Análise do Orçamento Geral do Estado (OGE) na óptica da...

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3.1. Introdução A análise do OGE na óptica das despesas, ajuda a perceber o impacto que as políticas públicas têm sobre o desenvolvimento humano. A análise foi realizada para as principais rubricas orçamentais na óptica da despesa pública e para alguns programas principais identificados como tendo um maior impacto sobre o desen- volvimento humano. Três dimensões da despe- sa foram consideradas nesta análise: a com- posição do OGE; o seu nível de realização; e os ritmos de crescimento. A composição do OGE representa a alo- cação anual de recursos públicos por funções de despesa, ou seja, em que sectores ou onde a despesa terá lugar. Ela deverá reflectir, igualmente, tendências estruturais de despesa de médio e longo prazo (óptica de programas com orçamentos pluri-anuais) e, também, um certo grau da própria inércia institucional (orçamentos anteriores condicionam orçamen- tos futuros). No essencial , em termos de economia política, a composição do OGE representa o nível de equilíbrio dos diferentes interesses de grupos de classe, muitas das vezes opostos, sendo que cada sector tenta negociar, da melhor maneira, uma maior fatia de recursos públicos. Os níveis de realização do OGE são um proxy dos níveis de prioritização infra-anual da execução das próprias políticas públicas. Elas mostram as prioridades reais de facto, quando o poder público é confrontado com novos cenários de despesa. A disponibilidade de recursos efectiva a curto prazo, conjugada com a pressão sectorial e, ainda, a capacidade de realização ou implementação, são factores a ter em conta. Em última análise, mostram o real poder político dos diferentes actores que compõem o Governo, na sua capacidade de influenciar a realocação da despesa. Finalmente, os ritmos de crescimento mostram a dinâmica temporal das alterações na composição do OGE e da sua capacidade de realização. Para efeitos de análise, as despesas públicas a preços correntes, foram deflacionadas a partir de preços de mercado do PIB de 1992, ajustados a 2000, a base de cálculo de análise. Por outro lado, houve a necessidade de agregar as despesas públicas por natureza das mesmas, ou seja, uma óptica mais funcional do que sectorial. Assim, foram criados para efeitos de análise, o sector de soberania, que agrega as despesas com os serviços públicos gerais, a defesa, a segurança e ordem pública; os serviços sociais, que incluem as despesas com a educação, saúde, segurança e assistên- cia social, habitação e serviços comunitários e cultura, recreação e serviços religiosos; os serviços económicos, que incluem os com- bustíveis e energia, agricultura, pecuária e sil- vicultura, mineração e recursos minerais, transportes e comunicações e outros serviços; capítulo 3 >> Análise do Orçamento Geral do Estado (OGE) na óptica da despesa pública Relatório de Desenvolvimento Humano | Angola 2005 51 Em última análise, mostram o real poder político dos diferentes actores que compõem o Governo, na sua capaci- dade de influenciar a realocação da despesa.

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3.1. Introdução

A análise do OGE na óptica das despesas, ajudaa perceber o impacto que as políticas públicastêm sobre o desenvolvimento humano. Aanálise foi realizada para as principais rubricasorçamentais na óptica da despesa pública epara alguns programas principais identificadoscomo tendo um maior impacto sobre o desen-volvimento humano. Três dimensões da despe-sa foram consideradas nesta análise: a com-posição do OGE; o seu nível de realização; e osritmos de crescimento.

A composição do OGE representa a alo-cação anual de recursos públicos por funçõesde despesa, ou seja, em que sectores ou ondea despesa terá lugar. Ela deverá reflectir,igualmente, tendências estruturais de despesade médio e longo prazo (óptica de programascom orçamentos pluri-anuais) e, também, umcerto grau da própria inércia institucional(orçamentos anteriores condicionam orçamen-tos futuros). No essencial , em termos deeconomia política, a composição do OGErepresenta o nível de equilíbrio dos diferentesinteresses de grupos de classe, muitas dasvezes opostos, sendo que cada sector tentanegociar, da melhor maneira, uma maior fatiade recursos públicos.

