Apostila Teoria Geral Dos Contratos

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1 TEORIA GERAL DOS CONTRATOS CIVIS E DE CONSUMO Francisco Vieira Lima Neto Renata Helena Paganoto Moura 2014

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TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

CIVIS E DE CONSUMO

Francisco Vieira Lima Neto

Renata Helena Paganoto Moura

2014

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SUMÁRIO:

Apresentação

1. A nova realidade do contrato (função social do contrato);

2. CC e CDC

2.1 Conceito de Consumidor

2.1.1 Consumidor e Usuário

2.1.2 Fornecedor

2.1.3 Consumidor por equiparação

3. Interpretação dos contratos

3.1 Interpretação no CDC

4. Princípios contratuais:

4.1 Autonomia da Vontade e Autonomia Privada

4.2 Consensualismo

4.3 Força obrigatória da convenção

4.4 Relatividade dos efeitos do contrato

4.5 Boa-fé objetiva

4.5.1 Função Interpretativa da boa-fé

4.5.2 Deveres Acessórios da boa-fé

4.5.2.1 Informação

4.5.2.2 Colaboração

4.6 Equilíbrio contratual

5. Classificação dos contratos:

5.1 Contratos unilaterais, bilaterais e plurilaterais

5.2 Contratos onerosos e gratuitos

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5.3 Contratos comutativos e aleatórios

5.3.1 A lesão e os contratos aleatórios

5.4 Contratos paritários e por adesão

5.5 Contratos consensuais; solenes e reais

5.6 Contratos nominados/típicos e contratos atípicos

5.7 Contratos de execução imediata ou instantânea / contratos de

execução continuada ou de trato sucessivo/

5.8 Contratos pessoais ou impessoais

5.9 Contratos administrativos/ trabalho/ comercial

5.10 Contratos principais e acessórios;

5.11 Outras classificações:

5.11.1 Autocontrato ou contrato consigo mesmo

5.11.2 Contrato sob condição potestativa

5.11.3 Contrato preliminar

6. Formação do contrato

6.1 Negociações Preliminares

6.2 Proposta

6.2.1Proposta no CC

6.2.2 Oferta no CDC

6.2.2.1 A publicidade de consumo. Algumas questões

6.3 Aceite

6.4 Conclusão

6.5 Lugar do contrato

6.5.1 Foro de eleição nos contratos civis

6.5.2 Foro de eleição nos contratos de consumo

7. Efeitos do contrato:

7.1 Efeitos do contrato com relação a terceiros

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7.1.1 Estipulação em favor de terceiro

7.1.2 Promessa de fato de terceiro

7.1.3 Contrato com pessoa a declarar

7.2 Vício Redibitório

7.2.1 Vício Redibitório no CC

7.2.1.1 Vício Redibitório e Erro

7.2.1.2 Vício Redibitório e Inadimplemento Contratual

7.2.1.3 445, §1°

7.2.2 Vício e Defeito no CDC

QUADRO COMPARATIVO

7.3 Evicção

7.4 Direito de Retenção

7.5 Exceção de contrato não cumprido

7.6 Arras

8. Revisão Judicial do Contrato

8.1 Teoria da Imprevisão

QUADRO COMPARATIVO

9. Extinção do contrato

9.1 Causas anteriores

9.2 Causas contemporâneas ou supervenientes

10.Responsabilidade pré-contratual, contratual e pós-contratual

10.1 Responsabilidade e obrigação

10.2 Responsabilidade Civil: contratual e extracontratual

10.3 Responsabilidade Contratual

10.4 Responsabilidade pré-contratual

10.5 Responsabilidade pós-contratual

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Apresentação

Há muitos anos lecionando a disciplina de Teoria geral dos

Contratos, onde tradicionalmente nas faculdades de direito

recebem designação numérica, com alguma variação, mas que mais

comumente é conhecida como Direito Civil V, sinto a dificuldade de

realizar uma abordagem exclusivamente civil, ou mais

propriamente, exclusivamente do direito expresso no Código Civil.

É que não há dúvida que a maior parte dos contratos realizados

hoje em dia são contratos de consumo, principalmente as

contratações em massa de consumo (contratos de seguro, contratos

bancários, contratos de serviços, como telefonia, internet etc.).

Isso faz com que a abordagem da teoria geral do contrato acabe

remetendo à análise da relação de consumo.

Como tratar por exemplo de vício redibitório no CC sem responder

às perguntas que surgem sobre defeitos dos produtos em relações

de consumo. Ou se opta por dizer que esse assunto será tratado em

outra disciplina (no caso das faculdades que tenham essa

disciplina), ou, no caso das faculdades que não tenham essa

disciplina, se deixa o aluno sem resposta ou, numa estratégia

docente comum, responde-se ao final da aula. Mas se a opção for

responder em aula, seria necessário começar do começo, e aí

explicar a diferença entre uma relação civil e de consumo, quando

se aplicará o CC e quando se aplicará o CDC, que os institutos

apesar de próximos tem uma roupagem diferente, desde requisitos

até seus prazos.

E isso vai ocorrer em vários outros tópicos da teoria geral dos

contratos, como nos princípios, nos efeitos do contrato, na revisão

judicial dos contratos etc.

Então ou se opta por delimitar a matéria e somente tratar da teoria

geral dos contratos no CC ou arrisca-se a elaborar uma aula de

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teoria geral dos contratos que aborde tanto esta no CC como no

CDC.

Foi o que fiz, como professora diante da dificuldade de fazer esse

recorte em sala de aula e por ver que a maior inquietação dos

alunos dizia respeito ao tratamento destas questões nas relações

de consumo, e, eles não deixam de ter razão, pois como comecei

dizendo, não há dúvida que a maior parte dos contratos realizados

atualmente envolve uma relação de consumo.

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1.0 A NOVA REALIDADE DO CONTRATO (função social do

contrato)

Importância da vontade – vícios da vontade

Dirigismo contratual

Publicização dos contratos

Constitucionalização dos contratos

Sociedade de massa: relações contratuais despersonalizadas

Supremacia da ordem pública (?) Art. 2035, § único. Nenhuma

convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais

como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social

da propriedade e dos contratos.

Princípios inspiradores do atual Código Civil: eticidade, socialidade e

operabilidade.

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2.0 CC e CDC

Como esse estudo pretende estabelecer uma relação entre os contratos

civis e de consumo, devemos inicialmente diferenciar essas figuras.

São diferentes os contratos civis e de consumo? O que é um contrato

civil e o que é um contrato de consumo são as perguntas que queremos

responder.

Poderíamos numa concepção civilista (ou privatística) dizer que não

há uma categoria contrato de consumo, tudo são contratos civis.

Porém não podemos deixar de perceber que existem regras diferentes,

que consequentemente trazem efeitos diversos a uma e outra

disciplina.

Muitos institutos são geneticamente os mesmos, porém com

contornos diferentes.

Haja vista que o CDC deixa claro o seu caráter de norma pública,1

enquanto o CC na parte do direito contratual ainda prevalece o

princípio da autonomia privada, quiçá não sendo o mesmo de

antigamente, ainda confere um caráter privatístico a esta relação. É

só tomarmos como exemplo institutos como o da formação do

contrato, do vício redibitório e do vício e defeito do produto, da revisão

judicial dos contratos, todos esses apesar de serem os mesmos

institutos, tem um contorno diferente quer se trate de um contrato

puramente civil, quer se trate de um contrato de consumo.

Então sendo esta a proposta deste estudo, devemos começar

estabelecendo a diferença entre eles, para sabermos quando estamos

diante de um contrato civil e quando estamos diante de um contrato

de consumo.

1 A Lei 8.078/90 estabelece em seu Art. 1° “O presente Código estabelece normas de proteção e defesa do

consumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos arts. 5°, inciso XXXII, 170, inciso V, da

Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias”.

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Vamos começar pelo contrato de consumo, já que o contrato civil será

definido por exclusão.

O contrato de consumo é definido na Lei 8.078/90 pelos seus

personagens, ou seja, é um critério (inicialmente) subjetivo.

Estabelece o art. 2° do CDC que “Consumidor é toda pessoa física ou

jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário

final”.

Por sua vez, estabelece o art. 3° que “Fornecedor é toda pessoa física

ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os

entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção,

montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação,

distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”.

Para que possamos definir um contrato como de consumo é necessário

que de um lado se encontre o consumidor e de outro lado se encontre

o fornecedor. Os dois, consumidor e fornecedor, tem que estar

presentes nos polos do contrato. É um conceito, como se costuma

dizer, relacional.2

Mas não é só isso, há também um elemento objetivo nesta definição,

o consumidor, diz o art. 2°, adquire ou utiliza produto ou serviço como

destinatário final. Por isso, explicam os autores do projeto, O conceito

de consumidor adotado pelo Código foi exclusivamente de caráter

econômico, ou seja, levando-se em consideração tão somente o

personagem que no mercado de consumo adquire bens ou então

contrata a prestação de serviços, como destinatário final,

pressupondo-se que assim age com vistas ao atendimento de uma

2 Mister frisar, explica Claudia Lima Marques, que a figura do consumidor (um civil ou leigo) somente

aparece frente a um fornecedor (um empresário ou profissional). O campo de aplicação do CDC ou a relação

de consumo (contratual ou extracontratual) é sempre entre um consumidor e um fornecedor, é um campo

de aplicação relacional, in Manual de Direito do Consumidor, p. 68.

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necessidade própria e não para o desenvolvimento de uma outra

atividade negocial.3

Vamos pensar em alguns exemplos. Imaginemos uma pessoa (física)

que esteja comprando um carro e outra pessoa (física) que esteja

vendendo seu carro para esta.

Quem está comprando, adquire o carro como destinatário final (art.

2°)?

Resposta: sim. Afinal ele está comprando para seu uso particular.

E quem está vendendo, é fornecedor nos termos do art. 3°?

Resposta: não. Pois quem está vendendo não é fornecedor de carros.

Logo, não se trata de um contrato de consumo.

Para que seja, voltamos a repetir, é necessário que de um lado esteja

o consumidor, aquele que adquire o produto como destinatário final e

de outro lado esteja presente o fornecedor, nos termos da definição do

art. 3°.

Agora vejamos esse outro exemplo: João, está comprando um carro

para uso pessoal em uma Concessionária de Veículos.

João é consumidor? Resposta: sim, pois, nos termos do art. 2° adquire

o veículo como destinatário final.

E a concessionária, é fornecedora? Resposta: sim, pois nos termos do

art. 3°, comercializa este produto.

Logo, trata-se de um contrato de consumo.

Mas ao contrário do que se possa parecer num primeiro momento,

consumidor não é a pessoa física e fornecedor a pessoa jurídica.

3 Grinover, Ada Pellegrini e outros. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, V. 1, p. 23.

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Veja que o art. 2° e o art. 3°, não fazem essa diferenciação, em nenhum

momento eles dizem que consumidor é a pessoa física e fornecedor a

pessoa jurídica.

Foi uma opção do nosso legislador, há diplomas legislativos que a

definição de consumidor e fornecedor está atrelada a essa distinção.4

Talvez se o nosso legislador tivesse optado por esse caminho teria nos

poupado de alguns problemas, mas como não o fez, não podemos nós

fazermos, então temos que interpretar a norma através de seus

elementos.

Dessa forma se não houve essa distinção pelo legislador é possível que

o consumidor seja pessoa jurídica e o fornecedor seja pessoa física?

A resposta deve ser sim, mas não sem algumas dificuldades.

Vamos primeiro enquadrar a pessoa física como fornecedora.

Imaginemos o seguinte exemplo: Dona Maria é uma exímia doceira e

faz doces e bolos para casamento. Dona Maria é uma pessoa física e é

fornecedora de bolos e doces. Quando a Dona Maria vende o bolo

encomendado ela se coloca nesta relação como fornecedora, afinal ela

produz o bolo e o comercializa, nos termos do art. 3° do CDC.

Porém quando se trata de enquadrar a pessoa jurídica como

consumidora, a questão pode se complicar um pouco mais, até porque

como dissemos acima o destinatário final age com vistas ao

atendimento de uma necessidade própria e não para o

desenvolvimento de uma outra atividade negocial.

A resposta está novamente no entendimento do que seja destinatário

final.5

4 E, aliás, essa posição do nosso legislador é criticada, autores de peso na área de direito do consumidor

entendem que o legislador deveria ter restringido o conceito para abranger somente as pessoas naturais,

que adquirem produtos ou serviços para um uso não profissional, a pessoa jurídica, não se encontra em

posição de vulnerabilidade que mereça a proteção desse sistema. Benjamin...

5 Afirma Brito Filomeno que a pessoa jurídica, também pode ser considerada consumidora, desde que,

assim como a pessoa física, seja destinatária final de determinado produto ou serviço, p. 26.

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Na explicação de José Geraldo Brito Filomeno a aquisição ou utilização

de produto ou serviço se dá como destinação final quando atende uma

necessidade efetiva ou imposta a uma pessoa jurídica e não são

utilizados como insumos, componentes, ou valor agregado a outros

produtos ou serviços.

Como então caracterizar a pessoa jurídica como consumidora se tudo

que ela adquire está relacionado direta ou indiretamente à sua

atividade negocial?6

Vamos começar utilizando dois exemplos:

1 Uma empresa adquire alimentos para fornecer aos seus empregados;

2 Uma empresa compra um carro para transportar o produto que

comercializa.

Nesses dois casos, a empresa pode ser considerada consumidora?

No primeiro exemplo talvez não haja dúvida, de que a empresa é

consumidora, pois na aquisição de alimento para oferecer aos seus

empregados, pode ser entendida como destinatária final desse produto

ou também porque esse bem não entra em sua cadeia produtiva.

Mas o segundo exemplo, já deixa alguma dúvida. Imaginemos mais

que essa empresa seja uma padaria, que comprou esse carro para

entregar as encomendas de seu negócio. Nessa aquisição do carro ela

seria consumidora?

Não se trata do trigo do pão e do bolo que ela fornece, mas de um

carro, que não é o produto que ela oferece, mas que será utilizado para

a venda do produto que ela oferece.

Para responder principalmente a esta questão surgiram 2 teorias: a

teoria finalista e a teoria maximalista.

6 É por isso que autores como Cláudia Lima Marques são contrários ao enquadramento da pessoa jurídica

como consumidora.

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Pela teoria finalista o conceito de destinatário final deve ser

interpretado de maneira restrita, para que não se amplie

demasiadamente o âmbito de aplicação do CDC. Assim, para essa

teoria, destinatário final é aquele que dá uma destinação fática e

econômica ao produto, ou seja, o consumidor tem que tirar o produto

do mercado e não pode mais colocar aquele produto numa relação de

negócio, por conseguinte, não pode mais ter qualquer tipo de lucro

com aquele produto.7

Pela teoria maximalista, não importa a questão econômica, apenas a

questão fática. Basta que o consumidor retire do mercado para que ele

passe a dar destinação final. Basta que ele seja o destinatário final dos

produtos ou serviços, incluindo aí não apenas aquilo que é adquirido

ou utilizado para uso pessoal, familiar ou doméstico como aquilo que

é adquirido para o desempenho de atividade ou profissão, bastando,

para tanto, que não haja a finalidade de revenda.8

Ou seja, para essa teoria (maximalista) não seria consumidor se o bem

é recolocado no mercado, ainda que transformado. Por exemplo, a

padaria quando compra trigo não é consumidora porque este produto

(trigo) é recolocado no mercado transformado em pães.

Por sua vez, já se percebe que pela teoria finalista dificilmente uma

pessoa jurídica seria consumidora, pois direta ou indiretamente, o

produto por esta adquirido, é sempre um instrumento de produção do

seu produto final.

Então respondendo aquela pergunta anterior a padaria que compra o

carro para transportar os produtos que vende é consumidora?

7 Como explica Claudia Lima Marques, “Não basta ser destinatário fático do produto, retirá-lo da cadeia de

produção, levá-lo para o escritório ou residência – é necessário ser destinatário final econômico do bem,

não adquiri-lo para revenda, não adquiri-lo para uso profissional, pois o bem seria novamente um

instrumento de produção cujo preço será incluído no preço final do profissional que o adquiriu”, op. cit., p.

71.

8 Almeida, João Batista de. Manual de Direito do Consumidor, p. 61.

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Pela teoria finalista, não. Pois, não está adquirindo o produto como

destinatária final. Este produto (carro) terá seu preço incluído no

produto final que esta oferece, assim como o freezer onde se

armazenam os produtos, os fornos industriais, as estufas etc para

uma empresa tudo que está ligado ao produto que oferece é insumo,

mesmo aquele para atração da clientela. (*)

Já para a teoria maximalista, sem dúvida a padaria seria

consumidora, pois adquire o produto como destinatária final, já que

não o recoloca no mercado.

Já se percebe que neste confronto, Teoria Finalista X Teoria

Maximalista a pessoa jurídica dificilmente seria consumidora em uma

e facilmente seria consumidora em outra.

Os críticos da teoria maximalista alegavam que assim não sobrariam

mais contratos civis, pois sempre que se estivesse adquirindo um

produto ou serviço, essa situação se enquadraria numa relação de

consumo.9

O STJ com o tempo foi solidificando a aceitação da teoria finalista em

seus julgados, mas abrandando-a para casos de consumidores-

profissionais em que na relação com o fornecedor encontrem-se numa

situação de vulnerabilidade.

Assim temperou-se a teoria finalista, para enquadrar como

consumidoras pequenas empresas que adquirem produtos,

principalmente fora de sua área de expertise e estando diante do

fornecedor numa situação de vulnerabilidade.

Em diversos julgados o STJ já se manifestou pela possibilidade da

pessoa jurídica ser consumidora, desde que reunidos aqueles

99 O problema desta visão é que transforma o direito do consumidor em direito privado geral, pois retira do

Código Civil quase todos os contratos comerciais, uma vez que comerciantes e profissionais consomem de

forma intermediária insumos para sua atividade-fim, de produção e distribuição, in Marques, op. Cit., p.

72.

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elementos: vulnerabilidade do consumidor profissional frente ao

fornecedor.

Bastante elucidativo e pedagógico o julgado que a seguir se transcreve,

revelando a posição daquela Corte:

PROCESSO CIVIL E CONSUMIDOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO.

CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO. MANDADO DE SEGURANÇA.

CABIMENTO. AGRAVO. DEFICIENTE FORMAÇÃO DO INSTRUMENTO.

AUSÊNCIA DE PEÇA ESSENCIAL. NÃO CONHECIMENTO. RELAÇÃO DE

CONSUMO. CARACTERIZAÇÃO. DESTINAÇÃO FINAL FÁTICA E ECONÔMICA

DO PRODUTO OU SERVIÇO. ATIVIDADE EMPRESARIAL. MITIGAÇÃO DA

REGRA. VULNERABILIDADE DA PESSOA JURÍDICA. PRESUNÇÃO RELATIVA.

(...)

A jurisprudência consolidada pela 2ª Seção deste STJ entende que, a rigor, a

efetiva incidência do CDC a uma relação de consumo está pautada na existência

de destinação final fática e econômica do produto ou serviço, isto é, exige-se

total desvinculação entre o destino do produto ou serviço consumido e qualquer

atividade produtiva desempenhada pelo utente ou adquirente. Entretanto, o

próprio STJ tem admitido o temperamento desta regra, com fulcro no art. 4º, I,

do CDC, fazendo a lei consumerista incidir sobre situações em que, apesar do

produto ou serviço ser adquirido no curso do desenvolvimento de uma atividade

empresarial, haja vulnerabilidade de uma parte frente à outra. - Uma

interpretação sistemática e teleológica do CDC aponta para a existência de uma

vulnerabilidade presumida do consumidor, inclusive pessoas jurídicas, visto

que a imposição de limites à presunção de vulnerabilidade implicaria restrição

excessiva, incompatível com o próprio espírito de facilitação da defesa do

consumidor e do reconhecimento de sua hipossuficiência, circunstância que

não se coaduna com o princípio constitucional de defesa do consumidor,

previsto nos arts. 5º, XXXII, e 170, V, da CF. Em suma, prevalece a regra geral

de que a caracterização da condição de consumidor exige destinação final fática

e econômica do bem ou serviço, mas a presunção de vulnerabilidade do

consumidor dá margem à incidência excepcional do CDC às atividades

empresariais, que só serão privadas da proteção da lei consumerista quando

comprovada, pelo fornecedor, a não vulnerabilidade do consumidor pessoa

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jurídica. - Ao encampar a pessoa jurídica no conceito de consumidor, a intenção

do legislador foi conferir proteção à empresa nas hipóteses em que, participando

de uma relação jurídica na qualidade de consumidora, sua condição ordinária

de fornecedora não lhe proporcione uma posição de igualdade frente à parte

contrária. Em outras palavras, a pessoa jurídica deve contar com o mesmo grau

de vulnerabilidade que qualquer pessoa comum se encontraria ao celebrar

aquele negócio, de sorte a manter o desequilíbrio da relação de consumo. A

paridade de armas entre a empresa-fornecedora e a empresa-consumidora

afasta a presunção de fragilidade desta. Tal consideração se mostra de extrema

relevância, pois uma mesma pessoa jurídica, enquanto consumidora, pode se

mostrar vulnerável em determinadas relações de consumo e em outras não.

