4 - Alimentos Desde e at Quando

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1 Alimentos desde e até quando? Maria Berenice Dias www.mbdias.com.br www.mariaberenice.com.br www.direitohomoafetivo.com.br Devem ser qualificadas, no mínimo, de tormentosas as questões que a definição do marco inicial e do termo final de vigência do encargo alimentar suscitam. O surgimento de dúvidas em sede doutrinária e de uma infinidade de posições díspares na jurisprudência florescem por fatores diversos: o princípio da irrepetibilidade dos alimentos, a eficácia imediata da sentença que os fixa e a retroatividade dos seus efeitos são alguns deles. O tema apresenta desdobramentos múltiplos e precisa ser dimensionado atentando-se em algumas distinções que se impõem. Há alimentos de distintas origens e espécies. Mesmo deixando de lado classificações outras – como as verbas alimentares decorrentes de ato ilícito ou convenção contratual –, os alimentos devidos em razão dos vínculos familiares encerram mais de uma natureza. Quanto mais se alarga o espectro das entidades familiares e se desdobram os conceitos de família e de filiação, a obrigação alimentar adquire novos matizes. Assim, os alimentos são devidos por vínculos de parentalidade, afinidade e até por dever de solidariedade. Quando exigidos em juízo, há a possibilidade de serem fixados alimentos provisórios, provisionais ou definitivos. Podem ser definidos initio litis, incidentalmente ou por sentença, e isso tanto em ação de alimentos como em demandas revisionais ou exoneratórias. Também a demanda de alimentos pode ser cumulada a ações outras, como separação judicial, divórcio, separação de corpos, reconhecimento de união estável e investigação de paternidade. Essas várias nuances merecem análise individualizada, a partir do estabelecimento de algumas afirmativas. 1º. Os alimentos provisórios ou provisionais vigoram desde a data em que são fixados. Optando pelo critério cronológico, cabe estabelecer o termo inicial de vigência dos alimentos fixados judicialmente. Os alimentos provisórios e provisionais não se confundem, possuem propósitos e finalidades diferentes e, inclusive, são previstos em distintos estatutos legais. Clara é a lição de Carlos Alberto Alvaro de Oliveira. 1 Ainda que a doutrina insista em diferenciar esses dois tipos de tutela emergencial, os juízes as tratam de maneira indistinta. A diferenciação entre as duas espécies é apenas 1 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. A Tutela de Urgência e o Direito de Família. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p.83.

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    Alimentos desde e at quando?

    Maria Berenice Dias www.mbdias.com.br

    www.mariaberenice.com.br www.direitohomoafetivo.com.br

    Devem ser qualificadas, no mnimo, de tormentosas as questes que a definio do marco inicial e do termo final de vigncia do encargo alimentar suscitam. O surgimento de dvidas em sede doutrinria e de uma infinidade de posies dspares na jurisprudncia florescem por fatores diversos: o princpio da irrepetibilidade dos alimentos, a eficcia imediata da sentena que os fixa e a retroatividade dos seus efeitos so alguns deles.

    O tema apresenta desdobramentos mltiplos e precisa ser dimensionado atentando-se em algumas distines que se impem. H alimentos de distintas origens e espcies. Mesmo deixando de lado classificaes outras como as verbas alimentares decorrentes de ato ilcito ou conveno contratual , os alimentos devidos em razo dos vnculos familiares encerram mais de uma natureza. Quanto mais se alarga o espectro das entidades familiares e se desdobram os conceitos de famlia e de filiao, a obrigao alimentar adquire novos matizes. Assim, os alimentos so devidos por vnculos de parentalidade, afinidade e at por dever de solidariedade. Quando exigidos em juzo, h a possibilidade de serem fixados alimentos provisrios, provisionais ou definitivos. Podem ser definidos initio litis, incidentalmente ou por sentena, e isso tanto em ao de alimentos como em demandas revisionais ou exoneratrias. Tambm a demanda de alimentos pode ser cumulada a aes outras, como separao judicial, divrcio, separao de corpos, reconhecimento de unio estvel e investigao de paternidade.

    Essas vrias nuances merecem anlise individualizada, a partir do estabelecimento de algumas afirmativas.

    1. Os alimentos provisrios ou provisionais vigoram desde a data em que so fixados.

    Optando pelo critrio cronolgico, cabe estabelecer o termo inicial de vigncia dos alimentos fixados judicialmente.

    Os alimentos provisrios e provisionais no se confundem, possuem propsitos e finalidades diferentes e, inclusive, so previstos em distintos estatutos legais. Clara a lio de Carlos Alberto Alvaro de Oliveira.1 Ainda que a doutrina insista em diferenciar esses dois tipos de tutela emergencial, os juzes as tratam de maneira indistinta. A diferenciao entre as duas espcies apenas

    1 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. A Tutela de Urgncia e o Direito de Famlia. 2 ed. So

    Paulo: Saraiva, 2000. p.83.

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    terminolgica e procedimental; em essncia, em substncia significam o mesmo instituto.2

    Araken de Assis bem explicita: Dos alimentos provisionais se distinguem os provisrios. certo que ambos pertencem categoria de alimentos antecipados, tendo em conta a fase procedimental em que ocorre seu deferimento pelo juiz: desde a postulao, sob forma liminar, e, frequentemente, sem audincia da parte contrria.3 Quando se buscam em juzo alimentos que no foram atendidos espontaneamente, em face da natureza urgente do direito, desimporta a que ttulo so fixados. Provisrios ou provisionais, seu ponto em comum est estruturado na possibilidade de as duas espcies de tutela alimentar preverem a expedio de mandado liminar, deferindo o adiantamento dos alimentos iniciais, fixados em carter temporrio pelo juiz da causa, para garantir os recursos necessrios subsistncia do alimentrio no fluir do processo.4

    No que diz respeito antecipao da obrigao alimentar, para o efeito de estabelecer o marco inicial de vigncia dos alimentos, no h diferenciao entre os provisrios e os provisionais. Ambos so fixados desde logo e imediatamente devem ser pagos. Nenhum deles cautelar.5 Em qualquer das modalidades, os alimentos tornam-se exigveis desde a data da fixao, por determinaes legais expressas. De forma lapidar, o art. 4 da Lei de Alimentos determina ao juiz que, ao despachar a inicial, fixe desde logo os alimentos provisrios. Em sede de alimentos provisionais, o pargrafo nico do art. 854 do CPC traz igual previso, impondo ao juiz que arbitre desde logo uma mensalidade para a mantena do alimentando.

