AVALIAÇÃO EXPERIMENTAL DA CONDIÇÃO ......entre a ferramenta e a apara, que possam contribuir...

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AVALIAÇÃO EXPERIMENTAL DA CONDIÇÃO TRIBOLÓGICA NO PROCESSO DE CORTE POR ARRANQUE DE APARA Esmeraldo Miguel Cangundo (Licenciado) Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Engenharia Mecânica Júri Presidente: Prof. Rui Manuel dos Santos Oliveira Baptista Orientador: Prof. Paulo António Firme Martins Co-orientador: Prof. Pedro Alexandre Rodrigues Carvalho Rosa Vogal: Profª Maria Beatriz Cipriano de Jesus Silva Outubro de 2009

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AVALIAÇÃO EXPERIMENTAL DA CONDIÇÃO TRIBOLÓGICA

NO PROCESSO DE CORTE POR ARRANQUE DE APARA

Esmeraldo Miguel Cangundo

(Licenciado)

Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em

Engenharia Mecânica

Júri

Presidente: Prof. Rui Manuel dos Santos Oliveira Baptista

Orientador: Prof. Paulo António Firme Martins

Co-orientador: Prof. Pedro Alexandre Rodrigues Carvalho Rosa

Vogal: Profª Maria Beatriz Cipriano de Jesus Silva

Outubro de 2009

I

À Dionísia, minha irmã Cristina e aos meus pais.

II

III

“Quando todos pensam da mesma forma, então ninguém está a pensar. ”

Walter Lippmann

IV

V

Resumo

A existência de atrito na interface de contacto entre a ferramenta e a apara tem uma influência

significativa no mecanismo de formação de apara, em especial na eficiência energética dos

processos de maquinagem. De facto, alguns autores estimam que em determinadas aplicações o

atrito possa ser responsável por até 50% da energia total consumida na formação da apara. Este

nível de energia dissipada é uma preocupação tanto económica, como ambiental, quando se analisa

a extensa aplicação industrial dos processos de maquinagem. Deste modo, torna-se prioritária a

realização de estudos compreensivos dos fenómenos tribológicos existentes na interface de contacto

entre a ferramenta e a apara, que possam contribuir futuramente para uma melhoria da eficiência de

um dos grupos de processos tecnológicos de maior utilização industrial.

A pesquisa bibliográfica neste domínio mostrou que existe alguma dificuldade, ou mesmo desacordo,

sobre quais os ensaios ou as técnicas que devem ser utilizadas ou que permitem reproduzir de forma

independente as condições tribológicas na interface de contacto entre a ferramenta e a apara. Deste

modo, o presente trabalho de investigação procura estabelecer metodologias experimentais

adequadas a uma avaliação do coeficiente de atrito na interface de contacto entre a ferramenta e a

apara. O estudo foi alargado à análise das variáveis operativas e da sua influência no valor do

coeficiente de atrito, tais como a velocidade ou a pressão relativa na interface, ou o meio envolvente.

Neste trabalho foram utilizadas condições de corte ortogonal, distintas da generalidade das

aplicações industriais, de modo a promover condições experimentais controladas que permitam uma

avaliação comparativa adequada. Foram seleccionados alguns ensaios tribológicos tradicionais,

tendo sido desenvolvidas as competências experimentais necessárias para a sua implementação na

caracterização do coeficiente de atrito entre diferentes pares de materiais. A utilização de ferramentas

de cálculo numérico foi também necessária para a realização de ábacos de calibração do coeficiente

de atrito para alguns dos ensaios tribológicos. Ficou demonstrado que é possível obter estimativas

adequadas do valor médio do coeficiente de atrito com o ensaio de pino-no-disco quando

devidamente controladas as principais variáveis operativas. De facto, a textura superficial mostrou ser

uma das principais variáveis a controlar para permitir estabelecer um controlo sobre o coeficiente de

atrito. O ensaio de anel, apesar de mostrar uma boa sensibilidade ao coeficiente de atrito, não é

utilizável na gama típica de valores para o corte por arranque de apara, apresentando saturação para

valores do coeficiente de atrito acima de 0.4. É ainda apresentada uma análise da influência das

propriedades mecânicas dos pares tribológicos no comportamento global do atrito.

VI

VII

Abstract

The presence of friction on the tool-chip interface has a significant impact on the energetic efficiency in

the machining process. In fact, some authors proposed that, in some applications, the friction

mechanism is responsible for up to 50% of the total energy consumption of the process. The level of

consumed energy is an economic and environmental concern, when it turns out clear the role of the

machining process in the modern day industry.

It turns out evident that, it is necessary to carried out comprehensive studies of the friction mechanism

on the tool-chip interface, contributing for the optimization of the efficiency of the one of the most

applied technological process in the industry.

The literature review shows that there is still some lack of knowledge about the reliability of the

tribological characterization techniques, especially for describing the chip-tool interaction in the metal

cutting operations. So, the present work searches to establish adequate experimental methodologies

that allow assessing the tool-chip interaction through independent techniques. The experimental work

were supported by an extended study on the principal operating parameters, such as sliding velocity,

applied load and the surrounding medium.

Orthogonal cutting conditions were employed in the present work, differing from the generality of the

industrial applications, in order to assure that the experimental work is conducted under similar

controlled conditions.

Some traditional tribological characterization techniques were selected and experimental tests were

conducted with different tribo-pairs. Numerical simulation techniques were also applied for calculating

the calibration curves for some tribological characterization techniques. It was also demonstrated that,

it is possible to obtain a good average for the friction coefficient value on the pin-on-disc test, when the

principal operating parameters are controlled. In fact, the surface texture has proved to be one of the

most important parameter that controls the friction coefficient. The ring compression test also shows a

good sensibility on the surface texture, but the test is not appropriate for the typical values of the

cutting operations, as the test saturates for a value of friction coefficient about 0.4. It was also

presented the analysis of the influence of the mechanical properties of the tribo-pairs on the overall

friction mechanism.

VIII

IX

Palavras-chave

Atrito

Ensaio de anel

Pino-no-disco

Corte ortogonal

Keywords

Friction

Pin-on-disc test

Ring compression test

Orthogonal cutting

X

XI

Agradecimentos

Desejo mostrar o meu profundo agradecimento;

Ao meu orientador científico, o Prof. Paulo António Firme Martins pelo apoio e dedicação

demonstrada ao longo da realização da presente dissertação;

Ao meu co-orientador científico, o Prof. Pedro Alexandre Rodrigues Carvalho Rosa, pelo apoio

científico, dedicação, sentido crítico, e pela preciosa colaboração prestada nos esclarecimentos e na

organização deste trabalho, mostrando-me sempre o caminho a seguir, tendo frequentemente

sacrificado o seu tempo em detrimento deste trabalho;

Ao Mestre Valentino Cristino pela dedicação, sentido crítico, amizade, grande capacidade de

transmissão de conhecimentos e ajuda prestada ao longo da realização desta dissertação, sem os

quais a conclusão da mesma não seria possível;

À Dionísia, pela paciência, dedicação, apoio, companheirismo e amor demonstrado ao longo destes

anos;

À minha irmã Cristina, por sempre acreditar em mim e por todo sacrifício que teve de fazer;

Aos meus irmãos e sobrinhos, pelo carinho e paciência demonstrado e ao mesmo tempo por

entenderem o motivo da minha ausência ao longo deste período da minha formação;

À Professora Doutora Maria Beatriz Cipriano de Jesus Silva, pelas palavras confortantes proferidas

nos momentos em que me sentia perdido;

Ao Engenheiro Hélder Neto pela amizade e companheirismo demonstrado nos momentos mais

difíceis, tornando possível a efectivação desta realidade;

À TOTAL E&P ANGOLA por ter acreditado em mim, e como tal oferecido uma bolsa de estudos, que

foi fundamental para a efectivação desta fase académica;

À Área Científica de Tecnologia Mecânica (ACTM) do Instituto Superior Técnico (IST) em particular na

pessoa do Sr. Farinha pelo apoio no fabrico de vários componentes, necessários para a execução do

presente trabalho;

Ao colega Joaquim Pereira, pela colaboração prestada no decorrer da realização deste trabalho;

Ao Mestre Carlos Silva pelo companheirismo e colaboração na parte do fabrico da célula de carga;

Aos colegas do Departamento de Engenharia Mecânica do Instituto Superior Técnico (IST) em

particular aos da ACTM pelo apoio e incentivo demonstrado;

Ao Nelson Martins, Alegria Jeremias, Samori Jordão, Fernando Dala, Jandira Coelho, Edson Silva e

Domingos Massala, pelo apoio e criticas dirigida a quanto da realização desta dissertação, tornando-a

ainda mais rica;

Aos bolseiros da TOTAL E&P ANGOLA pelo ambiente familiar oferecido ao longo deste período da

minha formação académica no IST;

A todos aqueles que directa ou indirectamente tornaram possível que esta realidade fosse alcançada

com sucesso, o meu muito obrigado.

XII

XIII

Índice

Resumo .............................................................................................................................................. V

Abstract ............................................................................................................................................ VII

Palavras-chave ................................................................................................................................ IX

Keywords .......................................................................................................................................... IX

Agradecimentos ............................................................................................................................... XI

Lista de tabelas ............................................................................................................................... XV

Lista de figuras ............................................................................................................................... XVI

Lista de símbolos ........................................................................................................................... XIX

Abreviaturas .................................................................................................................................... XX

Nomenclaturas ................................................................................................................................ XX

1 Introdução..................................................................................................................... 1

2 Fundamentos teóricos ................................................................................................. 5

2.1 Tribologia ............................................................................................................................... 5

2.1.1 Breve introdução histórica ........................................................................................... 5

2.1.2 Natureza das superfícies ............................................................................................. 9

2.1.3 Mecanismos de atrito ................................................................................................. 12

2.1.4 Lubrificação ................................................................................................................. 14

2.1.5 Modelos de atrito ........................................................................................................ 15

2.1.6 Quantificação do atrito ............................................................................................... 19

2.2 Corte por arranque de apara ............................................................................................ 25

2.2.1 Definições básicas ...................................................................................................... 25

2.2.2 Tribologia no corte ortogonal .................................................................................... 28

3 Desenvolvimento experimental ..................................................................................35

3.1 Ensaio de pino-no-disco .................................................................................................... 35

3.2 Ensaio de anel .................................................................................................................... 40

3.3 Ensaio de corte ortogonal ................................................................................................. 41

3.4 Materiais em estudo ........................................................................................................... 42

3.5 Plano de ensaios ................................................................................................................ 43

4 Resultados e Discussão .............................................................................................45

4.1 Influência da velocidade relativa e da pressão de contacto ........................................ 45

XIV

4.2 Influência da rugosidade superficial ................................................................................ 48

4.3 Influência do meio envolvente .......................................................................................... 52

4.4 Avaliação comparativa de ensaios .................................................................................. 55

5 Conclusões e perspectivas de trabalho futuro .........................................................59

5.1 Conclusões .......................................................................................................................... 59

5.2 Perspectivas de trabalho futuro ........................................................................................ 60

Bibliografia .........................................................................................................................61

Anexos .................................................................................................................................. i

Encoder ............................................................................................................................................... i

Subrotina (Diagrama de Bloco) ................................................................................................... i

Data Sheet ......................................................................................................................................ii

Características do óleo utilizado .................................................................................................... iii

XV

Lista de tabelas

Tabela 3.1 – Relação entre a textura superficial, a rugosidade superficial média e o tipo de lixa

utilizado na preparação superficial dos discos. ..................................................................................... 39

Tabela 3.2– Propriedades mecânicas dos materiais para o fabrico dos respectivos provetes. ........... 43

Tabela 3.3 – Plano de trabalho experimental para o ensaio pino-no-disco. ......................................... 44

Tabela 3.4 – Plano de trabalho experimental para o ensaio de anel .................................................... 44

XVI

Lista de figuras

Figura 2.1 – Equipamentos de redução de atrito: a) Mecanismos de transporte de carga nas

civilizações antigas; b) Pivô inferior da porta (Frene e co-autores, 1990). ............................................. 6

Figura 2.2 – Transporte de estátua, túmulo de Tchuti Hemp, EI-Bersheh, 1800 A.C. (Frene e co-

autores, 1990). ........................................................................................................................................ 7

Figura 2.3 – Esquemas das experiencias realizado por Leonardo da Vinci (Frene e co-autores, 1990);

a) Dispositivos para estudo do atrito; b) Dispositivo para diminuição do atrito. ...................................... 7

Figura 2.4 – Aspecto real de uma superfície acabada: a) Esquema representativo das impurezas que

afectam a superfície dos metais; b) Forma geométrica de uma superfície vista ao nível microscópico

............................................................................................................................................................... 10

Figura 2.5 – Decomposição do perfil de uma superfície mostrando os elementos que constituem a sua

textura (Rodrigues, 2006). ..................................................................................................................... 11

Figura 2.6 – Mecanismos básicos de atrito: a) Adesão; b) Formação de micro-apara e c) Deformação

de asperezas (elástica e plástica) (Holmberg e co-autor, 2009)........................................................... 13

Figura 2.7 – Esquema do contacto entre a superfície da peça (apara) e a ferramenta de corte com um

regime de tensão variável ao longo da face de ataque desta: a) Representação das forças de corte

(Fa), originadas pelo atrito consequente do carregamento normal (FN). b) Correspondência

interdisciplinar dos fenómenos do atrito e desgaste no corte por arranque de apara. ......................... 14

Figura 2.8 – Representação esquemática das principais leis de atrito usadas em engenharia,

mostrando a tensão de atrito numa interface sólido – sólido, como uma função da pressão normal.

São apresentadas duas curvas (A e B) geradas a partir da lei do atrito de Bay. ................................. 19

Figura 2.9 – Representação esquemática do ensaio de pino-no-disco. ............................................... 21

Figura 2.10 – Deformação do anel durante a operação de forjamento: a) Provete original e deformado

em condições de baixo e elevado atrito; b) Curva de calibração típica (Fletcher e co-autores, 1998). 23

Figura 2.11 – Representação da malha deformada durante a simulação do ensaio de anel no

programa I-Form2 (onde N define a linha neutra ou a zona de velocidade nula, que separa as duas

direcções de escoamento de material) ( Rosa, 2003). ......................................................................... 25

Figura 2.12 – Representação esquemática do corte por arranque de apara; a) Corte Oblíquo; b) Corte

Ortogonal ............................................................................................................................................... 26

Figura 2.13 – Mecanismo de formação de apara: a) Representação bidimensional do corte ortogonal,

ilustrando os principais parâmetros; b) Zonas de corte. ....................................................................... 27

Figura 2.14 Mecanismo de formação de apara: a) Tresca (1878); b) Mallock (1881-82) (Childs e co-

autores, 2000) e c) Processo de formação de apara observado actualmente em condições de baixo e

elevado atrito. ........................................................................................................................................ 29

Figura 2.15 – Métodos para determinação de distribuição de tensões: a) Método fotoelástico; b)

Método split tool (Loladze, 1958). ......................................................................................................... 30

Figura 2.16 – Influência dos parâmetros de corte no comprimento de contacto (lc): a) Correlação com

espessura da apara não deformada para diferentes materiais, 1-cobre, 2-chumbo, 3-alumínio, 4-aço

AISI E9310, 5-Câdmio e 6- Titânio; b) Correlação com a velocidade de corte para diferentes

XVII

materiais, 1-Titânio, 2-Liga berílio-cobre (UNSC17000, HB200), 3-Liga berílio-cobre (UNSC

17000,HB110), 5- cobre e 6- alumínio 2014 (Astkhov, 2006). .............................................................. 32

Figura 3.1 – Máquina de ensaios do pino-no-disco desenvolvido e componentes: a) Máquina de

ensaios; b) Motor-redutor A053UH25 18.6 1HP 4PB5; c) Variador de frequência ACT401-07 FA 1HP.

............................................................................................................................................................... 36

Figura 3.2 – Sistema de ensaio; a) Representação esquemática do aparato experimental de pino-no-

disco; b) Amplificador de sinais Vishay 2100; c) Célula de carga bidimensional; d) Painel frontal e

diagrama de bloco do programa desenvolvido. .................................................................................... 37

Figura 3.3 – Monitorização da velocidade de rotação do motor; a) Alterações para a montagem do

encoder; b) Montagem final. .................................................................................................................. 37

Figura 3.4 – Metodologia de polimento de discos; a) Unidade de limpeza e polimento; b) Direcção das

estrias obtidas no polimento. ................................................................................................................. 38

Figura 3.5 – Discos de AISI 316L e PVC com diferentes texturas superficiais obtidos na unidade de

limpeza e polimento. .............................................................................................................................. 38

Figura 3.6 – Controlo do estado superficial; a) Rugosímetro Kosaka Lab. SE 1200; b) Medição da

rugosidade superficial de um disco. ...................................................................................................... 39

Figura 3.7 – Máquina de ensaios universal Instron 1200KN utilizada para o ensaio de anel .............. 40

Figura 3.8 – Representação esquemática da textura dos pratos de compressão; pratos de

compressão utilizados no ensaio de anel. ............................................................................................ 40

Figura 3.9 – Aparato experimental para os ensaios de corte ortogonal: a) Montagem do aparato; b)

Esquema representativo do aparato. .................................................................................................... 41

Figura 3.10 – Polimento das ferramentas de corte: a) esquema representativo da ULP; b)

Acabamento superficial obtido para ferramentas de AISI 316L. ........................................................... 42

Figura 3.11 – Provetes de chumbo e cobre utilizados nos ensaios para os vários processos: a) pino

no disco, b) ensaio de anel; c) corte ortogonal. .................................................................................... 43

Figura 4.1 – Resultados do ensaio pino-no-disco: a) Força normal e tangencial em função do tempo

para o par Pb/PVC a velocidade v=0.072m/s; b) Relação da força normal e tangencial obtida nos

ensaios pino-no-disco para pares tribológicos com propriedades mecânicas similares ( Pb/PVC) para

diferentes velocidades. .......................................................................................................................... 46

Figura 4.2– Relação entre a força tangencial e normal para pares tribológicos com propriedades

mecânicas diferentes para várias velocidades: a) Pb/AISI 316 L; b) Cu/AISI 316 L. ........................... 47

Figura 4.3– Comportamento do coeficiente de atrito: a) Influência da rugosidade superficial no valor

do coeficiente de atrito no ensaio pino-no-disco; b) O mesmo gráfico com o eixo horizontal na em

escala logarítmica. ................................................................................................................................. 49

Figura 4.4 – Depósitos de chumbo na superfície dos discos: a) Disco de AISI 316 L com Ra=0.07 um;

b) Disco de PVC com Ra=0.65 um; c) disco de AISI 316 L com Ra=0.8 um; d) O mesmo disco

mostrado em (b) ampliado com recurso a microscópio óptico.............................................................. 50

Figura 4.5– Ilustração que mostra a interacção entre o pino e o disco para diferentes valores de

rugosidade ............................................................................................................................................. 50

Figura 4.6 – Resultados experimentais e curvas de calibração resultante do modelo de atrito de

Coulomb: a) Chumbo; b) Cobre ............................................................................................................ 51

XVIII

Figura 4.7 – Depósitos de cobre nos pratos depois de cada etapa do ensaio realizado. .................... 52

Figura 4.8 – Influência da atmosfera do meio envolvente no coeficiente de atrito. .............................. 53

Figura 4.9 – Coeficiente de atrito em função da velocidade relativa na interface para condições de

atrito lubrificado ..................................................................................................................................... 54

Figura 4.10 – Análise comparativa das técnicas de avaliação de atrito em condições de lubrificação.

