Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE LINGUAGENS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM ANA REGINA BRESOLIN O PROFESSOR DE LÍNGUAS EM FORMAÇÃO: UMA EXPERIÊNCIA REFLEXIVA COM BLOG CUIABÁ-MT 2011

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O PROFESSOR DE LÍNGUAS EM FORMAÇÃO: UMA EXPERIÊNCIA REFLEXIVA COM BLOGDISSERTAÇÃOUFMT- MESTRADO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM- 2011ORIENTADOR: DÁNIE MARCELO DE JESUS

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE LINGUAGENS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM

ANA REGINA BRESOLIN

O PROFESSOR DE LÍNGUAS EM FORMAÇÃO: UMA

EXPERIÊNCIA REFLEXIVA COM BLOG

CUIABÁ-MT 2011

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ANA REGINA BRESOLIN

O PROFESSOR DE LÍNGUAS EM FORMAÇÃO: UMA

EXPERIÊNCIA REFLEXIVA COM BLOG

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagem da Universidade Federal de Mato Grosso como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Estudos de Linguagem. Área de Concentração: Paradigmas do Ensino de Línguas Orientador: Prof. Dr. Dánie Marcelo de Jesus Instituto de Linguagens

CUIABÁ-MT 2011

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FICHA CATALOGRÁFICA 

B842p Bresolin, Ana Regina. O professor de línguas em formação: uma experiência reflexiva com blog /

Ana Regina Bresolin. – 2011.

146 f. : il. color. Orientador: Prof. Dr. Dánie Marcelo de Jesus.

Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Mato Grosso, Instituto de Linguagens, Pós-Graduação em Estudos de Linguagem, Área de Concentração: Paradigmas do Ensino de Línguas, 2011. Bibliografia: f. 135-146. 1. Professores – Línguas – Formação. 2. Educação – Ambiente virtual. 3. Internet. 4. Professor de línguas – Ambiente virtual. 5. Comunicação de massa. 6. Blogs – Formação de professores. I. Título.

CDU – 371.13:811:004.738.5 Ficha elaborada por: Rosângela Aparecida Vicente Söhn – CRB-1/931

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à minha amada família pelo carinho e dedicação constantes. Também ao querido Hugo pelo apoio e amor incondicionais.

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AGRADECIMENTOS

A Deus que dá a vida e ensina o caminho.

Quando jogamos a semente na terra na esperança que de lá brote vida nova, o fazemos

na confiança de que o universo conspirará a favor dessa empreitada. O mesmo ocorre quando

nos lançamos na experiência científica: a semente precisa, além de vontade intrínseca, água,

luz, terra e substratos. Quem envereda neste campo, conta com a ajuda de muitos amigos para

poder desabrochar e, a tempo, fazer _ sua _ parte nos jardins espalhados pelo mundo. Sendo

assim, gostaria de agradecer a todas as pessoas que direta ou indiretamente contribuíram para

meu crescimento intelectual e emocional. Em especial agradeço...

Ao Dr. Dánie Marcelo de Jesus, que me abraçou do primeiro ao último instante com muita

dedicação, firmeza, carinho e paciência. Obrigada por ter sido em muitos momentos o vento

que em meu jardim fazia alvoroço, instigando assim novas possibilidades. Desabrochei graças

também ao seu esforço.

Ao Programa de Mestrado em Estudos de Linguagem da UFMT, incluindo aqui todos os

professores que diversificam e iluminam aquele jardim, fazendo nele vingar, além da ciência,

a fraternidade.

Aos alunos participantes do projeto do blog, bem como os seus professores que acreditaram e

fizeram-no acontecer. Minha imensa gratidão por compartilharmos das mesmas vontades, das

mesmas dúvidas: fomos realmente parceiros.

Aos professores Dr. Rodrigo Camargo Aragão e Dra. Simone de Jesus Padilha, que

gentilmente contribuíram com uma leitura atenciosa e apurada do texto, deixando a paisagem

deste jardim mais agradável.

Aos amigos e pós-graduandos do MeEl, especialmente Ana Raquel Diamante, Perla Haydée,

Carmen Zirr Azurro, Sandra Pinotti, Fernando Zolin Vesz, Viviane Carrijo, Anderson Simão

e Verônica Hirata.

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Aos colegas do IFMT _ Campus Parecis, por terem acreditado em meu sonho e dado espaço

para que ele se confirmasse.

Às minhas amigas e amigos, professores que dividem os momentos diversos de trabalho, de

vida: Marisol, Ana Lúcia, Cassiana, Rosane, Adriana, Rodolfo, Tiago, Arnaldo, Fábio e

Rogério.

As minhas irmãs, delícias da vida que Deus me deu de presente: Analice, Daniela e Ana

Maria.

Aos meus pais, Neiva e Arlindo, que nunca pouparam esforços para nos ver estudando,

crescendo e conquistando novos espaços. A vocês devoto minha eterna gratidão.

Ao meu então noivo e agora esposo, Hugo Ricardo, por sua enorme dedicação, cuidados,

apoio, carinho e amizade. Se não fosse por você, meu amor, não teria me tornado flor.

Aos meus avôs, Olivo e Regina, exemplos de sabedoria, caridade e paixão. Noninho, que

Deus acalente e envolva seu coração no belo jardim que você deve estar passando suas tardes.

Sempre amaremos vocês...

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"A Educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tão pouco a sociedade muda”. (Paulo Freire)

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RESUMO

Ao considerarmos a égide tecnológica sob a qual temos construído muitas de nossas relações

nas últimas décadas, perceberemos que esse tipo de interação tem modificado e ressignificado

as formas como aprendemos e ensinamos, fazendo com que tanto professores quanto alunos

vejam este lugar social, a internet, propício também para aprender línguas. Considerando esse

cenário, este trabalho se insere no contexto de educação em ambiente virtual e tem como

objetivo investigar indícios de processos reflexivos e de que forma eles se desenvolvem em

um blog colaborativo educacional. Os participantes que compunham a comunidade discursiva

foram alunos do curso de Letras Português/Inglês de quatro universidades brasileiras durante

um período de seis meses. A partir das interações ocorridas no e por causa do blog, ou seja, as

postagens, comentários e e-mails, analisei de que forma o grupo desenvolveu processos

reflexivo-críticos em ambiente colaborativo. O trabalho contou com suporte teórico em Smyth

(1992), Zeichner (1994) e Mateus (2010) no que tange a reflexão crítica. Em Gomes (1995),

Primo & Smaniotto (2006) e Signorini & Cavalcanti (2010) no que diz respeito ao processo

de ensino-aprendizagem em ambiente virtual e os blogs. As questões que nortearam a

pesquisa foram as seguintes: 1) Quais possíveis indícios de processos reflexivos podem ser

observados nas interações entre os participantes? e 2) De que forma o grupo procurou

construir processos reflexivos neste ambiente virtual? O percurso teórico-metodológico

utilizado foi o interpretativismo de base netnográfica com apoio nos autores Erickson

(1986/1990) e Kozinets (2010). Os resultados sugerem algumas evidências linguísticas que

podem ser sinalizadores de que no blog ocorreram processos reflexivo-críticos e colaboração,

em graus diferentes de complexidade, contribuindo assim na formação inicial do professor de

línguas.

Palavras-chave: blogs, reflexão crítica, formação de professores.

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ABSTRACT

Considering the technology support under which we have built many of our relations in recent

decades, we realize that this type of interaction has changed and reframed the ways we learn

and teach, so that both teachers and students begin to see this social place, internet, also

suitable for learning languages. The context of this research is education in virtual

environment and taking this situation into account, it aims to investigate evidences of

reflective processes and how they develop in a collaborative educational blog. The

participants that took part in the speech community were students of Letras Course _

Portuguese/English _ of four brazilian universities over a period of six months. Based on the

interactions which occurred in and because of the blog, like posts, comments and emails, I

analyzed how the group developed critical-reflective processes in a collaborative

environment. The research theoretical foundation is provided by Smyth (1992), Zeichner

(1994) and Mateus (2010) with respect to critical reflection. In Gomes (1995), Primo &

Smaniotto (2006) and Signorini & Cavalcanti (2010) with regard to teaching and learning in a

virtual environment and blogs. The research questions were: 1) What possible evidence of

reflective processes can be observed in the interactions among the participants? And 2) How

the group sought to build reflective processes in this virtual environment? The theoretical and

methodological paradigm is based on interpretative and netnography approaches

(ERICKSON, 1986/1990; KOZINETS, 2010). Results suggest some linguistic evidences that

can characterize reflective-critical processes and collaboration in the blog, in different degrees

of complexity, contributing to these language teachers’ starting constitution.

Keywords: blogs, critical reflection, teacher training.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Postagem “Brazilian public school system”………………………………………..74

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Fluxo simplificado de um projeto de pesquisa netnográfico...................................63

Quadro 2: Quadro de análise dos dados....................................................................................74

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SUMÁRIO

i DEDICATÓRIA ...................................................................................................................... iii 

AGRADECIMENTOS ............................................................................................................ iv 

RESUMO ................................................................................................................................. vii 

ABSTRACT ........................................................................................................................... viii 

LISTA DE FIGURAS .............................................................................................................. ix 

LISTA DE QUADROS ............................................................................................................. x

O GERMINAR DA SEMENTE ............................................................................................ 13

1  ADUBO TEÓRICO ........................................................................................................ 23

1.1 Primeiro canteiro: blogs, um jardim cibernético em plena primavera ........................... 24

1.2 Segundo canteiro: cultivando o profissional crítico-reflexivo ....................................... 38

2 RAÍZES METODOLÓGICAS ........................................................................................... 55

2.1 A pesquisa interpretativista de cunho netnográfico: para buscar compreender o jardim é preciso ser jardineiro ............................................................................................................ 56

2.2 Conhecendo o jardim ...................................................................................................... 66

2.3 Apresentando os jardineiros ........................................................................................... 69

2.4 Coletando as sementes .................................................................................................... 71

2.5 Os olhares sobre o jardim ............................................................................................... 77

3 O DESABROCHAR DE UM JARDIM VIRTUAL: DESCREVENDO E

DISCUTINDO OS RESULTADOS ...................................................................................... 82

3.1 Cada flor desabrocha ao seu tempo ................................................................................ 84

3.1.1 Momento de observar a paisagem ........................................................................... 84 

3.1.2 Momento de compreender minhas práticas de cultivo ............................................ 93 

3.1.3 Momento de espiar por cima dos muros de meu jardim ....................................... 104 

3.2 As primaveras de nosso jardim ..................................................................................... 111

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3.2.1 Tema 1: Tentativas de construção ......................................................................... 112 

3.2.2 Tema 2: A procura dos culpados ........................................................................... 116 

3.2.3   Tema 3: O que é mesmo refletir? ..................................................................... 120 

3.2.4 Tema 4: Quero ser um bom professor ................................................................... 123 

4 COLHENDO OS FRUTOS .............................................................................................. 126 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 135 

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O GERMINAR DA SEMENTE

a terra

arada de novo

com a alma de artista

no chão de setembro

e no dia de ontem

a terra é macia

e cobre de flores

de todas as cores

de todos os nomes

a pele do outono.

De manhã morna

de tarde quente

de noite tão fria

ela espera a chuva

a semente e o homem.

( Carlos Rodrigues Brandão)

Estou convencida de que o estilo metafórico com o qual inicio este capítulo, bem

como os demais que se seguem, possa causar certa curiosidade. Penso igualmente, que a

escolha pelo uso da primeira pessoa, somada ao fato de iniciar esse trabalho contando um

pouco de minha experiência docente, também pode instigar indagações. Dessa maneira,

gostaria de explicar as razões de tais escolhas, bem como outras que serão observadas no

decorrer do texto: advêm da concepção que qualquer conhecimento é historicamente situado,

portanto sofre o efeito da situacionalidade do pesquisador.

Proponho descrever o blog, objeto de estudo deste trabalho, tal como um jardim, em

decorrência da multiplicidade de gêneros textuais, de sua natureza hipertextual e da

possibilidade de construção de um ambiente mais colaborativo. Sendo assim, recorrer a blogs

para o ensino-aprendizagem de línguas é caminhar entre as várias espécies que têm sido

cultivadas nesse ambiente, e assim plantar canteiros diferenciados. Nessa perspectiva, eu, na

qualidade de pesquisadora-participante, fui encarregada de adubar o terreno, lançar as

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sementes e animar os jardineiros para que o jardim viesse a florescer. Os participantes do

blog, os quais serão apresentados logo mais, foram os jardineiros que trabalharam nesses

canteiros. Tanto eu quanto eles cuidamos do jardim, observando o clima e quais práticas

seriam mais propícias para seu desenvolvimento.

O uso de metáforas é muito comum, por exemplo, na perspectiva teórico-

metodológica da Pesquisa Narrativa (CLANDININ & CONNELY, 2000), que as utilizam

justamente como forma de compreensão do contexto estudado. Embora essa não seja a

perspectiva que seguirei, necessariamente, acredito seja uma maneira ímpar de dividir com os

leitores o que sinto em relação a meu objeto de estudo. Desse modo, a metáfora do jardim

cibernético é a minha forma de representar a problematização que proponho nesta dissertação.

Os blogs, por sua vez, fazem parte desse lugar, e neles as formas híbridas se

constituem a cada escolha de seus jardineiros. As sementes são as mesmas dos jardins “reais”,

e as plantas do jardim cibernético são polinizadas por abelhas, insetos e pássaros que migram

dos mais remotos lugares onde a rede tenha alcance. Tal como a terra espera pela semente

para que a vida possa acontecer, o ambiente digital floresce a partir da experiência e da

vontade humana de interagir por meio da linguagem.

Mas por que investigar as experiências que ocorrem nos blogs? Acredito que muitas

pessoas do século XXI vivam sob uma nova égide tecnológica. Compram, vendem, estudam e

dialogam com pessoas dos lugares mais remotos do mundo conectado pelo ciberespaço. Essa

interação vem me intrigando nos últimos anos. Bem por isso, penso que poderia acrescentar a

esta resposta, algumas inevitáveis perguntas: qual o efeito dessa tecnologia no processo de

aprendizagem dos alunos? Como professores lidam com essa tecnologia em sua vida

cotidiana escolar? O que o professor pode fazer com vistas a oferecer maiores oportunidades

para o uso crítico da internet na sala de aula? Certamente, para muitos professores, essas

perguntas assim se exteriorizam: de que maneira posso aliar minhas aulas ao universo digital?

Esses questionamentos nasceram de minha própria vivência como professora e aluna, e

também da observação das atitudes de meus colegas e alunos nos últimos anos.

Relembrando um pouco de minha história acadêmica, percebo que sempre que os

professores de língua estrangeira associavam às suas práticas pedagógicas artefatos

multimidiáticos, tais como músicas, filmes, clipes, ou alargavam o espaço de sala de aula com

pesquisas extraclasse, bem quando usavam a internet como ferramenta de busca e acesso à

informação, havia certa comoção entre os alunos, causada, a meu ver, pelo fato de estarmos

em contato com a língua em uso, viva, “em seu habitat natural”. Ficava entre nós, os

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aprendizes, certa satisfação, possivelmente provocada pelo fato de estarmos experimentando

nosso potencial enquanto usuários da língua à qual estávamos nos dedicando.

Atualmente, sou professora de língua inglesa em um dos campi do Instituto Federal de

Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso. A escola onde trabalho se localiza no

interior do estado e há, em meu contexto educacional, além de uma forte vocação

notadamente agrícola, expectativas de desenvolvimento e apropriação de tecnologias que

possam dar suporte às atividades econômicas desenvolvidas na região, formando ou

instrumentalizando os trabalhadores. Porém, uma das questões que não podem deixar de ser

levadas em consideração em minha realidade geográfica é a distância de grandes centros, ou

mesmo a distância das propriedades rurais e das cidades que rodeiam o Instituto. Nesse andar,

mediar a educação por meio da internet faz com que nos apropriemos dos mais diversos

artefatos e experimentemos novas formas de conhecer o mundo, e de nos conhecermos

também, uma vez que essa prática diferenciada pode ser uma forma de democratizar o acesso

a uma formação de qualidade para muitos jovens e adultos.

Penso por igual que a escolha da metáfora do jardim tenha sido influenciada por essa

experiência assentada no ambiente rural. Convivendo com as práticas de cultivo

desenvolvidas por meus colegas, traço um paralelo entre o que acontece com a dinâmica da

semente se tornando árvore, em plena transformação, com o que temos vivenciado em relação

ao uso e à pertinência da internet em nossa sociedade. Parece-me que o crescimento da rede

em todo o mundo já passou da fase de semente, ou seja, da fase embrionária, e está em

constante desenvolvimento. Seus galhos e suas nuanças já são parte de nosso jardim

cibernético e já estamos colhendo os frutos, os mais diversos inclusive, de nossa construção e

da relação com esse objeto.

Voltando um pouco à minha história como professora, mas também na condição de

aluna, recordo que minha experiência com o ensino de idiomas começou quando eu era

adolescente e trabalhava em uma escola de línguas, na função de secretária. Nesta escola,

tanto trabalhava quanto aprendia Língua Inglesa e Língua Espanhola, e acabei tendo contato

desde cedo com o que os professores sentiam em relação ao cotidiano escolar, assim como

com o que estavam ensinando. Mesmo que a escola usasse livros didáticos, havia certa

abertura para que os professores incrementassem suas aulas, tanto a partir de seus anseios

quanto dos alunos. Dessa forma, os alunos podiam se expressar em relação ao que gostariam

de aprender, bem como de que maneira aprendiam mais. Lembro-me de que, dentre os

pedidos mais recorrentes da parte dos alunos, sempre estavam as músicas.

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Quando estava no 1º ano do curso de Letras, comecei a trabalhar em outra escola de

idiomas. Lá as coisas eram bem diferentes do lugar onde eu havia aprendido inglês e

espanhol. O método utilizado era o audiolingual, e todas as lições recheadas de muita

repetição. Nem o professor nem os alunos podiam fugir das regras do jogo. Recordo com

clareza, enquanto preparava minha primeira aula, não conseguia compreender como eles iriam

aprender daquela forma. Mesmo utilizando televisores, fones de ouvido, CDs, Cd roms,

DVDs, ou seja, muita tecnologia, eu acabava por perceber pouquíssima interação entre os

alunos.

Também trabalhei durante o curso de Letras em escolas particulares de ensino

fundamental e médio. Nessas escolas, equipadas com laboratórios de informática, projetores

de dados e internet, eu mesma, pouquíssimas vezes, dava conta de usar essas ferramentas de

forma realmente interessante. Fazíamos pesquisas, leituras, mas nada que pudesse nos levar

para um contexto de ensino mais reflexivo, quanto mais crítico e colaborativo.

Quando terminei a graduação, resolvi fazer um intercâmbio e estudar inglês em outro

país. Passei desta forma seis meses estudando em Londres. Essa experiência foi marcante em

minha vida, pois eu acredito que passei por mudanças profundas a respeito de minha

concepção acerca da postura do professor de línguas, do aluno e da importância de um grupo

multicultural, sabedora de que a miscigenação enriquece muito as aulas. Por conviver com

colegas do mundo todo, passei a observar como eles buscavam aprender, como os professores

tentavam fazer para que asiáticos, africanos e latinos, por exemplo, conseguissem

compreender as matizes da língua e da cultura na qual estavam inseridos. Essa vivência ímpar

me fez expandir minhas concepções, meu fazer em sala de aula, e percebi isso quando voltei e

comecei a lecionar novamente aqui no Brasil.

Hoje, acredito que a internet seja a ferramenta que pode mediar essa ampliação de

conceitos, essa vivência multicultural, pois ela possibilita, cada vez mais, a um número maior

de pessoas saber o que se pensa sobre os mais diversos assuntos nos recantos mais longínquos

do globo terrestre. Porém, acredito que a grande maioria ainda não tenha acesso à rede, ou até

mesmo não tenha criado a cultura de uso e acesso à ela.

Diante dessas observações, acredito que a internet se tornou ambiente propício para

aprendizagem de língua inglesa, independentemente de perceber que muitos colegas

professores não compreendem ainda a dinâmica do processo de ensino-aprendizagem de

línguas em contexto online. À luz desse quadro, a comunidade escolar, de modo geral, parece

mostrar-se ansiosa em usar as ferramentas da Web em seu dia a dia. De outra parte, há muitos

profissionais com um olhar ainda muito romântico em relação a esse ambiente, assim como há

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os que desconfiam totalmente de sua eficácia no processo educativo. Observo, no entanto, que

ambas as posturas fazem parte do processo de acomodação de toda e qualquer nova

tecnologia, tal como aponta Paiva (2010).

Se bem assim, existem também aqueles cuja preocupação não subjaz necessariamente

às já citadas, mas sim recaem justamente em como fazer/ter um uso crítico e contextualizado

do ambiente digital na aprendizagem de línguas. Ou seja, observar esse jardim cibernético

como algo propício para o uso efetivo da linguagem, e não só como uma repetição sem fim de

frases feitas. Aprender uma língua e usá-la a fim de compreender as relações sociais

estabelecidas na e por ela nos mais diversos contextos, inclusive no seu imediato. Em adendo,

por meio da linguagem, construir novos sentidos, novas maneiras de olhar e sentir o mundo, e

por que não, modificar-se a si próprio e o mundo que nos rodeia.

Essas percepções acerca de um ensino crítico de línguas me fizeram constatar um

vácuo existente entre a dinâmica social da sociedade da informação e a formação de

profissionais que deem conta da aprendizagem crítica mediada pelo computador. O fato de

termos certa familiaridade com o uso da internet no meio pessoal e/ou profissional não

garante que nós, professores, sejamos bem-sucedidos nesse contexto específico. Embora o

ambiente virtual possa ser altamente produtivo, crítico, hipertextual, diverso, dinâmico, e

além, em minha opinião, muito propício à aprendizagem, ainda há uma demanda gritante na

escola por conhecer e ressignificar as práticas dentro desse novo contexto.

Em decorrência dessa preocupação, decidi direcionar meu olhar para o uso dos blogs

como um terreno fértil para a aprendizagem reflexiva. A escolha do blog se deu em

consequência de ele constituir uma ferramenta relativamente popular para os usuários da

internet, por ser de fácil utilização, além de ter potencial para se revelar um espaço educativo,

no qual alunos e professores podem construir sentidos colaborativamente.

Minhas sensações acerca do ambiente digital é que não estamos criando um mundo

paralelo, virtual, mas sim um novo espaço de (com) vivências permeado pela linguagem, que

é tão “real” como outro qualquer. Por isso, proponho neste trabalho a metáfora do jardim. Em

minha concepção, o ambiente digital vem se tornando o chão das experiências de vida das

pessoas, terreno nos quais pequenas ideias têm se transformado de meras sementes em árvores

frondosas, cujos galhos, flores, frutos, raízes e por que não as sombras alcançam as mais

diversas vizinhanças. Sendo assim, ao comparar a experiência educacional em ambiente

digital com um jardim, busco fazer com que os leitores deste trabalho não vejam esse terreno

como um lugar desordenado e infértil intelectualmente. Pelo contrário, a experiência humana

nesse ambiente é plena de anseios, objetivos e práticas muito interessantes.

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Olhando para etimologia da palavra jardim, observo que ela se refere a algo fechado,

por ter sua origem no radical garth, o qual provém das línguas nórdicas e saxãs, a significar

“cintura ou cerca”. Em latim temos hortus gardinus, “local cercado para plantar flores e

ervas”, que deriva justamente do frâncisco gardo, que de sua vez dimana do germânico

gardaz. Dessa forma, o jardim é sempre algo construído, fechado, mas, ao mesmo tempo

heterogêneo. Lugar de encontros que conduzem à paz de espírito, à meditação, à

sensibilização, à experimentação de cheiros, gostos, ao conhecimento das artes, da cultura.

Em suma, é um lugar de deleite e experimentação.

Tanto na tradição ocidental quanto oriental, os jardins são tidos como lugares de

harmonização e segurança, como uma amostra do trabalho do homem sob a natureza, dando

certeza que ele poderia usufruir do selvagem, mas de maneira despreocupada, pois estaria

cercado. E isso, de certa forma acontece no jardim cibernético. Quando criamos categorias,

espaços, estilos, maneiras para que as interações ocorram, estamos a cercear os sujeitos,

possibilitando o que e como eles podem fazer as coisas.

A representação dos jardins, portanto, é algo inerente ao trabalho humano, ou até

mesmo divino, já que, conforme a cultura das religiões abraâmicas, tenha sido um jardim, o

Jardim do Éden ou o Paraíso, o lugar construído por Deus para que o homem e a mulher

primeiro habitassem e do qual posteriormente foram expulsos por transgredir regras,

provando a famigerada maçã por influência da uma serpente. Em hebraico temos, portanto, o

Gan Eden.

Na mitologia grega também temos o Jardim das Hespérides, famoso por suas lindas e

desejadas maças de ouro (pomos). Conta o mito que as Hespérides eram as deusas primaveris

guardiãs desse jardim e das fronteiras celestes entre o céu, a terra e o mundo subterrâneo. A

Hércules lhe foi pedido que buscasse uma dessas maças durante um de seus onze trabalhos. A

festa de casamento de Zeus e de Hera também se realizou no Jardim das Hespérides, tido

como símbolo de fecundidade sempre renascente.

É, portanto, por meio desses e de outros mitos e histórias que permeiam o nosso

imaginário que criamos a ideia do que seja um jardim. Percebo-o como um lugar delimitado,

dentro de um ambiente maior, o qual é planejado e organizado conforme os anseios do que ali

se pretende viver. O ambiente virtual se parece com um jardim dado que é um lugar

estruturado. Embora as coisas pareçam estar ao acaso, na verdade são construídas a partir das

experiências e conhecimentos de seus idealizadores. As espécies que habitam o jardim

cibernético vêm de outros lugares, e nada impede que elas se entrecruzem nesse novo

ambiente e que, dessa hibridização, aflorem as mais novas e diversas possibilidades.

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Para introduzir cada capítulo o leitor também perceberá que eu lanço mão de poesias.

Elas foram pinçadas da obra O jardim de todos, de Carlos Rodrigues Brandão. Conheci este

autor em uma de minhas andanças por congressos Brasil fora. Encantou-me a maneira ímpar

como esse ilustre professor-pesquisador cantava a experiência humana a partir da metáfora do

jardim. Quando optei por fazer o mesmo neste trabalho, não tive dúvidas de que sua poesia

me ajudaria na tentativa de desfilar meus sentimentos em relação a alguns aspectos de minha

caminhada.

Passeando por esse jardim, então, comecei a ler vários blogs relacionados com o tema

do ensino de língua inglesa e com o ensino em ambiente virtual. Passei a perceber que o

ambiente específico dos blogs pode ser propício à criação de comunidades de aprendizagem

que cultivem uma postura reflexiva, pois dá chance aos usuários desse serviço de criarem uma

rede de colaboração com leitores e escritores voltada a um assunto que lhes seja interessante.

Um espaço onde podemos apreciar pontos de vista e experiências muito diversas, as quais

podem, inclusive, ser muito distintas de nossas representações.

Os blogs também se diferenciam de outras ferramentas disponíveis na web por conta

de algumas características especiais, tal como a facilidade de formatação, o modo de

organizar as ideias, a gratuidade e a dinamicidade. Dessa forma, eles podem ser utilizados em

favor de uma formação, que ao mesmo tempo em que é reflexiva e colaborativa, proporciona

aos professores em formação inicial uma experiência efetiva com a língua inglesa em

ambiente virtual.

Passei, então, a refletir sobre esse contexto específico, com o intento de compreender

de que maneira os blogs poderiam contribuir para a formação mais reflexiva de professores de

língua estrangeira, bem como para o desenvolvimento de comunidades de aprendizagem

online.

Partindo dessas concepções iniciais em relação ao papel do ambiente digital na e para

a aprendizagem de línguas, construí um blog com a finalidade proporcionar uma experiência

de postura reflexiva e colaborativa em ambiente digital para alunos do curso de Letras de

quatro universidades brasileiras, a saber: UFMT _ Universidade Federal de Mato Grosso,

UESC _ Universidade Estadual de Santa Cruz, UFV _ Universidade Federal de Viçosa e

FECILCAM _ Faculdade de Educação, Ciências e Letras de Campo Mourão.

Vários estudos (SILVA, 2001; BAKER, GUIGNARD, LUND & SEJOURNÉ, 2008;

ARAÚJO JR, 2008; SALOMÃO, SILVA & DANIEL, 2009) indicam que o ambiente digital

pode propiciar a criação de redes de aprendizagem colaborativa e, se trabalhado para isso,

promover um processo de ensino-aprendizagem na esteira da reflexão. Para que o processo de

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aprendizagem colaborativa possa ocorrer são necessárias, por igual, alterações profundas nas

relações entre professores e alunos. Há que observar que, inevitavelmente ou felizmente, essas

mudanças já vêm se dando em diversas escalas e proporções, e suas consequências principiam

a fazer parte do cotidiano escolar. Alguns professores, por exemplo, começam a

compreendem que seu papel centralizador está mudando, e também os alunos, de certa forma,

parecem se tornar um pouco mais independentes em relação a seu próprio processo de

aprendizagem. Obviamente, tudo isso comporta inúmeras distinções de contexto.

A pertinência desse tema é clara, tendo em vista que cada vez mais estudos são

realizados buscando compreender as relações humanas permeadas pelo uso das tecnologias

(LÉVY, 1998 e 1999; MORIN, 2000; CRYSTAL, 2001 e SIGNORINI & CAVALCANTI,

2010), relacionados também com o fazer e com a formação docente para o uso das

Tecnologias de Informação e Comunicação, doravante TIC (LEFFA, 2002; COLLINS, 2004;

JESUS, 2007; MACHADO, 2008 e PAIVA, 2010). Em muitos casos, com o uso específico

dos blogs educativos (GOMES, 2005; RECUERO, 2010).

Este trabalho sinaliza um momento de discussão e reflexão sobre os blogs e seu

potencial educativo nos cursos de formação de professores de línguas a partir de uma

experiência prática relativa a alunos em formação e a professores do curso de Letras da

UFMT, UESC, UFV e FECILCAM. Os envolvidos participaram, de junho a dezembro de

2010, de um blog educacional intitulado Reflection in Action1, o qual foi idealizado na

expectativa de ensejar aos acadêmicos em formação uma experiência em ambiente virtual,

com vista a potencializar uma comunidade de aprendizagem colaborativa, e instigar a reflexão

acerca de alguns temas discutidos por pesquisadores da área da linguística aplicada e/ou da

educação, especialmente alguns que dizem respeito ao ensino de inglês na escola pública

brasileira.

Sendo assim, compreendo também ser papel da universidade, dos cursos de formação

continuada e demais cursos de formação de professores promover ou fomentar espaços

reflexivos, tal como um blog, que pode constituir espaço muito interessante para trocarmos

experiências.

Partindo dos conceitos e questões revitalizadas até aqui, intento voltar meu olhar para

a questão do uso de ferramentas da internet, em especial dos blogs educacionais durante a

formação de professores de línguas, até mesmo para observar de que forma os professores de

1 http://reflectionaction.blogspot.com

Page 23: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

21

línguas em formação inicial constroem sentidos em relação à sua área de atuação e se o blog

apresenta potencial na formação de um profissional mais reflexivo, crítico e colaborativo.

Assim, o estudo empírico tem sido construído assentado nestas perguntas de pesquisa:

1- Quais possíveis indícios de processos reflexivos podem ser observados nas

interações entre os participantes?

2- De que forma o grupo procurou construir processos reflexivos neste ambiente

virtual?

Nesta pesquisa, assumo a metodologia interpretativista, de base netnográfica2, pois

acredito que a netnografia possibilita ao pesquisador compreender a atuação online dos

sujeitos, bem como os processos sociais que os geram, e acaba por desenvolver uma melhor

interpretação das relações que se estabelecem neste ambiente, ao passo que, por sua

característica que vai além da observação, faculta ao pesquisador também participar desse

lugar social que é a internet.

No primeiro capítulo, metaforicamente intitulado “o adubo teórico”, descortino as

teorias que irão embasar a minha análise. Digo que se trata de adubo, porque foram

justamente esses estudos relativos ao ensino em ambiente digital, e em especial a partir do uso

dos blogs educacionais, a importância do trabalho reflexivo-crítico durante a formação

docente, que alimentaram e fizeram crescer em mim um olhar diferenciado acerca desses

assuntos. Baseio-me nesta empreitada no trabalho de Collins (2004), Gimenez (1999), Gomes

(2005), Magalhães & Celani (2005), Paiva (2010), Primo & Smaniotto (2006), Signorini e

Cavalcanti (2010), Sacristán (2010), Smyth (1992) e Zeichner (2008).

No segundo capítulo, evidencio as “raízes” metodológicas, trazendo o contexto

pesquisado, a metodologia que fundamentou o trabalho, bem como detalhamento sobre a

coleta de dados, perguntas de pesquisa, os procedimentos e os participantes. Acredito que esse

capítulo pode ser assim intitulado, porque são justamente as raízes que dão sustentação e

articulação a um projeto de pesquisa. Nesse capítulo, procuro montar um painel do jardim de

onde colhi meus textos de campo, os participantes, o contexto de pesquisa e o olhar que lanço

sobre eles.

No terceiro capítulo, busco mostrar o desabrochar cibernético do blog, através da

interpretação dos textos colhidos no blog e nas demais interações entre o grupo. Procuro dar

2 Baseada em Erickson (1986/1990), no que tange à pesquisa interpretativista, e em Kozinets (2010), no que diz respeito à pesquisa netnográfica.

Page 24: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

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ênfase à natureza das relações estabelecidas entre os participantes do blog, evidenciando os

indícios de processos reflexivos que surgiram neste ambiente e a forma como o grupo

intentou construir esses processos.

Finalmente, colhendo os frutos, apresento as limitações deste trabalho, bem como

algumas possíveis contribuições para o ensino e para as pesquisas preocupadas em

compreender o ambiente digital e suas possibilidades educativas.

Page 25: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

23

1 ADUBO TEÓRICO

tudo, todos e o todo

Somos feitos de barro e do fogo

e por isso somos o desejo e o amor.

Fomos feitos de terra e de água

e assim somos eternos como a vida

e somos passageiros como a flor.

Somos a luz a sombra, o claro, a escuridão

a memória de deus, a história e a poesia.

Somos o espaço e o tempo, a casa e a janela

e a noite e o dia, e o sol e o céu e o chão.

Somos o silêncio e o som da vida.

O estudo, a lembrança e o esquecimento.

Somos o medo e o abandono.

A espera somos nós e somos a esperança.

