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1 Journal of the Adventist Theological Society, 20/1-2 (2009):177-191. Tradução: Yure Gramacho Revisão da Tradução: Darcy Propodolski Pinto Revisão de Língua Portuguesa: Everton Cardoso Justificação pela Fé: Uma Compreensão Adventista Peter M. van Bemmelen Seminário Teológico Adventista do Sétimo Dia Universidade Andrews Introdução Os adventistas do sétimo dia acreditam que foram chamados a proclamar o evangelho eterno a cada nação, tribo, língua e povo, no contexto da tríplice mensagem angélica em Ap 14:6-12. Essas mensagens são o apelo final de Deus à raça humana antes da Segunda Vinda de Jesus Cristo (ver Ap 14:14-20). A expressão “Evangelho Eterno,” que ocorre somente nesta passagem no Novo Testamento, tem implicações importantes. Em primeiro lugar, implica que o evangelho estava no plano de Deus desde a eternidade. Este eterno propósito divino é enraizado no eterno amor de Deus como registrado em Jr 31:3 e Jo 3:12. Em segundo lugar, significa a existência de apenas um evangelho pelo qual os seres humanos caídos podem ser salvos, e este é o evangelho de Jesus Cristo, como Paulo frequentemente se refere (Rm 15:9; 1Co 9:12; etc). Em outras palavras, desde os dias de Adão e Eva até o fim do mundo tem havido e sempre haverá apenas um evangelho, um meio de salvação. Nas palavras do apóstolo: “pois pela graça sois salvos, por meio da fé e isso não vem de vós, é dom de Deus não por obras, para que ninguém se glorie” (Ef 2:8-9). Pedro, falando da salvação através de Jesus Cristo perante os guias religiosos de Israel foi muito enfático: Não há salvação em nenhum outro, pois, debaixo do céu não há nenhum outro nome dado aos homens pelo qual devamos ser salvos” (Atos 4:12). 1 Os adventistas sempre identificaram a si mesmos como os herdeiros das grandes verdades restauradas e proclamadas pelos reformadores protestantes. Como registrado no relatório final de outro diálogo bilateral: “Os adventistas têm um grande apreço pela Reforma. Eles se veem como herdeiros de Lutero e de outros reformadores, especialmente em sua fidelidade aos grandes princípios da 1 Salvo indicação contrária, os textos bíblicos deste artigo foram retirados da Nova Versão Internacional.

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Journal of the Adventist Theological Society, 20/1-2 (2009):177-191.

Tradução: Yure Gramacho

Revisão da Tradução: Darcy Propodolski Pinto

Revisão de Língua Portuguesa: Everton Cardoso

Justificação pela Fé:

Uma Compreensão Adventista

Peter M. van Bemmelen

Seminário Teológico Adventista do Sétimo Dia

Universidade Andrews

Introdução

Os adventistas do sétimo dia acreditam que foram chamados a

proclamar o evangelho eterno a cada nação, tribo, língua e povo, no contexto

da tríplice mensagem angélica em Ap 14:6-12. Essas mensagens são o apelo

final de Deus à raça humana antes da Segunda Vinda de Jesus Cristo (ver Ap

14:14-20). A expressão “Evangelho Eterno,” que ocorre somente nesta

passagem no Novo Testamento, tem implicações importantes. Em primeiro

lugar, implica que o evangelho estava no plano de Deus desde a eternidade.

Este eterno propósito divino é enraizado no eterno amor de Deus como

registrado em Jr 31:3 e Jo 3:12. Em segundo lugar, significa a existência de

apenas um evangelho pelo qual os seres humanos caídos podem ser salvos, e

este é o evangelho de Jesus Cristo, como Paulo frequentemente se refere

(Rm 15:9; 1Co 9:12; etc). Em outras palavras, desde os dias de Adão e Eva

até o fim do mundo tem havido e sempre haverá apenas um evangelho, um

meio de salvação. Nas palavras do apóstolo: “pois pela graça sois salvos, por

meio da fé – e isso não vem de vós, é dom de Deus – não por obras, para que

ninguém se glorie” (Ef 2:8-9). Pedro, falando da salvação através de Jesus

Cristo perante os guias religiosos de Israel foi muito enfático: “Não há

salvação em nenhum outro, pois, debaixo do céu não há nenhum outro nome

dado aos homens pelo qual devamos ser salvos” (Atos 4:12).1 Os adventistas

sempre identificaram a si mesmos como os herdeiros das grandes verdades

restauradas e proclamadas pelos reformadores protestantes. Como registrado

no relatório final de outro diálogo bilateral: “Os adventistas têm um grande

apreço pela Reforma. Eles se veem como herdeiros de Lutero e de outros

reformadores, especialmente em sua fidelidade aos grandes princípios da

1 Salvo indicação contrária, os textos bíblicos deste artigo foram retirados da Nova Versão

Internacional.