............................................................................................................................................................... 55

Figura 4.11 – Comparação da textura superficial dos pratos e discos utilizados nos ensaios de anel e

de pino-no-disco .................................................................................................................................... 55

Figura 4.12 – Análise comparativa das técnicas de avaliação de atrito: a) Influência das propriedades

mecânicas e da rugosidade superficial no coeficiente de atrito; b) O mesmo gráfico com escala

logarítmica no eixo horizontal. ............................................................................................................... 57

XIX

Lista de símbolos

µ - Coeficiente de atrito de Coulomb

D0 - Diâmetro exterior inicial do provete

d0 - Diâmetro interior inicial do provete

f - Constante representativa da tensão de corte na interface (modelo de atrito de Coulomb);

factor de atrito (modelo de atrito de Wanheim – Bay)

Fa - Força de atrito

Fc - Força de corte

FN - Força normal à direcção de escorregamento

Fp - Força de penetração

Ft - Força de atrito

hi - Variação de altura entre a espessura do anel (após carregamento)

h0 - Altura inicial do provete

k - Tensão de corte máxima do material

lc - Comprimento de contacto entre a apara e a face de ataque da ferramenta de corte

m - Factor de atrito (modelo de atrito de Prandtl)

P - Pressão normal

R0 - Raio exterior do anel

Ra - Rugosidade média aritmética

Rc - Grau de encalque

Rn - Posição radial da linha neutra

t - Espessura da apara depois do corte

to - Espessura da apara antes do corte

Vc - Velocidade de corte

w - Largura da apara (medida paralelamente ao sentido da aresta de corte)

Zi - Rugosidade parcial

α - Razão entre as áreas real e aparente (modelo de atrito de Wanheim – Bay)

α - Ângulo de ataque da ferramenta de corte

β - Ângulo de atrito

σ - Ângulo de saída da ferramenta de corte

σe - Tensão de cedência do material

τ - Tensão de corte derivado da força de atrito

𝜙 - Ângulo do plano de corte

XX

Abreviaturas

CA - Coeficiente de atrito

CFC - Cúbico de faces centradas

MEF - Modelação em elementos finitos

POD - Pino-no-disco

PVC - Cloreto de polivinila

SAD - Sistema de aquisição de dados

ULP - Unidade de limpeza e polimento

MFA - Microscópio de força atómica

PC - Personal computer

Nomenclaturas

ACTM - Área científica de Tecnologia Mecânica

AISI - American Iron and Steel Institute

ASTM - American Society for Testing and Materials

DEM - Departamento de Engenharia Mecânica

ISO - International Organization of Standardization

IST - Instituto Superior técnico

UTL - Universidade Técnica de Lisboa

1

Capítulo 1

1 Introdução

Os processos tecnológicos de maquinagem sempre possuíram, de entre os processos de fabrico,

uma importância significativa para a sociedade económico-industrial devido ao facto de estarem

envolvidos na produção directa da generalidade dos bens de consumo, ou indirectamente no fabrico

de ferramentas e/ou equipamentos utilizados noutros processos produtivos (Armarego e co-autor,

1969). A característica mais marcante dos processos de maquinagem está relacionada com a

elevada flexibilidade com que permitem a obtenção de geometrias complexas e/ou esbeltas com

elevada precisão numa gama alargada de materiais (p.ex. metais, polímeros ou cerâmicos) (Shaw,

1989). No entanto, e apesar da importância económica e tecnológica, os processos de maquinagem

continuam a ser dos menos compreendidos, devido possivelmente a dificuldades na compreensão do

mecanismo de formação de apara.

Em estudos recentes, Tekaya, Bil e Kiliç (2004) compararam as estimativas numéricas obtidas a partir

de três programas de elementos finitos com valores obtidos experimentalmente, tendo concluído que

embora os parâmetros individuais (tais como a força de corte, a força de penetração e o ângulo do

plano de corte) possam convergir com os resultados experimentais, nenhum dos modelos numéricos

possibilitou uma solução global satisfatória. Da análise deste trabalho consideraram como causas

prováveis para esta divergência lacunas no comportamento mecânico do material e da condição

tribológica na interface de contacto, para as condições de velocidade e de temperatura que se

verificam durante os processos de maquinagem. Em concordância com as observações anteriores,

Astakhov (2005) após analisar diversas simulações do corte por arranque de apara disponíveis na

literatura verificou que todas as estimativas numéricas estavam em boa concordância com os

resultados experimentais, independentemente do valor do coeficiente de atrito que tinha sido definido.

De facto, o coeficiente de atrito na generalidade dos casos não tinha sido pré-determinado

experimentalmente, mas sim utilizado como um parâmetro de ajuste da simulação numérica.

De acordo com a análise da literatura da especialidade parece haver algum embaraço com a

quantificação e a modelação do atrito no corte por arranque de apara. Esta dificuldade não parece

estar relacionada com a ausência de técnicas para a avaliação do atrito, muito pelo contrário (Blau,

1996 e Booser, 1985), mas com alguma falta de precisão e fiabilidade dos valores obtidos. Esta é a

razão pela qual muitos investigadores têm procurado quantificar o atrito através da medição directa

das componentes da força de corte, mesmo conhecendo a existência de contribuições secundárias

(aresta de corte, face de saída, etc…) que influenciam o valor final. Estas contribuições secundárias

são em grande parte as responsáveis pela medição de valores de atrito muito acima dos limites

teóricos, sendo possível encontrar na literatura da especialidade valores do coeficiente de atrito acima

de 1 (Kato, 1972; Shirakashi, 1982, e Childs, 1990), quando o limite teórico pela teórica da

plasticidade é de 0.577. Todas estas questões em torno da quantificação do atrito têm promovido

alguma confusão e desacordo, sobre quais os ensaios ou as técnicas que devem ser utilizadas ou

2

que permitem reproduzir as condições tribológicas no corte por arranque de apara. Outros,

beneficiando das dificuldades descritas anteriormente, aproveitam para mascarar problemas na

modelação do escoamento plástico do material, utilizando os ajustes no valor do atrito para fazer

convergir o campo de tensões ou o campo de extensões da solução numérica com os valores

experimentais. Alguns autores chegam mesmo a atribuir valores fisicamente impossíveis com alguma

naturalidade (Lin e co-autores, 1995). Será talvez por isso que não se encontram na literatura da

especialidade trabalhos que apresentem de forma combinada o campo de tensões e de deformações

com a respectiva validação experimental.

De acordo com o referido anteriormente, conclui-se que a previsão e o controlo do atrito são das

questões com mais influência na qualidade das previsões dos modelos teóricos, concorrendo para

dificultar a compreensão do mecanismo de formação de apara. Deste modo, o presente trabalho de

investigação procura estabelecer metodologias experimentais adequadas a uma avaliação do

coeficiente de atrito no corte por arranque de apara. É dada especial importância às questões

relacionadas com a quantificação do atrito em condições de ensaio semelhantes às encontradas nos

processos de corte, assim como, a necessidade de aplicar técnicas de avaliação independentes.

O estudo foi ainda alargado de modo a permitir identificar a influência das variáveis operativas (a

velocidade e a pressão relativa na interface, o meio envolvente, etc…) no valor do coeficiente de

atrito, assim como quantificar o valor dessa influência.

A presente dissertação está estruturada em cinco capítulos, incluindo a presente introdução ao

trabalho. O segundo capítulo refere-se aos fundamentos teóricos necessários para a compreensão do

trabalho desenvolvido na presente dissertação, tendo sido feita uma breve revisão histórica da

Tribologia, apresentação dos conceitos básicos sobre os fundamentos do atrito e os seus

mecanismos, bem como os métodos para a sua quantificação. Uma breve descrição do processo de

corte por arranque de apara é também apresentada neste capítulo para elucidar os principais

aspectos tecnológicos abordados ao longo da investigação.

O terceiro capítulo faz referência ao desenvolvimento experimental da presente investigação. Para a

quantificação independente do atrito foram escolhidos dois dos ensaios mais utilizados para a

avaliação do atrito no domínio dos processos de fabrico, o ensaio de anel e o ensaio de pino-no-

disco. A escolha destes ensaios tribológicos foi realizada no sentido de permitir uma aplicação

simples que permita uma avaliação independente do atrito sem a existência de contribuições

secundárias do processo tecnológico (aresta de corte, face de saída, etc…), proporcionando ao

mesmo tempo uma boa precisão de controlo das variáveis envolvidas. A quantificação do atrito no

processo tecnológico foi conduzida através da medição experimental da relação µ=Fc/Ft, entre os

valores da força de corte Fc e da força de penetração Ft, em condições operativas adequadas.

O terceiro capítulo apresenta ainda a concepção e o projecto de um novo conceito para máquinas de

ensaios tribológicos do tipo pino-no-disco desenvolvido pelo autor, permitindo introduzir novos

contributos na metodologia de ensaios relativamente às que são possíveis de realizar nas máquinas

comerciais. Destaca-se a possibilidade de avaliar a influência da textura e do nível de rugosidade

3

superficial sobre o valor do atrito. Esta metodologia foi igualmente estendida aos ensaios de corte

ortogonal.

O quarto capítulo refere-se à discussão dos resultados obtidos nesta investigação, onde se

comparam as medições obtidas com as novas metodologias experimentais com os valores reais do

processo de corte por arranque de apara. Esta comparação permitiu concluir sobre a validade dos

ensaios do tipo pino-no-disco na avaliação do atrito nos processos de corte por arranque de apara.

Estas metodologias foram igualmente importantes para esclarecer a possibilidade da aplicabilidade

do ensaio de anel na avaliação do coeficiente de atrito para o corte ortogonal. Para permitir uma

análise mais completa do tema, foi também avaliado o impacto de outras variáveis operativas no valor

do atrito, tal como a velocidade relativa ou a pressão na interface de contacto, ou o meio envolvente

com a utilização de diferentes tipos de gás. E por último, as conclusões e perspectivas de trabalhos

futuros resultantes deste trabalho são apresentadas no capítulo cinco respectivamente.

4

5

Capítulo 2

2 Fundamentos teóricos

A atenção dada à Tribologia ao longo da História do Homem começou por estar limitada a aspectos

intrínsecos dos sistemas mecânicos, onde o atrito promovia um aumento da força necessária para

accionar as alfaias agrícolas ou mesmo para deslocar pequenos objectos. Na actualidade a Tribologia

tem um papel fundamental na vida do Homem, desde as tarefas básicas da vida quotidiana até às

mais avançadas aplicações tecnológicas.

Desta maneira, o presente capítulo foi estruturado em duas grandes secções onde se procura

fornecer a informação necessária para uma melhor compreensão dos assuntos discutidos na

presente investigação. Na primeira secção procura-se compor uma visão geral da Tribologia aplicada

aos processos de fabrico, com particular destaque para os métodos de quantificação do atrito,

enquanto na segunda secção apresentam-se os principais aspectos tecnológicos dos processos de

maquinagem e os aspectos particulares da Tribologia neste domínio.

2.1 Tribologia

O estudo da Tribologia, em particular de fenómenos inerentes a compreensão do fenómeno de atrito

requer conhecimentos de carácter multidisciplinar pois este acréscimo de energia, de características

dissipativas, é o resultado de um conjunto de fenómenos físico/químicos que ocorrem

simultaneamente durante o movimento relativo das superfícies em contacto. Neste capítulo são

abordados os fundamentos teóricos referentes à Tribologia, é apresentada uma breve introdução

histórica, sendo dada especial ênfase aos mecanismos de atrito, as suas causas e consequências no

âmbito dos processos tecnológicos de fabrico.

2.1.1 Breve introdução histórica

A Tribologia é a ciência que estuda a interacção das superfícies em movimento relativo. A natureza e

consequência das interacções resultantes na interface de contacto entre dois sólidos são geralmente,

o atrito e o desgaste. Durante a interacção entre duas superfícies ocorre a transmissão de forças,

conversão de energia e a alteração das propriedades mecânicas e químicas incluindo a natureza

superficial dos materiais em contacto (Bhusan, 1999).

O nome Tribologia foi criado em 1967 (Frene e co-autores, 1990) e vem do grego sendo que a

palavra “tribo” significa friccionar, e “logos” significa estudo ou ciência. A Tribologia inclui o estudo da

lubrificação, atrito e desgaste resultante da interacção entre corpos. De referir, que apesar de que em

muitas aplicações de engenharia, o fenómeno de atrito e desgaste seja uma fonte de perda de

6

eficiência e aumento de custos, o mesmo não acontece com outras aplicações (sistemas de travões,

discos de embraiagens, processo de laminagem, etc) onde a presença do fenómeno de atrito faz

parte dos requisitos básicos para o seu funcionamento normal, do mesmo modo que o homem não

seria capaz de andar sem o efeito do fenómeno de atrito. Por fim, foi através da fricção que o homem

descobriu o fogo há mais de 100 000 anos.

Contudo desde o fabrico do primeiro mecanismo, que o homem tem tentado suprimir o desgaste e

diminuir o efeito do atrito para limitar o esforço. Com o desenvolvimento tecnológico, em cerca de

4000 A.C, foi possível o fabrico da roda, com a inclusão de articulações feitas de madeira, pedra ou

de produtos provenientes da indústria. A invenção da roda tornou possível a substituição do atrito de

deslizamento pelo de rolamento (Figura 2.1a).

O primeiro rolamento produzido pelo homem foi o suporte da porta denominado na literatura anglo-

saxónica por door sockets, o rolamento era composto por uma haste de madeira, que girava no

interior de uma outra madeira ou pedra oca. Rolamentos feitos de pedras datadas de 2500 D.C. foram

encontrados na Mesopotâmia1 (Figura 2.1b).

a) b)

Figura 2.1 – Equipamentos de redução de atrito: a) Mecanismos de transporte de carga nas

civilizações antigas; b) Pivô inferior da porta (Frene e co-autores, 1990).

Para transportar cargas pesadas, os egípcios deslizavam-na sobre calços provavelmente fabricados

em madeira e lubrificados. Existe várias documentações que comprova a utilização desta técnica

(Frene e co-autores, 1990). O mais antigo foi encontrado no túmulo de Saqqara, em cerca de 2400

A.C. e mostra o transporte de uma estátua, sendo que este é o primeiro sistema conhecido de

lubrificação. Outra documentação datada de 1800 A.C. foi encontrada no túmulo de Tchuti Hetep e

demonstra a utilização do princípio descrito anteriormente (Figura 2.2).

1 Mesopotâmia é uma região localizada no médio oriente, delimitada entre os vales dos rios Tigre e Eufrates e é

actualmente ocupada pelo território do Iraque.

7

Figura 2.2 – Transporte de estátua, túmulo de Tchuti Hemp, EI-Bersheh, 1800 A.C. (Frene e co-autores,

1990).

Apesar dos factos acima referidos, a investigação científica propriamente dita foi iniciado por

Leonardo da Vinci (1452-1519), este que é conhecido como o “pai da Tribologia” (Blau e co-autor,

2009) tendo desenvolvido as leis básicas do atrito tais como; a lei da proporcionalidade entre a força

normal e a força tangencial (força de atrito) no século XV. Vários desenhos mostram esquemas das

experiências realizadas por Leonardo da Vinci, com propostas tecnológicas dos métodos de

quantificação e diminuição do coeficiente de atrito (Figura 2.3).

a) b)

Figura 2.3 – Esquemas das experiências realizado por Leonardo da Vinci (Frene e co-autores, 1990); a)

Dispositivos para estudo do atrito; b) Dispositivo para diminuição do atrito.

Em 1699 Amonton desenvolveu vários estudos, tendo concluído que quando uma superfície é

coberta de pequenas esferas, o coeficiente de atrito é o resultado do ângulo entre as esferas e a

superfície (Stachowiak e co-autores, 2001). Um valor próximo de 0.3 foi encontrado assumindo-se

que, o movimento tem sempre lugar entre o topo das esferas (zona de contacto) e a superfície.

8

Realça-se que apesar de já Leonardo da Vinci ter concluído sobre a proporcionalidade da força

normal e tangencial, Amonton realizou as suas experiências mais tarde e independentemente do

Leonardo da Vinci tendo chegado às mesmas conclusões.

De notar, que mesmo com as experiências realizadas por Leonardo e Amonton, verificou-se um baixo

interesse pelos estudos dos fenómenos tribológicos. O baixo interesse verificado naquela fase, foi

devido a inexistência de questões que suscitassem uma maior curiosidade da parte dos

investigadores sobre a necessidade de se compreender o fenómeno de interacção entre corpos

(Stachowiak e co-autores, 2001).

Os primeiros estudos matemáticos referentes ao atrito foram realizados pelo engenheiro e físico

francês Charles Augustin Coulomb (1875). O seu estudo no atrito foi fortemente estimulado pelo

crescimento da indústria da guerra francesa da época. Coulomb não só estabeleceu as leis básicas

de atrito como reconheceu o papel da adesão na interacção entre superfícies.

A procura sobre o entendimento dos fenómenos tribológicos, começou concretamente com a

publicação em 1886 de trabalhos realizados por Osborne Reynolds sobre hidrodinâmica. Reynolds

demonstrou que a pressão hidrodinâmica do líquido entre duas superfícies em escorregamento é

suficiente para evitar o contacto entre as duas superfícies, quando sujeitos a baixas velocidades. A

apresentação dos trabalhos realizados por Reynolds, suscitou maior interesse de outros

investigadores quanto à procura de maior compreensão, relativamente aos fenómenos de interacção

das superfícies, sendo que, esta busca encontra-se presente até hoje.

Um progresso significativo foi observado em 1938, quando Holm demonstrou que quando as

asperezas de dois corpos em contactos são deformados, a possibilidade de ocorrência de ligações

entre as duas superfícies (soldadura a frio) é aumentada, porém nestas condições a força de atrito é

devida à tensão de corte resultante entre as ligações (Frene e co-autores, 1990). Em 1939 Bowden e

Tabor confirmaram esta teoria tendo ressaltado a influência do material com dureza inferior.

Mais recentemente, Bowden e Tabor (1950) definiram a área de contacto. A superfície em contacto

não é geometricamente perfeita; a força normal aplicada é distribuída ao longo dos picos de

asperezas sujeitas à deformação, ou seja, a área real de contacto é dependente da força aplicada

mas independente da área aparente de contacto.

Em diversos casos quando as superfícies recém-formadas entram em contacto, pode ocorrer o

fenómeno de adesão, aumentando o atrito e promovendo a deformação plástica do material com

menor dureza. Devido à quase “impossibilidade” de se evitar o contacto entre superfícies em

movimento relativo, os fenómenos de atrito e desgaste, apesar da sua complexidade para o seu

entendimento, têm um grau de importância muito elevado em quase todas aplicações de engenharia,

o que resulta a grande necessidade de os quantificar, ou em última possibilidade controlá-los.

