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III JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS São Luís – MA, 28 a 30 de agosto 2007.
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A MATRICIALIDADE SÓCIO-FAMILIAR COMO ORIENTADORA DAS AÇÕES DESENVOLVIDAS PELOS CENTROS DE REFERÊNCIA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
(CRAS) NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO
Amanda Nascimento Lougon* Ana Carolina Moreira Erustes**
Priscilla Assumpção dos Santos***
RESUMO Este trabalho busca entender como a diretriz da matricialidade sócio-familiar está orientando a materialização da Política de Assistência Social no município do Rio de Janeiro, a partir da implementação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Para alcançar este objetivo realizamos uma pesquisa com Assistentes Sociais que atuam nos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS). Visamos apresentar as conclusões parciais de nosso estudo acerca da visão que os profissionais inseridos nos CRAS possuem sobre a diretriz da matricialidade sócio-familiar e conhecer o modelo de família que orienta o trabalho desses profissionais. Palavras Chave: Família, Assistência Social e Sistema Único.
ABSTRACT
This task tries to understand how the “diretriz da matricialidade sócio-familiar” is leading the materialization of the Policy of Social Work in Rio de Janeiro city, taking the “Sistema Único de Assistência Social (SUAS)” implementation into a research with social workers who work in the “Centro de Referência de Assistência Social (CRAS). We aimed at presenting all the conclusions of our partial studies about the CRAS Social Workers comprehension of the “matricialidade sócio-familiar” and know the sort of family which directs these professionals. Words Keys: Family, Social Assistance and Only System
1 INTRODUÇÃO
O trabalho que estamos apresentando é resultado de pesquisa em andamento,
realizada nos Centros de Referência da Assistência Social – CRAS no município do Rio de
Janeiro, na qual pretendemos compreender a reorganização da Política de Assistência
Social neste município a partir da implementação do Sistema Único de Assistência Social –
SUAS.
Tal pesquisa teve início em meados de 2006 e vincula-se a um projeto maior
“Reforma do Estado e Assistência Social no Brasil - As mudanças no sistema de proteção e
suas repercussões nas políticas públicas”.
Buscando entender as mudanças trazidas pela implementação do SUAS,
centramos nosso estudo na forma como o princípio da matricialidade sócio-familiar está
* Graduanda ** Graduanda *** Graduanda
UFMA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃOPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS
III JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍCAS PÚBLICAS QUESTÃO SOCIAL E DESENVOLVIMENTO NO SÉCULO XXI
III JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS São Luís – MA, 28 a 30 de agosto 2007.
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orientando a materialização da Política de Assistência Social no município do Rio de
Janeiro.
Sendo assim, a partir da pesquisa de campo analisaremos a visão dos
profissionais inseridos nos CRAS sobre a diretriz da matricialidade sócio-familiar como guia
da política de assistência, e também conheceremos o modelo de família que orienta o
trabalho desses profissionais. Visto que, as concepções a respeito da família vêm sendo
alterados historicamente de acordo com as influências econômicas, sociais e culturais.
A importância da matricialidade sócio-familiar ocorre pelo fato desta ser um
espaço privilegiado no âmbito da Política de Assistência Social, partimos da idéia que, os
processos de exclusão sócio-cultural e as transformações sócio-econômicas acentuam as
fragilidades e contradições das famílias brasileiras. É de extrema importância levar em
consideração as diversidades que cercam as relações intra-familiares, sendo necessário
também, garantir as condições de sustentabilidade para as famílias.
A importância da família como espaço de socialização, já é reconhecida desde a
promulgação da Constituição Federal de 1988 em seu artigo 226, que diz “ a família, base
da sociedade, tem especial proteção do Estado” (BRASIL, 2003B). Logo após a Lei
Orgânica da Assistência Social - LOAS também vêm reforçando esta centralidade quando
diz em seu artigo 2º que a assistência social tem por objetivo a proteção a família.
