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VIII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Panamá, 28-31 Oct. 2003 Painel:Controle da Jurisdição pela Administração Gerencial: Experiências Implementadas e Novos modelos de Gestão Ibero-Americanos - Coordenador: Edgard Lippmann - Desembargador Federal y Coordenador da Qualidade do Tribunal Regional Federal da 4ª Região A realidade vigente na administração dos tribunais Elizabeth Leão 1. Partindo da análise dos avanços referentes à implementação, por países da Comunidade Européia, de modernos métodos de gestão no âmbito do Poder Judiciário, este estudo visa confrontar a realidade européia com a atual realidade brasileira – buscando subsídios nos avanços da norte-americana -, respeitando as necessidades culturais e organizacionais, diferentes em sua estruturação, mas idênticas quanto à exigência de se alcançar uma prestação de serviço judicial mais célere, mais eficiente, enfim, uma prestação jurisdicional que cumpra o preceito constitucional inserido em todas as nações democráticas que é o respeito à cidadania. As tendências decorrentes das medidas adotadas a partir da década de 90 demonstram, seja no âmbito da Comunidade Européia, seja no Brasil, a existência de uma reivindicação social que vem gradativamente sendo absorvida pelas organizações judiciais, haja vista as medidas normativas adotadas pelos países europeus, haja vista os avanços que vêm ocorrendo no âmbito do judiciário brasileiro. O que se pretende demonstrar é a importância da gestão no seio das organizações judiciais no mundo, quando, independentemente do idioma, da cultura, das crenças, apresentam objetivos comuns apesar da diversidade verificada na forma de implementação, o que pode efetivamente influenciar na eficiência dos projetos, mormente no que concerne à gestão de pessoas. O que poderia ter levado os tribunais da comunidade européia, do Brasil, a se preocupar com a melhoria da prestação jurisdicional? Seria uma decorrência exclusiva da exigência da sociedade como um todo? Da dinâmica cada vez mais expandida do desenvolvimento dos sistemas de comunicação? Da crescente expectativa de eficácia na resolução dos problemas? Ou seria decorrente apenas do sentimento de impotência que o próprio Judiciário se vê, quando obrigado a enfrentar um incontrolável aumento na demanda de processos, ajuizados por cidadãos que, conscientes de seus direitos buscam resposta à resolução de conflitos, sempre mais intensos em razão da complexidade das relações econômicas e pessoais do mundo moderno? Como os magistrados do novo milênio poderiam melhor refletir sobre seus próprios problemas e aqueles do seu tempo? 2. Impende sejam analisados alguns aspectos que extrapolam o sistema judiciário. Necessário buscar na racionalidade e ao mesmo tempo na quebra de paradigmas, a resposta a essas questões. Além disso, tentar superar a ditadura da especialização que imperou no século XX. Vivemos, hoje, o fenômeno da globalização e o Judiciário não pode estar alheio à dinâmica da evolução social. O mundo viveu a partir do século XVI a era planetária da comunicação, integração dos cinco continentes, da dominação do ocidente europeu sobre o resto do mundo. Vivemos catástrofes de civilização, especialmente nas Américas, destruição irremediável, escravidão, mas ao mesmo tempo início de novas civilizações. O progresso econômico, o desenvolvimento das comunicações, a subjugação dos continentes ao mercado mundial, tudo isso gerou imensurável movimento populacional, o que ampliou o crescimento demográfico e o desenvolvimento dos mercados.

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VIII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Panamá, 28-31 Oct. 2003

Painel:Controle da Jurisdição pela Administração Gerencial: Experiências Implementadas e Novos modelos de Gestão Ibero-Americanos - Coordenador: Edgard Lippmann - Desembargador Federal y Coordenador da Qualidade do Tribunal Regional Federal da 4ª Região

A realidade vigente na administração dos tribunais

Elizabeth Leão

1. Partindo da análise dos avanços referentes à implementação, por países da Comunidade Européia, de modernos métodos de gestão no âmbito do Poder Judiciário, este estudo visa confrontar a realidade européia com a atual realidade brasileira – buscando subsídios nos avanços da norte-americana -, respeitando as necessidades culturais e organizacionais, diferentes em sua estruturação, mas idênticas quanto à exigência de se alcançar uma prestação de serviço judicial mais célere, mais eficiente, enfim, uma prestação jurisdicional que cumpra o preceito constitucional inserido em todas as nações democráticas que é o respeito à cidadania. As tendências decorrentes das medidas adotadas a partir da década de 90 demonstram, seja no âmbito da Comunidade Européia, seja no Brasil, a existência de uma reivindicação social que vem gradativamente sendo absorvida pelas organizações judiciais, haja vista as medidas normativas adotadas pelos países europeus, haja vista os avanços que vêm ocorrendo no âmbito do judiciário brasileiro. O que se pretende demonstrar é a importância da gestão no seio das organizações judiciais no mundo, quando, independentemente do idioma, da cultura, das crenças, apresentam objetivos comuns apesar da diversidade verificada na forma de implementação, o que pode efetivamente influenciar na eficiência dos projetos, mormente no que concerne à gestão de pessoas. O que poderia ter levado os tribunais da comunidade européia, do Brasil, a se preocupar com a melhoria da prestação jurisdicional? Seria uma decorrência exclusiva da exigência da sociedade como um todo? Da dinâmica cada vez mais expandida do desenvolvimento dos sistemas de comunicação? Da crescente expectativa de eficácia na resolução dos problemas? Ou seria decorrente apenas do sentimento de impotência que o próprio Judiciário se vê, quando obrigado a enfrentar um incontrolável aumento na demanda de processos, ajuizados por cidadãos que, conscientes de seus direitos buscam resposta à resolução de conflitos, sempre mais intensos em razão da complexidade das relações econômicas e pessoais do mundo moderno? Como os magistrados do novo milênio poderiam melhor refletir sobre seus próprios problemas e aqueles do seu tempo? 2. Impende sejam analisados alguns aspectos que extrapolam o sistema judiciário. Necessário buscar na racionalidade e ao mesmo tempo na quebra de paradigmas, a resposta a essas questões. Além disso, tentar superar a ditadura da especialização que imperou no século XX. Vivemos, hoje, o fenômeno da globalização e o Judiciário não pode estar alheio à dinâmica da evolução social. O mundo viveu a partir do século XVI a era planetária da comunicação, integração dos cinco continentes, da dominação do ocidente europeu sobre o resto do mundo. Vivemos catástrofes de civilização, especialmente nas Américas, destruição irremediável, escravidão, mas ao mesmo tempo início de novas civilizações. O progresso econômico, o desenvolvimento das comunicações, a subjugação dos continentes ao mercado mundial, tudo isso gerou imensurável movimento populacional, o que ampliou o crescimento demográfico e o desenvolvimento dos mercados.

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Interessante observar que apesar do mundo evoluir em alguns continentes, como no Ocidente Europeu e América do Norte, e estagnar ou mesmo involuir em outros, subjugados, estes, à exploração dos conquistadores, verificou-se por um lado, uma facilidade cada vez maior de comunicação, e, ao mesmo tempo, cada vez mais intensa a luta pela independência dos povos, que, sedentos de liberdade e então emancipados politicamente buscaram seguir seu próprio desenvolvimento sem os grilhões do conquistador. Nos séculos que se seguiram, as nações e os povos presenciaram catástrofes, guerras, descobertas científicas, invenções, e a modernidade fê-se presente em grande parte do globo. Ocorre que passaram a vivenciar uma fase individualista, seja na condução dos Governos, seja na condução das vidas pessoais. De um mundo anteriormente subordinado a poucos Impérios, o século XX surge em um mundo fragmentado em nações múltiplas, independentes, preocupadas na manutenção de suas identidades. Disso decorre o fenômeno da fragmentação do todo, da especialização em sentido amplo. Cabe aqui uma observação. Todos os processos pelos quais passa a humanidade acabam por refletir em todos os segmentos da sociedade, seja esta considerada como um todo, seja no aspecto do indivíduo. O fenômeno da exigência sempre crescente de especialização profissional, ou do pensamento, não ocorreu por acaso, mas em decorrência de uma onda maior que se pode visualizar não somente na evolução dos povos, mas também na evolução do indivíduo. Dessa afirmativa não pode ser descurado o Poder Judiciário. Os sistemas de Governo Democrático em todo o mundo passaram por uma evolução que sofreu a influência da dinâmica social, da emancipação de seus povos, da ânsia por liberdade, mas ao mesmo tempo, influenciados pelo pensamento cada vez mais estratificado. Impossível pensar o Judiciário, um Poder que deveria ser administrado como um todo, fora, em dissonância com toda a evolução do pensamento fragmentado. Infelizmente acompanhou toda a dinâmica do desenvolvimento do pensamento universal, da exigência sempre crescente de especialização. Sem sombra de dúvida, durante o século XX efetuaram-se extraordinários progressos no âmbito das especializações da ciência, mormente na área do direito. Ocorre que a especialização muitas vezes fragmenta os contextos, as globalidades e as complexidades, contribuindo para intensificar a clausura em si mesmas. Isso pode ser verificado inclusive na separação do direito em áreas hiperespecializadas. Em decorrência, as realidades globais e complexas fracionam-se; o humano desloca-se; sua dimensão humanística é encerrada nos compêndios, subjugados pelo formalismo dos códigos de processo; suas dimensões psíquica, social, religiosa são ao mesmo tempo relegadas e poucas vezes analisadas em questões criminais ou de família; seus caracteres subjetivos, existenciais, poéticos, encontram-se confinados nos imensos volumes jurídicos, sem qualquer relevância; exceto, contudo, a dimensão econômica, que, apesar de importante no contexto da vida humana, acaba sendo quase que sempre a única a sobressair na análise da matéria posta a apreciação do magistrado, mesmo quando se trata de questões de direito indisponível. Nessas condições, as mentes formadas para julgar, para fazer cumprir a lei perdem suas aptidões naturais para contextualizar os anseios postos, do mesmo modo que encontra dificuldade para integrá-los em seus conjuntos naturais. O enfraquecimento da percepção do global conduz ao enfraquecimento da responsabilidade, cada qual tende a ser responsável apenas por sua tarefa especializada, assim como ao enfraquecimento da solidariedade, deixando de sentir os vínculos com seus concidadãos. Encontramo-nos, portanto, desde o final do século XX, na fase da mundialização. Isso significa a era das telecomunicações, da informação, da Internet, era da complexidade do mundo e, essas incontáveis informações sobre o mundo sufocam nossas possibilidades de