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2

Sola Scriptura, Sola Gratia, Sola Fide, Solo Christo”.2 Isso coloca os

adventistas em harmonia com a compreensão evangélica tradicional da

justificação pela fé e também com a tradição patrística, uma vez que, de

acordo com Thomas Oden, “os principais apelos dos reformadores por Sola

Scriptura, Sola Gratia e Sola Fide são encontrados abundantemente na

interpretação patrística das Escrituras”.3 Neste artigo pretendemos apresentar

a compreensão adventista da unidade do ensino da Escritura sobre a

justificação pela fé em Cristo somente, através da graça somente. Em

seguida, um suposto conflito entre alguns ensinos adventistas específicos, tal

como sua ênfase sobre a observância do Sábado e a compreensão protestante

tradicional da justificação pela fé serão considerados.

O Ensino Fundamental da Justificação pela Fé no Antigo Testamento

A unidade da Escritura não significa uniformidade. Esperar por

declarações teológicas muito explícitas no Antigo Testamento (AT) como

são encontrados nos escritos paulinos demonstra uma falta de apreciação

pela diversidade das revelações de Deus para, e no trato com seus

mensageiros inspirados. Todavia, o próprio Paulo recorre ao AT para

mostrar a unidade entre seu ensino sobre justificação pela fé ou justiça pela

fé com os de Moisés e dos Profetas. “Mas agora se manifestou uma justiça

que vem de Deus, independente da lei, da qual testemunham a Lei e os

Profetas” (Rm 3:21). É, portanto, essencial estudar cuidadosamente o que o

AT ensina sobre justiça e justificação. Obviamente, neste artigo podemos

lidar apenas com alguns dos aspectos mais pertinentes sobre o assunto.

O AT proclama a justiça de Deus em todo trato com Israel. No

cântico majestoso, que Moisés por ordem divina ensinou os israelitas a

cantarem, ele anunciou o nome do Senhor nestas palavras: “Ele é a Rocha, as

suas obras são perfeitas, e todos os seus caminhos são justos. É Deus fiel,

que não comete erros, justo e reto Ele é” (Dt 32:4). A justiça de Yahweh é

manifestada, de acordo com o pacto de bênçãos e maldições do capítulo 28

de Deuteronômio, em atos de juízo (ver por exemplo 2 Cr 12:1-6; Dn 9:3-14;

Ne 9:8) e em atos de salvação. Estes últimos são, por vezes, referidos como

os tsidqot Yahweh, podendo ser traduzido como as justiças ou os atos justos

do Senhor (ver Jz 5:10; 1Sm 12:6-7; Mq 6:5). É importante entender que no

AT a justiça de Deus é geralmente equivalente à salvação de Deus, como

pode ser observado no paralelismo hebraico (ver Is 51:6, 8).

2 Lutherans & Adventists in Conversation: Report and Papers Presented 1994-1998 (Silver

Spring, Maryland: General Conference of Seventh-day Adventists; Geneva, Switzerland: The Lutheran World Federation, 2000), 8.

3Thomas C. Oden, The Justification Reader (Grand Rapids, Michigan; Cambridge, United

Kingdom: William B. Eerdmans Publishing Co., 2002), 162.

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3

Quando aborda a justiça humana, o AT nos apresenta um aparente

paradoxo. Existem insistentes e enfáticas declarações de que ninguém é

justo, todos pecaram. Davi pleiteia com Deus, “mas não leves o teu servo a

julgamento, pois ninguém é justo diante de ti” (Sl 143:2). Salomão

reconhece, em sua oração de dedicação do templo, que “não há ninguém que

não peque” (1 Cr 6:36). Ele repete esse pensamento em Eclesiastes 7:20:

“não há um homem justo sobre a Terra que faça o que é certo e nunca

peque”. Moisés por três vezes disse aos israelitas para não acharem que o

Senhor lhes tinha dado a terra de Canaã devido à sua justiça, ao contrário

disso afirmou: “vocês são um povo de dura cerviz” (Dt 9:4-6). O paradoxo é

que esses mesmos escritores e todo o AT fazem uma distinção entre duas

classes de seres humanos: “os justos” e “os ímpios”. Isto suscita a questão

crucial: “Como algum ser humano pode ser chamado de justo em face da

afirmação de que ninguém é justo e que todos pecaram?” A urgência dessa

questão é intensificada quando encontramos pessoas que são designadas

como justas ou irrepreensíveis, “amigo de Deus”, ou mesmo “altamente

estimado” (tais como Noé, Jó, Abraão e Daniel- ver Gn 7:1; Jó 1:1; Is 41:8;

Dn 9:23), como tendo cometido pecados ou confessado algum deles. É

evidente que a justiça dessas pessoas não é idêntica com a ausência de

pecado. Como então podem ser chamados de justos ou irrepreensíveis?

Edmund Clowney destaca quão crucial é essa questão: “Como pode um

homem ser justo para com Deus? Toda a história do AT gira em torno das

respostas divinas a esta pergunta” 4.

A resposta clara e direta é que Yahweh, o Deus da Aliança, justifica

todo aquele que nEle acredita, confia em Suas promessas, reconhece seus

pecados, se lançam sobre a misericórdia de Deus e arrependem-se de suas

injustiças. De Abraão nós lemos, “Abraão creu no Senhor, e isso lhe foi

creditado como justiça” (Gn 15:6). Jó, de quem o Senhor testificou que era

“irrepreensível e honesto, um homem que teme a Deus e se aparta do mal”,

foi arguido pelo mesmo Senhor, “Você vai por em dúvida a minha Justiça?

