Aula 3: A abordagem territorial nas políticas de desenvolvimento...

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Disciplina: Políticas Públicas e Desenvolvimento Rural Aula 3: A abordagem territorial nas políticas de desenvolvimento rural Prof. Dr. Antonio Nivaldo Hespanhol Prof. Dr. Carlos de Castro Neves Neto 2017

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Disciplina: Políticas Públicas e

Desenvolvimento Rural

Aula 3: A abordagem territorial nas políticas de desenvolvimento rural

Prof. Dr. Antonio Nivaldo Hespanhol Prof. Dr. Carlos de Castro Neves Neto

2017

A Política Agrícola Comum (PAC) no contexto da União Europeia

• 1962: lançadao a PAC pela Comunidade Econômica Europeia (CEE);

• Principal objetivo: garantir a autossuficiência alimentar para a sua população.

• 3 pilares: a) unificação do mercado entre os países e garantia de preços mínimos;

• b) preferência de compra para produtos europeus e

• c) fixação de tarifas comuns para produtos estrangeiros.

Reformas da PAC

• modelo produtivista tecnológico das décadas de 1960 e 1970,

• o modelo da contenção-reconversão dos anos 1980

• e o paradigma da proteção-conservação da década de 1990 em diante. Surgimento da iniciativa Ligações Entre Ações de Desenvolvimento da Economia Rural (LEADER) nos anos 1990, no contexto das políticas de desenvolvimento rural.

Consequências da PAC

• a Europa passou a ser autossuficiente em vários produtos, ocorrendo um aumento no excedente de alimentos;

• A PAC se tornou bastante cara, geradora de desperdício e desigualdades, ao privilegiar os agricultores mais capitalizados, localizados nos países mais desenvolvidos da União Europeia.

• É introduzido o princípio da multifuncionalidade na PAC.

O Programa Ligação Entre Ações de Desenvolvimento da Economia Rural (LEADER)

• Objetivo: fomentar o desenvolvimento sustentável nas zonas rurais, incentivando ações locais, por meio da formação de grupos de açãoões localis (GALs)

• Valorização do patrimônio natural e cultural;

• o reconhecimento da dimensão ambiental como elemento fundamental no desenvolvimento.

• Abordagem territorial do desenvolvimento rural, em oposição à abordagem setorial.

Tabela: Evolução do LEADER e o número de grupos de ação local formados ao longo do Programa

Iniciativas Leader Número de grupos

de ação local

Superfície

abrangida (km²)

Financiamento EU

(milhões de euros)

Leader I

(1991-1993)

217 367 000 442

Leader II

(1994-1999)

906 1 375 144 1.755

Leader+

(2000-2006)

893 1 577 386 2 105,1

Consequências do LEADER

• Reforçou a necessidade de se pensar os espaços rurais além das atividades agrícolas;

• Reforçou a governança local;

• Incentivo ao turismo rural.

• No entanto, não reverteu o esvaziamento das áreas rurais (Exemplo: Portugal) e a maior parte dos recursos foiram destinadaos para as áreas mais desenvolvidas.

• A iniciativa LEADER influenciou os governos brasileiros a elaborarem políticas de desenvolvimento rural que levassem em consideração a opinião dos participantes e a valorização do manejo adequado dos recursos naturais, bem como atendessem os produtores rurais mais carentes.

A agricultura na década de 1990

• tanto o meio acadêmico quanto os órgãos públicos passaram a reconhecer que no meio rural não são desenvolvidas apenas atividades agropecuárias, e que as políticas destinadas a esses espaços deveriam incorporar outros aspectos, como a sustentabilidade ambiental e a pluriatividade das famílias rurais.

• “As instituições multilaterais, como o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), passaram a condicionar a concessão de financiamentos aos países periféricos à incorporação nos seus programas de desenvolvimento rural, de pressupostos e estratégias visando à redução da pobreza, o estímulo às formas organização coletiva, a conservação dos recursos naturais e a visão mais integrada dos espaços rurais e urbanos por meio da perspectiva territorial, sem considerar, entretanto, as particularidades que caracterizam esses países” (HESPANHOL, 2010, p. 127).

Pensar o Espaço Rural além do agrícola

• Estudos (Graziano da Silva. Novo Rural Brasileiro) mostram a presença do agricultor em tempo parcial (part-time) que combina atividades agropecuárias com atividades não-agrícolas, dentro ou fora da propriedade;

• reconhecimento do caráter multifuncional e multidimensional dos espaços rurais.

Destaque do projeto RURBANO, coordenado por Graziano da Silva - O Novo Rural Brasileiro

O Desenvolvimento Rural no Brasil até 1990

• as políticas vigentes até o início da década de 1990 não conseguiram reduzir a pobreza no campo nem a desigualdade social e regional.