Este destaque da família instituída na Política Nacional de Assistência Social -
PNAS é vista como uma forma de superar a focalização e a fragmentação, que
historicamente caracterizaram as ações sociais no Brasil, que tinham como foco grupos
populacionais de beneficiários com características comuns.
Para o desenvolvimento do nosso objeto de estudo realizamos uma pesquisa
bibliográfica, a partir da discussão critica dos textos de autores, não exclusivamente dos que
discutem assistência social, que nos permitiram um aprofundamento teórico acerca das
noções de assistencialismo, focalização, proteção social e sobre as diferentes
percepções/conceituações relativas a noção de família.
Realizamos também a pesquisa documental que nos possibilitou a analise de
documentos referentes a assistência social, tais como: Constituição Federal de 1988, Lei
Orgânica da Assistência Social – LOAS, e Política Nacional de Assistência Social. A análise
desses documentos permitiu a ampliação da discussão sobre o princípio da matricialidade
sócio-familiar.
Para complementar nossa pesquisa, realizamos também entrevistas e visitas
nos CRAS, nos quais conhecemos a dinâmica de implementação do SUAS no município do
Rio de Janeiro e também a visão destes profissionais a respeito do princípio da
matricialidade sócio-familiar.
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2 DESENVOLVIMENTO
Para discutirmos a questão da matricialidade na família na atual conjuntura da
Política de Assistência Social no Brasil, discutiremos rapidamente a noção de família na
contemporaneidade, sobre suas principais correntes de pensamento e sobre as suas
determinações históricas.
Acreditamos que os conceitos sobre família são influenciados pela conjuntura
histórica e por seus contextos econômicos, sociais e culturais, sendo uma instituição que se
encontra em constante construção e reconstrução.
De acordo com a bibliografia estudada o modelo de família moderna surgiu nas
camadas burguesas, no século XVIII e existem atualmente, segundo Ribeiro & Ribeiro
(1994), duas correntes principais de pensamento que discutem a categoria família: a teoria
funcionalista e a teoria marxista.
Na teoria funcionalista a família é pensada como uma instituição estática,
harmônica e centrada em relações consangüíneas. Essa teoria toma como referência o
modelo de família burguês, entendendo que o comportamento “desviante” dos indivíduos
tem origem na própria família, assim esta se torna a responsável por qualquer conduta de
seus membros. A teoria funcionalista oculta a dimensão histórica de construção da família,
que a nosso entender, é definida socialmente.
Percebemos que existem no Brasil diversas possibilidades de arranjos familiares
resultado do sincretismo cultural presente no processo histórico da nossa sociedade.
No Brasil prevalece e é cada vez mais enfatizado, como modelo ideal de família,
o modelo burguês. Portanto qualquer arranjo familiar que fuja desse modelo é estigmatizado
e classificado como sendo uma família desestruturada. Segundo Iamamoto (2003), no
âmbito do Serviço Social, foi esse modelo de família que influenciou o trabalho dos
assistentes sociais que historicamente desenvolveram uma atividade reguladora e
normatizadora da vida familiar.
A outra corrente de pensamento, que é marxista, concebe a família como uma
instituição em movimento dialético, está é a vertente com a qual pretendemos trabalhar
enquanto profissionais de Serviço Social. Pois percebemos a família como uma instituição
condicionada historicamente e articulada com a sociedade que se encontra inserida.
Deste modo, a instituição família está sujeita a sofrer influências e alterações
sociais, econômicas e culturais que podem alterar seus arranjos, pois segundo está teoria, a
família é uma unidade social complexa e contraditória, visto que está inserida numa
sociedade de classes antagônicas.
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Segundo Mioto, “a família deve ser percebida nos dias de hoje como reflexo e
palco de ressonâncias dos problemas de ordem ética, econômica, política e social” (Mioto,
1997, p.121). Há uma transformação nos papéis dos membros familiares que decorrem das
mudanças econômicas e sociais.