Vai condenar-me para justificar-se?” (Jó 40:8). Perante o Deus santo e justo

Jó reconheceu sua pecaminosidade e respondeu “Meus ouvidos já tinham

ouvido a teu respeito, mas agora meus olhos te viram. Por isso menosprezo a

mim mesmo e me arrependo no pó e na cinza” (Jó 42:6). Davi, o ungido do

Senhor, quando convencido do seu pecado contra Deus por meio do

adultério e assassinato, o confessou e encontrou perdão (2 Sm 12:13). De

acordo com os Salmos 32 e 51 ele foi justificado perante Deus e pôde cantar,

4 Edmund P. Clowney, “The Biblical Doctrine of Justification by Faith,” em Right With God:

Justification in the Bible and the World, ed. D.A. Carson, Publicado com a autorização do World

Evangelical Fellowship (Paternoster Press; Baker Book House, 1992), 24; cf. pág. 23, “De fato, esta é a

grande questão para todo o Antigo Testamento”.

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4

“Alegrem-se no Senhor e exultem, vocês que são justos! Cantem de alegria,

todos vocês que são retos de coração” (Sl 32:11). Isso é justificação pela fé

unicamente pela graça. A justiça dos justos no AT é um dom do justo

Senhor. É por isso que ao longo dos Salmos se exalta a justiça de Deus.

Paulo declarou a verdade quando afirmou que a Lei e os Profetas testificam

de “uma justiça que provém de Deus, independente da Lei” (Rm 3:21).

Esses temas do AT são desenvolvidos de forma mais profunda por

Edmund Clowney no seu capítulo “The Biblical Doctrine of Justification by

Faith” (A Doutrina Bíblica da Justificação Pela Fé), no livro Right with God:

Justification in the Bible and the World (Correto com Deus: Justificação na

Bíblia e o Mundo) publicado em 1992 em nome da World Evangelical

Fellowship (Sociedade Evangélica Mundial). Os adventistas do sétimo dia

deveriam, acredito eu, concordar com muito, se não com a totalidade da

minuciosa apresentação bíblica de Clowney.5 Seguindo McGrath, Clowney

mostra que o verbo hebraico hasdiq “sempre significa „declarar justo‟ e

portanto para inocentar ou vindicar”. Com um apelo a Dt 25:1, onde aos

juízes de Israel é ordenado “justificar o justo e condenar o ímpio” ele

declara: “é claro que „condenar‟ deve significar „declarar ímpio‟, não „fazer

ímpio‟” (ênfase dele), e que “„justificar‟ deve significar „declarar justo‟ e

não „fazer justo‟”. “Esse significado é constante no AT”.6 O Senhor

admoesta os juízes a darem vereditos justos porque Deus é o Supremo Juiz,

que testifica de si mesmo: “Eu não inocento [ou justifico] o culpado” (Ex

23:7). Enquanto aqui Deus está falando no contexto de um tribunal de justiça

terrestre, torna-se evidente quando avançamos através das Escrituras que

esta declaração tem um profundo significado soteriológico. É necessário

enfatizar que “justificar” é um termo legal, declarando que alguém não é

culpado. Assim, o significado básico de justificação como um veredito

judicial é mantido até mesmo quando abordado sob um aspecto mais amplo

na revelação progressiva de Deus e na reflexão teológica dessa revelação.

Justificação pela Fé em Cristo Somente

Os adventistas do sétimo dia acreditam firmemente e sinceramente

que a salvação é puramente um dom de Deus em Jesus Cristo. Pecadores

como somos, nós não podemos acrescentar nada à perfeita justiça de Cristo,

a qual Ele efetuou em sua encarnação por Sua perfeita obediência à Lei de

Deus e por Sua morte na cruz pelos nossos pecados. Nas palavras de uma

das crenças fundamentais dos adventistas do sétimo dia:

5 Clowney, “The Biblical Doctrine of Justification by Faith” em Right With God, 17-50 6 Ibid., 23; Alister E. McGrath, Iustitia Dei: A History of the Christian Doctrine of

Justification, Vol. 1, The Beginnings to the Reformation (Cambridge: Cambridge University Press, 1986),

12.

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5

Na vida de Cristo de perfeita obediência à vontade de Deus, Seu

sofrimento, morte e ressurreição, Deus provê o único meio de expiação para

o pecado humano, para que aqueles que pela fé aceitam esta expiação

possam ter vida eterna, e toda a criação possa entender melhor o infinito e

santo amor do Criador. Esta perfeita expiação vindica a justiça da Lei de

Deus e a graciosidade de Seu caráter; por ela condena nosso pecado e nos

provê perdão. Crenças Fundamentais, 9.7

“Salvação por meio de Cristo somente” é central para o

entendimento adventista e experiência da salvação. Embora durante nossa

história de mais de 160 anos isso nem sempre tenha recebido a devida

ênfase, essa crença central pode ser traçada ao longo desse período com

acentuação crescente e articulação em livros, tratados, e periódicos

publicados aos milhões pelas casas publicadoras adventistas em todo o

mundo. O mesmo é verdade para o evangelismo adventista em milhares de

formas diferentes desde pequenos grupos de estudo em casas particulares até

evangelismo de alta tecnologia por meios de satélite e internet. Aqui, nós

podemos apenas ressaltar algumas evidências significativas desta ênfase

cristocêntrica na compreensão adventista de justificação pela fé.