9

2.1.2 Natureza das superfícies

Quando se tenta compreender o fenómeno de atrito entre duas superfícies, é necessário conhecer

detalhes específicos acerca das superfícies envolvidas (Myers, 1999). Conforme visto anteriormente a

força de atrito entre superfícies depende das forças de interacção entre elas (i.e., da sua natureza

química) e da dureza e tensões de cedência de cada material (da sua natureza física).

Todas as superfícies obtidas por processos de fabrico (como p. ex. maquinagem, forjamento) não são

totalmente planas ou lisas, pois quando observado numa escala microscópica, facilmente se constata

que possuem irregularidades, apesar de muitas vezes parecerem perfeitamente polidas à vista

desarmada (Jamari e Schipper, 2006). A estas irregularidades encontradas na superfície, são

geralmente denominados de asperezas, sendo que a sua origem pode ser atribuída a diversos

fenómenos tais como: à fractura dos materiais, à formação de óxidos, a alterações metalúrgicas, à

deposição de material na superfície e à solidificação de líquidos. Quando dois corpos entram em

contacto entre si este dá-se inicialmente ao nível das asperezas.

O tipo de deformação que ocorre (elástica, elasto-plástica, plástica) durante o contacto de superfícies

depende do valor da carga normal aplicada, da micro-geometria e das propriedades dos materiais em

contacto. Vários investigadores (Thomas,1999 e Burakowski e co-autor,1999) concluíram que a força

de atrito depende das propriedades específicas dos materiais envolvidos e da área de contacto

estabelecida entre ambas as superfícies. É importante referir que em muitos casos as propriedades

dos materiais podem ser diferentes em relação ao que era de se esperar, ou por diferenças entre a

área real e a aparente ou por as asperezas apresentarem gradientes de dureza (p.ex. devido ao

fenómeno de encruamento da deformação plástica de materiais). A diferença entre a área real e a

aparente pode ainda ser promovida pela existência de partículas estranhas aos materiais em

interacção (camadas de óxidos, existência de bolsas de gás ou líquido, condensação de vapores,

impurezas sólidas, etc).

A orientação macroscópica das asperezas (textura superficial) está directamente dependente do

processo utilizado para a sua obtenção podendo variar desde grandezas atómicas a macroscópicas.

Existem casos em que a geometria da superfície é causada pelos efeitos localizados, como por

exemplo a presença de elementos microestruturais mais duros, a fractura local ou o efeito da

corrosão que pode atacar a superfície de forma aleatória. Mesmo após um cuidadoso polimento é

impossível fazer com que a superfície a nível atómico esteja totalmente lisa (Carilho, 2007) pelo que,

torna-se importante distinguir entre derivações macroscópicas (desvios), ondulações, asperezas e

micro-asperezas (Figura 2.4) relativamente à superfície teórica perfeita.

No caso do processo de corte por arranque de apara, por exemplo, as ferramentas de corte deixam

nas superfícies saliências e depressões que, embora tendo uma altura pequena em relação às

dimensões globais da peça, podem influenciar a resistência da peça a esforços mecânicos ou à

corrosão. Assim, quando se analisa detalhadamente uma superfície cilíndrica obtida por torneamento

10

a sua geometria não coincide exactamente com a de uma superfície cilíndrica circular recta, pois as

suas geratrizes apresentam rugosidades e ondulações, o mesmo se passando com as directrizes.

Uma vez que as superfícies resultantes do fabrico não coincidem com a superfícies geométricas

pretendidas; diferindo estas tanto na dimensão, como na forma, será necessário em cada caso definir

as variações consideradas admissíveis. No que respeita às dimensões (e também à forma), essa

especificação é feita definindo-se tolerâncias, enquanto no caso do grau de acabamento da superfície

é feita através da definição da rugosidade.

Água e gordurasAr

Metal

Oxidos

Flutuações

Rugosidades

Desvios macroscópicos

Superfície ideal

Micro-rugosidades

a) b)

Figura 2.4 – Aspecto real de uma superfície acabada: a) Esquema representativo das impurezas que

afectam a superfície dos metais; b) Forma geométrica de uma superfície vista ao nível microscópico

Após essa breve introdução das características superficiais obtidas nos processos de fabrico,

interessa estabelecer algumas medidas que são usadas para medir a rugosidade, designadamente,

as rugosidades Ra, Ry e Rz. Essas grandezas de medição de rugosidade serão definidas com base na

linha média, a qual se define como sendo a linha paralela à direcção geral do perfil, traçada de modo

a que, no comprimento da amostragem, a soma das áreas superiores, compreendida entre ela e o

perfil efectivo, seja igual à soma das áreas inferiores. A rugosidade média aritmética, Ra, é definida

como a média aritmética dos valores absolutos das ordenadas de afastamento (yi) dos pontos do

perfil de rugosidade em relação à linha média, dentro do comprimento de medida (Figura 2.5a) e é

obtida pela equação 2.1:

𝑅𝑎 =1

𝐿𝑚

𝑦𝑖 𝐿𝑚

0

𝑑𝑙 ≈1

𝑛 𝑦𝑖

𝑛

1

(2.1)

A rugosidade Ry define-se como à distância vertical entre o pico mais alto e o vale mais profundo,

dentro do comprimento de medida (Figura 2.5b), e por último a rugosidade Rz, corresponde a média

aritmética dos cincos valores de rugosidade superficial parcial existente no comprimento de medida

(equação 2.2). A rugosidade parcial Zi é a soma dos valores absolutos das ordenadas dos pontos de

maior afastamento, acima e abaixo da linha média no comprimento de amostragem (Figura 2.5c).

𝑅𝑧 =1

5 𝑍𝑖

5

1

(2.2)

11

Do ponto de vista prático, o par metal-metal é provavelmente o sistema tribológico mais estudado. De

facto, estudar o atrito na interacção de metais corresponde também ao estudo dos seus óxidos, pois

exceptuando-se casos muito específicos é impossível encontrar uma superfície completamente isenta

de contaminantes. Na melhor hipótese, a superfície normal de um metal estará coberta de camadas

absolvidas de moléculas de gases e/ou outros contaminantes. Como resultado destes factores a força

de atrito é quase sempre inferior devido a tendência que certos contaminantes possuem de se

comportar como um lubrificante (Myers, 1999).

a) Rugosidade média, Ra b) Rugosidade, Ry c) Rugosidade, Rz

Figura 2.5 – Decomposição do perfil de uma superfície mostrando os elementos que constituem a sua textura

(Rodrigues, 2006).

Para superfícies com grau de limpeza elevado, por exemplo as obtidas a partir de bombardeamento

de electrões a elevadas temperaturas e em ambiente controlado, o valor do coeficiente de atrito

obtidos nestas condições foram µ= 3-6 (Myers, 1999). De referir que, quando existe um bom contacto

entre superfícies de dois metais similares, e isentas de contaminantes, as duas superfícies de facto

estarão soldadas fortemente de tal forma que a ligação seja tão forte quanto a dos próprios materiais

envolvidos ou mesmo superior. Para metais dissimilares, resultados semelhantes poderão ser

encontrado caso exista algum grau de miscibilidade entre eles. No caso em que os dois metais são

mutuamente imiscíveis poderá haver ou não soldadura entre eles.

O comportamento de superfícies metálicas na presença do ar, poderá ser diferente em relação as

superfícies limpas ou recém-formadas. Quando em presença do oxigénio, a maioria dos metais

desenvolvem rapidamente uma camada de óxido na sua superfície. Portanto este óxido resultante

poderá ter características diferentes em relação ao par de material. Por exemplo, uma superfície

limpa de cobre o coeficiente de atrito pode atingir valor de 6.8, enquanto a mesma superfície exposta

ao ar fica pelos 0.8 (Myers, 1999).

Nos casos em que a interacção de dois corpos é realizada na presença de camadas de óxidos,

diferentes tipos de comportamento podem ser observados, dependendo principalmente das

características do óxido e da pressão superficial a que está sujeita a superfície do metal. Nos casos

em que a carga aplicada não é elevada ou em baixas velocidades relativas na interface, a camada de

óxido pode separar completamente as superfícies metálicas resultando como valores do coeficiente

de atrito na gama de 0.6 a 1. Com o aumento da carga aplicada, e se a camada de óxido for

12

relativamente fraca, esta vai-se deformar favorecendo assim a presença de um contacto directo entre

o par envolvido e um significado aumento do coeficiente de atrito. Na prática, o atrito entre superfícies

não lubrificadas pode provavelmente ser considerado como interacção entre camadas de óxidos ou

superfícies compostas por óxido-óxido, óxido-metal, e metal-metal.

2.1.3 Mecanismos de atrito

Ao longo da história surgiram várias teorias com o objectivo de explicar a origem e os mecanismos

envolvidos no mecanismo de atrito. As superfícies obtidas pelos processos de fabrico são sempre

rugosas e contaminadas (Batchelor e co-autor, 1995). Quando duas superfícies estão muito próximos,

o contacto ocorre primeiramente entre as asperezas que se deformam plasticamente em

consequência do aumento da pressão de contacto.

O atrito pode ser definido como a resistência ao movimento relativo, ou simplesmente a tendência da

sua ocorrência entre dois corpos em contacto. Depois de muitos anos de investigação em Tribologia,

concluiu-se que o fenómeno de atrito não corresponde simplesmente às propriedades intrínsecas do

material, mas também depende de diversos factores específicos do par tribológico envolvido, bem

como os factores do processo em estudo (Stolarski, 1990).

Bowden, Tabor e Leornardo da Vinci estudaram a interacção entre corpos com superfícies elásticas

(Ali, 2001). Actualmente muitos engenheiros continuam com grande interesse nesta área, como p. ex.

nos rolamentos, área na qual a lubrificação tem grande importância. De notar que o crescente

interesse ao estudo dos corpos em contacto com superfícies elásticas, fez com que as superfícies

elasto-plásticas fossem também incluídas no campo de interesse. A maioria dos processos com

metais, envolve a presença da ferramenta e do material a trabalhar.

Existem vários mecanismos de atrito, sendo que a sua predominância depende das particularidades

do sistema em análise. Segundo Lenard (2002), as causas mais frequentes do atrito são: (i) a

deformação elástica e plástica das asperezas, (ii) a deformação elástica e plástica devido à formação

de aparas; (iii) o fenómeno de adesão; e por último, (iv) a deformação e/ou fractura das camadas

superficiais de óxidos acima da zona de deformação plástica (sólidos, líquidos ou gasosos).

O fenómeno de adesão (Figura 2.6a) é predominante em ambiente de vácuo e no contacto entre

superfícies muito limpas ou recém-formadas. Este mecanismo foi explicado por Bowden e Tabor

(Holmberg e co-autor, 2009), que afirmam que quando duas asperezas entram em contacto a

pressões elevadas, surgem pequenas micro-soldaduras. Quando estas superfícies entram em

movimento relativo, as micro-soldaduras rompem-se, mas a tensão de corte resultante provoca uma

resistência ao movimento, sendo que durante o movimento relativo na interface outras soldaduras são

formadas e rompidas continuamente. A deformação plástica (também elástica) das asperezas é

causada pela elevada pressão que se desenvolve na interface de contacto, tendo as asperezas de

maior dureza uma acção predominante sobre a deformação da superfície mais macia (Figura 2.6c). A

formação de apara (Figura 2.6b) é devido à presença de corpos terceiros na superfície em contacto

13

com dureza superior relativamente aos materiais envolvidos no contacto, que podem comportar-se

como uma ferramenta de corte. Este fenómeno tem como resultado a formação de estrias na

superfície menos dura e/ou o arrastamento do material ao longo da superfície.

Como resultados de ensaios experimentais foram obtidas três leis básicas (Stolarski, 1990); (i) a força

de atrito actua sempre na direcção oposta do movimento relativo entre as duas superfícies; (ii) a força

de atrito é directamente proporcional à força normal aplicada ao contacto (equação 2.2) e (iii) a força

de atrito é independente da área nominal de contacto.

Figura 2.6 – Mecanismos básicos de atrito: a) Adesão; b) Formação de micro-apara e c) Deformação

de asperezas (elástica e plástica) (Holmberg e co-autor, 2009).

No entanto, apesar de o atrito ser um fenómeno observado há mais de 100 000 anos, os mecanismos

que o originam ainda não são suficientemente compreendidos, mas sabe-se que, é dependente de

vários factores que actuam geralmente de forma combinada. Dado que os mecanismos do atrito

dependem de vários factores, o seu estudo é bastante complexo e requer um conhecimento

multidisciplinar (Figura 2.7), onde se enquadra na mecânica dos fluidos, na mecânica dos sólidos, na

ciência dos materiais, na física e na química das superfícies, na termodinâmica e na mecânica da

fractura.

De realçar, que diversas publicações da especialidade apresentam tabelas com valores do coeficiente

de atrito para diversos pares de materiais, mas que não devem ser considerados como valores

exactos, pelo que em caso de desconhecimento das condições em que os mesmos foram obtidos

devem apenas ser usados a título indicativo.

a) b) c)

14

t

FN

Fa

Ac

Ferramenta

Bruto de

maquinagem

N ˜C

AR3

AR2

AR1

FN

Tool

Termodinâmica

(sistema inteiro)

Mecânica

da fractura

Física e química das

superfícies

Lubrificação e mec.

dos fluídos

Bruto de maquinagem

Ciência dos materiais

Plasticidade

a) b)

Figura 2.7 – Esquema do contacto entre a superfície da peça (apara) e a ferramenta de corte com um

regime de tensão variável ao longo da face de ataque desta: a) Representação das forças de corte (Fa),

originadas pelo atrito consequente do carregamento normal (FN). b) Correspondência interdisciplinar dos

fenómenos do atrito e desgaste no corte por arranque de apara.

2.1.4 Lubrificação

Em termos funcionais, a lubrificação pode ser definida como a redução do atrito entre duas

superfícies através da redução do nível de interacção existente entre as asperezas (Myers, 1999). Um

lubrificante pode ser uma substância sólida, líquida ou gasosa existente entre as superfícies em

movimento relativo entre si. Pode-se considerar, pelo menos localmente, que as superfícies estão

completamente separadas e a resistência ao movimento relativo é causada pela necessidade de

vencer a força de atrito causado pelo terceiro corpo (constituído geralmente por camadas de óleos,

óxidos ou outros corpos estranhos).

Os mecanismos de redução do atrito, entre duas superfícies em movimento relativo podem ser

convenientemente repartidos em quatro regimes (Myers, 1999); (i) regime hidrodinâmico, onde um

interveniente com uma camada relativamente espessa, evita o contacto directo entre as superfícies

em movimento relativo, e consequentemente reduz o atrito entre eles; (ii) regime elasto-hidrodinâmico

em que, para uma camada muito fina de lubrificante sobre altas pressões localizadas fazem com que

o lubrificante demonstre as suas características especiais (viscosidade) evitando o contacto directo

entre as asperezas; (iii) camada limite, onde a acção do lubrificante é o resultado da existência de

uma película mono molecular absolvida em ou ambos os sólidos e que reduzem as forças de adesão

que actuam nos pontos de contactos; e (iv) aquele que pode ser chamado de “lubrificação química”,

em que o lubrificante enfraquece ou destrói as ligações soldadas nas asperezas por meio de ataque

químico.

Em todos os casos, o atrito é dependente das propriedades combinadas do fluído lubrificante e a das

superfícies em contacto. Se as superfícies estão completamente separadas, o coeficiente de atrito

dependerá essencialmente das propriedades do lubrificante.

15

2.1.5 Modelos de atrito

O atrito é uma das variáveis mais importantes nos processos de corte e de deformação plástica, na

interface entre a ferramenta e a peça a trabalhar. Tal importância deve-se ao facto de que em todos

os processos, a magnitude e a distribuição da tensão, temperatura do processo, e as condições das

superfícies diferem de um processo para outro. Nos vários processos existentes, o atrito contribui

para o aumento da temperatura na interface ferramenta–peça (Ali, 2001).

O esforço para a tentativa de quantificar o atrito foi iniciado por Leonardo da Vinci (1452-1519) que,

com base em experiências simples chegou às primeiras conclusões sobre o fenómeno de atrito; (i)

atrito provocado pelo mesmo peso terá a mesma resistência no início do movimento, embora as

áreas ou comprimento de contacto sejam diferentes e (ii) o atrito é dependente da natureza das

superfícies em contacto e de outras condições operativas.

A consideração adequada da área de contacto, da força normal aplicada e da direcção do

escoamento de material requer a utilização dos modelos de atrito o mais realista possível. Existem

fundamentalmente três leis de atrito, com interesse nos processos de corte e de deformação plástica.

Estas leis podem ser generalizadas como:

Lei de Amonton-Coulomb (Teoria das Asperezas)

Lei de Prandtl (Teoria da Adesão)

Lei de Wanheim-Bay (Modelo Misto)

2.1.5.1 Lei de Amonton-Coulomb

A lei do atrito de Coulomb, também conhecida como a lei clássica do atrito, é baseada em trabalhos

desenvolvidos anteriormente por Leonardo da Vinci e Amonton (1663-1705), e é definida

matematicamente por:

𝜇 =Fa

FN

=τi

P

(2.3)

Onde, µ representa o coeficiente de atrito, FN a força normal a superfície de contacto, Fa a força de

atrito resultante do efeito da aplicação da força normal, τi é a tensão média de corte na superfície de

contacto e P a pressão normal de contacto. A equação 2.3 mostra que para um coeficiente de atrito

constante a tensão de corte cresce na mesma razão que a pressão de contacto. Esta equação é

apenas válida quando satisfaz este critério. A teoria de plasticidade indica que a equação 2.3 só é

aplicável para baixas pressões tendo em conta que para pressões elevadas esta relação deixa de

existir (Ali, 2001). Devido aos valores elevados de pressão hidrostática a que são sujeitos os diversos

16

processos de deformação plástica e corte de metais, os valores da pressão normal podem atingir

valores superiores ao da tensão de corte do material fazendo com que o valor do coeficiente de atrito

baixe consideravelmente atingindo valores pouco realísticos.

2.1.5.2 Lei de Prandtl

Para solucionar as limitações verificadas na lei do atrito de Coulomb, a lei de atrito constante ou

simplesmente a lei de Prandtl, assume que a tensão de corte é proporcional à força necessária para

que ocorra deformação plástica do material, resultando a seguinte expressão:

𝜏 = m. k (2.4)

Nesta formulação, m representa o factor de atrito ou factor de proporcionalidade e varia de 0

(condições de atrito nulo) a 1 (condições de atrito máximo geralmente com ocorrência do fenómeno

de adesão), k corresponde a tensão de corte máxima do material.

