vos fazem o mal e orai pelos que vosperseguem”. Mostrem, pois, que vocês são os verdadeiros discípulosdo Cristo, e que a doutrina que vocês abraçam é boa, fazendo o queJesus disse e Ele próprio exemplificou.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM469

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

470

A perseguição pouco durará.Aguardem com paciência o dia seguinte das realizações

Espíritas, porque os primeiros sinais desse novo dia já se apresentamna agitação moral que prenuncia a regeneração do homem. (Cap.XXIV, item 13 e seguintes.)

52. PRECE – Senhor, vós nos dissestes pelos lábios de Jesus,vosso Messias: “Bem-aventurados os que sofrem perseguição por amorà Justiça; perdoai a vossos inimigos; orai pelos que vos perseguem”, e doque Ele mesmo nos deu o exemplo, orando pelos seus algozes.

A exemplo de Jesus, meu Deus, nós imploramos vossa misericórdiapara aqueles que desprezam os vossos divinos preceitos, os únicos quepodem assegurar a paz neste mundo e no mundo espiritual. Como oCristo, nós vos dizemos: “Perdoai-lhes, meu Pai, porque eles não sabemo que fazem”.

Dai-nos a força de suportar com paciência e resignação, comoprovas para a nossa fé e nossa humildade, as zombarias, as injúrias, ascalúnias e as perseguições que nos movem.

Livrai-nos de toda idéia de represálias, porque a hora de vossaJustiça chegará para todos e nós a esperaremos, submissos à vossa santavontade.

POR UMA CRIANÇA QUE NASCE

53. Prefácio. Os Espíritos somente alcançam a perfeição,depois de haverem passado pelas lições da vida física. Os que estãono mundo espiritual próximo da Terra aguardam que a JustiçaDivina lhes permita retomar um corpo, para terem uma existênciaque deverá fornecer-lhes os meios de evoluírem. Reencarnados, aevolução se fará, seja pela expiação de seus erros passados medianteas vicissitudes a que estiverem sujeitos por efeito de suas quedasmorais, seja pelo desempenho de uma missão útil aos demais

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM470

471CAPÍTULO XXVIII

homens. A sua evolução e a sua felicidade futura serão proporcionaisao modo pelo qual empregarem o tempo que deverão passar sobrea Terra.

O encargo de guiar-lhes os primeiros passos, na novareencarnação, e de encaminhá-los ao campo do bem, está confiadoa seus pais. E os pais responderão diante da Justiça Divina pelamaneira como desempenharam esse mandato. É para facilitar-lheso cumprimento desse encargo que Deus fez do amor paternal e doamor filial uma lei da Natureza, lei que jamais será violada semamargas conseqüências.

54. PRECE (para ser dita pelos pais) – Espírito que reencarnastesno corpo de nosso filho, sede bem-vindo entre todos nós. Deus Todo-Poderoso que o enviastes, sede bendito.

Este é um depósito divino que nos é confiado e pelo qualresponderemos a todo tempo. Se este filho pertence à geração dos bonsEspíritos que povoarão a Terra, obrigado, ó meu Deus, por esse favor!Se ele, porém, é uma alma imperfeita, nosso dever é ajudá-lo a evoluirno caminho do bem, pelos nossos bons exemplos. Se ele cair no mal, porfalha nossa, seremos responsáveis por isso diante de Vós, porque nãoteremos cumprido com a nossa missão junto dele.

Senhor, amparai-nos em nossa tarefa e dai-nos a força e avontade de realizá-la a contento. Se este filho deve ser um motivo deprovas para nós, que seja feita a vossa vontade!

Bons Espíritos, que viestes organizar o nascimento desta alma eque deveis acompanhá-la durante esta existência, não a abandoneis.Livrai-a da influência dos Espíritos compromissados com o mal. Dai-lhe a força de resistir às tentações e a coragem de sofrer com paciênciae resignação as provas que a esperam na Terra. (Cap. XIV, item 9.)

55. PRECE (outra) – Meu Deus, vós me confiastes o destino deum de vossos Espíritos. Fazei, Senhor, que eu seja digno da tarefa queme concedestes. Concedei-me vossa proteção. Esclarecei a minha

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM471

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

472

compreensão, a fim de que eu possa discernir, na hora certa, as tendênciasdeste Espírito que devo preparar para a vossa paz.

56. PRECE (outra) – Deus de infinita bondade, pois já quepermitiste ao Espírito que anima esta criança vir novamente sofrer asprovas terrenas, destinadas a fazê-lo evoluir, dá-lhe a luz necessária, afim de que aprenda a te conhecer, a te adorar. Faz, pela tua onipotência,que esta alma se regenere na fonte divina de teus ensinamentos. Fazque, sob o amparo de seu Espírito Protetor, a sua inteligência cresça,que se desenvolva e que o faça aspirar a se aproximar, mais e mais, deti. Faz que o Espiritismo seja a luz brilhante que o esclareça diante dosdesafios da vida. Faz que ele saiba, enfim, apreciar toda a grandiosidadede teu amor, que nos submete a provas para nos purificar.

Senhor, lança o teu olhar paternal sobre esta família, a que confiasteesta alma! Possa esta família compreender a importância dessa missão efaz germinar nesta criança as boas sementes, até o dia que ela possa buscar,por suas próprias aspirações, elevar-se sozinha para ti.

Digna-te, ó meu Deus, acolher favoravelmente esta humildeprece em nome e pelas qualidades de Jesus que disse: “Deixai quevenham a mim as crianças, porque o reino dos céus é daqueles que selhes assemelhem”.

POR UM AGONIZANTE

57. Prefácio. A agonia são os primeiros passos da separaçãoentre a alma e o corpo. Poderemos dizer que, nesse momento, ohomem tem um pé nesse mundo e o outro pé no mundo espiritual.Essa transferência de um para o outro mundo é, algumas vezes,penosa para as pessoas que se apegam à matéria e que viveram maispara os bens deste mundo do que para os bens do mundo espiritual.Também é penosa para os que tenham a consciência agitada pormágoas e remorsos. Para os que, no entanto, alimentaram os seus

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM472

473CAPÍTULO XXVIII

pensamentos e os seus atos com a aspiração do Infinito e sedesprenderam dos bens materiais, os laços que os trazem cativos aocorpo físico são mais facilmente desatados. Para estes, os derradeirosmomentos não são nada dolorosos. Nestes, a alma se encontra ligadaao corpo por um fio, enquanto que naqueles outros a alma temprofundas raízes com tudo o que é da Terra. Para qualquer umdestes casos, a prece exerce uma influência poderosa no processo deseparação entre a alma e o corpo. (Ver O Céu e o Inferno, 2ª parte,Cap. I, “A Passagem”.)