Nos escritos de Ellen White, a autora mais lida do adventismo,

Cristo é consistentemente apresentado como a única esperança e o único

caminho de salvação para os seres humanos pecadores. Ela escreveu em

1891: “De todos os que professam serem cristãos, os adventistas do sétimo

dia deveriam ser os primeiros em exaltar a Cristo perante o mundo”.8 Ela

mesma fez exatamente aquilo que seus escritos prestaram testemunho.

Concernente à justificação pela fé era muito explícita. Note sua forte ênfase:

Não há outro ponto que precise ser mais zelosamente apresentado, mais

frequentemente repetido, ou mais firmemente estabelecido na mente de

todos que a impossibilidade do homem caído de merecer alguma coisa

pelas suas próprias boas obras. A salvação é através da fé em Jesus Cristo

somente9.

7 “Fundamental Beliefs of Seventh-day Adventists, 9. „Life, Death, and Resurrection of

Christ,‟” em Seventh-day Adventist Yearbook, 2006 ([Silver Springs, Maryland:] The General Conference Corporation of Seventh-day Adventists, 2006), 5.

8 Ellen G. White, Gospel Workers (Washington, D.C.: Review and Herald Publishing Assn.,

1915), 156; Idem, Manuscript Releases, Volume 9 (Silver Springs, Maryland: E.G. White State, 1990), 294.

9 Ellen G. White, Faith and Works (Washington, D.C.: Review and Herald Publishing Assn.,

1979), 19.

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6

O sangue de Cristo foi derramado para expiar o pecado e para purificar o

pecador; e nós devemos tomar posse dos méritos do sangue de Cristo,

crendo que temos vida em Seu nome. Não deixais as falácias de Satanás

vos enganar; vocês são justificados unicamente pela fé (…)10

.

Não é surpresa, pois, que Ellen White tinha uma elevada estima pela

epístola de Paulo aos Romanos. “Com grande clareza e poder o apóstolo

apresentou a doutrina da justificação pela fé em Cristo”. Ela comenta sobre o

fato de que Paulo vagamente podia prever o grande alcance que suas

palavras teriam. “Ao longo de todas as eras a grande verdade da justificação

pela fé tem se mantido como um poderoso farol para guiar pecadores

arrependidos ao caminho da vida”. Ela menciona a experiência de Martinho

Lutero e então conclui que “na epístola à igreja de Roma todo cristão tem

motivo para agradecer a Deus”.11

A importância da epístola aos Romanos e

outras epístolas paulinas para a compreensão adventista do evangelho é

manifestada em publicações eruditas bem como em materiais bíblicos em

geral e leituras devocionais12

.

Conforme exposto anteriormente, os adventistas crêem que existe

apenas um caminho para salvação desde Gênesis até Apocalipse, sendo este

a fé em Cristo e em Sua justiça. Essa crença central pode ser (e tem sido)

expressa em diferentes palavras, da mesma maneira como as Escrituras não

são monótonas, mas apresentam a verdade do evangelho eterno em variadas

formas. Enquanto os eruditos adventistas podem divergir de opinião no que

diz respeito a certos aspectos do evangelho (assim como diferenças podem

ser encontradas entre eruditos de outras denominações) há uma significativa

unidade concernente à doutrina da justificação unicamente através da graça

pela fé somente. Nas palavras do teólogo adventista Hans LaRondelle:

Básico para o adventismo é o princípio evangélico que a salvação humana

não é através da lei ou pelas obras humanas, mas unicamente por meio da

graça salvadora de Deus (…). A crença adventista aceita a Cristo como o

substituto e o exemplo do homem, nesta irreversível ordem. A fé em Cristo

como nosso substituto diante de Deus provê nossa justificação como o ato

de Deus em declarar (ênfase do autor) justo o crente arrependido. A

justificação é vista como o oposto da condenação (ver Rm 5:16; 8:1, 33,

10 Ellen G. White, “Faith Does Not Make Void the Law,” Signs of the Times, 24 de Março,

1890. 11 Ellen G. White Acts of the Apostles (Mountain View, California: Pacific Press Publishing

Assn., 1911), 373, 374. 12 Ver por exemplo a meditação diária para adultos de George R. Knight, Walking with Paul

Through the Book of Romans (Hagerstown, Maryland: Review and Herald Publishing Assn., 2002)