Tal como o coeficiente de atrito, o factor de atrito é dependente de parâmetros como a temperatura, a

pressão, a velocidade, o meio envolvente e a solubilidade dos materiais envolvidos (Brown e co-

autores, 1969). Atendendo que estes parâmetros podem variar ao longo do processo, é de esperar

que o coeficiente de atrito varie ao longo da interface de contacto. O uso do valor médio do

coeficiente de atrito é razoável para o cálculo de forças mas pode levar a erros consideráveis quando

aplicado para determinar a distribuição de tensão na interface de contacto conforme descrito por

Schey (1983). Igualmente como no caso da distribuição de tensão não é correcto usar o valor médio

do coeficiente de atrito para prever a microestrutura dos materiais envolvidos no processo.

Conforme discutido por Dieter (1976), a análise acima foi feita para o caso de atrito de deslizamento

na interface, facto este que é frequentemente descrito na física elementar. No caso extremo, verifica-

se uma situação onde a tensão de corte que actua na superfície de interface é máxima (igual ao valor

da tensão de corte puro) e constante, nesta situação deixa de existir o movimento relativo na interface

entre a apara e a ferramenta de corte. Usando o critério de plasticidade de Von Mises o coeficiente de

atrito máximo é:

µ =𝑘

𝜎𝑒

=

𝜎𝑒

3

𝜎𝑒

= 0.577 (2.5)

Portanto, o valor do coeficiente de atrito definido pela equação 2.5 pode ser considerado como o valor

limite, isto é se µ ≥ 0.577, não pode existir movimento relativo na interface. A equação 2.3 mostra que

se o coeficiente de atrito na interface entre a apara e a ferramenta de corte é constante, então a

razão entre a tensão de corte e a tensão normal é constante ao longo de todo o comprimento de

contacto.

17

Contudo, apesar deste constrangimento teórico para a existência de movimento relativo na interface

entre dois corpos, na prática este aspecto nem sempre é verificado. Estudos anteriores realizados por

vários investigadores encontraram valores muito superiores ao limite teórico, Zorev (1966) obteve µ =

0.6-1.8, Kronenberg (1966) 0.77-1.46, Armarego e Brawn (1969) 0.8-2, Finnie e Shaw (1956) 0.88-

1.85, Usui e Takeyama (1960) 0.4-2, etc. Como pode ser observado, os valores de coeficiente de

atrito obtido nos processos de corte de metais estão muito acima do valor limite teórico µ=0.577. Por

outro lado, os valores do coeficiente de atrito utilizados na previsão e modelação numérica para

caracterizar as condições de deslizamento na interface, são sempre inferiores ao valor limite. Na

simulação de processos de corte, Stenkowsky e Mon (1990) usaram µ=0.2, Komvopoulos e

Erpenbeck (1991) 0-0.5, Lin, Pan e Lo (1995) 0.074. Curiosamente todos os resultados da simulação

numérica parecem estar em boa concordância com os resultados obtidos experimentalmente

(Astkhov, 2006).

2.1.5.3 Lei de Wanheim-Bay

A teoria de adesão, considera que as superfícies são rugosas e possuem vales e picos. O contacto

entre dois corpos ocorre apenas em pontos específicos, resultando numa área real de contacto,

sendo esta uma fracção da área aparente de contacto. Devido a valores reduzidos da área de

contacto, a pressão aplicada é frequentemente elevada. Bowden e Tabor (1964) afirmaram que o

fenómeno de adesão (soldadura a frio) ocorre nas zonas em contacto e a força necessária para

romper esta ligação é a medida de atrito. Analisando a deformação plástica de asperezas de forma

isolada, Bowden e Tabor (1964) apresentaram uma explicação teórica para o coeficiente de atrito, na

lei de Amonton.

Nas suas primeiras análises, nas quais o efeito da pressão normal foi considerado independente da

tensão de corte, o valor máximo obtido para o coeficiente de atrito foi de 0.2. Portanto para alguns

metais em condições de atmosfera controlada (p. ex. no vácuo) este valor pode aumentar

significativamente. Para incorporar este factor, esta teoria foi posteriormente modificada de modo a

incluir o efeito combinado entre as tensões de corte e normais e como o aumento das áreas de

contacto, chegando-se à seguinte formulação:

µ =𝑓

3 1 − 𝑓2 (2.6)

Onde 𝑓 é uma constante que representa a tensão de corte na interface de contacto, sendo que para

ligações forte o seu limite é 1 e reduz à medida que a força na ligação diminui. Bay (1976) modificou a

equação 2.6 tendo substituído o 3 por β que representa a percentagem da área da superfície

realmente capaz de entrar em contacto com a outra representando-se como:

18

µ =𝑓

𝛽 1 − 𝑓2 (2.7)

A equação 2.7 indica a condição para o início de um deslizamento mais grosseiro. O deslizamento

começa quando as condições máximas de atrito estático são atingidos e as ligações separam-se.

Neste instante a resistência de atrito é nula, mas seguidamente novas ligações são formadas

repetindo-se o processo. A resistência estática de atrito permanece ao longo de uma distância da

ordem de 10-3

cm quando o movimento começa.

Nas teorias de Bowden e Tabor é considerada de forma isolada a deformação de cada impureza.

Porém, maioritariamente nos processos de corte e deformação plástica, a pressão na interface entre

a peça e a ferramenta é elevada fazendo com que as asperezas se deformem e consequentemente

entrem em contacto entre si. A necessidade de se considerar a interacção entre asperezas vizinhas

fez com que este problema fosse estudado por Wanheim, Bay e co-autores (1985). Estes estudos

foram resumidos por Bay (1985). Considerando a área real de contacto e a deformação plástica das

asperezas, o estudo propôs um modelo de atrito, que assume que o atrito e a pressão são

proporcionais simplesmente até o limite da proporcionalidade.

𝜏

𝑘= 𝑚. 𝛼 (2.8)

Onde α corresponde à relação entre a área real de contacto e a área aparente.

A lei do atrito de Amonton e a teoria de adesão de Bowden e Tabor têm uma aplicabilidade limitada.

Para além do limite de proporcionalidade, a deformação das asperezas favorece a ocorrência de

interacções entre si nas superfícies dos materiais. Nestas condições a variação do atrito com a

pressão deixa de ser proporcional, sendo que para pressões elevadas aproxima-se do valor máximo.

Quando a área real de contacto iguala a área aparente, o modelo de atrito constante (lei de Prandtl)

apresenta-se como o mais adequado. Este modelo assume que a inclinação das asperezas é baixa,

sendo que estas condições são verificadas ao longo de todo o intervalo de interesse. Os estudos

realizados por Bay (1985) tiveram em conta a inclinação das asperezas, obtendo-se como resultando

um novo modelo de atrito e novas curvas de atrito mais compreensivo e evoluindo para uma nova lei.

O modelo geral de Wanheim-Bay, diz que o atrito numa interface em contacto é proporcional à tensão

normal nos casos em que este assume valores baixos 𝑝

𝜎𝑒 < 1.5 , mas tende para um valor

constante a altas pressões normais na interface de contacto 𝑝

𝜎𝑒 > 3 . Esta formulação é

apresentada como se segue:

𝜏 = 𝑓. 𝛼. 𝑘 (2.9)

19

Na qual o τ é a tensão de atrito, 𝑓 é factor de atrito, α a razão entre a área real de contacto e a

aparente, k é a tensão de corte máxima do material.

A Figura 2.8 mostra uma representação esquemática das leis de atrito discutidas anteriormente,

apresentando a evolução da tensão de corte em função da pressão normal de contacto para

diferentes leis. Verifica-se no entanto que para pressões baixas as leis de atrito de Coulomb e Bay

confundem-se entre si.

Figura 2.8 – Representação esquemática das principais leis de atrito usadas em engenharia, mostrando a tensão

de atrito numa interface sólido – sólido, como uma função da pressão normal. São apresentadas duas curvas (A

e B) geradas a partir da lei do atrito de Bay.

2.1.6 Quantificação do atrito

A medida do atrito parece ser uma tarefa relativamente simples, mas torna-se mais complexa na

medida que é considerada com maior exactidão o seu significado. Apesar de muitos anos de

investigação sobre este fenómeno, ainda não existe uma concordância sobre o seu real significado

tornando-se assim muito difícil comparar os trabalhos realizados por vários investigadores.

Desde as experiências no plano inclinado realizado por Leonardo da Vinci muitos métodos foram

desenvolvidos para quantificar o atrito não só pela sua dependência pelo par tribológico envolvido

mas também pela forma que os mesmos interagem entre si. Nos mais diversos métodos existentes o

coeficiente de atrito é deduzido a partir da força de atrito, estando sujeito a incertezas na

determinação desta força tais como; (i) a força de atrito varia continuamente, fazendo com que o valor

do coeficiente de atrito seja apenas uma aproximação à realidade; e (ii) o cálculo do coeficiente de

atrito é baseado na carga nominal de contacto.

Lei de Prandtl

Lei de Coulomb

Lei de Bay

τa

p

Deformação

das asperezas

Zona de transição

(plasticidade

relativa)

Plasticidade total

20

O conhecimento preciso do atrito requer o uso de equipamentos de medida de alta tecnologia e ao

mesmo tempo muito dispendiosos (Stachowiak, 2004), estes ensaios são geralmente realizados em

condições laboratoriais controladas. A qualidade e a precisão destes valores influenciam

significativamente a compreensão deste fenómeno, pelo que a correcta compreensão dos métodos

utilizados para medir o atrito, bem como as suas limitações é essencial para a investigação na área

da Tribologia.

Tendo em consideração esta visão geral da sua aplicação, o objectivo dos ensaios na área da

Tribologia pode ser especificado como: encontrar soluções experimentais para os problemas reais

encontrados na indústria; diminuição de perdas energéticas; protecção do meio ambiente com a

redução da poluição gerada nos processos de fabrico; a melhoria das características dos materiais,

aumentando-se o seu tempo de vida útil; a caracterização de novos materiais bem como a ampliação

das áreas de aplicação. Devido o grau elevado de complexidade para a quantificação do coeficiente

de atrito, ela é geralmente determinada por dois métodos distintos:

a) Método de quantificação directa

Este método consiste fundamentalmente em medir as tensões de corte originadas pelo atrito e a

tensão normal na superfície de contacto. O valor do coeficiente de atrito é obtido com a utilização de

instrumentação adequada para medir as deformações na zona em avaliação. Portanto devido à

grande complexidade e custos elevados para a sua implementação este método é frequentemente

preterido em relação ao método de quantificação independente.

b) Método de quantificação independente

Existem muitos métodos para a quantificação de atrito, sendo que uma boa parte deles, encontra-se

descrita nas normas ASTM por parte do comité D-2, entre outras publicações (Cristino, 2007), tais

como os métodos bloco no anel (ASTM D2714) e o pino no disco (ASTM G 99-95a). De entre estes

métodos descritos na norma ASTM os indicados para recriar as condições nos processos de corte por

arranque de apara e de deformação plástica são os métodos de pino-no-disco e o de ensaio de anel

(Carilho, 2007). Nesta dissertação far-se-á uso dos dois métodos para avaliar o coeficiente de atrito

nos processos de corte por arranque de apara e de deformação plástica.

2.1.6.1 Ensaio de pino no disco

As máquinas de ensaios tribológicos, são aparatos que servem para medir atrito ou desgaste em

condições controladas, e são frequentemente utilizados nas mais diversas investigações realizadas

na área da Tribologia. Este aparato deve ser seleccionado cuidadosamente permitindo recriar todas

as características críticas do atrito ou desgaste sem a complexidade associada à utilização dos

ensaios nos processos reais de fabrico. No entanto, uma selecção inadequada pode fornecer

resultados completamente erróneos pelo que um profundo entendimento das características das

máquinas de ensaios tribológicos é fundamental. Existe uma grande diversidade de máquinas de

21

ensaios tribológicos utilizados pelos investigadores (Stachowiak e co-autores, 2004), facto este que

torna o universo de escolha bastante elevado. Devido à enorme variedade das máquinas de ensaios

tribológicos disponíveis no mercado faz com que, para a sua escolha, se tenha que responder a

várias questões que satisfaçam o seu interesse de estudo, tais como, a necessidade de se variar a

velocidade de deslizamento ou força aplicada. Nesta dissertação foi desenvolvida e fabricada uma

máquina de ensaios tribológicos pino-no-disco pelo que maior ênfase será dado a este ensaio.

A máquina de pino-no-disco é talvez a máquina de ensaios tribológicos mais utilizada para avaliar o

coeficiente de atrito em zonas com deformação plástica local e deformação elástica. Neste

equipamento o pino é pressionado contra um disco em movimento rotativo (Figura 2.9), sendo

portanto o coeficiente de atrito obtido medindo-se a força normal aplicada e a força tangencial através

de um dinamómetro. O ensaio de pino-no-disco permite obter um bom controlo experimental das

variáveis envolvidas no processo, sendo que é fundamentalmente esta a razão do crescente

interesse pelo seu uso relativamente a outros tipos de ensaios (Stachowiak e co-autores, 2004).

Fa

FN

V

Célula de

carga

Pino

Disco

Figura 2.9 – Representação esquemática do ensaio de pino-no-disco.

A geometria básica de um sistema de pino-no-disco consiste na utilização de um pino com secção

circular ou ponta hemisférica que desliza sobre uma superfície plana de um disco em rotação. O

diâmetro do pino e a espessura do disco dependem do caso em estudo, mas devem ser

seleccionados de forma a garantir a rigidez de todo o sistema.

O acabamento superficial de ambos os componentes (pino e disco) deve coincidir com as condições

experimentais que se pretendem reproduzir, sendo que um dos principais parâmetros é a rugosidade

superficial (Ra). Para evitar o efeito de forças indesejadas ao sistema, as faces dos discos e pinos

devem ser paralelas e o disco deve rodar concentricamente.

Um sistema pino-no-disco pode ser muito simples, ou complexo dependendo da quantidade de

variáveis que se pretendem controlar. Alguns destes aparatos são preparados para funcionarem em

condições de temperatura elevada, sendo que podem alcançar temperaturas superiores a 1000 ºC

em apenas alguns segundos, com o uso de corrente contínua com mais de 200A (Gee e co-autores,

1997). Nos aparatos frequentemente encontrados no mercado, a carga é aplicada no pino através do

uso de um sistema de alavanca de pesos calibrado, e o paralelismo do sistema garantido através do

uso de contra-pesos.

22

Recentemente, vários autores argumentaram que o ensaio de pino-no-disco é inadequado sendo

incapaz de reproduzir o valor das pressões de contacto envolvidas no processo, a temperatura do

processo e o fluxo de material frequentemente encontrado nas aplicações industriais (Grzesik e co-

autores, 2002). No caso do fluxo de material é dito que a apara desliza sobre a face de ataque

apenas uma vez, sendo que nos ensaios de pino-no-disco o pino desliza na mesma zona várias

vezes durante o ensaio. Em resultado disso, várias propostas alternativas do pino-no-disco foram

sugeridas por vários autores, como por exemplo Olsson e co-autores (1989), Hedenquist e Olsson

(1991) e Zemzemi e co-autores (2007).

Portanto, apesar de estas alternativas serem bem sucedidas na reprodução das condições de corte

reais, mostraram-se ser bastante dispendiosas, exigindo maior consumo de tempo e necessidade de

requerer uma grande precisão no controlo dos parâmetros do processo, isto relativamente aos do

pino-no-disco convencional. É de salientar ainda que as máquinas de ensaios de pino-no-disco,

trabalham frequentemente em condições extremas de pressão de contacto e velocidades relativas na

interface de contacto de forma a deliberadamente se acelerar o processo de desgaste, diminuindo

assim o tempo efectivo dos ensaios. Estas condições extremas não são portanto necessárias para a

avaliação do coeficiente de atrito, já que o atrito pode ser avaliado em apenas uma volta do disco em

contacto com o pino.

Tendo em contas as observações citadas verificou-se que os ensaios de POD precisam de ser

revistos de forma a se identificarem quais as modificações técnicas a serem efectuadas e quais os

parâmetros que precisam de ser controlados eficientemente, de tal forma que possam ser usados

com sucesso dado que, este é um método barato e rápido (disponível na maioria dos laboratórios a

nível mundial) para a determinação independente do coeficiente de atrito nas mais diversas

aplicações do processo de corte de metais.

2.1.6.2 Ensaio de Anel

Um outro tipo de ensaio frequentemente utilizado para calibração do atrito, principalmente nos

processos de forjamento, é o ensaio de anel. O ensaio consiste em comprimir um provete com forma

anelar de geometria específica 𝐷0: 𝑑0: ℎ0 (Figura 2.1a1) numa forma faseada, no qual, durante as

etapas, as variações da geometria do provete são registados e depois comparados com curvas de

calibração de atrito.

As primeiras análises matemáticas sobre o ensaio de anel foram apresentadas por Kunogi (1954),

formando as bases desta técnica. O primeiro trabalho experimental foi desenvolvido por Male (1964)

e Cockcroft (Sofouglu e co-autor, 1999), baseado na análise do forjamento de um disco sólido de

Schroeder e Webster (1949). Este ensaio de anel é conhecido por ensaio de “Cockcroft e Male” e

teve grande aceitação nas últimas duas décadas (Sofouglu e co-autor, 1999). Outros estudos teóricos

e experimentais incidiram na explicação dos efeitos de diferentes parâmetros tais como; dureza,

23

geometria do provete, velocidade de deformação, condições de lubrificação, temperatura, etc. Alguns

resultados interessantes foram apresentados, como o trabalho experimental desenvolvido por Male e

Depierre (1970) mostrou que a análise matemática apresentada por Avitzur (1964) pode resultar num

factor de atrito superior à unidade. As suas análises foram desenvolvidas com base no trabalho

experimental tendo sido usado provetes com geometrias de 6:3:1 e 6:3:0.5, onde concluíram que

provetes com relação geométrica de 6:3:1 fornecem um factor de atrito superior à unidade, enquanto

os resultados com 6:3:0.5 estavam em boa concordância com a curva teórica relativamente a um

factor de atrito de m=1.

A utilização do ensaio de anel não está só limitada à calibração do atrito, autores, como Saul e co-

autores (1971), Bramley e Abdul (1973), Depierre e Gurney (1974) e Altan e al. (1972,1975)

efectuaram análises teóricas do ensaio para avaliação da tensão do escoamento dos materiais. Altan

(1972) realizou os seus estudos através do método de limite superior para determinar a tensão de

escoamento num provete anelar, tendo concluído que, para as condições de atrito elevado, o campo

teórico de velocidade não representa com boa precisão as condições de escoamento do metal,

resultando que os resultados experimentais tenham uma fraca concordância com os resultados

teóricos.

No ensaio de anel, um provete anelar com dimensões específicas é comprimido e deformado entre

pratos. A partir do controlo da variação da altura e do diâmetro interno do provete em cada fase do

ensaio, é possível sem instrumentos especiais de medida obter o factor de atrito (m), através da

interpolação com as curvas teóricas de calibração. Uma geometria típica para este tipo de ensaios é

apresentada na Figura 2.10a, bem como um exemplo da curva de calibração (Figura 2.10b).

