Apostila de Didatica Do Ens Sup

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FACULDADES INTEGRADAS DE JACAREPAGUDIRETORIA ACADMICA NCLEO DE EDUCAO A DISTNCIA - NEAD

DIDTICA DO ENSINO SUPERIOR

MDULO I Unidade I Apresentao da Disciplina O curso de Ps-Graduao em Docncia do Ensino Superior que voc est participando uma iniciativa das Faculdades Integradas de Jacarepagu - FIJ. O oferecimento do curso Docncia do Ensino Superior tem como macro objetivo oferecer aos profissionais de diversas reas mais uma oportunidade de reflexo sobre o fazer pedaggico do professor de 3 Grau, na perspectiva de novas metodologias que dem conta de um novo caminhar, de uma nova viso necessria ao educador do sculo XXI. Nesse curso, voc, ter a oportunidade de fazer uma anlise crtico-interpretativa do contexto e desafios colocados para a educao da ps-modernidade ou contemporaneidade como preferem alguns pensadores da atualidade, em especial, no saber fazer e como fazer o ato pedaggico em tempo de avano cientfico-tecnolgicos que ocorrem nos dias de hoje. Como se sabe, a sociedade deste milnio vem sendo marcada por significativas transformaes no mundo do trabalho, da produo e das relaes sociais, apontando carncias de um novo perfil de educadores capazes de instrumentalizar os cidados das diversas reas do conhecimento humano para uma nova convivncia participativa e crtica nesta nova sociedade. Paralelamente, vivencia-se tambm o desafio de se acatar novos projetos para a educao brasileira que d conta dessa formao continuada dos profissionais como declara o texto legal, a NLDBEN, Lei Darcy Ribeiro (lei n 9.394-96) , de formar novos profissionais, trabalhadores e cidados, que devem estar atrelados e cientes do mundo cientfico e tecnolgico de que fazem parte, visando a construo de uma sociedade mais igualitria e justa para todos. Este o desafio posto a todos ns educadores enquanto formadores de novos profissionais. contribuir para a construo de um novo projeto educativo, uma nova formulao pedaggica altura das exigncias e carncias do mundo contemporneo. papel, de todos aqueles, de fato, comprometidos com a melhoria e redesenhamento da nova ordem mundial, no contexto scio-poltico-histrico-cultural e educacional do nosso Pas. A pergunta que no se quer calar, ento, que tipo de educao, que tipo de didtica se requerem e possam contribuir para a formao de cidados trabalhadores, com o espelhamento que esta sociedade atual est a nos exigir? Que currculo deve garantir o desvelamento do ato educativo, como ato poltico, como nos diz Paulo Freire, isto , transformador dos sujeitos inseridos no processo em rede de conhecimentos e saberes que possa assegurar efetivo entendimento histrico da poca em que vivemos, do mundo contemporneo e dos fundamentos tericos da Educao hoje. Em outras palavras, que contedos privilegiar para que os sujeitos democrticos possam se apropriar/instrumentalizar desses novos conhecimentos cientfico- tecnolgicos em rede e como esses saberes, enquanto fios condutores dos conhecimentos, se tecem? Que metodologias, mtodos e recursos esto a nossa disposio para a preparao de profissionais, capazes de responderem aos novos paradigmas e perfil profissional, que os levem a serem capazes de tomar decises, de administrar conflitos oriundo dos cotidianos do mundo do trabalho, resolver e solucionar problemas, de serem gestores de situaes novas, comunicarem-se com eficincia diante das mdias existentes e atuarem com participao e autonomia da ao pedaggica? Tendo como corpus referenciais tericos e prticos que sero trabalhados nos diversos mdulos do Curso, voc, junto s orientaes semi-presenciais de seu tutor-orientador, poder responder a essas e outras indagaes provocativas, e, com isso, ir delineando uma nova formatao do projeto poltico-pedaggico que se clama para a formao docente no ensino superior do qual faro parte. Ainda, a partir da ao-reflexo-ao, poder tambm, repensar sua futura prtica pedaggica cotidiana no encaminhamento de novas alternativas didticas da ao docente, no af de se descortinar metodologias realmente crticas e transformadoras da relao Homem-Mundo oxigenadas por dilogos atuais e produtivos.

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Desta forma quer se frisar, que o ponto de partida e de chegada do Curso de Docncia do Ensino Superior, no ensinar ou traar regras rgidas e tecnocrticas do simples ato de ensinar ou transmitir to somente os contedos programticos oferecidos pelos diversos currculos oficiais para as diversas reas de conhecimento, mas apresentar elementos didticoeducativos que possam auxilia-los no (re)pensar de sua ao docente futura e, conseqentemente, no projeto pedaggico da construo de uma nova escola, no mbito do ensino superior. O Curso foi organizado para voc buscar e aprofundar entendimento dos elementos bsicos de uma didtica crtica, que parta do dilogo dos diversos componentes do ato pedaggico como processo de ensino (Pressupostos e caractersticas da Didtica; o Contexto no qual ocorre ao ato pedaggico; ensinar e aprender como processo complementares na produo e construo em redes de conhecimento; A comunicao docente e suas implicaes na prtica do professor; o entendimento do projeto educativo e pesquisa.), sem perder o referencial com o tempo-espao em que vivemos e atuamos. Entendemos pois, que a Educao um processo em eterna discusso, logo no a concebemos que seja um produto pronto e acabado enquanto ponto de chegada. Ao contrrio, defendemos que por se tratar de um Curso de Educao a Distncia (EAD), toda a organizao, estrutura, funcionamento e desenvolvimento desse tipo de modalidade de ensino, devero por isto mesmo, ser alvo de avaliao contnua por todos os professores e cursistas envolvidos, para que se possa corrigir rotas, administrar pontos possveis de estrangulamento e aperfeioamento. Seu produto final, ser sim, a significativa contribuio de todos os envolvidos para desvelar posturas pedaggicas ultrapassadas e apontar para novas reflexes, debates e proposies para projetos educativos que a escola do sculo XXI requer. MDULO II: PRESSUPOSTOS E CARACTERSTICAS DA DIDTICA Unidade I - Didtica: Algumas Reflexes Como e o que levar em conta ensinar/aprender no Sculo XXI, ou qual a Didtica ideal que d conta para este desafio? Essa com certeza uma questo complexa a ser respondida de imediato, pois seu objeto difcil de ser delimitado, alm do que a sua conceituao polissmica. Lemos, por exemplo, nas literaturas especializadas termos como didtica geral, didtica aplicada, didtica terica, didtica tradicional, didtica crtica etc., sem falar em didticas outras todas com objetos especficos, como didtica da Educao Fsica, da Histria , do Portugus, de Ingls e muitas outras reas do conhecimento humano. A didtica est inserida na pedagogia e tem a escola em todos os seus movimentos como locus para ao pedaggica. A pedagogia, enquanto cincia da educao, necessita de outras cincias como a psicologia, a sociologia, a biologia, a filosofia, a histria, entre outras, para complet-la; da o seu status polissmico, ou seja, a crise da disciplina didtica. Como pode se entender, ento, a amplitude conceitual do termo Didtica? O texto que segue foi elaborado Baline prof da Universidade Federal do Rio de Janeiro e que oportunamente apresenta uma anlise interessante e introdutria ao entendimento do que Didtica, apresenta uma argumentao no sentido acima exposto e que pode esclarecer voc repensar sua futura prtica docente: Didtica "De modo geral, a palavra Didtica se associa arrumao, ordem, logicidade, clareza, simplificao e costuma, portanto tambm conotar rigor, bitolamento, limitao, quadratura. Se ela adquiriu significados negativos, supe-se que a origem deles esteja no prxis, ou seja, o exerccio regular da Didtica, em todos os nveis de ensino, seria responsvel pelo seu

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desprestgio ou m fama. Realmente, muitos manuais de Didtica esto cheios de itens e subitens, regras e conselhos: o professor deve, o professor no deve e ficam, portanto, muito prximos dos receiturios ou listagens de permisses e proibies, tentando inutilmente disfarar o seu vazio atrs de excessivo formalismo. Corroborando todas estas restritivas, fez-se popular o seguinte conceito de Didtica - disciplina com a qual ou sem a qual tudo fica tal e qual. De fato, convm perguntar como aprenderam os nossos antepassados, entregues a professores leigos, cuja preocupao maior era a competncia conteudstica, a manuteno do respeito ctedra e a sua pessoa, que do alto do seu tablado despejava sobre os alunos seu saber irrefutvel. Por outro lado, com tanta didtica hoje em voga, enriquecida pela psicologia, pela anlise de sistemas e por toda a tecnologia do ensino, como explicar que o ensino continue piorando sempre, como a querer comprovar a inutilidade desses recursos ? Alis estaro eles sendo utilizados ? E se realmente esto, haver em seu emprego uma dose mnima de conscincia, de adequao, de esprito de busca e pesquisa ? Ou tudo acontece na simples cpia ou transplante de modelos inadequados realidade brasileira e, por isso, devidamente rejeitados ? Como saber tambm se o caos do ensino seria bem maior , sem as tentativas de reformulao, sem o esforo das Faculdades de Educao com licenciaturas, sem os cursos de reciclagem, sem as ps-graduaes em Educao ? O momento pedaggico dos piores, reflete os problemas da sociedade doente, inflacionada, violenta, desigual. No adianta, pois, esperar milagres da Didtica. Conviria, ao contrrio, tomar conscincia dos seus limites e possibilidades e impedir que ela fosse mais um elemento de manipulao do homem, de violao dos seus direitos, de repetio do passado. Enfrentar o amanh com as armas de ontem garantir, previamente, a derrota. Desistir de lutar, sob o pretexto de falta de equipamento, covardia. No h verbas, no h material, mas o recurso humano, o mais vlido, existe, e a est a exigir um azeitamento interior, capaz de acionlo. De um professor de Didtica espera-se que seja pelo menos um didata, no na acepo vulgar da palavra, mas no sentido de reconhecer que suas atitudes valem bem mais que suas tcnicas, que, trocando com seus alunos o que ele , abrir caminhos mais amplos do que se apenas trocar com eles o que sabe, tentando mold-los a si, ao seu fazer didtico. Do professor de Didtica natural que o aluno cobre um pouco mais do que de qualquer outro professor: em primeiro lugar, ele exige respeito ao que ele (aluno) ; em segundo lugar, que ele vivencie e comprove numa lio de autenticidade o que ele (professor) considera correto, mas que tenha tambm abertura para valorizar outras opes... Uma Didtica de vida estaria frente de qualquer Didtica legista ou receitante; a vivncia didtica seria prefervel permanncia no exerccio didtico isolado ou atomizado. Ser o professor conseguir integrar, harmoniosamente e com amor, as habilidades antes treinadas em separado. Se em cada habilidade ele se coloca, sua humanidade ultrapassar a tcnica, conferindo-lhe espaos inusitados. A Didtica deve ampliar seu objeto de estudo, ampliando-a, libertando-a de padres rgidos e estagnantes, abrindo-lhe perspectiva que possam redimension-la e torn-la um instrumento til ao ensino. Uma Didtica Crtica e Criativa tentaria responder aos constantes ataques de que a Didtica no leva a nada e at colabora para o emperramento do sistema escolar. No se trata de negar as bases tcnico-cientficas em que se assenta a Didtica, mas de, em as mantendo, acrescentar-lhes uma possibilidade a mais - a da ousadia, a do incomum, a do ilgico, a nfase a tudo o que foge aos padres cotidianos e rotineiros. Parte-se do pressuposto de que se a Didtica se alicera na psicologia da aprendizagem e se alimenta da

