A Funçao Compensatoria Dos Sonhos Monog

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Francisco Purcotes Júnior A função compensatória dos sonhos CONIUNCTIO Revista Eletrônica de Psicologia e Religião | Ichthys Instituto | Curitiba - PR Ano I | número 1 | 2012

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monografia que mostra a importancia dos sonhos e de que maneira se dá a função compensatória.

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    CONIUNCTIO Revista Cientfica de Psicologia e Religio | Ichthys Instituto | Curitiba - PRAno I | nmero 1 | 2012

    Francisco Purcotes Jnior

    A funo compensatria dos sonhos

    CONIUNCTIO Revista Eletrnica de Psicologia e Religio | Ichthys Instituto | Curitiba - PRAno I | nmero 1 | 2012

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    A funo compensatria dos sonhos

    Introduo

    De acordo com Jung, nascemos incons-cientes e com o passar do tempo, por meio das experincias que vamos tendo na infncia, nosso ambiente e a educao que recebemos, a cons-cincia vai se criando. Entretanto, esse incons-ciente no desaparece, ele se manifesta na vida dos indivduos de diversas maneiras, uma delas por meio dos sonhos.

    Os sonhos so estudados h sculos pelas mais diversas pessoas, cada uma com um objeti-vo diferente. Com eles, algumas pessoas querem prever o futuro, outras procuram por mensagens secretas, e h outras linhas de pensamento, ainda,

    Francisco Purcotes Jnior*

    * Francisco Purcotes

    Jnior, psiclogo, es-

    pecialista em psicologia

    analtica e religio orien-

    tal e ocidental.

    [email protected]

    que buscam fatos do passado que possam estar agindo na vida do indivduo, enquanto religiosos a rmam que os sonhos so recados de Deus.

    A psicologia analtica, por meio de toda uma base terica, oriunda de experincias de consultrio do psiquiatra Carl Jung, descreve di-versos mtodos de trabalho com sonhos e como as imagens trazidas pelos pacientes so impor-tantes para o processo de individuao do ser.

    Os sonhos, em geral, possuem algumas funes na vida da pessoa, sendo uma delas cha-mada de compensatria. Compreender como ocorre essa compensao auxilia o paciente a descobrir novos potenciais em sua vida, a enten-

    Resumo

    Este texto tem a nalidade de apresentar, explicar e descrever uma das funes principais dos sonhos, segun-do a proposta terica do psiquiatra suo Carl Gustav Jung. Esta funo chamada compensatria, ou seja, restabelece o equilbrio psquico do sujeito. Pelo fato de cada vez mais as pessoas apresentarem problemas psicolgicos, di culdades e com a necessidade de lidarem com as mudanas da vida, pode-se utilizar os sonhos como um instrumento teraputico, pois so de grande utilidade no que se refere ao desenvolvimento e autoconhecimento. Para compreender como isso ocorre, o texto prope uma bsica explanao sobre a psique, bem como, da estrutura do aparelho psquico, por meio de uma reviso na literatura j existente.

    Palavras-chave: sonhos, funo compensatria, psique, Jung.

    Abstract

    is paper aims to present, explain and describe one of the main functions of dreams according to the theoretical proposal of Swiss psychiatrist Carl Gustav Jung. is function is called compensatory, it restores the psychic balance of the subject. Because more and more people experiencing psychological problems, di culties and need to deal with lifes changes, you can use dreams as a therapeutic tool, because they are very useful when it comes to development and self-knowledge. To understand how this happens, the text o ers a basic explanation of the psyche and the structure of the psychic apparatus through a review of existing literature.

    Keywords: dreams, compensation function, psyche, Jung.

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    der fatos, pensamentos e sentimentos, e a mudar de atitude em relao sua vida atual.

    A justi cativa para se estudar o assunto provm da constante necessidade do pro ssional que trabalha com a psique humana, seja ele tera-peuta, religioso ou conselheiro, de no ignorar o sonho em seu trabalho, mas agregar o contedo dos sonhos ao processo teraputico, tendo em vista que o sonho e seu material fazem parte do sujeito e so essenciais para o desenvolvimento de todo o processo que dever ocorrer durante o tratamento.

