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FERNANDA BALBINO ENVIADA ESPECIAL A MATO GROSSO O transpor- te ferro- viário é o grande trunfopa- ra elimi- nar os grandes congestionamentos de cami- nhões nos acessos ao Porto de Santos. Nele, as cargas de grãos demoram, em média, 86 horas para sair do interior de Mato Grosso (MT) e chegar aos termi- nais santistas, sem gerar filas nas estradas que atendem a Baixada Santista.Mesmocomessaagilida- de, ajustes ainda precisam ser fei- tos, principalmente na logística antese depoisdotrajeto. Essas melhorias e a situação do transporte ferroviário da pro- dução agrícola até o complexo marítimo santista são o tema desta edição da série A rota do caos, que A Tribuna publica nes- ta semana. Os terminais ferroviários de Mato Grosso, estado com a maior produção de grãos no País, têm capacidade para transportar até 13,5 milhões de toneladas por ano. A maior parte disso, 91%, é direcionada ao Porto de Santos. Orestante é descarregadoem ter- minaisferroviários no entorno. De acordo com a América Lati- na Logística (ALL), concessioná- ria que opera as linhas entre Ma- to Grosso e Santos, a distância entre origem e destino nesse tra- jeto é de 1,4 mil quilômetro. Ca- da composição ferroviária tem até 80 vagões, chegando a três quilômetros de extensão. Um vagão é capaz de trans- portar de 80 a 100 toneladas de grãos. Isso significa que cada um pode substituir até quatro caminhões. Uma composição le- va de 6,5 mil toneladas a 8 mil toneladas de mercadorias de uma só vez, retirando das estra- das 320 veículos de carga. Mas se engana quem pensa que, apesar de ser um meio de transporte viável, mais barato e limpo que o rodoviário, a ferro- via não apresente problemas. Existem gargalos, tanto na ori- gem quanto no destino, o Porto de Santos. No Mato Grosso, a demora para a descarga nos terminais ferroviários é a grande queixa dos usuários. Apesar de a ALL negar, caminhoneiros afirmam ficar até cinco dias à espera do descarregamento nos termi- nais de Alto Araguaia (MT) e Alto Taquari (MT). Segundo os motoristas, as fi- las para descarregar a produção nos vagões chegam a 30 quilô- metros de extensão na BR-264. Eles reclamam, principalmen- te, da demora e das condições de espera nas estradas. “Já vi as filas de Santos na televisão e posso garantir que aqui é bem pior”, afirma o caminhoneiro Genésio Ribeiro. GARGALO Os problemas não acabam quando o trajeto ferroviário é concluído. De acordo com a ALL, o tempo de retorno dos vagões poderia ser otimizado se os terminais portuários agili- zassem a descarga no cais san- tista. “Nós temos um gargalo no Porto que não nos deixa aumentar a agilidade do trans- porte. Se os vagões fossem des- carregados e voltassem mais rápido, o volume de transporte seria maior”, afirma o coorde- nador comercial do terminal da concessionária em Alto Ta- quari, Bruno Pegorini. Questionado, Renato Ferrei- ra Barco, diretor-presidente da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), a Autori- dade Portuária de Santos, diz estar ciente do problema. A questão já foi constatada em reuniões com as concessioná- rias ferroviárias que atuam no complexo (a ALL e a MRS Logís- tica) e terminais. Segundo ele, há uma comissão, com a partici- pação de técnicos da Agência Nacional de Transportes Terres- tres (ANTT), que pretende re- solver a questão. “Recebemos essa queixa e o problemaestásendo diagnostica- do.Temosumaequipetrabalhan- do nisso para vermos realmente o que está acontecendo, já que temos capacidade de atendimen- to a essas cargas. Imagino que esse problema foi resolvido ou está na iminência de acontecer”, afirmao executivo portuário. Composição ferroviária deixa as instalações da concessionária ALL no Mato Grosso: uma viagem de trem pode substituir a jornada de 320 caminhões FOTOS FERNANDA LUZ Com menor custo e maior agilidade do que o transporte rodoviário, as ferrovias podem melhorar a chegada da safra agrícola ao Porto de Santos. Mas melhorias ainda têm de ser feitas Caminhoneiros revelam que chegam a esperar até cinco dias para descarregar em terminal ferroviário A-4 Local A TRIBUNA Quarta-feira 26 www.atribuna.com.br junho de 2013

