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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A CONCORRÊNCIA ENTRE ESPOSA E CONCUBINA NO ÂMBITO DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO E A JURISPRUDÊNCIA RECENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL CAMILA BATISTA FELICI DECLARAÇÃO “DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PUBLICA EXAMINADORA”. ITAJAÍ (SC), 08 de novembro de 2010. ___________________________________________ Professor Orientador: Emerson de Morais Granado UNIVALI Campus Itajaí-SC

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

A CONCORRÊNCIA ENTRE ESPOSA E CONCUBINA NO ÂMBITO DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO E A

JURISPRUDÊNCIA RECENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

CAMILA BATISTA FELICI

DECLARAÇÃO

“DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PUBLICA EXAMINADORA”.

ITAJAÍ (SC), 08 de novembro de 2010.

___________________________________________ Professor Orientador: Emerson de Morais Granado

UNIVALI – Campus Itajaí-SC

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

A CONCORRÊNCIA ENTRE ESPOSA E CONCUBINA NO ÂMBITO DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO E A

JURISPRUDÊNCIA RECENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

CAMILA BATISTA FELICI

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Direito. Orientador: Professor Mestre Emerson de Morais Granado

Itajaí (SC), novembro de 2010

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AGRADECIMENTO

A Deus, por estar sempre comigo e me presenteou

com o ingresso na faculdade, me protegendo e me

guiando no palco da vida.

Aos meus pais Hélio Felici e Marlene Satiko Batista

Felici, que com muito amor e carinho acreditaram,

incentivaram e confiaram em mim oportunizando a

conclusão de mais uma etapa da vida e pelos sábios

conselhos que sempre contribuíram para minha

formação pessoal e acadêmica.

Ao meu irmão Murillo Batista Felici, que apesar da

distância me alegrava e me impulsionava com

poucas palavras.

Aos meus amigos que já me acompanhavam da

minha cidade natal e àqueles conquistados durante

a formação acadêmica, especialmente Bárbara

Victória Lopes, Fracislaine Rosa Chagas Francisco,

Cynthia Macedo e Mary Metelski, que sempre

poderei contar.

Àqueles que confiaram em mim nos estágios em que

passei, pela oportunidade e paciência, pois sem eles

não estaria preparada para a vida prático-

profissional.

Por fim, porém não menos importante, ao meu

Orientador, Emerson de Morais Granado, excelente

profissional, pelos sábios conselhos com que

conduziu a orientação do presente trabalho e pela

amizade.

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DEDICATÓRIA

Dedico esse trabalho ao Rei dos Reis, Arquiteto do

Universo, pois sem Ele eu não seria nada e não teria

força e perseverança para alcançar a graça de

concluir esse curso e aos meus pais que tanto amo,

que nunca saíram do meu lado, estiveram sempre

me fortalecendo, pois sei que essa conquista não é

só minha, é deles também, que durante toda essa

fase, não dispensaram amor, dedicação e cuidados.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, novembro de 2010.

Camila Batista Felici Graduanda

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Camila Batista Felici, sob o título “A

concorrência entre esposa e concubina no âmbito do direito previdenciário e a

jurisprudência recente do Supremo Tribunal Federal, foi submetida em 23 de

novembro de 2010 à banca examinadora composta pelos seguintes professores:

Emerson de Morais Granado, mestre e José Everton da Silva, mestre, e aprovada

com a nota 10,0 (dez).

Itajaí, novembro de 2010

Prof. Mestre Emerson de Morais Granado Orientador e Presidente da Banca

Prof. MSc. Antonio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

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ROL DE CATEGORIAS

Casamento

“O casamento é o vínculo jurídico entre o homem e a mulher que visa o auxílio

mútuo material e espiritual, de modo que haja uma integração fisiopsíquica e a

constituição de uma família.”1

Concubinato

“As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar,

constituem concubinato.”2

Estado

“É uma sociedade natural, no sentido de que decorre naturalmente do fato de os

homens viverem necessariamente em sociedade e aspirarem naturalmente realizar

o bem geral que lhes é próprio, isto é, o bem público. Por isso e para isso a

sociedade se organiza em Estado.”3

Pensão por morte

“É o benefício pago aos dependentes do segurado, homem ou mulher, que falecer,

aposentado ou não, conforme previsão expressa do art. 201, V, da Constituição

Federal, regulamentada pelo art. 74 da Lei do RGPS. Trata-se de prestação de

pagamento continuado, substituidora da remuneração do segurado falecido. Em face

disso, considera-se direito irrenunciável dos beneficiários que fazem jus a ela.”4

1 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 20 ed. v. 5. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 40.

2 BRASIL. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: ‹http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm› Acesso em: 28 set. 2010.

3 AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. 44 ed. São Paulo: Globo, 2005. p. 3.

4 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. 9 ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2008. p. 562.

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SUMÁRIO

RESUMO........................................................................................... IX

INTRODUÇÃO .................................................................................. 10

CAPÍTULO 1 ..................................................................................... 13

O ESTADO E SUA ORGANIZAÇÃO ................................................ 13

1.1 ORIGEM E FORMAÇÃO DO ESTADO ......................................................... 13

1.1.1 Teorias do Aparecimento do Estado ....................................................... 14

1.1.2 Teorias que explicam a formação originária do Estado ....................... 16 1.1.2.1 Teoria familiar e teoria da força ........................................................................16 1.1.2.2 Teoria da divindade ...........................................................................................18 1.1.2.3 Teoria contratual ................................................................................................18

1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE ESTADO .............................. 19

1.2.1 O Estado Oriental ...................................................................................... 20

1.2.2 O Estado Grego ......................................................................................... 21

1.2.3 O Estado Romano ..................................................................................... 23

1.2.4 O Estado Medieval..................................................................................... 25

1.2.5 O Estado Moderno..................................................................................... 27

1.2.6 O Estado Contemporâneo ........................................................................ 28

1.3 CONCEITO DE ESTADO ............................................................................... 29

CAPÍTULO 2 ..................................................................................... 33

CASAMENTO E CONCUBINATO .................................................... 33

2.1 ASPECTOS HISTÓRICOS DO CASAMENTO .............................................. 33

2.2 ASPECTOS HISTÓRICOS DO CONCUBINATO .......................................... 36

2.3 CONCEITO DE CASAMENTO ...................................................................... 42

2.4 CONCEITO DE CONCUBINATO ................................................................... 45

2.5 DIFERENÇA ENTRE O CASAMENTO E O CONCUBINATO ....................... 49

2.6 A IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO SIMULTÂNEO DO CASAMENTO E CONCUBINATO ....................................................................... 52

CAPÍTULO 3 ..................................................................................... 56

CONCORRÊNCIA ENTRE ESPOSA E CONCUBINA PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS ......................................................................... 56

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viii

3.1 BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS ............................................................... 56

3.1.1 Aposentadoria no RGPS ........................................................................... 56

3.1.2 Pensão por morte ...................................................................................... 59

3.1.3 Auxílio-doença ........................................................................................... 61

3.1.4 Auxílio-reclusão ........................................................................................ 62

3.1.5 Salário-família ............................................................................................ 62

3.1.6 Salário-maternidade .................................................................................. 63

3.1.7 Abono anual ............................................................................................... 64

3.1.8 Benefício assistencial ao idoso e ao deficiente – LOAS ........................ 64

3.2 ASPECTOS LEGAIS DA PENSÃO PREVIDENCIÁRIA................................ 65

3.3 A DEPENDÊNCIA PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS ................................... 67

3.4 A POSSIBILIDADE DO RATEIO DOS VALORES DA PENSÃO ENTRE A ESPOSA E A CONCUBINA ................................................................................. 70

3.5 (IN)COERÊNCIA NA FORMA DE RATEIO ................................................... 71

3.6 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL ..................................................................... 73

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 77

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ........................................... 79

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RESUMO

A presente monografia trata da concorrência entre esposa e

concubina no âmbito do direito previdenciário e a jurisprudência recente do Supremo

Tribunal Federal. Referido tema possui diferentes tratamentos nos tribunais, no

entanto, já existe um posicionamento do Supremo Tribunal Federal. O objetivo geral

é entender a diferença dos institutos casamento e concubinato e analisar se há

incoerência no rateio do benefício previdenciário, visto que o concubinato não é

reconhecido no direito de família. Para entender o objetivo geral é que num primeiro

momento se estuda o Estado e sua organização, analisando sua origem e formação

dando ênfase as teorias que demonstraram seu aparecimento caracterizado como

sociedade política. Logo, retrata-se a evolução histórica do conceito de Estado até

culminar em seu denominador. Num segundo momento será tratado das

características do casamento e do concubinato, com os aspectos históricos do

casamento e do concubinato, seus conceitos, suas diferenças e a impossibilidade de

reconhecimento simultâneo do casamento e do concubinato, que irá refletir na

divisão da pensão, caso o titular venha a falecer, tema que será abordado no

terceiro momento. Após será tratada da concorrência entre esposa e concubina para

fins previdenciários, sendo abordado os benefícios previdenciários, dando ênfase a

pensão, os aspectos legais da pensão, a dependência para fins de rateio, a

possibilidade do rateio dos valores da pensão entre esposa e concubina, a

(in)coerência na forma do rateio e a análise jurisprudencial. Diante disso, foram

levantados os seguintes questionamentos: a) é possível o reconhecimento da

simultaneidade entre casamento e concubinato, sendo este ultimo semelhante ao

instituto da união estável? b) existe incoerência no rateio da pensão por morte, pois

a lei não reconhece o concubinato impuro, então como poderá reconhecer o rateio

da pensão? Tais questionamentos apresentaram hipóteses que foram

minuciosamente estudadas e que acresceram para o melhor entendimento do

assunto.

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto a concorrência entre

esposa e concubina no âmbito do direito previdenciário e a jurisprudência recente do

Supremo Tribunal Federal.

O seu objetivo é analisar os institutos casamento e concubinato

e como são tratados os casos em que há simultaneidade entre os dois e a forma de

rateio da pensão previdenciária.

Para tanto, principia-se, no Capítulo 1, a origem e formação do

Estado, ante o fato de estar entre suas funções, a organização de convivência em

sociedade (inclusive o casamento e o concubinato), visto que o Estado surgiu para

prestar serviços a sociedade, ou seja, aos seus membros. Entre esses serviços,

destaca-se o legislativo legislando normas de comportamento entre casamento e

união estável, além de normatização dos benefícios sociais, entre eles o

previdenciário. Assim, o Estado instituiu e organizou a forma de convivência entre

pessoas, seja através do casamento ou do concubinato.

No Capítulo 2, estudam-se casamento e concubinato,

principalmente das características destes institutos, desde sua origem, conceitos e

diferenças existentes. Destarte, aborda-se o impedimento em se reconhecer o

concubinato impuro que seria aquele quando um dos cônjuges continua casado e

mantém outro relacionamento extraconjugal, que irá refletir na divisão da pensão,

caso o titular venha a falecer.

No Capítulo 3, tratando da concorrência entre esposa e

concubina para fins previdenciários, analisando as espécies de benefício

previdenciário, dando-se ênfase a pensão por morte. Há incoerência na forma de

rateio, pois a lei não reconhece o concubinato impuro e o Judiciário tem entendido a

questão de várias maneiras.

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O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados,

seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a

concorrência entre esposa e concubina no âmbito do direito previdenciário e a

jurisprudência recente do Supremo Tribunal Federal.

Para a presente monografia foram levantados os seguintes

problemas e hipóteses:

Problema 1: é possível o reconhecimento da simultaneidade

entre casamento e concubinato, sendo este último semelhante ao instituto da união

estável?

Hipótese 1: há possibilidade de simultaneidade entre

casamento e concubinato, no entanto, há casos em que os institutos união estável e

concubinato se confundem.

Problema 2: existe incoerência no rateio da pensão por morte,

pois a lei não reconhece o concubinato impuro, então como poderá reconhecer o

rateio da pensão?

Hipóteses 2: o rateio da pensão por morte, entre a concubina e

a esposa, torna-se incoerente, ante o fato de não se admitir dois relacionamentos

simultâneos, sendo um, considerado espúrio.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de

Investigação5 foi utilizado o Método Indutivo6, na Fase de Tratamento de Dados o

5 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente estabelecido [...]. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 11 ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2008. p. 83.

6 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 86.

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Método Cartesiano7, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia

é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas

do Referente8, da Categoria9, do Conceito Operacional10 e da Pesquisa

Bibliográfica11.

7 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

8 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 54.

9 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 25.

10 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 37.

11 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 209.

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CAPÍTULO 1

O ESTADO E SUA ORGANIZAÇÃO

1.1 ORIGEM E FORMAÇÃO DO ESTADO

Para se entender a origem e formação do Estado, necessário

se faz analisar duas questões: uma a respeito da época de seu aparecimento; outra

relativa aos motivos que determinaram e determinam seu surgimento.

A denominação Estado (do latim status, que significa, estar

firme) apareceu pela primeira vez na obra “O Príncipe”, de Maquiavel, escrito em

1513, que, já nas primeiras alíneas mencionou: “Todos os Estados, todos os

governos que tiveram e têm poder sobre os homens, foram e são ou repúblicas ou

principado.”12.

DALLARI13 cita os lugares que passaram a utilizar tal

denominação:

A denominação Estado (...), significando situação permanente de convivência e ligada a sociedade política, aparece pela primeira vez em “O Príncipe” de Maquiavel (...), passando a ser usada pelos italianos sempre ligada ao nome de uma cidade independente, como, por exemplo, stato de Firenze. Durante os séculos XVI e XVII a expressão foi sendo admitida em escritos franceses, ingleses e alemães. Na Espanha, até o século XVIII aplicava-se a denominação de estados a grandes propriedades rurais de domínio particular, cujos proprietários tinham poder jurisdicional.

Apesar do uso, o nome Estado, indicando uma sociedade

política, só aparece no século XVI, é por esse motivo que alguns autores não

admitem sua existência antes do século XVII.

12

MACHIAVELLI, Niccolo. O príncipe. Tradução de Ciro Mioranza. Coleção Grandes obras do pensamento universal 12. São Paulo: Escala, p. 13.

13 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 51.

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14

Sobre o tema AZAMBUJA14:

(...) o termo Estado se referia de preferência às três grandes classes que formavam a população dos países europeus, a nobreza, o clero e o povo, os Estados, como eram abreviadamente designados. (...) pode-se dizer que do século XVI em diante o termo Estado vai aos poucos tendo entrada na terminologia política dos povos ocidentais: é o État francês, Staat alemão, em inglês State, em italiano Stato, em português e espanhol Estado.

Entretanto, o nome Estado só pode ser usado com propriedade

em relação à sociedade política dotada de certas características bem definidas.

Porém, considera-se que a sociedade denominada Estado é igual a que existiu

anteriormente, muitas vezes com nomes diferentes, dá essa designação a “todas as

sociedades políticas que, com autoridade superior, fixaram as regras de convivência

de seus membros.”15

Passado essa preliminar, há de se verificar com mais

propriedade as teorias relacionadas com a origem do Estado.

1.1.1 Teorias do Aparecimento do Estado

Existem inúmeras teorias que justificam o aparecimento do

Estado como sociedade política, porém, pode-se reduzi-las a três, as quais são

consideradas fundamentais:

a) O Estado e a sociedade sempre existiram, pois se considera

que o homem desde sua existência se encontra integrado numa organização social,

atribuída de poder e com autoridade para definir a conduta de todo o grupo. Um dos

autores que adota essa posição é Eduardo Meyer, historiador das sociedades

antigas, e Wilhelm Koppers, etnólogo, ambos afirmando que o Estado é um

elemento universal na organização social humana.16

Como menciona DALLARI17:

14

AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. 44 ed. São Paulo: Globo, 2005. p. 7.

15 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 51.

16 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 52.

17 Eduardo Meyer expõe seu pensamento a respeito deste assunto em sua História da Antiguidade,

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15

Meyer define mesmo o Estado como o princípio organizador e unificador em toda organização social da Humanidade, considerando-o, por isso, onipresente na sociedade humana.

b) A sociedade humana existiu sem o Estado durante um

tempo. Com o passar dos anos, a formação do Estado foi surgindo de acordo com a

necessidade de cada lugar.18

c) Aceitava-se o Estado como uma sociedade com

características bem definidas.