Os níveis de realização do OGE são umproxy dos níveis de prioritização infra-anual daexecução das próprias políticas públicas. Elasmostram as prioridades reais de facto, quandoo poder público é confrontado com novoscenários de despesa. A disponibilidade derecursos efectiva a curto prazo, conjugadacom a pressão sectorial e, ainda, a capacidadede realização ou implementação, são factoresa ter em conta. Em última análise, mostram oreal poder político dos diferentes actores quecompõem o Governo, na sua capacidade deinfluenciar a realocação da despesa.

Finalmente, os ritmos decrescimento mostram adinâmica temporal dasalterações na composição doOGE e da sua capacidade derealização.

Para efeitos de análise,as despesas públicas a preços correntes, foramdeflacionadas a partir de preços de mercadodo PIB de 1992, ajustados a 2000, a base decálculo de análise.

Por outro lado, houve a necessidade deagregar as despesas públicas por natureza dasmesmas, ou seja, uma óptica mais funcional doque sectorial. Assim, foram criados paraefeitos de análise, o sector de soberania, queagrega as despesas com os serviços públicosgerais, a defesa, a segurança e ordem pública;os serviços sociais, que incluem as despesascom a educação, saúde, segurança e assistên-cia social, habitação e serviços comunitários ecultura, recreação e serviços religiosos; osserviços económicos, que incluem os com-bustíveis e energia, agricultura, pecuária e sil-vicultura, mineração e recursos minerais,transportes e comunicações e outros serviços;

capítulo 3 >>

Análise do Orçamento Geral do Estado

(OGE) na óptica da despesa pública

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Em última análise,mostram o real poderpolítico dos diferentesactores que compõem oGoverno, na sua capaci-dade de influenciar arealocação da despesa.

e finalmente os encargos financeiros e outrasdespesas que incluem as operações com opagamento da dívida pública interna e externae transferência entre diferentes níveis degovernação. Nas transferências estão incluídosos subsídios, em particular, aos combustíveisque têm peso importante em alguns anos.

Com o objectivo de apresentar uma ideiada grandeza em valores absolutos das despesaspúblicas e sua relação com estimativas do pro-duto interno bruto, foi elaborado o quadroseguinte que dá um enquadramento macro dasanálises apresentadas a seguir.

Para efeitos de valorização em dólares, asdespesas públicas foram calculadas com basena taxa de câmbio média anual e taxas de câm-bio semestrais, que melhor reflectem asdinâmicas infra-anuais e têm em linha de contaos níveis de desvalorização da moeda nacional.

Finalmente, as despesas públicas realizadascom base nas duas taxas de câmbio, foramcomparadas com o valor do PIB, para se poderavaliar o peso do sector público na economia,que se situa em alguns anos, a metade do PIB.

Isto por outras palavras, significa que o Estadotem um enorme peso sobre a economia, o quepode ser visto por muitos analistas, como umentrave ao desenvolvimento da economia e dosector privado, pois ambos disputam as mes-mas fontes de crédito e nalguns casos asmesmas áreas de intervenção.

Caixa 5 - E se o Produto Interno Bruto (PIB) estiver mal estimado ?

Quando se analisa a despesa públicaexpressa pela execução do OGE, é inevitávelque a mesma seja comparada com o ProdutoInterno Bruto (PIB). O objectivo é, ter umaideia da participação do Estado na criaçãoanual de riqueza nacional. Quanto mais eleva-da for essa participação, menor peso terá osector privado na produção da riquezanacional. Não há receitas económicas sobre aoptimização das despesas públicas, que podemvariar de acordo com as estratégias de desen-volvimento, regime político e social vigente e,disponibilidade de recursos.

Em períodos de recessão económica, temsido comum que a despesa pública aumentepor forma a dinamizar o crescimento da econo-mia, através da aquisição de bens e serviços aosector privado. Por essa via se promove aredução do desemprego típico das situações derecessão económica. Em situações de pós-con-flito, é legítimo esperar que o esforço dereconstrução do capital físico público da

n a ç ã o ,i m p o n h auma forted e m a n d asobre osr e c u r s o sp ú b l i c o s .Igualmente,que umam a i o ra t e n ç ã oseja dedica-da à for-mação doc a p i t a lhumano.