    Diante dessas precises legislativas, talvez nada mais necessitasse ser acrescentado. Qualquer que seja a natureza dos alimentos, ao serem fixados initio litis, nasce o dever de pagar a partir do momento em que estipulados. Sequer se faz necessria a prova prconstituda da obrigao, pois, em face da possibilidade de antecipao de tutela, assegurada pelo art. 273 do CPC, basta prova que convena da verossimilhana do direito. Como consequncia da reforma, nasce tambm a possibilidade para aqueles que no dispem de prova formada da obrigao, uma vez presentes os requisitos do art. 273 do CPC, de postularem a ttulo provisrio alimentos tambm na ao de rito ordinrio, vez que vivel a antecipao dos efeitos condenatrios e executivos de eventual sentena de procedncia.6

    No entanto, vem-se cristalizando uma corrente jurisprudencial que pretende emprestar abrangncia total ao 2 do art. 13 da Lei n 5.478/68, como se a determinao de retroatividade data da citao dissesse respeito a

    2 PEREIRA, Srgio Gischkow. Ao de Alimentos. Porto Alegre: Fabris, 1983. p.49.

    3 ASSIS, Araken de. Da Execuo de Alimentos e Priso do Devedor. 5 ed. So Paulo: Revista

    dos Tribunais, 2000. p. 102. 4 MADALENO, Rolf. Reviso dos alimentos liminares. Revista Brasileira de Direito de Famlia,

    Porto Alegre, v. 4, n. 15, p. 17, out./nov./dez. 2002. 5 ASSIS, op. cit., p. 103, nota 3.

    6 PORTO, Srgio Gilberto. Doutrina e prtica dos alimentos. 3 ed. So Paulo: Revista dos

    Tribunais, 2003. p. 70.

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    qualquer encargo alimentar estabelecido em juzo, quer inicialmente, a ttulo de antecipao de tutela, quer na sentena. Essa espcie de confuso no pode persistir, sob pena de gerar situaes aflitivas a quem necessita de alimentos para viver. Incontrovertido que, nas aes cautelares e em sede de antecipao de tutela, a deciso liminar possui eficcia imediata, nada justificando que, em se tratando de alimentos, o efeito no seja tambm imediato.

    A falta de razoabilidade de tal tendncia mostra-se de uma clareza evidente quando percebe o alimentante rendimentos pagos por terceiros. Proposta a ao e fixados os alimentos, o magistrado determina o desconto da verba alimentcia junto ao empregador, entidade previdenciria ou outra fonte de que o alimentante perceba ganhos. Os alimentos comeam a ser pagos to logo receba o rgo pagador a ordem judicial, sem estar condicionado citao do alimentante.

    De todo descabido um resultado diferenciado pelo s fato de dispor ou no o alimentante de vnculo laboral. A vingar a posio que se vem consolidando, fixados os alimentos provisrios e no havendo como determinar o pronto pagamento pela fonte pagadora, o ru passar a dever alimentos apenas aps sua citao. Porm, havendo a possibilidade de o pagamento ser levado a efeito mediante desconto de rendas ou rendimentos do devedor, os alimentos comeam a ser pagos de imediato. Assim, ainda que atrase a citao do ru empregado ou funcionrio, os alimentos so pagos. Todavia, ocorrendo o retardamento da citao do ru profissional autnomo, que deve pagar diretamente os alimentos, ficaria ele dispensado de atender de pronto sua obrigao.7 Dita distino, alm de revelar flagrante afronta ao princpio isonmico, acaba incentivando o alimentante a esquivar-se do oficial de justia para evitar ser citado.

    Nada justifica o deslocamento do termo inicial da obrigao para o ato citatrio. desnecessria a cincia do obrigado para a ordem judicial dispor de eficcia. A possibilidade de redefinio de valores, a pedido do demandado, to logo tome cincia do quantum fixado, no autoriza afronta ao comando legal. At porque a lei prev a possibilidade de os alimentos fixados inaudita altera parte serem modificados a qualquer tempo. Quanto aos alimentos provisionais, essa flexibilidade garantida na parte final do art. 807 do CPC. De forma explcita, o 1 do art. 13 da Lei n 5.478/68 admite que os alimentos provisrios sejam revisados. Inclusive vem sendo dispensado procedimento em apartado para esse fim.8 Necessrio ter presente que os alimentos de carter provisrio ou provisional no se confundem com os alimentos estabelecidos na sentena. Os alimentos

    7 Quanto ao termo inicial dos alimentos provisrios ou provisionais, tem-se pretendido que,

    tratando-se de provisionais, por fixados no limiar da ao de alimentos, vigem, desde logo, sem retroao, evidentemente, no podem os alimentandos depender de eventual localizao de quem deva cumprir deveres decorrentes da lei, para assumirem a certeza de fazer crdito ao valor fixado de antemo; assim, so devidos desde o primeiro arbitramento. (CAHALI, Yussef Said. Dos Alimentos. 3 ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 901). 8 Ibid., p. 907.

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    definitivos, esses sim, por fora do 2 do referi do artigo 13, so devidos a partir da data da citao.9

    O art. 4 da Lei n 5.478/68 e o pargrafo nico do art. 854 do CPC no so antagnicos ou contraditrios com o disposto no 2 do art. 13 da Lei de Alimentos. Ao contrrio, so harmnicos e se complementam. A tutela cautelar dispe de eficcia imediata. Os alimentos provisrios e provisionais fixados initio litis so devidos desde a data da fixao, o que nada tem a ver com os alimentos quantificados na sentena, esses sim, devidos retroativamente a contar da citao.10

    O valor dos alimentos provisrios e provisionais permanece intacto no perodo que medeia entre a fixao inicial e a data da citao. Nesse nterim (entre a fixao e a citao), os alimentos deferidos em sede liminar, mesmo que eventualmente venham a sofrer alteraes, so imexveis. Sendo alterados os alimentos, incidentalmente, na sentena ou no acrdo, independentemente de retroagir ou no o novo valor, nada altera o montante dos provisrios ou provisionais.

    2. Os alimentos provisrios e os provisionais so devidos at a data da sentena.

    Deferida pelo juiz, ao receber a petio inicial, tutela emergencial de alimentos, o termo a quo do encargo a data da fixao. Mister, no entanto, identificar o perodo de vigncia dos alimentos deferidos initio litis.

    preciso ter presente que a prpria expresso alimentos provisrios d o sentido de sua natureza, ou seja, vigoram temporariamente. Igualmente significa regulamentao provisria a concesso de alimentos provisionais. Os alimentos assim estabelecidos subsistem at a data da sentena, oportunidade em que so fixados os alimentos definitivos. A partir do momento em que so definidos na sentena, os alimentos perdem o carter de transitoriedade e tornam-se definitivos. Proferida a sentena depois de ultimada a fase de cognio, o encargo alimentar no mais provisrio, passando a valer o novo montante fixado pelo juiz como alimentos definitivos.