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Page 1: A-4 Local ATRIBUNA Quarta-feira26 Quarta ... - abttc.org.br · CriaçãográficaLuizSérgioMoura Santos Cuiabá Campo Grande SãoPaulo AltoAraguaia 1,4milkm ÉADISTÂNCIA PERCORRIDAPELOS

CriaçãográficaLuiz SérgioMoura

Santos

Cuiabá

CampoGrande

São Paulo

Alto Araguaia

1,4 mil kmÉ A DISTÂNCIA

PERCORRIDA PELOSTRENS ENTRE

ALTO ARAGUAIA E OPORTO DE SANTOS

MT

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SP

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1 vagão 4 caminhõesTRANSPORTADE 80 A 100 TONELADAS

1 composiçãoTÊM, EM MÉDIA, 80 VAGÕESE TRANSPORTA DE 6,5 MILA 8 MIL TONELADAS

320caminhões

O transporte ferroviáriodo Centro-Oeste a Santos

INFOGRAFIA MONICA SOBRAL/AT

MA

FERNANDABALBINO

ENVIADAESPECIALAMATOGROSSO

Otranspor-te ferro-viário é og r a n d etrunfopa-ra elimi-nar osgrandes

congestionamentos de cami-nhões nos acessos ao Porto deSantos. Nele, as cargas de grãosdemoram, em média, 86 horaspara sair do interior de MatoGrosso (MT) e chegar aos termi-nais santistas, semgerar filas nasestradas que atendem a BaixadaSantista.Mesmocomessaagilida-de,ajustesaindaprecisamserfei-tos, principalmente na logísticaantesedepoisdotrajeto.Essas melhorias e a situação

dotransporteferroviáriodapro-dução agrícola até o complexomarítimo santista são o temadesta edição da série A rota docaos,queATribunapublicanes-tasemana.Os terminais ferroviários de

Mato Grosso, estado com amaiorproduçãodegrãosnoPaís,têmcapacidadeparatransportaraté13,5milhõesdetoneladasporano. Amaior parte disso, 91%, édirecionada ao Porto de Santos.Orestanteédescarregadoemter-minaisferroviáriosnoentorno.DeacordocomaAméricaLati-

naLogística(ALL),concessioná-riaqueoperaaslinhasentreMa-to Grosso e Santos, a distânciaentreorigemedestinonessetra-jeto é de 1,4mil quilômetro. Ca-da composição ferroviária tematé 80 vagões, chegando a trêsquilômetrosdeextensão.Um vagão é capaz de trans-

portar de 80 a 100 toneladas degrãos. Isso significa que cadaum pode substituir até quatrocaminhões.Umacomposiçãole-va de 6,5 mil toneladas a 8 miltoneladas de mercadorias deuma só vez, retirandodas estra-das320veículosdecarga.Mas se engana quem pensa

que, apesar de ser um meio detransporte viável, mais barato elimpo que o rodoviário, a ferro-via não apresente problemas.Existem gargalos, tanto na ori-gemquanto no destino, o PortodeSantos.No Mato Grosso, a demora

para a descarga nos terminaisferroviários é a grande queixados usuários. Apesar de a ALLnegar, caminhoneiros afirmamficar até cinco dias à espera dodescarregamento nos termi-nais de Alto Araguaia (MT) eAltoTaquari (MT).Segundo os motoristas, as fi-

lasparadescarregaraproduçãonos vagões chegam a 30 quilô-metros de extensão na BR-264.Eles reclamam, principalmen-te, da demora e das condiçõesde espera nas estradas. “Já vi asfilas de Santos na televisão eposso garantir que aqui é bempior”, afirma o caminhoneiroGenésioRibeiro.

