A gruta

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21 Alunos do Agrupamento de Escolas da Corga 2009/10 Ilustração Alex Silva A Gruta

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Historia de Roda - Agrupamento de Escolas da Corga de Lobão

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21Alunos do Agrupamento de Escolas da Corga 2009/10

Ilustração Alex Silva

A Gruta

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2 Ele disse-me que me esperava na esquina da rua, abaixo do parque.

Era noite e a luz terna que iluminava os jardins descia, tímida, pelos

raios da lua que espreitavam por entre as nuvens. Queria contar-me o que

vira naquela manhã, na gruta que

ambos tínhamos descoberto, no Ve-

rão passado. Não entendia a razão de

tanto mistério, mas acreditei que algo

realmente estranho e surpreendente

lá tivesse ocorrido. Esperei…esperei…

Até que uma sombra, por entre os

arbustos, me deixou adivinhar a sua

presença intrigante.

Crack! … Crack! …

O ruído semelhante a pas-

sos pisando folhas secas tornou-se

mais forte à medida que um vulto

se aproximava. Sozinha, num lu-

gar isolado, com a lua a brincar às

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3escondidinhas, senti uma vontade imensa de sair dali. As pernas tremiam, o

coração, Pum! … Pum! … teimava em querer sair do peito e um friozinho ins-

talou-se na minha barriga. Nos meus ouvidos martelava este receio. Será ele?

E se é um desconhecido? Oh, my god! E se é um marginal? Tive vontade de

correr, mas as pernas não obedeceram. O vulto aproximou-se, todo de negro e

gorro na cabeça. Ia gritar quando…

– Schiiuu!... Não grites, por favor! – sussurrou o vulto - Sou eu, o

Nuno.

– Ah! Que susto me pregaste! –

murmurei, toda a tremer. – Afinal, o

que se passa? Qual a razão de tanto

mistério? Porque é que estás assim

vestido? E porque é que temos de

nos encontrar aqui, a esta hora?

– Calma! Pára de me metralhar

com perguntas! – pediu ele muito baixinho

– Vem comigo! Vamos conversando pelo cami-

nho.

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4 E lá fomos nós, lado a lado, enquanto me procurava recompor. Ele

ia observando tudo à nossa volta, muito nervoso. Uns metros adiante,

começou a relatar o que tinha acontecido:

– Lembras-te da gruta que nós desco-

brimos no Verão passado?

– Qual? Aquela que encontrámos jun-

to à praia?

– Sim. Essa mesma. Acontece que re-

solvi passar por lá e fiquei surpreendido,

porque encontrei pegadas de alguém

que só entrou e não saiu… As pegadas

terminavam como num beco sem saída

e o problema foi que tive a sensação de

que estava a ser observado dentro da

gruta. Quando me dirigia para casa, tive

a certeza de que estava a ser seguido

por uma senhora com a cara escondida

por um lenço…

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5 – Que estranho! – comentei, encostando-me a uma parede fria e rugo-

sa.

A história do Nuno era muito esquisita. Estaria ele a inventar aquilo

tudo só para me assustar? Estaria a contar a verdade?

O Nuno, impaciente, interrompeu os meus pensamentos:

– Sónia, queres ouvir o que aconteceu a seguir?

– Conta, conta! – pedi-lhe, não escondendo a ansiedade.

– Quando descobri que estava a ser seguido, fiquei preocupado. Então,

resolvi trocar-lhe as voltas, apanhá-la de surpresa e…

– Conseguiste apanhá-la? – perguntei eu, cada vez mais ansiosa.

– Claro que consegui! – exibiu-se o Nuno – Mas, quanto mais me apro

ximava da tal senhora, mais a achava parecida com…

– Com quem? – disparei eu.

– Calma, Sónia! – disse o Nuno, aparentando uma calma que não sentia

– A senhora era a D. Joaquina, a nova vizinha do 3º andar!

– O quê? – gritei eu, apanhada de surpresa - A D. Joaquina? Não pode

ser!

Perante a minha indignação, o Nuno tentou acalmar-me, assegurando

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6 que era a mais pura verdade, também ele ficou perplexo com aquela situ-

ação. Disse-me que o melhor era averiguar, mas precisava da minha cola-

boração. Assenti, sem pensar muito, estava atónita. O plano consistia em

vasculhar a casa de D. Joaquina. Combinámos que eu arranjaria maneira

de entrarmos no apartamento da vizinha esquisita.

