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AS OFERTAS PÚBLICAS INICIAIS NA BOVESPA NO PERÍODO RECENTE: CARACTERÍSTICAS DAS EMPRESAS, ESTRUTURA DE PROPRIEDADE E DE CONTROLE, E DESEMPENHO Dante Mendes Aldrighi * Resumo Este artigo examina os fatores determinantes na decisão das empresas de realizaram ofertas públicas iniciais (IPOs) na Bovespa no período entre 2002 e 2007. Investiga-se a influência sobre essa decisão de diversas características econômico-financeiras ex ante das empresas, tais como tamanho, gastos de investimento, crescimento das vendas, lucratividade, grau de endividamento, e setor em que atuam. São, ainda, analisadas as escolhas dos empresários relacionadas ao formato dessas IPOs, como, por exemplo, a parcela de oferta primária no total de oferta de ações, o segmento de listagem, a fração do maior acionista no capital votante da empresa após a IPO, e a parcela de free-float. Avalia-se, também, a relevância da conjuntura de liquidez internacional para a onda de IPOs nesse período, em particular o papel dos investidores estrangeiros na aquisição das ofertas. Por fim, verifica-se se há diferenças no desempenho e nas escolhas financeiras e de investimento das empresas antes e após a IPO. Destacam-se os seguintes resultados: (a) empresas maiores, mais lucrativas, com gastos de investimento mais elevados, e que mais crescem apresentam uma maior probabilidade de lançar uma IPO; (b) reestruturação financeira e diversificação da riqueza dos empresários não parecem ser motivações para as IPOs; e (c) as condições favoráveis do mercado internacional de capitais contribuíram para a onda de IPOs no período. A retomada do lançamento de IPOs no mercado brasileiro de ações a partir de 2004 culminou em 2007 com a abertura de capital de 64 empresas, que conjuntamente captaram cerca de R$ 55 bilhões. Tal montante é excepcional tanto se comparado ao dos anos anteriores ou ao valor total de desembolsos do BNDES, principal fonte de financiamento de longo prazo das grandes empresas brasileiras. 1 Entre 2004 e 2008, 109 empresas passaram a negociar suas ações na bolsa brasileira (Bovespa), 64 das quais em 2007. Juntas, essas empresas captaram um montante de R$ 86,4 bilhões, equivalente a uma arrecadação média por IPO de R$ 823 milhões. Entre os fatores usualmente identificados como responsáveis pelo boom no mercado de IPOs entre 2004 e 2007 destacam-se os sólidos fundamentos macroeconômicos da economia brasileira; os avanços nas reformas microeconômicas, especialmente a reforma da lei das S.A. em 2001 e da lei disciplinando as atribuições e responsabilidades da CVM em 2002; a farta liquidez internacional; e a criação em 2000 dos níveis diferenciados de exigências de governança corporativa pela Bovespa, aos quais as empresas podem aderir * Departamento de Economia, Universidade de São Paulo. O autor agradece ao BNDES e à ANPEC que, por meio do Programa de Fomento à Pesquisa em Desenvolvimento Econômico (PDE), deram apoio financeiro para a realização deste trabalho. A pesquisa contou com a enorme colaboração de Luis Eduardo Afonso na elaboração do banco de dados e na estimação do modelo econométrico. Guilherme Capparelli compilou dados detalhados sobre diversos aspectos das IPOs. Ariovaldo dos Santos generosamente cedeu o banco de dados da pesquisa “Melhores e Maiores” que a FIPECAFI realiza para a revista Exame e esclareceu diversas dúvidas do autor sobre questões contábeis. A todos eles, sou bastante grato. 1 Em 2007, os desembolsos desse banco atingiram R$ 64,9 bilhões.

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AS OFERTAS PÚBLICAS INICIAIS NA BOVESPA NO PERÍODO RECENTE: CARACTERÍSTICAS DAS EMPRESAS, ESTRUTURA

DE PROPRIEDADE E DE CONTROLE, E DESEMPENHO

Dante Mendes Aldrighi*

Resumo Este artigo examina os fatores determinantes na decisão das empresas de realizaram ofertas públicas iniciais (IPOs) na Bovespa no período entre 2002 e 2007. Investiga-se a influência sobre essa decisão de diversas características econômico-financeiras ex ante das empresas, tais como tamanho, gastos de investimento, crescimento das vendas, lucratividade, grau de endividamento, e setor em que atuam. São, ainda, analisadas as escolhas dos empresários relacionadas ao formato dessas IPOs, como, por exemplo, a parcela de oferta primária no total de oferta de ações, o segmento de listagem, a fração do maior acionista no capital votante da empresa após a IPO, e a parcela de free-float. Avalia-se, também, a relevância da conjuntura de liquidez internacional para a onda de IPOs nesse período, em particular o papel dos investidores estrangeiros na aquisição das ofertas. Por fim, verifica-se se há diferenças no desempenho e nas escolhas financeiras e de investimento das empresas antes e após a IPO. Destacam-se os seguintes resultados: (a) empresas maiores, mais lucrativas, com gastos de investimento mais elevados, e que mais crescem apresentam uma maior probabilidade de lançar uma IPO; (b) reestruturação financeira e diversificação da riqueza dos empresários não parecem ser motivações para as IPOs; e (c) as condições favoráveis do mercado internacional de capitais contribuíram para a onda de IPOs no período.

A retomada do lançamento de IPOs no mercado brasileiro de ações a partir de 2004 culminou em 2007 com a abertura de capital de 64 empresas, que conjuntamente captaram cerca de R$ 55 bilhões. Tal montante é excepcional tanto se comparado ao dos anos anteriores ou ao valor total de desembolsos do BNDES, principal fonte de financiamento de longo prazo das grandes empresas brasileiras.1 Entre 2004 e 2008, 109 empresas passaram a negociar suas ações na bolsa brasileira (Bovespa), 64 das quais em 2007. Juntas, essas empresas captaram um montante de R$ 86,4 bilhões, equivalente a uma arrecadação média por IPO de R$ 823 milhões. Entre os fatores usualmente identificados como responsáveis pelo boom no mercado de IPOs entre 2004 e 2007 destacam-se os sólidos fundamentos macroeconômicos da economia brasileira; os avanços nas reformas microeconômicas, especialmente a reforma da lei das S.A. em 2001 e da lei disciplinando as atribuições e responsabilidades da CVM em 2002; a farta liquidez internacional; e a criação em 2000 dos níveis diferenciados de exigências de governança corporativa pela Bovespa, aos quais as empresas podem aderir * Departamento de Economia, Universidade de São Paulo. O autor agradece ao BNDES e à ANPEC que, por meio do Programa de Fomento à Pesquisa em Desenvolvimento Econômico (PDE), deram apoio financeiro para a realização deste trabalho. A pesquisa contou com a enorme colaboração de Luis Eduardo Afonso na elaboração do banco de dados e na estimação do modelo econométrico. Guilherme Capparelli compilou dados detalhados sobre diversos aspectos das IPOs. Ariovaldo dos Santos generosamente cedeu o banco de dados da pesquisa “Melhores e Maiores” que a FIPECAFI realiza para a revista Exame e esclareceu diversas dúvidas do autor sobre questões contábeis. A todos eles, sou bastante grato. 1 Em 2007, os desembolsos desse banco atingiram R$ 64,9 bilhões.

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voluntariamente por meio de contrato privado. O intento deste artigo é contribuir para o entendimento da onda recente de IPOs na Bovespa, focalizando os seguintes aspectos: 1) Quais as características econômicas e financeiras das empresas que influenciaram a decisão dos proprietários de negociar publicamente suas ações? Para identificar os fatores relevantes na ocorrência de uma IPO, recorreu-se a modelos econométricos em que as variáveis explicativas testadas foram o tamanho da empresa, seu grau de endividamento, a rentabilidade, as taxas de crescimento da receita bruta, a taxa de investimento, o setor em que opera, e as oportunidades de crescimento na indústria (estas tendo como proxies as medianas do q de Tobin e da relação preço/lucro das empresas listadas do setor).

2) Quais foram as escolhas dos empresários relacionadas à configuração das IPOs, como, por exemplo, a proporção de emissões primárias e secundárias, o segmento de listagem, a participação no capital votante da empresa, e a parcela de free-float? Os proprietários originais renunciaram ao controle das empresas após as IPOs, rompendo com o padrão de concentração da propriedade e controle que tem prevalecido na cena corporativa brasileira?

3) Repetiu-se, aqui, o fenômeno observado em outros países de concentração temporal e setorial das IPOs?

4) Qual o peso relativo dos investidores estrangeiros na aquisição de ações dessas IPOs? Abundância de liquidez internacional foi um dos catalizadores da onda de IPOs no Brasil? 5) Qual a alocação dada aos recursos captados? Financiamento de investimentos? Reestruturação financeira? Capital de giro? 6) As IPOs representaram uma inflexão em termos de governança? Os conselhos de administração das empresas que fizeram IPOs compunham-se de uma parcela maior de membros independentes?

7) Quais as consequências da decisão dessas empresas de ingressarem na Bovespa sobre o desempenho e as escolhas financeiras e de investimento ? Há alteração na rentabilidade, alavancagem, e taxa de investimento vis-à-vis a situação delas anterior à IPO? Este artigo compõem-se de 5 seções, além desta introdução. Na primeira seção são discutidos os principais resultados da literatura visando identificar implicações que serão avaliadas à luz da experiência recente de IPOs no Brasil. Na seção seguinte, são apresentadas as fontes de dados e as conceituações referentes a estruturas de propriedade e controle. A seção III analisa as principais características das IPOs. Na seção IV, realiza-se um procedimento econométrico para estimar os fatores relevantes na ocorrência de IPOs. Finalmente, a seção V aponta e avalia as conclusões.

I. PRINCIPAIS RESULTADOS DA LITERATURA SOBRE IPOs

Um resultado robusto dos trabalhos empíricos sobre IPOs é que as condições do mercado de capital constituem o fator decisivo na decisão das empresas de passar a negociar ações

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em bolsa.2 Embora alguns fatores internos às empresas afetem também essa escolha, esta não resulta inevitavelmente do processo de desenvolvimento delas, existindo empresas de grande porte que mantêm o capital fechado e pequenas empresas listadas em bolsa. Por que muitas empresas optam por manter seu capital fechado? Inicialmente, a emissão de ações negociadas publicamente implica gastos com a IPO (fees pagas a underwriters e consultores jurídicos, despesas com publicação de balanços, prospectos e anúncios de oferta, taxas de registro em bolsas e em órgãos reguladores etc.) e, posteriormente, com a manutenção da condição de empresa listada em bolsa (despesas com taxas administrativas, com elaboração, publicação e auditoria de relatórios, balanços e demonstrações financeiras, com a operação de um departamento voltado para relações com investidores etc.). Como grande parcela dessas despesas é pouco sensível ao tamanho da empresa, seria mais fácil para as empresas de grande porte arcar com esses custos. Outra possível razão para os empresários manterem fechado o capital das empresas reside na preocupação de preservar a propriedade e o controle na tomada de decisões (Brau e Fawcett, 2006). Perda de confidencialidade, decorrente das exigências de disclosure, pode representar também um incentivo para manter a empresa com capital fechado, sobretudo em empresas de setores cujos gastos com pesquisa e desenvolvimento são elevados e cruciais para definir competitividade ou em que o grau de informalidade das relações de trabalho e a evasão tributária são altos, uma vez que a obrigação de divulgar balanços contábeis auditados estreitaria o escopo de tais práticas. O desconto no preço da ação na oferta pública inicial em relação ao preço da ação que prevalece nos primeiros pregões do mercado secundário pode ser outra desvantagem que inibe as IPOs. Várias teorias tentam explicar a ocorrência do underpricing, associado em geral a problemas de seleção adversa, ao comportamento oportunista de bancos de investimento, e ao risco de demanda e à incerteza do preço de market-clearing da IPO. Em um survey sobre underpricing, Ritter e Welch (2002) identificam teorias baseadas em informação simétrica e assimétrica. No primeiro grupo, a rationale do underpricing seria gerar: a) um excesso de demanda, permitindo ao underwriter discriminar preços e/ou determinar quem compra e quanto; ou b) liquidez, pois o desconto no preço ampliaria a demanda por ações, a base de compradores, e o volume de transações, tornando o valor da ação menos volátil e incerto. As teorias baseadas em informação assimétrica supõem ou que os emissores sejam mais bem informados do que os investidores ou o inverso. Quando a assimetria de informação nas IPOs favorece o emissor, este pode propor uma oferta com desconto para atrair o interesse dos investidores mesmo se tiver confiança na qualidade e valorização da empresa.3 No caso de investidores mais bem informados, os emissores não conseguem aferir com precisão a demanda potencial, o que os leva a ofertar ações a um preço mais baixo para testar a disposição dos investidores, podendo posteriormente corrigi-lo no período entre o prospecto definitivo e a abertura (price 2 Ver, entre outros trabalhos, Brau e Fawcett (2006), Pagano, Panetta e Zingales (1998), Pastor e Veronesi (2005), e Ritter e Welch (2002). 3 Ritter (1984) atribui a elevada dispersão de underpricing, sobretudo à heterogeneidade no acesso à informação a respeito das firmas: empresas mais jovens operando em mercados novos e com tecnologia dinâmica sofreriam um underpricing maior devido aos maiores problemas de assimetria de informação.

