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Eixo 01: História e Historiografia da Educação
A ESCOLA REGIONAL DE MERITI: ESCOLANOVISMO,
RURALISMO E O DEBATE NA HISTORIOGRAFIA DA
EDUCAÇÃO
Vinicius Kapicius Plessim (UERJ-FEBF/PPGECC) 1
Resumo: O estudo tenciona estabelecer uma análise da Escola Regional de Meriti a
partir da revisão bibliográfica em andamento sobre a escola e a docente Armanda
Álvaro Alberto, tendo em vista a importância desta instituição para os estudos em
história da educação no Brasil e enquanto experiência escolanovista e ruralista na atual
cidade de Duque de Caxias. Busca-se tencionar a produção acadêmica sobre a Escola
Regional de Meriti com os debates da historiografia da educação sobre a escola nova.
Por intermédio da história local e da experiência escolar, buscam-se compreender os
mecanismos sociais, políticos e pedagógicos desenvolvidos pela docente que permitem
classificar tal experiência em Meriti como escolanovista ainda problematizar a relação
entre a história da educação e memória escolar a partir da escola. Para além da questão
do escolanovismo, busca-se identificar os agentes e agências da Baixada Fluminense
que financiaram tal projeto pedagógico em Meriti, buscando por meio do projeto da
escola compreender o sentido do ruralismo nas atitudes introduzidas no seio escolar,
aspecto este ainda pouco estudado na historiografia educacional fluminense. O presente
estudo na sua estruturação dialogou com fontes produzidas sobre a Escola Regional de
Meriti como dissertações de mestrado e teses de doutorado que auxiliaram na
construção da revisão bibliográfica em andamento articulando uma ponte teórica e
conceitual com fontes da historiografia educacional brasileira em que abordam a
temática do escolanovismo e do ruralismo. Nota-se um recorte histórico entre 1921 anos
este da fundação da Escola Proletária de Merity até o ano de 1937 sendo o mesmo o
marco inicial do Estado Novo Varguista.
Palavras-chave: Escola Regional de Meriti; ruralismo; escola nova.
1 Vinicius Kapicius Plessim, Universidade do Estado do Rio de Janeiro/Faculdade de Educação da
Baixada Fluminense, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: [email protected]
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Introdução
A partir de uma breve análise na trajetória de vida da docente Armanda Álvaro
Alberto, o presente estudo procura compreender por intermédio da Escola Regional de
Meriti os sentidos do ruralismo e do escolanovismo por meio das práticas políticas,
pedagógicas e sociais introduzidas no seio escolar por meio da professora. Outro ponto
de compreensão levantado no estudo a seguir consistiu em identificar os agentes e as
agências da sociedade civil e política que permitiram a consolidação da experiência
escolar de Armanda em Meriti na Baixada Fluminense2.
Vale destacar que o ensaio a seguir estabeleceu um recorte entre os período de
1921 à 1937, onde respectivamente tais momentos históricos confluem no início da
experiência de Armanda na Baixada por intermédio da Escola Proletária de Meriti e o
período de tensão política que irá influenciar diretamente a docente, sendo o marco
inicial do Estado Novo Varguista no Brasil.
O artigo é estruturado a partir de três seções, onde a primeira intitulada de
Experiência Escolar em Meriti procura apresentar o processo de consolidação do
projeto educacional da professora Armanda na Baixada Fluminense, destacando os
mecanismos adotados pela mesma que possibilitaram sucesso em sua empreitada em
Meriti.
Na segunda seção de nominata A Escola Regional de Meriti: Ruralismo e
Escolanovismoprocura-se compreender por meio das práticas pedagógicas, políticas e
socias adotadas por Armanda no seio escolar e na comunidade de Meriti os sentidos do
ruralismo e do escolanovismo, frente a uma dualidade inerente de Meriti na época que
constrastava-se entre o urbano e o rural.
A construção do artigo, se baseou em um diálogo ferrenho com fontes
produzidas sobre a escola destacando Baú de Memórias, Bastidores de Histórias: O
Legado Pioneiro de Armanda Álvaro Alberto (2002) de Ana Chrystina Venancio
Mignot, Cuidando do Corpo e do Espírito Num Sertão Próximo: A Experiência e o
Exemplo da Escola Regional de Meriti (1921-1937) (2008) de autoria de Julio Cesar
Paixão Santos e ainda Um Caminho Inovador: O Projeto Educacional da Escola
2Atuais Municípios de Nova Iguaçu, Duque de Caxias, São João de Meriti, Belford Roxo, Nilópolis,
Mesquita, Japeri e Queimados.
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Regional de Merity (1921-1937) (2008) de Vilma Correa Amâncio da Silva que serão
base para a construção do presente pensamento em estudo. A partir das presentes fontes,
estabeleceu-se uma ponto com fontes secundárias oriundas da historiografia brasileira
de educação que abordam a essência do ruralismo e do escolanovismo, afim de, elucidar
os questionamentos e as propostas apresentadas anteriormente por meio deste estudo.
Armanda Álvaro Alberto, nascida na cidade do Rio de Janeiro em 1892, filha do
médico doutor Álvaro Alberto e Maria Teixeira, tinha ainda em sua composição
familiar seu irmão Álvaro Alberto. No ano de 1917, tendo seu irmão se dedicado ao
estudo de rupturita conforme seu pai funda a Fábrica Venâncio e Cia na Baixada
Fluminense3 em Meriti, estabelecimento que inclusive será responsável pelo
financiamento da escola de Armanda.
A vida no magistério de Armanda tem início no ano de 1917 por intermédio do
Colégio Jacobina cujo seio escolar onde a mesma adquire experiências, os seus laços de
amizade começam a se estreitar intensamente com as famílias da elite carioca, contatos
estes que serão responsáveis por investir em seu projeto educacional em Meriti.
(SILVA, 2008, 20)
A docente Armanda buscou enxergar na educação, através de um engajamento
político e uma luta social para buscar soluções para os problemas do país a partir do
setor educacional. A mesma vinculou sua luta política a educação, se denota a intenção
da professora em buscar lutar pelos direitos femininos frente à conjuntura política e
social da década de 20. (MIGNOT, 2002, 153)
Com o intuito de enfrentar os problemas da educação pelo país, Armanda
participa da Liga Brasileira contra o Analfabetismo em 1917, tendo caráter nacionalista
a mesma instituição que chama a responsabilidade do Estado para resolver as mazelas
oriundas da educação. (MIGNOT, 2002, 142)
A efervescência da década de 20 com os debates a cerca da educação, levam
Armanda participar da Associação Brasileira de Educação em 1924, objetivando
encontrar soluções para os problemas do país a partir da educação, sendo criada por
3Atuais municípios de Nova Iguaçu, Duque de Caxias, São João de Meriti, Belford Roxo, Nilópolis,
Mesquita, Japeri e Queimados.
