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27/11/11 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 1/8 dgsi.pt/jstj.nsf/«/c24d446e009c4079802570530044508f?OpenDocument Acyrdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça Processo: 05B1391 Nº Convencional: JSTJ000 Relator: MOITINHO DE ALMEIDA Descritores: FORMA DO CONTRATO OBRA FEITA EM COLABORAÇO DIREITOS DE AUTOR Nº do Documento: SJ200505310013912 Data do Acordão: 31-05-2005 Votação: UNANIMIDADE Tribunal Recurso: T REL LISBOA Processo no Tribunal Recurso: 4088/04 Data: 30-09-2004 Texto Integral: S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA. Decisão: NEGADA A REVISTA. Sumário : O contrato de obra por encomenda não exige forma escrita Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça : 1. "A" intentou a presente acção declarativa com processo ordinário, contra a Junta B pedindo que a Ré seja condenada a não fazer qualquer utilização da obra A Costa do Estoril - um Século de Turismo, incluindo a sua venda ao p~blico, sem a autorização da Autora (1), que seja ordenada a apreensão dos exemplares da obra que se encontrem à venda ao p~blico (2) e que a Ré seja condenada a pagar-lhe uma indemnização correspondente a 25% do preço de capa de todos os exemplares impressos da obra, computados em 9.843.750$00 (3). Alegou para o efeito e em substância que no início do ano 2000 foi contactada pela empresa C - Edição e Distribuição de Livros, Lda no sentido de elaborar textos e de coordenar a intervenção de outros participantes numa obra sobre a região de turismo da costa do Estoril, obra destinada à Ré que a pretendia utilizar para fins promocionais e de cortesia. A obra foi concluída em Julho de 2000, tendo a Ré

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Acórdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de JustiçaProcesso: 05B1391

Nº Convencional: JSTJ000

Relator: MOITINHO DE ALMEIDA

Descritores: FORMA DO CONTRATO

OBRA FEITA EM COLABORAÇÃO

DIREITOS DE AUTOR

Nº do Documento: SJ200505310013912

Data do Acordão: 31-05-2005Votação: UNANIMIDADE

Tribunal Recurso: T REL LISBOA

Processo no Tribunal

Recurso:

4088/04

Data: 30-09-2004

Texto Integral: S

Privacidade: 1

Meio Processual: REVISTA.

Decisão: NEGADA A REVISTA.

Sumário : O contrato de obra por encomenda não exige formaescrita

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça :

1. "A" intentou a presente acção declarativa comprocesso ordinário, contra a Junta B pedindo que a Réseja condenada a não fazer qualquer utilização da obraA Costa do Estoril - um Século de Turismo, incluindoa sua venda ao público, sem a autorização da Autora(1), que seja ordenada a apreensão dos exemplares daobra que se encontrem à venda ao público (2) e que aRé seja condenada a pagar-lhe uma indemnizaçãocorrespondente a 25% do preço de capa de todos osexemplares impressos da obra, computados em9.843.750$00 (3).Alegou para o efeito e em substância que no início doano 2000 foi contactada pela empresa C - Edição eDistribuição de Livros, Lda no sentido de elaborartextos e de coordenar a intervenção de outrosparticipantes numa obra sobre a região de turismo dacosta do Estoril, obra destinada à Ré que a pretendiautilizar para fins promocionais e de cortesia.A obra foi concluída em Julho de 2000, tendo a Ré

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colocado o livro à venda, pelo preço de 7.875$00, oque a surpreendeu pois tinha sido informada de queera apenas destinada a fins não comerciais.

A Autora não deu autorização para que tal venda serealizasse e não transmitiu os direitos de autorrelativamente à obra em causa.A pedido da Ré foi admitida a intervenção principal deC - Edição e Distribuição de Livros, Lda.A acção foi julgada improcedente. Por acórdão de 30de Setembro de 2004, a Relação de Lisboa julgouimprocedente o recurso de apelação interposto pelaautora.Inconformada, recorreu A para este Tribunal,concluindo as alegações da sua revista nos seguintestermos:

I - Das Questões ProcessuaisPretende a Recorrente que, de harmonia com o art. 616do CPC, não se tome em consideração os depoimentosde D e E, com base nos quais se acaba por tomar todaa decisão em primeira instância e confirmada naRelação, dado serem afinal partes e não testemunhas,decorrente do facto de representarem a IntervenientePrincipal "C", que vem a acabar por ser parte noprocesso.

