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 20 Rev bioét (Impr.) 2013; 21 (1): 20-31    A    r    t    i    g    o    s     d    e    a    t    u    a     l    i    z    a    ç    ã    o Emancipação na luta pela equidade em pesquisas com seres humanos Dirceu B. Greco  1 Resumo Este argo apresenta como estudo de caso os aspectos mais controversos de pesquisa conduzida na Guate - mala (1946-1948), patrocinada pelo Serviço de Saúde Pública dos Estados Unidos e envolvendo parcipan - tes infectados intencionalmente pelo Treponema pallidum. Analisando as alterações de 2008 na Declaração de Helsinque e a ainda pequena adesão a outros instrumentos internacionais, como a Declaração Universal sobre Bioéca e Direitos Humanos, da Unesco, a discussão enfaza a importância da implantação de diretri - zes écas internacionalmente aceitas para impedir que voluntários humanos sejam envolvidos em pesquisas não écas. Conclui considerando que é indispensável o envolvimento de cienstas e avistas para alcançar padrões écos universalmente aceitos e aplicáveis, visando evitar duplo standard . Além disso, que a parci - pação igualitária em pesquisas e distribuição justa de seus benecios será importante passo para angir o acesso universal a cuidados de saúde de qualidade para todos. Palavras-chave: Éca em pesquisa. Saúde pública. Declaração de Helsinque. Proteção. Efevidade. Resumen Emancipación en la lucha por la equidad en invesgac iones con seres humanos Este arculo presenta como estudio de caso los aspectos más controverdos de la invesgación realizadas en Guatemala (1946-1948), patrocinada por el Servicio de Salud Pública de los Estados Unidos e involucrando parcipantes infectados por el Treponema pallidum por todo el mundo. Analizando los cambios en la Decla - ración de Helsinki de 2008 y la pequeña adhesión, en aquel entonces, a directrices internacionales como la Declaración Universal sobre Bioéca y Derechos Humanos de UNESCO la discusión enfaza la importancia de aplicar normas écas aceptadas internacionalmente para impedir que voluntarios humanos parcipen de invesgaciones no écas y concluye considerando que es indispensable la parcipación de ciencos y ac - vistas para alcanzar las normas écas universalmente aceptados y aplicables, para evitar el doble estándar . Además, que la parcipación igualitaria en invesgaciones y la distribución justa de sus benecios será un importante paso para lograr el acceso universal a cuidados de una salud de calidad para todos. Palabras-clave: Éca en Invesgación. Salud pública. Declaración de Helsinki. Protección. Efecvidad. Abstract Emancipaon in the struggle for equality in research involving human volunteers This manuscript presents as a case study the most controver sial aspects of a research conducted in Guatemala (1946-1948), sponsored by the United States Public Health Service in which parcipants were intenonally infected with Treponema pallidum. The analysis of changes in the 2008 Declaraon of Helsinki and the sll insucient adherence to UNESCO´s Universal Declaraon on Bioethics and Human Rights emphasizes the importance of applying internaonally accepted ethical standards for human volunteers to prevent unethical research. It concludes that the involvement of sciensts and acvists is crucial to achieve internaonally ac - cepted ethical standards to be equally applied throughout the world, avoiding the risks of double standards, and also that egalitarian parcipaon in research and fair distribuon of its benets will be an important step towards universal access to good quality healthcare for all people. Key words: Ethics, research. Public health. Helsinki Declaraon. Prot econ. Eecve ness. 1. Pós-doutor [email protected] – Departamento de Clínica Médica, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte/MG, Brasil. Correspondência Serviço de Doenças Infecciosas e Parasitárias, Faculdade de Medicina e Hospital das Clínicas  Av. Alfredo Balena, 190, 1 o  andar CEP 30130-100. Belo Horizonte/MG, Bras il. Declara não haver conito de interesse.

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Emancipação na luta pela equidade em pesquisas

com seres humanosDirceu B. Greco 1

Resumo

Este argo apresenta como estudo de caso os aspectos mais controversos de pesquisa conduzida na Guate -

mala (1946-1948), patrocinada pelo Serviço de Saúde Pública dos Estados Unidos e envolvendo parcipan-

tes infectados intencionalmente pelo Treponema pallidum. Analisando as alterações de 2008 na Declaração

de Helsinque e a ainda pequena adesão a outros instrumentos internacionais, como a Declaração Universal

sobre Bioéca e Direitos Humanos, da Unesco, a discussão enfaza a importância da implantação de diretri-zes écas internacionalmente aceitas para impedir que voluntários humanos sejam envolvidos em pesquisasnão écas. Conclui considerando que é indispensável o envolvimento de cienstas e avistas para alcançarpadrões écos universalmente aceitos e aplicáveis, visando evitar duplo standard . Além disso, que a parci-pação igualitária em pesquisas e distribuição justa de seus benecios será importante passo para angir oacesso universal a cuidados de saúde de qualidade para todos.Palavras-chave: Éca em pesquisa. Saúde pública. Declaração de Helsinque. Proteção. Efevidade.

Resumen

Emancipación en la lucha por la equidad en invesgaciones con seres humanos

Este arculo presenta como estudio de caso los aspectos más controverdos de la invesgación realizadas enGuatemala (1946-1948), patrocinada por el Servicio de Salud Pública de los Estados Unidos e involucrandoparcipantes infectados por el Treponema pallidum por todo el mundo. Analizando los cambios en la Decla-

ración de Helsinki de 2008 y la pequeña adhesión, en aquel entonces, a directrices internacionales como laDeclaración Universal sobre Bioéca y Derechos Humanos de UNESCO la discusión enfaza la importanciade aplicar normas écas aceptadas internacionalmente para impedir que voluntarios humanos parcipen deinvesgaciones no écas y concluye considerando que es indispensable la parcipación de ciencos y ac-

vistas para alcanzar las normas écas universalmente aceptados y aplicables, para evitar el doble estándar .Además, que la parcipación igualitaria en invesgaciones y la distribución justa de sus benecios será un

importante paso para lograr el acceso universal a cuidados de una salud de calidad para todos.Palabras-clave: Éca en Invesgación. Salud pública. Declaración de Helsinki. Protección. Efecvidad.