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Heitor Lyra4 que foi influenciado pela conjuntura da escola nova européia cujas ideias
chegam ao Brasil. Armanda participa no interior da instituição da Seção de cooperação
da família, cujo objetivo era buscar criar mecanismos para aproximar as famílias do
processo de educação de seus filhos, chamando sua responsabilidade e na causa
educacional dos mesmos. (MIGNOT, 2002, p.108)
A importância da Associação Brasileira Educacional se vincula também em
expandir pelo país seus ideais e uma forma estabelecida de pela mesma é a formação de
congressos nacionais de educação que visa discutir idéias e soluções frente à conjuntura
educacional e política do país. Vale destacar a importância da primeira conferência
nacional de educação ocorrida em 1927, onde inclusive com a participação de Armanda
a mesma chama a importância de sua experiência escolar em Meriti para apontar os
benefícios da sua instituição para a localidade e apresentar ainda seu projeto para
aqueles que ainda não tivessem tido um contato. A importância da primeira conferência
nacional de educação é ratificada por Marta Chagas de Carvalho que:
Tal projeto formulava-se como programa de disciplinarização das
populações capaz de implantar hábitos de trabalho e cultivar a
operosidade como valor cívico. Mas não se esgotava nisso, pois era
preciso como pontificava Lourenço Filho na primeira Conferência
Nacional de Educação, em 1927, garantir a unidade política do país,
inculcando, ‘’ em todas as crianças brasileiras, idéias e sentimentos
necessários à própria existência da nacionalidade. (CARVALHO,
1989, p.5)
Com o limiar dos anos de 1930, Armanda intensifica sua luta pela educação no
país tendo sido uma das signatárias do manifesto dos pioneiros da escola nova, redigido
por Fernando de Azevedo5. A partir do presente manifesto, se estabelece uma defesa
clara de uma educação que seja pública, gratuita, sem distinção de gênero, com o Estado
4Nasceu em 1893, sendo formado pela escola politécnica do Rio de Janeiro. Dedicou sua vida a causa da
educação, sendo responsável por fundar no ano de 1924 a Associação Brasileira de Educação, cuja
instituição Armanda fez parte e exerceu militância participando das conferências nacionais de educação
pelo país que eram promovidas pela ABE. 5Foi Responsável por engajar a luta política através da educação ao lado de Anísio Teixeira, tendo
destaque na Associação Brasileira de Educação como secretário de educação do DF e ainda responsável
pela elaboração do manifesto dos pioneiros da escola nova em 1932.
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chamando a responsabilidade para si no intuito de investir maciçamente neste setor,
estabelecendo uma defesa de que a educação deveria buscar desenvolver no aluno um
olhar crítico, reflexivo, observador e ainda científico. A importância do Estado no
processo educacional a partir do manifesto é ratifico por Ana Magaldi onde
No bojo dessa ampla bandeira assumida pelos signatários do
Manifesto, situavam-se, por exemplo, preocupações com a
democratização do acesso ao ensino e com sua organização através de
um sistema nacional de educação sob o controle do Estado. Afirmava-
se a defesa da escola pública, gratuita e leiga, bem como de práticas
educativas apoiadas em métodos pedagógicos de base científica e na
centralidade do lugar do educando no processo de ensino-
aprendizagem. (MAGALDI, 2003, p.78)
Por meio de Julio Cesar Paixão, onde o mesmo apresenta a importância do
Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova em 1932, sendo Armanda uma das signatárias
conforme apresentado anteriormente conforme inclusive Mignot (2002) destacou,
estabelecendo uma defesa da regionalização do ensino, estabelecendo pelo mesmo uma
crítica com a situação estrutural do país nas esferas política, sociais e educacionais.
Destacando ainda que em muitos momentos o projeto da escola e a visão dos pioneiros
irá se contrapuser a concepção de setores conservadores católicos, que criticavam o fato
do manifesto defender claramente o fim do ensino religioso em prol de uma laicização
do sistema educacional, na defesa conforme Armanda apresentou de um ensino
agrícola, universal, gratuito para todos. (SANTOS, 2008, p.205)
O advento do governo de Getúlio Vargas com que as tensões políticas e
ideológicas se acentuassem. Neste contexto o marido de Armanda Edgar Sussekind de
Mendonça que também foi um dos financiadores do projeto desenvolvido por Armanda
em Meriti na Baixada Fluminense, se auto declara comunista, tendo sua esposa
estabelecida apenas uma defesa dos direitos do proletariado no presente período.
(MIGNOT, 2002, p.229)
Na luta pelos direitos femininos, como o voto e melhorias de condições de
trabalho. Armanda se destacou ocupando o cargo da União Feminina do Brasil criada
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em 1935. A aproximação com Luís Carlos Prestes 6por meio da Aliança Nacional
Libertadora7 e Olga Benário8 levou a docente a receber intensas críticas por parte do
governo e da imprensa sendo declarada como subversiva e comunista. Os ataques foram
tão Ferrenhos que levaram a docente juntamente com seu esposo Edgar à prisão no ano
de 1935 sendo soltos em 1937. (MIGNOT, 2002, 272)
Experiência Escolar em Meriti
Nesta seção objetiva-se apresentar uma breve trajetória da Escola Regional de
Meriti, destacando os mecanismos políticos, sociais e pedagógicos adotados por
Armanda Álvaro Alberto na escola e na comunidade de Meriti na Baixada Fluminense
para consolidação de sua experiência escolar.
