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    "Quando eu vi, eu tinha feito uma etnografia": notas sobre como no fazer uma

    etnografia acidental

    Autoria:Carolina Dalla Chiesa, Letcia Dias Fantinel

    Resumo

    Objetivamos neste trabalho apresentar alguns elementos bsicos do mtodo etnogrfico comvistas a reduzir os desentendimentos sobre suas definies que levam, por vezes,

    pesquisadores pouco informados a realizar etnografias acidentais. Para tanto, discutimosalgumas noes contemporneas sobre este mtodo, bem como aspectos centrais do mesmo,tais quais: a observao participante, o dirio de campo, a reflexividade, o estranhamento e a

    busca de significados. Esperamos, com isso, contribuir para a propagao do conhecimento epara uma transposio de mtodos e tcnicas, de uma disciplina a outra, que seja responsvel

    para com a manuteno de seus pressupostos.

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    Introduo

    A etnografia um mtodo de pesquisa surgido na Antropologia em um contexto decrtica ao que se vinha produzindo no seio dessa cincia no sculo XIX. Nessa poca,

    predominavam os estudos que tinham por objetivo a busca pela reconstituio dos diversos

    estgios da evoluo humana atravs, principalmente, do estudo de povos ditos primitivos.Nesse contexto, os textos antropolgicos eram produzidos, predominantemente, por meio daleitura de relatos de viajantes e missionrios, bem como de outros participantes de expediescientficas, o que resultava em produes marcadas pelo etnocentrismo, como a prpria teoriaevolucionista (URIARTE, 2012).

    A partir do final do sculo XIX, antroplogos passam a integrar expedies cientficas,e, no incio do sculo XX, destaca-se o polons Bronislaw Malinowski, que permaneceu poranos nas ilhas Trobriand, onde viveu entre os trobriandeses, aprendeu o idioma nativo evivenciou situaes cotidianas do grupo. Seu livro Argonautas do Pacfico Ocidental,

    publicado em 1922, marca o que se considera a primeira formulao do que o mtodoetnogrfico (URIARTE, 2012).

    O convvio com os nativos e a polifonia possibilitada atravs da interlocuo com osintegrantes dos grupos estudados possibilitou mudanas basilares na cincia antropolgica,que deixa de ser centrada na sociedade do pesquisador e passa a ser relativizada mediante a

    prpria viso de mundo dos nativos. Apenas a vivncia em campo, portanto, permitiria aopesquisador captar esse ponto de vista nativo (MALINOWSKI, 1978). Nesse sentido, emboraalguns autores prefiram chamar a etnografia no de mtodo, mas sim de prtica descritiva(INGOLD, 2008), a importncia da experincia direta e prolongada do pesquisador, daobservao detalhada e da preciso e sensibilidade na realizao da pesquisa vem sendomantida na prtica etnogrfica (INGOLD, 2008).

    Em geral, admite-se que, desde os tempos de Malinowski at os atuais, a Antropologiaem muito se alterou (GIUMBELLI, 2002). Seu locus de estudo transpe-se tambm parasociedades complexas, e os pesquisadores passam a estudar grupos pertencentes a sua prpriasociedade (VELHO, 2003). Contudo, muitos dos pressupostos do mtodo so mantidoscontemporaneamente, conforme ser visto neste texto. Da mesma maneira, o mtodoetnogrfico se disseminou em outros meios cientficos, e vem sendo apropriado por diversoscampos do conhecimento, como a prpria Administrao. A crescente utilizao do mtodoetnogrfico na rea de Administrao, por exemplo, vem sendo justificada por representaruma forma de pesquisa que conseguiria compreender melhor os hbitos, comportamentos eatitudes dos indivduos objeto de estudo (CALIMAN e COSTA, 2008). Na esteira dessa

    popularizao alcanada pelo mtodo etnogrfico, muito se vem discutindo sobre seu uso emdiversas reas, bem como algumas dificuldades surgidas da falta de esclarecimento de

    diversos pesquisadores em relao etnografia (FORSEY, 2010).Nesse contexto, o presente artigo surge de uma inquietao decorrente de nossaprpria experincia enquanto pesquisadoras com prtica em etnografia, na medida em quevivenciamos um perodo de grande difuso do mtodo, em que so feitas algumasapropriaes parciais de determinadas caractersticas relacionadas etnografia, como se

    partes do mtodo fossem equivalentes a sua totalidade. Como consequncia, acaba-seincorrendo em algumas impropriedades, nem sempre intencionais, em relao ao mtodo. Umexemplo emblemtico disso o episdio que desencadeou a redao deste texto e que inspiraseu ttulo. Uma de ns, certa feita, ouviu a fala de um pesquisador que, ao necessitar elaborarnotas de campo para um estudo que estava realizando, em determinado momento, teve uminsight e, segundo ele, deu-se conta de que, espontnea ou acidentalmente, sem ter a

    inteno de, estaria fazendo uma etnografia. Dado que acreditamos que uma pesquisa nodeve ter um mtodo acidentalmente conduzido, buscamos aqui ressaltar alguns pressupostosda etnografia como forma de contribuir para o campo de Estudos Organizacionais. Este

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    interesse surgiu no somente a partir do episdio em si que descrevemos, como tambm dofato de que nossas pesquisas utilizaram e utilizam o mtodo etnogrfico para seremconcretizadas. Assim, os conceitos e reflexes que expomos aqui advm, em grande parte, de

    pesquisas j realizadas por ns.

    O episdio real que citamos mostra que, apesar de discutido e difundido, ainda hmuitas questes a serem esclarecidas no meio acadmico em relao ao mtodo etnogrfico,principalmente no seio de cincias que no so aquelas de origem do mtodo, como aAdministrao. Outrossim, nosso objetivo aqui discutir algumas dessas possveis confusesgeradas em torno da etnografia, que simbolizamos atravs do que chamamos etnografiaacidental, bem como refletir sobre aspectos centrais do mtodo, evidenciando alguns de seus

    pressupostos. Nossa linha argumentativa centrar-se-, principalmente, nos pressupostos daAntropologia interpretativa de Geertz (2008), mesmo que apresentemos ao longo do texto

    posies divergentes a esta como forma de conhecimento sobre um mtodo que pode assumirdiferentes propostas. Pretendemos, com isso, fortalecer as discusses sobre esse mtodo a

    partir de suas bases, de modo a evitar equvocos, como o que citamos no pargrafo anterior.

