Artigo a lingua de eulalia - 2008

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WWW.CURSORAIZES.COM.BR UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ – UVA CURSO DE LICENCIATURA EM PORTUGUÊS Artigo – “A Língua de Eulália” Subtema: Português Padrão / Português Não-Padrão TOBIAS BARRETO-SE WWW.CURSORAIZES.COM.BR

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UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ – UVA

CURSO DE LICENCIATURA EM PORTUGUÊS

Artigo – “A Língua de Eulália”

Subtema: Português Padrão / Português Não-Padrão

TOBIAS BARRETO-SE

2008

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FONSECA, WELMA DE BRITO

LEITE, MARIA DO CARMO SOUSA

LEITE, RITA VIRGÍNIA DE SOUZA

OLIVEIRA, KIARA MARIA DANTAS

REIS, TÂNIA DO NASCIMENTO

SANTOS, BÁRBARA ACELES

Artigo – “A Língua de Eulália”

Subtema: Português Padrão / Português Não-Padrão

Artigo apresentado ao Curso de Licenciatura em Português a disciplina Teoria da Semântica orientada pela professora Anne Michelle Cruz Universidade do Vale do Acaraú – UVA. Turma: única

TOBIAS BARRETO-SE

2008

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CAMPOS, Anne Michelle Cruz (orientadora) graduada em Licenciatura Plena em

Português, Pós-graduada em Literatura Brasileira, Prof.ª do Curso de Letras /

Português da Universidade Estadual Vale do Acaraú.

RESUMO

Argumenta que as variedades da nossa língua têm suas próprias regras, explicáveis

pela história da língua portuguesa ou pela comparação com línguas estrangeiras. Demonstra

que falar diferente não é falar errado e o que parece erro de acordo com português padrão

pode ter uma explicação científica (lingüística, histórica, sociológica, psicológica). Numa

deliciosa e bem-humorada narrativa, três universitárias passam férias no interior e acabam

reciclando seus conhecimentos lingüísticos. E mais do que isso, passam a encarar de uma

nova maneira as variedades não-padrão da língua portuguesa. A novela trata a Socioligüística

como ela deveria ser tratada: com seriedade, mas sem sisudez. Uma leitura importante para

quem quer aprender um pouco mais do nosso idioma mergulhando numa “viagem ao país da

Lingüística”.

Palavras-chaves: conhecimentos lingüísticos, sociolingüística, língua portuguesa

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INTRODUÇÃO

Nessa jornada lingüística, vários conceitos são abordados, os principais são: o mito da

língua homogênea, ou seja, as variedades lingüísticas existem e precisam ser respeitadas, e o

seu uso não deve ser considerado errado, pois são maneiras diferentes de se falar a mesma

língua e sua utilização não prejudica o entendimento e  tudo que parece erro no Português

não-padrão tem uma explicação lógica e científica e incentiva o ensino da norma padrão pois

esta foi criada para que exista um modelo de comunicação nacional, no entanto sugere que o

ensino desta seja voltado para a Lingüística.

O livro busca sempre comparar o Português padrão com o não-padrão para provar que

há mais semelhanças que diferenças entre eles. Neste contexto discute que os falantes da

norma não-padrão têm dificuldade de aprender a norma padrão, primeiramente porque o

primeiro é transmitido naturalmente, já o segundo requer aprendizado e como na maioria das

vezes essas pessoas pertencem à classe baixa, abandonam a escola cedo para trabalhar ou

desistem de estudar por serem discriminadas lingüisticamente, dessa forma o problema

adquiriu grandes proporções.

Todavia, a eficácia do Português não-padrão não pode ser negada, pois consegue

diminuir as regras gramaticais as tornando mais simples, isso ocorre freqüentemente com o

uso de concordância, plural e conjugação verbal. Essa postura não deve ser abominada pois

esse processo é comum em muitas outras línguas, mesmo na norma padrão delas como o

Inglês, por exemplo.