A partir da experiência no Colégio Jacobina, Armanda no ano de 1919 começa a
estabelecer um ensaio de escola ativa na região de Angra dos Reis, acompanhando seu
irmão que servia a marinha. O objetivo de Armanda era ofertar uma escola inclusiva
que atendesse aos filhos de pescadores da região que não tinha condições de custear os
estudos de seus filhos. A luta contra o analfabetismo não somente na região, como em
todo país, é constatado a partir de 1915 com a criação da Liga Contra o Analfabetismo
apresentando esta um caráter nacionalista. (MIGNOT)
A partir do ano de 1921 recebe o convite do seu irmão para conhecer e ver o
andamento da fábrica de rupturita localizada em Meriti, onde ao se deparar com as
condições de vida na localidade, que carecia de investimentos na área da saúde,
educação, não tinha uma infraestrutura básica levaram a docente a vincular sua luta
educacional como solução dos problemas locais em Meriti. (SILVA, 2008, p.23)
6Nasceu em Porto Alegre em 1898, foi membro do Partido Comunista Brasileiro durante o governo
Vargas e uma das lideranças da Aliança Nacional Libertadora contra o imperialismo Varguista, o
fascismo e o integralismo. 7Organização política de esfera nacional criada em 1935com o intuito de combater o fascismo e o
imperialismo. 8Nasceu em Munique na Alemanha em 1908, membro do partido comunista alemão tendo contato com
Luís Carlos Prestes em 1931 onde se conhecem e acabam se casando, vindo para o Brasil lutou contra o
fascismo e o integralismo, tendo participação na Aliança Nacional Libertadora.
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Os fatos mencionados anteriormente culminaram na formação da Escola
Proletária de Merity, escola esta que tinha seu nome inicial apenas provisório
intencionalmente passando a se chamar Escola Regional de Meriti no ano de 1924. No
primeiro momento de sua caminhada a ideia seria atender aos filhos dos operários da
fábrica do irmão de Armanda, todavia, a partir da formação de uma escola que fosse
regional a ideia seria formar uma escola que atendesse as dificuldades locais, sendo
incorporada pelo meio, buscando formar uma consciência nacional a partir da escola.
(SILVA, 2008, p.23)
No primeiro ano de formação da escola, Armanda criou em seu espaço escolar o
Museu regional e ainda a Biblioteca Euclides da Cunha que objetivavam buscar
acrescentar em seu interior pertences da região com o intuito de apresentar para as
crianças. Nota-se uma defesa de Armanda em apresentar para suas crianças um
ambiente vivo e dinâmico no espaço escolar, enfeitando o mesmo com flores e ainda
criando um calendário escolar que fosse florido. (SANTOS, 2008, p.156)
Nota-se desde o primeiro momento a intenção de formar uma escola chegasse e
atendesse a todos, onde ‘’A escola era particular, gratuita e sem fins lucrativos’’.
(MIGNOT, 2002, p.171). Outro ponto importante na escola consiste na forma de
avaliação, uma vez que, a mesma não tinha prova e somente muito depois de sua
criação é que a escola começa a emitir boletins, mas não com notas, mas sim avaliações
escritas do rendimento do aluno na escola.
A formação de uma escola que fosse regional tinha o intuito de desenvolver o
espírito cívico em seu aluno, do amor à pátria, diversidade assim propostas pedagógicas
que existiam no Brasil, sendo uma alternativa e uma possibilidade de experimentação
para o país, chamando a responsabilidade da professora no processo educativo da
criança, sendo responsável por levar a criança a descoberta e a experimentação, contra
um ensino que se apresentava no país de apenas memorização de conteúdo, levando-se
em conta o desempenho o aluno nas tarefas desenvolvidas a escola não desenvolvia a
prática de formar exames tanto que apenas em 1926 a docente Armanda irá criar o
boletim não havendo notas.
No interior da escola, cada aluno tinha uma função a exercer, com o intuito de
criar nele e nos demais alunos um espírito dinâmico, tendo inclusive aulas de trabalhos
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manuais formando uma educação moral pelo trabalho e um ensino integral para os
alunos, chamando o corpo discente da escola para uma vida em comunidade. A ideia de
Armanda também era formar uma escola voltada para experimentação que era comum
na pedagogia norte-americana, aliando teoria à pratica e valorizando o método
cientifico, uma vez que,
Meriti, zona rural, em 1921, permitiu Armanda à Armanda
atender as crianças provenientes das camadas populares, numa
escola nova, diferente que servisse de exemplo, sendo um
‘’laboratório de pedagogia prática’’. Essa concepção de escola
experimental, escola-laboratório, diferente de escola-modelo,
visava dar à educação o mesmo estatuto dos laboratórios em
relação às ciências físicas, como preconizava Dewey.
(MIGNOT, 2002, p.184)
A escola Regional de Meriti no seu contexto de formação acabou vinculando sua
proposta educacional ao movimento sanitarista promovido na Baixada Fluminense pelo
doutor Belisário Penna. A ideia de Armanda era buscar dar as crianças e também as
famílias uma conscientização de higiene e saúde, promovendo a puericultura e ainda
formando cursos que pudessem ser ministrados na escola para os familiares com uma
intenção de aprimoramento quanto à questão sanitária. A importância do movimento
higienista vinculado a educação é confirmado por Júlio Cesar:
Assim, através de realizações práticas como a de Armanda, este
acreditava que poderia se corporificar o Brasil do futuro desejado. A
Escola Regional passaria, com o tempo, a ser tida como um exemplo
de possibilidade de realização dos objetivos dos movimentos sanitário
e educacional (...). (SANTOS, 2008, p.74)
Aos poucos a influência do movimento higienista é sentida na escola, com
influências de agentes da saúde e agências como Belisário Penna, o doutor Hugo dos
Santos Silva, como a criação formação da professora enfermeira tendo em vista que a
escola foi responsável pela profissionalização de inúmeras mulheres, a criação de cursos
de saúde como o ocorrido em 1925 conforme foi mencionado em parágrafos anteriores.