    Assim sendo, este texto est organizado em quatro itens, alm dessa introduo. Noprximo captulo, discutimos algumas das apropriaes parciais do mtodo etnogrfico quepodem ser confundidas com a totalidade do mtodo, como a utilizao de determinadastcnicas. A seguir, mostramos algumas possibilidades do mtodo etnogrfico nacontemporaneidade, para, posteriormente, refletir sobre pressupostos do mtodo. Ao final,elaboramos consideraes finais, sem a pretenso de esgotar a discusso, mas sim abrindocaminhos para novas reflexes tangentes ao uso da etnografia.

    2 O que pode parecer etnografia, mas no etnografia

    Uma etnografia consiste em um levantamento de todos os dados possveis de umadeterminada comunidade com a finalidade de conhecer o estilo de vida ou a cultura especficada mesma" (CAVEDON, 2003, p. 143). O objetivo da etnografia descrever a vida do outro,de maneira acurada e sensvel, guiada por um processo de observao detalhada e daexperienciao da realidade desse outro (INGOLD, 2008). O cerne do trabalho etnogrfico chegar a amplas afirmativas sobre o papel da cultura na elaborao da vida cotidiana, atravsdas chamadas especificaes complexas (ROCHA, BARROS e PEREIRA, 2005). Mesmo emsendo o trabalho do pesquisador microscpico, na medida em que olha com ateno para odetalhe, ele pretende ter acesso a grandes temas, atravs da anlise do pequeno e do particular.Assim, a funo do etngrafo residiria em descrever como um grupo de pessoas, localizadono espao e no tempo, percebe o mundo e como age sobre ele (INGOLD, 2008).

    Tais objetivos so seguidos atravs de trs caminhos bsicos: (1) o mapeamento das

    leis e costumes que regem a vida do grupo, processo no qual se observa o maior nmeropossvel de manifestaes concretas que definem a constituio social; (2) a observao e oregistro dos comportamentos cotidianos do grupo, tanto aqueles habituais quanto osconsiderados novos; (3) o registro das opinies, comentrios, palavras dos nativos(MALINOWSKI, 1978). S assim se tornaria possvel a compreenso do ponto de vista e daviso de mundo dos pesquisados (MALINOWSKI, 1978).

    Nesse processo, diversas tcnicas podem ser utilizadas, dentre elas a observaoparticipante, que se sobressai como a mais conhecida. Contudo, por vezes, o que seconvencionou chamar de mtodo etnogrfico confundido com tcnica, por vezes malcompreendido, mal interpretado, tambm em razo de ser um mtodo que possibilita associardiferentes tcnicas ao abordar um problema antropolgico de pesquisa. Conforme aponta

    Magnani (2002, p. 17):

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    O mtodo etnogrfico no se confunde nem se reduz a uma tcnica; pode usar ouservir-se de vrias, conforme as circunstncias de cada pesquisa; ele antes ummodo de acercamento e apreenso do que um conjunto de procedimentos.

    Dentre tais tcnicas, alm da observao participante, so utilizadas a observao

    direta, filmagens, captaes fotogrficas, entrevistas semi-estruturadas, entrevistas biogrficasou narrativas sobre a histria de vida dos sujeitos em foco na pesquisa, levantamento deregistros histricos, entre outras. Cada uma dessas tcnicas, por sua vez, pode contemplar umamplo espectro de possibilidades de que o pesquisador dispe para escolher. Sua escolha ser

    pautada pelo melhor modo de se acercar da realidade a ser pesquisada. Conforme apontamRocha e Eckert (2008), no h frmula pronta para elaborar uma pesquisa etnogrfica, porm,se o pesquisador quiser partir de algum lugar, pode comear com o manual de Mauss (1993)i.

    A confuso do mtodo com a tcnica normalmente traduzida na assuno de queconduzir uma observao participante seria sinnimo de realizar uma etnografia ocorre nosomente no que tange abordagem de coleta de dados em campo, mas tambm na forma deregistro desses dados. A forma consagrada de registro da observao participante, de

    entrevistas e demais interaes ocorridas nos locais pesquisados o dirio de campo. Dessemodo, nos tpicos seguintes abordaremos as tcnicas da observao participante e elaboraodo dirio de campo, respectivamente.

    2.1 Conduzir observao participante no fazer etnografiaA observao participante, uma das tcnicas fundamentais para o desenvolvimento de

    estudos etnogrficos, pressupe a atuao real do pesquisador na vida do grupo estudado. Ainterao, na pesquisa etnogrfica, materializa-se principalmente atravs dessa tcnica(OLIVEIRA, 2000). O conhecimento sobre o grupo se construiria, pois, a partir da vivnciaem seu interior, de maneira que a tcnica sirva como

    uma frmula entre o contnuo vaivm entre o interior e o exterior dosacontecimentos: de um lado, captando o sentido de ocorrncias e gestos especficos,atravs da empatia; de outro, d um passo atrs, para situar esses significados emcontextos mais amplos. [...] Entendida de modo literal, a observao-participante uma frmula paradoxal e enganosa, mas pode ser considerada seriamente sereformulada em termos hermenuticos, como uma dialtica entre experincia einterpretao. (CLIFFORD e GONALVES, 1998, p. 33-34)

    A participao do pesquisador pode, assim, variar de membro total a membro parcialdo grupo, uma vez que, em diversas situaes de pesquisa, quase impossvel o estranho sersempre um participante genuno (GOODE e HATT, 1960, p. 160). Ao integrar experincia einterpretao, o pesquisador pode atuar de forma real na vida do grupo estudado (CLIFFORDe GONALVES, 1998). Tal tcnica permite, destarte, o acesso a informaes que no seriamdisponibilizadas facilmente, em uma observao desinteressada (GOODE e HATT, 1960).

    Nesse sentido, no seria possvel atravs da mera observao, ao vagar pela aldeia ou gruponativo, captar os elementos necessrios conduo de uma etnografia; o etngrafo recolheriaum material morto, que no levaria ao entendimento da vida e lgica nativas(MALINOWSKI, 1978).

    Considerando que o etngrafo atua, mais do que como um observador participante,como um ouvidor participante, tendo em vista a importncia da audio, da linguagem, daentrevista e da conversa na coleta de dados etnogrficos (FORSEY, 2010), destaca-se tambmo papel central da interao no trabalho de campo (EMERSON, 2009). O olhar e o ouvir doetngrafo, atos cognitivos mais preliminares no trabalho de campo, so elementos centrais em

    sua experincia de pesquisa, que possuem significaes especificas no processo deinvestigao, e fazem-se presentes no desenvolvimento da observao participante,modalidade que ganhou um status elevado na Antropologia (OLIVEIRA, 2000). Contudo,

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    apesar dessa noo, importante destacar que a observao, ainda que participante, emboratcnica utilizada pelo etngrafo, no se traduz, em si, como equivalente prtica etnogrfica.