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tecnologia do ensino, nada impede o seu enriquecimento ou extrapolao na dinmica da criatividade e no processo crtico da realidade. Por certo, praticando a criatividade e incrementando o senso crtico, professores e alunos no se tornaro melhores, mas possvel que se preparem um pouco mais para o futuro, que transfiram mais facilmente as aprendizagens de hoje para o contexto de amanh e que possam tornar-se menos temerosos e mais felizes na superao de situaes diversas e adversas. A Didtica deve alertar a todos os professores do Brasil, pas de jovens no sentido de que despertem para o fato de que o ensino est perdendo terreno, antes mesmo de adquiri-lo, pela cansativa repetio das mesmas mesmices, antes teis, hoje irrisrias, na vida acelerada e imprevisvel de sculos, que passaram a durar de cinco a dez anos no mximo. Opta-se pela crena de que a boa Didtica a que incentiva a produo e no a reproduo, a divergncia muito mais que a convergncia, a crtica em lugar da tranqila aceitao, a dvida em detrimento das certezas preestabelecidas, o erro provisrio em lugar do acerto fcil. Prope-se tambm que a essa Didtica se chame DIDTICA CRTICA: alm da fuso de princpios cientficos e recursos tcnicos com a valorizao da funo criativa e busca do desvelamento da conscincia crtica do professor-aluno, ela "amplia" seu campo de atuao por aplicar-se a todos os nveis de ensino e por estar aberta a todas as contribuies plausveis que vieram subsidi-la. (Baline Bello Lima) Para aprofundarmos a temtica proposta para este mdulo, traamos a seguir a linha espao-tempo histrico da Didtica no panorama brasileiro para entendermos sua real evoluo conceitual. Unidade II - Breve panorama histrico da educao brasileira Histrico e evoluo da Didtica: 1549 aos nossos dias A retrospectiva histrica da Didtica abrange duas partes: na primeira abordado o papel da disciplina antes de sua incluso nos cursos de formao de professores a nvel superior, compreendendo o perodo que vai de 1549 at 1930; a segunda parte procura reconstituir a trajetria da Didtica a partir da dcada de 30 at os dias atuais. So destacados os aspectos scio-econmicos, polticos e educacionais que servem de pano de fundo para identificar as propostas pedaggicas presentes na educao, bem como os enfoques do papel da Didtica.

Primrdios da Didtica: O perodo de 1549/1930Scrates quando perguntava aos discpulos: "pode-se ensinar a virtude?" ou na lectio e na disputatio medievais j havia uma idia de Didtica implcita. Mas o traado de uma linha imaginria em torno de eventos - que caracterizam o ensino fato do incio dos tempos modernos, e revela uma tentativa -, de distinguir um campo de estudos autnomo. Sculo XVII: surgimento da Didtica. A inaugurao de um campo de estudos com esse nome tem uma caracterstica que vai ser reencontrada na vida histrica da Didtica: surge de uma crise e constitui um marco revolucionrio e doutrinrio no campo da Educao. Da nova disciplina espera-se reformas da Humanidade, j que deveria orientar educadores e destes, por sua vez, dependeria a formao das novas geraes. Justifica-se, assim, as muitas esperanas nela depositadas, acompanhadas, infelizmente, de outras tantas frustraes. Constata-se que a delimitao da Didtica constituiu a primeira tentativa que se conhece de agrupar os conhecimentos pedaggicos, atribuindo-Ihes uma situao superior da mera prtica costumeira, do uso ou no do mito. A Didtica surge graas ao de dois

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educadores, RATIOUIO (1571-1635) e COMENIO ((1582-1670), ambos provenientes da Europa Central, que atuaram em pases nos quais se havia instalado a Reforma Protestante. COMNIO escreveu, entre outras obras, a Didtica Magna (1633) , instituindo a nova disciplina como "arte de ensinar tudo a todos". Dessa ambio participa tambm RATQUIO, e ambos, pautados por ideais tico-religiosos, acreditam ter encontrado um mtodo para cumprir aqueles desgnios de modo rpido e agradvel. Na verdade a instruo popular crucial para a reforma religiosa, e a busca de procedimentos que propiciassem rendimento ao ensino torna-se importante. Obedecem utopia da poca: a idia baconiana da ateno natureza -esta o modelo que os didatas supem imitar quando aconselham seguir sempre do fcil ao difcil, ir das coisas s idias e do particular ao geral, tudo sem pressa. Numa poca em que o latim dominava, propunham iniciar o ensino pela lngua materna e por meio de livros ilustrados, como exemplificou COMNIO. Tem-se notcias de experincias educacionais realizadas conforme os princpios expostos, embora nem todas tivessem tido sucesso. No existem fronteiras, na obra do sculo XVII, entre Educao e Ensino, pois o objeto da Didtica abrange o ensino de conhecimentos, atitudes e sentimentos. Essa etapa da gnese da Didtica a faz servir, com ardor, causa da Reforma Protestante, e esse fato marca seu carter revolucionrio, de luta contra o tipo de ensino da Igreja Catlica Medieval. Doutrinariamente, seu vnculo com o preparo para a vida eterna e, em nome dela, com a natureza como "nosso estado primitivo e fundamental ao qual devemos regressar como princpio" Observa-se, entretanto, que, na Europa Ocidental Catlica, outros pensadores tambm j haviam discutido, como humanistas, a reforma de procedimentos educacionais, Os jesutas foram os principais educadores de quase todo o perodo colonial, atuando, aqui no Brasil, de 1549 a 1759. No contexto de uma sociedade de economia agrrio-exportadora-dependente, explorada pela Metrpole, a educao no era considerada um valor social importante. A tarefa educativa estava voltada para a catequese e instruo dos indgenas, mas, para a elite colonial, outro tipo de educao era oferecido: O plano de instruo era consubstanciado no Ratio Studiorum, cujo ideal era a formao do homem universal, humanista e cristo. A educao se preocupava com o ensino humanista de cultura geral, enciclopdico e alheio realidade da vida da Colnia. Esses eram os alicerces da Pedagogia Tradicional na vertente religiosa que, de acordo com SAVIANI (1984, p.12), marcada por uma viso essencialista de homem, isto , o homem constitudo por uma essencial universal e imutvel. A essncia humana considerada criao divina e, assim, o homem deve se empenhar para atingir a perfeio, para fazer por merecer a ddiva da vida sobrenatural. (Ibid., p.12). A ao pedaggica dos jesutas foi marcada pelas formas dogmticas de pensamento, contra o pensamento crtico. Privilegiavam o exerccio da memria e o desenvolvimento do raciocnio; dedicavam ateno ao preparo dos padres-mestres, dando nfase formao do carter e sua formao psicolgica para conhecimento de si mesmo e do aluno. Dessa forma, no se poderia pensar em uma prtica pedaggica e muito menos em uma Didtica que buscasse uma perspectiva transformadora na educao. Os pressupostos didticos diludos no Ratio enfocavam instrumentos e regras metodolgicas compreendendo o estudo privado, em que o mestre prescrevia o mtodo de estudo, a matria e o horrio; as aulas ministradas de forma expositiva; a repetio visando repetir, decorar e expor em aula; o desafio, estimulando a competio; a disputa, outro recurso metodolgico era visto como uma defesa de tese. Os exames eram orais e escritos, visando avaliar o aproveitamento do aluno.

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O enfoque sobre o qual o papel da Didtica, ou melhor, da Metodologia de Ensino, como denominada no Cdigo pedaggico dos jesutas, est centrado no seu carter meramente formal, tendo por base o intelecto; o conhecimento marcado pela viso essencialista de homem. A Metodologia de Ensino (Didtica) entendida como um conjunto de regras e normas prescritivas visando a orientao do ensino e do estudo. Como afirma PAIVA (1981, p. 11), um conjunto de normas metodolgicas referentes aula, seja na ordem das questes, no ritmo do desenvolvimento e seja, ainda, no prprio processo de ensino. Aps os jesutas, no ocorrem no pas grandes movimentos pedaggicos, como so poucas as mudanas sofridas pela sociedade colonial e durante o Imprio e a Repblica. A nova organizao instituda por Pombal, pedagogicamente, representou um retrocesso. Professores leigos comearam a ser admitidos para as aulas-rgias introduzidas pela reforma pombalina. Por volta de 1870, poca de expanso cafeeira e da passagem de um modelo agrrio-exportador para um urbano-comercial-exportador, o Brasil vive o seu perodo de iluminismo. Segundo SAVIANI (1984, p. 275), tomam corpo movimentos cada vez mais independentes da influncia religiosa. No campo educacional, suprime-se o ensino religioso nas escolas pblicas, passando o Estado a assumir a laicidade. aprovada a reforma de Benjamin Constant (1890) sob a influncia do positivismo. A escola busca disseminar uma viso burguesa de mundo e sociedade, a fim de garantir a consolidao da burguesia industrial como classe dominante. Os indicadores de penetrao da Pedagogia Tradicional em sua vertente leiga so os Pareceres de Rui Barbosa, de 1882 e a primeira reforma republicana, a de Benjamin Constant, em 1890. Esta vertente da Pedagogia Tradicional mantm a viso essencialista de homem, no como criao divina, mas aliada noo de natureza humana, essencialmente racional. Essa vertente inspirou a criao da escola pblica, laica, universal e gratuita. (SAVIANI, 1984, p. 274). A essa teoria pedaggica correspondiam as seguintes caractersticas: a nfase ao ensino humanstico de cultura geral, centrada no professor, que transmite a todos os alunos indistintamente a verdade universal e enciclopdica; a relao pedaggica que se desenvolve de forma hierarquizada e verticalista, onde o aluno educado para seguir atentamente a exposio do professor; o mtodo de ensino, calcado no cinco passos, formais de Hebart (preparao, apresentao, comparao, assimilao, generalizao e aplicao). assim que a Didtica, no bojo da Pedagogia Tradicional leiga, est centrada no intelecto, na essncia, atribuindo um carter dogmtico aos contedos; os mtodos so princpios universais e lgicos; o professor se torna o centro do processo de aprendizagem, concebendo o aluno como um ser receptivo e passivo. A disciplina a forma de garantir a ateno, o silncio e a ordem. A Didtica compreendida como um conjunto de regras, visando assegurar aos futuros professores as orientaes necessrias ao trabalho docente. A atividade docente entendida como inteiramente autnoma face poltica, dissociada das questes entre escola e sociedade. Uma Didtica que separa teoria e prtica. A Pedagogia tradicionalista leiga refletia-se nas disciplinas de natureza pedaggica do currculo das Escolas Normais desde o incio de sua criao, em 1835. A incluso da Didtica como disciplina em cursos de formao de professores para o ento ensino secundrio, ocorreu quase um sculo depois, ou seja, em 1934. A Didtica nos Cursos de Formao de Professores a partir de 1930 O perodo de 1930/1945: A Didtica tradicional, cumpre renov-la.