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A aproximação não somente da família, como também da comunidade local, era
fator providencial para Armanda, uma vez que, possibilitaria conhecer a realidade de
seu alunado. No intuito de buscar fundos para sua formação e ainda conhecer e
melhorar a realidade de Meriti no ano de 1923 Armanda começa a promover concursos
como o de janelas floridas e de criações vinculados a sua instituição escolar. O primeiro
formado foi o Concurso de Janelas floridas sendo destinadas as meninas visando o
incentivo ao trabalho e o embelezamento da cidade de Merity sendo também promovido
no mesmo ano o concurso de utilidades destino aos meninos buscando incentivar os
trabalhos de carpintaria. (SILVA. 2008, p.68)
Objetivando aumentar ainda mais a formação e a integração com os familiares, a
docente Armanda estabeleceu na escola o círculo de mães no ano de 1925, com o intuito
de promover conferências e cursos para as mães, apresentar seu projeto pedagógico,
ofertar uma formação para as responsáveis, onde o ‘’objetivo era o de transpor o
abismo, freqüentemente mencionado, entre a educação dada pelos pais, vista como
inapropriada, e aquela considerada apropriada, ministrada pela escola. (MAGALDI,
2003, p.84)
Vale destacar que Armanda ao desenvolver eu projeto educacional em Meriti na
Baixada Fluminense, a docente não ficou sozinha diante de tal desafio. A professora
Armanda recebeu apoio de membros tanto da sociedade política como da sociedade
civil, podendo aqui destacar o financiamento e também a divulgação da experiência
escolar a partir de seu marido Edgar Sussekind que acompanha a rotina na escola, o
professor Roquette Pinto9, Anísio Teixeira10, Heitor Lyra, Belisário Penna conforme foi
apresentado anteriormente, Cecília Meireles11, Júlia Lopes de Almeida12, Fernando de
9Nascido em 1884, foi um médico legista, professor, escritor e antropólogo, dedicou sua vida a
radiodifusão, foi um dos responsáveis por divulgar a importância da experiência escolar de Armanda em
Meriti na Baixada Fluminense. 10Nasceu em Caitité na Bahia no ano de 1900, exerceu a função não apenas de educador como de
advogado, enxergou na educação a solução para os problemas do país, sendo um dos signatários do
manifesto da escola nova no país, defensor do ensino laico em contraste com o religioso, defendeu a
função do Estado na educação, onde para o mesmo a educação é um direito e não um privilégio, com a
escola público sendo o motor para o mesmo para embutir os valores da democracia. 11Jornalista e poetisa uma das signatárias do manifesto dos pioneiros da escola nova de 1932, defensora
de que através de um ensino público, gratuito, laico e universal, sem distinção gênero poderia superar os
problemas do analfabetismo do país. Além destas bases, Cecília foi uma das defensoras da importância da
10
Azevedo, dentre outros que enxergaram no projeto escolar a solução para os problemas
aos qual o Brasil passava na conjuntura do século XX.
Adotando práticas assistencialistas por intermédio da escola, é perceptível ainda
pensando no aliar do movimento higienista com a questão educacional na Baixada
Fluminense, a criação da professora visitadora que visitava as famílias dos alunos da
escola com o intuito de perceber a realidade a qual ele estava inserido e ainda a criação
do médico escolar que adentrando a rotina escolar procurava atender as crianças do
local, ofertando as mesmas noções de higiene e palestras. (SANTOS, 2008, p.174)
A Escola Regional de Meriti não tinha uma defesa de uniformização do ensino
primário, mas sim um exemplo de possibilidade adaptadas ao meio e exercendo
influencia sobre ele, não podendo dizer que a escola regional era uma escola pobre, ou
ainda ‘’com poucos recursos e tendo a pessoa mais instruída do local como professor’’
(SANTOS, 2008, p.89)
Vale destacar que a Escola Regional de Meriti também exerceu influências na
elite local, defendendo o fato de que a escola configurou uma noção de cidade para a
localidade, onde seria ‘’um projeto voltado para melhoria e progresso da cidade e de sua
população’’. (SILVA, 2008, p.67)
Constata-se a importância da renovação escolar e seus efeitos nas práticas
pedagógicas de Armanda por meio da Regional de Meriti, estabelecendo uma análise da
trajetória histórica da educação brasileira. A autora destaca a importância da escola de
Armanda que busca por meio de suas práticas formem uma identidade nacional e ser um
modelo na educação de seu país. (SILVA, 2008, p.136)
No que tange ao ambiente escolar, foi criado além da biblioteca e do museu
escolar, o concurso janelas floridas e as conferências populares dos anos de 1925 e
1926. No que confere ao museu se percebe a influência de Roquette Pinto e Pacheco
Leão para buscar fundos para a criação dos mesmos e sua divulgação, assim como em
sua estruturação buscavam elementos locais para poder guardar no seu interior,
literatura infantil, fomentando uma consciência lúdica na criança, fustigando o espírito de experimentação
e observação na mesma. 12Contista, romancista, cronista, teatróloga. Foi uma das pioneiras da literatura infantil no Brasil,
presidenta da legião da mulher brasileira e ainda foi uma das intelectualidades que planejaram a criação
da Academia Brasileira de Letras.
11
apresentava a coleção regional de zoologia e botânica com o intuito de por meio dele as
crianças pudessem conhecer a sua região, estimulando estudos da natureza, ou ainda ‘’o
contato com a terra e com a natureza, através de excursões e de estudos do ambiente
natural’’ (SANTOS, 2008, p.185).
A Escola Regional de Meriti: Ruralismo e Escolanovismo
A presente seção tem como finalidade apresentar o cenário da história da
educação brasileira frente à conjuntura política e social das décadas de 20 e 30,
estabelecendo uma análise como esta conjuntura influenciou na formação da Escola
Regional de Meriti e seus agentes e agências de atuação na concretização do projeto
pedagógico de Armanda fomentando uma cultura de memória escolar. Para a produção
da seção foi estabelecido um diálogo com as fontes produzidas sobre a escola de Ana
Chrystina Mignot, Vilma Correa e Júlio Cezar denotando contrastes e aproximações das
mesmas fazendo ainda uma ponte na linha de idéias defendidas pelas mesmas com
fontes secundárias da história da educação brasileira.
A partir de uma leitura crítica da obra de Mignot (2002) se constatou a intenção
da autora em abordar uma discussão teórica e metodológica a partir dos conceitos de
Memória e história da educação frente à figura de atuação da docente Armanda,
denotando uma crítica ao fato de na historiografia se valorizar e estudar mais uma
memória masculina do que a feminina, e, sobretudo, dos homens que foram signatários
do manifesto dos pioneiros da escola nova no Brasil em 1932, destacando buscar
compreender os silêncios e esquecimentos a cerca da figura de Armanda e os motivos
que levaram a mesma a ser uma das signatárias do presente manifesto.
Num ponto distinto de Mignot (2002), Júlio Cesar (2008) que toma a obra da
autora como referência na construção de sua dissertação de mestrado, procurou
estabelecer um diálogo entre a história da educação no Brasil e a história das ciências e
da saúde no país, buscando compreender como o movimento higienista desenvolvido na
década de 20 vinculou a educação como soluções para os problemas de Meriti como
também de todo o país, vinculando os mecanismos adotados por intelectuais da área da
saúde como Belisário Penna e a docente Armanda junto com sua equipe escolar no
12
tocante de cuidar tanto do corpo como ainda do espírito da presente localidade em
estudo.