GARGALOOs problemas não acabamquando o trajeto ferroviário éconcluído. De acordo com aALL, o tempo de retorno dosvagões poderia ser otimizadoseos terminaisportuáriosagili-zassem a descarga no cais san-tista. “Nós temos um gargalono Porto que não nos deixaaumentar a agilidade do trans-porte. Se os vagões fossem des-carregados e voltassem maisrápido, o volume de transporteseria maior”, afirma o coorde-nador comercial do terminal

da concessionária em Alto Ta-quari,BrunoPegorini.Questionado, Renato Ferrei-

ra Barco, diretor-presidente daCompanhia Docas do EstadodeSãoPaulo(Codesp),aAutori-dade Portuária de Santos, dizestar ciente do problema. Aquestão já foi constatada emreuniões com as concessioná-rias ferroviárias que atuam nocomplexo(aALLeaMRSLogís-tica) e terminais. Segundo ele,háumacomissão,comapartici-pação de técnicos da AgênciaNacionaldeTransportesTerres-tres (ANTT), que pretende re-solveraquestão.“Recebemos essa queixa e o

problemaestásendodiagnostica-do.Temosumaequipetrabalhan-do nisso para vermos realmenteo que está acontecendo, já quetemoscapacidadedeatendimen-to a essas cargas. Imagino queesse problema foi resolvido ouestá na iminência de acontecer”,afirmaoexecutivoportuário.

❚❚❚Produtoresdegrãosdo inte-riordoMatoGrosso(MT)ques-tionam o preço cobrado pelaconcessionáriaferroviáriaAmé-rica Latina Logística (ALL) pa-ra o transporte da produção atéo Porto de Santos. Segundoeles, o valor estipuladopela em-presa deveria ser reduzido, ten-do em vista o menor custo detransporte do modal ferroviá-rio, em relação ao rodoviário.Mesmo assim, o trem continuasendo vantajoso devido ao ga-nhoemescala.Paraosprodutores, apesar da

eficiênciadasferroviasnotrans-porte de grãos, o preço e as filasque se formam nas proximida-des dos terminais ferroviáriossão entraves para a utilizaçãodomodal. “Essemodelode con-cessão em que não se tem con-corrência prejudica o produtor.A ALL quer cobrar o mesmopreçodofretedocaminhão,sen-do que o trem é muito maiseconômicoparaeles”,afirmaEl-so Pozzobon. Ele é vice-presi-dentedoSindicatoRuraldeSor-

riso,cidadematogrossenseloca-lizadaa412quilômetrosaonor-tedacapitalCuiabá.Essemuni-cípio possui a maior área deplantação de soja do mundo,com 620 mil hectares (6,2 milquilômetrosquadrados).O coordenador comercial do

terminal da ALL em Alto Ara-guaia(MT),BrunoPegorini,ex-plica que, na média por ano, otransporte ferroviário é 30%mais barato para o produtor doqueo rodoviário. Segundoele, ocusto por tonelada transporta-da é 7%menor comautilizaçãodevagões.Em abril, a média do frete

rodoviário foi de R$ 165,42 portonelada transportada. Já otransporte ferroviário para osmilquiloscustouR$153,84.Além do preço do frete rodo-

viário, produtores e caminho-neiros que fazem descargas nosterminais reclamamdademorapara o procedimento. Mas, se-gundo aALL, o processo é rápi-do e começa com a verificaçãodacarga.Aochegarno terminal

ferroviário, osmotoristas reti-ramumasenhaparaaclassifi-cação do produto. Trata-se deuma inspeção que verifica aqualidadedo grão. Se tudo es-tiverdeacordo,osveículossãoencaminhados para a descar-ganostombadores.Pegorini explica que opro-

cesso de descarga leva cercade seis minutos por cami-nhão carregadocom40 tone-ladasdegrão.Quatro tomba-dores são responsáveis porelevar em 45 graus os veícu-los, para que toda a cargaseja retirada. Em seguida, osgrãos descem por uma moe-ga (espécie de calha) até su-bir por um elevador, que osleva aos pátios no interior doarmazem.Aomesmo tempo, no outro

lado do terminal, acontece ocarregamentodacomposição.A cada hora, 30 vagões sãocarregados e, em seguida, já édada a autorização para queatravessemoPaísatéostermi-naisdoPortoSantos.