Adotando a tese “c”, diz SCHIMIDT19 “[...] que o conceito de

Estado não é um conceito geral válido para todos os tempos, mas é um conceito

histórico concreto, que surge quando nascem a idéia e a prática da soberania, o que

só ocorreu no século XVII.”

PALLIERI20 indica o ano do nascimento do Estado, escrevendo

que “a data oficial em que o mundo ocidental se apresenta organizado em Estados é

a de 1648, ano em que foi assinada a paz de Westfália.”

Já ATALIBA21, mencionando a pluralidade de autonomias

existentes no mundo medieval, sobretudo o feudalismo, as autonomias comunais e

as corporações, ressaltando que a luta entre elas foi um dos principais fatores

determinantes da constituição do Estado, o qual, com todas as suas características,

já se apresenta por ocasião de paz de Westfália.

publicada entre 1921 e 1925. A sustentação dessa tese por Wilhelm Koppers é mais recente, constando de seu trabalho L‟ Origine de l‟ État, apresentando ao VI Congresso Internacional de Ciências Antropológicas e Etnológicas, realizado em Paris, no ano de 1960. Veja-se, a respeito do pensamento desses autores, A Formação do Estado, de Lawrence Krader, págs. 26 e 27. Hermann Heller condena a amplitude dada por Meyer ao conceito de Estado, dizendo que com tão ilimitada extensão, o conceito histórico de Estado se desnatura por completo e se torna de impossível (Teoria del Estado, pág. 145) MEYER, Eduardo. Teoria del Estado. [DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 52.]

18 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 52.

19 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 53.

20 PALLIERI, Giorgio Balladore. A doutrina do Estado. [DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 53.]

21 NOGUEIRA. José Carlos Ataliba. Lições de teoria geral do estado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1969. p. 46-47.

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Ainda no que diz respeito ao aparecimento do Estado,

necessário se faz especificar que a sua existência está definida em originária e

derivada. Na primeira, parte-se de um grupo de humanos que ainda não eram

integrados a qualquer Estado, e na segunda, sua formação nasce a partir de outros

que já existiam.

A formação originária é inteiramente nova, não deriva de outro

Estado preexistente, e a formação derivada ocorre quando se tem influências de

outro Estado, o que acaba por criar características semelhantes entre ambos (o

novo e o já existente).

SILVA22 afirma que “Não há mais como formar novos Estados,

senão por divisão de outro por outros.”, ou seja, atualmente, é difícil existir Estados

originários, tendo em vista as constantes mudanças e a organização atual da

sociedade política.

Esses são os dois processos estudados que dão origem à

criação de novos Estados. Entretanto, mister se faz o estudo de teorias que

procuram explicar a formação originária do Estado, conforme se verá a seguir.

1.1.2 Teorias que explicam a formação originária do Estado

1.1.2.1 Teoria familiar e teoria da força

A teoria familiar tem o seu núcleo social fundamental na

família. Para os autores que defendem essa teoria, cada família primitiva se ampliou

e deu origem ao Estado.

AZAMBUJA23 explica:

Baseiam-se essas teorias, hoje adotadas por poucos autores, nas tradições e mitos de civilizações antiqüíssimas. Mas, há um evidente equívoco em identificar a origem da humanidade com a origem do Estado. [...] Finalmente, a teoria patriarcal é puramente conjetural, não tem confirmação alguma na experiência, e do ponto de vista lógico radica do equívoco a que aludimos: confunde a origem da humanidade com a origem do Estado.

22

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional. 29 ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

23 AZAMBUJA, Darcy. Teoria geral do estado. p. 98.

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Já a teoria da força defende que o grupo social mais forte

prevaleceu sobre o mais fraco, nascendo o Estado do grupo dominante e

dominados.

Cita-se, como defensor dessa teoria, ENGELS24:

Como o Estado surgiu da necessidade de conter as oposições de classes, mas ao mesmo tempo surgiu no meio do conflito subsistente entre elas, ele é, em regra, o Estado da classe mais poderosa, da classe economicamente dominante, classe que, por intermédio dele, converte-se também em classe politicamente dominante, adquirindo assim novos meios para a repressão e exploração da classe oprimida. Assim, o Estado antigo era, sobretudo, o Estado dos donos de escravos para manter os escravos subjugados, tal como o Estado feudal era o órgão de que se valeu a nobreza para manter a submissão dos servos e camponeses dependentes. E o moderno Estado representativo é o instrumento da exploração do trabalho assalariado pelo capital.

Nota-se, nesse contexto, que Engels não apontava como fator

econômico como único da origem do Estado, tendo em vista que a diferença das

classes sociais demonstravam a força dos mais fortes sobre os mais fracos.

Oppenheimer25, apud MENEZES, também afirma ter sido

criado o Estado para regular as relações entre vencedor e vencido:

O Estado é, inteiramente quanto à sua origem e quase inteiramente quanto à sua natureza durante os primeiros estágios de existência, uma organização social importa por um grupo vencedor a um grupo vencido, organização cujo único objetivo é regular a dominação do primeiro sobre o segundo, defendendo a autoridade contra as revoltas internas e os ataques externos.

Desse modo, para essa teoria, o Estado nasce com a

conquista de um grupo pelo outro, uma organização que se baseia na dominação do

grupo vencedor sobre o grupo vencido.

24

ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. Coleção Grandes Obras do Pensamento Universal – 2. 2 ed. São Paulo: Escala. p. 186.

25 OPENHEIMER, Franz. L’État, ses origines, son évolution et son avenir. In. MENEZES, Anderson de. Teoria geral do Estado. p. 89.

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18

1.1.2.2 Teoria da divindade

A teoria da divindade demonstra que o Estado surgiu

naturalmente, não existindo uma causa que estabelecesse a sua formação.

DALLARI26 ensina:

Teorias que afirmam a formação natural ou espontânea do Estado, não havendo entre elas uma coincidência quanto à causa, mas tendo todas em comum que a afirmação de que o Estado se formou naturalmente, não por um ato puramente voluntário.

Para AZAMBUJA27, a formação natural poderia ser simplificada

ao dizer que “[...] em toda a sociedade primitiva onde a autoridade de um chefe ou

de um conselho de anciãos se consolidou, [...] foi aceita pela massa social e

começou a dirigi-la permanentemente, aí se formou originária e naturalmente um

Estado.”

Essa teoria como mencionado acima pelos autores também é

conhecida como teoria natural.

1.1.2.3 Teoria contratual

Essa é a tese que defende a criação contratualista do Estado,

em que a sociedade política se originou de um pacto, uma convenção entre os

membros da sociedade humana.

Define MENEZES28:

Ministram as teorias contratuais, que também são designadas como convencionais ou pactuais, o ensinamento segundo o qual tem o Estado sua origem num acordo entre os homens, justificando-se o seu poder com base no mútuo consentimento de seus integrantes. Foi a inteligência humana, em reciprocidade concordante, que contratou, convencionou, pactuou a sociedade política, num determinado local e num certo instante sócio-histórico. No uso de sua razão, os indivíduos cogitaram e chegaram a acertar, entre si, a convivência social sob a feição jurídico-política.

26

DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. p. 51.

27 AZAMBUJA, Darcy. Teoria geral do Estado. p. 106.

28 MENEZES, Anderson de. Teoria geral do Estado. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996. p. 80.

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19

HOBBES29 é um dos autores que deu força a teoria do contrato

social, leciona:

[...] porque o acordo vigente entre as criaturas é natural, e dos homens surge por intermédio de um pacto, isto é, artificialmente. Não é de admirar, portanto, que seja necessária alguma coisa mais, além de um pacto, para tornar constante e duradouro seu acordo. Quer dizer, um poder comum que os mantenha em respeito e que dirija suas ações no sentido do benefício comum. [...] Feito isso, à multidão unida numa só pessoa se chama Estado, em latim civitas. Esta é a geração daquele enorme Leviatã, ou antes – com toda reverência – daquele Deus Imortal, nossa paz e defesa.

Essa teoria admite que o contrato deveria ser geral e baseado

na igualdade dos homens.

1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE ESTADO

A evolução histórica do Estado denota as formas fundamentais

que vem adotando durante o passar dos tempos. Essa verificação terá como

objetivo a busca de uma tipificação para o Estado, bem como uma idéia de como o

será no futuro.

Essa apresentação ajudará a encontrar soluções eficazes para

problemas atuais, pela nova forma do Estado que ainda sofre reflexos das

configurações anteriores.

Conforme menciona MENEZES30, será possível o

estabelecimento de tipos de Estado que “[...] por conseguinte, tem os seus cursos

em certas ocasiões renovados, repercutindo e refletindo-se os seus característicos

em diferentes épocas e em diferentes locais.”

Por esse motivo, há de se dizer que não existe uma regra de

sucessão cronológica dos tipos estatais. Conforme ensina DALLARI31, “[...] pode-se

procurar, de início, o conhecimento dos Estados particulares, descrevendo duas

singularidades, tanto por seus aspectos históricos-políticos, quanto pelos jurídicos.”

29

HOBBES, Thomas. Leviatã. São Paulo: Martin Claret, 2006. p. 130/131.

30 MENEZES, Anderson de. Teoria geral do Estado. p. 105.

31 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. p. 61.

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Importante serem, nesse momento, fixadas as características

fundamentais do Estado, em suas formas mais diversas, para o entendimento do

presente e para se fazer uma possível previsão sobre o seu futuro.

Com pequenas alterações, os autores que trataram desse

assunto adotaram uma sequência cronológica, compreendendo as seguintes fases:

Estado oriental, Estado grego, Estado romano, Estado medieval, Estado moderno e

Estado contemporâneo.

1.2.1 O Estado Oriental

O Estado oriental, também conhecido como Estado antigo ou

teocrático começou a se manifestar entre as mais antigas civilizações, tanto as do

Oriente como as do Mediterrâneo: chineses, indus, persas, assírios, hebreus,

egípcios etc.

Nessa forma de Estado, a família, a religião, a economia e a

política eram desorganizadas e não tinham uma diferenciação aparente, pois todas

tratavam dos mesmos assuntos; os pensamentos não eram distintos e nem

específicos.

Conforme explica MENEZES32, esta era uma forma de Estado

artificial:

[...] pela fortuna das armas de um conquistador, que anexava territórios e escravizava populações vencidas, o chamado Estado oriental, ainda é um embrião como tal, mal delineado em sua fisionomia política, em que prevalece absoluta diferenciação de castas, da qual emerge, pelo predomínio da classe sacerdotal, uma verdadeira teocracia, que se traduz com presença da autoridade divina no governo dos homens.

Entretanto, para DALLARI33, existiram duas marcas

fundamentais, que são as características que marcaram esse período: a natureza

unitária e a religiosidade.

32

MENEZES, Anderson de. Teoria geral do Estado. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996. p. 106.

33 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 62.

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A natureza unitária foi duradoura, pois permaneceu durante

toda a passagem política da Antiguidade. Essa marca apareceu como uma unidade

geral e não admitia divisão, nem de funções, nem de território.

Já a religiosidade foi marcante, pois, conforme anteriormente

citado por Menezes, houve o predomínio sacerdotal e, por isso, também ficou

conhecido como Estado teocrático. A religião teve uma influência grandiosa na

política e no comportamento individual e coletivo, como expressão de se atender ao

divino.

Essa forma de teocracia era uma relação entre o Estado e a

divindade, e nesse contexto são apontadas duas formas de teocracia diferentes por

JELLINEK34:

a) em certos casos, o governo é unipessoal e o governante é considerado um representante do poder divino, confundindo-se, às vezes, com a própria divindade. A vontade do governante é sempre semelhante à da divindade, dando-se ao Estado um caráter de objeto, submetido a um poder estranho e superior a ele; b) em outros casos, o poder do governante é limitado pela vontade da divindade, cujo veículo porém, é um órgão especial: a classe sacerdotal. Há uma convivência de dois poderes, um humano e um divino, variando a influência deste, segundo circunstâncias de tempo e de lugar.

Para MALUF35, o monarca “era o representante das

divindades, descendentes dos deuses. O poder do monarca era absoluto, e, sendo

equivalente ao poder divino, não encontrava possibilidade de limitação na ordem

temporal.”

Conforme pode ser notado, o Estado oriental foi marcado pela

religião e as idéias que prevaleceram foram aquelas sustentadas pelos sacerdotes.

1.2.2 O Estado Grego

Nesse período não existiu o Estado grego e sim diversos

Estados helênicos, formados cada um por uma porção da coletividade que estavam

integrados por um grupo de cidades distribuídas pela Grécia.

34

JELLINEK, Georg. Teoría general del Estado. Buenos Aires: Albatroz, 1954. p. 216.

35 MALUF, Sahid. Teoria geral do Estado. 24 ed. ed. rev. e atual. / pelo prof. Miguel Alfredo Malufe Neto. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 94.

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Embora se fale em vários Estados helênicos, verificam-se

características fundamentais e comuns a todos eles, principalmente quanto à

sociedade política.

A qualidade do Estado grego antigo era a polis, ou seja, a

cidade-Estado como a sociedade política de maior expressão. Foi da palavra polis

que derivou a palavra política.

Conforme ensina MENEZES36, as polis “[...] formavam todos

econômicos, sociais e políticos com vidas próprias. Eram legítimas autarquias [...]”

Através da polis que se pode ter uma idéia geral do Estado grego em seus traços

capitais.

O ideal que se deveria atingir era a auto-suficiência, conforme

ARISTÓTELES37 expõe:

§ 8. A sociedade formada por inúmeros pequenos burgos constitui-se uma cidade completa, com todos os meios para se prover a si mesma, e tendo alcançado, por assim dizer, a finalidade que se tinha proposto. (...) Além disso, a finalidade para a qual cada ser foi criado a de cada qual ser bastante a si mesmo; ora, a condição de bastar-se a si mesmo é o ideal a que todo indivíduo aspira, e o que de melhor pode haver para ele.

Essa idéia de auto-suficiência foi incisivo para a manutenção

da polis, pois, apesar das conquistas em batalhas, elas se mantiveram e não se

agregaram aos vencidos e nem expandiram o território.

Apesar disso, a política, a moral, o direito e a economia ainda

se misturavam, inclusive com a religião. De fato, todos os atos da vida estatal

ofereciam aspectos religiosos, conforme informa COULANGES38:

Quando as famílias, as fratrias e as tribos concordassem em se unir e ter o culto em comum, fundava-se logo a urbe para sediar o santuário desse culto comum. Assim a fundação da urbe foi sempre um ato religioso.

36

MENEZES, Anderson de. Teoria geral do Estado. p. 110.

37 ARISTOTELES. A política. São Paulo: Martin Claret, 2005. p. 13/14.

38 COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. São Paulo: Martin Claret, 2007. p. 145.

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Desse modo, pode-se dizer que cada polis era uma religião ou

uma igreja.

No Estado grego, havia um grupo de indivíduos que

compunham a classe política eram as elites que tinham uma grande participação

nas decisões do Estado, principalmente a respeito dos assuntos de caráter público.

Já nas relações de caráter privado, a autonomia da vontade individual era restrita.

Assim, demonstra DALLARI39:

(...) mesmo quando o governo era tido como democrático, isto significava que uma faixa restrita da população – os cidadãos – é que participava das decisões políticas, o que também influiu para a manutenção das características de cidade-Estado, (...)

Os cidadãos eram considerados aqueles que tivessem tempo

livre para dedicar aos negócios públicos e a manutenção da justiça, pois naquelas

cidades haviam muitos escravos que não tinham participação ativa nos assuntos

públicos. No entanto, o pensamento político existente na Grécia conduzia à idéia de

democracia.

1.2.3 O Estado Romano

O Estado romano passou por várias formas de governo,

dominou grande parte do mundo e atingiu povos com costumes e crenças

totalmente diversas do seu.

Esse império formado por Roma teve origem na família,

conforme demonstra MALUF40:

O Estado romano tinha a sua origem, efetivamente, na ampliação da família. A família era constituída pelo pater, seus parentes agnados, os parentes destes, os escravos (servus) e mais os estranhos que se associavam ao grupo (famulus). A autoridade do pater família era absoluta: pontífice, censor dos costumes, juiz e senhor, com poder de vida e morte sobre todos os componentes do grupo (jus vitae et necis).