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Na dcada de 30, a sociedade brasileira sofre profundas transformaes, motivadas basicamente pela modificao do modelo scio-econmico. A crise mundial da economia capitalista provoca no Brasil a crise cafeeira, instalando-se o modelo scio-econmico de substituio de importaes. Paralelamente, desencadeia-se o movimento de reorganizao das foras econmicas e polticas o que resultou em um conflito: a Revoluo de 30, marco comumente empregado para indicar o incio de uma nova fase na histria da Repblica do Brasil. No mbito educacional, durante o governo revolucionrio de 1930, Vargas constitui o Ministrio de Educao e Sade Pblica. Em 1932 lanado o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, preconizado a reconstruo social da escola na sociedade urbana e industrial. Entre os anos de 1931 e 1932 efetivou-se a Reforma Francisco Campos. Organizase o ensino comercial; adota-se o regime universitrio para o ensino superior, bem como organizase a primeira universidade brasileira. A Faculdade de Filosofia Cincias e Letras da Universidade de So Paulo foi o primeiro instituto de ensino superior que funcionou de acordo com o modelo Francisco Campos. A origem da Didtica como disciplina dos cursos de formao de professores a nvel superior est vinculada criao da referida Faculdade, em 1934, sabendo-se que a qualificao do magistrio era colocada como ponto central para a renovao do ensino. No incio, a parte pedaggica existente nos cursos de formao de professores era realizada no Instituto de Educao, sendo a includa a disciplina Metodologia do Ensino Secundrio, equivalente Didtica hoje nos cursos de licenciatura. Por fora do art. 20 do Decreto-Lei n. 1190/39, a Didtica foi instituda como curso e disciplina, com durao de um ano. A legislao educacional foi introduzindo alteraes para, em 1941, o curso de Didtica ser considerado um caso independente, realizado aps o trmino do bacharelado (esquema trs + um). Em 1937, ao se consolidar no poder com auxlio de grupos militantes e apoiado pela classe burguesa, Vargas implanta o Estado Novo, ditatorial, que persistiu at 1945. Os debates educacionais so paralisados e o prestgio dos educadores passa a condicionar-se s respectivas posies polticas, como afirma PAIVA (1973, p. 125). O perodo situado entre 1930 e 1945 marcado pelo equilbrio entre as influncias da concepo humanista tradicional (representada pelos catlicos) e humanista moderno (representada pelos pioneiros). Para SAVIANI (1985, p. 276) a concepo humanista moderno se baseia em uma viso de homem centrada na existncia, na vida, na atividade. H predomnio do aspecto psicolgico sobre o lgico. O escolanovismo prope um novo tipo de homem, defende os princpios democrticos, isto , todos tm direito a assim se desenvolverem. No entanto, isso feito em uma sociedade dividida em classes, onde so evidentes as diferenas entre o dominador e as classes subalternas. Assim, as possibilidades de se concretizar este ideal de homem se voltam para aqueles pertencentes classe dominante. A caracterstica mais marcante do escolanovismo a valorizao da criana, vista como ser dotado de poderes individuais, cuja liberdade, iniciativa, autonomia e interesses devem ser respeitados. O movimento escolanovista preconizava a soluo de problemas educacionais em uma perspectiva interna da escola, sem considerar a realidade brasileira nos seus aspectos poltico, econmico e social. O problema educacional passa a ser uma questo de escolar e tcnica. A nfase recai no ensinar bem, mesmo que a uma minoria. Devido predominncia e nos cursos de formao para Conseqentemente, nesse momento, acentuar o carter prtico-tcnico do justapostas. da influncia da Pedagogia Nova na legislao educacional o magistrio, o professor absorveu o seu iderio. a Didtica tambm sofre a sua influncia, passando a processo ensino-aprendizagem, onde teoria e prtica so

O ensino concebido como um processo de pesquisa, partindo do pressuposto de que os assuntos de que tratam o ensino so problemas.

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Para CANDAU (1982, p. 22), os mtodos e tcnicas mais difundidas pela Didtica renovada so: centros de interesse, estudo dirigido, unidades didticas, mtodos dos projetos, a tcnica de fichas didticas, o contrato de ensino, etc.... A Didtica entendida como um conjunto de idias e mtodos, privilegiando a dimenso tcnica do processo de ensino, fundamentada nos pressupostos psicolgicos e psicopedaggicos e experimentais, cientificamente validados na experincia e construdos em teoria, ignorando o contexto scio-poltico-econmico. A Didtica, assim concebida propiciou a formao de um novo perfil de professor: o tcnico. O perodo de 1945/1960: o predomnio das novas idias e a Didtica Esta fase correspondente acelerao e diversificao do processo de substituio de importaes e penetrao do capital estrangeiro. O modelo poltico baseado nos princpios da democracia liberal com crescente participao das massas. o Estado populista --desenvolvimentista, representando uma aliana entre o empresariado e setores populares, contra a oligarquia. No fim do perodo, comea a delinear-se uma polarizao, deixando entrever dois caminhos para o desenvolvimento: o de tendncia populista e o de tendncia antipopulista. Neste contexto, insere-se a educao. A poltica educacional, que caracteriza essa fase, reflete muito bem a ambivalncia dos grupos no poder como destaca FREITAG (1979, p.54). Em 1946, o Decreto-Lei n. 9053 desobrigava o curso de Didtica e, j sob a vigncia da Lei Diretrizes e Bases, Lei 4024/61, o esquema de trs mais um foi extinto pelo Parecer n. 242/62, do Conselho Federal de Educao. A Didtica perdeu seus qualificativos geral e especial e introduz-se a Prtica de Ensino sob a forma de estgio supervisionado. Entre 1948-1961, desenvolvem-se lutas ideolgicas em torno da oposio entre escola particular e defensores da escola pblica. A disseminao das idias novas ganha mais fora com a ao do Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos (INEP). As escolas catlicas se inserem no movimento renovador, difundindo o mtodo de Montessori e Lubienska. Outros indcios renovadores comeam a ser disseminados nessa dcada, entre os quais se destacam o Ginsio Orientado para o Trabalho (GOT), os Ginsios Pluricurriculares, os Ginsios Vocacionais. Paralelamente a essas iniciativas renovadoras que comearam a ser implantadas, um outro redirecionamento vinha sendo dado escola renovada, fortemente marcada pela nfase metodolgica, que culminou com as reformas promovidas no sistema escolar brasileiro no perodo de 1968/1971. Pela fora do convnio celebrado entre o MEC/Governo de Minas Gerais --- Misso de Operaes dos Estados Unidos (PONTO IV) criou-se o PABAEE (Programa Americano Brasileiro de Auxlio ao Ensino Elementar), voltado para o aperfeioamento de professores do Curso Normal;. Nesses cursos, comearam a ser introduzidos os princpios de uma tecnologia educacional importada dos Estados Unidos. Dado o seu carter multiplicador, o iderio renovador-tecnicista foise difundindo. importante frisar que, nesta fase, o ensino de Didtica tambm se inspirava no liberalismo e no pragmatismo, acentuando a predominncia dos processos metodolgicos em detrimento da prpria aquisio do conhecimento. A Didtica se voltava para as variveis do processo de ensino sem considerar o contexto poltico-social. Acentuava-se desta forma, o enfoque renovador-tecnicista da Didtica na esteira do movimento escolanovista. O perodo ps-1964: os descaminhos da Didtica O quadro que se instalou no pas com o movimento de 1964 alterou a ideologia poltica, a forma de governo e, conseqentemente, a educao.

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O modelo poltico-econmico tinha como caracterstica fundamental um projeto desenvolvimentista que buscava acelerar o crescimento scio-econmico do pas. A educao desempenhava importante papel na preparao adequada de recursos humanos necessrios incrementao do crescimento econmico e tecnolgico da sociedade de acordo com a concepo economicista de educao. O sistema educacional era marcado pela influncia dos Acordos MEC/USAID, que serviram de sustentculo s reformas do ensino superior e posteriormente do ensino de 1 e 2 graus. Por influncia, tambm dos educadores americanos foi implantada, pelo Parecer 252/69 e Resoluo n. 2/69 do Conselho Federal de Educao, a disciplina "Currculos e Programas", nos cursos de Pedagogia, o que, de certa forma, provocou a superposio de contedos da nova disciplina com a Didtica. O perodo compreendido entre 1960 e 1968 foi marcado pela crise da Pedagogia Nova e articulao da tendncia tecnicista, assumida pelo grupo militar e tecnocrata. O pressuposto que embasou esta pedagogia est na neutralidade cientfica, inspirada nos princpios de racionalidade, eficincia e produtividade. Buscou-se a objetivao do trabalho pedaggico da mesma maneira que ocorreu no trabalho fabril. Instalou-se na escola a diviso do trabalho sob a justificativa de produtividade, propiciando a fragmentao do processo e, com isso, acentuando as distncias entre quem planeja e quem executa. A Pedagogia Tecnicista est relacionada com a concepo analtica de Filosofia da Educao, mas no como conseqncia sua. SAVIANI (1984, p. 179), explica que a concepo analtica "(...) no tem por objeto a realidade. Refere-se, pois, clareza e consistncia dos enunciados relativos aos fenmenos eles mesmos. (...) A ela cabe fazer a assepsia da linguagem, depur-la de suas inconsistncias e ambigidades. No sua tarefa produzir enunciados e muito menos prticas." A afinidade entre as duas encontra-se, no no plano das conseqncias, mas no plano dos pressupostos de objetividade, racionalidade e neutralidade. O enfoque do papel da Didtica a partir dos pressupostos da Pedagogia Tecnicista procura desenvolver uma alternativa no psicolgica, situando-se no mbito da tecnologia educacional, tendo como preocupao bsica a eficcia e a eficincia do processo de ensino. Essa Didtica tem como pano de fundo uma perspectiva realmente ingnua de neutralidade cientfica. Neste enfoque, os contedos dos cursos de Didtica centram-se na organizao racional do processo de ensino, isto , no planejamento didtico formal, e na elaborao de materiais instrucionais, nos livros didticos descartveis. O processo que define o que professores e alunos devem fazer, quando e como o faro. Na Didtica Tecnicista, a desvinculao entre teoria e prtica mais acentuada. O professor torna-se mero executor de objetos instrucionais, de estratgias de ensino e de avaliao. Acentua-se o formalismo didtico atravs dos planos elaborados segundo normas pr-fixadas. A Didtica concebida como estratgia para o alcance dos produtos previstos para o processo ensino-aprendizagem. A partir de 1974, poca em que tem incio a abertura gradual do regime poltico autoritrio instalado em 1964, surgiram estudos empenhados em fazer a crtica da educao dominante, evidenciando as funes reais da poltica educacional, acobertada pelo discurso poltico-pedaggico oficial. Tais estudos foram agrupados e denominados por SAVIANI (1983, p. 19) de "teorias crticas-reprodutivistas", que, apesar de considerar a educao a partir dos seus aspectos sociais, concluem que sua funo primordial a de reproduzir as condies sociais vigentes. Elas