No caso do Português, há ocorrências de vários fenômenos lingüísticos, os principais

são: Rotacismo que é a troca de L por R, este pode ser explicado através da origem das

palavras no latim que recebiam R, mas com o passar do tempo essas palavras sofreram

modificações, porém alguns falantes não tiveram ciência disso e assim estão preservando os

traços do Português arcaico, Yeísmo que é a troca de LH por I, essas mudanças ocorreram

devido a ser mais cômodo pronunciar I do que LH, Assimilação é a transformação de ND em

N e de MB em M, isso se explica porque essas consoantes são dentais e o som de uma está

muito próximo da outra, Redução: ocorre quando as vogais E e O são pronunciadas como I e

U, Contração das proparoxítonas em paroxítonas, que não é exclusivo do Português não-

padrão que tem um ritmo paroxítono, já que palavras proparoxítonas em Latim passaram a

serem paroxítonas também no Português padrão, Desnalização de vogais postônicas que

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ocorre na norma padrão e não-padrão, caracteriza-se por eliminar o som nasal das vogais que

estão depois da sílaba tônica, o que é uma tendência natural da língua, Arcaísmo que surgiu

devido ao Português arcaico ter sido ensinado no Brasil, com isso seus traços ainda

permanecem em regiões afastadas das metrópoles brasileiras pela falta de contato com as

mudanças que surgiram na língua, Analogia que é a mudança lingüística causada pela

interferência de uma forma já existente, por exemplo, palavras que mudam de classe

gramatical por causa do som de uma vogal, e o caso do pronome oblíquo mim como sujeito

de infinitivos, com este ocorreu algo interessante, pois esse costume foi transmitido dos

menos cultos para os mais cultos. Seu uso, entre outras explicações justifica-se pelo pronome

mim ser tônico e procurar enfatizar a oração. 

Com o surgimento desses fenômenos a língua tornou-se mais complexa e quando é

necessário aplicar as normas gramaticais novas regras são geradas pelo Português não-padrão

que é inovador, a referente à  função da partícula se como verdadeiro sujeito da oração é uma

delas, dessa forma a ordem sujeito-verbo-objeto é obedecida, embora essa norma não seja

aceita pela Gramática Tradicional (neste caso), seu uso é totalmente compreensível pois reúne

uma explicação sintática, uma semântica na qual o sentido da oração é respeitado e outra

pragmática que aborda o uso que o falante faz da fala para obter determinado efeito.

Após a apresentação desses temas o livro questiona o ensino tradicional de Língua

Portuguesa e aponta como solução para reduzir o abismo entre o Português padrão e o não-

padrão que as escolas incorporem usos lingüísticos novos utilizados pela literatura, aceitem o

fim do mito da língua única e admitam que a língua esteja em constante mudança.   O ensino

de língua Portuguesa também precisa abordar temas como variantes lingüísticas e fenômenos

da língua, para informar o aluno sobre o uso prático da língua, assim evitando preconceitos e

nunca deixar de mencionar seu valor social, para instruí-lo quando ele deve usar o Português

padrão.

Evidentemente essas transformações não acontecerão rapidamente, pois há imposições

para que o ensino não mude, por parte dos gramáticos que não cansam de criar regras para

conservar o Português padrão e em conseqüência disso o distanciam do Português não-

padrão.   

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FATOR HISTÓRICO

Tudo o que está neste livro surpreende a muita gente que só via na língua portuguesa

uma forma de falar, ou seja, a forma português padrão, a forma acadêmica. Vemos que todos

os erros de português nele mostrado sempre foram vistos com preconceito, principalmente por

alguns gramáticos.

A professora Irene, personagem principal do livro, recebe em sua casa nas férias de

julho, sua sobrinha e duas amigas dela da faculdade. As meninas acham engraçado o modo de

falar de Eulália, amiga de Irene, que usa termos como: “véio”, “trabáio”, “cuié”, “broco",

“grobo”...

Irene começa a mostrar às meninas que cada cultura tem seu jeito próprio de falar,

modos herdados de antepassados, ou mesmo dificuldade na língua (órgão) ao pronunciar

certas palavras.