Recurso provido. (STJ, RMS 27512 / BA, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI).

Essa decisão do STJ explica bem o posicionamento daquela Corte

quando se trata de enquadrar a pessoa jurídica como consumidora.

Ao dizer que “A jurisprudência consolidada pela 2ª Seção deste STJ entende

que, a rigor, a efetiva incidência do CDC a uma relação de consumo está

pautada na existência de destinação final fática e econômica do produto ou

serviço” adota-se claramente o conceito finalista de consumidor. Mas

para considerar-se a pessoa jurídica nesse conceito como

consumidora exige-se a sua vulnerabilidade na relação com o

fornecedor, não se trata necessariamente de ser uma pequena ou

grande empresa mas de encontrar-se numa posição vulnerável com

aquele fornecedor. Tanto que essa decisão, é tão explicativa quanto a

isso que ao final conlui “Tal consideração se mostra de extrema relevância,

pois uma mesma pessoa jurídica, enquanto consumidora, pode se mostrar

vulnerável em determinadas relações de consumo e em outras não”.

A vulnerabilidade, segundo a doutrina, pode se apresentar em 3

aspectos: técnico, jurídico e fático.

Na vulnerabilidade técnica o comprador não possui conhecimentos

específicos sobre o objeto que está adquirindo e, portanto, é mais

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facilmente enganado quanto às características do bem ou quanto a

sua utilidade.10

A vulnerabilidade jurídica ou científica é a falta de conhecimentos

jurídicos específicos, conhecimentos de contabilidade ou de

economia.11

Por último, a vulnerabilidade fática ou sócio-econômica tem seu ponto

de concentração no outro parceiro, o fornecedor que, por sua posição

de monopólio, fático ou jurídico, por seu grande poder econômico ou

em razão da essencialidade do serviço, impõe sua superioridade a

todos que com ele contratam.12

A vulnerabilidade é o elemento essencial para determinar a qualidade

de consumidor às pessoas jurídicas. As decisões judiciais tem

reconhecido que apenas quando a pessoa jurídica contrata numa

posição de vulnerabilidade com o fornecedor é que pode ser

enquadrada como consumidora.

Veja nesta decisão do TJ/SP, que reconheceu a pessoa jurídica como

consumidora numa compra de motor de caminhão, pois para esta

relação seria vulnerável diante do consumidor que detém o

conhecimento técnico do produto (vulnerabilidade técnica):

AGRAVO. CONTRATO DE VENDA E COMPRA

DE MOTOR DE CAMINHÃO. ATIVIDADE

COMERCIAL DA COMPRADORA QUE NÃO

TEM EXATA IDENTIDADE COM A

FINALIDADE DA COMPRA. RELAÇÃO DE

CONSUMO. CONFIGURAÇÃO. INTELECÇÃO

DO ART. 2º DO CDC. TEORIA FINALISTA

APROFUNDADA. AGRAVO NESTA PARTE

IMPROVIDO. Forçoso o reconhecimento de

10 Marques, op.cit., p. 74.

11 Ib.idem, p. 74.

12 Ib idem, p. 75.

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que o motor instalado em um caminhão da

empresa não desnatura a condição de

consumidora da agravada na compra. A

aquisição desse componente não retira a

vulnerabilidade técnica da agravada sobre a

composição, funcionamento, apuração e

reparação de eventuais vícios do produto. A

fabricante, sim, vende esse produto a quem se

dispõe adquirir, seja comerciante ou não,

mantendo, em qualquer caso, seu domínio

técnico (Agravo de Instrumento nº 2007952-

45.2013.8.26.0000)

O STJ já se posicionou em diversas oportunidades quanto a

possibilidade da pessoa jurídica ser consumidora atendido o requisito

da vulnerabilidade, como nesse julgado.

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE

INSTRUMENTO. CONSUMIDOR. RELAÇÃO DE

CONSUMO. CARACTERIZAÇÃO. DESTINAÇÃO

FINAL FÁTICA E ECONÔMICA DO PRODUTO

OU SERVIÇO. ATIVIDADE EMPRESARIAL.

MITIGAÇÃO DA REGRA. VULNERABILIDADE

DA PESSOA JURÍDICA. PRESUNÇÃO

RELATIVA.1. O consumidor intermediário, ou

seja, aquele que adquiriu o produto ou o serviço

para utilizá-lo em sua atividade empresarial,

poderá ser beneficiado com a aplicação do

CDC quando demonstrada sua vulnerabilidade

técnica, jurídica ou econômica frente à outra

parte. 2. Agravo regimental a que se nega

provimento (AgRg no AGRAVO DE

INSTRUMENTO Nº 1.316.667 - RO

(2010/0105201-5) RELATOR MINISTRO

VASCO DELLA GIUSTINA).

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Assim, reconhece-se qualidade de consumidora a pessoas jurídicas

nestas situações: a aquisição de produto ou serviço como destinatária

final, ou então, que encontre-se numa posição de vulnerabilidade

(técnica, científica ou fática) com o fornecedor na aquisição deste

produto ou serviço.

E, faltando esses requisitos, nega-se a qualidade de consumidora às

pessoas jurídicas. O que, inclusive, é mais comum, diante da restrição

do conceito de destinatário final na teoria finalista, pois para esta,

como vimos, não basta que o produto ou serviço não seja revendido

ou transformado, desde que haja uma utilização econômica, mesmo

que para atração da clientela ou incremento do negócio, são inclusive

estes os termos utilizados nos julgados, não se poderá dizer que se

adquire como destinatário final, como nesse julgado do STJ:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. INDENIZAÇÃO.

DANO MORAL CUMULADO COM DANO

MATERIAL. RELAÇÃO DE

CONSUMO.VIOLAÇÃO AO ART. 2º DO CDC.

NÃO CONFIGURADA. INCIDÊNCIA DO

ENUNCIADO 83 DE SÚMULA/STJ. 1. "A

aquisição de bens ou a utilização de serviços,

por pessoa natural ou jurídica, com o escopo de

implementar ou incrementar a sua atividade

negocial, não se reputa como relação de

consumo e, sim, como uma atividade de

consumo intermediária." (REsp 541867/BA,

Rel. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO,

Rel. p/ Acórdão Ministro BARROS MONTEIRO,

SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 10/11/2004,

DJ 16/05/2005 p. 227). 2. Incidência do

enunciado nº 83 de Súmula desta Corte

Superior. 3. Recurso Especial a que se nega

provimento. (REsp 603763 / RS RECURSO

ESPECIAL 2003/0191786-9).

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Veja também esse outro julgado, do STJ, em que fica claro, que o

produto ou serviço adquirido, quando necessário para o exercício da

atividade empresarial, mesmo que não seja o produto ou serviço que

ao final ela oferecerá, não se enquadra como consumo, pois é um

insumo da empresa:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM

RECURSO ESPECIAL. APLICAÇÃO DO

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.

CONTRATO PARA USO DE SOFTWARE DE

VENDAS ON LINE. INAPLICABILIDADE.

PRECEDENTES DA CORTE. 1.- Quanto à

aplicação do CDC, conforme entendimento

firmado por esta Corte, o critério adotado para

determinação da relação de consumo é o

finalista. Desse modo, para caracterizar-se

como consumidora, a parte deve ser

destinatária final econômica do bem ou serviço

adquirido. 2.- No caso dos autos, em que

pessoa jurídica contrata uso de software de

vendas on line, não há como se reconhecer a

existência de relação de consumo, uma vez

que o programa teve o propósito de fomento

da atividade empresarial exercida, não

havendo, pois, relação de consumo entre as

partes. 3.- Agravo Regimental improvido (AgRg

nos EDcl no AREsp 245697 / PR AGRAVO

REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE

DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO

ESPECIAL 2012/0222041-6).

E, dessa forma tem-se decidido em diversas situações que a empresa

que adquire o serviço de telefonia, não é consumidora, como também

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não o é, quando contrata seguro, ou quando adquire sementes para

plantio.13

E, ao final, a importância desta distinção, baseado neste critério legal,

é identificar a aplicação do CDC ou do CC na situação concreta.

2.1.1 CONSUMIDOR E USUÁRIO

Uma distinção que devemos apontar aqui é entre consumidor e

usuário.

Num primeiro momento, poderia parecer que a aplicação do CDC

restringe-se àqueles que consomem, ou seja, àqueles que adquirem os

produtos e serviços.

Mas para o CDC consumidor não é somente aquele que adquire o

produto ou serviço, mas também quem somente o utiliza, sem ter, por

exemplo, adquirido.

A nossa lei consumerista não fez essa distinção.

O art. 2° do CDC estabelece que: Consumidor é toda pessoa física ou

jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário

final.

Com isto quer se dizer que o vínculo contratual é prescindível, ou seja,

tanto a pessoa que adquire junto ao fornecedor um produto ou serviço,

bem como aquela que simplesmente utiliza produto ou serviço são

considerados consumidores.14

2.1.2 FORNECEDOR

13 Jurisprudências:

14 Conforme Gustavo Ribeiro, para quem ainda, “A existência de um vínculo contratual entre consumidor

e fornecedor não é necessária, portanto, para a caracterização da posição jurídica de consumidor. O simples

utente de produto ou serviço também será juridicamente considerado consumidor”, op. Cit., p. 30.

Page 22: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

22

Até agora definimos o consumidor, mas quem é o fornecedor, já que

como dissemos acima para se identificar uma relação de consumo é

necessário que tenhamos de um lado o consumidor e do outro o

fornecedor.

O CDC em seu art. 3° estabelece que: Fornecedor é toda pessoa física

ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os

entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção,

montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação,

distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

O rol exemplificativo é grande, parece que nada escapa, nesse sentido,

como bem sintetiza Brito Filomeno, fornecedor, em última análise, é

todo aquele que provê o consumidor de produtos e serviços.15

Assim é fornecedor o supermercado que vende os produtos e a loja que

comercializa, mas também quem fabrica, produz, constrói, monta e

transforma esses produtos comercializados, e também quem o importa

ou exporta, e aquele que distribui.

Aqui a técnica legislativa parece ter sido inversa, enquanto para o

consumidor o legislador restringiu a sua abrangência, neste o

legislador ampliou.16

2.1.3 CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO

Além da busca de uma definição do conceito de consumidor baseado

nos arts. 2°e 3°, que chamaremos de consumidor padrão, identifica o

CDC outros consumidores, que são chamados de consumidores por

equiparação, além da própria jurisprudência que em determinados

15 Op. Cit., p. 32.

16 No dizer de João Batista de Almeida a definição legal praticamente esgotou todas as formas de atuação

no mercado de consumo, nesse ponto, a definição de fornecedor se distancia da definição de consumidor,

pois enquanto este há de ser o destinatário final, tal exigência, já não se verifica quanto ao fornecedor, que

pode ser o fabricante originário, o intermediário ou o comerciante, bastando que faça disso sua profissão

ou atividade principal, op. Cit., p. 63.

Page 23: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

23

casos amplia o conceito de consumidor, para abarcar os

‘consumidores profissionais’, diante de sua hipossuficiência diante do

fornecedor.17

Estudemos esses casos:

1) O primeiro deles encontra-se no parágrafo único do art. 2° ao

estabelecer que “Equipara-se a consumidor a coletividade de

pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas

relações de consumo”.

O Código de defesa do consumidor não é um diploma que tutela

somente o direito individual daquele que adquiriu ou usou um

produto ou serviço, estende a sua tutela à coletividade de

pessoas, ainda que indetermináveis.

O CDC constrói um sistema de proteção ao consumidor que vai

além dessa proteção individual em que seriam legitimados a

buscar uma tutela somente aquela pessoa que adquiriu ou

consumiu um produto em desamparo com a lei (seja com defeito,

errôneo etc) mas também a própria coletividade, daí porque se

legitimar na parte processual deste diploma (arts. 81 e

seguintes), entidades representativas desses interesses de

grupo.18

2) A segunda equiparação ocorre no art. 17, ao prescrever que:

“Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores

todas as vítimas do evento”.

17 A técnica da equiparação, como bem coloca Gustavo Ribeiro, proporciona a extensão do campo de

aplicação das normas tutelares do Código de Defesa do Consumidor, visando proteger muitas pessoas que

podem ser atingidas ou prejudicadas pelas atividades dos fornecedores no mercado, mesmo sem adquirir

ou utilizar produto ou serviço como destinatárias finais, op. Cit., p. 34.

18 Para tanto o CDC construiu toda uma tutela coletiva que vai desde a definição de consumidor até a

legitimidade para a tutela desses direitos, estabelecendo o art. 81 que A defesa dos interesses e direitos dos

consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

Page 24: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

24

O CDC também estende a qualidade de consumidor às vítimas

de um evento de consumo.

Imagine que João adquiriu um carro e ao dirigi-lo, por um

defeito de fabricação, ocorre um acidente. João sofre várias

lesões e Augusto, pedestre, que andava na calçada onde o carro

vem a colidir, também sofre lesões.

João é consumidor, porque adquiriu um produto como

destinatário final e poderá ajuizar uma ação para obter a

reparação de seu dano, beneficiando-se de todas as vantagens

estabelecidas nas normas consumeristas para o consumidor,

como a responsabilidade objetiva do fornecedor, maior prazo

prescricional, foro privilegiado etc.

E Augusto? O que poderá fazer? Ajuizará uma ação em face de

João ou poderá também ajuizar uma ação em face da montadora

do veículo ou até mesmo da concessionária onde este foi

adquirido?

Ao estender a condição de consumidor às vítimas do evento,

Augusto passa a ser consumidor por esta equiparação.

Sendo consumidor poderá se beneficiar das vantagens

estabelecidas àqueles. Logo nesse caso concreto, poderá ajuizar

demanda reparatória contra a fabricante do veículo e/ou todos

os demais fornecedores desse produto (quem comercializou,

quem distribuiu etc).

Esta equiparação atende a um princípio de igualdade, seria

injusto e desigual pensarmos que quem adquiriu o produto é

consumidor e poderá se valer dessa estrutura legal mas quem

sofreu o dano deste produto não o é.

3) Art. 29:

Page 25: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

25

Estabelece o art. 29 “Para os fins deste Capítulo e do seguinte,

equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis

ou não, expostas às práticas nele previstas”.

4) Hipossuficiência:

A interpretação restritiva da teoria finalista acabou por conduzir

a uma criação jurisprudencial ampliando a condição de

consumidor aos, vamos assim chamar, consumidores

profissionais.

Ou seja, aquele que não adquire o bem como destinatário final,

pois o utiliza em sua produção, mas pela hipossuficiência que

se coloca frente ao fornecedor é considerado consumidor.

Imaginemos a seguinte situação: Dona Maria faz salgadinhos em

casa para vender. Ao comprar farinha de trigo no supermercado,

Dona Maria é consumidora? A princípio a resposta seria não,

pois Dona Maria não adquire o bem como destinatária final,

afinal ela o utiliza no preparo do seu produto (salgadinho). Mas

Dona Maria apesar de ser uma fornecedora de salgadinhos, deve

ser considerada consumidora na sua relação com o fornecedor

de farinha de trigo, pois nesta relação ela se mostra

hipossuficiente.

E assim vem entendendo nossos Tribunais em relação a diversos

profissionais.

E quais seriam os contratos civis?

Esses, nós vamos definir por exclusão, são civis os contratos que não

são de consumo.

Claro que esta definição se prende a este ramo do direito privado, pois

há contratos administrativos, contratos de trabalho etc.

Page 26: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

26

3.0 INTERPRETAÇÃO DOS CONTRATOS

1- Ao interpretarmos os contratos partimos da noção de interpretação

da lei. Tanto para interpretar a lei, como para interpretar o negócio

jurídico, o que procuramos é fixar o sentido de uma manifestação de

vontade. Na vontade da lei, temos em mira um número indeterminado

de pessoas, no negócio jurídico o declarante e no contrato, duas

vontades.

2- Dois elementos (que integram qualquer manifestação de vontade) :

elemento externo, que é a declaração contratual propriamente dita, que

na relação contratual, materializa-se pela palavra escrita ou falada e,

mais raramente, por gestos ou condutas dos contratantes.; elemento

interno, o que foi realmente pensado, raciocinado e pretendido pelos

contratantes, qual seja, o substrato de sua declaração, sua vontade

real.19

3- Por maior que seja o número de doutrinas que buscam explicar a

problemática, o intérprete sempre ficará preso a dois parâmetros, dos

quais não pode fugir: de um lado estará a vontade declarada,

geralmente externada por palavras; de outro lado, se colocará a

necessidade de perscrutar a verdadeira intenção dos agentes

envolvidos.

4- A interpretação do negócio jurídico em geral, e do contrato em

particular, situa-se na fixação do conteúdo, compreensão e extensão,

da elaboração de vontade.Para isso, o julgador se valerá muito mais

de regras empíricas, da experiência, do que de normas interpretativas

estabelecidas na lei.

191919 Aqui como observa Carlos Gonçalves não se trata de buscar a vontade interna, psicológica, mas a

vontade objetiva, o conteúdo, as normas que nascem e sua declaração. In Direito Civil Esquematizado, p.

265.

Page 27: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

27

5- O CC optou em não tratar com detalhes o instituto da interpretação

dos negócios jurídicos (diferente do legislador francês e italiano).

Ainda na parte geral do Código estabeleceu em dois artigos as

principais regras sobre interpretação:

Art. 112: “Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção

nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”.

O CC/1916 em dispositivo semelhante, estabelecia em seu art. 85 que:

“Nas declarações de vontade se atenderá mais à sua intenção que ao

sentido literal da linguagem”.

Veja que a mudança resultou no acréscimo da expressão nelas

consubstanciada o que levou muitos intérpretes a concluirem que

diferentemente do diploma de 1916 o legislador não deu prevalência à

teoria da vontade. O oposto desta seria a teoria da declaração. E será

que o nosso legislador optou agora por esta? Parece que também não.

O código afastou-se de extremos, pois ao que parece não adotou

unicamente a teoria da declaração ou a vontade. Parece ter querido

dizer, que o intérprete deve partir inicialmente da declaração, e dela

procurar o verdadeiro alcance da vontade. Para outros intérpretes,

mas também nessa linha, o legislador preferiu a busca de uma

vontade objetiva, que partisse da declaração escrita para se buscar a

intenção manifestada no contrato e não simplesmente a busca do

pensamento íntimo, subjetivo do declarante.20

Art. 113: Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a

boa-fé e os usos do lugar de sua celebração”;

Art. 114: Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se

estritamente.

3.1 Outros dispositivos do Código Civil que tratam de interpretação:

20 É o pensamento de Carlos Gonçalves, in Direito Esquematizado, p. 265.

Page 28: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

28

Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas

ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao

aderente.

Art. 843. A transação interpreta-se restritivamente, e por ela não se

transmitem, apenas se declaram ou reconhecem direitos.

Art. 819: A fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação

extensiva.

Art. 1899. Quando a cláusula testamentária for suscetível de

interpretações diferentes, prevalecerá a que melhor assegure a

observância da vontade do testador.

3.2 Diz-se que há duas espécies de interpretação: a interpretação

declaratória e a interpretação construtiva ou integrativa.