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7

34). A base para a justificação do crente não é sua observância à lei, mas a

obediência sem pecado de Cristo (Rm 5:18, 19).13

Indubitavelmente, a justificação é primariamente uma declaração

judicial feita por Deus de que o pecador crente em Cristo é justo. Isso é o

oposto de condenação. Mas a fé pela qual nós somos justificados não é

meramente um assentimento mental de certa doutrina. Ela é uma fé viva que

se apega a Cristo e ao Seu sacrifício expiatório. Lutero distingue entre “fé

adquirida” e “fé verdadeira”. Ele escreveu: “Fé adquirida tem como

aplicação final a paixão de Cristo como mera especulação. Fé verdadeira tem

como aplicação final a paixão de Cristo como vida e salvação. (…) A fé

verdadeira com braços estendidos abraça alegremente a dádiva do Filho de

Deus e diz, „Ele é meu amado, e eu sou dEle.‟”14

Ellen White em uma linha

similar escreveu que “há milhares que creem no evangelho e em Jesus Cristo

como redentor do mundo, mas eles não são salvos por esta fé. Esse é apenas

um assentimento racional de que aquilo é um fato”. Ela chama isto de uma fé

geral e a contrasta com uma fé que se apodera de Cristo como o único

Salvador que perdoa pecados, uma fé que conduz ao arrependimento, “uma

fé que executa sua obra no recebedor, uma fé no sacrifício expiatório, uma fé

que opera por amor e purifica a alma”.15

Ela complementa a descrição dessa

fé com as seguintes palavras: “No momento em que a verdadeira fé nos

méritos do custoso sacrifício expiatório é exercitada, reivindicando a Cristo

como um Salvador pessoal, nesse exato momento o pecador é justificado

perante Deus, porque ele é perdoado”16

.

Algumas Áreas Supostamente Problemáticas do Ensino Adventista em

Relação à Justificação pela Fé

Os adventistas do sétimo dia não escaparam das acusações de que

não aceitam realmente o ensino bíblico da justificação unicamente pela graça

por meio da fé somente. Anthony Hoekema em seu livro The Four Major

Cults (As Quatro Maiores Seitas), expressa sua convicção de que os

adventistas, “embora reivindiquem ensinar salvação unicamente pela graça”,

são na realidade culpados por uma espécie de legalismo misturado.17

Ele

13 Hans K. LaRondelle, “The Seventh-day Adventist View of the Relationship of Justification-

Sanctification-the Final Judgment,” em Lutherans & Adventists in Conversation, 123. 14 Citado em Robin A. Leaver, Luther on Justification (St. Louis, Missouri: Concordia

Publishing House, 1975), 30. 15 Ellen G. White, “Justified by Faith,” em Manuscript Releases, Volume 8 (Silver Spring,

Maryland: E.G. White State, 1990), 356. 16 Ibid., 357. 17 Anthony A. Hoekema, The Four Major Cults (Exeter, Reino Unido: Paternoster Press,

1969), 126.

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8

baseia essa afirmação na doutrina adventista do juízo investigativo e seu

ensino com respeito à necessidade de guardar o sétimo dia como o Sábado, o

próprio Dia do Senhor (especialmente no contexto escatológico de Ap

13:11-17).18

Por essa e outras razões classifica o Adventismo do Sétimo Dia

como seita. Críticas similares têm sido levantadas por outros, não menos que

por alguns ex-adventistas. Nem todos concordam com a declaração de

Hoekema. Vale salientar que o erudito evangélico Walter Martin em sua

obra The Kingdom of the Cults (O Império das Seitas) mostra algumas

inconsistências sérias na argumentação de Hoekema. Embora o próprio

Martin não concorde com certas crenças adventistas, aceita como genuína a

enfática afirmação dos adventistas de “que a salvação vem apenas pela graça

de Deus por meio da fé no sacrifício de Jesus Cristo na cruz”19

.

É verdade que os adventistas acreditam que a Lei dos Dez

Mandamentos, incluindo o Sábado do sétimo dia, ainda vigora sobre a raça

humana.20

Mas isso de forma alguma significa que os pecadores podem ser

justificados pela obediência aos mandamentos de Deus. Como citado

anteriormente, os adventistas rejeitam enfaticamente a ideia de que os

pecadores são justificados através de sua obediência à Lei de Deus. Nesse

aspecto a crença adventista concorda com a posição dos reformadores

protestantes conforme indicado, por exemplo, na Segunda Confissão

Helvética de 1566, que diz no capítulo 12, intitulado “Da Lei de Deus”:

Nós ensinamos que essa lei [a Lei de Deus] não foi dada aos homens para

que pudessem ser justificados pela sua observância, mas que antes dela

aprendemos que podemos conhecer nossas fraquezas, pecado e condenação,

e, não confiando em nossas forças, podermos ser convertidos a Cristo pela

fé. O apóstolo abertamente declara: “A lei produz ira,” pois “é mediante a

lei que nos tornamos plenamente conscientes do pecado” (Rm 4:15; 3:20),

e, “Se a lei tivesse sido dada e pudesse justificar ou fazer viver, então a

justiça seria alcançada pela lei. Mas a Escritura (que é, a Lei) encerrou tudo

debaixo do pecado, a fim de que a promessa, que é pela fé em Jesus Cristo,

fosse dada aos que creem (…). Assim, a lei foi o nosso tutor até Cristo, para

que fôssemos justificados pela fé” (Gl 3:22, 24 ff.).21

O mesmo artigo, entretanto, começa afirmando “que a vontade de

Deus é nos explicar na Sua Lei o que Ele deseja ou não que façamos e o que

18 Ibid., 126-128. 19 Walter Martin, The Kingdon of the Cults (Minneapolis, Minnesota: Bethany House

Publishers, 1985), 435. 20 “Fundamental Beliefs of Seventh-day Adventists, 19. „Law of God,‟” em Seventh-day

Adventist Yearbook, 2006, 7. 21 Arthur C. Cochrane, ed., Reformed Confessions of the 16th Century (Philadelphia:

Westminster Press, 1966), 248.