39

DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. p. 64.

40 MALUF, Sahid. Teoria geral do Estado. 24 ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 102.

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COULANGES41 resume bem a noção de Estado em Roma:

(...) onde a religião dominava a vida privada e a pública; onde o Estado era uma comunidade religiosa, o rei um pontífice, o magistrado um sacerdote, a lei uma fórmula santa; onde o patriotismo era a piedade; o exílio, a excomunhão; onde o homem era sujeito ao Estado pela alma, pelo corpo, pelos seus bens; onde o ódio era obrigatório contra o estrangeiro; onde a noção do Direito, do dever, da justiça e da afeição terminava nos limites da cidade.

Daí a existência das duas classes em que se dividiu Roma:

patrícios, que eram os próprios paters e seus descendentes, formando a nobreza; e

clientes, que eram os servidores das famílias e esses tinham a posse e o uso das

terras, mas não o domínio.42

Tendo em vista a base familiar, concediam-se privilégios

especiais aos membros das famílias patrícias apesar do povo ter participação ativa

na vida política do Estado, durante muito tempo, os principais cargos do governo

eram destinados aos membros das famílias patrícias, principalmente os cargos de

magistrados.

Mas não foi sempre assim.

Com a queda de Roma e o início do Estado Medieval, foi que

se pretendeu realizar a integração jurídica dos povos que tiveram seus territórios

conquistados, sempre preservando uma parte das funções governamentais das

famílias com descendência patrícia.43

Foi no ano de 212 que o Imperador Caracala concedeu a

naturalização a todos os povos do Império, e, no ano de 313, que Constantino

assegurou a liberdade religiosa no Império, desaparecendo a visão de primazia dos

romanos.44

41

COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. São Paulo: Martin Claret, 2007. p. 248.

42 MENEZES, Anderson de. Teoria geral do Estado. p. 113.

43 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. p. 65.

44 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. p. 65.

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1.2.4 O Estado Medieval

O Estado medieval apareceu das invasões bárbaras, se focou

em torno da Igreja romana e teve a influência do feudalismo.45

O cristianismo veio a ser a base da aspiração à

universalidade.46 Começa a predominar a idéia de que todos são iguais perante

Deus, independente da classe social.47

DALLARI48 explica a unidade da igreja, num momento em que

não se via uma unidade política:

Motivos religiosos e pragmáticos levaram a conclusão de que todos os cristãos deveriam ser integrados numa só sociedade política. E, como havia a aspiração a que toda a Humanidade se tornasse cristã, era inevitável que se chegasse à idéia do Estado universal, que incluísse todos os homens, guiados pelos mesmos princípios e adotando as mesmas normas de comportamento público e particular. A própria Igreja vai estimular a afirmação do Império como unidade política, pensando, obviamente, no Império da Cristandade.

A partir do século VII, começou a originar a doutrina da

supremacia do poder espiritual sobre o poder temporal.49

Com esse escopo é que o Papa Leão III confere a Carlos

Magno, no ano de 800, o título de Imperador.50

Para MALUF51:

A preeminência do Papado sobre os monarcas medievais era de ordem espiritual. O Estado era de fundamento teológico, mas não se confundia com o feitio teocrático das monarquias orientais, isto é, com o sistema dos reis-deuses da antiguidade. O rei-cristão da Idade Média recebia o poder das mãos do Bispo, era consagrado no ato de sua investidura e ungido ao pé do altar. Daí a sua subordinação ao poder espiritual, considerando originário e superior.

45

MALUF, Sahid. Teoria geral do Estado. p. 111.

46 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 66.

47 MENEZES, Anderson de. Teoria geral do estado. p. 116.

48 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 66/67.

49 MALUF, Sahid. Teoria geral do estado. p. 112.

50 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 67.

51 MALUF, Sahid. Teoria geral do estado. p. 112.

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Essa luta entre o Papa e o Imperador só termina com o início

do Estado moderno, quando se afirma a supremacia absoluta dos monarcas na

ordem temporal.52

As invasões dos bárbaros perduraram do século III até o século

VI, e foram representadas por invasões de tropas armadas pelo território do Império

Romano.53

Os bárbaros eram oriundos de várias partes da Europa e

incluíam germanos, eslavos, godos etc., por esse motivo o surgimento de novos

costumes e unidades políticas independentes, culminando no aparecimento de

novos Estados.54

DALLARI55 leciona que é nesse momento que aparecem as

características do Estado moderno:

Dentro desse quadro é que se encontram os fatores de transformação, que, despertando aspirações e criando novas condições, irão determinar as características do Estado Moderno. Desde logo se percebe que, no Estado Medieval, a ordem era sempre bastante precária, pela improvisação das chefias, pelo abandono ou pela transformação de padrões tradicionais, pela presença de uma burocracia voraz e quase sempre toda-poderosa, pela constante situação de guerra, e, inevitavelmente, pela própria indefinição das fronteiras políticas.

É a partir daí que se acrescenta a influência do feudalismo.

Para melhor entender o feudalismo, MENEZES56 conceitua:

O feudalismo, como laço de coesão dos vínculos políticos para sustentar a ordem social então abalada, é um sistema de dependência territorial nas relações entre os homens, associado, na prática, à autoridade política e à influência religiosa.

Dessa forma, valoriza-se a posse da terra, de onde todas as

classes sociais deveriam tirar os meios de subsistência. Assim, toda a vida social

52

DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 67.

53 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 68.

54 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 68.

55 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 68/69.

56 MENEZES, Anderson de. Teoria geral do Estado. p. 117.

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passa a depender da propriedade ou da posse da terra, desenvolvendo-se um

sistema administrativo e uma organização militar estreitamente ligados a situação

patrimonial.57

Unindo os três fatores que caracterizam o Estado medieval, o

cristianismo, a invasão dos bárbaros e o feudalismo, é notável perceber uma

constante instabilidade política e, diante da necessidade de organização é que surge

o Estado moderno.

1.2.5 O Estado Moderno

Diante do fracasso que foi o Estado medieval, surge o Estado

moderno como solução do governo em reunir territórios e dominar populações

dispersas, “ainda pelas contingências feudais e religiosas.”58

Narra MENEZES59:

Esse absolutismo monárquico, caracterizado pela concentração dos poderes do Estado na pessoa dos soberanos, representava de qualquer sorte a conjunção das opiniões e das vontades para fins comuns, pela coexistência pacífica e coletiva, pela independência e engrandecimentos das nações e pela segurança universal.

Nesse mesmo diapasão, completa AZAMBUJA60:

[...] exatamente por ser um regime popular, em que a vontade do povo ditava a lei, absorveu o indivíduo e o povo. Porque o indivíduo e o povo, diante dos novos problemas e das novas necessidades que iam surgindo, incapazes de resolver aqueles e de suprir a estas, mesmo de compreender uns e outras, imploravam e exigiam do Estado a solução e o remédio para todas as dificuldades e males. E assim o Estado se hipertrofiou exatamente para atender os reclamos dos que mais teznamente pretendiam defender os direitos do indivíduo contra o poder do Estado. A cada necessidade, um novo serviço público, para cada problema, uma lei ou um código; cada inovação, cada progresso da técnica, determina uma regulamentação.

57

DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 69.

58 MENEZES, Anderson de. Teoria geral do estado. p. 118.

59 MENEZES, Anderson de. Teoria geral do estado. p. 118.

60 AZAMBUJA, Darcy. Teoria geral do estado. p. 146.

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Essa busca da unidade territorial foi marcada com os tratados

de paz de Westfália.61

O Estado moderno tinha como elementos essenciais diversos

fatores. Para Santi Romano apud DALLARI62, a soberania e a territorialidade é que

eram as peculiaridades do Estado.

Porém a maioria dos autores indicam três elementos, conforme

bem menciona DALLARI63:

De maneira geral, costuma-se mencionar a existência de dois elementos materiais, o território e o povo, havendo grandes variedades de opiniões sobre o terceiro elemento, que muitos denominam formal. O mais comum é a identificação desse último elemento com o poder ou alguma de suas expressões, como autoridade, governo ou soberania.

DALLARI64 ainda demonstra que a soberania, o território, o

povo e a finalidade, se unidos nos conduz a um conceito de Estado mais próximo da

realidade.

1.2.6 O Estado Contemporâneo

O Estado contemporâneo surgiu em 1917, com a Constituição

Mexicana, e, em 1919, com a Constituição de Weimar.65

Conforme PASOLD66, o Estado Contemporâneo apresenta as

seguintes características:

a) encontra-se conformado juridicamente, isto é, há consagrações formais dos conteúdos que caracterizam nos diversos países, correspondentes em maior ou menor medida às realidades ali existentes;

61

DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 71.

62 ROMANO, Santi. L‟ Ordinamento Giuridico. In: DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 71.

63 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 71.

64 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 71.

65 PASOLD, César Luiz. Função social do Estado contemporâneo. 2 ed. Florianópolis: Estudantil, 1988. p. 43.

66 PASOLD, César Luiz. Função social do Estado contemporâneo. p. 43/44.

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b) nos discursos legais, com variações redacionais, está colocado a sua submissão à Sociedade. (...);

c) da mesma maneira encontramos compromisso dos Estados para com os anseios das suas Sociedades, (...);

d) de modo geral tem o Estado Contemporâneo assumido uma estrutura tentacular que é objeto de estudos, constatações e propostas de cientistas que têm a “burocracia como centro de atenção”(...);

e) em decorrência da internacionalização da economia sob o princípio de que “as nações não podem viver isoladas mais eficientemente do que os indivíduos” e numa distorção progressiva dela através da desnacionalização do fluxo internacional de bens (...);

A função do Estado contemporâneo era baseada numa

condição instrumental e compromisso com o bem comum, compreendido este “além

da satisfação das necessidades materiais, alcançando a dimensão do respeito aos

valores fundamentais da pessoa humana, os quais devem sustentar o interesse

comum.”67

Visto isso, O Estado contemporâneo tem como objetivo

principal satisfazer as necessidades coletivas e, através de seus órgãos acionar o

cumprimento das funções, destacando-se a função social.

1.3 CONCEITO DE ESTADO

Um conceito de Estado que satisfaça todas as correntes

doutrinárias é algo impossível, tendo em vista que o Estado é um ente tão complexo,

que pode ser abordado sob diversos pontos de vista.

Além disso, é variável quanto à forma por sua própria

natureza.68

Conforme DALLARI69:

67

PASOLD, César Luiz. Função social do Estado contemporâneo. p. 65.

68 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 116.

69 DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 117.

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30

A análise de grande variedade de conceitos, revela duas orientações fundamentais: ou se dá mais ênfase a um elemento concreto ligado a noção de força, ou se realça a natureza jurídica, tomando-se como ponto de partida a noção de ordem.

Entre os conceitos que se adéquam mais a idéia de força e que

poderiam ser classificados como político70 o Estado é visto, como força que se põe a

si própria e que, por suas virtudes, busca a disciplina jurídica.

Essa é a orientação de DUGUIT71, que conceitua o Estado

“como uma força material irresistível, acrescentando que essa força, atualmente, é

limitada e regulada pelo direito.”

No mesmo contexto, HELLER72 não fica distante, dando ao

Estado o conceito de “unidade de denominação [...] ela é independente no exterior e

no interior, atua de modo contínuo com meios de poder próprio e é claramente

delimitada no pessoal e no territorial”.

Também é a conceituação de BURDEOU73, de que o Estado é

uma “institucionalização do poder”.

Ainda, GURVITCH74, diz que o Estado é o “monopólio do

poder”.

Verifica-se que todos esses conceitos dão a noção de força.

As teorias jurídicas não ignoram a presença da força no

Estado, entretanto essas teorias dão prioridade ao elemento jurídico, acentuando

que “todos os demais têm existência independente fora do Estado, só se

70

DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 117.

71 DUGUIT, Leon, Traité de Droit Constitutionnel. In: DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 117.

72 HELLER, Hermann, Teoria del Estado. In: DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 117.

73 BURDEOU, Georges. L‟État. In: DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 117.

74 GURVITCH, Georges. L‟Ideé du Droit Social. In: DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 117.

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compreendendo como componentes do Estado após sua integração numa ordem

jurídica, o que também se dá com a força, que se integra no Estado como poder.”75

RANELLETTI76, que menciona uma prévia noção social de

Estado, segundo a qual este “um povo fixado num território e organizado sob um

poder supremo originário de império, para atuar com ação unitária os seus próprios

fins coletivos.”

Nessa mesma ordem, JELLINEK77 diz:

[...] que aquela organização, que integra todos os elementos e tem como característica fundamental ser uma ordenação de pessoas, é, por este motivo, uma corporação, que difere das demais por ser territorial, isto é, integra também necessariamente um território, completando-se, assim, a formação do Estado.

A definição de DEL VECCHIO78 também é expressiva “a

unidade de um sistema jurídico que tem em si mesmo o próprio centro autônomo e

que é possuidor da suprema qualidade de pessoa”, e é nesse conceito que se

destaca o fator jurídico.

Porém é JELLINEK79 que chega ao conceito mais próximo da

noção jurídica de Estado definindo como “corporação territorial dotada de um poder

de mando originário.”.

No entanto, KELSEN80 defini uma noção puramente jurídica do

Estado, ao considerar exteriores todos os fatores não-jurídicos, como “ordem coativa

normativa da conduta humana”.

75

DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 118.

76 RANELLETTI, Oreste. Istituzioni di Diritto Pubblico. In: DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 118.

77 JELLINEK, Georg. Teoría general del Estado. Buenos Aires: Albatroz, 1954.

78 DEL VECCHIO, Giorgio. Studi Sullo Stato. In: DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 118.

79 JELLINEK, Georg. Teoria General del Estado. Buenos Aires: Albatroz, 1954.

80 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 5.ed. Coimbra: Sucessor, 1979. p. 21.

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32

Destarte, essa definição ainda é incompleta para o Estado e

então DALLARI81 o conceitua tentando rematar todo o exposto como a “ordem

jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em

determinado território.”.

Pode-se dizer que nesse conceito se acha presente todos os

elementos que compõem o Estado.

Considerando-se que o Estado surgiu ante a necessidade de

organização da consciência em sociedade. Com o surgimento do Estado, o povo

passou a abdicar parte da sua liberdade material, com a contraprestação do Estado,

em fornecer-lhes serviços, principalmente os de natureza social.

Entre os nomes de natureza social prestado pelo Estado

brasileiro, se encontra o previdenciário.

Para realizar (ou prestar) o serviço previdenciário, o Estado

brasileiro instituiu uma autarquia que presta os mais variados serviços

previdenciários sociais, dos quais serão abordados no capítulo seguinte.

81

DALARRI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. p. 119.

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CAPÍTULO 2

CASAMENTO E CONCUBINATO

2.1 ASPECTOS HISTÓRICOS DO CASAMENTO

As sociedades primitivas usavam de meios técnicos

rudimentares para enfrentar os rigores da natureza, pois o problema central do

homem primitivo era prover sua própria subsistência. O homem e a mulher dividiam

as tarefas e por causa disso o indivíduo solteiro era uma raridade dentro das

sociedades primitivas.82

Nas sociedades primitivas não existiam relações conjugais

individualizadas, como observa ENGELS:

A tolerância recíproca entre os machos adultos e a ausência de ciúmes constituíam a primeira condição para formar esses grupos maiores e duradouros que eram os únicos em cujo seio podia ocorrer a transformação do animal em homem. E, de fato, que encontramos como forma mais antiga e primitiva da família, cuja existência possamos comprovar irrefutavelmente pela história e que ainda hoje podemos estudar em certos lugares? É o casamento grupal, forma em que grupos inteiros de homens e grupos inteiros de mulheres se possuem mutuamente, deixando bem pouca margem para o ciúmes.83

Embora seja importante a estrutura histórica da família nas

civilizações mais antigas, o estudo apresentado partirá do casamento romano,

tomando-se por base, o tratamento dado com a origem do direito civil brasileiro.

Como apontado no capítulo anterior, à família romana não era

necessariamente unida pelo vínculo de sangue, mas pela identidade de culto.

Conforme menciona VENOZA84, “era um grupo numeroso formado por um ramo

82

VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 23.

83 ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. p. 45.