Diz-se que a interpretação contratual é declaratória quando tem como

único escopo a descoberta da intenção comum dos contratantes no

momento da celebração do contrato e é construtiva ou integrativa

quando objetiva o aproveitamento do contrato, mediante do

suprimento das lacunas e pontos omissos deixados pelas partes.21

Claro que nem sempre é fácil identifica essa separação.

Veja nesse interessante acórdão do TJ/SP, um exemplo de

interpretação de contrato:

Qual a interpretação utilizada pelo julgador?

Parece ter havido uma interpretação declarativa, o que se buscava era

entender o alcance da expressão: lâmpada elétricas.

Mas a interpretação não se baseou somente numa busca gramatical

do sentido da expressão àquela época, mas em outros elementos que

21 In Carlos Gonçalves, Direito Civil Esquematizado, p. 711.

Page 29: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

29

conduziram o intérprete a entender que não só o sentido da expressão

era aquele como também a forma como as partes vieram se

comportando ao longo de todos esses anos, deduz ter sido este o

sentido que elas quiseram dar à expressão.

3.3 Interpretação dos contratos no Código de Defesa do

Consumidor:

Seria diferente a interpretação dos contratos no Código de Defesa do

Consumidor? Haveria outras regras de interpretação ou aquelas

poderiam ser utilizadas?

Podemos começar dizendo que as regras de interpretação são as

mesmas, o mesmo art. 112 que determina a busca da intenção das

parte vale para o CDC.

Mais o CDC traz regras interpretativas e estas devem ser somadas ao

CC, apesar de que o contrário a princípio não se admite.22

Art. 4º, III: harmonização dos interesses dos participantes das relações

de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a

necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a

viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art.

170 da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio

nas relações entre consumidores e fornecedores.

Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não

obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de

tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos

instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de

seu sentido e alcance.

22 Ou seja, na interpretação de um contrato civil não podemos utilizar as regras do CDC, pois estas partes

sempre da consideração de que o consumidor é hipossuficiente o que não ocorre, a princípio, numa relação

civil em que se parte de uma igualdade.

Page 30: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

30

Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais

favorável ao consumidor.

12 REGRAS DE INTERPRETAÇÃO DE POTHIER (utilizadas no Código

Francês):

1. Nas convenções mais se deve indagar qual foi a intenção comum

das partes contraentes do que qual é o sentido comum das

palavras.

2. Quando uma cláusula é suscetível de dois sentidos, deve

entender-se naquele em que ela pode ter efeito; e não naquele

em que não teria efeito algum.

3. Quando em um contrato os termos são suscetíveis de dois

sentidos, deve entender-se no sentido que mais convém à

natureza do contrato.

4. Aquilo que em contrato é ambíguo interpreta-se conforme uso

do país.

5. O uso é de tamanha autoridade na interpretação dos contratos

que se subentendem as cláusulas do uso ainda que se não

exprimissem.

6. Uma cláusula deve interpretar-se pelas outras do mesmo

instrumento, ou elas precedam, ou elas sigam àquela.

7. Na dúvida, uma cláusula deve interpretar-se contra aquele que

tem estipulado uma coisa em descargo daquele que tem

contraído a obrigação.

8. Por muito genéricos que sejam os termos em que foi concebida

uma convenção, ela só compreende as coisas sobre as quais

parece que os contraentes se propuserem tratar, e não as coisas

em que eles não pensaram.

9. Quando o objeto da convenção é uma universalidade de coisas,

compreende todas as coisas particulares que compõem aquela

Page 31: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

31

universalidade, ainda aquelas de que as partes não tivessem

conhecimento.

10. Quando em um contrato se exprimiu um caso, por causa

da dúvida que poderia haver, se a obrigação resultante do

contrato se estenderia àquele caso, não se julga por isso ter

querido restringir a extensão da obrigação, nos outros casos que

por direito se compreendem nela, como se fossem expressos.

11. Nos contratos, bem como nos testamentos, uma cláusula

concebida no plural se distribui muitas vezes em muitas

cláusulas singulares.

12. O que está no fim de uma frase ordinariamente se refere a

toda a frase, e não àquilo só que a precede imediatamente;

contanto que este final da frase concorde em gênero e número

com a frase toda.

10- Interpretação Integrativa e Integração dos Contratos (exemplos,

art. 157, §2°, art. 51, §2°, CDC)

11- Interpretação objetiva: aplicação dos princípios contratuais (

princípio da boa-fé, princípio da conservação do contrato e princípio

da extrema ratio (menor peso e equilíbrio das prestações).

Page 32: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

32

4.0 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO CONTRATUAL:

Toda ciência é composta por princípios, que a orienta e legitima.23 O

Direito contratual é também regido por princípios, alguns podemos

chamar de fundadores, estão presentes efetivamente na origem dos

contratos, outros, mais atuais, foram fruto da evolução desse

instituto, baseados numa idéia de justiça e socialidade dos

contratos.24

Mas a tarefa de definir princípio não é fácil e hoje ainda convive-se

com outro instituto jurídico muito próximo e, que por vezes, são

tratados como sinônimos que são as Cláusulas Gerais. Seriam os

princípios e as cláusulas gerais sinônimos?

Preferimos não nos aprofundar nesse tema, mas tomar uma posição

em relação a eles.

Assim entendemos por princípios...

E, por cláusula geral...

Como dissemos acima os princípios do direito contratual podem ser

divididos nos fundadores e nos atuais, comecemos pelos princípios

fundadores.

4.1 PRINCÍPIO DA AUTONOMIA DA VONTADE E

AUTONOMIA PRIVADA

Este princípio é, com certeza, o que mais se identifica com a própria

idéia de contrato, ou mais especificamente, com a de contratar.

Contrata-se porque pode, porque temos liberdade para isso.

Por isso sempre se define autonomia da vontade como o poder das

partes de estipular livremente, como melhor lhes convier, mediante

23 De uma forma bem clara e objetiva Gagliano e Stolze definem princípios como “ditames superiores,

fundantes e simultaneamente informadores do conjunto de regras do Direito Positivo. Pairam, pois, por

sobre toda a legislação, dando-lhe significado legitimador e validade jurídica”. Novo Curso, vo. 4, p. 65.

24 Paulo Luiz Netto Lôbo, fala em princípios individuais e princípios sociais. In Pablo Stolze, v. 4, p. 79.

Page 33: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

33

acordo de vontades, a disciplina de seus interesses, suscitando efeitos

tutelados pela ordem jurídica.25

Esses efeitos tutelados pela ordem jurídica são na opinião de diversos

autores três: a liberdade de contratar ou não contratar, de escolher o

outro contraente e de fixar o conteúdo do contrato.26

É claro que nenhuma dessas liberdades são absolutas, até porque não

se coaduna com nosso Direito regras absolutas.

Todas comportam exceções:

A liberdade de contratar ou não contratar não é absoluta. Apesar de

em regra termos a liberdade de decidir se contratamos ou não

contratamos, nem sempre podemos fazer isso. Os seguros obrigatórios

dos veículos automotores, é uma contratação imposta.

Se pensarmos nas relações de consumo, essa liberdade é mitigada ao

fornecedor, que não pode deixar de vender ao consumidor e, por vezes,

pode até ser compelido a fazer isso.27

A liberdade de escolher o outro contratante, também não é absoluta.

Se pensarmos nos serviços públicos concedidos sob a forma de

monopólio, essa liberdade deixa de existir. Também é mitigada nas

relações de consumo para o fornecedor, que não pode escolher para

quem vende.

Por último a liberdade de fixar o conteúdo do contrato. Esta é sem

dúvida onde mais encontramos limitações.

25 Diniz, Maria Helena. Curso de Direito Civil, 3 vol. 1999, p. 31.

26 Gonçalves, Carlos Roberto, p. 41, Diniz, Maria Helena, p. XX.

27 Trataremos dessa matéria na formação dos contratos. O fornecedor não pode recusar a proposta por ele

realizada, podendo até ser compelido a cumpri-la.

Page 34: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

34

Para começar podemos distinguir aqui, aquilo que alguns autores

chamam de autonomia privada. Há uma distinção realizada por

civilistas entre autonomia da vontade e autonomia privada.28

A primeira estaria restrita a esse campo de liberdade de contratar ou

não contratar e de escolher com quem se contrata.

Já a fixação do conteúdo do contrato, está associada a um poder

maior, que é o poder de normatizar as nossas relações, de escolhermos

as regras que queremos estabelecer com o outro.

E justamente pelo poder maior que se tem aqui é que há também uma

limitação maior.

Imagine deixar à livre disposição das partes a fixação do conteúdo do

contrato? Teríamos com certeza muitos abusos, principalmente

daquele que detivesse o poder econômico na relação. Como seria hoje

um contrato de locação se não tivéssemos a lei de locação?

Quanto maior a desigualdade entre as partes maior a intervenção, daí

porque nos contratos de consumo o dirigismo estatal ser bem maior.

Podemos até questionar se não há um excesso de intervenção,

possibilitando muitas vezes que o judiciário reveja o conteúdo do

contrato.

Decisões judiciais pela abusividade de juros, nulidade de cláusulas

etc, são o reflexo dessa intervenção. Dessa intervenção no conteúdo

do contrato.

Pensando de forma tradicional, isso seria um absurdo. Como pode o

judiciário rever e até modificar o conteúdo de um contrato realizado

entre pessoa maiores e capazes cujo objeto é lícito?

No entanto todos sabemos que isso ocorre e a cada dia mais. É comum

no judiciário de hoje, questionar o contrato.

28 Autonomia da vontade X Autonomia privada.

Page 35: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

35

Mas aqui como comentamos na introdução, isso surge por 2

caminhos: um é o chamado dirigismo estatal, há intervenção estatal

no contrato com a elaboração de leis que regulam o conteúdo deste,

tenha-se como exemplo, a locação, o transporte, a doação etc Outro é

uma intervenção que surge realizada pelo Judiciário com o objetivo de

equilibrar o contrato e buscar vamos dizer uma justiça social.

Aí entra em profusão a aplicação de princípios sociais como a função

social do contrato e a boa-fé objetiva.

A aplicação desses princípios em matéria contratual é tão grande que

parece que os princípios fundadores, tradicionais foram revogados.

Pouco se fala em autonomia da vontade, força obrigatória do contrato.

Falar em pacta sunt servanda parece querer transportar-se para a

idade média.

E no entanto, o contrato só é contrato porque as partes tem autonomia

para contratar e para estabelecer as suas obrigações, e,

consequentemente, estar obrigadas ao seu cumprimento.29

4.2 PRINCÍPIO DO CONSENSUALISMO:

Segundo esse princípio, o simples acordo de duas ou mais vontades

basta para gerar contrato válido, pois a maioria dos negócios jurídicos

bilaterais é consensual, embora alguns, por serem solenes, tenham

sua validade condicionada à observância de certas formalidades

legais.

Diz-se também que esse princípio contrapõe-se ao formalismo e

simbolismo que vigoraram em termos primitivos.

29 Apesar de raro, nesta profusão de decisões judiciais aplicando princípios justificadores da revisão dos

contratos, ainda encontramos decisões que privilegiam a autonomia da vontade, como esta do TJSP:

“Seguro de vida em grupo e acidentes pessoais – Indenizatória – Dano moral – Cláusula de renovação

automática. Pedido da segurada no sentido de se restabelecer o seguro. Desinteresse da seguradora em

renovar a apólice. Fundamento no fato de que houve extinção do contrato por decurso do prazo nele

previsto. Admissibilidade. Seguradora que não está obrigada nem por lei, nem pelo contrato, a manter a

avença, sob pena de afronta ao princípio da autonomia da vontade. Não violação ao CDC. Prescrição

afastada. Recurso provido para julgar improcedente a ação (Apelação n° 0084913-03.2009 – Botucatu-SP,

27ª Câmara de Direito Privado).

Page 36: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

36

Muitas vezes a idéia de contrato confunde-se com a de seu

instrumento. Diz-se contrato para falar do acordo de vontades como

também, do papel, por exemplo, que instrumentalizou esse acordo: -

vou entregar o contrato para você.

Diferenciando-se os dois compreende-se o princípio do

consensualismo: o acordo de vontades entre as partes é que faz o

contrato, este por sua vez, pode ser instrumentalizado, num

documento escrito, numa gravação, ou hoje, como é tão comum,

virtualmente.30

É claro que num mundo da linguagem escrita, o ‘papel’ ganhou tanta

importância, a ponto de haver essa confusão.

Há também uma importância da escrita em virtude da prova. Como

provar que houve um acordo de vontades entre as partes? Claro que

havendo um documento escrito, isso será mais fácil.

Mas se o contrato é o acordo de vontades, temos como plenamente

válido o contrato verbal.

Aliás por mais que se estranhe quando se fale isso, a maioria dos

contratos são verbais: ou se faz contrato escrito quando se compra

uma roupa numa loja? Quando se tiram cópias de documentos?

Quando se contrata o encanador? O pintor? O pedreiro. A numerosa

–e, pequena contratação diária é verbal.

O contraponto do consensualismo seria o formalismo, que pode

ocorrer nos contratos reais como em exigências formais do legislador.

Os contratos reais, que será melhor explicado no capítulo da

classificação dos contratos, são aqueles que se aperfeiçoam com a

entrega do objeto contratado, logo não há contrato, mesmo que já

tenha ocorrido o acordo de vontades, se não houver a entrega do

objeto. Também são contratos formais aqueles em que o legislador

30 Estão aí os contratos eletrônicos.

Page 37: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

37

exige para sua validade que o contrato seja escrito, ou que seja

realizado por meio de escritura pública.31

Tudo isso torna o contrato formal, porque, nestes casos, não basta o

acordo de vontades, é necessário além disso que seja entregue o bem,

que seja realizado por um instrumento escrito ou que seja realizado

por um instrumento público.

Mas interessante é a possibilidade que as partes contratantes tem de,

mesmo sem exigência legal, tornar formal o contrato. Privilegiando a

autonomia da vontade das partes estas podem formalizar o contrato

exigindo para sua validade o instrumento público, conforme art. 109

do CC.32

Assim, a regra é o consensualismo, sendo exceção o formalismo, que

pode surgir por lei ou pela vontade das partes.

4.3 PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE DA CONVENÇÃO

(Força Obrigatória dos Contratos):

Por esse princípio, as estipulações feitas no contrato deverão ser

fielmente cumpridas, sob pena de execução patrimonial contra o

inadimplente.33

É deste princípio que surge a tão famosa expressão que o contrato é

lei entre as partes.

E por que isso? Porque o contrato é uma norma jurídica, criada pelas

partes, por força de sua autonomia da vontade, obrigando-as a seu

cumprimento. (*o contrato é uma norma? Ver posição do prof.

Junqueira*)

31 Diz o legislador civil no art. 819 que a fiança dar-se-á por escrito, logo não há fiança verbal. Na promessa

de compra e venda exige-se a forma pública, conforme art. 1417 do CC.

32 Art. 109. No negócio jurídico celebrado com a cláusula de não valer sem instrumento público, este é da

substância do ato.

33 Diniz, op. cit, 1999, p. 34.

Page 38: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

38

É difícil pensar o contrato como norma pois há muito tempo vivendo

uma supremacia constitucional, parece que somente as normas

públicas são normas, são leis. Mas mesmo Kelsen no desenho de sua

pirâmide normativa colocava na base os contratos.*

É também deste princípio que surge a não menos famosa expressão:

pacta sunt servanda. Numa tradução atual e politicamente correta diz-

se que os pactos devem ser cumpridos, mas mesmo para o latim

percebe-se claramente que o seu significado está relacionado a idéia

de servidão, algo como você se torna servo do pacto.

Por isso diz-se que o contrato é intangível, daí também receber esse

princípio o nome de princípio da intangibilidade dos contratos. A única

limitação a esse princípio, dentro da concepção clássica, é a escusa

por caso fortuito ou força maior, consignada no art. 393 e parágrafo

único do Código Civil34:

Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou

força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário,

cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.

Um efeito imediato desse princípio, é que além das partes estarem

obrigadas ao seu cumprimento (irretratabilidade), não podem alterar

o seu conteúdo (intangibilidade). Numa síntese muito clara dessa

idéia, explica Carlos Roberto Gonçalves que “como foram as partes que

escolheram os termos do ajuste e a ele se vincularam, não cabe ao juiz

preocupar-se com a severidade das cláusulas aceitas, que não podem

ser atacadas sob a invocação dos princípios de equidade. O princípio

da força obrigatória do contrato significa, em essência, a

irreversibilidade da palavra empenhada”35.

34Gonçalves, op. Cit., p. 49.

35 Op. Cit. P. 49.

Page 39: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

39

É o princípio da segurança jurídica no campo contratual. Como

conviver harmoniosamente na sociedade se os pactos estabelecidos

pelos cidadãos não forem cumpridos? Onde estará a segurança?

Perguntam.36

Mas é claro que essa visão irretratável e intangível do contrato, não é

absoluta, como nada dentro do Direito.

Como dissemos na apresentação desse trabalho o contrato é um

instituto jurídico e como tal não deixa de evoluir.

Essa visão (intangível) modificou-se ao longo do tempo permitindo que

o contrato fosse revisto, poderíamos numa cadeia histórica dizer que

inicialmente isso ocorreu com o reconhecimento da ocorrência de fatos

imprevisíveis que levavam a uma onerosidade excessiva do contrato

lesando um dos contratantes, posteriormente com o reconhecimento

de princípios de conotação social como a função social do contrato e o

princípio da boa-fé objetiva, chegando até um diploma legislativo

como o CDC prevê as chamadas cláusulas abusivas que não podem

conter um contrato, interferindo efetivamente no conteúdo do contrato

e já estabelecendo uma invalidade de antemão caso essas cláusulas

sejam inseridas num negócio.

4.4 PRINCÍPIO DA RELATIVIDADE DOS EFEITOS DO

CONTRATO

Por esse princípio, a avença apenas vincula as partes que nela

intervieram, não aproveitando nem prejudicando terceiros.

O contrato como dito, é lei ‘entre’ as partes. Ou como se diz, o contrato

é res inter alios acta, aliis neque nocet neque potest.37

36 Há uma frase famoso no Mercador de Veneza em que Shyloc argumenta no Tribunal “onde ficará a

segurança dos cidadãos de Veneza se os contratos puderem não ser cumpridos?”. Politicamente esse

também é um discurso sempre utilizado, principalmente em tempos de crise, assegura-se que apesar desta

os contratos serão cumpridos, para que credores e investidores não se assustem. 37 Tradução:

Page 40: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

40

Todavia, como os demais, o princípio também comporta exceções.

Alguma dessas são antigas, existem junto com o próprio princípio,

outras, são atuais, consequências em linhas gerais da função social

do contrato.

Assim, diga-se, o contrato atinge terceiros quando o contratante falece

e os seus herdeiros são obrigados a cumpri-lo. O contrato como regra

não se extingue com a morte do contratante, os seus sucessores

herdam também essa obrigação, de cumprir aquilo que foi

estabelecido pelo contratante, claro que isso não pode ultrapassar as

forças da herança.38

Outra exceção, conhecida há muito tempo, é a possibilidade das

partes estabelecer no contrato obrigações em face de terceiros.

Desde o Código anterior eram previstas algumas exceções a este

princípio, com as chamadas estipulações de terceiros e que foram

mantidas no Código atual. Assim, por exemplo, o art. 439 estabelece

que aquele que tiver prometido fato de terceiro responderá por perdas

e danos, quando este o não executar.

Veja, é possível que o contrato preveja um efeito a terceiro, mas

justamente pelo fato do terceiro não ter feito parte da obrigação ele

não estará obrigado.

Mais curioso é a estipulação em favor de terceiro, que permite que o

contrato traga um efeito que beneficie um terceiro que não fez parte

da avença.

De qualquer maneira essas sempre foram exceções previstas pelo

próprio legislador e que não afetavam na essência o princípio, pois o

contrato podia afetar terceiro mas desde que esse terceiro consentisse.

38 Conforme art. 1.792 do CC.

Page 41: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

41

O que chama atenção na atualidade é o princípio da função social do

contrato.

Quando se diz que o contrato – marco da individualidade – tem uma

função social, está dizendo que o contrato mesmo que seja realizado

entre as partes e para as partes afeta outras pessoas, tem um impacto

social.

