A Questão Da Psicopatologia Na Perspectiva Da Abordagem Centrada Na Pessoa

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7/25/2019 A Questão Da Psicopatologia Na Perspectiva Da Abordagem Centrada Na Pessoa http://slidepdf.com/reader/full/a-questao-da-psicopatologia-na-perspectiva-da-abordagem-centrada-na-pessoa 1/11  Revista da Abordagem Gestáltica: Phenomenological Studies ISSN: 1809-6867 [email protected] Instituto de Treinamento e Pesquisa em Gestalt Terapia de Goiânia Brasil Pereira de Souza, Camila; Torquato Callou, Virgínia; Moreira, Virginia A Questão da Psicopatologia na Perspectiva da Abordagem Centrada na Pessoa: Diálogos com Arthur Tatossian Revista da Abordagem Gestáltica: Phenomenological Studies, vol. XIX, núm. 2, julio-diciembre, 2013, pp. 189-197 Instituto de Treinamento e Pesquisa em Gestalt Terapia de Goiânia Goiânia, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=357735519007  Como citar este artigo  Número completo  Mais artigos  Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto

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Phenomenological Studies

ISSN: 1809-6867

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Brasil

Pereira de Souza, Camila; Torquato Callou, Virgínia; Moreira, Virginia

A Questão da Psicopatologia na Perspectiva da Abordagem Centrada na Pessoa: Diálogos com

Arthur Tatossian

Revista da Abordagem Gestáltica: Phenomenological Studies, vol. XIX, núm. 2, julio-diciembre, 2013,

pp. 189-197

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 A Questão da Psicopatologia na Perspectiva da Abordagem Centrada na Pessoa: Diálogos com Arthur Tatossian

A QUESTÃO DA PSICOPATOLOGIA NA PERSPECTIVADA ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA: DIÁLOGOS

COM ARTHUR TATOSSIAN

The Question of Psychopathology in Person Centered Approach: Dialogues with Arthur Tatossian

La Cuestión de la Psicopatología en el Enfoque Centrado em la Persona: Diálogos con Arthur Tatossian

CAMILA PEREIRA DE SOUZA

VIRGÍNIA TORQUATO CALLOU

VIRGINIA MOREIRA

Resumo: Os estudos realizados por Carl Rogers, no campo da Abordagem Centrada na Pessoa, têm uma preocupação nítida com

o homem e o seu desenvolvimento como pessoa. Seus trabalhos, inicialmente na área clínica, mostraram a presença de umacapacidade, manifestada em todos os indivíduos, a uma regulação organísmica que levaria ao crescimento e ao amadurecimen-to pessoal. Esta perspectiva também se encontraria nos casos mais graves de transtornos psicopatológicos, em que as desorga-nizações dos indivíduos se dariam de forma mais intensa. Por percebermos a relevância de maiores discussões no campo dostranstornos mentais, neste artigo nos propomos a pensar possíveis contribuições da psicopatologia fenomenológica de ArthurTatossian para a clínica humanista.Palavras-chave:  Psicopatologia fenomenológica; Abordagem centrada na pessoa; Transtornos mentais; Clínica humanista;Arthur Tatossian.

 Abstract: Carl Rogers’s studies in the field of the Person Centered Approach concern about the human being and his develop-ment as a person. The presence of an inherent capacity to all individuals of an organismic regulation leading to personal growthand maturity was shown in his work, initially in the clinical area. This perspective would also be present in more severe casesof psychopathological disorders in which the disorganization of individuals would be more intense. Because of the importance

of further discussion in the field of mental disorders, with this article we propose to reflect about the Arthur Tatossian phenom-enological psychopathology contributions to the humanist clinicalKeywords: Phenomenological psychopathology; Person-centered approach; Mental illness; Humanist clinical; Arthur Tatossian.

Resumen: Los estudios realizados por Carl Rogers, en el ámbito del Enfoque Centrado en la Persona, tiene una preocupaciónmuy clara con el hombre y su desarrollo como persona. En su obra, inicialmente en el área cl ínica, se observó una capacidadpresente en todos los individuos, un reglamento organísmico que llevaría al crecimiento y madurez personal. Tal perspecti-va también estaría presente en los casos más graves de trastornos psicopatológicos en los que la desorganización de los indi-viduos sería más intensa. Al darse cuenta de la importancia de la discusión en el campo de los trastornos mentales, con esteartículo nos proponemos reflexionar sobre las contribuciones de la psicopatología fenomenológica de Arthur Tatossian a laclínica humanista.Palabras-clave: Psicopatología fenomenológica; Enfoque centrado en la persona; Enfermedad mental, Clínica humanista;Arthur Tatossian.

Introdução

A forma de se lidar com o fenômeno da loucura é mar-cada por um meio social, cultural e político, que predomi-na em cada período histórico específico. Na Idade Média,por exemplo, era abordada como uma forma de possessãodemoníaca, já na modernidade, ocasião em que impera oracionalismo, a loucura fica conhecida como uma perdada razão e, por fim, na contemporaneidade, era em que

predomina o saber médico, passa a ser estudada no cam-po da psicopatologia e concebida como doença mental(Schneider, 2009).

