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    MONSENHOR HENRI DELASSUSDoutor em Teologia

    AC O N J U R A OA N T I C R I S T

    O Templo Manicoque quer seerguer sobre as runas da

    Igre ja Catlica

    As portas doinferno no prevalecero

    contra Ela.

    (Mat., XVI, 18)

    TOMO III

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    Biblio!que Saint Librehttp://www.liberius.net

    Bibliothque Saint Libre 2009.

    A reproduosem fins lucrativos permitida.

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    NIHIL OBSTAT:

    Insulis, die 11 Novembris 1910.

    H . Q U I L L I E T , s. th. d.

    librorum censor

    IMPRIMATUR

    Cameraci, die 12 Novembris 1910.

    A . MASSART, vic. gen.

    Domus Pontificiae Antistes.

    Traduzido do original francs

    "La Conjuration Antichrtienne - Le Temple Maonique

    voulant s'lever sur les ruines de l'glise Catholique",

    impresso por Socit Saint-Augustin

    Descle, De Brouwer et Cie.

    LILLE, 41, Rue du Metz

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    III

    SOLUO DA QUESTO

    O MUNDO

    CU E TERRA

    E SEU ENIGMA

    I A OBRA DO AMOR ETERNO

    E A QUEDA

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    CAPTULO lii

    A OB RA DO A M OR E T E RNOA partir del siglo XVIII la conjuracin anticristiana concentr su principal

    empeo en Francia, hija primognita de la Iglesia. Y, pues, principalmente ah quedebemos observarla. Pero como esa conjuracin se extiende a toda la tierra, debemos

    frecuentemente hacer incursiones en otras partes del mundo para seguir a sus agentes.

    partir do sculo XVIII a conjurao anti-crist concentrou seu principal empenhona Frana, filha primognita da Igreja. , pois, principalmente a que devemosobserv-la. Mas como essa conjurao se estende a toda a terra, devemos

    freqentemente fazer incurses em outras partes do mundo para seguir os seus agentes.

    Seus ltimos atos introduziram no cenrio um novo personagem ao qual parece pertencero primeiro papel. Os franco-maons conduziram-nos aos judeus, em seguida os judeus noscolocaram na presena de Sat.

    Se, pois, desejamos ter uma idia completa e aprofundada da conjurao anti-crist, eleque devemos agora estudar. Quem ele? Que ele quer? Como ele se pe em contacto comos homens e para que fim?

    Uma vez feito esse estudo, deveremos procurar saber se em oposio ao satnica noexiste uma outra ao extranatural para combat-la; e se acharmos que existe, deveremosperguntar a quem deve pertencer a vitria.

    Essas questes convidam-nos para as altas regies da filosofia e da teologia. Que nossosleitores no se assustem, com receio de no compreenderem, e no pulem estas pginas.Seremos suficientemente claro, cremos, para que possam seguir sem esforo e encontrar nesteestudo um interesse tanto mais cativante quanto mais elevada a ordem em que ele se realiza.

    A explicao da presena do demnio no nosso mundo e a ao funesta que nele exerceinvocam a questo preliminar do mal e suas origens, e a questo do mal no pode ser resolvidaseno com o conhecimento do ser, do ser sobrenatural como do ser natural.

    O ser existe, no posso neg-lo: tenho conscincia de minha existncia e tenho a viso e o

    contacto com mil e mil objetos que me rodeiam, que agem sobre mim e sobre os quais exerominha ao.

    Existo, mas no existia h cem anos. Eu era menos do que um gro de areia perdido nofundo dos mares. Como existo? No posso explic-lo seno atravs da ao de um outro ser,anterior minha existncia e que me produziu, assim como eu mesmo produzo. E assim comotodas as coisas que me circundam, o prprio cu e a prpria terra, tiveram comeo, minharazo conclui pela existncia de um primeiro Ser, que existe, Ele, por Si mesmo, e porconseqncia, eterno. Um tal Ser pode sozinho tirar todas as coisas da ausncia eterna, afim de que elas existam com Ele.

    A razo que no deseja enganar-se a si mesma no pode se impedir de remontar dessaforma do ser contingente e limitado que , e cuja presena ela observa fora de si, ao Sernecessrio, que carrega em si mesmo a razo do seu ser.

    Existindo em Si mesmo, tendo em si o princpio do ser, ele pode ser a fonte eterna.Por que quis Ele que com Ele existssemos?No podemos oferecer outras razes que no estas: Ele quis verimagensda sua essncia,

    porque isto que somos. Ele quis transbordar as idias que nEle existem e transmitir suafelicidade.

    Bonnum est diffusivum sui, disse So Toms de Aquino depois de Aristteles. O bemencontra prazer em se difundir, sua natureza de se dar. Conseqentemente, o Bem infinito, o

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    Ser infinito tem um desejo infinito de se comunicar. O apstolo So Joo, inspirado por Deus,deu dEle essa definio: Deus amor, Deus charitas est. , pois, no amor que existe em Deus,que Deus, que se encontra o motivo da criao e o princpio de todas as criaturas.

    Deus se conhece infinitamente porque se ama infinitamente. Conhecer, amar, esta avida das inteligncias. Conhecer-se, amar-se, no Ser infinito a vida absoluta. Assim Deus chamado nas Sagradas Escrituras: o Deus que vive.1 A vida em Deus Ele no-lo revelou a gerao do Verbo e a exalao do Amor, relaes inefveis de onde promanam as trs

    Pessoas que constituem a natureza divina.Nos transportes do seu amor natural, as trs Pessoas divinas chamaram do nada novaspessoas para nelas verem a repetio da sua felicidade.2 Elas nos concederam o dom do ser,da vida e da inteligncia para nos amarem e para serem amadas por ns, para obterem essaglria acidental e derramar em ns algo da felicidade dElas. Tal o mistrio da criao:exploso do Amor de Deus, como diz Saint-Bonnet, transbordamento do amor infinito. Deus bom, Ele impelido por Sua natureza a Se dar. Tal a evidncia que se coloca diante dohomem quando ele reflete sobre o que ele , sobre o que o universo.

    Blanc de Saint-Bonnet comea o livro pstumo editado pela piedade fraternal, com o ttulode LAmour et la Chute [O Amor e a Queda], com estas palavras:

    O cristianismo torna-se hoje menos visvel aos espritos nas suas duas grandes noes: oAmor, que a vida de Deus, e a queda que compromete a vida do homem. Esse

    esquecimento, que produz todos os nossos males, ameaa deixar desabar a civilizao. Se opensamento da queda do homem e do amor que Deus lhe vota pudesse entrar de novo nosespritos tudo mudaria de aspecto na Europa. Todos os escritores que compreenderam aRevoluo, que gostariam de libertar o mundo dela, esforam-se em restaurar o pensamento daqueda. O divino Salvador Jesus encarregou-se a Si mesmo de restaurar o pensamento doamor, manifestando o abrasamento do seu Sagrado Corao.

    Deus no podia satisfazer sua Bondade no dom da existncia de uma nica criatura, comono podia esgotar sua Beleza numa nica imagem da sua essncia. Ele ento multiplicou suascriaturas e multiplicou as espcies (species, imagem). Deus, diz So Toms de Aquino,transportou as idias ao ser para comunicar s criaturas sua bondade e represent-la nelas.3

    Ele produziu naturezas mltiplas e diversas a fim de que aquilo que falta a uma delas pararepresentar sua Bondade divina seja suprido por outra. E acrescenta: Existe distino formal

    para os seres que so de espcie diferente; existe distino material para aqueles que diferemapenas do ponto de vista numrico. Nas coisas incorruptveis (os puros espritos) existesomente um indivduo para cada espcie. A incontvel multido dos anjos apresenta, pois,graus infinitos de perfeio sempre mais alta, de beleza sempre mais perfeita, de bondadesempre mais comunicativa.

    Puros espritos e seres materiais no constituem toda a criao. Deus tambm produziu osseres mistos, que somos ns, animais racionais compostos de corpo e de alma. O conjuntodesses seres forma o mundo. Aquele que vive eternamente, diz a Sagrada Escritura, crioutudo ao mesmo tempo.4 Os seres animados no puderam aparecer seno quando a matria

    1 A palavra Deus, com a qual se denomina o Infinito, deriva de um verbo grego que significa: viver.2 Somente as inteligncias, somente as pessoas so capazes de felicidade; mas se as criaturas materiais no so feitas

    para serem feli zes, elas o so para contribuir para a felicidade dos seres espirituais.3 Summa Theologica, parte I, q. XLVI. Nas edies ordinrias esta questo contm apenas trs artigos. Nomanuscrito 138 da Biblioteca de Monte Cassino encontra-se um outro, que est reproduzido na edio das obras deSo Toms, publicada por Leo XIII: Dasubordinao dascoisas.4 Ecles. XVIII, 1. Deus simul ab initio temporis utrumque de nihilo condidit creaturam, spiritalem et corporalem,angelicam videlicet et mundanum et deinde humanam quasi comunem ex spiritu et corpore constitutam (4 Concliode Latro, cap. 1).

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    chegou ao ponto de poder prestar-se formao dos seus corpos. Eles existiram inicialmenteapenas no princpio de suas espcies, que se desenvolveu em indivduos atravs de sucessivasgeraes.

    Assim nasceu o mundo: O mundo foi feito por Ele, diz So Joo. 5 Colocando no singulara expresso o mundo, o apstolo assinala que existe apenas um mundo, quer dizer, que nose encontra na criao nenhuma parte que seja estranha s outras.

    Mas, nessa unidade, que multiplicidade e que diversidade! Falando apenas dos anjos,

    Daniel6

    exclama: Mil milhares O servem e uma mirade de mirades O assiste, o Senhor dosexrcitos, o Senhor de toda a hierarquia das diversas ordens de seres.Comentando essa palavra, diz So Toms: Os anjos formam uma multido que ultrapassa

    toda a multido material. Ele se apia sobre o que So Denis, o Areopagita, diz no captuloXIV da Hierarquia Celeste: So numerosas as bem-aventuradas falanges dos espritoscelestes; elas ultrapassam a medida nfima e restrita dos nossos nmeros materiais.7

    Ora, formando uma espcie nica para si, cada um desses espritos reflete, por assimdizer, um ponto do infinito, constitui uma imagem diferente da perfeio divina, um resplendorespecial da divina Bondade. Que imaginao poderia representar o esplendor crescentedesses espelhos da divindade que, partindo dos confins do mundo humano, vo, subindosempre em grupos graduados, at o trono do Eterno? Quem poderia ir em pensamento de umpara o outro at aquele que est no cume dessa hierarquia e recebe a primeira e a mais

    resplandecente irradiao da glria de Deus! abismo inesgotvel da sabedoria e da cinciade Deus, exclama So Paulo. DEle, por Ele e para Ele so todas as coisas. A Ele a glria portoda a eternidade!8

    Mas eis o que mais aflitivo para o nosso esprito e mais comovente para o nossocorao. O Amor no encontrou apaziguamento na criao, por inefvel que fosse o dom doser, e a vida no ser, e a inteligncia na vida! Aps ter feito das criaturas imagens de Suaperfeio, Deus quis fazer das criaturas suas amigas e para tanto elev-las at Ele. No nosadmiremos. Deus amor, e sua caridade desce como uma torrente que derruba todos osobstculos, os que vm do Infinito como os que vm da natureza do finito.