A questão é saber se em virtude disso, aquele que não fez parte no

contrato pode nele intervir? E qual alcance dessa intervenção?39

Cita-se o art. 51, §4º do CDC, como um exemplo de intervenção

externa ao contrato. Este, por sua vez, estabelece que

É facultado a qualquer consumidor ou entidade

que o represente requerer ao Ministério Público

que ajuíze a competente ação para ser declarada

a nulidade de cláusula contratual que contrarie

o disposto neste Código ou de qualquer forma

não assegure o justo equilíbrio entre direitos e

obrigações das partes.

Tal dispositivo encontra-se com razão no Código de Defesa do

Consumidor, pois as contratação de consumo são contratação de

massa, são contratos que se reproduzem e se multiplicam para

diversos consumidores.

A intervenção do MP então pretende evitar que um modelo contratual

lese diversos consumidores.

Daí que a atuação do MP...

Imagine um contrato estabelecido por um Plano de Saúde restringindo

tempo de internação médica. O Ministério Público ciente dessa

situação pode atuar para declarar a nulidade dessa cláusula

39 Carlos Roberto Gonçalves em análise a esse princípio conclui que é permitida essa intervenção diante do

abrandamento do princípio da relatividade dos efeitos do contrato diante dessa nova concepção de sua

função social, tal fato, diz o autor, tem como consequência, por exemplo, possibilitar que terceiros que não

são propriamente partes do contrato possam nele influir, em razão de serem por ele atingidos de maneira

direta ou indireta, in Direito Civil Esquematizado, p. 698.

Page 42: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

42

contratual e exigir que o fornecedor não a insira nos próximos

contratos. Claro que cada consumidor também poderá fazer isso, mas

a tutela coletiva é sempre mais democrática, pois todos serão

beneficiados, ao contrário de uma atuação individual, que dependerá

a priori inclusive de conhecimento.40

É por isso que concluiu-se na XX Jornada de Direito Civil que “A

função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil,

constitui cláusula geral, a impor a revisão do princípio da relatividade

dos efeitos do contrato em relação a terceiros, implicando a tutela

externa do crédito”.

Mas o princípio da relatividade não se aplica somente as partes, mas

também em relação ao objeto.

40 APELAÇÃO-CÍVEL. AÇÃO CÍVIL PÚBLICA. INTERESSES OU DIREITOS COLETIVOS.

CONTRATOS BANCÁRIOS. REVISÃO DE CLÁUSULAS. NULIDADE. PRELIMINARES.

LEGITIMIDADE. APLICABILIDADE DO CDC AOS CONTRATOS BANCÁRIOS. CLAUSULAS

ABUSIVAS. NULIDADE. O Ministério Público encontra-se legitimado constitucionalmente à propositura

de ação civil pública visando à declaração de nulidade de cláusulas contratuais existentes em contratos

bancários de adesão (direitos coletivos), bem como a sua exclusão dos contratos futuros (direitos difusos).

O fato de o objeto do pedido poder surtir reflexos nos direitos individuais homogêneos não traduz a sua

ilegitimidade, porquanto, mesmo que deles fosse tratado por presente interesse social compatível com as

finalidades da instituição, não haveria falar em carência de ação. O Código de Defesa do Consumidor

aplica-se aos contratos entre os clientes (consumidores) e as instituições integrantes do Sistema Financeiro

Nacional em face do que dispõe o seu artigo 3º, § 2º. São abusivas e merecem nulificadas as cláusulas

contratuais que autorizem a instituição financeira a modificar unilateralmente o conteúdo dos contratos

após a sua celebração, assim como aquelas que permitam impossibilitar a não-liquidação antecipada do

débito. Sendo oportunizado o prévio conhecimento das cláusulas gerais da contratação, satisfeito está o

requisito legal, com o que, do fato de elas não constarem do instrumento de contratação que apenas traz

remissão ao local em que podem ser obtidas não traduz abusividade à luz do Código de Defesa do

Consumidor. À unanimidade, rejeitaram as preliminares de ilegitimidade ativa e de falta de interesse

em agir e, no mérito, deram parcial provimento ao apelo. APELAÇÃO CÍVEL

Page 43: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

43

4.5 PRINCÍPIO DA BOA FÉ

Grande novidade deste Código Civil foi a inserção no art. 422 do

princípio da boa-fé objetiva.

Sem dúvida, junto com a função social do contrato este princípio tem

revolucionado o tratamento do contrato (?), desde a sua interpretação

até no tratamento de questões relacionadas com a possibilidade de

sua revisão ou mesmo de sua resolução.

Segundo esse princípio, na interpretação do contrato, é preciso ater-

se mais à intenção do que ao sentido literal da linguagem, e, em prol

do interesse social de segurança das relações jurídicas, as partes

deverão agir com lealdade e confiança recíprocas, auxiliando-se

mutuamente na formação e na execução do contrato.41

Uma questão inicial é saber se este é um novo princípio ou apenas o

aspecto objetivo do princípio da boa-fé. Ou seja, haveria o princípio da

boa-fé e este se dividiria em boa-fé subjetiva e objetiva ou teríamos um

novo princípio, a boa-fé objetiva?42

Concordamos com a segunda opção, trata-se de um novo princípio.

Deveres anexos:

4.5.1 INFORMAÇÃO

A informação é um dever contratual que se liga muito proximamente

da boa-fé e nesta também poderia se encaixar. Afinal aquele que não

informa o contratado sobre o objeto do negócio age com má-fé.

Mais a informação principalmente nas relações de consumo ganha

uma importância muito grande pois como acentua Fábio Ulhôa “O

consumidor certamente não conhece o produto ou serviço que

41 Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil Brasileiro, v. 3, p. 55.

42 Para Carlos Gonçalves a primeira opção seria a correta o princípio da boa-fé se bipartiria em boa-fé

subjetiva e boa-fé objetiva. In Direito Esquematizado, vol. 1, p. 701.

Page 44: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

44

pretende adquirir na mesma medida do fornecedor, e isso é uma das

mais importantes razões de sua vulnerabilidade”.

Ver art. 6º, III, CDC.

4.5.2 COLABORAÇÃO

Surge também como um importante dever contratual o da colaboração

entre as partes.

Porém mais uma vez poderíamos resumir na boa-fé objetiva, pois

negar-se a colaborar, dificultando ou mesmo impedindo a satisfação

do contrato viola aquele grande princípio.

Função interpretativa da Boa-fé:

Venire contra factum proprium

Supressio, surrectio e tu quoque

Também trazem os autores a discussão sobre novos princípios ou

deveres contratuais que nesta nova ordem jurídica devem ser

colocados ao lado daqueles pela importância que vem assumindo:

4.6 EQUILÍBRIO DOS CONTRATANTES

Fábio Ulhôa Coelho elenca o equilíbrio como um dos princípios

contratuais.

Para o autor a ordem jurídica somente deve reconhecer validade e

eficácia à composição dos interesses pelos próprios titulares, mediante

acordo de vontades, se eles possuírem iguais meios para defende-los

na mesa de negociação. Caso contrário, o mais forte acabará fazendo

Page 45: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

45

prevalecer seus interesses, e não se realizará a articulação de

interesses amparada na autonomia privada.43

Ver art. 4º, III, CDC

43 Curso de Direito Civil, v. 3, p. 28.

Page 46: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

46

5.0 CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS

O estudo da classificação dos contratos, não tem utilidade somente

teórica. De acordo com a espécie de contrato sob exame, há distintas

conseqüências com distintas formas de interpretação e enfoque da

posição das partes e do objeto contratado.

Por exemplo, o CC estabelece no art. 445 que o efeito do vício

redibitório aplica-se somente aos contratos comutativos, também

estabelece em outro momento que ...

Porém o Código não conceitua essa classificação utilizada cabendo

essa tarefa à doutrina, como também a de classificar o contrato em

diversas modalidades, inclusive para fins didáticos, pois do estudo de

sua classificação podemos posteriormente compreender diversos

efeitos dos contratos como também ter uma visão melhor do mesmo.

No direito romano os contratos classificavam-se em: reais, verbais,

literais e consensuais. Os contratos reais são os que implicam a

entrega de uma coisa (res), de um contraente a outro. Para que se

exista é necessário que se entregue a coisa (traditio). Contratos orais

são os que se formam com o pronunciamento de certas palavras.

Contrato oral típico, entre outros, na época clássica, era a stipulatio.

A obrigação nasce de uma resposta que o futuro devedor dá a uma

pergunta do futuro credor. Contratos literais são os que necessitam

da escrita Contratos consensuais são os que se perfazem pelo simples

consentimento das partes, independentemente de qualquer forma oral

ou escrita.

Os contratos podem ser classificados em diversas modalidades

segundo o critério que se adota, assim os contratos podem ser

classificados quanto aos seus efeitos, quanto à sua formação, quanto

ao momento de sua execução etc e claro que há também uma

diferença entre os autores, mas procuramos a seguir classificar os

Page 47: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

47

contratos segundo as divisões mais utilizadas, tanto pela doutrina

como, principalmente pelo legislador.

Quanto à natureza da obrigação entabulada:

1- Contratos unilaterais e bilaterais: A distinção se refere a carga

de obrigação no negócio jurídico e não ao número de

contratantes. Serão unilaterais se uma só das partes assumir

obrigações em face da outra; p. ex. comodato, mútuo, mandato,

depósito, etc. Serão bilaterais se cada contraente for credor e

devedor do outro, produzindo direitos e obrigações para ambos

(CC, art. 476); p. ex. compra e venda, troca, locação, etc. Os

contratos não são pela natureza bilaterais ou unilaterais, pois

as partes podem alterar a natureza primária de um contrato.

Assim, por exemplo, a doação pura e simples é contrato

unilateral, a doação com encargo passa a ser bilateral. Mesmo

exemplo no comodato e mútuo. A lei trata com maior rigor

aquele que não possui obrigação no contrato unilateral. Art.

392. Nos contratos benéficos, responde por simples culpa o

contraente, a quem o contrato aproveite, e por dolo, aquele a quem

não favoreça. Nos contratos onerosos, responde cada uma das

partes por culpa, salvo as exceções previstas em lei.

Os contratos bilaterais também são chamados de

sinalagmáticos, pois a obrigação de um tem por causa a do

outro. Utilizemos o exemplo do contrato de compra e venda, pois

conforme o próprio art. 481, um dos contraentes se obriga a

transferir o domínio e outro a pagar-lhe o preço.

Contratos plurilaterais.

Outra subclassificação desta espécie contratual é a que

identifica o contrato que se inicia unilateral e eventualmente

torna-se bilateral, identificando esta modalidade como Contrato

Page 48: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

48

Bilateral Imperfeito. Assim seria, bilateral imperfeito, o contrato

de depósito que no curso da contratação gerasse para o

depositante a obrigação de indenizar o depositário. Também

seria o contrato de comodato, que, iniciando-se unilateral,

poderia no curso do contrato surgir para o comodante a

obrigação de indenizar o comodatário pelas despesas realizadas.

2- Contratos onerosos e gratuitos: Os onerosos são aqueles que

trazem vantagens para ambos os contratantes, que sofrem um

sacrifício patrimonial correspondente a um proveito almejado; p.

ex: locação. Os gratuitos oneram somente uma das partes,

proporcionando à outra uma vantagem, sem qualquer

contraprestação; p. ex.: doação pura e simples (doação sem

encargo), comodato, mútuo sem pagamento de juros, depósito e

mandato gratuitos. Por isso esses contratos são também

denominados de contratos benéficos. Não retira a gratuidade a

previsão, p. ex., do mandante reembolsar o mandatário das

despesas (art. 675 a 681), nem a doação ser revogada por

ingratidão do donatário (art. 555). Há também uma distinção

lembrada por alguns autores entre o contrato gratuito e o

contrato desinteressado. Aqueles, como observa Carlos

Gonçalves, acarretam uma diminuição patrimonial a uma das

partes, estes, não produzem esse efeito, malgrado beneficiem a

outra parte.44Seria então exemplo do contrato gratuito, a doação

pura e exemplo do contrato desinteressado, o comodato.

Há uma relação direta entre os contratos bilaterais e onerosos e

os contratos unilaterais e gratuitos. Mas haveria a possibilidade

dos contratos bilaterais serem gratuitos e os unilaterais serem

onerosos? Todos os contratos bilaterais são onerosos, mas nem

todos os contratos unilaterais são gratuitos, p. ex., o mútuo

feneratício, em que se convenciona o pagamento de juros.

44 In Direito Civil Brasileiro, V. III, p. 93.

Page 49: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

49

Geralmente os contratos gratuitos são intuitu personae, pois a

pessoa do contratante beneficiado no contrato é essencial, doa-

se para aquela pessoa, por isso nesses contratos, avultam de

importância, as questões atinentes ao erro quanto à pessoa e à

ingratidão do donatário. Faz-se diferença estes contratos com

relação a interpretação, pois de acordo com o art. 114 do CC, os

contratos benéficos sofrem interpretação restritiva Na revogação

do negócio por fraude contra credores, os contratos gratuitos são

tratados com maior rigor (art. 158 e 159). A doação não está

sujeita a evicção.

3- Contratos comutativos e aleatórios: Os comutativos são

aqueles em que cada contraente, além de receber do outro

prestação relativamente equivalente à sua, pode verificar, de

imediato, essa equivalência; p. ex.: compra e venda. Os

contraentes conhecem, ex redice, suas respectivas prestações.

Os aleatórios são aqueles em que a prestação de uma ou de

ambas as partes depende de um risco futuro e incerto, não se

podendo antecipar o seu montante (CC, arts. 458 a 461); p. ex.:

rifa, bilhete de loteria, seguro etc. O contrato aleatório funda-se

na álea, sorte, ao menos para uma das partes. O contrato pode

ser aleatório por sua própria natureza ou a álea pode resultar

da vontade das partes. São aleatórios por natureza os contratos

de seguro (arts. 757 ss), jogo e aposta (arts. 814 a 817),

incluindo-se nessa natureza as loterias, rifas, lotos e similares,

e o contrato de constituição de renda (arts. 803 a 813). Já um

contrato que normalmente é comutativo, como a compra e

venda, pode ser transformado em aleatório pela vontade das

partes, como a compra e venda para a aquisição de uma futura

colheita, são os contratos chamados de acidentalmente

aleatórios.

Arts. 458 a 461 CC

Page 50: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

50

A lesão e os contratos aleatórios.

Esta diferença também se faz importante porque, a doutrina

ressalta que somente os contratos comutativos estão sujeitos à

lesão. Porém havendo abuso exagerado de uma das partes,

mesmo no contrato aleatório pode ter campo a lesão.

Contrato aleatório e contrato condicional: O contrato aleatório

não se confunde com o contrato condicional, neste a condição é

aposta pelas partes como seu elemento acidental, quer seja ela

suspensiva ou resolutiva; nos contratos aleatórios, a incerteza é

seu elemento estrutural, ainda que colocado pela vontade das

partes. A incerteza, neste último, está ínsita à estipulação

aleatória, enquanto na condição, a incerteza, o fato incerto, pode

ou não ocorrer.

4- Contratos paritários e contratos por adesão: Os paritários são

aqueles em que os interessados, colocados em pé de igualdade,

ante o princípio da autonomia da vontade, discutem, na fase da

puntazione, os termos do ato negocial, eliminando os pontos

divergentes mediante transigência mútua. Os contratos por

adesão são aqueles em que a manifestação de vontade de uma

das partes se reduz a mera anuência a uma proposta da outra,

p. ex., contrato de transporte, de fornecimento de gás, água, etc.

Sílvio Venosa faz ainda outra distinção batizando-a de contrato-

tipo, aproxima-se de um contrato de adesão mas não é, aqui as

cláusulas ainda que predispostas, decorrem da vontade

paritária de ambas as partes. No contrato de adesão, segundo o

autor, as cláusulas apresentam-se predispostas a um número

indeterminado e desconhecido a priori de pessoas.45

Quanto à forma:

45 Direito Civil, V. II, p. 395.

Page 51: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

51

1- Contratos consensuais: que se perfazem pela simples anuência

das partes, sem necessidade de outro ato; p. ex., locação,

parceria rural,,etc.

2- Contratos solenes: que consistem naqueles para os quais a lei

prescreve, para a sua celebração, forma especial; p. ex., compra

e venda de imóvel (CC, art. 108, II).

3- Contratos reais: são aqueles que se ultimam com a entrega da

coisa, feita por um contraente a outro: p. ex.: comodato, mútuo,

depósito, arras.

Explica Carlos Roberto Gonçalves que os contratos reais exigem

para se aperfeiçoar, além do consentimento, a entrega (traditio)

da coisa que lhe serve de objeto, como os de depósito, comodato,

o mútuo, penhor, anticrese, arras, esses contratos, segundo o

autor, não se formam sem a tradição da coisa. Antes pode existir

promessa de contratar, mas não existe depósito, comodato ou

mútuo. A efetiva entrega do objeto não é fase executória, porém

requisito da própria constituição do ato.46

É por isso, ainda sob a explicação do autor, que os contratos

reais são unilaterais, visto que, entregue a coisa (quando o

contrato torna-se perfeito e acabado), só resta a obrigação para

o depositário, o comodatário e o mutuário.

Venosa utiliza outra forma de classificação, para o autor aos

contratos consensuais se opõe aos contratos reais e de outro

lado haveria a classificação entre contratos solenes, formais e

não formais.

Contratos solenes são segundo o autor aqueles cuja formalidade

tem caráter constitutivo, assim eles seriam além de formais,

46 Direito Civil Brasileiro. V. 3, p. 109.

Page 52: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

52

solenes. Entre nós o exemplo seria a escritura pública. Já os

formais seriam aqueles que a lei exige a forma escrita.47

Ver art. 215

Art. 109 . As partes podem por sua vontade determinar que um

contrato seja formal.

Uma norma processual civil que afeta diretamente ao

consensualismo dos contratos é a do art. 401 do CPC “A prova

exclusivamente testemunhal só se admite nos contratos cujo

valor não exceda ao décuplo do maior salário-mínimo vigente no

país, ao tempo em que forem celebrados.

Essa disposição normativa impõe indiretamente um formalismo

aos contratos acima de 10 s.m., pois para que as partes possam

provar a relação contratual estabelecida entre ambas é

necessário um formalismo, que o contrato seja escrito, não se

admitindo o contrato exclusivamente verbal.

Claro que também se discute a validade desta disposição,

mesmo entre os processualistas há discussão se isso não

afetaria o princípio da liberdade na produção das provas.

Quanto à sua denominação:

1- Contratos nominados ou típicos: que abrangem, as espécies

contratuais que têm nomen juris e servem de base à fixação dos

esquemas, modelos ou tipos de regulamentação específica da lei;

p. ex.: compra e venda, troca, doação, locação, empréstimo,

parceria rural, etc.

47 “Alguns autores não distinguem a formalidade da solenidade, tratando-as como sinônimos, contudo as

conseqüências jurídicas da distinção são importantes. O contrato solene entre nós é aquele que exige

escritura pública. Outros contratos exigem a forma escrita, o que os torna formais, porém não solenes. No

contrato solene, a ausência da forma torna-o nulo. Nem sempre ocorrerá a nulidade, e a relação jurídica

gerará efeitos entre as partes, quando se trata de preterição de formalidade, em contrato não solene.”,

inVenosa, p. 427.

Page 53: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

53

2- Contratos inominados ou atípicos: que se afastam dos modelos

legais, pois não são disciplinados ou regulados expressamente

pelo Código Civil ou por lei extravagante, porém são permitidos

juridicamente, desde que não contrariem a lei e os bons

costumes, ante o princípio da autonomia da vontade e a

doutrina do número apertus em que se desenvolvem as relações

contratuais; p. ex.: contrato sobre exploração de lavoura de café,

cessão de clientela, contrato de locação de caixa forte etc. Ver

art. 425 do CC.

Quanto ao tempo de sua execução:

1- Contratos de execução imediata ou instantânea: são os que se

esgotam num só instante, mediante uma única prestação; p.ex.:

troca,compra e venda à vista.