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é bom e justo, ou o que é mal e injusto. Portanto, confessamos que a lei é

santa e boa.22

Os adventistas aceitam essa afirmação como compatível com o

ensino da Escritura, creem que a nova aliança prometida pelo Senhor

(conforme indicada através de Jeremias e repetida em Hebreus 8:10, “Porei

minhas leis em suas mentes e as escreverei em seus corações. Serei o Deus

deles, e eles serão Meu povo”) se cumpriu na vida de todo aquele que

aceitou a Jesus Cristo como seu Salvador e Sumo Sacerdote. Enquanto Paulo

enfaticamente assegura “que o homem é justificado pela fé independente da

obediência à lei”, válido tanto para judeus quanto para gentios, no mesmo

contexto afirma que através da fé não anulamos a lei, “pelo contrário,

confirmamos a lei” (Rm 3:28, 31). Em outro lugar ele (Paulo) declara a

mesma verdade com outras palavras: “a circuncisão não significa nada, e a

incircuncisão também nada é. O que importa é obedecer aos mandamentos

de Deus” (1Co 7:19). Essa obediência deriva da fé e amor a Cristo,

implantados pelo Espírito Santo, “pois em Cristo Jesus nem circuncisão ou

incircuncisão têm efeito algum, mas sim a fé que atua pelo amor” (Gl 5:6).

Jesus, em suas últimas palavras aos discípulos antes da crucificação, falou

várias vezes sobre essa obediência que nasce do amor: “Se vocês me amam,

obedecerão aos meus mandamentos” (Jo 14:15); “Como o Pai me amou,

assim eu os amei; permaneçam no meu amor. Se vocês obedecerem aos

meus mandamentos, permanecerão no meu amor, assim como eu tenho

obedecido aos mandamentos de meu Pai e em seu amor permaneço” (Jo

15:9, 10); “Vocês serão meus amigos, se fizerem o que eu lhes ordeno” (Jo

15:14). Os adventistas crêem que essa é a obediência por amor a qual Paulo

se refere quando escreve que “o amor é o cumprimento da lei” (Rm 13:10).

Enquanto os adventistas acreditam que os cristãos são chamados

para “a obediência que vem pela fé” (Rm 1:5) e que nós “somos criação de

Deus realizada em Cristo Jesus para fazermos boas obras, as quais Deus

preparou de antemão para nós as praticássemos” (Ef 2:10), rejeitam

energicamente qualquer sugestão de que tal obediência e boas obras tem

algum sentido meritório. O Concílio de Trento ensinou em seu Decreto

sobre Justificação que a justificação aumenta “por meio da observância dos

mandamentos de Deus e da Igreja, fé cooperando com boas obras” também

ensina o mérito de boas obras como frutos da justificação23

. Seu cânon sobre

justificação pronunciou a seguinte condenação a qualquer um que disser

“que a justiça recebida não se conserva nem tampouco se aumenta diante de

Deus pelas boas obras, mas que as obras somente são frutos e sinais da

justificação que se alcançou, e que não é causa do aumento da mesma – seja

22 Ibid., 247. 23 H. J. Schroeder, trans., Canons and Decrees of the Council of Trent (Rockford, Illinois: Tan

Books and Publishers, 1978), 36 e 40-42.

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excomungado”. Outro anátema condena qualquer um que disser “que as boas

obras do homem justificado de tal modo são dons de Deus, que não são

também méritos do homem justificado”24

. Em outras palavras, a justificação

é aumentada pela obediência e boas obras, não sendo estas apenas dons da

graça de Deus, mas também os méritos do cristão justificado. Essa crença foi

reconfirmada no Catecismo da Igreja Católica, publicado com a benção

papal de João Paulo II25

. O Catecismo também reafirma a posição do

Concílio de Trento de que “a Justificação não é apenas a remissão de

pecados, mas também a santificação e renovação do homem interior”26

. Esta

visão sobre justificação era e ainda é enfaticamente rejeitada por protestantes

tradicionais, incluindo os adventistas do sétimo dia27

.

Que o tema é bastante relevante no século XXI como foi no século

XVI fica evidente pelo fato de que Francis Beckwith, quem por um breve

período foi presidente da Sociedade Teológica Evangélica, em maio de 2007

renunciou sua posição e sua filiação na Sociedade, volvendo logo depois (em

abril do seguinte ano) à Igreja Católica Romana (igreja na qual cresceu). De

acordo com o Christianity Today, Beckwith mudou suas concepções sobre

justificação porque “achou a visão protestante, a qual assume que a

santificação segue a justificação, inadequada”28

. Beckwith convenceu-se que

o ponto de vista Católico Romano sobre justificação “tem mais poder de

argumentação para explicar para ambos os textos bíblicos sobre justificação

[e] o entendimento histórico da igreja sobre a salvação anterior à Reforma,

todos os caminhos levam de volta para a igreja primitiva dos primeiros

séculos”29

. Tal fato destaca a suprema importância e centralidade da doutrina

da justificação para todo aquele que aceita o princípio da Sola Scriptura. De

acordo com o editorial do Christianity Today, os reformadores

“corretamente ensinaram que apenas o mérito de Jesus tem validade diante

de Deus e que somente através da fé esse mérito poderia ser nosso”30

. Os

adventistas concordam totalmente com esta posição.