Certas palavras consideradas erradas por alguns gramáticos tem sua origem em outras

línguas, como o latim e no caso da região nordeste do Brasil a influência dos franceses e

holandeses que tentaram uma colonização em séculos passados.

Os preconceitos citados nesse livro (racial, religioso, sexual e etc...) também são

ligados ao uso da fala. O povo brasileiro não dá valor as nossas raízes, nossa cultura, só

valorizando o que vem dos países de primeiro mundo.

À medida que se vai avançando na leitura desse livro, vamos nos achando até patéticos

por até agora só vermos a forma correta e impecável de falar o Português Padrão, aquele

usado pelos acadêmicos. Mas vamos descobrindo que até em países de primeiro mundo como

nos Estados Unidos, os negros têm um modo de falar diferente dos brancos, e aí entra o

preconceito; são negros e por isso falam errado.

O que fica claro no livro é que não existe um jeito certo ou errado de falar, mas sim

heranças lingüísticas vindas de outros países e certas línguas, já consideradas mortas, como o

Latim.

No Brasil quem não fala o português acadêmico é considerado sem cultura. Mas

felizmente alguns escritores estudiosos de línguas, estão lutando para libertar o povo desses

preconceitos lingüísticos, e vamos querer acreditar que o ensino da língua portuguesa, num

futuro bem próximo, seja dado de uma forma que respeite o Brasil como um todo, levando-se

em consideração o falar de cada estado, cada região, cada aldeia. O que interessa realmente é

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que o Brasil é um país riquíssimo em cultura e que a diversidade da nossa língua é um fator

muito importante, que não deve ser alvo de preconceito.

PORTUGUÊS PADRÃO / PORTUGUÊS NÃO-PADRÃO

O livro de Marcos Bagno conta a história de três professoras e estudantes

universitárias que visitam a tia de uma delas, chamada Irene. Esta mora em uma fazenda em

Atibaia e é professora universitária já aposentada, de Língua Portuguesa e Lingüística.

No capítulo "Que língua é essa?", Irene dá aulas de Língua Portuguesa para as

estudantes. Segundo essa personagem, existe o "mito de unidade lingüística do Brasil", que

aprendemos nas escolas, de que no Brasil só se fala o português. Essa idéia é falsa, sem

correspondência na realidade, já que, mesmo sendo a minoria da população, existem outras

línguas que são faladas por nações indígenas espalhadas em diversas partes do país e por

imigrantes estrangeiros que mantém viva a língua de seus ancestrais.

Não existe nenhuma língua que seja uma só. O que chamamos de "português" não é

um bloco compacto, sólido, e sim um conjunto de coisas chamadas de variedades, diz Irene.

Também compara o modo de falar do português com o modo de falar do brasileiro e suas

diferenças fonéticas, sintáticas, lexicais, semânticas e no uso da língua. Outras diferenças

também existem em grau menor entre o português falado no Norte-Nordeste e o falado no

Centro-Sul. Além das variedades geográficas, existem as variedades de gênero,

sócioeconômicas, etárias, de nível de instrução, urbanas, rurais, etc. Se quisermos ser mais

exatos na hora de dar nome a uma língua, teríamos que levar em conta todas essas variáveis. É

como se cada pessoa falasse uma língua.

Segundo Irene:

Ainda, que toda língua muda e varia. Quer dizer, muda com o tempo (diacrônica) e varia no espaço (diatópica). Muda com o tempo, porque a língua que falamos hoje no Brasil não é a mesma do início da colonização e provavelmente também é diferente da língua que será falada aqui mesmo dentro de trezentos ou quatrocentos anos. E é por isso que não existe a língua portuguesa: o que existe é a norma-padrão, que é aquele modelo ideal de língua que deve ser usado pelas autoridades, pelos órgãos oficiais, pelas

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pessoas cultas, pelos escritores e jornalistas, aquela que deve ser ensinada e aprendida na escola. Essa norma, ao longo do tempo, se torna objeto de um grande investimento. No processo de cristalização da norma-padrão, a língua é analisada pelos gramáticos; definida pelos dicionários; imposta por decreto-lei pela Academia de Letras e divulgada pelos autores de livros didáticos. Por isso é que a norma-padrão parece ser mais rica, mais complexa que as demais variedades. Mas se esse investimento fosse aplicado a qualquer uma das variedades faladas no país, ela também enriqueceria e se tornaria o que se costuma chamar de "língua culta".