Abstract

Emancipaon in the struggle for equality in research involving human volunteers

This manuscript presents as a case study the most controversial aspects of a research conducted in Guatemala(1946-1948), sponsored by the United States Public Health Service in which parcipants were intenonallyinfected with Treponema pallidum. The analysis of changes in the 2008 Declaraon of Helsinki and the sllinsucient adherence to UNESCO´s Universal Declaraon on Bioethics and Human Rights emphasizes theimportance of applying internaonally accepted ethical standards for human volunteers to prevent unethicalresearch. It concludes that the involvement of sciensts and acvists is crucial to achieve internaonally ac -

cepted ethical standards to be equally applied throughout the world, avoiding the risks of double standards,

and also that egalitarian parcipaon in research and fair distribuon of its benets will be an important steptowards universal access to good quality healthcare for all people.Key words: Ethics, research. Public health. Helsinki Declaraon. Protecon. Eecveness.

1.  Pós-doutor [email protected] – Departamento de Clínica Médica, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de MinasGerais (UFMG), Belo Horizonte/MG, Brasil.

CorrespondênciaServiço de Doenças Infecciosas e Parasitárias, Faculdade de Medicina e Hospital das Clínicas 

Av. Alfredo Balena, 190, 1o andar CEP 30130-100. Belo Horizonte/MG, Brasil.

Declara não haver conito de interesse.

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Emancipação na luta pela equidade em pesquisas com seres humanos

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A discussão sobre as normas écas para pes-

quisas biomédicas em países em desenvolvimentoganhou considerável visibilidade nos úlmos anos 1-4.

Este interesse foi inicialmente alimentado pela ne-

cessidade de pesquisas relacionadas à pandemia daaids e pela migração de ensaios clínicos dos países

industrializados para os países em desenvolvimento.Embora algumas das doenças pesquisadas ocorramglobalmente, o que parcialmente explicaria a inclu-

são dos países em desenvolvimento, é preocupanteque este aumento não inclua as variadas doençasque afetam especialmente os países mais pobres.

Mesmo com o progresso da ciência e da tecno-

logia, os benecios raramente alcançam estas popu-

lações. Mais de um terço da população mundial ain-

da vive em condições intoleráveis de pobreza, compouco ou nenhum acesso aos serviços de saúde eaos medicamentos mais básicos. Assim, para que o

progresso cienco acompanhe o progresso moral,é necessário que os padrões dos serviços de saúdemelhorem e os invesmentos sejam direcionados,preferencialmente, ao desenvolvimento de estudosécos e relevantes às prioridades locais, visando àmelhoria da saúde pública para todos 5.

O registro de diversas pesquisas não écas en-

volvendo seres humanos, não somente durante a 2a 

Guerra Mundial 6, mas em tempos teoricamente pa-

cícos, como as atrocidades em Tuskegee 7,8 e as bar-

baridades recentemente reveladas de pesquisa na

Guatemala (1946-1948)  9-11

, demonstram a impor-

tância desta discussão, que será o foco deste argo.Ao apresentar e analisar esses casos se pretende ilus-

trar os principais impasses que, ainda atualmente, afetam o controle éco de estudos clínicos em todoo mundo.

A éca na pesquisa internacional e na saúde

global

É indubitável a necessidade de desenvolver va-

cinas ecazes e medicamentos potentes e acessíveispara o tratamento ou controle de muitas doenças,inclusive a aids, que tornará necessárias pesquisasque envolvam voluntários humanos. Isso pode serconrmado pelos cerca de 7.500 novos casos de in-

fecção pelo HIV diariamente 12, mais de 90% delesem países em desenvolvimento. O mesmo ocorrecom outros agravos, tais como tuberculose, hepa-

tes virais, leishmaniose, malária e hanseníase. En-

tretanto, é inaceitável que tal urgência seja ulizadacomo juscava para diminuir os padrões écosdos ensaios clínicos 3,13-16.

Se os pesquisadores são em geral pessoas pri-vilegiadas, muitos dos voluntários estão entre aspopulações mais vulneráveis do mundo, vivendo emprivação, que facilita a sua exploração, com poucaou nenhuma voz nas decisões sobre onde e comoa pesquisa deve ocorrer. A juscava apresentada

de que essas comunidades precisam com urgênciade respostas a perguntas especícas da pesquisa emgeral não é verdadeira, pois frequentemente os be-

necios da pesquisa não lhes serão acessíveis.

A necessidade urgente e real dessas comuni-dades é ter acesso a produtos pesquisados, desen-

volvidos e muitas vezes já ulizados em outros luga-

res. Alega-se, soscamente, que há desigualdadeem todos os lugares e que a pergunta especíca dapesquisa só pode ser respondida em uma comunida-

de especíca (muitas vezes miserável). Mesmo naspoucas situações em que esta especicidade pode-

ria ser defendida, a vulnerabilidade dos parcipantespotenciais da pesquisa torna quase impossível con-

seguir consenmento realmente livre e esclarecido.Assim, nas situações como as listadas em documentoda Organização Mundial da Saúde (OMS) relacionadoaos cuidados e éca na pesquisa sobre tuberculose,apresentadas no Quadro 1, ao nal, recomenda-se 

até mesmo que a pesquisa não seja realizada 17. Nes-

tes casos, há que se adequar às condições locais oubuscar regiões/comunidades onde possa ser execu-

tada, com o compromisso de que os resultados serãodisponibilizados onde forem necessários.

Outra atual questão refere-se ao acesso aosserviços de saúde durante e após o ensaio. É maisque justo armar que não pode haver duplo padrão,todos devem ter acesso aos comprovadamente me-

lhores cuidados de saúde, mesmo quando existamlimitações econômicas. A discussão econômica nãopode ser ulizada para diminuir os requisitos écos.

Estes aspectos relavos à proteção aos par-

cipantes em estudos clínicos revelam controvérsiasem relação às normas écas para a condução depesquisas, como a Declaração de Helsinque (DH) 18,

que ao longo das úlmas quatro décadas se tornoureferência na proteção aos parcipantes nos en-

saios. Entretanto, mudanças recentes na DH (2008)diminuíram a efevidade de sua proteção. Parndodo princípio de que vivemos num mundo desigual,qualquer mudança deveria visar que as obrigaçõesécas com os mais vulneráveis se tornem ainda maisrigorosas, bem como sua aplicação em todas as pes-

quisas envolvendo seres humanos, onde quer quesejam realizadas – e não subsumi-las.