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se empenham em fazer a denncia do carter reprodutor da escola. H uma predominncia dos aspectos polticos, enquanto as questes didtico-pedaggicas so minimizadas. Em conseqncia, a Didtica passou tambm a fazer o discurso reprodutivista, ou seja, a apontar o seu contedo ideolgico, buscando sua desmistificao de certa forma relevante, porm relegando a segundo plano sua especificidade. CANDAU (1982, p. 28) afirma que "(...) junto com esta postura de denncia e de explicitao do compromisso com o 'status quo' do tcnico aparentemente neutro, alguns autores chegaram negao da prpria dimenso tcnica da prtica docente." Sob esta tica, a Didtica nos cursos de formao de professores passou a assumir o discurso sociolgico, filosfico e histrico, secundarizando a sua dimenso tcnica, comprometendo, de certa forma, a sua identidade, acentuando uma postura pessimista e de descrdito relativo sua contribuio quanto prtica pedaggica do futuro professor. Contudo pode-se perceber que se, de um lado, a teoria crtico-reprodutivista contribuiu para acentuar uma postura de pessimismo, por outro lado, a atitude crtica passou a ser exigida pelos alunos e os professores procuram rever sua prpria prtica pedaggica a fim de torn-la mais coerente com a realidade scio-cultural. A Didtica questionada e os movimentos em torno de sua reviso apontam para a busca de novos rumos. A dcada de 80: momento atual da Didtica Ao longo dos anos 80, a situao scio-econmica do pas tem dificultado a vida do povo brasileiro com a elevao da inflao, elevao do ndice de desemprego, agravado mais com o aumento da dvida externa e pela poltica recessionista, orientada pelo Fundo Monetrio Internacional (FMI). Na primeira metade da dcada de 80, instala-se a Nova Repblica, iniciando-se, desta forma uma nova fase da vida do pas. A asceno do governo civil da Aliana Democrtica assinala o fim da ditadura militar, porm conserva inmeros aspectos dela, sob formas e meios diferentes. (FALCO, 1986, p. 27). A luta operria ganha fora, passando a se generalizar por outras categorias profissionais e, dentre elas, os professores. nessa dcada que os professores se empenham para a reconquista do direito e dever de participarem na definio da poltica educacional e na luta pela recuperao da escola pblica. A realizao da I Conferncia Brasileira de Educao foi um marco importante na histria da educao brasileira. Constitui um espao para se discutir e disseminar a concepo crtica de educao, pois, como afirma SAVIANI (1984, p.24), "a preocupao com a perspectiva

dialtica ultrapassa, na filosofia da educao, aquele empenho individual de sistematizao e se torna objeto de um esforo coletivo."A concepo dialtica ou crtica no foi dominante no nosso texto educacional. Ela se organizou com maior nitidez a partir de 1979. Para a concepo dialtica de Filosofia da Educao, no existe um homem dado "a priori", pois no coloca como ponto de partida uma determinada viso homem. Interesse-se pelo ser concreto. A tarefa da filosofia explicitar os problemas educacionais e compreend-los a partir do contexto histrico em que esto inseridos (SAVIANI, 1984, p.24) A educao no est centrada no professor ou no aluno, mas na questo central da formao do homem. A educao est voltada para o ser humano e sua realizao em sociedade. Nesse sentido, GADOTTI afirma que, no bojo de uma Pedagogia Crtica, "a educao se identifica como o processo de hominizao. A educao o que se pode fazer do homem de amanh".

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(1983, p. 149) uma pedagogia que se compromete com os interesses do homem das camadas desfavorecidas. A escola se organiza como espao de negao da dominao e no mero instrumento para reproduzir a estrutura social vigente. Nesse sentido, agir no interior da escola contribuir para transformar a prpria sociedade. Ora, no meu entender a Didtica tem uma importante contribuio a dar em funo de clarificar o papel scio-poltico da educao, da escola e, mais especificamente, do ensino. Assim, o enfoque da Didtica, de acordo com os pressupostos de uma Pedagogia Crtica, o de trabalhar no sentido de ir alm dos mtodos e tcnicas, procurando associar escolasociedade, teoria-prtica, contedo-forma, tcnico-poltico, ensino-pesquisa. Ela deve contribuir para ampliar a viso do professor quanto s perspectivas didtico-pedaggicas mais coerentes, com nossa realidade educacional, ao analisar as contradies entre o que realmente o cotidiano da aula e o iderio pedaggico calcado nos princpios da teoria liberal, arraigado, na prtica dos professores. Na dcada de 80, esboam-se os primeiros estudos em busca de alternativas para a Didtica, a partir dos pressupostos da Pedagogia Crtica. A Didtica no mbito desta pedagogia auxilia no processo de politizao do futuro professor, de modo que ele possa perceber a ideologia que inspirou a natureza do conhecimento usado e a prtica desenvolvida na escola. Neste sentido, a Didtica Crtica busca superar o intelectualismo formal do enfoque tradicional, evitar os efeitos do espontanesmo escolanovista, combater a orientao desmobilizadora do tecnicismo e recuperar as tarefas especificamente pedaggicas, desprestigiadas a partir do discurso reprodutivista. Procura, ainda, compreender e analisar a realidade social onde est inserida a escola. preciso uma Didtica que proponha mudanas no modo de pensar e agir do professor e que este tenha presente a necessidade de democratizar o ensino. Este concebido como um processo sistemtico e intencional de transmisso de contedos culturais e cientficos. evidente que a Didtica, por si, no condio suficiente para a formao do professor crtico. No resta dvida de que a tomada de conscincia e o desvelamento das contradies que permeiam a dinmica da sala de aula so pontos de partida para a construo de uma Didtica Crtica, contextualizada e socialmente comprometida com a formao do professor. Final do sculo: a Didtica oscila entre diferentes paradigmas Um paradigma (ou um conjunto de paradigmas) aquilo que os membros de uma comunidade partilham e,inversamente, uma comunidade cientfica consiste em homens que partilham um paradigma. (Kuhn, A Estrutura das Revolues Cientficas) Trocando-se a palavra cientfica por educacional obtm-se uma afirmativa que merece ser considerada. Qual o paradigma compartilhado, quanto Didtica? Como que a comunidade educacional interpreta esse paradigma? Considera-se que a dificuldade de responder a essas questes encontra-se no fato de que no h um paradigma, mas talvez paradigmas em conflito. Atreve-se dizer que boa parte dessa situao se deve a uma espcie de contaminao entre Didtica disciplina e o contedo dos cursos. Explicando melhor, o continente didtico acolhe diferentes contedos, em termos de tendncias doutrinrias ou tericas. Ou seja, algumas obras ou cursos privilegiam determinadas inflexes sociolgicas, psicolgicas, filosficas - , mas nem sempre as mesmas. Interpretam, o Ensino de muitos modos. H diferenas entre posies tericas e diretrizes metodolgicas ou tecnolgicas. E condena-se o continente por seu contedo. Na verdade h uma ao de retorno do segundo sobre o primeiro e pode-se acusar certas restries Didtica (quando se torna somente uma srie de tcnicas docentes...) ou certas expanses da rea (quando se expande at tornar-se uma sociopoltica do ensino). H

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outros exemplos, facilitados pela complexidade do fenmeno didtico, por seus mltiplos aspectos, pelo comprometimento da sala de aula com a escola, com as comunidades, com a sociedade, com a cultura que interpreta a realidade da vida. Consideraes Finais O percurso feito, do sculo XVII at nossos dias, indicou alguns marcos no desenvolvimento histrico da Didtica. Viu-se que seu primeiro objeto, o Mtodo, correspondendo ao modo de agir.sobre o educando, recuou ao fundo do palco quando sua outra face, o prprio educando ou aprendiz, reclamou seus direitos. Um reviver metodolgico, no sculo XIX, ps em relevo as caractersticas de ordem e seqncia, no processo didtico, antes que a Escola Nova, retornando ao puerocentrismo, em sua aspirao cientfica, recorresse psicologia da criana. O panorama do final do sculo XX e incio do Sculo XXI no simples. A Didtica est impregnada de todas as inquietaes da poca e, entre as muitas frentes de pesquisa e explorao, ora requer auxlio da psicologia profunda de origem freudiana, ora recorre s correntes neomarxistas. A oscilao entre uma tendncia psicolgica que acentua a relevncia da compreenso da inteligncia humana e sua construo e outra que se apia na viso sociolgica das relaes escola-sociedade, parece dominar o contedo da disciplina. Esta, em conseqncia, vai-se familiarizar com teorias de origem epistemolgica e social, sem perder, no entanto; seu compromisso com a prtica do ensino. Nos programas de Didtica, essa fermentao ideolgica nem sempre consegue um resultado harmnico: os novos temas ainda no tiveram funo aglutinadora e vem-se programaes enviesadas com exclusividade, de um lado ou de outro. No se entenda, entretanto, que defendo a possibilidade de uma "Didtica Marxista" ou "Didtica Sociolgica" ou "Didtica Cognitivista" ou qualquer outra adjetivao que indique um ponto de vista exclusivo sobre seu campo de estudos. Pois ocorre que, por constituir-se a Didtica numa disciplina que pode ser desmembrada em vrios planos (exemplifiquei com os planos humano, tcnico e cultural), v-se que, em cada um deles, contribuies de reas diferentes se tornam teis e mesmo necessrias: Sua dupla dimenso (vertical e horizontal) e o ciclo didtico sempre recomeado, por outro lado, vinculam-na diretamente prtica e esta, em sua complexidade, exige recursos e tcnicas, cuja eficincia objeto de pesquisa e experimentao. Mas no existem duas Didticas, uma terica e outra prtica: so duas faces da mesma moeda, e, como elas, interdependentes. Um esclarecimento final, sobre o conceito foco da Didtica: o Ensino. Revela uma inteno: a de produzir aprendizagem; palavra-ao, palavra-ordem, palavra-prospectiva, palavra que revela um resultado desejado. Mas, depois de PIAGET, no se pode mais entender o ensino como a simples apropriao de um contedo: uma informao, um conhecimento ou uma atitude, por exemplo. O ato assimilador, essncia da aprendizagem legtima, correspondente ao ensino que merece esse nome, ter como subproduto (sub ou super?) alguma mobilizao da inteligncia redundando em progresso cognitivo, em capacidade ampliada para conhecer ( ou aprender). desse fenmeno que trata a Didtica: do ensino que implica desenvolvimento, melhoria. E mais: no se limita o bom ensino ao avano cognitivo intelectual, mas envolver igualmente progressos na afetividade, moralidade ou sociabilidade, por condies que so do desenvolvimento humano integral. Deixamos claro que a Didtica, como disciplina e campo de estudos, parece acelerar o progresso no sentido de uma autoconscincia de sua identidade -encontrada em seu ncleo central -e de sua necessria interdisciplinaridade. Conseguir plenamente a autonomia, sem prejudicar suas fecundas relaes com disciplinas afins, um projeto que, a meu ver, depende tanto de um esforo terico e reflexivo, quanto de um avano no campo experimental. Creio que tarefa para o sculo XXI. Resumindo: Em 1994, o grupo de Trabalho (GT) de Metodologia e Didtica da Associao de Pesquisadores em Educao (ANPED) mudou seu nome para GT de Didtica e a definiu como