    No com o objetivo de cura, como enten-dido no modelo mdico, mas com o objetivo de autodesenvolvimento ou do que Jung chama, na psicologia, de processo de individuao, os so-nhos so materiais essenciais para o tratamento psicolgico, visto trazerem informaes impor-tantssimas sobre o andamento e o ritmo do de-senvolvimento psquico do sujeito.

    Por meio de uma reviso de literatura, o texto procura abordar o que pensam os autores Junguianos sobre o tema dos sonhos, quais so as suas de nies, como utilizar o sonho em uma terapia, e como se d a compensao efe-tivada pelos sonhos. Busca-se resposta ainda ao que seria essa funo, e como se pode dela lanar mo para avanar no caminho de tornar-se si-mesmo.

    Desenvolvimento

    Segundo Hall (1983, p. 14), ao falar sobre a diviso estrutural da psique humana de acor-do com a psicologia analtica criada por Carl Gustav Jung, a psique pode ser representada da seguinte maneira: a percepo consciente da pessoa, chamada de conscincia pessoal; o in-consciente pessoal, ou seja, o que dela exclusi-vo, mas no consciente; a psique objetiva, ou o inconsciente coletivo, que contm uma estrutura universal na humanidade e o mundo exterior da conscincia coletiva, a cultura.

    Grinberg (2003, p. 80) a rma que nasceu junto com a humanidade a experincia do in-

    consciente. Os antigos hindus, egpcios e he-breus, bem antes de Freud e Jung, j tinham conscincia da existncia de aspectos desconhe-cidos e estranhos nas pessoas, que a conscincia no era capaz de compreender nem controlar.

    Grinberg tambm ressalta que quando deixamos de dar ateno conscientemente a al-guma ideia ou emoo, essas no desaparecem nem deixam de ter in uncia sobre nossas vidas, mas surgem no inconsciente por meio de ima-gens e sonhos.

    Chamados de visitantes da noite por Jo-hnson e Ruhl (2010), desde a antiguidade, os sonhos so objetos de interesse das pessoas. Os gregos antigos acreditavam que os sonhos pode-riam nos orientar sobre o futuro ou nos oferecer informaes do outro mundo, de tal modo que nos poderiam ajudar a curar doenas.

    Johnson e Ruhl (2010, p. 150) de nem os sonhos como uma das criaes da nature-za, uma expresso espontnea, manifestao da fora da vida que ui em e atravs de ns. Por diversos motivos, importante prestar ateno aos sonhos; os complexos causam ns em nos-sas vidas que os sonhos ajudam a desatar. Os sonhos nos oferecem uma fonte abundante de criatividade, renovao, fora e sabedoria. So um portal direto para que aquilo que est madu-ro possa se manifestar na conscincia ( JOHN-SON; RUHL, 2010, p. 150).

    Segundo Von Franz (2007, p. 14), Jung te-ria descoberto que enquanto as pessoas dormem, por meio de seus sonhos, despertam para aquilo que so realmente. Desta forma, a coisa mais saudvel que o ser humano pode fazer prestar ateno aos seus sonhos.

    Bosnak (2006, p. 50) diz que os sonhos se renem ao redor de temas espec cos que se ma-nifestam no tempo. Suas imagens passam atra-vs de um processo contnuo de transformao, s vezes comum a uma srie de imagens que se apresentam como sonhos.

    Sobre a linguagem dos sonhos, Whitmont

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    (1969) explica:O sonho fala na linguagem simblica arcaica da psique objetiva. Ele fala a srio e exprime, em ter-mos simblicos, o lado desconhecido da situao de vida da maneira que apreendida e espelhada pelo inconsciente. Os sonhos, portanto, no so sintomticos, mas simblicos. Eles so simblicos, visto que a psique objetiva no conceitualiza; ela no fala ingls, francs, alemo ou chins; ela fala imagens, que so formas aborgenes de percepo e expresso (1969, p. 35)

    O sonho no funciona como estamos acos-tumados a ver o mundo enquanto acordados. No sonho no existe tempo nem espao, passado e presente se misturam, e, junto com esses conte-dos, h resqucios de atividades que ocorreram durante o dia. H imagens estranhas e contra-ditrias, uma combinao fantstica de ideias (GRINBERG, 2003, p. 112).