Na versão 2000 da Declaração de Helsinque 

um dos pontos fundamentais de discussão estava

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nos itens 19 e 30. No primeiro, a pesquisa clínica só é juscada se houver razoável probabilidade de queas populações onde a pesquisa é realizada se bene-

ciem de seus resultados. Este item foi mando naversão 2008. Entretanto, foi modicado o item 30,que garana o acesso aos produtos da pesquisa, in-

clusive medicamentos, independentemente de seulocal de realização. Denia, ainda, que como a par-

cipação como voluntário pressupõe equilíbrio entreônus e benecios não há qualquer juscava parainterromper o acesso, após a conclusão do estudo,ao que se mostrou benéco durante a pesquisa. Amodicação de 2008 facilita o seu não cumprimen-

to, abrindo a possibilidade de que os benecios aserem comparlhados não sejam o acesso às inter-

venções ecazes, mas a outros cuidados “apropria-

dos”, o que é vago.

Outra controvérsia frequente e também sos-

ta é que não se pode esperar dos nanciadores epesquisadores que assumam o ônus, pois isto inibi-ria pesquisas importantes para o atendimento direto 

das necessidades de saúde dessas populações. Acei-tar esse argumento é um protecionismo mal orienta-

do em favor das agências e/ou indústrias farmacêu-

cas. Em geral, emprega-se o argumento dos altoscustos para não manter tratamento para os voluntá-

rios após o nal do experimento, sem avaliação siste-

máca destes custos, que provavelmente represen-

tam minúscula fração dos orçamentos usualmente 

mulmilionários da maioria dos ensaios. O argu-

mento de que, se implementadas, as provisões deacesso pós-ensaio (item 30, sem as modicações de2008) comprometeriam pesquisas necessárias é damesma forma falho. O Brasil é exemplo que conr-

ma a falácia do argumento, pois o CNS/Conep man-

teve esta exigência de acesso e os ensaios clínicosaqui propostos não foram reduzidos, ao contrário,seguem crescentes.

Precedente e concomitante – Tuskegee

Para compreender estes pontos controversos,bem como a dinâmica que envolve os ensaios clíni-cos, é necessário voltar a 1932 e relembrar o queocorreu em Tuskegee, Alabama. À época, o Serviçode Saúde Pública dos Estados Unidos da América(EUA) iniciou projeto para estudar a história naturalda sílis entre afro-americanos pobres, trabalhado-

res em fazendas de algodão. Este estudo, conhecidocomo a experiência de Tuskegee, revelou-se estar-

recedor. Foram recrutados 399 homens, infectadospelo Treponema pallidum. Ainda que na primeiradécada de realização do estudo não houvesse tra-

tamento adequado para a sílis, a penicilina foi dis-

ponibilizada no início da década de 40, tornando-seo tratamento padrão em torno de 1947. Entretanto,nenhum dos “voluntários” obteve permissão parareceber este medicamento.

Como consequência, dos 399 parcipantes 28

morreram em decorrência da doença e 100, de com-

plicações relacionadas; 40 esposas foram infectadase houve pelo menos 19 casos de sílis congênita. Éinaceitável que a pesquisa tenha prosseguido mes-

mo após outras atrocidades comedas durante a 2a 

Guerra Mundial terem sido condenadas pelo Tribu-

nal de Nüremberg (1947). E que tenha connuadomesmo após a aprovação, em 1964, da primeira DH.

A experiência de Tuskegee foi publicada em vá-

rias revistas de presgio, relatando a história naturalda infecção, aparentemente sem despertar qual-

quer quesonamento éco dos editores ou leitores.A exceção foi Peter Buxton, assistente social do De-

partamento de Saúde Pública dos EUA (PHS), que to-

mou conhecimento do experimento e empenhou-seem uma cruzada solitária para interrompê-lo. Suapostura desencadeou processo de avaliação écainterna, que concluiu por sancionar a connuidadedo estudo. Discordando desta avaliação, Buxton re-

lata a história para a imprensa em 1972. Jean Heller,repórter do The Washington Star , publica uma sériede argos com repercussão imediata nas televisõese outros jornais, inclusive em argo de capa no The

New York Times – o que leva, nalmente, à interrup-ção deniva da experiência 19. O governo estadu-

nidense disponibilizou pequena indenização aos so-

breviventes ou seus cônjuges e, 25 anos mais tarde(1997), o presidente Clinton reuniu sobreviventes efamiliares dos falecidos na Casa Branca, desculpan-

do-se publicamente:

O Governo dos Estados Unidos fez uma coisa errada, profunda e moralmente errada, que ultraja nossocompromemento com a integridade e igualdade detodos os nossos cidadãos. Podemos acabar com o

silêncio. Podemos parar de olhar para o outro lado.Podemos olhar em seus olhos e nalmente dizer, emnome do povo americano, que o Governo dos Esta-

dos Unidos fez uma coisa vergonhosa, e que eu sintomuito... O legado de Tuskegee teve forte e profundoalcance, prejudicando nosso progresso e dividindonossa nação. Não podemos ser uma única América

quando todo um segmento da nação descona da América. Um pedido de desculpas é o primeiro passo

e nós o damos com o compromemento de recons-

truir a conança perdida. Para começar, é precisogaranr que episódios como esse jamais venham

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a acontecer novamente. Precisamos nos empenharmais para assegurar que as prácas de pesquisasmédicas sejam sólidas e écas, e que os pesquisa-

dores trabalhem mais estreitamente ligados às co-

munidades 20.

Em 1966, apenas alguns anos antes do can-

celamento de Tuskegee, outro importante relatosobre a éca em pesquisas (ou a sua ausência) foipublicado por Henry Beecher 21. Neste argo, relatadiversas pesquisas não écas publicadas entre 1952e 1965, em periódicos de presgio, incluindo o New

England Journal of Medicine (NEJM) e o Lancet . Des-

crevia abusos agrantes, inclusive contra o princípiodo respeito à pessoa, já que muitos parcipantesnem sabiam que parcipavam de um estudo e, por-

tanto, foram expostos a situações em que havia ris-

co de morte sem conhecimento.