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inteligibilidade. Difícil destacar, apesar de estarmos constantemente tentando, a solução vital para os problemas do Judiciário, já que cada problema é constituído por um conjunto de problemas essenciais, quer seja, por uma intersolidariedade complexa de problemas, antagonismos, crises, processos descontrolados, como a crescente demanda por soluções, apertados orçamentos, insuficiência de recursos humanos. O que agrava a dificuldade de conhecer nossos problemas, ou melhor, as respostas aos problemas do Judiciário, é o modo de pensar que atrofiou em nós. Perdemos, o homem moderno, a capacidade de desenvolver a aptidão de contextualizar e de globalizar. E a exigência desta era é pensar na sua globalidade, a relação todo-partes, sua multidimensionalidade, sua complexidade. Pensamos, vivenciamos, no entanto, de forma estratificada, sendo cada vez mais individualizado o conhecimento e, de conseqüente, o nosso modo de vida. A hiperespecialização não permite sua integração na problemática global ou na concepção de conjunto do objeto do qual ela só considera um aspecto ou uma parte. Impede tanto a percepção do global, que ela fragmenta em parcelas, quanto do essencial, que ela dissolve. Se considerarmos que até meados do século XX vivemos sob a égide da lógica determinista da máquina artificial, podemos afirmar, ainda, que fomos educados para separar, compartimentar, isolar e não para unir conhecimento. Infelizmente, os grandes problemas humanos perderam sentido, desapareceram em benefício dos problemas particulares. Daí a dificuldade de pensar no todo, nas Instituições; pelo contrário, as pessoas colocam seus interesses pessoais acima dos interesses do grupo, do todo. Disso decorre a incapacidade de organizar o pensamento disperso e compartimentado, conduzindo à atrofia da disposição mental natural de contextualizar e de globalizar. A inteligência parcelada quebra a complexidade do mundo em fragmentos, fraciona os problemas, destrói as possibilidades de compreensão e reflexão, reduz as possibilidades de planejamento corretivo ou de visão a longo prazo. Por isso, quanto mais a crise progride, mais progride a incapacidade de pensar a crise; incapaz de considerar o contexto, a inteligência torna-se inconsciente e irresponsável. O parcelamento e a compartimentação dos interesses impedem a apreensão do todo. Necessitamos compreender a indiscutível complexidade do Judiciário no sentido de que é preciso considerar a um só tempo a unidade e a diversidade do seu sistema, suas complementaridades e ao mesmo tempo seus antagonismos. Nova consciência começou a surgir o início da década de 90. O Judiciário europeu e o brasileiro – antes havia sido despertado o norte-americano -, confrontados por todos os lados pelo colapso eminente, viu-se obrigado a buscar alternativas para sua própria sobrevivência e incertezas. Assim, tornou-se imperativo conhecer as causas dos problemas e procurar enfrentar a incerteza, já que vivemos uma época de mudanças, uma época em que, apesar dos valores serem ambivalentes, compartimentados, tudo é interligado. Tudo deve ser encarado em sua globalidade, realçar as relações entre o todo e as partes, como o conjunto das diversas partes ligadas ao contexto de modo organizacional. O Poder Judiciário é mais que um contexto, constitui um todo organizador do qual fazemos partes, nós magistrados e servidores. Quando se afirma Poder Judiciário me reporto não ao meu Tribunal, mas ao Poder Judiciário nacional representado por todos os Tribunais do País, pois assim deve ser entendido, como um todo com qualidades e defeitos, um sistema que busca responder aos anseios da sociedade, do jurisdicionado. Não há como entender o Judiciário isolado, com órgãos isolados uns dos outros, isso porque o sistema não se encontra nas partes, mas no todo.

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Impende seja procedida a recomposição do todo para melhor conhecer as partes! Pascal1 considera “ser impossível conhecer as partes sem conhecer o todo, tampouco conhecer o todo sem conhecer particularmente as partes”. O sistema judiciário, como um todo, está presente em cada tribunal, em cada magistrado, em cada servidor, seja na sua linguagem, em seu conhecimento, em suas obrigações, em suas normas. Assim, quanto mais desenvolvido for o sistema, maior sua faculdade no tratamento dos problemas específicos. Por sua vez, a compreensão dos problemas específicos necessita da ativação do sistema geral, que opera, organiza e mobiliza os conhecimentos de conjunto em cada caso em particular. As instituições devem favorecer a aptidão natural da inteligência dos integrantes do Judiciário em formular e resolver problemas essenciais e, de forma correlata, estimular o uso total da mente global, geral. O primeiro passo é vencer os paradigmas. Os paradigmas controlam a conduta do homem moderno, podendo afirmar com segurança, a própria ciência, já que ela se transformou no mais intenso propagador de verdades muitas vezes intransponíveis e, muitas vezes, reconhecidas como verdades imutáveis. Neste aspecto confrontamo-nos com o próprio conceito de realidade, conceito este que também não pode e não deve ser enfrentado como absoluto. Não podemos olvidar que o desenvolvimento do conhecimento científico é poderoso meio de detecção dos erros e de luta contra as ilusões. Assim, não é demais afirmar que os paradigmas que controlam a ciência podem desenvolver ilusões, e nenhuma teoria científica está eternamente imune contra o erro. Conceitos-mestres de inteligibilidade podem definir um paradigma, conceitos esses que excluem ou subordinam outros que lhes são antinômicos, por exemplo, o conceito de ordem, para a concepção determinista, em contraposição ao de desordem, o conceito de matéria, para a concepção materialista, em contraste ao espírito, para as concepções espiritualistas. Podemos afirmar, portanto, que utilizando uma determinada operação lógica, os paradigmas dão ao discurso e às teorias que controlam as características da verdade e da oportunidade, um sentido estratificado, como se verdade absoluta fossem, tornando-se impossível alcançar, de conseqüente, sua transformação. Por sua prescrição, os discursos transformam em paradigmas axiomáticos, e se expressam em axiomas: “todo fenômeno natural obedece ao determinismo”; “todo fenômeno propriamente humano se define por oposição à natureza”; “a demora dos processos judiciais decorre da dificuldade do credor dar impulso aos processos”; “pobre é sempre condenado”; “rico não vai para a cadeia”; “o problema do Judiciário é a falta de magistrados”; “os problemas do Judiciário vão ser resolvidos com controle externo”; “a reforma processual vai fazer diminuir o número de processos”; “o judiciário não tem solução”, “processo judicial! pode esquecer!”; “servidor público não trabalha”, dentre outros. O paradigma, portanto, efetua a seleção e a determinação da conceituação e dos raciocínios lógicos. Podemos observar que os indivíduos conhecem, pensam e agem segundo paradigmas inscritos culturalmente em cada um. E quando se trata do Poder Judiciário, como o número de pessoas conhecidas, se não o próprio interessado, que buscam a prestação jurisdicional é cada dia mais elevado, todos pensam, radicalizam e agem segundo os paradigmas incrustados culturalmente em cada qual. Quando se fala ou se pensa no Judiciário, fala-se e pensa-se em serviço demorado, inatingível, caro e desconfortável, principalmente porque a média dos cidadãos não tem acesso às informações, nem entendem como se desenvolve um processo. A insegurança na ciência jurídica, aliada à sempre e comum desconfiança no profissional da advocacia, detentor, este, também de 1 Pascal, Pensées (texto estabelecido por Leon Brunschwicg). Ed. Garnier-Flammarion, Paris, 1976

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paradigmas falsos, levam o cidadão, sempre ansioso por soluções rápidas e favoráveis para a solução de seus interesses, a contribuir para o estabelecimento de um sem número de paradigmas, que se tornam cada mais arraigados no inconsciente coletivo e transforma os operadores do direito em seres desiludidos com a possibilidade de transformar a máquina judiciária, fria e insuperável em um sistema ágil e eficiente, onde os serviços serão prestados dentro dos padrões “paradigmáticos” de excelência. Como disse, os indivíduos pensam e agem segundo os paradigmas inscritos culturalmente neles. O difícil é mudar esses paradigmas, mudar a cultura instalada. O paradigma instaura relações primordiais, das quais nascem axiomas, determina conceitos, comanda discursos e/ou teorias. Não é em vão que se debate há tantos anos a reforma do judiciário brasileiro, que segmentos importantes da sociedade entende que a solução única para a questão do Judiciário se resume no controle externo. Ilusório paradigma, como tantos outros. O poder imperativo do conjunto de paradigmas que regem as crenças, as doutrinas reinantes e as verdades estabelecidas em relação ao Judiciário é causa determinante de estereótipos, da rejeição de evidências não contestadas, dos absurdos triunfantes, da rejeição de evidências em nome da evidência, faz reinar por toda a parte os conformismos cognitivos e intelectuais. Falamos, aqui, e principalmente, da tecnoburocratização do trabalho judiciário, da burocratização da administração judiciária, subjugados por um lado, às normas processuais que contribuem indubitavelmente para a complexidade dos atos processuais, e, por outro, ao arcaico método burocrático, causa primeira e maior da morosidade dos atos judiciários, seja no que concerne à atividade meio, seja quanto à atividade fim. Vive, o Judiciário, pois, em função de determinações culturais, que convergem e sinergizam para encarcerar o conhecimento nas normas, proibições, rigidezes e bloqueios. Podemos afirmar, assim, que muito mais que conformismo cognitivo, existe estagnação. Poderíamos, inclusive, afirmar que os paradigmas obedecem a uma espécie de determinismo, que se associa às convicções e crenças reinantes em determinada sociedade. Assim, de uma forma ou de outra, impõem a todos e a cada um a força imperativa do preconceito, a força controladora do dogma, a força proibitiva do tabu. Em relação ao Judiciário, o paradigma de que a morosidade do judiciário é resultado do próprio processo, este tem que ser lento, para ser seguro. Tudo isso cristaliza o pensamento e, de conseqüente, as ações, o que dificulta toda e qualquer transformação no seio de um sistema normativo de origem secular e conduta formalista que necessita de demonstração constante de autoridade para sua manutenção. E mesmo que grande número de integrantes dessa Instituição busque maior adaptação de suas condutas e ações em sintonia com a dinâmica e evolução social, as doutrinas e ideologias dominantes dispõem de força imperativa e força coercitiva que suscita o medo inibidor da sociedade. O grande problema surge quando o inesperado surpreende aqueles que se encontram instalados de maneira segura em suas rotinas e teorias e estas não têm estrutura para acolher o novo. Quando o inesperado se manifesta, é preciso ser capaz de rever as rotinas e teorias baseadas em paradigmas que nos dirigem, é preciso estar aberto para recepcionar as inovações, sob pena de sermos obrigados a deixar o fato novo entrar à força e deparar com rotinas e teorias incapazes de recebê-lo. Daí a necessidade de rever nossos padrões, desenvolver nova geração de teorias, que sejam racionais, críticas, reflexivas, autocríticas, aptas a serem reformuladas. Somos obrigados, por uma imposição de responsabilidade pela própria atividade que exercemos de buscar articular e organizar os métodos e os conhecimentos, além de reconhecer e conhecer os problemas do mundo.