58. PRECE – Deus Onipotente e Misericordioso, aqui está umaalma que deixa o corpo físico para retornar ao mundo espiritual, a suaverdadeira pátria! Que ela possa libertar-se em paz e que sobre ela seestenda a vossa misericórdia.

Bons Espíritos que a acompanhastes na Terra, não a abandoneisneste momento supremo. Dai-lhe força de suportar os últimossofrimentos pelos quais deve passar neste mundo, para a sua evoluçãofutura. Inspirai-a para que ela consagre ao arrependimento de suasfaltas as últimas luzes da inteligência que lhe restem, ou as últimasluzes que lhe possam ocorrer.

Utilizai as minhas radiações desta hora, a fim de que a sua açãotorne para ela menos penosa a atividade de separação e que leve nasua alma, no momento de deixar a Terra, as consolações da esperança.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM473

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

474

IV – PRECES PELOS DESENCARNADOS

PELO QUE ACABA DE DESENCARNAR

59. Prefácio. As preces pelas pessoas que acabam de desencarnarnão têm somente por finalidade dar-lhes uma prova de simpatia.Essas preces têm o efeito de ajudá-las no seu desligamento do corpofísico e, desse modo, abreviar-lhes a perturbação que sempre se segueapós a separação do corpo. E tornam o seu despertar mais calmo.Neste caso, porém, como em todos os outros em que se recorra àoração, a eficácia da prece está na sinceridade do pensamento e não naquantidade de palavras ditas com mais ou menos solenidade e emque, no mais das vezes, o coração não participa.

As preces que nascem do coração envolvem agradavelmenteos desencarnados a que se dirijam, e cujas idéias ainda estão confusas,como se fossem vozes amigas que nos vêm despertar do sono (Cap.XXVII, item 10.)

60. PRECE – Deus Todo-Poderoso, que a vossa misericórdia seestenda sobre a alma de ..... (diz o nome do desencarnado), queacabais de chamar para vós. Possam ser contadas a seu favor as provaspelas quais passou na Terra. E que as nossas preces abrandem e aliviemos sofrimentos que ainda possa sentir como Espírito!

Bons Espíritos que o viestes receber, e vós, sobretudo, seu EspíritoProtetor, assisti-o, ajudando-o a despojar-se das coisas materiais. Dai-lhe a luz e a consciência de si mesmo, a fim de livrar-se da perturbaçãodos sentidos que acompanha a passagem desta vida corporal para a vidaespiritual. Inspirai-lhe o arrependimento dos erros que possa ter cometidoe o desejo de obter permissão de repará-los, para acelerar a sua evoluçãorumo à vida eterna bem-aventurada .....(diz o nome do desencarnado),acabas de entrar no mundo espiritual e, no entanto, estás aqui presenteentre nós. Tu nos vês e nos ouves, porque deixaste entre nós o teu corpoperecível que, em breve, se reduzirá a pó.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM474

475CAPÍTULO XXVIII

Deixaste o envoltório grosseiro da carne, sujeito às vicissitudes eà morte e conservaste o envoltório fluídico imperecível e inacessível aossofrimentos. Se já não vives mais pelo corpo, vives a vida dos Espíritose essa vida está livre das misérias que afligem a humanidade.

Já não tens mais o véu que oculta de nossas vistas os esplendoresda vida futura. Podes agora contemplar novas maravilhas, enquantoque nós continuamos mergulhados nas sombras.

Vais percorrer o espaço e visitar os mundos em total liberdade,enquanto nós rastejamos penosamente sobre a Terra, presos ao nossocorpo material, qual se estivéssemos a carregar um pesado fardo.

Os horizontes do infinito se desdobrarão diante de ti e,contemplando tanta grandeza, compreenderás a vaidade de nossosdesejos terrestres, das nossas ambições mundanas e das alegrias fúteis,das quais os homens fazem os seus prazeres.

A morte, para os homens, é apenas uma separação material quedura uns poucos instantes. Do exílio, onde ainda nos retém a vontadede Deus e também os deveres que nos tocam neste mundo, nós teseguiremos pelos pensamentos. E assim estaremos até o momento emque nos seja permitido juntar-nos novamente contigo, como agora tejuntas com aqueles que partiram antes de ti.

Não podemos ir até onde estás, mas podes vir a nós. Venha pois,aos que te amam e que tu amaste. Ampara-os nas provas da vida.Vela pelos que te são caros. Protege-os, conforme puderes e abrandaseus pesares, sugerindo-lhes o pensamento que és mais feliz agora e oda consoladora certeza de que um dia todos estaremos reunidos contigonum mundo melhor.

No mundo em que estás, todos os ressentimentos terrenos devemser extintos. Que possas, para tua felicidade futura, permanecerinacessível a esses ressentimentos! Perdoa, portanto, aos que te hajamofendido, como aqueles contra os quais erraste te perdoam também.

Nota – Podem juntar-se a esta prece, que se aplica a todos, algumas palavras

escolhidas, segundo as circunstâncias particulares da família ou das relações ou

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM475

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

476

61. PRECE (1) – Senhor Todo-Poderoso, que a vossa misericórdia sejasobre os nossos irmãos que acabam de deixar a Terra! Que a vossa luzbrilhe sobre eles! Tirai-os das sombras. Abri os seus olhos e os seus ouvidos!Que os bons Espíritos os envolvam e os façam entender as vossas palavrasde paz e de esperança!

Senhor, por mais indignos que sejamos, ousamos implorar vossamisericordiosa indulgência em favor deste nosso irmão que acabais dechamar do exílio. Fazei que o seu retorno seja o de um filho pródigo.Esquecei, ó meu Deus, as faltas que ele possa ter cometido para voslembrar do bem que ele fez. Vossa Justiça é imutável, bem o sabemos,mas o vosso amor é imenso. Nós vos suplicamos que abrandeis a vossajustiça na fonte da bondade que nasce de vós.