A loucura, como aponta Foucault (1961/2005) em seuestudo arqueológico, esteve presente desde a antiguidade,acompanhando o homem em todo o seu percurso históri-co. Mas em uma época específica, quando o saber médicoganhou força, ela passa a ser apropriada pela Medicinaatravés da psiquiatria para, em seguida, fazer parte dodomínio da psicopatologia.

Entretanto, a clínica psiquiátrica, como apontaSchneider (2009), efetuou um erro epistemológico gra-

ve, pois

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Camila P. de Souza; Virgínia T. Callou & Virginia Moreira

confunde as variáveis constitutivas dos fenômenospsicopatológicos, ou seja, aquelas variáveis que deli-mitam e definem tal fenômeno em sua complexidade,no caso específico, as variáveis biológicas e psicoló-gicas, que se desdobram em seus sintomas psicofí-sicos, como sendo suas variáveis constituintes, ou

seja, aquelas que geram, constituem ou determinamo fenômeno, que como nos mostram a antropologia,sociologia e psicologia social são da ordem do socio-lógico e do cultural (p. 67).

Esta perspectiva corrobora a posição dualista men-te/corpo que imperava no século XVII e aprisionava apsiquiatria em um modelo empírico que proporcionavauma exacerbada descrição de inúmeros sintomas, masque, apesar de relevante e verídico, não oferecia umadefinição do adoecer psíquico e nem uma compreensãodos quadros patológicos. A psiquiatria se coloca, então,

em um lugar epistemologicamente frágil, pois não con-seguiu estabelecer algo que demarcasse biologicamentea etiologia de seus transtornos, apesar de todo o rigorempírico presente na elaboração de seus diagnósticos(Schneider, 2009). A objetividade que almeja recai soba tentativa de reafirmar a existência de uma determi-nação orgânica, possibilitando, assim, que outras áreasdo saber, como a psicologia, adentrassem em seu cam-po de discussão.

São inúmeros os enfoques que discutem o humanoe os transtornos mentais. Dentre eles, encontramos aAbordagem Centrada na Pessoa, desenvolvida pelo psi-cólogo norte-americano Carl Rogers, mas não podemosafirmar que Rogers desenvolveu um estudo específicoacerca dos transtornos mentais. Para Rogers (1961/2009),o fundamental era estabelecer uma relação de pessoa--a-pessoa, considerando o cliente em sua totalidade or-ganísmica, ao invés de encarcerá-lo em classificaçõesdiagnósticas. No entanto, como afirmam Vieira & Freire(2012), apesar de Carl Rogers ter preferido se abster decriar ou de utilizar as categorias classificatórias dostranstornos psicopatológicos, ele não pôde fugir de taisquestões, em decorrência do desenvolvimento de suasideias sobre a pessoa em pleno funcionamento e a ten-dência atualizante.

Por mais que discutir os transtornos mentais não fosseseu núcleo principal de estudo e pesquisa, a contribuiçãodo pensamento de Carl Rogers neste campo foi notória.Através do desenvolvimento de sua teoria, o olhar do psi-coterapeuta ou do facilitador recai sobre a pessoa que estáem processo terapêutico e na própria relação interpessoalestabelecida nas sessões. Postura esta que desmistifica olugar de poder ocupado pelo profissional, conferindo li-berdade e autonomia para o cliente, que busca por ajuda,sem enxergá-lo como um objeto passível de uma rotula-

ção. Carl Rogers dá destaque para o indivíduo enquantopessoa, deixando em segundo plano a compreensão doadoecimento que também compõe a dimensão existen-

cial do sujeito. Ele prioriza a relação intersubjetiva en-tre cliente e psicoterapeuta e a subjetividade do cliente,como pessoa, em detrimento da doença.

 A Psicopatologia Fenomenológica, inspirada na fi-losofia de autores como Husserl e Heidegger, entre ou-tros, busca a compreensão da dimensão existencial do

homem que adoece mentalmente. Esta perspectiva nãose prende aos dados unicamente subjetivos do paciente,ainda que se preocupe com esta dimensão como parteda experiência vivida, questionando, bem como Rogers,uma abordagem da doença que negligencie o sujeito, oua pessoa. Consiste uma perspectiva que prioriza a formacomo o fenômeno se manifesta e o seu significado paraquem o experiencia, ultrapassando a lógica psiquiátricaclassificatória, pois compreende os transtornos mentaiscomo condição de possibilidade de uma existência ado-ecida e se apresenta como uma vertente que rompe comos padrões dominantes de saúde e doença e de normal

e patológico, que categorizam e excluem os indivídu-os que possuem um laudo diagnóstico (Pessotti, 2006;Schneider, 2009).

A Psicopatologia Fenomenológica surge com as pu-blicações de Eugène Minkowski e Ludwig Binswangerna década de 1920, na Europa (Tatossian, 1979/2006).No decorrer de seu desenvolvimento também encontra-mos nomes como os de Hubert Tellenbach, Medard Boss,Kimura Bin, Van Den Berg, entre outros, e, mais recente-mente, Arthur Tatossian (Schneider, 2009; Moreira, 2011;Tatossian & Moreira, 2012).