Após as revelações de Buxton, a publicação deBeecher e o encerramento da experiência de Tuske-

gee em 1972, foram instaurados diversos inquéritospelo poder legislavo norte-americano para lidarcom a improbidade éca em pesquisas. Em 1974,foi criada a Comissão Nacional para a Proteção deSujeitos Humanos em Pesquisas Biomédicas e Com-

portamentais, para idencar os princípios écosbásicos que deveriam fundamentar a conduta empesquisas envolvendo seres humanos e desenvolverdiretrizes para assegurar que sejam conduzidas emconformidade com aqueles princípios. Incluíam-se

nessas considerações: os limites entre a pesquisabiomédica e comportamental e a práca aceita e ro-

neira da medicina; o papel da avaliação dos crité-

rios risco-benecio para determinar a adequação depesquisas envolvendo seres humanos; as diretrizesapropriadas para a seleção de parcipantes em pes-

quisas; e a natureza e denição do consenmentoesclarecido nos diversos ambientes de pesquisa.

Em 1979, a Comissão publicou “Princípiosécos e diretrizes para a proteção de sujeitos hu-

manos em pesquisas”, conhecido como RelatórioBelmonte 22, que estabeleceu três princípios écospara a pesquisa com seres humanos: a autonomiados parcipantes sempre deve ser respeitada; a be-

necência (fazer o bem) deve fundamentar a con-

duta em todas as pesquisas com seres humanos;a jusça deve sempre prevalecer na pesquisa comseres humanos. Um quarto princípio foi posterior-

mente acrescentado: o princípio da não malecên-

cia (não prejudicar).

As normas básicas para a proteção de sereshumanos em pesquisas nanciadas ou realizadaspelo Departamento de Saúde, Educação e Previdên-

cia Social foram publicadas em 1974, com a aprova-

ção do Ato de Pesquisa Nacional (Lei 93-348) quecriou a comissão. As normas para a proteção de su-

 jeitos humanos, baseadas principalmente no Rela-

tório Belmonte, foram expandidas no nal dos anos70. Vale observar que somente em 1991 outros 14

departamentos e agências federais envolvidos como tema adotaram conjunto uniforme de regras paraesta proteção, idênco ao do Código das Regula-

mentações Federais (CFR) 45, parte 46, subparte A.Esse conjunto de regras constui a políca federalnorte-americana para a proteção de sujeitos hu-

manos, conhecida como Regra Comum (Common

Rule). Os principais requisitos incluem: garana deconformidade pelas instuições de pesquisa; obten-

ção e documentação do consenmento esclarecidopelos pesquisadores; estabelecimento de Comissãode Revisão Instucional (Instuonal Review Bo-

ard ), que equivale aos comitês de éca em pesquisabrasileiros – com especicação de membros, funcio-

namento, funções, operações, revisão de pesquisase manutenção de registros; e proteções adicionaispara populações vulneráveis especícas – mulheresgrávidas, prisioneiros e crianças.

A experiência da Guatemala

Em 2010, Susan Reverby, da Faculdade deWesllesley 9, revelou que na década de 40 o Depar-

tamento de Saúde Pública deliberadamente inocu-lou prisioneiros e prossionais do sexo na Guatema-

la com doenças sexualmente transmissíveis, princi-palmente o T. pallidum. Incluíam-se nos objevos doestudo descobrir se o uso proláco da penicilinapoderia evitar a infecção e avaliar sua ecácia. Oconsenmento não foi obdo e muitos recrutadosnão veram acesso a tratamento adequado.

Essa descoberta provocou reações entre espe-

cialistas em éca de todo o mundo e o atual gover-

no estadunidense divulgou pedido de desculpas àGuatemala: Embora esses eventos tenham ocorrido

há mais de 60 anos, é revoltante que pesquisa tãorepreensível possa ter ocorrido sob o pretexto dasaúde pública (…) O estudo é um triste lembrete deque salvaguardas adequadas para os seres huma-

nos não exisam há meio século 10. Acrescentaramque as atuais diretrizes de pesquisa médica em hu-

manos, nanciadas pelos EUA, proíbem esse estar-recedor po de violação:

No espírito de compromemento com a pesquisaéca, estamos lançando invesgação rigorosa sobretodos os aspectos desse caso. Além disso, por meio

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da Comissão Presidencial para o Estudo de QuestõesBioécas, estamos reunindo um grupo de especialis-

tas internacionais para rever estes métodos e parabuscar os mais ecazes para garanr que todas as

 pesquisas médicas com seres humanos conduzidasatualmente no mundo todo atendam padrões écos

rigorosos10

.

Foi então criado, em março de 2011, o Pai-nel Internacional Presidencial dos EUA, com quatromembros da Comissão Presidencial para o Estudo deQuestões Bioécas e 13 especialistas internacionais.O presidente Obama orientou a Comissão a super-

visionar invesgação para apuração completa dos fatos e a realizar revisão das proteções para pessoasque se submetem a experimentos, para determinarse as normas federais e os padrões internacionaisresguardam a saúde e o bem-estar dos parcipantescontra danos ou tratamentos não écos, em estudosciencos nanciados pelo Governo norte-america-

no nacional e internacionalmente 23. Este Painel sereuniu presencialmente três vezes, sendo a úlmaem Washington, em julho de 2011 11.

Como os voluntários eram infectados

No início, prostutas infectadas por sílis fo-

ram recrutadas para ter relações sexuais com pri-sioneiros. Como a taxa de transmissão foi baixa,

os pesquisadores prepararam amostras infectadaspara inocular os parcipantes, mediante muitos mé-

todos. As espiroquetas vivas no inóculo, preparadoa parr de raspagens de cancros dos prisioneiros oude militares infectados, sobreviviam por períodosmuito curtos fora do corpo, levando à ulização dematerial com espiroquetas mortas pelo calor. Estematerial era transferido para os sujeitos por abrasãoda pele, injeção ou inoculação pela uretra.

Há outros exemplos dos inaceitáveis proce-

dimentos ulizados: nas prisioneiras o inóculo eraintroduzido por escaricação nos braços, rosto ou

boca 23. Nos homens, a inoculação era geralmentemais direta. Foram escolhidos homens com  prepú-

cios no mínimo moderadamente longos [para man-

ter as membranas mucosas úmidas] e que podiam car sentados ou em pé calmamente em um lugardurante várias horas. O médico segurava o pênis do

 parcipante, puxava o prepúcio e escaricava o pê-

nis com uma agulha hipodérmica; em seguida, intro-

duzia um chumaço de algodão (ou gaze pequena) egotejava a emulsão de sílis, que cava em contatocom a pele lacerada do pênis durante pelo menosuma hora, algumas vezes, até duas horas 23.