Que a luz se faça para ti, meu irmão, que vens de deixar aTerra! Que os bons Espíritos do Senhor se aproximem de ti, que tecerquem de cuidados e te ajudem a desligar-te de tudo o que te prendana Terra. Vê e compreenda a grandeza de nosso Senhor. Submete-te,sem queixas, à sua Justiça, mas não desesperes jamais de suamisericórdia!

Irmão! Que dediques atenção muito grande aos atos de tuaúltima existência que retornam diante de teus olhos, para que isso teabra as portas do teu futuro espiritual. Que percebas os erros que deixaspara trás e o trabalho a que te deves dedicar para os reparar! QueDeus te perdoe e que os bons Espíritos te amparem e te animem! Osteus irmãos da Terra orarão por ti e te pedem para que ores por eles.

posição social do desencarnado.

Quando se trata de uma criança, o Espiritismo nos ensina que não está ali um espírito

recém-criado, mas um que já viveu outras vidas e que pode ser até muito evoluído. Se

a sua última existência foi curta, é que necessitava só um complemento de provas ou

que deveria ser uma provação para os seus pais. (Cap. V, item 21.)

1. Esta prece foi ditada a um médium de Bordéus, no momento em que passava diante

de sua janela o enterro de um desconhecido.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM476

477CAPÍTULO XXVIII

POR QUEM TEMOS AMIZADE

62. Prefácio. Como é horrível a idéia do nada! Quanto sãolastimáveis aquelas pessoas que acreditam que a voz do amigo, quechora a separação de seu amigo, se perde no vazio, sem encontrar aresposta daquele que se foi! Essas pessoas jamais conheceram as purase santas amizades, porque pensam que tudo morre com o corpo.Elas julgam que o homem de gênio que iluminou o mundo com asua ampla sabedoria é uma organização da matéria que se extinguecomo um sopro. Elas pensam que do ser mais querido, de um pai,de uma mãe, de um filho muito amado não restará mais que umpouco de pó que o vento dissipará, sem sobreviver o amor.

Como pode um homem que tem sentimentos ficar indiferentea essa idéia de extinção da amizade e do amor? Como a idéia de umfinal absoluto dos seres que ama não o gera de horror e não o faz, aomenos, desejar que não seja assim após a morte? Se até hoje a suarazão não foi suficiente para afastar as suas dúvidas sobre a imortalidadeda alma, eis que o Espiritismo vem dissipar toda incerteza sobre ofuturo espiritual, através das provas positivas que fornece dasobrevivência da alma e da existência dos seres do mundo espiritual.Por toda parte essas provas são colhidas, também, com satisfação.Com elas, a confiança no futuro espiritual renasce, porque então ohomem sabe, a partir dessa demonstração, que a vida terrena não émais que uma curta experiência que abre os horizontes de uma vidamelhor. Seus trabalhos, neste mundo, não ficam perdidos para ele eas suas mais santas afeições não são interrompidas sem a esperança deum futuro reencontro. (Cap. IV, item 18 e Cap. V, item 21.)

63. PRECE – Dignai-vos, ó meu Deus de acolher favoravelmentea prece que vos dirijo pelo Espírito de .... (diz o nome do desencarnado).Fazei-lhe entrever a vossa divina claridade e tornai-lhe fácil o caminhoda eterna felicidade. Permiti que os bons Espíritos lhe levem estaspalavras e meu pensamento.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM477

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

478

E tu, que me eras tão querido neste mundo, ouve a minha vozque te chama para te dar uma nova prova de minha afeição. Deuspermitiu que fosses libertado antes de mim. Eu não poderia queixar-me dessa resolução do Pai, sem egoísmo, porque isso seria querer ver-tesujeito ainda aos sofrimentos da vida de todos os encarnados. Aguardo,pois, com resignação, o dia de nosso reencontro no mundo mais feliz,onde chegaste antes de mim.

Sei que a nossa separação é temporária e que, por mais longaque ela possa me parecer, a sua duração é um nada diante daeternidade de ventura que Deus promete a seus eleitos. Que a bondadedivina me livre de fazer qualquer coisa que possa retardar o desejadomomento de nossa união no mundo espiritual e que, assim, me poupeda dor de não te reencontrar ao sair de meu cativeiro terreno.

Oh! Quanto é doce e consoladora a certeza de que, entre nós,não há mais que um véu material, que te esconde de minhas vistas,de que tu podes estar aqui ao meu lado, a ver-me e a ouvir-me comonos outros momentos de nossas vidas, de que não me esqueces, damesma maneira que eu não me esqueço de ti, de que os nossospensamentos se visitam e de que os teus pensamentos me seguem e meamparam sempre!

Que a paz do Senhor seja contigo.

PELOS SOFREDORES QUE PEDEM PRECES

64. Prefácio. Para compreender o alívio que a prece pode levaraos Espíritos sofredores, é necessário lembrar o mecanismo da açãodas orações, que ficou explicado páginas atrás. (Cap. XXVII, itens 9,18 e seguintes.) Quem se compenetrar dessa verdade, faz a sua oraçãocom muito fervor, pela certeza que tem de não orar em vão.

65. PRECE – Deus clemente e misericordioso, que a vossabondade se estenda por sobre todos os Espíritos que recorrem às nossas

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM478

479CAPÍTULO XXVIII

orações e particularmente sobre a alma de .... (diz o nome do Espíritoque pediu preces).

Bons Espíritos, que tendes a vossa maior missão no fazer o bem,intercedei comigo para alívio dos sofrimentos dessas almas. Fazei brilhardiante de seus olhos uma luz de esperança e que a divina luz os esclareçasobre as imperfeições morais que os mantêm distantes dos bem-aventurados. Abri-lhes o coração ao arrependimento de seus erros e aodesejo de se depurarem, para acelerar a sua evolução. Fazei-lhescompreender que, pelos seus esforços no reajustamento de suasinclinações, eles poderão abreviar o tempo de suas provas.

Que Deus, na sua bondade, lhes conceda a força de perseveraremnas suas boas decisões!

Possam estas palavras benevolentes suavizar seus sofrimentos,por mostrar-lhes que há sobre a Terra criaturas que deles se compadeceme lhes desejam toda a felicidade.