Pois não somos mais e nem menos do que o todo

e nem somos menos e nem mais que tudo.

Somos o perene e o momento, a pedra e o vento

a energia e a paz, a vida criada e o criador.

Somos o mundo que sente, e irmãos da vida

somos a aventura de ser vida e sentimento.

E assim em cada ave que voa há nossa alma,

e em cada ave que morre, a nossa dor.

(Carlos Rodrigues Brandão)

Um jardim é feito de várias espécies, e sua beleza se revela justamente na diversidade,

no colorido que se contrapõe, e, misturando-se, revela nuanças nunca antes observadas. Parto

dessa linguagem metafórica para trazer à baila os insumos teóricos que fertilizaram minhas

análises, problematizações e discussões e que, de certa forma, no decorrer da caminhada,

balizaram o conteúdo veiculado no próprio blog Reflection in Action. Assim, as sementes em

Page 26: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

24

meu jardim foram dispostas em dois canteiros: o primeiro sobre os blogs e o ambiente digital,

e o segundo sobre processos reflexivos na esteira crítica.

No primeiro canteiro semeio sobre os blogs, especialmente, seu potencial pedagógico

como uma ferramenta/artefato digital para o processo de ensino-aprendizagem de línguas e

também para a formação dos professores de língua estrangeira segundo Buzato (2006),

Gomes (2005), Gomes & Lopes (2007), Komesu (2005), Marcuschi (2005), Paiva (2010),

Primo & Smanioto (2006) e Signorini & Cavalcanti (2010).

No segundo canteiro, proponho um panorama das correntes teóricas sobre reflexão

docente e discorro sobre algumas perspectivas atuais sobre a formação do professor crítico-

reflexivo e o uso de tecnologias, discorrendo sobre as concepções que historicamente foram

construídas ao redor da expressão reflexão docente, segundo Dewey (1933), Libâneo (2010),

Perrenoud (2002), Pimenta (2010), Sacristán (2010), Schön (1992; 2000). Também alinho

definições e considerações sobre o processo reflexivo, enfatizando como isso poderia formar

um professor mais crítico, seguindo os conceitos de Gimenez (1999), Mateus (2010),

Magalhães & Celani (2005) e Zeichner (1994). Apresento, posteriormente, as contribuições

que uma prática reflexiva traria ao processo de ensino-aprendizagem em ambiente digital,

especialmente nos blogs.

Gostaria de observar que este estudo se insere nos estudos da Linguística Aplicada e

que, tal como defendem Bastos & Mattos (1993), o enfoque dos trabalhos nesta área não é o

de resolver problemas, mas sim o de explicar fenômenos, problematizar o que já está

instituído. Sendo assim, este trabalho buscará discutir, com a ajuda de um aporte teórico,

como o jardim cibernético constitui novas formas de aprender e ensinar.

1.1 Primeiro canteiro: blogs, um jardim cibernético em plena primavera

Os blogs nascem da necessidade humana de interação, ou seja, são essencialmente

sociais. Fumero (2005) assevera que esta tecnologia, como todas, voltar-se-á para seu criador,

o homem, tendente a mudá-lo, gerando novas formas de relação social e novas convenções

que surgirão de sua utilização. Atualmente o número de blogs cresce vertiginosamente entre

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25

os internautas do mundo todo3, e a escola, por sua vez, passa a enxergar, nessa ferramenta,

certa potencialidade educativa.

Eles tiveram sua origem mais especificamente na década de 90, nos Estados Unidos,

onde jornalistas e pessoas ligadas à informática começaram a elencar o que mais gostavam no

mundo virtual por meio de listas de links. Blood (2000) propõe um histórico relatando que ela

era uma das pessoas que começaram a usar seu site pessoal, no final da década de 90, para

postar pequenos pensamentos, comentários, textos. Conforme a Wikipédia4, John Barger

inaugurou, em 1997, o termo weblog (diário de bordo da rede), começou a postar pequenas

notas de cunho pessoal em seu site sobre o conflito israelense-palestino. Contudo, foi 1998,

em sua página pessoal, que Peter Merholz, propôs a frase “we blog”, inaugurando a utilização

do verbo blogar. Embora, no final da década de 90, já houvesse alguns aplicativos na rede,

cujas ferramentas davam ao usuário certa facilidade de criação, editoração e manutenção de

seus blogs, ainda era necessário saber, em muitos casos, como fazer programação em HTML5

para criar seu blog. Foi somente no ano de 1999, com a criação do software Blogger, pela

empresa Pyra Lab, que os blogs se espalharam-se na rede. O software dispensava, no caso, o

conhecimento de linguagem de programação, oferecendo aos usuários facilidade de criação,

editoração, publicação e gratuidade. Era o que faltava para que um número cada vez maior de

usuários se sentisse à vontade para ter e manter seus blogs.

Passados mais de 10 anos desde o surgimento do blogger.com, pesquisas em sites

especializados, embora não tenham valor acadêmico, medem a blogosfera mundial e acabam

traçando um perfil deste espaço online. Geograficamente falando, conforme o site Technorati,

em 2010, dos 70 milhões de blogs no mundo, somente 8% pertenceriam aos latino-

americanos. O perfil dos usuários seria composto por uma maioria de jovens e adultos, sendo

que 65% teriam entre 18 a 44 anos e, dos quais dois terços seriam homens. O nível de

escolarização também chama atenção: 43% teriam dito possuir nível superior6.

3 No início eram somente especialistas em informática que o utilizavam, até que, em 1999, a mais famosa ferramenta de produção e hospedagens de blogs até hoje foi lançada, o Blogger.com. O ano de 2002 também foi marcante, pois, com a criação da Web 2.0, outras ferramentas como Facebook, Myspace e o Twitter, (atualmente são as mais populares), têm sido disseminadas no contexto brasileiro, evidenciando o caráter social da internet. 4 Fonte: Wikipedia. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Blog>. Acessado em 27 set. 2011. 5 HTML (acrônimo para a expressão inglesa Hyper Text Markup Language, que significa Linguagem de Marcação de Hipertexto) é uma linguagem de marcação utilizada para produzir páginas na Web. Fonte: Wikipedia. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/HTML>. Acessado em 27 set. 2011. 6 Sobre os demais blogueiros, 33% deste total estariam nos Estados Unidos da América, 38% no restante da América do Norte, 19% seriam europeus e o restante, 2%, em outros países. Fonte: Site Technorati. Disponível em: <http://technorati.com/blogging/article/who-bloggers-brands-and-consumers-day/>. Acessado em 27 set. 2011.

Page 28: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

26

Embora os números possam nos chamar a atenção, não menos importante é observar

as possíveis motivações para o surgimento e a manutenção das redes sociais na

contemporaneidade. Sibilia (2008), por exemplo, defende que os textos (auto) biográficos e os

diários íntimos seriam os primos românticos dos blogs. Assim, os blogs seriam uma espécie

de ressurgimento deste ato impulsivo de as pessoas revelarem sua intimidade.

Entretanto, penso ser interessante relativizar esse desejo de mostrar a intimidade e, até

mesmo, em que ponto isso ocorre na rede. Não que essa não possa ser uma das motivações,

mas me preocupa o olhar leigo, no que tange à crença7 de que, por ter esse tom intimista, os

textos que circulam nos blogs encartam a realidade ipsis litteris da vida de seus escritores ou

de qualquer um que seja. Baseio-me em Lejeune (1994) e Foucault (1996, apud KOMESU,

2010, p. 349)8 para asseverar que esse tom intimista e revelador funciona, na verdade, como

um dos ingredientes entre o escritor do blog e seu público-leitor no processo de produção e

leitura do texto, vincando que, não necessariamente, estes textos produzidos nos blogs trariam

“a verdade”, até mesmo, como afirma Maciel (2004), “os gêneros confessionais são, como

qualquer discurso, uma produção humana entrecortada de ficção”.

Por isso, observo que tanto as redes sociais, quanto os programas de TV (reality

shows), ou a expressiva vendagem de livros dos gêneros confessionais, podem até ser

interpretados como um culto ao individualismo, a subjetividade, e especialmente ao “ser

diferente”. No entanto, mais do que isso, acredito que essas “novas-antigas técnicas da

confissão” são, tal como defende Foucault (1976, apud SIBILIA, 2003, p. 144-147),

modalidades de construção da “verdade”.

Diante da sucinta contextualização, surgem dúvidas do que seriam os blogs, ou como

poderíamos enquadrá-los dentro do escopo comum aos estudos relacionados com a

linguagem. Seriam os blogs gêneros textuais? Como poderíamos delimitar o objeto de estudos

blog? Será que, em sua maioria, são jardins em que se cultiva grande diversidade de espécies

de maneira organizada ou será que tudo se dá quase ao acaso?

Creio que, primeiramente, em virtude das ressignificações possibilitadas pelo advento

do uso da linguagem em ambiente digital, inúmeros gêneros textuais têm aflorado e/ou sido

renovados nesse novo contexto discursivo, e também ganharam, observando pela óptica

bakhtiniana (2000), novas características estilísticas e composicionais. Conceituar o que seja 7 Aqui a palavra crença é utilizada no sentido do senso comum. 8 Lejeune (1994), por sua vez, explica que há entre o leitor e o escritor um “acordo” de legitimidade ou, nos termos dele, um “pacto autobiográfico”, a qual se entende como uma atitude na hora da leitura onde quem escreve se compromete em ser sincero e quem lê passa a buscar fatos externos para comprovar essa suposta verdade. Foucault (1996) contribui neste aspecto pontuando que um dos mecanismos de exclusão que atravessa o discurso é a vontade da verdade, que faz com que o sujeito se constitua, assim como seu enunciado.

Page 29: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

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um blog, conforme Gomes (2005, p. 312), não parece ser muito consensual, uma vez que ele

oferece uma diversidade de formas e objetivo, conectados aos mais diversos contextos, de

seus também diferentes criadores. Acrescento também que diversas são as lentes teóricas que

podemos usar para observar esse mesmo objeto, as quais contribuem no sentido de ampliar a

gama de possibilidades.

O que se observa nos blogs é que praticamente todos os gêneros que circulam no

ambiente digital podem estar presentes lá, como o chat, a enquete, a poesia, o conto, a

propaganda, a crítica, entre outros. Assim, há quem compreenda o blog como um suporte para

esses diversos gêneros distintos (PEREIRA, 2007), como um gênero híbrido (KOMESU,

2005) ou, nos termos cunhados por Bakhtin (2000), como um gênero secundário, que

absorveria por sua vez gêneros primários (LIMA, 2008b), sem perder sua característica

principal, funcionando tal como num romance que contenha, por exemplo, uma carta,

registrando que a carta, exemplarmente, tem seu propósito subordinado ao gênero secundário

romance. É como se concebêssemos que a crônica veiculada por meio do blog fosse

subordinada ao gênero secundário blog.

Os blogs, assim, têm se mostrado um espaço ou suporte, ou um gênero, que tanto têm

servido para os gêneros já consagrados dentro das diversas esferas de produção, quanto para

os que estão se reinventando neste novo contexto de produção. Penso que, no caso desta

pesquisa, mais importante que discutir se os blogs são ou não gêneros, buscando categorizá-

los e enquadrá-los, está a necessidade de observar de que forma as pessoas se servem deste

dispositivo de linguagem para se relacionar neste contexto. Acrescentaria que eles são

também, na qualidade de software, uma ferramenta para a editoração dos mais variados

gêneros. Assim, as postagens são, no meu conceito, o espaço onde se veiculam diversos

gêneros, que vão desde uma poesia até tutoriais ensinando as pessoas a costurar, por exemplo.

Já os comentários são, a meu ver, também gêneros distintos, que se assemelham muito aos

gêneros orais, tal como o debate. A grande diferença entre o leitor de jornais impressos e o

dos blogs é que estes são mais impelidos a dar sua opinião, uma vez que dispõem, inclusive,

de espaço para isso. Os comentários do leitor do jornal impresso, de sua vez, poderiam se dar

na presença de outra pessoa, nos monólogos silenciosos, ou nas cartas de leitores, por

exemplo.

Em contrapartida, para Marcuschi (2005, p. 29), os blogs são entendidos como um

gênero, mais especificadamente “como diários pessoais na rede; uma escrita autobiográfica

com observações diárias ou não, agendas, anotações, em geral muito praticados pelos

adolescentes na forma de diários participativos”. Ele ainda compara o blog ao e-mail,

Page 30: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

28

observando que naquele existe mais liberdade e menos preocupação com a pontuação e/ou

com os aspectos morfológicos. Acredito que Marcuschi tenha dado sua contribuição, mas

acaba não levando em consideração a amplitude que os blogs têm assumido na rede,

desconsiderando, por exemplo, outros tipos/funções que atualmente são possíveis e muito

usados tal como os blogs políticos, jornalísticos, para vendas, em meio a outras inúmeras

possibilidades.

O blog é observado como um gênero discursivo ou como um gênero híbrido também

por Komesu (2005), baseando-se nos construtos teóricos da Análise do Discurso de linha

francesa. Ela propõe um trabalho que busca compreender os efeitos de poder provenientes de

enunciados que são criados numa condição histórica que privilegia a exposição exacerbada da

intimidade no domínio público. Seus estudos são feitos a partir da aproximação de enunciados

intergenéricos para levar-nos às semelhanças, bem como os possíveis traços estilísticos do

gênero em apreço. A pesquisadora estabelece, portanto, que existe uma aproximação entre os

blogs e os diários íntimos. Porém, ressalta diferenças endossadas pelo contexto diverso de

produção (dos diários íntimos no século XIX e dos blogs, contemporaneamente), a saber:

enquanto os escritores de diários íntimos escreviam para a historização de si mesmos, os

blogueiros são impelidos a falar de si para os outros, com o intuito de se mostrar, de “fazer-se

ver e ser visto”, numa relação permeada pela instantaneidade mediada pelo computador. Por

isso, dentre algumas de suas constatações, Komesu afirma:

Acreditamos que as atuais condições de produção dos discursos fazem com que o modo de enunciação dos escreventes dos blogs esteja muito mais próximo ao do das páginas eletrônicas (home pages ou websites) pessoais da internet do que ao do modo de enunciação dos escreventes dos diários íntimos.

(KOMESU, 2005, p.155)

Em pesquisas posteriores, Komesu acrescenta que, embora muitos blogueiros sejam

movidos ainda pelo desejo narrativo do “eu”, com conteúdo temático ligado ao cotidiano, às

relações familiares e afetivas, o foco dos blogs atualmente está se voltando para as atividades

profissionais, para o marketing pessoal nas redes sociais e na monetização da informação

propagada na rede. Assim, também os microblogs, tais como o Twitter (que só permite

postagens de, no máximo, 140 caracteres), têm sido usados para divulgar, por exemplo, a

insatisfação de determinado grupo social ou nacional diante de aspectos políticos. Os

microblogs, assim como os blogs, constituem espaços discursivos em que se apresentam

Page 31: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

29

“efeitos de sentido (poder) resultantes das relações entre linguagem e novas tecnologias”.

(KOMESU, 2010, p. 345).

Quando observamos nosso objeto de estudo e suas várias facetas, no meu modo de ver,

podemos refletir mais atentamente para as limitações desenvolvidas no decorrer da

caminhada. Dessa forma, trago para o seio da discussão as pesquisas desenvolvidas na área

da Comunicação (PRIMO & SMANIOTTO, 2006; PRIMO, 2008), que tendem a observar os

blogs com outro olhar, que apontam que eles não são, necessariamente, ou tão somente, um

gênero discursivo, nem mesmo enunciados intergenéricos. Penso ser interessante

compreender, mesmo que sucintamente, como outras áreas, tal como a Comunicação ou

Jornalismo compreendem e ressignificam essas novas práticas de uso da linguagem, pelo

motivo de alargar um pouco nosso campo de visão acerca do mesmo tema.

Primo & Smaniotto (2006) são pesquisadores que elucidam claramente que o termo

blog pode fazer referência a um texto, a um espaço, mas também a um programa da internet.

Ele esclarece que, embora os programas como o Blogguer ou o Wordpress, exemplificando os

mais usados atualmente no Brasil, possam ajudar na produção e manutenção de um blog, eles

podem ser substituídos por qualquer programa, até mesmo os mais convencionais, para fazer

sites pessoais (os quais usam outras linguagens de programação como HTML, PHP, MySQL,

FTP, etc.). O pesquisador explicita, nesse diapasão, que:

Mesmo reconhecendo os condicionamentos da materialidade do meio, é preciso enfatizar que o blog/texto não é estritamente determinado pelo blog/programa. As ferramentas de blog normalmente não determinam um limite máximo de caracteres por post. Como o blog/programa não pode compreender o que é publicado (se trata- se de uma poesia, uma foto, ou um conjunto aleatório de caracteres), já que a semântica lhe é estranha, não pode impor que os posts sejam necessariamente curtos nem que sigam um certo gênero discursivo. Logo, as definições de blogs como publicação de microconteúdo ou como diário íntimo na Internet revelam suas limitações, pois relacionam um tipo específico de blog/texto ao uso do blog/programa.

(PRIMO & SMANIOTTO, 2006, p. 2)

Portanto, como bem descrevem os autores, essa possibilidade de agregação de todo e

qualquer gênero textual em um blog não o faz parecer necessariamente com os diários, antes

faz com que eles tenham mais características em comum com os sites pessoais, onde o usuário

“os recheia” com os mais variados gêneros, muitas vezes multimodais e multimidiáticos e

estabelece links com publicação que não são necessariamente de sua autoria. Isso sem contar

o papel fundamental dos comentários, que fazem parte do processo enunciativo, e que podem

ser considerados outro gênero, mas que estão dentro do blog, sendo característica marcante

Page 32: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

30

dele, e até muito mais interessantes para nossa pesquisa, ao passo que acreditamos residem

nos comentários boa parte dos processos reflexivos.

Também é interessante pontuar que, não raro, o conteúdo dos blogs acaba se

desvinculando de sua plataforma inicial e finda por fazer parte de outros espaços por meio dos

recursos de feed9, que podem ser compreendidos como pontos de agregação de informação

que circula na rede. O usuário, portanto, não precisa visitar o blog para ler seu conteúdo, pois

ele estará disponível, por meio desses recursos como os feeds (RSS10, por exemplo) em outros

lugares da rede.

Recuero (2003, apud PRIMO & SMANIOTTO, 2006), por sua vez, incorpora uma

tipologia um pouco diferenciada, que, a meu ver, apresenta uma caracterização um pouco

mais abrangente do universo da linguagem dos blogs, podendo ser:

a) diários, tratam basicamente da vida pessoal do autor; b) publicações, comentários sobre diversas informações; c) literários, os posts trazem contos, crônicas ou poesias; d) clippings, agregam links ou recortes de outras publicações; e) mistos, misturam posts pessoais e informativos, comentados pelo autor.” (RECUERO, 2003 apud PRIMO & SMANIOTTO, 2006, p. 3)

Já a definição abaixo, talvez, se revele mais esclarecedora. Acrescento entretanto que,

embora as postagens obedeçam a uma ordem cronológica, hoje, a maioria dos programas que

hospedam os blogs possibilita aos usuários mostrar o arquivo daquilo que já foi postado tanto

em ordem ascendente como descendente.

De modo geral, o “blog” ou blogue (em uma versão mais próxima à grafia portuguesa), é uma página comparada a um diário virtual, uma vez que apresenta registros freqüentes de informações, atualizados por meio de inserção de mensagens, mais conhecidas como posts, e cuja apresentação obedece à ordem cronológica ascendente (inicia-se a página pelo post mais atual). Os posts podem pertencer ou não ao mesmo gênero de escrita, fazer referência ao mesmo assunto ou ter sido escrito pela mesma pessoa ou por pessoas diferentes, isso vai depender de divulgação, interesse e aceitação do usuário proprietário do blog para publicação do comentário. O blog é caracterizado pelo tom informal e pela diversidade de temas que pode abordar. Como pode ser escrito por uma ou mais pessoas, costuma expressar uma gama ampla de idéias e opiniões. (RODRIGUES, 2008, p. 43)

9 Feed (vindo do verbo em inglês "alimentar") é um formato de dados usados para distribuir informação na rede no momento em que o conteúdo é atualizado. É frequentemente usado em sites de notícias ou blogs. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Feed. Acessado em 27 set. 2011. 10 RSS é um subconjunto de "dialetos" XML que servem para agregar conteúdo ou "Web syndication", podendo ser acessado mediante programas ou sites agregadores. É usado principalmente em sites de notícias e blogs. A abreviatura do RSS é usada para se referir aos seguintes padrões: Rich Site Summary (RSS 0.91), RDF Site Summary (RSS 0.9 e 1.0), Really Simple Syndication (RSS 2.0). Fonte: http://pt.wikipedia.org. Acessado em 27 set. 2011.

Page 33: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

31

Os blogs são, em meu entendimento, páginas na internet que se assemelham às home

pages comuns, porém o que os diferencia são aspectos como a facilidade de diagramação, a

gratuidade, o aspecto dinâmico, plástico, hipertextual e hipermidiático, uma vez que abrigam

além de texto, imagens, links, vídeos e músicas, por exemplo. Os blogs também dão o ensejo

ao visitante, ou aos seguidores, de poderem acessar todas as postagens e comentários que

foram feitos desde a sua criação, a partir do histórico das postagens, além de discutir o

assunto que esteja sendo veiculado (se assim permitido pelo autor do blog) com comentários.

O histórico das postagens se auto-organiza normalmente em ordem cronológica ascendente,

ainda que os sites que hospedam os blogs, atualmente, possibilitam aos blogueiros, como são

denominados os usuários dos blogs, inúmeras maneiras de dispor a informação. Os blogs

podem ser tanto individuais quanto coletivos, e os assuntos são tão variados quanto o desejo

de seus usuários. Embora, a princípio, o estilo e os gêneros dos textos produzidos tenham

certa proximidade com o diário íntimo, hoje, a pluralidade de funções, estilos e gêneros é algo

latente no universo dos blogs.

De posse dessas tentativas de definição, interessantes que são, pois ajudam os

pesquisadores a olhar com mais perspicácia seu objeto de estudo, ficam estas perguntas: como

usar os blogs no processo de ensino-aprendizagem de línguas? Como fazer isso na escola?

Como fazê-lo sobretudo na escola pública?

A escola tende a incorporar em suas práticas cotidianas as TIC11. Assim como outras

ascensões, (re)produções e disseminação de informação que tiveram como berço a internet, os

blogs estão sendo incluídos no processo de ensino-aprendizagem como ferramentas que

dinamizam o processo e possibilitam novas formas de interação e de trabalho. Isso se dá tanto

pela pressão social quanto pela necessidade de incluir nas aulas, práticas que satisfaçam os

anseios dos próprios estudantes, deixando-as em sintonia com as expectativas da classe

estudantil.

Podemos denotar certo incentivo governamental para que isso ocorra, especialmente

com as tentativas de massificação de laboratórios de informática ligados à internet nas escolas

públicas, como o proposto pelo Programa ProInfo do Governo Federal, ou com as políticas de

inserção desses laboratórios levadas a cabo pelos governos estaduais e municipais. Em

portais oficiais como Portal do Professor12, desenvolvido e monitorado pelo Ministério da

Educação e Cultura, observa-se uma tentativa de organização do material disponível na rede

11 Tecnologias de Informação e Comunicação. 12 http://portaldoprofessor.mec.gov.br

Page 34: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

32

para os professores. Também é pulsante a movimentação social e governamental em prol do

letramento digital, da inserção de grupos sociais na dinâmica virtual.

Segundo Paiva, (2010, p. 3), há uma tendência internacional para que as políticas

governamentais persigam a criação de redes digitais e a informatização. “Os governos no

mundo inteiro estão preocupados em possibilitar o acesso às tecnologias digitais a todas as

camadas das populações, especialmente no setor educacional.” Entretanto, como

posteriormente afirma essa pesquisadora, parece que os esforços governamentais

aparentemente não estão convergindo na apropriação de tecnologia por parte dos professores,

ao menos de maneira não tão rápida, tal como a sociedade e o governo parecem esperar.

Vale a pena ressaltar que esse descompasso entre os anseios da sociedade capitalista e

a apropriação da escola e dos professores de novas tecnologias e/ou novas formas de ensinar é

passível de ser relativizado. Baseada em Bax (2003), Paiva (2010) frisa que a apropriação das

novas tecnologias pelos professores se sucede processualmente, e oferece-nos até um

esquema dos estágios de normalização das tecnologias. Por isso, o uso dos computadores e de

suas ferramentas ocorrerá de maneira processual, mas não necessariamente com todos os

profissionais, muito menos ao mesmo tempo, uma vez que são vários os fatores que

concorrem para que essa normalização do uso ocorra.

[...] será inevitável a convivência com as tensões e ciclos concomitantes de adeptos iniciais, resistências, tentativas, medo ou veneração, normalização ou morte de uma tecnologia. Enquanto alguns professores já se apropriaram do Orkurt, Second Life, e Twitter para fins educacionais, a maioria ainda não tem blog nem página pessoal e mal usa o e-mail. Muitos demandam programas de capacitação e outros preferem se manter à margem das inovações. (PAIVA, 2010, p. 8)

Falando em exemplos práticos, se mergulharmos na rede, facilmente encontraremos

blogs de alunos e professores, tanto individuais quanto coletivos. Seja nas escolas seja nas

aulas dos professores que buscam aportar para o ambiente escolar, ferramentas como os blogs,

isso vem se caracterizando como uma prática corriqueira. Hoje, observamos, por exemplo,

blogs de professores que buscam expor na rede seu perfil, suas aulas, suas opiniões, suas

sugestões, enfim, um recorte de seu trabalho docente. Temos alunos criando blogs individuais

e coletivos, por “incentivo” do professor, para a apresentação e desenvolvimento de trabalhos

de pesquisa, para manter um portfólio de seu desenvolvimento intelectual, entre outras coisas.

Os blogs podem ser de uma disciplina específica ou transdisciplinares e acabam sendo uma

representação na rede de escolas, grupos sociais, grupos de alunos, grupos profissionais, em

meio a outros.

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33

Em decorrência dessa ânsia pelo uso das TIC em sala de aula, alguns estudos têm

contribuído para entendermos como e em que proporção essas novas ferramentas têm sido ou

poderiam estar sendo utilizadas em prol da melhoria do processo de ensino-aprendizagem, no

contexto brasileiro atualmente. Embora não sejam abundantes as pesquisas relacionadas com

o uso pedagógico dos blogs, já temos, no meio acadêmico, trabalhos que levam em linha de

conta as possibilidades do uso deles na ressignificação desse processo, tanto de língua

materna quanto de língua estrangeira.

Rodrigues (2008) é um bom exemplo disso. Partindo do pressuposto que os recursos

tecnológicos dos quais algumas escolas já dispõem não têm sido explorados a contento,

propôs duas tarefas de produção de texto, as quais utilizavam os blogs como lugar de

publicação. Assim, tal como Gomes & Lopes (2007), suas observações levaram-na a

compreender que, quando o professor formata o blog, centralizando seu uso, pedindo ao aluno

que simplesmente entre no blog e escreva o que o próprio professor propôs e delimitou, ao

invés de uma prática ressignificada, há um engessamento do cotidiano escolar.

Lanza (2007), por sua vez, utilizou o blog como material didático no ensino de língua

espanhola em sua pesquisa. Ela organizou uma tarefa que utilizava blogs pré-selecionados,

como fonte de informação. A autora criou um banco de blogs que possuíam textos ligados à

realidade social brasileira, aos temas transversais e que são, por natureza, autênticos. Ela

conclui que o blog é um ótimo material didático (se assim concebido), mas que, ao mesmo

tempo em que tem essa qualidade de ser atualizado, também é volátil, pois seus usuários

podem simplesmente deixar de atualizá-los, tornando-os inativos, ou até mesmo excluir sua

conta.

Na pesquisa de Kosikoski (2007), a qual envolve a ato de escrever em língua

estrangeira, o blog é tido, na representação dos alunos de língua inglesa do ensino médio e da

pesquisadora, como uma interface diferenciada e mais produtiva no quesito “interação”

durante o processo de escrita. A pesquisadora contrasta o ato de escrever em diferentes

“interfaces” propondo atividades de produção textual que tinham, como objetivo, preparar o

aluno para o mercado de trabalho. Quando essas atividades eram feitas na interface papel, as

dificuldades de escrita, conforme a pesquisadora, pareciam aflorar, enquanto que, usando o

blog como interface, os alunos experimentaram não só nova forma de interação entre eles,

mas entre os alunos e a ferramenta blog, e entre eles e a internet.

O trabalho de Gomes (2005) defende a ideia que blogs educacionais podem ser usados

tanto como ferramenta quanto como recurso e/ou também como suporte para a publicação de

textos. O blog educacional em seu caráter de ferramenta, é visto como aquele que abre uma

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34

dinamização dos processos de pesquisa, enfatizando o processo de filtragem e observação da

relevância da informação. Pode também, conforme a autora, ser apreendido na condição de

recurso, porque faculta a prática colaborativa, a criação de comunidades de aprendizagem e

certa descentralização da figura do professor no processo de ensino-aprendizagem. Pode,

ainda, ser simplesmente o suporte para a publicação de textos escritos na escola em práticas

de produção textual que não necessariamente se utilizam das outras possibilidades que o blog

proporciona aos seus usuários, podendo neste caso ser comparado a um mural virtual.

Observando toda essa movimentação das/nas redes sociais é que Fumero (2005)

sinaliza que os blogs são, entre outras ferramentas, marca fortíssima da tendência de

socialização da rede, o que, para ele, seria o primeiro passo para nos tornarmos a verdadeira

“Sociedade da Informação”, onde o ciberespaço não é considerado como algo para viver além

da vida cotidiana, mas como mais um espaço de desenvolvimento da experiência humana

social em sua totalidade.

Justapondo-se a este ponto de vista temos também Signorini & Cavalcanti (2010, p.

423) que apresentam algumas das perspectivas a serem observadas quando lidamos com

artefatos tecnológicos. As autoras apontam que é relevante, na pesquisa sobre os artefatos

tecnológicos, compreender este fato:

1- Eles são desenhados e construídos por pessoas13, portanto não são naturais, neutros, dados e, que eles são carregados, tal qual como qualquer uso linguístico, de interesses, valores, (pré) conceitos; 2- Sua materialidade é forjada e determinada dentro de um dado contexto histórico e social, fazendo-os desta forma, integradores de uma certa comunidade, de um certo discurso, marcado no tempo e no espaço; 3- São feitos a partir de uma multiplicidade de componentes, o que não os fazem uniformes, mas pelo contrário, frágeis e fragmentários. É necessário integrar e articular as suas diversas “peças”, para que eles funcionem14; 4- Reconfiguram-se o tempo todo, desde o seu “nascimento” até a sua alteração drástica, quando se transforma em outro artefato ou “desaparecem”. Essa característica mutável é dada pelo fato de que as tecnologias coexistem e coevoluem e, também porque inúmeras adequações e adaptações são criadas pelos usuários.

Portanto, quando observo o espaço dos blogs, vejo que eles são, por excelência,

criadores de e criados por comunidades discursivas15 na rede. Um espaço onde justamente as

13 Grifo meu. 14 Grifo meu. 15 Embora este não seja o enfoque do trabalho, penso ser importante balizar teoricamente dentro de quais termos trago a expressão Comunidade Discursiva (doravante CD). Um dos autores que é deveras citado em se tratando da locução CD é John Swales (1992), o qual inclusive propõe critérios para delimitar o que seria e o que não seria uma CD. Após inúmeras reformulações conceituais, Swales (1998, apud Lima, 2008a) estabeleceu que trabalharia com a expressão CD local, que compreenderia “um grupo de pessoas que trabalhariam juntas (embora nem sempre), possuindo geralmente um nome, consciência dos papéis designados a cada membro, um

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práticas sociais ocorrem. Sendo assim, eles não podem ser observados tão somente como um

“ponto de encontro” na rede, visto que, como bem pontuam as autoras supracitadas, a

materialidade linguística dos blogs só ocorre (e só poderia se dar) dentro daquele contexto

histórico e social, sendo forjada para tal.

Os blogs, também se exibem com chances de gerar resultados significativos no que

tange à qualidade dos textos produzidos, da quantidade de leituras feitas, do serviço de

pesquisa e seleção de fontes, enfim, de contribuir para o letramento digital dos alunos, desde

que haja um real e coletivo envolvimento dos sujeitos em sua produção. Rodrigues (2008), em

sua pesquisa, enfatiza que, além do trabalho com novas práticas de ensino, o que mais se

modifica nessa nova relação professor-aluno-escola-tecnologia ao usar blogs, por exemplo, é

que nós, professores, deixamos de ser o centro do processo, ou aquele para quem

(unicamente) se escreve e o qual avalia. Um novo perfil, o de professor orientador, o de leitor

críticos dos textos parece estar sendo requisitado pela nova prática social.

Acrescento que os blogs, de igual maneira, podem ser justificados nas aulas de língua

estrangeira, por atenderem a um dos grandes desafios enfrentados durante o processo de

formação docente dos professores de língua, que é a questão do uso da língua escrita

significativamente. Não bastasse, os blogueiros podem visitar e ser visitados por usuários da

internet que não pertençam necessariamente ao ambiente escolar, ampliando, assim, as

fronteiras do ambiente escolarizado, fazendo com que ele se aproxime do uso real da língua

na/pela sociedade em geral.

Embora ainda haja muita resistência da comunidade escolar e da sociedade em geral

quando o assunto é educação a distância e/ou em ambiente virtual, de certa forma elas têm

crescido, em decorrência do já exposto panorama histórico vivenciado por todos nós. Dados

de 2010 da Associação Brasileira de Educação a Distância relatam que já são mais de 200 as

instituições que oferecem cursos e, mais de dois milhões de alunos matriculados16. A

educação a distância cresce significativamente em nosso país. Em adendo, a busca por uma

conjunto de gêneros, ritmo de trabalho e vocabulário próprios e uma consciência de sua história”. Finalmente, Lima (2008b), em estudos sobre blogs e CD, propôs um realinhamento da teoria swalesiana, defendendo os seguintes termos: CD global seriam “redes sóciorretóricas amplas formadas a partir de múltiplos subgrupos organizados hierarquicamente e interelacionados entre si por um ou mais objetivos, gêneros, valores e léxico comuns”. Já uma CD local seria “um grupo menor pertencente a uma comunidade com quem compartilha objetivos, valores, léxico e gêneros, mas que no entanto apresenta em sua constituição traços próprios relativos a essas categorias, o que identifica como um grupo menor formado a partir de objetivos, valores, léxico e gêneros específicos, podendo também ter uma hierarquia própria, sempre situando-se no todo hierárquico maior da comunidade global a que pertence”. Desta forma, alio-me ao conceito reformulado por Lima e me baseio nele ao compreender o blog Reflection in Action como uma CD local e também global. 16 Fonte: Censo ead.br / organização Associação Brasileira de Educação a Distância Disponível em <http://www.abed.org.br/censoead/CensoEaDbr0809_portugues.pdf>. Acessado em 25 nov. de 2011.

