Apostila Pratica BioCel

20
DEPARTAMENTO DE GENÉTICA E BIOLOGIA EVOLUTIVA INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO BIOLOGIA CELULAR (BIO-206) INTRODUÇÃO AOS MÉTODOS DE ESTUDO DA CÉLULA

description

introdução as métodos de estudo da célula

Transcript of Apostila Pratica BioCel

Page 1: Apostila Pratica BioCel

DEPARTAMENTO DE GENÉTICA E BIOLOGIA EVOLUTIVA INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

BIOLOGIA CELULAR (BIO-206)

INTRODUÇÃO AOS MÉTODOS DE ESTUDO DA CÉLULA

Page 2: Apostila Pratica BioCel

2

I. INSTRUMENTAÇÃO EM CITOLOGIA: O MICROSCÓPIO FOTÔNICO

A célula, o objeto de estudo da Citologia, pode ser estudada sob diversos

aspectos: podemos procurar conhecer sua forma e a de seus constituintes, a

natureza química desses constituintes e seu modo de funcionamento. Em outras

palavras, essas investigações são denominadas morfológicas, químicas ou

bioquímicas e fisiológicas e a cada uma delas correspondem métodos de estudo

particulares. Esta parte do curso de Citologia tratará justamente de introduzir o aluno

nos diversos tipos de abordagem normalmente utilizados no estudo da célula.

De uma maneira geral, podemos dizer que, devido às suas pequenas

dimensões, um estudo detalhado da célula e de seus constituintes com a vista

desarmada é virtualmente impossível. Para se ter uma idéia, as dimensões mais

comumente observadas entre as células de animais e vegetais superiores, situam-se

na faixa de 10 a 20 µm (lembrar que 1 µm = 10-3 mm; 1 nm = 10-6 mm e 1 å = 10-1 nm).

Por isso, o citologista é obrigado a se utilizar de instrumentos de aumento para a

observação conveniente da célula.

Os estudos morfológicos ou morfofisiológicos da célula começam

normalmente com o emprego do microscópio óptico, mais corretamente denominado

de microscópio fotônico (por se utilizar da luz como fonte de formação de imagens)

ou microscópio composto (pode ser constituído por dois sistemas de lentes

sobrepostas: a objetiva e a ocular). Este instrumento pode ser considerado como a

ferramenta básica e indispensável de todo o citologista.

A observação da célula ao microscópio fotônico é feita por luz transmitida,

possibilitando assim que detalhes estruturais internos possam ser evidenciados.

Contudo, esta observação por transmissão de luz exige que o objeto a ser estudado

responda a certas condições. Para que a luz possa atravessá-lo, o objeto deve ser

suficientemente fino. No caso da célula, para se ter uma imagem conveniente sem

grande sobreposição de estruturas, essa espessura deve ser da ordem de 5 µm.

Como raramente uma célula apresenta uma espessura tão pequena, somos

obrigados a fazer fatias ou cortes da célula para atingir a espessura desejada.

Além da espessura, a observação da célula por transmissão ao microscópio

fotônico apresenta ainda um outro problema: ela só é efetiva se certas regiões do

objeto absorverem mais luz do que outras, ou seja, se esse objeto apresentar

contrastes. Como em geral os constituintes celulares têm muito pouco contraste, o

citologista é obrigado a lançar mão de certos artifícios para contornar esse problema.

A alternativa mais lógica é criar, artificialmente, este contraste, no nível de certas

estruturas celulares. Isto pode ser obtido através do uso de corantes, que são

Page 3: Apostila Pratica BioCel

3

substâncias que absorvem certos comprimentos de onda da luz visível e têm

afinidade por determinados constituintes celulares. Uma outra maneira de se criarem

contrastes artificialmente é através da utilização de certas montagens ópticas

especiais que são capazes de ampliar as pequenas diferenças de contrastes

existentes entre as diversas regiões da célula. Como exemplo dessas montagens,

temos o microscópio de fase, o microscópio de interferência, o microscópio de

polarização, etc.

- Partes do Microscópio Composto.

Compõe-se fundamentalmente das seguintes partes:

A) Partes Mecânicas

1. PÉ - é a base do aparelho e suporta todas as outras partes.

2. BRAÇO - preso ao pé, rígido ou articulado, suporta o canhão, a platina, o

condensador e o espelho (ou fonte luminosa).