    A sentena serve de marco final de vigncia dos alimentos provisrios ou provisionais. O simples fato de estar ela sujeita a recurso no retira a exigibilidade

    9 INVESTIGAO DE PATERNIDADE. ALIMENTOS PROVISRIOS. ADEQUAO DO

    QUANTUM. VIGNCIA DO ENCARGO ALIMENTAR. 1. Sendo assalariado, devem os alimentos ser fixados em percentual sobre a receita, atendendo-se o princpio da proporcionalidade. 2. Os alimentos provisrios so devidos desde a fixao e os definitivos desde a citao, pois aqueles podem ser discutidos durante o processo, podendo sofrer majorao ou reduo, podendo haver at exonerao do encargo. Recurso provido em parte. (AI n 70006881858, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Srgio Fernando de Vasconcellos Chaves, julgado em 17/09/2003). 10

    ALIMENTOS PROVISRIOS. VIGNCIA. Tratando-se de alimentos provisionais, que podem ser modificados no curso da demanda, so eles devidos a partir da fixao judicial. No entanto, estabelecidos os alimentos na sentena, sero devidos desde a citao, deduzidos os valores pagos. Inteligncia do art. 13, 2, do CPC. (...). Recurso provido (AI 598368447, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Srgio Fernando de Vasconcellos Chaves, julgado em 10/03/1999).

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    dos alimentos, de modo que os provisrios (que vigem da data em que fixados at a sentena) e os definitivos (que vigoram a partir da sentena) podem ser executados de imediato e conjuntamente.

    Essa, de longa data, a posio do STF, que no ano de 1975 decidiu: a quantia da penso alimentcia fixada provisoriamente em deciso liminar no prevalece, bvio, sobre a que foi arbitrada na sentena final: se a medida liminar a satisfao provisoriamente antecipada do pedido, como sustenta a doutrina dominante (Calamandrei, Jos Alberto dos Reis), a eficcia da deciso pela qual o juiz resolve deferi-la no ultrapassa o momento em que for editada a sentena, porque a primeira, resolvendo questo incidente, no tem como preponderar sobre a outra, que pe termo ao processo julgando o mrito da causa (CPC, art. 162, 1 e 2). 11

    Os alimentos provisrios e provisionais, quer fixados no incio da ao, quer incidentalmente durante a tramitao da demanda, tm como marco final de vigncia a data da sentena de primeiro grau. A sentena que altera os valores fixados inicialmente passa a produzir efeitos imediatos, tanto que somente desafia recurso no efeito devolutivo. Portanto, no a data do julgamento do recurso no segundo grau ou o seu trnsito em julgado que marcam a converso dos alimentos de provisrios para definitivos.12

    Os alimentos provisrios nunca so devidos para alm da data da sentena, independente de haver o juiz elevado ou reduzido o quantum alimentar. O 3 do art. 13 da Lei de Alimentos, ao menos na parte final, necessita de uma releitura. No se pode olvidar que a Lei de Alimentos anterior ao atual Cdigo de Processo Civil, que no concede efeito suspensivo ao recurso extraordinrio. Alis, aps a Constituio Federal, no h como falar somente em recurso extraordinrio, em face do seu desdobramento em recurso especial.13 Modo expresso, o 2 do art. 542 do CPC empresta efeito apenas devolutivo aos recursos extraordinrio e especial. Ainda que o art. 587 do CPC autorize execuo provisria somente quando a sentena impugnada por recurso recebido apenas no efeito devolutivo, em sede de alimentos no h como falar em execuo provisria, em face de sua natureza. De tal sorte, os alimentos definitivos, tambm chamados de regulares, decorrem de acordo ou ato decisrio final do juiz, e ostentam carter permanente, ainda que sujeitos a eventual reviso.14

    Impositivo, assim, adequar o indigitado dispositivo legal aos novos ares que varrem o formalismo estrito e o imobilismo judicial. O grande marco foi a

    11 CAHALI, op. cit, p. 914, nota 7.

    12 ALIMENTOS PROVISRIOS. PERODO DE VIGNCIA. APELAO. EFEITOS. Os alimentos

    fixados provisoriamente initio litis so devidos desde a data de sua fixao at a data da deciso que fixa os alimentos definitivos. A partir da sentena, o valor dos alimentos o fixado pelo juiz, uma vez que a sentena desafia recurso no s efeito devolutivo. O efeito singular do recurso serve para no obstaculizar a cobrana e produz efeitos modificativos desde a sua prolao. No a data do julgamento no segundo grau e nem o trnsito em julgado que opera a mudana do valor dos alimentos provisrios pelo quantum fixado pelo juiz singular. Apelo provido em parte. (AC 70007718737, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Maria Berenice Dias, julgado em 18/2/2004). 13

    PORTO, op. cit, p. 90, nota 6. 14

    ASSIS, op. cit., p. 101, nota 3.

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    introduo, no ordenamento jurdico, da tutela antecipada, que reverteu a estrutura do processo.

    Vem proliferando cada vez com mais desenvoltura a esfera de possibilidades de concesso de tutela antecipada no processo de conhecimento. Tambm a onda de invocar o poder cautelar geral do juiz invadiu as aes de alimentos. Principalmente no que diz com os alimentos provisrios, fixados em sede liminar com as informaes trazidas pelo autor sobre a situao econmica do alimentante, a possibilidade de redefinio tornou-se regra. Na medida em que aportam no processo novas provas, a modificao a qualquer tempo do quantum fixado passou a ser amplamente aceita, para atender ao princpio da proporcionalidade. H at quem conceda ao magistrado a possibilidade de agir ex officio.15

    A modificabilidade dos alimentos a qualquer momento encontra respaldo nos arts. 273, 4, e 807, ambos do CPC, e no 1 do art. 13 da Lei de Alimentos.16 Alterados os alimentos na sentena, ou mesmo quando desacolhida a ao na qual haviam sido fixados alimentos provisrios, a eficcia imediata concedida com base no art. 273 do CPC. Na interposio do recurso, invoca-se o pargrafo nico do art. 558 do CPC para esse mesmo fim. Essa faculdade de agregar efeito suspensivo ao recurso, mesmo fora do elenco legal, h muito conferida tambm ao juiz, ao receber a apelao.

    Assim, quer se trate de alimentos provisrios, provisionais ou definitivos, quer sejam os alimentos majorados, reduzidos ou excludos, vm os juzes, na sentena, dando aplicabilidade imediata ao que decidem. Concedem de ofcio tutela antecipada, fazendo uso de seu poder geral de cautela. Ou, quando do recebimento da apelao, invocando o pargrafo nico do art. 558 do CPC, agregam efeito suspensivo ao recurso, o que empresta eficcia imediata sentena que limitou ou dispensou os alimentos.17 Essas novas posturas no afrontam as regras e princpios que regem os alimentos, dispondo de sustentao legal.

    Igualmente no se pode olvidar a possibilidade que foi concedida ao relator de emprestar efeito suspensivo ao agravo de instrumento. A atual redao do art. 557 do CPC introduziu profundas mudanas no sistema recursal no que diz com os efeitos das decises interlocutrias e das sentenas. Talvez j se possa afirmar que o princpio da suspensividade est seriamente comprometido.

