Ativ Conto Felicidade Clandestina Parte 1

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  • 8/13/2019 Ativ Conto Felicidade Clandestina Parte 1

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    Escola Municipal Dr. Lund

    Aqui sim um bom lugar de se estudar.

    Atividade Avaliativa - Portugus - 3 trimestre - Valor: 2! pontos - Pro"a. #leunice

    $elicidade clandestina

    Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados. Tinha um busto enorme,enquanto ns todas ainda ramos achatadas. Como se no bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com

    balas. !as possu"a o que qualquer crian#a devoradora de histrias gostaria de ter$ um pai dono de livraria.%ouco aproveitava. E ns menos ainda$ at para anivers&rio, em ve' de pelo menos um livrinho barato, ela nosentregava em mos um carto(postal da lo)a do pai. Ainda por cima era de paisagem do *eci+e mesmo, onde mor&vamos, comsuas pontes mais do que vistas. Atr&s escrevia com letra bordad"ssima palavras como data natal"cia e saudade.

    !as que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vingan#a, chupando balas com barulho. Como essa meninadevia nos odiar, ns que ramos imperdoavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu comcalma +erocidade o seu sadismo. a minha -nsia de ler, eu nem notava as humilha#es a que ela me submetia$ continuava aimplorar(lhe emprestados os livros que ela no lia.

    At que veio para ela o magno dia de come#ar a exercer sobre mim uma tortura chinesa. Como casualmente,in+ormou(me que possu"aAs Reinaes de Narizinho,de !onteiro /obato.

    Era um livro grosso, meu 0eus, era um livro para se +icar vivendo com ele, comendo(o, dormindo(o. E completamenteacima de minhas posses. 0isse(me que eu passasse pela sua casa no dia seguinte e que ela o emprestaria.

    At o dia seguinte eu me trans+ormei na prpria esperan#a da alegria$ eu no vivia, eu nadava devagar num marsuave, as ondas me levavam e me tra'iam.

    o dia seguinte +ui 1 sua casa, literalmente correndo. Ela no morava num sobrado como eu, e sim numa casa. ome mandou entrar. 2lhando bem para meus olhos, disse(me que havia emprestado o livro a outra menina, e que eu voltasseno dia seguinte para busc&(lo. 3oquiaberta, sa" devagar, mas em breve a esperan#a de novo me tomava toda e eurecome#ava na rua a andar pulando, que era o meu modo estranho de andar pelas ruas de *eci+e. 0essa ve' nem ca"$ guiava(me a promessa do livro, o dia seguinte viria, os dias seguintes seriam mais tarde a minha vida inteira, o amor pelo mundo meesperava, andei pulando pelas ruas como sempre e no ca" nenhuma ve'.

    !as no +icou simplesmente nisso. 2 plano secreto da +ilha do dono de livraria era tranquilo e diablico. o diaseguinte l& estava eu 1 porta de sua casa, com um sorriso e o cora#o batendo. %ara ouvir a resposta calma$ o livro ainda noestava em seu poder, que eu voltasse no dia seguinte. !al sabia eu como mais tarde, no decorrer da vida, o drama do diaseguinte com ela ia se repetir com meu cora#o batendo.

    E assim continuou. 4uanto tempo5 o sei. Ela sabia que era tempo inde+inido, enquanto o +el no escorresse todode seu corpo grosso. Eu )& come#ara a adivinhar que ela me escolhera para eu so+rer, 1s ve'es adivinho. !as, adivinhandomesmo, 1s ve'es aceito$ como se quem quer me +a'er so+rer este)a precisando danadamente que eu so+ra.

    4uanto tempo5 Eu ia diariamente 1 sua casa, sem +altar um dia sequer. As ve'es ela di'ia$ pois o livro esteve comigoontem de tarde, mas voc6 s veio de manh, de modo que o emprestei a outra menina. E eu, que no era dada a olheiras,sentia as olheiras se cavando sob os meus olhos espantados.

    At que um dia, quando eu estava 1 porta de sua casa, ouvindo humilde e silenciosa a sua recusa, apareceu suame. Ela devia estar estranhando a apari#o muda e di&ria daquela menina 1 porta de sua casa. %ediu explica#es a nsduas. 7ouve uma con+uso silenciosa, entrecortada de palavras pouco elucidativas. A senhora achava cada ve' mais estranhoo +ato de no estar entendendo. At que essa me boa entendeu. 8oltou(se para a +ilha e com enorme surpresa exclamou$mas este livro nunca saiu daqui de casa e voc6 nem quis ler9

    E o pior para essa mulher no era a descoberta do que acontecia. 0evia ser a descoberta horrori'ada da +ilha quetinha. Ela nos espiava em sil6ncio$ a pot6ncia de perversidade de sua +ilha desconhecida e a menina loura em p 1 porta,exausta, ao vento das ruas de *eci+e. :oi ento que, +inalmente se re+a'endo, disse +irme e calma para a +ilha$ voc6 vaiemprestar o livro agora mesmo. E para mim$ E voc6 +ica com o livro por quanto tempo quiser. Entendem5 8alia mais do queme dar o livro$ pelo tempo que eu quisesse tudo o que uma pessoa, grande ou pequena, pode ter a ousadia de querer.

    Como contar o que se seguiu5 Eu estava estonteada, e assim recebi o livro na mo. Acho que eu no disse nada.%eguei o livro. o, no sa" pulando como sempre. ;a" andando bem devagar. ;ei que segurava o livro grosso com as duasmos, comprimindo(o contra o peito. 4uanto tempo levei at chegar em casa, tambm pouco importa. !eu peito estavaquente, meu cora#o pensativo.

    Chegando em casa, no comecei a ler. :ingia que no o tinha, s para depois ter o susto de o ter. 7oras depois abri(o, li algumas linhas maravilhosas, +echei(o de novo, +ui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer po com manteiga, +ingique no sabia onde guardara o livro, achava(o, abria(o por alguns instantes. Criava as mais +alsas di+iculdades para aquela

    coisa clandestina que era a +elicidade. A +elicidade sempre iria ser clandestina para mim. %arece que eu )& pressentia. Comodemorei9 Eu vivia no ar... 7avia orgulho e pudor em mim. Eu era uma rainha delicada.