Irene continua explicando que, no momento que se estabelece uma norma padrão, ela

ganha tanta importância que todas as demais variedades são consideradas "impróprias",

"erradas" e "feias". Os motivos que levam determinada variedade a servir de base para o

padrão não tem nada a ver com as qualidades intrínsecas, internas, lingüísticas dessas

variedades e sim por motivos históricos, econômicos e culturais.

Irene afirma, então, que existe um português padrão (PP) que é usado para a literatura,

nas escolas, etc; e um português não-padrão (PNP) que é falado pela grande maioria de pobres

e pelos analfabetos. Por ser utilizado por pessoas de classes sociais marginalizadas e

oprimidas pelas injustiças sociais que impera no Brasil, o PNP é vítima dos mesmos

preconceitos que pesam sobre essas pessoas.

A criança que chega à escola falando o PNP é considerada uma "deficiente" lingüística, como se sua bagagem lingüística refletisse conseqüentemente uma inferioridade mental. Isso cria um sentimento de rejeição, levando o aluno a considerar-se incapaz de aprender qualquer coisa. O domínio da norma-padrão é uma forma que esse falante de PNP tem de ter acesso aos bens econômicos, políticos e culturais reservados à elites dominantes.

Como podemos ver, trata-se de um problema amplo e complexo que passa pela

transformação radical do tipo de sociedade em que vivemos. Se conhecêssemos melhor o

português não-padrão, talvez conseguíssemos identificar as diferenças que o distinguem do

português padrão. Irene diz que o PNP deve ser encarado como aquilo que ele realmente é:

uma língua bem organizada, coerente e funcional.

Irene comenta que na tentativa diária da aceitação das diferenças, devemos incluir

também uma língua diferente da nossa, sendo humildes e tentando ver o que os falantes do

PNP têm a nos ensinar sobre nós mesmos.

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Ensina ainda que a noção de "erro" deve ser reservada para problemas individuais. Se

alguém, ao invés de dizer cavalo diz cafalo estará cometendo um erro, porque essa palavra

não faz parte do registro de variedade do português do Brasil. Porém, se disser pranta no

lugar de planta não é um erro, esse é um fenômeno chamado de rotacismo, que acontece em

diversas regiões do país e que participou da formação da língua portuguesa padrão ao longo

dos séculos. Para chegar a tal constatação deve-se: comparar o PNP com outras línguas e

mostrar que nelas também ocorreram fenômenos semelhantes; buscar na história da própria

norma-padrão as explicações para determinar características que aparentemente são

exclusivas do PNP. Da mesma maneira que o latim se transformou lentamente nas diversas

línguas românicas hoje existentes, também cada uma delas continua se transformando.

Irene afirma que a diferença do português-padrão para o português não-padrão é que

este é:

Natural, transmitido, apreendido, funcional, inovador, tem tradição oral, estigmatizado, marginal, tem tendências livres e é falado pelas classes dominadas. Já o português padrão é: arbitrário, adquirido, aprendido, redundante, conservador, tem uma tradição escrita, é prestigiado, é oficial, tem tendências refreadas e é falado pela classe dominante.

Segundo Irene, existem muito mais semelhanças do que diferenças entre as

variedades, porém as pessoas escolarizadas não enfatizam as diferenças lingüísticas, mas sim

as diferenças sociais. Daí nasce o preconceito lingüístico.

Finalmente, Irene diz que por mais que sejam refreadas, as forças de mudanças

internas da língua nunca param de agir; e conta que foi do latim vulgar que surgiu, com o

passar do tempo, todas as línguas românicas.