Q u a l -quer que seja a circunstância histórica em quese encontra um país, o rácio Despesas Públi-cas/PIB deve ser monitorado pelos analistas efazedores de políticas. Aqui se levanta aquestão de saber sobre a qualidade do indi-cador PIB, já que os dados do OGE são à parti-da conhecidos. Na impossibilidade de acesso à

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metodologia de cálculo das contas nacionais ecomo tal do PIB, que não é do conhecimentopúblico em Angola, esta análise socorre-se deum conhecimento empírico da economiaangolana e, da experiência de outros países,em particular, africanos.

Angola é um país caracterizado por umforte sector informal urbano e uma economiaagrícola de subsistência, que se presume ocu-par metade da sua população. Estes dois sec-tores coabitam com um sector moderno daeconomia, assente largamente no enclave

petrolífero e extractivo (diamantífero). O sec-tor de indústria transformadora, sofreu umforte processo de desindustrialização, noperíodo pós independência, não tendo aindagrande expressão em termos de contribuiçãopara o PIB. Os elevados níveis de desempregourbano estimados ao redor de 46% têm pro-movido, largamente, o emprego no sectorinformal urbano.

Na África sub-sahariana em 1990, a pro-porção da mão de obra urbana no sector infor-mal, foi estimada ao redor de 61% e mostravapoucas variações inter-países. A proporção dosector informal no emprego urbano na Ásia,varia, segundo estimativas, entre os 10% nospaíses recentemente industrializados, a 65%,não obstante um intervalo de entre os 40 aos60% seja mais típico para esta região. A médiapara a América Latina foi estimada em 25% em1990, embora se registam variações consideráveisentre países (Costa Rica e Venezuela, 20%;Bolívia e Equador acima de 50% (1980)).

No caso concreto de Angola, o sector infor-mal urbano é constituído por uma variedade de

actividades económicas que incluem: comércioa retalho; serviços; transporte (táxi); comércioe distribuição de água; construção civil; pro-dução de materiais de construção (adobes);artesanato, etc. Com base em estudos anteri-ores a maioria da mão de obra no sector infor-mal urbano é largamente feminina, nomeada-mente, no sector do comércio a retalho. Anível rural, para além da agricultura tradi-cional, há que ter em linha de conta as activi-dades de mineração artesanal de diamantes,que constituem a base da economia familiarem algumas províncias.

Que factores, entre outros, poderão afec-tar a qualidade do PIB em termos de cobertu-ra da economia? Por um lado a fraca qualidade,disponibilidade e cobertura (capacidade decobrir ao máximo o universo de estudo) dasestatísticas sectoriais referentes ao sector for-mal moderno da economia (indústria transfor-madora; construção civil; transporte; comércioa retalho; energia e água; serviços; agriculturae pescas) . Por outro lado, a não inclusão deestimativas da contribuição do sector informalurbano e da economia tradicional agrícola.

Como se pode observar, as fontes de errode cobertura podem resultar, quer da fracaqualidade das estatísticas do sector formal daeconomia (que parece ser o caso de Angola),por um lado, quer, por outro lado, da nãoinclusão do sector informal da economia nametodologia de cálculo das contas nacionais.

Não é do conhecimento público a realiza-ção de qualquer estudo sobre o aproveitamen-to dos resultados dos inquéritos de receitas edespesas para o cálculo da contribuição do sec-tor informal. O balanço entre uso e oferta deprincipais produtos é, geralmente, o métodomais comum para estimar o sector informal nasactividades transformadoras e, o seu usorequer a disponibilidade de dados sobre o con-sumo do agregado familiar. A estimação dacontribuição dos serviços no sector informalurbano, nem sempre é possível ser realizado,usando o método do equilíbrio pelo queassumpções têm de ser feitas sobre a produ-tividade da mão de obra, baseadas em dadosmuitas das vezes aproximados, a partir de umnúmero de unidades muito pequeno. Os sis-

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temas de recolha de dados maiseficientes, incluem um inquéritoaos agregados familiares, realiza-do a cada 5 anos (um inquéritoaos estabelecimentos agregado aode receitas e despesas por formaa reconciliar os dados sobre a pro-dução, rendimento e consumo nomesmo inquérito) e um inquéritoanual ou infra-anual da mão deobra, com uma secção especialpara a estimação do sector infor-mal. Uma vez mais, não é doconhecimento público a realiza-ção de inquéritos anuais ou infra-anuais, nosúltimos anos em Angola.