3. CANHÃO - é o tubo onde se dispõem as parte ópticas de ampliação; pode ser fixo

ao braço ou possuir movimento vertical.

4. REVÓLVER - é uma peça giratória onde se conectam as objetivas e que permite a

instantânea mudança das mesmas.

5. PLATINA - é a mesa de trabalho, onde se coloca a preparação para exame; possui

uma abertura central que dá passagem à luz proveniente da fonte; pode ser fixa ao

braço (se o canhão for móvel) ou possuir movimento vertical (se o canhão for

fixo).

6. "CHARRIOT" - é um dispositivo preso à platina, dotado de movimento antero-

posterior e lateral, destinado a movimentar a preparação.

7. PARAFUSO MACROMÉTRICO - é um dispositivo destinado a dar grandes e rápidos

deslocamentos verticais ao canhão ou à platina; serve para focalização grosseira.

8. PARAFUSO MICROMÉTRICO - é um dispositivo destinado a dar pequenos e lentos

deslocamentos verticais ao canhão ou à platina; serve para focalização fina.

Page 4: Apostila Pratica BioCel

4

B) Sistema de iluminação

1. ESPELHO OU FONTE DE LUZ DIRETA - preso à parte inferior do braço, refletindo

ou projetando a luz para a parte inferior do condensador.

2. DIAFRAGMA OU ÍRIS - colocado sob o condensador, destinado a restringir o

diâmetro do feixe luminoso.

3. CONDENSADOR - é um sistema óptico de refração preso à parte inferior do braço,

sob a platina, podendo ou não possuir movimento vertical (e lateral para

centragem), destinado a fazer convergir sobre a preparação a luz proveniente da

fonte.

C) Sistema de ampliação

1. OBJETIVA

2. OCULAR

- Princípios de Formação de Imagem ao Microscópio Fotônico

A luz proveniente da fonte luminosa, seja ela direta ou refletida, após

atravessar o condensador, é concentrada sobre a preparação. A luz incidente no

condensador deve ser paralela para que toda a luz emergente possa convergir no

foco daquele sistema óptico. Assim, no caso da existência de espelho, a face plana

deve ser utilizada quando a luz for artificial e emitir luz paralela e a face côncava

quando a luz for natural (difusa) ou artificial divergente.

A preparação (objeto) a ser observado deve ter como vimos, uma espessura

reduzida para permitir a transmissão da luz. Cada um de seus pontos funciona como

fonte intensa para a formação de imagens pela objetiva.

A objetiva fornece uma imagem real, ampliada e invertida da preparação,

conforme se pode ver na construção geométrica da Figura 1. Nessa figura, Ho é a

preparação, Hi a imagem formada pela objetiva, F1 e F2 os focos, f a distância focal

da objetiva e D a distância entre a objetiva e a imagem. Note que a objetiva foi

considerada, para efeitos didáticos, como uma lente simples, apesar de ser, na

realidade, um sistema de lentes. Como veremos adiante, o mesmo foi feito com

relação à ocular. Contudo, as relações obtidas são as mesmas.

Analisando a construção geométrica da Figura 1, pode-se tirar a relação:

Hi = D - 1 Ho f

Page 5: Apostila Pratica BioCel

5

De onde se conclui que a distância focal e o poder de ampliação de uma

objetiva são inversamente proporcionais, ou seja, quanto menor for a distância focal

da objetiva, maior será seu poder de ampliação (maior o Hi).

A imagem fornecida pela objetiva será novamente ampliada pela ocular,

funcionando essa imagem, portanto, como "preparação" ou "objeto" para a ocular.

Assim, esta lente fornecerá uma imagem virtual, ampliada e direta dessa imagem já

formada pela objetiva, como se pode ver na Figura 2. Nessa figura temos também que

o Ho é a preparação (no caso a imagem formada pela objetiva), Hi a imagem formada

pela ocular, F1 e F2 os focos, f a distância focal e D a distância entre a lente e a

imagem.

Analisando-se a construção geométrica da Figura 2, temos:

Hi = D + 1

Ho f

De onde se conclui que, similarmente à objetiva, a distância focal e o poder de

ampliação da ocular são inversamente proporcionais, ou seja, quanto menor for a

distância focal de uma ocular, maior será seu poder de ampliação.