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formação docente alicerçada na colaboração em rede tem sido algo almejado, tanto por quem

trabalha com esse segmento educacional quanto por quem trabalha com o ensino presencial.

Zulian (2003) já considerava que as TIC tinham um potencial afirmativo na formação

docente, ao passo que possibilitam ressignificações das metodologias utilizadas no processo

de aprendizagem, das relações interpessoais, bem como do papel da universidade neste

contexto. Entretanto, ainda são inúmeras as dúvidas que pairam no ar quando o assunto é a

formação de professores diante dos desafios da dita pós-modernidade. Eu adiciono a estas

perguntas: como os blogs poderiam ajudar nessa empreitada?

Reichmann (2009) descortina um interessante estudo relativo a narrativas de formação

em blogs reflexivos, relatos e diários na formação de professores de língua estrangeira.

Conforme a autora, o espaço do blog foi capaz de proporcionar aos professores em formação

uma ressignificação de objeto de estudo e de si mesmos, pois permitiu-lhes reposicionar-se

em sua própria história narrada. Nesta pesquisa, a autora também observou que as postagens

(as quais foram escritas em língua materna) favoreceram o processo de ensino-aprendizagem

de língua estrangeira, revitalizando o ensino presencial e a sala de aula, pois construíram

significados e ampliaram o lugar do aluno neste contexto específico.

Já Machado (2008), em sua pesquisa sobre a formação de educadores e o uso de blogs,

compreendeu que é importante, quando trabalhamos e/ou produzimos blogs de cunho

educacional, redigir as postagens e/ou os comentários com “bases de argumentação, troca de

ideias, experimentação, ousadia [sem temer os riscos], interpretação, análise, crítica, síntese e

proposição de hipóteses que sejam perenes” (idem, p.103). Conforme o autor, o conteúdo

discutido no blog fará parte de uma grande base de dados e se tornará referência na internet,

podendo ser acessado por mecanismos de busca como o Google, por exemplo. Por esse

motivo, o pesquisador advoga que os educadores ainda carecem de esclarecimentos,

informações e de um uso mais corrente das tecnologias, evidenciando que a própria internet

pode ser um canal de formação continuada, de busca e de trocas de experiências relevantes.

A pesquisa desenvolvida por Fonseca (2009) investigou a relação dos professores

com os blogs, enfatizando as dificuldades mostradas por eles, além de observar o

relacionamento dos ainda alunos com a ferramenta. Dentre suas averiguações, Fonseca aponta

a falta de estrutura física tecnológica da escola pública brasileira que, mesmo tendo

laboratórios de informática, em virtude da falta de manutenção e de técnicos de suporte,

acabam por se tornar sucata e inviabilizar o trabalho de professores e alunos interessados em

se inserir no ambiente digital.

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37

A autora supracitada também tece crítica a programas de formação digital, como o

caso do ProInfo, mantido pelo Governo Federal. Ela o considera um projeto insipiente, uma

vez que, mesmo tendo como objetivo equipar 100% das escolas básicas com laboratórios de

informática, não capacita os professores (acentuando que ela observa que muitos também não

buscam sua capacitação), nem dá suporte técnico especializado para a manutenção desses

laboratórios. O Brasil parece ter longo caminho a percorrer no que tange à informatização das

escolas e à inserção da comunidade no ambiente digital.

Outra observação de Fonseca, que cabe inclusive à nossa proposta de blog

colaborativo, é que as práticas de inserções de Processos Imperativos17 num blog que busca

ser colaborativo “destoam da proposta e acabam por afastar os alunos” (idem, p.117). O

professor tem que ter uma postura pró-ativa. De nada adianta, na opinião de Fonseca, termos

blogs educativos que não proporcionem a interação, as buscas, as descobertas. Caso contrário,

teremos blogs/livros didáticos no velho estilo “donos da verdade”, que de nada se parecerão

com a proposta criada pelos grupos sociais que a princípio os desenvolveram e os utilizam

contemporaneamente.

Atentando para as pesquisas e para a produção teórica que vem sendo desenvolvida

sobre o assunto blogs em diversas universidades, fica clara a preocupação em perceber como

essa ferramenta pode ser incorporada em sala de aula de língua materna e língua estrangeira,

pontuando que o objetivo mais recorrente parece ser este: envolver o uso de blogs com a

prática de escrita para alunos de ensino médio. Porém, são ainda raras as pesquisas que dão

conta dos blogs como promotores de um ensino mais reflexivo e colaborativo. Esta pesquisa

se torna válida, uma vez que buscará averiguar como os blogs podem ser uma ferramenta

utilizável na formação de professores de línguas, trabalhando tanto o uso/aprendizagem da

própria língua estrangeira quanto proporcionando um ambiente em que através da

colaboração, os envolvidos poderiam estar ressignificando o conhecimento e pondo em

prática posturas mais reflexivas e críticas.

Para ter um pouco mais de clareza acerca dessas representações e da influência dos

blogs educacionais como catalisadores de processos reflexivos e do desenvolvimento de uma

postura crítica, é necessário também observar que as práticas em sala de aula fazem parte da

formação do sujeito-professor, mas não são as únicas responsáveis pelo processo. Por isso,

devemos levar em consideração que, quando os professores em pré-serviço chegam a seu

17 De acordo com a Gramática Sistêmico-Funcional, baseada em Halliday (2004), as ações são trocas linguísticas que podem ser mapeadas, e elas nos permitem investigar a maneira como os envolvidos com a interação expressam suas atitudes, ou seja, como processos imperativos, declarativos e interrogativos, por exemplo.

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curso de graduação, carregam muitos conceitos pré-estabelecidos em relação, por exemplo, à

escola pública e ao ensino de línguas. Isso se dá pela própria vivência que eles provavelmente

tiveram neste contexto e é reforçada pelas vozes sociais, a exemplo da mídia, e pelas crenças

ou representações18 de seu ambiente cultural. Por sua vez, os blogs educacionais podem se

constituir um ambiente que pode favorecer aos alunos contato com diversas opiniões acerca

de um assunto em pauta.

1.2 Segundo canteiro: cultivando o profissional crítico-reflexivo

Crer na prática reflexiva no fazer docente é acreditar que essa postura traz melhoria

para o processo de formação do professor e também para o processo de ensino-aprendizagem

em geral, e que ambos não se dão pelo simples acúmulo de teorias, mas sim a partir de um

processo de reflexão sobre a prática e os construtos teóricos em uma constante reformulação

deles (SCHÖN, 1995; NÓVOA, 1995).

Libâneo (2010, p. 62), por sua vez, assevera que essa preocupação com a reflexão em

sala de aula não é um fenômeno tão contemporâneo, uma vez que em diversos outros autores,

como Dewey, Schön, Vigotsky e Piaget, há uma clara preocupação de que é (ou deveria ser) o

papel da escola desenvolver o pensar, já que essa capacidade pode ser aperfeiçoada e

estimulada para o empoderamento dos sujeitos. Mas, ao mesmo tempo, o autor observa que a

reflexão docente, tal como tem sido apreendida na época moderna, foi concebida em berço

iluminista, tendo crença na supremacia da razão e no potencial reflexivo como um ato

intrínseco, ou seja, nato ao ser humano. Acrescento ainda que, em muitos casos, as correntes

teóricas que discutem a reflexão docente acabam por desconsiderar as forças sócio-histórico-

ideológicas nas e pelas quais a sociedade se constrói.

Libâneo (2010) aponta para o fato de que entre as versões para o termo reflexão,

distinguem-se a visão idealista, a prática e a dialética. Na idealista, o sujeito é autorreflexivo e

se orienta a uma nova prática que muda sua realidade. Na visão prática, ou pragmática, o

sujeito está centrado em pensar a experiência prática e, assentado nisso, definir como serão as 18 Embora esta não seja a discussão desenvolvida neste trabalho, acredito ser importante expor em que termos utilizo as palavras crença e representação, pois são dois conceitos amplamente discutidos pela Linguística Aplicada. Sigo a partir deste momento em meu texto o que conceitua Barcelos (2006, p.18) sobre o termo crença: “como uma forma de pensamento, como construções da realidade, maneiras de ver e perceber o mundo e seus fenômenos, co-construída em nossas experiências e resultante de um processo interativo de interpretação e ressignificação. Como tal, crenças são sociais (mas também individuais). Dinâmicas, contextuais e paradoxais”. Enfatizo que utilizo ambos os termos, crença e representação, como sinônimos.

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próximas. Já na concepção dialética, a realidade é entendida como uma construção teórico-

prática, que é captada com base em nossa experiência, a qual é notadamente subjetiva. Por

isso, antes mesmo da reflexão exercida pelo sujeito, há uma realidade dada, que independe de

minha reflexão, e outra, essa, construída pelo sujeito, tendo como alicerce a reflexão. Pelo

caminho dialético de compreender reflexão, o autor ainda pontua que essa concepção pode

desencadear em uma postura crítica emancipatória ou num viés que, além de ser crítico, leva

em consideração que também a reflexão agasalha as suas próprias limitações, inerentes a este

trabalho intelectual. “[...] a chamada teoria crítica acentua o caráter político da teoria em relação à prática, pois o conhecimento teórico tem a função de operar o desvendamento das condições que produzem a alienação, as injustiças, as relações de dominação. Mas esse conhecimento precisa ser crítico, implicando uma auto-reflexão sobre si próprio, seus compromissos e seus limites.” (LIBÂNEO, 2010, p. 57)

Sacristán (2010) corrobora essa explicitação das tendências investigativas na formação

de professores ao incitar a discussão sobre as grandes correntes teórico-pedagógicas que

influenciaram e influenciam o que se entende por reflexão docente. Para o autor, há uma

vertente pós-positivista e uma pós-weberiana. Retomando o que fora em outro passo exposto,

convém lembrar que, num dado momento histórico, político e social, há uma tendência que

prevalece. Contudo, conforme o autor, ambas as tendências têm caminhado desde seu

surgimento na modernidade, até contemporaneamente, com o objetivo de intelectualização e

reestruturação do processo produtivo para o empoderamento dos sujeitos, ou seja, o que era e

ainda é necessário, afina com flexibilidade profissional.

Assim, Sacristán compreende que, entre as teorias pós-positivistas, ou neoliberalistas,

estariam as de cunho behaviorista, que posteriormente vieram a ser chamadas de cognitiva e

cognitivista. Dentro dessa linha, conforme o autor, estão Dewey e Scho�n.

Já a pós-weberiana, baseia-se na teoria marxista/neomarxista, a qual, conforme

Sacristán, busca o conhecimento usando lentes políticas. Essa visão leva em conta que a

ciência social é construída baseada na subjetividade do pesquisador, de seus interesses. Ele, o

pesquisador, seleciona, conforme sua realidade complexa e caótica, elementos para montar

seu “tipo ideal” e então poder trabalhar com ele.

Dessa forma, podemos observar que a preocupação em formar profissionais que

atuassem de maneira reflexiva não é algo tão recente nas discussões acadêmicas, nem

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tampouco consensual, uma vez que na década de 30, nos Estados Unidos, igualmente no

Brasil e na Europa, já a partir da década de 70, esse assunto esteve em pauta de discussão.

Pimenta (2010) argumenta que houve uma preocupação exacerbada sobre esse tema

no meio acadêmico brasileiro após a década de 90. Ela constata que isso acorreu após a

publicação do livro Os professores e sua formação, coordenado pelo professor português

Antônio Nóva, (1992), obra cujos textos se devem a autores europeus e norte-americanos. A

pesquisadora aponta para o fato de que, por questões contextuais, o tema obteve na época um

terreno fértil em nosso país, por inúmeros motivos, entre eles as preocupações do governo

com a formação docente (o que já estava, inclusive, nas leis e propostas para a educação), o

crescimento dos cursos de pós-graduação no país e com eles a pesquisa e as (re)organizações

e (re)valoração tanto do papel da escola quanto do professor nas transformações

socioeconômicas e políticas da sociedade. Após um tempo de efervescentes discussões, não

somente no Brasil mas principalmente no ocidente, as discussões acadêmicas acabaram por

guiar-se por caminhos tão diversos, que tal como avalia Rodgers (2002, apud ZEICHNER,

2008), tornaram-se tudo para todos e acabaram perdendo sua visibilidade.

Se bem assim, muitos trabalhos de pesquisa relacionados com a prática e com a

formação docentes com ênfase reflexiva têm sido desenvolvidos nos últimos anos em nosso

país, entre os quais cito Assis-Peterson & Silva (2010), Freire (2009), Geraldini (2003),

Liberali (1994; 1999), Magalhães & Celani (2005), Melão (2001), Moita-Lopes (1996),

Oliveira (2008) e Pimenta (2010). Penso que, de antemão, é interessante ressaltar que, embora

sigam diversas tendências, percebo que, em sua maioria, os pesquisadores dessa área fazem

esforços em no mínimo dois sentidos que se entrecruzam na caminhada. Primeiramente,

dialogam em busca de compreender o que é a reflexão e como ela funciona. Posteriormente,

discutem como as pesquisas e a universidade em si (dentro da formação inicial e também da

continuada) podem contribuir de forma mais eficaz na valorização de uma cultura reflexiva no

meio educacional, asseverando quanto essa prática pode(ria) ser útil neste contexto.

Ao propor uma retomada histórica, penso ser John Dewey, provavelmente, um dos

autores mais citados quando o assunto é reflexão. Ele foi um dos educadores que, já no início

do século passado, começou a se preocupar com aquilo que denominou de extremos da

educação de seu país, Estados Unidos. Mas, afinal, quais foram as angústias que fizeram este

tema aflorar em seus estudos? Para ele, alguns dos extremos que ocorriam em seu contexto

eram ou centralizar a educação nos programas, o que era tido naquele momento como

pedagogia tradicional, ou, focar na criança, que era concebido como algo “romântico”. Sua

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proposta árdua, portanto, era a de “reincorporar os temas de estudo na experiência” (DEWEY,

1902, p. 285).

Para embasar sua teoria, na obra Como pensamos (DEWEY, 1933), o autor discute,

entre outras coisas, que existem diferenças entre o ato rotineiro e o ato reflexivo. Para ele,

pautar-se em uma prática rotineira seria não questionar, aceitando passivamente as ordens

dadas pelas autoridades, ou seja, ser impulsivo e acrítico. Já o sujeito reflexivo seria aquele

cuja postura fosse questionadora, na qual, a partir de suas próprias crenças, encontraria a

solução racional e lógica para os problemas vivenciados.

Por isso, em sua concepção, as escolas deveriam passar por uma reconstrução

completa, dado que elas se tornariam instrumentos de democratização radicais da sociedade

norte-americana da época. Paradoxalmente, o próprio Dewey admitia que essa seria uma

tarefa hercúlea, uma vez que “o sistema escolar sempre esteve em função do tipo de

organização da vida social dominante”(DEWEY, 1896, p. 285).

Uma das maiores críticas instituídas ao idealismo de Dewey (WESTBROOK, 2010, p.

31) foi justamente a de que ele considerava a escola uma instituição apolítica, desvinculada do

restante da sociedade e que pudesse funcionar como um oásis democrático. Mas,

posteriormente, quando toma consciência de seu próprio pesadelo, assume que sua proposta

de fazer educação não poderia ser aplicada em situações onde houvesse relação de poder ou

desigualdade democrática.

[...] assume-se que o objetivo da educação é habilitar os indivíduos a continuar sua educação- ou que o objetivo ou recompensa da aprendizagem é a capacidade de desenvolvimento constante. Entretanto, essa idéia não pode ser aplicada a todos os membros de uma sociedade, mas apenas quando a relação de um homem com o outro é mútua e existem condições adequadas para a reconstrução de hábitos e instituições sociais por meio de amplos estímulos originados da distribuição equitativa de interesses. Isso significa sociedade democrática.

(DEWEY, 2007, p. 11)

Posso observar que, mesmo sendo a preocupação inicial do autor reincorporar os

temas de estudo da experiência de forma democrática, fazendo em suas experiências que os

alunos dividissem e participassem da reformulação de projetos com toda a comunidade

escolar, isso pode ter significado certas mudanças na técnica ou nos métodos de ensinar, mas

não necessariamente nos objetivos da educação proposta. Embora a maneira como as

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atividades se sucediam fosse aparentemente mais democrática, elas não tinham um viés

crítico19.

Diante do fazer pedagógico proposto por Dewey, o professor também deveria ser

alguém que refletisse sobre sua prática constantemente, na esperança que isso trouxesse de

maneira natural, o desenvolvimento de seu pensamento e de suas ações. Ainda que o trabalho

do autor tenha trazido muitas contribuições para a educação, tal como questionar o

extremismo metodológico e curricular, ele desconsiderou as relações de poder existentes no

ambiente escolar, as contribuições da ciência e o desenvolvimento da criticidade, fazendo

com que suas preposições fossem taxadas, no mais das vezes, como tecnicistas.

Inspirado em boa parte na filosofia deweydiana, Donald Schön propôs em suas obras

O profissional Reflexivo (SCHÖN, 1983) e Educando o profissional Reflexivo (SCHÖN,

1987) discutir de certa forma as mesmas angústias de Dewey, ou seja, o extremismo na

maneira de ensinar o conteúdo. Para Schön, quando há uma supervalorização do

conhecimento sistemático, ou científico, recheado por um currículo normativo que separa a

pesquisa da prática, há a tendência que a escola, em especial as escolas profissionais,

sacrifique o talento dos alunos e a relevância do conteúdo. Diante disso, ele desenvolve o

paradigma do profissional reflexivo, não necessariamente professores, mas de qualquer

profissional em geral. Ele buscou, assim, contestar a crença de que a ciência traria respostas

para tudo e valorizou a prática e a reflexão-na-prática como as responsáveis pelo

desenvolvimento do talento artístico dos profissionais e pela capacidade de solução de

problemas.

É interessante verificar que quando em 1983, Donald Schön publicou O profissional

reflexivo (SCHÖN, 1983) houve uma (re)emergência do tema reflexão, justamente quando o

interesse sobre esse assunto passou a ser pauta aqui no Brasil, sejam exemplo os estudos de

Paulo Freire (FREIRE, 1970), e na Europa, com Jurgen Habermas (HABERMAS, 1981a e

1981b). Isso se deve, de certa forma ao momento histórico (década de 60, 70 e 80) que foi

sacudido pelo questionamento e discussão de vários paradigmas vigentes, dentre eles o da

ilusão de que a ciência, em termos cartesianos e positivistas, teria respostas para todas as

ações racionais. Scho�n (2000) exemplifica que uma das angústias vivenciadas por ele e por

seus colegas professores era a de que eles sabiam como ensinar as pessoas a construit navios,

19 Penso que devemos relativizar esse fato, até porque acredito que o próprio impulso da teoria reflexiva de Dewey tenha sido fomentado com base nas necessidades sociais do momento histórico que seu país atravessava, momento este, em que o sistema capitalista já se estabelecia e requeria que seus profissionais perseguissem novas e melhores formas de fazer o que já faziam, sem necessariamente discutir para quê ou para quem faziam.

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mas não a saber quais navios construir. Acredito que, hoje, deveríamos adicionar ao

questionamento, o porquê e o para quem construir estes navios.

Schön propõe (já em 1983 e rediscute o tema em 1987) uma epistemologia da prática

baseada na reflexão-na-ação. O profissional aprenderia fundado na análise e interpretação de

sua própria atividade no momento em que ela estava acorrendo. Esse momento é tido como

crucial pra Schön, pois seria nessa situação que “nosso pensar serve para dar nova forma ao

que estamos fazendo, enquanto ainda o fazemos. Eu diria, em casos como este, que

refletimos-na-ação” (SCHO�N, 2000, p. 32). Seria através desse tipo de reflexão, de análise e

de problematização, levando em consideração o conhecimento tácito presente nas soluções

propostas pelos profissionais, que se constrói, do ponto de vista do autor, o conhecimento, o

qual se revelaria através da ação, e não deveras verbal, ou por meio de explicações científicas.

O autor ainda explicita que a reflexão sobre a ação, ou seja, pensar retrospectivamente

sobre o que fizemos, a fim de descobrir e verbalizar de que forma nosso ato de conhecer-na-

ação poderia ter contribuído para o resultado inesperado não teria nenhuma conexão com a

ação presente (SCHO�N, 2000, p. 32).

Teríamos uma terceira opção: seria a de sermos capazes de refletir sobre a descrição

resultante da reflexão sobre a ação. Schön é mais afeito à primeira opção de reflexão, mesmo

que enxergue que seria uma idealização acreditar que isso se daria de maneira tão clara e de

fácil interpretação.

Consideraremos que os estudantes devem aprender um tipo de reflexão-na-ação que vai além das regras que se podem explicitar – não apenas por enxergar novos métodos de raciocínio, como acima, mas também por construir e testar novas categorias de compreensão, estratégias de ação e formas de conceber o problema. (SCHO�N, 2000, p. 41)

A principal crítica que teço em relação à maneira como Schön entende o processo

reflexivo, é que ele olha esse fenômeno como se fosse algo que não partisse de nossas

experiências, tanto quando trata da reflexão-na-ação ou da reflexão sobre a ação, ou, até

mesmo, a própria reflexão sobre as descrições resultantes da reflexão sobre a ação. O autor

não vê a reflexão como construções simbólicas. Nessa esteira, é provável que o talento

artístico necessário nas situações adversas parece surgir do nada, como se fosse algo

inaugural, e que verbalizar isso poderia trazer até prejuízos ao ato “inventivo” do sujeito. O

autor, igualmente, deixa de considerar a linguagem como a ferramenta psicológica que

organiza e constitui os sujeitos. Se consideramos os preceitos vygotskianos e bakhtinianos

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44

sobre a organização dos discursos como o fator que determina as relações entre os indivíduos

engajados em qualquer tipo de interação, observaremos que, verbalizando ou não sua

reflexão, parando fatidicamente ou não para fazê-la, os sujeitos estarão em constante

reformulação de suas experiências e em uso daquilo que já está internalizado, e isso se dá por

meio da linguagem, novamente, explicitada ou não no momento em que ocorre.

Perrenoud (2002, p.38) problematiza essa mesma questão, baseado no que Piaget

chama de estrutura ou esquema da ação. Ele enfatiza que tanto nossos gestos como nossas

operações intelectuais (que se aplicam mais às representações e símbolos do que os objetos

em si) são progressivamente interiorizadas. Dessa forma, não inventamos nossos atos, tanto

“concretos” quanto “abstratos” a todo o momento. Mas sim fazemos variações em uma trama

bastante estável.

A questão pertinente, portanto, não está no fato de fazermos ou não essa

“verbalização”, ou fazermos isso durante ou depois, mas em compreender que, dentro dos

padrões da racionalidade técnica, é considerado competente o profissional que não foge aos

padrões de investigação e ação, ou seja, aquela pessoa ou que segue o manual ou que

consegue descrevê-lo. Este padrão passivo, tal como pondera Mateus (2010, p. 29), tem

perdido força ante as necessidades dos processos de globalização ou de neoliberação. Hoje,

acredito que haja uma busca por um fazer profissional calcado na reflexão e na aceitação da

complexidade. Assim, apostar na reflexão como válvula de escape na resolução dos

problemas é a maneira que temos para suprir as necessidades de nossos tempos, cujas

situações são muitas vezes incertas, únicas e conflituosas. Por isso, reflexão pode ocorre

antes, durante ou num momento posterior à ação.

Perrenoud (2002, p. 32) também questiona a viabilidade e a praticidade dessas

distinções, recorrendo principalmente ao fato de que a divisão entre o que seja pensamento e o

que seja reflexão é algo que muito se discute, mas que pouco se conclui. Dessa forma, ele

compreende que “refletir na ação é o mesmo que refletir, fugazmente, sobre a ação em curso,

sobre seu ambiente e seus limites e seus recursos”. Percebe-se, portanto, que para esse autor

essa distinção é infrutífera ou que ela nem mesmo existe.

Mas, então, qual seria a necessidade de formar professores que tenham uma prática

reflexiva e/ou que possibilitem momentos de reflexão durante suas aulas? Pimenta (2010)

acredita que a superação, ou seja, a tomada de consciência sobre a própria prática advém de

teorias que levem o profissional docente a compreender as restrições impostas pela prática

institucional e histórico-social ao ensino, de modo que se identifique o potencial

transformador dessas práticas.

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45

A compreensão dos fatores sociais e institucionais que condicionam a prática educativa e a emancipação das formas de dominação que afetam nosso pensamento e nossa ação não são espontâneas e nem se produzem naturalmente. São processos contínuos de descoberta, de transformação das diferenças de nossas práticas contemporâneas. (PIMENTA, 2010, p. 28)

Diante disso, uma das formas de compreender o termo reflexão, em especial a que nos

motiva a uma observação mais crítica do cotidiano, é pensá-la como uma maneira de o

professor compreender seu papel social, bem como o papel da escola na manutenção ou na

mudança do status quo. É também uma maneira de buscar estar sempre reconstruindo e

reformulando seu fazer pedagógico e seu conhecimento.

O que é então reflexão, e como ela poderia ocorrer de maneira consubstancial?

Primeiramente, penso que dentre todas as discussões acerca do tema, percebo que houve, de

maneira simultânea a e profunda, um desgaste no que se refere a entender reflexão como algo

passível de ser “industrializado, ou mecanizado” no fazer dos professores. Digo isso porque a

maioria das críticas tecidas a esses métodos/metodologias buscavam salientar que, mesmo que

o professor esteja de posse de “receitas” e treinado para o uso dessas técnicas, isso não é, de

modo algum, viável em todos os contextos, para todos os sujeitos e muito menos algo que se

faça sozinho, tal como explicita Bourdieu (1980), quando trata de uma orquestração dos

habitus, ou Fullan (2009), por exemplo, quando crê, por exemplo, nos processos de mudança

no meio educacional como algo coletivo que demanda tempo, vontade e organização.

Compreendo que ela ocorre como um habitus20, tal como defende Perrenoud (2002, p.

44). Para o autor, a postura reflexiva e o habitus correspondente a ela não se constrói de

maneira espontânea. Se quisermos que o professor tenha uma postura reflexiva precisamos

desenvolvê-la sob a condição de uma construção linguística, uma prática que cultiva uma

identidade particular. O profissional reflexivo tende a estar em constante auto-observação,

autoanálise, questionamento e experimentação, para que, enfim, ele possa sentir o prazer (ou o

desprazer) de compreender mais a fundo seu fazer pedagógico, bem como suas implicações.

Seria o ideal que o professor se tornasse o investigador de sua própria prática, assim

como defende Liberali (2010, p.10), que, alicerçado em sua vivência e ao mesmo tempo em

que a investiga, promovesse uma mudança gradual, planejada internamente, em harmonia

20 De acordo com Bourdieu, podemos denominar habitus o conjunto de esquemas que uma pessoa dispõe em um determinado momento de sua vida. O habitus é definido como “um pequeno grupo de esquemas que permitem gerar uma infinidade de práticas adaptadas a situações que sempre se renovam sem nunca se constituir em princípios explícitos” (BOURDIEU, 1972, p. 209).

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com o sistema e adaptável ao meio. Todavia, idealizar esse processo é algo perigoso. Não

podemos esquecer que o professor também está inserido na trama social. Seria contraditório,

diante das exigências e das condições atuais do professorado brasileiro, acreditar que isso

poderia se dar de maneira harmoniosa. Desconsiderar o conflito existente é deixar de lado o

próprio construto teórico que defende que todo signo é ideológico e que a escola está inserida

na trama social como qualquer outra instituição.

Nessa mancha, propõe Giroux (1997) que simplesmente refletir sobre o trabalho

docente em sala de aula não dá aos professores insumo suficiente para compreender os

inúmeros elementos que condicionam as práticas sociais nesse ambiente. Doutro modo

dizendo, não podemos deixar de levar em consideração que a prática social reflexiva é

também produto do contexto social e histórico.

Portanto, é também passível de discussão acreditar que uma postura reflexiva poderia

gerar um grupo de educadores com características homogêneas, sincronizadas e

sistematizadas, enfim, “ideais”. Refiro-me a essa problemática porque acredito que não

podemos buscar na reflexão uma linha de montagem. Bem pelo contrário, ela tende a trazer,

em meu pensar, constantes reconfigurações e rediscussões do já aí, propondo a

desnaturalização das práticas sociais e da linguagem.

Percebe-se, então, grande diferença entre o discurso pretendido pela orientação

positivista e, como bem explicita Sacristán (2010), pela “realidade flagrada pelo pós-

weberiano e as políticas de privatização”. E, dentro desse feixe de possibilidades, o autor

defende que deveríamos compreender que o pensamento (consciente) do professor não se dá,

necessariamente, pela ciência, mas que a ciência pode ajudá-lo a pensar, sem que isso

determine, certamente, algum tipo de modificação em seu pensamento e em sua maneira de

fazer. Por fim, ele ainda pontua que “é muito importante atender às raízes culturais das quais

se nutrem os professores, para entender como atuam e por que atuam e como queremos que

atuem”.

Por isso o autor em outra passagem defende que, além de implementar as ferramentas

pedagógico-didáticas para melhorar e potencializar o “pensar” dos docentes, temos também

que instrumentá-los teoricamente para que busquem fazer uma leitura crítica da realidade.

É preciso associar o movimento de ensino do pensar ao processo de reflexão dialética de cunho crítico. Pensar é mais do que explicitar e, para isso, as instituições precisam formar sujeitos pensantes, capazes de um pensar epistêmico, ou seja, sujeitos que desenvolvam capacidades básicas em instrumentação conceitual que lhes permitam mais do que saber coisas, mais do que receber informações, colocar-se frente à realidade, apropriar-se do momento histórico de modo a pensar historicamente essa realidade e reagir a ela.

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47

(SACRISTÁN, 2010, p. 72)

Partilho, diante do acima exposto, as contribuições de Magalhães & Celani (2005):

para elas, é necessário preparar o terreno para que os processos reflexivos ocorram. Elas

consideram crucial construir ou estabelecer um contexto, organizar os discursos.

Resumidamente, munir esses profissionais de uma bagagem teórico-filosófica _

preferencialmente que leve em consideração as implicações sociais e históricas das escolhas

de cada profissional _ para que, a partir disso, os professores tenham a possibilidade de

observar e questionar com mais nitidez seu próprio fazer, suas verdades, suas representações e

também as dos outros.

Acima de tudo, pensar reflexão-crítica como algo que possa se dar ao natural, sem que

haja esforços de instrumentalização, formação teórica, ou ainda, como algo que possa ser

desvinculado do plano político, histórico e ideológico, acaba por gerar resultados insossos

caricaturando o professor de maneira muito desagradável. Se ele não se apresenta com uma

postura reflexiva, é o culpado; se desconhece as relações de poder estabelecidas, é a vítima do

sistema.

Alicerçado nesse choque de tendências que autores como Engestro�m (1999),

Contreras (1997) e Gimenez (1999) relutam contra o imediatismo, o individualismo, a falta de

conteúdo, a desconsideração do contexto social e das várias possibilidades de compreender o

tema. Também refutam a promoção de ideias tais como a de que ação e pensamento são de

todo conscientes, a desvalorização da teoria, a desconsideração da ideologia e o

desmerecimento do trabalho coletivo e crítico. Quer dizer, em suma: os autores discutem que

devemos, antes de tudo, atentam para o seguinte: refletir para quê? Para quem? A favor de

quê? Buscando o quê? E em quais condições?

Ao transformar o mundo social e natural, o homem transforma a si mesmo, e o objetivo último dessa transformação é a supressão de suas carências, quaisquer que sejam. O educador não pode deixar de envolver-se nessa questão. Sua atividade profissional envolve aspectos políticos, econômicos e sociais e, mais do que isso, tem uma dimensão ética, cuja legitimidade está ligada a esses fins. A prática educativa sempre traz em si uma filosofia política, tenha o educador consciência disso ou não. (FERREIRA, 1993, p. 5)

Nesse momento, faz-se necessário pontuar que o processo de reflexão, por si só, pode

tanto favorecer a manutenção do status quo e a desigualdade social quanto formar um cidadão

que perceba a língua como a que é constituída, mas que também estabelece as relações de

poder, e ele como um sujeito que faz parte desse sistema. Se o próprio professor não consegue

perceber que, em sua sala de aula, as relações sociais se entabulam como em qualquer outro

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48

lugar na sociedade, ele nem sequer terá a possibilidade de analisar seu microcosmos, quanto

mais promover práticas emancipatórias.

A prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer (...). Por isso, é fundamental na prática da formação docente, que o aprendiz de educador assuma que o indispensável pensar certo não é presente dos deuses nem acha nos guias de professores que iluminados intelectuais escrevem desde o centro do poder, mas, pelo contrário, o pensar certo que supera o ingênuo tem que ser produzido pelo próprio aprendiz em comunhão com o professor formador. (FREIRE, 1996, p. 43)

É justamente nesse ponto que se faz imprescindível considerar o papel da pesquisa

acadêmica. Gimenez (1999) crê que o entendimento de um professor sobre o processo de

aprendizagem de língua estrangeira deveria vir de uma relação dialética entre o conhecimento

gerado pela experiência pessoal e as que são conduzidas externamente, e não pautado somente

em suas próprias experiências práticas.

Citando Charlot (2010), observo que o contrário, ou seja, aderir somente à teoria

também não é algo bem-vindo ao professorado em geral. Entretanto, conforme o autor, o que

ele percebe é que em muitos casos, quando o os professores dispensam “as teorias”, estão na

verdade abrindo mão do fetichismo teórico, e as teorias que não fazem sentido fora da teoria.

Zeichner (2008), de sua parte, aponta que essa interpretação de que a teoria é das

universidades e de que a prática pertence às escolas, é uma dicotomia que de nada ajuda o

processo de ensino-aprendizagem e a percepção do próprio professor como parte de um

sistema.

A visão de que as teorias são sempre produzidas por meio de práticas e de que as práticas sempre refletem alguma filiação teórica é ignorada. Ainda existem, hoje, muitos exemplos desse modelo de racionalidade técnica na prática reflexiva em programas de formação docente ao redor do mundo. (ZEICHNER, 2008)

Outro ponto a ser abordado nessa discussão pelo autor supracitado é que transpor

teorias de um país para outro, como foi o ocorrido no início da década de 90 no Brasil, não é

nada simples, muito menos transparente, pois, para que os “projetos teóricos” funcionem,

além da vontade dos sujeitos, há uma série de outros fatores culturais que entram em jogo.