Numa rota de divergência a partir da obra de Vilma Correa (2008) se constatou
uma defesa da autora em apresentar como a Escola Regional de Meriti exerceu
influência na localidade e as práticas adotadas pela professora Armanda a partir da
Escola que vincularam a comunidade presente em Meriti e consolidaram sua proposta
de escola nova na Baixada Fluminense. A obra de Vilma (2008), que também usou
como referência o corpo textual de Mignot (2002), se distancia da mesma, a partir do
momento em que ela não finca seu estudo apenas em compreender a trajetória de vida
de Armanda e as práticas adotadas pela mesma que levaram a sua pessoa a ter uma
atuação de destaque não somente na educação como na política, ou ainda em perceber a
memória feminina em Armanda, mas sim em perceber pela docente a pela escola como
existiu uma aproximação das duas frentes com a comunidade de Meriti, fomentando
métodos que pudessem atrair esta população local.
Com a dissertação de Júlio Cesar (2008), a partir do enfoque trazido pelo mesmo
através do movimento sanitarista e a educação na Baixada, constatou-se a importância
que Armanda teve pela experiência desenvolvida em Angra dos Reis formando uma
escola ativa, com aulas práticas ao ar livre, ofertando o ensino para os filhos dos
pescadores da localidade em 1919 que não tinham condições de custear os estudos de
seus filhos. Ponto importante destacado por Júlio (2008) consistiu em apresentar que
neste momento Armanda começa a ter contato com Belisário Penna que foi responsável
pela condução do movimento sanitarista na Baixada Fluminense e de forma específica
por aliar o mesmo movimento com a educação através da Escola Regional de Meriti.
Outro ponto importante que foi confirmado tanto por Júlio (2008) como Mignot (2002)
é que nesta conjuntura Armanda já sofria influência de idéias pedagógicas vindas da
Europa de Montessori e Pestalozzi.
Através da dissertação de Vilma (2008) que ratifica ainda a ideia apresentada
por Mignot (2002) é que a partir do ano de 1921 se formará na Baixada a escola
proletária de Merity. As duas autoras estabelecem uma defesa de que tal projeto nunca
foi uma experiência escolar isolada, havendo contribuições de membros da sociedade
civil e política para que o projeto fosse à frente. A importância de se entender que foram
13
os agentes e as agências da sociedade civil e política que angariaram o presente projeto,
confirma ainda a visão de Sonia Regina de Mendonça13onde
Cabe ao pesquisador verificar quem são os atores integrantes desses
sujeitos coletivos organizados, bem como a que classe ou fração
encontram-se organicamente vinculados e, sobretudo, o que estão
disputando junto a cada uma das agências do Estado restrito, sem
jamais perder de vista que Sociedade Civil e Sociedade Política
encontram-se em permanente relação. (MENDONÇA, 2005, 12)
O auxílio na compreensão dos primeiros anos da experiência escolar em Meriti
teve como base a obra de Mignot (2002), que chamou a atenção para as dificuldades
encontradas por Armanda em levar a frente seu projeto, criando no segundo ano a caixa
escolar para buscar fundar, recebeu concessões financeiras da fábrica de rupturita de seu
irmão, criou o museu regional e a biblioteca Euclides da Cunha com o intuito de
aproximar a escola da comunidade. A partir de 1924 a escola intencionalmente de
proletária para regional, buscando a partir da escola em formar uma identidade local. As
idéias presentes defendidas por Mignot (2002), sobretudo, no que tange as dificuldades
encontradas por Armanda são confirmadas por Vilma (2008) em sua dissertação, onde
inclusive a docente teve que lutar contra a evasão escolar, uma vez que, seus alunos
saiam da escola cedo para trabalhar, ou ainda devido as condições de saúde da
localidade ficavam doentes. Constataram-se também críticas fundamentadas pelos pais
das crianças aos métodos nos anos iniciais da escola e ainda a dificuldades de Armanda
para com seus professores em compreender seu projeto educacional.
O projeto da escola começa a ganhar ‘’corpo’’ desde seus primeiros anos, a partir
do momento, em que a docente Armanda constata que era necessário formar uma
instituição que estivesse atrelada aos problemas da localidade, incorporando os mesmos
em seu princípio educativo. A escola teve como principais divulgadores e financiadores
13Possui doutorado pela Universidade de São Paulo em 1990 e atualmente é docente aposentada da
Universidade Federal Fluminense.
14
membros do movimento de renovação educacional como Lourenço Filho14, Fernando de
Azevedo, Julia Lopes de Almeida, Edgar, Roquette Pinto, médicos sanitaristas e
higienistas, onde a partir da mudança do nome em 1924 a autora estabeleceu uma defesa
de apresentar que o regionalismo era uma ideia de formar uma identidade nacional a
partir da escola. (SILVA, 2008, p.31)
A formação de uma escola rural, abrangendo a dualidade entre o urbano e o rural
de Meriti foi confirmado por Julio Cesar (2008) e Mignot (2002), destacando a
relevância dos estudos cujo enfoque se torna a escola agrícola nos anos 20 e 30 e os
motivos para os seus surgimentos, que são confirmados por Sonia de Mendonça onde
1) A escola rural enquanto instrumento de alfabetização ou 2) a escola
rural enquanto instrumento de trabalho. A vitória momentânea desta
última posição não impediria que, a partir da implantação do Estado
Novo, fosse resgata a chamada ‘’vertente ruralizadora’’ do ensino
básico agrícola, centrada no binômio educação e treinamento.
(MENDONÇA, 2006, p.137)
Conforme apresentado acima por Sonia de Mendonça (2006), a escola agrícola
em muitos momentos teve sua inserção ligada em voltar um ensino para o trabalho. A
partir da obra de Mignot (2002) e Júlio Cesar (2008) estes fatos permitem uma
confirmação, uma vez que, a Escola Regional de Meriti buscando solucionar os
problemas voltados a evasão escolar, vinculou um ensino que buscasse dimensionar o
aluno com um ensino voltado ao trabalho, assim como, promover eventos de obras
artísticas feitas pelos alunos, onde o lucro era revertido tanto para a escola como
também para o aluno.
A ideia de vincular uma educação fosse voltada com um engajamento político, é
confirmado nas três dissertações de mestrado, sobretudo, com a participação de
Armanda na Liga Brasileira contra o Analfabetismo, na Associação Brasileira de
Educação que teve seu início em 1924 por meio de Heitor Lyra com Armanda
participação em 1925 também da Seção de Cooperação da Família, visando sempre à
14 Educador e pedagogo brasileiro, sendo responsável pela reforma de ensino público no Ceará entre os
anos de 1922-1923. No Rio de Janeiro nos anos 30 exerceu a função chefe de gabinete do ministro da
educação Francisco Campos.