Na Figura 3 podemos observar a marcha dos raios luminosos em um

microscópio fotônico, desde a preparação até a formação de imagem virtual da

ocular e convertida em imagem real na retina do observador.

Nessa figura existem alguns parâmetros considerados importantes. Um deles

é a distância de trabalho, que é simplesmente a distância entre a preparação e a lente

frontal da objetiva. No caso, quanto maior for o aumento da objetiva (menor distância

focal), menor será a distância de trabalho.

Um outro parâmetro é a região crítica, que é a região onde devem ser

formadas as imagens fornecidas pela objetiva, para que a ocular possa torná-las

virtuais e ampliadas e situadas a uma distância que não pode ser menor que a d

(distância mínima de visão distinta).

O comprimento óptico é simplesmente a distância entre os focos da objetiva e

da ocular.

- Poder de Resolução

O poder de resolução de um microscópio fotônico ou outro instrumento óptico

qualquer, pode ser definido como a capacidade que este sistema possui de formar

imagens distintas e nítidas de dois pontos situados muito próximos em uma

preparação. O limite máximo de resolução teórico é aproximadamente a metade do

Page 6: Apostila Pratica BioCel

6

comprimento de onda da fonte luminosa. Como o microscópio fotônico usa luz

visível (4000 a 7000 å ou 400a 700 nm), o máximo de poder de resolução deste

aparelho estaria em torno de 2000 å (ou 200 nm).

- Abertura Geométrica de uma Objetiva

É um parâmetro que caracteriza uma objetiva, sendo definido como o ângulo

máximo formado pelos raios luminosos extremos que partem de um ponto da

preparação, situado sobre o eixo óptico, atingindo os bordos da lente. Na Figura 4:

ag = 2µ

- Objetivas de Imersão - Abertura Numérica de uma Objetiva

Para se aproveitar uma maior quantidade de luz quando a objetiva é de grande

aumento e, portanto, de pequeno diâmetro e sendo utilizada a uma distância de

trabalho muito pequena, trabalha-se com a lente frontal imersa em um líquido de alta

refringência, em geral óleo de cedro (índice de refração de 1,575). Com o emprego

deste óleo, pode-se fazer convergir o feixe luminoso proveniente do condensador,

captando-se aqueles raios luminosos que, com objetivas secas, seriam perdidos.

Estas objetivas são denominadas de objetivas de imersão. A conseqüência direta do

emprego dessas objetivas é o aumento da luminosidade.

Como o índice de refração do líquido de imersão (n) altera a distância de

trabalho e, consequentemente a abertura geométrica da objetiva, foi criado um novo

parâmetro que é a abertura numérica. Este parâmetro, normalmente impresso no

próprio suporte metálico da objetiva, é definido como (Figura 5):

an = n . sen µ

Onde n = índice de refração do meio

µ = metade da abertura geométrica

No caso de uma objetiva seca, não existe óleo, e o índice de refração (n)

corresponderá ao do ar que é 1. Portanto:

an = sen µ

Page 7: Apostila Pratica BioCel

7

Poder Penetrador

É a capacidade que tem uma objetiva de permitir a observação simultânea de

pontos situados em diferentes níveis de preparação. Pela Figura 6 pode-se verificar

que a distância entre as imagens dos planos extremos da preparação, com objetivas

de pequena distância focal (F2) é bem maior do que com objetivas de grande

distância focal (F1). Assim, podemos concluir que quanto maior for o aumento da

objetiva (e menor sua distância focal), menor será seu poder penetrador.

II. EXAME A FRESCO E COLORAÇÃO VITAL

1. EXAME A FRESCO

O exame a fresco é um método muito simples, consistindo na observação ao

microscópio de células, pequenos organismos vivos ou fragmentos de tecidos vivos,

num meio líquido o mais próximo possível do meio natural desses organismos. A finalidade desse método é permitir a observação de estruturas "in vivo", de modo a poder observar manifestações funcionais, como a ciclose, reações a estímulos, etc., além de ser importante na contraprova de outros métodos de estudos de estrutura celular que utilizem o estudo de células mortas.

Page 8: Apostila Pratica BioCel

8

Page 9: Apostila Pratica BioCel

9

Page 10: Apostila Pratica BioCel

10

Para que a célula sobreviva o maior tempo possível, é necessário o uso de líquidos

chamados conservadores fisiológicos que são soluções que proporcionam às

células que estão sendo observadas condições as mais aproximadas possíveis do

seu ambiente natural. Isso possibilita um exame mais prolongado.