    Em si mesma, a observao participante, assim como a observao direta e asentrevistas, so tcnicas, e como tais, no so responsveis pela construo da etnografia

    em si. A etapa de uma observao participante apenas parte do trabalho de campo.Juntamente das outras tcnicas utilizadas, o pesquisador ter um esforo posterior deconstruo do relato etnogrfico sobre sua experincia vivida que no se resume a umatcnica, to somente. Neste relato o qual abordaremos em itens posteriores o pesquisadordar sentido ao vivido na forma de texto, com vistas a remontar significados dedeterminados acontecimentos para o grupo ou indivduos que esto em foco na pesquisa.

    Traar relaes, compreender eventos, rituais, acontecimentos usuais ou excepcionais,para alm de suas oficializaes so tarefas que transcendem a observao em si. Mesmo queno curso da observao em campo, o pesquisador depare-se com a necessidade de j traarrelaes e buscar compreenses mais amplas envoltas em teias de significados (GEERTZ,2008), esta etapa transcende a tcnica em si mesma.

    2.2 Escrever dirios de campo no fazer etnografiaAssim como o fato de empreender a observao participante no se caracteriza como a

    realizao de uma etnografia, tampouco o fato de registrar vivncias de observaes diretasou participantes em dirios, configura-se, por si somente, a conduo do mtodo etnogrfico.Quando o pesquisador est em campo, em geral, ele anota discursos, comportamentos,vivncias, acontecimentos, expresses variadas sobre a realidade em que est participando.Estes registros so realizados em algo que se convencionou chamar de caderno de campo,utilizado para auxiliar o etngrafo em sua etapa posterior, de escrita de um dirio de campo.

    Normalmente, aponta-se que a utilizao do caderno de campo no seja tal que atrapalhe ouinterponha-se na interao do pesquisador com o campo. Mais importante que a perfeio doregistro, a consecuo da interao em campo, uma vez que, sem esta, no existe etnografia(ROCHA e ECKERT, 2008).

    Por sua vez, no dirio de campo, devem ser feitos todos os registros dos dadoscoletados. O pesquisador deve relatar todos os acontecimentos presenciados durante o

    perodo, no apenas manifestaes concretas da cultura, mas tambm comportamentoscotidianos e expresses prprias do grupo, assim como os prprios sentimentos do

    pesquisador, no intuito de melhor compreenso da realidade estudada (CALIMAN e COSTA,2008).

    Parte significativa do exerccio etnogrfico reside na construo do dirio de campo,instrumento em que o pesquisador produz dia aps dia a partir do exerccio da observao de

    comportamentos culturais de determinado grupo (WEBER, 2009). No dirio de campo, queno deve ser confundido meramente com um dirio ntimo ou um simples dirio de pesquisa,devem ser relacionados os eventos observados ou compartilhados, e reunidos materiais paraanalisar prticas, discursos e posies dos pesquisados, alm de registradas as relaes queforam nutridas, permitindo descrever e analisar fenmenos estudados (WEBER, 2009). Emsuma, a reflexo sobre o trabalho de campo passa pela compreenso do processo de confecodos dirios de campo e sua apropriao como principal fonte da pesquisa (BONETTI eFLEISCHER, 2007).

    O mtodo etnogrfico representa muito mais do que um simples modo de fazerpesquisa ou de coletar dados, pois, no campo da Antropologia, a partir da pesquisa decampo, especialmente de cunho etnogrfico, que se constri o conhecimento (CALIMAN e

    COSTA, 2008). A etnografia tanto um mtodo, por excelncia, de desvendamento da vidacotidiana (YBEMA, YANOW, et al., 2009) quanto uma postura (ROCHA, BARROS ePEREIRA, 2005) que implica no somente a interao com o campo, mas questes ticas que

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    esto colocadas nesta interao e uma profunda vigilncia epistemolgica (ROCHA eECKERT, 2008) no curso da pesquisa.

    3 Algumas perspectivas sobre etnografia

    Assim como a prpria Antropologia enquanto disciplina, o exerccio etnogrfico podeser visto de diferentes maneiras, uma vez que o mtodo constituinte da disciplina. A escritado trabalho de campo que resultar em uma etnografia deve acompanhar as mudanas eatualizaes deste campo disciplinar, tendo em vista a construo deste que chamamos deoutro no texto. Vrias so as maneiras de fazer etnografia e, portanto, vamos exploraralgumas delas, atentando para a postura do pesquisador frente aos pesquisados, comeando

    por um dos trabalhos etnogrficos mais antigos e importantes, que data aproximadamente de1915, apesar de ser publicado posteriormente.

    Referncia indubitvel na discusso do mtodo antropolgico, Malinowski (1978)tinha como uma das grandes virtudes de sua etnografia, a capacidade de remontar umaquantidade infindvel de dados de campo, dando a sensao, para o leitor, de que ele tambm

    esteve l. Como diz Durham (2004), grande o mrito deste autor em reconstruir umaexperincia cultural especfica pautada por reflexes terico-metodolgicas capazes de darconta de sua experincia de campo. Sua tentativa de integrao entre representao e aofornece bases para compreender o sentido de totalidade de sua obra pautada por uma

    preocupao do funcionalismo cultural, que entende a realidade social como apreensvelsomente enquanto sistema (DURHAM, 2004). Sua abordagem privilegiava tomar comounidade de anlise determinado segmento concreto do povo estudado, como o kula, queapresenta muitas semelhanas com o que Mauss (2003) chama de fato social total, umaunidade multidimensional que inclui aspectos materiais, sociais, simblicos, econmicos,

    jurdicos, religiosos relacionando-se com outras instituies.Entretanto, aponta Durham (2004) que, quando Malinowski teoriza sobre a cultura, ele

    indaga a funo da instituio do conjunto, concluindo que esta responderia a umanecessidade bsica ou derivada e, assim, empobreceria a anlise, na opinio da referidaautora. Sob esse ponto de vista, a cultura passaria a ser concebida como a soma deinstituies, parte autnoma de uma totalidade. Para nossa discusso sobre etnografia, talaspecto importa, pois se entende contemporaneamente que j passou o tempo em que umetngrafo, depois de passar um perodo em campo, buscava retratar este todo de seu campo.Atualmente, tende-se a rejeitar explicaes holsticas, dados os limites da capacidade de um

    pesquisador conhecer o outro (CALDEIRA, 1988). Desse modo, o esforo etnogrficoconfigura-se sempre uma interpretao parcial.