15
causa da educação e luta pelos direitos femininos no país. A importância da ABE
enquanto instituição de luta pela educação como solução para os problemas do país, é
confirmado por Marta de Carvalho:
A intensa agitação que marcara o movimento de renovação
educacional nos anos 20 tinha se traduzido na organização da
Associação Brasileira de Educação (ABE), promotora das notórias
Conferências Nacionais de Educação. A convergência de projetos de
construção da nacionalidade através da educação possibilitou forte
coesão do movimento neutralizando divergências que aflorariam na
década de 30. (CARVALHO, 1989, p.2)
A realização de Conferências Nacionais de Educação pela ABE foi confirmada
na obra de Mignot (2002), onde Armanda vinculando a educação na Regional de Meriti
buscou mostrar sua escola para o país tendo seu começo e ápice com a primeira
conferência nacional de educação em 1927, onde Armanda destaca sua experiência e
aponta os mecanismos adotados pela mesma na escola que levaram sua caminhada em
Meriti ao sucesso.
O aliar a educação ao movimento higienista torna-se relevante a nossa discussão,
tendo como referência a obra de Júlio Cesar (2008), que defende os mecanismos
adotados dos dois lados tantos dos sanitaristas como dos educadores para poder resolver
os problemas na saúde em Meriti. A importância de este aliar é confirmada por Ana
Maria Magaldi onde:
(...) a Escola de Meriti chegou a implementar ações diversas, como
conferências públicas e campanhas voltadas para o saneamento da
região, bem como para outros aspectos identificados com a melhoria
da condição de vida da localidade. Concursos também eram
promovidos, como ‘’os das janelas floridas’’, em que se pretendia
‘’combater a fealdade e o desconforto em Meriti. (...) (MAGALDI,
2003, p.84)
Como mecanismos adotados além de cursos de formação que visavam
conscientizar a população através de noções de higiene, defendendo conforme foi
16
apresentado por Julio Cesar (2008) e Vilma Correa (2008), diferente de Mignot (2002),
que a Escola Regional de Meriti buscou dar uma formação através da prática de
puericultura, acompanhando a população em todos os momentos, destacando ainda o
assistencialismo pela escola com a presença do médico escolar, da professora visitadora
que acompanhava a família dos alunos da escola com o objetivo de conhecer sua
realidade e seus problemas, ou ainda a entrega de medicamentos e eventos de saúde
com o intuito de aproximar também a comunidade da escola, fomentando uma cultura
de saúde ou ainda de higiene em Meriti conforme destacou Júlio Cesar (2008).
Outro ponto que cabe aqui mencionar consistiu na defesa de Vilma Correa em
apresentar os mecanismos adotados por Armanda que permitem classificar a experiência
da Escola Regional de Meriti como uma escola ativa e pertencendo ao movimento de
escola nova que teve suas bases na Europa e chegou ao país na década de 20.
Como método adotado por Armanda percebe-se nas três dissertações o ressaltar
da importância do círculo de mães no ano de 1925, onde o ‘’objetivo era o de transpor o
abismo, freqüentemente mencionado, entre a educação dada pelos pais, vista como
inapropriada, e aquela considerada apropriada, ministrada pela escola. (MAGALDI,
2003, p.84)
Outro ponto importante consistiu na adoção de concursos para buscar esta
integração com a comunidade, como o conforme mencionado anteriormente o de janelas
floridas iniciado em 1923. A Escola Regional de Meriti, escola esta de ensino primário,
não estabeleceu provas ou avaliações, somente muito depois começou a emitir boletins,
mas sem constar neles notas, o que foi confirmado nas obras de Mignot (2002) e Vilma
Correa (2008).
A ideia desde início era formar uma escola que não houvesse separação de
gênero, com cada aluno sendo responsável por uma função dentro da escola, havendo
aulas ao ar livre como a de estudo da natureza com o intuito de incentivar a
experimentação, observação e o olhar cientifico do aluno. Com uma educação voltada
para o trabalho eram comuns aulas práticas de carpintaria conforme foi apresentado nas
três obras.
Conforme destacou Mignot (2002) e Júlio Cesar (2008) que desde o início de
sua fundação, a docente Armanda buscou formar um ambiente vivo, prático, dinâmico e
17
científico estabelecendo uma defesa da solidariedade entre os membros da escola,
separando o mundo do adulto do da criança, onde se tornava necessário trabalhar o
lúdico do discente por intermédio da literatura infantil.
Os adventos dos anos 30 levaram Armanda a uma luta frenética pela educação
de seu país. Em 1932, se tem o estabelecimento do manifesto dos pioneiros da escola
nova, manifesto este que será intensamente criticado pela ala conservadora da Igreja
Católica. O embate ideológico dos anos 30, sobretudo entre aqueles que se intitulavam
como reformadores ou tradicionalistas é confirmado na obra de Mignot (2002) e
também ratificado por Marta de Carvalho:
Nela se lê que ‘’doutrinas extremadas’’ e um conflito de ideologias
importado teriam turvado as cristalinas águas de um embate, cujo teor
é captado como oposição entre ‘’novos’’ e ‘’velhos’, ‘’fato normal e
constante em todas as sociedades’’. Os agentes da contenda são
diluídos: a política escolar da Igreja é apenas fator desencadeador de
um embate, que se deu no campo ideológico mais amplo, como
conflito entre posições de esquerda e de direita. Mas, também este
conflito é esvaziado: tais ‘’doutrinas extremadas’’ teriam sacudido e
turvado, sem conseguir desviá-la de seu curso, a contenda entre
‘’tradicionalistas’’ e ‘’renovadores. (CARVALHO, 1989, p.3)
Outro ponto defendido por Mignot (2002) e que também é apresentado por
Marta de Carvalho (1989), é que a década de 30, demarcou profundos reflexos na
educação oriundos da dita “revolução” de 1930, por intermédio da criação de uma
consciência educacional, de um ministério da educação e a reorganização de um ensino
secundário e superior.
No ano de 1933 ocorre a fundação da União Popular Caxiense 15que inclusive
exerceu auxílio na localidade conjuntamente com a escola promovendo medidas
assistencialistas como atendimento médico e odontológico, distribuindo roupas e
remédios à população local.