Neste artigo nos propomos a investigar a compreen-são de psicopatologia presente no pensamento rogeriano,pautado nos conceitos de tendência atualizante e pessoaem funcionamento pleno, e as possíveis contribuiçõesda proposta da psicopatologia fenomenológica para umaclínica humanista tomando como base os escritos do psi-quiatra francês Arthur Tatossian. Discutimos, inicial-mente, o pensamento de Carl Rogers, por meio da propostade uma Terapia Centrada no Cliente, e sua visão sobre aPsicopatologia. Em seguida, apontamos para os caminhostrilhados no campo da Psicopatologia Fenomenológica deArthur Tatossian, que podem vir a enriquecer a aborda-gem da clínica humanista.

 

1. A Abordagem Centrada na Pessoa e a Questão doAdoecimento Mental

A  Abordagem Centrada na Pessoa, desenvolvida apartir dos estudos e da experiência profissional do psi-cólogo norte-americano Carl Rogers, tem como princípionorteador a crença de que todos os indivíduos possuemuma capacidade inata à autorregulação, ao desenvolvi-mento e ao amadurecimento do próprio organismo. Esta

inclinação ficou conhecida, ao longo da obra de CarlRogers, como tendência atualizante (Sanders, 2009).Como aponta Bozarth (2001), esta tendência seria a pe-

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dra angular sobre a qual se constrói a terapia centradana pessoa, pois a confiança creditada pelo terapeuta nocliente lhe proporcionaria uma libertação e promoção desuas capacidades naturais para o crescimento. SegundoRogers (1961/2009),

(...) o indivíduo traz dentro de si a capacidade e atendência, latente se não evidente, para caminharrumo à maturidade. Em um clima psicológico ade-quado, essa tendência é liberada, tornando-se realao invés de potencial... Seja chamando a isto umatendência ao crescimento, uma propensão rumo àauto-realização ou uma tendência direcionada parafrente, esta constitui a mola principal da vida, e é, emúltima análise, a tendência de que toda a psicoterapiadepende (p. 40)

Assumindo a tendência à atualização como postula-

do central de sua teoria, Rogers direciona sua visão dehomem e de mundo à confiança na capacidade de au-torregulação do indivíduo. Coloca suas crenças na forçainterior do cliente, acreditando que a vontade positivana direção do crescimento resultaria em sua mudançaterapêutica, mesmo em casos de severas desordens psi-quiátricas (Van Blarikom, 2008). Com esta perspectiva,Rogers (1942/2005, 1946/2000, 1951/1992 e 1961/2009)desmistifica o papel do terapeuta como aquele que detémo saber e o controle do processo terapêutico, ressaltandoa importância da relação interpessoal entre terapeuta ecliente para a f luidez da terapia e o consequente cresci-mento do paciente (Cury, 1987; Warner, 2005).

A tendência atualizante estaria, para ele, presenteem todos os indivíduos, inclusive em casos mais gravesde doenças mentais. Em sua última obra publicada, olivro Um Jeito de Ser, Rogers (1980/1983) expande estaperspectiva ao propor o conceito de tendência formati-va, em que a capacidade à atualização estaria presen-te não apenas nos seres vivos, mas em todo o universo,dando um sentido holístico e transcendental à existên-cia do homem.

Apesar desta tendência ao crescimento ser inata atodos os organismos, ela precisa ser estimulada paraque ocorra uma mudança terapêutica significativa nocliente. Rogers (1957/1995), baseado em sua prática clí-nica e na de seus colegas, pesquisou com afinco as nu-ances desse processo, para, em seguida, apresentar oque designou como as seis condições necessárias e su-ficientes para a mudança construtiva da personalidade.Dentre elas, Rogers (1957/1995) estipulou ser necessárioque o cliente se encontrasse em um nível de incongru-ência, demonstrando estar vulnerável e ansioso. Seriaum estado em que se apresentaria uma cisão entre aimagem que o indivíduo tem de si próprio e o que real-

mente ele experiencia em sua totalidade organísmica.Há uma distorção na representação consciente da ex-periência, portanto,

Há uma discrepância fundamental entre o significadoexperienciado da situação, da forma como é registradopor seu organismo e a representação simbólica daque-la experiência na consciência, de uma maneira quenão entre em conflito com a imagem que ele tem desi mesmo (Rogers, 1957/1995, p. 160).

Com o decorrer do processo psicoterápico, se todasas seis condições facilitadoras fossem adequadamenteintegradas à relação, o indivíduo mudaria significativa-mente a sua personalidade, alcançando um modo de fun-cionamento pleno e integrado, uma vez que a tendênciaà autorregulação poderia fluir continuamente (Rogers,1957/1995; Warner, 2005). Esse pressuposto rogeriano éválido para todos os casos de “desadaptação” e “desa-justamento”, uma vez que Rogers salienta, ao longo desua obra, que o seu foco é na pessoa e não em catego-rias diagnósticas de quadros psicopatológicos (Joseph &

Worsley, 2005; Warner, 2005). Sua proposta de psicote-rapia seria, então, eficaz para todos os transtornos men-tais, mas, como salienta Van Blarikom (2008), não exis-tem estudos que confirmem essa posição. “Tudo o quesabemos com certeza é que a terapia centrada na pessoanão é universalmente eficaz e que isso leva a consequên-cias sobre as quais precisamos refletir” (Van Blarikom,2008, p. 29). A proposta rogeriana era oferecer um para-digma alternativo ao do modelo médico vigente (Joseph& Worsley, 2005).