84 VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 23.

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principal e ramo secundário, este formado por serviçais e clientes que conservavam

sua unidade baseada na religião comum.”

Essa unidade religiosa permaneceu por várias gerações.

Nesse cenário, o matrimônio solene era o laço sagrado por excelência. O

casamento, a confarretio era uma cerimônia religiosa e levava esse nome porque

uma tora de cevada era dividida entre os esposos como símbolo da vida comum que

se iniciava. Daí a origem do bolo de noiva.85

Nesse contexto, além do casamento religioso, também existia a

chamada coemptio, forma de união do casal que era uma modalidade de

mancipatio, ou seja, negócio jurídico formal utilizado para vasto número de negócios,

a começar pela compra e venda. Consistia em uma venda da mulher por quem

exercia o pátrio poder. Essa alienação era real a princípio, passando, a ser ficta

posteriormente. Outra modalidade de união era o usus, pelo qual a mulher se

submetia ao poder do marido após um ano de convivência. Esses matrimônios

chamados cum manum faziam com que a mulher perdesse totalmente a ligação e

parentesco da família do pai, submetendo-se à família do marido, inclusive seu

culto.86

Com o passar dos anos, a mulher buscou uma forma de

convivência que lhe permitia o direito a herança da família originária, sem que a

união lhe desvinculasse completamente de suas origens. A Lei das XII Tábuas

mencionava que para isso a mulher poderia ausentar-se do lar conjugal por três

noites consecutivas em cada ano. Logo, a lei reconhece o casamento sine manu,

sem qualquer outra exigência, nem mesmo de convivência.87

Esse tipo de matrimônio, que desonera a mulher dos vínculos

da família do marido, passa a ser predominante nos casamentos a partir do período

da República. Os casamentos cum manun passam a ser excepcionais e o usus

deixa de existir, é abolido. A confarretio era adotada por um pequeno grupo de

85

VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 23.

86 VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 24.

87 VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 24.

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pessoas que eram aqueles que tinham altos cargos sacerdotais, pois tinham que

pregar por esse tipo de matrimônio.88

Devido aos efeitos do usus e de sua origem histórica, o

casamento romano é comparado com a posse e seus efeitos, pois esses institutos

possuem a noção de aquisição por decurso de tempo. Porém, no casamento foi

agregada a affectio maritalis, o que o diferencia da simples posse. A natureza do

casamento romano, diferenciado dos princípios religiosos o aproxima de certa forma

do concubinato. Somente o Cristianismo transforma essa idéia ao considerá-lo um

sacramento.89

Tendo em vista que o casamento romano incentivava a prole, o

que acarretava perdas patrimoniais aos solteiros e aos casados sem filhos, o Direito

não era contra novas núpcias. 90

Já no Brasil, com a proclamação da República, em 1889, deu-

se a separação entre a Igreja e o Estado, sendo criado o Decreto n. 181, de 24 de

janeiro de 1890, que estabeleceu o casamento civil no país, pois anteriormente a

única forma de casamentos era o religioso.91

No Código Civil de 1916, considerava-se família, aquela

constituída pelo casamento. A família tinha um viés patriarcal, e a legislação

demonstrava essa realidade. Por isso, não era aceita nenhum outro tipo de família, a

não ser a formada pelo casamento. O casamento era indissolúvel. A única forma de

rompimento era o desquite, que não permitia novas núpcias.92

Com a edição da Lei do Divórcio, o desquite se transformou em

separação e passou a existir duas formas de dissolução do casamento: separação e

divórcio.

88

VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 24.

89 VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 24.

90 VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 24.

91 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. 28 ed. São Paulo: Saraiva, v. 6, 2008. p. 23.

92 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 127.

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36

RODRIGUES93 de forma cronológica demonstra a evolução

das legislações que trataram do casamento:

(...) a Lei n. 379, de 16 de janeiro de 1937, regulamentou o casamento religioso de forma que ele gerasse efeitos civis, uma vez cumpridas formalidades nelas estabelecidas. Tal lei foi refundida pela Lei n. 1.110, de 23 de maio de 1950. Atualmente é prevista a eficácia da celebração eclesiática também na Lei n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973 (Lei de Registros Públicos, arts. 71 a 75), e na própria Constituição Federal (art. 226 § 2º). O Código Civil incorpora a previsão em seus arts. 1.515 e 1.516.

Atualmente, com a revolução da estrutura social do país,

tornou-se tão imperioso o novo perfil da sociedade que a Constituição Federal de

1988 estendeu o conceito de família para além do casamento. Dessa forma, passou

a ser considerada entidade familiar, outras formas. O Código Civil de 2002, trouxe os

dispositivos previstos na Constituição com relação a família, deixando o casamento

de ser o único marco a identificar a existência desta.

2.2 ASPECTOS HISTÓRICOS DO CONCUBINATO

A palavra concubinato deriva do verbo em latim concubo, (em

inglês e francês concubinage), que significa dormir junto, ir para cama com outro, ter

relações carnais.94. Ao lado das justae nuptiae (justas núpcias, forma oficial de

casamento) e do conturbernium (união de fato, entre escravos), no Direito Romano,

reconhecia-se o concubinato como uma modalidade de casamento de segunda

classe, em que homem e mulher mantinham convivência duradoura, porém despida

da affectio maritalis.95

93

RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 23.

94 A origem latina do termo concubinato dá a idéia de ajuntamento carnal, coabitação. A conceituação moderna dispensa a vida em comum sob o mesmo teto (Súmula 382 do STF). Basta a continuidade do relacionamento, ainda que em lares separados, com ou sem reciprocidade no suporte econômico. Esse o sentido genérico de concubinato que os dicionários registram como o “estado de quem tem ou é concubina”. Assim, o Novo Dicionário da Língua Portuguesa, de AURÉLIO BUARQUE DE HOLANDA, a definir concubina como “a mulher que vive amasiada com um homem”; o mesmo que “amante, amásia, amiga, arranjo, barregã, camarada, caseira, china, camborça, espingarda, fêmea, gato, manceba, moça, murixaba, puxavante, rapariga, sexta-feira”. Curioso o registro único de “concubina”, no feminino, sem o termo correlato no masculino, como se fora possível a mulher como protagonista isolada no cenário.

95 OLIVEIRA, Euclides Benedito de. União estável: do concubinato ao casamento. 6 ed. São Paulo: Método, 2003. p. 72.

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Segundo OLIVEIRA, o concubinato “constituiu realidade

sociofamiliar das mais antigas na história da humanidade, com referências na lei

mosaica e no direito hebraico antigo, além de constar do Gênesis e do

Deuteronômio”.96

A história antiga é cheia de referências de cultos religiosos

impregnados de devassidão.

Historiadores como Herótodo e Estrabão, citados por Dias,

apud PESSOA97, afirmam que haveria consentimento por parte dos pais e maridos,

em relação às filhas e esposas, em favor dos estrangeiros, bem como franca

liberalidade no que concerne aos maridos, que podiam se unir a tantas concubinas

quantas pudessem manter.

O autor refere, também, que, ante a projeção desfrutada pelo

povo babilônico, o culto de Milita, ou a prostituição sacra, estendeu-se a outras

regiões de sua influência, inclusive Egito e Pérsia.

CANTU98 destaca, por sua vez, na cultura grega, a existência

de famosas concubinas, entre elas Aspásia, nascida em Mileto, no Mar Egeu, a qual,

considerada estrangeira, não se podia casar com Péricles, tendo eles vivido juntos,

em concubinato público e notório; note-se que ela teria sido, anteriormente,

concubina de Sócrates e, após a sua morte, de Alcebíades.

Segundo Bittencourt, apud PEREIRA99, “entre os gregos, a

concubinagem não acarretava qualquer desconsideração e era, em certa medida,

reconhecida pelas leis”.

96

OLIVEIRA, Basílio de. O concubinato e a constituição atual. In: PESSOA, Claudia Grieco Tabosa. Efeitos patrimoniais do concubinato. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 12.

97 DIAS, Adahyl Lourenço. A concubina e o direito brasileiro. In: PESSOA, Claudia Grieco Tabosa. Efeitos patrimoniais do concubinato. p. 13.

98 CANTÚ, Cesare. Storia universale. In: PESSOA, Claudia Grieco Tabosa. Efeitos patrimoniais do concubinato. p. 13.

99 BITTENCOURT, Edgard de. Concubinato. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato de união estável. 6 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 16.

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No início do Império, em Roma, o concubinato era comum,

inclusive entre homens de grande honra, mas não produzia quaisquer efeitos

jurídicos.

No Baixo Império torna-se o concubinato um casamento inferior, embora lícito. Com os imperadores cristãos começa a receber o reconhecimento jurídico. Distinguem eles os filhos nascidos de concubinato (liberi naturales), que se podem legitimar per subseuquens matrimo-nium dos vulgo quaesiti ou spuriti, oriundos de uniões sexuais passageiras. Favorece-se, assim, a transformação do concubinato em matrimônio através da legitimação dos filhos.100

A respeito do concubinato da Idade Média até a Idade

Moderna PEREIRA101 diz:

(...) apesar de combatido pela Igreja, nunca foi evitado, nunca deixou de existir. E se os canonistas o repudiavam de iure divino, os juristas sempre o aceitaram de iure civile. Quem rastrear a sua persistente sobrevivência, por tantos séculos, verá que em todas as legislações em todos os sistemas jurídicos ocidentais houve tais uniões, produzindo seus efeitos mais ou menos extensos.

Na Idade Moderna, MIRANDA102:

A união não-matrimonial só desponta como elemento de negociação jurídica a partir da instituição do casamento civil, no século XVI, e nos séculos posteriores acentuou-se a tendência de legislar-se sobre essa matéria. Anteriormente a essa conquista de institucionalização do matrimônio, as ligações estranhas a este não se apresentavam como problema: existia uma disciplina legal a respeito, tal como no Direito romano, em que o concubinato era considerado casamento inferior, de segundo grau, e como no regime das ordenações filipinas, em que a ligação extramatrimonial prolongada gerava direitos em favor da mulher.

Na Idade Contemporânea ocorreram mudanças a partir da

primeira metade do século XIX, quando os tribunais franceses apreciam e

consideram as pretensões das concubinas. Esta relação passa a ser vista sob dois

pontos: sociedade com caráter nitidamente econômico e como obrigação natural

100

CHAMOUN, Ebert. Instituições de direito romano. Rio de Janeiro: Forense, 1957. p. 171.

101 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Concubinato: sua moderna conceituação. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato de união estável. p. 16.

102 MIRANDA, Pontes de. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato de união estável. p. 17.

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39

quando, rompida a relação, havia promessa de certas vantagens à ex-

companheira.103

Para BITTENCOURT104, o julgado de 1883, do Tribunal de

Rennes, é o marco inicial da atual doutrina e concepção sobre o concubinato:

Sem nada a reclamar que se prendesse à vida concubinária, a concubina alegou haver entrado com bens próprios para a formação do acervo do companheiro falecido. Não podendo firmar-se inteiramente na prova por ela apresentada, o tribunal admitiu os elementos fornecidos como prova supletiva e mandou pagar-lhe a quarta parte dos bens deixados pelo morto, a título de serviços prestados e da contribuição de seus bens no acervo comum.

Depois dessa inédita decisão para a época, os tribunais

franceses passaram a ter a mesma orientação, tornando a jurisprudência o

referencial dos princípios da sociedade em participação, sociedade universal de

ganhos ou sociedade de fato do reconhecimento sem causa.105

O marco importante da Idade Contemporânea no aspecto

jurídico, é que os motivos de proteção à concubina eram vinculados somente a uma

relação comercial entre o homem e a mulher, mas sempre à margem da relação

concubinária.106

Instalou-se dessa forma uma nova concepção jurídica para o

concubinato.

A evolução é traduzida pela Lei de 16 de novembro de 1912,

que introduz a noção de concubinato notório, caracterizado pela união longa e

duradoura, que gozaria de efeitos jurídicos.107

A expressão concubinato foi trazida pela primeira vez por essa

lei civil, estabelecendo que “o concubinato notório” era fato gerador de

reconhecimento de paternidade ilegítima. Dessa forma, essa lei abriu caminho para

103

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato de união estável. p. 17.

104 BITTENCOURT, Edgard de. Concubinato. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato de união estável. p. 17-18.

105 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato de união estável. p. 18.

106 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato de união estável. p. 18.

107 MÖELLER, Oscarlino. O concubinato. In: PESSOA, Claudia Grieco Tabosa. Efeitos patrimoniais do concubinato. p. 16.

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várias outras e contribuiu decisivamente para a evolução doutrinária e

jurisprudencial sobre o concubinato. Por isso que a França é considerada como a

pátria do direito concubinário.108

No ordenamento jurídico brasileiro, o concubinato não estava

devidamente regulado, no entanto há divergências entre doutrinadores quanto à

proibição ou não de tal situação, e sobre suas implicações.

Conforme explicita PEREIRA109, observa-se que o concubinato

não era proibido:

No Brasil, como em todos os países do mundo, o concubinato nunca foi tipificado como crime. Nossos textos legais não o regulavam, mas, também, não o proibiam. É o que pode constatar desde as Ordenações Filipinas. Mesmo as proibições de doações feitas à concubina, dispostas em nosso Código Civil, segundo a maioria dos doutrinadores e também jurisprudência, não se constitui propriamente uma “repulsa ao concubinato, mas, sim, uma defesa do patrimônio da família”. Mesmo que essa afirmação possa em alguns aspectos parecer contraditória, denota, de qualquer forma, uma não-proibição, não-interdição do Estado a esse tipo de relação.

Ainda, PESSOA110 também demonstra o reconhecimento do

concubinato ao citar as Ordenações Filipinas:

No Brasil, consoante o Título 46, §2º, do Livro IV e Título 26, §1º, do Livro V das Ordenações Filipinas, previa-se o reconhecimento do concubinato, desde que houvesse a união de pessoas “vivendo em forma de marido e mulher, com mesa e leito comuns, por tais havidos por toda vizinhança e vila”.

Já de acordo com OLIVEIRA111, existiam resistências quanto à

aceitação:

No Brasil, com a união entre Estado e Igreja, que persistiu até fins do Império, somente se admitia o casamento religioso, sendo considerada imoral a ligação concubinária. (...), a Era Republicana trouxe consigo a inovação do casamento civil, embora reconhecendo efeitos civis ao casamento religioso.

108

PESSOA, Claudia Grieco Tabosa. Efeitos patrimoniais do concubinato. p. 17.

109 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato de união estável. p. 19.

110 PESSOA, Claudia Grieco Tabosa. Efeitos patrimoniais do concubinato. p. 17.

111 OLIVEIRA, Euclides de. União estável. Do concubinato ao casamento. p. 72 e 73.

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Nesse contexto, o concubinato permaneceu à margem da lei, sem nenhuma regulamentação, a não ser para fins de penalização ou restrição de direitos aos unidos sob essa roupagem. Justificava-se pela defesa da família constituída pelo casamento, considerada a única forma legítima de união.

No entanto, com o advento do Código Civil brasileiro de 1916,

destaca-se o art. 1.474 que proibia como beneficiária do contrato de seguro de vida,

ao prescrever: “não se pode instituir beneficiário pessoa que for legalmente inibida

de receber doação do segurado”.112

Para RODRIGUES113, o Código Civil de 1916 ignorava o

concubinato para proteger a família que era a considerada legítima, ou seja, o

casamento:

(...) o legislador de 1916 ignorava a então chamada família ilegítima, e as raras menções que faz ao concubinato (arts. 248, IV, 1.177 e 1.179, III etc.) eram apenas com o propósito de proteger a família constituída pelo casamento, não como reconhecedoras de umas situação de fato, digna de qualquer amparo.

Nota-se que o legislador deixou à margem da lei as demais

formas de união, consideradas ilegítimas.

Essa omissão, somente foi suprida com Constituição Federal

de 1988 que reconheceu expressamente o concubinato ao dispor em seu art. 226, §

3º que:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

(...)

§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.114

112

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v. 5. p. 376.

113 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito de família. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 6. p. 256.

114 BRASIL, Constituição da República Federativa do, 05 de outubro de 1988. Disponível em: ‹http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm.› Acesso em: 28 ago. 2010.