Contrariamente à maioria dos métodos, este método não necessita de medição da força, sendo

suficiente o controlo dimensional do provete durante cada fase do ensaio.

h0

D0

d0

Di

hidi

hidi

Di

a) b)

Figura 2.10 – Deformação do anel durante a operação de forjamento: a) Provete original e deformado em

condições de baixo e elevado atrito; b) Curva de calibração típica (Fletcher e co-autores, 1998).

a2

a1

a3

24

É de referir que, quando assumidas diferentes considerações teóricas (modelos de atrito), o

comportamento das curvas de calibração pode variar e consequentemente também varia a magnitude

do valor do coeficiente de atrito (Fletcher e co-autores, 1998).

Na Figura 2.10a, encontra-se representado o comportamento típico de dois provetes anelares

idênticos, obtidos após a realização do ensaio de anel com uma mesma redução de altura (Δh). Um

dos provetes comprimido encontra-se em condições de baixo atrito (Figura 2.10a3), enquanto o outro

em condições de atrito elevado (Figura 2.10a2). Verifica-se portanto que nos dois casos o

comportamento do anel durante o ensaio é completamente diferente. No caso em que temos as

condições de baixo atrito, o diâmetro interior aumenta, enquanto no caso oposto verifica-se uma

diminuição do diâmetro interior. Note-se que em ambos os casos há um aumento do diâmetro

exterior.

No entanto, para o uso deste método uma série de pressupostos simplificativos deve ser feito, o que

pode levar a grandes erros e incertezas (Loveday e Books, 2000). Além disso, uma vez que os

valores obtidos por este método varia com vários parâmetros entre os quais a velocidade relativa, e a

pressão de contacto, faz com que qualquer estimativa do atrito seja apenas um valor indicativo (as

condições de lubrificação podem variar em cada fase do ensaio).

Apesar de este tipo de ensaio ser amplamente utilizado, ele só é adequado para classificar

qualitativamente a qualidade dos lubrificantes ou o acabamento das superfícies das ferramentas, pois

não é ideal para a obtenção de valores quantitativos fiáveis para fins de modelação. Os valores

obtidos são altamente dependentes dos pressupostos assumidos para o cálculo das curvas de

calibração, sendo que para reduções de altura inferiores a 20%, o método não é muito sensível

estando muito dependente do grau de qualidade da caracterização mecânica do material (Loveday e

Books, 2000), (Petersen e co-autores, 1997).

Estudos anteriores demonstraram que, no ensaio do anel, o factor de atrito é só função da variação

do diâmetro interior e da altura do provete, como expressa em Eq. 2,10. As curvas de calibração do

ensaio de anel podem ser obtidas a partir de dois métodos diferentes: (i) analítica e (ii) numérico. O

factor de atrito, m é obtido a partir da seguinte expressão:

𝑚 = 𝐹 ℎ𝑜 − ℎ

ℎ𝑜 ,

𝑑𝑖 − 𝑑

𝑑 (2.10)

A determinação das curvas de calibração com base na análise numérica é essencialmente obtida

através do método de elementos finitos (Figura 2.11). Com este método é possível prever o

comportamento do material do anel, em função da variação da pressão de contacto na face, bem

como em função da velocidade de deformação e temperatura no factor de atrito (m) (Petersen e co-

autores, 1997).

25

Figura 2.11 – Representação da malha deformada durante a simulação do ensaio de anel no programa I-Form2

(onde N define a linha neutra ou a zona de velocidade nula, que separa as duas direcções de escoamento de

material) ( Rosa, 2003).

A modelação numérica do ensaio de anel é geralmente feita através de uma análise rígido-plástica ou

visco-plástica bidimensional, tendo em consideração a axissimetria, com base no método de

elementos finitos (MEF). O atrito na interface esta incluído no modelo de elementos finitos através de

varias leis, tais como a de atrito constante, τ= 𝑚𝐾. A realização da simulação numérica utilizando

diferentes factores de atrito e a observação do aspecto da malha gerada permite a determinação de

curvas de calibração para o ensaio do anel.

2.2 Corte por arranque de apara

No domínio do corte por arranque de apara, as maiores contribuições para compreender a influência

da condição tribológica no mecanismo de formação de apara foram devidas a Tresca (1878) e

Mallock (1882) no século XIX. No entanto, e apesar do esforço este não é ainda um tema que esteja

perto de se considerar encerrado.

2.2.1 Definições básicas

O processo de corte por arranque de apara pode ser definido como um processo onde a forma da

peça a processar é obtida por remoção do material em excesso através de pequenas quantidades de

material (aparas). O processo está representado na Figura 2.12, onde a ferramenta de corte possui

uma geometria bem definida, que move sobre a peça, de um material mais macio a maquinar. O caso

geral do corte por arranque é ilustrado na Figura 2.12a onde a ferramenta possui uma determinada

obliquidade em relação ao movimento sobre a peça a maquinar, denominado por corte oblíquo. A

Figura 2.12b representa um caso especial do processo, onde a superfície da face de ataque da

ferramenta de corte é perpendicular a direcção de corte e é denominado por corte ortogonal

(Merchant, 1944) sendo este último o caso de estudo desta dissertação.

Com a utilização do conceito de corte ortogonal introduziram-se vários postulados simplificativos,

permitindo assim, estudar o mecanismo de corte por arranque de apara em apenas duas dimensões

26

(Mesquita e co-autor, 1990). No entanto, após a introdução destas simplificações é possível eliminar

muitas variáveis, diminuindo-se assim o grau de complexidade para se estudar este processo. A

forma de cunha da ferramenta de corte é a resultante de convergência de duas superfícies, sendo a

face de ataque, a que é solidária com a apara, de forma a formar a aresta de corte.

Uma das mais importantes variáveis neste processo é o ângulo de inclinação da face de ataque,

definido entre a face de ataque e uma linha perpendicular a superfície da peça já maquinada. A esta

inclinação denomina-se ângulo de ataque da ferramenta de corte (α) e de acordo a terminologia ISO

o seu sinal é definido conforme mostrado na Figura 2.13. Apesar de a face de saída não entrar

directamente no processo de formação da apara tem sido objecto de estudo quando se pretende

optimizar e/ou minimizar o tempo de vida das ferramentas de corte. Esta é definida pelo ângulo de

saída (σ), definida entre a superfície de saída e uma linha paralela a nova superfície da peça.

90º90º

Ferramenta

Bruto de

maquinagemBruto de

maquinagem

Ferramenta

AparaApara

Ângulo de

obliquidade

Figura 2.12 – Representação esquemática do corte por arranque de apara; a) Corte Oblíquo; b) Corte

Ortogonal

Uma outra variável com grande importância, é a inclinação do plano de corte (ϕ) em relação a

velocidade de corte. Apesar das dificuldades existentes de se prever experimentalmente, é possível

obtê-lo de forma analítica com base no grau de encalque (Rc):

𝑅𝐶 =t

to=

𝐴𝐵 cos 𝜙 − 𝛼

𝐴𝐵 sin 𝜙= cot 𝜙 cos 𝜙 + sin 𝛼 (2.11)

Com algumas manipulações matemáticas a partir da equação 2.11 é possível calcular o ângulo de

inclinação do plano de corte (equação 2.12), com o ângulo de ataque da ferramenta (α), a espessura

da apara antes (to) e depois do corte (𝑡). Note-se que, mesmo quando a apara é contínua regular,

ela, de facto não tem espessura absolutamente uniforme, pelo que a sua espessura não pode ser

medido directamente. Porém é possível calculá-la a partir do peso médio da apara já que é

normalmente conhecida a densidade do material a maquinar (Mesquita e co-autor, 1990),

a) b)

27

determinando-se em seguida o volume da apara e com a largura da apara conhecida determina-se a

respectiva espessura.

𝜙 = cot−1 Rc − sin α

cos α (2.12)

A Figura 2.13b mostra as zonas de corte consideradas nos processos de corte por arranque de

apara. A primeira zona é denominada de zona primária de corte, e começa na aresta de corte e

estende-se ao longo do plano de corte, até atingir a superfície exterior do material, limitando a zona

onde o material será deformado. Nesta região, o material atinge a tensão máxima de corte (k) na

direcção do plano de corte e distorce ao longo deste plano. A segunda zona é denominada de zona

secundária de corte e surge ao longo do plano de ataque da ferramenta como resultado do atrito de

contacto entre esta e a superfície da apara, e por último a terceira zona que surge no decorrer do

deslizamento entre a superfície recém-formada da peça e a face de saída da ferramenta de corte é

denominada de zona terciária de corte.

+

+A

B

Ângulo de ataque ()

Espessura da

apara (t)

Plano de corte

Superfície

maquinadaAresta de corte

Ângulo de

saída ()

Espessura de corte (t0)

ângulo do plano

de corte ()Face de saída

Face de

ataque

a)

Ferramenta

Bruto de

maquinagem

Zona de corte

secundária

Zona de corte primária

Interface ferramenta/apara

lc

Interface ferramenta/bruto

Zona terciária de corte

b)

Figura 2.13 – Mecanismo de formação de apara: a) Representação bidimensional do corte ortogonal,

ilustrando os principais parâmetros; b) Zonas de corte.

28

2.2.2 Tribologia no corte ortogonal

O termo Tribologia é frequentemente utilizado para representar a performance real das superfícies em

termos de lubrificação, atrito e desgaste (Grzesik, 2008). O processo de corte é realizado através de

um sistema tribo-mecânico que é composto por três elementos básicos: (i) o material a maquinar; (ii)

a ferramenta e o meio envolvente; (iii) lubrificante líquido, ou gasoso. As características tribológicas

na face de ataque são o resultado da geração de novas superfícies resultante do escorregamento

entre a ferramenta e a apara, da força de contacto que actua em superfícies reduzidas elevando

assim o valor da tensão normal que aí actua.

Vários estudos demonstraram que apenas 30 a 50% da energia necessária para o corte de metais é

utilizada para o corte propriamente dito, sendo a restante despendida maioritariamente nas zonas das

interfaces apara-ferramenta e peça-ferramenta (Astkhov, 2006). Este facto pode ser verificado

quando analisado o comportamento térmico das zonas de corte. Surpreendentemente, quando

comparado as temperaturas na zona de deformação com a zona de interface entre a apara e a

ferramenta de corte verificou-se que a temperatura neste ultimo é relativamente baixa (80 a 250 ºC)

em relação ao primeiro que pode ultrapassar 1000ºC (Astkhov, 2006).

A interface entre a ferramenta e a apara, e a ferramenta e a peça a maquinar são as zonas de

contacto que participam directamente no processo de corte. Apesar de muitas diferenças existentes

entre estas zonas, existe igualmente um número elevado de semelhanças nas características

tribológicas das suas interfaces tais como; pressões de contacto elevadas, gama de temperaturas, o

contacto entre as superfícies recém-formadas e as altas velocidades relativas na interface. Existe

também uma correlação entre as tensões que actuam nestas zonas de interfaces já que ambas estão

relacionadas com o mesmo estado de tensão na zona de deformação. Portanto a zona de corte

frequentemente com maior interesse corresponde à zona de interface entre a ferramenta e a apara,

daí o facto da maior atenção dada a este zona pela maioria dos investigadores na área.

Na maioria dos fenómenos de engenharia, o efeito do atrito nas interfaces tribológicas é

caracterizados pela lei de Coulomb (equação 2.2). Embora seja já bem conhecido que o contacto

entre dois corpos ocorre entre as asperezas, é frequente calcular-se as tensões assumindo que as

forças encontram-se totalmente distribuídas em toda área de contacto (área aparente). Apesar de ser

uma aproximação, ela não se encontra longe da realidade visto que nos processos de maquinagem a

área real e a área aparente são praticamente iguais devido às elevadas pressões de contacto que se

verificam nestes processos (Zorev, 1966).

A Figura 2.14 mostra o tipo de aparas observadas há mais de 100 anos atrás e as observadas

actualmente nos processos de corte por arranque de apara. A análise desta figura permite definir as

três zonas fundamentais no mecanismo do processo de formação de apara nomeadamente (Figura

2.13b) a zona de corte primária, a secundária e a terciária. Também mostra que apenas uma

superfície da apara é constrangida (aquela em contacto com a ferramenta de corte), enquanto a outra

29

encontra-se livre. Este aspecto favorece a formação de diferentes tipos de apara em função das

condições tribológicas existente na interface entre a apara e a ferramenta de corte.

Os factores que afectam a geometria da apara são: o ângulo de ataque da ferramenta de corte (α), as

condições tribológicas entre a apara e a ferramenta, e as propriedades mecânicas do material a

maquinar. A espessura da apara obtida nos processos de corte por arranque de apara, aumenta à

medida que se aumenta a dureza do material a maquinar, no entanto é difícil fundamentar esta

afirmação já que é muito difícil variar a dureza do material sem que, com ela se varie também o

coeficiente de atrito na interface entre a ferramenta de corte (Childs e co-autores, 2000).

Figura 2.14 Mecanismo de formação de apara: a) Tresca (1878); b) Mallock (1881-82) (Childs e co-autores,

2000) e c) Processo de formação de apara observado actualmente em condições de baixo e elevado atrito.

Distribuição de tensões

Vários estudos foram realizados com o objectivo de melhorar a compreensão dos fenómenos que

ocorrem na interface apara–ferramenta, através do estudo da distribuição da tensão de corte e normal

nesta zona. Diversos métodos experimentais incluindo o uso de ferramentas de polímeros

fotoelásticas, ferramentas transparentes para permitir uma directa observação da interface, apara-

ferramenta (Figura 2.15). O método fotoelástico foi desenvolvido por investigadores como Coker e

Filon (1931) e Zeichev (1934) que usaram material fotoelástico na análise do processo de corte

ortogonal. Os primeiros investigadores que provavelmente obtiveram resultados satisfatórios, quanto

à distribuição de tensões na interface entre a apara e a ferramenta de corte foram Andreev (1958) e

Kattwinkel (1957).

Andreev (1958), concluiu que o comprimento de contacto lc está dividido em duas partes distintas

aproximadamente iguais; a parte plástica que compreende desde o gume da ferramenta até a zona

central do comprimento de contacto (ou o comprimento da zona de interface entre a apara e a

ferramenta) e a parte elástica que corresponde desde a parte central do comprimento de contacto até

a zona de separação da apara com a face de ataque. Os resultados obtidos indicam que a tensão

normal é nula no ponto de separação e cresce exponencialmente até à zona do gume da ferramenta.

Kettwinkel (1957) usou um procedimento semelhante e encontrou um comportamento idêntico da

distribuição da tensão normal ao longo do comprimento de contacto (lc). Porém concluiu também que

a tensão de corte começa com um valor nulo no ponto de separação, sendo que alcança o seu

máximo na zona central decrescendo a partir deste ponto até ao gume da ferramenta. De notar que

a) b) c)

30

vários outros investigadores como Takeyama e Usi (1958), Chandrasekaran e Kapoor (1965)

chegaram a conclusões semelhantes quanto à distribuição das tensões normais e de corte na face de

ataque.

Apesar do acima exposto, os estudos experimentais com o recurso a este método são apenas uma

tentativa para determinar a distribuição de tensão durante o processo de corte de metais, sendo que

inúmeras questões relativamente ao entendimento deste fenómeno continuam em aberto (Astkhov,

2006). Uma das limitações consiste no facto de que a velocidade de corte utilizada nos ensaios é

muito inferior em relação ao que se verifica na realidade. Como resultado as lacunas, que ainda

existem quanto ao entendimento dos aspectos tribológicos que ocorrem na interface entre a apara e a

ferramenta de corte, nomeadamente, o modo de deformação; a máxima temperatura; a velocidade

relativa na interface de contacto; o fenómeno de adesão e as interacções químicas, fazem com que

estes resultados alcançados tenham ainda um grau de incerteza muito elevado (Doyle e co-autores,

1979).

Um outro método utilizado para determinar a distribuição de tensões na face de ataque foi

desenvolvido por Loladze (1958) e é denominado por split tool method (Figura 2.15 b) que consiste

em utilizar como material da ferramenta de corte, um compósito constituído em duas partes. Neste

método durante o ensaio é apenas medida a força que actua por uma das partes (𝑂𝐶 ), sendo que o

seu comprimento é aumentado incrementalmente durante o ensaio desde um valor pequeno até

atingir o comprimento total de contacto (𝑂𝐵 ), reduzindo-se assim a outra parte. Em cada fase

incremental a força normal que actua na fase de ataque é controlada e posteriormente procede-se o

cálculo das tensões.

a) b)

Figura 2.15 – Métodos para determinação de distribuição de tensões: a) Método fotoelástico; b) Método split tool (Loladze, 1958).

Utilizando a metodologia desenvolvida por si, Loladze (1958) encontrou para a distribuição da tensão

normal e de corte, um comportamento qualitativo semelhante ao verificado nos estudos de Andreev

(1958). Os valores máximos da tensão normal variavam entre 900 a 1600 MPa para diferentes tipos

de aço utilizados nos ensaios e foram superiores em relação à tensão de cedência do material da

peça para todos os casos (≅ 2𝜎𝑒 ).

A formação de apara pela acção das tensões de corte verificadas no plano de corte, é um dos

aspectos do processo de corte que mais a atraiu atenção dos investigadores nesta área. Com grande

O

31

relevância é também o facto de existir um grande interesse para entender a maquinabilidade e a

performance das ferramentas de corte, o movimento da apara e do material a maquinar ao longo da

face de ataque e do gume da ferramenta.

Na maioria dos casos a interacção entre a apara e a ferramenta de corte é visto como uma situação

clássica do fenómeno de atrito, em que a força de atrito tende a restringir o movimento da apara ao

longo da superfície da ferramenta, pelo que esta força é considerada em termos de coeficiente de

atrito (µ) entre a ferramenta de corte e o material a maquinar. Como visto anteriormente (ver secção

2.1) o coeficiente de atrito tem origem nos trabalhos de Amonton e Coulomb que demonstraram que,

na maioria dos casos de escorregamento ou deslizamento de um sólido em relação ao outro, a força

requerida para iniciar o movimento é proporcional à força normal à superfície de interface onde o

deslizamento ocorre. Trabalhos de vários investigadores como Bowden e Tabor, Archad, e tantos

outros demonstraram que esta proporcionalidade resulta do facto de que as superfícies dos sólidos

não são totalmente planas e como tal o contacto é apenas verificado entre as asperezas. De facto

esta proporcionalidade só acontece em condições de pressões baixas na interface de contacto.

Segundo Trent (2000) nas condições em que ocorrem a maioria dos processos de engenharia onde

ocorre o mecanismo de deslizamento, a área de contacto é muito pequena e por este facto é

importante sempre conhecerem-se as condições de carregamento a que o processo está sujeito.

Até hoje continua-se a assumir que a tensão de atrito na face de ataque é proporcional à tensão

normal que actua na mesma face, ou seja a tensão de corte (tensão de atrito) é relacionada com a

tensão normal pelo coeficiente de atrito (µ) ou pelo ângulo de atrito (β). O coeficiente de atrito e o

ângulo de atrito estão relacionados pela seguinte expressão:

𝑡𝑎𝑛 𝛽 = µ (2.13)

É de referir que resultados experimentais demonstraram que os valores da tensão normal na face de

ataque podem ser de 1 a 3 vezes superiores à tensão de corte máxima, k, enquanto o valor máximo

da tensão de atrito chega a duas vezes mais que o valor da tensão de corte máxima. Esta última

conclusão é discutível sendo que teoricamente um metal não pode transmitir tensões de corte

superiores à tensão de corte máxima, k.