Rogers (1963/1995) aponta que há evidências que de-monstram um desacordo entre as categorias diagnósti-cas de classificação dos transtornos mentais, desacre-ditando-as enquanto conceitos científicos e recusan-do-as por motivos clínicos e éticos em sua abordagem(Sanders, 2007). Não concebe, então, como resultadosatisfatório da psicoterapia, a saída de um diagnósti-co para um estado “normal”. Para ele, não é necessá-rio discriminar diferentes patologias mentais, que ne-cessitam de diferentes tratamentos ( Joseph & Worsley,2005), uma vez que todas elas corresponderiam a ummodo de funcionamento incongruente e inautêntico doindivíduo (Warner, 2006).

Nos últimos anos tenho conjeturado se o termo psi-copatologia não pode simplesmente ser uma palavra--baú que se presta a acolher todos aqueles aspectosda personalidade que os diagnosticadores como umtodo teme em si mesmos. Por essas e outras razões,a mudança no diagnóstico não é uma descrição deresultado psicoterapêutico que me satisfaça (Rogers,1963/1995, p. 73).

Suas questões em psicoterapia não se remetem, dire-tamente, a abordar e tratar os transtornos mentais, pois

seu foco principal se dava sobre as relações interpessoais,partindo de sua percepção de que cada indivíduo teriaguardado em si mesmo toda a capacidade para alcançar

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o pleno desenvolvimento (Warner, 2005). A classificaçãoe o diagnóstico são recursos científicos importantes, po-rém a visão unilateral desta perspectiva se torna arrisca-da para o desenrolar do processo terapêutico, por levara uma redução e “coisificação” do cliente, aprisionandoseu modo de ser (Shlien, 1977). O principal objetivo do

psicoterapeuta seria apoiar a capacidade de crescimentodo cliente, compreendendo e aceitando seus sentimen-tos e percepções da realidade, sem impor uma visão sua.Ele não assumiria uma postura curativa, mas auxiliariao cliente a entrar em contato com seu processo de autor-realização, pois cada indivíduo teria um impulso primá-rio que lutaria pelo aperfeiçoamento do eu (Shlien, 1977).Ao invés de buscar conduzi-lo com ideias pré-concebi-das, o psicoterapeuta se preocuparia em estabelecer umclima facilitador para o crescimento do cliente atravésdas qualidades atitudinais de congruência, compreensãoempática e olhar incondicionalmente positivo (Bozarth,

2001). “A teoria de mudança da personalidade propostapor Rogers assume uma única fonte para a psicopatolo-gia - a incongruência - e uma única cura - as condiçõesnecessárias e suficientes presentes na relação terapêuti-ca” (Warner, 2006, p. 5).

A presença dessas atitudes criaria um clima propícioao desenvolvimento do cliente. Ao discorrer sobre esteaspecto, Rogers (1963/1995) se questiona sobre quais se-riam as características de um indivíduo que encerrouo processo psicoterapêutico. Assinala que existe umaideia “comumente aceita, de que a pessoa que comple-tou a psicoterapia estará ajustada à sociedade” (Rogers,1963/1995, p. 72). Para ele, o cliente alcançaria um estadotal que lhe seria possível experienciar conscientementecertos elementos que, anteriormente, lhe eram pernicio-sos à estrutura do self . O cliente se percebe em todos es-ses sentimentos, compreendendo que não precisa maistemer certas experiências e as concebe como parte in-tegrante de seu self  mutável e em constante desenvolvi-mento (Rogers, 1963/1995).

Emergir de uma experiência em psicoterapia que ob-teve um nível ótimo, como descreve Rogers (1963/1995),corresponderia a uma pessoa que alcançou um modo defuncionamento pleno, na Terapia Centrada no Cliente. Éuma pessoa que estaria inteiramente empenhada no pro-cesso de tornar-se ela mesma e funcionaria de forma livreem toda a plenitude de suas potencialidades, pois a flui-dez de suas experiências se daria a partir da consciênciaque teria de si mesma (Rogers, 1963/1995).

Em psicoterapia, o cliente tem a oportunidade deexperienciar a sua liberdade de escolha e a direção quequer dar ao processo. Ele pode ser ele mesmo ou apre-sentar-se com uma máscara ou fachada, quando aquiloo que experiencia a nível organísmico está desintegra-do da imagem que tem de si em seu self. Tanto os seus

comportamentos destrutivos quanto os construtivos sãoaceitos e compreendidos genuinamente pelo terapeuta,o que levaria a fluidez de suas capacidades criativas e

ao alcance de um modo de funcionamento pleno com ofim da terapia. Este seria, em resumo, como ocorrem osprocessos terapêuticos, partindo de um enfoque centra-do no cliente.

Rogers dirigiu uma pesquisa, juntamente comEugene Gendlin e Charles Truax, sobre o processo de

psicoterapia com pacientes esquizofrênicos no InstitutoPsiquiátrico da Universidade de Winsconsin, que rece-bia o apoio do Instituto Nacional de Saúde Mental dosEstados Unidos (Gendlin, 1966; Van Blarikom, 2006;Traynor, Elliott & Cooper, 2011). O principal objetivo doprojeto era testar se a hipótese inicial de Rogers sobreas três condições facilitadoras (empatia, autenticidade eaceitação positiva incondicional) auxiliaria na melhorados pacientes atendidos (Gendlin, 1966). O resultado,entretanto, foi decepcionante, pois não houve uma dife-rença significativa entre o grupo de tratamento e o grupode controle (Van Blarikom, 2006). Esse foi um dos raros

momentos, da trajetória de Carl Rogers, em que o campoda Psicopatologia entrou em cena com maior destaque,pois há uma relutância do enfoque centrado na pessoaem trabalhar com a linguagem psiquiátrica dos quadrospsicopatológicos (Joseph & Worsley, 2005; Van Blarikom,2006). Essa característica é percebida até os dias atuais,o que é confirmado pela dif iculdade de encontrar mate-rial bibliográfico sobre o assunto. Como afirma Warner(2005), “vários passos são necessários para o desenvol-vimento de um modelo de bem-estar e psicopatologiacentrado na pessoa” (p. 4).