66. PRECE (outra) – Nós vos pedimos, Senhor, que derrameissobre todos aqueles que sofrem, seja no mundo espiritual, seja entre osencarnados, a bênção do vosso amor e de vossa misericórdia. Tendepiedade de nossas fraquezas morais. Fizeste-nos falíveis, mas nos destesa força de resistir ao mal e vencê-lo. Que a vossa misericórdia se estendasobre todos os que não podem resistir às suas más tendências e que sedeixam ainda arrastar pelos maus caminhos das quedas morais. Quevós, bons Espíritos, os envolvam. Que as vossas luzes brilhem aos seusolhos e que, atraídos pelo calor vivificante dessas luzes, eles venhamoferecerem-se aos vossos pés, arrependidos e submissos.

Nós vos pedimos, igualmente, Pai de misericórdia por aquelesirmãos que não tiveram forças para suportar as suas provas terrenas.Vós nos dais um fardo para carregar, Senhor, e só devemos depositá-loaos vossos pés. A nossa fraqueza espiritual, porém, é grande e o ânimonos falta, algumas vezes, numa das etapas de nossa caminhada atévós. Tende piedade destes vossos servidores indolentes que abandonama obra antes da hora de terminá-la. Que a vossa Justiça os poupe e

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM479

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

480

permiti que os bons Espíritos lhes levem o alívio, as consolações e asesperanças no futuro. A esperança do perdão fortalece a alma. Mostrai-a, Senhor, aos culpados que se desesperam e, renovados por essaesperança, eles haurirão energias na própria extensão de suas faltas ede seus sofrimentos, a fim de resgatarem seu passado e de se prepararempara a conquista do futuro espiritual que os aguarda.

POR UM INIMIGO DESENCARNADO

67. Prefácio. A caridade para com os nossos inimigos deveultrapassar a fronteira do túmulo e envolvê-los na vida espiritual.Devemos saber que o mal que eles nos fizeram foi para nós umaprova, que poderá ser útil ao desenvolvimento de nossas qualidadesespirituais, se nós soubermos aproveitá-la como lições de vida. Elanos pode ser mais aproveitável que as aflições puramente de ordemmaterial, porque à coragem e à resignação, que haurimos nas afliçõescomuns da existência, a prova da inimizade nos permitirá somar acaridade e o esquecimento das ofensas. (Cap. X, item 6 e Cap. XII,itens 5 e 6.)

68. PRECE – Senhor, quisestes chamar, antes de mim, a almade ..... (diz o nome do inimigo desencarnado): Perdôo-lhe o malque me fez e suas más intenções que nutriu a meu respeito. Possa ele seter arrependido de tudo, agora que ele não tem mais as ilusões destemundo.

Que vossa misericórdia, meu Deus, se estenda sobre ele e afastaide mim a idéia de alegrar-me com a morte dele. Se também erreicontra ele, que ele me perdoe por tais erros, como eu esqueço aqueleserros que ele cometeu contra mim.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM480

481CAPÍTULO XXVIII

POR UM CRIMINOSO

69. Prefácio. Se a eficácia da prece dependesse da sua exten-são, as mais longas deveriam ser destinadas para os mais culpados.É que têm mais necessidades de orações do que aqueles que vive-ram de um modo santo. Recusá-las aos criminosos é faltar com acaridade e desconhecer a misericórdia de Deus. Julgá-las inúteis,porque um homem cometeu faltas gravíssimas, equivale a quererjulgar antecipadamente a Justiça Divina. (Cap. XI, item 14.)

70. PRECE – Senhor, Deus de misericórdia não repilais esseinfeliz que acaba de deixar a Terra. A justiça dos homens pode tê-locondenado, mas ele não se livrará da Justiça Divina se o coração delenão for tocado pelo remorso de seus erros.

Tirai-lhe a venda que lhe oculta a gravidade de suas, faltas.Possa, então o arrependimento dele encontrar a clemência diante devós, meu Deus para que se aliviem os sofrimentos de sua alma! Possamtambém as nossas preces, e a intercessão dos bons Espíritos, levar-lhe aesperança e a consolação. Inspirai-lhe o desejo de reparar as suas másações através de uma nova existência e dai-lhe as forças para nãosucumbir nas novas lutas em que se empenhar contra as suas másinclinações!

Senhor, tende piedade dele!

POR UM SUICIDA

71. Prefácio. O homem não tem jamais o direito de disporde sua própria vida. Só a Deus cabe a direito de retirá-lo da escolaterrena, quando o julgar apropriado. Todavia, a Justiça Divina podesuavizar as conseqüências que sofre de suas faltas passadas, em virtudede certas circunstâncias que as atenuem. Agrava, porém, os seuspróprios sofrimentos aquele que voluntariamente quis fugir dasprovações da vida. O suicida é como o prisioneiro que foge de sua

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM481

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

482

prisão antes do cumprimento de pena e que, ao ser presonovamente, será tratado com mais severidade. Assim acontece,também, com o suicida que julga escapar das misérias presentes emergulha em desgraças maiores. (Cap. V, item 14 e seguintes.)

72. PRECE – Sabemos, ó meu Deus, as conseqüênciasinevitáveis que sofrem os que violam as vossas leis ao abreviaremvoluntariamente seus dias na existência física. Mas sabermos, também,que a vossa misericórdia é infinita. Dignai-vos, pois, de estender avossa misericórdia por sobre a alma de ..... (diz o nome de quem sesuicidou). Possam as nossas orações e vossa comiseração abrandar oamargor dos sofrimentos que ele está experimentando, por não ter tidocoragem de esperar o fim de suas provas!

Bons Espíritos, cuja missão é assistir os infelizes, tomai-o sob avossa proteção. Inspirai-lhe o arrependimento pela falta que cometeu.Que a vossa assistência lhe dê a força para suportar, com mais resignação,as novas provas pela quais tenha de passar para consertar o erropraticado contra si mesmo. Afastai dele os Espíritos malévolos quepoderiam de novo levá-lo ao mal e prolongar seus sofrimentos, ao fazê-lo perder o fruto de suas futuras provações morais.

E a ti, cuja desgraça se faz a finalidade de nossas preces, possa anossa comiseração abrandar o teu amargor e possa nascer no teu coraçãoa esperança de um futuro melhor! Esse futuro está entre as tuas mãos!Confia-te à bondade de Deus, cujo seio se abre para todos os que searrependem de seus erros e só não dá acesso aos que mantêm o coraçãoendurecido.