    Aqui reside o mistrios dos mistrios do Amor: esse dom de Deus para ns, elevando-nosat Ele para nos amar e ser amado por ns! Como dar, a esse respeito, j no digo o

    conhecimento adequado, mas uma idia suficiente para nos convidar ao abandono amoroso danossa alma ao Amigo divino?Com Deus se d a ns? Como O possumos? Com que amor somos chamados a am-

    Lo?Digamos inicialmente com So Toms que Deus est em todas as suas criaturas como a

    causa est no seu efeito. Ele , Ele, causa primeira, a causa inicial e a causa persistente, acausa criadora e a causa conservadora de tudo quanto existe. Ele est, ademais, em suascriaturas, atravs da sua essncia, quer dizer, atravs da idia que cada uma delas realiza. Eleest, enfim, atravs do seu poder que, depois de as ter criado, as mantm no ser que Ele lhasdeu e constitui o primeiro princpio da atividade delas.

    Nas inteligncias Deus est, ou pelo menos pode estar, de um outro modo: como o objetoconhecido naquele que conhece e o objeto amado naquele que ama. Mas isto no constitui um

    modo especial de presena distinta do modo geral. Concedendo criatura racional que O

    5 Jo. I, 10.6 Dan. VII, 10.7 Quem considera os milhes de estrelas que a mo de Deus lanou no espao, pode admirar-se da multido dosespritos celestes, os quais podem glorific-Lo por si mesmos?8 Rom. XI, 33-34.

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    conhea e O ame, Deus no faz seno mov-la para o seu fim, segundo pede sua natureza,como Ele faz com as outras criaturas.

    Um modo de presena verdadeiramente especial seria aquele que produzisse um efeito deuma ordem externa, acima da ordem natural.

    Ora, esse modo existe. Deus, no seu amor infinito, inventou-o, criou-o e revelou-nos suaexistncia.

    Digamos no que consiste.

    O uso normal da razo faz-nos chegar ao conhecimento de Deus e esse conhecimentoproduz em ns o amor. um conhecimento abstrato, atravs do raciocnio, da viso dos serese de sua contingncia. Esse conhecimento faz-nos desejar um outro conhecimento: a visodireta do prprio Ser Supremo. Como explicamos nas primeiras pginas deste livro,9 essaviso no naturalmente possvel a nenhuma criatura que existe ou venha a existir. Masconcebemo-la possvel se, na natureza criada, Deus vier enxertar, por assim dizer, umaparticipao da natureza divina. Participando dessa natureza, o homem, o anjo, poderiamproduzir atos dela: ver a Deus e amar a Deus, como Deus se v e se ama.

    Deus dignou-se informar-nos de que seu amor chegou a esse ponto. Pelo dom da graasantificante Ele nos tornou partcipes da natureza divina. Deus, por Jesus Cristo NossoSenhor, diz o apstolo So Pedro, concedeu-nos os maiores e mais preciosos dons que noshavia prometido; por eles tornou-nos participantes de sua natureza divina.10

    Qual a obra prpria da natureza divina? engendrar o Verbo e emanar o Amor. Essaobra to absoluta, que seus resultados so as Pessoas: o Pai, o Filho e o Esprito Santo. Severdadeiramente tornamo-nos participantes da natureza divina, essa participao que a graasantificante deve trazer para nossa alma como que um eco da gerao do Verbo e daprocesso do Esprito Santo. Que isto e ser assim coisa ainda afirmada: Vede, diz-nos oapstolo So Joo da parte de Deus, vede que amor o Pai tem por ns, em querer que sejamoschamados filhos de Deus, e com efeito o somos... Sim, meus bem-amados, ns somos, desdeagora, os filhos de Deus. Mas aquilo que seremos um dia ainda no nos foi revelado.Sabemos que quando Ele vier na sua glria, seremos semelhantes a Ele, porque O veremos talqual . E todo aquele que tem essa esperana nEle torna-se santo como Deus.11

    Veremos a Deus tal como Ele , e isto porque seremos, porque somos semelhantes a Ele;e sendo semelhantes a Ele, somos legitimamente chamados seus filhos, somos

    verdadeiramente seus filhos. Ns o somos desde agora, porque j possumos a graasantificante que nos faz participar da natureza divina. Essa natureza participada j produz emns seus atos, os atos das virtudes teologais, a F, a Esperana e a Caridade, que nos fazemalcanar Deus nEle mesmo e que, aps o tempo da prova, transformar-se-o em viso, posse,amor beatfico.

    A produo desses atos, assim na terra como no cu, e ser, dissemos acima, como umeco em ns da gerao do Verbo e da processo do Esprito. So Toms f-lo compreendernos oito artigos da sexagsima terceira questo da primeira parte da sua Suma, parte estaintitulada Da misso das Pessoas divinas.

    Houve misso visvel da segunda Pessoa da Santssima Trindade atravs do Pai naEncarnao.

    Houve misso visvel da terceira Pessoa atravs das duas outras em diversas

    circunstncias.Alm dessas misses visveis, h as invisveis em cada um de ns e em todos os instantesda vida crist. E por elas que Deus est em ns de forma diferente do que a ttulo de causa e

    9 Tomo I, p. 18.10 II Ped. I, 4.11 I Jo. III, 2.

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    de exemplar, como ele est em todas as suas criaturas, segundo a diversidade das suasnaturezas. A missoO faz habitar em ns de outra maneira. Da mesma maneira que em Deuso Filho engendrado pelo Pai e que o Esprito procede do Pai e do Filho, em ns, cristos, eem geral em todas as criaturas inteligentes ornadas da graa santificante, e por isso tornadasparticipantes da natureza divina, o Pai, do qual procede o Filho, enviao Filho; o Pai e o Filho,dos quais procede o Esprito, enviamo Esprito Santo, e isto no uma vez, mas em todos osatos da vida sobrenatural que so f e caridade; misso do Filho no ato de f, misso do

    Esprito Santo no ato de caridade, como no cu, a viso intuitiva ser produzida pela misso doVerbo, e o amor beatfico pela misso do Amor divino.De onde resulta que as trs Pessoas divinas habitam em ns como nelas mesmas, agem

    em ns como nelas mesmas. o que Nosso Senhor prometera: Se algum me ama,corresponde s propostas do meu amor, Ns viremos a ele e nele fa remos nossa morada.12 Eno somente Elas a habitam, mas Elas tm a suas relaes e essas relaes tm repercussonas nossas almas, nas nossas inteligncias e nos nossos coraes sobrenaturalizados pelagraa. Falamos de misso a respeito do Filho, diz Santo Agostinho,13 em razo dos dons quetocam a inteligncia. Podemos dizer a mesma coisa a respeito do Esprito Santo, em razodos dons do corao: ele abrasa as faculdades afetivas de um amor sobrenatural, como o Filhoilumina a inteligncia com as luzes da f.

    A est em ns o comeo de uma vida divina que desabrochar nos cus; a, a f ser

    viso e o amor beatitude, pela mesma maneira, pela ressonncia da vida divina em ns.Toda a vida adquire sua origem num nascimento. Uma vida nova no pode sair seno deuma nova gerao. Foi o que realizou em ns o santo batismo. Ele nos fez entrar nessa vidasuperior, especificamente e genericamente distinta da vida natural. a necessidade que NossoSenhor assim exprimira: Em verdade, em verdade eu vos digo, quem no renascer da gua edo Esprito Santo no entrar no reino de Deus,14 onde Deus visto e amado como Ele se v ese ama. O primeiro nascimento tornou-nos partcipes da natureza humana, o segundo, danatureza divina.

    A criao se explica pelo desejo de Deus que induzido, se assim podemos dizer, peloesplendor do seu Verbo, a querer que seu brilho reaparea nos espritos criados sua imagem.O dom do sobrenatural encontra sua explicao na santidade de Deus. Ela faz a unio divina,ela chama as criaturas a uma unio participada: Sanctus, sanctus, sanctus, Dominus Deus

    Sabaoth. Santo, santo, santo o Deus dos exrcitos. Ele trs vezes santo nEle mesmo pelaTrindade das suas Pessoas; e Ele santo na multido dos espritos ordenados, hierarquizadoscomo um exrcito, que Ele convida unio santificante, a se unirem a Ele sobrenaturalmente.Essa unio exige uma regenerao nEle, Ele suficiente poderoso para produzi-la, noobstante pea uma virtude mais alta do que a exigida para a criao. Assim a SantssimaVirgem, cheia da graa divina, manifestou sua admirao e sua alegria com estas palavras:Fecit mihi magna quiPOTENS est et SANCTUM nomem ejus. Ele fez em minha grandes coisas,Aquele que poderoso e cujo nome santo. Pela santidade entramos no infinito sem nosconfundir, penetramos no seio de Deus sem nos perder, conservando nossa individualidade,nossa personalidade, estando unidos Divindade, de tal maneira que ela produz em ns o queela produz nEla mesma. Eis a grande coisa que maravilhava a Santssima Virgem e A fazialanar este brado: Magnificat anima mea Dominum et exultavit spiritus meo in Deo salutari

    meo.

    12 Jo. XIV, 23.13 DeTrinit., IV, cap. XX.14 Jo. III, 5.

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    A unio sobrenatural com Deus, assim entre os anjos como entre ns, tem dois graus: apreparao e a fruio, a graa e a glria. Pela graa somos dados em garantia do dote que entregue somente no feliz final da prova qual a preparao nos submete.

    Porque Deus quer respeitar a liberdade das suas criaturas, e essa vontade obriga a notornar definitivo o dom do sobrenatural seno aps a aceitao reconhecida e amorosa.

    As Pessoas divinas que querem habitar em ns, batem, primeiramente, atravs dos apelosda graa, porta do nosso corao. Elas querem ser acolhidas como amigas antes de

    produzirem em ns as grandes coisas de que falamos. Elas nos oferecem sua amizade, Vosamici mei estis;15 preciso que lhes demos a nossa, que entremos em comrcio com Elas, emcomrcio de amor. Se essa oferta deve ser aceita, pode ser recusada, recusa que seria umaofensa e uma ofensa de uma culpabilidade infinita, o limite da injria, tratando-se de Deus.

    Foi essa injria feita infinita Bondade?

    15 Jo. XV, 14.

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    CAPTULO LIII

    A QUE DA

    I.

    NO CU

    captulo precedente pode ter parecido uma digresso, algo dispensvel.No isso, ele disse o que era necessrio dizer para preparar o esprito compreenso de tudo quanto vai seguir.

    Assim, desde a criao dos anjos,16 Deus convidou a inumervel multido deles acontratarem com Ele uma aliana de amizade tal que, se fossem fiis, ela os levaria aogozo da viso do seu Ser, a contempl-Lo face a face, a penetrarem na sua vida ntimae dela participarem. Sua Bondade antecipou-lhes Seu amor; a eles incumbia o deverde corresponder a essa antecipao.

    Que ocorreu?

    O arcanjo So Miguel e os anjos que escutaram sua voz, abriram-se comentusiasmo e gratido ao dom divino. Lcifer e os anjos que seguiram seu exemploopuseram uma recusa munificncia divina.

    Como isso pde se dar?Os anjos, na superioridade de suas inteligncias, viam, compreendiam a

    excelncia do dom que lhes era oferecido melhor do que ns o podemos fazer.Como um dom to excelente, um dom realmente divino at no seu objeto, pde

    ser desprezado? Esse fato, o mais desconcertante que houve e que jamais haver,faz-nos descer ao fundo da misria do ser contingente, tivesse mesmo ele asublimidade daquele que, pela excelncia de sua natureza, estava no pice dahierarquia anglica.

    Ao transmitir o ser s criaturas inteligentes, Deus pe nelas o desejo da felicidade.

    Esse impulso as leva e as dirige a Deus, o Sumo Bem, quando elas acolhem, por umalivre correspondncia, a emanao do amor divino; esse impulso as abandona ao malquando a esse amor elas preferem o movimento cego do amor prprio. A esse desejode felicidade Deus acrescentou a Graa, isto , uma atrao de ordem sobrenatural,que se sobrepe atrao de ordem natural, dirigida ao Sumo Bem.