É interessante ressaltar que muitos foram os autores que tentaram esmiuçar como esse

processo reflexivo deveria ocorrer, ou como ele poderia ocorrer. Dentre eles, destaco o

trabalho de Smyth (1992), que, baseado no trabalho de Contreras (1997) e nos princípios

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freirianos (1970) de educação problematizadora, acaba resumindo as quatro fases da reflexão-

crítica:

1. Descrever: o que estou fazendo? Tem como objetivo fazer com que o professor

parta da observação de fatos concretos de seu ensino.

2. Informar: que significado tem o que eu faço? Busca fazer com que os professores

se autoanalisem, ou seja, que observem que suas práticas, suas escolhas são

perpassadas por crenças, valores, que nem tudo se dá de maneira consciente, e que,

revisitando suas práticas, o professor tem mais chance de compreender suas

escolhas.

3. Confrontar: como cheguei a ser ou agir dessa maneira? É quando justamente o

professor passa a observar que o seu fazer em sala de aula é entremeado por

normas e valores culturais estabelecidos naquela sociedade e passa e se

autointerrogar do porquê ele age de determinada maneira, para a manutenção de

quais interesses sua aula trabalha, para formar que tipo de aluno. Esse confronto

pode partir do microcosmos da sala, mas deve expandir-se para o macrocosmos

social.

4. Reconstruir: como poderia fazer as coisas de um modo diferente? É nesse

momento que o professor fará tomadas de decisão em busca de novas maneiras de

agir.

Acredito que Smyth (1992) propôs um caminho que poderia ser seguido dentro de

uma tentativa de desenvolver um processo reflexivo-crítico. Entretanto, creio que esse

processo na busca de uma reflexão crítica nem sempre, ou não necessariamente, ocorre por

etapas consecutivas e/ou organizadas em fases cronológicas. Ao delinear e delimitar essa

fases, interpreto que Smyth pretende atentar para o fato de que, dentro de um viés crítico, não

poderíamos (ou não deveríamos) “parar”, por exemplo, na “terceira fase”, pois reconstruir

também deve (ria) fazer parte deste processo.

Diante disso, penso que a contribuição do autor é de suma importância para

desenvolvermos um olhar mais perspicaz sobre os processos reflexivos, tendo em vista que

eles se desenvolvem em muitos casos enfatizando determinados aspectos, tais como o

confronto, ou a descrição. No entanto, deve ele seguir na tentativa de reconstrução, caso

contrário estaríamos metaforicamente “nadando e morrendo na praia”. Não há, em meu ponto

de vista, e acredito que nem no de Smyth, portanto, uma ordem consecutiva que as pessoas

sigam em um processo reflexivo, mas sim diversos momentos deste processo. Neste caso a

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teoria smythiana serve como um norte ou como um mapa que pode ser seguido neste

processo.

Zeichner (1994) também defende que o termo reflexão deve ser mobilizado com um

processo sistemático, um guia, no qual os professores pudessem ser encorajados a considerar

em sua prática docente não somente o contexto imediato de sala de aula, mas também

compreender e analisar as implicações de ser um professor e de suas escolhas em sala.

Mateus (2010) também contribui perante este desafio de compreender a reflexão, suas

nuanças, potencialidades e possíveis restrições. Para a autora é de suma importância

compreender que o professor, assim como qualquer outro sujeito, ao feitio de “indivíduos

socialmente projetados pelas/nas relações sociais que estabelecem com o outro”. Sendo assim,

conforme Mateus, não podemos acreditar que o professor possa se autodeterminar, como se

fosse um sujeito deslocado das relações de poder instituídas em seu próprio trabalho, no caso

na escola, até porque “as transformações nos contextos sociais se dão num processo histórico,

muitas vezes longo e lento”. Mas, então, de que forma poderia ocorrer a reflexão? A

pesquisadora é enfática em propor que a reflexão é calcada em novas práticas sociais, e

discursivas, ou seja, “novas formas de existir no mundo”.

[...]não é a consciência de si que gera transformações nas práticas pedagógicas, mas o acabamento que se faz do outro quando se sente e se sabe como o outro. E, falando a partir da teoria bakhtiniana, saber-se e sentir-se como o outro exige caminhar para chegar ao lugar de encontro com ele, ou seja, exige sair do seu lugar, sempre mais cômodo, sempre mais confortável. O encontro do eu como o outro não pode se dar sem que os formadores saiam de seus territórios e se coloquem na estrada, metáfora que, para Bakhtin, representa o lugar por excelência de alteridade. (MATEUS, 2010, p. 34)

Nesse andar, Mateus vai ao encontro do que propõem Engestro�n (1987) sobre o tema

reflexão, entendimento este a que busco me aliar no decorrer desta pesquisa. Para eles, uma

postura reflexivo-crítica demanda não somente aquisição, assimilação e internalização do

próprio método científico do pensamento crítico, mas, na verdade, da criação de novas/outras

práticas sociais, as quais ocorrem, sim, mas dependem da colaboração, ou nas palavras do

próprio autor de uma “reorquestração das vozes, dos diferentes pontos de vista e das

abordagens dos vários participantes”. A colaboração dessa forma se coloca como o pilar

decisivo para o processo reflexivo-crítico.

Gostaria de salientar que colaboração não é o enfoque deste trabalho, mas, é um

campo de estudos que está intimamente ligado à reflexão. Perrenoud (2002, p. 40), por

exemplo, compreende que a reflexão e a colaboração caminham juntas, ou seja, são maneiras

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51

interdependentes de agir pedagogicamente e, dessa forma, estão irremediavelmente

conectadas: a reflexão motiva os sujeitos a se inserirem em sistemas sociais a se relacionarem

com os outros. Por quê? Justamente porque é no coletivo que nos reconhecemos, que fazemos

a ginástica da interação a fim de existir junto com os outros de maneira razoavelmente estável

e harmônica. Sendo dessa forma, penso que a reflexão e colaboração são maneiras

interdependentes de agir pedagogicamente e dessa forma, estão irremediavelmente

conectadas.

Nosso trabalho como professores de professores precisa ser cada vez mais movido pela compreensão de que não é a aplicação do método científico que permite a todos – professores, coordenadores, funcionários, pais e alunos – recriarem práticas sociais mais justas. Essa é uma abordagem que reage às condições existentes e aos valores sociais impostos. Ao contrário, precisamos buscar produzir, em colaboração com as pessoas integrantes dessas comunidades, a prática do método numa atividade explicitamente colaborativa, que tem o ideal de nos permitir confrontar concepções, questionar convicções, recriar hierarquias na relação de uns com os outros, subordinar conhecimento teórico-prático a eventos concretos e singularidade do Ser. Essa é uma abordagem que age sobre as realidades vividas por nós e traz consigo, portanto, potencial revolucionário”. (MATEUS, p. 36, 2010).

Neste momento, penso ser importante tecer minha própria reflexão sobre o que seja

um processo reflexivo-crítico. Faço isso tendo em conta, obviamente, a discussão teórica que

fiz até aqui, porém sem deixar de lado minha experiência de vida, inclusive a que tive no

decorrer desta pesquisa. Para mim, o processo reflexivo-crítico é uma escolha conflituosa e

uma construção sistemática, coletiva, linguística, bem como um exercício de alteridade. É

conflituosa, pois nos deixa o tempo todo na corda bamba entre o ser e o querer ser. É

sistemática, pois além de regularidade, pede escolhas norteadas, embora isso não signifique

que esse processo siga alguma ordem predeterminada. É coletiva, dado que depende da força

do conjunto. É linguística, pois demanda esforço consciente do sujeito na reestruturação do

discurso. Finalmente, é um exercício de alteridade, pois é somente se pondo no lugar do outro

que podemos buscar nos desvencilhar de nossos (pré)conceitos, de nossa familiaridade, para

observar o mundo de outra forma. Por isso, ele não envolve só o professor, mas aqueles que

preparam o terreno teórico para que esse processo reflexivo ocorra, aqueles que ancoram e

encorajam o professor a deter a vista no fato de que suas escolhas também são importantes na

construção de uma sociedade mais justa e equilibrada. A reflexão assim não é entendida por

mim como um processo de autodeterminação. Antes é imbricado na prática social que, tal

como defende Mateus (2010), resgata a ação transformadora da educação.

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Ainda acrescento que, a meu ver, o espaço da internet, por sua característica interativa,

rápida e simplificadora, tende a proporcionar aos usuários grande variedade de informações,

de pontos de vista, inclusive de vivência e acesso a experiências de ensino, pesquisas de

outros profissionais, que, de maneira dialética, tal como defende Gimenez (1999), podem

favorecer a reflexão entre o conhecimento gerado pela experiência pessoal e o que é

conduzido externamente, ou seja, as pesquisas. Porém, para que tudo isso ocorra é necessário,

antes de qualquer coisa, ação colaborativa e formação de novas práticas sociais.

Sendo assim, a internet e os blogs, que são o foco de minha investigação, ou qualquer

outra tecnologia, sozinhas, não formam profissionais, nem dão, necessariamente, espaço para

a reflexão e a criticidade. Mas entendo que os blogs são uma ferramenta muito útil na

promoção de momentos reflexivos e colaborativos, com vista a uma postura crítica, desde que

empreendamos tal objetivo. Nestes termos, podemos ter um ambiente propício para

discussões frutíferas, em que os professores em formação possam experimentar uma postura

reflexiva e crítica, desde que sejam instigados a tanto, que se percebam como atores sociais e

que desejem/busquem reorquestrar suas vozes.

Da mesma forma pondera Duarte (2001), apontando que uma das ilusões da sociedade

dita pós-moderna seria a de crer que, a partir da disseminação da internet e dos meios de

comunicação, haveria amplo e ilimitado acesso de todas as pessoas ao conhecimento e à

informação. Isso pode ser comparado à falácia de pensar que, treinando os professores para

que eles sejam reflexivos, seguindo alguns passos tecnicamente preestabelecidos, a educação

tenderia a uma grande revolução. Como exemplo disso, cito os próprios dados colhidos no

blog que é fonte de nossa pesquisa. Em muitos comentários, mesmo com preparo técnico e

pedagógico, mesmo sendo os participantes alunos universitários, o processo reflexivo ocorreu

de maneira muito tímida e desencorajada.

Serrão (2010), por exemplo, não crendo que a reflexão possa realmente se dar tal

como se empenham Perrenoud (2002) ou Smyth (1992), usa justamente como um de seus

argumentos o imenso abismo que há, em nosso país, entre a escola pública e a escola privada.

Há entre as instituições aquelas que até concordam que pesquisa é importante e mantêm seus

esforços nesse sentido, mas também há as que não disponibilizam recursos e infraestrutura

para que isso acorra.

Creio ser o papel da universidade expor o professor em formação inicial o que se

espera de sua atuação na sociedade, porém, não menos importante, é proporcionar a esses

profissionais momentos de reflexão a fim de criar uma cultura reflexiva e crítica, onde se

busque a dialogicidade constante entre o seu fazer e o fazer dos outros. Em meu ponto de

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vista, professores _ aqui no sentido colaborativo _ que busquem desenvolver uma postura

reflexiva, acrescida de uma constante informação teórica, poderão conseguir refletir sobre os

vários aspectos que se entrelaçam seu fazer pedagógico e, colaborativamente, podem sim criar

novas/outras práticas sociais. Infelizmente, esse trabalho muitas vezes é árduo e demora a dar

frutos, mas é assim mesmo que ocorrem as coisas no campo educacional e, acredito, que em

muitos outros. As mudanças são lentas, mas existem. O que não podemos oprimir ou esquecer

é a problematização acerca das angústias que permeiam nosso campo de trabalho.

É importante também relativizarmos o seguinte aspecto: com o desenvolvimento da

dita sociedade da informação, cada vez mais se espera de qualquer profissional uma postura

pró-ativa, pois o sistema pós-industrial precisa de pessoas que possam não só cumprir

atividades predeterminadas, mas que tenham habilidade de análise, reflexão e tomada de

decisão. Nada mais normal que essas também sejam as características esperadas dos

profissionais docentes. Não podemos fugir de nossa própria história, mas isso também não

quer dizer que devemos ficar alienados. Revisando algumas das falhas das teorias que

buscavam compreender a reflexão docente, Zeichner (2008) relata:

Se, por um lado, as ações educativas dos professores, nas escolas, obviamente, não podem resolver os problemas da sociedade por elas mesmas, por outro, elas podem contribuir para a construção de sociedades mais justas e mais decentes. Os professores devem agir com uma clareza política maior sobre quais interesses estão sendo privilegiados por meio de suas ações cotidianas. Eles podem ser incapazes de mudar alguns aspectos da situação atual, mas ao menos estão conscientes do que está acontecendo.

Tenho observado que os blogs colaborativos21 são espaços que dão visibilidade e voz

aos diversos grupos, também aos professores. Contudo, observo que muito mais interessante e

útil que simplesmente “estar” na rede é compreender que fazer uso de recursos com um blog,

por exemplo, dá a chance aos docentes de usar a linguagem escrita para refletir e reelaborar

seus conceitos acerca de seu papel social, do papel da educação e da escola. Se concebermos

que esse ambiente seja colaborativo, ainda teremos mais oportunidades de que ele se torne

mais criativo e crítico, desde que tenhamos sujeitos que busquem esse tipo de reflexão e que

tenham bases para realizá-las.

Portanto, o ambiente digital acaba por não se diferenciar tanto da sala de aula

presencial. O que ele proporciona são mais possibilidades de acesso à informação, sem que

isso dispense a formação acadêmica que nos dá (ou deveria dar) parâmetros para a

compreensão dos possíveis papéis sociais do sujeito professor.

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Dentre tantas possibilidades de compreendermos o termo reflexão dentro do fazer

docente, conforme Gimenez (1999), o que faz com que esse tema aflore de maneira ímpar

nesta discussão é a necessidade de encorajarmos o professor e, aqui em nosso caso, os

professores de língua inglesa em formação incial, a uma exploração sistemática de sua própria

teoria, e não necessariamente sobre aquilo que se dá em sala de aula, mas sim “refletir

sistematicamente sobre suas próprias ações em sala de aula e o efeito que essas ações trazem

em termos de aprendizagem de linguagem”.

Finalmente, posso acrescentar que o ambiente digital, tal como o não virtual, constitui

um lugar onde as experiências se dão por meio da linguagem e, como bem resgata Magalhães

(2009), “as ações verbais são compreendidas como mediadoras e constitutivas do social, onde

interagem múltiplos e diversos interesses, valores, conceitos, teorias, objetivos e significações

de si e dos outros”.

Discuti até este momento o adubo teórico que tem guiado minha interpretação. No

capítulo seguinte, posiciono as raízes metodológicas sobre as quais busquei articular esta

pesquisa.

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2 RAÍZES METODOLÓGICAS

A lagarta e a Borboleta

Do lado de dentro

do seu casulo no escuro

a lagarta olha o mundo

e pensa que ele é o mundo

é tudo o que existe na vida

é ela e o seu casulo.

Ela abre os olhos no escuro

e olha o negrume de tudo

e pensa que o mundo é assim:

escuro...escuro...escuro.

Ela ouve o som do silêncio

recolhido dentro do casulo

e sente a canção da vida

como um silencio de tudo.

No galho de cedro lá no mato

o casulo da lagarta é como

uma flor de prata no inverno.

E ela pensa: o mundo sou eu

o casulo, o silencio e o escuro.

E isso é tudo. Tudo! Tudo?

Carlos Rodrigues Brandão

Neste capítulo, apresento as raízes metodológicas que dão suporte a esta pesquisa: o

contexto em que o blog e a pesquisa foram desenvolvidos, os participantes, o material

analisado, assim como a modalidade de pesquisa utilizada e a perspectiva de análise do

material coletado. Para iniciar, aclararei a perspectiva teórico-metodológica que enraíza esse

trabalho: a pesquisa interpretativista de base netnográfica.

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56

2.1 A pesquisa interpretativista de cunho netnográfico: para buscar compreender o jardim é

preciso ser jardineiro

  

Parto do pressuposto que fazer pesquisa é olhar o mesmo mundo com lentes

emprestadas, e a partir daí, propor ressignificações e reconstruções da “realidade” fatídica do

dia a dia. E depois, com a experiência da caminhada, renovar quando necessário as próprias

lentes (e quem sabe as de outros), num processo dialético de redescobrir o mundo e de se

autodescobrir. Dessa forma, creio que, para compreender a dinâmica de um jardim, há que se

tornar um jardineiro, sentir a terra, o odor, o clima, o vento. Enfim, há que estar lá.

Sendo assim, esta pesquisa foi desenvolvida com as lentes do interpretativismo

(ERICKSON, 1986/1990), baseada na etnografia aplicada aos estudos de linguagem (HEATH

& STREET, 2008) e também na etnografia virtual ou netnografia (HINE, 2005; KOZINETS,

2010). Essa postura metodológica pretende dar conta de estudar como os humanos produzem

estruturas simbólicas uns para os outros e de que maneira representam e sustentam essas

diversas maneiras de (re)criar. Portanto, a necessidade de compreender a experiência humana

como tal advém da crença de que a participação extensiva no campo pesquisado é uma

estratégia para investigar determinado fenômeno social, que neste caso se dá em um ambiente

virtual, cuja interpretação feita por mim, pesquisadora, também não deixa de ser uma

representação sobre o objeto estudado.

A etnografia surgiu primeiramente no seio dos estudos antropológicos (ANDRÉ,

2009; FLICK, 2009; GOETZ & LECOMPTE, 1988), no fim do século XIX e início do XX,

com o intuito de estudar a cultura e a sociedade. Etimologicamente, a palavra etnografia

significa “descrição cultural” e significa para os antropólogos um conjunto de técnicas _

usadas para coletar dados sobre hábitos, valores, crenças, comportamentos, valores e práticas

de um determinado grupo _ ou um relato escrito que surge justamente dessas técnicas.

É sobremaneira importante ressaltar que a etnografia tem servido de base para muitos

estudos em diferentes áreas do conhecimento, e que, inevitavelmente, tem sofrido

modificações em seu interior, as quais buscam atender e se adaptar, felizmente, aos desafios

da pesquisa em ambiente virtual, como é o caso desse trabalho. Portanto, surge já na década

passada a preocupação de compreender quais seriam as modificações pelas quais a etnografia

estaria/necessitaria estar passando para ser utilizada no contexto virtual. Assim, a expressão

etnografia virtual e/ou netnografia emerge inicialmente em Kozinets (1997; 2010) e Hine

(2005). No Brasil, temos as pesquisas de Sá (2002), Montardo & Rocha (2005) e Montardo &

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Passerino (2006). Opto por usar o termo netnografia em meu trabalho, baseada na postura

epistemológica defendida por Kozinets (2010, p. 62) em relação a esse método: que ele é

inegavelmente subjetivo22.

Penso que, antes mesmo de versar sobre as vantagens de observar o objeto deste

estudo _ as interações ocorridas no e por causa do blog Reflection in Action _ sob a ótica

interpretativista de cunho netnográfico, é interessante trazer à baila da discussão as posturas

ou crenças que subjazem à relação estabelecida na tríade homem-tecnologia-educação, pois

elas findam por influenciar a maneira como o sujeito se observa, observa o outro e observa o

mundo. Portanto, conforme Buzato (2006, p. 3) há dois polos proeminentes, que ora se opõem

ora se sobressaem nessa relação: pensar a tecnologia de maneira determinista, ou de maneira

neutra.

O autor concebe que há quem compreenda as tecnologias produzidas pelo homem,

especialmente as relacionadas com a linguagem e à comunicação como autodeterminadas,

forças exógenas capazes inclusive de ser responsáveis por grandes mudanças macrossociais

em determinado grupo, bem como operar mudanças nas capacidades cognitivas dos sujeitos

que a utilizam. Informatizar-se, dentro dessa concepção, seria o equivalente a desenvolver-se

técnica e cientificamente.

Em oposição à crença determinista, há a ideia de que as tecnologias poderiam ser

neutras ou instrumentais, cujos efeitos são determinados exclusivamente por quem as usa.

Pensando dessa forma, somente seria necessário treinar as pessoas para usar de forma

“correta” a tecnologia, e todos os problemas sociais se resolveriam, “Tudo, enfim, começaria

e terminaria na capacitação para o uso do instrumento, e, portanto, todo excluído seria, em

tese, alguém incapaz ou impossibilitado de utilizar o instrumento a seu favor” (BUZATO,

2006, p.4).

Dessa forma, alio-me a Buzato (2006, p. 4) para defender que ambas as crenças

relacionadas com a tecnologia e com a educação são acríticas, pois elas não veem a escola

22 Ressalto que, em especial o termo netnografia tem sido usado para tratar de pesquisas que ocorrem na área do marketing e administração e que a expressão etnografia virtual é mais usada pelos antropólogos e cientistas sociais. Não é, portanto, meu objetivo neste trabalho fazer uma distinção entre tais conceitos, que são entendidos por muitos como sinônimos, mas penso ser importante observar o que cada um carrega em seu bojo conceitual. Kozinets (2010, p. 63) critica amplamente a postura dotada por Hine (2005, p. 63), pois conforme esta autora, a etnografia virtual seria deficiente em alguns aspectos. Por exemplo: ela não traria dados tão autênticos como as entrevistas face a face desenvolvidas pela etnografia, e que a etnografia virtual seria um método parcial. Kozinets se contrapõe a isso, anotando que as tão sonhadas características da pesquisa etnográfica, a “realidade”, a “autenticidade”, a “adequação”, a “holística”, são, como em qualquer outro método, construções sociais, determinadas pelo contexto, ou seja, são características subjetivas, que mudam conforme as circunstâncias. Por essa afinidade conceitual com a pesquisa interpretativista, opto dessa forma, por usar o termo netnografia nos moldes de Kozinets, em vez de etnografia virtual.

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como um lugar de inclusão, e também não observam o ambiente digital como constituído das

relações entre sujeitos, ou seja, pela prática social. Fiquemos com Komesu (2010, p. 346) “A

discussão sobre práticas de escrita em blogs e microblogs envolve reflexão que não é apenas

tecnológica, no sentido de dispositivo material, mas também linguística e discursiva”

Penso, então, que uma noção mais adequada da relação sociedade-tecnologia, especialmente em relação à Educação, deve tomar como pressuposto que a tecnologia, a exemplo da linguagem, tanto molda e organiza relações (como as que há entre professores, autores e alunos) como é, ao mesmo tempo, moldada e organizada por essas mesmas forças (quando alunos, autores e professores, através de seus usos modificam a linguagem). Não se trata, contudo, de supor um "cabo-de-guerra" entre forças distintas (sociedade e tecnologia), ou entre uns poucos agentes criadores e difusores (cientistas e engenheiros) e diferentes meios de recepção e/ou resistência (a escola, a língua, o mercado, as pessoas "comuns"), mas de conceber a tecnologia como ação social coletiva, como rede de enlaces entre atores humanos e não-humanos, e o seu desenvolvimento como um processo de desvios, derivas, deslizamentos, e translações sucessivas (LATOUR, 2000). A partir dessa visão, abre-se a possibilidade de identificarmos não apenas as necessidades de infra-estrutura e capacitação relacionadas à tecnologia na escola, mas também as possibilidades dos professores, alunos e da escola enquanto instituição, praticarem a tecnologia (como praticam a linguagem) a favor da sua própria inclusão. (BUZATO, 2006, p. 4)

Ao tratar da interação homem-homem mediada por computador com foco nas

interações sociais, de Paula (2003) entende três perspectivas de pesquisa emergentes, as quais

devem ser observadas, a saber: uma voltada para a criação de sistemas que usem atividades do

cotidiano; uma na criação de ambientes que favoreçam a interação homem-homem e,

finalmente, ele apresenta a sóciocomputação, que basicamente se preocupa em como a

tecnologia afeta as interações e vice-versa. Mesmo que esse seja um passo na compreensão da

rede não como um ambiente dado, mas sim construído, fica claro que, embora tragam para o

âmbito das discussões questões relativas à cultura, ao contexto, à história23, não se questiona

quanto, nem como, nem de que maneira essa interação humana mediada por computadores

contribui para a manutenção das relações de poder estabelecidas. Esse modo de olhar os

artefatos tecnológicos deixa muito a desejar dentro de uma postura crítica.

Adiciono ainda, conforme Dourish (2004), que há outros problemas enfrentados por

tais inclinações epistemológicas, tais como os que ocorrem em áreas transdisciplinares que

trabalham com a educação em ambiente virtual, a exemplo de engenharias computacionais. É

comum em tais áreas (em alguns casos por sua tradição positivista) olhar o contexto onde

23 An important contribution of this framework is to bring culture, context, and history back to the study of HCI. From this perspective, all human activities are embedded in sociocultural contexts, that are not solely created by local cultural and historical practices, but also co-created by each participants’ history and life-experiences in the use of a technology ( de Paula, 2003, p. 220).

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ocorrem as relações como algo passível de definição, estável, codificável, um “lugar e um

momento” que poderiam ser reduzidos ao cenário para a ação dos sujeitos envolvidos. Já as

relações que se dão, em muitos casos, são observadas como dissociadas deste contexto, o que,

dentro da perspectiva da linguagem como prática social, não é concebível.

À luz desses paradigmas conceituais, penso ser importante vincar que a etnografia em

geral não tem a preocupação imediata de quantificar, calcular ou codificar os dados em

sistemas lógicos, mas sim a de observar qualitativamente determinada experiência em

contexto (SIGNORINI & CAVALCANTI, 2010, p. 430). Ressalto que essa orientação

epistemológica não se dá por uma escolha particular, mas pelo fato de que ela é uma

tendência de exploração nascida naquilo que denominamos “computação sensível ao

contexto” (DOURISH, 2004). Este viés, por sua vez, se dispõe a dar conta das necessidades e

dos desafios que vão surgindo quando buscamos analisar as relações estabelecidas dentro de

um contexto virtual específico, como de um blog, por exemplo.

É também pauta da Línguistica Aplicada (CÉSAR & CAVALCANTI, 2007; MOITA-

LOPES, 2006; FABRÍCIO, 2006) a necessidade de refletir sobre o papel crucial das pesquisas

em reconhecer sua contribuição para a constituição das práticas sócias, produzindo,

contribuindo, perpetuando ou apagando as vozes sociais minoritárias e legitimando, em

muitos momentos, o discurso hegemônico. Portanto, o que se torna necessário é justamente

desconstruir, problematizar e desestabilizar os sentidos tidos como tácitos, pois são

justamente nas vozes apagadas que estão as alternativas de compreender a contemporaneidade

trabalhando, dessa forma, na “construção de uma agenda anti-hegemônica em um mundo

globalizado, ao mesmo tempo em que redescreve a vida social e as formas de conhecê-la”

(MOITA-LOPES, 2006, p. 27).

O objetivo dessa escolha metodológica é, resumidamente, uma tentativa de olhar o

objeto desta pesquisa, bem como o contexto onde ela se insere, não como um simples

dispositivo que viabiliza pessoas que estejam longe fisicamente de se encontrar no ambiente

virtual para discutir determinado assunto, mas sim observá-lo como uma prática social,

linguística e discursiva. Esta é construída a partir das relações humanas mediadas pelos

computadores e que podem contribuir (em diferentes níveis) para a manutenção das relações

de poder estabelecidas em nossa sociedade.

Retomando a pesquisa netnográfica, afilio-me a Kozinets (2010, p. 60) ao conceituá-la

como um método de observação participante, baseada em campos de pesquisa online, que

seguem procedimentos e protocolos próprios, tais como a comunicação mediada por

computador, como fonte de dados para chegar ao entendimento etnográfico, e a representação

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60

de um fenômeno cultural comunal. Ela é apropriada para os estudos de ambas, comunidades

digitais e comunidades de cultura que manifestam importantes interações sociais online.

Qual é o papel do pesquisador interpretativista de cunho netnográfico diante das

postagens e dos comentários vivenciados no blog, por exemplo? Falando especificamente

sobre a pesquisa interpretativista, Erickson (1986/1990) acredita que, quando o pesquisador

ingressa no campo de pesquisa, ele já possui hipóteses, que acabam por lançar um olhar

diferenciado que, consequentemente, orientam e delimitam o problema a ser pesquisado.

Penso que essa é a primeira percepção que temos de ter: o pesquisador tem um olhar

subjetivo, a descrição do que ocorre em determinado contexto é uma transformação dos

eventos sociais em inscrições.

Por igual, acrescenta Kozinets (1997) que a netnografia exige combinação imersiva

entre participação e observação cultural com relação às comunidades pesquisadas, uma vez

que o pesquisador é reconhecido como um membro da cultura, ou seja, um dos elementos da

pesquisa.

De acordo com Erikson (1986/1990), no meio educacional se torna uma necessidade

da abordagem interpretativista dispensar uma longa e intensa participação observante no

campo pesquisado, bem como um tempo longo e denso refletindo sobre o que foi observado,

a fim de promover a credibilidade e confiabilidade da pesquisa. Por esse motivo, busquei

olhar a fundo os textos que surgiram no e em decorrência do blog Reflection in Action, em

busca de sinais de uma postura reflexiva e colaborativa entre os participantes. Como enfatiza

Jesus (2007), nesse tipo de pesquisa não estamos preocupados com a quantidade ou com a

frequência desses eventos, mas quando, onde e como determinado evento ocorreu.

O pesquisador, nesse caso, procura fazer “recorte” da realidade observada como contadores de histórias que reescrevem os sentidos capturados. Nesse sentido é que a validade, a confiabilidade e a generalidade podem ser entendidas na abordagem interpretativista. (JESUS, 2007, p. 84)

Cabe-nos também a seguinte interrogação: se e como as interações em ambiente

digital se diferenciam das que ocorrem face a face. No pensar de Kozinets, (2010), há sim

diferenças entre um contexto e outro. Por isso, a netnografia se distingue de certa forma da

etnografia tradicional, pois analisa a comunicação entendendo que, em ambiente digital, ela:

1) é mediada por computador, portanto adaptada as várias mídias tecnológicas; 2) está

disponível publicamente, o que causa e tem como consequência uma vasta ampliação do

acesso aos bens culturais; 3) é gerada em forma de texto escrito, o que facilita o arquivamento

automático dos enunciados; e 4) as identidades dos participantes da conversação são mais

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61

difíceis de ser discernidas, fazendo com que se dê mais facilmente a participação sob

condições de anonimato.

Portanto, Kozinets (2010) acentua que é relevante valorizar, nas pesquisas

desenvolvidas no ou sobre o ambiente virtual, a extensão da integração dos comportamentos

sociais focais tanto em contextos online quanto nos face a face. Ele também relativiza a

importância de uma observação corporizada e verbal, ou de outros tipos de

autorrepresentação. Finalmente, questiona a necessidade de autoidentificação. Como afirmam

Montardo & Passerino (2006), a questão da identificação (no sentido restrito do nome dos

sujeitos) é uma questão ética, podendo ser feita por meio de permissão de divulgação dessas

informações, tal como ocorre na etnografia.

Por isto, neste caso, optei por resguardar a identidade dos participantes do projeto,

usando tarjas pretas nas fotos e nos nomes no decorrer deste texto. Porém, no momento em

que o leitor desejar acessar os links e visualizar o blog que ainda está online, observará as

informações na íntegra, sem restrições. Embora essa situação possa parecer um tanto quanto

contraditória, muito ainda tem sido discutido sobre este assunto, ou seja, a ética nas pesquisas

envolvendo o ambiente virtual. Neste caso, o blog é de domínio público e as informações lá

produzidas foram elaboradas dentro deste contexto. No caso da análise, busco não expor os

participantes, por isso uso dos recursos antes citados para preservar suas identidades.

Das contribuições de Dicks & Mason (1998) em relação à importância de discutir o

diferencial do olhar netnográfico, está a de compreender, por exemplo, o papel da hipermídia

nos dados provenientes do ambiente digital. Para eles, os hyperlinks proporcionam/ permitem,

tanto ao pesquisador como a todo e qualquer sujeito, que este deem conta de que o discurso é

altamente intertextual e interdiscursivo. Isso, de certa forma, faz com que olhemos os dados

com uma firmeza ainda maior em relação à forma como os discursos se apropriam e são

apropriados, de quais vozes se tornam mais hegemônicas, ou mais apagadas. Enseja, portanto,

uma análise dos dados de maneira mais flexível, completa, através de um nível de descrição

mais consubstancial.

Na linha de Kozinets (2010, p. 65) é possível, e inclusive comum, termos a etnografia

e a netnografia mescladas em determinadas pesquisas, dependendo da observação de certos

aspectos, tais como a existência de ambas, interação e coleta de dados face a face e online.

Cabe ao pesquisador observar o que mais lhe cabe. No caso desta pesquisa, as interações

minhas (da pesquisadora) não foram face a face, nem os comentários feitos pelos participantes

do blog. Entretanto, é de suma importância afirmar que muitos dos participantes já se

conheciam, pois eram colegas na universidade. Isso certamente influencia o quê, como,

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62

quando e de que forma teceram seus comentários: eles conheciam seu público leitor, que era

constituído por seus próprios colegas, igualmente por seus professores.

Tendo como base essas experiências vividas em determinado contexto, a pesquisa

interpretativista de cunho netnográfico se constitui, então, como um método de representar a

experiência. Mas o que é a representação? Para Agar (1996), Denzin & Lincoln (1998) e

Kozinets (2010), a observação participante, imersa no contexto, finda por organizar uma

bricolagem com as representações, que são dessa forma os fragmentos de uma situação

sociocultural complexa, e sua construção interpretativa, ou seja, a representação do

pesquisador é ressignificada ao passo que a investigação se aprofunda.

Nas palavras de Denzin & Lincon (2006, p. 18), o pesquisador interpretativista é visto

como um bricoleur que produz uma bricolagem, tal como alguém que confecciona uma

colcha de retalhos, ou tal qual o cineasta que reúne as imagens para transformá-las em

montagens. Em ambos os casos, essas representações se encaixam justamente nas

especificidades dessas situações complexas.

É interessante também discutir este processo de movimentação do meu olhar enquanto

pesquisadora. No caso desse projeto, além de ocupar o lugar de pesquisadora, também fui a

blogueira, a mediadora e de certa forma, também a professora. Fazer este movimento de

aproximação e distanciamento em relação ao objeto estudado é fundamental, a exemplo do

que considera Amorin (2003). A autora, baseada nos preceitos bakhtinianos, compreende que

o exercício exotópico se constitui de um “desdobramento de olhares a partir de um lugar

exterior”. Sendo assim, o pesquisador é convocado a questionar-se sobre este aspecto. De

outra parte, Amorin ainda nos adverte que, acontecer o movimento exotópico, é necessário

estranhamento do sujeito e do espaço pesquisado.