Podemos classificar os líquidos conservadores em naturais e artificiais:

(a) Líquidos naturais: água doce (organismos aquáticos), água do mar (para

organismos marinhos), humor aquoso (do globo ocular de bovinos), soro

sangüíneo (técnicas de cultura de tecido), líquido amniótico, líquido ascítico

(obtido de processos patológicos), etc.

(b) Líquidos artificiais:

- Soro Fisiológico

NaCl em água - 0,9% para mamíferos

0,8% para anfíbios

0,6% para insetos

- Líquido de Ringer

Cloreto de sódio

Cloreto de potássio

Cloreto de cálcio

Bicarbonato de sódio

Água destilada

- Líquido de Knop - para órgãos e tecidos vegetais.

- Líquido de Tyrode - para hematologia.

(Esses últimos, além dos sais acima, levam em sua composição magnésio, glicose, etc.).

A grande vantagem desse método é não produzir modificações nem na forma

nem na função do objeto examinado, servindo portanto de contraprova para outros

métodos. Outra vantagem é a sua rapidez.

O emprego do exame a fresco está restrito dentro de estreitos limites: só se

aplica a objetos finos e transparentes; não permite observações prolongadas e

mostra apenas uma pequena parte dos detalhes das estruturas. É, portanto,

relativamente grosseiro e leva eventualmente à morte celular.

O exame a fresco pode ser feito entre lâmina e lamínula, utilizando-se líquidos

fisiológicos. O condensador deve ser abaixado nos microscópios comuns ou a

observação deve ser feita em fase. Se for necessário, para evitar o esmagamento (por

exemplo para visualizar o movimento de protozoários), deve-se suspender a

Page 11: Apostila Pratica BioCel

11

lamínula entre quatro pilares de cera, ou utilizar o método da gota pendente, que tem

a vantagem de criar uma micro-câmara úmida para observações mais prolongadas.

Consiste na utilização de uma lâmina escavada com uma lamínula contendo uma

pequena gota de material nessa região. A gota deve ficar suspensa. A câmara assim

construída pode ser vedada com parafina.

2. COLORAÇÃO VITAL

O método da coloração vital constitui um procedimento intermediário entre a

observação a fresco e a observação após a fixação. Constitui-se o uso de corantes

não tóxicos que permitem que as células continuem vivas, embora penetrem

facilmente no organismo.

Corantes vitais

- Azul de Metileno - para observação, por exemplo, de protozoários entre lâmina e

lamínula.

- Vermelho Neutro.

- Verde Janus - cora mitocôndria.

- Carmin Lítico.

Esses corantes se empregam em grandes diluições, de 1:500 até 1:100.000,

variando a diluição para cada corante e para cada uso, por exemplo, se destinar a ser

injetado, ou se, simplesmente, o organismo for mergulhado no corante.

Esses corantes não reagem quimicamente com nenhuma estrutura celular. A

coloração vital se processa apenas por atração eletrostática entre o corante e a

estrutura.

Demonstrar a existência real dos diversos elementos morfológicos revelados

pelos materiais fixados. É, entretanto, uma técnica limitada pelo pouco detalhe de

estrutura que fornece.

Page 12: Apostila Pratica BioCel

12

III. FIXAÇÃO

Os métodos de exame a fresco dão apenas informações insuficientes sobre a

célula viva porque os elementos que a constituem possuem mais ou menos o mesmo

índice de refração, o que de certo modo é resolvido pelo microscópio de contraste de

fase ou outras montagens ópticas especiais.

Um pedaço de tecido cortado de um organismo não mantém sua estrutura, ao

nível microscópico, por causa principalmente da:

. evaporação

. diferenças osmóticas

. ataques de microorganismos

. autólise (auto digestão das células pelas suas próprias

enzimas ativadas pela cessação da atividade metabólica

vital e normal das células).

Para estudar a estrutura da célula é necessário proceder à coloração,

suprimindo com a cor a falta de contraste das células. A coloração é muito limitada e

quase impossível no estado vivo, por isso é necessário matar as células para se

proceder à coloração.