    A vida presente foi dada ao homem, e o primeiro instante foi dado ao anjo paraque a criatura cedesse o euao amor; para que o eu, renunciando ao egosmo, se dao Sumo Bem. Assim se dando, longe de se aniquilar, o eu, pela maravilha dapersonalidade, entra ele prprio na posse do Bem; fica penetrado dele, como se penetrado pela alegria, como o corpo penetrado pelo ar que respira e pelo qual estenvolvido. Mas o finito, cuja natureza vem do nada, pode permanecer estril; e apesardo impulso divino, tornar-se o oposto ao Amor, cair no estado contrrio a Deus, no

    estado daquele que recusa se dar, daquele que no ama. Esse egosmo possvel noser que tem a liberdade de usar, como quiser, o dom sagrado da existncia e o poderde recusar-se ao Amor.17

    16 Condens in eis naturam et largiens gratiam. (S. Agostinho, Denatura etgratia).17 Blanc de Saint-Bonnet,Lamour et la chute.

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    Essa foi, dor!, a conduta de numerosos anjos, e tambm a conduta denumerosos homens. Criados para a eterna Felicidade, eles se desviaram dela, e sedesviaram dela para correrem em direo runa. Esse movimento de independnciada criatura denominado superbia,18 acima, , fora; na nossa lngua,suficincia, estado daquele que cr bastar a si mesmo. No encontramos a suficincia,

    ou orgulho, naqueles que so atingidos pelo sentimento de uma fora exageradaquepretende tudo encontrar em si mesmo?

    So Toms de Aquino diz19 que todos os anjos, sem exceo, sob a moo deDeus, realizaram um primeiro ato bom que os conduziu rumo a Deus, como autor danatureza. Restava-lhes realizarem um segundo ato de amor mais perfeito, o ato decaridade, o ato do amor sobrenatural. A graa convidava-os a isso, ela osimpulsionava a se voltarem para Deus enquanto objeto da Beatitude.

    So Miguel e os anjos que o imitaram por um reflexo da graa recebida, prestaramhomenagem a Deus com todo o seu ser; por um ato de amor, eles uniram suasvontades ao dom que Deus lhes oferecia, e por esse ato chegaram ao seu fimsobrenatural.

    Os outros fecharam-se neles mesmos, e Deus no pde fazer chegar a vida

    sobrenatural a esses coraes orgulhosos; Ele no podia violar inutilmente a liberdadedeles. Por causa de suas naturezas puramente espirituais, suas vontades fixaram-senesse mal atravs desse primeiro ato. Foi-lhes feito imediatamente segundo suasvontades. Enquanto os espritos dceis vocao sobrenatural entravam no cu daglria, gozavam imediatamente da viso de Deus nEle mesmo, no mistrios dasProcesses divinas que constituem Seu Ser, os outros abandonavam mesmo o cu dagraa e eram relegados para sempre s regies inferiores, geena do inferno, castigodo orgulho deles.

    frente deles encontrava-se Lcifer, o mais perfeito dos anjos e, por conseguinte,de todos os seres criados. Foi a sua sugesto e o seu exemplo que arrastaram osoutros. Vendo-se no cume da criao, ele no quis olhar acima de si, procurar suaperfeio e sua beatitude na unio com uma natureza superior sua; ele quis

    encontr-las nele mesmo. Ele se fechou, pois, na sua naturerza, querendo secontentar em gozar suas faculdades naturais.

    Esprito soberbo e infeliz, tu paraste em ti mesmo admirador da tua prpriabeleza, ela foi para ti uma armadilha.20 Era no somente ingratido, mas revoltacontra Deus, ao Qual pertence determinar o fim de cada uma das suas criaturas.

    No se lhe pode atribuir [a Lcifer], como observa So Toms, a espectativainsensata de destronar o Ser Supremo, ou de fora sentar-se Sua direita, comoSeu igual.21 Ele teve apenas o desejo de ser semelhante a Deus,22 quer dizer, depoder apresentar-se como bastando a si mesmo, como no tendo nenhumanecessidade de ser aperfeioado por nada fora de si. Deus definiu a Si mesmo: Eusou Aquele que . No seu orgulho, Lcifer disse: Eu sou aquele que . Deus no

    18 Initium omnis peccate superbia. Ecle. X, 15.19 S. T., parte I, q. LXIII, art. 5.20 Bossuet, Elvations, IV semana, 2 elevao.21 O anjo, que conhece a Deus no como ns, atravs da razo, mas, como observa So Toms, com umconhecimento necessrio e infalvel que resulta do conhecimento que tem de si mesmo, reproduo danatureza divina, real e exata, embora infinitamente distante do divino exemplar, no podia ter tal idia.22 Sou semelhante ao Altssimo. Is. XIV, 13, 14.

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    espera de nenhuma natureza superior sua um acrscimo de perfeio; nisto queroser como Ele. A mim tambm basta ser o que sou por minha prpria natureza ecomprazer-me nisso. O demnio no permaneceu na verdade, diz o apstolo SoJoo.23 A verdade est em que mesmo a sua natureza ele a recebia de Deus e ela otornava dependente dEle.

    O orgulho tanto mais o impeliu para esse caminho quanto Deus, oferecendo-lhe oestado sobrenatural, dava-lhe a conhecer Seus desgnios acerca da natureza humana.Lcifer viu que para entrar em unio com Deus e receber nesta unio a vidasobrenatural, devia inclinar-se diante de um ser inferior a ele numa das duas naturezasque deviam compor Sua pessoa, o Filho de Deus feito Homem, tornado o Chefe detoda a criao;24 e mesmo diante da Mulher que, cooperando com a Encarnao doVerbo, mereceria partilhar Sua realeza sobre o universo, cu e terra.25

    A falta de Lcifer, o crime do seu orgulho, foi, pois, precisamente, repudiar osobrenatural; e a tentao que ele fez com que os anjos que estavam abaixo delesofressem, aps ele mesmo ter nela sucumbido, pode, pois, ser denominada, com todaa propriedade do termo, tentao do naturalismo. Retenhamos essa observao, poisela nos servir de tocha na seqncia deste estudo, porque veremos essa mesma

    tentao reproduzir-se no paraso terrestre, depois no deserto ao qual Jesus se retiraraps seu batismo; e tambm a ela que a Cristandade est submetida desde o sculoXV pela franco-maonaria, pela judiaria e pelo demnio.

    No cu essa tentao ocasionou o que as Sagradas Escrituras chamam degrande combate: Et factum est prlium magnum in clo. Miguel e seus anjoscombateram contra o Drago, e o Drago e seus anjos combateram; mas ele nopuderam vencer.26

    a mesma guerra que prossegue aqui em baixo e que entre ns se apresenta sobeste aspecto: O antagonismo entre duas civilizaes. Para compreender o que ela foino cu e como na terra, ela tem por adversrios no somente os homens contra oshomens, mas tambm os humanos contra os demnios. No somente contra

    23 Jo. VIII, 44.24 Primogenitus omnis creatur. Colos. I, 15-17.In omnibus Ipse primatum tenens. Ef. I, 20-22.Pacificans... sive qu in clis sunt. Colos. I, 20.Orgenes diz que Jesus pacificou os cus obtendo para os bons anjos o dom dos dons, isto , a vida

    sobrenatural. In clis quidem non pro peccato sed pro munere oblatus est (Hom. 2, supra caput, 1 e 2,Levit.).25 Tendo Deus introduzido uma segunda vez no cenrio do mundo seu Filho primognito, disse: Quetodos os anjos O adorem! Essa segunda introduo, essa nova apresentao feita pelo Pai, refere-sevisivelmente a Seu Filho colocado num segundo e novo estado, conseqentemente, a Seu Filho encarnado.Crer no Filho de Deus feito homem, esperar nEle, am-Lo, servi-Lo, ador-Lo, tal foi a condio dasalvao. Os dois testamentos contam que o preceito foi dirigido assim aos anjos como aos homens: est

    escrito num e noutro: Et adorent eum omnes angeli ejus.Sat estremeceu ante a idia de se prosternar diante de uma natureza inferior sua, sobretudo ante a

    idia de receber ele prprio, dessa natureza to estranhamente privilegiada, um acrscimo atual de luz,cincia, mrito e um aumento eterno de glria e de beatitude. Julgando-se ferido na dignidade da suacondio nativa, ele se entrincheirou nos direitos e exigncias da ordem natural. Cardeal Pie, IIIInstruo sinodal. Ver Suma Teolgica, parte I, q. LXIV, a. I, ad IV. Suarez diz a mesma coisa: Demalig. ang. L. VIII, C. XIII, n. 13 e 18.26 Apoc. XII, 7.

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    homens de carne e sangue que temos de lutar, mas contra os principados epotestades, contra os dominadores deste mundo de trevas, contra os maus espritosespalhados pelos ares27 preciso dizer, a ordem, a hierarquia e a subordinaoque Deus estabeleceu entre suas criaturas.

    Vemos na parte mais baixa da criao as criaturas que apenas tm existncia;acima delas, as que participam, em graus diversos, da energia vital; depois os animaisracionais, e, no cimo, as puras inteligncias. Sabemos por nossa prpria experinciaque os seres inferiores esto na dependncia dos seres superiores. Deus disse aocriar o homem: Que ele domine sobre os peixes do mar, as aves do cu, os animaisdomsticos e toda a terra e ns exercemos esse domnio.

    Guardadas as propores, d-se o mesmo no cu.Entre os puros espritos no h somente diferenas de graus na semelhana com

    o Ser divino, na participao da Sua perfeio; h tambm comrcio entre os seressuperiores e os seres inferiores, aqueles dando a estes. o que explica, numalinguagem sublime, So Denis, o Areopagita, ou, pelo menos, o autor dos tratados quelhe so atribudos.

    Nessa efuso liberal da natureza divina, diz ele, sobre todas as criaturas, umaparte mais importante cabe s ordens da hierarquia celeste, porque, num comrciomais imediato e mais direto, a divindade deixa extravasar nelas mais puramente e maiseficazmente o esplendor da sua glria. Ora, em toda constituio hierrquica, dosgraus de perfeio resultam os graus de subordinao. A ltima ordem do exrcitoanglico elevada a Deus pelas augustas potestades dos graus mais sublimes. Qual o nmero, quais so as faculdades das diversas ordens que os espritos celestesformam? Isto exatamente conhecido apenas por Aquele que o adorvel princpioda perfeio dessas ordens. A primeira hierarquia regida pelo prprio soberanoiniciador, e ela afeioa os espritos subalternos semelhana divina. Ela no secomunica a eles atravs dos excessos de um poder tirnico, mas, arremessando-separa as coisas do alto com uma impetuosidade bem ordenada, arrasta com amor em

    direo ao mesmo objeto as inteligncias menos elevadas. Deve-se estimar, sempreSo Denis quem fala, que a hierarquia superior mais prxima por sua classe dosanturio da divindade, governe a segunda por meios misteriosos; por seu turno, asegunda, que engloba as Dominaes, as Virtudes, as Potestades, conduz a hierarquiados Principados, dos Arcanjos e dos Anjos; e esta rege a hierarquia humana, a fim deque o homem se eleve e se volte para Deus e a Ele se una. E assim, por divinaharmonia e justa proporo, todos se elevam, um atravs do outro, at Aquele que osoberano princpio e fim de toda a bela ordenao. Ele denominado Dominadorsupremo, porque atrai tudo a Si como um centro poderoso, e porque comanda todos osmundos e os rege com plena e forte independncia, ao mesmo tempo que o objetodo desejo e do amor universais. Todas as coisas sofrem o seu jugo por uma naturalinclinao e tendem instintivamente para Ele, atradas pelos encantos poderosos do

    seu indmito e suave amor.28

    27 Ef. VI, 12.28 So Denis, o Areopagita, De la hirarchiecleste. Passim.

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    Constitui, pois, lei da natureza universal, que entre as criaturas existe umahierarquia baseada na desigualdade da participao que elas tm na perfeiosuprema, na superioridade ou na inferioridade da natureza que lhes toca.