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campo de estudos e prticas, cujo objeto a prtica pedaggica de sala de aula e suas relaes com a instituio escolar, com o sistema educacional e com o sistema social mais amplo. Da, conclui-se que:Didtica , pois, a teoria pedaggica ou a teoria do ato educativo pois: 1. teoria pedaggica multifacetada, porque precisa para sua teorizao outras reas do conhecimento (cincias da educao), e, portanto, sua fundamentao interdisciplinar. O conhecimento deve se tornar interdisciplinar enquanto objeto e no se tornar interdisciplinar depois de construdo. 2. teoria pedaggica porque histrica. A neutralidade cientfica impossvel, assim como a neutralidade poltica. logo, o ato pedaggico ato poltico e histrico. um projeto histrico e poltico, porque aponta para o tipo de cidado que se quer ajudar a construir; da realidade que se quer transformar. Neste sentido, a teoria pedaggica evidencia formas de se chegar l, a partir da anlise crtico-interpretativa do fenmeno social. 3 teoria pedaggica porque teoria e prtica pedaggica em viso curricular moderna. Isso se deve pela articulao crtica da escola e a sociedade onde est inserida como um todo; a sua funo social fazer exaustivamente esta anlise do real/realidade, objetiva, desta forma, o aluno na sua auto-organizao enquanto ser/estar no Mundo e com ele interage por ser social, histrico, poltico e cultural. O escolacentrismo (escola como redentora dos problemas sociais - mas, conscientizadora dos problemas sociais) negado pela modernidade, buscando-se resgatar o ensino, a educao e a (in)formao. ATIVIDADES 1 1. A partir do texto Didtica de Balina Lima trace, em linhas gerais, as principais caractersticas que devem fundamentar uma didtica crtica par ao sculo XXI. 2. Faa um quadro-sntese da evoluo do conceito de didtica atravs dos tempos; Para facilitar trace uma matriz analtica a partir do roteiro sugestivo que apresentamos: Ano ou perodo; aspectos conceituais apresentados pelos autores nas diversas pocas. 3. Localize e transcreva do texto 1.2 a definio contempornea da Didtica e sua sntese. Aps essa anlise, construa uma texto pessoal do que Didtica. Para facilitar a elaborao do seu texto, relembre seus professores inesquecveis, didaticamente reconhecidos por todos seus colegas de turma. INDICAES DE LEITURAS 1 GADOTTI, Moacir. Histrias das idias pedaggicas. Rio de Janeiro : Editora tica S.A. 1993. O autor faz uma trajetria das idias pedaggicas elaboradas por diversos pensadores da Antigidade aos dias de hoje, atravs de textos de autores que marcaram decisivamente suas pocas. Os textos esto agrupados por perodos e tendncias e apresentam uma introduo, o contexto de cada perodo e informaes biogrficas sobre o tempo-espao e as condies scio-polticas em que os textos foram produzidos, alm de apresentar algumas questes para reflexo. HAIDT, Regina Clia Cazaux. Curso de didtica geral. So Paulo : Ed. tica. 2003. A autora parte das razes mais profundas da Didtica suas ligaes com a filosofia e a psicologia -, chegando progressivamente as grandes ramificaes da ao didtica:

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planejamentos de ensino, recursos e avaliao. Oferece, ainda, um captulo sobre a informtica e a educao, tema bem atual e oportuno. RANCIRE, Jacques. O mestre ignorante: cinco lies sobre a emancipao intelectual. Traduo de Llian do Valle Belo Horizonte : autntica, 2002. Neste livro, Rancire enuncia sem hesitaes a idia bastante simples, de que a emancipao intelectual tarefa singular, que no poderia ser delegada, mas que depende mais do homem do que do cidado. Em outras palavras, demonstra cinco histrias que permitem o repensar de nossas verdades pelas quais educamos e nas quais nos educamos, deixando para o leitor a reflexo do que educar/ensinar pela liberdade de pensar. EVOLUO DO ENSINO DA DIDTICA

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MDULO III A PRTICA PEDAGGICA: CONCEPES E TENDNCIAS O objetivo desta unidade fazer com que o cursista possa analisar as contradies existentes entre as diferentes concepes de educao e modo como tais concepes manifestaram concretamente nas prticas pedaggicas brasileiras. 1.1 INTRODUO Para analisarmos a Didtica e o seu papel na prtica pedaggica, faz-se necessrio explicar quem o educador e como ele concebe o fenmeno educativo, tendo em vista as diretrizes que orientam sua atuao pedaggica. Entendendo educao no seu sentido mais amplo, podemos dizer que educadores so todos os membros de uma sociedade. No entanto, a educao sistemtica, planejada com objetivos definidos e realizada atravs do ensino, que um tipo de prtica educativa, exige um profissional da educao com formao adequada. Mas, qual a formao adequada? A resposta est no entendimento que temos do que ser educador. interessante citar Rubens Alves que compara, de forma metafrica, o educador com o professor: Eu diria que os educadores so como velhas arvores. Possui uma face, um nome, uma histria a ser contada. Habitam um mundo em que o que vale a relao que os liga aos alunos, sendo que cada aluno uma entidade sui generis, portador de um nome, tambm de uma histria sofrendo tristezas e alimentando esperanas. E a educao algo para acontecer neste espao invisvel e denso, que se estabelece a dois. Espao artesanal... Mas professores so habitantes de um mundo diferente, onde o educador pouco importa, pois o que interessa um crdito cultural que o aluno adquire numa disciplina identificada por uma sigla, sendo que, para fins institucionais, nenhuma diferena faz aquele que a ministra. Por isso mesmo, professores so entidades descartveis, coadores de caf descartveis, copinhos plsticos de caf descartveis. (Rubem Alves, 1983, p. 17-18) O educador olha os seus alunos como pessoas com necessidades, dificuldades, fraquezas e pontos fortes, procurando, com esta postura, contribuir para seu crescimento nos diferentes aspectos. A importncia da conscincia poltica do educador outro ponto a ser ressaltado. Como diz Freire (1988), a educao um ato poltico um ato que sempre praticado a favor de algum, de um grupo, de algumas idias e, conseqentemente, contra outro algum, contra outro grupo e contra outras idias. O educador algum que deixa sua marca na educao de seus alunos. Dessa forma, entendemos que os diferentes posicionamentos pessoais e profissionais do educador envolvem diferentes modos de compreender e organizar o processo ensinoaprendizagem, e, por isso, a sua ao educativa e a sua prtica pedaggica retratam sempre uma opo poltica. Segundo Mizukami (1986), subjacente a esta prtica estaria presente, implcita ou explicitamente, de forma articulada ou no, um referencial terico que compreendesse os conceitos de homem, mundo e sociedade, cultura, conhecimento etc... (p. 4). Cada tendncia pedaggica est embasada em teorias do conhecimento advindas de pesquisas nas reas de Psicologia, Sociologia ou Filosofia e resulta de uma relao sujeito-

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ambiente, isto , deriva de uma tomada de posies epistemolgicas em relao ao sujeito e ao meio. No entanto, o educador pode adotar um ou outro aspecto das diferentes tendncias, desde que seja coerente com a sua filosofia de educao. Ou seja, mesmo sendo um progressista, o professor pode adotar uma metodologia prpria de tendncia escolanovista, considerando sempre as premissas bsicas da abordagem que privilegia em sua prxis. importante ressaltar que at hoje no encontramos uma teoria que d conta de todas as expresses e complexidades do comportamento dos indivduos em situaes de ensinoaprendizagem. Da nossa preocupao em ressaltar o carter parcial deste estudo sobre as correntes pedaggicas que sero apresentadas, podendo outras abordagens tericas virem a ser sugeridas por outros autores. Veja agora o papel que a Didtica vem desempenhando nas principais teorias ou tendncias pedaggicas que esto influenciando a formao do professor brasileiro. 1.2 AS TENDNCIAS NO-CRTICAS Se voltarmos muito longe no tempo, vamos encontrar a Didtica Magna de Comnio, considerado o pai da Didtica, que, no sculo XVII, procurou um mtodo que pudesse ensinar tudo a todos. Esta a Didtica Tradicional, cuja grande contribuio ter chamado a ateno para a organizao lgica do processo ensino-aprendizagem, nos seus aspectos mais gerais (Candau, 1998, p. 29). A supervalorizao do mtodo, que foi peculiar na Teoria do Mtodo nico, abstrato e formal, estava embasa em uma psicologia tipicamente racionalista. Comnio, Pestalozzi e Herbart formularam um mtodo que acreditavam ser dotado de valor universal, ser capaz de imprimir ordem e unidade em todos os graus do saber. Herbart estruturou um mtodo tendo por base a ordem psicolgica de aquisio do conhecimento. Este mtodo foi organizado de acordo com as seguintes etapas: preparao, apresentao, associao, sistematizao e aplicao. Tal seqncia, apresentada por Herbart , at hoje, seguida por muitos mestres. Alguns destes fazem parte do grupo que comunga da tendncia tradicional de educao, entendendo que a Didtica deve estar voltada para a divulgao dos contedos de ensino, com fim em si mesmo. a valorizao do contedo pelo contedo. Nesta tendncia, o centro do processo ensinoaprendizagem o professor, que assume uma postura autoritria e privilegia a exposio oral sobre qualquer outro procedimento de ensino. Outros professores adaptam esta proposta de ensino em suas aulas, tendo em vista as possibilidades que esta oferece para a organizao e planejamento das mesmas. No Brasil, desde os jesutas, cuja influncia religiosa se deu at o final do Imprio e o inicio de Primeira Repblica, prevaleceu a tendncia pedaggica tradicional. A Didtica, nessa tendncia, est embasada na transmisso cultural, concebendo o aluno como um ser passivo, atribuindo um carter dogmtico aos contedos de ensino e percebendo o professor como figura principal do processo ensino-aprendizagem. Na avaliao do aprendizado utilizam-se provas e argies, apenas para classificar o aluno. J nos anos de 1920, a tendncia tradicional comea a sofrer criticas com o despontar da tendncia Liberal Renovada Progressivista (Escola Nova) que lhe faz oposio, apesar de a tendncia tradicional ainda prevalecer na pratica da maioria dos professores brasileiros. No final do sculo XIX e inicio do sculo XX, a Psicologia desponta como cincia independente, dando grandes contribuies educao. Traz como grande novidade a seguinte afirmao: o individuo que aprende, a aprendizagem se d na pessoa. Portanto, o processo ensino-aprendizagem tem de estar centrado no aluno, e no no professor.