Por inferência se pode concluir que a situ-ação Angolana aponta para uma não inclusãodo sector informal da economia no cálculo daeconomia nacional. Então, é pacífico suporque uma sub-estimação do PIB possa estar aocorrer.

A tabela que se apresenta a seguir consti-tui um exercício de cenários de recálculo doPIB, considerando a inclusão do sector infor-mal, a partir de dados recolhidos de outraseconomias de países sub-desenvolvidos, con-forme um estudo comparativo realizado .

Como se pode observar na tabela ao lado,

uma subestimação de 25%, implicaria umaredução que varia de 9 a 10%, no racio dadespesa pública sobre o PIB angolano (2000-2002). A média sub-sahariana, encontrada noestudo acima referido, é de uma contribuiçãode 25,9% do sector informal para o produtointerno bruto. No caso de Moçambique, paísque atravessou um percurso histórico de con-flito com fortes deslocamentos de população eurbanização acelerada, a contribuição para oPIB situou-se em 38,9%. Qualquer que sejam oscenários usados os novos rácios da despesapública sobre o PIB colocam Angola numaposição menos atípica da média da região daSADC.

As implicações da sub-estimação do PIB,vão para além da grandeza do rácio emanálise, pois o PIB é, também, denominadorpara o indicador PIB per capita por exemplo.

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3.2. Composição do OGE

No processo de alocação do OGE no perío-do em análise, parece terem predominado aspreocupações de reforço e alargamento dasfunções de soberania (administração pública,defesa e ordem pública) e encargos financeiros

relativos ao pagamento do serviço da dívida eda própria dívida. As preocupações com opagamento da dívida, estãoilustradas pelos recursos autoriza-dos em 2000 e 2002. Este esforçode pagamento da dívida, tem sidorealizado à custa da relativa esta-bilidade da alocaçao de recursosautorizados aos sectores sociais eeconómicos. Outra característicaprincipal das tendências orça-mentais por sector é a sua vari-abilidade temporal, parecendonão haver uma constância relativade um ano para outro.

Caixa 6 - A ajuda pública ao desenvolvimento e o pagamentodo serviço da dívida externa

A tabela abaixo, mostra a relação entre osmontantes de ajuda pública ao desenvolvimen-to recebidos por Angola e, os montantes que

Angola vem pagando ao exterior,maioritariamente, relativos aoserviço da dívida externa. O queos dados mostram é que Angolapaga mais de dívida, anualmente,do que recebe de ajuda interna-cional. Os saldos têm sido nega-tivos, estimando-se que tenhaatingido 833 milhões de dólaresem 2002.

Sob o ponto de vista do desenvolvimentohumano, isto constituí uma forte contradição.

Angola deve ser, talvez, o únicopaís do mundo saído de uma longaguerra, ainda num processo detransição política e com gravesproblemas estruturais, que pagaum serviço de dívida externa tãoelevado. No ano orçamental de2002, isso correspondeu a 26% doseu orçamento público. Mais demetade da ajuda pública entre2001 e 2002 foi dedicada áemergência.

Vários analistas e instituições,têm aconselhado o Governo aabandonar a prática de contrair

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empréstimos bilaterais garantidos competróleo, sugerindo como alternativa aobtenção de um acordo com as instituições deBretton Woods, cujas taxas de empréstimo sãoclaramente mais baixas.

Como se pode obser-var, a rubrica serviçospúblicos gerais, é aquelaque, em conjunto com osencargos financeiros -maioritariamente, opagamento da dívida - adefesa e a ordem públi-ca, que possui a maiorcontribuição individualorçamental.