Comprimento de contacto

As características tribológicas dos processos de corte, não se limitam apenas ao desgaste da

ferramenta de corte, ou na sua temperatura de contacto mas sim em todas características físicas

deste processo. Estas características não podem ser ignoradas relativamente a outros parâmetros do

corte de metais, atendendo que afectam estes parâmetros directamente. De facto é muito importante

o estabelecimento dos parâmetros principais e dependentes, bem como as suas correlações de forma

a controlar o processo de corte.

32

Nos ensaios, o comprimento de contacto (lc) é medido com recurso ao microscópio. Como discutido

anteriormente, o contacto entre a apara e a ferramenta também conhecido como comprimento de

contacto determina um dos mais importantes parâmetros na interface (Figura 2.13b), assim como a

temperatura, as tensões, o desgaste da ferramenta, etc. Estudos feitos demonstraram que este

parâmetro é muito sensível à variação dos parâmetros e características do processo de corte

(Astkhov, 2006). Em consequência desta sensibilidade é de grande importância determinar as

correlações existentes entre estas características e o comprimento de contacto, pois a optimização da

Tribologia do processo só é efectivamente conseguida quando estas correlações são conhecidas e

bem compreendidas.

A Figura 2.16a mostra como a espessura de corte pode afectar directamente o comprimento de corte.

Estudos realizados com o objectivo de analisar apenas a influência da espessura de corte isolando-a

da influência da razão de compressão da apara ou grau de encalque (Rc), demonstraram que o

comprimento de contacto é directamente proporcional à espessura da apara antes do corte. Portanto

a espessura da apara antes do corte pode ser vista como um parâmetro que afecta directamente o

comprimento de contacto (Astkhov, 2006).

a) b)

Figura 2.16 – Influência dos parâmetros de corte no comprimento de contacto (lc): a) Correlação com espessura

da apara não deformada para diferentes materiais, 1-cobre, 2-chumbo, 3-alumínio, 4-aço AISI E9310, 5-Câdmio

e 6- Titânio; b) Correlação com a velocidade de corte para diferentes materiais, 1-Titânio, 2-Liga berílio-cobre

(UNSC17000, HB200), 3-Liga berílio-cobre (UNSC 17000,HB110), 5- cobre e 6- alumínio 2014 (Astkhov, 2006).

A influência da velocidade de corte no comprimento de contacto, é mostrada na Figura 2.16b para

diferentes materiais, como pode ser visto a dependência é mais evidente para baixas velocidades de

corte. Esta alta dependência pode ser atribuída a mudanças da temperatura na interface entre a

apara e a ferramenta, que muda significativamente com a velocidade de corte, sendo que esta

mudança de temperatura é menos significativa para altas velocidades de corte. De facto a

dependência apresentada na Figura 2.16b é resultado do efeito combinado entre a velocidade de

corte e a temperatura na interface. De referir que outro parâmetro que pode influenciar o comprimento

de contacto é o ângulo de ataque da ferramenta (α), sendo que o comprimento de contacto diminui

com o aumento do ângulo de ataque. Porém o ângulo de ataque afecta o comprimento de contacto

de duas formas, nomeadamente, directamente e através do grau de encalque. Importa no entanto

33

realçar que a influência do ângulo de ataque no comprimento de corte não é muito significativa

(Astkhov, 2006).

Como resultado das considerações acima apresentadas, entre os três factores analisados (espessura

da apara não deformada, velocidade de corte e o ângulo de ataque), só a espessura da apara afecta

directamente o comprimento de corte, já que os outros actuam sempre de forma combinada.

Fluidos de corte

As funções básicas de um fluido de corte é permitirem a refrigeração, lubrificação e a redução severa

do grau de contacto existente na interface entre a apara-ferramenta de corte e peça-ferramenta de

corte (Astkhov, 2006). Como resultado, os fluidos de corte podem afectar significativamente as

condições tribológicas existente na interface com a mudança da temperatura de contacto, da tensão

normal e de corte bem como a sua distribuição ao longo da interface, o tipo e o mecanismo de

desgaste da ferramenta de corte, a qualidade da superfície maquinada, etc. Em algumas aplicações

industriais os fluidos de corte para além de exercerem as funções descritas anteriormente assumem

outras finalidades como a lavagem de partes integrantes dos equipamentos ou o transporte da apara

do local em que se efectua o corte até outro mais conveniente.

Historicamente até ao século XIX a água era utilizada como sistema de refrigeração em várias

operações de processamento de metais. Taylor (1907) foi provavelmente o primeiro a provar sobre a

utilidade prática do uso de líquidos para aumentar a eficácia do processo de corte de metais. Em

1883, demonstrou que com a utilização de um fluxo de água na zona de corte consegue-se aumentar

a velocidade de corte admissível entre 30 a 40%. De facto ele verificou que a água era um óptimo

refrigerante devido à sua alta capacidade térmica, bem como a sua grande disponibilidade (Astkhov,

2006), no entanto as suas propriedades corrosiva e a fraca capacidade de lubrificação, fizeram com

que cedo se percebesse a necessidade de desenvolver novos fluidos para diminuir o impacto

negativo presente com o uso da água como fluido refrigerante de uma maneira isolada.

Para diminuir os constrangimentos verificados com o uso isolado da água descrito anteriormente,

rapidamente desenvolveram-se os óleos minerais com elevada capacidade de lubrificação, mas a sua

baixa capacidade de refrigeração e o seu alto custo fez com que a sua utilização estivesse limitada

apenas nos processos realizados a baixa velocidade. Finalmente a partir de 1910 desenvolveram-se

óleos solúveis que permitiram conjugar as propriedades de lubrificação e refrigeração de diversos

fluidos de corte.

Embora o significado do uso de fluidos de corte na maquinagem ser amplamente compreendido,

frequentemente é visto como um elemento de apoio necessário mas não importante (Astkhov, 2006).

Em consequência disso em muitos casos, a selecção do fluido de corte é baseada na hipótese de

que quanto maior a quantidade de lubrificante utilizado, melhor é o suporte para o processo de corte,

sendo que é frequente ver um fluxo contínuo do fluido de corte na zona de contacto entre a peça e a

ferramenta de corte, sem se ter em conta os requisitos do próprio processo. Além disso a selecção do

34

tipo de fluido é geralmente baseada nas recomendações do fabricante dos respectivos fluidos, sem a

clara compreensão da natureza da operação em questão bem como do verdadeiro objectivo do fluido

de corte.

De referir ainda, que o custo relativamente à compra e à utilização dos fluidos de corte tem crescido

comparativamente ao que se verificava hà duas décadas atrás (≈3%), sendo que hoje é estimado em

15% dos custos globais do processo. Em resultado deste aumento, esforços têm sido feitos no

sentido de diminuir ou mesmo quando possível eliminar o seu uso, sendo que presentemente existe

um grande interesse no desenvolvimento de processos avançados de maquinagem que permite o

uso reduzido ou mesmo na sua totalidade, eliminando-se todos os problemas associado ao uso de

fluidos de corte (custos de maquinagem, custos de reciclagem da apara, etc) (Astkhov, 2006).

35

Capítulo 3

3 Desenvolvimento experimental

Este capítulo apresenta resumidamente o desenvolvimento experimental necessário para permitir a

realização dos ensaios de avaliação da condição tribológica no corte por arranque de apara,

utilizando tantas técnicas de medição directa como pela utilização de ensaios tribológicos

independentes. O capítulo começa por apresentar brevemente o projecto e a construção do aparato

experimental para o ensaio de pino-no-disco e para o ensaio de anel. De seguida apresenta a

montagem experimental utilizada na medida das componentes da força de corte em condições

laboratoriais controladas. No final do capítulo são apresentados os materiais utilizados na

investigação e é elaborado um plano de ensaios adequado a uma avaliação compreensiva da

influência dos principais parâmetros operativos na interface de contacto e a sua influência no valor do

atrito.

3.1 Ensaio de pino-no-disco

A Figura 3.1a apresenta a nova máquina de ensaios desenvolvida e fabricado para a execução do

plano de ensaios da presente investigação. As componentes gerais do equipamento podem ser

divididas em quatro grupos distintos:

i) Parte estrutural básica;

ii) Parte eléctrica e mecânica;

iii) Grupo de controlo e monitorização;

iv) Unidade de polimento

A parte estrutural básica oferece suporte aos componentes mecânicos e eléctricos, para o controlo e

medição das cargas, tal como a unidade de polimento. Estes são independentes do tipo de ensaio (p.

ex. avaliação de atrito ou desgaste), as condições operativas e materiais, revestimento e lubrificantes

a analisar. A parte mecânica e eléctrica, consistem no motor eléctrico, no suporte do disco, nos

sistemas de guiamento e posicionamento, no pino e nos discos. O motor eléctrico (Figura 3.1b) está

equipado com um variador de frequência (Figura 3.1c) para o controlo preciso da velocidade de

rotação do disco. O suporte do disco encontra-se acoplado sobre um rolamento cónico, e não

directamente ao veio rotativo do motor eléctrico, devido às cargas originadas durante o ensaio, que

pode danificar o redutor.

Os ensaios de pino-no-disco realizados durante este trabalho foram especialmente concebidos para a

avaliação do atrito no corte ortogonal, sendo assim, o pino simula o bruto de maquinagem e os discos

a face de ataque da ferramenta de corte. O projecto do suporte do pino desvia-se do conceito das

máquinas de ensaios convencionais, com o fim de aumentar a rigidez e reduzir a deformação da

36

estrutura causada pela deformação originada pelo peso do sistema e das cargas aplicadas. O novo

conceito elimina o uso de um contra-peso. A utilização de guias lineares reduz as folgas do sem-fim,

melhorando o paralelismo do sistema, permitindo assim, suportar cargas até 15 kN. Os pinos e discos

são dependentes do tipo de ensaio, condições operativas e materiais, revestimento e lubrificantes em

estudo.

b)

a) c)

Figura 3.1 – Máquina de ensaios do pino-no-disco desenvolvido e componentes: a) Máquina de ensaios; b)

Motor-redutor A053UH25 18.6 1HP 4PB5; c) Variador de frequência ACT401-07 FA 1HP.

Os sistemas de controlo e medição incluem uma célula de carga bidimensional, um sistema de

aquisição e um computador pessoal. A célula de carga, projectada e fabricada especificamente para

os ensaios, é fixa no suporte do pino e ligada à unidade de amplificação de sinal (Vishay 2100). Um

computador pessoal (PC) instalado com o sistema de aquisição de dados (SAD) fornecido pela

National Instruments PCI-6025E, combinado com o software de controlo Labview destinado à

monitorização dos valores experimentais, tal como a força normal e tangencial (Figura 3.2). As forças

foram obtidas através da célula de carga bidimensional com uma frequência de aquisição de 300Hz.

Atendendo ao facto de que a velocidade relativa na interface entre as duas superfícies é um dos

parâmetros mais influentes no atrito, é indispensável monitorizar a velocidade de rotação do disco. O

controlo da velocidade de rotação do motor através do variador de frequência permite um controlo

preciso da velocidade, mas este encontra-se num software comercial fornecido pelo fabricante do

equipamento. Assim, foi necessário instalar um encoder angular (Figura 3.3), Kubler

5.2400.1122.0360 no eixo de rotação do motor que permite comparar a fiabilidade do valor fornecido

pelo variador de frequência (ver anexo). O software de monitorização programado em Labview foi

posteriormente introduzido no software de aquisição final.

37

b)

a) c)

d)

Figura 3.2 – Sistema de ensaio; a) Representação esquemática do aparato experimental de pino-no-disco; b)

Amplificador de sinais Vishay 2100; c) Célula de carga bidimensional; d) Painel frontal e diagrama de bloco do

programa desenvolvido.

a) b)

Figura 3.3 – Monitorização da velocidade de rotação do motor; a) Alterações para a montagem do encoder; b)

Montagem final.

Os ensaios preliminares demonstraram que dado o paralelismo existente entre a textura obtida pelo

polimento convencional e a direcção do movimento do pino não afecta a rugosidade medida na

direcção do movimento do pino. Portanto, é necessário introduzir à máquina de ensaios uma nova

unidade de limpeza e polimento (ULP) para obter a textura desejada, com as trajectórias das estrias

na direcção radial, perpendiculares ao sentido do movimento do pino (Figura 3.4b).

38

lixa / pano de

polimento

Disco

Unidade de limpeza e

polimento

Pino

a) b)

Figura 3.4 – Metodologia de polimento de discos; a) Unidade de limpeza e polimento; b) Direcção das estrias

obtidas no polimento.

A ULP não só permite produzir a textura desejada, mas também repor as condições superficiais dos

discos depois do ensaio. Conforme ilustrado na Figura 3.4b, a unidade combina a velocidade de

rotação e granulação da lixa e/ou pano de polimento (suspensão de alumina) com a rotação do disco

para assegurar os valores da rugosidade superficial (Ra) que variam desde 0.07 a 0.8 µm para os

diferentes materiais a ensaiar (Figura 3.5).

Figura 3.5 – Discos de AISI 316L e PVC com diferentes texturas superficiais obtidos na unidade de limpeza e

polimento.

Estes valores são controlados através de medições com um rugosímetro de contacto Kosaka Lab.

SE-1200 (Figura 3.6) para valores de 0.2 à 0.8 µm e um microscópio de força atómica (MFA) para

rugosidades inferiores à 0.2 µm na direcção perpendicular ao de rotação dos discos. A

Tabela 3.1 apresenta a micrografia dos discos apresentados na Figura 3.5, bem como a relação entre

o seu aspecto superficial com a rugosidade média (Ra) e a granulometria da lixa utilizada. Para

concluir a apresentação do novo conceito da máquina de ensaios tribológico referido anteriormente é

necessário referir que o seu projecto modular permite diferentes tipos de aplicação de carga sobre o

Ra=0.1µm Ra=0.3µm

Ra=0.2µm

Ra=0.4µm

Ra=0.007µm Ra=0.3µm Ra=0.4µm Ra=0.5µm Ra=0.8µm

Ra=0.2µm Ra=0.5µm Ra=0.7µm

39

pino; (i) a aplicação de uma carga estacionária através de pesos calibrados, e (ii) a aplicação da

carga variável, pouco comum nas máquinas comerciais, através do sem-fim com porca de

recirculação de esferas para controlar a posição e a carga aplicada no pino.

a) b)

Figura 3.6 – Controlo do estado superficial; a) Rugosímetro Kosaka Lab. SE 1200; b) Medição da rugosidade

superficial de um disco.

Textura Granulação da Lixa Ra obtido (µm)

100 0.8

180 0.5

240 0.4

600 0.3

1200 0.2

0.3 µm (suspensão

de alumina) 0.007

Tabela 3.1 – Relação entre a textura superficial, a rugosidade superficial média e o tipo de lixa utilizado na

preparação superficial dos discos.

1mm

1mm

1mm

1mm

1mm

X 10 µm/div

Z 150 nm/div

40

3.2 Ensaio de anel

Os ensaios de anel foram realizados na máquina de ensaios universal Instron (Figura 3.7) com

capacidade de 1200 kN, onde o provete foi comprimido em várias etapas. No fim de cada etapa, os

valores da altura, diâmetro interior e exterior são medidos, e depois aplicados nas curvas de

calibração de atrito obtidas através de um ábaco numérico. Os ensaios foram realizados à

temperatura ambiente e em condições “quasi-estáticas”, similares a outros ensaios executados no

desenvolvimento experimental da presente investigação.

Figura 3.7 – Máquina de ensaios universal Instron 1200KN utilizada para o ensaio de anel

O acabamento superficial dos pratos de compressão foi controlado através de procedimentos de

polimento com lixas e panos de polimento, realizados num torno convencional, obtendo assim, uma

textura radial, ilustrada na Figura 3.8 e os valores de Ra variam de 0.04 a 0.65 µm. Estes valores

foram medidos através do rugosímetro de contacto Kosaka Lab. SE-1200 ao longo da direcção do

escoamento do material durante o ensaio.

Provete

Prato de compressão

Figura 3.8 – Representação esquemática da textura dos pratos de compressão; pratos de compressão utilizados

no ensaio de anel.

Ra = 0.04 µm Ra = 0.06 µm Ra = 0.12 µm Ra = 0.20 µm Ra = 0.35 µm Ra = 0.65 µm

41

3.3 Ensaio de corte ortogonal

Para assegurar que todos os ensaios de corte ortogonal são realizados em condições comparáveis

com as técnicas de calibração de atrito independentes mencionadas anteriormente, foi necessário

desenvolver e fabricar um aparato que permitisse medir as forças no corte ortogonal em condições

controladas. O aparato foi instalado numa fresadora CNC TRIAC de 2½ eixos (Figura 3.9), composto

essencialmente pela ferramenta de corte, um dinamómetro piezoeléctrico tridimensional, um provete

e uma unidade de limpeza e polimento.

Dinamometro

Piezoelectrico

Ferramenta de

corte

Amplificador de

sinalFz

Fresadora CNC

Provete

PC com SAD

Fy

a) b)

Figura 3.9 – Aparato experimental para os ensaios de corte ortogonal: a) Montagem do aparato; b) Esquema

representativo do aparato.

As ferramentas de corte têm todas a mesma geometria, com um ângulo de ataque α = 0º e um ângulo

de saída σ = 5º e foram fabricados com o mesmo material dos discos utilizado nos ensaios de pino-

no-disco. O material a maquinar é o mesmo utilizado nos pinos para o ensaio de pino-no-disco e anel,

fixo directamente no dinamómetro piezoeléctrico tridimensional através de dois parafusos. Os ensaios

foram realizados em condições de corte ortogonal, isto é, o gume da ferramenta de corte é recto e

perpendicular à direcção de corte. Importa referir que, para todos os casos analisados no processo de

corte, a rugosidade superficial na face saída foi mantida constante ( 05.0aR µm).

O dinamómetro piezoeléctrico tridimensional (Kistler 9257B) é ligado a um amplificador de sinal

(Kistler 5011B) e permite medir a força de corte durante o ensaio. O sistema é linear em toda a sua

gama de medida, medindo a força com uma precisão de 1% e a sua resolução permite medir

variações da força com grande amplitude. Um PC com sistema de aquisição de dados (National

Instruments, PCI-6025E) combinado com o software programado em Labview, adquire e armazena os

resultados experimentais.

A ULP, para além de limpar a ferramenta de corte, reproduz uma rugosidade superficial na face de

ataque próxima à observada nos discos utilizados nos ensaios de pino-no-disco permitindo assim

obter-se resultados comparáveis. A Figura 3.9b mostra esquematicamente o aparato utilizado para a

realização do ensaio de corte, sendo que a unidade de limpeza e polimento desenvolvida

42

especificamente para este tipo de ensaio é mostrada na Figura 3.10a. As ferramentas de corte com

diferentes texturas e rugosidades estão apresentadas na Figura 3.10b.