Vale ressaltar a influência de Froebel sobre o pensamento de Armanda, uma vez
que, a educadora estabeleceu a utilização do jardim e do jardim de infância, tendo em
15Instituição que lutou pela emancipação de Duque de Caxias, sendo composta por jornalistas, médicos e
políticos locais.
18
vista que as crianças seriam como flores. (SANTOS, 2002, p.123). A formação de uma
educação higiênica é notória em Meriti, onde o cultivo da infância é apresentado e
difundido através dos jardins e das árvores presentes na escola.
Na conjuntura dos anos 20 no Brasil, através da influência de Belisário Penna se
percebe que por meio do discurso higienista busca-se mudar as relações sociais e
políticas em Meriti, onde a educação e o cuidado com a criança eram instrumentos de
luta para modificar tais relações. O movimento higienista era apresentado como a
solução dos problemas do país atrelado a questão educacional onde ‘’A ação educativa e
civilizadora eliminaria os fatores adversos, os vícios, produzindo uma nação regenerada
e grandiosa para os indivíduos, a sociedade e o Estado’’, (SANTOS, 2008, p.132)
A formação de uma pedagogia higienista é perceptível, moldada sobre os pilares
da ordem e da moral, onde a ideia consistia na melhora do homem por meio do futuro
através da educação, onde era dever da educação melhorar a vida na localidade, o futuro
do país.
No tocante a escola nova no Brasil, se percebe a defesa de Júlio Cesar (2008) em
apresentar as características destas na escola regional de Meriti, onde existia a defesa da
autonomia da consciência da criança, liberdade pessoal de escolha, compreensão da
realidade da criança, onde a mesma deveria ter contato com a terra, tendo aulas de
carpintaria e jardinagem.
Analisar a Escola Regional de Meriti também é perceber as instituições que
patrocinaram o movimento higienista através da mesma, como o Serviço de Profilaxia
Rural, que juntamente com a escola tinha por objetivo acompanhar o aluno e sua
realidade a qual estava inserido e o Departamento Nacional de Saúde Público que foi
responsável também por atuar na promoção da saúde pública na localidade. (SANTOS,
2008, p.157)
Com o manifesto dos pioneiros da escola nova em 1932, conforme apresentou
Júlio Cesar (2008) e Vilma Correa (2008), Armanda solidificou as estruturas de sua
escola em Meriti na Baixada Fluminense, estabelecendo conforme destacou Sônia
Camara um ensino laico, sem distinção de gênero, chamando a responsabilidade do
Estado apesar de sua iniciativa particular em promover a educação na localidade, onde:
19
Partindo deste pressuposto sobre o Estado e seu papel diante da
educação, defendiam como preocupação primeira a concepção da
escola única, acompanhada da defesa da laicidade, da obrigatoriedade,
da gratuidade e da coeducação como condições essenciais para a
política de educação a ser erigida pelo Estado (CAMARA, 2003, p.39)
Vale destacar que a ideia dos reformadores conforme defendeu Mignot (2002)
em sua obra consistiu em enfrentar os problemas relativos à educação brasileira por
intermédio da organização de uma cultura, onde a educação é enxergada em moldes
nacionalistas por intermédio da noção de trabalho, defendendo ainda novos métodos de
administração escolar e a aplicação mais larga dos métodos científicos aos problemas
oriundos da educação no país. As críticas sofridas pelos reformadores se acentuaram
quando os católicos que não aceitavam a defesa do manifesto na premissa de um ensino
laico em detrimento do ensino religioso acabaram culminando na saída destes da
Associação Brasileira de Educação nos anos 30.
Outro ponto importante a mencionar na presente discussão, consiste em destacar
conforme apresentou Mignot (2002) e Vilma Correa (2008) em que a Escola Regional
de Meriti buscou romper com os valores de uma educação tradicional que era marcada
por castigos, rigor excessivo para com o aluno por parte dos professores, apenas visando
uma memorização de conteúdo. A partir da experiência em Meriti, Armanda defende
uma escola que estimule o aluno a estar naquele ambiente, valorizando o cientificismo,
a experimentação, a contextualização dos fatos, o meio sendo inserido na escola. Tais
práticas podem ser classificadas como medidas oriundas da escola nova, onde Carlos
Monarcha confirma tais fatos quando:
É de notar o modo pelo qual engendrou-se um mito de origem da
Escola Nova situado nas nascentes de um extenso rio luminoso que
trazia nas águas uma educação branda centrada no contato com a
natureza, no trabalho coletivo, na autonomia individual e no princípio
de interesse. (MONARCHA, 2009, p.61)
Torna-se fecundo destacar ainda a partir de um olhar em Gramsci e seu
pensamento, que tanto os membros da sociedade civil e política são marcados por atores
ou agências que irão promover medidas no parâmetro social, educacional, cultural,
20
institucional na conjuntura de seu tempo sob a tutela ou não do Estado. Tais fatos são
confirmados por Sonia Regina de Mendonça onde:
Pensar o Estado gramscianamente é pensá-lo sob dupla perspectiva. A
primeira remete às formas mediante as quais as frações de classe se
consolidam e se organizam para além da produção, no seio da
Sociedade Civil, enquanto a segunda, refere-se às formas pelas quais
as agências ou órgãos públicos contemplam projetos e/ou atores
sociais emanados dos aparelhos privados de hegemonia dos quais a
sociedade civil é portadora. (MENDONÇA, 2005, PP.11-12)
A partir do ponto mencionado acima, torna-se fecundo ainda apresentar
conforme destacou Júlio Cesar (2008) e Vilma Correa (2008) determinados agentes e
agências da sociedade civil e política que possibilitaram o desenvolvimento da
experiência escolar da Regional de Meriti na Baixada Fluminense.
Vale destacar ainda o emprego do conceito de Sertão para a região da Baixada
Fluminense, onde tal conceito de Sertões parte de premissas com uma visão negativa
apresentando a noção de sertão como atraso e outra positiva o sertão como caminho
para uma autêntica consciência nacional. A partir disso, o autor estabelece que o sistema
educacional criado em Meriti fosse criado através das leituras nacionais realizadas pelos
intelectuais da saúde, dos conceitos apreendidos por educadores estrangeiros e ainda por
questões práticas da localidade que sofria com as doenças endêmicas e o abandono.
(SANTOS, 2008, PP.43-44)
Importante destacar que se torna fecundo repensar as práticas pedagógicas com
as modificações da organização espacial e social da Baixada Fluminense, que mesmo
com a criação de instituições que buscassem dar um saneamento adequado na
conjuntura dos anos 10 e 20 ocorriam em anos posteriores como a dos anos de 28 e 29
de febre amarela gerando um teor caótico na população local, onde na maioria dos casos
o Estado que deveria promover tais mudanças e soluções fechava seus olhos para uma
população concebida pelo ideal de sertão, isto é, atrasada e abandonada.