II - Do direitoNenhum contrato foi estipulado entre a entidadecomitente - Junta B, Recorrida - da obra em apreço, ea Recorrente, mas entre aquela e aInterveniente/Recorrida.A Recorrida "C" sub-contratou, e na modalidade decontrato de prestação de serviços, com a Recorrente, afeitura da obra, nesse contrato não se fazendo qualqueralusão a quem é que ficariam a pertencer os direitosde autor.

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Como o art. 14 do Código do Direito de Autor eDireitos Conexos exige para a obra de encomenda que,para que esses direitos não pertençam ao seu criadorintelectual - a Recorrente -, a favor de quem funcionaa presunção aí estabelecida, terá de se "convencionar"nesse sentido, entende-se permanecerem tais direitosna esfera jurídica da Recorrente, uma vez que nãoexiste nenhum documento escrito nesse sentido, e osdepoimentos, afinal de parte, que afirmam que aRecorrente não se importou de que os direitos de autorseriam da Recorrida/Ré, não são de tomar emconsideração, e acabaram por ser a únicafundamentação de facto de todo o processo!

O CDADC não prevê "sub-contratos" entre a entidadecomitente e o autor, aquando obra de encomenda,portanto não se admitirá que seja através da figuraintermediária da Recorrida/ Interveniente que seretirem conclusões acerca da titularidade dos direitosde autor, em prejuízo da sua criadora intelectual, aRecorrente.É uma obra feita em colaboração, pelo que ficouprovado e pela ficha técnica do livro de acordo com oart°19° n°2.A Recorrente é autora, porque criadora intelectual eesta característica nunca lhe foi negada ao longo doprocesso -, conforme o art°11°.Não se provou que a depoente E tenha participado emnenhuma reunião com a Recorrente.

Também se reivindicam direitos morais, relativos àdivulgação e publicação de formas não previstas pelaRecorrente, porque independentemente de se falar emfruição económica, e isto devido à colocação do livroem postos de venda (ex.: livraria Galileu) e de ter sidopublicado na revista "Evasões".Tal como até dos próprios factos da sentença se podeconstatar, a Recorrente nunca autorizou a publicação

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da obra nem transmitiu a nenhuma entidade os seusdireitos de autora.A Recorrente é, além de escritora, jornalista, e fazparte da comissão Deontológica do Sindicato dosJornalistas, nunca permitiria que os direitos de autorde uma produção sua ficassem na titularidade deterceiro.

2. Quanto à matéria de facto, com interesse para aapreciação da revista, importa mencionar o seguinte:A Autora nunca deu autorização, que nunca lhe foisolicitada, à C, à Ré ou a qualquer outra pessoa paravender ao público a obra em questão (n°18 dos factosassentes);A Autora nunca transmitiu à C,Lda., à Ré ou aqualquer outra entidade os seus direitos de autorarelativamente à obra A Costa do Estoril - Um Séculode Turismo (n°19);

A Ré junta de Turismo ao pôr a concurso a"concepção, produção e edição de um livro prestígioda Costa do Estoril 1999/2000" , deixou claro, atravésde publicação em "A Capital" de 8.12.1999 e noCaderno de Encargos que "os direitos patrimoniais emorais de autor sobre a obra pertencerão à junta B" ebem assim que "A Junta de Turismo será proprietáriados fotolitos após produção dos materiais, devendoestes ser entregues conjuntamente com os exemplaresimpressos" e ainda que "será elaborado um contratocom o titular da proposta vencedora, contendo no seuclausulado as disposições relevantes do presentecaderno de encargos, dele fazendo parte integranteainda que por remissão (n°24);

A Ré ao contratar com C, Lda (com a Autora nadacontratou) " a concepção, produção e edição de umlivro de prestígio da Costa do Estoril 1999/2000 nãocontratou ou pessoalmente assumiu com esta

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quaisquer limitações na utilização futura do referidolivro (antes, pelo contrário, desde logo ficou assenteque lhe daria o destino que entendesse, mormente asua eventual posterior comercialização) e nunca com aautora sequer abordou ou discutiu este assunto (n°27);Na fl. 6 do livro Costa do Estoril consta a referência"Junta B/ todos os direitos reservados" (n°28);