    15 SANTOS, Ulderico Pires dos. Medidas Cautelares. So Paulo: Saraiva, 1979. p. 211.

    16 ALIMENTOS PROVISRIOS. UNIO ESTVEL. REVOGAO. EFEITOS. A comprovao de

    a alimentanda viver em unio estvel, no qual existe o recproco dever de assistncia, resta desonerado o anterior parceiro do encargo alimentar. A modificabilidade dos alimentos pelo juiz autoriza a revogao da verba fixada provisoriamente ao ser comprovado que no faz a alimentanda jus aos mesmos. No entanto, em face do princpio da irrepetibilidade do encargo alimentar, descabido revogar os alimentos com efeito retroativo, o que seria emprestar efeito liberatrio ao inadimplemento. Agravo provido, em parte. (Agravo de Instrumento n 70008295701, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Maria Berenice Dias, julgado em 5/5/2004). 17

    Quanto mutabilidade do valor dos alimentos, Yussef Cahali preconiza solues distintas a depender de se tratar de alimentos provisionais ou provisrios (op cit., p. 917, nota 7).

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    Ainda que a legislao alimentria disponha de um sentido protecionista, em favor do alimentando, no se pode chancelar irreparveis prejuzos. No h sentido em fazer prevalecer o que meramente provisrio, e que foi determinado em superficial e precria cognio, sobre o convencimento obtido aps ampla dilao probatria! Mais ainda, porque irrepetveis os alimentos.18 Foge razoabilidade forar o pagamento de alimentos fixados sem o crivo do contraditrio e faz-los vigorar aps a dilao probatria e o julgamento em sede recursal, quando reconhecido o descabimento da mantena do indigitado montante.

    3. Os alimentos fixados na sentena retroagem data da citao. Nem sempre nas aes alimentcias h a fixao liminar de alimentos.

    Quer por expressamente dispensados os alimentos provisrios, quer por no reconhecida, quando do despacho inicial, a necessidade da verba,19 h casos em que os alimentos so deferidos somente na sentena.

    Quantificando o juiz os alimentos, a sentena produz efeito imediato, devendo o ru comear a pag-los de pronto. A falta de definitividade da sentena no impede a cobrana da verba alimentar, uma vez que o recurso no dispe de efeito suspensivo. O artigo 14 da Lei n 5.478/68 confere um nico efeito sentena que fixa alimentos. A recorribilidade no s efeito devolutivo dispe de uma razo pragmtica: permitir que o credor busque a cobrana dos alimentos imediatamente, sem necessidade de aguardar o trnsito em julgado da sentena.20

    Como o pensionamento fixado no ato sentencial definitivo, portanto, dispe de efeito retroativo e vigora desde a data da citao. a esse encargo alimentar quantificado pelo sentenciante que se refere o 2 do art. 13 da Lei de Alimentos. Quando os alimentos so estabelecidos de forma definitiva, opera-se a retroao de seus efeitos, passando o montante estipulado nessa oportunidade a vigorar a partir da data da citao. Essa a orientao da Justia gacha.21

    18 WELTER, Belmiro Pedro. Alimentos no Cdigo Civil. Porto Alegre: Sntese, 2003. p. 78.

    19 Essa possibilidade existe principalmente quando se trata de alimentos buscados em razo do

    casamento ou unio estvel. 20

    No demais lembrar que dispe o credor de dupla modalidade executria. Mesmo no fixado definitivamente o valor dos alimentos, uma vez que sujeito a recurso, pode o credor valer-se tanto da execuo pelo rito expropriatrio (art. 732 do CPC) como pelo da coao pessoal (art. 733 do CPC) para cobrar os alimentos provisrios e os definidos na sentena. 21

    ALIMENTOS. PENSO PROVISRIA. VIGNCIA. Os alimentos provisrios vigem a partir da data do decisrio judicial que os fixa. Da data da citao, vigem os alimentos definitivos e os decorrentes de reviso. Aplicao dos arts. 4 e 13, 2, da Lei Alimentar (AI 593089584, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Waldemar Luiz de Freitas Filho, julgado em 22/09/1993). ALIMENTOS PROVISRIOS, PROVISIONAIS E DEFINITIVOS. TERMO A QUO. Os alimentos provisrios ou provisionais so devidos desde a data de sua fixao, norma que no se incompatibiliza com o disposto no 2 do art. 13 da Lei de Alimentos, que estabelece o termo inicial dos alimentos definitivos. Apelo provido, por maioria. (APC 70006663942, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Maria Berenice Dias, julgado em 5/11/2003).

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    A eventualidade de a sentena ser modificada no segundo grau no livra o ru do dever de pagar os alimentos desde a data da citao at o trnsito em julgado do acrdo. Essa a nica possibilidade aceitvel. Fixados os alimentos, so devidos retroativamente desde o ato citatrio at a data da deciso que os cassa definitivamente.

    4. Julgada improcedente a ao de alimentos, cessa o pagamento dos alimentos provisrios.

    Intentada ao de alimentos e fixados os alimentos provisrios, a partir desse momento surge a obrigao do devedor de pagar o valor estipulado pelo juiz. O fato de haver a possibilidade de, ao final, a demanda ser desacolhida no libera o ru do dever de pagar os alimentos estabelecidos liminarmente. Livra-se o demandado do encargo somente a partir do momento em que a sentena rejeita a ao, ou a contar do julgamento da apelao que, ao dar provimento ao recurso, julga improcedente a ao.

    O encargo vigora da data da fixao liminar at a deciso que libera o ru do pagamento. No pode o alimentante, ainda que vitorioso na ao, buscar a repetio dos pagamentos feitos. Os alimentos so irrepetveis. Mesmo que no esteja pagando os alimentos fixados provisoriamente e venha a ganhar a ao, o devedor no pode ser dispensado do pagamento a que estava obrigado, sob pena de premiar o inadimplente. Assim, o dever de pagar os alimentos existe desde a data de sua fixao, e no montante fixado. Ainda que a obrigao venha a ser afastada na sentena, durante esse lapso temporal os alimentos permanecem.

    A liberao do encargo levada a efeito pela sentena no retroage data da citao, descabendo invocar o 2 do art. 13 da Lei de Alimentos. No entanto, o reconhecimento da inexistncia da obrigao consagrada na sentena passa a beneficiar de imediato o devedor, que deixa de pagar os alimentos provisrios. A sentena favorvel ao ru, assim, no opera efeito retroativo, mas produz efeitos imediatos. Possui efeito ex nunc. O recurso a que est sujeita a sentena dispe de nico efeito (art. 14 da Lei n 5.478/68), e a interposio do apelo no possui o condo de manter a obrigao de pagar os alimentos que foram cassados no decisum.