A fixação é uma operação destinada a matar as células, conservando-as o

mais próximas possível do seu aspecto quando vivas. O fixador, portanto, deve

imobilizar a célula, conservar exatamente todas as suas partes constituintes e não

fazer aparecer novos detalhes de estrutura (artefatos). Desse modo será possível ao

pesquisador utilizar corantes tóxicos, fazer testes histoquímicos que raramente são

aplicáveis a células vivas, manter preparações permanentes, cortar os tecidos em

secções finas, para o estudo da estrutura intracelular e principalmente das relações

intercelulares.

Não existe um fixador absolutamente perfeito; portanto, o melhor fixador será

aquele que apresentar o menor número possível de modificações secundárias no

tecido analisado. Um tecido bem fixado mostrará células bem preservadas,

permitindo a visualização de detalhes de sua estrutura fina.

Page 13: Apostila Pratica BioCel

13

- A Qualidade dos fixadores

1) Poder de Penetração: o fixador deve penetrar rapidamente tanto nas camadas

superficiais como nas profundas; de outro modo, as camadas internas poderão se

necrosar antes de serem atingidas por ele.

2) Deve alterar os constituintes da célula, de modo a torná-los insolúveis: esta ação

não deve ser violenta e instantânea; ao contrário, deve-se produzir secundariamente

em relação à morte das células, de modo a não produzir contrações.

3) A acidez é uma qualidade importante, sendo o ácido acético um dos mais

empregados. O meio alcalino dificulta a coagulação, nos fixadores que agem desta

maneira.

Em resumo, o bom fixador deve: favorecer a observação das estruturas; impedir o

aparecimento de alterações; impedir o aparecimento de estruturas artificiais; não

impedir colorações posteriores; aumentar a afinidade do tecido pelos corantes;

impedir o desaparecimento dos elementos solúveis e possuir alto poder de

penetração.

Agentes Fixadores

Podem ser Físicos e Químicos

Físicos

O frio não é, em geral, um bom agente fixador, no máximo ele suspende as

alterações devidas à necrose e à digestão enzimática. Além disso, a formação de

cristais e o aumento de volume dos líquidos com o congelamento acarretará

distorções no material.*

O calor exerce uma ação bem diferente, segundo seja aplicado a objetos

úmidos ou secos. Os fixadores em ebulição são utilizados para certos casos. O calor

seco tem uso em esfregaços previamente desidratados, podendo, entretanto,

provocar distorções.

* Empregado juntamente com agentes crioprotetores (como o glicerol), que impedem a formação de cristais, é muito utilizado em exames citológicos rápidos como, por exemplo, em patologia.

Page 14: Apostila Pratica BioCel

14

Químicos

São preferíveis para o estudo dos tecidos. Podemos classificá-los de modo a

reuni-los em dois grandes grupos de acordo com seu efeito sobre as proteínas (o que

pode ser testado com uma solução de albumina).

1) Coagulantes - agem como o calor, coagulando as proteínas, transformando o

protoplasma celular numa rede. Ex.: metanol, etanol, acetona, ácido nítrico, ácido

pícrico, etc.

2) Não coagulantes - ex: ácido acético, formaldeído, tetróxido de ósmio e dicromato

de potássio.

Esses agentes fixadores, entretanto, não são capazes de reunir,

individualmente, todas as qualidades necessárias para um bom fixador. É raro,

portanto, que se empregue, hoje em dia, um fixador único. Utilizam-se, isso sim,

misturas de fixadores de maneira a que um componente complete a ação do outro.

Algumas das misturas fixadoras mais usadas:

(a) Bouin - ácido pícrico, formalina e ácido acético glacial. Trata-se de um fixador

extremamente penetrante, que praticamente serve para todas as espécies de

trabalho.

(b) Zenker - dicromato de potássio, cloreto de mercúrio e sulfato de sódio. Esse

fixador apresenta o inconveniente de exigir uma lavagem cuidadosa do material

por tempo prolongado.

(c) Carnoy - ácido acético, metanol e clorofórmio. Usado em citogenética.

A fixação química é normalmente realizada imergindo-se a peça a ser estudada

no fixador. O volume deve ser 20 a 30x da peça a ser fixada. Para peças de grande

tamanho, é útil usar-se o método da perfusão, que consiste em injetar o fixador

através da rede vascular do organismo.

Page 15: Apostila Pratica BioCel

15

IV - COLORAÇÃO

Os processos de coloração têm um papel importante na técnica histológica.