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E isso somente será possível com a necessária e sempre exigida reforma do pensamento. A dinâmica da sociedade deve ser vista não somente no que diz respeito ao direito que cada um busca no Judiciário, mas e principalmente, em face da questão que hoje preocupa e gera tantas discussões – a morosidade – e que tão estreitamente está em relação à gestão do sistema administrativo judiciário. O conhecimento das informações ou dos dados isolados é insuficiente. A especialização, quer dizer, a fragmentação das causas de estrangulamento do sistema judiciário não pode mais ser aceita sem questionamentos. Torna-se imperativo situar as informações e os dados em seu contexto para que adquira sentido. Para ter sentido, a tão propalada e debatida reforma necessita ser encarada em face de todo o sistema seja no que diz respeito às questões de ordem interna, como também às de ordem externa, àquilo que a sociedade espera dos serviços judiciários. E sem sombra de dúvidas, podemos afirmar, sem medo de errar que a sociedade espera transparência e eficiência às suas demandas, às expectativas que depositam na solução rápida e eficiente dos seus problemas. Para tanto, a sociedade exige dos integrantes do Judiciário um comportamento dotado de racionalidade, já que se pensa se tratar da melhor proteção contra o erro e a ilusão, já que se pensa que na racionalidade está depositada a melhor forma de solução do conflito. A racionalidade deve, isso sim, ser fruto do debate argumentado de idéias, não a propriedade de um sistema de idéias. Não podemos nos esquecer que a mente humana não é onisciente e que a realidade tem em seu contexto não somente aquilo que é visível, mas comporta mistério e muitas vezes o que é real não está visível. Assim, a realidade precisa ser não apenas crítica, mas também autocrítica. Sem medo de errar, posso afirmar que a verdadeira racionalidade é reconhecida pela capacidade de identificação de suas insuficiências. A verdadeira racionalidade difere e reconhece a racionalização, que se fundamenta em bases mutiladas ou falsas e se nega ao debate e à verificação empírica. Devemos sempre estar atentos e em vigilante autocrítica, para não cairmos na ilusão, para não nos subjugarmos à nossa razão todo-poderosa e tão sujeita a falhas. Se a sociedade exige racionalidade dos integrantes do Judiciário, racionalidade que não se confunde com racionalização, impende sejam analisadas as causas que levaram o sistema judiciário, não apenas no Brasil, mas no mundo inteiro a se tornar um problema, aparentemente insolúvel, em face da insuficiência de ações propulsoras ao seu aprimoramento. Conforme já mencionado no início deste apontamento, surgiu, desde o início da década de 90, um movimento que se iniciou nos Estados Unidos, propagando-se aos poucos pelos países da Europa, hoje corporificado como meta dos países que integram a União Européia e depois, de forma pontual no Brasil, com tendências de implementação das modernas metodologias cientificamente comprovadas e utilizadas por empresas no mundo inteiro. Têm-se buscado, portanto, assumir eventuais falhas, e destacar e identificar o potencial humano, técnico e orçamentário existentes. O Poder Judiciário, no mundo inteiro encontra-se enfrentando uma realidade, que deve ser encarada com racionalidade, quebrar seus paradigmas obsoletos e que configura verdadeiro obstáculo à celeridade e eficiência da prestação jurisdicional. Esta realidade é vista, sentida e debatida seja pelo jurisdicionado, seja pela sociedade como um todo. Trata-se da morosidade dos nossos serviços judiciários. Este é um problema global, deve ser reconhecido em seu todo, mas somente poderá ser vencido se desvendarmos suas causas, suas especificidades, suas “partes”, verdadeiramente segmentadas. Dessa forma, haverá de ser reconhecido e apreendido o problema do todo. Ao mesmo tempo, o todo será importante conduto auxiliar na solução dos problemas das partes, que uma vez superados, solucionados, voltarão à integrar o todo, de forma consistente e consciente. Não há racionalidade na tentativa de reformar o judiciário pensando apenas na sua

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estrutura. Felizmente, hoje, alguns segmentos desta instituição já acrescentam às causas do problema, a imperiosa necessidade de atacar e modificar a forma de administração burocrática utilizada, passando a aplicar metodologia de gestão pela qualidade, mundialmente comprovada como o único caminho para solução dos problemas relacionados à morosidade. Aqui cabe ressaltar que a morosidade não é afetada apenas pela ineficiência do processamento dos atos judiciários, mas é decorrente de todo e qualquer ineficiência no âmbito dos serviços judiciários, seja no que diz respeito à informatização, seja no que diz respeito ao ordenamento jurídico processual, que tantas e tantas vezes é apontado como o grande vilão do problema, seja no que diz respeito a falta de magistrados e ou servidores, seja, no que diz respeito à própria atividade meio, conhecida como a área administrativa dos órgãos do Judiciário, seja, enfim, por toda e qualquer causa que possa ser apontada ou detectada como causa do problema denominado morosidade. O que deve ser reconhecido é que todos essas causas afetam o objetivo maior do Poder Judiciário, que é a prestação jurisdicional célere e eficiente, quer seja, a prestação jurisdicional tempestiva, sob pena de sua própria inviabilidade. 3. E a única saída para o problema – utilizando evidentemente do recurso da racionalidade e não da racionalização – pode ser encontrado na mudança da cultura no seio do Judiciário, quer seja, na implementação da metodologia da qualidade, com utilização dos modelos internacionalmente reconhecidos como contraponto à burocracia, já que proporciona à sociedade maior visibilidade, transparência dos atos do Judiciário, em face dos indicadores de desempenho que passam a ser disponibilizados. Este constitui o verdadeiro e efetivo controle externo que tanto e tantas vezes se propaga como a solução dos problemas da administração do Poder Judiciário. Dessa forma, à Qualidade foi reservada a função de principal instrumento para a mudança da cultura burocrática para uma cultura gerencial orientada para resultados e focada no cidadão. Adotada como instrumento de modernização da administração pública judiciária constitui o estabelecimento de um sistema eficaz de liderança que garanta a coesão e uniformidade às atividades da organização, a definição clara dos clientes, quer seja de todos os usuários do serviço, e dos resultados por eles esperados; o gerenciamento de informações por meio da geração de indicadores de desempenho; as ações de planejamento e acompanhamento das ações, o envolvimento, estímulo e desenvolvimento dos servidores, dentro do compromisso de satisfazer o usuário do serviço público. A gestão pela Qualidade visa o alcance da dimensão política em sua expressão mais ampla que é a CIDADANIA. Assim, a gestão pela Qualidade, como dito, fulcrada em metodologia cientificamente comprovada, deve consubstanciar, se transformar em uma exigência interna dos organismos judiciários, quer seja, magistrados e servidores devem estar preocupados com a melhoria da prestação dos serviços jurisdicionais, envolvidos com o processo de reforma e não apenas submetidos às normas legais impostas hierarquicamente, como se estivessem implementando técnicas da moderna administração gerencial com utilização da metodologia burocrática. Esta configurará, em verdade, uma outra via da administração burocrática, sob uma nova roupagem, ainda verticalizada, mas com aplicação dos mesmos princípios, apesar de modernamente implementadas rotinas por meio das tecnologias de informatização. O Poder Judiciário em alguns países da Comunidade Européia encontra-se avançado em determinados aspectos e embrionário em outros. Pode ser verificada a conscientização racional da necessidade de mudanças por parte dos atuais responsáveis pela administração do Judiciário, inclusive tendo sido editadas normas legais que regulam a modernização

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dessa Instituição, levantamento de necessidades, mas encontra-se ausente um aspecto de primeira ordem que é o envolvimento das pessoas na condução das ações. Não havendo o compromisso dos magistrados e funcionários quanto ao papel primordial de cada um na satisfação dos usuários dos serviços jurisdicionais, a simples - embora necessária e essencial - modernização dos meios de informatização não conduzirá a uma reformulação efetiva da cultura judiciária. A aplicação do método gerencial deve visar não somente o estabelecimento de um sistema eficaz de administração que garanta coesão e uniformidade às atividades das instituições judiciárias, mas também e, principalmente, deve ser objeto dos projetos, a mobilização e conscientização das pessoas envolvidas, comprometidas com os resultados e definição precisa dos objetivos que cada um, como administrador judiciário, deverá atingir para o alcance de suas metas, visando sempre à satisfação do usuário dos serviços jurisdicionais. Afirmo, portanto, que a solução pode ser encontrada na gestão pela qualidade. Porque este é o mais eficiente método gerencial adotado na atualidade, utilizado não somente pela empresa privada, mas também pela Administração Pública, que, apesar de diferentes na estrutura e finalidade, possuem um ponto comum que é a prestação de serviços. Somos prestadores de serviços e disso não podemos olvidar. O sucesso da implementação da administração gerencial exige liderança, comprometida com a mudança da cultura burocrática inerente às condutas e aos serviços judiciários, com capacidade de não somente modernizar os meios de informação, informática, ambiente, materiais, normas jurídicas, mas, também, de convencer os agentes responsáveis pelos serviços judiciários da necessidade de mudança da cultura arcaica e deficiente que se tornou a administração burocrática, até tão pouco tempo a única utilizada nos organismos judiciário. Observo que, se tanto no âmbito da Comunidade Européia quanto no âmbito da Justiça Brasileira, houver, seja quanto ao primeiro, envolvimento dos magistrados e funcionários no processo de reforma, seja quanto ao segundo, comprometimento dos gestores dos Tribunais quanto à condução desse processo - já que existe um movimento substancial e crescente no sentido de disseminação sistemática das metodologias, visando uma integração de todo os órgãos do judiciário brasileiro -, ter-se-á, em curto e médio prazo, resultados que influirão substancialmente nos projetos de Reforma em andamento. Cabe ao Poder Judiciário a responsabilidade de manter-se suficientemente transparente, com aplicação científica de indicadores, o que redundará obviamente em um “controle” real e efetivo, realizado pelas pessoas que formal e materialmente administram os processos, proporcionando resultados que conduzam à satisfação dos anseios da sociedade no que se refere, principalmente no Brasil, à eficácia e eficiência da administração da Justiça. Visando a consolidação de um Sistema de Qualidade no Poder Judiciário, com a uniformização, agilização e racionalização sistêmica, seja nos países da Comunidade Européia, seja no Brasil, impende tenha sua base estruturada em órgãos de direção comprometidos com a reforma, unidos por um objetivo comum, um sistema de informática que acompanhe a dinâmica da evolução das necessidades processuais e estruturais do sistema, e, principalmente, metas arrojadas e possíveis de serem alcançadas pelas pessoas envolvidas e efetivamente motivadas e comprometidas. A modernização do Poder Judiciário proporcionará ao Estado Democrático a possibilidade de cumprir sua missão básica que é servir a sociedade. Dessa forma, não se trata de um problema exclusivo desse Poder, que, apesar de independente, mantém relações de estreita cooperação com instituições outras que influenciam sobremaneira no andamento dos seus serviços. Trata-se, portanto, de uma reforma que ultrapassa os limites do Judiciário,