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Resguardou-se no campo legal, as relações estáveis de um

homem e uma mulher, sem serem casados civilmente, que representam tal entidade.

Deve-se ter em mente a diferenciação entre as variantes das

uniões homem/mulher, pois o certame constitucional privilegia certa categoria.

A união de fato ou concubinato pode ser: puro ou impuro:

Define DINIZ115 as duas classificações:

Será puro (CC, arts. 1.723 a 1.726) se se apresentar como uma união duradoura, sem casamento civil, entre homem e mulher livres e desimpedidos, isto é, não comprometidos em deveres matrimoniais ou por outra ligação concubinária. Assim, vivem em união estável ou concubinato puro: solteiros, viúvos, separados judicialmente ou de fato (...) e divorciados. (...) Ter-se-á concubinato impuro ou simplesmente concubinato, nas relações não eventuais em que um dos amantes ou ambos estão comprometidos ou impedidos legalmente de se casar. No concubinato há um panorama de clandestinidade que lhe retira o caráter de entidade familiar (CC, art. 1.727), visto não poder ser convertido em casamento. Apresenta-se como: a) adulterino (...) se se fundar no estado de cônjuge de um ou ambos os concubinos, p. ex., se homem casado, não separado de fato, mantém, ao lado da família, uma outra (...); e b) incestuoso, se houver parentesco próximo entre os amantes.

Visto a classificação acima, é reconhecido na Constituição

Federal o concubinato puro, também conhecido como união estável.

Depois do advento da Constituição Federal de 1988, as Leis n.

8.971, de 29 de dezembro de 1994, e 9.278, de 10 de maio de 1996, trouxeram a

figura da família nascida fora do casamento, com origem na união estável entre

homem e mulher. E mais, em 2002, repetindo a proposta da Lei 9.278, o Código

Civil também abordou a união estável.116

2.3 CONCEITO DE CASAMENTO

O casamento é o instituto mais importante do direito privado,

por ser uma das bases da família. Por isso, interessante se faz verificar as várias

conceituações dadas a esse instituto familiar.

115

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 371, 372/373.

116 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito de família. p. 256 e 260.

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Apesar do Código Civil Brasileiro não oferecer uma

conceituação de casamento, como grande parte dos Códigos Modernos117, ao se

estudar as diferentes definições é notório a distinção entre o casamento como

negócio jurídico e o casamento como relação jurídica que deriva do negócio jurídico

matrimonial.

É assim o casamento:

(...) negócio jurídico de Direito de Família por meio do qual um homem e uma mulher se vinculam através de uma relação jurídica típica, que é a relação matrimonial. Esta é uma relação personalíssima e permanente, que traduz ampla e duradoura comunhão de vida.118

No dizer de Beitzke, apud MUNIZ e OLIVEIRA119, significa

“comunhão de nome, estado, domicílio, vida sexual e demais aspectos da vida

conjunta; é a mais estreita das relações comunitárias”.

De forma simples e restrita, GONÇALVES120 conceitua que o

“casamento é a união legal entre um homem e uma mulher, com o objetivo de

constituírem a família legítima”.

Para RODRIGUES121:

Casamento é o contrato de direito de família que tem por fim promover a união do homem e da mulher, de conformidade com a lei, a fim de regularem suas relações sexuais, cuidarem da prole comum e se prestarem mútua assistência.

Tal conceito é extraído dos elementos que a lei fornece e das

numerosas outras definições dadas pelos escritores.

117

O Código português é exceção, definindo o casamento no art. 1.577: „Casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida, nos termos das disposições deste Código‟.

118 OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de. MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de Direito de Família. 4 ed. Curitiba: Juruá, 2004. p. 125.

119 BEITZKE, G. Op. Cit., § 6, p. 24. In: OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de. MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de Direito de Família. p. 125.

120 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. 11 ed. v. 2. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 1.

121 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Direito de família. p. 19.

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DINIZ122 considera o casamento a mais importante e poderosa

de todas as instituições de direito privado, por ser uma das bases da família, que é a

pedra angular da sociedade e o define como “(...) o vínculo jurídico entre homem e a

mulher que visa o auxílio mútuo material e espiritual, de modo que haja uma

integração fisiopsíquica e a constituição de uma família.”

Na definição de Pereira apud WALD123 “o casamento é o ato

solene pelo qual duas pessoas de sexo diferente se unem para sempre sob a

promessa recíproca de fidelidade no amor e da mais estreita comunhão da vida.”

Destacam-se na definição de Pereira a solenidade do ato,

sendo o casamento aberto ao público e a vontade dos nubentes que se

comprometem em serem fiéis e terem uma vida em comum.124

No Código Civil, em seu art. 1.511, ficou disposto que “O

casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos

e deveres dos cônjuges.”125

Ao se definir o casamento como relação jurídica que deriva do

negócio jurídico matrimonial, diz-se que o casamento é ato de autonomia privada. A

autonomia privada corresponde “a ordenação auto-formulada, que é a zona

reservada do direito privado”.126 Desta forma, verifica-se os efeitos do casamento no

âmbito do Direito das Obrigações, no domínio das relações patrimoniais.127

O princípio da autonomia privada está presente em matéria matrimonial na liberdade de casar-se, na liberdade de escolha do

122

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 39.

123 PEREIRA, Lafayette Rodrigues. Direito de Família. In: WALD, Arnoldo. Curso de direito civil brasileiro. O novo direito de família. 12 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 66.

124 WALD, Arnoldo. Curso de direito civil brasileiro. O novo direito de família. 12 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 66.

125 BRASIL. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: ‹http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm› Acesso em: 28 set. 2010.

126 PINTO, C. A. Mota. Teoria geral do direito civil. In: OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de. MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de família. p. 126.

127 OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de. MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de família. p. 126.

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cônjuge, e também vistas as coisas pelo ângulo reverso, na liberdade de não se casar.128

Das várias conceituações acima, nota-se que o matrimônio é

encarado mais sob o aspecto moral do que jurídico, no entanto não se pode afirmar

que o compromisso assumido pelo homem e pela mulher de viverem juntos possui

um caráter de perpetuidade, o que, aliás, depreende-se do próprio Código Civil, no

art. 1.566: “São deveres de ambos os cônjuges: I – fidelidade recíproca; II – vida em

comum, no domicílio conjugal; III – mútua assistência; IV – sustento, guarda e

educação dos filhos; V – respeito e consideração mútuos.”129

RIZZARDO130 comenta sobre esse aspecto:

Não se percebe o caráter de indissolubilidade. Mas a moral e os costumes, o interesse social e a ordem pública recomendam, em princípio, a contratação com o intuito de perpetuidade, ou que se imprima nele o que os franceses denominam de „espirit de perpetuité‟. É conveniente, por razões de estabilidade social, que as uniões se mantenham firmes e perenes, com vistas a assegurar uma sólida estrutura na criação e educação dos filhos.

A idéia de casamento não pode ser imutável, pois é um dos

principais institutos do direito de família. Além disso, o matrimônio tem sua

importância como negócio jurídico formal que vai desde as formalidades anteriores a

celebração, até os efeitos que ocorrem na relação cotidiana dos cônjuges, os

deveres recíprocos, a criação, a assistência material e espiritual recíproca e da prole

etc.131

2.4 CONCEITO DE CONCUBINATO

Paralelamente ao casamento contrapõe-se a união livre que

também gera efeitos jurídicos. O fato é que preexistente ao casamento existia a

128

BENABENT. A. El negocio jurídico del derecho de família. In: OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de. MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de família. p. 126.

129 BRASIL. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: ‹http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm› Acesso em: 28 set. 2010.

130 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. Lei nº 10.406, de 10.01.2002. 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 17.

131 VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 25.

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família, um fato natural. Logo depois, a sociedade institui o casamento como regra

de conduta, o que ocasiona a problemática da união conjugal sem casamento.132

Durante muito tempo, o legislador considerou o casamento

como única forma de constituição familiar, excluindo efeitos jurídicos a união livre.

Essa resistência ao reconhecimento da união sem casamento se deu por causa da

forte influência da igreja católica.

No entanto, apesar da inexistência de regras que regulassem

esse tipo de união, a doutrina começou a tecer fortes considerações dos direitos dos

concubinos, o que foi fortalecido pela jurisprudência e logo depois vindo a alterar a

legislação.

Trata-se de anotações feitas trazendo o concubinato como

situação de vida em comum de casais não casados, conforme demonstra MUNIZ133:

Como o casamento, o concubinato é uma comunhão de vida em que dominam essencialmente relações de sentimentos e de interesses da vida em conjunto que se estendem ao campo econômico (por exemplo, com o sustento material recíproco, com a colaboração de um concubinato no exercício da profissão ou indústria do outro, com a construção de uma casa para habitação, com a organização e exploração de uma indústria ou comércio). Essas relações traduzem o estreito e íntimo vínculo de coesão entre os concubinos.

Para OLIVEIRA134:

Entende-se por concubinato a união entre o homem e a mulher, com o intuito de vida em comum, sem as formalidades do casamento. Corresponde à chamada “união livre” ou informal, porque sem as peias da celebração oficial e dos regramentos estabelecidos na lei para as pessoas casadas. Esse é o sentido amplo da palavra, abrangendo tanto as situações de vida em comum de pessoas desimpedidas, isto é, solteiras, separadas, divorciadas, como as uniões paralelas ao casamento, ou adulterinas (“triângulo amoroso”).

Concubinato apresenta o sentido etimológico de comunhão de

leito: cum (com) cubare (dormir).135

132

VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 36.

133 OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de. MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de família. p. 79.

134 OLIVEIRA, Euclides de. União estável. Do concubinato ao casamento. p. 73.

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Como anota Bittencourt, apud VENOZA136:

(...) união livre e concubinato são idéias semelhantes, abrangendo uma e outra relação entre homem e mulher fora do matrimônio, citando Savatier, para quem as expressões são uma questão de mero estilo, nobre para a união livre, e menos nobre para o concubinato.

Há que se considerar que existem denominações específicas

de concubinato puro e concubinato impuro, para distinguir as duas situações de vida

comum.

Adota esse entendimento AZEVEDO137, quando diz que

existem duas espécies de concubinato. Puro seria o concubinato que se apresenta

como “união duradoura, sem casamento, entre homem e mulher, constituindo-se a

família de fato, sem qualquer detrimento da família legítima”. Exemplifica com os

casos de união de solteiros, viúvos, separados judicialmente ou de fato, por mais de

um ano, “desde que respeitada outra união concubinária”. Por outro lado, consigna

que “o concubinato impuro se for adulterino, incestuoso ou desleal (relativamente a

outra união de fato), como o de um homem casado ou concubinado que mantenha,

paralelamente ao seu lar, outro de fato.” Conclui que o primeiro, “concubinato puro

ou concubinato simplesmente, deve merecer, por parte do Estado, completa

proteção e regulamentação legal, já o segundo, concubinato impuro ou

concubinagem, não deve merecer apoio nos órgãos públicos e, mesmo, da

sociedade”. Ressalva, porém, que sempre haverá efeito jurídico em favor do

concubino de boa-fé, “como acontece, analogicamente, com o casamento putativo, e

para evitar-se locupletamento ilícito”.

Conforme pode ser visto, o concubinato puro, também

conhecido como união estável foi reconhecido na Constituição Federal de 1988

como entidade familiar. Isso se deve porque a qualificação impura seria igualmente

aplicável aos que mantém mais de uma união de fato, em face da deslealdade para

o primeiro companheiro.

135

VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 37.

136 BITTENCOURT, Edgard de Moura. Alimentos. VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 37.

137 AZEVEDO, Álvaro Villaça. Estatuto da família de fato. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2001. p. 211.

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O Código Civil Brasileiro, em seu artigo 1.727 descreve o

concubinato: “As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de

casar, constituem concubinato.”138

Trata-se do denominado concubinato impuro.

Conceitua GONÇALVES139:

A expressão “concubinato” é hoje utilizada para designar o relacionamento amoroso envolvendo pessoas casadas, que infringem o dever de fidelidade (adulterino). Configura-se quando ocorrem “relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar” (CC, art. 1.727). Denominado “concubinato impuro”, não enseja a configuração de união estável, pois o objetivo desta é a constituição de família.

Apesar do Código Civil ter tratado do concubinato, a norma

restou falha, conforme afirma DIAS140:

A palavra concubinato carrega consigo uma estigma e revela relacionamento alvo de preconceito. Historicamente, sempre traduziu relação escusa e pecaminosa, quase uma depreciação moral. Pela primeira vez, é registrada em um texto legislativo (CC 1.727), tendo o legislador procurado diferenciar o concubinato da união estável. Mas não foi feliz. Certamente, a intenção era estabelecer uma distinção entre união estável e união paralela, chamada doutrinariamente de concubinato adulterino, mas para isso faltou coragem ao legislador. A norma restou incoerente e contraditória. Simplesmente parece dizer – mas não diz – que as relações paralelas não constituem união estável. Pelo jeito, a pretensão é deixar as uniões “espúrias” fora de qualquer reconhecimento e a descoberto de direitos.

No texto legal não foi feita sequer remissão ao direito das

obrigações, para que seja feita analogia com as sociedades de fato. A lei condena a

invisibilidade e nega proteção jurídica às relações que desaprova, sem atentar que

isso pode causar injustiças, dando margem ao enriquecimento ilícito de um dos

parceiros.141

138

BRASIL. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: ‹http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm› Acesso em: 28 set. 2010.

139 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de família. p. 191.

140 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 149.

141 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 149.

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2.5 DIFERENÇA ENTRE O CASAMENTO E O CONCUBINATO

Depois do reconhecimento do concubinato puro (unia estável)

pela Constituição Federal em seu art. 226 § 3º da Constituição Federal, aspectos

distintos têm sido notados quanto à diferenciação entre união estável (concubinato

puro) e casamento.

Destarte, a natureza jurídica de ambos os institutos são

diferentes: enquanto o casamento é negócio jurídico, a união estável é fato jurídico.

Esse aspecto fica bem evidente no tratamento legislativo. Por isso, já se decidiu, por

exemplo, que:

(...) a convivência concubinária não transmite ao convivente o estado de casado, não sendo impediente ao casamento com outra pessoa, inocorrendo a hipótese prevista no CCB, art. 183, VI.142

Quanto à prova dessas uniões, tem-se que o casamento

celebrado no Brasil prova-se pela certidão de nascimento. Igual prova, de natureza

registral exigi-se do estrangeiro, perante a autoridade consular do Brasil. 143

Já a união estável é provada pela sua existência, é exigível a

notoriedade dessa relação, conforme explica GAMA144:

A união extramatrimonial, fonte originadora de família, dotada de estabilidade e representatividade do único vínculo dos partícipes, deve se revestir de notoriedade, no sentido de ser reconhecida socialmente, ainda que por um grupo restrito, como a união de um homem e uma mulher como se casados fossem. Tal característica sempre foi apontada como requisito pelos doutrinadores. De qualquer forma, independendo de sua consideração como característica ou requisito, o importante é identificar a notoriedade com o sentido oposto ao clandestino do oculto.

Nota-se no citado acima uma das peculiaridades do

concubinato impuro, que é a clandestinidade, o querer ocultar a relação. Ao contrário

da união estável, o impuro é uma relação dissimulada.

142

BELO HORIZONTE. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Indeferimento de pedido de apelação cível nº 111.669/8. Relator: Corrêa Martins. 18 mar. 1999. VENOZA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. p. 47.

143 OLIVEIRA, Euclides de. União estável. Do concubinato ao casamento. p. 56.

144 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. O companheirismo. Uma espécie de família. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p. 135.

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Ainda, acerca de tal característica OLIVEIRA145 atribui a

designação do vocábulo publicidade:

No concubinato qualificado, os concubinos, tais quais os esposos, não escondem seu relacionamento da sociedade em que vivem; pelo contrário, freqüentam-na, ostentando sua fática, como marido e mulher. Convivência pública é aquela conhecida de todos; é a convivência daqueles que vivem em união estável e manifesta, notória. Essa convivência se dá em público, não é uma convivência secreta.

O nome é um dos direitos mais essenciais da personalidade146.

No casamento, o Código Civil faculta a qualquer dos noivos acrescer, ao seu, o

sobrenome do outro, conforme dispõe o §1º do art. 1.565:

Art. 1.565. Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família.