No dia seguinte, esperámos que D. Joaquina chegasse com as com-

pras da semana. O Nuno escondeu-se no vão das escadas e eu aproximei-

me dela e perguntei-lhe:

– Olá, D. Joaquina! Quer ajuda com os sacos? Devem pe-

sar…

– Oh! És muito simpática! Se não te importares…

– Claro que não me importo Assim, até faço exercí-

cio!

– Eu já tive o teu vigor, mas agora a idade

não me ajuda muito.

– Não parece muito velha! Que idade tem?

– Já fiz sessenta primaveras. – afir-

mou D. Joaquina.

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7 – Ah! Mas não aparenta. Tem uma pele tão

jovem! – observei, tentando fazer conversa para

ganhar a sua confiança.

Finalmente, chegámos ao 3º Andar,

prontifiquei-me logo para entrar e ajudá-

la a arrumar os sacos das compras. No

entanto, ela mostrou-se relutante em

deixar-me entrar, parecia estar a esconder

algo. Ocorreu-me, então, pedir um copo com

água:

– É que os degraus são muitos para sacos tão

pesados! – disse eu.

– Está bem, se é só isso, vou lá dentro

buscar.

O plano estava a funcionar. Assim que ela entrou, sussurrei ao Nuno:

– Despacha-te, podes entrar agora!

– Está bem, depois, abro-te a porta.

– Aqui está a água – afirmou D. Joaquina.- E obrigada!

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Escondi-me. Não demorou muito que D. Joaquina voltasse a sair de

casa. Aguardei que o Nuno me abrisse a porta.

– Vá, temos que ser rápidos. – Afirmou o Nuno.

Percorremos a casa toda, na tentativa de encontrar algo suspeito.

Nada!

Abrimos armários, espreitámos debaixo da cama e…

– Não acredito! - exclamámos ao mesmo tempo – Uma máscara de

silicone com as feições de D. Joaquina e uma peruca?

– Mas quem será esta mulher? – Interroguei.

– Se calhar a verdadeira D. Joaquina está raptada na gruta!

Estávamos nós ainda a digerir esta descoberta, quando, de

repente, ouvimos o barulho de uma chave na fechadura, ficámos

aterrorizados e só tivemos tempo de nos escondermos debaixo

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9da cama, sem nos mexermos

nem respirarmos!

Debaixo da cama, só conse- gu ía -

mos ouvir o barulho de gavetas a fe-

char e a abrir. Quando D. Joaquina

voltou a ausentar-se, saímos de-

baixo da cama e retomámos a nossa

busca, contudo não encontrámos mais nada. Nuno, cansado, encostou-se a

uma parede que subitamente rodou. Foi aí que descobrimos uma passagem

secreta para um compartimento.

Curioso e admirado, Nuno disse-me:

– Anda Sónia, vamos descobrir o que existe

aqui dentro!

Eu, pálida e quase a desmaiar, respondi:

– Não, nem pensar….tenho medo de não

voltar!

Ele voltou a insistir:

– Vem comigo, Sónia, nada nos acontecerá…temos oportunidade de

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10 desvendar este mistério de uma vez por todas!

Já mais convencida, disse:

– Ai meu Deus….está bem…estou cheia de medo, protege-

me, por favor!

Então, entrámos de mãos dadas e começámos a

caminhar lentamente. Descobrimos bilhetes de

identidade, passaportes, muitas fotografias de

várias pessoas, caras em silicone, dinheiro e uns

binóculos.

– O que estão aqui a fazer? – gritou uma

voz rouca e de poucos amigos.

Estávamos tão envolvidos a vasculhar aquele com-

partimento minúsculo repleto de objectos, que

nem demos pelo regresso de D. Joaquina.

Para maior espanto nosso, esta tirou uma máscara

de silicone! Uma jovem ruiva, de olhos verdes e sardas na

cara revelou o seu rosto. Parecia uma Bond Girl!

Era gira, mas ambos ficámos aterrorizados. Eu, já completamente

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11arrependida de ter acedido ao pedido de Nuno, aflorava-me apenas ao pensa-

mento um desfecho trágico. Nuno, embora apavorado, não quis demonstrar a

sua fragilidade. Agarrou, então, com força, a minha mão e sussurrou-me:

– Por favor, não desesperes! Juntos venceremos, confia em mim!