PELOS ESPÍRITOS ARREPENDIDOS

73. Prefácio. Seria injusto de incluir na categoria dos Espíritosmalévolos os Espíritos sofredores e os arrependidos de suas faltas,

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM482

483CAPÍTULO XXVIII

que pedem orações. Podem eles já ter sido maldosos, mas já não osão mais, a partir do momento em que eles reconhecem as suasfaltas e as lamentam. Eles, então, não são mais que infelizes. Algunsdeles, a partir do arrependimento, já começam mesmo a gozar dafelicidade que nasce da esperança de uma vida ajustada às leis divinas.

74. PRECE – Deus de misericórdia, que aceitais o arrependimentosincero de quem errou, encarnado ou desencarnado! Eis aqui umEspírito que esteve comprometido com o mal, mas que reconhece osseus erros e volta ao bom caminho. Dignai-vos, ó meu Deus, de recebê-lo como um filho pródigo e de lhe perdoar.

Bons Espíritos, cujos conselhos ele fez por ignorar, ele vem, agora,vos escutar. Permiti-lhe entrever a felicidade dos eleitos do Senhor, afim de que ele persista no desejo de depurar-se para alcançar essamesma felicidade. Sustentai-o nas suas boas decisões e dai-lhe a forçade resistir aos seus maus pendores. Espírito .... (diz o nome do espíritoarrependido), nós te felicitamos pela transformação moral que em tioperas e agradecemos aos bons Espíritos que te ajudaram!

Se antes te sentias à vontade em fazer o mal, é que não sabiasquanto é doce o prazer de fazer o bem. Tu te sentias, também, muitoinferior para conseguir abraçar o bem. Mas, desde o momento em quepuseste o pé no bom caminho, uma nova luz de esperança se fez sobreti. Começaste, então, a sentir uma felicidade que desconhecias e aesperança se instalou em teu coração. É que Deus escuta sempre aprece dos que se arrependem do mal. Deus não repele a nenhuma dascriaturas que vão até Ele.

Para voltares completamente à graça do Senhor, empenha-te,de agora em diante, a não mais fazeres o mal, mas em fazeres o beme, acima de tudo, em consertares o mal que hajas feito. Terás, então,cumprido a Justiça Divina. É que o mal será corrigido com o bem ecada boa ação que fizeres cobrirá um erro de teu passado.

O primeiro passo tu o deste. Agora, quanto mais avançares nobem, tanto mais o bom caminho te parecerá fácil e agradável.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM483

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

484

Persevera, pois, e um dia terás a glória de ser contado entre os bonsEspíritos e entre os Espíritos bem-aventurados.

PELOS ESPÍRITOS ENDURECIDOS

75. Prefácio. Os Espíritos malévolos são aqueles que aindanão foram tocados pelo arrependimento. Eles sentem um grandeprazer no mal e não sentem nenhum pesar pelo mal que praticam.Eles são insensíveis às advertências, repelem as orações efreqüentemente blasfemam contra Deus. São essas almas endurecidasque, após a desencarnação, se vingam nos homens dos sofrimentosque suportaram e perseguem, com o seu ódio, aqueles que lhesfizeram o mal durante as suas vidas. Esta vingança eles a realizamseja por obsidiar os seus ofensores, seja exercendo sobre eles algumainfluência prejudicial. (Cap. X item 6 e Cap. X11, itens 5 e 6.)

Entre os Espíritos perversos, há duas categorias bemdiferenciadas: aqueles que são abertamente malévolos e aqueles quesão hipócritas. Os primeiros são infinitamente mais fáceis de seremreconduzidos ao bem, enquanto os hipócritas são mais difíceis.

Esses que são abertamente malévolos são, muitofreqüentemente, de hábitos selvagens e grosseiros, como podemosnotar entre os próprios homens encarnados, que fazem o mal maispor um impulso do que por cálculo e que não querem se fazerpassar por melhores do que são. Há neles, portanto, um germelatente que é necessário fazer germinar. E isso se consegue, quasesempre, com a perseverança, com a energia moral aliada com abenevolência, com os conselhos, com as ponderações sobre aexcelência do bem e com a oração. Nas comunicações mediúnicas,a dificuldade que esses Espíritos sentem em escrever ou em dizer onome de Deus é o sinal de um receio instintivo, da voz íntima daconsciência que lhes diz serem eles indignos de pronunciarem o

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM484

485CAPÍTULO XXVIII

nome do Deus. Aqueles que assim hesitam, estão próximos derender-se ao bem e tudo se pode esperar deles. Bastará, então, quese encontre o ponto vulnerável do coração.

Os Espíritos hipócritas são, quase sempre, muito inteligentes,mas eles não têm no coração alguma fibra mais sensível para o toquedo bem. Nada parece sensibilizá-los! Eles fingem ter todos os bonssentimentos para conquistar a confiança de quem os escuta. Ficamfelizes quando encontram alguns tolos que os recebam comoEspíritos santificados. É que, então, poderão manobrar esses tolosà vontade. O nome de Deus, longe de inspirar-lhes algum receio,lhes serve de máscara para encobrir a sua conduta indigna diantedos tolos que os acolhem. No mundo espiritual, como no mundodos homens encarnados, os hipócritas são os seres mais perigosos,porque eles agem na sombra e deles não se desconfia. Eles têm asaparências da fé, mas só as aparências, sem terem uma fé sincera.

76. PRECE – Senhor, dignai-vos deitar um olhar de bondadesobre os Espíritos imperfeitos que estão, ainda, nas sombras da ignorânciae que vos desconhecem, principalmente sobre o Espírito de ..... (diz onome do espírito).

Bons Espíritos, ajudai-nos a fazê-lo compreender que, induzindoos homens ao mal, que os obsidiando e os atormentando, ele prolongaos seus próprios sofrimentos. Fazei que o exemplo da felicidade que vósgozais lhe seja um encorajamento para que busque o campo do bem.

Espírito que te comprazes ainda no mal, vem ouvir a oraçãoque fazemos por ti. Essa prece deve mostrar que desejamos o teu bem,embora ainda faças o mal.

És infeliz, porque é impossível ser feliz quando fazemos o mal.Por que, então, te conservas em dores, quando de ti depende evitar oteu sofrimento? Olha os bons Espíritos que estão à tua volta! Vê quantoeles são felizes! Não te seria mais agradável gozar também dessafelicidade?