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Ora, se o processo ensino-aprendizagem deve estar centrado no aluno, este aluno deve ser ativo, participar diretamente do seu processo de aprendizagem. Sendo assim, em vez da exposio oral, deve-se dar preferncia aos mtodos ativos, os contedos devem ser os meios para o desenvolvimento de habilidades e os sentimentos tambm devem ser trabalhados, fato justificado pela grande influencia da Psicologia. A avaliao passa a ter conotao qualitativa e comea a ser considerada pelo professor, que passa a valorizar no mais a quantidade de conhecimento. A auto-avaliao surge na prtica escolar como conseqncia da viso do aluno como pessoa e da valorizao dos aspectos qualitativos que ele demonstra na apreenso dos conhecimentos. Para Mizukami (1986), a abordagem Liberal Progressivista ou Escolanovista (Escola Nova) poderia ser denominada didaticista, em virtude da grande importncia atribuda aos aspectos didticos. Educadores como Ansio Teixeira, Loureno Filho e Fernando de Azevedo, retornando dos Estados Unidos, onde a Escola Nova estava bastante difundida, passam a preconizar esta tendncia, criticando de maneira contundente a tendncia tradicional. Mesmo sendo 1932 o ano que ocorreu o grande alarde em torno da Escola Nova em nosso pas, foi somente em 1960 que ela atingiu o auge, refluindo logo depois. importante frisar que esta tendncia trouxe informaes indiscutveis para a pratica pedaggica, como as modificaes nos papis do professor e do aluno, em conseqncia da compreenso de que a aprendizagem se d na pessoa; o individuo que aprende, dentre outras. Entretanto, aluno ativo implica escola equipada com laboratrios e salas-ambiente, recursos didticos que geram custos. Sendo a nossa escola pblica carente de recursos, a implantao dessa proposta educativa tornou-se difcil. A maioria dos professores no estava bem preparada e se sentia insegura, ainda que a nova tendncia marcasse o tom dos cursos de formao. Sobre este momento, costuma-se dizer que os docentes no s se sentiam despreparados para assumir uma nova prtica, condizente com a Nova Escola, mas tambm no queriam ser tradicionais. Isto fez com que eles deixassem de fazer , na prtica pedaggica o que sabiam e fizessem mal feito o novo. Podemos dizer que a Didtica da Escola Nova centra-se na preocupao de como facilitar o processo ensino-aprendizagem de forma a possibilitar ao aluno uma participao ativa neste processo, respeitando suas caractersticas, seus interesses, seus sentimentos, para que a escola seja um local prazeroso e que retrate a vida da maneira mais fidedigna possvel. A grande influncia da Psicologia na Educao fez com que os educadores apresentassem uma proposta educacional no-diretiva, de liberdade para aprender, estimulado pelos trabalhos de Carl Rogers, psiclogo norte-americano que desenvolvia um trabalho teraputico na linha no diretiva, centrada na pessoa. Nesta proposta, o trabalho pedaggico acaba por confundir-se com o psicolgico e torna-se secundrio; o importante ajudar o aluno a se conhecer, a se relacionar, a se auto-realizar. Assim, o professor passaria a ser um especialista em relaes humanas, mais preocupado com as questes psicolgicas do que com as pedaggicas e sociais, ou seja, mais um psiclogo do que um educador. Por isso, se essa tendncia, num primeiro momento, seduziu os educadores, num segundo momento passou a cargo dos orientadores educacionais e psiclogos escolares. Na segunda metade do sculo XX, com o crescimento da sociedade industrial, fortemente calcada na tecnologia, desponta uma outra tendncia: a Tecnicista. Na tendncia tradicional, o processo ensino-aprendizagem estava centrado no professor, ao passo que na Escola Nova centrava-se no aluno. Agora, na tendncia tecnicista, os meios passam a ser o foco, como forma de garantir os resultados do processo ensino-aprendizagem, e os mtodos de ensino tornam-se sofisticados.

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Outra vez a Psicologia faz-se muito presente na educao, mostrando, agora, que todos so capazes de aprender qualquer coisa desde que estimulados. A tendncia tecnicista adequa-se perfeitamente a uma sociedade industrializada que precisa aumentar, cada vez mais, a sua produo e, nesse sentido, tornar os indivduos mais produtivos. No inicio de 1960, o Brasil chega ao final de um modelo econmico intitulado substituio de importaes com a implantao de indstrias de grande porte, como as automobilsticas. Isso significou a nossa entrada no mundo capitalista, que, naquela ocasio, era movido pela produo industrial. O bom desempenho alcanado pelas indstrias devia-se, em grande parte, ao avano tecnolgico. Isto levou todos os setores sociais a se tornarem tecnologizados, inclusive a educao, com a adoo pela escola da separao entre o pensar e o fazer. Foi o momento em que surgiram novas profisses na rea educacional: o administrador escolar, o orientador educacional e o supervisor escolar, este ltimo pensado bem moda da indstria. Estes profissionais formavam a equipe que planejava o processo didtico a ser colocado em prtica pelos professores. Evidentemente, este modelo no funcionou, gerando nos professores, verdadeiro horror em relao aos planejamentos de ensino. O professor sempre planejou as aulas sua maneira, relacionando os contedos que daria e se organizando em funo disto. No modelo tecnicista, esta forma de planejar j no servia, pois havia uma equipe responsvel por isto, alijando o professor se seu prprio fazer. Este passou a achar que o planejamento no servia para nada. O planejamento didtico, com base neste modelo fabril, estabelecia objetivos de forma bem operacionalizada. A idia era que, ao se organizar o trabalho aos poucos, isto , dando pequenos passos de cada vez, a possibilidade de sucesso era bem maior. A metodologia sofreu grande sofisticao pois agora ela passou a ser o foco principal do processo ensino-aprendizagem. Nas escolas surgiram os mtodos individualizados, como a instruo programada e o mdulo instrucional, entre outros, tendo como principais caractersticas o respeito ao ritmo prprio do aluno e s diferenas individuais. Nesta tendncia, a avaliao voltou-se para toso o processo de ensino, utilizando procedimentos extremamente tcnicos. Os contedos valorizados eram os de carter cientfico, exigidos para a capacitao profissional em uma sociedade industrial e tecnolgica. A legislao brasileira, nesse momento, admitia a possibilidade de qualificar o professor em nvel superior e o contedo dos cursos de formao de professores no seria mais que a verso do tecnicismo educacional. A didtica, na tendncia tecnicista, enfatizou o carter prtico-tcnico do ensino, desconsiderando, como as tendncias anteriores, os condicionantes sociais. A vida dos professores ficou mais complicada quando a tendncia tecnicista foi implantada oficialmente com a promulgao da Lei n 5.692/71 para o ensino de 1 e 2 graus (denominao da poca). O tecnicismo exigia a aplicao de uma metodologia extremamente sofisticada e distante da realidade da maioria dos professores das escolas brasileiras. Alm do que, a nfase na tcnica, no processo de ensino, gerou um grande esvaziamento nos contedos, o que contribuiu enormemente para a desestruturao da educao no nosso pas. As teorias apresentadas at ento, segundo a Psicologia, apiam-se em diferentes concepes do homem e do modo como ele constri o conhecimento. Esse processo de apropriao do conhecimento enfatiza ora os fatores de interao internos (endgenos), ora os externos (exgenos), o que os estudiosos denominam de abordagens inatistas (importncia dos fatores endgenos) ou ambientalistas (ao do meio e da cultura sobre a conduta humana). Poder-se-ia dizer que, at o advento do tecnicismo, a Didtica enfatizava mais o processo de ensinar do que o contexto. Da a denominao no-critica que se d as tendncias tradicionais, liberal escolanovista, liberal no-diretiva e liberal tecnicista, pois elas no se ocupam da realidade,

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no relacionam as questes educacionais s sociais, no se percebendo, portanto, condicionadas por estas. 1.3 AS TENDNCIAS CRTICAS A dcada de 1980 se inicia ainda sob a efervescncia e ansiedade do restabelecimento do estado democrtico de direito no Brasil, aps um longo perodo de ditadura militar. A partir de ento, movimentos sociais ganham fora em todo pas. A classe operria se une aos professores na luta pela participao nas decises poltico-educacionais, pela recuperao da escola pblica e pela democratizao do ensino. A Didtica passa a sofrer grande influncia das teorias crticas da educao. Esta orientao se deu a partir dos diferentes enfoques e confrontos de seus pesquisadores, em um pluralismo de idias e de inquietudes que norteava sua trajetria em novos rumos. Espaos para troca de saberes entre educadores aconteciam em todo pas. Buscava-se repensar a didtica a partir da nfase da competncia poltica dos educadores, contrapondo-se a anterior viso tcnica da Didtica como disciplina instrumental. Essa busca resultou ento na historizao da Didtica com a educao premente para o novo projeto histrico que emergia no Brasil, uma Didtica Fundamental. Algumas das preocupaes que orientaram as investigaes na rea giravam em torno das seguintes questes: ideologia, poder, alienao, conscientizao, reproduo, contestao do sistema capitalista, classes sociais, emancipao, resistncia, relao teoria-prtica, educao como prtica social, o educador como agente de transformao, articulao do processo educativo com a realidade. Sobressaiu, nas posies dos educadores progressistas, a influncia marxista em suas vrias interpretaes. 1.3.1 As Pedagogias progressistas No Brasil, a pedagogia crtica libertadora de Paulo Freire atribuiu educao o papel de denncia das condies alienantes do povo, passando a fundamentar as crticas dos professores que apontavam os mecanismos de opresso da sociedade de classes. A teoria pedaggica de Paulo Freire no tem uma proposta explcita para a Didtica. H, no entanto, uma didtica implcita na orientao do trabalho escolar, cujo ensino centrado na realidade social, ou seja, uma didtica que busca desenvolver o processo educativo como tarefa que se d no interior dos grupos sociais e por isso o professor coordenador das atividades que se organizam sempre pela ao conjunta dele e dos alunos. A preocupao de Freire girava em torno da educao das classes populares, inicialmente de carter extra-escolar, no formal. Seus princpios e prticas, tornaram-se pontos de referncia para professores no mundo todo. Para citar alguns: 1. a valorizao do cotidiano do aluno; 2. a construo de uma prxis educativa que estimula a sua conscincia crtica, tornando-se o sujeito de sua prpria histria; 3. o dilogo amoroso entre professor e aluno; 4. o professor como mediador entre o aluno e o conhecimento; 5. o ensino dos contedos desvelando a realidade. Tais princpios e aes contriburam para uma concepo prpria e poltica do ato de educar, numa postura filosfica que influenciou a forma didtica de atuar de muitos professores que trabalham tambm na educao formal.