Ao pôr em funcionamento a perspectiva teórico-metodológica interpretativista de base

netnográfica, um dos argumentos tecidos é de que o próprio pesquisador é também sujeito de

sua pesquisa. Nada mais condizente, nessa esteira, que ele busque trabalhar a diferença entre o

sujeito pesquisado e o pesquisador.

Apoiada em Amorin (2001; 2003), no que diz respeito à pesquisa desenvolvida nas

áreas humanas, acredito haver clarificação dos anseios básicos do olhar teórico do qual busco

lançar mão: a pesquisa, sim, se desvincula da ilusão positivista do objeto dado, aliando-se ao

do objeto construído, admitindo e valorizando a subjetividade de tal trabalho sem que, no

entanto, se reduza o próprio objeto tão somente ao que dele falamos. Nas palavras de Fonseca

(2004) “nessa perspectiva, o objeto não é somente falado, ele é também texto que se fala”.

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63

Acordada com os pressupostos debatidos nas passagens anteriores, proponho me

concentrar no blog e desenvolver um texto que de espaço para as diversas vozes que lá foram

se estabelecendo, a fim de que sejam ouvidas, na tentativa de não as reduzi-las àquilo que eu

esteja acostumada a ver ou que deseje.

A pesquisa interpretativista, assim, se exibe como uma maneira de representar a

realidade, mas também uma maneira de pensá-la. No caso do cenário específico do blog

pesquisado, tenho-o como um recorte microestrutural das relações humanas e entendo que ele

deixa pistas que podem nos levar a compreender as macroestruturas sociais. Conforme

observa Erikson (1986/1990), essas relações da micro e da macroestrutura se dão de forma

dialética, por isso o autor enfatiza que essa dialogicidade se dá numa via de mão dupla. Em

outras palavras, não são somente as macroestruturas, tal como o ambiente sociocultural dos

sujeitos, que influenciam suas representações e comportamentos sociais, mas também as

microestruturas, tais como as comunidades de aprendizagem criadas na internet que

interferem na reconstrução de significados, conhecimentos e as representações do mundo dos

sujeitos.

Em relação aos estudos de aprendizagem de línguas, são inúmeras as situações em que

os pressupostos da etnografia têm ajudado esse campo de estudos, dentre elas, ponderam

Heath & Street (2008, p. 3) que esta metodologia tem colaborado na compreensão dos

processos de esforço individual do aprendiz em se tornar especialista em algo, na constituição

da identidade dos grupos e na instituição da educação formal24. Compreendo, dessa forma,

que a etnografia relacionada com os estudos em educação dá suporte às pesquisas que buscam

entender de que forma e em qual proporção os processos de reflexão e colaboração vão se

instituindo (ou não) dentro de ambientes específicos, como é o caso dos blogs, ao passo que

estabelecem quais são os esforços individuais, mas também coletivos, dos professores em

formação em prol de seu profissionalismo. Também, ela nós faz parar para observar de que

maneira as redes, ou os grupos, vão se imbricando no contexto específico da internet, em

especial dos blogs, e ainda, porém não menos importante, como a educação formal passa por

constantes processos de desestabilização e acaba (algumas vezes) por tomar novos rumos.

Considerando que a pesquisa interpretativista de cunho netnográfico é uma forma de

representar a realidade, qual seria a melhor forma de fazê-lo? Kozinets (2010) propõe de

maneira sucinta o protocolo que pode ajudar os netnógrafos a realizar seus projetos de

pesquisa. Contudo, ressalto que, ante a proposta desse trabalho em mesclar a pesquisa

24 Tradução minha.

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64

interpretativista e netnografia, há de deixar claro que, baseada em Wolcott (1994), a

reconstrução de sentidos por parte do pesquisador não ocorre de maneira linear, mas vai se

construindo dialeticamente.

Quadro 1: Fluxo simplificado de um projeto de pesquisa netnográfico.

Tradução minha. Fonte: Kozinets (2010, p. 61)

Em assim sendo, observo que no início há a preocupação do pesquisador em ingressar

culturalmente no espaço que busca compreender, o que aconteceu no caso dessa pesquisa,

com a visita a vários blogs e com a construção do blog estudado. Antes de semear o jardim

desta pesquisa, fiz visitas a vários outros, para entender como as interações ocorriam nesse

lugar social específico que são os blogs. Nesse momento, tal como acentua Erickon

(1986/1990), o pesquisador já possui intrinsecamente algumas hipóteses, e dentre elas, neste

caso, estava a de que os alunos teriam facilidade em postar comentários no blog. E o mais

importante, eu acreditava que esses comentários seriam hipertextuais, de cunho subjetivo, um

espaço para possíveis (re) construções do já aí, já dado. Estas hipóteses afloraram baseadas

nas pesquisas de Komesu (2005), Marcuschi (2005), Primo & Smaniotto (2006) e Sibilia

(2008) que comprovam o alto grau de hipertextualidade, o desejo de construção de uma

narrativa mais subjetiva e engajada.

Após esse período, enveredei para o seguinte passo: convidar, com ajuda de meu

orientador, os alunos de curso de letras e seus professores para participar do blog. Tentei

estabelecer com eles, dessa forma, uma comunidade de aprendizagem, deixando claros os

objetivos da pesquisa e do blog, na qualidade de experiência reflexiva e colaborativa acerca

Page 67: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

65

de temas intrigantes do ensino de línguas estrangeiras. E, tal como pressupõe Erickson

(1986/1990), o problema acaba normalmente por redefinir-se no decorrer da caminhada. No

caso desta investigação, algumas das hipóteses foram reformuladas, outras redefinidas, pois

com base no contato com o blog, com os participantes e com as inúmeras leituras sempre

buscando ter uma postura mais reflexiva, as crenças vão se redefinindo. Acredita Erickon que

isso seja de suma importância, pois pode evitar o problema de prematura tipificação.

Passei posteriormente à coleta dos dados e à observação da comunidade. Os dados

foram gerados a partir de postagens periódicas que eram então comentadas pelos participantes

e através dos e-mails enviados por mim ao grupo.

Embora a netnografia proponha que o pesquisador escreva seu trabalho após a análise

dos dados, as lentes interpretativistas pressupõem, como já dito em outra passagem, uma não

linearidade desse processo. Erickon (1986/1990) argumenta que as primeiras análise são

indutivas e que o contato constante e denso com todos os dados conclui por afunilar as

hipóteses. Dessa forma, todas as fontes têm sua importância, toda a experiência vivida durante

a caminhada acaba por reconstruir outro modo de interagir com o objeto, com os dados e até

consigo mesmo.

Sobretudo, creio que os autores que trabalham com a etnografia focalizam as

interações sociais dos sujeitos envolvidos, dando ênfase ao processo, o que é deveras especial

dentro de uma concepção linguística que observa a linguagem como sendo o resultado da

atividade humana coletiva, cuja criação e representação são de natureza social (BARROS,

2008, p. 17). Assim há, conforme André (2009, p. 29), no viés etnográfico, uma “preocupação

com o significado, com a maneira própria com que as pessoas veem a si mesmas, as suas

experiências e o mundo que as cerca”.

Nessa mancha, compreendo que este trabalho possa ser delimitado como

interpretativista e de cunho netnográfico, ao passo que eu, na condição de pesquisadora,

interagi constantemente com o objeto pesquisado (o blog no caso), formatando-o, inserindo-

lhe conteúdos para discussão, mediando as postagens (que são parte dos dados), enfim,

interagindo constantemente perante a situação estudada. Tive também contato direto e

prolongado com os participantes do blog (no caso, os alunos do curso de letras) e com seus

professores. Busquei refletir por longo período sobre as interações ocorridas naquele

determinado contexto, mas mais do que isso, intentei compreender o que seria ter uma postura

reflexiva e dessa forma, acabei redescobrindo maneiras de ensinar, aprender e de pesquisar.

Para representar minha experiência, fiz uso de uma linguagem metafórica, e isso

acabou, sistematicamente, permeando este trabalho. Penso no contexto digital como um

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jardim, e as pessoas que fazem parte dele e que o constroem como idealizadores desse lugar

virtual, ou seja, os jardineiros. Acredito que, associado ao construto teórico e metodológico,

minhas experiências de vida me fazem observar este objeto com determinadas lentes, as quais

são, sobremaneira subjetivas, sendo uma possibilidade de interpretação de uma experiência

colaborativa e reflexiva vivida no jardim cibernético.

2.2 Conhecendo o jardim

O jardim digital no qual esta pesquisa caminhou durante o segundo semestre de 2010,

foi o blog intitulado Reflection in Action, foi desenvolvido em conta do projeto de extensão

envolvendo alguns dos docentes do curso de Letras da UFMT _ Universidade Federal de Mato

Grosso _ (Campus Rondonópolis), da UESC _ Universidade Estadual de Santa Cruz, da UFV _

Universidade Federal de Viçosa _ e da FECILCAM _ Faculdade de Educação, Ciências e

Letras de Campo Mourão _, coordenado por mim e em parceria com os professores que

ministravam disciplinas relacionadas à língua inglesa e/ou ao ensino de língua estrangeira,

doravante LE, em suas respectivas turmas. O projeto começou a tomar forma em maio de

2010, sendo efetivamente desenvolvido com os colegas de junho a dezembro de 2010, com

um total de treze postagens e 163 comentários entre os participantes.

Este projeto foi pensado no intuito de criar um espaço colaborativo e reflexivo em

ambiente digital, para que os participantes, professores de línguas em formação inicial,

pudessem discutir vários temas ligados ao processo de ensino-aprendizagem de LE,

principalmente na escola pública, assentado num olhar enunciativo-discursivo. Sua realização

teve como intento efetivar minha proposta de pesquisa perante o Mestrado em Estudos de

Linguagem _ MeEl, da Universidade Federal de Mato Grosso, e contou com o imprescindível

apoio dos professores parceiros das outras universidades envolvidas, bem assim de meu

orientador.

Para melhor organização das trocas de experiências vivenciadas pelo grupo e para que

todos, efetivamente, se sentissem à vontade para participar do projeto de criarmos um blog, os

professores parceiros apresentaram o projeto a seus alunos e os incentivaram a ler o blog,

postar comentários, enfim, participar.

Outro fator importante a ser discutido neste momento é o motivo que me levou a

propor a criação de um blog especial, e não observar algum outro que existisse na rede. Isso

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se deve a dois fatores: o primeiro é que blogs educacionais, onde se estabelecem parcerias

entre universidades com o intuito de fazer parte da formação inicial dos professores de língua

inglesa, são uma raridade; o segundo motivo é que, ao criar o projeto, eu tive um apoio que

muda consideravelmente a participação dos alunos. Refiro-me à ajuda dos professores deles.

Acredito que esse fator é de extrema relevância, pois esses professores criaram pontes entre o

projeto do blog e os participantes, constituindo, por exemplo, que as discussões por meio dos

comentários fizessem parte das disciplinas curriculares que ministravam naquele semestre,

além de incentivar a participação e levá-la em consideração, em alguns casos, no processo

avaliativo.

Sobre as instruções pedagógicas, acrescento ainda que em momento algum os

participantes foram motivados ou impelidos a replicar comentários, para que participassem

várias vezes durante a mesma postagem, por exemplo. Eles foram convidados a participar do

blog periodicamente e a tecer comentários, no mínimo um em cada postagem.

Dessa forma, com alguns grupos estes comentários se tornaram parte das atividades do

cronograma semestral e acabaram sendo tomadas dentro do processo de avaliação dos alunos

em determinadas disciplinas. Porém, em outros grupos, isto não ocorreu.

Em relação à participação dos professores universitários, ou seja, dos colegas que nos

ajudaram na criação e manutenção desta rede de colaboração, não lhes foi requisitado que

atuassem diretamente no blog, com comentários periódicos, tal como ocorreu com os alunos.

A eles foi pedido que nos ajudassem na divulgação do projeto, que convidassem os alunos a

se envolver e que buscassem inserir o grupo na atividade desenvolvida, animando-os. No

decorrer no projeto, porém, tivemos a participação de alguns deste professores universitários,

que livremente se dispuseram a contribuir com seus pontos de vista e experiências de ensino-

aprendizagem.

É interessante pontuar que todos os alunos envolvidos possuíam acesso à internet em

sua universidade e tinham e-mail. Porém, poucos tinham blogs ou cultivavam o hábito de ler

algum blog em específico. Diante disso, percebi que o meio de comunicação mais efetivo

seria o e-mail. Os professores parceiros, então, me enviaram os e-mails dos alunos para que

eu pudesse estabelecer os próximos contatos. Nesse intuito, ficou estabelecido que, como uma

forma de “propaganda” ou de “convite”, o envio de e-mails sempre ocorreria. Toda vez que

eu propunha uma postagem, eu enviava o link e uma chamada pelo e-mail para todos os

participantes.

As postagens do blog foram feitas de maneira bilíngue e eram citações de artigos de

linguístas e educadores contemporâneos. Preferi não versar para o inglês as citações, pois não

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me senti à vontade para fazê-lo, uma vez que os assuntos se revelam muito variados,

sabedores de que nem sempre os termos que usamos nas versões são os mais adequados.

Acredito que teríamos a necessidade, se assim desejássemos, de procurar especialistas em

cada assunto para melhorar as versões para o inglês e não ter problemas. Nesse diapasão,

somente as orações redigidas por mim foram escritas em língua inglesa e as citações em

português.

Aos alunos, foi-lhes acordado que seus comentários seriam todos em inglês. Porém,

para não criar uma nuvem de preocupação entre aqueles que não se sentiam tão à vontade

para escrever em inglês, em um dos e-mails de apoio deixei bem claro que o objetivo do blog

não era o de avaliar a ortografia, a adequação, ou seja, as escolhas gramaticais que eles

fizessem durante a escrita em LE. Além desse artifício, postamos algumas “dicas” para iniciar

frases de opinião, com o objetivo de dar mais segurança e um apoio linguístico aos alunos

(início de frases como I totally agree, ou I have to disagree with you, por exemplo). Isso foi

de certa forma interessante, pois os alunos justamente usufruíram das dicas e, mesmo não

sendo o foco desse estudo, observei que a maioria buscou realmente escrever sem ajuda de

tradutores. Além dessas “dicas”, nos contatos por e-mail, procurei deixar claro que, em

momento algum, o blog teria como foco, ou como preocupação, a correção gramatical, ou

ortográfica, por exemplo.

Tanto a elaboração da parte visual como o layout _ comumente chamado de template,

ou tema pelos blogueiros _ com suas cores, fontes, imagens, estilos e disposição das

informações na página, foram feitas por mim em parceria com meu orientador que, por deter

mais experiência, propôs, por exemplo, usar cores claras para não cansar a visão do leitor. Já

nas postagens, busquei sempre fazer chamadas provocativas que tentassem fomentar uma

reflexão de cunho mais crítico e a colaboração entre os participantes.

Persegui no decorrer do projeto, o desenvolvimento de uma comunidade de

aprendizagem, à luz do conceito de presença social de Garrison & Anderson (2003, p. 5). Os

autores postulam, a favor de certos tipos de interação, que podem gerar construções cognitivas

mais complexas em ambientes virtuais de aprendizagem, ao passo que facilitam e direcionam

os processos sociais. Eles também defendem que o desenvolvimento das comunidades, até

mesmo em ambiente virtual, influencia na fusão entre o indivíduo e o coletivo, entre o

psicológico e o sociológico, entre o reflexivo e o colaborativo, e são de certa forma desafio

para os educadores que propõem o ensino nesse contexto. Portanto, na tentativa de criar essa

comunidade e também de ser uma das presenças sociais dela, a primeira postagem do blog foi

um convite para que todos se apresentassem, contando um pouco de suas experiências como

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aprendizes de língua inglesa. Por igual, entabulei muitas vezes comentários de incentivo,

busquei desenvolver o debate instigando os participantes a comentar novamente. Penso que os

convites que mandava por e-mail também faziam com que eles se sentissem membros de um

grupo especial, detentores de um objetivo em comum.

Antes de o blog entrar em funcionamento, fiz uma escolha prévia de alguns excertos

para redigir as postagens. Os trechos foram retirados de alguns artigos científicos presentes no

livro Ensino e aprendizagem de Língua Inglesa, conversas com especialistas, organizado por

Diógenes Cândido de Lima (LIMA, 2009). Essa escolha se deu pelo fato de essa ser uma obra

em que grandes linguistas brasileiros conversam com demais professores em torno de temas

de interesse comum. Como o próprio Lima salienta, é uma obra dialógica, na qual se pretende

pôr os especialistas não num patamar de donos do saber, mas como estudiosos interessados

em socializar o conhecimento, em fazer pontes entre as angústias dos professores de língua

inglesa e suas teorias. Percebe-se igualmente que esta tentativa de estabelecer um ambiente

dialógico insere o professor como alguém preocupado em compreender seu papel e o papel da

educação de qualidade em nossa sociedade. Penso ser uma obra que incorpora a reflexão e a

colaboração, por isso optei por criar as postagens e as provocações com o espírito de

discussão desses artigos.

Em relação aos contatos por e-mail que tive com o grupo, gostaria de enfatizar um em

especial, no qual convidei os alunos a trazer outras discussões para o blog, a fim de tentar

proporcionar protagonismo aos professores em formação e para enriquecer aquele espaço.

Ressalto, entretanto, que não obtive colaboração nesse sentido. Percebo, com isso, quanto é

difícil promover um ambiente colaborativo, reflexivo e crítico. É necessário, como defende

Fullan (2009), um processo de reculturação, o que demanda tempo e muita vontade por parte

de todo grupo.

 

2.3 Apresentando os jardineiros

Neste momento, apresento os jardineiros do blog que, metaforicamente, são as pessoas

que participaram ativamente dele durante esse semestre, incluindo eu, a pesquisadora.

Dentro das crenças de um estudo com bases na pesquisa interpretativista de cunho

netnográfico, está a de compreender que, quando um pesquisador desenvolve uma pesquisa

participante, ele já está interferindo naquele determinado contexto, mas, mais do que isso, há

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70

que aceitarmos que a leitura daquilo que ocorreu lá é uma das várias possibilidades de

representação daquela realidade.

Uma vez que admito este alto grau de subjetividade da análise das experiências

vivenciadas no campo da pesquisa, não há outra opção a não ser perceber também o sujeito

pesquisador e sua história de vida como fatores de extrema importância para a pesquisa.

Querendo ou não, admitindo isso ou não, o arcabouço de vida são as lentes do pesquisador.

Justifico assim, a escolha por contar, na introdução, um pouco de minha história, sobre a qual

darei alguma ênfase, associadas às histórias dos alunos participantes.

Como já contei em outro passo, sou Licenciada em Letras pela UCP _ Faculdades de

Ensino Superior do Centro do Paraná, em Pitanga. Leciono língua inglesa há oito anos e já

perpassei o ensino infantil, fundamental, médio, curso de idiomas e graduação. Atualmente

sou professora de língua estrangeira para alunos de nível médio integrado ao curso técnico e

para alunos de cursos superiores de bacharelado e tecnologia do IFMT _ Instituto Federal de

Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso, no campus de Campo Novo do Parecis.

Sobre meu letramento tecnológico, acredito que, embora encarte muitas dificuldades

com programação que utilize linguagem específica, como os recursos HTML, ou a linguagem

Java, tenho certa familiaridade com o ambiente virtual. Como já acentuei anteriormente, tive

contato com computadores e com a internet desde a infância e adolescência. Atualmente faço

parte de redes sociais como o Orkut, o Facebook, tenho meu blog pessoal, uso e-mail

diariamente, inclusive como ferramenta de trabalho. Sempre que as condições estruturais das

escolas onde trabalhei me proporcionaram, fazia uso constante de recursos audiovisuais, da

internet e do conteúdo presente em ambiente virtual.

Embora fizesse esse uso constante da rede tanto na vida pessoal quanto na

profissional, ainda não havia tido experiência de mediar um ambiente virtual a fim de acolher

pessoas e tentar, a partir da colaboração e da reflexão, criar um ambiente onde ocorresse

ensino e aprendizagem. Desta forma, essa experiência tem sido ímpar em minha formação

docente e pessoal, se é que podemos separar...

Sobre os alunos participantes, tivemos treze alunos da UESC _ Universidade Estadual

de Santa Cruz da Bahia; dezessete alunos da UFV _ Universidade Federal de Viçosa de Minas

Gerais; treze alunos da FECILCAM _ Faculdade de Educação, Ciências e Letras de Campo

Mourão no Paraná, e nove alunos da UFMT- Universidade Federal de Mato Grosso, campus

de Rondonópolis, totalizando cinqüenta e dois alunos, além dos cinco professores deles. Ou

seja, juntamente comigo e meu orientador, essa pesquisa envolveu diretamente cinqüenta e

nove pessoas.

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Sobre os alunos, todos cursam Letras Português/Inglês e realizaram o projeto com o

apoio de professores que ministravam aulas de língua inglesa ou, relacionadas com

metodologias de ensino da LE.

Em alguns se percebia certa fluência e domínio linguístico maiores de língua inglesa,

em outros não, sendo esse fator algo bem variado entre os participantes. Como esse não foi

um pré-requisito, muito menos observado no blog, tentei fazer com que todos, até os alunos

iniciantes, se sentissem motivados a usar a língua estrangeira que estavam aprendendo para

dar suas opiniões e participar.

Como já dito, todos os alunos participantes tinham acesso à internet em casa, na

universidade ou no trabalho, e alguns já possuíam blogs pessoais, quando não coletivos, sobre

variados assuntos. Alguns deles mantinham blogs em inglês no qual postavam textos

relacionados com suas experiências em sala de aula, na qualidade de aprendizes de língua.

Isso se devia a um projeto dos próprios professores deles. Outros tinham blogs no quais

teciam críticas de cinema e literatura. Enfim, outros mais já tinham certa intimidade com os

blogs e/ou com diversas redes sociais e com o correio eletrônico. Esses dados relacionados

com a familiaridade deles com os blogs foram recolhidos a partir da observação dos perfis dos

alunos, o que é disponibilizado no momento em que a pessoa faz um comentário. Os dados de

acesso a internet foram recolhidos com os professores parceiros no período de organização do

projeto, uma vez que seria inviável desenvolver o blog caso os alunos não tivessem acesso.

2.4 Coletando as sementes

A metáfora da semente aportar várias interpretações ao leitor. Dentre elas, gostaria de

enfatizar uma: a de que as sementes que foram colhidas durante o projeto foram as que

fizeram brotar a análise, ou seja, as minhas representações da pesquisadora sobre o meu

objeto de pesquisa.

Os dados ou as nossas “sementes” foram geradas a partir de interações assíncronas

vivenciadas pelos participantes do blog. Fazem parte, então, dos textos que estão sendo

analisados neste trabalho: as postagens e os comentários que se deram no blog e, também, os

e-mails enviados por mim, a pesquisadora, durante o período de vigência do projeto. Como o

blog está online e disponível para acesso irrestrito, uma das facilidades e/ou possibilidades

que tenho, é a de compartilhar com o leitor os hyperlinks que levam diretamente aos textos

sobre os quais estaremos discutindo. Sendo assim, se você estiver lendo esta dissertação em

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um suporte digital e tendo acesso a internet, basta apertar a tecla Ctrl de seu teclado e, ao

mesmo tempo, clicar nos hyperlinks azuis e você será encaminhado diretamente às páginas do

blog que é parte da fonte de dados desta pesquisa (o que já ocorreu inclusive na página 66).

O período de geração e obtenção dos dados ocorreu de julho a novembro de 2010, e

esta foi feita a partir da observação participativa das postagens, dos comentários e da troca de

e-mails. Houve um total de 173 comentários, treze postagens para discussão feitas por mim,

incluindo nessa contagem as que eu propus como uma maneira de auxiliar o trabalho, as quais

envolviam apresentação dos parceiros, dos colegas e dicas para o andamento do blog e oito e-

mails efetivos trocados com o grupo.

Tanto esses emails trocados com os participantes quanto as postagens e os comentários

são os dados analisados na busca de compreender como se deu esse processo colaborativo,

reflexivo-crítico de todo o grupo, inclusive o meu. A partir de uma postura interpretativista,

não poderia deixar de levar em consideração minhas tentativas de criar essa esfera reflexiva,

colaborativa e crítica, a qual foi permeada por “erros” e “acertos”, cuja compreensão é

importante neste processo.

O recurso do e-mail, dessa forma, foi usado como uma das ferramentas de apoio na

manutenção do contato com os participantes. No mês de julho enviei um e-mail me

apresentando e apresentando o projeto do blog. Vale ressaltar que os professores parceiros já

haviam comentado que eu passaria a fazer contatos por e-mail. Meus contatos iniciais foram

uma tentativa de criar certo vínculo com os colegas participantes e instruí-los sobre a

periodicidade das postagens, sobre a importância da participação efetiva de todos.

Foram vários e-mails trocados entre o grupo, incluindo os trocados diretamente com

os professores deles, e outros, por exemplo, que buscavam sanar dúvidas dos alunos em

relação ao blog, as postagens, etc. Porém, será analisada parte dos oito e-mails principais que

enviei para o grupo durante o período de julho a novembro de 2010. Foram redigidos com o

seguinte conteúdo: os e-mails sempre continham uma saudação aos participantes, um pequeno

resumo sobre o que a postagem daquela semana dizia respeito, além do link que levava a

postagem no blog e uma frase de incentivo falando sobre a importância da participação de

todos nesse processo reflexivo e colaborativo em ambiente virtual. Como o conteúdo era de

ordem muito prática, procuro olhar na materialidade linguística destes textos as formas que

busquei para gerar maior colaboração e reflexão. Sendo assim, não organizarei os e-mails por

momentos _ tal como fiz com os comentários e postagens, que explico mais adiante _ , mas

observarei de que forma intentei mobilizar os alunos para a participação efetiva no blog.

Page 75: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

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Sobre as postagens, frizo que o objetivo básico era criar um ambiente de discussão

reflexivo, colaborativo e crítico. Por isso, todas as postagens foram formuladas com base em

excertos de textos de pesquisadores da área _ como já comentado _ e terminavam com

perguntas provocativas. No cabeçalho do blog há uma chamada com a frase Give your

opinion, a fim de apresentar o blog justamente como lugar de debate, de troca de experiências,

de reflexão e colaboração. Além disso, sempre usei alguma imagem que pudesse de certa

forma estar relacionada com o assunto. Após o texto com o trecho de citação havia sempre

uma ou duas perguntas para guiar a discussão.

Embora possa parecer redundante, creio ser importante enfatizar que, em momento

algum, os alunos foram treinados para que pudessem aplicar um método reflexivo-crítico, ou

foram apresentados sistematicamente a alguma das teorias discutidas no construto teórico

deste trabalho. Penso ser importante este comentário, no sentido de reafirmar minha crença de

que não seria dessa maneira que poderíamos ter processos reflexivos no blog. O que propus

intensamente foi desenvolver de maneira colaborativa um espaço e uma comunidade

discursiva que buscasse confrontar opiniões, questionar convicções, exercitar a alteridade, ou

seja, tentar fomentar novas práticas sociais, tal como defende Engestro�m (1999) e Mateus

(2010). Assim, os excertos que eu trouxe para o blog tinham como objetivo servir de estopim

para as discussões, num ir e vir entre o conhecimento teórico-prático e as experiências dos

jardineiros do blog.

Resumidamente, buscarei desenhar o percurso do blog em relação às postagens.

Dentre as treze postagens, em dez delas a participação dos alunos foi necessariamente

requerida. O blog obteve na verdade, durante o período de vigência do projeto, 172

comentários, porém, nove foram removidos por seus autores, chegando ao número final de

163 comentários.

A primeira postagem que propus foi feita no mês de julho, intitulada Função Clara?

Essa postagem gerou um total de dezessete comentários, ressaltando que um foi removido

pelo autor.

No mês de agosto foram propostas as seguintes postagens em ordem cronológica:

Rules to our blog, Do you know me?, Partner universities in this project, Opinion examples to

help you, My own method?, Are you fluent?, Take a look at the students. Apresento abaixo um

resumo sobre o conteúdo de cada uma delas.

Propus algumas regras para o blog na postagem Rules to our blog. Busquei deixar

claro para o grupo que sempre que tivéssemos postagens novas, era necessário que os

participantes entrassem já naquela semana e estampassem seus comentários. Isso foi feito para

Page 76: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

74

que os alunos não deixassem para fazer os comentários de uma só vez, no final do projeto, por

exemplo, caso contrário, se tornaria uma lista individual de respostas. Igualmente para

incentivá-los a ler e a reler as postagens e os comentários, amadurecendo e refletindo a partir

do contato com os outros. Acrescentei também às regras a observação de que cada colega

poderia comentar qualquer postagem e que poderia se basear nas experiências de vida, nas

leituras, em suas crenças e em suas observações. Finalizei, enfatizando que, como esse era um

trabalho que tenatava ser uma experiência de aprendizagem colaborativa, as contribuições que

eles estavam fazendo seriam interessantes e significativas não só para eles, mas para todos os

participantes.

A postagem Do you know me? era de “participação obrigatória”, pois os alunos foram

impelidos a se apresentar, a escrever sobre suas experiências na condição de estudantes do

curso de Letras em suas regiões e, também, sobre as suas vivências como aprendizes de língua

inglesa. Justifico o tom que dei a essa postagem no fato de crer na necessidade de o grupo se

estabelecer, se reconhecer e compreender o papel crucial da presença de cada um para a

manutenção de uma comunidade virtual coesa. Essa postagem obteve 43 comentários, dos

quais 32 foram realmente respostas à postagem. Cinco foram feitos por mim como

agradecimento e boas-vindas à medida que os participantes iam chegando, e seis removidas

por seus autores.

A postagem intitulada Partner universities in this project buscou apresentar, de

maneira simples, as universidades parceiras neste projeto. Para isso, inclui os links para

currículo lattes dos professores, as fotos dos campi, bem como links de acesso às páginas das

universidades participantes. Essa postagem obteve um comentário.

A postagem Opinion examples to help you foi feita também durante esse período

inicial. Ela continha dicas de frases ou início de frases para começar a dar uma opinião,

concordar e discordar em inglês. Isto teve como objetivo propiciar certo suporte linguístico

aos alunos que não estivessem se sentido à vontade para redigir em inglês, tanto pela falta de

domínio linguístico, quanto pela exposição perante os colegas e a rede, pois afinal, seus

comentários estariam expostos na internet. Pedi a eles que evitassem o uso de tradutores, na

tentativa de incentivá-los à produção escrita de seus comentários na língua que estão

estudando, o inglês. Essa postagem não obteve nenhum comentário.

A postagem que veio sob o título Are you fluent? discutia a questão do tempo para

adquirir fluência e a facilidade de perdê-la. Ela obteve dezessete comentários, ressaltando que

um foi removido pelo autor. Também no mesmo mês fiz uma postagem com as fotos de duas

das turmas participantes, sob o título Take a look at the students, com o objetivo de fazer com

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75

que os alunos se sentissem inseridos ainda mais no contexto do blog. Esta postagem obteve

um comentário.

Tão logo os participantes se ambientaram em nosso jardim, começamos a fazer novas

postagens e comentários. Os alunos que sentiram dificuldades técnicas se reportaram a mim

através do e-mail e eu, dentro do possível, ajudei-os a sanar as dúvidas e as dificuldades.

Em setembro foi o momento de buscar refletir sobre as seguintes postagens: What are

your goals? e World english and the native speakers que tiveram dez e vinte e cinco

comentários respectivamente, além de Brazilian public school system, que obteve dezessete

comentários _ um deles removido pelo autor _, e My own method?, com vinte comentários.

Abaixo, como forma de ilustrar como eram estruturadas essas postagens, apresento a

forma como visualmente a postagem “Brazilian public school system” aparece no blog.

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Figura 1: Postagem Brazilian public school system. Fonte: Blog Reflection in Action

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Em outubro, discutimos sobre a questão da correção da fala na postagem Please,

repeat after me que teve quinze comentários e, finalmente, no mês de novembro, a reflexão

sobre o tema What could challange you?, que contabilizou cinco comentários.

Assim, os comentários e as postagens feitas durante o projeto darão suporte para que

se busquem compreender dois aspectos desta pesquisa, que são os possíveis indícios de

processos reflexivos observados nas interações entre os participantes e de que forma esse

grupo específico procurou construir processos reflexivos neste ambiente virtual

2.5 Os olhares sobre o jardim

A perspectiva de análise dos textos produzidos no blog “Reflection in Action” será a

pesquisa interpretativista de cunho netnográfico, baseado principalmente em Erickson

(1986/1990) e Kozinets (2010). Trata-se de processo de cunho qualitativo, o qual considera a

análise dos textos de campo estruturas simbólicas, ou seja, maneiras de representar e sustentar

as diversas maneiras de (re)criarmos a experiência humana.

Esta abordagem não compreende a realidade como um fato, mas sim como uma

interpretação do discurso daqueles participantes. Sendo assim, a cada momento em que

recompõe suas considerações sobre os textos de campo, a cada interação que tem com os

participantes, o pesquisador acaba por apreender e compreender de uma maneira diferente

como esses participantes constroem sentidos em seus contextos.

Pensando dessa maneira, pude olhar os muitos dados que obtive no período em que o

projeto esteve em fase de funcionamento. O próximo passo é justamente o de dar sentido aos

dados, reconstruindo-os e resignificando-os a partir de meu olhar, que é permeado por

conceitos teóricos e metodológicos, os quais estão sendo esmiuçados durante este texto.

Parto agora para descrever os passos que segui durante a análise dos dados.

O primeiro momento da análise ocorreu ao longo do processo de coleta dos dados,

pois, desde o primeiro contato com os dados, na pesquisa qualitativa, admitimos e buscamos a

coleta e a análise de forma simultânea. Portanto, procurei observar as postagens, os

comentários e os e-mails trocados de forma reflexiva e contínua. Sendo assim, a análise

aconteceu desde o momento em que a proposta do blog foi idealizada entre os participantes,

perpassando pela construção dele e pelas trocas de e-mails que foram ocorrendo. Durante o

funcionamento do blog, já observava quais os estilos de postagem que estavam fomentando

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maior discussão, colaboração e reflexão entre os participantes e, acabei, não raro, por redefinir

inclusive o conteúdo das postagens.