É importante realçar que, a unidade de limpeza e polimento foi projectado de forma a assegurar a

direccionalidade da topografia superficial de acordo com os discos e pratos de compressão no caso

dos ensaios de caracterização independentes, porque a textura superficial influencia drasticamente o

valor do coeficiente de atrito (Bhusan, 1999 e Sedlacek, 2009).

Ferramenta

Unidade de

limpeza/Polimento

a) b)

Figura 3.10 – Polimento das ferramentas de corte: a) esquema representativo da ULP; b) Acabamento superficial

obtido para ferramentas de AISI 316L.

3.4 Materiais em estudo

Os materiais para o desenvolvimento experimental foram seleccionados de uma forma criteriosa, com

o objectivo de avaliar quantitativamente a influência das propriedades dos pares tribológicos na

interacção com a rugosidade superficial e o coeficiente de atrito daí resultante. Os discos foram

fabricados em aço inoxidável AISI 316L e em cloreto de polivinila (PVC).

Os pinos utilizados nos ensaios de pino-no-disco possuem forma cilíndrica com 8 mm de diâmetro

(Figura 3.11a). A escolha do chumbo tecnicamente puro (99.7%) justifica-se pelo facto que o seu

comportamento mecânico ser muito próximo de um material rígido-perfeitamente plástico que é

assumido na maioria dos modelos analíticos, bem como pela possibilidade de poder realizar os

ensaios à temperatura ambiente. O outro material utilizado para fabricar os pinos, é o cobre

electrolítico, o qual apresenta propriedades mecânicas próximas do aço inoxidável AISI 316L.

Como foi referido anteriormente (ver 2.1.6.2) os estudos anteriores relativos à geometria e dimensões

usadas para determinar o factor de atrito no ensaio de anel concluíram que os anéis com a mesma

razão geométrica 𝐷0: 𝑑0:ℎ0 de 6:3:2 são os que apresentaram os melhores resultados para avaliar o

factor de atrito (Male, 1964). Neste trabalho foram utilizados anéis com dimensões de 24:12:8 mm

(Figura 3.11b).

Nos ensaios de corte ortogonal, devido à proximidade das propriedades mecânicas entre o cobre

electrolítico e o aço AISI 316L que pode danificar a aresta de corte, foram limitados ao chumbo

Ra = 0.015 µm

Ra = 0.120 µm Ra = 0.320 µm Ra = 0.360 µm

Ra = 0.750 µm

Ra = 0.052 µm

Aresta de corte

Face de ataque

43

tecnicamente puro. A zona de ensaio do provete tem as dimensões de 19 mm de largura e 25 mm de

comprimento para assegurar que o corte decorre em condições estacionárias, e em deformação

plana (Figura 3.11c).

a) b) c)

Figura 3.11 – Provetes de chumbo e cobre utilizados nos ensaios para os vários processos: a) pino no disco, b)

ensaio de anel; c) corte ortogonal.

A Tabela 3.2 apresenta as propriedades mecânicas e metalúrgicas do chumbo e cobre

respectivamente.

Designação/Material Chumbo Cobre

Densidade (g/mm3) 11.35 8.89

Ponto de Fusão (ºC) 327.46 1083

Ponto de ebulição 1749 2595

Temperatura de Recristalização 120

Dureza (Mohs) 1.5

Sistema Cristalografico Cúbico Cúbico

Estrutura Cristalina CFC CFC

Tabela 3.2– Propriedades mecânicas dos materiais para o fabrico dos respectivos provetes.

3.5 Plano de ensaios

A Tabela 3.3 apresenta o plano de trabalhos para os ensaios de pino-no-disco. O trabalho

experimental foi realizado de forma a isolar os parâmetros do processo mais relevantes

nomeadamente no valor do coeficiente de atrito: (i) a força normal, (ii) a velocidade, (iii) a morfologia

superficial e os pares de materiais. Diferentes meios envolventes foram também analisados, através

da aplicação de um lubrificante líquido, o Mobilgear 627 (detalhes adicionais do óleo encontram-se

em anexo), e gases como azoto e oxigénio. Devido à natureza absorvente do PVC, só foram

realizados ensaios em condições a seco para este material. Antes de cada ensaio, os discos foram

desengordurados para garantir as condições iniciais em todos os casos analisados. Os ensaios foram

realizados de forma aleatória e no mínimo três ensaios para cada caso com fins estatísticos.

44

Ra [µm] Material do pino Material do disco Velocidade [m/s] Lubrificação Atmosfera

<=0.1

Chumbo e

Cobre AISI 316L e PVC

0.072,0.216,0.432

e 0.72 Sim/não

Ar, Oxigénio*

e Azoto*

0.2

0.3

0.4

0.5

0.8

* - Ensaios realizados só para o par tribológico chumbo/AISI 316L

Tabela 3.3 – Plano de trabalho experimental para o ensaio pino-no-disco.

No caso dos ensaios de anel, os provetes foram fabricados em chumbo e cobre, e os pratos em aço

inoxidável AISI 316L. A Tabela 3.4 apresenta o respectivo plano de ensaios. Os ensaios foram

realizados de forma aleatória e no mínimo três ensaios para cada caso com fins estatísticos. O

lubrificante foi utilizado com o objectivo de reproduzir as mesmas condições nos ensaios de pino-no-

disco. Para evitar depósitos de material dos provetes sobre os pratos de compressão, influenciando

os resultados finais, os pratos são limpos e desengordurados com etanol entre estágios de

compressão. Depois de cada caso de ensaio, a superfície dos pratos é recondicionada através de

polimento e a sua rugosidade medida.

Pratos Ra [um] Material do provete Material do prato Lubrificação

0.04

Chumbo e Cobre AISI 316L Sim/Não

0.06

0.12

0.20

0.35

0.65

Tabela 3.4 – Plano de trabalho experimental para o ensaio de anel

O plano de ensaios para o corte ortogonal foi projectado para conseguir reproduzir as condições dos

ensaios de pino-no-disco e anel, realizados a seco. A eliminação da utilização do lubrificante,

temperatura e encruamento no plano de ensaios é crucial para reduzir o número de parâmetros que

influenciam a condição tribológica do processo. O mesmo se aplica para a espessura de corte e a

velocidade de corte, que é mantida constante, com o valor da espessura de corte de 0.2 mm e a

velocidade de corte “quasi-estáticas” para todos os ensaios. Caso contrário, o número de

combinações das variáveis torna-se demasiado grande. Os ensaios foram realizados de forma

aleatória e no mínimo três ensaios para cada caso com fins estatísticos. De notar, que todos os

ensaios foram realizados em condições quasi-estáticas.

45

Capítulo 4

4 Resultados e Discussão

Este capítulo apresenta uma análise compreensiva da condição tribológica na interface de contacto

entre a apara e a ferramenta em condições de corte ortogonal. Procura identificar os principais

parâmetros que influenciam o valor do coeficiente de atrito, assim como avaliar quais os ensaios

tribológicos independentes que mais se adequam à realidade do corte por arranque de apara. Desta

maneira, o capítulo foi estruturado em três secções iniciais onde se procura identificar as principais

variáveis operativas e quantificar a sua influência no coeficiente de atrito. Por fim termina com uma

quarta secção onde se desenvolve uma avaliação comparativa das estimativas independentes

obtidas através do ensaio de pino-no-disco e do ensaio de anel, comparando com os resultados reais

observados experimentalmente no processo de corte por arranque de apara. Ao longo do capítulo é

dada uma ênfase especial à influência da rugosidade superficial e às propriedades mecânicas dos

pares tribológicos no valor do coeficiente de atrito.

4.1 Influência da velocidade relativa e da pressão de contacto

A concepção da máquina de pino-no-disco introduzida no Capítulo 3 permitiu a realização de ensaios

combinados com carga e velocidade variáveis. A Figura 4.1a mostra os resultados típicos obtidos

para a evolução da força normal/tangencial (FN/Ft) em função do tempo de ensaio. A análise da

influência da velocidade relativa na interface de contacto, em condições a seco, é apresentada para o

par de materiais Pb/PVC na Figura 4.1b, Pb/AISI 316L na Figura 4.2a e Cu/AISI 316 L na Figura 4.2b.

A partir da Figura 4.1 a) e b) é possível retirar duas conclusões principais: 1) a primeira, as figuras

demonstram que a força de atrito é directamente proporcional à força normal aplicada sobre o pino,

logo, o coeficiente de atrito não é afectado pela pressão de contacto existente entre o pino e o disco;

2) o coeficiente de atrito, em condições de atrito seco, não é influenciado, de uma forma significativa,

pela velocidade relativa na interface de contacto. De facto a variação do coeficiente de atrito com a

variação da velocidade relativa na interface de contacto é pouco significativa. Para os ensaios do par

tribológico Pb/PVC, a primeira conclusão está em concordância com as leis fundamentais de atrito e

foi previamente descrito por Bowers e co-autores (1953). A segunda conclusão é surpreendente

quando analisado com base em muitos trabalhos publicados na área da tribologia, mas encontra-se

em concordância com os resultados experimentais publicado por Shooter e Thomas (1952) no caso

do par de material aço-polímero.

46

a)

b

Figura 4.1 – Resultados do ensaio pino-no-disco: a) Força normal e tangencial em função do tempo

para o par Pb/PVC a velocidade v=0.072m/s; b) Relação da força normal e tangencial obtida nos

ensaios pino-no-disco para pares tribológicos com propriedades mecânicas similares ( Pb/PVC) para

diferentes velocidades.

Como se verifica na Figura 4.2a/b, para os pares tribológicos Pb/AISI 316L e Cu/AISI 316L, a

independência do coeficiente de atrito com a carga normal e a velocidade relativa na interface de

contacto também são verificadas. Este último resultado também foi obtido recentemente por Sedlacek

e co-autores (2009), no caso de pinos de alumínio (Al2O3) e discos de aço 100Cr6. No entanto, para a

gama de velocidades ensaiadas, relativamente baixas, pode não ser suficiente para suportar a

segunda conclusão mencionada anteriormente. No entanto, é de salientar que o objectivo da

presente dissertação consiste em procurar estabelecer metodologias experimentais adequadas para

avaliar o coeficiente de atrito no corte por arranque de apara, e não explorar de uma forma exaustiva

0

50

100

150

200

250

300

0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6

Fo

rça

[N

]

Tempo [s]

Força Normal

Força tangencial

0

20

40

60

80

100

120

140

160

0 50 100 150 200 250 300 350

Fo

rça

Ta

ng

en

cia

l [N

]

Força Normal [N]

0.072m/s

0.43m/s

0.72m/s

47

a influência de todos os parâmetros, sendo a velocidade relativa na interface de contacto limitada

pelo equipamento desenvolvido.

a)

b)

Figura 4.2– Relação entre a força tangencial e normal para pares tribológicos com propriedades

mecânicas diferentes para várias velocidades: a) Pb/AISI 316 L; b) Cu/AISI 316 L.

0

20

40

60

80

100

120

140

160

0 100 200 300 400 500

Fo

rça

Ta

ng

en

cia

l [N

]

Força Normal [N]

0.072 m/s

0.43 m/s

0.72 m/s

0

20

40

60

80

100

120

140

160

0 50 100 150 200

Fo

rça

Ta

ng

en

cia

l [N

]

Força Normal [N]

0.072m/s

0.72 m/s

0.43 m/s

48

4.2 Influência da rugosidade superficial

A Figura 4.3 mostra a evolução do coeficiente de atrito obtido nos ensaios de pino-no-disco para

todos os pares de materiais descritos na secção 3.5. Na Figura 4.3b, o eixo horizontal do gráfico está

apresentado numa escala logarítmica para facilitar a sua leitura ao longo de todo intervalo da

rugosidade superficial com grande relevância na zona de adesão. No caso dos pares de materiais Pb/

AISI 316L e Cu/ AISI 316L, a análise da Figura 4.3a/b permite identificar três regiões diferentes; (i) a

região esquerda (Ra <0.1 µm), no qual o coeficiente de atrito é constante e assume o menor valor de

todos os casos analisados, (ii) A direita (Ra >0.5 µm) onde o coeficiente de atrito é constante e

apresenta o máximo valor de todos os casos analisados e (iii) a região central (0.1< Ra<0.5) onde o

valor do coeficiente de atrito cresce progressivamente do valor mais baixo para o valor mais alto.

Na região à esquerda do gráfico, a rugosidade superficial dos discos de aço AISI 316L é muito inferior

(Ra<0.1 µm) e por esta razão o deslizamento entre o pino e o disco é bastante suave. Nesta zona o

mecanismo de atrito é originado basicamente pelo fenómeno de adesão (Figura 4.5) e a força de

atrito resultante do movimento relativo entre o pino e o disco deve ser aproximadamente igual à força

necessária para romper as ligações resultantes da elevada pressão local (soldadura a frio), que actua

entre as asperezas.

A Figura 4.3a/b também revela diferenças significativas entre a variação do coeficiente de atrito em

função da rugosidade para os pares Pb/ AISI 316L, e Pb/ PVC. De facto, os ensaios realizados com

os discos de PVC forneceram um coeficiente de atrito µ≈0.24 que é aproximadamente constante e

independente da rugosidade superficial em toda a gama dos ensaios realizados. Este comportamento

pode ser explicado pelo facto de que as propriedades mecânicas do PVC e do chumbo serem muito

similares em comparação com o par chumbo-aço. Por outras palavras o contacto entre superfícies

com propriedades mecânicas muito próximas reduz (ou elimina) a interacção entre as asperezas, pois

o grau de penetração e deformação das asperezas nos discos é relativamente pequeno. Como

resultado deste fenómeno, a resistência ao deslizamento em condições de atrito seco, poderá ser

independente da rugosidade superficial inicial do pino e dos discos do par de material.

Contudo os resultados resultantes da interacção dos pares Pb/ AISI 316L e Pb/ PVC, ajudam a

entender as diferenças básicas existente no comportamento do atrito entre os processos de

deformação e de corte. No caso dos processos de deformação as diferenças existentes nas

propriedades mecânicas da peça a trabalhar e da ferramenta é muito reduzida quando comparado

com as diferenças verificadas nos processos de corte e esta é a razão pelo que o comportamento do

atrito nos processos de deformação em condições de atrito seco é pouco sensível à influência da

rugosidade superficial em relação aos processos de corte.

49

a)

b)

Figura 4.3– Comportamento do coeficiente de atrito: a) Influência da rugosidade superficial no valor do coeficiente de atrito no ensaio pino-no-disco; b) O mesmo gráfico com o eixo horizontal em escala logarítmica.

Contrariamente, à região à direita do gráfico (região em que a rugosidade superficial é elevada) o

nível de interacção entre as asperezas é maior. As pontas das asperezas dos discos (material com

dureza superior em relação ao do pino), penetram no interior do pino produzindo aparas resultantes

do micro-corte ao nível das asperezas (Figura 4.4). Este resulta da forte resistência ao deslizamento

descrito por Bowden e Tabor (1964) e explica o aumento observado do valor do coeficiente de atrito

na interacção de materiais com rugosidade superficial elevada (Figura 4.5).

0.0

0.1

0.2

0.3

0.4

0.5

0.6

0.7

0.8

0.9

1.0

0.0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1.0

Co

efi

ce

inte

de

atr

ito

Ra [um]

Pino-no-disco Pb/AISI 316L

Pino-no-disco Pb/PVC

Pino-no-disco Cu/AISI 316L

Ajuste Pino-no-disco Pb/AISI 316L

Ajuste Pino-no-disco Pb/PVC

Ajuste Pino-no-disco Cu/AISI 316L

0.0

0.1

0.2

0.3

0.4

0.5

0.6

0.7

0.8

0.9

1.0

0.0 0.0 0.1 1.0

Co

efi

ce

inte

de

atr

ito

Log Ra [um]

Pino-no-disco Pb/AISI 316L

Pino-no-disco Pb/PVC

Pino-no-disco Cu/AISI 316L

Ajuste Pino-no-disco Pb/AISI 316L

Ajuste Pino-no-disco Pb/PVC

Ajuste Pino-no-disco Cu/AISI 316L

50

a) b)

c) d)

Figura 4.4 – Depósitos de chumbo na superfície dos discos: a) Disco de AISI 316 L com Ra=0.07 um;

b) Disco de PVC com Ra=0.65 um; c) disco de AISI 316 L com Ra=0.8 um; d) O mesmo disco

mostrado em (b) ampliado com recurso a microscópio óptico.

0.1 um < Ra < 0.5 µm Ra < 0.1 µm Ra > 0.5 µm Independente de Ra

Figura 4.5– Ilustração que mostra a interacção entre o pino e o disco para diferentes valores de rugosidade

As curvas de calibração para o ensaio de anel foram determinadas a partir do método de elementos

finitos. A simulação numérica foi obtida com o uso do software I-FORM2 desenvolvido pela área

científica de Tecnologia Mecânica do IST. A Figura 4.6 apresenta as curvas de calibração e os

resultados experimentais obtidos na compressão dos anéis para os dois pares de materiais utilizados.

Para o caso Cu/AISI 316L o valor mínimo do coeficiente de atrito observado é ligeiramente inferior em

relação ao caso Pb/AISI 316L. Também é possível observar que quando os provetes de cobre são

comprimidos, o coeficiente de atrito atinge rapidamente o valor máximo (𝜇 = 1), demonstrando assim,

pouca dependência da rugosidade superficial dos pratos relativamente ao caso do chumbo.

1 mm

51

a)

b)

Figura 4.6 – Resultados experimentais e curvas de calibração resultante do modelo de atrito de Coulomb: a)

Ensaios realizados com provete de chumbo; b) Ensaios realizados com provete de cobre

-50%

-30%

-10%

10%

30%

50%

70%

90%

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60%

(Do

-Di)

/Do

(h0-hi)/h0

Ra = 0.04 um seco Ra = 0.06 um seco

Ra = 0.12 um seco Ra = 0.20 um seco

Ra = 0.35 um seco Ra = 0.65 um seco

Ra = 0.04 um lubrificado Ra = 0.12 um lubrificado

Ra = 0.35 um lubrificado Ra = 0.65 um lubrificado

u = 0.00 u = 0.05

u = 0.10 u = 0.18

u = 0.20 u = 0.25

u = 0.30 u = 0.40

u = 0.50 u = 1.00

-50%

-30%

-10%

10%

30%

50%

70%

90%

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60%

(Do

-Di)

/Do

(h0-hi)/h0

Ra = 0.04 um seco Ra = 0.06 um seco

Ra = 0.12 um seco Ra = 0.20 um seco

Ra = 0.65 um seco Ra = 0.04 um lubrificado

Ra = 0.12 um lubrificado Ra = 0.35 um lubrificado

Ra = 0.65 um lubrificado u = 0.00

u = 0.050 u = 0.055

u = 0.09 u = 0.10

u = 0.162 u = 0.30

u = 0.70 u = 1.00

Lubrificado

Seco

Seco

Lubrificado

52

Através dos resultados experimentas para o par tribológico Pb/AISI 316L, verificou-se também que,

em condições de atrito seco, a redução do diâmetro interior do provete durante o ensaio é mais

acentuada à medida que aumenta a rugosidade dos pratos, no entanto, o diâmetro interior final tende

manter-se constante a partir de um certo valor da rugosidade Ra>0.15 µm. Este efeito de “saturação

da geometria do provete” também se verifica para o par tribológico Cu/AISI 316L o valor da

rugosidade superficial no qual se regista a saturação da geometria do provete encontra-se nos

Ra=0.10 µm.