CriaçãográficaLuiz SérgioMoura

Composição ferroviária deixa as instalações da concessionária ALL no Mato Grosso: uma viagem de trem pode substituir a jornada de 320 caminhões

❚❚❚ Alternativa para viabilizar oescoamento de cargas agrícolasaté o Porto de Santos, as ferro-vias têmum limite de transpor-te. E ele está perto de ser alcan-çado, garante o consultor por-tuárioMarcosVendramini.Cin-co anos é oprazo estimadoparao esgotamento da capacidadedas linhasférreasbrasileiras.O transporte ferroviário tem

comocaracterísticaobaixocus-to de combustível e os ganhosemescala, jáquesãotransporta-dasgrandesquantidadesdecar-gas. Hoje, o Brasil tem 28 milquilômetros de linhas férreas,comtrêstiposdebitolas(distân-cia entre as rodas do vagão e,consequentemente, de cada la-do dos trilhos). Há a larga, de1,6metro, amétrica, de 1metro,e a mista, que pode receber osvagões dos dois tipos. Não porcoincidência, grande parte damalha ferroviária do Brasil estáconcentrada nas regiões Sul eSudeste, as mais industrializa-dasedesenvolvidasdoPaís.Segundo Vendramini, a ma-

lha ferroviária brasileira podetransportar70milhõesdetone-ladasporano.Noentanto, hoje,já são movimentadas cerca de35milhõesdetoneladasdemer-cadoriasacada12meses.Segundo a Codesp, estatal

que administra o Porto de San-tos, no ano passado, 23.8 mi-lhões de toneladas de cargaschegaramousaíramdocomple-xo santista em vagões. Destas,21,9 milhões de toneladas fo-ram exportadas e 1,9 milhão detoneladas, importadas. Milho,soja e açúcar estão na lista de

produtos mais transportadospelostrensatéocais santista.A concorrência com o modal

rodoviário ainda não é a que osespecialistas esperam, já queumaparcelade69%dosprodu-tosexportadosutilizamoscami-nhões para a chegada ao caissantista.Oidealédividirotrans-porte de cargas utilizando umamédia de 30%para as ferroviase35%paraasrodovias.Oproblema,nestecaso,équea

demandaparaotransporteferro-viário vem crescendo e a capaci-dadenãoacompanhaeste ritmo.Com a ineficiência domodal ro-doviário, a tendência é que as li-nhas férreas sejam cadamais re-quisitadas para amovimentaçãodecargasporlongasdistâncias.

LONGASDISTÂNCIASDeacordocomespecialistas emlogística, o transporte de cargaspordistânciasacimade300qui-

lômetros só é viável através detrilhos. O baixo custo demanu-tenção das linhas férreas e osganhosemescala, jáquemuitastoneladas são transportadas,são fatores que fazem com que,hoje, o trem seja considerado aforma mais eficiente no trans-portedegrãos.Marcos Vendramini explica

queacapacidadeeaeficiênciadomodal ferroviário são medidasde acordo com a quantidade de

passagensde vagões pelas linhasférreas. Comeste índice, é possí-velmensurar aprodutividadedotransporteferroviário.Comocrescimentodademan-

da para amovimentação de car-gasatravésdostrilhos,éevidentea necessidade de construção denovas linhas. A Reportagemquestionou o Ministério doTransportes sobre a questão,mas até o fechamento desta edi-ção,oórgãonãosemanifestou.

Emcinco anos, o esgotamentodamalha ferroviária

Leiaamanhã:Naquinta reportagemdasérieNaRota doCaos, osproblemasenfrentadospelo transporte hidroviário

PI

MAMA

FOTOS FERNANDALUZ

Commenor custo emaior agilidadedoqueo transporte rodoviário, as ferrovias podemmelhorar a chegadada safra agrícola aoPorto deSantos.Masmelhorias ainda têmde ser feitas

Caminhoneiros revelam que chegam a esperar até cinco dias para descarregar em terminal ferroviário

Carreta é descarregada no tombador do terminal de Alto Taquari, processo que leva seis minutos, diz a ALL

Preço e filas irritam agricultores

Vagão é carregado com soja em terminal da ALL: transporte ferroviário é indicado para levar cargas por distâncias maiores do que 300 quilômetros

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