• havia um rural invisível, composto por uma grande parcela da população que não tinha acesso às políticas públicas (BONNAL, DELGADO, 2011).

• As políticas públicas de desenvolvimento rural passam a incorporar a perspectiva territorial.

A adoção da perspectiva territorial no Brasil

• Marco inicial (1999) : Programa Comunidade Ativa, executado no governo FHC. Esse programa procurou fomentar o desenvolvimento local nas regiões mais pobres do país com a execução dos planos de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável (DELIS).

Pronaf Infraestrutura e Serviços Municipais (1997 – 2002)

• Linha de financiamento do Governo Federal, com recursos não reembolsáveis, em parceria com os prefeitos as prefeituras municipais, objetivando a implementação, implantação, racionalização, modernização ou realocação da infraestrutura pública e de serviços de apoio ao desenvolvimento da agricultura familiar;

• Transição nas políticas públicas do país: do enfoque setorial para a perspectiva territorial, focada nos municípios;

Empreendimentos e práticas financiadas:

• Recuperação dos solos;

• Implantação de sistemas de abastecimento de água e geração de energia;

• Armazenamento, transporte e venda coletiva de produtos;

• Classificação, limpeza e beneficiamento de produtos agropecuários;

• Para obter essa linha de financiamento, era necessário o município dispor de um Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural e de um Plano Municipal de Desenvolvimento Rural que atendessem as reivindicações dos agricultores familiares.

• Regiões Norte e Nordeste tiveram maior participação no programa.

Principais problemas do Pronaf Infraestrutura

• Os critérios para a seleção dos municípios;

• Manipulação dos prefeitos na alocação dos recursos;

• Vulnerabilidade dos Planos Municipais de Desenvolvimento Rural;

• A pouca experiência em termos de participação dos principais agentes envolvidos no processo;

• Não funcionamento efetivo dos CMDRs.

O fortalecimento das políticas territoriais nos dois mandatos do governo Lula

• 2004: criação da Secretaria de Desenvolvimento Territorial, subordinada ao MDA;

• Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Territórios Rurais (Pronat) - 2004.

• Surgimento dos Colegiados Territoriais (CODETER);

• Extinção da linha Pronaf Infraestrutura que foi incorporada aos objetivos do Pronat.

Principal objetivo da SDT • articular e integrar políticas públicas, em nível

federal, estadual e municipal, com as organizações da sociedade civil, em busca do desenvolvimento de territórios rurais onde fosse predominante a agricultura familiar e os assentamentos rurais, contribuindo para a elevação das capacidades humanas, institucionais e de autogestão dos territórios (ORTEGA, MENDONÇA, 2007).

Definição de território para o MDA

• “um espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, compreendendo a cidade e o campo, caracterizado por critérios multidimensionais – tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições - e uma população com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial” (BRASIL, MDA/SDT, 2005, apud DELGADO; LEITE, 2011, p. 90).

Pronat • Gerido pelo MDA, com recursos do Orçamento Geral

da União;

• Os projetos podem ser submetidos pelos chefes do poder executivo dos estados e municípios, assim como os representantes da sociedade civil. No entanto, os projetos devem ser aprovados pelo Colegiado de Desenvolvimento Territorial (CODETER);

• A maior parte dos recursos tem sido destinada na Ação de no Apoio a Projetos de Infraestrutura e Serviços em Territórios Rurais (PROINF).

• 2003 – 2012: foram implementados 6.852 projetos pelo Proinf, com alocação de 1,56 bilhão de reias reais pela SDT do MDA.

Linhas do Pronat Ano

Apoio a Projetos de Infraestrutura e Serviços

em Territórios Rurais (PROINF)

2003

Capacitação de Agentes de Desenvolvimento 2003

Assistência Financeira Mediante Emendas

Parlamentares

2003

Projeto Dom Helder Câmara (PDHC) 2003

Elaboração de Planos Territoriais de

Desenvolvimento Rural Sustentável

(PTDRS)

2004

Gestão Administrativa do Programa 2004

Apoio a Gestão de PTDRS 2006

Fomento aos Empreendimentos Associativos

e Cooperativos da Agricultura Familiar e

Assentamentos da Reforma Agrária

2007

Fortalecimento e Valorização de Iniciativas

Territoriais de Manejo e Uso Sustentável da

Agrobiodiversidade

2008

Territórios Rurais • Áreas de municípios próximos com densidade

demográfica inferior a 80 hab/km², baixo IDH e com grande presença de agricultores familiares e de projetos da reforma agrária;

• Foram identificados 450 territórios rurais, dentre os quais 250 foram selecionados, com base na concentração de agricultores familiares, no número de famílias assentadas pela reforma agrária e na quantidade de trabalhadores rurais sem terra.

• Do total de 210 territórios selecionados foram priorizados 164 para participar do Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (PRONAT) a partir do ano de 2004.