    Os seres de uma natureza inferior, de uma perfeio menor, esto subordinadosqueles que so de uma natureza superior. Os anjos de uma classe mais elevada

    exercem, pois, sobre os que esto abaixo deles aquilo que So Toms denomina dePrlatio, uma supremacia de autoridade e de poder.

    Essa prelazia pertencia, em toda a hierarquia dos seres, ao mais sublime de todosos anjos, quele que havia recebido o nome de Lcifer, de porta-luz, em razo dopapel que lhe estava destinado no cu e que o Areopagita explica assim: Toda graaexcelente, todo dom perfeito vem do alto e desce do Pai das luzes. Ele uma fontefecunda e um imenso transbordamento das luzes que cumula com sua plenitude todosos espritos.

    Lcifer, colocado no primeiro lugar, recebia pois as primeiras ondas desse rio deluz e de vida que corre de Deus, e elas se espalhavam dele para as esferas inferiores.Da seu nome Lcifer, transmissor da luz.

    Ele quis conservar a prelazia que o tornava to glorioso, e foi para mant-la na

    sua posse que ele travou batalha. Santo Agostinho, que denomina Satans Perversussui amor, diz que no seu pecado ele amou o poder que lhe era prprio. Angelum

    peccasse amando propriam potestatem.29

    Ele quis conservar esse poder, enquanto seu pecado o transferia a outros.Como conseqncia do pecado que ele e seus discpulos acabavam de cometer,

    uma nova distino era estabelecida entre os puros espritos; uns eramsobrenaturalizados, outros no. Ora, o sobrenatural fazia com que os primeirosentrassem numa regio inacessvel aos segundos, conferia-lhes uma dignidade eprerrogativas que os outros no podiam mais alcanar. Temos a prova disso no louvorque a Santa Igreja faz a uma criatura humana, mas extraordinariamentesobrenaturalizada, a humanidade do Homem-Deus: Exultata est super chorosangelorum. Ademais, sabemos que a Santssima Virgem, a Me de Cristo, foi coroada

    Rainha dos Anjos.Lcifer, vendo isso, ainda asim quis manter e afirmar a supremacia que a

    excelncia da sua natureza lhe dava sobre os outros anjos. Estes resistiram, e o gritoQuis ut Deus? exprime bem o gnero dessa resistncia. Ele pe em relvo umaoposio fundamental s sugestes naturalistas que Satans espalhava nas fileirasdas milcias celestes para conservar o domnio sobre seus irmos. Quem comoDeus? responderam estes. Quem pode pretender bastar a si mesmo, subsistir por simesmo, encontrar em si mesmo seu fim ltimo? E, de outro lado, quem pode sersuperior criatura que Deus elevou a uma participao na sua natureza divina? Deus,que est acima de tudo, d criatura qual Ele se une pela graa uma dignidade quea eleva acima do que quer que exista no mundo da pura natureza.

    As pretenses de Lcifer e dos seus foram assim repelidas. Ele, o prncipe dos

    arcanjos, tornou-se, por seu orgulho, subordinado daquele dentre os anjos bons que o ltimo na ordem da natureza.

    29Genesi ad litteram, cap. XV.

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    CAPTULO LIV

    A QUE DA

    II. NA TERRA

    fato pr-histrico que acabamos de relatar segundo as SagradasEscrituras e as revelaes divinas tambm um fato histrico porqueentrou na trama dos acontecimentos deste mundo. Sem ele estes no

    se podem explicar, nele encontram sua luz.

    Desde que a humanidade existe, existe luta, existe combate, combate no coraode cada homem, combate entre os bons e os maus, combate do naturalismo contra osobrenatural, do egosmo humano contra o Amor infinito. Esse combate no , pois,seno a continuao daquele que foi deflagrado entre os puros espritos na origem do

    mundo, e, entre ns como no cu, Lcifer quem conduz a batalha, e se ele aindaencontra So Miguel como adversrio, na nossa direo ele v sobretudo Maria, quetomou junto a Deus o lugar que ele deixou vazio pelo seu pecado, o mais formal queexistiu: peccatum aversio a Deo.

    O pecado de Lcifer e dos seus anjos retirou-lhes, dissemos, a prelazia, querdizer, a preeminncia e essa espcie de jurisdio que dela decorre, sobre os anjosque lhes eram inferiores. Retirou-lhes o poder que tinham sobre o mundo material?So Paulo decidiu a questo. Ele os denomina, ainda aps a queda: as virtudes doscus. So Denis, no seu livro Des noms divins (cap. VI), diz de uma maneira geralque os dons concedidos natureza anglica de nenhum modo mudaram nosdemnios, mas permanecem na sua integridade.

    So Toms de Aquino indica com exatido essa verdade. Ele observa que aps a

    queda o demnio ainda chamado querubim, mas no mais serafim. D-se que apalavra querubim significa plenitude de cincia, enquanto serafim significa aqueleque arde do fogo da caridade. A cincia compatvel com o pecado, mas no acaridade.

    Assim, eles guardam seu poder, observa Bossuet. Eles continuam, diz ele, a serchamados Virtudes dos Cus para mostrar-nos que ainda no suplcio conservam opoder, assim como o nome que tinham por sua natureza. Deus podia justamente priv-los de todas as vantagens naturais, sempre Bossuet quem fala, Ele preferiu fazer ver,conservando-as, que todo o bem da natureza transformava-se em suplcio paraaqueles que dele abusam contra Deus. Assim, a inteligncia deles permaneceu topenetrante e sublime como sempre; e a fora de suas vontades, para mover os corpos,por essa mesma razo, ficou como os destroos do seu pavoroso naufrgio.

    No Livro III do Tratado sobre a Trindade, captulo IV, Santo Agostinho nos ensinaque todaa natureza corporal administrada por Deus com o concurso dos anjos. Naresposta que deu a Bildad, J, falando do poder de Deus, denomina-o: Aquele sob oQual se curvam os que carregam o mundo.30 So Toms tece esplndido comentrio

    30 J IX, 13. Traduo de Bossuet.

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    sobre essa palavra.31 A causa segunda, a criatura, verdadeiramente age, e age porsua prpria virtude, mas sua virtude e sua ao prprias so penetradas pela virtude epela ao do agente principal, Deus, da qual ela de alguma maneira instrumento.

    Quando Deus criou os puros espritos, diz Bossuet, tanto lhes deu a intelignciaquanto o poder: e submetendo-os Sua vontade, Ele quis, para a ordem do mundo,

    que as naturezas corporais e inferiores fossem submetidas s deles, segundo oslimites que Ele prescrevera. Assim, o mundo visvel foi sua maneira sujeitado aomundo espiritual e intelectual; e Deus fez esse pacto com a natureza corporal, que elaestivesse unida vontade dos anjos, na medida em que a vontade dos anjos, nistoconformes de Deus, a determinasse para certos efeitos.32

    No so somente os telogos que nos dizem que os corpos so governados pelosespritos.

    Newton imortalizou-se, observa J. de Maistre, ao relacionar gravidade osfenmenos que ningum jamais imaginara atribuir-lhe; mas o criado do grande homemsabia, a respeito da causa da gravidade, tanto quanto seu senhor. O princpio domovimento no pode ser encontrada na matria, e ns carregamos em ns mesmos aprova de que o movimento comea por uma vontade. o que diz Plato: Pode o

    movimento ter um outro princpio alm dessa fora que se move ela mesma? (Plato,De Lege).

    Ademais, Newton no pensava de maneira diversa. Nas suas cartas teolgicas aoDr. Bentlig, ele diz mais explicitamente o que dissera na sua filosofia natural (PrincpiosMatemticos): Quando me sirvo da palavra atrao, no considero essa forafisicamente, mas apenas matematicamente. Que o leitor cuide, pois, de no imaginarque com essa palavra eu entenda designar uma causa ou uma razo fsica, nem queeu queira atribuir aos centros de atrao foras reais e fsicas, porque no consideronesse tratado seno as propores matemticas, sem me ocupar com a natureza dasforas e das qualidades fsicas.33

    O mundo material , pois, regido pelos anjos, a ponto de So Toms (q. LII) seperguntar se existe um anjo cuja virtude pudesse atingir atravs de um mesmo ato e

    como objeto proporcionado ao seu poder todo o universo material. E responde: Em sia coisa no impossvel. Mas sendo mltiplos os anjos destinados administrao domundo material, cada qual tem uma virtude limitada a certos efeitos determinados.34Os anjos decados conservaram a parte que lhes estava destinada no governo domundo material. O poder deles sobre o mundo tal que se Deus no retivesse seufuror, diz Bossuet, ns os veramos agitar este mundo com a mesma facilidade comque giramos uma bolinha.

    31 Sum. Theol., q. XLVII. Ver tambm as questes CV a CXIX.32 Elvationsur lesmystres, XXXIII semana, V elevao.33Clarke, de quem Newton disse: Somente Clarke me compreende, fez essa declarao: A atrao podeser o efeito de um impulso, mas no certamente material impulsu non utiquecorporeo. E numa notaacrescenta: A atrao no certamente uma ao material distncia, mas a ao de alguma causaimaterial.34 A mesma restrio deve ser feita na ordem moral. Deus designa para o demnio os limites precisos dopoder que Ele lhe concedeu sobre o seu servidor J. Assim tambm Nosso Senhor disse aos Apstolos:Sat pediu para vos examinar. Ele pede, observa Bossuet um poder maligno, malfazejo, tirnico, massubmisso ao poder e justia de Deus.

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    Estamos ns submetidos ao imprio deles, como o esto os seres materiais? Aespcie humana guarda o ltimo nvel na hierarquia dos espritos e por essa razodeve receber a luz e a inspirao para o bem atravs do ministrio dos anjos. De fato,cada um de ns temos o nosso anjo da guarda, que exerce junto a ns esse ofcio.Conservou o demnio sua prelazia sobre ns? Nossa raa foi dotada, desde a criao,

    na pessoa de Ado, nosso chefe, da graa santificante, que nos faz entrar na ordemsobrenatural. Ora, vimos que o sobrenatural estabelece entre os seres uma hierarquiade ordem superior que subtrai Ado e seus descendentes do imprio do demnio.

    Este concebe amargos sentimentos sobre isso. A inveja que despertara nelequando o Homem-Deus fora apresentado adorao se exasperou. um cimefurioso, diz Bossuet, que anima os demnios contra ns. Eles vem que, sendo beminferiores pela natureza, ns os sobrepujamos em muito pela graa. E mais: Ainimizade de Satans no de uma natureza vulgar; ela est misturada a um cimenegro que o corri eternamente. Ele no pode suportar que vivamos na esperana dafelicidade que ele perdeu, e que Deus, por sua graa, nos iguale aos anjos; que seuFilho se tenha revestido de uma carne humana para fazer de ns homens divinos. Elese encoleriza quando considera que os servidores de Jesus, homens miserveis e

    pecadores, sentados nos tronos augustos, o julgaro, com os anjos que o imitaram, nofim dos sculos. Essa inveja queima-o mais do que as chamas.35

    E por isso ele diligencia em nos arrastar aps ele ao pecado que faz perder aprerrogativa que a graa nos d sobre ele.