§1º Qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobrenome do outro.147

No entanto, o Código Civil não previu a possibilidade de

alteração de nome aos que vivem em união estável. Destarte, a Lei de Registros

Públicos em seu § 2º, art. 57 permite:

Art. 57. Qualquer alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandado e publicando-se a alteração pela imprensa.

(...)

§ 2º. A mulher solteira, desquitada ou viúva, que viva com homem solteiro, desquitado ou viúvo, excepcionalmente e havendo motivo ponderável, poderá requerer ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o patronímico de seu companheiro, sem prejuízo dos apelidos próprios, de família, desde que haja

145

OLIVEIRA, J. M. Leoni de. Alimentos e sucessão no casamento e na união estável. 2 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1996. p. 109.

146 MORAES, Maria Cecília Bondin de. Sobre o nome da pessoa humana. In: NEGREIROS, Teresa. Fundamentos para um interpretação constitucional do princípio da boa-fé. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p. 39.

147 BRASIL. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: ‹http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm› Acesso em: 28 set. 2010.

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impedimento legal para o casamento, decorrente do estado civil de qualquer das partes ou de ambas.148

A possibilidade é somente de acréscimo, não podendo a

companheiro substituir seu sobrenome pelo do varão. A autorização judicial depende

também de um motivo ponderável e que um ou ambos estejam impedidos de casar

em decorrência do estado civil. Por isso, é imprescindível que ao menos um dos

conviventes seja separado de fato ou judicialmente para a mulher fazer uso dessa

faculdade legal.149

Quanto ao direito sucessório tem direito o cônjuge sobrevivente

a sua parte da herança, conforme assegurado no art. 1.829, inciso I do Código Civil:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime de comunhão universal de bens, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime de comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;150

Diferentemente do direito que tem o cônjuge, o concubino não

possui legitimidade sucessória, este é excluído da sucessão nos termos do art.

1.801, inciso III do Código Civil:

Art. 1.801. Não podem ser nomeados herdeiros nem legatários:

(...)

III – o concubino do testador casado, salvo se este, sem culpa sua, estiver separado de fato do cônjuge há mais de cinco anos;151

O legislador procurou no artigo acima proteger a união

matrimonial, evitando o enriquecimento ilícito do concubino em detrimento do

cônjuge e dos demais herdeiros necessários.

148

BRASIL. Lei n.º 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Lei de Registros Públicos. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6015.htm Acesso em: 28 set. 2010.

149 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 118.

150 BRASIL. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: ‹http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm› Acesso em: 28 set. 2010.

151 BRASIL. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: ‹http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm› Acesso em: 28 set. 2010.

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Outra diferença quanto ao casamento é que no concubinato a

falta do decurso do lapso temporal induz à constatação de que os partícipes da

relação ainda não são companheiros, faltando a característica da estabilidade.152

Conforme demonstrado, as diferenciações entre o casamento e

o concubinato são bastante relevantes, principalmente no que se refere ao

concubinato impuro, visto que esse tipo de relação informal entre pessoas de sexo

diferentes, com nítida conotação sexual, não configura união estável, o que lhe veda

direitos, por não ser reconhecido como entidade familiar e não ter a proteção do

Direito.153

Todavia, àquele que vive do modo que a lei desaprova,

simplesmente, não lhe advém qualquer responsabilidade, encargo ou ônus.154

2.6 A IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO SIMULTÂNEO DO

CASAMENTO E CONCUBINATO

A Constituição integrou no conceito de entidade familiar o que

chamou de união estável e acabou por delegar à legislação infraconstitucional sua

regulamentação.

Urge, todavia, que este não se conserve em sigilo. O segredo

tem como conseqüência o desconhecimento do fato e, posteriormente a dificuldade

de sua comprovação em juízo. A clandestinidade de um relacionamento como esse

é o concubinato.155

Ao se estudar o concubinato, o que se observa é a referência

quanto a impossibilidade de seu reconhecimento quando pelo menos um dos

partícipes é casado, haja vista se considerar que fere o sistema monogâmico de

família e de casamento.

152

GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. O companheirismo. 1998. p. 488.

153 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. O companheirismo. 1998. p. 488.

154 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 152.

155 MONTEIRO, Washigton de Barros. Curso de direito civil. Direito de família. 34 ed. v.2. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 19.

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DIAS156 entende que a monogamia não foi instituída em favor

do amor, mas como mera convenção decorrente do triunfo da propriedade privada

sobre o estado condominal primitivo e ainda reconhece que tal princípio autoriza que

se chegue a resultados desastrosos, não concordando com o não reconhecimento

do concubinato:

(...) quando há simultaneidade de relações, simplesmente deixar de emprestar efeitos jurídicos a um ou, pior, a ambos os relacionamentos, sob o fundamento de que foi ferido o dogma da monogamia, acaba permitindo o enriquecimento ilícito exatamente do parceiro infiel. Resta ele com a totalidade do patrimônio e sem qualquer responsabilidade para com o outro. Essa solução que vem sendo apontada pela doutrina e aceita pela jurisprudência afasta-se do dogma maior de respeito à dignidade da pessoa humana, além de chegar a um resultado de absoluta afronta à ética.

Ao contrário, PEREIRA157 ensina:

(...) o Direito, através das Leis n. 8.971/94 e n. 9.278/96 e do Novo Código Civil, não protege o concubinato adulterino. A amante, amásia - ou qualquer nomeação que se dê à pessoa que, paralelamente ao vínculo de casamento, mantém uma outra relação, uma segunda ou terceira... -, ela será sempre a outra, ou o outro, que não tem lugar em uma sociedade monogâmica. Alguns autores preferem nomear essas relações como "concubinato impuro", em oposição a "concubinato puro", ou "honesto" que é quando não há impedimento legal para o estabelecimento da relação. É um paradoxo para o Direito proteger as duas situações concomitantemente. Isto poderia destruir toda a lógica do nosso ordenamento jurídico, que gira em torno da monogamia.

Sob esse ponto de vista, o casamento sempre deve prevalecer

sobre as relações concubinárias. Todavia, há autores que reconhecem, apenas,

efeitos patrimoniais às relações concubinárias no âmbito do direito das obrigações,

como sociedade de fato.

Esse é o posicionamento de GAMA158, "é imperioso reconhecer

que mesmo de tais uniões concubinárias advêm efeitos que o Direito não pode

desconhecer, por aplicação dos princípios tradicionalmente reconhecidos (...)".

156

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 51-52.

157 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Concubinato de união estável. 2001. p.63.

158 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. O companheirismo. 1998. p. 488.

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Apesar do reconhecimento do direito do concubinário quanto

aos efeitos patrimoniais, destaca-se o acórdão do Superior Tribunal de Justiça da

relatora Ministra Nancy Andrighi, que demonstra o valor do casamento e o não

reconhecimento da simultaneidade com o concubinato.

Discute-se, no processo em análise, a possibilidade de se ver caracterizada sociedade de fato na qual o concubino era, ao mesmo tempo da relação concubinária, casado com outra mulher. Necessário, portanto, que se faça a delimitação entre dois institutos diversos: o casamento e o concubinato. O casamento tem sido conceituado como 'o contrato de direito de família que regula a vida em comum (não só a união sexual) entre o varão e a mulher' (Pontes de Miranda, Trat., 4ª ed., t. VII, § 765, n. 8, p. 210). É visto ainda como 'o mecanismo mais adequado de proteção jurídica da Família' (Nelson Nery Jr., Código Civil Anotado, 2ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 692). De outra banda, a relação concubinária pode ser entendida como aquela que abrange relacionamentos e convivências à margem do casamento e que vulneram os impedimentos existentes para a concretização de nova relação matrimonial, 'como as que existem em quebra do dever de fidelidade, quando uma pessoa casada, por exemplo, mantém vida concubinária simultaneamente com sua convivência conjugal' (Álvaro Villaça Azevedo, Do concubinato ao casamento de fato, Revista do Advogado, n. 25, 1988, p. 14). Em tais situações, entende o doutrinador, não deve a relação concubinária surtir qualquer efeito. Volvendo às razões do recurso especial, vê-se que o recorrente erige como dispositivo legal violado o art. 1º da Lei n.º 9.278/96 (correspondência: art. 1723, caput, do CC/02), que versa sobre a união estável. Diante dos conceitos supramencionados, e da perspectiva adotada pelo CC/02, se a pessoa casada tiver rompido a sociedade conjugal, de fato, ou judicialmente (art. 1.723, § 1º), não se obsta a constituição da união estável. Contudo, se a relação entre um homem e uma mulher se der sem a observância da proibição contida no art. 183, VI, do CC/16 (correspondência: art. 1.521, VI, CC/02), sem que tenha havido separação judicial ou de fato no anterior casamento do impedido, não restará configurada a hipótese de união estável, mas de mero concubinato (art. 1.727, CC/02) - caso concreto. Consubstanciada a existência de concomitante casamento e concubinato, impende fixar-se a preponderância legal de um dos institutos. Emerge, tanto do plano legal subjacente às razões acima esposadas, quanto do plano social, segundo o qual o legislador conferiu especial deslinde ao casamento, notadamente no que tange à salvaguarda da Família, base da sociedade e merecedora de fundamental proteção do Estado, a prevalência do vínculo matrimonial diante da figura do concubinato a ele simultâneo, reforçando-se tal preponderância quando a relação concubinária vem alicerçada em impedimento para configuração de nova relação conjugal. Desse modo, não há que se falar em violação ao art. 1º da Lei n.º 9.278/96, primeiro, pela não configuração de hipótese de união estável, contemplada pela referida lei, segundo, porque mesmo ante o possível reconhecimento

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da relação concubinária, seus efeitos não poderiam prevalecer frente aos do casamento pré e coexistente. (negritou-se).

Retira-se do julgado acima o valor dado ao casamento como

entidade familiar, principalmente no que tange a salvaguarda da família, enquanto

que o concubinato é união clandestina entre as pessoas impedidas legalmente de

casar.

Relevante anotar que o que se quer é a proteção da família

legalmente constituída, prevalecendo-se o interesse do cônjuge, cujo matrimônio

não foi dissolvido.

Por isso, inviável o reconhecimento da simultaneidade do

casamento e concubinato, uma vez que tal providência eleva o concubinato a nível

de proteção mais sofisticado do que o existente na união estável e no casamento.

Além disso, esse regramento irá refletir na divisão da pensão,

caso o titular venha a falecer, tema que será abordado no próximo capítulo.

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CAPÍTULO 3

CONCORRÊNCIA ENTRE ESPOSA E CONCUBINA PARA FINS

PREVIDENCIÁRIOS

3.1 BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS

Os benefícios previdenciários previstos pelo Regime Geral de

Previdência Social – RGPS possuem características distintas e regras próprias de

concessão, que serão analisados a seguir, com uma breve síntese.

Para esclarecer melhor o tema, vale conceituar benefícios que

de acordo com TAVARES159:

São prestações pecuniárias, devidas pelo Regime Geral da Previdência Social aos segurados, destinados a prover-lhes a subsistência, nas eventualidade que os impossibilite de, por seu esforço, auferir recursos para isto, ou reforçar-lhes os ganhos para enfrentar encargos de família, ou amparar, em caso de morte ou prisão, os que dele dependiam economicamente.

Para usufruir dos benefícios previdenciários há que se atentar

as condições previstas em lei.

3.1.1 Aposentadoria no RGPS

A aposentadoria é a prestação por excelência da Previdência

Social, juntamente com a pensão por morte. Ambas substituem, em caráter

permanente (ou pelo menos duradouro), os rendimentos do segurado e asseguram

sua subsistência e daqueles que dele dependam.160

159

TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário. Regime geral de previdência social e regimes próprios de previdência social. 10 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2008. p. 113.

160 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. 9 ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2008. p. 515.

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A aposentadoria é garantia constitucional, compreendida no

art. 201 da Constituição Federal de 1988, com nova redação dada pela Emenda

Constitucional n. 20/98, nos seguintes termos:

Art. 201. omissis;

§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:

I – trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;

II – sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, reduzido em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam a suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.

§ 8º Os requisitos a que se refere o inciso I do parágrafo anterior serão deduzidos em cinco anos, para o professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio.161

No texto legal acima, estão compreendidas as aposentadorias

por idade, tempo de contribuição e especial que de acordo com o art. 181-B do

Decreto n. 3.048/99 (redação dada pelo Decreto n. 3.265/99) são irrenunciáveis e

irreversíveis.162

A aposentadoria por invalidez é tratada nos arts. 42 e seguintes

da Lei n. 8.213/91. Será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de

auxílio doença, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o

exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto

permanecer nesta condição.163

A aposentadoria por tempo de contribuição é produto da

Emenda Constitucional nº 20/98, que a previu no art. 201, §7º, I da Constituição

Federal e teve origem no malogro do projeto em criar uma aposentadoria exigindo

cumulativamente os requisitos de idade e de tempo de contribuição. Será sempre

161

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: ‹http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm› Acesso em: 28 set. 2010.

162 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. p. 516.

163 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. 2 ed. São Paulo: LTr, 2007. p. 244.

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paga no valor integral de cem por cento do salário-de-benefício, sem admitir

proporcionalidade.

Conforme TAVARES164 explica, a aposentadoria por tempo de

contribuição é devida:

Devida ao segurado que completar trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se do sexo feminino. Para os professores que comprovem exclusivamente tempo de efetivo exercício em função de magistério na educação infantil, no ensino fundamental e no ensino médio como docente em sala de aula, o requisito será de trinta anos para o homem e de vinte e cinco anos para a mulher.

A aposentadoria por idade é regulada no art. 201 §7º, II, da

Constituição, que dispõe ser assegurada aposentadoria no regime de previdência

social, nos termos da lei, àqueles que completarem 65 anos de idade, se homem, e

60 anos de idade, se mulher, reduzidos em cinco anos o limite para os trabalhadores

rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de

economia familiar, estes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador

artesanal.165

A matéria é regulamentada no art. 48 e seguintes da Lei n.

8.213/91. Está disposto que é devida ao segurado que completar 65 anos de idade,

se homem, e 60, se mulher. Ao se falar de trabalhadores rurais, respectivamente

homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos

incisos VI e VII do art. 11 da mesma lei, o limite de idade é reduzido para 60 e 55

anos. O trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício da atividade rural,

ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento

do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à

carência do benefício pretendido.166

Quanto à aposentadoria especial que é uma espécie de

aposentadoria por tempo de contribuição, com redução do tempo necessário a

inativação, é o benefício previdenciário realizado em condições prejudiciais à saúde

164

TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário. p. 135.

165 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. p. 250.

166 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. p. 250.

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ou a integridade física do segurado, de acordo com a previsão da lei. Trata-se de um

benefício de natureza extraordinária, tendo por objetivo compensar o trabalho do

segurado que presta serviços em condições adversas à sua saúde ou que

desempenha atividades com riscos superiores aos normais.167

MARTINS distingue a aposentadoria especial da aposentadoria

por tem de contribuição:

Distingui-se a aposentadoria especial da por tempo de contribuição, pois a primeira é extraordinária. Na aposentadoria especial o tempo necessário é de 15, 20 ou 25 anos de trabalho em condições prejudiciais à saúde do segurado, enquanto na por tempo de serviço é necessário que a segurada tenha trabalhado pelo menos 30 anos e o segurado, 35. Difere, também, a aposentadoria especial da aposentadoria por invalidez, pois nesta o fato gerador é a incapacidade para o trabalho e na aposentadoria especial esse fato inexiste. A aposentadoria especial pressupõe agressão à saúde do trabalhador por meio de exposição a agentes nocivos. A segunda decorre de incapacidade e insusceptibilidade de reabilitação do segurado. O aposentado de forma especial não fica inválido para o trabalho, apenas não pode exercer atividade que o exponha a agentes nocivos à saúde.168

A aposentadoria especial está regulada no art. 57 da Lei nº

8.213/91.

3.1.2 Pensão por morte

A pensão por morte é o benefício da previdência social devido

aos dependentes do segurado em função da morte deste. Este é o benefício mais

importante para o estudo apresentado.

Em sentido amplo, pensão é uma renda paga a pessoa durante

toda a sua vida.