Uma boa parte do conhecimento a respeito dos corantes é devida a Otto Witt que em

1876 apresentou uma teoria sobre a coloração. Segundo Witt a cor é condicionada

por certos grupos ou radicais que ele chamou de cromóforos. De acordo com as

idéias atuais, esses seriam constituídos por conjuntos de átomos não saturados,

responsáveis pela cor das moléculas das quais eles fazem parte. Em sua maioria são

substâncias aromáticas que têm a possibilidade de alterar rapidamente a

configuração da molécula entre os vários estados possíveis, sendo essas alterações

denominadas ressonância, envolvendo a absorção de ondas eletromagnéticas.

As substâncias que possuem um ou vários cromóforos são chamadas

cromogênios. Dito de outro modo, os cromóforos são grupamentos atômicos que

dão a potencialidade de coloração às moléculas que são então chamadas de

cromogênios.

Um exemplo de cromóforo é a quinona. A quinona por si só não tem a

tendência a se ligar a uma substância de uma preparação microscópica, pois as

substâncias que apresentam essa tendência se ionizam em solução aquosa e a

quinona não. Portanto, não basta somente que a substância tenha cor, isto é, um

cromóforo por si só não confere à molécula a capacidade tintorial. Um grupo

ionizável é também necessário. Esses grupos ionizáveis que transformam

substâncias coloridas em corantes são denominados auxocromos. Além de

geralmente conferir o poder tintorial, os auxocromos aumentam a intensidade da cor,

como seu nome sugere. Um dos auxocromos mais comuns em corantes é o grupo -

NH2, grupo amida.

Tintóforos por outro lado, são grupos que não modificam o espectro de

absorção e, portanto, a coloração de um cromogênio, mas fazem aparecer o poder

tintorial, agindo nesse sentido da mesma forma que os auxocromos.

Dentre os radicais que agem como tintóforos, temos por exemplo o grupo

carboxila, -COOH.

A finalidade da coloração não é a obtenção de uma imagem de diversos

coloridos, mas acentuar os contrastes das estruturas celulares.

Page 16: Apostila Pratica BioCel

16

Classificação dos Corantes

Os corantes podem ser classificados, de acordo com sua origem, em naturais

e artificiais (ou sintéticos).

A) Naturais - produtos extraídos de animais, como o carmin, ou dos vegetais, como a

hematoxilina, a orceína, etc.

B) Artificiais ou sintéticos - derivados da destilação da hulha e, genericamente

conhecidos como corantes de anilina. Do ponto de vista químico, esses

corantes são sempre sais, podendo assim ter caráter ácido, básico, neutro ou

indiferente.

(a) Corantes ácidos:

Nesses corantes a base é incolor e o ácido é colorido (cromóforo). Temos por

ex.: a Eosina em que a propriedade do corante é devida ao ácido eosínico; na parte

básica, temos o sódio que é incolor. Outros exemplos: Fucsina ácida, Vermelho

congo, Eritrosina. Tingem o citoplasma, a quitina, etc., de reação básica (acidófilos).

(b) Corantes básicos:

Possuem a base colorida e o ácido incolor. Temos por exemplo, o azul de

metileno, que é um cloridrato de azul de metileno; o poder do corante é devido ao

composto básico de azul de metileno e não ao ácido clorídrico que é a parte incolor.

Outros exemplos: Fucsina básica, Azul de Toluidina, Violeta de Genciana. São

corantes absorvidos com certa avidez pelas estruturas celulares de reação ácida

(basófilas) como a cromatina.

(c) Corantes neutros:

Tanto o ácido como a base são coloridos. Ex.: o Eosinato de Azul de Metileno.

Esses corantes se obtêm misturando partes convenientes de corantes ácidos e

básicos e têm grande importância em estudos hematológicos.

(d) Corantes indiferentes:

Não são nem ácidos nem básicos e são incapazes de formar sais. São

insolúveis em água, mas solúveis em álcool e nos lipídios. São desse grupo os

corantes de lipídios Sudan III e Vermelho Escarlate.

Page 17: Apostila Pratica BioCel

17

- Mordente

Uma coloração pode ser direta ou indireta, dependendo do fato de haver ou

não uma substância intermediária entre o corpo a ser colorido e o corante.