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dependendo, pois, o sucesso da implementação da gestão com resultados efetivos, de ações conjuntas com o Poder Executivo e o Legislativo. Impende, portanto, fazer uma análise das principais medidas que adotadas ou em fase de implementação nos países desenvolvidos e no Brasil. Observo que em face da proposição do presente trabalho não será possível exaurir, o que não constitui nosso objetivo, mas apenas apontar algumas atitudes positivas em prol da erradicação do problema maior do sistema judiciário no mundo que é a morosidade da prestação jurisdicional, agravada pela crescente demanda por parte daqueles que buscam a solução de seus conflitos. 4. Os movimentos de reforma dos sistemas judiciais na comunidade européia e Estados Unidos da América, país, este, referência nesse aspecto, fazem parte das respectivas agendas políticas desde início da década de 90. O entendimento é unânime no sentido de estabelecimento - observado o contexto político-cultural de cada país - de novo paradigma do sistema judicial, sensível aos direitos e garantias fundamentais, além da busca da eficiência e eficácia, visando sempre uma ampla modernização do Estado, em específico, na reforma da administração da justiça. Predomina a idéia de crise nos mais diversos sistemas judiciários, sendo, essa, uma decorrência das transformações de ordem econômica, social e legal, causa do crescimento incontrolável do número de processos ajuizados nos Tribunais. Esta situação exige novas respostas na resolução dos problemas da ineficiência e da lentidão da justiça em todo o mundo. Neste sentido, a análise comparativa dos países integrantes da comunidade européia e dos Estados Unidos da América, com identificação das causas que concorrem para a morosidade da justiça e, em geral, para a ineficiência dos sistemas judiciais constitui importante paradigma para o sucesso da metodologia e medidas que alguns órgãos do judiciário brasileiro têm buscado implementar. Restou destacado, nos projetos de reforma supra referenciados - o que pode ser perfeitamente endossado no que diz respeito ao judiciário brasileiro -, a insuficiência de infra-estruturas judiciárias e de recursos humanos; o aumento considerável de litígios em resultado de alterações de ordem legislativa, social, econômica ou outra; a crescente complexidade dos casos, tanto no âmbito da justiça cível, como no da criminal; a escassez de recursos financeiros; a ausência ou limitação de recurso aos meios alternativos de resolução de conflitos; a excessiva burocratização dos procedimentos judiciais; a ausência de mecanismos de comunicação e interação célere no interior do sistema judicial e nas relações deste com outras instituições; uma legislação processual pouco flexível; os elevados níveis de desperdícios e retrabalhos decorrentes de uma estrutura burocrática; a opacidade do sistema judicial; e sua distância social2. Pode ser observado que o movimento reformador na maioria dos países da Europa era concentrado, sobretudo antes da década de 90, em soluções de caráter processual. A partir daí, têm-se registrado uma tendência para o investimento em medidas de melhoria das infra-estruturas, visando a implementação de novas tecnologias, novos modelos de gestão de processos e tribunais, bem como nos mecanismos alternativos de resolução de conflitos. Modernos métodos de gestão têm sido introduzidos, em reconhecimento à ineficiente resposta dos métodos tradicionais, sempre lentos e burocráticos, não respondendo quer ao volume e complexidade dos processos judiciais, quer às exigências de qualidade e rapidez exigidas pela sociedade. Os modernos modelos de gestão assentam nos princípios da racionalidade e da qualidade do sistema, no seu funcionamento de forma orientada. Estes

2 Relatório do Observatório Permanente da Justiça Portuguesa, nov/2001, p. 4/5

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modelos de organização oferecem maior flexibilidade e encorajam a eficiência3. Impende observar a evolução dos modelos de gestão que têm dominado a estrutura organizativa pública nas últimas décadas. A administração das organizações pertencentes ao setor público menos flexível e mais conservadora que o privado, sempre adotou o modelo burocrático, apesar da burocracia4, enquanto paradigma de organização, ter deixado de responder às exigências de celeridade e eficiência dos serviços e, conseqüentemente, não satisfazer as necessidades dos cidadãos. Nas últimas décadas começou a ser desenhado o novo modelo de gestão pública denominado modelo gestionário. Este modelo é caracterizado pela gestão profissional, pela fragmentação das unidades administrativas, pela competição, pela adoção dos modelos de gestão empresarial, pela clara definição dos padrões de performance, pela focalização nos resultados, e pela importância dada ao uso eficiente dos meios existentes. Armando Pereira entende que os princípios base da gestão se aplicam à Administração Pública, sob o fundamento de que “também aí se congregam as pessoas, se desenvolvem as actividades com vista à produção das utilidades públicas, se levam a cabo, com mais ou menos ênfase, as actividades funcionais de gestão, como seja planear, organizar, dirigir, coordenar, controlar, avaliar, etc., no âmbito da prossecução dos objetivos que se colocam às organizações e designadamente aos departamentos públicos”5. Na mesma esteira, vários autores propõem uma nova concepção de Administração Pública, baseada nos fundamentos do modelo gestionário, denominado Qualidade, seguindo determinados critérios como a liderança, fator fundamental na promoção da qualidade em

3 ib idem, p. 6/7 4 A burocracia surgiu no início do século XX, quando o objetivo fundamental das organizações centrava-se no melhoramento das tarefas a desempenhar, buscando novas formas de administração focadas na simplificação e especialização das tarefas e do trabalho em cadeia, sendo destacada a preocupação com a estrutura organizacional das instituições. Recentemente surgiu uma nova teoria de gestão, denominada Gestão da Qualidade Total, focada no comportamento das pessoas e nas relações humanas, com a inclusão da tecnologia no seio da organização e a preocupação com o meio ambiente, com a qualidade do serviço ou do produto focada na satisfação do usuário. Tem sido lenta a evolução das organizações pertencentes ao poder público, já que as exigências do Estado aparentemente encontram-se satisfeitas com a adoção do modelo burocrático, cujas características se encontram baseadas na centralização do poder, na rígida determinação das funções e dos procedimentos e a hierarquização das relações. Dessa estrutura, decorre o desenvolvimento de rotinas e resistências que dificultam a implementação de mudanças organizacionais. Por outro lado, a burocracia proporciona problemas de comunicação entre os diferentes níveis hierárquicos, despersonaliza as relações entre os indivíduos, torna a comunicação formal e distante, contribui para que as decisões sejam tomadas por pessoas afastadas dos problemas e dos usuários. Em decorrência, os funcionários, admitidos com base em concursos e neutros nas suas decisões se sentem desmotivados, inexistindo percepção dos objetivos da organização. Buscou-se com o modelo burocrático obter da organização precisão, velocidade, conhecimento, unidade, subordinação estrita e redução dos custos materiais e humanos. O lado perverso da hierarquização das relações interpessoais, do caráter formal das comunicações, da divisão racional do trabalho, da padronização dos procedimentos e da completa previsibilidade do comportamento dos funcionários, resultou na despersonalização do relacionamento interpessoal e no uso excessivo de formalismos, o que potencializou elevada resistência à mudança e forte defesa dos funcionários em relação a pressões externas. Interessante observar que a crise do modelo burocrático surgiu com o aumento das funções do Estado, resultantes do New Deal, agravada com a emergência do Welfare State e o conseqüente aumento das despesas com a saúde, educação, segurança social e funcionários públicos. Foi criado, em alguns países da comunidade européia e nos EUA, na tentativa de superar a ineficiência deste modelo, a figura do administrador público profissional, com base no entendimento de que o sistema administrativo não está isolado dentro do sistema político, devendo ter um papel determinante na discussão das políticas públicas. Dessa forma, a operacionalização da gestão pela qualidade se define por um processo contínuo de inovação e aprendizagem, através do desenvolvimento de meio e processos com vista ao alcance de resultados, como garante da eficácia e eficiência de qualquer unidade produtiva, pública ou privada. 5 Pereira, Armando. 2000. “A Gestão e a Modernização na Administração Pública e particularmente na Administração Local e Regional”. Revista Portuguesa de Administração e Políticas Públicas. Vol. 1 n. 1, Braga:APAPP:82-97

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qualquer organização; a gestão das pessoas, visando desenvolver e sustentar o potencial humano de uma forma eficiente; a definição clara da política e estratégia organizacional; a gestão das parcerias externas e dos recursos internos à organização; o aumento da eficiência dos procedimentos para melhor satisfazer as necessidades dos usuários; e a comparação dos resultados do desempenho planejados com os resultados alcançados. Estes critérios vão também ao encontro de alguns dos princípios defendidos pelo modelo gestionário como a liderança6, a motivação7 dos funcionários, o desenvolvimento de uma cultura organizacional8, a comunicação9 e a introdução de novas tecnologias10. Dessa forma, o modelo de gestão tornou-se fundamental à administração da justiça, possibilitando melhor adaptação às constantes mudanças políticas, econômicas e sociais. Caso contrário, continuará totalmente inadequada ao atendimento das necessidades dos usuários e incapaz de responder com eficácia às tarefas administrativas. Somente com uma política avançada em gestão pública, o Judiciário apresentará resultados efetivos nos seus serviços. Os tribunais ainda são vistos como organizações excessivamente burocráticas e a administração burocrática dos tribunais tem sido apontada como uma das principais causas da crise da justiça e da distância social entre os tribunais e os cidadãos, por isso, uma das áreas mais carentes de reforma. A comunidade européia e a norte americana, acompanhada do Judiciário brasileiro, chegaram à conclusão de que a introdução de novos sistemas de gestão e administração constitui requisito fundamental de eficácia do sistema judiciário. Indiscutível que os meios burocráticos utilizados para o alcance da racionalidade da administração das organizações resultou em dificuldades, ineficiência e morosidade. Para o eminente sociólogo Boaventura de Souza Santos, apontando vários exemplos de excessiva burocratização dos tribunais e da tramitação processual, “o acesso ao direito e à justiça é a pedra de toque do regime democrático. Não há democracia sem o respeito pela garantia dos

6 Ao líder cabe definir o papel e a missão e os objetivos da organização, bem como decidir os meios para alcançar os fins; ainda, defender a integridade da organização e eventuais conflitos internos. São identificados quatro estilos de liderança, quer seja, o diretivo, cujo objetivo principal é a estruturação de tarefas, fornecendo instruções específicas e controlando o seu cumprimento; o orientativo, além da direção, oferece apoio, elogia e o trata com dignidade os subordinados, buscando a mobilização e a motivação deles; a liderança participativa envolve a participação dos subordinados com alguma experiência na definição e execução das tarefas; o último é o estilo delegativo, quando o líder supervisiona, mas delega responsabilidades. O estilo de liderança deve se adaptar ao contexto e aos objetivos da organização. 7 Os funcionários devem conhecer os objetivos da organização. Além disso, as pessoas devem sentir a importância do trabalho que desempenham, o reconhecimento do seu esforço e empenho, quebrar a rotina com a realização de novas tarefas, necessidade de segurança, de estabilidade no emprego, necessidade de amizade e convívio, de realização e prestígio profissional, de ter poder, de sentirem que contribuem para o sucesso da organização e, por fim, a necessidade de desenvolvimento e progressão na carreira. 8 A motivação dos funcionários deve estar integrada a estratégia de desenvolvimento de uma cultura organizacional própria que vise a flexibilização da organização possibilitando sua eficaz adaptação às novas realidades sociais. É importante o papel do líder como agente coordenador e impulsionador da satisfação das necessidades de motivação dos funcionários. 9 A comunicação é essencial como sistema de processamento de informação, sendo, pois, imprescindível para processos de tomada de decisões, poder e liderança, a quem cabe determinar as necessidades dos funcionários, visando a sua satisfação e o desenvolvimento de uma cultura organizacional sólida. 10Com o surgimento de novas tecnologias após a segunda guerra mundial, surgiu, também a necessidade de especialização da mão de obra, não respondendo à essa fase o anterior modelo de simplificação das tarefas e de trabalho em cadeia. Assim, quanto mais desenvolvida a tecnologia utilizada pela organização, maior a exigência de qualificação dos grupos e indivíduos, do que se demonstra insuficiente a modernização apenas do equipamento, sendo necessário investir na flexibilidade da organização e da mão-de-obra.