2- Contratos de execução continuada ou de trato sucessivo: são

os que se cumprem por meio de atos reiterados, ocorrem quando

a prestação de um ou de ambos os contraentes se dá a termo; p.

ex.: compra e venda a prazo, fornecimento periódico de

mercadorias. Tais contratos são os que sobrevivem com a

persistência da obrigação, muito embora ocorram soluções

periódicas, até que, pelo implemento de uma condição ou

decurso de um prazo, cessa o próprio contrato; p. ex.: locação

de coisa ou de serviço e contrato de fornecimento de matéria-

prima;

3- Contratos de execução diferida ou retardada: são os que

devem ser cumpridos também em um só ato, mas em momento

futuro, p. ex. a entrega em determinada data do objeto

alienado.48

48 Gonçalves, Direito Civil Brasileiro, p. 101.

Page 54: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

54

O interesse prático desta classificação ocorre por diversas razões:

a) Aplicação da teoria da imprevisão (art. 478 a 480 CC);

b) Aplicação da exceptio non adimpleti contractus;

c) Efeitos da resolução do contrato (no de execução imediata a

nulidade ou resolução reconduz as partes ao estado anterior,

enquanto nos de execução continuada, respeitam-se os efeitos

já produzidos);

d) A prescrição da ação para exigir o cumprimento das prestações

vencidas, nos contratos de trato sucessivo, começa a fluir da

data do vencimento de cada prestação.49

Quanto à pessoa do contratante:

1- Contratos pessoais: são aqueles em que a pessoa do contratante

é considerada pelo outro como elemento determinante de sua

conclusão, são também chamados contratos intuitu personae.

2- Contratos impessoais: são aqueles em que a pessoa do

contratante é juridicamente indiferente.

Dois elementos nos chama a atenção nesta classificação: primeiro

a morte, que é para os contratos pessoais causa de extinção,

segundo a fungibilidade da prestação, os contratos pessoais são

infungíveis, assim o seu descumprimento leva à resolução do

contrato.

Alguns autores como Fábio Ulhôa também realizam esta

classificação:

Segundo o ramo jurídico de regência

49 Gonçalves, p. 102.

Page 55: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

55

Contratos administrativos: Os contratos que possuem como uma

das partes uma pessoa jurídica de direito público são denominados

contratos da administração. Nem todo contrato da administração

pode ser classificado como contrato administrativo.

Há contratos que a administração pública celebra que são regidos

pelo direito privado, em que o poder público atua no mesmo plano

jurídico do particular. Exemplos: contratos de locação, compra e

venda, doação, etc.

Os contratos administrativos são uma modalidade de contrato

celebrado pela administração pública regulada pelo direito público,

lhe conferindo poderes especiais para assegurar a supremacia do

interesse público sobre o particular. Essas clausulas especiais são

denominadas clausulas exorbitantes.

A Lei 8.666 de 21/06/1993 enumera em seu art. 58 essas

prerrogativas da administração nos contratos administrativos, o

que inclui os poderes de alteração unilateral do contrato, rescisão

unilateral, fiscalização da execução do contrato, aplicação de

sanções, ocupação provisória de bens, pessoas e serviços

vinculados ao objeto do contrato.

Cabe a administração escolher se contratará utilizando as normas

de direito público (contratos administrativos) ou de direito privado,

nesse sentido, José dos Santos Carvalho Filho esclarece:

(..)Não se pode descaracterizar o contrato

de natureza privada, se foi este o tipo de

pacto eleito pela Administração, até

porque, se ela o desejasse, firmaria

contrato administrativo de concessão de

Page 56: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

56

uso. Trata-se, pois, de opção

administrativa50.

Contrato de trabalho: A CLT define o contrato de trabalho no

artigo 442: “Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou

expresso, correspondente à relação de emprego”.

Relação de emprego, por sua vez, está definida no artigo 3º da CLT.

Consiste na prestação de serviços por pessoa física para

empregador, desde que realizado com habitualidade, mediante

pagamento e sob ordens do empregador.

É na caracterização da relação de emprego que diferenciamos o

contrato de trabalho do contrato de prestação de serviços. Se faltar

algum requisito para configurar a relação de emprego, não se trata

de contrato de trabalho.

A profissão não é um fator determinante para verificar se estamos

diante de um contrato de trabalho. Um advogado, por exemplo,

pode tanto trabalhar mediante contrato de trabalho (quando é

empregado de um escritório de advocacia ou de uma empresa),

como mediante prestação de serviços (quando é contratado para

cuidar de uma causa, realizar consulta jurídica, etc), a diferença

nesse caso está em obedecer ordens: o advogado que presta serviço

age conforme a sua vontade, não necessita de autorização para

escolher as horas que dedicará ao processo, que se dirigirá ao

fórum, ou para definir os processos prioritários.

O contrato de trabalho, via de regra, é um contrato de adesão, são

raros os casos de empregados que podem negociar livremente seu

contrato de trabalho. Normalmente o empregado simplesmente

adere às condições impostas pela empresa.

50 CARVALHO FILHO, José dos Santos, Manual de Direito Administrativo, 24ª ed. Rio de Janeiro:

Lumen Juris. 2011. Pág. 175.

Page 57: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

57

Há um nítido desequilíbrio de poder entre o empregado e o

empregador. Para corrigir esse desequilíbrio o contrato de trabalho

deve obedecer aos parâmetros mínimos estipulados pela legislação

trabalhista. Ou seja, não é permitido convencionar férias anuais

com duração de 10 dias, já um período de 45 dias é permitido.

Contrato de consumo (consumerista): O contrato de consumo já

foi definido anteriormente, para onde remetemos o leitor nesse

momento;

Contrato comercial: art. 966 CC (Os contratantes são todos

empresários, isto é, exercem profissionalmente atividade

econômica organizada para produção ou a circulação de bens ou

de serviços).

Segundo a liberdade de contratar

Voluntários

Necessários: ex. energia, água etc.

Ainda sobre a classificação dos contratos há algumas

denominações principalmente utilizadas pela doutrina, vamos citar

duas:

Contratos sob condição potestativa

Contrato consigo mesmo ou autocontrato.

CONTRATOS RECIPROCAMENTE CONSIDERADOS

1- Contratos principais: são os que existem por si, exercendo sua

função e finalidade independentemente de outro

Page 58: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

58

2- Contratos acessórios: são aqueles cuja existência jurídica supõe

a do principal, pois visam assegurar a sua execução; p. ex.:

fiança, sub-locação.

OUTRAS CLASSFICAÇÕES

AUTOCONTRATO OU CONTRATO CONSIGO MESMO

CONTRATO SOB CONDIÇÃO POTESTATIVA

CONTRATO PRELIMINAR

Page 59: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

59

6.0 FORMAÇÃO DO CONTRATO

Na realização de um contrato, via de regra, antecede-se vários

momentos. É claro que estes muitas vezes acontecem reunidos sem

que se possa muitas vezes distingui-los, mas se pudéssemos analisar

pausadamente esses momentos veríamos que a formação de um

contrato se divide em fases.

Desta forma o contrato é o resultado de uma série de fases, chamadas

de fases da formação do vínculo contratual, que são51:

Negociações preliminares

Proposta ou policitação

Aceitação

Conclusão

6.1 NEGOCIAÇÕES PRELIMINARES

A primeira fase identificada na formação do contrato são as

negociações preliminares, ou fase de puntuazione, para nós a fase

de pontuação.

Todos antes de contratar negociam, mesmo que solitariamente

analisando se devem ou não realizar aquele negócio.

Mas a negociação que chama a atenção para o direito é aquela que

ocorre bilateralmente, numa dinâmica de atos, conversas,

ponderações, análise do objeto contratado etc. Como bem resume

Carlos Gonçalves “O processo denominado negociações

preliminares nada mais é do que a dinâmica sucessão de propostas

51 Nesse ponto a doutrina consente, assim Maria Helena, Carlos Roberto, Pablo Stolze, Caio Mário...

Page 60: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

60

não vinculativas e contrapropostas que paulatinamente leva ao

encontro de vontades”.

A grande discussão que se coloca atualmente em relação às

negociações preliminares é sobre o surgimento de obrigações nessa

fase: estariam as partes obrigadas a agir dentro de determinada

forma sob pena de responder por isso? Estariam obrigadas a

prestar determinadas informações sob pena de responsabilidade?

Estariam por fim obrigadas a contratar se não agissem de

determinada maneira?

A característica básica dessa fase no dizer de Pablo Stolze, é

justamente a não vinculação das partes a uma relação jurídica

obrigacional.52

Mas dizer que as partes não estão vinculadas a uma relação

jurídica obrigacional não quer dizer que não tenham obrigações.

Já se foi o tempo que negociar era um ato sem nenhuma

responsabilidade, hoje exige-se das partes um comportamento

condizente com o princípio da boa-fé objetiva: ou seja, exige-se que

as partes ajam de maneira ética, proba, que prestem as

informações necessárias para o negócio, que sejam leais.

Não se tolera mais a conta do levar vantagem, do fazer um bom

negócio ou mesmo do agir sem responsabilidade, causar dano a

outro, ou frustrar uma expectativa legítima que se criou na outra

parte.53

É por isso que sobram decisões judiciais em todos os Tribunais do

país e também nos tribunais superiores acatando condenações às

52 Novo Curso de Direito Civil, Vol. 4, Tomo 1, p. 131.

53 Com muita propriedade afirmam Stolze e Pamplona “Dizer, portanto, que há direito subjetivo de não

contratar não quer dizer que os danos daí decorrentes, não devam ser indenizados, haja vista que, como

vimos, independentemente da imperfeição da norma positivada, o princípio da boa-fé objetiva, também é

aplicável a esta fase pré-contratual, notadamente os deveres acessórios de lealdade e confiança recíprocos”.

Op. Cit., p. 131.

Page 61: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

61

partes nesta fase da formação do contrato quando – apesar de não

obrigadas a contratar – deixaram de agir conforme os preceitos da

boa-fé objetiva.

Veja nesse caso:...

Também é de se observar que o rompimento das negociações

preliminares, ou tratativas, traz responsabilidades nos diversos

contratos, não só os contratos civis e de consumo, mas, como no

caso dessa interessante decisão, nos contratos trabalhistas:

“RESPONSABILIDADE PRÉ-CONTRATUAL - ARTS. 927, 186 E 187 DO CCB -

PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA - ARTS. 113, 187 E 422 DO CCB - TRATATIVAS

PRÉ-CONTRATUAIS - POLICITAÇÃO - CRIAÇÃO DE EXPECTATIVA DE

CONTRATAÇÃO FRUSTRADA POR ABUSO NO DIREITO DE CONTRATAR -

PRINCÍPIO DA APTIDÃO DA PROVA - DEVER DE INDENIZAÇÃO IMPOSITIVO

Consoante princípio da boa-fé objetiva, previsto nos arts. 113, 187

e 422 do Código Civil, aplicável à generalidade das espécies

contratuais, inclusive trabalhistas, as partes devem agir em

conformidade com parâmetros razoáveis de boa-fé, tratando o contratante

como parceiro e buscando relação de cooperação, boa-

fé objetiva esta que deve informar todas as fases do contrato, inclusive

as fases pré-contratuais. Logo, ainda que um dos pilares do direito contratual seja

o princípio da liberdade de contratar, quando verificado o abuso no exercício de tal

direito, possível se

evidencia a responsabilização civil quando da conduta abusiva decorrer

um dano a direito ou interesse da parte inocente. Demonstradas, no caso,

as tratativas empregatícias na sua fase pré-contratual - policitação-, bem assim

transgredido o dever das partes de agir de forma correta e honesta, antes, durante

e após a extinção da relação contratual - obrigação atualmente adotada

expressamente como cláusula geral no art. 422 do CC -, impositivo

o reconhecimento do direito ao ressarcimento pelo autor, não contratado

pela empresa que nele criou uma expectativa real nesse sentido. Sentença

reformada para se condenar a ré ao

pagamento de indenização a título de responsabilidade pré-contratual. TRT-

PR-00506-2008-024-09-00-5-ACO-27977-2008 -

4A. TURMA - Relator: SUELI GIL EL-RAFIHI - DJPR 08/08/2008”.

Page 62: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

62

A boa-fé objetiva, como observado pela magistrada nesta decisão

trabalhista, é uma cláusula geral, aplicável a todas as relações

contratuais, não somente às relações civis.

6.2 PROPOSTA OU POLICITAÇÃO

Consiste a proposta, na oferta de contratar que uma parte faz à

outra, com vistas à celebração de determinado negócio.54

Se com relação às negociações preliminares não havia diferenças

entre os contratos civis e de consumo, com relação à proposta

existe, a começar pela terminologia que no CDC chama-se oferta.

Assim, comecemos pelo CC.

6.2.1 PROPOSTA NO CC

Dizem os autores que ela deve ser séria e concreta, para que

efetivamente possa se revestir de força vinculante, pois conforme,

o art. 427 do CC, a proposta de contrato obriga o proponente.

São consideradas suas características:

é uma declaração unilateral;

reveste-se de força vinculante;

é um negócio jurídico receptício (pois não é apenas uma

informação);

deve conter todos os elementos do negócio jurídico;

é elemento inicial do contrato.

Apesar de ser obrigatória, o próprio legislador retira a sua

obrigatoriedade quando nos arts. 427 e 428 estabelece que:

I- se o contrário não resultar dos temos dela(427);

II- se o contrário não resultar da natureza da obrigação (427);

54 Stolze, p. 132.

Page 63: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

63

III- se o contrário não resultar das circunstâncias do caso (427);

IV- se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita.

Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por

meio de comunicação semelhante (428);

V- se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente

para chegar a resposta ao conhecimento do proponente (428);

VI- se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta dentro do

prazo dado (428);

VII- se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra

parte a retratação do proponente (428).

As 3 primeiras hipóteses, previstas no próprio art. 427, parecem

criar regras gerais, exceções baseadas até no bom senso dos

negócios.

A primeira estabelece que a proposta deixará de ser obrigatória se

o contrário não resultar dos termos dela: podemos exemplificar com

expressões comumente utilizadas em propostas, que nesse caso –

não obrigando- seria apenas informação: “não vale como proposta”;

“sujeita a confirmação”; “apenas para divulgação”.

A segunda estabelece que a proposta deixará de ser obrigatória se o

contrário resultar da natureza do negócio:

E, por último, a proposta deixará de ser obrigatória se o contrário

resultar das circunstâncias do caso: essa, por sua vez, parece ser

aquelas normas de encerramento, estabelecidas, para prevê outros

casos não citados pelo legislador.

O art. 428 por sua vez é uma norma que não faz sentido constar do

código e que a sua permanência só se explica, pela cômoda

reprodução de regras do CC anterior, mesmo que desprovidas de

aplicação prática ou de uma necessária atualização.

Page 64: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

64

De uma atualização é o que necessitava o art. 428, pois o seu texto

no CC/16 tratava do envio de proposta por correspondência, fato

que não existe mais hoje, ou alguém imagina que uma pessoa envia

a outra uma proposta pelo correio? Se sim, é para estes que se

destina o art. 428, o que também poderia ter sido facilmente

resolvida pela própria exceção da parte final do art. 427 (quando as

circunstâncias do caso assim indicarem).

De qualquer maneira temos que dar um sentido a essas regras

aplicando-a a esse universo contratual que nos encontramos,

inclusive aos contratos cuja formação ocorre por meios eletrônicos.

O art. 428 do CC separa a proposta realizada entre pessoas

presentes (inter praesentes) e pessoas ausentes (inter absentes)

para estabelecer suas regras.

Seriam presentes as pessoas que contratam através de contato

direto e simultâneo, ou presentes fisicamente falando uma com a

outra ou, por exemplo através de telefone e seriam ausentes as

pessoas que não mantém contato direto e imediato entre si, como

as que contratam por carta.

Para as pessoas presentes estabelece apenas uma regra o

legislador, que sendo feito a proposta sem prazo e esta não for

imediatamente aceita, deixa de ser obrigatória (art. 428, I).

Para as pessoas ausentes estabelece as regras seguintes do art.

428, que dispensa comentários pois os artigos são excessivamente

explicativos.

6. 3.OFERTA NO CDC

O CDC em terminologia que lhe é mais apropriada refere-se a oferta

no lugar de proposta, pois esta parece sempre querer indicar um

Page 65: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

65

destinatário certo enquanto aquela atinge um número

indeterminado de pessoas.

E trata com muito mais rigor da oferta, inserindo-a dentro do

Capítulo denominado PRÁTICAS COMERCIAIS (arts. 29 a 45).

Estabelece a lei em seu art. 30 que “Toda informação ou publicidade,

suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de

comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou

apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se

utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.”

Por sua vez para o consumidor que for lesado no descumprimento

da oferta, surgem 3 possibilidades: exigir o cumprimento forçado

da obrigação; aceitar outro produto ou serviço ou rescindir o

contrato. (art. 35).

Veja, como dissemos acima, o CDC trata com mais rigor a oferta ou

mais propriamente a recusa da oferta, pois permite até mesmo o

cumprimento forçado do contrato e as outras possibilidades

representam apenas alternativas ao consumidor.55

Questão interessante é quando ocorre um erro no anúncio. Imagine

que uma grande loja varejista anuncie um produto por um preço

bem inferior ao de mercado, por um erro de digitação seja publicado

R$100,00 ao invés de R$1.000,00. Ela estaria mesmo assim

obrigada a cumprir a oferta?

Há decisões entendendo que nestes casos de erros grosseiros o

fornecedor não está obrigado a cumprir o contrato, pois, exige-se

não só do fornecedor mas também do consumidor que haja com

55 “Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou

publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua escolha: I- exigir o cumprimento forçado da

obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade; II- aceitar outro produto ou prestação de

serviço equivalente; III- rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente

antecipada, monetariamente atualizada, e as perdas e danos.”

Page 66: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

66

boa-fé, aproveitar-se de um erro no anúncio para levar vantagem é

agir com deslealdade.56

E nos contratos civis, sendo também a proposta obrigatória,

haveria a possibilidade de se exigir o cumprimento forçado da

obrigação, por exemplo, através de uma ação de obrigação de fazer?

Não, isso não é possível nos contratos civis. Mesmo sendo a

proposta obrigatória, caso o proponente desista ou se arrependa do

negócio, não pode o aceitante, exigir, mesmo judicialmente o

cumprimento do contrato.

6.3 ACEITAÇÃO

Características:

I- não exige obediência a determinada forma (expressa ou

tácita);

II- a aceitação deve ser oportuna;

III- a aceitação deve corresponder a uma adesão integral;

IV- a resposta deve ser conclusiva e coerente (se for adicional

equivale a uma nova proposta)

Retratação do aceitante:

V- Art. 433 CC

56 Veja esta decisão de MG: “Compra e venda pela internet. Aquisição de bem móvel. Erro no anúncio.

Valor informado é inferior ao que realmente vale a mercadoria, o que impossibilitou a conclusão da compra

e entrega do bem adquirido. Pedido de indenização por dano moral e material, visto caracterização de

descumprimento do preceituado na legislação consumeirista quando da não entrega do produto, com a

inteligência dos arts. 30 e 31 do CDC. Indeferimento do pedido indenizatório ante a disparidade do valor

anunciado e o valor real do produto, ainda mais quando o consumidor é expert e saberia facilmente

identificar tal equívoco. O requisito da boa-fé exigido ao fornecedor também se aplica ao consumidor sob

pena de violação do princípio da boa-fé contratual e seu enriquecimento sem causa. (Ap. Cível n°

1.0701.12.014686-8/001- Uberaba – MG, j. 7/8/2013)

Page 67: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

67

6.1 CONCLUSÃO

Assim, como ensina Fábio Ulhôa Coelho, o contrato nasce da

convergência da proposta e aceitação. É portanto, negócio jurídico

bilateral resultante do encontro de negócios jurídicos unilaterais.

Momento da conclusão:

Teorias:

6.1.1 teoria da informação ou cognição (quando o

ofertante tem ciência da aceitação);

6.1.2 teoria da agnição ou declaração:

6.1.2.1 declaração propriamente dita (o

aceitante formula a resposta);

6.1.2.2 expedição (o aceitante envia a resposta)(

art. 434, caput)

6.1.2.3 recepção (a resposta chega ao destino).

6.5 LUGAR DO CONTRATO

Por último estabelece o art. 435 do CC que “Reputar-se-á celebrado o

contrato no lugar em que foi proposto”.