A minha visão é muito clara a respeito das variáveis ou dialetos, já que isso acontece

com outras línguas, como o inglês e o italiano, além do português. No Brasil, de um modo

geral, temos definição nas regiões Sudeste e Sul, que têm um nível cultural, econômico e

político mais elevado e, por essa razão, usam a norma-padrão. Na região Nordeste, onde

encontramos estados econômica e culturalmente pobres, sua fala é vista como "engraçada",

"divertida" e "pitoresca", sendo muitas vezes desprezada, pelos falantes do Sudeste. Mas, se

formos para o interior do estado do Rio de Janeiro, poderemos observar essa variedade

peculiar da população pobre e marginalizada. Assim como no interior dos estados de São

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Paulo e Minas Gerais encontramos os caipiras tão ridicularizados, pelos moradores das

grandes cidades. No interior do Rio Grande do Sul, vamos encontrar a fala do imigrante

italiano e alemão, no Norte do país, a fala do índio, que são variedades significativas da língua

portuguesa falada no Brasil.

Podemos concluir, feita a leitura do capítulo que essas variedades geográficas,

culturais, urbanas, etc. estão intimamente atreladas ao poder socioeconômico. É culto e

importante quem sabe a norma-padrão, sem se levar em conta a bagagem de conhecimento e

sabedoria, que muitas vezes são abafadas pelo preconceito.

Por esses falantes da variedade serem desconsiderados, por não terem seus direitos

lingüísticos reconhecidos e sendo obrigados a assimilar uma variedade que é estranha a eles,

por nossa escola não conhecer uma multiplicidade de variedades do português e tentar impor

a norma-padrão para todos os alunos, sem procurar saber em que medida ela é na prática uma

"língua estrangeira", cabe a todos o professores, já que se servem da língua como meio de

transmissão dos conteúdos, a transformação do modo de olhar as variedades não-padrão em

todos os campos da educação, sendo tarefa de todos e não apenas dos professores de língua

portuguesa.

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Conclusão

Publicada em 1997, a obra sociolingüistica de Marcos Bagno, A Língua de Eulália,

procura mostrar que o uso de uma linguagem 'diferente', nem sempre pode ser considerado

um "erro de português". O modo estranho das pessoas falarem pode ser explicado por

algumas ciências como a lingüística, a história, a sociologia e até mesmo a psicologia.

Embora a nossa tradição educacional negue a existência de uma pluralidade dentro do

universo da língua portuguesa, e não aceite que a norma padrão é uma das muitas variedades

possíveis no uso do português, a "língua portuguesa" está em constante modificação e recebe,

notadamente, a influência de palavras pertencentes a outros idiomas, principalmente dos

imigrantes que chegam a todo momento no país, entre eles portugueses, americanos,

japoneses, alemães e italianos.

A obra faz parte da coleção Caminhos da Lingüística e conta a história de três

estudantes universitárias dos cursos de Psicologia, Letras e Pedagogia que escolhem a chácara

de sua professora Irene, em Atibaia -SP, para passar as férias escolares. No decorrer dos dias,

as jovens vão se integrando cada vez mais com a professora em situações pouco acadêmicas,

desenvolvendo conhecimentos e observações diferentes dos aprendidos em sala de aula, tendo

oportunidade de reciclar, com diferentes padrões, os vários conceitos da língua portuguesa.

Em diálogos e observações sobre o modo de falar de Eulália - a empregada e amiga de

muitos anos de Irene -, as jovens aprendem, perplexas, que palavras pronunciadas de forma

considerada errada, como "os fósfro", "os home", "as pranta", "os broco", "as tauba", "os

corgo", "a arvre", "trabaiá", o "R caipira", "tamém", além da "língua de índio" - Mim fazer -,

são; na verdade formas diferentes de pronúncia, e que não podem ser vistas pelos educadores

como "erradas" ou "pobres", mas sim diferentes do padrão vigente (pobres são aqueles que as

pronunciam, e errada é a situação de injustiça social em que vivem).