Segundo está mesma autora, a família pode ser vista atualmente como um
conjunto de pessoas que convivem num mesmo lugar, durante certo tempo, ligadas ou não
por laços consangüíneos. Entretanto as tradicionais responsabilidades de manutenção e
proteção da família continuam recaindo para as famílias atuais. Entendemos que é
necessário compreender a família num contexto de classe dentro do sistema capitalista e
por isso se constituindo num espaço de relações contraditórias e desiguais.
Ao analisarmos a trajetória histórica da assistência no Brasil percebemos que
suas ações não estiveram voltadas para atender a família como um todo, e sim voltadas
para atender necessidades individuais, por meio de medidas pontuais e emergenciais.
Vivemos atualmente um processo crescente de pauperização da sociedade com
índices crescentes de desemprego, produzido pelo desenvolvimento tecnológico e pelas
mudanças ocorridas no mundo do trabalho.
Acreditamos que muitas das mudanças ocorridas na organização da estrutura
familiar são decorrentes dessas alterações ocorridas no mundo do trabalho, no
desenvolvimento tecnológico e na expansão dos meios de comunicação. Essas alterações
têm produzido também, mudanças na relação entre homens e mulheres, pois estas se
inserem cada vez mais no mercado de trabalho, desconstruindo portanto o papel exercido
pela mulher na sociedade.
Compreendemos que para preservar a unidade nas famílias é necessário criar
mecanismos capazes de dar suporte para que estas atendam suas necessidades, sendo
fundamental atuação do Estado no âmbito das Políticas Públicas.
A constituição Federal de 1988 institui que a Assistência Social forma um dos
tripés da Seguridade Social e possui como um de seus objetivos à proteção à família. A
partir deste marco histórico, foram surgindo as legislações que permitiram a materialização
da política de assistência social e da recente implementação do Sistema Único de
Assistência Social – SUAS no país. Assim, em dezembro de 1993 é sancionada a Lei
Orgânica da Assistência Social – LOAS que dispõe sobre a organização da Assistência
Social, esta traz em seu artigo 2º que um de seus objetivos é a proteção à família.
Visando transformar em ações o que foi estabelecido pela Constituição Federal e
pela LOAS, aprova-se em 2004 a Política Nacional de Assistência Social. Tal Política coloca
como 5ª diretriz a “centralidade na família para concepção e implementação dos benefícios,
serviços, programas e projetos” (BRASIL, 2004, pg. 27).
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Por sua vez, a Norma Operacional Básica de assistência social – NOB/SUAS,
criada para operacionalizar a implementação da política, enuncia como um dos eixos
estruturantes do SUAS a matricialidade sócio-familiar, na qual a família passa a ser
entendida como núcleo central de protagonismo social, convívio e sustentabilidade e que
esta deve ser apoiada para ter as condições necessárias de desenvolver o seu papel.
Uma discussão importante para a compreensão desta centralidade diz respeito
às mudanças de concepções acerca da família durante décadas. Porém, a concepção que
norteia a Política Nacional de Assistência Social não é a tradicional, ou seja, não é
considerada família apenas o grupo de indivíduos unidos por laços consangüíneos, mas sim
“podemos dizer que estamos diante de uma família quando encontramos um conjunto de
pessoas que se acham unidas por laços consangüíneos, afetivos e, ou de solidariedade”.
(BRASIL, 2004, pg.35).
A Política Nacional de Assistência Social coloca ainda que é extremamente
necessário garantir condições de sustentabilidade para a família, a fim de que esta possa
prevenir situações de risco para seus membros.
Estas novas configurações familiares que estão presentes na sociedade “(...)
começam a ter visibilidade quer porque contam com o apoio de grupos organizados, que
fazem pressão e conquistam alguns direitos no âmbito da justiça, quer porque fazem parte
do cotidiano das pessoas e não é mais possível negá-las” (Gueiros, 2002, p.117).