Erickson (1986/1990) lança uma luz sobre esses fatos, no apontar o fato de que,

quando o pesquisador envereda pelo campo de pesquisa, ele possui as suas perguntas e as suas

hipóteses, as quais acabam por ser redefinidas no decorrer da caminhada, a partir das

inúmeras reformulações e afunilamentos feitos, os quais ocorrem necessariamente durante a

coleta e/ou durante as inúmeras reanálises. Daí, o autor compreende que é importante gastar

tempo revisitando as anotações, os textos, até porque é esse ir e vir que finda por delinear os

sentidos reconstruídos a partir da análise.

O segundo passo dessa caminhada foi a organização dos dados. Com o objetivo de

dispor as informações de maneira mais simplificada, enumerei as postagens, os comentários e

os e-mails pela ordem em que eles foram sendo redigidos no blog, usando para isso uma

tabela criada no Software Excel. (ex. P1 _ postagem de número 1; P1/C5 _ comentário 5 que

surgiu na postagem 1; E1 _ e-mail de número 1).

Com base na primeira pergunta de pesquisa, li todos os comentários a fim de observar

quais os possíveis indícios de processos reflexivos podem ser observados nas interações entre

os participantes. Reitero neste momento minha concepção sobre o que seja um processo

reflexivo, pois é a partir deste olhar que persigo esses indícios. Creio, baseada em meu

construto teórico, que ele seja uma construção processual sistemática, mas nem sempre

consecutiva, conflituosa, que necessita da coletividade para se instituir e que perpassa pela

materialidade linguística da construção discursiva dos sujeitos. Sabedora de que a reflexão é

processual, entendo que esses indícios podem ser observados em vários momentos e em

diferentes aspectos, e não somente no momento da descrição daquilo que o professor faz em

sala, por exemplo.

Em busca desses indícios, portanto, observei, na materialidade linguística de cada um

dos comentários, traços que pudessem delimitá-los como pertencentes a determinados

“momentos” deste processo. Assim, a fim de delimitar os momentos que foram se

desenvolvendo no decorrer do blog, proponho uma tematização, usufruindo também de

metáforas relacionadas com os jardins. Portanto, quando a temática se instituía ao redor da

descrição das experiências vividas, compreendo-a como o “Momento de observar a

paisagem”. Quando ela se estabelecia voltada mais para uma autoanálise, compreendo que

houve um “Momento de compreender minhas práticas de cultivo”. Já quando a temática era

permeada por um maior confronto, compreendo-a como um “Momento de espiar por cima dos

muros de meu jardim”. Finalmente, a última temática seria a da reconstrução, ou seja, o

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79

“Momento de replantar”25. Ressalto que não delimitei nenhum dos comentários como

pertencente ao “Momento de replantar”, pois ele diz respeito a novas maneiras de agir, o que

só poderia ser observado se eu passasse um bom tempo com muitos dos participantes em seus

locais de trabalho, fato que pode ser interessante em um próximo trabalho.

Como este trabalho busca justamente observar as relações estabelecidas dentro do

blog, com vistas a discutir as necessidades e os desafios deste ambiente, adiciono que busquei

trazer para a segmentação dos momentos e para as inúmeras análises uma leitura que

conduzisse a tal complexidade. Diante desse desafio, o critério que eu usei para delimitar os

comentários dentro de cada momento, assim como para tecer as análises, foi baseado em uma

interpretação comparativa da materialidade linguística dos comentários com que preconiza

Smyth (1992) e o olhar subjetivo de autores como Engestro�m (1999), Gimenez (1999),

Sacristán (2010) e Zeichner (1994; 2008).

Dessa forma, procedi à leitura de cada comentário em busca de indícios de processos

reflexivos de cada uma dos momentos. Para não perder de vista a interpretação dos dados que

eu fazia, além de sublinhar o que me chamava mais a atenção em cada comentário, redigi

inúmeras anotações com análises que iam tomando corpo durante este trabalho. Como forma

de dispor essas informações de maneira organizada, criei três quadros no Software Excel, ou

seja, uma para cada momento. Trago abaixo um exemplo de como esses quadros ficaram:

25 Não criei uma fase zero, ou seja, um lugar determinado para as asserções que não se mostraram, a meu ver, com indícios de processo reflexivo, por crer que o simples fato de o participante acessar o blog e propor sua contribuição já é, de certa forma, uma das fases desse processo, mesmo que embrionária ou não explícita.

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Quadro 2: Quadro de análise dos dados

Fonte: Documentos de pesquisa

Levando em consideração a grande quantidade de comentários, acabei operando um

recorte dos dados, descartando os que considerei repetitivos e mantendo os que poderiam ser

mais exemplares em cada momento. Agindo assim, acabo trazendo para a análise, vinte e

quatro comentários, oito pertencentes ao “Momento de observar a paisagem”, onze do

“Momento de compreender minhas práticas de cultivo e cinco do “Momento de espiar por

cima dos muros de meu jardim”.

O passo seguinte foi trabalhar com a segunda pergunta de pesquisa, que diz respeito à

compreensão dos artifícios que esse grupo lançou mão na busca da construção de processos

reflexivos. Nesta tarefa reli novamente os e-mails, as postagens e os comentários. Observei

especificamente os e-mails e as postagens no intuito de analisar de que forma eu, como

pesquisadora e organizadora do blog, intentei construir um ambiente reflexivo-crítico e

colaborativo. Já nos comentários feitos por todos os participantes, também me servi das

temáticas, mas, dessa vez, as temáticas que emanaram dos textos do blog. Para isso, estabeleci

os temas mais recorrentes que acabavam operando como cenário para que as reflexões

sucedessem. Para organizar esses temas, criei uma lista no mesmo software (Excel), em que,

ao passo que eles iam surgindo, passava a anotá-los, assim como as recorrências. Nesta lista,

portanto, foram sendo criados títulos temáticos e os comentários iam sendo organizados

conforme iam aflorando as recorrências. Por exemplo, dentro do tema “A procura dos

culpados”, houve recorrência em “P1C2 e P6C5”, que diz respeito à postagem 1, comentário

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1, e à postagem 6, comentário 5. No total trago quatro temas, que foram arquivados, a partir

de minha interpretação, como os mais recorrentes, a saber: tema 1: “Tentativas de

construção”; tema 2: “A procura dos culpados”, tema 3: “O que é mesmo refletir?” e tema 4:

“Quero ser um bom professor”.

De conseguinte, no próximo capítulo, apresento em duas seções os indícios mais

recorrentes de processos reflexivos que se deram no blog, e os temas proeminentes que

surgiram, a fim de desenhar o percurso do esforço coletivo desse grupo na construção de

processos reflexivos.

Justifico meu interesse em observar esses aspectos dentro de uma gama de

possibilidades, pois creio ser relevante contrastar inclusive o que propunha esse projeto _

colaborativo, reflexivo-crítico em ambiente virtual _ e a forma como os participantes

construíram ou buscaram construir os processos de aprendizagem neste contexto.

É importante revitalizar que esse trabalho intenta denotar em todos os participantes

indícios de processos reflexivos em ambiente virtual, por isso, para apresentar e discutir os

textos, busco também recorrer a uma postura mais reflexiva: observo primeiramente as

práticas dos participantes no blog e procuro revisitar minha própria prática na qualidade de

sujeito que buscou fomentar esse espaço online, passando constantemente a fazer confrontos

entre a teoria e a prática, refletindo, portanto, sobre possíveis novas maneiras de agir.

Retomo novamente Perrenoud (2002), Engestro�m (1999), Contreras (1997) e

Gimenez (1999) para defender que uma postura reflexiva é uma prática que cultiva uma

identidade particular, que é indissociável do social e do histórico, que necessita ser

colaborativa, que não se constrói de maneira espontânea e que é sobremaneira uma construção

linguística.

Finalmente, no capítulo destinado às considerações finais, o qual foi intitulado

metaforicamente “Colhendo os frutos”, desfilo algumas conclusões e implicações acerca de

minha interpretação, que podem ser úteis até mesmo para apresentar as limitações deste

trabalho, assim como recomendações para novas pesquisas.

Até então busquei trazer para a discussão as raízes metodológicas que sustentam

minha leitura, ou seja, a interpretação que tive sobre o blog. Os olhares que desabrocharam

com mais força nesse jardim serão o assunto do próximo capítulo.

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3 O DESABROCHAR DE UM JARDIM VIRTUAL: DESCREVENDO E

DISCUTINDO OS RESULTADOS

E abriu-se em Flores

Quando um pé de ipê floresce

nasce um mistério de novo.

Pois quando o ipê se abre em flor

lá no cerrado em outubro

floresce a parte no todo

e tudo o que é bom renasce

em cada flor que se abre

no seu pedaço de todo.

E cada flor – cada parte –

quando atinge a sua cor

pinta a sua parte no todo

da planta onde a flor é parte

de tudo o que a terra cria

e a planta-flor faz com a arte.

Assim, cada flor renasce

na parte em que a flor é tudo

no seu momento do mundo

do todo onde a planta é parte.

(Carlos Rodrigues Brandão)

Neste capítulo, pretendo responder às perguntas que nortearam meu olhar durante este

estudo. Retomando-as:

1- Quais possíveis indícios de processos reflexivos podem ser observados nas

interações entre os participantes?

2- De que forma o grupo procurou construir processos reflexivos neste ambiente

virtual?

Para isso, entabulo, inicialmente, os comentários produzidos no blog Reflection in

Action. Intuito verificar os possíveis indícios de processos reflexivos que ocorreram no blog.

Page 85: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

83

Em seguida, proponho percorrer o sentido contrário, ou seja, olhar os dados de dentro para

fora, usando para isso os temas que emanaram do próprio discurso dos participantes.

Metaforicamente, baseio-me no que diz a poesia logo acima: “cada flor que

desabrocha, pinta sua parte no todo”, pois acredito que, ao buscarmos compreender o

macrocosmos da interação humana, podemos partir da compreensão da esfera micro, que

acaba por representar, neste caso, os esforços do grupo na construção de um espaço reflexivo,

colaborativo e crítico.

Esta análise, portanto, se divide em duas seções, a saber: Seção 1 “Cada flor

desabrocha ao seu tempo” e seção 2 “Os primaveras de nosso jardim”. Abaixo as especifico.

A primeira seção se apoia na primeira pergunta de pesquisa deste trabalho e se dedica

a observar os indícios de processos reflexivos que ocorreram no blog. Para isso, faço um

trabalho de análise descritiva dos comentários mais expressivos, organizando-os em três

momentos distintos, intitulados “Momento de observar a paisagem”, “Momento de

compreender minhas práticas de cultivo” e “Momento de espiar por cima dos muros de meu

jardim”.

Já na segunda seção, cujo amparo se dá na segunda pergunta de pesquisa, intento

compreender de que forma o grupo procurou construir esses processos. Neste momento, vou

além da descrição feita na seção 1, partindo para uma análise feita com base nos temas que se

fizeram mais recorrentes nos comentários, nos e-mails que troquei com o grupo e nas

postagens que fiz. Tudo isso, a fim de caracterizar de que forma esse grupo procurou

construir, ou não, esses processos reflexivos. Para desenvolver esta análise temática, procedi à

leitura dos comentários, das postagens e dos e-mails enviados ao grupo por mim, com vista a

identificar os temas gerados, agrupando assim os dados em eixos temáticos e, alicerçado

neles, chegar aos traços predominantes constitutivos dos processos reflexivos em ambiente

virtual deste grupo de alunos em formação. Portanto, em cada uma das temáticas _ tema 1:

“Tentativas de construção”; tema 2: “A procura dos culpados”, tema 3: “O que é mesmo

refletir?” e tema 4: “Quero ser um bom professor” _ busco perscrutar as escolhas linguísticas e

os aspectos contextuais que possivelmente contribuíram para a construção destes processos

reflexivos. Teço também, simultaneamente a segunda seção, uma reinterpretação arraigada

em nova análise que explora, por sua vez, as semelhanças e/ou divergências com os demais

estudos de diversos pesquisadores trazidos na discussão teórica.

Page 86: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

84

3.1 Cada flor desabrocha ao seu tempo

Esta análise busca dar conta de observar os indícios de processos reflexivos. Será

realizada tendo como eixo delimitador três possíveis momentos distintos de um processo

reflexivo: “Momento de observar a paisagem”, “Momento de compreender minhas práticas de

cultivo” e “Momento de espiar por cima dos muros de meu jardim”. Delimitei-os, como já

dito em outro momento com base em Engestro�n (1987), Smyth (1992), Zeichner (1994;

2008), Gimenez (1999) e Sacristán (2010).

Antes de iniciar, gostaria que o leitor levasse em consideração o subtítulo desta seção:

“Cada flor desabrocha ao seu tempo”. Uso esta metáfora, porque acredito que existe sim, a

cada nova fase delimitada por Smyth, ou a cada novo momento proposto por mim como

metáfora para a exploração do tema, um aumento da complexidade do processo reflexivo, de

análise e de tomada de decisão por parte do profissional, neste caso o professor. Porém, isso

não significa que uma fase, ou um momento específico, seja mais importante que o outro, pois

eles são na verdade, em meu ver, interdependentes. Assim, cada flor desabrocha justamente

ao seu tempo.

Os textos que foram interpretados como pertencentes a qualquer um dos momentos

são, portanto, exemplos de como estes processos reflexivos podem se desenvolver em

ambiente virtual. Tal como já discutido no capítulo teórico deste trabalho, eles são construídos

com base em muitos fatores, não sendo, assim, ancorados somente no contexto imediato do

blog, mas permeados por inúmeros conflitos advindos das articulações sociais, políticas,

ideológicas e das relações de poder estabelecidas na escola. Daí a necessidade constante de

análise das implicações de ser um professor e de suas escolhas em sala de aula. Por isso, me

sinto à vontade para perscrutar os comentários em busca desses indícios tendo como norte a

teoria já discutida.

3.1.1 Momento de observar a paisagem

Um dos momentos de um processo reflexivo pode ser cunhado a partir de uma

pergunta norteadora: o que estou fazendo? Este questionamento, como compreende Smyth

(1992), busca criar no professor uma postura de observação dos fatos concretos de seu ensino,

por isso resumida pelo verbo “descrever”. Num universo de 163 comentários redigidos

Page 87: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

85

durante o percurso do projeto, 115 deles foram compreendidos como descrições daquilo que o

professor está fazendo, e, em muitos casos, as descrições sobre aquilo que eles acreditam ser a

melhor maneira de agir. Trago para a análise oito comentários. Enfatizo que a grande maioria

dos participantes são alunos do curso de Letras. Alguns já tiveram experiências de estágio ou

até mesmo de docência, mas, por igual, temos como participantes alguns dos professores

desses alunos, professores universitários, e eu, organizadora do blog.

O primeiro exemplo que colhi em nosso jardim foi um comentário redigido em

resposta a postagem Do you know me? Traz uma descrição de alguns fatos que ocorreram

durante o processo de formação inicial do professor de inglês:

Exemplo 1 (relativo à postagem Do you know me?)

O participante, em um primeiro olhar, começa pela descrição de alguns fatos de seu

processo de aprendizagem de língua inglesa e de seu fazer docente, para culminar em uma

asserção: sua experiência tem sido um desafio, ou nas palavras dele a real challange for me.

Porém, analisando a frase i didnt intend to be a teacher, and luckly because little by

little i`ve felt in love with everything that includes this subjet, specially if it also involves

english, podemos perceber que ele constrói, mesmo que timidamente, uma representação

conflituosa em relação à profissão professor, o que Artuzo (2011, p. 60-61) compreendeu

como “o não querer ser e o se tornar esse ser”. A pesquisadora sugere, justamente em um

projeto de pesquisa em ambiente digital, que a inserção no mundo da docência,

principalmente quando não intencional, é de fato conflituosa. Acredito que, neste conflito,

transpareça de certa forma uma representação ideológica sobre a profissão docente como

desgastante, pouco remunerada, decadente, o que explica, em muitos casos, o não desejo de

muitos alunos que já estão ocupando cadeiras nos cursos de licenciatura de se tornar

realmente professores.

Page 88: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

86

Artuzo (2011) também observou em seus dados que, apesar do “não querer ser”, em

certo momento há um despertar docente, um sentimento positivo que passa pela ordem da

paixão, tal como relata o participante do nosso blog i`ve felt in love with everything that

includes this subjet.

Assim, este primeiro exemplo, cuja reflexão se ancora mais na descrição de fatos da

vivência acadêmica, pode ser compreendido, tal como defendem Assis-Peterson & Silva

(2010, p. 145), como um retrato da experiência docente permeado e construído a partir de

inúmeras implicações sociais, culturais, políticas e ideológicas, que nos forçam, muitas vezes,

a extrapolar o olhar em relação ao fazer do professor como algo que seja intimamente

relacionado e/ou construído com base tão somente em métodos, que poderiam ser

reinventados ou reorganizados, tal como propõe Scho�n (2000). Neste caso, o momento da

reflexão revela justamente a descrição daquilo que o profissional está (ou acredita estar)

fazendo, podendo tornar-se importante ferramenta na (auto)compreensão das esferas macro e

micro das relações de poder e do papel do próprio profissional professor neste contexto.

O segundo exemplo também confere como mote para a discussão uma descrição sobre

as experiências de um aluno com as aulas de língua inglesa na escola pública e revela as

angústias vivenciadas em seu processo de formação. O comentário foi redigido no blog

enquanto discutíamos a postagem Função Clara.

Exemplo 2: (relativo à postagem 1- Função Clara)

No trecho Based on my experiences in English teaching in Public School I think that

most of the times, the main objective in English classes is to fulfill the book, fica a

representação deste participante sobre os objetivos de ambos, alunos e professores da escola

pública: preencher o livro. A imagem, construída ao redor do profissional professor, passa

pela ordem da falta de iniciativa e de imobilidade perante os alunos e do sistema.

Page 89: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

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Esta angústia vivenciada em relação à escola pública tem sido discutida por inúmeros

pesquisadores, entre eles cito Cox & Assis- Peterson (2008, p. 35), que apontam os diversos

aspectos e facetas do drama do ensino de línguas estrangeiras na escola pública brasileira.

Assim, compreendo que, ao descrever seu ponto de vista por meio da expressão “preencher o

livro”, este participante remete a uma representação arraigada na cultura escolar em nosso

país, que até mesmo as pesquisadoras já citadas pontuam como uma das possíveis graves

falhas do ensino público: a não participação dos professores na produção do conhecimento.

Assim, ao serem alijados _ por motivos sociais e históricos _ da produção, inclusive do seu

material didático, desconhecem que estão fazendo em sala de aula e perpetuam, em muitos

casos, esse sentimento de desgaste e imobilidade.

Dessa forma, essa reflexão germinada e florescida no blog remete a um discurso que

se descortina no ambiente digital, mas que é sobremaneira forjado, tal como apontam

Signorini & Calvacanti (2010, p. 423) em um determinado contexto histórico e social que não

é o virtual, mas acaba constituindo-o: o discurso já marcado no tempo e no espaço sobre as

condições de ensino oferecidas pela escola pública brasileira até então.

Há, neste mesmo trecho, uma construção representativa sobre os sujeitos alunos. Eles,

do ponto de vista do participante, são descrentes e desmotivados They prioritize quantity

instead of quality because to them it is more important to fulfill all the book than to

understand the content. Esta é, a meu ver, uma construção que insere algumas representações

deste professor em formação inicial em relação aos alunos, representações que, no decorrer do

comentário não foram questionadas. Assim, o participante parece desconsiderar o que o

motiva a pensar assim sobre “os alunos” e desconsidera o significado dessas práticas

relatadas.

Estes trechos, enfim, assinalam quanto o processo reflexivo é conflituoso e de como

ele necessita ser balizado e sistematizado. Não é somente criando o espaço ou motivando o

sujeito a refletir que isso irá ocorrer, principalmente na esteira crítica. Assim, o oásis reflexivo

e naturalmente democrático que propunha Dewey (1933) parece não se estabelecer no blog.

Muitos são os conflitos entre o ser e o querer ser.

Reitero entretanto que, mesmo assim, esses indícios de processo reflexivo são

sobremaneira significativos, não sendo melhores ou piores que quaisquer outros. Eles são, na

verdade, passos deste processo, que ora se estabelece de maneira mais ou menos complexa,

cabendo ao próprio sujeito e a quem lhe propõe dar formação, incentivar, tal como propõe

Pimenta (2010, p.28), a continuamente redescobrir os fatores sociais que instituem e

condicionam nossa prática educativa.

Page 90: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

88

Durante o momento de “observação da paisagem”, os jardineiros do blog também

produziram nos comentários manifestações de otimismo, assim como comentários explícitos

das expectativas positivas que rondavam o projeto. Muitos alunos, além de se disporem a

participar, acreditavam que essa experiência poderia ser importante e enriqueceria sua

formação docente: I’m really glad to get in touch with everybody here through this blog.

That`s a relly good idea and i hope to be a better student and professional as well by

reflection with the group and sharing ideas do exemplo um, e I think it is really nice to have

this opportunity to know people through this blog and t interact with them, do exemplo dois.

Mas de onde vem esse sentimento positivo e pró-ativo em relação às ferramentas e/ou

às redes sociais? A pesquisa de Kosikoski (2007), já citada neste trabalho, revelou que,

comparando o processo de escrita feita na interface papel e a feita no blog, durante esta, os

alunos envolvidos interagiram muito mais, compreendendo-a como diferenciada e mais

produtiva. Proponho que uma das possíveis causas desta postura, adotada no blog Reflection

in Action e no blog pesquisado por Kosikoski, possa ser a mobilização do processo de

produção escrita dentro de um ambiente mais próximo ao “real”, pois quem escreve no blog

expõe seu texto, tem um público leitor, ou seja, escreve algo para alguém ler o que, em muitos

casos, não ocorre com a escrita desenvolvida na escola na interface papel. Contudo, somente a

exposição online não garante este contexto. De que forma o blog, então, estimula este

processo? No caso do blog desenvolvido nesta pesquisa, houve a tentativa de agregar e

consolidar um grupo de debate, o que, de certa forma, pode ter criado essa sensação de

dinamismo, colaboração e crescimento profissional e pessoal.

Acredito que essa característica seja sobremaneira relevante na manutenção de um

espaço colaborativo, uma vez que um ambiente reflexivo que persegue ter essa característica

depende da construção da comunidade discursiva. Portanto, esses traços podem ser marcas

constitutivas de tal comunidade.

Nos exemplos abaixo, os comentários, além de trazerem as descrições de fatos

vivenciados pelos participantes, trazem um tom de expectativa relacionado com o projeto do

blog, com traços de manifestação entusiasta dos participantes e inúmeras tentativas para que o

grupo comece a se conhecer melhor e a se estabelecer neste novo ambiente. Logo abaixo, o

aluno se põe à disposição para participar, deixando o link para seu blog pessoal, o que, em

meu ver, manifesta o desejo de que o grupo se conheça mais a fundo ... has a blog to talk

about herself, if you want to know more information about ..., come to ...blog.blogspot.com.

Page 91: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

89

Exemplo 3 (relativo à postagem 1- Função Clara)

Mas de que forma essas manifestações e esses desejos podem criar condições para

momentos reflexivos? Penso que, neste terceiro exemplo _ que foi inclusive o primeiro

comentário que o blog recebeu _ há alguns aspectos que nos ajudam a responder a essa

questão: o uso da expressão hope to learn and share, além das palavras happy e o link que

eles estabelecem para o blog de um dos participantes, são características que sinalizam o

desejo de que se instaure uma comunidade discursiva e colaborativa, uma vez que ela

depende, justamente, desta identificação ou desse sentimento de grupo.

Essa sinalização é, por sua vez, de suma importância, ao passo que pode passar a

produzir caminhos para uma cultura colaborativa de aprendizagem, prática essa requisitada

por Engestron (1987) e Mateus (2010) como pilastra essencial no processo de formação

inicial e continuada não só dos professores, mas de qualquer profissional. Assim, essa postura

colaborativa faz parte de um processo de compartilhamento das responsabilidades acerca do

processo de ensino-aprendizagem de todo grupo. São sinais que, no ambiente digital, podem

estabelecer a colaboração, fator esse do qual dependem os processos reflexivos e críticos.

Nos próximos exemplos, percebo que também há traços de colaboração neste sentido,

pois ambos _ o exemplo quatro e o cinco _ os participantes se apresentam abertos às

experiências que poderiam ser vivenciadas no blog, esperam que ele contribua para sua

formação profissional e expõem explicitamente que desejam refletir como o grupo e trocar

ideias. O uso das expressões afirmativas I’m very happy, Nice way to learn e dos verbos que

enfatizam a colaboração e a discussão share ideas e discuss são marcas linguísticas

sobremaneira interessantes, pois podem revelar uma postura receptiva, entusiasta e pró-ativa

em relação ao projeto do blog.

Page 92: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

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Exemplo 4: (relativo à postagem Do you know me?)

Exemplo 5: (relativo à postagem “Do you know me?”)

Chamo a atenção para o uso de expressões como NICE TO MEET YOU e Welcome

que podem ser interpretadas como marcas desta tentativa de criar um ambiente mais

aconchegante, onde as pessoas se sentissem parte de um grupo próximo, que estavam usando

o blog como ferramenta, mas, mais do que isso, como ponto de encontro, como lugar para

refletir junto à sua comunidade sobre diversos assuntos inerentes à carreira do professor de

língua Inglesa.

Estas manifestações positivas, de sua vez, foram sendo construídas por muitas mãos,

ou seja, nosso jardim contou realmente com o trabalho de muitos. Por isso, esse pré-

julgamento sobre o que seria o blog e o desenvolvimento geral do projeto foi plantado com a

ajuda dos professores destes alunos em suas universidades. Mas de que forma essas ações são

importantes para o desenvolvimento de um projeto como esse?

Acredito que a criação da rede de apoio tenha sido um dos fatores cruciais para que o

projeto fosse bem-sucedido diante da proposta original. Dentre as maiores contribuições,

destaco a mobilização e a valorização do projeto como parte do processo de aprendizagem

curricular, que se estendeu do meramente presencial e passou a acontecer também

Page 93: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

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virtualmente. Os professores colaboraram no sentido de incentivar os alunos a periodicamente

visitar o blog, não o deixando cair no esquecimento.

Outro ponto de suma importância foram os comentários produzidos pelos professores

universitários participantes da pesquisa. Esses comentários traziam, muitas vezes, um olhar

mais apurado, envolvido em uma postura mais problematizadora, o que, de certa forma, abria

novos caminhos durante as discussões. Esta atitude participativa pode ter ajudado no sentido

de promover a prática reflexiva, pois, assim como defende Perrenoud (2002, p.44), ela é,

sobretudo, uma construção linguística que cultiva uma identidade particular. Neste caso, a

presença social de pares mais avançados, no que diz respeito à vivência profissional e teórica,

mobiliza aspectos lingüísticos que são deveras importantes neste processo.

Em alguns comentários, a observação da paisagem ensejou análises mais

aprofundadas, que passavam a verificar o contexto escolar a usando lentes mais sensíveis,

enquanto que, em outros momentos, as reflexões permaneciam em um nível mais raso. No

trecho do sexto exemplo I think that the most important thing is the teacher to know the

students, há a descrição daquilo que o participante julga ser significativo no bom desempenho

da atividade docente. Mesmo que de maneira ainda tímida, a partir das expressões

explicativas because only in this e once, um processo reflexivo sobre as possíveis causas e

conseqüências destas escolhas começa a tomar corpo no cerne da discussão.

Exemplo 6: (relativo à postagem My own method?)

O mesmo ocorre no exemplo sete, em que o participante descreve atos rotineiros de

seu processo de aprendizagem I love listening to music and translate the lyrics, acrescentando

que seu objetivo é adquirir fluência, mas não promove correlações mais explícitas, buscando

compreender o valor social, ou o sentido que ser um professor fluente na língua que ensina

pode adquirir dentro do contexto escolar.

Page 94: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

92

Exemplo 7: (relativo à postagem What are your goals?)

Mas quais seriam as causas deste imediatismo? Acredito que isso se deve justamente

ao não desenvolvimento do habitus correspondente à postura reflexiva. Segundo Perrenoud

(2002) e Pimenta (2010), a superação disso, ou seja, a tomada de consciência sobre a prática

não é, por assim dizer, processo espontâneo ou natural. Ao contrário, demanda uma

observação sistematizada com vista a perscrutar as restrições impostas pelas práticas

institucionais, sociais e históricas. Portanto, compreendo que, durante os processos reflexivos

vivenciados no blog, e em especial nos exemplos seis e sete, há indícios da necessidade de

guiar e sistematizar o olhar, uma vez que se mostra potencializado, porém ainda muito tímido.

Em outros casos, as descrições dos fatos do cotidiano escolar e da história de cada um

são mais problematizadas, embora ainda não se reconheçam estas escolhas como parte de uma

trama que envolve crenças, valores, ideologia e relações de poder. Ou seja, que leve em

consideração o significado que suas escolhas podem ter dentro de seu contexto imediato, ou

ainda mais amplo. Mas é tocante que, além da mera descrição daquilo que eles fazem

diariamente, esses participantes acabam tecendo implicitamente o sentido daquilo que eles

fazem. Os exemplos oito e nove apresentam esse tipo de postura.

Exemplo 8: (relativo à postagem “Please, repeat after me / he�t / . Now, that's ok!”)

No trecho I think the correction is necessary, but must have the sensitivity to do

without embarrassing the students, percebo que ele busca ir além da simples representação

Page 95: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

93

sobre o que seria postura ideal _ nos termos do participante _ do professor de línguas. Por

trazer para a discussão os possíveis motivos desta crença, no caso não embaraçar os alunos,

ele pode estar ampliando sua visão sobre suas experiências.

Estes foram, portanto, os exemplos que trouxe para ilustrar algumas da nuanças que

permearam os comentários neste momento de observação da paisagem. Resumidamente,

acredito que tenha transparecido, no decorrer dos comentários, os conflitos que envolvem a

profissão docente, principalmente entre o ser e o querer ser, que revelam que deveras o

processo reflexivo é dialético (LIBÂNEO, 2010) e, por isso, a necessidade de olhar a

realidade deste jardim, a qual foi de certa forma transmutada textualmente, enquanto uma

construção teórico-prática, cunhada com base em nossas experiências, as quais são

sobremaneira subjetivas e conflituosas.

Tal como observa Reichmann (2009), em seu trabalho sobre os blogs como ferramenta

na formação dos professores, acredito que essa descrição é o primeiro passo no sentido da

ressignificação de seu objeto de estudo, sobre si mesmo, pois permite um reposicionamento

ao passo que os participantes muitas vezes narram suas próprias histórias, suas crenças e suas

escolhas, por exemplo.

3.1.2 Momento de compreender minhas práticas de cultivo

Durante este momento de redescoberta ou, como diz o poeta Brandão (2004), “no seu

momento do mundo do todo onde a planta é parte”, também pretendi delimitar os comentários

que foram além da mera descrição, desenvolvendo uma problematização que, de certa forma,

atende à pergunta: que significado tem o que eu faço? Assim, cada flor que se abre, floresce

sua parte do todo, e captar cada parte também é algo que pode _ ou que deveria _ ocorrer em

um processo reflexivo. Sendo assim, interpretei como pertencentes a este momento trinta e

dois comentários elaborados pelos participantes, sendo onze que trago para a discussão. Neles

há indícios de um processo reflexivo que observa as práticas, ou as escolhas, dentro de uma

esfera de relações perpassadas por crenças e valores que, em muitos casos, conforme Smyth

(1992) não se dão de maneira consciente.

Nos primeiros exemplos que insiro para ilustrar esse momento em que os participantes

pareceram revisitar suas práticas, podemos perceber um tom mais afeito à discussão das

motivações, assim como as possíveis consequências de determinadas escolhas do fazer

docente. Percebo que parece haver demonstração de necessidade de informar aos outros e a si

Page 96: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

94

mesmo o significado de compreender aquilo que fazemos como parte de um sistema

complexo.

Exemplo 1 (relativo à postagem 1- Função Clara)

O exemplo número um parece conceituar os professores de inglês brasileiros como

não sendo bem preparados, que trabalhariam sem objetivos bem-definidos e comuns teach

their students just the same thing during all the time they are at school, for example,

salientando que, conforme o participante, isso tenha sido um “fato” em sua experiência como

aluno one day I asked a teacher why she always taught me the same thing for her class and

she said me “It is not important that they learn this language, it is just because there is this

class and is my obligation to teach. Finalmente, ele parece concluir deixando pistas sobre o

que ela acredita ser a melhor maneira de agir: deixar a crença de que é impossível aprender

inglês na escola pública The teachers and the school must firstly be prepared to do it and

leaving this belief that at school is impossible to learn English.

Contudo, de que forma esses aspectos do discurso deste participante podem ser

importantes em seu processo reflexivo?

Creio que, no momento em que o aluno parece começar a perceber suas representações

como parte de um sistema complexo, perpassado por crenças e valores (Smyth, 1992), de

certa forma parece compreender a subjetividade de suas experiências, levando em linha de

conta que elas são práticas sociais articuladas dentro de um plano histórico, sociopolítico e

ideológico. Assim, ele parece desnaturalizar, tal como propõe Zeichner (1994), as ações de

sua ex-professora e a sua própria crença de que não seria possível aprender inglês na escola

pública.

Page 97: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

95

Outro aspecto importante que emergiu nos comentários foi a valorização da pesquisa

em sua formação. Os participantes, em alguns momentos, partem de suas experiências para

refletir de maneira mais complexa sobre uma delas: seus trabalhos monográficos.

No segundo exemplo, o participante observa I`m preparing my monograph work e

parece elucidar o significado que essa vivência tem/teve em sua formação I consider that

research will help me to understand better Foreign language in Brazil. Essa tomada de

consciência sobre o papel da pesquisa em sua formação pode ser compreendido como indício

de que esse aluno, além de perceber, problematiza o significado de algumas de suas escolhas

profissionais e/ou pessoais para sua carreira docente.

Exemplo 2: (relativo à postagem Do you know me?)

No exemplo três, aglutinado à descrição de suas vivências, o aluno parece promover

também uma autoanálise, que demostra querer informar publicamente o porquê da escolha

temática de seu estudo monográfico the course helped me to understand Literature, for

example, because I hated it before, and now I loved to know about American and English

literature, I`m enjoying so much that my monograph is about English literature.

Page 98: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

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Exemplo 3: (relativo à postagem Do you know me?)