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update), ou então alterar a quantidade de ações oferecidas. É possível, ainda, que o underpricing resulte de assimetria de informações entre investidores, em que alguns investidores possuem informação privada sobre o real valor da empresa emissora.4 Brau e Fawcett (2006), entretanto, apresentam evidências de que os CFOs das empresas têm conhecimento do underpricing, mas o percebem como uma compensação aos investidores pelo risco que assumem com a IPO, decorrente das incertezas sobre o mercado. Segundo os autores, os CFOs das empresas da amostra analisada julgam que os underwriters das IPOs prestam um serviço importante de intermediação, descartando que o underpricing resulte de comportamento oportunista. Do lado dos potenciais benefícios de uma IPO, é possível apontar a diminuição do custo médio do capital. A emissão de ações pode ser uma fonte de financiamento menos custosa vis-à-vis o crédito bancário, especialmente em empresas operando em setores de maior risco e incerteza. Ademais, a listagem em bolsa pode afetar as condições de financiamento bancário, uma vez que as maiores exigências de disclosure e de transparência reduziriam a assimetria informacional, ensejando maior concorrência entre os bancos. Empresas de capital fechado possivelmente dependem mais de relational banking, o que confere enorme poder de mercado ao principal banco credor, permitindo-lhe extrair rents das empresas (Pagano, Panetta e Zingales, 1998).

Outra potencial vantagem da abertura de capital é a avaliação impessoal da empresa pelo mercado, baseada no monitoramento descentralizado provido por analistas e investidores. Enquanto Ritter e Welch (2002) enfatizam que tal valuation pode converter a empresa que fez uma IPO em alvo de takeover por outras empresas, Brau e Fawcett (2006) mostram que a motivação principal para as IPOs é a busca de capital e reputação para a aquisição de outras empresas.5

Diversificação de portfolio e maior liquidez da riqueza podem também ser motivações de IPOs. Uma IPO envolve a decisão sobre a estrutura de controle: o empreendedor pode retê-lo, transferi-lo, ou optar pela dispersão da propriedade do capital.6 Pode ainda preservar o controle por algum tempo após a IPO com o objetivo de transferi-lo posteriormente a termos mais favoráveis, que decorreriam dos ganhos de visibilidade e liquidez. É provável que a maior liquidez das ações resultante da negociação em bolsa reduza o custo de capital. Algumas empresas tentam ampliar os benefícios de maior liquidez recorrendo à dupla listagem para explorar a ampla base de investidores de bolsas internacionais. Um impacto benigno adicional da cross-listing sobre o valor de mercado da empresa é a submissão a padrões mais exigentes de governança e de enforcement legal das autoridades regulatórias dos países mais desenvolvidos. Vários trabalhos encontram evidências para diversos países de que as IPOs se concentram 4 Sobre spillovers de informação entre investidores com diferentes graus de informação, ver Biais, Bossaerts, e Rochet (2002), Maksimovic e Pichler (2002), e Sherman e Titman (2002). 5 Os resultados da pesquisa desses autores não endossam a interpretação de que a principal motivação das IPOs é a redução do custo médio do capital. 6 Pagano, Panetta e Zingales (1998) observam uma frequência elevada de transferências de controle após as IPOs de empresas italianas no período 1982-1992. Como será visto, a experiência recente de IPOs no Brasil é bastante distinta.

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nas fases de boom do mercado acionário e tendem a ocorrer em determinadas setores.7 Embora o “clustering” temporal e setorial de IPOs possa refletir oportunidades favoráveis de investimento em determinados setores, esses trabalhos constatam que tal evidência resulta, sobretudo do comportamento das firmas de explorarem a janela de oportunidade ensejada pelas condições favoráveis do mercado acionário, do setor, ou do mercado de IPOs (market timing).

Alguns autores interpretam a elevada sensibilidade da decisão de uma IPO às condições do mercado acionário (em particular, ao desempenho de ofertas recentes) à luz dos spillovers de informação entre investidores com diferentes graus de informação. Dada a assimetria de informação entre firma emissora e a maioria dos investidores e entre investidores, prevalece um desconto no preço de oferta, que permite a investidores informados se apropriar de rents informacionais. Alti (2005) argumenta que preços elevados de oferta para as IPOs (isto é, preços que excedem as expectativas iniciais) refletem melhor a informação dos investidores, promovendo o efeito de spillover, facilitando a precificação das IPOs posteriores e, portanto, incentivando mais firmas a fazerem IPOs. Para esse autor, os resultados das IPOs pioneiras revelam informação privada dos investidores sobre “fatores de valuation comuns” e este spillover de informação reduz a incerteza sobre esses fatores, diminuindo os custos das IPOs subsequentes. Enquanto preços elevados sinalizam notícias boas, preços baixos não necessariamente expressam notícias ruins, mas apenas ausência de ofertas mais elevadas. Assim, as firmas lançam IPOs nos momentos de hot market como reação à estratégia de investidores informados de capturar rents de informação. O market timing de IPO pelos seguidores constitui um resultado endógeno de equilíbrio visando minimizar o mispricing na oferta. Alti observa, ainda, que nos hot markets a qualidade das IPOs declina ao longo do tempo e, por isso, a utilização das receitas das IPOs difere entre pioneiros, que logo as alocam para investimentos, e seguidores, que as retêm em caixa por mais tempo.

A ocorrência de market-timing, por sua vez, cria incentivos para a prática do “window-dressing,” isto é, manipulação dos balanços, demonstrativos e prospectos para explorarem a janela de oportunidade aberta em momentos de euforia no mercado de ações. Nesses momentos em que o otimismo exagerado dos investidores engendra a valorização excessiva das ações, a qualidade média das firmas que abrem o capital tende a declinar. Firmas menores e mais novas podem se beneficiar ainda mais do timing da IPO. Brau e Fawcett (2006) assinalam que, para os CFOs, o histórico de lucratividade é o principal sinal transmitido aos investidores sobre a qualidade da empresa (a certificação do underwriter vem em segundo lugar). A importância dessa variável pode reforçar o incentivo das empresas para a prática de window dressing. Em contrapartida, atitudes dos insiders que sugiram avidez no embolso de recursos da IPO são interpretadas pelos 7 Ritter e Welch (2002) e Pagano, Panetta e Zingales (1998) identificam as condições do mercado de capital como um dos fatores decisivos na decisão de abrir o capital. Brau e Fawcett (2006) assinalam que os insiders das empresas de sua amostra são oportunistas no timing da IPO, sobretudo aquelas em que há venture capitalists, norteando a decisão da IPO predominantemente pelas condições do mercado acionário em geral (preços altos das ações) e do setor de atividade, e não pelas condições do mercado de IPO. Ver, também, Lowry e Schwert (2002), Pastor e Veronesi (2005), e Benveniste, Ljungqvist, Wilhelm, e Yu (2003).

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investidores como um sinal negativo. Embora a influência das condições do mercado de capital sobre a decisão de lançar uma IPO seja interpretada pela maioria dos trabalhos como uma ineficiência,8 Pastor e Veronesi (2005) desenvolvem um modelo de timing ótimo de IPOs em que as flutuações no volume destes independem de mispricing e são provocadas por mudanças nas seguintes condições de mercado: taxa do retorno esperado do mercado, rentabilidade agregada esperada, ou incerteza prévia sobre a lucratividade futura média das IPOs. Testando as implicações do modelo, encontram evidências empíricas que as corroboram: ondas de IPOs tendem a ser precedidas por taxas elevadas de retorno do mercado acionário e seguidas por taxas baixas de retorno; ondas de IPO associam-se a aumentos na lucratividade agregada; o volume de IPOs tende a reagir principalmente a variações, e não tanto ao nível, dos preços das ações; e o volume de IPOs é negativamente relacionado a mudanças na volatilidade dos retornos de mercado. À luz do exposto acima, pode-se destacar os seguintes incentivos que os proprietários de uma empresa de capital fechado têm para realizar uma IPO: (a) o acesso a uma fonte de financiamento alternativa ao crédito bancário; (b) o maior poder de barganha com os bancos e, como resultado, taxas menores de juros; (c) a diversificação de portfólio; (d) os benefícios de maior liquidez e a consequente redução no custo de capital; e (e) market timing. Em contrapartida, entre os custos que as empresas incorrem com a abertura do capital, cabe mencionar: (a) o desconto no preço das ações em decorrência do problema da seleção adversa, desconto esse ainda maior em empresas novas e pequenas; e (b) as maiores exigências de disclosure, que podem dificultar a evasão fiscal e forçar as empresas a revelarem informações estratégicas que favorecem seus concorrentes. Uma vez que o trabalho de Pagano, Panetta e Zingales (1998) é um dos poucos fundamentados em dados sistemáticos a analisar as causas e efeitos das IPOs, convém apresentar alguns de seus resultados. Em sua amostra composta de empresas italianas, constatam que o principal determinante da probabilidade de uma IPO é a mediana da relação entre valor de mercado e valor contábil das empresas listadas do setor correspondente. Como verificam uma queda no investimento e na lucratividade depois da IPO, inferem que o coeficiente positivo da variável market-to-book ratio do setor expressa a tentativa dos empresários de explorar momentos de euforia do mercado acionário (market timing), descartando a interpretação alternativa de que refletiria uma necessidade maior de investimento em setores com elevadas oportunidades de crescimento.

Observam também que empresas maiores e mais antigas têm maior probabilidade de abrir o capital, o que pode indicar que escala e idade operam como proxies para reputação: empresas menores e emergentes seriam pouco conhecidas e, por conseguinte, enfrentariam problemas maiores de seleção adversa ao se lançarem no mercado. No caso de IPOs de empresas pertencentes a um grupo econômico, tamanho não se mostra relevante, talvez por haver spillover da reputação da empresa-matriz e esta assumir os 8 Ver, entre outros, Pagano, Panetta, e Zingales (1998), Baker e Wurgler (2000), e Lowry (2003). Tal interpretação sustenta que as empresas lançam IPOs em momentos em que as ações de outras empresas do mesmo setor estão sendo negociadas a preços sobrevalorizados. Pressupõe, assim, que o mispricing do mercado é percebido pelos insiders dessas empresas mas não pelos investidores.