Em seus diálogos com o filósofo Martin Buber, Rogerse Buber (1957/2008) ressalta que, em seu percurso pro-fissional, não passou pela experiência de trabalhar emum hospital psiquiátrico, não entrando em contato compessoas com graves transtornos psicopatológicos. Afirmaque tem “lidado com pessoas que, em sua maioria, sãocapazes de algum tipo de ajustamento na comunidade”(Rogers & Buber, 1957/2008, p. 238). Apesar disso, ressal-ta que, ao focar na relação interpessoal estabelecida como paciente, a classificação em um transtorno esquizofrê-nico, paranoico ou outro qualquer não seria o mais rele-vante, pois “se a terapia é efetiva, existe o mesmo tipo deencontro de pessoas, não importa qual seja o rótulo psi-quiátrico” (Rogers & Buber, 1957/2008, p. 238). Seu focose mantém centrado na pessoa e na relação interpessoalestabelecida com o terapeuta, reafirmando, assim, a ne-cessidade de um clima favorável ao crescimento e ama-durecimento do indivíduo.

Por mais que Rogers não tenha aprofundado, emseus escritos, estudos sobre as questões psicopatológi-cas, não lhe foi possível uma abstenção completa sobreesse assunto, especialmente quando coloca em pautasuas teorias sobre a tendência atualizante e a pessoaem funcionamento pleno. Sua visão de homem e de

mundo contribuiu para que se pudesse discutir os con-ceitos de normal e patológico, saúde e doença e toda alógica classificatória embutida nos processos diagnós-

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 A Questão da Psicopatologia na Perspectiva da Abordagem Centrada na Pessoa: Diálogos com Arthur Tatossian

ticos, que reduziam o homem a categorias específicas.Como afirma Rogers,

Sinto que se, do meu ponto de vista, esta for umapessoa doente, então, eu não o ajudarei tanto quantoeu poderia. Sinto que essa é uma pessoa. Sim, outros

podem chamá-lo de doente, ou se eu olhar para elede um ponto de vista objetivo, então eu poderia con-cordar, também, “Sim, ele está doente.” Mas ao entrarem uma relação, me parece que, se estou olhando paraisso como “eu sou uma pessoa relativamente beme esta é uma pessoa doente”... não servirá de nada(Rogers & Buber, 1957/2008, p. 236).

Partir de uma lógica compreensiva para lidar coma questão do adoecimento mental é um salto relevantepara uma possível discussão e reflexão sobre a sua apro-priação pelo saber médico psiquiátrico e suas concep-

ções no mundo contemporâneo. Como apontam Vieira& Freire (2012), para Rogers seria suficiente responder atodo o problema que envolve os transtornos psicopato-lógicos ao simplesmente assumir o outro como pessoa.Os dados específicos presentes em cada patologia, comoalucinações e delírios por exemplo, seriam concebidospor Rogers como uma expressão singular da experiên-cia daquele cliente, que poderia ou não dificultar a co-municação com o mesmo, mas o processo terapêutico sedesenrolaria seguindo os mesmos pressupostos (Vieira& Freire, 2012).

Esta perspectiva se faz bastante evidente em sua ela-boração a partir do caso Ellen West, cujo original cor-responde a um estudo clássico da psicopatologia feno-menológica a respeito de uma paciente atendida na clí-nica de Bellevue pelo psiquiatra fenomenólogo LudwigBinswanger. Este caso está originalmente publicado emalemão, porém possui traduções para o inglês e o espa-nhol, e sua riqueza reside não só nos vários relatos derenomados profissionais do campo da psiquiatria e dapsicoterapia, mas também em descrições e anotaçõespessoais em diários e cartas da paciente (Rogers, 1977).

Da época em que procurou ajuda até o fim de suavida, Ellen West passou por diversos profissionais, des-de psiquiatras a psicanalistas, e obteve pouquíssima me-lhora em seu quadro, culminando em suicídio. SegundoRogers (1977), o erro fatal, que resultou no insucesso dotratamento de Ellen West, correspondeu ao fato de a pa-ciente ter sido tratada como um objeto por todos os pro-fissionais envolvidos em seu caso. Os psiquiatras bus-caram ser assertivos no que se referia a classificação desua doença, cada um apontando para diferentes rotu-lações. Já os analistas ajudaram Ellen West a perceberseus sentimentos, mas não a vivenciá-los, distanciando--a cada vez mais da possibilidade de alcançar sua pró-

pria experiência.Como aponta Rogers (1977), ninguém estabeleceu umrelacionamento de pessoa-a-pessoa com a paciente, con-

fiando em sua autonomia de escolha e em sua capacidadede autodireção. Não havia nenhum clima que facilitas-se o desenvolvimento de uma relação interpessoal, quepoderia levar Ellen West ao encontro genuíno consigomesma e com a sua experiência. A vivência da pacientenão era digna de confiança e seus sentimentos não eram

aceitos por quem a atendia. Rogers (1977) afirma que odestino trágico de Ellen West poderia ter sido revertidose a paciente tivesse sido atendida a partir de um enfo-que centrado na pessoa, pois teria adquirido a confian-ça necessária para acreditar em suas potencialidades dedesenvolvimento e atualização.