Apesar de ser considerado como "erro" por muitas pessoas, no português-padrão, que

é tido como o 'correto', existem alguns verbos que têm dois particípios passados, sendo um

deles com uma forma mais reduzida, como o verbo aceitar, que pode ser pronunciado como

aceitado ou aceito; entregar, que pode ser conjugado como entregado ou entregue; gastar, que

pode ser utilizado como gastado ou gasto, além dos verbos pagar onde as formas pagado ou

pago são encontradas, e salvar, também visto como salvado ou salvo.

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A professora Irene, que também é Doutora em Lingüística, chama a atenção das

estudantes para que reflitam se realmente a língua que se fala no Brasil é o português; uma

vez que os brasileiros não compreendem o português do século XII e nem o português falado

em Portugal. A conclusão a que chegam é que o nosso "português" não existe, por ser uma

língua formada por muitos outros idiomas e dialetos, totalmente mutáveis e variáveis.

Ela explica que o que existe na verdade, são variações do português. Em diferentes

regiões do país o português é falado com sotaques e características muito próprias, mas a

norma padrão, com uma ortografia oficial, definida pela Academia Brasileira de Letras, é uma

só, para ser seguida em todo o país.

Essa imposição marca a diferença entre a língua falada, que nem sempre segue o

padrão imposto por lei, e o português-padrão, chamado também de norma 'culta'. Enquanto o

português-padrão é aprendido nas escolas, e é aquele usado na linguagem escrita, o português-

não-padrão é passado de uma geração para outra, oralmente.

As regras do português-não-padrão são apreendidas quase naturalmente, por imitação.

É uma linguagem mais funcional, que trata de eliminar as regras desnecessárias. É uma

linguagem inovadora, que se deixa levar pelas forças vivas de mudança.

Por outro lado, o português-padrão é muitas vezes redundante, necessita de muitas

regras para dar conta de um único fenômeno. É conservador, demora muito para aceitar

qualquer tipo de novidade e por essa razão se mantém inalterado por um tempo muito longo.

No livro, a professora Irene considera ainda que, devido às imposições da norma culta

da língua portuguesa, pode-se observar muito mais semelhanças do que desigualdades na

comparação entre o português-padrão e o não-padrão. Essas semelhanças podem ser vistas

principalmente em traços lingüísticos, como os verificados em um falante escolarizado da

região Sul, que pode se comunicar perfeitamente com um analfabeto do Norte do país. Esse

mesmo analfabeto terá grandes dificuldades em entender uma linguagem mais padronizada.

Mas isso não significa que não tenha capacidade para aprender regras gramaticais, o que

depende, em parte, da maneira de ensinar na escola que ele vier a freqüentar.

Entre outras coisas, o livro A Língua de Eulália mostra que na comparação entre o

português-padrão e o português-não-padrão o maior preconceito apontado não são exatamente

as diferenças lingüísticas que prevalecem, mas sim, as diferenças sociais, mostrando que esses

preconceitos são comuns, como por exemplo o étnico: o índio "preguiçoso", o negro

"malandro", o japonês "trabalhador", o judeu "mesquinho", o português "burro"; o sexual: a

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valorização do "macho"; o cultural: o desprezo pelas práticas medicinais "caseiras", além dos

socio-econômicos: como a valorização do rico e o desprezo pelo pobre; entre outros.

Desvendando a sociolingüística de maneira especial, o autor se preocupa em transmitir

através desta obra, que por mais estranhas que possam parecer certas pronúncias, por mais

incompatíveis que sejam com o português padrão que aprendemos na escola, cada uma dessas

palavras têm uma origem perfeitamente explicável dentro da história da língua portuguesa.

A Língua de Eulália conduz o leitor a uma verdadeira "viagem ao País da Lingüística",

e ajuda a entender mais a nossa língua portuguesa.

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Referências Bibliográficas

BAGNO, Marcos. Novela Sociolingüística – A Língua de Eulália. Editora Contexto, São

Paulo, 1997

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