Considerações Finais
21
A partir da revisão de bibliografia, o artigo tencionou apresentar a trajetória de
vida política, social e educacional de Armanda, que enquanto filha de seu tempo, sofreu
e exerceu influência da conjuntura dos anos 20 e 30. Na sua luta pela educação em
Meriti, por intermédio da Escola Regional de Meriti, engatou sua experiência escolar, a
causa política do país, enxergando que por meio da educação era possível se libertar dos
inúmeros problemas que assolavam o solo brasileiro.
Nota-se que o projeto desenvolvido por Armanda Álvaro Alberto na Baixada,
não foi um projeto isolado, mas sim que recebeu inúmeros financiamentos de agentes da
sociedade política e civil. A partir das influências da escola nova européia de
Montessori e Pestalozzi, assim como a escola laboratório de Dewey, começou a
empregar métodos de escola ativa em Meriti no ano de 1921, fundando a Escola
Proletária de Merity.
A partir de uma escola que adotou prática de escola nova na localidade,
buscando desde o início a integração com a comunidade, formando uma educação que
fosse voltada para o trabalho, lutando contra as condições precárias de higiene na região
aliando o movimento sanitarista de Belisário Penna a causa educacional, formando a
professora visitadora com o intuito de conhecer a realidade de seu aluno e ainda o
médico escolar que fomentou cursos e conferências na escola para conscientizar os
alunos e seus responsáveis da questão de saúde e higiene da região.
Outro ponto constatado consistiu na vinculação política com instituições de
cunho privado, como a Associação Brasileira de Educação, a Liga Nacional Contra o
Analfabetismo, a União Feminina do Brasil, a Associação Cristã Feminina, a Seção de
Cooperação da Família que investiram e financiou o projeto de Armanda com o intuito
de divulgar suas idéias pelo país, enxergando também a importância dos direitos das
mulheres na luta pelas suas conquistas na sociedade e também a educação.
Vale ressaltar que Armanda adotou métodos na escola contrários a educação
tradicional que valoriza a memorização do aluno e castigos na mesma como forma de
disciplina, em oposição à docente empregou aulas práticas ao ar livre com Estudos da
Natureza, introduziu na escola a biblioteca Euclides da Cunha, criou o Museu Escolar,
22
formou um ensino primário integral, introduziu a merenda escolar, defendeu a literatura
infantil e ainda o uso da linguagem que fosse acessível às crianças, o estímulo a
observação, experimentação e a utilização do método científico, não formou avaliações
e provas para o seu aluno, defendeu a liberdade deste de se expressar, buscou
desenvolver em cada aluno para que este executasse uma função dentro da escola,
estimulando a solidariedade social, demonstrando por estes mecanismos, que é possível
se formar através do espaço escolar, uma memória local que fomente a identidade da
região.
A docente com o intuito de aproximar e consolidar seu projeto pedagógico na
Baixada Fluminense, promoveu cursos como o de Janelas Floridas e o de criações
aproximando a região e a escola, criou em 1925 o Círculo de Mães fustigando um
contato com os membros das famílias, transmitindo além de formação a estes o
desenvolvimento da puericultura nos encontros.
A articulação com a educação e a política em Armanda, é perceptível com a
participação da mesma na Primeira Conferência Nacional de Educação em 1927, onde
na mesma a docente procurou apresentar o seu projeto escolar em Meriti. Acentuando
tal fato, se percebe em Armanda sua participação como uma das signatárias do
Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova em 1932, que estabeleceu uma defesa de um
ensino laico em contraste ao religioso, onde o Estado deveria promover o mesmo, com
uma educação sem distinção de gênero e ainda gratuita.
A discussão sobre o presente Manifesto se acentuou recebendo críticas de
católicos e integralistas, que o acusaram diante do seu tom de ter laços com o
comunismo e ao fato do mesmo defender o ensino laico em detrimento do ensino
religioso.
Apesar da experiência de Armanda na Baixada, ser de uma escola de iniciativa
particular, a mesma sempre defendeu que ensino chegasse a todos, sem restrição de
sexo, buscando sugar o meio a qual a escola estava inserida, com o intuito de formar
uma escola rural na mescla entre o urbano e o rural de Meriti, fustigando a busca pela
identidade local e nacional a partir de uma escola que fosse regional.
Vale destacar que a partir da Escola Regional de Meriti, cuja mesma de caráter
ruralista na Baixada Fluminense, buscou por intermédio de seu ruralismo, fomentar uma
23
cultura e memória escolar, buscando formar por meio de um ensino agrícola com aulas
de Estudo da Natureza para seus alunos, formando também a identidade local,
integrando a comunidade com seu projeto escolar.
A partir das práticas desenvolvidas na escola por Armanda, constatou-se que o
ruralismo fomentado a partir da escola, está vinculado a um engajamento político, de
luta social, conotado também pela mudança de nome da escola em 1924 para uma
escola que fosse regional e ainda fustigasse nos alunos uma consciência nacional, onde
a educação seria a solução para os problemas do país.
Outro ponto constatado consistiu em vincular a causa educacional ruralista e
higienista visando à solução dos problemas do Sertão como era rotulada a região da
Baixada Fluminense, especificamente Meriti, tendo em vista que agentes e agências da
própria Baixada promoveram a experiência escolar de Armanda, em meio a uma cidade
que estava contrastada pela dualidade entre o urbano e o rural.
O projeto educacional de Armanda, vinculando o ruralismo por meio de uma
escola agrícola na Baixada Fluminense, foi consolidado também por meio da adoção de
práticas escolanovistas em Meriti, ações estas advindas da Europa, que procuraram
formar uma escola viva, dinâmica, prática, formando uma educação que fosse voltada
ao trabalho, com cada aluno sendo chamado a exercer uma função dentro do seio
escolar, lutando contra os indicadores alarmantes na saúde pública da região, por meio
do movimento sanitarista de Belisário Pena conforme mencionado anteriormente.
Constatou-se ainda que a dualidade entre ruralismo e escolanovismo no projeto escolar
de Armanda está intrinsecamente ligada e em profundo diálogo, buscando formar uma
identidade local e uma cultura ainda de memória escolar por meio do espaço e da
integração entre a escola e a comunidade de Meriti.
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24
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