– Quem me dera estar assim tão confiante. – balbuciei eu.

– Se queremos ser os heróis desta aventura, teremos de ultrapassar

esta etapa e todos os outros obstáculos que possam surgir.

Enquanto isto, a Bond Girl, entrando naquele compartimento estreito,

sombrio e glacial, avança para nós com uma faca na mão.

Como o cubículo era

pouco iluminado e não era

fácil vislumbrar o canto onde está-

vamos escondidos, a mulher tentou desvendar-nos,

sacando, do bolso direito da sua bata, uma lanterna. O clarão inten-

so feriu o nosso olhar es- pavorido e fez-nos recuar e

sentir o calafrio da pedra.

Súbita e inespe- rada-

mente, a luz da lanterna

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apagou-se, o Nuno, com a determinação de um herói dos filmes de acção,

arrasta-me e, como por magia, quando dei por mim, estávamos já a des-

cer as escadas do prédio, mais rápidos do que um fórmula 1 numa pista

de corrida!

Convenci-me de que já estávamos sãos e salvos desta emboscada.

Ufa! Que alívio! Contudo, as tréguas duraram pouco! A meio da longa es-

cadaria de caracol – não consigo encontrar uma explicação plausível para

o sucedido – fomos capturados por dois indivíduos com corpos musculosos

e atléticos e com cara de poucos amigos que nos conduziram de novo ao

apartamento de D. Joaquina no 3º andar do prédio.

A Bond Girl esperava-nos:

– Com que então julgavam que era fácil escapar! Fechem-nos no

cubículo! Mas antes revistem-nos. Tirem-lhes os telemóveis!

Depois de sermos espoliados por aqueles piratas de água doce, fo-

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mos atirados para dentro do compartimento como se fossemos peças de lego.

Caímos no chão. Sem luz o espaço minúsculo parecia ainda

mais aterrador.

– Nuno, e agora? O que é que fazemos? – perguntei eu já a

chorar.

– Tem calma! Assim, não conseguimos descobrir uma saída

para esta situação!

Ao fim de alguns minutos fechados, os nossos olhos habitua-

ram-se à escuridão e começamos à procura de alguma coisa

que pudesse ajudar-nos a sair dali… vivos, preferencialmente!

– Olha uma caneta! – disse eu.

– Para que é que isso serve agora? Não me digas que vais atacar os

lutadores de wrestling com a caneta? – comentou ironicamente o Nuno.

– Não! Podemos escrever uma mensagem num papel e, se eles nos tirarem

deste cubículo podemos lançá-la pela janela… sei lá!

– Não é má ideia! – assentiu o Nuno – mas escreves

tu! Eu não tenho muito jeito para relatos, ainda mais

por escrito!

Escrevi a mensagem no papel, contando o que nos ti-

nha acontecido e apresentando as suspeitas do Nuno

acerca da gruta e dos movimentos estranhos à sua vol-

ta. Meti o papel no bolso à espera de uma oportunidade

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14 para o largar.

Ficámos ali fechados horas, sem ouvir nenhum ruído. Acabámos

por adormecer.

Acordámos com o barulho estridente da porta a abrir e com um

clarão de luz que nos cegou.

– Levantem-se! Já! – gritou a Bond Girl

Obedecemos sem hesitar.

– Vamos sair do apartamento e vamos entrar no carro que está

estacionado mesmo em frente à porta de entrada. Ai de vocês que me de-

sobedeçam ou que se arrisquem a fugir – disse-nos a Bond Girl com uma

pistola bem encostada ao nosso nariz.

Saímos. Ao descer as escadas, aproveitei um momento de distrac-

ção dos vilões para deixar cair, silenciosamente, a mensagem.

Entrámos no carro e seguimos para a praia, em direcção à gruta.

No areal, todo o percurso foi feito de um modo descontraído fingindo nor-

malidade. Nós e os vilões parecíamos uma família!

Dentro da gruta, encontrámos a verdadeira D. Joaquina muito com-

balida e dois indivíduos desconhecidos.

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15 Mais uma vez, um fim trágico se vislumbrava aos meus olhos. As per-

nas tremiam-me, o coração palpitava e a vista começou a ficar turvada pelas

lágrimas que teimavam em cair. De súbito, escutámos o barulho de um motor,

proveniente da parte traseira daquela gruta…

Entretanto, no prédio, a subir a escadaria de caracol, mui-

to serenamente, seguia Alfredo. Era agente da polícia judiciá-

ria e regressava a casa após largos meses de investigação,

em Espanha, sobre um caso de falsificação de documentos

e imigração ilegal.