    No primeiro momento, vendo o que a natureza humana, uma s espcie namultido dos indivduos que com o tempo ela deveria abarcar, disse para si mesmoque se conseguisse fazer decair do nvel em que a graa colocara aquele no qual aespcie inteira estava ento contida, recuperaria sobre ela o imprio que o direito danatureza lhe dava, tornar-se-ia o prncipe, o chefe da humanidade. inveja juntou-se,pois, a ambio, para lev-lo a tentar junto aos nossos primeiros pais a seduo queexercera sobre os anjos; se viesse a persuadi-los toda a raa cairia sob o seu imprio.

    Como fizera com os anjos, Deus concedera a Ado e Eva o dom da graa

    santificante, preldio e preparao da glria. Antes de admiti-los glria era precisoque se mostrassem dignos dela. Da a necessidade da prova no paraso terrestre,assim como no paraso celeste. L como aqui, Deus quis, Deus devia, podemos dizer,pedir sua criatura o consentimento para o pacto de amizade que Ele queria contratarcom ela para a eternidade. Os termos do mandamento, ou da proibio, tal comoformulados no texto bblico, indicam com suficiente clareza uma lei, uma clusula quese refere conservao ou perda do estado paradisaco e dos privilgios que oconstituam. Ne comedas... quocumque enim die comederis... morte morieris. Para ohomem, tratava-se de ficar na posse do dom da imortalidade ou perd-lo, e, como aseqncia do relato o prova, ficar na posse dos outros dons que lhe eram conexos ouperd-los. A natureza do homem, composto de corpo e alma, pedia que o ato do qualdependesse seu destino fosse concomitantemente interior e exterior, ato plenamente

    deliberado e ao mesmo tempo exterior. Foi o que aconteceu: no comereis dessefruto, seno morrereis.Para operar a seduo, Satans apresentou-se no jardim sob a forma de

    serpente. Deus, no paraso, mostrava-Se ao homem e conversava com ele sob forma

    35 Primeiro sermo da Quaresma.

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    visvel; dava-se o mesmo com os anjos. Eva no se surpreendeu, pois, ao ouvir umaserpente falar. Que era essa serpente? H os que traduzem a palavra hebraicaserafim por serpente que voa e resplandecente. Talvez Ado e Eva estivessemacostumados a ver os anjos celestes sob essa forma.

    Ele chegou, pois, junto rvore da cincia do bem e do mal, e perguntou a Eva:

    Teria Deus dito: No comereis das rvores do jardim? A mulher respondeu:Comemos dos frutos das rvores do jardim. Mas do fruto da rvore que fica no meiodo jardim Deus disse: No comereis desse fruto e nele no tocareis, com receio de quemorrais. Disse a serpente mulher: No, no morrereis. Mas Deus sabe que no diaem que comerdes, vossos olhos se abriro e sereis como Deus, conhecendo o bem e omal. Sereis como Deus. A est a tentao, a renovao da tentao que seduzira osanjos. Ser como Deus, bastar-se a si mesmo. Que tentao para o egosmo! Adonela sucumbiu, como sucumbiram os anjos que se deixaram acalentar pelo orgulho.Sereis como Deus, conhecendo por vs mesmos o bem e o mal. Encontrando no usodas vossas faculdades naturais o progresso que vos conduzir perfeio pretendidapela vossa natureza, chegareis felicidade, a uma felicidade semelhante quela deque Deus goza, felicidade que no ser nem emprestada, nem dependente.

    Assim como os anjos maus, Ado e Eva deixaram-se convencer.Como vemos, na terra como no cu a essncia da tentao foi o naturalismo. Foi

    por ter tido o orgulho de dizer, acompanhando os anjos rebeldes: como Deus, eubastarei a mim, que Ado transps a proibio de comer o fruto funesto. dor! seuorgulho f-lo cair no somente no estado de natureza, mas ainda no estado denatureza corrompida. Ele e Eva viram-se, subitamente, no deuses, mas seres decarne!

    Ademais, viram-se submetidos a Satans. Todo aquele que se entrega aopecado, diz So Joo, escravo do pecado,36 e todo aquele que d ouvidos a Satansvolta a cair sob sua supremacia, da qual a graa o livrara. Lcifer pde, desde ento,prometer-se na terra um imprio semelhante ao que conservava nos infernos sobreaqueles que o seguiram na apostasia. Ele dominou sobre todos os filhos do orgulho.37

    De fato, at vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo, todo o gnero humano,38

    excetuado um pequenssimo povo depositrio da promessa, viveu no naturalismo aoqual Ado o arrastara e sob o jugo do demnio, pelo qual se deixara seduzir. Satansfez erguer para si templos e levantar altares em todos os lugares da terra, e a fez comque lhe rendessem um culto to mpio quanto supersticioso. Quantas vezes o prprio

    36 Jo. VIII, 34.37 ltima palavra de Deus a J.38 No refletimos suficientemente sobre as conseqncias contidas nas leis da espcie. Certamente existe

    qualquer coisa em mim que no existia em Ado, posto que sou um indivduo; mas no houve nada deessencia lem Ado que no haja em mim. Porque ele mesmo era a espcie, antes de ser indivduo. Todosos homens que nascem de Ado, diz So Toms, podem ser considerados um s homem, pois todos tm amesma natureza. A cincia, que no pode perceber a causa do prodgio da espcie no seio da natureza,relativamente s plantas e aos animais, como conheceria, relativamente ao homem, a lei da solidariedade, qual esto atreladas, simultaneamente, a reversibilidade do mrito e o pecado original?

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    povo eleito deixou-se arrastar por ele, a ponto de sacrificar a Maloch at os seusfilhos!39

    Ainda hoje, em todos os lugares em que o Evangelho ainda no foi pregado, emtodos os lugares em que o tabernculo se encontra ainda ausente, Lcifer e seusdemnios reinam. Os missionrios do sculo XVII ficaram muito surpresos quando,

    tendo partido da Frana ligeiramente ctica de ento, desembarcaram nas ndiasOrientais e se encontraram no meio das mais estranhas manifestaes diablicas. Osviajantes, como os missionrios dos dias de hoje, so testemunhas dos mesmosprodgios. Paul Verdun publicou um livro, Le diable dans les missions.40 Dosnumerosos fatos que ele recolheu dos relatos de viagens e de estadas nos gelos dosplos como nos ardores do Equador, nas florestas das nascentes do Amazonas comonas margens do Bramaputra, nos pagodes das cidades chinesas e nas choas dosselvagens da Oceania, resulta que, em todos os lugares em que o cristianismo no foiimplantado, as populaes acreditam, e no sem razo, no poder dos demnios dosdolos, das pedras e das rvores consagradas ao seu culto. Entre essas populaesas aparies e possesses so coisas freqentes, conhecidas e admitidas por todo omundo. Em todos esses pases existem feiticeiros. Para tornar-se um deles preciso

    sofrer provas cruis, que ultrapassam em muito as prticas mais penosas damortificao crist. Na maioria dessas iniciaes uma manifestao do demniomostra que ele aceita o candidato como seu, faz dele um possudo ou o leva. Essesfeiticeiros tm por servidor ou por senhor um demnio familiar que fazem agir,revestido com uma aparncia de animal. Eles podem dar a certos objetos amuletos,fetiches uma virtude benfazeja ou prejudicial. A natureza desses objetos indiferente; a consagrao deles ao demnio que lhes d a fora. Em todos oslugares os feiticeiros odeiam e temem os missionrios catlicos, e em todos os lugaresos missionrios expulsam os demnios. Os enviados dos missionrios, simplescristos, virgens, mesmo crianas, tm o mesmo poder. Esses fatos verificados nosnossos dias confirmam no somente os relatos do Evangelho, mas ainda aqueles dospagos da antiguidade e aqueles dos nossos pais da Idade Mdia. Eles confirmam

    igualmente aquilo que a doutrina catlica nos ensina sobre o pecado original e suasconseqncias.

    39 Todas as religies pags, antes como depois da vinda de Cristo, procedem da magia ou nela desguam, eesta, na diversidade das suas formas e das suas prticas, aparece como uma na sua essncia e se manifestacomo o culto de Sat.40 2 vol., in-12, Delhomme.

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    A T E N T A O R E N O V A D A

    CAPTULO LV

    I A T E NT A O DE C RI S T O

    esde que a maldade do demnio nos envenenou com o venenomortal da sua inveja, disse o Papa So Leo,41 o Deus todo-poderoso e clemente, cuja natureza bondade, cuja vontade

    poder e cuja ao misericrdia, indicou por antecipao o remdio que Sua piedadedestinava cura dos humanos; e isso nos primeiros tempos do mundo, quandodeclarou serpente que da Mulher nasceria algum bastante forte para esmagar suacabea cheia de orgulho e de malcia. Ele anunciava desse modo que Cristo viria emnossa carne, simultaneamente Deus e homem, e que, nascido de uma Virgem, seunascimento condenaria aquele pelo qual a origem humana fora profanada. Aps terenganado o homem com sua velhacaria, o demnio se regozijava de v-lo despojadodos bens celestes; ele se regozijava por ter encontrado algum consolo na sua misriaatravs da companhia dos prevaricadores, e de ter sido causa de que Deus, tendocriado o homem num estado to honorvel, tivesse mudado suas disposies a seurespeito. Foi necessria, pois, amados irmos, a maravilhosa economia de umprofundo desgnio pelo qual um Imutvel, cuja vontade no pode deixar de ser boa,realizou, por intermdio de um mistrio mais oculto, os primeiros desgnios do seuamor, para que o homem, arrastado ao mal pela astcia e maldade do demnio, noviesse a perecer, contrariamente finalidade que Deus se propusera.

    No tempo assinalado pela divina sabedoria, Deus executou esse desgnio da suamisericrdia, manifestado na mesma hora da ofensa e da queda. Ele enviou seu Filhopara reparar a falta do nosso pai. Entre os homens a justia enfraquece quando se

    transmuda em misericrdia; na Redeno ela permanece intacta: Deus perdoa, mas ajustia recebe satisfao posto que um Deus-Homem substitui os culpados e expia poreles.

    Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, Ele assumiu acondio de escravo e apareceu aos demnios e aos homens na humildade da carne,numa carne semelhante quela do pecado, e assim reconhecido como homem.42

    41 2 Sermo sobre a Natividade.42 Rom. VIII, 3 e Filip. II, 7.

    Existe tanto perigo em afirmar que no h em Jesus Cristo uma natureza semelhante nossa quanto em

    negar que Ele seja igual em glria ao seu Pai. sobre a autoridade divina que est apoiada nossa f, e uma doutrina divina que professamos. So verdadeiras as palavras que Jesus, cheio do Esprito Santo, fezressoar: No comeo era o Verbo, e o Verbo estava em Deus e o Verbo era Deus... Aquilo que o mesmo

    pregador acrescenta igualmente verdadeiro: O Verbo se fez carne e habitou entre ns, e vimos suaglria, como a glria do Filho nico do Pai. Numa e noutra natureza o Filho de Deus , pois, o mesmo,assumindo o que nosso sem nada perder do que Lhe prprio; renovando o homem no homem, Elepermanecia nEle mesmo, imutvel... por isso que, quando o Filho nico de Deus confessa ser inferior aoPai, ao Qual se diz igual, mostra que h verdadeiramente nEle uma e outra natureza, porque, atravs da

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    Satans estava a espreita. Ele viu Jesus nascer num estbulo de Belm e viverobscuramente no humilde povoado de Nazar. Os prodgios que envolveram suainfncia no lhe passaram desapercebidos, mas trinta anos passados na oficina de umcarpinteiro, na submisso e na obedincia, na humildade e na pobreza, no lhepareceram poder constituir as primcias dAquele que devia derrubar seu imprio.43

    Quando ele O viu sair do retiro; quando ouviu as palavras de Jesus queanunciavam estar prximo o reino de Deus; quando viu o Precursor recusar-se abatizar Jesus pela razo de no ser digno de desatar as correias de suas sandlias, edizer que Ele batizaria no Esprito Santo; quando, sobretudo, foi testemunha dadescida do Esprito Santo e ouviu a voz do Pai celes te declarar: Este o meu Filhobem amado!, comeou a se perguntar se no se tinha enganado at ento, e se esseJesus no era o Filho da Mulher que lhe fora mostrado no dia da sua primeira vitria,como sendo Aquele que devia roubar-lhe o imprio e esmagar-lhe a cabea.