Gimenez (1999) e Sacristán (2010) são alguns dos autores que defendem que, para que

um processo reflexivo seja consubstancial, é necessário desenvolver o pensar epistêmico, pois

é na relação dialética entre o conhecimento proveniente da experiência, aliado ao da pesquisa,

que pode permitir o profissional, nas palavras de Sacristán “colocar-se frente à realidade,

apropriar-se do momento histórico de modo a pensar historicamente essa realidade e reagir a

ela”. Por isso, acredito seja de suma importância denotar que, durante o processo reflexivo, os

participantes pareçam valorizar as contribuições que o olhar teórico pode trazer para a prática

docente.

Neste mesmo viés de maior problematização das experiências, em um dos comentários _ exemplo quatro _, eu, na qualidade de participante, parti da descrição de minha experiência

como aluna, relembrando de um momentos fatídicos no qual o professor corrigiu bruscamente

a pronúncia de meus colegas, I can still remember my classemates, when we were very young.

The ones who were very shy used to feel extremely horrified and blushed if our teacher

corrects our mistakes in a rude way... for example, during our speech or stopping us, para

(re)elaborar o significado que esta postura tem hoje em meu ponto de vista: “embaraçar” o

aluno e prejudicar seu processo de aprendizagem.

Page 99: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

97

Exemplo 4: (relativo à postagem Please, repeat after me / he�t / . Now, that's ok!)

Além disso, para iluminar esse momento de autoanálise, eu acredito assumir

implicitamente que nem sempre as escolhas são de todo consciente. Ao usar o verbo modal

can, estabeleço que o professor pode embaraçar os alunos e bloqueá-los, sem nem mesmo

perceber In my opinion we can really “embarassed them”, like Ludmilla said, and blocked his

efforts to speak better and better. Assim, posso estar admitindo nossas práticas em sala de

aula, tal como pontua Smyth (1992), nem sempre se dão de maneira consciente. Daí a

necessidade constante de cultivar a prática reflexiva.

Além desse processo de autoanálise em busca do significado das escolhas diárias dos

professores, houve, notadamente em alguns comentários, _ tal como ocorreu no primeiro

momento _, um desejo e efetiva colaboração entre os participantes. Todavia, é interessante

discutir: quais seriam os possíveis efeitos de sentidos promovidos por um processo reflexivo

na esteira da colaboração?

Em relação à colaboração, possíveis marcas podem ser verificadas já no início do

comentário (exemplo cinco), no momento em que ele diz concordar com os participantes que

já haviam postado I completely agree with those previous comentaries.... O que mais chama a

atenção aqui é que, conforme o participante, isso se deu a partir da leitura da opinião dos

outros, quando ele retomou suas memórias que acabaram por servir de esteira para sua

reflexão sobre o papel de um professor ante o uso de métodos/metodologias: As soon as I

read those I remembered a teacher of mine who said once to my class that students are not all

the same to fit in the same bottle.

Page 100: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

98

Exemplo 5: (relativo à postagem My own method?)

Diante disso, lanço mão da discussão que estabeleci sobre a postura adotada por

Scho�n (2000) perante o processo reflexivo. O excerto acima parece mostrar que,

diferentemente do que propõe o autor, as experiências prévias, assim como a rede de

colaboração neste caso, parecem florescer das construções simbólicas do participante em

torno do tema discutido. A reflexão não se estabelece dessa forma antes, durante ou depois da

ação, mas é forjada entre as experiências do “eu” e do “outro” num processo dialético

atravessado por imensa subjetividade. Esta percepção do processo reflexivo na condição de

exercício de alteridade nos faz visualizar a prática reflexiva muito próxima ao que postula

Mateus (2010, p.34), baseada na teoria bakhtiniana, ou seja, como prática pedagógica que

proporcione “o acabamento que se faz do outro quando se sente e sabe como o outro”. Desta

forma, este exemplo acaba por acentuar o entendimento sobre o processo reflexivo como

forjado pela/na linguagem como interação, construída entre as experiências entre o “eu” e o

“outro”.

O sexto exemplo foi redigido por um participante que já havia postado seu comentário,

ou seja, sua contribuição para a postagem que estava sendo discutida. Porém, mesmo assim

ele trouxe como colaboração extra: um link que levava os leitores a um vídeo que discutia o

mesmo assunto que estava sendo debatido naquela postagem I found a video ate

macmillanglobal.com very interestig and I thought it will be great for us to watch it, since it

talks about the theme we are discussing here.

Page 101: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

99

Exemplo 6: (relativo à postagem World english and the native speakers)

Este comentário teve um efeito interessante no decorrer da discussão, pois, em

decorrência dele, surgiram outros comentários, um deles feito por mim, que provavelmente

não teria aflorado se não fosse feita esta colaboração explícita por parte de um colega. Mas,

até que ponto este hyperlink pode ter contribuído para o processo? Entendo que a reflexão

naquele momento _ que era sobre o funcionamento de uma língua _, foi reconfigurada pela

hipertextualidade proporcionada pelos demais participantes do blog. Assim, minha

representação sobre o assunto, que exponho no exemplo sete, the non native and the native

will start to influence each other... that`s how language works, foi construída com a ajuda do

recurso de hyperlink.

Exemplo 7: (relativo à postagem World english and the native speakers)

Embora o uso de hyperlinks seja um fator compreendido como muito comum nos

blogs, o que já foi até mesmo debatido nos trabalhos de Komesu (2005), Marcuschi (2005),

Primo & Smaniotto (2006) e Sibilia (2003), percebi que, no caso do blog Reflection in Action,

isso não se mostrou uma prática tão comum. Poucos foram os momentos em que os

participantes se propuseram a colaborar neste sentido. Qual poderia ser a causa disso?

Page 102: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

100

Acredito que o processo de estabelecer hyperlinks é de certa forma, uma maneira de

protagonismo, pois o sujeito faz no mínimo dois movimentos. Primeiro, busca agregar ao

conteúdo que esteja sendo discutido algo de fora, ou seja, é necessário que conheça, que faça

a pesquisa, que proponha. Posteriormente, estará propondo aos demais um novo caminho, o

que subjaz certa responsabilidade discursiva, certa exposição e argumentação. De qualquer

maneira, ao trabalhar com um hyperlink, o sujeito passa a abrir espaço para outros/novos

caminhos de leitura. Sendo assim, acredito que a inconstância deste mecanismo textual está

muito ligada a cultura estabelecida em sala de aula de não protagonismo por parte dos alunos.

Não é comum, na cultura escolar estabelecida, os alunos proporem, mas sim, o professor. O

protagonismo do aluno, tão ensejado e discutido como parte primordial do processo

educativo, não é um conceito dado, sendo necessário uma construção de tal prática. Acredito

que esse seja uma dos fatores que acabam condicionando a postura dos participantes e

fazendo com que um blog educacional acabe, em certos momentos, se distinguindo dos

demais propostos pelos internautas, que são fatidicamente hipertextuais.

Outro caso em que houve esse processo reflexivo guiado por uma colaboração mais

explícita se deu entre os exemplos oito e nove. Nesses dois últimos exemplos, em especial no

exemplo nove, houve uma discussão que se estabeleceu em torno das divergências de pontos

de vista. De certa forma, esse tipo de postura foi ímpar durante o projeto. Ela ocorreu durante

a décima postagem, momento no qual discutíamos sobre a língua inglesa como língua

mundial e os falantes nativos, em que um participante se posicionou explicitamente contra a

opinião de outro.

O que ocorreu neste processo reflexivo-colaborativo se iniciou quando o participante

que escreveu a postagem oito construiu sua reflexão arregimentando fatos em sua experiência

de leitor I`ve read somewhere that currently there are 3 non native for 1 native speaker of

English. Nessa mancha, refletiu então sobre o sentido que isso teria para ele, que é um falante

não nativo da língua It’s likely to say we`ve got the power!!! We are the future of English

Language!

Exemplo 8: (relativo à postagem World english and the native speakers)

Page 103: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

101

Já a postagem que apareceu num momento posterior (exemplo nove), veio justamente

rebatendo o que defendia o seu colega de blog But in fact, I dont agree when he enphasises

that as what happens in a commentary before wich says "we have the power" because it

seems like they're not the owners, but we're gonna be! I believe that if the language is alive

and if everybody constructs it, nobody is gonna be the owner.

Exemplo 9: (relativo à postagem “World english and the native speakers”)

Ao aduzir, portanto, essa linha de raciocínio para seu processo reflexivo, o participante

do exemplo oito ressignifica os papéis de ambos os falantes, o nativo e o não nativo, situando

aquele à margem, e este como o que de agora em diante “tem o poder sobre a língua”. Embora

o participante não explicite isso, ele parece reconhecer a língua como um instrumento de

poder.

Acredito não ser este o momento para discutir qual a opinião seria a mais adequada,

até mesmo porque isso incluiria vasta discussão teórica, mas, o que importa aqui, é perceber

que o blog serviu de espaço para discussões conceituais e práticas que acabaram por gerar

indícios de processos reflexivos cada vez mais elaborados e complexos, pois fez com que os

Page 104: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

102

participantes se dessem conta da complexidade das nossas escolhas, trazendo para a discussão

a influência dos valores, dos sistemas de crenças, tal como observa Smyth (1992).

Outros dois pontos que chamam atenção no exemplo nove é que podemos perceber

que, a partir da observação da sua vivência acadêmica, o participante reestrutura novamente o

espaço de discussão aportando para o ambiente do blog um momento de intensa observação

do significado que tinha aquilo que ele estava fazendo, ou seja, refletindo: But I have a point:

talking about accent, i remember fonology. It's one of the things a language is based on. With

native speakers we can "check" how we can talk. If we dont do that, in a long future English

might be another different language as it happened with latin. O que parece é que esse

processo tem sido conflituoso para ele, tanto é que, no final, ele acrescenta que but the truth is

i`ve got confused.

Observo, desta forma, que muitos são os indícios de processos reflexivos e que,

enquanto a colaboração aumentava e os participantes se tornavam mais experientes, a

complexidade dos processos reflexivos também se torna mais visível nas postagens. Isso me

conduz a concordar com Engestro�n (1987), Pimenta, (2010) e Zeichner (1994), no que tange

à defesa de que a reflexão é um processo sistemático e colaborativo. Daí a necessidade de o

grupo estar em constante contato, encorajado a resignificar sua prática docente, tendo sempre

o terreno preparado, tal como observam Magalhães & Celani (2005). Ir além da mera

descrição daquilo que vivemos no espaço escolar depende, sim, de maior consideração do

contexto social em que estamos inseridos, assim como de maior sensibilização em relação às

implicações de nossas escolhas, inclusive linguísticas e/ou discursivas na manutenção, ou não,

das relações sociais estabelecidas.

Para finalizar a discussão desta segunda fase que visa a mais um reconhecimento, ou

seja, a uma tomada de consciência por parte do professor do significado que têm as suas

escolhas, trago os exemplos dez e onze. Estes se diferenciam dos demais pelo fato de

aparecerem neles resquícios de um olhar menos hegemônico e mais crítico, ao passo que,

mesmo de forma tênue, haja alguma consideração dos aspectos do plano político, ideológico e

histórico, tanto do fazer docente quanto do papel da escola.

Exemplo 10: (relativo à postagem “Brazilian public school system”)

Page 105: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

103

Exemplo 11: (relativo à postagem “Brazilian public school system”)

No exemplo 10, por sua vez, compreendo que há, sim, uma expansão na discussão

sobre a escola pública brasileira. O participante expõe explicitamente que, para ele, a

educação brasileira é um problema de todos, embora ele não mencione que seja também do

próprio professor: I think that the education in Brasil is a problem the all; of the governament

because they have condition to better the situation but nothing do, of the students, because do

not value the shools and also a problem of the parents, because many time they do not

encourage their children, they do not observe the shool life of the children.

É interessante notar que o participante posteriormente se situa como parte do “nós”

antes assinalado, ao se denominar como brasileiro e requisitar uma mudança de conceitos

preestabelecidos, inclusive sobre o ensino de línguas em nosso país: We "Brazilian" need to

change our concept about public education, we need left to be accommodate and to required

a quality teach to our children, incluing a quality teach in relation to language English in

public shool. O processo reflexivo, nesse caso, parece ter dado espaço para a tomada de

consciência sobre seu papel na conjuntura.

O mesmo ocorre no exemplo 11, porém, aparentemente, com um tom mais reflexivo:

neste caso o aluno não somente aponta culpados I agree with XXX when she says the problem

is instate society, school and government, mas volta seu olhar para questões mais complexas,

Page 106: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

104

tais como o sistema de crenças, que, na opinião dele, é sobremaneira importante na

manutenção deste problema many students are not interested in learning a second language

because they don’t believe that school is capable to teach it.

Complemento esta discussão sobre os comentários que interpretei como pertencentes à

segunda fase vincando que houve fortes indícios de que o blog colaborou como espaço e

ferramenta para que o grupo pudesse produzir sentido, refletir sobre suas experiências, seus

valores ou crenças acerca de inúmeros temas relacionados com o fazer docente. Observei

também que, quanto mais há colaboração explícita entre os participantes, mais a discussão

traz à tona outros pontos de vista, forçando uma migração do discurso hegemônico em direção

às construções mais críticas que buscam discutir justamente as situações de conflito que

perpassam a carreira docente e a escola brasileira.

3.1.3 Momento de espiar por cima dos muros de meu jardim

Como pertencentes a esta terceira fase, compreendo os indícios de processo reflexivo

que buscam respostas para a seguinte pergunta: como cheguei a ser ou a agir dessa maneira?

Por isso, procurei trazer para a discussão, neste momento, cinco exemplos dos dezesseis

comentários que, a meu ver, vão além da observação das causas, ou dos porquês para começar

um processo de reconhecimento das possíveis consequências de nossas escolhas em sala

deaula. Ou seja, são comentários em que há indícios de um movimento que contempla desde a

descrição do fazer docente, a desestabilização e reconhecimento da complexidade de nossos

atos diários, até a observação das consequências intrínsecas a esses atos. De qualquer forma, é

um aumento na complexidade do processo reflexivo, pois sistematicamente o sujeito passa a

levar em consideração vários aspectos de seu microcosmo no intuito de compreender o macro

e o qual seria seu papel neste espaço. É um momento de espiar sobre os muros de seu jardim

para confrontar suas experiências.

Os primeiros dois exemplos discutem paralelamente as angústias que o professor de

línguas vivencia tanto na escola pública quando na escola privada, evidenciando que o

processo reflexivo traz a situação conflituosa que o professor muitas vezes experimenta: um

ser e um querer ser.

Page 107: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

105

Exemplo 1: (relativo à postagem Brazilian public school system)

Neste caso, o participante insere a sua vivência e opinião acerca de alguns pontos

críticos que contribuem para o declínio da qualidade do ensino de línguas no Brasil: a falta de

formação dos professores, anyone who speaks English can teach at an English school

nowadays, especially if he has been abroad., a indisciplina em sala de aula I believe the

situation in those schools are even more complex, since teachers deal with a lot of problems,

including indiscipline, e a terceirização do papel da escola Even the government doesn't seem

to care when they pay English schools to offer English classes to public school students (this

is happening in SP).

O que me fez compreender que neste comentário há indícios de um processo reflexivo

mais abrangente e complexo é que a própria escolha dos pontos a serem trazidos para a

discussão é um exemplo da preocupação deste aluno em confrontar o que ocorre com a

política de ensino de línguas no Brasil (ou a falta dela). Ao descrever, por exemplo, que há

essa possível terceirização do setor, cujos professores, como ele explicitou posteriormente,

nem sempre transitam por uma formação acadêmica, o participante deixa implícita a

preocupação que se instaure no Brasil um ensino acrítico e alienado, fato esse que pode ser

entendido a partir da preocupação sobre que aluno desejamos formar ou, como bem indaga

Smyth (1992) “trabalhamos para a manutenção de quais interesses?”

Mesmo que este participante não teça um comentário que converse com algo que já

tenha sido dito em outra passagem, ele pode estar promovendo o espaço colaborativo, ao

passo que aduz outros questionamentos para o grupo: By the way, does English fail anyone?

Além deste aspectos, pode ser observado neste trecho que uma de suas desilusões, vividas por

este professor em formação inicial, é que a disciplina língua inglesa, não pode nem sequer

Page 108: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

106

reprovar alguém. Essa reflexão sobre esse valor cultural do inglês na escola pública acaba

fazendo com que ele prossiga para finalizar que essa falta de objetivo se dá, também, pela não

clareza de uma política para o ensino de línguas I just think it's difficult to have a greater aim

if the politics for language teaching is not clear (neither fair).

A desvalorização do ensino de línguas no Brasil tem sido pauta de inúmeras

discussões no ambiente acadêmico. Cox & Assis-Peterson (2008, p. 35), por exemplo, relatam

o baixo status da língua estrangeira na grade curricular, que acaba desenvolvendo um

sentimento de ineficiência em relação à escola pública e ao ensino que lá é pressupostamente

realizado. Flores (2010), por sua vez, assevera que o ensino das línguas estrangeiras em nosso

país está ultrapassado: a sociedade carece de falantes de línguas estrangeiras, enquanto a

escola de modo geral _ e neste caso inclusive muitas particulares _ não consegue organizar e se

adequar diante das demandas sociais e econômicas. Parece-me que, por incluir estes aspectos

na discussão, o participante busca analisar o que ocorre em sala de aula como parte das

relações sociais e dos sistemas de valores instaurados em nossa sociedade.

No comentário do exemplo dois, o participante também parte de suas experiências

pessoais para tecer uma reflexão sobre a complexidade de ser professor: Although these

experiences were short, I liked them very much and they were very important for me because I

learned that teaching language is not an easy task. In my opinion, this process is complex

because people often don’t like it.

Exemplo 2: (relativo à postagem “Do you know me?”)

Page 109: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

107

O que mais me chamou a atenção nesta postagem é que o participante inseriu na

discussão um confronto entre o aluno real X o aluno ideal. Isso ocorreu com o participante se

baseando em sua experiência como professor, mas também levando em conta as causas e as

consequências de suas possíveis escolhas em sala de aula. Para ele, dessa forma, não raro o

professor denota um tipo ideal de estudante e depara com o real, que não satisfaz aquilo que

ele busca They learn language by necessity, as for example to get a promotion. In addition,

many people think that going to school and make the lessons at home is sufficient. É um

comentário que discute justamente a questão da corda bamba em que o professor que busca

ser reflexivo e crítico vive: em muitos casos, o aluno não está interessado em uma educação

problematizadora, ele quer é rapidez. Porém, na opinião do participante, aprender uma

segunda língua requer muito mais do que isso but learning a second language requires a lot

more. It takes effort, dedication, discipline, both the teacher and, above all, the students. É

com comentários como este que acredito que os participantes passaram por essa fase reflexiva

que expande o microcosmos da sala de aula para o macrocosmos social.

No exemplo três há indícios de processos reflexivos que se constroem a partir de uma

relação colaborativa explícita entre dois participantes. Ele inicia concordando com os demais,

mas especialmente com um colega que diz ser importante, antes de tudo, observar o que quer

dizer um processo efetivo de ensino de línguas estrangeiras it is important to think about what

we really want to mean with "an effective foreign learning process". E ele ainda aponta,

posteriormente, que é possível, sim, ensinar e aprender língua estrangeira na escola pública,

mas deveríamos considerar a complexidade deste contexto. Caso contrário, ficaria difícil

compreender as implicações do processo de ensino aprendizagem na escola pública I believe

it is possible to teach and learn English language at production context. But, it is necessary to

consider the production conditions otherwise it is impossible to understand the implications

of this teaching and learning process.

Ainda chamo a atenção para o fato de este participante também colacionar outras

questões, sendo também colaborativo, ao passo que abre o leque de possibilidades de

discussão Do you agree with me? What do you think about that? I would like to know your

opinion about these and other aspects which can be problems in Brazilian public school

system. Thanks, anyway.

Page 110: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

108

Exemplo 3: (relativo à postagem Brazilian public school system)

Os dois últimos exemplos da fase três se constituem com um diferencial, ao mesmo

tempo em que, além do confronto entre o que faço ou penso e como possivelmente tenho

chegado a ter essas ações, ou representações, alinha-se ao discurso dos participantes a

explicitação dos conflitos pelos quais transita o profissional professor.

Saliento que o comentário que aduzo no exemplo cinco foi impulsionado pelo

exemplo quatro, ou seja, eles se complementam. Em ambos os comentários os participantes se

desculpam por não terem contribuído antes, o que pode significar que elas estavam cientes da

importância de sua contribuição no sentido de enriquecer a discussão.

No caso do exemplo abaixo, o participante apresenta suas opiniões acerca do assunto

que estava sendo discutindo, I don't think the teachers of English have a clear objective when

entering in a classroom e the main objective in English classroom is to accomplish a

determined content without reflecting so much about the students' needs and difficulties.

Porém, ele não se detém a uma simples descrição daquilo que seja a realidade fatídica na

opinião dele, mas sim parte para uma explicitação de que é necessário trazer para a discussão

questões como estas: quem serão os eleitos para serem “preparados” pelo sistema de ensino,

que tipo de alunos e de pessoas queremos preparar, e, por que não, que tipo de escola

queremos em nossa sociedade.

Page 111: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

109

Exemplo 4: (relativo à postagem 1- Função Clara)

Estes questionamentos vêm justamente para complementar a sua opinião: na escola

pública os objetivos são diferentes e muito mais complexos. Neste caso, penso que

implicitamente, o participante parece admitir que a escola pública não é, necessariamente

moldada para que o aluno aprenda efetivamente (mesmo que isso não ocorra somente na

escola pública) e que, muitas vezes, o professor não se dá conta disso, e acaba vivendo

angústias e problemas que não são só dele, mas também dele. Porém, isso não lhe retira a

responsabilidade e/ou as possibilidades de ser um agente de mudanças, caso contrário não

seria necessário nem sequer a problematização.

No quinto exemplo, o participante também descreve as dificuldades pelas quais os

professores passam, observando a falta de apoio por parte da instituição escolar como uns dos

fatores que devem ser levados em consideração: I just add that when teachers do have a

purpose in a way that it can provide good results, the school doesnt provide support enough

for applying it. In face of this, it's too hard if the teacher keeps trying to give classes following

his/her aims, pretending better prepare his students in an affective way.

Page 112: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

110

Exemplo 5: (relativo à postagem 1- Função Clara)

Adiciono ainda que ele traz para a discussão não só o papel do professor mas também

o da escola, como instituição, pois ambos são importantes para a melhoria do ensino de

línguas no Brasil if the teachers are good enough to teach and able to understand what the

students need is one point. The second is about what the school offers to both teachers and

students in order to provide a good English education. Há, desta maneira, indícios de um

processo reflexivo ainda mais complexo, que parece levar em conta as situações conflituosas,

mais especificamente quando o participante expõe a questão do mercado das escolas privadas

que conclui, na opinião dele, atraindo muitos dos bons profissionais por oferecerem melhores

condições de trabalho. Entendo que ele finaliza sua reflexão portando à tona com ainda mais

clareza as situações angustiantes vivenciadas por muitos profissionais: In public schools, our

good teachers who have affective aims and can use it in class are heros, and we dont easily

find heros around.

Em resumo, neste terceiro momento, que metaforicamente traz a ideia de espiar por

cima dos muros do jardim no anseio de expandir o olhar do sujeito, houve, tal como nos

demais, muitos indícios de que os participantes desenvolveram, sim, uma postura reflexiva

perante suas experiências e as crenças sobre sua futura profissão.

É interessante notar que em certos momentos, as opiniões são construídas com base

em uma postura muito hegemônica e acrítica. Mas, com o surgimento de um comentário mais

bem elaborado, como foi o caso dos últimos exemplos discutidos, os demais começam a

considerar as outras faces do mesmo assunto. Compreendo este fato como um indício de que

Page 113: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

111

o blog serve também como uma ferramenta de motivação contra o imediatismo, o

individualismo, a falta de conteúdo e a desconsideração do contexto social, que são

justamente os pontos-chave defendidos por Gimenez (1999), Sacristán (2010) e Zeichner

(1994; 2008).

Pude observar que inúmeros foram os indícios de postura reflexiva no blog e de busca

por criar e manter um ambiente colaborativo. Porém, o que não foi tão comum assim foi esse

reposicionamento crítico ante as inúmeras experiências vividas e discutidas. Em muitos casos,

mesmo o grupo estando num ambiente que teria várias chances de ser ainda mais produtivo no

que tange à reflexão-crítica e à colaboração, há uma predominância de discursos hegemônicos

e acríticos, e uma desconsideração de suas próprias experiências de vida e de quanto elas

podem ser interessantes durante este processo.

O que posso compreender disso é que, assim como defende Freire (1996), uma

reflexão que supere a ingenuidade não é presente dos deuses nem pode ser encontrada de

maneira pronta e acabada em manuais. Ela é resultado do esforço colaborativo e sistemático,

regado tanto pela observação da prática quanto da teoria, não olvidando, portanto, os

conflitos. É no conflito que se dá a mudança.

3.2 As primaveras de nosso jardim

A partir de agora, intento tecer uma reinterpretação dos dados, trazendo também para a

discussão as postagens e os e-mails que partilhei com o grupo. Acredito que os temas mais

emergentes são os que fomentaram a primavera das discussões, lembrando que esta é a

estação do ano em que a vida se renova e tudo floresce. Por isso, busco, nos fragmentos desta

situação complexa, organizar uma bricolagem no intuito de construir minha interpretação.

Verifico que essa é uma das possibilidades de representar as relações estabelecidas no blog e

convido o leitor para que, se assim desejar, possa também tecer as suas próprias. Diante desse

desafio, procuro estabelecer as relações entre o contexto, as temáticas e as escolhas

lingüísticas a fim de compreender melhor de que forma este grupo se empenhou na

construção de processos reflexivos em ambiente digital.

Page 114: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

112

3.2.1 Tema 1: Tentativas de construção

O primeiro tema que aporto à discussão foi minha tentativa de criar, manter e animar

um grupo virtual em prol de um objetivo comum: refletir criticamente. Por isso,

metaforicamente, falo de um serviço de jardineira, uma vez que busquei articular o jardim.

Acredito que seja de central interesse dois aspectos nestas interações que eu tive com o grupo:

primeiro o que tentei estabelecer e, depois, como isso acabou se desenvolvendo no decorrer

do projeto.

Trago para discussão, portanto, três dos oito e-mails enviados para os participantes.

Exemplo 1- Conteúdo do primeiro e-mail enviado no mês de agosto.

Olá pessoal!

Sejam bem vindos ao nosso Blog “Reflection in Action”

www.reflectionaction.blogspot.com

Nosso Blog tem como finalidade criar um espaço de discussão para

estudantes do Curso de Letras/Língua Inglesa de diferentes Universidades. Entre os

seus mais novos colegas estão alunos da UESC _ Universidade Estadual de Santa

Cruz _, que tem apoio do Professor Dr. Rogério Aragão, da UFMT, _ Universidade

Federal de Mato Grosso _, com o Professor Dr. Dánie Marcelo de Jesus e da UFV _,

da Universidade Federal de Viçosa _, com a Professora Dra. Ana Maria Barcelos

Nossa interação ocorrerá em língua inglesa. Por isso, gostaríamos que todos

participassem sem se preocupar com possíveis “erros” na escrita. Estamos aqui

para compartilhar idéias, aprender mutuamente e promover uma maior reflexão

sobre o processo de ensino-aprendizagem de língua estrangeira no Brasil.

Ao entrar no blog pela primeira vez, você observará que no canto direito há

dois links relevantes para que nosso projeto seja bem sucedido. O título das duas

postagens são: "Do you know me?", onde você deverá postar uma reflexão sobre

sua condição de aprendiz e, “Rules to our blog”, que apresenta algumas regras

sobre como funcionará nosso espaço de discussão.

Tenho certeza que essa será uma experiência interessante e útil para sua

formação enquanto professor de língua estrangeira.

Qualquer dúvida estamos à disposição por e-mail, ou no blog.

Um abraço.

Page 115: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

113

Exemplo 2: Quinto e-mail enviado para o grupo em setembro.

Good morning everybody!!!!!!

We already have a new post in our blog! But, after show you the link, I would

like to thank you by all the contributions you have made to the blog “Reflection in

Action”. I believe it has been a very interesting activity for most of us and also a

great opportunity to share ideas.

For those who haven’t contributed in all post, I would like to remind you can

find them in “Arquivos do Blog”. They are just above the world map with red spots.

So, let’s go to our newest post. It’s about the Brazilian Public School System.

http://reflectionaction.blogspot.com/2010/09/brazilian-public-school-system.html

I hope we have a great discussion again.

Exemplo 3: Sétimo e-mail enviado aos participantes em outubro.

Hi people!!!

First of all, I would like to say sorry because I'm late with this week post.

But, now it`s here. This week we are going to talk about the teacher's correction in

the students' pronunciation mistakes during the classes:

http://reflectionaction.blogspot.com/2010/10/please-repeat-after-me-het-now-thats-

ok.html

Ok, one more thing… I also would like to invite you to organize the next topic

of our blog. So, if you have something interesting for our discussion, like topics

regarded to second language learning process, especially things that were not

discussed yet, send to my e-mail. You will enrich a lot our work with your special

contribution.

Thanks a lot!!!!!

Hugs

I’m waiting for your e-mail

Nos e-mails, percebo que o desejo de colaboração é algo bem marcante. O uso de

terceira pessoa no plural, por exemplo, é uma característica forte: Nosso Blog tem como

finalidade, Estamos aqui para compartilhar idéias, para aprendermos mutuamente [...], We

already have a new post in our blog! e This week we are going to talk about. Acredito que

escrevi desta maneira para buscar criar uma sensação de coletividade, mas, mais do que isso,

para tentar construir nos participantes a ideia de que eles eram corresponsáveis pelo

funcionamento do blog.

Page 116: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

114

Penso igualmente que um dos fatores que me impulsionaram neste sentido tenham

sido as leituras que eu fui desenvolvendo no andar da pesquisa, do curso de mestrado e da

minha experiência docente. Essas experiências têm me feito observar que, realmente, nos

constituímos através do “outro”. Dessa forma, quanto mais pudermos reconhecer,

compreender e valorizar esse olhar que vê o processo educativo como prática social mais,

haverá a valorização do trabalho reflexivo na qualidade de processo sistemático, dependente

da colaboração.

De qualquer forma, o que não podemos deixar de atentar é que esse processo de

ensino-aprendizagem em ambiente virtual é conflituoso e que, tal como apontam Signorini &

Cavalcanti (2010), tem sua materialidade forjada e determinada dentro de um contexto

histórico e social. E o meu conflito entre o querer ser e ser realmente também pode ser

percebido nestes e-mails. Mesmo tentando criar este ambiente plural e colaborativo, noto que

em muitos momentos, desloco meu papel e me retiro de cena, dando a sensação de que eu não

preciso fazer determinadas coisas. Observo como exemplo disso o e-mail que trago no

exemplo um. Eu redigi que “Nossa interação ocorrerá em língua inglesa”, mas, no parágrafo

posterior, havia proposto que “você deverá postar uma reflexão sobre sua condição de

aprendiz”, ou seja, há, na escolha do pronome pessoal, uma marca de que em alguns

momentos eu fazia parte do grupo e, em outros, eu não julgava necessária minha participação.

Tenho a sensação de que, em boa parte, isso se deve a uma cultura estabelecida de que o

professor não precisa participar do processo. Ele é a pessoa que encarta algo pronto, não

participa da discussão e está lá somente para colher resultados.

Como tentativa de fomentar o espaço virtual, foi marcante também o estabelecimento

de links que tinham como objetivo facilitar aos participantes a busca pelas informações no

blog e os locais onde deveriam postar. É exemplo a postagem Rules to our blog, que apresenta

algumas regras sobre como funcionará nosso espaço de discussão. Compreendo, baseada em

Signorini & Cavalcanti (2010), que diante da fragmentação e da fragilidade do ambiente

virtual, muitas vezes as pessoas que se propõem usufruir da rede tenham que justamente

integrar e articular este ambiente para que as “peças” funcionem, não porque isso tenha que

ser assim, mas porque, tal como explicita Paiva (2010), a escola tende a buscar a

normalização das tecnologias. Assim, mesmo que, a priori, na rede não haja essa preocupação

de estabilização e articulação do conhecimento para fins educacionais _ dentro dos parâmetros

e esquemas já utilizados pela educação formal _, tanto os alunos quanto os professores sentem

a necessidade de se apropriar da tecnologia, mas mais do que isso, de estabilizá-la.

Page 117: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

115

Assim, o envio de e-mails com links que eu estabelecia diretamente para o blog, a

insistência para que os alunos participassem, assim como a possível convalidação como parte

das atividades curriculares deles nos seus cursos na universidade, foram os artifícios que

acredito serem os principais nesta articulação, responsáveis pela história vivenciada no blog.

Entendo minha presença, dessa forma, não como mera pessoa que organizou esse

“encontro na rede”, pois, observá-la desta maneira seria desconsiderar que o blog é, por

excelência, uma comunidade discursiva na rede, onde se estabelecem, como em qualquer

outra comunidade as inúmeras relações sociais. Assim, meu discurso remete inclusive à

minha própria experiência docente anterior ao projeto e ele foi, obviamente, se

reconfigurando e ressignificando com base na experiência estabelecida com o grupo.

Neste sentindo, ao passo que o blog foi avançando, acabei convidando os alunos para

que pudessem colaborar com a construção das postagens:

I also would like to invite you to organize the next topic of our blog. So, if you have

something interesting for our discussion, like topics regarded to second language

learning process, especially thing that were not discussed yet, send to my e-mail. You

will enrich a lot our work with your special contribution.

(Excerto do sétimo e-mail enviado em outubro)

Embora o convite para uma participação mais efetiva tenha sido lançado, não obtive

nenhuma resposta neste sentido, o que interpreto como parte do processo de internalização do

uso da tecnologia, uma vez que nem todos os sujeitos envolvidos têm as mesmas

representações sobre os papéis que poderiam desempenhar neste processo. Gomes (2005), por

exemplo, defende que os blogs podem ser utilizados tanto como ferramenta, quanto como

recurso. Embora minha tentativa tenha sido de utilizá-lo como recurso e criar uma

comunidade de aprendizagem com vista à reflexão, descentralizando a figura do professor _

que no caso foi performizada por mim _, compreendo que a não colaboração dos alunos nesse

sentido, possa ser entendida como traço constitutivo da cultura que infelizmente se estabelece

para e pelo sujeito professor: não se perceber como alguém que constrói sentidos

Finalizando, observo que nas postagens que eu fiz diretamente no blog, busquei criar

perguntas para fomentar e nortear a reflexão. Os exemplos abaixo são excertos de duas

postagens:

Page 118: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

116

Exemplo 4: Trecho da postagem World English and the native speakers, de setembro.

“Taking into account the social practices and power relationship that are established

in and through the language, do you agree with Rajagopalan about the English

native speakers currently situation?