• Com a constituição dos Territórios Rurais, o governo Federal tentou diminuir o poder das oligarquias que comandam a política nas áreas mais pobres do país;

• 2009 - aplicação de R$ 381,5 milhões em ações implementadas nos 164 Territórios Rurais e em 2.500 municípios.

• “A maior parte dos projetos aprovados pelos CODETER, na modalidade PROINF, é de natureza pontual e setorial, vinculando-se basicamente ao atendimento de demandas de municípios para atender grupos de agricultores familiares vinculados a cadeias produtivas específicas, ou seja, não são apoiados projetos de interesse coletivo dos territórios, mas sim projetos voltados ao incremento e melhoria da infraestrutura de atividades agropecuárias tradicionais, as quais possuem baixo potencial de encadeamento e de dinamização dos territórios rurais.” (HESPANHOL, 2014, p. 432).

Programa Territórios da Cidadania (2008) Principal Objetivo do PTC: superar a pobreza e as

desigualdades sociais nas áreas rurais

Critérios adotados para a definição e priorização dos

Territórios da Cidadania:

Maior incidência de pobreza.

a) Menor IDH);

b) maior concentração de beneficiários do Programa Bolsa

Família;

c) maior concentração de agricultores familiares e

assentados da reforma agrária;

d) maior concentração de populações tradicionais,

quilombolas e indígenas e

e) baixo dinamismo econômico.

Ações de 22 ministérios. Investimentos de mais de 30

bilhões de reais por ano.

diferença entre o PRONAT e o PTC

• “(...) ênfase no combate à pobreza e na conquista de cidadania como objetivos primordiais da intervenção governamental, assim como a mobilização de 22 ministérios no sentido de planejarem suas ações de modo a implementarem políticas públicas correspondentes de forma integrada. Isso significa que já na esfera federal e não apenas nos territórios as políticas governamentais deverão ser coordenadas para agirem articuladamente” (LEITE, WESZ JÚNIOR, ANO, p. 653).

Problemas na execução dos programas territoriais no Brasil

• A concentração de terra e de renda (problemas estruturais);

• Permanência das relações arcaicas de poder (clientelismo, paternalismo, coronelismo);

• Incapacidade de atuação a contento das instituições públicas;

• Baixa participação da sociedade civil na elaboração, execução e fiscalização das políticas públicas.

• Baixo valor de recursos destinados aos programas;

• Interferências dos poderes municipais na execução dos programas territorriais;

• Não obstante os programas incorporaram a perspectiva terretorial, a maior parte da estrutura institucional brasileira continua vinculada a lógica produtivista e setorial associada ao agronegócio.

• “constata-se que embora a abordagem territorial seja relevante e apresente potencialidades para ser ampliada no futuro, ela se limita aos documentos oficiais (manuais). Para que a abordagem territorial possa ser implementada com maior vigor é necessária a superação de problemas estruturais e a realização de pesados investimentos em educação para que a população do país possa, de fato, adquirir autonomia e exercer plenamente a cidadania” (HESPANHOL, 2012, p. 8).

Referências • BONNAL, P. ; DELGADO, N. G. ; CAZELLA, A. A. Subsídios metológicos ao estudo do

desenvolvimento territorial rural. In: Carlos Miranda; Breno Tiburcio. (Org.). Políticas Públicas, Atores Sociais e Desenvolvimento Territorial no Brasil. Brasília: Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura - IICA, 2011(Série desenvolvimento rural sustentável; v.14), p. 35-60.

• HESPANHOL, A. N.. Abordagem territorial e fomento ao desenvolvimento rural no Brasil e em Portugal. In: XXII Encontro Nacional de Geografia Agrária, 2014, Natal..Natal: UFRN, 2014. v. 1. p. 424-437.

• LEITE, Sérgio P; WESZ JÚNIOR, Waldemar J. O financiamento da política de desenvolvimento territorrial: uma análise do Pronaf e do programa Território da Cidadania. In: Carlos Miranda; Breno Tiburcio. (Org.). Políticas Públicas, Atores Sociais e Desenvolvimento Territorial no Brasil. 1. ed. Brasília, D.F.: Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), 2011(Série desenvolvimento rural sustentável; v.14), p. 169-196.

• ORTEGA, Antonio César & MENDONÇA, Nilton César. Estratégias de desenvolvimento territorial rural no Brasil: continuidades e rupturas. In ORTEGA, Antonio César & ALMEIDA FILHO, Niemeyer. Desenvolvimento territorial, segurança alimentar e economia solidária. Campinas-SP: Editora Alínea, 2007, p. 93-121. HESPANHOL, R.A.M.A adoção da perspectiva territorial nas políticas de desenvolvimento rural no Brasil. Campo - Território, v. 5, p. 123-147, 2010.

• MUITO OBRIGADO !!