    Algo semelhante a esta crtica postulado por correntes ps-modernas, diferenciando-

    se de etnografias clssicas, como as empreendidas por Malinowski (1978), Evans-Pritchard(2013) e Radcliffe-Brown (2013), por exemplo. A partir da dcada de 1980, diversosantroplogos americanos, chamados de meta-etngrafos (RABINOW, 1986), passaram acriticar o modelo de etnografia sustentado na ideia de um encontro colonial, e em relaesde poder assimtricas trazidas pelo imperialismo europeu em direo aos povos africanos eaustralianos, principalmente. Com o desmantelamento dos imprios, reestruturaes de podere com as complexas relaes entre sociedades, tornou-se invivel compreender este outroem sua totalidade, visto que essa totalidade no isolvel no tempo e no espao.

    Clifford e Gonalves (1998), por exemplo, desmantelam a construo da autoridadeetnogrfica estabelecida com base na crena que o outro passvel de ser observado econhecido, desde que com os olhos treinados de um antroplogo. Essa preocupao

    objetivista, que se instaura na dicotomia mico-ticoii

    , expe certo realismo etnogrficoexplorada por Marcus e Cushman (1982). Na viso destes autores, a noo de realismoparte de alguns pressupostos das etnografias clssicas, quais sejam: estruturar o relato

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    etnogrfico sequencialmente; retirar-se do texto, suprimindo a experincia etnogrfica doautor; falar pouco em indivduos e mais no grupo como um todo; acumular detalhes da vidacotidiana; apresentar o ponto de vista do nativo objetificado; tender s generalizaes, efazer uma exegese de termos nativos, demonstrando assim a competncia do pesquisador

    (CALDEIRA, 1988).O que era ento uma experincia fragmentada, descompassada e confusa torna-se,depois, um todo coerente que pouco fala sobre o campo, provocando uma fissura entreexperincia e texto, ou at entre discurso e texto. Assim, as noes de inveno do outro einveno da cultura (WAGNER, 2012), pautadas na ideia de que o outro no existe atque este seja inventado como algo diferente do pesquisador, passam a ganhar relevncia nocontexto de uma crtica da prpria produo etnogrfica. Sob esse ponto de vista, a noo decultura no existiria fora de uma relao dialtica entre a cultura do pesquisador e a cultura do

    pesquisado.A resposta metodolgica de Geertz (2008) aos dilemas antropolgicos aponta para um

    esforo hermenutico. Para ele, etnografia no somente um mtodo do qual o pesquisador se

    utiliza para abordar seu universo emprico; etnografia seria, em si mesma, um trabalhoantropolgico e, como tal, deveria compreender as teias de significados culturais. Para esteautor, a anlise construda atravs de uma descrio densa etnogrfica sempre incompleta,

    pois se trata de uma interpretao e, por isso mesmo, sempre provisria.

    [...] a etnografia uma descrio densa. O que o etngrafo enfrenta, de fato a noser quando (como deve fazer, naturalmente) est seguindo as rotinas maisautomatizadas de coletar dados uma multiplicidade de estruturas conceptuaiscomplexas, muitas delas sobrepostas ou amarradas umas s outras, que sosimultaneamente estranhas, irregulares, inexplcitas, e que ele tem que, de algumaforma, primeiro apreender e depois apresentar. [...] Fazer etnografia como tentarler (no sentido de construir uma leitura de) um manuscrito estranho, desbotado,

    cheio de elipses, incoerncias, emendas suspeitas e comentrios tendenciosos escritono com os sinais convencionais do som, mas com exemplos transitrios decomportamento modelado (GEERTZ, 2008, p. 7).

    A escrita etnogrfica tratar-se-ia, ento, de um esforo ficcional, uma interpretao dainterpretao. Tal esforo verdadeiro, mas no em um sentido de objetificao realistadaquilo que observado; verdadeira apenas a interpretao empreendida pelo pesquisador.

    Os textos antropolgicos so eles mesmos interpretaes e, na verdade, de segunda eterceira mo. Trata-se, portanto, de fices; fices no sentido de que so algoconstrudo, algo modelado o sentido original defictio no que sejam falsas,no-factuais ou apenas experimentos de pensamento. (GEERTZ, 2008, p. 25-26).

    Colocando-se ao encontro desse argumento, Peirano (2008) aponta que etnografia no apenas uma metodologia ou uma prtica de pesquisa, mas a prpria teoria vivida [...]. Nofazer etnogrfico, a teoria est, assim, de maneira bvia, em ao, emaranhada nas evidnciasempricas e nos nossos dados. (2008, p. 3). Teoria e prtica so, pois, inseparveis, uma vezque as lentes que o pesquisador usa para interpretar o campo so oriundas das teorias quedirecionam tanto sua insero em campo quando seu posterior relato etnogrfico.

    A postura interpretativa, entretanto, no a nica existente. Contra ela, crticos ps-modernos apontam que a noo de interpretao provisria e de descrio densa no rompemcom a autoridade etnogrfica clssica (CALDEIRA, 1988). Ainda haveria um outro a serinterpretado; ainda h uma cultura entendida como externa ao pesquisador que, extrada emseus elementos diferenciadores, pautados por um relato que implcita relaes de poder,

    possibilita que esta seja interpretada. Nesse sentido, Marcus e Fischer (1986) defendem adisciplina da Antropologia como crtica cultural.

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    A sugesto dos crticos ps-modernos a tentativa de construo de um texto dialgico,polifnico, representando muitas vozes e, portanto, diluindo a presena do autor no texto.Assim, a etnografia no representaria uma cultura, mas processos comunicacionais dos quaisele, o pesquisador, apenas mais uma das vozes. O texto, assim, sugere, provoca relaes,

    mas no se considera politicamente superior para realizar uma explicao concisa da realidadevivida de outrem (CALDEIRA, 1988).Quando no h mais um todo coerente e isolvel para analisar e quando as conexes de

    uma sociedade moderno-contempornea complexa (VELHO, 2003) transcendem aslocalidades situadas estavelmente no tempo e espao, a prtica etnogrfica deve adaptar-seaos objetos de estudo mais complexos, como os multi-situados e interdisciplinares(MARCUS, 1995). Algumas so as estratgias etnogrficas sugeridas pelo autor, as quaisabordaremos na sequncia.

    Uma delas seguir as pessoas. A mais bvia e convencional de todas, j encontradaem Malinowski (1978), hoje vem sendo utilizada para estudos sobre processos migratrios,

    por exemplo. Outra abordagem seguir as coisas, cujo fundamento est em grande parte no

    trabalho de Appadurai (1986) A vida social das coisasiiide forma a traar as mudanas destatus das coisas, commodities, gifts, obras de arte ou recursos ao longo do tempo emdiferentes contextos. Para Marcus (1995), este tipo de etnografia seria o mais utilizado paraestudar processos do sistema capitalista, porm, para alm deste, pode-se citar tambm aabordagem de Latour (2000) em estudos sobre cincia e tecnologia que, ao buscar traar aconstruo de fatos cientficos, segue atores humanos e no-humanos no mesmo plano deinvestigao.