    Outra hiptese merece ser figurada, ainda falando-se de demanda alimentria em que houve o estabelecimento de alimentos provisrios. Julgada procedente a ao pelo juiz singular, persiste a obrigao de pagar alimentos, mas no valor definido na sentena, independente de tratar-se de quantia superior ou inferior ao quantum dos alimentos provisrios. Mesmo diante da existncia de recurso, prevalecem de imediato os alimentos redesenhados na sentena.

    No segundo grau de jurisdio, h duas possibilidades. A primeira ocorre no caso de acolhimento do recurso, quando reformada a sentena e julgada improcedente a ao de alimentos. Nessa hiptese, cessa o dever de pagar a penso com o trnsito em julgado do acrdo. Os valores pagos no so devolvidos e os impagos permanecem sendo devidos e podem ser executados. A segunda hiptese o caso da rejeio da apelao, quando confirmada a

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    improcedncia da demanda e reconhecida definitivamente a inexistncia da obrigao alimentar. Todas as parcelas vencidas desde a fixao dos alimentos at o trnsito em julgado do recurso so devidas. A nica regra que merece ser invocada a da irrepetibilidade dos alimentos e o descabimento de beneficiar o inadimplente.

    5. A majorao dos alimentos provisrios ou provisionais retroage data da citao.

    Os alimentos provisrios e provisionais so devidos desde a sua fixao at a data da sentena que estabelece os alimentos definitivos. A partir da definio dos alimentos pelo juzo de primeiro grau, passa a prevalecer desde logo o quantum definitivo. O fato de a sentena desafiar apelao no s efeito devolutivo, conforme preconizam o art. 14 da Lei n 5.478/68 e o inciso II do art. 520 do CPC, significa to-s que o recurso no impede a cobrana dos alimentos.

    A partir da sentena, sempre passam a vigorar os alimentos que o juiz estabelece, no importa se em valor maior ou menor do que os provisrios. No entanto, para saber se os alimentos fixados no decisum retroagem ou no data da citao, impe-se proceder a uma distino. Basta identificar se a sentena elevou ou reduziu o valor dos alimentos provisrios. A depender desse fato, as solues so diversas, pois distintos so os dispositivos legais invocveis.

    Quando a sentena eleva os alimentos provisrios, o novo valor, alm de se tornar devido imediatamente, dispe de efeito retroativo, vigorando desde a data da citao.22 Como houve acrscimo, o devedor obrigado a pagar as diferenas. Assim, a contar do dia da citao, o ru passa a dever os alimentos no valor definido na sentena.

    De outro lado, o novo valor exigvel imediatamente, no se aplicando espcie o disposto no 3 do artigo 13 da Lei de Alimentos. Ocorrendo a fixao dos alimentos definitivos em montante superior ao estipulado inicialmente, o valor originalmente fixado devido da data da fixao at a data da citao. A partir desse marco, o valor passa a ser o definido na sentena. Portanto, o efeito retroativo no alcana os alimentos devidos da data da fixao at a data da sentena. o que diz o 2 do art. 13 da Lei n 5.478/68.

    A sentena opera de imediato a elevao do encargo, que passa a ser devido desde a data da citao do devedor.23 Mas se a majorao ocorrer em

    22 EXECUO. ALIMENTOS PROVISRIOS. CABIMENTO DA COBRANA. 1. Os alimentos

    provisrios fixados podem ser cobrados de forma autnoma, ainda que a sentena final tenha indeferido o direito aos alimentos. 2. Fixada a penso alimentcia, provisria ou definitiva, ela devida at que sobrevenha outra deciso modificando-a. Se majorado o valor dos alimentos provisrios na sentena, essa majorao retroage data da citao; se reduzido o valor ou exonerado o devedor, a nova deciso produzir efeitos ex nunc, no afetando a dvida j consolidada, que possui liquidez, certeza e exigibilidade. Recurso provido. (AC n 70005813068, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Srgio Fernando de Vasconcellos Chaves, julgado em 26/03/2003). 23

    EMBARGOS DO DEVEDOR. EXECUO DE ALIMENTOS. COBRANA DE DIFERENAS DECORRENTES DE SENTENA QUE MAJOROU A PENSO. O quantum da obrigao alimentar

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    sede de apelao, ainda assim o valor fixado no recurso ser devido a contar da data em que o ru foi citado.

    6. Reduzindo a sentena o valor dos alimentos provisrios ou provisionais, o novo montante passa a vigorar de imediato, mas no dispe de efeito retroativo.

    apenas aparente o conflito desta assertiva com a anterior. Basta atentar na natureza da obrigao alimentar, que consagra o princpio da irrepetibilidade dos alimentos.

    Estabelecidos os alimentos initio litis, impositivo que o alimentante passe a pag-los de imediato, pois se destinam mantena do credor. Alis, por esse motivo que vigoram os alimentos provisrios desde a data em que foram fixados.

    No entanto, se na sentena o magistrado reduz os alimentos fixados provisoriamente, o encargo devido pelo alimentante passa a ser o estipulado nessa oportunidade. No prevalece o valor dos alimentos provisrios, a partir da sentena que, pendente de recurso, ou sujeita a ele, fixe os definitivos em valor menor.24

    Na eventualidade de o devedor no pagar os alimentos provisrios, tal omisso no pode vir em seu proveito. Admitir a possibilidade de conceder efeito retroativo quando os alimentos so reduzidos seria estimular a inadimplncia. Ficaria fcil. Estipulados os alimentos provisrios, deixaria o ru de proceder ao pagamento na esperana de o valor ser reduzido quando do julgamento do mrito da ao.25

    De outro lado, tal possibilidade viria em prejuzo exatamente de quem atendeu ordem judicial e passou a pagar os alimentos fixados no incio da demanda. Mais uma vez de lembrar o princpio da irrepetibilidade: Os alimentos, quer sejam provisionais, quer definitivos, uma vez fixados judicialmente no so restituveis.26 Pelo mesmo motivo, tambm no admitem compensao. A reduo dos alimentos provisrios ou provisionais no pode, em qualquer hiptese, ter efeito retroativo. No h como beneficiar o mal pagador, permitindo que pague o

    estabelecido na sentena, mas os alimentos fixados retroagem sempre data da citao. Inteligncia do art. 13, 2, da Lei de Alimentos. (AC n 70005512041, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Srgio Fernando de Vasconcellos Chaves, julgado em 28/02/2003). 24

    CAHALI, Yussef Said. Dos Alimentos. 4 ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 866. 25

    HABEAS CORPUS. ALIMENTOS. Em face da sentena que fixou os alimentos definitivos em valor inferior aos provisrios, o clculo do dbito deve ser elaborado levando-se em conta essa reduo, valor que vigora imediatamente, ainda que pendente a deciso de recurso. Contudo, as parcelas vencidas devem ser pagas no valor vigorante at a data de sua prolao. Ordem concedida, para elaborao de novo clculo do dbito. Unnime. (Habeas Corpus n 70001205871, 7 CC do TJRGS, Rel. Des Maria Berenice Dias, julgado em 09/08/2000). 26

    PORTO, op. cit., p.36, nota 6.