A Autora elaborou o serviço a que se obrigou deforma sucessiva e parcelar, sendo cada parte do seutrabalho, texto por texto, capítulo por capítulo,submetido à aprovação prévia da Junta de turismo, napessoa do Sr. F, a qual tinha a faculdade de aprovar,reprovar ou sugerir alterações aos textos elaboradospela autora, vindo os mesmos a incorporar a obra porterem sido previa e sucessivamente aprovados pelajunta de Turismo (n°35);Deste facto tinha a Autora conhecimento (n°36);A própria C, Lda, acordou com a Autora que osdireitos de autor, morais e patrimoniais, sobre a obra,seriam adquiridos originariamente pela Ré Junta deTurismo, conforme o caderno de encargos do qual aAutora previamente à realização do trabalho, tomoupleno conhecimento, dando expresso assentimento a talfacto (n°40);

A Autora sempre teve inteiro conhecimento do tectointegral do livro, tendo inclusivamente estado presenteno acto de lançamento e reservado para si váriosexemplares, e sempre soube que a Ré Junta sempre seconsiderou e comportou como exclusiva proprietáriados direitos patrimoniais e morais da Autora (n°41);A C informou a Autora de que a obra se destinava,não só a fins de cortesia e promoção, mas também aser comercializada pela Junta de Turismo,nomeadamente nos dois postos de venda ao públicoque possui, um no Estoril, outro em Cascais (n°43);C informou ainda a Autora que, nos termos do caderno

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de encargos da adjudicação da feitura da obra, osdireitos de autor, morais e patrimoniais, sobre amesma, ficariam a pertencer, originariamente, à juntede Turismo (n°44);A Autora concordou em realizar o trabalho nos termose condições mencionadas (n°45).Cumpre decidir.

3. Prova testemunhalQuanto a esta parte do recurso basta observar que elanão foi objecto do recurso de apelação. De qualquermodo a pretensa indevida audição das pessoas emcausa como testemunhas constituiria uma nulidade quea Recorrente não suscitou no momento oportuno.

4. Sujeição da aquisição dos direitos sobre a obra aforma escritaConsidera o acórdão recorrido que, face ao constantedo n°35 dos factos assentes, nos encontramos peranteuma obra por encomenda. A obra veio a público poriniciativa e segundo parâmetros definidos pela JuntaB, entidade que através de um seu representante,acompanhou a respectiva feitura. Contrariamente aoque a Recorrente pretende, o facto de oscolaboradores poderem ser identificados não é denatureza a afastar esta qualificação.

Ora, estão em causa direitos patrimoniais a que aAutora se arroga (em virtude da venda ao público, semdela ter conhecimento, a Autora deixou de receber acorrespondente contrapartida financeira). Nestas condições "sendo livre a alienação ou renúnciado direito de autor na sua vertente patrimonial, coloca-se o problema de saber se a lei exige sempre a formaescrita para o efeito. Tal sucede, por exemplo, no casode obra subsidiada (artigo 13° do CDADC), prevendoa lei que quem subsidie ou financie por qualquerforma, total ou parcialmente, a preparação, conclusão,

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publicação ou divulgação de uma obra, não adquirepor esse facto sobre esta qualquer dos poderesincluídos no direito de autor, salvo convenção escrita.Mas diferente é o caso da obra feita por encomenda oupor conta de outrem (art°14°), pois aí a titularidade dodireito de autor "determina-se de harmonia com o quetiver sido convencionado", não se exigindo, portanto, aforma escrita, havendo que proceder - como refereLuís Francisco Rebelo - "em cada caso concreto a umaanálise dos termos do acordo, que pode ser ou nãoreduzido a escrito nos termos gerais do artigo 219° doCódigo Civil".

Considera a Recorrente que a prova escrita se impõeem tal caso.Em primeiro lugar porque, contrariamente ao decidido,estão em causa direitos morais na medida em que a"publicação e divulgação da obra" podem revestir-sede características que ofendam a reputação do autor.Em segundo lugar, para "prevenir situações como a dopresente processo". É este o "espírito" do CDADC ,que assenta numa máxima protecção dada ao autor.

A este respeito importa observar que, como o acórdãorecorrido observou, nenhuma prova escrita prevê oCódigo para a obra por encomenda, contrariamente aoestabelecido noutros casos (p. ex. os artigos 87°, n°1 e159°, n°2). E não se vê como do seu "espírito" oucomo do facto de , eventualmente, poderem estar emcausa "direitos morais" do autor (não é o caso dospresentes autos) seja de extrair uma exigência que nostermos da lei é excepcional (artigo 219° do CódigoCivil).Quanto ao mais remete-se para a fundamentação doacórdão recorrido (artigos 713°, n°5 e 726° do Códigode Processo Civil).Nega-se, pois, a revista.Custas pela Recorrente.

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Lisboa, 31 de Maio de 2005Moitinho de Almeida,Noronha do Nascimento,Ferreira de Almeida.