Se para a conclusão do contrato parece ter adotado o legislador a

teoria da declaração, considerando a expedição da resposta, para o

lugar do contrato, prevaleceu o lugar da proposta.57

57 Conforme Maria Helena Diniz, o código civil, apesar de ter adotado, sob o ponto de vista do tempo, a

teoria da expedição da resposta, quanto ao lugar determinou que o contrato será tido como celebrado no

local em que se deu a oferta, in Curso, v. 3, p. 84.

Page 68: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

68

Lembra a prof. Maria Helena Diniz, que o local do contrato é

especialmente importante para o direito internacional privado, pois

dele depende a apuração do foro competente e da lei à ser aplicada.58

Nesse sentido a LICC estabelece no art. 9°, §2° que a obrigação

resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o

proponente.

Mas, lembra-nos com propriedade o prof. Sílvio Venosa do princípio

da autonomia da vontade e dentro deste as partes contratantes podem

estabelecer a lei aplicável como também o foro competente para dirimir

litígios.59

Assim a regra da lei de introdução citada acima se aplicaria na lacuna

do contrato.

6.5.1 Foro de eleição nos contratos civil

Avulta de importância em matéria contratual a escolha das partes do

local competente para resolver os litígios oriundos do contrato,

conhecida esta como: CLÁUSULA DE FORO DE ELEIÇÃO.

Porém hoje em tempos de solução do conflito por meio extrajudicial

temos que lembrar da possibilidade das partes optarem pela

arbitragem, inserindo nesta caso a CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA.

Nestes termos poderíamos para efeitos didáticos dividir a cláusula de

foro de eleição em judicial e extrajudicial.

JUDICIAL

FORO DE ELEIÇÃO{

EXTRAJUDICIAL (CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA)

58 Op. Cit., p. 84.

59 Direito Civil, V. II, p. 537.

Page 69: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

69

A escolha das partes do local em que será resolvido o litígio é uma

prática extremamente comum nos contratos e autorizada pelo art. 111

do CPC.

Assim, poderia haver uma descoincidência entre o lugar do contrato e

o foro de eleição escolhido pelas partes, ou em outras palavras, poderia

se assinar o contrato em São Paulo e estabelecer o foro de eleição em

Curitiba.

Uma questão interessante seria a possibilidade de se invalidar uma

cláusula de foro de eleição que prejudicasse demasiadamente uma das

partes em detrimento da outra.

No Código de Defesa do Consumidor como veremos, isso é possível,

pois o foro de eleição não pode prejudicar a defesa do consumidor em

juízo.

Mas em se tratando de contrato civil a questão já fica um pouco mais

difícil, seja pela maior valorização da autonomia da vontade, que, em

última análise repercute numa intervenção menor do judiciário no

contrato.

Mas também não podemos esquecer que não há somente contratos de

adesão nas relações de consumo, as relações civis também tem se

tornado propícias a esse tipo de contratação, aquela visão do contrato

como objeto de uma negociação das partes, de tratativas, de minutas,

até desenhar o modelo definitivo do contrato, é uma visão quase que

romantizada deste, o contrato mesmo o civil é, via de regra, imposto

pela parte mais forte. Basta citarmos como exemplo os contratos de

locação, dificilmente o locatário consegue impor as suas condições no

contrato, principalmente quando há uma imobiliária contratada pelo

locador e intermediando o negócio.

Diz-se isso para que possamos refletir sobre o foro de eleição nos

contratos civis de adesão, aplicando-lhe por analogia os arts. 423 e

424 do CC.

Page 70: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

70

Será que não podemos reconhecer como nula uma cláusula de foro de

eleição num contrato civil e de adesão que prejudica a parte lesada a

obter a reparação de seu direito?

É só imaginarmos um contrato de prestação de serviço onde uma

pequena empresa de informática presta para uma grande empresa

seus serviços. Por essa empresa ter várias filiais no país e matriz em

São Paulo, estabeleceu-se apesar do lugar do contrato ser Vitória-ES,

o foro de eleição em São Paulo. Havendo valores a receber pela

contratada, esta não poderia a despeito do foro de eleição contratual,

propor a ação em Vitória?

Acreditamos que sim, principalmente se isto não trouxer prejuízo para

a outra parte do contrato, mas trouxer prejuízo para a parte lesada

que quer buscar os seus direitos, nesse caso o lugar do contrato

poderia ser, em nossa análise, um foro concorrente.

Foro de Eleição Extrajudicial (CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA)

A Lei 9.307 que regulou a partir de 1996 a arbitragem no país dispôs

em seu art. 4° que “A cláusula compromissória é a convenção através

da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à

arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal

contrato”.

Sendo assim podem as partes optar pela solução arbitral do litígio do

contrato estabelecendo em uma cláusula esta possibilidade, desde que

nos termos do art. 1° da Lei o objeto envolva direitos patrimoniais

disponíveis.

Como dissemos acima, neste caso teríamos um foro de eleição

extrajudicial, pois o conflito neste caso não seria resolvido

judicialmente mas extrajudicialmente pela arbitragem.

Page 71: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

71

Os contratos como regra envolvem direitos patrimoniais disponíveis,

pois os direitos indisponíveis não podem ser contratados, se bem que

a discussão sobre isso iria longe, pois cansamos de ver direitos

indisponíveis como os alimentos de menores serem contratados em

acordos judiciais.

Os direitos podem ser patrimoniais e não patrimoniais, podem ser

disponíveis e indisponíveis.

A lei uniu dois critérios, é necessário que seja patrimonial e disponível.

A isso se prestam a maioria dos contratos, contrato de locação,

contrato de compra e venda, contrato de prestação de serviço,

contratos de empréstimos etc

A cláusula compromissória por sua vez pode ser vazia ou cheia.

Vazia é a cláusula que apenas indica a arbitragem como forma de

solução dos litígios relacionados ao contrato, cheia é a cláusula que

além disso indica o órgão arbitral que irá solucionar o litígio (p. ex. a

câmara arbitral) ou indica o árbitro.

6.5.2 Foro de eleição nos contrato de consumo (art. 6, VIII)

6.6. PUBLICIDADE DO CONTRATO

Contrato de gaveta, negócio simulado (art. 167 CC)

Page 72: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

72

7.0 EFEITOS DO CONTRATO (classificação segundo Maria

Helena Diniz):

O principal efeito do contrato consiste em criar obrigações,

estabelecendo um vínculo jurídico entre as partes contratantes.60

1- Efeitos jurídicos decorrentes da obrigatoriedade do contrato

Para Maria Helena Diniz da força vinculante dos contratos decorre:

a) Cada contratante fica ligado ao contrato, sob pena de execução

ou de responsabilidade por perdas e danos;

b) O contrato deve ser executado como se fosse lei para os que o

estipularam;

c) O contrato é irretratável e inalterável;

d) O juiz, ante a equiparação do contrato à lei, ficará adstrito ao

ato negocial.61

2- Efeitos do contrato quanto à sua relatividade { gerais e

particulares

Quanto aos efeitos do contrato do ponto de vista subjetivo, deve-se

lembrar:

a) O contrato em regra somente obriga as partes contratantes, não

alcançando terceiros, pois não lhes aproveita nem prejudica;

b) A obrigação contratual, exceto a personalíssima, é passível de

transmissão ativa e passiva aos sucessores a título universal e

particular das partes;

60 Curso de Direito Civil, p. 123.

61 in Diniz, Maria Helena, Curso, p. 124.

Page 73: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

73

c) O princípio da relatividade sofre exceções, quando o contrato

ultrapassa as partes que nele intervierem, atingindo terceiros

que não o estipularam;

d) A eficácia do contrato também é relativa ao objeto, pois dele

surgem obrigações de dar, de fazer ou de não fazer.62

2.1 Efeitos gerais{ em relação aos contratantes

quanto aos seus sucessores { a título universal e a

título singular

relativamente a terceiros{ estipulação em favor de

terceiro

da promessa de fato de

terceiro

contrato com pessoa a

declarar

relatividade quanto ao objeto da obrigação

2.2 Efeitos particulares do contrato{ direito de retenção

exceptio non adimpleti contractus

vícios redibitórios

evicção

arras

7.1 EFEITOS GERAIS RELATIVAMENTE A TERCEIROS:

Terceiros no direito contratual são aqueles que não participaram

do negócio, e por isso o contrato não pode prejudicá-los.

Nesse aspecto as 3 figuras abaixo (estipulação em favor de terceiro;

promessa de fato de terceiro e contrato com pessoa a declarar)

62 Op. Cit. p. 124.

Page 74: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

74

representam exceções ao princípio da relatividade dos efeitos do

contrato.

7.1.1 DA ESTIPULAÇÃO EM FAVOR DE TERCEIRO

(art. 436-438)

“Dá-se a estipulação em favor de terceiro quando, num contrato

entre duas pessoas, pactua-se que a vantagem resultante do ajuste

reverterá em benefício de terceiro, estranho à convenção e nela não

representado”.63

Na estipulação de terceiro podemos verificar os seguintes

personagens:

estipulante – promitente – terceiro(beneficiário)

Onde:

Estipulante é o promitente a promessa em favor de

que obtém do terceiro

O exemplo clássico da estipulação em favor de terceiro é o seguro

de vida. Neste o contratante (estipulante) obtém do contratado

(seguradora/promitente) a promessa em favor de terceiro

(beneficiário do seguro).

Mas são também exemplos desse contrato: doação com encargo

(nas doações modais, o donatário se obriga para com o doador a

executar o encargo em benefício de certa pessoa) e os acordos

estabelecidos entre marido-mulher beneficiando o filho do casal na

separação de ambos.64

O terceiro (beneficiário) não é parte na contratação, mas pode exigir

o seu cumprimento, conforme art. 438, e aqui reside a

63 Sílvio Rodrigues, p. 91.

64 Por exemplo quando estabelecem que o imóvel que está financiado continuará sendo pago e ao final

será transferido ao filho.

Page 75: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

75

peculiaridade deste contrato. O terceiro que sequer participou da

relação contratual – logo não é contratante – , e muitas vezes,

sequer tem conhecimento desse efeito que lhe favorece, torna-se

parte legítima para exigir o cumprimento do contrato.

Dessa forma surgem 3 efeitos desse contrato:

7.2 as relações entre estipulante e promitente

7.3 as relações entre promitente e terceiro

7.4 as relações entre estipulante e terceiro beneficiado

Art. 437- Se não constar esta cláusula a qualquer tempo o

estipulante pode exonerar o devedor e a exoneração do obrigado

equivale à revogação do negócio jurídico.

Art. 438 – Para Sílvio Rodrigues este artigo só se aplica quando

a estipulação for por liberalidade;

§ único, 436 – Para Venosa o texto não é suficientemente claro,

porque, ao anuir no contrato, deixa o estranho de ser terceiro.

E, mesmo que não tenha havido anuência, o promitente não

pode ser obrigado a cumprir mais do que se comprometeu.

7.1.2 DA PROMESSA DE FATO DE TERCEIRO (art. 439-

440)

Há uma obrigação de fazer (conseguir ato de terceiro).

O promissário não beneficia terceiro, mas se responsabiliza por

uma prestação de terceiro. Pois ninguém pode vincular terceiro a

uma obrigação. A pessoa só se torna devedora de uma obrigação

ou por manifestação de sua própria vontade, ou por força de lei, ou

em decorrência de ato ilícito por ela praticado.

Page 76: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

76

Mas não há iliceidade no ato do promitente, que apenas se vincula

a uma obrigação de fazer, ou seja, a de conseguir o ato de terceiro.

Promitente – contratante – terceiro

Art. 440 – A assunção da obrigação pelo terceiro libera o

promitente.

7.1.3 CONTRATO COM PESSOA A DECLARAR ( 467 a 471)

Um dos contratantes tem o interesse em fazer-se substituir por

pessoa cujo nome pretende ocultar, embora tal substituição possa

não ocorrer.

Ex. compromisso de compra e venda de imóveis, nos quais ao

promissário comprador atribui-se a faculdade de indicar terceiro

para figurar na escritura definitiva.

Cláusula pro amico eligendo

Stipulans – promittens- electus

*Efeitos gerais relativo ao objeto da obrigação

Em nosso direito o contrato não produz efeitos reais, translativos

de propriedade.

7.2 EFEITOS PARTICULARES:

VÍCIO REDIBITÓRIO E EVICÇÃO

As obrigações do alienante, do transmitente da coisa não terminam

com a entrega da res, esse realiza ao adquirente 3 garantias:

1- o transmitente abstém-se da prática de qualquer ato que

implique turbação do direito transmitido;

Page 77: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

77

2- o transmitente garante que o adquirente não será turbado no

exercício do direito por atos espoliativos emanados de terceiros,

decorrentes de causas anteriores à transmissão (se o terceiro

triunfa e obtém a coisa para si, o alienante tem a obrigação de

indenizar o adquirente pela perda);

3- o alienante assegura a materialidade idônea da coisa,

garantindo o adquirente de vícios ocultos.

A lei preocupa-se, tradicionalmente, em disciplinar os vícios de fato

(redibitório) e de direito (evicção) na coisa transferida.

Quando falamos em vicio redibitório evicção referimo-nos não

somente à transmissão da propriedade mas também da posse,

assim o transmitente pode ser o vendedor, o locador, o comodante,o

doador etc.

Iniciemos com o vício redibitório.

Aqui temos uma diferença no tratamento do instituto em se

tratando de CC ou de CDC.

O CC tradicionalmente denomina este instituto como Vício

Redibitório, por sua vez, o CDC não se utiliza dessa denominação,

fala somente em Vício e Defeito.

Mas trata-se do mesmo instituto pois ambos visam proteger o

adquirente de um bem de suas imperfeições.

Iniciemos com o estudo do instituto no CC.

7.2.1 VÍCIO REDIBITÓRIO ( arts. 441 a 446)

Diz-se que a coisa é viciada quando apresenta alguma

impropriedade, capaz de prejudicar ou comprometer seu pleno uso

ou diminuir-lhe o valor.65 Ou seja, não é qualquer vício, mas um

65 Fábio Ulhôa Coelho, Curso de Direito Civil, v. 3, p. 133.

Page 78: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

78

vício ou defeito oculto e não aparente. Para definir o vício oculto

leva-se em consideração o conhecimento do ‘homem médio’. Essa é

uma afirmação que prevalece para o CC e não para as relações de

consumo em que se aplica o CDC, que como veremos trata o vício

diferentemente.

A teoria dos vícios redibitórios visa aumentar as garantias do

adquirente sujeito a uma contraprestação, responsabilizando o

alienante pelos vícios ocultos do bem alienado. Presume-se que o

negócio não teria sido realizado, ou teria sido realizado de outra

forma se o adquirente soubesse do vício.66

Exemplos: automóvel que apresenta aquecimento excessivo do

motor;

prédio sujeito a freqüentes inundações em virtude das chuvas,

novilhas adquiridas para reprodução mas estéreis.

Como observa Venosa há legislação que disciplina este instituto

dentro da compra e venda, o nosso diferentemente generalizou a

sua aplicação.67

7.2.1.1 VÍCIO REDIBITÓRIO E ERRO

Apesar de aparentemente semelhante não pode ser confundido o

erro com o vício redibitório. Naquele o adquirente recebe uma coisa

por outra, o declarante forma uma convicção diversa da realidade,

a coisa em si não é viciada, o vício redibitório por sua vez decorre

da própria coisa, que é a verdadeiramente desejada pela parte, mas

66 Diz Maria Helena Diniz que o CC admitiu a teoria dos vícios redibitórios, a fim de aumentar as garantias

do adquirente sujeito a uma contraprestação, responsabilizando o alienante pelos vícios ocultos do bem

alienado, visto que o adquirente tem direito à utilidade natural da coisa.

67 Venosa, Direito Civil, V. II, p. 542.

Page 79: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

79

o adquirente não toma conhecimento do defeito porque o vício está

oculto. Sílvio Venosa nos conta o seguinte exemplo: “quem compra

um quadro falso, pensando que é verdadeiro, incide em erro, quem

compra um quadro que apresenta fungos invisíveis, e, após a

aquisição vem a mofar, estará perante um vício redibitório.68

E daí, havendo erro, a regra jurídica aplicável é outra.

O erro é um dos defeitos do negócio jurídico previsto no art. do CC

e como tal gera a anulação do negócio jurídico no prazo de 4 anos,

conforme art. 178 do CC.

Anular um negócio é diferente de redibir, ou, mais ainda de exigir

abatimento no preço, são conseqüências jurídicas que não se

confundem.

Mas nem sempre é fácil perceber a diferença, principalmente

quando se pensa que conhecendo o defeito também não se

contrataria.

Veja esse interessante acórdão do TJDF que resolve uma questão

bem próxima:

Negócio jurídico. Hipótese de vício de consentimento, e não de vício

redibitório. Anulação do negócio. Indenização devida.Direito civil –

Compra e venda – Vício Redibitório – Inexistência – Vício de

consentimento – Omissão dolosa – Anulação do negócio. No vício

redibitório, o erro é objetivo, incidindo sobre a coisa que possui um vício

oculto. O fundamento repousa na obrigação que o alienante tem

legalmente de garantir ao adquirente o uso da coisa, desafiando a

interposição das ações edilícias. Já no caso do vício de consentimento, o

erro é subjetivo, opera-se na própria manifestação da vontade e rende

ensejo `a ação anulatória, cujo prazo decadencial é de quatro anos. Nos

termos dos arts. 138 e ss. do Código Civil, o vício de consentimento (erro,

dolo, simulação ou fraude, estado de perigo e lesão) caracteriza defeito do

68 Direito Civil, V. II, p. 543.

Page 80: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

80

negócio jurídico, apto a dar ensejo à sua anulação. O dolo pode ser

definido como o artifício de que alguém se utiliza para induzir outrem a

praticar um ato jurídico que lhe é desfavorável. Para tanto exige-se que a

conduta dolosa tenha sido a causa determinante do ato jurídico e que

tenha tido intensidade e má-fé suficientes a justificar o engano da vítima.

Comete dolo, viciando a vontade negocial, aquele que aliena veículo

sinistrado, ocultando essa informação da parte adquirente, o que

determina a anulação do negócio com o retorno das partes ao status quo

ante. Recurso conhecido e não provido. ( Apelação Cível n°

2011011113332-2 – TJDF - 6ª Turma Cível. Julgamento 12/09/2012).

7.2.1.2 VÍCIO REDIBITÓRIO E INADIMPLEMENTO

CONTRATUAL:

Também difere o vício redibitório do inadimplemento contratual.

A garantia pode ser DIMINUÍDA, AMPLIADA ou RENUNCIADA.

A cláusula de exclusão da garantia pode limitar-se apenas a alguma

das qualidades da coisa, bem como pode excluir unicamente a

possibilidade de redibição, mantendo a ação estimatória, e vice-

versa.69

Requisitos:

coisa adquirida em virtude de contrato

comutativo ou de doação onerosa, ou

melhor, gravada com encargo

(translativo da posse e da propriedade

da coisa);

69 Venosa, op. Cit., p. 549.

Page 81: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

81

vício ou defeito prejudicial à utilização

da coisa ou determinante de seu valor (

e não o menos excelente, o menos belo o

menos agradável);

defeito grave da coisa (não é portanto

qualquer falha que fundamenta o pedido

que visa responsabilizar o alienante por

vício redibitório;

vício oculto;

defeito já existente no momento da

celebração do ato negocial.

Conseqüências jurídicas:

a. A ignorância desses vícios pelo alienante

não o exime da responsabilidade (art.

443: o fundamento de sua

responsabilidade não é o seu

comportamento, mas tão-só a garantia);

b. Responsabilidade do alienante que

subsiste mesmo após a tradição (art.

444 CC);

c. Opção do adquirente (art. 442): a) ação

redibitória, b) ação estimatória ou quanti

minoris.

d. Prazo: C.C. : 30 dias = móvel; 1 ano=

imóvel

ii. CDC: 30 dias=bens não duráveis; 90 dias=bens

duráveis e 1 ano= imóvel.

Page 82: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

82

a. Momento da contagem (caput do art.