Outras técnicas foram testadas, tais como ainjeção intravenosa, a ingestão de suspensão emágua ou a colocação do inóculo no colo do útero dasprostutas antes da relação sexual. Diferentes posde produtos prolácos químicos foram fornecidosa alguns dos parcipantes e nenhum para o grupo

controle. Antes do recrutamento, cercaram-seque não estavam infectados ou que não haviam re -

cebido medicamento para a sílis.

Centenas de homens e mulheres foram envol-vidos, muitos fotografados e suas fotos encontradasnos arquivos. Alguns parciparam em múlplas ex-

periências. Os números totais apurados pela Comis-

são Presidencial foram 696 pessoas expostas à sílis,722 à gonorreia e 142 ao cancroide 23

.

Engodo

O principal pesquisador da experiência daGuatemala também desempenhou importante pa-

pel em Tuskegee. John Cutler, cirurgião que supervi-sionou o projeto guatemalteco, tornou-se cirurgiãogeral assistente em 1958 e parcipou de Tuskegeena década seguinte. Em sua correspondência commédicos interessados em infecções sexualmentetransmissíveis, admiu que apenas algumas pessoas(não os parcipantes, nem seus colegas do PHS eda comunidade cienca) nham conhecimento doprocedimento completo: estamos explicando paraos pacientes e outros envolvidos, com algumas pou-

cas exceções, que se trata de um novo tratamentoulizando soro seguido de penicilina. Às vezes estepo de conversa ambígua me deixa apreensivo 23.

Em carta, comenta: algumas palavras ditas para a pessoa errada aqui, ou mesmo em casa, podem des-truir o projeto ou parte dele 23

.

Parcipação de funcionários guatemaltecos

Um projeto desta envergadura não poderia teracontecido sem a colaboração de muitas pessoas, in-

clusive de autoridades e médicos guatemaltecos, su-

 jeitos, portanto, a diversos conitos de interesse 24.

Entre esses interesses estava a possibilidade de pro-

gredir na carreira com a associação com pesquisa-

dores e instuições norte-americanas renomadas. Oprojeto trazia ainda a implementação de infraestru-

tura laboratorial, a possibilidade de acesso a examese de maior acesso do país à penicilina.

Adicionalmente, Cutler acrescentou o forneci-mento de medicamentos para a malária em troca do

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direito de connuar a fazer exames de sangue. Des-

de a descoberta da penicilina o PHS estava enfren-

tando restrições orçamentárias nos trabalhos sobredoenças venéreas, dicultando juscar o projetoda Guatemala. Após diversas cartas, Cutler prome-

teu ser cuidadoso: ulizaremos nosso estoque com

moderação de modo a tê-lo sempre disponível parauso em programas de demonstração e para cons-

truir uma relação de boa vontade 23. Também des-

tacou: com a oportunidade que se oferece aqui paraestudar a sílis de uma perspecva puramente cien-

ca, da mesma forma que Chesney a estuda comcoelhos  (...) seria possível juscar os projetos nocaso de impossibilidade de resolução do programa

 proláco 23.

Chama a atenção uma pergunta especícaendereçada ao Painel Internacional pelo presiden-

te Obama, sobre se haveria, hoje, o risco de experi-

mentos similares. Embora se considere que as nor-

mas federais e os padrões internacionais protegemde maneira adequada a saúde e o bem-estar dos

 parcipantes em estudos ciencos 23, sendo muitoimprovável que um projeto como o da Guatemalaseja permido atualmente, deve-se atentar para ofato de que há outras maneiras, sus e também nãoécas em ensaios clínicos, tanto nos Estados Unidoscomo em outros países, devido às desigualdades depoder (vulnerabilidade) e falta de aceitação (ou re-

conhecimento) de uma diretriz éca internacionalrepresentava, tal como a Declaração Universal so-

bre Bioéca e Direitos Humanos da Unesco 25, quesequer foi mencionada no relatório nal do PainelInternacional 26

.

Assim, não é possível concluir que a saúde eo bem-estar de parcipantes estejam de fato pro-

tegidos de maneira adequada em todos os estudosnanciados pelo governo federal americano e aindamenos em projetos apoiados e desenvolvidos pelaindústria farmacêuca. Uma maneira de lidar comessa questão, pelo menos para começar, é garanrque normas écas universalmente reconhecidas se-

 jam adotadas, conhecidas por todos e que uma es-trutura éca independente realmente funcione emcada país onde a pesquisa está sendo proposta.

Soluções possíveis

O que deve ser discudo e decidido é comogaranr o papel das diretrizes ou melhor, de uma di-retriz universal, como a citada Declaração da Unes-

co, para lidar de maneira efeva com questões derelevância (ou capacidade de resposta), jusça e as

disparidades. E tão importante quanto, a apropria-

ção pelo país das suas necessidades de pesquisas,por meio da comunidade, pesquisadores locais, co-

mitês de éca em pesquisa realmente independen-

tes e autoridades da saúde. São questões realmentepolêmicas que, apesar de discudas, não são en-

frentadas com rigor. Não há consenso nos diversospaíses e também internacionalmente sobre as ques-

tões de relevância/capacidade de resposta, jusça,acesso aos produtos da pesquisa, uso de placebo,riscos de exploração com relação ao desempenhode pesquisas quesonáveis com voluntários/comu-

nidades/pesquisadores/países vulneráveis.

Contudo, cumpre dar crédito ao presidentedos EUA por sua decisão de revelar mais uma vez,à semelhança do citado pedido público de descul-pas do presidente Clinton por Tuskegee, outra partedeplorável da história daquele país. Além disso, em

março de 2013 a Comissão de Bioéca da Presidên-

cia dos EUA disponibilizou pela primeira vez os da-

dos referentes a 55 mil ensaios clínicos nanciadospelo governo federal no período de 2006 a 2010 27.

Esta medida reforça o que preconiza o item 30 daDeclaração de Helsinque 18, denindo a obrigação dapublicação ou publicização dos resultados posivosou negavos dos ensaios clínicos, incluindo fontede nanciamento, aliação instucional e possíveisconitos de interesse. Evidentemente, revelar nãoé o suciente, mas pode e deve ser ulizado comooportunidade para ampliar a discussão éca e me-

lhorar o delineamento das questões de autonomia,relevância, igualdade e riscos de exploração dos vul-neráveis.