    Ele quis certificar-se disso; e, permitindo-lhe Deus, em razo das lies que daresultariam para ns,44 ele pde tentar em Jesus suas insinuaes e prestgios, comofizera no paraso terrestre e nos cus.45

    Conhecemos o relato do Evangelho. Aps seu batismo, Jesus se retirou para o

    deserto, abstendo-se de qualquer alimento durante quarenta dias. Vendo-O apertadopela fome segundo a fraqueza da carne que Ele havia assumido, Satans aproveitouessa ocasio para tent-Lo, para descobrir o que lhe importava saber, atravs de umaprova decisiva. Demon Christum aggressus est, potissimum ut exploraret utrum vereFilius Deis esset, diz Suarez.46 Foi sobretudo para saber se Ele era o Filho de Deusque o demnio atacou Cristo.

    Sua primeira palavra manifestou seu pensamento: Se tu s o Filho de Deus...Mostrando as pedras arredondadas em forma de po que juncavam o solo, como elehavia mostrado a Eva o fruto proibido, ele Lhe props fizesse um milagre que provariaSua divindade: transformar as pedras em pes. Ele no percebia que esse milagre, se

    desigualdade da qual Ele fala, prova que nEle existe a natureza humana; e atravs da igualdade que Eleafirma, declara possuir a natureza divina. (So Leo, Papa, 7 Sermo sobre a Natividade).43 Deus est presente em toda a parte, conhece tudo o que se faz e tudo o que se diz, porque est em todasas suas criaturas como princpio dos seus seres e de suas atividades. O mesmo no acontece com os anjos,bons ou maus. O anjo est num lugar conforme, por sua vontade, ele aplica a esse lugar a ao da suavirtude. Ele no se encontra circunscrito, como esto os corpos, mas definido, de tal maneira que no estem outro. De maneira que muitos dos atos de Jesus que concerniam Sua pessoa puderam escapar aSatans. verdade que aquilo que ele no conheceu por si mesmo pde conhecer atravs de um ou vriosdemnios que tivesse delegado junto ao Divino Salvador para estarem informados de tudo quanto Lhedizia respeito.

    Ademais, como observa Santo Agostinho (Cidade de Deus, IX, 21), Cristo s foi conhecido dosdemnios tanto quanto quis, e Ele s quis tanto quanto foi necessrio... Quando Ele julgou bom ocultar-seum pouco mais profundamente, o prncipe das trevas duvidou dEle e O tentou para saber se Ele era Cristo.44 Persuadamo-nos, cristos, de que no teria sido permitido a Satans tentar o Salvador sem algum altoconselho da divina Providncia. (Bossuet, Sermosobreo demnio. 1domingo da Quaresma).45No indigno do nosso Redentor, diz So Gregrio Magno, ter querido ser tentado, por que Ele viera aesse mundo para ser morto. Ao contrrio, era justo que Ele vencesse assim as nossas tentaes pelas suas,da mesma maneira como viera triunfar sobre a nossa morte pela sua morte... O Filho de Deus pde sertentado pela sugesto; mas jamais o deleite penetrou na sua alma. Assim, essa tentao do diabo foi todaexterior e de nenhum modo esteve dentro dEle. (Sermo sobre o Evangelho do 1 domingo da Quaresma).46 Intertiampartemdivi Thom. Q. XLI, art. I, com. II.

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    realizado, provaria precisamente o contrrio, porque a saciao da fome poderia serobtida por meios naturais e humanos, e querer obt-la para si chamando em auxlio opoder divino era faltar com o respeito devido a Deus. Talvez ele percebesse isso, eento sua proposta era duplamente maliciosa. Sabemos qual foi a resposta de Jesus;ela exprimia Seu respeito por seu Pai e pela Palavra que Deus estabeleceu como regra

    da nossa conduta, a ns, filhos dos homens, e ao prprio Verbo encarnado. De outrolado, ela deixava o tentador na ignorncia relativamente sua Pessoa.

    A segunda tentao traiu visivelmente a inquietao de Satans. No extremodesejo de alcanar o objetivo pretendido, ele teria aceitado saber, custa de suaprpria humilhao, se Nosso Senhor era verdadeiramente o Filho de Deus. Se Jesus,precipitando-se do alto do templo, como ele Lhe pedia, os anjos tivessem vindosustent-Lo, ele teria reconhecido nisso, pensava ele, que era o senhor soberano daceleste hierarquia, mas para sua vergonha e confuso. Porque teria sido cruel para elever Jesus caindo do alto do templo como se descesse do cu, carregado pelos anjosbons, que so os ministros de Deus no castigo que lhe infligido, diante da multidoque enchia o trio do templo, e apresent-Lo nessa pompa celeste e nessa majestadeque teria forado a adorao dos espectadores. Jesus, como fizera da primeira vez,

    dissipou com uma palavra tirada das Sagradas Escrituras essa tentao que Satansacreditara muito sedutora.

    Este no se deu ainda por satisfeito; e novamente usando o poder sobre-humanodos espritos, senhores da gravidade e do espao, transportou Jesus para o cume deuma alta montanha. Quando dizemos que o Homem-Deus foi transportado pelo diabopara uma montanha elevada ou para a cidade santa, observa So Gregrio, Papa,repugna ao esprito crer e os ouvidos humanos se espantam em ver isso afirmado.Reconhecemos, porm, que isso no inacreditvel, se comparamos outros fatos aesse. certo que o demnio o chefe de todos os homens inquos e todos os mpiosso membros desse chefe. No foi Pilatos um membro do diabo? No forammembros do diabo os judeus que perseguiram Jesus Cristo e os soldados que Ocrucificaram? Assim, que haveria de espantoso em Cristo se deixar transportar pelo

    prprio demnio para uma montanha, visto como Ele desejou sofrer a crucifixo pelosmembros do demnio?.47

    As duas primeiras tentaes no tinham podido resolver a questo queatormentava o prncipe deste mundo. Ele compreendeu que seria intil continuar aencaminhar suas tentativas no mesmo sentido. Assim, na terceira tentao, ele nomais diz: Se s o Filho de Deus. Deixando essa questo, que ele sentia no poderresolver, buscou um outro intuito.

    47 Sermo sobre o 1 domingo da Quaresma.Santo Agostinho, no comentrio sobre o Salmo LXIII, versculo 7, tambm diz:

    Cr isto,como homem, colocou-se ao alcance das intenes perversas dos judeus, e como homem sofreuque eles se apoderassem dEle. Com efeito, no poderiam ter-se apoderado dEle se Ele no fosse homem,nem v-Lo se no fosse homem, nem feri-Lo se no fosse homem, nem crucific-Lo e mat-Lo se nofosse homem. Foi, pois, como homem que Ele se exps a todos esses sofrimentos, que no poderiamacontecer-Lhe se no fosse homem. Mas se Ele no fosse homem, o homem no teria sido libertado. Essehomem penetrou o fundo dos coraes, quer dizer, o segredo dos coraes, oferecendo ao olhar humanoSua humanidade, no deixando aparecer Sua divindade; ocultando Sua natureza de Deus, pela qual Ele igual ao Pai.

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    Desde a catstrofe do paraso terrestre ele reinava como senhor da humanidadeaviltada e degradada; mas ele temia por seu imprio todas as vezes que se lembravada predio do Senhor: uma Mulher e seu Filho esmagaro tua cabea. Inquieto, eleno cessava de espionar os filhos dos homens, particularmente aqueles que lhepareciam mais inteligentes e mais fortes, para tom-los ao seu servio. Jamais sua

    ateno fora despertada sobre algum como sobre este, jamais algum lhe pareceradever desempenhar no mundo um papel to importante. Ele O v entrar na suacarreira e comear uma obra que, sem dvida e vista da extraordinria virtualidadedo personagem, ter sobre o curso do mundo, sobre a direo do gnero humano, umainfluncia que no pode ser avaliada. Ele diz a si mesmo que para conservar seuimprio ele deve apoderar-se dessa fora. Assim, aps ter mostrado seu podertransportando Jesus para o pinculo do templo, ele opera um prestgio que deveseduz-Lo, se ele for apenas um homem, e coloc-Lo a seu servio. Do alto damontanha para a qual O transportou, ele Lhe mostra todos os reinos do mundo e suaglria, e Lhe diz: Eu te darei todo o poder e a glria desses imprios porque isso mefoi entregue e eu o dou a quem eu quiser. Isto me foi entregue. Ai de ns, sim, porAdo e seu pecado. Eu o dou a quem eu quiser. No. O poder de Lcifer depende

    inteiramente de uma simples permisso divina. Tudo isso eu Te darei, se,prosternado, me adorares. V, eu sou o senhor do mundo. Conheo teu gnio. EuTe darei o governo do universo, sob minha suserania, se Tu me prestares essahomenagem.

    Sem dvida, a pregao de So Joo Batista, anunciando que o reino de Deusestava prximo, tinha determinado Lcifer a adotar suas providncias para mantersobre a terra o imprio de que desfrutava h tantos sculos. Um homem lhe eranecessrio para lutar contra o enviado de Deus, como ele mesmo havia feito no cucontra o arcanjo Miguel, para manter sobre a terra o reino do naturalismo e impedir oreino de Deus, quer dizer, o sobrenatural, de tomar posse da terra. Ele quis ver seJesus no seria esse homem. Ele se esfora em deslumbr-Lo, em excitar nEle oamor ao mundo e quilo que existe no mundo: a concupiscncia da carne, a

    concupiscncia dos olhos e o orgulho da vida,48

    numa palavra, mergulh-Lo nonaturalismo e atravs dEle a manter todos os povos. A palavra de Deus pronunciadapelo Homem-Deus, com a autoridade que Lhe pertencia, arrebatou-lhe essa quimera:Retira-te, Satans. Porque est escrito: adorars ao Senhor teu Deus e s a Eleservirs.

    Adorars ao Senhor teu Deus e s a Ele servirs. Era o que vinha ensinar denovo raa de Ado Aquele que tinha a misso de restabelec-lo na sua primitivadignidade de filho de Deus destinado eterna beatitude que a vida sobrenaturaloferece.

    A tentao de Nosso Senhor foi um dos grandes mistrios da Sua vida. Oshomens tornaram-se no paraso terrestre sditos de Satans e escravos da natureza.Importava que Nosso Senhor, empreendendo a obra que seu Pai lhe confiara, de

    introduzir numerosos filhos na glria, vencesse primeiramente o inimigo que tinhasubmetido a humanidade e limitado sua ambio vida presente e ao gozo dos bensdeste mundo. Ele poderia ento, novo Ado, chefe da humanidade regenerada,oferecer-lhe uma beno mais preciosa do que aquela perdida na origem.