Exemplo 5: Trecho da postagem What could challenge you?, de novembro.

In your point of view and according to your experience, what could the

University do to challenge students in order to achieve and improve his/her

technology proficiency for the teaching career? Give you opinion, it can be very

useful!!

No quarto exemplo, galgo estabelecer que os alunos deveriam procurar levar em conta

as relações de poder que se estabelecem na e pela linguagem para tecer suas opiniões.

Acredito que essa possa ser minha tentativa de estabelecer um solo comum para a reflexão, tal

como defendem Magalhães & Celani (2005) e Sacristán (2010). Olhando por esse viés, fica

evidente a não neutralidade de meu discurso (SIGNORINI & CAVALCANTI, 2010), à

medida que surjam interesses e valores que eu gostaria que o grupo levasse no mínimo em

consideração.

Neste último exemplo, quando eu peço aos alunos que levem em conta suas

experiências no momento em que forem tecer seus comentários, fica claro também que meu

discurso é permeado pela voz da reflexão baseada na própria vivência.

Assim, percebo que meu serviço de jardineira teve valor de presença social, tal como

observam Garrison & Anderson (2003), responsável até pela manutenção da comunidade.

Mais do que isso, pode ele ser observado como uma representação de minhas crenças, de

meus valores, de meu processo de assimilação e ressignificação desses objetos de

aprendizagem e do papel que temos dentro desse processo, que é essencialmente construído

alicerçado na experiência.

3.2.2 Tema 2: A procura dos culpados

Na mancha dos comentários, um dos artifícios que aparece com maior força

argumentativa para os participantes é calcar suas reflexões buscando culpados para os

Page 119: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

117

“problemas” que vivenciamos na escola contemporânea. Entre os culpados por tais problemas

estão, conforme os participantes, os alunos, os professores, as famílias, o sistema, e a

universidade. Para ilustrar esse tema tão recorrente no blog, trago exemplos de comentários

tecidos pelo grupo no decorrer do projeto.

Durante os comentários que se seguem, os participantes organizam toda a sua reflexão

tendo como pano de fundo a busca por culpados. O aluno é visto como o mais alijado do

processo, pois ele é um culpado que desconhece até mesmo o porquê ele deveria dar valor

àquilo: students don`t know the English importance for their lives, so they don`t know why

they need to study it.

Exemplo 1: (relativo à postagem Brazilian public school system)

Há também este tom de alienação por parte dos alunos no trecho do exemplo dois the

students are already used to pretend they are having English classes at school.

Já os professores são os culpados, mas não necessariamente alienados de seu papel,

pois eles, na opinião do participante do segundo exemplo, sabem que fazem de conta que

ensinam: most part of the teachers pretend they are teaching English. Ou até mesmo não

querem atuar de maneira satisfatória, como aponta o terceiro exemplo: some teachers don`t

want or don`t know how to do it. Podem, também, tal como se depreende do terceiro exemplo,

não serem bons professores na escola pública por falta de engajamento: They were more

engaged with private courses that State school.

Page 120: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

118

Exemplo 2: (relativo à postagem Brazilian public school system)

Exemplo 3: (relativo à postagem 1- Função Clara)

A família é vista como uma das culpadas pelo mau desempenho dos alunos no

exemplo dois: Another point I`d like to say is the lack of family presence at school [...]

Parents should be part of the school community, talk to the teachers and accompany their

kids' studies more closely.

Como culpados também foram listados o sistema e a universidade. O sistema, por sua

vez, é visto como desestruturado, caótico e sem objetivos: in the public school the teaching is

a chaotyc [...] the public school don`t have any objective in English classes”. Já a

universidade é responsável por esse falta de preparação dos professores: “lack of

preparation of teachers.

Page 121: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

119

Exemplo 4: (relativo à postagem 1- Função Clara)

Exemplo 5: (relativo à postagem Brazilian public school system)

Embora, num primeiro momento, possa parecer que apontar os culpados seja algo

negativo em um processo reflexivo, creio que esse é um dos passos do processo. O que

observo é que em alguns casos, como neste último exemplo, o apontamento dos culpados foi

o mote que possibilitou ao participante ampliar seu olhar para a consequência desses fatos

que, na opinião do participante, é a criação de círculo vicioso que prejudica o processo de

ensino-aprendizagem.

Tal como Zeichner (1994) defende, é papel de quem oferece a formação a esses

professores encorajá-los a ir além da “caça as bruxas”, ou seja, tornar sistemática a reflexão

sobre o contexto mais amplo de sua prática docente, analisando os porquês das diversas

situações que vivenciamos no dia a dia escolar. Acredito, portanto, que esse movimento de

apontamento dos “culpados” possa ser, sim, um dos passos desse processo, mas ele,

radicalmente, não pode nem deve ser o único, sob pena de gerarmos reflexões insossas, que

caricaturam vítimas e culpados e desvinculam as práticas sociais do plano político, histórico e

ideológico.

O tema seguinte enseja como mote de discussão, a busca por compreender o que é e

como se faz um processo reflexivo.

Page 122: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

120

3.2.3 Tema 3: O que é mesmo refletir?

Como já foi debatido no construto teórico deste trabalho, estabelecer parâmetros e

estabilizar o conceito de reflexão é algo muito inconstante e, tal como outra teoria, deve ser

relativizado, pois, é forjado dentro de uma materialidade histórica. Ao passo que os contextos

mudam, mudam também as “verdades” teóricas. Por isso, acredito que um dos temas que

também serviu de cenário para os processos reflexivos que ocorreram no blog foi o próprio

conceito sobre reflexão. Sendo assim, percebi que, para esse grupo, refletir pode significar

conhecer os alunos, ou poderia ser uma ferramenta para adequar seus métodos, metodologias

e/ou estratégias de ensino para situação ou grupo específico. Paralelamente, a reflexão, foi

concebida por alguns como uma maneira de compreender a complexidade e aceitá-la como

um processo passível de conflitos, ou como um processo tranquilo, sem angústias ou

oscilações.

O exemplo abaixo entreabre a perspectiva do que pode ser entendido como um

processo reflexivo, ou ao menos como o primeiro passo para que ele ocorra: conhecer os

alunos. Em alguns comentários foi possível identificar esse posicionamento diante do assunto.

Exemplo 1: (relativo à postagem My own method?)

Seguindo, portanto, a linha de raciocínio estabelecida, ao conhecer os alunos,

passaríamos a conhecer suas necessidades e refletindo sobre elas poderíamos ensinar melhor.

Noto que, neste caso, não há um olhar crítico e contextualizado por parte do participante, até

porque nem sempre suprir aquilo que um grupo julgue ser necessário para si condiz com as

preocupações que a escola pública tem, ou deveria ter. Zeichner (2008) acentua essa postura

de preocupação com o papel da educação enfatizando que os professores “devem agir com

uma clareza política maior sobre quais interesses estão sendo privilegiados por meio de suas

ações cotidianas”. Contudo, isso não quer dizer que o participante negue essas necessidades

Page 123: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

121

defendidas pelo autor, mas que ele deve ser encorajado a ampliar sua perspectiva de análise, o

que depende de muita reflexão.

No próximo exemplo, observo um olhar ainda mais distinto sobre o que seja refletir: A

reflexive teacher is important because with effort he will be hable to to get your purpose, to

help the students. For exemple if the student has dificulty in speaking or listening the reflexive

teacher will develop a way, one activity. Interpreto que refletir, para este participante,

signifique adequar os métodos, metodologias e/ou estratégias de ensino para que o aluno

aprenda melhor, ou seja, uma concepção que poderia, grosso modo, ser comparada à filosofia

deweyana, reconfigurar os métodos, mas desconsiderar o papel político da escola e as relações

estabelecidas lá.

Exemplo 2: (relativo à postagem “My own method?”)

Houve também posturas marcadamente antitéticas neste intento por compreender a

reflexão em si, como pode ser compreendido nos exemplos três e quatro. No exemplo logo

abaixo, ao invés de um sentido único, o participante questiona o leitor do blog: What is the

importance os being a reflexive teacher? Para ele, parece ser necessário reconhecer a

complexidade que este tema demanda it is very interesting to be a reflexive teacher, but, we

must know exactly what this question and its implications mean.

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122

Exemplo 3: (relativo à postagem My own method?)

Já para o participante que redigiu o comentário que insiro como quarto exemplo, há

uma desconsideração da complexidade e dos conflitos que podem ocorrer. O professor

reflexivo _ por ter essa característica _ saberá automaticamente o que fazer para melhorar suas

aulas: If the teacher become a reflexive he/she going to know what to do to improve his/her

class and become it more interesting.

Exemplo 4: (relativo à postagem My own method?)

Essa preocupação em compreender o que seja e como ocorre um processo reflexivo é

uma amostra, a meu ver, de que os participantes estavam tomando consciência sobre suas

responsabilidades no processo educacional. Muitos são os que falam que ser um profissional

reflexivo é importante, mas discutir o quê, e como isso poderia ser feito efetivamente ainda

acredito ser um desafio dentro da universidade.

Por isso, não acredito que alguma dessas considerações seja correta ou mais próxima

ao ideal, mas que todas fazem parte de um processo de amadurecimento sobre o tema. Tal

como defendem Engestro�m (1999), Contreras (1997) e Gimenez (1999), o tema reflexão

pode, sim, ser compreendido de várias formas, a depender do contexto social e histórico, das

teorias e das ideologias pelas quais fomos perpassados no decorrer de nossa experiência.

Além do quê, tal como observam os autores, ação e pensamento não são de todo conscientes,

Page 125: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

123

ou até mesmo, retomando o que postula Giroux (1997), a prática social reflexiva é também

um produto do contexto social e histórico. Por isso, a defesa constante por parte dos

pesquisadores antes citados de que a sistematização, a coletividade e o olhar crítico sejam as

premissas básicas na construção de uma postura reflexiva efetiva.

Dessa forma, o fato de o tema reflexão ter se tornado preponderante nas discussões do

blog já demonstra que este ambiente pode proporcionar a formação de uma comunidade

discursiva, uma rede de interesses e ter papel relevante na formação desses profissionais.

Portanto, o que ocorreu no blog foi um passo importante no processo reflexivo dos

participantes. Mas o que fazer para desenvolver significativamente esse grupo? Acredito que

o próximo passo seria encorajar todo o grupo _ inclusive os próprios formadores se

encorajarem _ a discutir para quê refletir, para quem, a favor de quê, buscando o quê e em

quais condições. Essas são as perguntas que vão esclarecer _ ou rechear de dúvidas _ a

complexidade que o tema carrega em si.

3.2.4 Tema 4: Quero ser um bom professor

O último tema que emoldurou as interações ocorridas no blog foi uma postura muita

positiva em relação ao fazer pedagógico que eles pretendem desenvolver no futuro e o papel

do curso de Letras. Este, de sua vez, é visto como ideal e confiável para que essa formação

ocorra, o que denota de certa forma a confiança que os alunos em formação nele depositam.

Exemplo 1: (relativo à postagem Do you know me?)

Page 126: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

124

Exemplo 2: (relativo à postagem What are your goals?)

Em ambos os exemplos acima há esse desejo de se tornar bom professor de inglês, e

isso se deve, em meu ver, a essa busca do professor em compreender seu papel social. Mesmo

que não se tenham claros os parâmetros do que seja um “bom professor”, o grupo

insistentemente mostrou que esse era um de seus anseios, e até, em alguns casos, como no

exemplo abaixo, os participantes viram aquela comunidade discursiva que estava se

estabelecendo no blog com potencial para transformar esse desejo em realidade.

A universidade, de outra parte, é trazida nos exemplos três e quatro como uma aliada,

mas não necessariamente, ou não somente, em razão das aulas teóricas que lá se estabelecem.

Antes ela é vista como um lugar que funciona como uma ponte para experiência propriamente

dita através de projetos que viabilizam a docência e a pesquisa. No exemplo três, o

participante aponta, que essa experiência foi decisiva para que ele sentisse o inglês de maneira

diferente: When I start at University I felt English in a different way. Now, make part of a

project in English area which is developed in a Public School and I want to learning and

teaching this language a lot.

Exemplo 3: (relativo à postagem Do you know me?)

Page 127: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

125

Exemplo 4: (relativo à postagem Do you know me?)

Da mesma forma, o participante do exemplo quarto expressa sua representação sobre o

papel da experiência docente: It made me enjoy the language even more and the experience I

have been getting since I started there is unmeasurable. Ele ainda finaliza acentuando que,

graças a tudo que tem vivenciado no curso de Letras, está certo daquilo que deseja para sua

vida: ser um bom professor de língua inglesa.

A partir da análise dos temas mais preponderantes, galguei reinterpretar o percurso

dessa comunidade discursiva em ambiente digital. Por meio da reconstrução dessa colcha de

retalhos, procurei representar as forma, ou os caminhos pelos quais o grupo se enveredou em

busca de viver essa experiência.

No próximo capítulo, aponto minhas considerações finais ante a experiência vivida no

blog Reflection-in-action, ressaltando as limitações, as contribuições e as possibilidades de

continuidade deste estudo.

Page 128: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

126

4 COLHENDO OS FRUTOS

Vestindo a Camisa

A folha verde da árvore da amora

alimenta uma pequena lagarta marrom.

A lagarta come e cresce e come

e de um casulo de fios ela se veste.

Quando o casulo seca e a lagarta voa:

borboleta lilás no céu de azul!

Chega o homem e acontece isto:

quem plantou, colhe e põe no cesto,

o tintureiro tinge os fios com aquarela,

a fiandeira fia e faz pano de seda fina,

a costureira cose a camisa que eu visto.

E quando acordo e visto a blusa de manha

eu visto o trabalho da Mao da costureira

a cor do tintureiro e o amor da tecelã.

E visto no corpo um casulo secando ao sol

com a folha da amora e a fome da lagarta marrom.

E como tudo está no corpo de um fiozinho só

e há um mundo na teia de um pano azul-marinho,

na camisa eu visto o sol e o sonho a chuva e o vento

e o galho e a flor e o fruto e o ar e o passarinho,

a borboleta e o sereno, a névoa e a noite passageira

e o calor e o frio a terra o fogo e a água amiga,

e a abelha e o marimbondo a mariposa e a formiga.

Pois a camisa me põe no corpo a terra inteira

e com todo o mundo eu me cubro e entreteço

vestindo uma blusa de seda que me abriga.

(Carlos Rodrigues Brandão)

Nesta dissertação, quis levar os leitores a visitar a conhecer melhor um jardim virtual,

o blog Reflection in Action, que deu origem a esta pesquisa. Descortinei o substrato teórico

que alimentou um olhar diferenciado sobre o assunto, as raízes metodológicas que

sustentaram e guiaram meus passos, bem assim a minha interpretação sobre o desabrochar

Page 129: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

127

desta comunidade virtual. Este é o momento do fim de tarde, quando o Sol se põe, os pássaros

voltam para seus ninhos e o jardim se silencia. É quando busco redesenhar o que vivenciamos

em nosso jardim e refletir novamente sobre minhas representações.

Planejei o jardim desta pesquisa buscando compreender como um grupo de quase

sessenta pessoas _ alunos do curso de Letras de quatro universidades brasileiras, seus

professores e a pesquisadora _ concebidos aqui como os jardineiros, vivenciaria a experiência

de aprendizagem com vista a uma postura reflexiva e crítica de maneira colaborativa. Os

blogs, no início do projeto, eram vistos por mim como um lugar de inúmeras possibilidades,

um espaço no qual quase tudo caberia, o qual, por suas características hipertextuais e de

multiplicidade de gêneros, não demandaria muitos esforços para que lá se instituísse uma

comunidade virtual que desenvolvesse processos reflexivos dentro de um viés crítico e de

maneira colaborativa.

Na busca por compreender de que forma uma ferramenta digital como o blog poderia

ser mais bem empregada na formação de professor, acabei representando a formação dos

outros assentada em minhas próprias experiências e modifiquei a experiência deles, tal como

já postula a abordagem etnográfica. Fizemos parte um do mundo do outro, mesmo estando

longe fisicamente e, com certeza, influenciamo-nos a ponto de ressignificar muitos dos velhos

conceitos e verdades estabelecidas.

Os jardineiros interagiram mutuamente no blog e por e-mail. O objetivo era criar uma

comunidade de aprendizagem em ambiente virtual, no qual, ancorados em uma postura

reflexiva e crítica, pudéssemos discutir inúmeros assuntos relativos ao processo de ensino-

aprendizagem de língua inglesa. E, na busca por compreender melhor como poderíamos usar

a ferramenta blog neste sentido, elaborei duas perguntas de pesquisa, as quais retomo nesse

momento a fim de a elas responder:

1) Quais possíveis indícios de processos reflexivos podem ser observados na

interação entre os participantes?

2) De que forma o grupo procurou construir processos reflexivos neste ambiente

virtual?

Em relação à primeira pergunta, que diz respeito aos indícios de processos reflexivos

no blog, acredito que tenham ocorrido de maneira satisfatória entre os participantes e se

tornaram mais complexos ao passo que a colaboração no blog venha a aumentar aliado ao

fator do tempo, ou seja, em decorrência da prática e da sistematização. Acredito que eu

Page 130: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

128

também passei por inúmeros processos reflexivos durante todo o projeto do blog, enfatizando,

neste caso, os momentos em que recortei os excertos que julgava serem interessantes para a

discussão, na escolha das palavras para redigir os e-mails, as postagens e os comentários.

Como atentei para os níveis de reflexão propostos por Smyth (1992), percebi que a

grande maioria dos participantes sentiu dificuldades para considerar aspectos mais complexos

sobre sua vivência, tais como os significados de nossas atitudes diárias, pondo em linha de

reflexão não somente as causas, mas também as consequências disso, para então, buscar fazer

ou ser diferente. Por isso, a grande maioria não passou desse processo de mera descrição

daquilo que eles fazem ou da melhor maneira como acreditam que as coisas devem ser feitas.

Mesmo quando tendo como base suas próprias experiências de vida, na grande maioria das

vezes há uma desconsideração do contexto, do que tenha lhes influenciado e, também, em

muitos casos, uma desconsideração dos parceiros. Mesmo o blog sendo uma rede social,

houve certo individualismo nas relações. Contudo, como já dito em passo anterior, isso não

pode nem deve ser taxado de maneira negativa, pois, tal como defende Smyth (1992), faz

parte do amadurecimento dos processos reflexivos. Acredito que devememos balizar o

individualismo percebido no blog levando em consideração o contexto da pesquisa _

educacional, usado para e na escola. Acredito que este espaço tendeu a reimprimir a nossa

cultura estabelecida em sala de aula presencial, normalmente contrária à colaboração,

arraigada em processos individualistas. Cabe à universidade, aos grupos formadores e aos

próprios alunos em formação se encorajarem a considerar a complexidade que o tema

depreende e se propor o trabalho de alteridade tal como uma prática contínua em sua vivência

profissional.

Gostaria de relativizar minha representação sobre a participação dos alunos, pois, dada

minha crença em relação ao tema, a qual foi estabelecida e reformulada até mesmo por meio

dos estudos teóricos que fiz para redigir esta dissertação, não podemos radicalmente acreditar

que uma proposta seja de todo clara e automática. A proposta era um blog reflexivo, mas até

compreender o que seja ter uma postura reflexiva, e as implicâncias disso é fonte de muita

discussão. Assim, percebi que a grande maioria, principalmente no início do projeto, não

buscava discutir com mais propriedade os assuntos, ficando tão somente “contentes” por estar

participando, mas sem muito aprofundar o conteúdo de seus comentários. Esse cenário,

contudo, foi se alterando com o passar do tempo. Nos últimos comentários, por exemplo, a

colaboração já era muito mais comum entre os participantes e havia uma busca por

compreender as várias facetas do tema que estivessem discutindo.

Page 131: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

129

A dificuldade em percorrer os caminhos que interpelem nosso comodismo e que façam

aflorar não só as angústias, mas o porquê e o que fazer com elas não é uma prática muito

comum entre o professorado brasileiro. Acredito que isso ocorra porque o professor não se vê

como alguém capaz de produzir sentidos e, muitas vezes, não consegue fazê-lo. Prova disso,

por exemplo, é a massificação do livro didático na escola pública brasileira: os professores

não têm tempo _ e na concepção de muitos nem capacidade para gerenciar a própria aula.

Buscar ser reflexivo e colaborativo, em nosso contexto, em que quase nada proporciona para

que isso aconteça, não é tarefa assim tão simples. A colaboração também é uma relação de

poder, e mudar a cultura do professor somente não basta, uma vez que ele está inserido em um

grupo maior, envolvendo outros professores, coordenadores, direção e a própria escola. Esta,

como instituição, pouco facilita para que a reflexão crítica ocorra.

Já os comentários que foram interpretados por mim como pertencentes aos outros dois

momentos de reflexão são marcados por maiores níveis de colaboração, autoanálise e busca

incessante em refletir sobre os porquês de suas escolhas, de suas crenças e de seus valores.

Foi notável que muito se discutiu sobre o sistema de crenças, isso na condição da própria

teoria. Acredito que tal se deve ao fato de os professores de alguns dos alunos trabalharem

também na linha teórica que se dedica a estudar os sistemas de crenças, a exemplo do que

propõe o professor Dr. Dánie Marcelo de Jesus, orientador deste trabalho, mas que também

atuava como professor de um dos grupos, e a professora Dra. Ana Maria Barcelos. Creio que

isso possa ter influenciado alguns dos participantes para que levassem em consideração isso

durante seus processos reflexivos.

É interessante salientar a importância da criação de uma rede parceira. Penso que, ao

passo que a colaboração ia se estabelecendo, os processos reflexivos iam amadurecendo e se

tornando mais complexos. Esta rede, portanto, pode ter encorajado os alunos a participar,

incentivando-os e, em alguns casos, fazendo da participação deles no blog tarefa incluída nos

deveres curriculares daquele semestre de aulas. A criação de uma rede de colaboração é, tal

como já advoga Perrenoud (2002), premissa básica neste processo de reorquestração das

vozes (Bourdieu, 1980), para a mudança educacional proposta por Fullan (2009). Mas por

quê? Porque, de maneira individualista, corremos o alto risco de não promover espaços de

aprendizagem, pois ela se dá a partir do “outro”. Entretanto, algo que percebi no blog é que

não basta que as pessoas estejam ali reunidas ou que estejam em uma rede social: há que

desejar e esforçar para (re)conhecer no “outro” sua chance de melhorar/mudar. É um esforço

também sistemático e cultural, ou seja, a convivência da alteridade, da colaboração e da

reflexão.

Page 132: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

130

O que foi tímido nos comentários de todas as fases do blog foi o olhar crítico, capaz de

despertar novos caminhos, novas maneiras de agir. Creio que isso tenha ocorrido porque,

além de um ambiente propício, há que estabelecermos um solo comum, assim como defendem

Magalhães & Celani (2005). Colocar-se diante da realidade apropriando-se do seu momento

histórico e reagir a ela, tal como defende Sacristán (2010), é um movimento, ou seja, uma

sistematização. Tornar-se um sujeito que compreenda a reflexão dentro de um viés crítico

também depende de instrumentalização teórica e de escolha prática.

Respondendo à segunda pergunta que se refere às formas como os participantes

procuraram construir esses espaços reflexivos no blog, penso que a busca por cenários que

pudessem emoldurar as cenas desta participação proporcionaram ao grupo subterfúgios para ir

trilhando seus caminhos no blog. Por isso, a análise temática acabou gerando uma

representação interessante sobre esses percursos que podem ser galgados em uma experiência

como esta. Eles perpassam desde o olhar mais taxativo em busca de culpados pelas faltas que

são, em boa parte, de todos, e chegam até os sonhos mais profícuos e bem-intencionados de

ser um bom professor.

Os temas que emergiram dos comentários dos participantes estão intimamente ligados

com os momentos dos quais tratei, baseada nas noções estabelecidas por Smyth (1992). Não

que isso tenha se tornado regra, mas foi comum em meio aos comentários delimitados no

“Momento de observar a paisagem”, uma total caça às bruxas, onde cada um procurava o

culpado pelas coisas “ruins” que já aconteceram em sua vida escolar ou que acontecem na

escola. Já os temas relacionados com compreender o que era um processo reflexivo e sobre o

anseio por se tornar um bom professor, esses já trilharam caminhos mais complexos, estando

normalmente mais ligados aos momentos que metaforicamente intitulei “Momento de

compreender minhas práticas de cultivo” e “Momento de espiar por cima dos muros de meu

jardim”.

Portanto, mediante esta busca inquietante por perceber a maneira como as pessoas se

veem, analisam as suas experiências e o mundo que as cerca, também comecei a me auto-

observar, repensando assim tanto o desenvolvimento profissional quanto pessoal, reavaliando

muitas das minhas escolhas e atitudes perante mim e perante os outros. Daí surgiu o tema que

diz respeito às minhas próprias tentativas de criação e manutenção dessa comunidade de

aprendizagem. Acredito que, entre as práticas que eu faria diferente de modo diferente, estaria

a de dar mais espaço para os alunos na escolha dos textos para discutirmos e até mesmo a de

passar essa responsabilidade para eles. Também percebi que não podemos confundir uma rede

social que se estabelece ao acaso e acreditar que, só porque está na rede, que as pessoas vão

Page 133: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

131

interagir e dela participar. É, sim, necessário, tal como na escola presencial, uma organização

didática para que a coisas ocorram. Os blogueiros precisam estar bem-articulados para obter

sucesso. Assim, vejo que, até o presente momento, parece que os alunos não estão adaptados

ao autodidatismo, mesmo tendo muitas das ferramentas para isso.

Em relação à minha própria experiência no decorrer do projeto, e mais

especificamente olhando para minhas tentativas de criar esse ambiente reflexivo, colaborativo

e crítico em ambiente virtual, percebi que nem sempre tudo que nos propomos fazer é assim

tão automático. No decorrer do projeto, por exemplo, em muitos momentos me senti insegura

sobre meu papel de mediadora e, observando agora minha própria atuação, sinto que poderia

ter sido muito mais colaborativa e ter instigado mais a criticidade, fazendo outros

questionamentos, ampliando o olhar tanto meu quanto dos demais participantes. Também, em

vários momentos, me peguei buscando seguir algum modelo já existente, no qual pudesse me

apoiar para criar o blog. Estava aí meu desejo que alguém me desse a “receita pronta”, desejo

este que, perante qualquer nova tecnologia, é comum de ter, mas de difícil de realizar.

O conteúdo da última postagem do blog falava justamente sobre os propósitos da

formação de professores no que diz respeito à inserção da tecnologia nos currículos. Neste, e

em outros momentos, os colegas participantes expressaram essa mesmo desejo de modelo

pronto, não sabendo como usar o que o ambiente digital. Ainda que, em muitos casos, a

pesquisa tenha servido exatamente para isso _ analisar as várias possibilidades e traçar os

caminhos que teriam mais chances de “dar certo” _, creio que, quando discutimos o ambiente

virtual e o ensino de língua, quase tudo ainda está por ser feito. Em adendo, creio que isso é

fruto da dinamicidade e da contemporaneidade deste novo lugar de encontro que o ser

humano criou.

Um fator deveras interessante foi o uso da língua inglesa na redação dos comentários.

Mesmo que essa não seja minha especialidade, percebi que realmente os alunos buscaram

usufruir de seu conhecimento linguístico sem apelar para tradutores. Acredito que eles se

sentiram mais à vontade em relação ao uso do inglês, porque alguns já pareciam possuir um

nível de proficiência maior e porque o foco nosso não era a correção linguística, mas sim o

uso da língua na construção de enunciados contextualizados. Resumindo, os alunos pareciam

usar a língua para interagir e construir sentido verdadeiramente.

Quanto às limitações enfrentadas no decorrer do projeto, acredito que, embora

tenhamos nos preocupado em articular bem os participantes do blog, criando essa rede

colaborativa, em muitos momentos, os alunos acabavam não participando com tamanha

frequência, ao menos não como o esperado por mim.

Page 134: Ana regina bresolin ufmt dissertaçao

132

Outra limitação se deu na mancha das postagens. Eu havia prometido no mínimo uma

postagem por semana, o que não ocorreu, pois senti que nem todos estavam se

disponibilizando para despender tanto tempo assim no projeto. Como, para muitos alunos,

isso fazia parte de seus processos avaliativos, fiquei com medo de sobrecarregá-los e acabar

forçando demasiadamente a participação deles.

Como professora, pude perceber que meu fazer docente e o processo de aprendizagem

dos alunos em ambiente virtual ainda é uma semente. Assim, acredito que não se trata de

somente marcarmos a hora o local, mas precisamos ter uma razão. Acima de tudo, é preciso

preparar o terreno para que os processos reflexivos ocorram e estudar cada vez mais essas

novas interfaces que, se bem usadas, têm muito potencial educativo.

Na qualidade de pesquisadora, tive a oportunidade de entrar em contato com a

pesquisa interpretativista, perspectiva esta que me fez olhar o mundo por um viés ainda mais

subjetivo, e aceitar a subjetividade como inerente à experiência humana vivida e representada.

Perscrutar as microrrelações pode nos fazer pensar o macro de maneira mais clara. Essa foi

uma rica oportunidade para ouvirmos as inúmeras vozes que no blog se estabeleceram.

Retomo uma das questões que se refere ao movimento exotópico que o pesquisador é

requisitado a fazer durante sua caminhada. Uso a palavra requisitado, porque compreendo que

após passar por esse processo de análise e de escrita, me vi em muitos momentos tendo que

desdobrar-me em vários papéis, exercitando o estranhamento e o constante questionamento.

Quando iniciei esta pesquisa, observava meu objeto com olhos de professora. Não que os

professores em geral não usem teorias ou métodos de pesquisa, mas para mim, este processo

de apropriação de um aparato teórico e metodológico a fim de guiar meu olhar, tem sido um

exercício sobremaneira interessante e de imensa busca por mobilidade interpretativa.

Acredito, após a experiência vivida, que o movimento exotópico, requisitado como

instrumento de pesquisa e postura evocada pelo pesquisador, dependeu de treino constante e

de muita orientação. É difícil num primeiro momento ativarmos nosso senso de

estranhamento. Até pelo fato de estarmos diariamente em contato com o objeto pesquisado,

temos a sensação de que as coisas vão se naturalizando. E como exercitar então o

estranhamento? No meu caso, constantemente recebia orientações para desenvolver esse

senso, e ele só fez sentido e começou a dar frutos a partir de muitas leituras e releituras, de

imensa discussão e busca por reflexão. O processo de revisitação constante dos dados aliado

as leituras fez com que eu construísse os sentidos. Desta forma, penso que este texto, que ao

mesmo tempo é processo e produto, ecoou as diversas vozes presentes no blog.

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Assim, suponho que este trabalho tenha dado certa contribuição aos estudos

relacionados à formação de professores de línguas em ambiente virtual. Além disso, na

qualidade de pesquisadora, a experiência vivida foi enfaticamente enriquecedora em dois

momentos. O primeiro diz respeito às minhas ressignificações sobre as redes sociais, sobre a

educação em ambiente digital, sobre o papel do professor, do aluno e da escola neste

contexto. O outro, considero uma redescoberta do processo de escrita, que parafraseando a

metáfora de Amorin (2001; 2003), hoje é para mim uma viagem. A autora compreende que

quando nos lançamos nesta viagem, devemos nos permitir pensá-la como um trabalho, ou

seja, um trabalho de escrita. Desta forma, permeada pelo olhar bakhtiniano, se assim o

fizéssemos, seríamos ao mesmo tempo mais objetivos e subjetivos em nossos textos de

pesquisa. Objetivos, no sentido de avisar nosso leitor de que aquele texto é, nas palavras de

Amorin, “uma certa dimensão” do encontro do pesquisador com seu objeto. Assim, o texto

que lhes apresento não foi uma restituição daquilo que ocorreu em campo, muito menos dos

sentidos do discurso lá instituídos. Subjetiva, pois minha escrita já é outra cena enunciativa,

na qual busco restituir a significação, ou as minhas representações sobre a experiência vivida,

Em adendo, por meio das metáforas, prática muito comum que tomei emprestada da

pesquisa-narrativa, exercitei meu lado mais poético, também na tentativa de dialogar com o

leitor sobre minhas sensações e representações acerca do que contei nesta dissertação.

Acredito que para os demais participantes, alunos das universidades parceiras e seus

professores, esta experiência por igual tenha sido interessante. Depois do blog eles já não

sejam mais os mesmos, pois vivenciaram momentos de reflexão sobre inúmeros temas que

não teriam experimentado se não fosse aquele blog, com aqueles colegas, naquele momento.

Espero que o blog tenha contribuído na ressignificação de conceitos e atitudes em prol de um

ensino mais reflexivo e crítico, não só na universidade, mas também pelos caminhos que eles

ainda vão trilhar.

Traçando perspectivas para outros passeios nos jardins virtuais que a internet nos

proporciona, trago como sugestão para estudos futuros de que maneira os participantes se

sentem vivenciando estas experiências reflexivas. Seria possível também analisar as relações

de poder havidas entre os participantes, ou dando ênfase em como se estabelecem as parcerias

e as colaborações. Podemos ainda, perscrutar a influência do blog no processo de escrita em

língua estrangeira. Como última sugestão, este trabalho também poderia ser feito com

professores que já atuam nas redes públicas de ensino e que desejam transitar por uma

experiência em rede.

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O jardim virtual que busquei representar ao leitor deste texto surgiu através de minha

inquietação sobre como a educação pode usufruir da rede mundial de computadores a fim de

construir uma sociedade mais igualitária. Ao vivenciar a experiência de mestranda,

pesquisadora e organizadora do projeto do blog, experimentei inúmeras angústias, venci

desafios e me tornei alguém que busca compreender a complexidade e a importância de nossa

experiência docente.

Assim, é chegada a hora de parar a discussão. O Sol já vem chegando, até porque há

sempre um novo amanhecer nos jardins da vida. Relembro da experiência que vivi, dos

amigos que fiz, das pessoas que ajudei e das tantas que me ajudaram. Penso que eu poderia ter

feito muitas coisas de maneira diferente, mas sempre é tempo de recomeçar e tentar

novamente. Mesmo sabendo que esse momento de “finalização” era por mim tão esperado, é

difícil pôr um ponto final, uma vez que sempre há o que discutir, a cada nova leitura, minha

vontade se inclina a reescrever muita coisa _ o que acredito ser até muito comum entre os

colegas. Termino com a sensação de que ainda passearei por muitos outros jardins

cibernéticos. Mais ainda que nos encontraremos pelo espaço “virtual”, para mim tão “real”

quanto outro qualquer.

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