    Os sonhos podem ser didaticamente divi-didos em quatro fases: na primeira, aparecem as cenas onde se passa a ao, onde so conhecidos os personagens e as pessoas envolvidas; na se-gunda fase, desenvolve-se o enredo do sonho, as complicaes, a histria; a fase trs chamada de clmax, e onde geralmente acontece algo deci-sivo ou que muda o enredo; a ltima fase apre-senta o resultado do sonho, a soluo, a situao nal (GRINBERG, 2003, p. 112).

    Cavalcanti con rma que os sonhos [...] comportam-se como compensaes da situa-o da conscincia em determinado momento (apud JUNG, 2007, p. 35).

    Grinberg reitera que o sonho um re-gulador do equilbrio psquico. Pode-se a rmar que seu signi cado principal estabelecer uma relao entre a vida consciente e inconsciente (2003, p. 116).

    Sobre o termo compensatrio, utilizado por Jung para explicar a funo deste tipo de sonho, ele prprio diz: Uso de propsito a ex-presso compensatria e no a palavra oposta, porque consciente e inconsciente no se acham

    necessariamente em oposio, mas se comple-mentam mutuamente, para formar uma totali-dade: o si-mesmo (1996, p. 53).

    Segundo Grinberg, a palavra compensar vem do latim compensare, e signi ca igualar, ba-lancear e comparar diferentes dados e pontos de vista, a m de produzir um ajuste ou reti cao (2003, p. 118).

    Por outro lado, de acordo com Whitmont: O sonho no censura ou distorce. E, diferen-ciando a viso freudiana sobre a abordagem dos sonhos da viso junguiana, continua: Os apa-rentes fenmenos de distoro, de condensao e de substituio realmente ocorrem nos sonhos, mas no servem necessariamente ao propsito de disfarar um desejo inaceitvel (1969, p. 34).

    Whitmont (1969) exprime a ideia de que o sonho fala em forma simblica sobre situaes desconhecidas da vida. Completa sinalizando que, diferentemente de Freud, seu professor e mestre, Jung no v o contedo manifesto no sonho na forma de imagens, como se ali se ocul-tasse algum contedo latente.

    Segundo Hall, na psicologia junguiana, o sonho considerado um processo psquico na-tural, regulador, anlogo aos mecanismos com-pensatrios do funcionamento corporal (1983, p. 30).

    Santos a rma que os sonhos compensat-rios so aqueles que corrigem um autoconceito pobre que temos a nosso respeito e se referem ou a situaes que acreditamos no termos tido um bom desempenho ou a pessoas com quem con-vivemos. Desta forma, estes sonhos podero dis-torcer pessoas que admiramos, nos dando uma imagem diminuda desta pessoa (2009, p. 30).

    De acordo com Von Franz, o sonho corri-ge nossas atitudes (2007, p. 50).

    Grinberg con rma que o objetivo a compensao da unilateralidade, dos erros, des-vios e atalhos da atitude consciente. O incons-ciente encarrega-se de registrar e fazer a orar o

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    que a conscincia deixou passar despercebido (2003, p. 118).

    Hall diz que o sonho pode compensar es-tas distores temporrias na estrutura do ego, direcionando o sujeito para entender melhor suas atitudes e aes. Como exemplo, o autor cita uma pessoa que est furiosa com um amigo, por reprimir esta fria, sonha que violentamente se volta contra este amigo. importante para o sonhador, identi car qual complexo foi ativado nesta situao (1983, p. 31).