A pesquisa participante realizada nos Centros de Referência de Assistência
Social – CRAS do município do Rio de Janeiro nos permitiu conhecer como a diretriz da
matricialidade sócio-familiar é concebida na prática pelos Assistentes Sociais que atuam na
execução da Política de Assistência Social. Consideramos relevante tal pesquisa e o
desenvolvimento deste trabalho pelo fato de que não basta apenas estas considerações
serem postas na teoria e tidas como um avanço, mas é prioritariamente necessário que
estejam sendo materializadas junto à população usuárias dos CRAS.
Alguns Assistentes Sociais dos CRAS pesquisados compreendem tal diretriz e a
consideram como um grande avanço trazido pelo Sistema Único de Assistência Social,
porém na prática ainda trabalham centrando sua atuação em grupos específicos de
beneficiários inseridos nos programas e projetos desenvolvidos pela Secretaria Municipal de
Assistência Social. Este fato nos permite visualizar o caráter focalizador e centralizador das
ações desenvolvidas nos CRAS. No entanto, a maioria dos entrevistados ressalta em seu
discurso a compreensão da família em sua totalidade e também colocam que o trabalho
realizado segue essa lógica.
De acordo com esses profissionais, não basta apenas inserir cada indivíduo de
uma mesma família em programas diferentes, pois isto resultaria apenas em uma
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fragmentação desta e uma superposição de ações por parte dos profissionais e a família
continuaria não sendo trabalhada na sua totalidade.
Com a centralidade das ações na família, cada Assistente Social fica
responsável por um determinado número de famílias em um território, ou seja, este
Assistente Social passa a ser o profissional de referência para essas famílias. O profissional
trabalha a família como um todo, conhecendo a realidade de cada um de seus membros e
desenvolvendo um trabalho que possui a concepção de totalidade.
O trabalho ora apresentado baseia-se nas entrevistas dos profissionais, o que
não torna possível afirmarmos que na prática cotidiana os atendimentos sejam realizados de
acordo com o que é posto na Política Nacional de Assistência Social. Afinal, a realidade
brasileira nos permite considerar que a teoria utilizada nem sempre é desenvolvida na
prática.
Entretanto o avanço do neoliberalismo no Brasil representa um limite para a
materialização dos preceitos estabelecidos nessas legislações no que diz respeito a
elaboração de Políticas Públicas em defesa da família em sua totalidade. Pois o ideário
neoliberal valoriza o mercado como principal regulador das relações sociais, provocando
uma diminuição da intervenção do Estado, favorecendo a manutenção das políticas
focalizadas e segmentadas em indivíduos específicos.
3 CONCLUSÃO
Entendemos que a família não pode ser pensada isolada de seu contexto social
e econômico. É importante compreender a família como uma categoria inserida numa
conjuntura social complexa e que os problemas vividos pelos seus integrantes são advindos
de todo um contexto social, econômico e cultural.
Sendo assim podemos concluir a partir das entrevistas realizadas que para a
maioria dos profissionais a matricialidade na família significa, em teoria, um avanço, já que a
família passa a ser o alvo dos atendimentos prestados nos CRAS; diferenciando-se da
forma como até então era viabilizada a política de assistência social, que direcionava o seu
atendimento nos programas voltados à grupos específicos de beneficiários (idoso, criança,
mulher, entre outros).
Embora a maioria dos profissionais entenda a importância da centralidade na
família como um avanço na implementação da política de assistência social, percebemos
que ela ainda não é algo materializado na realidade da rede de assistência social no
município do Rio de Janeiro, pois a família ainda não é entendida na sua totalidade, fazendo
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com que o trabalho desenvolvido em alguns CRAS ainda mantenham seu foco nos
programas setoriais e não na família.
Compreendemos o SUAS e a diretriz da matricialidade na família como um
avanço, já que visa romper com práticas assistencialistas, focalizadas e fragmentadas,
porém estes avanços não conseguem mudar a lógica da política.
REFERÊNCIAS
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