A análise dos doissectores sociais maisimportantes, mostra quepara a Educação, a con-tribuição para o ensinoprimário ronda quase osmesmos valores alocadosao ensino terciário. Emtermos de política daeducação, isto pode sertraduzido por uma baixaprioridade ao ensinoprimário vis-a-vis o ensi-no terciário. Por outro

lado, a rubrica Outros Serviços da Edu-cação pelo seu peso elevado, aliás arubrica da educação com maior peso,distorce a análise anterior, se não setiver conhecimento da sua aplicação defacto.

O Governo subscreveu as Metas deDesenvolvimento do Milénio (MDM),entre as quais a meta 3, de alcançar oensino primário para todos até 2015,através da execução do Plano Nacionalde Acção sobre a Educação para Todos(2000-2015). Aos actuais baixos níveis dedespesa com o sector da Educação (7.7%em 2003) acrescido às tensões intra-sec-torial, exemplo do terciário e primário,pela maior fatia do já escasso orçamen-to da educação, é ilusório pensar que talobjectivo possa ser atingido em 2015.

Isso implicaria a nível dos orçamentos, no mín-imo a realização de dois tipos de acçãosimultâneas, cujas decisões são mais dodomínio político que tecnocrata.

(1) Compromisso político do Governo em

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manter o nível de orçamento anualpara a educação ao redor dos 20%(média da SADC) durante os próximos10 anos;

(2) Re-equilibrar a afectação orçamentalintra-sectorial entre o ensino primárioe os restantes níveis de ensino. Aintrodução de mecanismos de finan-ciamento subsidiado de bolsas deestudo para o sector terciário, bolsasreembolsáveis pelos alunos a médio elongo prazos, poderia ser uma soluçãoadequada para reduzir a pressãosobre o OGE da Educação. Mecanismoidêntico poderia ser aplicado ao ensi-no técnico profissional. Para além dasimplicações fiscais e orçamentais, iriaajudar a reorientar a oferta e procurade serviços de educação, mais deacordo com as necessidades do mer-cado.

Com relação à saúde, a rubrica orçamentaldestinada aos Hospitais tem a prioridade noorçamento da saúde. À excepção de 2002, emque a rubrica Saúde Pública teve a maior afec-tação, a mesma não tem recebido a maior pri-oridade social. Aqui também se observa que arubrica Outros Serviços de Saúde possui umpeso relativamente elevado, já que consti-tuíam em 2003 quase 50 % do orçamento dasaúde.

3.3. Nível de realizaçãoorçamental

De uma forma global, o nível de realizaçãoorçamental, tem vindo a melhorar nos últimosanos, conforme mostram a tabela e o gráficoabaixo. Assistiu-se a um esforço de maior rigorna execução do orçamento aprovado, por umlado, mas por outro, observou-se uma sobre-realização do orçamento no ano de 2003. Ouseja, foram realizadas despesas não previstasno orçamento, na ordem dos 19%. Con-tribuíram para esta sobre-realização, as rubri-cas do sector de soberania que tiveram no seuconjunto uma sobre-realização de 76%.

A análise do desvio médio noperíodo (2000-2003) entre o OGEprevisto e o realizado, mostra queo sector de soberania é aqueleque apresenta uma sobre-alo-cação anual de recursos, atingin-do em média, cerca de 23%. Amaior sobre-alocação do orça-mento em benefício do sector desoberania ocorreu em 2003, comofoi assinalado anteriormente.Uma análise intra-sectorial dessesector, mostra que isso se deveulargamente à rubrica de serviçospúblicos gerais, que em 2003,tiveram uma alocação 50% acimada previsão inicial.