445: conta-se da entrega efetiva);

b. Regra especial (§1º, art. 445) como

interpretá-la?

c. Impedimento de contagem do prazo

durante a cláusula de garantia (art. 446

CC).

Como deve ser interpretada a regra do art. 445, §1°? A sua leitura leva-

nos muitas vezes a uma percepção equivocada, seja do próprio objeto

– afinal se o vício redibitório é um vício oculto, que vício é esse que só

pode ser conhecido mais tarde? É um vício mais que oculto? – depois

quanto ao prazo, também o parágrafo permite alguma confusão –

haveria uma alteração do prazo do caput? Há limite para aparecimento

desse vício? Ou a qualquer momento em que ele aparecer o adquirente

teria mais 180 dias se móvel e 1 ano, se imóvel?

Não se pode dizer que se tem uma única resposta correta de um artigo

embaralhado como este, mas de acordo com a jurisprudência do

TJ/SP, entende-se que não há alteração do prazo estabelecido no

caput (30 dias – móvel e 1 ano – imóvel) apenas teríamos dois dias a

quo, o primeiro da tradição e o segundo do aparecimento do vício –

porém nesse caso, para que o alienante não se tornasse eternamente

responsável haveria um limite de 180 dias, para bens móveis.70

70 Conforme Apelação 9152014-35.2008.8.26.0000 decidida pela 31ª Câmara de Direito Privado de SP “A

correta compreensão do art. 445, §1° do Código Civil é de que esse dispositivo estabelece um dies a quo

para o início da contagem do prazo decadencial. A partir desse momento – 180 dias da tradição –

independente de conhecer o vício, inicia-se o prazo decadencial de 30 dias.

Mais que isso, a regra é supletiva, ou seja, somente vigora na hipótese de não conhecimento do vício. A

partir do momento em que ele se torna conhecido do adquirente, inicia-se a contagem do prazo.

O código civil estabelece prazo decadencial de 30 dias para reclamar de vício oculto de bem móvel

negociado em contrato comutativo, contado: 1- da data da tradição; 2- da data em que o adquirente tomar

conhecimento do vício quando este não puder ser conhecido de imediato, desde que esse conhecimento

ocorra em até 180 dias da tradição.”

Page 83: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

83

Uma outra questão importante, ainda sobre os prazos é a observada

pelo prof. Nelson Nery Junior, que explica em seu CC comentado que

o prazo da ação redibitória é decadencial, pois se trata de uma ação

constitutiva negativa, porém o da ação quanti minoris é prescricional.71

Quando a coisa é alienada, consumida ou transformada ainda pode se

reclamar o vício redibitório?

Quem alienou não mais pode.

7.2.2 VÍCIO e DEFEITO NO CDC

Inicialmente podemos estabelecer duas diferenças na disciplina do

vício redibitório no CC e no CDC; a primeira é que para este diploma

há diferença entre VÍCIO e DEFEITO, a segunda é que diferencia-se os

chamados VÍCIOS OCULTOS dos VÍCIOS APARENTES OU DE FÁCIL

CONSTATAÇÃO.

Esta disciplina encontra-se no Capítulo IV do CDC, arts. 8 a 27.

Temos a categoria do defeito estabelecido nos arts. 12 a 17 e a dos

vícios estabelecida nos arts. 18 a 25.

Espécie

s

DEFEITO

(Responsabi

lidade pelo

fato do

produto e

do serviço)

VÍCIO (de

qualidade

ou

quantidade

que tornem

impróprios

ou

inadequado

VÍCIO (de

quantidade do

produto)

VÍCIO (de

qualidade

do serviço

que os

tornem

impróprios

ao consumo

ou lhes

71 P. 570.

Page 84: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

84

s ao

consumo)

diminuam o

valor)

Discipli

na legal

Art. 12 -17 Art. 18 Art. 19 Art. 20

Opção

do

consum

idor

Substi

tuição

do

produ

to;

Restit

uição

da

quanti

a

paga;

Abati

mento

do

preço

Abatimen

to do

preço;

Complem

entação

do peso

ou

medida;

Substitui

ção do

produto;

Restituiç

ão da

quantia

paga

Reexe

cução

dos

serviç

os;

Restit

uição

da

quanti

a paga

Abati

mento

propo

rciona

l do

preço

Prazo 5 anos 30 dias –

produto não

durável

90 dias –

produto

durável

30 dias –

produto não

durável

90 dias –

produto

durável

30 dias –

produto não

durável

90 dias –

produto

durável

Início

da

A partir do

conhecimen

to do dano e

Vício

aparente – a

partir da

Vício aparente

– a partir da

entrega efetiva

Vício

aparente – a

partir da

Page 85: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

85

contage

m

de sua

autoria (art.

27)

entrega

efetiva do

produto ou

do término

da execução

do serviço

(§1°, art. 26)

Vício oculto

– a partir do

momento

em que ficar

evidenciado

o vício (§3°,

art. 26).

do produto ou

do término da

execução do

serviço (§1°,

art. 26)

Vício oculto – a

partir do

momento em

que ficar

evidenciado o

vício (§3°, art.

26).

entrega

efetiva do

produto ou

do término

da execução

do serviço

(§1°, art. 26)

Vício oculto

– a partir do

momento

em que ficar

evidenciado

o vício (§3°,

art. 26).

Dever de informar: art. 12 e 20.

* Quando o adquirente aliena, consome ou transforma a coisa ficará

inibido de reclamar os vícios?

QUADRO COMPARATIVO DO CC E CDC NOS VÍCIOS E DEFEITOS:

CÓDIGO CIVIL CDC

Vício = Defeito Vício= impropriedade inócua que

não gera danos de monta ao

consumidor

Page 86: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

86

Defeito= é a que o prejudica de

modo acentuado, ocasionando

acidentes de consumo.

2 opções: resolução do negócio

(ação redibitória) e redução

proporcional do preço (ação

estimatória)

As opções dependem da espécie

do vício (art. 18, 19 e 20).

30 dias (bem móvel)

1 ano (bem imóvel)

30 dias (produto ou serviço não-

durável)

90 dias (produto ou serviço

duráveis)

Indenização somente em caso de

culpa (CC art. 443)

Indenização subsiste mesmo sem

culpa (CDC, arts. 12, 14, 18, 19,

23).

7.3 EVICÇÃO (arts. 447 a 457)

Evicção é a perda da coisa, por força de decisão judicial, fundada

em motivo jurídico anterior, que a confere a outrem, seu verdadeiro

dono, com o reconhecimento em juízo da existência de ônus sobre

a mesma coisa, não denunciado oportunamente no contrato (Maria

Helena Diniz).

O CC anterior trazia uma redação mais completa ao dizer que “Nos

contratos onerosos, pelos quais se transfere o domínio, posse ou

uso, será obrigado o alienante a resguardar o adquirente dos riscos

da evicção, toda vez que se não tenha excluído expressamente esta

responsabilidade” (art. 1107).

Page 87: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

87

Está presente em todo contrato oneroso, e não apenas na compra

e venda (vendedor, cedente, arrendante...): “Deve ser assegurado ao

adquirente que seu título é bom e suficiente e que ninguém mais

tem direito sobre o objeto do contrato, vindo a turba-lo, alegando

melhor direito”. (Venosa, p. 580)

Para que consista a garantia da evicção, é indispensável que ocorra

uma perturbação de direito, fundada em causa jurídica, porque as

perturbações de fato, devem ser protegidas pelo próprio adquirente,

assim como o vício deve ser anterior, pois se posterior ao negócio,

a responsabilidade é do novo titular, o adquirente.

Personagens da evicção:

EVICTOR (o vencedor que fica com a coisa) – EVICTO (o que se vê

despojado dela) – ALIENANTE .

Assim como no vício redibitório na evicção também a

responsabilidade do alienante independe de culpa.

Requisitos:

causa anterior;

sentença judicial (requisitos abrandado para também se

compreender as apreensões administrativas, realizadas, p.

ex, pela polícia em carros roubados);

Intervenção do alienante no processo em que o adquirente

é demandado (art. 456) * o art. 70, I, do CPC, disse menos,

porque a evicção não se limita à discussão de domínio.

Exclusão/diminuição/reforço da responsabilidade por evicção:

Ex. estabelecendo ainda cláusula penal (reforço)

Page 88: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

88

Montante do direito do evicto (valor a ser indenizado):

Art. 450, § único, benfeitorias, art. 453 e 454.

Evicção parcial:

Ex. hipoteca

Evicção e Dação em pagamento

Art. 359 CC (“Se o credor for evicto da coisa recebida em

pagamento, restabelecer-se-á a obrigação primitiva, ficando sem

efeito a quitação dada, ressalvados os direitos de terceiros”).

7.4 DIREITO DE RETENÇÃO

Conceito: direito de retenção é a permissão, concedida pela norma

ao credor, de conservar em seu poder coisa alheia, que já detém

legitimamente, além do momento em que a deveria restituir se o

seu crédito não existisse e, normalmente, até a extinção deste

(Arnoldo Medeiros da Fonseca, in Maria Helena Diniz).

O direito de retenção está assegurado:

a todo possuidor de boa-fé que tem direito à indenização

das benfeitorias necessárias ou úteis (art. 1219);

ao credor pignoratício (art. 1433, II e III);

ao depositário (art. 644, § único);

ao mandatário (art. 681);

ao cônjuge (art. 1652).

Para que se configure tal direito, será preciso que haja:

Page 89: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

89

detenção de coisa alheia;

conservação dessa detenção (o direito como uma forma de

garantia será mantido enquanto o bem permanecer sob o

poder do retentor);

crédito líquido, certo e exigível do retentor, em relação de

conexidade com a coisa retida;

inexistência de exclusão legal ou convencional do direito

de retenção (ex. art. 1220, que nega ao possuidor de má-fé

o direito de retenção por benfeitorias).

7.5 EXCEPTIO NON ADIMPLETI CONTRACTUS

Nesses contratos há uma dependência recíproca das prestações

que, por serem simultâneas, são exigíveis no mesmo momento.

Só é aplicável aos contratos bilaterais.

O fundamento desse princípio repousa no justo equilíbrio das

partes no cumprimento do contrato, fundamentalmente em razão

da equidade, portanto.72

Exceptio non rite adimpleti contractus – quando houver

cumprimento incompleto, defeituoso ou inexato.

Ex. Compra e venda de imóvel a prazo (deixa de pagar as

prestações, pois o imóvel não havia sido construído pela ré).

Solve et repete – apresenta-se como uma renúncia à exceção do

contrato não cumprido. Muito comum nos contratos

administrativos’

Não é possível imaginá-la nos contratos de consumo, pois feriria a

proibição do art. 51, IV do CDC.

72 Venosa, v. 2, p. 406.

Page 90: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

90

O que o contratante pode fazer? Pode agir por meio de ação ou de

defesa.

Pode conforme art. 475 requerer a resolução do contrato, se não

preferir exigir o cumprimento ou caso seja acionado pelo outro

contratante, pode alegar em defesa esta exceção, que terá a

natureza de defesa indireta (fato impeditivo ou modificativo?).

Trata-se como dizem os autores de uma prejudicial de mérito.73

Todos os contratos bilaterais trazem essa chamada cláusula

resolutória implícita.

É também comum vermos a alegação de exceção de contrato não

cumprido como fundamento para a sustação de pagamentos em

cheques, em negócios parcelados.

7.6 ARRAS

Quantia em dinheiro ou outra coisa móvel fungível, dada por um

dos contraentes ao outro, a fim de concluir o contrato e,

excepcionalmente, assegurar o pontual cumprimento da obrigação

(quando no contrato for estipulado direito de arrependimento).

O sinal desempenha duplo papel na relação contratual. Em

primeiro lugar, e primordialmente em nossa lei, é uma garantia que

serve para demonstrar a seriedade do ato e tem a característica de

significar princípio de pagamento e adiantamento do preço. Em

segundo lugar, as arras podem servir de indenização em caso de

73 Em elucidante voto explica o juiz relator que “os contratos bilaterais, como é o caso do acordo discutido

nos autos, caracterizam-se pelo fato de que ambas as partes contratantes ocupam simultaneamente a posição

de credor de uma obrigação e devedor de outra. Essa é a razão pela qual uma das partes não pode, nessa

espécie contratual, exigir que a outra cumpra a obrigação sem que antes tenha cumprido a obrigação que

lhe compete. A exceção do contrato não cumprido é, portanto, modalidade de defesa que, nos contratos

bilaterais, o devedor inadimplente tem para opor ao também devedor inadimplente que figura como parte

na mesma relação contratual” (Des. Relator José Affonso da Costa Côrtes, no julgamento da Apelação

Cível n. 1.0145.07.431436-3/001,25/06/2009 TJ/MG).

Page 91: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

91

arrependimento de qualquer dos contratantes, quando isto é

colocado e facultado na avença.74

Assim as arras podem ser:

CONFIRMATÓRIAS – art. 417

PENITENCIAIS – art. 420

74 Venosa, v. 2, p. 361

Page 92: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

92

8 REVISÃO JUDICIAL DO CONTRATO

Tema bastante relevante na teoria geral dos contratos é a

possibilidade do juiz rever o contrato? Até onde vai esta atuação

revisional? É possível ao juiz mudar o contrato? Alterar as suas

cláusulas? Ou, constatando a sua irregularidade poderia somente

resolvê-lo?

A solução destas questões também aponta para uma diferença entre

os contratos civis e de consumo.

Um das principais teses que justificam a revisão judicial dos

contratos é a teoria da imprevisão.

Esta pode ser definida como ...

Aplica-se a teoria tanto as relações civis quanto consumeristas?

A resposta é negativa.

QUADRO COMPARATIVO

TEORIA DA

IMPREVISÃO

Previsão Legal Requisitos

CC Art. 478 Superveniência +

Imprevisibilidade +

onerosidade excessiva

CDC Art. 6°, V Superveniência +

Onerosidade excessiva

Há várias situações em que discute-se a aplicação da teoria da

imprevisão. Seria possível aplicá-la em caso de desemprego? Haveria

Page 93: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

93

diferença se o emprego fosse privado ou público? E em caso de morte?

Para todas há decisões judiciais, a maioria negando a aplicação. 75

75 “REVISIONAL DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS – TEORIA DA IMPREVISÃO – ALTERAÇÃO

DAS CIRCUNSTÂNCIAS OBJETIVAS DO CONTRATO – DESEMPREGO – FATO SUBJETIVO E

PESSOAL – INAPLICABILIDADE. Apenas os acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, que

alterem as circunstâncias objetivas do contrato, sejam alheios às partes e tornem as prestações contratadas

excessivamente onerosas para uma delas, autorizam a revisão das cláusulas contratuais. Tratando-se o

desemprego de fato subjetivo e pessoal, sua ocorrência, por si só, não autoriza a revisão das cláusulas

contratuais. (Ap. Cível, n° 1.0701.05.107068-1/001, Uberaba)

Page 94: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

94

9 EXTINÇÃO DA RELAÇÃO CONTRATUAL

As obrigações têm como característica fundamental seu caráter

transitório. O contrato nasce para um dia ser extinto. Não existe

obrigação perene, a permanência é característica dos direitos reais.

Nesse sentido Humberto Theodoro Junior assinala que “ao contrário

dos direitos reais, que tendem à perpetuidade, os direitos

obrigacionais gerados pelo contrato caracterizam-se pela

temporalidade. Não há contrato eterno. O vínculo contratual é, por

natureza, passageiro e deve desaparecer naturalmente, tão logo o

devedor cumpra a prestação prometida ao credor”76

Como o fim normal do contrato é o seu cumprimento, cumprida a ou

as obrigações nele estabelecidas do devedor tem direito à quitação, que

nos termos do art. 320 do CC sempre poderá ser dada por instrumento

particular.

Devemos também lembrar que o pagamento nos negócios pode ocorrer

por meios indiretos como a dação, novação, compensação.

Extinção, Resolução, Resilição, Rescisão, Revogação são termos

utilizados pela doutrina para apontar o desfazimento da relação

contratual, quando esta ocorre de modo anormal, ou seja, sem ter

alcançado o seu fim.

O contrato, como dissemos, pode ter uma extinção normal ou não. A

extinção normal de um contrato se dá com a sua execução.

76 Apud Carlos Roberto Gonçalves, Direito Civil Brasileiro, V. 3, p. 176.

Page 95: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

95

Alguns autores dividem as causas de extinção do contrato em causas

anteriores ou contemporâneas à formação do contrato e causas

supervenientes à formação do contrato.77

ANTERIORES OU CONTEMPORÂNEAS:

1- Nulidade {

1.1 Nulidade relativa (art. 171-172 a 174)

1.2 Nulidade absoluta (art. 166, I a VII e 167 – 169)

2- Condição resolutiva (art. 475 a 476){

2.1 Tácita

2.2 Expressa

3- Direito de arrependimento (art. 420, art. 49 L. 8.078/90)

SUPERVENIENTES:

1- Resolução por inexecução voluntária do contrato

2- Resolução por inexecução contratual involuntária

3- Resolução por onerosidade excessiva

4- Resilição bilateral ou distrato

5- Resilição unilateral

6- Morte de um dos contratantes

9.1 CAUSAS ANTERIORES OU CONTEMPORÂNEAS

9.1.1 Nulidade absolula ou relativa (nulidade e anulabilidade)

Nos dizeres de Carlos Roberto Gonçalves, a nulidade absoluta decorre

de ausência de elemento essencial do ato, com transgressão a preceito

77 Como Maria Helena Diniz e Carlos Roberto Gonçalves.

Page 96: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

96

de ordem pública, impedindo que o contrato produza efeitos desde a

sua formação (ex tunc).78

O pronunciamento da nulidade pode ser requerido em juízo a qualquer

tempo, por qualquer interessado, inclusive pelo Ministério Público, e

pode ser declarada de ofício pelo juiz (art. 168, CC).

Se a hipótese for de anulabilidade, haverá prazo para seu

reconhecimento e os efeitos deste não retroagirão. Só poderá ser

argüida pela parte prejudicada e não pode ser declarada de ofício pelo

juiz (art. 177, CC).

As hipóteses de anulabilidade advém, como observa Carlos Roberto

Gonçalves, da imperfeição da vontade: ou porque emanada de um

relativamente incapaz não assistido, ou porque contém algum dos

vícios do consentimento.79

9.1.2 Cláusula Resolutiva

A cláusula resolutiva representa a possibilidade atribuída ao

contratante de desfazer o contrato, ou seja, resolvê-lo diante do

inadimplemento do outro.

Não tem sentindo obrigar o contratante a permanecer em uma relação

contratual que está sendo descumprida.

Esta faculdade – de pedir a resolução do contrato – pode ser expressa

ou implícita, daí dizer o legislador no art. 474 que a cláusula resolutiva

expressa opera de pleno direito e a tácita depende de interpelação

judicial.

Aqui já chegamos em um ponto controverso: é necessário o

pronunciamento judicial para se operar a resolução do contrato?

Mesmo no da cláusula resolutória expressa?

78 Direito Civil Brasileiro, V. 3, p. 177.

79 Op. Cit., p. 178.

Page 97: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

97

Para Carlos Roberto Gonçalves sim, em ambos os casos, diz o autor,

tanto no de cláusula resolutiva expressa ou convencional, como no de

cláusula resolutiva tácita, a resolução deve ser judicial, ou seja,

precisa ser judicialmente pronunciada.80

Outra questão interessante que envolve a sua resolução é quando o

devedor cumpriu uma grande parte do contrato, ou seja, quando

houve um adimplemento substancial. Neste caso, havendo

inadimplemento, poderia o credor exigir a sua resolução?81

9.1.3 Direito de Arrependimento

Quando previsto expressamente no contrato – pois não se presume –

o arrependimento autoriza qualquer das partes a extinguir o negócio.

Aquele que deu causa ao arrependimento, se no contrato tiver havido

arras, perderá o sinal ou devolverá em dobro (art. 420 CC).

O direito de arrependimento dever ser exercido no prazo estabelecido

pelas partes ou antes de sua execução, pois havendo esta, presume-

se que houve renúncia a este direito.

O CDC prevê modalidade de arrependimento, disposta no art. 49,

quando a contratação se der fora do estabelecimento comercial.