Riscos de situações similares na estrutura é-

ca em pesquisa no Brasil

Como o Brasil protege os voluntários dos pro-

 jetos de pesquisa? A estrutura éca em pesquisabrasileira tem como base a Resolução CNS 196/96,

que criou a Conep. Nesta resolução estão claramen-

te estabelecidos os passos necessários para criar eregistrar comitês de éca em pesquisa (CEP) locais;denida a estruturação de um projeto, com todas assalvaguardas para a proteção de voluntários huma-

nos, incluindo, mas não se limitando, o processo doconsenmento livre e esclarecido 28

.

A Resolução CNS 196/96 está sendo atualiza-

da (2013) e há diversas resoluções complementarespara situações/populações especícas, com maiorrisco de vulnerabilidade. Com este conjunto de nor-

mas, propostas de pesquisa similares à de Tuskegee

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ou ao estudo da sílis na Guatemala não seriam per-midas no Brasil. Entretanto, é inegável a pressãopor normas mais exíveis, que podem enfraqueceros requisitos écos, ulizando os já conhecidos sos-

cos argumentos da urgência e de que não é realistaser mais rígido que o resto do mundo, além do risco

inerente à vulnerabilidade dos voluntários em pes-quisas brasileiras, geralmente recrutados nos servi-ços públicos muitas vezes sobrecarregados. Estes, aoserem recrutados, passam a ter acesso privilegiado acuidados de saúde, que não nham antes, dicultan-

do inclusive o consenmento realmente livre.

As modicações na Declaração de Helsinque 

(2008) exemplicam como uma regulamentaçãointernacional relacionada à éca em pesquisa podenão corresponder aos interesses dos países em de-

senvolvimento, devido à inuência das agências defomento/nanciadoras e da indústria farmacêuca

dos países centrais. Este foi o caso desta úlma ver-

são da DH, que poderia ter inuenciado negava-

mente as diretrizes de pesquisa brasileiras, mas quefoi prontamente combada pela posição soberanae inequívoca do CNS, com a aprovação da Resolu-

ção 404/08 29, e do Conselho Federal de Medicina(CFM), com a Resolução é 1.885/08 30, ambas man-

tendo as conquistas da versão 2000 da DH.

Estas decisões do CNS e do CFM denem quea autonomia, o processo de consenmento verda-

deiramente esclarecido e o acesso ao cuidado etratamento durante e após os ensaios clínicos sãodireitos de todos os voluntários em ensaios de pes-

quisa. Todos esses requisitos devem integrar umaperspecva mais ampla e necessária, que é a expan-

são do direito de acesso aos benecios da pesquisana saúde pública. Como visto, as úlmas décadaspresenciaram impressionante expansão de ensaiosclínicos originados em países desenvolvidos, em ge-

ral conduzidos em países em desenvolvimento 31.

O aumento no número de ensaios ocorre,entre outras razões, também pela necessidade deconformidade com as regras para a realização de

ensaios clínicos randomizados de grande escala. Oestabelecimento de ensaios clínicos fase III (avalia-

ção da ecácia), com milhares de voluntários, e aglobalização da indústria farmacêuca contribuírampara a expansão dos ensaios fora do país de origemda indústria. Talvez ainda mais importante, a facili-dade de recrutamento de voluntários em ambientesmais pobres, muitas vezes com estrutura éca depesquisa menos organizada, com alta incidência dadoença e indivíduos menos exigentes, que muitasvezes veem a oportunidade de parcipação como oúnico meio de obter atendimento médico. Paralela-

mente, normas mais rígidas nos países desenvolvi-dos, onde os direitos dos voluntários são protegidospelo menos na lei, fazem parte do mesmo quadroque facilita a migração dos ensaios clínicos.

Duplo padrão em ensaios clínicos

A migração de ensaios randomizados contro-

lados para o Terceiro Mundo traz o risco de que setente diminuir as exigências écas internacionais.Não há aqui a intenção de demonizar a indústriafarmacêuca, que tem seu papel no processo de de-

senvolvimento de produtos necessários, qualican-

do-a como única condutora de ensaios anécos.Entretanto, existem diversos relatos de ensaios nãoécos, em época recente, para o desenvolvimentode medicamentos ou avaliação de métodos preven-

vos patrocinados pela indústria farmacêuca 32.

Cabe detalhar o catalisador especíco e recente dediscussões acirradas sobre requisitos écos em en-

saios clínicos.

Em 1997, enérgico editorial de Marcia Angell 33 

e argo de Wolfe e Lurie 34, publicados na mesmaedição do NEJM, cricaram a éca dos estudos -

nanciados pelo Instuto Nacional de Saúde (NIH)dos EUA sobre a prevenção da transmissão vercaldo HIV, realizados em países da África, República Do-

minicana e Tailândia, no nal da década de 80. Peloestudo ACTG 076 sabia-se que zidovudina por via oraldurante a gravidez, endovenosa durante o parto eoralmente para o neonato reduzia substancialmenteo risco de transmissão. Os ensaios nestes países uli-zaram esquema mais curto do AZT, eliminando o usointravenoso. Além disso, em vez de ser comparadocom o protocolo do ACTG 076, o ensaio ulizou pla-

cebo como controle. Angell, editora-chefe do NEJM,quesonou a metodologia empregada remetendo-aàquela de Tuskegee.

O editorial e o argo provocaram discussõesacirradas que, por sua vez, traduziram-se em forte

pressão para alterar a Declaração de Helsinque (ver-são 1996), o principal e mais respeitado conjuntode normas écas para pesquisa com seres huma-

nos. O objevo era modicar dois argos, precisa-

mente aqueles que tratavam do acesso ao melhortratamento médico comprovado a todos os volun-

tários, sem considerar condição econômica ou paísde origem; e as restrições ao uso de placebo quan-

do existe tratamento ecaz. A Assembleia Geral daAssociação Médica Mundial, em Edimburgo (2000),manteve as restrições ao uso de placebos (item 29)e acrescentou a exigência de acesso pós-estudo ao

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produto que se mostrar ecaz (item 30). As pres-

sões, tanto da indústria farmacêuca quanto dasagências americanas, foram intensas o sucientepara que estas exigências cassem muito menos rí -gidas na versão 2008 da DH, como discudo.