Somos de profunda ajuda somente quando nos rela-cionamos como pessoas, quando nos arriscamos comopessoas no relacionamento, quando vivenciamos o ou-tro como uma pessoa em seu próprio direito. Somenteassim existe um encontro de uma profundidade tal

que dissolve, tanto no cliente quanto no terapeuta, osofrimento da solidão (Rogers, 1977, p. 100).

A perspectiva de Carl Rogers, sobre as psicopatolo-gias, dá margem para discutir o lugar que o pacienteocupa no processo terapêutico e refletir sobre a visãodicotômica presente nas concepções contemporâneasde saúde e doença. Seu pensamento rompe com o mo-delo médico classificatório, que compreendia a doen-ça como um objeto a ser tratado. É um avanço signifi-cativo na compreensão do adoecimento mental, mas asua proposta de tratamento assume como verdadeiroum único caminho, ou seja, a relação estabelecida depessoa-para-pessoa.

Van Blarikom (2006) chama a atenção para o fatoque, em casos de transtornos mentais graves, a pessoanão deve ser separada de sua doença, afirmando que“não pode haver dúvidas de que existe algo chamado dedoença mental que influencia o funcionamento de umapessoa para além do que pode ser entendido em termospsicológicos” (p. 168). Essa posição não invalida os pre-ceitos básicos da Abordagem Centrada na Pessoa, mas sesoma a eles (Van Blarikom, 2008). Ao assumir esta ideia,o enfoque centrado na pessoa poderia alcançar uma com-preensão mais clara da experiência de adoecimento docliente, percebendo a interrelação entre pessoa e doençacomo partes de um mesmo processo.

Sanders (2009) critica o modelo médico de diagnós-tico dos transtornos mentais ao retomar uma posturaholística na compreensão do todo organizado que com-põe o homem. Para ele, a existência humana possui di-mensões somáticas, afetivas, espirituais, etc, que devemter a mesma importância aos olhos da Terapia Centradana Pessoa, pois esta tem o potencial de co-construir umdiagnóstico como um momento temporário do processo

e não um destino fixo (Sanders, 2009).A Psicopatologia Fenomenológica desenvolve seus es-tudos sobre os transtornos mentais considerando outras

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possibilidades de ser e outros modos existenciais queconstituem o sujeito, compreendendo o adoecimento emtoda a sua complexidade. Além do caso de Ellen West deBinswanger, Rogers não faz referências à tradição euro-peia da psicopatologia fenomenológica. Em alguns mo-mentos ele se aproxima do pensamento fenomenológico,

quando utiliza os conceitos de experienciação, oriundosde Eugene Gendlin, ou a noção de encontro, resgatadado pensamento de Martin Buber. Entretanto, mesmo emsua fase experiencial, quando trabalhou com Gendlin,Rogers nunca abandonou a ideia de pessoa como centropara priorizar fenomenologicamente a intersubjetividadee a relação (Moreira, 2007).

A Abordagem Centrada na Pessoa oferece uma teoriaforte e um método psicoterapêutico consistente. O apro-fundamento de uma linguagem fenomenológica seriaum dos caminhos para o desenvolvimento de trabalhoscom pacientes que possuem transtornos mentais graves

(Warner, 2006).

2. Do sintoma ao fenômeno: o caminho para umadiscussão da psicopatologia

Ao pensar sobre os quadros psicopatológicos, a psi-copatologia fenomenológica apresenta a relevância dadaà compreensão da dimensão existencial do homem. Estefator auxiliou a romper com uma lógica dicotômica eexplicativa, presente no estudo das doenças mentais. AAbordagem Centrada na Pessoa também contribui paraesta ruptura, pois foge do pensamento classificatóriopredominante ao apresentar a relevância da relação in-terpessoal estabelecida entre terapeuta e paciente e aocolocar o homem, para além da doença, como centro deseus estudos.

Porém, os estudos de Carl Rogers não aprofundam asquestões referentes à psicopatologia. É sob o terreno dafenomenologia que se desenvolve uma compreensão dopatológico como pathos, ou seja, como uma disposiçãoafetiva fundamental inerente ao homem. Ele correspondea uma “disposição originária do sujeito que está na basedo que é próprio do humano. Assim, o pathos atravessatoda e qualquer dimensão humana, permeando todo ouniverso do ser” (Martins, 1999, p. 66).

O patológico, a partir de uma lente da psicopatologiafenomenológica, não é apenas o que a ciência expõe comodoença, imerso em uma conotação negativa e atrelado aoconceito de cura, mas corresponde a uma disposição e aum movimento do fenômeno fundamental que compõea existência do homem (Martins, 1999). Dessa forma, afenomenologia está mais preocupada com a compreensãodos modos de ser que compõem uma existência adoeci-da. Ela não tem interesse em acrescentar uma nova téc-

nica terapêutica às já existentes, podendo, no máximo,se encarregar de fazer uma análise crítica das mesmas(Tatossian, 1979/2006).