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM485

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

486

Dirás que essa felicidade te é impossível! Mas nada é impossívelpara aquele que a quer! Deus te deu, como para todas as demaiscriaturas, a liberdade de escolher entre o bem e o mal, ou seja, escolherentre a felicidade e a desgraça. Ninguém está sentenciado para fazero mal. Se tens a vontade de fazer o mal, podes ter também a de fazero bem e de seres feliz.

Volta teu olhar para Deus. Eleva, por um minuto que seja, osteus pensamentos para Deus e um raio da divina luz virá te clarear ocaminho. Diz, estas simples palavras: Meu Deus, eu me arrependo,perdoa-me! Tenta arrepender-te e tenta fazer o bem ao invés de fazereso mal. Verás, então, que logo a misericórdia celeste descerá sobre ti eque um bem-estar, que desconheces até agora, te virá substituir asansiedades que sofres.

Assim que deres o primeiro passo no bom caminho, o restante docaminho te será fácil percorrer. Compreenderás, então, quanto tempode felicidade perdeste por tua própria culpa. Mas um futuro brilhantee repleto de esperanças se abrirá diante de ti e te fará esquecer o teudoloroso passado, repleto de perturbações e de torturas morais, queseriam para ti um inferno, se ele existisse e se teus sofrimentos durassemeternamente. Um dia virá em que essas torturas serão tantas e tãointensas que tu, a qualquer custo, quererás fazê-las cessar. Porém,quanto mais te demorares no mal, tanto mais difícil será despojar-tedessas torturas morais.

Não creias que estarás sempre neste estado infeliz em que teencontras. Não! Essa permanência é impossível! Tens duas situaçõesdiante de ti: uma, a de sofreres muito mais do que tens sofrido atéagora e, a outra, de seres feliz como os bons Espíritos que estão à tuavolta. A primeira dessas situações é inevitável, se persistires na tuaobstinação no mal. A segunda é possível se, por um simples esforço detua vontade, te afastares da má situação em que te encontras. Apressa-te, portanto, porque cada dia em que te demoras em tuas ansiedades,é um dia perdido para a tua felicidade.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM486

487CAPÍTULO XXVIII

Bons Espíritos, fazei que estas palavras encontrem a porta deentrada no coração desta alma ainda estacionada na escaladaevolutiva, a fim de que a ajudem a voltar-se para Deus. Nós vo-lopedimos em nome de Jesus Cristo, que teve tão grande poder deiluminar os Espíritos infelizes.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM487

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

488

V – PRECES PELOS DOENTES E PELOS OBSIDIADOS

PELOS DOENTES

77. Prefácio. As doenças fazem parte das provações e dasvicissitudes da vida terrena. Elas são próprias da imperfeição de nossanatureza física e da inferioridade do mundo que habitamos. Aspaixões e os excessos de toda ordem semeiam em nós os princípiosdas enfermidades, algumas vezes transmissíveis pela hereditariedade.

Nos mundos mais avançados física e moralmente, o organismohumano, mais depurado e menos denso, não está sujeito às mesmasenfermidades que aqui experimentamos e o corpo não é minadosilenciosamente pelos fluidos envenenados das paixões humanas.(Cap. III item 9.) É necessário, portanto, que nos resignemos asuportar as conseqüências do meio em que nos coloca a nossa própriainferioridade espiritual, até que conquistemos o direito de passarpara um mundo melhor. Isso não deve, porém, impedir-nos defazer o que de nós depende para melhorar a situação atual. Se, noentanto, apesar de nossos esforços, não pudermos fazê-lo, oEspiritismo nos ensina a suportar, com resignação, os nossos malespassageiros.

Se Deus não quisesse que nossos sofrimentos físicos fossemcurados ou aliviadas as enfermidades, em certos casos, ele não teriacolocado os meios de cura à nossa disposição. A sua providencialsolicitude a esse respeito, ajustada ao nosso instinto de conservação,é um sinal de que é nosso dever procurar e aplicar esses meios decura que se encontram ao nosso alcance.

Ao lado da medicação comum, elaborada pela Ciência, omagnetismo nos levou a conhecer o poder de cura da ação fluídica.E o Espiritismo, por sua vez, nos veio revelar uma outra energia namediunidade de cura e na influência benéfica de prece sobre a saúde

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM488

489CAPÍTULO XXVIII

humana. (Ver no cap. XXVI e no item 81, a seguir, informaçõessobre a mediunidade de cura.)

78. PRECE (a ser feita pelo próprio doente) – Senhor, sois todojustiça. A doença que me enviastes, eu devo merecê-la, porque nuncafazeis alguém sofrer sem justos motivos. Apresento-me, pois, para aminha cura, diante de vossa infinita misericórdia. Se for de vosso agradome devolver a saúde, que o vosso santo nome seja bendito! Se, pelocontrário, eu devo sofrer mais, bendito seja o vosso nome, também. Eume submeto aos vossos desígnios sem me queixar, porque tudo o quefazeis só pode ter por finalidade o bem de vossas criaturas.

Fazei, ó meu Deus, que esta enfermidade seja para mim umaviso salutar e que me leve a examinar-me a mim mesmo, do pontode vista da vida moral. Eu a aceito como uma expiação de meus errosdo passado e como uma prova para a minha fé e para a minhasubmissão à Justiça Divina. (Ver a prece 40.)

79. PRECE (a ser feita por um doente) – Meu Deus, os vossosdesígnios são impenetráveis pelos humanos! Na vossa sabedoria,deixastes que uma enfermidade viesse afligir a ..... (diz o nome dodoente). Lançai, eu vos suplico, um olhar de compaixão sobre ossofrimentos dele e dignai-vos de colocar um final em suas dores.

Bons Espíritos, que sois ministros do Onipotente, secundai-me,eu vos peço, no meu desejo de aliviá-lo. Dirigi meus pensamentos, afim de que possam derramar-se como um bálsamo salutar sobre o corpodele e que sejam uma consolação para a sua alma.

Inspirai-lhe a paciência e a submissão à Justiça Divina. Dai-lheforças para suportar as suas dores com resignação cristã, a fim de elenão perder o fruto desta prova. (Ver prece 57.)