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Outras correntes antiautoritrias aparecem no Brasil contrapondo-se ao sistema de explorao e dominao ideolgica, tais como a Pedagogia Histrico-Crtica e a Pedagogia Crtico-Social dos Contedos. A Pedagogia Histrico-Crtica fundamenta-se em uma teoria crtico-pedaggica capaz de orientar a prtica cotidiana dos professores, assumindo a pedagogia como cincia da educao e para a educao. A Pedagogia Crtico-Social dos contedos atribuiu grande importncia Didtica, considerando que esta tem como objetivo a direo do processo de ensinar, tendo em vista as finalidades sociopolticas e pedaggicas e as condies e meios formativos, convergindo para promover a auto-atividade dos alunos que a aprendizagem. Para Libneo, um dos principais expoentes dessa teoria, o que importa que os conhecimentos sistematizados sejam confrontados com as experincias socioculturais e com a vida concreta dos alunos, de forma a assegurar o acesso aos conhecimentos sistematizados a todos como condio para a efetiva participao do povo nas lutas sociais. Para o autor, os professores no devem, de maneira nenhuma, perder de vista o contedo da sua disciplina, contextualizando e orientado o aluno para aplic-lo na sua vida prtica. Para tanto, a seleo do contedo deve ser feita considerando a sua utilidade e seu carter cientifico. O autor defende os contedos que, por sua natureza, possibilitam maior capacidade de interveno e analise da realidade. Nesse sentido, a Didtica corpo de conhecimentos tericos e prticos medeia o pedaggico e a docncia. Isto significa que ela faz a ligao entre o para qu (opo polticopedaggica) e o como da prtica escolar (a prtica docente). A partir dessa fase, percebe-se na educao de todo o pas uma releitura de autores como Freire, da Pedagogia Libertadora, e Freinet, da Pedagogia Libertria, de Piaget e Vygotsky considerados construtivistas, num tipo de Pedagogia ainda procura de uma denominao. 1.4 A PEDAGOGIA DE CLESTIM FREINET A pedagogia de Clestin Freinet (1896-1966) tinha como preceito a reflexo, a experimentao e o compromisso com uma escola democrtica e popular, procurando proporcionar aos filhos do povo os instrumentos necessrios sua emancipao, atravs da autogesto e educao pelo trabalho. Propunha como atividade para os alunos a produo de textos livres, a imprensa escolar, a correspondncia interescolar, a biblioteca de trabalho, o fichrio escolar cooperativo, a horta, o uso do tear, os atelis de artes. Esse conjunto de tcnicas tinha como objetivo dar condies aos indivduos para exercerem a cidadania. O autor organizou junto com os alunos o livro da vida, no qual eram registrados os fatos mais interessantes vivenciados no cotidianos escolar. 1.5 OS ESTUDOS DE PIAGET Os estudos de Jean Piaget (1896-1980) tinham como preocupao a epistemologia (teoria do conhecimento) em uma perspectiva interdisciplinar e construtivista. O autor elaborou a teoria psicogentica, que procurava mostrar por quais mudanas qualitativas a criana passa, desde o estgio inicial de uma inteligncia prtica at o pensamento formal. Para o autor, o conhecimento resulta de uma interao do sujeito que conhece (cognoscente) com o objetivo a ser conhecido. A aprendizagem depende do estgio de desenvolvimento atingido pela criana. Ela criana ativa em todas as etapas de sua vida e procura compreender o que passa a seu redor atravs de esquemas mentais (assimilao, ao, operaes) e se modifica como resultado da maturao biolgica, das experincias, das trocas interpessoais e das transmisses culturais.

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1.6 A TEORIA DE VYGOTSKY A teoria de Vygotsky baseou-se no vnculo histrico-cultural, em uma nova relao entre sujeito e objeto no processo de construo do conhecimento. Ele e sua equipe utilizaram-se de uma abordagem interdisciplinar e construtivista para investigar o reflexo que o mundo exterior exerce no mundo interior dos indivduos, a partir da interao destes com a realidade. Para o grupo, a aprendizagem favorece o desenvolvimento das funes mentais e comea desde que a criana nasce. O conhecimento se d a partir da ao ativa e interativa da criana sobre a realidade. A aprendizagem escolar deve favorecer o desenvolvimento real (possibilidades que os alunos tm para realizarem sozinhos as tarefas) e o desenvolvimento proximal (possibilidades que as crianas revelam quando as atividades so mediadas por um professor ou um colega experiente). Para o terico, as mudanas que ocorrem com as pessoas decorrem da interao destas com a prpria histria, cultura e sociedade. As teorias anteriormente referidas passaram a revigorar o cenrio da educao brasileira, tendo em vista a ento necessidade de defesa da ao libertadora do sujeito humano silenciado pela realidade objetiva de mercado. Para a Didtica, essas tericas auxiliaram a reflexo dos professores, sobre o processo de ensino-aprendizagem, no que dizia respeito relao professoraluno, s operaes mentais dos alunos, ao conhecimento, importncia das atividades socializadas e de interao na sala de aula, utilizao de atividades do interesse e produo dos alunos, organizao dos contedos, avaliao do aluno, etc. 1.7 DA PERSPECTIVA DA INCERTEZA INCERTEZA DE PERSPECTIVAS A partir de 1990, passamos a vivenciar a era das incertezas na vida da sociedade brasileira e na educao. H uma consolidao do projeto neoliberal, ampliam-se as formas de excluso social e cultural e uma intensificao da globalizao econmica e da mundializao da cultura com o processo de globalizao e a crise de paradigmas no nvel das diferentes cincias. Ao mesmo tempo que se verificava uma valorizao acentuada da educao, nos Encontros Nacionais de Didticas e Prtica de Ensino (ENDIPEs), debatiam-se vrios temas: o saber e o trabalho docente, a profissionalizao, a qualidade do ensino a partir da sala de aula, a nova lei, as prticas desumanizadoras e a produo do conhecimento na rea de Didtica. Questionavam-se os valores do neoliberalismo e as formas institudas da racionalidade econmica. Considerando a falta de perspectivas, os educadores mostravam a necessidade de se trabalhar pelas prticas didtico-pedaggicas transformadoras luz do materialismo histrico-dialtico. A partir de ento, as pesquisas na rea da Didtica Crtica, em geral, voltaram-se para o interior da escola de ensino fundamental, com o objetivo de compreender melhor o seu cotidiano e o fazer pedaggico. Outros educadores e profissionais das reas da Sociologia, Psicologia e Filosofia colaboraram na investigao sobre a prtica pedaggica escolar. Diversas experincias educacionais ocorreram em todo o pas, deflagrados pelo esprito da nova Lei de Diretrizes e Bases, Lei n 9.394/96; reformas curriculares forma realizadas e orientadas, na maioria das vezes, por polticos educacionais vindos de fora, ditados, muitas vezes, por organismos internacionais tais como o FMI e o Banco Mundial. Ao mesmo tempo, cada vez mais, as cincias questionavam o paradigma cientfico at ento utilizado como base da produo e divulgao do conhecimento. Afirmavam que o mundo e o sujeito histrico tambm so construes culturais e os conhecimentos no devem ser tratados de forma compartimentalizada, propondo o paradigma holstico para se trabalhar os saberes, isto , propondo-se que se estudassem as diferentes reas do conhecimento de forma interligada, como o todo que as formam. A educao tambm inclinava-se para essa viso holstica, enfatizando cada vez mais a integrao de contedos e a percepo do aluno no

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s como um ser intelectual, mas considerando tambm os aspectos emocional, fsico, cultural, social e de gnero. Repercutiram no Brasil, nesse perodo, pesquisas realizadas na Europa e nos Estados Unidos sobre a formao docente cuja perspectiva era o ensino como prtica reflexiva. O ensino, por esta perspectiva, era encarado como uma forma de investigao e experimentao. Outras contribuies para a didtica comeavam a surgir nesse perodo vindas de outras reas do conhecimento, entre elas a preocupao com os aspectos culturais. A escola ento percebida como espao de produo cultural e de poltica cultural. Questes como a diversidade cultural e a pedagogia da diferena constituram temas do multiculturalismo, da educao e de um currculo multicultural. Ainda h de se considerar o grande desenvolvimento tecnolgico no campo da informao e da comunicao, passando a exigir dos educadores preparo para a sua utilizao, o que reacende o aprender a aprender da Escola Nova. Atualmente surgem novas exigncias. O aluno deve ser capaz de buscar informaes em diferentes mdias e transform-las em conhecimento. Faz-se necessria a formao continuada de professores, como conseqncia dos desafios impostos pela rea tecnolgica. Finalmente, poderamos dizer que o mundo ps-moderno esta dificultando a crtica s questes sociais em educao. A insegurana desse perodo passa a exigir uma relao constante sobre os fins dessa sociedade, de forma a fundamentar cientfica, tcnica e filosoficamente a prpria prtica didtica, reformulando-a quando for o caso. Leitura Complementar Quando falamos que um professor muito tradicional, conservador ou conteudista, isto enciclopedista ao extremo na quantificao de contedos que transmite aos seus alunos, ou quando dizemos que determinado professor metodologicamente maravilhoso pela sua exposio, que est sempre antenado com o seu tempo, seu tratamento com os alunos dialgico, suas avaliaes so instrumentos qualitativos por excelncia, visto que a nota de seus trabalhos somatrio de todo um processo de aprendizagem dos alunos, no sentido mais amplo da funo cognitiva e afetiva de suas relaes, etc., pensamos imediatamente porque estas diferenas existem dentro do fazer docente. Por isso temos que estar atentos e buscarmos reflexes mais aprofundadas sobre quem educa o educador? A resposta, como todo ato em Educao, no simples , pois sabemos que os cursos de graduao, na busca de qualidade de ensino, privilegia essa ou aquela teoria, essa ou aquela tendncia pedaggica, como metodologia e caractersticas prprias, alijando do processo de formao muitas vezes, a discusso maior do ato educativo, promovendo condicionamentos que interferem nos papis desempenhados pelos professores e que recaem de forma at nefasta e desestimuladora nos alunos. Os quadros que segue, apresentam caractersticas da pedagogia progressiva e liberal, tendncias que orientaram (ou ainda continuam orientando, a prtica educativa dos professores de nossas escolas). Indica vrios caminhos que podero ser apontados a partir destas reflexes para que o professor criticamente situado possa analisa-los, auxiliando-os para uma redefinio de um projeto de democratizao do ensino em nossas escolas, inclusiva as do ensino superior.

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PEDAGOGIA PROGRESSIVA DISCRIMINAO PAPEL ESCOLA CONTEDOS ENSINO LIBERTADORA CRTICO-SOCIAL DOS CONTEDOS Atuar na transformao Preparao do aluno para o adulto e suas da personalidade do mundo aluno, contaminando contradies. todo o sistema. Resultam de No basta que os contedos necessidades e sejam apenas ensinados, ainda interesses manifestos que bem ensinados, preciso que se liguem de forma pelo grupo. indissocivel, sua significao humana e social. Vivncia grupal. Vai-se da ao compreenso e da compreenso ao, at a sntese (unidade entre a teoria e a prtica). Relao no-diretiva. Participao ativa do aluno. LIBERTRIA

DA Objetiva uma transformao social. DE So extrados da problematizao da prtica de vida dos educandos. Atravs de dilogos.

MTODOS

RELACIONAMENT Relao horizontal. O PROFESSOR- Educando e educador ALUNO se posicionam como sujeito do ato do conhecimento. O que aprendido Aprendizagem PRESSUPOSTOS no decorre de uma via-grupo. DA ou APRENDIZAGEM imposio memorizao, mas, do nvel crtico de conhecimento. MANIFESTAES Confunde-se com NA PRTICA "educao popular". ESCOLAR

informal Verificao da bagagem cultural do aluno.

Interao sociais.

contedos/realidades

DISCRIMINAO TRADICIONA L PAPEL DA Preparao ESCOLA intelectual e moral do aluno. CONTEDOS DE So ENSINO separados da experincia dos alunos e da realidade social MTODOS Expositivo e memoriza o. RELACIONAMEN- Predomina a

PEDAGOGIA LIBERAL RENOVADA RENOVADA NOPROGRESSISTA DIRETIVA na Adequar as Mudana educao. Momento necessidades individuais sua de psicologismo da educao. realidade social. Contedos, Facilitar os estabelecidos estudantes a buscar atravs de por si mesmo os experincias e conhecimentos. situaes-problemas e desafios cognitivos. Aprender fazendo. Prevalecendo quase exclusivamente o esforo do professor, atravs de sua criatividade. Professor no ocupa No h rigidez nas

TECNICISTA Modeladora do comportamento humano, atravs de tcnicas especficas. Cincia objetiva eliminando qualquer subjetividade.