167

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. Custeio da seguridade social. Benefícios – Acidente do trabalho. Assistência social – Saúde. 25 ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 357.

168 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. Custeio da seguridade social. Benefícios – Acidente do trabalho. Assistência social. p. 358.

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Para Orlando, apud MARTINS, “(...) pensão é uma “renda

vitalícia ou temporária” que o Estado ou o particular se obriga a pagar, mensal ou

anualmente, a determinada pessoa em decorrência de serviços prestados.”169

No conceito acima, salienta-se que a pensão pode ser paga

tanto pelo Estado, como pelo particular. Identifica-se que “pensão” foi tratado no seu

sentido amplo, abrangendo tanto a espécie alimentícia no Direito Civil e a pensão

por morte do Direito Previdenciário.170

Não é necessário que o sujeito esteja desempenhando

atividade remunerada sujeita à filiação ao RGPS no momento do óbito; mas, sim,

que mantenha a qualidade de segurado. Assim, pode estar desempregado, desde

que cumprida as condições legais.171

Sendo o óbito presumido, a pensão será provisória.

Reaparecendo o segurado, cessará imediatamente, não sendo obrigados os

dependentes da reposição dos valores recebidos, salvo má-fé.172

No que tange a renda mensal do benefício, se o segurado

falecer quando aposentado, a renda será de cem por cento do valor da

aposentadoria. Neste caso, haverá mera conversão desta pensão. Estando ativo,

será de cem por cento do valor da aposentadoria por invalidez a que teria direito, se

a esta fizesse jus, ou seja, cem por cento do salário-de-benefício.173

O valor da pensão por morte não pode ser inferior ao valor do

salário mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário-de-contribuição.174

169

ORLANDO, Pedro. Novíssimo dicionário jurídico brasileiro. In: MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. Custeio da seguridade social. Benefícios – Acidente do trabalho. Assistência social. p. 366.

170 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. Custeio da seguridade social. Benefícios – Acidente do trabalho. Assistência social. p. 366.

171 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. p. 282.

172 TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário. p. 167.

173 TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário. p. 171.

174 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. p. 284.

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3.1.3 Auxílio-doença

O auxílio doença é o benefício concedido em virtude de

incapacidade temporária, não estando apto a suas atividades habituais, ficando o

segurado suscetível de recuperação, desde que necessite afastar-se de sua

atividade habitual por mais de quinze dias.175

De acordo com VIANNA176:

O auxílio-doença será devido ao segurado que ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos. Não é devido o benefício ao segurado que se filiar ao RGPS já portador da doença ou da lesão invocada como causa para a sua concessão, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão. O período inicial de 15 dias é denominado „período de espera‟. É disciplinado nos arts. 59 e seguintes da Lei n. 8.213/91.

Conforme citado acima, o benefício é devido ao incapacitado

temporariamente as suas atividades habituais e não àquele que se filia ao RGPS já

possuidor da doença ou lesão que permita a concessão.

Tal benefício é devido a partir do décimo sexto dia de

afastamento para os empregados e desde a data do início da incapacidade para os

segurados empregados domésticos. No entanto, quando requerido após trinta dias

da incapacidade, em qualquer caso, este será contado a partir da data do

requerimento, a não ser que fique comprovado pelo segurado por meio de atestado,

que a previdência social encontrava-se ciente da internação hospitalar ou do

tratamento ambulatorial do segurado.177

Durante os quinze primeiros dias do afastamento da atividade

por motivo de doença, a empresa será a responsável em pagar o salário integral do

empregado, ocasião em que o contrato de trabalho ficará interrompido.178

175

TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário. p. 114.

176 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. p. 274.

177 TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário. p. 114.

178 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. Custeio da seguridade social. Benefícios – Acidente do trabalho. Assistência social. p. 317.

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3.1.4 Auxílio-reclusão

O auxílio-reclusão é devido nas mesmas condições da pensão

por morte, não é devido ao segurado, mas, sim aos seus dependentes, enquanto

aquele estiver recolhido à prisão que não receber remuneração da empresa nem

estiver em gozo de auxílio-doença ou aposentadoria. O auxílio-doença é devido aos

dependentes do segurado de baixa renda.179

Sobre a ratio legis deste benefício, esclarece Russomano,

apud, CASTRO180:

O criminoso, recolhido à prisão, por mais deprimente e dolorosa que seja sua posição, fica sob a responsabilidade do Estado. Mas, seus familiares perdem o apoio econômico que o segurado lhes dava e, muitas vezes, como se fossem os verdadeiros culpados, sofrem a condenação injusta de gravíssimas dificuldades.

Inspirado por essas idéias, desde o início da década de 1930, isto é, no dealbar da fase de criação, no Brasil, dos Institutos de Aposentadoria e Pensões, nosso legislador teve o cuidado de enfrentar o problema e atribuir ao sistema de Previdência Social o ônus de amparar, naquela contingência, os dependentes do segurado detento ou recluso.

O auxílio reclusão está previsto no art. 201, VI da Constituição

Federal, que teve nova redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/98, para

limitar a concessão a beneficiários de segurados que possuem baixa renda.

A data de início do benefício será o momento do efetivo

recolhimento do segurado à prisão, se requerido até trinta dias depois deste, ou na

data do requerimento, se posterior.181

3.1.5 Salário-família

O salário-família tem previsão no art. 7º, XII, da Constituição

Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/98, que rege ser

179

CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. p. 578.

180 RUSSOMANO. Mozart Victor. Curso de direito do trabalho. 6 ed. Curitiba: Juruá, 1997. In: CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. p. 578.

181 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. p. 288.

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direito dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de

sua condição social, salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de

baixa renda nos termos da lei.182

A finalidade deste benefício é bem definida por Ruprecht, apud,

CASTRO183: “a constituição ou o desenvolvimento normal da família, com o aporte

de uma contribuição regular e permanente para a manutenção das pessoas cujo

cargo é assumido pelo chefe de família”.

O salário-família é concedido por cotas, de modo que o

segurado perceba tantas cotas quantas sejam os filhos, enteados ou tutelados, com

idade até 14 anos incompletos, ou inválidos, com qualquer idade.184

3.1.6 Salário-maternidade

Nas palavras de VIANNA185:

Salário-maternidade é o benefício previdenciário pago pelo INSS à segurada – qualquer segurada – em decorrência do nascimento de filho, com o objetivo de garantir o salário durante o seu afastamento do trabalho, com duração de 120 dias, com início no período entre 28 dias antes do parte e a data de ocorrência deste (...).

O art. 71 da Lei nº 8.213/91 prevê o direito do salário-

maternidade para a segurada da Previdência Social. Inclui qualquer segurada, tanta

a empregada (urbana, rural ou temporária), como a empregada doméstica,

trabalhadora avulsa, contribuinte individual (autônoma, eventual, empresária),

segurada especial e facultativa. É indevido o salário-maternidade a outras

seguradas, que não sejam da Previdência Social, por falta de previsão legal.186

182

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm› Acesso em: 19 out. 2010.

183 RUPRECHT, Alfredo J. Direito da seguridade social. São Paulo: LTr, 1996. CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. p. 587.

184 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. p. 587.

185 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. p. 278/279.

186 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. Custeio da seguridade social. Benefícios – Acidente do trabalho. Assistência social. p. 374.

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O salário-maternidade tem início com o afastamento do

trabalho pela segurada, o qual é determinado com base em atestado médico ou

certidão de nascimento do filho. Compete à interessada instruir o requerimento do

benefício com os atestados médicos necessários.187

3.1.7 Abono anual

O abono anual é devido ao segurado ou dependente que

durante o ano, recebeu auxílio-doença, auxílio-acidente, aposentadoria, salário-

maternidade, pensão por morte ou auxílio-reclusão.188

É um direito dos beneficiários da Previdência Social previsto no

art. 201, § 6º, da Constituição Federal e regulado pelo art. 40 da Lei n. 8.213/91,

bem como pelo art. 120 do Decreto n. 3.048/99.189

O abono anual é pago no mês de dezembro de cada ano ou na

data da cessação dos benefícios.

O valor é calculado da mesma forma que a gratificação de

Natal dos trabalhadores: corresponde à renda mensal de dezembro, se o

beneficiário tiver sido mantido por doze meses, dentro do mesmo ano. Será

proporcional ao valor da renda mensal da data de cessação, se o benefício tiver sido

mantido por período igual ou superior a quinze dias a inferior a doze meses.190

3.1.8 Benefício assistencial ao idoso e ao deficiente – LOAS

O benefício assistencial, na forma de prestação continuada,

está previsto no art. 203, V, da Constituição e corresponde à garantia de um salário

mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não

possuir meio de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.

187

CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. p. 593.

188 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. Custeio da seguridade social. Benefícios – Acidente do trabalho. Assistência social. p. 394.

189 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. p. 597.

190 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. p. 597.

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O aludido benefício não pode ser cumulado pelo beneficiário

com qualquer outro, salvo o da assistência médica.191

Além disso, é intransferível, não gerando direito a pensão por

morte a herdeiros ou a sucessores. Entretanto, o valor não recebido em vida pelo

beneficiário será pago aos seus herdeiros diretamente pelo INSS.192

3.2 ASPECTOS LEGAIS DA PENSÃO PREVIDENCIÁRIA

A pensão por morte tem previsão legal no art. 201, I e V da

Constituição Federal193:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei a:

I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada;

(...)

V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes observado o disposto no §2º;

Além disso, esse benefício está regulamentado nos arts. 74 e

seguintes da Lei nº 8.213/91194.

Trata-se de prestação de pagamento continuado, que substitui

a remuneração do segurado falecido. Por isso, o direito dos beneficiários é

irrenunciável.195

O art. 74, da Lei 8.213/91, regula a data do início de benefício:

191

VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. p. 39.

192 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. p. 602.

193 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm› Acesso em: 19 out. 2010.

194 BRASIL. Lei 8.213, de 24 de julho de 1991. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8213cons.htm› Acesso em: 19 out. 2010.

195 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. p. 562.

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Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto de dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:

I – do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste;

II – do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;

III – da decisão judicial, no caso de morte presumida.

Uma importante observação há que se fazer, quando a pensão

for requerida após o prazo de trinta dias, em que a data de início do benefício será a

data do requerimento, pois não será devida qualquer importância relativa a período

anterior.196

Quanto ao valor da pensão, o art. 75, da Lei 8.213/91,

menciona que o valor da pensão será de cem por cento do valor da aposentadoria

que o segurado recebia ou daquela de que teria direito se estivesse aposentado por

invalidez na data de seu falecimento, observado o disposto no art. 33 da referida Lei.

O legislador ao fixar o valor do benefício o fez de forma clara e

concisa.

No que tange a cessão do benefício esse se dará, conforme

ensina MARTINS197:

a. pela morte do pensionista;

b. para o pensionista menor de idade, pela emancipação ou ao completar 21 anos, salvo se for inválido. A pensão por morte, devida ao filho de até 21 anos de idade, não se prorroga pela pendência do curso universitário (Súmula 37 do Juizado Especial Federal);

c. para o pensionista inválido, pela cessação da invalidez, verificada em exame médico-pericial, não se extinguindo a respectiva cota se confirmada a invalidez.

A pensão se extinguirá com a extinção da parte do último

pensionista.

196

CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. p. 568.

197 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. Custeio da seguridade social. Benefícios – Acidente do trabalho. Assistência social. p. 370.

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3.3 A DEPENDÊNCIA PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS

A dependência para fins previdenciários está devidamente

regulada pela Lei 8.213/91, sendo que os beneficiários, ou seja, os sujeitos ativos da

relação jurídico-previdenciária do Regime Geral de Previdência Social classificam-se

como segurados e dependentes, conforme o art. 10 da referida Lei.

Os segurados dividem-se em obrigatórios e facultativos. São

segurados obrigatórios o empregado, empregado doméstico, trabalhador avulso,

trabalhador autônomo, eventual, equiparado e o empresário.198

São segurados facultativos o que não exerça atividade de

vinculação obrigatória a qualquer regime previdenciário e o maior de 16 anos que se

filiar ao RGPS, mediante contribuição, desde que não incluído na categoria de

segurado obrigatório. Quanto ao último, tem previsão no art. 7º, XXIII, da

Constituição Federal, com redação dada pela EC nº 20/98.199

Já os dependentes dos segurados podem ser divididos em três

classes, conforme se extrai do art. 16 da Lei 8.213/91200:

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

II – os pais;

III – o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um anos), ou inválido;

No que tange a classe I, a dependência econômica destes é

presumida, salvo para os equiparados a filhos (enteado e tutelado).201

198

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. Custeio da seguridade social. Benefícios – Acidente do trabalho. Assistência social. p. 370.

199 TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário. p. 58/59.

200 BRASIL. Lei 8.213, de 24 de julho de 1991. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8213cons.htm› Acesso em: 19 out. 2010.

201 TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário. p. 59.

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Segundo MARTINEZ202, “a presunção da lei é absoluta e,

portanto, não comporta prova em contrário”.

Em geral, a prova da dependência econômica é feita mediante

declaração assinada pelo próprio interessado, em formulário fornecido pelo INSS,

mediante apresentação de documentos que comprovem a dependência (art. 22, §3º,

do Decreto n. 3.048/99), ou, então, mediante justificação administrativa ou judicial.203

Salienta-se que quando há concorrência entre as classes,

havendo a primeira classe, essa exclui a segunda e a terceira. Dessa forma,

havendo cônjuge, não há que se falar no direito dos pais ou irmão ao benefício

previdenciário. De acordo com COIMBRA204, “a existência de vários dependentes

arroladas na mesma classe decreta a concorrência entre eles e partilha da

prestação previdenciária.”

No entanto, concorrem em igualdade de condições os que se

encontram na mesma classe, sendo que quando o benefício daquele cessar, será

revertido em favor dos demais dependentes da mesma classe a sua cota-parte.205

No que tange ao exposto acima, VIANNA206 comenta:

A dependência econômica da classe preferencial, ou seja, da primeira classe, é absoluta, dispensando qualquer meio de prova. Não importa de o cônjuge, por exemplo, dependia ou não economicamente do segurado. Essa presunção não admite prova em contrário. Em relação às demais classes a dependência econômica deve ser comprovada.

ROCHA207, nesse aspecto ensina:

202

MARTINEZ, Wladimir Novaes. Comentários à lei básica da previdência social. 4 ed. São Paulo: LTr, 1997. p. 137.

203 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. p. 205.

204 COIMBRA, J. R. Feijó. Direito previdenciário brasileiro. 7 ed. Rio de Janeiro: Edições Trabalhistas, 1997. p. 97.

205 TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário. p. 59.

206 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. p. 214.

207 ROCHA, Daniel Machado da. Direito previdenciário. Aspectos materiais, processuais e penais. 2 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 60.

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(...) materializando-se o risco social, três são os pressupostos para que o dependente faça jus às prestações previdenciárias: a) manutenção da qualidade de segurado por parte de quem era responsável pela subsistência do dependente; b) integrar o benefício da classe prioritária, ou inexistência de outros dependentes mais privilegiados, e c) comprovação da dependência econômica (para a primeira classe de dependente a lei erigiu uma presunção que poderá dispensar a sua demonstração).

São cabíveis duas observações encontradas na Lei nº

8.213/91, uma em seu art. 102, §2º208:

Art. 102. A perda da qualidade de segurado importa em caducidade dos direitos inerentes a essa qualidade.

(...)

§ 2º Não será concedida pensão por morte aos dependentes do segurado que falecer após a perda desta qualidade, nos termos do artigo 15 desta Lei, salvo se preenchidos os requisitos para obtenção da aposentadoria na fora do parágrafo anterior.

O artigo acima alude que “se o segurado tiver adquirido direito

a um tipo qualquer de aposentadoria, mesmo com posterior perda da qualidade, a

pensão estará garantida aos dependentes.”209

A segunda observação tem previsão no art. 16, § 2º da referida

Lei210:

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

(...)

§ 2º O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração de segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regimento.

Observa-se que o tutelado e o curatelado são equiparados a

filhos, podendo ser declarados pelo segurado desde que não possuam bens

suficientes para o próprio sustento e a educação.

208

BRASIL. Lei 8.213, de 24 de julho de 1991. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8213cons.htm› Acesso em: 19 out. 2010.