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custos fixos de listagem. Outro resultado que encontram é que empresas mais lucrativas e com crescimento acelerado das vendas apresentam maior probabilidade de realizarem IPOs. A análise desses autores aponta uma redução substancial da rentabilidade, alavancagem e investimentos após as IPOs, sendo estes efeitos persistentes mesmo depois de três anos. No que se refere aos investimentos, apenas dois anos após a IPO o declínio é significativo, mas o efeito é forte e permanente, o que leva os autores a concluírem que empresas independentes abrem o capital com o objetivo de se reestruturarem financeiramente após um período de investimentos elevados. No caso de IPOs de empresas subsidiárias (carve-outs), ocorre o contrário: há um aumento significativo no investimento após a IPO e a alavancagem cai a um ritmo mais lento, o que pode indicar que, além de permitir que o controlador venda parte de sua participação, a IPO serve para financiar novos investimentos. Com base nos argumentos teóricos e empíricos acima esboçados, podem ser formuladas as seguintes implicações testáveis: a) Se o coeficiente da variável “valor de mercado/valor contábil” dos setores no modelo de estimação da probabilidade de ocorrência de uma IPO for positivo e significativo, há então duas possibilidades:

a1) Valores altos dessa variável refletem elevadas oportunidades de expansão do setor, levando empresas deste setor a realizarem IPOs para financiarem a maior necessidade de investimentos; nesse caso, espera-se que os investimentos e a lucratividade cresçam após as IPOs;

a2) Valores altos dessa variável expressam a tentativa das empresas de explorar o market timing, lançando IPOs em momentos em que os preços das ações de empresas pertencentes à mesma indústria estão sobrevalorizados; isso implicaria queda nos investimentos e na lucratividade.

b) Se os proprietários iniciais visam à diversificação de portfolio, então é baixa a fração do capital sob seu controle e são elevados o percentual de free float das ações e as parcelas de emissões secundárias; c) A explicação das IPOs baseada em seleção adversa e reputação sugere que firmas maiores e mais velhas têm maior probabilidade de abrir o capital; d) Se os coeficientes das variáveis “investimento” e “leverage” no modelo forem positivos e significativos e, adicionalmente, houver uma queda no nível destas variáveis após a IPO, é bem provável que a motivação para a IPO seja a reestruturação financeira.

II. DADOS E CONCEITUAÇÕES

A. Dados As fontes de dados utilizadas para a pesquisa sobre as empresas que realizaram IPOs entre 2002 e 2008 foram: a) Informativo Anual (IAN) e Demonstrações Financeiras Padronizadas (DFP): relatórios que todas as empresas de capital aberto no Brasil são obrigadas, por força legal, a

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fornecer anualmente à Comissão de Valores Imobiliários (CVM). Os dados dos IANs relevantes para o propósito deste trabalho são: i) a quantidade e modalidade de ações sob a propriedade dos acionistas com pelo menos 5% do capital da empresa; ii) a quantidade de ações emitidas pela empresa por tipo de ação (ordinária, e preferencial com e sem direito a voto); iii) a existência de acordo formal de votos entre acionistas; iv) a relação dos diretores e dos membros dos conselhos de administração das empresas; e v) informações gerais sobre as empresas. Das DFPs, extraíram-se dados de balanço patrimonial e demonstração de resultados.

b) Editais de anúncio de encerramento de emissão pública de ações, que fornecem, entre outras informações, a proporção entre ofertas primária e secundária, o montante captado na IPO, o preço por ação e o perfil dos compradores. Por exigência da CVM, esses editais são publicados em jornais de grande divulgação e podem ser encontrados nos sites das respectivas empresas; c) Banco de dados da “Melhores e Maiores” (Revista Exame), que dispõe de dados econômicos e financeiros sobre empresas de capital aberto e fechado, permitindo comparar as características das empresas que realizaram IPOs com as das empresas de capital fechado, antes e depois das IPOs; d) Economatica, de onde foram obtidos dados das empresas listadas em bolsa relativos a despesas com capital, estoque de capital, grau de endividamento, valor de mercado e valor contábil etc.

e) Bloomberg, que fornece dados sobre cotações de ações, necessárias para o cálculo dos retornos iniciais.

B. Definições de direitos de cash flow e de voto Uma vez que o grau de concentração dos direitos de votos do maior acionista último na grande maioria das empresas no Brasil é bastante elevado, define-se acionista controlador como o acionista que possui direta ou indiretamente (via estrutura de pirâmide) pelo menos 50% dos direitos de voto da empresa.9 Por sua vez, o maior acionista último de uma empresa é o acionista que possui, diretamente ou por meio de uma estrutura de pirâmide, a maior porcentagem dos direitos de voto.

Para cada empresa, elaborou-se o organograma dos acionistas com participação superior a 5% do capital social total. Os direitos de voto do maior acionista último da empresa representam a soma das frações que este possui no total das ações ON e das ações PN com direito a voto. Por sua vez, os direitos de fluxo de caixa do maior acionista último representam a fração que este detém do total de ações ON e PN.

O cálculo da participação do acionista último nos direitos de fluxo de caixa da empresa depende da existência ou não de uma propriedade piramidal. Se a empresa examinada não for parte desse tipo de estrutura, a parcela dos direitos de fluxo de caixa do acionista último é dada diretamente pela fração do capital social que tal acionista possui na empresa considerada. Havendo propriedade piramidal, a parcela dos direitos de fluxo de

9 Ver Aldrighi e Mazzer Neto (2007).

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caixa é dada pelo produto das frações do capital nas empresas envolvidas na pirâmide. A estimativa da parcela dos direitos de voto do maior acionista último depende de haver ao longo da cadeia piramidal participações acionárias com direitos de votos inferiores a 50%. Não havendo, considera-se que a parcela dos direitos de voto do maior acionista último é determinada pela soma entre a porcentagem do capital votante que o último intermediário na cadeia de propriedade piramidal possui na empresa da amostra e a parcela dos votos que o maior acionista último eventualmente detenha diretamente nesta empresa. Se, entretanto, houver participações acionárias não controladoras ao longo da cadeia piramidal, a parcela dos direitos de voto do maior acionista último é dada pela soma entre o produto dessas participações e a parcela dos votos que eventualmente o maior acionista último possua diretamente na empresa examinada. Os indicadores financeiros e de desempenho foram construídos com base em dados de balanço (como alavancagem, retorno sobre ativos, e taxa de investimento) e em dados referentes também à valoração do mercado (por exemplo, o q de Tobin, isto é, a relação entre o valor de mercado e o valor contábil das empresas).

III. CARACTERÍSTICAS DAS IPOs RECENTES NO BRASIL

Nesta seção tenta-se demarcar as principais características das IPOs realizadas nesta década no Brasil, tendo como guia algumas das proposições discutidas na Seção I. Na seção seguinte, essa análise é complementada com a elaboração de modelos econométricos de variável dependente limitada para estimar a probabilidade de ocorrência de IPOs.

A. Aspectos da governança das empresas que fizeram IPO Uma característica saliente do cenário corporativo brasileiro até o final dos anos noventa era a forte concentração da propriedade de capital e dos direitos de votos da empresa em alguns poucos acionistas, em geral famílias, com profundas implicações sobre a governança. A emissão de ações sem direito a voto e a propriedade do capital via arranjos piramidais resultavam na predominância de acionistas controladores, que dispunham de ampla discricionariedade para expropriar acionistas minoritários. Com os novos segmentos de listagem introduzidos pela Bovespa e com as reformas nas leis referentes às sociedades anônimas e à CVM, esperava-se que as empresas ingressantes na Bovespa passassem a apresentar uma estrutura de propriedade do capital mais dispersa e que seus maiores acionistas teriam poder de voto significativamente inferior ao das empresas operando no segmento tradicional de listagem.

De fato, a demanda dos investidores, sobretudo estrangeiros, por padrões mais exigentes de governança teve papel decisivo na concentração da listagem das IPOs no Novo Mercado no período entre 2004 e 2008. A Tabela I mostra que esse segmento foi

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escolhido por 71% das empresas que ingressaram na Bovespa nesses cinco anos.10 Com isso, das 389 empresas com ações negociadas na Bovespa em dezembro de 2008, 175 empresas estavam listadas nos três segmentos com maior exigência de governança, 99 das quais no Novo Mercado (cerca de 25% do total).

Tabela I - Número de IPOs e Montante Arrecadado por Nível de Governança

(2004-2008) 2004 2005 2006 2007 2008 Total N. MA N. MA N. MA N. MA N. MA N. MA N. Merc. 5 3020 7 4275 20 11188 43 42936 3 7474 78 68893 Nível 2 2 1466 2 1173 4 2629 7 4160 0 0 15 9428 Nível 1 0 0 0 0 0 0 8 4906 0 0 8 4906 BDRs 0 0 0 0 2 1586 6 3138 0 0 8 4724 Total 7 4486 9 5448 26 15403 64 55140 3 7474 109 87951

Montante arrecadado em R$ milhões Fonte: Elaboração do autor a partir de dados da CVM e dos prospectos de IPOs das empresas.

Como reflexo da opção pelo ingresso no Novo Mercado, que permite apenas a emissão de ações ordinárias, das 101 empresas que lançaram IPOs e cujos dados sobre número de ações ordinárias e preferenciais estavam disponíveis, 78 tinham o capital social constituído integralmente por ações ordinárias, todas listadas no Novo Mercado.11 Das 23 empresas restantes (quinze listadas no Nível 2 e oito no Nível 1), oito haviam emitido menos de 1/3 do capital social na forma de ações preferenciais, doze na faixa entre 1/3 e 50%, e apenas três em uma proporção superior a 50%.

A despeito dessas mudanças significativas nos últimos anos, motivadas em grande parte pelas reformas legais e pela inovação institucional da Bovespa, as empresas que lançaram IPOs entre 2004 e 2008 não promoveram uma ruptura com o padrão tradicional de estrutura concentrada de propriedade do capital e do controle. A análise da parcela das ações em circulação no mercado revela que os controladores e a tesouraria retêm ainda parcela preponderante das ações. A Tabela II mostra que 82% das 107 empresas estreantes na BOVESPA no período 2004-2008 com dados pertinentes disponíveis possuem free float inferior a 50%. Observa-se na Tabela III que a média de free float do capital social é semelhante em todos os segmentos de listagem, mantendo-se inferior a 40% mesmo no Novo Mercado. A expressiva discrepância entre os percentuais de free float relativos a ações ordinárias e ao total de ações para as empresas emissoras de BDRs e aquelas listadas no Nível 1 e no Nível 2 reflete a emissão de ações sem direito a voto pelas empresas que se listaram nesses segmentos (ver Tabela IV). 10 Como a Resolução 282 da Bovespa, de 2002, obriga qualquer empresa estreante na bolsa brasileira a se listar pelo menos no Nível 1, algumas empresas controladas por brasileiros e refratárias às recentes exigências de governança registraram-se em paraísos fiscais e regulatórios e emitiram Brazilian depositary receipts (BDRs), captando recursos no mercado de capital brasileiro. Cabe notar, também, que restrições legais impedem que algumas das exigências do Novo Mercado sejam satisfeitas por empresas de certos setores (como bancos, aviação, e ferrovias), obrigando-as a se listarem em níveis inferiores de governança. 11 As ações ordinárias (ON) concedem a seus titulares o direito de voto em assembléia, enquanto os detentores de ações preferenciais (PN) raramente dispõem deste direito, embora haja empresas com ações PN com direito a voto.

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Tabela II - Distribuição do Número de Empresas com IPOs Segundo Intervalos de Free-Float do Capital Social: 2004-2008

Porcentagem da Distribuição N. % do Número de Empresas Menor do que 20% 13 12,15% Maior ou igual a 20% e menor do que 30% 35 32,71% Maior ou igual a 30% e menor do que 40% 20 18,69% Maior ou igual a 40% e menor do que 50% 20 18,69% Maior ou igual a 50% e menor do que 75% 16 14,95% Maior ou igual a 75% 3 2,80% Total 107 100,00%

Fonte: Elaboração do autor a partir de dados dos prospectos de IPOs das empresas.

Tabela III - Free-Float do Capital Social das Empresas com IPOs por

Segmento de Listagem: 2004-2008 Segmento de Listagem Média Mediana Mínimo Máximo Desvio-Padrão BDR 32,14% 31,27% 16,19% 54,18% 0,12429 Nível 1 31,47% 27,83% 13,12% 83,38% 0,22005 Nível 2 32,87% 32,29% 7,70% 70,65% 0,15684 Novo Mercado 38,02% 35,01% 0,00% 84,27% 0,16853

Fonte: Elaboração do autor a partir de dados dos prospectos de IPOs das empresas.