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Por outro lado, os serviços sociais, que em2002, registaram uma sobre-alocação derecursos, (cerca de 60% acima do que foi, ini-cialmente, orçamentado) sofreram, em 2003,uma queda acentuada, ficando a cerca de 33%do orçamento previsto. Uma análise dasdiferentes rubricas que constituem o sectorsocial mostra uma forte instabilidade derealização orçamental no período em análise.Por exemplo, a nível da Educação observa-seque o Ensino Terciário teve, em 2003, umasobre-alocação de recursos na ordem dos 92%,enquanto que o Ensino Primário teve umasub-alocação na ordem dos 35%. Já as rubricas,

Outros Serviços de Edu-cação e Serviços de Edu-cação não identificadostiveram um desempenhomelhor. É notório que arubrica Ensino Primárioé aquela que, nãoobstante ter o maiorimpacto sobre a quali-dade do IDH, ser das quepior desempenho médioanual teve neste perío-do. A nível da Saúde os

níveis de realização das rubricas componentessão, relativamente, mais estáveis entre si.

3.4. Ritmos de crescimento do OGE

O OGE realizado cresceu, em média, 1,9vezes por ano no período 2000-2003, a preçosconstantes de 2000. O sector orçamental desoberania foi o que apresentou o maior cresci-mento anual médio, aproximadamente 4

vezes, a explicaresforços substanciais naextensão da adminis-tração do estado, visan-do a consolidação dapaz. Já o sector socialcresceu em, média, nomesmo período duasvezes. Ainda neste perío-do o crescimento não foiuniforme, registando-seum crescimento maisacelerado de 2002 a 2003do sector de soberania,comparativamente aosoutros sectores. Entre2000 e 2003, as despesaspúblicas cresceram cercade 5 vezes, um cresci-mento notável comoresultado provável doPrograma de Investimen-tos Públicos (PIP)

Em resumo, os dados

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mostram uma expansão geral da despesa públi-ca no período em análise com uma aceleração

de crescimento no último orçamento. Poroutro lado, o crescimento por sectores não éuniforme com prioridade de crescimento parao sector de soberania.

3.5. Análise do orçamento da Educação por programas

A tabela seguinteapresenta os valores doorçamento da educaçãoem termos globais e porrubricas orçamentais em$US.

Pode-se observar, quea partir de 2002 o orça-mento atribuído à Edu-cação passou a ser dis-tribuído por programas,a fim de permitir umamelhor visibilidade fun-cional das despesas den-tro do sector. Nãoobstante esse esforço,

verifica-se que existem dois programas genéri-cos, que sozinhos, detêm a maior parte do

orçamento da educação. Em 2002, o programaMelhoria da Qualidade do Ensino recebeu 73%do total do orçamento realizado do sector,enquanto que, em 2003, o programa Gestão daPolítica de Educação e Cultura receberia 69%.Por outras palavras, comparando com os anos

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anteriores (2000 e 2001) em que somente 34%e 19%, respectivamente, dos orçamentos realiza-dos haviam sido atribuídos a programas, nãoparece ter havido, de facto, uma mudançaestrutural na distribuição de recursos directa-mente aos programas. Assim, continua a existiruma gestão centralizada, assente amplamente

num único programa. Este último aspecto levaa que uma análise mais aprofundada dos difer-entes programas acabará, necessariamente,por ficar enviesada pelo peso dos referidosprogramas.

3.5.1. Contribuição relativa por componente de análise e programas

A tabela seguinte, agrupa os diferentesprogramas da educação por componente deanálise mais agregada (ex. ensino primário,secundário, etc). Uma tabela mais detalhadacom cada programa por componente de análiseé apresentada logo a seguir.

Como foi anteriormente assinalado, aexistência de dois programas em 2002 e 2003com 73 % e 69 % da fatia do orçamento, enviesae deturpa a análise que se pretendeu realizar.Certamente que esses programas suportamoutros programas, não se sabendo contudo, emque proporções isso esta a ser feito.

Como se pode observar a partir da primeiratabela, constata-se que a contribuição relativados programas listados sob a componente Ensi-no Primário correspondeu a 8,8% do orçamentorealizado enquanto que os programas sob acomponente Ensino Superior receberam 12,6 %do orçamento realizado.

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A nível da componente Ensino Primário, oprograma de Construção e Reabilitação deEscolas tem o maior peso específico (60%) em2002 e 2003. A nível do ensino superior, o pro-grama de Reestruturação da UniversidadePública Agostinho Neto (UAN), recolheu 75% dafatia atribuída a programas da componenteEnsino Superior.