Por consequência, abria-se a possibilidade de

que os ensaios se esquivassem das exigências detratar os voluntários com igual respeito e garanas,independentemente da sua origem e poder econô-

mico, criando a possibilidade de duplo padrão naspesquisas clínicas. As pressões também contamina-

ram outros importantes documentos, como as Con-

siderações écas sobre ensaios com vacinas an-HIV  (Unaids, 2000) 35 e as Diretrizes Écas Internacionaissobre Pesquisas Biomédicas  Envolvendo Seres Hu-

manos  (Cioms, 2002) 36. Nos dois documentos, ositens relacionados ao acesso a atendimento médicoe uso de placebos são longos, de complexo entendi-

mento e possibilitam tratar voluntários de países emdesenvolvimento de maneiras diversas, isto é, commenos direitos que os do mundo industrializado.

Acrescente-se a isso o surgimento, nos paísesindustrializados, de outros documentos focadosnas pesquisas em países em desenvolvimento. Umexemplo é o documento da Comissão Nacional deAssessoramento Bioéco dos Estados Unidos (USNaonal Bioethics Advisory Commission - 2001) 37

. A

este, seguiu-se um documento da Administração deDrogas e Alimentos (FDA) 38, aprovado em 2008, de-

nindo que projetos de pesquisa clínica realizadosfora dos EUA e não conduzidos sob um pedido deinvesgação de nova droga (IND) não mais precisamestar acordes com as normas da Declaração de Hel-

sinque, mas apenas com as Boas prácas clínicas daConferência Internacional de Harmonização (ICH).Vale lembrar que o objevo precípuo das diretrizesda ICH 39 é unicar os procedimentos europeus, nor-te-americanos e japoneses para facilitar a aceitaçãomútua de dados clínicos pelas agências reguladorasdestes países. Trata-se – mais uma vez – dos mes-

mos riscos de padrões duplos 40,41.

Contra-ataque

Nos primeiros anos do século XXI, mais preci-samente em 2005, uma vitória foi conquistada coma promulgação, por aclamação dos Estados-mem-

bros na 32a Sessão da Conferência Geral da Unesco,da Declaração Universal sobre Bioéca e DireitosHumanos. Trata-se de marco real e efevo na buscapela jusça e igualdade para todos. Nas ProvisõesGerais, o item “f” do argo 2 dene dentre seus

objevos: promover o acesso igualitário aos desen-

volvimentos médicos, ciencos e tecnológicos, bemcomo encorajar o uxo e o comparlhamento maisrápido possível do conhecimento relavo a esses de-

senvolvimentos e de seus benecios, com especialatenção às necessidades dos países em desenvolvi -

mento26

. Os objevos da Declaração, que estão em

completa consonância com o escopo deste argo,incluem a universalidade dos princípios e tambémdos procedimentos, enfazando a necessidade derespeito à dignidade humana e de proteção dos di-reitos humanos e, mais importante, a obrigatorie-

dade do acesso igualitário aos desenvolvimentosmédicos, ciencos e tecnológicos, o comparlha-

mento dos benecios alcançados e atenção especialàs necessidades dos países em desenvolvimento. ADeclaração reforça ainda a posição emanada pelo

CNS do Brasil em relação à proteção efeva aos vo-

luntários de pesquisa, contra qualquer possibilidadede duplo padrão nos estudos.

Documento similar – Considerações écas paraensaios biomédicos para a prevenção do HIV  42 –  foi 

publicado em 2007 pela OMS e Joint United NaonsProgramme on HIV/Aids (Unaids). Substuindo eampliando o escopo da diretriz Pesquisa de vacinas

 prevenvas para o HIV-Unaids 2000, inclui recomen-

dação explícita e direta de que os parcipantes infec-

tados pelo HIV durante a condução do ensaio biomé-

dico para a prevenção do HIV devem receber acessoa regimes de tratamento que sejam reconhecidoscomo excelentes em nível internacional  (Diretriz 14).Em 2010, a OMS publicou diretriz sobre a éca paraa prevenção, cuidado e controle da tuberculose 17,anteriormente citada, que segue a mesma linha dodocumento da OMS/Unaids de 2007, incluindo a ta-

bela que lista as circunstâncias nas quais os ensaiosclínicos não devem ser realizados (Quadro 1).

Acesso a serviços de saúde adequados para

todos

Toda a discussão sobre o direito dos voluntá-

rios de ensaios clínicos ao acesso igualitário a cui-dados médicos decentes, independentemente desua origem econômica ou do país onde a pesquisaestá sendo conduzida, pode ser hoje consideradaultrapassada. Isto porque, ao longo deste período(1999-2008), as discussões sobre o acesso extrapo-

laram os ambientes controlados dos ensaios clínicospara uma expectava muito mais ampla de acessoaos produtos desenvolvidos para todos que deles

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precisam. O cerne da questão não está no ensaio clí -nico controlado e em geral nanciado por indústriasmulmilionárias, mas na tarefa mais importante,mais dicil e menos visível que consiste em aplicaros resultados na saúde pública, em ambientes de re-

cursos limitados.

Há exemplos neste sendo relacionados coin-

cidentemente à epidemia da aids: a Iniciava 3 por 5(3 by 5) da OMS/Unaids em 2003, propondo que asdrogas para o tratamento do HIV sejam de fato dispo-

nibilizadas em todos os países em desenvolvimento;e em 2011, aprovada na reunião de alto nível da ONUem Nova Iorque, a Declaração Políca sobre HIV/Aids, que entre seus objevos traz a disponibilização de tra-

tamento anrretroviral para 15 milhões de pessoasaté 2015 (15 by 15)  43. Outro exemplo foi a aprova-

ção e implementação, no Brasil, da Lei 9.313/96, queestabeleceu acesso universal pelo Sistema Único de

Saúde (SUS) aos anrretrovirais para todos os pacien-

tes que deles necessitassem, sem custo adicional.

Essa decisão ajudou a reduzir as taxas de mor-talidade, morbidade, hospitalizações, ausências notrabalho e novas infecções, além de se revelar vá-

lida também do ponto de vista econômico 44. Entre1996 e 2002, o invesmento total com medicamen-

tos ultrapassou US$ 1,6 bilhão, com incalculávelimpacto social. Houve, ainda, signicavo impactoeconômico, com economia esmada em outros US$2 bilhões em decorrência da redução nas hospitali-zações, cuidados ambulatoriais, despesas com pre-

vidência e mortalidade.