Na tradição da Psicopatologia Fenomenológica, en-contramos diversos autores que desenvolveram estudose fundamentaram seus pensamentos em eixos filosóficosespecíficos. Neste artigo, damos ênfase aos escritos deArthur Tatossian, psiquiatra francês de origem armênia,que foi um dos autores da psicopatologia fenomenológica

que mais priorizou uma prática clínica construída sobree na experiência. Tatossian (1979/2006) elucida que a fe-nomenologia não tem interesse em explicar a experiênciapsicopatológica, mas clarificá-la através de um caminhoprioritariamente descritivo.

Sua contribuição no campo da psicopatologia feno-menológica não reside apenas no aparato de uma técni-ca de aplicação filosófica, mas na forma em que buscaquestionar e compreender os indivíduos acometidos poralgum transtorno mental. Tatossian afirma que “a feno-menologia psiquiátrica não poderia ser ensinada de ma-neira didática, que ela se ‘vivia’, que demandava um sério

esforço àqueles que queriam utilizá-la e que não poderiajamais se resumir em algumas receitas estereotipadas”(Tatossian & Samuelian, 2002/2006, p. 354).

Trata-se do esforço de pensarmos em uma prática clí-nica sempre voltada para a experiência, pois, como afir-ma Tatossian (1979/2006), a fenomenologia é definida apartir de uma mudança de atitude, em que é necessárioo abandono de uma atitude natural e ingênua, ou seja,aquela do cotidiano em que apreendemos as realidadesobjetivas e materiais para voltar-se para as condições depossibilidade do sujeito, recusando todos os prejulgamen-tos. Ela se constrói sob uma maneira de trabalhar sempreem fluxo, em que há uma relação de implicação entre fi-losofia e psicopatologia e não apenas de uma aplicaçãoconceitual prévia.

A psicopatologia fenomenológica se interessa primor-dialmente pelo fenômeno que compõe a globalidade daexperiência de adoecimento, não se restringindo ape-nas ao sintoma. Estes surgem como um indício da doen-ça e correspondem àquilo que a denuncia enquanto tal(Tatossian, 1979/2006; 1980/2012). Se tomarmos comoexemplo uma pessoa acometida pelo vírus da gripe, umespirro ou uma tosse poderia ser um primeiro vestígio aapontar que algo se passa com aquele sujeito, mas estessintomas não seriam suficientes para abranger a totali-dade daquela experiência de adoecimento. Já o fenôme-no é a modalidade de ser própria do doente, que rompecom as dicotomias entre sujeito e objeto, priorizando umaexperiência pré-teórica e pré-reflexiva do mundo vividode cada indivíduo (Tatossian, 1979/2006; 1980/2012), quepode ser definido como aquilo que corresponde ao mundodas significações presente na experiência imediata dasações humanas (Moreira, 2011).

Como aponta Tatossian (1979/2006), “é necessárioperceber que a experiência fenomenológica autêntica

e acabada não se reduz àquela do puro fenômeno, mas,antes, é fusão da experiência empírica com a experiên-cia apriórica” (p. 44). Os sintomas também fazem parte

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dessa experiência de adoecimento, estando ali presen-tes e residindo no fenômeno, mas o olhar da fenomeno-logia transcende aos dados aprióricos de uma realidadeobjetiva, buscando uma descrição do todo ao qual cor-responde esse mundo vivido, sem descartar, contudo,seus dados materiais.

Trata-se de uma compreensão do adoecimento psico-patológico que não se apresenta a partir de um pensamen-to reflexivo e externalizado, mas como uma co-experiên-cia, em que temos o transtorno e também a experiênciado sujeito adoecido. É uma constante relação entre pas-sividade e atividade, receptividade e espontaneidade, emque o “movimento próprio de nós mesmos, incorporandoo movimento essencial do outro por um ‘pensamento re-ceptivo’” (Tatossian, 1979/2006, p. 115) mantém o objetoda experiência, que se constrói e é construído, nessa re-lação paradoxal que a incorpora.

Pensar em sintoma e fenômeno é colocar em pau-

ta uma relação paradoxal para a compreensão de umaclínica fenomenológica, em que se entrelaçam uma ex-periência que é subjetiva e objetiva simultaneamente.Trata-se de uma perspectiva que ultrapassa um mode-lo dualista e tradicional ao constituir-se sob um pen-samento ambíguo (Moreira, 2011, 2012; Bloc, 2012). Aolongo de sua obra, Tatossian mantêm um diálogo con-tínuo com vários autores da fenomenologia, mas semnunca perder de vista sua preocupação com o homeme seu sofrimento. Sua prioridade era a de “desenvolveruma psicopatologia da clínica e para a clínica” (Moreira,2012, p. 210), pois trabalhava de forma ambígua, na in-terseção entre a teoria da psicopatologia fenomenológi-ca, que era oriunda de uma prática que se constituía so-bre e na experiência de adoecimento, sem distanciar-sedo exercício clínico, no qual cada paciente possuía suasingularidade (Bloc, 2012).