9.2 CAUSAS SUPERVENIENTES

O termo RESILIÇÃO, importado do direito francês, é a cessação do

vínculo contratual pela vontade das partes. A resilição bilateral é o

distrato mencionado no art. 472 do CC.

Já a RESCISÃO implica a noção de extinção da relação contratual por

culpa (geralmente quando uma parte imputa à outra o

80 Direito Civil Brasileiro, v. 3, p. 181.

8181 Para Carlos Roberto Gonçalves, o adimplemento substancial do contrato, todavia, tem sido reconhecido,

pela doutrina, como impedimento à resolução unilateral do contrato. Sustenta-se que a hipótese de resolução

contratual por inadimplemento haverá de ceder diante do pressuposto do atendimento quase integral das

obrigações pactuadas, ou seja, do incumprimento insignificante da avença, não se afigurando razoável a

sua extinção como resposta jurídica à preservação e à função social do contrato (CC art. 421), in op. Cit. p.

179.

Page 98: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

98

descumprimento de um contrato, pede a rescisão em juízo e a

sentença decreta-a).

9.2.1 RESILIÇÃO UNILATERAL

Há contratos em que sua natureza permite que a parte dê por finda

unilateralmente a relação. Isso ocorre nos contratos em que o

elemento confiança assume um papel de relevante importância, ex.

comodato, mandato, depósito.

Também nos contratos de trato sucessivo, de execução continuada,

quando por prazo indeterminado permitem que mediante denúncia

prévia, sejam resilidos.

*Art. 473

9.2.2 CLÁUSULA RESOLUTÓRIA

O termo resolução é geralmente reservado, como nos ensina Sílvio

Venosa, para as hipóteses de inexecução do contrato por uma das

partes. Essa inexecução pode ser culposa ou não.

Mas quando existe o dever de indenizar o termo rescindir é mais

apropriado.

A inexecução da obrigação importa automaticamente na rescisão do

contrato, sujeito o faltoso às perdas e danos.

“Uma vez convencionada a condição resolutiva expressa, o contrato

rescindir-se-á automaticamente, fundando-se no princípio da

obrigatoriedade dos contratos, justificando-se quando o devedor

estiver em mora” (MHD, Código Civil Anotado)

9.2.3 RESOLUÇÃO POR ONEROSIDADE EXCESSIVA

Cláusula rebus sic standibus.

Page 99: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

99

Teoria da equivalência contratual.

Pode se entender essa cláusula, conforme Maria Helena Diniz, como a

possibilidade da parte lesada no contrato por aqueles eventos

supervenientes, que alteram profundamente a economia contratual,

desequilibrando as prestações recíprocas, poderá evitar

enriquecimento sem causa ou abuso de direito por desvio de finalidade

econômico-social, sob a falsa aparência de legalidade, desligar-se de

sua obrigação, pedindo a rescisão do contrato, ingressando em juízo

no curso da produção dos efeitos do contrato.

Requisitos:

1- vigência de um contrato comutativo de execução continuada;

2- alteração radical das condições econômicas no momento da

execução do contrato, em confronto com as do instante de sua

formação;

3- onerosidade excessiva para um dos contratantes e benefício

exagerado para o outro;

4- imprevisibilidade e extraordinariedade daquela modificação.

Page 100: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

100

10 RESPONSABILIDADE PRÉ E PÓS-CONTRATUAL

Os contratos devem ser cumpridos sob pena de responsabilidade.

Essa idéia é comum a todos. Diz-se que o contrato é lei entre as partes,

pacta sunt servanda.

Sendo assim a responsabilidade contratual sempre foi um assunto

tratado pelo nosso legislador na matéria relativa ao inadimplemento

das obrigações.

Ao descumprir uma obrigação estabelecida em um contrato sabe-se

que poderá incidir os efeitos do inadimplemento, mora, perdas e

danos, juros, cláusula penal e arras. “Não cumprida a obrigação,

responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização

monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e

honorários de advogado”, nos diz o art. 389 CC.

Mas junto a esta idéia surgem duas novas, uma responsabilidade que

surge ainda nas tratativas de negociação e outra que perdura após o

término do contrato, a essas tem-se chamado responsabilidade pré-

contratual ou culpa in contrahendo e responsabilidade pós-contratual

ou culpa post pactum finitum.

Sobre estas responsabilidades trataremos neste capítulo.

10.1 Responsabilidade e obrigação

Podemos iniciar estabelecendo a diferença entre responsabilidade e

obrigação, tão comumente confundidas.

Obrigação é o vínculo jurídico estabelecido entre credor e devedor cujo

objeto é uma prestação de dar, fazer ou não fazer alguma coisa. É

clássica a definição de Justiniano nas Instituas de que obligatio est

juris vinculum, quo necessitate adstringimur alicujus solvendae rei,

secudum nostrae civitatis jura (a obrigação é um vínculo jurídico que

nos obriga a pagar alguma coisa, ou seja, a fazer ou deixar de fazer

alguma coisa).

Page 101: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

101

Também se conceitua obrigação como a relação jurídica, de caráter

transitório, estabelecida entre devedor e credor, cujo objeto consiste

numa prestação pessoal econômica, positiva ou negativa, devida pelo

primeiro ao segundo.

Sendo assim o conceito de obrigação sempre esteve relacionado a uma

prestação devida pelo devedor ao credor, a fonte por excelência desta

obrigação é o contrato, mas também os atos unilaterais, e para alguns,

também a lei.

A responsabilidade surge como um segundo momento dessa relação,

quando não cumprida a obrigação.

Os dois termos se confundem pois responsabilidade também nos dá a

idéia de obrigação, muitas vezes nos dizemos responsáveis como

sinônimo de obrigados (p. ex. isso é minha responsabilidade

significando também, isso é minha obrigação).

E em certo sentido realmente se assemelham, mas no sentido jurídico

devemos estabelecer sua diferença e assim saber que obrigação refere-

se à relação estabelecida entre credor e devedor para uma prestação

que se descumprida surgirá a responsabilidade.

10.2 Responsabilidade civil: contratual e extracontratual

Quando distinguimos a responsabilidade contratual da extracontratual,

estamos diferenciando o dever que foi violado: um dever oriundo do

contrato (art. 389 CC) ou um dever geral de não causar dano a outrem

(art. 927 CC).

Para Cavalieri, “esse dever, passível de violação, pode ter como fonte uma

relação jurídica obrigacional preexistente, isto é, um dever oriundo de

contrato, ou, por outro lado, pode ter por causa geradora uma obrigação

imposta por preceito geral de Direito, ou pela própria lei.”

Assim afirmamos que uma responsabilidade é contratual quando ela

surge do descumprimento do contrato e afirmamos que uma

responsabilidade é extracontratual ou aquiliana quando ela surge do

cometimento de um ato ilícito.

Page 102: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

102

Claro que apesar de aparentemente simples, saber se há ou não um

contrato pré-existente entre as partes para definir se a responsabilidade

é contratual ou extracontratual, nem sempre se afigura tão fácil esta

distinção.

Por exemplo, um acidente de trânsito que causa dano em um passageiro

de um carro, que tinha pegado carona com seu colega. É uma

responsabilidade contratual ou extracontratual? Há um contrato de

transporte entre as partes?

A mesma questão se coloca nos dois temas que iremos aqui discutir. Um

dano provocado nas tratativas negociais, é uma responsabilidade

contratual ou extracontratual? E um dano causado por uma conduta

indevida realizada posterior ao contrato, é uma responsabilidade

contratual ou extracontratual?

Não são questões simples de se resolver mas devem ser enfrentadas,

comecemos com a responsabilidade contratual.

10.3 Responsabilidade contratual

A responsabilidade contratual nasce do descumprimento de um contrato.

É então requisito inicial desta responsabilidade que haja um contrato

entre as partes e que este seja válido.

O descumprimento do contrato pode dar-se de várias formas: pelo

devedor ou pelo credor pode ser absoluto ou relativo, pode ocorrer com

ou sem culpa.

Os arts. 389 a 420 do Código Civil cuidam do inadimplemento das

obrigações.

Há inadimplemento absoluto quando não há mais utilidade no

cumprimento da obrigação para o credor, há inadimplemento relativo ou

mora, quando ainda é útil o cumprimento da obrigação para o credor.

Os elementos da responsabilidade contratual são os mesmos da

responsabilidade civil: culpa →dano → nexo causal.

Page 103: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

103

É necessário que haja culpa para que surja o dever de indenizar, mas é

necessário que haja prejuízo a ser indenizado e por último é necessário

que haja nexo causal entre esses elementos, ou seja, que o dano seja

oriundo do descumprimento do contrato.

Devemos porém lembrar que a culpa civil não se identifica com a penal,

o seu sentido é mais abrangente e abrange, inclusive, o dolo.

Como para o direito civil a responsabilidade está ligada com a reparação

do prejuízo, esta é a sua preocupação, logo, importa, o prejuízo e não a

conduta do agente, pois se com dolo ou culpa o dano foi o mesmo, é este

que deve ser indenizado. Para o direito penal a responsabilidade está

relacionada com a conduta, e esta que será sancionada, importa saber se

a conduta foi culposa ou dolosa.

Assim para o direito civil, deixar de cumprir um contrato já é agir

culposamente, só não haverá culpa se o descumprimento ocorreu por um

caso fortuito ou de força maior, ou ainda se o descumprimento foi do

credor.

Os contratos podem já prevê os efeitos do inadimplemento estabelecendo

juros, cláusula penal e arras.

Neste caso não haverá necessidade de provar o prejuízo, pois este já foi

pré-estabelecido contratualmente.

Se as partes estabeleceram num contrato uma cláusula penal (multa)

para o caso de descumprimento quando este ocorrer a pena incidirá

automaticamente sem necessidade de provar o prejuízo, este como

dissemos, já foi pré-estabelecido pela cláusula.

É por isso que diz o código no art. 416, caput, “Para exigir a pena

convencional, não é necessário que o credor alegue prejuízo”.

Também se numa obrigação de pagamento foram estabelecidas pelas

partes juros moratórios (pelo atraso), ou mesmo se não estabelecidos,

diante deste os juros incidirão automaticamente, independente da prova

do prejuízo. É o que estabelece o art. 407: “Ainda que se não alegue

prejuízo, é obrigado o devedor aos juros da mora que se contarão assim às

Page 104: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

104

dívidas em dinheiro, como às prestações de outra natureza, uma vez que

lhes esteja fixado o valor pecuniário por sentença judicial, arbitramento,

ou acordo entre as partes.”

Por isso, quando estes efeitos já estiverem pré-fixados num contrato, o

credor só deverá alegar seu descumprimento. O devedor, por sua vez, é

que deverá provar que o descumprimento não se deu por culpa.

Caso não haja esta pré-fixação no contrato, quando ocorrer o

descumprimento deverá o credor alegar o descumprimento e também o

prejuízo, que para ser indenizado deverá ser provado. O devedor por sua

vez neste caso poderá provar que o descumprimento não se deu por sua

culpa ou que não houve prejuízo.

10.4 Responsabilidade pré-contratual

Que o contrato gera responsabilidade este é um pensamento comum,

como dissemos no início deste artigo, todos que contratam sabem que

este deve ser cumprido sob pena de responsabilidade, pacta sunt

servanda.

Por mais que a força do contrato não seja a mesma do passado, havendo

cada vez mais considerações a ser feitas acerca da sua validade e da sua

exigibilidade diante de cláusulas abusivas, de fatos imprevistos etc, todos

sabemos que devemos cumpri-los, afinal ele foi o pacto de nossa vontade.

Mas pensar em uma responsabilidade que surge quando ainda não

contratamos, quando ainda estamos na fase das negociações

preliminares, é um pensamento novo.

Não tão novo assim, pois a tese da culpa in contrahendo ou

responsabilidade pré-contratual surgiu na Alemanha em 1861 sob a pena

de Rudolf Von Ihering.

A aceitação desta teoria repercutiu fortemente no mundo ocidental,

sendo prevista na Alemanha, na Itália, em Portugal.

Page 105: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

105

No Brasil apesar de inicialmente rechaçada, como nos conta Rogério

Doninni82, após a obra de Antônio Chaves de 1959 com esse título

“Responsabilidade pré-contratual” passou esta a ganhar larga aceitação.

O CC de 2002 inovando em seu texto dispõe expressamente no art. 422

que “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do

contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”.

A boa-fé, aqui objetiva, é o elemento central desta teoria. Pois diz-se que

pela boa-fé nos surgem os chamados deveres de conduta, e que devem

estar presentes também nesta fase pré-contratual. Assim informar, ser

leal, transparente na negociação são deveres exigidos de todos os que

contratam.

Discute a doutrina se esta responsabilidade é contratual ou extra-

contratual. A primeira corrente é mais aceita, pois argumentam seus

autores, que por ainda não haver contrato a responsabilidade não

surgiria de um vínculo entre as partes, mas do dever geral de não

prejudicar outrem. A segunda corrente encontra menos adeptos, mas tem

entre seus defensores Antônio Junqueira de Azevedo, para quem a

responsabilidade civil pré-contratual, embora provenha de um ato ilícito,

resulta da quebra de um dever específico de boa-fé, motivo pelo qual a

responsabilidade seria contratual e não extracontratual.83

Esta tese nos parece ser a mais acertada. Devemos entender que mesmo

na fase das negociações preliminares já existe um vínculo entre as partes,

impondo a estas deveres de conduta.

Sílvio Venosa aborda o tema da responsabilidade pré-contratual sob dois

elementos: da recusa em contratar e do rompimento das negociações

preliminares.

82 Responsabilidade pós-contratual, p. 53.

83 Revista de Direito do Consumidor, p. 23.

Page 106: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

106

Com relação ao primeiro nos diz o autor que quem se recusa a contratar,

pura e simplesmente, ou quem, injustificadamente, desiste de contratar

após iniciar eficientes tratativas, pode ser obrigado a indenizar.

A recusa injustificada na venda ou prestação de serviços pode inclusive

representar um abuso de direito.84 Se alguém se propôs a vender um

bem, não pode simplesmente recusar a venda a alguém sem nenhum

motivo justificado. Se isto nas relações civis já é certo, mais ainda nas

relações de consumo, onde a oferta obriga o consumidor (art. 35 CDC).

Com relação ao segundo elemento, rompimento das negociações

preliminares, observa Venosa que há necessidade de que o estágio das

preliminares da contratação já tenha imbuído o espírito dos postulantes

da verdadeira existência do futuro contrato.

Não é o rompimento de qualquer negociação, mas daquela que já tinha

provocado na parte a expectativa razoável do contrato.

Dário Vicente nos coloca uma questão para começarmos a refletir sobre

a responsabilidade pré-contratual sob o prisma do rompimento das

negociações preliminares: suponhamos que um empresário estabelecido

em Porto Alegre convida um colega do Recife a viajar até àquela cidade, a

fim de negociarem um contrato. O convidado apanha um avião, aluga um

automóvel e instala-se a expensas suas num hotel. Quando chega ao

escritório do anfitrião, este informa-o de que celebrou o contrato com um

terceiro duas semanas antes. Pode o empresário pernambucano exigir do

gaúcho o reembolso das despesas que fez tendo em vista a conclusão do

referido contrato? E pode, além disso, reclamar uma indemnização por

ter perdido a oportunidade de celebrar o mesmo contrato com um

terceiro?85

A resposta é positiva diante dos elementos da responsabilidade pré-

contratual, pois não agiu com lealdade o empresário de Porto Alegre ao

84 “Art, 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente

os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”

85 A responsabilidade pré-contratual no Código Civil brasileiro de 2002, p. 3.

Page 107: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

107

deixar de informar que também estava negociando com outra pessoa esse

negócio e, mesmo que já tinha fechado negócio com este.

Venosa também no caso do rompimento das negociações preliminares

diferencia as relações civis e consumeristas. Na relação civil, não pode a

parte exigir o implemento do contrato que não foi realizado, apenas a

responsabilidade diante de seu desfazimento, mas na relação

consumerista, dada a vinculação da oferta ao fornecedor, o consumidor

pode exigir deste o implemento do contrato (art. 35, I, CDC).

10.5 Responsabilidade pós-contratual

É possível após o término do contrato continuar havendo deveres entre

as partes? É possível uma exigir da outra uma conduta, e diante da não

observância desta conduta responsabiliza-la?

São estas algumas das questões que se colocam ao discutir a

responsabilidade pós-contratual, ou culpa post pactum finitum.

Como nos relata Rogério Doninni, a idéia de responsabilizar uma pessoa

após a extinção de uma relação obrigacional, mesmo estando cumprida

a prestação, não é recente. Todavia, no plano mundial, a doutrina e a

jurisprudência acerca desse tema são extremamente escassas.86

A tese, assim como a da responsabilidade pré-contratual, surgiu na

Alemanha em 1910, conforme também nos informa o autor, mas o marco

de seu acolhimento deu-se em 1925, quando o Reichsgericht (RG) decidiu

que, após o término de uma cessão de crédito, o cedente deveria

continuar a não impor obstáculos ao cessionário. No ano seguinte, nova

decisão aplicou essa teoria ao determinar, findo um contrato de edição,

que o titular dos direitos de publicação (no caso os herdeiros de Flaubert)

estava impedido de fazer concorrência ao editor, por meio da publicação

de novas edições, enquanto não esgotadas as anteriores.87

86 Responsabilidade pós-contratual, p. 85.

87 Op. cit., p. 85.

Page 108: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

108

Seu principal fundamento também está na boa-fé objetiva, que como

cláusula geral de nosso sistema, é interpretada no direito contratual,

como uma exigência (dever) das partes se portarem, como lealdade,

confiança, proteção. E esses deveres não são exigidos somente durante a

execução do contrato, mas antes e também depois.

Imagine que um químico tenha sido contratado para prestar serviço em

uma empresa de cosméticos e após findo seu contrato, revela segredos

desta empresa à concorrente. Esta conduta é permitida? Mesmo que o

contrato não estabelecesse essa proibição poderíamos afirmar que

haveria uma responsabilidade deste químico?

E, agora imagine uma empresa de roupas que contrata um estilista

famoso para fazer sua coleção de inverno, e este após o término de sua

prestação de serviço, vende os mesmos modelos a outra empresa?

Nos dois casos chama atenção a conduta antiética, mas isso tem proteção

no direito, principalmente no direito contratual?

Sim, pela doutrina da responsabilidade pós-contratual, nos dois casos

surgem responsabilidades das partes que infringiram deveres de

conduta.

Caso esta conduta já estivesse prescrita contratualmente ou por lei

chamaríamos então de pós-eficácia aparente.88

O art. 422 do CC que fundamenta legalmente a responsabilidade pré-

contratual, também é utilizado como fundamento da responsabilidade

pós-contratual, apesar de receber críticas por ter deixado de constar esta

expressão – pós-contratual- , é por isso que o Projeto n°6.960/2002

propõe alterar sua redação para o seguinte texto:

“Os contratantes são obrigados a guardar, assim nas negociações

preliminares e conclusão do contrato, como em sua execução e fase pós-

88 “É mister esclarecer, contudo, que se o dever de informação, proteção ou lealdade estiver previsto em

lei, de maneira específica e que se enquadre ao caso concreto, ou ainda contratualmente, não será hipótese

de responsabilidade pós-contratual, mas exato cumprimento de determinação legal que estende os efeitos

do contrato, ou disposição contratual que estende uma certa produção de efeitos. A mera produção de efeitos

para o momento posterior à celebração do contrato não configura a responsabilidade pós-contratual, ao

menos segundo o enfoque aqui tratado.”, op. cit. p. 102.

Page 109: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

109

contratual, os princípios de probidade e boa-fé e tudo o mais que resulte

da natureza do contrato, da lei, dos usos e das exigências da razão e da

eqüidade”.

10.6 Conclusão

Concluímos este breve estudo observando que a responsabilidade

contratual não decorre somente do cumprimento do contrato, mas de

seus deveres acessórios baseados na boa-fé objetiva, que impõe aos

contratantes pautar-se no momento de suas negociações preliminares

com lealdade, proteção, informação para que o contrato corresponda

exatamente aquilo que foi pretendido pelas partes e não frustre suas reais

expectativas, assim também, para que o contrato forneça a segurança

esperada pelas partes mesmo após o seu término.

Page 110: Apostila Teoria Geral Dos Contratos

110

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