3.5.2. Taxasde crescimentodos programas

A tabela a seguir apre-senta as taxas de cresci-mento dos orçamentosrealizados dos programasa preços constantes de2000. Observa-se que acomponente do EnsinoPrimário cresceu 7.5vezes (2000-2003)enquanto que a compo-nente do Ensino Superiorcresceu quase 3 vezes nomesmo período. Regis-tou-se uma forte aceler-ação no crescimento da

componente EnsinoSuperior no último anodo período em análise.

Análise de pro-gramas específicos(com 3 anos decontinuidade)

O programa de Construçãoe Reabilitação de EscolasPrimárias foi iniciado em2001 tendo tido cresci-mentos consideráveis derealização orçamental(2000-2002 = 18.7 e2000-2003 = 5.5 vezes).Já o Programa de Meren-

da Escolar que, supostamente, deveria ter umimpacto directo sobre a pobreza junto das cri-anças mais desfavorecidas, teve um cresci-mento em termos reais de 1.14 vezes (2001-2002) e uma queda entre (2002-2003) de 0.72,ou seja, inferior ao orçamento realizado noano anterior. A Formação de Professores teveum crescimento de 7 vezes entre 2002-2003.Por outro lado, a Melhoria da Qualidade deEnsino teve um pico de crescimento em 2001-2002 seguido de uma queda vertiginosa em

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2003. Finalmente, o pro-grama de Erradicação doAnalfabetismo teve umcrescimento estável noperíodo em análise.

3.5.3 Principaisconclusões

A análise dos progra-mas da educação permitiuconstatar entre outrascoisas o seguinte:

* Existem programasque não têm con-tinuidade de umano orçamentalpara outro, comopor exemplo o Pro-grama de Con-cessão de Bolsasde Estudo, cujosvalores não estãolistados em 2001 e2002; programasrelativos ao ensinosecundário (2001);embora se assumaque eles existam;

* Durante os quatroanos de análise doso r ç a m e n t o s ,somente 5 progra-mas tiveram con-tinuidade ao longodos orçamentos.Foram listados 16programas em2001; 36 programasem 2002; e 24 pro-gramas em 2003.Os programas comcontinuidade nosorçamentos foram:Merenda Escolar;Construção eReabilitação de

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Escolas Primárias; Melhoria da quali-dade de Ensino; Formação de Profes-sores e Erradicação do Analfabetismo;

* Existem programas que mudaram dedesignação (ex. ensino superior e ensi-no terciário; investigação científica edesenvolvimento científico e tecnológi-co) ou têm uma designação insuficienteou demasiado genérica para perceber oseu âmbito de intervenção programáti-ca (ex. Gestão da Política de Educaçãoe Cultura; Produção de cadernos esco-lares e Operação carteira, livro escolare material didáctico);

* Existem programas que ultrapassaramlargamente as taxas de realização,casos dos programas de Reestruturação daUniversidade Públi-ca (UAN), 7,8 vezessuperior ao orça-mento autorizado(2003); Programade Desenvolvimen-to do Ensino Profis-sional, 19 vezessuperior ao autoriza-do (2002);

* Existem programascujas afectaçõesorçamentais variamsubstancialmentede um ano para ooutro, como porexemplo, a Formação de Professores(2001, 2002, 2003); Desenvolvimentodo Ensino secundário (2002, 2003);Melhoria da Qualidade de Ensino (2001,2002, 2003)

* A distribuição dos recursos do orçamen-to geral da Educação por Programasainda é limitada, pois continua a existiruma gestão centralizada, assenteamplamente num único programa (ex.2002 (73%); 2003 (69%)).

* A descontinuidade na alocação de fundosaos programas revela, uma certa faltade programação estratégica multi-

anual orientada para os resultados eexplica em parte a estagnação que seassiste nos principais indicadores daeducação.