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direitos dos cidadãos”11 . Sem sombra de dúvidas, o desenvolvimento de novos sistemas de gestão e administração deve ser considerado requisito fundamental da eficácia do sistema judiciário, já que muitos problemas se resolveriam “se alguém com um pouco de conhecimento de gestão e de organização, fosse analisar o que se passa”, ainda nas considerações do eminente sociólogo Boaventura Santos, acrescentando que “seria simples eliminar algumas das irracionalidades do sistema sem para tal ser necessário mudar as leis”12. José Orvalho Silva13, referindo-se especificamente ao caso da Administração Pública portuguesa, apesar de racionalmente ser detectado como aspecto comum aos demais sistemas judiciários, ressalta que “não faz sentido que (se) ignore o movimento mundial pela qualidade, pois condenaria o país a um atraso progressivo e irreversível em relação aos países que já fizeram a sua opção pela qualidade dos serviços públicos”. Defendendo, pois, a necessidade de ser adotado o novo modelo gestionário em substituição ao modelo centralista, burocrático e autoritário, o mesmo autor analisa que se trata de um “modelo de responsabilidade partilhada, delegando autoridade e responsabilidade de decisão, actuando com base nas necessidades explícitas e implícitas do cliente, fomentando o trabalho em equipa, partilhando a gestão como forma de motivação e envolvimento dos funcionários e libertando o potencial criativo das pessoas” 5. Verifica-se, portanto, que o modelo de administração gestionária tem sido introduzido na administração de vários países da comunidade européia, EUA e Canadá, como estímulo à eficiência do sistema judicial, com a adoção das novas tendências de organização, em particular o de Qualidade Total14. Evidente que esta nova visão de administração da justiça depara com problemas ligados à complexidade do sistema decorrente da sua composição heterogênea e da estrutura complexa de cada uma das organizações que o integram. Trata-se, a complexidade das organizações, de um dos problemas enfrentados também pela justiça brasileira, aspecto que abordaremos ainda neste estudo. Na visão do Observatório Permanente da Justiça Portuguesa, adaptadas as diferenças do sistema português ao brasileiro, o estudo da administração e da gestão dos tribunais obriga a uma visão macro, devendo ser englobada a administração de todo o sistema da justiça, quer seja, além dos tribunais, também os institutos de reinserção social, o sistema prisional e o Ministério da Justiça, e micro, direcionada à administração de cada tribunal, enquanto unidade organizacional. Além de Portugal, outros sistemas como a Holanda, a Noruega, os EUA, também destacam em seus programas, a abordagem macro, direcionado ao sistema e a cada Tribunal e a micro, focada no desempenho funcional dos servidores e juizes. Têm-se, portanto, que as reformas da administração da justiça a nível macro e micro não são antagônicas, mas complementares, exigindo-se, para sua eficácia, uma coordenação intensa entre as alterações efetuadas nos dois níveis. 11 Boaventura Santos, João Pedroso, Maria Manuel Leitão, Pedro Lopes Ferreira, 1996. Os tribunais nas sociedades contemporâneas: o caso português. Porto: Afrontamento/CES/CEJ, p. 483 12 Boaventura Santos, 1996:193 13 José Orvalho Silva, 2000. “Qualidade, cidadania e modernização administrativa” Revista Portuguesa de Administração e Políticas Públicas. Vol. 1 n. 1. Braga:APAPP: 106-111. 14 Filosofia de gestão denominada Total Quality Management – TQM,, que se fundamenta no modelo europeu de excelência consagrado pela Fundação Européia para a Qualidade da Gestão, a European Foundation for Quality Management – EPQM. Esta Fundação foi criada em 1988 pelos presidentes de quatorze companhias, com apoio da Comissão Européia. Congrega, hoje, mas de seiscentas organizações e se propõe a estimular e apoiar organizações européias na participação de atividades de melhoramento que conduzam à satisfação do consumidor, do trabalhador com vista à produção de impacto positivo na sociedade e nos resultados da empresa.

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A administração dos tribunais a nível macro enfrenta dificuldades de natureza organizacional e financeira, além da burocratização da justiça e a excessiva regulamentação da tramitação processual, e a independência dos tribunais, órgãos de soberania que são, apenas sujeitos à lei. Contudo, essa independência não chega a constituir fator de obstáculo à implementação de uma gestão eficaz e racional. Por sua vez, a nível micro, a dificuldade encontra-se assentada na complexidade das organizações envolvidas (magistratura, ministério público, servidores, advogados, jurisdicionado), mormente quando exercem duplamente a função de administração da justiça e administração da organização. Sendo o principal objetivo dos tribunais facilitar o acesso aos cidadãos, proporcionado-lhes um bom atendimento, a eles cabe o dever de obedecer a regras de gestão, pois como serviço público que é, devem assegurar ao jurisdicionado uma prestação célere e eficaz. Para Mário Torres, “a independência dos tribunais não pode mais ser vista como uma contraposição de um pretenso poder soberano face a outros poderes do Estado”15. 6. Partindo, de conseqüente, dos dados levantados, foi possível alinhar as principais ações dos diversos projetos de melhoria iniciados na ordem internacional, ressaltando, primeiro, a condução estabelecida pelo Conselho da Europa, e depois, identificando as medidas iguais ou similares e apontando aquelas que discrepam do padrão adotado pela maioria. O Conselho da Europa tem tratado a justiça e o Estado de direito como questões prioritárias, buscando-se, no seu âmbito, a promoção da eficiência da administração da justiça, assegurando a celeridade e eficácia dos processos, com a implementação de um conjunto de Resoluções e Recomendações adotadas pelo Comitê de Ministros do Conselho da Europa. Em destaque, o relatório elaborado pelo Comitê Europeu da Cooperação Judiciária em colaboração ao Comitê Europeu para os Problemas Criminais e o relatório do Grupo de Projeto sobre práticas institucionais, avaliação de experiências piloto e sobre reformas no âmbito da gestão da justiça criminal. Também na 23ª Conferência de Ministros Europeus da Justiça, realizada em Junho de 2000, em Londres, foram debatidas as questões da morosidade judicial e modernização dos tribunais. Concluíram que a morosidade resulta de fatores como procedimentos inadequados e sistemas de prevenção e de resolução alternativa de litígios ineficientes. Indicaram medidas como tornar os procedimentos internos mais eficazes; distinguir entre o acesso à justiça e o acesso ao tribunal; incentivar os acordos na fase inicial do processo; adoção, pelos juizes, de métodos eficientes de trabalho, utilizando atitude pró-ativa e adoção de medidas adequadas para a redução dos casos16. Quanto à modernização dos tribunais, o relatório aponta caminhos para a condução das reformas dos tribunais, com base em uma política de orientação para o consumidor, adoção de novas tecnologias de informação17 visando a reorganização do sistema judicial; formação dos agentes judiciais em tecnologias de informação e de proteção de dados e, adaptação das instalações dos tribunais às novas tecnologias. No decurso do ano de 200118, o Conselho da Europa voltou a debater o assunto morosidade e modernização da justiça, tendo sido produzidas as Recomendação (2001) 3 e a 15 Torres, Mário. 2000. “Por uma economia do serviço público de justiça”. In Barreto, Antônio. Justiça em crise? Crises da Justiça. Lisboa: Publicações Dom Quixote: 385-391 (p. 386) 16 por ex., procedimentos mais rápidos para apresentação de queixa, descriminalização, processos sumários, uso de juiz singular na 1a. instância, indeferir casos sem fundamento para a ação, sanções (multas) quanto a prazos não respeitados, horários rígidos para a prática dos atos, restrições nos recursos, co-operação entre os departamentos. 17 Constituem uma ferramenta fundamental na administração dos tribunais. São indicadas, as ligações de vídeo (gravações dos fatos ou dos processos do tribunal) vídeo conferências, etc., base de dados ou internet (legislação, assinaturas eletrônicas digitais, registros ccmerciais, registros de propriedade, etc) 18 No âmbito da 743a. reunião dos Delegados dos Ministros, em 28 de Fevereiro.

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Recomendação (2001) 2, tratando, a primeira, do uso de novas tecnologias19 nos serviços prestados ao cidadão20, com responsabilidade do Estado quanto ao apoio logístico aos tribunais e a segunda, da concepção dos sistemas judiciários e dos sistemas de informação, agora numa perspectiva de custo-eficácia, visando melhorar o sistema judiciário mormente no que diz respeito à qualidade, celeridade, eficácia e eficiência do direito e das justiça nos Estados-membros. Na Recomendação n. R (95) 12, o Conselho da Europa concluiu que “desde o início dos anos 70 muitos países têm vindo a sentir problemas crescentes na administração da justiça criminal”, destacando diversos fatores tais como o aumento dos processos crime, a judicialização de determinadas práticas sociais e as expectativas dos cidadãos quanto a rapidez, eficácia e imparcialidade no tratamento dos processos criminais. Em 1972, foi criado, pelo Conselho da Europa, um programa de estudos visando conhecer o funcionamento dos sistemas de justiça criminal. Em 1980 foi publicado o Relatório sobre a Descriminalização, tendo sido analisada esta questão, sob o ponto de vista teórico e sociológico. Em 1987, na 17a. Conferência de Estudos Criminológicos foi abordada a questão da cooperação organizacional21, bem como a exigência de uma definição clara dos objetivos da justiça e das funções de cada departamento. Na 410a. Reunião dos Delegados dos Ministros, ainda em 1987, foi adotada pelo Comitê de Ministros do Conselho Europeu, a Recomendação n. R (87) 18, que trata da simplificação da justiça penal, visando melhor definir as prioridades da política criminal, defendendo a introdução, no sistema judicial, de métodos modernos de gestão, de formação dos funcionários na área da administração/gestão e avaliação sistemática do desempenho dos órgãos judiciais com vista à introdução imediata de correção, se necessário. O mesmo tema foi objeto de relatório22 na 4ª Conferência Sobre Política Criminal, em 1990, onde se defendeu a implementação de modelos de gestão. A partir de 1991, o Comitê Europeu para os Problemas Criminais (CEPC) indicou um grupo de especialistas em gestão da justiça criminal, com o objetivo de conhecer e analisar as técnicas de gestão utilizadas pelos Estados-membros, com foco nas práticas institucionais, avaliação de experiências piloto e sobre reformas ou projetos de reforma no âmbito da gestão da justiça criminal. Apresentaram, em 1995, dois Relatórios, um identificando os fatores concorrentes para a morosidade da justiça e para a ineficiência dos sistemas judiciais, e o outro, com propostas23 para melhoria do sistema. Indicam como fatores que contribuem para a ineficiência do sistema a falta de infra-estruturas judiciárias e de magistrados profissionais24; o aumento considerável de litígios em face de alteração de ordem legislativa, social ou outras, não compensados com um aumento da produtividade no sistema judiciário; o aumento da complexidade dos casos quer seja no âmbito da justiça cível, quer no âmbito da criminal; a insuficiência ou má utilização dos recursos colocados à disposição da justiça; escassez dos recursos financeiros; ausência ou