80. PRECE (a ser feita pelo médium de cura) – Meu Deus, sequiserdes servir-vos de mim, apesar de tão indigno que eu sou, podereicurar este sofrimento, se essa for a vossa vontade, Senhor, porque tenhofé em vós. Mas sem vós eu nada posso. Permiti aos bons Espíritosenvolver-me em seus fluidos regeneradores, a fim de que eu os transmita

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM489

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

490

ao enfermo. Afastai de mim todo pensamento de orgulho e de egoísmoque poderia envenenar a pureza dos elementos restauradores quechegam do Mais Alto.

PELOS OBSIDIADOS

81. Prefácio. A obsessão é a ação persistente que um Espíritomalévolo exerce sobre uma pessoa. Essa enfermidade moral apresentacaracterísticas muito diferentes, desde a simples influência sobre aconduta moral do encarnado, sem sinais exteriores perceptíveis daorigem do mal, até a completa perturbação do organismo e dasfaculdades mentais. A obsessão desordena todas as faculdadesmediúnicas. Na mediunidade de psicografia, como na de psicofonia,a obsessão se entremostra pela obstinação de apenas um Espírito semanifestar, com exclusão de qualquer outro Espírito.

Os Espíritos malévolos estão por toda a Terra, em razão dainferioridade moral de seus habitantes. A ação malfazeja que elesdesenvolvem faz parte dos flagelos que a Humanidade suporta nestemundo. A obsessão, como as doenças e todas as tribulações da vida,deve ser considerada como uma prova ou como uma expiação e seraceita nessa situação.

Do mesmo modo que as doenças são a conseqüência dasimperfeições físicas que submetem o corpo às influências perniciosasexteriores, a obsessão é sempre uma conseqüência da imperfeiçãomoral que dá acesso à atuação de um Espírito endurecido no mal.

A uma causa física, opõe-se uma força física.A uma causa moral é necessário opor-se uma energia moral.Para preservar-se das doenças procuramos estimular a

resistência orgânica. Para preservar-se da obsessão, deveremosestimular à resistência dos valores morais da alma. Daí resulta que oobsidiado, e também os seus familiares, têm necessidade de trabalhar

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM490

491CAPÍTULO XXVIII

pelo seu aprimoramento espiritual. Isto, na maioria dos casos, ésuficiente para desembaraçar-se do obsessor, sem se socorrer de outraspessoas. Esse socorro se torna necessário, porém, quando a obsessãodegenera em subjugação e em possessão, porque, então, o pacienteperde, por vezes, o domínio de sua vontade e de seu livre-arbítrio.

A obsessão, quase sempre, é o efeito de uma vingançapraticada por um Espírito. Na maioria das vezes, tem a sua origemno relacionamento que o obsidiado e o obsessor tiveram numaexistência anterior. (Ver o Cap. X, item 6 e o Cap. XII, itens 5 e 6.)

Nos casos de obsessão grave, o obsidiado está como queenvolvido e impregnado de um fluido envenenado que,perniciosamente, neutraliza os efeitos dos fluidos salutares e osdestrói. É desse fluido envenenado que importa despojar o obsidiado.Um mau fluido, no entanto, não pode ser eliminado por outromau fluido. Por uma ação semelhante à do médium de cura, noscasos das enfermidades físicas, para que possa ocorrer a neutralizaçãodo fluido envenenado que envolve o obsidiado, é necessária a ajudade um fluido melhor que produza o efeito de um reagente. Este é omecanismo da química dos fluidos, mas que não basta! Necessárioé que se atue sobre o ser inteligente que o produz, para fazer cessar essainfluenciação. Para isso é necessário que se fale com ele comautoridade, mas com aquela autoridade que nasce da superioridademoral de quem fala. Quanto maior for a superioridade moral dequem fala, maior será a autoridade que emanará de sua presença.

E isso, ainda, não é tudo!Para assegurar a libertação espiritual, é preciso induzir o

Espírito obsessor a renunciar aos seus maus desejos. É necessáriodespertar nele o arrependimento e o desejo do bem, ajudando-ocom ensinamentos habilmente dirigidos, tantas vezes quantas elevenha a manifestar-se mediunicamente, tendo em vista a sua lentaeducação moral. Deve-se buscar, na desobsessão, a dupla satisfação

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM491

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

492

de libertar dela um encarnado e de converter para o bem um Espíritoimperfeito.

A tarefa se torna mais fácil quando o obsidiado, compenetradode sua situação, oferece a participação de sua vontade de regenerar-se também moralmente e dá o apoio de suas próprias orações.

Dá-se, porém, o contrário, quando o obsidiado, seduzidopelo Espírito embusteiro, se mantém iludido sobre as qualidadesdo Espírito que o domina e se entrega gostosamente às mistificações.É que, neste caso, longe de colaborar com o amparo, o obsidiado seimanta ao obsessor e repele toda assistência que se lhe oferece. Étipicamente o quadro da fascinação que é sempre infinitamentemais rebelde que a mais acentuada subjugação. (Veja no Livro dosMédiuns a 2ª parte, cap. XXIII.)

Em todos os casos de obsessão, a prece é o mais poderosoauxiliar para agir junto do Espírito obsessor.

82. PRECE (a ser feita pelo obsidiado) – Meu Deus, permitique os bons Espíritos me libertem do Espírito malfazejo que se ligou amim. Se é uma vingança que ele quer, em conseqüências dos malesque eu lhe teria feito noutra encarnação, vós a permitistes, meu Deus,para que eu sofra as conseqüências de meus próprios erros. Possa o meuarrependimento me fazer credor do vosso perdão e da libertação dessejugo! Mas, seja qual for o motivo, suplico a vossa misericórdia para esseque me cobra. Dignai-vos de facilitar-lhe o caminho da evolução, deque se desviou ao pensar em fazer o mal. Possa eu, de meu lado,retribuir-lhe o mal com o bem e encaminhá-lo para melhoressentimentos.

Mas sei também, ó meu Deus, que são as minhas imperfeiçõesque me tornam acessível às influências dos Espíritos imperfeitos. Dai-me a luz necessária para identificar as minhas imperfeições e paracombater o meu orgulho que me torna cego para os meus própriosdefeitos.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM492

493CAPÍTULO XXVIII

Como deve ser grande a minha indignidade para que urnacriatura malfazeja me possa dominar!

Fazei, ó meu Deus, que esse golpe desferido na minha vaidademe sirva de lição para o futuro. Que isso me fortaleça na decisão deme depurar pela prática do bem, da caridade, da humildade, a fimde que eu possa opor, daqui para a frente, uma barreira às másinfluências espirituais.