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    valor reduzido.27 Fere o princpio da igualdade livrar o faltoso, sem conceder igual benesse a quem atendeu aos pagamentos pontualmente.

    Emprestar efeito retroativo aos alimentos fixados na sentena equivaleria a punir o alimentante que cumpre com o determinado judicialmente e a premiar o devedor relapso, que, mesmo devendo alimentos provisrios, no os paga, para faz-lo s depois da sentena, contando com a possibilidade de v-los reduzidos.28

    Alterado o montante dos alimentos no recurso, o que passa a valer so os alimentos fixados no segundo grau de jurisdio. Os alimentos fixados no acrdo, se superiores ao montante dos alimentos provisrios, dispem de efeito retroativo data da citao, de modo que o devedor dever arcar com as diferenas impagas. De outra parte, se no acrdo houve o achatamento da verba alimentar, o novo valor s vale a partir da sua fixao no Tribunal.29

    7. Os alimentos fixados na ao investigatria de paternidade retroagem data da citao.

    A fixao de alimentos nem sempre feita em aes que possuam esse nico objeto. Os exemplos so os mais variados. A ao de separao judicial e a ao declaratria de unio estvel podem ser cumuladas com a ao de alimentos. Por construo jurisprudencial, admite-se nessas demandas a fixao de alimentos provisrios.

    O exemplo mais frequente o da ao de investigao de paternidade cumulada com alimentos. Para a obteno de alimentos initio litis, suficiente haver indcios do vnculo obrigacional. No acompanhando dita prova a inicial, no h como fixar o encargo liminarmente. Mas, a partir do momento em que aportam aos autos elementos indicativos que permitam estabelecer um juzo de verossimilhana (normalmente o resultado do exame de DNA), cabe fixar alimentos provisrios inclusive de ofcio e mesmo antes de a sentena declarar a paternidade.

    Como houve o estabelecimento da verba a ttulo de alimentos provisrios, so aplicveis todas as assertivas at agora colocadas. Os alimentos so devidos desde a data em que foram fixados at a sentena. Se houve o estabelecimento

    27 No h como concordar com Yussef Cahali, que reconhece que a reduo alcana os alimentos

    cautelares no pagos oportunamente. (op.cit., p. 915). 28

    ALIMENTOS PROVISRIOS. REDUO DO VALOR NA SENTENA. O valor dos alimentos fixados provisoriamente devido at a data da sentena, ainda que esta os tenha reduzido. Agravo improvido. (AGI n 598500437, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Maria Berenice Dias, julgado em 10/02/1999). 29

    HC. ALIMENTOS. DECRETO PRISIONAL. EXECUO PROPOSTA SOB O RITO DO ART. 733, CPC. De acordo com o art. 520, II, do CPC, combinado com o art. 13, 3, e 14, ambos da Lei de Alimentos (Lei n 5.478/68), os alimentos provisrios fixados so devidos at o trnsito em julgado da sentena que julgou improcedente o pedido de alimentos. Denegaram. Unnime. (HC n 70001153261, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos, julgado em 14/06/2000).

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    de alimentos provisrios antes da citao do ru, tal valor vigora at a data da citao, desimportando se houve aumento ou reduo de valores a posteriori. A partir da citao, o valor dos alimentos passa a ser o definido na sentena, podendo dispor de efeito retroativo. Para isso, necessrio identificar se o valor fixado foi superior ou inferior aos provisrios, para saber se retroage data da citao ou vigora somente a partir do ato sentencial.

    Na hiptese de a sentena estabelecer alimentos em montante superior ao dos provisrios, o novo valor devido desde a data da citao, havendo necessidade do pagamento das diferenas. Essas diferenas so devidas exclusivamente quanto s parcelas vencidas a contar da citao.

    De outro lado, quando a sentena estabelece valor inferior ao dos alimentos provisrios, no dispe de efeito retroativo. Assim, os provisrios so devidos desde a data da fixao at a da sentena. Somente a partir do estabelecimento do quantum inferior que este passa a vigorar. Os alimentos pretritos so devidos no valor originalmente estabelecido.

    Quando os alimentos so fixados somente na sentena, isto , no havendo sido fixados alimentos provisrios, a obrigao de pagamento comea de imediato e sempre retroage data da citao. Desimporta o fato de a sentena estar sujeita a recurso para que o pai passe a pagar de imediato os alimentos a que foi condenado pelo juiz. Aps a fixao definitiva dos alimentos no juzo recursal, possvel identificar o valor da dvida que se avolumou desde a data da citao.

    Custou a jurisprudncia em fixar esse marco, pois a tendncia era estabelecer o pagamento somente a partir da data da sentena.30 Em boa hora passou a prevalecer o entendimento do STJ, consolidado na Smula n 277: Julgada procedente a investigao de paternidade, os alimentos so devidos a partir da citao. Essa j era, h longa data, a orientao da jurisprudncia gacha.31

    8. Majorados os alimentos, em ao revisional, o valor fixado retroage data da citao.

    Todo o afirmado at agora diz com as aes de alimentos, nica sede em que cabe fixao de alimentos provisrios.

    Nas demandas revisionais, ainda que no se fale em alimentos provisrios, est consagrada a possibilidade de haver pedido de antecipao de tutela. Majorados ou reduzidos os alimentos, ou sendo liminarmente exonerado o

    30 Mathias Coltro comenta a deciso que consolidou a nova posio (COLTRO, Antonio Carlos Mathias. Ao de investigao de paternidade e o termo inicial dos alimentos. Revista Brasileira de Direito de Famlia, Porto Alegre, v. 2, n. 6, p. 77,jul./set. 2000). 31

    EMBARGOS INFRINGENTES. AO RESCISRIA. INVESTIGAO DE PATERNIDADE. ALIMENTOS. TERMO INICIAL. Na ao de investigao de paternidade, os alimentos fixados na sentena so devidos a partir da citao. (Embargos Infringentes n 598483998, 4 Grupo Cvel do TJRGS, Rel. Des. Jos Carlos Teixeira Giorgis, julgado em 12/3/1999).

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    alimentante do encargo, tal no transmuda a natureza dos alimentos. Simplesmente houve modificao de valores em sede liminar, o que no desconfigura os alimentos como definitivos. Continuam sendo definitivos, mas so aplicveis os regramentos at aqui referidos.

    Ainda assim, mesmo em se tratando de demanda revisional, distines necessitam ser feitas.