19 Aqui há realce à importância da tecnologia, se esquecendo que a informática é apenas uma ferramenta no contexto da gestão. 20 Tais como disponibilizar ao cidadão, as informações eletrônicas; criar um anuário de registros eletrônicos da área jurídica na internet; desenvolver a interação dos serviços judiciários com o público, como a instauração da ação via eletrônica, obtenção do andamento do processo acessando o sistema de informação; obter a decisão do processo via eletrônica. 21 Tendo em vista que nas primeiras fases do processo, o trabalho de cada departamento ou órgão da justiça criminal ser condicionado ao trabalho e decisão tomadas por outros departamentos ou órgãos. 22 Thurley, K. E. 1991. Conference Report. 4th Conference on Crime Policy. Strasbourg 9th to 11th May. 1990. Strasbourg. 23 elaboradas pelo Comitê Europeu de Cooperação Jurídica em colaboração com o Comitê Europeu para os Problemas Criminais 24 além desses, existe no sistema europeu a figura do magistrado contratado para julgamento de determinadas matérias.

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limitação do recurso aos meios alternativos de resolução de conflitos; legislação processual pouco flexível; e excessivas possibilidades de recursos. Quanto às propostas, foram recomendadas a implementação de medidas preventivas, com vista a evitar o aparecimento de litígios ou ajudar a resolvê-los numa fase precoce25; mediação e conciliação, a primeira no âmbito dos conflitos da família, direito comercial e conflito relativo a menores, e a segunda, a ser promovida como meio extrajudicial e condição prévia e obrigatória à instância judicial em determinados processos; administração da justiça, tendo sido apontado como obstáculo mais recorrente a insuficiência de meios tecnológicos e sistemas complexos26; organização judiciária, que prevê um conjunto de medidas como a introdução do juiz único27, melhor fiscalização da atividade judiciária dos juízes28; medidas de âmbito da formação inicial e permanente dos magistrados29; transferência de certas tarefas para assessores, com formação jurídica; e, por fim, a necessidade de implementação de um conjunto de medidas no âmbito da gestão judiciária do processo, definindo métodos sobre os quais os tribunais deverão se utilizar para gerirem os processos30, ressaltando a necessidade de simplificação dos processos, nos moldes das experiências francesa, inglesa31, irlandesa32. O Relatório supra aponta como vantagens decorrentes da implementação do modelo de gestão33, a especial atenção que se dá às tarefas de administração e gestão; a definição objetiva dos padrões e medidas de performance individual, expressas em metas e indicadores; o enfoque nos resultados em vez dos procedimentos; a diminuição dos custos e elevação dos padrões de eficiência; a utilização dos recursos de forma racional e disciplinada. Foram identificadas como áreas prioritárias para a implementação da metodologia de gestão34, a de recursos financeiros (financiamento e distribuição interna dos recursos), infra-estruturas (localização geográfica e acesso aos tribunais, novos edifícios, antigos edifícios e manutenção desses edifícios)35; recursos humanos (carências de funcionários,

25 Campanhas de publicidade, serviços de consulta e aconselhamento jurídico, incentivo à negociação. 26 Alguns sistemas têm modelo centralizado de administração, gerido pelo Ministério da Justiça ou pelo Supremo Tribunal, outros apresentam modelos mais descentralizados. De todos os modelos utilizados nos Estados-membros, a experiência considerada particularmente eficaz foi a da Noruega. 27 Estão sendo gradativamente substituídos, em matéria cível, os julgamentos coletivos na primeira instância. 28 As medidas disciplinares deverão levar em conta os critérios previstos na Recomendação n. R (94) 12 que trata da independência, eficácia e papel dos juízes. 29 Condição fundamental para o funcionamento eficaz do sistema judiciário. Ressalto a existência dos magistrados não profissionais, dos juízes temporários e aos juízes com tempo parcial, considerados como importantes no combate à morosidade judicial. 30 Como por ex., prazos dentro dos quais as partes devem apresentar e trocar informações e comunicá-las ao tribunal; conseqüências do descumprimento desses prazos; regras sobre o calendário judicial, no que se refere à preparação dos processos, à fixação das datas de audiências; sobre a distribuição dos processos aos juízes; regras sobre as audiências preliminares; regras sobre o recurso e sobre a condução das audiências. 31 Utiliza processos simplificados para a solução dos pequenos litígios, principalmente no âmbito da arbitragem informal. 32 O Small Claims Procedure – que trata de modo informal, rápido e a baixo custo as ações instauradas por consumidores 33 O modelo gestionário busca a efetividade e eficiência do trabalho realizado, tendo como princípio o conhecimento das necessidades, da performance e dos resultados, possibilitando o fornecimento de informações aos agentes da organização sobre o que se passa e visando reduzir os obstáculos para a consecução de um trabalho efetivo e eficiente. Busca o estabelecimento dos objetivos e sua monitorização, tentando racionalizar e simplificar as tarefas. Este modelo também se preocupa com o custo, racionalizando o orçamento. E, por fim, visa a satisfação do indivíduo que busca os serviços. 34 O primeiro e fundamental passo exigido pelo modelo gestionário é o estabelecimento de objetivos, dos métodos e instrumentos de trabalho a serem utilizados, sempre conciliados com a política definida globalmente pela autoridade central. 35 Deve ser considerado, também como infra-estrutura, o processamento dos feitos, ligados às atividades dos agentes judiciais.

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formação e progressão na carreira, cultura judiciária, avaliação do desempenho e relações internas), e informação e comunicação (concepção e implementação de sistemas de informação interna adequados, e problemas de comunicação no interior e para fora do sistema judicial). 7. Interessante ressaltar as medidas adotadas pelos países europeus, EUA e Canadá, ressaltando as iniciadas no Brasil, algumas pontuais, outras de forma sistêmica, mas ainda sendo exigência para a efetividade da reforma, que ela seja concertada, integrada. Todos os países da comunidade européia e mesmo os Estados Unidos da América têm uma administração subordinada às ações do Poder Executivo, cabendo aos respectivos Ministérios da Justiça uma maior ou menor responsabilidade na administração da justiça, sem qualquer interferência, logicamente, na atividade considerada jurisdicional. Pode ser verificada uma preocupação unânime em relação à necessidade de modernização dos sistemas judiciários, sendo, em todos os programas, ressaltadas as questões da morosidade e da exigência de se alcançar eficiência e eficácia dos serviços judiciários. O Programa de reforma da Noruega nomeia o sistema de gestão por objetivos, fundado no controle do resultado e na qualidade final do trabalho, que deve ser objeto de regular avaliação dos resultados obtidos, sempre via monitoração. A Noruega, em 1996 instalou uma Comissão para avaliar o modelo de administração dos seus tribunais, visando encontrar soluções alternativas e definir princípios sob o aspecto macro. Destaca a necessidade de reformas setoriais, de forma integrada, seja preventiva ou na tramitação do processo. Também a Inglaterra e País de Gales, já em 1996, apresenta propostas similares, visando a integração e coerência das reformas setoriais dos Tribunais, baseado em perspectivas sistêmica e uniformização dos objetivos (acesso à informação36 e eficiência37) e procedimentos38. Dentre os mecanismos alternativos de resolução de conflitos, encontrados nos vários sistemas, ressalta a mediação e a conciliação, além das medidas preventivas adotadas para evitar ou resolver os conflitos ainda em fase precoce. Conclui-se que a implementação de metodologia de gestão constitui uma medida eficaz de prevenção dos problemas levantados. Outras estratégias foram definidas em todos os sistemas estudados, seja na Inglaterra39 e

36 Simplificação das leis e procedimento, reforma do sistema de apoio ao menos favorecido. 37 Desenvolver meios alternativos de resolução de conflitos, reforma da gestão dos tribunais, alteração das regras processuais, alteração da organização judiciária. 38 Ressalto a fixação prévia dos procedimentos e sua duração. 39 O programa inglês em relação à justiça criminal, ressalta a necessidade de funcionamento integrado, o estabelecimento de parcerias, a eliminação de atrasos desnecessários, a partilha de responsabilidades no combate ao crime, a troca eletrônica de informações, a descriminalização e alternativas ao julgamento convencional, a definição de critérios objetivos de avaliação da prova, a redução de custos, o desenvolvimento e instalação de software para envio de peças processuais, a sistematização de proteção de documentos, a introdução de assinatura digital, o estabelecimento de links com escritório de advocacia, usuários dos tribunais, etc., apresentação de peças via correio eletrônico, juiz aprecia o pedido e devolve pela mesma via, quiosques de informação aos Tribunais e outros locais, instalação de vídeo-conferências, apresentação eletrônica de provas, liquidação de custas via cartão de crédito ou débito, possibilitar o acesso à informação em várias línguas, desenvolver eficientes programas de gestão, comunicar eletronicamente os despacho judiciais, com a polícia, advogados, aos serviços prisionais. São experiências de sucesso, o centro eletrônico de queixa (desde 1990), o serviço de retenção dos salários do empregado para quitação de débito de sua responsabilidade e o JUROR, programa de notificação do Júri, que permite saber os antecedentes criminais dos jurados, afastando-os, o que reduz tempo, custo, deslocando ao Tribunal apenas os que vão participar do Júri.