    Pode-se ainda seguir a metfora, quando aquilo que se busca est envolto emdiscursos e modos de pensamentos de modo que o que guia a investigao so os sinais,smbolos e metforas em torno do objeto. Haraway, Kunzru e Tadeu (2009) utilizam essaestratgia para a construo de seu objeto de estudo sobre ciborgues, enquanto Martin (1995)

    busca traar a noo deimunidadena cultura norte-americana. Outra abordagem seguir ahistria ou enredo, uma vez que existem narrativas que podem, elas mesmas, servir comouma heurstica para o trabalho de campo. Esta estratgia, para Marcus (1995), j foi bastanteutilizada na anlise Lvi-straussiana de mitos e atualmente direciona-se tambm parainvestigao da memria social e coletiva. Pode-se ainda seguir a biografia, ou seja, ahistria de vida, como um caso particular da estratgia de seguir a histria ou enredo. Altima estratgia sugerida por Marcus (1995) de seguir o conflito, ou partes do conflito.Comum na Antropologia do Direito, no estudo de instituies legais e mdia de massa, algunsexemplos dessa estratgia apontam para o estudo da controvrsia sobre o aborto, sobre leis dedireitos autorais, entre outros conflitos cotidianos.

    No obstante, contemporaneamente, o contexto de elaborao dos textos etnogrficosem muito difere daquele em que foram elaboradas as etnografias chamadas clssicas, uma vezque, tradicionalmente, o objeto de estudo da Antropologia eram prioritariamente os indivduosdas sociedades tradicionais (CAVEDON, 2003). Hoje, com a diminuio em nmero dassociedades ditas tradicionais, e com a complexificao da vida urbana, muitos trabalhosantropolgicos voltam-se para o estudo das sociedades contemporneas nas grandes cidades(MAGNANI, 2002). Criam-se novas esferas de investigao, como a Antropologia doConsumo, a Antropologia Urbana, Antropologia Rural, Antropologia Poltica, campos em quea etnografia representa, mais que um mtodo, a atividade que d essncia ao conhecimento e compreenso do outro (CALIMAN e COSTA, 2008).

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    Ento, o que caracteriza uma etnografia?Como se viu, possvel dizer que o mtodo etnogrfico no pode ser confundido com

    ou reduzido a uma tcnica, na medida em que pode fazer uso de vrias delas a depender de

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    cada pesquisa; ele se caracteriza mais por ser um modo de acercamento e apreenso do queum conjunto de procedimentos (MAGNANI, 2002, p. 17). Contudo, independentemente daforma que o pesquisador escolhe para acercar-se da realidade a estudar, h algunsentendimentos bsicos que podem ser elencados na reflexo sobre este mtodo, que no se

    esgotam nos itens abordados no presente trabalho.Os diferentes autores que versam sobre etnografia deixam entrever determinadosncleos de significado recorrentes, como: primeiro, a necessidade de uma atitude deestranhamento por parte do pesquisador em relao ao objeto, a qual provm da presena desua cultura de origem (MAGNANI, 2009). Em verdade, essa copresena acaba provocando a

    possibilidade de uma soluo no prevista, um olhar descentrado, uma sada inesperada. Opesquisador se depara com o significado do arranjo do nativo, percebe esse significado e deveser capaz de descrev-lo em seus prprios termos, apreender essa lgica e incorpor-la deacordo com os padres de seu prprio aparato intelectual e at mesmo de seu sistema devalores e percepo. De acordo com o autor, logo:

    a etnografia uma forma especial de operar em que o pesquisador entra em contatocom o universo dos pesquisados e compartilha seu horizonte, no para permanecerl ou mesmo para atestar a lgica de sua viso de mundo, mas para, seguindo-os atonde seja possvel, numa verdadeira relao de troca, comparar suas prprias teoriascom as deles e assim tentar sair com um modelo novo de entendimento ou, aomenos, com uma pista nova, no prevista anteriormente. (MAGNANI, 2009, p.135).

    Essa maneira de aproximao prpria da abordagem etnogrfica. Trata-se de umempreendimento que supe investimento, pacincia e continuidade, ao cabo do qual e emalgum momento, os fragmentos se ordenam, perfazendo um significado que pode serinesperado (MAGNANI, 2009). A abordagem etnogrfica se revela, pois, relacional, tantoquanto relacional seu objeto. O conhecimento etnogrfico construdo, assim, atravs da

    experincia e da relao com o outro (MOHIA, 2008). Destarte, o pesquisador descreve, comgrande profundidade, as culturas enquanto teias de significado que devem ser apreendidas,revelando a singularidade do objeto de estudo frente a outros fenmenos culturais (GEERTZ,2008). Sendo assim, organizamos algumas noes bsicas que julgamos mais importantes na

    pesquisa etnogrfica em seis aspectos, que esto apresentados a seguir.

    4.1 A entrada em campo e o fluxo da observao participanteNo comum que a etnografia parta de hipteses (ROCHA e ECKERT, 2008). Desse

    modo, somente com a entrada em campo e no decorrer da observao participante que asrelaes terico-empricas comearo a ser desenvolvidas. Como ressalta Geertz (2008, p.20), chegar a qualquer lugar com um assunto enfocado intensificar a suspeita, a sua prpriae a dos outros, de que voc no o est encarando de maneira correta. Entretanto, cabe apontarque necessrio um esforo prvio entrada em campo buscando o que j foi dito sobredeterminado fenmeno, com o intuito de acercar-se do objeto de pesquisa.

    Na medida do possvel, com a entrada em campo, o pesquisador procurar relativizarsuas percepes com vistas compreenso da realidade observada a partir de sua prprialgica de funcionamento. Isto certamente no significa que o pesquisador ir despir-secompletamente de suas vivncias e percepes dada a impossibilidade disso mas sim queir colocar-se em uma vigilncia epistemolgica (ROCHA e ECKERT, 2008), de modo asempre questionar-se sobre o que ocorre e sobre seu prprio entendimento acerca do cotidianodo campo.