3.6. Análise do orçamento daSaúde por programas

O gráfico seguinte mostra o orçamento dasaúde per capita realizado. Como se podeobservar, registou-se um crescimento do orça-mento per capita atribuído à saúde no períodoem análise. Seria muito aconselhável que oritmo de crescimento per capita se mantenha,para lograr alcançar alguns dos indicadores de

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desenvolvimento domilénio, em particular, nasáreas ligadas à saúdepública.

A tabela seguinteapresenta os valores doorçamento da saúde emtermos globais e por pro-gramas em Dólares Norte-Americanos.

A distribuição do orça-mento da saúde àexcepção de 2002 continuaa estar concentrada a nívelde uma única rubricageral. Ou seja, assume-seque tenha havido, no sec-tor, uma gestão do orça-mento fortemente concen-trada a nível central, aoredor dos 52 % em 2000,49% em 2001 e 44% em2003. Isto levanta forteslimitações a qualquer tipode análise por programas,já que se desconhece comoé alocado metade do orça-mento. A título de exemplo,a variabilidade da con-tribuição relativa dos pro-gramas listados sobre ascomponentes de análiseSaúde Pública e MedicinaHospitalar, levanta sériasquestões. A gestão dos hos-pitais não poderia ter sidorealizada com afectaçõesde 1,9% (2001) e 5,2%(2002). Logo, se poderáassumir que o diferencialtenha sido proveniente dacomponente do orçamentoda saúde, não programada.As variações abruptas dascontribuições relativas dosprogramas sobre a rubricaSaúde Pública, ao longodos anos, torna difícilperceber as mudanças emtermos de prioridades.

3.6.1. Taxas de

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crescimento dos programas

A tabela a seguir, apresenta as taxas decrescimento do orçamento realizado da saúdee também desdobrado por programas, a

preços constantes de 2000. Verifica-se queeste cresceu 4,7 vezes (2000-2003), com umamédia anual de 2,7 vezes. A maior aceleraçãoocorreu entre 2002 e 2003. Tendo em conta asconsiderações feitas anteriormente, asanálises sobre as taxas de crescimento a nívelde programas não são fidedignas, o que nãopermite mensurá-las.

3.6.2. Principais Conclusões

A análise dos programas da saúde permitiuconstatar entre outras questões o seguinte:

* Existem programas que não têm con-tinuidade de um ano orçamental paraoutro, como por exemplo o Programade Tuberculose e Lepra (2001); Progra-ma de Controlo de Doenças Transmis-síveis (2000, 2003); Programa de Com-bate à Malária (2001, 2002). O Progra-ma de Combate à Malária em 2003 pas-

sou a ser um projecto;

* Existem programas que mudaram dedesignação como por exemplo Progra-ma de Reabilitação e Apetrechamentode Hospitais (2001, 2002) e Programa

de Construção, Ape-trechamento, Reabilitaçãode Infra-estruturas deSaúde (2003). Por nãoestarem correctamenteidentificados, pode-se pre-sumir que este últimotenha substituído oprimeiro;

* No período de análisedos orçamentos desde2001, em que a adopção deprogramas tornou-se maisprevalecente, somente 6programas tiveram con-tinuidade ao longo dosorçamentos. Foram lista-dos 20 programas em 2001;18 programas em 2002; e14 programas em 2003. Os

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programas com continuidade nos orça-mentos anuais foram: Vigilância Epi-demiológica; Saúde Escolar, sem algu-ma expressão orçamental; Prevenção ecombate às Endemias; AssistênciaMédica e Medicamentosa no Exterior;Programa Alargado de Vacinação; eMedicamentos Essenciais. O ProgramaAlargado de Vacinação tem o apoio doUNICEF.

* Não se registaram situações de sobre-realização a nível dos programas. Poroutro lado, observa-se uma forte vari-abilidade nalguns programas em ter-mos de afectações orçamentais de umano para o outro. Esta variabilidadelevanta sérias interrogações sobre aeficiência de tais programas, particu-larmente, naqueles que exigem umacontinuidade temporal;

* À excepção de 2002, em que 99% doorçamento da saúde foi disponibilizadopor programas, nos outros anos, a dis-tribuição do orçamento por programasequivaleu a cerca de metade: 2001(51%); 2003 (56%).

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