Preocupao com a tele educao.

O professor o elo de

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TO PROFESSOR- autoridade ALUNO do professor: Aluno: passivo PRESSUPOSTOS repassar os conheciment DA APRENDIZAGEM os para o esprito da criana.

lugar de destaque. normas disciplinares. um auxiliar de desenvolvimento. A motivao Auto-avaliao depende do aluno. estmulo. Aprender: atividade de descoberta.

ligao entre a verdade cientfica e o aluno.

MANIFESTAES Predominant Choque com uma Prtica NA PRTICA emente prtica pedaggica pedaggica. ESCOLAR autoritria. tradicional.

do O ensino um processo de condicionamento, atravs do uso de reforamento das respostas que se quer obter. no Atravs das leis:5540/68 e 5692/71.

A prtica escolar consiste na concretizao das condies que asseguram a realizao do trabalho docente. Tais condies no se reduzem ao estritamente "pedaggico", j que a escola cumpre funes que lhe so dadas pela sociedade concreta que, por sua vez, apresenta-se como constituda por classes sociais com interesses antagnicos. A prtica escolar, assim, tem atrs de si condicionantes scio-polticos que configuram diferentes concepes de homem e de sociedade e, conseqentemente, diferentes pressupostos sobre o papel da escola, aprendizagem, relaes professor-aluno, tcnicas pedaggicas etc. Fica claro que o modo como os professores realizam seu trabalho, selecionam e organizam o contedo das matrias. ou escolhem tcnicas de ensino e avaliao tem a ver com pressupostos terico-metodolgicos, explcita ou implicitamente. Uma boa parte dos professores, provavelmente a maioria, baseia a sua prtica em prescries pedaggicas que viraram senso comum, incorporadas quando de sua passagem pela escola ou transmitidas pelos colegas mais velhos; entretanto. essa prtica contm pressupostos tericos implcitos. Por outro lado, h professores interessados num trabalho docente mais conseqente, professores capazes de perceber o sentido mais amplo de sua prtica e de explicitar suas convices. Inclusive h aqueles que se apegam ltima tendncia da moda, sem maiores cuidados em refletir se essa escolha trar, de fato, as respostas que procuram. Deve-se salientar. ainda, que os contedos dos cursos de licenciaturas, ou no incluem o estudo das correntes pedaggicas. ou giram em tomo de teorias de aprendizagem e ensino que quase nunca tm correspondncia com as situaes concretas de sala de aula, no ajudando os professores a formar um quadro de referncia para orientar a sua prtica. Em artigo publicado em 1981. Saviani descreveu com muita propriedade certas confuses que se emaranham na cabea de professores. Aps caracterizar a pedagogia tradicional e a pedagogia nova. indica o aparecimento, mais recente, da tendncia tecnicista e das teorias crtico-reprodutivistas, todas incidindo sobre o professor. Ele escreve: "Os professores tm na cabea o movimento e os princpios da escola nova. : A realidade, porm, no oferece aos professores condies para instaurar a escola nova, porque a realidade em que atuam tradicional. (...) Mas o drama do professor no termina a. A essa contradio se acrescenta uma outra: alm de constatar que as condies concretas no correspondem sua crena, o professor se v pressionado pela pedagogia oficial que prega a racionalidade e a produtividade do sistema do seu trabalho. isto . nfase nos meios {tecnicismo), (...) A est o quadro contraditrio em que se encontra o professor: sua cabea escola-novista, a realidade tradicional; (...) rejeita o tecnicismo porque sente-se violentado pela ideologia. oficial; no aceita a linha crtica porque no quer receber a denominao de agente repressor.1

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SAVIANI, Dermeval. Tendncias pedaggicas contmporneas, p.65.

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necessrio esclarecer que as tendncias no aparecem em sua forma pura. nem sempre so mutuamente exclusivas. nem conseguem captar toda a riqueza da prtica concreta. So, alis, as limitaes de qualquer tentativa de classificao. De qualquer modo, a classificao e a descrio das tendncias podero funcionar como instrumento de anlise para o professor avaliar sua prtica de sala de aula. ATIVIDADE 2 2.1 Faa uma comparao em linhas gerais entre a pedagogia liberal da pedagogia progressista. 2.2 Segundo Paulo Freire, seria o dilogo - o confronto entre as experincias dos sujeitos com os saberes acumulados que proporcionaria ao educando uma vida menos fragmentada e ingnua do mundo em que vive. Voc concorda com esses posicionamentos do autor? 2.3 Das tendncias apresentadas neste mdulo, qual tendncia voc mais se identifica? Justifique sua resposta. INDICAO DE LEITURAS FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. Rio de Janeiro. : Paz e Terra, 1996. Neste livro, Paulo Freire faz uma profunda reflexo sobre a formao docente ruma autonomia discente. Segundo Moacir Gadotti, na busca permanente de aprendizado, poucas vezes encontramos textos apropriados como este. Nele Paulo Freire nos ensina a ensinar partindo do ser professor. Numa linguagem acessvel e didtica ele reflete sobre saberes necessrios prtica educativo-crtica fundamentados numa tica pedaggica e numa viso de mundo aliceradas em rigorisidade, pesquisa, criticidade, risco, humildade, bom senso, tolerncia, alegria, curiosidade, esperana, competncia, generosidade, disponibilidade... molhadas pela esperana. SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. So Paulo : Cortez ? autores associados, 1993. Neste livro, Saviani rene quatro textos que tiverampapel fundamental nos debates em torno da educao, na dcada de 80 e que continua fundamentando a prtica de uma pedagogia crtica at os dias atuais. O referido autor associa as teorias da educao e o problema da marginalidade com o fenmeno da escolarizao. Nos estudos Escola e democracia so abordados e discutidas os fundamentos da pedagogia histrico-crtica e o papel da educao na sociedade de um saber construdo ao longo da Histria. O ltimo texto 0 Onze teses sobre educao e poltica tem por objetivo encaminhar, de modo explcito, a discusso das relaes entre educao e poltica, que atravessa, de ponta a ponta, o contedo da obra. SNYDERS, George. Alunos felizes: reflexes sobre a alegria na escola a partir de textos literrios. Prefcio por Paulo Freire e traduo de Ctia ainda Pereira da Silva. Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1996.. A singularidade da minha escola transformar os contedos escolares a ponto de colocar em primeiro plano a obra-prima e a alegria que o aluno pode extrair da obra prima; uma escola que ambiciona confrontar o aluno com as conquistas humanas essenciais, na esperana de que ele alcance assim as alegrias essenciais. Eis como Georges Snyders define neste livro seu projeto pedaggico. Trabalhando com uma noo ampla de obra-prima, que inclui no apenas as grandes obras artsticas e literrias do passado e do presente, mas tambm as grandes descobertas cientficas, as conquistas da tcnica, do pensamento e da moral, o autor mostra, por meio de exemplos tirados da literatura, que possvel criar uma escola alegre, uma vez que existiram e existem embora constituam uma minoria alunos felizes.

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MDULO IV Unidade I - As Teorias Do Conflito E A Prtica Docente Os objetivos desta unidade podem ser assim formulados: 1. Relacionar as teorias do conflito problemtica da reproduo e da ideologia subjacente no campo da prtica docente; 2. Distinguir e descrever as trs posies dominantes nas teorias do conflito, revelando os seus vnculos com a natureza do trabalho docente; 3. Descrever as lacunas existentes pelas teorias do conflito a partir do exame de suas semelhanas com as teorias do consenso. Segundo Petitat (2002), a oposio existente entre as teorias do consenso e as teorias do conflito ainda constitui um dominante debate intelectual no campo da Sociologia. O debate entre essas teorias coloca em questo a seguinte contradio: enquanto as teorias do consenso esto centradas na problemtica da integrao social e do equilbrio, as teorias do conflito colocam os conflitos de classe no cerne da explicao da realidade social, na qual se circunscreve o espao da educao. Portanto, o conjunto dessas teorias apresenta diferentes interpretaes da sociedade como um todo. Para as teorias do consenso, a sociedade concebida como um sistema integrado ou em vias de integrao de elementos que so complementares. J para as teorias do conflito, a sociedade concebida como uma unidade configurada por elementos contraditrios cuja estabilidade garantida pela manuteno das relaes de dominao. Para as primeiras teorias (as do consenso), o conceito-chave o de ordem, enquanto para as teorias do conflito o de controle. Assim sendo, a oposio existente entre o conjunto dessas teorias bastante profundo e reflete no modo de interpretao da escola, de sua gnese, de suas funes e de suas relaes com a sociedade como unidade contraditria de elementos. No interior da corrente conflitualista h diferentes posies tericas; todavia, destacaremos nesta aula trs posies, a saber: 1. a reproduo social; 2. a teoria da correspondncia; 3. a reproduo cultural. Iniciaremos nosso estudo examinando as concepes marxistas de Louis Althusser e de Bowles-Gintis; em seguida examinaremos a teoria de Bourdieu-Passeron. A TEORIA DA REPRODUO SOCIAL E A PRTICA DOCENTE Louis Althusser, no seu trabalho Ideologia e aparelhos ideolgicos de Estado, publicado pela primeira vez em 1969, apresenta-nos uma interpretao da instituio escolar claramente poltica e, mais concretamente, marxista. O seu meritrio trabalho prope um modelo explicativo do modo como se reproduzem as relaes de produo nas sociedades capitalistas. Todas as formaes sociais devem, ao mesmo tempo que produzem, e precisamente para poderem produzir, reproduzir as condies da sua produo. Necessitam, por isso, reproduzir as foras produtivas e as relaes de produo existentes. Althusser vai concentrar mais ateno na ltima questo, na reproduo das relaes de produo. Althusser (1989) concebe a forma de articulao de uma sociedade constituda por duas instncias: a infra-estrutura ou base econmica; e a superestrutura, composta por sua vez por dois nveis, o jurdico-poltico (o direito e o Estado) e a ideologia (as diferentes ideologias: religiosa, moral, jurdica, poltica etc.). E, para isso, no hesita em recorrer a uma metfora especial, a de comparar a sociedade com um edifcio com diversos andares, na base, a infraestrutura, e sobre esta dois andares, a superestrutura, mostrando assim uma considervel rigidez conceitual, pois, segundo as suas prprias palavras, os andares superiores no poderiam sustentar-se no ar por si prprios, se no se apoiassem, precisamente, sobre a sua base (p. 77).

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Pressupe, dessa forma, um total determinismo, em ltima instncia, por parte da base econmica; a superestrutura no teria, por conseguinte, qualquer autonomia, no desempenharia qualquer papel de relevo como motor de transformao da sociedade. Na superestrutura, a diferenciao dos dois nveis atrs referidos (o jurdico-poltico e o ideolgico) vai ter tambm duas funes diferentes. Assim, os aparelhos repressivos de Estado (o governo, o ministrio, a polcia, os tribunais, as prises etc.) ocupar-se-o em conservar o poder de uma forma mais direta e visvel; funcionam mediante a violncia pelo menos em ltima instncia (j que a represso, por exemplo administrativa, pode revestir-se de formas no fsicas) (Althusser, 1989, p. 84). Por outro lado, os aparelhos ideolgicos de Estad