    A observao participante no consiste apenas em, s vezes, deixar de lado a mquinafotogrfica, o lpis e o caderno para participar do que est acontecendo, mas tambm significaa possibilidade de captar aes e discursos em ato, o meio privilegiado para elaborao de

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    teorias etnogrficas, expresso que serve para solucionar o dilema do antroplogo,constantemente preso entre cincia e narrativa, entre discurso sobre os outros e o prpriodilogo com eles (GOLDMAN, 2006). Os dados de pesquisa no so meramente observados,mas sim possibilitam revelar, no ao pesquisador, mas no pesquisador, aspectos situados na

    interseo das categorias nativas apresentadas pelos informantes e da observao do etngrafo(PEIRANO, 1995).Conforme aponta Cavedon (2003), a maneira pela qual o pesquisador introduzido no

    campo diz muito sobre o tipo de interao que se tem com as pessoas. Em uma estruturaorganizacional, por exemplo, ser introduzido por algum hierarquicamente superior podefacilitar uma entrada inicial, porm, dificultar a relao com outras camadasorganizacionais. A entrada com um informante-chave em especfico, hierarquicamentesuperior ou no, tambm pode fazer com que a viso de mundo do pesquisador sejaimpregnada com a dele, no possibilitando que ele note percepes para alm daquela.

    Tanto na insero em campo quando em todos os momentos posteriores de interao,o pesquisador deve ser capaz de permitir-se uma sensibilidade emocional para compreender

    motivos e intenes que fazem parte das aes humanas (ROCHA e ECKERT, 2008).Quando se assume a etnografia como mtodo e como postura, entende-se que a realidade no mensurvel ou objetivamente apreensvel. Sequer ela apreensvel como totalidade.

    Estar com o outro estar no fluxo dos acontecimentos, nas tramas do cotidiano, nasvariaes de prticas, nas regularidades e irregularidades do dia-a-dia, atentando para aquiloque significa, que simboliza e que representa a ao do homem, mesmo aquelesacontecimentos extremamente nfimos e efmeros que aparentemente no tm valor.Entretanto, acessar tais aspectos depende da relao de confiana que se constri, a qualdepende tanto da interao em si, da sensibilidade do pesquisador, como tambm deelementos ticos de pesquisa que sero abordados noutro tpico.

    guisa de finalizao deste item, cabe pontuarmos que um exemplo clssico de umaetnografia que mostra claramente um processo de entrada em campo e a gradativa confianaadquirida pelo pesquisador o trabalho de Foote-Whyte (2005). Ele serve de reflexo paraconsiderarmos que isto que chamamos de entrada em campo algo ambguo. Formalmente,

    pode ser considerado tanto o aceite do grupo ou indivduo para a pesquisa, quanto,informalmente, o momento posterior, em que o pesquisador passa granjear confiana docampo.

    4.2 O estranhamento e a familiarizaoCabe ressaltar, neste item, que, para o etngrafo, as tenses entre o familiar e o

    estranho se fazem presentes durante todo o processo de pesquisa. O estranhamento,

    imprescindvel para o desenvolvimento do trabalho etnogrfico, implica um ato de livrepensar, no sentido de problematizar e estranhar categorias de pensamento, prticas,representaes, relaes (TORNQUIST, 2007). significativo o esforo do pesquisador no

    processo de estranhamento do familiar, na assuno de uma perspectiva estritamente analtica(VELHO, 2003), processo esse que difcil e doloroso, uma vez que implica umdescentramento do olhar que traz mudanas irreversveis forma de ver do pesquisador.

    Malinowski (1978) defende a necessidade de aprender o idioma nativo e transferir-separa a aldeia, afastando-se do convvio com outros homens brancos. O pesquisador deixaria,assim, segundo o autor, de representar um elemento perturbador na vida do grupo, e passaria ater uma viso integral e exaustiva do cotidiano nativo. Quando transposto esse pressuposto

    para as sociedades complexas, com suas multiplicidades de relaes pouco isolveis no tempo

    e no espao, deve-se relativizar essa concepo de isolamento do pesquisador, dado quemuitas vezes o grupo pesquisado faz parte de um ethossemelhante ao dele.

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    Estudar a cidade de perto e de dentro (MAGNANI, 2002) implica riscos e demandaalguns cuidados. No deixa de ser um desafio o estudo do urbano, na medida em que a cinciaantropolgica sempre se caracterizou pelo estranhamento, aos olhos dos estudiosos, dos povosexticos estudados. O estranhamento daquilo que familiar ao pesquisador uma das etapas

    mais difceis dos estudos em Antropologia Urbana (VELHO, 2003). O ato de se colocar nolugar do outro, desenvolver uma atitude de estranhamento de diversos fenmenosobservados na cultura estudada se torna mais custoso quando tal cultura familiar ao

    pesquisador (OLIVEN, 2007). Alm disso, a compreenso do espao na cidade demanda umtreino do olhar, uma vez que, enquanto seus habitantes, estamos continuamente sujeitos aosestmulos da metrpole.

    Estranhar o familiar e familiarizar o estranho (VELHO, 1978) torna-se vital paraadentrar em um nvel de significao no compreendido antes da insero em determinadocampo. Esse movimento passa pela superao das representaes prvias e ingnuas do

    pesquisador em torno do universo de pesquisa em foco, colocando em substituio questesrelacionais (ROCHA e ECKERT, 2008), atentas s condies de produo etnogrfica. Este

    movimento de constante vai-e-vem da experincia em campo posta numa linha tnue entreno ser etnocntrico, nem tornar-se completamente nativo caracteriza a produo dotexto. Nosso texto, portanto, estar sempre condicionado capacidade de refletirmos sobrenossa prpria experincia identificando o que nos familiariza e o que nos distancia dedeterminado objeto. Na medida em que compreendemos isso, a experincia de campo e o tipode interao que temos tornam-se mais claros, de modo que possamos expor taisfamiliarizaes e estranhamentos como parte da pesquisa. Tais aspectos podem ser expressosnum esforo de reflexividade que exporemos em seguida.

    4.3 A reflexividade e ainterioridade da experincia temporalIndependentemente do modo de acercamento empreendidoem um trabalho de campo

    ou na forma de reconstruo etnogrfica posterior, o instrumento privilegiado de pesquisa sempre a prpria presena do pesquisador, tanto no campo quando na escrita (CALDEIRA,1988). Mesmo com as crticas ps-modernas que expusemos anteriormente, cabe considerarque o pesquisador em uma proposta antropolgica nunca est ausente do texto, por isso aautoridade etnogrfica reside na possibilidade de dizer eu estive l (CLIFFORD eGONALVES, 1998). A postura antropolgica parte do pressuposto de que, em estando l,existem condies nas quais o conhecimento ser construdo; uma delas a presena do

    prprio pesquisador, o que revela de maneira mais consistente a noo de reflexividade.