Tabela IV Free-Float das Ações Ordinárias das Empresas com IPOs por Segmento de Listagem: 2004-2008

Segmento de Listagem Média Mediana Mínimo Máximo Desvio-Padrão BDR 26,24% 31,27% 0,00% 69,48% 0,24864 Nível 1 20,20% 11,64% 0,00% 83,38% 0,27217 Nível 2 16,58% 11,41% 0,00% 50,45% 0,15966 Novo Mercado 38,02% 35,01% 0,00% 84,27% 0,16853

Fonte: Elaboração do autor a partir de dados dos prospectos de IPOs das empresas. Com a inovação institucional dos níveis diferenciados de governança corporativa e do Novo Mercado, a expectativa era de que as empresas que fizessem IPOs apresentariam uma distribuição dos direitos de voto menos concentrada vis-à-vis à das empresas operando no segmento tradicional da BOVESPA. A despeito da concentração das listagens das empresas no Novo Mercado, as IPOs não provocaram descontinuidade com o padrão tradicional de propriedade do capital e de controle. A Tabela V mostra que a participação média do maior acionista último nos direitos de votos das empresas que realizaram IPOs é bastante elevada em todos os segmentos de listagem, não excedendo o cutoff que define a existência de um controlador apenas no grupo de empresas que se listaram no Novo Mercado, no qual a média foi de 47%. Em 62% das empresas que realizaram IPOs havia um controlador, isto é, um acionista detendo mais de 50% do capital votante; e em 16% delas o controlador era proprietário de 75% ou mais dos votos. Em contrapartida, a parcela das empresas em que o maior acionista último detinha menos

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de 20% do capital votante era 10% (ver Tabela VI).12 Das 77 empresas que fizeram IPOs e se listaram no Novo Mercado, em 44 o maior acionista último detinha mais de 50% do capital votante.13 Acordo de acionistas garantia o controle em 18 empresas que fizeram IPOs entre 2004 e 2008 e se listaram no Novo Mercado (em apenas uma empresa o acordo não implicou controle). O número médio de participantes dos acordos é 4.4 (mediana, 4), mas atinge até 11 na Natura.

Tabela V - Participação Média do Maior Acionista Último nos Direitos de Votos e de

Cash-Flow das Empresas e Desvio entre esses Direitos por Nível de Governança (2004-2008)

Nível de Governança Direitos de Votos* Direitos de Cash Flow* Desvio de Direitos‡ BDRs 74,61 40,61 34,00 Nível 1 68,89 48,94 19,95 Nível 2 73,05 55,43 17,63 N, Mercado 47,62 44,48 3,13

Dados referentes a 107 empresas * Porcentagem; ‡ Pontos percentuais Fonte: Elaboração do autor a partir dos IAN e dos prospectos de IPOs das empresas.

Tabela VI - Distribuição da Participação do Maior Acionista Último no Capital Votante das Empresas que Lançaram IPOs

(2004-2008) Fração do Capital Votante N. de Empresas Parcela do N. de Empresas ≤ 20% 11   10,28%  ≥ 20% e < 30% 10   9,35%  ≥ 30% e < 40% 7   6,54%  ≥ 40% e < 50% 12   11,21%  ≥ 50% e < 75% 49   45,79%  ≥ 75% e < 100% 11   10,28%  100% 7   6,54%  Total 107   100,00%  

Fonte: Elaboração do autor a partir dos IAN e dos prospectos de IPOs das empresas. Chama atenção, também, a elevada parcela dos direitos de cash flow sob a propriedade do maior acionista último — acima de 40% em todos os segmentos. Em 54% das empresas da amostra de IPOs, 54% tinham um acionista proprietário de 50% ou mais do capital social (Tabela VII). Em termos médios, os desvios entre direitos são expressivos, exceto para o grupo de empresas listadas no Novo Mercado (Tabela V). Entretanto, em 12 das 77 empresas da amostra de IPOs que se listaram no Novo Mercado o desvio entre direitos era positivo e em 6 o desvio excedia 20 pontos percentuais. No mesmo sentido, estruturas piramidais de propriedade prevaleceram também nas empresas que fizeram IPOs que se listaram no Novo Mercado (das 77, 49 estavam envolvidas em arranjos piramidais), 12 Os direitos de votos do maior acionista último das empresas que lançaram IPOs entre 2004 e 2008 apresentam média de 47.62%, mediana de 51.23%, mínimo de 5.94% e máximo de 100%. 13 Entre elas, a Nossa Caixa (71.25%), a CPFL Energia (72.17%), a Grendene (74.10%), a Natura (74.48%).

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sendo que no caso da Cosan Ltd. e da CPFL Energia sete empresas intermediárias conectavam cada uma delas ao maior acionista último.

Tabela VII - Distribuição da Participação do Maior Acionista Último no Capital

Total das Empresas que Lançaram IPOs (2004-2008)

Fração do Capital Votante N. de Empresas Parcela do N. de Empresas ≤ 20% 21   19,63%  ≥ 20% e < 30% 9   8,41%  ≥ 30% e < 40% 7   6,54%  ≥ 40% e < 50% 12   11.21%  ≥ 50% e < 75% 57   53.27%  ≥ 75% 1   0.93%  Total 107   100.00%  

Fonte: Elaboração do autor a partir dos IAN e dos prospectos de IPOs das empresas.

Tabela VIII - Nível de Pirâmide das Empresas que Lançaram IPO (2004-2008)

Nível de Pirâmide

N. de Empresas

% do N. de Empresas

N. de Empresas do Novo Mercado

% do N. de Empresas do Novo Mercado

0   24   22,43%   18   23,38%  1 42   39,25%   26   33,77%  2 26   24,30%   22   28,57%  3 8   7,48%   6   7,79%  4 3   2,80%   2   2,60%  6 1   0,93%   1   1,30%  7 2   1,87%   2   2,60%  8 1   0,93%   0 0,00%  Total   107   100,00%   77 100,00%  

Fonte: Elaboração do autor a partir dos IAN e dos prospectos de IPOs das empresas.

As empresas da amostra de IPOs parecem manter, também, uma continuidade com o padrão tradicional de composição dos Conselhos de Administração. A Bovespa define “conselheiros independentes” como os membros do conselho de administração que não são executivos da empresa e não foram indicados pelo controlador. Esse critério subestima o grau efetivo de independência do conselheiro pois não capta outros vínculos que o tornam submisso aos controladores e CEOs — como relações de amizade ou negócios em outras atividades. Adotando-se essa definição, classificou-se a composição dos conselhos das empresas que realizaram IPOs entre 2004 e 2008 com base nos dados compilados a partir do IAN de cada uma dessas empresas. Verifica-se que na empresa média da amostra de IPO apenas 27% são conselheiros independentes, indicando um amplo potencial para comportamento passivo dos conselheiros, de meramente chancelar decisões dos executivos e controladores. Mesmo nas empresas que se listaram no Novo Mercado, a parcela média de independência dos conselhos é 27%, contra 24% nas empresas do Nível 2 e de apenas 16% nas estreantes do Nível 1. A Tabela IX revela que 38% das 106 empresas da amostra de IPOs não tinha em seus conselhos nenhum membro independente e em apenas 20% das empresas o grau de independência superava 50%.

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Tabela IX - Participação de Membros “Independentes”nos Conselhos de Administração das Empresas IPOs

(2004-2008) Idade (anos) N. de Empresas % do N. de Empresas

0% 41 38,7% > 0% e ≤ 25% 25 23,6% > 25% e ≤ 50% 18 17,0% > 50% e ≤ 75% 9 8,5% > 75% e ≤ 100% 5 4,7% 100% 8 7,5% Total 106 100,0%

Fonte: Elaboração do autor a partir dos IAN e dos prospectos de IPOs das empresas. Em relação aos tipos de oferta pública inicial de ações, 37 empresas fizeram apenas ofertas primárias, 9 recorreram exclusivamente a emissões secundárias, e as demais realizaram ofertas mistas, combinando ambas as formas em proporções variadas (Tabela X). Mais de 79% das empresas fizeram emissões primárias em uma proporção acima ou igual a 50%, sendo a média e a mediana da parcela deste tipo de emissões no total das ofertas de, respectivamente, 70.9% e 77.8%). Essas estatísticas sugerem que os proprietários originais preservaram uma participação elevada no capital das empresas após as IPOs.

Tabela X - Distribuição da Participação de Oferta Primária no Total das IPOs

(2004-2008) Fração de Oferta Primária N. de Empresas % do N. de Empresas 100%   37   34,91%  ≥ 75% e < 100%   20   18,87%  ≥ 50% e < 75%   27   25,47%  ≥ 33% e < 50%   7   6,60%  > 0% e < 33%   6   5,66%  0%   9   8,49%  Total   106   100,00%  

Fonte: Elaboração do autor a partir prospectos de IPOs das empresas. B. Alocação das receitas das IPOs De acordo com os anúncios de encerramento das IPOs, as empresas que fizeram emissão primária destinaram a maior parcela dos recursos captados a investimentos, sobretudo infraestrutura e aquisição de outras empresas ou de participações, o que pode sugerir um efeito benéfico das IPOs sobre a acumulação de capital das empresas. A Tabela XI mostra que, na média, essa parcela foi de 78%, sendo que 86% das empresas despenderam 50% ou mais das receitas das IPOs em investimentos, e 35% das empresas as utilizaram integralmente para esse tipo de gasto (Tabela XII). Para o financiamento do capital de giro, foram empregados, em média, 12% dos recursos arrecadados nas IPOs pelas empresas, enquanto a parcela alocada no pagamento de dívidas foi de apenas 9%,14

14 Das 96 empresas cujos dados sobre uso das receitas das IPOs estavam disponíveis, apenas 11 utilizaram mais de 1/3 dos recursos para pagamento de dívidas (o mesmo ocorre para o financiamento de capital de giro); 62 empresas não despenderam recursos das IPOs para reduzir endividamento e 49 não os utilizaram

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bem abaixo do que Pagano, Panetta e Zingales (1998) encontram para as empresas italianas, cujo dinheiro levantado pelas IPOs era canalizado principalmente para a redução do leverage. A destinação reportada das receitas dos IPOs no Brasil nesse período é semelhante à que Ritter e Welch (2002) observam para os EUA: em ambos os países, a maioria das empresas concentra os recursos captados no financiamento do crescimento futuro, e não na reestruturação financeira.15

Tabela XI - Destinação dos Recursos Captados da Emissão Primária

(2004-2008) Uso dos Recursos

Média   Mediana   Máximo   Mínimo   Desvio-Padrão  

Investimento* 78,25%   90,00%   100,0%   0,0%   0,2639  K de Giro* 12,5%   0,00%   80,0%   0,0%   0,1743  Dívida* 9,0%   0,00%   71,7%   0,0%   0,1749  Outros* 0,3%   0,00%   8,0%   0,0%   0,0131  Rec. Líquidos‡ 434,6   366,3   2,023,1   15,0   318,54  

* em %; ‡ em R$ milhões, antes do green shoe Fonte: Elaboração do autor a partir dos prospectos de IPOs das empresas.

Tabela XII - Parcela dos Recursos Líquidos das IPOs Destinada a Investimentos (2004-2008)

Fração de Oferta Primária N. de Empresas % do N. de Empresas 100%   34   35,42%  ≥ 75% e < 100%   30   31,25%  ≥ 50% e < 75%   19   19,79%  ≥ 33% e < 50%   5   5,21%  > 0% e < 33%   5   5,21%  0%   3   3,13%  Total   96   100,00%  

Fonte: Elaboração do autor a partir dos prospectos de IPOs das empresas. C. Caracterização dos investidores No que concerne ao perfil dos investidores que adquiriram as ações das IPOs, a Tabela XIII revela que, na média, os estrangeiros foram responsáveis pela compra de 67% do valor das ofertas, secundados por investidores institucionais nacionais (fundos de investimento, fundos de previdência privada e seguradoras), com uma parcela de 16%, e pessoas físicas (8%). A contribuição decisiva para o sucesso dos IPOs da farta liquidez internacional, observada até 2007, pode ser aferida também pela Tabela XIV: em 90% das IPOs, os investidores estrangeiros adquiriram uma fatia superior ou igual a 50% das novas emissões. Observa-se uma tendência de crescimento da participação dos investidores estrangeiros nas IPOs a partir de 2005 e até o final de 2007. Era inevitável que a crise financeira internacional deflagrada a partir do final de 2007 reduzisse para capital de giro. 15 Vale notar que a Agrenco, empresa acusada de práticas fraudulentas e que pediu recuperação judicial em setembro de 2008, menos de um ano após ter lançado sua IPO no hot market, usou 67.5% das receitas da emissão primária inicial de R$ 630 milhões para pagar uma dívida contraída junto ao Credit Suisse, banco de investimento que depois seria também o underwriter da IPO.