Nos ensaios realizados ao aplicar um lubrificante líquido, observa-se um decréscimo do valor do

coeficiente de atrito para toda a gama de rugosidades ensaiadas. É de notar que, a maior diferença

no valor de coeficiente de atrito para as diferentes condições ensaiadas verifica-se para os ensaios

realizados nos pratos com os valores de rugosidade mais elevados.

Tal como foi verificado nos ensaios de pino-no-disco, o material do provete também se encontra

depositado nos pratos de compressão. Por isso, durante as etapas de compressão, os pratos foram

limpos com etanol para evitar depósitos de material (Figura 4.7), para que as manchas não

influenciassem os resultados.

Figura 4.7 – Depósitos de cobre nos pratos depois de cada etapa do ensaio realizado.

4.3 Influência do meio envolvente

A forma da interacção entre as superfícies é de maior interesse nos estudos no âmbito da Tribologia e

ocorre em diferentes tipos de atmosferas envolventes, no entanto é comum supor que um meio

envolvente, quando controlado, seja um lubrificante líquido. Mesmo nas condições muitas vezes

referidas de “atrito seco”, o meio envolvente é composto por uma mistura de gases que formam a

atmosfera terrestre. Entre as superfícies em estudo, normalmente, o par tribológico não se encontra

em contacto directo, mas sim as camadas oxidadas, nitrogenadas e vapor de água.

Nos ensaios de pino-no-disco, o material do pino na interface, é constantemente removido pelo disco

durante o ensaio. Com a introdução da atmosfera controlada, pode-se observar o impacto da

presença das camadas oxidadas na interface sobre o coeficiente de atrito. Da Figura 4.8 observa-se

que, os ensaios realizados numa atmosfera controlada constituída basicamente de azoto (N2), são

semelhantes aos realizados na atmosfera terrestre pelo facto de que este é constituído

53

maioritariamente por azoto. Porém, quando os ensaios são realizados numa atmosfera susceptível de

promover a formação de óxidos, como é o caso do oxigénio (O2) constata-se uma subida do

coeficiente de atrito de aproximadamente 10%, em relação ao valor obtido com a utilização do ar

atmosférico como meio envolvente.

Figura 4.8 – Influência da atmosfera do meio envolvente no coeficiente de atrito.

A Figura 4.9 mostra uma redução significativa do coeficiente de atrito para ambos os casos

analisados (chumbo e cobre) relativamente aos ensaios realizados em condições de atrito seco

(Figura 4.3), com a aplicação de um lubrificante líquido (Mobilgear 627). Outro facto interessante é

que as condições de lubrificação também dependem do par de material utilizado: para o par Cu/AISI

316L, o coeficiente de atrito mantém-se constante (µ≈0.19), independente da velocidade relativa na

interface. Porém, um resultado diferente foi obtido com o par Pb/AISI 316 L, que mostrou ser muito

sensível a baixas velocidades relativas na interface (≤ 0.3 m/s), para maiores velocidades relativa na

interface de contacto, este tende a um valor constante de 0.13.

A influência da velocidade relativa na interface de contacto que se verifica no caso do par tribológico

Pb/AISI 316 L é justificada pela presença do regime de lubrificação hidrodinâmica, devido a formação

de “poças lubrificantes”, que é facilitada pela presença de metais macios.

0

0.1

0.2

0.3

0.4

0.5

0.6

0.7

0.8

0.9

1

0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1

Co

efi

cie

nte

de

atr

ito

Ra [um]

Pino-no-disco Pb/AISI 316L ar

Pino-no-disco Pb/AISI 316L O2

Pino-no-disco Pb/AISI 316L N2

Ajuste Pino-no-disco Pb/AISI ar

Ajuste Pino-no-disco Pb/AISI 316L O2

Ajuste Pino-no-disco Pb/AISI 316L N2

54

Figura 4.9 – Coeficiente de atrito em função da velocidade relativa na interface para condições de atrito

lubrificado

A Figura 4.10 apresenta o coeficiente de atrito em função da rugosidade superficial em condições de

atrito lubrificado realizados nos ensaios de anel e pino-no-disco respectivamente. Para ambos os

casos, verificou-se uma redução significativa (≥55%) do valor do coeficiente atrito em condições

lubrificadas relativamente ao atrito seco. De referir ainda, que para o caso do par Pb/AISI 316 L, esta

redução tende a aumentar com a velocidade relativa na interface, enquanto para o caso do par

Cu/AISI 316L, esta redução do coeficiente de atrito é praticamente constante e independente da

velocidade relativa na interface.

Da comparação feita, pode-se observar que, as diferentes técnicas de caracterização tribologica

apresentam a mesma influência da rugosidade superficial no coeficiente de atrito. No entanto para os

resultados obtidos no ensaio de anel (Figura 4.10), verifica-se uma tendência de subestimar o valor

do coeficiente de atrito, para ambos os casos estudados, diferendo dos resultados obtidos no ensaio

de pino-no-disco. Maiores diferenças são observadas para valores elevados de rugosidade superficial

(Ra).

0

0.1

0.2

0.3

0.4

0.5

0.6

0.7

0.8

0.9

1

0.0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8

Co

efi

cie

nte

de

atr

ito

Velocidade na interface [m/s]

Pb/AISI 316L

Cu/AISI 316L

Ajuste Pb/AISI 316L

Ajuste Cu/AISI 316L

55

Figura 4.10 – Análise comparativa das técnicas de avaliação de atrito em condições de lubrificação.

4.4 Avaliação comparativa de ensaios

Durante a fase de preparação superficial dos discos e pratos de compressão, é necessário garantir

que os métodos de preparação das superfícies permitem texturas semelhantes e comparáveis

conseguindo assim, reproduzir as mesmas condições nos ensaios tribológicos realizados. A Figura

4.11 apresenta esta análise, realizada entre as superfícies dos discos e pratos, e como pode ser

observado, as texturas superficiais para os dois casos (pino-no-disco e ensaio de anel) são

semelhantes, permitindo assim a sua comparação.

Figura 4.11 – Comparação da textura superficial dos pratos e discos utilizados nos ensaios de anel e de

pino-no-disco

0

0.1

0.2

0.3

0.4

0.5

0.6

0 0.2 0.4 0.6 0.8 1

Co

efi

ce

inte

de

atr

ito

Ra [um]

Pino-no-disco Pb/AISI 316L

Anel Pb/AISI 316L

Pino-no-disco Cu/AISI 316L

Anel Cu/AISI 316L

Ajuste Pino-no-disco Pb/AISI 316L

Ajuste Anel Pb/AISI 316L

Ajuste Pino-no-disco Cu/AISI 316L

Ajuste Anel Cu/AISI 316L

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2

Ry,R

z [

µm

]

Ra [µm]

Ry_Ensaio de Anel Pb/AISI 316 L

Ry_Ensaio de Anel Cu/AISI 316 L

Ry_Pino-no-disco Pb/AISI 316 L

Ry_Pino-no-disco Cu/AISI 316 L

Rz_Ensaio de Anel Pb/AISI 316 L

Rz_Ensaio de Anel Cu/AISI 316 L

Rz_Pino-no-disco Pb/AISI 316 L

Rz_Pino-no-disco Cu/AISI 316 L

Ajuste Ry

Ajuste Rz

56

A precisão e fiabilidade dos resultados obtidos nos ensaios de pino-no-disco, para todos os casos

estudados foram avaliadas com o ensaio de anel e de corte em condições laboratoriais. Para o

ensaio de corte, a escolha da velocidade de corte, como a preparação superficial das ferramentas de

corte, foi feita cuidadosamente de forma a ser semelhantes aos utilizados no ensaio de pino-no-disco.

No caso das ferramentas de corte, procurou-se ter o mesmo alinhamento das estrias com o verificado

no ensaio de pino-no-disco permitindo assim possível a comparação dos valores obtidos nos três

tipos de ensaios. De realçar que, estes ajustes são muito importantes já que, o coeficiente de atrito

depende também da morfologia superficial e da dureza verificada na ponta das suas estrias como

mostrado recentemente por Menezes e co-autores (2009).

A Figura 4.12 apresenta a análise comparativa do valor de coeficiente de atrito obtido nos ensaios

descritos no Capítulo 3. De referir, quando comparados os resultados obtidos no ensaio pino-no-disco

com os obtidos no processo de corte relativamente ao par de material Pb/AISI 316L, verifica-se que

para rugosidades inferiores a 0.25 µm, o coeficiente de atrito obtido no processo de corte é superior

em relação ao do pino-no-disco. A presença de superfícies recém-formadas no processo de corte de

metais, para esta zona de rugosidades, não é possível recriar na sua totalidade com o uso de ensaios

de pino-no-disco e de anel. Outro facto importante que também deve ser referido, é que nesta região

existe uma grande influência do efeito de escala. Devido à dificuldade de isolar os efeitos resultantes

das forças (tangencial e normal) que actuam na zona do raio de bico e da face de saída, o valor

medido pelo sensor piezoeléctrico utilizado no processo de corte é influenciado significativamente por

estas componentes, já que para estes casos (Ra <0.25 µm), as forças possuem a mesma magnitude.

Na outra região em que o coeficiente de atrito obtido no ensaio pino-no-disco é superior relativamente

ao obtido no processo de corte (Ra >0.25 µm), justifica-se pelo facto de que nesta zona o ensaio

realizado no pino-no-disco é mais propenso a formação de camadas de óxidos na interface entre o

pino e o disco originando coeficiente de atrito superior, enquanto no processo de corte existe sempre

a presença de superfícies recém-formadas. De realçar que para os casos em que a rugosidade na

superfície de ataque da ferramenta de corte é muito superior ao da face de saída o efeito de escala

referido anteriormente é bastante reduzido.

Na mesma figura, também se pode verificar que o ensaio de anel apresenta uma evolução menos

definida que o do pino-no-disco e do ensaio de corte. Para rugosidades inferiores a 0.1 µm, o ensaio

de anel apresenta um resultado próximo do ensaio de pino-no-disco. No entanto, ao aumentar o valor

da rugosidade do prato de compressão, o valor do coeficiente de atrito atinge rapidamente o seu valor

máximo. O facto da curva de calibração depender simplesmente da sensibilidade da geometria do

provete, isto indica que a geometria utilizada pode não ser a mais apropriada para estudos

tribológicos para valores de atrito elevados. O mesmo pode ser verificado na Figura 4.6, em que a

curva de calibração para µ = 0.5 se encontra muito próximo da curva para o atrito máximo µ = 1.

57

Pode-se concluir que, nas condições dos ensaios realizados ao longo deste trabalho verificou-se que

a morfologia superficial, a rugosidade e as propriedades mecânicas dos pinos e discos possuem

grande relevância no comportamento de atrito entre os diferentes pares de materiais.

a)

b)

Figura 4.12 – Análise comparativa das técnicas de avaliação de atrito: a) Influência das propriedades

mecânicas e da rugosidade superficial no coeficiente de atrito; b) O mesmo gráfico com escala

logarítmica no eixo horizontal.

A comparação entre os dois tipos de ensaios tribológicos nomeadamente, o ensaio de pino-no-disco

e os resultados obtidos directamente no processo de corte por arranque de apara para o par Pb/AISI

316L, no geral mostram uma boa concordância. No caso do ensaio de anel, a sua rápida saturação

no que diz respeito à rugosidade superficial, torna-o menos apropriado para descrever o atrito no

corte.

0.0

0.2

0.4

0.6

0.8

1.0

1.2

0.0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1.0

Co

efi

ce

inte

de

atr

ito

Ra [um]

Pino-no-disco Pb/AISI 316L

Anel Pb/AISI 316L

Corte Ortogonal Pb/AISI 316L

Pino-no-disco Cu/AISI 316L

Anel Cu/AISI 316L

Ajuste Pino-no-disco Pb/AISI 316L

Ajuste Anel Pb/AISI 316L

Ajuste Corte Ortogonal Pb/AISI 316L

Ajuste Pino-no-disco Cu/AISI 316L

Ajuste Anel Cu/AISI 316L

0

0.2

0.4

0.6

0.8

1

1.2

0.0 0.0 0.1 1.0

Co

efi

ce

inte

de

atr

ito

Ra [um]

Pino-no-disco Pb/AISI 316L

Anel Pb/AISI 316L

Corte Ortogonal Pb/AISI 316L

Pino-no-disco Cu/AISI 316L

Anel Cu/AISI 316L

Ajuste Pino-no-disco Pb/AISI 316L

Ajuste Anel Pb/AISI 316L

Ajuste Corte Ortogonal Pb/AISI 316L

Ajuste Pino-no-disco Cu/AISI 316L

Ajuste Anel Cu/AISI 316L

58

59

Capítulo 5

5 Conclusões e perspectivas de trabalho futuro

Este capítulo encerra a presente dissertação de mestrado, apresentando as conclusões sobre os

resultados obtidos, bem como perspectivando novas oportunidades de investigação. Desta forma, o

capítulo está organizado numa primeira secção onde são apresentadas as principais contribuições

deste trabalho de investigação, e numa segunda secção que procura deixar indicações para futuros

desenvolvimentos no domínio da experimentação e da modelação numérica do fenómeno tribológico

que ocorre no processo de corte por arranque de apara.

5.1 Conclusões

A avaliação do coeficiente de atrito nos processos reais de corte e de deformação, além de complexa,

é uma tarefa morosa. A realização dos ensaios tribológicos em equipamentos do tipo pino-no-disco

permite agilizar o processo de quantificação do atrito e das influências das suas principais variáveis

operativas, mas é necessário seguir procedimentos adequados de modo a permitir reproduzir as

condições tribológicas representativas do caso de estudo real.

A velocidade relativa na interface (na gama de velocidade utilizada neste trabalho), não possui

influência significativa no coeficiente de atrito, para os ensaios realizados em condições de atrito seco

em todos os casos analisados. Contrariamente aos ensaios realizados em condições de atrito seco,

nos ensaios realizados em condições de atrito lubrificado, constatou-se uma influência para baixas

velocidades (≤ 0.3 m/s) para os pares de materiais com propriedades mecânicas similares.

A utilização de líquido lubrificante possibilitou uma redução significativa (55%) do coeficiente de atrito

relativamente aos ensaios realizados no pino-no-disco e de anel em condições de atrito seco.

Verificou-se também que a maior diferença entre os resultados a seco e a lubrificado residem nos

casos com elevada rugosidade superficial. A eficácia do lubrificante também depende das

propriedades mecânicas do par tribológico em estudo.

Observou-se também que, a atmosfera envolvente possui grande influência no coeficiente de atrito,

tendo sido observado um aumento significativo no caso em que foi utilizado oxigénio (O2) como fluido

do meio envolvente, sendo que este aumento deve-se à grande capacidade de gerar óxidos que o

oxigénio tem quando exposto a superfícies metálicas. Para o caso em que foi utilizado o nitrogénio

(N2) como atmosfera envolvente não se observou grande influência, relativamente aos ensaios

realizados com a utilização do ar atmosférico, facto que é justificado pela presença maioritária deste

gás no ar atmosférico.

60

Contrariamente ao que tem sido considerado nos ensaios de anel, desde a sua primeira

apresentação, ficou demonstrado neste trabalho que as texturas superficiais dos pratos utilizados têm

grande influência no coeficiente de atrito, pelo que o seu controlo não deve ser desprezado. O ensaio

de anel demonstrou ser mais adequado para condições de baixo atrito, já que para os casos em

condições de atrito elevado a geometria típica do provete tende a saturar, pelo que nestas condições

as curvas de calibração de atrito se confundem entre si.

Este trabalho permitiu mostrar que com o pino-no-disco, é possível avaliar o coeficiente de atrito no

corte por arranque de apara quando combinado com um controlo adequado da morfologia e

rugosidade superficial. Ao realizar o ensaio em apenas uma volta do disco de forma que o pino

deslize sobre a superfície do disco apenas uma vez, elimina o problema levantado por muitos

autores, como causa do ensaio ser inadequado para reproduzir as condições num processo de corte

real.

Os resultados obtidos também permitem concluir que a diferença existente nas propriedades

mecânicas do material dos pinos e discos faz com que existam variações significativas do coeficiente

de atrito com a rugosidade superficial, enquanto para materiais com propriedades mecânicas

similares (tensão e dureza), o coeficiente de atrito é praticamente constante e independente da

rugosidade superficial, em condições de atrito seco.

5.2 Perspectivas de trabalho futuro

Durante a realização deste trabalho observou-se uma grande influência das propriedades mecânicas

dos materiais no valor do coeficiente de atrito, pelo que o autor sugere uma investigação futura mais

aprofundada da influência das propriedades metalúrgicas dos discos e/ou pinos sendo que para isso

poderá ser necessário o recurso aos tratamentos térmicos.

Dado o grau de complexidade elevado para se isolar os efeitos resultantes das forças que actuam na

face de saída (corte ortogonal) medido pelo sensor piezoeléctrico, uma análise sobre influência da

rugosidade superficial poderá ajudar a quantificar o seu efeito sobre o coeficiente de atrito e portanto

aumentar a precisão dos valores encontrados frequentemente nesses ensaios de corte ortogonal.

Um estudo experimental de corte ortogonal focado só nas várias zonas de interface entre apara-face

de ataque, aresta do corte e peça-face de saída tem que ser efectuado, com o objectivo de conseguir

quantificar a influência de cada uma destas componentes no mecanismo de atrito no corte por

arranque de apara.

Novos acessórios devem ser introduzidos no novo equipamento de ensaio pino-no-disco para permitir

a realização de ensaios com geração de superfícies novas, pelo que o autor sugere um estudo

alargado dos efeitos do meio envolventes possuem sobre as superfícies recém-formadas,

identificando as reacções químicas ocorridas entre as superfícies em contacto e quantificando a sua

contribuição para o mecanismo de atrito.

61

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66

i

Anexos

Encoder

Subrotina (Diagrama de Bloco)

ii

Data Sheet

iii

Características do óleo utilizado

Mobilgear 627

ISO Viscosity Grade 100

Viscosity, ASTM D 445

cSt @ 40º C 100

cSt @ 100º C 12.0

Viscosity Index, ASTM D 2270 98

Pour Point, ºC, ASTM D 97 -27

Flash Point, ºC, ASTM D 92 235

Density @15.6º C, ASTM D 4052, kg/l

0.89

Timken OK Load, ASTM D 2782, lb

65

Weld Load, kg 250

Load Wear Index, kgf 48

FZG Scuffing, DIN 51534, A/8.3/90, Fail Stage

12+

Rust protection, ASTM D 665, Sea Water

Pass

Copper Strip Corrosion, ASTM D 130, 3 hrs @ 100º C

1B

Demulsibility, ASTM D 1401, @ 54º C Time to 3ml emulsion, minutes @ 82º C

30

Foam Test, ASTM D 892, Seq I and II, Tendency/Stability, ml/ml

0/0

iv