    48 I Jo. 2, 16.

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    Quando Jesus terminou Sua misso de Evangelista, na segunda-feira da SemanaSanta, na qual Ele deveria completar Sua outra misso, a de nos resgatar, osapstolos Andr e Filipe apresentaram a Jesus os gentios vindos a Jerusalm para asolenidade da Pscoa e que tinham exprimido o desejo de ver o Messias. Ao pedidodeles, Jesus Se sobressalta. Ele v neles e nas suas condutas como que as primcias

    e o penhor da converso do mundo pago, que ser o fruto da Sua morte, que Eleacaba de mostrar estar prxima. Esse pensamento O comove. Dir-se-ia o preldio daterrvel agonia que devia produzir-se trs dias mais tarde no jardim das Oliveiras. Eleexclama: Minha alma est perturbada. Que direi? Pai, livrai-me dessa hora! Mas foipara isso que vim, Pai. Pai, glorificai vosso nome. E vem uma Voz do cu: Eu oglorifiquei e novamente o glorificarei. A multido se espanta. Jesus diz: No foi paramim que essa voz se fez ouvir, mas para vs... Agora o julgamento deste mundo,agora o prncipe deste mundo vai ser jogado para fora.

    Jesus, em acordo com o cu, anunciava assim a runa do imprio de Satans e ainaugurao do novo reino, do Reino de Cristo, do Reino dos Cus, que ia ser fundadosobre essa runa, por Sua morte na cruz.

    Assim ia ser restaurada a ordem sobrenatural, qual seriam novamente

    convidados judeus e gentios, toda a raa de Ado resgatada pelo sangue do Homem-Deus.

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    A T E N T A O D A C R I S T A N D A D E

    CAPTULO LVI

    I I . TENTAES DIVERSAS

    ors et vita duello conflixere mirando. A morte e a vida travaram sobreo Calvrio um combate a que os anjos assistiam cheios de admirao.Nesse combate, o autor da vida morre, mas na Sua morte Ele vive e

    por Sua morte Ele reina. Dux vit mortuus regnat vivus. O resgate foi pago, aRedeno foi completada, o pecado do mundo foi eliminado e o prncipe deste mundoest vencido, seu reino terminou, em princpio, mas necessrio que o reino que eleconstruiu seja reconquistado, o magnum prlium do cu que vai se repetir na terra,nas mesmas condies. Muitas vezes a Igreja parecer expirante; sempre na suamorte aparente ela haurir uma nova vida.

    O duelo deflagrado em primeiro lugar entre cada alma e seu tentador. ARedeno universal, o divino Salvador mereceu a salvao de todos os homens, masa justificao continuar a depender da vontade de cada um. Os mritos de Cristo nosero aplicados aos indivduos seno com o consentimento e a cooperao deles.49 Osobrenatural, que voltou a ser o apangio da humanidade, deve, como sempre, seraceito por cada um dos seus membros. Antes dessa aceitao, suposta na criana,efetiva no adulto, o filho de Ado est ainda sob o jugo de Satans, e a ele retornaatravs do voluntrio repdio do estado de graa, seja cometendo atos condenadospela moral crist, o que lhe faz perder a amizade de Deus, seja pela resoluo de seisolar unicamente na natureza, atravs da indiferena religiosa. Esta a lei que foipromulgada desde o comeo no cu e na terra. Ela no mudou, no pde mudar com

    a Redeno. A nova fonte de vida que a lana do soldado romano fez correr doCorao de Jesus na cruz est aberta a todos, mas ela no d suas guas seno aosque as vm beber.

    O que verdadeiro para os indivduos, tambm o para os povos. Chamadospela voz dos apstolos, judeus e gentios se entregaram, um a um, a essa fonte, e aaglomerao deles formou o corpo da Igreja.

    Para reconquistar seu imprio, Satans atacou o corpo social como ele ataca aspessoas. o que fora dito no comeo e o que a divina Sabedoria requeria: Inimicitiasponam inter semen tuum et semen illius. Aps ter anunciado a Redeno do gnerohumano pelo Filho da Mulher, Deus fez entrever a luta que devia seguir-se entre asduas cidades, uma, a raa da serpente, outra, a raa da Mulher bendita.

    A palavra hebraica empregada pelo Gnesis para assinalar os ataques da

    serpente designa bem os dois gneros de assalto que a Igreja no cessou de ter desofrer: as perseguies e as heresias. Essa palavra especifica um dio que se exerce

    49 O batismo conferido s crianas dos pais que pedem por elas; a elas, em seguida, cabe ratificar o quefoi feito. Foi assim que as coisas se passaram no cu e no paraso terrestre: os anjos e nossos primeirospais receberam a graa santificante no momento de sua criao; eles tiveram em seguida de consentir nodom divino que lhes fora concedido.

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    simultaneamente atravs do ardil e da crueldade. Exatamente a se situam as duasguerras que a histria sempre tem visto se alternarem, ou mesmo se confundirem,desde os primeiros dias at este em que vivemos.

    Satans suscitou primeiro a perseguio dos imperadores romanos, que duroutrs sculos e produziu tantos milhares de mrtires. No podendo sufocar a Igreja no

    Seu sangue, recorreu a outros meios de destruio.50Quase logo aps o reino de Constantino, chegamos ao pontificado do papa

    Gelsio I, no ano de Cristo 493. Como a situao sombria! A converso do imprio,um sculo antes, parece ter sido estril, e a catstrofe parece iminente. O Orienteinteiro est nas mos de cristos infiis no Conclio Ecumnico da Calcednia; oOcidente est sob o domnio dos arianos, que rejeitam o Conclio Ecumnico de Nica;o prprio Papa sdito de um soberano ariano. E como se uma s heresia nobastasse, o pelagianismo se propaga no Picenum com a conivncia dos bispos. NoNorte do imprio desmembrado, os bretes inicialmente infestados pelo pelagianismoso agora espoliados pelos pagos saxes. O clero catlico est oprimido nos reinosarianos de Borgonha, Aquitnia, Espanha, e o culto catlico est momentaneamenteabolido pelos vndalos arianos da frica. O Oriente quase inteiro toma o partido do

    patriarca de Constantinopla Accio no seu cisma, e adere heresia monofisista,enquanto que, fora do imprio, a heresia oposta, o nestorianismo, faz escandalososprogressos.

    este um caso isolado? Cento e quinze anos mais tarde, quando So GregrioNazianzeno ia inaugurar sua pregao em Constantinopla (378), no parecia asituao desesperadora com o arianismo crescendo e os cismas cada vez maisnumerosos? E mais tarde, no incio do pontificado de So Gregrio Magno, a Igrejano parecia ameaada de um fim prximo? Os ltimos vestgios da civilizao romanaesboroavam diante da invaso dos lombardos na Itlia; no Oriente e no Ocidente,fome, pestes, terremotos; os bretes cristos so massacrados, reduzidos escravido, expulsos para as montanhas desertas pelos seus inimigos pagos; oarianismo ainda o senhor na Espanha e em grande parte da Itlia. Nada de

    espantoso que So Colomban e ele no era o nico acreditasse no fim domundo.

    Se dividirmos em trs perodos cronolgicos toda a histria da Igreja, astempestades que acabamos de descrever pertencem ao primeiro, mas os outros doisno so menos agitados. No segundo (636-1270), a Igreja viu-se vrias vezesameaada de destruio: no sculo VIII pelos rabes; no IX pelos normandos; no Xpelos imperadores germnicos. O terceiro perodo, o mais prximo de ns, estmarcado por trs grandes acontecimentos, que, segundo os princpios dasprobabilidades histricas, teriam sido fatais, cada um de per si, Igreja.Primeiramente, o Grande Cisma: durante trinta e sete anos, os prprios fundamentosso abalados, o princpio da obedincia desacreditado, conquanto, emcompensao, a boa f e, mais que isso, a santidade se mostrem nas duas

    obedincias como para atestar uma autoridade divina, ainda que em guerra com elamesma. Em seguida estoura o protestantismo: os catlicos so vtimas de calnias ede insultos indescritveis, logo seguidos de pilhagens, destruies, massacres. A

    50 O quadro que segue emprestado do livro de Charles Stanton Devas, doutor em artes pela Universidadede Oxford: A Igrejaeo Progresso do Mundo, traduzido do ingls pelo dominicano Folghera.

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    Inglaterra parece, em 1540, um pas devastado: as obras de arte e os tesouros dosaber, acumulados durante sculos, desaparecem. A Frana v suas igrejasdestrudas s centenas, seus padres e religiosos imolados aos milhares; os prncipescatlicos so declarados indignos de comandarem, e a religio catlica ultrajada porhorrveis sacrilgios. De um s golpe, no meio desse furaco de egosmo e de

    fanatismo, dois teros do seu imprio parecem irremediavelmente perdidos para aIgreja. Enfim, o jansenismo triunfa durante o sculo XVIII: a grande Igreja da Franaest infestada por ele at s entranhas; Jos II, arquiduque de Toscana, e o rei deNpoles esto s vsperas de romper com a Santa S; bispos e professores discutemabertamente as doutrinas catlicas; os jesutas, campees de Roma contra oprotestantismo e o jansenismo, so perseguidos de morte em Portugal, na Espanha, naFrana, em Npoles, e a ameaa de um cisma obriga o Papa a suprimir aquela guardade elite no momento mesmo em que dela tem mais necessidade. Depois vem aRevoluo, que renova os massacres dos primeiros sculos.

    Esse quadro bem lgubre, mas o reverso no consolador? Em cada umdesses momentos o Mestre intervm. Constantino sucede a Diocleciano; o quarto, oquinto e o sexto sculo terminam em trs converses que constituem trs

    esplendorosas bnos: a de Santo Agostinho, a de Clvis, a dos anglo-saxes; adesolao dos sculos seguintes desabrocha em Hildebrando e nas Cruzadas; o zelodos dominicanos, dos franciscanos, a glria da Suma Teolgica de So Toms deAquino so, por assim dizer, a resposta de Deus tirania imperial e heresiaalbigense; a ferida do grande cisma mal est fechada e eis Fra Angelico, a flor da artecrist, e Toms de Kempis, a flor da mstica crist; aps Lutero e Calvino aparece averdadeira Reforma, obra do Conclio de Trento, e novas misses se estendem aoOriente e ao Ocidente, trazendo Igreja povos mais numerosos do que aqueles que Atinham desertado.

    Nessa luta gigantesca, observemos isto, foi sempre a Frana que forneceu o maisdisputado e o mais ilustre campo de batalha. Clvis bate os arianos, Carlos Martelo osrabes, Carlos Magno os lombardos, Montfort esmaga os albigenses, So Lus planta a

    cruz diante de Tnis, os Guise e a Santa Liga triunfam sobre a morte, e hoje, entre osmissionrios, aqueles que saram do corao da Frana so os que levam mais longeas conquistas da Igreja nos pases infiis. Como verdadeira esta palavra da histria:Gesta Dei per Francos!

    tambm na Frana que se v o fronte de batalha de uma outra guerra maisntima do que essa que acaba de ser descrita.

    Os outros combates foram diferentes, parciais e, relativamente falando, de poucadurao. Era o corpo-a-corpo de dois gigantes que, aps um esforo num sentidotentavam derrubar o adversrio num impulso contrrio. O que nos resta descrever aluta contnua, porque deve ser decisiva; a luta profunda que atinge as prprias fontesda vida espiritual, no indivduo como na sociedade e na Igreja. Seu objeto aquele

    que esteve, primeiramente, em litgio com os anjos, depois entre nossos primeiros paise a serpente: naturalismo contra o sobrenatural.Desde os primeiros dias do cristianismo esse combate se travou no fundo das

    almas, mas no sculo XV Satans acreditou chegado o momento de transportar essedrama ntimo para o grande cenrio do mundo e dele fazer a augusta tragdia que nosoferece a histria dos povos cristos desses ltimos sculos.