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drasticamente o incentivo para empresas brasileiras abrirem o capital. Diferentemente, as participações de pessoas físicas e de investidores institucionais nacionais nas IPOs apresentaram parcelas relativamente modestas e declinantes no período, a despeito do potencial promissor que a redução nas taxas de juros abria ao mercado de títulos de renda variável. Inequivocamente, durante o boom das IPOs no Brasil, empresas e bancos de investimento visaram primariamente a investidores estrangeiros, cortejando-os por meio de road shows nas principais praças financeiras.

Tabela XIII - Participações na Aquisição das IPOs por Categoria de Investidor (2004-2008)

Categoria de Investidor

Média   Mediana   Máximo   Mínimo  

Estrangeiros 67,47%   70,24%   97,99%   0,00%  Institucionais Nac. 16,48%   16,10%   55,15%   0,00%  Pessoas físicas 8,48%   8,24%   70,34%   0,15%  Bancos 2,57%   1,46%   32,69%   0,00%  Clubes de Inv. 0,91%   0,50%   16,73%   0,00%  

Fonte: Elaboração do autor a partir dos editais de encerramento das IPOs

Tabela XIV - Participação dos Investidores Estrangeiros nas IPOs (2004-2008)

Participação N. de Empresas % do N. de Empresas ≥ 75%   30   28,57%  ≥ 50% e < 75%   65   61,90%  ≥ 33% e < 50%   4   3,81%  > 0% e < 33%   5   4,76%  0%   1   0,95%  Total   105   100,00%  

Fonte: Elaboração do autor a partir dos editais de encerramento das IPOs D. Market timing das IPOs Os fenômenos de clusters temporais e setoriais e de market timing das IPOs também se verificam no Brasil no período analisado. A distribuição das IPOs por mês é apresentada no Gráfico 1. Das 109 empresas que abriram o capital nos 49 meses do período analisado (maio de 2004, a IPO da Natura, e junho de 2008, a IPO da OGX Petróleo, a última de 2008), 51 fizeram IPOs nos 7 meses entre abril e outubro de 2007 (11 em abril, 8 em junho, 16 em julho, e 12 em outubro). Com a crise internacional, que elevou a preferência pela liquidez e a aversão ao risco dos investidores globais, as condições do mercado de capitais se deterioraram. Preços das ações deprimidos se traduziram na queda dramática do volume de IPOs em 2008, refletindo a opção das empresas de capital fechado de aguardar condições mais favoráveis de mercado para lançar IPO. Apenas quatro IPOs ocorreram em 2008, apesar de 42 registros de oferta terem sido concedidos pela CVM. Após as IPOs da Hypermarcas, Le Lis Blanc, OGX e LLX, foram postergadas as operações previstas de IPOs da, entre outras empresas, Visanet, Marítima Seguros e Banco Industrial. Essa evidência é consistente com o resultado encontrado por vários autores, discutido na Seção I, de que as condições do mercado de capital são o fator de maior peso na decisão de abrir ou não o capital.

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Gráfico 1 - Distribuição Mensal das Aberturas de Capital

(2004-2008)

Examinou-se, também, se, além de se concentrarem no tempo, as IPOs configuraram um cluster setorial. A Tabela XV mostra que cerca de 42% das empresas concentram-se em apenas três setores: construção civil, com 19 empresas, às quais podem ser adicionadas outras sete vinculadas à exploração de imóveis; bancos, com 11 IPOs, e alimentos, com oito empresas.

Tabela XV - IPOs por Indústria (2004-2008)

Setor N. de Empresas Construção Civil 19 Bancos 11 Alimentos 8 Serviços Diversos 8 Exploração de Imóveis 7 Energia Elétrica 5 Serviços Médico-Hospitalares 5 Tecidos, Vestuário e Calçados 5 Serviços Educacionais 4 Carnes e Derivados 3 Serviços Financeiros Diversos 3 Tecnologia da Informação 3 Setores com menos de 3 IPOs 28

Total   109   Fonte: Elaboração do autor a partir dso site da Bovespa E. Underpricing O preço de fechamento das ações das IPOs no primeiro dia de pregão em que foram negociadas valorizou-se, na média, 4.6% (mediana de 1.99%). Tal magnitude é baixa se comparada ao underpricing observado em outros países nos períodos os mais diversos.16

16 Em seu survey sobre retornos brutos médios no primeiro dia de negociação das ações das IPOs em 38 países, Ritter (2003) registra retornos variando entre 5.4% e 256.9%, sendo apenas 4 casos com retornos inferiores a dois dígitos. Adotando-se como critério de underpricing no primeiro dia o cutoff de retorno de

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A Tabela XVI aponta que 44% das empresas com dados de preços disponíveis apresentaram retornos brutos no primeiro dia de negociação pública ou negativos ou inferiores a 1%. Os dois extremos verificados foram a IPO da Gafisa (2006), com uma valorização de 29%, e a depreciação de 20% na abertura da Le Lis Blanc (2008). É provável que a discrepância decorra da complexidade da valuation em momentos de intensa euforia ou desalento no mercado acionário, que prevaleceram, respectivamente entre 2004 e 2007, e em 2008.

Tabela XVI - Retorno Bruto das Ações de IPOs no Primeiro Dia de Negociação

(2004-2008) Retorno N. de Empresas

< 0% 25 ≥ 0% e < 1% 20 ≥ 1% e < 5% 15 ≥ 5% e < 10% 15 ≥ 10% e < 15% 11 ≥ 15% e < 20% 11 ≥ 20% e < 25% 2 ≥ 25% 2

Total   101   Fonte: Elaboração do autor a partir do site da Boomberg F. Idade das empresas que realizaram IPOs A média (e mediana) da idade das empresas que realizaram IPOs no período analisado é 27 anos. Pagano, Panetta e Zingales (1998) encontram estatísticas semelhantes para a amostra de IPOs de empresas italianas que abriram capital entre 1982 e 1992 (média de 33 e mediana de 28 anos) e observam que estes valores não são discrepantes com os da média para a Europa, mas bem acima da média para os Estados Unidos. A Tabela XVII indica, porém, que 28% da amostra eram constituídas por empresas de idade igual ou inferior a 10 anos. Aqueles autores constatam que empresas maiores e mais antigas apresentam maior probabilidade de abrirem seu capital. Dada a ausência de dados sistemáticos sobre a idade das empresas com capital fechado no Brasil, esta variável não poderá ser incorporada ao modelo econométrico.

Tabela XVII - Idade das Empresas que Lançaram IPOs entre 2004-2008

Idade (anos) N. de Empresas % do N. de Empresas ≤ 5 15 13,76% > 5 e ≤ 10 16 14,68% > 10 e ≤ 20 17 15,60% > 20 e ≤ 30 18 16,51% > 30 e ≤ 50 29 26,61% > 50 e ≤ 75 14 12,84% Total 109 100,00% Fonte: Elaboração do autor a partir dos sites das empresas

10%, apenas 26 das 101 IPOs para as quais obtivemos dados sobre preços das ações apresentaram underpricing (Tabela XV).

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G. Outras características das IPOs As tabelas XVIII, XIX e XX apresentam estatísticas descritivas de algumas variáveis financeiras das 109 empresas da amostra de IPOs. As empresas que realizaram IPOs estão razoavelmente bem distribuídas em termos de tamanho, tomando-se como proxy para esta variável a receita bruta ou o total de ativos.17 O mesmo vale para as variáveis resultado bruto, valor capitalizado (o valor de mercado da empresa, que resulta da multiplicação do preço da ação pela quantidade de ações emitidas) e o montante captado. Esta última variável apresentou uma média de R$ 823 milhões (mediana de R$ 542 milhões), mas houve empresa que captou apenas R$ 16 milhões (Renar) enquanto 14 arrecadaram mais de R$ 1 bilhão (BM&F, Bovespa Holding, e OGX Petróleo captaram, respectivamente, R$ 5.2, R$ 6.6, e R$ 6.72 bilhões). Pode-se perceber uma queda no valor médio da receita bruta entre os primeiros e últimos anos da fase ascendente das IPOs, indicando que empresas menores ingressaram na bolsa. Em termos de segmentos de listagem, o Nível 2 apresentou maiores valores médios de receita e resultado brutos, o Nível 1 teve valor médio mais elevado do ativo total, e o Novo Mercado acolheu as empresas com a maior média de capitalização e de volume captado.

Tabela XVIII - Estatísticas Descritivas de Algumas Variáveis Financeiras das Empresas da Amostra de IPOs

(2004-2008) Variáveis Média   Mediana   Mínimo   Máximo  Resultado Bruto* 402,73 171,65 0,66 3.870,59 Receita Bruta* 1.417,21 519,91 0,70 14.727,10 Ativo Total* 2.887,81 1.398,30 0,02 47.430,64 Capitalização* 2.928,61 1.387,80 126,80 32.254,97 Montante Captado* 822,99 542,15 16,00 6.711,66

Valores em R$ milhões Fonte: Elaboração do autor a partir dos editais de encerramento das IPOs, IANs, e Bovespa

Tabela XIX - Evolução dos Valores Médios de Algumas Variáveis Financeiras das

Empresas da Amostra de IPOs (2004-2008)

Ano Receita Bruta

Resultado Bruto

Ativo Total

Capitalização Montante Arrecadado

2004 4073,96   1156,53   6034,36   6761,72   681,24  2005 3202,08   973,54   8274,96   3320,55 577,83 2006 706,21 214,02 1340,77 2063,26 589,30 2007 1002,12 258,97 2365,94 2359,20 874,91 2008 943,61 434,63 74,88 12298,16 2491,41

Valores em R$ milhões Fonte: Elaboração do autor a partir dos editais de encerramento das IPOs.

17 As IPOs envolveram empresas com receita bruta variando de R$ 698 mil (BrasilAgro) a montantes de cerca de R$ 14 bilhões (como JBS e CPFL Energia). Seguindo a classificação do BNDES, que considera “grandes empresas” aquelas com renda operacional bruta anual superior a R$ 60 milhões, apenas cinco empresas da amostra não o são.

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Tabela XX - Valores Médios de Algumas Variáveis Financeiras das Empresas da Amostra de IPOs por Segmento de Listagem

(2004-2008) Segmento Receita

Bruta Resultado

Bruto Ativo Total

Capitalização Montante Arrecadado

Todas 1319,19 367,89 2858,45 2658,34 773,92 Nível 1 890,76 482,92 5359,33 1451,81 623,93 Nível 2 1864,41 530,61 3219,55 2835,69 632,71 BDR 400,43 82,59 1305,03 1298,62 544,31 N. Merc. 1343,18 355,61 2584,77 3268,29 909,47

Fonte: Elaboração do autor a partir dos editais de encerramento das IPOs, IANs, e Bovespa Finalizando, cabe mencionar a extrema concentração regional e dos underwriters das IPOs. Das 106 empresas que realizaram IPOs, 65 se localizavam no estado de São Paulo, 18 no Rio de Janeiro, 7 em Minas Gerais, 6 no Paraná, 5 no Rio Grande do Sul, e duas em Santa Catarina. Por sua vez, dois bancos de investimento (Credit Suisse e UBS Pactual) operaram como coordenador-líder em 60 IPOs, que somados aos IPOs que o UBS Investment (seis IPOs) e o Pactual (mais seis) coordenaram antes de sua fusão totalizam 2/3 das IPOs do período (Tabela XXI).