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País de Gales, Holanda40, Noruega41, França42, Portugal43, Espanha44, EUA45, Países Baixos46 e Canadá47. Assim, todos ressaltam a importância de utilização da tecnologia da informação48, ferramenta de gestão utilizada como medida de otimização do funcionamento dos tribunais para agilizar o andamento dos processos, minorar os custos, levantar dados relativos à produtividade dos juizes, realizar auditorias para avaliação de desempenho do sistema, possibilitar a agilidade na pesquisa aos usuários, enfim, trata-se de estratégia de 40 O Projeto Qualidade para o Judiciário teve início em 1999, cujo objetivo é desenvolver instrumentos e padrões de qualidade no plano interno (melhorar o desempenho individual dos funcionários e facilitar a definição de políticas, principalmente a orçamental) e externo (maior responsabilidade do judiciário perante a sociedade e perante o Parlamento). 41 O Relatório de 2000 sugere a criação de órgão autônomo para administrar os Tribunais, parte eleito, parte nomeado pela Assembléia, parte pelo Governo. A nível central, a administração dos tribunais é de responsabilidade do Ministério da Justiça, por meio do Departamento de Administração dos Tribunais (Department of Courts Administration), criado em 1996 e responsável pelo administração de pessoal, preparação e distribuição do orçamento dos tribunais, pelos equipamentos, instalações e à formação profissional, além de competências quanto à nomeação de juízes, contratação de profissionais para o exercício temporário das funções de juiz, e, em matéria de incompatibilidade dos juízes para o exercício de outras funções. O Departamento inclui nos seus quadros 30 gestores além do pessoal administrativo e está dividido em três Seções, a administrativa, a de assuntos jurídicos e a do planejamento e desenvolvimento. 42 Desde 1986 a Associação Francesa dos Círculos de Qualidade (AFCERQ) tem trabalhado no tema gestão. A justiça francesa entende que a construção dos indicadores de desempenho deve respeita as duas funções que justiça que é dizer o direito (jurisdição) e fazer-se respeitar (império). Entende que mensurar é um imperativo jurídico, constitui um impacto político, um instrumento de gestão pública, útil na melhoria da performance de uma organização, além de base de experiências ou comparações internacionais, de correlação entre os diversos fatores de produção. Adota como dimensões para medir, a qualidade, a performance, a eficácia e a produtividade. Distingue, na ordem lógica do processo de produção, os quatro elementos: custos, meios, ação e resultado (impacto). O sistema francês apresenta oito propostas para avaliar a justiça: 1. pesquisar o consenso com escolha do seu objeto, sua natureza e sua produção e a solução para os problemas deve ser considerada legítima pelos profissionais da justiça e seus usuários; 2. respeitar a independência dos magistrados; 3. avaliar o essencial, dizer o direito de maneira exata e motivada e o fazer respeitar; 4. enfocar a qualidade da justiça detnro do seu contexto, ressaltando que não é um sistema isolado e considerando a interação entre aqueles que dela participam; 5. distinguir as diferentes finalidades de avaliação; 6. permitir o acesso à justiça; 7. se equiparar com a estatística européia; 8. medir a performance da medida de performance. 43 Iniciado o processo de reforma em 2000, adotando um plano de informatização, criando a figura do administrador da justiça, instalando um Gabinete de Auditoria e buscando autonomia administrativa e financeira, via legislação. 44 O Libro Blanco, em 1988, se preocupou com a caracterização e avaliação geral do sistema judicial espanhol, apresentando propostas de mudança. 45 A American Judicature Society desenvolveu um estudo em 1993 com o objetivo de mostrar que, de forma simples, sem grandes mudanças estruturais e sem grandes investimentos é possível melhorar o acesso aos tribunais. O Centro Judicial Federal criado em 1967 é responsável pelo estudo das matérias relativas ao Judiciário, à formação dos magistrados e servidores, pela melhoria da gestão, pelo desenvolvimento de métodos e técnicas, em matéria administrativa, gestão de processos, dos recursos humanos, orçamento e adaptação de novas tecnologias. O Judiciário norte-americano define uma série de medidas a serem adotadas pela administração judiciária, como a auto-avaliação das práticas processuais utilizadas e comunicação dos resultados aos procuradores públicos, advogados e partes interessadas; comparar informações relativas às experiências e procedimentos prestados por outros tribunais; encorajar a discussão, a nível estadual e nacional, entre juizes, procuradores públicos, advogados e oficiais de justiça sob a eficiência do tratamento processual; adotar uma política de educação dotada de mecanismos e estratégias que fomentem a celeridade e a qualidade processuais; 46 A finalidade é tornar a justiça mais responsável, sendo o orçamento alocado em função dos objetivos. Os principais instrumentos utilizados se circunscrevem à auditoria organizacional por uma agência; definição de indicadores de qualidade profissional, inclusive dos magistrados; instituição de um Conselho de Justiça encarregado de supervisionar e de avaliar o orçamento da justiça; implementar um sistema de acesso eletrônico à jurisprudência; implementar pesquisa periódica de satisfação dos usuários. O Conselho da Justiça é responsável, ao mesmo tempos pelo orçamento da Justiça como pela coordenação da avaliação da qualidade. Utiliza vários indicadores, como estatísticas judiciais, auditoria conduzida por pessoas de outra jurisdição, pesquisa de satisfação dos usuários. 47 A finalidade da justiça canadense se cinge à melhorar a qualidade profissional do trabalho dos magistrados; utiliza como método de coleta de produtividade, a pesquisa realizada por uma equipe na forma de questionários escritos; 48 O modelo espanhol adota critérios de uniformização, transparência, universalidade, integração e centralização física dos equipamentos de hardware

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modernização. Outra estratégia se refere à valorização dos recursos humanos, focada na formação e desenvolvimento do conhecimento e competências dos funcionários judiciais, não apenas em matérias relacionadas à área judiciária, mas também em matéria de administração49 e gestão dos tribunais a nível macro e micro50. A eficiência no controle do orçamento mereceu destaque em todos os programas, focado sempre no aspecto custo-eficácia do sistema. Em matéria de crime, existe uniformidade quanto a necessidade de intensificar a cooperação organizacional, mormente o estabelecimento de parcerias entre as organizações e com a sociedade. 8. Da análise dos sistemas judiciais existentes nos países supra, imperiosa a demonstração dos passos iniciados pela justiça brasileira, com verificação de seus aspectos positivos e suas falhas, bem como será possível aprimorar o sistema, com utilização da metodologia de gestão já inserida como norma, se não legislativa, mas como norma de conduta a ser adotada nos países europeus e nos Estados Unidos da América e Canadá. Desde 1995, verificamos movimentos em alguns órgãos do Poder Judiciário brasileiro, na esteira das ações encetadas desde 1991 pela Administração Pública Brasileira, com o propósito de transformação dos seus processos burocráticos, tornando-se mais preocupada com o cidadão, enfim, introduzindo metodologias de modernização da gestão pública. O movimento dos Tribunais Superiores, Regionais Federais, Regionais do Trabalho, Regionais Eleitorais, Estaduais, teve início com a preocupação no desenvolvimento de tecnologias de informação51, passando, de forma pontual e gradativa à criação de núcleos de qualidade, despertando para a necessidade de iniciar um processo de mudança da cultura burocrática para a gerencial Essa exigência de demonstra nos movimentos dos Tribunais, seja realizando Congressos de Administração Judiciária, seja as Mostras de Trabalhos da Qualidade, cujo objetivo é integrar o movimento, para que as experiências e os resultados encontrados sejam expostos e colocados à disposição dos participantes. Desde 1994, órgãos do Poder Judiciário Brasileiro deram início à implementação do modelo de administração gerencial, com resultados efetivos. A iniciativa partiu do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, sendo que em 1995, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais deu os primeiros passos ao seu Programa de Qualidade, encontrando-se, hoje, executando a reestruturação de cargos. O TRT da 10ª Região recebeu em 1998 a primeira certificação ISO para a atividade meio do Judiciário. Em 1997, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região criou o Conselho da Qualidade e desenvolve, desde essa data e, principalmente, um

49 Conteúdo de alguns cursos realizados em 2001 pelo Institute for Court Management – ICM,(EUA): acesso à justiça; gestão avançada de processos; standards avançados de performance dos tribunais; métodos de pesquisa; gestão de processo em tribunais rurais; cobrança de multa e de custas; colaboração entre o Tribunal e a comunidade; tradução nos Tribunais; gestão da biblioteca dos tribunais; standards de performance dos tribunais; gestão da segurança dos tribunais; como elaborar e produzir apresentações; infra-estruturas judiciais; desenvolvimento de programas de apoio aos usuários; liderança executiva eficaz; arquivo eletrônico/cópia digital de documentos; formação de educadores; a gestão de processos: questões fundamentais; como melhorar a gestão de processos no sistema judicial e nos tribunais de família e menores; melhorar o acesso à justiça aos litigantes que se auto-representam; o uso da internet nos tribunais; gestão do tempo e stress no sistema judicial; gestão dos júris; gestão de recursos financeiros dos tribunais; gestão de recursos humanos; os novos líderes nos tribunais; a estrutura e a disposição do espaço num tribunal; gestão de projetos judiciais; tecnologias e problemas inerentes ao acesso público; redução da agressividade no local de trabalho; métodos de pesquisa e avaliação; como construir uma equipe; tecnologias para os profissionais de sistemas de informação; tecnologia para os juizes; tecnologia nos tribunais; treinar o treinador; programa de liderança para tribunais de primeira instância; as mulheres na liderança. 50Também no modelo espanhol dentre as medidas a serem adotadas no âmbito das Secretarias, cabe ressaltar a estruturação dos serviços comuns, o apoio nas tarefas, tornar a estrutura organizacional mais ágil, racionalizar espaço e tarefas, além da formação das pessoas. 51 Até 1995 o sistema de informatização era embrionário.