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    A T E N T A O D A C R I S T A N D A D ECAPTULO LVII

    I I I . T E N T A O F U N D A M E N T A L E G E R A L

    I. DA RENASCENA REVOLUO

    cabamos de ver que inicialmente Satans tentou sufocar a Igreja no Seusangue. Ele no pde lograr xito. Quando os pagos puseram fim perseguio sangrenta, viu-se o inferno fazer os maiores esforos para

    obter que essa Igreja se destrusse por si prpria, enfraquecida que estava pelosataques externos. Ele suscitou as heresias. Atravs delas ele destacava do corpomstico de Cristo membros mais ou menos numerosos e mesmo populaes. Massucedia que aquilo que a Igreja perdia de um lado, Ela o reganhava de outro, e que,mesmo as ovelhas desgarradas, aps maior ou menor aflio, voltavam ao redil.

    Ele concebeu ento um outro desgnio, mais digno do seu gnio infernal.Continuando a suscitar seitas, as diversas confisses protestantes que se seguiram ao

    jansenismo, ele raciocinou que seu triunfo estaria assegurado, e para sempre, seconseguisse formar no prprio seio da Igreja uma sociedade de homens que ficariammisturados aos catlicos, como o fermento na massa, para produzir uma fermentaosecreta que ele poria em desenvolvimento, se preciso por uma seqncia de sculos,mas que terminaria infalivelmente por expulsar do corpo da Igreja o espritosobrenatural e substitu-lo pelo esprito naturalista. Ele obteria assim na terra o mesmotriunfo, mas mais completo do que conseguira no cu atravs da seduo da teraparte da milcia celeste. Ele esperava chegar, atravs desse envenenamento lento,insensvel, ignorado, a uma dissoluo completa do reino de Deus sobre a terra.

    As duas primeiras partes desta obra descreveram esse trabalho obscuro da

    franco-maonaria, porque ela que constitui na Cristandade o fermento naturalista.Para convencer-se disso basta reler o que ela mesma disse de si prpria e considerarsuas obras.

    Vimo-la nascer nas catacumbas de Roma no sculo XIV. No contradigo aquelesque viram sociedades secretas no seio da Igreja antes dessa poca. Elas existiam,emprestaram seu auxlio s diversas heresias. Mas foi somente no sculo XIV que seformou a sociedade que teve por objetivo substituir a religio crist pela religio natural,no num ou noutro pas, mas em toda a Cristandade, e que perseguiu esse objetivoimperturbavelmente at o dia de hoje, aps acreditar ter chegado ao termo dos seusesforos com a Revoluo.

    Dos humanistas aos enciclopedistas, dos enciclopedistas aos modernistas, ogrito do naturalismo que se faz ouvir sempre e por toda a parte, so as instituies

    inspiradas pela idia naturalista que querem substituir as instituies crists, tantoassim que o cardeal Pie pde observar este fato: A questo viva que agita o mundo saber se o Verbo feito carne, Jesus Cristo, permanecer sobre os nossos altares ou seEle ser suplantado pela deusa Razo.

    A seita tenebrosa que se denominou franco-maonaria no cessou, desde osculo XIV, de se desenvolver em todos os pases cristos, e depois entre todos ospovos do universo. Em toda a parte ela se mistura a todas as manifestaes da

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    atividade humana para torc-las no sentido do objetivo que Satans lhe destinou, otriunfo da razo sobre a f, da natureza sobre a graa, do homem sobre Deus. Foi oque ele props aos anjos: Sacudi o jugo do Deus Redentor e santificador. Sede vsmesmos suficientes para vs mesmos e sereis como deuses.

    No considerada a poca em que se realizou a transformao da antiguidade

    pag no cristianismo, diz o historiador Pastor, no existe outra mais memorvel do queo perodo de transio que une a Idade Mdia aos tempos modernos e ao qual se deuo nome de Renascena... Desfraldou-se francamente o estandarte do paganismo.Pretendeu-se destruir radicalmente o estado de coisas existente (a civilizao crist)considerado por eles (os humanistas) como uma degenerescncia.

    Ao homem decado e resgatado, diz Briot, a Renascena ops o homem nemdecado nem resgatado, que se erguia pelas nicas foras da razo e do livre-arbtrio.O ideal naturalista de Zenon, Plutarco e Epicuro, que consistia em multiplicar ao infinitoas energias do ser, tornou-se o ideal pelo qual os fiis da Renascena substituram, nasua conduta assim como nos seus escritos, as aspiraes sobrenaturais docristianismo. Assim Paulin Paris pde dizer com toda verdade que o que comeou aser mudado no mundo, na poca da Renascena, foi o objetivo da atividade humana:

    a ordem sobrenatural foi mais ou menos completamente posta de lado, a moral tornou-se a satisfao dada a todos os instintos, o gozo sob todas as formas tornou-se objetode todos os desejos imoderados. A noo crist do nosso fim foi derrubada noscoraes e ao mesmo tempo estabelecia-se o divrcio entre a sociedade civil e asociedade religiosa. A Deus, dizia Alberti no seu Tratado de Direito, deve ser deixadoo cuidado das coisas divinas. As coisas humanas so da competncia do juiz.

    A Reforma, disse Taine, apenas um movimento particular dentro de umarevoluo que comeou antes dela, retorno do cristianismo ao naturalismo.

    Essa revoluo teve seu desabrochar nos ltimos anos do sculo XVIII. exatamente o estabelecimento e o reino do naturalismo sobre as runas docristianismo, perseguido pelos filsofos e depois pelos jacobinos. Barruel, nas suasMmoires pour servir lHistoire du Jacobinisme , faz a observao desse fato: As

    obras dos enciclopedistas esto repletas de indcios que anunciam a resoluo defazer suceder uma religio puramente natural religio revelada. Ademais, a ambiodeles no se limitava a transformar a Frana, mas a recomear a Histria, e, para isso,refazer o homem nele mesmo,51segundo o modelo naturalista. O grande objetivobuscado pela Revoluo, dizia Boissy-dAnglas, reconduzir o homem pureza, simplicidade da natureza, e ele pedia o retorno de uma religio brilhante que seapresentasse com dogmas que prometeriam o prazer e a felicidade.

    Eles instituram, pois, o culto da Natureza, que os humanistas tinham solicitadocom seus desejos. Quando acreditaram morto o catolicismo na Frana, graas guilhotina e s proscries, puseram-se ao trabalho para instituir a religio daNatureza. Robespierre inaugurou-a com o discurso de 7 de maio de 1794: Todas asseitas, disse ele, devem se confundir na religio nova da natureza. O Deus da

    revelao foi substitudo pelo Ser Supremo indicado pela razo. A prpria razo foideificada, teve seu calendrio, suas dcadas, suas festas, seu culto, sua moral.Um discurso no suficiente para instaurar uma religio; assim, a festa do Ser

    Supremo foi apenas o ponto de partida. Pouco tempo aps a festa de 10 de agosto de

    51 Ver tomo I, pg. 37.

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    1793, na qual as honras divinas foram rendidas a uma esttua da Natureza, erguida napraa da Bastilha,52 viu-se surgir uma sociedade de carter religioso, sustentadapelos governantes, que lhe entregaram, logo aps sua apario, vrias das nossasigrejas: os teofilantropos.53 Na inaugurao do Templo da Fidelidade, a teofilantropia apresentada como o culto dos primeiros humanos, do homem que sai das mos do

    Ser Supremo, culto original, religio da natureza que Deus, essencialmente imutvel,no pde querer mudar. Assim, na base da teofilantropia estava a negao formal doamor divino que quis elevar a humanidade ordem sobrenatural.54

    Um ritual determinava o costume que devia vestir o oficiante desse culto. Umatnica azul-celeste, descendo do pescoo aos ps, um cinto rosa e, por cima, umaveste branca aberta na frente. Na abertura da cerimnia, crianas depositam sobre oaltar um cesto de flores e frutos; queima-se incenso; depois o leitor comea o ofciocom uma orao qual os assistentes se associam mantendo-se de p: Pai danatureza, bendigo teus favores, agradeo teus dons... Digna-te receber de bom gradonossos cnticos,55 a oferenda dos nossos coraes e a homenagem dos presentes daterra que acabamos de depositar sobre teu altar em sinal do nosso reconhecimentopelos teus benefcios.

    Intil expor aqui todo o ritual. Ele regulamenta o ofcio das dcadas e das regras aserem observadas nas festas: da primavera, 10 do germinal; do vero, 10 do messidor;do outono, 10 de vendemirio; do inverno, 10 do pluvioso; da fundao da Repblica,1 do vendemirio; da soberania do povo, 30 do ventoso; da juventude, 10 do germinal;

    52 Ver o captulo V, A Revoluo institui o naturalismo.53 Temos mo as brochuras que eles se apressaram em publicar para divulgar e espalhar a nova religio:

    Da origem do culto dos teofilantropos, o que, o que deveser. Discurso pronunciado no diada inaugurao do Templo da FIDELIDADE (Igre ja deSo Gervsio) e de MONTREUIL (Igre ja deSantaMargarida). Ano VI da Repblica.

    MANUAL DOS TEOFILANTROPOS OU ADORADORES DE DEUS E AMIGOS DOS HOMENS . Contendo aexposio dos seus dogmas, da sua moral e das suas prticas religiosas, com uma indicao sobre aorganizaoeacelebrao doculto. Ano VI.

    INSTRUO ELEMENTAR SOBRE A MORAL RELIGIOSA, EM PERGUNTAS E RESPOSTAS. Redigida peloautor do Manual dosTeofilantropos.

    RITUAL DOS TEOFILANTROPOS.Contendo a ordem dosseusdiferentesexercciose acoletnea doscnticos, hinoseodes adotadospelosdiferentes Templos,tanto deParisquanto dos Departamentos. AnoVI.

    COLETNEA DE CNTICOS, HINOS E ODES para as festas religiosas emorais dos teofilantropos,precedida das invocaesefrmulasquerecitamnassuasfestas.

    ANO RELIGIOSO DOS TEOFILANTROPOS. Coletnea dos discursos e extratos sobre a religioe amoral universais, paraserem lidos duranteocurso do ano,seja nos templos pblicos,seja nas famlias.No possumos o ANO RELIGIOSO, que compreendia seis volumes.54 Na INSTRUO ELEMENTAR SOBRE A MORAL RELIGIOSA, Livro composto para os teofilantropos,adotado pelo jri de instruo para ser ensinado nas escolas primrias, lem-se as perguntas e respostas

    que seguem:P. A moral fornece uma regra para distinguir o que bom e o que mal?R. Sim.P. Qual essa regra?

    R. a seguinte mxima: Bom tudo aquilo que tende a conservar o homem ou a aperfeio -lo. Mal tudo o que tende a destru-lo ou a deterior-lo.

    exatamente a moral dos humanistas: e tambm exatamente a dos manuais escolares de hoje.55 Um professor e uma professora estavam adidos a cada templo para ensinar os cantos aos alunos.

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    dos esposos, 10 do floreal; do reconhecimento, 10 do prarial; da agricultura, 10 domessidor; da liberdade, 10 do termidor; dos ancios, 10 do frutidor.

    O ritual dessas festas comea por esta introduo: A teofilantropia o culto dareligio natural... O autor da natureza uniu todos os homens pelo liame de uma sreligio e de uma s moral, liames preciosos que necessrio evitar cuidadosamente

    sejam rompidos pela introduo de doutrinas e de prticas que no conviriam toda afamlia do gnero humano. O Manual que expe os dogmas dos teofilantroposexprime este desejo: Possa este cdigo fazer a felicidade do mundo inteiro! Seusdogmas reduzem-se a dois: a existncia de Deus e a imortalidade da alma. Mas o que Deus, o que a alma, como Deus recompensa os bons, pune os