    Para Hall, essa seria uma primeira forma de compensao inconsciente para o sonho. Ja-mes Hall continua seu texto dissertando ento sobre uma segunda forma de compensao, veri- cada no processo onrico. Diz ele:

    Um segundo e mais profundo modo de compen-sao aquele em que o sonho, como autorepre-sentao da psique, pode colocar uma estrutura do ego em funcionamento face a face com a necessi-dade de uma adaptao mais rigorosa ao proces-so de individuao. Isso em geral ocorre quando o indivduo se desvia do caminho pessoalmente correto e verdadeiro. A meta da individuao nun-ca simplesmente um ajustamento s condies existentes; por mais adequado que tal ajustamento parea, uma tarefa adicional est sempre espera. [...] Um exemplo desse segundo tipo de compen-sao o sonho de uma pessoa que estava muito bem adaptada socialmente, nas reas da vida co-munitria, familiar e de trabalho. Ela sonhou que uma voz impressionante dizia: No ests levando tua verdadeira vida! A fora dessa declarao, que a despertou em sobressalto, durou por muitos anos e in uenciou um movimento na direo de hori-zontes que no estavam claros na poca do sonho (1983, p. 31).

    Arespeito da funo de compensao, Jung a rma que os processos inconscientes de com-pensao do ego possuem todos os elementos para a autorregulao da psique. No nvel pes-soal, estes processos so constitudos por razes que a conscincia desconhece, mas que apare-

    cem nos sonhos, ou tambm por situaes igno-radas no dia-a-dia, afetos ou crticas que no nos permitimos (1996, p. 53).

    Por sua vez, ao ser questionada sobre a fun-o dos sonhos, Santos diz que o sonho mostra pessoa coisas que ela no est tendo a possibili-dade de ver. Infelizmente a linguagem do sonho no sempre entendida pelo sonhador, de forma que muita coisa acaba sendo perdida, o que no gera aprendizado (1976, p. 139).

    Von Franz a rma que o sonho nunca diz o que j sabemos. Ele indica algo desconheci-do, um ponto cego. como tentar olhar para as costas. Voc pode mostr-las para o mdico, que examinar como esto, mas no pode v-las (2007, p. 51).

    Grinberg fala sobre o princpio da equi-valncia na teoria Junguiana, onde sempre que uma quantidade de energia gerada em um dos polos da psique, automaticamente surge no ou-tro polo uma quantidade de energia equivalente, com o objetivo de regular e neutralizar a energia psquica. Este princpio pode ser utilizado para analisar os polos conscientes e inconscientes da psique. A rma Grinberg: Se imaginarmos a psique como um sistema fechado, podemos a r-mar que a energia psquica est em uxo cons-tante de um sistema da personalidade para o outro, do consciente para o inconsciente e vice-versa (2003, p. 92).

    Deste modo, Grinberg (2003, p. 93), a respeito da ligao sobre a energia psquica e os sonhos, con rma que o inconsciente tem a ca-pacidade de criar espontaneamente coisas novas, ativar uma certa quantidade de energia e foras sua entrada na conscincia. Podemos sonhar com coisa que consideramos estranhas, e s ve-zes, com a soluo de algum problema.

    Grinberg faz uma analogia da psique com um velho ba, aonde podemos esconder coisas que no recordamos ou que no queremos lem-brar. Todavia, faz uma ressalva sobre esses con-tedos. Segundo ele, os contedos que foram

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    reprimidos voltaro inexoravelmente e tentaro voltar conscincia na forma de sintoma ou de sonho.

    Sobre os sintomas e os sonhos que podem ser manifestos pela pessoa quando reprime al-gum contedo, Grinberg diz:

    Antes de chegar a desenvolver sintomas, a pessoa costuma ter sonhos ou receber outras dicas a res-peito do contedo reprimido. Na realidade, quan-do algum contedo desaparece da conscincia, no quer dizer que ele deixou de existir, mas, sim, que perdeu sua energia consciente. A energia psqui-ca que desaparece gera um produto inconsciente que apresenta traos em comum com o contedo desaparecido. Esse produto inconsciente pode sur-gir em sonho ou fantasia como imagem simblica (2003, p. 95).

    Para Hall e Nordby Quando re etimos sobre os nossos sonhos, estamos re etindo sobre a nossa natureza bsica (2005, p. 105).