24 Ibid., 45 (Canon 24) e 46 (Canon 32). 25 “Uma vez que a iniciativa pertence a Deus na ordem da graça, ninguém pode merecer a

graça inicial do perdão e justificação, no inicio da conversão. Movido pelo Espírito Santo e pela caridade,

podemos então merecer para nós mesmos e para outros as graças necessárias para nossa santificação, para

o aumento da graça e da caridade, e para a obtenção da vida eterna” (a ênfase está no texto). Catechism of the Catholic Church (Mahwah, New Jersey: Paulist Press, 1994), 487, parágrafo 2010.

26 Catechism of the Catholic Church, 482, parágrafo 1989. 27 Uma incisiva crítica protestante do Decreto sobre Justificação do Concílio de Trento pode

ser encontrada em Martin Chemnitz, Examination of the Council of Trent, Part 1, trans. Fred Kramer (St.

Louis, Missouri: Concordia Publishing House, 1971), 455-663. 28 Editorial, “Virtue That Counts: Why Justification by Faith Alone Is Still Our Defining

Doctrine,” Christianity Today, Julho de 2007, 20. 29 Collin Hansen, “Leaving for Rome,” Christianity Today, Julho de 2007, 14. 30 Editorial, “Virtue That Counts,” Christianity Today, Julho de 2007, 20.

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Desta discussão anterior deve ficar claro que os adventistas do

sétimo dia acreditam que a guarda dos dez mandamentos, incluindo a

observância do Sábado do sétimo dia da semana, é visto como parte da

obediência da fé. É o fruto da justificação, nunca a raiz. Cristo refere-se a si

mesmo como o Senhor do Sábado (Mc 2:28), obviamente não para abolir o

Sábado, mas para que todos os que foram justificados pela fé pudessem

seguir seu Senhor na observância do Sábado como um memorial da criação

bem como um selo de sua redenção da escravidão do pecado através de

Cristo (ver e.g. Ex 20:8-11; 31:12-17; Dt 5:12-15; Ez 20:12, 20). Não há

sequer um traço de legalismo em tal observância do Sábado.

Se nossa justificação é somente por meio da graça pela fé somente, a

obediência pela fé tem algo que ver com nossa salvação? Ou para formular a

questão de outra maneira: nossos pensamentos, palavras e atos têm algum

papel em determinar nosso destino eterno? Essas são questões cruciais que

estão estreitamente relacionadas com o tema do julgamento final. As

Escrituras têm muito a dizer sobre esse juízo, não menos que os ensinos de

nosso Senhor como registrado nos Evangelhos. Disse Jesus: “Mas eu lhes

digo que, no dia do juízo, os homens haverão de dar conta de toda palavra

inútil que tiverem falado. Pois por suas palavras você será absolvido (RSV

“justificados”), e por suas palavras será condenado” (Mt 12:36-37). Aqui

nosso Senhor fala sobre justificação e condenação (as declarações judiciais

de inocência e culpa) no contexto do dia do juízo. Obviamente, há um

aspecto escatológico para justificação. Os adventistas creem com base nas

Escrituras que o dia do juízo é um conceito muito abrangente e muita

literatura adventista tem sido publicada sobre o assunto31

. É suficiente dizer

que sustentam o juízo como possuindo duas fases distintas, uma

investigativa e outra executiva. É a sua crença em um juízo investigativo que

tem levado à acusação de que não crêem realmente nos princípios da

Reforma de Sola Fide e Sola Gratia. Para concluir, analisemos brevemente a

questão.

Em Romanos 8:1, Paulo nos diz que “agora já não há condenação

para os que estão em Cristo Jesus”. Anteriormente havia afirmado que

“tendo sido, pois justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor

Jesus Cristo” (Rm 5:1). Tudo isso é uma realidade presente. Em outro lugar

está escrito que “o sólido fundamento de Deus permanece firme, selado com

essa inscrição: „O Senhor conhece quem lhe pertence‟” (2 Tm 2:19).

31 Ver por exemplo Roy Gane, Who’s Afraid of the Judgment? (Nampa: Idaho: Pacific Press

Publishing Association, 2006); Gerhard F. Hasel, “Divine Judgment” em Handbook of Seventh-day Adventist Theology, Commentary Reference Series, Vol. 12, ed. Raoul Dederen (Hagerstown, Maryland:

Review and Herald Publishing Association, 2000), 815-856; Frank B. Holbrook, The Atoning Priesthood

of Jesus Christ (Berrien Springs, Michigan: Adventist Theological Society Publications, 1996).

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Algumas vezes argumenta-se que tais textos mostram que para aqueles que

estão em Cristo não há necessidade de serem julgados, que o conceito de um

juízo investigativo não é bíblico e retira a certeza de salvação dos crentes.