Senhor, dai-me a força de suportar esta prova com paciência eresignação. Compreendo que, como todas as outras provas, esta deveajudar-me na minha evolução, se eu não perder seus frutos com asminhas queixas, já que esta prova me dá a oportunidade de mostrarao mundo a minha submissão e de praticar a caridade para com umirmão infeliz, perdoando-lhe o mal que me tenha feito. (Ver Cap.XII, itens 5 e 6 e os itens 15 e seguintes e 46 e 47 desta Coleção dePreces Espíritas.)

83. PRECE (a ser feita em favor do obsidiado) – Deus Todo-Poderoso, dignai-vos em dar-me a energia para libertar ..... (diz onome do encarnado obsidiado), do Espírito que o obsidia. Se está nosvossos desígnios colocar um fim a essa prova, concedei-me a graça deconversar com esse Espírito com força moral.

Bons Espíritos que me assistis, e vós, Espírito Protetor do obsidiado,dai-me o vosso amparo. Ajudai-me a despojá-lo do fluido impuro queo envolve.

Em nome de Deus Todo-Poderoso, rogo ao Espírito malfazejoque o atormenta, que lhe dê trégua!

84. PRECE (pelo Espírito obsessor) – Deus infinitamente bom,imploro a vossa misericórdia para com a Espírito que obsidia ..... (dizo nome do encarnado obsidiado), fazendo-lhe entrever as divinasclaridades, a fim de que ele reconheça o falso caminho que está seguindopara obter justiça. Bons Espíritos, ajudai-me a fazê-lo compreenderque ele tem tudo a perder com a prática dessa vingança e que temtudo a ganhar na prática do bem.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM493

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

494

Espírito que te entregas a atormentar .....(diz o nome doencarnado obsidiado), escuta-me porque te falo em nome de Deus.

Se quiseres refletir, compreenderás que o mal nunca superará obem e que não podes ser mais forte que Deus e que os bons Espíritos.Ele poderia preservar ..... (diz o nome do encarnado obsidiado) detodo ataque de tua parte. Mas, se não o fazem, é porque ele tem umaprova a sofrer. Mas quando essa prova findar, eles te impedirão deagir sobre ele. O mal que lhe tiveres feito, ao invés de prejudicá-lo,terá servido para a sua evolução moral e ele será ainda mais feliz.Assim, a tua maldade terá sido vã e as suas conseqüências se voltarãocontra ti.

Deus, que é Todo-Poderoso, e os Espíritos superiores, seusministros, que são mais poderosos do que tu és, poderão pôr um fim aessa perseguição, quando quiserem, e a tua tenacidade se partirá diantedessa suprema autoridade da Vida. Mas, por ser bom, Deus quer tedeixar o mérito de interrompê-la por um ato de tua própria vontade.Esta é uma concessão que Deus te faz. Se tu não a aproveitares, terásde sofrer dolorosas conseqüências. Grandes e duros sofrimentos teesperarão. Serás constrangido, pela dor, a suplicar por piedade e pelaspreces deste que hoje é tua vítima. E ele, hoje, já te perdoou e ora porti, o que já é para ele um grande mérito aos olhos de Deus e o queapressará a libertação dele. Reflete, pois, enquanto ainda é tempo,porque a Justiça Divina visita todos os Espíritos rebeldes.

Lembra-te que o mal que praticas neste momento terá umfim, enquanto que, se persistires no teu endurecimento de coração, osteus sofrimentos irão sempre crescendo.

Quando tu estiveste na Terra, não consideravas uma tolicesacrificar um grande bem por uma pequenina satisfação passageira?Acontece o mesmo agora que és Espírito. O que ganhas com o queestás fazendo? Ganhas, tão-somente, o triste prazer de atormentaralguém, o que não impede que tu sejas infeliz, digas o que quiseresdizer, e isso te fará ainda mais infeliz.

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM494

495CAPÍTULO XXVIII

Ao lado disso, vê o que tu perdes. Observa os bons Espíritosque te cercam e dize: o estado deles não é preferível ao teu? A felicidadeque eles desfrutam será tua também, quando quiseres. O que épreciso para tê-la? Implorar o amparo de Deus e fazeres o bem aoinvés de fazeres o mal. Eu sei que não te podes transformar de ummomento para o outro. Mas Deus não quer o impossível. Ele desejatão-somente a boa vontade. Experimenta essa transformação morale nós te ajudaremos. Faze que em breve possamos dizer a teu favora prece pelos Espíritos arrependidos (n.° 73) e não mais te considerarentre os Espíritos malevolentes, enquanto esperamos o momentode te contar entre os bons Espíritos. (Ver, também, o item 75 “Precespelos Espíritos endurecidos”.)

Observação– A cura das obsessões graves requer muitapaciência, perseverança e devotamento. Ela exige, também,muito tato psicológico e habilidade, a fim de encaminhar para obem os Espíritos perversos, endurecidos no mal e astuciosos,porquanto há Espíritos rebeldes até o último grau. Na maiorparte dos casos, é necessário se orientar pelos acontecimentos.Mas, quaisquer que sejam as características do Espírito, há umfato certo: nada se obtém pelo constrangimento e pelas ameaças. Todainfluência, para desobsessão, está na superioridade moral. Umaoutra verdade, igualmente constatada pela experiência e tambémpela lógica das leis divinas: é completamente sem eficiência, para adesobsessão, a prática de exorcismos, a aplicação de fórmulas mágicas,as palavras sacramentais, o uso de amuletos, o falso poder dos talismãs,as práticas exteriores e todos e quaisquer símbolos materiais.

A obsessão muito prolongada pode ocasionar desordenspatológicas, exigindo, algumas vezes, um tratamento simultâneoou consecutivo, seja magnético, seja médico, para reabilitar oorganismo. Tendo sido afastada a causa da obsessão, resta

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM495

COLEÇÃO DE PRECES ESPÍRITAS

496

combater os efeitos remanescentes. (Ver em O Livro dosMédiuns, o cap. XXIII sobre a obsessão. Ver na Revista Espírita,números de fevereiro e março de 1864 e de abril de 1865,exemplos de curas de obsessão.)

o evangelho segundo o espiritismo.p65 11/12/2004, 3:58 PM496