    Sobre o equilbrio que a funo compensa-tria procura trazer, Jung a rma que os sonhos tm como funo geral tentar restabelecer nos-sa balana psicolgica, produzindo um material nos sonhos que reconstitui sutilmente o equil-brio psquico total (2008, p. 56).

    Um exemplo interessante sobre a anlise de sonhos e a compensao que o inconscien-te proporciona para o indivduo pode ser vis-to em Santos (1976), quando a autora relata o sonho de uma paciente que foi educada a ver a raiva como algo negativo, e reprimindo, assim, qualquer tipo de manifestao de raiva durante a vida e tornando-se passiva diante de muitas ocasies em que precisaria se impor.

    Uma pessoa adulta, cuja vida se caracterizava por passividade imensa, entrara em srio quadro reacio-nal depressivo. Contou-nos um sonho: Via-se na posio horizontal e sendo puxada, por cada perna e por cada brao, numa direo, por vrias pesso-as. Sua falta de reao, decorrente de falta de rai-va, punha-a como joguete, completamente inerte, frente aos outros, fazendo-a sentir-se puxada vio-

    lentamente para todos os lados, como uma coisa. A partir da compreenso do sonho, passou a ter uma atitude, a saber, passou a ter raiva contra isso ou aquilo e a conseguir se conduzir, em vez de se deixar puxar servilmente (SANTOS, 1976, p. 15).

    Outro exemplo clnico de anlise de sonho compensatrio visto em Jung:

    [...] uma jovem que amava apaixonadamente a me, sempre sonhava com ela de modo desfavo-rvel. Esta aparecia em seus sonhos como bruxa, como um fantasma ou como uma perseguidora. A me a mimara exageradamente e a cegara com sua ternura; a lha no podia, pois, reconhecer cons-cientemente a in uncia nociva da me sobre ela. Seu inconsciente, no entanto, exerceu uma crti-ca nitidamente compensadora em relao me (1996, p. 55)

    Von Franz (2007) a rma que quando exis-te uma atitude unilateral da conscincia, mate-rialista demais, espiritual ou racional, ou seja, algo dirigido demais por um nico impulso, os sonhos iro compensar essa situao, trazendo nas imagens o que est pesando do outro lado.

    Sobre a mensagem do sonho: como se o sonho dissesse: Voc est desequilibrado em relao sua totalidade. Essa a sabedoria essencial dos sonhos: preservar um equilbrio entre todos os nossos opostos psquicos e esta-belecer uma espcie de via intermediria (VON FRANZ, 2007, p. 230).

    Por meio do sonho, o inconsciente estaria alertando: Olhe melhor! Um lado necessita do outro. O lado bom contm a semente do mal, e o lado ruim contm a semente do bem (GRIN-BERG, 2003, p. 118).

    Em sua vasta obra, onde mais de 80.000 sonhos foram analisados durante sua prtica cl-nica, Jung obteve material su ciente para elabo-rar sua teoria. Ele reitera que o sonho compensa as de cincias de personalidade, alm de preve-nir as pessoas dos perigos dos seus rumos atuais, e, caso estes avisos sejam rejeitados e ignorados, podem ocorrer acidentes reais ( JUNG, 2008, p.

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    56). Segundo Von Franz, 80% do que nos per-

    segue em sonhos , na verdade, algum aspecto valioso da nossa personalidade que deveria ser integrado (2007, p. 93).

    Para Jung, esses avisos ou mensagens do inconsciente so de real importncia. Cons-cientemente, no nosso dia-a-dia, nos expomos a diversos tipos de in uncia. As pessoas podem nos estimular ou deprimir, eventos de nossa vida pessoal e social desviam nossa ateno. Estes desvios podem nos levar a caminhos diferentes daquele que leva nossa individuao, podemos ou no perceber os efeitos dessas in uncias: O fato que nossa conscincia perturbada e convive, quase sem defesa, com esses incidentes (2008, p. 56).