    Caso a pretenso do autor seja elevar o encargo alimentar estabelecido em anterior ao, se o magistrado aumenta o valor em sede liminar, nesse momento passa a vigorar o montante superior. Se o aumento concedido exclusivamente na sentena, o novo valor retroage data da citao. Porm, se a sentena desacolhe a demanda ou estabelece valor aqum do que havia deferido inicialmente, voltam os alimentos ao valor pretrito. No entanto, havendo ocorrido majorao, de forma liminar, na ao revisional, o quantum majorado devido desde a data da elevao da penso at a da sentena que desacolhe a ao ou limita o valor dos alimentos iniciais.

    Elevada a verba alimentar na sentena e acolhido o recurso, julgando improcedente a ao revisional, a situao idntica. Majorados os alimentos liminarmente, o valor dilatado vigora at a data do acrdo que rejeita a ao ou altera o montante estabelecido na sentena. Igualmente, se o magistrado majora os alimentos somente na sentena, vindo esta a ser reformada em sede recursal, mantendo a verba originria, ainda assim os alimentos fixados na sentena vigoram desde a data da citao at o julgamento colegiado.32

    9. Reduzidos os alimentos, em ao revisional, o novo valor devido a partir da sentena, ainda que sujeita a recurso.

    Impositivo no olvidar que reduo significa que o encargo alimentar j est estabelecido e quantificado ou em demanda anterior ou em acordo chancelado judicialmente, isto , vigora obrigao de pagar alimentos.

    Acolhida a demanda, seus termos produzem efeito de imediato. Reduzidos pela sentena os alimentos, o novo valor passa a vigorar de pronto. A ausncia de suspensividade da sentena lhe concede efeito imediato. Aqui incide a regra do art. 14 da Lei de Alimentos e do inciso II do art. 520 do CPC. Acolhida a ao somente em sede recursal, o achatamento do valor da penso ocorre depois do seu trnsito em julgado.

    Estando os alimentos fixados com a chancela judicial e de forma definitiva, no recomendvel sua reduo liminar, pois se destinam a garantir a subsistncia do alimentado. o que preconiza Carlos Alberto Alvaro de Oliveira:

    32 ALIMENTOS. REVISIONAL. MAJORAO. Os alimentos majorados pela sentena em ao

    revisional so devidos desde a citao at a data do trnsito em julgado do acrdo que reps a verba no montante anterior. Isso porque o apelo, no caso, recebido em efeito meramente devolutivo, o que enseja a eficcia imediata da sentena, inclusive com retroao data da citao. Inteligncia do art. 13, 2 , da Lei 5478/68. Proveram. Unnime. (AC 70005999123, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos, julgado em 18/6/2003).

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    Sendo necessria a discusso quanto aos elementos fticos justificadores da reviso da penso, no haveria ttulo suficiente utilizao da tutela jurisdicional diferenciada, devendo ser exercida a pretenso, em via principal, somente pelo rito ordinrio.33

    Em se tratando de ao de reduo de alimentos, no h como invocar o efeito retroativo data da citao do alimentando. A regra do 2 do art. 13 da Lei de Alimentos no aplicvel demanda reducionista. Descabido emprestar efeito retroativo deciso que limita o valor dos alimentos. A irrepetibilidade de que se revestem os alimentos o desautoriza. Pelas mesmas razes, os alimentos no so passveis de compensao. Assim, admitir a retroao seria estimular o inadimplemento, na esperana de conseguir a reduo com efeito pretrito.34

    Cabe figurar a hiptese at porque aceita pela doutrina e pela jurisprudncia de ocorrer a reduo liminar dos alimentos na demanda revisional. Prudncia no deve faltar ao juiz, no sendo justificvel limitar alimentos sem ouvir o credor, que seria tomado de surpresa. No entanto, em situao excepcional, havendo prova da impossibilidade absoluta de persistir o pagamento no montante fixado, a deciso que restringe o valor dos alimentos possui efeito imediato. Dita reduo, ao no ser chancelada na sentena ou no acrdo, restaura o valor originrio, ficando o devedor obrigado a pagar as diferenas dos valores que deixou de alcanar ao credor.

    10. Julgada improcedente a ao de reduo dos alimentos, o alimentante deve pagar o valor das diferenas.

    Quando, ao invs de o credor pretender aumentar o valor dos alimentos, o devedor quem busca reduzi-los, o resultado bem diverso.

    Na ao de reduo da obrigao alimentar, se o magistrado, em sede liminar, altera o valor dos alimentos, a partir desse momento passa a vigorar o novo montante.

    Ainda que no se possa falar em alimentos provisrios, provisria a alterao levada a efeito. Confirmando a sentena a reduo deferido em sede antecipatria, aplicam-se todas as premissas at agora colocadas com referncia aos alimentos provisrios. No entanto, desacolhida pelo juiz a ao, imediatamente se restaura a obrigao alimentar no valor anterior, no havendo necessidade de aguardar o alimentando o trnsito em julgado da sentena para cobrar o valor original dos alimentos. O recurso no dispe de efeito suspensivo, e

    33 OLIVEIRA, op. cit., p. 97, nota 1.

    34 EXECUO DE ALIMENTOS. REDUO DECORRENTE DE AO REVISIONAL NO CURSO

    DA EXECUO. IRRETROATIVIDADE. 1. Na ao de reduo de alimentos julgada procedente, o novo valor da obrigao alimentria no retroage data da citao, sob pena de ser estimulada a inadimplncia do encargo durante a ao revisional, eis que os alimentos so irrepetveis e incompensveis. 2. Somente com o trnsito em julgado da sentena que o novo valor passa a vigorar, eis que o recurso interposto contra a sentena recebido no duplo efeito. Recurso desprovido. (AI n 70005672860, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Srgio Fernando de Vasconcelos Chaves, julgado em 12/03/2003).

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    passa a valer de pronto o resultado preconizado na sentena, ainda que sujeita a recurso.

    Outra hiptese que cabe figurar de a ao, desacolhida no primeiro grau, ser reformada pelo Tribunal, reduzindo o quantum alimentar. Assim, limitados os alimentos em sede liminar, quando da sentena que rejeita a ao, volta o alimentante a dever os alimentos originrios, restando sem efeito a reduo deferida initio litis. A liminar que havia sido concedida fica com a eficcia suspensa em razo da sentena que rejeita a demanda, dispondo a deciso de efeito retroativo. Necessita o alimentante pagar as diferenas decorrentes da reduo provisria que no foi confirmada pela sentena. Como o recurso no dispe de efeito suspensivo, impositivo o imediato retorno ao pagamento dos alimentos.

    Rejeitada a ao pelo juiz, sendo acolhido o recurso, a ao procedente. Mesmo que vitorioso o autor, que resta com a obrigao alimentar em valor menor, s poder reduzir a penso aps o trnsito em julgado do acrdo. Assim, desde a concesso da liminar at o trnsito em julgado do acrdo, o valor ser o originrio e deve ser pago de forma integral. Esse o efeito retroativo previsto no 2 do art. 13 da Lei de Alimentos. Na eventualidade da interposio de recurso extraordinrio ou especial, tambm a reduo se opera, uma vez que tais recursos no possuem efeito suspensivo.