    A personalidade do investigador e sua experincia pessoal no podem ser eliminadasdo trabalho etnogrfico. Na verdade, elas esto engastadas, plantadas nos fatos

    etnogrficos que so selecionados e interpretados. (PEIRANO, 2008, p. 3-4).Assim, a escolha de determinado objeto de pesquisa, as escolhas tericas, a abordagem

    em campo, entre outros aspectos, encontram-se imbricados personalidade do investigador.Entende-se que, estando consciente deste fato e revelando-o claramente, tem-se dimenso dascondies de produo do conhecimento. Ao invs de anular-se pretensamente pressupondoum distanciamento entre o pesquisador e sua pesquisa com ambies positivistas , acondio de produo etnogrfica justamente a interao e, portanto, a relao entre sujeitoe objeto da pesquisa.

    Rocha e Eckert (2005) apontam ainda que reconhecer a reflexividade, a relaointersubjetiva e dialgica da etnografia no suficiente. Embasando-se em Ricoeur (2012), asautoras acreditam que o que est em jogo o ato de configurao e reconfigurao do tempoque encerra a interpretao. Ou seja, dentro de uma proposta de Antropologia Interpretativa, omtodo etnogrfico tambm se caracteriza por uma tenso entre tempos da vivncia e da

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    escritura. A disteno temporal do si que ocorre entre o viver l e escrever aqui umesforo da ao reflexiva do sujeito cognoscente frente descontinuidade do tempo vivido. Acoerncia interna da produo etnogrfica, em suma, um compromisso com a manutenodo si, da identidade narrativa, descompassada entre vivncia e escritura.

    atravs da composio narrativa que o pesquisador coincide as redes de relaes:agenciando fatos, situaes, acontecimentos, personagens e seus dramas num todo ordenado(para alm da lgica acrnica ou cronolgica) [...] (ROCHA e ECKERT, 2005, p. 133). Essacaracterstica do mtodo nos leva ao item seguinte, que diz respeito forma de apresentaofinal dos dados, a qual deve condizer com a experincia vivida.

    4.4 A construo do textoA importncia deste item reside no fato de que o relatrio final de pesquisa, na medida

    do possvel, deve almejar transmitir ao leitor a sensao de estar no campo, passando elemesmo pela experincia do contato com os nativos (GIUMBELLI, 2002). O ato de escrever,configurao final do produto do trabalho de campo, significa trazer os fatos observados

    (vistos e ouvidos, por assim dizer) para o plano do discurso. Ele representa a textualizao dotrabalho de campo, e se destaca por dois momentos centrais: o da elaborao do dirio decampo, j abordado neste artigo, e o da elaborao do texto final (OLIVEIRA, 2000).

    A textualizao das observaes do etngrafo sobre uma determinada culturaconfigura-se empreendimento complexo, na medida em que essa construo, derivada darelao entre sistema conceitual e dados, resulta na produo de um texto delicado do pontode vista moral, poltico e epistemolgico (OLIVEIRA, 2000). Em suma, trata-se de uma

    preocupao com a articulao entre o trabalho de campo e a construo do texto etnogrfico.Textos etnogrficos tendem a se assemelhar a romances, mais prximos de textos ditos

    literrios que dos considerados cientfico (GEERTZ, 2008). Dessa forma, o pesquisador buscanarrar os acontecimentos, pois atravs de uma descrio densa parafraseando o referidoautor que se pode alcanar as teias de significado que se apresentam no curso da experinciaem campo.

    Nesse sentido, a escrita em primeira pessoa do singular, aspecto debatido na produotextual de cunho etnogrfico, no significa necessariamente a produo de um texto intimista.Significa que o autor no deve se esconder sistematicamente sob a capa de um observadorimpessoal, coletivo, onipresente e onisciente, valendo-se da primeira pessoa do plural: ns(OLIVEIRA, 2000, p. 30). A importncia dessa questo reside no fato de que, quando se falana conhecida polifonia do texto etnogrfico, observa-se a pluralidade de vozes s quais seoferece espao no texto, mas tambm se destaca que a voz do prprio pesquisador no podeser obscurecida ou substituda pelas transcries das falas dos entrevistados.

    No existe uma receita pronta para a produo do relato etnogrfico, segundo Rocha eEckert (2008). Entretanto, somente com a leitura de outras etnografias recentes ou clssicas,com a leitura de dirios de campo e suas abordagens tericas que o pesquisador ir apropriar-se da forma de escrita etnogrfica (ROCHA e ECKERT, 2008). Nesse sentido, a leitura dosclssicos fundamental, no somente como forma de compreender a arte da escrita, comotambm para tomar parte nos fundamentos da disciplina. Afinal, o conhecimento queobtivemos atualmente deste mtodo decorre de uma trajetria que, em si mesma, muito revelasobre ele. Dispens-la na tentativa de buscar somente as atualizaes do mtodo seriadesconsiderar seus fundamentos que, apesar das mudanas e crticas realizadas ao longo dotempo, mantm ainda noes bsicas que o norteiam.

    Alm disso, Rocha e Eckert (2008) apontam que a realizao de uma etnografia

    necessita um pensamento especulativo preliminar, no qual a escrita exploratria e ensasticaassumem um papel fundamental. Em sua viso, a organizao do trabalho em fases estanques

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    e precisas como preparao, coleta de dados, anlise e escrita final trata-se de uma ilusoda escrita.

    Por fim, importante destacar que, mais do que uma particularidade do mtodo, adimenso literria do discurso etnogrfico no um ornamento dispensvel, mas sim

    elemento fundamental nesse discurso. A etnografia, assim, no se configuraria apenas emmtodo ou criao literria: seria um campo articulado por tenses, ambiguidades eindeterminaes prprias do sistema de relaes no qual est situada (CLIFFORD eGONALVES, 1998). Mesmo buscando a polifonia, em que o pesquisador tenta apreenderdiversos discursos, a etnografia um texto de autoria de um indivduo, com suas percepes eidiossincrasias.

    4.5 A busca de significadosIntegrando experincia e interpretao, o pesquisador atua de forma real na vida do

    grupo estudado, captando o sentido de ocorrncias e gestos especficos e situando essessignificados em contextos mais amplos (CLIFFORD e GONALVES, 1998, p. 33-34).

    Sem dvida, para que um trabalho etnogrfico seja vlido, imprescindvel quecubra a totalidade de todos os aspectos social, cultural e psicolgico dacomunidade; pois esses aspectos so de tal forma interdependentes que um no podeser estudado e entendido a no ser levando-se em conta todos os demais.(MALINOWSKI, 1978, p. 11-12)iv.