    Entretanto, a respeito do trabalho do tera-peuta com os sonhos dos pacientes, Jung fala que no seguro querer interpretar um sonho sem observar os detalhes do contexto, e com todo o cuidado possvel. Diz Jung: Nunca aplique uma teoria, mas pergunte sempre ao paciente como ele se sente em relao s imagens que produz (1972, p. 145).

    Jung de ne os sonhos como a reao natural do sistema de autorregulao psquica (1972, p. 145).

    Sobre os contedos que podem vir tona nos sonhos, Jung a rma que h alguns aconte-cimentos que no tomamos conscincia, e que cam abaixo do seu limiar. Estes acontecimen-tos foram absorvidos de forma subliminar pelo sistema consciente. Como ignoramos esses pro-cessos, visto que estes contedos poderiam de alguma forma gerar emoo, eles retornam em forma de imagens em um sonho.

    Geralmente, o aspecto inconsciente de um aconte-cimento nos revelado por meio de sonhos, onde se manifesta no como um pensamento racional, mas como uma imagem simblica. Do ponto de vista histrico, foi o estudo dos sonhos que per-mitiu, inicialmente, aos psiclogos investigar o as-

    pecto inconsciente de ocorrncias psquicas cons-cientes. (2008, p. 22)

    Con rma Jung (2008, p. 58) que muitas das crises que passamos em nossas vidas tm uma longa histria inconsciente.

    deveras deveras importante para a compreenso da teoria Junguiana sobre os so-nhos, deixar claro como funciona a linguagem simblica e qual a importncia dos smbolos para a humanidade. Jung (2008) explica que, pelo fato da compreenso humana ser to limi-tada e existirem coisas fora do alcance do campo consciente, precisamos utilizar smbolos, formas de expresso que tornem possvel a compreenso das coisas que no conseguimos de nir.

    O smbolo demonstra o estado da psique atual, ele funciona como uma ponte entre o consciente e o inconsciente.

    Em toda a sua obra, Jung explicou a ne-cessidade e a importncia do processo de anli-se dos sonhos, de ateno para e percepo das imagens internas do indivduo. Atualmente en-contramos diversos autores e pro ssionais que demonstram interesse em trabalhar com anlise de sonhos.

    Santos (2009, p. 30) acrescenta que, a par-tir do momento em que iniciamos um trabalho com sonhos e comeamos a anot-los, eles vo seguindo uma sequncia na organizao da vida psquica. Mesmo para as pessoas que no tm conhecimento sobre os smbolos dos sonhos, vantajoso que se os anote, pois cada vez mais o inconsciente vai entrando em contato com es-sas imagens, e os sonhos vo se tornando mais claros.

    A relao entre o terapeuta e o paciente tambm amplamente abordada nas obras de Jung, onde so enfatizados todos os pontos re-levantes que um pro ssional da mente humana precisa adotar e se inteirar para que haja efeti-vidade no processo teraputico. A terapia no apenas um processo do paciente, mas uma rela-o entre duas psiques. Tanto paciente, quanto

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    terapeuta devem procurar a anlise para tratar suas questes pessoais. Jung alerta sobre a im-portncia do autocuidado que deve ter o tera-peuta em seu cotidiano clnico:

    O terapeuta deve perceber a todo instante o modo pelo qual reage em confronto com o doente. No se reage s com o consciente; necessrio pergun-tar sempre: como meu inconsciente vive esta situ-ao? preciso, pois, tentar compreender os pr-prios sonhos, prestar uma ateno minuciosa em si mesmo e observar-se tanto quanto ao doente, seno o tratamento poder fracassar (2006, p.160).

    Desta forma, compreende-se como deve ser mtuo o processo de terapia e a prpria an-lise dos sonhos. Ignorar os contedos dos so-nhos deixa as pessoas a merc do inconsciente.

    O processo de anlise Junguiana, que tem como um dos instrumentos o trabalho com so-nhos, deve ser feito da forma mais verdadeira possvel, a m de que o paciente consiga entrar em contato com as imagens encontradas no so-nho. Esse dilogo entre a imagem e o indivduo extremamente necessrio para que o paciente possa se desenvolver. Ele entra em contato com todas as imagens que pertencem a ele mesmo e que de alguma maneira in uenciam sua psique.