Os sais de certos metais alteram radicalmente o comportamento de certos

corantes. Esses sais metálicos são chamados mordentes. Forma-se um complexo

tecido-mordente-corante e, uma vez formado, ele é insolúvel em todos os fluidos

neutros usados ordinariamente em histologia, de modo que facilita os procedimentos

posteriores. O mordente provoca uma combinação química entre dois corpos que

não têm afinidade química entre si. Forma-se então o precipitado fortemente colorido

e insolúvel em água.

Exemplo: os alúmens que, em geral, são sulfatos duplos de alumínio e outro

metal, têm a propriedade de formar, com certos corantes, soluções intensamente

coloridas e com propriedades seletivas.

- Marcha de Coloração

Coloração Progressiva - nesse tipo de coloração, a absorção do corante pelas

células é controlada e interrompida no ponto desejado.

Coloração Regressiva - nesse caso, há um exagero de absorção do corante,

ou super coloração que, em seguida deve ser extraído novamente. A diferenciação

consiste na remoção do excesso de coloração até que o corante fique retido apenas

pelos componentes celulares ou tissulares que interessam ao estudo. Pode ser

obtida pelo emprego do álcool etílico puro ou acidificado, por exemplo.

Tipos de Coloração

Ortocromática - quando o tecido aparece corado nas cores do próprio corante.

Metacromática - quando o tecido aparece com cor ou cores diferentes das do

corante. Ex.: Azul de Toluidina, entre pH 4,5 e 5,0 cora o DNA em azul e o RNA em

vermelho.

Page 18: Apostila Pratica BioCel

18

V. INCLUSÃO E MICROTOMIA

A maior parte das peças fixadas deverá ser tratada posteriormente, de modo a

permitir sua observação por meio da luz transmitida.

Para isso, é preciso reduzi-la a fatias delgadas, obtidas por cortes. Esses

cortes, com espessura de 3 a 4 µm são impossíveis de obter em tecidos frescos ou

mesmo fixados. Desse modo, faz-se a inclusão da peça numa substância plástica que

permita a obtenção de secções finas do tecido. A substância deve penetrar

totalmente até os componentes celulares mais delicados, de modo a preservar a

estrutura fina.

É possível então orientar e manusear as peças.

- Meios ou Massas de Inclusão

1) Meios aquosos - não é necessário, neste caso, desidratar as peças. Utilizados

principalmente para pesquisas de fisiologia celular e histoquímica ou anatomia

vegetal.

- gelatina glicerinada: para organismos delicados;

- goma (arábica) glicerinada: para objetos duros e quitinosos, como pelos de

mamíferos, por exemplo.

2) Meios anidros - são muito comuns nos estudos gerais de Histologia. Utilizam

produtos de inclusão insolúveis em água, sendo, portanto, imprescindível a

desidratação da peça, uma vez que a água é parte integrante dos tecidos. Após a

desidratação, impregna-se a peça com o solvente do meio de inclusão.

(a) Celoidina

Nesse caso, é feita a impregnação a frio dos objetos com nitrocelulose

dissolvida numa mistura de álcool e éter. O uso dessa massa de inclusão permite

executar cortes de grandes diâmetros, sem riscos de quebras, como ocorre com a

parafina. É conveniente para objetos pouco homogêneos ou que apresentam grandes

cavidades, para materiais duros ou fibrosos (artrópodos, por ex.), ou para tecidos

que suportam mal as elevações de temperatura. Não há necessidade de remover a

celoidina dos cortes, o que facilita o manejo. Entretanto, é um processo muito

demorado (pode levar meses), sendo muito difícil obter cortes finos, e quase

impossível obtê-los em série. A conservação dos blocos é difícil e é necessário o uso

de um micrótomo de deslizamento, especial, que molha automaticamente o bloco e a

navalha com álcool 70, à medida que vai cortando.

Page 19: Apostila Pratica BioCel

19

(b) Inclusão em parafina

A parafina é uma mistura de hidrocarbonetos saturados sólidos extraídos por

resfriamento dos resíduos pesados do petróleo. Tem pouca afinidade (parum affinis)

química (inerte). É muito solúvel no xilol, sendo entretanto insolúvel no álcool e na

água.

As vantagens da parafina consistem em permitir a obtenção de cortes finos; o

processo de inclusão é rápido (24 horas); é possível obter cortes seriados pela

facilidade de produção de fitas; os blocos podem ser guardados indefinidamente.