    11. A exonerao do valor dos alimentos vige a partir da sentena, ainda que sujeita a recurso.

    Falar em ao exoneratria do encargo alimentar significa que os alimentos que vm sendo pagos so definitivos. No se trata de alimentos provisrios nem provisionais, pois advm de anterior sentena ou acordo em que foram fixados. Ainda assim, h a possibilidade de o magistrado, em sede liminar, reduzir o valor dos alimentos ou dispensar o autor de pag-los. Aqui tambm cabe recomendar redobrada cautela ao magistrado, pois o credor, sem nada saber, ficar sem alimentos e sem a oportunidade de manifestar-se.35

    Em qualquer dessas hipteses, so invocveis e aplicveis todas as premissas referentes aos alimentos provisrios. A alterao deferida pelo juiz vigora imediatamente.36 Se a ao acolhida e o magistrado desonera o alimentante, a modificao operada pela sentena vigora desde esse momento,

    35 ALIMENTOS. EXONERAO LIMINAR. DESCABIMENTO. Exonerao liminar de alimentos s

    cabvel em situaes excepcionais, ante prova que exclua convincentemente a obrigao. Na cognio sumria do agravo nem sempre isso possvel, notadamente quando os agravados, por no ter sido ainda estabelecida a angularizao processual, no participaram do recurso e, consequentemente, no trouxeram suas razes. (AI n 70005970942, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Srgio Fernando de Vasconcellos Chaves, julgado em 13/05/2003). 36

    ALIMENTO. ALCANCE DA DECISO QUE REDUZ OS ALIMENTOS PROVISRIOS. A deciso interlocutria que reduz os alimentos tem efeito ex nunc. Exegese dos arts. 520, inc. II, do CPC, c/c arts. 13, 3, e 14, da Lei de Alimentos. NEGARAM PROVIMENTO. UNNIME. (AI n 70006785968, 7 CC do TJRGS, Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos, julgado em 13/08/2003).

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    mesmo tendo havido recurso. Sendo a exonerao deferida no acrdo, o alimentante fica dispensado do pagamento a contar do trnsito em julgado.

    Eventual rejeio da ao exoneratria, quer em primeiro, quer em segundo grau de jurisdio, restaura os alimentos com efeito retroativo, cabendo o pagamento de todas as parcelas impagas.

    12. O uso da tutela antecipada vem relativizando os princpios que regem a obrigao alimentar.

    O tratamento diferenciado dispensado s aes que buscam elevar, reduzir ou extinguir os alimentos afasta o princpio que rege os efeitos da sentena. A sentena ineficaz at seu trnsito em julgado, ou seja, em princpio, s produz efeitos a partir do momento em que o julgamento se torna definitivo. Assim, se a sentena est sujeita ao recurso, a apelao recebida no duplo efeito: devolutivo e suspensivo. o que diz de forma clara o art. 520 do CPC.

    O princpio da suspensividade dos efeitos da sentena, no entanto, comporta excees, estando elas elencadas nos incisos do art. 520 do estatuto processual. O inciso II do art. 520 empresta um s efeito sentena que condena prestao de alimentos. O art. 14 da Lei Especial prev igual exceo, ao atribuir efeito somente devolutivo sentena que impe o pagamento de alimentos. Nem preciso lembrar que as excees ao princpio geral no comportam interpretao extensiva. No entanto, no somente na hiptese de imposio de alimentos que cabe invocar o art. 14 da Lei de Alimentos, regra, alis, que guarda consonncia com o posto no inciso II do art. 520 do CPC. O princpio do Cdigo e da Lei o mesmo. Ainda que condenar ao pagamento no signifique reduzir ou exonerar, no h como deixar de aplicar tais dispositivos em toda e qualquer demanda alimentcia. Ou seja, a exceo legal compreende tambm a reduo da obrigao ou sua extino.

    cabvel invocar o prprio art. 14 da Lei de Alimentos para estender tal possibilidade a todas as hipteses de demanda sobre alimentos. Esse dispositivo guarda sintonia com o artigo anterior, o artigo 13, que elenca as aes sujeitas ao rito especial da lei. Entre elas se encontra a ao revisional de alimentos. E, s claras, a ao exoneratria um gnero da demanda revisional, devendo, portanto, ser adotado o mesmo procedimento indicado na lei. As estipulaes constantes dos pargrafos do artigo 13 dizem com a imposio dos alimentos, o que no exclui pretenses de reduo ou exonerao do encargo. O 1 diz: os alimentos provisrios fixados na inicial (...). O pargrafo seguinte prev: os alimentos fixados retroagem (...). O 3 tambm claro: os alimentos provisrios sero devidos at (...). Em todas essas hipteses, ainda que a referncia seja imposio de encargo, de reconhecer aplicabilidade s demandas em que o objeto seja a reviso ou a exonerao dos alimentos.

    De qualquer forma, no se pode perder de vista o carter protetivo da lei, toda voltada ao interesse do alimentando. Por isso a singularidade do efeito da ao de alimentos, exatamente para que a imposio de encargo alimentar passe a vigorar desde logo. Assim, mais do que imperioso, indispensvel que se faa

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    uso cauteloso desses expedientes. O magistrado nunca pode perder de vista o carter vital dos alimentos. E tirar alimentos de quem precisa um mal muito maior do que mant-los at a aquisio da certeza jurdica de sua desnecessidade.

    Em concluso: Os alimentos provisrios e provisionais vigoram desde a data da

    fixao at a sentena. Os alimentos fixados na sentena possuem efeito imediato. Dispem de efeito retroativo data da citao os alimentos fixados

    na sentena ou no acrdo. Majorados os alimentos na sentena ou no acrdo, o novo valor

    retroage data da citao. A deciso que reduz os alimentos possui vigncia imediata, mas no

    dispe de efeito retroativo. A exonerao do encargo alimentar produz efeito imediato, sem

    efeito retroativo. A multiplicidade de hipteses que o tema apresenta no permitiu outra

    forma de abordagem que no de maneira articulada. Somente rogo que no me cobrem coerncia com alguns julgados meus, pois o presente trabalho ensejou a mudana de conceitos e posies sustentadas em alguns julgamentos.

    Todas as assertivas aqui feitas no so definitivas. Ningum nunca disse que todo esse leque de questes de fcil compreenso, dispe de interpretao uniforme e muito menos que tem aplicao de forma pacfica.

    O que se impe estabelecer um profcuo debate, e, quem sabe, traar diretrizes bem definidas para subsidiar uma nova normatizao legal dos alimentos.

    O debate est aberto!