Entretanto, esse tipo de raciocínio ignora totalmente o claro ensino da

Escritura de que todos serão julgados. O apóstolo Paulo é muito enfático

sobre esse ponto. “Pois todos compareceremos diante do tribunal de Deus

(…). Assim, cada um de nós prestará contas de si mesmo a Deus” (Rm

14:10, 12); “Pois todos nós devemos comparecer perante o tribunal de

Cristo, para que cada um receba de acordo com as obras praticadas por meio

do corpo, quer sejam boas quer sejam más” (2Co 5:10). Outras passagens da

Escritura podem ser incluídas. Salomão escreveu no fim de sua vida cheia de

altos e baixos: “agora que já se ouviu tudo, aqui está a conclusão: Tema a

Deus e guarde os seus mandamentos, pois isso é o essencial para o homem.

Pois Deus trará a julgamento tudo o que foi feito, inclusive tudo o que está

escondido, seja bom, seja mal” (Ec 12:13, 14). O apóstolo Pedro nos informa

que o juízo começará pela família de Deus. Todos os que em algum

momento professaram fé em Deus e em Cristo serão julgados antes

“daqueles que não obedecem ao evangelho de Deus” (1 Pe 4:17). Essas

declarações porventura retiram a certeza de nossa justificação?

A clara resposta para essa pergunta é: “Não, se permanecemos em

Cristo!” Jesus na parábola da videira e os ramos destaca a importância

crucial de permanecer nEle. “Eu sou a videira; vocês são os ramos. Se

alguém permanecer em mim e eu nele, esse dá muito fruto; pois sem mim

vocês não podem fazer coisa alguma” (Jo 15:5). E acrescenta que se alguém

não permanece nEle será semelhante a um ramo seco que é lançado ao fogo

para ser queimado (v. 6). O juízo final revelará quem permaneceu ou não em

Cristo. Isso será manifestado se nossa fé em Cristo produziu frutos em

obediência de fé ou se é uma fé estéril (cf. Tg 2:17, 26). Isso revelará na

presença de todo o universo quem manteve a fé em Cristo e quem perdeu de

vista o Caminho, a Verdade e a Vida. A certeza de Paulo na vida eterna

estava enraizada no fato de que “ele tinha guardado a fé” (2 Tm 4:7), sua fé

em Cristo como seu Salvador e Senhor, o justo Juiz de quem receberia a

coroa da justiça. LaRondelle destaca a relação entre a justificação presente

dos crentes e sua justificação no juízo final:

Paulo baseia nossa certeza de salvação futura na realidade de nossa

salvação presente, a certeza de nossa justificação futura na realidade de

nossa justificação presente: „Logo, muito mais agora, sendo justificados

pelo seu sangue, seremos por Ele salvos da ira!”(Rm 5:9, ênfase

acrescentada; ver também v.17). Em outras palavras, quando Jesus nos

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justifica, nós temos plena certeza de que Ele nos justificará no juízo final se

tão somente permanecermos nEle32

.

De um modo diferente, P. T. O‟Brien, colaborador do livro Right

with God (Correto com Deus), também destaca a relação entre justificação

pela fé e julgamento pelas obras. O autor torna claro que o “alicerce da

justificação não está nas obras, nem na fé, mas „na revelação da graça de

Deus em Cristo abraçada pela fé‟. As obras são indispensáveis, pois

demonstram a presença da verdadeira fé e elas são a evidência de que a

pessoa está unida com Cristo em Sua morte e ressurreição”33

. Os adventistas

concordam e acreditam que o juízo, seja investigativo ou executivo, é uma

boa notícia para todos que (assim como Paulo) tem guardado a fé pela graça

de Deus, a saber, a fé em Cristo.

Peter M. van Bemmelen é professor emérito de teologia sistemática no

Seminário Teológico Adventista na Universidade Andrews. Recebeu seu Th.D. da

Universidade Andrews em 1987 e sua dissertação, Issues in Biblical Inspiration:

Sanday and Warfield, foi publicada em 1988 pela Andrews University Press. Van

Bemmelen trabalhou como pastor, presidente de missão e professor em cinco países

diferentes. Ele ensinou mais de trinta anos no Caribbean Union College em

Trinidad, Newbold College na Inglaterra, e desde 1993 na Universidade Andrews.

Tem contribuído com artigos para vários periódicos e simpósios, dentre os quais

Handbook of Seventy-day Adventist Theology (2000), Understanding Scripture: Na

Adventist Approch (2006), Christ, Salvation, and the Eschaton: Essays in Honor and

Hans K. LaRondelle (2009), e Interpreting Scripture: Bible Questions and Answers

(2010).

32 Hans K. LaRondelle, Assurance of Salvation (Nampa: Idaho: Pacific Press Publishing

Association, 1999), 99. Herman Ridderbos discute sucintamente o assunto (Judgment According to Works) em seu excelente livro Paul: An Outline of His Theology, trans. John Richard De Witt (Grand

Rapids, Michigan: William B. Eerdmans Publishing Company, 1975), 178-181. 33 P. T. O‟Brien, “Justification in Paul and Some Crucial Issues of the Last Two Decades,” em

Right With God: Justification in the Bible and the World, ed. D.A. Carson, Publicado com a autorização

da World Evangelical Fellowship (Paternoster Press; Baker Book House, 1992), 94. A citação dentro da

citação foi tirada de Ridderbos, Paul: An Outline of His Theology, 180.