209 TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário. p. 59.

210 BRASIL. Lei 8.213, de 24 de julho de 1991. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8213cons.htm› Acesso em: 19 out. 2010.

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A respeito dos companheiros previstos na primeira classe, tal

denominação é dada a pessoa que mantenha união estável com o segurado ou

segurada. Considera-se união estável aquela prevista no art. 226, § 3º da

Constituição Federal.

No caso da pensão por morte, a sua concessão não será

prejudicada pela falta de habilitação de outro possível dependente, sendo que

qualquer inscrição ou habilitação posterior que culmine em exclusão ou inclusão de

dependente só surtirá efeito a contar da data da inscrição ou habilitação.211

Se o cônjuge for considerado ausente, este não exclui do

direito à pensão por morte o companheiro ou a companheira, que somente fará jus

ao benefício a partir da data da sua habilitação e mediante prova de dependência

econômica. O cônjuge divorciado ou separado judicialmente ou de fato que recebia

pensão de alimentos concorrerá em igualdade de condições com os dependentes da

primeira classe prevista no art. 16, I, da Lei 8.213/91.212

3.4 A POSSIBILIDADE DO RATEIO DOS VALORES DA PENSÃO ENTRE A

ESPOSA E A CONCUBINA

A possibilidade do rateio da pensão entre esposa e concubina

normalmente ocorre, quando é verificado que existe separação de fato do

contribuinte com a esposa, ou quando a concubina demonstra que dependia

economicamente deste e que o intuito era a formação de família.

O direito da concubina, normalmente, é interpretado caso a

caso, conforme demonstra GUIMARÃES213:

A avaliação sobre os direitos da concubina é feita caso a caso. Em julgamento na Quinta Turma, ocorrido em 2005, os ministros entenderam, por unanimidade, que é possível a geração de direitos da concubina, especialmente no plano da assistência social.

211

VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. p. 283.

212 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. p. 283.

213 GUIMARÃES, Janaina Rosa. Pensão por morte – Possibilidade de rateio entre esposa e concubina. IBDFAM, Rio de Janeiro, maio 2008. Disponível em: < http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=414> Acesso em: 25 out. de 2010.

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O recurso analisado (REsp 742.685-RJ) foi apresentado pela esposa, que contestava a divisão de pensão previdenciária com a concubina do marido falecido. Esta havia conseguido a divisão diretamente junto ao Instituto Nacional de Seguro Social. O TRF-2ª Região manteve a partilha, considerando o relatório emitido pelo órgão. O laudo ateve-se ao fato da relação íntima duradoura.

Existem julgados que demonstram o direito da concubina em

fazer jus ao benefício previdenciário:

PENSÃO POR MORTE – RATEIO. A existência de impedimento para se casar por parte de um dos companheiros, como, por exemplo, na hipótese de a pessoa ser casada, mas não separada de fato ou judicialmente, obsta a constituição de união estável. Nossa sociedade se pauta nos princípios da monogamia, fidelidade e lealdade, que se encontram não apenas na ética ou na moral, mas que são imposições legais de nosso ordenamento jurídico. Circunstâncias especiais reconhecidas em juízo para que se divida, em definitivo, a pensão de morte entre a viúva e a concubina; pesando as circunstâncias fáticas e as de direito, concluo, com base na eqüidade, no livre convencimento e no princípio da igualdade material, pelo rateio da pensão no percentual de 70% para a esposa e 30% para a concubina.214

PENSÃO POR MORTE DE SERVIDOR PÚBLICO - REGIME DE UNIÃO ESTÁVEL - CONCUBINATO IMPURO. (...) Constatada a convivência more uxorio entre a autora e o segurado falecido, é de se ratear na mesma proporção a pensão entre a esposa e a concubina, pela dependência econômica de ambas para com o de cujus.215

Embora a situação da concubina possua entendimentos

diversos nos tribunais, esta vem tendo seus direitos reconhecidos em alguns casos

com o rateio da pensão com a esposa.

3.5 (IN)COERÊNCIA NA FORMA DE RATEIO

Durante algum tempo, a jurisprudência vinha desconsiderando

a distinção entre esposa e concubina e fazia rateio de pensão entre as duas.

214

TRF2. AI 2005.51.01.516495-, Segunda Turma Especial, Relator Messod Azulay Neto, D.E. 30/08/2007.

215 TRF4. Ap. Civ. 2003.72.08.011683-4/SC, Terceira Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 11/04/2007.

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Essas decisões vinham por prejudicar a esposa, havendo

incoerência na forma do rateio, conforme comenta PIZZOLATTI216:

Até o Supremo Tribunal Federal (STF) assentar, recentemente (RE nº 397.762, DJe de 12.09.2008, com base na Constituição e no Direito Civil, que a concubina não tem direito a cota de pensão por morte em prejuízo da esposa, com quem o segurado nunca deixou de conviver, sob pena de dar-se chancela jurídica a bigamia, a jurisprudência vinha desconsiderando a distinção entre concubina e esposa e fazia rateio da pensão entre as duas. Os julgadores certamente incorriam em autoengano, decorrente da ilusão de que, com essa partilha à moda Salomão, estariam fazendo obra de “justiça”, quando em geral o que resultava era o oposto, por isso que a esposa quase sempre superava a concubina, em anos de convivência e em filhos criados. Entre vários semelhantes, certo caso houve em que o colegiado, pretextando o “caráter social das norma de direito previdenciário”, retirou metade da pensão da viúva, uma velhinha “do lar”, que criara oito filhos do segurado, para dá-la a concubina, pessoa mais jovem e com economia própria, que nenhum filho teve com o segurado... Este é o grande perigo do bem-intencionado julgador que “quer fazer o bem” acima de tudo, minimizando os critérios normativos: acaba, o mais das vezes, incorrendo no “paradoxo de São Paulo” (“Não faço o bem que quero, e sim o mal que não quero” – Epístola aos Romanos, 7, 19). Felizmente, nesse ponto o velho mas sempre atual Direito Civil volta a prevalecer, desde que o STF lhe restaurou o prestígio.

Leva-se em consideração que o instituto da pensão

previdenciária está como que um cordão umbilical ligado ao Direito Civil, que lhe

acrescenta com conceitos e critérios. Destarte, as jurisprudências que excluem o

Direito Civil parecem ilusórias, pois acabam por levar o Direito Previdenciário a

isolar-se do sistema jurídico.217

A 4ª Turma, do Superior Tribunal de Justiça, demonstra a

incoerência do rateio. Em seu voto, o ministro Luiz Felipe Salomão, citando Zeno

Veloso, apontou proteção ao concubinato como uma ameaça a monogamia:

DIREITO CIVIL. CONCUBINATO. INDENIZAÇÃO DECORRENTE DE SERVIÇOS DOMÉSTICOS. IMPOSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA

216

PIZZOLATTI, Rômulo. A pensão previdenciária por morte e o direito civil. Revista de doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, jun. 2010. Disponível em: <http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao036/romulo_pizzolatti.html> Acesso em: 05. jul. 2010.

217 PIZZOLATTI, Rômulo. A pensão previdenciária por morte e o direito civil. Revista de doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, jun. 2010. Disponível em: <http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao036/romulo_pizzolatti.html> Acesso em: 05. jul. 2010.

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DO ART. 1.727 DO CC/02. INCOERÊNCIA COM A LÓGICA JURÍDICA ADOTADA PELO CÓDIGO E PELA CF/88, QUE NÃO RECONHECEM DIREITO ANÁLOGO NO CASAMENTO OU UNIÃO ESTÁVEL. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. (...) a união estável é uma relação afetiva qualificada, espiritualizada, aberta, franca, exposta, assumida, constitutiva da família; o concubinato, em regra, é clandestino, velado, desleal, impuro. É um paradoxo para o direito proteger as duas situações concomitantemente. Isto poderia destruir toda a lógica do nosso ordenamento jurídico, que gira em torno da monogamia. Isto não significa uma defesa moralista da fidelidade conjugal. Trata-se de invocar um princípio ordenador, sob pena de se desinstalar a monogamia.218

E por isso que existe a incoerência quando do rateio da pensão

por morte entre a esposa e a concubina, visto que o concubinato não tem amparo

como entidade familiar na legislação.

3.6 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL

A questão da pessoa que vive em concubinato ainda é

bastante discutida nos tribunais. No entanto, o Supremo Tribunal Federal já firmou

entendimento, negando o direito da pensão por morte à concubina.

Há tribunais que vêm seguindo a mesma orientação do

Supremo Tribunal Federal, conforme pode ser extraído da decisão da 5ª Turma do

Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

EMENTA: PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL PARALELA À FAMÍLIA OFICIAL. IMPOSSIBILIDADE. CONCUBINATO. A mulher que vive com homem casado, sem que este esteja separado de direito ou de fato da esposa, não é companheira, mas simples concubina, não possuindo, portanto, a condição de dependente previdenciária e ensejar a concessão do benefício previdenciário de pensão por morte do segurado.219 (negritou-se).

A 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ainda

explica a impossibilidade do reconhecimento do concubinato em concomitância do

casamento, pois tal instituto impede a constituição de união estável.

218

STJ. REsp 988090/MS, Relator Ministro Luis Felipe Salomão. D.E 22/02/2010.

219 TRF4, AC 2003.70.00.0077956-0, Quinta Turma, Relator p/ Acódão Rômulo Pizzolatti, D.E. 05/10/2009.

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PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. COMPARTILHAMENTO DA PENSÃO ENTRE A VIÚVA E CONCUBINA. IMPOSSIBILIDADE. CONCOMITÂNCIA ENTRE CASAMENTO E CONCUBINATO ADULTERINO IMPEDE A CONSTITUIÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL, PARA FINS PREVIDENCIÁRIOS. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Para fins previdenciários, há união estável na hipótese em que a relação seja constituída entre pessoas solteiras, ou separadas de fato judicialmente, ou viúvas, e que convivam como entidade familiar, ainda que não sob o mesmo teto. 2. As situações de concomitância, isto é, em que há simultânea relação matrimonial e de concubinato, por não se amoldarem ao modelo estabelecido pela legislação previdenciária, não são capazes de ensejar união estável, razão pela qual apenas a viúva tem direito à pensão por morte. 3. Recurso especial provido.220

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região já decidiu no sentido

de não ser possível o direito da concubina à pensão por morte, tampouco a

equiparação do concubinato à união estável:

CONSTITUCIONAL – DIREITO DE FAMÍLIA – PENSÃO POR MORTE – VIÚVA – MATRIMÔNIO NÃO FOI DISSOLVIDO ATÉ O ÓBITO DO CÕNJUGE – CONCUBINA – INEXISTÊNCIA DE UNIÃO ESTÁVEL – IMPOSSIBILIDADE 1. O art. 1.727 do Código Civil prevê que relações não eventuais entre o homem e a mulher impedidos de casar constituem concubinato, ao qual não se iguala a união estável, por não estar coberto pela garantia dada pela Constituição Federal. 2. O concubinato não pode ser caracterizado como união estável, uma vez que o matrimônio não foi dissolvido, óbice do art. 226, §3º, da Constituição Federal de 1988.221

Nesse mesmo diapasão, é o julgado do Superior Tribunal de

Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL. RELAÇÃO SIMULTÂNEA AO CASAMENTO. CARACTERIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Não há como abrigar agravo regimental que não logra desconstituir os fundamentos da decisão atacada. 2. Segundo o entendimento firmado nesta Corte, a proteção conferida pelo Estado à união estável não alcança as situações ilegítimas, a exemplo do concubinato. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.222

220

TRF4, REsp 1104316/RS, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, D.E.18/05/2009.

221 TRF1. AC 199901000281162/MG, Segunda Turma, Relatora Adverci Rates Mendes de Abreu. .E. 09.03.2009.

222 STJ. REsp 1142584/SC, Relator Haroldo Rodrigues, D.E. 05.04.2004.

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No entanto, como poderá ser analisado no julgado abaixo,

existem casos em que a concubina pode ser beneficiada com a pensão por morte,

quando demonstrado que o contribuinte já era separado de fato há alguns anos:

PRINCÍPIO DA LEGALIDADE - VIOLÊNCIA - CONFIGURAÇÃO - PENSÃO - EX-CONTRIBUINTE CASADO - DIREITO DA CONCUBINA - LEI COMPLEMENTAR N. 500/87-SP. Não e crivel que órgão investido do oficio judicante admita a existência de diploma legal dispondo em determinado sentido e decida de forma diametralmente oposta. Os provimentos judiciais são formalizados a partir de interpretação da lei regedora da espécie. Isto ocorre quando o acórdão proferido revela a analise de situação concreta em que ex-contribuinte estava separado de fato e vivendo em concubinato há mais de vinte anos, resultando no reconhecimento, com base em legislação local - Lei Complementar n. 500/87-SP, do direito da concubina a pensão, posto que contemplada como beneficiaria obrigatoria de contribuinte solteiro, viuvo, separado judicialmente ou divorciado. A referencia ao terceiro "status" encontra justificativa socialmente aceitavel não em simples apego a forma, mas na necessidade de serem afastadas situações ambiguas, o que não se configura quando a convivencia decorrente do casamento haja cessado há duas decadas, momento em que teve inicio o concubinato.223

O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido

da impossibilidade de configuração de união estável quando um de seus

componentes é casado e vive matrimonialmente com o cônjuge, como pode ser visto

no caso em voga:

Ressaltou-se que, apesar de o Código Civil versar a união estável como núcleo familiar, excepciona a proteção do Estado quando existente impedimento para o casamento relativamente aos integrantes da união, sendo que, se um deles é casado, esse estado civil apenas deixa de ser óbice quando verificada a separação de fato. Conclui-se, dessa forma, estar-se diante de concubinato (CC, art. 1.727) e não de união estável.224

Pode ser verificado que os tribunais dão tratamentos diversos

ao direito da concubina e da esposa frente ao Direito Previdenciário.

Apesar dos entendimentos diferenciados, prevalece o do

Supremo Tribunal Federal a tese de que o concubinato não produz direitos como a

223

STF. RE 135780/SP, Relator Ministro Marco Aurélio, D.E. 24/06/1994.

224 STF. RE 590779/ES, Relator Ministro Marco Aurélio. D.E. 10/02/2009.

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união estável e o casamento, com algumas exceções quanto aos direitos reais e das

obrigações.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme legislação, os dependentes previdenciários são

divididos em três classes, sendo que a existência de dependente em uma classe

afasta aqueles das classes mais remotas. Foi analisado aspectos da pensão por

morte e a inclusão – ou não – da concubina como dependente, com base no

tratamento dispensado ao assunto pelos Tribunais e pela doutrina.

Viu-se que há um direcionamento tendencioso dos Tribunais de

acordo com os entendimentos mais recentes do Supremo Tribunal Federal, no que

tange ao não rateio da pensão entre esposa e concubina.

Isso se deve, porque àqueles que entendem ser devido o rateio

da pensão, tratam dos conceitos de concubinato e união estável como se fosse

sinônimo, o que não pode ser confundido.

Contudo, salienta-se que art. 1.727 do novo Código Civil, prevê

que as relações não eventuais entre homem e mulher constituem concubinato,

conceito este completamente diferente do que é dado a união estável, inclusive

reconhecido como entidade familiar pela Constituição Federal.

Destarte, não resta dúvida que o concubinato não se confunde

com a união estável. Do mesmo modo, a legislação previdenciária não traz a

concubina como dependente.

Diante disso, resta não confirmada a hipótese 1, pois apesar da

análise de caso a caso, concubinato e união estável possuem denominações

próprias.

No entanto restou parcialmente confirmada a hipótese 2, visto

que apesar do entendimento pacificado do Supremo Tribunal Federal em não

reconhecer o rateio da pensão por morte, com fundamento na monogamia, os

tribunais inferiores ainda não são unânimes nesse sentido, por fazerem referência a

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comprovação da união e a demonstração de que a concubina dependia

economicamente do falecido, demonstrando a existência de incoerência entre o

posicionamento do tribunal Supremo e os inferiores.

Portanto, há que se verificar o entendimento do Supremo

Tribunal Federal que está pacificado a tese de que o concubinato não produz

direitos, como a união estável, por não ser entidade familiar e para a proteção do

casamento e a monogamia.

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