    Por colocar o paciente em contato com elementos inconscientes, o trabalho com sonhos pode gerar certa resistncia. Na sua autobiogra- a, Memrias, sonhos e re exes, Jung expe como entrou em contato com seu inconsciente, fazen-do um relato de como foi para ele a experincia de analisar seus prprios sonhos e de enfrentar seus medos:

    Desde o incio, concebera o confronto com o in-consciente como uma experincia cient ca efe-tuada sobre mim mesmo e em cujo resultado eu estava vitalmente interessado. Hoje, entretanto, poderia acrescentar: tratava-se tambm de uma experincia tentada comigo mesmo. Uma das maiores di culdades que tive de superar foi supor-tar meus sentimentos negativos. Abandonava-me livremente s emoes que, entretanto, no podia

    aprovar. Anotava as fantasias que frequentemente me pareciam insensatas e que provocavam minhas resistncias. Enquanto no se compreende sua signi cao, elas parecem uma mistura infernal de elementos solenes e ridculos. Foi a duras penas que perseverei nessa prova atravs da qual o desti-no me desa ara. E s depois dos maiores esforos consegui en m sair do labirinto (2006, p. 205).

    Desta forma, o processo de anlise das prprias fantasias, por mais difcil que seja, deve ser encarado como natural no desenvolvimen-to do ser e a compensao do inconsciente por meio dos sonhos deve ser vista como normal e positiva para a psique.

    Concluso

    De acordo com o trabalho apresentado e com a bibliogra a consultada, percebe-se que o trabalho com sonhos e a anlise dos mesmos so de suma importncia para o desenvolvimento psquico do sujeito, j que so instrumentos ps-quicos de manifestao inconsciente.

    O inconsciente pode se comunicar com o ego do indivduo e apresentar diversas funes. Uma delas a funo compensatria, ou seja, o inconsciente compensa as atitudes conscientes, de forma a proporcionar a homeostase para o sujeito.

    Os exemplos apresentados deixam um alerta para a relevncia do problema onrico, deve-se car atento s imagens que aparecem nos sonhos, levar estas imagens para a terapia e trabalh-las.

    O contato com o inconsciente, como a r-mou Jung, muito difcil. mister que cada pes-soa envolvida na terapia, seja paciente ou ana-lista, enfrente os contedos de sua psique, pois este enfrentamento trs para o sujeito os pontos obscuros de sua vida, coisas entendidas como ruins ou ms, o que pode deix-lo extremamen-te resistente. Entretanto, o nico caminho para a individuao o contato com tais contedos.

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    O sonho de funo compensatria trs possi-bilidades de reconhecimento das falhas que se cometem conscientemente, indicando tambm caminhos que podem ser seguidos e atitudes que o sujeito no est desenvolvendo, mas que tem em potencial. O inconsciente reconhece essa fal-ta e direciona o indivduo por meio das imagens onricas.

    Como pro ssional da mente humana e reconhecendo toda a subjetividade do ser como parte essencial do processo teraputico, o tera-peuta considera o sonho como contedo do su-jeito e as imagens que aparecem no podem ser ignoradas. Essas imagens pertencem ao paciente e dizem algo sobre ele.

    Uma anlise adequada e que traga o pa-ciente ao caminho correto fundamental na te-rapia, na vida, e em todo o percurso que a pessoa ainda ir percorrer.

    Referncias

    BOSNAK, Robert. Breve curso sobre sonhos. 4. ed. So Paulo: Paulus, 2006.CAVALCANTI, Tito R. de A. Jung. So Paulo: Publifolha, 2007. (Col. Folha explica)GRINBERG, Luiz Paulo. Jung o homem cria-tivo. 2. ed. So Paulo: FTD, 2003. HALL, Calvin Springer; NORDBY, Vernon J.

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    A funo compensatria dos sonhos | Francisco Purcotes Jnior | Franciele Engelmann | 44 - 42