Reclamava o facto do prédio, já antigo como ele, não ter

elevador! Subia olhando para o chão para não tropeçar

nos degraus irregulares e gastos, quando encontrou um

papel. Pegou nele, sem curiosidade meteu-o no bolso e

continuou a subir aqueles degraus que pareciam a esca-

daria de Machu Picchu no Peru!

Alfredo entra em casa.

– Joaquina! Joaquina! Onde estás?

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16 Como não obteve resposta, decide deixar a mala no quarto e des-

cobre que a abertura para o seu escritório secreto, onde guardava as con-

clusões das suas investigações, estava aberta. Estava tudo revirado.

– Fomos assaltados! Não! Raptaram Joaquina!

Alfredo mete a mão no bolso à procura do telemóvel para telefonar

às autoridades e sente o papel que apanhou nas escadas…

– É isso mesmo! Entraram no meu apartamento e levaram a Jo-

aquina! Tenho um documento escrito pela miúda do 2º andar, a Sónia!

– disse Alfredo ao telefone – temos de ir de imediato para a praia. Eles

devem ter ido para lá!

Na gruta, os dois gorilas que nos apanharam na escadaria obriga-

ram-nos a sair juntamente com D. Joaquina e os outros dois indivídu-

os.

O Nuno, armado em valentão, deu um pontapé no homem

que o segurava, conseguiu libertar-se e fugir, mas caiu logo a

seguir com um soco bem no meio da testa e desmaiou.

Meteram-nos aos cinco no iate! Era velho, mas

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17era um iate! Para onde íamos?

– Vamos passear – disse um dos lutadores de wrestling rindo às garga-

lhadas.

Eu sempre quis andar de iate, mas esta viagem certamente não iria

apreciar! Sentia-me desconfortável como um lavagante com as pinças amarra-

das num aquário. O vento fresco que me batia na cara tinha um hálito fétido a

morte! Adeus pai. Adeus mãe!

Ainda no apartamento, Alfredo ordenava:

– Levem também uma lancha bem rápida. Nunca

se sabe!

Os agentes da polícia, a mando de Alfre-

do, vasculharam a gruta e pelas pegadas na

areia aperceberam-se que estas se diri-

giam para a água.

– A lancha! Tragam a lancha rápi-

do! – ordenou Alfredo correndo para

água como um rapazito de dez

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anos. Saltou para a lancha esquecendo-se do seu reumatismo, das suas

artroses e da sua hérnia discal que há muito reinavam no seu esqueleto.

Seria uma visão? Uma lancha a toda a velocidade corria sobre as

águas? Não era uma visão. Era mesmo uma lancha! A Bond Girl enervou-

se e aumentou a velocidade do iate.

Nuno acordou. Bastou uma simples troca de olhares para eu per-

ceber que ele pretendia empurrar, com os pés – pois tinha as mãos amar-

radas – os dois matulões borda fora. Assenti com a cabeça, concordando

com o plano. Eu teria de fazer o mesmo com a beldade ruiva que prague-

java, pois o iate ia perdendo terreno em relação à lancha. Um, dois, três…!

Fogo! Parecíamos o capitão Jack Sparrow no filme os Piratas das Caraíbas!

Os três caíram borda fora e … estávamos salvos! Estávamos salvos, mas o

iate seguia a grande velocidade, mas desta vez sem piloto!

Tão rápido como um raio, um agente saltou para o iate em anda-

mento e, depois de uma queda acrobática, parou o motor…

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19Ficha TécnicaTítulo

A Gruta

Autores

Alunos do 5ºC, 6ºB, 6ºE, 7ºC, 8ºC, 9ºC, 11ºA e 12ºA

Agrupamento de Escolas da Corga [2009/10]

Ilustração

Alex Silva, 8ºA

Colecção

História de Roda 1

Coordenação

Biblioteca Escolar do Agrupamento de Escolas da Corga

Edição

Agrupamento de Escolas da Corga

Arranjo Gráfico

Anabela Santos

Impressão e Acabamento

Sinais Criativos, Lda

Tiragem

250 Exemplares

Data de edição. Local

Abril de 2010. Corga