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Programa voltado para a valorização das pessoas. O Tribunal Regional Federal da 3ª Região, nesse ano iniciou a adoção do Gerenciamento pela Qualidade Total de forma pontual. Em 1999, o Regional Federal da Terceira Região iniciou um Plano Institucional, tendo obtido o primeiro certificado ISO no setor de atividade fim do Poder Judiciário. Nesse mesmo ano, também obtiveram certificações sob os padrões da norma ISO 9000, o Tribunal Regional Eleitoral do Paraná e o Tribunal de Justiça de Rondônia, em atividade meio. Em 2000, o Superior Tribunal de Justiça obteve a primeira certificação ISO 9000 da instituição, sendo que em 2001, essa certificação foi obtida por alguns setores do Supremo Tribunal Federal. Os demais Tribunais Regionais Federais também já iniciaram seus programas, cabendo ressaltar o Planejamento Estratégico desenvolvido pelo Regional da 5ª Região desde 2001, com resultados positivos. Na mesma esteira encontram-se os Tribunais Regionais do Trabalho, alguns Tribunais Eleitorais, alguns Tribunais Estaduais, convindo ressaltar, que em muitos deles, de forma ainda incipiente. Importa, sobremaneira, demonstrar a substancial evolução e o interesse verificados com a implementação das modernas técnicas de gestão. Dessa forma, vem crescendo como uma exigência interna dos servidores e magistrados a implementação de metodologia de gestão pela qualidade52, vez que preocupados com a melhoria da prestação dos serviços. Podemos afirmar, inclusive, que se trata também de uma exigência da sociedade brasileira, em face dos reclamos constantes dos meios de comunicação e, principalmente daqueles que necessitam de nossos serviços. Ocorre que o poder judiciário brasileiro vem trabalhando em busca da melhoria de seus serviços de forma não integrada, não concertada. Cada Instituição busca a melhoria de seus serviços de forma isolada, não sistêmica. Impende, portanto, seja a gestão administrativa estruturada de forma sistemática, pois se trata de um Poder Uno. O que se verifica é a divisão de competências, sendo imprescindíveis e imperiosas medidas no sentido de estabelecer uma coordenação uniforme para toda a administração judiciária, já que as competências são diversas, o que propicia a realização de medidas desfocadas, sem qualquer sintonia com a realidade, enfraquecendo o sistema. A independência de cada Tribunal, mormente no que diz respeito a medidas administrativas, já que existe uma impossibilidade constitucional de submissão hierárquica aos Tribunais Superiores, que dificulta a verificação de resultados efetivos a nível nacional. Dessa forma, se por um lado é surpreendente, em comparação com vários outros países no mundo, a estrutura funcional administrativa de nossos órgãos judiciários53, por outro, a ausência de integração na condução dos serviços torna o sistema tão deficiente quanto qualquer outro que tenha sua administração subordinada ao Poder Executivo. Nenhum sistema pode ser considerado ideal enquanto apresentarem deficiência quer seja estrutural, quer seja gestional. Se países como Portugal e Espanha possuem hoje uma legislação que estabelece normas de gestão, por sua vez os Tribunais não possuem elementos humanos com cargos direcionados à gestão, apesar do movimento atual visando o alcance de autonomia administrativa e orçamental, o que exigirá a criação de cargos específicos. O problema brasileiro não se consubstancia na criação de cargos54, nem na independência administrativa, já que o Judiciário é responsável pelo seu próprio orçamento e pela

52 Foram realizadas pesquisas pelos Regionais Federais, objetivando a obtenção de uma visão sistemática da satisfação dos usuários internos e externos. 53 A responsabilidade para a administrar os Tribunais e Fóruns no Brasil é dos magistrados, auxiliados por funcionários, com função administrativa. Existe uma estrutura organizada, apesar das falhas decorrentes da burocracia reinante. 54 Cargos na área administrativa.

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administração deste orçamento. O problema brasileiro está na administração burocrática, está na necessidade de mudança de cultura na administração, na quebra de paradigmas, vez que a estrutura organizacional aparentemente é satisfatória, exigindo-se apenas o seu aprimoramento na área de gestão, subordinado a uma política global do judiciário como um todo. Torna-se necessária a criação de um sistema judiciário administrativo sistêmico e organizado. O Poder Judiciário, hoje, tem consciência de que a ele cabe não somente cuidar de questões que concernem à prestação jurisdicional, tornando-se imperioso se vergar, também, às exigências de uma administração moderna e eficiente baseada em métodos científicos e não mais empíricos. Assim, deve, o Judiciário estar atento, em face das condicionantes estruturais do sistema, ao aperfeiçoamento contínuo de órgãos permanentes no seio dos tribunais e nas seções judiciárias e comarcas voltados para a administração da atividade-fim e para a administração da atividade-meio, buscando uma reforma eficaz, que exige não apenas a coordenação dos serviços internos da organização, mas também a coordenação global dos Tribunais, todos com programas focados no resultado e, consequentemente, na satisfação do usuário. Somente assim, estará o sistema judiciário apto a combater os problemas inerentes a toda administração derivada da arcaica e ultrapassada concepção burocrática. Por fim, importa ressaltar e reforçar que em nenhum momento qualquer sucesso atingido por um tribunal conseguirá superar a visão paradigmática da realidade do judiciário, em qualquer parte do mundo. Em se tratando do sistema judiciário, somente uma reforma que englobe o todo dos tribunais, o todo do sistema em cada País, permitirá a aproximação do cidadão à Justiça. Somente haverá um resultado satisfatório se o serviço prestado for eficiente, de qualidade, quer seja, se realizado em tempo útil e não demasiadamente oneroso ou incômodo ao usuário. Não será suficiente a edição de leis, ou a motivação das pessoas que integram o sistema, o resultado somente será efetivo e completo a partir do momento que houver, além do resultado satisfatório, efetivo ao usuário, também for determinante o comprometimento dos agentes prestadores desse serviço. Bibliografia Boaventura Santos, João Pedroso, Maria Manuel Leitão, Pedro Lopes Ferreira, 1996. Os

tribunais nas sociedades contemporâneas: o caso português. Porto: Afrontamento/CES/CEJ.

Breen, Emmanuel. Évaluer la justice. Ed. PUF, Droit et Justice, 1ª ed. 2002. Morin, Edgar. Os Sete Saberes necessários à Educação do Futuro. Cortez Editora, SP,

Unesco, 2000. Nicolescu, Basarab. O Manifesto da Transdisciplinariedade. Ed. Triom, SP, 1999, 1ª ed. Observatório Permanente da Justiça Portuguesa. A Administração e Gestão da Justiça,

Análise comparada das tendência de reforma. Centro de Estudos Sociais, Faculdade de Economia, Universidade de Coimbra. Nov. de 2000.

Pereira, Armando. 2000. “A Gestão e a Modernização na Administração Pública e particularmente na Administração Local e Regional”. Revista Portuguesa de Administração e Políticas Públicas. Vol. 1 n. 1, Braga: APAPP:82-97

Programa de Qualidade do Serviço Público. Instrumento de Avaliação da Gestão Pública, Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Brasília, DF, 2001.

Silva, José Orvalho, 2000. “Qualidade, cidadania e modernização administrativa” Revista Portuguesa de Administração e Políticas Públicas. Vol. 1 n. 1. Braga: APAPP: 106-111.

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em crise? Crises da Justiça. Lisboa: Publicações Dom Quixote. 2000. 385-391 Síntese biográfica: Elizabeth Leão Formação:

- Universidade Federal do Rio de Janeiro - Escola Nacional de Música, Graduação em Piano, 1973 - Universidade Federal de Goiás, Graduação em Licenciatura,1974 - Faculdade de Direito na Universidade Católica de Goiás, Graduação em Direito, 1984 - Universidade Federal de GoiáS - Faculdade de Direito, Especialização em Direito Agrário,1987 - Universidade Federal de Goiás - Faculdade de Direito, Mestrado, 1996

Atividades Profissionais Área Jurídica:

- AGROJURIS – Advocacia e Assessoria Agrária, 1985/1995, Goiânia - Goiás - Justiça Federal da Terceira Região

Magistrada Federal Titular da 33ª Vara – Seção Judiciária de São Paulo - Capital Ingresso em 30.11.1995 Magistério:

- Universidade São Judas Tadeu - Faculdade de Direito : Direito Civil e Direito Agrário/ Ambiental, 1996/2002 - Federal Concursos - Direito Civil, 2000

Atividades junto a Justiça Federal:

- Membro integrante da Comissão Especial instalada para solução das questões agrárias, representando o TRF da 3ª Região Técnica Judiciária perante o Conselho da Justiça Federal do Superior Tribunal de Justiça -1996 - Membro do Conselho da Qualidade da Justiça Federal de Primeira Instância do TRF da 3ª Região -1998 - Presidente da Comissão de Treinamento dos Servidores da Justiça Federal da Primeira Instância da 3ª Região – 1999/2001 - Coordenadora Executiva do Escritório da Qualidade – Justiça Federal da 3ª Região – 1999/2001

Cursos Jurídicos:

- “Curso de Direito Constitucional e Direito Internacional”, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa – 1998. - “Environmental & Natural Resources Law Seminar”, Northwestern School of Law of Lewis & Clark College, Portland, Oregon, USA, maio de 1997 - Seminários e Congressos diversos

Teses:

- “A Reforma Agrária na Visão do Judiciário”, tese apresentada em 19.12.97

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perante a Universidade Federal de Goiás para obtenção do título de mestre. - “Desapropriação em matéria ambiental”, tese apresentada no Seminário de Direito Ambiental – União Européia e Primeiro Congresso da Magistratura e Ministério Público, dezembro de 1997, São Luís/MA.

Qualidade e Gestão Pública:

- ”Gerenciamento pela Qualidade Total na Indústria” – Fundação de Desenvolvimento Gerencial – set/99 - Carga horária: 24 hs - “5S – Ambiente da Qualidade” - Fundação de Desenvolvimento Gerencial – fev/2 – Carga horária: 8 hs

- “Técnicas de Condução de Reunião” – CEF/TRF da 3ª Região - Carga horária: 16 hs. - “Treinamento Six Sigma para Executivos” – Centro de Desenvolvimento da Qualidade – set/2000 – Carga horária: 08 hs - “Implementando a ISO 9000” – TRF da 3ª Região – jan/2001 - Carga horária: 12hs. - Pós-graduação em Qualidade e Produtividade, USP, 2002. - Participação no III Encontro Nacional de Coordenação do Programa da Qualidade no Serviço Público – Ministério do Planejamento e Gestão – 11 a 12 dez/2000 - Participação no IV Encontro Nacional de Coordenação do Programa da Qualidade no Serviço Público – Ministério do Planejamento e Gestão – 03 a 05 dez/2001 - Palestrante na II Mostra de Qualidade do Judiciário, sediada pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais: “Planejamento estratégico” - 1º.09.2000 - Palestrante na III Mostra de Qualidade do Judiciário, sediada pelo Superior Tribunal de Justiça - Tema: “Qualidade no Poder Judiciário: Histórico e Perspectivas” - 09.12.2001 - Painelista no VII Congresso Internacional do CLAD - Centro Latino Americano de Administración para el Desarrollo, sobre a Reforma do Estado e a Administração Pública - Painel: Modernas tecnologias de gestão na Justiça Federal Brasileira: Experiências implementadas nas diversas regiões do País. Tema: Centro de Gestão Empreendedora do Poder Judiciário. Lisboa, Portugal, 8-11 de outubro de 2002. Texto publicado pelo CLAD. - Conferência na IV Mostra de Qualidade do Poder Judiciário sediada pelo Tribunal Regional Federal da V Região: novembro de 2002. - Palestras de sensibilização em Programas de implementação do Programa de Qualidade em diversos Tribunais - Supremo Tribunal Federal, Tribunal Regional Federal da Quarta Região, TRF da Quinta Região e Seções Judiciárias. - Vencedora do Concurso de Monografias promovido pela AJUFESP – Associação dos Juízes Federais de São Paulo e Mato Grosso do Sul, com o tema “Desafios da Prestação Jurisdicional no Século XXI”, para estágio no Centro de Estudos Judiciários, em Lisboa, Portugal, no período de 06 de janeiro a 30 de abril de 2003.

- Autora do Projeto de implementação do Centro de Qualidade do Poder Judiciário. (Colaboradores: Maria Alice Teixeira Visintainer, Jamil Zamur Filho e Dácio Penna César Dias).