Existem, também, algumas, como por exemplo, tecidos de difícil penetração,

tais como ossos, dentes, etc. Estes tecidos necessitam de longo tempo de inclusão,

o que é desaconselhado, pois este processo extrai lipídeos, uma vez que os agentes

de diafanização e desidratação são solventes de lipídios.

(c) Inclusão em resinas plásticas - particularmente as resinas acrílicas têm sido cada

vez mais empregadas em histologia no lugar da parafina, principalmente por

permitirem cortes mais finos (1-3 µm) e, portanto, com melhor definição das

estruturas celulares.

- Procedimento para a inclusão em parafina

1) Desidratação pelo álcool - com duração variável, de acordo com o tamanho da

peça.

2) Impregnação em solvente de parafina - consiste em trocar por um solvente de

parafina o álcool que impregna o objeto desidratado. Essa operação é chamada

diafanização, uma vez que os líquidos utilizados tornam o material transparente.

Os líquidos devem ser solúveis em álcool em todas as proporções. O xilol é

bastante utilizado neste procedimento.

3) Impregnação em parafina - não pode ser feita a frio, uma vez que a parafina é

sólida à temperatura ambiente. Durante a impregnação, a parafina deve ser

mantida na estufa, próxima a seu ponto de fusão (aproximadamente 60oC).

4) A peça agora é retirada do banho de parafina e levada para uma forma vaselinada

cheia de parafina fundida. A peça deve ser orientada. A parafina se solidifica

rapidamente, de modo que a orientação do corte fica fácil. Esfria-se rapidamente a

parafina, de modo a não formar cristais de grande tamanho ou bolhas.

Quando o processo é bem feito, pode-se guardar o material indefinidamente.

Page 20: Apostila Pratica BioCel

20

• Corte dos blocos - usa-se um micrótomo automático que regula a espessura dos

cortes, aderindo-se uns aos outros, de modo a se obter uma fita. As fitas são

fáceis de manipular, com o auxílio de um pincel e se pode obter cortes em série

(cortes seriados).

• Montagem dos cortes - os cortes são esticados em água aquecida a 40oC e

"pescador" com uma lâmina albuminizada com o auxílio de um pincel o excesso

de água é escorrido e os cortes secos em estufa a 40oC. Posteriormente a

parafina é retirada das preparações, banhando-se as lâminas em xilol.

- Coloração dos cortes com hematoxilina-eosina (HE)

Para se fazer a coloração do material (esfregaço de mucosa bucal, por ex.),

este precisa ser hidratado de maneira lenta através de uma série de álcoois em

concentrações cada vez menores. A razão disto é que os corantes são aquosos. Para

montagem permanente, o material precisa ser diafanizado pelo xilol e montado em

Bálsamo do Canadá (ver mais abaixo). Assim, o xilol age como diafanizador e

também como solvente do bálsamo. Uma vez que o xilol não é miscível em água (nem

o bálsamo), o material deve ser desidratado novamente. Se o xilol ficar turvo, ou

aparecerem bolhas de água na preparação, é porque o material não foi

convenientemente desidratado.

• Montagem permanente - consiste em colocar o objeto entre lâmina e lamínula, em

um líquido refringente, que servirá de meio de conservação e meio de observação.

Esse meio deve se tornar sólido posteriormente.

O meio de montagem deve ter índice de refração próximo ao do vidro, deve

secar rapidamente, não rachar, nem se alterar. Os meios de montagem mais usados

são o Bálsamo do Canadá, resina proveniente de coníferas da América do Norte

(sendo que o material, nesse caso, deve estar totalmente desidratado), o Euparal que

tem a desvantagem de não secar muito rapidamente e o Permount que seca

rapidamente.

Além dos processos de inclusão acima discutidos, existem outros métodos

que permitem o corte do material biológico a ser estudado ao microscópio de luz. Um

destes métodos envolve, por exemplo, o congelamento do material em nitrogênio

líquido e seu corte posterior em um micrótomo refrigerado denominado de criostato.

Em método rápido, muito útil em patologia quando, por exemplo, se necessita de

uma análise imediata de um tecido. Para determinados tipos de material que tenham

uma certa consistência é possível fazer ainda cortes a mão livre, com resultados

razoáveis. É o caso de alguns tipos de tecidos vegetais, como caules e folhas.