    Cabe destacar a realizao da pesquisa a partir do ponto de vista nativo, de ngulointerno, buscando a lgica cultural que orienta a vida dos grupos estudados em seu prpriocontexto (BOAS, 2004). Em busca dos imponderveis da vida real e de uma viso de dentro,o entendimento do ponto de vista nativo dar-se-ia apenas atravs da observao participante,mtodo de trabalho que permite ao pesquisador aceso ao modo pelo qual os valores sociais

    so vivenciados no cotidiano (MALINOWSKI, 1978).Mesmo que a compreenso do vivido em sua totalidade seja contemporaneamentecontestada, cabe ponderar que na medida do possvel, o pesquisador ir contemplar em seusdirios todas as manifestaes culturais das quais tiver acesso. Isso ser feito com vistas interpretao do sistema simblico que orienta a vida, conformando valores ticos expressosem suas aes e representaes (ROCHA e ECKERT, 2008).

    Independentemente do objeto de pesquisa, o etngrafo questiona-se: o que est sepassando naquele momento em que um determinado acontecimento est ocorrendo?(ROCHA e ECKERT, 2008). As referidas autoras continuam ainda em suas sugestes dequestionamentos: quem faz o que nestas situaes?; quem quem na ordem deocorrncias?; por que as coisas esto acontecendo da maneira que esto acontecendo?, etc.

    Desvelar o significado de algo, portanto, no se resume a executar a observao participante ou demais tcnicas nem a escrever dirios de campo; para alm disso, o pesquisadorquestiona-se sobre as situaes que se interpem no interior de determinado grupo. Seurelatrio final no , portanto, uma descrio pretensamente objetiva daquilo que viu, masinterpretaes do vivido. Nesse sentido, possvel dizer que a descrio etnogrfica denatureza altamente situacional, ou seja, trata-se de um dado etngrafo, em determinada pocae lugar, com certos informantes, vivendo tais experincias (GEERTZ, 2005).

    Assim, um dos principais aspectos que se tem em mente, na anlise etnogrfica, orespeito pela viso que os pesquisados possuem sobre si, sua vida, suas prticas e suaconcepo de mundo (ROCHA, 1995). A etnografia, por ser a interpretao do pesquisadorsobre os valores dos pesquisados, no trata do que se pensa sobre a cultura, mas sim do que se

    pode interpretar a partir das representaes e do imaginrio nativo sobre si mesmo (ROCHA,1995). Mesmo em sendo o trabalho do pesquisador microscpico, porque olha com ateno

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    para o detalhe, pretende ter acesso a grandes temas, atravs da anlise do pequeno e doparticular (ROCHA, BARROS e PEREIRA, 2005).

    Em suma, a prtica etnogrfica representa um processo interativo em que o outro compreendido, no encontro intersubjetivo entre o pesquisador e os sujeitos pesquisados e nas

    tenses entre suas identidades/alteridades (ROCHA e ECKERT, 1998). Assim, asingularidade do discurso mico que o pesquisador profere residiria no carter reflexivopresente nas pesquisas (ROCHA e ECKERT, 1998).

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    Consideraes finais

    Nossa inteno com este trabalho certamente no foi esgotar as possibilidades domtodo, mas clarificar alguns embasamentos e discusses atuais, tendo em vista que atransposio de um mtodo de uma disciplina a outra deve ser acompanhada daresponsabilidade pela manuteno de seus pressupostos. Esperamos, com isso, reduzir asconfuses sobre a prtica etnogrfica, que tendo em vista as subjetividades que ele encerra cerca-se de compreenses equivocadas, por vezes, precipitadas sobre o que venha a ser. No

    pretendemos, a partir destas reflexes, postular uma verdade indubitvel, mas, antes,contribuir para qualificar os estudos em organizaes que se constroem a partir da utilizaodesse mtodo.

    A proposio que apresentamos aqui evidencia que a etnografia no um mtodocompatvel com questes de pesquisa funcionalistas ou positivistas sobre determinadofenmeno seja ele organizacional ou no. No obstante, trata-se de um mtodo que auxiliano levantamento de questionamentos e proposies terico-empricas de fundo compreensivoe interpretativo da realidade vivida. A tais aspectos o pesquisador deve estar atento quando do

    planejamento de seu modo de acercamento do fenmeno em pauta.Bonetti e Fleischer (2007) apontam que uma das dimenses mais ricas do trabalho

    etnogrfico reside em seu carter experimental e artesanal. Por sua vez, Goldman (2006)aponta que o principal, se no o nico, meio de pesquisa a socialidade, ou a disposio paraviver uma experincia pessoal junto a um grupo com o propsito de transformar essa mesmaexperincia em tema de pesquisa e, finalmente, em texto etnogrfico. Desse modo, torna-seimpossvel manualizar a etnografia, dado que cada experincia ser diferente, mesmo quesobre o mesmo objeto de pesquisa. Cabe apontarmos que, independentemente do tipo deexperincia de campo, o pesquisador deve ter em mente que sua interao e posterior relatosobre dada realidade esto permeados por uma tica de trabalho, no sentido de respeitar ocampo e seus participantes. No aprofundamos aqui a dimenso tica na etnografia e,

    portanto, apontamo-la como algo a ser discutido em futuros trabalhos, haja vista suaimportncia, no somente na conduo de uma etnografia, como em qualquer mtodo de

    pesquisa social.Ademais, esse estudo das experincias humanas a partir da experincia pessoal torna aalteridade uma noo central na disciplina, que orienta e limita a prtica etnogrfica(GOLDMAN, 2006). Sendo assim, reiteramos que as tcnicas em si mesmas no configurama etnografia; para alm disso, necessrio que o pesquisador assuma uma postura de pesquisaetnogrfica, atentando para as condies de produo do conhecimento expressos tanto nasinteraes que ele trava em campo quanto na reflexividade. Acreditamos que apropriando-sedesses elementos, reduz-se o risco de realizao de etnografias acidentais.

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    iConforme aponta Cavedon (2003), em verdade, este manual uma compilao de aulas de Marcel Maussque, anotadas por seus alunos, foram transformadas em um livro.iiO que o antroplogo escreve nunca a voz do nativo, porque uma coisa o que o nativo pensa e a outra oque o antroplogo pensa que o nativo pensa. Assim sendo, o ponto de vista do etngrafo em verdade umarelao com o ponto de vista do nativo (VIVEIROS DE CASTRO, 2002).iiiNo original: The Social Life of Things.iv Como dissemos anteriormente, tal noo apresentada por Malinowski est envolta em um pressuposto decapacidade de totalizar a experincia; algo atualmente relativizado tendo em vista a incapacidade do pesquisadorem apreender este todo coerente da experincia (CALDEIRA, 1988). Nesse sentido, retomamos a nooexpressa por Geertz (2008) de que qualquer interpretao sempre incompleta.