Tabela XXI - Coordenador-Líder das IPOs (2004-2008)

Banco de Investimento N. de IPOs Credit Suisse 32 UBS Pactual 28 Itaú BBA 7 Merrill Lynch 6 Morgan Stanley 6 UBS Investment 6 Pactual 6 Unibanco 5 JP Morgan 5 Outros 8 Total 109

Fonte: Elaboração do autor a partir dos editais de encerramento das IPOs

IV. PROCEDIMENTO ECONOMÉTRICO Com base na literatura sobre IPOs e com as informações apresentadas na seção anterior, esta seção focaliza os determinantes da probabilidade de realização de uma IPO empregando alguns testes estatísticos. Construiu-se para isso, um banco de dados composto por empresas de capital fechado, algumas das quais viriam, posteriormente, a realizar IPOs.18 A seguir são introduzidas as variáveis utilizadas nos modelos econométricos e relatados os resultados dos modelos estimados. 18 A descrição de como o banco de dados foi construído é descrita no Anexo 2.

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A. Definição das variáveis utilizadas nos modelos Com base no estudo de Pagano, Panetta e Zingales (1998), os modelos econométricos estimados utilzaram as seguintes variáveis:

a) Sales. Para cada empresa i, no ano t, define-se Sales de acordo com a equação 1. Todos os valores estão expressos em R$ de dezembro de 2008. Adotou-se como deflator o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Esta variável é uma proxy do tamanho da empresa. Como há grande dispersão nas receitas das empresas, utiliza-se o logaritmo natural da receita.

( )itit utaacional Brceita OperSales Reln= (1)

b) Growth. A taxa de crescimento da Receita Operacional Bruta (Rob) para a empresa i, no instante t, é dada pela equação 2:

( )1

1it

!

!!=

it

itit Rob

RobRobGrowth (2)

c) Roa. A variável Return on Assets (Roa) é dada pela relação entre o Ebitda (Earnings before interest, taxes, depreciation and amortization e o Ativo Total (At) da empresa, conforme apresentado na equação 3:

it

itit At

EbitdaRoa = (3)

d) Leverage. Esta variável tem como objetivo calcular XX. É dada pela equação 4, em que Ac é o Ativo Circulante, Elp é o Exigível de Longo Prazo e Pl é o Patrimônio Líquido da empresa.

( )( )111

11

!!!

!!

++

+=

ititit

ititit PlElpAc

ElpAcLeverage (4)

e) Capex. Esta variável expressa a relação entre as aquisições de capital físico,

dada pela relação entre a variável Aquisição de Ativo Imobilizado (Aquiatimob) e o Imobilizado Líquido (Imobliq).

1

1

!

!=it

itit IMobliq

AquiatimobCapex (5)

O segundo grupo de variáveis teve como fonte de informações a base de dados da Economatica. A primeira variável é o q de Tobin setorial. O q de Tobin, por definição, só pode ser calculado para empresas com ações negociadas em bolsas de valores, o que não é o caso das empresas fechadas, que podem fazer uma IPO.

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Para superar esta restrição adotou-se a estratégia descrita a seguir. Com base nos dados da Economatica, foi calculada a mediana do q de Tobin setorial para cada ano analisado, para as empresas abertas, de acordo com a equação 6. Nesta expressão o q de Tobin (MTB) do setor j no ano t é dado pela mediana da expressão entre parênteses, calculada com base em cada uma das i firmas que compõe o setor j no ano t. O termo VM representa o valor de mercado das empresas, dado pelo preço de suas ações negociadas na Bovespa. Os termos Pcirc e Pncirc são, respectivamente, o Passivo Circulante e o Passivo Não Circulante. O termo Est refere-se aos estoques da empresa, Atcirc é o Ativo Circulante e o Ativo Total é dado por At.

!!"

#$$%

& ++++=

it

itititititjt At

AtcircEstPncircPcircVMmedMTB (6)

Uma vez calculada a mediana do q de Tobin de cada setor j a cada ano t, os valores foram imputados para cada empresa i candidata a fazer a IPO, em cada ano t. A segunda variável é a mediana da relação Preço/Lucro (P/L) setorial por ano. Esta variável também pode ser interpretada como uma proxy dos anos de maior crescimento dos preços das ações no mercado acionário, o que pode ser um incentivo às empresas fazerem uma IPO. De forma análoga ao procedimento para o cálculo do q de Tobin, a relação P/L de cada setor j no ano t é dada na equação 7, em que o termo no numerador representa o preço da ação negociada em bolsa da empresa i no ano t e o termo no denominador, o Lucro Líquido da empresa. A imputação dos valores segue a forma descrita no parágrafo anterior.

!!"

#$$%

&=

it

itjt Ll

PmedPLset (7)

B. Estimações e resultados Antes de estimar alguns modelos de variável dependente limitada, são apresentadas algumas estatísticas descritivas sobre o banco de dados. A Tabela XXII apresenta os dados somente das empresas que fizeram a IPO no período analisado. A Tabela XXIII traz os dados das empresas que não fizeram o IPO, mas poderiam vir a fazê-lo. Para evitar a presença de valores extremos, que poderiam distorcer os resultados das regressões, foram feitos dois cortes no banco de dados. O primeiro foi excluir dos cálculos as empresas com patrimônio líquido negativo. O segundo foi excluir os registros das firmas cujas taxas de crescimento em um determinado ano fossem iguais a -100% ou maiores que 100%. Os valores das variáveis Receita Operacional Bruta, Ativo Total, Lucro Líquido e Ebitda estão expressos em milhares de reais, em valores de dezembro de 2008. As demais variáveis seguem as definições apresentadas anteriormente. Para a variável Capex é apresentado o seu logaritmo natural, visto ser essa a forma utilizada nas regressões.

Uma breve inspeção das duas tabelas mostra que as empresas que fizeram IPO têm valores mais elevados das variáveis Roa e Growth. Para as demais, embora haja algumas

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diferenças, estas não são tão expressivas.

Tabela XXII – Empresas que não fizeram IPO Variável Observações Média Desvio Padrão Mínimo Máximo

Receita Operacional Bruta 10.297 915.562 4.831.462 8 196.674.448 Ativo Total 10.297 1.123.464 6.622.936 489 227.441.824 Lucro Líquido 10.297 67.318 761.138 -2.798.497 31.579.500 Ebitda 9.726 142.240 1.163.944 -2.204.916 49.991.556 Sales 10.297 12,4911 1,4545 2,0189 19,0971 ln (Capex) 9.427 -1,9998 1,1927 -11,0195 12,3605 Growth 10.297 0,0621 0,2485 -0,9999 0,9964 Roa 9.726 0,1196 0,1443 -1,3315 2,7357 Leverage 10.297 0,5942 0,3253 -17,5104 9,2278 Mtb 10.200 0,8894 0,4031 0,1214 2,4653 PLset 10.200 7,5070 8,8817 -17,5000 57,8000

Fonte: tabulações do autor

Tabela XXIII – Empresas que fizeram IPO

Variável Observações Média Desvio Padrão Mínimo Máximo Receita Operacional Bruta 146 900.372 944.355 38.126 5.754.198 Ativo Total 146 1.202.668 1.866.180 51.244 12.736.543 Lucro Líquido 146 66.207 101.582 -139.726 559.736 Ebitda 146 147.719 179.754 -21.703 795.152 Sales 146 13,2607 0,9738 0,5487 15,5654 ln (Capex) 135 -1,1985 1,7171 -7,1958 11,0121 Growth 146 0,1634 0,2419 -0,7392 0,9237 Roa 146 6,2336 9,0346 -27,0000 38,7000 Leverage 138 0,6696 0,4603 0,1645 5,3748 Mtb 146 0,8859 0,4318 0,1214 2,0998 PLset 146 7,5873 9,5115 -17,5000 57,8000

Fonte: tabulações do autor

A seguir foram estimadas três regressões, com variável dependente limitada. Neste caso, a variável binária dependente é IPO. Para as empresas que realizaram a oferta de ações, a variável IPO tem valor 1. Para as demais, o valor é zero. Para os anos posteriores ao IPO, as empresas que já o fizeram são excluídas da amostra. Os modelos estimados têm a especificação, dada pela equação 8. O período em questão vai de 2002 a 2007. Os anos 2000, 2001 e 2008 foram excluídos pela inexistência de informações que permitissem diferenciar as empresas componentes da amostra. Os seis primeiros regressores correspondem às variáveis cuja construção foi explicada anteriormente. O último termo, com a somatória, refere-se às dummies de ano. A dummy de referência (omitida) refere-se ao ano 2007.

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( ) ( )( ) ( )

ii

i dummyanoMtbLeverageRoa

GrowthCapexSalesIPOPXFIPOP

!=

++++

+++==

==

2006

2002654

3210 ln1,1

""""

""""

"

(8)

Foram estimados inicialmente três modelos: logit (1), probit (2) e probit em painel (3). Os resultados são reportados na Tabela XXIV. Para cada variável são apresentados o coeficiente estimado e na linha abaixo, o erro-padrão.

Tabela XXIV – Modelos de variável dependente limitada (I) Variáveis Logit Probit Probit em painel (1) (2) (3) Sales 0,243*** 0,110*** 0,187*** (0,0842) (0,0315) (0,0557) Lncapex 0,309*** 0,148*** 0,214*** (0,101) (0,0366) (0,0576) Growth 1,420*** 0,618*** 0,821*** (0,466) (0,173) (0,270) Roa 1,032*** 0,283*** 0,201*** (0,0938) (0,0187) (0,0230) Leverage 0,367 0,154 0,203 (0,313) (0,141) (0,226) Mtb -0,831** -0,308** -0,238 (0,421) (0,144) (0,227) d2002 0,175 0,132 0,185 (0,474) (0,172) (0,263) d2003 -0,303 -0,0756 -0,114 (0,479) (0,171) (0,260) d2004 -0,791 -0,239 -0,327 (0,512) (0,179) (0,273) d2005 -0,381 -0,0816 -0,111 (0,485) (0,172) (0,258) d2006 0,0505 0,0891 0,0938 (0,426) (0,155) (0,230) Constante -7,107*** -3,453*** -5,541*** (1,262) (0,468) (0,807) Número de observações 9.289 9.289 9.289

*** Significativo a 1%; ** Significativo a 5%; * Significativo a 10%. Fonte: Tabulações do autor

Em todos os três modelos, as variáveis Sales, ln(Capex), Growth e Roa mostraram-se significativas a 1%, com o sinal sendo consistente com a previsão. De forma geral, o modelo logit apresentou coeficientes mais elevados em relação aos outros dois modelos. A variável Leverage não se mostrou significativa em nenhum dos modelos, enquanto a

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variável Mtb foi significativa a 5% nos modelos 1 e 2, mas não no modelo 3. O sinal dessa variável, entretanto, está em desacordo com o previsto pela literatura. Algumas das dummies de ano, como 2002 e 2006, apresentaram sinais opostos ao esperado, visto que 2007 é o ano de boom nas IPOs, mas nenhuma das dummies de ano mostrou-se significativa. Cabe apontar também que os resultados nos três modelos são bastante similares, o que talvez possa ser entendido como um sinal da robustez do modelo estimado. Como os resultados da estimação mostraram um sinal para o coeficiente do q de Tobin (variável MTb) oposto ao esperado, uma hipótese é que, por algum motivo esta variável não esteja conseguindo captar os anos de crescimento do mercado acionário, Por este motivo, foi feita nova série de estimações, com as mesmas formas funcionais, porém substituindo-se a variável Mtb pela relação Preço/Lucro Setorial (PLset). Os resultados são apresentados na Tabela XXV, para os modelos 4 a 6. As alterações quantitativas são muito pequenas. Todos os coeficientes são bastante similares aos dos modelos 1 a 3. Até mesmo os coeficientes e os níveis de significância da variável PLset são similares aos da variável Mtb.