Uma psicopatologia que visa à compreensão domundo vivido ( Lebenswelt ) possui uma dupla dimen-são em sua experiência. Temos, de um lado, um dadopré-teórico e pré-objetivo perante o doente e, de outro,a dimensão de como um mundo vivido (Lebenswelt)particula r se constitui. “A experiência fenomenológicaé, portanto, uma experiência dupla, ao mesmo tempoempírica (no sentido comum) e apriórica” (Tatossian,1979/2006, p. 36). É uma experiência de um mundo co-tidiano de ordem concreta, sempre individual, mas quetambém é coletivo e impregnado de historicidade, emque a subjetividade é pensada enquanto intersubjetivi-dade (Moreira, 2011).

A proposta da Psicopatologia Fenomenológica deArthur Tatossian dá vazão a todos os aspectos que com-põem a globalidade da experiência de adoecimento, a par-tir de uma relação do sujeito consigo mesmo, com o outroe com o mundo. Para Tatossian (1979/2006; 1980/2012),

compreender fenomenologicamente os quadros psico-patológicos é vislumbrar a experiência de adoecimentodo sujeito e também a doença; o apriórico e o empírico,

a pessoa e a doença, destacando ambos em uma relaçãoambígua de mútua constituição.

Considerações finais

Em seus escritos, Rogers deixa claro que a psicopa-tologia não era seu campo primordial de estudo, porém,em alguns momentos, ele adentra no terreno desta dis-cussão e questiona o modelo classificatório e reducionis-ta de compreensão dos transtornos mentais. Esta críticaconsiste em uma contribuição fundamental à área, poisproporciona uma alternativa distinta daquela do modelomédico psiquiátrico. O pensamento humanista de Rogersprioriza a pessoa e a experiência psicoterapeuta-cliente.Refuta a relevância do diagnóstico dos quadros psicopa-tológicos. Tatossian, por sua vez, ressalta a importânciada experiência do indivíduo adoecido e do fenômeno que

emerge em sua vivência na clínica, na relação intersubje-tiva entre paciente e psicoterapeuta. Nas duas propostas,percebemos uma compreensão da psicopatologia comoalgo que vai além de um diagnóstico ou uma técnica deaplicação prática, recolocando a experiência do sujeitocomo ponto de destaque ao invés de um aprisionamen-to no sintoma.

Embora oriundos de fundamentos epistemológicosdistintos, e momentos históricos e culturais tambémdiferentes, Rogers e Tatossian são autores que dão am-pla relevância ao homem, em toda a sua complexidade,e a experiência que emerge no contexto de uma relaçãoterapêutica estabelecida na clínica. No entanto, suasperspectivas se distanciam quando Rogers descarta to-talmente a importância da doença, priorizando a pes-soa, como se a doença não fosse parte constitutiva des-sa pessoa.

Assim como Rogers, Tatossian não se limita ao diag-nóstico ou ao sintoma, mas, diferentemente dele, não fo-caliza a pessoa como o centro único da questão. Ele pro-põe a compreensão de uma experiência que é objetiva esubjetiva, simultaneamente, e que se constitui de formaambígua no entrelaçamento de ambas. É uma forma decompreensão do adoecimento psicopatológico que nãose constitui com um pensamento unilateral, mas comouma co-experiência, em que temos o transtorno e tam-bém a experiência do sujeito adoecido. É uma constan-te relação entre passividade e atividade, receptividade eespontaneidade, que comporta a globalidade da experi-ência de adoecimento.

A psicopatologia fenomenológica defende as diversaspossibilidades que configuram a existência humana eque estão vinculadas ao seu processo histórico e cultu-ral numa relação de mútua constituição. A doença nãoé interior ou exterior ao indivíduo, mas ela faz parte de

seu modo de funcionamento existencial. É uma compre-ensão do adoecimento que não desconsidera os dadosobjetivos e empíricos em prol dos conteúdos subjetivos

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e com a experiência de depressividade vivida por ele.Ou seja, pessoa e doença se constituem mutuamente,são parte de um mesmo tecido. A pessoa é a doença e adoença é a pessoa.

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Camila Pereira de Souza - Psicoterapeuta e Mestranda em Psicologiapela Universidade de Fortaleza (Unifor). Pesquisadora integrantedo Laboratório de Psicopatologia e Psicoterapia Humanista-Feno-menológica Crítica (APHETO) e bolsista de pesquisa vinculada àFundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento (FUNCAP). E-mail:[email protected]

 Virgínia Torquato Callou - Psicoterapeuta e Mestranda em Psicologiapela Universidade de Fortaleza (Unifor) e pesquisadora integrante dolaboratório de Psicopatologia e Psicoterapia Humanista-Fenomenoló-gica Crítica - APHETO. E-mail: [email protected]

 Virginia Moreira  - Psicoterapeuta, Doutora em Psicologia Clí nica

pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós-Doutoraem Antropologia Médica pela Ha rvard University. É Professora Ti-tular da Universidade de Fortaleza e Affiliated Faculty da Har vardMedical School. Endereço Institucional: APHETO – Laboratóriode Psicopatologia e Psicoterapia Humanista Fenomenológica Cr í-tica. Progra ma de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade deFortaleza. Av. Washington Soares, 1321 (Fortaleza, CE). E-mail:[email protected] ; [email protected]

Recebido em 04.01.2013Primeira Decisão Editorial em 13.05.2013Aceito em 05.06.13