Determinantes sociais e as relações de poder

O termo empoderamento  tem sido repedoad nauseam como forma de “capacitar” indivíduoscom relação às suas necessidades e expectavas. In-

felizmente, em geral não passa de gura de retórica,vez que o poder nunca é dado e muito raramentecomparlhado. Na maioria das vezes, o uso do ter-

mo corresponde a uma forma iluminista de fornecerde maneira marginal um pouco para os necessita-

dos, objevando acalmar suas reivindicações. É co-

mum que esses indivíduos/países com diculdadeseconômicas enalteçam os “doadores” por ajudá-losa obter algo que é de fato seu direito. Essa atudepode perpetuar a dependência: nasce novo po decolonialismo (entreguem os anéis, salvem os dedose perpetuem a disparidade e a dependência).

O termo “empoderamento”, do inglês empo-

werment , deveria ser substuído por emancipação,no sendo de Paulo Freire, que em sua abrangente

obra sobre a educação para a liberdade empregoua palavra com sendo amplo, de libertação e auto-

nomia, exatamente como deve ser ulizada quan-

do discumos cidadania, direitos ou a luta contradisparidades 45. Marx também indicou que a eman-

cipação humana só é realizada quando o homem

reconhece e organiza as suas próprias forças como forças sociais, deixando, pois, de separar de si a for -ça social sob a forma de força políca 46. Assim, aemancipação não acontecerá por eventualidade,por concessão, mas será uma conquista efevadapela práxis humana, que demanda luta ininterrupta:

 A libertação, por isto, é um parto (...) O homem que

nasce deste parto é um homem novo que só é viávelna e pela superação da contradição opressores-opri -midos, que é a libertação de todos 47.

Considerações nais

Ensaios com novos medicamentos ou vacinassão necessários e devem ser realizados em locaisonde requisitos écos e avaliações independentesestejam disponíveis, onde a exploração possa serevitada, quando a pesquisa proposta aborda pro-

blemas de saúde locais e quando há garanas deacesso ao melhor método diagnósco e terapêucocomprovado.

Uma estrutura bem denida e adequada deéca em pesquisa é fundamental e o envolvimentode cienstas, avistas e de toda a sociedade é es -

sencial para garanr que requisitos écos acordadosinternacionalmente sejam ulizados corretamenteem todo o mundo, evitando o risco do duplo pa-

drão; que pessoas recebam tratamento diferente egeralmente pior em função de sua origem, etnia ousituação econômica.

Em relação às pesquisas envolvendo sereshumanos, há procedimentos capazes de reduzir demaneira parcial esses problemas, que incluem di-retriz internacional sobre éca em pesquisa, apro-

vada e universalmente aplicável; estabelecimentode comitês de éca em pesquisas locais/nacionaissoberanos e independentes, acompanhados da di-vulgação pública das propostas e resultados daspesquisas. Com todos esses instrumentos será pos-

sível impedir que se repitam não só experimentoscomo os de Tuskegee, Guatemala e os ensaios comAZT para mães infectadas pelo HIV, mas tambémmuitos outros igualmente não écos. Se, ao nal dapesquisa, o produto se mostrou ecaz, deve haverpressão internacional para disponibilizá-lo e torná-lo acessível nanceiramente para uso em outros

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países. Existe urgência, portanto, não apenas parapesquisar métodos prevenvos melhores ou drogase vacinas mais ecazes, mas principalmente paradisponibilizá-los para todos.

Contudo, a tarefa mais dicil, aquela da qualtodos temos de fazer parte, é o desao de lutar de

fato contra as disparidades que separam os poucosricos, tanto em países desenvolvidos como em de-

senvolvimento, dos milhões de destuídos que ain-

da não têm voz nem direitos. Infelizmente, as dispa-

ridades de saúde não serão solucionadas apenas pormeio dos padrões e diretrizes que regulamentam aspesquisas e os pesquisadores, ou mesmo pelo tra-

tamento igualitário a todos nos estudos envolvendoseres humanos.

Cumpre ressaltar importante passo adotadoconsensualmente pelos países na 67a  Assembleia

Geral das Nações Unidas, em 2012, para transiçãodos sistemas nacionais de cuidados de saúde em di-reção à cobertura universal em saúde 48. Tucídides 49

 

armou que a jusça só será alcançada quando osque não são injusçados senrem-se tão indignadosquanto aqueles que o são. Atrevo-me a dizer que a

 jusça só prevalecerá quando aqueles afetados e in-dignados pela injusça forem capazes de se emanci-par para a luta por seus direitos.

Garanr que a igualdade e os direitos sejamrespeitados nas pesquisas que envolvem os sereshumanos em qualquer lugar do mundo é signica-

vo passo para reverter a injusça atual na alocaçãode recursos para a saúde e pode contribuir para aemancipação dos voluntários, pesquisadores e so-

ciedade, para que exerçam seus direitos enquantocidadãos e a capacidade de lutar por eles.

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31Rev bioét (Impr.) 2013; 21 (1): 20-31

Emancipação na luta pela equidade em pesquisas com seres humanos

   A   r   t   i   g   o   s    d   e

   a   t   u   a    l   i   z   a   ç   ã   o

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sonhos possíveis. São Paulo: Editora Unesp; 2001.48. United Naons. Adopng consensus text. General Assembly encourages member states to

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49. Thucydites. The history of the Peloponesian wars. London: Penguin Classics; 1974.

Anexo

Quadro 1. Circunstâncias selecionadas nas quais o ensaio clínico não deve ser realizado 18

• Quando não exisr capacidade local para conduzir uma avaliação cienca e éca adequada eindependente.

• Quando não puderem ser obdos a parcipação realmente voluntária e o consenmento livre eesclarecido.

• Em locais onde as condições claramente puderem aumentar ou potencializ ar a vulnerabilidade oufacilitar a exploração.

• Quando não forem alcançados acordos entre os interessados na pesquisa quanto aos padrões deprevenção, questões de condencialidade e acesso a cuidados e tratamentos médicos.

• Quando não forem alcançados acordos quanto a responsabilidades e planos para a disponibilização

do produto da pesquisa (drogas, medidas prevenvas ou procedimentos) que seja comprovadamenteseguro, ecaz e acessível nanceiramente às comunidades e países onde foi testado.

Fonte: WHO guidance on ethics of tuberculosis prevenon, care and control.

Recebido: 17. 1.2013

Revisado: 19. 2.2013

Aprovado: 8. 3.2013