Tabela XXV – Modelos de variável dependente limitada (II) Variáveis Logit Probit Probit em painel (4) (5) (6) Sales 0,239*** 0,109*** 0,185*** (0,0845) (0,0316) (0,0557) Lncapex 0,327*** 0,153*** 0,220*** (0,106) (0,0372) (0,0583) Growth 1,396*** 0,609*** 0,815*** (0,469) (0,175) (0,271) Roa 1,048*** 0,284*** 0,203*** (0,0953) (0,0187) (0,0228) Leverage 0,375 0,160 0,208 (0,298) (0,138) (0,223) PLset -0,0498** -0,0186** -0,0162 (0,0203) (0,00744) (0,0108) d2002 0,234 0,149 0,174 (0,410) (0,156) (0,237) d2003 -0,228 -0,0535 -0,116 (0,437) (0,161) (0,244) d2004 -0,716 -0,217 -0,324 (0,478) (0,171) (0,260) d2005 -0,241 -0,0338 -0,0921 (0,436) (0,159) (0,240) d2006 0,161 0,128 0,110 (0,402) (0,149) (0,222) Constante -7,513*** -3,603*** -5,612*** (1,185) (0,445) (0,777) Número de observações 9.289 9.289 9.289

*** Significativo a 1%; ** Significativo a 5%; * Significativo a 10%. Fonte: Tabulações do autor

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C. O que acontece após as IPOs? Algumas evidências

Uma questão que surge após as seções anteriores é sobre os resultados das IPOs para as empresas. O que acontece com uma firma após ter realizado a oferta de ações na bolsa de valores? Para tentar obter alguma evidência sobre este tema, foram feitas algumas estatísticas sobre as empresas, antes e depois de terem feito a IPO. Os resultados são apresentados nas Tabelas XXVI e XXVII. Antes que sejam feitas quaisquer comparações, parece ser razoável afirmar que as variáveis Lucro Líquido, Receita Operacional Bruta, Ebitda e Capex têm suas estatísticas bastante diferentes entre os períodos pré e pós-IPO. Talvez estes resultados devam-se parcialmente a valores extremos muito elevados, como pode ser visto pelos valores mínimos e máximos das duas tabelas.

Já para as variáveis Roa, Leverage e Growth, os resultados são bastante similares, particularmente para as médias. Por meio de um teste de médias, constata-se que para Roa e Growth não se pode rejeitar a hipótese de que as médias antes e após a IPO são iguais. Já para a variável Leverage, a conclusão é oposta, podendo se concluir que esta variável tem uma queda após a realização da IPO.

Tabela XXVI – Empresas que fizeram IPO – Antes da IPO Variável Observações Média Desvio Padrão Mínimo Máximo

Lucro Líquido 146 48.992 73.385 -98.637 360.337 Receita Operacional Bruta 146 900.372 944.355 38.126 5.754.198 Ebitda 146 109.729 133.504 -16.388 656.254 Roa 146 6,2336 9,0346 -27,0000 38,7000 Capex 135 453,8657 5.215,4510 0,0007 60.600,0000 Leverage 138 0,6696 0,4603 0,1645 5,3748 Growth 146 0,1634 0,2419 -0,7392 0,9237

Fonte: tabulações do autor

Tabela XXVII – Empresas que fizeram IPO – Após a IPO

Variável Observações Média Desvio Padrão Mínimo Máximo Lucro Líquido 68 126.946 216.649 -253.164 1.196.120 Receita Operacional Bruta 68 2.142.519 3.790.907 289.789 31.100.000 Ebitda 68 331.637 374.716 -119.224 1.447.238 Roa 67 6,0849 9,8523 -39,5000 29,7000 Capex 67 22,2763 72,8340 0,0000 350,3858 Leverage 68 0,5861 0,1214 0,2611 0,9804 Growth 68 0,1550 0,2006 -0,2882 0,9616

Fonte: tabulações do autor

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V. CONCLUSÕES Tentou-se neste trabalho identificar os fatores determinantes na decisão de lançar IPOs na Bovespa entre 2002 e 2008 bem como as principais características delas. Para isso, recorreu-se a diversas fontes de dados (Informativo Anual e Demonstrações Financeiras Padronizadas da CVM, banco de dados da “Melhores e Maiores” da revista Exame, Economatica, Bovespa, Bloomberg, e prospectos de ofertas públicas de distribuição) e a diversas metodologias (modelos econométricos, testes de média, e estatísticas descritivas. Entre os principais resultados, podemos destacar os seguintes:

a) As participações elevadas do maior acionista último nos direitos de votos e de cash flow combinadas com as parcelas altas de free float e de oferta primária indicam que diversificação de portfolio não foi uma motivação relevante para as IPOs no período. De 107 empresas estreantes na bolsa, 82% possuíam free float inferior a 50% e em 62% delas havia um acionista com mais de 50% do capital votante. Desse modo, não se confirmou a expectativa, alimentada pelas mudanças institucionais no início da década, de uma descontinuidade no padrão tradicional de forte concentração da propriedade do capital e do controle do capital das empresas. Analogamente, as IPOs pouco avançaram no grau de participação de membros independentes nos conselhos de administração (média de 27%).

b) Dado que (i) os prospectos de ofertas públicas de distribuição informam que a alocação das receitas arrecadas com as IPOs concentrou-se em despesas com investimentos (média de 78%); (ii) os modelos econométricos estimam um coeficiente positivo e significativo para a variável investimento/capital (CAPEX); e (iii) os testes de comparação de médias apontam que a variável CAPEX cai após as IPOs, é possível que as empresas tenham investido muito antes da IPO e continuaram a investir após a IPO mas a um ritmo menor. c) As evidências não corroboram a suposição de que a reestruturação financeira tenha sido uma motivação relevante das IPOs. Os prospectos das ofertas relatam uma baixa parcela dos recursos das IPOs para o pagamento de empréstimo e os coeficientes da variável “leverage” nos modelos econométricos não se mostram significativos. O fato de que os testes de comparação de médias indicam uma queda no grau de endividamento após as IPOs pode estar associado ao crescimento do lucro líquido e do EBTIDA, com os investimentos sendo financiados com lucros e receitas das IPOs. Tal especulação deve ser vista com precaução, uma vez que há fortes outliers nas variáveis EBTIDA e lucro líquido.

d) A estimação dos modelos econométricos conclui que empresas maiores, mais lucrativas, com gastos de investimento mais elevados, e que mais crescem são mais propensas a realizarem uma IPO. A significância estatística da variável “tamanho” aliada à elevada média (e mediana) de idade das empresas que realizaram IPOs (27 anos) são evidências em conformidade com interpretações dos determinantes das IPOs baseadas em seleção adversa e reputação. Cabe investigar se os níveis mais elevados das taxas de lucro, dos gastos de investimento e da taxa de crescimento são efetivos ou decorrem de window-dressing. Não foi possível esclarecer essa questão com a metodologia seguida, uma vez que os testes de média revelaram apenas que a relação investimento sobre capital cai após as IPOs (as diferenças não são estatisticamente significativas para retorno

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sobre ativos nem para taxa de crescimento). e) As condições favoráveis do mercado internacional de capitais parecem ter sido uma contribuição essencial para a onda de IPOs entre 2004 e 2007. Na média, os investidores estrangeiros adquiriram mais de 2/3 das ofertas, sendo que em 90% delas a fatia adquirida foi superior a 50%. f) O fenômeno do underpricing foi observado na amostra analisada de IPOs. Todavia, sua magnitude (média de 4,6%) é muito inferior à que Ritter (2003) relata para outros países. g) Embora não captado pelos modelos econométricos, há evidências de market timing das IPOs. Enquanto a média para o período analisado (49 meses) é de 2,2 IPOs por mês, em abril de 2007 ocorreram 11, em junho 8, em julho 16 e em outubro 12 (51 IPOs, 42% do total, foram lançadas nos sete meses entre abril e outubro de 2007). As IPOs tenderam, também, a formar cluster setorial, com 42% delas concentrando-se nos setores de construção civil, bancos, e alimentos. h) Como as dummies de ano têm como referência 2007, ano em que se concentraram as IPOs, esperava-se, à luz dos resultados robustos da literatura, que seus coeficientes seriam significativos e apresentassem sinais negativos. Os resultados observados pelos modelos contrastam com essa previsão: nenhuma dummy é estatisticamente significativa e os coeficientes das dummies para 2002 e 2006 são positivos. Também em discrepância com a literatura são os resultados para o q de Tobin setorial e para a relação preço/lucro setorial: embora significativos nos modelos logit e probit, os coeficientes apresentam sinal negativo. Há a possibilidade de que esses resultados resultem de erros na classificação setorial, provocados pela integração de bancos de dados com procedências e conceitos distintos e pela exigência de agrupamento das empresas em um número limitado de setores para não se perder grau de liberdade. Acrescentam-se a isso, o curto horizonte temporal da amostra (6 anos) e o número relativamente baixo de empresas de IPOs cujos dados completos para todas as variáveis em todos os anos estavam disponíveis.

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ANEXOS Anexo 1: Relação das IPOs

Nome Nome da Empresa Nome do Maior Acionista Último ABC Brasil Banco ABC Brasil S.A. Arab Banking Corporation (B.S.C.) AbNote American Banknote S.A. Bay Harbour Partners, Ltd.

Abyara Abyara Planejamento Imobiliário S.A. Acordo

Agra Agra Empreendimentos Imobiliários S.A. Acordo

Agrenco Agrenco Limited Antonio Iafelice

ALL ALL América Latina Logística S.A. Acordo

Amil Amil Participações S.A. Família Bueno

Anhanguera Anhanguera Educacional Participações S.A. Acordo

Bematech Bematech S.A. Marcel Martinz Malczeuski

BicBanco Banco Industrial e Comercial S.A. Acordo

BM&F Bolsa de Mercadorias e Futuros - BM&F S.A. CMEG Brazil 1 Participações Ltda.

Bovespa Bovespa Holding S.A. Fundos ADM para Fidelity

Brascan Brascan Residential Properties S.A. Brookfield Asset Management Inc

Brasil Ecodiesel

Brasil Ecodiesel Ind. Com. Bio. Ol. Veg. S.A. Acordo

BrasilAgro BrasilAgro Cia. Bras. Propriedades Agrícolas

Cresud Sociedade Anônima Comercial Imob.

BRBrokers Brasil Brokers Participapções S.A. Ney Prado Júnior

BRMalls BR Malls Participações S.A. GP Investments

CC Des Imob

Camargo Corrêa Desenvolvimento Imobiliário S.A. Família Camargo

Company Company S.A. Walter Francisco Lafemina

Copasa Cia. Saneamento de Minas Gerais - COPASA MG Governo do Estado de Minas Gerais

Cosan Cosan S.A. Indústria e Comércio Acordo Cosan Ltd Cosan Limited Acordo CPFL Energia CPFL Energia S.A. Acordo

CR2 CR2 Empreendimentos Imobiliários S.A. Tiebold Assets LLC

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Cremer Cremer S.A. Hedging Griffo Corretora de Valores S.A.

Cruzeiro Sul Banco Cruzeiro do Sul S.A. Família Índio da Costa CSU CSU CardSystem S.A. Acordo

DASA Diagnósticos da América S.A. Brazilian Analysis and Diag. Priv. Inv. LLP

Datasul Datasul S.A. Família Abuhab Daycoval Banco Daycoval S.A. Família Dayan Dufry Dufry South America Ltd. Travel Retail Investments SCA EnergiasBR EDP - Energias do Brasil S.A. EDP - Energias de Portugal Equatorial Equatorial Energia S.A. PCP Latin America Power S.A. Estacio Estácio Participações S.A. Acordo

Even Even Construtora e Incorporadora S.A. Acordo

EzTec EZTec Empreend. e Participações S.A. Família Zarzur

Fer Heringer Fertilizantes Heringer S.A. Dalton Dias Heringer Gafisa Gafisa S.A. EIP Brazil Holdings LLC GeneralShopp General Shopping Brasil S.A. Família Veronezi

Gol Gol Linhas Aéreas Inteligentes S.A. Família Constantino

GP Investments* GP Investments Ltd

Fersen L. Lambranho e Antonio Bonchristiano

Grendene Grendene S.A. Acordo Guarani Açúcar Guarani S.A. Acordo GVT GVT Holding S.A. Egaly Group Inc. Helbor Helbor Empreendimentos S.A. Família Borenstein Hypermarcas Hypermarcas S.A. João Alves de Queiroz Filho

Iguatemi Iguatemi Empresa de Shopping Centers S.A. Família Jereissati

Indusval Banco Indusval S.A. Acordo InPar Inpar S.A. Família Parizotto

InvestTur InvestTur Brasil - Desenv. Imobiliário Turístico Espírito Santo Tourismo

JBS JBS S.A. Família Batista JHSF JHSF Participações S.A. José Auriemo e Fabio Chimenti KlabinSegall Klabin Segall S.A. Família Segall Kroton Kroton Educacional S.A. Evandro José Neiva Laep Laep Investments Ltd. Marcus Alberto Elias

Le Lis Blanc Le Lis Blanc Deux Com. Confec Roupas S.A. Federated Kauffman Fund (EUA)

LLX LLX Logística S.A. Eike Furhken Batista Localiza Localiza Rent A Car S.A. José Salim Mattar Júnior Log-In Log-In Logística Intermodal S.A. Cia. Vale do Rio Doce

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Lopes LPS Brasil - Consultoria de Imóveis S.A. Acordo

Lupatech Lupatech S.A. Família Perini

Marfrig Marfrig Frigoríficos e Comércio de Alimentos S.A. Família Santos

Marisa Marisa S.A. Famílias Goldfarb e Terpins Mdias Branco

M. Diasbranco S.A. Ind. e Com. de Alimentos Família Dias Branco

Medial Medial Saúde S.A. Família Schapira / Família Rocha Mello / Família Kalil

Metalfrio Metalfrio Solutions S.A. Marcelo Faria de Lima Minerva Minerva S.A. Família Queiroz

MMX MMX Mineração e Metálicos S.A. Eike Furhken Batista

MPX MPX Energia S.A. Eike Furhken Batista

MRV MRV Engenharia & Participações S.A. Acordo

Multiplan Multiplan Empreentimentos Imob. S.A. Acordo

Natura Natura Cosméticos S.A. Acordo Nossa Caixa Banco Nossa Caixa S.A. Estado de São Paulo

Odontoprev OdontoPrev S.A. Dynamo Administração de Recursos Ltda.

OGX OGX Petróleo e Gás Participações S.A. Eike Furhken Batista

OHL Brasil Obrascon Huarte Lain Brasil S.A. Grupo Villar MIR, S.L. Panamericano Banco Panamericano S.A. Família Abravanel Parana Paraná Banco S.A. Família Malucelli Patagonia Banco Patagonia S.A. Família Milne

PDG Realty PDG Realty S.A. Empreend. e Participações André Esteves

Pine Banco Pine S.A. Noberto Nogueira Pinheiro PortoSeguro Porto Seguro S.A. Família Garfinkel Positivo Positivo Informática S.A. Acordo

Profarma Profarma Distrib. Prod. Farmacêuticos S.A. Família Birmarcker

Providencia Cia Providencia Indústria e Comércio Acordo

Redecard Redecard S.A. Acordo Renar Renar Maçãs S.A. Willy Egon Frey Rodobens Rodobens Negócios Imobiliários Família Verdi SantosBras Santos Brasil S.A. Opportunity Fund São Martinho São Martinho S.A. Família Ometto

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Satipel Satipel Industrial S.A. Família Seibel

SEB SEB - Sistema Educacional Brasileiro S.A. Família Zaher

SLC SLC Agrícola S.A. Família Logemann Sofisa Banco Sofisa S.A. Hilda Direhy Burmaian

Springs Springs Global Participações S.A. Acordo

SulAmérica Sul América S.A. Acordo TAM TAM S.A. Família Amaro Tarpon Tarpon Investment Group Ltd. José Carlos Reis de Magalhães Neto Tecnisa Tecnisa S.A. Família Nigri Tegma Tegma Gestão Logística S.A. Acordo Tempo Part. Tempo Participações s.A. Acordo Tenda Construtora Tenda S.A. Família Alves Pinto

Terna Terna Participações S.A. Terna Rete Eletttrica Nazionale S.p.A.

Totvs Totvs S.A. Ernesto Mário Haberkorn / Laércio Cosentino

Trisul Trisul S.A. Família Cury

Triunfo TPI - Triunfo Participação & Invest. S.A. Acordo

UOL Universo Online S.A. Acordo Wilson Sons Wilson Sons Limited Ocean Wilsons Holding Limited

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Anexo 2: Construção do banco de dados A construção do banco de dados envolveu três etapas. O objetivo é que este banco tenha as informações referentes às empresas que podem vir a fazer uma IPO. Com base nessas informações são estimados alguns modelos econométricos de variável dependente limitada, por meio dos quais se tenta quantificar a influência de cada variável sobre a probabilidade de realização do IPO. Tendo em vista neste objetivo, a estratégia empírica adotada baseia-se no trabalho já citado de Pagano, Panetta e Zingales (1998). A primeira etapa consistiu na construção do primeiro banco de dados, com os registros contábil-financeiros referentes às maiores empresas do país. Estas informações foram obtidas no banco de dados utilizado na elaboração da edição anual da Revista Melhores e Maiores (MM), que é realizada há 37 anos. A organização e a análise dos dados são de responsabilidade de uma equipe de professores e pesquisadores do Departamento de Contabilidade e Atuária da FEA/USP e da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi). Esta base de dados tem origem nas demonstrações contábeis auditadas enviadas anualmente, de forma voluntária, pelas empresas. Estes dados formam um conjunto bastante rico de informações sobre as empresas que operam no Brasil e também sobre a situação da economia do país. Este primeiro banco de dados compreende todas as empresas do banco de dados da MM, no período 2000-2008, com exceção dos bancos e das empresas do setor financeiro. O banco tem 3.592 empresas, totalizando 19.879 registros. A Tabela A1 apresenta uma descrição sumária desse banco. Dois pontos, relevantes para o desenvolvimento do trabalho e para a construção do banco de dados devem ser ressaltados. O primeiro é que nem todas as empresas possuem Demonstrações Contábeis (DC) para todo o período analisado. Por exemplo, na tabela é possível notar que 349 empresas apresentam apenas um ano de DCs. E apenas 927 empresas têm DCs para os 9 anos escolhidos. O segundo ponto é que nem todas as informações contábeis estão disponíveis para os anos em que há DCs. Este fato limita particularmente as escolhas feitas no procedimento econométrico descrito na seção IV, pelo fato de reduzir o número de registros que podem ser utilizados, particularmente quando se empregam variáveis explicativas defasadas.19 A classificação setorial adotada neste trabalho é a mesma da MM, com 22 setores.

A segunda etapa consiste na incorporação horizontal (por meio de um merge) de um segundo conjunto de dados, com as informações sobre todas as empresas que efetuaram IPOs no período 2002-2007. As variáveis utilizadas como chave no merge são o CNPJ da empresa e o ano. As informações sobre as empresas que realizaram IPOs foram colhidas nos sites da CVM e da Bovespa. Com a incorporação deste segundo banco ao banco da MM, é possível conhecer as informações contábeis das empresas que fizeram IPOs. No entanto, uma parcela significativa das empresas que constam nos registros da MM são empresas abertas, com ações negociadas na Bovespa. Ou seja, são empresas que, por natureza, não poderão a vir efetuar uma IPO. Mas nos registros da MM não há informações sobre esta característica.

19 Ver nos Anexos 3 e 4 uma relação das principais variáveis oriundas do banco da MM e a classificação setorial do q de Tobin.

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Tabela A1 – Número de empresas com Demonstrações Contábeis – Base MM

Número de anos com DC Número de empresas Porcentagem 1 349 9,72 2 435 12,11 3 350 9,74 4 343 9,55 5 229 6,38 6 282 7,85 7 367 10,22 8 310 8,63 9 927 25,81

Total 3.592 100,00 Fonte: Elaboração do autor

Por este motivo, procede-se à terceira etapa do processo, no qual é feita a identificação das empresas abertas. Recorre-se então a outra fonte de informações, dada pela Economatica. Esta empresa, por meio de sistema próprio, disponibiliza o acesso a um conjunto de informações contábeis do período 2000-2008, das 529 empresas com ações negociadas na Bovespa, no total de 3.581 registros. Estas informações são incorporadas ao banco anterior, por meio de um merge, igualmente feito pelo CNPJ da empresa e pelo ano. O critério de delimitação das empresas que podem vir a fazer um IPO é a origem das informações. Se uma empresa do banco principal (MM) também aparece no banco da Economatica, então esta é uma empresa com ações negociadas na Bovespa e, portanto, está eliminada a hipótese de que ela venha a fazer uma IPO. Logo, esta empresa deve ser excluída da amostra. De forma análoga, se uma empresa aparece apenas no banco da Economatica, também será excluída do banco de dados. Desta maneira, resumindo, o banco de dados a ser utilizado no procedimento empírico conta com aquelas empresas cujas informações constam no banco da MM, mas que não estão listadas nos registros da Economatica, em um total de 3425 empresas.

Embora haja semelhanças, a classificação setorial da MM e da Economatica não é a mesma, o que exigiu duas alterações nos setores originais da MM, listados anteriormente. Os setores “Atacado” e “Varejo” foram fundidos, dando origem ao setor “Atacado e Varejo”. E os setores "Comunicações", "Serviços" e "Farmacêutico” foram agrupados sob a rubrica “Diversos”. Entretanto, após este procedimento, verificou-se que muitos dos registros, particularmente das empresas que realizaram IPOs tinham informações contábeis incompletas, o que seria um obstáculo grande para a realização da parte empírica do trabalho. Dado este problema, foi necessário recorrer-se a um terceiro procedimento de merge. Neste caso, buscou-se completar as informações das empresas que realizaram IPOs com base em duas fontes de informação adicionais. A primeira foi o site da Bovespa, que disponibiliza registros contábeis das empresas. A segunda foram os prospectos das IPOs das empresas, registrados no site da CVM. Este merge, da mesma maneira que os anteriores, teve como chaves de identificação o CNPJ e o ano. Após e exclusão de registros restantes, sem a identificação do CNPJ ou do nome fantasia, obtém-

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se um banco com 3.209 empresas e 18.530 registros, com a seguinte divisão por setores:

Tabela AII – Distribuição setorial das empresas Setor Número de empresas Porcentagem Atacado e Varejo 426 13,28 Autoindústria 101 3,15 Bens de Capital 76 2,37 Bens de Consumo 193 6,01 Clubes e Confederações 32 1,00 Diversos 588 18,32 Eletroeletrônico 106 3,30 Energia 236 7,35 Indústria Digital 148 4,61 Indústria da Construção 260 8,10 Mineração 56 1,75 Papel e Celulose 72 2,24 Produção Agropecuária 147 4,58 Química e Petroquímica 202 6,29 Siderurgia e Metalurgia 173 5,39 Telecomunicações 83 2,59 Transporte 152 4,74 Têxteis 158 4,92 Total 3.209 100,00

Fonte: Elaboração do autor

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Anexo 3: Variáveis oriundas do banco da MM • Razão social • Nome fantasia • CNPJ • Ano • Controle acionário • Setor • Receita operacional bruta • Número de empregados • Imobilizado líquido • Lucro líquido • Receita líquida • Ativo total • Ativo permanente • Ativo circulante • Passivo circulante • Dívida total • Aquisição de ativo imobilizado • Dívida total líquida • Montante de empréstimos • Despesa financeira

Anexo 4: Classificação setorial da MM • Atacado • Autoindústria

• Bens de Capital • Bens de Consumo

• Clubes e Confederações • Comunicações

• Diversos • Eletroeletrônico

• Energia • Farmacêutico

• Indústria Digital • Indústria da Construção

• Mineração • Papel e Celulose

• Produção Agropecuária • Química e Petroquímica

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• Serviços • Siderurgia e Metalurgia

• Telecomunicações • Transporte

• Têxteis • Varejo